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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO A VEZ DO MESTRE DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E RELAÇÕES FAMILIARES Por: Maria Aparecida da Matta Andrés Orientadora Profa. Ana Claudia Morrissy Machado Rio de Janeiro 2009

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E RELAÇÕES

FAMILIARES

Por: Maria Aparecida da Matta Andrés

Orientadora

Profa. Ana Claudia Morrissy Machado

Rio de Janeiro

2009

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E RELAÇÕES

FAMILIARES

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do

Mestre – Universidade Cândido Mendes como

condição prévia para a conclusão do curso de Pós-

Graduação Lato Sensu em Psicopedagogia.

Por: Maria Aparecida da Matta Andrés

3

AGRADECIMENTOS

Ao meu marido Newton pelo

companheirismo, apoio e incentivo.

Aos meus filhos, Paula e Rodrigo por me

ensinarem a educar.

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todas as crianças que por mim foram atendidas e

aquelas que ainda serão.

A amiga, fonoaudióloga e psicopedagoga Regina Amaral por apostar em

mim, abrindo as portas de sua clínica criando a oportunidade de recomeço da

minha carreira.

A amiga – irmã, neuropediatra Maria Regina Augusto de Andrade,

presente em todos os momentos importantes da minha vida por me incentivar,

confiar e acreditar no meu trabalho.

Aos meus filhos Rodrigo e Paula, que mesmo sem saber, me motivaram

a aprofundar meu conhecimento nas áreas da cognição e do comportamento

humano.

Ao meu marido Newton, companheiro há 20 anos que sempre me

incentivou e amparou, inclusive financeiramente, demonstrando seu carinho e

sua paciência em todos os momentos de nossa vida em comum.

5

RESUMO

Quando uma criança ou adolescente apresenta uma dificuldade na

escola quase sempre é sugerido um acompanhamento especializado e ela é

encaminhada ao fonoaudiólogo, psicopedagogo, psicólogo, neurologista ou

psiquiatra. O problema é visto como sendo da criança ou do adolescente, tem

causa biológica e deve ser corrigido na criança. Se o comportamento da

criança se torna inadequado ela se transforma num problema ainda maior para

a família. O presente trabalho aborda o tema dificuldade de aprendizagem

dando ênfase às relações familiares. O atendimento à família é tão importante

quanto ao dedicado à criança/adolescente. É necessário orientar, educar e

treinar a família a manejar o comportamento da criança e a se relacionar

melhor com ela. A maneira como os pais se comportam irá determinar o tipo de

relação ensino/aprendizagem que se estabelece na família e na vida escolar da

criança. A pouca flexibilidade dos pais e suas inabilidades sociais podem gerar

ou agravar os problemas de aprendizagem dos filhos. Por outro lado, se há

empatia na relação entre pais e filhos, se a criança sente-se acolhida e

respeitada por seus pais, as dificuldades relacionadas à aprendizagem e os

conseqüentes problemas emocionais possivelmente desencadeados por estas,

poderão ser superados com maior facilidade. O educador, seja ele pai ou

professor, precisa estar consciente de sua influência positiva ou negativa e de

como seu comportamento e suas atitudes, positivas ou negativas, poderão

determinar o comportamento futuro da criança/adolescentes.

6

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................. 07

CAPÍTULO I – Dificuldades de Aprendizagem......................................... 09

CAPÍTULO II – As Famílias Diante dos Problemas de Aprendizagem... 17

CAPÍTULOIII – Questões Emocionais e Comportamentais das

Crianças/Adolescentes com Dificuldade de Aprendizagem................... 25

CONCLUSÃO................................................................................................32

BIBLIOGRAFIA.............................................................................................34

FOLHA DE AVALIAÇÃO..............................................................................36

7

INTRODUÇÃO

Este trabalho foi desenvolvido a partir de pesquisa bibliográfica,

buscando embasamento teórico para estabelecer a relação entre a importância

da participação da família no processo de aprendizagem e a superação das

dificuldades de aprendizagem de crianças e adolescentes.

Minha maior motivação para dissertar sobre este tema reside em minha

experiência como mãe de um menino, hoje com 16 anos que, desde o início de

sua escolaridade, apresentou dificuldades e ainda hoje apresenta e, na minha

atuação como psicóloga clínica e mediadora de PEI - Programa de

Enriquecimento Instrumental -, um programa voltado para desenvolvimento do

pensamento, das habilidades mentais e das funções cognitivas do indivíduo.

Trabalhar com o PEI me aproximou de uma realidade que hoje encaro com

muito mais otimismo. Hoje acredito na capacidade se superação do indivíduo

porque a minha prática vem provando que isso é possível.

No entanto, não podemos esquecer que o sucesso não depende só da

nossa vontade de ajudar, nem da família querer e se dispor investindo tempo e

dinheiro no tratamento. É necessário que haja motivação interna por parte da

criança e do adolescente. Essa motivação precisa ser estimulada, alimentada e

mantida pela família desde muito cedo, quando é estabelecida uma relação

positiva com a aprendizagem, criando um ambiente familiar de segurança e

respeito mútuo.

A falta de comportamento alteritário nas famílias, ou seja, famílias onde

as diferenças não são aceitas e não é estimulada a autoria do pensamento,

problemas de aprendizagem podem ser desencadeados ocorrendo, até

mesmo, seu agravamento.

Não me espanta que um tema tão discutido e pesquisado ainda cause

tanto transtorno às famílias de crianças que sofrem com alguma dificuldade

para aprender. Não é fácil aceitar que seu filho ou sua filha não irá

8

corresponder às suas expectativas. Ele dificilmente será o médico, o advogado

ou o arquiteto que sua família sonhou.

Aceitar as diferenças, flexibilizar o pensamento, desenvolver habilidades

sociais, praticar a empatia com seu filho, são o primeiro passo para ajudá-lo

desenvolver suas próprias habilidades.

Espero que este trabalho possa ser uma leitura ao mesmo tempo

agradável e instrutiva e, que ao final, possa ajudar a compreender melhor as

dificuldades de aprendizagem, suas causas (etiologia) e, quem sabe, promover

alguma reflexão ou mudança na modalidade de ensino/aprendizagem de

alguma família.

9

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Falar sobre a dificuldade de aprendizagem implica falar sobre como

aprendemos e desde quando começamos a aprender. Ao nascermos, no seio

materno, estamos iniciando o longo processo de aprendizagem que se

estenderá por toda nossa vida. É na família que ocorrem os primeiros

processos de aprendizagem. “ Munhoz (2005,p.180) diz que é observando a

interação existente entre os membros da família que podemos compreender

como se dá a circulação do conhecimento e o acesso à aprendizagem...”,

(Sampaio,2009, p.69).

O que significa aprender e como aprendemos

Numa visão psicológica e mais acadêmica, Campos afirma que (citando

Cannon e o conceito de equilíbrio vital) toda aprendizagem resulta na busca do

restabelecimento de um equilíbrio vital (homeostase). Ao enfrentarmos uma

situação nova, esse equilíbrio é rompido e, para restabelecê-lo, precisamos

agir ou reagir até obtermos uma resposta adequada à nova situação, então,

esta fará parte de um repertório de respostas integrando nosso equipamento

de comportamentos adquiridos. (Campos, 1983, p.33)

Aprender é um processo contínuo, dinâmico, global, pessoal, gradativo e

cumulativo.

“A aprendizagem envolve o uso e o desenvolvimento de todos os

poderes, capacidades, potencialidades do homem, tanto físicas, quanto

mentais e afetivas. Isto significa que a aprendizagem não pode ser considerada

somente como um processo de memorização ou que emprega apenas o

conjunto das funções mentais ou unicamente os elementos físicos ou

emocionais, pois todos estes aspectos são necessários”. (Campos, 1983, p.33)

Segundo as teorias de Reuven Feuerstein sobre a Experiência de

Aprendizagem Mediada e sobre a Modificabilidade Cognitiva e muito bem

definido por Beauclair (2008, p.35), “aprender é saber desenvolver nossos

10

potenciais para mudança, visando alcançarmos maior flexibilidade para

a apreensão das diferentes situações formais e informais presentes em nosso

cotidiano: quando aprendemos, melhoramos nossas possibilidades de adquirir

novos conceitos e ampliar antigos, generalizando-os. Aprender é saber

promover transferências de aprendizagens anteriores para situações novas,

expandindo nossos sentimentos de competência. Aprender é, ainda, controlar

nossas impulsividades diante das complexidades presentes em nosso viver,

modo essencial à promoção de nossa auto-estima, fundamental para a

construção de uma auto-imagem que seja, realmente, positiva.”

Sabemos, então que para aprender precisamos de um organismo

preparado, habilitado e capaz de reproduzir, elaborar e reelaborar respostas de

acordo com as diversas situações impostas pela vida e, também, àquelas

outras situações problemas que esperamos solucionar ao longo da vida

escolar. “Quando aprendemos, aumentamos e modificamos nossas estruturas

cognitivas e, com isso, as possibilidades se ampliam, nossa exposição aos

estímulos e às experiências cotidianas produz melhores resultados, vamos nos

tornando pessoas capazes de organizar e a usar informações obtidas de modo

melhor, visto que mais relevante do que saber é aprender como utilizar, cada

vez mais e melhor, este saber”. (Beauclair 2008, p.36)

São as dificuldades encontradas para solucionarmos os problemas

relacionados ao aprendizado na escola que serão objeto de estudo neste

capítulo.

O que são e o que significa dificuldade para aprender

Os conceitos de dificuldades de aprendizagem são diversos e

apresentam definições, por vezes, contraditórias. Mas, se faz necessário definir

o que queremos dizer com a expressão.

Como se pode determinar se uma criança apresenta ou não uma

dificuldade de aprendizagem? Apesar de todos os esforços de pesquisa e de

muitas tentativas para defini-la, ainda não há uma definição operacional geral

sobre os distúrbios de aprendizagem que seja aceita. “Segundo Hooper e Willis

11

(1989) isto se dá em virtude da heterogeneidade dos grupos de dificuldades

dos distúrbios de aprendizagem”. (Dockrell e Mc Shane, 2000, p.13)

Segundo Reuven Feuerstein, a privação cultural (isto é a falta de

experiência de aprendizagem mediada - EAM) pode ser determinada por

fatores exógenos - condições ambientais em que os pais e/ou demais grupos

de relacionamento não transmitem a cultura, ou seja, não oferecem mediação -

ou fatores endógenos, quando a mediação não alcança o sistema mental

devido a condições fisiológicas internas. Seja qual for a etiologia, o fato é que a

falta de EAM diminui a plasticidade e a flexibilidade mental tornando mais difícil

adaptações a novas condições de vida por um processo de aprendizagem.

Para estes indivíduos e para que superem suas dificuldades será necessário

um nível de intensidade maior de EAM.

O sistema de classificação das dificuldades de aprendizagem por

etiologia apresenta duas desvantagens. A primeira diz respeito àquelas

dificuldades de etiologia desconhecida e que serão classificadas “de causa

desconhecida”, a segunda desvantagem, diz respeito ao fato de que origens

semelhantes se manifestam diferentemente e, como conseqüência necessitam

de diferentes estratégias de intervenção.

No sistema de classificação funcional as crianças são separadas em

dois grupos. O primeiro grupo, de crianças com nível intelectual inferior à média

são denominadas “lentas” e nos casos mais graves ”deficientes mentais”. O

segundo grupo, com nível intelectual considerado normal, mas que apresentam

dificuldades em tarefas específicas. Na avaliação, as crianças com dificuldades

específicas, por exemplo, em leitura, apresentam grande discrepância entre a

realização e a habilidade na área de dificuldade, Essas crianças são

classificadas como tendo uma “dificuldade específica de aprendizagem”.

(Dockrell e Mc Shane, 2000)

As dificuldades de aprendizagem ocorrem por várias razões. A criança

apresenta alguma dificuldade cognitiva e, por isso, seu aprendizado se torna

mais difícil do que o normal. Ocorre que algumas dificuldades são

conseqüência de problemas na estrutura educacional ou proveniente do

12

ambiente em que vive a criança e não estão relacionados às habilidades

cognitivas da criança. Ou seja, estratégias educacionais ineficientes, fracasso

escolar precoce pode levar a perda da autoconfiança com conseqüências no

aprendizado e, uma série de variáveis relacionadas ao ambiente familiar

também contribuem para as dificuldades de aprendizagem. Algumas vezes

todos os fatores estão interligados. “Mas, independente da causa primária, as

crianças com dificuldades de aprendizagem estão defasadas em relação a

seus colegas no que diz respeito a importantes aspectos do aprendizado.”

(Dockrell e Mc Shane, 2000, p.17)

A importância dada aos problemas de aprendizagem e a variedade de

problemas aumentou bastante nos últimos tempos, pois, esses dados são

quantificados baseados no fato de que o sucesso do indivíduo é medido a partir

de seu desempenho escolar. Em outras palavras, quem fracassa na escola

apresenta algum tipo de problema de aprendizagem, com algum grau de

intensidade.

“O quadro das dificuldades de aprendizagem é cada vez mais uma

“esponja social” que cresceu muito rapidamente, exatamente porque foi

utilizado para absorver uma diversidade de problemas educacionais acrescidos

de uma grande complexidade de acontecimentos externos e eles inerentes”.

(Porto, 2009, p.58)

Para Feuerstein, a figura do mediador é fundamental no processo de

aprendizagem. Segundo ele, a criança não aprende porque seu mediador

(entende-se por mediador seu professor, seus pais ou, até mesmo, outra

criança) não foi competente para transmitir adequadamente o conteúdo da

informação ou estimular o desenvolvimento da habilidade necessária à

aprendizagem. De acordo com a sua ‘Teoria da Modificabilidade Cognitiva’,

todos nós podemos ampliar nossos potenciais de inteligência, desde que bem

mediados.

Segundo Gardner (1995) e a ‘Teoria das Múltiplas Inteligências’, a

inteligência é um conjunto de capacidades humanas diferenciadas, talentos

e/ou habilidades intelectuais. Todos os seres humanos são inteligentes, o que

13

varia são as combinações das diferentes inteligências, dentre elas: musical,

espaço temporal, cinestésica-corporal, lingüística, lógico-matemática e

interpessoal. Esta definição considera as origens biológicas e, também, as

origens culturais. As inteligências têm herança genética que se manifestam

independente da educação e da cultura, mas as influências culturais são

determinantes no grau em que esse potencial intelectual irá se manifestar. Há

uma relação entre fatores genéticos e nível de inteligência, o que poderá impor

limites ao desenvolvimento evidenciando uma deficiência cognitiva e

intelectual. No entanto, nem todas as crianças que apresentam alguma

dificuldade para aprender não são inteligentes. Muito ao contrário, algumas são

até inteligentes demais. As dificuldades podem estar relacionadas a questões

de ordem familiar ou escolar, quando a escola é deficiente ao mediar o

conhecimento e estimular o desenvolvimento de habilidades cognitivas.

O distúrbio de aprendizagem se caracteriza por uma disfunção do

sistema nervoso central, já a dificuldade escolar está relacionada

especificamente a um problema de ordem ou origem de método de ensino.

Para, Dockrell & McShane (2000), como já foi pontuando anteriormente, as

dificuldades de aprendizagem podem ser decorrentes de déficits cognitivos que

prejudicam a aquisição de conhecimentos como também, na maioria delas, são

apenas resultantes de problemas educacionais ou ambientais que não estão

relacionados a um comprometimento cognitivo.

Desse modo, vamos tratar de definir os principais problemas de

aprendizagem ou dificuldades específicas da aprendizagem ou transtornos da

aprendizagem segundo a Classificação Internacional de Doenças – CID 10 e o

Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV,

resumidamente. (http://www.plenamente.com.br/diagnosticos7.htm)

Em seguida, no segundo capítulo, serão abordados os aspectos

relacionados aos comprometimentos cognitivo-educacionais desencadeados

ou agravados pelas relações familiares.

14

QUAIS SÃO OS TIPOS DE TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM?

Tanto o CID-10, como o DSM-IV apresentam basicamente três tipos

de transtornos específicos: o Transtorno da Leitura, o Transtorno da Matemática, e o

Transtorno da Expressão Escrita. A caracterização geral destes transtornos não difere muito

entre os dois manuais.

Transtorno da Leitura

O Transtorno da Leitura, também conhecido como dislexia, é um

transtorno caracterizado por uma dificuldade específica em compreender palavras escritas.

Dessa forma, pode-se afirmar que se trata de um transtorno específico das habilidades de

leitura, que sob nenhuma hipótese está relacionado à idade mental, problemas de acuidade

visual ou baixo nível de escolaridade.

O DSM-IV classifica como critérios diagnósticos para o Transtorno da

Leitura:

• Rendimento da capacidade de leitura, como correção,

velocidade ou compreensão da leitura, significativamente inferior a media para a idade

cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

• A dificuldade de leitura apresentada pelo indivíduo interfere

de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de leitura.

• Sob a presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de

leitura excedem aquelas habitualmente a este associadas.

• A leitura oral se caracteriza por distorções, substituições ou

omissões, e junto com a leitura silenciosa vem acompanhada por lentidão e erros na

compreensão do texto.

Transtorno da Matemática

O Transtorno da Matemática, também conhecido como discalculia,

não é relacionado à ausência de habilidades matemáticas básicas, como contagem, e sim,

na forma com que a criança associa essas habilidades com o mundo que a cerca.

A aquisição de conceitos matemáticos e outras atividades que exigem

raciocínio são afetadas neste transtorno, cuja baixa capacidade para manejar números e

conceitos matemáticos não é originada por uma lesão ou outra causa orgânica. Em geral, o

Transtorno da Matemática é encontrado em combinação com o Transtorno da Leitura ou

Transtorno da Expressão Escrita.

O Transtorno da Matemática, segundo o DSM-IV, é caracterizado por:

• A capacidade matemática para a realização de operações

aritméticas, cálculo e raciocínio matemático, encontra-se substancialmente inferior à média

15

esperada para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do

indivíduo.

• As dificuldades da capacidade matemática apresentadas pelo

indivíduo trazem prejuízos significativos em tarefas da vida diária que exigem tal habilidade.

• Em caso de presença de algum déficit sensorial, as

dificuldades matemáticas excedem aquelas geralmente a este associadas.

• Diversas habilidades podem estar prejudicadas nesse

Transtorno, como as habilidades lingüisticas (compreensão e nomeação de termos,

operações ou conceitos matemáticos, e transposição de problemas escritos em símbolos

matemáticos), perceptuais (reconhecimento de símbolos numéricos ou aritméticos, ou

agrupamento de objetos em conjuntos), de atenção (copiar números ou cifras, observar

sinais de operação), e matemáticas (dar seqüência a etapas matemáticas, contar objetos e

aprender tabuadas de multiplicação).

Transtorno da Expressão Escrita

Um transtorno apenas de ortografia ou caligrafia, na ausência de

outras dificuldades da expressão escrita, em geral, não se presta a um diagnóstico de

Transtorno da Expressão Escrita. Neste transtorno geralmente existe uma combinação de

dificuldades na capacidade de compor textos escritos, evidenciada por erros de gramática e

pontuação dentro das frases, má organização dos parágrafos, múltiplos erros ortográficos

ou fraca caligrafia, na ausência de outros prejuízos na expressão escrita.

Em comparação com outros Transtornos de Aprendizagem, sabe-se

relativamente menos acerca do Transtorno da Expressão Escrita e sobre o seu tratamento,

particularmente quando ocorre na ausência de Transtorno de Leitura. Existem algumas

evidências de que déficits de linguagem e percepto-motores podem acompanhar este

transtorno.

O Transtorno da Expressão Escrita, de acordo com os critérios

diagnósticos do DSM-IV, são:

• A capacidade das habilidades de expressão escrita

encontram-se significativamente inferior a media para a idade cronológica, capacidade

intelectual e nível de escolaridade do indivíduo.

• A dificuldade na expressão escrita apresentada pelo indivíduo

interfere de modo significativo nas atividades cotidianas que requeiram habilidades de

escrita, como escrever frases gramaticamente corretas e parágrafos organizados.

• Na presença de algum déficit sensorial, as dificuldades de

escrita excedem aquelas habitualmente a este associadas.

• O problema se caracteriza por dificuldades na composição de

textos, erros de gramática e pontuação, má organização dos parágrafos, erros freqüentes de

ortografia e caligrafia precária.

16

Nestes casos, após avaliação criteriosa, a criança ou adolescente

deverá ser encaminhado para um tratamento, preferencialmente,

multidisciplinar que quase sempre envolve uma intervenção psicopedagógica

e/ou fonoaudiológica; acompanhamento médico especializado de um

neurologista ou psiquiatra, quando for necessário, dependendo da gravidade

do caso; aconselhamento e orientação da escola com sugestões para o uso de

técnicas e tecnologias apropriadas; e, atendimento familiar, orientando quanto

ao manejo do comportamento da criança/adolescente que muitas vezes é

afetado e se modifica causando problemas para toda família. A família deve ser

informada através de psicoeducação sobre o transtorno, seus sintomas, suas

causas e conseqüências.

17

AS FAMÍLIAS DIANTE DOS PROBLEMAS DE

APRENDIZAGEM

“Alicia Fernandez, (1990) em vários momentos do seu livro A Inteligência

Aprisionada, nos traz uma visão mais global das Dificuldades de

Aprendizagem. Ela diz: Se pensarmos no problema de aprendizagem como só

derivado do organismo ou só da inteligência, para sua cura não haveria

necessidade de recorrer à família. Se, ao contrário, as patologias no aprender

surgissem na criança ou adolescente somente a partir de sua função

equilibradora do sistema familiar, não necessitaríamos, para seu diagnóstico e

cura, recorrer ao sujeito separadamente de sua família.” (Polity.

www.pedagobrasil.com.br/pedagogia/dificuldadeaprendizagem.htm)

As dificuldades de aprendizagem podem gerar e agravar problemas

emocionais. Se o rendimento da criança na escola for regular ou sofrível,

dependendo da cultura escolar, ela pode ser considerada um fracasso pelos

professores ou colegas, e até pela própria família. Infelizmente, muitas dessas

crianças desenvolvem uma baixa auto-estima e uma auto-avaliação negativa

que poderia ser evitada, com o auxílio da família e, com a escolha de uma

escola mais adequada ao perfil da criança/adolescente.

A dificuldade de aprendizagem, quando de origem biológica, é bastante

clara o que nos leva a sugerir que a área emocional e o ambiente familiar não

tiveram nenhuma participação no seu aparecimento e determinação. Mas,

mesmo assim, a dinâmica familiar e o comportamento dos pais diante do

problema e de suas manifestações, pode acentuar, ainda mais, o problema da

criança/adolescente. A criança hiperativa se tronará mais hiperativa, a

deprimida mais deprimida, a autista mais autista, a agressiva mais agressiva.

“A criança em idade escolar sabe que precisa ter sucesso nos estudos.

Isso é exigido por seus pais, familiares, colegas, professores, pela sociedade

como um todo. O sucesso opõe-se ao fracasso, e este implica num juízo de

valor, num julgamento que deve corresponder a um ideal.

Esse ideal normalmente é ditado por valores familiares que são transmitidos de

18

geração em geração. Há famílias de engenheiros, que se espera do filho

mais velho que também o seja. Há famílias de advogados, de médicos ou de

negociantes, onde o destino da criança já está selado nem bem ela nasceu.

Pode-se observar aqui o papel dos mitos familiares que tentam a construção de

uma realidade irreal desejada para a continuação da história familiar”.

Cada grupo familiar introduz expectativas e valores sobre como o filho

deve ser, como deve se comportar e transferem, mesmo sem saber, seus

sonhos sobre a vida profissional futura da criança. Desde seu nascimento

começam as profecias (acho que ele será um grande economista, como o avô),

os mandatos (somos uma família de advogados, esperamos que ele siga a

mesma profissão;), as comparações (ele deve se esforçar para tirar notas boas

como o irmão), as lealdades (meus pais são analfabetos, acho que também

não preciso estudar muito) os segredos (minha mulher e eu achamos melhor

não lhe falar nada sobre a adoção). Todas estas situações marcam

profundamente o desenvolvimento futuro da criança impondo-lhe tarefas que

estão em desarmonia com suas capacidades, aptidões ou mesmo desejos.

(Polity. www.pedagobrasil.com.br/pedagogia/dificuldadeaprendizagem.htm)

Uma criança precisa se sentir segura, amada e compreendida para se

sentir capaz de aprender e se perceber aprendendo e se reconhecer

pertencente ao seu grupo familiar. É na família que a criança pode encontrar

um ambiente favorável ou desfavorável que irá influenciar e interferir no

processo de aprendizagem. “É na família que são absorvidos os primeiros

saberes, e onde se aprofundam os vínculos humanos”. (Revista

Psicopedagogia 2007; 24(74): p.184). Num ambiente hostil, a criança estará

propensa a apresentar comportamentos hostis e se auto-avaliar negativamente

o que poderá dificultar seu aprendizado.

“A família é responsável pelo processo de amadurecimento psíquico e

proporciona uma sustentação necessária à individuação. A individuação é um

processo que passa pela diferenciação, por uma condição de auto-expressão.

Teoricamente, a criança ou adolescente são membros garantidos no grupo,

visto que nascem e crescem nesse meio. Mas, não basta nascer e crescer,

essa criança ou adolescente necessita do apoio da família e de um lugar na

19

relação parental. Nesse sentido, o sujeito vai constituindo sua maturidade e

iniciando o processo de individuação”. (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74):

p.184)

Esclarecendo melhor as questões relativas à individuação e a

diferenciação: “diferenciação do self, segundo teoria de Bowen (1978)

desenvolvida por Kerr (1981-84) é descrita como grau de controle de cada

indivíduo sobre os pensamentos e sentimentos, critérios próprios que o levam a

escolher suas ações e responsabilizar-se por elas. Os bons resultados da

diferenciação do self demonstram a capacidade de pertencer e, ao mesmo

tempo, estar separado do meio familiar”. (Revista Psicopedagogia 2007;

24(74), p.154)

Para Fernandez, a falta de comportamento alteritário é marca registrada

de famílias facilitadoras de problemas de aprendizagem. O comportamento

alteritário é aquele que permite que o aprendente * faça escolhas diferentes do

ensinante*. Famílias com ausência de comportamento alteritário apresentam

dificuldade para aceitar as diferenças e as opiniões contrárias são entendidas

como agressão. “A alteridade na família favorece relações saudáveis com a

aprendizagem, resulta em espaço de autonomia de pensamento”. (Revista

Psicopedagogia 2007; 24(74), p.152)

“Algumas famílias podem ser vistas como cerceadoras da autoria de

pensamento, pois não permitem à criança realizar experiências e ter a vivência

de satisfação de ter conseguido realizá-la por si mesma e, conseqüentemente,

reconhecer-se autora de sua produção, construindo a confiança em sua

capacidade pensante”. (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74), p.154)

Se a família não oferece apoio, não é acolhedora a criança poderá

manifestar através de algum tipo de dificuldade de aprendizagem a falta ou

carência de afeto nas relações familiares. Com as relações familiares abaladas,

as crianças procuram suprir sua carência de afeto chamando a atenção de

seus pais de forma negativa. No caso de adolescentes, essa carência é por

*Aprendente e Ensinante são termos usados por Alicia Fernandez e equivalem a relação aluno e professor, mas, também, a outros vínculos como pais e filhos, amigos-amigo.

20

vezes perigosa, pois o adolescente poderá buscar supri-la integrando outros

grupos fora da família e, nos dias de hoje, não podemos negligenciar questões

como violência urbana e drogas e, as influências das tão comentadas más

companhias.

“... Embora não exista uma concordância quanto ao papel

desempenhado pelos afetos no processo de conhecer, é consenso o fato de

que os estados afetivos interferem no cognitivo. Também parece haver uma

certa concordância quanto ao fato de que as funções afetivas e cognitivas são

de natureza distintas, embora indissociáveis, uma vez que não existe conduta

afetiva sem elementos cognitivos, nem tão pouco elementos cognitivos

desvinculados do afeto”. (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74), p.184)

Assim, é sabido que as dificuldades de aprendizagem têm diversas

causas orgânicas, e pode estar associada a fatores externos e internos do

indivíduo, mas, seja qual for a causa, o fato é que a família tem papel

fundamental na manutenção ou solução do problema apresentado.

“... As qualidades que de início pertencem a uma relação familiar e dela

emergem, com o passar do tempo, se tornam qualidades intrínsecas do

indivíduo. Portanto, alteridade, autoria de pensamento e família estão

entrelaçados.” (Revista Psicopedagogia 2007; 24(74), p.155)

Existem, ainda, outros entrelaçamentos, o ensino-aprendizagem e a

modalidade de aprendizagem da criança entrelaçada a modalidade de

aprendizagem da família. “A modalidade de aprendizagem do sujeito também

é o resultado de uma história de experiências do indivíduo em interação com o

grupo familiar, onde importa: como ocorreram as experiências e como foram

interpretadas pelo indivíduo e pelos seus pais. A aprendizagem acontece na

produção das diferenças dos pais e dos filhos, apoiada no significado que o

aprender tem para o grupo.” (Munhoz. Revista Psicopedagogia 2007; 24(74);

p.156)

As maneiras como os pais se comportam e reagem a autoria de

pensamento da criança/adolescente irá determinar o tipo de modalidade de

ensino da família. O que irá determinar uma modalidade de

21

ensino/aprendizagem patogênica é a rigidez ou a falta de flexibilidade de

pensamento desses pais.

O reconhecimento da autoria de pensamento nasce no meio familiar,

que podemos descrever como propício quando existe alteridade nas relações.

É importante que os pais aceitem as diferenças e as características individuais

de seus filhos, respeitando-os e amando-os como são propiciando modalidades

de ensino e aprendizagem sadias.

Com o objetivo de afirmar e comprovar o acima exposto, relato a seguir

um resumo do resultado de pesquisas realizadas por Marturano e cols.

(1997,1998,1999), conduzidas no Núcleo de Estudos em Problemas de

Aprendizagem da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP.

Observou-se que os problemas de aprendizagem quase sempre

antecedem as dificuldades de aprendizagem na escola.

Participaram da pesquisa crianças com idade entre 7 e 12 anos, de

séries escolares correspondente ao 1º. Ciclo do ensino fundamental e suas

respectivas mães ou responsáveis. O percentual de meninos oscila entre 65%

e 70% nas diferentes amostras.

O perfil da Demanda diz que 70% das crianças apresentam capacidade

intelectual em torno da média, porém com baixo rendimento escolar confirmado

através de teste psicométrico, em 84% dos casos. Prejuízos discretos em

indicadores de Inteligência verbal e processamento da linguagem oral

aparecem quando as crianças são comparadas aos colegas sem dificuldades

escolares. Por outro lado, quando comparadas com colegas que também

apresentam baixo desempenho escolar, as crianças encaminhadas ao serviço

de saúde mostram potencial cognitivo e lingüístico equivalente, porém, maior

prejuízo em leitura e escrita. ( Marturano e cols. 1977; Benzoni e cols.1998;

Elias, 2002)

O conjunto dos resultados sugere que o desempenho atual dessas

crianças está aquém do seu potencial de aprendizagem e realização.

22

A pesquisa adotou uma linha de investigação, guiada por questões

relativas ao suporte parental para o progresso escolar e abordam a natureza e

extensão do suporte oferecido, sua dependência em relação a fatores

socioeconômicos e educacionais, diferenças individuais no acesso aos

recursos e o grau que o suporte parental efetivamente favorece o desempenho

escolar da criança, partindo do pressuposto de que a ativação e a

potencialização de recursos presentes no ambiente familiar pode contribuir

para melhor capitalização do potencial cognitivo das crianças.

Foram quatro áreas identificadas nos relatos das famílias quanto aos

recursos facilitadores do progresso escolar: suporte para desenvolvimento e

aprendizagem; relacionamento pais-criança; clima emocional e práticas

educativas.

As conclusões das pesquisas, aqui apresentados qualitativamente, são

um resumo dos estudos desenvolvidos por Marturano e cols. nos anos de

1997, 1998 e 1999.

Os resultados obtidos sugerem que o progresso na aprendizagem

escolar, indicado seja pela ausência de atraso ou pela qualidade de produção

escrita, esta associado à supervisão e à organização das rotinas no lar, a

oportunidades de interação com os pais e à oferta de recursos no ambiente

físico. A escolaridade materna não foi um preditivo direto de medidas de

realização escolar.

O atraso escolar se vincula mais fortemente à menor estruturação do

tempo em casa, a menos oportunidades de interação com os pais e à presença

de situações adversas, sinalizando condições psicossociais que podem

interferir com a integração da criança na escola. Essa combinação de baixos

níveis de suporte com alta incidência de estressores ambientais configura uma

condição de vulnerabilidade ( Dubois e cols.,1992; Dubow e Tisak, 1989;

Marten e cols, 1988). Os resultados da análise de regressão mostraram que a

adversidade crônica mantém relação com o atraso escolar, mesmo quando

controlado estatísticamente o fator idade.

23

O delineamento do estudo apenas permite detectar relações de co-

ocorrência e não de causalidade. Dentro desses limites, a coerência entre os

resultados obtidos junto a essa clientela de uma clínica-escola brasileira e

aquelas derivados de investigações conduzidas na população geral em outros

países, sugerindo que recursos ambientais familiares, favorecedores do

desempenho escolar, incluem presença de materiais educacionais e

envolvimento dos pais, em forma de participação e organização das rotinas.

Não raro usamos a expressão a vida imita a arte. Mas, o filme ‘Somos

todos Diferentes’ com certeza é uma lição de vida e retrata muito bem o

sofrimento de uma criança para ser aceita por sua família e pela escola. Até

mesmo detectar o problema da criança, nesse caso a dislexia, foi complicado,

pois a família não aceita o filho com problemas, a escola rotula a criança de

desatento e desinteressado, a família prefere reconhecer o filho como um

preguiçoso do que portador de um transtorno específico de aprendizagem de

origem biológica e que se agrava devido a desinformação e falta de orientação.

No filme, o personagem principal, um menino indiano de 8 anos,

cursando a 4ª. série fica deprimido, se isola de tudo e de todos depois que é

levado pela família para um colégio interno. Um professor de Artes que

também é disléxico condoído em ver aquele menino tão triste resolve investigar

sua história visitando a família. Quando revela o problema aos pais e a escola

ocorre o grande milagre, aquele garoto ‘burro’ que não conseguia ler nem

escrever, com a ajuda, a acolhida e o afeto desse professor se revela um

menino inteligente, criativo e consegue desenvolver as habilidades necessárias

para seguir sua vida escolar e se reintegrar familiar com sucesso e alegria.

Bem, estamos falando de uma ficção com final feliz, uma história triste

que nos enche de emoção, mas também nos remete a muitos casos como

esse na vida real e que nem sempre têm um final tão feliz como o deste filme.

Então, se esbarrarmos com uma criança triste devemos investigar e, se

houver uma única chance, devemos buscar ajuda para ela. Caso seja algum

tipo de dificuldade de aprendizagem cabe a indicação de um tratamento para a

criança que considere importante intervir junto aos pais ou cuidadores para

24

orientação e esclarecimento quanto ao problema. Quem sabe assim, não

mudamos um pouco o rumo de muitas histórias fadadas a uma vida cheia de

percalços e fracassos.

25

QUESTÕES EMOCIONAIS E COMPORTAMENTAIS DAS

CRIANÇAS/ADOLESCENTES COM DIFICULDADE DE

APRENDIZAGEM.

A Universidade Federal do Paraná - PROEC ( Pró-Reitoria de Extensão

e Cultura) aprovou para 2009/2010, dentre mais de 300 bolsas, o Projeto

Reconectar- reabilitação neuropsicológica para crianças e adolescentes. São

promovidos encontros semanais com as crianças/adolescentes, intercalados

com orientações aos responsáveis e atividades de interação entre eles. Além

dos encontros, crianças e pais realizam em conjunto tarefas de casa diárias.

Os pais são orientados e informados sobre os problemas de aprendizagem de

seus filhos e espera-se que compreendam os déficits e as potencialidades dos

mesmos, auxiliem na reabilitação das deficiências cognitivas destes e

percebam as necessidades orgânicas, afetivas e de socialização da criança.

Em relação à criança, espera-se que ela supere ou reduza seus

comprometimentos, aumente a utilização de recursos auxiliares às suas

dificuldades e melhore a auto-estima bem como sua competência social.

O projeto investe na intervenção com os pais, o que considera fator

essencial, não só orientando-os, como também estimulando-os a uma auto

análise quanto aos seus comportamentos em relação aos seus filhos;

intervenções com a criança/adolescente para que aumente o repertório de

habilidades sociais. O desenvolvimento das habilidades sociais da criança

melhora não somente as relações familiares, como também o seu ajustamento

em relação à escola. O projeto se embasa teoricamente no programa de

desenvolvimento de habilidades sociais de Del Prette & Del Prette: a criança

deve ser capaz de pedir e aceitar auxílio na realização das tarefas escolares;

iniciar, manter e concluir conversação com colegas, irmãos e pais; expressar

suas opiniões aos professores, amigos e familiares; recusar-se a fazer o que

não quer como destruir materiais de outros colegas e cabular aulas por

influência de amigos; analisar situações conflitantes bem como formas de

26

resolvê-las, tais como brigas entre colegas e acusações injustas por parte de

professores e pais.

Projetos como esse fazem a diferença não só por que presta assistência

uma camada da população mais carente, mas, por que entendem que uma boa

parcela do problema pode ser resolvido se houver uma ação direta junto a

família da criança/adolescente com dificuldade de aprendizagem.

Se prestarmos bastante atenção, as propostas de tratamento para pais e

filhos, ajudam e ensinam os pais a educarem seus filhos.

Sabemos que educar não é fácil e demanda tempo, paciência e bastante

informação. Educar não é só prover as necessidades básicas, físicas e

emocionais da criança/adolescente é, antes de tudo, estar provido dessas

necessidades. O educador seja ele pai ou professor precisa estar consciente

de sua influência positiva ou negativa e de como seu comportamento e suas

atitudes, positivas ou negativas, poderão determinar o comportamento futuro

da criança/adolescentes.

Para educar é necessário que haja diálogo e maturidade por parte dos

pais, respeito entre pais e filhos, aceitação por parte dos pais das diferenças

individuais e liberdade para ser e permitir ser.

Educar é ser empático. Quando demonstramos que compreendemos

nossos filhos, sem críticas, sem sermões, apenas ouvimos com atenção o que

estão dizendo eles se sentem amparados, sabem que podem contar conosco.

E, é assim que acontece como num passe de mágica, nossos filhos começam

a confiar em nós, nos contam seus problemas. Nesse momento da relação, os

pais podem exercer seu poder de ensinar, ajudando seu filho a resolver

problemas. Parece simples e é simples. Difícil é colocar em prática. (Gottman,

1999, p.79)

Crianças ou adolescentes com dificuldade de aprendizagem quase

sempre desenvolvem, em conseqüência de sucessivos fracassos escolares e

por não corresponderem as expectativas dos pais e professores, uma baixa

auto-estima e diversos pensamentos disfuncionais sobre si mesmos. Podem se

isolar dos colegas, evitando que pensamentos e sentimentos negativos ativem

27

a crença de que são incompetentes e inadequados (não se enquadram no

grupo) ou, não raros os casos, se tornam agressivos se comportando de forma

desafiadora junto aos adultos.

Segundo Young “um esquema é um padrão extremamente estável e

duradouro que se desenvolve durante a infância e é aperfeiçoado durante toda

a vida do indivíduo. Nós vemos o mundo por meio dos nossos esquemas”.

(Young. 2003, p.75) Um esquema não está no nível da consciência e pode ser

disparado por acontecimentos, sentimentos e por pensamentos. Os esquemas

são autoperpetuadores e muito resistentes a mudança. Daí a importância de

uma intervenção, um tratamento visando enfraquecer ao máximo os esquemas

iniciais desadaptativos (Young. 2003 p.81), de desenvolver habilidades sociais

e outras ‘habilidades de pensamento’ necessárias à vida escolar e pessoal

(social e família).

Greene (2007, cap.6) defende a tese de que crianças e adolescentes

com comportamento explosivo precisam desenvolver habilidades de

pensamento que os tornem mais flexíveis, mais tolerantes as frustrações e

mais capazes de solucionar os problemas no dia a dia. Por outro lado, é

enfático ao orientar os pais a adotarem um plano para o manejo desses

comportamentos que se baseia na capacidade de observação dos pais em

identificar os desencadeadores, os acontecimentos que servem de estopim

para um comportamento agressivo da criança e qual ou quais habilidades de

pensamento devem ser ensinadas à criança.

Os pais devem desenvolver suas habilidades empáticas, a fim de ajudar

seus filhos a solucionar problemas, ensinando-os a identificar o fator estressor,

a definir o problema e, finalmente convidando-os a solucionar o problema

examinando todas as possibilidades viáveis.

O mais interessante é que normalmente esses pais apresentam muita

dificuldade em serem empáticos e precisam ser treinados, orientados e

estimulados a persistirem, pois, até que a criança ou adolescente se acostume

ao novo padrão de resposta, seus pais necessitarão de muita persistência, de

muita consistência e constância em suas ações.

28

Quanto às habilidades, Greene (2007, cap.3) as classifica em

habilidades de execução, de processamento da linguagem, de regulação

emocional, de flexibilidade cognitiva e, finalmente as habilidades sociais.

Habilidades de Execução:

A maioria das crianças diagnosticadas com TDAH encontra dificuldades

em relação às habilidades de execução.

1. Mudança de Padrões Cognitivos

• Capacidade de mudar eficientemente de uma atitude mental para outra.

Ex. Mudar de ambiente – recreio/aula

2. Organização e Planejamento

• São fundamentais para que a criança possa avaliar as opções sugeridas

e para que lide com problemas ou frustrações do dia a dia.

• Quando estamos diante de uma frustração precisamos resolver o

problema que nos frustra. Isso exige muita organização e planejamento:

1) identificar o problema; 2) considerar uma série de possíveis soluções;

3) prever as prováveis conseqüências dessas soluções; 4) tomar uma

atitude.

3. Separação do sentimento

• Capacidade de separar suas reações emocionais diante de um

problema no momento em que precisa imaginar algo para solucioná-lo.

Esta habilidade permite que a pessoa “deixe de lado” suas emoções.

• Uma criança sem essa habilidade tende a reagir mais emocionalmente

do que racionalmente às frustrações.

Habilidades Específicas da Linguagem:

• Categorização e expressão das emoções;

• Identificação e articulação das próprias necessidades;

• Resolução de problemas.

29

Problemas mais freqüentes: vocabulário reduzido; dificuldade de

expressar verbalmente as sensações; pouca experiência anterior. As

habilidades de Linguagem são fundamentais para nos ajudar a refletir, auto-

regular, estabelecer metas e controlar nossas emoções.

Habilidade de Regulação Emocional:

• A capacidade de ser flexível e de ser tolerante diante das frustrações

Alterações de humor, irritabilidade, agitação, indisposição e cansaço são

sentidos com maior intensidade na ausência desta habilidade.

Habilidade de Flexibilidade Cognitiva:

• Capacidade de pensar relativo; considerar as exceções a regra e formas

alternativas de encarar os fatos.

São crianças que pensam de modo extremo e ficam paralisadas em um

mundo relativo/abstrato. Em geral, preferem a previsibilidade e a rotina.

Habilidades Sociais

Poucas habilidades humanas exigem tanto pensamento complexo,

processamento rápido e flexibilidade do que as interações sociais.

• Dificuldade para prestar atenção aos indícios sociais e suas nuanças,

• Não interpreta bem os indícios da linguagem não verbal – “ele me

odeia”, “ninguém gosta de mim”, “todos me perseguem”;

• Não consegue associar os indícios com experiências passadas;

• Não conseguem avaliar como gostariam que conduzisse suas interações

sociais;

• Tem um repertório limitado de reações e acabam utilizando reações

idênticas (risos afetados, empurrões) em situações inadequadas;

• Pouca habilidade para perceber como as pessoas estão interpretando o

que ela faz ou fala;

• Pouca habilidade para perceber até que ponto seu comportamento afeta

outras pessoas;

30

• Apresenta dificuldade para iniciar uma conversa, ingressar em um

grupo, compartilhar.

Segundo Del Prette & Del Prette (2005) existem sete classes de habilidades

sociais fundamentais ao desenvolvimento interpessoal da criança. São elas:

1. autocontrole e expressividade emocional, do qual fazem parte o

reconhecimento

2. de suas próprias emoções, a dos outros e o lidar com as

mesmas; civilidade, no qual se incluem o cumprimentar, o

despedir-se e o agradecer;

3. empatia, como capacidade de interessar-se pelo outro e

expressar compreensão pela experiência alheia;

4. assertividade, do qual integra o expressar sentimentos e opiniões;

5. fazer amizades; fazer, perguntas, responder perguntas, dar

informações;

6. solução de problemas interpessoais; pensar e acalmar-se antes

de agir, escolher a melhor estratégia de solução, avaliar as

conseqüências;

7. habilidades sociais acadêmicas, seguir regras orai, prestar

atenção, reconhecer e elogiar o desempenho do outro, aguardar

a vez para falar;

Essas habilidades sociais se bem desenvolvidas possibilitam uma boa

competência social que irá repercutir no comportamento e nas relações sociais.

“Competência social é a capacidade de articular pensamentos, sentimentos e

ações em função de objetivos pessoais e de demandas da situação e da

cultura, gerando conseqüências positivas para o indivíduo e para a sua relação

com as demais pessoas”. (Del Prette & Del Prette. 2006 p.33) É de extrema

importância, portanto, atentar para o desenvolvimento das habilidades sociais

das crianças e dos adolescentes.

31

Podemos concluir que as dificuldades de aprendizagem, de causa

biológica ou não, podem ser agravadas se apenas o problema da criança for

tratado. A família, os pais, professores e cuidadores devem ser orientados e

tratados paralelamente. Os problemas de aprendizagem podem acentuar os

problemas emocionais trazendo grande prejuízo por toda a vida do indivíduo.

Não devemos negligenciar as questões de ordem emocional e muito menos as

de ordem cognitiva. Portanto, faz-se necessário um trabalho multidisciplinar,

que envolve o uso de técnicas eficazes (como descrito acima o uso da

empatia) e a atuação da família, da escola e de uma equipe de profissionais,

dependendo da gravidade do caso.

32

CONCLUSÃO

As dificuldades de aprendizagem ocorrem por várias razões. Podem ter

diversas causas orgânicas e, estarem associada a fatores externos e internos

do indivíduo. A criança apresenta alguma dificuldade cognitiva e por isso seu

aprendizado se torna mais difícil, mais lento do que o normal. Tais dificuldades

podem ser decorrentes de déficits cognitivos ou resultantes de problemas

educacionais ou, até mesmo, ambientais, que não estão relacionados a um

comprometimento cognitivo. A família tem papel fundamental na manutenção

ou na solução do problema apresentado pela criança.

Estratégias educacionais ineficientes e fracasso escolar precoce pode

levar a perda da autoconfiança com conseqüências no aprendizado e, uma

série de variáveis relacionadas ao ambiente familiar também contribuem para

as dificuldades de aprendizagem. Algumas vezes todos estes fatores estão

interligados.

A dinâmica familiar e o comportamento dos pais diante das dificuldades

de aprendizagem pode acentuar, ainda mais, o problema da

criança/adolescente. A criança hiperativa se tornará mais hiperativa, a

deprimida mais deprimida, a autista mais autista, a agressiva mais agressiva.

É importante e indispensável uma avaliação criteriosa da criança ou

adolescente para diagnosticar o problema ou levantar hipótese diagnóstica.

Preferencialmente, o tratamento proposto é multidisciplinar que, quase sempre,

envolve uma intervenção psicopedagógica e/ou fonoaudiológica; neurologista

ou psiquiatra; aconselhamento e orientação à escola; e, atendimento familiar,

orientando quanto ao manejo do comportamento da criança/adolescente.

Crianças ou adolescentes com dificuldades de aprendizagem quase

sempre desenvolvem, em conseqüência de sucessivos fracassos escolares e

por não corresponderem as expectativas dos pais e professores, uma baixa

auto-estima e diversos pensamentos disfuncionais sobre si mesmos. É comum

o isolamento, a agressividade, o comportamento desafiador principalmente em

33

relação aos adultos como pais, professores, diretores e coordenadores de

escolas.

Nestes casos, escola e família devem ser preparados e treinados em

técnicas comportamentais específicas. O uso de reforçador positivo é muito

mais eficaz do que o uso da punição. A punição pode agravar e aumentar a

freqüência do comportamento indesejado.

Pais de crianças com dificuldade de aprendizagem precisam aceitar as

diferenças individuais de seus filhos. Precisam exercer a liberdade para ser e

permitir ser. É necessário que haja diálogo e maturidade por parte dos pais

para que haja respeito entre pais e filhos.

Ser empático parece ser a solução. Os pais devem aprender e praticar a

empatia e a estabelecer relações de empatia com os filhos, a fim de ajudá-los

na solução de seus problemas. Quando os pais se tornam próximos dos filhos,

demonstrando compreendê-los, evitando punições e privilegiando o reforço do

comportamento desejado, os filhos se sentem amparados, mais próximos de

seus pais. Assim, fica mais fácil desenvolver as habilidades sociais,

normalmente comprometidas, em crianças com dificuldades de aprendizagem

e, muitas vezes, nos próprios pais.

A eficácia de um tratamento multidisciplinar não depende apenas da

intervenção junto à criança, mas também, e, paralelamente, na família e na

escola.

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

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