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0 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE SUPERENDIVIDAMENTO E O CDC: CAUSAS EFEITOS E SOLUÇÕES. Por: Yuri Santos Ckless Orientador Prof. William Rocha Rio de Janeiro 2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

SUPERENDIVIDAMENTO E O CDC: CAUSAS EFEITOS E

SOLUÇÕES.

Por: Yuri Santos Ckless

Orientador

Prof. William Rocha

Rio de Janeiro

2010

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

SUPERENDIVIDAMENTO E O CDC: CAUSAS EFEITOS E

SOLUÇÕES.

Apresentação de monografia à Universidade Cândido

Mendes como condição prévia para a conclusão do

Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito nas

relações de consumo.

Por. Yuri Santos Ckless

3

DEDICATÓRIA

Dedico essa monografia à minha amada esposa Renata,

que tanto me incentivou e sempre me apoiou no decorrer

deste trabalho. Também ao Pedro, meu filho, luz da

minha vida, a razão de minha existência.

À Marlene, minha querida mãe, exemplo de vida,

coragem, bravura e dedicação a ser seguido.

Yuri Ckless

4

RESUMO

O superendividamento é um fenômeno sócio-econômico que começou a ser

conhecido em nosso ordenamento jurídico a partir de 2005. Desde então, tem-

se notícia de diversos casos de consumidores que vem passando por esta

mazela social nos tribunais de todo o país. Infelizmente como ainda não se tem

uma legislação específica que trate desta matéria, a total responsabilidade na

resolução deste infortúnio está nas mãos dos magistrados, que na ausência de

lei, aplica-se nosso Código de Defesa do Consumidor – que completou vinte

anos, e tratando-se desta matéria, restam diversas lacunas para resolução

deste problema. A concessão do crédito desenfreado pelas instituições

financeiras aliado à publicidade agressiva e desenfreada tem sido um fator

considerável no agravamento desta questão. A prevenção sempre será o

melhor remédio para se evitar que o consumidor chegue ao

superendividamento, através de cartilhas educativas à população e um alerta

dos órgãos de defesa ao consumidor de como evitar esse mal. Mas na

impossibilidade de se conseguir a prevenção e o cidadão cair em tentação,

este trabalho vislumbra mostrar o que deve ser feito nesse caso, como os

tribunais estão enxergando essa anomalia que nos atinge, o que o direito

comparado nos mostra e a possibilidade de termos uma lei que trate desse

assunto especificamente, beneficiando ainda mais o indivíduo que é atingido

por este infortúnio.

5

METODOLOGIA

A metodologia utilizada neste trabalho, primeiramente, é definir o que vem a

ser o superendividamento, pois ele desdobra-se em ativo e passivo, sendo esta

primeira etapa primordial para o entendimento da pesquisa.

Ainda neste início pretende-se mostrar que este desdobramento é de suma

importância, pois irá ou não, dependendo do caso, mostrar se o consumidor

terá a tutela de proteção amparada pela legislação.

A vulnerabilidade do consumidor também é tema de apreciação neste

princípio, bem como a boa-fé por parte dos fornecedores nesta primeira visão.

Num segundo plano é abordado sobre a ingerência da concessão do crédito

ao cidadão e a responsabilidade dos fornecedores nesta etapa, bem como o

código de defesa do consumidor o protege desta anomalia, quer através de

artigos, reportagens, doutrina e jurisprudências versando sobre o tema.

Ainda é visto o que está sendo feito e como é o tratamento dispensado ao

consumidor que sofre deste problema e exemplos de soluções propostas para

a resolução do superendividamento e como a legislação em outros países

tratam deste assunto ao mesmo tempo em que ela pode ser trazida à nossa

realidade.

Finalmente é mostrado através de um anteprojeto de lei uma proposta para

ser aprovado em nosso ordenamento jurídico a elaboração de uma lei para a

proteção do consumidor superendividado.

6

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 7

CAPÍTULO I – Fatores e causas que propiciam o superendividamento 8

CAPÍTULO II – A concessão do crédito, sua proteção no CDC e o tratamento

das situações de superendividamento do consumidor. 19

CAPÍTULO III – O direito comparado e o superendividamento 35

CAPÍTULO IV – Uma lei para o superendividado 39

CAPÍTULO V – Conclusão 41

BIBLIOGRAFIA 43

7

Introdução

O intuito da presente pesquisa, primordialmente, é alertar à sociedade de

um problema que cada vez mais vem assombrando os lares das famílias

brasileiras, mormente das classes B, C, e D, que é o superendividamento

passivo do cidadão brasileiro.

A inspiração para melindrar nesta seara, foram o de dois casos concretos

em minha família, cuja resolução não se precisou recorrer ao judiciário para

sanar este fenômeno e sim de orientações simples, como exemplos que serão

dados neste trabalho, que poderão evitar do consumidor de chegar à

insolvência civil.

No primeiro capítulo está a definição do que vem a ser este tão delicado

assunto, bem como a oferta e a demanda por crédito, mostrando também a

vulnerabilidade a que o consumidor está submetido e a boa-fé que o

fornecedor deve ter nos contratos.

No segundo capítulo discorro sobre a concessão do crédito e a influência do

marketing e da publicidade no cotidiano do cidadão; também é mencionada a

proteção do Código de Defesa do Consumidor aplicável ao indivíduo e

exemplos de tratamentos do superendividado em nosso país.

No terceiro capítulo faz-se um paralelo do direito comparado frente a nossa

legislação, e finalmente no quarto capítulo menciono o anteprojeto de lei para o

superendividado.

8

Cap. 1 – FATORES E CAUSAS QUE PROPICIAM O

SUPERENDIVIDAMENTO

1.1 – Definição

Primeiramente, antes de iniciar o desenvolvimento desta pesquisa,

cumpre informar que o que vem a ser superendividamento ou

sobreendividamento.

Em brilhante definição de Cláudia Lima Marques, fenômeno comum na

sociedade atual,

“caracteriza-se pela impossibilidade manifesta pelo devedor de

boa-fé de fazer face ao conjunto de suas dívidas não

profissionais e não pagas” (definição da Lei Especial Francesa

de 31-12-1989), traduzida pela autora (Contratos no código de

defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais.

4.ed. São Paulo: RT, 2004, p. 690), ou em outras palavras da

própria autora: “como impossibilidade global do devedor

pessoa física, consumidor leigo e de boa-fé de pagar todas as

suas dívidas atuais e futuras de consumo – excluídas as

dívidas com o fisco, as oriundas de delitos ou de alimentos”.

Diante de tal definição há um desdobramento entre superendividamento

ativo e passivo.

O primeiro refere-se àquele indivíduo que

“é resultante de uma acumulação de inconsiderada de dívidas,

oriundas de consumo desenfreado estimulado pelo mercado,

na tentativa de manutenção de um padrão de vida incompatível

com as possibilidades financeiras” 1

1 Marcus Vinicius Ferrari – “O consumo e o superendividamento”

http://www.nosrevista.com.br acesso em 01-04-10).

9

Continua Marcus Vinicius:

“Será passivo se decorrente da perda de receita por um

desemprego repentino, algum tratamento de saúde sem

cobertura de seguro, separação conjugal não planejada sob o

aspecto financeiro, aplicações ou investimentos mal sucedidos

etc” 2

Sendo assim, para efeito de pesquisa, o presente estudo será focado

neste segundo caso de superendividamento passivo, cujas fontes e

materiais doutrinários são amplos ao versarem sobre este objeto.

1.2 – A oferta e a demanda por crédito

Neste subitem da pesquisa, coloco o seguinte questionamento: A oferta de

crédito é proporcional à sua demanda ?

Inquestionavelmente percebe-se uma avalanche da oferta de crédito em

diversos meios diariamente, sendo o consumidor bombardeado pela facilidade

em sua obtenção.

Houve uma banalização do crédito e a facilidade em obtê-lo, faz com que o

indivíduo muitas das vezes tenha mais de um empréstimo simultâneo.

Indubitavelmente a oferta é maior que a demanda. Com a economia do país

sem abalos de crises globais, aliada a uma inflação controlada, temos um

aumento da circulação de dinheiro e de riquezas no país.

Todavia, porém, essa dação irresponsável do crédito pelos bancos gera

também conseqüências nefastas.

Quem concede o crédito nem sempre se preocupa em avaliar

detalhadamente as condições de solvência do cliente e sim na correção

2 Marcus Vinicius Ferrari – “ O consumo e o superendividamento” http://www.nosrevista.com.br acesso em 01-04-10).

10

monetária e os juros que determinado empréstimo irá gerar de lucro para certa

instituição bancária.

Diante de tal fato, em artigo no site da Serasa 3 do “superendividamento e o

papel dos indicadores de demanda por crédito” foi feito um levantamento sobre

a procura do crédito entre o primeiro bimestre de 2009, comparado com o

mesmo período de 2008.

Em decorrência desta pesquisa

“foi constatado que com a globalização econômica, a crise

mundial afastou o consumidor brasileiro do crédito. Embora o

indicador de demanda por crédito não represente o aumento do

superendividamento e da inadimplência, pois representa

apenas que a atividade econômica tem sido ou não alavancada

pela procura e concessão de crédito, não se pode negar que o

superendividamento é uma conseqüência da falta de

planejamento na concessão de crédito para um determinado

tomador” 4

Como conseqüência o superendividamento dos consumidores está de certa

forma atrelado ao aumento excessivo de crédito a eles concedido.

Em seu livro “Proteção do consumidor de crédito bancário e financeiro”, de

Márcio Mello Casado, RT, 2007, p. 145, o autor cita Clóvis Veríssimo do Couto

e Silva 4 que nos ensina que

“os contratos firmados com instituições financeiras, dada a

atual indispensabilidade do crédito na sociedade de consumo,

3 http://www.serasaexperian.com.br – acesso em 01-04-10 4 Couto e Silva, Clóvis Veríssimo do. A obrigação como processo. São Paulo: Bushatsky, 1976,

p. 92

11

podem ser considerados como verdadeiros atos existenciais,

absolutamente necessárias à vida humana”.

Mas esta necessidade de consumo deve ser cautelosa e responsável, sem

prejuízo do reconhecimento das relevantes funções sociais do crédito:

financiamento do consumo, elevação da produção, geração de empregos,

aumento do bem-estar dos brasileiros e contribuição para o crescimento do

país; em suma: mais qualidade de vida para todos.

Baseada nessa qualidade de vida e no aumento do consumo, os bancos

deram-se conta deste momento favorável em que passa nossa economia e

começou a ofertar nos intervalos de programas populares e horários nobres o

crédito fácil, que Márcio Mello Casado compara com uma pizza.

Esta comparação frente a um produto tão nobre quanto o crédito, além de

banalizá-lo, afirma o caráter de abusiva e enganosa a publicidade (art. 37 pár.

1° e 2° CDC).

Leciona Márcio Casado 5 :

“É abusiva porque pode induzir o consumidor a se comportar

de forma prejudicial e perigosa a sua saúde e segurança, na

medida em que as altas taxas de juros praticadas e diversas

práticas ilegais conduzem as pessoas a situações de

endividamento importantes que podem levar à insolvência”.

Completa o autor: “É enganosa, pois não é completa, não vem

acompanhada das necessárias advertências acerca do produto crédito, seus

riscos”.

Acerca desta questão, foram aprovadas, em 11.03.1998, no IV Congresso

Brasileiro de Direito do Consumidor, realizado em Gramado – RS, no painel

sobre serviços bancários e financeiros, as seguintes conclusões, onde se

5 Proteção do Consumidor de Crédito Bancário e Financeiro – RT – 2006 – 2.ed. – São Paulo

12

caracterizam a responsabilidade civil dos banqueiros pela concessão do

crédito6.

“ 5: As instituições financeiras, ao prestarem serviços atinentes

ao crédito, manipulam interesses públicos relevantes e devem

agir com a maior diligência, cumprindo com as funções

inerentes ao crédito (captação de poupança e financiamento à

produção) de molde a não causar danos (aprovada por

unanimidade).

“ 6. Responde o banqueiro pelos danos causados a terceiros,

com base no art. 186 do CC/2002, quando por falta de

observância de normas de conduta consistente em: a) prévia

verificação da capacidade de pagamento e, ou, b) proceder

estudo de viabilidade econômica da empresa ou do

empreendimento financiado, vier a conceder crédito a pessoa

em estado de insolvência. (aprovado por maioria).

“ 7. Considera-se recusa injustificada de crédito, ensejadora de

responsabilidade civil do banqueiro: a) a negativa de crédito a

demandante que preencha os requisitos objetivos exigidos pela

instituição financeira; b) a cessação de fluxo de crédito

contratualmente ajustado; c) a cessação de renovação de

crédito em relação jurídica continuativa. (aprovada por maioria).

1.3 – A vulnerabilidade do consumidor e a boa-fé nos

contratos

1.3.1 – A vulnerabilidade do consumidor

De acordo com a definição do dicionário Aurélio 7, vulnerabilidade significa

para os léxicos, “a qualidade ou estado de vulnerável que, por sua vez,

6 Revista de direito consumidor 26/244

13

significa o que pode ser vulnerado, magoado, prejudicado, ofendido, o que é

frágil, que pode ser atacado ou ferido”.

Sendo assim, percebendo a fragilidade do consumidor frente ao fornecedor,

o Código de Defesa do Consumidor expressou em seu art. 4°, I, como um

princípio estruturante de seu sistema, ou nas palavras de João Batista de

Almeida 8 : “essa é a espinha dorsal da proteção do consumidor”.

Em face do princípio em exame,

“ a vulnerabilidade é qualidade intrínseca, ingênita, peculiar,

imanente e indissolúvel de todos que se colocam na posição de

consumidor, pouco importando sua condição social, cultural ou

econômica (...) É incindível do contexto das relações de

consumo, não admitindo prova em contrário por não se tratar

de mera presunção legal.” ( Thereza Arruda e James Martins

Eduardo Alvim, Código do consumidor comentado, 2.ed,

Revista dos Tribunais, 1995, p.45) em outras palavras,

vulnerabilidade é um estado da pessoa, uma situação

permanente ou provisória que fragiliza o consumidor.

Vulnerabilidade e hipossuficiência não se confudem, embora digam respeito

ao consumidor. Antônio Herman Benjamin 9 traça com extrema peculiaridade a

distinção na lição que segue:

“ A vulnerabilidade é um traço universal de todos os

consumidores, ricos ou pobres, educados ou ignorantes,

crédulos ou espertos. Já a hipossuficiência é marca pessoal,

limitada a alguns – até mesmo a uma coletividade – mas nunca

a todos os consumidores...A vulnerabilidade do consumidor

justifica a existência do código. A hipossuficiência, por seu seu

turno, legitima alguns tratamentos diferenciados no interior do

próprio código, como por exemplo a previsão do ônus da prova

7 Dicionário Aurélio Eletrônico, séc. XXI, versão 3.0, Nov. 1999 8 João Batista de Almeida. A proteção jurídica do consumidor, n° 54, São Paulo: RT, 2005

14

– art. 6°, VIII (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor

comentado pelos autores do anteprojeto, 8.ed., Forense

Universitária, p. 371).

Complementando com a visão de Sérgio Cavalieri10·:

“O CDC trata de maneira desigual o consumidor não para

conferir-lhe privilégios ou vantagens indevidas, mas sim

prerrogativas legais – materiais e instrumentais – para que se

atinja o desiderato constitucional da igualdade real.”

A igualdade, na clássica lição de Rui Barbosa, importa em tratar

desigualmente aos desiguais, na medida de suas desigualdades.

Cavalieri 11 classifica a vulnerabilidade em três espécies: fática, técnica e

jurídica.

Na fática ele descreve como “a discrepância entre a maior capacidade

econômica e social dos agentes econômicos.”

Na técnica “decorre do fato de não possuir o consumidor conhecimentos

específicos sobre o processo produtivo, bem assim dos atributos específicos de

determinados produtos ou serviços pela falta ou inexatidão das informações

que lhe são prestadas”.

E finalmente a jurídica ou científica, “resulta da falta de informação do

consumidor a respeito dos seus direitos.”

Diante das definições de vulnerabilidade a que o consumidor sempre estará

exposto fática, técnica e juridicamente, um estudo feito pelo núcleo de

superendividamento do PROCON-SP 12 em dezembro de 2006, comprovou em

9 Antônio Herman Benjamin. O direito do consumidor: RT. n. 670, p.50 10 Sérgio Cavalieri.Programa de direito do consumidor. Ed.Atlas, 2008,p.39 11 Op. Cit. p.39 12http://www.procon.sp.gov.br/noticia.asp?id=369 – acesso em 01.04.10

15

seu atendimento a 420 consumidores superendividados passivos que 82%

deste total não recebeu a cópia do contrato no momento em que realizou a

contratação; o documento não foi recebido ou somente foi recebido após a

assinatura. Tal dado é preocupante, vez que demonstra que o consumidor não

teve acesso às informações referentes aos seus direitos e deveres, tampouco

às condições contratuais, violando direitos básicos do consumidor (art. 6°, III)

quanto à informação prévia, clara e precisa e quanto à oferta (art. 31) o que

demonstra o descaso e abuso das instituições financeiras frente ao

consumidor.

Outro dado relevante desta pesquisa refere-se à forma que o consumidor

teve acesso ao crédito. 53% obtiveram conhecimento por meio de panfletos ou

inserções de TV, o que demonstra que o crédito é quem procura o consumidor

e não ao contrário, como deveria ocorrer. Essa forma de marketing agressivo

não é salutar quando se fala em cessão de crédito. Outro dado que corrobora a

afirmação é o de que a grande maioria, 92% não teve que apresentar nenhuma

garantia para obter o crédito.

1.3.2 – A boa fé nos contratos

Após relatada a vulnerabilidade que o consumidor sofre diariamente, far-

se-á a ligação entre esta fragilidade aliado ao consagrado princípio da boa-fé

objetiva, cujo Código de Defesa do Consumidor, o adotou, implicitamente como

cláusula geral no seu art. 4°, inciso III, onde a mesma deve ser considerada

inserida em todas as relações jurídicas de consumo.

16

Se, no plano constitucional o princípio da dignidade humana é o mais

importante, tanto assim que consagrado como um dos fundamentos do nosso

Estado democrático de direito (CF, art. 1°, III), no plano infraconstitucional esse

papel cabe ao princípio da boa-fé.13

Como função da boa-fé, continua Cavalieri:

“importa dizer que em toda e qualquer relação jurídica

obrigacional de consumo esses deveres estarão presentes,

ainda que não inscritos expressamente no instrumento

contratual. Quem contrata não contrata apenas a prestação

principal; contrata também cooperação, respeito, lealdade etc.”

Vale dizer, o contrato não envolve apenas a obrigação de prestar, envolve

também obrigação de conduta ética antes, durante e após a celebração14

Ainda nas brilhantes palavras de Cavalieri “em sua função de controle, a

boa-fé representa, pois o padrão ético de confiança e lealdade, indispensável

para a convivência social (...) uma espécie de cinto de segurança de toda a

ordem jurídica”.

Mas frente a estas definições mais que perfeitas, percebe-se que na prática,

no dia-a-dia, na contratação de um empréstimo junto a um banco, na

realização de um contrato de seguro de automóvel etc, vislumbra-se a total

falta de boa-fé ao não ser entregue previamente ao consumidor uma cópia do

contrato a que o mesmo tem direito, tampouco ele é alertado dos riscos a que

está exposto sobre o prolongamento das prestações, quiçá das cláusulas de

limitação de seus direitos, que deveriam estar em destaque no corpo do

contrato (art. 54, par. 4°), com formato de letra nunca inferior ao corpo 12 ( Lei

11.785/08 – art.1°) nos contratos de adesão.

Quanto aos contratos de empréstimo consignado, houve um precedente em

nosso TJRJ15, onde segundo o julgado,

13 Cavalieri. Op.cit.pág. 30 14 Idem. Op.cit. pág.30

17

o “superendividamento é uma patologia econômico-financeira

gerada pela moderna sociedade globalizada de consumo e de

crédito (...) onde o débito em conta representa uma agressão à

dignidade se os descontos incidem sobre os parcos

vencimentos da autora retirando-lhe a possibilidade de

deliberar sobre quais os débitos de sua vida privada são mais

relevantes.”

Ainda dos fundamentos da decisão, merece realce a

consideração de que “não importa que o contrato de

refinanciamento tenha sido firmado em 2001, e os descontos

feitos em 2005, pois o CDC exige a transparência clara, prévia

e objetiva como direito fundamental a proteger o consumidor

(art. 6°, III, CDC), e, principalmente a boa-fé objetiva no trato

com o mais frágil.”

Cumpre destacar nas palavras de Geraldo de Faria Martins da Costa16 que:

“não só a omissão dolosa deve ser combatida. O legislador

busca um consentimento esclarecido pelo cumprimento

adequado da obrigação positiva de informar, com o objetivo de

prevenir os litígios, de dissipar a falta de clareza, de estimular a

escolha nacional do consumidor de crédito. O judiciário ficar

atento ao descumprimento generalizado da obrigação positiva

de informar adequadamente o consumidor de crédito. Este tem

direito a informações de boa-fé (art. 4°, III, c/c art. 6°, III do

CDC) completas, adequadas, postas em forma de menções

precisas (art. 52 CDC) e escritas (art. 54, par. 3° e 4° do CDC,

c/c o art. 13, XX, dec. 2181/97).

15 TJRJ, 5ª Cam. Cív.,Ap.Cív. 2006.001.46305, JDS. Des. Cristina Tereza Gaulia, j.25.04.2006 16 Direitos do consumidor endividado – Estudo sobre direito Brasileiro e superendividamento. RT, 2006, pág. 240

18

1.4 – Conclusão

Diante do primeiro capítulo desta pesquisa, cabe ressaltar que o

endividamento cada vez mais comum do cidadão em nossa sociedade não é

culpa exclusiva do indivíduo que teve um acidente da vida, como classifica

Cláudia Lima Marques17, como desemprego, morte na família, nascimento de

filhos etc, mas também das agressivas propagandas e abuso das mesmas a

que o indivíduo são submetidos diariamente; seja em outdoors ,panfletagem

constantes e incessantes nas ruas, celebridades promovendo a facilidade do

crédito, aliada à facilidade na obtenção do mesmo em bancos e instituições

financeiras.

Deveria haver uma maior responsabilização na dação do crédito pelo

comércio e bancos principalmente, devendo-se avaliar as condições de

solvência do cliente.

A falta de informação clara, omitindo dados que são relevantes ao cidadão,

além de violar o princípio da boa-fé, dever-se-ia ter nesses contratos

corriqueiros de adesão e empréstimos, linguagem mais didática, sem o

jurisdiquês e economês tão freqüentes, que acaba prejudicando o homem

médio na compreensão na hora de contratar, bem como uma maior fiscalização

dos órgãos de defesa do consumidor às instituições bancárias e financeiras.

17 Direitos do consumidor endividado – Estudos sobre direito brasileiro e superendividamento. RT, 2006.

19

2 – A concessão do crédito, sua proteção no CDC e o

tratamento das situações de superendividamento do

consumidor.

2.1 – A concessão do crédito

A oferta e a publicidade caminham de mãos dadas nesse mercado frenético

que é o da concessão de crédito. Como visto anteriormente, percebe-se uma

enxurrada diariamente em todas as mídias possíveis a que o consumidor tem

acesso: seja através de spams enviados às caixas de mensagens de correio

eletrônico, jornais de toda sorte, panfletagens nas ruas etc; somado a este

emaranhado de publicidade a que está sujeito este cidadão, proliferam as

instituições de concessão de crédito, visando ludibriar os consumidores

hipervulneráveis, no caso os idosos, com descontos em folhas de pagamento e

prestações a serem perdidas de vista, bem como aquele indivíduo, que pela

facilidade do crédito, acaba sendo fisgado por este tipo de oferta.

Segundo Cristina Tereza Gaulia18: “E justamente a partir da explosão de

ofertas, e da massiva publicidade sobre o crédito fácil e o sonho de deixar de

ser um excluído, é que nasce o grande perigo para o homo consumericus.

Atordoado pela oferta abundante e pela publicidade muitas vezes enganosa,

até por omissão, e quase sempre abusiva, o consumidor se deixa atrair para

esse novo mundo do qual ele quer tanto fazer parte: o mundo da felicidade

líquida, usando expressão de Zygmunt Bauman19 ”.

Mais uma vez vale referência à mídia escrita.

18 O abuso de direito na concessão de crédito: o risco do empreendimento financeiro na era do hiperconsumo. Publicado na RDC 71/34

19 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

20

O Jornal do Brasil 20 de 26.01.2006 traz fotogramas emblemáticos.

Uma foto mostra, numa das ruas do centro do Rio de Janeiro, os chamados

promotores de crédito, rapazes e moças, vestidos com cores marcantes: verde,

amarelo, azul, e, na frente desses está passando uma senhorinha.

A matéria descreve:

“Oferta estimula consumo”, e, logo abaixo, há outra foto na qual

uma segunda senhora está sentada em frente ao preposto de

uma financeira, e o título da reportagem diz: “Rede para pegar

cliente”.

Não é preciso muito conhecimento psicanalítico para interpretar

essa linguagem jornalística de duplos sentidos. É o

“consumidor-sardinha” que atraído pelas “iscas” publicitárias

termina “fisgado na rede do crédito fácil”.

Em trabalho apresentado perante a 7.ª Conferência

Internacional de Serviços Financeiros e reflexões sobre a

situação brasileira, o presidente do Brasilcon, promotor de

justiça, relata:

“Em 2007, apenas os cinco maiores bancos privados tiveram,

de lucro líquido, cerca de 20 (vinte) bilhões de reais, o que

representou cerca de 90% de crescimento em relação aos

lucros de 2006 (que foi um ano também de faturamentos

recordes). Ocorre que o principal fator de crescimento deveu-

se à expansão da oferta de crédito no mercado, especialmente

com a popularização do uso de cartões de crédito, empréstimo

consignado em folha de pagamento e o mútuo conhecido como

cheque especial (oferta de crédito pré-aprovado diretamente na

conta-corrente).

20 Vide nota 23, p. A18.

21

(...)

A expansão na oferta de crédito teve um crescimento real de

cerca de um terço (28,9%).21”

Nesta seara, visualiza o mesmo autor que “a bancarização não ocorreu

como um fenômeno natural do mercado (a partir da procura espontânea dos

consumidores), mas pelo aumento do anúncio publicitário em outdoors,

programas de televisão, panfletagem e internet 22”, ou seja, na

complementação de Cristina Tereza Gáulia 23:

“há um projeto empresarial claramente definido no sentido da

captação dos consumidores, pela isca do desejo, de modo tão

insistente, sedutor, massificado, constante e invasivo, que a

vontade individual se fragiliza, fragmentando as barreiras do

homem, mesmo as do mais espartano”.

Fazendo um paralelo do exposto com a psicologia, vale ressaltar que a

publicidade e a propaganda, para nos convencer a adquirir produtos e serviços,

criam desejos em nossas mentes, onde tudo é planejado para que seja

associado, ao ato de comprar, a ideia de felicidade e status pelo uso da

sedução que elas provocam no ser humano.

Extraindo enxerto de artigo de Cláudio Sinoé Ardenghy dos Santos 24, cujo

aspecto psicológico é abordado pelo Grupo de Psicologia Econômica

(G.P.P.E.), coordenado pela Dra. Alice Moreira25, cujas conclusões são

transcritas a seguir:

21 Impressões atuais sobre o superendividamento: sobre a 7.ª Conferência Internacional de Serviços Financeiros e reflexões para a situação brasileira. RDC, n. 65. São Paulo: Ed. RT, jan.-mar. 2008, p. 147 22 Idem, ibidem, nota 27, p. 148. 23 Idem, ibidem, p.16 24 Superendividamento: a fragilidade do consumidor. Publicado em 21.11.2005,Ed. 153, cód.pub. 924 25 O que é psicologia econômica. LAPE, Belém/PA.http://www.cpgp.ufpa.br/lape/portug/contato.htm > Acesso em: 01.04.2010.

22

“O interesse dos psicólogos por temas relacionados à vida

econômica é compreensível no panorama contemporâneo,

marcado pela transformação de valores, estabelecimento de

novos mercados e tendências globalizantes. A ética da

poupança e autocontenção foi superada por valores de

consumo e satisfação imediata de desejos, gerando o que tem

sido chamado de “cultura do débito” (Livingstone & Lunt, 1993).

As identidades sustentam-se cada vez mais na posse e

exibição de bens materiais (Belk, 1991; Canclini, 1999).

Crescem as preocupações com a patologia do comprar

compulsivo (Hanley & Wilhelm, 1992), em paralelo ao estudo

das mais antigas, como jogar e colecionar (Belk, 1995; Griffiths,

1995).

A participação crescente da mulher no mercado de trabalho

leva à reestruturação das relações e estratégias de poder na

família (Burgoyne, 1995; Kirchler, 1999). Novas configurações

de mercado geram estudos abordando a influência dos valores

sobre preferências de consumo (Grunert & Beckmann, 1999)

ou as interrelações entre moeda, simbolismo e identidade

nacional (Conlon, Routh, & Pannayiotakopoulo, 2000)”.

Esta felicidade líquida e efêmera a que estamos submetidos nesta cultura

do débito faz com que nossa mente assimile aliada à massificação do crédito,

que o “gastar-sem-ter” é uma praxe cada vez mais comum em nossa

sociedade atual.

Desta forma, conforme relatado na reportagem acima, o crédito é importante

para a sociedade, mas não da forma em que está sendo feito com o

consumidor, isca de financeiras, com juros abusivos; o controle por parte do

Estado é fundamental na coibição do abuso desses juros, onde o desespero na

obtenção do crédito não pode superar a letra da lei.

23

2.2 – A proteção do CDC contra o superendividamento

Outro artigo que merece ser mencionado neste trabalho, escrito por Marcus

Vinicius Ferrari 26:

“Tendo em vista a condição de hipossuficiência do consumidor

leigo e de boa-fé, qualquer que seja a causa do

superendividamento e a despeito de ainda inexistir um

tratamento jurídico específico sobre o assunto, é importante

destacar que o Código de Defesa do Consumidor pode ser

invocado para tutelar os interesses do devedor.”

Continua o palestrante: “Com efeito, diversos dispositivos

previstos no Código consumerista apontam para a

possibilidade da proteção jurídica dos superendividados, a

despeito de não existirem normas explícitas a ampará-los. Os

princípios da boa-fé objetiva, da vulnerabilidade do consumidor

e do equilíbrio das relações entre fornecedores e

consumidores, por exemplo, estão todos previstos no artigo 4°

da Lei 8.078/90 e podem ser utilizados para a defesa de

consumidores superendividados. É vontade do legislador que

todas as relações de consumo entre fornecedores e

consumidores sejam na compra e venda de um produto ou na

prestação de um serviço sejam pautadas pela harmonização

de interesses dos participantes, com a observância da

vulnerabilidade da parte consumidora e da boa-fé objetiva tanto

26 O consumo e o superendividamento. Disponível em http://www.nosrevista.com.br/2009/10/07. Acesso em 01.04.10

24

na celebração dos contratos quanto na eventual necessidade

de renegociação destes.”

Ferrari 27, por sua vez, explica que

“o artigo 6°, ao estabelecer os direitos básicos do consumidor,

prevê no inciso V, ainda que indiretamente, um dever de

cooperação do fornecedor quando fatos supervenientes vierem

a tornar as cláusulas contratuais estabelecidas excessivamente

onerosas. Não seria o superendividamento um fato

superveniente que impossibilita a manutenção das condições

contratuais previamente assumidas? - Argui ele. As

conseqüências do endividamento, tais como a inscrição nos

sistemas de proteção de crédito com a conseqüente

impossibilidade de consumir novos bens e serviços em uma

sociedade organizada para o consumo, não seriam fatos

suficientes a ensejar, pelo menos a boa vontade dos

fornecedores de crédito em negociar? – completa o autor.

Estes questionamentos, baseados em outras situações de

superendividamento serão abordadas nos tópicos mais adiante.

Diante dessa desigualdade e da falta de uma tutela efetiva para os

consumidores, que representam a maioria no mercado, organizou-se um

movimento social consumerista.28

Segundo definição de Fernanda Moreira Cezar 29 “O direito

do consumidor despontou, assim, como elemento de

transformação do direito tradicional, para suprir as

necessidades sociais geradas pela realidade econômica do

mercado massificado.No ordenamento jurídico brasileiro, desde

a Constituição da República de 1988, a defesa do consumidor

27 Idem, ibidem, p.2 28 BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcellos e. O direito do consumidor. Revista dos Tribunais, ano 80, v. 670. São Paulo: RT, p. 49-61, 1991, p. 54. 29 O consumidor superendividado:por uma tutela jurídica à luz do direito civil-constitucional – publicada na RDC 63/131

25

adquiriu status de direito e garantia fundamental, conforme seu

art. 5.º, XXXII, bem como foi insculpida entre os princípios

conformadores da ordem econômica nacional, nos termos do

seu art. 170, V ” 30.

Prossegue a professora: “Indo além, o legislador constitucional impôs

verdadeiro dever de legislar ao Congresso Nacional, determinando, no art. 48

do ADCT, a elaboração o Código de Defesa do Consumidor. Em 11.09.1990,

foi enfim editada a Lei 8.078, que “dispõe sobre a proteção do consumidor e dá

outras providências”, tendo como fonte inspiradora a própria Lei Maior, a qual

expressamente optou por um sistema codificado e coerente de normas de

consumo”.

Convém remarcar, entretanto, que tal sistema não importa, em nenhuma

hipótese, na existência de um “microssistema fragmentado”, na pertinente lição

do professor Gustavo Tepedino 31. Em suas palavras, “a força do Código não

se reduz às suas próprias normas, localizando-se, sobretudo, na ordem

constitucional que o fundamenta e o assegura”.

O intuito protetivo da lei está, por certo, fundado no reconhecimento da

desigualdade entre consumidor e fornecedor 32 nas relações de consumo,

sendo correto afirmar que o Código de Defesa do Consumidor é expressão do

30 Sobre o tema, comenta PEDERIVA, João Henrique que “entre os princípios que devem ser observados pela ordem econômica, por força constitucional, encontra-se a defesa do consumidor. Segundo o art. 170 da Lei Maior, essa ordem visa a assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. É, portanto, possível afirmar, com base nos termos constitucionais, que a defesa do consumidor respalda-se no ideal de justiça social e constitui meio hábil de atingir a existência digna e legítima, a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa.” (O direito do consumidor, o sistema financeiro e os cartões de crédito. Revista de Informação Legislativa, ano 39, n. 153. Brasília: Subsecretaria de Edições Técnicas do Senado Federal, p. 201-221, 2002, p. 203). 31 TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 3. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 215. 32 PASQUALOTTO, Adalberto. Conceitos fundamentais do Código de Defesa do Consumidor. Revista dos Tribunais, ano 80, v. 666. São Paulo: RT, p. 48-53, 1991, p. 49.

26

princípio da isonomia material, pois trata desigualmente os sujeitos da relação

de consumo na medida em que se diferenciam.33

Dentro da perspectiva do Estado Social, a intervenção legislativa veio para

atribuir “ao consumidor uma igualdade jurídica destinada a compensar a sua

desigualdade econômica frente ao fornecedor”.34 Assim sendo, a Lei 8.078/90

está em plena sintonia com os valores constitucionalmente tutelados. Isto se

evidencia por meio da intenção do legislador infraconstitucional de buscar a

integral proteção do consumidor, parte vulnerável da relação de consumo, bem

como a harmonização dos interesses dos seus integrantes, com base na boa-

fé objetiva e no equilíbrio das relações entre consumidores e fornecedores,

como dispõe seu art. 4.º.

Em excepcional artigo de Heloisa Carpena 35, a mesma traduz de forma

brilhante, a proteção jurídica frente a nossa Lei 8.078/90, relatando os artigos

pertinentes em defesa do consumidor e às informações claras a que todos tem

direito, nas fases pré-contratual e no momento de formação do contrato;

aborda o controle da publicidade, a execução do contrato e o controle do

conteúdo das cláusulas, a possibilidade de revisão contratual, bem como a lei

processual civil que também possui normas que podem ser invocadas pelo

superendividado, tendo como pano de fundo o princípio da boa-fé.

33 Assim é a lição de MARQUES, Claudia Lima: “Trata-se de uma necessária concretização do Princípio de Igualdade, de tratamento desigual aos desiguais, da procura de uma igualdade material e momentânea para um sujeito com direitos diferentes, sujeito vulnerável, mais fraco” (Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2002, p. 317).

34 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 358.

35 Uma lei para os consumidores endividados – publicado na RDC 61/76

27

“O fornecedor somente se desincumbe de forma satisfatória do

dever de informar quando os dados necessários à tomada de

decisão pelo consumidor são por ele cognoscíveis. Não basta,

portanto dar a conhecer disponibilizar, é preciso que o

consumidor efetivamente compreenda o que está sendo

informado. Este é o sentido da regra do art. 31 do CDC, que

impõe o dever de informar de forma clara, destacando-se ainda

o disposto no art. 46, segundo o qual são ineficazes as

cláusulas, ou mesmo todo o contrato, redigidas “de modo a

dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.” Em outras

palavras, se a informação não é cognoscível, não obriga o

consumidor.36

No momento pré-contratual, a lei consumerista permite a

imposição de especiais deveres de informação ao fornecedor

de crédito, que a doutrina vem denominando de

aconselhamento 37, cuja inobservância acarreta a invalidade da

disposição, por aplicação do art. 46 do CDC. O Código contém

ainda norma específica para o “fornecimento de produtos e

36 “Consumidor. Método de cálculo de resgate de difícil compreensão inserido em título de capitalização. Cláusula que deveria constar em destaque para facilitar o seu entendimento. Afronta ao principio da boa-fé objetiva, transparência e da informação. Nulidade das regras do pacto. Subscrição de título de capitalização com desistência antes do prazo avençado. Cláusula contendo cálculo de resgate redigida sem destaque obrigando a empresa financeira ao reembolso apenas de metade dos valores vertidos. Violação ao princípio da boa-fé objetiva, da transparência e do direito subjetivo do consumidor à informação verdadeira. Exegese das regras contidas nos arts. 4.º, III, 46, § 4.º, 51, IV e 54, todos da Lei 8.078/90. Nulidade das referidas cláusulas corretamente reconhecida pela sentença, eis que abusiva. Pleito de desconto de valores precedentemente pagos que não se viu demonstrado nos autos, de molde que não há que se falar em ma-fé em razão de alegada omissão em tese praticada pelo autor, tampouco em julgamento ultra petita face a sua inserção no comando condenatório. Improvimento do recurso. Unânime.” TJRJ, 3.ª Câm. Cív., Ap.Cív 2002.001.29061, rel. Des. Murilo Andrade de Carvalho, j. 17.06.2003.

37 “A obrigação de conselho implica no dever de revelar ao consumidor os prováveis problemas da operação de crédito a curto e a longo prazos, prevenindo-o e sugerindo soluções possíveis.” Geraldo de Faria Martins da Costa. O direito do consumidor endividado e a técnica do prazo de reflexão. Revista de Direito do Consumidor n.43. São Paulo: Revista dos Tribunais, jul.-set. 2002, p. 265.

28

serviços que envolva a outorga de crédito ou concessão de

financiamento”, criando outros deveres de informação para o

fornecedor (art. 52).

Ainda quanto ao aspecto da comunicação, entendida de acordo

com a noção de oferta, cabe destacar que o sistema de

controle da publicidade instituído pelo CDC também apresenta

soluções para a questão do contrato de crédito. A lei classifica

como enganosa a propaganda que “seja capaz de induzir em

erro o consumidor” a respeito das condições da contratação

(art. 37, § 1.º, CDC). Todavia, quanto à publicidade abusiva, a

lei referiu-se apenas àquela que explora a “deficiência de

julgamento da criança”, não contemplando de forma expressa a

situação dos idosos.

Também no momento da formação do contrato, quando este

for celebrado fora do estabelecimento do fornecedor, o art. 49

do CDC prevê o direito de arrependimento do consumidor,

submetendo o pacto a uma condição resolutiva38, dada a

especial vulnerabilidade do consumidor nessa situação.

Na fase da execução do contrato, a lei brasileira oferece a

possibilidade de controle do conteúdo das cláusulas, tornando

nulas de pleno direito aquelas que violem o princípio da boa-fé

objetiva, o qual preside a contratação para o consumo. Assim,

38 A jurisprudência vem definindo os contornos do instituto, confira-se: “Promessa de compra e venda. Arrependimento. Modificação superveniente das condições do negócio. Devolução das quantias já pagas. Código de Defesa do Consumidor. Direito de arrependimento. 1. O direito de arrependimento previsto no art. 49 do Código de Defesa do Consumidor se esgota decorridos sete dias da celebração do negócio, ainda que a entrega do bem dependa da conclusão do prédio. Extensão indevida a regra destinada a proteger o consumidor de uma prática comercial na qual ele não desfruta das melhores condições para decidir sobre a conveniência do negócio, circunstâncias essas que não persistem depois de prolongada execução do contrato. 2. Não reconhecida, na instância ordinária, a existência de circunstância que justifique a extinção do contrato por fato superveniente, e se manifestando a promitente vendedora, categoricamente, pela manutenção do contrato, não cabe ao juiz dar o contrato por extinto. 3. Improcedente a ação de extinção do contrato, inatendível a pretensão do promissário comprador de obter a devolução das quantias pagas. Inexistência de violação a lei. Divergência que não se reconhece, por versar o paradigma hipótese em que houve a rescisão do contrato por iniciativa da vendedora. Falta de prequestionamento sobre a questão da verba honorária. Recurso não conhecido. STJ, 4.ª T., REsp 57.789-SP, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar; DJ 12.06.1995.

29

com esteio no art. 51 do CDC, o julgador pode declarar a

nulidade de uma cláusula que preveja a aplicação de juros

capitalizados, por exemplo, já se encontrando na jurisprudência

decisões neste sentido.39 Vale lembrar também que os arts. 52

e 53 da Lei Consumerista cuidaram de alguns aspectos desse

tipo de contrato, a saber: limitação da multa moratória, garantia

da liquidação antecipada do débito e, nas compra e venda de

imóveis, proibição da perda total das prestações pagas, em

caso de inadimplemento.

Finalmente, nas relações de consumo, haverá a possibilidade

de revisão contratual, nos termos do art. 6.º, V, do CDC;

enquanto nas dívidas civis, o superendividado conta com a

revisão por excessiva onerosidade, prevista no art. 478 do

CC/2002. Nas duas hipóteses, embora sejam diversos os

pressupostos, o devedor pode obter a modificação de cláusulas

contratuais de modo a restaurar o equilíbrio entre deveres e

obrigações.

Fora do âmbito da proteção do consumidor, a lei processual

civil também possui normas que podem ser invocadas pelo

superendividado, no capítulo da execução por quantia certa

contra devedor insolvente (arts. 748 a 786-A do CPC). A lei

processual considera haver insolvência “toda vez que as

dívidas excederem à importância de bens do devedor” e institui

um procedimento de execução coletiva no qual são

arrecadados os bens, é antecipado o vencimento das dívidas e

39 Vale citar, por todos, aresto do Superior Tribunal de Justiça: Embargos à execução. Contrato de mútuo bancário. Juros remuneratórios. Abusividade cabalmente demonstrada por perícia. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Recurso especial provido. Sentença restabelecida. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos de financiamento bancários firmados entre as instituições financeiras e seus clientes, sendo possível a declaração de nulidade de cláusula manifestamente abusiva. Cabalmente comprovada por perícia, nas instâncias ordinárias, que a estipulação da taxa de juros remuneratórios foi aproximadamente 150% maior que a taxa média praticada no mercado, nula é a cláusula do contrato. Recurso especial conhecido e provido. 2.ª Seção, REsp 327.727-SP, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 08.03.2004.

30

estabelecido o concurso universal dos credores. Tais regras,

contudo, não tratam do aspecto preventivo do

superendividamento e se destinam apenas à satisfação dos

interesses dos credores. Como subsídio para o tratamento do

superendividado, vale registrar que o Código de Processo Civil

prevê, em seu art. 778, a extinção de todas as obrigações do

devedor após o prazo de 5 anos contado da data do

encerramento do processo de insolvência.40

Mais amplamente, na disciplina do contrato de consumo,

assume especial destaque o princípio da boa-fé objetiva, que

impõe deveres de cooperação, veracidade e lealdade aos

contratantes, e cuja aplicação vem gerando expressiva

jurisprudência em todo o Brasil, reconhecendo os Tribunais a

prevalência do interesse do consumidor no tocante a questões

como o adimplemento substancial, o direito de rescisão, a

renegociação das dívidas e outras.41

40 Sobre a efetividade do dispositivo da lei processual civil, adverte Alexandre Câmara : “Estes dois artigos [777 e 778] do CPC regulam - nas suas linhas gerais - o sistema de extinção das obrigações do devedor insolvente. Assim é que, instaurado o concurso universal de credores (o que é, como visto, efeito do provimento declaratório da insolvência), interrompem-se todos os prazos prescricionais dos créditos de que o executado é devedor. Transitada em julgado a sentença que extingue a obrigação, porém, tais prazos voltam a correr, agora unificados em cinco anos. (...) A cada vez que se reabre a execução a execução, repita-se, há interrupção do prazo de cinco anos a que se refere o art. 777 do CPC. Decorridos cinco anos sem que tenha havido reabertura do processo, aí sim, deve-se considerar extintas as obrigações.” (Lições de direito processual civil. v. 2, 9.ed. Rio de Janeiro : Lumen Iuris, 2004, p. 381-382.

41 Sobre este ponto, Claudia Lima Marques faz uma resenha das decisões do STJ referidas à boa-fé objetiva e concessão de crédito: “Há, pois, na boa-fé uma função de correção e de adaptação em caso de mudança das circunstâncias (Korrekturfunktion), a permitir que o julgador adapte e modifique o conteúdo dos contratos para que o vínculo permaneça (manutenção do vínculo) apesar da quebra da base objetiva do negócio, por exemplo, com a desvalorização do dólar em contrato de leasing, ou imponha deveres de negociação face à quebra subjetiva da base do negócio, por exemplo, quando o consumidor perde seu emprego.” (Sugestões para uma lei sobre o tratamento do superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do Sul. In: Claudia Lima Marques e Rosângela Lunardelli Cavallazzi (coords.). Direitos do consumidor endividado - superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006; Revista do Consumidor, n. 55. São Paulo: Revista dos Tribunais, jul.-set. 2005, p. 281.

31

Este é, em breve síntese, o panorama do instrumental que, de

lege lata, está ao alcance do devedor para enfrentar a situação

de superendividamento.”

2.3 Tratamento das situações de superendividamento

No Estado do Rio Grande do Sul 42, duas juízas de Direito, Clarissa Costa

de Lima e Káren Rick Danilevicz Bertoncello, das varas de Sapucaia do Sul e

Sapiranga, respectivamente, propuseram um projeto, através do Conselho

Nacional de Justiça “Conciliar é Legal”, cujo objetivo era suprir

momentaneamente a falta de previsão legal para as situações de

superendividamento dos consumidores com a finalidade de inserção social dos

indivíduos e dos núcleos familiares no mercado que se encontram

impossibilitados ou com dificuldades de adimplir suas dívidas.

Baseado nos estudos realizados pela profa. Cláudia Lima Marques 43, este

projeto aborda as modalidades de conciliação processual e paraprocessual,

cujas dívidas abrangidas são as vencidas ou a vencer, créditos consignados,

contratos de crédito ao consumo em geral, contratos de prestação de serviços

(essenciais ou não), isto com a ausência de limitação do valor da dívida,

excluindo-se as dívidas alimentícias, fiscais, créditos habitacionais, decorrentes

de indenização por ilícitos civis ou penais.

Os pressupostos do superendividado era que fosse pessoa física de boa-fé,

que não tivesse contraído crédito para o exercício de suas atividades

profissionais ou com qualquer renda familiar.

O procedimento era o de preenchimento de um formulário padrão com as

informações prestadas pelo endividado, verificando a veracidade dos dados

fornecidos e isento das custas, obviamente.

42 http://www.tj.rs.gov.br – acesso em 01.04.2010. 43 MARQUES, Cláudia Lima. Sugestões para uma lei sobre o tratamento do superendividamento de pessoas físicas em contratos de crédito ao consumo: proposições com base em pesquisa empírica de

32

Feito isto, é enviada uma carta-convite padrão a todos os devedores,

preferencialmente via eletrônica para a audiência de renegociação com os

credores arrolados pelo superendividado.

Da audiência de renegociação com o fim de preservar a agilidade do projeto

e a garantia ao mínimo existencial ao consumidor, resultariam o acordo exitoso

da conciliação paraprocessual e processual, a homologação pelo juiz de direito,

constituindo título executivo judicial; no acordo inexitoso na conciliação

paraprocessual, o superendividado é orientado a procurar a satisfação do seu

direito pelas vias ordinárias, na justiça comum ou JEC; já no acordo inexitoso

da conciliação processual, o processo será devolvido à vara de origem para o

regular prosseguimento.

Os efeitos da renegociação a serem consignados no termo do acordo são:

1- As dívidas vencerão antecipadamente caso o superendividado:

a. Preste dolosamente falsas declarações ou produza documentos

inexatos com o objetivo de utilizar-se dos benefícios do procedimento

de tratamento da situação de superendividamento;

b. Dissimule ou desvie a totalidade ou parte de seus bens com o

objetivo de fraudar credores ou a execução;

c. Sem o acordo de seus credores, agrave sua situação de

endividamento mediante a obtenção de novos empréstimos ou

pratique atos de disposição de seu patrimônio durante o curso de

procedimento de tratamento da situação de superendividamento.

2- Incidência de cláusula penal;

100 casos no Rio Grande do Sul. In: Direitos do consumidor endividado: superendividamento e crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.256

33

3- Acordo conjunto, identificando valor de cada dívida e seu respectivo

credor.

Diante deste projeto, percebe-se, na ausência de uma lei que trate do

superendividado, uma alternativa viável dentro de nosso ordenamento jurídico

para combater essa anomalia que atinge nossa sociedade.

Ainda na esteira de ideias do pensamento jurídico sulista de nosso país, foi

criada pela Justiça Gaúcha 44, uma cartilha para o consumidor evitar a situação

ou quitar os débitos sem prejudicar a subsistência básica, para resgatar a

saúde financeira do consumidor.

1- Em primeiro lugar, nunca gaste mais do que você ganha, o que indica que

você terá problemas futuros;

2- O cenário econômico indica para uma grande oferta de crédito fácil para os

consumidores, com baixas taxas de juros e facilidades de parcelamento.

No entanto, não se iluda com esta oferta, veja se você realmente necessita

do empréstimo e se terá condições de pagá-lo no futuro;

3- Antes de adquirir qualquer dívida, converse com sua família. Isso porque

gastos imprevistos podem surgir, o que complicará sua situação na hora de

pagar a dívida;

4- Quando assumir uma dívida, saiba todos os procedimentos para

pagamento e exija-os por escrito. Leia atentamente o contrato;

5- Exija informações sobre as taxas de juros anuais e mensais e as compare

entre instituições, para reconhecer a mais vantajosa de acordo com seu

orçamento;

6- Exija o prévio cálculo do valor da dívida e veja se ela se encaixa em seu

orçamento, ou seja, se é compatível com a renda;

7- Compare as taxas de juros dos concorrentes;

44 http:// noticias.uol.com.br/economia/ultnot/infomoney-acesso em 01.04.2010.

34

8- Não assuma dívidas para outras pessoas, as quais podem não arcar com o

compromisso;

9- Nunca assuma dívidas nem forneça seus dados pela internet, meio pelo

qual você poderá ser vítima de fraudes;

10- Sempre reserve parte de seu salário para as contas essenciais e nunca o

comprometa para pagamento de dívidas.

Frente a estes “dez mandamentos”, que servirão de alerta à população,

será abordado no próximo capítulo a visão no direito comparado.

2.4 - Conclusão

A concessão e oferta do crédito estão associadas diretamente ao

crescimento do lucro dos bancos.

Os consumidores, cada vez mais atraídos pela mídia fácil da oferta do

crédito, criam a ilusão de que é necessário um empréstimo para resolver o

problema de suas ansiedades compulsivas e terminam por gerar outro que é o

(super) envidividamento, seja através da utilização do cartão de crédito e

cheque especial – maiores vilões, comprometendo grande parte de seu salário

com dívidas, impedindo a sua própria subsistência.

Como ainda não há uma legislação especial que trate da matéria do

superendividamento, o CDC é aplicável para sanar os problemas desta

epidemia da sociedade frente à desigualdade social entre fornecedor e

consumidor.

Na esteira de exemplo a ser seguido, o estado do Rio Grande do Sul larga

na frente em matéria de se antecipar ao problema, propondo projetos para este

nicho da população através de programas em seus tribunais, bem como

cartilhas educativas aos consumidores.

35

3 – O direito comparado e o superendividamento

Em nosso ordenamento jurídico infelizmente ainda não temos uma

legislação tratando especificamente sobre o superendividamento, apesar de

nosso Código de Defesa de Consumidor ser um dos mais modernos em se

tratando de matéria pertinente à defesa do consumidor.

Existe um projeto de lei elaborado pela profa. Cláudia Lima Marques, que

será objeto de apreciação no próximo tópico, retratando o quadro do

superendividado e a real necessidade de se ter uma lei específica versando

sobre o assunto.

Enquanto esta lei não surge em nosso sistema jurídico para proteção dessa

camada da população vulnerável, o que não está longe de acontecer, deve-se

aplicar o CDC como forma de defesa ao consumidor conforme mostrado

anteriormente, não é suficiente para tratar de forma adequada as situações em

que se constata que o consumidor já está superendividado.

Desta forma, segue abaixo estudo da visão em outros países frente a este

problema que não é privilégio em nosso país, conforme estudo de Heloisa

Carpena45 transcrito abaixo:

“O superendividamento como fenômeno social foi tratado

pioneiramente pela Dinamarca, primeiro país europeu a instituir

uma legislação, em 1984, seguida da França em 1989, com a

Lei Neiertz. Além desses países, Alemanha, Bélgica, Holanda,

Luxemburgo, Áustria, Suécia, Noruega, Finlândia, Canadá

(Quebec) e Estados Unidos também possuem leis sobre o

36

tema, apresentando diferentes soluções para o seu tratamento.

Dois modelos, porém, se destacam: o francês e o americano,

que podem ser definidos como o da fresh start e o da

reeducação.46

As soluções apresentadas no direito comparado em regra se

alternam entre um procedimento de liquidação com perdão de

dívidas e sem penhora do rendimento futuro, ou um plano de

pagamento prolongado que alcance todos ou parte dos débitos.

Na primeira hipótese, apurado o ativo e liquidado o passivo, o

devedor pode reiniciar a sua vida sem os encargos do

passado; no segundo caso, busca-se uma fórmula para saldar

integralmente as dívidas, persistindo a responsabilidade pelos

compromissos assumidos.

Cada um desses modelos corresponde a um matiz ideológico

próprio. A solução do fresh start do direito norte americano

condiz com o individualismo que caracteriza a sociedade

daquele país e atende ao objetivo de preservar o consumidor

como agente econômico fundamental para o funcionamento do

mercado. A principal crítica que se faz a este modelo,

obviamente, é a probabilidade de causar prejuízos aos

credores, pois faculta a concessão do perdão a devedores que

poderiam pagar uma parte das suas dívidas. A

responsabilização do devedor cessa com a venda de seus

bens, concedendo a lei um novo começo em 4 meses (fresh

start), porém impedindo-o de recorrer ao mesmo sistema por

um período de 6 anos.

45 Uma lei para os consumidores endividados – publicado na RDC 61/76

46 Maria Manuel Leitão Marques identifica essas duas alternativas, afirmando que “na prática, contudo, os modelos tendem cada vez mais a misturar-se.” O endividamento dos consumidores. Lisboa: Almedina, 2000, p. 304.

37

O modelo europeu continental, por outro lado, espelha a ideia

de solidariedade, no sentido de co-responsabilidade de todos

os agentes sociais na proliferação do crédito.47 Contra este,

argumenta-se que o plano de pagamento freqüentemente se

torna inexeqüível, vez que grande parte dos superendividados

não possui recursos suficientes ao seu cumprimento,

comprometendo a eficácia desta solução.

Embora reportados a esses dois modelos, cada um dos

diferentes sistemas apresenta peculiaridades, tratando de

forma distinta aspectos comuns, como o prazo máximo do

plano de pagamento, a definição do superendividado, a

exigência de boa-fé, dentre outros. Assim, por exemplo, na

França, o consumidor superendividado será sempre aquele

que possua dívidas não profissionais, vencidas e vincendas,

ficando excluído o superendividado ativo, ou seja, aquele que

agiu com a intenção deliberada de não pagar.48 Já a lei belga

de 1999, que se destina também a profissionais liberais e

agricultores, não traz um tratamento diferenciado dos créditos e

dos credores, admitindo sejam as dívidas de origem

profissional ou não, bastando apenas que o sobreendividado

não tenha provocado a sua situação de insolvência.49 Na

Finlândia, embora o sistema tenha por destinatários os

particulares onerados por dívidas não profissionais, é possível

o recurso a esse procedimento por dívidas contraídas no

exercício de uma atividade econômica, desde que esta

atividade tenha cessado.50 Quanto à proteção do mínimo

existencial também há diversas soluções: nos Estados Unidos,

47 Assim leciona Maria Manuel Marques: “... a importância atribuída à comunidade, mais do que ao indivíduo, permite também justificar o princípio de que não é justo que a sociedade encoraje o crédito e depois se desresponsabilize das conseqüências. Tudo isto compõe um modelo baseado na ideia de que o sobreendividado se excedeu, passou a linha de um comportamento social 'normal', mas em parte foi também vítima do sistema.” Op. cit., p. 217. 48 A lei especial e os dispositivos do Código do Consumidor francês estão disponíveis em www.guidedusurendettement.org , acessado em 03.06.2006. 49 Disponível em www.observatoire-credit.be, acessado em 28.03.2006. 50 Maria Manuel Leitão Marques et al. Op. cit., p. 266.

38

o Bankruptcy Code, de 1978 (Cap. 7) prevê que o devedor

reserve todo o disposable income para o pagamento das

dívidas, mas quem determina esse excedente é o próprio

devedor, fazendo uma estimativa das despesas mínimas de

sobrevivência; enquanto no sistema francês, é o juiz quem

determina o valor do reste à vivre.51 Enfim, são muitas as

alternativas que se apresentam, cabendo ao legislador

brasileiro formular as questões pertinentes, para as quais deve

buscar respostas adequadas a nossa realidade”.

3.1 Conclusão

Diante do relatado e na visão de Fernanda Moreira Cezar 52:

“O que se observa na legislação francesa é que o consumidor

superendividado recebe um tratamento normativo, onde se

busca formas de solução negociadas do endividamento como

um todo, e não apenas de maneira pontual, em relação a cada

credor.53

A aplicação de qualquer das medidas legais de tratamento da

situação de superendividamento exige o respeito ao mínimo

existencial. Devem-se preservar os meios essenciais de

sobrevivência do consumidor, assegurando-lhe recursos ao

menos equivalentes a uma renda mínima de reinserção

(revenu minimum d'insertion - RMI).54 Garante-se, neste

sentido, o mínimo indispensável à sua existência (reste à

51 Livro III do Code de la Consommation, sob o Título III, denominado Traitement des situations de surendettement, disponível em www.lexinter.net/Legislation/codeconsommation.htm, acessado em 13.06.2006. 52 O consumidor superendividado:por uma tutela jurídica à luz do direito civil-constitucional – publicada na RDC 63/131 – pág.35 53 Exemplo de solução pontual é o art. 6.º, V, do CDC, que prevê a possibilidade revisão judicial de cada contrato individualmente, o que impossibilita a análise global do endividamento do consumidor.

39

vivre), considerando sua renda e o valor dos débitos vencidos e

a vencer”.

Feita esta análise com o direito comparado, será exposto então no próximo

capítulo, uma sugestão de elaboração de lei para tratamento do

superendividamento.

4 – Uma lei para o superendividado

Em reportagem veiculada no jornal O Globo 55, a ilustre profa. Cláudia Lima

Marques, uma das autoras do anteprojeto de lei, no X Congresso Brasileiro de

Direito do Consumidor, propôs uma lei modelo para América Latina para tratar

do superendividamento do consumidor, cujo problema foi identificado em

meados de 2005, com a inclusão das classes B, C e D.

Este projeto, inicialmente com 53 artigos, para tratar esta síndrome

econômico-social, visa complementar nosso CDC, com objetivos bem claros,

como: a garantia ao mínimo existencial, reforçar a obrigação dos fornecedores

de terem boa-fé; a necessidade de entrega de cópia do contrato; cuidados na

técnica de promoção do crédito; tratamento dos dados do contratante e a

manutenção do nome limpo do superendividado.

Ainda neste veículo de comunicação, continua, com um modelo adotado no

estado do Paraná, o superendividamento está na pauta do Ministério da

Justiça, onde promoveu oficina em Brasília com representantes dos Procons,

Defensoria Pública e Ministério Público das cinco regiões do país com o

levantamento de quatro pontos:

54 Desde 1999, o RMI passou a ser igual a 2,502,30 F. (COSTA, Geraldo de Faria Martins da. Superendividamento: a proteção..., cit., p. 124). 55 O Globo – “Uma lei para os superendividados” – economia – 16.05.2010

40

a. Diagnosticar as demandas recebidas para cada entidade;

b. Recomendações de fiscalização com os aspectos que mais provocam o

superendividamento;

c. Diretrizes para educação no consumo ao crédito;

d. Atentar para proteção dos consumidores hipervulneráveis – os idosos;

e. Maior responsabilidade na concessão do crédito – mala direta,

telemarketing agressivo – publicidade na televisão;

f. Maior qualidade de informação ao consumidor

Nesta entrevista, o professor da faculdade de Direito de Coimbra – Diogo

Leite Campos, relatando o “direito bancário sobre a ótica do consumidor”,

esclarece que na Europa exige-se que os bancos sejam transparentes em

relação a riscos e avaliem o perfil do consumidor onde há um fundo de

indenização. Explica também que a legislação brasileira está entre as mais

avançadas e que em muitos países ainda não há uma legislação específica

sobre o tema, sendo que no Brasil ainda existe a Defensoria Pública.

Em outra mídia televisiva veiculada no Fantástico 56, mostra um advogado

no Rio Grande do Sul, tentando renegociar uma dívida com o banco, pois o

mesmo não tinha como arcar com as parcelas, não consegue empréstimo em

sua localidade em função da ação que propôs contra seu banco.

Enfim, diante deste quadro a que está submetido o consumidor, não restam

dúvidas quanto à necessidade de uma complementação do CDC ou mesmo de

uma lei que está na iminência de ser aprovada.

O fornecedor, em sentido amplo, não pode mais ignorar o Código de Defesa

do Consumidor, violando inúmeras regras, que ante o consumidor leigo, fica

56 Programa de entretenimento exibido na Rede Globo, canal 4, em 30.05.2010.

41

como uma marionete em suas mãos, preso às cordas da hipossuficiência,

sendo direcionado para o abismo da ignorância, onde nada mais resta fazer.

5 – Conclusão

Findo este trabalho sobre a sistemática do superendividamento, é possível

concluir que no Brasil é um fato social grave, atual e abrangente, para o qual

não há resposta adequada do ordenamento.

Em artigo publicado por Fernanda Moreira Cezar, a mesma explana com

maestria ao mesmo tempo em que, com sábias palavras, conclui o que vem a

ser este fenômeno a que estamos submetidos:

“O princípio da dignidade da pessoa humana e seus corolários,

o princípio da solidariedade social e da isonomia, estão no

ápice da ordem constitucional, incidindo diretamente nas

relações privadas. No âmbito das relações de consumo, o

princípio da boa-fé ganha força, enquanto standard de

comportamento ético e solidário, por sua expressa previsão no

Código de Defesa do Consumidor.

A imposição de uma atuação solidária dos fornecedores recai,

por certo, sobre aqueles que oferecem e concedem crédito ao

consumo. Pois o crédito, conquanto permita o desenvolvimento

da vida econômica do indivíduo, se concedido de forma

irresponsável, pode levar ao endividamento desmedido e

resultar na exclusão social e econômica do consumidor, por se

encontrar impossibilitado de adimplir todos os seus débitos de

consumo.

42

Dessa forma, os deveres anexos de informação, cooperação e

lealdade, advindos da boa-fé objetiva, servem como

mecanismos de controle da abusividade na oferta e

contratação de crédito, que não pode ser irrefletida e temerária.

A transparência das informações e a preocupação do

fornecedor em avaliar as condições financeiras do consumidor

que contrata o crédito são imperativos para uma prevenção

efetiva do sobreendividamento dos consumidores.

O endividamento excessivo é um verdadeiro flagelo social que

põe em risco a própria sobrevivência do consumidor e de sua

família, sendo evidente sua incompatibilidade com os ideais de

solidariedade e de justiça social e com o respeito à dignidade

humana. Mister que se envide todo o esforço necessário à

prevenção e tratamento do superendividamento do consumidor

pessoa física e de boa-fé, impedindo-o de chegar a um estado

crítico de incapacidade econômico-financeira.

No entanto, o direito brasileiro, ainda carece de uma lei que

cuide detalhadamente do superendividamento, impondo o

dever de aconselhamento, concedendo ao consumidor um

prazo de reflexão, e, principalmente, determinando a criação de

procedimentos extrajudiciais e judiciais, nos moldes de

legislações que, como a francesa, que permitem ao

consumidor se reequilibrar financeiramente.

Os valores da dignidade da pessoa humana e da solidariedade

social, aliadas à vulnerabilidade do consumidor na relação de

consumo, conduzem à conclusão de que o

superendividamento, flagelo social da sociedade de consumo,

deve ser prevenido e combatido. Merecendo, de lege ferenda,

uma tutela jurídica mais adequada e específica que cuide de

sua prevenção, bem como do tratamento das situações de

superendividamento, para evitar a “morte do homo

economicus” e sua exclusão social”

43

6 – BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

-BELMONTE, Cláudio. Proteção contratual do consumidor – Conservação e

redução do negócio jurídico no Brasil e em Portugal - São Paulo : Editora

Revista dos Tribunais, 2002. – (Biblioteca de direito do consumidor; v.21)

-BENJAMIN, Antônio Herman V. Manual de direito do consumidor – 2.ed. rev.,

atual e ampl. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2009.

-CASADO, Márcio Mello. Proteção do consumidor de crédito bancário e

financeiro – 2.ed. ver. atual. e ampl. – São Paulo : Editora Revista dos

Tribunais, 2006. – (Biblioteca de direito do consumidor; v.15)

-CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito do consumidor – São Paulo:

Atlas, 2008.

-MARQUES, Cláudia Lima. Direitos do consumidor endividado:

superendividamento e crédito – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,

2006. – (Biblioteca de direito do consumidor; v.29)

REVISTAS CONSULTADAS:

- Revista de direito do consumidor - O consumidor superendividado:por uma

tutela jurídica à luz do direito civil-constitucional – publicada na RDC 63/131 –

pág.35

- Revista de direito do consumidor – Uma lei para os consumidores

endividados- publicado na RDC 61/76

- Revista de direito do consumidor – O abuso de direito na concessão de

crédito: o risco do empreendimento financeiro na era do hiperconsumo –

publicado na RDC 71/34

44

SITES CONSULTADOS:

-http://gilbertomelo.com.br/jurisprudencias-e-noticias/25/1552-judiciario-pode-

intervir-a-favor-de-superendividados. - acesso em 01/04/2010

http://noticias.uol.com.br/economia/ultnot/infomoney/2006/12/ult4040u1539.jht

m - acesso em 01/04/2010.

-www.nosrevista.com.br/2009/10/07/o-consumo-e-o-superendividamento -

acesso em 01/04/2010.

-www.parana-online.com.br/colunistas/235/38836/?postagem=consumidores

endividados – acesso em 01/04/2010.

-www.procon.sp.gov.br/noticia.asp?id=369 – acesso em 01/04/2010.

-www.serasaexperian.com.br/serasaexperian/publicacoes/serasalegal/2009/90

- acesso em 01/04/2010

-www.tj.rs.gov.br – acesso em 01/04/2010.

JORNAL CONSULTADO:

- O GLOBO – Economia – Defesa do consumidor – 16/05/2010.

MÍDIA TELEVISIVA:

- FANTÁSTICO – Rede Globo – Canal 4 – programa exibido em 30/05/2010.

45

6.1 - BIBLIOGRAFIA CITADA:

- AURÉLIO, dicionário eletrônico, séc.XXI, versão 3.0, Nov. 1999

- BAUMAN, Zigmunt. Modernidade líquida. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 2001.

- CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. v.2, 9.ed. Rio

de janeiro: Lumen Juris, 2004, p.381-382.

- MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o

novo regime das relações contratuais, 4.ed. São Paulo: Revista do Tribunais,

2004, p.690

- MARQUES, Cláudia Lima. Sugestões para uma lei sobre o tratamento do

superendividamento de pessoa física em contratos de crédito ao consumo:

proposições com base em pesquisa empírica de 100 casos no Rio Grande do

Sul. In: Direito do consumidor endividado: superendividamento e crédito. São

Paulo: RT, 2006, p.256

- MARQUES, Maria Manuel Leitão. O endividamento dos consumidores.

Lisboa: Almedina, 2000, p.304.

- PASQUALOTTO, Adalberto. Conceitos fundamentais do código de defesa do

consumidor. Revista dos Tribunais, ano 80, v.666. São Paulo. RT.p.48-53,

1991, p.49.

- TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 3.ed. rev. e atual.Rio de janeiro.

Renovar. 2004, p.215.

46

REVISTAS CITADAS:

- Revista de direito do consumidor. O direito do consumidor endividado e a

técnica do prazo de reflexão. RDC, n.43, São Paulo: RT, jul-set. 2008, p.265

- Revista de direito do consumidor. Impressões atuais sobre o

superendividamento: sobre a 7ª. Conferência Internacional de Serviços

Financeiros e reflexões para a situação brasileira. RDC, n.65: Ed. RT, jan-

mar.2008, p.147.

SITES CITADOS:

- www.cpgp.ufpa.br/lape/portug/contato.htm - acesso em 01.04.2010.

- www.guidedusurendettement.org. – acessado em 03.06.2006

- www.lexinter.net/legislation/codeconsommation.htm - acesso em 13.06.06

JORNAL CITADO:

- Jornal do Brasil – Oferta estimula consumo – 26.01.2006.

47

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

DEDICATÓRIA 3

RESUMO 4

METODOLOGIA 5

SUMÁRIO 6

INTRODUÇÃO 7

CAPÍTULO I 8

FATORES E CAUSAS QUE PROPICIAM O SUPERENDIVIDAMENTO

1.1 – Definição 8

1.2 – A Oferta e a demanda por crédito 9

1.3 – A vulnerabilidade do consumidor e a boa-fé nos contratos 12

1.3.1 – A vulnerabilidade do consumidor 12

1.3.2 – A boa-fé nos contratos 15

1.4 – Conclusão 18

CAPÍTULO II

A CONCESSÃO DO CRÉDITO, SUA PROTEÇÃO NO CDC E O

TRATAMENTO DAS SITUAÇÕES DE SUPERENDIVIDAMENTO DO

CONSUMIDOR 19

2.1 – A concessão do crédito 19

2.2 – A proteção do CDC contra o superendividamento 23

2.3 – Tratamento das situações de superendividamento 31

2.4 – Conclusão 34

48

CAPÍTULO III

O DIREITO COMPARADO E O SUPERENDIVIDAMENTO 35

3.1 – Conclusão 38

CAPÍTULO IV

UMA LEI PARA O SUPERENDIVIDADO 39

CAPÍTULO V

CONCLUSÃO 41

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 43

BIBLIOGRAFIA CITADA 45

ÍNDICE 47

FOLHA DE AVALIAÇÃO 49

49

FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

Título da Monografia: SUPERENDIVIDAMENTO E O CDC: CAUSAS EFEITOS E

SOLUÇÕES

Autor: YURI SANTOS CKLESS

Data da entrega: 27.07.2010

Avaliado por: WILLIAM ROCHA Conceito: