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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE NUTRIÇÃO
Estado Nutricional Pré-Gestacional e a Incidência de Diabetes Gestacional em
Gestantes Atendidas em Consultório Particular, Cuiabá/MT.
MARINA THOMMEN PEREIRA BRESSANE
CUIABÁ- MT
2016
Estado nutricional pré-gestacional e a incidência de Diabetes Gestacional em gestantes
atendidas em consultório particular, Cuiabá/MT.
Marina Thommen Pereira Bressane
Cuiabá, MT
2016
Monografia apresentada ao
Programa de Especialização em
Nutrição Clínica para a obtenção
do título de especialista em
Nutrição Clínica.
Área de concentração: Nutrição
Professor: Ma. Luciana Sicca
Pasquali Garcia
Dedicatória
Ao meu esposo e meus pais, pelo
apoio incondicional, presença
constante em minha vida, pelos
incentivos ao estudo e por
acreditarem em mim.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus pela sua luz, direção e sabedoria.
Ao meu marido, meu pai e minha mãe, pela paciência, apoio dedicados em
todos os momentos desta trajetória e inspiração na busca pelo aperfeiçoamento.
À Profª Luciana Sicca Pasquali Garcia, minha orientadora, pelo conhecimento
e orientações fundamentais para concretização deste estudo.
À Profª Leticia Martins Ignácio Souza e Profª Ana Paula Muraro pela atenção
e contribuições no desenvolvimento deste estudo.
“Quanto mais aumenta nosso conhecimento, mais
evidente fica nossa ignorância.”
John F. Kennedy
RESUMO
O diabetes mellitus gestacional (DMG) é definido como a ocorrência de
intolerância à glicose, em variados graus, diagnosticada durante a gestação e podendo
persistir após o parto. O DMG não diagnosticado e/ou não tratado pode resultar em
intercorrências para a gestante (hipertensão arterial, pré-eclâmpsia, risco aumentado de
parto cesariano, etc.) e para o feto (óbito neonatal, macrossomia, distocias, aspiração de
mecônio, entre outras). Dentre os fatores de risco para o DMG pode-se citar: idade
superior a 35 anos; sobrepeso, obesidade ou ganho excessivo de peso na gravidez atual;
história familiar de diabetes, deposição central excessiva de gordura corporal. Este
estudo observacional retrospectivo envolvendo 37 gestantes diagnosticadas com
alteração glicêmica durante a gestação e que consultaram com nutricionista clínico no
período de janeiro/2014 a janeiro/2016 teve como objetivo avaliar o perfil nutricional
das mulheres em idade fértil e a incidência de diabetes gestacional, a fim de elaborar
meios preventivos ou facilitar o controle glicêmico durante a gestação. Das 37 gestantes
avaliadas 62,2% tinham menos de 35 anos, 51,4% constavam com excesso de peso,
73% não praticavam atividade física, 94% consultaram com nutricionista no 3º trimestre
de gravidez e das que sabiam o sexo fetal, 43,2% estava gestante de feto feminino. O
melhor controle glicêmico tanto em jejum quanto pós-prandial 60/120 minutos após
teste oral de tolerância à glicose se deu nas gestantes sem excesso de peso e fisicamente
ativas durante a gestação.
O peso pré-gestacional é considerado um fator bem influente na saúde materna e
fetal, e o aumento dos casos de sobrepeso e obesidade no período pré-concepção está
associado a desfechos negativos sobre a saúde do binômio mãe-filho. O monitoramento
do peso pré-gestacional através do cálculo de IMC é um procedimento de baixo custo,
simples e útil para estabelecer intervenções nutricionais e garantir uma gestação com
menores fatores de riscos maternos e fetais.
Palavras-chave: diabetes gestacional, índice de massa corporal, controle glicêmico na
gestação.
ABSTRACT
Gestational Diabetes Mellitus (GDM) is defined as any degree of glucose
intolerance with onset or first recognition during pregnancy. Undiagnosed or non-
treated GDM can result on many complications and adverse pregnancy outcomes that
threatens both mothers and their offspring (hypertensive disorders, cesarean deliveries,
fetal macrosomia, distocias, neonatal hypoglycemia, obesity, type 2 diabetes). Many
factors can contribute to the development of GDM as: age > 35 years old, overweight
and obesity, family history of diabetes, history of GDM on previous pregnancy,
excessive gestational weight gain.
The aim of this retrospective study was to determine the relationship of pre-
gestational body mass index (BMI) and the incidence of GDM on 37 pregnant women
that consulted a clinical nutritionist during prenatal care from January/2014-
january/2016, and by then elaborate preventive ways and improve glycemic control
during pregnancy.
From de 37 pregnant women evaluated, 62,2% were <35 years old, 51,4% were
overweight or obese, 73% were physically inactive, 94% consulted a clinical nutritionist
on their third trimester of pregnancy and for those that already knew the fetal sex,
43,2% were expecting girls. The best glycemic control either for fasting or post-prandial
60/120 minutes after the glucose challenge test (GCT) was performed by the pregnants
that had a pre-gestational normal weight and were physically active during pregnancy.
The pre-gestational weight is considered a big influent factor on both mother and
fetal’s health, and the increasing number of overweight and obesity on preconception
period is relevant to predict adverse outcomes during pregnancy. The monitoring of the
pre-pregnancy weight by BMI calculation is a low-cost, simple and useful procedure to
establish nutritional interventions and reduce maternal and fetal risks factors.
Key-words: gestational diabetes mellitus, body mass index, glycemic control during pregnancy.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Tabela 1- Critérios para diagnóstico de DMG segundo o HAPO e OMS.
13
Tabela 2- Característica das gestantes com diabetes gestacional atendidas
em consultório nutricional, Cuiabá, 2016.
17
Gráfico 1- Relação entre o peso pré-gestacional e valor de glicemia de
jejum das gestantes diagnosticadas com DMG, atendidas em consultório
nutricional (n=32).
19
Gráfico 2- Relação entre atividade física e excesso de peso pré-gestacional das
gestantes diagnosticadas com DMG, atendidas em consultório nutricional.
19
Gráfico 3- Relação entre a atividade física durante na gestação e a glicemia de
jejum das gestantes diagnosticadas com DMG, atendidas em consultório
nutricional (n= 32).
20
Gráfico 4- Relação entre a atividade física durante na gestação e alteração da
glicemia pós-prandial de 60 minutos após TOTG, das gestantes diagnosticadas
com DMG, atendidas em consultório nutricional (n= 22).
20
LISTA DE ABREVIATURAS
ADA American Diabetes Association
BMI Body Mass Index
DM Diabetes Mellitus
GCT Glucose challange test
DMG Diabetes Mellitus Gestacional
GDM Gestational Diabetes Mellitus
HAPO Hyperglicemia and Adverse Pregnancy Outcomes
IDF International Diabetes Federation
IMC Índice de Massa Corporal
OMS Organização Mundial da Saúde
SBD Sociedade Brasileira de Diabetes
SHG Síndrome Hipertensiva da Gravidez
TOTG Teste oral de tolerância à glicose
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 11
2. OBJETIVOS 14
2.1 OBJETIVOS GERAIS 14
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 15
3. METODOLOGIA 15
3.1 TIPO DE ESTUDO 15
3.2 COLETA DE DADOS 15
3.3 VARIÁVEIS 15
3.3.1 IDADE 15
3.3.2 PESO PRÉ-GESTACIONAL 15
3.3.3 VALOR DE GLICEMIA 15
3.3.4 ESTADO NUTRICIONAL 16
3.3.5 ATIVIDADE FÍSICA 16
3.3.6 IDADE GESTACIONAL 16
3.3.7 SEXO FETAL 16
3.4 ANÁLISES ESTATÍSTICAS 16
3.5 ASPECTOS ÉTICOS 16
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 16
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 23
11
1.0 INTRODUÇÃO
O Diabetes Mellitus (DM) não se define como uma única doença, mas um grupo
de distúrbios metabólicos que apresenta em comum a hiperglicemia resultante de
defeitos na secreção e/ou na ação do hormônio insulina (GALINDO; CAVALCANTI;
LYRA, 2006).
O DM pode ser classificado em sua maioria, em diabetes tipo 1 (DM1), diabetes
tipo 2 (DM2) e diabetes gestacional (DMG). O DM1 é caracterizado pela destruição das
células beta, ocasionando deficiência absoluta de insulina, de natureza auto-imune ou
idiopática. Já o DM2 cursa com resistência insulínica com relativa deficiência de
insulina, ou um defeito essencialmente secretório, com ou sem resistência insulínica
(GALINDO; CAVALCANTI; LYRA, 2006).
É estimado que aproximadamente 415 milhões de adultos no mundo tenham
diabetes (INTERNATIONAL DIABETES FEDERATION, 2015), e mais 318 milhões
de adultos tenham tolerância à glicose diminuída - uma condição de alto risco para o
desenvolvimento do diabetes, chamada também de pré-diabetes (FONSECA;
FONSECA, 2008).
Em 2015 estimou-se que um em cada onze adultos possui diabetes, sendo o
DM2 o tipo mais prevalente em países desenvolvidos, atingindo mais de 91% dos
adultos com a doença (INTERNATIONAL DIABETES FEDERATION, 2015).
O diabetes mellitus gestacional (DMG) é definido como a ocorrência de
intolerância à glicose, em variados graus, diagnosticada durante a gestação e podendo
persistir após o parto (FORTI; FAÇANHA; FERRAZ, 2006).
A fisiopatologia do DMG pode ser explicada devido à resistência insulínica
fisiológica da gravidez por elevação de hormônios antagonistas da insulina na
circulação materna, como o hormônio lactogênio placentário, prolactina, estrógeno e
cortisol. E assim como ocorre no DM2, é possível verificar a presença de resistência
insulínica associada a uma queda relativa na função secretória da célula beta pancreática
(FORTI; FAÇANHA; FERRAZ, 2006).
O primeiro caso de diabetes gestacional foi descrito na tese de doutorado em
medicina do Dr. Heinrich G. Bennewitz, no ano de 1824. Tratava-se de uma gestante
que desenvolveu diabetes mellitus sintomática durante a gestação e cujos sintomas
(poliúria, polidipsia) e sinais (glicosúria) desapareceram após o parto. Entre 1825 e
1949 várias pacientes similares foram identificadas, sendo determinado o termo
12
“glicosúria benigna da gestação”. Porém em 1949, Gilbert observou que as mulheres
que foram diagnosticadas com diabetes mellitus tipo 2 depois dos 50 anos de idade,
tinham tido uma má história obstétrica, com alta incidência de mortalidade perinatal e
fetos macrossômicos. Assim, a partir de 1949 o termo “glicosúria benigna da gestação”
deixou de ser aplicado e passou a denominar-se “pré-diabetes na gestação”, e em 1954
trocou-se por “diabetes meta-gestacional”. Finalmente em 1964, o diabetes gestacional
surgiu como um sub-tipo de diabetes mellitus, e desde então a incidência tem
aumentado cada vez mais (COELHO, 2014).
A análise de genes é bem relevante na história de desenvolvimento de diabetes,
já que se vêem diferenças significativas na prevalência e incidência do DMG entre
diversas raças, etnias e regiões (exemplo: afro-americanos, latinos, americanos
nativos, americanos asiáticos e habitantes das ilhas do Pacífico são considerados raças
étnicas de alto risco para desenvolvimento de DM2) (LIN et al, 2016).
Através de testes moleculares podem ser identificados polimorfismos (variantes
genéticas) em uma população e associá-los a processos patológicos a fim de facilitar o
diagnóstico, tratamento e prognóstico da patologia. A íntima correlação entre o DMG
e o DM2 sugere que o DMG seja uma patologia poligênica tal qual DM2, na qual
variantes em múltiplos genes interagem com fatores ambientais para causar a doença.
Portanto, os estudos a respeito da etiologia do DMG iniciaram-se avaliando variantes
dos genes que predispõem ao DM2 (MELO, 2013).
O DMG não diagnosticado e/ou não tratado pode resultar em intercorrências
para a gestante (hipertensão arterial, pré-eclâmpsia, risco aumentado de parto cesariano,
etc.) e para o feto (óbito neonatal, macrossomia, distocias, aspiração de mecônio,
hipoglicemia, entre outras) (BRAGA et al, 2011).
Estima-se que 1 a cada 7 nascimentos seja afetado pelo diabetes gestacional
(INTERNATIONAL DIABETES FEDERATION, 2015), e os fetos expostos a elevados
níveis de glicose no útero possuem maior risco de desenvolverem diabetes tipo 2 no
futuro. (FETITA et al, 2006).
Em se tratando de macrossomia fetal, estudos demonstram uma grande relação
entre o excessivo crescimento fetal e o desenvolvimento de obesidade e outras doenças
metabólicas associadas em idade jovem (ALBERICO et al, 2015; CASEY et al, 2015),
sendo o controle glicêmico materno de extrema importância até como medida
preventiva para essas patologias no futuro.
13
O rastreamento para a intolerância à glicose deve ser feito já na primeira
consulta pré-natal, com a avaliação da glicemia de jejum. Caso o valor encontrado seja
acima de 126mg/dl, caracteriza um diabetes mellitus pré-gestacional. Se a glicemia
plasmática de jejum estiver entre 92mg/dl e 126mg/dl, caracteriza o diabetes
gestacional, porém este resultado deverá ser confirmado com uma segunda dosagem da
glicemia em jejum. Excluindo as gestantes com diagnóstico prévio de diabetes, é
recomendado que todas as gestantes sejam investigadas com teste oral de tolerância à
glicose (TOTG) entre a 24ª e a 28ª semana de gestação (SOCIEDADE BRASILEIRA
DE DIABETES, 2015).
Ainda não existe consenso quanto ao teste a ser utilizado para o diagnóstico de
DMG, e os critérios diagnósticos utilizados atualmente se baseiam nos resultados do
estudo “Hyperglicemia and Adverse Pregnancy Outcomes” (HAPO), ou nos critérios da
Organização Mundial da Saúde (OMS). O estudo HAPO demonstrou associação entre
os valores de glicemia materna e os desfechos perinatais, determinando o diagnóstico
com TOTG com ingestão de 75g de glicose e pontos de corte de glicemia ≥92mg/dl em
jejum, ≥180mg/dl após uma hora e ≥153mg/dl após duas horas. (SOCIEDADE
BRASILEIRA DE DIABETES, 2015). Já os critérios da OMS se baseiam nos mesmo
definidos para o diagnóstico de Diabetes Mellitus: ingestão de 75g de glicose e
glicemia de jejum ≥126mg/dl ou ≥140mg/dl após duas horas. Em ambos critérios, um
valor alterado já confirma o diagnóstico.
Tabela 1- Critérios para diagnóstico de DMG segundo o HAPO e OMS.
Glicemia plasmática HAPO 75g - TOTG OMS - 75g - TOTG
Jejum ≥92mg/dl ≥126mg/dl
1 hora (60 minutos) ≥180mg/dl -----
2 horas (120 minutos) ≥153mg/dl ≥140mg/dl
As pacientes devem ser reavaliadas 4 a 6 semanas após o parto e reclassificadas
como apresentando DM, glicemia de jejum alterada, tolerância à glicose diminuída ou
normoglicemia. Na maioria dos casos a tolerância à glicose retorna ao normal, porém há
10% a 63% de risco de desenvolver DM2 dentro de 5 a 16 anos após o parto.
(SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES, 2015)
Dentre os fatores de risco para o DMG pode-se citar: idade superior a 35 anos;
sobrepeso, obesidade ou ganho excessivo de peso na gravidez atual; história familiar de
14
diabetes em parentes de primeiro grau; deposição central excessiva de gordura corporal
(SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES, 2015). Portanto o peso pré-gestacional é
considerado um fator bem influente na saúde materna e fetal, e o aumento dos casos de
sobrepeso e obesidade no período pré-concepção está associado a desfechos negativos
sobre a saúde do binômio mãe-filho (SEABRA et al, 2011).
O Estado nutricional pode ser avaliado de acordo com o Índice de Massa
Corporal (IMC), cálculo antropométrico que leva em consideração o peso dividido pela
altura ao quadrado, com os critérios de classificação determinados pela Organização
Mundial da Saúde: IMC < 18,5kg/m2 (Baixo peso); IMC > 18,5 e até
24,9kg/m2(Eutrófico); IMC > 25 e até 29,9kg/m
2 (Sobrepeso) e
IMC > 30,0kg/m2 (Obeso) (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2003). Na
população de gestantes brasileiras, o IMC superior a 25kg/m2 se relacionou a risco
aumentado de diabetes gestacional (BRAGA et al, 2011).
Sendo a obesidade considerada uma doença crônica cada vez mais crescente em
todo o mundo, caracterizada como problema de saúde pública grave e possuindo uma
estreita relação com alterações glicêmicas, se faz necessária uma atenção ao estado
nutricional da mulher em processo de engravidar.
Com o aumento da procura por terapia nutricional para melhora do perfil
glicêmico das gestantes em consultório particular, surgiu o interesse em relacionar o
perfil nutricional das mulheres em idade fértil e a incidência de diabetes gestacional, a
fim de elaborar meios preventivos ou facilitar o controle glicêmico durante a gestação.
O nutricionista pode facilmente avaliar o estado nutricional da paciente através
de medidas antropométricas e a classificação de IMC, cálculo de fácil aplicabilidade,
baixo custo e caráter pouco invasivo. Portanto é interessante a avaliação e
acompanhamento por tal profissional de modo a orientar sobre o ganho de peso
adequado na gestação e mudanças alimentares para prevenir ou tratar as alterações
metabólicas, especialmente em relação à glicemia.
2.0 OBJETIVOS
2.1 GERAL
Analisou-se a associação entre o estado nutricional pré-gestacional e a incidência
de Diabetes Gestacional em gestantes atendidas em consultório particular
15
2.2 ESPECÍFICOS
Identificaram-se as gestantes com diagnóstico de Diabetes Gestacional;
Classificou-se o estado nutricional pré-gestacional de acordo com o IMC;
Comparou-se o estado nutricional pré-gestacional com o aparecimento de
Diabetes Gestacional
3.0 MÉTODOS
3.1 TIPO DE ESTUDO
Tratou-se de um estudo observacional retrospectivo, cujos dados foram obtidos dos
prontuários das mulheres em idade fértil diagnosticadas com alteração glicêmica
durante a gestação e que consultaram com nutricionista clínico no período de
janeiro/2014 a janeiro/2016. Foram excluídas gestantes com diabetes mellitus pré-
gestacional.
3.2 COLETA DE DADOS
A coleta de dados foi realizada através dos prontuários das gestantes atendidas em
consultório nutricional no período de janeiro/2014 a janeiro/2016. A admissão no
estudo ocorreu com as pacientes que se enquadraram nos critérios previamente
estabelecidos.
3.3 VARIÁVEIS
3.3.1 Idade
A idade foi obtida através do cálculo da diferença existente
entre a data da consulta e a data de nascimento, sendo
expressa em anos de vida.
3.3.2 Peso pré-gestacional
O peso pré-gestacional foi definido como o relatado pela
paciente na primeira consulta do pré-natal.
3.3.3 Valor de glicemia
A glicemia alterada comparada a valores de referência
caracterizou o diagnóstico de Diabetes Gestacional, feito pelo
médico que solicitou o exame.
16
3.3.4 Estado nutricional
O estado nutricional foi classificado de acordo com o Índice
de Massa Corporal em Eutrofia (18,5-24,9kg/m2), Sobrepeso
(25,0-29,9kg/m2) e Obesidade (acima de 30,0kg/m
2)
3.3.5 Atividade física
A freqüência da realização e o tipo da atividade física, se
existente, foi relatada pela paciente na consulta com o
nutricionista.
3.3.6 Idade gestacional
A idade gestacional foi calculada de acordo com a diferença
da data da consulta e a data da última menstruação, expressa
em semanas de gestação e classificadas por trimestre: 1º
trimestre (até 12ª semana de gestação), 2º trimestre (13ª a 24ª
semana de gestação) e 3º trimestre (25ª a 40ª semana de
gestação).
3.3.7 Sexo Fetal
O sexo fetal, se sabido, foi informado pela gestante, sendo
observado através de exame de ultrassom ou sexagem.
3.4 ANÁLISE ESTATÍSTICAS
Os dados coletados foram analisados estatisticamente no programa Epi Info® 7,
e as variáveis contínuas descritas por média e desvio-padrão. Para todos os testes
estatísticos, o valor p <0,05 foi considerado significativo.
3.5 ASPECTOS ÉTICOS
O projeto de pesquisa foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa do Hospital Universitário Julio Muller (HUJM)/Cuiabá/MT, sob parecer
1.547.203.
4.0 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram avaliadas trinta e sete (37) gestantes, que passaram por consulta com
nutricionista clínico em consultório particular durante o pré-natal. Todas as gestantes
17
foram encaminhadas ao nutricionista por médico obstetra ou endocrinologista devido à
alteração glicêmica em exames pré-natais de rotina ou no TOTG, o qual detectou o
diabetes gestacional. A consulta se dividiu em cinco etapas: coleta de dados pessoais,
história clínica, anamnese alimentar, medidas antropométricas (peso pré-gestacional,
peso atual, altura, IMC) e outras informações relevantes (idade gestacional e sexo fetal,
quando sabido). O perfil das gestantes está apresentado na Tabela 2.
Tabela 2: Característica das gestantes com diabetes gestacional atendidas em
consultório nutricional, Cuiabá, 2016. n (%)
Idade
37 100
< 35 anos 23 62,2
≥ 35 anos 14 37,8
Idade gestacional
1º trimestre 2 5,4
2º trimestre 0 0
3º trimestre 35 94,6
IMC
Eutrófico 18 48,6
Sobrepeso 11 29,7
Obesidade 8 21,6
Sexo Fetal
Feminino 16 43,2
Masculino 13 35,1
Não sabido 8 21,6
Prática de atividade física
Sim 10 27
Não 27 73
Cerca de 51,4% das mulheres iniciaram a gestação com desvio ponderal,
segundo avaliação do estado antropométrico pré-gestacional. Quanto à classificação
do estado nutricional de acordo com o IMC, 48,6% eram eutróficas, 29,7% sobrepeso
e 21,6% obesas. A idade materna média foi de 32,8 anos e a idade gestacional média
foi de 30,5 semanas.
Nem todas as gestantes atendidas possuíam na consulta os exames bioquímicos
com os valores da glicemia em jejum e/ou pós-prandial, resultando em trinta e duas
(32) gestantes com a glicemia de jejum relatada, vinte e duas (22) gestantes com a
medida de glicemia 60 minutos após o TOTG e vinte (20) gestantes com a medida de
glicemia 120 minutos após o TOTG. A média de glicemia de jejum foi de 88mg/dl, e a
média das pós-prandiais tanto de 60 quanto 120 minutos após TOTG foi de 185mg/dl.
18
Quanto à atividade física, 73% relataram não praticar durante a gestação e
apenas 27% relataram ser fisicamente ativas, sendo a caminhada em terreno plano,
hidroterapia, pilates, natação e musculação as atividades relatadas, tendo inclusive em
alguns casos, a prática combinada de modalidades.
Das 29 gestantes que já sabiam o sexo fetal, 43,2% estavam grávidas de meninas
e 35,1% de meninos.
É preocupante o estado nutricional das gestantes avaliadas, já que a maioria foi
diagnosticada com excesso de peso (sobrepeso ou obesidade) antes da gestação,
aumentando o risco de desenvolver DMG e também outras doenças, como a Síndrome
Hipertensiva da Gravidez (SHG), já que as duas condições clínicas compartilham
fatores de risco semelhantes (OLIVEIRA; GRACILIANO, 2015), aumentando o risco
para a saúde materna/fetal.
O desenvolvimento do DMG e a alteração glicêmica característica é prejudicial
ao feto durante a gestação e mesmo após o parto. O pobre controle glicêmico é um
importante fator de risco para macrossomia, independentemente do IMC pré-
gestacional (ALBERICO et al, 2014). Há fortes indícios também que diabetes durante
a gestação predispõe a prole a desenvolver obesidade e tolerância anormal à glicose
mais tarde na vida, independentemente de transmissão genética, devido à redução da
massa pancreática, defeito na angiogênese do órgão e hiperinsulinismo (FETITA et al,
2006).
Para as gestantes, o risco de desenvolver DM2 no futuro é altíssimo, já que cerca
de um terço das gestantes portadoras de DMG desenvolverá diabetes ou intolerância à
glicose no seguimento pós-parto (PEREIRA, 2014).
Neste estudo, o peso pré-gestacional adequado/eutrófico relacionado a valores
adequados de glicemia de jejum (<92mg/dl) foi estatisticamente significativo (p=0,04)
conforme mostra o gráfico 1.
19
Gráfico 1- Relação entre o peso pré-gestacional e valor de glicemia de jejum
das gestantes diagnosticadas com DMG, atendidas em consultório nutricional
(n=32).
Outro fator extremamente importante é o ganho de peso durante a gestação, pois
mesmo que o peso pré-gestacional seja adequado (eutrófico), um ganho de peso
excessivo na gestação aumenta o risco de desenvolver sobrepeso/obesidade nos
próximos 15 anos (GONÇALVES et al, 2012). Este fator ainda é agravado nas
mulheres com excesso de peso pré-gestacional que mantém a retenção de peso no pós-
parto.
Apesar de não ter se demonstrado estatisticamente significativo (p= 0,11),
podemos deduzir no presente estudo que a baixa adesão à prática de atividade física
durante a gravidez pode refletir a ausência do hábito antes de engravidar, justificando
em parte o excesso de peso pré-gestacional, conforme mostrado no Gráfico 2.
Gráfico 2- Relação entre atividade física e excesso de peso pré-gestacional das
gestantes diagnosticadas com DMG, atendidas em consultório nutricional.
A prática de atividade física regular na gestação contribui para um melhor
controle glicêmico, controle do ganho de peso materno e, conseqüentemente, a
20
diminuição da incidência de macrossomia fetal, devendo ser recomendada para todas
as gestantes diabéticas, na ausência de contraindicações (WEINERT et al, 2011).
Traçando um paralelo entre a atividade física e a glicemia de jejum, pode-se
verificar que as gestantes ativas possuíam melhor valor de glicemia de jejum em
relação às gestantes inativas, observado no gráfico 3. E as maiores alterações da
glicemia pós-prandial de 60 minutos após o TOTG também se deram nas gestantes
inativas, mais que nas gestantes ativas, conforme o gráfico 4.
Gráfico 3- Relação entre a atividade física durante na gestação e a glicemia de
jejum das gestantes diagnosticadas com DMG, atendidas em consultório
nutricional (n= 32).
Gráfico 4- Relação entre a atividade física durante na gestação e alteração da
glicemia pós-prandial de 60 minutos após TOTG, das gestantes diagnosticadas com
DMG, atendidas em consultório nutricional (n= 22).
Neste estudo as médias de glicemia em jejum (88 mg/dl) e pós-prandial após 120
minutos do TOTG (185mg/dl) foram superiores aos valores de alguns estudos, como o
Metformin In Gestational Diabetes, o qual valores inferiores a 88 mg/dL para a glicemia
21
de jejum e inferiores a 115 mg/dL para a glicemia 120 minutos pós-prandial resultaram em
menor número de complicações materno-fetais (WEINERT et al, 2011), reiterando aí
a necessidade de uma intervenção inicial de dieta individualizada e prática de
atividade física, e posteriormente caso não se atinja um bom controle glicêmico, o uso
de medicações.
Não foi possível avaliar a relação da alteração glicêmica com a presença do feto
masculino neste estudo, pois aproximadamente 21% das gestantes não sabiam sexo
fetal e das que sabiam, 43,2% esperavam feto do sexo feminino. A presença do feto
masculino parece estar associada a uma discreta piora da função das células-beta
pancreáticas e a um aumento da glicemia pós-prandial, se comparado ao feto feminino
(RETNAKARAN et al, 2015).
O fato de o TOTG para confirmação do DMG ser solicitado apenas no final do
segundo e início do terceiro trimestre de gestação dificulta a conduta para prevenção,
restando apenas cuidados para controle da glicemia até o parto, muitas vezes próximo.
Daí se faz importante que desde o período pré-concepção a mulher em vias de
engravidar seja estimulada a adquirir hábitos de vida mais saudáveis, como a
instituição de uma alimentação saudável e equilibrada aliada à prática de atividade
física regular e encorajada a perder peso, caso se encontre com valor de IMC acima do
ideal, especialmente se possui histórico de diabetes na família ou em gestações
anteriores.
O preparo da mulher para a concepção pode contribuir para um melhor
planejamento da gestação futura, reduzindo a probabilidade de alterações glicêmicas
na gestação. Quanto antes for diagnosticado o DMG, maiores as chances de melhor
controle glicêmico, e conseqüentemente, maior a prevenção para o desenvolvimento
de DM2 nas futuras gerações. O acompanhamento pós-parto também se faz de suma
importância para garantir a perda de peso adequada e menor retenção ponderal,
reduzindo assim a possibilidade de resistência insulínica relacionada à alta
adiposidade.
Com este estudo conclui-se que o desenvolvimento de diabetes gestacional não
está relacionado somente ao excesso de peso pré-gestacional, mas também a vários
outros fatores modificáveis (dieta, atividade física freqüente, ganho de peso adequado
na gestação) e não modificáveis (história familiar de diabetes mellitus, sexo fetal). O
fator genético é de grande significância no metabolismo da glicose, explicando em
22
parte a ocorrência de DMG também em gestantes com peso pré-gestacional normal.
Porém vale ressaltar que dentre os fatores modificáveis, o monitoramento do peso pré-
gestacional é um procedimento de baixo custo, simples e útil para estabelecer
intervenções nutricionais e garantir uma gestação com menores fatores de riscos
maternos e fetais.
23
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