produção de aguardente dupla destilação

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Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” Produção de aguardentes de cana-de-açúcar por dupla destilação em alambique retificador Paula Araújo de Souza Dissertação apresentada para obtenção do título de Mestre em Ciências. Área de concentração: Ciência e Tecnologia de Alimentos Piracicaba 2009

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produção destilação da aguardente de cana

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  • Universidade de So Paulo Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz

    Produo de aguardentes de cana-de-acar por dupla destilao em

    alambique retificador

    Paula Arajo de Souza

    Dissertao apresentada para obteno do ttulo de Mestre em Cincias. rea de concentrao: Cincia e Tecnologia de Alimentos

    Piracicaba 2009

  • Paula Arajo de Souza Nutricionista

    Produo de aguardentes de cana-de-acar por dupla destilao em alambique

    retificador

    Orientador: Prof. Dr. ANDR RICARDO ALCARDE

    Dissertao apresentada para

    obteno do ttulo de Mestre em Cincias. rea de concentrao: Cincia e Tecnologia de Alimentos

    Piracicaba 2009

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    DIVISO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO - ESALQ/USP

    Souza, Paula Arajo de Produo de aguardentes de cana-de-acar por dupla destilao em alambique

    retificador / Paula Arajo de Souza . - - Piracicaba, 2009. 97 p. : il.

    Dissertao (Mestrado) - - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, 2009. Bibliografia.

    1. Aguardente 2. Anlise sensorial de alimentos 3. Bebidas alcolicas 4. Cana-de-acar 5. Destilao I. Ttulo

    CDD 663.53 S729p

    Permitida a cpia total ou parcial deste documento, desde que citada a fonte O autor

  • 2

  • 3

    Dedico e ofereo aos meus amados pais

    ngela e Jos Alberto, por serem a razo e o

    porqu de tudo na minha vida. No h palavras

    que expressem o meu amor por vocs!

  • 4

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    Deus, por estar sempre presente na minha vida, protegendo, abenoando e guiando

    os meus passos e os daqueles que amo;

    Aos meus amados e queridos pais ngela e Jos Alberto, pelos grandiosos

    ensinamentos e exemplos de seres humanos e profissionais, pelo carinho, zelo,

    proteo, colo, incentivo, amizade, concretizao de sonhos, cumplicidade e amor

    imensurveis e incondicionais. Vocs so os maiores orgulho e felicidade para o meu

    corao. Obrigada por serem perfeitos aos meus olhos e corao. Amo vocs sem

    limites...;

    Ao meu amado irmo Fernando, pelo nosso amor, amizade, companheirismo, abraos

    apertados e sorrisos iluminados todos os dias. Ter voc, ao meu lado, no dia a dia, me

    fez e me faz mais forte e feliz;

    Ao meu amado namorado Paulo, pelo nosso companheirismo, amor, cuidado,

    presena, compreenso e carinho sempre.. sempre.. sempre. Voc torna meus dias

    mais doces e coloridos. A sua famlia, pelo grande carinho;

    vov Didi, ao vov Joo e vov Betinha, pelo amor, carinho, preocupao e

    inmeras oraes;

    Ao vov Jos (eterna saudade), por estar sempre presente no meu corao;

    s minhas madrinhas e padrinho, tias e tios, primas e primos, pelo eterno carinho. Em

    especial, dindinha Cristina e afilhada Rachel, pelo amor e incentivo;

    s minhas amigas - Ana Helena, Paloma e Luciana, pela verdadeira amizade, mesmo a

    longas distncias;

  • 6

    Ao meu orientador, Prof. Dr. Andr Ricardo Alcarde, pela confiana, oportunidade,

    dedicao, orientao, ensinamentos e infinitas ajudas;

    Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz ESALQ, pela oportunidade de

    realizao deste projeto;

    A todos os professores e funcionrios do Departamento de Agroindstria, Alimentos e

    Nutrio, pelos ensinamentos cientficos e ateno sempre carinhosa;

    Aos funcionrios do laboratrio de Acar e lcool Dito, Gil, Joana, Regina e Vana. E,

    em especial, ao Pedrinho, Sylvino e Rose pela acolhida, auxlios indispensveis nos

    experimentos e anlises, carinho e momentos de descontrao;

    A todos os estagirios que passaram pelo projeto, em especial Renata, Camila e

    Patrcia pela companhia e papos durante as longas destilaes e anlises;

    Helena Finardi lvares Scanavini, por ter se tornado uma grande companheira e

    amiga, pelos grandes ensinamentos e valiosas ajudas sempre;

    Aos meus colegas de mestrado: Dieta, Pol, Adna, Milla, Carlinha, J Era, Carla e a

    todos os outros, pelas ajudas e convivncia carinhosa;

    Aos participantes das anlises sensoriais, pela colaborao;

    Aos membros da banca examinadora, pela participao e valiosas sugestes;

    bibliotecria Slvia Maria Zinsly, pelo auxlio tcnico na reviso deste trabalho;

    Ao Prof. Dr. Douglas Wagner Franco, pela gentil colaborao na anlise de carbamato

    de etila;

  • 7

    Ao Prof. Dr. Andr Luis Teixeira Fernandes, pela confiana, credibilidade, incentivo e

    grandiosa ajuda na realizao do sonho do mestrado;

    Ao Prof. Dr. Ricardo Gonalves Coelho, pelo incentivo e carinho;

    Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo FAPESP, pela bolsa

    concedida e apoio financeiro ao projeto (07/53017-7);

    A todos aqueles que, direta ou indiretamente, contriburam para a elaborao e

    concluso deste projeto;

    Minha eterna gratido a todos vocs...

  • 8

  • 9

    SUMRIO

    RESUMO ................................................................................................................... 13

    ABSTRACT ................................................................................................................ 15

    LISTA DE TABELAS .................................................................................................. 17

    LISTA DE FIGURAS .................................................................................................. 19

    1 INTRODUO ........................................................................................................ 21

    2 REVISO BIBLIOGRFICA ................................................................................... 23

    2.1 Histrico da aguardente ....................................................................................... 23

    2.2 Diferenciao entre aguardente e cachaa ......................................................... 24

    2.3 Caracterizao dos componentes da aguardente ............................................... 25

    2.3.1 Cobre ................................................................................................................ 27

    2.3.2 Acidez voltil ..................................................................................................... 27

    2.3.3 steres .............................................................................................................. 27

    2.3.4 Aldedos ............................................................................................................ 28

    2.3.5 lcoois superiores ............................................................................................ 28

    2.3.6 Furfural ............................................................................................................. 28

    2.3.7 Metanol ............................................................................................................. 29

    2.3.8 Carbamato de etila ........................................................................................... 29

    2.3.9 Etanol ................................................................................................................ 29

    2.4 Importncia econmica e social .......................................................................... 29

    2.5 Processo de produo da aguardente ................................................................. 31

    2.5.1 Matria-prima .................................................................................................... 31

    2.5.2 Caldo de cana-de-acar ................................................................................. 32

    2.5.3 Mosto ................................................................................................................ 33

    2.5.4 Fermentao ..................................................................................................... 34

    2.5.5 Componentes secundrios ............................................................................... 35

    2.5.6 Destilao ......................................................................................................... 37

    2.6 Composio qualitativa da aguardente ............................................................... 39

    2.7 Tcnicas de destilao ...................................................................................... 40

  • 10

    2.7.1 Destilao simples ............................................................................................ 40

    2.7.2 Dupla destilao ............................................................................................... 41

    2.7.3 Destilao para produo de cognac ............................................................... 42

    2.7.4 Destilao para produo de whisky ................................................................ 43

    2.8 Envelhecimento ................................................................................................... 43

    2.9 Anlise sensorial ................................................................................................ 44

    3 OBJETIVOS ............................................................................................................ 47

    4 MATERIAL E MTODOS ....................................................................................... 49

    4.1 Material ................................................................................................................ 49

    4.2 Mtodos ............................................................................................................... 49

    4.2.1 Extrao do caldo de cana-de-acar .............................................................. 49

    4.2.2 Tratamento de purificao do caldo de cana-de-acar .................................. 49

    4.2.3 Padronizao do caldo de cana-de-acar ....................................................... 49

    4.2.4 Fermentao do caldo de cana-de-acar ....................................................... 50

    4.2.5 Destilao do vinho .......................................................................................... 50

    4.2.6 Mtodos utilizados para dupla destilao ......................................................... 52

    4.2.7 Mtodo utilizado para aguardente testemunha ................................................ 53

    4.2.8 Envelhecimento das aguardentes .................................................................... 54

    4.2.9 Anlises fsico-qumicas ................................................................................... 54

    4.2.9.1 Acidez voltil .................................................................................................. 55

    4.2.9.2 Furfural .......................................................................................................... 55

    4.2.9.3 Graduao alcolica ...................................................................................... 55

    4.2.9.4 Aldedos, steres, metanol e lcoois superiores ........................................... 55

    4.2.9.5 Cobre ............................................................................................................. 56

    4.2.9.6 Carbamato de etila ........................................................................................ 56

    4.2.9.7 Composto fenlicos totais .............................................................................. 57

    4.2.9.8 Cor ................................................................................................................. 57

    4.2.10 Anlise sensorial ............................................................................................. 57

    4.2.11 Anlise estatstica ........................................................................................... 58

    5 RESULTADOS E DISCUSSO .............................................................................. 61

    5.1 Caldo e vinho de cana-de-acar ........................................................................ 61

  • 11

    5.2 Curvas de volatilizao dos componentes .......................................................... 62

    5.2.1 Primeira destilao ........................................................................................... 62

    5.2.2 Segunda destilao .......................................................................................... 66

    5.3 Anlise qumica das aguardentes ........................................................................ 70

    5.3.1 Produo de aguardente segundo processo do cognac (LAUT, 1990) ....... 70

    5.3.2 Produo de aguardente segundo processo do whisky (PIGGOTT, 2003) ...... 77

    5.3.3 Produo da aguardente testemunha .............................................................. 82

    5.3.4 Determinao dos teores de carbamato de etila .............................................. 83

    5.3.5 Compostos fenlicos totais e cor ...................................................................... 84

    5.4 Anlise sensorial .................................................................................................. 84

    6 CONCLUSO ......................................................................................................... 89

    REFERNCIAS ......................................................................................................... 91

  • 12

  • 13

    RESUMO

    Produo de aguardentes de cana-de-acar por dupla destilao em alambique retificador

    O Brasil produz atualmente cerca de 1,5 bilho de litros de aguardente e cachaa

    por ano. O aumento do consumo dessa bebida e a possibilidade de exportao exigem que seu processo de fabricao seja baseado em prticas corretas visando obteno de um produto padronizado e com boa qualidade fsico-qumica e sensorial. O objetivo deste trabalho foi a produo de aguardentes por dupla destilao em alambique retificador, por mtodos utilizados na produo de cognac e scotch malt whisky. Foi possvel estudar como essas tcnicas de destilao interferem no perfil dos componentes secundrios da bebida e, consequentemente, em sua qualidade, uma vez que contribuem para seu aroma e sabor, sendo indicadores de qualidade e aceitao pelos consumidores. As aguardentes foram maturadas em tonis de carvalho e submetidas s anlises fsico-qumicas estabelecidas pela legislao vigente no Brasil, e anlise sensorial. Os resultados obtidos revelaram que as tcnicas de dupla destilao empregadas proporcionaram melhora na qualidade qumica e sensorial das aguardentes, podendo representar uma opo vlida para um melhor controle da produo e da padronizao da aguardente de cana. A melhora da qualidade da aguardente poder incrementar a aceitao pelos consumidores habituais, ganhar novos consumidores e contribuir para a expanso das exportaes. A dupla destilao, como preconizada por este trabalho uma alternativa para a melhoria da qualidade das aguardentes.

    Palavras chave: Aguardente; Dupla destilao; Qualidade; Whisky; Cognac; Anlise sensorial

  • 14

  • 15

    ABSTRACT

    Production of sugar cane spirits for double distillation in rectifying still

    Nowadays the production of sugar cane spirits reaches around 1.5 billion liters

    per year. The increase of its consumption and the possibility of exportation require a production process based on accurate management practices in order to obtain a standardized product with good physicochemical and sensory qualities. The objective of this work was to produce sugar cane spirits by double distillation in rectifying still, based on the methods for the production of cognac and scotch malt whisky. It was possible to study how the distillation techniques affected the profiles of secondary components of the distillates, and consequently spirits quality, once these components contribute for aroma and flavor, being indicators of quality and consumers acceptance. The sugar cane spirit were aged in oak casks and submitted to physicochemical and sensorial analyses established for the current law in Brazil. The results showed that the techniques of double distillation improved the chemical and sensorial quality of the spirits. The improvement of sugar cane spirits quality would lead to a better acceptance by usual consumers, would acquire new ones and would contribute for export expansion. The double distillation represents an interesting option for the quality improvement and the standardization of sugar cane spirit.

    Keywords: Sugar cane spirit; Double distillation; Quality; Scotch Malt Whisky; Cognac; Sensory analysis

  • 16

  • 17

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Caractersticas fsicas e qumicas para aguardente e cachaa estabeleci- das pela legislao brasileira .....................................................................

    26

    Tabela 2 Anlises dos caldos de cana-de-acar nos mtodos utilizados ............. 61

    Tabela 3 Anlises dos vinhos de cana-de-acar nos mtodos utilizados ................. 61

    Tabela 4 - Composio das fraes separadas pela dupla destilao seguindo o mtodo de produo de cognac ................................................................

    72

    Tabela 5 Anlises da composio qumica realizada em whiskies e cognac .......... 74

    Tabela 6 Composio das fraes separadas durante as destilaes seguindo o mtodo de produo de whisky ................................................................

    78

    Tabela 7 Composio qumica da aguardente testemunha .................................... 83

    Tabela 8 - Resultados dos teores de carbamato de etila encontrados nas amostras de aguardentes ..........................................................................................

    83

    Tabela 9 Polifenis totais (mg/100mL cido glico) e intensidade de cor (%T a 420nm) das aguardentes ..........................................................................

    84

  • 18

  • 19

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Caldo e adio do fermento em dorna fermentadora de 13L .................... 50

    Figura 2 - Esquema detalhado do destilador retificador ............................................. 51

    Figura 3 Destilador retificador utilizado no experimento .......................................... 52

    Figura 4 - Maturao das aguardentes em tonis de carvalho de 10L ...................... 54

    Figura 5 - Kit para anlise de cobre da HACH ............................................................ 56

    Figura 6 - Modelo utilizado do questionrio de avaliao para anlise sensorial ....... 58

    Figura 7 - Curva de volatilizao dos cidos volteis durante a primeira destilao . 62

    Figura 8 - Curva de volatilizao dos aldedos durante a primeira destilao ........... 63

    Figura 9 - Curva de volatilizao dos steres durante a primeira destilao ............. 63

    Figura 10 - Curva de volatilizao do metanol durante a primeira destilao ............ 64

    Figura 11 - Curva de volatilizao dos lcoois superiores durante a primeira destilao ..................................................................................................

    64

    Figura 12 - Curva de volatilizao do coeficiente de congneres durante a primeira destilao ....................................................................................

    65

    Figura 13 - Curva de volatilizao do etanol durante a primeira destilao ............... 65

    Figura 14 - Curva de volatilizao dos cidos volteis durante a segunda destilao 66

    Figura 15 - Curva de volatilizao dos aldedos durante a segunda destilao ......... 67

    Figura 16 - Curva de volatilizao dos steres durante a segunda destilao .......... 67

    Figura 17 - Curva de volatilizao do metanol durante a segunda destilao ........... 68

    Figura 18 - Curva de volatilizao dos lcoois superiores durante a segunda destilao ..................................................................................................

    68

    Figura 19 - Curva de volatilizao do coeficiente de congneres durante a segunda destilao ..................................................................................................

    69

    Figura 20 - Curva de volatilizao do etanol durante a segunda destilao .............. 69

    Figura 21 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a primeira monodestilao (B-I) ..................................................

    75

    Figura 22 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante segunda monodestilao (B-II) ....................................................

    76

    Figura 23 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a terceira monodestilao (B-III) ..................................................

    76

    Figura 24 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a segunda destilao (B-IV) ........................................................

    77

  • 20

    Figura 25 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a primeira monodestilao (A-I) ...................................................

    80

    Figura 26 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a segunda monodestilao (A-II) .................................................

    81

    Figura 27 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a terceira monodestilao (A-III) ..................................................

    81

    Figura 28 - Perfil de graduao alcolica e temperaturas na caldeira e na coluna durante a segunda destilao (A-IV) ........................................................

    82

    Figura 29 Representao grfica em relao aparncia das aguardentes analisadas ...............................................................................................

    85

    Figura 30 Representao grfica em relao ao aroma das aguardentes analisadas ...............................................................................................

    85

    Figura 31 Representao grfica em relao ao sabor das aguardentes analisadas ..............................................................................................

    86

    Figura 32 Representao grfica em relao atitude de compra dos provadores em relao as aguardentes apresentadas ...............................................

    86

  • 21

    1 INTRODUO

    A aguardente de cana-de-acar (graduao alcolica de 38 a 54% em volume,

    a 20oC) e a cachaa (graduao alcolica de 38 a 48% em volume, a 20oC) so

    produtos alcolicos obtidos pela destilao de mosto de cana-de-acar (Saccharum

    officinarum L.) fermentado (BRASIL, 1997).

    A produo de aguardente de cana e de cachaa no Brasil atinge 1,5 bilho de

    litros anuais, representando 87% da produo nacional de bebidas alcolicas destiladas

    (FRANCO, 2002). O setor emprega mais de 600 mil trabalhadores diretos e indiretos

    com investimentos de 16 milhes de reais desde o ano de 2002 e crescimento anual

    entre 4% e 5% no Brasil e 8% no exterior com exportao de 14 milhes de litros por

    ano (PITONDO, 2008). considerada a bebida destilada mais consumida no Brasil e no

    mundo ocupa o terceiro lugar, depois da vodca e dos usques.

    A anlise de investimentos na produo de aguardente deve levar em conta que

    o mercado apresenta um consumo elevado. O produto mostrou algumas mudanas de

    mercado que no podem deixar de ser consideradas. At alguns anos atrs, o produto

    de forte conotao popular e de consumo restrito s classes de mais baixa renda, j

    alcanou pblico de renda mais elevada, incluindo o mercado externo (ESPERANCINI,

    2005).

    A produo de aguardente no Brasil destina-se quase totalmente ao mercado

    interno, em que o consumo hbito amplamente difundido especialmente entre a

    populao de baixo poder aquisitivo, visto ser bebida de preo relativamente baixo. A

    parcela de produo destinada ao mercado externo pouco significativa. Pesquisas de

    mbito nacional apontam que alteraes na qualidade da aguardente resultariam em

    melhor acolhida do produto no s pelos consumidores, como tambm por no

    consumidores, alm de propiciar condies para aumentar o volume de exportao

    (LIMA NETO E FRANCO, 1994).

    Porm, apesar da tradio e importncia desta bebida, principalmente a cachaa

    produzida em alambique, que agrega maior valor ao produto, a falta de padronizao do

    processo e a no utilizao de adequadas tecnologias de produo tm levado

  • 22

    fabricao de aguardentes de baixa qualidade, sem padronizao, no atendendo as

    exigncias da legislao nacional e muito menos da internacional voltadas para

    exportao (MIRANDA et al., 2007).

    E para isso h uma legislao nacional (BRASIL, 2005), de responsabilidade do

    Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento MAPA, cujos padres de

    identidade e qualidade da aguardente devem estar de acordo com a Instruo

    Normativa n 13 de 30 de junho de 2005. Onde este rgo estabelece a composio

    qumica, os requisitos de qualidade e a concentrao mxima permitida de

    contaminantes dessas bebidas. Esses padres e seus respectivos limites tm a

    finalidade de moderar a influncia de cada um dos componentes na proteo sade

    pblica e na qualidade da bebida, no significando, entretanto, que a cachaa que ali se

    enquadre possa ser considerada um produto de qualidade sensorial superior.

    Portanto, o aprimoramento da qualidade e da padronizao da aguardente

    nacional essencial para que a bebida atenda aos padres de qualidade e seja aceita

    pelo mercado externo e pelas classes de maior poder aquisitivo do mercado interno,

    devendo ser objetivos essenciais dos produtores de bebidas destiladas.

    Em vista disso foi investigada a produo de cachaa por dupla destilao

    segundo os mtodos de produo de whisky e cognac, analisando-se sua influncia na

    composio, sobretudo em relao aos componentes secundrios e,

    consequentemente, na qualidade do destilado de cana-de-acar. Os componentes

    secundrios so minoritrios, mas contribuem para o aroma e o sabor da bebida, sendo

    indicadores de qualidade e aceitao dos consumidores. Assim, com essa tcnica

    pretendeu-se produzir uma aguardente de alta qualidade, diferenciada das aguardentes

    comerciais e das artesanais comuns.

  • 23

    2 REVISO BIBLIOGRFICA

    2.1 Histrico da aguardente

    Aps o descobrimento do Brasil, Portugal procurou desenvolver a cultura e a

    industrializao da cana-de-acar na sua nova colnia, trazida pelos donatrios e

    donos de engenhos, visando inicialmente produo de rapadura (LIMA, 1983).

    No h registros exatos sobre qual teria sido o primeiro engenho a produzir

    aguardente de cana, porm possvel afirmar que j era fabricada nas primeiras

    dcadas a partir do descobrimento do Brasil. Segundo fontes documentais dos anos de

    1762 a 1817, j existiam naquela poca dois tipos de bebidas destiladas, uma obtida

    diretamente do caldo de cana fermentado e chamada aguardente de cana e outra

    obtida a partir do resduo dos engenhos e chamada de aguardente de mel ou cachaa.

    Diante da predileo popular pela cachaa, que era mais barata e abundante que

    as bebidas portuguesas, muitos engenhos passaram a valorizar mais a sua produo

    do que a do acar. Diante disso, a Companhia de Comrcio recorreu Cincia do

    Conselho da Coroa e, em 13 de setembro de 1649, a Carta Real proibiu a fabricao da

    bebida em toda a Colnia. Entretanto, uma produo oculta e teimosa continuou se

    desenvolvendo. Segundo Cascudo (1983), esse ato da Coroa foi inoperante, ineficaz e

    desastroso, estimulando a clandestinidade e o contrabando da bebida. Em face disso, e

    sob forte presso da Colnia, em 1661, o Rei D. Afonso VI suprimiu a proibio, porm,

    logo vieram as taxaes. Em 1756, os impostos sobre a comercializao da aguardente

    contriburam para a reconstruo de Lisboa, que havia sido parcialmente destruda por

    um grande terremoto. Existia ainda o subsdio literrio imposto produo da bebida e

    destinado s faculdades da Corte. A nova bebida transformou-se tambm em

    verdadeiro smbolo dos ideais de liberdade junto aos Inconfidentes e outros movimentos

    revolucionrios. No tempo da transmigrao da Corte para o Rio de Janeiro, em 1808, a

    cachaa j era considerada um dos principais produtos da economia e era moeda

    corrente para a compra de escravos na frica, sendo tambm usada como alimento

    complementar das dietas consumidas nas travessias do Atlntico.

  • 24

    De acordo com Lima (1983), at o final da II Guerra Mundial, a indstria da

    cachaa era essencialmente rural, envolvendo um grande nmero de fbricas

    rudimentares, tecnicamente atrasadas e com pequeno volume de produo.

    Geralmente, o prprio proprietrio da fbrica, com a ajuda da sua famlia, plantava a

    cana e comercializava a aguardente que produzia. Poucos produtores engarrafavam

    seu produto e quase no havia engarrafadores exclusivos.

    O aumento da populao e do consumo ps-guerra, juntamente com o hbito de

    beber cachaa, levou ao aumento das lavouras e da capacidade de produo das

    destilarias e com elas a necessidade de conhecimentos tcnicos e cientficos, desde a

    cultura da cana-de-acar ao engarrafamento da bebida (LIMA, 1992). Assim, os

    pequenos alambiques cederam espao para as grandes instalaes, equipadas com

    colunas de destilao contnua e comearam a surgir tambm as grandes

    engarrafadoras, com marcas comerciais prprias, hoje espalhadas por todo pas (LIMA,

    1983).

    Resumindo o processo, a destilao consiste na gerao de vapores de lcool

    na caldeira, sua passagem serpentina de refrigerao atravs do capitel e do tubo de

    condensao e da para fora do alambique, na forma de uma mistura lquida com teor

    de lcool muito superior do vinho de cana de onde se originou (LIMA, 1983).

    A aguardente de cana-de-acar uma bebida tipicamente brasileira, que vem

    conquistando uma parcela crescente do mercado internacional de bebidas destiladas

    por ser considerada extica e de sabor especial. Em 2004, o volume exportado foi de

    14,8 milhes de litros, segundo a Associao Brasileira de Bebidas (ABRABE, 2006), o

    que corresponde a apenas 1% do volume total produzido, sendo Alemanha, Portugal e

    Estados Unidos os principais pases importadores da aguardente.

    2.2 Diferenciao entre aguardente e cachaa

    Aguardente de cana possui uma graduao alcolica de 38 a 54% em volume, a

    20oC, obtida de destilado alcolico simples de cana-de-acar (Saccharum officinarum

    L.) ou pela destilao do mosto fermentado de cana-de-acar, podendo ser adicionada

  • 25

    de acares at 6 g L-1. A aguardente de cana envelhecida refere-se bebida que

    contiver, no mnimo, 50% de aguardente de cana envelhecida em recipiente de madeira

    apropriado, com capacidade mxima de 700 litros, por um perodo no inferior a um ano

    (BRASIL, 1997).

    Cachaa a denominao tpica e exclusiva da aguardente de cana produzida

    no Brasil (BRASIL, 2001), com graduao alcolica de 38 a 48% em volume, a 20oC e

    com caractersticas sensoriais peculiares, podendo ser adicionada de acares at 6 g

    L-1 (BRASIL, 2002). Cachaa envelhecida, cachaa premium e cachaa extra premium

    seguem as mesmas definies descritas para aguardentes dos mesmos tipos.

    Aguardente de cana e cachaa envelhecida, aguardente de cana e cachaa premium e

    aguardente de cana e cachaa extra premium podem ser adicionadas de caramelo para

    correo de cor (BRASIL, 2005).

    2.3 Caracterizao dos componentes da aguardente

    Tanto a aguardente de cana como a cachaa esto submetidas legislao

    nacional (BRASIL, 2005), de responsabilidade do MAPA, que estabelece a composio

    qumica, os requisitos de qualidade e a concentrao mxima permitida de

    contaminantes dessas bebidas, conforme Tabela 1.

    O recente decreto n 6.871, de 4 de junho de 2009, regulamenta a Lei no 8.918,

    de 14 de julho de 1994, que dispe sobre a padronizao, a classificao, o registro, a

    inspeo, a produo e a fiscalizao de bebidas.

    Esses padres e seus respectivos limites tm a finalidade de moderar a

    influncia de cada um desses componentes na proteo sade pblica e na qualidade

    da bebida, no significando, entretanto, que a cachaa que ali se enquadre possa ser

    considerada um produto de qualidade sensorial superior.

    De acordo com a Instruo Normativa n 13 de 30 de junho de 2005, a

    concentrao mxima de lcoois superiores permitida 360 mg/100 mL-1 de lcool

    anidro, e no mais 300 mg/100 mL-1, favorecendo a conformidade de cachaas

    anteriormente consideradas fora dos padres legais do MAPA (BRASIL, 2005).

  • 26

    Tabela 1 - Caractersticas fsicas e qumicas para aguardente e cachaa estabelecidas pela legislao brasileira

    Componentes Unidade Limite Mnimo Mximo Cobre mg / L ... 5,0

    Carbamato de etila g / L ... 150

    Acidez voltil (em cido actico) mg / 100 mL lcool anidro ... 150

    steres totais (em acetato de etila) mg / 100 mL lcool anidro ... 200

    Aldedos (em aldedo actico) mg / 100 mL lcool anidro ... 30

    lcoois superiores * mg / 100 mL lcool anidro ... 360

    Furfural mg / 100 mL lcool anidro ... 5

    Metanol mg / 100 mL lcool anidro ... 20

    Acrolena mg / 100 mL lcool anidro ... 5

    Sacarose (em acar refinado, cristal, invertido ou glicose) **

    g / L

    ...

    6,0

    Partculas em suspenso (resduo slido de qualquer espcie)

    Ausentes

    Ausentes

    Extrato seco g / L - 6,0 Graduao alcolica de aguardente % lcool etlico a 20oC 38 54

    Graduao alcolica de cachaa % lcool etlico a 20oC 38 48 Fonte: Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento MAPA Notas: Sinal convencional utilizado: ... Dado numrico no disponvel * lcoois superiores = (n-Propanol + i-Butanol + i-Amlico) ** Adicionados aps a destilao. Se a concentrao de acares for maior que 6 g/L e obrigatoriamente inferior a 30 g/L, o produto deve ser designado como adoado

    Alm disso, foram definidas quantidades mximas permitidas de alguns

    contaminantes anteriormente no mencionados como carbamato de etila (150 g L-1),

    acrolena (5 mg 100 mL-1 de lcool anidro), lcool sec-butlico (10 mg 100 mL-1 de

    lcool anidro), lcool n-butlico (3 mg 100 mL-1 de lcool anidro), chumbo (200 g L-1) e

  • 27

    arsnio (100 g L-1). Para carbamato de etila a Instruo Normativa n 13 estabelece

    julho de 2010 como o prazo mximo para adequao e controle desde contaminante

    (BRASIL, 2005).

    2.3.1 Cobre

    O cobre um dos metais indesejveis na cachaa, e seu limite permitido

    permanece 5 mg L-1 (BRASIL, 2005). Sua presena na bebida provm do material

    tradicionalmente utilizado na construo dos alambiques. A legislao de alguns pases

    do hemisfrio norte estabelece um limite inferior a 2 mg L-1 de cobre (Cu2+) nos

    destilados alcolicos (BRASIL, 1974), dificultando a exportao da cachaa para esses

    pases.

    O excesso de cobre solvel no organismo (hipercupremia) pode ser txico devido

    afinidade do cobre com grupos SH de muitas protenas e enzimas, causando doenas

    como epilepsia, melanoma, artrite reumatide, bem como a perda do paladar

    (SARGENTELLI et al., 1996).

    2.3.2 Acidez voltil

    A acidez voltil elevada geralmente atribuda a ms condies higinicas, que

    propiciam a contaminao por bactrias acticas e lcticas. No entanto, a prtica tem

    revelado que os principais fatores determinantes de uma acidez voltil elevada so o

    tempo e as condies de estocagem da cana no perodo compreendido entre a colheita

    e a moagem (MAIA E CAMPELO, 2005).

    2.3.3 steres

    Os steres so desejveis porque so volteis que favorecem o aroma da

    aguardente. So produtos da reao de lcoois com cidos: assim o acetato de etila,

    por exemplo, formado a partir da reao do cido actico com o etanol. A maior

    produo de steres se d durante a fermentao. No envelhecimento, estes

  • 28

    compostos so produzidos a uma velocidade muito menor, o que requer vrios meses e

    at anos, para equiparar-se com o teor produzido na fermentao (MAIA, 1994).

    2.3.4 Aldedos

    De modo geral, ocorre aumento na formao de aldedos quando se faz aerao

    do mosto durante a fermentao. Por isso, recomenda-se no aerar e sequer remexer

    o mosto aps as primeiras horas do incio da fermentao.

    Durante a destilao, os aldedos se concentram no destilado de cabea.

    Contudo, o aumento do volume do destilado de cabea pode acarretar perda de

    componentes desejveis, como os steres (MAIA E CAMPELO, 2005).

    O baixo contedo de acetaldedo nas bebidas frequentemente associado a

    uma melhora na qualidade. Isso porque, a presena de aldedos nas bebidas alcolicas

    comumente associada aos sintomas da conhecida ressaca: nusea, vmitos,

    inquietao, sudorese, confuso, queda da presso sangnea, acelerao dos

    batimentos cardacos e dores de cabea (NASCIMENTO et al., 1997).

    2.3.5 lcoois superiores

    O grupo dos lcoois superiores quantitativamente o maior grupo que compe o

    sabor em bebidas alcolicas (NYKNEN, 1986). Este grupo composto de lcoois

    alifticos e aromticos, formados pela ao das leveduras sobre aminocidos.

    2.3.6 Furfural

    Tambm denominado furfurol e furfuraldedo um aldedo (furano-2-carbaldeido)

    que se forma pela desidratao das pentoses do bagao e hexoses do caldo de cana.

    Seu teor nos destilados deve ser mnimo, pois confere cachaa aroma

    penetrante e enjoativo. Aparece em quantidades significativas no corante de caramelo

    (acar queimado), cujo emprego admitido na legislao como artifcio para ajuste da

    cor da cachaa, embora evitado pelos produtores de bebida de qualidade. Os teores

  • 29

    desse aldedo na cachaa artesanal so geralmente muito baixos o que se atribui aos

    cuidados de no queimar a cana-de-acar para colheita e no encaminhar bagacilho

    ao alambique (MAIA E CAMPELO, 2005).

    2.3.7 Metanol

    O metanol um lcool particularmente indesejvel na aguardente. Sua ingesto,

    mesmo em doses muito pequenas, mas por longos perodos, pode causar intoxicao

    severa, levar cegueira e at a morte (LAMIABLE et al., 2004). A origem deste lcool

    est associada degradao da pectina por reao de hidrlise durante a fermentao.

    A pectina um polissacardeo sempre presente na cana, embora em quantidade

    pequena (MAIA, 1994; ZOCCA et al., 2007).

    2.3.8 Carbamato de etila

    O carbamato de etila ou uretana um composto considerado potencialmente

    carcinognico. O Canad, primeiro pas com legislao especfica sobre o assunto, foi

    um referencial para os Estados Unidos e a Comunidade Europia, que seguiram o teor

    mximo deste contaminante estabelecido por aquele pas para bebidas destiladas (150

    g L-1). A obrigatoriedade da deteco e controle do carbamato de etila na cachaa

    torna-se de grande importncia, pois alm dos aspectos ligados sade pblica, sua

    presena em concentraes superiores a 150 g L-1 constitui tambm uma barreira para

    exportaes para Europa e Amrica do Norte (ANDRADE-SOBRINHO et al., 2002).

    2.3.9 Etanol

    O etanol o maior constituinte orgnico voltil das bebidas, responsvel pelo

    corpo da bebida. Tem um leve sabor doce e abranda o cido (AMERINE et al., 1972).

    2.4 Importncia econmica e social

  • 30

    A produo de aguardente de cana e de cachaa no Brasil atinge 1,5 bilho de

    litros anuais, representando 87% da produo nacional de bebidas alcolicas

    destiladas. No entanto, principalmente devido sua m qualidade qumica, as

    exportaes dessas bebidas so baixas (FRANCO, 2002).

    Deste volume total produzido 10% tm origem artesanal, distribudos entre 25 mil

    produtores (AMPAQ, 2007). Em Minas Gerais se concentra a maior parte desta

    produo, enquanto o estado de So Paulo o maior produtor de aguardente de todos os

    tipos, concentrando 45% de toda a produo nacional. No Brasil existem cerca de 5.000

    marcas de aguardente ou cachaa, elaboradas por cerca de 30.000 produtores, dos

    quais mais de 50% so informais (OLIVEIRA, 2001).

    O plantio de cana-de-acar para a produo de aguardente e de cachaa

    abrange cerca de 125.000 ha, os quais fornecem anualmente 10 milhes de toneladas

    de cana.

    A aguardente de cana e a cachaa so as bebidas destiladas mais consumidas

    no Brasil, sendo estimado o consumo mdio nacional de 9,4 L/hab/ano. No mundo

    ocupam o terceiro lugar, atrs da vodca e dos usques. Porm, apesar da tradio e

    importncia da aguardente de cana brasileira, a sua indstria no tem caminhado no

    sentido de desenvolver tecnologias para aprimorar e controlar a qualidade e a

    padronizao dessa bebida.

    A deciso em investir para produzir aguardente se direciona a dois mercados

    especficos, o da produo industrial voltada para o consumo de massa e o da

    produo para um mercado diferenciado. No primeiro, o ganho se d pelo volume de

    produo, pois a margem do produto reduzida e no segundo, se valoriza o produto

    mais artesanal e de melhor qualidade com maior preo unitrio.

    O primeiro mercado demanda uma estrutura de produo industrial, com maior

    volume de capital investido, de modo a conseguir economia de escala e volume de

    produo, enquanto o segundo demanda menor investimento em estrutura produtiva e

    maior investimento em qualidade, embalagem e diferenciao (ESPERANCINI, 2005).

    O processo produtivo industrial realizado em grandes empresas e as cachaas

    obtidas apresentam padro relativamente uniforme de qualidade. No processo

    artesanal, as cachaas so elaboradas em pequena escala de acordo com as tradies.

  • 31

    Geralmente, o produto obtido por meio de fermentao alcolica natural (uso de

    culturas de leveduras selvagens obtidas in loco) e destilao em alambiques de cobre

    (NBREGA E LIMA, 2004).

    Azevedo et al. (2003) destacam que atualmente, o mercado mundial e tambm o

    consumidor brasileiro de melhor poder aquisitivo tem valorizado os produtos

    denominados naturais. O produto artesanal, dado seu maior apelo comercial tem

    permitido ao micro, pequeno e mdio produtor a oportunidade de atingir um pblico

    consumidor mais refinado e exigente, que se distingue da parcela de consumidores

    tradicionais das cachaas industrializadas. Esses novos consumidores tm como

    principal caracterstica apreciar a degustao da aguardente pura, sem misturas,

    valorizando a importncia de seu aroma e sabor, tornando imprescindvel uma bebida

    com boa qualidade sensorial.

    O aumento do consumo de aguardente e a possibilidade de exportao exigem,

    portanto, que o processo de fabricao dessa bebida seja baseado em prticas corretas

    visando obteno de um produto padronizado e com boa qualidade fsico-qumica e

    sensorial (AZEVEDO et al., 2003).

    O maior desafio para o tecnologista de bebidas a definio da composio

    qumica do produto final (BOZA E HORII, 2000). Sem recursos tecnolgicos, controle

    operacional e de qualidade, a aguardente desses pequenos produtores apresentam-se

    muitas vezes completamente fora dos padres da legislao.

    2.5 Processo de produo da aguardente

    2.5.1 Matria prima

    A cana-de-acar (Saccharum officinarum) uma das gramneas mais cultivadas

    nas regies tropicais e subtropicais do globo terrestre devido enorme contribuio

    socioeconmica que sua explorao representa. Tal importncia consequncia direta

    da propriedade que essa planta tem de sintetizar e armazenar uma quantidade

    significativa de sacarose em seus tecidos de reserva (NOGUEIRA E VENTURINI

    FILHO, 2005).

  • 32

    cultivada em todo o mundo para produo de acar, lcool ou cachaa, sendo

    as principais espcies originrias da Oceania (Nova Guin) e sia (ndia e China). O

    Brasil, que tem uma rea plantada com cana-de-acar de aproximadamente 5 milhes

    de hectares, o maior produtor mundial (cerca de 330 milhes de t/ano; representando

    2,7% da produo mundial), sendo So Paulo o maior estado produtor com 200

    milhes de t/ano, ou seja, aproximadamente 60% da produo brasileira; Minas Gerais

    o quarto estado produtor do pas, com 18 milhes t/ano (ANDRADE, 2006). A

    produtividade mdia do pas gira em torno de 71,1 t/ha (FNP, 2004).

    Fatores como planejamento agrcola, produtividade, controle de pragas e

    doenas, maturao, colheita, carregamento e transporte so tambm responsveis

    pela melhoria da qualidade da matria prima recebida pelas indstrias (YOKOYA,

    1995).

    Segundo Novaes (1995), no h variedades de cana que sejam especficas para

    a produo de aguardente, pois as pequenas diferenas observadas na sua

    composio fsico-qumica muito provavelmente no tm influncia na qualidade final

    da bebida. As variedades de cana devem ser adaptadas s condies climticas da

    regio onde se encontra a unidade industrial, e sua principal caracterstica desejada

    apresentar elevada produtividade de acar.

    Quanto mais madura a cana, mais o caldo ser rico em acares. Nas canas

    maduras o teor de acares redutores de 1% e o de sacarose em torno de 14%. As

    canas no devem ser colhidas com menos de 14% de acares que corresponde a

    18Brix (LIMA, 2001).

    2.5.2 Caldo de cana-de-acar

    A extrao do caldo de cana o fator mais importante do ponto de vista do

    rendimento de aguardente por tonelada de cana processada, e est diretamente

    relacionado com o nmero e tipo de unidades esmagadoras (LIMA, 1983; NOVAES,

    1994; FARIA, 2000; NOGUEIRA E VENTURINI FILHO, 2005).

    A eficincia de uma moenda medida em funo da sua capacidade e da

    percentagem de extrao. Entende-se como capacidade da moenda a quantidade de

  • 33

    cana moda na unidade de tempo, enquanto a extrao relaciona-se com a quantidade

    de acar extrado.

    O caldo de cana-de-acar, por ser um substrato rico e ser extrado em

    condies no asspticas pode carregar para a dorna de fermentao uma diversa

    populao microbiana. Na microflora do caldo so encontradas leveduras dos gneros

    Candida, Cryptococcus, Hansenula, Saccharomyces e Torulopsis, e as bactrias mais

    frequentes so Leuconostoc dextranicum e L. mesenteroides (LIMA, 2001). Esses

    microorganismos podem interferir no processo fermentativo da cana-de-acar (GALLO

    E CANHOS, 1991). Uma contaminao bacteriana pode trazer consequncias

    desfavorveis para o produtor, pois as bactrias podem elevar a acidez da bebida e

    tambm diminuir a concentrao final de etanol, reduzindo a eficincia do processo

    (SCHWAN E CASTRO, 2001).

    2.5.3 Mosto

    Aps a colheita da cana-de-acar, faz-se a extrao do seu caldo atravs de

    moendas, que dar origem ao que se chama de mosto, que o termo empregado em

    tecnologia de bebidas alcolicas para definir qualquer lquido aucarado apto a

    fermentar (NOGUEIRA E VENTURINI FILHO, 2005).

    Segundo Yokoya (1995), todo lquido aucarado apto a fermentar; no seu

    preparo feita a sua correo que compreende todas as operaes tecnolgicas para

    corrigir e transformar a matria-prima em um lquido aucarado de fcil fermentao. O

    caldo constitudo de 65-75% de gua, 11-18% de acares (sacarose, glicose e

    frutose), pequenas quantidades de substncias nitrogenadas, ceras, lipdeos, pectinas,

    materiais corantes (clorofila, antocianinas e compostos polifenlicos) e sais minerais. O

    pH das canas sadias cido, favorecendo o desenvolvimento de microrganismos

    (SCHWAN E CASTRO, 2001).

    O preparo do mosto de cana tem por objetivo garantir uma tima quantidade de

    acares fermentescveis, menor contaminao inicial possvel, pH adequado,

    nutrientes e boas condies para o metabolismo da levedura (VALSECHI, 1960;

    NOVAES, 1970; AQUARONE, 1983).

  • 34

    Assim, no preparo do mosto alguns cuidados devem ser tomados em relao

    concentrao de slidos solveis, acares totais, acidez total e pH, de forma a garantir

    uma fermentao pura, regular e com rendimentos satisfatrios (NOGUEIRA E

    VENTURINI FILHO, 2005).

    Outro fator que deve ser levado em considerao no preparo de um mosto

    padronizado a temperatura do caldo, sendo um dos fatores responsvel pelas

    condies que regulam a vida dos microorganismos (VALSECHI, 1960).

    Segundo Amorim e Oliveira (1982), ao promover um tratamento trmico de

    100C por cinco minutos e defeco simples em caldos de cana-de-acar, conseguiram reduo de 99,9% da populao microbiana sem influenciar, todavia, na

    eficincia fermentativa, demonstrando a no ocorrncia de prejuzo qualidade do

    mosto. um recurso que pode ser vivel para a padronizao do mosto a ser

    fermentado.

    2.5.4 Fermentao

    O processo fermentativo consiste basicamente no desdobramento do acar

    (sacarose) em etanol. A fermentao iniciada pela adio do p-de-cuba ao caldo de

    cana presente na dorna de fermentao, e completado com o caldo de cana diludo

    para 16 Brix (CANTO, 2006).

    Geralmente o processo fermentativo tem uma durao mdia de 24 horas, com

    reciclagem do inculo, ou seja, aps esse tempo, as leveduras iro se depositar no

    fundo da dorna de fermentao retira-se o vinho e adiciona-se um novo mosto, com

    temperatura em torno de 30C (CANTO, 2006).

    A fermentao do mosto de caldo de cana para a produo de aguardente uma

    fermentao primordialmente alcolica, que se inicia no momento em que o inculo

    entra em contato com o mosto convenientemente preparado. Na produo de

    aguardente artesanal, comum a fermentao ser conduzida com fermentos naturais,

    preparados com caldo de cana, adio de caldo de laranja azeda ou de limo, farelo de

    arroz, fub ou ambos e um pouco de gua. O controle do processo feito apenas pela

  • 35

    verificao da fermentao, pelo trmino do desprendimento de bolhas de gs

    carbnico e pelo fim da agitao do mosto fermentado (LIMA, 2001). Para que se tenha garantia de uma fermentao sadia, regular e de alto

    rendimento, necessrio introduzir o mosto a uma quantidade adequada de fermento

    de qualidade reconhecidamente boa. Esta quantidade inicial de levedura, segundo

    Schwan e Castro (2001), chama-se de inculo, p-de-cuba, p-de-fermentao ou

    lvedo.

    Alm do fermento denominado caipira, leveduras fermentativas que esto

    naturalmente presentes no ambiente, comum usar fermento de panificao, seco ou

    prensado e leveduras puras selecionadas em laboratrio (MUTTON E MUTTON, 2005).

    Estas, para serem utilizadas na produo de aguardente exigem uma preparao

    cuidadosa de inculo adequado. O uso de linhagens selecionadas pode proporcionar

    caractersticas prprias fermentao, pois diferentes leveduras usadas na

    fermentao de caldo de cana apresentam caractersticas especficas quanto a

    parmetros cinticos e composio do vinho resultante da fermentao, incluindo

    diferenas quantitativas em relao a compostos secundrios produzidos (RIBEIRO E

    HORII, 1999).

    2.5.5 Componentes secundrios

    Alm de lcool e gua, a aguardente composta de outras substncias

    orgnicas volteis ditas secundrias. A combinao dos compostos secundrios

    propicia o aroma global da bebida. A variao qualitativa destes componentes na

    cachaa que determina a aceitao do produto no mercado (YOKOYA, 1995).

    Os produtos secundrios so todas as substncias formadas durante a

    fermentao alcolica, excetuando os produtos principais (lcool etlico e gs

    carbnico). Eles so encontrados em pequenas quantidades e muitas vezes so difceis

    de serem determinados ou quantificados (YOKOYA, 1995).

    Segundo Maia (1994) os teores dos compostos secundrios da fermentao so

    geralmente inferiores a 0,1%, freqentemente inferiores a 0,001% (em m/v). A natureza

    e proporo desses compostos dependem das caractersticas da matria-prima, da

  • 36

    fermentao, da destilao e do envelhecimento. Os principais compostos secundrios

    formados durante a fermentao alcolica pertencem s classes funcionais dos cidos,

    steres, aldedos e alcois; em propores menores formam-se tambm cetonas,

    compostos fenlicos, aminas e mercaptanas.

    Dentre os produtos secundrios cidos da fermentao alcolica, o cido actico

    tem sido quantitativamente o principal componente nas aguardentes. A alta acidez em

    cachaa pode ser atribuda contaminao da cana-de-acar ou do prprio mosto por

    bactrias acticas, fazendo com que parte do substrato sofra fermentao actica,

    elevando a acidez e diminuindo o rendimento da produo de etanol (CARDOSO,

    2001).

    A aerao do mosto durante esta etapa tambm pode aumentar a converso do

    acar em cido actico, ainda que no haja contaminao do mosto por essas

    bactrias (MAIA, 1994).

    Durante a fermentao alcolica, uma parte do etanol reage intracelularmente

    com o cido actico, formando acetato de etila (MAIA, 1994; YOKOYA, 1995;

    CARDOSO, 2001). Da mesma forma, outros lcoois reagem, em parte, com o cido

    actico resultando em outros steres. Reaes de esterificao ocorrem tambm

    durante o envelhecimento da cachaa, mas em velocidade muito menor. Segundo Maia

    (1994), os steres favorecem o aroma da bebida, e cada ster tem um aroma peculiar;

    o acetato de etila possui aroma frutado que em grandes quantidades confere cachaa

    um sabor indesejvel e enjoativo.

    Os aldedos com at oito tomos de carbono tem aromas penetrantes e

    enjoativos, considerados indesejveis em bebidas destiladas. Os aldedos de cadeias

    maiores, com mais de dez tomos de carbono, apresentam aroma agradvel. Vrios

    aldedos podem ser formados a partir de aminocidos presentes no caldo de cana.

    Tambm podem ter origem na ao das leveduras durante estgios preliminares do

    processo da fermentao, principalmente o acetaldedo, que tende a desaparecer no

    final pela oxidao a cido actico (MAIA, 1994; CARDOSO, 2001). O principal aldedo

    associado fermentao alcolica o acetaldedo (MAIA, 1994). O furfural e o hidroximetilfurfural no so formados durante a fermentao. Esses

    aldedos podem aparecer no prprio caldo da cana-de-acar, quando sua colheita

  • 37

    precedida da queima da folhagem, acarretando desidratao parcial de uma pequena

    frao de acares (pentoses e hexoses) livres no caldo ou presentes no bagao

    (MAIA, 1994).

    lcoois superiores, com trs a cinco tomos de carbono, apresentam odores

    caractersticos (buqu), tradicionalmente associados com bebidas destiladas. Acima

    disso, os lcoois tornam-se oleosos e alguns lembram fortemente o aroma de flores.

    Os lcoois de 4 e 5 tomos de carbono (leo fsel) so formados pela degradao do

    acar dentro das leveduras, e em parte pela degradao de aminocidos (MAIA, 1994)

    e em teor elevado desvaloriza a cachaa (YOKOYA, 1995).

    Do ponto de vista quantitativo, a formao de lcoois superiores depende

    acentuadamente da cepa empregada, assim como da ocorrncia de microrganismos

    contaminantes. A formao desses lcoois maior quando a fermentao mais

    demorada devido fraca atividade do fermento (MAIA, 1994).

    O lcool metlico um lcool indesejvel na cachaa, originando-se da

    degradao de pectina, um polissacardeo da cana-de-acar, presente em

    quantidades muito pequenas (MAIA, 1994). A intoxicao por lcool metlico causa

    alguns sintomas como cefalia, vertigem, vmitos e dores diversas. Dependendo do

    organismo a dose fatal varia de 10 a 100 mL e a ingesto de 15 mL suficiente para

    causar cegueira (CARDOSO, 2001).

    Concluda a fermentao do mosto, obtm-se o vinho, que apresenta ento

    diversos constituintes de natureza gasosa, liquida e slida, em virtude das

    transformaes que se desenvolveram durante a fermentao. Segundo Lima (2001) os gasosos so o ar e o gs carbnico dissolvidos em

    pequena poro. Os lquidos so a gua, em proporo de 90% ou superior e o lcool

    etlico em teor de 6 a 10%.

    2.5.6 Destilao

    A etapa seguinte na produo de aguardente a destilao do vinho que

    consiste em separar e selecionar os produtos de acordo com as temperaturas de

    ebulio ou de mudana de fase do componente (SALES, 2001).

  • 38

    Fundamentando-se no conhecimento da volatilidade das substncias, podem-se

    separar as substncias volteis (gua, lcool etlico, aldedos, lcoois superiores, cido

    actico, entre outros) das no volteis ou fixas (clulas de leveduras, bactrias, slidos

    em suspenso, sais minerais, acares no fermentescveis, protenas, entre outros

    resduos), obtendo-se duas fraes, conhecidas como flegma ou aguardente, e a outra

    vinhaa (YOKOYA, 1995). O flegma, produto principal da destilao do vinho

    constituda por uma mistura hidralcolica impura, cuja graduao depende do tipo de

    aparelho utilizado na destilao do vinho. A vinhaa o resduo da destilao do vinho,

    constituda de gua, sais, clulas de levedura e bactrias, alm de resduos diversos.

    Os componentes volteis do vinho possuem diferentes graus de volatilidade, o

    que possibilita a separao dos mesmos atravs da destilao. O destilado pode ser

    ento dividido em trs fraes:

    Destilado de cabea, que corresponde frao formada pelos compostos mais

    volteis (metanol, acetaldedo e acetato de etila), que corresponde s primeiras fraes

    recolhidas na sada do alambique, com teor alcolico superior a 60GL. Esta frao

    normalmente descartada, por conter vrios componentes de aroma que possuem um

    impacto sensorial negativo, tais como acetaldedo e compostos sulfurados (CASSINI,

    2004).

    Destilado de corao, que a poro destilada intermediria. Por apresentar a

    menor quantidade de substncias indesejveis, constitui-se na melhor frao do

    destilado, correspondendo verdadeira aguardente. Os lcoois superiores, compostos

    presentes em maior quantidade nas bebidas destiladas e importantes para o flavor,

    tendem a destilar a partir da metade da destilao, mas permanecem em parte nesta

    frao do corao. A vodka, que um destilado recolhido com alta graduao

    alcolica possui teores de lcoois superiores menores que outras bebidas recolhidas

    com grau alcolico mais baixo (GUYMON, 1972).

    E por fim, o destilado de cauda, que tambm conhecido como gua fraca,

    que corresponde a ltima poro destilada, formada por compostos com pontos de

    ebulio maiores que 100C (quando puros). obtida quando a destilao no

    interrompida aps a obteno da aguardente. cidos como o caprico, caprilico e

  • 39

    cprico possuem aromas parecidos com o de sabo e esto concentrados nesta frao,

    que geralmente descartada (CASSINI, 2004).

    A otimizao das condies de operao de destilao fundamental na

    obteno de uma bebida de boa qualidade, pois, a destilao alm de separar,

    selecionar e concentrar os componentes do vinho de cana, ainda promove algumas

    reaes qumicas induzidas pelo calor e catalisadas pelo cobre presente nos

    alambiques. Assim os componentes volteis presentes inicialmente no vinho de cana

    podem aumentar, diminuir ou ainda originar novos componentes. Algumas reaes so

    bem conhecidas, como a hidrlise, a esterificao, a acetilao de vrios produtos, a

    produo de furfural e as reaes com o cobre (GUYMON, 1974; LAUT, 1990).

    Estas ocorrem porque os aparelhos de destilao usados na obteno de bebidas

    destiladas so, na maioria, construdos com cobre, metal bem malevel, bom condutor

    de calor, resistente ao desgaste fsico, e que apresenta grande influncia na formao

    de sabor e aroma do produto.

    2.6 Composio qualitativa da aguardente

    A obteno da aguardente requer conhecimentos cientficos e tecnolgicos

    apurados, competncia, sensibilidade e dedicao. Os aspectos gerais do controle de

    qualidade da cachaa exigem realizao de anlises fsico-qumicas peridicas

    (CARDOSO, 2001). A qualidade da bebida est relacionada a suas propriedades

    organolpticas, tais como cor, sabor e aroma, que, por sua vez, dependem da

    qualidade da matria-prima, do mosto e do fermento utilizados, das condies e do

    tempo de fermentao, do sistema de destilao, do material de fabricao dos

    equipamentos e dos processos de envelhecimento, padronizao e de engarrafamento

    da bebida (VARGAS E GLRIA, 1995).

    Medidas de preveno, monitoramento contnuo e aes corretivas durante a

    produo so obrigatrias na indstria de alimentos, garantindo o fornecimento de

    produtos mais seguros ao consumidor e atendendo s exigncias do mercado

  • 40

    globalizado. No entanto, essas prticas no so uma realidade na maioria das unidades

    produtoras de cachaa.

    Apesar dos produtores considerarem a taxao, a falta de marketing e de rede

    de distribuio adequada nos mercados americano e europeu como entraves

    exportao (FRANCO, 2002), na verdade um dos pontos mais delicados no processo

    de aceitao da cachaa no mercado exterior a baixa qualidade e padronizao da

    bebida produzida, muitas vezes inadequada aos padres internacionais de qualidade

    exigidos para bebidas destiladas.

    E mesmo com alto volume de cachaa produzido pelo Brasil, a negligncia na

    observao de padres de identidade exigidos pelo MAPA e a falta de controle da

    qualidade da bebida tm sido as principais barreiras a um maior avano da cachaa no

    mercado externo. Pelas mesmas razes, observa-se no mercado interno grande

    variao na qualidade das cachaas.

    Assim para chegarmos a uma aguardente que atenda esses padres de

    qualidade de fundamental importncia levar em considerao todas as fases de seu

    processo de fabricao desde a matria-prima at o produto final. Segundo Stupiello

    (1992), a qualidade da matria-prima assume importncia relevante, estando envolvida

    diretamente com o desempenho das operaes de extrao, fermentao e destilao,

    razo fundamental da obteno de altos rendimentos e da qualidade do produto final.

    Ele ainda considera que os principais fatores de qualidade so variedade de cana-de-

    acar, pragas e doenas, maturao, queima, colheita, carregamento e transporte.

    importante ressaltar que, mesmo atendendo aos padres numricos de

    composio exigidos pela Legislao, uma bebida pode no atender aos padres de

    qualidade organolptica exigidos pelos consumidores.

    2.7 Tcnicas de destilao 2.7.1 Destilao simples

  • 41

    Yokoya (1995) descreve dois processos de destilao de vinho: simples e

    sistemtica (ou metdica). A primeira feita em aparelhos que operam em operao

    descontnua e a segunda, nos que operam de forma contnua (colunas de destilao). A

    destilao simples utilizada pelos pequenos produtores, enquanto que a destilao

    contnua encontrada em destilarias de mdio e grande porte.

    O desempenho destes processos depende principalmente do desenho e da

    construo dos destiladores, da eficcia da eliminao de produtos de cabea e cauda,

    e das demais condies operacionais como: vazes de vinho de cana e de vapor, grau

    alcolico e presso de trabalho.

    Os alambiques podem ter corpo simples ou trs corpos. O alambique simples

    no permite um bom esgotamento do vinho e em condies normais de operao pode

    fornecer aguardente rica em componentes secundrios.

    A destilao descontnua principalmente empregada nas destilarias de

    pequeno porte, onde geralmente realizada em alambiques simples, de dois e at trs

    corpos, carregados com o vinho de cana e aquecidos a fogo nu ou a vapor.

    O cobre parece ser o melhor material de construo do alambique. um material

    malevel, bom condutor de calor, resistente corroso (LAUT, 1990) e ainda

    promove as reaes de remoo dos compostos sulfurados. A ausncia de cobre no

    destilador e mesmo em colunas de destilao pode produzir um defeito sensorial com

    aroma sulfurado no produto final (FARIA, 1982).

    No processo industrial empregada a destilao contnua, conduzida em

    colunas de destilao, que so alimentadas continuamente com vinho pela parte

    superior e vapor pela base, de modo a se obter, tambm continuamente, o destilado na

    parte superior da coluna e o resduo na sua base (FARIA, 2000).

    2.7.2 Dupla destilao

    um processo que consiste em realizar duas destilaes sucessivas, que podem

    ser efetuadas em um mesmo alambique ou em alambiques distintos. A dupla destilao

    permite a obteno de uma aguardente com qualidade supostamente superior s

    provenientes de uma nica destilao, com baixa acidez e caractersticas sensoriais

  • 42

    mais agradveis. Esta melhoria da qualidade da aguardente duplamente destilada

    procurada pela separao de fraes dos componentes indesejveis, como o caso

    dos aldedos, metanol, cido actico, carbamato de etila, e de outros compostos

    volteis prejudiciais qualidade sensorial da bebida e sade do consumidor.

    Atualmente cerca de algumas dezenas de marcas comerciais de aguardentes

    duplamente destiladas j se encontram no mercado. Porm, de maneira geral, esta

    prtica ainda no adotada nas destilarias brasileiras, sendo a aguardente de cana

    geralmente obtida numa nica destilao, sem separao de fraes de cabea e

    cauda com vistas a purificar o destilado obtido (NOGUEIRA E VENTURINI FILHO,

    2005).

    A dupla destilao que uma prtica normalmente adotada na produo de

    outras bebidas destiladas, como o whisky, o cognac e o rum, foi proposta pela primeira

    vez por Novaes (1994) visando a obteno de um destilado mais leve para ser

    posteriormente envelhecido.

    Recentemente, vem sendo implementada a tcnica de bidestilao, visando a

    reestruturao do perfil dos compostos orgnicos secundrios das aguardentes de cana

    produzidas em alambiques, com o objetivo de obter uma bebida sensorialmente

    diferenciada, pela seletividade de fraes volteis desejadas, reduo de acidez voltil,

    do teor de cobre e de steres e visando ainda possibilitar o controle, reduo ou

    eliminao de compostos no permitidos pela legislao, como metanol, furfural e

    carbamato de etila (FORLIN, 2005).

    2.7.3 Destilao para produo de cognac

    Segundo Laut (1990) para a produo de cognac, na primeira destilao, o

    produto fracionado em trs fraes: cabea (0,4% do volume til da caldeira),

    corao ou brouillis (destilado recolhido aps a frao cabea e at o destilado

    apresentar 5% de lcool) e cauda (destilado recolhido de 5 a 0% de lcool). O brouillis

    ou corao passa por uma segunda destilao e do produto desta segunda destilao,

    so obtidas quatro fraes: cabea (1,0% do volume til da caldeira), corao 1, ou

    seja, o cognac (destilado recolhido aps a frao cabea e at o destilado apresentar

  • 43

    60% de lcool), corao 2 que corresponde aos produtos secundrios (destilado

    recolhido entre 60 e 5% de lcool) e a cauda (destilado recolhido entre 5 e 0% de

    lcool). As fraes cabea e cauda das duas destilaes so recirculadas nas

    primeiras destilaes da prxima rodada e a frao corao 2 redestilada

    juntamente com o brouillis da rodada seguinte.

    2.7.4 Destilao para produo de whisky

    Para destilao de whisky, a primeira destilao recupera o etanol do vinho, sem

    realizado os cortes de fraes, originando o low wine. Na segunda destilao, o low

    wine destilado e procede-se a separao das fraes cabea (2% do volume til da

    caldeira, recuperados de 78 a 75 GL), corao ou whisky (destilado separado de 75 a

    60 GL) e cauda (destilado separado de 60 a 0 GL). As fraes cabea e cauda

    so recirculadas nas primeiras destilaes da prxima rodada (PIGGOTT, 2003).

    2.8 Envelhecimento

    A qualidade de uma bebida julgada pelo consumidor atravs da cor, odor e

    sabor, ou seja, pelas suas propriedades sensoriais. O envelhecimento da cachaa em

    tonis de madeira promove diminuio significativa do sabor alcolico e da

    agressividade da bebida, com simultneo aumento da doura e do sabor de madeira,

    proporcionando uma efetiva melhora sensorial do produto (CARDELLO E FARIA,

    2000a).

    Durante o envelhecimento, a aguardente passa por inmeras transformaes

    fsicas, qumicas e sensoriais, incluindo as interaes qumicas dos componentes

    secundrios entre si, do etanol e o oxignio da atmosfera. Tambm a incorporao de

    componentes solveis extrados da madeira do tonel como flavonides e taninos e a

    decomposio parcial de macromolculas da madeira (lignina, celulose, hemicelulose)

    em monmeros solveis principalmente os aldedos e os cidos fenlicos que so

    incorporados cachaa. Outros so a oxidao de aldedos fenlicos que se convertem

  • 44

    em cidos fenlicos, a interao entre os cidos fenlicos e o etanol e outros lcoois da

    cachaa, gerando steres fenlicos, componentes oleosos com aromas peculiares e

    agradveis. A colorao se altera progressivamente de amarelo-claro a amarelo mais

    intenso, com tonalidade dourada a avermelhada dependendo do tipo da madeira.

    Durante o envelhecimento h complexao entre componentes secundrios que

    interagem preferencialmente com o etanol, caracterizando uma emulso hidralcolica e

    o aumento progressivo da viscosidade e da oleosidade. Como resultado de todas essas

    transformaes so as peculiaridades de aparncia, cor, aroma, sabor e palatabilidade

    tpicos de cada bebida (MAIA E CAMPELO, 2005).

    O processo de envelhecimento de bebidas destiladas, geralmente realizadas em

    tonis de madeira, etapa obrigatria nos Estados Unidos e Inglaterra (BOZA E

    OETTERER, 1999). No Brasil, para cachaa esta etapa optativa, no sendo realizada

    sistematicamente devido ao tempo requerido pelo processo e aos custos introduzidos

    pelo armazenamento da bebida em grandes tonis por alguns anos. Este procedimento

    melhora a qualidade sensorial da bebida, tornando-a mais suave, com sabor e aroma

    mais agradvel e com colorao amarelada mais atraente. O carvalho a principal madeira utilizada para o envelhecimento de bebidas. O

    carvalho branco americano (Quercus alba) e o carvalho europeu (Quercus robur e

    Quercus petraea) so tradicionalmente usados na manufatura de barris para

    envelhecimento de bebidas devido s suas propriedades de dureza, flexibilidade e

    impermeabilidade gua, bem como pela liberao de extrativos necessrios

    maturao de bebidas alcolicas, conferindo cor e aroma suave bebida.

    Como o carvalho no uma rvore nativa do Brasil, os tonis fabricados com

    essa madeira so provenientes principalmente dos Estados Unidos e Frana. Desta

    forma muitos tonis de carvalho que chegam aqui j foram utilizados nesses dois

    pases (BOSCOLO et al., 1995).

    2.9 Anlise sensorial

  • 45

    As anlises sensoriais so indispensveis na maior parte dos experimentos com

    alimentos e bebidas porque respondem a importantes questes sobre sabor, odor,

    aparncia, textura, aceitao e outros fatores de qualidade que no podem ser obtidos

    por outros mtodos (CETEC, 1989).

    Os testes afetivos tm como objetivo conhecer a opinio de um determinado

    grupo de consumidores em relao a um ou mais produtos. Um teste afetivo muito

    utilizado o teste de aceitao, que avalia o quanto os consumidores gostam ou

    desgostam de um ou mais produtos (MEILGAARD et al., 1988).

    No caso da aguardente de cana numerosos trabalhos j utilizaram a anlise

    sensorial para avaliar e comparar sua aceitao, bem como para estudar o efeito da

    modificao durante o processo de obteno da bebida, assim como o efeito do

    envelhecimento em tonis de carvalho e outras madeiras. (CARDELLO E FARIA,

    2000b).

    Qualidade o conjunto de caractersticas que diferenciam as unidades

    individuais de um produto e que tem importncia na determinao do grau de

    aceitabilidade daquela unidade pelo comprador/consumidor. Entretanto, sob o aspecto

    operacional e em sentido amplo, a qualidade consiste em um grupo de especificaes

    dentro de determinados limites ou tolerncias que devem ser atingidos (CHAVES E

    PVOA, 1992).

    De acordo com Laing e Jinks (1996), o sabor definido como o conjunto de

    sensaes provocadas por estmulos de um produto na cavidade bucal. Compreendem

    os odores, causados pelas substncias volteis (via retro nasal), os gostos, provocados

    pelas substncias solveis na boca e os fatores de sensibilidade qumica, estimulantes

    das terminaes nervosas das cavidades oral e nasal (pungncia, frescor, irritao).

    O maior desafio para o tecnologista de bebidas a definio da composio

    qumica do produto final, pois o conhecimento das substncias responsveis pelo

    flavor e por outras caractersticas das bebidas est longe de ser elucidado. Tais

    substncias encontram-se em quantidades mnimas, dificultando seu isolamento,

    caracterizao e quantificao e sem o conhecimento delas torna-se muito difcil

    modificar as caractersticas, e/ou controlar a qualidade do produto (BOZA E HORII,

    1998).

  • 46

  • 47

    3 OBJETIVO

    O objetivo do presente trabalho foi produzir aguardentes de cana-de-acar

    padronizadas e de qualidade, mediante a tcnica da dupla destilao em alambique

    retificador, segundo os mtodos utilizados para a produo de cognac e scotch malt

    whisky.

  • 48

  • 49

    4 MATERIAL E MTODOS 4.1 Material

    A cana-de-acar utilizada no projeto foi da variedade SP-83-2847 no quarto

    ciclo de produo (quarto corte), cultivada nas dependncias do Setor de lcool e

    Acar do Departamento de Agroindstria, Alimentos e Nutrio da Escola Superior de

    Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de So Paulo, em Piracicaba SP

    (ESALQ / USP).

    4.2 Mtodos 4.2.1 Extrao do caldo de cana-de-acar

    O caldo de cana-de-acar foi extrado em um terno de moenda com dimenses

    de 9 x 9 e filtrado em algodo para remoo de resduos da moagem (bagacilho).

    4.2.2 Tratamento de purificao do caldo de cana-de-acar

    O caldo foi submetido ao tratamento de purificao, que consistiu no

    aquecimento at temperatura de ebulio, resfriamento e nova filtrao em algodo

    para remoo de borra formada pelo processamento trmico do caldo.

    4.2.3 Padronizao do caldo de cana-de-acar

    Aps o tratamento trmico, o caldo de cana-de-acar foi diludo a 18 Brix com

    gua destilada, concentrao aquela determinada em refratmetro PR 101 / Atago, e

    submetido s anlises de Pol em Sucromat VIS NIR / Anton Paar, acares

  • 50

    redutores totais (ART) pelo mtodo de Lane-Eynon em Redutec MA 086 / Marconi,

    de pH em pHmetro MPA 210 / Cientfica (CALDAS, 1998).

    4.2.4 Fermentao do caldo de cana-de-acar

    O caldo clarificado foi fermentado com a adio de 3,0g/L da levedura Y-904 (AB

    Brasil Pederneiras / SP), fermento vivo desidratado. Foi realizada uma hidratao

    prvia do fermento com o prprio mosto. A fermentao foi conduzida sob agitao em

    fermentadores de 13L, com temperatura controlada a 30oC por banho termostatizado

    (Figura 1).

    Figura 1 - Caldo e adio do fermento em dorna fermentadora de 13L

    4.2.5 Destilao do vinho

  • 51

    O mosto fermentado (vinho), deslevedurado por decantao, foi analisado

    quanto ao pH em pHmetro MPA 210 / Cientfica e graduao alcolica pela medio

    da densidade de um destilado de amostra do vinho em Density Meter DMA 4500 /

    Anton Paar. A seguir foi encaminhado destilao em destilador retificador de

    laboratrio de 40L de carga til. O destilador utilizado possui caldeira em cobre, tronco

    retificador com cinco bandejas concentradoras e condensador em ao inoxidvel

    (Figura 2 e 3).

    Figura 2 - Esquema detalhado do destilador retificador

  • 52

    Figura 3 Destilador retificador utilizado no experimento

    4.2.6 Mtodos utilizados para dupla destilao

  • 53

    A destilao foi conduzida de forma a simular o processo de destilao em

    alambique, utilizado para a produo de cognac (conhaque) de scotch malt whisky

    (usque escocs puro malte).

    Nos ensaios similares produo de cognac (Laut, 1990), foram realizadas

    duas destilaes, a primeira para separar todo o lcool do vinho e tambm uma

    primeira frao de cabea (0,4% do volume de vinho da caldeira). A cada trs

    operaes de destilao iguais a esta eram obtidos de 30 a 35L de destilado com mdia

    36% de lcool em volume, que foram submetidos a uma segunda destilao, na qual foi

    feita a separao de fraes, como segue: cabea (1% do volume de destilado),

    corao 1 ou aguardente (volume de destilado at 60% de lcool sada do

    condensador), corao 2 (volume de destilado de 60 at 5% de lcool sada do

    condensador) e cauda (de 5 a 0% de lcool no destilado sada do condensador).

    Nos ensaios similares produo de scotch malt whisky foi seguida a

    metodologia descrita por Piggott (2003) que corresponde a duas destilaes, sendo a

    primeira para separar todo lcool do vinho sem realizar nenhum corte das fraes e a

    segunda para realizar os pontos de cortes das fraes de cabea (2% do volume total

    a ser destilado), corao (at 70% de lcool no destilado sada do condensador) e

    cauda (de 70 a 5% de lcool no destilado sada do condensador).

    Durante os procedimentos foram realizadas medidas de vazo, recolhendo-se o

    destilado em proveta graduada. A cada volume coletado (500mL), a concentrao

    alcolica era medida por alcometro Dujardin-Salleron. Tambm foram coletadas as

    medidas de temperatura no tronco de destilao e na caldeira.

    Todas as destilaes foram realizadas em duplicata e os resduos aquosos

    (vinhaa) das destilaes foram adequadamente descartados.

    4.2.7 Mtodo utilizado para aguardente testemunha

    Para fins de comparao foi tambm produzida uma aguardente testemunha

    monodestilada. Nessa tcnica de destilao, o vinho foi aquecido no interior do

    alambique e os vapores hidralcolicos gerados foram condensados e coletados at que

  • 54

    o destilado global recolhido tivesse apresentado um teor alcolico mdio de 43GL, sem

    separao de fraes.

    4.2.8 Envelhecimento das aguardentes

    As aguardentes foram maturadas por 6 meses em tonis de carvalho de 10L de

    capacidade, armazenados em posio horizontal durante todo o perodo de

    envelhecimento (Figura 4). Aps aquele perodo as aguardentes foram retiradas dos

    tonis, filtradas em algodo para retirada de qualquer impureza proveniente dos

    recipientes e diludas a 43% em volume, a 20C com gua destilada.

    Figura 4 Maturao das aguardentes em tonis de carvalho de 10L 4.2.9 Anlises fsico-qumicas

    As aguardentes foram submetidas s anlises fsico-qumicas estabelecidas pela

    legislao vigente no Brasil (acidez voltil, furfural, cobre, graduao alcolica,

  • 55

    aldedos, steres, metanol e lcoois superiores). Foram tambm analisadas quanto aos

    compostos fenlicos totais, colorao e carbamato de etila.

    Todas as anlises foram feitas em duplicata.

    4.2.9.1 Acidez voltil

    A anlise de acidez voltil foi determinada em Redutec MA 086/087 / Marconi,

    por titulometria de neutralizao, utilizando soluo de hidrxido de sdio 0,05N aps

    separao dos compostos volteis da amostra mediante destilao por arraste de

    vapor, segundo metodologia oficial descrita em BRASIL (2005).

    4.2.9.2 Furfural

    A concentrao de furfural foi determinada por espectrofotmetro 700 S / Femto,

    mediante correlao com curvas padro de concentrao do composto, segundo

    mtodo oficial descrito em BRASIL (2005).

    4.2.9.3 Graduao alcolica

    A determinao da graduao alcolica foi realizada em densmetro digital DMA

    4500 / Anton Paar, aps destilao por arraste de vapor, conforme metodologia oficial

    descrita em BRASIL (2005).

    4.2.9.4 Aldedos, steres, metanol e lcoois superiores

    As anlises de aldedos (aldedo actico), steres (acetato de etila), metanol e

    lcoois superiores (isobutlico + isoamlicos + n-proplico) foram efetuadas utilizando um

    cromatgrafo CG-037, equipado com uma coluna empacotada PAAC 3334-CG e um

    detector de ionizao de chama (FID). Como gs de arraste utilizou-se H2, com vazo

    de 30 mL/min. A temperatura do injetor foi programada para 170C, a programao da

  • 56

    temperatura da coluna isotrmica a 94C, e a temperatura do detector programada para

    225C.

    4.2.9.5 Cobre

    A concentrao de cobre foi determinada por anlise quantitativa por meio do

    Test Kit Copper Poket ColorimeterTM / HACH (Figura 5).

    Figura 5 Kit para anlise de cobre da HACH

    4.2.9.6 Carbamato de etila

    O teor de carbamato de etila foi analisado por cromatgrafo em fase gasosa

    Shimadzu GC17A acoplada a um espectrmetro de massas Shimadzu modelo

    QP5050A operando em modo SIM (m/z = 62). Foi utilizada uma coluna HP-FFAP (40m

    x 0,20mm x 0,33m), com gradiente de temperatura de 90C (2 minutos), taxa de

    aquecimento de 10C/min at 150C e outra taxa de aquecimento de 40C/min at

    220C (2 minutos). As temperaturas do injetor e do detector foram, respectivamente, de

  • 57

    230C e 240C. Na anlise qualitativa foram levados em considerao o tempo de

    reteno, o monitoramento dos ons m/z 62 (por ser o mais empregado em anlises

    deste composto) e adies sucessivas do padro. Na anlise quantitativa foi

    considerado o mtodo de adio do padro (CLEGG E FRANK, 1988).

    4.2.9.7 Composto fenlicos totais

    A anlise dos compostos fenlicos totais seguiu o mtodo de Folin-Ciocalteau,

    sendo determinado em espectrofotmetro 700 S / Femto com utilizao de soluo de

    cido glico (C7H6O8) como padro (PUECH, 1988).

    4.2.9.8 Cor

    A cor foi analisada atravs de um espectrofotmetro 700 S / Femto com leitura

    em %T 420nm (PUECH, 1988).

    4.2.10 Anlise sensorial

    Ao final do perodo de seis meses de envelhecimento, as aguardentes destiladas

    segundo os processos de obteno do cognac e do whisky, e a testemunha, foram

    analisadas sensorialmente por teste afetivo de aceitao das amostras em relao aos

    atributos aroma, sabor e aparncia, mediante escala hednica de nove pontos (STONE

    E SIDEL, 1993).

    As amostras foram apresentadas em temperatura ambiente, de forma mondica

    e sequencial em clices transparentes, codificados com algarismos de trs dgitos e

    cobertos com vidro de relgio, que eram retirados no momento do teste.

    A equipe foi composta de 30 provadores voluntrios no treinados entre alunos,

    professores e funcionrios maiores de 18 anos do laboratrio de Acar e lcool e a

    ficha utilizada para o teste de aceitao seguiu o modelo da Figura 6. Na ficha utilizada,

    tambm foi avaliada a atitude de compra das amostras apresentadas, ou seja, com qual

    aguardente cada provador se identificava mais.

  • 58

    Figura 6 Modelo utilizado do questionrio de avaliao para anlise sensorial

    Os testes foram realizados no Departamento de Agroindstria, Alimentos e

    Nutrio da ESALQ/USP.

    4.2.11 Anlise estatstica

    A anlise estatstica dos resultados da anlise sensorial se deu atravs da

    aplicao do Teste F ao nvel de 5% de significncia e do Teste de Tukey, atravs do

  • 59

    programa estatstico SAS (1996), dentro de um delineamento experimental inteiramente

    casualizado (PIMENTEL-GOMES E GARCIA, 2002), com 2 repeties.

  • 60

  • 61

    5 RESULTADOS E DISCUSSO

    5.1 Caldo e vinho de cana-de-acar

    O resultado das anlises do caldo de cana-de-acar encontra-se na Tabela 2.

    Alguns cuidados foram tomados em relao concentrao de slidos solveis,

    acares totais e pH, de forma a garantir uma fermentao pura, regular e com

    rendimentos satisfatrios (NOGUEIRA e VENTURINI FILHO, 2005).

    Tabela 2 Anlises dos caldos de cana-de-acar nos mtodos utilizados Anlises Mtodo cognac * Mtodo whisky ** Mono

    Brix (antes diluio) 20 18 18

    Pol 15,42% 15,25% 12,64%

    pH 5,54 5,26 5,26

    Acares Redutores Totais 17,24% 17,95% 16,09% Nota: * Mdia das anlises das trs primeiras destilaes realizadas para produo de cognac. ** Mdia das anlises das trs primeiras destilaes realizadas para produo de whisky.

    O pH dos caldos (5,26 a 5,54) contribuiu para o desenvolvimento de

    microrganismos benficos para a fermentao alcolica (SCHWAN e CASTRO, 2001),

    assim como a Pol, os acares redutores totais e os graus Brix que garantiram uma

    fermentao adequada para haver o desdobramento do acar (sacarose) em lcool.

    O resultado das anlises do vinho est descrito na Tabela 3.

    Tabela 3 Anlises dos vinhos de cana-de-acar nos mtodos utilizados

    Nota: * Mdia das anlises das trs primeiras destilaes realizadas para produo de cognac. ** Mdia das anlises das trs primeiras destilaes realizadas para produo de whisky.

    Anlises Mtodo cognac * Mtodo whisky ** Mono

    pH 4,25 4,04 5,03

    Graduao Alcolica (%v/100mL)

    10,35 9,3 8,33

  • 62

    0

    50

    100

    150

    200

    250

    01020304050607080

    Concentrao alcolica do destilado (%v/v 20C)

    Aci

    dez

    vol

    ltil d

    o de

    stila

    do (m

    gc

    ido

    act

    ico/

    100m

    L et

    anol

    Acidez Voltil

    5.2 Curvas de volatilizao dos componentes 5.2.1 Primeira destilao

    As curvas de volatilizao dos componentes qumicos dos destilados ao longo da

    primeira destilao, ou seja, da destilao do caldo de cana-de-acar fermentado

    (vinho) esto represen