organizaÇÃo do estado e direitos...

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ROTEIRO DE CURSO 2015.2 5 a EDIÇÃO ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DIREITOS FUNDAMENTAIS AUTORES: ÁLVARO JORGE E GUSTAVO SCHMIDT COLABORADORA: CECÍLIA MARIA BARCELLOS ZERBINI

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ROTEIRO DE CURSO 2015.2

5a EDIÇÃO

ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DIREITOS FUNDAMENTAIS

AUTORES: ÁLVARO JORGE E GUSTAVO SCHMIDT COLABORADORA: CECÍLIA MARIA BARCELLOS ZERBINI

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NOTA INTRODUTÓRIA ......................................................................................................................................................................4

AUlA 1 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES ............................................................................................................................................5

AUlA 2 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES ............................................................................................................................................7

AUlA 3 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES ............................................................................................................................................9

AUlA 4 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES – QUEM É QUEM? ................................................................................................................ 11

AUlA 5 – ADMINISTRAÇÃO PÚBlICA - PRINCÍPIOS .......................................................................................................................... 14

AUlA 6 – ADMINISTRAÇÃO PÚBlICA – CONTROlE ........................................................................................................................... 15

AUlA 7 – FEDERAÇÃO .................................................................................................................................................................... 17

AUlA 8 – FEDERAÇÃO - COMPETÊNCIAS .......................................................................................................................................... 19

AUlA 9 – CONSTITUIÇÃO ESTADUAl ............................................................................................................................................... 21

AUlA 10 – FEDERAÇÃO – lEI ORGÂNICA E MUNICÍPIO ..................................................................................................................... 23

AUlA 11 – FEDERAÇÃO - INTERVENÇÃO .......................................................................................................................................... 25

AUlAS 12 E 13 - COMO E POR QUE IDENTIFICAR DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO? .......................................................... 28

AUlA 14 - COlISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS: A PONDERAÇÃO NO CASO lEBACH ......................................................................... 30

AUlA 15 - DEVIDO PROCESSO lEGAl E PROVAS IlÍCITAS................................................................................................................... 33

AUlA 16 E 17 - EXIGIBIlIDADE EM JUÍZO DOS DIREITOS SOCIAIS PRESTACIONAIS. O CASO DO DIREITO À SAÚDE E O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS ........................................................................................................................................... 35

AUlA 18 – PROCESSO lEGISlATIVO E REFORMA DA CONSTITUIÇÃO – ClÁUSUlAS PÉTREAS ................................................................ 38

AUlA 19 – PROCESSO lEGISlATIVO ORDINÁRIO .............................................................................................................................. 40

AUlA 20 – CONTROlE JUDICIAl DO PROCESSO lEGISlATIVO ............................................................................................................ 43

AUlA 21 – TIPOS DE INCONSTITUCIONAlIDADE E CONTROlE DE CONSTITUCIONAlIDADE ................................................................... 45

AUlA 22 – CONTROlE DE CONSTITUCIONAlIDADE – TIPOS ............................................................................................................... 49

AUlA 23 – CONTROlE DE CONSTITUCIONAlIDADE – CONTROlE JUDICIAl REPRESSIVO DIFUSO .......................................................... 53

AUlAS 24, 25 E 26 – CONTROlE DE CONSTITUCIONAlIDADE – CONTROlE JUDICIAl CONCENTRADO ..................................................... 55

AUlA 27 - ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAl ........................................................................................ 59

AUlAS 28 E 29 – REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS ............................................................................................................................... 62

AUlA 30 – OMISSÃO INCONSTITUCIONAl E MANDADO DE INJUNÇÃO ................................................................................................ 64

SumárioOrganização do Estado e direitos fundamentais

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FGV DIREITO RIO 3

ORGANIZAÇãO DO ESTADO E DIREITOS fUNDAMENTAIS

3FGV DIREITO RIO

ORGanIzaçãO DO EsTaDO E DIREITOs FunDamEnTaIs

5FGV DIREITO

ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DIREITOS FUNDAMENTAISORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DIREITOS FUNDAMENTAIS

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NOTA INTRODUTÓRIA

Esta aula inicia o curso de Direito Constitucional II – Organização do Estado e dos Direitos Fundamentais (“Curso”). Após o Curso de Teoria do Direito Constitucional ter apresentado os principais problemas e funda-mentos teóricos do Direito Constitucional, passa-se, aqui, a aprofundar esses conceitos com o estudo específico da engenharia constitucional brasileira e seu objetivo primeiro. Em outras palavras, considerando o alicerce teórico desenvolvido em Direito Constitucional I – Teoria do Direito Constitucional, o curso pretende analisar e discutir os dois objetivos principais para os quais o Direito Constitucional foi construído: a organização do Estado/Poderes e a proteção aos Direitos Fundamentais.

Como leciona Canotilho, o conceito ideal de constituição deve consagrar um sistema de garantias da liber-dade e o princípio da divisão dos poderes1. Tal indicação, entretanto, não se dá sem motivo, pelo simples fato de que não se pode fugir da idéia de que a constituição, como visto em Direito Constitucional I, é o documento que organiza o poder com um fim específico, qual seja, o de proteger os direitos dos cidadãos.

É da essência da tarefa libertadora da constituição assim fazê-lo. Quando tal não ocorre, como diria Montes-quieu, tudo está perdido. Não existe proteção, nem há que se falar em constituição2. Assim, neste curso, deve a organização do Poder Estatal ser analisada a partir da sua finalidade primeira acima referida.

Em termos “geográficos”, o curso vai simultaneamente apresentar e debater os Títulos III e IV (Organização do Estado e Organização dos Poderes), da Constituição Federal de 1988, e o sistema de direitos estabelecido pela Carta Política, discutindo os prós e contras do modus operandi e da estrutura criadas pelo constituinte para a proteção dos Direitos Fundamentais.

O curso encontra-se dividido em cinco blocos principais: (i) o primeiro, que vai tratar da organização dos Po-deres; (ii) o segundo, que vai trabalhar com a idéia de Federação e a sua arquitetura específica na Constituição; (iii) o terceiro, que vai aprofundar o estudo dos Direitos Fundamentais declarados na Constituição, e dos instrumentos metodológicos envolvidos na sua identificação e aplicação; (iv) o quarto, que vai estudar os mecanismos institu-cionais e modelos de controle de constitucionalidade; e (v) o quinto, que cuida das formas processuais – ou ações – previstas na Constituição para a proteção dos Direitos Fundamentais.

Passemos ao primeiro.

AULA 1 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Nota ao Aluno

No meio e no final deste semestre você prestará contas daquilo que aprendeu. Vai ser submetido a uma prova. O síndico do seu prédio fará o mesmo na assembléia de condomínio. Nas próximas eleições, os membros do Congresso Nacional prestarão contas aos seus eleitores. O presidente da República também não vai fugir deste compromisso.

Se olharmos ao nosso redor, diversos são os exemplos de pessoas e instituições prestando contas. Mas e o juiz do caso analisado: por que ele não deve prestar contas ao Congresso? Ele está livre para fazer o que quiser? Ao decidir, o Supremo Tribunal Federal simplesmente protegia um membro da magistratura, aplicando o chamado “espírito de corpo”, ou pensava em algo mais? Qual é o bem jurídico tutelado pela decisão?

O objetivo desta aula é discutir a idéia de fragmentação do Poder Estatal. Tomando por base o texto clássico de Montesquieu (que deverá ser atentamente estudado), você deve buscar entender o porquê da idéia de frag-mentação. Procure refletir:

Que realidade norteou Montesquieu na construção de seu texto? Suas premissas são corretas? Ainda são válidas nos dias de hoje? O que mudou no mundo desde que o texto foi escrito?

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É possível encontrarmos outros exemplos para fundamentar as idéias de Montesquieu, além daConstituição da Inglaterra?

Prepare-se para o debate em sala buscando aplicar as idéias de Montesquieu ao caso da aula. Procure compre-ender o papel da Constituição em toda esta discussão. A Constituição concede “passes livres” aos juízes? E para os demais Poderes? Afinal, o que é e para que serve a separação dos Poderes? Não se esqueça que o caminho para estas respostas está na bibliografia indicada.

Caso

A juíza Cláudia Valéria foi convocada em 2002, pelo deputado–presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito do Narcotráfico, para depor. Os membros da CPI exigiam que a juíza prestasse esclarecimentos sobre a revogação da prisão preventiva que concedera a dois cidadãos possivelmente envolvidos no tráfico de drogas. Devido à percepção social de que o narcotráfico se tornara um problema prioritário, profundamente agravado pela impunidade, a imprensa e a sociedade a princípio louvaram a iniciativa da CPI.

Imediatamente, o juiz Fernando da Costa Tourinho Neto impetrou habeas corpus em favor da juíza Cláudia Valéria, alegando que sua convocação estava ferindo o princípio da independência de poderes. Apreciando o pedido formulado por Tourinho Neto, o ministro Nelson Jobim, do STF, asseverou que “as decisões judiciais só podem ser revistas pelos recursos processuais próprios”. É o que estabelece em detalhes o artigo 41 da Lei Complementar nº 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), que protege a independência do exercício da jurisdição:

“Art. 41. Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem, o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir.”

Nesse contexto, reflita: a convocação feita pela CPI é constitucional?

Conceitos

O Poder Estatal e a sua fragmentação; fragmentação do poder e proteção da liberdade; o poder freia o poder; tripartição.

Bibliografia

MONTESQUIEU, Charles L. S. O espírito das Leis. Tradução Jean Melville, 2002, editora Martin Claret pp. 164-176

Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789

Anexo

DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO(Votada definitivamente em 2 de Outubro de 1789)

Os representantes do Povo Francês, constituídos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento e o menosprezo aos Direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, resolvem expor em uma declaração solene os direitos naturais, inalienáveis, imprescritíveis e sagra-dos do homem, a fim de que esta declaração, sempre presente a todos os membros do corpo social, permaneça constantemente atenta a seus direitos e deveres, a fim de que os atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo possam ser a cada momento comparados com o objetivo de toda instituição política e no intuito de serem por ela respeitados; para que as reclamações dos cidadãos, fundadas daqui por diante em princípios simples e incon-testáveis, destinem-se sempre à manutenção da Constituição e ao bem-estar de todos.

ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DIREITOS FUNDAMENTAIS

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NOTA INTRODUTÓRIA

Esta aula inicia o curso de Direito Constitucional II – Organização do Estado e dos Direitos Fundamentais (“Curso”). Após o Curso de Teoria do Direito Constitucional ter apresentado os principais problemas e funda-mentos teóricos do Direito Constitucional, passa-se, aqui, a aprofundar esses conceitos com o estudo específico da engenharia constitucional brasileira e seu objetivo primeiro. Em outras palavras, considerando o alicerce teórico desenvolvido em Direito Constitucional I – Teoria do Direito Constitucional, o curso pretende analisar e discutir os dois objetivos principais para os quais o Direito Constitucional foi construído: a organização do Estado/Poderes e a proteção aos Direitos Fundamentais.

Como leciona Canotilho, o conceito ideal de constituição deve consagrar um sistema de garantias da liber-dade e o princípio da divisão dos poderes1. Tal indicação, entretanto, não se dá sem motivo, pelo simples fato de que não se pode fugir da idéia de que a constituição, como visto em Direito Constitucional I, é o documento que organiza o poder com um fim específico, qual seja, o de proteger os direitos dos cidadãos.

É da essência da tarefa libertadora da constituição assim fazê-lo. Quando tal não ocorre, como diria Montes-quieu, tudo está perdido. Não existe proteção, nem há que se falar em constituição2. Assim, neste curso, deve a organização do Poder Estatal ser analisada a partir da sua finalidade primeira acima referida.

Em termos “geográficos”, o curso vai simultaneamente apresentar e debater os Títulos III e IV (Organização do Estado e Organização dos Poderes), da Constituição Federal de 1988, e o sistema de direitos estabelecido pela Carta Política, discutindo os prós e contras do modus operandi e da estrutura criadas pelo constituinte para a proteção dos Direitos Fundamentais.

O curso encontra-se dividido em cinco blocos principais: (i) o primeiro, que vai tratar da organização dos Po-deres; (ii) o segundo, que vai trabalhar com a idéia de Federação e a sua arquitetura específica na Constituição; (iii) o terceiro, que vai aprofundar o estudo dos Direitos Fundamentais declarados na Constituição, e dos instrumentos metodológicos envolvidos na sua identificação e aplicação; (iv) o quarto, que vai estudar os mecanismos institu-cionais e modelos de controle de constitucionalidade; e (v) o quinto, que cuida das formas processuais – ou ações – previstas na Constituição para a proteção dos Direitos Fundamentais.

Passemos ao primeiro.

AULA 1 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Nota ao Aluno

No meio e no final deste semestre você prestará contas daquilo que aprendeu. Vai ser submetido a uma prova. O síndico do seu prédio fará o mesmo na assembléia de condomínio. Nas próximas eleições, os membros do Congresso Nacional prestarão contas aos seus eleitores. O presidente da República também não vai fugir deste compromisso.

Se olharmos ao nosso redor, diversos são os exemplos de pessoas e instituições prestando contas. Mas e o juiz do caso analisado: por que ele não deve prestar contas ao Congresso? Ele está livre para fazer o que quiser? Ao decidir, o Supremo Tribunal Federal simplesmente protegia um membro da magistratura, aplicando o chamado “espírito de corpo”, ou pensava em algo mais? Qual é o bem jurídico tutelado pela decisão?

O objetivo desta aula é discutir a idéia de fragmentação do Poder Estatal. Tomando por base o texto clássico de Montesquieu (que deverá ser atentamente estudado), você deve buscar entender o porquê da idéia de frag-mentação. Procure refletir:

Que realidade norteou Montesquieu na construção de seu texto? Suas premissas são corretas? Ainda são válidas nos dias de hoje? O que mudou no mundo desde que o texto foi escrito?

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Por conseguinte, a Assembléia Nacional reconhece e declara, em presença e sob os auspícios do Ser Supremo, os seguintes direitos do Homem e do Cidadão:

I - Os homens nascem e ficam iguais em direitos. As distinções sociais só podem ser fundamentadas na uti-lidade comum.

II - O fim de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem.III - O princípio de toda a Soberania reside essencialmente na Nação; nenhuma corporação, nenhum indi-

víduo pode exercer autoridade que não emane diretamente dela.IV - A liberdade consiste em poder fazer tudo quanto não prejudique o próximo; assim, o exercício dos di-

reitos naturais de cada homem não tem limites senão os que assegurem o gozo desses direitos. Tais limites não podem ser determinados senão pela lei.

V - A lei só tem direito de proibir as ações prejudiciais à sociedade. Tudo quanto não é proibido pela lei não pode ser impedido e ninguém pode ser obrigado a fazer o que ela não ordena.

VI - A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou por seus representantes, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, quer ela proteja, quer ela castigue. Todos os cidadãos, sendo iguais aos seus olhos, sendo igualmente admissíveis a todas as dignidades, colocações e empregos públicos, e sem outra distinção do que a de suas virtudes e seus talentos.

VII - Nenhum homem poder ser acusado, sentenciado, nem preso se não for nos casos determinados pela lei e segundo as formas que ela prescreveu. Os que solicitam, expedem, executam ou fazem executar ordens ar-bitrárias, devem ser castigados; mas todo cidadão chamado ou preso em virtude da lei deve obedecer no mesmo instante; ele se torna culpado pela resistência.

VIII - A lei só deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias, e ninguém pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada anteriormente ao delito e legalmente aplicada.

IX - Todo sendo considerado inocente até que tenha sido declarado culpado, se se julga indispensável detê-lo, todo rigor que não for necessário para garantir sua detenção deve ser severamente proibido pôr lei.

X - Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, mesmo religiosas, contanto que não perturbem a ordem pública estabelecida pela lei.

XI - A livre comunicação de pensamentos e de opinião é um dos direitos mais preciosos do homem; todo cidadão pode, pois, falar, escrever e imprimir livremente, respondendo pelo abuso dessa liberdade nos casos previstos pela lei.

XII - A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita da força pública; esta força é instituída para o benefício de todos e não para a utilidade particular daqueles aos quais foi confiada.

XIII - Para o sustento da força pública e para as despesas da administração, uma contribuição comum é in-dispensável. Ela deve ser igualmente repartida entre todos os cidadãos em razão das suas faculdades.

XIV - Cada cidadão tem o direito de verificar, por ele mesmo ou por seus representantes, a necessidade de contribuição pública, de consenti-la livremente, de acompanhar o seu emprego, de determinar a cota, a estabi-lidade, a cobrança e a duração.

XV - A sociedade tem o direito de exigir contas a qualquer agente público de sua administração.XVI - Qualquer sociedade na qual a garantia dos direitos não for assegurada, nem a repartição de poderes

determinada, não tem constituição.XVII - Sendo a propriedade um direito inviolável e sagrado, ninguém pode dela ser privado, a não ser

quando a necessidade pública, legalmente reconhecida, o exigir evidentemente e sob a condição de uma justa e anterior indenização.

ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E DIREITOS FUNDAMENTAIS

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É possível encontrarmos outros exemplos para fundamentar as idéias de Montesquieu, além daConstituição da Inglaterra?

Prepare-se para o debate em sala buscando aplicar as idéias de Montesquieu ao caso da aula. Procure compre-ender o papel da Constituição em toda esta discussão. A Constituição concede “passes livres” aos juízes? E para os demais Poderes? Afinal, o que é e para que serve a separação dos Poderes? Não se esqueça que o caminho para estas respostas está na bibliografia indicada.

Caso

A juíza Cláudia Valéria foi convocada em 2002, pelo deputado–presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito do Narcotráfico, para depor. Os membros da CPI exigiam que a juíza prestasse esclarecimentos sobre a revogação da prisão preventiva que concedera a dois cidadãos possivelmente envolvidos no tráfico de drogas. Devido à percepção social de que o narcotráfico se tornara um problema prioritário, profundamente agravado pela impunidade, a imprensa e a sociedade a princípio louvaram a iniciativa da CPI.

Imediatamente, o juiz Fernando da Costa Tourinho Neto impetrou habeas corpus em favor da juíza Cláudia Valéria, alegando que sua convocação estava ferindo o princípio da independência de poderes. Apreciando o pedido formulado por Tourinho Neto, o ministro Nelson Jobim, do STF, asseverou que “as decisões judiciais só podem ser revistas pelos recursos processuais próprios”. É o que estabelece em detalhes o artigo 41 da Lei Complementar nº 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), que protege a independência do exercício da jurisdição:

“Art. 41. Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem, o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir.”

Nesse contexto, reflita: a convocação feita pela CPI é constitucional?

Conceitos

O Poder Estatal e a sua fragmentação; fragmentação do poder e proteção da liberdade; o poder freia o poder; tripartição.

Bibliografia

MONTESQUIEU, Charles L. S. O espírito das Leis. Tradução Jean Melville, 2002, editora Martin Claret pp. 164-176

Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789

Anexo

DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO(Votada definitivamente em 2 de Outubro de 1789)

Os representantes do Povo Francês, constituídos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento e o menosprezo aos Direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, resolvem expor em uma declaração solene os direitos naturais, inalienáveis, imprescritíveis e sagra-dos do homem, a fim de que esta declaração, sempre presente a todos os membros do corpo social, permaneça constantemente atenta a seus direitos e deveres, a fim de que os atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo possam ser a cada momento comparados com o objetivo de toda instituição política e no intuito de serem por ela respeitados; para que as reclamações dos cidadãos, fundadas daqui por diante em princípios simples e incon-testáveis, destinem-se sempre à manutenção da Constituição e ao bem-estar de todos.

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AULA 2 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Nota ao Aluno

Na primeira aula você discutiu a idéia de que a fragmentação do Poder do Estado é fundamental para a pro-teção da liberdade. Mas, afinal, a simples divisão do Poder é capaz de garantir a liberdade?

No caso apresentado, vemos o Poder Executivo exercitando uma prerrogativa sua. Mas seria essa compatível com o princípio da separação dos poderes? Teria sido este princípio violado? Afinal, não cabe ao Poder Legisla-tivo legislar? O que legitima o Poder Executivo a “criar” leis? O que dizem os textos indicados sobre esta “desca-racterização” da separação de poderes estudada na aula passada?

Como você verá, da leitura dos textos percebe-se que, além da idéia de divisão dos Poderes, outra noção é fundamental para a compreensão deste desenho institucional. Trata-se da constatação de que o Estado tem determinadas funções a serem cumpridas e que tais funções encontram-se distribuídas entre os diversos Po-deres do Estado. Procure refletir:

Seria essa uma distribuição perfeita, ou seja, a cada Poder corresponderia uma função? Procure esta resposta na Constituição e traga exemplos para o debate em sala. Como a Constituição Federal de 1988 realizou a distribuição das funções estatais entre os Poderes? Quais as vantagens e desvantagens da fórmula adotada?

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de manejar os conceitos de separação de poderes e separação de funções, bem como de identificar na Constituição Federal de 1988 funções típicas e atípicas de cada um dos Poderes.

Caso

No dia 31/05/1990, o presidente da República editou a Medida Provisória nº 190, tendo por objeto os re-cursos em dissídios coletivos de natureza econômica ou jurídica.

Algum tempo depois da edição da norma, o procurador-geral da República propôs Ação Direta de Inconsti-tucionalidade atacando o seu artigo 1º e parágrafo único, que determinam o seguinte:

“Art. 1º. Nos dissídios coletivos de natureza econômica ou jurídica, para evitar grave lesão à ordem ou à economia públicas, o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, a pedido da parte interessada, poderá sus-pender, em despacho fundamentado, total ou parcialmente, a execução das decisões dos Tribunais Regionais do Trabalho, até o trânsito em julgado da decisão proferida em respectivo recurso.

Parágrafo Único – A competência atribuída neste artigo ao Presidente do Tribunal Superior do Trabalho se extinguirá dentro de 180 dias, a contar da publicação desta Medida Provisória.”

Segundo o procurador-geral da República, o conteúdo da MP impugnada seria idêntico ao dos artigos 2º e 4º da Medida Provisória nº 1854, editada em 04/05/1990 – medida essa que fora integralmente rejei-tada pelo Congresso Nacional no dia anterior à reedição.

O fundamento constitucional da argumentação construída na ADIn estaria nos princípios do Estado Democrático de Direito e da independência e harmonia dos Poderes, previstos respectivamente nos artigos 1º, caput e parágrafo único e 2º, da Constituição Federal:

“Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

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Parágrafo Único – Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou direta-mente, nos termos desta Constituição.

Art. 2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”

Ao editar medida provisória de teor idêntico ao da medida anteriormente rejeitada pelos representantes do povo, o chefe do Poder Executivo nacional teria exercido competência legislativa fora dos limites expressamente previstos na Constituição.

Justamente por isso – continua a argumentação dos autores da ADIn – é que, para adquirir esta-bilidade normativa e ser convertida em lei, toda medida provisória deve ser submetida à apreciação e aprovação do Legislativo. Trata-se de uma garantia da separação de poderes – caso contrário, o Executivo estaria livre para assumir indiretamente (por edição de MPs), e sem controle do Congresso Nacional, uma função que é não é precipuamente sua, mas do próprio Legislativo. Esta manifestação do Poder Le-gislativo para estabilização das MPs é “insubstituível e insuprimível”, como pode ser constatado a partir do artigo 62 da Constituição:

“Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias , com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.

Que argumentos você usaria para contestar a posição da Procuradoria Geral da República?

Conceitos

Funções estatais; funções típicas e atípicas; freios e contrapesos

Bibliografia

LOEWENSTEIN, K. Teoria de la Constitucion. Ariel Derecho, Barcelona, 1965. (trechos selecionados pelo professor)

KELSEN, H. Teoria Geral do Direito do Estado. Martins Fontes, São Paulo, 1990. (trechos selecionados pelo professor)

SILVA, J. A. da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, São Paulo, 2005, pp. 106 – 112.

Questões de Concursos

1) Prova preliminar para ingresso para a Magistratura estadual/1999- RJÉ possível a delegação de funções entre os Poderes? Resposta fundamentada.

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AULA 3 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

Nota ao Aluno

Nas duas primeiras aulas sobre o tema Organização dos Poderes foram debatidas as idéias de fragmentação do Poder com vistas à proteção da liberdade, divisão das tarefas entre instituições distintas dentro da estrutura do Estado e, por fim, funções típicas e atípicas de cada um dos Poderes.

Você já percebeu que a chamada Independência dos Poderes não quer dizer liberdade para fazer o que bem entender. Pelo contrário, foram vários os exemplos de que a organiza-ção constitucional não deixa cada Poder fazer o que bem entende.

Na aula de hoje, vamos aprofundar um conceito que materializa aquela idéia de que a independência dos Poderes não significa ausência de controles. Vamos discutir a engenharia constitucional necessária para a implementação do chamado sistema de freios e contrapesos.

Leia a bibliografia indicada, o caso gerador e o voto do ministro Cezar Pelluso sobre a criação do controle externo da magistratura. Lembre-se das aulas anteriores e crie um qua-dro de freios e contrapesos relativos aos três Poderes, procurando refletir:

Quais as vantagens e desvantagens deste sistema? Você acha que os Constituintes de 1988 tiveram as mesmas discussões que os Federalistas?

Ao final, tente colocar no papel o conceito que você entende como o mais correto sobre o que vem a ser a independência e harmonia previstas no art. 2° da Constituição Federal.

Caso1

Há alguns anos, a Assembléia Legislativa da Paraíba resolveu incluir na Constituição Estadual o seguinte dispositivo:

“Art. 147. O Conselho Estadual de Justiça é órgão de fiscalização da atividade adminis-trativa e do desempenho dos deveres funcionais do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Advocacia Geral do Estado e da Defensoria Pública.

§1º - O Conselho de Justiça será integrado por dois desembargadores, um representante da Assembléia Legislativa do Estado, o Procurador-Geral da Justiça, o Procurador-Geral do Estado e o Presidente da Secional da OAB.

§2º - Lei complementar definirá a organização e o funcionamento do Conselho Esta-dual de Justiça”.

A criação de um órgão de fiscalização do Poder Judiciário, ainda que em âmbito estadu-al, tem sido um dos temas mais intensamente debatidos no Brasil desde que a Reforma do Judiciário começou a ser proposta.

As reações de setores tradicionalmente refratários ao controle externo não demoraram. Pouco tempo após a publicação da emenda, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) contra o novo artigo 147 da Consti-tuição do Estado da Paraíba.

O argumento básico da AMB era o de que a norma impugnada feriria os princípios da separação de poderes e da independência do Poder Judiciário – cláusulas pétreas da Cons-

1 Caso baseado na ADIN 135-3 PB – Criação de Conselho Es-tadual de Controle Externo do Poder Judiciário pela Constitui-ção Estadual.

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tituição Federal, nos termos do artigo 60, §4°. Além disso, a função fiscalizadora do órgão criado pela Emenda pertencia originariamente do Tribunal de Contas do Estado.

Defendendo a constitucionalidade do artigo 147, a Assembléia Legislativa da Paraíba alegou que o Conselho criado não violaria qualquer dos princípios fundamentais da Constituição. Aliás, argumentava a Assembléia, a própria Constituição a autorizava a implementar tal órgão, na medida em que “recobriu-se de modernidade, insculpindo em seu seio, e permitindo que as Cartas Estaduais o fizessem, institutos correspondentes aos avanços sociais e aos justos anseios comunitários da mudança.”

Como você se posicionaria acerca da criação de um órgão de fiscalização do Poder Judiciário? Procure cons-truir argumentos favoráveis e contrários à constitucionalidade desse órgão.

Conceitos

Freios e contrapesos.

Bibliografia

LOEWENSTEIN, K. Teoria de la Constitucion. Ariel Derecho, Barcelona, 1965. (trechos selecionados pelo professor)

HAMILTON, A. O Federalista. Editora Líder, Belo Horizonte, 2003, pp. 298 – 309 ( Artigos XLVII e LI) Voto do ministro César Peluso na ADIN 3367-1 (ver Apêndice 1)

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AULA 4 – ORGANIZAÇÃO DOS PODERES – QUEM É QUEM?

Nota ao Aluno

Nas aulas anteriores, você estudou a idéia de separação de poderes. Deve ter com-preendido que o sistema montado para garantir a independência dos Poderes é, em verdade, um sistema de controles mútuos e não um sistema de independência absoluta. Viu também como os Poderes detêm funções típicas e atípicas e como estas idéias se materializam por meio da criação de um sistema de freios e contrapesos expresso na Constituição.

Agora é hora de aprofundar o estudo particular de cada um dos Poderes, com ênfase em algumas de suas funções respectivas, sejam elas típicas ou atípicas. Esta aula procura analisar um pouco mais detalhadamente os Poderes Legislativo e Judiciário, particular-mente no que concerne às suas respectivas estruturas. De carona, devido à sua inserção no cenário institucional a partir de 1988, o Ministério Público também será estudado.

Não é necessário maior detalhamento do tema, uma vez que o mesmo será objeto de disciplinas específicas a partir do quarto período. Mas é fundamental que a estrutura dese-nhada pela Constituição para esses Poderes seja compreendida por você.

O caso gerador discute o poder das Comissões Parlamentares de Inquérito. Essas comissões buscaram, na vigência da nova Constituição, agigantar os seus poderes de investigação, mas acabaram tendo muitas de suas decisões revistas pelo Poder Judi-ciário, que passou a delimitar o âmbito de atuação das mesmas. Em conjunto com o caso, a bibliografia indicada aprofunda a discussão sobre os limites da competência de tais comissões, cuidando também de apontar o novo ator no teatro das instituições: o Ministério Público.

Busque identificar nos textos e no caso estudados a materialização da idéia de freios e contrapesos. Traga para o debate em sala exemplos que você pôde retirar das leituras.

Caso2

Em 17 de novembro de 1999, um advogado, Dr. Artur, teve seu escritório e sua residên-cia revistados por agentes da Polícia Federal. Quando o advogado exigiu que mostrassem a autorização judicial para realizar a medida, os policiais informaram que estavam cumprindo um Mandado de Busca e Apreensão expedido pelo deputado Federal Magno Malta, na condição de presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), criada para o Avanço e a Impunidade do Narcotráfico.

Durante a busca, foram apreendidos bens necessários ao exercício profissional de Artur, como, por exemplo, computadores – nos quais estavam armazenadas diversas informações sobre clientes e processos de Artur – e inúmeros documentos relativos a casos em que tra-balhava na época.

Sentindo-se extremamente lesado tanto moral, como materialmente, o advogado impe-trou mandado de segurança contra a medida “abusiva, autoritária e ilegal” do presidente da CPI, com o intuito de reaver os bens apreendidos.

Inquirido sobre o assunto, o deputado federal Magno Malta afirmou que “a CPI tem se pautado por preservar os direitos dos cidadãos, principalmente quando da prática de atos graves, como a busca e apreensão”. Com relação aos bens apreendidos, explicou que “depois de uma primeira análise nos serviços de informática da Câmara dos Deputados, que já implicou certa

2 Caso baseado no MS nº 23.642/DF – Determinação de busca e apreensão em domicí-lio por Comissão Parlamentar de Inquérito.

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demora, a CPI concluiu que, seja nesta Casa, seja no Senado Federal, o Poder Legislativo não dispunha de equipamen-tos e técnicos que pudessem fazer essa perícia”, fato que teria ocasionado a “entrega de todo o material de informática aos peritos da Polícia Federal”.

Diante dos fatos acima expostos, responda: a Comissão Parlamentar poderia ter ordenado a narrada busca e apreensão?

Conceitos

Poder Legislativo; Congresso Nacional; Comissões Parlamentares de Inquérito; Tribunal de Contas; Poder Judiciário; Ministério Público.

Bibliografia

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 509 – 517; 553 - 557 BARROSO, Luís Roberto. Comissões Parlamentares de Inquérito e suas Competências: Política, Direito e Devido Processo Legal. Disponível nos sites:o http://direitopublico.com.br/pdf/REVISTA-DIALOGO-JURIDICO-01-2001-LUIS-R-BARROSO.pdfo www.presidencia.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_15/Art_Luis.htm. FALCÃO, J. A. Os Novos Políticos. Correio Braziliense, 30/07/1999.

Jurisprudência

HC 83515 - RSEMENTA: HABEAS CORPUS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PRAZO DE VALIDADE. ALE-

GAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE OUTRO MEIO DE INVESTIGAÇÃO. FALTA DE TRANSCRIÇÃO DE CONVERSAS INTERCEPTADAS NOS RELATÓRIOS APRESENTADOS AO JUIZ. AUSÊNCIA DE CIÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ACERCA DOS PEDIDOS DE PRORROGAÇÃO. APU-RAÇÃO DE CRIME PUNIDO COM PENA DE DETENÇÃO. 1. É possível a prorrogação do prazo de autorização para a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente quando o fato é complexo a exigir investigação diferenciada e contínua. Não configuração de desrespeito ao art. 5º, caput, da L. 9.296/96. 2. A interceptação telefônica foi decretada após longa e minuciosa apuração dos fatos por CPI estadual, na qual houve coleta de documentos, oitiva de testemunhas e audiências, além do procedimento investigatório normal da polícia. Ademais, a interceptação telefônica é perfeitamente viável sempre que somente por meio dela se puder investigar determinados fatos ou circunstâncias que envolverem os denunciados. 3. Para fun-damentar o pedido de interceptação, a lei apenas exige relatório circunstanciado da polícia com a explicação das conversas e da necessidade da continuação das investigações. Não é exigida a transcrição total dessas conversas, o que, em alguns casos, poderia prejudicar a celeridade da investigação e a obtenção das provas necessárias (art. 6º, § 2º, da L. 9.296/96). 4. Na linha do art. 6º, caput, da L. 9.296/96, a obrigação de cien-tificar o Ministério Público das diligências efetuadas é prioritariamente da polícia. O argumento da falta de ciência do MP é superado pelo fato de que a denúncia não sugere surpresa, novidade ou desconhecimento do procurador, mas sim envolvimento próximo com as investigações e conhecimento pleno das providências tomadas. 5. Uma vez realizada a interceptação telefônica de forma fundamentada, legal e legítima, as infor-mações e provas coletas dessa diligência podem subsidiar denúncia com base em crimes puníveis com pena de detenção, desde que conexos aos primeiros tipos penais que justificaram a interceptação. Do contrário, a interpretação do art. 2º, III, da L. 9.296/96 levaria ao absurdo de concluir pela impossibilidade de intercep-tação para investigar crimes apenados com reclusão quando forem estes conexos com crimes punidos com detenção. Habeas corpus indeferido.

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MS N. 23.639-DF3

RELATOR:MIN.CELSO DE MELLOEMENTA: COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO - QUEBRA DE SIGI-

LO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA - VALIDADE - EXISTÊNCIA SIMUL-TÂNEA DE PROCEDIMENTO PENAL EM CURSO PERANTE O PODER JUDICI-ÁRIO LOCAL - CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO IMPEDE A INSTAURAÇÃO, SOBRE FATOS CONEXOS AO EVENTO DELITUOSO, DA PERTINENTE INVESTIGA-ÇÃO PARLAMENTAR - MANDADO DE SEGURANÇA INDEFERIDO. A QUEBRA FUNDAMENTADA DO SIGILO INCLUI-SE NA ESFERA DE COMPETÊNCIA IN-VESTIGATÓRIA DAS COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO.

A quebra do sigilo fiscal, bancário e telefônico de qualquer pessoa sujeita a investigação legislativa pode ser legitimamente decretada pela Comissão Parlamentar de Inquérito, des-de que esse órgão estatal o faça mediante deliberação adequadamente fundamentada e na qual indique a necessidade objetiva da adoção dessa medida extraordinária. Precedente: MS 23.452-RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Pleno).

PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE JURISDIÇÃO E QUEBRA DE SIGILO POR DETERMINAÇÃO DA CPI.

O princípio constitucional da reserva de jurisdição - que incide sobre as hipóteses de busca domiciliar (CF, art. 5º, XI), de interceptação telefônica (CF, art. 5º, XII) e de decre-tação da prisão, ressalvada a situação de flagrância penal (CF, art. 5º, LXI) - não se estende ao tema da quebra de sigilo, pois, em tal matéria, e por efeito de expressa autorização dada pela própria Constituição da República (CF, art. 58, § 3º), assiste competência à Comissão Parlamentar de Inquérito, para decretar, sempre em ato necessariamente motivado, a excep-cional ruptura dessa esfera de privacidade das pessoas.

AUTONOMIA DA INVESTIGAÇÃO PARLAMENTAR.O inquérito parlamentar, realizado por qualquer CPI, qualifica-se como procedimen-

to jurídico-constitucional revestido de autonomia e dotado de finalidade própria, circuns-tância esta que permite à Comissão legislativa - sempre respeitados os limites inerentes à competência material do Poder Legislativo e observados os fatos determinados que ditaram a sua constituição - promover a pertinente investigação, ainda que os atos investigatórios possam incidir, eventualmente, sobre aspectos referentes a acontecimentos sujeitos a inqué-ritos policiais ou a processos judiciais que guardem conexão com o evento principal objeto da apuração congressual. Doutrina.

Questões de concursos

1) Prova preliminar para o ingresso na Magistratura estadual/1999 - RJ O disposto no art. 58, § 3º, da Constituição da República autoriza comissão parlamen-

tar de inquérito decretar a prisão de pessoa por ela investigada?

2) 17º Concurso - Ministério Público Federal/ 1999DISSERTAÇÃOAs Comissões Parlamentares de Inquérito: criação, fins, poderes de investigação e limites

constitucionais.

3 Noticiado no Informativo do STF n. 210.

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AULA 5 – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - PRINCÍPIOS

Nota ao Aluno

Esta aula é dedicada ao estudo da Administração Pública, notadamente no que toca aos princípios que devem reger a sua atuação. A idéia da aula é discutir a série de condicionamentos aos quais está submetida à atividade administrativa pública. Seriam os mesmos razoáveis?

É importante que você compreenda como estes princípios da Administração Pública podem servir como uma forma de controle da mesma.

No entanto, uma questão permanece: o conteúdo de tais princípios está definido? Como o operador do direito deve argumentar para aplicá-los a favor de suas teses? Pense em exemplos.

A partir do caso concreto, analise o que vem a ser princípio da moralidade. Procure refletir: Seria possível propor uma ação fundamentada apenas nesse princípio? Por quê? Que outros exemplos de violação ao princípio da moralidade você poderia dar? Existe alguma ligação lógica entre esses princípios, em especial com o princípio da legalidade? Algum destes princípios seria aplicável aos particulares?

Caso

Para auxiliar o chefe de gabinete da Presidência da República, o presidente, Fernando Henrique Cardoso, nomeou sua filha, gerando protestos gerais.

O Sindicato dos Servidores Públicos Federais alegou que o ato do presidente feria o princípio da morali-dade (artigo 37, CF). A Advocacia Geral da União, por sua vez, alegou que a filha do presidente não estava diretamente subordinada ao primeiro mandatário da nação, pelo que não haveria violação àquele princípio.

E você? O que acha? Afinal, qual é o conteúdo do princípio da moralidade?

Conceitos

Poder Executivo; estrutura do Poder Executivo; responsabilidade do presidente da República; princípios da Administração Pública: princípio da legalidade; princípio da impessoalidade; princípio da moralidade; princípio da publicidade; princípio da eficiência; poder discricionário; improbidade administrativa; princípio licitatório.

Bibliografia

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 666 – 676 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 10ª ed. Atlas, SP, pp. 306-318 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. Malheiros, SP, pp. 87-89

Questões de concursos

1) 20º Concurso - Magistratura Estadual/ 2000 - MSNa Constituição Federal, o que é o princípio da eficiência na Administração Pública? Quais são os novos

mecanismos introduzidos na constituição tendentes a promover o cumprimento desse mesmo princípio? Des-creva-os e comente-os, afirmando se o conceito desse princípio é jurídico ou econômico. Fundamente.

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AULA 6 – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – CONTROLE

Nota ao Aluno

Na aula passada você viu que determinados princípios constitucionais norteiam a atuação da administração pública. Indicam como a mesma deve se portar e servem como instrumentos de controle do poder público pelos administrados.

O objetivo desta aula é aprofundar a importância daqueles princípios, particularmen-te no que toca à restrição que os mesmos impõem aos poderes especiais detidos pela administração para a implementação do interesse público.

Você considera essa avaliação fundamental? Se olharmos ao redor, veremos que os po-deres que detêm a administração estão presentes no nosso dia-a-dia, baseando decisões que influenciam diretamente as nossas vidas.

De fato, imagine a sua vinda para a faculdade. Se você vem de ônibus, saiba que foi a Administração Pública que aprovou o traçado da linha; se ela vai passar ou não em frente a sua casa. O metrô também é uma concessão pública que foi outorgada para um particu-lar por um processo licitatório. E cabe à Administração Pública determinar se um número maior ou menor de vagões vai circular em determinado horário. O guarda que controla o trânsito também vai exercer poderes ligados à Administração Pública que podem afetar o seu horário de chegada na aula.

Mas qual é o limite desses poderes da administração? Como os princípios estudados na aula anterior controlam tais poderes?

O caso gerador mostra como o Judiciário se portou diante do exercício de uma prerro-gativa detida pelo administrador público, no caso, o presidente da República.

Coloque-se nas duas posições: de agente da Administração Pública e do sr. Salvador. Reflita:

Não lhe parece que ambas as posições são razoáveis? O que diz a Constituição sobre a questão? Quais são os princípios envolvidos? Faça uma relação dos mesmos para auxiliar no

debate em classe. Os princípios analisados foram corretamente aplicados pela decisão?

Caso4

Salvador Alfredo Veja Canjura, cidadão salvadorenho, mudou-se para o Brasil com a intenção de fugir dos sucessivos conflitos armados em seu país. Aqui chegando, começou a construir nova vida. Arrumou emprego fixo de professor em firma própria, saindo da situa-ção antiga de crise financeira. Algum tempo depois, sua companheira ficou grávida. A nova vida de Salvador parecia ser perfeita.

Contudo, em 17 de outubro de 1994, o então presidente da República, Itamar Franco, decre-tou a expulsão de Salvador do Brasil, com base no processo nº 08410-001.486/86, do Ministério da Justiça, em virtude de não ter ficado comprovado que seu filho dependia economicamente dele, visto que Salvador havia se separado de sua companheira e não sustentava a criança.

Salvador imediatamente procurou um advogado para reverter sua situação. Este pro-curou o Ministério da Justiça para reverter o problema administrativamente, ameaçando recorrer ao Judiciário, caso o decreto do presidente fosse mantido.

4 Caso baseado no HC 72082/RJ – Expulsão de �lho de brasi-leiro, sem a observância, pelo Decreto Presidencial, da neces-sária motivação.

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A consultoria jurídica do Ministério da Justiça informou ao advogado que a decisão do presidente era irre-versível e que não adiantaria buscar o Judiciário, uma vez que era uma decisão discricionária do presidente, que não poderia ser revista por aquele outro Poder.

E agora? Procurado por aquele advogado para elaborar um parecer, que argumentos você traria para auxiliá-lo no caso? Procure responder às questões propostas no texto introdutório para se preparar para o debate em sala. Se preferir, escolha um papel para defender. Analise sempre a questão pensando na natureza e nos limites do poder discricionário da Administração Pública.

Conceitos

Poderes da administração pública; poder discricionário; improbidade administrativa

Bibliografia

Responsabilidade Administrativa e Impeachment – Sérgio Sérvulo Cunha (trechos selecionados pelo professor) MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª edição, Malheiros, SP. pp. 114-116 SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 547-552.

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AULA 7 – FEDERAÇÃO

Nota ao Aluno

Nesta aula, vamos iniciar o estudo da organização federativa prevista na Constituição. Esta será uma seqüência de aulas sobre a Organização do Estado Brasileiro, sendo o fio con-dutor a idéia de que organização do Estado está diretamente ligada à proteção dos direitos dos cidadãos. O conceito de Federação e seus princípios básicos devem passar a integrar o seu vocabulário profissional, sendo os textos de apoio muito importantes para tal fim. Por-tanto, não deixe de lê-los antes da aula.

Lembre-se que, em Direito Constitucional I, você estudou a influência da Constituição dos Estados Unidos de 1787 no modelo republicano adotado pelo Brasil, por meio da Constituição de 1891. Particularmente em relação à estrutura federal, pense no que aproxi-ma e no que distancia as duas constituições.

Leia o caso gerador e reflita sobre qual é o problema central. Anote os artigos pertinentes ao caso para facilitar o debate em sala.

Ao final da aula, você deverá ter compreendido o que vem a ser o princípio federativo, o modo de formação da Federação brasileira e os traços básicos do Estado Federal, apresenta-dos no texto do ministro Velloso.

Caso5

Em 1990, João, morador de uma cidadezinha de Goiás, obteve a aprovação em um con-curso público para trabalhar para o Estado de Goiás, assumindo seu cargo na administração pública estadual no mês de março. Para sua surpresa e felicidade, sem saber bem o porquê, viu que seu salário aumentava um pouquinho a cada mês.

O que estava ocorrendo em Goiás era que os vencimentos e salários, em virtude de legis-lação estadual, foram atrelados aos salários pagos a cargos equivalentes em âmbito federal. Assim, o reajuste era automático: uma vez alterada a remuneração do cargo-padrão no nível federal, ocorria uma modificação reflexa na remuneração no nível estadual.

Diante desse quadro, a gestão administrativa e financeira do Poder Executivo de Goiás se viu totalmente “quebrada”. Afinal, os salários pagos pelo Estado eram alterados, no fim do dia, pela vontade da União. Mas seriam os aumentos concedidos constitucionais?

Suponha que o governador do Estado tenha, por meio da Procuradoria do Estado, pro-curado o seu escritório para elaborar um parecer contrário aos referidos reajustes. Que argu-mentos constitucionais você utilizaria em seu parecer?

Conceitos

Princípio federativo; formação da Federação brasileira; auto-organização.

Bibliografia

HAMILTON, A. O Federalista. Editora Líder, Belo Horizonte, 2003, pp. 84 – 89. (trechos selecionados pelo professor)

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 608 – 617; 666 – 676

5 Caso baseado na Representa-ção nº 1419-3 (Goiás).

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VELOSO, Carlos M. Temas de Direito Público. Editora Del Rey, Belo Horizonte. (trechos selecionados pelo professor)

�e Federal Commerce Power – “Substantially affecting” (U.S. v. Lopez) http://caselaw.lp.findlaw.com/cgi- bin/getcase.pl?navby=case&court=US&vol=514&invol=549

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AULA 8 – FEDERAÇÃO - COMPETÊNCIAS

Nota ao Aluno

Na aula passada, iniciamos o estudo da Federação brasileira por meio da discussão dos princípios básicos do sistema federativo. Dentre as idéias estudadas, a mais importante foi a de autonomia dos Estados-membros, subdividida nos institutos da auto-gestão, do auto-governo e da auto-organização.

Mas seria a declaração de autonomia dos Estados-membros em relação à União sufi-ciente para desenhar o modelo federativo? Como resolver os conflitos de interesse entre os Estados? Não é importante saber qual é o galho de cada macaco? Mas como?

O conceito fundamental que você deve compreender ao fim da aula é o da predominân-cia do interesse como princípio guia da repartição de competências. Ou seja, qual a lógica por trás da repartição de competências estabelecida pela Constituição.

Prepare-se para o debate em sala identificando o que vêm a ser os interesses geral, regional e local. Reflita:

Como a Constituição tratou deste tema? Separe alguns exemplos e traga-os para o debate em sala. Compare a forma de positivação de tais competências no Brasil e nos Estados Unidos. São iguais ou distintas? O que essa comparação pode nos dizer acerca das preocupações dos constituintes de um e de outro país?

Caso6

As Leis federais 6.538/1978 e 10683/2003 atribuíram ao Ministério das Comunicações a responsabilidade pela prestação dos serviços postais à população brasileira, sendo que, nos termos destas normas, a exploração deveria ser realizada por meio de uma empresa pública criada para tal fim.

Em 19/09/2000, a Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina promulgou a Lei 11.561, cujo objetivo era garantir a todos os cidadãos residentes no território catarinense “as condições de acessibilidade e de prestação dos serviços postais”. Nesse sentido, foram estabe-lecidas regras como as seguintes:

a) a obrigatoriedade da entrega de correspondência no endereço residencial ou comercial indicado pelo remetente;

b) a vedação do uso, pelo concessionário encarregado da distribuição domiciliar de cor-respondência, de caixas postais comunitárias ou de qualquer outro instrumento que substi-tua a entrega direta do correio nas residências; e

c) a realização de trabalho conjunto, envolvendo o concessionário de serviços pos-tais, órgãos públicos competentes e associações de moradores, para a identificação e a organização de endereços residenciais nas comunidades populares de baixa renda ou em áreas de difícil acesso, de modo a viabilizar a distribuição de correspondências pelos carteiros.

Contudo, em 2004, o Ministério das Comunicações representou ao procurador-geral da República para a proposição de uma ADIn atacando a Lei estadual. O principal argumento do governo era o de que o ato normativo em questão estaria invadindo a competência pri-vativa da União.

Seria tal argumento correto? O Estado não teria o direito de defender o interesse de sua população, impondo condições que melhorassem a qualidade dos serviços prestados?

6 Caso baseado na ADI 3080-9 – Santa Catarina

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Você é o ministro relator do processo no Supremo Tribunal Federal. Diante do exposto, procure construir a solução mais adequada para o caso.

Conceitos

Competências; Poderes dos Estados-membros; Organização dos governos estaduais

Bibliografia

COMPARATO, Fábio K. Horário de funcionamento de farmácias e drogarias e o princípio constitucional de proteção ao consumidor. Revista de Direito Público n° 98, abril/junho de 1991.

Questões de concursos

1) Prova preliminar para o ingresso na Magistratura estadual/ - RJ Discorra sobre a técnica e o critério de partilha de competências adotados na Constituição para os entes que

fazem parte da Federação brasileira (aproximadamente 15 linhas).

2) Magistratura Estadual/ 2000 – DFQue é Federação? Descreva seus requisitos de existência, ou seja, as características jurídicas que a definem.

3) Magistratura Estadual/ 2003 - MGO que se entende por federalismo simétrico e por federalismo assimétrico?

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AULA 9 – CONSTITUIÇÃO ESTADUAL

Nota ao Aluno

No Curso de Direito Constitucional I você estudou a teoria do poder constituinte. Lem-bra-se? Foram vistos os conceitos de poder constituinte originário e do poder constituinte derivado. De forma tangencial, também foi mencionada a existência de um terceiro tipo de poder constituinte.

Este poder está ligado à capacidade de os Estados-membros auto-organizarem-se. É o chamado poder constituinte decorrente.

O objetivo da presente aula é discutir a forma de atuação e os limites desse poder cons-tituinte decorrente. A partir dos textos de leitura prévia, procure refletir:

Se existe uma lei maior que funda todo o sistema (a Constituição Federal), o que significa “que os Estados organizam-se e regem-se pela Constituição e leis que

adotarem” (art. 25)? Haveria algum condicionamento à forma como os \Estados irão ser organizar? Se existe, qual a razão de sua existência? Existem alguns valores que a Constituição Federal quer que o Estados comunguem?

Que valores ou princípios seriam esses? Compare a Constituição Federal com a Constituição do Estado do Rio de Janeiro.

Traga para aula exemplos de questões que estão tratadas de forma semelhante e distinta em cada um dos documentos. Como se dá o procedimento de fusão, subdivisão e desmembramento?

Leia o caso e procure responder às perguntas acima levantadas, tentando entender a pertinência das mesmas – e da bibliografia – para o caso.

Caso7

Adalberto, policial aposentado de 65 anos, morador do Rio de Janeiro, obteve sua aposentadoria compulsória antes da promulgação da Constituição Federal de 1988. Na época, vigorava a Lei Complementar nº 51, que dispunha, em seu artigo 1º, que o funcionário público policial seria aposentado compulsoriamente, com pro-ventos proporcionais ao tempo de serviço, aos 65 anos de idade. Tal dispositivo tinha aplicação imediata e direta aos Estados – ao completar 65 anos, o policial cessaria imediatamente suas atividades, independentemente de ato oficial determinando sua aposentadoria.

Em 1989, foi promulgada a Constituição Estadual do Rio de Janeiro. O artigo 78 do seu ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) previa o seguinte:

“Art. 78. Fica assegurado direito de reversão ao serviço ativo aos policiais que, embora hajam completado sessenta e cinco anos, não tiveram formalizada sua aposentadoria com-pulsória até a data da promulgação da Constituição da República.”

Nesse sentido, mesmo não podendo mais dar o melhor de sua energia à comunidade, Adalberto optou por voltar à atividade policial. Descobrira que sentia falta de colaborar com o combate ao crime no Rio de Janeiro e que a tranqüila vida de aposentado poderia esperar mais um pouco.

7 Caso baseado na ADIN 250-3 – Rio de Janeiro (Federação)

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Em 1990, já na vigência da nova Constituição Federal, o governador do Estado do Rio de Janeiro propôs uma ADIn atacando o artigo 78 da ADCT da Constituição Estadual. Seu argumento básico era o de que tal artigo violaria o artigo 2º da Constituição Federal.

Além disso, ao garantir a volta dos policiais inativos ao trabalho, a norma estaria criando na verdade um novo cargo dentro da corporação policial.

Você foi procurado pela associação de policiais seniores para elaborar um parecer contrário à pretensão do governador. Que argumentos você utilizaria?

Conceitos

Poder constituinte decorrente; inconstitucionalidade de Lei estadual; formação de Estados (fusão, subdivisão, desmembramento); princípios federais extensíveis; princípios sensíveis e estabelecidos; intervenção federal.

Bibliografia

SILVA. J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. Malheiros, SP (págs. 617-622) Incidente de Deslocamento de Competência n° 1 – PA (2005/0029378-4), Rel. Min. Arnaldo Lima (Caso Dorothy) – ver apêndice Preâmbulo da Constituição do Estado do Rio de Janeiro

Anexo

Preâmbulo da Constituição do Estado do Rio de Janeiro

Nós, Deputados Estaduais Constituintes, no pleno exercício dos poderes outorgados pelo artigo 11 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição da República Federativa do Brasil, promul-gada em 5 de outubro de 1988, reunidos em Assembléia e exercendo nossos mandatos, em perfeito acordo com a vontade política dos cidadãos deste Estado quanto à necessidade de ser construída uma ordem jurídica democrática, voltada à mais ampla defesa da liberdade e da igualdade de todos os brasileiros, e ainda no intransigente combate à opressão, à discriminação e à exploração do ho-mem pelo homem, dentro dos limites autorizados pelos princípios constitucionais que disciplinam a Federação Brasileira, promulgamos, sob a proteção de Deus, a presente CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

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AULA 10 – FEDERAÇÃO – LEI ORGÂNICA E MUNICÍPIO

Nota ao Aluno

A Constituição Federal de 1988 inovou na estruturação jurídico-política do país e in-cluiu o município entre os membros da Federação brasileira. Com efeito, o município nunca fez parte da concepção clássica federalista, que se limitava a definir como integrantes da Federação a União e os Estados.

Nesse sentido, ou seja, na qualidade de membro do pacto federativo, também são garantidas ao município as capacidades de auto-organização, auto-administração e auto-governo, estudadas anteriormente neste bloco.

O objetivo central da aula é que você compreenda a dimensão das citadas capaci-dades em nível municipal e como a Constituição regula as mesmas.

Anteriormente foi estudada a regra do interesse. A idéia é que você saiba responder quando é que um dos “interesses” envolvidos no pacto-federativo prevalece.

Leia o caso gerador e, a partir dos textos, reflita: De quem é a competência para a prestação dos serviços de tratamento de água e esgoto? Como distinguir entre o interesse local, regional e geral? O fato da Constituição estadual prever a criação da região metropolitana influi nessa distinção?

Procure compreender também a forma constitucional prevista para a criação ou des-membramento dos municípios. Você não ouviu falar do movimento “Rio Cidade-Estado”. Pois bem, o que a Constituição tem a dizer aos organizadores do mesmo?

Não se esqueça que não é um debate sobre o que “você” pensa simplesmente. Mas sobre o que você pensa, a partir do que a Constituição diz.

Caso

Em 1997, o Estado do Rio de Janeiro criou, por lei estadual, a chamada Região Metropolitana do Rio de Janeiro (“Região”). Esta região abrange diversos municípios e sua competência está prevista constitucionalmente7.

A lei estadual de criação definiu que os serviços públicos de saneamento básico a serem prestados dentro da “Região” seriam de competência do Estado do Rio de Janeiro, e não dos municípios.

O prefeito de um dos municípios incluídos na “Região”, entretanto, entendeu que a criação da Região Metropolitana usurpava funções de estrita competência munici-pal, mais especificamente no que toca à competência para a prestação dos serviços de distribuição de água e o tratamento do esgoto sanitário.

A discussão sobre competências é bastante recorrente no Brasil, na medida em que a Constituição Federal garantiu a autonomia tanto dos Estados quanto dos municípios.

O citado prefeito procurou a assessoria jurídica do diretório regional de seu par-tido político, de modo a obter orientação de como atacar a lei que criou a Região Metropolitana.

Na qualidade de advogado do partido, estude o caso e indique ao prefeito quais seriam os argumentos jurídicos que ele poderia utilizar para derrubar a lei.

7 Art. 25, § 3º - Os Estados poderão, mediante lei com-plementar, instituir regiões metropolitanas, aglomera-ções urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamen-tos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.

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Conceitos

Competências municipais; auto-organização municipal; governo municipal; formação de municípios

Bibliografia

MEIRELES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 2ª ed. Revista dos Tribunais. (trechos selecionados pelo professor) SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 639 – 648;

Questões de concursos

1) Prova preliminar para o ingresso na Magistratura estadual/1998 - RJ Discorra sobre as atribuições do município na Federação brasileira. (aproximadamente 15 linhas)

2) 37º Concurso – Magistratura Estadual/2003 – RJ No Município X a Câmara de Vereadores aprovou projeto de lei, imediatamente sancionado pelo Prefeito,

obrigando todas as empresas instaladas em seu território a fornecerem, a todos os seus empregados, diariamente, café-da-manhã nutritivo e constituído de número mínimo de calorias.

A empresa Y, inconformada com a nova obrigação que lhe foi imposta, ingressou perante o Juízo da Comarca com medida judicial discutindo a constitucionalidade de lei comunal.

Aprecie a hipótese, sucintamente, apenas sob o ângulo da adequação da lei ao sistema constitucional vigente.

3) XLII Concurso – Ministério Público Estadual - RSO Município poderia adotar o sistema de governo parlamentar em face da Constituição vigente? Explique

cabalmente a resposta, citando, se for o caso, dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, sem, contudo, transcrevê-los.

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AULA 11 – FEDERAÇÃO - INTERVENÇÃO

Nota ao Aluno

Esta aula encerra o bloco sobre a Federação brasileira. Até aqui você estudou o que vem a ser a autonomia dos entes federados, como foi a mesma concebida, quais são seus instru-mentos de efetivação etc.

Chegou a hora do contraponto. O tema da aula de hoje é intervenção. Em outras pala-vras, a quebra da autonomia dos entes federados, que, em regra, se dá do órgão mais abran-gente para o menos. Assim, cabe à União intervir nos Estados e a estes nos municípios.

Mas o que justifica a quebra da autonomia de um ente federativo por outro? Não é incoerente se falar em autonomia e intervenção ao mesmo tempo? Por que o texto constitu-cional previu tal agressão ao princípio da autonomia?

Leia o caso gerador pensando nessas perguntas. O texto constitucional existente lhe parece sufi-ciente para resolver a questão apresentada no caso gerador? No caso de uma intervenção ser necessária, qual o procedimento a ser seguido? Prepare-se para responder esta questão na sala de aula.

Caso8

Em 2 de dezembro de 1986, os funcionários e diretores da empresa Solidor Industrial Ltda., localizada em Boa Vista de São Roque, no Município de Quedas do Iguaçu, Paraná, foram surpreendidos por uma ação do Movimento dos Sem Terra (“MST”). A propriedade na qual a empresa se localizava foi invadida por integrantes do movimento. Imediatamente, foi ajuizada ação de reintegração de posse. Em pouco tempo saiu a decisão favorável à empresa.

A decisão do Juízo de Direito da Comarca de Quedas do Iguaçu, porém, não pôde ser cumprida. Não havia força policial disponível para remover os sem-terra da propriedade. O número de invasores aumentava a cada dia, sendo que os mesmos já tinham inclusive começado a remodelar, a lotear a propriedade para o cultivo das famílias que lá estavam.

Na qualidade de advogado da empresa Solidor, o que você faria? Que medida(s) você indicaria para o seu cliente e qual o fundamento da(s) mesma(s)?

Conceitos

Intervenção; princípios constitucionais sensíveis e estabelecidos; hipóteses, procedimento da intervenção federal; intervenção estadual nos municípios; ação direta interventiva.

Bibliografia

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 484 – 491;

Questões de concursos

1) 36º Concurso – Magistratura Estadual/ 2002 - RJ Qual é o instrumento normativo utilizado para aprovar a intervenção federal nos Esta-

dos? Quem tem legitimidade para aprová-la8 Caso baseado na Intervenção Federal nº 103 - Paraná

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2) 36º Concurso – Magistratura Estadual/ 2002 - RJ O modelo constitucional vigente prevê a existência de um controle político sobre o ato interventivo?

Fundamente.

3) 36º Concurso – Magistratura Estadual/ 2002 - RJ Pode o legislador constituinte estadual ampliar os casos de intervenção estadual nos Municípios? Justifique.

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AULAS 12 A 16 - DIREITOS FUNDAMENTAIS

Introdução ao Bloco de Direitos Fundamentais

No curso de Direitos Humanos, ministrado simultaneamente com esta disciplina, os alunos entrarão em contato com bibliografia voltada para a definição e a formação dos di-reitos que hoje são considerados essenciais – por meio de normas internacionais – para a existência humana plena. Assim, na presente disciplina, não procuraremos oferecer justifi-cativas ou fundamentações para a existência de tais direitos, nem discutiremos se eles são declarados ou instituídos pela sua positivação. O ponto de partida será o fato de que a nossa Constituição reconhece a existência de direitos fundamentais (o Título II é dedicado aos “Direitos e Garantias Fundamentais”), que expressamente condicionam à atuação dos po-deres públicos. Essa premissa embasará a discussão dos seguintes cinco problemas principais do bloco:

Quais direitos da Constituição são fundamentais? (Aulas 12 e 13) Quem está vinculado aos direitos fundamentais? (Aula 14) Como resolver colisões de direitos fundamentais? (Aula 14) Quando não podemos restringir ou ponderar direitos fundamentais? (Aula 15) Qual conteúdo ou parte do conteúdo desses direitos é passível de ser exigido judicial-

mente? (Aula 16)

Assim, a perspectiva será eminentemente dogmática/pragmática: como podemos ope-racionalizar as normas que versam sobre direitos e garantias fundamentais? Que efeitos po-dem extrair delas? Quais são os seus destinatários e quem deve responder pelo seu descum-primento? São questões práticas, e é natural que o sejam. Afinal, se os direitos fundamentais devem ser mais do que declarações de boa vontade e boas intenções do constituinte, e se a Constituição deve ser respeitada como norma jurídica vinculante e não mero conselho às futuras gerações, então os operadores do direito devem ser capazes de determinar qual o conteúdo de “dever ser” dos dispositivos constitucionais sobre direitos fundamentais.

O professor deve ter em mente e deixar claro para os alunos que as teorias sobre direitos fundamentais nascem e morrem com os regimes políticos, as ideologias da época, os defen-sores de determinada concepção de Estado e de sociedade e assim por diante.9 Não se quer apenas enumerar teorias sobre direitos fundamentais, mas sim capacitar os alunos a utilizar tais teorias para formular sólidas e eficazes respostas diante de casos concretos.

9 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional.

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AULAS 12 E 13 - COMO E POR QUE IDENTIFICAR DIREITOS FUNDAMENTAISNA CONSTITUIÇÃO?

Nota ao Aluno

Direitos fundamentais e a organização do poder estatal são a essência mesma do consti-tucionalismo; pode-se afirmar inclusive que a organização do poder estatal é um meio para se atingir as liberdades estabelecidas pelos direitos fundamentais. Atualmente, pode-se afir-mar, inclusive, que longe de serem apenas limites (direitos ditos “de primeira geração”) ou metas indispensáveis (direitos ditos “de segunda geração”) ao exercício do poder, os direitos fundamentais são verdadeiros critérios de legitimação do poder estatal e da ordem constitu-cional como um todo10. Não basta ao Estado respeitá-los; é preciso promovê-los.

Contudo, não é simples identificar quais os dispositivos constitucionais que consa-gram os direitos fundamentais. Não há nenhum critério que não seja problemático. Se-riam “fundamentais” apenas os direitos do artigo 5o? Os direitos e garantias do artigo 5o? Os direitos dos artigos 5o, 6o e 7o e seu incisos? Todo e qualquer direito assegurado pela Constituição? Você já parou para pensar de quantas formas diferentes podemos enfrentar esta questão?

Este é um problema com conseqüências práticas importantes. Em especial, vale notar que, nos termos do artigo 60, §4o da Constituição, não será sequer apreciada emenda constitucional que tenda a abolir “os direitos e garantias individuais”. Afinal, o que está incluído nesta vedação? Quais os direitos, ou quais as categorias de direitos? Dizer que um determinado dispositivo constitucional constitui cláusula pétrea é algo muito sério, pois as cláusulas do gênero representam uma excepcional restrição ao poder que as gerações futuras têm de traçar o seu próprio destino e criar suas próprias leis e instituições sob a égide da Constituição de 1988.

Caso

No julgamento da ADI 939-7, em 1993, o Supremo precisou interpretar pela pri-meira vez o alcance do artigo 60, §4o no que se refere à expressão “direitos e garantias individuais”. O que se questionava era a constitucionalidade da Emenda Constitucional n.03/93, que instituía o IPMF. Nos termos do art. 2o da Emenda, este tributo não estaria sujeito ao princípio da anterioridade11 (ou seja, poderia gerar efeitos e ser cobrado com re-ferência ao mesmo exercício fiscal em que fosse instituído), nem às imunidades tributárias previstas no artigo 153 da Constituição (de modo que poderia ser cobrado inclusive de entidades que o Poder Constituinte originário tinha colocado fora do alcance de qualquer tributação, como igrejas e templos religiosos, por exemplo).

Em uma decisão surpreendente, o Supremo entendeu que tanto a anterioridade, quan-to as imunidades tributárias estariam abrangidas pela expressão “direitos e garantias indi-viduais”, nos termos do artigo 60, §4o. Após a leitura dos textos indicados para esta aula e dos trechos dos votos dos Ministros na ADIn 939-7, reflita: você concorda ou discorda com os argumentos utilizados na interpretação do Supremo? Por quê?

Bibliografia

SARLET, Ingo. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. (pgs. 42 a 72).

10 SARLET, Ingo. A E�cácia dos Direitos Fundamentais (1998:61).

11 Constituição Federal, Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas aos con-tribuintes, é vedada á União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: III – cobrar tributos, b) no mesmo exercí-cio �nanceiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.

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Conceitos

Concepções formais e materiais para a definição dos direitos fundamentais; direitos de primeira, segunda e terceira geração; direitos e garantias individuais; direitos econômicos e sociais; direitos difusos; direitos de defesa; direitos a prestações positivas; limites ao poder de reforma constitucional.

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AULA 14 - COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS: A PONDERAÇÃO NO CASO LEBACH

Nota ao Aluno

Independentemente do seu conteúdo específico, a expressão “direitos fundamen-tais” não deixa dúvidas: estamos diante de bens jurídicos extremamente importantes. São fundamentais na medida em que, sem eles, nenhum outro direito poderia fazer sentido. Você consegue pensar em uma sociedade na qual a liberdade de locomoção não estivesse minimamente garantida? E a liberdade de expressão? E o direito à vida? Atualmente, a própria noção de Estado de Direito traz consigo a idéia de que a atu-ação dos poderes públicos encontra seu limite e seu objetivo na proteção a certos direitos dos cidadãos.

Não é difícil deslizar da afirmação da fundamentalidade desses direitos para a afirmação de que eles são absolutos. Você certamente já deve ter ouvido ou talvez pensado algo parecido: direitos fundamentais são tão importantes que são absolutos. Não há bons motivos ou razões suficientes para simplesmente deixá-los de lado, caso contrário não fariam sentido chamá-los de “direitos fundamentais”. Esta visão parece ser persuasiva. Mas será verdadeira?

Pare para pensar nas inúmeras limitações que os nossos direitos suportam diaria-mente. Afinal, normas penais punindo a lesão corporal, a injúria e a difamação não parecem limitar a liberdade que cada um de nós tem? A existência de zonas militares, de entrada restrita, é compatível com um direito fundamental absoluto de ir e vir? A partir de constatações como essas, doutrina e jurisprudência reconhecem que, a despeito de sua importância, os direitos fundamentais em nosso país não são nem poderiam ser absolutos. Como já observou o ministro Celso de Mello:

“OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS NÃO TÊM CARÁTER AB-SOLUTO. Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional das liberdades públicas, ao deli-near o regime jurídico a que estas estão sujeitas - e considerado o substrato ético que as informa - permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica, destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social e, de outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.”12

Assim, 1) o interesse da coletividade ou 2) outros interesses individuais dignos de pro-teção podem condicionar e na prática condicionam a aplicação das normas de “direitos fundamentais”. Eles têm limites que precisam ser respeitados. Nesta aula, nós analisaremos um caso específico que se enquadra na segunda hipótese:

12 MS 23452 / RJ. Rel: Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 16/09/1999. Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ DATA-12-05-2000.

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Direitos fundamentais são protegidos por meio de normas jurídicas, que, naturalmente, podem colidir umas com as outras, colocando seus destinatários e o julgador em uma situação insustentável: como devemos agir quando a proteção exigida pela norma A parece ser incompatível com a conduta necessária à proteção exigida pela norma B? Quando ocorre uma antinomia do gênero, isto é, quando parece ser impossível atender a dois direitos fundamentais em uma mesma decisão, dizemos estar diante de um caso de colisão de direitos.

Não há um critério mecânico e de simples aplicação para a solução de colisões do gênero. Pelo princípio da unidade da Constituição, as colisões de direitos não podem ser resolvidas com o simples sacrifício de um direi-to em detrimento do outro, sem maiores justificativas; é preciso levar a sério o dever de determinar qual delas deve prevalecer em cada caso. Assim, nas últimas décadas, doutrinadores e juízes têm discutido a possibilidade de se estabelecer um método ou um parâmetro mínimo para a solução de tais conflitos de forma adequado à Constituição.

Nesse sentido, o Tribunal Constitucional da Alemanha, ao decidir o Caso Lebach em 1973, lançou mão de um procedimento chamado ponderação para resolver um conflito entre a liberdade de expressão e outros interesses que também demandavam tutela constitucional.

Caso

Em 1972, uma grande emissora de televisão alemã se planejou para exibir um filme documentário sobre o assassinato de soldados da polícia alemã na cidade de Lebach. O crime foi praticado enquanto as vítimas dor-miam e tinha como objetivo a subtração de armas do local, que seriam utilizadas posteriormente na prática de outros delitos. Na época de sua execução, o assassinato assumiu grande repercussão, já que resultou na morte de quatro soldados do Exército Federal, lotados em um depósito de munições.

Ocorre que, na época programada para a exibição do documentário, um dos participantes do crime estava prestes a deixar a prisão, depois de ter cumprido pena em regime fechado por 3 anos. Ele considerou que a exibi-ção do referido documentário iria violar seus direitos à honra e à privacidade, além de dificultar profundamente sua ressocialização, pois seu nome seria novamente mencionado na mídia televisiva, com sua fotografia apare-cendo em todos os lares alemães. Seu pedido tinha suporte fático: todos sabem do estigma que um ex-presidiário carrega ao sair da prisão. Torna-se mais difícil encontrar emprego, e até mesmo ser aceito pela família e pelos amigos se constitui em algo complicado.

Após as várias negativas das instâncias inferiores, que acataram os direitos à informação e à liberdade de imprensa da emissora de televisão e permitiram a divulgação do documentário, foi ajuizado um recurso à Corte Constitucional Alemã.

Leia agora os trechos selecionados do Caso Lebach e procure refletir: Podemos considerar a liberdade de imprensa como absoluta? E o direito à informação? Por quê? Neste caso específico, como o Tribunal Constitucional resolveu o conflito? Quais foram os argumentos utilizados? Você concorda com a decisão do Tribunal? Que circunstâncias fáticas precisariam ser alteradas no caso, para fazer você mudar sua opinião?

Conceitos

Regras e princípios; ponderação; colisão de direitos fundamentais; deveres de proteção; dimensões objetiva e subjetiva dos direitos fundamentais; eficácia horizontal dos direitos fundamental.

Bibliografia

ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. (trecho a ser selecionado pelo professor)

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BARROS, Suzana de Toledo. O Princípio da Proporcionalidade e o controle de onstitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 3ª ed. Brasília Jurídica. (págs. 172-177). Caso Lebach (trechos traduzidos do espanhol, selecionados pelo Professor)

Questões de Concursos

1) Ministério Público Estadual/ 2001 – CEDiscorra sobre a incidência dos direitos fundamentais nas relações entre particulares. Resposta (mínimo de

20 e máximo de 35 linhas)

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AULA 15 - DEVIDO PROCESSO LEGAL E PROVAS ILÍCITAS

Nota ao Aluno

Na aula passada, vimos como o Tribunal Constitucional Alemão vem utilizando o recurso da ponderação para resolver casos de colisão entre princípios que consagram direitos fundamentais – em casos nos quais não poderíamos contar com os critérios tradicionais de solução de antinomias.

Conforme os trechos selecionados das decisões do Supremo, a doutrina da ponderação tem sido utilizada pela jurisprudência brasileira. Ainda assim, trata-se de um recurso argumentativo que só pode ser considerado pertinente ou não diante do caso concreto, não sendo, portanto, uma simples “fórmula” a apontar para a decisão correta. Se assim não fosse, afirmam muitos doutrinadores, os juízes teriam em suas mãos um poder excessivo, pois, a princípio, poderiam relativizar a aplicação de qualquer regra jurídica, em qualquer caso, mesmo as de hierarquia constitucional. O que não pode ser admitido em um Estado Demo-crático de Direito. Assim, ponderar é sobretudo argumentar – argumentar para mostrar que os elementos do caso concreto permitem que se fale da prevalência desta ou aquela regra, mas também para mostrar que o caso pode ser resolvido com recurso à ponderação.

Analise o caso abaixo e procure resolvê-lo por meio da noção de ponderação.

Caso

Em fevereiro de 1999, seguindo denúncias telefônicas anônimas, policiais civis da Delegacia de Repressão a Entorpecentes do Rio de Janeiro prenderam Ana Christina da Cruz Campos, residente na rua do Riachuelo. Cumprindo mandando judicial de busca, os policiais encontraram no interior de sua residência diversos papéis e manuscritos contendo descrições de tipos de armas, munições e compradores e fornecedores de material bélico dentro e fora do país.

Ainda naquela manhã, na delegacia, Ana Christina afirmou que trabalhava para o Sr. Francisco Agathos Trivelas (conhecido como “Chico”), fazendo cobranças de valores referentes à vendas de armas. Os principais clientes do negócio seriam alguns dos grandes traficantes em atividade no Rio de Janeiro.

Ana afirmou, ainda, que às 14h daquele mesmo dia, tinha um encontro marcado com “Chico” na estação do metrô de Copacabana. Na hora e local combinados, Francisco apareceu e, no lugar de Ana Christina, encon-trou a polícia esperando por ele.

Levado à delegacia, os policiais começaram a conversar informalmente com Francisco. A conversa foi gravada pelos policiais, com autorização do delegado, que estava presente na sala. Na gravação, Francisco admitiu que há vários anos vendia para os principais traficantes em atividade no Rio de Janeiro armas de uso exclusivo das forças armadas.

No dia seguinte, as autoridades policiais pediram ao juiz competente que determinasse a prisão temporária de Francisco, para que pudessem terminar de efetuar o inquérito e colher as informações necessárias ao ofere-cimento da denúncia pelo Ministério Público. O juiz indeferiu o pedido dos policiais, por considerar que não havia necessidade de se prolongar o inquérito. Francisco foi solto.

Alguns dias depois, o advogado de Francisco impetrou um hábeas corpus na primeira instância, pedindo que se declarassem “imprestáveis todas as provas obtidas ilegalmente, a saber, gravação telefônica, gravação ambiental, sem que fosse cumprido o art. 5º, LXIII da Constituição Federal, assim como ilegais e im-prestáveis, por derivação, as apreensões, os depoimentos de policiais que tenham conteúdo decorrente de prova ilícita, ou qualquer peça que a ela se refira, que a transcreva ou seja decorrente dela”.

O Ministério Público solicitou esclarecimentos ao delegado responsável pela prisão de Francisco, que informou que “as gravações objeto das fitas mencionadas (...) foram realizadas nesta [Delegacia] Especializada, com autorização e conhecimento de Francisco Agathos Trivelas”, acrescentando que “o gravador ficou sobre a mesa, à vista do mesmo.”

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Em todas as vezes que esteve diante do juiz, Francisco negou qualquer envolvimento com os fatos narrados por Ana Christina e confirmados na conversa gravada.

O juiz indeferiu o habeas corpus. Os advogados de Francisco insistiram e recorreram ao Tribunal, mas sem sucesso. Nova derrota aconteceu no Superior Tribunal de Justiça; os ministros do STJ afirmaram que, mesmo que Francisco não tivesse autorizado a gravação da conversa em meio magnético, “a jurisprudência vem enten-dendo ser lícita gravação obtida com anuência de uma das partes” – no caso, os policiais.

Quando o Superior Tribunal de Justiça indeferiu o pedido de hábeas corpus, a defesa de Francisco recorreu ao Supremo Tribunal Federal, por meio de novo hábeas corpus, acrescentando aos seus argumentos a tese de que os precedentes invocados se refeririam as gravações por vítimas de crimes, sendo portanto inaplicáveis a um caso em que “as gravações foram realizadas pelo Estado, polícia, para incriminar o paciente.”

Se estivesse no STF, como você decidiria?

Conceitos

Ampla defesa, autodefesa e defesa técnica; contraditório; direito ao silêncio e privilégio da não auto-incrimi-nação; princípio do juiz natural; presunção de inocência; motivação das decisões judiciais; provas ilícitas e provas ilícitas por derivação (fruit of the poisonous tree); duplo grau de jurisdição.

Bibliografia

Seleção de trechos de decisões dos tribunais brasileiros nos quais se recorrem à ponderação SARMENTO, Daniel. A Ponderação de Interesses na CF 88. 1ªed. Rio de Janeiro, 2003. págs. 102-106 ROCHIN v. CALIFORNIA, 342 U.S. 165 (1952) http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?navby=case&court=us&vol=342&page=165

Questões de Concursos:

1) 20º Concurso - Magistratura Estadual/ 2000 - MSA gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, sem o consentimento do outro, se constitui

em interceptação de conversa telefônica, violando o sigilo da comunicação assegurado pelo Artigo 5º, XII, da C.F., e o direito à intimidade do segundo interlocutor?

2) 6º Concurso - Magistratura Federal/ 1999 - 2ª RegiãoTendo em vista a norma constitucional que atribui às Comissões Parlamentares de Inquérito “poderes de in-

vestigação próprios das autoridades judiciais”, indaga-se se o órgão de investigação congressual pode determinar a interceptação ou escuta telefônica. Justifique a resposta.

3) 17º Concurso - Ministério Público Federal/ 1999É absoluta a inviolabilidade de domicílio, não podendo ninguém nele ingressar sem consentimento do mo-

rador? Por quê?

4) 17º Concurso - Ministério Público Federal/ 1999Descreva hipóteses em que se configura, segundo a Constituição, a obtenção de provas por meios ilíci-

tos. São elas juridicamente válidas e admissíveis para fins de investigação criminal ou instrução processual penal? Por quê?

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AULA 16 E 17 - EXIGIBILIDADE EM JUÍZO DOS DIREITOS SOCIAIS PRESTACIONAIS. O CASO DO DIREITO À SAÚDE E O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS.

Nota ao Aluno

Em certo momento da história do país, chegou a ser consensual a idéia de que os direitos de defesa tinham aplicabilidade imediata por parte do Poder Judiciário, enquan-to que os direitos sociais (mais especificamente, os direitos sociais prestacionais) depen-deriam de integração legislativa e/ou regulamentação administrativa para sua fruição. Liberdade de culto, por exemplo, poderia ser exigida em juízo e assegurada por decisão judicial; direito à moradia, por sua vez, ao envolver uma prestação positiva do Estado (o fornecimento de alguma habitação ao indivíduo), seria apenas um norte para a atuação dos poderes públicos – um fim a ser atingido, mas não algo vinculante e efetivo.

Em 1988, o constituinte tomou uma decisão que parecia ter resolvido a questão: nos termos do art. 5o, § 1º da Constituição Federal de 1988, “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Além disso, não há na Constituição nenhuma restrição evidente e definitiva do âmbito de aplicação desta norma; não há como se afirmar que ela se aplicaria apenas aos direitos de defesa, aos direitos de liberdade ou somente aos direitos chamados não-prestacionais. Assim, todas as categorias imagináveis de direitos fundamentais estariam sujeitas ao mesmo regime jurídico.12

Portanto, a princípio o direito à saúde também deve ter aplicabilidade imediata. Aliás, a saúde é uma escolha óbvia para ser um direito fundamental, e parece fazer sen-tido que este importante direito possa ser exigido em juízo13. De fato, trata-se de um bem indispensável para a fruição de qualquer outra liberdade, como por exemplo as de expressão e associação. O constituinte de 1988 reconheceu a importância da saúde e determinou explicitamente a sua proteção por parte do Estado em dois dispositivos:14

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segu-rança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desam-parados, na forma desta Constituição.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

De fato, há uma grande margem para desacordo razoável em torno da melhor maneira de atender aos dispositivos constitucionais que tratam da saúde. Os recursos são limitados; as maneiras de aplicá-los, inúmeras. Por exemplo: você pode ter bons motivos para pensar que a atuação estatal no âmbito da saúde deve ser pautada pelo uso da medicina alternativa chinesa ou do saber indígena de certas tribos da Amazô-nia; outros poderiam priorizar o investimento em sofisticadas vacinas experimentais, ainda que sem eficácia comprovada, ou, ao contrário, enfocar o combate às moléstias que já tenham sido adquiridas, por meio da distribuição de medicamentos e reali-zação de intervenções cirúrgicas em larga escala15. O legislador e o administrador têm diante de si vários cursos de ação plausíveis para atingir o fim constitucional da promoção da saúde.

12 SARLET, Ingo. A E�cácia dos Direitos Fundamentais (1998:236). 13 Como observa Luís Roberto Barroso, não se trata de na ver-dade de “direito à saúde” – já que o Estado não tem o poder de impedir que as pessoas ado-eçam –, mas sim de um “direito à proteção da saúde” (BARRO-SO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas......). 14 Observe ainda que os Estados da Federação podem intervir nos respectivos Municípios que não investirem a devida parcela do orçamento em saú-de, nos termos do Art. 35: “O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Ter-ritório Federal, exceto quando: (...) III – não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde”. Procure encontrar outros dispositivos constitu-cionais que vinculem a atuação do poder público à promoção da saúde.

15 Cf. GOUVÊA, Marcos Maselli. O Controle Judicial das Omissões Administrativas. (2003:75).

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Contudo, é certo que a “saúde de todos” prevista pela Constituição não pode ser interpretada de forma literal e apressada. Os agentes políticos devem atuar de modo a promover a saúde da coletividade, mas parece difícil de acreditar que vá haver recursos suficientes para conseguir manter todos os cidadãos saudáveis em um dado momento. O tratamento de enfermidades pode ser tão custoso a ponto de inviabilizar o combate e a prevenção de outras doenças, talvez até mais sérias. Não apenas é possível fazer escolhas: também é necessário escolher. Como já afirmou o Prof. Ricardo Lobo Torres:

“O acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, assegurado no art. 196 da Constituição, transformado em gratuito pela legislação infraconstitucional, é utópico e gera expectativas inalcançáveis para os cidadãos. As prestações de medicina curativa, com-preendidas no âmbito dos direitos sociais (art. 6o da Constituição), devem ser analisadas a partir dos critérios elaborados pela teoria da justiça. Dependem de escolhas orçamentárias, sempre dramáticas num ambiente de escassez de recursos financeiros, que conduzem ine-xoravelmente à escassez de alguns – a depender das opções por investimentos em hospitais, sanatórios ou postos médicos que atendam à população segundo as condições de idade, sexo ou domicílio.”16

Como você pode ver, a questão é delicada e é nesse cenário que se situam os casos desta aula. Quando começaram a aparecer nos tribunais brasileiros ações nas quais se exigia do Estado o fornecimento de medicamentos, a primeira reação dos juízes foi a de negar tais pedidos com base no argumento de que a norma inscrita no artigo 196 seria programática. Esta posição, porém, foi se alterando significativamente com o tempo. Hoje, é possível encontrar tanto na doutrina quanto na jurisprudência, argumentos pró e contra decisões judiciais determinando o fornecimento gratuito de medicamentos com base no direito constitucional à saúde.

Caso17

Imagine agora a seguinte situação. João é portador do vírus HIV. Embora não seja com-pletamente desprovido de recursos financeiros, João não possui a menor condição de arcar com alguns dos remédios básicos e indispensáveis à manutenção de sua saúde, que já come-ça a ficar fragilizada.

Folheando a Constituição, João se depara com o Artigo 196 – “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. Na esperança de conseguir viabilizar o seu tratamento, entra na Justiça plei-teando o fornecimento, pelo Estado, dos medicamentos necessários à sua sobrevivência.

A partir dos textos de leitura para essa aula, responda como você construiria sua argu-mentação se fosse:

Advogado de João nesse processo? Procurador do Estado ou do Município, defendendo a Fazenda Pública nesse processo?

Conceitos

Efetividade da Constituição; mínimo existencial; reserva do possível; legalidade; Or-çamento; discricionariedade; políticas públicas; vedação de retrocesso; direitos a prestações positivas; Direitos sociais; princípio democrático.

Bibliografia

AMARAL, Gustavo. Direito, Escassez e Escolha. Ed. 1ª, Renovar, 2001. (trechos a serem selecionados pelo professor)

16 TORRES, Ricardo Lobo. “A Cidadania Multidimensional na Era dos Direitos”, in TORRES, Ricardo Lobo. (org.) Teoria dos Direitos Fundamentais (1999:283).

17 Caso baseado no Agravo Regimental em Recurso Extra-ordinário Nº271286.

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SARLET, Ingo. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Ed. 2ª, Porto Alegre, 1999 (trechos a serem selecionados pelo professor) BARCELLOS, Ana Paula. A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. pgs. 201-246

Leitura Complementar

GOUVÊA, Marcos Maselli. O Controle Judicial das Omissões Administrativas.

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AULA 18 – PROCESSO LEGISLATIVO E REFORMA DA CONSTITUIÇÃO – CLÁUSULAS PÉTREAS

Nota ao Aluno

Na disciplina Teoria do Direito Constitucional, você foi apresentado às várias ma-neiras de se mudar a Constituição (emendas, novas interpretações etc.). Agora, será convidado a refletir sobre uma outra questão, qual seja, até onde vai o poder de Refor-ma Constitucional, poder este que cabe ao Congresso Nacional.

Alguns conceitos dogmáticos serão indispensáveis à nossa análise. Segundo a dou-trina clássica, existem dois tipos de Poder Constituinte, o originário e o derivado. O primeiro, atribuído ao povo desde Sieyès18, é o responsável pela criação do segundo, tendo, portanto, legitimidade para lhe impor limites na função de reforma do texto constitucional. Assim sendo, é possível concluir que a última palavra acerca de qual deve ser o direito constitucional positivo em dado momento é do Congresso Nacional, no exercício de seu poder constituinte derivado, salvo no tocante aos limites menciona-dos – as chamadas cláusulas pétreas. Você consegue identificar essas “cláusulas pétreas na Constituição”? Tente imaginar uma lista dos dispositivos aos quais o artigo 60,§ 4º pode ser aplicado.

O adjetivo “pétrea” vem de pedra; no âmbito jurídico, cláusula pétrea é aquela imo-dificável, irreformável, insuscetível de mudança formal. Os dispositivos protegidos como cláusulas pétreas não podem ser objeto de emenda que “tenda a aboli-los”. Mas a quem cabe decidir o que é “tender a abolir” em cada caso? O Judiciário? O Legislativo? Se for o Judiciário, será legítimo que uma geração impeça a geração posterior de ade-quar a Constituição às suas necessidades e aspirações? Como podem as cláusulas pétreas se compatibilizarem com a idéia de democracia?

Caso19

O sistema constitucional de previdência no Brasil é dividido em privado e público. O primeiro é de natureza contratual, facultativa e complementar e o segundo, conhecido como Previdência Social, tem caráter institucional e é de filiação compulsória. Este pode ser de regime geral, congregando todos os trabalhadores da iniciativa privada ou de regime próprio dos servidores públicos, reunindo servidores que ocupam ou que ocuparam cargos públicos efetivos.

Sobre esse tema existem diversas e profundas discussões, dada a desequiparação en-tre os setores privado e público. No setor público, existem benefícios diferenciados, como a integralidade dos proventos e a paridade entre ativos e inativos, o que gera um déficit crescente.

Nesse sentido, foi elaborada e aprovada a Emenda Constitucional nº 41 de 2003 que trata da Reforma da Previdência. Com essa Emenda consolidou-se o entendimento de que os servidores públicos inativos também deveriam contribuir para a Previdência, com vistas a diminuir a desigualdade que existia anteriormente.

Em 2004 foi proposta a ADIN 3105-DF pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, questionando a constitucionalidade da Reforma da Previdência no to-cante à taxação dos servidores inativos.

Como você, na posição de ministro do STF, solucionaria o caso?

18 Sieyès é autor do livro clássi-co: “Qu’est-ce que le Tiers-Etat”, 1789.

19 Caso baseado na ADIN 3105-DF.

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Conceitos

Cláusulas Pétreas; Poder Constituinte Derivado; Limites Formais, Circunstanciais e Materiais do Poder Constituinte Derivado.

Bibliografia

BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. Tomo III. Renovar, RJ, 2005 (págs. 167-216). SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. Malheiros, SP. (págs. 64-67).

Leitura Complementar

HORTA, Raúl Machado. Direito Constitucional. 4a ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. Pp. 235-251 (“Constituição e Direito Adquirido”)

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AULA 19 – PROCESSO LEGISLATIVO ORDINÁRIO

Nota ao Aluno

Como já estudamos em aulas anteriores, a elaboração de normas jurídicas gerais é função típica do Poder Legislativo. Contudo, para ingressarem validamente no ordenamento jurídico, as leis ordinárias dependem da deliberação e manifestação do Poder Executivo, que pode vetá-las ou sancioná-las. A participação do Executi-vo, vetando ou sancionando as leis, bem como as previsões constitucionais estabelecendo a iniciativa privativa para propor leis sobre certas matérias, tem seu fundamento na idéia de freios e contrapesos.

Assim, embora a produção legislativa seja fruto da vontade e da deliberação do Poder Legislativo (Câma-ra e Senado), para a formação das leis ordinárias concorre também a vontade do presidente da República. A manutenção desse equilíbrio é assegurada por meio da distribuição, entre esses atores, das competências e prerrogativas que formam o processo legislativo. Na aula de hoje, nossa análise enfocará a prerrogativa de veto do Executivo.

O instituto do veto confere ao presidente da República a faculdade de recusar sanção a projeto de lei já aprovado pelo Congresso, impedindo assim sua transformação em Lei, nos termos do artigo 66 e seus parágrafos:

“Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará.

§ 1º - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebi-mento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto.

§ 2º - O veto parcial somente abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.

§ 3º - Decorrido o prazo de quinze dias, o silêncio do Presidente da República importará sanção.

§ 4º - O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só poden-do ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores, em escrutínio secreto.

§ 5º - Se o veto não for mantido, será o projeto enviado, para promulgação, ao Presidente da República.

§ 6º - Esgotado sem deliberação o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final.

§ 7º - Se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da República, nos casos dos § 3º e § 5º, o Presidente do Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-Pre-sidente do Senado fazê-lo.”

Como você pode perceber, o poder de veto tem diversos limites. O mais evidente deles é ele tem um prazo certo para acontecer, sob a pena sanção tácita do projeto de lei (Art. 66, § 3º). Você consegue identificar os outros limites?

Repare também que o veto pode ter dois fundamentos, nos termos do caput do artigo 66: ou o presidente da Repú-blica considera o projeto de lei inconstitucional (o chamado veto jurídico), ou o vê como contrário ao interesse público (veto jurídico-político). Na aula de hoje, você verá como esses fundamentos podem ser afastados pelo Poder Legislativo, que tem o poder de “derrubar” o veto.

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Mas há um complicador adicional. Se a existência do poder de veto se justifica com base na noção de “freios e contrapesos”, como ficaria a participação do Poder Judiciário? Não tem também o Judiciário um papel importante na manutenção da separação, da harmonia e da independência entre os Poderes da República, dizendo o direito em cada caso? É possível que o Poder Judiciário aprecie o mérito de um veto do Poder Executivo?

Caso20

Após ser aprovado nas duas Casas do Congresso Nacional, em conformidade com os dis-positivos constitucionais referentes ao processo legislativo, o Projeto de Lei Complementar nº 161 de 1989, que regulamentava o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, foi submetido à apreciação do Presiden-te da República para que este o sancionasse.

“Art. 1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municí-pios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. (...)

Lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

7.14 – Saneamento ambiental, inclusive purificação, tratamento, esgotamento sanitário e congêneres.

7.15 – Tratamento e purificação de água.”O presidente da República, porém, apresentou um veto parcial ao Projeto de Lei Com-

plementar, nos seguintes termos:

MENSAGEM Nº 362, DE 31 DE JULHO DE 2003.

Senhor Presidente do Senado Federal,

Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1o do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público e por inconstitucionalidade, o Projeto de Lei no 161, de 1989 - Complementar (no 1/91 - Complementar na Câmara dos Deputados), que “Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de com-petência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências”.

O Ministério das Cidades propôs veto aos seguintes dispositivos:

Itens 7.14 e 7.15 da Lista de serviços

“7.14 – Saneamento ambiental, inclusive purificação, tratamento, esgotamento sanitá-rio e congêneres.”

“7.15 – Tratamento e purificação de água.”

Razões do veto

“A incidência do imposto sobre serviços de saneamento ambiental, inclusive purificação, tratamento, esgotamento sanitários e congêneres, bem como sobre serviços de tratamento e purificação de água, não atende ao interesse público. A tributação poderia comprometer o objetivo do Governo em universalizar o acesso a tais serviços básicos. O desincentivo

20 Caso baseado no MS 24675 MC / DF – Rel. Min. Cezar Pe-luso. DJ 18/03/2004.

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que a tributação acarretaria ao setor teria como conseqüência de longo prazo aumento nas despesas no atendimento da população atingida pela falta de acesso a saneamento básico e água tratada. Ademais, o Projeto de Lei nº 161 – Complementar revogou expressamente o art. 11 do Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, com redação dada pela Lei Complementar nº 22, de 9 de dezembro de 1974. Dessa forma, as obras hidráulicas e de construção civil contratadas pela União, Estados, Distrito Federal Municípios, autarquias e concessionárias, antes isentas do tributo, passariam ser taxadas, com reflexos nos gastos com investimentos do Poder Público.

Dessa forma, a incidência do imposto sobre os referidos serviços não atende o interesse público, recomendando-se o veto aos itens 7.14 e 7.15, constantes da Lista de Serviços do presente Projeto de lei Complementar.”

Imediatamente após a publicação da mensagem de veto, o Município de Paranavaí impe-trou mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal, alegando violação da autonomia municipal prevista no artigo 18 da Constituição Federal21. Segundo o impetrante, o veto do presidente instituía verdadeira isenção tributária em relação às empresas concessionárias de serviços de água e de esgoto, interferindo assim na arrecadação tributária constitucional-mente assegurada do município.

A Lei Complementar deveria apenas estabelecer as regras gerais para a incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, não sendo constitucional a diminuição do seu âmbito de incidência com base em política pública do Poder Executivo.

Analisando o caso acima, reflita:

Por que a matéria exigia a edição de Lei Complementar? O veto presidencial seguiu os trâmites e limitações constitucionais? Pode o Supremo Tribunal Federal apreciar o mérito do veto do Poder Executivo durante o

processo legislativo?

Conceitos

Competência; sanção expressa e tácita; veto jurídico e veto jurídico-político;superabilidade do veto pelo Congresso Nacional; veto total e parcial; nulidadesdo processo legislativo; controle judicial do processo legislativo.

Bibliografia

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do Processo Legislativo. Saraiva, São Paulo, Pp. 195-226. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Atlas, São Paulo, Pp. 583-587. SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ªed. Malheiros, São Paulo. Págs. 527-532

21 Art. 18. A organização políti-co-administrativa da República Federativa do Brasil compreen-de a União, os Estados, o Dis-trito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

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AULA 20 – CONTROLE JUDICIAL DO PROCESSO LEGISLATIVO

Nota ao Aluno

As fases e trâmites do processo legislativo não são estabelecidos por consenso, ou pelo bom senso dos parlamentares envolvidos. É matéria diretamente regulada por normas jurí-dicas: Constituição Federal, Leis e o Regimento Interno das Casas Legislativas. A doutrina e jurisprudência brasileiras reconhecem que “a estrita observância das normas constitucionais condiciona a própria validade dos atos normativos editados pelo Poder Legislativo”22. Em outras palavras, uma “lei” cuja formação não tenha obedecido os trâmites e condições previstos nas normas referentes ao processo legislativo não é válida.

Este grave conseqüência do desrespeito ao devido processo legislativo é justificada. De que adiantaria instituir um “Estado Democrático de Direito” (Art. 1o, CF), se não houvesse mecanismos estabelecidos para determinar quem pode e como poder criar Direito? Teria al-gum sentido prático do princípio da legalidade (Art. 5o, II) se não fosse possível determinar objetivamente o que é e o que não é “lei”?

Assim, as normas referentes ao processo de elaboração de outras normas jurídicas devem ser respeitadas, sob pena de nulidade do ato normativo cuja formação foi irregular. Median-te provocação, o Judiciário pode declarar essa nulidade em sede de controle de constitucio-nalidade – a chamada “inconstitucionalidade formal”, que será estudada mais adiante.

Mas e se a violação ao processo legislativo for levada ao conhecimento do Judiciário durante o próprio processo de elaboração do ato normativo? A jurisprudência do Supremo reconhece aos parlamentares envolvidos a faculdade de impetrar mandado de segurança para fazer cessar a tramitação de projeto de lei que viole norma constitucional de processo legislativo. Veja, por exemplo, o que disse o ministro Celso de Mello no Mandado de Segurança 23.565-DF:

“(...) o Supremo Tribunal Federal, na análise dessa específica questão, consagrou orientação jurisprudencial que reconhece a possibilidade do controle incidental de constitucionalidade das pro-posições legislativas, desde que instaurado por iniciativa de membros do órgão parlamentar perante o qual se acham em curso os projetos de lei ou as propostas de emenda à Constituição. (...)

A possibilidade extraordinária dessa intervenção jurisdicional, ainda que no próprio mo-mento de produção das normas pelo Congresso Nacional, tem por finalidade assegurar, ao parlamentar (e a este, apenas), o direito público subjetivo - que lhe é inerente - de ver elaborados, pelo Legislativo, atos estatais compatíveis com o texto constitucional, garantin-do-se, desse modo, àqueles que participam do processo legislativo, a certeza de observância da efetiva supremacia da Constituição (...).

“Titulares do poder de agir em sede jurisdicional, portanto, tratando-se de controvérsia cons-titucional instaurada ainda no momento formativo do projeto de lei ou da proposta de emenda à Constituição, hão de ser os próprios membros do Congresso Nacional, a quem se reconhece, como líquido e certo, o direito público subjetivo à correta observância da disciplina jurídica imposta pela Carta Política, em sede de elaboração das espécies normativas. O parlamentar, fundado na sua condição de co-partícipe do procedimento de formação das normas estatais, dispõe, por tal razão, da prerrogativa irrecusável de impugnar, em juízo, o eventual descumprimento, pela Casa legislativa, das cláusulas constitucionais que lhe condicionam, no domínio material ou no plano formal, a atividade de positivação dos atos normativos.”23

22 Voto do Ministro Celso de Mello no Mandado de Segu-rança 23.565-DF (1999).

23 MS 23.565-DF (1999).

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Ao analisar o caso abaixo, procure refletir se os argumentos acima transcritos poderiam colaborar na solução dos problemas apresentados pelos impetrantes do mandado de segurança. Procure também pesquisar a jurispru-dência do Supremo Tribunal Federal sobre os pontos que considerar relevantes para a sua decisão.

Caso

Em 06 de março de 1996, o Plenário da Câmara dos Deputados rejeitou o substitutivo do relator da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) n.33-A/95, originária do Poder Executivo e referente ao Sistema de Pre-vidência Social.

O novo relator designado para a matéria foi o deputado Michel Temer (PMDB).Ocorre que, na sessão anterior, o deputado Michel Temer tinha proposto uma emenda aglutinativa à própria

PEC 33-A/95 – “emenda aglutinativa n.06”.Imediatamente, um grupo de deputados, encabeçados pela deputada Jandira Feghali (PC do B/RJ), impe-

traram mandado de segurança contra ato do presidente da Mesa da Câmara dos Deputados, deputado Luís Eduardo Magalhães.

Alegavam duas violações ao devido processo legislativo: Primeiro, o regimento interno da Câmara dos Deputados, então vigente, vedava a coincidência de rela-

toria e autoria na apreciação de emendas feitas a projetos de lei; se o autor da emenda aglutinativa n.06 foi o próprio deputado Michel Temer, então, pelo regimento, não poderia ser ele a relatá-la.

Segundo, como o regimento interno da Câmara também vedava que a emenda rejeitada fosse reapre-sentada na mesma seção, o devido processo legislativo teria sido violado na medida em que a emenda aglutina-tiva proposta pelo deputado Michel Temer conteria diversos dispositivos idênticos aos da PEC 33-A/95.

Você é o relator do mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal. Após a leitura, reflita: como seria o seu voto no mandado de segurança impetrado pela deputada Jandira Feghali?

Conceitos

Controle judicial do processo legislativo; normas constitucionais e normas regimentais; questão interna corporis; Direito público subjetivo ao devido processo legislativo.

Bibliografia

Controle sobre as leis – Manoel Gonçalves Ferreira Filho (trechos selecionados pelo professor) Objeto do Controle Formal de Constitucionalidade das Leis – Germana Moraes (trechos selecionados pelo professor).

Questões de concursos

Emenda Constitucional autoriza a instituição de tributo, dispensando a observância do princípio da ante-rioridade. É legítima tal Emenda? Pode uma emenda constitucional ser declarada inconstitucional? Resposta objetivamente justificada.

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AULA 21 – TIPOS DE INCONSTITUCIONALIDADE E CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Nota ao Aluno

“A Constituição é a lei fundamental de um país”. Você certamente já deve ter ouvido essa frase inúmeras vezes, assim como a idéia de que a superioridade da Constituição está ligada à sua rigidez: se possui um procedimento de elaboração distinto e mais rigoroso do que o das outras normas do ordenamento, então a Constituição não pode ser derrogada por uma lei posterior.

Contudo, essa idéia de supremacia da Constituição sozinha não nos assevera muita coisa. O que podemos extrair daí? Que as normas contrárias à Constituição não devem ser aplicadas pelos juízes? Ou que os juízes não têm nada a ver com isso, e devem continuar aplicando a norma até que o legislador reconheça a incompatibili-dade com a Constituição e a retire do ordenamento? Ou ainda que os próprios juízes têm o dever de retirar essas normas do ordenamento? As opções são inúmeras. O fun-damental, aqui, é perceber que uma coisa é reconhecer a superioridade da Constituição. Outra, bem diferente, é determinar quais as conseqüências práticas dessa superioridade no mundo do direito. Como observa Raúl Machado Horta, “não há concomitância no tempo entre a técnica da rigidez constitucional e a prática do controle da constitucio-nalidade das leis. Na generalidade dos casos, esse desencontro sedimentava-se em razões históricas e políticas, que distanciaram as duas noções.” 24

Na verdade, reconhecer que todas as normas que retiram sua validade da Constituição devem ser materialmente e formalmente compatíveis com ela é necessário, mas insuficiente para assegurar a supremacia da Constituição como norma superior do ordenamento ju-rídico. É preciso organizar um aparato institucional que previna e reprima as violações à Constituição que o legislador eventualmente cometerá ao editar leis contrárias às decisões tomadas pelo Poder Constituinte.

Esse “aparato institucional” diz respeito justamente ao controle de constitucionali-dade, isto é, ao modo pelo qual será fiscalizada a compatibilidade da uma lei com a Constituição, e quais as conseqüências que a eventual incompatibilidade terá na vida dos cidadãos.

O problema é que, como você certamente já aprendeu, a aplicação do direito não é um ato mecânico, preciso. Ao contrário, não é raro que juristas e cidadãos se encontrem em profunda divergência sobre a interpretação de uma norma jurídica. A Constituição não é exceção. Assim, ao se desenhar as instituições encarregadas de realizar o controle de constitucionalidade das leis, é preciso ter em mente que o poder envolvido nesse processo é considerável. Pense, por exemplo, em quantas respostas diferentes podemos dar às se-guintes questões:

Que tipo de órgão realizará o controle? Será um órgão do Judiciário, do Legislativo, do Executivo,

ou de nenhum dos três? Quando essa fiscalização será exercida? Durante os debates sobre a criação ou não da lei no Poder Legislativo, ou também após a entrada da lei no ordenamento jurídico? O órgão encarregado do controle será único? Ou, por exemplo, todos os juízes poderão decidir que uma determinada lei é inconstitucional?

24 HORTA, Raúl Machado. Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, pp. 130-131.

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De que forma se dará o controle? A partir de um caso concreto, em que uma lei contrária à Constituição está prejudicando o direito de um ou mais indivíduos? Ou em abstrato, levando-se apenas em conta a compatibilidade em tese da lei com a Constituição?

O conjunto de respostas a essas questões dá origem ao que se chama modelo de controle de constitucionalidade. Diferentes culturas jurídicas formularam modelos di-ferentes, de acordo com as respostas que consideraram mais adequadas aos problemas acima. É claro que esses modelos não são completamente estáticos. Mesmo assim, é possível identificar traços e fatores que permanecem mais ou menos estáveis com o passar dos anos e das Constituições.

Veja, por exemplo, o que Raul Machado Horta afirma sobre a relação entre supremacia da Constituição e controle de constitucionalidade na França revolucionária:

“Procurava-se preservar a vigência da Constituição mediante o acatamento solene e re-verencial ou mediante a estipulação e cláusulas e processos especiais, válidos para momentos excepcionais. A Constituição francesa de 1791, que está no pórtico do constitucionalismo moderno, foi confiada pelo constituinte da época à fidelidade do Corpo Legislativo, do Soberano e dos Juízes, à vigilância dos pais de família, esposas e mães, à estima dos jovens cidadãos, à coragem de todos os franceses (art. 8o, Título VII). Exprimia-se, assim, um voto eloqüente, generoso e nobre, nem sempre de correspondência fácil, sem cuidar da sanção que viesse repor o texto constitucional na sua culminância primitiva, quando violado pelo legislador ordinário, em prática de infidelidade, para nos valermos da sugestão do consti-tuinte francês de 1791.”25

Assim, os revolucionários franceses não viam qualquer estranheza em, de um lado, acei-tar que a Constituição era algo muito importante, e, de outro, determinar que não havia qualquer sanção para o legislador ou administrador que a descumprisse e editasse normas contrárias aos seus comandos. Na verdade, a Constituição estava completamente nas mãos do legislador: ela apenas não poderia ser invocada diretamente para resolver litígios, como também não era um parâmetro para aferição da validade de outras leis26. A Constituição era importante, fundamental, mas pouco ou nada se podia fazer com base nela, sendo quase uma mera “declaração de intenções” do Constituinte ou de “conselhos” para o legislador.27

Caso

Nos Estados Unidos da América, por outro lado, a situação é diferente. O problema da incompatibilidade das leis com a Constituição foi abordado pelos autores dos Artigos Fede-ralistas da seguinte maneira:

“Some perplexity respecting the rights of the courts to pronounce legislative acts void, because contrary to the Constitution, has arisen from an imagination that the doctrine would imply a superiority of the judiciary to the legislative power. It is urged that the au-thority which can declare the acts of another void, must necessarily be superior to the one whose acts may be declared void. As this doctrine is of great importance in all the American constitutions, a brief discussion of the ground on which it rests cannot be unacceptable.

�ere is no position which depends on clearer principles, than that every act of a de-legated authority, contrary to the tenor of the commission under which it is exercised, is void. No legislative act, therefore, contrary to the Constitution, can be valid. To deny this, would be to affirm, that the deputy is greater than his principal; that the servant is above

25 Idem, p. 131.

26 GARCÍA DE ENTERRÍA, La Constitución Española de 1978 como pacto social y como nor-ma jurídica, 2003.

27 BARROSO, Luís Roberto. O Di-reito Constitucional e a Efetivi-dade de suas Normas, passim.

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his master; that the representatives of the people are superior to the people themselves; that men acting by virtue of powers, may do not only what their powers do not authorize, but what they forbid.

If it be said that the legislative body are themselves the constitutional judges of their own powers, and that the construction they put upon them is conclusive upon the other departments, it may be answered, that this cannot be the natural presumption, where it is not to be collected from any particular provisions in the Constitution. It is not otherwise to be supposed, that the Constitution could intend to enable the representatives of the people to substitute their WILL to that of their constituents. It is far more rational to suppose, that the courts were designed to be an intermediate body between the people and the legis-lature, in order, among other things, to keep the latter within the limits assigned to their authority. �e interpretation of the laws is the proper and peculiar province of the courts. A constitution is, in fact, and must be regarded by the judges, as a fundamental law. It the-refore belongs to them to ascertain its meaning, as well as the meaning of any particular act proceeding from the legislative body. If there should happen to be an irreconcilable variance between the two, that which has the superior obligation and validity ought, of course, to be preferred; or, in other words, the Constitution ought to be preferred to the statute, the intention of the people to the intention of their agents.

Nor does this conclusion by any means suppose a superiority of the judicial to the le-gislative power. It only supposes that the power of the people is superior to both; and that where the will of the legislature, declared in its statutes, stands in opposition to that of the people, declared in the Constitution, the judges ought to be governed by the latter rather than the former. �ey ought to regulate their decisions by the fundamental laws, rather than by those which are not fundamental.”28

Como você pode perceber, o problema identificado por Alexander Hamilton no artigo acima, é muito claro: a Constituição e uma norma de estatura inferior podem determinar condutas distintas a seus destinatários. Se a Constituição é a lei fundamental do país, porque posta pelo povo, e se o papel dos juízes é o de interpretar e aplicar o direito, então os casos nos quais ocorra um conflito do gênero devem sempre ser resolvidos pelo Judiciário por meio da aplicação da Constituição, e não da norma inferior.

Com base no trecho acima e no voto do juiz Marshall, previsto na bibliografia para esta aula, você consegue identificar as respostas que os dois dariam para as quatro questões que levantamos acima?

Conceitos

Supremacia da Constituição; Judicial Review e Controle de Constitucionalidade; Nulidade dos atos inconstitucionais.

Bibliografia

BARROSO, Luís Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2004. Pp. 1-10 e 39-57. VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremo Tribunal Federal – Jurisprudência Política. 2a ed. São Paulo: Malheiros, 2001. Pp. 42-44 e 50-56. Voto do Juiz Marshal no caso Marbury vs. Madison.

28 The Federalist Papers. Artigo LXXVIII.

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Leitura Complementar

BINENBOJM, Gustavo. A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira. 2a ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. Pp. 15-46 e 121-137. GARCÍA DE ENTERRÍA, La Constitución Española de 1978 como pacto social y como norma jurídica, 2003.

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AULA 22 – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE – TIPOS

Nota ao Aluno

Como visto na aula anterior, o controle de constitucionalidade das leis é atualmente indispensável para a teoria constitucional. Parece ser difícil de se conceber a idéia de supremacia da Constituição e da regra da rigidez, sem a existência de um processo espe-cífico para a retirada do sistema normativo de uma norma inconstitucional.

Afinal, como ficaria o sistema jurídico se as leis contrárias à Constituição manti-vessem suas respectivas vigências e eficácias? Seria possível se falar em Constituições rígidas? Por quê?

Na aula passada, você percebeu a razão de ser do controle e iniciou a discussão do porquê adotar um ou outro modelo. Mas afinal, existe um modelo melhor? Pior?

O objetivo desta aula é continuar o estudo dos tipos de controle de constitucionalida-de. Partindo do caso gerador, procure identificar o tipo de argumento que é utilizado no parecer da CCJ para a apreciação de uma norma. Compare-o com uma decisão qualquer do STF que já tenha sido estudada. Procure perceber a distinção entre os argumentos e mesmo entre a estrutura de uma e de outra decisão. Traga exemplos para a aula.

Ao final da aula, você deve ser capaz de distinguir entre o que seja controle preven-tivo e repressivo; e entre político, judicial e misto. Da mesma forma, você deve saber as principais diferenças entre os modelos difuso e concentrado de controle judicial.

Não deixe de ler a bibliografia indicada. Da mesma forma, estude atentamente o caso. Você será questionado sobre os fatos e argumentos contidos no parecer.

Caso29

PARECER Nº , DE 2005

Da COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA, em caráter ter-minativo, sobre o Projeto de Lei do Senado nº 62, de 2003, que acrescenta dois artigos à Lei nº 8.987/95 – Lei da Concessão e Permissão de prestação de serviços públicos, que impedem que concessionárias e permissionárias de serviço público interrompam a prestação de bens ou serviços sem aviso prévio ao consumidor e que efetivem na cobrança da conta mensal diferenças relativas a contas já pagas e dá outras providências.

RELATOR: Senador ANTONIO CARLOS MAGALHÃES

I – RELATÓRIO

Nos termos regimentais, vem ao exame desta Comissão, em decisão terminativa, o anexo Projeto de Lei do Senado nº 62, de 2003, que tem por objetivo vedar às empresas concessionárias e permissionárias de serviço público a interrupção da prestação de serviço ou do fornecimento de bens sem prévio aviso ao consumidor, e, ainda, obstar que consig-nem na conta mensal diferenças de tarifas relativas a períodos anteriores.

Alega o ilustre autor que o consumidor não pode ficar privado do fornecimento de bens e serviços essenciais, como, dentre outros, gás, energia elétrica e água, que, pela sua essencia-

29 Este parecer foi retirado do site do Senado Federal no seguinte endereço: http://we-bthes.senado.gov.br/sil/Co-missoes/Permanentes/CCJ/Pa-receres/PLS2005060162.rtf

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lidade, necessitam de proteção maior da lei. É necessário que se dê ao usuário prazo razoável para quitar eventuais débitos, demonstrar que já pagou sua conta ou, ainda, pedir parcelamento.

Outro ponto importante a justificar sua pretensão diz com a prática das concessionárias de fazerem medições por amostragem durante vários meses, vindo, de repente, incluir em um único mês os valores atual e as diferen-ças verificadas em relação a meses anteriores. Tal procedimento pode até ser conveniente para a empresa conces-sionária, como forma de redução de custos, mas causa tremendo impacto na renda dos trabalhadores, sendo, as mais das vezes, o motivo de muitas inadimplências, sobretudo para a população de baixa renda.

II – ANÁLISE

A prestação de serviços públicos é dever indeclinável do Poder Público, quer diretamente, quer através de interpostas pessoas, como as concessionárias e permissionárias de serviços públicos.

Nosso Estatuto Fundamental dispõe sobre essa matéria em seu art. 175, onde se lê:

Art. 175. Incumbe ao poder público, na forma da lei, diretamente o sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de servos públicos.

Parágrafo único. A lei disporá sobre:I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu

contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;

II – os direitos dos usuários;III – política tarifária;IV – a obrigação de manter serviço adequado.

Em atendimento ao mandamento constitucional, foi editada a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 1º e parágrafo único).

No ponto que diz com a proposição em exame, a chamada Lei das Concessões assim dispõe:

Art. (...)

§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso quando:

I – motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações;II – por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

Cumpre observar, desde logo, que já existe previsão legal para a obrigatoriedade de aviso prévio para a inter-rupção de fornecimento de bens ou da prestação de serviço nas duas hipóteses previstas nos incisos do art. 6º acima transcritos. Apenas não há na lei estipulação de prazo para esse aviso, daí as justas ponderações do nobre autor do projeto.

Quanto ao outro aspecto da proposição, também tem razão o proponente, pois pode até ser útil para as concessionárias a prática de medições periódicas, mas esse proceder não deve acarretar dificuldades para os consumidores.

De notar, ainda, que a referida Lei das Concessões é norma de caráter nacional, destinando-se a todas as esferas de poder da Federação, de sorte que é desnecessária e reafirmação desse fato em outras de suas partes.

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Por tais razões e fundamentos, evidencia-se que a proposta carece de alguns aperfeiçoamentos, especialmente quanto à definição de prazos mínimos para a adoção de providências sancionatórias por parte das concessionárias.

III – VOTO

Nessa perspectiva, o parecer é pela aprovação do Projeto de Lei do Senado nº 62 , de 2003, na forma do Substitutivo oferecido como conclusão do Voto em Separado do Senador Fernando Bezerra:

EMENDA Nº 1-CCJ (SUBSTITUTIVO)PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 62, DE 2003

Altera a Lei nº 8.987/95 (Lei de concessão e permissão da prestação de serviços públicos) e a Lei nº 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações), para impedir que concessionárias e permissionárias de serviço público inter-rompam a prestação de bens ou serviços sem aviso prévio ao consumidor, disciplina a cobrança de diferenças relativas a débitos anteriores, e dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º A Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, passa a viger com as seguintes alterações:Art. 6º..................................................................................................................................................................................

§ 4º Se o inadimplemento do consumidor decorrer de falta de pagamento da conta mensal dos serviços, o pré-vio aviso da interrupção deverá ser feito por escrito, com prazo mínimo de quinze dias de antecedência. (NR)

Art. 31-A. A cobrança de valores relativos a serviços prestados em meses anteriores ao mês de referência da conta a ser paga pelo consumidor deverá ser devidamente discriminada e em documento específico.

Parágrafo único. Ao consumidor fica garantido o direito de ser informado sobre a origem e o motivo das diferenças eventualmente cobradas, assegurando-se-lhe o pleno direito de defesa previamente ao pagamento, na forma do que dispuser a entidade responsável pela regulação do serviço.

Art. 2º A Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, passa a vigorar com a seguinte alteração:

Art. 3º.....................................................................................................................................................................................

§ 1º Nos casos de suspensão do serviço prestado em regime público em virtude do não pagamento do docu-mento de cobrança, o prévio aviso a que se refere o inciso VIII deste artigo dar-se-á no prazo mínimo de quinze dias de antecedência, assegurado ao consumidor o pleno direito de defesa previamente ao pagamento.

§ 2º A cobrança de serviços prestados feita após os prazos determinados pela agência reguladora deve ser em separado e objeto de negociação entre a prestadora e o consumidor.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.Sala da Comissão, 1º de junho de 2005.

Presidente Relator

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Conceitos Controle político e controle jurisdicional; a matriz francesa e a matriz americana; controle preventivo e con-

trole repressivo; controle difuso e controle concentrado.

Bibliografia

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 49 – 50. BARROSO, L.R. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. Editora Saraiva, São Paulo, 2004, pp. 39-50.

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AULA 23 – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE – CONTROLE JUDICIAL REPRESSIVO DIFUSO

Nota ao Aluno

Na aula passada, foram estudadas as modalidades de controle de constitucionalidade relativas à natureza do órgão de controle e ao momento de seu exercício. Controle político, judicial e misto, e controle preventivo e repressivo devem ser, a esta altura, conceitos conso-lidados para você. Além disso, também foi apresentada a idéia de controle difuso e controle concentrado. O estudo do controle difuso é o objetivo da aula de hoje.

Para tanto, leia atentamente o caso gerador. Pense como seria possível ajudar a associa-ção. Estude os argumentos possíveis e o caminho judicial a ser seguido. Lembre-se que é fundamental que você entenda cada passo, pois os mesmos deverão ser explicados para os membros da associação.

Existem argumentos constitucionais a serem apresentados aqui? E se existem, qual a diferença entre estes argumentos e uma disputa que não envolva questões constitucionais? A forma de decisão de uma e outra é diferente? Por quê?

Com base nessas questões, leia a bibliografia indicada e prepare-se para o debate em sala. Prepare também argumentos de defesa da farra do boi, pois você poderá ser chamado para defender a posição contrária.

Caso

No litoral de Santa Catarina, todo ano é realizada a chamada “Farra do Boi”, na época da Quaresma. A Farra é uma festa tradicional, de origem açoriana, em que um boi é solto e perseguido pela população que, munida de pedaços de pau, chicotes e pedras, persegue o animal até que chegue ao mar. Nessa época do ano, algumas comunidades celebram casamentos, aniversários, jogos de futebol e outras festas, dada a importância cultural do evento.

Entretanto, existem organizações da sociedade civil, voltadas à proteção dos animais e do patrimônio ecológico, que entendem que a Farra do Boi é, em verdade, uma forma cruel de se tratar o animal. Um grupo de ONGs ambientalistas chegou inclusive a mover ação civil pública contra o Estado de Santa Catarina, pedindo que o mesmo fosse judicialmente obrigado a coibir a farra do boi.

O pedido foi indeferido tanto na primeira instância quanto no Tribunal Regional Fede-ral; os juízes entenderam que a festa, sendo uma prática tradicional daquela sociedade, não poderia o Estado pretender legitimamente suprimi-la.

Você foi procurado em seu escritório por uma dessas associações, sediada no Rio de Ja-neiro, que quer obrigar judicialmente o Estado de Santa Catarina a proibir a referida festa. Analise a situação a partir das normas constitucionais pertinentes e indique qual seria o caminho e os argumentos a serem utilizados pela associação.30

Conceitos

Controle repressivo realizado pelo poder judiciário; controle difuso; o modelo norte-americano; regra da maioria; papel do Senado Federal.

30 Este caso foi baseado no RE 153.531 – SC.

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Bibliografia

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. Malheiros, SP, pp. 45-56 BARROSO, L.R. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. Editora Saraiva, São Paulo, 2004, pp. 45-50

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AULAS 24, 25 E 26 – CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE – CONTROLE JUDICIAL CONCENTRADO

Nota ao Aluno

Agora que você já estudou os tipos de controle de constitucionalidade e viu a impor-tância do controle judicial em nosso país, chegou a hora de aprofundar seu conhecimento técnico sobre como funciona o controle concentrado de constitucionalidade.

A leitura da Constituição e da Lei n° 9.868/1999 são fundamentais para tanto. Elas lhe darão a base para compreender o funcionamento do nosso sistema.

Antes de se aprofundar na técnica, porém, reflita sobre a seguinte questão: nos casos ge-radores, o Supremo Tribunal Federal está exercendo um controle jurídico ou político? Afinal, qual o papel desempenhado pela Corte na disputa retratada pelos casos? Esta reflexão é im-portante para a compreensão exata do papel daquela Corte na vida do país a partir da Cons-tituição de 1988.

Voltando ao objetivo específico das próximas duas aulas, sendo certo que existe aula particular para a discussão da argüição de descumprimento de preceito fundamental e que a ação direta interventiva já foi estudada no capítulo sobre intervenção, nestas aulas serão estudadas: (i) a Ação Direta de Inconstitucionalidade; (ii) a Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão; e (iii) a ação declaratória de constitucionalidade.

Ao final deste bloco é fundamental que você compreenda a natureza do ato considerado incons-titucional, se nulo ou anulável, bem como a fundamentação do porquê de tal conclusão.

Ao fim do bloco, em relação à Ação Direta de Inconstitucionalidade você deve ter identificado, pelo menos, as seguintes questões: (i) problemas com a legitimidade ativa; (ii) normas passíveis de controle; (iii) efeitos da decisão e situações constituídas com base na norma inconstitucional; (iv) a possibilidade e os limites para a concessão de medida cautelar; e, por fim, (v) a possibilidade de reclamação para garantia de eficácia das decisões em sede de controle abstrato.

No que toca à ação declaratória de constitucionalidade os temas básicos são: (i) a sua in-constitucionalidade; (ii) o controle difuso e a necessidade de unificação das decisões; e (iii) a distinção dos legitimados em relação à Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Relativamente à Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão, você deve buscar compre-ender seu objetivo e seu efeito “prático”. A grande pergunta deve ser: para que serve, afinal, esta ação?

Casos30

1. Direito de Reunião

Em 1999, um deputado da Câmara Legislativa do Distrito Federal apresentou projeto de lei regulamentando o exercício do direito de reunião31, previsto na Constituição. Em seu primeiro artigo, o projeto dispunha:

Art. 1º - Fica vedada a realização de manifestações públicas, com a utilização de carros, aparelhos e objetos sonoros nos locais abaixo discriminados:

I – Praça dos Três Poderes;II – Esplanada dos Ministérios;

30 Caso baseado na ADIN 1969-4-DF. 31 Art. 5º XVI - todos podem reunir-se paci�camente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autori-dade competente;

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III – Praça do Buriti;IV – Vias adjacentes. Por envolver um direito fundamental a lei gerou discussões acaloradas na Câmara. O

seu caráter polêmico acabou levando à sua não-aprovação, por uma diferença muito pe-quena de votos. A rejeição da lei pelos integrantes da Câmara só foi possível graças a uma ampla articulação do Partido dos Trabalhadores (PT).

Alguns meses depois, entretanto, o governador do Distrito Federal, no mesmo ano de 1999, editou decreto com disposição praticamente idêntica à do projeto de lei rejeitado. A medida causou indignação não apenas entre o Partido dos Trabalhadores, mas entre diversas entidades sindicais atuantes em Brasília.

Você é assessor jurídico do Partido dos Trabalhadores. O que pode ser feito contra o ato do governador do Distrito Federal? Determine se existe medida judicial cabível para resolver o problema de forma favorável aos interesses do PT. Caso seja possível, indique:

Quem deverá figurar no pólo passivo, se for o caso; Os argumentos que apresentaria para justificar o cabimento da medida; O pedido a ser elaborado e a sua fundamentação jurídica.

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2. Salário Mínimo32

Dispõe o artigo 7º, IV da Constituição Federal de 1988:

Art. 7o- São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas

necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.Cabe ao Congresso Nacional cumprir o disposto na Constituição e fixar o valor do salá-rio-mínimo de modo a assegurar aos trabalhadores as necessidades básicas enumeradas no artigo mencionado. Nos últimos anos, essa função tem sido cumprida nos termos da tabela abaixo:

Desde a promulgação da Constituição, diversas entidades representativas dos trabalha-dores assalariados vêm questionando a “constitucionalidade” das normas que estabelecem o salário-mínimo; afinal, se o valor que elas prevêem é insuficiente para os fins determinados no artigo 7º, então tais normas – argumentam os trabalhadores – são contrárias à Constituição.

Atualmente, o valor do salário-mínimo está estipulado em R$ 300,00 nos termos da MP 248 de 20 de abril de 200533. Inconformada com a “inconstitucionalidade” desse valor, a CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde) ajuíza Ação Direta de Inconstitucionalidade, pedindo ao Supremo que tome as medidas necessárias à solução do problema.

Você é o relator dessa ADIn no Supremo. Elabore um relatório e o seu voto sobre o caso.

32 Caso baseado na ADIn n. 1458-7.

33 MP 248 de 20 de abril de 2005, art. 1º. A partir de 1o de maio de 2005, após a aplicação dos percentuais de seis inteiros e trezentos e cinqüenta e cinco milésimos por cento, a título de reajuste, e de oito inteiros e quarenta e nove centésimos por cento, a título de aumen-to real, sobre o valor de R$ 260,00 (duzentos e sessenta reais), o salário mínimo será de R$ 300,00 (trezentos reais).

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2. Salário Mínimo32

Dispõe o artigo 7º, IV da Constituição Federal de 1988:

Art. 7o- São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas

necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.Cabe ao Congresso Nacional cumprir o disposto na Constituição e fixar o valor do salá-rio-mínimo de modo a assegurar aos trabalhadores as necessidades básicas enumeradas no artigo mencionado. Nos últimos anos, essa função tem sido cumprida nos termos da tabela abaixo:

Desde a promulgação da Constituição, diversas entidades representativas dos trabalha-dores assalariados vêm questionando a “constitucionalidade” das normas que estabelecem o salário-mínimo; afinal, se o valor que elas prevêem é insuficiente para os fins determinados no artigo 7º, então tais normas – argumentam os trabalhadores – são contrárias à Constituição.

Atualmente, o valor do salário-mínimo está estipulado em R$ 300,00 nos termos da MP 248 de 20 de abril de 200533. Inconformada com a “inconstitucionalidade” desse valor, a CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde) ajuíza Ação Direta de Inconstitucionalidade, pedindo ao Supremo que tome as medidas necessárias à solução do problema.

Você é o relator dessa ADIn no Supremo. Elabore um relatório e o seu voto sobre o caso.

32 Caso baseado na ADIn n. 1458-7.

33 MP 248 de 20 de abril de 2005, art. 1º. A partir de 1o de maio de 2005, após a aplicação dos percentuais de seis inteiros e trezentos e cinqüenta e cinco milésimos por cento, a título de reajuste, e de oito inteiros e quarenta e nove centésimos por cento, a título de aumen-to real, sobre o valor de R$ 260,00 (duzentos e sessenta reais), o salário mínimo será de R$ 300,00 (trezentos reais).

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2. Salário Mínimo32

Dispõe o artigo 7º, IV da Constituição Federal de 1988:

Art. 7o- São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas

necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.Cabe ao Congresso Nacional cumprir o disposto na Constituição e fixar o valor do salá-rio-mínimo de modo a assegurar aos trabalhadores as necessidades básicas enumeradas no artigo mencionado. Nos últimos anos, essa função tem sido cumprida nos termos da tabela abaixo:

Desde a promulgação da Constituição, diversas entidades representativas dos trabalha-dores assalariados vêm questionando a “constitucionalidade” das normas que estabelecem o salário-mínimo; afinal, se o valor que elas prevêem é insuficiente para os fins determinados no artigo 7º, então tais normas – argumentam os trabalhadores – são contrárias à Constituição.

Atualmente, o valor do salário-mínimo está estipulado em R$ 300,00 nos termos da MP 248 de 20 de abril de 200533. Inconformada com a “inconstitucionalidade” desse valor, a CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde) ajuíza Ação Direta de Inconstitucionalidade, pedindo ao Supremo que tome as medidas necessárias à solução do problema.

Você é o relator dessa ADIn no Supremo. Elabore um relatório e o seu voto sobre o caso.

32 Caso baseado na ADIn n. 1458-7.

33 MP 248 de 20 de abril de 2005, art. 1º. A partir de 1o de maio de 2005, após a aplicação dos percentuais de seis inteiros e trezentos e cinqüenta e cinco milésimos por cento, a título de reajuste, e de oito inteiros e quarenta e nove centésimos por cento, a título de aumen-to real, sobre o valor de R$ 260,00 (duzentos e sessenta reais), o salário mínimo será de R$ 300,00 (trezentos reais).

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Conceitos

Controle concentrado; legitimação; tipos de ação; efeitos da decisão; processo; papel político do Supremo Tribunal Federal.

Bibliografia

Lei n° 9.868/99 SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 50 – 61. BARROSO, L.R. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro.

Editora Sarayva, São Paulo, 2004, pp. 113-214.

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AULA 27 - ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL

Nota ao Aluno

Diz o artigo 102, § 1º da Constituição Federal:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Consti-tuição, cabendo-lhe:

§ 1.º A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Cons-tituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.

Esta norma constitucional de eficácia limitada, que dependia de lei formal para produzir todos os seus efeitos, foi regulamentada pela lei 9.882/1999, nos seguintes termos.34

Art. 1o A argüição prevista no § 1o do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fun-damental, resultante de ato do Poder Público.

Parágrafo único. Caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamen-tal:

I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição;

Art. 2o Podem propor argüição de descumprimento de preceito fundamental:I - os legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade;(...)Art. 3o A petição inicial deverá conter:I - a indicação do preceito fundamental que se considera violado;II - a indicação do ato questionado;III - a prova da violação do preceito fundamental;IV - o pedido, com suas especificações;V - se for o caso, a comprovação da existência de controvérsia judicial relevante sobre a

aplicação do preceito fundamental que se considera violado.(...)Art. 4o A petição inicial será indeferida liminarmente, pelo relator, quando não for o

caso de argüição de descumprimento de preceito fundamental, faltar algum dos requisitos prescritos nesta Lei ou for inepta.

§ 1o Não será admitida argüição de descumprimento de preceito fundamental quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade. (...)35

Como se vê, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental tem alguns requi-sitos de admissibilidade bastante específicos, cuja aplicação na prática não é simples. Sendo um instrumento processual novo, criado pela Constituição de 1988 e só regulamentado há

59 Em voto no Agravo Regi-mental em Petição nº 1140-7, o Relator Min. Sydnei Sanches observou que, à falta de lei regulamentadora, não caberia “aplicação da analogia, dos costumes e dos princípios ge-rais de direito” (DJ. 31.05.96).

60 Segundo o STF, “é incabível a argüição de descumprimento de preceito fundamental quan-do ainda existente medida e�caz para sanar a lesividade.” (ADPF nº03/CE – Questão de Ordem – J. em 18.05.2000).

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alguns anos, a questão do cabimento da ADPF ainda é objeto de intensas controvérsias na comunidade jurídica.

No caso selecionado para esta aula, você deverá avaliar se o ajuizamento da ADPF 54 pela CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde) é compatível com os critérios de admissibilidade previstos nos dispositivos da Constituição e da Lei 9882/1999 acima transcritos.

Lembre-se que a questão a ser discutida é o cabimento da ADPF, e não o seu mérito. Ou seja: você deve concentrar sua atenção na forma processual escolhida pela CNTS para atingir o fim pretendido, independentemente de concordar ou não com este fim específico.

Caso

Leia com atenção a notícia abaixo: 36

“18/06/2004 - 19:21 - CNTS pede ao STF que antecipação do parto de feto sem cérebro não seja caracterizada como aborto

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) quer que o Supremo Tribunal Federal (STF) fixe entendimento de que antecipação terapêutica de parto de feto anencefálico (ausência de cérebro) não é aborto e permita que gestantes em tal situação tenham o direito de interromper a gravidez sem a necessidade de autorização judicial ou qualquer outra forma de permissão específica do Estado. Na Argüição de Descumpri-mento de Preceito Fundamental (ADPF 54) ajuizada na Corte, com pedido de liminar, a entidade sustenta que “o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal tornou-se in-dispensável na matéria”.

A entidade registra que o Judiciário vinha firmando jurisprudência, por meio de de-cisões proferidas em todo o país, reconhecendo o direito das gestantes de se submeterem à antecipação terapêutica do parto nesses casos, mas que decisões em sentido inverso desequilibraram essa jurisprudência.

Segundo a CNTS, a anencefalia é uma má formação fetal congênita incompatível com a vida intra-uterina e fatal em 100% dos casos. A entidade sustenta que um exame de ecografia detecta a anomalia com índice de erro praticamente nulo e que não existe pos-sibilidade de tratamento ou reversão do problema. Afirma que não há controvérsia sobre o tema na literatura científica ou na experiência médica.

Por outro lado, diz a CNTS, “a permanência do feto anômalo no útero da mãe é potencialmente perigosa, podendo gerar danos à saúde da gestante e até perigo de vida, em razão do alto índice de óbitos intra-uterinos desses fetos”. A entidade alega que “a antecipação do parto nessa hipótese constitui indicação terapêutica médica: a única possível e eficaz para o tratamento da gestante, já que para reverter a inviabilidade do feto não há solução”.

Com esses argumentos, a CNTS sustenta que a antecipação desses partos não caracteri-za o crime de aborto tipificado no Código Penal37. Isso porque, diz a entidade, no caso de aborto, “a morte do feto deve ser resultado direto dos meios abortivos, sendo imprescindível tanto a comprovação da relação causal como a potencialidade de vida extra-uterina do feto”, o que inexiste nos casos de fetos com anencefalia. “Não há potencial de vida a ser protegido, de modo que falta à hipótese o suporte fático exigido pela norma. Apenas o feto com capa-cidade potencial de ser pessoa pode ser passivo de aborto”, sustenta.

Para a CNTS, nessas situações, “o foco da atenção há de voltar-se para o estado da ges-tante” e o reconhecimento desses direitos não causam lesão a bem ou ao direito à vida do

36 Extraída do site do Supremo Tribunal Federal (www.stf.gov.br).

37 Art. 125, CP - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de três a dez anos. Art. 126, CP - Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de um a qua-tro anos.

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feto. “A gestante portadora de feto anencefálico que opte pela antecipação terapêutica do parto está protegida por direitos constitucionais que imunizam a sua conduta da incidência da legislação ordinária repressiva”, alega a entidade, que aponta a violação de três direitos básicos da mulher impedida de interromper esse tipo gravidez. O direito da dignidade da pessoa humana, da legalidade, liberdade e autonomia da vontade, e do direito à saúde.

A CNTS pede que o Supremo reconheça o descumprimento desses preceitos fundamentais em relação à mulher, nos casos em que as normas penais são interpretadas de forma a impedir a antecipação terapêutica de partos de fetos anencefálicos. E que seja dada interpretação conforme a Constituição dos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal, para declarar inconstitucional, com eficácia erga omnes (para todos) e efeito vin-culante, a aplicação desses dispositivos para impedir a intervenção nos casos em que a anomalia é diagnosticada por médico habilitado.

Requer, também, a concessão de liminar para suspender o andamento de processos ou anular os efeitos de de-cisões judiciais que pretendam aplicar ou tenham aplicado os dispositivos do Código Penal para caracterizar como aborto a interrupção desses tipos de gravidez.”

Em sessão específica para discutir o cabimento da ADPF, o Supremo Tribunal Federal assistiu à sustentação oral do advogado da CNTS, Luís Roberto Barroso. Foi também junto aos autos do processo um parecer dos professores José Afonso da Silva e Clémerson Clève discutindo a admissibilidade da Argüição nesse caso.

Após a leitura desses materiais, responda: se você fosse ministro do Supremo Tribunal Federal, como decidi-ra? Conheceria da ADPF ou extinguiria o processo sem entrar no mérito do aborto de fetos anencéfalos?

Bibliografia

BARROSO, Luís Roberto. “Memorial sobre Questão de Ordem: legitimidade do exercício dejurisdição constitucional na hipótese, propriedade da interpretação conforme a Constituição ecabimento da ADPF”, na ADPF 54/DF

SILVA, José Afonso da, e CLÈVE, Clémerson. “Argüição de Descumprimento de PreceitoFundamental. Interpretação conforme a Constituição de dispositivos do Código Penal. Declaraçãode inconstitucionalidade da incidência sobre a hipótese de antecipação de parto de fetocomprovadamente anencefálico”, Parecer na ADPF 54/DF

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AULAS 28 E 29 – REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

Nota ao Aluno

No bloco sobre direitos fundamentais foram estudados alguns dos direitos mais importantes previstos na Constituição Federal. A violação a um direito e a implicação referente no campo jurídico a essa violação, já fazem parte do seu conhecimento.

Entretanto, assim como ocorreu no estudo do controle de constitucionalidade, um passo a mais deve ser dado na direção da compreensão do processo de proteção do bem jurídico que se quer preservar. Com efeito, se de um lado você já sabe que a violação a um direito implica na inconstitucionalidade da norma ou do ato violador e que existe um processo próprio para a retirada deste ato ou norma do universo jurídico, de outro, é importante que você compreenda também como é possível proteger as principais liberdades fundamentais previstas na Constituição.

Neste contexto, a primeira coisa que você deve compreender é a distinção entre direitos e garantias. A leitura do texto do professor José Afonso é fundamental, nesse sentido.

Partindo da distinção acima apontada, o objetivo das próximas aulas será apresentar a você os “remédios” previstos na Constituição para combater a violação a algumas liberdades fundamentais.

Assim, considerando a existência de aula própria para o debate do mandado de injunção, nas próximas aulas deverão ser estudados: (i) o habeas corpus; (ii) o habeas data; (iii) o mandado de segurança (individual e coletivo); (iv) o direito de certidão; (v) o direito de petição; e, por fim, (vi) a ação popular.

Após estudar a bibliografia prepare-se para ser questionado em sala sobre qual é o remédio correto para cada um dos casos que serão apresentados pelo professor.

Para começar o bloco, prepare-se para o estudo do caso gerador da primeira aula. A discussão será essen-cialmente sobre o devido processo legal. Afinal, o prazo para apresentação da defesa e o fato de a votação pelos deputados ser “aberta” violariam algum direito do presidente Collor? Em caso positivo, o que seria possível fazer para defender o presidente? Quais os argumentos que você utilizaria?

Caso

Em setembro de 1992, Marcelo Lavenère Machado, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, e Barbo-sa Lima Sobrinho, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), na qualidade de cidadãos brasileiros, protocolaram na Câmara dos Deputados uma denúncia por crime de responsabilidade contra o presidente da República, Fernando Collor de Mello, nos termos dos artigos 85, IV e V da Constituição:

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constitui-ção Federal e, especialmente, contra:

IV - a segurança interna do País;V - a probidade na administração; Marcelo Lavenère e Barbosa Lima Sobrinho também embasavam suas acusações na Lei 1.079/1950, que

regulava o procedimento de impeachment:Art. 8º. São crimes contra a segurança interna do país:4 - praticar ou concorrer para que se perpetre qualquer dos crimes contra a segurança interna, definidos na

legislação penal;5 - não dar as providências de sua competência para impedir ou frustrar a execução desses crimes;7 - permitir, de forma expressa ou tácita, a infração de lei federal de ordem pública;

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Art. 9º. São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração:3 - não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou

na prática de atos contrários à Constituição;4 - expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição;5 - infringir no provimento dos cargos públicos, as normas legais;6 - Usar de violência ou ameaça contra funcionário público para coagi-lo a proceder ilegalmente, bem como

utilizar-se de suborno ou de qualquer outra forma de corrupção para o mesmo fim;7 - proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.

Para justificar a acusação de crime de responsabilidade, a denúncia recorria ao resultado das investigações conduzidas pela Comissão Parlamentar de Inquérito convocada para apurar as acusações de corrupção feitas por Pedro Collor de Mello, irmão do presidente. Os fatos revelados por Pedro Collor enfocavam basicamente a figura de Paulo César Farias (o famoso “PC Farias”), que comandara o caixa na campanha eleitoral de Fernando Collor. Ao cabo do procedimento investigatório, a CPI produziu relatório concluindo que o próprio presidente Collor também estaria envolvido.

O presidente da Câmara, deputado Ibsen Pinheiro, recebeu a denúncia. Analisando a legislação aplicável, o deputado concluiu que o procedimento previsto na Lei 1.079/1950 não poderia ser aplicado na vigência da atu-al Constituição, pois o regime jurídico do impeachment recebia tratamento bastante diferente na Constituição de 1946. Uma lei pode ser recepcionada pela Constituição desde que não seja incompatível com ela. Assim, de-terminou-se que as eventuais lacunas procedimentais que assim surgissem nas etapas previstas para a realização da defesa de Collor seriam supridas com a aplicação do regimento interno da Câmara dos Deputados.

Em dois pontos, porém, Ibsen decidiu expressamente pela não aplicação do regimento interno da Câmara.Primeiro, contrariando o artigo 188, II do regimento interno, o deputado determinou que a votação para

autorização do início do julgamento pelo Senado Federal seria nominal¸ isto é, os deputados votariam “em aberto”. O respaldo normativo se encontraria no art.23 da Lei 1.079/1950, segundo o qual, após a deliberação sobre o conteúdo da denúncia, “será o mesmo submetido a votação nominal, não sendo permitidas então, questões de ordem, nem encaminhamento de votação.” Na verdade, o deputado Ibsen entendeu que esta seria uma questão em relação à qual o disposto na Lei 1.079/1950 teria sido recepcionado pela Constituição, não sendo aplicável o regimento interno da Câmara.

Segundo, utilizando apenas sua autoridade como presidente da Câmara para conduzir os processos que na Casa tramitam, o deputado Ibsen determinou que os advogados de Collor – Evaristo de Morais Filho e José Guilherme Vilela – teriam o período equivalente a cinco sessões da Câmara para prepararem a defesa do presidente.

Coloque-se na posição de um dos advogados de Fernando Collor de Mello. Você acabou de ser notificado das decisões tomadas pelo presidente da Câmara. Qual a medida jurídica cabível? Procure indicar, de forma justificada:

Quem deve figurar no pólo passivo desta ação; A justificativa para o cabimento deste tipo de ação; O seu pedido e os argumentos que o embasam.

Conceitos

Direitos e garantias; remédios constitucionais; devido processo legal; habeas corpus; habeas data; mandado de injunção; mandado de segurança; direito de petição; direito de certidão; ação popular.

Bibliografia

SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. Malheiros, SP, pp. 442 – 467. MORAES, A. Direito Constitucional. 17ª ed. Atlas, SP, pp. 108 – 170.

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AULA 30 – OMISSÃO INCONSTITUCIONAL E MANDADO DE INJUNÇÃO

Nota ao Aluno

Nas aulas anteriores, você viu que o descumprimento das normas constitucionais por parte dos Poderes Públicos pode se dar não apenas por ação, mas também por omissão.

Veja, por exemplo, o artigo 7º, I da Constituição:

“Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos ter-mos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;”

Até hoje, mais de 15 anos após a promulgação da Constituição, a “Lei Complementar” prevista no dispositivo acima não foi regulamentada. Embora seja fácil perceber que a fun-ção legislativa possui certos trâmites específicos, na medida em que depende de negociação, deliberação, acordos e persuasão entre os parlamentares, podemos dizer que essa demora já não pode mais ser considerada como “justificada”. Sem a Lei Complementar, o direito não está suficientemente concretizado para ser aplicado, pois seria preciso determinar o que contaria como “despedida arbitrária” e “justa causa”, as exceções a esta regra, os critérios para fixação da indenização de que fala o artigo etc. É o tipo de coisa que o Poder Legislativo precisaria discutir e decidir, mas não o fez até o momento. O que fazer nesses casos?

Para lidar com este tipo de situação, os constituintes inventaram uma nova instituição: o man-dado de injunção. Embora se afirme que o mandado de injunção é em boa parte inspirado no writ of injunction dos norte-americanos, ou em ações similares no Direito Português38, trata-se de um instrumento inédito, criado para resolver um antigo problema brasileiro: a inércia do legislador e a conseqüente falta de efetividade dos dispositivos constitucionais e da própria Constituição.

Nesse sentido, foi incluído no artigo 5º da Constituição o inciso LXXI, com a seguin-te redação:

“LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamenta-dora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”

Observe-se que essa invenção do Constituinte tem um propósito similar ao da Ação Direta de Inconstitucionalidade: combater a inércia legislativa. No caso do mandado de injunção, porém, o âmbito de incidência é mais específico: a inércia deve dar causa à invia-bilidade do exercício de direitos fundamentais e outras prerrogativas básicas conferidas aos cidadãos brasileiros; não basta qualquer omissão do legislador para justificar a admissibili-dade deste instituto.

As dificuldades na aplicação do mandado de injunção, por sua vez, também são similares às da ADIN por omissão. Dado o nosso regime de separação de poderes, o que o Judici-ário pode fazer em caso de comprovada mora do Poder Legislativo? Preencher a lacuna normativa deixado pelo legislador, criando a regulamentação para o caso concreto? Como o Judiciário pode (ou não pode) avaliar o impacto econômico e/ou social de suas decisões nestes casos? 38 MORAES, Alexandre de. Di-

reito Constitucional. P. 157.

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A doutrina e os ministros do Supremo Tribunal Federal têm se dividido na tentativa de responder às questões acima. Analise as controvérsias e teses doutrinárias constantes do material de leitura previsto para essa aula e procure aplicá-las na resolução do caso.

Caso39

Diz a Constituição de 1988:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

§ 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de

assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

Em 1991, mais de três anos após a promulgação da Constituição de 1988, o Centro de Cultura Luiz Freire – entidade civil de fins filantrópicos – o consulta a respeito da aplicabili-dade da norma acima transcrita. A instituição afirma que dependeria da imunidade prevista no artigo 195, § 7º para continuar prestando suas atividades de interesse público e social. Até o momento em que o representante legal da entidade tinha entrado em seu escritório, porém, o Poder Legislativo não tinha sequer começado a deliberar sobre projetos de lei que viessem a regulamentar a referida isenção de contribuição para a seguridade social.

Como advogado do Centro de Cultura Luiz Freire, qual a medida jurídica que você tomaria? Indique:

Quem deveria figurar no pólo passivo da ação; O pedido a ser formulado; Os principais argumentos a favor de suas teses.

Bibliografia

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. P. 157 a 163. PIOVESAN, Flavia. Proteção Judicial contra omissões legislativas. (trechos a serem selecionados pelo professor)

Leitura complementar

BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas. P. 247 a 266.

39 Caso baseado no MI nº 232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves.

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ÁLVARO JORGELL.M. pela Harvard Law School. Bacharel em Direito pela UfRJ. Sócio do escritó-rio Barbosa Müssnich e Aragão Advogados. Atualmente é Professor do fundação Getúlio Vargas — RJ.

GUSTAVO SCHMIDTBacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2000), Master of Laws pela New York University School of Law (2008) e Professor de Direito Constitucional da fGV Direito Rio. É, ainda, Procurador do Município do Rio de Janeiro e Professor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. foi sócio do escritório Schmidt, Lourenço & Kingston — Advogados Associados. Tem experiência nas mais diversas áreas do direito, com ênfase em direito cons-titucional e administrativo. Ocupa, atualmente, o cargo de Secretário-Chefe do Gabinete do Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro.

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Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

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Joaquim FalcãoDIRETOR

Sérgio GuerraVICE-DIRETOR DE ENSINO, PESQUISA E PÓS-GRADUAÇãO

Rodrigo ViannaVICE-DIRETOR ADMINISTRATIVO

Thiago Bottino do AmaralCOORDENADOR DA GRADUAÇãO

Andre Pacheco MendesCOORDENADOR DO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA – CLÍNICAS

Cristina Nacif AlvesCOORDENADORA DE ENSINO

Marília AraújoCOORDENADORA EXECUTIVA DA GRADUAÇãO

FICHA TÉCNICA