pensar 12 05 2012

10
VITÓRIA, SÁBADO, 12 DE MAIO DE 2012 www.agazeta.com.br Pensar Arte sem fronteiras Entrelinhas DOIS ROMANCES LEGITIMAM PEPETELA COMO ÍCONE LITERÁRIO DE ANGOLA. Página 3 Letras LIVRO DE LIMA BARRETO TRAZ PAINEL DA SOCIEDADE ESCRAVAGISTA BRASILEIRA. Página 4 Música KATIA ROCHA INVESTE EM SEU LADO INTÉRPRETE NO QUARTO ÁLBUM SOLO. Página 5 Visuais ESPECIALISTA DESCREVE A FORÇA VITAL DAS OBRAS DE RENOIR . Página 12 CURADORA DISSECA OS SIGNIFICADOS DA NOVA SÉRIE DE INSTALAÇÕES DE NENNA Páginas 6, 7 e 8 UM MÉTODO E UM FILME PERIGOSOS Analista junguiano aponta acertos e erros do longa que mostra triângulo entre Freud, Jung e sua ex-paciente Págs. 10 e 11 BERNARDO COUTINHO O artista plástico Nenna na exposição “Meditações Extravagantes”, aberta à visitação no Maes, com extensão na Galeria Homero Massena

Upload: leonardo-quarto

Post on 11-Mar-2016

218 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Pensar é um caderno semanal do jornal A Gazeta

TRANSCRIPT

Page 1: Pensar 12 05 2012

VITÓRIA, SÁBADO, 12 DE MAIO DE 2012

www.agazeta.com.brPensar

Arte sem fronteiras

EntrelinhasDOISROMANCESLEGITIMAMPEPETELACOMO ÍCONELITERÁRIO DEANGOLA.Página 3

LetrasLIVRO DELIMA BARRETOTRAZ PAINEL DASOCIEDADEESCRAVAGISTABRASILEIRA.Página 4

MúsicaKATIA ROCHAINVESTEEM SEU LADOINTÉRPRETENO QUARTOÁLBUM SOLO.Página 5

VisuaisESPECIALISTADESCREVE AFORÇA VITALDAS OBRAS DERENOIR.Página 12

CURADORA DISSECA OS SIGNIFICADOS DANOVA SÉRIE DE INSTALAÇÕES DE NENNA Páginas 6, 7 e 8

UM MÉTODO E UM FILME PERIGOSOSAnalista junguiano aponta acertos e erros do longa quemostra triângulo entre Freud, Jung e sua ex-paciente Págs. 10 e 11

BERNARDO COUTINHO

O artista plástico Nenna na exposição “Meditações Extravagantes”, aberta à visitação no Maes, com extensão na Galeria Homero Massena

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_1.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 20:01:12

Page 2: Pensar 12 05 2012

2PensarA GAZETAVITÓRIA,SÁBADO,12 DE MAIODE 2012

marque na agenda prateleiraquempensa

Ana Paula LunséconsultorademodaearteegraduandadeLetrasdaFaculdadeSaberes.apluns@hotmail.com

Vera Márcia Soares de Toledoé professora de Literatura e História daFaculdade Saberes. [email protected]

Diego FloreséformadoemLetras/InglêsemestreemEstudosLiterá[email protected]

Almerinda da Silva Lopesé doutora em Artes Visuais pela PUC/SP eUniversité de Paris. [email protected]

Nayara Limaé escritora e graduanda em Psicologia pelaUfes. www.nayaralima-versoeprosa.blogspot.com

Lara Spallaé advogada especialista em Direito doTrabalho. [email protected]

Bernardo Calomasé escritor e o melhor amigo de [email protected]

Joel Fernando Brinco NascimentoépsicólogoemembrodaAssociaçãoInternacionaldeEstudosJunguianos. [email protected]

MariaD’Ermoggineé italiana, professora de História da Arte ecuradora de exposições no exterior.

Robinson CrusoéDaniel DefoeA reedição do clássicoromance sobre o marujoinglês que luta pelasobrevivência após umtrágico naufrágioconta com alentada

introdução de John Richetti, professoremérito de Literatura Inglesa naUniversidade Columbia e reconhecidoespecialista na obra de Daniel Defoe.

408 páginas. Companhia das Letras. R$ 28

Poesia e FilosofiaAntonio CiceroAutor de um dos ensaiosfilosóficos maisimportantes já publicadosno Brasil, “O mundodesde o fim”, e um dospoetas e letristas mais

respeitados de sua geração, AntonioCicero junta nesta obra a delicada belezada poesia e a profundidade da filosofia.

144 páginas. Civilização Brasileira. R$ 29,90

PlatãoJulia AnnasEspecialista em filosofiaantiga, Julia Annas apresentao pensador grego a partir dosseus mais cativantesdiálogos, como o “Fedro”, “OBanquete” e “A República”,

até hoje a sua obra mais lida. Esses textosapontam por que Platão é conhecido como ofilósofo mais acessível aos não especialistas.

112 páginas. L&PM. R$ 12

Caderno deRuminaçõesFrancisco J. C. DantasNeste romance inédito, oautor sergipano narra osinfortúnios de um médicocorroído por dúvidase remorsos, e que é

incapaz de escapar de sua sorte.

408 páginas. Alfaguara. R$ 49,90

LiteraturaEscritores promovem roda de leituraNo dia 29 de maio, às 19h, os escritores Erly Vieira Jr., OrlandoLopes e Sérgio Blank lerão trechos de seus livros no projetocultural “Leituras”, na Livraria Leitura do Shopping Vitória.

UniversidadeUVV sedia encontro sobre história da mídiaO II Encontro Regional Sudeste de História da Mídia será realizadonos dias 31 de maio e 01 de junho, na UVV, no campus Boa Vista. Otema este ano é Mídia: Memória e Esquecimento. Veja aprogramação completa no link:http://historiadamidia2012.blogspot.com.br/p/programacao.html

17de maioLara Felipe expõe na Matias BrotasA nova exposição da artista, “Itinerários”, será aberta nopróximo dia 17, em comemoração ao sexto aniversário dagaleria. Com curadoria de Neusa Mendes, reúne questõessobre o tempo e deslocamento, em cerca de 10 quadros emacrílica, colagem, fotografias e formatos diversos.

19de maio“Cartoons em Jazz” volta ao Teatro do SesiIdealizado e dirigido pelo pianista Turi Collura em 2008, oshow que reúne músicas de desenhos animados, teatro,projeções e muito humor será reapresentado no Teatro doSesi, em Jardim da Penha, Vitória. Ingresso: R$ 20 (inteira)e R$ 10 (meia). Mais informações: (27) 9224-0515.

José Roberto Santos Nevesé editor do Caderno Pensar, espaço para adiscussão e reflexão cultural que circulasemanalmente, aos sábados.

[email protected] ARTISTA INQUIETO

Pioneiro da arte contemporânea no Estado, Nenna tema inquietação como uma das marcas de sua personalidade.Suas criações ganham ressignificados constantes a partir dainteração e do diálogo com o público, uma característicapresente em sua nova exposição, “Meditações Extrava-gantes”, que extrapola o espaço interno do Museu de Arte doEspírito Santo para ocupar sua área externa e a GaleriaHomero Massena. Nesta edição, a pesquisadora e curadorada mostra, Almerinda da Silva Lopes, interpreta a des-construção do conceito de tempo histórico, artístico e

cultural contido no conjunto de oito ambientações oumicroinstalações apresentados por Nenna. Cada uma dessascriações pode ser entendida como um segmento inde-pendente, que, no entanto, mantém algum tipo de re-ciprocidade com os demais. “Como na maioria das pro-posições criadas pelo artista desde os anos 1970, o público éconvidado a transitar, vivenciar, criar hipóteses e conceitos,reordenar e realocar o todo e as partes, por meio de suareflexão e intermediação”, afirma Almerinda. Convite feito,agora é só desfrutar as páginas do nosso Pensar.

Pensar na webGaleria de fotos da mostra “MeditaçõesExtravagantes”, de Nenna, faixas do CD deKatia Rocha, trailer do filme “Um MétodoPerigoso” e trechos de livros comentadosnesta edição, no www.agazeta.com.br

Pensar Editor: José Roberto Santos Neves; Editor de Arte: Paulo Nascimento; Textos: Colaboradores; Diagramação: Dirceu Gilberto Sarcinelli; Fotos: Editoria de Fotografia e Agências; Ilustrações: Editoria de Arte; Correspondência: Jornal

A GAZETA, Rua Chafic Murad, 902, Monte Belo, Vitória/ES, Cep: 29.053-315, Tel.: (27) 3321-8493

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_2.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 22:09:47

Page 3: Pensar 12 05 2012

3PensarA GAZETA

VITÓRIA,SÁBADO,

12 DE MAIODE 2012

entrelinhaspor ANA PAULA LUNS E VERA MÁRCIA SOARES DE TOLEDO

PEPETELA, A VOZLITERÁRIA DE ANGOLA

DIVULGAÇÃO

A SUL. O SOMBREIRO.Pepetela. Leya. 256 páginas.Quanto: R$ 44,90

MAYOMBEPepetela. Ática. 270 páginas.Quanto: R$ 60(www.estantevirtual.com.br)

TRECHOSMAYOMBE“Da terra recebi a cor escura docafé, vinda da mãe, misturadaao branco defunto do meu pai,comerciante português. Tragoem mim o inconciliável e é esteo meu motor. Num universo desim ou não, branco ou negro, eurepresento o talvez. Talvez é nãopara quem quer ouvir sim esignifica sim para quem esperaouvir não.” (p. 6-7)

A SUL. O SOMBREIRO“Manuel Cerveira Pereira, sejá antes era façanhudo etempestuoso, com o podervirou um animal feroz esedento, ao qual tudo erapermitido. Eu estava então naVila de Luanda, hoje cidade,sei do que falo. Umas coisasvi, outras me foram contandona frescura dos claustros, donosso tranquilo sítio, maistarde convento, no final daCidade Alta, onde a própriabrisa do entardecer levava aciciar notícias sigilosamente,nunca trombetear informaçõescomo arauto antigo. As liçõesda brisa nunca se esquecem.Nem as dos claustros.” (p.10-11)”

Escritor representa a luta contra o colonialismo português no país africano

Quarenta e um anos se-param as edições dos ro-mances “Mayombe” e “ASul. O Sombreiro”, doescritor angolano Pepe-tela (pseudônimo de Ar-tur Carlos Maurício Pes-

tana dos Santos), nascido em 1941.Com a trajetória marcada, desde cedo,pela luta contra o colonialismo por-tuguês em Angola (entra na luta ar-mada, junto ao MPLA, aos 28 anos),Pepetela constrói, no interior de seuembate real, um percurso literário só-lido, prolífero e exitoso. Além de mui-tos prêmios, ao longo da carreira deescritor, recebeu, pelo conjunto daobra, o Prêmio Camões em 1997.

Os dois romances estão separadostambém, no plano da narrativa, porum largo período da História de An-gola. Enquanto “Mayombe” (que é de1971) conta a história de um grupo deguerrilheiros, em luta contra o co-lonialismo na década de 70, do séculoXX, “A Sul. O Sombreiro” (que acaba deser lançado) aborda a região de An-gola, nos séculos XVI e XVII, atravésdas aventuras de capitães-mores, je-suítas, franciscanos, governadores aserviço de Portugal e ingleses, emplena montagem do sistema colonial.Em ambos, o comum é a busca decompreensão do espaço real, dos ma-tizes simbólicos, da construção daidentidade e dos desdobramentos daHistória desse país africano, tornadonação em 1975.

A terra natal é o pano de fundo, omotivo e a razão de ser das duasnarrativas. Não apenas a Angola real,mas também a mítica, a simbólica, aimaginária. A necessidade de compre-ensão e apreensão de seu espaço marcao trabalho de Pepetela, desde o início.

A respeito de “Mayombe”, em en-trevista de 1999, ele afirmou: “Eu escrevipara não publicar. Escrevi porque tinha anecessidade de escrever. Estava em cimade uma realidade que quase exigia que euescrevesse. Escrevendo eu compreendiamelhor essa realidade; escrevendo euatuaria também melhor sobre a própriarealidade.” (CHAVES, Rita e MACÊDO,Tania. Portanto... Pepetela. São Paulo:Ateliê Editorial, 2009, p. 40). Sobre onovo romance, Pepetela ainda poderá nosdizer muito. Uma boa oportunidade ti-veram aqueles que puderam ouvi-lo, aolongo desta semana, em eventos pa-trocinados pela Editora Leya, para lan-çamento de “A Sul. O Sombreiro”, em SãoPaulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.

“Mayombe” é uma alegoria crítica danarrativa da diferença, onde Pepetela

constrói a ficção decorrente da ob-servação empírica nos limites da fa-tualidade histórica. Sua obra é fic-cional, embora apresente elementos deuma realidade interposta pela memó-ria, revelando a necessidade de re-construção de uma experiência. O nar-rador-testemunha elabora seu textoatravés de um “filtro subjetivo” e nãocomo um documento histórico, pura esimplesmente. A obra se apresentatambém sob um conjunto de vozes emque a palavra autoral parece se mis-turar ou se identificar com as vozes dos

narradores, vozes de luta, vozes ideo-lógicas, que dão um tom polifônico àenunciação. Algumas vozes parecemainda fadadas ao silêncio, consequên-cia da opressão, da fome e da miséria.Essas são expressas por um foco nar-rativo, às vezes, distanciado e tênue.Estão presentes também, neste mag-nífico romance, a influência da forçamítica da palavra falada e a expressãoda cultura cotidiana africana.

E “A Sul. O Sombreiro” igualmente seambienta em um período histórico con-troverso de Angola, optando pela po-

lifonia e apresentação dos personagens(alguns deles históricos) em uma nar-rativa de formato realista mas cominegável dimensão épica.

Os dois romances, tanto quanto orestante da obra de Pepetela, revelamuma viva energia artística, que mis-tura deliciosamente história e ficção,lutando para conservar uma dimen-são humana que teima em não es-morecer ou se esgotar, apesar dasdesesperanças e desilusões semprepresentes. Leituras fundamentaise imprescindíveis.

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_3.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 19:24:49

Page 4: Pensar 12 05 2012

4PensarA GAZETAVITÓRIA,SÁBADO,12 DE MAIODE 2012

No romance “Clara dos Anjos”, Lima Barreto deixou uma crítica contundente contra opreconceito racial e o machismo de seu tempo, através do drama de uma jovem mulata pobre

livrospor DIEGO FLORES

PANORAMA DE UMASOCIEDADE ESCRAVAGISTA

ARQUIVO AG

Clara dos AnjosLima Barreto. Penguin eCompanhia das Letras. 304páginas. Quanto: R$ 26

Escritor encontrou nas letras os meios para falar da problemática negra

Mil oitocentos e oiten-ta e um e 1922 são osanos de nascimentoe morte de AfonsoHenrique de LimaBarreto, e também

marcos históricos das letras brasileiras:em 1881, Machado de Assis publicava“Memórias Póstumas de Brás Cubas”,enquanto 1922 viu a Semana de ArteModerna, que mudaria os rumos dasartes em terras brasileiras. Mas as coin-cidências históricas não acabam aí: adata do aniversário em que Lima Bar-reto completava 7 anos de idade tam-bém é a data oficial da Abolição daEscravatura, em 13 de maio de 1888.

Mulato e pobre, filho de pais tambémeles mulatos e pobres, Lima Barretoviu-se, logo cedo, e devido ao fale-cimento de seus dois progenitores,obrigado a carregar nos ombros o pesopela responsabilidade da família. Logocedo, também, encontraria nas letras osmeios para falar da problemática ne-gra, algo que faz muito mais decla-radamente do que Machado de Assis,muitas vezes – injustamente, diria –criticado por parecer omisso diante doproblema.

Autor do bem conhecido “Triste Fimde Policarpo Quaresma”, mas tambémde outras obras como “Recordações doEscrivão Isaías Caminha” e “Os Bru-zudangas”, Lima Barreto ficou conhe-cido por sua crítica mordaz à Re-pública Velha e à sociedade da época.Mas é no romance “Clara dos Anjos”que parece depositar a maior parte dosseus esforços.

Queria o autor, neste romance, se-gundo anotações do seu “Diário Ín-timo”, traçar um painel da sociedadeescravagista do século anterior. Em1904, mais ou menos na mesma épocaem que também trabalhava na redaçãode “Isaías Caminha”, Lima Barreto co-meça a escrever “Clara dos Anjos”. Noentanto, o trabalho é interrompido e éretomado somente em 1920, quando omotivo do romance transforma-se numconto publicado naquele mesmo anoem “Histórias e Sonhos”. O romanceseria concluído nos anos seguintes,entre o fim de 1921 e o início de 1922,ano em que Lima Barreto, já acometidopelo alcoolismo, vem a falecer. Emboratenha sido publicado postumamente

em folhetins na “Revista Sousa Cruz”,só seria impresso em livro somentemuito mais tarde, no ano de 1948.

Situando seu romance no subúrbiodo Rio de Janeiro oitocentista, LimaBarreto se propõe a contar a história dajovem Clara dos Anjos, mulata pobre eque contava apenas 17 anos, filha docarteiro Joaquim dos Anjos, descritopelo autor como um homem que não

era de “serestas e serenatas; mas gos-tava de violão e de modinhas”, e deDona Engrácia, religiosa em extremo,“embora fosse pouco à igreja, devido àssuas obrigações caseiras”, ambos tam-bém eles mulatos e pobres. Joaquimensinaria à filha “rudimentos da artemusical e a caligrafia respectiva”, mas“não lhe ensinara um instrumento, por-que só queria piano, flauta não era

próprio para uma moça; violino eraagourento, e o violão era desmora-lizado e desmoralizava”. Clara, por suavez, não se interessava pela música,nem pelo sustento e a independênciaque o ensino da música lhe poderiafornecer futuramente. Ao contrário, “Oseu ideal na vida não era adquirir umapersonalidade, não era ser ela [...]. Eraconstituir função do pai, enquanto sol-teira, e do marido, quando casada”.

Presa fácilSendo assim, Clara dos Anjos tor-

na-se presa fácil do arrivista Cassi Jo-nes. O jovem, que já carrega no nomeaspectos europeizantes mas de origemduvidosa, era um “rapaz de poucomenos de trinta anos, branco, sardento,insignificante, de rosto e de corpo”,conhecido como um “modinhoso”, co-nhecido por encantar e seduzir damascom seu “irresistível violão” e que ape-sar da pouca idade, já contava “perto dedez defloramentos e a sedução de mui-to maior número e senhoras casadas”,além de seus constantes envolvimentosem escândalos e até mesmo com apolícia, de quem era salvo pela mãe,Dona Salustiana, pois “como tinha assuas presunções fidalgas, repugna-va-lhe ver o filho casado com umacriada preta, ou com uma pobre mulatacostureira, ou com uma moça brancalavadeira e analfabeta”.

Não demora muito para que Clara caianas graças de Cassi Jones que, como erade se esperar, não só deflora a moça comoa engravida. Evidentemente, também,Cassi Jones não se responsabiliza pelo quefez e resolve simplesmente desaparecer, oque força a jovem Clara a procurar a mãedo rapaz, que se insulta com a ideia de vero seu filho “casado com gente dessa laia”.Só depois dos ocorridos que Clara passa ater “noção exata de sua situação nasociedade” e percebe que “não era umamoça como as outras; era muito menos noconceito de todos”, e assim Lima Barretodeixa, de forma indelével, sua crítica nãotanto sutil contra o preconceito racial,contra uma sociedade machista, e faz de“Clara dos Anjos” leitura obrigatória paraque todos conheçam e saibam do quenossa sociedade foi – e talvez ainda seja –capaz, para que não voltemos a re-petir os mesmos e absurdos erros.

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_4.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 19:25:45

Page 5: Pensar 12 05 2012

5PensarA GAZETA

VITÓRIA,SÁBADO,

12 DE MAIODE 2012

HOJE O SAMBA SAIUKatia Rocha. Lei Rubem Bragada Prefeitura de Vitória. 10faixas. Lançamento no dia19/05, às 20h30, no TeatroCarlos Gomes, em Vitória.Ingresso: R$ 20 (inteira). Maisinformações: (27) 7811-5482

falando de músicapor JOSÉ ROBERTO SANTOS NEVES

SAMBA CERCADO DEBOAS COMPANHIAS

Artista com reconhecidadesenvoltura pelo jazz eos ritmos brasileiros, Ka-tia Rocha vem construin-do sua carreira há maisde duas décadas como

quem escreve o arranjo de uma can-ção: com cadência, harmonia e al-gumas pausas para retomar a baseoriginal. Após diversas gravações comoutros músicos e três álbuns solo –“Katia Rocha” (1996), “Brasileira”(2001) e “Ginga” (2007) –, a cantora,compositora e saxofonista investe emseu lado intérprete no CD “Hoje osamba saiu”, o primeiro dedicado ex-clusivamente ao gênero que o batiza,ainda que em trabalhos anteriores ti-vesse flertado com o samba ao longodo repertório.

Em termos técnicos, trata-se deuma produção impecável, a começarpela direção musical de Zé Renato, doBoca Livre, que conseguiu dar uni-dade às 10 faixas do disco, execu-tadas por um elenco formado porJoão Castilho (violão, guitarra e ca-vaquinho); Marcelo Costa (percus-são); Rômulo Gomes (baixo); Eduar-do Neves (flautas); João Carlos Cou-tinho (piano); mais os backing vocalsde Jurema de Candia, Lizzie Bravo,Viviane Godoi e Claudia Telles, filhada saudosa Sylvinha Telles.

É notável também a evolução da can-tora como intérprete. Ciente de suaslimitações, Katia trabalha bem a voz, semforçar os agudos e sempre respeitando anatureza de cada canção. Pode-se afir-mar que sua estética vocal se situa naseara da Bossa Nova, em função daemissão leve, suave, quase uma conversamusical com o ouvinte. Esse posicio-namento seguro combina perfeitamentecom a sonoridade intimista do álbum, noqual, em alguns momentos, ela busca afonte jazzística que pautou sua formaçãomusical, como se percebe na releitura de“Bonita” (Tom Jobim/Ray Gilbert).

“Bonita” tem execução à altura do seutítulo, com harmonias pontuadas pelopiano, bateria conduzida com vassou-rinha, baixo e violão discretos e umbreve solo de sax da anfitriã, que cum-pre a função de abrilhantar a melodia dacanção. É um dos pontos altos do CD, aexemplo do gostoso samba “Amor até ofim” (Gilberto Gil), em que a cantoracomprova sua precisão vocal em uminteressante diálogo com as cordas. Aela se seguem “Hora da razão” (Ba-tatinha-J. Luna), gravada por MariaBethânia e Caetano Veloso, e “Ave rara”(Edu Lobo/Aldir Blanc), cujos versos

deixam clara a assinatura refinada deAldir Blanc: “Minha vida peregrina/Vaiem busca de você/Como seu eu fosseum malê/E você fosse a revelação”. Aofundo, os solfejos de Zé Renato em-belezam essa obra-prima devidamenteresgatada no álbum. “Meu”, de Djavan,

A LETRAAVE RARA(Edu Lobo/Aldir Blanc)

Minha vida peregrinaVai em busca de vocêComo se eu fosse um malêE você fosse a revelação

Do poente vem teu cantoAve rara do IslãQuem é pedra como eu souBebe a água do amanhã

Ah,Tanta sede é meu destinoEsse amor é beduínoE o oásis teu lençol

Mas sempre no fim da viagemVocê volta a ser miragemAreia e sol

DIVULGAÇÃO

Katia Rocha demonstra evolução como intérprete em seu quarto CD solo

colabora para compor o clima amorosoda seleção musical.

Obter autorização para regravar es-sas canções não deve ter sido tarefafácil, o que demonstra o profissio-nalismo da cantora. Mas “Hoje o sam-ba saiu” traz um impasse conceitual:

se, por um lado, é um disco avançadopara os padrões musicais do EspíritoSanto, por outro peca por não oferecernovidades ao cenário nacional. Afinal,o mercado está cheio de cantoras ta-lentosas gravando discos de samba. Ealgumas das escolhas de Katia Rochacontribuem para essa sensação de dé-jà-vu: são elas “Samba da benção”(Vinicius de Moraes/Baden Powell),com participação da estrela da Lapa,Teresa Cristina; “E o mundo não seacabou” (Assis Valente), conhecidanos últimos anos nas vozes de AdrianaCalcanhotto e Paula Toller; e “Quem teviu, quem te vê” (Chico Buarque), cujorefrão inspirou o título do CD. Por suavez, “Pra cobrir a solidão” (Zé Re-nato/Teresa Cristina), novamente comvocal de Zé Renato, fez sucesso recentena voz de sua coautora.

O lançamento do CD em Vitória seráno dia 19 de maio, no Teatro CarlosGomes. Mas Katia Rocha deve pensargrande e tentar levar seu sambapara outras praças. A conferir.

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_5.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 20:52:09

Page 6: Pensar 12 05 2012

7PensarA GAZETA

VITÓRIA,SÁBADO,

12 DE MAIODE 2012

6PensarA GAZETAVITÓRIA,SÁBADO,12 DE MAIODE 2012

CURADORA ANALISA A DESCONSTRUÇÃO DO TEMPO NAEXPOSIÇÃO “MEDITAÇÕES EXTRAVAGANTES”, DE NENNA

artes plásticaspor ALMERINDA DA SILVA LOPES

A AMPLITUDECONCEITUALDA INSTALAÇÃO

Aberta à visitação no Museu de Arte do Espírito Santo, até 22 de julho, a mostra ganhou uma extensão intitulada “Tempo – Meditação VIII”, em cartaz na Galeria Homero Massena, até 8 de junho

FOTOS: BERNARDO COUTINHO

Ao observar que é “im-possível pensar a artecontemporânea, hoje,em termos de uma pu-reza visual, de um cam-po da visualidade ab-

solutamente autossuficiente ecompletamente isolado de outrasáreas”, mas como um “processo deautonomização” pleno de possibi-lidades e de relações e como umcampo aberto a “constantes inter-cambiações” e “trocas com seulado de fora, sua parte outra, he-terogênea”, Ricardo Basbaum aju-da a iluminar a compreensão dasarticulações postuladas por Nennaem “Meditações Extravagantes”.

Trata-se de instalação ‘sitespecific’, que extrapola o espaçointerno do Museu de Arte doEspírito Santo, completando-seou expandindo-se na área exter-na, além de incluir a Galeria Ho-mero Massena. Constituída porum impactante conjunto de oitoambientações ou microinstala-ções que mesmo entendidas co-mo segmentos independentesou autônomos, traduzem dife-rentes instâncias de pensamen-to, se contaminam ou se cruzamde diferentes maneiras, manten-do entre si alguma relação dereciprocidade. São elas: Diálogo,Memória, Tradição, Precipício,Tranquilidade, Deus, Mundo eTempo.

A obra foi criada com objetos eformas diversificadas, materiaisheterogêneos ou de naturezasdiferenciadas entre si, por meiodos quais o artista equacionauma ampla gama de referênciasà natureza, à ideia de tradição ede tempo, ao trinômio: memória,esquecimento e perda, ao sin-cretismo religioso, à subjetivi-dade e ao imaginário. Remete,ainda, à potência dos investi-

mentos científicos que nos apro-ximaram do desconhecido e pu-seram diante de nós aspectos domundo que até bem pouco tempopareciam inatingíveis, e queconfirmam a superação do de-sejo humano de vencer as dis-tâncias incomensuráveis paraconquistar o espaço sideral.

Os objetos e materiais hetero-gêneos e imagens híbridas, que oartista amalgama na instalação,não se mantêm circunscritos aodomínio da visualidade. Articulamatravés de uma rede de índicestramada na obra, uma multipli-cidade de conceitos, sentidos, ex-periências, reflexões e narrativas.É através da reflexão e do diálogodos potenciais interlocutores, quea instalação se reordena e se po-tencializa conceitual e significa-tivamente, instituindo-se comoobra aberta ou em processo.

Respaldado no conceito de au-tonomia artística e na ideia de quea arte do nosso tempo não seestabelece como uma sequêncialinear e contínua de estilos, pro-cessos e formas, Nenna tenciona otempo para frente ou para trás,apropriando-se de objetos, supor-tes e materiais de diferentes pro-cedências, memórias e territóriosculturais. A remissão à memória, àdiacronia e ao anacronismo nãotraduz, evidentemente, um sen-timento saudosista. Ao contrário,tem a intenção de retirar objetos eimagens do passado do esque-cimento, reordenando-os e atri-buindo-lhes novo significado nopresente. Tal processo não deixade referir-se, de alguma maneira,à praxe duchampeana, pois tem omesmo propósito de mover o ob-jeto da esfera da produção para ada arte.

Ao tencionar o tempo para fren-te e para trás, o artista proble-

matiza e desestabiliza o conceitode tempo histórico, artístico e cul-tural, enquanto processo linear oucontínuo, alertando-nos que oacesso ao passado não ocorre anão ser de maneira parcial e frag-mentária, por meio dos restos, oudaquilo que teima em não ser es-quecido ou descartado.

Assim, facilmente se depreendeque a denominação “MeditaçõesExtravagantes” não foi atribuídaaleatoriamente pelo artista à ins-talação, mas se revela conscientee articuladora de um amplo es-pectro de pensamentos e signi-ficados. Por essa angulação é pos-sível entender o alargamento depossibilidades conceituais e a he-terogeneidade de formas, estilose procedimentos, bem como a coe-xistência de “ecletismo” e “his-toricismo” (emprestando os ter-mos a Thierry de Duve) que sedesvelam no conjunto de mi-croinstalações ou ambientaçõesde “Meditações Extravagantes”.

A negação da unanimidade ex-plica as diferentes configuraçõesformais e materiais das microin-talações que, no entanto, se ar-ticulam como células ou tesselasde um mosaico na instalação, as-sumindo, grosso modo, a ideia deum prisma multifacetado, capaz defiltrar, atravessar e interrelacionarde maneira pacífica, diferentesconceitos, reminiscências, frag-mentos temporais e culturais. Seisso não deixa de atribuir à obrauma dimensão fluida consciente-mente instigante e em alguns as-pectos até paradoxal, também re-força a ideia de que a arte con-temporânea escamoteia a homo-geneidade, apresentando-se como“sujeito múltiplo, clivado, irredu-tível a toda tentativa de reificação”,de acordo com Gilles Deleuzeem “Logique du sens” (1969).

Artista apresenta impactante conjunto de oito ambientações que, mesmo entendidas como segmentos independentes, mantêm alguma relação de reciprocidade

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_6.PS;Página:1;Formato:(548.22 x 382.06 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 21:04:06

Page 7: Pensar 12 05 2012

8PensarA GAZETAVITÓRIA,SÁBADO,12 DE MAIODE 2012

+ artigo de capapor ALMERINDA DA SILVA LOPES

OBRAS DE MÚLTIPLOS SIGNIFICADOSNenna faz de suas criações um espaço aberto e ao mesmo tempo lúdico e de estímulo aopensamento, o que equivale a demover a ideia de espectador passivo ou contemplativo

DAMON ALMEIDA/DIVULGAÇÃO

Instalação “Tempo”, aberta à visitação na Galeria Homero Massena: novos sentidos surgem da interação com o público

Nenna propõe que o pú-blico adentre cada am-biente da instalaçãocom um olhar tátil e umcorpo sinestésico, pro-pondo a relação com a

obra como um território sem fron-teiras, um espaço aberto e ao mesmotempo lúdico e de estímulo ao pen-samento e à intelecção, o que equivalea demover a ideia de espectador pas-sivo ou contemplativo. Aliás, como namaioria das proposições criadas peloartista desde os anos 1970, o público éconvidado a transitar, vivenciar, criarhipóteses e conceitos, reordenar erealocar o todo e as partes, por meiode sua reflexão e intermediação, cons-ciente de que sem a presença desseinterlocutor ativo, sensível e pers-crutador, a obra se manterá estática,incompleta e inerte.

E se a instalação confirma que areferência à arte conceitual se man-tém como um dos postulados da pro-dução do artista desde o início de suacoerente e profícua trajetória, queultrapassa quatro décadas de pro-dução, também atesta que o capixabanão se revelaria adepto do herme-tismo, em que se fundamentou essalinguagem artística, de modo especialem suas origens. Nenna tampouco seprenderia a rótulos, escolas, tendên-cias ou se restringiria a repetir temasespecíficos, como confirma na for-mulação dos vários segmentos ou ins-tâncias rizomáticas que constituem as“Meditações Extravagantes”.

A instalação é integrada por umconjunto de obras conceituais, degrande densidade criativa e percep-tiva, que montam, desmontam e rea-locam a noção de tempo. Nelas, oartista não prioriza o fazer, a técnica ea ideia de unidade, mas o significadoda experiência reflexiva e crítica co-mo fatores relevantes da arte atual.

Vale considerar, finalmente, que odiálogo que estabelecemos com a pro-posta artística em questão não tem apretensão de abarcar toda a dimensãoreflexiva, significativa e crítica da mes-ma. Primeiro, pela complexidade e am-plitude da obra, que se potencializa enos revela novos meandros e tessituras acada nova visada que lançamos sobreela. Segundo, por discorrermos sobre

poéticas visuais, por meio de outrogênero de linguagem, que são os có-digos linguísticos, o que é por si só tantoproblemático quanto dicotômico. Alémdisso, o objeto arte se dobra e desdobrapermanentemente, não se desvelandofacilmente ao olhar apressado, nem sedeixando traduzir, em toda a sua di-mensão criativa, formal, conceitual em

um único discurso teórico, que nadamais é que um esforço analítico oureflexivo daquilo que podemos perce-ber, apreender e deduzir sobre essemesmo objeto. Cabe ao grande públicoampliar e redimensionar a obra in-teragindo e dialogando com ela.

O Museu de Arte do Espírito Santo, aooportunizar ao público a produção mais

recente deste artista capixaba, que comousadia e coragem abalou e pôs emxeque o conservadorismo arraigado nasestruturas sociais e acadêmicas locais,abriga talvez a mais significativa mostrade arte contemporânea por ela exibida,e presta merecido tributo a este quecontinua sendo um dos mais talentososartistas brasileiros de sua geração.

Há muito o artista não realizava emVitória uma exposição individual des-te porte e refinamento criativo, reu-nindo e fixando questões atuais queextrapolam o âmbito local e assumemuma dimensão universal. O Maescumpre assim importante papel narecontextualização do artista, sejareafirmando a potência significativa econceitual de sua obra, seja para si-tuá-lo como autêntico e paradigmá-tico conector entre a geração queemergiu nos anos de 1970 e a atualgeração de artistas, e que emmuitos sentidos lhe é tributária.

Instalação “Deus”, em cartaz no Maes: obra é vista por um buraco na parede ecoloca o espectador como se estivesse dentro da Estação Espacial Internacional

JORGE SAGRILO

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_8.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 21:09:09

Page 8: Pensar 12 05 2012

9PensarA GAZETA

VITÓRIA,SÁBADO,

12 DE MAIODE 2012

DIA SEM FIMEu acordei com os olhos fechadosE esperei o dia acabarPerguntei tantas vezesMas é uma perda de tempoPassaram-se mesesE o relógio ficou mais lento

Segure sua cruz ou carregue suaarmaTranque sua porta e disfarce seucheiroSe todos os dias são iguaisNão há como separarQuem vai lhe proteger agora?Quanto dura um dia inteiro?Se esse dia não acabar logoEu vou acabar primeiro.

poesias

ADENOIDEBERNARDO CALOMASEu cuspo quando faloEu falo quando durmoAtiro quando brigoErro e não assumo.

Eu babo quando durmoAcordo quando ouçoUm barulho no escuroE durmo num segundo

Eu bebo quando saioVomito quando beboLevanto quando caioCaio de novo e não percebo

Eu guardo e cultivoOs rancores mais antigosE despejo nos inimigosCorpos frágeis como vidro

Eu tremo quando acordoEu quebro rotinas e coposEu acordo quando tremoVidas frágeis como corpos

Eu como o que cai no chãoEu adoro dizer nãoEu gosto mais de mimDo que dos meus irmãos

Eu cuspo no prato que comoEu mordo e não assoproEu durmo e acordo com sonoEu anulo o meu voto

Eu cuspo quando faloPorque estou sempre certoEu quebro tudo o que é caroE o meu destino retoEu me protejo e me caloPorque tenho o corpo aberto.A vingança vem a cavaloEu estou sempre certo.

crônicas

DA CHINApor NAYARA LIMA

À beira do rio, há um ponto pequenosentado na Ásia do mapa, perto do quese chama Oceano, no mundo que, paraas Américas, é o outro lado. Esseponto, perto do rio, contempla a Chinacom fervor, ao mesmo tempo que passaum homem que cospe, um automóvelque buzina e um pássaro que salvatudo. Sou o ponto perto do rio. Querofazer a palavra transcorrer o conti-nente, em voo que não se vê. Querocontar minha paisagem ao leitor quelonge, de algum modo, verá. Não hárazão para isso que não seja o fato de aescrita atravessar a mim como umrecado de pássaro que na guerra se faznecessário. Portanto, sobrevoo semolhar para baixo. Conto o que está emfrente. Logo caminho, em êxtase, para

conhecer o Museu de Arte deShanghai. Retorno ao texto quando euestiver lá dentro.

Estou. No museu de arte deShanghai sou um dos quadros porqueme tornei imagem em foto. A câmeramira meu rosto em sorriso curioso.Aberração, ora bonita. Não me sintonem mulher, nem arte. Me sinto parte.No Museu de Arte de Shanghai pouso,então, distraída. Não como modelo àmáquina, mas como o pássaro, semninho. Depois do primeiro voo, as asasnão mais se desesperam. Dormem evão. Um estalo, e a liberdade. Voam.Contemplo quadro por quadro, gentepor gente, gente que é quadro, quadroque é gente. Estar longe não é estarlonge nem perto. Talvez seja estar,

intimamente, dentro do “eu” que àsvezes, perto, distancia-se de mim. Ne-cessito também de algumas descober-tas fora do quadro, como a de conheceralgum jardim. Quero ir ao Botânico.

Depois de algumas linhas de metrô,caminho lentamente entre flores quejamais pensei um dia ver. No JardimBotânico de Shanghai, onde as plantase as crianças se tornam o paraíso, nãohá o que dizer senão que a palavra setransforma na língua da terra, senãoque a dor evapora nas pétalas que ospássaros levam, senão que a vida sus-surra intensa como uma mulher na pelede quem ama. No outro lado do mundo,um rio passa à beira do meu sono,pertenço à liberdade como um pequenopertence a sua mãe. Foi no ventre dessejardim que, de repente, depois de ternascido, nasci. Dou ao mundo o meutempo, em troca do instante em que aborboleta voa, e eu olho. Se peço a Deusalgum milagre é o de poder ver aborboleta que passa, no continente dasasas. No mistério suave do mapa.

INSÔNIApor LARA SPALLA

O momento de insônia é uma grandeoportunidade para dialogar. Não, vo-cê não vai acordar seu marido, suamãe ou seu filho para bater um papoem plena madrugada de domingo pa-ra segunda, justamente quando a vidarecomeça – a contragosto da maioriados mortais. O que estou dizendo éque quando passamos por esta si-tuação começa uma busca frenéticapelo sono perdido e o que acabamosencontrando não são carneirinhos pu-lando cercas – no mais puro sentidoda palavra, mas sim palavras perdidasque vão saltando na memória.

Acredito que nosso subconscientenos acorda de propósito, para lem-brar-nos que os dias se passaram enós não paramos para conversar comnós mesmos. É tanta correria que emmuitas das vezes as palavras saem deuma forma mecânica e sem sentido.Esquecemos de falar amorosamentecom nossos filhos, que mais uma vez

saíram atrasados para a escola, e docontrário, equivocadamente, manda-mos beijo para um desconhecidoqualquer numa ligação telefônica –que vergonha!

Os pensamentos começam com otípico rol de compras, o que fazer parao almoço, levar a roupa na lavanderia,comprar papel para a impressora doescritório e, de repente, o monólogovira um diálogo. Mas quem é esta semetendo em seus pensamentos?

“Oi muito prazer: eu sou você!”Já de cara não gostei, muito pra

frente. Você quer organizar o dia emsua mente, mas a outra parte de vocêquer pensar no filme que está em cartazno cinema, em como está precisando demais uma roupa nova, na hidratação docabelo e em como perder um milímetrode barriga a deixaria mais feliz.

A briga continua por um certo tem-po, até que você e você mesma seentendem. É claro que sempre vai

existir aquela vontade inconsciente deque um pensamento predomine sobreo outro, e decerto que algum vai con-seguir se sobressair, mas será um mo-mento em que ambas saberão apreciare aproveitar. São momentos engra-çados. É a luta por um pensamento,unzinho só, por completo. Quando secomeça a concluir um, sua mente va-gueia e a leva para outro caminho.Você tenta voltar, mas não há maiscomo. Não quero pensamentos fabri-cados, que sejam livres para passearpelo meu íntimo. Será que nessa fase osono está a caminho ou atingimos onosso mais alto ponto de lucidez?Nestas horas vagamos por cômodosquase que inexplorados, que ficamescondidos durante o dia, mas queservem para limpar a alma, refazercaminhos, liberar sonhos trancados nocalabouço da sua infância, brincar como real, espalhar o perfume do passadoe nos colocar para dormir.

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_9.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 19:26:55

Page 9: Pensar 12 05 2012

11PensarA GAZETA

VITÓRIA,SÁBADO,

12 DE MAIODE 2012

10PensarA GAZETAVITÓRIA,SÁBADO,12 DE MAIODE 2012

cinemapor JOEL FERNANDO BRINCO NASCIMENTO

UM TRIÂNGULO ENTRE OSESTUDOS DA MENTE HUMANA

DIVULGAÇÃO

Carl Gustav Jung(1875-1961), psiquiatrasuíço-alemão, nascido nazona ruraldaSuíça,pai-fun-dador da Psicologia Ana-lítica, e apaixonado pela psi-

canálise. Primeiro presidente da Asso-ciação Internacional de Psicanálise, pri-meiro editor do “Jahrbuch”, Anuário in-ternacional de Psicanálise, e do “Zen-tralblatt”, dedicado a artigos que dida-tizavam os trabalhos e as conferênciaspublicados no “Jahrbuch”. Sigmund Sch-lomo “Petrus” Freud (1856-1939), neu-

rologista, pai-fundador da Psicanálise, ju-deu austríaco, sobre cujos ombros recaía apecha do judeu errante, que temia que apsicanálise se tornasse uma espécie dequestão nacional judaica. E Sabina Spiel-rein (1885-1942), médica psiquiatra bri-lhante, judia russa, uma das primeiraspsicanalistas do então nascedouro da psi-canálise, autora de um importante ensaioa respeito de Tanatologia, que inspiroutanto a Freud em seus textos a respeito dapulsão de vida, Eros, e sobre a pulsão demorte, Thanathos, quanto a Jung.

A diferença é que enquanto Jung cita

Spielrein em sua bibliografia, em “Sím-bolos da transformação”, Freud não amenciona em sua referência bibliográ-fica. Pouco mais de cem anos após olançamento de “A interpretação dos So-nhos”, de Freud, a pedra angular doedifício da psicanálise, e da excelentepublicação de “Um método muito pe-rigoso”, do historiador britânico JohnKerr, estamos nós, leitores pós-modernosdo Caderno Pensar, discutindo o filmede David Cronenberg, “Um Método Pe-rigoso”, a respeito de um alegado triân-gulo amoroso formado entre Jung, Freud

e Sabina Spielrein.Cronenberg passa os olhos por cima

do livro de Kerr, tomando-lhe empres-tado o nome inspirando-se, de fato, notexto teatral da peça “The Talking Cure”(“A Cura pela Fala”), de ChristopherHampton.

Na verdade, “Um Método Perigoso”repercutiu muito mal na comunidade jun-guiana internacional, leia-se a AssociaçãoInternacional de Psicologia Analítica(IAAP), sediada em Zurique, com cerca detrês mil membros registrados mundoafora. A negligência e o descaso com a

pesquisa histórica por parte de Cro-nenberg fez a IAAP torcer o nariz para

o filme, que pecou principalmente pelasuperficialidade de personagens tão his-toricamente densos. Apesar de tratar-se deum filme da maturidade de Cronenberg, aobra realmente traz inúmeras falhas. Eudigo: leia o livro, leia o texto da peça e vejao filme. Necessariamente nessa ordem.

Erros e acertosUm ponto a favor do filme diz respeito

a suas locações. Elas são reais. O hospitalpsiquiátrico Burghölzli, em Zurique, con-tinua intacto. Emma, esposa de Jung,realmente era ruiva, e o barco a vela quevemos no filme foi realmente do próprioJung. Presenteado por Emma. Jung eFreud velejaram nesse barco.

O filme peca pela pouca pesquisa his-tórica. Por exemplo: não entendemosporque Cronenberg não consultou SonuShamdasani, o principal historiador daPsicologia Analítica no momento, e queadquiriu vínculos profundos com a fa-mília Jung. Isso enriqueceria em muito ofilme, além de fornecer a densidade psi-cológica necessária aos personagens deJung (Michael Fassbender), Sabina (KeiraKnightley), Freud (Viggo Mortensen),Emma Jung (Sarah Gadon) – principalherdeira da fortuna dos Rauschenbach,família de ricos industriais suíços – e OttoGross (Vincent Cassel), estabelecendo adevida justiça histórica aos mesmos.

Otto Gross, um dos fundadores domovimento anarquista, não foi inter-nado no mesmo período que SabinaSpielrein, como o filme leva a crer.

Homem sério, atento, sensível, preo-cupado com seus pacientes e relutanteem sair de sua cidade, Freud neces-sitava do apoio de Jung na interna-cionalização da psicanálise. Ele é ca-ricaturalmente retratado como uma es-pécie de mafioso – “capo de tuti capi” –longe do homem real que era. Um“capo” que se preza não desmaiaria aosentir sua autoridade ser supostamentequestionada ou ameaçada. O “robusto ecorpulento Jung”, assim chamado porErnest Jones na biografia de Freud(publicada em três volumes pela Ima-go), nunca chegou a ser chamado porFreud de “ariano”, o que seria umaofensa para qualquer suíço que se pre-ze, conservadores extremados e na-cionalistas arraigados que são.

Ao contrário, Freud via com bonsolhos o fato de Jung, um não-judeu e umnão vienense, como membro da So-ciedade Internacional de Psicanálise,fundar e presidir o círculo de Zurique.Chamava-o de “Príncipe Coroado” esucessor imediato da coroa.

Em 1908, como nos retrata o filme,Freud faz uma visita pessoal a Jung noHospital Psiquiátrico de Burghölzli, inloco. Jung conduzia um grupo de estudosacalorado no hospital. Era apelidado deMaomé, o profeta de Alá (Freud). O textosagrado, o Alcorão, referia-se obviamenteao que Freud e seus discípulos imediatoshaviam publicado até então.

Sabina SpielreinSabina Spielrein foi internada no

Burghölzli em meados de 1904, per-manecendo por lá até 1905. Nove me-ses depois, com carta de recomendaçãodo diretor do hospital, Eugen Bleuler,Sabina matricula-se na faculdade deMedicina, tornando-se psiquiatra. Ha-via pouquíssimas mulheres matricu-ladas. Anos mais tarde, Sabina torna-sepsicanalista.

Sabina era filha de ricos comerciantesjudeus, cultíssima, poliglota (falava qua-tro idiomas além do hebraico) e, assimcomo seus irmãos, dominava o idiomaalemão, quando internada no Burghölzli.Entretanto, conforme retratado no filme,não existe nenhuma referência histórica,nem em diários nem em textos de SabinaSpielrein, e tampouco do conservadorJung, que acene a um desejo masoquista.Se David Cronenberg fez uso dessa ape-lação como uma estratégia para ganharem ingressos, perdeu o público inte-

ligente. A ideia de sexo masoquista podeter sido extraída do fato de Sabina, amais velha de cinco irmãos, ter sidoperiodicamente surrada pelo pai, desdeos quatro anos de idade até os 18 anos.

Com a morte de sua irmã caçula e como prosseguimento das surras, Sabina so-çobra emocionalmente, não mais evacuan-do, retendoas fezespordias, associando-sea esse quadro a masturbação. Ao invés derender-se ao medo do pai, expulsando asfezes, Sabina as retêm, provocando aprisão de ventre e transformando a regiãoem fonte de prazer, afirmando-se diantedas agressões de seu pai. Um gesto deresistência heroico e neurótico.

Por fim, Sabina recebe indicação mé-dica de internação no Hospital Psiquiá-trico Burghölzli. Apesar de não ser oprimeiro “grande caso” clínico de Jung, ocaso de Sabina S. adquiria fundamentalimportância para a psicanálise e, igual-mente, para a psiquiatria de então, res-paldando a Escola de Freud interna-cionalmente ao validar o uso e a práticado método de associação de palavras.

Em um novo continente, Jung co-mete um deslize ao literalizar a trans-ferência, optando por manter um casoextraconjugal com Sabina, quebrandouma regra de ouro do processo ana-lítico. Isso os dilacerou. Mais tarde,Jung orienta a dissertação de dou-torado de Sabina, que verdadeiramentedesejava ter um filho com ele, sim-bolizando e concretizando a união deaspectos complementares entre ambos.Com o desejo de formar uma família,Sabina afasta-se física e intelectual-mente de Jung, ingressando na in-ternacional de Psicanálise, mantendoFreud como analista e interlocutor.

O filme acerta no encontro entreFreud e Jung. Sim, eles conversaram por13 horas seguidas e, sim, havia muito aser dito e ouvido por ambos. Até orompimento definitivo entre eles (talvezpor imaturidade, talvez por tensões quenão foram suportadas, talvez por umaformação reativa), a psicanálise tenhaconhecido o seu período mais efer-vescente e criativo.

Logo após a publicação da parte final de“Os Símbolos da Transformação”, o quintovolume das obras incompletas de Jung,Freud publica o 14º volume de suas obrascompletas, “A História do Movimento Psi-canalítico”. Mesmo não dando o braço atorcer, notamos uma mudança de ventos ede direção ao percebermos um Freud maismitológico, por assim dizer. Houve daparte de Jung a projeção, em Freud, de umcomplexo paterno negativo. A fé que Jungnão via em seu pai, um pastor da IgrejaReformada Suíça, ele enxergava em Freude em seu monoteísmo, a psicanálise. Dequalquer forma, Jung jamais poderia serconsiderado um antípoda de Freud. Com anatural identificação, segue-se uma na-tural desidentificação. Sua relação comFreud sempre se pautou pela frase: "Se oque Freud disser for verdade...”

ConclusãoÀ guisa de conclusão, é bom dizer que

o excelente livro de John Kerr e o própriofilme “Um Método Perigoso” tornaram-seviáveis graças ao fato de Aldo Carotenuto,psicólogo e analista junguiano, graduadono Instituto C. G. Jung, de Zurique, terrealizado a descoberta, na biblioteca daUniversidade de Roma, no final dos anos70, (1979) dos diários de Sabina Spiel-rein, contendo a correspondência entreela, Freud e Jung. No Brasil, os diários deSabina foram publicados pela editora Paze Terra, com o título de “Diários de umasecreta simetria”. Um verdadeiro achado.Em sua velhice, bem após a morte deSabina (1942) e a morte de sua esposaEmma (1955), Jung lapida um trípticoem uma pedra. Em uma das imagens,vemos um urso, em pé, empurrando umabola. Ele escreveu:”A Rússia mantém abola rolando.” Uma referência a Sabina.Dez dias antes de entrar em coma, Jungentrega seu último manuscrito aos seuseditores, intitulado “Acessando o incons-ciente” (publicado em “O Homem eseus Símbolos”).

Analista junguiano descreve como a relação conturbada entre Freud, Jung e SabinaSpielrein, mostrada no filme “Um Método Perigoso”, influenciou a evolução da psicanálise

Cena do filme de David Cronenberg, em cartaz no Estado: Freud (Viggo Mortensen) e Jung (Michael Fassbender) representam o período mais fértil da psicanálise

Keira Knightley vive a ex-paciente que manteve um caso amoroso com Jung

>

>

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_10.PS;Página:1;Formato:(548.22 x 382.06 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 20:37:46

Page 10: Pensar 12 05 2012

12PensarA GAZETAVITÓRIA,SÁBADO,12 DE MAIODE 2012

artes plásticaspor MARIA D’EERMOGGINE

RENOIR: A PINTURA COMOREPRESENTAÇÃO DA VIDAObras expostas na mostra “Mestres Franceses”, até 10 de junho, no Palácio Anchieta,demonstram a visão de mundo do artista, com base no equilíbrio entre tradição e inovação

DIVULGAÇÃO

Pierre August Renoir (Li-moges, 25 de fevereiro de1841 – Cagnes, 3 de de-zembro de 1919) viveu pa-ra pintar. Ele é, talvez, omais popular entre os im-

pressionistas. É conhecido como o pin-tor dos aspectos serenos da vida, que,para ele, “deve ser retratada na suabeleza, alegria e na crença de que apintura deve ser especialmente agra-dável e amável, pois já existem coisasno mundo bastante desagradáveis e,portanto, não há necessidade de criarnovas imagens neste sentido”.

Suas afirmações eram transmitidaspara suas obras. O jogo da luz e osreflexos da produção, mas especial-mente a figura humana das mulheres,com seus corpos banhados por luznatural, são os temas centrais de suaspinturas. Renoir confiou completa-mente no efeito autonômo de cor econtorno descritivo modelado, compinceladas fracas e desbotadas, quasecomo um Da Vinci moderno.

Porém, em 1880, ele se afastou dapintura impressionista pura, sentindoo perigo de pintar exclusivamente nasensação do livre arbítrio. O artistaentrou no chamado Período Seco, de-dicado a um tipo de composição clarae consciente, com foco no rigor dodesenhar, e sofreu principalmente ocharme da obra de Ingres e de outrosartistas neoclássicos.

Foi apenas nos últimos anos de suacarreira que Renoir retornou ao co-lorismo livre impressionista, tornandosuas pinturas ainda mais sumptuosas ebrilhantes, com cores puras, usandotons de choque e contrastantes, se-guindo sua coragem e emoção.

Na exposição “Mestres Franceses”,aberta gratuitamente para o públicocapixaba, até 10 de junho, no PalácioAnchieta, estão em exibição 11 de-senhos de Renoir, que captam o artista apartir de outro ponto de vista. As gra-vuras demonstram o caminho da in-vestigação e inovação empreendida porele, com um olhar atento à tradição eoutro focado no frescor das inovaçõesda contemporaneidade.

Apesar de sua arte ser marcada pelapresença viva de cores e material, Re-noir não se importava de usar novastécnicas de impressão em tela, úteis

para a divulgação de sua arte.Mesmo por meio de litografias e

gravuras, é possível rastrear a evoluçãográfica do artista. Com diferentes te-mas, que vão desde paisagens a retratoscom imagens de meninas imersas empaisagem exuberante, Renoir conseguemais uma vez surpreender.

Além da temática das gravuras damostra, o artista também pintou ao

longo dos anos fascinantes nus femi-ninos. Em particular, as duas versões de“Femme au cep de vigne”, o quadro “LaBagnante con grifoncino”, preservadono Museu de Arte de São Paulo, e“Diana cacciatrice”, localizado na Na-tional Gallery of Art, em Washington,pintura visivelmente influenciada pelaarte de Coubet.

Ao final de sua vida, Renoir – que

carregava artrite em suas mãos –, naânsia de não dar fim a sua arte,amarrou pincéis a seus pulsos, quasecomo se fosse uma espécie de “ex-tensão orgânica”. E mais uma vezprovou ser prodigiosamente prolíficoaté o fim de seus dias. Sua últimagrande tela, “As Banhistas”, foi pin-tada em 1918, e pode ser apre-ciada no Louvre, em Paris.

Em sentido horário: “Richard Wagner”, 1900, litografia; “Mulher nua deitada virada para a direita”, 1906, água forte;“Claude Renoir de cabeça baixa”, 1904, litografia; e “Le chapeau epinglé”, 1894, gravura, estão em exibição na mostra

Documento:AGazeta_12_05_2012 1a. SABADO_CP_Pensar_12.PS;Página:1;Formato:(274.11 x 381.00 mm);Chapa:Composto;Data:10 de May de 2012 20:53:17