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    Revista Intersaberes | vol. 7 n.13, p. 8 - 28 | jan. jun. 2012 |ISSN 1809-7286

    Conceito de mediao em Vygotsky, Leontiev eWertsch

    The conception of mediation in Vygotsky, Leontiev andWertsch

    Onilza Borges Martins1; Alvino Moser2

    1 Ps-doutorado em Educao Superior a Distncia, em Madrid (UNED), Barcelona (Universidade

    Autnoma) e Paris (UNESCO); doutorado em Educao (UFSM). Consultora Pedaggica Geral emEaD (Facinter/UFPR), docente e pesquisadora em EaD (UFPR), especialista em Gesto da Qualidade eassessora tcnica da Direo-Geral da Facinter (Faculdade Internacional de Curitiba).

    2 Professor Ps-Doutor em Filosofia: tica e Epistemologia, pela Universidade de Louvain La Neuve,Blgica.

    RESUMO

    A inteno do presente estudo discutir a mediao como ato de interao entre

    um mediador e um mediado (SOUZA, MACHADO, 2001, p. 39). Foram abordadas asvises dos autores James Wertsch, Michel Cole e Jerome Bruner, bem como oconceito na perspectiva do desenvolvimento sociocultural da atualidade. Os meiosartificiais, seus instrumentos e a gama de atividades que so operadas no referidoprocesso mereceram destaque pelos autores. Finalmente, foi relatado como odesenvolvimento da comunicao pela Web 2.0 apontou para a era digital, sendopossvel reconhecer os novos meios de virtualidade no processo de ensino-aprendizagem.

    Palavras-chave:Mediao sciohistrica e sociocultural. Vygotsky. Wertsch. Cole.

    ABSTRACT

    The intent of this paper is to discuss the mediation as an act of interaction that occursbetween a mediator and a mediated person (SOUZA Machado, 2001, p. 39). As a result,the views of authors James Wertsch, Michel Cole and Jerome Bruner, as well as, theconcept from the perspective of todays socio-cultural development were discussed.The artificial means, their instruments and the range of activities that are operated in

    that process, were pointed out by the authors. Finally, it was reported as the

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    development of communication by WEB 2.0 pointed to the digital age, being able torecognize the new means of virtuality in the teaching-learning process.

    Key-words:Mediation. Socio Historical and Cultural. Vygotsky. Wertsch. Cole.

    Introduo

    No presente trabalho, a preocupao inicial discutir a mediao como um

    ato de interao que ocorre entre um mediador e um mediado (SOUZA, MACHADO,

    2001, p. 39). Ser apresentada, na sequncia, a viso dos autores James Wertsch,

    Michel Cole e Jerome Bruner e como eles discutiram esse conceito na perspectiva

    do desenvolvimento sociocultural da atualidade, enfatizando como a incluso dos

    elementos mediacionais surgiram, com sugestes a favor de mudanas no conceito

    de mediao, sob o ponto de vista pedaggico. Finalmente, indicou-se, de modo

    muito breve, o desenvolvimento da comunicao pela Web 2.0, o que aponta para a

    era digital e os novos meios de interatividade no processo de ensino-aprendizagem.

    Apresentao do conceito de mediao

    Vygotsky teve como finalidade, em seus trabalhos, edificar uma psicologia e

    uma pedagogia no quadro terico-epistemolgico do marxismo. Para isso, usou

    como exemplo a metfora do conceito de trabalho em Marx, que deu origem ao

    conceito de mediao. A viso mais importante para compreendermos as teorias

    vygotskyanas sobre o funcionamento do crebro humano a mediao. De acordo

    com Vygotsky,

    Mediao em termos genricos o processo de interveno de umelemento intermedirio numa relao; a relao deixa, ento, de serdireta e passa a ser mediada por esse elemento (OLIVEIRA, 2002, p. 26).

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    Acrescenta, alm disso, que:

    O processo de mediao, por meio de instrumentos e signos, fundamental para o desenvolvimento das funes psicolgicassuperiores, distinguindo o homem dos outros animais. A mediao umprocesso essencial para tornar possvel as atividades psicolgicasvoluntrias, intencionais, controladas pelo prprio indivduo(Idem, p. 33).

    Com base nessas reflexes, tanto no trabalho como na ao sobre o mundo

    para transform-lo, o homem usa de instrumentos. Para plantar uma semente, ao

    cavar um buraco, ele usa de uma p, e os exemplos podem ser citados ad infinitum.

    Assim, quando o crebro humano aprende um conceito, usa a mediao das

    palavras ou a prpria linguagem. No h como pensar se no utilizarmos, sempre,

    palavras ou imagens. Por isso, em vez da linguagem, podemos falar de umamediao semitica. Marta Kohl de Oliveira, ao tratar da aprendizagem em

    Vygotsky, afirma: "[...] a principal funo da linguagem a de intercmbio social:

    para se comunicar com seus semelhantes que o homem cria e utiliza os sistemas de

    linguagens" (2002, p. 42).

    Se toda ao humana supe uma mediao, do mesmo modo a

    aprendizagem se faz com a mediao semitica ou pela interao com o outro, na

    interao social, na qual as palavras so empregadas como meio de comunicao ou

    de interao. A essa mediao, Vygotsky e seus discpulos denominaram de

    sociointeracionismo a ao se d numa interao scio-histrica ou histrico-

    cultural.

    Contudo, para Jerome Bruner e Michel Cole:

    A psicologia cultural diferente dos ramos especializados da psicologiana medida em que ela no surge como uma subdisciplina aps a funoda psicologia experimental; a ideia da psicologia cultural antecede apsicologia experimental e foi apresentada na sua fundao (1990, p. 279

    apud WERTSCH et al.,1998b, p. 13).

    James Wertsch (loc. cit.) prefere o termo sociocultural em vez dos termos

    anteriormente referidos, por ser mais adequado e mais especfico. Bruner afirma

    que a cultura e a procura do significado dentro da cultura so as prprias causas da

    ao humana (1969, p.20). Portanto, algo mais do que o significado intercultural

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    ou histrico-cultural, que indicaria que o significado e a ao dependeriam das

    variaes histricas, sociais e culturais.

    O termo sociocultural inscreve a ao e o significado da ao no contexto:

    ato, agente, instrumentos propsitos(BURKE, 1969, p. 445). No se trata, pois, de

    encarar a ao como algo apenas teleolgico, mas, sim, com parte do quadro da

    cultura, na qual a ao se produz. o contexto sociocultural que confere significado

    ao.

    A mediao era vista por Vygotsky sob os aspectos: signo, palavra esmbolo.

    As contribuies dos autores M. Cole e J. Wertsch e Bruner conferem uma

    determinao mais ampla ou restrita, conforme o ponto de vista. Nas perspectivasde Vygotsky e Leontiev, os conceitos de meios mediacionais e de ao mediada

    so essenciais para compreender o verdadeiro significado ou processo da

    aprendizagem.

    Se falarmos de meios, significa que o acesso do homem ou de sua mente ao

    mundo no se d de modo direto, mas por uma mediao que lhe permite um

    acesso indireto. Lembrando o tringulo do significado de Ogden e Richards (1976), a

    passagem da coisa ou do objeto palavra no se d de maneira direta, mas por

    meio do conceito. E o conceito envolve a mediao das interaes e interconexes

    neuronais (a passagem dessas interconexes conscincia em que se produz o

    conceito outra questo, que, alis, est em aberto).

    PENSAMENTO (MENTE)

    COISA PALAVRA

    Figura 1 Esquema da Teoria ConceitualistaFonte: Adaptado de OGDEN;RICHARDS (1976).

    Convm, contudo, salientar que os meios ou ferramentas que constituem a

    mediao no produzem o significado nem a aprendizagem, que algo prprio da

    ao de cada indivduo, porque uma ferramenta ou um meio apenas possui uma

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    ao na medida em que os indivduos os usam (WERTSCH et al., 1998b, p. 28).

    Conforme os citados autores, os meios culturais modulam a ao, o que se pode

    notar ao observar a variao dos significados, segundo o uso que delas fazem as

    pessoas: meaning is use, diria Wittgenstein (1996, p.43). O significado est nautilizao da palavra realizada pelas pessoas. Os meios so opacos por si ss:

    dependem do contexto, da cultura e da utilizao que se faz deles. No possvel,

    portanto, dar significado a uma rvore usando a palavra cozinha. Dessa maneira,

    parece existir uma dinmica prpria da mediao.

    Ao ser includa no processo do comportamento, a ferramenta psicolgicaaltera todo o fluxo e a estrutura das funes mentais. Assim se faz aodeterminar a estrutura de um novo ato instrumental, semelhante

    ferramenta tcnica que altera o processo de uma adaptao natural aodeterminar as formas das operaes de trabalho (VYGOTSKY, 1981, p. 137apud WERTSCH et al.,1998b, loc.cit.).

    H, portanto, uma funo dinmica da mediao, como se pode inferir da

    metfora empregada por esse autor para explicitar como os meios presentes no

    processo de mediao atualmente so dinmicos. Trata-se da metfora do salto

    com vara. Sem vara, o salto humano alcanou apenas pouco mais de 2 metros de

    altura. A vara foi usada para o salto em 1896, quando o atleta deveria correr 38,1 m

    com a vara para saltar sobre uma barra suspensa por dois pilares. Como a vara era

    pesada e pouco flexvel, o salto foi de 3,30 m.

    A partir de 1900, foi iniciado o uso de varas de bambu, que permitiam saltos

    mais altos. Em 1943, Cornelius Warmerdam saltou 5,78 m, recorde que durou at

    1959. Aps, foram introduzidas as varas de alumnio e, finalmente, as varas feitas de

    fibra de vidro, que permitiram a Sergei Bubka saltar mais de 7 metros (WERTSCH etal.,1998b, p. 63-65).

    Essa metfora pode ser observada na ao de saltar e em como o mediador

    pode influenciar no resultado dessa ao. Em relao aprendizagem e ao ensino,

    se fizermos um retrospecto sobre as formas de ensinar, necessrio comear da

    poca em que o nico meio empregado era a palavra do mestre. Posteriormente,

    surgiu a lousa e o quadro-negro ou quadro de giz, que foram superados, na sua

    maioria, pela introduo dos cadernos, nos quais os alunos anotavam os pontos

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    ditados pelo mestre. Esse mtodo tornou-se obsoleto quando foram introduzidos

    os textos didticos.

    Nas duas ltimas dcadas do sculo XX e no incio do sculo XXI, os meios

    virtuais e digitais introduziram o ensino no ciberespao. A mediao virtual

    expandiu-se e ampliou as possibilidades de aprendizagem e de ensino (uma vez que

    os alunos desejem aprender, pois ningum aprende se no estiver motivado).

    Ao finalizar sua pesquisa, Wertsch (Idem, p. 68) afirmou que sua teoria

    sociocultural tem como objetivo superar a dicotomia indivduo-sociedade. Para ele,

    os membros da antinomia existem em interao dialtica, e no como objetos

    separados (p. 68). Dessa forma, no se pode entender a mediao social naaprendizagem como algo isolado: todos os instrumentos usados para a mediao

    esto interagindo dialeticamente com o contedo que se pretende ensinar.

    Como as novas geraes de estudantes NET e NEXT nasceram e esto

    imersas no meio digital e virtual, adquiriram novas habilidades e capacidades e

    perderam outras. Por exemplo, a durao de seu tempo de ateno foi reduzida.

    Ensinar de maneira expositiva tem pouca eficcia para essas geraes, que no

    esto dispostas a ouvir longas exposies (TAPSCOTT, 2010, p. 129). O meio dita a

    forma de comunicao e de interao entre o ensino e a aprendizagem ,conforme

    Vygotsky (1998, p. 73) assim esclarece:

    [...] O uso de meios artificiais a transio para a atividade mediada muda, fundamentalmente, todas as operaes psicolgicas, assim como ouso de instrumentos amplia de forma ilimitada a gama de atividades emcujo interior as novas funes psicolgicas podem operar. Nesse

    contexto, podemos usar a lgica superior, ou comportamento superiorcom referncia combinao entre o instrumento e o signo na atividadepsicolgica.

    A mediao e as funes mentais superiores

    O tema acima citado sempre constituiu preocupao dos autores que tratam

    do conhecimento, desde os pr-socrticos at os atuais. O pensamento que

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    antecede o perodo pr-socrtico era envolto em mitos, supersties e em certa

    religiosidade.

    Para Herclito, o pensamento ou o conhecimento vinha da iluminao de um

    Logos nico. Plato fala da reminiscncia (anamnesis). Aristteles trata daformao dos conceitos a partir das percepes de onde o intelecto extrai tais

    conceitos. Os empiristas, como Locke e Hume, defenderam que as ideias e os

    conceitos surgiam dos dados ou das impresses dos sentidos.

    Vygotsky trata da gnese das funes mentais superiores por meio do

    conceito marxista de mediao, como j exposto. A mente forma os conceitos pela

    mediao de signos, e a linguagem passa a ser o meio ou o modo mais importante

    que os seres humanos possuem para formar conceitos e para aprender, mas

    sempre no contexto da interao social. Merece destaque o papel da funo

    semitica para a estruturao da vida mental ou, em outros termos, para a

    construo do conhecimento.

    As formas conscientes do homem aparecem impulsionadas e moldadas pela

    mediao da linguagem: no pensamos sem palavras ( inconcebvel formar um

    conceito sem traduzi-lo em termos semiticos: no pensamos no vcuo). Se o que

    distingue a atividade humana das atividades dos animais, como j o afirmara Marx,

    a atividade que passou a ser intencional, portanto, uma atividade consciente.

    Mas, como explica Marx o surgimento da conscincia? No algo que venha

    de uma psychespiritual, pois sua perspectiva materialista. A conscincia gerada

    na interao social. E essa interao constituda pela linguagem. Concordar com

    Marx adotar o materialismo histrico, no entanto, no deixa de ser um fato de

    que a mediao da linguagem algo de fundamental na formao do conhecimento

    e da prpria conscincia. Seno, como saberia eu que sou eu,e no o outro, o

    tu, outro que se diz eu, mas no o eu que sou, mas que outro, outro eu,

    um alter-ego, como muito bem afirmou W.F. Hegel, em suas obras baseadas na

    Fenomenologia do Esprito (1998).

    A mediao segundo Vygotsky revisitada por Wertsch

    Baseado nos textos de Vygotsky (1981, 1993, 1998), James Wertsch (1998),depois de considerar que a conscincia a faculdade que distingue os humanos dos

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    animais, afirma que essa conscientizao se d por meio de uma internalizao do

    que ocorre nas interaes sociais. Izabel Bustamante Smolka e Eduardo Fleury

    Mortimer, ao comentarem o texto de Wertsch, The Concept of Internalization in

    Vygotskys Account of The Genesis of higher Mental Functions(1985),assim resumemsuas afirmaes:

    Esse conceito no pode ser discutido independentemente das origenssociais da atividade individual, e que a atividade interna quase-socialemsua natureza. (PEDAGOGIA CONTEMPORNEA 2, 2009, p. 50).

    A dimenso cultural deve ser considerada, portanto, como condicionante

    fundamental na internalizao consciente. Esse fato considera tanto a importncia

    como a necessidade de levar em conta a dimenso sociocultural no ensino e na

    aprendizagem. Tal fato ocorre no s na aprendizagem, mas no prprio

    desenvolvimento humano.

    O conceito de Wertsch torna-se explcito se considerarmos suas afirmaes

    apresentadas, em comunicao, no Segundo Congresso Interdisciplinar

    Internacional, na Sucia, em 2009 (Wertsch, 2010).

    Nessa comunicao, o autor procura explicar o que ele entende pormediao no dialogismo que acontece na comunicao, de indivduo para indivduo,

    ou de um escritor para uma audincia. Inicia afirmando que esse tema mereceu, at

    agora, pouco interesse dos estudiosos, seja nas publicaes dos psiclogos, que

    abordam a memria humana, sem, contudo, considerarem os avanos feitos pela

    neurologia ou pelas neurocincias, seja pelos socilogos, que tratam da memria

    coletiva, sem conhecer suficientemente os estudos sobre a memria individual.

    Acrescenta, alm disso, que preciso verificar o papel da mediao na

    formao da memria humana. Nesse sentido, seria possvel chegar a uma

    compreenso sobre a gnese e a formao das funes mentais superiores.

    Os seres humanos so basicamente animais que usam signos, e as formasde ao que desenvolvem especialmente o falar e pensar envolvem umacombinao no redutvel de um agente ativo e uma ferramenta cultural

    (WERTSCH, 2002 .COMUNICAO acima, 2010, p. 123).

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    Essas formas de comunicao ou de pensamento esto distribudasentre o

    ser agente, que seria o professor (no processo de ensino) e a ferramenta cultural,

    nesse caso, a linguagem. Em outros termos, a gnese das funes mentais. Como a

    memria e o pensamento em geral, no so frutos de uma evoluo unicamente docrebro do indivduo, ou essa evoluo no depende unicamente da estrutura do

    indivduo, como j o afirmou Gerard Edelman (1994). Ao contrrio, a biologia, tal

    qual como a conhecemos, uma cincia especfica:

    Ela se interessa pelos fenmenos que se passam no interior duma faixamuita estreita de temperatura (ou de energia) e de presso e quedependem de uma qumica muito particular. Ainda mais se se considerar ofato de que a biologia histrica. A evoluo leva em conta a sequnciahistrica particular de selees naturais que acontecem no seio de umapopulao de organismos diversificados. Isso no levado emconsiderao pela fsica (EDELMAN, 1994, p. 328).

    O desenvolvimento das formas internas das funes mentais se produz em

    conjuno com os determinantes externos, seja por estmulos, como foi

    demonstrado por Eric Kandel (2003), seja por registros textuais ou por desenhos ou

    figuras, como o fez Vygotsky, quando explicou o que mediao. Para apoiar a

    afirmao de Vygotsky, na viso histrica do autor, Wertsch afirma:

    [...] o sistema simblico externo impe ao crebro mais de uma estruturade interface. Ele impe estratgias de busca, novas estratgias dearmazenamento, novas rotas de acesso memria, novas opes tanto nocontrole quanto na anlise do prprio pensamento de cada um (WERTSCH,2010 p. 124).

    importante lembrar que a memria que est armazenada em algum lugar

    do crebro s pode ser acessada exclusivamente pela prpria pessoa, como foi

    constatado com pessoas que sofrem de amnsia por traumatismo e com

    portadores de degenerescncias do crebro, como no mal de Alzheimer. Mas o

    certo que ningum pode lembrar por mim: uma atividade de um sujeito que fala

    na primeira pessoa (EU).

    Contudo, as recordaes que as pessoas tm so suscitadas por uma

    mediao externa ou associaes mentais dos prprios indivduos. As associaes

    mentais ocorrem por interaes neuronais geralmente inconscientes. Assim, por

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    exemplo, os msicos devem memorizar longas sequncias de notas; por isso,

    recorrem s partituras, que constituem a mediao.

    As notas das partituras so os meios semiticos citados por Wertsch para

    explicar a mediao, tanto nas lembranas como na instruo e nas lembranas dasmemrias coletivas. Convm lembrar que, numa recente obra, Henri Atlan procura

    demostrar os modelos que explicariam a memria (ATLAN, 2011, p 264 e ss).

    Tendo em vista os pressupostos acima mencionados, Wetsch afirmou:

    Cada texto, (considerando um determinado coletivo), pressupe umsistema de signos ou uma linguagem geralmente compreendidos, uma demodo geral. Em cada texto, h um sistema de linguagem. Tudo no textoque repetido ou reproduzido, tudo que reproduzvel, tudo que pode

    ser dado fora de um determinado texto (o dado) est em conformidadecom esse sistema de linguagem. No entanto, ao mesmo tempo, cadatexto individual, nico e no repetvel, e aqui reside sua inteirasignificao (seu plano, o propsito, para o qual ele foi criado) (Idem, p.124-125).

    Para o autor, em tela a mediao semitica constituda pelos elementos

    repetveis e reproduzveis, oferecidos por um sistema de linguagem que

    externo ao crebro do indivduo, mas que deixa traos ou marcas ou

    transformaes nas interaes neuronais, possibilitando sua vinda tona pelamemria. Como no texto, o autor usa da linguagem de modo individual e

    insubstituvel e, da mesma forma, a memria vai reproduzir sua interao ou sua

    reao aos meios semiticos da mediao de modo irrepetvel. Isso acontece

    porque nem todos os crebros memorizam os indicadores ou os contextos

    externos do mesmo modo, pois, como afirma Kandel (2003), a memria no

    reproduz os fatos de modo idntico ao modo como eles se produziram.

    A memria realiza composies, articulaes, transformaes, que variam de

    indivduo para indivduo e de um tempo para outro, como se estivesse narrando sua

    prpria histria, contada de modo nico por cada pessoa, conforme seu jeito de

    assimil-la. Duas pessoas no contam a mesma histria que ouviram e, quando

    usam as mesmas frases decoradas ao p da letra, isso no significa que tenham a

    mesma representao consciente e interior. conscincia somente o EU tem

    acesso e ningum mais , por mais que se possam escanear as transformaes

    neurais do crebro, como pensam os materialistas monistas.

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    H, sim, uma mediao externa, que exige a presena de uma mediao:

    [...] a enunciao, com toda a sua individualidade e criatividade, no podede modo algum ser vista como uma combinao completamente livre deformas de linguagem, como pressupe, por exemplo, Saussure (e por

    muitos outros linguistas depois dele), o qual justaps a enunciao (laparole), como um ato puramente individual, ao sistema de linguagemcomo um fenmeno que puramente social e obrigatrio para oindivduo (p. 81, apud WERTSCH, op. cit., p. 125).

    A pessoa que usa a palavra (langue eparole(SAUSSURE, 1969, p. 22 e ss.))

    tem a liberdade, e essa liberdade apenas se d no modo em que combina os

    recursos da linguagem (langue). Mas a linguagem (langue)supe limites para essas

    combinaes, uma vez que se devem seguir as regras da sintaxe prpria de cada

    lngua. Portanto, alm das formas de linguagem, h, tambm, formas de

    combinaes (formas essas que constituem a sintaxe). Desses pressupostos,

    Wertsch conclui que h um dinamismo nas formas da mediao semitica

    envolvida(1998, p. 67-68) algo como o que se d na metfora da vara de salto,

    anteriormente mencionada.

    relevante, tambm, o fato de que Bakhtin, ao comentar como o dilogo se

    processa, tanto na forma presencial quanto na virtual, afirma que a palavra nunca

    pertence ao falante, pois metade dela pertence ao outro (1998, p. 126). Assim, os

    docentes, no cotidiano, ao ensinarem seus alunos, devem levar em conta no

    apenas o que querem explicar, mas, tambm, ter cincia da percepo que os

    alunos tm do que lhes ensinado. A recepo da fala do professor, por esses

    alunos, feita de acordo com suas prprias maneiras de entender, as quais variam

    de aluno para aluno.

    H equvocos que podem ser gerados numa exposio em sala de aula. Da a

    importncia de se ter em mente o dinamismo dos meios semiticos que so

    introduzidos no processo de ensino-aprendizagem. Popper diria que, depois de se

    pronunciar uma fala ou um discurso, essa fala ou esse discurso passam a pertencer a

    um mundo autnomo de significados em relao ao falante: os alunos tomaro

    conhecimento desse mundo autnomo sua maneira e semelhana (Ver: POPPER,

    1975).

    E, como se viu, tendo em vista que as mediaes culturais, a exemplo dosalto com vara, so dinmicas e evoluem ao longo da histria, necessrio

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    considerar, com sua devida importncia, no ensino-aprendizagem, a variao e a

    evoluo dos meios de interao social. Ou, em outros termos, no mais possvel

    se ater ao ensino expositivo, com base no livro didtico ou no livro-texto, ou apenas

    com ilustraes em vdeos e na TV, preciso levar a srio o fato de que estamos napoca da Web 2.0. Pouco importam as resistncias que se apresentarem. Deve-se

    evoluir, portanto, e se atualizar o mximo possvel, como acontece em todos os

    campos, do salto com vara at o uso dos I-Phone 3G e 4G, IPADS e outros que ainda

    viro.

    Zinchenko, no artigo A psicologia histrico-cultural e a teoria psicolgica da

    atividade: retrospectos eprospectos(in WERTSCH et al., 1998, p. 41-55), explica por

    que a leitura das obras de Vygotsky foi proibida na antiga URSS. Vygotsky fundava a

    mediao na palavra, no signo, no smbolo e no mito (ideologias religiosas). Tal

    fundao poderia induzir concluso de que a formao da conscincia se processa

    subjetivamente pelo prprio indivduo, tese que os marxistas no aceitaram nunca.

    Isso porque contrariava a postura de Marx (1973), que afirmava que: a conscincia

    individual determinada pela conscincia social ou coletiva. Portanto, a

    internalizao a que se refere Vygotsky no acentua devidamente a determinao

    da conscincia individual pela conscincia social. Por isso, Leontiev e outros

    colaboradores se transferiram para Krakov e passaram a pesquisar os instrumentos

    mediacionais, com o que evitaram a subjetivao individual da internalizao. Essa

    perspectiva permitiu a aproximao dos psiclogos americanos, que seguiam a

    psicologia comportamentalista de Skinner. Da possvel inferir que a fala uma

    atividade interna, quase-social.

    Os processos socioculturais e socioinstitucionais no fazem parte das

    consideraes e dos estudos de Vygotsky, embora estivessem implcitos em sua

    teoria. Embora implcitos ou pressupostos em suas pesquisas sobre a ZDP, ele no

    os pesquisou de maneira explcita. possvel deduzir, assim, a importncia de se

    estar em constante dilogo com os autores que revisitam as obras de Vygotsky, que

    devem ser estudadas tendo-se sempre em vista o cenrio do incio do sculo XX

    (uma vez que ele faleceu em 1934).

    A estrutura dos instrumentos mediacionais, daquela poca atualidade,mudaram de forma quase radical. As aulas, expositivas ou no, se atentarmos para

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    o que afirma Pierre Levy (2008), devem ser inseridas no ciberespao, e, com isso,

    elas iro alm dos muros das escolas. Consequentemente, no se exigir mais que

    todos os alunos estejam presentes no mesmo lugar, durante todas as aulas como,

    alis, a recente recomendao do Conselho Nacional prope para o ensino mdio.Basta que frequentem a mesma comunidade virtual de comunicao, seja um Orkut

    temtico, Facebook ou Messenger, sejam as comunidades de prtica (criadas para o

    objetivo especfico da aprendizagem, no caso, virtual).

    Wertsch (1998, loc. cit.) aponta duas consequncias derivadas de suas

    observaes sobre os meios mediacionais:

    1. Os instrumentos ou as mediaes includos no comportamento alteram e

    modulam tanto o fluxo como a estrutura das funes mentais: os jovens que

    se educam no meio digital j no tm mais o pensamento linear das geraes

    que os antecederam.

    2. Por conseguinte, e este um aspecto muito controvertido, o

    desenvolvimento cognitivo e mental no apenas resultado de unfolding

    (desdobramento) de carter orgnico ou gentico ou neuronal, mas

    depende, tambm, das interaes sociais e culturais.

    Considerar os processos mentais como condicionados ou modulados pelos

    instrumentos e como meios que fazem a mediao exige que se observe a evoluo

    desses meios na vida cotidiana dos alunos, fora da sala de aula. Esses meios

    deveriam ter sido empregados nas salas de aula, e isso exige dos docentes, mais do

    que nunca, sua imaginao e sua criatividade, as quais se manifestaro medida

    que esses profissionais procurarem se atualizar e estiverem dispostos a aprender,

    durante toda a vida, no bastando nem seus diplomas nem seus ttulos para

    credenci-los com vistas a um ensino eficiente.

    A mediao na era digital

    Todo o processo de formao mental ocorre num meio social definido, que d

    forma linguagem, fornecendo-lhe o solo de sentido: as falas dos atores tmsentido quando se consideram os personagens na sua aparncia e presena, na

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    cena em que a ao e a fala ocorrem. Se no for levado em devida conta o entorno

    social, a fala dos professores no tem significado e no alcana seu propsito.

    Nas interaes educativas, seja nos encontros com professores e alunos, seja na

    famlia, entre pais e filhos, seja num contexto mais amplo, preciso considerar opano de fundo e o horizonte em que se desenha o ato educativo ou ato

    pedaggico. Se os textos no falam aos filhos ou aos alunos como o mundo, as

    aulas sero pura perda de tempo, porque os docentes falam numa linguagem pr-

    digital, que os nativos digitais no entendem (SIEMENS, 2004).

    Toda fala ocorre num meio cultural e social. Tanto o ensino como as falas no

    so ditados por regras ou normas gramaticais, que constituem apenas o esquema

    formal ou sinttico da linguagem. mister considerar os aspectos semnticos e

    pragmticos da aprendizagem, pois ela se processa em uma mediao.

    relevante tornar consciente que estamos na era digital e que os alunos da

    atualidade constituem a gerao NET (gerao Y, indivduos que nasceram depois

    de janeiro de 1980) e a gerao NEXT (as pessoas nascidas depois de janeiro de

    1998). Esses alunos aprendem de modo diverso ao dos estudantes das geraes que

    os precederam. Para essas novas geraes, as pedagogias baseadas em dados da

    psicologia clssica da aprendizagem esto defasadas fato que j assinalamos

    anteriormente, quando Pierre Levy e Don Tapscott foram citados.

    Os alunos e os estudantes atuais no esto mais dispostos a prestar ateno

    numa aula de estilo clssico ou a segui-la, num modelo em que o professor se

    colocava como centro ou orientador dos seus alunos. Referimo-nos ao docente que

    orientava seus discpulos para que seguissem as rotas que ele, mestre, impunha a

    seus alunos. Os novos estudantes no aceitam esse tipo de ensino e no

    conseguem aprender desse modo.

    A esse respeito, podemos refletir sobre a postura de Jacques Rancire, na

    obra O mestre ignorante (2002). A mediao do professor preconizada no um

    tipo de mediao socrtica, segundo a qual o aluno conduzido a recordar o saber

    que nele est por meio de perguntas que lhe so feitas. O mestre ignorante difere

    da maiutica socrtica:

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    O mtodo socrtico da interrogao que pretende conduzir o aluno a seuprprio saber , de fato, o papel de um amestrador de cavalos. Elecomanda as evolues, as marchas e contramarchas. De sua parte,conserva o repouso e a dignidade do comando durante o manejo doesprito que est dirigindo. De desvios em desvios, o esprito chega a um

    fim que no havia entrevisto quando da partida. Ele se espanta, se volta,percebe seu guia, o espanto se transforma em admirao e o embrutece. Oaluno sente que, sozinho e abandonado a si mesmo, ele no teria seguidoessa rota (Enseinement naturel. Droit et philosophie pancastique. Paris,1838, p. 41apud RANCIRE, 2002, p. 69).

    Consideraes finais

    Como analisa criticamente Jacques Rancire, em O mestre ignorante(1985, p.9-15), o professor que se coloca numa postura socrtica parte de uma situao de

    desigualdade ou confirma a desigualdade existente no contexto sociocultural. O

    professor se apresenta como aquele que deve explicar, ao aluno, o que e como

    aprender: numa palavra, ele orienta. Como escreve Plato: o discpulo j possui a

    viso, mas preciso que se indique a ele para onde olhar (REPBLICA, livros VI e

    VII). o mestre que sabe onde est a paisagem e como ela deve ser vista, isto , de

    sua perspectiva, que possui a habilidade de ser docente. Consagra-se, desse modo,a desigualdade a partir do momento que se pretende estabelecer a igualdade entre

    todos (porque a falta de saber os faria desiguais).

    Ao contrrio, dever-se-ia comear negando as desigualdades e afirmando

    que todos podem aprender e so iguais diante do conhecimento. Quanto s nossas

    deficincias, elas dependem das situaes com que se defrontam, algumas sendo

    at insuperveis e involuntrias. Para exemplificar, necessrio observar que as

    crianas aprendem a falar e a fazer muitas outras coisas apenas ouvindo e vendo o

    que acontece ao seu redor, imitando as pessoas, tanto no falar como no fazer. O

    meio social , pois, um mediador essencial que no precisa per sede um orientador

    extra, como se d nas comunidades de prtica.

    Como proceder, ento?

    Rancire relata a experincia de Joseph Jacotot, um aluno de nacionalidade

    belga. Exilado para a Holanda, recebeu como emprego a incumbncia de ensinar

    francs para alunos holandeses, mas ele nem sabia o neerlands. Resolveu o

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    problema dando aos alunos a tarefa de aprender francs pela leitura de um texto de

    Fenelon, intituladoAs aventuras de Telmaco, numa edio bilngue, solicitando aos

    mesmos discentes que aprendessem o francs, por sua conta e risco, lendo o texto

    nas duas lnguas. Qual no foi sua surpresa, algumas semanas depois, quando osalunos, solicitados a escrever sobre o que aprenderam de francs, redigiram

    corretamente nessa lngua. Embora no tivessem participado de aulas de gramtica

    nem realizado outras atividades tradicionais de ensino, haviam aprendido a lngua

    francesa, e isso sem a orientao do professor. Os alunos compararam palavras,

    pediram informaes a pessoas que sabiam francs e, assim, aprenderam esse

    idioma (RANCRE, loc. cit.).

    Baseado nessa experincia e em outras semelhantes, Jacotot props o

    mtodo universal, por meio do qual um professor pode ensinar as matrias que

    ignora. O princpio que fundamenta o mtodo universal o de que todos tm uma

    inteligncia servio da vontade. O que o professor, o mediador, tem de fazer

    despertar nos seus discpulos a vontade de aprender. Quem quer aprender aprende,

    de um jeito ou de outro (RANCIRE, 2002, p. 60).

    Essa ltima observao lembra o que Pierre Levy afirma:

    Mas o essencial se encontra em um novo estilo de pedagogia quefavorece ao mesmo tempo as aprendizagens personalizadas e aaprendizagem coletiva em rede. Nesse contexto, o professor incentivado a tornar-se um animador da inteligncia coletiva de seusgrupos de alunos em vez de um fornecedor direto de conhecimento(2008, p. 158).

    Assim, o professor atua como animador da inteligncia coletiva dos seus

    estudantes.

    Tambm Don Tapscott (2010, p. 149-180), ao comentar sobre o modo como a

    gerao NET aprende, afirma que as instituies de ensino esto desatualizas. Ele se

    referiu aos Estados Unidos; imagine-se, ento, a situao no Brasil e em pases mais

    pobres, tanto por falta de polticas pblicas adequadas como por falta de

    investimentos. A vontade poltica dos dirigentes no deve apenas ficar em discursos

    ridos; necessrio que os discursos sejam sustentados pela disponibilizao de

    recursos financeiros aos novos meios, to exguos. Por exemplo, como falar nas

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    potencialidades do ensino e da educao, se os alunos e os professores apenas

    dispem de uma sala ou de laboratrios de informtica, quando todos os alunos

    deveriam ter um computador? H um projeto, desenvolvido por vrias instituies,

    denominado UCA, isto , um computador para cada aluno. Os discursos e asinauguraes ficaram nas intenes, sem o devido respaldo de aes que

    pudessem dar corpo a essas boas intenes.

    Os jovens da Gerao Internet cresceram em um ambiente digital e estovivendo no sculo XXI, mas o sistema educacional em muitos lugares estpelo menos cem anos atrasado. O modelo de educao que aindaprevalece hoje foi projetado para a Era Industrial. centrado noprofessor, que d uma aula padronizada, unidirecional. O aluno,trabalhando sozinho, deve absorver o contedo ministrado pelo

    professor. [...] Isso no funciona mais para os desafios da economiadigital, ou para a mente da Gerao Internet (TAPSCOTT, 2010, p.149-150).

    O modelo de ensino que se baseia em aulas planejadas com antecipao de

    anos, meses ou semanas j no mais adequado, pois o que ensinado na aula

    agora pode ser diferente ao se sair dela, ou no final do dia, em virtude da acelerao

    das mudanas, que so prodigiosamente rpidas. Como preparar ou formar os

    alunos para um mundo em que a inovao e o descarte constituem a regra?

    claro que, para isso, no h receitas. Mas, mesmo assim, Tapscott oferece

    vrios exemplos, que esto na seco da qual retiramos essas citaes. Um

    exemplo citado pela Dra. Maria Terrell, catedrtica de clculo na Universidade

    Cornell (TAPSCOTT, 2010, pp. 149-180). Antes do encontro em sala, ela coloca, na

    internet, questionamentos que produzem inquietaes sobre o tema a ser

    estudado ou sobre os problemas a serem discutidos e, at, se possvel, resolvidos.

    As referidas indagaes podem, tambm, provir dos alunos, para registrar comtransparncia todos os significados, que, naturalmente, sero muito diversos.

    Um encontro planejado dessa forma representa um compromisso e uma

    interatividade entre colegas e, certamente, discusses positivas para reinventar

    solues ou novas respostas ao problema. Finalmente, se houver tempo, alguns

    alunos apresentaro, no quadro ou no relatrio das aulas, as solues que

    provocaro destaque. importante constatar que essas aulas so presenciais e sem

    o auxlio do meio digital. Sem dvida, essa interao seria muito mais eficiente e

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    participativa com o auxlio das mdias digitais, usando Facebook, MySpace ou outro

    tipo de sitede grupo colaborativo.

    No h dvida de que a mediao uma interatividade muito dinmica de

    comunicao, para alunos dos sistemas presencial e a distncia. Conforme afirmou

    Wertsch (1998), a mediao exige mudanas nos modos de aprender e de ensinar.

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