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Graduação Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais 1 Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais - Tecnologia e Regulamentação e Como Estes Estão Repercutindo no Mercado PROF: OTTO EDUARDO FONSECA LOBO

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Graduação

Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

1

Trading Eletrônico e o Mercado de

Capitais - Tecnologia e Regulamentação e

Como Estes Estão Repercutindo no

Mercado

PROF: OTTO EDUARDO FONSECA LOBO

Graduação

Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

2

Sumário TRADING ELETRÔNICO E O MERCADO DE CAPITAIS - TECNOLOGIA E REGULAMENTAÇÃO E COMO

ESTES ESTÃO REPERCUTINDO NO MERCADO

1. ROTEIRO DO CURSO .......................................................................................................... 5

1.1 VISÃO GERAL .......................................................................................................................... 5 1.2 OBJETIVOS GERAIS ................................................................................................................. 5

1.3 METODOLOGIA ........................................................................................................................ 5 1.4 DESAFIOS E DIFICULDADES..................................................................................................... 6

1.5 MÉTODOS DE AVALIAÇÃO ...................................................................................................... 6 1.6 ATIVIDADES COMPLEMENTARES ............................................................................................ 6

2.1 AULA 1: A ATUAÇÃO DOS ADVOGADOS NA CRIAÇÃO DE RIQUEZAS ............. 7

A) EMENTÁRIO DE TEMAS ............................................................................................................ 7

B) MATERIAL DE LEITURA ........................................................................................................... 7

C) ROTEIRO DE AULA ................................................................................................................... 7 LAW AND ECONOMICS .................................................................................................................. 8

NOÇÕES ECONÔMICAS SOBRE O MERCADO FINANCEIRO ........................................................... 10 D) BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR .......................................................................................... 14 E) GLOSSÁRIO ............................................................................................................................. 15

3.1. AULA 2: AUTO-REGULAÇÃO ...................................................................................... 16

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 16 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ....................................................................................................... 17 ESTRUTURA REGULATÓRIA ........................................................................................................ 18 VANTAGENS E DESVANTAGENS DA ESTRUTURA REGULATÓRIA ............................................... 19

PROVIDÊNCIAS ADOTADAS PARA MELHORAR A ESTRUTURA REGULATÓRIA .......................... 21 CONCEPT RELEASE CONCERNING SELF-REGULATION .......................................... 21 CONSULTA PÚBLICA - EDITAL DE AUDIÊNCIA PÚBLICA SDM Nº 05/13 ....................... 30

4.1. AULA 3. OS VALORES MOBILIÁRIOS ....................................................................... 42

5.1. AULA 4: ILICITUDES ADMINISTRATIVAS E PENAIS NO AMBITO DO

MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO ........................................................................... 48

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1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 48

2. O ILÍCITO PENAL. MANIPULAÇÃO DO MERCADO, CRIAÇÃO DE CONDIÇÕES ARTIFICIAIS,

OPERAÇÕES FRAUDULENTAS E PRÁTICAS NÃO EQUITATIVAS – ART. 27-C DA LEI 6.385/1976. 49 2.2. USO INDEVIDO DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA – ART. 27-D DA LEI 6.385/1976. ............ 53 2.3. EXERCÍCIO IRREGULAR DE CARGO, PROFISSÃO OU ATIVIDADE – ART. 27-E DA LEI

6.385/1976. .................................................................................................................................. 56

3. O ILÍCITO ADMINISTRATIVO. ................................................................................................. 58 4. O TERMO DE COMPROMISSO. ................................................................................................. 60 GLOSSÁRIO .................................................................................................................................. 64

6.1. AULAS 5 E 6: A CVM E OS CASOS DE ALIENAÇÃO DE CONTROLE NAS

SOCIEDADES ANÔNIMAS .................................................................................................... 66

A) EMENTÁRIO DE TEMAS .......................................................................................................... 66 B) MATERIAL DE LEITURA ......................................................................................................... 66

C) ROTEIRO DE AULA ................................................................................................................. 66 D) TEXTO DE APOIO.................................................................................................................... 79

7.1 AULAS 7 E 8: OFERTA PÚBLICA DE AQUISIÇÃO DE AÇÕES .............................. 83

A) EMENTÁRIO DE TEMAS .......................................................................................................... 83 B) MATERIAL DE LEITURA ......................................................................................................... 83

C) ROTEIRO DE AULA ................................................................................................................. 83 D) LEITURA COMPLEMENTAR .................................................................................................... 98

8.1. AULA 9. POISON PILLS ................................................................................................ 102

A) EMENTÁRIO DE TEMAS ........................................................................................................ 102 B) MATERIAL DE LEITURA ....................................................................................................... 102 C) ROTEIRO DE AULA ............................................................................................................... 102

D) TEXTOS COMPLEMENTARES................................................................................................ 111 E) GLOSSÁRIO ........................................................................................................................... 122

9.1 AULA 10: TAKEOVER PANEL ..................................................................................... 124

A) EMENTÁRIO DE TEMAS ........................................................................................................ 124

B) MATERIAL DE LEITURA ....................................................................................................... 124 C) ROTEIRO DE AULA ............................................................................................................... 124 D) BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................... 130

10.1. AULAS 11 E 12: GOVERNAÇA CORPORATIVA, OS INTERESSES

FUNDAMENTAIS E AS QUESTÕES ÉTICAS. ................................................................. 132

A) EMENTÁRIO DE TEMAS ........................................................................................................ 132

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B) MATERIAL DE LEITURA ...................................................................................................... 132

C) ROTEIRO DE AULA ............................................................................................................... 132 D) TEXTOS DE APOIO ................................................................................................................ 139 E) ESTUDO DE CASOS ................................................................................................................ 159 F) GLOSSÁRIO ........................................................................................................................... 162 G) QUESTÕES DE CONCURSO ................................................................................................... 164

11.1 AULA 13: OPERAÇÕES DE REORGANIZAÇÕES SOCIETÁRIA: ASPECTOS

TRIBUTÁRIOS ....................................................................................................................... 166

A) EMENTÁRIO DE TEMAS ........................................................................................................ 166

B) MATERIAL DE LEITURA ....................................................................................................... 166 C) ROTEIRO DE AULA ............................................................................................................... 167 D) TEXTOS DE APOIO ................................................................................................................ 181

12.1. AULA 14. O USO DOS FUNDOS DE INVESTIMENTOS EM PARTICIPAÇÕES

FIP ............................................................................................................................................. 194

A) EMENTÁRIO DE TEMAS ........................................................................................................ 194

B) MATERIAL DE LEITURA ....................................................................................................... 194 C) ROTEIRO DE AULA ............................................................................................................... 194 D) TEXTOS DE APOIO ................................................................................................................ 197

E) CASO ..................................................................................................................................... 204 F) GLOSSÁRIO ........................................................................................................................... 205

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1. Roteiro do Curso

1.1 Visão Geral

Sejam bem-vindos ao ATC de Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais.

Propõe-se à análise e aplicação das seguintes leis e regulamentos a casos concretos de mercado

de capitais e direito societário: Lei das S.A., Código Civil, Instruções da CVM e regulamentos

do Conselho Monetário Nacional e portarias do Ministério da Fazenda.

1.2 Objetivos Gerais

O advogado que pretende trabalhar com mercado de capitais e direito societário necessita ter

uma visão multidisciplinar do direito e, principalmente, compreender as questões mais

relevantes. A ênfase é buscar o equilíbrio entre a teoria e a prática. Portanto, nesta disciplina o

aluno irá analisar e discutir questões conceituais e práticas destes temas, através de estudo de

casos, análise e discussão de textos, memorandos, contratos e documentos típicos de mercado de

capitais e direito societário.1

Ainda, com relação à parte específica de mercado de capitais, é importante que os alunos

reconheçam a relevância da discussão da regulação e autoregulação e suas consequências.

1.3 Metodologia

O material didático menciona o roteiro de cada aula, com indicação dos textos para leitura, os

casos práticos a serem estudados e outras questões relevantes. Serão também apresentados

textos de leitura complementares.

As primeiras aulas serão importantes para firmar os conceitos básicos da matéria. Propõe-se

também trabalhar em diversos casos e contratos que serão a espinha dorsal de parte do curso.

Serão apresentadas questões praticas e teóricas na maioria das aulas.

Ademais, o curso poderá contar com atividades complementares, como a realização de palestras

com professores e profissionais convidados, projeção de filmes e documentários, e apresentação

de seminários pelos alunos.

1 Especiais agradecimentos aos estagiários Marcelo Trindade Matos de Andrade, Carolina Ferraz Barbosa Ferreira

e Guilherme Torres Bandeira de Mello que auxiliaram, de forma efetiva, na elaboração dos capítulos 1, 2 e 3 da

presente apostila.

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1.4 Desafios e Dificuldades

Os principais desafios serão identificar e analisar as questões relacionadas ao mercado de

capitaios e o direito societário e aplicar os conhecimentos teóricos, incluindo as leis, instruções,

pareceres de orientação aos casos concretos e aos contratos e documentos a serem elaborados

em situações trazidas por operações de mercado de capitais e direito societárias.

1.5 Métodos de Avaliação

Serão realizadas avaliações baseadas em atividades em sala de aula ou em trabalhos sobre temas

específicos a serem indicados pelo professor.

1.6 Atividades Complementares

Dependendo do andamento do curso, poderão ser propostas atividades adicionais.

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2.1 Aula 1: A Atuação dos Advogados na Criação de Riquezas

A) Ementário de Temas

A função dos advogados de negócios na economia. Noções de agente deficitário e agente

superavitário. O mercado financeiro e suas divisões. Diferenciações entre o mercado de capitais

e o resto do mercado financeiro.

B) Material de Leitura

Eizirik, Nelson; Gaal, Ariadna B.; Parente, Flávia; Henriques, Marcus de Freitas. Mercado de

Capitais – regime jurídico. 2. ed. revisada e atualizada. Rio de Janeiro: Renovar: 2008. p. 1-8.

YAZBEK, Otavio. Regulação do mercado financeiro e de capitais. 2. ed. Rio de Janeiro:

Elsevier, 2009. p. 126-127.

PEDREIRA, coordenado por Alfredo Lamy Filho; José Luiz Bulhões. Direito das Companhias.

Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 215-218.

C) Roteiro de Aula

Inicia-se este curso com uma análise sobre o necessário reconhecimento da função fundamental

exercida pelos advogados no desenvolvimento da economia e distribuição de justiça.

Atualmente, os economistas concordam em uníssono quanto à importância da propriedade para

o aprimoramento do capital humano, ao contrário do que afirmava a doutrina comunista surgida

no século XIX. Em outras palavras, a existência da propriedade é uma arma eficiente que pode

ser usada na busca do bem-estar social, pois ela incentiva muito mais a produtividade do que o

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sistema centralizador comunista, pois através da propriedade pode ser realizada a distribuição de

riqueza.2

Quando atribuímos a importância da propriedade na busca do bem-estar social, somos logo

levados a investigar a sua origem: o sistema jurídico, que é aquele que impõe à sociedade o

respeito à sua existência.

Law and Economics

A partir disso, foi dado início ao intercâmbio de informações entre a área econômica e a

jurídica, com vistas ao aperfeiçoamento das teorias de ambas as áreas de estudo. Neste sentido,

foi criada a doutrina Law and Economics, amplamente explorada pela doutrina norte-

americana3, com reflexos notáveis nas decisões judiciais norte-americanas, e que no Brasil

ganhou o nome de Análise Econômica do Direito. A partir dessas análises, procura-se aplicar a

solução mais eficiente economicamente ao litígio em questão.4

Mas a conexão entre direito e economia não se encerra nesta seara. Ainda, e mais importante

para este curso, percebeu-se recentemente o papel fundamental do advogado societário no

aprimoramento do bem-estar social, na medida em que sua atividade reduz os custos

transacionais.

2 Neste sentido, o artigo seminal de Ronald Coase, "The Problem of Social Cost", publicado em 1961, sugeriu que

direitos de propriedade bem definidos poderiam superar os problemas das externalidades. Desde que os custos de

transação se aproximassem de zero, acordos mutuamente benéficos regulariam quem arcaria com o custo da

externalidade. Coase, Ronald, "The Problem of Social Cost", The Journal of Law and Economics. Vol.3, No.1

(1960). Essa edição foi publicada em 1961. 3 Por exemplo, Anthony Kronman, ex-reitor da Yale Law School, escreveu que "the intellectual movement that has

had the greatest influence on American academic law in the past quarter-century [of the 20th Century]" is law and

economics. Anthony T. Kronman, The Lost Lawyer 166 (1993). 4 Exemplo é o caso Boomer v. Atlantic Cement Company, Inc., em que a Court of Appeals of New York não

condenou o réu a pagar indenização ao autor, pois o efeito econômico de tal obrigação levaria o réu à falência,

prejudicando centenas de empregados do réu.

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Os custos transacionais são aqueles custos que surgem na realização de uma transação

econômica, além do preço da coisa em si. Por exemplo, a taxa de comissão que se deve pagar ao

corretor quando se compra uma ação.

Oliver Williamson, professor de Yale, especialista em custos de transação, demonstrou em seu

trabalho5 que a redução dos custos de transação é uma função essencial na economia, que é em

grande parte desenvolvida no âmbito jurídico.

Aperfeiçoando esta ideia, o Professor Ronald Gilson da Stanford Law School denominou os

advogados de negócios como ―engenheiros de custo de transações‖6. A frase demonstra uma

parte importante da utilidade especial que os advogados de negócios trazem aos seus clientes.

Este artigo fundamental do professor Ronald Gilson reconhece que as estruturas organizacionais

e transacionais criadas pelos advogados podem ser compreendidas como mecanismos que

economizam em informação, barganha e custos agenciais7.

Sem dúvidas, os custos de transação que os advogados de negócios ajudam a reduzir envolvem

as despesas correntes de negociação, documentação e a efetivação de transações – por exemplo,

a burocracia do registro de documentos perante órgãos públicos. Mas a atuação advocatícia não

se encerra neste âmbito. A sua contribuição vital para o bem-estar humano, enquanto busca o

bem-estar do cliente, é a criação de novas soluções para problemas que são percebidos nas

transações. Nesta atividade criativa, os advogados de negócios permitem que seus clientes

assumam formas adicionais ou novas de riscos, e assim são exercidas novas atividades criadoras

de riqueza.

Deste modo, Gilson enxerga o papel exercido pelos advogados de negócios como engenheiros

de custos de transação, cuja função é agir como intermediários organizacionais, projetando

5 Oliver E. Williamson (1981). "The Economics of Organization: The Transaction Cost Approach". The American

Journal of Sociology 87 (3): 548–577.

6 Gilson, Ronald J., Lawyers as Transaction Cost Engineers (August 1997). Disponível em:

http://ssrn.com/abstract=11418 acessado em 14 de maio de 2012. 7 Agência, na tradução livre do termo Agency, na verdade é o princípio do comitente e comissário, previsto no

nosso direito civil.

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eficientes estruturas de custo de transação através das quais eles desenvolvem suas atividades

produtivas.

É importante chamar atenção à importância pública desta atividade. A continuação do

desenvolvimento dos mercados de capitais no Brasil, assim como dos empréstimos bancários e

investimentos privados, é uma medida significativa nas mãos dos advogados de negócios do

país. Os seus esforços para projetar e realizar transações inovadoras aos seus clientes e para

ajudar na construção da infra-estrutura moderna institucional de uma economia de mercado para

o Brasil traz tanto benefícios privados como públicos.8

Por um longo tempo, os advogados de negócios têm oferecido essa função aos seus clientes.

Nos dias de hoje, a complexidade do mundo do direito e das finanças crescentemente requer que

os advogados de negócios efetivamente tenham amplo conhecimento, se não forem experts, em

conceitos de corporate finance, exercendo uma interdisciplinaridade entre a economia e o

direito.

Noções econômicas sobre o mercado financeiro

O estudo da tecnologia e regulamentação dos mercados de capitais exige, previamente, uma

introdução econômica sobre o funcionamento dos mercados.

Dois conceitos são essenciais à compreensão dos mercados: poupança e investimento. Os

economistas classicamente conceituam como ato de poupança a abstenção de consumo,

enquanto o ato de investimento seria a utilização de recursos poupados para a produção de um

bem de capital.

A partir da poupança e investimento, criou-se uma classificação dos agentes econômicos que

atuam na economia capitalista. Agentes superavitários são aqueles que possuem um nível de

8 Vella, Beatriz Franco, Daniel Kalansky, Bianca Soares e Rodrigo V. International Business Transactions with

Brazil. Juris Publishing, Inc. 2008.

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renda superior aos seus gastos, ou seja, possuem recursos financeiros poupados, pois escolhem

por poupar mais do que investir. Já os agentes deficitários são os que possuem um nível de

gastos superior ao da renda, ou seja, necessitam de recursos para realizarem investimentos, pois

decidem por investir mais do que poupar.9

O mercado financeiro tem como objeto a canalização da poupança para o investimento, ou seja,

a transferência dos recursos dos setores superavitários para os deficitários. O denominado

Sistema Financeiro Nacional, regulado pela Lei nº 4.595/1964, é o conjunto de instituições

responsáveis pela captação de recursos financeiros, pela distribuição e circulação de valores e

regulação dos processos10.

Dentro do mercado financeiro se situam diferentes tipos de mercados, que lidam com formas

específicas de transferência de recursos daqueles que os têm para aqueles que precisam deles.

São eles o mercado de crédito, o mercado monetário, o mercado cambial e o mercado de

capitais.

Para explicação do âmbito de atuação de cada um destes mercados, nos valemos da explicação

de Valdir Lameira sobre o tema:

―O mercado de crédito é onde se operam, a curto ou médio prazos, os recursos que se destinam

ao financiamento de consumo e capital de giro para empresas e indivíduos, através,

principalmente, de bancos comerciais.

No mercado de câmbio se realizam operações que carecem de conversão de moedas para a sua

concretização. São, em geral, operações de curto prazo [...]. As instituições financeiras que

9 Eizirik, Nelson; Gaal, Ariadna B.; Parente, Flávia; Henriques, Marcus de Freitas. Mercado de Capitais – regime

jurídico. 2. ed. revisada e atualizada. Rio de Janeiro: Renovar: 2008. p. 2. 10 Fernando Carvalho explica o funcionamento do sistema financeiro: ―Sistemas financeiros permitem que aqueles

que acumulam ou herdam recursos, mas que não tem capacidade ou desejo de empregá-los produtivamente, possam

transferi-los para os que se dispõem a empreender, a inovar, a contribuir para o desenvolvimento das atividades

produtivas. Relações financeiras servem assim para alavancar o desenvolvimento econômico, permitindo uma

alocação de recursos muito mais eficiente do que aquela que resultaria previamente.‖ CARVALHO, Fernando J.

Cardim de, et al. Economia monetária e financeira: teoria e prática. Rio de Janeiro: Campus, 2000. pg. 237.

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operam nesse mercado são os bancos comerciais e as corretoras de câmbio e valores

mobiliários.

O mercado monetário permite ao governo federal controlar, através de operações com

vencimento no mesmo dia (curtíssimo prazo), os meios de pagamento (depósitos à vista em

bancos comerciais + papel moeda em poder do público), valendo-se basicamente de lançar

títulos de dívida pública (União, Estados ou Municípios) resgatáveis e com taxas de juros

atraentes para os aplicadores. [...]

O mercado de capitais é onde se concentram operações de longo prazo, ou de prazo

indeterminado, com o objetivo de financiamento de um complexo industrial, da compra de

máquinas e equipamentos, ou obtenção de sócios ou parcerias, para a capitalização de empresas

já existentes no mercado ou que estejam se constituindo.

Também ocorrem nesses mercados processos de alongamento do perfil da dívida de uma

empresa, através da troca de dívidas de vencimento a longo prazo, ou a antecipação de fluxos de

caixa futuros, descontados a valor presente, em processos conhecidos como securitização‖11

Cabe lembrar que a divisão sistemática do mercado financeiro não é absoluta, já que o mercado

é dinâmico e surgem incessantemente instrumentos complexos que visam cumprir novas

finalidades, cuja classificação num modelo rígido se torna dúbia.12

No mercado financeiro, as transações são realizadas por meio de uma intermediação

profissional entre os agentes deficitários e os superavitários. As instituições financeiras, que são

entidades especializadas autorizadas administrativamente a funcionar no mercado financeiro,

organizam a transferência de recursos de forma peculiar, em decorrência da fungibilidade dos

bens que intermedeiam. Elas captam recursos junto aos superavitários, com a finalidade de

repassá-los, como empréstimos, aos deficitários. Mas, ao emprestar os recursos, elas agem como

11

LAMEIRA, Valdir de Jesus. Mercado de Capitais. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. p. 8-9. 12

YAZBEK, Otavio. Regulação do mercado financeiro e de capitais. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 128.

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se os recursos emprestados fossem próprios – ou seja, atuam em nome próprio. O agente

superavitário não tem uma relação direta com o superavitário.

Muitas vezes, o agente superavitário pretende emprestar seu recurso por curto prazo, enquanto o

deficitário necessita do empréstimo do recurso por um longo prazo. A instituição financeira

soluciona este problema, pois tem o papel de compatibilizar os prazos pretendidos por cada um

dos agentes, permitindo que aquele que lhe empresta o recurso o saque à vista, e exigindo a

dívida daquele a quem emprestou o dinheiro só depois de certo prazo.

As instituições financeiras são essenciais para o funcionamento da economia, pois transmitem

uma segurança de capacidade patrimonial. Quando esta confiança está abalada, podem

acontecer as chamadas ―corridas bancárias‖, em que os superavitários em massa sacam seus

recursos que estavam depositados na instituição financeira.13

As instituições financeiras, ao realizar esse serviço de intermediação, compatibilização de

prazos e assunção de riscos, recebem uma remuneração, denominada spread, que consiste na

diferença entre a taxa de juros pagos na captação dos recursos e os juros cobrados no momento

de repasse ao agente deficitário.

No entanto, o mercado de capitais se diferencia dessa estrutura adotada pelo resto do mercado

financeiro. No mercado de capitais, a relação de financiamento se estabelece diretamente entre o

agente superavitário e o agente deficitário. Existe uma instituição que realiza a intermediação

entre os agentes, mas que não age em nome próprio; apenas participa da transação, como um

interveniente que presta o serviço de aproximação entre as partes. Isto faz com que a

remuneração de tais instituições seja menor do que a remuneração das instituições financeiras

típicas, tornando a transação menos custosa para o agente deficitário.

13

Um exemplo é a afirmação de economistas sobre a crise da Grécia em 2011-2012, de que o maior risco que a

Grécia correu durante sua crise econômica foi o de crise bancária. Com a ameaça de o país sair da zona do euro, o

dinheiro poderia se desvalorizar ao ser convertido em moeda local, o que amedrontaria os gregos que tinham suas

economias depositadas em bancos gregos. Por exemplo, a economista Miriam Leitão, em artigo publicado em 25

de maio de 2012, afirmou que o pior risco à economia grega era a corrida bancária. Disponível em:

http://oglobo.globo.com/economia/miriam/posts/2012/05/25/corrida-bancaria-maior-risco-enfrentado-hoje-pela-

grecia-447137.asp, acessado em 01/07/2012

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14

No mercado de capitais, em contraste com o resto do mercado financeiro, a segurança das

operações financeiras não reside na saúde patrimonial de uma instituição financeira, mas sim na

criação de fundos de garantia, da regulamentação das condutas adotadas pelos agentes

econômicos, entre outros mecanismos.

Como a função da instituição financeira no mercado de capitais é apenas de aproximação, sem

substituição das partes, não é ela quem compatibiliza os prazos diversos desejados por cada um

dos agentes. Esta função é então exercida pelo mercado secundário, cuja liquidez permite que

haja compra e venda de ativos a qualquer momento desejado pelo agente.14

Em comparação ao restante do mercado financeiro, o mercado de capitais é mais atraente tanto

aos subscritores de ações como às companhias que se financiam através da emissão de valores

mobiliários que serão negociados no mercado de capitais. A título de exemplo, trazemos uma

breve análise dos mestres Bulhões Pedreira e Lamy Filho sobre a dinâmica das ações nas

sociedades:

―Do ângulo das empresas, os recursos obtidos na subscrição das ações são, sem dúvida,

menos onerosos, dado que não supõem pagamento de juros e não têm prazo de resgate,

ou melhor, não são exigíveis pelo subscritor.

Do ângulo do subscritor, trata-se de aplicação financeira na medida de suas posses, ou de

seus propósitos, sem outros riscos que não os do investimento, do qual espera resultados

positivos, com a possibilidade de recuar, retirar-se mediante alienação no momento que

lhe parecer conveniente.‖15

D) Bibliografia Complementar

14

Otavio Yazbek, minoritariamente, diverge de tal análise sobre o mercado de capitais, argumentando que ela deixa

de considerar atividades como as atividades securitárias e as operações com derivativos, que funcionam de forma

diversa. YAZBEK, Otavio. Regulação do mercado financeiro e de capitais. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p.

126-127.

15 PEDREIRA, coordenado por Alfredo Lamy Filho; José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. Rio de Janeiro:

Forense, 2009. p. 218.

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15

LAMEIRA, Valdir de Jesus. Mercado de Capitais. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

2000. p. 8-9

E) Glossário

Ato de investir: é a utilização de recursos poupados para a produção de um bem de capital.

Ato de poupar: é a abstenção de consumo, que resulta na sobra de recursos.

Agente deficitário: é aquele que investe mais recursos do que poupa recursos.

Agente superavitário: é aquele que deseja poupar mais recursos do que investi-los.

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16

3.1. Aula 2: Auto-regulação

Introdução

Assim como as bases do nosso direito societário foram inspiradas em algum nível pelo

Corporate Law do direito norte-americano, diferente não foi quanto à estrutura de regulação do

mercado.

O sistema brasileiro de auto-regulação conferido às bolsas de valores usou como

referência o Securities Exchange Act de 1934 dos Estados Unidos. Este ―act‖ estatuiu poderes

regulatórios às bolsas de valores, que passaram a vigorar como obrigação imposta por lei. Com

a intenção de garantir que as funções reguladoras desempenhadas pelas bolsas atendessem ao

interesse público, foi delegada a supervisão dos feitos à Securities Exchange Comission (SEC).

De modo semelhante, observou-se implantar um sistema de auto-regulação igualmente para as

operação de derivativos e mercados futuros com o Commodity Exchange Act, e a superveniente

delegação da supervisão de seus atos à Commodity Futures Trading Commision (CFTC).

As razões cruciais que fizeram com que o Congresso norte-americano adotasse o sistema

de auto-regulação com supervisão governamental foram, primeiramente, o temor da burocracia

governamental, e também a constatação de maior eficácia no controle regulatório independente

das bolsas.

Por adotar uma forma federalista de Estado, os Estados Unidos diferem do sistema

brasileiro na medida em que os cinqüenta Estados da Federação e o Distrito de Columbia

competem entre si em termos de negócios entre outros aspectos. No entanto, a lógica da auto-

regulação que se pretende demonstrar neste capítulo permanece a mesma.

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

17

A Legislação Brasileira

A legislação vigente no ordenamento brasileiro sobre o assunto, encontra-se na Lei nº

6385/76, essencialmente em seu artigo 17, com redação dada pela Lei 10.303/11:

Art. 17. As Bolsas de Valores, as Bolsas de Mercadorias e Futuros, as entidades

do mercado de balcão organizado e as entidades de compensação e liquidação de

operações com valores mobiliários terão autonomia administrativa, financeira e

patrimonial, operando sob a supervisão da Comissão de Valores Mobiliários.

§ 1o Às Bolsas de Valores, às Bolsas de Mercadorias e Futuros, às entidades do

mercado de balcão organizado e às entidades de compensação e liquidação de

operações com valores mobiliários incumbe, como órgãos auxiliares da

Comissão de Valores Mobiliários, fiscalizar os respectivos membros e as

operações com valores mobiliários nelas realizadas.

Como se vê, no ordenamento há disposição de que as bolsas, na condição de órgãos

auxiliares da CVM, deverão fiscalizar os respectivos membros e as operações com valores

mobiliários nelas realizadas. Esta competência conferida às bolsas está sujeita à supervisão da

Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Trata-se de um modelo de dupla-fiscalização que dita a regulação e a fiscalização das

operações do mercado financeiro e das corretoras. Primeiro a fiscalização é delegada às bolsas,

e à CVM só caberia fiscalizar o proceder deste poder regulatório, já que a Comissão de Valores

Mobiliários, na condição de autarquia federal, deverá defender o interesse público.

As bolsas não poderão ser limitadas ou substituídas em seus atos de auto-regulação pela

CVM, já que não consta dispositivo que a permita expressamente na lei nº 6385/76. Esta

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18

questão da auto-regulação do mercado de capitais que era anteriormente pautada em princípios

ganhou o patamar de imposição legal pela CVM.16

Estrutura Regulatória

* 1 - Congresso – Constituição e Leis; 2 – Conselho Monetário Nacional – Resoluções; 3 – Comissão de

Valores Mobiliários – Instruções/Deliberações; 4 – Banco Central – Circulares e Cartas Circulares;

Desse modo, em paralelo à posição regulatória estatal (CVM, Banco Central, Conselho

Monetário), constata-se a posição auto-regulatória desempenhada pelas Bolsas, que surgem:

1 Por Exigência legal (os ditames básicos desta disciplina encontram-se pautados na

Instrução da CVM nº 461, de 23 de outubro de 2007);

16

COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS (CVM), Órgão Regulador e a Experiência Auto Regulatória,

maio. 2001, disponível em www.cvm.gov.br/port/public/publ/PalestraAuto-regulação.ppt, acessado em 06.08.2007

Apud EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 213.

Congresso

(Constituição e Leis)

Conselho Monetário Nacional

Comissão de Valores Mobiliários

- CVM

Entidades Auto-reguladoras

Banco Central

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

19

2 Voluntária (Auto-regulação voluntária em complemento à regulação estatal -

ANBID)17

Vantagens e Desvantagens da Estrutura Regulatória

Acerca das vantagens e desvantagens desse sistema de Auto-regulação desempenhado

pelas bolsas, muito se discute sobre a sua eficácia.

Vem sendo consolidada a opinião de que o sistema de auto-regulação seria o mais eficaz

no controle das atividades desenvolvidas pelas instituições intermediárias no mercado de

valores mobiliários.

A doutrina inclina-se no sentido de conferir maior eficácia às normas internas no âmbito

regulatório, as quais os membros das bolsas de valores obedecem voluntariamente, do que as

normas oriundas do Poder Público. Essa constatação decorre do fato de as normas auto-

reguladoras se originarem de experiências concretas dos próprios ―Market Players‖,

ocasionando a produção de normas flexíveis (condizente com as realidades do mercado) e uma

mais fácil adequação às mudanças das circunstâncias do mercado. A própria participação dos

membros do mercado na disciplina das suas atividades, por si só, já confere maior eficácia à

regulação. Nesse sentido, é pertinente a citação de uma passagem do ―The Yale Law Journal‖,

que observa:

―As a competitive legal market supplants a monopolist federal agency in

the fashioning of regulation, it would produce rules more aligned with the

preferences of investors, whose decisions drive the capital market‖18

17

A second off-cited virtue of self-regulation is that the professional body will have a special knowledge of what

regulated parties will see as reasonable in terms of obligations. This allows standards to be set in a realistic manner

– one that produces ‗identification‘ with the rules and higher levels of voluntary compliance than is possible with

outside driven rules. Misjudging levels of rules accountability leads, say proponents of self-regulation, to low levels

of voluntary compliance, high state enforcement costs and inefficient controls‖. BALDWIN, ROBERT; HUTTER,

BRIDGET e ROTHSTEIN, HENRY. Risk Regulation, Management and Compliance – A report to the BRI

Inquiry, p. 39. The London School of Economics and Political Science.

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

20

Além disso, acredita-se que se essa fosse uma delegação governamental, não haveria o

mesmo grau de eficácia e nos depararíamos com uma situação de burocracia exacerbada.

Por outro lado, alegam-se como pontos negativos acerca do sistema de auto-regulação,

principalmente, a possibilidade de haver conflito de interesses entre a atividade regulatória

desempenhada pelas bolsas e as operações comerciais desempenhadas pelos integrantes do

mercado e pelas próprias bolsas. Desta situação pode-se destacar:

1 Pressão dos membros associados da bolsa para que a fiscalização seja feita de forma

menos rigorosa, para beneficiar seus negócios;

2 Conflito entre os interesses das bolsas e os interesses particulares das corretoras;

3 A função regulatória das bolsas, enquanto órgão auxiliar do poder público, pode

conflitar com a própria bolsa como entidade de direito privado.

Além dessas situações supramencionadas de conflito de interesses, pode ser sustentada a

posição de que em um contexto de globalização e o conseqüente encurtamento das distâncias,

também somada à competição dos mercados19, ensejaria um fluxo migratório dos investidores

para bolsas off-shore diante de algum impeditivo ou incompatibilidade com os serviços auto-

regulatórios desempenhados pelas Bolsas, fazendo com que as bolsas percam negócios e lucros

em razão de sua função regulatória. Neste sentido, bem elucidou Nelson Eizirik:

―A crescente competição em escala internacional entre as bolsas pode agravar tal

conflito, na medida em que os investidores e as corretoras passaram a ter maior

flexibilidade para, a qualquer momento, re-direcionar seus negócios para outras

bolsas, aumentando, assim, os riscos de determinada bolsa vir a perder negócios

18

ROMANO, Roberta, ―Empowering Investors: A Market Approach to Securities Regulation” (1998). Faculty

Scholarship Series. Paper 1914. http://digitalcommons.laws.yale.edu/fss_papers/1914 19

Fleckner, Andreas M., Stock Exchange at the Crossroads. Fordham Law Review, Article, 2005 page 2541: ―

with increased competition caused by deregulation, technological advances, and globalization, the organization of

stock exchanges is at a crossroads.”

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

21

caso, no exercício de sua função regulatória, venha a tomar medidas contrárias aos

interesses de seus clientes.20

Providências Adotadas para Melhorar a Estrutura Regulatória

Apesar de todos os reflexos negativos de se ter uma auto-regulação exercida pelas

bolsas, esta competência condicionada à supervisão da CVM ainda parece a melhor e mais

eficaz estrutura de fiscalização dos mercados.

Todavia, busca-se o aperfeiçoamento do sistema regulatório dos mercados para fins de

redução dos casos de conflito de interesses supracitados, e, ainda, para promover a

independência dos responsáveis pela implementação da atividade auto-regulatória. Nesse

sentido, as bolsas têm adotado basicamente três medidas:

1 ―Desmutualização‖

2 Separação das competências Comerciais e Regulatórias

3 Escolha de membros independentes para integração nos Conselhos de

Administração.

CONCEPT RELEASE CONCERNING SELF-REGULATION

SECURITIES AND EXCHANGE COMMISSION

17 CFR PART 240

Release No. 34-50700; File No. S7-40-04

RIN 3235-AJ36

CONCEPT RELEASE CONCERNING SELF-REGULATION

AGENCY: Securities and Exchange Commission.

ACTION: Concept release; Request for comment.

20

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 216.

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

22

SUMMARY: The Securities and Exchange Commission (―Commission‖ or ―SEC‖) is

publishing this concept release and seeking public comment on a range of issues related to the

self-regulatory system of the securities industry. This release discusses the foundations of the

self-regulatory system and new considerations that the Commission and the industry are facing.

In addition, this release describes certain enhancements that could be made to the current system

that could improve its operation and also discusses a variety of other potential approaches to

securities industry regulation.

DATES: Mar. 8, 2005.

I. Introduction

Self-regulation is a key component of U.S. securities industry regulation. All broker-

dealers are required to be members of a self-regulatory organization (―SRO‖), which sets

standards, conducts examinations, and enforces rules regarding its members.1 Most, but not all,

SROs also operate and regulate markets or clearing services.2 Inherent in self-regulation is the

conflict of interest that exists when an organization both serves the commercial interests of and

regulates its members or users.

The Securities Exchange Act of 1934 (―Exchange Act‖),3 the Maloney Act of 1938

(―Maloney Act‖),4 and the Exchange Act Amendments of 1975 (―1975 Amendments‖),5 reflect

Congress‘ determination to rely on self-regulation as a fundamental component of U.S. market

and broker-dealer regulation, despite this inherent conflict of interest. Congress favored self-

regulation for a variety of reasons. A key reason was that the cost of effectively regulating the

inner-workings of the securities industry at the federal level was viewed as cost prohibitive and

inefficient.6 In addition, the complexity of securities trading practices made it desirable for SRO

regulatory staff to be intimately involved with SRO rulemaking and enforcement.7 Moreover,

the SROs could set standards that exceeded those imposed by the Commission, such as just and

equitable principles of trade and detailed proscriptive business conduct standards.8 In short,

Congress determined that the securities industry self-regulatory system would provide a

workable balance between federal and industry regulation.9

Since the self-regulatory system was incorporated into the federal securities laws, the

Commission has reexamined it periodically.10 While steps have been taken over time to redress

perceived shortcomings, the SRO structure has been repeatedly reaffirmed both by Congress

and the Commission.11 In recent years, changes in the markets and in the ownership structure

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

23

of SROs have generated questions about the fairness and efficiency of the current SRO

structure.12 The increased dispersion of order flow across multiple markets has produced

questions of comparable regulation by SROs and the effectiveness of cross-market

supervision.13 The increased competition among markets for listings and trading volume has

applied pressure on SRO regulatory efforts and sources of funding.14 Moreover, the advent of

for-profit, shareholder-owned SROs has introduced potential new conflicts of interest and issues

of regulatory incentives.15 In addition, recent failings or perceived failings with respect to

SROs fulfilling their self-regulatory obligations have sparked public debate as to the efficacy of

the SRO system in general.16

For these reasons, the Commission is publishing this release to discuss and solicit

comments on the role and operation of SROs in today‘s markets. This release examines a

number of issues concerning securities industry self-regulation, including: (1) the inherent

conflicts of interest between an SRO‘s regulatory obligations and the interests of its members,

its market operations, its listed issuers, and, in the case of a demutualized SRO, its shareholders;

(2) the costs and inefficiencies of the multiple SRO model; (3) the challenges of surveillance

across markets by multiple SROs; and (4) the manner in which SROs generate revenue and how

SROs fund regulatory operations. Finally, this release examines and seeks comment on certain

enhancements to the current system and a number of regulatory approaches or legislative

initiatives that could be considered by the Commission to address concerns with the current

SRO model.

II. Foundations of Self-Regulation

Securities industry self-regulation has a long tradition in the U.S. securities markets. In

its earliest years, the nascent U.S. securities industry was subject loosely to state laws and, in

1792, the New York broker community negotiated the historic Buttonwood Agreement to form

the first organized stock market in New York.17 As the NYSE and other stock exchanges

developed, trading conventions became formalized as exchange rules. In 1817, the NYSE‘s

Constitution was adopted and the NYSE subsequently adopted a range of rules governing its

members and listed companies, including member financial responsibility rules and listed

company registration and financial reporting rules.18 In 1820, a detailed set of NYSE By-Laws

was adopted.19

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

24

Federal regulation of exchanges, and their formal recognition as self-regulatory

organizations, followed a number of significant events, including the stock market crash of 1929

and the evidence of NYSE investigatory failures related to market manipulation highlighted at

the 1934 Pecora Hearings.20 In Section 6 of the Exchange Act, Congress recognized the

regulatory role of exchanges, and required all existing securities exchanges, including the

NYSE, to register with the Commission and to function as self-regulatory organizations.21

The stock market crash of 1929 also severely damaged the public reputation of over-the-

counter (―OTC‖) securities dealers. In 1933, in an effort to improve their collective image, OTC

dealers formed the Investment Bankers Code Committee (―IBCC‖), which promulgated industry

best practices.22 In 1936, the IBCC was succeeded, by the Investment Bankers Conference

(―IBC‖), a prominent group of investment banks formed to act as a national, voluntary industry

organization.23

After experience with the IBCC and the IBC, the Commission and leaders of the

investment banking community generally agreed that an industry association needed official

legal status in order to effectively carry out the task of self-regulating the OTC market.24

Ultimately, in 1938, the Maloney Act amended the Exchange Act by adding a new Section 15A

and establishing the concept of registered national securities association SROs.25 To date, the

NASD and the NFA26 are the only registered national securities associations.

In enacting these provisions, Congress concluded that self-regulation of both the

exchange markets and the OTC market was a mutually beneficial balance between government

and securities industry interests.27 Through establishment of self-regulation, the securities

industry was supervised by an organization familiar with the nuances of securities industry

operations. In addition, industry participants preferred the less invasive regulation by their peers

to direct government regulation and the government benefited by being able to leverage its

resources through its oversight of self-regulatory organizations.28 Moreover, the SROs had the

ability to set proscriptive standards relating to just and equitable principles of trade and detailed

business conduct standards.29 In enacting the Maloney Act in 1938, Congress stated that an

approach to securities regulation relying solely on government regulation "would involve a

pronounced expansion of the organization of the Securities and Exchange Commission; the

multiplication of branch offices; a large increase in the expenditure of public funds; an increase

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25

in the problem of avoiding the evils of bureaucracy; and a minute, detailed, and rigid regulation

of business conduct by law."30

The legislative history of the 1975 Amendments noted that, rather than adopt this purely

governmental approach, Congress determined that it was "distinctly preferable" to rely on

"cooperative regulation, in which the task will be largely performed by representative

organizations of investment bankers, dealers, and brokers, with the Government exercising

appropriate supervision in the public interest, and exercising supplementary powers of direct

regulation."31 Similarly, in 1975, Congress stated that a principal reason for retaining a self-

regulatory regime was the "sheer ineffectiveness of attempting to assure [regulation] directly

through the government on a wide scale," and that, although the SROs had not always

performed their role up to expectations, self-regulation generally was considered to have

worked well and "should be preserved and strengthened.‖32

The Commission has periodically examined the self-regulatory system and the extent to

which SROs have successfully fulfilled their statutory obligations.33 Such analysis has

sometimes resulted in SROs making changes to their structures or regulatory programs. For

example, after problems surfaced regarding the floor operations of Amex specialists, the

Commission sponsored the sweeping 1961-1963 Special Study.34 The Special Study concluded

that SROs have a natural tendency to protect member firms and that SRO regulatory operations

appear to falter without the ―pointed stimuli‖ of vigilant Commission oversight.35 Among other

conclusions, the Special Study found a need for a reduction in the amount of control that

exchange floor members exercised over exchange regulatory operations and governance.36

Moreover, the study called for a general strengthening of SRO governance.37

Another example of past analysis was the Commission‘s Division of Market Regulation

review of the structure and costs of the SRO system in the Market 2000 Report, which was

published by the Commission in 1994. The Market 2000 Report noted the impact that increasing

intermarket competition and duplicative SRO rules were having on the self-regulatory

system.38 In addition, the report discussed the extent to which costs to support the SRO system

were being fairly allocated across the markets.39 The report also examined the desirability of

reallocating the regulatory and market functions of SROs and the possibility of the Commission

assuming a greater role with respect to the functions carried out by the SROs.40 While the

opinion advanced in the Market 2000 Report was that such changes were unlikely to improve

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26

the existing SRO system, it did not foreclose the possibility of reconsidering this position in the

future in light of changed circumstances.41

Another example of past Commission analysis on this issue was in 1996 when the

Commission instituted administrative proceedings against the NASD with respect to OTC

market maker pricing collusion.42 At the same time, the Commission issued the 21(a) Report

regarding the NASD and Nasdaq. In the 21(a) Report, issued pursuant to Section 21(a) of the

Exchange Act, the Commission discussed at length a range of issues concerning the efficacy of

the self-regulatory system and the potential problems associated with inherent SRO conflicts.43

Of particular concern, in this case, was the lack of independence of the NASD regulatory staff

from Nasdaq‘s market operations.44

In sum, while Congress and the Commission have criticized and modified the SRO

system in the past, it has not been radically revised or dismantled since its establishment.

Rather, it is generally considered that the SRO system has functioned effectively and has served

government, industry, and investors well.45 Notwithstanding this positive record, because of

new considerations in our markets, the Commission believes it is an appropriate time to

reexamine and solicit public comment on the efficacy of the system overall.

III. New Considerations

In recent years, the U.S. markets have experienced increasingly vigorous competition.

The effect of this development is that markets operated by SROs have faced increased

competition from foreign trading markets and from electronic communications networks

(―ECNs‖) that have shifted significant amounts of market share away from the primary markets,

especially with respect to Nasdaq securities. For example, the NYSE and Amex historically

dominated trading in their listed securities, and market makers dominated trading in Nasdaq

stocks. Today, however, in the Nasdaq market, automated market centers (such as Nasdaq's

order collector, aggregator, and execution system, SuperMontage, the Archipelago exchange

(―ArcaEx‖), and the INET ECN) have captured more than 50% of share volume.46 For Amex-

listed stocks (for which approximately 39% of share volume now is represented by two

extremely active exchange-traded funds (―ETFs‖) – the QQQ and SPDR), Amex now handles

approximately 21% of the volume, with the remaining balance split among Arca-Ex, INET, and

others.47 The NYSE has managed to retain approximately 80% of the volume in its listed

stocks, but other market centers are raising the level of competition and reducing the NYSE‘s

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27

share of trading.48 Moreover, the NYSE and Amex have sought to add automated facilities that

are integrated with and complement their traditional exchange floors.49 In the listed options

markets, the proliferation of multiple trading of options and the entry of two new electronic

exchanges has raised the tempo of competition among these markets and redistributed their

market share.50

This heightened competition has benefited trading markets by spurring innovation in

trading systems and responsiveness to customers.51 It has also driven down costs, including

fees charged by the trading markets.52 At the same time, this competition places greater strains

on the self-regulatory system.53 Some industry observers have posited that trading previously

covered by one market‘s rules may move to another market in search of lower regulatory

standards.54 Others have argued that trading across markets may be subject to inconsistent rules

across several markets.55 Some have voiced concerns about falling market share inducing

SROs to reduce the rigor of their member and market supervision programs.56 Also, concerns

have been raised about SROs favoring key participants in their markets to encourage those key

participants to remain active in their markets or to attract other users.57 Shifts in market share

can undermine revenues supporting an SRO‘s regulatory functions, without reducing the SRO‘s

responsibility for supervision of its members trading across markets.58 Shifts in trading to

multiple markets also increase concerns about potential gaps in the surveillance of intermarket

trading.59

Other considerations also may alter the delicate balance of the SRO system. The

conversion of some SROs to publicly traded, for profit status may increase the actual or

perceived conflicts inherent in the SRO model.60 Likewise, numerous recent SRO failings

related to governance, member oversight and trading supervision raise significant concerns

about the efficacy of the self-regulatory model.61 Finally, in response to the recently proposed

Regulation NMS (―Reg NMS‖),62 commenters raised serious questions about the level of

market data fees, which are an important component of SRO revenues and the funding of self-

regulation.63 The Commission believes that it is an appropriate time to issue a concept release

to examine and solicit public comment on the extent to which recent developments in our

markets warrant changes to the current system.

IV. Current SRO System Attributes

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28

This discussion focuses on the following distinctive attributes of the existing SRO

system and explores how recent market changes have impacted them: (1) the inherent conflicts

of interest between SRO regulatory operations and members, market operations, issuers, and

shareholders; (2) the costs and inefficiencies of multiple SROs, arising from multiple SRO

rulebooks, inspection regimes, and staff; (3) the challenges of surveillance of cross market

trading by multiple SROs; and (4) the funding SROs have available for regulatory operations

and the manner in which SROs allocate revenue to regulatory operations.

1 15 U.S.C. 78o15(b)(8)

2 Analysis in this release focuses primarily on one registered national securities association SRO,

the National Association of Securities Dealers (―NASD‖) (including its subsidiary, the Nasdaq Stock Market

(―Nasdaq‖)), and those registered national securities exchange SROs that operate equity or options markets, the

American Stock Exchange (―Amex‖), the Boston Stock Exchange (―BSE‖), the Chicago Board Options Exchange

(―CBOE‖), the Chicago Stock Exchange (―CHX‖), the International Securities Exchange (―ISE‖), the National

Stock Exchange (―NSX‖) the New York Stock Exchange (―NYSE‖), the Pacific Exchange (―PCX‖), and the

Philadelphia Stock Exchange (―Phlx‖). Unless otherwise specifically noted, discussion in this release does not

necessarily relate to other registered SROs, including the National Futures Association (―NFA‖), the Municipal

Securities Rulemaking Board (―MSRB‖), the registered clearing agencies, and notice registered national securities

exchanges. 3 15 U.S.C. 78a et seq.

4 Pub. L. 75-719, 52 Stat. 1070 (1938) (codified as amended at 15 U.S.C. § 78o, authorizing the U.S. Securities and

Exchange Commission to register national securities associations). 5 Pub. L. 29, 89 Stat. 97 (1975).

6 See generally S. Rep. No. 1455, 73d Cong., 2d Sess. (1934); H.R. Doc. No. 1383, 73d Cong., 2d Sess. (1934); S.

Rep. No. 1455, 73d Cong., 2d Sess. (1934). 7 Id.

8 Id.

9 Id.

10 See e.g., 1961-1963 Special Study of Securities Markets. Securities and Exchange Commission, Report of

Special Study of Securities Markets, (―Special Study‖), H.R. Doc. No. 95, 88th Cong., 1st Sess. (1963) and Market

2000: An Examination of Current Equity Market Developments, Division of Market Regulation, U.S. Securities and

Exchange Commission (January 1994) (―Market 2000 Report‖). 11

See e.g., Id.; infra notes 30-31. 12

See generally infra Section IV. 13

Id. 14

Id. 15

Id. 16

Id. 17

Robert Sobel, The Big Board, A History of the New York Stock Market 14-27 (The Free Press 1965). The

agreement generally bound its signors to give preference to each other when buying and selling. Id. 18

Id. at 30-31. 19

Id. at 38-40. 20

Joel Seligman, The Transformation of Wall Street: A History of the Securities and Exchange Commission and

Modern Corporate Finance at 1-38 (Aspen Pub. N.Y. 3rd ed. 2003). 21

Exchange Act Section 6, 15 U.S.C. 78f. 22

Seligman at 183-85. 23

The IBC, however, proved to be imperfect, because only seventeen hundred of the nation‘s six thousand

securities dealers ultimately joined. While the Commission realized that this voluntary organization was not

effectively regulating the OTC market, it also determined that direct Commission regulation of the OTC market

was not practicable. See Seligman at 183-85. While not speaking for the whole Commission, one early

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29

Commissioner compared the prospect of regulating the OTC market to building a structure out of sand because

―there is no cohesive force to hold it together, no organization with which [the Commission] could build, as

authoritatively representing a substantial element in the over-the-counter business.‖ Id. 24

Id. 25

Exchange Act Section 15A, 15 U.S.C. 78o-3 26

NFA is a national securities association registered for the limited purpose of regulating the activities of members

who are registered as brokers or dealers in security futures products under Section 15(b)(11) of the Exchange Act,

15 U.S.C. 78o(b)(11). 27

See supra notes 6-9. 28

Id. 29

Market 2000 Report at VI-6. 30

S. Rep. No. 1455, 75th

Cong., 3d Sess. I.B.4. (1938).; H.R. Rep. No. 2307, 75th

Cong., 3d Sess. I.B.4. (1938)

(duplicate text quoted in both reports). 31

S. Rep. No. 94-75, 94th

Cong., 1st Sess. 7, II (1975).

32 Id.

33 See e.g., supra note 10. In addition, the Commission speaks implicitly and explicitly to self-regulatory concepts in

virtually every SRO rule that is noticed for public comment and approved through the Commission Rule 19b-4

rulefiling process. SEC Rule 19b-4, 17 CFR 240.19b-4. 34

Specialist domination of the Amex resulted in a series of scandals in the late 1950s involving market

manipulations. In 1961, the Commission launched an investigation into the trading practices of two Amex

specialists in particular. This investigation was ultimately broadened into the Special Study. See Seligman at 281-

86. 35

See generally Seligman at 299-348. 36

Id. 37

Id. Congress recognized that self-regulators may not always be as diligent as desired, and, indeed, may use self-

regulation as a device to avoid regulation altogether. Nonetheless, Congress also was of the view that members of

the securities industry could bring down to bear on the problems of regulation a degree of expertise and, in many

circumstances, expedition not expected of a necessarily more remote governmental agency. Special Study at 693-

697. 38

See Market 2000 Report at III-1. 39

Id. at III-3. 40

Id. at III-5-7. 41

Id. at III-10. See also infra Section IV. 42

See In the Matter of National Association of Securities Dealers, Inc.; SEC Release No. 34-37538, August 8,

1996; Administrative Proceeding File No. 3-9056 (―21(a) Administrative Order‖). See also Report and Appendix to

Report Pursuant to Section 21(a) of the Securities Exchange Act of 1934 Regarding the NASD and The Nasdaq

Stock Market (August 8, 1996) and Securities Exchange Act Release No. 37538 (August 8, 1996) (―21(a) Report‖).

The undertakings were included in the SEC Order (―21(a) Report Undertakings‖). 43

See 21(a) Administrative Order Section III; 21(a) Report at 40-47. 44

See 21(a) Administrative Order Section III; 21(a) Report at 52-54. 45

See e.g., supra note 10. 46

The figure is based on Nasdaq/UTP Plan market data (as of September 2004). 47

The figure is based on Network B, CTS Activity market data (as of September 2004). 48

The figure is based on Network A, CTS Activity market data (as of September 2004). See also e.g., Ivy

Schmerken, Will the NYSE‟s Specialist Probe Open the Listed Market to ECNs?, Wall Street + Technology, July 1,

2003, at 18; Robert Sales, The Big Picture – ECN Evolution, Wall Street + Technology, February 1, 2003, at 6. 49

See Securities Exchange Act Release Nos. 50173 (August 10, 2004), 69 FR 50407 (August 16, 2004) (notice of

proposed rule change proposing improvements to NYSE‘s existing automatic execution facility, NYSE Direct+®);

and 49921 (June 25, 2004), 69 FR 40690 (July 6, 2004) (approval of proposed rule change by Amex to enhance its

Auto-Ex technology for exchange-traded funds and Nasdaq stocks traded on the exchange). 50

In August 1999, 32% of equity options were traded on more than one exchange. By September 2000, that number

had risen to 45%. Over the same period, the percentage of aggregate option volume traded on only one exchange

fell from 60% to 15%. See Exchange Act Release No. 43085 (July 28, 2000), 65 FR 47918 (August 4, 2000)

(proposing to extend Exchange Act Rule 11Ac1-1 to options). According to the Options Clearing Corporation, by

September 2003, 98.3% of equity options classes traded on more than one exchange. As of December 2003, the

market shares held by options exchanges were 31.3% by the CBOE, 27.0% by the ISE, 19.8% by the Amex, 12.4%

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

30

by the Phlx, and 9.5% by the PCX. Options Clearing Corporation, 2003 Annual Report 1 (2004). By June of 2004,

the ISE‘s market share was 33.6%, the CBOE‘s was 26.0%, the Amex‘s was 18.6%, the Phlx‘s was 11.6%, the

PCX‘s was 8.4% , and the BSE Boston Options Exchange (―BOX‖) facility‘s was 1.8%. Will Acworth, Electronic

Trading Sweeps Options Industry, Futures Industry Magazine, September/October 2004 (citing Futures Industry

Association statistics). 51

See generally infra Section IV. 52

Id. 53

Id. 54

Id. 55

Id. 56

Id. 57

Id. 58

Id. 59

Id. 60

Id. 61

See In the Matter of Chicago Stock Exchange, Securities Exchange Act Release No. 48566 (September 30, 2003).

See also In the Matter of Bear Wagner Specialists LLC, Securities Exchange Act Release No. 49498 (March 30,

2004); In the Matter of Fleet Specialist, Inc., Securities Exchange Act Release No. 49499 (March 30, 2004); In the

Matter of LaBranche & Co. LLC, Securities Exchange Act Release No. 49500 (March 30, 2004); In the Matter of

Spear, Leeds & Kellogg Specialists LLC, Securities Exchange Act Release No. 49501 (March 30, 2004); In the

Matter of Van der Moolen Specialists USA, LLC, Securities Exchange Act Release No. 49502 (March 30, 2004).

See In the Matter of SIG Specialists, Inc., Securities Exchange Act Release No. 50076 (July 26, 2004) and In the

Matter of Performance Specialist Group LLC, Securities Exchange Act Release No. 50075 (July 26, 2004). See

also Securities Exchange Act Release No. 48946 (December 17, 2003), 68 FR 74678 (December 24, 2003)

(approving NYSE proposal to restructure NYSE corporate governance structure). 62

See Exchange Act Release No. 49325 (February 26, 2004), 69 FR 11126 (March 9, 2004) (noticing proposed

rulemaking for comment); Exchange Act Release No. 49749 (May 20, 2003), 69 FR 30142 (May 26, 2004)

(extending comment period and seeking additional comments). 63

See infra Section IV.

Consulta Pública - EDITAL DE AUDIÊNCIA PÚBLICA SDM Nº 05/13

1

EDITAL DE AUDIÊNCIA PÚBLICA SDM Nº 05/13

Prazo: 12 de agosto de 2013 Objeto: Convite para apresentação de manifestações sobre as opções regulatórias relacionadas à

identificação, à mitigação, ao gerenciamento de riscos decorrentes da fragmentação de liquidez e de

dados e à possível mudança na estrutura de autorregulação, tendo em vista a hipótese de

concorrência entre plataformas de negociação.

1. Objetivo da Consulta

A introdução no Brasil de concorrência entre ambientes de negociação de ações não envolve apenas

o eventual ingresso de novos prestadores de serviços, mas também a adequação do arcabouço

regulatório hoje existente para lidar com os novos desafios daí decorrentes.

Assim, a CVM está avaliando algumas opções regulatórias relacionadas à identificação, mitigação e

gerenciamento de riscos que podem advir da fragmentação de liquidez e de dados, além da

possibilidade de mudanças na atual estrutura de autorregulação.

O objetivo desta consulta é coletar, junto aos participantes do mercado e às partes interessadas,

reflexões fundamentadas, dados, informações e estudos relacionados aos tópicos acima

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31

mencionados, para que a CVM siga na sua avaliação sobre questões conceituais de maneira mais

informada.

Dada a natureza dessa consulta, a CVM não irá elaborar relatório para avaliar as manifestações

recebidas.

2. Introdução

No final de 2011, a CVM comunicou ao mercado que a empresa internacional de consultoria Oxera

Consulting Ltd. (Oxera) entregaria à Autarquia um estudo econômico sobre eficiência do mercado

acionário brasileiro.

O referido estudo, denominado ―Quais seriam os custos e benefícios para mudar a estrutura

competitiva do mercado para serviços de negociação e pós-negociação no Brasil?‖ 1, analisou

questões ligadas à estrutura do mercado brasileiro de ações, tendo em vista as tendências observadas

em outros países, como a de concorrência entre diferentes ambientes de negociação nas transações

com ações. 1 ―What would be the costs and benefits of changing the competitive structure of the market for trading and

post-trading services in Brazil‖. 2

Além da análise sobre a eventual necessidade de adoção de medidas adicionais pela CVM para

promover a eficiência do mercado acionário brasileiro no que diz respeito à sua estrutura, sob a ótica

dos benefícios econômicos líquidos, foi solicitado à Oxera que abordasse algumas questões

inerentes a um cenário de múltiplos ambientes de negociação, tais como a fragmentação da liquidez,

os custos decorrentes de novas infraestruturas necessárias para a difusão de informações e para a

efetiva supervisão dos mercados e eventuais questões de acesso para participantes.

Em junho de 2012, ao receber os resultados do estudo da Oxera, a CVM realizou uma reunião de

seu Colegiado com participantes do mercado diretamente interessados e afetados para discutir as

implicações de um cenário de concorrência nos serviços de negociação e pós-negociação.

A reunião, que também foi transmitida por webcast2, tinha por base as conclusões e recomendações

do estudo e foi uma primeira interação da CVM com participantes do mercado com a finalidade de

coletar subsídios para o início de uma análise mais aprofundada da matéria. 2As apresentações e os debates estão disponibilizados no Canal Educacional da CVM no Youtube

(www.youtube.com/cvmeducacional). Além das opções regulatórias sobre a infraestrutura de pós-negociação, a Oxera, em suas

conclusões, recomendou que a CVM iniciasse estudos sobre o desenvolvimento de uma estrutura

regulatória capaz de assegurar o bom funcionamento do mercado em caso de existência de múltiplos

ambientes de negociação. Nesse sentido, a CVM vem se organizando para abordar esses outros

aspectos.

A análise e a preparação da CVM, segundo as conclusões do estudo, seriam necessárias mesmo

antes da chegada da concorrência, ainda que as novas regras não fossem implementadas até a efetiva

entrada de um concorrente.

Parte desses aspectos diz respeito à mitigação de riscos que a eventual introdução de concorrência

pode trazer. Com base em arcabouço teórico, em estudos empíricos e nas experiências

internacionais, a consultoria destacou que a introdução da concorrência poderá beneficiar o mercado

e a sociedade brasileira. No entanto, ela também poderá representar desafios ao cumprimento, pela

CVM, de seu mandato de assegurar proteção contínua aos investidores, formação eficiente de preços

e integridade do mercado.

Os riscos decorrem particularmente das fragmentações de liquidez e de dados, bem como de

dificuldades para a supervisão de múltiplos ambientes de negociação. 3

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32

Para mitigar esses riscos, o estudo recomenda: a) o desenvolvimento de um regime de melhor

execução (best execution); b) a consolidação de dados de todos os ambientes de negociação

concorrentes por meio de uma solução como a da chamada ―fita consolidada‖ (consolidated tape);

e c) mudanças na estrutura de autorregulação e de autorregulamentação, como por exemplo, a

incorporação, pela CVM, de algumas atividades hoje exercidas pela estrutura de autorregulação da

única bolsa em funcionamento no país.

Em função de existirem modelos diferentes para o tratamento dos pontos anteriormente

mencionados, a CVM deseja, por meio dessa consulta pública, convidar os participantes do mercado

e outras partes interessadas a apresentarem reflexões fundamentadas, dados, informações,

evidências e estudos para que a Autarquia possa avaliar os modelos conceitualmente mais

apropriados ao nosso mercado.

A CVM entende que a análise desses diferentes modelos é crítica, pois é necessária uma solução que

não aumente o nível de risco existente na presente estrutura de mercado.

As respostas dos participantes devem levar em consideração a negociação de uma mesma ação

somente em bolsas ou somente em mercados de balcão organizado. Isso porque, no presente

momento, a CVM optou por uma abordagem mais gradual, em que se mantém o marco regulatório

atual, que apenas permite a concorrência entre bolsas ou entre mercados de balcão organizado para

as transações com ações.

A introdução simultânea de uma nova estrutura regulatória e de concorrência entre os dois diferentes

tipos de mercado (bolsa e mercado de balcão organizado) poderia trazer novos riscos, de difícil

identificação neste momento – as discussões sobre o regime de melhor execução e sobre a fita

consolidada, por exemplo, envolveriam complexidades muito maiores, caso sejam mantidas as

soluções hoje adotadas.

O Edital detalha a seguir os principais pontos para os quais a CVM pretende receber subsídios dos

participantes, e formula perguntas específicas que devem nortear as manifestações a serem

encaminhadas.

3. Melhor execução no interesse dos clientes (best execution)

A existência de um regime de best execution busca mitigar conflitos de interesses que possam

surgir na execução de ordens dos clientes pelos intermediários, assegurando que as ordens serão

executadas no melhor interesse dos clientes e nas melhores condições para estes, mesmo existindo

mais 4

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33

de um sistema de negociação e uma eventual divergência, ainda que temporária, entre os preços

praticados em cada sistema.

O regime de best execution não é novidade no Brasil. Os arts. 19 e 20 da Instrução CVM nº 505, de

27 de setembro de 20113, que trata de normas e procedimentos a serem observados nas operações

realizadas com valores mobiliários em mercados regulamentados, já preveem que as ordens dos

clientes devem ser executadas no seu melhor interesse, incorporando algumas das feições típicas das

regras de best execution que vigoram em outros mercados. 3 A Instrução CVM nº 387, de 28 de abril de 2003, aliás, já tratava da matéria.

4 Na página 82 de seu relatório, a Oxera afirma que, caso as ordens para um ambiente de negociação não sejam fechadas

automaticamente com o melhor preço disponível entre todos os ambientes, então os intermediários (bem como os

investidores finais) incorrerão em maiores custos para localizar o melhor preço disponível, podendo a concorrência

(que representa, a rigor, uma fragmentação de volume) levar à fragmentação de liquidez para aqueles que não

tiverem acesso a todos os ambientes. No entanto, com base na experiência internacional, o estudo da consultoria Oxera apontou que, em

outros países, foram necessários ajustes nas normas de best execution quando da passagem do

cenário de uma única bolsa para o de múltiplas bolsas.

Quando os valores mobiliários são negociados apenas em uma bolsa, questões de ―como, onde,

quando e a que preço‖ os intermediários devem executar as ordens são resolvidas de maneira

relativamente simples. Contudo, na hipótese de coexistência de diversos ambientes, as normas

tendem a ser mais complexas e a demanda para o regulador garantir o seu cumprimento torna-se

muito maior.

Além de assegurar a melhor execução para o cliente, o desenho do regime de best execution está

intimamente relacionado ao grau de fragmentação de liquidez de um mercado4. A fragmentação de

liquidez pode ser mitigada, caso os investidores tenham acesso à liquidez dos diferentes ambientes

de negociação, por meio de um regime de best execution que conduza à execução de suas ordens

considerando todos os ambientes de negociação. Dessa forma, indiretamente, o investidor estará

acessando a liquidez geral do mercado e não apenas a liquidez isolada de um único ambiente, com

efeitos sobre a formação eficiente de preços.

Embora haja diversos pontos em comum entre os diferentes regimes de best execution, reguladores

de outros países adotaram modelos bastante diversificados, com variados graus de abrangência de

pessoas cobertas, cadeias de responsabilidades e fatores/critérios para definição de best execution.

Além disso, existem diferenças no nível de detalhamento sobre a política de best execution dos

intermediários e dos reportes aos clientes sobre a observância das regras.

3.1 Fatores e critérios do regime de best execution 5

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34

O art. 19 da Instrução CVM nº 505, de 2011, dispõe que o intermediário deve executar as ordens nas

condições indicadas pelo cliente ou, na falta de indicação, nas melhores condições que o mercado

permita.

Além disso, o parágrafo único deste artigo determina que para aferir as melhores condições para a

execução de ordens, o intermediário deve levar em conta o preço, o custo, a rapidez, a probabilidade

de execução e liquidação, o volume, a natureza e qualquer outra consideração relevante para

execução da ordem. Esses seriam, no presente contexto os ―fatores‖ para a melhor execução.

Nos Estados Unidos, o regime de melhor execução leva em consideração vários fatores, porém, na

prática, o preço do ativo é o fator preponderante na maioria das transações, em função do disposto

na Rule 611 do National Market System (NMS), conhecida como Order Protection Rule. O

regime criado por essa norma, como se verá adiante, acaba por fazer que um ambiente de

negociação roteie uma ordem para outro ambiente, caso neste último haja uma oferta melhor.

Na Europa, o regime de melhor execução é definido como a obtenção do melhor resultado possível

em termos de preço, velocidade e probabilidade de execução e de liquidação. Também são

considerados, o tamanho e a natureza da ordem. Os diversos fatores passíveis de consideração

quando do cumprimento de uma ordem devem ser julgados segundo determinados critérios, tendo

em vista a produção do melhor resultado.

Perguntas: (i) Quais seriam os fatores a serem levados em conta em uma regra de best execution, considerando

a existência de diversas bolsas concorrentes? Por quê?

(ii) Seria desejável o estabelecimento de critérios/parâmetros para a verificação do cumprimento da

execução das ordens? Caso positivo, quais poderiam ser esses critérios/parâmetros? Por quê? Caso

negativo, por que não seria apropriada a definição de critérios/parâmetros?

3.2 Diferenciação de fatores por perfil do investidor Certas jurisdições optaram por estabelecer fatores diferenciados para verificação do best execution,

conforme o perfil do investidor. Na Austrália, por exemplo, o fator total consideration (incluindo

preço do ativo, custos de execução e outros custos pagos a terceiros envolvidos na transação) foi

considerado 6

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35

apropriado para investidores de varejo, enquanto que, para investidores profissionais, outros fatores

podem ser utilizados pelos intermediários.

Adicionalmente, em várias jurisdições, certos investidores não estão, ou podem optar por não estar,

cobertos pela política de best execution do intermediário. Por exemplo, alguns investidores que

apenas utilizam a infraestrutura do intermediário, operando diretamente nos ambientes de

negociação, podem ser excetuados, pelos intermediários, de sua política de best execution.

Perguntas: (i) Seria oportuno a CVM adotar diferentes fatores de best execution, tendo em vista que diferentes

perfis de investidores podem ter estratégias distintas de negociação? Por exemplo, investidores de

varejo, institucionais, aqueles que operam por meio de acesso direto ao mercado (DMA) ou ainda os

investidores de alta frequência (HFT)?

(ii) Em caso afirmativo, indicar quais os fatores e os critérios mais apropriados para cada perfil de

investidor ou tipo de ordem e as razões para tal?

3.3 Conexão e roteamento de ordens Best execution, em um cenário de múltiplas bolsas, implica a conexão dos intermediários com os

diversos ambientes de negociação e a utilização de ferramentas para roteamento das ordens

recebidas, de acordo com as especificações que melhor atendam ao interesse do investidor.

Nos Estados Unidos, em certa medida, a obrigação de best execution foi estendida para os próprios

ambientes de negociação por meio do Order Protection Rule. Essa norma proíbe um ambiente de

negociação de executar uma ordem em seu mercado, caso haja uma cotação mais favorável em outro

ambiente de negociação. Em função disso, há o roteamento de ordens pelos próprios ambientes de

negociação.

Perguntas: (i) A adoção de um regime de best execution, em cenário de concorrência entre bolsas, implicaria

em mudanças relevantes nos sistemas ou procedimentos dos intermediários? 7

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

36

(ii) Quais seriam os desafios para os intermediários se conectarem aos diversos ambientes e

realizarem o roteamento de ordens, por exemplo, em relação a custos e estrutura tecnológica? Nas

respostas, é desejável a descrição das mudanças necessárias e, se possível, estimativas de custos.

(iii) Seria apropriado estabelecer previsões para os administradores de mercado no sentido de

estarem também sujeitos ao regime de best execution, nos moldes da Order Protection Rule?

Quais seriam os desafios e benefícios dessa opção?

(iv) Fornecer quaisquer comentários adicionais sobre o regime de best execution e mecanismos de

mitigação do risco de fragmentação de liquidez que julgar relevantes.

4. Consolidação dos dados de pré-negociação e pós-negociação

No cenário de múltiplas bolsas ou de múltiplos mercados de balcão organizado, a fragmentação de

dados ocorre naturalmente, uma vez que cada ambiente de negociação terá os seus próprios dados

sobre as ofertas e as negociações executadas.

O acesso aos dados pré-negociação e pós-negociação são importantes para os participantes do

mercado obterem uma visão acurada sobre as condições que afetam a sua atuação e determinam a

tomada de suas decisões. A International Organization of Securities Commissions (IOSCO)

considera tais dados centrais para a equidade e a eficiência do mercado, e em especial na promoção

de liquidez e qualidade da formação dos preços5. 5 Transparency and market fragmentation, pg 3, Technical Committee of IOSCO, Nov 2001. Em cenário de múltiplos mercados, o acesso aos dados fragmentados de cada um dos ambientes de

negociação não é suficiente e o acesso aos dados consolidados pode revelar-se caro ou a sua

consolidação requerer muito tempo. Segundo o estudo da Oxera, o custo de acessar informações

consolidadas ―pode ser proibitivo para alguns participantes do mercado, especialmente investidores

de varejo ou fundos menores‖.

São várias as razões que podem causar o encarecimento do acesso a informações consolidadas. A

consolidação por conta própria, por exemplo, requer a implementação e manutenção de sistemas

próprios que capturem e processem as informações de cada ambiente de negociação. Por outro lado,

quando ela é deixada a cargo de provedores de informações, estes podem vincular a venda desse

serviço à contratação de outros serviços prestados. 8

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37

Para ambientes de negociação multilaterais, a Instrução CVM nº 461, de 23 de outubro de 2007, já

requer a transparência pré-negociação e pós-negociação para cada um dos ambientes, não existindo,

contudo, nenhuma disposição visando à consolidação dos dados de diferentes ambientes de

negociação.

Segundo a Oxera, inicialmente a consolidação de dados foi deixada para os próprios participantes do

mercado nos Estados Unidos, na Europa e no Canadá. Porém, mais recentemente, foi introduzida

nos Estados Unidos e no Canadá uma estrutura centralizada de consolidação, enquanto que, na

Europa, a consolidação de dados é oferecida por vendors ou realizada pelo próprio participante.

Em consulta pública de 2010, a Australian Securities and Investments Commission (ASIC)

sugeriu 3 (três) opções para a consolidação de dados: a) por múltiplos vendors aprovados pela

ASIC; b) por um único consolidador por meio de processo licitatório; e c) por uma entidade

governamental ou da indústria com caráter de utilidade pública.

A ASIC manifestou clara preferência pelas 2 primeiras alternativas, em que o(s) consolidador(es)

necessariamente ofereceria(m) a fita consolidada (pré e pós-negociação) como produto separado do

restante dos serviços por ele(s) oferecidos. Após a consulta pública, a ASIC decidiu-se pela primeira

alternativa, ou seja, pela prestação do serviço por agentes privados, em regime de concorrência,

sujeitos, porém, a autorização específica.

No caso da Austrália, ademais, a fita consolidada, independentemente de quem fosse(m) o(s)

consolidador(es), seria utilizada pela ASIC como referência para o cumprimento de regime de best

execution e para propósitos de monitoramento e supervisão de mercado.

Perguntas: (i) Qual seria a melhor forma de implementar a fita consolidada no Brasil? Um único ou diversos

consolidadores? Por quê?

(ii) No caso de uma única entidade funcionar como consolidador central, como essa entidade

poderia ser estabelecida? No caso dos consolidadores serem os vendors, quais deveriam ser os

requisitos mínimos para o seu reconhecimento pela CVM?

(iii) Haveria alguma questão de ordem operacional que deveria ser avaliada sob a perspectiva dos

usuários e sob a perspectiva do(s) consolidador(es) reconhecido(s) pela CVM, considerando a

desvinculação do serviço de fornecimento de informações consolidadas de outros serviços

prestados? 9

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38

(iv) Quais seriam os custos relevantes para o(s) consolidador(es)? Favor apresentar estimativas.

(v) Administradores de mercado deveriam poder cobrar pelo fornecimento de dados sobre cotações

e ordens executadas ao(s) consolidador(es)?

(vi) Administradores de mercado deveriam poder exercer o papel de consolidadores?

(vii) Fornecer quaisquer comentários adicionais sobre fita consolidada e consolidadores que julgar

relevantes.

5. Supervisão, autorregulação e normatização

De acordo com a Oxera, as atividades de supervisão de mercado, de autorregulação e mesmo de

normatização efetuadas pelos autorreguladores (administradores de mercado) tendem a ser

repensadas em função da introdução de concorrência.

Em suas conclusões, a consultoria afirma que a experiência dos mercados internacionais sugere que

mudanças nessas estruturas devem ser analisadas pela CVM, uma vez que o elevado grau de

autorregulação existente hoje pode não ser apropriado, considerando o cenário de diversas bolsas

concorrentes.

Em relação à supervisão, a introdução de concorrência pode trazer diversas implicações, entre elas a

demanda por sistemas de informação e pessoal com qualificação diferente da situação em que há

uma única bolsa operando. A supervisão torna-se mais complexa, uma vez que passa a haver

dispersão de negociações em diferentes ambientes e a visão e a atuação dos autorreguladores na

estrutura atual, por mais diligentes que eles sejam, tendem a ser também fragmentadas.

Do lado da regulamentação, com o objetivo de coordenar diversos mercados, a experiência

internacional também mostrou a necessidade de o regulador tomar para si a tarefa de harmonização

e uniformização de regras que anteriormente, inclusive pelo seu grau de detalhamento, eram

definidas pela única plataforma de negociação existente (ainda que sujeitas à aprovação prévia do

regulador), a fim de manter a eficiência e integridade dos mercados, evitar a concorrência predatória

e mitigar riscos sistêmicos.

A Instrução CVM nº 461, de 2007, editada no contexto da desmutualização da Bovespa, BM&F e

Cetip, representou um grande avanço no arcabouço regulatório vigente, ao disciplinar de forma

completa 10

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39

e abrangente a constituição, organização e funcionamentos das bolsas e dos mercados de balcão

organizados.

No Edital de audiência pública nº 06/2007, que resultou na Instrução CVM nº 461, de 2007, a CVM

destacou ―o esforço feito para que a minuta não adentrasse em detalhes muito específicos da matéria

que se propõe a regular, procurando-se, ao invés, o alinhamento com uma postura baseada em

princípios... Essa abordagem baseada em princípios, entretanto, não foi perseguida com um fim em

si mesmo, tendo sido deixada de lado ocasionalmente, em benefício daquilo que, neste primeiro

momento, nos tenha parecido melhor ao funcionamento dos mercados...‖

Dentro desse contexto, por exemplo, os arts. 15 e 17 da Instrução CVM nº 461, de 2007, atribuíram

à entidade administradora de mercados a definição das regras de funcionamento dos mercados por

ela administrados e a determinação das regras de admissão e permanência das pessoas autorizadas a

negociar, bem como as normas de conduta aplicáveis a elas, procurando-se, o menos possível,

estabelecer regras mais objetivas.

Por sua vez, o art. 42 determinou que cada entidade administradora deveria manter o seu

departamento de autorregulação. A esse departamento caberia, entre outros, fiscalizar as operações

realizadas nos mercados administrados pela entidade, fiscalizar as pessoas autorizadas a operar, de

forma direta e ampla, podendo, no exercício das suas atividades, exigir dessas pessoas informações

necessárias ao exercício de sua competência (por exemplo, auditorias), e conduzir processos

administrativos disciplinares para apurar as infrações das normas que lhe incumbe fiscalizar.

Na época, o debate sobre autorregulação se deu no contexto de conflito de interesses entre as

atividades de uma bolsa que vise ao lucro e as atividades de autorregulação dessa mesma bolsa.

No Edital de audiência pública referido anteriormente, a CVM expôs a sua convicção nas atividades

de autorregulação do mercado pelos administradores de mercado de bolsa ou balcão organizado. O

Edital afirmou que ―uma regulação que imponha a independência, o financiamento adequado e a

atuação efetiva da autorregulação, aliada aos riscos impostos ao mercado no caso de falhas de

autorregulação (inclusive, no extremo, de cassação da autorização para funcionar), constituem

incentivos adequados para que os administradores de mercados e os sócios das sociedades que

explorem esses mercados atuem de maneira adequada no exercício de suas funções

autorreguladoras, sempre sob a supervisão atenta do regulador‖.

O debate daquela época foi superado pela prática e pelo aprendizado desses anos, e não obstante os

avanços que obtivemos no Brasil, o estudo da Oxera traz uma reflexão de diferente natureza sobre o

modelo de autorregulação adotado pela CVM. Isto é, a reflexão oportuna nesse momento diz

respeito à 11

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40

extensão da eficácia e às limitações da autorregulação exercida individualmente por cada

administrador de mercado, na hipótese de haver diversas bolsas concorrentes.

Perguntas: (i) Quais seriam os aspectos positivos ou negativos da estrutura atual de autorregulação, em

existindo diversas bolsas concorrentes?

(ii) Considerando a hipótese de diversas bolsas concorrentes, a estrutura atual de autorregulação

seria adequada?

Caso a resposta seja afirmativa:

(ii.a) Apresente razões, considerando as preocupações mencionadas anteriormente. Considerando a

hipótese de várias bolsas, a constituição de múltiplos departamentos de autorregulação afetaria as

suas atividades? Como? Considerando o ambiente de múltiplos mercados, quais seriam os pontos

mais relevantes que necessitariam de atuação integrada entre os autorreguladores, bem como entre

os departamentos de autorregulação? Como a autorregulação de cada entidade do mercado poderia

se organizar conjuntamente, de forma a continuar exercendo o papel de auxiliar da CVM na

supervisão do mercado como um todo?

Caso a resposta seja negativa:

(ii.b) Qual seria a estrutura mais adequada? Fundamente a resposta. No caso de indicar a

centralização de algumas atividades hoje sob um único autorregulador, que salvaguardas

precisariam ser consideradas? A estrutura proposta implicaria custos adicionais para a sua atividade?

A organização da estrutura proposta implicaria em que tipos custos de implantação e manutenção?

Como eles deveriam e poderiam ser financiados?

(iii) Fornecer quaisquer comentários adicionais sobre estrutura de autorregulação que julgar

relevantes.

6. Encaminhamento de sugestões e comentários

As respostas e comentários devem ser encaminhados, por escrito, até o dia 12 de agosto de 2013 à

Superintendência de Desenvolvimento de Mercado, preferencialmente pelo endereço eletrônico 12

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41

[email protected] ou para a Rua Sete de Setembro, 111, 23º andar, Rio de Janeiro – RJ,

CEP 20050-901.

Após o envio dos comentários ao endereço eletrônico especificado acima, o participante receberá

uma mensagem de confirmação gerada automaticamente pelo sistema.

As menções a outras normas, nacionais ou internacionais, devem identificar número da regra e do

dispositivo correspondente.

As respostas e comentários que não estejam acompanhadas de fundamentação, dados e evidências

ou que claramente não tenham relação com o objeto proposto não serão considerados nesta

audiência.

As respostas e comentários recebidos pela CVM serão considerados públicos e disponibilizados na

íntegra, após o término do prazo da audiência pública, na página da CVM na rede mundial de

computadores.

Rio de Janeiro, 13 de junho de 2013. Original assinado por

ANTONIO CARLOS BERWANGER

Superintendente de Desenvolvimento de Mercado

Em Exercício Original assinado por

LEONARDO P. GOMES PEREIRA

Presidente

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42

4.1. Aula 3. Os Valores Mobiliários

O "valor mobiliário" é um termo chave dentro da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de

1976. Se um determinado título for considerado valor mobiliário, sua emissão e negociação

públicas passam a estar sujeitas às normas e a fiscalização da Comissão de Valores Mobiliários.

Antes da Lei 6.385, que criou a Comissão dos Valores Mobiliários, as operações

envolvendo valores mobiliários eram regulados pelo Banco Central do Brasil, na forma da Lei

4.728 de 1975. No entanto, para que se defina quais operações devem ser reguladas, é

necessário que se defina primeiramente o que é um valor mobiliário. A lei 4.728 não definia o

que era um valor mobiliário. Mas, como este mercado era ainda incipiente no Brasil, isto não

chegou a causar grandes problemas.

Na promulgação da Lei 6.385/76, com vistas a demarcar a competência da Comissão de

Valores Mobiliários de forma a evitar conflitos de competência com o Banco Central, o

legislador brasileiro pela primeira vez definiu o que eram valores mobiliários. Para tal fim, usou

da técnica europeia de definição dos valores mobiliários, fixando uma lista exaustiva dos

valores mobiliários. Ainda, foi conferido ao Conselho Monetário Nacional competência para

alterar esta lista, atribuindo assim flexibilidade ao sistema.

Ou seja, os valores mobiliários eram apenas aqueles taxativamente listados em lei; todos

os outros ativos financeiros seriam regulados pelo Banco Central. Assim, seriam evitados

conflitos de competência entre os órgãos reguladores, e haveria previsibilidade no mercado,

para que este pudesse se desenvolver com segurança. No entanto, a opção por uma lista fechada

errou por não estabelecer uma definição legal devia ser ampla, capaz de se adequar às

constantes inovações e mutações do mercado de forma rápida.

Dando-se conta desta deficiência do mercado, o governo federal editou a Medida

Provisória nº 1.637, de 8 de janeiro de 1998, posteriormente transformada na Lei 10.198 de 14

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43

de fevereiro de 2001, que procurou estabelecer um conceito amplo de "valor mobiliário", apto a

abarcar praticamente todas as hipóteses de captação em massa da poupança popular.

A medida provisória buscou adotar a técnica americana de definição de valores

mobiliários. Nos Estados Unidos, o Securities Act e o Securities and Exchange Act de 1933

criaram a Securities and Exchange Comission, equivalente americana à Comissão de Valores

Mobiliários brasileira, e estabeleceram a sua competência. A competência de tal órgão seria a

regulamentação e fiscalização de operações que envolvessem os valores mobiliários

(securities)21. Dentre outros, os valores mobiliários envolveriam os chamados investment

contracts, cuja definição não foi estabelecida pelo legislador.

Como a legislação americana não definiu o que são investment contracts, coube à

Suprema Corte Americana fazê-lo. No clássico caso SEC v. W. J. Howey Company,

estabeleceu-se qual seria esta definição. O caso tratava-se de uma companhia que vendia lotes

de terra para plantio, por meio de um contrato em que o comprador não só adquiria a

propriedade sobre o lote de terra, mas também contratava uma prestadora de serviços que se

encarregaria do plantio em tais lotes. Conforme o entendimento da Suprema Corte Americana, a

definição de contrato de investimento seria:

―For purposes of the Securities Act, an investment contract (undefined by the Act)

means a contract, transaction, or scheme whereby a person invests his money in a common

enterprise and is led to expect profits solely from the efforts of the promoter or a third party, it

21

SEC. 2. (a) DEFINITIONS.—When used in this title, unless the context otherwise requires— (1) The term

‗‗security‘‘ means any note, stock, treasury stock, security future, security-based swap, bond, debenture, evidence

of indebtedness, certificate of interest or participation in any profit-sharing agreement, collateral-trust certificate,

preorganization certificate or subscription, transferable share, investment contract, voting-trust certificate,

certificate of deposit for a security, fractional undivided interest in oil, gas, or other mineral rights, any put, call,

straddle, option, or privilege on any security, certificate of deposit, or group or index of securities (including any

interest therein or based on the value thereof), or any put, call, straddle, option, or privilege entered into on a

national securities exchange relating to foreign currency, or, in general, any interest or instrument commonly

known as a ‗‗security‘‘, or any certificate of interest or participation in, temporary or interim certificate for, receipt

for, guarantee of, or warrant or right to subscribe to or purchase, any of the foregoing.

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44

being immaterial whether the shares in the enterprise are evidenced by formal certificates or by

nominal interests in the physical assets employed in the enterprise.‖22

Esta definição de contratos de investimento acabou por se confundir com o próprio

conceito de valor mobiliário.

Segundo o art. 1º da Medida Provisória 1.637/98, "constituem valores mobiliários

quaisquer títulos ou contratos de investimento coletivo que gerem direito de participação, de

parceria ou remuneração, inclusive resultante da prestação de serviços, cujos rendimentos

advém do esforço do empreendedor ou de terceiros".

Com a promulgação da Lei nº 10.303, de 31 de outubro de 2001, este conceito foi

incorporado ao art. 2º da Lei nº 6.385/76, cujo caput passou a vigorar com a seguinte redação:

―Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:

I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;

II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento

relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;

III - os certificados de depósito de valores mobiliários;

IV - as cédulas de debêntures;

V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de

investimento em quaisquer ativos;

VI - as notas comerciais;

VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes

sejam valores mobiliários;

VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e

IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de

investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração,

22 U.S. Supreme Court. SEC v. Howey Co., 328 U.S. 293 (1946). Securities and Exchange Commission

v. Howey Co. No. 843 Argued May 2, 1946 Decided May 27, 1946 328 U.S. 293.

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45

inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do

empreendedor ou de terceiros.‖ (grifo nosso)

Diante de tal redação, percebe-se que o legislador brasileiro buscou oferecer uma lista

dos valores mobiliários mais comumente negociados, de forma a garantir previsibilidade e

segurança jurídica. Mas, além disso, de forma a corrigir a deficiência da lei em se adaptar à

dinamicidade do mercado de valores mobiliários, o legislador inseriu no inciso IX do mesmo

artigo um conceito amplo, notadamente inspirado no conceito americano de valor mobiliário,

que poderia abranger outros tipos de valores mobiliários que se fizessem necessários.23

Conforme o pensamento da Suprema Corte Americana, a inserção do contrato de

investimento dentre os valores mobiliários é extremamente vantajosa:

―It embodies a flexible, rather than a static, principle, one that is capable of adaptation to

meet the countless and variable schemes devised by those who seek the use of the money of

others on the promise of profits.‖

No entanto, mesmo diante de tal definição, ainda surgem divergências doutrinárias

quanto à caracterização de um instrumento como valor mobiliário.

O Diretor Marcos Barbosa Pinto, da Comissão dos Valores Mobiliários, analisa o

conceito de valores mobiliários, constante no inciso IX do artigo 2º da lei 6.385, de modo a

fazer um esforço interpretativo para estabelecer os elementos dos valores mobiliários, que

seriam os seguintes:24

O agente superavitário deve entregar sua poupança com o intuito de fazer um

investimento; o instrumento pode ser um título ou contrato, ou seja, é irrelevante a sua natureza;

23

Neste mesmo sentido, Nelson Eizirik: ―A vantagem da adoção desta acepção mais ampla de valores mobiliários,

ao invés de mera enumeração, é que, assim, evitar-se-á a reformulação periódica da legislação sobre mercado de

capitais. O alargamento do conceito de valores mobiliários tem o condão de incluir as situações futuras em que

serão ofertados novos produtos ao investidor, tendo sido, por via de conseqüência, aumentado o âmbito de atuação

e fiscalização da CVM.‖ Eizirik, Nelson; Gaal, Ariadna B.; Parente, Flávia; Henriques, Marcus de Freitas. Mercado

de Capitais – regime jurídico. 3.ed. revista e ampliada. – Rio de Janeiro: Renovar, 2011. p. 57. 24

Processo CVM Nº RJ2007/11.593.

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46

o investimento deve ser coletivo, isto é, vários investidores devem realizar um investimento em

comum; o investimento deve ser dar direito a alguma forma de remuneração, cujo conceito é

interpretado de maneira ampla; a remuneração deve ter origem nos esforços do empreendedor

ou de terceiros que não o investidor; e os títulos ou contratos devem ser objeto de oferta pública.

Já o doutrinador Nelson Eizrik se aprofunda no conceito determinado pela lei para aferir

que os elementos dos valores mobiliários são os seguintes:

―(a) a sua caracterização como modalidade de investimento coletivo, isto é, o fato de ser

destinado a circular em massa, perante uma pluralidade de investidores;

(b) o fornecimento de recursos, em dinheiro ou outros bens suscetíveis de avaliação

econômica, por parte do investidor para o emissor do título ou contrato;

(c) a gestão dos recursos por parte de terceiros, não controlando o investidor o negócio

no qual seus recursos foram empregados;

(d) o fato de tratar-se de um empreendimento comum, cujo sucesso é almejado tanto

pelo investidor quanto pelo gestor, havendo entre ambos uma comunhão de interesses

econômicos interligados juridicamente;

(e) a expectativa do investidor em participar diretamente dos lucros resultantes do

empreendimento comum gerido pelo empreendedor ou por terceiros, e

(f) a circunstância de o investidor partilhar os riscos do empreendimento no qual ele

deseja participar, que são diversos dos riscos meramente comerciais ou de crédito.‖25

Percebe-se nítida a divergência entre os doutos, em especial quanto aos três

últimos requisitos elencados por Nelson Eizirik. Isto continua causando uma insegurança

jurídica na caracterização de um título como valor mobiliário.

Um exemplo notório desta divergência se dá quanto à caracterização ou não das Cédulas

de Crédito Bancário (CCBs) como valores mobiliários. No âmbito do julgamento do

PROCESSO CVM Nº RJ2007/11.593, o colegiado de Diretores da CVM entendeu que as CCBs

seriam valores mobiliários, com certas restrições, incidindo, portanto a fiscalização da CVM

25

Eizirik , Nelson. A polêmica sobre a cédula de crédito bancário. Valor Econômico, 25/02/2008, Legislação &

Tributos, p. E2

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47

sobre as ofertas públicas que envolvessem as CCBs. Já a posição de Nelson Eizirik é contrária à

caracterização de tais títulos como valores mobiliários, pois neles não se percebe o interesse da

instituição financeira no sucesso do empreendimento do tomador do empréstimo.26

Considerando a rotação constante dos Diretores da autarquia e a notória divergência

entre os diversos doutrinadores societários, percebe-se que a conceituação dos valores

mobiliários continua sendo matéria de controvérsia que causa visível insegurança jurídica.

26

Idem.

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48

5.1. Aula 4: Ilicitudes Administrativas e Penais no Ambito do Mercado

de capitais Brasileiro

1. Introdução

Tanto nas esferas civil e criminal quanto na administrativa, o ilícito é constituído da

mesma forma: trata-se sempre de violação a um dever de conduta previamente existente e a

imputação de tal ação ou omissão a um agente. Não há, assim, uma diferença fundamental no

ilícito em cada esfera, mas sim no que tange à natureza do bem jurídico protegido caso a caso.

Dessa forma, no âmbito do mercado de capitais, podem os delitos ensejar tanto sanções

de natureza administrativa quanto penal, conforme o bem jurídico tutelado, cabendo aos

dispositivos legais pertinentes denotar critérios formais que os distinguam.

Nessa linha, temos, por um lado, os ilícitos administrativos tipificados tanto em

Instruções Normativas específicas da CVM, como a IN nº 08/79, a ser estudada posteriormente,

quanto na própria Lei nº 6.385/1976, conhecida por Lei do Mercado de Valores Mobiliários.

Os ilícitos penais, por outro lado, são previstos apenas pela Lei nº 6.385, no capítulo

VII-B, artigos 27-C, 27-D e 27-E. Tal capítulo foi inserido na referida lei posteriormente a sua

edição, através do art. 5º da Lei nº 10.303/2001, a fim de suprir lacuna deixada pela Lei nº

7.492/1986, que, muito embora tenha disciplinado os crimes contra o Sistema Financeiro

Nacional, não vislumbrou as condutas ilícitas do âmbito do mercado de capitais.

Cabe ressaltar que as condutas previstas nos artigos acima como ilícitos penais já eram

antes tipificadas como ilícitos administrativos. Entretanto, tendo em vista a relevância do bem

jurídico ali protegido e, mais especificamente, um esforço em passar mais credibilidade ao

mercado financeiro e maior segurança aos investidores, decidiu o governo brasileiro por seguir

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49

o exemplo de países mais desenvolvidos na área, em que tais condutas já eram, desde muito,

criminosas.

Como estudado na parte histórica, o Brasil não encontrou facilidades no

desenvolvimento de seu mercado de capitais, enfrentando desde sua criação, nos anos 60,

adversidades, como a falta de segurança, a especulação inescrupulosa e corrupção. Apesar da

evolução legislativa da área, para Nelson Eizirik, o fato de diversos ilícitos administrativos

ainda serem tratados em poucos ou um único tipo penal acaba por causar dificuldade na

interpretação e aplicação adequada das normas27. Estudaremos a seguir os principais tipos

penais do mercado de capitais.

Podemos citar, como principais ilícitos administrativos e penais previstos na legislação

brasileira sobre mercado de capitais, as seguintes práticas: criação de condições artificiais de

demanda, oferta ou preço de valores mobiliários; exercício irregular do cargo, profissão ou

atividade; manipulação do mercado; práticas não equitativas; uso indevido de informação

privilegiada.

2. O Ilícito Penal. Manipulação do mercado, criação de condições artificiais, operações

fraudulentas e práticas não equitativas – Art. 27-C da Lei 6.385/1976.

Art. 27-C. Realizar operações simuladas ou executar outras manobras

fraudulentas, com a finalidade de alterar artificialmente o regular funcionamento

dos mercados de valores mobiliários em bolsa de valores, de mercadorias e de

futuros, no mercado de balcão ou no mercado de balcão organizado, com o fim

de obter vantagem indevida ou lucro, para si ou para outrem, ou causar dano a

terceiros: Pena – reclusão, de 1 (um) a 8 (oito) anos, e multa de até 3 (três) vezes

o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime.

Nenhum mercado é capaz de se desenvolver de maneira saudável com apenas investimentos

especulativos. A manutenção do capital investido em determinado mercado acaba por atrair

27

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 537.

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50

mais investimentos, pois denota segurança no investimento, o que, por conseqüência final,

resulta no crescimento das empresas negociadas e do próprio mercado. É um processo cíclico.

Com a abertura do mercado de capitais brasileiro para investimento estrangeiro no final

do último século, fez-se rapidamente necessária uma adaptação do mercado nacional a normas

já há muito existentes em mercados mais desenvolvidos a fim de não só incentivar a vinda de

investidores estrangeiros, mas também assegurar a manutenção de tais investimentos em

empresas aqui negociadas.

Nessa linha do direito comparado, foi criado o art. 27-C, que disciplinou o crime de

manipulação do mercado de capitais, prevendo, em um mesmo tipo penal, três condutas

consideradas ilícitos administrativos, quais sejam: a criação de condições artificiais de demanda,

oferta ou preço de valores mobiliários; a operação fraudulenta; e a manipulação de preços.

A fim de elucidar tais condutas, garantindo a eficaz aplicabilidade do artigo, coube à CVM,

entretanto, a definição do que seriam, de fato, constituídas tais praticas. Dessa forma, a CVM,

através da Instrução Normativa nº 08/79 assim as definiu:

a. Condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores mobiliários

aquelas criadas em decorrência de negociações pelas quais seus participantes ou

intermediários, por ação ou omissão dolosa provocarem, direta ou indiretamente,

alterações no fluxo de origens de compra ou venda de valores mobiliários;

b. manipulação de preços no mercado de valores mobiliários, a utilização de

qualquer processo ou artifício destinado, direta ou indiretamente, a elevar, manter

ou baixar a cotação de um valor mobiliário, induzindo, terceiros à sua compra e

venda;

c. operação fraudulenta no mercado de valores mobiliários, aquela em que se

utilize ardil ou artifício destinado a induzir ou manter terceiros em erro, com a

finalidade de se obter vantagem ilícita de natureza patrimonial para as partes na

operação, para o intermediário ou para terceiros.

O bem jurídico aqui tutelado é a estabilidade do mercado de capitais. Um mercado

estável e eficiente é aquele em que as cotações dos papéis negociados reagem de maneira mais

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51

rápida às informações publicadas. Diz-se aí que existe ―uma cotação real e verdadeira dos ativos

financeiros negociados no mercado de capitais.‖ 28

Em contrapartida, a manipulação consiste na execução de conduta, não necessariamente

fraudulenta, por qualquer pessoa (crime comum), que intente por alterar o bom funcionamento

do mercado. Trata-se de uma agressão à sua estabilidade através da formação de preços não

condizentes com a realidade, preços falsos, que geram, por sua vez, um mercado falso.

Importante aqui se faz distinguir a manipulação, ilícito penal, da especulação, conduta

perfeitamente aceitável nas economias de mercado. Em definição geral, a especulação se trata

de ―qualquer aposta baseada nas previsões acerca dos desdobramentos econômicos do futuro de

um país, um evento, um setor de atividade ou de uma empresa.‖ 29

Como toda aposta, a especulação necessariamente deve envolver um risco. O

especulador não tem conhecimento prévio dos resultados que obterá com sua operação

especulativa, trata-se de uma esperança, que pode ou não lograr êxito. O manipulador, por sua

vez, não contempla tal risco em suas negociatas. De acordo com a boa doutrina, podemos

observar claramente tal distinção:

Apontam-se dois traços essenciais na manipulação, que a distinguem da

mera especulação: a alteração das regras do jogo do mercado; e o

engano dos investidores. Na especulação existe sempre o risco, uma vez

que o especulador realiza operações com a esperança de obter lucros, em

28

LORIE, James H. Public policy for American capital markets. Washington, Department of treasure, 1974

Apud EIZIRIK, Nelson. O papel do estado na regulação do mercado de capitais. Rio de Janeiro. IBMEC. 1977,

p. 54: ―Eficiência nesse contexto significa a capacidade de reação das cotações dos títulos às novas informações;

quanto mais rápida for esta reação, mais eficiente será o mercado. O ideal é que a cotação de determinado título

reflita toda a informação publicamente disponível, o que pode ser obtido mediante uma eficaz legislação de

disclosure e uma efetiva fiscalização da fidedignidade dos dados revelados. A eficiência nesse sentido parece

conflitar com outras características do mercado, consideradas desejáveis. Mercados eficientes causam variações

rápidas de preços, em resposta às novas informações, sendo tais variações consideradas, algumas vezes, como

fatores de excessiva volatilidade, devendo então merecer alguma atenção governamental. Este é um ponto

extremamente discutível. Para Lorie, quando as variações nos preços constituem uma resposta a novas

informações, a regulação deve facilitá-las e não impedi-las ou restringi-las, supondo-se, no entanto, o igual acesso

às informações (isto é, um sistema eficaz de combate ao insider trading). Em mercados de dimensões reduzidas

não se pode levar a extremos esta posição, já que flutuações exageradas nas cotações podem abalar fortemente a

confiança dos investidores individuais, tradicionalmente com menor acesso e mesmo menor capacidade análise das

novas informações do que os investidores institucionais.‖ 29

GUNTHER, Max. Os Axiomas de Zurique. Ed. Record. 2006.

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52

função de uma variação de preços que lhe seja favorável, mas que pode

não se verificar. Já o manipulador objetiva eliminar os riscos da

operação, transformando em certeza a esperança de obter lucros; para

tanto, modifica as regras de funcionamento do mercado e da formação

de preços, enganando os investidores, que desconhecem o caráter

artificial das cotações dos títulos.30

É importante frisar que não é necessário que as operações com intuito manipulativo se

dêem todas no âmbito de uma mesma bolsa. O chamado intermarket manipulation consiste

exatamente em operações realizadas no âmbito de determinada bolsa, mas que na verdade visam

atingir os preços de uma bolsa diversa. Trata-se de uma manipulação indireta.

Nesse mesmo sentido, podemos verificar a realização de operações intertemporais, que

visam elevar ou derrubar o valor de determinada ação, dependendo da posição do manipulador,

para que este possa lucrar com a liquidação de contratos a futuro. Tanto no caso da intermarket

manipulation quanto no último exemplo citado, incorre o agente no crime previsto no art. 27-C

da Lei 6.385/1976.

Cabe ressaltar, ainda, que há divergência na doutrina quanto à necessidade de resultado

no crime de manipulação do mercado de capitais. Para Nelson Eizirik e Modesto Carvalhosa, tal

tipo penal constitui crime material, sendo, dessa forma, necessária a ocorrência de alteração do

mercado e uma vantagem indevida. Nesse sentido:

A manipulação constitui um delito material, cujo resultado, a efetiva

alteração do mercado e a vantagem indevida, são indispensáveis para a

sua caracterização. Trata-se de um crime de dano, em que deve restar

demonstrado que as condutas puníveis tinham o condão de elevar,

30

DA SILVA, João Gomes. O crime de Manipulação do Mercado. Direito e Justiça – Revista da Faculdade de

Direito da Universidade Católica Portuguesa. Lisboa Universidade Católica editora. V. 14, n.1, p. 198. Apud

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de capitais

– regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 540.

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53

manter ou baixar a cotação de determinado valor mobiliário, induzindo

terceiros a sua compra e venda. 31

Há, contudo, quem entenda de forma diversa. Conforme a doutrina de Fausto Martin De

Sanctis, o crime de manipulação ―se cuida de delito formal, cujo resultado, alteração do

mercado regular e vantagem indevida com prejuízo alheio, não se apresenta imprescindível‖. 32

Assevera, ainda, o autor que, dessa forma, seria necessário demonstrar apenas a finalidade do

investidor, ou seja, sua intenção.

Pode-se concluir, portanto, que o crime tipificado pelo art. 27-C pode assumir diversas

formas e práticas, uma vez que tal tipo penal é abrangente, englobando mais de uma conduta,

como visto, podendo resultar em até oito anos de reclusão e multa até o triplo do valor do

montante indevidamente obtido, conforme art. 27-F33 da mesma lei.

2.2. Uso indevido de informação privilegiada – Art. 27-D da Lei 6.385/1976.

Art. 27-D. Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que

tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou

para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de

terceiro, com valores mobiliários: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e

multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência

do crime.

Através do presente tipo penal, visou-se punir a conduta do agente que utiliza

informação sigilosa em proveito próprio ou alheio, dolosamente (dolo específico de auferir

vantagem), no âmbito do mercado de capitais. Nesse sentido, Frederico de Lacerda da Costa

31

EIRIZIK, Nelson. CARVALHOSA, Modesto. A nova Lei das S/A. São Paulo: Saraiva. 2002, p. 540. 32

DE SANCTIS, Fausto. Punibilidade no sistema financeiro nacional. Campinas. Millenium. 2003, p. 104. 33

Art. 27-F. As multas cominadas para os crimes previstos nos arts. 27-C e 27-D deverão ser aplicadas em razão do

dano provocado ou da vantagem ilícita auferida pelo agente. Sobre tal aspecto, a doutrina é uníssona em considerar

a pena desproporcional ao bem jurídico tutelado, uma vez que penas equivalentes podem ser observadas em crimes

mais simples como furto ou o estelionato, em que o sujeito passivo é consideravelmente menor, quando não

individual.

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54

muito bem definiu o propósito de tal dispositivo como ―[...] tutelar a função pública da

informação, enquanto justo critério de distribuição do risco dos negócios [...]‖.34

O bem jurídico tutelado é, portanto, o princípio da transparência de informações, e

assim, de forma indireta, a estabilidade, eficiência e equidade do mercado. João Carlos Castellar

afirma que também pode ser incluído como bem jurídico tutelado a proteção da confiança e do

patrimônio dos investidores que aplicam seus recursos no mercado de capitais. 35

A legislação das companhias no âmbito nacional, através do art. 157 § 4º, 36 já muito

bem previa o ―dever de informar‖, que, em essência, determina a divulgação de deliberações da

assembleia geral ou dos órgãos de administração, ou fato relevante ocorrido na empresa, por

parte dos administradores da companhia, que ficam, dessa forma, impedidos de se utilizarem da

informação para obtenção de vantagem para si ou para outros através de negociação de valores

mobiliários.

Assim, seguindo o direito norte-americano37, adotou a legislação pátria o princípio da

―disclose or refrain from trading‖, que importa na obrigação de publicar informações relevantes

ou se abster de utilizá-la em proveito próprio ou alheio, incorrendo em crime aquele que pratica

conduta contrária. Nesse sentido, observemos a lição de José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo

Lamy Filho:

34

PINTO, Frederico de Lacerda da Costa. Crimes econômicos e mercados financeiros. In: Revista Brasileira de

Ciências Criminais, n. 39, p. 28. Apud DE SANCTIS, Fausto. Punibilidade no sistema financeiro nacional.

Campinas. Millenium. 2003, p. 107. 35

CASTELLAR, João Carlos. Os novos Crimes Societários, p. 104. Apud EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.;

PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro:

Renovar. 2011, p. 540. 36

Art. 157. (...)

§ 4º Os administradores da companhia aberta são obrigados a comunicar imediatamente à bolsa de valores e a

divulgar pela imprensa qualquer deliberação da assembléia-geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou

fato relevante ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do

mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia. 37

Ainda sobre o direito comparado, Nelson Eizirik assevera: “No Direito Europeu, desde a Diretiva da CEE

592/89, a generalidade dos países membros vem adotando normas penais sobre o insider trading, sob diversos

fundamentos: a igualdade entre os investidores; a confiança no mercado; a justa distribuição dos riscos do

mercado; e, principalmente, os pressupostos de eficiência do mercado de capitais.” EIRIZIK, Nelson; GAAL,

Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de capitais – regime jurídico. Rio de

Janeiro: Renovar. 2011, p. 557.

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55

O sigilo supõe, pois, necessariamente, ―informação que não tenha sido

divulgada‖, pelo que fica o administrador proibido de fazer qualquer

negociação para obter vantagem na base de informação de que o mercado

desconhece, o que caracteriza o ―insider trading‖. (...) os deveres de sigilo

e de divulgar informação completam-se no mesmo propósito de evitar o

insider, a ação do iniciado, o proveito do bem informado: o administrador

é obrigado a divulgar as notícias relevantes e até a divulgação está

obrigado ao sigilo, cuja violação enseja o insider.

Cabe ressaltar que a Instrução CVM nº. 358/2002 dispõe, em seu art. 13, que os

seguintes personagens podem ser considerados insiders: a própria companhia; seus acionistas

controladores, sejam eles diretos ou indiretos, diretores, membros do conselho de administração,

do conselho fiscal, ou de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas, criadas por

disposição estatutária, bem como quem quer que, em virtude de seu cargo, função ou posição na

companhia, sua controladora, controlada ou coligada, tenha conhecimento da informação

relativa ao ato ou fato relevante.

Por fim, é importante frisar que a caracterização do delito requer, necessariamente, que a

informação seja relevante. Entende-se por relevante a informação ―capaz de influir, de modo

ponderável, na cotação dos valores mobiliários, causando sua alta ou queda.‖ 38 Ou ainda, na

definição estadunidense, material fact seria aquele que um investidor médio levaria em

consideração ao negociar no mercado.

Sobre tal aspecto, interessante ainda observar o entendimento da CVM, que consiste na

seguinte definição:

O fato relevante deve ser reconhecido como tal a partir da avaliação de sua

repercussão no valor da companhia, não importando que figure no rol

exemplificativo da Instrução CVM 358/2002. 39

38

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 558. 39

CVM, PAS nº RJ 2002/1822, Rel. Dir. Norma Jonssen Parente, julgado em 06.05.2005. Disponível em

www.cvm.gov.br.

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56

Também sobre o insider trading, pode-se verificar divergência doutrinária quanto ao seu

momento consumativo. Nelson Eizirik, Frederico de Lacerda da Costa Pinto e João Castellar

afirmam se tratar de crime material, em que a vantagem indevida obtida com a utilização da

informação privilegiada seria necessária para tipificação penal.

Já Fausto De Sanctis considera o auferimento de vantagem indevida como dispensável,

entendendo, assim, o crime como um delito de perigo abstrato, bastando a demonstração de que

a conduta de negociar utilizando informação relevante foi realizada.

Por fim, o crime de insider trading é visto como próprio, devendo o agente ativo,

necessariamente, ter a obrigação de guardar sigilo por força legal ou contratual. Há, contudo,

doutrina divergente no direito comparado40, como aponta Nelson Eizirik, nos termos do art.

285 do Código Penal Espanhol, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo de tal delito.

2.3. Exercício irregular de cargo, profissão ou atividade – Art. 27-E da Lei 6.385/1976.

Art. 27-E. Atuar, ainda que a título gratuito, no mercado de valores mobiliários,

como instituição integrante do sistema de distribuição, administrador de carteira

coletiva ou individual, agente autônomo de investimento, auditor independente,

analista de valores mobiliários, agente fiduciário ou exercer qualquer cargo,

profissão, atividade ou função, sem estar, para esse fim, autorizado ou registrado

junto à autoridade administrativa competente, quando exigido por lei ou

regulamento.

O tipo penal no artigo em questão visa coibir a conduta daquele que atua, como uma das

figuras elencadas, ou exerce cargo ou função no âmbito do mercado de capitais sem o devido

registro administrativo perante a CVM exigido por lei. Tutela-se assim o bem jurídico da

40

Também no direito brasileiro, podem-se encontrar doutrinadores que defendam o insider trading como crime

comum. Nesse sentido: ―[...] apesar de exigir do sujeito ativo obigação ao sigilo, não se cuida de delito próprio e,

portanto, não se requer o nexo de causalidade entre o conhecimento do sigilo e o cargo ocupado pelo agente. [...]

qualquer pessoa que tenha acesso a essa informação, seja em razão do cargo, ou não, poderá ser enquadrada no

dispositivo, bastando que negocie com valores mobiliários. DE SANCTIS, Fausto. Punibilidade no sistema

financeiro nacional. Campinas. Millenium. 2003, p. 110.

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57

estabilidade do mercado de capitais, uma vez que, pelo menos em um plano teórico, tal registro

pode ser capaz de dificultar a prática de ilícitos.

Há divergência doutrinária quanto à natureza de tal delito, uma vez que para Nelson

Eizirik, trata-se de crime de hábito e formal, sendo necessária a reiteração de tal prática e não se

podendo assim cogitar a tentativa. Neste sentido, assevera:

―A natureza dos verbos utilizados – atuar e exercer – indica que para se

configurar o delito deve haver constância, reiteração, ou seja, habitualidade na

conduta do agente: a prática de um único ato, isolado, avulso, não caracteriza o

ilícito.‖ 41

Para Fausto De Sanctis, no entanto, o tipo penal previsto no art. 27-E deve ser separado

em dois núcleos distintos, separando a atuação do exercício. No primeiro núcleo, atuar, o crime

estaria configurado com apenas uma única transação no âmbito do mercado de capitais sem a

devida autorização, sendo assim um crime material e não habitual, possibilitando-se a tentativa.

O segundo núcleo, exercer, constituiria um crime habitual, exigindo-se, portanto, ―a

habitual atividade ou função sem a autorização competente.‖ 42 Não comportaria tal ilícito,

assim, a forma tentada.

Trata-se ademais de norma penal em branco, devendo-se consultar a legislação

disciplinadora do mercado de capitais que estabelece os parâmetros da necessidade de

autorização ou registro. Cabe ressaltar que pode haver, dessa forma, inclusão ou exclusão de

personagens que podem atuar no pólo ativo de tal crime.

Por fim, importante se faz salientar crítica presente na doutrina acerca da pena

para tal crime. Sendo a pena máxima de dois anos, o delito é considerado como de menor

potencial ofensivo, inserindo-se assim na Lei nº. 10.259/2001. Contudo, entende Nelson Eizirik

41

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 566. Do mesmo entendimento João Carlos Castellar:

[...] CASTELLAR, João Carlos. Os novos crimes societários. [...] 42

DE SANCTIS, Fausto. Punibilidade no sistema financeiro nacional. Campinas. Millenium. 2003, p. 116.

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58

que há uma ―supervalorização da atuação registrária da CVM, cuja omissão, em princípio, não

representaria ofensa de grande relevância para a sociedade.‖ 43

3. O Ilícito Administrativo.

A Lei 6.385/1976, em seu art. 4º, estabelece que é dever do Conselho Monetário

Nacional e da CVM proteger os titulares de valores mobiliários e os investidores do mercado

contra o uso de informação relevante não divulgada no mercado de valores mobiliários (IV ―c‖);

modalidades de fraude ou manipulação destinadas a criar condições artificiais de demanda,

oferta ou preço dos valores mobiliários negociados no mercado (V); assegurar a observância de

práticas comerciais equitativas no mercado de valores mobiliários (VII).

Assim sendo, elaborou a CVM a Instrução Normativa nº. 08/1979, que, visando

regulamentar o referido dispositivo, definiu quatro tipos de ilícitos administrativos (que

acabaram sendo utilizados também na tipificação do art. 27-C da mesma Lei, como

anteriormente exposto).

Ao editar tal norma, utilizou-se a CVM do conceito do ―tipo aberto‖, já

anteriormente utilizado no âmbito dos crimes contra o patrimônio do Código Penal, a fim de

abarcar uma maior quantidade de condutas como ilícitos, flexibilizando-se assim o poder

punitivo da CVM. Segundo a própria Nota Explicativa nº 14, que acompanha a referida

instrução normativa, visa-se, na aplicação do tipo penal aberto, ―possibilitar a paulatina

adaptação das definições adotadas às necessidades demonstradas pela prática.‖ 44

Segundo a doutrina de Nelson Eizirik, os tipos ali constantes se tratam de

―conceitos amplos, não precisamente determinados e que podem ser adaptados às circunstâncias

fáticas do mercado.‖ 45 São, assim, denominados standard legais.

43

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 566. 44

Nota Explicativa 14/79 disponível em:

http://www.cvm.gov.br/asp/cvmwww/atos/Atos_Redir.asp?Tipo=N&File=\nota\nota014.doc > acesso: 14.06.2012. 45

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 547.

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59

Nesse sentido, pondera o doutrinador que muito embora se possa criticar a

generalidade de tais tipos pela possível insegurança jurídica gerada aos sujeitos a eles

submetidos, outro modo não mostra efetivo, tendo em vista ser impossível prever todas as

condutas nocivas no âmbito do mercado, pela sua alta dinamicidade.

Sobre tal aspecto, assevera:

―A utilização de tipos abertos importa a concessão de ampla discrição à

autoridade administrativa encarregada de aplicá-los à prática dos negócios,

cabendo-lhe preencher os vazios do padrão genérico de conduta, caso a caso, no

julgamento dos processos sancionadores.‖ 46

Por derradeiro, cabem algumas considerações acerca do Processo Administrativo

Sancionador. O PAS pode ser definido como:

―Uma modalidade de processo administrativo mediante a qual a

Administração Pública, no exercício do seu poder de polícia e

obedecendo sempre o postulado do devido processo legal, aplica as

penalidades administrativas às pessoas que praticam atos qualificados

em lei ou regulamento como ilícitos administrativos.‖ 47

Assim sendo, o PAS no âmbito da CVM observa especificamente as disposições da Lei

nº. 9.784/1999, que trata dos princípios orientadores do processo administrativo em geral no

âmbito da administração pública federal. Podemos citar como principais princípios: a

legalidade, finalidade, motivação, proporcionalidade, contraditório, ampla defesa, publicidade e

segurança jurídica.

46

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 547.

47

MEDAUAR, Odete. A processualidade no Direito Administrativo. Revista dos Tribunais. Apud EIRIZIK,

Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de capitais – regime

jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 547.

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60

Ademais, a fim de garantir a higidez de tal procedimento e a imparcialidade de eventual

decisão proferida, necessária se fez a separação funcional entre as fases processuais, sendo elas

a fase de instrução e de decisão, e dos diversos órgãos nelas atuantes.

Dessa sorte, no procedimento ordinário48 do Processo Administrativo Sancionador da

CVM, a acusação é feita pela Superintendência de Processos Sancionadores (―SPS‖) em

conjunto com Procuradoria Especializada Federal (―PFE‖), enquanto que a decisão deve ser

proferida, em primeira instância, pelo Colegiado, composto pelo Presidente49 e mais dois

diretores, no mínimo, cabendo recurso de tal decisão ao Conselho de Recursos do Sistema

Financeiro Nacional.

4. O Termo de Compromisso.

O Termo de Compromisso no Brasil foi instituído através da Lei nº. 9.457/1997, que

introduziu os §§ 5º a 8º ao artigo 11, na Lei nº. 6.385/1976 com a seguinte redação:

§ 5o A Comissão de Valores Mobiliários poderá, a seu exclusivo critério, se o

interesse público permitir, suspender, em qualquer fase, o procedimento

administrativo instaurado para a apuração de infrações da legislação do mercado

de valores mobiliários, se o investigado ou acusado assinar termo de

compromisso, obrigando-se a:

I - cessar a prática de atividades ou atos considerados ilícitos pela Comissão de

Valores Mobiliários; e

II - corrigir as irregularidades apontadas, inclusive indenizando os prejuízos.

§ 6º O compromisso a que se refere o parágrafo anterior não importará

confissão quanto à matéria de fato, nem reconhecimento de ilicitude da conduta

analisada.

48

Em se tratando de infrações de natureza objetiva a que se comine penalidade de multa pecuniária de até no

máximo de R$ 100.000,00 (cem mil reais) o rito será o sumário. Conforme art. 1º Regulamento Anexo à Resolução

CMN nº. 1.657/1989. 49

Em sua ausência, qualquer dos diretores poderá presidir, exigindo-se, sempre, três julgadores presentes.

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61

§ 7o O termo de compromisso deverá ser publicado no Diário Oficial da União,

discriminando o prazo para cumprimento das obrigações eventualmente assumidas, e

constituirá título executivo extrajudicial.

§ 8º Não cumpridas as obrigações no prazo, a Comissão de Valores Mobiliários

dará continuidade ao procedimento administrativo anteriormente suspenso, para a

aplicação das penalidades cabíveis.

Historicamente, podemos relacionar o Termo de Compromisso brasileiro com o Consent

Decree50 americano, regulamentado pela Securities and Exchange Comission. Através da

regulamentação americana, as propostas para celebração de Consent Decree devem obedecer a

algumas Normas de Conduta (―Rules of Practice‖), que prevêem, por exemplo, a constituição de

garantias para assegurar eventuais indenizações às partes eventualmente prejudicadas.

Dessa forma, tanto o Consent Decree como o Termo de Compromisso visam atender ao

mesmo propósito, qual seja, possibilitar a celebração de acordo entre o investigado da prática de

algum ilícito e o ente público responsável por sua apuração e eventual condenação, seja a SEC

nos EUA ou a CVM no Brasil, através da prática de condutas que ajustem ou amenizem o ilícito

cometido.

Cabe distinguir tais institutos, entretanto, no que tange a necessidade de homologação

em juízo de tais compromissos. Nos EUA, o Consent Decree obrigatoriamente deverá ser

apreciado e homologado por um juiz, enquanto que no Brasil não há tal obrigatoriedade, tendo a

CVM, dessa forma, autonomia suficiente para propor, modificar ou aceitar termos de

compromisso.

50

A consent decree (also referred to as a consent order or stipulated judgment or agreed judgment) is a final,

binding judicial decree or judgment memorializing a voluntary agreement between parties to a suit in return for

withdrawal of a criminal charge or an end to a civil litigation. In a typical consent decree, the defendant has already

ceased or agrees to cease the conduct alleged by the plaintiff to be illegal and consents to a court injunction barring

the conduct in the future. A consent judgment can also memorialize payment of damages. Sometimes the defendant

expressly does not admit to fault, illegality or damages. Consent decrees are used most commonly in criminal law

and family law. They are frequently used by the U.S. Securities and Exchange Commission. They are sometimes

used in antitrust law. Fonte: http://www.justice.gov/enrd/Consent_Decrees.html > acessado em 28 de junho de

2012.

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62

A natureza jurídica do termo de compromisso é a de uma transação. Segundo a doutrina

de Nelson Eizirik, a CVM ―‘abre a mão‘, provisoriamente, de seu jus puniendi e o particular

deixa de praticar o ato sob investigação, comprometendo-se a indenizar eventuais danos

causados pela sua conduta.‖ Constitui-se, assim, através do Termo de Compromisso, um

negócio jurídico bilateral, em que as partes dão fim às condutas duvidosas investigadas, por

meio de concessões recíprocas, muitas vezes de cunho pecuniário, muito embora essa não seja

obrigatoriamente a regra.

Vale ressaltar que, como se depreende do dispositivo legal, a celebração de Termo de

Compromisso não implica em nenhuma hipótese na confissão da prática ilícita por parte do

acusado, o que gera certa dúvida quanto o seu real propósito, afinal, se o acusado não é culpado,

por que estaria pagando?

Paga-se para encerrar o processo, sem que o acusado seja levado a julgamento ou sua

culpa seja presumida, criando-se a ideia no mercado de que o termo de compromisso, na

realidade, seria uma multa por uma conduta capaz de ensejar dúvida quanto a sua licitude, sendo

essa umas de suas principais críticas.

Entretanto, pelo princípio constitucional da presunção da inocência, jamais poderia o

Termo de Compromisso ser visto como tal, uma vez que não há que se falar em sanção sem a

prévia certeza quanto à ilicitude do ato, devendo tal entendimento ser afastado.

Notória crítica do Termo de Compromisso, Norma Jonssen Parente assevera:

―Acho que sendo mais proativa, valendo-se, por exemplo, do importante poder

preventivo que lhe foi conferido pelo legislador, nos termos do art. 124, §5º, II, da Lei

de S/A, quando a CVM está autorizada por lei a suspender o curso de uma assembleia

para manifestar a sua opinião sobre a questão em discussão. Exemplo eloqüente e eficaz

de tal procedimento ocorreu no caso da reorganização societária pretendida pela Tele

Centro Oeste Participações S/A e da Telesp Celular Participações S/A, em dezembro de

2003, cuja não equitatividade, antes da realização da assembleia convocada para decidir

a questão, foi reconhecida pela CVM e terminou impedindo a perpetração da injustiça

que iria ser praticada contra os acionistas minoritários. Pois após a opinião da CVM, as

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63

empresas optaram por não levar adiante as assembléias. Porém, inconformadas,

questionaram judicialmente a opinião da CVM, mas não obtiveram sucesso, pois a ação

foi julgada extinta sem análise do mérito, em face de impossibilidade jurídica do pedido,

pois se tratava de mera opinião cuja competência para mudá-la escapava da alçada do

poder judiciário.‖ 51

Apesar da existência de crítica na doutrina acerca do uso de Termos de Compromisso,

tal instituto encontra também considerável respaldo por muitos juristas, como Nelson Eirizik

que assim leciona:

(...) o Termo de Compromisso não pode, em hipótese alguma, ser confundido com

tolerância com o ilícito; ao contrário, deve ser entendido como instrumento que lhe

permite perseguir o interesse público de forma rápida e eficaz, nos casos em que, em seu

entendimento, a eventual continuidade do processo não traria qualquer benefício ao

desenvolvimento do mercado. 52

O mesmo entendimento pode ser extraído do seguinte trecho do voto proferido pelo

Diretor Sergio Weguelin em processo de sua relatoria:

―Vale destacar que o instituto legal do termo de compromisso não tem outro sentido

senão o de dar certa flexibilidade à CVM. Não se trata, evidentemente, de tolerar o

ilícito, mas sim de permitir à entidade reguladora identificar o momento em que a

resposta regulatória já se apresentou suficiente para o bom desenvolvimento do

mercado.‖ 53

Concluí-se, portanto, que o Termo de Compromisso no âmbito do mercado de

capitais brasileiros é prática cada vez mais comum, dando flexibilidade à CVM para que exerça

seu poder punitivo de modo mais célere e eficaz, uma vez que, diferentemente das multas, a

51

Disponível em:

http://www.transparenciaegovernanca.com.br/TG/index.php?option=com_content&view=article&id=119&Itemid=

118&lang=br > acessado: 28.06.2012 52

EIRIZIK, Nelson; GAAL, Ariadna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de

capitais – regime jurídico. Rio de Janeiro: Renovar. 2011, p. 357. 53

Processo CVM RJ 2001/4652, j. 22.03.2005.

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64

adimplência em termos de compromisso é quase certa. Ressalve-se, contudo, a existência de

fortes críticas a esse instituto, que, de fato, ainda busca seu aperfeiçoamento na legislação pátria.

Glossário

Auto-Regulação. Conjunto de normas e procedimentos de fiscalização criados por

entidades privadas para fazer cumprir as práticas equitativas de mercado e manter padrões éticos

na condução das negociações. As bolsas de valores e de mercadorias e as entidades de classe

que congregam instituições financeiras são as principais fontes de auto-regulação do SFN -

Sistema Financeiro Nacional

Capital Estrangeiro: Valor dos bens, máquinas e equipamentos entrados no Brasil com

dispêndio inicial de divisas, bem como recursos financeiros e monetários introduzidos no país

para aplicação em atividades econômicas, desde que pertençam a pessoas físicas ou jurídicas

residentes, domiciliadas ou com sede no exterior (BM&F).

Companhia Fechada. Companhia cujos valores mobiliários não estão admitidos à

negociação no mercado de títulos e valores mobiliários (BM&F).

Oferta Pública. 1) Distribuição de títulos e valores mobiliários junto ao público

investidor; 2) colocação junto ao público de determinado número de ações de uma companhia.

Caracteriza-se por ser extensiva a não-acionistas da companhia. A companhia aberta que já

tenha efetuado distribuição pública de valores mobiliários poderá submeter para arquivamento

na CVM - Comissão de Valores Mobiliários - um Programa de Distribuição de Valores

Mobiliários, com o objetivo de no futuro efetuar ofertas públicas de distribuição dos valores

mobiliários nele mencionados. O Programa de Distribuição terá prazo máximo de 2 (dois) anos,

contado do seu arquivamento pela CVM, devendo ser indeferido qualquer pedido de registro de

oferta vinculado a um Programa de Distribuição apresentado após o transcurso deste prazo.

CVM - Comissão de Valores Mobiliários. Autarquia federal que disciplina e fiscaliza o

mercado de valores mobiliários. Foi criada pela Lei 6.385/76. EnFin. Compete à CVM: a)

estimular a formação de poupança e a sua aplicação em valores mobiliários; b) promover a

expansão e o funcionamento eficiente e regular do mercado de ações, e estimular as aplicações

permanentes em ações do capital social de companhias abertas sob controle de capitais privados

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65

nacionais; c) assegurar o funcionamento eficiente e regular dos mercados da Bolsa e do balcão;

d) proteger os titulares de valores mobiliários e os investidores do mercado contra emissões

irregulares de valores mobiliários e atos ilegais de administradores e acionistas controladores

das companhias abertas, ou de administradores de carteira de valores mobiliários; e) evitar ou

coibir modalidades de fraude ou manipulação destinada a criar condições, artificiais de

demanda, oferta ou preço dos valores mobiliários negociados no mercado; f) assegurar o acesso

do público a informações sobre os valores mobiliários negociados e as companhias que os

tenham emitido; g) assegurar a observância de práticas comerciais eqüitativas no mercado de

valores mobiliários; h) assegurar a observância, no mercado, das condições de utilização de

crédito fixadas pelo Conselho Monetário Nacional; i) regulamentar, com observância da política

definida pelo Conselho Monetário Nacional, as matérias previstas na lei que a criou e na Lei de

Sociedades por Ações; j) administrar os registros instituídos na lei que a criou; k) fiscalizar

permanentemente as atividades e os serviços do mercado de valores mobiliários, bem como a

veiculação de informações relativas ao mercado, às pessoas que dele participem, e aos valores

nele negociados; l) propor ao Conselho Monetário Nacional a eventual fixação de limites

máximos de preço, comissões, emolumentos e quaisquer outras vantagens cobradas pelos

intermediários de mercado; m) fiscalizar e inspecionar as companhias abertas, dada prioridade

às que não apresentem lucro em balanço ou às que deixem de pagar o dividendo mínimo

obrigatório.

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66

6.1. Aulas 5 e 6: A CVM e os casos de alienação de controle nas

sociedades anônimas

A) Ementário de Temas

A alteração e alienação de controle nas sociedades anônimas. O papel da Comissão de Valores

Mobiliários, transferência do bloco de controle e as recentes operações. A proteção aos

minoritários.

B) Material de Leitura

Leitura Básica

FILHO, Alfredo Lamy e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Rio de

Janeiro: Forense, 1ª Edição 2009. Volume I, Rio de Janeiro, 1ª Edição, 2009. pág. 808 – 864

(Acionista Controlador e Proteção da Maioria), Volume II, pág. 1998 – 2024 (Alienação de

Controle)

Leitura Complementar

SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do Controle Acionário –

Interpretação e Valor. Niterói, FMF Editora, 2004

C) Roteiro de Aula

O art. 254-A veio a reboque do problema de análise, que era subjetiva, da existência de efetiva

transferência do poder de controle.

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67

Com a lei 10.303/2001, que trouxe a inserção desse dispositivo ao ordenamento jurídico, foi

feita a proposta de compra das ações pertencentes aos acionistas minoritários obrigatória. O

objetivo dessa política de proteção ao interesse do minoritário pelo legislador pátrio tem como

fundamento não deixar o minoritário ser absorvido por um controle que pode-se tornar abusivo

e que, acima de tudo, não é de seu interesse.

Legislação aplicável

Inicialmente, na companhia aberta o legislador pátrio havia estabelecido nos arts. 254 e

255 um sistema especial de proteção aos acionistas minoritários, este que foi revogado com o

advento da Lei nº 9457/97. Tal sistema visava conferir aos acionistas minoritários os mesmos

direitos dos controladores nas operações que envolvessem reorganização societária através de

alienação de controle.

Assim, a alienação de controle dependeria de prévia autorização da CVM, o que só

ocorreria com oferta pública para aquisição de ações dos acionistas minoritários.

A função da Lei nº 9457/97, logo, foi eliminar do cenário jurídico das sociedades

anônimas abertas a necessidade de realização estipulada por lei de oferta pública para aquisição

de ações dos acionistas minoritários.

A restauração desse sistema foi feita pela alteração da Lei 6404/76 pela Lei 10303/01

que introduziu o art. 254-A. Com esse artigo, algumas inovações ocorreram. A principal foi a

abrangência do conceito da alienação do controle, estendendo-o à transferência direta ou

indireta do bloco de controle. Nas palavras de Tavares Borba "A lei consagrou o direito de os

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68

acionistas com voto, que não integrem o bloco de controle, receberem uma oferta pública de

compra de suas ações por no mínimo oitenta por cento do preço pago aos controladores" 54

Além disso, a oferta não é mais simultânea, mas sim se torna uma condição suspensiva ou

resolutiva do contrato que estabelece a compra e venda das ações.

A Lei nº 10.303, de 2001, modificou a LSA, que agora dispõe dos requisitos mais substancias

no que tange a alteração de controle em uma sociedade anônima. A Comissão de Valores

Mobiliários (―CVM‖) também baixou instrução normativa 361, de 2002.

O artigo 254-A assim prevê as disposições acerca da alienação de controle:

Art. 254-A. A alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta somente

poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou resolutiva, de que o adquirente se

obrigue a fazer oferta pública de aquisição das ações com direito a voto de propriedade

dos demais acionistas da companhia, de modo a lhes assegurar o preço no mínimo igual

a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação com direito a voto, integrante do

bloco de controle. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

§ 1º. Entende-se como alienação de controle a transferência, de forma direta ou

indireta, de ações integrantes do bloco de controle, de ações vinculadas a acordos de

acionistas e de valores mobiliários conversíveis em ações com direito a voto, cessão de

direitos de subscrição de ações e de outros títulos ou direitos relativos a valores

mobiliários conversíveis em ações que venham a resultar na alienação de controle

acionário da sociedade. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

O § 4 do Artigo 254-A dispõe que o adquirente de controle acionário de companhia aberta

poderá oferecer aos acionistas minoritários a opção de permanecer na companhia, mediante o

54

BORBA, José Edvaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro, 11ª Edição, Renovar,

2008, pág. 523

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69

pagamento de um premio equivalente à diferença entre o valor de mercado das açõpes e o valor

pago por ação integrante do bloco de controle.

Função da CVM e sua Legislação

A CVM trouxe para o seu escopo de atuação na regulamentação do mercado a necessidade de

dispor sobre essas situaçãoes no mercado mobiliário. Foi atribuída à CVM a obrigação de zelar

pela proteção às minorias assegurando, logo, aos acionistas não-controladores, o recebimento de

proposta de compra por suas ações.

Diante disso, leciona o autor Carlos Augusto Junqueira da Siqueira nos seguintes termos:

―No desempenho dessa atribuição, a CVM atua nos procedimentos relativos à alienação

de controle, não apenas verificando os requisitos formais do negócio e da posterior

oferta pública de extensão, como, principalmente, procedendo ao exame do preço e das

condições que serão estendidas na oferta para a compra das ações votantes existentes

em circulação.

Constitui seu dever legal assegurar aos acionistas não-controladores o recebimento de

proposta de compra por suas ações, nos termos determinados pela lei. Poderá, para

tanto, definir o preço e as condições da oferta. Não só por critérios apropriados, mas,

especialmente, com fundamento nas condições verificadas na transferência de controle,

concluindo em linha a realidade econômica da transação”55

Sugere-se no mundo acionário que o papel da regulamenteção é dar ao escopo da transferência

acionária do controle um revestimento jurídico, uma proteção que impeça o poderio econômico

de abduzir as formalidades ora necessárias para o fiel retrato da estrutura corporativa ser

mantida.

55

SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do Controle Acionário – Interpretação e Valor. 2004.

Pág. 29

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70

É por essa complexidade que persiste que a CVM tornou-se não somente um órgão

complementariamente legislador, mas também um órgão julgador. A análise de casos concretos

pelo órgão abriu diversos precedentes e criou uma rede jurisprundencial cuja referência e

aplicação em muito se assemelha à existente no Poder Judiciário. Diz Junqueira de Siqueira que

―Em face da complexidade apresentada em muitas operações da espécie, a CVM adotou, como

premissa, proceder à análise casuística das transferências de controle acionário para melhor

exercer seu dever de tutela que visa a preservar os direitos dos acionistas minoritários”56

O artigo 29 da Instrução CVM 361/02 dispõe, assim, sobre a necessidade ou não de realização

de OPA:

Instrução CVM nº 361/02

Art. 29. A OPA por alienação de controle de companhia aberta será obrigatória, na

forma do art. 254-A da Lei 6.404/76, sempre que houver alienação, de forma direta ou

indireta, do controle de companhia aberta, e terá por objeto todas as ações de emissão

da companhia às quais seja atribuído o pleno e permanente direito de voto, por

disposição legal ou estatutária.

(...)

§ 4º. Para os efeitos desta instrução, entende-se por alienação de controle a operação,

ou o conjunto de operações, de alienação de valores mobiliários com direito a voto, ou

neles conversíveis, ou de cessão onerosa de direitos de subscrição desses valores

mobiliários, realizada pelo acionista controlador ou por pessoas integrantes do grupo

de controle, pelas quais um terceiro, ou um conjunto de terceiros representando o

mesmo interesse, adquira o poder de controle da companhia, como definido no art.

116 da Lei 6.404/76.

56

SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do Controle Acionário – Interpretação e Valor. 2004.

Pág. 30

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71

§ 5º. Sem prejuízo da definição constante do parágrafo anterior, a CVM poderá impor a

realização de OPA por alienação de controle sempre que verificar ter ocorrido a

alienação onerosa do controle de companhia aberta.

O Conceito do Poder de Controle

A expressão ―controle‖ é usada na Lei 6404/76 (―LSA‖) em diferentes acepções. Em

determinados momentos, ao ―poder de controle‖, em outros, representa o ―bloco de controle‖.

Dessa forma, é preciso antes tudo situar os dois conceitos dentro do cenário de uma

restruturação societária.

O ―Poder de controle‖, conforme ditado por Bulhões Pedreira, no Direito das Companhias, é

o ―poder supremo da estrutura hierárquica da companhia exercido pelo acionista controlador,

titular da maioria pré-constituída dos votos na Assembleia Geral.‖, enquanto o ―Bloco de

controle‖ é o ―conjunto de ações de propriedade do acionistas controlador; „bloco‟ porque é

considerado coletivamente, e „de controle‟, porque é a fonte do poder de controle.”

Outro conceito já utilizado pela doutrina é do ―valor de controle”. Enquanto o poder de

controle é detido exclusivamente pelos acionistas controladores, estes somente poderão

apropriar o valor de controle. Esse conceito engloba o aspecto econômico contido na companhia

aberta.

Nos termos do art. 116 da LSA, que prevê as disposições acerca do acionista controlador, uma

das modalidades do acionista controlador (pessoa ou grupo de pessoas) é ―é titular de direitos

de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da

assembléia-geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia‖.

Nesse ponto, a diferença que existe entre os conceitos de ―acionista controlador‖ (do art. 116, da

LSA) e ―controle‖ (do art. 254-A, §1º, da LSA) foi bem definida pelo colegiado da CVM em

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72

caso real com uma evolução na interpretação trazendo uma situação que se assemelhe mais das

situações fáticas57

:

―acionista controlador‖ (art. 116) exige: (a) a titularidade de direitos de sócio que

garanta, de modo permanente, a maioria dos votos em Assembleia e poder de eleger a

maioria dos administradores; e cumulativamente (b) o uso efetivo do poder de controle.

―controle‖ do art. 254-A, §1º, da LSA, não traz qualquer menção ao exercício efetivo do

poder de controle, tratando apenas da propriedade de bens (bloco de controle) que

permitam o seu exercício, tal como no §2º, do art. 243, da LSA.

O colegiado no caso CBD optou pela mais ampla interpretação que se deve dar à expressão

―alienação direta e indireta‖, prevista no art. 254-A ―para a aplicação do art. 254-A, se em uma

operação não se verificar a transferência de valores mobiliários que implique na alienação de

controle, deve-se analisar se essa alienação ocorreu de forma indireta (i.e., mediante acordos

que resultem na transferência de poder político e econômico desses valores mobiliários).‖

Nesse pensamento, o poder de controle pode ser incorporado por dois tipos de aquisição:

originária e derivada. Lembre-se que o poder de controle evoluiu ao longo do tempo com a

presunção da necessidade de respeito ao princípio da governança corporativa que denota a real

assunção do controle diretivo das atividades

Aquisição Originária: Quando o poder de controle adquirido é resultante da formação,

no patrimônio de uma pessoa, de bloco de controle que antes não existia no patrimônio

de outra.

Aquisição Derivada: Quando o poder de controle adquirido é resultante de determinado

fato jurídico, cujo efeito seja a transmissão da propriedade de bloco de controle detido

por uma pessoa (ou grupo de pessoas).

57

Caso CBD (Proc. CVM 2005/4069)

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73

Ainda, Bulhões Pedreira e Lamy Filho conceituam a palavra controle que ―denota a capacidade

de um agente de intencionalmente fazer algo ou produzir um resultado, e essa capacidade

pressupõe (a) uma relação entre o agente que detém o poder e o objeto a ele submetido e (b)

uma fonte do poder.‖58

Nesse conceito, a aquisição do poder de controle pressupõe a do bloco de controle, mas

entende-se que a simples aquisição do poder de controle é passar a ter controle de fato da

companhia. Não se confunde com a aquisição do bloco de controle que é quando há aquisição

das ações que compõe o bloco que dá o controle de fato. A propriedade do bloco de controle

pressupõe, pelo menos, ser usufrutário de direito de voto conferido pelas ações).

Análise de Jurisprudência da CVM

Recentes Operações

Caso Aracruz Celulose (Proc. CVM 2001/10329)

A divisão acioniária da sociedade era a seguinte: i) Acionistas minoritários: 3,5%; ii) Três

diferentes grupos de acionistas representando cada um, respectivamente, 12,5%, 28% e 28% do

capital social e iii)VCP: 28%

58

Bulhões Pedreira e Lamy Filho. Direito das Companhias. Pág. 824

Aracruz Celulose

minorit

ários X Y Z VVCCPP

3,5% 12,5% 28% 28% 28%

Bloco de Controle

(Acordo de Acionistas)

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74

Controle por acionistas unidos por acordo.

No voto do Relator Marcelo Trindade, encontramos o escopo da solução do caso:

―Como se vê, a lei trata de três possibilidades de controle da sociedade: (i) o controle

detido isoladamente por pessoa física ou jurídica, (ii) o detido por grupo de pessoas

unidas por acordo de acionistas, e (iii) o exercido diretamente por um grupo de pessoas

jurídicas, controladas por um controlador comum, que então controlará a sociedade

indiretamente. No caso dos autos se está claramente diante de uma hipótese de controle

detido por um "grupo de pessoas vinculadas por acordo de voto, composto por

BNDESPAR, Grupo Lorentzen, Grupo Safra e agora pela VCP, em substituição ao

Grupo Mondi.‖

Nos termos do voto proferido, ―este caso não desafia as complexas questões que podem surgir

quanto ao conceito de alienação de controle detido por grupo de acionistas unido por acordo.

Aqui não houve alienação de uma participação majoritária dentro do bloco de controle, (...)

nem se está diante da aquisição de uma participação que, somada àquela já detida pelo

adquirente, o eleve à condição de controlador único. No caso destes autos houve simplesmente

a transferência de uma participação que compõe o bloco de controle‖.

Conclusão

No entendimento de Marcelo Trindade a operação tomou os seguintes contornos: ―Grupo Mondi

não alienou nem a VCP adquiriu o controle da sociedade, pois nem o Grupo Mondi detinha

isoladamente, nem a VCP adquiriu o poder de, isoladamente, exercer "a maioria dos votos nas

deliberações da assembléia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da

companhia".

Por entendimento desse voto não foi considerada obrigatória a realização de OPA, pois nem o

vendedor isoladamente detinha o poder de controle, nem a VCP o adquiriu isoladamente.

Caso Polipropileno (Proc. CVM 2005/6228)

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75

Análise pela Superintendência de Registro sobre necessidade de OPA na alienação de controle

no pedido da Suzano Química Ltda., por meio do Banco Itaú BBA S.A., para o registro de

Oferta Pública de Aquisição de Ações ("OPA") ordinárias e preferenciais para cancelamento de

registro de companhia aberta de Polipropileno S.A.

O controle da Propileno era exercido conjuntamente e igualmente pela Suzano e Basell

Poliofeinas Ltda.

Nos termos do parecer auto explicativo:

―12. A Suzano Petroquímica S.A. adquiriu a Basell Poliolefinas Ltda. passando a deter o

controle da Polibrasil Participações S.A., que por sua vez detém 98,1% do capital total

da Emissora. O desembolso líquido da aquisição foi de US$ 253,8 milhões, pois a

compra incluiu a venda simultânea, para a Basell International Holdings BV, da

Norcom Compostos Termoplásticos do Nordeste S.A., pelo valor de US$ 23 milhões;‖

―15. Em conseqüência da aquisição acima referida inexistiu qualquer alteração no

controle da citada Emissora (vez que ele continua sendo exercido por Polibrasil

Participações S.A.), assim como no seu controle indireto que, se anteriormente era

exercido em conjunto por Suzano Petroquímica S.A. e Basell Brasil Poliolefinas Ltda.,

agora passa a ser exercido, de forma isolada, por Suzano Petroquímica S.A.‖

―16. Finalmente, conclui o parecer, que a obrigação de apresentação de oferta pública,

derivada de alienação do controle de companhia aberta, apenas há quando o poder de

controle da sociedade é alienado a terceiros;‖

Conclusão

A SRE aceitou parecer no sentido de que ―inexistiu qualquer alteração no controle‖ da

Prolipoleno, seja no seu controle direto, não sendo exigida a OPA. Assim, como já

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76

mencionando acima, cabe à CVM fazer uma análise casuística para assim poder aproximar suas

decisões da realidade do Mercado.

O voto do relator é iniciado com a seguinte explicação: ―Com o advento da Lei nº 10.303/01, foi

introduzido no ordenamento jurídico o artigo 254-A com redação semelhante àquela do

revogado artigo 254, e, em especial seu § 1º, entendendo a expressão "alienação de controle"

como "a transferência, de forma direta ou indireta, de ações integrantes do bloco de controle,

de ações vinculadas a acordos de acionistas e de valores mobiliários conversíveis em ações

com direito a voto, cessão de direitos de subscrição de ações e de outros títulos ou direitos

relativos a valores mobiliários conversíveis em ações que venham a resultar na alienação de

controle acionário da sociedade."

Segue: ―A Instrução CVM nº 361/02, em seu artigo 29, traz as hipóteses de incidência, objeto e

preço das ofertas públicas por alienação de controle de companhia aberta e, em seu § 4º,

entende por "alienação de controle" a alienação de valores mobiliários com direito a voto

realizada pelo acionista controlador ou por pessoas integrantes do grupo de controle, pela qual

um terceiro adquire o poder de controle da companhia, remetendo ao art. 116 da Lei nº

6.404/76.‖

Caso Copesul (Proc. CVM 2007/7230)

Nesse caso, a CVM julgou o precedente de que: i) pode analisar diferentemente cada caso; e, ii)

a alienação de controle, sempre que onerosa, ensejará a realização obrigatória de OPA.

Nos termos do voto proferido, são apenas duas as caraterísticas que determinam a realização de

uma OPA: i) quando a titularidade do poder de controle é conferida a pessoa diversa do anterior

detentor do controle, e ii) quando a transferência de ações do bloco de controle é realizada a

título oneroso, com ônus e bônus tanto para o alienante quanto para o adquirente.

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77

Olhando a estrutura societária do grupo de sociedades:

Braskem e IPQ eram signatárias de acordo de acionistas e participavam do controle da Copesul

com decisões de comum acordo.

Conclusão

A operação se caracterizou como sendo consolidação do controle nas mãos do controlador

Braskem

Bunge (Processo CVM 2001/11663)

Na situação de julgamento desse caso, discutiu-se a necessidade de OPA para fechamento de

capital da Bunge Fert. e da Bunge Alim, em virtude da operação de incorporação de ações.

A CVM observou a redação do art. 264, §4º, da LSA, que expressamente aplica a regra do caput

do art. 264 às operações de ―incorporação de ações de companhia controlada ou controladora‖.

Copesul

minoritários

BBrraasskkeemm Petrobras

Copesul

minoritários IPQ Braskem

ICQ Bloco de Controle

(Acordo de Acionistas)

IPQ

ICQ

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78

A CVM entendeu que inexiste a necessidade de regulação pela CVM, no que toca à operação de

incorporação de ações, e no que tange a proteção dos acionistas minoritários nesta operação.

Desde que cumpridos os requisitos legais e inexista o abuso do acionista controlador, uma

obrigatoriedade de OPA seria prejudicial ao bom andamento de eventuais reorganizações

societárias.

Sadia/Perdigão (Processo CVM 2009/4691)

Uma das mais recentes operações no mercado acionário que envolveram a alienção de controle

foi a compra da Sadia pela Perdigão. A operação foi organizada em duas etapas e ao fim 100%

do capital social da Sadia passaria a ser detido pela nova sociedade, Brasil Foods. Nos termos

do relatório da CVM ―Na primeira etapa, as ações pertencentes aos integrantes do bloco de

controle da Sadia foram conferidas ao capital social da HFF (empresa veículo), recebendo os

titulares em questão, por cada ação ON da SADIA, uma ação do capital social da HFF. Ato

contínuo, as ações de HFF foram incorporadas pela BRF de acordo com uma relação de troca de

0,166247 ação da BRF para cada ação ON da HFF. A segunda etapa envolve a incorporação das

ações pertencentes aos minoritários da SADIA pela já controladora BRF, segundo uma relação

de troca de 0,132998 ação da BRF para cada ação ON ou PN de emissão da Sadia. Desse modo,

a operação contempla relações de troca diferenciadas, sendo a relação em favor dos acionistas

que integravam originalmente o bloco de controle da Sadia e de pessoas a eles ligadas mais

vantajosa.‖

min.BF

Serrana

min.BA

100%

Acionistas

Bunge Fert.

min.BF Serrana

Bunge Alim.

min.BA

Acionistas

Bunge Fert. Bunge Alim.

100%

Incorporação

de ações

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79

Assim, no entendimento do Diretor Marcos Barbosa Pinto ―na prática, essas duas

incorporações configuram uma única operação, por meio da qual Perdigão e Sadia

combinarão seus negócios e suas bases acionárias‖

Invocando a Lei das Sociedades Anônimas, esclarece que o art. 115, §1º faz com que os

acionistas controladores da Sadia sejam impedidos de votar na assembléia que deliberar sobre a

operação, pois ―Analisando a operação como um todo, fica claro que ela confere um benefício

particular aos antigos controladores de Sadia. Ao final da operação, cada ação dos acionistas

controladores de Sadia será substituída por 0,166247 ação da Brasil Foods S.A., nova

denominação da Perdigão. Porém, cada ação dos demais acionistas de Sadia S.A. será

substituída por apenas 0,132998 ação da Brasil Foods‖.

D) Texto de Apoio

Transferência de controle minoritário 59

11 de agosto de 2009

Leslie Amendolara

O mercado de capitais brasileiro começa a ganhar algumas características do mercado

americano com o surgimento de empresas sem o controle formal majoritário de 50% das ações

votantes por quem detenha sozinho esse percentual ou através de acordos de acionistas (controle

compartilhado). Essa novidade despertou a atenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)

quando da questão da venda das ações da Tim Participações em situação de controlador

minoritário. A autoridade regulatória entendeu desnecessária a oferta pública, não acatando a

solicitação de oferta requerida por uma gestora de recursos que pretendia poder vender as ações

de um fundo através do tag along.

Um dos aspectos mais intrigantes do mundo acionário é o estabelecimento preciso do conceito

de controle de uma companhia. O legislador da lei atual: Lei nº 6.404, de 1976, diríamos, ousou

fazê-lo, deixando, porém, no rastro de sua ousadia algumas dúvidas que a doutrina tem

procurado sanar.

59

Amendolara, Leslie. Transferência de controle mintoritário. Artigo publicado no jornal ―Valor Econômico‖ em

11 de agosto de 2009

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80

Assim, a Lei das Sociedades Anônimas, em seu artigo 116, conceituou nas alíneas a e b como

requisitos para ser considerado acionista controlador: ―a) ser titular de direito de sócios que lhe

assegurem de modo permanente a maioria dos votos nas deliberações em assembleia geral e o

poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; b) usa efetivamente o poder para

dirigir as atividades sociais e orientar o seu funcionamento.‖ Da análise acurada dessas alíneas

verifica-se que o legislador, prudentemente, não fixou qualquer percentual de votos para

conceituar alguém como controlador. Bastaria que detivesse votos suficientes para deliberar em

assembleias de modo permanente, elegendo os administradores e usando esse poder para dirigir

a empresa.

Do ponto de vista dos ―quori‖ para deliberar, com exceção daquele previsto para as matérias do

artigo 136, considerado voto qualificado, em que a norma exige no mínimo a presença em

assembleia de 50% dos acionistas votantes para deliberar, os demais poderão ocorrer com

qualquer número em segunda votação. Mesmo no caso do artigo 136, parágrafo 2º, que

estabelece que a CVM pode autorizar a redução do quorum qualificado se a empresa tiver suas

ações dispersas no mercado e ―cujas três últimas assembleias tenham sido realizadas com a

presença de acionistas representando menos da metade das ações com direito a voto‖.

A questão que se propõe a analisar então é saber se a venda desse controle minoritário exigirá

oferta pública do adquirente para comprar também as ações ordinárias dos minoritários,

portanto, a obrigação do tag along. Essa nova questão, diferente da primeira, exige uma

interpretação teleológica, perquirindo-se a finalidade da lei na falta de expresso amparo legal.

O objetivo da norma que criou o tag along foi proteger o acionista minoritário de duas formas:

conceder-lhe parte do ágio recebido pelo controlador (80%), e propiciar a esses acionistas a

possibilidade de vender suas ações, na dúvida ou incerteza dos rumos que a companhia tomará

com a alteração do controle.

Fábio Konder Comparato admitiu, plenamente, a existência de um controle minoritário na

sociedade anônima ao mencionar que:

―A rigor, um controle minoritário bem estruturado, em companhia com grande

pulverização acionária pode atuar com a mesma eficiência que um controle majoritário‖

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81

Como consequência da evidente existência de um controle minoritário, conclui-se então que

caberá a aplicação do instituto do tag along também nessas hipóteses.

O terceiro aspecto a considerar é o percentual para estabelecer o que é controle minoritário, uma

vez resolvida de modo satisfatório a questão em comento. Parece-nos aqui o lado mais difícil de

definir, como afirmou a presidente da CVM em nota publicada no jornal Valor: ―para evitar a

excessiva subjetividade de análises puramente casuísticas.‖ Logo em seguida, sugere que esse

percentual seja de 30%, presumindo-o como representativo do controle minoritário.

O estabelecimento de um percentual fixo, seja de 30% mais ou menos, não resolve, a nosso ver,

de maneira plena o problema. Fábio Comparato, na obra citada, menciona a lei sueca sobre

sociedade por ações que dispõe: ―uma sociedade é considerada controladora de outra não

somente quando possui mais da metade do seu capital votante, mas também quando possui uma

influência decisiva sobre outra companhia em razão de sua participação acionária‖. Modesto

Carvalhosa, por sua vez, ao analisar o conceito de controle legal, destaca o requisito da atuação

do grupo de acionistas de modo permanente como atributo inerente ao controle. Diz ainda que

―é suficiente que haja prevalência do grupo nas demais deliberações societárias, para que

também a caracterização de controle se estabeleça‖ (In Comentários à Lei de Sociedades

Anônimas - Saraiva). A própria CVM, através da Instrução nº 361, de 2002,estabeleceu que

fazem parte do controle acionário, não integrando o percentual de 2/3 de acionistas minoritários

que irão aprovar ou rejeitar o fechamento de capital, os acionistas que votaram com os

controladores nas três últimas assembleias.

Em face das notórias dificuldades aqui mencionadas, entendemos que o órgão regulador deveria

caracterizar o controle minoritário com base na somatória de dois parâmetros, a saber: elevada

posição acionária do grupo - sem estabelecer um rígido percentual de propriedade de ações - e

sua decisiva influência na administração e nos negócios da empresa.

Leslie Amendolara é advogado especialista em direito empresarial

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se

responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de

qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

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Fonte: Valor Online

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83

7.1 Aulas 7 e 8: Oferta pública de aquisição de ações

A) Ementário de Temas

Conceito de oferta pública. Necessidade de realização de OPA na alienação de controle.

Modalidades de OPA. Regulação da CVM.

B) Material de Leitura

Leitura Básica

FILHO, Alfredo Lamy e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Volume

I, Rio de Janeiro, 1ª Edição, 2009. pág. 1998 – 2025 (Alienação de Controle na Companhia

Aberta), Volume II, pág. 2031-2044 (Oferta Pública para Aquisição de Controle de Companhia

Aberta).

Leitura Complementar

SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do Controle Acionário –

Interpretação e Valor. Niterói, FMF Editora, 2004

C) Roteiro de Aula

A oferta publica para aquisição de controle da companhia é atualmente prevista no direito

societário brasileiro na Lei 6.404/76, a Lei das Sociedades Anônimas (―LSA‖) e pela Instrução

Normativa CVM nº 361/2002. A doutrina evoluiu esse conceito ao longo do tempo e adaptou-se

com as mudanças legislativas, em especial a renovação da LSA com as alterações introduzidas

pela Lei 10.303/2001. No campo conceitual, ―a oferta pública para aquisição de controle de

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84

companhia aberta é uma proposta irrevogável de contratar a compra e venda ou a permuta de

ações com direito a voto de uma companhia aberta, em quantidade suficiente para assegurar ao

adquirente o controle da companhia, dirigida indistintamente a todos os titulares dessas ações

por meio de publicação em jornal de grande circulação‖.60

A LSA só dispõe de modo mais abrangente sobre a oferta pública para aquisição de controle, de

maneira a estabelecer critérios norteadores que façam configurar a necessidade ou possibilidade

de realização da OPA. As outras modalidades de OPA serão reguladas pelos dispositivos da

Instrução CVM nº 361.

De forma oportuna ao estudo desse instituto, que, de certa forma se aliou ao direito de venda

conjunta (derivado do termo em inglês ―tag along‖), procede-se a uma análise dos diversos

tipos de OPA previstos na regulamentação da CVM.

A Lei 6.404, incorporou um dispositivo, o art. 254, assegurando aos acionistas minoritários das

companhias abertas que tenham seu controle alienado o direito de receber oferta pública,

apresentada pelo adquirente do controle, de aquisição de suas ações por preço igual ao que tiver

sido pago ao alienante.

Desta forma, acolheu-se o princípio da igualdade de oportunidade a todos os acionistas titulares

de ações da mesma espécie. A oferta pública de aquisição de ações (OPA) é uma operação

através da qual um acionista ou uma sociedade pretende comprar uma participação ou a

totalidade das ações de uma empresa listada na BOVESPA.

Modalidades de OPA

São reguladas pelo art. 2º da Instrução Normativa CVM 361/2002, podendo ocorrer em seis

modalidades:

Art. 2º - A Oferta Pública de Aquisição de ações de companhia aberta

(OPA) pode ser de uma das seguintes modalidades:

60

FILHO, Alfredo Lamy e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Volume I, Rio de

Janeiro, 1ª Edição, 2009. pág. 2031-2032

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85

I. OPA para cancelamento de registro: é a OPA obrigatória,

realizada como condição do cancelamento do registro de

companhia aberta, por força do § 4º do art. 4º da Lei 6.404/76 e

do § 6º do art. 21 da Lei 6.385/76;

II. OPA por aumento de participação: é a OPA obrigatória,

realizada em conseqüência de aumento da participação do

acionista controlador no capital social de companhia aberta, por

força do § 6º do art. 4º da Lei 6.404/76;

III. OPA por alienação de controle: é a OPA obrigatória, realizada

como condição de eficácia de negócio jurídico de alienação de

controle de companhia aberta, por força do art. 254-A da Lei

6.404/76;

IV. OPA voluntária: é a OPA que visa à aquisição de ações de

emissão de companhia aberta, que não deva realizar-se segundo

os procedimentos específicos estabelecidos nesta Instrução para

qualquer OPA obrigatória referida nos incisos anteriores;

V. OPA para aquisição de controle de companhia aberta: é a OPA

voluntária de que trata o art. 257 da Lei 6.404/76; e

VI. OPA concorrente: é a OPA formulada por um terceiro que não o

ofertante ou pessoa a ele vinculada, e que tenha por objeto ações

abrangidas por OPA já apresentada para registro perante a

CVM, ou por OPA não sujeita a registro que esteja em curso

OPA para aquisição de controle

Nas palavras de Nelson Eirizik:

―A oferta pública constitui uma proposta irrecusável, configurando-se

uma declaração unilateral de vontade e obrigando o ofertante, nos

termos do art. 1080 do Código Civil; sendo uma proposta firme e

irrevogável, não está a oferta pública de aquisição sujeita a eventuais

alterações de vontade de seu autor. Nos termos do § 2º do art. 254-A, a

CVM autorizará a alienação do controle da companhia aberta desde que

as condições atendam aos requisitos legais.‖61

Assegura-se aos acionistas minoritários das companhias abertas que tenham seu controle

alienado o direito de receber oferta pública, apresentada pelo adquirente do controle, de

aquisição de suas ações por preço igual ao que tiver sido pago ao alienante, acolhendo-se o

princípio da igualdade de oportunidade a todos os acionistas titulares de ações da mesma

61

EIRIZIK, Nelson. Oferta Pública de Aquisição: Interpretação do art. 254-A da Lei das S.A. Revista de Direito

da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. Volume XIV. Pág. 85

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86

espécie e classe, estabelecendo que todos fazem jus aos mesmos direitos e vantagens

econômicas.

A partir da entrada em vigor da recente reforma da legislação societária, em 2001, com a Lei

10.303, que introduziu o artigo 254-A, restaurou-se a obrigação de propor a OPA em caso de

alienação do controle acionário, mas deixou-se de lado o tratamento igualitário entre acionista

controlador e acionistas minoritários contido originalmente no art. 254 da LSA.

Idealmente, o instituto da OPA, que é regulado pra CVM por meio da Instrução CVM 361/2002,

que mais a seguir será detalhada, protege os direitos dos minoritários, concedendo-lhes o

beneficio da opção pela oferta pública, como forma de saída da companhia, no momento em que

o poder da sociedade sofre algum tipo de alteração ou reestruturação que influencie nos direitos

dos acionistas.

A importância das ofertas públicas para aquisição de controle já é reconhecida pela doutrina,

visto o entendimento que segue:

―Por outro lado, há de se reconhecer que as ofertas públicas para

aquisição de controle são importantes, porque constituem um mecanismo

natural de o próprio mercado depurar a eficiência da gestão das

companhias abertas. Os gestores, sentindo que podem perder seus

poderes por força de uma oferta pública, cuidam de aperfeiçoar a

administração, prover mais adequadamente informações e dedicar maior

respeito aos interesses dos acionistas. Quanto mais baixa a qualidade da

gestão, maior é a vulnerabilidade a uma tomada de controle por oferta

pública. Exerce assim a oferta pública para aquisição de controle o papel

importantíssimo de excluir do mercado os administradores e

controladores menos competentes.‖62

Destinatários

62

FILHO, Alfredo Lamy e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Volume I, Rio de

Janeiro, 1ª Edição, 2009. pág. 2035

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87

Deve-se, primeiramente, entender a generalidade da aplicação do artigo 254-A da LSA. Vale

destacar, nesse sentido, que a doutrina e a lei entendem que a regra da oferta pública se faz

aplicável a toda espécie de sociedade aberta já que a lei não estabeleceu qualquer tipo de

distinção.

A doutrina ainda discute quais devem ser os ideais destinatários da oferta pública. Pode-se

concluir, entretanto, que é pacífico o entendimento de que os ordinaristas sempre se

beneficiarão deste direito de saída conjunta, bem como os preferencialistas, quando o estatuto

social assim dispuser sobre a não vedação ao direito de voto.

O extinto artigo 254 da LSA estabelecia que deveria ser dado tratamento igualitário aos

acionistas minoritários mediante oferta pública para aquisição de ações. O critério de

minoritários abrangia a noção do estado de acionista minoritário representava um atributo

qualitativo mais do que quantitativo com referencial necessário ao poder de controle na

sociedade.

Isso porque a Resolução 401 do Conselho Monetário Nacional (―CMN‖) regulava que de

acordo com o inciso I da Resolução CMN nº 401, de 22 de dezembro de 1976 ―a alienação do

controle de companhia aberta somente poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou

resolutiva, de que o adquirente se obrigue a fazer, nos termos desta Resolução, oferta pública

de aquisição das ações com direito a voto de propriedade dos demais acionistas da companhia,

de modo a lhes assegurar tratamento igualitário ao do acionista controlador.‖

No entanto, a redação do atual artigo 254-A pacificou, em termos, esta questão, ao estabelecer

que a oferta seria destinada exclusivamente aos titulares de ações com direito a voto não

integrantes do bloco de controle. O art. 254-A não produz qualquer requisito quanto à questão

de permanência do direito de voto.

Com o entendimento de Carlos Augusto Junqueira de Siqueira entende-se que os

preferencilistas não devem ser destinatários de OPA pois, nas palavras referidas:

―a aquisição do direito de voto pelas ações preferenciais, em função do

não pagamento de dividendos, não credencia essas ações como

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88

destinatárias da oferta. Nesta circunstância excepcional, o direito de voto

é transitório e o poder de controle só é compartilhado entre as ações com

direito permanente de voto. Apenas a elas serão estendidas as condições

praticadas no negócio de transferência do controle. Se o valor praticado

na transação for partilhado entre as ações não votantes, estas estariam

apropriando-se de algo que não lhes pertence, pois as preferenciais não

compõem o poder de controle.‖63

Finalizando o entendimento, o Superior Tribunal de Justiça já julgou caso referente ao tema:

―A autorização para a transferência do controle de companhia aberta,

através da oferta pública para aquisição de suas ações, referendada pelo

Banco Central e pela Comissão de Valores Mobiliários, não envolve as

ações preferenciais, quando determina que seja assegurado tratamento

equitativo aos acionistas minoritários mediante simultânea oferta pública

(§ 1º do Art. 255, da Lei 6.404/76). Somente os acionistas minoritários

portadores de ações ordinárias estão protegidos pela lei societária.‖64

O que resta concluir, para os fins de estudo, que apesar de se tratar de uma matéria bastante

controversa, existe uma noção de transitoriedade do direito de voto dos preferencialistas, o que

os faz não serem incluídos no rol dos destinatários da OPA, entendimento ainda incorporado à

lei pela Instrução CVM nº 361/02.

OPA para cancelamento de registro

Segundo o art. 4º, § 4o da LSA:

Art. 4º, § 4º.: O registro de companhia aberta para negociação de ações

no mercado somente poderá ser cancelado se a companhia emissora de

ações, o acionista controlador ou a sociedade que a controle, direta ou

indiretamente, formular oferta pública para adquirir a totalidade das

ações em circulação no mercado, por preço justo, ao menos igual ao

valor de avaliação da companhia, apurado com base nos critérios,

adotados de forma isolada ou combinada, de patrimônio líquido contábil,

de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado, de fluxo de caixa

63

SIQUEIRA, Carlos Augusto Junqueira de. Transferência do Controle Acionário – Interpretação e Valor.

Niterói, FMF Editora, 2004 p. 369. 64

STJ – 1ª turma, Recurso Especial nº 2.276, RJ

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89

descontado, de comparação por múltiplos, de cotação das ações no

mercado de valores mobiliários, ou com base em outro critério aceito

pela Comissão de Valores Mobiliários, assegurada a revisão do valor da

oferta, em conformidade com o disposto no art. 4o-A.

Essa modalidade de OPA foi, dessa maneira, regulada pela Instrução CMV 361, que por vez

dispõe o seguinte:

Art. 16 - O cancelamento do registro de companhia aberta somente será

deferido pela CVM caso seja precedido de uma OPA para cancelamento

de registro, formulada pelo acionista controlador ou pela própria

companhia aberta, e tendo por objeto todas as ações de emissão da

companhia objeto, observando-se os seguintes requisitos:

I. o preço ofertado deve ser justo, na forma estabelecida no § 4º do

art. 4º da Lei 6.404/76, e tendo em vista a avaliação a que se

refere o § 1º do art. 8º; e

II. acionistas titulares de mais de 2/3 (dois terços) das ações em

circulação deverão aceitar a OPA ou concordar expressamente

com o cancelamento do registro, considerando-se ações em

circulação, para este só efeito, apenas as ações cujos titulares

concordarem expressamente com o cancelamento de registro ou

se habilitarem para o leilão de OPA, na forma do art. 22.

No ensejo, essa modalidade de OPA pressupõe como condições para o fechamento a

concordância e expressa aceitação da OPA por acionistas titulares de mais de dois terços das

ações em circulação, sendo a realização da OPA exclusivamente facultada ao acionista

controlador ou a própria companhia. A concordância ou discordância dar-se-á de acordo com o

procedimento do leilão em que serão concordantes com o cancelamento do registro aqueles que

aceitarem a realização da OPA e venderem suas ações em leilão, manifestando consentimento

com o cancelamento. Por outro lado, haverá discordância daqueles que ao se habilitarem ao

leilão não aceitem a realização da OPA.

OPA voluntária

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90

Já a oferta pública voluntária é a denominação para as ofertas de ―hostile takeovers‖.

Relativamente comuns em mercados com dispersão acionária, as ofertas hostis.

O nome desta operação, segundo normas da CVM em vigor é Oferta Pública de Aquisição de

ações voluntária pressupondo-se, entretanto, envolver empresas com controle acionário difuso,

sem grupo controlador. Os primeiros casos de pulverização de ações no Brasil só ocorreram em

2005, com a Lojas Renner seguindo-se, depois, o caso Sadia/Perdigão.

A base legal é o previsto no artigo 31 da Instrução CVM 361:

Art. 31 - Qualquer OPA voluntária, originária ou concorrente, de ações

de companhia aberta, quer tenha por objeto parte, quer a totalidade das

ações de emissão da companhia, obedecerá aos procedimentos de que

tratam os arts. 4º a 8º e 10 a 12, e as vedações dos arts. 14 e 15, no que

couberem.

Parágrafo único. À OPA voluntária formulada pelo acionista controlador

ou por pessoa a eles vinculada, que tenha por objeto a totalidade das

ações em circulação de emissão da companhia objeto, ou de uma

determinada classe ou espécie de ações em circulação, aplicam-se ainda

as regras da OPA para aumento de participação.

Da mesma forma que o artigo 31 sofreu alteração para prever que a aquisição da totalidade das

ações deve obedecer às regras do aumento de participação, o art. 26 que dispõe sobre as

hipóteses de incidência da OPA prevista no art. 4º, § 6º, da Lei 6404, também sofreu, tendo sido

inserida a limitação de que a aquisição de ações que enseja a obrigatoriedade de realização

desse tipo de OPA deve ser por meio diverso de OPA.

Com a mudança do art. 31, trazendo o entendimento de que a OPA voluntária que visa à

totalidade das ações deve seguir as regras da OPA por aumento de participação, se a aquisição

for por meio da OPA que já observou as suas regras, quais sejam, preço justo, revisão do preço

da oferta e registro na CVM, não se faz necessária a realização de uma nova OPA.

OPA por aumento de participação

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91

A OPA por aumento de participação é obrigatória e realizada em conseqüência de aumento de

participação no capital social pelo acionista controlador. Sempre que o acionista controlador,

pessoa a ele vinculada e outras pessoas que trabalhem em conexão, adquiram por meios

diversos de uma OPA, ações que façam-os incorrer na hipótese do art. 4º, § 6º da LSA, deverá

ser realizada a OPA obrigatória.

Importante nesse caso é a observação do complemento legislativo feito pela Instrução CVM 361

à LSA que em seu artigo estabeleceu o valor desse percentual mínimo:

Art. 26 - A OPA por aumento de participação, conforme prevista no § 6º

do art. 4º da Lei 6.404/76, deverá realizar-se sempre que o acionista

controlador, pessoa a ele vinculada, e outras pessoas que atuem em

conjunto com o acionista controlador ou pessoa a ele vinculada,

adquiram, por outro meio que não uma OPA, ações que representem

mais de 1/3 (um terço) do total das ações de cada espécie ou classe em

circulação na data da entrada em vigor desta Instrução, observado o

disposto no §§ 1º e 2º do art. 37.

Independentemente de ter atingido o percentual correspondente a um terço do total de ações de

cada espécie ou classe, a CVM poderá determinar a realização de OPA por aumento de

participação caso seja verificado, no prazo máximo de 6 meses a contar da comunicação de

aquisição de ações, que tal aquisição teve por objeto impedir a liquidez de ações; e desde que

tais acionistas possuam mais da metade das ações de emissão da companhia de determinada

espécie e classe, e tenham adquirido, isoladamente ou em conjunto, participação igual ou

superior a 10% (dez por cento) daquela mesma espécie e classe em período de 12 meses.

Ponto importante em relação à OPA por aumento de participação acionária é a sua diferença em

relação à OPA para cancelamento de registro, pois fica nesse caso vedada a desistência em caso

de revisão do preço.

OPA concorrente

A publicação da oferta pública na imprensa deverá conter as condições estabelecidas no art. 258

da LSA e dentro de 24 horas da primeira publicação, a oferta será devidamente comunicada à

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92

CVM. A oferta é irretratável, porém, pode o ofertantes até 10 dias antes do término do prazo,

melhorar sua proposta – estendendo as novas condições a todos os aceitantes.

As ofertas públicas sujeitas a registros perante a CVM somente poderão ser afetadas pelas

interferências compradoras por interferente que tenha registrado OPA concorrente junto à CVM.

A OPA concorrente tem base no direito estrangeiro e foi incorporado pela CVM na Instrução

CVM 361, nos termos que segue:

Art. 13 - A OPA concorrente observará os mesmos requisitos e

procedimentos estabelecidos por esta Instrução para a OPA com que

concorrer, inclusive quanto ao registro, se for o caso, observadas as

regras deste artigo.

§ 1º As declarações do ofertante concorrente a que se refere o inciso I do

art. 10 e o § 2º daquele artigo, somente tornar-se-ão eficazes caso ele, ou

pessoa a ele vinculada, seja ou venha a tornar-se o acionista controlador

da companhia objeto.

§ 2º A OPA concorrente deverá ser lançada por preço no mínimo 5%

(cinco por cento) superior ao da OPA com que concorrer, e o seu

lançamento torna sem efeito as manifestações que já tenham sido

firmadas em relação à aceitação desta última, cujo leilão poderá ser

adiado, se necessário, inclusive por determinação da CVM, para que se

realize na mesma data do leilão da OPA concorrente.

§ 3º Uma vez lançada uma OPA concorrente, será lícito tanto ao

ofertante inicial quanto ao ofertante concorrente aumentarem o preço de

suas ofertas tantas vezes quantas julgarem conveniente, desde que de tal

aumento dêem notícia pública, com o mesmo destaque da oferta.

§ 4º Se a OPA concorrente depender de registro, este presumir-se-á

deferido no prazo de 5 (cinco) dias contado do protocolo na CVM, desde

que:

a. trate-se de oferta concorrente de compra, ou tratando-se de oferta

concorrente de permuta, mista ou alternativa, se os valores

mobiliários ofertados forem idênticos aos da OPA;

b. o ofertante apresente as declarações de que tratam os incisos I e

II do art. 10 e o § 2º do mesmo artigo, e as informações referidas

no inciso V do art. 10 e nas alíneas (a) e (g) do inciso I do Anexo

II;

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93

c. o pedido seja instruído com contrato de intermediação nos termos

do art. 7º; e

d. o pedido seja apresentado em data que permita que a publicação

do edital da OPA concorrente se dê com antecedência mínima de

até 10 (dez) dias em relação ao leilão da OPA.

§ 5º Com exceção da hipótese do parágrafo anterior, toda OPA

concorrente que depender de registro observará os mesmos requisitos,

procedimentos e prazos estabelecidos no art. 9º.

Nesse âmbito e também quando se trata de casos de aquisição hostil, existe sempre a hipótese de

surgir uma OPA concorrente, onde uma terceira entidade efetua uma OPA alternativa a inicial,

podendo esta ser mais próxima dos interesses dos acionistas da empresa alvo. É quase uma

espécie de ―contra-OPA‖, surgindo a possibilidade da apresentação de oferta pública

concorrente.

Ainda nesse sentido, a LSA em seu artigo 262 corrobora o entendimento da CVM em que a

existência de uma oferta pública em curso não impede a formulação por um terceiro de uma

oferta concorrente, desde que sejam observadas as normas pertinentes. Nesse sentido, Carlos

Augusto da Silveira Lobo nos ensina:

“Em face de uma oferta concorrente, faculta-se ao primeiro ofertante

prorrogar o prazo de validade de sua oferta até fazê-lo coinscidir com o

da oferta concorrente. Nos termos do § 1º do artigo 261 da LSA, acima

comentado, poderá o primeiro ofertante melhorar sua oferta original

para competir com a oferta concorrente. Tais faculdades deverão ser

exercidas mediante publicação de um adiantamento ao instrumento da

oferta, exigido o prévio registro da melhoria na CVM, se a oferta

melhorada envolver a permuta de valores mobiliários”65

Vale ressaltar que o princípio da igualdade, já comentado, proclamado pela doutrina vem a ser

respeitado nessa modalidade de OPA, pois o objetivo da lei ao permitir a melhoria da oferta foi

o de colocar em pé de igualdade o ofertante inicial e ofertante concorrente. A melhoria da oferta

vem prevista no parágrafo 1º do artigo 261 da LSA.

65

FILHO, Alfredo Lamy e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Volume I, Rio de

Janeiro, 1ª Edição, 2009. pág. 2042

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94

OPA por alienação de controle

Como discutido na aula sobre alienação de controle, inicialmente, na companhia aberta o

legislador pátrio estabeleceu no art. 254-A um mecanismo similar ao tag along que obrigava a

realização de OPA em determinadas hipóteses. Dispõe o caput do artigo:

Art. 254-A. A alienação, direta ou indireta, do controle de companhia

aberta somente poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou

resolutiva, de que o adquirente se obrigue a fazer oferta pública de

aquisição das ações com direito a voto de propriedade dos demais

acionistas da companhia, de modo a lhes assegurar o preço no mínimo

igual a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação com direito a

voto, integrante do bloco de controle.

A insegurança sobre a transferência de controle societário impõe desconto sobre as ações, o que

eleva o custo de capital, dificultando a capitalização da sociedade aberta. A receptividade do

investidor a essa parcela de risco, associada à exclusão de operação de alienação do controle

sem importar o dispositivo legal, demanda algum tipo de retorno que a compense.

Esse princípio fundamental do mercado leva a compreender que a alienação de controle

dependeria de prévia autorização da CVM, o que só ocorreria com oferta pública para aquisição

de ações dos acionistas minoritários.

Isso foi objeto do sistema legislativo societário nacional, sendo introduzido, pela Lei 10303/01,

o art. 254-A na LSA. Tavares Borba afirma:

"A lei consagrou o direito de os acionistas com voto, que não integrem o

bloco de controle, receberem uma oferta pública de compra de suas

ações por no mínimo oitenta por cento do preço pago aos

controladores".66

66

BORBA, José Edvaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro, 11ª Edição, Renovar, 2008, pág. 523

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95

A alienação de controle transfere, segundo Lobo, ao adquirente, além dos poderes jurídicos

conferidos pela propriedade das ações transferidas, o poder de fato de controlar a companhia.67

Por isso, o mesmo doutrinador é claro em afirmar que deve existir um prêmio de controle a ser

pago aos minoritários, que será compreendido como parte do investimento. É desse

procedimento que se determina a OPA. Dessa forma lê-se:

“As alternativas previstas na lei em favor dos minoritários – venda das

ações ou recebimento de prêmio de optarem por permanecer na

companhia – causam a atribuição aos acionistas minoritários de uma

parcela do investimento que o adquirente se dispõe a pagar pelo controle,

reduzindo o valor que pagaria ao controlador, caso não existissem as

obrigações criadas pelo artigo 254-A. Essas obrigações exigem do

comprador do controle um investimento que compreende, além do preço

de compra do bloco de controle, a probabilidade de incorrer também no

preço de compra das ações dos minoritários ou no prêmio àqueles que

optarem por permanecer na companhia. Funcionam, portanto, como

mecanismo que transfere para os minoritários uma parte do prêmio de

controle, ou seja, da mais-valia resultante do fato de o objeto do negócio

entre o adquirente e o controlador ser o bloco de controle”68

É obrigatória e decorrente da realização do negócio jurídico de alienação de controle. A

Instrução CVM nº 361 prevê:

Art. 29. A OPA por alienação de controle de companhia aberta será

obrigatória, na forma do art. 254-A da Lei 6.404/76, sempre que houver

alienação, de forma direta ou indireta, do controle de companhia aberta,

e terá por objeto todas as ações de emissão da companhia às quais seja

atribuído o pleno e permanente direito de voto, por disposição legal ou

estatutária.

§ 1º A OPA deverá ser formulada pelo adquirente do controle, e seu

instrumento conterá, além dos requisitos estabelecidos pelo art. 10, as

informações contidas na notícia de fato relevante divulgada quando da

alienação do controle, sem prejuízo do disposto no inciso I do § 1º do art.

33, se for o caso.

§ 2º O requerimento de registro da OPA de que trata o "caput" deverá ser

apresentado à CVM no prazo máximo de 30 (trinta) dias, a contar da

celebração do instrumento definitivo de alienação das ações

67

FILHO, Alfredo Lamy e BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Forense,

1ª Edição 2009. Volume I, Rio de Janeiro, 1ª Edição, 2009. pág. 1999 68

Idem. pág. 2000

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96

representativas do controle, quer a realização da OPA se constitua em

condição suspensiva, quer em condição resolutiva da alienação.

§ 3º O registro da OPA pela CVM implica na autorização da alienação

do controle, sob a condição de que a oferta pública venha a ser efetivada

nos termos aprovados e prazos regulamentares.

§ 4º Para os efeitos desta instrução, entende-se por alienação de controle

a operação, ou o conjunto de operações, de alienação de valores

mobiliários com direito a voto, ou neles conversíveis, ou de cessão

onerosa de direitos de subscrição desses valores mobiliários, realizada

pelo acionista controlador ou por pessoas integrantes do grupo de

controle, pelas quais um terceiro, ou um conjunto de terceiros

representando o mesmo interesse, adquira o poder de controle da

companhia, como definido no art. 116 da Lei 6.404/76.

§ 5º Sem prejuízo da definição constante do parágrafo anterior, a CVM

poderá impor a realização de OPA por alienação de controle sempre que

verificar ter ocorrido a alienação onerosa do controle de companhia

aberta.

§ 6º No caso de alienação indireta do controle acionário, o ofertante

deverá submeter à CVM, juntamente com o pedido de registro, a

demonstração justificada da forma de cálculo do preço devido por força

do art. 254-A da Lei 6.404/76, correspondente à alienação do controle da

companhia objeto.

Está em clara conexão com a LSA no que tange como requisito para aprovação da transferência

de controle.

“Art. 254-A § 2º A Comissão de Valores Mobiliários autorizará a

alienação de controle de que trata o caput, desde que verificado que as

condições da oferta pública atendem aos requisitos legais.”

Nisso, a doutrina é enfática sobre a perpetuação da modalidade de OPA para alienação de

controle nos casos previstos no art. 254-A. Carvalhosa e Eirizik, por exemplo, dispõem:

“Nos termos do § 2º do art. 254-A, a CVM autorizará a alienação do

controle da companhia aberta desde que as condições da oferta pública

atendam aos requisitos legais. Assim, tal como ocorria no regime

anterior, quando vigente a R. 401/76, o poder da CVM é vinculado, não

lhe competindo entrar no exame de oportunidade ou da conveniência da

alienação de controle, mas meramente verificar se a oferta pública está

assegurando aos titulares de ações com direito de voto o pagamento de

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97

preço no mínimo igual a 80% do valor pago por ação com direito de voto

integrante do bloco de controle.”69

Regulação do Novo Mercado

Por fim, o Novo Mercado tem estudado regras para adaptar a legislação brasileira aos moldes

europeus. Por conta do processo de revisão das normas desse segmento, resolveu-se incluir na

pauta a proposta de adotar regra semelhante às da diretiva da União Européia e do City Code do

Reino Unido. Nesses instrumentos legais existe a indicação de necessidade de OPA na hipótese

de alienação de percentual de ações representativas ao status de presunção de controle.

De todas as propostas da reforma, é esta que torna compulsória a OPA quando um investidor

compra determinada participação acionária que foi a mais bem recebida pelos investidores das

companhias, pois ajuda a esclarecer o rol de direitos dos minoritários nas transações que

configuram alienação de controle. A segurança jurídica que é agregada ao viés econômico é de

relevante valor.

Na Europa, fica a cargo dos países estabelecerem esse percentual (na média, em torno de 33%

das ações votantes) enquanto no Reino Unido, desde 1972, está definido para o controle para

fins de imposição da OPA como a titularidade de ações que representem 30% do total de ações

votantes. No Brasil, a implementação da regra de percentual predeterminado para adoção de

OPA pode trazer segurança aos investidores, apesar de suscitar críticas de parte do meio

advocatício, como severifica a seguir:

―A norma convive cronicamente com o incentivo a transações que

envolvem, dentre outras possibilidades, estruturas piramidais, regras de

jurisdições distintas, além de um elusivo conceito de “atuação em

concerto” entre os acionistas, que deixa dúvidas se, por meio de acordo

formal ou simples entendimento informal, esses cooperaram para obter

ou exercer o controle da companhia. Parece-me que, portanto, na melhor

69

CARVALHOSA, Modesto e EIRIZIK, Nelson. A Nova Lei das S.A. São Paulo, Ed. Saraiva, 2002, pág. 408

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98

das hipóteses, a regra substitui riscos, ou seja, troca-se a aparente

incerteza sobre a transferência de controle pelos riscos acima citados.‖70

O que fica em discussão no cenário jurídico do mercado de capitais é o percentual ideal para o

qual deve ser previsto a OPA. Enquanto a recomendação hoje é de 30%, há um setor da

advocacia societária que considera esse número alto demais. Argumenta-se que o grau de

pulverização acionária pode ser tamanho que mesmo um baixo valor percentual já pode ser

indicativo de presunção de controle.

D) Leitura complementar

CVM descarta OPA no caso TIM, mas admite tag along para venda de controle

minoritário71

Para quem ainda tem alguma dúvida, a presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM),

Maria Helena Santana, esclarece: o atual colegiado do órgão regulador do mercado de capitais

brasileiro acredita que uma alienação de controle de fato, mas não de direito, pode exigir sim a

concessão do chamado tag along. Esse é o direito do acionista minoritário, previsto no artigo

254-A da Lei das S.As., de receber, por ação ordinária, 80% do preço pago por ação do

controlador, quando o controle é vendido.

Maria Helena está apenas ratificando um posicionamento que, na sua visão, ficou claro num

julgamento recente dos diretores da autarquia. Contrariando uma decisão histórica tomada no

início do ano pela área técnica da CVM, o colegiado desobrigou o consórcio de investimentos

Telco, que tem como principal acionista a Telefônica, de comprar as ações dos minoritários da

TIM Participações. Após analisar o recurso da Telco, concluiu que o consórcio não adquirira o

controle da operadora de celular ao comprar dos grupos Pirelli e Sintonia, em 2007, a Olimpia,

dona de 17,99% da Telecom Itália (controladora indireta da TIM).

70

GREBLER, Gustavo. Opinião em Você concorda com a OPA obrigatória, quando da aquisição de determinada

participação minoritária, conforme proposto na reforma do Novo Mercado? Revista Capital Aberto Ano 7, No. 76,

Dezembro/2009

71

AZEVEDO, Simone e GREGÓRIO, Daniel. CVM descarta OPA no caso TIM, mas admite tag along para venda

de controle minoritário. Revista Capital Aberto Ano 7, No. 73 (Setembro/2009), pág. 66 a 68

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99

Portanto, a Telco foi dispensada de estender uma oferta pública de aquisição (OPA) aos

ordinaristas da subsidiária brasileira. Mas isso ocorreu porque o colegiado, por maioria,

entendeu que não houve alienação de controle. Se tivesse chegado a uma conclusão diferente,

pelo que consta, seria o primeiro caso no Brasil em que uma alienação de controle minoritário

— com menos da metade das ações com direito a voto — ensejaria o tag along.

Identificar o exercício do poder de controle com uma participação menor do que 50% pode ser

uma missão duríssima. Tanto é que causou um racha entre os diretores da CVM. Só o diretor

Marcos Barbosa Pinto acompanhou o voto vencido do relator do processo, Eliseu Martins, que

viu ali uma venda de controle indireto e a consequente necessidade de execução de OPA. Os

outros três membros do colegiado discordaram dessa tese. Porém, para justificarem seus votos,

usaram fundamentações distintas entre si. Para Eli Loria, a aplicação do 254-A ―não abrange a

alienação de controle minoritário‖. Otávio Yazbek não encontrou elementos suficientes para

caracterizar o poder de controle exercido pela Olimpia. Já a presidente Maria Helena se apoiou

na regulamentação italiana, segundo a qual a compra da 17,99% do capital da Telecom Itália

pela Telco não significou uma aquisição de controle.

As diferentes argumentações deixaram alguns investidores e advogados com a impressão de que

não se pode extrair lição nenhuma dos votos dos diretores. Um consenso mínimo poderia

aumentar a previsibilidade sobre as próximas decisões do colegiado em situações semelhantes.

―A ausência de pontos em comum pode gerar insegurança jurídica‖, teme Carlos Alexandre

Lobo, sócio do escritório Pinheiro Neto.

Entretanto, cabe destacar que o diretor Otávio Yazbek, ao contrário do colega Eli Loria, admitiu

em seu voto a possibilidade de o tag along ser legítimo em uma transferência de controle

minoritário — embora seja muito difícil detectar o controle nessas situações, declarou Yazbek à

CAPITAL ABERTO. Ou seja, ao menos uma convergência houve: a maioria dos diretores

reconhece o tag along nessas circunstâncias, algo certamente inédito no colegiado

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100

Nova regra da CVM visa a dar mais informações para investidores sobre as ofertas

públicas de aquisição72

Quando arquitetou a oferta pública de aquisição de ações (OPA) da GVT pela Telefônica, em

setembro de 2009, a advogada Adriana Pallis, sócia do escritório Machado, Meyer, Sendacz e

Opice, percebeu que a Instrução 361 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) não abrangia

todas as questões que envolvem uma OPA voluntária. De fato, a regra não previu uma operação

como a do grupo francês Vivendi, que na surdina acabou levando o controle da GVT por meio

de derivativos, frustrando a aproximação hostil feita pela Telefônica.

Foi com satisfação, portanto, que Adriana recebeu a notícia de que o regulador está disposto a

alterar as regras. Em 25 de março, a CVM colocou em audiência pública uma minuta de

instrução que altera a 361. ―O principal benefício da proposta é aumentar a divulgação de

informações sobre a negociação com ações da companhia que é objeto de uma oferta‖, avalia a

advogada.

Segundo a minuta, titulares de 2,5% ou mais das ações de determinada espécie e classe de uma

companhia-alvo de OPA terão de divulgar ao mercado cada movimentação feita com papéis da

empresa durante o período de uma oferta pública. ―Qualquer negociação deverá ser informada,

mesmo que envolva apenas uma ação‖, explica o diretor da CVM Marcos Barbosa Pinto.

Inspirada no código do Takeover Panel britânico, essa regra inclui as posições montadas com

derivativos. Assim, dificilmente alguém poderá, de uma hora para outra, desbancar uma OPA

com o uso desse instrumento sem que ninguém perceba essa movimentação.

Um dos objetivos da reforma da instrução é incentivar o uso de ofertas concorrentes para quem

quiser competir com uma OPA. Elas passarão a prescindir de registro na CVM, a não ser que

sejam unificadas a uma OPA que exija registro. Hoje, uma oferta concorrente deve ser lançada a

um preço no mínimo 5% superior ao da OPA com que entra em disputa. A proposta é

acrescentar a obrigação de que venha à tona até cinco dias antes da data prevista para o

―procedimento especial‖ da oferta original. Esse procedimento substituiria o processo de leilão,

em que são permitidas interferências compradoras. No novo modelo, ofertas de última hora

72

GREGÓRIO, Daniel. Nova regra da CVM visa a dar mais informações para investidores sobre as ofertas

públicas de aquisição. Revista Capital Aberto Ano 7, No. 80, Abril/2010, pág. 60 a 63

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101

serão proibidas. A finalidade é permitir que os acionistas tenham tempo suficiente para avaliar a

qualidade das ofertas e não se sintam pressionados a tomar uma decisão. Deverá contribuir para

esse maior conforto dos investidores a previsão de que o conselho de administração da

companhia-alvo se manifeste contra ou favor da OPA, fundamentando sua opinião. ―Por dever

de diligência, os administradores já deveriam se pronunciar, principalmente quando a oferta é

ruim para a empresa‖, acredita Erik Oioli, sócio do escritório Vaz, Barreto, Shingaki e Oioli

Advogados. A CVM receberá comentários sobre a minuta até o dia 25 de maio.

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102

8.1. Aula 9. Poison Pills

A) Ementário de Temas

Introdução as medidas defensivas. Tomada de controle hostil ou amigável. O Poison Pill.

Shareholder rights plans. As medidas defensivas brasileiras e as Norte Americanas e Européias.

B) Material de Leitura

Leitura Básica

BAINBRIDGE, Stephen M., Mergers and Acquisitions. New York: Foundation Press, 2nd

Edition. Capítulos 5 e 6, páginas 158-245.

SILVA, Alexandre Couto. Responsabilidade dos Administradores de S.A., Business Judgement

Rule. Rio de Janeiro: Editora Campus Elsevier, 2007 pp. 210- 229.

Leitura Complementar

CARY, William L. e EISEMBERG, Melvin Aron. Cases and Materials on Corporation. The

Foundation Press, Inc: New York, 1995 pp. 592-634

C) Roteiro de Aula

Introdução

As medidas defensivas são proteções utilizadas por companhias abertas em que o capital

social está organizado com dispersão acionária contra tentativas hostis de tomadas de controle,

denominadas as ―takeovers hostis‖.73

73 A aquisição do controle de uma companhia pode ser efetivada de várias formas: (a) se há acionista controlador,

através da compra do bloco de controle; (b) se não há acionista controlador, através de compra negociada

diretamente com os principais acionistas ou através de aquisições de ações no mercado; e (c) se o grau de dispersão

é alto, por meio de uma oferta pública de aquisição de ações dirigida a todos os acionistas da companhia visada.

(segundo Luiz Alberto Colonna Rosman )

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103

Essas medidas podem ser adotadas de diversas formas. A forma mais comum é a adoção de

medidas defensivas em mecanismos estatutários, nos estatutos das companhias. 74

Também é

comum a adoção destas em formas contratuais, incluindo contratos de compensação de

executivos estratégicos, opção de compra de ações e ativos, bônus de subscrição e dívidas.

Ademais, as medidas defensivas são introduzidas de forma institucional como, por exemplo,

uma organização estrutural de companhias com diversas holdings em uma estrutura piramidal.

Business Judgment Rule e o Dever de Diligência dos Administradores

Conforme Alexandre Couto Silva, a regra do business judgement rule busca evitar que

pessoas capazes fiquem com receio de administrar uma companhia, sabendo que poderão

colocar em risco ou até perder seu patrimônio pessoal. A regra tem por finalidade estabelecer

parâmetros para evitar a responsabilização do administrador.75

O judiciário deve examinar os limites de atuação do Conselho de Administração; porém,

não deve substituir a decisão do administrador, mas pode examiná-la para verificar se está nos

limites e de acordo com a razoabilidade.76

Este princípio vale como parte integrante do dever

fiduciário dos administradores.77

74 Usualmente os estatutos das companhias prevêem uma série de medidas defensivas para inibir ou desestimular

tomadas de controle sem que a operação seja previamente aprovada pelos administradores, que funcionam, no caso

como ―gatekeepers‖ (guardiões dos interesses dos acionistas, da empresa e dos ―stakeholders‖). Os estatutos

também contêm dispositivos estabelecendo que se a operação for aprovada pela maioria (qualificada ou simples)

dos membros do Board deixa de ser aplicável a regra que poderia inviabilizar o takeover. (idem)

75

SILVA, Alexandre Couto. Responsabilidade dos Administradores de S.A., Business Judgement Rule. Rio de

Janeiro: Editora Campus Elsevier, 2007 76

―The business judgement rule is the primary mechanism that courts employ to balance the cost and benefits of

corporate takeover activity among stockholders, directors, and the corporation. As traditionally conceived, this rule

is a judicial presumption that directors make their business decisions in good faith, and that such decisions will not,

therefore, be subjected to judicial scrutinity if any ―rational business purpose can be attributed to them‖ Lubega,

Stephen Kors to Unocal: the business judgement rule speaks with a forked tongue. Southern University Law

Review, Los Angeles, v. 16, n. 4, p. 823, 1986 77

―The ratio decidencid for the ―range of reasonableness‖ standard is a need of the board of directors for latitude in

dischrging its fiduciary duties of the corporation and its shareaholder when defending against perceived threats.

The concomitant requirement is for judicial restraint. Consequently, if the board of directors‘ defensive response is

not draconin (preclusion or coercive) and is within a ―range of resonableness‖, a court must not substitute its

judgement for the board‘s. Unitirin, Inc, v. American General Corp, 651 A.2d 1361 9Del. 1995)

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104

O Parecer de Orientação n. 35/2008 da Comissão de Valores Mobiliários (―CVM‖) visa

recomendar aos administradores de companhias abertas que observem determinados

procedimentos durante a negociação de aquisições e fusões e, deve o administrador agir com

diligência e lealdade à companhia. Esse zelo pelos interesses da sociedade deve ser feito de boa-

fé e se enquadra no conceito da business judgement rule.78

Tomada de controle hostil ou amigável.

Na experiência societária americana, o ―takeover hostil‖ é uma forma de tomada de controle

em que o ofertante desconsidera a rejeição de sua oferta pelo conselho de administração da

empresa alvo, e continua na sua tentativa de tomada de controle, ou, ainda, o ofertante faz uma

oferta sem informar de antemão o conselho de administração da empresa alvo. Já o ―takeover

amigável‖ ocorre de forma que o ofertante primeiro informa ao conselho de administração da

empresa alvo antes de fazer a oferta de aquisição de controle, a fim de que o conselho de

administração possa recomendar ou não a oferta aos acionistas da empresa. 79

A tomada de controle pode ser hostil ou amigável, lembrando que, havendo acionista

controlador majoritário ou de um bloco significativo de ações, deve ser empreendida uma

negociação bilateral com esses acionistas. Se a companhia for de capital pulverizado, poderá

78 ―Na sistemática da Lei nº 6.404, de 1976, cabe a eles negociar o protocolo de incorporação ou fusão que será

submetido à aprovação da assembléia geral. Ao negociar o protocolo, os administradores devem cumprir os deveres

fiduciários que a lei lhes atribui, defendendo os interesses da companhia que administram e de seus acionistas,

assegurando a fixação de uma relação de troca eqüitativa.‖

79 Problemas de ―Agência‖ nas Companhias com Capital Disperso. O controle de fato da sociedade fica na mão

dos administradores, o que gera um problema de conflito de interesses: a transferência do controle pode ser

vantajosa do ponto de vista dos acionistas – que conseguem alienar suas ações por valor substancialmente acima da

cotação de mercado – mas ameaça a manutenção do emprego e das vantagens econômicas dos administradores da

companhia visada. ―Problema de agência‖ é uma expressão utilização no jargão dos economistas para designar

situações nas quais o bem-estar de uma parte, designada ―comitente‖ (―principal‖), depende de ações tomadas pela

outra parte, o agente (―agent‖).Usualmente o agente tem maiores informações e qualificação técnica do que o

comitente, relativamente ao assunto cuja execução lhe foi confiada, e o comitente não pode, sem custos, se

assegurar que o agente está cumprindo adequadamente aquilo a que se obrigou. No plano das companhias, esses

problemas de agência podem ocorrer nas relações (a) acionistas x administradores; (b) controladores x minoritários;

e, no caso de transferências de controle, entre (c) acionistas da companhia alvo x adquirente do controle. (Luiz

Alberto Colonna Rosman)

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105

ocorrer a oferta pública para aquisição de controle de companhia aberta (―OPA‖) 80

voluntária,

sendo amistosa quando houver concordância da administração.

―A aquisição do controle de uma companhia aberta, cujo capital votante se encontre

disseminado no mercado, tanto poderá operar-se através de compra de ações em bolsa,

como de oferta pública. A oferta pública compreenderá, em regra, o montante de ações

necessário à obtenção do controle; sendo o ofertante acionista, a oferta poderá restringir-

se a um número de ações capaz de, somando-se às suas, compor o controle‖. BORBA,

José Edwaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 11ª Edição, 2008.

pp. 524-525.

O Poison Pill

O termo ―poison pill‖ se refere a uma estratégia geralmente adotada, em negócios ou em

política, com o intuito de aumentar as chances de ocorrerem resultados negativos, e diminuir as

chances de ocorrerem resultados positivos, a uma parte que tenta qualquer forma de ―takeover‖.

81 O termo é derivado do significado original literal de uma pílula venenosa portada por espiões,

80 Uma "oferta pública de aquisição de ações" (OPA) é uma operação através da qual um acionista ou uma

sociedade pretende comprar uma participação ou a totalidade das ações de uma empresa cotada em Bolsa. O termo

em inglês muito utilizado para tratar da OPA, quando a mesma busca a aquisição de controle de outra empresa, é

"take over". (Wikipédia)

Uma OPA diz-se hostil quando o Conselho de Administração da empresa alvo não é informado da oferta ou quando

a sociedade promotora da oferta decide avançar com a OPA mesmo depois do Conselho de Administração a ter

recusado. Quando o Conselho de Administração considera a proposta vantajosa para os acionistas e recomenda-

lhes que aceitem a oferta a OPA diz-se amigável. Realiza-se uma OPA, com objectivo principal de adquirir o

controle de uma companhia aberta, cujo capital votante esteja disseminado no mercado. Muitas vezes é usado para

se fechar o capital - retirando as ações da bolsa. OPA - Oferta pública de aquisição (em dinheiro); OPT - Oferta

pública de troca (em títulos); OPV - Oferta pública de venda (em geral é seguida por uma entrada em bolsa).

(Idem)

81 Segundo Modesto Carvalhosa, as cláusulas de poison pills brasileiras não correspondem ao mesmo conceito

dessas cláusulas no direito norte-americano. Poison pills brasileiras são variações da oferta pública de aquisição do

controle – art. 254-A, Lei das S.A. – tag along. Já as poison pills norte-americanas são Shareholder Rights Plans

(SRP). Assim, há o efeito venenoso dos SRP - acionista-adquirente do percentual que disparou a cláusula é

excluído do SRP. Finalidade das poison pills norte-americanas é barrar tomadas hostis de controle, desencorajar a

compra de grandes blocos de ações da companhia alvo. Poison pills são instrumentos para maior negociação, pela

administração da companhia, do valor de suas ações durante uma oferta hostil. Não podem bloquear todas as

ofertas hostis que sejam feitas, pois a administração não pode se ―entrincheirar‖ na companhia. A única semelhança

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106

que eram tomadas a fim de eliminar a possibilidade de serem interrogados e forçados a divulgar

informações secretas que pudessem ser usadas em benefício do inimigo.

―In publicly held companies, various methods to avoid takeover bids are called ―poison

pills‖. Takeover bids are attempts by a bidder to obtain control of a target company,

either by soliciting proxies to get elected to the board or by acquiring a controlling block

of shares and using the associated votes to get elected to the board. Once in control of

the target`s board, the bidder can determine the target`s management. As discussed

further below, targets have various takeover defenses available, and several types of

defenses have been called ―poison pills‖ because they not only harm the bidder but the

target (or its shareholders) as well. At this time, the most common defense known as a

poison pill is a shareholder rights plan.‖ (Wikipedia)

São comuns referências equivocadas ao termo ―poison pills‖, que por vezes é visto como um

termo genérico de todas as espécies de medidas defensivas contra takeovers hostis. A ―poison

pill‖ é, na verdade, uma das espécies de medidas defensivas, talvez uma das mais famosas,

desenvolvida pelo advogado norte Americano Martin Lipton, do escritório Wachtell, Lipton,

Rosen & Katz. 82

entre a poison pill brasileira e a norte-americana é a existência de ―gatilho‖ que delimita a porcentagem de

aquisição de ações que ―dispara‖, sendo que ambas são técnicas de defesa.

82 ―The poison pill was invented by noted M&A lawyer Martin Lipton of Wachtell, Lipton, Rosen & Katz, in 1982,

as a response to tender-based hostile takeovers. Poison pills became popular during the early 1980s, in response to

the increasing trend of corporate raids by businessmen such as Carl Icahn.‖

―It was reported in 2001 that since 1997, for every company with a poison pill that successfully resisted a hostile

takeover, there were 20 companies with poison pills that accepted takeover offers. The trend since the early 2000s

has been for shareholders to vote against poison pill authorization, since, despite the above statistic, poison pills are

designed to resist takeovers, whereas from the point of view of a shareholder, takeovers can be financially

rewarding.‖

―Some have argued that poison pills are detrimental to shareholder interests because they perpetuate existing

management. For instance, Microsoft originally made an unsolicited bid for Yahoo!, but later dropped out after

Yahoo! CEO Jerry Yang threatened to make the takeover as difficult as possible unless Microsoft raised it to

US$37 per share; one Microsoft executive commented, "They are going to burn the furniture if we go hostile. They

are going to destroy the place." The nature of Yahoo!'s poison pill was never announced.[citation needed] Analysts

suggested that Microsoft's raised offer of $33 per share was already too expensive, and that Yang was not

bargaining in good faith, which later led to several shareholder lawsuits and an aborted proxy fight from Carl Icahn.

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107

As medidas defensivas contra takeovers hostis são também conhecidas como ―shark

repellants‖ (repelente de tubarão)83

, e a ―poison pill‖ é uma espécie de ―shark repellant‖.

Shareholder rights plans

Nos EUA, as poison pills são em sua maioria configuradas como shareholder rights plans,

cujo objetivo é diluir a participação do acionista adquirente.

―Shareholder rights plans- The target company issues rights to existing shareholders to

acquire a large number of new securities, usually common stock or preferred stock. The

new rights typically allow holders (other than a bidder) to convert the right into a large

number of common shares if anyone acquires more than a set amount of the target's

stock (typically 20-30%). This dilutes the percentage of the target owned by the bidder,

and makes it more expensive to acquire control of the target. This form of poison pill is

After Microsoft dropped their bid, Yahoo's stock price plunged and Jerry Yang faced a backlash from stockholders

that led to his resignation.‖ (idem)

83 Os chamados ―shark repellents‖ são cláusulas inseridas nos estatutos visando desestimular terceiros que possam

se interessar pela aquisição do controle sem apoio do ―Board‖. Substituição do Conselho de Administração - Uma

das medidas mais comuns é a previsão de eleição dos membros do Conselho com mandatos escalonados no tempo

(―staggered boards‖), visando-se, com isso, dificultar a substituição dos conselheiros de uma só vez. Esse tipo de

defesa é mais eficaz quando o adquirente necessita ter rápido acesso aos ativos da companhia alvo – através de uma

incorporação ou venda de bens, por exemplo – para pagar as dívidas assumidas com a aquisição do controle.

As chamadas ―poison pills‖ podem assumir uma grande variedade de formas, mas atualmente a maioria delas está

baseada no mecanismo chamado ―share purchase rights plan‖: espécie de bônus de subscrição que é distribuído

como bonificação ou dividendo, atribuindo aos acionistas – com exceção do ofertante – o direito de adquirir ações

da companhia a um preço significativamente inferior a seu valor de mercado, na hipótese de qualquer adquirente

vir a acumular ações em determinado percentual (10 a 20% usualmente) (―flip-in‖). Conseqüência: forte diluição da

participação do adquirente no capital da companhia, tornando mais gravosa a tentativa de aquisição do controle.

Como é comum a incorporação da companhia alvo pela adquirente em seguida à tomada de controle, foi criado um

novo mecanismo (―flip-over‖) que dá direito aos acionistas da companhia alvo de subscreverem ações da

companhia adquirente por valor substancialmente inferior a seu preço de mercado, o que causa uma grande diluição

aos antigos acionistas da adquirente. (LACR).

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108

sometimes called a shareholder rights plan because it provides shareholders (other than

the bidder) with rights to buy more stock in the event of a control acquisition.

Effects on shareholders - The goal of a shareholder rights plan is to force a bidder to

negotiate with management. The effects are twofold: Positive effect: it gives

management time to find competing offers that maximizes selling price. Negative effect:

it discourages takeovers, potentially preventing inefficient management from being

replaced (hence reducing shareholders' stock value)‖.(idem)

Nos EUA, a decisão sobre a aplicabilidade ou não das pílulas cabe ao board of directors,

observadas as limitações impostas pela Suprema Corte de Delaware. A Suprema Corte de

Delaware decidiu em 1985, no famoso caso Moran v. Household International, Inc. que cada

caso de tentativa de takeover hostil deve ser estudado separadamente, avaliando-se se está de

acordo com o interesse social.84

Decidiu, ainda, esta Suprema Corte, que o conselho de

administração não pode aplicar automaticamente o shareholder rights plan, tendo inclusive que

levar a aplicação das ―poison pills‖ à Assembléia Geral em certos casos. Na experiência

brasileira, pelo contrário, a aplicação é automática. 85

86

84

In Moran v. Household International Inc., 500 A.2d 1346 (Del. 1985), the Delaware Supreme Court held that

Section 157 of the General Corporation Law provides statutory authority for a board of directors to issue rights

containing provisions similar to certain provisions of the Agreement (the ―Flip-Over Provisions‖) and that the

business judgment rule applied to the adoption by the board of directors of Household International of a rights

dividend plan as a preplanned defensive mechanism. The Court found that the rights dividend issued by Household

had a rational corporate purpose in view of Household‘s reasonably perceived vulnerability to unfair or coercive

takeovers generally, and, accordingly, that the issuance of rights containing provisions similar to the Flip-Over

Provisions was a legitimate exercise of the business judgment of the Household directors under the facts presented.

In so holding, the Court stated: ―The Directors adopted the Agreement in the good faith belief that it was necessary

to protect Household from coercive acquisition techniques. The Board was informed as to the details of the

Agreement. In addition, Household has demonstrated that the Agreement is reasonable in relation to the threat

posed.‖ http://www.secinfo.com/d14D5a.v6cz.c.htm

85 Moran v. Household International, Inc., 500 A.2d 1346 9 Del. Supr. 1985) Supreme Court of Delaware. A

decisão se concentra em torno da aplicabilidade da regra do business judgement rule como forma padrão de rever o

Plano de Direitos dos Acionistas (flip-over pill). Pois quando o Conselho (Board) analisar uma tentativa de

aquisição deve determinar se ela atende aos melhores interesses, tanto da companhia como de seus acionistas.

No caso Moran VS Household International, decidido pela Suprema Corte de Delaware (Supreme Court of

Delaware) em 1985, ocorreu a adoção de um mecanismo de defesa para proteção de futuros avanços, não se

blindando de uma ameaça real e iminente de aquisição hostil. Denota-se o modo do Conselho de planejar-se

antecipadamente a uma aquisição hostil, reduzindo a chance de, na eventualidade de uma takeover bid, exercer-se

um julgamento errôneo do que será o melhor aos interesses da empresa. Assim, a business judgement rule tem

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109

aplicabilidade, de modo que não configura abuso de poder pelo Conselho e não reprime, segundo a Suprema Corte

de Delaware, direitos dos acionistas, nem mesmo a possibilidade de recebimento pelos mesmos de uma oferta.

A decisão ainda ressalva que a business judgement rule somente pode aplicar-se dentro dos limites de competência

do Conselho. Deve existir autorização estatutária para o Conselho adotar o Rights Plans.

No referido caso, a parte apelante Moran contestou não existir autorização para a adoção pelo Conselho do Rights

Plan, alegando não existir tal provisão disposta na Delaware General Corporation Law (DGCL). Adicionalmente,

alega o mesmo entendimento da Securities and Exchanges Comission - SEC de que o Conselho não pode usurpar

direitos dos acionistas de análise de aquisições hostis. Por outro lado, entendeu a Household estar de acordo com a

referida lei, no Título 8, Sub-capítulo VI (Stocks and Dividends) § 151(g) e 157 da DGLC e que a emissão de ações

preferenciais com os direitos de acionistas obedece ao § 151. Dentro dessa linha de argumentação, Moran protesta

afirmando que o § 157 proporciona meios de estruturação financeira empresarial, não de um mecanismo preventivo

contra alguma aquisição – o que, logo, não autorizaria o Conselho da Household a tal ação. Isso foi rejeitado pela

Suprema Corte de Delaware (comparação com a decisão Providence & Worchester Co. VS. Baker, Del. Supr., 378

A.2d 121, 124 (1977). De acordo com o Tribunal, o fato da lei ser silenciosa neste aspecto não valida uma

proibição de adaptação das normas para defender a empresa de uma aquisição hostil.

Moran afirma que o § 157 não autoriza a emissão de sham rights como o Rights Plan. Acusa as ações preferenciais

ora referidas de serem ilusórias, já que não teriam valor econômico, tendo propósito apenas para blindar Household

de uma futura oferta hostil o que foi também rejeitado pela Suprema Corte de Delaware. Explica o Tribunal que ao

contrário do caso Telvest, Inc. v Olson, que invalidou sham securities por serem ilusórias, as ações preferenciais de

Household tem dividendos superiores.

Ainda sim, detalhou a Suprema Corte como sendo válido o Rights Plan no seu escopo de ser uma disposição ―anti-

destruction‖. Isto é, as cláusulas ―anti-destruction‖ dão ao investidor a possibilidade de conversão de seus títulos

mobilários pelos que vierem a suceder em uma nova sociedade, no caso de uma fusão.

Alegando a inconstitucionalidade do Rights Plan, Moran afirmou que o mesmo viola a Commerce Clause e é nula

sob a ótica da Supremacy Clause, por obstar a linha de política definida no Williams Act., usando como pretexto o

caso Edgar v. MITE Corp., 457 U.S. 624, 102 S.Ct. 2629, 73 L.Ed.2d 269 (1982), no qual a Suprema Corte dos

Estados Unidos sentenciou que a Lei de Aquisições Empresariais de Illinois (Illinois Business Takeover Act) era

incostitucional, pois onerava o comércio interestadual. Entendeu a Suprema Corte de Delaware que não há nexo

para analogia entre os dois casos.

Ainda mais, Moran parte do princípio de que a Conselho não pode usurpar os direitos dos acionistas de receber

uma oferta através de mudanças societárias na companhia. O Tribunal, porém, conclui que o Rights Plan não

suprime os direitos dos acionistas de receber uma oferta. O Rights Plan não é absoluto, pois ao receber uma Oferta

Pública de Aquisição de Ações (―OPA‖), de acordo com o Tribunal, a Diretoria ainda assim deve atuar

diligentemente (fiduciary duties) para definir a adoção do mecanismo de defesa. Igualmente, alega que não tem

fundamento a alegação de Moran de que o Righs Plan vai tirar poderes dos acionistas e dar ao Conselho, uma vez

que o plano não tende a afetar o valor de mercado das ações. Não há mudança significativa na governança

corporativa; o fato de tornar a companhia menos suscetível a aquisições hostis não impossibilita ofertas. Não

obstante, o Rights Plan não minimizará o valor das ações, além de não oferecer prejuízos fiscais à empresa e aos

seus acionistas; não trará dívidas à empresa como pode trazer outros mecanismos de defesa.

A business judgement rule não conota má-fé dos Diretores e sim é uma presunção de que ao tomar uma decisão de

caráter corporativo os Diretores agiram de boa-fé e diligentemente, nos melhores interesses da companhia

(Aronson v. Lewis). Household claramente demonstrou que a adoção do Rights Plan foi em reação ao que

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110

―Constraints and legal status - Following the development of poison pills in the 1980s,

the legality of their use was unclear in the United States for some time. However, poison

pills were upheld as a valid instrument of Delaware corporate law by the Delaware

Supreme Court in its 1985 decision Moran v. Household International, Inc.‖ (idem)

Segundo o Professor Modesto Carvalhosa, no Brasil, o que ocorre é o estabelecimento de

um gatilho para que haja oferta pública de compra da totalidade das ações ou para que se inicie

um procedimento de leilão daquele bloco de ações. As nossas poison pills não correspondem às

poison pills norte-americanas, tampouco às takeover bids de Londres e as poison pills da

diretiva européia. A similaridade entre a estrutura brasileira e norte-americana é que o efeito

venenoso é o gatilho.

imaginou ser uma ameaça existente no mercado de ofertas públicas de aquisição de ações secundárias . Requisito

que é a diligência por parte dos Diretores, entende a Suprema Corte de Delaware que deve-se verificar se foram os

Diretores negligentes à época da adoção do Rights Plan (Smith v. Van Gorkom).

Entendeu a Corte de Delaware que não existe preclusão de futuras tentativas de aquisição hostil e que não houve

negigência pelo Conselho, já que já tinha providenciado aos Diretores informações (um resumo de três páginas) do

Rights Plan, logo, os Diretores da Household, assim estavam cientes que a sociedade era vulnerável a técnicas de

aquisição coercitivas e adotou um mecanismo de defesa justificável. Conclui a Corte de Delaware que os Diretores

adotaram o plano de acordo com as disposições de autoridade estatutária, como previsto na DGCL, § 141, § 151 e §

157, tendo especificamente informado os detalhes do Plano, agido de boa-fé, e não tendo desrespeitado nenhum

dever de diligência.

86 Segundo Luiz Alberto Colonna Rosman, há dois Modelos Básicos para Enfrentar o Problema de Agência no

Caso de Tomada de Controle, que se distinguem em função de a quem é atribuído o poder para decidir sobre a

aceitação ou não da oferta de aquisição de ações: I - No primeiro modelo (EUA), a decisão é, inicialmente,

atribuída ao ―Board of Directors‖ e, após, aos acionistas – a quem cabe, em última análise, aceitar ou não a

proposta de compra de suas ações. Nessa hipótese, há grande potencial de que os administradores ajam protegendo

seus próprios interesses (manutenção de cargos e privilégios) – e não visando aos maiores benefícios para os

acionistas. Por outro lado, os administradores, por conhecerem profundamente a empresa, podem obter preço e

condições de pagamento mais vantajosas para a venda das ações, evitando propostas oportunistas ou coercitivas. II - No segundo modelo (Comunidade Econômica Européia), a decisão cabe exclusivamente aos acionistas, tendo o

Conselho de Administração uma atuação apenas de assessoria. Nesse modelo o conflito de interesses entre

acionistas e administradores é fortemente reduzido, mas remanesce o problema do conflito de interesses entre o

ofertante e os acionistas.

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111

D) Textos Complementares

A Noção de Separação entre as figuras dos acionistas e administradores Antônio Bernando

Palhares, Gustavo Sampaio, Igor Lyra Mosso, Leonardo Carvalho e Maria Donati, alunos da

FGV Direito Rio.

No que tange ao tema de poder de controle, uma questão de grande relevância se refere à

noção no meio jurídico de uma tendência verificada já no início do século XX: a noção de

separação entre as figuras dos proprietários (os acionistas) e daqueles que ditam as diretrizes de

funcionamento, consubstanciado na tomada de decisões administrativas no dia-a-dia que

influenciam a forma de alocação dos recursos e conseqüentemente, o futuro e os lucros da

companhia (os administradores).

Com essa perspectiva, os autores Berle e Means, em sua clássica obra sobre a sociedade

anônima moderna, analisaram a distinção entre a titularidade do capital e a gestão social

realizada pelos administradores87

. Esta obra representou um marco para a compreensão da

organização interna das sociedades anônimas no último século, em especial nos Estados Unidos.

Nela é ilustrada a mudança ocorrida no tradicional conceito da propriedade privada, a qual é

classicamente entendida como o poder de disposição e a faculdade de usar e gozar, que, no caso

das ações, está dividida entre uma titularidade nominal e o verdadeiro poder que está vinculado

a ela.

Além disso, os autores citados identificaram pela primeira vez o conflito de interesse que

ocorre entre os acionistas e os administradores como conseqüência desta separação entre a

titularidade do capital e a administração social. A partir de então, passa-se a entender que estes

últimos poderiam ter motivações distintas daqueles. Desta forma, estes interesses antagônicos

originam problemas de coordenação entre acionistas e administradores, que podem gerar

comportamentos abusivos por parte dos que dirigem a sociedade.

Tão relevantes foram os resultados empíricos demonstrados pelo trabalho de Berle e Means,

que desde então existe a preocupação de colocar em prática normas e mecanismos de controle

87

Essa percepção se popularizou com a obra clássica: ADOLF A. BERLE & GARDINER C. MEANS. The

Modern Corporation and Private Property. New York, Transaction Publishers, 1991.

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112

orientados a minorar as tensões originadas do mencionado antagonismo entre acionista e

administradores.

Deve-se considerar ainda que, em um ambiente de quadro acionário pulverizado, como

aquele identificado pelos autores, é consideravelmente mais difícil para os acionistas exercerem

um efetivo controle e monitoramento dos administradores, bem como mais custoso substituí-los.

Em uma companhia com capital pulverizado, considerando cada acionista individualmente,

nenhum destes possui os devidos incentivos para exercer um efetivo nível de controle sobre as

decisões da administração da companhia. Isto porque, na medida em que os demais acionistas

também se beneficiam das externalidades positivas associadas à fiscalização das atividades da

companhia, nenhum dos acionistas dispersos no mercado é capaz individualmente de se

apropriar de todos os ganhos gerados pelo monitoramento da administração88

. Ao invés, os

benefícios resultantes do pleno exercício do direito à fiscalização, inerente à condição de acionista,

seriam distribuídos não de acordo com seus esforços de monitoramento, mas em virtude de seus

investimentos, uma vez que essa fiscalização tenderia a se refletir em melhores práticas gerenciais, e

assim, preços das ações potencialmente maiores89

.

Adicionalmente, outro problema na fiscalização da administração pelos acionistas

individuais está ligado à dificuldade de cognição e à presença de uma relevante assimetria de

informações entre os acionistas e a administração da companhia. Isto se reflete no fato de que,

ainda que os acionistas possam considerar que vale a pena monitorar a administração, eles

podem vir a enfrentar certa dificuldade em separar se as reais causas dos resultados ruins da

companhia são provenientes de estratégias ineficientes da administração ou de fatores externos à

companhia90

.

Ressalte-se que não se pretende afirmar que o acionista que exerce um devido

monitoramento da administração da companhia não obtém retorno algum. O argumento é

apenas de que os custos envolvidos na fiscalização por um agente isolado podem ser de tal

ordem que os benefícios percebidos por este mesmo agente não sejam suficientes para tornar

racional toda a atividade de monitoramento.

88

Podemos definir o conceito de externalidade, de uma maneira simplória, como os efeitos decorrentes das

condutas dos agentes que não são incorporados no sistema de preços. Os economistas tratam do fenômeno de um

agente que se aproveita de alguma externalidade sem pagar por ela como problema do carona (―free-rider‖). 89

EASTERBOOK, Frank H. e FISCHEL, Daniel R., The economic structure of corporate law, Cambridge:

Harvard University Press, 1996, p.171. 90

EASTERBOOK, Frank H. e FISCHEL, Daniel R., The economic structure of corporate law, Cambridge:

Harvard University Press, 1996, p.172.

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113

Essa constatação assume grande relevância quando enfrentamos o problema da falta de

alinhamento de interesses entre administradores e acionistas e como isto pode levar com que

aqueles adotem uma postura gerencial que não condiz com os interesses da companhia ou dos

acionistas. Por exemplo, administradores podem escolher investir em certos projetos

pretendendo uma expansão exagerada e ineficiente da companhia no curto prazo ao invés de

buscarem um devido planejamento sustentável que maximize a riqueza dos acionistas, uma vez

que seus benefícios financeiros, prestígio e influência também aumentam proporcionalmente à

expansão da companhia que administram91,92

.

O Dever Fiduciário dos Administradores

Com o propósito de fazer frente ao problema da ausência de controles efetivos sobre a

administração societária, construiu-se nos tribunais o conceito de dever fiduciário dos

administradores93

. Ele surgiu para contrapor o amplo domínio dos administradores das

sociedades e, desta forma, assegurar os direitos dos acionistas. Outras medidas adotadas mais

recentemente para neutralizar este conflito de interesse entre os acionistas e os administradores

são de origem legal e objetivam a criação de incentivos que harmonizem a maximização da

utilidade de cada uma das partes.

Uma maneira possível de buscar alcançar tal objetivo, certamente, consiste em proporcionar

aos administradores participação no capital da sociedade de modo que ocorra um paralelismo de

interesse entre os acionistas e aqueles que possuem poder de decisão na sociedade. Para obter

esta simetria de interesses, são estabelecidos, por exemplo, incentivos fiscais para que os

administradores possam adquirir participação societária sem incorrer em altos custos tributários.

A Alteração do Artigo 254-A posterior ao parecer de J. L. Bulhões Pedreira sobre a

alienação do controle de Companhia Aberta

91

A essa tendência de crescimento exacerbado é denominada de ―empire building”. Sobre esse tema: KLEIN,

William A. e COFFEE, John C. Jr., Business Organization and Finance: Legal and Economics Principles. 9ª ed.,

Nova York: Foundation Press, 2004, pp. 177 e 199. 92

JENSEN, Michael C., Takeovers: their causes and consequences, Journal of Economic Perspectives, vol. 02, n°

01, 1988, pp. 21-48. 93

BAINBRIDGE, Stephen M.. Corporation Law and Economics, New York, Foundation Press, 2002, p. 11.

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114

Ao analisar-se a legislação modificada posterior ao parecer de J. L. Bulhões Pedreira, que

relata sobre a alienação do controle de Companhia Aberta, escrito em 20 de outubro de 1983,

conclui-se que duas Leis revogaram e reformaram o artigo a qual Bulhões Pedreira se baseou, a

antiga redação do Artigo 254-A. São estas as Lei 9.457 de 1997 e 10.303 de 2001.

Em relação a expressão ambígua de ―Controle da Companhia‖ interpretado conjuntamente

pelos os artigos 254 e 255 da Lei 6404 de 1976, houve bastante alteração pós 1983, já que a Lei

nº 9457 de 5 de Maio de 1997 revogou diversos artigos e além de ter reformado outro. Já a Lei

10.303 de 2001 também teve seu papel importante, já que incluiu diversos artigos para auxiliar

na interpretação de ―Controle da Companhia‖. Seguem as inclusões abaixo:

Art. 254-A. A alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta somente

poderá ser contratada sob a condição, suspensiva ou resolutiva, de que o adquirente se

obrigue a fazer oferta pública de aquisição das ações com direito a voto de propriedade

dos demais acionistas da companhia, de modo a lhes assegurar o preço no mínimo igual

a 80% (oitenta por cento) do valor pago por ação com direito a voto, integrante do bloco

de controle. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

§ 1o Entende-se como alienação de controle a transferência, de forma direta ou

indireta, de ações integrantes do bloco de controle, de ações vinculadas a acordos de

acionistas e de valores mobiliários conversíveis em ações com direito a voto, cessão de

direitos de subscrição de ações e de outros títulos ou direitos relativos a valores

mobiliários conversíveis em ações que venham a resultar na alienação de controle

acionário da sociedade. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

§ 2o A Comissão de Valores Mobiliários autorizará a alienação de controle de que

trata o caput, desde que verificado que as condições da oferta pública atendem aos

requisitos legais. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

§ 3o Compete à Comissão de Valores Mobiliários estabelecer normas a serem

observadas na oferta pública de que trata o caput. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

§ 4o O adquirente do controle acionário de companhia aberta poderá oferecer aos

acionistas minoritários a opção de permanecer na companhia, mediante o pagamento de

um prêmio equivalente à diferença entre o valor de mercado das ações e o valor pago por

ação integrante do bloco de controle. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

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115

§ 5o (VETADO) (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

Art. 255. A alienação do controle de companhia aberta que dependa de autorização do

governo para funcionar está sujeita à prévia autorização do órgão competente para

aprovar a alteração do seu estatuto.(Redação dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

§ 1º A autoridade competente para autorizar a alienação deve zelar para que seja

assegurado tratamento eqüitativo aos acionistas minoritários, mediante simultânea oferta

pública para a aquisição das suas ações, ou o rateio, por todos os acionistas, dos

intangíveis da companhia, inclusive autorização para funcionar. (Revogado pela Lei nº

9.457, de 1997)

§ 2º Se a compradora pretender incorporar a companhia, ou com ela se fundir, o

tratamento eqüitativo referido no § 1º será apreciado no conjunto das operações.

(Revogado pela Lei nº 9.457, de 1997)

Já em relação a ―Poder de Controle‖, previsto pelos artigos 116 e 117 da Lei 6.404/76, teve

alteração somente em parte dos artigos, que foi incluída pelas mesmas leis, Lei 10.303 de 2001

e Lei 9457 de 1997, conforme demonstrado a seguir.

Art. 116-A. O acionista controlador da companhia aberta e os acionistas, ou grupo de

acionistas, que elegerem membro do conselho de administração ou membro do conselho

fiscal, deverão informar imediatamente as modificações em sua posição acionária na

companhia à Comissão de Valores Mobiliários e às Bolsas de Valores ou entidades do

mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da

companhia estejam admitidos à negociação, nas condições e na forma determinadas pela

Comissão de Valores Mobiliários.(Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com

abuso de poder.

§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:

h) subscrever ações, para os fins do disposto no art. 170, com a realização em bens

estranhos ao objeto social da companhia. (Incluída dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

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116

No que remete a ―Bloco de Controle‖, previsto pelo artigo 254 da Lei 6404 de 1976, como

já transcrito acima, houve algumas revogações por conta da Lei 9457 de 1997 e inclusão pela

Lei 10.303 de 2001, onde o novo artigo 254-A, § 1o e § 4 previu o que seria o ―Bloco de

Controle‖.

O entendimento da CVM sobre o que caracteriza a alienação de controle para incidência da

hipótese de Oferta Pública de Ações (OPA)

Em relação ao entendimento da CVM sobre o que caracteriza a alienação de controle para

incidência da hipótese de Oferta Pública de Ações (OPA) do art. 254-A da Lei 6.404/1976

(―LSA‖), o primeiro ponto de discussão diz respeito ao o que se caracteriza como controle.

Sabe-se, e a CVM já discutiu inúmeras vezes tal quesito, que é preciso qualificar o controle para

saber se dá ensejo à OPA por alienação de controle. Ou há: (i) um controle majoritário

(acionista ou grupo de acionistas com mais de 50% das ações com direito a voto); ou (ii) um

controle minoritário (acionistas ou grupo de acionistas unidos que detém menos de 50% das

ações com direito a voto, mas que, mesmo não tendo a maioria das ações, tem efetivo poder de

comandar a vida social, diante da pulverização de seu quadro acionário).

Tal segunda hipótese trata-se do controle de fato. Esta é abordada no processo CVM RJ n.º

2009/0471. No caso é questionado o poder de controle dos acionistas de companhia Espanhola

que controla companhia Brasileira. Octavio Yazbeck, relator do processo, ressalta que para se

caracterizar esta segunda modalidade de controle é preciso ter certa constância no poder de

mando social. Ressalta o Diretor, argumentando a inexistência de controle de fato no caso sob

análise:

―O argumento parece-me falho por mais de um motivo. Inicialmente porque ele

confunde o consenso eventual e necessário, em assembléia, com bloco de controle. O

art. 116 da Lei nº 6.404/76, ao caracterizar a figura do acionista controlador, remete não

apenas à capacidade de influenciar de forma determinante, a tomada de decisões na

companhia, mas também a uma consistência temporal no exercício de tal capacidade.

Não é por outro motivo que a alínea "a" do citado artigo fala em direitos de sócio que

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117

assegurem "de modo permanente, a maioria dos votos nas deliberações da assembléia-

geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia". No próprio texto

trazido pelo Recorrente, Fábio Konder Comparato realça a importância dessa

permanência‖

No âmbito do processo CVM RJ n.º 2005/4069, o Diretor Relator Pedro Oliva Marcilio de

Souza, sobre a mesma questão, também destacou:

―Outro ponto importante desse primeiro requisito é a necessidade de permanência do

poder. Em razão dele, vencer uma eleição ou preponderar em uma decisão não é

suficiente. É necessário que esse acionista possa, juridicamente, fazer prevalecer sua

vontade sempre que desejar (excluídas, por óbvio, as votações especiais entre acionistas

sem direito a voto ou de determinada classe ou espécie, ou mesmo a votação em

conjunto de ações ordinárias e preferenciais, quando o estatuto estabelecer matérias

específicas)‖.

Este entendimento defendido encontra consonância na doutrina nacional sobre o tema, a

saber:

―[o controle] Trata-se de definição eminentemente centrada na realidade material,

porquanto apenas considera controlador quem tem a maioria dos votos nas assembléias

e, ao mesmo tempo, usa essa maioria para comandar a sociedade.

Quem tem a maioria e não a utiliza é sócio majoritário, mas não é controlador.

As maiorias eventuais também não caracterizam o controle, pois para tanto exige a lei

um poder permanente. (...) O nível de presença mostrará a maioria necessária e,

conseqüentemente, o titular do poder de controle.”94

94

BORBA, José Edwaldo Tavares; Direito Societário ; 10.ed. ver –Rio de Janeiro: Renovar, 2007; pp.356 e 357.

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118

―Já o controle compartilhado, configura-se quando, mesmo inexistindo um acionista

majoritário, o poder de controle é exercido por várias pessoas em conjunto, usualmente

como signatários de acordo de acionistas, que se obrigam a votar em bloco nas matérias

atinentes ao exercício do poder de controle. Embora nenhum dos signatários do acordo

detenham, individualmente, a maioria das ações votantes, a união das suas ações

assegura o controle acionário, mediante o chamado bloco de controle.‖95

O Conceito de Alienação de Controle Segundo Entendimento da CVM

Passado o conceito de controle, essencial para discutir-se a alienação dele, verifica-se o

conceito da expressão ―alienação de controle‖ segundo entendimento moderno da CVM.

É pacifico no colegiado da CVM que, para incidir a obrigação legal de alienação de

controle, é necessário que haja um controlador (uma única pessoa ou conjunto de pessoas) que

esteja passando o controle por ele possuído para terceiro investidor. É, preciso, assim, que o

status quo de controlador pré-exista na vida cotidiana da companhia.

Tal questionamento foi diretamente tratado pelo Diretor Marcelo Trindade no curso do

processo CVM RJ n.º 2007/7230, no qual se manifestou o Diretor: “O art. 254-A é explícito ao

condicionar a OPA à ocorrência de uma alienação de controle, e, passe o truísmo, somente

controladores podem alienar o controle.”

Por sua vez, a hipótese de exercício de controle em bloco, configurando sua alienação a

incidência do art. 254-A LSA, foi tratada no âmbito do processo n.º 2007/7230, manifestando-se

o Diretor Marcelo Trindade, in verbis:

―Mas, na verdade, além da hipótese (por ora admitida) de consolidação do controle, há

pelo menos uma outra situação em que um integrante do bloco de controle pode vender

ações que isoladamente não asseguram o controle, e apesar disso o controle seja

transferido. Trata-se da indisputada situação em que a alienação das ações integrantes do

bloco de controle se dê em conjunto por diversos integrantes do bloco, de modo que

95

EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas; Mercado de

Capitais –regime jurídico. – Rio de Janeiro: renovar, 2008; pp.369.

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119

cada um aliene menos que 50%, mas em conjunto transfiram ao adquirente mais que

50% das ações com voto (...) Sendo tal hipótese um caso indisputado de obrigação de

realizar a OPA (pois os alienantes transferem em conjunto o controle que detêm em

conjunto)‖.

Pacificado no âmbito da CVM a necessidade de se realizar a OPA do art. 254 LSA quando

alienado o controle pelo conjunto de acionistas que o exercem por meio de acordo de acionistas,

restam três discussões sobre a OPA de alienação do controle quando ocorra a transferência de

valores mobiliários de pessoas integrantes de acordo de acionista que garantam o controle, quais

sejam: (i) quando um acionista integrante do acordo, mas que não predomina dentro deste,

aliena sua participação a terceiro; (ii) quando um acionista integrante do acordo, que predomina

dentro deste, aliena sua participação para terceiro; e (iii) quando um acionista integrante do

acordo de acionista aliena sua participação para demais integrante do acordo que passa a, assim,

deter sozinho o controle da companhia.

Sobre o primeiro tópico a CVM já se manifestou que não incide a necessidade de OPA,

posto que o acionista que não predomina no acordo de acionista passa longe de ter o controle da

sociedade. Sobre o terceiro ponto a CVM também já se manifestou no âmbito do processo CVM

RJ n.º 2007/7230, já citado, chegando o Diretor Marcelo Trindade a concluir com o relator do

caso, manifestando o seguinte entendimento:

―Concluir pela não obrigatoriedade de OPA em casos de consolidação do controle dentro

do bloco não é, certamente, adotar a decisão mais simpática. E certamente este não é o

voto que eu mais gostaria de dar. De lege ferenda, me parece que a alienação de

participações relevantes, conforme percentual previsto em lei ou no Estatuto, deveria

gerar a obrigação de estender as mesmas condições aos demais acionistas, através da

realização de OPA. Isto contribui para que o valor das ações de uma companhia aberta

seja estabelecido pelo mercado de maneira mais adequada, sem prêmios ou descontos

economicamente pouco justificáveis, decorrentes de direitos não expressos nos títulos,

mas sim inerentes ao exercício do poder.

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120

―Mas o fato é que, de lege lata, estou de acordo com a conclusão do voto do Diretor

Relator, pela inexistência de alienação de controle, que só pode ser alienado por quem o

detenha, o que, em casos de acordo de acionistas, significa o grupo de pessoas

vinculadas por acordo de voto, como diz o art. 116 da Lei das S.A., e não um membro

desse grupo que detenha menos que a maioria das ações com voto, ressalvada a análise

do acordo de acionistas, que revele a preponderância do subscritor alienante perante os

demais.‖

Sobre o segundo ponto, a CVM ainda não se prestou a analisar. Tal caso jamais bateu às

portas da autarquia, solicitando desta seu entendimento. Marcelo Trindade, na citação acima,

ressalvou este segundo ponto, esclarecendo que chegada à hora, a CVM resguardará a devida

análise para o caso. Tal hipótese ainda não apareceu. Acredita-se que se tal hipótese ocorrer o

ponto essencial em debate será verificar a existência de um acionista que detenha um quantum

que garante ao mesmo a preponderância freqüente nas deliberações do acordo. Em havendo a

presença deste percentual por um acionista, o mesmo controlará as deliberações do acordo, que,

por sua vez, garante o quorum para decidir a vida social da Companhia. A par de tal opinião,

espera-se o entendimento da CVM.

Portanto, resta claro que hipóteses em que a Companhia é pulverizada e um investidor

adquire o controle mediante a compra das ações de uma enorme diversidade de acionistas, por

não haver um controle pré-existente, não dão ensejo à aplicação da OPA prescrita no art. 254-A

da LSA, nem a qualquer outra OPA legal ou prevista na esfera normativa da CVM.

Outro tema relevante diz respeito ao entendimento do Diretor da CVM, Pedro Oliva

Marcilio de Souza, de que não é necessária a alienação de valores mobiliários que garantam o

controle. Ocorre a OPA do art. 254-A também caso sejam transferidos, por quaisquer razões,

direito políticos e econômicos que possibilitem o exercício do poder de controle, conforme se

verifica no âmbito do mesmo processo acima mencionado. Segundo Pedro Oliva Marcilio de

Souza:

―Esse significado inclui, dentre as operações que dão causa à oferta pública, não só a

alienação de ações agrupadas em sociedade holding, mas, também, a inclusão de acertos

contratuais que impliquem a transferência dos direitos políticos e econômicos do valor

mobiliário, sem a transferência da ação (a conferência de usufruto vitalício de voto e

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121

dividendos mediante contraprestação em dinheiro ou a celebração de acordo de

acionistas, regulando voto e distribuição de dividendos, por exemplo), tenha esse acordo

sido celebrado para se evitar a realizar a oferta pública ou mesmo com vistas a um outro

fim lícito. Como isso, para a aplicação do art. 254-A, se em uma operação não se

verificar a transferência de valores mobiliários que implique alienação de controle, deve-

se analisar se essa alienação ocorreu de forma indireta (i.e., mediante acordos que

resultem na transferência de poder político e econômico desses valores mobiliários).‖

Tal conclusão do Diretor é um tanto questionável diante da literalidade normativa da IN

CVM 361, a saber:

Art. 29. §4o. Para os efeitos desta instrução, entende-se por alienação de controle a

operação, ou o conjunto de operações, de alienação de valores mobiliários com direito a

voto, ou neles conversíveis, ou de cessão onerosa de direitos de subscrição desses

valores mobiliários, realizada pelo acionista controlador ou por pessoas integrantes do

grupo de controle, pelas quais um terceiro, ou um conjunto de terceiros representando o

mesmo interesse, adquira o poder de controle da companhia, como definido no art. 116

da Lei 6.404/76.

EDITAL DE AUDIÊNCIA PÚBLICA Nº 03/2009 Prazo: 18 de maio de 2009 A Comissão de Valores Mobiliários - CVM submete à audiência pública minuta de parecer de orientação sobre disposições estatutárias que impõem aos acionistas que votarem favoravelmente à alteração ou à supressão de cláusula de proteção à dispersão acionária a obrigação de realizar a mesma oferta pública de aquisição de ações que se pretende alterar ou excluir do estatuto. A minuta do parecer de orientação está disponível para os interessados na página da CVM na rede mundial de computadores (www.cvm.gov.br)

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122

MARIA HELENA DOS SANTOS FERNANDES DE SANTANA Presidente 2 PARECER DE ORIENTAÇÃO Nº XXX, DE XX DE XXXXXX DE 2009. Disposições estatutárias que impõem ônus a acionistas que votarem favoravelmente à supressão de cláusula de proteção à dispersão acionária. Nos últimos anos, os estatutos de diversas companhias passaram a conter cláusulas de proteção à dispersão acionária que obrigam o investidor que adquirir determinado percentual das ações em circulação a realizar uma oferta pública de compra das ações remanescentes. Além disso, alguns estatutos incluem disposições acessórias a essas cláusulas, impondo um ônus substancial aos acionistas que votarem favoravelmente à supressão ou à alteração das cláusulas, qual seja, a obrigação de realizar a oferta pública anteriormente previsa no estatuto. A CVM entende que a aplicação concreta dessas disposições acessórias não se compatiliza com diversos princípios e normas da legislação societária em vigor, em especial os previstos nos arts. 115, 121, 122, I, e 129 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Por esse motivo, a CVM não aplicará penalidades, em processos administrativos sancionadores, aos acionistas que, nos termos da legislação em vigor, votarem pela supressão ou alteração da cláusula de proteção à dispersão acionária, ainda que não realizem a oferta pública prevista na disposição acessória. Aprovado em reunião de XX de XXXXXX de 2009. MARIA HELENA DOS SANTOS FERNANDES DE SANTANA

Presidente

E) Glossário

Whitemail. In economics, Whitemail is an anti-takeover arrangement in which the

target company will sell significantly discounted stock to a friendly third party. In return, the

target company helps thwart takeover attempts, by raising the acquisition price of the raider,

diluting the hostile bidder‘s number of shares, and increasing the aggregate stock holdings of

the company. (Fonte: Wikipedia)

Standstill agreement. A standstill agreement is usually an instrument of a hostile

takeover defense, in which an unfriendly bidder agrees to limit its holdings of a target firm. In

many cases, the target firm is willing to purchase the potential raider‘s shares at a premium

price, thereby enacting a standstill or eliminating any takeover chance. By establishing this

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123

provision with the prospective acquirer, the target firm will have more time to build up other

takeover defenses. (Fonte: Wikipedia)

Staggered Board of Directors. A staggered board of directors or classified board is a

practice governing the board of directors of a company, corporation, or other organization in

which the members of the board of directors are elected a few at a time, with different groups of

directors having overlapping multi-year terms, instead of en masse (where all directors have

one-year terms). Each group of directors falls within a specified "class"—e.g., Class I, Class II,

etc.—hence the use of the term "classified" board.

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124

9.1 Aula 10: Takeover Panel

A) Ementário de Temas

Origem e contexto histórico do ―Takeover Panel‖. O ―Takeover Panel‖ na Inglaterra. O

funcionamento do modelo britânico. Possibilidade de uma versão brasileira sobre o ―Takeover

Panel‖ e suas características.

B) Material de Leitura

Leitura Básica

DAVIES, Gower and. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell, 2008,

Eighth Edition, páginas. 961-1059.

Leitura Complementar

Pullinger, Anthony. THE UK TAKEOVER PANEL: A POSSIBLE MODEL FOR BRAZIL?:

Texto do Seminário Internacional ―Takeover Panel e as incorporações no Brasil‖, promovido

pela AMEC no dia 09 de dezembro de 2009, em São Paulo

C) Roteiro de Aula

O Takeover Panel se caracteriza como uma entidade de autorregulação para as operações

de incorporação, fusões e aquisições. Já existem vários países que adotam essa entidade de

autorregulação, sendo os maiores e mais famosos a Inglaterra e a Austrália. Analisaremos o

modelo britânico por ser o pioneiro nessa iniciativa96

.

O modelo britânico foi criado em 1968, com o intuito de organizar e criar regras para o

mercado de fusões e aquisições. O número de litígios era crescente e as decisões resultantes

96

O modelo australiano difere do modelo inglês por ser um órgão federal, sob os cuidados do Tesouro Nacional.

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125

destes eram insatisfatórias, gerando processos de longa duração, com alto custo e de resultados

imprevisíveis. Esse contexto surgiu de três grandes problemas na estrutura jurídica do país. O

primeiro, e de longa data, foi a falta de proteção que os acionistas minoritários tinham diante da

lei de sociedades anônimas britânica com relação às empresas familiar. O segundo problema

surgiu com a mudança dessa estrutura de controle em empresas familiar para um controle feito

por investidores mais dispersos. A lei britânica se mostrou incapaz de garantir que

administradores profissionais cuidassem dos interesses dos acionistas em uma tomada de

controle. Por último, com a crescente tomada de controle hostil nos anos 50 e a explosão de

práticas de tomada de controle nos anos 60, surgiram inúmeros casos de práticas abusivas e

injustas. Esse cenário foi visto como uma ameaça aos invetimentos no país, tornando-se

necessária uma mudança no modelo vigente. Assim, foi criado um órgão dedicado às operações

que envolvem transferência de controle, o Takeover Panel. O Takeover Panel é um órgão não

estatutário, independente do governo e de financiamento próprio.

O Takeover Panel tem seis principais objetivos: a igualdade entre os acionistas e um

tratamento justo entre eles, a prevenção de ações que possam frustrar ofertas, o estabelecimento

de uma estrutura ordenada para as ofertas, o comprometimento dos ofertantes com as suas

ofertas, o fornecimento de informações e conselhos suficientes e satisfatórios sobre a oferta em

questão, e a manutenção de um mercado justo e honesto.

Tendo em vista esses objetivos, o Takeover Panel possui três poderes: elaborar regras

para o modo em que as ofertas serão feitas, interpretar essas regras em casos concretos, e

determinar a apresentação de algum documento específico ou de alguma informação específica

nos casos concretos. “The main powers of the Panel are as follows. First, the Panel is given

both an obligation and a Power to make rules to govern the conduct of bids. Thus, the

legislation does not purport to discharge that rule-making function itself but requires or

empowers the Panel to do so. […] The Panel is permitted to arrange for its rule-making power

(and, indeed, any of its functions) to be discharged by a committee of the Panel, so that there

can be a further stage of delegation efore the power to make rules is actually exercised. […]

Secondly, the Panel “may give rulings on the interpretation, application or effect of rules”. […]

This is the Panel‟s judicial function. Thirdly, the Panel may require a person by notice in

writing to produce to it specified documents or to provide specified information, where such

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126

disclosure is “reasonably required in connection with the exercise by the Panel of its

functions‖97

.

A composição do órgão é simples. O quadro de membros é amplo e inclui investidores,

profissionais e integrantes do mundo corporativo. Todos os ramos envolvidos em operações de

tomadas de controle estão representados no órgão. Este é dividido em um Comitê de Ouvidoria,

que se caracteriza pelo corpo de juízes responsáveis pelos recursos contra as decisões do

executivo, e em um Comitê responsável pelo Código, que se caracteriza como o órgão

legislativo do Takeover Panel, com o dever de criar e definir as regras. Além disso, há uma

Junta de Apelação, que tem como função julgar os recursos contra as decisões do Comitê de

Ouvidoria. “The composition of the Panel is to be found, not in legislation, but in the Code

itself. It consists of a Chairman and up to two Deputy Chairman appointed by the Panel itself,

up to a further 20 members appointed by the Panel and individuals appointed by representative

bodies of those involved in takeovers, such as the Association of British Insures, the National

Association of Pension Funds, the Association of Investment Companies and other investor

groups, the British Bankers‟ Association and the London Investment Banking Association, the

Institute of Charteres Accountants and the Confederation of British Industry.98

O Takeover Panel funciona com um sistema baseado em princípios. Esse sistema é

vantajoso porque amplia a capacidade de lidar com mudanças uma vez que o órgão não se

preocupa em regular todo e qualquer caso específico, pois os princípios nos quais são baseados

são amplos e genéricos, podendo ser aplicados a qualquer situação. Houve, na história da

Inglaterra, uma série de mudanças com as quais, devido a essa característica, o Takeover Panel

conseguiu lidar sem nenhum prejuízo à sua reputação e, pelo contrário, com reforço à sua

autoridade. Além disso, esse sistema permite que sejam estabelecidos padrões elevados em suas

regras, uma vez que pode conceder derrogações a estas regras nas situações onde operaria de

forma excessiva ou de forma desnecessariamente restritiva ou onerosa.

97

Gower and Davies. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell, 2008, Eighth Edition by

Paul L. Davies, p. 970-972.

98 Gower and Davies. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell, 2008, Eighth Edition by

Paul L. Davies, p. 967.

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127

Caso alguém viole as regras do Takeover panel, essa pessoa ou empresa está sujeita à

censura do próprio órgão, pública ou privadamente. Essa conseqüência, que a princípio parece

ser branda, tem funcionado de modo eficaz na Inglaterra, uma vez que gera um dano à reputação

da pessoa ou empresa. Segundo Anthony Pullinger, diretor geral do organismo na Inglaterra, as

conseqüência podem ser ainda mais graves: ―More rarely, the Panel may report a person‘s

conduct to other regulators or, exceptionally, ―cold-shoulder‖ a person. If a person is ―cold-

shouldered‖ it means that authorised entities and other professionals are no longer able to act for

the person concerned. Effectively they are ―frozen out‖ of takeover activity, and denied the

facilities of the securities markets, in the UK‖99

. Assim, as sanções previstas tem se mostrado

suficientes para manter o alto nível de compliance das empresas às regras da entidade de

autorregulação, porém, hoje em dia, já existem outras sanções caso alguém não cumpra as

regras do órgão. Isso pode ser encontrado na seção 955 do Companies Act, conforme cita Gower

and Davies: “Perhaps the strongest expression of the new policy of giving the Panel statutory

sanctions is to be found in section 955 which confers upon the Panel a Power to apply to the

court (High Court or Court of Session) where a person has contravened or is likely to

contravene a requirement imposed by or under a Code rule or has failed to comply with a

requirement […]. The court may then make such order will as it thinks fit to secure compliance

with the requirement, which order will be backed by the sanctions for contempt of court.” 100

Para minimizar o risco de inadimplemento das regras, há um órgão executivo que realiza

a função de esclarecer às pessoas que são submetidas ao código de fusões e aquisições quais os

requerimentos que serão aplicados para a sua situação específica. Vale ressaltar que esse

procedimento pode ser feito por iniciativa do próprio órgão ou pelas pessoas envolvidas na

transação. Segundo Gower and Davies, “The Panel Executive gives rulings on the Code in the

course of a bid, either on its own initiative or at the request of one or more parties to the

bid101

.” Dessa forma, Anthony Pullinger explicou em seu discurso: “When a person or its

advisers are in doubt whatsoever as to whether a proposed course of conduct is in accordance

99

Retirado do discurso ―The UK Takeover Panel: A possible model for Brail?‖ para o Seminário Internacional

Takeover Panel e as incorporações no Brasil, promovido pela AMEC no dia 09 de dezembro de 2009 em São

Paulo. 100

Gower and Davies. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell, 2008, Eighth Edition by

Paul L. Davies, p. 973. 101

Gower and Davies. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell, 2008, Eighth Edition by

Paul L. Davies, p. 967.

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

128

with the General Principles or the rules, or whenever a waiver or derogation from the

application of the provisions of the Code is sought, that person or its advisers must consult the

Executive in advance. In this way, they can obtains a conditional ruling (on na ex parte basis)

or an unconditional ruling as to the basis on which they can properly proceed and thus

minimise the risk of taking action which might, in the event, be a breach of the Code. To take

legal or other Professional advice on the interpretation, application or effect of the Code is not

an appropriate alternative to obtaining a ruling from the Executive”102

. Assim, o executivo age,

de maneira rápida e flexível uma vez que estas são transações que ocorrem de modo veloz,

antes do evento e das ações e não depois que eles já aconteceram. Funciona de forma

preventiva. Essa decisão é obrigatória, desde que não seja feito recurso apelativo para o Comitê

de Ouvidoria. Essa oitiva ocorre de maneira rápida e é raro acontecer. Ainda, a decisão do

Comitê de Ouvidoria pode ser recorrida na Junta de Apelação, com a mesma rapidez da

primeira apelação.

“The Hearing Committee was formerly known as the “Full Panel”. The Executive may

require any appeal to the Hearing Committee to be lodged within a specific period, possibly a

period as short as a few hours. The Hearing Committee normally sits in private and operates

informally, but does issue public statements of its rulings. A party to the hearing before the

Hearing Committee may appeal to the Takeover Appeal Board (formerly known as the “Appeal

Committee”), normaly within two business days of receipt in writing of the ruling of the

Hearing Committee. This is a rather wider right of appeal than existed previously when many

appeals required leave of the Appeal Board. The Appeal Board is an independent body, whose

chairman and deputy chairman, appointed by the Master of the Rolls, will usually have held

high judicial office and whose other member (normally four) are experienced in takeovers. The

Appeal Board operates in a similar way to the Hearing Committee, including the publication of

its decision. It may confirm, vary, set aside or replace the ruling of the Hearing Committee.”103

102

Retirado do discurso ―The UK Takeover Panel: A possible model for Brasil?‖ feito por Anthony Pullinger, para

o Seminário Internacional Takeover Panel e as incorporações no Brasil, promovido pela AMEC no dia 09 de

dezembro de 2009 em São Paulo. 103

Gower and Davies. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell, 2008, Eighth Edition by

Paul L. Davies, p. 967-968.

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129

Tendo em vista o sucesso da criação de uma entidade de autorregulação para as

operações de fusões e aquisições, surgiu o debate sobre a possibilidade da criação do mesmo

para o mercado brasileiro. Debate este que começou quando a presidente da Comissão de

Valores Mobiliários (CVM), Maria Helena Santana, levantou a questão. O estudo está sendo

feito pela BM&FBOVESPA que contratou o jurista Nelson Eizirik, especialista em direito

societário, para desenvolvê-lo. ―O assunto, porém, ganhou força para seguir em frente por dois

motivos, além da promoção do tema pela CVM. O primeiro é a contínua sofisticação do

ambiente brasileiro de fusões e aquisições, com operações cada vez mais inusitadas para o país.

O segundo é a revisão do regulamento do Novo Mercado, tema ao qual a possibilidade de

criação de um comitê para fusões esteve inicialmente ligado. Foi assim que o debate foi

transferido da Abrasca à BM&FBOVESPA‖104

.

O estudo desenvolvido pelo jurista, baseado no modelo inglês, visa definir o que seria

necessário para a aplicação do órgão e as suas características no Brasil. A idéia é que seja

também uma iniciativa privada e que funcione por adesão voluntária das empresas que, segundo

Nelson Eizirik, serão apenas empresas do segmento especial da bolsa, diferente do que ocorre

na Inglaterra que abrange todas as companhias abertas. Para ele, o modelo seria de

autorregulação voluntária, sem mudanças na Lei das S/A e na Lei 6.385/76, com a criação de

um Código de Autorregulação de Fusões e Aquisições baseado em princípios e regras e de um

Comitê de Fusões e Aquisições (CFA), composto por membros representantes das principais

associações do mercado. As operações que seriam submetidas ao Comitê são as operações de

Oferta Pública de Aquisição (OPAs) para aquisição de controle ou decorrente da aquisição de

controle e as operações de fusões e incorporações de companhias e de ações. O Comitê terá as

funções de decidir os casos, com decisões incondicionais e condicionadas, com a constituição

em cada caso de um comitê ―ad hoc‖, e a função de elaborar e revisar periodicamente o Código.

Esse Comitê abrangerá as companhias listadas no Novo Mercado ou em segmento especial e

quaisquer outras companhias que queiram ter uma decisão do CFA em seus processos de

104

Retirado da matéria ―Código para fusões‖ por Graziella Valenti,do Jornal Valor Econômico, do dia 01 de

dezembro de 2009.

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130

reestruturação societária. Além disso, os Pareceres de Orientação da CVM podem presumir à

legalidade das operações realizadas de acordo com o Código e aprovadas pela CFA. 105

As sanções para aqueles que violarem as normas do Comitê são a censura, pública ou

privada, a multa, a exclusão do mercado e a comunicação à CVM sobre o delito.

O estudo sobre o tema ainda é recente e ainda não está concluído. Porém, a discussão

sobre a criação dessa entidade está cada vez mais importante e presente.

D) Bibliografia

Gower and Davies. Principles of Modern Company Law: London, Sweet & Maxwell,

2008, Eighth Edition by Paul L. Davies, p. 961-1059.

Discursos do Seminário Internacional ―Takeover Panel e as incorporações no Brasil‖,

promovido pela AMEC no dia 09 de dezembro de 2009, em São Paulo:

―VISÃO BRASILEIRA SOBRE TAKEOVER PANEL‖, Nelson Eizirik;

―THE UK TAKEOVER PANEL: A POSSIBLE MODEL FOR BRAZIL?‖,

Anthony Pullinger.

―The Australian Takeovers Panel‖, Alan Shaw.

Matéria ―Código para fusões‖, por Graziella Valenti, Jornal Valor Econômico.

Site do Takeover Panel na Inglaterra: http://www.thetakeoverpanel.org.uk/

The Takeover Code

General Principles and Rules

Companies Act 2006, part 28 – TAKEOVERS ETC

105

Retirado da palestra ―Visão brasileira sobre Takeover Panel‖ de Nelson Eizirik para o Seminário Internacional

Takeover Panel e as incorporações no Brasil, promovido pela AMEC no dia 09 de dezembro de 2009 em São

Paulo.

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131

About the Panel

Site do Takeover panel na Austrália: http://www.takeovers.gov.au/

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132

10.1. Aulas 11 e 12: Governaça Corporativa, Os Interesses

Fundamentais e As Questões Éticas.

A) Ementário de Temas

Os Interesses Fundamentais da S.A. A Governança Corporativa. O Combate A Fraude,

Corrupção, Crime Econômico Internacional e Recuperação de Ativos

B) Material de Leitura

Leitura Básica

BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, pp 151-156.

KLOSE, Bernd H., Asset Tracing & Recovery The Fraudnet World Compendium. Berlin: Erich

Schmidt Verlag Gmbh & Co. , 2009. P. 327-341.

Leitura Complementar

NUNES, Marcelo Guedes. In: ―Sociedade Anônima, 30 Anos da Lei 6.404/76‖. São Paulo:

Quartier Latin, 2007. p. 88-117

C) Roteiro de Aula

Os Interesses Fundamentais da S.A e a Governança Corporativa.

A Lei 6.404/76 determina, no parágrafo único do artigo 116, que o controlador deve usar

o seu poder para ― fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem

deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e

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133

para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e

atender.‖

A Lei das Sociedades Anônimas prevê, portanto, os deveres e as responsabilidades dos

acionistas, ao mesmo tempo em que determina quem são os destinatários dos interesses

protegidos por ela: acionistas, empregados e comunidade.

A sociedade anônima deixa de ser um mero instrumento de produção de lucros para

distribuição aos detentores do capital para elevar-se à condição de instrumento destinada a

exercer o seu objeto para atender aos interesses de 1) acionistas, 2) empregados e 3)

comunidade. Esses três interesses devem, por conseguinte, conviver equilibradamente no

âmbito da sociedade; as decisões tomadas terão, necessariamente, que considerá-los, a fim de

que nenhum deles seja sacrificado. 106

O acionista sempre foi considerado significativo para a sociedade. A grande inovação

trazida pela lei atual situa-se na consagração do empregado e da comunidade como merecedores

desse mesmo nível de significação. O acionista, aportando capital à sociedade, torna-se

merecedor de uma administração que adote as medidas conducentes a uma compensadora

remuneração para o seu investimento. O empregado, emprestando sua força de trabalho à

empresa, faz jus a uma administração que lhe garanta o emprego, bem como um padrão de vida

adequado. A comunidade, vivendo em estreito relacionamento com a empresa, merece desta

não só a permanência naquele meio social, como igualmente a adoção de processos capazes de

evitar danos ou prejuízos à população local e ao meio ambiente. 107

Parte do estudo dos interesses fundamentais trata do instituto da governança corporativa

e suas implicações práticas. Com os vários casos de fraude e corrupção no Brasil e no exterior,

como os casos da Enron, Parmalat, e o escândalo financeiro perpetrado por Bernard Madoff e

outros, fica difícil achar um tema que seja mais atual e relevante.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, na terceira versão, revisada e

ampliada, do seu ―Código Brasileiro das Melhores Práticas de Governança Corporativa‖, define

governança corporativa ―como o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas,

envolvendo os relacionamentos entre acionistas/quotistas, conselho de administração, diretoria,

auditoria independente e conselho fiscal. As boas práticas de governança corporativa têm a

106

BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, pp 151-152. 107

Idem.

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134

finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para a

sua perenidade.‖108

Governança Corporativa. O Relatório a define como o sistema composto de normas

legais e regulamentares, de organização e de mecanismos contratuais necessários para proteger

os interesses dos acionistas, limitando o comportamento oportunista dos seus administradores.

Muitas companhias têm o capital pulverizado, o que impede um investidor de controlá-la

isoladamente ou de eleger a maioria dos membros do Conselho de Administração. Nessa

situação, os mecanismos de ―governança‖ buscam proteger o interesse de todos os investidores

face aos administradores, cujos interesses não são necessariamente coincidentes com os da

companhia e de seus acionistas. Em algumas circunstâncias, no entanto, um acionista (ou grupo

deles) também pode comandar a sociedade. Na Parmalat, em que a família Tanzi controlava

51% de seu capital votante, os mecanismos de ―governança‖ deveriam procurar evitar que o

detentor do controle majoritário dirigisse a companhia para explorar os acionistas

minoritários.109

Combate à fraude, corrupção e recuperação de ativos.

Introdução

Etimologia da palavra ―corrupção‖. Corrupção deriva do latim corruptus que, numa primeira

acepção, significa quebrado em pedaços e, numa segunda acepção, apodrecido, pútrido. Por

conseguinte, o verbo corromper significa tornar pútrido, podre.110

Conceito de corrupção: Forma de comportamento que se distancia da ética, moralidade,

tradição, lei e virtude cívica. A Transparência Internacional é uma organização não

governamental fundada na Alemanha que tem como missão criar mudanças de comportamento

que levem a um mundo livre de corrupção. Ela possui atualmente escritórios distribuídos em 90

países do planeta. Definição – ―the misuse of entrusted power for private gain‖ – (―o mal uso

do poder confiado para ganho privado‖). 108

Apud Luiz Alberto Colonna Palestra proferida na IX Conferência dos Advogados do Estado do Rio de Janeiro

(19/05/2005) sobre GOVERNANÇA CORPORATIVA. 109

Governança Corporativa e o Brasil, Luiz Leonardo Cantidiano. 110 MULTI-JURISDICTIONAL CONCEALED ASSET RECOVERY ‗Investigations‘ Presented To: 2nd Meeting

of Fraudnet, Hammonds, Madrid, 25 February, 2005. Martin S. Kenney.

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135

Definição ampla: “corrupção política significa o uso ilegal, por parte de governantes,

funcionários públicos e agentes privados - do poder político e financeiro de organismos ou

agências governamentais com o objetivo de transferir renda pública ou privada de maneira

criminosa para determinados indivíduos ou grupos de indivíduos ligados por quaisquer laços de

interesse comum – como, por exemplo, negócios, localidade de moradia, etnia ou de fé

religiosa.‖ (fonte Wilkipedia).

Não há uma definição universalmente aceita de corrupção e sua percepção varia de uma a

outra cultura. Corrupção inclui os seguintes comportamentos: conflito de interesse, apropriação

indébita, fraude, corrupção ativa e passiva (suborno), organização criminosa com o fim de

realizar corrupção continuada, corrupção política, nepotismo, sectarismo e extorsão.111

O Banco Mundial afirma que são pagos anualmente no mundo todo em forma de ―subornos‖

um total de US$ 80 Bilhões (trata-se de um número obscuro que não pode ser confirmado de

forma empírica). Este valor pode ser somente a ponta de um iceberg.

Corrupção em larga escala (―grand corruption‖) são os casos de riqueza patrimonial maciça

que é adquirida de Estados por oficiais públicos graduados incluindo: a) a escala de riqueza

adquirida de forma corrupta; e, b) a graduação dos oficiais envolvidos.112

Apropriação indébita e malversação de ativos do estado são as atividades envolvidas em

corrupção.

A Sociedade para Avanço de Estudos Legais descreveu ―grand corruption‖: ―Nós usamos o

termo ‗grand corruption‘ para descrever casos nos quais riqueza patrimonial maciça é adquirida

dos Estados por oficiais públicos graduados utilizando-se de meios corruptos. Portanto os

fatores que distinguem a ‗grand corruption‘ são a escala da riqueza adquirida pelos meios

corruptos e a graduação do funcionário/político envolvido. Esta definição é bastante

diferençável da corrupção pequena, ―bola‖ suborno e não há um patamar arbitrário para

determinar o valor envolvido.‖

A corrupção em larga escala (―grand corruption‖) é também conhecida como kleptocracia.

Independente da classificação, a corrupção é uma preocupação global. Kleptocracia representa

uma ameaça a boa governança e a regra da lei.

111

Idem. 112

Idem.

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136

A questão se torna muito mais complexa e relevante quando a corrupção se manifesta a um

nível de kleptocracia internacional.

Países que precisam lidar com este problema em uma escala maior encaram grandes

desafios.

O que pode fazer um país se os ativos decorrentes de ―grand corruption‖ que ocorreu em

outro local são encontrados em seus território?

A quem poderá ser feito um suspicios transaction report ( SAR)?

A quem e para onde serão repatriados estes ativos?

E quanto à lei de imunidade de soberania estrangeira?

Como pode um sistema robusto de combate à lavagem de dinheiro ser eficientemente

aplicado contra bancos ou outros detentores provisórios dos ativos?

E quanto a culturas em que com o tempo foi enraizado um alto grau de tolerância por

corrupção?

À primeira vista, o problema se apresenta tão complicado que parece impossível de resolver.

Não obstante, várias leis e conversões internacionais de combate à corrupção foram

implementadas. 113

O Brasil é signatário das seguintes convenções internacionais, que facilitam o combate a

fraude:

a) A ―Convention on Combating Bribery of Foreign Public Oficials‖ - Convenção de

Combate a Suborno de Oficiais Públicos Estrangeiros nas Transações Negociais Internacionais

(OECD – Organization for Economic Cooperation and Development - Organização para

Cooperação e Desenvolvimento Econômico114

b) A ―Inter American Convention Against Corruption adopted by the Organization of

American States‖ - Convenção OEA - Convenção contra a Corrupção da Organização dos

Estados Americanos – OEA

Além desses existe a ―Criminal Law Convention Against Corruption of the Council of

Europe‖. ―The African Union‘s Anti Corruption Convention‖. A ―United Nations Convention

Against Corruption (the ―UNCAC‖).

113

Idem. 114

On 21 November 1997, OECD Member countries and five non-member countries, Argentina, Brazil, Bulgaria,

Chile and the Slovak Republic, adopted a Convention on Combating Bribery of Foreign Public Officials in

International Business Transactions. The signing of the Convention took place in Paris on 17 December 1997.

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137

Além de estabelecer novos padrões internacionais para estados membros, cada convenção

inclui regras que facilitam investigações entre países e aplicação das convenções, que está

sempre sujeita a cooperação internacional e vontade política. Muitas vezes, as convenções são

menos aplicadas que as legislações. Não obstante, convenções internacionais de anticorrupção

representam diretrizes ambiciosas para regular um problema em que não há/havia regras ou

aplicação de regras anticorrupção.

Crimes Contra o Sistema Financeiro e Lavagem de Dinheiro

Lei 9.613/98 – Lei de Lavagem de Dinheiro

Resulta do compromisso assumido pelo Brasil com a comunidade internacional ao firmar a

Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substancias Psicotrópicas –

Convenção de Viena – de 20.12.88, referendada pelo Brasil em 1991.

Em 1990, Conselho da Europa aprovou a Convenção sobre Lavagem, Identificação,

Embargo e Confisco de Bens derivados de Crime. Neste ano foi publicada a diretiva sobre

prevenção da utilização do sistema financeiro para lavagem de dinheiro.

A lavagem de dinheiro e os crimes a ela correlatos tornaram-se ultimamente delitos que

extrapolam regiões ou países. Exteriorizam-se além das fronteiras nacionais. Desestruturam o

sistema financeiro. Comprometem a atividade econômica e minam as políticas sociais.

A lavagem de dinheiro não está distante de nossa realidade.

O combate à lavagem de dinheiro no Brasil é uma atividade recente e, por isso conta com

pouca experiência acumulada.. É necessária ampla atividade de capacitação e especialização

pois cada dia criam-se novas formas de prática deste ilícito. São crimes de grande sofisticação e

complexidade, exigindo preparo permanente dos órgãos incumbidos da aplicação da lei.115

Cada órgão, seja de fiscalização, inteligência financeira, persecução penal, detém apenas

uma parcela do conhecimento necessário.

Complexidade da matéria exige um trabalho descentralizado, integrado, com ampla troca de

informações, compartilhando os conhecimentos e técnicas para a consecução dos objetivos

perseguidos.

115 Entrevista do Ministro Gilson Dipp falando no I Simpósio Internacional Sobre Prevenção e Combate à Lavagem

de Dinheiro.

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138

A cooperação interna entre os órgãos institucionais é essencial

A escalada do crime organizado no país está diretamente ligada ao crescente poder

econômico obtido pelas diversas associações criminosas

A lavagem de dinheiro é uma atividade obrigatória dessa criminalidade, financiando-a e

realimentando-a. É prática geralmente complexa, envolvendo inúmeras transações que são

utilizadas para ocultar a origem dos ativos financeiros e permitir que sejam usados sem o

comprometimento dos criminosos.

A cooperação internacional torna-se imprescindível para a elucidação destes crimes. Os

meios tradicionais de cooperação internacional, como a entre os quais a carta rogatória, têm

mostrado inadequados e ineficientes para a obtenção de medidas eficazes, como o bloqueio de

ativos financeiros.

O Conselho da Justiça Federal editou Resolução especializando Varas Federais Criminais

para o processamento e julgamento de crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro

e os TRFs as implementaram. Atualmente, estão localizadas nas principais capitais brasileiras,

com competência territorial sobre toda a Seção Judiciária.

Na segunda avaliação mútua da República Federativa do Brasil, no âmbito do Grupo de

Ação Financeira Contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI-FATF), a criação de varas

especializadas foi motivo de avaliação mais positiva.

Importância de se garantir também os direitos e garantias individuais constitucionalmente

garantidas, bem como aspectos que envolvem a ordem pública e o interesse social.

Aplicação de acordos internacionais, pedidos de ação controlada, bloqueio de ativos, quebra

de sigilo fiscal e bancário, de interceptação telefônica e ambiental, de delação premiada, de

infiltração de agente policial ou de inteligência em organizações criminosas etc são objeto de

estudos destes juízes.

O desafio do juiz criminal é manter um ponto de equilíbrio entre a preservação do direito ao

sigilo, à intimidade e o interesse social.

Conceito de Lavagem de dinheiro

É uma atividade que consiste na desvinculação ou afastamento do dinheiro da sua origem

ilícita para que possa ser aproveitado.

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139

Lavagem de dinheiro é definida como: O conjunto complexo de operações, integrado pelas

etapas de Conversão (―placement‖); Dissimulação (―layering‖) e, Integração (―integration‖) de

bens, direitos e valores, que tem por finalidade tornar legítimos ativos oriundos da prática de

atos ilícitos penais.116

A primeira fase é a de colocação (―placement‖), ocultação ou conversão. Consiste na

separação física do dinheiro dos autores do crime, sem ocultação da identidade dos titulares.

A segunda fase é conhecida como dissimulação ou circulação (ensombrecimento,

―layering‖). Multiplicam-se as transações anteriores com várias transferências com cabo (wire

transfer) através de muitas empresas e contas, de modo a que se perca a trilha do dinheiro (paper

trail), constituindo-se na lavagem propriamente dita. 117

Objetivo da lavagem. Fazer com que não se possa identificar a origem ilícita.

D) Textos de Apoio

GOVERNANÇA CORPORATIVA (Palestra proferida na IX Conferência dos Advogados do

Estado do Rio de Janeiro (19/05/2005))

Luiz Alberto Colonna Rosman- Advogado no Rio de Janeiro – sócio de ―Bulhões

Pedreira, Bulhões Carvalho, Piva, Rosman e Souza Leão Advogados‖

Governança Corporativa é a expressão com que se procura designar o sistema, ou

conjunto de regras, pelo qual as companhias são dirigidas e controladas. Até há 10 anos atrás, a

expressão era praticamente desconhecida no Brasil. Hoje, em um ambiente de economia

globalizada, em que, cada vez mais, tanto empresas brasileiras vão buscar recursos em mercados

de capitais estrangeiros, principalmente o americano, quanto investidores externos e empresas

multinacionais aplicam recursos na economia brasileira, a expressão se tornou de uso corrente.

Mas o que, mais concretamente, vem a ser ―governança corporativa‖ ? Como bem

sintetizado por Aline de Menezes Santos, em interessante trabalho ―Reflexões sobre a

116 TIGRE MAIA, Rodolfo. Lavagem de dinheiro (lavagem de ativos provenientes de crime). Anotações às

disposições criminais da Lei 9.613/98. São Paulo. 2ª ed.Malheiros, 2007. pp. 37-43.

117

Idem.

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140

Governança Corporativa no Brasil‖ (Revista de Direito Mercantil nº 130, pp. 180/206), a

―governança corporativa diz respeito a um conjunto de instrumentos públicos e privados,

incluindo leis, regulamentos e práticas comerciais que organizam e comandam a relação, numa

economia de mercado, entre os controladores e administradores de uma empresa, de um lado, e

aqueles que nela investem recursos, de outro‖. O conjunto de pessoas que investe recursos em

empresas abrange tanto os investidores em participações societárias (os acionistas ou sócios),

como os provedores de capital financeiro (os debenturistas e outros tipos de credores em geral),

os prestadores de serviços (como empregados e consultores) e ainda pessoas provedoras de

outros fatores de produção necessários à atividade da empresa.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, na terceira versão, revisada e

ampliada, do seu ―Código Brasileiro das Melhores Práticas de Governança Corporativa‖, define

governança corporativa ―como o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas,

envolvendo os relacionamentos entre acionistas/quotistas, conselho de administração, diretoria,

auditoria independente e conselho fiscal. As boas práticas de governança corporativa têm a

finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para a

sua perenidade.‖

O termo ―governança corporativa‖ é tradução literal e ruim da expressão inglesa

equivalente ―corporate governance‖. ―Corporate‖ vem de ―corporation‖, que em português se

pode traduzir por companhia ou sociedade. ―Governance‖ tem a ver com governo ou sistema de

administração. Conforme bem destacado pelo professor Arnold Wald, em artigo que escreveu

sobre o tema (―O Governo das Empresas‖, Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais

e da Arbitragem nº 15, pp. 53 a 78), seria mais adequado usar a expressão ―governo das

empresas‖ ou ―governo das sociedades‖, que são expressões mais correntes nos países de língua

latina, nos quais a palavra ―corporação‖ tem, não o sentido de sociedade anônima ou

companhia, mas, o de associação profissional ou de classe. Consoante acentuado pelo professor

Wald, ―os adjetivos corporativo e corporativista têm sentido pejorativo, dando idéia de

prevalência de interesses de um grupo ou de uma classe. Ao contrário desta noção, o termo

―governo das empresas‖ pretende denominar a renovação da entidade, atendendo aos interesses

de todos aqueles que a integram ou com ela colaboram‖. Entretanto, a prática consagrou a

expressão governança corporativa, e assim, democraticamente, a ela nos rendemos.

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141

Para bem compreender a importância e o significado dos princípios que formam o

sistema da governança corporativa, é essencial ter presente as origens do movimento e o

ambiente econômico-jurídico em que se desenvolveram suas regras como hoje conhecidas e

divulgadas.

O movimento da governança corporativa teve início nos Estados Unidos, como reação

ao desenvolvimento das grandes companhias americanas, nas quais, em razão da pulverização

do capital, que era detido fragmentariamente por milhares de acionistas, se configurou uma

crescente separação entre a propriedade da companhia e sua gestão ou controle. O mais

influente estudo desta realidade econômico-jurídica foi feito pelos americanos Adolf Berle e

Gardiner Means, que, em seu clássico livro ―A Moderna Companhia e a Propriedade Privada‖,

escrito em 1932, analisaram detidamente a estrutura de poder das grandes corporações

americanas, e demonstraram haver uma clara separação entre a propriedade do capital e o

controle e a gestão da empresa, os dois últimos a cargo dos administradores executivos, os

quais, por agir com grande autonomia, estabeleciam as políticas e metas de desenvolvimento da

empresa que, muitas vezes, não correspondiam aos melhores interesses dos donos do capital, os

acionistas, mas aos interesses deles, os executivos.

A grande dispersão na propriedade das ações tornava os acionistas desinteressados em

participar das assembléias gerais, estando boa parte deles plenamente satisfeita em outorgar

procurações aos executivos da companhia, que, dessa forma, garantiam sua manutenção nos

cargos e a eleição para o Board of Directors (análogo ao nosso conselho de administração) de

pessoas a eles vinculadas, e que não poriam em risco a manutenção do poder de controle em

suas mãos. Como as quantidades de ações detidas pelos acionistas individualmente eram

pequenas, aqueles que não estavam satisfeitos com a administração, ao invés de se organizarem

para reclamar e exigir seus direitos, simplesmente desfaziam-se das ações, passando a aplicar

seus recursos em outro ativo financeiro ou em ações de companhias que julgavam melhor

administradas.

Essa dissociação entre a propriedade do capital e a gestão da empresa é analisada na

economia sob o nome de ―teoria da agência‖, que, entre outras questões, analisa os conflitos de

interesse entre quem tem a propriedade (o acionista) e quem tem o controle da organização (o

agente ou administrador). Segundo ressaltou Adrian Cadbury (―Corporate Governance and

Chairmanship – A Personal View‖, Oxford University Press, 2002), esse problema de agência

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142

nas sociedades por ações já havia chamado atenção de Adam Smith que, em seu livro ―A

Riqueza das Nações‖, faz o seguinte comentário:

―Os diretores de tais companhias pelo fato de serem administradores mais do dinheiro de

outras pessoas do que do próprio deles não se pode esperar que zelem pelo negócio com a

mesma vigilância atenta com a qual os sócios em uma sociedade privada freqüentemente zelam

por seus próprios interesses (....). Negligência e esbanjamento, dessa forma, deverão

frequentemente predominar na administração dos negócios de tais companhias.‖

Após a transcrição desse trecho, Cadbury comenta que ―o problema de agência que

Adam Smith identificou tem sido e continua a ser objeto de exaustivos estudos, porque ele é

inerente à relação entre os provedores de capital e seus agentes, que põem este capital em uso,

ou em outras palavras, entre acionistas e conselhos de administração. (.....) Hoje em dia, a

atenção é muito mais focada nos conselheiros e diretores executivos que atuam na busca dos

próprios interesses, como, por exemplo, pelo reinvestimento na expansão de seus impérios ao

invés de aumentar o retorno dos acionistas, do que na negligência e esbanjamento – nada

obstante essas atitudes indevidas ainda continuem a ocorrer.‖ (ob. cit., p.4)

Conforme assinala o mesmo Cadbury, em termos de exercício do poder de controle, é a

diretoria executiva que, no período entre as duas guerras mundiais, estava no comando, tanto na

Inglaterra, como nos Estados Unidos. Considerando que os conselhos de administração eram

relativamente fracos, o fato de os acionistas não estarem em posição de exercer controle sobre

os administradores e, em conseqüência, sem condições de deles exigir a devida prestação de

contas, levou a que a questão da governança corporativa não tivesse, naquela época, o

desenvolvimento que poderia ter tido.

Posteriormente, essa situação foi-se modificando por uma série de fatores, dentre os

quais é importante destacar dois principais: o primeiro é a entrada em cena, de forma cada vez

mais acentuada, dos fundos de pensão e dos fundos de investimentos em ações, que passaram a

substituir as pessoas físicas, que eram individualmente os acionistas das grandes companhias.

Essa mudança de investidores pessoas físicas, com pequenas participações no capital das

grandes companhias americanas, por investidores institucionais e coletivos, com melhor

organização e participação mais relevante no capital das empresas, e, em decorrência, mais

aptos e incentivados para acompanhar e fiscalizar a administração das sociedades, deu aos

proprietários do capital maior poder de barganha, na medida em que os administradores

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Trading Eletrônico e o Mercado de Capitais

143

executivos passaram a ter que lidar com acionistas mais preparados, titulares de maiores

parcelas do capital social e com os quais tinham que compor para continuarem a se manter em

seus cargos.

O maior ativismo por parte dos investidores, agora reunidos em fundos de ação ou

fundos de pensão, aumentou a pressão sobre os legisladores, motivando – no início de forma

tímida e, posteriormente, de forma mais incisiva – a edição de novas regras no sentido de

aumentar a transparência e freqüência das informações prestadas aos acionistas, melhorias no

sistema de fiscalização, com a introdução dos comitês de auditoria formados exclusivamente

por administradores independentes dos executivos, propiciando uma mais efetiva e abrangente

prestação de contas por parte dos administradores. As Bolsas de Valores passaram,

paulatinamente, a exigir das companhias o cumprimento de uma série de requisitos mínimos de

divulgação de informações e transparência nos dados relativos às demonstrações financeiras,

para dar aos acionistas melhor conhecimento tanto da situação financeira da companhia como

das suas perspectivas de rentabilidade futura. Em 1977, por exemplo, a Securities and Exchange

Comission – SEC aprovou a decisão da Bolsa de Nova Yorque de passar a exigir que todas as

companhias americanas listadas deveriam instituir comitês de auditoria formados

exclusivamente por conselheiros externos e independentes.

O segundo fator importante, na mudança de atitude dos administradores das grandes

companhias no sentido da adoção de práticas mais afinadas com os interesses dos acionistas, foi

a revolução causada pelas chamadas tomadas de controle hostis, que passaram a ser realizadas

com maior freqüência a partir dos anos 80. Desenvolveu-se no mercado a percepção de que

determinadas companhias poderiam ter rentabilidade muito melhor com uma administração

mais competente, daí gerando a motivação econômica para a reunião de capitais com

endividamento financeiro, para a formulação de oferta pública para aquisição do controle da

companhia por determinado grupo de investidores que passaria a administrar a sociedade,

diretamente ou através de pessoas capazes de sua confiança. O efeito benéfico era de duas

ordens: com nova administração mais eficiente, os recursos da companhia seriam utilizados de

forma mais rentável, em benefício não só do pagamento das dívidas contraídas para a tomada do

controle, como dos novos acionistas. Além disso, a percepção do mercado de que a companhia

passaria a ser gerida de forma mais eficiente permitia o lançamento de novas ações, com preços

de emissão mais altos. A reação dos administradores das grandes companhias às tomadas de

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144

controle hostis não se demorou a fazer, principalmente através de inserção nos estatutos das

companhias e em contratos com os administradores de cláusulas – conhecidas como ―poison

pills‖ ou ―golden parachute‖ – que encareciam grandemente a tomada hostil do controle, ao

criar a obrigação de pagamento de vultosas indenizações aos administradores em caso de

demissão, o que acabou por tornar a tomada do controle hostil uma operação cara e ineficiente.

A concentração de porções cada vez maiores do capital das grandes companhias

americanas e inglesas nas mãos de investidores institucionais e, porque não dizer, o medo dos

administradores de perderem seus cargos, levou, naturalmente, ao entendimento entre as partes

no sentido de um maior alinhamento entre os interesses dos acionistas e dos administradores das

companhias, por meio da adoção, de forma cada vez mais efetiva, de melhores práticas de

administração e de relacionamento da companhia com os acionistas, especialmente na

apresentação das demonstrações financeiras e na divulgação de políticas estratégicas de

desenvolvimento da empresa, mais abrangente prestação de contas dos administradores, tudo

visando a tornar a empresa mais atrativa a seus investidores e mais alinhada aos seus interesses.

Nos últimos 30 anos uma série de fatores tem contribuído decididamente como

catalizador do movimento da governança corporativa, com o objetivo de atrair poupanças

populares para investimento em empresas produtivas, com segurança para os investidores,

transparência na prestação de informações e alinhamento mais robusto entre os interesses de

acionistas, como titulares do capital, e de administradores, como gestores do capital de terceiros.

Dentre esses fatores, como bem sumariado por Aline de Menezes Santos, no trabalho a que

antes me referi, podem ser destacados os seguintes: (a) ―a globalização financeira, com livre e

rápida circulação de capitais entre fronteiras; (b) a diminuição das barreiras comerciais entre

países que levam as empresas a enfrentar competição em nível global, aumentando as

necessidades de financiamento e capitalização; (c) falhas e escândalos em grandes empresas que

expuseram a necessidade de se aperfeiçoar os mecanismos de monitoramento e despertaram a

atenção para quem controla a empresa ; (d) movimento de privatizações em massa ao redor do

mundo, com os Estados deixando de atuar diretamente, como agentes econômicos; (e) ascensão

dos investidores institucionais cada vez mais preocupados com retornos sobre seus

investimentos, que consistirão nas rendas futuras de milhares de aposentados‖. (ob. cit. p.186)

Essas são as razões básicas, de cunho macroeconômico, que levaram diversos governos,

organismos e instituições internacionais a aplicar seus esforços e recursos no estabelecimento de

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145

princípios, regras e padrões de comportamento que deveriam pautar as relações entre os

investidores e as grandes companhias.

Os investidores institucionais, preocupados com a rentabilidade de seus investimentos

em ações, passaram a privilegiar a aplicação de recursos em empresas que adotassem práticas

sadias de governança corporativa. Em diferentes países, inclusive no Brasil, organizaram-se

grupos de trabalho para redação de códigos e conjuntos de normas estabelecendo princípios que,

além das normas jurídicas que regulam o funcionamento das sociedades, deveriam ser adotados

e praticados pelas companhias para maior transparência na divulgação de informações,

alinhamento dos interesses dos acionistas aos dos administradores, inclusive, e especialmente,

no que se refere à sua remuneração, que deveria estar preferencialmente atrelada à rentabilidade

da empresa – e, portanto, ao retorno propiciado aos acionistas – dando-se, ainda, destaque à

lealdade e à responsabilidade dos administradores, com aprimoramento do sistema de prestação

de contas de sua gestão.

Há, atualmente, um consenso sobre a relação entre a capacidade das empresas, ou

mesmo de países, de atrair investimentos e as estruturas que adotam de governança corporativa,

especialmente no que se refere à proteção dos investidores e acionistas minoritários. Existem

vários estudos e exemplos práticos que mostram estarem os investidores dispostos a pagar mais

caro pelas ações de empresas que adotam as melhores práticas de administração e transparência

na divulgação de informações. Há um conhecido estudo da empresa de consultoria McKinsey

no qual se apurou que os investidores estariam dispostos a pagar entre 18% e 28% a mais pelas

ações de empresas que praticam as principais regras de governança corporativa.

O tema da governança corporativa é hoje uma realidade no cenário brasileiro. Várias de

nossas maiores companhias abertas que têm ações negociadas no mercado americano já vêm,

há vários anos, intensificando a adoção de padrões de conduta em sintonia com as sugestões dos

diversos códigos existentes de melhores práticas de governança corporativa, destacando-se,

dentre eles, o que é publicado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Esta

situação é fruto de notáveis mudanças que ocorreram no cenário econômico brasileiro a partir de

1994, quando, após o Plano Real, finalmente conseguimos alcançar uma estabilidade monetária,

tendo sido complementarmente adotadas várias medidas que propiciaram a abertura da

economia brasileira, com maior rapidez e mobilidade dos fluxos de capital do e para o exterior.

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146

Outra mudança fundamental foi a redefinição do papel do Estado na economia, que

deixou de atuar como agente econômico, privatizando o controle de várias e importantes

companhias nas áreas de siderurgia, telefonia e energia elétrica. Como subproduto do processo

de privatização, surgiram no mercado brasileiro – até então dominado por companhias

controladas basicamente por grupos familiares – empresas com controle compartilhado,

formado pelos integrantes dos consórcios vencedores nos leilões de privatização, que se

organizavam em grupo de controle através de acordos de acionistas. Para expansão de suas

atividades e enfrentar a concorrência das empresas estrangeiras, as companhias brasileiras

precisam de recursos financeiros a custos competitivos. O recurso financeiro mais barato é

obtido pela emissão de ações, mas, para sua obtenção, seria necessário que as empresas

brasileiras se adaptassem para atender as exigências e expectativas dos investidores

institucionais, no Brasil e no exterior. Muitas empresas brasileiras passaram, a partir dos anos

80, a fazer o lançamento de ações no mercado americano, através da emissão de ADR´s, e para

cumprir as exigências da legislação e dos investidores americanos, tiveram de adotar estruturas

de administração e políticas de divulgação de informações que se adequassem às melhores

práticas de governança corporativa.

Há muitos anos que se vem tentando desenvolver e incentivar o mercado de capitais no

Brasil, de forma a que possa cumprir seu papel como alternativa de financiamento de longo

prazo para as empresas. No Brasil, com o endividamento público retirando boa parte da

poupança privada – que praticamente se vê compelida a aplicar nos papéis do Tesouro, com

baixo risco e alta remuneração – a tarefa de desenvolvimento do mercado de capitais tem sido

espinhosa. Trata-se, porém, de mecanismo absolutamente essencial a garantir às nossas

empresas desenvolvimento equilibrado e condições competitivas com os concorrentes

estrangeiros. Como salientado pela CVM, em material de divulgação institucional, ―o grau de

proteção aos investidores é fator determinante no desenvolvimento do mercado de capitais.

Quando a lei oferece proteção efetiva, os investidores estão mais dispostos a financiar as

companhias e o mercado de capitais é maior e mais valorizado. Quanto maior a proteção aos

investidores, maior será o preço que eles estarão dispostos a pagar pelas ações porque, com

maior proteção, estes reconhecem que o retorno das companhias também será usufruído por

eles, tanto quanto pelos controladores; isto permite aos empresários financiar seus

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147

empreendimentos, fazendo do mercado de capitais uma real alternativa de capitalização das

empresas‖.

Neste sentido, uma série de iniciativas importantes foram tomadas nos últimos anos. A

Bolsa de Valores de São Paulo instituiu, em dezembro de 2000, os Níveis 1 e 2 de práticas

diferenciadas de governança corporativa e o Novo Mercado, como segmentos de negociação de

ações de companhias abertas destinados a sociedades comprometidas com a observância

voluntária de certos padrões de governança corporativa. Conforme destacado em material de

divulgação, ―a adoção de práticas diferenciadas de governança corporativa, com a ampliação do

rol de direitos de acionistas minoritários e o incremento na qualidade das informações

divulgadas, geram efeitos positivos para a imagem da companhia, estimulam a liquidez e

melhoram a precificação das suas ações, gerando benefícios para os acionistas e para o mercado

em geral‖. Dependendo do grau de compromisso assumido pela empresa relativamente às

práticas de boa governança que pretende adotar, as suas ações são listadas nos Níveis 1 ou 2, ou

no Novo Mercado. O chamado Novo Mercado é o patamar mais alto de adoção de práticas de

governança corporativa, dentre as quais se destacam as seguintes: (a) emissão exclusivamente

de ações ordinárias, tendo todos os acionistas direito a voto; (b) manutenção em circulação de

ações representativas de ao menos 25% do capital social; (c) realização de ofertas públicas de

colocação de ações por meio de mecanismos que favoreçam a dispersão do capital; (d) extensão

a todos os acionistas das condições obtidas pelo controlador em caso de venda do bloco de

controle; (e) conselho de administração com mandato de um ano para todos os membros; (f)

demonstrações financeiras com adoção das normas internacionais de contabilidade e introdução

de melhorias nas informações prestadas trimestralmente.

O Governo Federal, por meio de seus órgãos e agências, tem estimulado a adoção pelas

companhias das práticas de governança corporativa com uma série de medidas, dentre as quais

se pode destacar: (a) a atuação do BNDES, que tem propiciado financiamentos com taxas de

juros mais vantajosas para as empresas que se obriguem a, dentro de determinado prazo, abrir

seu capital com listagem de suas ações no Novo Mercado; e (b) o Conselho Monetário Nacional

aprovou a Resolução nº 2.829, de 6 de abril de 2001, que permite às entidades fechadas de

previdência privada investir percentual maior de recursos em ações emitidas por companhias

que observem as melhores práticas de governança corporativa; (c) em 2002, a CVM lançou a

sua ―Cartilha de governança corporativa‖, com indicação de que passará a exigir a inclusão nas

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148

informações anuais das companhias abertas de indicação do nível de adesão às práticas

recomendadas, na forma ―pratique ou explique‖, isto é, ao não adotar uma recomendação, a

companhia deverá explicar as razões.

No âmbito legislativo, a Lei nº 10.303, de 2001, introduziu uma série de modificações na

Lei das Sociedades Anônimas cujo principal objetivo foi fortalecer o mercado de capitais

brasileiro e acentuar a proteção do acionista minoritário. Dentre os aperfeiçoamentos trazidos

pela lei, vale destacar os seguintes: (a) aumento da proteção a acionista minoritário no

fechamento do capital de companhias abertas; (b) estabelecimento de vantagens financeiras

mínimas ao acionista preferencial de companhias abertas; (c) garantia de nomeação de membro

para o conselho de administração por parte dos acionistas preferenciais e dos ordinários

minoritários, que detenham determinado percentual mínimo do capital social, em eleição em

separado; (d) ajustes no mecanismo do recesso; (e) estabelecimento de regras que garantem a

eficácia e a execução dos acordos de acionistas; (f) reintrodução da obrigação de oferta pública

aos acionistas minoritários em caso de venda do controle, com garantia de valor no mínimo

igual a 80% do pago ao controlador.

A maior parte das regras que formam os diversos códigos de boas práticas de governança

corporativa – que hoje existem, em diferentes países, na casa das dezenas – são, de uma maneira

geral, aplicáveis às grandes companhias e consistentes com a legislação da maioria dos países

do mundo capitalista. No Brasil, por exemplo, na Lei nº 6.404, de 1976 – que até onde se sabe é

a única que regula detalhadamente a figura do acionista controlador, estabelecendo seus deveres

e obrigações para com a companhia – há um dispositivo que consagra, de uma forma geral, os

valores essenciais a serem realizados pelos códigos de boa governança corporativa. Refiro-me à

norma do parágrafo único do artigo 116, que diz: ―O acionista controlador deve usar o poder

com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres

e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para

com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.‖

Há, entretanto, regras e princípios que, por derivarem da cultura e de sistemas jurídicos

diferentes do nosso – como é o caso dos Estados Unidos e da Inglaterra, nos quais as grandes

companhias não têm acionista controlador, sendo o poder de controle exercido pelos

administradores – não são aplicáveis, sem as necessárias adaptações, a países como o Brasil, no

qual a realidade empresarial é bastante diferente. Aqui, diferentemente dos Estados Unidos,

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149

praticamente todas as companhias abertas têm acionista controlador ou grupo de controle

definido. Daí, por exemplo, não ser aplicável no regime jurídico brasileiro uma das principais

bandeiras da governança corporativa, que é a de que devem ser eleitas para o conselho de

administração pessoas independentes, não vinculadas à diretoria executiva, nem aos acionistas

controladores.

O jurista italiano Guido Rossi, que escreveu relevante trabalho para um congresso

havido na Itália sobre governança corporativa, ao qual deu o provocante título de ―O Mito da

Governança Corporativa‖ (publicado no livro ―Le Nove Funzioni degli Organi Societari: verso a

Corporate Governance?‖, Giuffre, Itália, 2002, pp. 13-18), faz análise dessa questão,

concluindo, com muita propriedade, que nos sistemas jurídicos, como o italiano, em que as

sociedades possuem um controlador pré-definido – contrariamente às grandes corporações

americanas, em que o controle é interno, detido pelos administradores –- ―a presença de

administradores independentes que perseguem o interesse social sem observar, e se necessário,

opondo-se ao interesse do sócio controlador é simplesmente utópico‖. Esta mesma observação

aplica-se à situação brasileira, cujos códigos e recomendações de boas práticas de governança

corporativa incluem a nomeação de conselheiros independentes como uma das suas

recomendações mais badaladas.

Lembro-me que, por ocasião da promulgação da Lei nº 10.303, de 2001, houve intenso

debate sobre os novos parágrafos 6º a 11º acrescentados ao artigo 118, da Lei das Sociedades

por Ações, que estabeleceram de forma mais clara e incisiva o modo pela qual a companhia e

seus órgãos sociais devem observar as estipulações dos acordos de acionistas, dispositivos esses

cujas normas se alegava serem conflitantes com as proposições da governança corporativa.

Os argumentos usados para fundamentar o pretendido veto a estes dispositivos foram no

sentido de que a vinculação da companhia e seus órgãos sociais às estipulações de acordo de

acionistas e a obrigatoriedade de membros do Conselho de Administração de votarem nas

reuniões do órgão, segundo a orientação dos acionistas controladores que os tenham indicado,

implicaria na "usurpação, pelos acionistas, dos poderes conferidos ao Conselho de

Administração", e a transformação de seus membros em "conselheiros-laranja" ou "fantoches"

dos acionistas controladores.

Esses argumentos eram – e continuam sendo – totalmente improcedentes porque não

levam em conta as características e particularidades, econômicas e jurídicas, das sociedades

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150

anônimas no Brasil. Tais observações fariam sentido tendo em conta as características das

macroempresas, ditas institucionalizadas, européias e norte-americanas, cujas ações se acham

pulverizadas no mercado, e que são, de fato, controladas pelos administradores, os quais se

perpetuam nos cargos com base em procurações de acionistas anualmente renovadas (ao menos

enquanto as companhias não enfrentam dificuldades). Nesses tipos de macrocompanhias há

consenso sobre as vantagens de profissionais independentes integrarem os órgãos

administrativos para estabelecer um contraponto, nas deliberações colegiadas, à orientação que

é normalmente adotada pelos executivos. A independência que aí se busca não é em relação aos

acionistas, mas sim ao grupo de administradores que, mantendo-se no exercício dos cargos de

direção, representam, de fato, o poder de controle dentro da companhia.

A situação é diferente no Brasil: praticamente todas as companhias abertas brasileiras

têm maioria pré-constituída – isto é, há acionista, ou grupo de acionistas controlador, que exerce

o poder de controle determinando a deliberação das assembléias gerais e elegendo a maioria dos

administradores. Nesta matéria não cabe buscar inspiração na legislação e prática estrangeira,

que difere da nossa. Na legislação européia e norte-americana, por exemplo, a assembléia geral

de acionistas tem competência para deliberar apenas sobre determinadas matérias, enquanto o

Conselho de Administração é o órgão com competência ampla e genérica para decidir sobre as

matérias que interessam aos negócios da sociedade.

No sistema brasileiro, o órgão supremo na hierarquia da sociedade é a assembléia geral,

que possui "poderes para decidir todos os negócios relativos ao objeto da companhia e tomar as

resoluções que julgar convenientes à sua defesa e desenvolvimento" (art 121). Também

diferentemente de outros sistemas legislativos, a lei brasileira reconhece a existência do

acionista controlador e da sociedade controladora para atribuir-lhes deveres e cobrar-lhes

responsabilidade por abuso do poder que exercem. O artigo 116 da Lei das S.A. define o poder

de controle como sendo a capacidade de (a) determinar as deliberações da assembléia geral, (b)

eleger a maioria dos administradores, (c) dirigir as atividades sociais e (d) orientar o

funcionamento dos órgãos da companhia. Assim, na interpretação e aplicação da lei brasileira,

não cabe questionar se o acionista controlador pode ou não dirigir as atividades sociais e

orientar o funcionamento dos órgãos da companhia, uma vez que esse poder lhe é

expressamente reconhecido pelo artigo 116; igualmente não se pode afirmar que o

administrador da companhia é autônomo ou independente no exercício de suas funções, no

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151

sentido de que estaria submetido exclusivamente às normas da lei, sem se subordinar à

orientação legítima recebida do acionista controlador.

É inquestionável que o acionista controlador não pode validamente dar instruções ilegais

ao administrador para o exercício de suas funções, e que este tem não apenas a faculdade, mas o

dever, de não cumprir ordens ilegais. Se houver conflito de opiniões sobre a legalidade de

determinada orientação, é indiscutível que o administrador conserva a liberdade de agir segundo

suas convicções; e a conseqüência dessa divergência de opiniões será ou o convencimento do

controlador do acerto do ponto de vista do conselheiro ou sua substituição, uma vez que, na lei

brasileira, os membros do conselho de administração são demissíveis a qualquer tempo por

deliberação da assembléia geral. Todavia, na maioria das deliberações dos órgãos sociais da

companhia não se colocam questões que tenham a ver com a legalidade da proposta, mas, sim

com a sua conveniência ou adequação ao interesse da companhia. E nesses casos deve

prevalecer o princípio da estrutura hierárquica: se há opiniões divergentes sobre qual o ato mais

conveniente para o interesse da companhia, são os órgãos hierarquicamente superiores que têm

competência para decidir. O que legitima o poder da maioria da assembléia geral e do acionista

controlador para determinar a direção das atividades sociais e orientação dos administradores da

companhia é o fato de que os acionistas são os únicos que contribuem para o capital social e

correm o risco de perder esse capital em caso de prejuízo: não há como justificar que a opinião

do administrador, que não responde pelas obrigações sociais nem pelos prejuízos causados pelos

seus atos regulares, prevaleça sobre a dos acionistas.

Essas considerações levam às seguintes conclusões:

1ª) A governança corporativa, como movimento que visa a melhorar as práticas adotadas

no governo das companhias abertas e nos mercados de valores mobiliários, pode constituir

contribuição importante para o aperfeiçoamento das instituições das economias de mercado e da

livre empresa, ao divulgar, acentuar e salientar, em cada sistema cultural, os conceitos, valores e

princípios essenciais dessas instituições, com o conseqüente aumento do grau de sua eficácia e

justiça na organização social;

2ª) Algumas das normas concretas que o movimento propõe para solucionar problemas

ou corrigir defeitos precisam, todavia, ser adaptadas às características de cada economia, pois

refletem a experiência das macroempresas das economias industrializadas, cujo controle é

exercido pelos seus administradores, uma vez que a propriedade das suas ações é pulverizada

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152

em grande número de acionistas, que exercem apenas a função econômica de investidores de

capital, sem que haja um proprietário das ações que exerça toda a função empresarial – que

compreende os papéis de empreendedor, administrador e aplicador de capital; por isso, o

objetivo precípuo das normas propostas é criar contrapesos ao poder exercido pelos

administradores, mediante criação ou aperfeiçoamento de órgãos da companhia especializados

na fiscalização dos administradores e a indução a que os acionistas exerçam efetivamente seu

poder de orientar e fiscalizar os administradores e tenham maior participação nas deliberações

dos órgãos sociais;

3ª) No Brasil, a realidade das companhias e do mercado de capitais é essencialmente

diferente: praticamente todas as companhias são controladas por um acionista, ou grupo de

acionistas, e o aperfeiçoamento do governo da companhia requer, principalmente, o controle do

exercício do poder pelos acionistas controladores, e não pelos administradores; a Lei

nº 6.404/76 já enuncia os valores e princípios propugnados pelo movimento de governança

corporativa, e o objetivo desse movimento deve ser o aperfeiçoamento do regime legal mediante

modificações da lei ou da sua regulamentação pela CVM;

4ª) Seguindo a tradição anglo-saxônica, o movimento de governança corporativa procura

alcançar seus objetivos através de auto-regulação pelas próprias companhias e pelas instituições

do mercado, como as bolsas de valores, mas a tradição de nossa cultura é bem diferente -- os

resultados das experiências de auto-regulação no Brasil são pequenos e a regulação estatal da

economia, mediante leis e regulamentos, é ampla e mais eficazmente utilizada como meio de

criar e aperfeiçoar as instituições econômicas.

Governança Corporativa e o Brasil Luiz Leonardo Cantidiano 118

Introdução. Em fevereiro deste ano o Comitê Técnico da IOSCO (International

Organization of Securities Commissions) criou uma ―Força Tarefa‖, integrada pela Comissão de

Valores Mobiliários (CVM), para realizar um amplo estudo sobre as razões que possibilitaram o

escândalo ―Parmalat‖. Após algumas reuniões, a ―Força Tarefa‖ destaca, em Relatório

Preliminar, as iniciativas que vêm sendo desenvolvidas pela IOSCO para assegurar a

118

Advogado, sócio de Motta, Fernandes Rocha Advogados.

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153

integridade e a estabilidade do mercado de capitais: (a) indicação dos princípios a serem

seguidos pelos reguladores, nas suas jurisdições, para tornar o mercado mais confiável, (b)

regras sobre o monitoramento da atividade de auditoria, (c) normas sobre a divulgação, pelos

emissores, de informações, periódicas ou extraordinárias (fato relevante)119

, (d) regulação da

atividade dos analistas de valores mobiliários120

e de agências de ―rating‖, especialmente para

eliminar o conflito de interesses no exercício dessas atividades e (e) esforço para aperfeiçoar a

cooperação entre os reguladores, com a assinatura de memorando que possibilite a troca de

informações e a realização de investigações sobre operações que extrapolam a fronteira de uma

jurisdição121

. Em sua primeira parte o Relatório resume as informações públicas que historiam

o colapso da ―Parmalat‖. A seguir ressalta pontos que podem ter facilitado a prática das fraudes

e indica os aspectos que devem ser considerados, ou revistos, pelos reguladores para

desenvolver e fortalecer seus mercados.

Após sumariar a história do Grupo Parmalat e as deficiências que foram destacadas no

Relatório da ―Força Tarefa‖, pretendo analisar a situação vigente no Brasil em relação a cada

uma das aludidas deficiências. Nesta primeira parte do trabalho faço um resumo da situação da

Parmalat, indico as deficiências apontadas pelo Relatório e examino duas delas – governança

corporativa e proteção aos minoritários – comparando-as com a situação vigente no Brasil. Na

segunda parte do trabalho, a ser publicada no próximo número de CAPITAL ABERTO, analiso a

independência da auditoria independente e a supervisão regulatória, enquanto que na parte final

discuto os demais pontos levantados pela ―Força Tarefa‖: (a) a utilização de estruturas

societárias complexas, (b) o papel desempenhado pelos prestadores de serviços (bancos de

investimento, advogados e corretores), (c) a atuação de analistas de investimentos e de agências

de avaliação de risco e (d) a atuação em paraísos fiscais.

119

A IOSCO, em suas recomendações sobre a regulação do ―disclosure‖, cita a Instrução nº 358 da CVM como um

exemplo a ser considerado pelas diversas jurisdições ao regulamentar a matéria. 120

O Presidente da Federação Européia de Analistas Financeiros e da Associação Internacional Certificadora de

Analistas de Investimentos sobre a Instrução CVM nº 388 em carta que me foi dirigida, afirma: ―I would like to

congratulate you on Instruction CVM 388, that describes our profession with excellent clarity and outlines a

transparent route to be followed by any professional wanting to develop his career in your country. As a member of

the IOSCO, may I suggest that you send a copy of Instruction 388 to all individual Presidents of the different

IOSCO associations as an example of what can be done to simplify the regulations of financial analysts and

enhance transparency” 121

Infelizmente o Brasil ainda não teve condições para assinar o Memorando de Entendimento da IOSCO, uma vez

que a nossa legislação não permite que a CVM possa ter acesso ao sigilo bancário das pessoas que operam no

mercado de valores mobiliários, o que prejudica sobremaneira sua atuação fiscalizadora e punitiva. Iniciativas – até

agora infrutíferas – vêm sendo desenvolvidas pela CVM, junto ao Ministério da Fazenda, para que seja editada

uma lei que assegure à CVM amplo poder de rastrear o movimento bancário dos agentes de mercado.

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154

O Grupo Parmalat. A Parmalat Finanziaria SpA é uma sociedade aberta, holding do

Grupo Parmalat, que tinha uma atuação muito ativa no setor de alimentos, operando em 30

países através de 250 subsidiárias. A Parmalat é controlada pela família Tanzi, cujo principal

representante era, ao mesmo tempo, Presidente do seu Conselho de Administração e seu Diretor

Presidente. De acordo com as recomendações do Código de Governança Corporativa aplicável

às sociedades listadas no mercado italiano, o Conselho de Administração da Parmalat era

composto de 13 membros, dos quais 5 não executivos e 3 independentes, dentre os quais 2 eram

ligados, há muito tempo, a Calisto Tanzi. O grupo Parmalat havia criado, no inicio de 2001, um

Comitê de Auditoria composto de 3 membros, dos quais apenas 1 era independente.

De 1990 a 1999 as demonstrações financeiras da Parmalat eram auditadas pela Grant

Thornton; de 1999 a 2003, em função do rodízio obrigatório da empresa de auditoria, que

prevalece na Itália, as demonstrações financeiras da Parmalat passaram a ser auditadas pela

Deloitte Touche Tohmatsu; não obstante, a Grant Thornton continuou, após 1999, a auditar as

demonstrações de um número significativo de subsidiárias da Parmalat.

Nas demonstrações financeiras que eram divulgadas pela Parmalat, seu débito liquido

consolidado não aparentava ser alto: no período entre 1997 e 2003 variou entre €1 bilhão e €2.8

bilhões, contra uma receita anual de vendas, também consolidada, que variou entre €5.1 e €7.6

bilhões. A Standard & Poor‘s (S&P), que começou a analisar o risco da Parmalat em novembro

de 2000, atribuiu para seu risco de crédito BBB- (o menor grau de ―investment grade‖) e, para o

débito de curto prazo até dezembro de 2003, A-3.

Nas demonstrações financeiras da Parmalat, de dezembro de 2002, os auditores deram

um parecer sem ressalvas. Os eventos subseqüentes demonstraram, no entanto, que as

demonstrações financeiras da Parmalat, para esse período, eram falsas, como foi apurado pela

PriceWaterhouseCoopers (PwC), contratada em meados de dezembro de 2003 para verificar a

existência e o valor dos ativos e das dívidas da Parmalat. A PwC concluiu que o valor dos

ativos líquidos da Parmalat era insignificante, ao mesmo tempo em que apurou que o valor das

dívidas estava subestimado no expressivo montante de €14.5 bilhões.

As deficiências apontadas no Relatório. O Relatório lista, como deficiências que

podem ter facilitado a prática das fraudes, os seguintes pontos: (a) governança corporativa e

proteção dos investidores, (b) vigilância e acompanhamento do trabalho dos auditores

independentes, (c) supervisão regulatória, (d) a utilização de estruturas societárias complexas,

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155

(e) o papel desempenhado pelos prestadores de serviços (bancos de investimento, advogados e

corretores), (f) a atuação de analistas de investimentos e de agências de avaliação de risco e (g)

a atuação em paraísos fiscais.

Governança Corporativa. O Relatório a define como o sistema composto de normas

legais e regulamentares, de organização e de mecanismos contratuais necessários para proteger

os interesses dos acionistas, limitando o comportamento oportunista dos seus administradores.

Muitas companhias têm o capital pulverizado, o que impede um investidor de controlá-la

isoladamente ou de eleger a maioria dos membros do Conselho de Administração. Nessa

situação, os mecanismos de ―governança‖ buscam proteger o interesse de todos os investidores

face aos administradores, cujos interesses não são necessariamente coincidentes com os da

companhia e de seus acionistas. Em algumas circunstâncias, no entanto, um acionista (ou grupo

deles) também pode comandar a sociedade. Na Parmalat, em que a família Tanzi controlava

51% de seu capital votante, os mecanismos de ―governança‖ deveriam procurar evitar que o

detentor do controle majoritário dirigisse a companhia para explorar os acionistas minoritários.

O Relatório ressalta que o colapso da Parmalat, da Enron e de outras companhias sempre

teve origem na errada estrutura de governança. Os respectivos Conselhos de Administração são

acusados de falta de independência frente à diretoria, principalmente pela não vigilância do

desempenho da sociedade e pela aprovação de uma série de transações com partes relacionadas,

incluindo a transferência de ativos para administradores e acionistas controladores122

. Outro

ponto que mereceu destaque no Relatório são as alegações de que os titulares de instrumentos

de dívida de emissão da Parmalat foram preferidos por credores mais expressivos, do que

resultou a assunção inadvertida, pelos primeiros, do risco Parmalat.

Como aponta o Relatório, na melhor hipótese um Conselho de Administração fraco pode

permitir que um projeto ruim, de escolha do controlador, venha a ser desenvolvido pela

sociedade, enquanto que um Conselho independente pode questionar a decisão de explorar uma

oportunidade que não trará resultados positivos. E, na pior hipótese, um Conselho fraco pode

aprovar a realização de operações com partes relacionadas que possibilitem a apropriação, pelo

controlador, de ativos ou de oportunidades que são da companhia. Um Conselho independente

122

O alinhamento do Conselho de Administração com os principais executivos é considerado problemático, porque

leva a uma ineficiente supervisão da atuação dos administradores e possibilita o ―oportunismo‖ dos administradores

(com a utilização de ativos da corporação para beneficio próprio). Conselhos fracos causaram diversos escândalos,

incluindo Enron, Worldcom, e Vivendi Universal.

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156

funciona como uma salvaguarda contra propostas que, apesar de poderem ser legítimas, foram

inadequadamente desenvolvidas.

Situação no Brasil. A questão da governança corporativa, entre nós, ao contrário do que

ocorre em países com mercado mais desenvolvido, não está relacionada à possibilidade que têm

os administradores de expropriar direitos dos minoritários; entre nós a principal preocupação é

buscar evitar que o acionista controlador, que detém o poder de comandar os destinos da

companhia, elegendo a maioria de seus administradores, possa atuar contra o interesse social,

auferindo benefícios indevidos.

Como praticamente todas as nossas companhias abertas têm seu controle concentrado

nas mãos de uma família ou de um grupo de acionistas, é comum verificarmos que a maioria

dos membros do Conselho seja vinculada ao controlador, o que pode levar a uma falta de

independência na sua atuação como conselheiro123

; também é corriqueiro que uma parcela dos

membros da diretoria executiva (1/3) possa integrar o Conselho, inclusive com a acumulação,

pela mesma pessoa, das funções de Diretor Presidente e de Presidente do Conselho. Também

pode conspirar contra a independência dos integrantes do Conselho a permissão, constante de

nossa lei, de vinculação de voto do administrador a decisão adotada em reunião prévia por

signatários de acordos de acionistas124

.

Porque está consciente dessa realidade, que reflete uma cultura enraizada em nossa

sociedade, e que decorre de expressa disposição legal, a CVM editou uma Cartilha125

contendo

diversas recomendações que assegurem o reforço da governança de nossas companhias.

Especificamente quanto ao Conselho de Administração, a CVM sugere que ele seja composto

por 5 a 9 membros, tecnicamente qualificados, sempre que possível desvinculados da diretoria,

com pelo menos 2 com experiência em finanças e responsabilidade para acompanhar mais

123

Recente Relatório apresentado pelo The Institute of International Finance, Inc. indica a fragilidade de nosso

sistema ao mencionar que na maioria das companhias o Conselho de Administração é composto por membros da

família controladora ou pelos seus representantes (advogados ou banqueiros), com menos de 10% deles sendo

considerados genuinamente independentes. Os membros do Conselho, segundo afirma dito Relatório, adotam as

decisões que interessam as famílias controladoras e raramente as companhias têm comitês de auditoria. Geralmente

matérias que não têm maior importância estratégica para o desenvolvimento dos negócios dominam a agenda das

reuniões do Conselho, que não se envolve em planejamento estratégico ou na avaliação do desempenho dos

administradores. 124

Em diversos trabalhos, publicados no nº 11 de CAPITAL ABERTO, o problema é levantado. 125

A Cartilha pode ser examinada no site da CVM: www.cvm.gov.br

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157

detalhadamente as práticas contábeis adotadas. O mandato de todos os conselheiros deve ser

unificado, com prazo de gestão de 1 ano, permitida a reeleição126

.

A CVM também sugere que o conselho adote um regimento dispondo sobre método de

convocação de reuniões, direitos e deveres dos conselheiros, relacionamento com a diretoria e

procedimentos para solicitação de informações por conselheiros. O conselho deve ser autorizado

a solicitar a contratação de especialistas externos para auxílio em decisões, quando considerar

necessário. O estatuto deve autorizar qualquer membro do conselho a convocar reuniões em

caso de necessidade, quando o conselheiro que é encarregado não o faz. De outro lado, os

comitês especializados devem ser compostos por alguns membros do conselho para estudar seus

assuntos e preparar propostas, as quais deverão ser submetidas à deliberação do conselho.

Como o conselho fiscaliza a gestão dos diretores, a CVM recomenda que, para evitar

conflitos de interesses, o seu presidente não deve ser também o seu executivo principal.

Papel importante na conscientização de nossas companhias abertas quanto à necessidade

de terem um Conselho de Administração estruturado de maneira adequada, e composto por

pessoas qualificadas e independentes, vem sendo realizado pelo Instituto Brasileiro de

Governança Corporativa (IBGC) que, além de ter editado um Código cujas normas aconselham

as companhias a observar, organiza seguidos cursos de treinamento.

Proteção de Minoritários. O Relatório salienta que os minoritários podem ficar numa

posição desvantajosa em relação aos majoritários, porque os últimos exercem o controle da

companhia. Enquanto majoritários e minoritários buscam manter o crescimento da companhia, a

existência de um acionista controlador, com as características que vigoram no Brasil, o coloca

numa posição que permite a expropriação de interesses dos investidores. Muitas jurisdições

cuidam da questão estabelecendo regras que vedam tal prática e impondo ao Conselho de

Administração o dever de proteger os interesses de todos os acionistas; em tais jurisdições os

administradores e controladores que se utilizam sociedade em benefício próprio podem ser

processados pelos minoritários e, até mesmo, estar submetidos a procedimentos criminais. No

126 Igual recomendação, quanto ao mandato dos conselheiros, prevalece nos Regulamentos do Nível 2 e do Novo

Mercado da Bovespa. A recomendação sobre o número de membros leva em conta que o conselho de

administração deve ser grande o suficiente para assegurar ampla representatividade, e não tão grande que

prejudique a eficiência. Mandatos unificados facilitam a representação de acionistas minoritários no conselho.

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158

entanto, como aponta o Relatório, é difícil para os minoritários monitorar a performance da

companhia, assim como supervisionar a atuação de seus administradores. Papel essencial na

defesa dos investidores é exercido pelo Conselho de Administração, formado por pessoas

independentes, que devem atuar impedindo a realização de operações que possam apenas

beneficiar o controlador. Outra proteção se dá mediante mecanismos – previstos em lei ou

constantes do estatuto da companhia – que assegurem o voto do minoritário em certos itens. Em

algumas jurisdições a Bolsa de Valores exige, para listar a companhia, que o seu estatuto

contenha regras que assegurem adequada proteção aos investidores; algumas poucas jurisdições

editam Códigos ou Cartilhas cujo cumprimento é encorajado pelos respectivos órgãos

reguladores.

Situação no Brasil. Nossa lei assegura boa proteção aos investidores. Dentre inúmeros

dispositivos que tratam da matéria temos (a) o art. 115, que explicita o dever de qualquer

acionista de votar no interesse da companhia, considerando abusivo o voto exercido para causar

dano à companhia ou a outros acionistas, ou para obter, para si ou para terceiros, vantagem

indevida, (b) o art. 116, que define a responsabilidade do controlador, explicitando que o poder

de controle deve ser utilizado para fazer a companhia realizar seu objeto e cumprir sua função

social, (c) o art. 117, que cria a responsabilidade do controlador quando pratica atos com abuso

de poder, exemplificando situações que configuram aquela prática, (d) os arts. 155 e 156, que,

respectivamente, estipula o dever de lealdade do administrador para com a companhia e que

veda a sua intervenção em operações nas quais possa ter conflito de interesses. Também visa dar

proteção aos investidores o direito que a lei assegura ao minoritário de fiscalizar os negócios

sociais, seja pela possibilidade que ele tem de (a) requerer a exibição de livros (art. 105), (b)

pedir a convocação de assembléia geral (art. 123, § único, ―a‖ e ―c‖), (c) requerer a instalação

de conselho fiscal, com a eleição de representantes e (d) eleger membros para o Conselho de

Administração, pela adoção do processo de voto múltiplo e, até mesmo, pela detenção de ações

preferenciais sem voto. O que é complicado, em nosso sistema, mesmo após a reforma de 2001,

quando se reduziu – para as novas companhias – o limite de ações sem direito a voto e quando

se buscou, a meu juízo sem sucesso, reforçar as vantagens das ações não votantes, é a existência

de ações das quais é retirado o direito de voto. Outro problema estrutural, na defesa dos

interesses dos minoritários, é o funcionamento de nosso poder judiciário, lento e pouco

especializado para dirimir as complexas questões que envolvem os direitos dos investidores.

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159

Exatamente em virtude de tais deficiências é que a Bovespa decidiu criar níveis diferenciados de

listagem em seu pregão, especialmente o Nível 2 de Governança e o Novo Mercado, nos quais,

além assegurar voto a todas as ações nas questões mais sensíveis aos minoritários, está previsto

que as divergências entre os acionistas e destes perante a companhia serão dirimidas por

arbitragem, preferencialmente junto à Câmara do Mercado, integrada por especialistas em

questões legais, contábeis e financeiras. Outro avanço considerável em nossa legislação decorre

de novo dispositivo da lei – o art. 124, § 5º – que faculta à CVM, a pedido de qualquer

acionista, (a) aumentar para até 30 dias o prazo de convocação de assembléia geral da

companhia, quando esta tiver por objeto matéria complexa, que exija um exame mais demorado

pelos acionistas e (b) para interromper, por até 15 dias, o curso do prazo de antecedência de

convocação de assembléia, a fim de conhecer e analisar as propostas a serem submetidas à

apreciação dos acionistas, informando a CVM, até o final do prazo de interrupção, as razões

pelas quais entende, se for o caso, que dita proposta viola dispositivos vigentes. Essa faculdade,

que tem sido bastante utilizada, permite que os investidores possam recorrer ao Judiciário com

respaldo da CVM, sempre que o regulador entender que estará sendo submetida à apreciação

dos acionistas uma proposta ilegal.

E) Estudo de Casos

Estudo de Caso I – Fraude na exportação de sandálias

• Empresa ABC descobriu que uma de suas subsidiárias, empresa XYZ, estava sendo usada como

uma ferramenta de fraude nas exportações de sandálias para Europa.

• XYZ montou subsidiárias no Panamá e BVI. XYZ exportava sandálias diretamente aos clientes.

“Bills of lading” – conhecimentos de transporte - eram emitidos para entrega das sandálias aos

clientes.

• Clientes deveriam pagar pelas sandálias depositando diretamente nas contas das sociedades no

Panamá e BVI.

• Faturas eram emitidas contra as sociedades no Panamá e BVI. Sociedades no Panamá e BVI se

apropriavam indevidamente de 20% do valor das vendas e remetiam o resto a ABC.

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160

• A Fraude foi descoberta. Dinheiro das contas das sociedades no Panamá e BVI foi enviado para

contas nos EUA, SUÍÇA e BVI .

• Como recuperar os ativos?

• Qual a estratégia?

• Ações em quais países?

• Onde iniciar o tracing?

• Há patrimônio nos EUA? Há patrimônio no Brasil?

• È possível fazer um back tracing?

• Questões relevantes na Suíça, BVI e EUA.

Estudo de Caso II – Sonegação de Ativos do Inventário

Executivo muito bem sucedido, casado, pai de 4 filhos, 60 anos de idade, conhece jovem moça

de vida fácil (ou difícil).

Executivo larga família e começa nova família com moça.

Executivo morre e jovem moça de vida fácil se torna inventariante dos bens deixados por

executivo.

Jovem moça de vida fácil sonega bens móveis e imóveis.

• Dinheiro das contas das sociedades nas Bahamas, Panamá e BVI foi enviado para contas nos

EUA, Suíça, Jérsei e BVI .

• Como recuperar os ativos?

• Qual a estratégia?

• Ações em quais países?

• Onde iniciar o tracing?

• Há patrimônio nos EUA? Há patrimônio no Brasil?

• È possível fazer um back tracing?

• Questões relevantes na EUA, Suíça, Jérsei e BVI.

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161

• Dinheiro das contas das sociedades nas Bahamas, Panamá e BVI foi enviado para contas nos

EUA, Suíça, Jérsei e BVI .

• Como recuperar os ativos?

• Qual a estratégia?

• Ações em quais países?

• Onde iniciar o tracing?

• Há patrimônio nos EUA? Há patrimônio no Brasil?

• È possível fazer um back tracing?

• Questões relevantes na EUA, Suíça, Jérsei e BVI.

Estudo de Caso III – Falência de Empresa ABC decretada com extensão da falência aos bens do quotista

XYZ

• Empresa ABC distribui muito mais lucro do que poderia ao quotista XYZ

• ABC (e XYZ) superfaturou contratos, desviou valores da empresa, fez empréstimo e deixou de

cobrar e etc e etc e etc.

• XYZ leva uma vida abastada com festas, amigos importantes “carros e mulheres velozes e

cavalos lentos”

• Decretada a falência da empresa ABC com extensão da falência ao quotista XYZ

• Credor de quase todo o crédito de ABC contrata você para ir atrás de ativos de ABC, desviados

para contas de XYZ no exterior

• XYZ tem sociedades/contas nas BVIs, Cayman, EUA e Suíça

• XYZ tem jatinho de propriedade de empresa nas BVIs

• Dinheiro das contas das sociedades nas Bahamas, Panamá e BVI foi enviado para contas nos

EUA, Suíça, Jérsei e BVI .

• Como recuperar os ativos?

• Qual a estratégia?

• Ações em quais países?

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162

• Onde iniciar o tracing?

• Há patrimônio nos EUA? Há patrimônio no Brasil?

• È possível fazer um back tracing?

Questões relevantes na EUA, Suíça, Jérsei e BVI.

F) Glossário

Governança Corporativa: Práticas e relacionamentos entre Acionistas/Cotistas,

Conselho de Administração, Diretoria, Auditoria Independente e Conselho Fiscal, com a

finalidade de otimizar o desempenho da empresa e facilitar o acesso ao capital. Estas práticas

abrangem os assuntos relativos ao poder de controle e direção de uma empresa, bem como as

diferentes formas e esferas de seu exercício e os diversos interesses que, de alguma forma, estão

ligados à vida das sociedades comerciais. EnFin. A governança corporativa proporciona aos

proprietários (acionistas ou cotistas) a gestão estratégica de sua empresa e a monitoração efetiva

da administração. As principais ferramentas que asseguram o controle da propriedade sobre a

gestão são o Conselho de Administração, a Auditoria Independente e o Conselho Fiscal. A

empresa que opta pelas práticas de governança corporativa adota como linhas mestras a

transparência, a prestação de contas (―accountability‖) e a equidade. No Brasil, os conselheiros

profissionais e independentes começaram a surgir tanto como conseqüência do crescimento da

necessidade das médias empresas se profissionalizarem rapidamente, tendo em vista o processo

de globalização, quanto das primeiras privatizações de empresas estatais no país (Bovespa).

Novo Mercado. Segmento de listagem destinado à negociação de ações emitidas por

empresas que se comprometem, voluntariamente, com a adoção de práticas de governança

corporativa e ―disclosure‖ adicionais em relação ao que é exigido pela legislação. EnFin. A

premissa básica é a de que a valorização e a liquidez das ações de um mercado são influenciadas

positivamente pelo grau de segurança que os direitos concedidos aos acionistas oferecem e pela

qualidade das informações prestadas pelas empresas. A entrada de uma empresa no Novo

Mercado significa a adesão a um conjunto de regras societárias, genericamente chamadas de

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163

boas práticas de governança corporativa, mais rígidas do que as presentes na legislação

brasileira.

Essas regras, consolidadas no Regulamento de Listagem, ampliam os direitos dos

acionistas, melhoram a qualidade das informações usualmente prestadas pelas companhias e, ao

determinar a resolução dos conflitos por meio de uma Câmara de Arbitragem, oferecem aos

investidores a segurança de uma alternativa mais ágil e especializada.

A principal inovação do Novo Mercado, em relação à legislação, é a proibição de

emissão de ações preferenciais.

Resumidamente, a companhia aberta participante do Novo Mercado tem como

obrigações adicionais: a) realização de ofertas públicas de colocação de ações por meio de

mecanismos que favoreçam a dispersão do capital; b) manutenção em circulação de uma parcela

mínima de ações representando 25% do capital; c) extensão para todos os acionistas das mesmas

condições obtidas pelos controladores quando da venda do controle da companhia; d)

estabelecimento de um mandato unificado de 1 ano para todo o Conselho de Administração; e)

disponibilização de balanço anual seguindo as normas do US GAAP ou IAS GAAP; f)

introdução de melhorias nas informações prestadas trimestralmente, entre as quais a exigência

de consolidação e de revisão especial; g) obrigatoriedade de realização de uma oferta de compra

de todas as ações em circulação, pelo valor econômico, nas hipóteses de fechamento do capital

ou cancelamento do registro de negociação no Novo Mercado; h) cumprimento de regras de

―disclosure‖ em negociações envolvendo ativos de emissão da companhia por parte de

acionistas controladores ou administradores da empresa. Além de presentes no Regulamento de

Listagem, alguns desses compromissos deverão ser aprovados em Assembléias Gerais e

incluídos no Estatuto Social da companhia. Um contrato assinado entre a Bovespa e a empresa,

com a participação de controladores e administradores, fortalece a exigibilidade do seu

cumprimento (Bovespa).

Auditor Independente. Perito-contador que presta serviços de auditoria independente a

empresas. Para exercer atividade no âmbito do mercado de valores mobiliários, está sujeito ao

registro na CVM - Comissão de Valores Mobiliários. Pode ser pessoa física ou jurídica,

sociedade profissional, constituída sob a forma de sociedade limitada.

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164

A CVM mantém cadastro dos responsáveis técnicos autorizados a emitir e assinar

parecer do auditor, em nome de cada empresa, no âmbito do mercado de valores mobiliários

(Bovespa).

G) Questões de Concurso

1) Explique a doutrina da desconsideração da personalidade jurídica.

2) Os acionistas minoritários ficam completamente à mercê dos majoritários, quanto à

tomada de decisões na companhia?

3) Quais as principais medidas de controle, destinadas à proteção dos acionistas

minoritários, asseguradas pela legislação societária brasileira?

4) Em que difere o exercício de direito de recesso, no caso das sociedades de pessoas,

em comparação com as sociedades anônimas?

5) Quando o acionista dissidente discordar de deliberações da maioria e pretender retirar-

se da companhia, a que terá direito?

6) O que distingue o proprietário do acionista controlador?

7) Quais as características principais do acionista controlador?

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166

11.1 Aula 13: Operações de Reorganizações Societária: Aspectos

Tributários

A) Ementário de Temas

Hipóteses de sucessão tributária. Transferência do passivo fiscal e sucessão tributária. Aspectos

práticos inerentes aos processos de reorganização de sociedades. Exemplos de planejamentos

fiscais.

B) Material de Leitura

Leitura Básica

MUNIZ, Ian; Branco, Adriano Castello. Fusões e Aquisições – Aspectos Fiscais e Societários.

São Paulo: Quartier Latin, 2007.

XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Paulo:

Dialética, 2001.

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167

Leitura Complementar

ANNAN JUNIOR, Pedro. Fusão, Cisão e Incorporação de Sociedades – Teoria e Prática. 2ª ed.

São Paulo: Quartier Latiin, 2005.

GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 2ª ed. São Paulo: Dialética, 2008.

C) Roteiro de Aula

Introdução127

Os processos de reorganizações de empresas, tais como as aquisições, incorporações, fusões

e cisões, além de todos os aspectos societários que deverão ser considerados, também trazem

várias questões tributárias que precisam ser avaliadas de antemão, podendo ser, em alguns

casos, o ponto determinante de algumas reestruturações.

Nesse breve estudo serão abordados alguns temas tributários recorrentes e relacionados aos

processos de reorganizações societárias.

Em primeiro lugar, serão expostas as hipóteses de sucessão tributária, onde uma pessoa

jurídica tem para si transferido o passivo fiscal pertencente à outra sociedade, em decorrência do

fato de assumir a condição de sucessora tributária.

Na seqüência, serão tratados alguns aspectos práticos inerentes aos processos de

reorganização de sociedades, tal como o encerramento do período-base dos tributos, bem como

a necessidade de apresentação pelas sociedades envolvidas de declarações à Receita Federal do

Brasil.

Por fim, serão expostos alguns exemplos de planejamentos fiscais possíveis de serem

utilizados pelas empresas através das reorganizações societárias, tais como o aproveitamento de

prejuízos fiscais e a utilização do ágio pago na aquisição de participação societária e a

amortização para fins de reduzir da base de cálculo do Imposto da Renda da Pessoa Jurídica

(IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro (CSL).

127

Aula desenvolvida em conjunto com o Professor Gustavo Goiabeira de Oliveira.

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168

Sucessão Tributária nos processos de reorganização societária

Nas reorganizações societárias ocorre a responsabilidade por transferência, na modalidade

―sucessão‖. Responsabilidade por transferência se dá depois de ocorrido o fato gerador. A

obrigação tributária surge contra o próprio contribuinte, que realizou o fato gerador, mas é

transferida ao responsável, podendo-se manter ou não a figura do contribuinte no pólo passivo

(solidária ou subsidiariamente).

Especificamente para os processos de reorganização societária, o art. 132 do Código

Tributário Nacional traz as seguintes hipóteses de sucessão tributária:

―Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou

incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até a data do ato

pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas.

Parágrafo Único. O disposto neste artigo aplica-se aos casos de extinção de pessoas

jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada

por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou

sob firma individual.‖

Com fundamento nesse dispositivo do Código Tributário Nacional, está afixada a

responsabilidade, por sucessão, da sociedade resultante de processos de incorporação, fusão ou

transformação, no que se refere ao passivo tributário existente nas pessoas jurídicas fusionadas,

transformadas ou incorporadas, referentes aos tributos devidos até a data do evento.

Note-se que o art. 132 faz referência aos processos de fusão (A+B = C), transformação

(Sociedade Anônima em Limitada, ou fundação etc.), e incorporação (A+B = A) de sociedade,

não existindo previsão expressa para a hipótese de cisão (C = A+B).

A razão apontada para essa lacuna é que o Código Tributário Nacional (1966) foi editado

antes da Lei das S/A (1976), não existindo até então a figura da cisão. A despeito da ausência de

menção expressa, aplica-se a mesma regra.

Assim, em todo o processo de aquisição de uma sociedade, e mesmo nos casos de

reorganização societária dentro de um mesmo grupo de sociedades, é necessário observar com

prudência as regras de sucessão fiscal, com a realização de due diligence fiscal/contábil, de

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169

forma a confirmar o real passivo fiscal que está sendo transferido para a sociedade que seja a

resultante desse processo de reorganização.

Sucessão Comercial

Além das hipóteses de sucessão fiscal por transferência apontadas acima, e também

relacionado ao tema das aquisições e reorganizações de empresas, o art. 133 do Código

Tributário Nacional prevê as hipóteses de sucessão comercial, onde uma pessoa jurídica adquire

de outra fundo de comércio ou estabelecimento. Vejamos o teor do art. 133:

―Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por

qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou

profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou

sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou

estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato:

I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;

II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro

de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo

de comércio, indústria ou profissão.

A sucessão se dará com a cessão do fundo de comércio e com a continuação da exploração

da respectiva atividade, com duas possíveis hipóteses:

(a) Quando o alienante cessa a exploração. Nesse caso a responsabilidade será exclusiva e

integral do adquirente; e

(b) Quando o alienante continua exercendo a atividade, ou iniciou uma nova dentro de seis

meses, a responsabilidade será apenas subsidiária.

Aquisições com base na nova Lei de Recuperação de Empresas

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170

A regra acima exposta hoje possui exceções derivadas das alterações promovidas no texto

do Código Tributário Nacional pela Lei Complementar nº 118/2005 que teve por finalidade

adaptar as regras tributárias à nova Lei de Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/2005). Essa

Lei Complementar acrescentou os parágrafos 1º, 2º e 3º ao art. 133 do Código Tributário

Nacional:

―Art. 133 (...)

§ 1o O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial:

(Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)

I – em processo de falência; (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)

II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial.(Incluído

pela Lcp nº 118, de 2005)

§ 2o Não se aplica o disposto no § 1o deste artigo quando o adquirente for: (Incluído

pela Lcp nº 118, de 2005)

I – sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo

devedor falido ou em recuperação judicial; (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)

II – parente, em linha reta ou colateral até o 4o (quarto) grau, consangüíneo ou afim, do

devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; ou (Incluído

pela Lcp nº 118, de 2005)

III – identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o

objetivo de fraudar a sucessão tributária. (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)

§ 3o Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou

unidade produtiva isolada permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de

falência pelo prazo de 1 (um) ano, contado da data de alienação, somente podendo ser

utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao

tributário. (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)‖

Visando a dar maior segurança ao adquirente de unidade produtiva em processos de

recuperação de empresas, os citados dispositivos da Lei Complementar nº 118/2005 excluíram a

responsabilidade no caso de alienação judicial em: (a) processo de falência; (b) filial em

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171

processo de recuperação judicial. Exceções aplicáveis nos casos em que o adquirente for ligado

à empresa em falência ou em recuperação judicial, para se evitar fraude.

Alguns Aspectos Práticos

Encerramento de Período-Base

As operações de incorporação, cisão e fusão trazem como conseqüência para as pessoas

jurídicas incorporadora e incorporada, cisionada ou fundida, a antecipação do encerramento do

período-base para fins de incidência do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da

Contribuição Social Sobre o Lucro (CSL), que em geral se dá em 31 de dezembro de cada ano.

Tal comando se encontra previsto no art. 1º, § 1, da Lei n° 9.430/96, a seguir transcrito:

―Art. 1º A partir do ano-calendário de 1997, o imposto de renda das pessoas jurídicas

será determinado com base no lucro real, presumido, ou arbitrado, por períodos de

apuração trimestrais, encerrados nos dias 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31

de dezembro de cada ano-calendário, observada a legislação vigente, com as alterações

desta Lei.

§ 1º Nos casos de incorporação, fusão ou cisão, a apuração da base de cálculo e do

imposto de renda devido será efetuada na data do evento, observado o disposto no art. 21

da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995.

§ 2º Na extinção da pessoa jurídica, pelo encerramento da liquidação, a apuração da base

de cálculo e do imposto devido será efetuada na data desse evento.‖

Em relação às pessoas jurídicas que figurarem como incorporadoras, e, portanto, que

permanecerão existentes após o processo de reorganização das empresas envolvidas, tais

pessoas jurídicas não precisarão antecipar o encerramento do seu período-base de apuração do

IRPJ e da CSL caso tanto a incorporadora quanto a incorporada estivessem sob o mesmo

controle societário, conforme determina o art. 5º da Lei nº 9.959/2000:

―Art. 5º. Aplica-se à pessoa jurídica incorporadora o disposto no art. 21 da Lei nº 9.249,

de 26 de dezembro de 1995, e no § 1º do art. 1º da Lei nº 9.430, de 1996, salvo nos casos

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172

em que as pessoas jurídicas, incorporadora e incorporada, estivessem sob o mesmo

controle societário desde o ano-calendário anterior ao do evento.‖

Necessidade de apresentação da Declaração de Informações Econômicas Fiscais da Pessoa

Jurídica – DIPJ

Outro aspecto a ser observado pelas pessoas jurídicas que participarem dos processos de

reorganização societária e que tenham o período-base antecipado, conforme exposto acima, é a

obrigação de apresentar a DIPJ relativa ao período-base no qual ocorrer a operação, devendo a

DIPJ ser entregue até o último dia útil do mês subseqüente ao da ocorrência do evento,

conforme dispõe o art. 21 da Lei n° 9.429/95:

―Art. 21. A pessoa jurídica que tiver parte ou todo o seu patrimônio absorvido em

virtude de incorporação, fusão ou cisão deverá levantar balanço específico para esse fim,

no qual os bens e direitos serão avaliados pelo valor contábil ou de mercado.

§ 1º O balanço a que se refere este artigo deverá ser levantado até trinta dias antes do

evento.

§ 2º No caso de pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido ou arbitrado, que

optar pela avaliação a valor de mercado, a diferença entre este e o custo de aquisição,

diminuído dos encargos de depreciação, amortização ou exaustão, será considerada

ganho de capital, que deverá ser adicionado à base de cálculo do imposto de renda

devido e da contribuição social sobre o lucro líquido.

§ 3º Para efeito do disposto no parágrafo anterior, os encargos serão considerados

incorridos, ainda que não tenham sido registrados contabilmente.

§ 4º A pessoa jurídica incorporada, fusionada ou cindida deverá apresentar

declaração de rendimentos correspondente ao período transcorrido durante o ano-

calendário, em seu próprio nome, até o último dia útil do mês subseqüente ao do

evento.”

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173

Com a apresentação da DIPJ pela pessoa jurídica, o IRPJ e CSL devidos, se for o caso,

deverão ser recolhidos até o último dia útil do mês subseqüente ao da ocorrência do evento da

incorporação, fusão ou cisão.

Planejamento Fiscal

Direito à Compensação de Prejuízos Fiscais (IRPJ) e Bases Negativas (CSL)

As sociedades que forem incorporadas e fusionadas em processos de reorganização de

empresas não transferem às sociedades remanescentes o direito à compensação dos prejuízos

fiscais originalmente das sociedades que foram incorporadas e fusionadas, conforme previsto no

art. 514 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR/99) aprovado pelo Decreto nº 3.000/99:

―Art. 514. A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá

compensar prejuízos fiscais da sucedida (Decreto-Lei nº 2.341, de 1987, art. 33).

Parágrafo único. No caso de cisão parcial, a pessoa jurídica cindida poderá compensar os

seus próprios prejuízos, proporcionalmente à parcela remanescente do patrimônio

líquido (Decreto-Lei nº 2.341, de 1987, art. 33, parágrafo único).‖

No caso de cisão parcial, ao contrário, conforme exposto no parágrafo único do mesmo art.

514, a sociedade cindida permanece com o direito à compensação dos prejuízos fiscais, mas em

montante proporcional ao patrimônio líquido remanescente após a operação. Assim, a sociedade

cindida poderá aplicar sobre o saldo de prejuízos fiscais o percentual obtido por meio da divisão

do valor do patrimônio líquido remanescente.

O mesmo tratamento atribuído aos prejuízos fiscais de IRPJ deve ser atribuído às bases

negativas de CSL, conforme dispõe o art. 22 da MP 2.158-35/01. Assim, é possível afirmar que

os prejuízos fiscais e bases negativas não se transferem, mas só podem ser utilizados pelas

próprias sociedades que detinham tais prejuízos e bases negativas antes do processo de

reorganização societária.

Cabe ressaltar que, a despeito do que a Receita Federal entendia no passado, não há vedação

de incorporação de sociedade superavitária por uma outra sociedade deficitária, permitindo

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174

assim a utilização dos prejuízos fiscais da incorporadora para redução do lucro tributável da

sociedade incorporada. Vejamos:

―IRPJ - SIMULAÇÃO NA INCORPORAÇÃO - Para que se possa materializar, é

indispensável que o ato praticado não pudesse ser realizado, fosse por vedação legal ou

por qualquer outra razão. Se não existia impedimento para a realização da incorporação

tal como realizada e o ato praticado não é de natureza diversa daquela que de fato

aparenta, não há como qualificar-se a operação de simulada. Os objetivos visados com a

prática do ato não interferem na qualificação do ato praticado. Portanto, se o ato

praticado era lícito, as eventuais conseqüências contrárias ao fisco devem ser

qualificadas como casos de elisão fiscal e não de "evasão ilícita." (Ac. CSRF/01-

01.874/94). IRPJ- INCORPORAÇÃO ATÍPICA - A incorporação de empresa

superavitária por outra deficitária, embora atípica, não é vedada por lei, representando

negócio jurídico indireto.‖

(Recurso nº 131653, 1ª Câmara do Conselho de Contribuintes, sessão de 28.02.2003)

Diante do exposto, como forma de maximizar o aproveitamento dos prejuízos fiscais detidos

por uma sociedade deficitária, em processo de reorganização de empresas, é recomendável que

está sociedade venha a incorporar outra sociedade superavitária, permitido a diminuição do ônus

fiscal.

Todavia, apesar de reconhecer a possibilidade de uma sociedade deficitária incorporar uma

sociedade superavitária, essa operação não deve existir apenas formalmente, ou seja, apenas nos

atos formais de incorporação de uma sociedade, devendo refletir a substância real da operação.

Caso isso se configure apenas uma incorporação formal, mas que não represente a real operação

ocorrida, a jurisprudência administrativa entende que se está diante de uma operação de

simulação, não validando o processo de reorganização societária para efeitos tributários:

―IR – COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS DA EMPRESA INCORPORADORA COM

OS LUCROS DA INCORPORANTE – VEDAÇÃO.

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175

(...) Comprovado, com base nos elementos constantes dos autos, que a declaração de

vontade expressa nos atos de incorporação era enganosa para produzir efeito diverso do

ostensivamente indicado, a autoridade fiscal não está jungida aos efeitos jurídicos que os

atos produziram, mas a verdadeira repercussão tributária dos fatos subjacentes.‖

(Acórdão nº 101-83.921 da 1ª Câmara do Conselho de Contribuintes do Ministério da

Fazenda).

Ponto relevante nas operações de reorganização societária é o cuidado a ser tomado pelas

empresas envolvidas para que não se incorra na hipótese de vedação ao uso de prejuízos fiscais

e base de cálculo negativa de CSL próprios, das empresas incorporadoras e na sociedade

remanescente em uma cisão parcial, que teriam normalmente o direito ao aproveitamento,

conforme exposto acima.

Isso porque, mesmo para essas empresas, caso a operação de reorganização societária resulte

em mudança de controle societário e do ramo de atividade da incorporadora ou cindida parcial,

tal sociedade ficará impedida de compensar seus prejuízos fiscais e base negativa de CSL por

expressa vedação legal prevista no art. 513 do RIR/99:

―Art. 513. A pessoa jurídica não poderá compensar seus próprios prejuízos fiscais se

entre a data da apuração e da compensação houver ocorrido, cumulativamente,

modificação de seu controle societário e do ramo de atividade (Decreto-Lei nº 2.341, de

29 de junho de 1987, art. 32).‖

Dessa forma, caso uma sociedade com prejuízos fiscais próprios, venha a incorporar

sociedade lucrativa, mas tenha, cumulativamente, modificado o seu controle societário e o ramo

de atividade, a incorporadora não poderá aproveitar seus próprios prejuízos fiscais.

Limitação à Compensação dos Prejuízos Fiscal e Bases Negativas de CSL

A partir de 1º de janeiro de 1995 a compensação dos prejuízos fiscal e bases negativas de

CSL ficaram sujeitos à limitação de 30% do valor do lucro real e da base de cálculo da CSL,

contra os quais serão compensados. Essa limitação foi originariamente previstas nos artigos 42

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176

(IRPJ) e 58 (CSL) da Lei nº 8.981/95, posteriormente complementados pelos artigos 15 e 16 da

Lei nº 9.065/95, a seguir transcritos:

―Art. 15. O prejuízo fiscal apurado a partir do encerramento do ano-calendário de 1995,

poderá ser compensado, cumulativamente com os prejuízos fiscais apurados até 31 de

dezembro de 1994, com o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas na

legislação do imposto de renda, observado o limite máximo, para a compensação, de

trinta por cento do referido lucro líquido ajustado.

Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que

mantiverem os livros e documentos, exigidos pela legislação fiscal, comprobatórios do

montante do prejuízo fiscal utilizado para a compensação.‖

―Art. 16. A base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, quando negativa,

apurada a partir do encerramento do ano-calendário de 1995, poderá ser compensada,

cumulativamente com a base de cálculo negativa apurada até 31 de dezembro de 1994,

com o resultado do período de apuração ajustado pelas adições e exclusões previstas na

legislação da referida contribuição social, determinado em anos-calendário

subseqüentes, observado o limite máximo de redução de trinta por cento, previsto no art.

58 da Lei nº 8.981, de 1995.

Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que

mantiverem os livros e documentos, exigidos pela legislação fiscal, comprobatórios da

base de cálculo negativa utilizada para a compensação.‖

Os dispositivos que originariamente criaram a limitação ao aproveitamento do prejuízo

fiscal e base negativa foram contestados pelos contribuintes judicialmente, sob a alegação de

que, com a limitação, estaria sendo tributada algo além da renda, devido à vedação de reduzir a

base de cálculo.

Todavia, a jurisprudência se consolidou no sentido de reconhecer como legitima a vedação,

já que não se estaria vedando a utilização dos prejuízos fiscais e base negativa, apenas

postergando suas utilizações. Cite-se a decisão abaixo do Superior Tribunal de Justiça:

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177

―PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE RENDA E CSSL –

PREJUÍZOS FISCAIS - COMPENSAÇÃO - LIMITAÇÃO - LEI 8.981/95, ARTS. 42 E

58 - PRECEDENTES/STJ.

A limitação (30%) de compensação dos prejuízos fiscais indicados no balanço das

empresas para o exercício de 1995 é legítima porque não impede o abatimento, nos anos

seguintes, dos 70% (setenta por cento) restantes, até o limite total. Ressalva do ponto de

vista do relator. Recurso especial conhecido, mas improvido.‖

(RESP nº 548687, 2ª Turma do STJ, Mis. Francisco Peçanha Martins, DJ 13.02.2006).

Visto isso, cabe analisar os efeitos dessa vedação sobre as operações de incorporação, fusão

ou cisão total em que será extinta a sociedade incorporada, fusionada ou cindida, visto que essas

sociedades não terão como se utilizar no futuro dos saldos remanescentes de prejuízos fiscais e

bases negativas de CSL acumuladas.

Ora, sendo a justificativa para admitir a legalidade da limitação imposta ao aproveitamento

dos prejuízos fiscais e bases negativas o fato de que é possível a utilização do saldo

remanescente no futuro, e considerando que as empresas extintas durante os processos de

reorganização societária não terão esse futuro, deve se admitir a utilização integral desses

valores. A incorporada, fusionada ou cindida devem ser autorizadas a utilizar 100% de seus

prejuízos fiscais e bases negativas na data do evento que resulte na sua extinção.

Esse entendimento já foi referendado pelo Conselho de Contribuintes do Ministério da

Fazenda, por meio de seu órgão superior, a Câmara Superior de Recursos Fiscais:

―INCORPORAÇÃO – DECLARAÇÃO FINAL DE INCORPORADA. LIMITAÇÃO

DE 30% NA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS. INAPLICABILIDADE. No caso de

compensação de prejuízos fiscais na última declaração de rendimentos da incorporada,

não se aplica a norma de limitação a 30% do lucro líquido ajustado.‖

(Acórdão nº 01-04.258, Câmara Superior de Recursos Fiscais)

Ágio na aquisição de participação societária

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178

O ágio ou o deságio são, respectivamente, as diferenças positivas ou negativas entre o valor

patrimonial de uma participação societária e o valor efetivamente pago pela sociedade

adquirente desta participação societária. Trataremos aqui do ágio verificado nos processos de

aquisição de participações societárias, com especial enfoque na utilização desse ágio para

posterior redução da tributação em decorrência de processos de reorganização de empresas.

Na aquisição de participação societária com ágio, o valor pago deverá ser desdobrado na

contabilidade da sociedade adquirente entre o valor do patrimônio líquido na época da

aquisição, e o valor do ágio ou deságio, entendido como a diferença entre o custo de aquisição e

o valor de patrimônio líquido. Assim dispões o art. 385 do RIR/99:

―Art. 385. O contribuinte que avaliar investimento em sociedade coligada ou controlada

pelo valor de patrimônio líquido deverá, por ocasião da aquisição da participação,

desdobrar o custo de aquisição em (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 20):

I - valor de patrimônio líquido na época da aquisição, determinado de acordo com o

disposto no artigo seguinte; e

II - ágio ou deságio na aquisição, que será a diferença entre o custo de aquisição do

investimento e o valor de que trata o inciso anterior.

§ 1º O valor de patrimônio líquido e o ágio ou deságio serão registrados em subcontas

distintas do custo de aquisição do investimento (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 20,

§ 1º).

§ 2º O lançamento do ágio ou deságio deverá indicar, dentre os seguintes, seu

fundamento econômico (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 20, § 2º):

I - valor de mercado de bens do ativo da coligada ou controlada superior ou inferior ao

custo registrado na sua contabilidade;

II - valor de rentabilidade da coligada ou controlada, com base em previsão dos

resultados nos exercícios futuros;

III - fundo de comércio, intangíveis e outras razões econômicas.

§ 3º O lançamento com os fundamentos de que tratam os incisos I e II do parágrafo

anterior deverá ser baseado em demonstração que o contribuinte arquivará como

comprovante da escrituração (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 20, § 3º).

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179

Como visto, as razões que podem justificar o ágio previstas na legislação fiscal são (a) o

valor de mercado dos bens que integram o ativo da sociedade adquirida, maior que o valor

patrimonial indicado na contabilidade da adquirida; (b) o valor da expectativa da rentabilidade

futura da sociedade adquirida (em geral com base no fluxo de caixa descontado); e (c) fundo de

comércio, intangíveis e outras razões econômicas.

Ponto tratado especificamente pela legislação fiscal, mas que em determinadas operações

não é observado pelas sociedades é a necessidade de se justificar, com demonstração contábil

técnica, o ágio baseado no valor de mercado dos bens, e na expectativa de rentabilidade futura.

A ausência desse laudo técnico irá inviabilizar, por exemplo, o aproveitamento fiscal do ágio,

conforme visto a seguir.

De fato, quando uma sociedade absorve patrimônio de outra, via um processo de

reorganização societária, o ágio eventualmente existente poderá ser utilizado para reduzir a base

de cálculo na pessoa jurídica sucessora, na forma do art. 386 do RIR/99:

―Art. 386. A pessoa jurídica que absorver patrimônio de outra, em virtude de

incorporação, fusão ou cisão, na qual detenha participação societária adquirida com ágio

ou deságio, apurado segundo o disposto no artigo anterior (Lei nº 9.532, de 1997, art. 7º,

e Lei nº 9.718, de 1998, art. 10):

I - deverá registrar o valor do ágio ou deságio cujo fundamento seja o de que trata o

inciso I do § 2º do artigo anterior, em contrapartida à conta que registre o bem ou direito

que lhe deu causa;

II - deverá registrar o valor do ágio cujo fundamento seja o de que trata o inciso III do

§ 2º do artigo anterior, em contrapartida a conta de ativo permanente, não sujeita a

amortização;

III - poderá amortizar o valor do ágio cujo fundamento seja o de que trata o inciso II do

§ 2º do artigo anterior, nos balanços correspondentes à apuração de lucro real,

levantados posteriormente à incorporação, fusão ou cisão, à razão de um sessenta avos,

no máximo, para cada mês do período de apuração;

IV - deverá amortizar o valor do deságio cujo fundamento seja o de que trata o inciso II

do § 2º do artigo anterior, nos balanços correspondentes à apuração do lucro real,

levantados durante os cinco anos-calendário subseqüentes à incorporação, fusão ou

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180

cisão, à razão de um sessenta avos, no mínimo, para cada mês do período de apuração.

(...)‖

Com base nos dispositivos legais acima transcritos, a maioria das operações de aquisição de

empresas se dá com base na expectativa de rentabilidade futura da sociedade adquirida, em

geral calculada com base no fluxo de caixa descontado, em média de cinco anos. Assim o

adquirente irá registrar o ágio da operação com base no art. 385, § 2º, inciso II.

Posteriormente, com base no art. 386, inciso III, é realizado processo de reorganização

societária onde, por meio de uma incorporação, uma pessoa jurídica absorva outra, sendo

permitida a amortização desse ágio na apuração do lucro real, à razão de 1/60, no máximo, para

cada mês do período de apuração.

Assim, o valor que foi pago à título de ágio originalmente na aquisição de participação

societária poderá ser utilizado para reduzir a base de cálculo de incidência do Imposto de Renda.

Observe-se que, além da incorporação da sociedade investida pela investidora, que seria o

caminho mais natural, é permitido que a sociedade investida venha a incorporar a investidora, e,

assim também ter direito de amortizar o ágio originalmente pago pela investidora. Nesse sentido

já decidiu o Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda:

―Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

Ano-calendário: 2002

AMORTIZAÇÃO DE ÁGIO. INCORPORAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA

CONTROLADORA POR SUA CONTROLADA. ANO-CALENDÁRIO 2002. É

permitida a amortização de ágio nas situações em que uma pessoa jurídica absorve

patrimônio de outra, em conseqüência de incorporação, na qual detenha participação

societária adquirida com ágio, apurado segundo o disposto no artigo 385 do RIR/99,

inclusive no caso de incorporação da controladora por sua controlada. Tratando-se de

fundamento econômico lastreado em previsão de resultados nos exercícios futuros, a

amortização se dá nos balanços correspondentes à apuração do lucro real, levantados

posteriormente à incorporação, à razão de 1/60 (um sessenta avos), no máximo, para

cada mês do período de apuração.

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181

INCORPORAÇÃO DE EMPRESA. AMORTIZAÇÃO DE ÁGIO. NECESSIDADE DE

PROPÓSITO NEGOCIAL. UTILIZAÇÃO DE "EMPRESA VEÍCULO". Não produz o

efeito tributário almejado pelo sujeito passivo a incorporação de pessoa jurídica, em cujo

patrimônio constava registro de ágio com fundamento em expectativa de rentabilidade

futura, sem qualquer finalidade negocial ou societária, especialmente quando a

incorporada teve o seu capital integralizado com o investimento originário de aquisição

de participação societária da incorporadora (ágio) e, ato contínuo, o evento da

incorporação ocorreu no dia seguinte. Nestes casos, resta caracterizada a utilização da

incorporada como mera "empresa veículo" para transferência do ágio à incorporadora.‖

(Recurso nº 152980, 3ª Câmara do Conselho de Contribuintes, sessão de 05.12.2007)

Como visto na parte final da decisão acima transcrita, apesar de ser permitida a amortização

do ágio no caso de incorporação da controladora pela controlada, caso não reste demonstrado o

propósito negocial, essa amortização não será permitida pelas autoridades fiscais.

D) Textos de Apoio

Operarações de Incorporação, Cisão, Fusão e Transformação – Aspectos Fiscais

Anna Beatriz Luz, Desiree Perón e Juliana Kac 128

128 Alunas do Curso de Direito da FGV Direito Rio.

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182

Contextualização

As reestruturações societárias envolvendo incorporação, fusão e cisão constituem operações

em que pessoas jurídicas (―PJ‖) transferem direitos e obrigações para outra PJ. Neste sentido,

representa um processo de sucessão em que a PJ sucessora se torna detentora do patrimônio que

lhe foi transferido para o exercício de uma atividade empresarial.

No que se refere à obrigação tributária, o Código Tributário Nacional, ao disciplinar a

matéria determina que a nova sociedade ou a remanescente será responsável pelos tributos

devidos pelas incorporadas, cindidas ou fusionadas:

"Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou

incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até a data do ato

pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas."

1. INCORPORAÇÃO

As operações de incorporação encontram-se definidas pelo artigo 227 da Lei 6.404/76

(―LSA‖), abaixo transcrito:

―Art. 227 - A incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são

absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações.‖

Sendo assim, verifica-se que em operações de incorporação, a sociedade incorporadora

absorve a incorporada, que será extinta, sucedendo todos os direitos e obrigações da última.

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183

O patrimônio líquido (―PL‖) e o capital social (―CS‖) da sociedade incorporadora, desta

forma, será acrescido pelo PL e CS da incorporada. No que se refere aos sócios ou acionistas da

incorporada, estes passarão a possuir investimentos na incorporadora.

Abaixo, esquema de operação de incorporação entre empresas de um mesmo grupo

econômico:

Antes da incorporação:

Após a incorporação:

C

Inv. A 100

Inv. B 100

PL 200

A

Cx. 100

PL 100

B

At. 100

PL 100

C

Inv. A 200

PL 200

A

Cx. 100

At. B 100

PL 200

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184

2. FUSÃO

Na fusão, duas ou mais sociedades se unem para formação de uma nova sociedade; esta

sociedade sucederá as demais em todas as suas obrigações e direitos extinguindo-as.

A LSA, em seu artigo 228, define tal operação como:

―Art. 228. A fusão é a operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar

sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações.‖

Abaixo, esquema de operação de fusão:

Antes da fusão:

Após a fusão:

A

Cx. 300

PL 300

B

Cx. 200, Passivo 100,

PL 100

C

Nova Sociedade

C

Cx 500

Passivo 100

PL 400

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185

3. CISÃO

Em operações de cisão uma sociedade transfere parte de seu patrimônio para uma ou mais

sociedades, que podem ser pré-existentes ou não.

A LSA assim define tais operações:

―Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu

patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes,

extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou

dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.‖

A cisão, neste sentido, pode ser parcial ou total. Na primeira, somente uma parte do

patrimônio é transferido enquanto na segunda o patrimônio é completamente transferido

extinguindo-se a sociedade cindida.

Abaixo, esquema de operação de cisão parcial sem incorporação:

Antes da cisão parcial de B:

A

Inv. B 100

PL 100

B

Cx. 200

Passivo 100

PL 100

C

Nova Sociedade

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186

Após a cisão parcial de B:

4. TRANSFORMAÇÃO

A transformação é a operação pela qual a sociedade passa, independentemente de dissolução

e liquidação, de um tipo societário para outro (LSA - art. 220). Ocorre, por exemplo, quando

uma sociedade limitada se transforma em anônima.

5. IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURÍDICA (“IRPJ”) E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O

LUCRO LÍQUIDO (“CSL”)

a. Encerramento de Período Base – Declaração de Informações Econômicas Fiscais da

Pessoa Jurídica (―DIPJ‖)

Nas reestruturações societárias envolvendo incorporação, fusão e cisão de sociedades, as

sociedades incorporadora e incorporada, cisionada ou fundida devem encerrar o período-base

para fins de incidência de IRPJ e CSL. Tal obrigatoriedade foi imposta pela Lei 9.430/97, nos

seguintes termos:

―Art. 1º A partir do ano-calendário de 1997, o imposto de renda das pessoas jurídicas

será determinado com base no lucro real, presumido, ou arbitrado, por períodos de

A

Inv. B 50

Inv. C 50, PL 100

B

Cx. 100

Passivo 50, PL 50

C

Cx. 100

Passivo 50, PL 50

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187

apuração trimestrais, encerrados nos dias 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31

de dezembro de cada ano-calendário, observada a legislação vigente, com as alterações

desta Lei.

§ 1º Nos casos de incorporação, fusão ou cisão, a apuração da base de cálculo e do

imposto de renda devido será efetuada na data do evento, observado o disposto no art. 21

da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995.

§ 2° Na extinção da pessoa jurídica, pelo encerramento da liquidação, a apuração da base

de cálculo e do imposto devido será efetuada na data desse evento.‖

Importante observar que, nos casos em que as sociedades envolvidas na operação de

incorporação estiverem submetidas ao mesmo controle societário, desde o ano-calendário

anterior ao do evento, não existe a necessidade quanto ao encerramento do período-base.

Como conseqüência do encerramento do período-base as sociedade estão obrigadas a

apresentação da DIPJ até o último dia útil do mês subseqüente ao da ocorrência do evento.

a. Compensação de Prejuízos Fiscais/ Bases Negativas da CSL

O direito a compensação de prejuízos fiscais é somente autorizado em operações de cisão

parcial em montante proporcional a parcela remanescente do patrimônio líquido.

Nos demais casos (incorporação e fusão) não há direito`a compensação de prejuízos fiscais,

conforme dispõe o art. 514 do Decreto 3.000/99 (―RIR‖):

―Art. 514. A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá

compensar prejuízos fiscais da sucedida (Decreto-Lei nº 2.341, de 1987, art. 33).

Graduação

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188

Parágrafo único. No caso de cisão parcial, a pessoa jurídica cindida poderá compensar

os seus próprios prejuízos, proporcionalmente à parcela remanescente do patrimônio

líquido (Decreto-Lei nº 2.341, de 1987, art. 33, parágrafo único).‖

Até julho de 1999 o direito`a compensação de bases negativas de CSL era permitido nas

operações de incorporação, fusão e cisão por falta de vedação legal. Contudo, em 11.04.2000 foi

editada a Medida Provisória 1991-16/00 que vedou tal possibilidade. Atualmente esta em vigor

a MP 2158-35/01 que manteve tal disposição.

Note-se que não haverá a possibilidade de compensar os prejuízos apurados entre a data da

apuração e da compensação em caso de incorporação e cisão que resulte em alteração do

controle societário ou do ramo de atividade da incorporadora (art. 513 do RIR).

a. Incorporação de empresa lucrativa por outra com prejuízos acumulados

Apesar de ser vedado a compensação de prejuízos em hipótese em que a empresa lucrativa

incorpore a sociedade com prejuízos, não há vedação legal restringindo a hipótese contraria.

Dessa forma, atualmente o planejamento tributário que tem sido realizado para o

aproveitamento de prejuízos fiscais consiste na realização de operação de incorporação reversa

(`as avessas). Nesse sentido, citamos o seguinte precedente da Câmara Superior de Recursos

Fiscais (―CSRF‖):

―IRPJ - INCORPORAÇÃO ÀS AVESSAS - GLOSA DE PREJUÍZOS -

IMPROCEDÊNCIA - A denominada "incorporação às avessas", não proibida pelo

ordenamento jurídico, realizada entre empresas operativas e que sempre estiveram sob

controle comum, não pode ser tipificada como operação simulada ou abusiva, mormente

quando, a par da inegável intenção de não perda de prejuízos fiscais acumulados, teve

por escopo a busca de melhor eficiência das operações entres ambas praticadas.‖

Acórdão n. 01-05.413

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189

A despeito de tais operações terem sido reconhecidas como licitas pela jurisprudência

administrativa há decisões que consideram as mesmas como fraude ou simulação. Deve-se

atentar ao risco da operação poder ser, portanto, desconsiderada pelo Fisco, o que provocara a

incidência de multa qualificada e a impossibilidade de aproveitamento do prejuízo. Cite-se, por

todos, o seguinte acórdão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (―CARF‖ – antigo

Conselho de Contribuintes):

―COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS - Os prejuízos compensáveis, de acordo com a

legislação fiscal (RIR/80, art. 382) são os sofridos pela própria pessoa jurídica, sendo

defesa a compensação de prejuízos da empresa incorporada com os lucros da

incorporante. Comprovado, com base nos elementos constantes dos autos, que a

declaração de vontade expressa nos atos de incorporação era enganosa para produzir

efeito diverso do ostensivamente indicado, a autoridade fiscal não está jungida aos

efeitos jurídicos que os atos produziram, mas à verdadeira repercussão tributária dos

fatos subjacentes. MULTA QUALIFICADA - Configurado o evidente intuito de reduzir

a base de cálculo do imposto através de fraude à lei fiscal, justifica-se a aplicação da

multa qualificada prevista no inciso III do artigo 728 do RIR/80. MULTA AGRAVADA

- Não se configurando na espécie o evidente intuito de fraude de que trata o inciso III do

art. 728 do RIR/80, impõe-se a desqualificação da penalidade imposta.‖ Acórdão n. 101-

83.921

a. Ganhos e perdas de capital

A incorporação, fusão e cisão poder gerar perdas ou ganhos de capital, decorrente da

diferença entre o valor contábil das quotas ou ações extintas e o valor do acervo liquido que as

substituir, nos termos do art. 430 do RIR:

―Art. 430. Na fusão, incorporação ou cisão de sociedades com extinção de ações ou

quotas de capital de uma possuída por outra, a diferença entre o valor contábil das ações

ou quotas extintas e o valor de acervo líquido que as substituir será computada na

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190

determinação do lucro real de acordo com as seguintes normas (Decreto-Lei nº 1.598, de

1977, art. 34):

I - somente será dedutível como perda de capital a diferença entre o valor contábil e o

valor do acervo líquido avaliado a preços de mercado, e o contribuinte poderá, para

efeito de determinar o lucro real, optar pelo tratamento da diferença como ativo diferido,

amortizável no prazo máximo de dez anos;

II - será computado como ganho de capital o valor pelo qual tiver sido recebido o acervo

líquido que exceder ao valor contábil das ações ou quotas extintas, mas o contribuinte

poderá, observado o disposto nos §§ 1º e 2º, diferir a tributação sobre a parte do ganho

de capital em bens do ativo permanente, até que esse seja realizado.

§ 1º O contribuinte somente poderá diferir a tributação da parte do ganho de capital

correspondente a bens do ativo permanente se (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 34, §

1º):

I - discriminar os bens do acervo líquido recebido a que corresponder o ganho de capital

diferido, de modo a permitir a determinação do valor realizado em cada período de

apuração; e

II - mantiver, no LALUR, controle do ganho de capital ainda não tributado, cujo saldo

ficará sujeito à atualização monetária até 31 de dezembro de 1995 (Lei nº 9.249, de

1995, art. 6º, e parágrafo único).

§ 2º O contribuinte deve computar no lucro real de cada período de apuração a parte do

ganho de capital realizada mediante alienação ou liquidação, ou através de quotas de

depreciação, amortização ou exaustão e respectiva atualização monetária até 31 de

dezembro de 1995, quando for o caso, deduzidas como custo ou despesa operacional

(Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 34, § 2º, e Lei nº 9.249, de 1995, art. 6º, e parágrafo

único).‖

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191

Desta forma, a diferença será computada no lucro real, aumentando ou diminuindo o

imposto a ser recolhido, conforme o caso.

a. Ágio/deságio

O ágio ou deságio, em operações de aquisição societária avaliadas pelo método de

equivalência patrimonial (MEP), resta configurado quando há diferença entre o valor do

patrimônio líquido contábil - PLC da investida e o custo de sua aquisição. Sendo assim, caso o

montante investido (custo de aquisição) seja maior do que o valor constante do PLC da

investida, esta diferença deverá ser contabilizada como ágio no balanço patrimonial – e seus

reflexos na demonstração de resultado do exercício – da sociedade investidora que utilize o

MEP.

Isto, pois, com base no disposto nos artigos 7 e 8 da lei n° 9.532/97, o referido ágio é

dedutível na apuração do lucro real do Imposto de Renda – IR caso seja oriundo de

incorporação, fusão ou cisão, configurando-se exceção à regra constante no artigo 23, parágrafo

único, do Decreto-lei n° 1.598/77.

O registro do ágio ou deságio averiguado, deverá ser registrado em subcontas distintas do

custo de aquisição do investimento, sendo necessário indicar a razão, o fundamento, de sua

existência.

Sendo assim, tendo em vista que o ágio oriundo de incorporações, fusões ou cisões é

dedutível na apuração do Imposto de Renda – IR, este se mostra como um benefício fiscal

essencial para viabilizar tais operações.

6. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA E SERVIÇO (“ICMS”)

O ICMS incide sobre a circulação de mercadorias e a prestação de serviços de transporte

interestadual e intermunicipal e de comunicação. Se a operação de incorporação, fusão ou cisão

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192

provocar a transferência física de estoque ou imobilizado de um estabelecimento comercial para

outro, incidirá ICMS.

7. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (“IPI”)

O IPI incide sobre produtos industrializados, nacionais e estrangeiros, obedecidas as

especificações constantes da Tabela de Incidência do IPI. Assim como no ICMS, se a operação

de incorporação, fusão ou cisão provocar a transferência física de estoque ou imobilizado de um

estabelecimento comercial para outro e estiver disposto na tabela, incidirá IPI.

8. IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS (“ITBI”)

O ITBI incide sobre a transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens

imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia,

bem como cessão de direitos a sua aquisição.

O referido imposto encontra-se previsto no art. 156, II da Constituição Federal (―CF‖),

assim como exceção a regra acima exposta em casos de incorporação, fusão e cisão, nos

seguintes termos:

―Art. 156 § 2º - O imposto previsto no inciso II: I - não incide sobre a transmissão de

bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital,

nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou

extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do

adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou

arrendamento mercantil;‖

Observe que, nas hipóteses em que a atividade preponderante da incorporadora/sucessora for

a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil

haverá a incidência do ITBI.

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193

O CTN, em seu artigo 37, define atividade preponderante como:

―Art. 37. § 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo

quando mais de 50% (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica

adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subseqüentes à aquisição,

decorrer de transações mencionadas neste artigo.‖

Atualmente, a alíquota do ITBI no Rio de Janeiro é de 4%.

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194

12.1. Aula 14. O Uso dos Fundos de Investimentos em Participações

FIP

Obs. Esta aula extra não está incluída no plano de aulas do curso e somente será administrada em caso

de sobra de tempo no fim do período letivo.

A) Ementário de Temas

O Uso dos Fundos de Investimento em Participações.

B) Material de Leitura

Leitura Complementar

ROCHA, Tatiana Nogueira. ―Fundos de Investimento e o Papel do Administrador‖. São Paulo:

Ibmec Law, 2006.

C) Roteiro de Aula

O Uso de Fundos de investimentos em Participações.

Não obstante o fato do mercado de capitais no Brasil oferecer a um investidor uma enorme

gama de produtos, o fundo de investimento em participações é um conceito relativamente novo.

Até o ano de 2003 as poucas experiências existentes no mercado brasileiro de constituição

de fundos com as características de um ―private equity‖ decorreram da adaptação das regras

aplicáveis aos fundos de investimentos em ações FIA, o que criava inúmeras restrições à correta

utilização do instituto. 129

129

Fundos de Investimentos em Participações ( FIP ) – mais um Instrumento para Redução do Custo Brasil. Luiz

Leonardo Cantidiano.

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195

Esta incerteza permaneceu até que a Comissão de Valores Mobiliários - CVM baixou a

Instrução No. 391, de 16 de julho de 2003, regulando os Fundos de Investimento em

Participações – FIPs, o veiculo ideal para investimento em fundos de private equity. O propósito

dos FIPs é de adquirir ações, debêntures, warrants e outros títulos conversíveis ou permutáveis

por ações emitidas por companhias abertas ou fechadas. É uma condição para qualquer

investimento com FIPs que haja uma efetiva participação na administração da companhia em

que se está investindo, através, por exemplo, da nomeação de diretores.

O FIP é um instrumento bastante utilizado em economias mais desenvolvidas, isto porque

admite que a empresa, que ainda não atingiu um estágio e um porte que lhe permitam acessar o

mercado através de oferta primária de ações (IPO), mas que necessita de capital para

desenvolver seus negócios, modernizar-se e conquistar mais mercado, venha a captar, por

prazos longos, recursos fornecidos por investidores que estão dispostos a correr os riscos

inerentes ao salto que a empresa investida pretende dar, buscando alcançar maiores lucros,

derivados não apenas do retorno que possa ser alcançado pelo recebimento de dividendos

futuros, mas especialmente da expectativa de valorização da ação que possibilite, quando do

IPO, um expressivo ganho de capital.130

O FIP pode participar no processo de decisão da companhia através dos seguintes

mecanismos:

detendo ações que são parte do bloco de controle;

entrando em acordos de acionistas; ou

tomando quaisquer outras medidas que garantam a efetiva influência do FIP na

administração da companhia ou nas políticas estratégicas desta.

O arcabouço regulatório dos FIPs é flexível. Há alguns requisitos de como estes deverão ser

administrados: o estatuto tem flexibilidade substancial em dispor como regular o requisito do

capital mínimo, a política de investimento, chamadas para investir capital, distribuição de

resultados. As ofertas públicas dos FIPs estão sujeitas a requisitos mínimos de registro que são

flexíveis, já que seus investidores são considerados investidores sofisticados, que tem condições

de avaliar as perspectivas e os riscos desta forma de investimento.

130

Idem.

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196

FIPs em companhias em recuperação.

A Instrução 391 permite que FIPs investam em companhias sob recuperação mediante o uso

de ativos ou créditos para compra de ações. Esta Instrução requer que tais ativos ou créditos

sejam avaliados e que esta avaliação conste em um relatório de avaliação feita por um expert

que seja relacionado ao procedimento de recuperação. Credores podem, portanto, usar seus

créditos para investir na companhia, um aspecto que mudou, de forma dramática, todo o cenário

das relações entre credores e investidores em companhias insolventes.

Benefícios de se Usar os FIPs

Geralmente, os FIPs são administrados por terceiros a fim de que:

sejam maximizados os retornos financeiros dos credores que vão receber quotas dos

fundos como pagamento pelas suas demandas; e

seja dada mais credibilidade, transparência e segurança ao planos de reorganização.

Através desta estrutura, credores que têm interesse em comum podem melhorar suas

posições de negociação a fim de exercerem um papel mais importante durante a reorganização

da empresa, permitindo a estes receber seus créditos e aumentar seus ganhos através de

dividendos ou venda da empresa já recuperada.

Portanto, o uso de FIPs quando se trata de uma companhia insolvente pode trazer vantagens

significativas e benefícios a todos envolvidos no processo de reorganização.

Por exemplo, os credores de uma companhia em recuperação podem adquirir quotas do FIP

mediante cessão de seus créditos contra a empresa ou até ativos relacionados ao processo de

reorganização. Há também credores que queiram vender parte ou a totalidade de seus créditos a

investidores que queiram participar no processo de reorganização a fim de obter resultados

maiores do que os resultados efetivamente disponíveis no mercado.

Investidores estratégicos que queiram tomar controle de uma companhia podem investir em

fundos no FIP. Tais investidores irão alocar estes fundos para a capitalização da companhia e

exercer um papel relevante na estrutura de governança do fundo.

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197

Ademais, fornecedores de bens e equipamentos e prestadores de serviços podem transferir

seus bens, equipamentos e créditos ao FIP. Esta medida permitiria que uma unidade de

produção que estivesse em recuperação tivesse fluxo de caixa compatível com sua situação

econômica e financeira, enquanto permitiria que estas partes maximizassem seus ganhos.

Luiz Leonardo Cantidiano, Otto Eduardo Fonseca Lobo and Daniel Kalansky

D) Textos de Apoio

Fundos de Investimentos em Participações ( FIP ) – mais um instrumento para redução do

custo Brasil

Luiz Leonardo Cantidiano

Inicio as minhas considerações sobre o tema objeto de minha reflexão lembrando que os

Fundos de Investimentos em Participações (FIP) foram regulamentados pela Instrução CVM nº

391/03, editada durante a minha gestão como Presidente da Comissão de Valores Mobiliários

(CVM).

Ressalto que o FIP é um instrumento bastante utilizado em economias mais desenvolvidas,

isto porque admite que a empresa, que ainda não atingiu um estágio e um porte que lhe

permitam acessar o mercado através de oferta primária de ações (IPO), mas que necessita de

capital para desenvolver seus negócios, modernizar-se e conquistar mais mercado, venha a

captar, por prazos longos, recursos fornecidos por investidores que estão dispostos a correr os

riscos inerentes ao salto que a empresa investida pretende dar, buscando alcançar maiores

lucros, derivados não apenas do retorno que possa ser alcançado pelo recebimento de

dividendos futuros, mas especialmente da expectativa de valorização da ação que possibilite,

quando do IPO, um expressivo ganho de capital131.

131

Experiências recentes, ocorridas em nosso país, confirmam a tese aqui sustentada, dentre as quais posso citar os

casos da Gol, da Tam, de Diagnósticos das Américas (DASA) e do UOL, nos quais os aportes efetuados por fundos

de private equity e a colaboração na gestão das companhias investidas foram fundamentais para assegurar o

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198

Até o ano de 2003 as poucas experiências existentes no mercado brasileiro de constituição

de fundos com as características de um ―private equity‖ decorreram da adaptação das regras

aplicáveis aos fundos de investimentos em ações (FIA), o que criava inúmeras restrições à

correta utilização do instituto.

Eu, que havia participado, como advogado do então Banco Garantia de Investimentos, da

criação (no ano de 1996), do 1º fundo com essa característica (Brasil Private Equity Fundo de

Investimento em Ações), conhecia bem as dificuldades que deviam ser enfrentadas para

possibilitar dita adaptação, dentre as quais certamente a maior delas decorria da imposição

regulamentar que restringia as aplicações do FIA a companhias abertas.

Em artigo que escrevi para o 1º numero da Revista Capital Aberto, quando estava no

exercício da Presidência da CVM, chamei a atenção do leitor para o fato de que a agencia

reguladora de nosso mercado de capitais estava imbuída da necessidade de modernizar o

ambiente regulatório, desenvolvendo mecanismos e procedimentos que permitissem viabilizar o

crescimento simultâneo dos mercados primário e secundário de valores mobiliários.

Especificamente sobre o FIP, que estava, naquela ocasião, sendo objeto de regulação pela

CVM, tive a oportunidade de afirmar:

Mas não é suficiente, para desenvolver o mercado, aperfeiçoar as regras sobre os

instrumentos já disponíveis para emissores e investidores. Faz-se necessário, num regime

jurídico como o nosso, oferecer novos produtos que venham a permitir alternativas

diferenciadas de captação e aplicação da poupança popular.

Nos países mais desenvolvidos, atenção especial é dada aos empreendimentos que se

encontram numa fase inicial de concepção e implantação, sem que se possa assegurar seu pleno

sucesso.

Nessa fase, em que os recursos disponíveis em mãos de empreendedores são escassos, é

preciso viabilizar fontes adequadas de obtenção de capital novo, que possibilitem a continuidade

do projeto. Não podem os empreendedores, em tal estágio, pretender captar recursos pela

emissão de ações ou debêntures nos mercados nacionais, até mesmo porque há o risco de o

projeto não prosperar ou, o que também é comum, demorar a oferecer retorno.

crescimento das referidas empresas, propiciando aos investidores, quando do respectivo IPO, obter ganho de capital

acima da média vigente no mercado.

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199

O fundo de private equity (o nosso fundo de investimento em participações, regulado pela

Instrução CVM nº 391/03) permite que administradores de recursos possam obter capitais para

destiná-los a aplicações em projetos dessa natureza, oferecendo aos aplicadores a oportunidade

de, no longo prazo, com a maturação dos investimentos realizados, obter retorno adequado,

decorrente da valorização do negócio explorado pelo receptor dos recursos captados.

Em nosso país, utilizava-se uma adaptação do fundo de investimento em ações para permitir

a aplicação de recursos em operações de private equity. Dita solução não atendia plenamente os

objetivos que se busca alcançar com a utilização do private equity, não apenas porque os fundos

de ações não estão autorizados a investir seus recursos em companhias fechadas, mas também

porque as regras que tratam de sua organização e operação não são as mais apropriadas para

permitir o melhor aproveitamento do instituto.

De acordo com a regulamentação editada pela CVM, o fundo de Investimento em

participações é uma comunhão de recursos destinados à aquisição de ações, debêntures, bônus

de subscrição, ou outros títulos e valores mobiliários conversíveis ou permutáveis em ações de

emissão de companhias, abertas ou fechadas, com participação no processo decisório da

companhia investida, e efetiva influência na definição de sua política estratégica e na sua gestão,

notadamente através da indicação de membros do Conselho de Administração132

.

Para permitir que o fundo de private equity esteja habilitado a participar de projetos de

reorganização de empresas, a regulamentação admite que a integralização de cotas, pelo

investidor, possa ser efetivada em bens ou direitos, inclusive créditos, desde que tais bens e

direitos estejam vinculados ao processo de recuperação da sociedade investida e desde que o

valor dos mesmos esteja respaldado em laudo de avaliação elaborado por empresa

especializada.

Considerando que as aplicações feitas pelos fundos de private equity são de maturação

longa, e que na maioria das vezes os valores mobiliários de emissão das companhias investidas

são de nenhuma ou de baixa liquidez, até mesmo porque elas podem não ser sociedades abertas,

o produto não pode ser dirigido ao varejo, o que levou a CVM a restringir tais aplicações a

investidores qualificados.

132

A participação do fundo no processo decisório da companhia investida pode ocorrer: (a) pela detenção de ações

que integrem o respectivo bloco de controle, (b) pela celebração de acordo de acionistas ou, ainda, (c) pela

celebração de ajuste de natureza diversa ou adoção de procedimento que assegure ao fundo efetiva influência na

definição de sua política estratégica e na sua gestão.

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200

Pela natureza dos investidores que estão autorizados a aplicar suas poupanças em fundos de

private equity, a CVM optou por fazer ampla delegação aos respectivos regulamentos sobre as

regras de sua organização e de seu funcionamento, até mesmo porque a prática demonstra que,

durante a criação do fundo os possíveis investidores estão adequadamente assessorados e sabem

exigir as regras que, em cada caso, melhor protejam seus interesses‖.

Cumpre recordar que, além da Instrução 391/03, que regulamentou o FIP, a CVM também

editou a Instrução 406/04, que dispõe sobre a constituição, o funcionamento e a administração

dos Fundos de Investimento em Participações que obtenham apoio financeiro de organismos de

fomento. Dita instrução permite que possam ser emitidas, pelo fundo, (a) cotas de diferentes

classes, a que sejam atribuídos direitos econômico-financeiros e/ou políticos diferenciados, a

serem estabelecidos no respectivo regulamento, (b) ao mesmo tempo em que admite que o

fundo possa contrair empréstimos, diretamente, dos organismos, das agências de fomento ou

dos bancos de desenvolvimento, limitados tais empréstimos ao montante correspondente a 30%

(trinta por cento) dos ativos do fundo133

.

Saliento que a Instrução CVM 406/04 foi editada a pedido do BID, que desejava, em

conjunto com investidores de mercado, aplicar recursos em nosso país que fossem direcionados

a projetos de infra-estrutura, mas que desejava fazê-lo na posição de credor (e não de acionista),

através de um FIP, porque considerava que este seria o veículo mais adequado para congregar

os interesses de todos os poupadores que viessem a se interessar por participar dos projetos de

melhoria da infra-estrutura de nosso país.

Expostas as razões que levaram a CVM a regulamentar o FIP, e descritas as suas principais

características, cumpre-me agora ressaltar em que medida o citado fundo pode contribuir para a

redução do custo Brasil.

A esse respeito penso que o primeiro aspecto a ser destacado diz respeito à perspectiva que

se abre, de forma mais ampla, para a nossa economia, de captar recursos a serem investidos por

prazos mais longos134,

permitindo que nossas empresas (especialmente aquelas que são

exploradas por companhias fechadas) possam desenvolver projetos de crescimento e de

133

De acordo com o que estabelece a Instrução 406/04, são considerados como organismos de fomento os

organismos multilaterais, agências de fomento ou bancos de desenvolvimento que possuam recursos provenientes

de contribuições e cotas integralizadas majoritariamente com recursos orçamentários de um único ou diversos

governos, e cujo controle seja governamental ou multi-governamental. 134

Segundo está consignado no endereço eletrônico da CVM (www.cvm.gov.br), no corrente ano foram registradas

5 ofertas de FIP, totalizando mais de 2 bilhões de reais; no ano de 2005 foram concedidos 6 registros, totalizando

mais de R$ 2.100 milhões.

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201

modernização, certas de que poderão obter apoio financeiro de investidores interessados em

participar do processo de desenvolvimento planejado, a um custo mais baixo de capital. Por

outro lado, além do apoio financeiro derivado da captação de recursos, as empresas estão

habilitadas a alcançar apoio gerencial, instrumento importante para permitir que seu processo de

desenvolvimento seja corretamente implementado.

Assinalo, porque importante para compreender a questão aqui analisada, que o FIP substitui,

até mesmo com vantagens fiscais, a sociedade holding, como mecanismo para possibilitar que

recursos dos poupadores possam ser aglutinados e direcionados a investimentos no setor

produtivo da economia, gerando empregos e impostos.

Não é por outra razão, aliás, que os investidores vêm estruturando operações das mais

variadas naturezas mediante a utilização de FIP. Como exemplo posso citar, não apenas aquelas

operações tradicionais de aporte de recursos a empresas que necessitam crescer e se modernizar,

mas também as operações de Project finance, em que os financiadores antecipam recursos

financeiros a serem pagos através de resultados a serem alcançados pela exploração do

empreendimento implantado com o financiamento concedido pelo mercado.

Aliás, em todos as discussões que vêm sendo travadas sobre a estruturação das Parcerias

Público Privadas (PPPs)135,

sempre é ressaltada a conveniência de utilização do FIP como

veículo capaz de aglutinar os interesses dos investidores, destinando os recursos captados ao

financiamento do projeto a ser desenvolvido.

Outro ponto da regulamentação do FIP, que também deve ser objeto de destaque, está

relacionado à entrada em vigor, em nosso país, da lei de recuperação de empresas, que visa

permitir que as entidades que se encontrarem em dificuldades, decorrentes de inadequada

estrutura de capital ou de problemas de gestão (aí consideradas, também, as dificuldades

oriundas das características de seu controle acionário).

Todos aqueles que, de um modo ou de outro, já estiveram envolvidos em operações de

recuperação de empresas, ao perceberem que ao menos uma parcela do empreendimento pode

ser recuperada, através da segregação dos setores viáveis da empresa, que atravessa problemas

de liquidez, ou que se defronta com estrutura inadequada de capital, para dar continuidade aos

135

Quando da privatização de empresas estatais, durante a última década, muitos investidores que participaram do

processo utilizaram a estrutura do private equity (através da adaptação do FIA, já referida) para realizar seus

investimentos.

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202

itens do negócio com perspectiva de crescimento, também encontraram dificuldades na

obtenção de novos recursos capazes de permitir o soerguimento da empresa.

Os investidores, capazes de destinar recursos novos para permitir a recuperação da empresa

viável, são reticentes em participar da operação de recuperação, em primeiro lugar, pelo risco

de ficarem contaminados pelos problemas decorrentes da situação delicada em que a empresa se

encontra. De outro lado, os investidores geralmente não estão dispostos a injetar recursos

financeiros na companhia, correndo o duplo risco de (a) permanecer a companhia sob o controle

e a gestão das mesmas pessoas que lá estavam quando do fracasso e (b) ter os recursos

apreendidos pelos credores, que buscam recuperar os valores a que fazem jus.

Por sua vez, o controlador da empresa que se encontra em dificuldade não aceita abdicar do

poder de que é titular sem que esteja seguro de que a recuperação será alcançada, o que apenas

será realidade se houver renegociação com os credores (mediante a qual haja redução dos

encargos, alongamento de prazos e, na maioria das vezes, perdão de parcela da dívida ou

capitalização de uma parte dela).

Finalmente, o credor não aceita renegociar seu crédito se não tiver a perspectiva de,

rapidamente, ver regularizada a situação da empresa, o que apenas ocorrerá se houver aporte de

novos recursos, com substituição da gestão da companhia.

A regulamentação do FIP, editada pela CVM, admite, como já referido, que a integralização

de cotas do fundo criado para empresa em recuperação possa ser efetivada em bens ou direitos,

inclusive créditos, desde que tais bens e direitos estejam vinculados ao processo de recuperação

da sociedade investida e desde que o valor dos mesmos esteja respaldado em laudo de avaliação

elaborado por empresa especializada.

Através do FIP pode ser equacionado o problema acima mencionado, na medida em que o

fundo pode permitir a convergência dos diversos interesses envolvidos, relativos à empresa que

se encontra em situação difícil: o detentor do controle transfere, para o fundo, que será gerido

por empresa independente, escolhida pelos credores, as ações integrantes do bloco de controle.

Ademais, através de uma adequada estrutura de governança do fundo – que pode contemplar

comitês de investimento e de fiscalização, integrado pelos credores e por investidores –, os

interessados no processo ficam habilitados a interferir na gestão do fundo, assim como a

acompanhar os atos que são praticados visando a recuperação.

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Os credores, por sua vez, também podem participar do FIP, os primeiros através da

transferência de seus créditos e encargos (ou de parcelas deles), créditos esses que podem ser

objeto de capitalização na empresa em recuperação e, até mesmo, ser utilizados para integralizar

debêntures de prazo longo, emitidas pela empresa investida. Também estão habilitados, os

credores que assim desejarem, a alienar seus créditos, ou parte deles, a investidores

(especuladores) que desejem participar do processo de recuperação, objetivando ganhar

resultados maiores do que aqueles vigentes no mercado.

De outro lado, os investidores estratégicos, que desejarem assumir o comando da empresa

em recuperação, estarão habilitados a injetar recursos monetários no FIP, que os destinará à

capitalização da empresa investida, ao mesmo tempo em que assumirão papel de destaque na

estrutura de governança do fundo.

Há, ainda, os fornecedores de bens e equipamentos, assim como os prestadores de serviços,

que poderão ser convencidos pela empresa em recuperação a transferir os bens, equipamentos e

créditos de que sejam titulares ao FIP, de sorte a permitir que a unidade produtiva, em processo

de recuperação, possa ter um fluxo de caixa compatível com o estágio em que se encontrar sua

situação econômico financeira, ao mesmo tempo em que possibilitará que tais pessoas

(fornecedores de bens e prestadores de serviços) possam maximizar seus ganhos.

Concluindo, penso não haver dúvidas quanto à contribuição que o FIP certamente trará para

a redução do chamado custo Brasil.

Assim entendo, em primeiro lugar, porque me parece indiscutível que o fundo é capaz de

fazer fluir, para o processo de crescimento e de modernização das empresas nacionais,

expressiva soma de recursos financeiros que antes não estavam disponíveis.

Com o aporte de tais recursos aptos a financiar o desenvolvimento das empresas que operam

em nosso país, e com a contribuição que o FIP dá no processo de gestão da companhia

investida, temos como conseqüência, não apenas o incremento da competitividade (necessário

para fazer a economia alcançar um melhor desempenho), mas também a melhoria nos processos

de produção, que proporciona um inquestionável acréscimo da produtividade nacional, fatores

esses indispensáveis para que se possa obter uma redução do custo de operação de nossa

economia136.

136 Não pode deixar de ser lembrado que, sendo o FIP uma comunhão de recursos, pertencentes aos cotistas do

fundo, os critérios de atuação do gestor quanto à escolha dos projetos a serem objeto de investimentos, assim como

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Outra contribuição relevante que o FIP traz para as empresas investidas, por força do que

estabelece a Instrução CVM 391/03, é a indiscutível melhoria nas práticas de governança das

empresas investidas, que devem observar regras mínimas de organização.

Não podemos esquecer, de outro lado, que o FIP pode colaborar com o setor público no

equacionamento das questões relacionadas à infra-estrutura de nosso país, canalizando recursos

para financiar obras nas áreas de transporte (modernização de estradas e portos) e de

saneamento, isto porque, como visto, o fundo se constitui em veículo ideal para a realização de

investimentos no setor, até mesmo porque a regulamentação admite que ele opere alavancado

(tendo até 30% de seu patrimônio originado de dívida contraída com os cotistas), podendo

investir mediante a subscrição de instrumentos de divida ofertados pelas empresas encarregadas

de desenvolver os projetos.

Finalmente, a possibilidade de o FIP ser utilizado como veículo catalisador dos diversos

interesses envolvidos em processo de recuperação de empresas insolventes certamente é um

fator adicional para ajudar no saneamento das empresas nacionais.

E) Caso

O Primeiro Plano de Recuperação137

da Varig baseava-se em uma garantia aos credores de

que estes efetivamente participariam nas negociações para admissão de novos investidores que

trariam capital para a Varig (art. 35).

O Primeiro Plano aprovado em assembléia de credores criava quatro Fundos de

Investimento e Participação (FIPs), cada um com características individuais, que seriam geridos

por empresas especializadas (conforme regras da CVM). O primeiro FIP (FIP controle) tinha as

ações de controle da Varig. Os outros três FIPs tinham os créditos da Classe I (créditos

o cuidado que ele deve ter no acompanhamento da ação dos administradores das companhias investidas, serão

constantemente avaliados pelos investidores; ou seja, a tendência é que o gestor do fundo busque ser o mais

eficiente possível, não apenas porque deseja assegurar um bom retorno para os investimentos captados, mas

principalmente porque ele sabe que, sendo o seu desempenho avaliado pelo mercado, se ele fracassar muito

dificilmente voltará a operar no mercado. 137

No Processo de Recuperação Judicial, os seguintes meios/ tipos de recuperação podem ser propostos (art. 50 ):

(i) aumento de capital social;(ii) trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída

pelos próprios empregados; (iii) redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo

ou convenção coletiva; (iv) dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de

garantia própria ou de terceiro; (v) usufruto da empresa; administração compartilhada; (vi) emissão de valores

mobiliários; (vii) constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os

ativos do devedor.

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trabalhistas), Classe II (credores com garantia real) e Classe III ( credores sem garantia real e

privilégios especiais).

F) Glossário

Administrador de Fundos de Investimento. Profissional de carteira de fundo de

investimentos, podendo ser pessoa física ou jurídica, com autoridade para comprar ou vender

valores mobiliários por conta do fundo.. O administrador e o gestor estão obrigados a adotar as

seguintes normas de conduta: a) exercer suas atividades buscando sempre as melhores

condições para o fundo, empregando o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo

costuma dispensar à administração de seus próprios negócios, atuando com lealdade em relação

aos interesses dos cotistas e do fundo, evitando práticas que possam ferir a relação fiduciária

com eles mantida, e respondendo por quaisquer infrações ou irregularidades que venham a ser

cometidas sob sua administração ou gestão; b) exercer, ou diligenciar para que sejam exercidos,

todos os direitos decorrentes do patrimônio e das atividades do fundo, ressalvado o que dispuser

o regulamento sobre a política relativa ao exercício de direito de voto do fundo; e, c) empregar,

na defesa dos direitos do cotista, a diligência exigida pelas circunstâncias, praticando todos os

atos necessários para assegurá-los, e adotando as medidas judiciais cabíveis.

O administrador e o gestor devem transferir ao fundo qualquer benefício ou vantagem que

possam alcançar em decorrência de sua condição, admitindo-se, contudo, que o administrador e

o gestor de fundo de quotas sejam remunerados pelo administrador do fundo investido

(Bovespa).

Resgate (em fundos de investimento). Normas que regulam o resgate de quotas de fundo

de investimento: a) o regulamento estabelece o prazo entre o pedido de resgate e a data de

conversão de quotas, assim entendida, para os efeitos desta Instrução, a data da apuração do

valor da quota para efeito do pagamento do resgate; b) a conversão de quotas dar-se-á pelo valor

da quota do dia na data da conversão, c) o pagamento do resgate deve ser efetuado em cheque,

crédito em conta corrente ou ordem de pagamento, no prazo estabelecido no regulamento, que

não poderá ser superior a 5 dias úteis, contados da data da conversão de quotas, d) o

regulamento pode estabelecer prazo de carência para resgate, com ou sem rendimento; e) é

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devida ao cotista uma multa de 0,5% do valor de resgate, a ser paga pelo administrador do

fundo, por dia de atraso no pagamento do resgate de quotas.

O regulamento estabelece o prazo a decorrer entre o pedido de resgate e a data de conversão

de quotas, assim entendida a data da apuração do valor da quota para efeito do pagamento do

resgate. A conversão de quotas se dá pelo valor da quota do dia na data da conversão,

ressalvadas as hipóteses previstas para os fundos de curto prazo, fundos referenciados e fundos

de renda fixa.

O pagamento do resgate deve ser efetuado no prazo estabelecido no regulamento, que não

pode ser superior a 5 dias úteis, contados da data da conversão de quotas, ressalvada a hipótese

de fundos destinados exclusivamente a investidores qualificados.

EnFin. Em casos excepcionais de iliquidez dos ativos componentes da carteira do fundo,

inclusive em decorrência de pedidos de resgates incompatíveis com a liquidez existente, ou que

possam implicar na alteração do tratamento tributário do fundo ou do conjunto dos cotistas, em

prejuízo destes últimos, o administrador pode declarar o fechamento do fundo para a realização

de resgates, sendo obrigatória a convocação de Assembléia Geral Extraordinária, no prazo

máximo de 1 dia, para deliberar, no prazo de 15 dias, a contar da data do fechamento para

resgate, sobre as seguintes possibilidades: a) substituição do administrador, do gestor ou de

ambos; b) reabertura ou manutenção do fechamento do fundo para resgate; c) possibilidade do

pagamento de resgate em títulos e valores mobiliários; d) cisão do fundo; e, e) liquidação do

fundo.

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Otto Eduardo Fonseca de Albuquerque Lobo

Bacharel em direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,

mestre pela University of Miami School of Law e com pós graduação na COPPE

UFRJ, MBP em Óleo e Gás. Foi sócio do escritório Steel Hector & Davis LLP. É

atualmente sócio do escritório Motta, Fernandes Rocha Advogados.