justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

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Justificação do Estado. Liberdade de Expressão e Desobediência Civil

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Page 1: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

Justificação do Estado. Liberdade de Expressão e

Desobediência Civil

Page 2: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

ESTADO DIREITO LIBERDADE

O Estado é uma instituição que

organiza e regula a vida social,

exercendo o seu poder sobre os

cidadãos e manifestando-se sob a forma de

autoridade.

O conjunto de normas e leis que

apoiadas no poder coercivo (imposição de

penas e punições) do Estado que as

elabora e institui regulam o

comportamento dos membros de uma sociedade.

Em sentido político é a

liberdade de optarmos por

diferentes modelos de organização económica e social e de,

consequente, votarmos ou não no partido que

no nosso entendimento mais fielmente defende essas

opções políticas.

Page 3: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

1. A JUSTIFICAÇÃO DO ESTADO – Porque devemos consentir em ser governados e em obedecer a regras exteriormente impostas por uma autoridade externa?

AS TEORIAS CONTRATUALISTAS (Hobbes, Locke e Rousseau)

Caracterização Geral

Uma teoria contratualista é aquela que defende o estabelecimento de um acordo entre vários indivíduos

implicando compromissos recíprocos. A este acordo entre os indivíduos chama-se pacto ou contrato social (porque

estabelecido entre os indivíduos de uma determinada sociedade).

Page 4: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

Finalidade do AcordoEste acordo visa alterar

uma determinada situação na sociedade

que se tornou insustentável,

concretamente o desrespeito pelos

direitos básicos dos indivíduos, desrespeito

esse que gera um estado conflituoso. O

acordo vai permitir eliminar ou reduzir os conflitos na sociedade.

Que compromissos recíprocos são

estabelecidos com o acordo?

Estes compromissos traduzem-se

geralmente no seguinte: todos os

indivíduos comprometem-se a

obedecer a um poder exterior que garanta

uma melhoria das relações entre eles e promova um maior bem-estar geral.

Que poder exterior é esse a que todos os

indivíduos se comprometem a

obedecer?

Esse poder é o Estado. Neste sentido, o contrato

social é uma forma de legitimação do Estado.

As teorias contratualistas que vamos estudar são as de Thomas Hobbes,

John Locke e Rousseau..

Page 5: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

O CONTRATO SOCIAL SEGUNDO THOMAS HOBBES

O Argumento de Hobbes

No estado de natureza assiste-se a uma situação de permanente conflito e medo entre os indivíduos.O permanente conflito e medo entre os indivíduos são insustentáveis.O Estado vai impedir esta situação de conflito permanente entre os indivíduos exigindo a sua submissão em troca da segurança que estabelece.Logo, o Estado é um bem necessário.

Page 6: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

Explicitação

1. Por que razão é necessário um contrato social e por conseguinte a autoridade do Estado?

Para Hobbes, no estado de natureza, o indivíduo vive num permanente estado de violência e de medo, estado no qual ninguém se encontra a salvo e onde a vida de cada um corre sempre um grande risco. Hobbes sintetizou este estado de guerra permanente entre todos com a seguinte expressão: “O Homem é o lobo do Homem”. Os indivíduos não podem continuar a viver neste estado de permanente angústia e temor. Torna-se necessário o estabelecimento de um contrato ou pacto entre todos os indivíduos que salvaguarde as suas vidas e os seus bens.

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2. De que modo Hobbes estabelece este pacto?

Defende Hobbes que, para se instaurar a paz e a segurança na sociedade, é necessário transferir os direitos de todos os indivíduos (direitos esses que eram ilimitados no estado de natureza) para uma pessoa que seria o titular desses mesmos direitos. Esta pessoa, o soberano, estaria acima dos indivíduos e deteria um poder absoluto (detém todos os poderes: poder legislativo, executivo e judicial), não se encontrando submetido a qualquer poder ou lei que não a sua.

3. Porquê transferir os direitos para uma pessoa e não para duas, três ou mais?

Porque, de acordo com Hobbes, ao transferirem-se os direitos para mais do que uma pessoa, regressava-se ao estado de natureza, no qual vários detinham direitos ilimitados.

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4. Porque razão o poder do soberano é absoluto?

Para Hobbes, o soberano não se encontra submetido ao contrato ou pacto estabelecido entre os vários indivíduos, porque nesse caso também estaria limitado pelo pacto e, portanto, limitado ao nível dos direitos como os outros indivíduos. Se todos estivessem igualmente limitados nos seus direitos, não haveria ninguém que pudesse governar os outros.

5. Mas não se pode transformar este poder absoluto do soberano num poder despótico?

Hobbes responde que, mesmo que se transforme num poder despótico, os súbditos não têm direito de resistência (a não ser apenas quando o soberano obriga o próprio súbdito a matar-se – porque também esta situação não ocorria no estado de natureza), porque o seu poder lhe foi confiado legitimamente pelos próprios súbditos a partir de um pacto ou contrato.

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O CONTRATO SOCIAL SEGUNDO JOHN LOCKE

O Argumento de Locke

No estado de natureza os indivíduos possuem certos direitos que não são totalmente respeitados.O respeito pelos direitos individuais é um bem.O Estado vai garantir o pleno respeito de todos os direitos individuais.Logo, o Estado é um bem necessário.

Page 10: Justificação do estado. liberdade de expressão e desobediência civil (2)

Explicitação1. Para Locke, no estado de natureza os indivíduos possuem um conjunto de direitos naturais – o direito à vida, à liberdade e à propriedade – que são, inicialmente, reconhecidos e respeitados por todos, reconhecimento de direitos esse que torna possível a convivência entre os indivíduos.

Verificam-se nesta concepção de estado de natureza de Locke diferenças em relação a Hobbes. Enquanto para Hobbes, no estado de natureza, se assistia a uma situação de permanente conflito e medo entre os indivíduos, um estado de guerra de todos contra todos, para Locke, no estado de natureza, assiste-se a uma situação de convivência e sociabilidade entre os indivíduos, de respeito pelos direitos do outro, como o direito à vida, à liberdade e à propriedade (o direito à propriedade é aqui entendido como o direito sobre o produto do trabalho).

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2. Mas se os indivíduos vivem no estado de natureza numa situação convivencial de liberdade e de responsabilidade, por que razão defende Locke o estabelecimento de um contrato ou pacto social?

De acordo com Locke, a necessidade do estabelecimento de um pacto entre os vários indivíduos tem a ver essencialmente com um factor: os conflitos de interesse que resultam do direito à propriedade privada.

3. Mas por que razão o direito à propriedade privada gera conflitos de interesses?

Para Locke, o direito à propriedade privada começa a provocar discrepâncias de bens materiais entre os indivíduos, de tal modo que passa a haver uns indivíduos que possuem muito e outros que possuem pouco. Esta desigualdade de posses gera conflitos de interesse entre os indivíduos, porque os que possuem muitos bens procuram sucessivamente obter mais bens à custa dos que possuem pouco. Ora, esta situação cria uma dependência dos que possuem pouco em relação aos que possuem muito e, dado que a posse dos bens não se encontra legitimada, geram-se conflitos entre os indivíduos pela posse dos bens.

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4.Como surge e por que razão é necessário o Estado?

É necessário regular estes conflitos de interesses para bem de todos. É com vista a regular os conflitos de interesse que se estabelece um pacto entre os indivíduos. Este pacto social passa pelo reconhecimento de uma autoridade que supervisione e regule esses conflitos e garanta os direitos que os indivíduos já usufruíam no estado de natureza. Essa autoridade será o Estado.

5.Qual é a finalidade do Estado?

O Estado terá como finalidade garantir os direitos individuais básicos (designadamente o direito à propriedade, que no estado de natureza começou a correr alguns riscos) que os indivíduos já possuíam anteriormente à instituição do poder político, legalizando esses mesmos direitos.

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6. O poder do Estado tem limites ou é absoluto?

Tem limites. O estabelecimento do contrato social não implica que cada indivíduo transfira os seus direitos (direitos que cada indivíduo possuía no estado de natureza) para o Estado. O contrato social não anula um conjunto de direitos que o indivíduo já possuía no estado de natureza (o direito à vida, à liberdade e à propriedade). Enquanto em Hobbes havia uma clara separação entre o estado de natureza e o estado civil – encarados como dois estados distintos, residindo no primeiro o conflito e o medo e no segundo a paz e a segurança –, em Locke o estado civil corresponde apenas a uma legalização de direitos que o indivíduo já possuía no estado de natureza, não se verificando, por isso, uma separação tão nítida como em Hobbes.

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8. Por que razão a desobediência civil é neste caso um dever?

Porque no caso de o Estado não cumprir o seu dever – o de fazer respeitar os direitos naturais dos indivíduos –, a situação na comunidade ficaria pior do que a situação vivida no estado de natureza, no qual os direitos eram reconhecidos (mas apenas não se encontravam legitimados). Reconhece-se na teoria política de Locke, pela primeira vez, uma limitação do poder político com a sua consequente subordinação ao consentimento popular.

7. O poder do Estado encontra-se limitado, pois o Estado não poderá interferir ou pôr em causa o direito à vida, à liberdade e o direito à propriedade por parte dos vários indivíduos. O que é que isto vai implicar?

Que os indivíduos apenas obedecem ao Estado se o Estado cumprir as suas obrigações. Quando o Estado não cumprir a tarefa que lhe foi imposta pelo pacto, os indivíduos têm o direito e o dever de desobedecer ao poder político, elegendo para tal novos representantes.

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O CONTRATO SOCIAL SEGUNDO ROUSSEAU

O Argumento de Rousseau

No estado de natureza o indivíduo vive de forma livre e independente.No estado civilizado surgem os conflitos de interesse entre os indivíduos.Os conflitos de interesse entre os indivíduos são um mal.O Estado vai resolver estes conflitos de interesse.Logo, o Estado é necessário.

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1. A civilização corrompe o ser humano.

Para Rousseau, no estado de natureza o indivíduo vive livremente e de forma isolada dos outros indivíduos. Assegura por si próprio a sua sobrevivência e vive feliz. Com a passagem do estado de natureza ao estado selvagem, o indivíduo começa a estabelecer relações com os outros indivíduos, vivendo de forma livre e harmoniosa com os outros. Com a intensificação das relações com os outros surge o estado civilizado. No estado civilizado o indivíduo começa a comparar-se com os outros, verificando que existem uns indivíduos que possuem mais bens materiais do que outros. Ao tomar consciência destas desigualdades e conduzido pela sua inveja, desencadeiam-se os conflitos de interesse, conflitos mantidos com base na força e que põem em causa as liberdades individuais. Neste sentido, para Rousseau, é a civilização que torna o Homem mau. Verifica-se aqui uma importante diferença entre Hobbes (sobretudo este) e Rousseau: enquanto para Hobbes o estado de natureza é caracterizado por permanentes conflitos entre os indivíduos, para Rousseau estes conflitos entre os indivíduos apenas surgem com o estado civilizado.

Explicitação

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Torna-se então necessário regular estes conflitos, não com base na força, mas no direito. Para isso, defende Rousseau a necessidade do estabelecimento de um contrato social.

2. Qual é a finalidade do estabelecimento deste contrato social?

O pacto social tem a finalidade de restabelecer os direitos que o indivíduo já possuía no estado de natureza: a liberdade, a independência e outro direito crucial, a igualdade. Para Rousseau, todos os indivíduos são iguais perante a lei, nenhum tem mais poder do que outro, porque apenas pode haver liberdade num espaço de igualdade entre todos os indivíduos. Esta perspectiva vai influenciar o modo como Rousseau defende o estabelecimento do pacto social: não existe uma relação vertical de poder, mas, antes pelo contrário, o poder é o próprio povo.

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3. Como é que Rousseau concebe o pacto social?

O pacto social é um pacto de associação entre os indivíduos, a partir do qual todos concordam em obedecer a um conjunto determinado de leis, que, por sua vez, foram aprovadas por todos. Com esta obediência a leis por todos aprovadas criam-se as condições para o restabelecimento dos direitos naturais entretanto perdidos – como o direito à liberdade, à igualdade e à independência.

4. Por que razão a obediência a leis por todos aprovadas – à vontade geral – promove e assegura os referidos direitos naturais?

Os direitos naturais básicos são direitos de que todos os indivíduos desejam usufruir na comunidade, porque ninguém quer viver sem liberdade, ser tratado de modo inferior em relação aos outros ou viver na dependência de alguém. Se é desejo de todos os indivíduos possuírem esses direitos e se as leis são a expressão da vontade de todos, então as leis vão certamente promover os direitos naturais. Sendo as leis o reflexo dos direitos naturais, torna-se deste modo possível a convivência social num respeito pelos direitos naturais básicos.

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5. Quem governa?

As leis são, para Rousseau, a única autoridade que existe no estado civil. Sendo as leis a autoridade e sendo as leis a expressão da vontade geral (de todos os indivíduos), então é o próprio povo que passa a ser a autoridade. É o povo que governa. No estado civil, o indivíduo passa a agir, não enquanto vontade particular, mas enquanto vontade geral, vontade de todos.

6. Por que razão é importante que cada indivíduo passe a agir como se fizesse parte activa de uma vontade geral?

Porque se agisse apenas de acordo com a sua própria vontade regressaríamos ao estado civilizado sem leis. Ao agir de acordo com uma vontade geral, está a agir de acordo com um interesse comum e que, como tal, fará também parte do seu interesse. Na teoria política de Rousseau não existe um poder superior aos outros, mas o poder é o próprio povo. Rousseau evita deste modo o despotismo, a subjugação dos indivíduos a um poder com mais força do que a totalidade dos súbditos.

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2.ESTADO E LIBERDADE: Até que ponto é legítimo que o Estado intervenha na vida dos indivíduos? É legítimo desobedecer às leis do Estado?

ESTADO E LIBERDADE INDIVIDUAL

A liberdade individual é um valor fundamental para muitas pessoas. Contudo, a nossa vida em sociedade é regulada por um vasto conjunto de leis promulgadas pelo Estado e que exigem obediência. Devemos respeitar as regras de trânsito, a propriedade alheia, a integridade física dos outros, exceptuando casos de legítima defesa, cumprir as normas de utilização dos espaços públicos (não sair do restaurante sem pagar o que se consumiu) e muito mais. A liberdade não é sinónimo de fazer tudo o que queremos. A liberdade de cada indivíduo deve sofrer as restrições e limites que tornem possível a liberdade dos outros. Mas não haverá aspectos da nossa vida que legitimamente escapam ao controlo social e estatal? Não haverá uma esfera de liberdade pessoal, um conjunto de actividades que legitimamente escapam à intervenção de autoridades externas? Se vou praticar desportos radicais, é legítimo que o Estado intervenha para me obrigar a fazer um seguro? É legítimo ou abusivo que o Estado me proíba de fumar? Que me force a praticar exercício com regularidade? Que declare ilegais certas práticas sexuais?

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MILL EOS LIMITES DE INTERVENÇÃO DO ESTADO

1. Em que condições é justificável a limitação da liberdade de acção de uma pessoa por parte do Estado?

O Estado pode limitar legitimamente a liberdade de acção de uma pessoa se esta causar danos a outras pessoas ou ameaçar prejudicá-las. Somente para prevenir danos a outrem o governo está moralmente autorizado a interferir, impondo restrições à liberdade individual. Este princípio consequencialista é conhecido como princípio do dano (prejuízo).

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2. Onde começa a linha que divide as acções que eventualmente me causarão dano a mim e as acções que podem prejudicar os outros? Que acções podemos considerar como envolvendo somente os meus interesses e que portanto só a mim me afectam?

Por exemplo, posso fumar e embebedar -me em minha casa, posso andar por aí sem roupa, vestir-me em público de forma considerada bizarra, ter práticas sexuais pouco comuns com adultos e com o seu consentimento, professar publicamente o ateísmo, etc. Alguma destas acções prejudica os outros de modo a que legitime uma interferência quer através de leis quer mediante a pressão social? A resposta de Mill baseia-se na crença de que a autonomia individual é um dos valores mais importantes. Mas podemos perguntar se a pessoa que se embebeda frequentemente só causa dano a si mesma. Não acontece em muitos casos que pode transformar a vida dos seus familiares num inferno e deixá-los sem apoio por, devido ao vício, perder o emprego? E o vício não a torna menos capaz de contribuir para a sociedade com o seu trabalho? A resposta de Mill é a de que o indivíduo em causa pode ser punido por descurar as suas responsabilidades familiares, mas que não devemos interferir no estilo e opção de vida das pessoas, mesmo que a sociedade como um todo seja em certa medida prejudicada. A liberdade individual, para o bem e para o mal, deve ser preservada o mais possível.

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3. Podemos sentir-nos ofendidos por comportamentos que consideramos repugnantes e desagradáveis. Será isso razão para que através de leis ou de outros meios limitemos a liberdade de quem provoca tais sentimentos?

A resposta de Mill é claramente negativa. Se a forma de vestir de uma pessoa ofende outras, se as suas crenças religiosas desagradam a muitas, não há razão para que se recorra à força da lei. Na verdade, o conceito de ofensa é pouco objectivo e facilmente encontramos sempre alguém que se sinta ofendido com alguma coisa. O que legitimamente podemos fazer é tentar persuadir essas pessoas a mudar ou então evitá-las e seguir o nosso caminho.

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O PROBLEMA DA DESOBEDIÊNCIA CIVIL: Devo obedecer sempre às leis?

1.O que é a desobediência civil?

É uma acção ilegal não criminosa que por razões éticas protesta publicamente contra leis e medidas das autoridades políticas, estando os seus autores dispostos a sofrer as consequências da infracção da lei.

2.O que transforma a desobediência em protesto moral?

A injustiça das leis ou das suas aplicações.

3.O que distingue a desobediência civil da desobediência criminosa?

A desobediência civil é pública e visa denunciar publicamente injustiças legais, enquanto a desobediência criminosa consiste num acto ilegal cometido de forma tão secreta quanto possível e que não pretende mudar nada que esteja errado. No primeiro caso, a ilegalidade é um meio de combater uma grande injustiça. No segundo caso, infringe-se deliberadamente a lei para benefício próprio e prejuízo da sociedade.

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4. O respeito pela lei é importante porque nenhuma sociedade subsistiria sem a obediência às leis aprovadas. Em que distinção se baseia a desobediência civil?

Baseia – se na distinção entre moralidade (legitimidade) e legalidade. Na Alemanha nazi era possível prender pessoas que não tinham cometido qualquer crime, confiscar-lhe os bens porque tinham sido aprovadas pelo governo leis que o permitiam. Sistemas legais como os da Alemanha nazi ou do apartheid sul-africano mostram que o que é legal — em conformidade com o direito positivo — pode não ser legítimo, ou seja, pode ser injusto.A desobediência civil revela-nos que há uma diferença que nunca deve ser esquecida entre obrigação moral e obrigação política ou jurídica, isto é, uma diferença entre os direitos das pessoas e os deveres dos cidadãos.

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5. Em estados ditos democráticos ou de direito justifica-se a desobediência civil?

As sociedades ditas livres ou abertas são aquelas que procuram evitar abusos de poder negando a qualquer ser humano — governante ou governado, privilegiado ou desfavorecido — o direito de estar acima da lei. Mas as leis podem ser injustas e repressivas e as próprias sociedades democráticas não parecem estar imunes a esta crítica. Ora, nessas ocasiões é habitual verificar-se um desacordo entre a legalidade vigente e os princípios da consciência moral dos indivíduos. Estes não reconhecem legitimidade a uma determinada lei (ou a várias), não a consideram em conformidade com valores morais fundamentais. Assim, a legitimidade ou não das leis define-se em função dos valores que estão na sua base.