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Vol. 10 - Ano 5 - Nº 10 - Julho / 2017 2017 Salvador Bahia Brasil Uma oportunidade para o Livre Pensar Vol. 10 - Ano 5 - Nº 10 - Julho / 2017 ISSN 2317-8612 http://revistatransdisciplinar.com.br/ - www.artezen.org

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2017 Salvador – Bahia – Brasil

Uma oportunidade para o Livre Pensar

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APRESENTAÇÃO

A Revista Transdisciplinar é um periódico on-line semestral, organizado por Celeste Carneiro, que tem como objetivo socializar o pensamento de autores que desejam expressar suas reflexões sobre os mais diversos temas inter-relacionados com o Ser Integral e sua interação com o mundo que o cerca. Busca a integração de saberes e perfis, valorizando o diálogo entre sabedoria e conhecimento, estimulando a liberdade expressiva e dando oportunidade ao exercício da beleza, quer através da articulação de temas, ideias e conceitos, quer através do estilo de apresentação dessas ideias e conceitos Pautamos esta Revista no pensamento de Basarab Nicolescu e grupo que escreveu a Carta da Transdisciplinaridade (1994), onde esclarece:

A pluridisciplinaridade diz respeito ao estudo de um objeto de uma mesma e única disciplina por várias disciplinas ao mesmo tempo. A interdisciplinaridade diz respeito à transferência de métodos de uma disciplina para outra. A transdisciplinaridade, como o prefixo "trans" indica, diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento. Rigor, abertura e tolerância são as características fundamentais da visão transdisciplinar. O rigor da argumentação que leva em conta todos os dados é o agente protetor contra todos os possíveis desvios. A abertura pressupõe a aceitação do desconhecido, do inesperado e do imprevisível. A tolerância é o reconhecimento do direito a idéias e verdades diferentes das nossas.

E no texto Educação para o Séc. XXI, do Relatório Delors (UNESCO, 2006):

Na visão transdisciplinar, há uma transrelação que conecta os quatro pilares do novo sistema de educação (aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser) e tem sua fonte na nossa própria constituição, enquanto seres humanos. Uma educação viável só pode ser uma educação integral do ser humano. Uma educação que é dirigida para a totalidade aberta do ser humano e não apenas para um de seus componentes.

Esperamos contribuir para a difusão do conhecimento, com a sabedoria da abertura e da tolerância, aliada ao rigor que dá o ajuste necessário. Como símbolo, trazemos a Flor da Vida, rico em mistérios estudados desde a mais antiga civilização e que encanta até os nossos dias. Lembra a conexão de todos com o Universo, a semente da vida, a relação do um com o todo, a gênese e o encadeamento dos genes, o que nos une e nos dá vida. Os textos são de responsabilidade dos autores que deverão encaminhá-los para nossa apreciação já revisados.

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EQUIPE EDITORIAL

Criação, editoração e coordenação geral

Maria Celeste Carneiro dos Santos – Especialista em Arteterapia Junguiana - ASBART 0036/0906 e em

Psicologia Transpessoal – ALUBRAT SEA2 030 (Instituto Junguiano da Bahia – IJBA / Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/ Instituto Hólon). Graduada em Desenho e Artes Plásticas (Faculdade de Belas Artes de São Paulo – FEBASP). Professora (2007 a 2016) e Supervisora no curso de pós-graduação em Arteterapia do IJBA. Foi coordenadora, professora e supervisora na pós-graduação em Arteterapia em Teresina – PI. Escritora e coautora. Membro dos Grupos de Pesquisas EFICAZ, da Universidade do Estado da Bahia – UNEB e REUPE – Rede Universitária de Pesquisas em Espiritualidade, da Universidade Federal da Bahia – UFBA. Membro do Colégio Internacional dos Terapeutas – CIT, da Associação Baiana de Arteterapia – ASBART e Conselheira de Honra da União Brasileira das Associações de Arteterapia – UBAAT. Currículo Lattes disponível em: http://lattes.cnpq.br/0119114800261879

CONSELHO EDITORIAL

Dulciene Anjos de Andrade e Silva – Doutora em Educação (Universidade Federal da Bahia – UFBA). Mestre

em Educação (UFBA). Graduada em Letras Vernáculas com Inglês (UFBA). Professora Adjunta da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, campus II. Currículo Lattes disponível em: http://lattes.cnpq.br/8015189418594078. Priscila Peixinho Fiorindo – Arteterapeuta ASBART 0129/0514. Doutora em Psicolinguística (Universidade de

São Paulo - USP/SP). Mestre em Linguística (USP/SP). Graduada em Letras (Mackenzie/SP). Vice-coordenadora e docente do Mestrado Profissional em Letras/PROFLETRAS da Universidade Estadual da Bahia (UNEB). Coordenadora do Grupo de Pesquisa – Psicolinguística: perspectivas interdisciplinares/UNEB. Currículo Lattes disponível em: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4744418Z4 Vanessa Di Cássia Fragosso – Arteterapeuta Junguiana – ASBART 0132/0215 – Terapeuta Holística EET:

0004-BA. Mestranda em Tecnologias Educacionais e Tecnologias em Saúde (Universidade Estadual da Bahia - UNEB). Arteterapeuta Junguiana. Terapeuta Holística. Pedagoga com Orientação Educacional e Vocacional - Especialista em Metodologia do Ensino Superior e Práticas Lúdicas: Escolar e Organizacional - Licenciada com Certificações Internacionais para Resiliência de Jovens e Adultos e Gerenciamento de Stress. Pesquisadora sobre Resiliência e Habilidades Socioemocionais. Docência na Graduação e Pós-Graduação na área de Ciências da Saúde e Ciências Humanas e Coordenação de núcleos socioeducativos. Participa como Membro e Pesquisadora no Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Ludicidade – GPEL – Universidade Federal da Bahia – UFBA e como Coord. Pedagógica do PROAP – Programas de Estudos Aplicados em Administração e Políticas na Faculdade de Economia e Administração – FEA/UFBA. Dirige o Projeto Ateliê. Currículo Lattes disponível em: http://lattes.cnpq.br/0735288007250867

Gildenor Carneiro dos Santos – Pós-Doutor em Educação (Faculdade de Educação da Universidade Federal

da Bahia – FACED-UFBA). Doutor em Educação (Universidade de São Paulo - USP). Mestre em Educação (FACED-UFBA). Graduado em Matemática e em Arquitetura (USP). Professor da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, Campus XI. Currículo Lattes disponível: http://lattes.cnpq.br/0814023926904547 Francesca Freitas – Graduada em Medicina pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública - EBMSP em

1981. Professora Assistente de Neuroanatomia (EBMSP, 1982 a 2012). Tutora do Departamento de Biomorfologia da EBMSP, 2005 a 2012. Coordenadora do Serviço de Neurofisiologia Clínica do Hospital São Rafael de 1992 a 1998. Atuação em Neurofisiologia Clínica – Eletroneuromiografia. Sonia Maria Bufarah Tommasi – Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Psicologia da

Saúde. Especialização em Musicoterapia, em Psicologia Analítica e em Arteterapia. Psicóloga clínica e educacional. Docente em cursos de pós-graduação de Arteterapia, Psicologia Analítica, Psicossomática, Psicopedagogia, Gerontologia. Coordenadora do curso de Arteterapia Censupeg. Presidente fundadora da Oscip Arte Sem Barreiras. Presidente da Associação Catarinense de Arteterapia (ACAT). Membro do Conselho da UBAAT – União Brasileira das Associações de Arteterapia. Escritora. Organizadora dos livros da Vetor

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Editora: Revisitando a Ética com Múltiplos Olhares; Arteterapeuta: um cuidador da psique; Pensando a Arteterapia com arte, ciência e religião. Organizadora da coleção Anima Mundi, livros de Arteterapia, da Vetor Editora. Organizadora, em parceria com Graciela Ormezzano, do livro publicado pela Ed. Paulinas: Envelhecendo com sabedoria. Autora dos livros: Arte Terapia e Loucura, Vetor Editora; Origami em Educação e Arteterapia, em parceria com Luiza Minuzzo, Ed. Paulinas. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5010212588553393

Marcus Welby Borges Oliveira – Doutorado (2008) e mestrado (2000) em Patologia Humana pela Universidade

Federal da Bahia – UFBA. Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal da Bahia (1997). Experiência na área de Patologia, Biologia Celular e Imunologia, com ênfase em Imunopatologia, atuando principalmente na Imunopatologia da leishmaniose tegumentar murina. Professor Adjunto II do Departamento de Ciências da Biointeração da Universidade Federal da Bahia e integra o grupo de pesquisa do Laboratório de Virologia do Instituto de Ciências da Saúde (UFBA), onde iniciou uma colaboração em projetos nas áreas de imunologia e virologia humana e animal. Atualmente tem demonstrado particular interesse pelas áreas de Psiconeuroimunologia e Saúde e Espiritualidade, tendo desenvolvido eventos, projetos e estudos nessa área. Cofundador da REUPE – Rede Universitária de Pesquisas em Espiritualidade. Coordenador do Grupo de Trabalho em Saúde e Espiritualidade da REUPE e das sessões científicas desse grupo. Tem como outras áreas de interesse: Biologia Celular do Câncer e de Células-tronco Tumorais. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/9992514942111915 Vitor Moura Cardoso e Silva Souza – Doutor em Geofísica Espacial (2015) pelo Instituto Nacional de

Pesquisas Espaciais (INPE). Bacharel em Física pela Universidade Federal da Bahia (2010), e Trabalhou como pesquisador assistente na NASA/Goddard Space Flight Center, EUA, por um ano durante o período de doutoramento. Atua na linha de pesquisa Magnetosfera-Heliosfera, focando nos seguintes temas: estudo da reconexão magnética na magnetopausa terrestre utilizando observações in situ e simulações numéricas, cinturões de radiação Van Allen e fenômenos físicos associados à plasmas espaciais. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8026732855379621

Pedro Teixeira da Mota – Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa (Portugal). Investigador da

Tradição Perene ou da Espiritualidade Universal. Conferencista em vários países e sobre diversos temas. Viveu dois anos e meio na Índia. Foi professor de Yoga, e tem trabalhado como especialista do livro antigo. Dinamizador espiritual. Publicou quatro livros de inéditos de Fernando Pessoa, comentados: Moral, Regras de Vida e Condições de Iniciação. Lisboa, Edições Manuel Lencastre, 1988; A Grande Alma Portuguesa. Lisboa, Edições Manuel Lencastre, 1988; A Rosea Cruz. Lisboa, Edições Manuel Lencastre, 1989; Poesia Profética, Mágica e Espiritual. Lisboa, Edições Manuel Lencastre, 1989. Em 1998, o Livro dos Descobrimentos do Oriente e do Ocidente. Em 2006, a tradução comentada do texto sânscrito AstavakraGita, o Cântico da Consciência Suprema. Em 2008 a tradução (com Álvaro Pereira Mendes), e comentando-a, do Modo de Orar a Deus, de Erasmo de Roterdão. E em 2015 um livro de trinta e três ensaios, ―Da Alma ao Espírito‖, Publicações Maitreya. Gildemar Carneiro dos Santos – Doutor em Física, na área de sólitons, pela Universidade de Nagoya – Japão

(1990). Mestre em Física pela Universidade de Nagoya – Japão (1986). Mestre em Física pela Universidade de São Paulo (1982). Bacharel em Física pela Universidade de São Paulo (1979). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal da Bahia. Tem experiência na área de Física, com ênfase em Métodos Matemáticos da Física, atuando principalmente nos seguintes temas: álgebras bidimensionais, equações diferenciais não lineares associadas a sólitons. Músico nas horas vagas, coordena a orquestra de amadores Ateneu Musical. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/9800581085946445 Ingrid Estefania Mancia de Gutiérrez – Doutora e Mestre em Biotecnologia com ênfase em Recursos Naturais

da Região Nordeste pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Graduação em Farmácia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Especialista em Gestão da Inovação Tecnológica pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Atualmente é membro da Comissão de Fitoterapia (COMFITO) do Conselho Regional de Farmácia (CRF) da Bahia e docente do Curso de Farmácia do Departamento de Saúde da UEFS, lecionando a disciplina Farmacognosia. Coordenadora do Programa Terapias não-Convencionais (TnC) e Você: um projeto de ensino e extensão em terapias complementares e integrativas da UEFS. Tem experiência na área de Farmacognosia e Prospecção Tecnológica, com ênfase no marco regulatório em Fitoterápicos, atuando principalmente nos seguintes temas: regulamentação de fitoterápicos, controle de qualidade de matéria-prima vegetal, técnicas cromatográficas, cultivo in vitro de lenhosas medicinais, patentes, práticas integrativas e complementares em saúde. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5002607120452691 Lucielen Porfirio – Professora Doutora em Linguística – UFBA, DLG - Departamento de Letras Germânicas –

UFBA. Doutorado em Linguística pela Universidade Federal da Bahia – UFBA – programa DINTER – UFBA/ UNIOESTE (2013). Mestrado em Letras - Linguagem e Sociedade pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (2006). Graduação em Pedagogia pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (2000) e também graduação em Letras pela Universidade Pan Americana (2009). Atualmente atua como professora Adjunto 1 na Universidade Federal da Bahia - Departamento de Letras Germânicas. Desenvolve projetos de pesquisa na área de ensino-aprendizagem de língua estrangeira, formação de professores e Inglês como Língua Franca. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4716299Y1

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Glícia Conceição Manso Paganotto – Possui mestrado em programa de pós-graduação em educação pela

Universidade Federal do Espirito Santo (2010), graduação em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Espírito Santo (2000) e graduação em Estudos Sociais pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora (1979). Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Arteterapia, atuando principalmente nos seguintes temas: arteterapia, criatividade, linguagem visual, autoconhecimento, educação emocional e saúde mental. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6024542661274908

Román Gonzalvo – Psicólogo transpessoal e doutor em psicología pela Universidad Autónoma de Madrid

(Espanha). Fundador do Journal of Transpersonal Research e da Asociación Transpersonal Iberoamericana. Desde 2006 tem trabalhado e investigado enfermos terminais, ajudando-os a morrer em paz e com boa qualidade de vida. Também trabalha os processos de aprendizagem e transformação interior produzidos nesta última etapa da vida. Suas investigações ocorrem no México, India, Papua, Nova Guiné, Zimbabue e Kenia, além do seu labor na Espanha. É professor de psicoterapia transpessoal no Máster en Psicoterapia del Bienestar Emocional del Instituto Superior de Estudios Psicológicos (ISEP) de Barcelona e no Máster en Mindfulness de la Universidad de Zaragoza. Organiza anualmente as Jornadas de Psicología Transpessoal e Espiritualidade, em Tudela (Navarra). Seus interesses profissionais convergem com seus interesses pessoais: contribuir na criação de um sistema social mais empático, compassivo e altruísta, favorecendo um nível de consciência coletiva que transcenda a limitada identidade egoica individual, e cujo motor seja o amor por tudo o que existe. Norma de Oliveira Alves – Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Sergipe cujo tema da

Dissertação foi Associação entre Depressão e Síndrome Coronariana Aguda e Prognóstico Intra-hospitalar. Médica Psiquiatra e Psicanalista transpessoal. Graduada em Medicina pela Universidade Federal de Sergipe (1986). Foi diretora Científica da Associação Sergipana de Psiquiatria, vice-presidente da Associação Sergipana de Psiquiatria e membro do Projeto Freudiano de Aracaju. É membro da Associação Brasileira de Psiquiatria; Membro Fundador da Associação Brasileira de Medicina psicossomática – Regional Aracaju; Fundadora e Diretora Presidente de Athenas – Instituto de Educação e Saúde Integral; Escritora e co-autora. Escreveu os livros: Psicanálise Transpessoal e Terapia de Vivências Passadas; Associação entre Depressão e Síndrome Coronariana Aguda – Impacto no Prognóstico Intra-hospitalar; Transtornos Mentais sob um Novo Prisma. É

Conferencista em eventos científicos e comunitários. Coordena os cursos de Especialização em Psicologia Transpessoal e Pós-graduação em Terapia Regressiva por ATHENAS – Instituto de Educação em parceria com a FACEI – Faculdade Einstein. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0042503228810827 Aurino Lima Ferreira – Doutorado em Educação (Conceito CAPES 5), Universidade Federal de Pernambuco,

UFPE, Brasil (2007). Mestrado em Psicologia Cognitiva (Conceito CAPES 4), Universidade Federal de Pernambuco, UFPE, (1999). Graduação em Psicologia, Faculdade Frassinetti do Recife, FAFIRE, (1993). Professor Adjunto da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE – (Departamento de Psicologia e Orientação Educacionais). Desenvolve atividades de extensão e pesquisa no Núcleo Educacional Irmãos Menores de Francisco de Assis (NEIMFA), comunidade do Coque, Recife, PE. Pesquisador e Professor do Núcleo Educação e Espiritualidade do Programa de Pós-graduação em Educação da UFPE. Tem experiência na área de Educação e Psicologia, atuando principalmente nos seguintes temas: Psicologia Transpessoal, Positiva e Integral, Psicologia social/comunitária, Educação não-formal, Dinâmica de Grupo, Relações Interpessoais, Fenomenologia (Merleau-Ponty), Sexualidade, Resiliência, Espiritualidade Integral (Ken Wilber), Processos afetivos e interativos na educação, Intervenções psicossocias, Psicologia do Desenvolvimento (infância e adolescência). Escritor e coautor. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5402096659543875

Vera Peceguini Saldanha – Doutora em Psicologia Transpessoal pela Faculdade de Educação da UNICAMP,

linha de pesquisa Psicologia Genética, Psicodrama e Psicologia Transpessoal. Psicóloga clínica com mais de 30 anos de experiência. Presidente da Associação Luso Brasileira de Transpessoal, ministra cursos no Brasil e no Exterior. Palestrante e autora de livros e publicações na área da Psicologia Transpessoal. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1016093168342110 Ivana Braga de Freitas – Pedagoga (UNEB); Psicopedagoga (UNEB); especialista em Neuropsicologia (IBPEX/UNINTER); autora do livro Transtornos e Dificuldades de Aprendizagem, ed. WAK, 2011; diretora cultural da ABPp_BA 2014/16; tutora Cogmed; professora de cursos de pós graduação em psicopedagogia; palestrante e formadora de educadores. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5427495900253997 Margarete Barbosa Nicolosi Soares – Doutora em Artes, arte-educadora, artista plástica e pesquisadora.

Docente na UNIMES, em Santos, SP. Foi docente na UNICASTELO, SP, e docente conferencista no Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA/ USP, SP. Faz parte do grupo de Pesquisa: Palavra e Imagem, no CAP, ECA/USP. Pesquisa na área de ensino e aprendizagem da arte e linguagem tridimensional. [email protected]; [email protected]. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4204217D7 Luis Lacouture González – Médico cirurgião (Universidad de Concepción – Chile). Psiquiatra de adultos

(Universidad de Chile – Santiago de Chile). Médico Geral no Hospital de Calama, II região, Chile. Médico psiquiatra no Serviço de Psiquiatria do Hospital Regional de Antofagasta – II região, Chile. Professor de Psiquiatria na Universidad de Antofagasta. Atualmente trabalha de forma independente no extrasistema, na cidade de Antofagasta – Chile.

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Cristina Lopes – Mestre em Criatividade pela Universidade Fernando Pessoa – PT. Psicóloga, Arteterapeuta,

Treinadora de SoulCollage® e terapeuta Floral. Coordena o curso de Pós-graduação em Arteterapia, desde o ano 2004. Faz parte do grupo TRAÇOS - Estudos em Arteterapia. Atual Presidente do Conselho Diretor da UBAAT. Publicou livros abordando a temática da arteterapia como também escreveu artigos relacionados ao tema. Frequentemente participa de Congressos nacionais e internacionais. Sua principal linha de pesquisa é a relação entre arte e saúde. Maria Suzana Moura – Doutora em Administração Pública pela Universidade Federal da Bahia, local onde atua

como professora associada e pesquisadora desde 1994. Tem se dedicado nos últimos anos ao tema das Metodologias Integrativas para a Educação e a Gestão Social. Recentemente concluiu a pesquisa de pós doc sobre o Escutar Consciente como competência para a Gestão, realizada com Valeria Giannella, da UFSBA e Eduardo Davel, da UFBA. Formação complementar na DEP (Dinâmica Energética do Psiquismo), na RYE (Rede de Pesquisadores sobre Técnicas de Yoga para a Educação) e na Rede Dragon Dreaming - Criação Colaborativa de Projetos. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4789454J1 Lívia Maria Costa Sousa – Mestre em Literatura e Cultura pelo programa de pós-graduação da Universidade

Federal da Bahia (UFBA). Graduada em Letras Vernáculas pela Universidade do Estado da Bahia - UNEB (2014), graduanda em Filosofia pela Universidade Federal da Bahia e professora de Literatura brasileira e africana. Coordenadora editorial da LEAL Editora e membro do conselho editorial da Revista vinculada a essa editora. Possui experiência com edição, revisão e diagramação de livros e revistas. É escritora e tem alguns de seus textos publicados em antologias. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1126574918629874

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PARA PUBLICAR A Revista Transdisciplinar é um periódico semestral, organizado por Celeste Carneiro, que tem como objetivo socializar o pensamento de autores que desejam expressar suas reflexões sobre os mais diversos temas interrelacionados com o Ser Integral e sua interação com o mundo que o cerca. Busca a integração de saberes e perfis, valorizando o diálogo entre sabedoria e conhecimento, estimulando a liberdade expressiva e dando oportunidade ao exercício da beleza, quer através da articulação de temas, ideias e conceitos, quer através do estilo de apresentação dessas ideias e conceitos, seguindo os parâmetros expressos na Apresentação. A Revista Transdisciplinar será publicada nos meses de Janeiro e de Julho de cada ano e os artigos deverão ser enviados com até dois meses de antecedência. Os artigos serão avaliados, por ordem de recebimento, por dois membros do Conselho Editorial. Caso haja divergência quanto à aprovação dos mesmos, um terceiro parecer de outro membro do Conselho Editorial será solicitado. Os textos poderão ter o formato acadêmico ou serem escritos de forma mais livre, desde que em linguagem clara e de acordo com os padrões normativos da Língua Portuguesa. Devem procurar coerência com a proposta da Revista Transdisciplinar.

Se o autor escolher escrever de acordo com as normas acadêmicas, deverá fazê-lo em conformidade com os padrões da ABNT, com resumo, problemática anunciada e desenvolvida, objetivos, metodologia, conclusões e referências. Nas referências, deverão constar apenas as obras citadas no texto. Os textos que seguirem uma forma mais livre (ou seja, por um estilo que não priorize o rigor acadêmico, podendo valer-se ou não da poesia, mas que também possibilite a exposição do pensamento com fluidez, clareza, coerência e consistência), se fizerem uso de citações diretas ou indiretas, devem também listar essas referências ao final, de acordo com as normas da ABNT. Entretanto, caso o autor queira também indicar livros e sites que não fazem parte do texto, mas que são complementares a ele, pode fazê-lo anunciando após as referências o item ―Para saber mais”. Os artigos não precisam ser inéditos, desde que seja explicitada a fonte original de sua publicação. Preferencialmente os artigos estarão no idioma Português, mas eventualmente outros idiomas poderão ser aceitos.

Cada artigo deverá ter, no máximo, 20 páginas (incluídas as notas de pé de página e as referências) e deverá ser escrito em fonte Arial, tamanho 10, seguindo um espaçamento de 1,5 cm e obedecendo as margens superior e inferior de 2,5cm, esquerda e direita 3,0cm. Os artigos deverão ser encaminhados já revisados.

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CONTATO

Endereço postal da Revista

Celeste Carneiro

CINDEP – Centro Integrado de Desenvolvimento Pessoal Centro Odonto Médico Henri Dunant

Rua Agnelo Brito, 187 sala 107 – Federação CEP 40210-245 – Salvador – Bahia – Brasil

CONTATO PRINCIPAL

Celeste Carneiro

Telefones: 71 - 3497-1306 / 98874-1155 (Tim) [email protected]

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EDIÇÃO ATUAL Revista Transdisciplinar Vol. 10 - Ano 5 - Nº 10 - Julho / 2017

ISSN 2317-8612

ÍNDICE

1 – DULCE MAGALHÃES

Jairo Salles p. 10

2 – A MANDALA DA VIDA–MORTE–VIDA – Uma carta para Dulce Magalhães

Hélyda Di Oliveira p. 12

3 – HOMENAGEM A DULCE MAGALHÃES (III)

Wilson Jacques p. 16 4 – INSTINTO OU INTUIÇÃO

Dulce Magalhães p. 17 5 – TERRA À VISTA!!!

Wilson Z. Moura p. 19

6 – COMENTÁRIOS AO ENSAIO “TEORIA DA SEMICULTURA” DE THEODOR W. ADORNO

Luciano Machado Tomaz p. 21 7 – BAMBU, UM SÍMBOLO DE ASSOCIAÇÃO E O SAGRADO DIREITO DE BENDIZER

Acely Gonçalves Hovelacque p. 24

8 – DIÁLOGOS ENTRE O MODERNISMO BRASILEIRO E AS LITERATURAS AFRICANAS

DE LÍNGUA PORTUGUESA

Lívia Maria Costa Sousa p. 26

9 – EL MENSAJE DE JESÚS COMO TERAPIA

Román Gonzalvo p. 32

10 – A MENSAGEM DE JESUS COMO TERAPIA

Román Gonzalvo (Tradução: Celeste Carneiro) p. 35

11 – EDUCAÇÃO TRANSPESSOAL: A BUSCA PELA INTEGRAÇÃO

Maria Aparecida Soares Pereira e Josiana Veloso Fonseca p. 38 12 – A ARQUITETURA DO TEMPO NA ARTE LUSO-BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA

Margarete Barbosa Nicolosi Soares p. 49 13 – A VIDA E SUAS DIFERENÇAS

Gilmar Carneiro p. 54 14 – PROVA DE QUÍMICA

Carlos Marighella p. 56 15 – HISTÓRIAS DE MULÁ NASRUNDIN p. 57

Capa: Mandala de Dulce Magalhães oferecida para a Revista Transdisciplinar.

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1 – DULCE MAGALHÃES

Nossa homenagem

Pela sua importância no cenário nacional e internacional, assim como parceria no Colégio Internacional dos Terapeutas – CIT, do qual faço parte, pelo incentivo e colaboração com a Revista Transdisciplinar, fazemos esta homenagem a

Dulce Magalhães, colocando na capa um mandala por ela oferecida para a Revista, publicando um dos seus artigos e a homenagem de alguns dos seus amigos mais próximos que ainda sentem o impacto de sua passagem para outros

planos, deixando a Terra em 06 de fevereiro de 2017. Celeste Carneiro

Dulce Magalhães

Fonte: Divulgação

Jairo Salles*

1

Tive a graça de conhecer Dulce Magalhães

por volta de 2002, quando fazíamos a Formação da UNIPAZ – Universidade Internacional da Paz em Florianópolis-SC e a partir dai tive a honra e o privilégio de tecer uma profunda amizade e ter minha vida impactada profundamente pela presença de uma amiga, irmã e mestra querida.

Vi diante dos meus olhos as transformações por quais Dulce passou à medida que mergulhava em investigações, aventuras e vivências a que se permitia e aprendi a cada encontro, conversas e risos. Vivencei sua presença, leveza e atrevimento, a vi viver isto sem medidas, vivendo o que professava, desdobrando-se em uma bela e viva mandala de mudanças e realizações, tomando o mundo por sua casa, a humanidade por sua família, a gentileza por sua religião e a paz por seu propósito de vida.

Dulce me fez crer, me mostrou um campo ilimitado de possibilidades, tantas vezes ao refletir

meus pensamentos me mostrou aquilo que eu não tinha ou não me permitia condições para enxergar, me conduziu a lugares meus que me assustavam e me empoderou para seguir passos por mim mesmo com ousadia e coragem.

A vida me presenteou ainda com a oportunidade de mergulhar em seus pensamentos através de suas palestras, seminários e livros, trabalhando a seu lado e acompanhando de perto suas inspirações e processos criativos.

Dulce era intuitiva, permeável aos sinais que seu coração indicava, com sua presença forte, bela e generosa era capaz de criar um campo efetivamente transformador para quem tivesse a oportunidade de encontrá-la, ao encantar-se com seu riso fácil e ao ouvir suas ideias além deste tempo e espaço.

Ela se foi no início deste ano de 2017, e escrevo este texto vivendo ainda tudo o que sua

________________ * Jairo Salles – Life coach, terapeuta, palestrante e professor de filosofia. www.jairosalles.com

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passagem significa para mim, uma imensa saudade... e ao mesmo tempo sinto-a como que diluída na existência nos deixando um ressoar de beleza e atrevimento, de força e poder, amor e gentileza para quem quer que faça contato com suas palavras através do valioso legado que nos deixou com sua obra.

Dulce nos convidava a todo momento à viver nossa própria jornada alinhada com a ousadia de colocar em dúvida todas as nossas certezas, a não brigar com o inevitável e a um assentimento pacífico que nos conduz ao autoconhecimento, a autorresponsabilidade por nossas escolhas e a renovação de nossa autoestima. Através da aceitação da vida como ela é, podemos alterar nosso olhar sobre o mundo e enxergar mais além, olhando para a realidade a partir de nossos resultados e não por nossas interpretações ou das crenças que nos foram repassadas. E desta forma poderemos compreender onde a mudança realmente se faz necessária no ponto da jornada em que nos encontramos e a criar uma alquimia libertadora que irá efetivamente nos levar a uma nova forma de ser e estar no mundo.

Dulce era e é uma força viva da natureza, nos deixou marcas de uma trajetória única e entre todas as coisas, sua capacidade incrível de aglutinar pessoas e sensibilizá-las na causa da Paz. Quem viveu ao lado dela sentindo sua energia, emoção e comprometimento ao mobilizar grupos em eventos como as III edições do

Festival Mundial da Paz, e em 2016 no Fórum Mundial da Paz em Florianópolis sabe o quanto os resultados alcançados são transformadores nas vidas das pessoas que tiveram a oportunidade de participar e tecer juntos estes movimentos.

Cada ato, ação, palavra abraço, olhar e a presença de Dulce nos convidava simplesmente a nos tornarmos quem somos e a nos surpreender a nos mesmos escolhendo a vida e o mundo que desejamos habitar agora e a descobrir que tudo é possível.

À Dulce Magalhães, Anam Cara (amiga da alma)

Gratidão e Amor Infinitos,

Jairo Salles Florianópolis, Fevereiro de 2017

_______________ 1

Adaptado do livro: ―Atreva-se! Torne-se quem você é!‖ de Dulce Magalhães – organizado por Jairo Salles. Obra que será lançada este ano pelo Instituto Dulce Magalhães, entidade que levará adiante seu legado promovendo a cultura de paz, direitos humanos, inclusão social e o empoderamento de mulheres. O Instituto através de diversas ações e atividades seguirá compartilhando o pensamento e a sabedoria de Dulce Magalhães que inspirou e segue inspirando tantas pessoas a transformarem suas vidas.

Arco-íris – união da Terra com o Céu

Fonte: Fotografia de Celeste Carneiro

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2 – A MANDALA DA VIDA–MORTE–VIDA

Uma carta para Dulce Magalhães

Hélyda Di Oliveira*

Dulce querida, cadê você? Por onde anda

você? O que você tem feito? Quais têm sido seus novos sonhos? E sobre qual tema do novo livro você está escrevendo agora? E o Nurinur, tem estado com você? Que cores têm suas novas mandalas?

Querida Dulce, desde o dia em que você partiu para o seu voo mais alto, estas têm sido as perguntas mais difíceis deste momento na minha vida e só mesmo seu confortador mantra ―Está tudo certo, não tem nada errado‖ me faz companhia e me conforta nos dias de maior saudade.

Eu me sinto agraciada pelo nosso encontro, Dulce querida, e pela irmandade que dele aconteceu. Você, uma aquariana generosa e acessível a todo mundo, mas íntima de poucos, me colocou entre os poucos... Entre aqueles de se contar nos dedos de uma mão!

Das coisas mais simples do dia a dia, como por exemplo: onde iremos jantar hoje? Até às mais complexas conversas sobre seres de outras dimensões e viagens intergalácticas, compartilhamos conversas inesquecíveis e absolutamente únicas.

Agora, amiga-irmã querida, sou convidada a falar, a escrever sobre você. Então, respiro fundo e deixo fluir...

Convivi com esta mulher que se tornou a primeira brasileira a compor o Comitê de 80 Lideranças pela Paz no mundo, organização coordenada pelo ex-presidente americano Bill Clinton, do Programa Global de Cultura de Paz. Testemunhei seu papel de tecelã da Rede Unipaz – Universidade Internacional da Paz - convidada que foi a tecer suas histórias e sua magia pelas dezoito unidades da Unipaz espalhadas no Brasil, além das da França, Portugal e Argentina.

Carismática e competente, tornou-se, no Brasil, uma das palestrantes mais requisitadas, a falar sobre os temas de Liderança, Mudança de Paradigmas e Cultura de Paz. Essa menina, neta de Cigana, nasceu em Cornélio Procópio, interior do estado do Paraná, no dia 25 de janeiro de 1966, estudou Filosofia e concluiu seu PhD também em Filosofia com foco em Planejamento de Carreira pela Universidade de Columbia (USA). Fez pós-graduação em Marketing na ESPM/SP, tornou-se Mestre em Comunicação Empresarial pela Universidade de Londres (Inglaterra) e especialista em Educação para Adultos pelas Universidade de Roma (Itália) e Oxford (Inglaterra).

Idealista e agregadora, Dulce foi presidente da unidade Unipaz de Santa Catarina e idealizadora, mentora e realizadora, do I Festival Mundial da

_______________ * Hélyda Di Oliveira – Doutoranda em Ciências da Religião (PUC/GO). Focalizadora de Dança Circular. Terapeuta do

CIT (Colégio Internacional de Terapeutas). Astróloga e Diretora Geral da Unipaz Goiás. [email protected]

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Paz (2006, SC) que, com o incentivo de Pierre Weil, desdobrou-se para convocar voluntários de todos os cantos do país e motivou-se a liderar e cooperar na realização do segundo, terceiro e quarto Festival Mundial da Paz.

De aparência e alma cigana, Dulce Magalhães publicou 16 livros, escreveu 930 artigos em revistas, foi colunista da Revista Amanhã, por 20 anos (1997-2017), e também do jornal Correio do Povo. Realizou, em 26 anos de carreira, 2000 mil palestras registradas, além de outras inúmeras conferências voluntárias que sempre fez com esmero, competência e amor.

Dentre seus livros, alguns se tornaram bestseller, como ―Super Dicas para Administrar o Tempo e Aproveitar Melhor a Vida‖ (2008), ―O Foco Define a Sorte‖ (2011) e ―A Paz como Caminho‖ (2007). Seus conteúdos transitavam entre gestão de paradigma, liderança e especialmente Cultura de Paz, no âmbito pessoal e corporativo. Como uma excelente filósofa, brincava com as palavras com propriedade única. Dulce publicou o livro: ―Manual de Disciplina para Indisciplinados‖ (2008), entendendo e refletindo a palavra disciplina como a compreensão do termo ‗de-si-pleno‘ = disciplina.

Sempre de forma ousada na linguagem escrita e no visual, Dulce impulsionou reflexões importantes sobre valores e crenças, afirmando que ―não vemos o mundo como ele é, vemos o mundo como nós somos‖, e nesta intensa ação para o bem coletivo, teceu várias histórias sobre como nos tornarmos líderes de nossos próprios sonhos e que as perguntas são sempre mais importantes que as repostas. Estimulava as pessoas a fazerem perguntas inusitadas e as convidava a olhar ao redor procurando qualquer sinal que, primeiro aparecesse aos olhos, desde uma placa de transito, a letreiros de caminhões ou a qualquer palavra que, inesperadamente, apontasse no campo visual de quem fez a pergunta. Objeto ou coisa encontrada nessa pesquisa de olhar, certamente contribuiriam para a resposta às indagações pessoais. Quer dizer: para Dulce, tudo é uma questão de presença e conexão, entre o visível e o invisível.

Consagrada Sacerdotisa de Ávalon (em cerimônia específica conduzida por Solange Frazão), Dulce Magalhães foi a coordenadora geral do X World Peace Fórum e do II Youth Peace Fórum, realizado em Florianópolis, SC, na data de 22 a 25 de setembro de 2016. O evento reuniu centenas de pessoas em torno ao tema WE BELIEVE – NÓS ACREDITAMOS – organizado pela Fundação Schengen Peace, com sede em Luxemburgo. Após a Passagem da Dulce para planos mais sutis, a Fundação criou em abril último, a ROTA DA PAZ

1, com a ideia de

_____________ 1 ROTA DA PAZ DULCE MAGALHÃES. Para mais

informações acessar: http://dulcemagalhaes.com.br/ rota-da-paz-dulce-magalhaes-rota-interamericana-de-obeliscos-da-paz/, acessado em 08.06.2017.

plantar obeliscos da Paz e honrando o legado de Dulce Magalhães, no propósito de manter viva sua incomparável mobilização de pessoas para a causa da Paz.

Viajante por missão, profissão e prazer, Dulce fez do aeroporto sua terceira casa. A primeira era a casa em Florianópolis, a segunda era o lugar que estivesse e a terceira, com certeza, eram os saguões de aeroportos, espalhados por todo planeta. Ela viajou pelos quatro continentes, conheceu, viveu e exalou em vida, as várias culturas nas quais desfrutou das comidas, do linguajar, das crenças e especialmente da sabedoria de cada povo no qual fez contato. Ela vestiu roupas desde burcas aos seus encantadores vestidos e panos coloridos, viajou por todo o Reino Unido, morou em Londres, estudou na Itália, em Roma e também nos Estados Unidos, peregrinou por toda Europa, sem exceção esteve em cada país europeu. Bebeu da sabedoria da Grécia e do Egito por várias vezes. Encontrou um Sábio na Jordânia que lhe deu sua maior aula racional sobre o amor e o amar, esteve na Turquia, Israel, China, Canadá, encantou-se com a Tailândia e Bali, onde desejou celebrar os seus 50 anos, com 50 amigas (a viagem não ocorreu). Aprendeu com o povo do Butão sobre Felicidade. Visitou a Indonésia e no Marrocos... ahh... o Marrocos.... Na América do Sul, esteve em todos os países, ora como viajante, muitas vezes ministrando palestras em grandes conferências. Esteve no Líbano, no Nepal, na Síria e Canadá.

Em 2012 esteve na casa de Nelson Mandela, entrou em seu quarto e o viu dormindo! Esta experiência foi marcante em sua trajetória! Ela contou inúmeras vezes esta experiência e em cada recontagem, parecia que a estava contando pela primeira vez.

Dulce sempre se rendeu à Guiança Superior sob a regência do Grande Mistério da vida, em todos os seus níveis. Tinha a companhia de um Ser - especial e espacial - que ela denominou Nurinur, um Ser Alado, de grandes asas, de cor azul-acinzentado. Ela e Nurinur tinham encontros constantes, os quais relatava a nós, amigos, com a qualidade de detalhes que era simplesmente impossível duvidar. Tive a graça de ouvir incontáveis histórias com o Nurinur, a quem passei a ter um carinho significativo.

Para Dulce, todos nós somos seres passageiros… Passamos pela experiência chamada VIDA como cidadãos do Planeta Terra, porém VIDA é infinitamente mais ampla do que simplesmente a relação da vida funcional do organismo mortal. O corpo é mortal e a vida é eterna, portanto… a morte é uma ilusão. Sob o ponto de vista da matéria, há a morte física, isto é fato. O corpo perde a conexão com a vida. Mas a VIDA, em sua consciência ampla e subjetiva, nunca morre. O campo de consciência que envolve aspectos do viver permanece vivo na

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memória e nas lembranças afetivas. Falar da Dulce é reconhecê-la viva. Apenas

morreu o corpo físico, porém todas as ações já realizadas e o conhecimento compartilhado por ela, permanecem vivos e pulsantes.

Dulce foi mulher de uma competência inigualável, encantou e transformou a vida de incontáveis pessoas, e bastava um único encontro e o elo para sempre era estabelecido. Tratava-se de uma mulher de enigma indecifrável e uma exímia inspiradora de sonhos. Em uma de suas viagens para Índia, Dulce teve um acidente no pé e separou-se do grupo liderado pela querida Gislaine D‘Assumpção. Dulce ficou no hotel, pois estava impedida de andar... ahh… mal sabia ela que aquilo tudo era uma bela conspiração ―Dos Caras‖ para nascer a Mandaleira Dulce Magalhães. Muitos ―downloads‖ foram feitos... diz a Lenda que uma Mandala representa uns mil livros, imagine só quantos milhões de livros foram lidos pela querida Dulce que, a partir daquele janeiro de 2005, não parou mais de desenhar. Ela teve uma ―tempestade de visões de Merkabas

2‖... Assistimos juntas há

alguns filmes e documentários sobre o tema para tentarmos decodificar o que estava lhe acontecendo. Era comum vê-la desenhando enquanto assistia palestras e traduzia pelas mandalas o conteúdo apreendido. As Mandalas foram ganhando nomes: Prosperidade, Mandala da Vida, do Amor, da Inspiração... e inúmeras mandalas desenhadas à mão livre surgiam de suas singelas e firmes mãos.

Vocês podem estar perguntando: quem são ―Os Caras‖? E o que são ―downloads‖? ―Os Caras‖ são seres com os quais ela tinha contato em sonhos e/ou em pura guiança em estado de vigília. Uma presença real e quase tocável. Demos inúmeras risadas nos contatos com ―Os Caras‖. Recorríamos sempre a eles pois em muitos momentos, vivíamos algo tão além da compreensão da mente racional e dualista que somente alguém ―do lado de lá‖ poderia falar ―nossa língua‖ e compreender o que nos ocorria. Sim, era bem assim mesmo: Os Caras passaram a ser nossos amigos íntimos e fiéis testemunhas da imensa fé na vida e no ser humano que a fazia mover montanhas acreditando que a Paz é algo possível e construtível entre nós.

Sobre ―download‖3, quem a conheceu ou conviveu com a Dulce, sabe da inigualável inteligência que a habitava, portanto, para ____________ 2

Merkabas – compreendido pelas tradições místicas, é um corpo de luz que possibilita o movimento e a manifestação de energias do campo sutil e podem ser vistas ao olho humano. 3

Download – termo muito utilizado pela Dulce e por

amigas próximas para referir-se à admirável inspiração de seus conteúdos que, sob o ponto de vista do profundo significado, entendíamos que era como baixar informação de planos sutis da consciência.

justificar tamanha conexão de seus ensinamentos, passamos a falar que ela fazia downloads, pois era mais fácil entendermos que algo de muito especial, único e importante estava sendo decodificado pela Dulce.

Bem, nem preciso dizer que tínhamos certeza de que fomos queimadas na fogueira na época da ―caça às bruxas‖... e nossa brincadeira favorita era dizer assim: ―Estamos pagando os nossos pecados pois jogamos pedra na Cruz, porém a nossa pedra acertou em Jesus‖... ahhh... e a risada surgia natural e demoradamente... Saudades...

Esta brincadeira começou entre nós na maluca experiência de realizar e coordenar o II Festival Mundial da Paz, pela Unipaz Goiás/Rede Unipaz no ano de 2009. Imagine só, ao nos propormos realizar um Festival Mundial da Paz, no Brasil, o nível de conflitos que atraímos foi gigantesco, pois, como boas aprendizes da Unipaz, sabemos que quanto mais Luz, mais Sombra! Então... foi preciso muita conexão com ―Os Caras‖ para vermos além de todos os desafios rotineiros a que éramos expostas e confiar no horizonte que cada vez mais se expandia aos nossos olhos.

Posso afirmar que ter sido testemunha de sua passagem, – pude segurar suas mãos na UTI, arrumar o seu cabelo lindo e exuberante recoberto por tubos e fios, massagear os seus pés frios, acariciar o seu rosto pálido... – foram cenas que transformaram completamente minha relação com a vida – morte – vida.

Muitos Mestres, de diferentes tradições, dizem que o Portal Iniciático acontece quando abraçamos a ‗Noite Escura da Alma‘. Para mim, foi assim aquele domingo, dia 05 de fevereiro/2017, acompanhada por mais 8 ou 10 pessoas que juntas, rezávamos e cantávamos no hall do hospital na Zona Sul em São Paulo, pedindo pela recuperação da querida Dulce.

Porém o destino já estava traçado: na primeira hora do dia 06 de fevereiro de 2017, Dulce lançou-se na sua viagem mais longa e para o seu destino inevitável: a Clara Luz!

Este dia, sem comparação com nenhuma outra experiência, foi de imensurável impacto na minha vida até o momento. Cantar para Dulce, já com o seu corpo sem vida, foi algo que ampliou minhas crenças sobre a vida e a morte e impactou a relação com meu próprio corpo, especialmente por refletir sobre nossa percepção e capacidade de amar.

Um dos aprendizados é constatar que o amor ultrapassa qualquer matéria exposta. Nas intermináveis 11 horas no Instituto Médico Legal de São Paulo, o aprendizado foi intenso e redefinidor. Observar o trabalho que é feito no corpo, pós-―morte‖, certifica-se que o aprendizado sobre as questões que envolvem o rito da morte é o mais significativo manual para aprender a viver a vida em sua plenitude.

Entre nós, nunca faltou cumplicidade!!! Nunca

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faltou colo! Eu poderia ficar aqui falando muitas histórias lindas que compartilhamos! Tenho certeza que muitas delas poucos acreditariam. Mas acreditar ou não, não é o mais importante agora. O que foi vivido transformou-nos eternamente em amigas-irmãs inseparáveis e honrarei o seu legado enquanto vida neste plano eu tiver.

O que aprendi com tudo isto? Que a vida vale pelo que se vive! Que nada, nada é mais importante além do amor expressado. Aprendi o valor das palavras certas ditas nas horas certas. Sou grata pelo aprendizado por hoje saber escutar os sinais da vida com a consciência de estar no lugar certo, na hora certa, disponível para o que der e vier. Que um olhar vale imensamente mais que um discurso inteiro. Que a certeza da mão amiga muda a direção para sempre dos rumos da vida.

Mulher de fé, Dulce Magalhães comungou em várias tradições religiosas. Aconchegou-se na Tradição da Fé Baha‘i, do Profeta Bahá‘u‘lláh o qual profetiza que ―A Terra é um só país e os seres humanos os seus cidadãos‖. Dulce viveu seus 51 anos como peregrina e cidadã do mundo, contagiando milhares de pessoas por onde passou com os preceitos inspirados na sua fé, por meio do serviço, do amor e da gentileza. Agora, com certeza, está peregrinando sua Jornada intergaláctica, num mundo onde não se pode ver com os olhos da matéria, mas sim com os olhos do coração.

Para finalizar, expresso minha honra por eu ter sido escolhida por ela como sua irmã, inclusive com aparências físicas semelhantes refletindo a comunhão de nossa alma. Levo comigo, por onde eu for, o seu mantra favorito: ―Não há nada errado, está TUDO CERTO‖!

Por inúmeras vezes a escutei dizendo a oração abaixo descrita, que agora finalizo este texto em formato de carta, para a minha eterna doce Dulce que hoje está espalhada em todos aqueles que acreditam que a utopia de um mundo mais solidário e pacífico é possível:

―Eu quero o que é bom para mim. Deus sabe o que é bom para mim. Tomara que seja a mesma coisa.

Mas se não for, será bom mesmo assim‖

Com amor e amizade

Hélyda Di Oliveira Unipaz Goiás

Para saber mais: Site oficial: www.dulcemagalhaes.org.br Principais livros publicados, organizados e em co-autoria: MAGALHÃES, Dulce. A Paz como caminho (org). Rio de Janeiro: Qualitymark, 2007. _________________.Mensageiros do vento: uma viagem pela mudança. Rio de Janeiro: Do Autor, 2002. _________________. Superdicas para administrar o tempo e aproveitar melhor a vida. São Paulo: Saraiva, _________________. Alternativas estratégicas para o varejo no Brasil. São Paulo: Do Autor, 1998. _________________. Pensamento estratégico para líderes de hoje e amanhã. São Paulo: Integrare, 2008. _________________. O foco define a sorte. São Paulo: Integrare, 2011. _________________. Manual da disciplina para indisciplinados. São Paulo: Integrare, 2008. _________________. Le Sacré Aujord‘hui. França, 2003. JULIO, Carlos Alberto (org). Superdicas para ensinar a aprender. São Paulo: Saraiva, 2009. BOOG, Magdalena. Tempo de convergir: o impacto nas pessoas, organizações e sociedade. São Paulo: Gente, 2003. http://www.gislainedassumpcao.psc.br/site/

Hélyda Di Oliveira e Dulce Magalhães

Fonte: Foto fornecida pela autora

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3 – HOMENAGEM A DULCE MAGALHÃES (III)

Dulce Magalhães

Fonte: Divulgação

Meu reconhecimento e carinho pela querida Dulce!

Wilson Jacques*

Conheci Dulce Magalhães quando a Unipaz RS estava iniciando a primeira turma da FHB/SC em Florianópolis.

Profundamente simpática e acolhedora, Dulce revelava determinação e otimismo em suas participações. Focada, atenta e participativa, não só trazia questionamentos importantes aos temas apresentados, como também fazia a conciliação destes com a realidade, ressaltando sua aplicabilidade na vida real, no dia a dia, para o bem das pessoas, grupos e da sociedade em geral.

Sempre revelou-se um ser voltado para o bem, para o melhor, para o desenvolvimento humano, social e universal, através da visão transdis-ciplinar holística em palavras e ações.

Estimulava todas as pessoas e parceiros a desenvolver e aprofundar a caminhada e, quando necessário, empurrava empaticamente o processo ao percebê-lo inativo ou muito lento, auxiliando a todos nós. Uma líder! Uma guerreira!

Era bem possível prever seu desenvolvimento social e cultural pela via da visão transdisciplinar holística, como também, o bem que iria proporcionar transitando pela mesma, o que certamente ocorreu, visto sua trajetória e sua obra que enaltece a todos nós, irmãos de caminhada, e auxilia e favorece todos os seres humanos e comunidades.

É possível entender sua breve partida deste plano, embora tenha contrariado nossas expectativas. Imaginem, queridos irmãos, o quanto havia de chamadas e esperas pela sua presença necessária e imprescindível em outros planos!

Obrigado querida Dulce! Sem dúvidas, continuaremos nosso trabalho energizados pela tua sabedoria e acarinhados pelo teu amor!

Em qualquer plano que estejas, nunca sairás do nosso coração, da nossa mente, da nossa alma, da nossa Vida!

Pensamentos e lembranças afetuosos!!

_____________ *Wilson Jacques - Psicólogo, Terapeuta Transpessoal, Professor e Membro da Unipaz Sul. Terapeuta do Cit (Colégio

Internacional de Terapeutas). [email protected]

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4 – INSTINTO OU INTUIÇÃO

Dulce Magalhães*

Todos somos dotados de instintos e da capacidade de intuir. Porém, é preciso que compreendamos o papel de cada uma dessas matrizes em nós. Todos os animais recebem instintos para garantir a segurança e preservar a vida. Há três fontes básicas que comandam nossos instintos: medo, raiva e carência.

Essas três emoções são fundamentais para garantir nossa sobrevivência. É graças ao medo que não nos colocamos em riscos que possam comprometer nossa integridade física e nossa vida. A raiva garante nossa capacidade de agir frente aos obstáculos, e a carência é que faz o bebê chorar quando sente fome, frio, solidão ou desconforto e alerta aos adultos da necessidade de oferecer cuidado.

Assim, um indivíduo saudável deve apresentar essas emoções para lidar com aspectos da vida, contudo o problema se instala quando essas emoções passam a reger toda a vida e não apenas circunstâncias e condições específicas.

Se gerimos a vida através do núcleo de nossos instintos, vamos oferecer determinadas e condicionadas respostas frente a todos os desafios, sejam eles de que natureza for. O medo vai nos levar ao desejo de controlar a realidade para que esta seja de acordo com nossa visão de como as coisas devem ser. Naturalmente esse controle é irrelevante, pois a realidade vai se apresentar como é e não como gostaríamos que fosse. Assim, vivemos como consequência a frustração, onde julgamos que determinada coisa, pessoa ou comportamento não poderiam ser como são. Mera ilusão.

A carência vai nos conduzir à necessidade de preservar, ao desejo de manter determinadas coisas, pessoas ou circunstâncias em nossa vida. Como tudo é impermanente, essa é a natureza essencial do mundo, acabamos vivendo com um permanente senso de falta que precisamos completar com alguém ou com algo, afetando nossa capacidade de autorresponsabilidade, pois

criamos a fantasia de que outra pessoa, certa situação ou condição, ou ainda determinado objeto é que nos trará o senso de completude, a vivência da felicidade. Como já sabemos bem, isso não ocorre e vivemos continuamente à busca desse ―algo‖ que poderá nos completar.

A raiva vai nos condicionar a determinadas reações pré-programadas, tornando- nos reativos frente aos constantes e mutantes desafios da vida. Seja qual for a situação lançamos mão do mesmo procedimento de sempre: atacar ou defender, orientados por uma emoção que nos faz agir dentro dessas condicionantes.

Tudo isso já nos é bem conhecido, pois usamos cotidianamente nossos instintos para gerenciar os processos da vida e alcançamos resultados indesejados como o estresse, que é fruto de nossa necessidade de controlar o incontrolável, dores físicas pela tensão produzida pelo senso de falta, pela necessidade de buscar continuamente e cansaço pela enorme energia que aplicamos para fazer o básico em função de nossa reatividade que utiliza respostas prontas e ineficazes para novos e inéditos desafios e oportunidades.

A grande tarefa educacional é promover uma mudança na esfera da consciência. Passar do instinto para a intuição, que é a qualidade humana de ler o momento e criar a história a partir de cada contexto. O uso da intuição nos permite ver com novos olhos a cada instante do caminho. Abrirmo-nos para a oportunidade e percebermos o que está oculto ou não tão aparente. O tempo todo a vida oferece sinais para trilharmos com maior vigor e entusiasmo, porém só a intuição nos permitirá vê-los.

Com o exercício intuitivo saímos dos instintos básicos e ao invés de preservar vamos poder fluir com a experiência, ao invés de controlar, confiar no fluxo e na capacidade de dar conta do que viver, na medida que ocorrer e, o mais motivacional de tudo, ao invés de sermos reativos

________________ * Dulce Magalhães - Filósofa, Educadora, Pesquisadora.

Uma oportunidade para o Livre Pensar

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podemos nos tornar criativos e inventar novas respostas frente a novos desafios. Isso vai nos economizar enorme energia, liberar-nos do estresse e do cansaço, evitar uma série de frustrações e fazer da vida uma experiência muito mais divertida.

Gerir a partir da intuição em lugar do instinto é como mudar de vida. Isso exige um treino especial, a capacitação da consciência. É preciso

educar-se, rever valores, crenças e conceitos, liberar certezas arraigadas, lidar e superar medos, aprofundar o autoconhecimento e transcender a raiva básica que nos move, encontrar um novo olhar que nos liberte da prisão da carência. Talvez isso lhe pareça muito trabalho, mas a alternativa é uma vida limitada, dolorosa, estressante e cansativa. Pense a respeito de qual alternativa você prefere.

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5 – TERRA À VISTA!!!

Wilson Z. Moura*

Noutro dia, uma estonteante lua cheia me inspirou a pensar sobre como eu poderia comparar o recheado e turbulento quadro que o Brasil vivencia. Meus pensamentos se multiplicavam e, quase que imediatamente, lembrei-me de alguns personagens super interessantes, já que a história mundial nos brinda com vários exemplos burlescos, dramáticos e reflexivos.

Não há como evitar uma comparação com os clássicos ‗Sonho de uma noite de verão‘, ‗Julio Cesar‘ e ‗Macbeth‘, do dramaturgo inglês William Shakespeare, transitando entre comédias e tragédias de uma forma embriagante. Lembrei do compositor inglês Henry Purcell, que no século 17 escreveu uma obra espetacular, a ópera barroca ‗Dido e Eneias‘, com um dos lamentos mais envolventes da história.

Já o século 19 nos ofereceu uma contribuição valiosa entre intrigas, batalhas políticas e lamentos. O romancista francês Auguste Masquet adorava escrever dramas heróicos como ‗Os Três Mosqueteiros‘ e o ‗Conde de Monte Cristo‘, recheados de traição e vinganças. Na Itália, o compositor Giuseppe Verdi introduzia várias óperas melodramáticas como ‗La Traviata‘ e ‗Aida‘. Na Alemanha, Richard Wagner compôs a magnífica ‗A cavalgada das Valquírias‘, utilizada como trilha sonora do filme ‗Apocalypse Now‘, 1979, uma das músicas mais densas de todos os tempos. Mas a crise no Brasil é tão extraordinária que eu não poderia esquecer da genial ‗Sinfonia nº. 9‘, do maestro alemão Ludwig Van Beethoven, com suas variações enfurecidas.

Numa retrospectiva mais recente, recordei-me do filme ‗O desespero de Veronika Voss‘, do alemão Rainer Fassbinder, exemplificando a ambiguidade da condição humana, que, imedia-tamente, me conectou com os ensaios pornográficos, angustiantes e deprimentes do

diretor italiano Pier Paolo Pasolini. Mas, você pode estar perguntando por que eu

resolvi escrever sobre esses caras. Por que esses gênios revelam a loucura da sociedade, o lado bizarro da vida. O cenário brasileiro do século XXI apresenta muitas semelhanças com os exemplos citados acima, submerso num mar de mediocridades. Os critérios de qualidade de vida no Brasil são medíocres, num panorama de muitas complicações e discrepâncias, onde os mosquitos, raposas e ratazanas se multiplicaram exponencialmente, sem qualquer controle ou governança.

Porém, esta tacanha circunstância pode e deve nos servir para exercitar algumas lições. Precisamos aprender a olhar para o próprio umbigo e identificar as oportunidades de melhoria, conscientes de que só temos poder sobre nós mesmos. Efetuar um exercício de cidadania, de identificação de aspectos de qualidade para o desenvolvimento inteligente de uma nação. E isso passa pela analogia consciente das características da ideologia e da cultura brasileira.

Ideologia é a resultante de três componentes: valores, intenções e crenças. Cultura é função direta da ideologia e comportamento, isto é, quando colocamos a ideologia em ação explícita. Portanto, aqui temos a nossa pedra filosofal, nosso precioso objeto de análise.

Nesse ponto, temos que investigar as qualificações da nossa cultura. Eu diria que nós, brasileiros, temos quatro características virtuosas: criatividade, comunicabilidade, alegria e compaixão. Somos alegres, comunicativos, criativos e compassivos. Atenção: compaixão não é sentir pena de alguém, como muitos pensam, mas sim desejar que os outros não sofram e que desenvolvam métodos de aprender com o sofrimento. É um conceito muito próximo

_______________ *Wilson Z Moura, 1958, é pesquisador, consultor e palestrante na área de Desenvolvimento Humano desde 2000, além

de especialista em empreendedorismo e comércio exterior. Possui 30 anos de vivência internacional, tendo atuado em mais de 25 países distribuídos entre as Américas do Norte e Sul, Europa e Ásia. Autor do livro ‗Fator Zen – Um Convite à Paz Interior‘. [email protected] http://fatorwzen.com.br/wilsonzmoura/

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da empatia, quando nos colocamos no lugar do outro, contudo devemos tomar o devido cuidado para não sofrer com o sofrimento alheio, uma forma de ação totalmente dispensável.

De outra forma, devemos analisar cuidadosamente o lado sombrio, as características ignorantes que nos imprimem o lodo da mediocridade. É fundamental frisar que o conceito de ignorância é totalmente diferente de inteligência: é a incapacidade de enxergar os fenômenos como realmente são, a negação do conhecimento, causa raiz de todo sofrimento.

Eis aqui a parte mais interessante, já que é o momento de encarar as emoções aflitivas, as ações que nos colocam nessa decadência geral e irrestrita, num pacote de confusão mental e inércia. Após apreciar com cautela, consegui apontar três complicações latentes: orgulho, irresponsabilidade (falta de compromisso) e inabilidade de transformar intenções em comportamentos.

O orgulho talvez seja o veneno mais difícil de ser analisado, devido ao fato de que existe uma ‗aura protetora‘ ao redor dele. Sim, dificilmente as pessoas o reconhecem como um veneno mental, ao contrário: é um tal de ―tenho orgulho disso/daquilo‖, ―tenho muito orgulho dele/dela‖, sem contar os hábitos da cultura popular como o infeliz verso ―Eu, sou brasileiro, com muito orgulho…..‖. É uma espécie de inimigo tentador, impiedoso e sabotador. Mas, por que o orgulho é um veneno? Por que faz com que alguém se considere superior aos outros, inflando sua condição. Exagera o estado do eu e a condição de vida, como se as coisas não fossem impermanentes. Quando o orgulho se manifesta, perdemos a capacidade de dialogar, aceitar opiniões, surgindo uma relação de irrespon-sabilidade e incompetência para olhar para si e reconhecer as próprias limitações: gera ciúme, inveja, arrogância, egocentrismo e prepotência. É uma erva daninha e, por mais que se tente extingui-la, ela encontra um jeitinho de brotar de novo. Sem dúvidas, é um dos venenos mais difíceis de serem reconhecidos, totalmente enraizado na sociedade brasileira, uma atitude absolutamente desnecessária. Além disso, o orgulho não possui qualquer espécie de relacionamento com a autoestima ou automotivação, ao contrário.

Um outro aspecto importante a ser esclarecido é a falta de compromisso, marcante característica brasileira. O verbo reclamar é um dos mais utilizados no dia a dia: é um tal de ‗culpar alguém‘ pelos problemas e se isentar da própria responsabilidade, dos deveres de cidadão.

Pouquíssimos são aqueles que leem os artigos mais importantes da Constituição federal, que procuram escolher os políticos menos nocivos, que assumem sua parte do bolo. Existem inúmeros exemplos como jogar bagas de cigarro e lixo no chão, enojar as praias, destruir monumentos e locais públicos, sem considerar a abstenção no exercício do sufrágio universal (direito de voto) de forma consciente: ―eu não vou votar em ninguém!‖. Como se outros não fossem votar em políticos medíocres e os mesmos não fossem assumir seus cargos; e quer queiramos ou não, nos representam nas instituições públicas. Um outro exemplo explícito é uma associação de falta de compromisso com cinismo ―Vamos combinar um encontro! Vá lá em casa! Me liga!‖. O objeto de análise aqui é que quem convida não marca a data, nunca liga e, muitas vezes, nem dá o endereço. Quem morou em países desenvolvidos entende bem esse sutil movimento. É uma demonstração evidente de ausência de engajamento, muito comum entre nós. Finalmente, eu não poderia deixar de citar um outro padrão nacional: reclamar somente quando algo acontece contra si mesmo. Sim, usualmente reclamamos quando a prefeitura não cuida da rua, quando alguém pisa no seu pé. Porém, raros são aqueles que abrem a boca para defender causas alheias; quando é com os outros, ignora-se. O próprio umbigo torna-se um estruturado e firme asilo contra a manifestação do discernimento e da consciência.

Hein, como é? Ah, entendi: nada é mais fácil do que ‗culpar os outros‘, certo? O povo brasileiro não é compromissado com a mudança, e isso não se atém as classes menos favorecidas. Ao contrário, os mais esclarecidos deveriam educar os menos capacitados, abrir um portal de diálogo. Portanto, a falta de compromisso também pode ser chamada de irresponsabilidade.

Finalmente, é fundamental refletir sobre a incapacidade de transformar intenções em comportamentos. Intenção é diferente de comportamento: intencionar é uma ação mental, enquanto que o comportamento se caracteriza por meio de ações físicas explícitas. Precisamos aprender a manifestar o querer, o desejo de mudança, de forma consciente e responsável. Esse é outro aspecto muito importante porque as pessoas falam em mudar, mas não mudam. A mudança só vem acompanhada de autoconhecimento, alicerçada por um desejo genuíno. Mas, como diria um ex-aluno, ―mudar dá trabalho, né, professor?‖.

Terra à vista! Aprender a saber, saber fazer e saber ser, precisamos.

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6 – COMENTÁRIOS AO ENSAIO “TEORIA DA SEMICULTURA” DE THEODOR W. ADORNO

Luciano Machado Tomaz*

I - O duplo caráter da cultura e a emergência da semiformação

Para Adorno, o problema da semiformação é extremamente complexo e exige um grande esforço teórico para que se possa vislumbrar sua gênese e as condições que tornaram possível a ascensão da semiformação à ―forma dominante da consciência atual‖ (Adorno, 1996, p.2 – tradução modificada). A Cultura, segundo Adorno, permanece sempre em um conflito entre o excessivo distanciamento em relação à realidade por um lado, e completa absorção na prática por outro. O equilíbrio ou mediania em relação a esse conflito é raro e, quando conseguido, tênue.

O primeiro dos extremos entre os quais a dinâmica cultural oscila é o da crescente espiritualização e idealização da cultura, representada de maneira mais veemente pela ―cultura do espírito‖ alemã. Nesse extremo, a cultura tende a tornar-se cada vez mais descolada da realidade, alheia ao mundo da práxis, ensimesmada, encastelada na metafísica. É essa cisão entre cultura e sociedade que torna a cultura inócua, incapaz de transformar o real. A formação torna-se assim, mero aparato erudito, acúmulo de um saber sem objeto. No limite, esse tipo de formação, que abstraí do real, degenera em semiformação, em mero adereço intelectual.

No outro extremo, há uma concepção de cultura, e de formação, que procura assimilar-se de maneira quase completa à práxis; à ―estruturação da vida real‖ (Adorno, 1996, p.3 – tradução modificada). Essa concepção se cristaliza no conceito de adaptação, e poda, de certa maneira, a possibilidade de elevação do homem através de sua capacidade especulativa,

aprisionando-o, desse modo, no que Adorno chama de ―mera história natural darwinista‖ (Adorno, 1996, p.4 – tradução modificada). Também esse extremo, no limite, converte-se em semiformação.

Tanto a hiperespiritualização quanto a submissão de tudo à ―sobrevivência do mais adaptado‖ darwinista caminham pari passu em direção à fetichização. A cultura do espírito tem, no entanto, uma característica que a torna condição de possibilidade para a própria crítica cultura e, consequentemente, para o entendimento dos conceitos de formação e semiformação. Esta característica é o distanciamento estabelecido em relação à práxis cotidiana, componente fundamental para uma compreensão abrangente do processo.

Quando, no entanto, a concepção idealizada do real vê-se frente a frente com os problemas da práxis cotidiana, só lhe resta buscar refúgio em uma ―pureza‖ da reflexão teórica, tornando-se ideologia. Ou, ao contrário, abrir mão de sua faculdade crítica e diluir-se no ideal de adaptação. Como diz Adorno:

Sem dúvida, na ideia de formação cultural necessariamente se postula a de uma humanidade sem status e sem exploração, e tão logo ela se deixa contaminar com isso e se imiscui nas práxis dos fins particulares dignificados como trabalho socialmente útil, ela comete sacrilégio a si mesma. Ela, no entanto, não se torna menos culpada por sua pureza, que se torna ideologia (1996, p.5 – tradução modificada).

Desse modo, a semiformação não é um

fenômeno enxertado na Cultura a partir de fora, mas sim que surge a partir da própria dinâmica da

____________ * Luciano Machado Tomaz possui graduação em Engenharia Eletrônica e de Telecomunicação pela Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais (2011) e Mestrado em Engenharia Elétrica pelo CEFFET-MG / UFSJ (2014). Atualmente cursa doutorado no Politecnico di Milano na área de telecomunicações. [email protected]

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Cultura e da formação cultural. Porém, na perspectiva de Adorno, também não é possível dizer que a semiformação esteja para a formação assim como, por exemplo, um jovem está para um homem maduro. Entre a semiformação e a formação, a diferença é substancial e não apenas de grau. Ou seja, ―a semiformação não é uma etapa construtiva rumo a uma formação plena, que faça jus ao princípio da cultura como promessa de liberdade para o ser humano, mas sim uma degradação sua‖ (Freitas, inédito, §1). Tanto a semiformação quanto a semicultura aparecem como simulacros que buscam ocupar o lugar da formação e da cultura, estas sim, substantivamente superiores. II - A universalidade da semiformação e o barateamento da cultura

Quando Adorno afirma, numa passagem já citada, que a semiformação se tornou em nosso tempo a ―forma dominante da consciência atual‖, é grande a tentação para acusá-lo de fazer, desse modo, uma generalização arbitrária que não condiz com o que se pode verificar na prática. Reconhecendo essa possibilidade e já antecipando a resposta a tal ressalva, Adorno diz:

"Tudo isso, certamente, é bastante ousado. Mas é próprio dos estudos teóricos que não coincidam imediatamente com os dados das pesquisas, que se exponham a isso, que avancem em excesso ou que — segundo a linguagem da pesquisa social — se inclinem para falsas generalizações [...]. Sem aquele ousado exagero da especulação, entretanto, sem o momento inevitável da falsidade na teoria, isso nunca teria se tornado possível: ela se contentaria a ser mera abreviatura de fatos, deixando-os inassimilados, aquém do científico (1996, p.9 – tradução modificada)".

Evidentemente, Adorno não acredita em uma

absoluta universalidade da semiformação como o modelo formativo de todo homem ocidental independentemente da sua classe, nacionalidade, instrução, etc. A universalidade da semiformação se dá de maneira diferente: mesmo não abarcando a totalidade da sociedade, a semiformação passou a ser o paradigma formativo do capitalismo tardio. Nas palavras de Adorno, essa universalidade diz respeito a ―um espírito que determinaria a marca da época mesmo se tivéssemos que restringir quantitativa e qualitativamente o âmbito de sua validade‖ (Adorno, 1996, p.10 – tradução modificada). Trata-se, portanto, de uma universalização metodológica que não pode ser entendida como a afirmação de que a formação foi extinta e que agora a semiformação é a única realidade possível.

Uma outra ressalva que poderia ser feita às teses de ―Teoria da Semicultura‖ é a de que o

autor critica a divulgação em massa dos bens culturais (música erudita no rádio, livros de filosofia em edições de bolso, a ciência em revistas de curiosidades, etc.) por um viés elitista, negando o caráter democratizante dessa divulgação. Primeiramente, Adorno refuta essa ideia negando o dito caráter democrático da divulgação em massa e classificando-a como ―uma ideologia comercial pseudodemocrática‖ (Adorno, 1996, p.18 – tradução modificada). A ideia é a de que por trás dessa ―democratização‖, os bens culturais são amputados de maneira substancial. O barateamento da cultura degenera a cultura. Os bens culturais já não têm mais valor por si mesmos, mas são cuidadosamente adaptados ao ―consumidor‖. O caráter de mercadoria assumido pela cultura, sua transformação em fetiche, exaure-a de substância. A semicultura é isto: a cultura ―apropriada pela metade‖, que, quando absorvida subjetivamente como semiformação, acaba por bloquear o acesso à cultura em seu sentido pleno. Por isso a crítica de Adorno é apenas aparentemente elitista, porque o que ela busca é justamente mostrar que a dita democracia no acesso à cultura não só não corresponde a um fenômeno que se possa chamar verdadeiramente de democrático, mas também oferece, no lugar de uma cultura e formação propriamente ditas, apenas pedaços vazios e deformados destas. Não se trata, porém, de um sentimento nostálgico em relação a um passado idealizado no qual a Cultura tenha florescido em todo o seu esplendor. Para o Adorno o fundamental é que o pensamento não se acomode à pseudodemocratização e esforce-se por compreender também o caráter regressivo que o fenômeno comporta.

III - O mecanismo narcísico e psicótico da

semiformação Adorno identifica na dinâmica da

semiformação a estrutura de um narcisismo coletivo. O indivíduo, diante de sua impotência em relação à participação no mecanismo de criação da Cultura, contenta-se em absorver certos vestígios dos bens culturais e colocá-los no lugar que deveria ser ocupado por aquela. Esse processo funciona pela identificação que gera entre os indivíduos que partilham da semicultura, criando um vínculo através do pertencimento a grupos específicos. A ―cultura‖ absorvida pelo sujeito a partir do processo de semiformação adquire uma forma cristalizada e regressiva que inviabiliza a crítica acerca de tal conteúdo. Ela aparece de maneira supervalorizada e idealizada, característica do narcisismo

1.

_____________ 1 No texto ―Sobre o narcisismo: uma introdução‖, Freud diz: ―O

narcisismo do indivíduo surge deslocado em direção a esse novo ego ideal, o qual, como o ego infantil, se acha possuído de toda perfeição de valor‖ (Freud, 1914, p.100).

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Dispensados de sua parte na construção da Cultura, os indivíduos passam a usar o simulacro que é a semicultura como signo de vinculação a grupos. Como é, por natureza, esvaziada de substância, a semicultura compensa esse vazio através da glamourização excessiva, uma espécie de pirotecnia que busca, com suas luzes ofuscantes, tornar invisível a sua face usurpadora. A cultura, que envolvia uma concepção do mundo na qual o indivíduo se integrava e na história da qual participava de maneira ativa, é substituída, enfim, por alguns ritos esvaziados de seu significado, pelo pertencimento a instituições já caducas e pela força agregadora do grupo. Ao mesmo tempo em que ―o semiculto dedica-se à conservação de si mesmo sem si mesmo‖ (Adorno, 1996, p.25 – tradução modificada), ele também tem a satisfação narcísica de identificar no outro aquele mesmo ideal (os ritos esvaziados, etc.) seu.

Adorno chama também a atenção para o caráter psicótico da dinâmica da semicultura. Para ele, esse caráter é dado pelo fato de a semicultura assumir sempre uma postura defensiva que busca ao máximo ensimesmar-se e evitar o contraditório, realimentando-se de seus próprios esquemas.

Acerca dos últimos pontos expostos, vale à pena comentar um trecho de um texto de Freud, escrito em 1921, ―Psicologia de grupo e a análise do Ego‖, no qual ele diz que um grupo "não possui faculdade crítica e o improvável não existe para ele. Pensa por imagens, que se chamam umas às outras por associação [...], e cuja concordância com a realidade jamais é conferida por qualquer órgão razoável. Os sentimentos de um grupo são sempre muito simples e exagerados, de maneira que não conhece dúvida nem a incerteza. [...].

Inclinado como é a todos os extremos, um grupo só pode ser excitado por um estímulo excessivo. Quem quer que deseje produzir efeito sobre ele, não necessita de nenhuma ordem lógica em seus argumentos; deve pintar nas cores mais fortes, deve exagerar e repetir a mesma coisa diversas vezes" (FREUD, 1921, p.88-89).

Ora, o que Adorno diz não é outra coisa senão que a indústria cultural, em sua ânsia de abarcar a todos, utiliza o mesmo mecanismo que Freud já dizia que deve ser utilizado para produzir efeito sobre um grupo, a saber: as cores fortes, o

exagero e a repetição. É disso que se trata quando se coloca uma repetição de palavras para facilitar a memorização dos temas principais de sinfonias famosas, ou quando, em um filme, cada cena concentra o máximo de estímulo para um determinado sentimento; tudo na semicultura é saturado a tal ponto que sua exposição não comporta sequer a dimensão da leitura do indivíduo. Tudo ali já está dado, lido e visto. Tal saturação não é gratuita, mas faz-se necessária, na medida em que é a única forma que a semicultura tem para esconder sua substancial fragilidade.

O semiculto, além de tornar-se completamente dependente do fato de pertencer ao grupo, também dedica um grande ódio a qualquer um que ouse criticar o registro formativo no qual ele se insere ou que mostre possuir a Cultura da qual ele só conhece o simulacro. Nessa perspectiva, o semiculto é, também, um ressentido, que se imiscui na turba com o objetivo de, em maior número, vencer àquilo que não poderia subjugar sozinho, a saber, a Cultura e o indivíduo verdadeiramente culto. O gozo narcísico de pertencimento ao grupo exime o indivíduo do confronto com o real, retira-lhe a capacidade crítica. Um processo que Adorno caracteriza como semelhante à estrutura psicótica.

REFERÊNCIAS ADORNO, Theodor W. ―Teoria da Semicultura‖. Tradução de Newton Ramos-de-Oliveira, Bruno Pucci e Cláudia B. M. de Abreu. Revista ―Educação e Sociedade‖ n. 56, ano XVII, dezembro de 1996, pág. 388-411. Tradução revista por Verlaine Freitas, inédita. FREITAS, Verlaine. "A dialética negativa da cultura". Inédito. FREUD, Sigmund. ―Psicologia de grupo e análise do Ego‖, 1921. In: Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. 18, 2006. FREUD, Sigmund. ―Sobre o narcisismo: uma introdução‖, 1914. In: Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. 14, 2006.

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7 – BAMBU, UM SÍMBOLO DE ASSOCIAÇÃO E O SAGRADO DIREITO DE BENDIZER

Apresentação durante o Encontro Anual do CIT - Colégio Internacional dos Terapeutas/2017, DO CAOS AO COSMO, ocorrido no Instituto Renascer da

Consciência, Ravena - MG, abril de 2017.

Acely Gonçalves Hovelacque*

http://freehdswallpapers.blogspot.com.br/2015/08/bamboo-desktop-wallpaper.html

Eu desejo ao CIT, ao Instituto Renascer e cada um de nós que, como o bambu, possamos estar ancorados em profundas raízes. Que para tal recordemos de nossa

história, dos nossos ancestrais e de todo o caminho trilhado pela espécie humana.

A existência não começou agora, não estamos sós ou desamparados e sim nutridos pelas raízes que nos trouxeram até este momento.

Lembremos dos que inspiraram e trabalharam pelo CIT e pelo Renascer e investiram seu tempo e vida, e que seguem oferecendo apoio através da memória do que construíram.

Que respeitemos e utilizemos os conhecimentos do caminho percorrido, com seus erros e acertos.

_______________ *Acely Gonçalves Hovelacque é médica (UFMG), com especialização em Clínica Médica, Homeopatia, Antroposofia e FAO. Fundou, com uma equipe transdisciplinar, o Centro de Incentivo à Saúde – ProCurar-Se, com uma orientação voltada para a visão holística do Ser Humano. Idealizou e coordena os Jardins de Buda da Medicina, Mendja, um espaço dedicado à conexão com a presença, com a bem-aventurança, a criatividade e ao conceito de Saúde integral. Membro do Colégio Internacional de Terapeutas de Alexandria - CIT, contadora de histórias, co-autora do jogo terapêutico Tui, a Arte de Amar, autora de livros. Atua como clínica, facilitadora e palestrante em vários cursos, seminários e congressos. [email protected] www.mendja.com.br

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Eu desejo que como o bambu nós sejamos ocos. Que tenhamos espaço para receber, para ouvir, para o silêncio, para a pausa, para aprender e crescer. E que o vazio, seja sustentado como no bambu, pelos nós que a vida traz a cada ciclo. Nós temporários, nem por isto às vezes menos dolorosos, que as mudanças, as perdas e as dores da

impermanência oferecem. Que sigamos fortalecidos por nossos nós.

Eu desejo a flexibilidade do bambu e a alegria de dançar com as brisas nas noites de luar, nos dias ensolarados e na gratidão de estar vivo aqui e agora. Lembrando que o único tempo que existe é aqui e agora, e que nele estamos co-criando o futuro neste

exato momento. Não o percamos!

Eu desejo a resiliência do bambu, que nós possamos nos dobrar às tempestades e até às nevascas, salvando o essencial.

Eu desejo que associemos e nos conectemos a uma generosa touceira, símbolo da

união e da sabedoria dos revezamentos. Na força do grupo aprendemos a proteger os indivíduos durante as tempestades ou organizamos o revezamento para as etapas de cada um. Ninguém permanecerá no alto ou crescendo sempre. Todos enfrentaremos

nós e nesta hora estar associado como os bambus, faz toda a diferença.

Nesta época em que estamos obviamente associados, conectados em redes abertas, velozes e interdependentes, que estejamos nas redes que somam as afinidades e

multiplicam as diferenças, e não em redes que aprisionam.

Eu desejo que como bambu nós cresçamos para o alto e para tal tenhamos poucos galhos. Liberemos o que não é essencial, as mágoas, as ilusões... Peçamos ajuda, nos

cuidemos, procuremos nossos mestres e sábios, mudemos a medida da realidade, ampliemos a janela que olha a vida e cresçamos. Que encontremos autonomia, de quem

sabe fazer parte do todo e nele interfere.

Por fim, eu desejo, que nós encontremos a bem-aventurança, que dá sentido à vida. Descubramos a felicidade genuína que é o que cada um veio trazer ao mundo, além é

claro de viver.

Que cada um conecte-se a si mesmo, conheça-se. E que por um momento possamos não atender aos milhões de demandas e à mente turbulenta de pensamentos. Que cada

um foque na própria presença e comece a descobrir o seu norte e a sua bem-aventurança. E como o bambu busca o alto, acertemos a rota de nossos dias para

nossas reais escolhas.

E assim..., NOS BENDIGO.

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8 – DIÁLOGOS ENTRE O MODERNISMO BRASILEIRO E AS LITERATURAS AFRICANAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Lívia Maria Costa Sousa*

Resumo: Este ensaio propõe revisitar e repensar a historiográfica canônica do Modernismo brasileiro e perceber a forma como este modernismo dialogou e se relacionou com as literaturas africanas de língua portuguesa em contexto de independência nacional e descolonização cultural. Palavras-chave: Modernismo brasileiro. Literaturas africanas. Literaturas brasileiras. Abstract: This essay has the objective to revisit and rethink canonical historiographic of Brazilian modernism and realize the way this modernism has dialogued and related to the African Literatures of Portuguese language on the context of national independence and cultural decolonization. Keywords: Brazilian modernism. African literatures. Brazilian Literatures.

“Até que os leões tenham as suas histórias, os contos de caça glorificarão sempre o caçador”.

Provérbio africano)

* Lívia Maria Costa Sousa – Mestranda do curso de Pós-graduação em Literatura e Cultura (UFBA).

[email protected]

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1 (RE) VISITANDO O (S) MODERNISMO (S) BRASILEIRO (S)

Conforme a historiografia canônica acerca do

Modernismo brasileiro, esse movimento iniciou-se em São Paulo com a famigerada Semana de Arte Moderna, em 1922, e foi se alastrando pelo resto do país. Tendo como objetivo principal superar a literatura na época cristalizada − composta por reminiscências de naturalismo, parnasianismo e simbolismo −, a designação Modernismo, em literatura, abarca três elementos muito interligados: um movimento, uma estética e um período. No que tange à teoria estética, que não é bem claramente marcada, tampouco unificada, a proposta era uma renovação, desenvolvendo novas reflexões acerca do conceito de literatura e de escritor.

Em todas as narrativas que envolvem o modernismo, vinculam-se de maneira muito estreita as transformações políticas, econômicas e sociais que repercutiram significativamente. A relação, por exemplo, do ano de 1922 como marco simbólico do Brasil moderno, pois que coincidiu com o Centenário da Independência brasileira, é amplamente repetida. A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) também deixou sua marca no que tange à economia, tal como nas culturas e nas relações políticas, perpassando assim as questões de arte e educação (CANDIDO, 1997). Além das transformações literárias que emergem em 1922, eclodem revoltas e levantes políticos-militares que acabariam por triunfar com a Revolução de Outubro de 1930; funda-se, inclusive, o Partido Comunista Brasileiro, de extrema relevância para a política das massas, que ―se esboçava e que avultaria cada vez mais‖

1. A crise econômica

mundial de 1930, que golpeou a oligarquia vigente, alicerçada numa economia rural, abalou o produto base de exportação: o café, ensejando outros ares de incentivo à mudança.

A arte e a literatura modernas – antes postas à margem e consideradas capricho de alguns iconoclastas irresponsáveis – são agora reconhecidas como expressão legítima de nossa sensibilidade e da nossa mentalidade; ocorre uma intensa radicalização política, tanto para a esquerda quanto para a direita; e a comoção das velhas estruturas sociais favorece o desejo de descrever e esquadrinhar a realidade social e espiritual do país (CANDIDO; CASTELLO, 1997, p.11).

Entende-se, nesse sentido, modernismo por

ruptura com as literaturas do primeiro vintênio, sendo uma crítica às estruturas mentais das ______________________ 1CANDIDO; CASTELLO, Antonio e José Aderaldo. Modernismo: história e antologia. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997, pp.9-10.

gerações antigas, além de um desejo de aprofundar-se nas idiossincrasias brasileiras, subvertendo uma linguagem designada ―culta‖ e dando ensejo às marcas de oralidade e linguajar popular do brasileiro.

Quando se pensa em Semana de Arte Moderna e Modernismo dentro de uma leitura canônica, considera-se resumidamente o eixo Rio─São Paulo, em apenas algumas correntes estéticas e determinados nomes. Essa tendência pode ser detectada em muitas obras que propõem uma historiografia literária, como se pode identificar, inclusive, em Bosi (2003, p. 382):

A Semana foi, ao mesmo tempo, o ponto de encontro das várias tendências modernas que desde a I Guerra se vinham firmando em São Paulo e no Rio, e a plataforma que permitiu a consolidação dos grupos, a publicação de livros, revistas e manifestos, numa palavra, o seu desdobrar-se em viva realidade cultural (BOSI, 2003, p.383).

Embora o cânone modernista ainda exerça

preponderante atenção, revisitá-lo criticamente, no intuito de alcançar ―outros modernismos‖, a partir de uma desconstrução da historiografia oficial, é fomentar o sentido de heterogeneidade, de pluralidade e dar voz àquilo que foi recalcado. A proposta crítica é justamente submeter essas leituras canônicas do Modernismo a uma reelaboração, de modo a refletir acerca dos aspectos inacabados e inconclusos da história cristalizada. A tentativa, nesse sentido, de uma re-leitura não é a mera repetição do que foi feito, produzido, mas repensar essa produção e as suas eleições no tempo da posteridade, é ―tensionar o cânone proposto pela historiografia literária, é, no contemporâneo, voltar-se para o passado para compreender aquilo que sofreu recalcamento, é reelaborar a modernidade‖

2. O

conceito de modernismo a partir de uma unidade, exclusividade e harmonia estética e histórica é um modelo subvertido pela desconstrução

(DERRIDA, 2007), cujo entendimento da história se reflete por rupturas, descontinuidades e denúncias aos valores centrados que silenciaram outros valores e significações, pois

(...) é a desconstrução de uma historiografia cujo modelo teleológico exibe critérios de ruptura e evolução nas artes e na cultura. Essa posição possibilita reverter o que foi registrado como modernista, homologado pelos manuais escolares, pela historiografia oficial e pelos inúmeros estudos acadêmicos centrados na consolidação de determinados nomes e correntes estéticas. Como consequência desse debate, o conceito de moderno continua ainda sujeito a

2

Registros colhidos durante o minicurso ―Modernidade toda prosa‖ ministrado pelas professoras Eneida de Souza e Marília Cardoso, na Universidade Federal da Bahia, em 2015.

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interpretações, revisões e equívocos. No ato festivo das comemorações, é comum a realização de balanços que ressaltem o valor do movimento e suas qualidades, no lugar de rever as falhas e vazios e projetos (SOUZA; CARDOSO, 2014, p. 27).

O que, por exemplo, as autoras propõem ao sugerir uma revisão do Modernismo é analisar o porquê e as razões pelas quais certas omissões e exclusões são efetivadas, sem necessariamente querer reivindicar a integração dos autores excluídos do cânone, tampouco propor um ―discurso de ressentimento‖ (SOUZA; CARDOSO, 2014, p. 26).

As reflexões suscitadas pela contempo-raneidade se imiscuem com a teoria pós-estruturalista ─ pensando-se aqui no conceito de desconstrução e descentramento derridiano e reversão deleuziana ─, uma vez que se busca romper com pretensos essencialismos e universalismos dicotômicos da metafísica ocidental, em que centros fixos são eleitos e enraizados, limitando, assim, o jogo das significações. De modo símile, a multiplicidade imersa no simulacro deleuziano é produzida a partir de uma cadeia imensa de relações (ou rizomas) em que a diferença se forma, mas a hierarquização não é mais admitida. É nesse sentido que emerge uma tendência a se repensar e rearticular as contradições e complexidades em torno da modernidade e modernismo, rompendo com os valores tradicionais, imóveis, unívocos e repetitivos.

2 UMA PONTE QUE CRUZA O ATLÂNTICO: RE-LEITURAS AFRICANAS DA (S) LITERATURA (S) MODERNISTA (S) BRASILEIRA (S)

Quando nos propomos a revisitar o (s) modernismo (s) brasileiro (s), podemos também refletir acerca dos sentidos e apreensões que essa concepção canônica do modernismo promoveu em países com o projeto símile de independência nacional e descolonização cultural, promovendo assim diálogos e perspectivas comuns existentes entre o Brasil e os países africanos de língua portuguesa que, ao longo das discussões que envolvem o tema, pouco se põem em xeque. Repensar a nuance desse modernismo brasileiro, refletindo acerca de seu alcance no projeto de modernização de outros países com cenários políticos diferentes, é também uma proposta de revisitá-lo, remodelá-lo num contexto que não lhe é próprio, sendo forjado em perspectivas semelhantes, mas insólitas, como houve nos Cinco3 de língua portuguesa. É refletir ainda de que modo os ideários canônicos modernistas mobilizaram as

3 Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e

São Tomé e Príncipe.

literaturas africanas de L.P., promovendo outros cânones e outros sentidos de modelos teleológicos, ora tendendo a ser desconstruídos.

A necessidade de uma criação artística que transgredisse as marcas literárias de feição europeia, rompendo com as normas e promovendo uma experimentação na utilização da língua portuguesa, dando-lhe tessitura nacional, foi um dos vários pontos em comum que fomentou uma leva de escritores africanos de língua portuguesa a voltar-se para a irreverência do Modernismo brasileiro.

A tentativa é, nesse sentido, de distender as formas de expressão sacralizadas pelo ideário colonialista, tensionando a língua do colonizador para transformá-la em expressão de novas cosmogonias culturais. Ademais, o interesse em ―trazer para perto‖ o Modernismo brasileiro foi, para os países africanos de língua portuguesa, uma identificação estética, porém, sobretudo, ideológica, uma vez que ―(...) esteve ligada a uma conscientização político-social. Tratava-se nesses países, como ocorrera no Brasil, de prestigiar um nível de fala de identificação nacional‖ (ABDALA JÚNIOR, 1989, p. 73).

Se a presença de Manuel Bandeira e de outros poetas modernistas é visível, por exemplo, na literatura de Cabo Verde e se, na literatura angolana, os regionalistas brasileiros expandem a busca da identidade literária, tal esforço corrobora para a produção de uma literatura que, semelhante à dos modernistas brasileiros, transgredisse as normas fixadas pelos modelos literários que não se adequavam ao amadurecimento da identidade nacional, no Brasil, e ao processo de conscientização política. O movimento literário angolano,

(...) em 1948, lançou o brado ―Vamos descobrir Angola‖, procurava repetir o que acontecera no Brasil, literariamente falando, em 1922. O fato de o salazarismo haver censurado, em Portugal, obras de escritores brasileiros, como Jorge Amado e Graciliano Ramos, aguçava, em África, o interesse pela literatura que aqui se fazia (FONSECA, 2008, p. 58).

Muitos estudiosos de África apontam a

importância de ficcionistas e poetas brasileiros na efetivação dos projetos literários que se desenvolviam na África de língua portuguesa. A literatura brasileira fomentou um contexto de contestação que alcançou aquela geração africana em luta para a conquista da liberdade. O movimento que viria ser, em 1948, o ―Vamos descobrir Angola‖ foi uma proposta muito próxima ao que foi a Semana de 22 no Brasil, em São Paulo, e isso foi nitidamente proposital, conforme o supracitado. Na revista cabo-verdiana Claridade, inaugurada em 1936, em seus primeiros números percebe-se a forte ponte literária entre Brasil e Cabo verde, quando, por

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exemplo, apresenta algumas leituras diferentes de ―Evocação de Recife‖ e ―Vou-me embora para Pasárgada‖, de Manuel Bandeira. Para se ter ideia, o poema foi ―relido‖ quatro vezes em diferentes poemas só pelo cabo-verdiano Osvaldo Alcântara, nos poemas: ―Balada dos companheiros para Pasárgada‖, ―Dos humildes é o reino de Pasárgada‖, ―Evangelho segundo a Pasárgada‖ e ―Passaporte para Pasárgada‖ (FONSECA, 2008, p. 57).

No poema Carta para Manuel Bandeira, o também poeta cabo-verdiano Jorge Barbosa assume a interdição de Manuel Bandeira no seu fazer literário e declara o existente elo entre ele e o poeta brasileiro, quando escreve:

Carta para Manuel Bandeira

Nunca li nenhum dos teus livros.

Já li apenas a Estrela da Manhã e alguns outros poemas

teus (...)

Aqui onde estou, no outro lado do mesmo mar, tu me preocupas, Manuel Bandeira,

meu irmão atlântico (BARBOSA, 1956, p.55-56).

Do mesmo modo, o poeta angolano Maurício

Gomes, em referência aos aspectos ideológicos e estéticos propostos pelo Modernismo brasileiro, escreve versos entusiásticos para a construção da identidade angolana, como se vê no poema ―Exortação‖:

Ribeiro Couto e Manuel Bandeira,

poetas do Brasil, do Brasil, nosso irmão,

disseram: “ – É preciso criar a poesia brasileira,

de versos quentes, fortes, como o Brasil, sem macaquear a literatura lusíada”.

Angola grita pela minha voz, Pedindo a seus filhos nova poesia!

Deixemos moldes arcaicos, ponhamos de lado,

corajosamente, suaves endeixas brandas queixas

e cantemos a nossa terra e toda a sua beleza

(SANTILLI, 1985, p. 29).

O diálogo e a contribuição dos escritores modernistas brasileiros são bastante confessados, porém a transgressão operada por cada país de língua portuguesa africana sempre foi marcada por recursos que envolvem cada idiossincrasia local, de modo a evocar e marcar assumidamente as singularidades de cada cultura, rompendo potencialmente com os padrões europeus, sobretudo com Portugal. O Modernismo e a Semana de 22, nesse sentido, fomentaram e entusiasmaram uma atmosfera de

luta pela independência a partir do cenário brasileiro, cuja proposta de contravenção e renovação muito embeveceu os militantes do processo de independência na África desde meados de 1950 até 1976, quando as guerras pela independência ―cessaram‖, conforme nos esclarece Maria Nazareth Fonseca:

O impulso à atividade criadora e à descoberta de novos caminhos procura então transgredir a tradição literária de feição europeia. O projeto de ruptura das normas e a experimentação de novos recursos de escrita acentuaram-se com elementos levados à África pelos textos dos escritores modernistas brasileiros, ainda que outros ecos vindos de épocas anteriores, também se pudessem ouvir nessa ―fase clandestina‖ da ―expressão poética escrita em português‖, conforme acentua Fernando da Costa Andrade. A literatura brasileira viria engrossar o coro de vozes discordantes que insuflam a busca da palavra transgressora que já habitava os versos negristas do cubano Nicolas Guillén, do norte-americano Lagston Hughes e transparecia no brado do martinicano Aime Césaire. A literatura africana reforça as vozes que contestam os valores defendidos pela tradição literária de feição colonialista... (FONSECA, 2008, p. 58).

Várias outras referências brasileiras foram

incorporadas no projeto africano de buscar novos rumos literários. A presença de escritores brasileiros como Manuel Bandeira, Oswald de Andrade, Jorge de Lima, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Guimarães Rosa, só para citar alguns, foi vista com bastante identificação por escritores de países africanos de língua portuguesa. Poetas de Cabo Verde, Moçambique e Angola, por exemplo, retomaram e releram poemas famosos como ―No meio caminho tinha uma pedra‖. O poeta angolano João Maimona, ao ansiar por novas experiências e caminhos de escrita, sobretudo em um período de pós-independência, dedica o título de sua poesia a Drummond – ―Poema para Carlos Drummond de Andrade‖ – cuja epígrafe traz o verso ―no meio do caminho tinha uma pedra‖, com o possível intuito de pensar os novos caminhos e percalços dos poetas angolanos em períodos de pós-guerra, quando as dificuldades ainda persistiam: ―fechastes os teus dois olhos/ aos ombros do corpo do caminho/ e apenas viste uma pedra/ no meio do caminho/ no caminho doloroso das coisas‖.

No que se refere a Guimarães Rosa, a relação é ainda mais fluida. Famoso pelo experimentalismo e manuseio com as potencialidades da língua, inovando efusivamente os léxicos e utilizando ―cada palavra como se ela tivesse acabado de nascer, limpando-a das

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impurezas da linguagem cotidiana‖ (FONSECA, 2008, p. 61), Guimarães Rosa é muito referenciado pelos escritores africanos. O escritor angolano Luandino Vieira, por exemplo, embora a sua transgressão na linguagem tivesse sido operada antes do acesso à literatura rosiana, confessa-se leitor e aprendiz de Guimarães, dando total liberdade à linguagem e promovendo um próprio instrumento linguístico.

Guimarães Rosa é, sem dúvida, para Luandino Vieira, o mestre da experi-mentação, da reinvenção da língua portuguesa. E, como o escritor angolano declara, a ultrapassagem rosiana serviu-lhe para mostrar que era possível transgredir os padrões literários que vigoravam até então nas ex-colônias portuguesas em África. Recebida em espaços de tensão em que tudo se faz político, a literatura rosiana ganha, assim, outros contornos, nos quais a invenção torna-se também arma de combate (FONSECA, 2008, p. 62).

De modo parecido, o escritor moçambicano

contemporâneo Mia Couto, em muitas entrevistas, ensaios, declarações públicas etc., revela abertamente a intervenção ficcional desse escritor brasileiro em suas narrativas. Em um de seus contos mais famosos, ―Nas águas do tempo‖, há confessadamente um diálogo direto com o conto rosiano ―A terceira margem do rio‖, em que a relação entre as personagens se apresentam de forma muito parecida, embora possuam cosmogonias próprias – este brasileiro enquanto aquele moçambicano. O experimentalismo na linguagem, as brincriações, as marcas de oralidade e coloquialidade, a poesia na encruzilhada da prosa, os ditos e provérbios populares, os espaços híbridos, são alguns dos elementos que são muito comuns em Guimarães e que se pode identificar com muita frequência em textos tanto de Luandino quanto de Mia Couto e em alguns outros escritores africanos na tentativa de promover uma tensão radical na escrita, feita como forma política. Muitos pesquisadores promoverão uma leitura comparada dessas literaturas, percebendo em textos africanos criações que nos remetem a Rosa, mas de maneira relida, reconfigurada, um simulacro com possibilidades circulares. Na palavra de Maria Nazareth (2008, p.63), ―ao se ler um texto de Luandino ou Mia Couto, ouvem-se as criações próprias de Guimarães Rosa e um sotaque que já não é o dele, sem deixar de o ser...‖. É nesse sentido que se desenvolvem outras modulações do ―falainventar‖ a língua portuguesa, sendo marcadas por hibridismos culturais de cada contexto, em que bifurcações e encruzilhadas são feitas entre aquilo que foi imposto pela metrópole e o que é realmente falado, marcando tanto as identidades de cada cosmovisão que se pode ora chamar de

português africano ou moçambicano, angolano, etc., assim como já chamamos de português do Brasil.

3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS

Destarte, consideramos que ao repensar o

Modernismo, deve-se, inclusive, rever seus alcances, as nuances de suas fórmulas, que outros ―modernismos‖ ajudaram a traçar, que cânones permearam e entusiasmaram outros territórios, enfim, uma rede de rupturas e continuidades que envolveram ideologicamente aquele contexto.

Portanto, a literatura brasileira, sobretudo no contexto do Modernismo brasileiro, incitou a potencialização das literaturas africanas com novas tendências e rebeldias, com manejo insólito para com a língua portuguesa, dando-lhe feitio próprio; já na produção literária, há a forte preocupação com a causa nacional, com a narrativa da terra, demarcando as fronteiras, de modo a subverter a história canonizada contada pelo outro, o colonizador, como se pode atestar, por exemplo, na metáfora de um famoso provérbio africano: ―até que os leões tenham as suas histórias, os contos de caça glorificarão sempre o caçador‖.

Em tempos atuais, ainda é possível encontrar, recorrendo aos mais recentes escritores africanos, vestígios e ecos da literatura brasileira. Em Mia Couto, por exemplo, conforme o próprio ratifica em entrevistas, o forte diálogo e união pela língua com os escritores brasileiros não se dá somente em Oswald, Guimarães, Drummond ou Jorge Amado, mas, na contemporaneidade, com a singularidade poética de Manoel de Barros, que encanta profundamente o autor moçambicano.

Em 2003, Mia Couto veiculou pelas mídias sociais uma poesia que muito remete às marcas deixadas em África pelos escritores brasileiros, utilizando a pessoa de Manoel de Barros, e é assim que encerro esse ―pensatempo‖:

UM ABRAÇO PARA MANOEL

Dizem que entre nós

há oceanos e terras com peso de distância. Talvez. Quem sabe de certezas não é o

poeta. O mundo que é nosso

é sempre tão pequeno e tão infindo que só cabe em olhar de menino.

Contra essa distância

tu me deste uma sabedora desgeografia e engravidando palavra africana

tornei-me tão vizinho que ganhei intimidades

com a barriga do teu chão brasileiro.

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E é sempre o mesmo chão, a mesma poeira nos versos,

a mesma peneira separando os grãos, a mesma infância nos devolvendo a palavra

a mesma palavra devolvendo a infância.

E assim, sem lonjura,

na mesma água riscaremos a palavra

que incendeia a nuvem. (COUTO, 2013)

REFERÊNCIAS

AGAZZI, Giselle L. Relações entre os países africanos de língua portuguesa e o Brasil na formação das literaturas nacionais. Revista Matter, São Paulo, vol. 1, nº 7, 5-6, 2011.

CANDIDO; CASTELLO, Antonio e José Aderaldo. Modernismo: história e antologia. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. DERRIDA, Jacques. A escritura e a diferença. Trad. Maria B. N. e Silva. São Paulo: Perspectiva, 1971. FOCAULT, Michel. Em Defesa da Sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). São Paulo: Martins Fontes, 2005. FONSECA, Maria Nazareth Soares. Literaturas africanas de língua portuguesa: percursos da memória e outros trânsitos. Belo Horizonte:Veredas e cenários, 2008. MATOS, Gramiro de. Influências da literatura brasileira nas literaturas africanas de língua portuguesa. Salvador: EGBA: 1992. SANTILLI, Maria Aparecida. Africanidades. São Paulo: Ática, 1986. SOUZA, Eneida Maria de; CARDOSO, Marília Rothier. Modernidade toda prosa. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2014.

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9 – EL MENSAJE DE JESÚS COMO TERAPIA

Román Gonzalvo*

Introducción

¿Es legítimo relacionar el mensaje de Jesús con el proceso de la psicoterapia de hoy en día? Esta pregunta en tiempos de Jesús, no tendría sentido, porque la concepción del ser humano era mucho más holística de lo que la concebimos hoy. En sus tiempos, una persona era una unidad compuesta de cuerpo, mente y espíritu. Y por tanto el tratamiento y sanación de un elemento, iba relacionado con la recuperación del otro.

Hoy en día no es así, ya que bajo el paradigma científico actual, la mente y el cuerpo se entienden bastante diferenciados, así como la parte espiritual es ignorada completamente.

Tradicionalmente entendida la medicina como la disciplina encargada de tratar y sanar el cuerpo, y la psicología dedicada al tratamiento (sanación) de la mente, es curioso observar cómo el significado etimológico de la palabra psicología, significa estudio del alma humana [del griego ψυχή, psyché (RAE, 2012)], y el de terapia [del griego θεραπεία] significa tratamiento o sanación. Así pues la definición original del término psicoterapia resulta: la sanación del alma humana. Precisamente aquello que hacía Jesús, entendido desde la perspectiva del Jesús Histórico (Meier, 2000).

Un hombre des-egoizado

Desde la psicología transpersonal (la

psicología que estudia los estados de consciencia que transcienden el propio ego) se entiende que Jesús vivió en un estadio de consciencia superior,

en unión con la dimensión transcendente de la existencia, y en comunión con todas las personas, especialmente con aquellas que más sufren. Es decir, cada vez que hablaba y actuaba, no lo hacía desde su consciencia egoica, sino desde una consciencia universal (Martínez Lozano, 2010).

La principal característica que le define es la des-identificación con su ego, al enseñar y actuar coherentemente siempre en pro del bien ajeno, en armonía con su constante mensaje de amor al prójimo, entendiendo que el-otro-eres-tú. Pruebas de ello lo tenemos en los siguientes dichos: ―El que quiera salvar su vida, la perderá, pero el

que niegue su vida (…) la salvará‖. (Mc 8,35)

―Habéis oído que se dijo: Ojo por ojo y diente por diente. Pero yo os digo que no hagáis frente al

que os hace mal; al contrario, a quien te abofetea en la mejilla derecha, preséntale también la otra

(…)‖. (Mt 5, 38-39)

―Habéis oído que se dijo: Ama a tu prójimo y odia a tu enemigo. Pero yo os digo: Amad a vuestros enemigos y orad por los que os persiguen (…)‖.

(Mt 5, 43-44)

―(…) El que quiera ser grande entre vosotros, que sea vuestro servidor; y el que quiera ser el prime-ro entre vosotros, que sea esclavo de todos (…)‖.

(Mc 10, 43-44)

_______________ * Román Gonzalvo – Psicólogo transpersonal y doctor en psicología por la Universidad Autónoma de Madrid. Autor de diversas publicaciones académicas sobre psicología transpersonal, es fundador y director del Journal of Transpersonal Research y presidente de la Asociación Transpersonal Iberoamericana. Desde 2007 investigando las necesidades, aprendizajes y transformación personal en enfermos terminales. Psicoterapeuta con formación en diferentes abordajes terapéuticos, especializado en psicoterapia transpersonal. Organiza anualmente las Jornadas de Psicología Transpersonal y Espiritualidad, en Tudela (España) y es profesor de Psicoterapia Transpersonal en el Máster de Psicoterapia Del Bienestar Emocional del Instituto Superior de Estudios Psicológicos (ISEP, España) y en el Máster en Mindfulness, de la Universidad de Zaragoza. www.romangonzalvo.com

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En todos estos pasajes se aprecia un estado de consciencia expandido más allá de la persona individual, es decir trans-personal, donde la persona no se identifica con su yo, sino con los yoes de las demás personas y del TODO. Algo que evidencia totalmente el siguiente hecho y la siguiente afirmación:

Llegaron su madre y sus hermanos y, desde fuera, lo mandaron llamar. La gente estaba sentada a su alrededor, y le dijeron: ¡Oye! Tu madre, tus hermanos y tus hermanas están fuera y te buscan. Jesús les respondió: ¿Quiénes son mi madre y mis hermanos?. Y mirando entonces a los que estaban sentados a su alrededor, añadió: Estos son mi madre y mis hermanos. El que cumple la voluntad de Dios, ése es mi hermano, mi hermana y mi madre.

(Mc 3, 31-35)

―El Padre y yo somos uno‖ (Jn 10,30).

En su bienaventuranza: Felices los que lloran,

porque ésos van a recibir consuelo (Mt 5,5), hace referencia al dolor humano, ofreciendo esperanza a los que sufren. ¿Qué significa esto?.

Jesús entiende el sufrimiento como el alejamiento que vivimos respecto de nuestro ser profundo, y nos ofrece la actitud de aceptarlo (de llorar), de aprender a liberarnos de las necesidades que nos hacen girar en torno a nosotros mismos (Martínez Lozano, 2010, p. 81). Es decir, llorar la muerte de nuestro ego (transcenderlo), para dar paso a una consciencia más real de lo que somos en verdad.

Muchas de las enseñanzas de Jesús se expresan de forma encriptada para el desarrollo personal tal y como hoy en día lo entendemos (San José, 2013).

La utilidad de su mensaje en psicoterapia

Baker (2001) afirma que Jesús es el mejor

psicólogo que jamás ha existido. ¿En qué se basa para hacer esta afirmación?.

Por todos es sabido que pobres, inválidos, endemoniados, ciegos y cojos acudían a Jesús en busca de sanación, tal cual muchas personas heridas buscan terapia.

La psicoterapia supone un espacio en el que el paciente no solo viene preparado a ―tocar‖ (trabajar) sus heridas, sino que se expone a una revisión y confrontación total de su sistema de creencias, su estructura de personalidad y su modo de comportarse, que desembocarán en una transformación personal debida a un mayor conocimiento personal y consecuente expansión de la consciencia (Grof y Grof, 1995).

El encuentro con Jesús suponía esta transformación personal, a la que estaba dispuesto todo aquel que acudía a él. ¿Cuál era

entonces la técnica psicoterapéutica utilizada por él, que hacía sanar a tantas personas?

Klimek (1991) contempla las tres primeras bienaventuranzas como las fases del desarrollo psicológico que vive el ser humano cuando se encuentra en crisis, y acude a terapia; ―Bienaventurados los pobres de espíritu, porque

de ellos es el reino de los cielos‖ (Mt 5,3)

―Bienaventurados los mansos, porque ellos

poseerán en herencia la tierra‖ (Mt 5,4)

―Bienaventurados los que lloran, porque

ellos serán consolados‖ (Mt 5,5)

¿Qué relación tienen éstas con la

psicoterapia?. Siguiendo a Rodríguez Castillo (2012), para Jesús, los pobres de espíritu son bienaventurados porque representan el momento en que agotados por el sufrimiento, después de haber intentado todas las posibilidades de auto-sanación, rendidos por el fracaso y a punto de desfallecer, deciden acudir a terapia como última esperanza. Tal situación de total desfallecimiento y vaciamiento, es necesaria para poder encontrarnos con nuestro verdadero ser. En estos momentos se caen todas las máscaras que hasta ahora habíamos estado utilizando en la vida, para mantener una imagen falsa de nosotros mismos que no nos correspondía. En este momento de la verdad, aceptamos nuestra propia debilidad, y nos volvemos humildes. Elemento catalizador para el crecimiento personal consiguiente. ―Ser pobre de espíritu significa estar en un estado de vulnerabilidad, apertura mental y sinceridad emocional para enfrentarnos a nosotros mismos‖ (p. 48). O lo que es lo mismo, ser capaces de enfrentar a nuestro ego.

Jesús dice ―bienaventurados los que lloran‖ porque son ellos los que se enfrentan a sí mismos, a su fragilidad humana, sus fracasos, su indigencia, sus sombras. Lloran el derrumbamiento de su estructura personal (egoica), para dar cabida al renacimiento de un nuevo ser más evolucionado, más consciente de quien se es. Es el momento en que nos aceptamos tal cual somos, en que nos encontramos con nosotros mismos de verdad. Para resurgir fortalecidos, aceptando con serenidad (―bienaventurados los mansos‖) nuestro dolor, nuestra caída, nuestra pérdida, sin reaccionar mediante la ira o la venganza de cualquier tipo, contra nosotros mismos, o contra los demás. Mantener la calma ante el sufrimiento, supone crear los cimientos del nuevo ser en que nos vamos a convertir. Aceptar perder, para ganar el encuentro con nuestro ser real. En la medida que la terapia progresa, el paciente va

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Vol. 10 - Ano 5 - Nº 10 - Julho / 2017 ISSN 2317-8612 http://revistatransdisciplinar.com.br/ - www.artezen.org

encontrando su lugar en la vida y en las relaciones, de una forma renovada, fortalecida y honesta. Habrá alcanzado un nivel de consciencia superior al cual se encontraba, originario de su malestar. Situaciones que antes suponían un problema, ahora no lo producirán, porque nos habremos convertido en una persona trascendida.

Muchas veces, esta expansión de la consciencia originada por lo que se ha tratado en terapia, encuentra que ha accedido a una nueva dimensión antes totalmente desconocida, que le lleva a seguir queriendo evolucionar, de una forma ya no solo personal sino transpersonal (espiritual). Porque cuanto más centrados nos encontramos en nuestro verdadero ser, más identificación con el mundo que nos rodea experimentamos, siendo UNO con TODO. Cuando nos damos cuenta de que no existe separación alguna entre nosotros y el resto, solo cabe la expansión del amor que teníamos por nosotros mismos, hacia el resto de seres. Habremos avanzado en la difícil tarea de la des-egoización, saboreando más la esencia unitaria que nos define, en la cual vivió Jesús, y animó a que viviéramos todos:

Así pues, todo el que oiga estas palabras mías y las ponga en práctica, será como el hombre prudente que edificó su casa sobre roca: cayó la lluvia, vinieron los torrentes, soplaron los vientos y embistieron contra aquella casa; pero ella no cayó, porque estaba cimentada sobre roca. Y todo el que oiga estas palabras mías y no las ponga en práctica, será como el hombre insensato que edificó su casa sobre arena; cayó la lluvia, vinieron los torrentes, soplaron los vientos, irrumpieron contra aquella casa y cayó, y fue grande su ruina.

(Mt 7, 24-27)

A lo largo de estas páginas hemos analizado cómo las enseñanzas de Jesús son aplicables todavía hoy, tras dos mil años. Es así porque la esencia humana es perenne. Sin embargo, miles de años de historia no han supuesto miles de años de evolución de nuestro ser. ¡Cómo sería la vida en este planeta si todas las personas hubiésemos seguido las enseñanzas de Jesús!, que fundamentalmente hablan de amar al prójimo, al enemigo, de ayudar al necesitado, de hacernos servidores… En conclusión, hablan de sanarnos al transcender nuestro ego, para encontraros con el otro, que siempre fuimos, pero que nunca entendimos por nuestra ignorancia. Bibliografía Baker, W.M. (2001). The greatest psychologist

who ever lived: Jesus and the wisdom of the soul. San Francisco: Harper.

Grof, S. y Grof, C. (1995). La tormentosa búsqueda del ser. Barcelona: La liebre de marzo.

Klimek, D. (1991). Wisdom, Jesus and Psychotherapy. Ann Arbor, Mi: Winsted Publications.

Martínez Lozano, E. (2010). Recuperar a Jesús: una mirada transpersonal. Bilbao: Desclée de Brower.

Meier, J. (2000). Un judío marginal: nueva visión del Jesús histórico. Madrid: Verbo Divino.

RAE (2012). Diccionario de la Lengua Española. Edición 22.

Rodríguez Castillo, S. (2012). Camino al reino. Monterrey: Editorial Font.

San José, P. (2013). Los koans de Jesús de Nazareth. Madrid: Mandala Ediciones.

VV.AA. (1999). Biblia de Jerusalén. Bilbao: Desclée de Brower.

As Bem-aventuranças – por Gustave Doré

Fonte: https://www.wikiart.org/en/gustave-dore

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10 – A MENSAGEM DE JESUS COMO TERAPIA

Román Gonzalvo* Introdução

É legítimo relacionar a mensagem de Jesus com o processo da psicoterapia de hoje em dia? Esta pergunta nos tempos de Jesus, não teria sentido, porque a concepção do ser humano era muito mais holística do que a concebemos hoje. Em seus tempos, uma pessoa era uma unidade composta de corpo, mente e espírito. E, portanto, o tratamento e a cura de um elemento, era relacionado com a recuperação do outro.

Hoje em dia não é assim, já que sob o paradigma científico atual, a mente e o corpo se entendem bastante diferenciados, assim como a parte espiritual é ignorada completamente.

Tradicionalmente entendida a medicina como a disciplina encarregada de tratar e curar o corpo, e a psicologia dedicada ao tratamento (cura) da mente, é curioso observar como o significado etimológico da palavra psicologia significa estudo da alma humana [do grego ―ψυχή, psyché” (RAE, 2012)], e o de ―terapia‖ [do grego ―θεραπεία”] significa tratamento ou cura. Assim, pois, a definição original do termo psicoterapia resulta: ―a cura da alma humana‖. Precisamente aquilo que fazia Jesus, entendido desde a perspectiva de Jesus Histórico (Meier, 2000). Um homem des-egoizado

Desde a psicologia transpessoal (a psicología que estuda os estados de consciência que transcendem o próprio ego) se entende que Jesus viveu em um estado de consciência superior, em união com a dimensão transcendente da existência, e em comunhão com todas as pessoas, especialmente com aquelas que mais sofrem. Quer dizer, cada vez que falava e atuava, não o fazia desde sua

consciência egóica, mas sim a partir de uma consciência universal (Martínez Lozano, 2010).

A principal característica que lhe define é a des-identificação com seu ego, ao ensinar e atuar coerentemente sempre em prol do bem alheio, em harmonia com sua constante mensagem de amor ao próximo, entendendo que o-outro-és-tu. Provas disso temos nos seguintes ditos:

―Pois aquele que quiser salvar a sua vida, irá perdê-la; mas, o que perder a sua vida (…) irá

salvá-la‖ (Mc 8,35).

―Ouvistes que foi dito: Olho por olho e dente por

dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao homem mal; antes, àquele que te fere na face direita, oferece-lhe também a esquerda (…)‖.

(Mt 5, 38-39).

―Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: Amai

os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem; (…)‖

(Mt 5, 43-44).

―(…) Aquele que dentre vós quiser ser grande, seja o vosso servidor; e aquele que quiser ser o primeiro dentre vós, seja o servo de todos. (…)

(Mc 10, 43-44).

Em todas estas passagens se aprecia um estado de consciência expandido mais além da pessoa individual, quer dizer, trans-pessoal, onde a pessoa não se identifica com seu eu, sim com os egos das demais pessoas e do TODO. Algo que evidencia totalmente o seguinte fato é a seguinte afirmação:

________________ * Román Gonzalvo – Psicólogo transpessoal e doutor em psicologia pela Universidad Autónoma de Madrid. Autor de diversas publicações acadêmicas sobre psicología transpessoal, é fundador e diretor do Journal of Transpersonal Research e presidente da Asociación Transpersonal Iberoamericana. Desde 2007 vem investigando as necessidades, aprendizagens e transformações pessoais em enfermos terminais. Psicoterapeuta com formação em diferentes abordagens terapêuticas, especializado em psicoterapia transpessoal. Organiza anualmente as Jornadas de Psicología Transpersonal y Espiritualidad, en Tudela (España) e é professor de Psicoterapia Transpessoal no Máster de Psicoterapia del Bienestar Emocional do Instituto Superior de Estudios Psicológicos (ISEP, España) e no Máster em Mindfulness, da Universidad de Zaragoza. www.romangonzalvo.com

Uma oportunidade para o Livre Pensar

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Vol 1 - Jan / 2013 ISSN:

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Chegaram então sua mãe e seus irmãos e, ficando do lado de fora, mandaram chamá-lo. Havia uma multidão sentada em torno dele. Disseram-lhe: ―Eis que tua mãe, teus irmãos e tuas irmãs estão lá fora e te procuram‖. Ele perguntou: ―Quem é minha mãe e meus irmãos?‖ E, repassando com o olhar os que estavam sentados ao seu redor, disse: ―Eis a minha mãe e os meus irmãos. Quem fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe‖.

(Mc. 3, 31-35)

―Eu e o Pai somos um‖. (Jo 10, 30)

Em sua bem-aventurança: Bem-aventurados

os aflitos, porque serão consolados (Mt 5,5), faz referência à dor humana, oferecendo esperança aos que sofrem. Que significa isto?

Jesus entende o sofrimento como o afastamento em que vivemos a respeito do nosso ser profundo, e nos oferece atitude de aceitá-lo (de chorar, afligir-se), de aprender a liberar-nos das necessidades que nos fazem girar em torno de nós mesmos (Martínez Lozano, 2010, p. 81). Quer dizer, chorar a morte de nosso ego (transcendê-lo), para dar lugar a uma consciência mais real do que somos em verdade.

Muitos dos ensinamentos de Jesus se expressam de forma criptografada para o desenvolvimento pessoal tal e como hoje em dia os entendemos (San José, 2013).

A utilidade de sua mensagem em psicoterapia

Baker (2001) afirma que Jesus é o melhor

psicólogo que jamais existiu. Em que se baseia para fazer esta afirmação?

Por todos é sabido que pobres, inválidos, endemoninhados, cegos e coxos iam até Jesus em busca de cura, tal qual muitas pessoas feridas buscam terapia.

A psicoterapia supõe um espaço no qual o paciente não só vem preparado a ―tocar‖ (trabalhar) suas feridas, mas que se expõe a uma revisão e confrontação total de seu sistema de crenças, sua estrutura de personalidade e seu modo comportar-se, que o levará a uma transformação pessoal devida a um maior conhecimento pessoal e conseqüente expansão da consciência (Grof y Grof, 1995).

O encontro com Jesus supunha esta transformação pessoal, a qual estava disposto todo aquele que ia até ele. Qual era então a técnica psicoterapêutica utilizada por ele, que fazia curar a tantas pessoas?

Klimek (1991) contempla as três primeiras bem-aventuranças como as fases do desenvolvimento psicológico que vive o ser humano quando se encontra em crises, e procura a terapia:

―Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus.‖

(Mt 5,3)

―Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.‖

(Mt 5,4)

―Bem-aventurados os aflitos (os que choram), porque serão consolados‖

(Mt 5,5)

Que relação tem estas com a psicoterapia?

Seguindo a Rodriguez Castillo (2012), para Jesus, os pobres de espírito são bem-aventurados porque representam o momento em que esgotados pelo sofrimento, depois de haver tentado todas as possibilidades de autocura, rendidos pelo fracasso e a ponto de desfalecerem, decidem procurar a terapia como última esperança. Tal situação de total desfalecimento e esvaziamento é necessária para poder encontrarmos com nosso verdadeiro ser. Nesses momentos caem todas as máscaras que até agora vínhamos utilizando na vida, para manter uma imagem falsa de nós mesmos que não nos correspondia. Nesse momento da verdade, aceitamos nossa própria debilidade, e nos tornamos humildes. Elemento catalisador para o crescimento pessoal conseqüente. ―Ser pobre de espírito significa estar em um estado de vulnerabilidade, com abertura mental e sinceridade emocional para enfrentarmos a nós mesmos‖ (p. 48). Ou, o que é o mesmo, ser capazes de enfrentar a nosso ego.

Jesus disse: ―bem-aventurados os aflitos (os que choram)‖ porque são eles que se enfrentam a si mesmos, a sua fragilidade humana, seus fracassos, sua indigência, suas sombras. Choram o desmoronamento ou colapso de sua estrutura pessoal (egóica), para dar cabimento ao renascimento de um novo ser mais evoluído, mais consciente de quem se é. É o momento em que nos aceitamos tal qual somos, em que nos encontramos conosco mesmo, de verdade. Para ressurgir fortalecidos, aceitando com serenidade (―bem-aventurados os mansos‖) nossa dor, nossa queda, nossa perda, sem reagir diante da ira ou da vingança de qualquer tipo, contra nós mesmos, ou contra os demais. Manter a calma diante do sofrimento, supõe criar as bases do novo ser em que nos vamos a converter. Aceitar perder, para ganhar o encontro com nosso ser real. Na medida em que a terapia progride, o paciente vai encontrando seu lugar na vida e nas relações, de uma forma renovada, fortalecida e honesta. Haverá alcançado um nível de consciência superior a que se encontrava, originário do seu mal-estar. Situações que antes supunham ser um problema, agora não o são,

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porque nos havemos convertido em uma pessoa transcendida.

Muitas vezes, esta expansão da consciência originada pelo que se tem tratado na terapia, encontra que há acessado a uma nova dimensão antes totalmente desconhecida, que lhe leva a seguir querendo evoluir, de uma forma já não só pessoal, mas sim tranpessoal (espiritual). Porque quanto mais centrados nos encontramos em nosso verdadeiro ser, mais identificação com o mundo que nos rodeia experimentamos, sendo UNO com TUDO. Quando nos damos conta de que não existe separação alguma entre nós e o resto, só cabe a expansão do amor que teríamos por nós mesmo, em relação aos outros seres. Havemos avançado na difícil tarefa da desegoização, saboreando mais a essência unitária que nos define, na qual viveu Jesus, e incentivou-nos a que vivêssemos todos:

Assim, todo aquele que ouve essas minhas palavras e as põe em prática será comparado a um homem sensato que construiu a sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, vieram as enxurradas, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, mas ela não caiu, porque estava alicerçada na rocha. Por outro lado, todo aquele que ouve essas minhas palavras, mas não as pratica, será comparado a um homem insensato que construiu a sua casa sobre a areia. Caiu a chuva, vieram as enxurradas, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela caiu. E foi grande sua ruína!

(Mt 7, 24-27)

Ao largo destas páginas temos analisado como os ensinamentos de Jesus são aplicáveis até hoje, passados dois mil anos. É assim porque a essência humana é perene. Sem dúvida, milhares de anos de evolução do nosso ser. Como seria a vida neste planeta se todas as

pessoas houvessem seguido os ensinamentos de Jesus, que fundamentalmente falam de amor ao próximo, ao inimigo, de ajudar ao necessitado, de nos fazermos servidores... Concluindo, falam de curarmos ao transcender nosso ego, para nos encontrarmos com o outro, que sempre fomos, porém que nunca entendemos por nossa ignorância.

Referências Baker, W.M. (2001). The greatest psychologist

who ever lived: Jesus and the wisdom of the soul. San Francisco: Harper.

Grof, S. y Grof, C. (1995). La tormentosa búsqueda del ser. Barcelona: La liebre de marzo.

Klimek, D. (1991). Wisdom, Jesus and Psychotherapy. Ann Arbor, Mi: Winsted Publications.

Martínez Lozano, E. (2010). Recuperar a Jesús: una mirada transpersonal. Bilbao: Desclée de Brower.

Meier, J. (2000). Un judío marginal: nueva visión del Jesús histórico. Madrid: Verbo Divino.

RAE (2012). Diccionario de la Lengua Española. Edición 22.

Rodríguez Castillo, S. (2012). Camino al reino. Monterrey: Editorial Font.

San José, P. (2013). Los koans de Jesús de Nazareth. Madrid: Mandala Ediciones.

VV.AA. (1999). Biblia de Jerusalén. Bilbao: Desclée de Brower. (Traduzida para o Português pela Sociedade Bíblica Católica Internacional e Paulus – 1985).

Tradução: Celeste Carneiro

As Bem-aventuranças

Fonte: https://zhenxinzhufu.files.wordpress.com/2012/08/ec9db4ebafb8eca780-33.png

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11 – EDUCAÇÃO TRANSPESSOAL: A BUSCA PELA INTEGRAÇÃO

Maria Aparecida Soares Pereira*

Josiana Veloso Fonseca**

RESUMO Este estudo apresenta uma proposta de educação transpessoal para a formação integral do educando. Esta nova abordagem da educação trabalha a partir da interioridade do indivíduo para que ele se encontre de forma equilibrada, consciente e plena. A educação transpessoal surge a partir da psicologia transpessoal, corrente da psicologia que defende a dimensão espiritual existente no ser humano. A psicologia transpessoal surgiu na década de 60, como a quarta força da psicologia e teve como seu principal representante Abraham Maslow. A educação transpessoal busca formar o indivíduo para encontrar a sua plenitude, integrando as suas várias dimensões para que este indivíduo sinta-se unificado com o universo. Este modelo de educação quer levar o ser humano a conhecer-se de forma profunda para chegar a um nível de transcendência. Este trabalho destaca ainda a espiritualidade e mística como meios para alcançar o ser transpessoal. Acredita-se que na escola, educadores junto com os educandos, podem desenvolver a dimensão transpessoal a partir dos recursos transpessoais dentro da transdisciplinaridade, nova abordagem metodológica que unifica as ciências a partir do diálogo e do conhecimento integrado. PALAVRAS-CHAVE: Psicologia. Educação. Transpessoalidade. Transdiscipinaridade. ABSTRACT This study presents a proposal for a transpersonal education for the integral formation of the student. This new approach to education works from the interiority of the individual so that he is in a balanced way, aware and full. The transpersonal education arises from the transpersonal psychology, chain of psychology that defends the spiritual dimension exists in the human being. The transpersonal psychology emerged in the 1960s, as the Fourth Force in psychology and had as its principal representative Abraham Maslow. The transpersonal education seeks to form the individual to find its fullness, integrating its various dimensions to which this individual feel unified with the universe. This model of the education wants to bring the human being to know yourself so deep to reach a level of transcendence. This work also emphasizes the spirituality and mysticism as a means to achieve the transpersonal be. It is believed that at school, teachers along with the students, can develop the transpersonal resources inside of transdisciplinarity, new methodological approach that unifies the sciences from the dialog and integrated knowledge. KEYWORDS: Psychology. Education. Transpersonality. Transdisciplinarity. ___________________

*Maria Aparecida Soares Pereira - Mestre em Administração e gestão educacional. Docente no curso de Psicologia

Educacional da Universidade Pedagógica Sagrada Família - UNISAF, Moçambique, Gestora da Escola Infantil Sagrada Família em Maxixe, Moçambique. [email protected] **Josiana Veloso Fonseca - Mestranda em Psicologia Educacional na Universidade Pedagógica Sagrada Família -

UNISAF, Moçambique. Gestora da Escola Pré Universitária Sagrada Família em Maxixe – Moçambique. [email protected]

Uma oportunidade para o Livre Pensar

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Vol 1 - Jan / 2013 ISSN:

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1. Introdução

O presente estudo visa apresentar uma

proposta de educação transpessoal para a formação integral do educando. A educação transpessoal parte da psicologia transpessoal, uma ciência nova em termos históricos, sendo a primeira corrente da psicologia que defende a dimensão espiritual do ser humano. Os pioneiros desta corrente são Maslow, Jung, Victor Frankl, Fritjof Captra, Ken Wilber e Stanislav Grof.

A psicologia transpessoal foi apontada por Maslow em 1968, como a quarta força da psicologia, avançando ainda que a mesma superaria o humanismo para alcançar a dimensão da transpessoalidade. Nesse processo, acontece a transição da dualidade do homem para a sua unicidade com o Kosmos, de modo a alcançar a felicidade plena. Esta dinâmica perpassa por um caminho de conhecimento interior, através dos recursos transpessoais que possibilitarão a verdadeira liberdade e a alegria de viver.

Notamos infelizmente que na actualidade, em muitos países, sobretudo, no Brasil e Moçambique a dificuldade que a educação tem em formar pessoas integradas e plenas, verificando-se no seio do processo educativo uma preocupação demasiada com a formação técnica volvida para os interesses mercantis e capitalistas. Neste sentido, são igualmente preocupantes as situações quotidianas encontradas no ambiente escolar. Por um lado, a transgressão das normas que favorecem o bem-estar social, e a falta de interesse na aprendizagem por parte dos alunos. Por outro, existe um mal-estar e um esgotamento nos professores. Figuram como causas desta dualidade de fenómenos, a burocracia, a descrença do ensino, a ansiedade, o pouco valor dado ao conhecimento, a falta de recursos materiais, a violência, dentre outros, demonstrando, assim, que existe uma barreira entre a escola, professor e aluno.

Deste modo, a educação, a partir da psicologia transpessoal, pode favorecer um retorno àquilo que é o seu verdadeiro papel dentro da sociedade que é o de formar o homem integral, ou seja, formar o homem para a vivência de valores como o respeito, a liberdade, a ética, o conhecimento, o cuidado, a solidariedade e a justiça, para a construção de uma sociedade mais justa e feliz. A educação transpessoal integra o saber e o ser. Verifica-se, todavia, que a sociedade actual valoriza mais o ter em detrimento do ser, perdendo-se deste modo a nossa capacidade de interiorização e sabedoria. É precisamente neste âmbito que surge a educação transpessoal, como uma luz para a intensa crise de valores que estamos a viver.

Apresenta-se aqui a proposta de uma educação que sai do paradigma dualista, materialista, capitalista, consumista e artificial,

para uma educação que está preocupada com a realização pessoal e profunda da pessoa, através da unificação e integração para uma transformação interior e exterior, acrescentando ainda que a ausência da dimensão espiritual na vida do ser humano o deixa vazio, superficial e infeliz.

Desta feita, este estudo discorre sobre a psicologia transpessoal como fundamento para uma educação que valoriza a espiritualidade para a integração do ser, entendendo que esta dimensão carece de ser assumida pelos educadores, dentro de uma perspectiva transdisciplinar, uma vez que a educação é essencial para o desenvolvimento humano e tem grande força para a transformação da nossa sociedade.

2. Psicologia Transpessoal A psicologia transpessoal, segundo Simão

(2010), surgiu nos anos sessenta como a quarta força da psicologia, sendo a primeira, a psicologia comportamental criada por Watson; a segunda, a psicanálise designada por Freud, e a terceira, a psicologia humanista criada por Maslow. Em sequência surgiu a psicologia transpessoal como a quarta força da psicologia, como refere Maslow no seu livro intitulado Introdução à psicologia do ser (1968).

A psicologia humanista, como terceira força, prepara uma psicologia que transcende as necessidades humanas, a qual não está focada nos interesses humanos, mas busca uma relação e equilíbrio com o cosmo, tal como se pode constatar na nota seguinte:

Para Maslow a Psicologia encontrava-se muito fragmentada, composta por três grandes grupos científicos, sem comunicação entre eles: em primeiro lugar, estava o grupo dos comportamentais, objectivista, mecanicista e positivista; em segundo, o conjunto de psicólogos adeptos de Freud e da psicanálise e, em terceiro, as psicologias humanistas ou terceira força, as quais representam a união de vários grupos psicológicos em uma só filosofia que incluía a primeira e a segunda escola. Haveria, ainda, uma quarta Psicologia transcendental que se estava desenvolvendo, a qual incluía aspectos das escolas anteriores (SALDANHA, 2006, p. 38).

Em 1968, a psicologia transpessoal oficializou-

se como uma corrente da psicologia, com a colaboração de Vitor Frankl, Stanislav Grof, James Fadiman e Antony Sutich, unidos a Maslow. Atualmente encontramos Daniel Goleman, Ken Wilber, Jean Yves Leloup, Pierre Weil e Frances Vaughan, que também contribuem para a ampliação desta corrente cujo objecto principal é a consciência cósmica, como refere Weil (1999).

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A psicologia transpessoal é um ramo da psicologia especializada no estudo dos estados da consciência; ela lida mais especialmente com a ―experiência cósmica‖ ou os estados ditos ―superiores‖ ou ―ampliados‖ da consciência (WEIL, 1999, p. 9).

França (2002) afirma que a psicologia

transpessoal está voltada para o estudo da saúde e do bem-estar psíquicos do ser humano. Esta psicologia reconhece o ser humano como um ser transcendente, capaz de viver holisticamente. Neste sentido, o ser humano, enquanto corpo e mente, é entendido como um todo interdependente, conforme sustenta França ao referir que:

Seu campo de investigações abrange a saúde e o bem-estar psicológico ótimos, estados alterados de consciência; valores e experiências místicas; práticas de meditação, relaxamento, concentração; transcendência do eu; convivência trans-pessoal; técnicas respiratórias; controle e aplicações da bioenergia e outros aspectos psicológicos relevantes (FRANÇA, 2002, p.02).

A psicologia transpessoal, conforme Berger

(2001) estuda ainda a dimensão da experiência humana, inclusive os estados holotrópicos, palavra de origem grega que significa inteireza, totalidade, e busca a integração da ciência e a espiritualidade. O termo refere-se ao ser humano que, fragmentado, busca a sua totalidade e plenitude. Estas ideias sobre o ser humano na busca da plenitude são encontradas nos estudos de Stanislav Grof, que desenvolveu pesquisas durante 40 anos sobre o estudo da consciência. São encontradas ainda nas tradições místicas do Budismo, Taoísmo, Sufismo, Misticismo Cristão, Cabala, dentre outros.

Deste modo, entende-se que para a psicologia transpessoal, não existe divisão do ser humano, mas ele é contemplado em todas as dimensões, sejam elas, física, psíquica, espiritual, social e cultural. Ela reconhece a espiritualidade como uma força que leva o indivíduo à transcendência, alcançando à felicidade plena. O alcance da transpessoalidade ou da consciência cósmica desperta no ser humano o sentido de compaixão e cuidado, compaixão essa que segundo Boff (2001) é uma virtude muito estimada no budismo (karuna), no hinduísmo (ahimsa) e no cristianismo (rahamim). Por sua vez, a compaixão complementa-se com outra virtude que é o cuidado, o qual é aqui visto no sentido geral como cuidado com o mundo, cuidado com tudo o que existe e vive.

Para Simão (2010), a psicologia transpessoal considera o ser humano como único, e este não deve ser comparado a outro, ao mesmo tempo, ela não deve levá-lo a pensar em si na condição

de superioridade, mas reconhece que todos estão num processo de crescimento. Nesta perspectiva, a psicologia transpessoal ajuda a buscar o sentido da vida e a definir o que somos e o que desejamos. Ela contribui ainda para perceber que o ser humano é responsável pelo mundo, e o leva a se preocupar com a sua existência e o seu futuro.

Weil (1977 apud SIMÃO, 2010) descreveu alguns princípios que fundamentam a psicologia transpessoal, dos quais, o primeiro se refere a um sistema de energias que são inacessíveis, mas registáveis pelos outros sentidos. Por sua vez o segundo princípio postula que a natureza transforma tudo em energia e esta é eterna. O terceiro refere que a vida inicia antes do nascimento e continua após a morte física. O quarto princípio defende que a vida mental e espiritual é capaz de criar um sistema apto para desligar-se do corpo físico. Na sequência, o quinto entende que a vida do indivíduo está ligada de forma integrada com toda a vida do cosmo. O sexto princípio preconiza que a evolução que tivemos durante a nossa existência continua depois da morte física e, por fim, o último princípio defende que a consciência é a energia, é a própria vida nas suas mais diferentes expressões.

Weil (1993 apud BERGER, 2001) considera que há quatro estados de consciência que são: estado da vigília, estado hipnagógico e onírico, estado de sono profundo e o estado transpessoal.

Por serem chamados de estados da consciência [...], estes possuem estruturas, leis e formas de organização mental próprias, como também para cada estado o cérebro emite ondas eletroencefalográficas específicas (TREVISOL, 2008, p.83).

No estado de vigília acontece a objectividade

científica, existe a separação entre o sujeito, conhecimento e objecto. Segundo Weil (1989), o ritmo encontrado em pessoas acordadas é o beta,

e se caracteriza pela realização de actividades dos cinco sentidos do pensamento e agitação mental. Neste estado o sujeito é dualista, o conhecimento é fragmentado e na relação entre sujeito e objecto há um mau uso que interfere no ecossistema.

O estado hipnagógico e onírico referem-se ao estado de sonho, onde dormimos, mas continuamos a participar da vida através das nossas imagens mentais que podem ser vistas a partir dos movimentos dos olhos. O ritmo deste estado é o teta, que segundo Berger:

Nesse estado continua a separação conhecedor, conhecimento e conhecido, sob a forma do criador, da criação e do criado, no caso do estado hipnagógico; e do sonhador, do sonho e da cena sonhada, no caso do sonho propriamente dito,

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permanecendo a percepção dualista sujeito-objeto (BERGER, 2001, p.62).

No estado de sono profundo, que é o estado

considerado sem sonho porque não os recordamos ou os memorizamos, é o estado em que não se tem actividade ou estado da inquietação mental. A mente encontra-se no seu estado original porque não existe o contacto com o mundo físico. Traduz-se por ondas delta muito lentas e pela ausência de reflexo óculo-motor.

E, por fim, o estado chamado de transpessoal ou consciência cósmica, é aquele onde a consciência se encontra numa paz profunda. Segundo Berger, este estado:

É conhecido em todas as culturas, épocas e tradições espirituais, sob nomes diferentes: Nirvana (ioga budista indiana), satori (Japão), samadhi (ioga hinduísta), devekuth (judaísmo hassídico), reino do céu (cristianismo), Tao (Taoismo) e, na modernidade, consciência cósmica, experiência transcendental, vivência ou estado transpessoal (BERGER, 2001, p.63).

Neste estado, as pessoas fazem grandes

experiências do que são verdadeiramente na sua essência; aqui não existe mais dualidade e o mundo exterior e interior é visto e sentido como luz e energia na sua matéria sólida. Este estado é igualmente conhecido como o estado da supraconsciência. Nele são registadas ondas delta mais lentas e são destas experiências que a psicologia transpessoal se ocupa.

No estado de vigília acontece um diálogo entre sujeito e objecto. No mesmo utiliza-se a linguagem, toque e visualização, e encontra-se aí o paradigma da ideia de causa e efeito, da quantificação, da relação sujeito e objecto, enquanto no estado transpessoal, o indivíduo supera a dualidade e fragmentação, alcançando um estado de totalidade.

A psicologia transpessoal defende a ideia de que o ser humano pleno é aquele que se sobressai na sua condição humana, ou seja, ele chega a níveis acima da sua pessoalidade, através da espiritualidade e transcendência, confirmando que o ser humano pode chegar a uma condição divina. Assim, iremos deter-nos a seguir num campo central desta psicologia que é a dimensão espiritual do ser humano e as suas experiências místicas.

3. Espiritualidade e Mística Quando pensamos na espiritualidade a

tendência é pensá-la como um acontecimento religioso, mas queremos já destacar que a proposta de uma educação mais espiritualizada não está ligada ao fenómeno da religião.

Nas palavras de Grof e Grof (1994), o episódio religioso é uma atividade grupal institucionalizada e organizada que pode ou não tender para a espiritualidade. Isso vai depender se ela é capaz de proporcionar um campo para descobertas pessoais ou para o florescimento de certos tipos de qualidades no modo de vida do sujeito (FERREIRA; SILVA. 2016, p.108).

As organizações religiosas geralmente têm

grupos hierárquicos que estão concentrados com algumas preocupações como o poder, dinheiro, posses etc., sendo que nestas situações elas atrapalham a vivência da mística e o crescimento da espiritualidade. A espiritualidade e a mística distinguem-se do fenômeno religioso e elas nos dão acesso direto as experiências transpessoais (GROF; GROF, 2010).

A espiritualidade refere-se ao conjunto de princípios e valores que servem de base para um sistema religioso, político, filosófico, etc. A palavra espiritualidade deriva etimologicamente do termo latino “spiritus‖. Segundo o dicionário Aurélio (2010), a espiritualidade refere-se às qualidades daquilo que é espiritual, ou seja, ela está ligada aos valores do espírito que quer dizer sopro. Maslow (1980 apud TREVISOL 2008) considera a vida espiritual como parte da essência humana.

Dalai Lama afirma que A espiritualidade está relacionada com as qualidades do espírito humano, tais como: amor, compaixão, tolerância, paciência, capacidade de perdoar, contentamento, noção de responsabilidade, noção de harmonia (LAMA, 2000, p. 32-33).

Por sua vez, Amatuzzi (2005) refere que a

espiritualidade não é algo que está distante do ser humano, mas é na prática aquilo que toca profundamente a sua vida, é movimento e busca da radicalidade que existe na realidade.

A espiritualidade envolve a necessidade de transcendência, sensação de bem-estar que é experienciada quando encontramos um propósito, um sentido significativo para a vida, os quais favorecem experiências transpessoais (SALDANHA, 2008, p.150).

A espiritualidade e a capacidade de

transcendência do ser humano são consideradas como uma porta de saída para este mundo, que segundo Trevisol (2008) se encontra num caos. Deparamo-nos com uma humanidade doente e caótica, fria e sem espiritualidade. No entanto, o ser humano possui grande capacidade de evolução que tem como desdobramento a capacidade de revelação, revisão, retroacção e redenção. O cultivo da espiritualidade é importante porque nos coloca em contacto com o nosso ser profundo, ou seja, a nossa própria interioridade. A vida espiritual, segundo Wilderink

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(2004), consiste em integrar essas capacidades à vida concreta, pois estas qualificarão a existência humana.

Conforme refere Trevisol (2008), o ser humano perdeu a capacidade de viver de modo interiorizado, aprendeu a viver de um jeito diferente da sua própria origem, perdeu a capacidade de evoluir e a noção do que seja o ser humano. De tal modo, tornamo-nos amigos de coisas ao invés de pessoas, preocupamo-nos mais em fazer do que em ser, entendemos mais do exterior sem ser conhecedores do interior e assim, deparamo-nos com uma sociedade doente e fragmentada que foge do contacto com a sua sabedoria mais profunda.

Uma sociedade que desconhece os valores mais belos que a compõem, como a compaixão, o amor, a bondade, a gratuidade, o cuidado e a criatividade demonstra que esqueceu a dimensão da espiritualidade. Este é mais um dado metafísico que qualifica a nossa existência humana e não o contrário, a espiritualidade é elemento fundamental na integração do ser e sucessivamente da sociedade. Para Saldanha (2008, p.149), a espiritualidade é um ―aspecto central no desenvolvimento do ser humano, parte da própria biologia subjetiva‖, porque favorece e legitima uma óptica de confiança, tornando possível a perspectiva de uma sociedade melhor.

Segundo Beto e Boff (2010) a espiritualidade é tudo o que produz e expande vida. E viver este dinamismo e esse mistério é viver a mística. Neste sentido, Beto e Boff (2010) consideram que a palavra mística é adjectiva de mistério, que é a revelação do escondido, do não comunicado de uma realidade ou intenção. Numa acepção etimológica, o termo mística deriva dos verbos gregos Mýo ou Muo que significa ―fechar os olhos‖ e Mueo que significa “iniciar nos mistérios”. Os místicos experimentam o mistério no êxtase, mas também no quotidiano da vida, nas situações simples que se tornam transcendente. O mistério é experimentado por quem tem a ousadia de descer ao nível mais profundo de si mesmo, por quem tem sensibilidade diante do outro e do cosmo, percebendo a sua grandiosidade e ao mesmo tempo a sua harmonia. De acordo com Amatuzzi,

A experiência espiritual e mística está sempre presente nas diversas formas de religiosidade, seja semítica, seja oriental, bem como formas não religiosas. (AMATUZZI, 2005, p. 17).

Assim, entende-se que a espiritualidade e a

experiência mística constituem um caminho que toda pessoa pode fazer, independente de religião. Tais experiências acontecem quando desenvolvemos a capacidade para a compreensão existencial, quando há um encantamento e sensibilidade com a vida. É

nesse momento que entra a educação, pois cabe a ela a sublime tarefa de cuidar do caminho das pessoas para que estas transformem a sociedade.

A partir disso, buscamos compreender a dimensão da espiritualidade e a capacidade de transcendência dentro da experiência educacional. Assim, na subsecção que se segue apresentamos uma proposta de educação transpessoal.

4. Educação transpessoal A dimensão da transpessoalidade na

educação foi indicada ainda por Maslow (1994). Para este autor, a educação é o caminho para mudar a sociedade, mudança esta que ocorrerá através da busca do autoconhecimento, da valorização do ser e da auto-realização, que é a capacidade do ser humano de reconhecer e usar as suas capacidades e potencialidades. Os indivíduos auto-realizados ou autoatualizados têm mais possibilidades de fazerem experiências culminantes, as quais são consideradas como os momentos mais felizes da vida de uma pessoa, como nos confirma Weil ao referir que

Os participantes dessas experiências, que se manifestam de modo súbito, contam que se sentiram unidos a todo o universo, que eram o cosmos inteiro, tendo sido tomados por um estado de alegria e de paz indescritível, saindo do espaço-tempo e perdendo o medo da morte, já que seu eu, por ter um caráter apenas ilusório, não podia morrer, sendo parte do cosmos, e assim por diante (WEIL, 1994, p.44).

A transpessoalidade desperta em cada ser

humano a sua própria consciência para uma vivência profunda de si mesmo com o mundo, mantendo o indivíduo conectado com a totalidade do seu ser em seus diferentes níveis. No educando, a vivência da transpessoalidade desperta a sensibilidade para o cuidado, para a amorosidade, receptividade e criatividade. Assim, uma educação interiorizada tem o objectivo de preparar as crianças, adolescentes e também os adultos para a vivência do amor, compaixão, solidariedade e alegria. São estes os valores experimentados e vivenciados que transformarão a nossa sociedade.

Para Berger (2001), a educação transpessoal busca educar a pessoa num todo, numa perspectiva integral, dentro de um equilíbrio entre o saber e o ser, onde, por um lado, o saber é o próprio conhecimento que se realiza através do estudo e da pesquisa e, por outro, o ser corresponde às próprias vivências. Estas duas dimensões devem ser experimentadas dentro de uma dinâmica transdisciplinar onde o conhecimento é integrado nas suas diferentes áreas.

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A educação integral busca oferecer ao ser humano a oportunidade de se descobrir como pessoa, de conhecer a interdependência entre os sistemas vivos; orientar para o retorno da vivência dos valores humanos; desenvolver a sensibilidade, a estética, a mística, os potenciais intelectuais, afectivos e intuitivos e, sobretudo, expandir os níveis de consciência pessoal para uma experiência transpessoal. Neste sentido, a tarefa educativa é de alargar a visão de mundo da pessoa humana, de unificar o homem como integrante do universo e, acima de tudo, de desenvolver o que já existe de valor e de bom no educando. Na mesma ordem, Berger refere que na dimensão da transpessoalidade:

Educar é eduzir, isto é, conduzir para fora o que está dentro do educando, para que ele possa reconhecer-se e assumir o seu processo de autocriação, desenvolvimento pessoal e auto-cuidado. O grande desafio da educação é mobilizar, tanto no educador como no educando, a vontade do Eu pessoal nesse processo (BERGER, 2001, p. 75).

França (2002), na perspectiva transpessoal,

refere-se à importância da energia vital que um ser humano pode passar para o outro. Deste modo, as relações interpessoais nas situações de ensino-aprendizagem tornam-se valorosas dentro desta discussão da educação transpessoal.

Na sua pesquisa, o autor em epígrafe usou como recurso a kirliangrafia, que é o registro fotográfico do campo energético (aura) que envolve objectos, animais, plantas e seres humanos. Ele confirmou na sua pesquisa que quando existe a troca de uma boa energia e uma harmonia entre os participantes de um grupo, (nesse caso, do educador e dos alunos), quando há uma integração amiga e cooperativa, há também uma maior receptividade e, portanto, os resultados dos trabalhos são mais satisfatórios (o aluno aprende com mais facilidade), tal como nos atestam Simão e Saldanha ao avançarem que:

O princípio da transcendência gera relações mais cooperativas, não fragmentadas e harmoniosas em direção à unidade interna e com o outro, favorece valores de crescimento e os valores do ser (SIMÃO. SALDANHA, 2012, p. 07).

Em experiências realizadas por França (2002),

foram utilizadas algumas actividades como a interiorização e a concentração, o relaxamento, as respirações ritmadas, as massagens, a meditação e a visualização criativa. As pesquisas mostraram que após estas actividades de interiorização e de busca pela transcendência, os resultados foram de diminuição de ansiedade, fadiga e depressão e um melhor equilíbrio emocional.

Paulo Freire (2005), Paro (2014) e Saviani

(2005), preocupados com o papel da educação, indicam uma educação para a transformação da sociedade. Segundo estes estudiosos e críticos, a educação deve promover a conscientização política crítica para superar a dominação, exploração, alienação e divisão de classes, de modo que a educação promova uma nova sociedade através da humanização.

A educação transpessoal também quer chegar a uma transformação da sociedade, contudo, tal transformação acontecerá primeiramente no interior do próprio ser humano que, por sua vez, o mesmo ser depois intervirá na sociedade. Assim, a transformação interior acontecerá através do auto-conhecimento, da expansão da consciência, da experiência profunda de amor e da alegria de ser. A transformação na sociedade acontecerá a partir da partilha de amor, da solidariedade, do diálogo, da responsabilidade, dentre outros valores positivos experimentados. Uma educação interiorizada propiciará ainda o acolhimento das nossas sombras e a libertação de nós mesmos, dos nossos medos, vazios, inconsistências, fragilidades e a consequência dessa liberdade será também a responsabilidade e a unidade.

O educador é uma pessoa extremamente importante neste processo, pois será ele que ajudará aos educandos a entrarem na dinâmica da busca pela integração. O educador precisa primeiramente ser verdadeiro consigo mesmo, ter feito um processo profundo de autoconhecimento e de experiência da sua verdadeira pessoa que encontra a sua totalidade na sua identificação e unidade com o universo, no encontro com o divino a partir de uma expansão da sua consciência. O educador precisa ainda criar espaços favoráveis para que os seus alunos consigam fazer a sua própria experiência de transpessoalidade no nível pessoal e colectivo.

Segundo Berger (2001), o educador passa por alguns estágios naturais para chegar ao nível do educador transpessoal ou holocentrado. É possível identificar inicialmente um educador muito preocupado e apegado com a teoria e a técnica, prevalecendo o saber ao invés do ser. Em seguida, já no segundo estágio, o educador está mais centrado na pessoa. Neste estágio ele é mais livre em relação ao outro, perdeu a insegurança e não precisa mais se apegar às técnicas, e por isso progrediu um pouco, mas o indivíduo ainda permanece isolado. Por fim, no terceiro estágio encontramos o professor que habita o universo holístico, aqui o indivíduo está no centro, mais inserido no todo e participante dele.

O educador que não se abre a esse processo e não cultiva a dimensão transpessoal corre o risco de se tornar uma pessoa exigente, intolerante, moralista e crítica. A crítica refere-se às outras pessoas, porque ele torna-se incapaz de ter um autoconhecimento e de ver as

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qualidades, assim sendo, o foco permanece nos defeitos.

Como se pode notar, o educador precisa sair de uma educação conteudista, tecnicista e meramente formal, que contribui muito pouco para o desenvolvimento da pessoa, e avançar para uma formação na vertente transpessoal, a partir da interioridade e vivência de valores como o amor, a verdade, a tolerância, a partilha e o discernimento, de modo que aconteça uma educação integral, partindo de uma escala individual para a escala planetária.

A partir destas novas atitudes e práticas, surgirá então um novo educador, uma nova maneira de educar e, portanto, uma nova escola, tal como se pode ler em Trevisol:

O novo jeito de educar é aquele que prioriza a expressão da interioridade, através de vários métodos geradores de consciência. É de grande importância a escuta, a pergunta certa, a tolerância, a compaixão e a firme certeza de que educar, é educar-se. Não há julgamento, nem constrangimento. Não há nada a ser ―empurrado‖. Tudo precisa ser encantador, para que possa ser amado. Então será abraçado e transformado (TREVISOL, 2008, p. 190).

O novo educador é capaz de amar e inovar

por que ele fez a experiência de se sentir amado e integrado. Assim, o novo projecto de educação está voltado inicialmente para ajudar o próprio educador. Ele precisa conhecer seu processo, sua história, suas fragilidades e virtudes, reconhecendo que cada pessoa é um indivíduo irrepetível e tem sua própria essência.

O verdadeiro educador deve ser uma pessoa que se empenha em ser verdadeira e honesta consigo mesma, que seja empenhada na sua auto realização. A educação total exige a realização do homem integral. Entretanto, essa tarefa não se faz por decreto, mas pela auto-determinação (BERGER, 2001, p.61).

A nova escola é a que prioriza a educação

integral e a plenitude do ser. Ela vai além dos muros da escola para formar uma escola transpessoal. Esta dará mais atenção ao que existe de mais sagrado no ser humano que é a consciência. Nela, os educadores, educandos e toda a comunidade educativa estarão juntos num desafio da educação sensibilizada, amorosa e transformadora, de modo que este trabalho educativo possa provocar uma transformação, que contribuirá para a construção de uma sociedade mais justa e plena.

A educação transpessoal é um desafio para os educadores, toda a comunidade educativa e a sociedade em geral, pois conduzir o homem a uma experiência interior, para responder às questões mais profundas sobre o sentido da vida,

exige responsabilidade, autocuidado e compro-metimento evolutivo.

A aprendizagem da interiorização possibilita-nos entrar no nosso interior para encontrar o nosso ―deserto‖ e aceitá-lo. ―Aceitar o nosso deserto é aceitar a nossa carência de ser, é aceitar o nosso ser como pó, e saber que não pode haver melhor leito, não podem haver panos mais belos para acolher a luz.‖ (LELOUP, 2007, p.19). Porém, importa acautelar que a conquista da integração e da felicidade plena não quer dizer que chegamos a um nível de perfeição, isto é, pessoas sem defeitos, mas que chegamos a um nível de aceitação, equilíbrio e harmonização do que somos, e de certeza que todos os dias temos possibilidades de sermos pessoas melhores.

4.1. Recursos transpessoais A partir da psicologia transpessoal, Saldanha

(2006) propõe a Abordagem Integrativa Transpessoal (AIT), por meio de uma didáctica para uma aprendizagem integrada com a utilização de recursos transpessoais que, além da educação, podem ser aplicados em clínicas e outras instituições que utilizem a psicologia transpessoal. Os recursos indicados pela autora são: intervenção verbal, imaginação activa, reorganização simbólica, dinâmica interativa, recursos auxiliares ou adjuntos e a integração relacional do saber.

Os recursos acima aludidos foram utilizados numa pesquisa com alunos nos cursos de Psicologia transpessoal. Dessa pesquisa, surgiram resultados muito positivos, quer na vida pessoal, quer profissional dos participantes. Assim, a AIT, por meio da didáctica transpessoal, possibilitou aos alunos de psicologia transpessoal um maior autoconhecimento, resgate da dignidade, elevação da auto-estima, relações mais harmoniosas, valorização do ser, entre outros.

Para a utilização dos recursos indicados por Saldanha (2006) precisa-se de profissionais que já tiveram experiência com a psicologia transpessoal e que estão habilitados para aplicar a didáctica transpessoal. Os recursos auxiliares ou adjuntos são utilizados há milénios de anos, tal como a concentração, meditação, relaxamento e contemplação. Segundo Saldanha:

Os recursos adjuntos no processo educacional revestem-se de uma importância cada vez maior por diversos fatores que favorecem a aprendizagem: - Facilitam a atualização de níveis de expansão da consciência, especialmente, do supraconsciente; - Rebaixam o nível de tensão e a ansiedade, aprende-se melhor em campo relaxado; - Promovem uma clareza mental maior e receptividade ao novo (SALDANHA, 2006, 168).

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A inclusão destes recursos com os educandos requer do educador alguma experiência e prática com exercícios de interiorização para conduzir esse processo. Queremos sublinhar primeira-mente a importância do silêncio: notamos na nossa sociedade a dificuldade de se fazer silêncio. Nós estamos constantemente imersos num constante barulho (interior e exterior) e para nos silenciarmos interiormente precisamos do silêncio externo. O silêncio é um valor caríssimo para entrarmos na dinâmica transpessoal. Os exercícios de respiração (inspirar e expirar), a observação de uma respiração tranquila e profunda, também são muito válidos para aplicarmos qualquer um dos recursos auxiliares.

Para a abertura e início de uma educação escolar fundamentada na transpessoalidade, através da transdisciplinaridade (iremos falar sobre o assunto no próximo item), acreditamos que um bom começo para trabalhar com nossas crianças, adolescentes e jovens, seria a prática do silêncio, dos exercícios de respiração, dos exercícios físicos leves acompanhados de músicas meditativas, da confecção de artes (desenhos, colagem), da repetição de frases espirituais ou mantras, da biodança e danças circulares.

Mantra é uma evocação de natureza espiritual. Ele pode ser falado e também cantado numa sequência repetitiva em grupo ou individual e pode ser criado pelo próprio grupo. O mantra ajuda a manter o pensamento concentrado e controlado, além de propiciar a elevação da consciência.

A utilização da música meditativa ajuda a pessoa a entrar num clima de interioridade. Segundo Naranjo (2005, 167), ―ouvir tem mais importância do que ver, e o som (e sua modulação) é um veículo mais potente do que a vista para a sensação do sagrado.‖ No entanto, o autor chama a atenção para não abusar da música no treinamento da nossa mente e nem substituí-la pelo silêncio.

A dança é uma actividade muito atractiva para as crianças, jovens e adolescentes. Através dela podemos possibilitar aos educandos uma vivência de integração. Por sua vez, a biodança, que significa dança da vida, foi criada pelo chileno Rolando Toro em 1960 e busca conectar o homem a si mesmo, ao outro e à natureza (REIS, 2013). Através da biodança sentimos leveza, liberdade, entrega e sincronia com o universo.

Sobre a dança circular, Lorthiois (2008, p. 132) afirma que com a dança circular, ―dançamos para o planeta terra para entender suas necessidades mediante os sinais de exaustão que está dando, e para sanar suas feridas‖. A autora em epígrafe refere ainda que a dança circular é um instrumento para a tolerância, propõe entrar na dança do outro para comunicar com ele e compreendê-lo. Este tipo de dança esteve presente nas diversas e antigas tradições do

mundo todo e são praticadas na circularidade como as danças de roda. É um recurso que ajuda a ampliar a consciência individual e grupal.

A actividade com artes pode ser feita através de desenhos, utilização de cores e colagens, sendo que, o que difere de uma actividade artística comum da escola é o objectivo e a maneira de conduzir actividade. O educando é convidado entrar em si mesmo para se conhecer e exteriorizar o que ele é na sua arte, demonstrará a sua sensibilidade, criatividade, espontaneidade e liberdade.

Para Maslow, a arte pode ser um instrumento valioso dentro da aprendizagem intrínseca, já que se aproxima muito da nossa essência psicológica e biológica, podendo se converter em experiência fundamental na educação, resgatando valores, metas e significado. A educação, por exemplo, através da dança, teatro espontâneo, música, arte e outros recursos expressivos é uma forma nova que direciona a criança, o adulto ao novo tipo de ser humano, um indivíduo orientado no processo; um indivíduo criativo; espontâneo; expressivo; improvisador e confiante, capaz de assumir atitudes criativas (SALDANHA, 2006, p. 73).

Os recursos utilizados na educação, dentro

das escolas, possibilitarão desenvolver nos educandos a capacidade de reflexão sobre quem são, o que os move e o que querem ser. Possibilitarão um maior nível de tranquilidade e abertura para a aprendizagem, assimilação do conhecimento e capacidade de relacioná-lo com a prática e, por fim, ajudará a formar uma sociedade com valores, cada vez mais unificada e em constante evolução.

É importante notarmos que a aderência à psicologia transpessoal numa instituição educacional, necessitaria de um conhecimento sobre esta abordagem e os seus benefícios. Pensando numa dimensão mais ampla como aquela da educação pública, o desafio seria a construção e adoção de políticas públicas, de um currículo escolar e um modelo pedagógico que favorecesse a uma ação educacional que estivesse voltada para a transpessoalidade. Poderíamos pensar ainda que o ideal seria que as nossas escolas tivessem um modelo de gestão transpessoal, ou seja, uma gestão que além do conhecimento, valorizasse os potenciais de cada um dos integrantes do processo educacional. Deste modo, a gestão transpessoal propiciaria uma transformação interior e exterior, e a sua prioridade seria a busca da felicidade plena para cada um dos educandos e colaboradores. Ainda, na perspectiva transpessoal, as instituições de educação estimulariam a todos a descobrirem a sua capacidade de criar, inovar e transformar. Significaria uma gestão no seu sentido mais

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amplo, sensível, motivadora e a sua influência na vida de todos os educandos seria muito positiva.

4.2. Transdisciplinaridade

Na prática, este novo modelo de educação adoptaria nos seus currículos o conceito da transdisciplinaridade, que é uma nova abordagem científica, social, cultural e espiritual que busca uma maneira nova de ver e entender a humanidade e encontrar um sentido para a vida. A transdisciplinaridade tem como referência teórica o holismo, que significa totalidade, inteireza.

A transdisciplinaridade é uma nova atitude, é a assimilação de uma cultura, é uma arte, no sentido da capacidade de articular a multirreferencialidade e a multidimen-sionalidade do ser humano e do mundo. Ela implica numa postura sensível, intelectual e transcendental perante si mesmo e perante o mundo [...]. A transdisciplinaridade transforma nosso olhar sobre o individual, o cultural e o social, remetendo para a reflexão respeitosa e aberta sobre as culturas do presente e do passado, do Ocidente e do Oriente, buscando contribuir para a sustentabilidade do ser humano e da sociedade (COLL et al, 2002, p.9-10).

A metodologia transdisciplinar revela uma

nova maneira de ser e de se relacionar com o mundo. Nela a aprendizagem não é fragmentada, o conhecimento é aprendido e apreendido. O seu objectivo é de resignificar os valores humanos para formar cidadãos melhores. ―O desafio da transdisciplinaridade é gerar uma civilização, em escala planetária, movida pela força de um diálogo intercultural‖ (IRIBARRY, 2003, p. 486).

A transdisciplinaridade supera o modelo da multidisciplinaridade e interdisciplinaridade, pois a multidisciplinaridade é a aproximação das disciplinas para resolver um determinado problema; a interdisciplinaridade é a interacção entre as disciplinas que integram vários conceitos, mas cada uma ainda permanece no seu bloco de ciências e continuam ainda separadas. A transdisciplinaridade vai além da separação e da fragmentação; as ciências interagem numa dimensão global, o seu objectivo é a totalidade; há uma busca pela sintonia e a conexão do ser humano com o cosmo e a unificação do todo.

Aqui as ciências não se encontram divididas, isoladas e fragmentadas, mas elas encontram-se unificadas através do diálogo e da reconciliação, o conhecimento é unificado e integrado. Uma ciência não é mais importante que a outra, a matemática não é mais importante que a arte, mas elas interagem e se complementam.

A transdisciplinaridade não procura o domínio sobre várias outras disciplinas, mas a abertura de todas elas àquilo que as atravessa e as ultrapassa. A visão transdisciplinar está resolutamente aberta na medida em que ela ultrapassa o domínio das ciências exatas por seu diálogo e sua reconciliação não somente com as ciências humanas, mas também com a arte, a literatura, a poesia e a experiência espiritual (IRIBARRY, 2003, p.486).

No quotidiano escolar, a transdisciplinaridade

supera a visão dualista e fragmentada (sujeito-objecto) de Descartes. O modelo de educação fundamentado na teoria de Descartes supervalorizou a racionalidade e a objectividade e simplificou os fenómenos complexos, dividindo-os em partes para melhor estudá-los. A transdisciplinaridade, também fundamentada na teoria da complexidade, assume uma didáctica unificada e contextualizada. As matérias e disciplinas não são vistas e estudadas separadas e sem conexão, mas elas se complementam e fazem sentido para o educando. O conhecimento aqui não é estático, neutro e nem pertencente a uma única pessoa (educador), pelo contrário, ele está constantemente em mudança e é construído conjuntamente (educador e educando).

A transdisciplinaridade permitirá ao educador uma consciência transdisciplinar a partir do autoconhecimento e da realização pessoal, essa consciência o levará à prática de valores humanos universais como a ética, o amor, a solidariedade, o respeito, a coerência e o cuidado. Para Nicolescu (1999 apud SALDANHA, 2008).

A transdisciplinaridade não é ―o‖ caminho, mas ―um‖ caminho no qual há um profundo olhar ético e humanitário: uma atitude transcultural, transreligiosa, transpolítica, transracional numa relação continua com a paz, a dignidade e nobreza da vida humana. Nesse contexto, de um paradigma transdisciplinar, está inserida a Psicologia Transpessoal (SALDANHA, 2008, p. 53).

Na perspectiva transdisciplinar, a escola não

tem a preocupação limitada com o conteúdo que deve ser partilhado com os educandos. Mais do que isso, a sua preocupação avança para a integração do ser humano. Preocupar-se-á com a alimentação, com o cuidado com o corpo que também é sagrado, prevê-se uma reeducação alimentar, uso de medicamentos alternativos, exercícios físicos e muito contacto com a natureza. Os educadores transpessoais ajudarão aos seus educandos no conhecimento e desenvolvimento das suas habilidades e aptidões, de modo que eles se encontrem como pessoas dentro de uma vocação e de uma profissão. Esta nova educação formará indivíduos mais

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conscientes de si, mais plenamente felizes e, portanto, transformadores da sociedade.

5. Conclusão A abordagem transpessoal na educação é

uma proposta que vem para inovar a atual maneira de educar encontrada na maioria dos espaços educacionais, demonstrando que o nosso modelo de educar ainda está fundamentado no reducionismo e mecanicismo. Associadas a esta realidade, as disciplinas e conteúdos estudados encontram-se num estágio fragmentado, sem conexão e sem integração entre eles. Deste modo, na esperança de uma transformação na sociedade a partir da mudança no ser humano, propomos um modelo de educação que propiciará aos educandos, humanização para chegar a um estado transpessoal, através da aplicação dos recursos transpessoais.

A educação transpessoal conduz à integração entre as disciplinas, a qual acontece a partir da transdisciplinaridade, abordagem que assume uma didáctica unificada e contextualizada.

A transpessoalidade na educação fundamenta-se na psicologia transpessoal, no entanto, ela não se restringe apenas à psicologia, vinculando-se igualmente a outras ciências como a sociologia, filosofia, antropologia e psiquiatria. A psicologia transpessoal é completa porque considera o organismo humano com um ser integrado nas suas dimensões biológica, física, psíquica, social e espiritual, uma vez que o ser humano é um indivíduo que está em busca da sua completude e da felicidade plena. Esse processo ocorre através de uma mudança de paradigmas, começando pela maneira de ver, pensar e de estar diante da vida.

Nesta perspectiva teremos um novo educador, uma nova escola e, portanto, um novo educando. A nova escola priorizará a descoberta e promoção das potencialidades do educador e dos educandos e se preocupará com a integração de cada um deles. Um novo educador, porque este fez a experiência de unidade e integração, assume novas atitudes na sua maneira de educar. O novo educando, por sua vez, descobrirá em si mesmo um ser capaz de integração e consciência para a transformação da sociedade.

Este estudo possibilitou o conhecimento e aprofundamento da psicologia transpessoal e dos benefícios da dimensão espiritual na educação para a integração do ser humano. A psicologia transpessoal não é uma ciência estagnada, mas aberta às constantes transformações da vida, isto porque quando nos referimos ao nosso interior, estamos diante de uma grande complexidade e de possíveis novas descobertas quotidianas. A experiência transpessoal provoca o abandono de ideias preconceituosas e fragmentadas e leva-nos

a ter uma visão mais ampla do mundo. Nela predomina o sentimento de integração com o universo e o sentimento de plenitude, isto porque estamos conectados com o nosso interior e exterior.

Entende-se que este trabalho é limitado e necessita de maiores aprofundamentos para indicar novas ideias dentro de uma proposta transpessoal para a educação. Este estudo despertou nas pesquisadoras o desejo de enveredar pela pesquisa no campo da psicologia e educação transpessoal, na perspectiva de aprofundar, nas suas experiências como educadoras, as dimensões da interioridade e da espiritualidade, de modo a garantir um trabalho mais integrado e unificador na educação.

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Mandala da integração

Fonte: Autoria de Celeste Carneiro

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12 – A ARQUITETURA DO TEMPO NA ARTE LUSO-BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA

Margarete Barbosa Nicolosi Soares*

Resumo O presente artigo visa retratar diálogos e reflexões elaborados a partir da observação direta de algumas obras tridimensionais de dois artistas contemporâneos reconhecidos em Portugal e no Brasil. As obras foram selecionadas da exposição ―Diálogos (in) directos‖, 2007, de Mónica Oliveira, bem como do Projeto ―As paredes têm orelhas‖, 2014, de Alcindo Moreira Filho. O texto relaciona a estética e a ressonância das obras de ambos e simula um diálogo entre elas. O texto traz ponderações dialéticas com alguns pensamentos de Gaston Bachelard nos capítulos I e X de seu livro ―Poética do Espaço‖: ―A casa. Do porão ao sótão. O sentido da cabana‖ e ―Fenomenologia do redondo‖. Palavras-chave: Forma tridimensional. Artes visuais. Espaço e tempo. Abstract The architecture of the time in the Luso-Brazilian contemporary art. This article aims to establish dialogues and reflections from the direct observation of some three-dimensional works of two contemporary artists well-known in Portugal and Brazil. The works were selected from the exhibition "Dialogues (in) direct," in 2007, Monica Oliveira, and the project "The walls have ears," 2014, Alcindo Moreira Filho. The text relates the aesthetics and the resonance of their works by simulating a dialogue between them. The text‘s reflections interact with some thoughts of Gaston Bachelard, in particular his book "Poetics of Space," the cap. I and X: "The house. From the basement to the attic. The direction of the cabin "and" Phenomenology of round". Keywords: Three-dimensional shape. Visual arts. Space and time.

As reflexões aqui desenvolvidas não pretendem abarcar a complexidade estética das obras escolhidas e da época em que elas se inserem, mas sobretudo pensar o que estas obras suscitam a partir de si mesmas. ________________________ * Margarete Barbosa Nicolosi Soares – Doutora em Artes, arte-educadora, artista plástica e pesquisadora. Docente na

UNIMES, em Santos, SP. Foi docente na UNICASTELO, SP, e docente conferencista no Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA/ USP, SP. Faz parte do grupo de Pesquisa: Palavra e Imagem, no CAP, ECA/USP. Pesquisa na área de ensino e aprendizagem da arte e linguagem tridimensional. [email protected]; [email protected].

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A exposição “Discursos (in)directos” (2007), de Mónica Oliveira

1

Monica Oliveira, ―Refúgio‖, 2007. Ferro pintado.

25,5 x 34 x 7 cm.

Mónica Oliveira, ―Esconderijo‖, 2007. Ferro

pintado. 39,0 x 34,5 cm.

Monica Oliveira, ―Teia das palavras‖. 2007. Ferro

pintado. 1,46 x 28 x 12 cm. 1,46 x 28 x 12 cm.

___________________________

1 Mónica Oliveira – Pós-doutorada em Educação Artística pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Doutora em Artes Plásticas pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Salamanca, 2000. Professora Coordenadora na Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, desde 1996. Investigadora integrada do Centro de Estudos em Desenvolvimento Humano da Universidade Católica do Porto. Investigadora colaboradora do Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade – Núcleo de Educação Artística da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Autora de várias publicações na área da Educação Artística, Ilustração e Artes Plásticas. Como escultora participou em várias exposições coletivas e individuais no país e no estrangeiro.

Mónica Oliveira, ―Palavras mutantes‖, 2007. Ferro

pintado.175 x 27 x 18 cm.

As cartas, de certo modo simulacros ou

mesmo microcosmos das casas, abrigavam, num passado não ainda muito distante, as nossas confidências amorosas, as aventuras, as viagens, as notícias das paisagens e dos acontecimentos humanos. E assim como há casas antigas e casas novas, de taipa e de tijolo, de madeira, de pedra e de papel, assim também há casas de ferro e de sonho. De igual modo há cartas de amor e de raiva, cartas para rir e para chorar, cartas de novidades e de banalidades, cartas verdadeiras e cartas hipócritas, cartas choradas e cartas perfumadas. E assim quando uma carta chega a uma casa ela de algum modo partilha mais ou menos explicitamente algo do que se passa ou faz parte da história da sua casa.

Segundo Laureano Silveira, traduziu a exposição Discursos (in)directos como a ―Presentificação do Ausente‖:

(...) discursos (in)directos - convida-nos a regressar à matriz antropogenética da comunicação, restaurando os laços metapsicológicos que unem os seres humanos pelos símbolos em dimensões de exterioridade sócio-afectiva. Um desses símbolos é a carta e os significantes a ela associados – envelopes, folhas, postais, caixas de correio, selos - formas geradoras de conteúdos. Mas também as palavras e os conceitos – sonho, viagem, memórias, destino, ilusão, encontro, fuga,... – conteú-dos que se instituem como formas, convidando ao diálogo entre o concreto e o abstracto, entre o objectivo e o subjectivo, entre o mundo e a sua representação e que, indo para além destas e de outras dualidades, numa visão que relaciona o múltiplo e o heterogéneo, respeitando o

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«tecido comum» (Morin, 1988) com que se faz a realidade, entrelaça os destinos de cada um no destino colectivo da condição humana (SILVEIRA, 2007).

As formas envelopes casas dos ―Discursos (in) directos‖ suscitam como que uma arquitetura dos sonhos e transportam-nos para o mundo suprarreal, do qual somos muitas vezes ou quase sempre afastados pelas contingências da vida, mas que no fundo e em última instância nos é tão íntimo. ―(...) todo espaço verdadeiramente habitado traz a essência da noção de casa‖ (BACHELARD, p. 200).

A casa é o lugar onde somos iniciados nos primeiros passos, palavras, sabores, leituras, descobertas, sentimentos e sonhos. É o local primordial do acolhimento e do encontro, um lugar de intimidade, abrigo, segurança e proteção.

A casa minimalista e geometrizada por si remete à essência, ao que tem valor; atrai-nos e captura o olhar, traduz a intimidade do espaço interior em que nos abrigamos. A casa fechada lembra-nos todas as casas que nos deram proteção e segurança, intensifica e potencializa os nossos afetos e anseios. A casa aberta por sua vez já nos faz refletir sobre a abertura ao mundo, o relacionamento com o exterior, o ir e vir no espaço.

A contemplação aprofundada causa uma suspensão temporária da vida quotidiana e leva-nos para a imaginação da filosofia do habitar. Deixamo-nos percorrer pelas lembranças adormecidas da infância, época em que a vontade instintiva e a imaginação livre moviam as nossas mãos e associações de pensamentos. Esquecemos então por momentos da vida manipulada pelo apelo ao consumo, e vendida e propagada pelos meios de comunicação, de modo a consumirmos tanto a obra como a nós mesmos. Passamos então de novo de observadores contemplativos a participantes por atração e por vontade, esta mais ou menos consciente. Mas nesses momentos de contemplação mergulhamos na imensidão íntima do ser como buscadores sonhando com o tempo perdido, com o ambiente da infância, com a segurança maternal ou mesmo divina.

Na ―Poética do Espaço‖, Bachelard inaugura o primeiro capítulo com um estudo sobre: ―A casa. Do porão ao sótão. O sentido da cabana‖, e salienta:

É preciso dizer então como habitamos nosso espaço vital de acordo com todas as dialéticas da vida, como nos enraizamos, dia a dia, num "canto do mundo" (BACHELARD, p. 208).

A arquitetura dos sonhos une o envelope com a casa. Juntos, eles protegem, isolam, abrigam e refugiam o sonhador. O ser que habita a casa é o mesmo que habita a carta. Ora somos corpo

carnal, ora somos corpo literário. Nossas palavras são aquilo que respiramos, inspiramos e exalamos, ou seja, o que somos, do que nos alimentamos e amamos.

As cartas trazem-nos de volta para casa, para o lugar seguro. Da casa partimos: cartas abertas. Para casa voltamos: cartas escritas. E na casa chegamos: cartas fechadas.

Pois a casa é o nosso canto do mundo. Ela é, como se diz frequentemente, o nosso primeiro universo. É um verdadeiro cosmos. Um cosmos em toda a acepção da palavra. Até a mais modesta habitação, vista intimamente, é bela (BACHELARD, p. 200).

A verticalidade da casa intensifica e dialoga com a verticalidade do homem. As lembranças da casa ativam a imaginação, trazem à consciência os sonhos e os seus valores, tal como afirma Bachelard: ―somos mais poetas do que verdadeiros historiadores‖. A arquitetura dos sonhos traz-nos, pois, a emoção da palavra e da poesia perdida (BACHELARD, p.201).

A casa é imaginada como um ser vertical. Ela se eleva. Ela diferencia-se no sentido da sua verticalidade. É um dos apelos à nossa consciência de verticalidade (BACHELARD, p.208).

A obra sacia o nosso desejo de subir ao céu: ―Os elevadores destroem os heroísmos da escada. Já quase não há mérito em morar perto do céu‖. Assim como o automatismo no envio de e-mails destrói as subtilezas e inspirações da carta: o seu perfume, a intencionalidade, o toque na pele papel, a expectativa da espera, a surpresa na chegada, no fundo a casa que chega a outra casa, a comunicação dos microcosmos no macrocosmos. E é este convite à comunicação sócioafetiva que Silveira exalta nas obras de Mónica Oliveira:

Num tempo de «nomadismo cosmopático», em que os seres humanos das sociedades globalizadas se exercitam na «reformatação da personalidade para o novo mundo sincrónico», cumprindo um processo histórico-político-antropológico que «repre-senta uma contínua onda de insularidade, definidora do próprio indivíduo» (Slöterdijk, 1996), aquilo a que chamaríamos a face visível da presente proposta de Mónica Oliveira – discursos (in)directos - convida-nos a regressar à matriz antropogenética da comunicação, restaurando os laços metapsicológicos que unem os seres humanos pelos símbolos em dimensões de exterioridade sócio-afectiva (SILVEIRA, 2007).

Quando olho a escada, desejo abrir as janelas

do céu, desfazer as paredes do abrigo e poder voar nas asas de liberdade. ―Diálogos (in) directos‖ dialogam com as histórias da nossa casa íntima. Todos temos um lugar no mundo, um canto, uma casa.

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Projeto: “As paredes têm orelhas” (2010-2015), de Alcindo Moreira Filho

2

Alcindo Moreira Filho, projeto ―As paredes têm orelhas‖. Ferro oxidado e pintado. Várias dimensões. 2014.

________________ 2Alcindo Moreira Filho, 1950, Natural de Caconde - SP,

Brasil, graduado em Artes Plásticas desde 1975. Professor Livre Docente com Doutorado e Mestrado pela Escola de Comunicações e Artes, ECA – Universidade de São Paulo, USP. Professor da Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖, UNESP. Cursos em Espanha, Inglaterra e Itália. Realizou diversas exposições nacionais e internacionais. Homenageado na UNESP que deu o seu nome a galeria de arte da universidade. Desenvolve intensa pesquisa no campo da artes contemporânea

Alcindo Moreira Filho, projeto ―As paredes têm orelhas‖. Ferro oxidado e pintado. Várias dimensões. 2014.

O projeto ―Paredes tem orelhas‖ apresenta-nos um conjunto de formas ou objectos que já foram de um casa de família ou de um local de trabalho, ou seja, de lazer ou de labuta e que adquiriram novos significados.

Os objetos mais resilientes como que preservam as rugas do tempo e manifestam quase que uma estética da mumificação, uma arte preservação realizada pelo corte, a colagem, a solda, a corrosão, a oxidação, a pintura.

As formas circulares que contemplamos evocam o universo, o cosmos, que é um todo ordenado ou ornamentado.

O ser é redondo (...). As imagens da plena redondeza ajudam-nos a congregar-nos, a darmos a nós próprios uma primeira constituição, a afirmarmos o nosso ser intimamente, pelo interior (BACHELARD, p.350).

Na ―Poética do Espaço‖, Bachelard nos lembra Van Gogh: ―A vida é provavelmente redonda‖. Aqui, o que o filósofo nos reintroduz, não é apenas a percepção fenomênica da esfericidade da existência humana, mas a lembrança do caráter cíclico do existir.

Ao lembrarmos das origens da concepção dialética, nos remetemos a Heráclito e sua valorização do caráter cíclico da vida humana. No capítulo ―A fenomenologia do redondo‖, que encerra o livro já citado, Bachelard nos auxilia a compreender através de asserções fenome-nológicas, como a de Van Gogh, que esse caráter dialético da existência humana, já vivo em Heráclito, e perceptível nas falas posteriores acerca do caráter esférico da realidade e sua qualidade dialética, compõe todas as dimensões do cotidiano humano, em sua esfera individual e social.

As obras apresentadas evocam a continui-dade e perpetuação da matéria, a experimen-tação, a serialidade, a repetição, a apropriação, a acumulação, a multiplicação, a sustentabilidade, a transitoriedade, a transmutação, a reciclagem e a ressignificação.

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O criador das novas formas é, sobretudo, um reutilizador, um reordenador das coisas, mas também por extensão do ambiente e da psique de todos os que os contemplarem ou utilizarem, o que ecoará luminosamente ou como novo ornamento no Universo do Logos ou Razão e dos seus significados. O encontro entre os “Discursos (in)directos” e as “Paredes têm orelhas”

Esta reflexão possibilita relacionar a

ressonância das obras contemporâneas de Mónica Oliveira, artista portuguesa, e de Alcindo Moreira Filho, artista brasileiro, cujos trabalhos evocam a duração no tempo dos objetos, a mutabilidade e a transitoriedade dos seus usos e signficados.

Podem-se observar analogias nos processos de criação de ambos, tais como a criatividade de um trabalho rigoroso e a capacidade de desenvolverem as especificidades técnicas e processuais para obra de acordo com o material utilizado, o qual gera necessidades exclusivas bem condicionadoras.

No mundo onde os e-mails são disparados automaticamente aos milhares, os ―Discursos diretos (in) directos‖, permeados por envelopes, cadeados que se fecham, origamis e simetrias sequenciais dobradiças levam-nos a refletir sobre o consumismo, a industrialização, a troca do trabalho manual pela dependência da máquina, a passagem cada vez mais rápida e não aprofundada do tempo e das horas.

Na era do objeto descartável, onde as pessoas trocam de celular, computador ou carro num ritmo cada vez mais acelerado e ecologicamente irresponsável, o projeto ―As paredes têm orelhas‖ materializa a tomada de controle consciente e ressignificadora de objetos usados, evitando assim o seu destino para a lixeira e manifestando uma sensibilidade ecológica, estética e artística de preservação, transmutação e salvação ressignificante.

As obras podem despertar quase infinitas relações e reflexões teórico-práticas e existenciais, assim como a projeção de novas referências a partir do grau consciencial e cultural do apreciador fruidor. O olhar sensível e a percepção aguçada, conscientemente coerente ou em sintonia com os homens e o mundo e a natureza de seu tempo, proporcionam as produções ou criações de cada um com o seu caráter original e específico.

As formas movem os nossos corpos, propõem a ação de aguçarmos os sentidos em função, sobretudo da área visual e do campo corporal afetado ou que interage e são, portanto, objetos com um grande potencial de despertarem ou inspirarem uma poética dos afloramentos ou mesmo adensamentos sinestésicos. Comensu-ram o incomensurável, transportam o ser para outros lugares, contextos e dimensões, originando ou propondo novas significações, propulsoras de várias leituras perceptivo-sensoriais do mundo com as consequentes dinamizações da ornamentação do Todo.

Artistas críticos, ativos, responsáveis, coerentes e conscientes das consequências da sua existência são importantes ou mesmo fulcrais para a evolução da humanidade enquanto co-criadores de sua época. Ressignificam os objetos e sentidos esquecidos ou perdidos, abandonados ou descartados em prol da conservação e preservação, memória e valorização, renovação e transformação, transmutação e vitalidade das melhores potencialidades humanas.

No meio da crise e dos desastres mundiais somos então impulsionados a pensar na saturação e ilusão de muitos dos falsos valores da sociedade, tais como o individualismo, o progresso a qualquer preço ou o trabalho meramente utilitário, e por meio da arte podemos vislumbrar e contribuir para um mundo melhor, no qual o Microcosmos humano refletirá mais luminosamente o Macrocosmos, ou o Todo belo e ordenado.

Porto, outono de 2015.

Referências BACHELARD, Gaston. A Poética do Espaço. Martins Fontes. São Paulo, 2012. ________________ A Poética do Espaço. Martins Fontes. São Paulo, 2012. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/57089481/BACHELARD-Gaston-A-Poetica-Do-Espaco#scribd Acessado em: 15/10/2015, 10h30

SILVEIRA, Laureano. Presentificação do

Ausente2007. Disponível em: http://www.monicaoliveira.net/pt.html. Acessado em: 13/10/2015, 09h20.

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13 – A VIDA E SUAS DIFERENÇAS

Gilmar Carneiro*

Nas fábricas antigas, nos fins do século XVIII só trabalhavam homens. Em alguns casos tinham mulheres e crianças, que faziam serviços menos pesados e/ou complementares. A jornada de trabalho era de 16 horas diárias, sem férias, nem 13º salário. Sem assistência médica, nem ajuda funerária. O ser humano valia muito pouco. Era o início do modo de produção capitalista e da revolução industrial.

Com as grandes guerras na Europa, os homens precisaram ir para as batalhas e as mulheres e as crianças passaram a fazer ―serviço pesado de homens‖. Passaram também a ter salários melhores que antes e aumentaram seu poder de barganha por salários, condições de trabalho e benefícios complementares.

Quando as guerras acabaram, as mulheres já não aceitavam mais deixar de trabalhar fora e ser apenas ―donas de casa‖. Já as crianças foram protegidas e muitas puderam estudar e ter vida de criança. Afinal, depois de milhões de mortes, a Europa precisava ser repovoada. As monarquias iam perdendo suas funções, sendo substituídas por democracias e progressivamente aumentava o respeito ao povo.

Com o fim das guerras, muitos países precisaram ―importar mão de obra‖ para serviços pesados como construção civil, limpeza e os serviços pesados nas fábricas e prefeituras. Por exemplo, a Alemanha importou centenas de milhares de cidadãos da Turquia. Os franceses importaram argelinos e os ingleses importaram indianos.

Estas diferenças étnicas fizeram com que, além das diferenças sociais dentro da mesma etnia, surgisse a diferença social entre povos diferentes, mas moradores nas mesmas cidades, muitas vezes estimulando o preconceito e as agressões. Comunidades muitas vezes não se

misturavam, aumentando o risco de agressões. Da mesma forma que as mulheres passaram a

receber salários menores do que os dos homens, mesmo exercendo as mesmas funções, as pessoas de etnias diferentes também passaram a ter restrições para determinadas funções, além de salários menores.

Estas diferenças criaram as condições para grandes campanhas cívicas como a luta das mulheres pelo direito de votar, o movimento dos negros americanos para terem os mesmo direitos que os brancos, e mesmo a campanha dos latinos para serem incluídos na sociedade dos Estados Unidos.

Com a evolução da tecnologia, a melhoria da qualidade da educação e a inclusão de amplas parcelas da população nas políticas públicas, segmentos que até então não se expressavam publicamente, como os homossexuais e as lésbicas, passaram a exigir o direito de opção sexual ou de ser o que o corpo ou a mente lhe demandavam. Chegamos a um estágio de qualidade de vida e de respeito à cidadania até então impensável. Afinal, se o homem foi à lua, por que se recusar a reconhecer as diferenças humanas?

Para que as pessoas pudessem ter garantidos os seus direitos, surgiram associações religiosas, associações de imigrantes, associações de moradores, associações profissionais e, mais tarde, surgiram também os Partidos Políticos e os Sindicatos de Trabalhadores (homens e mulheres).

Acontece que os ricos, os governantes e os conservadores defenderam (e defendem) suas posições e seus valores sociais usando as instituições do Estado. Por exemplo, o judiciário julga conforme a constituição conservadora, a polícia geralmente defende as leis dos

_________________ * Gilmar Carneiro – Formado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. Sindicalista, foi presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Secretário Geral da CUT, um dos fundadores e dirigentes do PT e da CUT, militante de base da Pastoral da Criança, Espírita da Teologia da Libertação. Foi do Comitê Mundial da UNI - Union Network International e representou a CUT no Conselho de Administração do BNDES. Foi diretor do DIEESE, da Fundação Projeto Travessia, TVT-TV dos Trabalhadores, da Coordenação Nacional da ADS - Agência de Desenvolvimento Solidário da CUT. http://www.carneirogilmar.com.br/ - [email protected]

Uma oportunidade para o Livre Pensar

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governantes, as empresas selecionam profis- sionais que aceitem as normas conservadoras, os evangelizadores interpretam os ensinamentos com os conceitos conservadores e até as escolas ensinam os mesmos valores conservadores como se fossem os mais corretos. Com o surgimento do rádio e da TV, o conservadorismo achou mais um mecanismo doutrinário e interpretativo.

Entre os valores conservadores, passa-se a imagem de que as organizações sociais, os sindicatos e os partidos de esquerda são instituições ruins e nocivas à sociedade. Entretanto, é tudo uma questão de evolução. Da mesma forma que hoje se reconhece os direitos das mulheres, que se acha natural as mulheres votarem, sendo que este direito foi conquistado somente a partir do século XX, os sindicatos de trabalhadores e os partidos de esquerda, também, aos poucos serão vistos como algo ―natural‖, necessário e que faz parte da nossa vida quotidiana. Na Europa, os sindicatos existem há mais de cem anos e fazem parte da história de seus países.

Estes mesmos direitos e suas instituições também serão necessários para defender, dos mais ricos e dos preconceituosos, as pessoas de etnias diferentes.

O tempo é fundamental, mas não devemos ―esperar passivamente‖. Direitos e deveres devem ser ensinados e praticados diariamente. Sendo todos agentes da história de cada um e de todos.

O mundo passa por um período de insegurança, de terrorismo e de guerras localizadas que se espalham por regiões, ameaçando ampliar-se por continentes, como aconteceu, tanto na Primeira Guerra Mundial como na Segunda. Esta mesma insegurança aparece no Brasil atual, com o surgimento de intolerâncias e preconceitos que não apareciam até pouco tempo atrás.

O descrédito nas instituições e governos deixam as pessoas inseguras e com medo. Foi assim que o nazismo cresceu e levou o mundo ao genocídio. Será que estamos vivendo o inicio de um novo processo de autodestruição? Ou o mundo está fazendo seu "enxugamento populacional cíclico"? Na Primeira Guerra Mundial morreram mais de 20 milhões de pessoas e acabou a maioria das monarquias. Na Segunda Guerra Mundial, morreram mais de 60 milhões de pessoas e acabaram os grandes impérios da Inglaterra e da França, consolidando-se os novos impérios americanos e soviéticos.

Se, por um lado acabaram velhos impérios e surgiram novos, ao mesmo tempo o mundo passou por profundas transformações e melhorias de qualidade de vida. Áreas como saúde, medicina, pesquisa, tecnologias, informática, transporte e eletrodomésticos melhoraram as condições de vida e levaram o planeta Terra a mais que duplicar sua população. Ao mesmo tempo em que, com as guerras, morreram mais de 100 milhões de pessoas, com o avanço tecnológico a população mundial pulou de 3 para 7 bilhões de pessoas.

As aldeias deram lugar às cidades, que se tornaram megalópolis que transformaram pequenos países em parte da Aldeia Global. Isto é, todos estamos interligados. No Brasil se compra um tênis produzido no Vietnã, que compra uma camisa de futebol com o nome de Messi, que aplica o que ganha na bolsa de Londres, que financia uma fábrica na China, que compra as terras no Brasil, que vende carne para os russos, que vende gás para os franceses e assim o mundo se interliga.

Com todas as contradições e diferenças, mas do que nunca vamos compreendendo que "A Terra é nossa Pátria".

Fonte: Imagem Goolgle

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14 – PROVA DE QUÍMICA

Escola Politécnica da Bahia Curso de Engenharia Civil

Carlos Marighella*

Dissertar sobre as propriedades do hidrogênio — elemento. Sua preparação no laboratório e na indústria.

De leveza no peso são capazes Diversos elementos, vários gases O hidrogênio, porém, é um gás que deve Ter destaque, por ser o gás mais leve. Combina-se com vários metalóides, Com todos aliás, e os sais halóides, Provêem de ácidos por aquele gás Formados, reunindo-se aos metais. Cloro e hidrogênio combinados dão Um ácido – o clorídrico – e a explosão Produzida por bela experiência Pode ser de funesta conseqüência. Vale a pena que seja aqui descrita Essa experiência que acho tão bonita. O desejado efeito se produz Na escuridão, ausente toda luz. O cloro ao lado do hidrogênio fica Num vaso, e isso por forma alguma implica

Numa veloz combinação dos dois, Porquanto a mesma só virá depois. Então, do vaso em que se chegando à boca Uma chama, ribomba, estruge, espouca O violento estampido que anuncia Pronta a combinação. À luz do dia Faz-se a combinação rapidamente (Nesse caso o perigo é iminente). De uma notável propriedade goza: Atravessa veloz qualquer porosa Superfície e, por ser incomburente, É queimado, não queima. A luz ardente Que possui é de cor azul no tom, E na harmonia química, o seu som É típico e semelha um longo ronco De um urso velho dorminhoco e bronco. Salvador, 27 de junho de 1931.

Extraído do Jornal A Tarde – 25.09.1999.

__________________ * Carlos Marighella – (1911-1969). Político, guerrilheiro e escritor brasileiro, participou ativamente do Partido

Comunista, da Intentona Comunista e, a partir de 1964, foi um dos principais organizadores da luta contra a ditadura militar, vindo a falecer assassinado numa emboscada armada pelos militares. Em 2012, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, oficializou a anistia post mortem de Marighella. Em novembro de 2013, a Comissão da Verdade realizou ato em homenagem ao aniversário de 44 anos da sua morte. https://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_Marighella

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15 – HISTÓRIAS DE MULÁ NASRUDIN*

O CONTRABANDISTA

Nasrudin costumava atravessar a fronteira da Pérsia com a Grécia no lombo de um burro.

Levava sempre dois cestos de palha e voltava caminhando sem eles.

Todas as vezes os guardas o revistavam em busca de contrabando. Nunca encontraram nada.

―O que está transportando, Nasrudin?‖ ―Sou um contrabandista‖, ele respondia. Anos depois, aparentando cada vez mais

prosperidade, Nasrudin se mudou para o Egito. Lá, um dos homens da alfândega o encontrou. ―Diga-me, Mulá, agora que você está fora da

jurisdição da Pérsia e da Grécia, vivendo aqui com tamanho luxo, o que contrabandeava e que nunca conseguimos pegá-lo?‖

―Burros.‖ A MULHER PERFEITA

Nasrudin conversava com um amigo, que lhe perguntou: – Então, mullah, nunca pensaste em casamento? – Já pensei. Em minha juventude, resolvi conhecer a mulher perfeita. Atravessei o deserto, cheguei a Damasco, e conheci uma mulher espiritualizada e linda; mas ela não sabia nada das coisas do mundo. Continuei a viagem, e fui a Isfahan; lá encontrei uma mulher que conhecia o reino da matéria e do espírito, mas não era uma moça bonita. Então

resolvi ir até o Cairo, onde jantei na casa de uma moça bonita, religiosa e conhecedora da realidade material. – E por que não casaste com ela? – Ah, meu companheiro! Infelizmente ela também procurava um homem perfeito. FISGANDO O PEIXE

Um rei enviou uma delegação secreta às zonas rurais para que se encontrasse um homem modesto que pudesse ser designado para juiz. O Mullá Nasrudin acabou sabendo disso.

Quando a delegação, fazendo-se passar por um grupo de viajantes, visitou Nasrudin, verificou que ele tinha uma rede de pesca enrolada nos ombros.

Um deles perguntou: ―Diga-nos, por favor, porque usa esta rede?‖

―Simplesmente para recordar-me de minha origem humilde, pois um dia já fui pescador‖.

Pela força deste nobre sentimento, Nasrudin foi nomeado juiz.

Um dia, ao visitar sua corte, um dos oficiais que estivera naquela delegação, perguntou-lhe: ―o que aconteceu à sua rede, Nasrudin?‖

―Com toda a certeza‖, respondeu o novo Juiz, ―não há necessidade de uma rede, quando já se fisgou o peixe‖.

______________

* Mulá Nasrudin – Sábio sufi, acredita-se que viveu durante o século XIII em Akshehir, perto de Konya, capital do

Sultanato de Rum Seljuk, na atual Turquia. Suas histórias são traduzidas para vários idiomas, usadas para ilustrar ensinamentos e como instrumentos de meditação, como os ensinos zen budistas e os koans. Dentre as obras que contém suas histórias, destacamos As parábolas e contos de Nasrudin, organizado por Alexandre Rangel, Ed.

Leitura.

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