jornal lampião - 11ª edição

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2 Edição: Nome dos Editores Edição: Nome dos Editores Abril de 2012 Na Arte dE iNspIrAr... O eSsEnCiAl é InViSíVeL Um título real Pág. 9 O legado da palhaçaria Pág. 11 Jornal Laboratório I Comunicação Social - Jornalismo I UFOP I Ano 3 - Edição Nº 11- Setembro de 2013 ARTE: KÍRIA RIBEIRO | FOTO: DAVI MACHADO A saga de um mito Pág. 10 Plantar, colher e servir Pág. 5 Pé na estrada, garra e determinação Pág. 4

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O Jornal Lampião é uma publicação laboratorial do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto. Produzido pela turma 2010.2, 11ª Edição – Setembro de 2013.

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Page 1: Jornal Lampião - 11ª Edição

2Edição: Nome dos Editores

Edição: Nome dos Editores

Abril de 2012

Na Arte dE iNspIrAr...O eSsEnCiAl é InViSíVeL

Um título real Pág. 9

O legado da palhaçaria Pág. 11

Jornal Laboratório I Comunicação Social - Jornalismo I UFOP I Ano 3 - Edição Nº 11- Setembro de 2013

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A saga de um mito Pág. 10

Plantar, colher e servirPág. 5

Pé na estrada, garrae determinação Pág. 4

Page 2: Jornal Lampião - 11ª Edição

2 Setembro de 2013Edição: Daniela Gurgel e Adriel Campos

Arte: Gustavo Kirchner

A citação poética de Manoel de Barros, que abre este editorial, proclama um modo de olhar e criar relações que gostaríamos de imprimir nesta 11ª edição do LAMPIÃO. Tomamos como norte a arte de inspirar, pois a inspiração é algo que move o ser humano, provoca o imaginário e produz a inovação.

Numa mistura de realidade e imaginação, o jornal vestiu-se de poeta e foi atrás do novo, do desconhecido, do inusitado, ancorando-se em três pilares: construir, inventar e recriar. Buscamos, assim, uma forma prazerosa de você, leitor, envolver seu olhar na nossa proposta de edição.

Adequar-se a um novo estilo de vida, a uma nova forma de educação, seja ela física, mental e/ou social é uma das maneiras de buscar o novo. Fazer algo d’antes nunca feito, viver a arte na rua, alcançar um título,

EDitoriAl

Um jogo de inspirações

Jornal Laboratório produzido pelos alunos do 6° período do curso de Jornalismo – Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA)/ Universidade Federal de Ouro Preto – Reitor: Prof. Dr. Marcone Jamilson Freitas Souza. Diretor do ICSA: Prof. Dr. José Artur dos Santos Ferreira. Chefe de departamento: Profa. Dra. Ednéia Oliveira. Presi-dente do Colegiado de Jornalismo: Prof. Dr. Ricardo Augusto Orlando – Professoras responsáveis: Adriana Bravin (Reportagem), Ana Carolina Lima Santos (Fotografia) e Priscila Borges (Planejamento Visual) – Editor Chefe: Adriel Campos - Secretária de Redação: Daniela Gurgel - Editora de Arte: Kíria Ribeiro - Editor de Fotografia: Davi Machado - Editora Multimídia: Bruna Sudário - Reportagem: Bárbara Zdanowsky, Cibele Souza, Flávia Pupo, Flávia Silva, Íris Zanetti, José Sampaio, Juliana Melo, Lídia Ferreira, Luma Sabóia, Marina Ibba, Samuel Perpétuo, Tácito Chimato, Thainá Cunha e Thiago Novais – Fotografia: Bruna Silveira, Carolina Lourenço, Edan André, Felipe Sales, Flávio Ernani, Gerliani Mendes, Nathália Nunes e Rafael Camara - Diagramação: Ana Clara de Castro, Arthur Medrado, Di Anna Lourenço, Gabriela Costa, Gustavo Kirchner, Marcelo Nahime, Mariana Borba, Pedro Ferreira, Tamires Duarte e Thamira Bastos - Multmídia: Bárbara Zdanowsky, Di Anna Lourenço, Felipe Sales e Gustavo Kirchner - Revisão: Daniela Gurgel, Isabela Azi, Mariana Borba e Núbia Cunha - Monitoras: Isabela Azi e Núbia Cunha Tiragem: 3.000 exemplares. Endereço: Rua do Catete, n° 166, Centro. Mariana - MG. CEP 35420-000

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Fique atento!Sempre que o símbolo ao lado estiver presente na página, não deixe de conferir mais em nos-sa versão online.

www.jornalismo.ufop.br/lampiaoLá você encontrará conteúdos exclusi-vos relacionados a leitura de cada pági-na. Não deixe de conferir!

FAlE ConosCo

Um jornal é tão bonitoUm jornal é tão bonitoTudo escrito, tudo ditoTudo num fotolitoÉ tão bonito um jornalVigilantes do momentoSenhores do bom jargãoFaçam já soprar o ventoSeja em qualquer direçãoQue o jornal é a matériaE o espírito do mundoCoisa fútil, coisa sériaTodo escrever vagabundoUm jornal é tão diversoUm jornal é tão diversoTudo impresso, tudo expressoTudo pelo sucessoÉ tão diverso um jornalNão importa a má notíciaMas vale a boa vversãoNa nota um toque de astúciaE faça-se a opiniãoDe outra feita, quando sejaDesejo editorial

PoEsiA

lAmPEjos

“Vamos atacar as questões mais urgentes, o transporte público, a sinalização, priorizando pedestres e condutores”.Geraldo Simplício, chefe do Demutran – Pág. 3

até então, jamais esperado. Vencer os desafios da vida, despertar uma nova visão, experimentar novos sabores. Voltar um olhar especial para a literatura, a música e o lazer são experiências dignas que afloram a inspiração. Diante disso, o LAMPIÃO transformou estas experiências em narrativas, em matérias de excelente qualidade, e por que não dizer, poéticas, pois a vida é uma grande e inspiradora poesia!

Com o intuito de promover este jogo de inspiração, nós brincamos com as formas, trouxemos os fatos, narramos vidas, ou seja, inspiramos a ação na simplicidade poética de Manoel de Barros.

Incorporar um poeta foi o nosso desafio. O LAMPIÃO imergiu em um universo diversificado e descobriu que, diante da inspiração, o essencial é invisível!

“Pois minha imaginação não tem estrada. E eu não gosto mesmo da estrada. Gosto do desvio e do desver”.

Faça-se sujo o que é limpoTroque-se o bem pelo malUm jornal é tanta genteUm jornal é tanta genteTudo frio, tudo quenteTudo preso à correnteÉ tanta gente um jornalUm que dita, um que escreveUm que confessa, um que menteUm que manda, um que obedeceUm que calcula, um que senteUm que recebe propinaUm que continua honestoUm puxa-saco dos fortesUm que mantém seu protestoUm que trafica influênciaUm que tem opiniãoUm jornalista de fatoUm rato de redaçãoUm jornal é igual ao mundoUm jornal é igual ao mundoTudo certo, tudo incertoTudo tão longe e pertoÉ igual ao mundo um jornal

“Não chamamos os jogadores de atletas, mas sim de família”. Givanildo Gonzaga, preparador físico – Pág. 9

“Pelo amor de Deus, conserta meu guarda-chuva pra mim? E nesse ‘pelo amor de Deus’, já vai completar uns 20 anos ou mais que eu trabalho nesses consertos”.João Luís dos Santos, consertador de guarda-chuva – Pág. 10

“Tem que vir da cabeça. O dedo faz a coreografia sobre o instrumento. A gente não faz a música. Ela faz a gente”. Ian Guest, músico e compositor – Pág. 6

“Que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamen-to que a coisa produza em nós”.

Manoel de Barros

O jornal Gilberto Gil

“Fazemos isso porque acreditamos que, através dos livros, o ser humano pode ser cada vez melhor e a leitura pode sim, mudar vidas”.Fernanda D’Angelo Tonidandel, coordenadora da Osquindoteca - Pág. 8

“O palhaço é o imperfeito em um mundo que pretende ser perfeito”.Palhaço Furreca - Pág. 11

Arthur MedrAdo

EntrE olhArEs

ChArGE

Page 3: Jornal Lampião - 11ª Edição

3Edição: Cibele Souza e Edan André

Arte: Pedro Ferreira

Setembro de 2013

Insegurança no trânsito

#EunoLampião

Praça Tancredo Neves, Centro de Mariana, às 14h30: os flagrantes da imprudência de pedestres, ciclistas e motoristas apontam um dos principais fatores que aumenta o risco de acidentes

Surpresas e perigos são constantes no trânsi-to de Mariana. Os proble-mas vão desde pedestres que não respeitam a si-nalização a veículos que transitam em alta veloci-dade. Em locais onde o trafego é intenso, é possí-vel observar como a cida-de tenta conciliar suas an-tigas estruturas com os 54 mil habitantes.

Nos últimos anos, devi-do à expansão da minera-ção, houve um aumento na quantidade de veículos, o que tem gerado engarrafa-mentos e diversos transtor-nos no trânsito. De acordo com dados do último cen-so do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2011 Maria-na possuía 17.650 veícu-los e, em 2012, passou a contar com 19.595, o que representa um crescimento de 11% ao ano. Como consequência cres-

tirar o carro.” A falta de respeito dos

motoristas é o que dei-xa a fotocopista Fernanda Rocha mais indignada. “O carro para na faixa de pe-destre e, quando você vai atravessar a rua, vem uma moto desesperada. Se ele tá vendo que o carro pa-rou, por que a moto não para?”, questiona.

Segundo o Boletim Es-tatístico do Observató-rio Nacional de Segurança Viária, de 2013, basea-do na Seguradora Líder e nos Danos Pessoais Cau-sados por veículos Auto-motores de Via Terrestre (DPVAT), nos casos de invalidez permanente os motociclistas representaram 75% e os condutores de automóveis, 20% do total das indenizações pagas.

Para melhorar o fluxo de veículos e pedestres na cidade, foi elaborado um Plano de Mobilidade Urba-na, que já se encontra em

ceram os riscos de aciden-tes nas vias da cidade, muitas vezes provocados pelo desrespeito à sinaliza-ção, como nas faixas de pedestres. Foi o que acon-teceu com o cadeirante e aposentado Edésio Perei-ra, que fraturou o pé ao ser atropelado na Avenida Getúlio Vargas, Centro de Mariana, enquanto atraves-sava na faixa. “O motoris-ta me deu preferência, deu sinal para eu passar na fai-xa e, na hora que eu passei com a cadeira, ele avançou o carro”, contou.

De acordo com Edésio, o motorista somente parou o veículo para dar assistên-cia “porque o pessoal se-gurou ele”. O cadeirante precisou fazer fisioterapia após o acidente e enfren-ta agora outros obstáculos. “Onde eu faço fisioterapia, todas as vezes que eu che-go lá tem carro na rampa, tenho que esperar eles vi-rem para ver se conseguem

Etapas do plano de mobilidade urbana

Crescimento da frota de veículos e expansão da mineração exigem mudanças no planejamento viário da cidade

Cibele Souza

eDAN ANDRÉCIDADE

Repetir, repetir até ficar diferente.Manoel de Barros{ }

Transporte coletivo urbano: rotas para percurso

mais ágilTáxi: regulamentação Sinalização

Acessibilidade para pedestres e deficientes

Estacionamentos: Parquímetro

Estudo de criação do Moto Táxi

Em julho passado, lançamos a cam-panha #eunolampião. Além de ir às ruas ouvir a população, abrimos espaço nas redes sociais para que você, leitor, lan-çasse sua opinião sobre o que precisa ser mudado em Mariana.

BRuNA SuDáRio

fase de licitação. O De-partamento Municipal de Trânsito (Demutran) infor-mou que a empresa esco-lhida terá de oito meses a um ano para implan-tar todas as etapas previs-tas (veja no Box). “Vamos atacar as questões mais ur-gentes, o transporte públi-co, a sinalização, priorizan-

do pedestres e condutores”, afirmou o chefe do Demu-tran, Geraldo Simplício.

Além disso, são realiza-das campanhas de educação no trânsito para conscienti-zar a população. “Hoje nós temos um setor educativo que trabalha nas escolas e dar palestras também em algumas empresas”, lem-

brou Simplício.Diversas atividades es-

tão programadas para a Semana Nacional de Edu-cação no Trânsito, que acontece de 12 a 25 des-te mês e conta com pa-lestras, exposições, cam-panhas, rua de lazer e apresentações culturais em diversos pontos da cidade.

E

Recebemos manifestações sobre diver-sos temas que abrangem o sistema públi-co da cidade. Os setores mais criticados foram: saúde, educação, política, plane-jamento , segurança, serviços públicos e patrimônio.

Confira as opiniões:

“Mariana precisa ser melhorada na questão da saúde pú-blica, onde as condições são precárias”. Jéssica Silva, 20 anos, coordenadora, Santa Rita de Cássia

“Acredito que o transporte público deva ser, significamente, melhora-do em Mariana. Além disso, o preço dos imóveis é algo que deveria ser bastante revisto”. Júlia Maria Muniz, 19 anos, estudante, Centro

“Mais segurança nas escolas e nas ruas”. Cristiele Carolina, 21 anos, balconista, Rosário

“A cidade precisa de várias questões básicas: educação, saúde e segurança pública. Política e políticos deveriam estar em co-munhão, promovendo o bem coletivo. Está passando da hora!”. Jacqueline Antunes, 49 anos, pedagoga e professora, Jardim dos Inconfidentes

“Um concurso público para eleição dos diretores das escolas já se-ria um bom começo. Em Mariana, na maioria das escolas munici-pais ainda são usados os métodos do nepotismo e da troca de favo-res. A escola Wilson Pimenta Ferreira, localizada no Santo Antônio (Prainha) e onde eu estagio, passou por uma profunda crise políti-ca esse ano por conta desse problema”. Lucas Oliveira, 20 anos, estudante do curso de Letras, Centro

FoNte: DepARtAmeNto muNicipAl De tRâNSito

Nas ruas e praças de Mariana, moradores opinam sobre a administração pública.

Page 4: Jornal Lampião - 11ª Edição

4 Edição: Flávia Pupo

Arte: Thamira Bastos

Setembro de 2013

Entre quitutes, legumes e uma boa conversa

EducAção

Flávia PuPo

São cinco horas e já é possí-vel ouvir o galo cantar. É manhã de sábado. No estacionamento ao lado do Centro de Conven-ções Alphonsus de Guimaraens Filho o dia já havia amanheci-do antes mesmo de o sol raiar. É dia de feira livre em Mariana.

No Brasil, o costume veio com os portugueses e há regis-tros de feiras desde a época co-lonial. Em Mariana, ela existe há cerca de três décadas. Em seu início o comércio não era tão organizado; hoje as 37 barra-cas são montadas na noite ante-rior. Assim, quando o sol nasce elas já estão prontas para rece-ber os produtos. É hora de co-meçar a festa. Sim, as feiras li-vres são como uma festa onde as pessoas podem conversar e até comer um bom tropeiro en-quanto fazem suas compras.

Com uma rica diversidade, você encontra desde alimentos para uma boa salada até pane-las de pedra e artesanato. E não se espante se vir um galo fugin-do da gaiola. Você não está no

lugar errado, ele também está à venda.

– Tenho sapucaia, sim senho-ra – escuto a feirante Maria Cla-ra Cota responder a cliente. E indago:

– Sapuca, o que? – e Dona Maria, que vende a sapucaia e outras plantas medicinais, me explica: ela é retirada de uma árvore brasileira. Muito usada como remédio natural para do-enças como diabete e inflama-flamações, mas não serve só pra isso, pois suas sementes são co-mestíveis como a da castanha do pará e têm o mesmo valor nutricional.

FeirantesJá passa das 10 horas e o

movimento começa a diminuir. Quando penso em ir embora, algo chama minha atenção: é a barraca da Dona Roseli da Sil-va, que há 12 anos atende to-dos seus clientes com carisma e um jeitinho encantador. Além disso, ela é a atual presiden-te da Associação da Feira Livre de Produtores Rurais de Maria-

na. A maioria dos produtos ven-didos na feira provém de agri-cultura familiar da região, “mas tem gente que vem de longe também”, completa Roseli.

Segundo ela, “a prefeitura queria que ficasse só o povo da cidade, mas não tem gente sufi-ciente para atender o movimen-to que costuma ter aos sába-dos. Eles têm incentivando muito para melhorar a plantação daqui para que fique só a gente mes-mo. É uma ideia bacana de in-centivar a produção local”, diz.

A manhã de sábado vai che-gando ao fim. As barracas co-meçam a ser desmontadas e a maioria dos produtos já foi ven-dida. É hora de levantar as man-gas, juntar as coisas e ir embo-ra. Semana que vem, todos os feirantes estão de volta. Nesse dia, tente parar alguns minutos para perceber as boas energias que esse lugar produz. Você irá se surpreender com a experiência incrível que é ficar do lado de fora da feira, observando e re-descobrindo esse lugar cheio de cores e vida.

Os desafios em busca de um futuro melhor

Samuel PerPétuo Sair de casa às seis da manhã

e retornar à noite, essa é a ro-tina de muitos marianenses que precisam dividir o dia entre tra-balho e faculdade.

O acesso ao ensino superior no Brasil vem crescendo nos úl-timos anos, por isso, o Governo Federal tem investido nesse se-tor, com programas como: Rees-truturação e Expansão das Uni-versidades Federais (Reuni), que já ampliou mais de 850 mil va-gas em universidades públicas, e o Programa Universidade para Todos (Prouni), que já concedeu mais de 1,2 milhão de bolsas em universidades particulares.

Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-tística (IBGE), divulgada em maio último, revelou que diplo-ma de nível superior aumenta o salário em 219,4%. Nessa bus-ca por melhorias na vida profis-sional, muitas pessoas que não tiveram a oportunidade de in-gressar na faculdade ao concluir

o ensino médio, hoje estão lo-tando as salas de faculdades e universidades em todo o Brasil.

DificuldadesEsse é o caso do guarda mu-

nicipal, Aloísio Junior, que mes-mo já estando empregado, está em busca de qualificação profis-sional. Apesar de Mariana pos-suir quatro instituições de ensino superior, Aloísio precisa deslo-car-se para outro município.

Ele trabalha durante o dia e estuda Educação Física, à noi-te, em Ponte Nova, que fica a 69 quilômetros de Mariana. Um dos motivos é que as faculda-des particulares de sua cidade não oferecem o curso. Ele disse que tentou o vestibular da Uni-versidade Federal de Ouro Preto (Ufop), mas não teve bons re-sultados. O ingresso nas univer-sidades públicas exige disponi-bilidade de tempo para que os candidatos consigam se preparar para a seleção e uma boa forma-ção no ensino médio.

Assim como Aloísio, o técni-co em manutenção mecânica Re-nato Roberto precisa enfrentar a estrada todos os dias para estu-dar em outra cidade. Prestes a se formar em Engenharia Indus-trial Mecânica, em Ouro Bran-co, a 44 quilômetros de Mariana, ele afirma que trabalhar e estu-dar em outra cidade pode atra-palhar no desempenho dos estu-dos. “Particularmente acho que atrapalha, pois em alguns dias o rendimento após o serviço é fra-co. A escola demanda um tempo grande para estudos e trabalhos em casa. Ainda temos a dificul-dade do trajeto entre a empresa onde trabalho e a escola”.

A pedagoga e Vice-Reito-ra da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Célia Maria Fernandes Nunes, acredita que o aluno que trabalha durante o dia inteiro pode ter uma formação com a mesma qualidade que o colega que se dedica em tempo integral aos estudos. “A motiva-ção e o desempenho do aluno

ao longo do curso é que auxilia-rá a sua formação durante todo o ensino superior. Com certeza, é isso que fará a diferença após a conclusão do curso e a in-serção no mercado de trabalho”.

GastosA Prefeitura de Mariana não

possui nenhum plano de apoio a estudantes nessa situação. Di-ferente de Itabirito, distante 61 quilômetros, que disponibiliza vans sem custos para alunos que estudam em outra cidade.

Além de todo o esforço, pessoas como Aloísio e Rena-to possuem muitos gastos com transporte e alimentação por pre-

cisarem se deslocar para outra cidade. Segundo Aloísio, juntan-do todos os seus gastos com fa-culdade, alimentação e transporte seu investimento fica em apro-ximadamente R$ 1 mil por mês, mesmo dividindo os custos da gasolina com o amigo Fernan-do Morais.

O dia só termina para os dois por volta de meia-noite quan-do retornam para casa. O tempo que sobra para descansar é cur-to, pois às seis da manhã eles já estarão de pé para começar um novo dia de trabalho. Segundo ele, a rotina é difícil, mas o sa-crifício vale a pena pelo retorno que terão no futuro.

cAROL teixeiRA

Apesar dos programas do Governo Federal e do aumento das vagas em universidades, conciliar emprego e estudos é um obstáculo

BRUNA SiLVeiRA

Para estudar, Aloíso Jr. (em pé) e Fernando Morais viajam diariamente

cIdAdE

Dona Roseli vende pães, biscoitos e doces caseiros na feira livre de Mariana

As coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveisManoel de Barros{ }

BRUNA SiLVeiRA BRUNA SiLVeiRA BRUNA SiLVeiRA

Page 5: Jornal Lampião - 11ª Edição

5Edição: Luma Oliveira

Arte: Marcelo Nahime Jr.

Setembro de 2013

Orgânicos para saúde e almaForam 17 quilômetros

de estrada de Mariana até o Distrito de Monsenhor Horta. De lá até o nosso destino, não esperávamos que houvesse ainda muito chão pela frente. Em uma estrada de terra, repleta de verde e com diversas ca-choeiras pelo caminho, se-guimos a direção indicada pelos moradores do local até o Sítio Nova Esperan-ça. Na chegada, fomos re-

cebidos por um sorridente senhor, o nosso anfitrião, que nos aguardava atrás de uma porteira, na entrada do seu sítio.

O amanhecer foi ape-nas mais um complemento para deixar a nossa entre-vista ainda mais agradável. Em meio à combinação de cores e mistura de texturas, encontra-se a horta do agri-cultor Waldir Pollack, 67 anos. Nascido na cidade de Itaguaçu (ES), e morador do subdistrito de Paraca-tu de Baixo, Waldir pas-sou a dedicar-se à produ-ção de produtos orgânicos após o falecimento da sua esposa, vítima de câncer, aos 40 anos.

Ao descobrir que a do-ença, segundo diagnóstico médico, fora causada pelo consumo de alimentos con-tendo alto teor de agrotó-xicos, o agricultor come-çou uma intensa pesquisa, juntamente com a médi-ca veterinária e instruto-ra do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Se-nar), Michelle Azevedo. Juntos, levaram 28 cursos para a região, oferecendo novas oportunidades aos moradores da zona rural.

Em uma área de 600 metros quadrados, cober-tos, Waldir realiza a produ-ção por meio de compostos e adubo orgânico. “Cresci em torno do plantio. Nun-ca concordei em queimar mato e usar veneno para pragas. A natureza se faz sozinha”, afirma o produ-tor, que descartou a hidro-ponia, técnica que utiliza a água, por não ser to-

talmente isenta de química.Em um ritmo acelerado

de trabalho, Waldir conta com uma ajudante, Zélia Ana Batista, e com três es-tagiários da Escola Técnica Paulo Freire, para produ-zir mais de 40 hortaliças, como alface, cenoura, cou-ve, tomate, dentre outras, que são levadas todos os sábados à feira livre de Mariana e distribuídas, às quartas, em cerca de 50 casas da cidade.

A produção segue o sis-tema de rotação de terra. Os alimentos orgânicos, além de serem isentos de adubos químicos e agrotó-xicos, também são livres de drogas veterinárias, hor-mônios, antibióticos e re-síduos que poluam a água ou o solo. Durante o cul-tivo não são usados adi-cionais químicos sintéticos como corantes e aroma-tizantes. O produtor ain-da explica que a rotação é feita para que o solo se recomponha dos nutrientes absorvidos por cada uma das espécies plantadas, as-sim sempre estará fértil para novas plantações.

Em Mariana, é possível encontrar produtos orgâni-cos na feira, ao lado do Centro de Convenções Al-phonsus de Guimarães, aos sábados, a partir das sete horas, nas hortas comunitá-rias e, também, nos merca-dos que recebem esses pro-dutos de distribuidoras da região. Os produtos vin-dos de distribuidores che-gam embalados e possuem o selo que identifica a pro-dução orgânica.

Luma OLiveira Os produtos orgânicos

são mais saudáveis, pois são livres de agrotóxicos, hormônios e produtos quí-micos, além de possuírem um alto valor nutricional, explica a nutricionista e professora pesquisadora do Instituto Federal de Edu-cação Ciência e Tecnolo-gia do Sudeste de Minas, Juliana Andrade. “Há uma grande diferença em nível nutricional entre os alimen-tos orgânicos e os produzi-dos de forma convencional. Os orgânicos possuem di-ferença acentuada no con-teúdo de alguns minerais. Eles são muito mais sabo-rosos e fazem bem à nos-

sa saúde, apresentando uma variedade de nutrientes e vitaminas essenciais para o bom funcionamento do nosso corpo”.

Na hora das compras, os alimentos mais bonitos e os mais baratos são sem-pre os escolhidos, porém, o que é mais atrativo aos olhos pode ter sido cultiva-do utilizando uma série de agrotóxicos. Por isso, nem sempre os alimentos com mais peso ou cor represen-tam melhor qualidade.

A única desvantagem dos alimentos orgânicos para o convencional é o

preço, por serem produ-zidos em uma escala me-nor e por terem custo de produção maior, eles aca-bam se tornando mais ca-ros. Entretanto, o barato pode sair caro, porque os alimentos cultivados com agrotóxicos podem causar doenças crônicas, câncer, sobrecarga hepática, dentre outras enfermidades.

Desconto para quem preservaBárBara ZdanOwsky

Todo ano, os proprietá-rios de imóveis pagam ao município o Imposto Pre-dial e Territorial Urbano (IPTU), que visa à obten-ção de recursos financeiros para investir em serviços de limpeza urbana, manu-tenção das vias públicas e segurança. Em Ouro Pre-to, desde janeiro de 2012, os cidadãos que contri-buem com a sustentabilida-de e preservação do meio ambiente recebem isenção parcial do imposto.

Os inscritos no progra-ma “Quem preserva paga menos” podem receber des-contos, de até 20%, so-bre o valor do IPTU. Esse desconto varia de acordo com a contribuição do ci-dadão: 5% para aqueles que comprovarem ter siste-ma de captação de água da chuva ou de energia solar em casa, e 10% do valor para o proprietário do imó-vel que estiver inserido no programa de coleta seletiva do município.

O programa de incenti-vo à preservação foi cria-do pela Lei Municipal 113/2011, de 27 de de-zembro de 2011, e é de

MEIO AMBIENTE

Fotos: Gerliani medes

Luma OLiveira

Por uma vida mais saudável

autoria do ex-vereador de Ouro Preto, Flávio An-drade (PV). “A ideia do ‘Quem preserva paga me-nos’ é fazer com que as pessoas que se preocupam com o meio ambiente te-nham algum benefício fi-nanceiro”, explicou.

De acordo com o su-pervisor de tributos imobi-liários de Ouro Preto, Fe-lipe Almeida Pinho, neste ano, cerca de cem pessoas receberam o desconto so-bre o valor do IPTU. A maioria dos inscritos bus-cam 10% de desconto pela coleta seletiva.

Para se inscrever no programa, o interessado deve preencher o formulá-rio disponível no site da Prefeitura de Ouro Preto (www.ouropreto.mg.gov.br), e anexar fotos das insta-lações (no caso de capta-ção de água da chuva ou de energia solar), ou deve buscar seu comprovante de participação da coleta sele-tiva em uma das associa-ções responsáveis pelo ser-viço. Em seguida, é feita uma verificação na proprie-dade. Caso esteja tudo re-gularizado, é concedido o desconto ao proprietário do

imóvel no ano seguinte à inscrição.

Ouro Preto não tem uma política pública de coleta seletiva, por isso, o serviço é realizado pela Associação de Catadores de Materiais Recicláveis da Rancharia (Acemar) e pela Associa-ção de Beneficiamento e Reciclagem do Lixo Am-biental e Preservação Am-biental (Associação do Pa-dre Faria).

A coleta acontece de segunda à sexta-feira, das 8 às 17 horas. Ainda são poucas as pessoas que se-param o lixo reciclável, e as rotas dos caminhões não são fixas. Fazem parte da rota os bairros Bauxita, Sa-ramenha, Vila dos Enge-nheiros, Jardim Alvorada, Vila São José, Centro, Ca-beças e Vila dos Operários.

Há ainda a opção de levar o material reciclável para as sedes das associa-ções, nos endereços: Rua Diamante, 18, Jardim Ita-colomy (Acemar), e Rua Desidério de Matos, S/N, Padre Faria. Os telefones para contato são: 3552-3063 (Acemar) e 3559-3265 (Associação do Pa-dre Faria).

A horta orgânica exige tratamento diferenciado e mais cuidados

Escolher alimentos sem agrotóxicos é um hábito de consumo saudável

O selo é a garantia de procedência de cada produto comercializado

Em Mariana, a produção agrícola sem agrotóxicos já é realidade

Veja como receber os descontos do programa

Sistema de coleta

seletiva: 10%

Sistema de captação de água de chuva:

5%

Sistema de captação de energia solar: 5%

20%

Eu via a natureza como quem a veste.Manoel de Barros{ }

Um prato nutritivo e variado resume toda essa história

Há dez anos, o produtor Waldir dedica-se a sua plantação

metal

vidro

pape

l

plás

tico

Page 6: Jornal Lampião - 11ª Edição

6 Edição: Íris Zanetti, Lídia Ferreira e Thiago Novais

Arte: Tamires Duarte

Setembro de 2013

detalhes. A vida de cidade grande é corrida e as coi-sas passam despercebidas. Às vezes, eu penso ‘por que estou correndo tanto?’ A gente tem que dar um tempo para a gente. Viver cada minuto. Levantar, fa-zer alongamento. Ler... A leitura me inspira muito.

-Inspiração é algo que vem da alma. Deus co-locou dentro da gente. O que me inspira é a própria criação.

Na Praça do Jardim, duas das quatro irmãs apo-sentadas de Brasília, em viagem por Mariana: Fran-ces Soares Vieira, 58 e Valkíria Rocha, 64.

-O que é inspiração?-É uma coisa de

respirar?! Brincando no Jardim:

Vitor Soares, seis anos.

Íris Zanetti O LAMPIÃO foi às ruas

de Mariana para saber: “o que te inspira?”

-O que me inspira? Vocês!

-A gente?-É... a mulher. A natu-

reza, a vontade de viver. A música.

-Vocês são músicos?-A gente engana. Mas

inspiração é tudo isso aqui, esse convívio, as amizades. O que faz a gente deixar um legado.

Sentados dentro da Casa de Cultura, Tarcísio de Je-sus, 67 anos e Francisco Assis, 63, membros da Cia. Musical Uns e Outros.

-O que é inspiração para você?

-Ah, é difícil. É o ar. É o fogo da gente.

Encerrando o trabalho na Praça do Jardim: Efigê-nia da Conceição, 52, gari.

Ao ver sua loja, a tal da inspiração me visitou. Eu, que queria uma entre-vista para falar dela, ago-ra a recebo com prazer. Andando pela Rua do Ca-tete, em Mariana, passei pela ourivesaria Aliança, de Dionísio Ferreira, abri as portas para a inspiração e entrei.

O rapaz de 24 anos era bem simples, do tipo que só fala para respon-der algo. Percebendo isso, fui logo perguntando, até que ele se empolgou com o rumo da conversa. Com um sorriso torto ele con-tava que, quando está pra baixo, fica quietinho num canto e as ideias apare-cem. Minutos se passa-ram e de apreensivo ele passou a relaxado, e pa-

coisa é parar de ser adul-to”. Sentado numa pol-trona confortável, explica com simplicidade que pre-za pela arte com estéti-ca, não com ética. Fala da criação como algo para si, sem certos e errados, sem vaidade. “O importante é a não-qualidade”.

Cerca de dez minutos de prosa, Ian se dirige ao piano, a passos ágeis, para demonstrar algumas obras. Fascinante! Os dedos ha-bilidosos, que ele apelida de “macacos de circo”, es-palharam belas harmonias pela casa. “Tem que vir da cabeça. O dedo faz a coreografia sobre o instru-mento. A gente não faz a música. Ela faz a gente”, comenta numa pausa – o silêncio que ele aprendeu a ouvir para criar.

“Se os olhos veem com amor o que não é, tem ser” Humana e plural: a

inspiração de cada um

“Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundância de ser feliz. Meu quintal é maior que o mundo (Manoel de Barros)”.

“Precisamos desfazer o normal da cidade para reinventá-la! (Manoel de Barros)”.

Íris Zanetti

thiago novais

- O que é inspiração?-Inspiração é uma coisa

que a gente tem que ter. Se tiver, seu trabalho sem-pre sai bom.

-E o que te inspira?-Fazer coisas diferentes,

bem feitas, com amor. Não é só pelo patrão, é pela gente também. Tem que cozinhar com amor para tudo.

Acabando de preparar o almoço no restaurante Ran-cho: Maria Aparecida de Souza, 58, cozinheira des-de os 16.

-O que te inspira?-Me inspira? Eu vejo

pássaros, como esse aqui agora, e eu fico toda feliz, toda inspirada. As monta-nhas também me inspiram. Tenho vontade de mostrar para os meus netos e meus filhos.

-É, tem que observar os

Um olhar de quem cria

Da casa sem divi-sórias, ecoou a inspira-ção para esta escrita. O húngaro de cabelos bran-cos, sobrancelhas escuras e grossas e de sorriso ca-rismático falou da palavra como quem é de casa - daquela, sem paredes para as ideias. “Nunca fiz tanta música boa como depois que vim morar aqui”, diz o músico e compositor Ian Guest, 73 anos.

Vinícius de Morais cantou que “pra fazer um samba com beleza é pre-ciso um bocado de tris-teza”. Fazendo jus às palavras do poetinha ca-marada, com quem com-pôs algumas canções, Ian, entusiasmado, define ins-piração: é emoção... com uma pitada de ingenuidade da infância. “A primeira

“Eu sou da invencionática”

“Até fez uma pedra dar flor”

Ian Guest

Dionísio Ferreira

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Flávio Ernani

Page 7: Jornal Lampião - 11ª Edição

7Edição: Íris Zanetti, Lídia Ferreira e Thiago Novais

Arte: Tamires Duarte

Setembro de 2013

recia sentir prazer em fa-lar do que faz. “Já traba-lhei como eletricista, e em outros trabalhos, mas isso é diferente. Sento ali e o tempo passa”, disse, apon-tando para o seu cantinho, sua oficina, onde trabalha, no ouro, com a alma. Lu-gar de encontro com seu íntimo.

Enquanto contava que herdou essa paixão de seu pai, Abílio Ferreira, olha-va vagamente para o nada, como quem sonha acorda-do. Lembrava que cresceu ouvindo o martelo baten-do. Que quando via o ser-viço do pai, esse lhe dava alguns metais sem valor para criar peças. Hoje sabe do valor do seu trabalho: “cada um tem um gosto, e minha inspiração é ten-tar satisfazê-lo”.

“Se os olhos veem com amor o que não é, tem ser” Não é para compreender,

é para incorporarLÍdia Ferreira

Subjetiva. Real. Abstra-ta. Concreta. Pode sur-gir da sutileza do cotidia-no, que constrói olhares. Por vezes vai ao encon-tro da arte. Tem contra-to com o amor. Não tem hora marcada, nem mesmo preferências. Alguns espe-ram por ela, outros a pro-curam. De onde ela vem? De qualquer lugar do mundo. Há até quem acre-dite que ela seja um dom. Faz pensar que existe uma força maior. Ou acreditar que no meio da noite ou no claro do dia ela esco-lhe aparecer, e aí nos res-ta deixar levar.

Sua origem vem do latim, e das explicações em dicionários encontra-mos seu conceito material: ação pela qual o ar pene-tra nos pulmões. Das con-versas entre esquinas ou nas mesas de bar ouvimos que é um estado da alma, quase sempre passageiro. Dirá a ciência que é quan-do a percepção do real ou

a ideia é coberta por afe-to, ou pelo sentimento que aquilo traz, junto à capaci-dade de transcender e ob-jetivar essa percepção no real. “Ela precisa ser cons-truída no mundo. É na significação do real que acontece a inspiração”, ex-plica a psicóloga Sandra Augusta de Melo.

E por mais que ela goste de chegar sem avi-sar, sem nem mesmo pedir licença, sua autoridade não a torna dona da arte, como muitos pensam. É ape-nas subsídio. “O proces-so artístico não é apenas a inspiração, mas é toda uma área de conhecimen-to. Tem a ver com predis-posição de sentir o coti-diano, suas relações, suas lembranças. É um modo de ver e expressar o mun-do. A inspiração está liga-da à fase de nutrição artís-tica e estética”, alertou o professor de artes cênicas, Davi de Oliveira.

Misturada ao vento. Sobrenatural. Por defini-ção religiosa, a inspiração

– divina – está vinculada a origem da escritura sa-grada, a Bíblia. Ela ga-rante que o conteúdo dos textos bíblicos – Velho e Novo Testamentos – este-ja isento de erros. “Inspi-ração é o processo da re-velação divina, é Deus que se comunica com os ho-mens, é a tradução dessa revelação nos escritos bí-blicos. Ela é um dom do Espírito Santo, é um ca-risma”, confirmou o Padre Geraldo Dias.

Subsídio. Dom. Quan-do se concretiza transfor-ma-se em música, poesia, escultura. Vemos em cena, no palco. Torna-se concre-ta, mas nem sempre ma-terial. Pode ser individual ou coletiva. Mas não se li-mita. Pode ser encontrada nos sabores, na caminhada, na profissão, na natureza, no convívio, na amizade, em um sorriso, e até nas montanhas. Com frequên-cia habita o mundo dos prazeres. É nômade. Com inúmeras origens, sotaques e explicações ela não tem dono. É de quem quiser. É de quem procura.

“ E tem mais: as andorinhas, pelo que sei, consideram os andarilhos como árvore (Manoel de Barros)”.

Um deles sentou-se no palco. Corpo e pés a al-guns palmos do chão. O outro na primeira fila, lu-gar da plateia. Didito Ca-millo e Marcelino Xibil Ramos são da Estandarte Cia. de Teatro. A com-panhia artística, que é re-ferência em Ouro Preto, há nove anos faz princi-palmente teatro de rua e possui um trabalho pau-tado na cultura popular brasileira.

Através de uma ana-logia entre o mundo que vivemos e as artes cêni-cas, contaram sobre o que para eles é a inspiração. “Quando se tem uma ideia é preciso abrir um leque de informações sobre o

LÍdia Ferreira

assunto. É necessário vi-venciar outras coisas, sen-tir, observar”, disse Didito. “Vivenciar é importante. A inspiração precisa estar em sintonia com a vida, é pre-ciso ter verdade, ter pul-sação”, acrescentou Xibil.

As opiniões se comple-tavam e ambas destacavam a importância do trabalho no fazer artístico. “Uma ideia sem trabalho não é nada, é só uma ideia ruim que eu descartei”, afirmou Didito. Falaram desse pro-cesso de concretização da ideia no mundo real, da tentativa e do erro. Do corpo e da alma em cena, de deixá-los dizer além da voz. De fazer com que a energia que não é visível seja sentida em palco.

E com um sorriso sin-cero Marcelino Xibil con-cluiu: “mas o que nos dá prazer é o que realmente nos inspira”.

Um olhar de quem cria

“Até fez uma pedra dar flor”

“É preciso transver o mundo”

Didito Camillo

Xibil Ramos

Flávio Ernani

Flávio Ernani

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Page 8: Jornal Lampião - 11ª Edição

8 Edição: Flávia Silva e Thainá Cunha

Arte: Arthur Medrado

Setembro de 2013

Com lazer e imaginação, a Osquindoteca desperta o interesse pela leitura em crianças e jovens de Passagem de Mariana

Alphonsus de Guimaraens entre memória e esquecimento

Thainá Cunha

Já dizia o escritor Monteiro Lobato que “um país se faz com homens e livros”, e foi pensan-do em contribuir para a forma-ção de pessoas apaixonadas por leitura que uma garagem virou uma biblioteca comunitária no distrito de Passagem de Maria-na. Com mais de seis mil livros em seu acervo, a Osquindoteca funciona desde 2009, promoven-do atividades de fomento à lei-tura, contação de histórias, ofici-nas, mostras, palestras e exibição de filmes.

As ações promovidas pela Osquindoteca fazem parte do Clube Osquindô, Associação Cultural de Passagem, que rea-liza diversos projetos sociais na região. Os projetos são mantidos através de Leis de Incentivo à Cultura e editais. O local que já atrai pelas cores fortes na facha-da, traz em seu interior um uni-verso mágico de livros, brinque-dos, jogos, histórias, invenções e diversão de sobra, que surpre-endem quem visita pela primei-ra vez.

A conquista das crianças e jovens também veio a partir de iniciativas diferenciadas, como o Projeto Loucos por Leitura, o varal com reconto dos livros, um mural com os melhores li-vros indicados pelos leitores e a criação do Godofredo, um gato leitor que incentiva a leitura por meio da imaginação infantil e leva sua mala de histórias para escolas da região.

De acordo com a coordena-dora da Osquindoteca, Fernanda D’Angelo Tonidandel, cerca de 20 crianças por dia frequentam o local e mais de 600 estão cadas-tradas. Para ela, “há uma resis-tência na cultura da região com relação à leitura, o que não im-

pede o trabalho”. “Fazemos isso porque acreditamos que, através dos livros, o ser humano pode ser cada vez melhor e a leitura pode sim, mudar vidas”.

Fernanda afirma que a dife-rença da Osquindoteca para uma biblioteca “comum” é que “aqui conhecemos a maioria do nos-so público e oferecemos ativi-dades que o envolve cada vez mais com o local, com a nos-sa cultura e a arte, de uma for-ma geral”.

LeitoresAinda segundo ela, “o desejo

é criar cada vez mais redes de leitores e fazer com que a Os-quindoteca seja um elo de pes-soas engajadas na causa”. E essa realidade já está mudando, con-

Preto (Proex/Ufop). “Os proje-tos levam alunos de cerca de 15 escolas, de Santa Barbara, Ouro Preto e Mariana, tanto públicas quanto particulares, dos ensinos médio e fundamental, além do público adulto, a lerem, produzi-rem textos literários e recriarem as obras de Alphonsus no sarau que acontece em março, na Se-mana de Museus em Mariana” , informou a coordenadora do mu-seu, Ana Cláudia Rola.

DesvalorizadoAlphonsus foi um grande po-

eta simbolista do Século XIX, admirado por escritores como Mário de Andrade, que veio a Minas especialmente para conhe-cer o “solitário de Mariana”, e Carlos Drummond de Andrade que até escreveu um poema so-bre o encontro dos dois poe-tas. Hoje, porém, “não passa de uma placa: aqui nesta casa nas-ceu o poeta Alphosus de Gui-maraens’ e nada mais encon-tramos a sobre o poeta”, diz,

desolado, o escritor e pesquisa-dor José Efig enio Pinto Coelho, integrante da Academia Ouropre-tana de Letras.

Há momentos na história de Alphonsus de Guimaraens que se fundem à história de Mariana. Entre as amizades dele estava Gomes Freire, importante políti-co da cidade e um dos respon-sáveis por trazer a ferrovia para Mariana, dono também do jor-nal em que o poeta escrevia, O Germinal.

Vale lembrar também que foi a convite de Gomes Frei-re, que Alphonsus escreveu o hino do bicentenário da cidade, que é cantado até hoje nas fes-tividades. O hino relata a fase pós-Ciclo do Ouro na cidade, afirmando que seriam as futu-ras gerações as responsáveis por acabar com o marasmo em que Mariana se encontrava. Alphon-sus de Guimaraens foi poeta, cronista, juiz e jornalista, deixou muito mais que uma herança fí-sica, mas uma herança cultural.

Flávia Silva

Depois de aproximadamen-te quatro anos fechado, come-çaram este ano, no museu Casa de Alphonsus, as obras de rees-truturação do prédio. “Por meio de recursos próprios do Esta-do, a primeira fase do proje-to de revitalização do espaço já foi concluída, com a contratação de projetos arquitetônicos, estru-turais e complementares para a reforma do edifício”, afirmou o superintendente de Museus e Ar-tes Visuais, da Secretaria de Es-tado de Cultura de Minas Ge-rais, Leonardo Bahia.

Mesmo com o museu fecha-do, as atividades culturais não foram interrompidas, como o “Cantando Alphonsus”, “Alô Po-esia” e “Alphonsus vai à es-cola”, que são projetos de in-centivo aos estudos da obra de Alphonsus de Guimaraens exis-tentes desde 1984. Desde 2001, passaram a integrar parceria com a Pró-reitoria de Extensão, da Universidade Federal de Ouro

Aparecida Silva, da Escola Mu-nicipal de Passagem de Mariana, “esses pontos de difusão da cul-tura e da leitura são muito im-portantes porque também funcio-nam como um local de encontro dos moradores; as crianças e jo-vens daqui eram carentes com relação a isso. A Osquindoteca possui uma parceria muito inte-ressante com as escolas e nós sempre orientamos os alunos a frequentá-la”.

Os moradores da região po-dem ter acesso gratuito a livros de autores renomados, como Ga-briel García Marquez, Eça de Queiroz, Agatha Christie, Mon-teiro Lobato e muitos outros, a partir de um cadastro realizado na Osquindoteca. O local fica aberto ao público de segunda a

forme garante a estudante Júlia Rocha Gomes, sete anos. “Amo esse lugar, porque já gostava de ler antes e agora leio ain-da mais. Adoro vir pra desenhar também e sempre que venho, vou embora só quando fecha”, afirma.

Quando está de folga, o su-pervisor Eduardo Júnior de Pai-va, 35 anos, leva sua filha de três anos para ter seus primei-ros contatos com a literatura na Osquindoteca. Segundo ele, “é importante incentivar a leitura desde cedo. Acho que a comu-nidade deveria aproveitar ainda mais o local, porque ele se tor-nou uma referência para Passa-gem, com atividades que reme-tem a sua história também”.

Para a pedagoga Simone

Há várias maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é a verdadeira.Manoel de Barros{ }

Quarta-feira: Jogos in-fantis, das 15h15 às 17h30

Quinta-feira: Cine Go-dofredo, das 15h15 às 17h30

Sexta-feira: Senta que lá vem a história, das 15h15 às 17h30

sexta-feira, das 10 às 13h e das 15h às 18h e funciona na Rua do Comércio, 625 em Passagen de Mariana. Mais informações pelo telefone: (031) 3557-5260

CulTurA

Os livros na Osquindoteca säo separados por faixa etária; a estudante Stella Tonidandel, 11 anos, prefere os de histórias infanto-juvenis

Felipe sales

Atividades:

Reinventando histórias

No seio dolente das idas idades Em meio ao silêncio , fiquei a sorrir... A Deusa de outrora só tinha saudades, Chorando o passado , esperando o porvir!

Entre os coros das litanias Que vêm do céu, na asa do luar, Vivo de mortas alegrias, Sempre a sonhar, sempre a sonhar!

Quem é que me vem perturbar o meu sono De bela princesa no bosque a dormir? Que há muito caiu sobre o solo o meu trono, Que era emperolado de perlas de Ofir!

De estrelas o céu sobre mim recama; Há luz no zênite e clarões no nadir... O campo auriverde da nossa auriflama, É todo esperança: esperei o porvir!

Agora bem sinto, no peito, áureos brilhos; De novo me voltam as perlas de Ofir... Aos doces afagos da voz dos meus filhos, Mais belas que outrora, eu irei ressurgir!

Alphonsus de GuimaraensHino de Mariana

Page 9: Jornal Lampião - 11ª Edição

9Edição: Neto Medeiros, Thainá Cunha e Tácito ChimatoArte: Di Anna Lourenço

Semtembro de 2013

Lições do futebol Flores que mudam vidasTáciTo chimaTo

A precoce eliminação na Taça BH de Futebol Jú-nior - cinco derrotas em cinco jogos - não é motivo para desanimar a Seleção de Mariana. Além da es-treia em competiçoes pro-fissionais, o time conquis-tou a inédita Copa Estrada Real de Futebol Amador 2013, com apenas uma derrota em 16 partidas.

Segundo o treinador da Seleção, Thiago Freitas, esse título veio com o tra-balho conjunto de comissão técnica e jogadores. “Todos interagiram muito bem. Sa-bemos a hora de falar sé-rio e de brincar. Depois de três meses trabalhando de forma unida, é gratificante um resultado desses”.

Para Thiago, o diferen-cial da conquista veio na forma como todos enca-ram o trabalho. “No ge-ral, a Seleção era montada para a disputa da Copa e no resto do ano ficava pa-rada. Hoje, não queremos mais parar, queremos ou-tros campeonatos”.

Assim, a Taça BH foi o início de um trabalho pro-fissional com a Seleção. “Vamos continuar mais unidos do que nunca”, dis-se o técnico, após a pri-meira derrota do time para o Guaicurus F.C.

Essa seriedade se refle-te no discurso do supervi-sor do time e preparador de goleiros, Wagner Flávio Ramos, o Waguinho, mi-nutos antes do treino no campo do Guarany. “Espe-

ro a colaboração de todos para que esse não seja só o nosso segundo passo. A partir de agora, quero con-centração. Essa é a oportu-nidade da vida de vocês”.

FamíliaUm dos preparadores fí-

sicos do time, Givanildo Gonzaga, destacou a im-portância do grupo unido em torno de um único ob-jetivo: a evolução indivi-dual. “Não chamamos os jogadores de atletas, mas sim de família”. Para a co-missão técnica, jogadores e todos que acompanham o time não restam dúvidas: mais do que formar joga-dores, a missão é formar cidadãos. Informação con-firmada pelo goleiro Marco

Thainá cunha

Com a chegada da Pri-mavera, o LAMPIÃO mer-gulha na arte de recriar jornais, revistas, tecidos, plásticos, sacos, garrafas pets e madeiras em flores artesanais. O trabalho feito pelo grupo Maria das Flo-res, da Casa Maria Isabel, reinventa histórias de vida no distrito de Passagem de Mariana.

A casa, criada há qua-se cinco anos, envolve 11 mulheres com idades de 30 a 66 anos para traba-lhar com o material reci-clável. Uma sede decorada por flores coloridas, corti-nas, pinturas e murais para inspiração em novos traba-lhos artesanais.

A idealizadora e coor-denadora da casa, Marilu Motta, 66 anos, afirma que teve a ideia a partir da vontade de trazer um tra-balho diferenciado à Pas-sagem. “Quis criar flores com esse material, porque acredito que a mulher é um pouco flor, ela é deli-cada por natureza. O que fazemos aqui dentro é uma espécie de terapia, pois não possuímos nem renda fixa e o trabalho é voluntário”, conta.

O material reutilizado pelo grupo é fruto de doa-ção dos próprios moradores do distrito, e a casa onde elas se instalam é alugada por Marilu. A artesã Tere-sinha Alexandrina da Costa e Silva, 59 anos, conta que “no começo, nem acredita-va que era possível trans-formar algo que tratamos como lixo pra fazer flores. Agora tudo que eu vejo, imagino se transformando em rosas” diz. Para a arte-sã Elizabeth Lara da Silva, 51 anos, que está no grupo há três meses, “esse é um trabalho artístico, algo bo-nito de se ver e mais ainda de se fazer parte. É mui-to gratificante ser uma das Marias das Flores”.

A artesã Cláudia Ma-ria Zadra Peixoto, 59 anos, afirma que o trabalho com as flores mudou a sua vida. “Estou envolvida no grupo desde o início e isso mu-dou minha visão com re-lação a tudo que jogamos fora, que pode ser recria-do e ter outras possibilida-des de utilização. O artesão tem uma alma de artista e as flores me inspiram du-rante o meu dia, isso já faz parte da minha vida”.

A Casa Maria Isabel está aberta para visitação às quartas e quintas-feiras, de 13h às 16h, na Rua do Comércio, nº 599, Passa-gem de Mariana.

O truco talvez seja o jogo de cartas mais baru-lhento que existe. Não há uma “mão” sem algazarra. O da Barra não foge à re-gra. Totó lembra-se dos jo-gadores que agitavam as partidas como ninguém. “Os que gostavam de fazer uma gracinha, infelizmen-te, Deus levou. Seu Tatão, Ronaldo Sabiá, Baiano Ji-boia”, recorda-se.

Assim como a cruz que protege a ponte do mau agouro, o truco da Barra se junta à paisagem e ao coti-diano de Ouro Preto, feito harmoniosa curva barroca.

União e entrosamento levam Seleção de Mariana à disputa do primeiro campeonato profissional

Wagner Ramos, supervisor do time, se reúne com jogadores antes do treino para motivar a equipe rumo a novas conquistas

A tradição das cartas na ponte

No truco da Barra, em Ouro Preto, os olhares atentos dos jogadores acompanham cada movimento das partidas

Considerado o joga-dor destaque do time, Ro-naldo de Paula, o Sinha, foi longe: artilheiro da Copa Estrada Real aos 17 anos, agora joga a sé-rie A do Brasileirão pelo Vitória (BA), após dispu-tar o primeiro campeonato profissional de sua carrei-ra .“Quero ser profissio-nal, lógico. Quem aqui não quer?”, indaga.

Sinha nasceu em Maria-na, no Bairro da Prainha, e mal lembra como começou a jogar bola. “Sei que era goleiro”. Aos 12 anos, foi convocado pela primeira vez para o Olympique, de Mariana. Depois foi para a equipe do seu bairro até

ser convocado pelo Clu-be Guarany, onde jogou por três anos e foi para o Marianense F.C. “Aí fui convocado pela Seleção e depois fui pro Valério do Rio Doce, de Itabira”.

O jogador fala com alegria dos últimos meses junto à Seleção “Foi muito bom. Levamos o nome de Mariana muito longe. Foi uma experiência incrível”. E destaca: “tivemos mui-to apoio da comissão, nos-sa diferença não ficou só no preparo. Também faci-lita muito o fato de ser-mos amigos. Conheço o Tulinho (goleiro) há mui-to tempo, já jogamos junto fora da seleção”, conclui.

neTo medeiros

Coringa. Letrado. Cata-tau. Se essas palavras te seduzem é provável que você já tenha se reunido a alguns senhores em um lu-gar especial de Ouro Pre-to. Se não, tentarei levá-lo a este universo. Todos os fins de semana e tam-bém nos feriados, homens de diversas idades se reú-nem para jogarem truco no descansadouro, um vão que fica na Ponte da Barra, que une o bairro homônimo ao do Antônio Dias.

A cada rodada o trio perdedor cede o lugar na

Artilheiro nato

Confira o ensaio no site:http://migre.me/fSGvK

TOCOObjeto quadrado, semelhante a um dado, geralmente de madeira que contem os números 2, 4, 6, 8, 10 e 12 correspondentes à pontuação da rodada.

PÉ OU FECHADO O úlltimo competidor da rodada a jogar. É sempre ele quem distribui as cartas.

MÃO Competidor que inicia a rodada.

MANILHAS ( Maiores cartas)*Da esquerda pra direita

Coringa ou CopãoLetrado7 de RataCatatau*usadas no jogo da Barra

ENTENDA O TRUCO

mesa aos de fora, os cha-mados “sapos”. São eles quem animam as partidas. As cadeiras, a sombrinha, a mesa, os tocos e o ba-ralho são cedidos pelo co-merciante Nelson Ferrei-ra, 61 anos. É no Bar do Nelson, no início da ponte, que os jogadores adeptos da caninha recarregam suas energias. “O truco da Bar-ra surgiu quando um rapaz que trabalhava na Brah-ma daqui resolveu fazer um campeonato relâmpa-go, desde então não parou mais. Isso tem uns 20, 25 anos”, relata Nelson Totó,

como é chamado o sim-pático comerciante da Rua Antônio Martins, nº 37.

Nelson Totó conhece bem cada jogador do truco da Barra. “O mais sacana é o Celé. Tem muito jogador bom. Dico Dobrada. Tem o Deca Picareta. Os ruins são o Terêncio e o Tobias, que não joga nada”. Tobias da Silva, 54, o sanfonei-ro, discorda de Nelson. “O melhor sou eu né?” Diz. Tobias joga na ponte desde que o truco começou. Ali-ás, a maioria dos compe-tidores já está na chamada melhor idade.

Túlio Mendes, o Tulinho, de 19 anos, eleito atleta re-velação da Copa,.

Para ele, o entrosamento vai além do campo. “Quan-do se joga há tanto tem-po com as mesmas pesso-as você acaba aprendendo com todos. Na vida, você tem ser educado em todo lugar. Respeitamos muito um ao outro, e em todas as equipes que joguei, nun-ca vi um time tão unido”.

Lições que fazem ques-tão de levar para fora do campo. “ Esses meninos trabalham, estudam, e tam-bém levam a sério o time”, conta o técnico. Ele afirma que buscam seu melhor, dentro e fora do gramado, representando a cidade de Mariana.

Bruna silveira

rafael Camara

É no ínfimo que eu vejo a exuberância.Manoel de Barros{ }

Arte: Neto Medeiros

ESPORTE ARTE

Page 10: Jornal Lampião - 11ª Edição

10 Edição: Daniela Gurgel

Arte: Ana Clara de Castro

Setembro de 2013

Juliana Melo

Vivemos numa era em que as coisas são descar-

táveis. Com toda facilidade que te-mos, nos desfazemos daqueles objetos

que não nos são mais úteis e logo adquiri-mos algo novo. Andando pelas ruas de Maria-

na, me deparei com uma cena um tanto quanto di-ferente: uma oficina de guarda-chuvas. Atentei para isso em meio ao movimento da Ave-

nida Manoel Leandro Corrêa, onde mora o Seu João Luís dos Santos, 80 anos. Ele não é apenas mais um dos inúme-

ros moradores da avenida, mas um consertador, um recriador. A oficina, instalada na garagem de sua casa, abriga centenas de

guarda-chuvas: pretos, coloridos, estampados, novos, velhos, repa-rados ou quebrados. Com ar humilde e acolhedor, ele recebe bem

a todos que procuram por seus serviços. A história desse consertador começou há pelo menos 20 anos,

quando seus familiares começaram a lhe pedir que consertasse algumas sombrinhas que estavam com defeitos. A partir daí outras pessoas solicitavam o mesmo favor com frequên-

cia. “Pelo amor de Deus, conserta meu guarda-chuva pra mim? E nesse ‘pelo amor de Deus’, já vai completar uns 20 anos ou mais que eu tra-balho nesses consertos”, lembra Seu João, com alegria estampada no rosto.

Foi aí que ele começou a exercer seu dom de pensar novas pos-sibilidades para antigos objetos.

A clientela é variada: irmãs de caridade, padres, médicos e gente de todo tipo o procuram. São pessoas não só de Mariana, mas também de Ouro Preto, Acaiaca e Ponte Nova. A oficina é tomada por inúmeros guarda-chuvas, alguns esquecidos, abandonados por seus donos, uns ele guarda, os bons ele vende, e os ruins ele doa. Mas Seu João diz que a verdade é que as pessoas só se lembram realmente do consertador de guarda-chuvas quando a chuva vem. Mesmo assim, ele exerce seu trabalho com paixão e a paciência de um verdadeiro reparador.

É como retrata o poeta Manoel de Barros: “As coisas não que-rem mais ser vistas por pessoas razoáveis: elas desejam ser olhadas de azul, que nem uma criança que você olha de ave”. É o olhar de pessoas razoáveis, de pessoas comuns que acaba com a poesia, com a possibilidade de recriação. O olhar comum não consegue ver nelas qualquer sentido, acabando por enxergar apenas definições e palavras com seus significados convencionais. Seu João com toda sua criativida-de, paciência, atenção e cuidado consegue extrair de um objeto aparente-mente perdido, um novo recomeço, e é isso que o diferencia dos demais.

R

eparo

s de guarda-chuva Uma outra história real

de Muzinga? Teria ele si-do coroado e dado início a primeira festa do congado e reinado? Teria ele, “mes-mo”, adquirido a mina on-de trabalhou?

Maria Bárbara de Lima passou boa parte de seus 97 anos cuidando deste mito. Um de seus filhos redescobriu a mina da En-cardideira enquanto brinca-va nos fundos de sua casa, que fica no Bairro Antônio Dias, isso no final da dé-cada de 40. A doce Dona Mariazinha, como era co-nhecida por todos, se foi no último 7 de julho, vés-pera do aniversário da ci-dade patrimônio mundial.

Ouro Preto também é referência para o Conga-do mineiro. O doutoran-do em Museologia e Pa-trimônio pela Universidade Federal do Estado do Rio

neto Medeiros

Ao digitar o nome “Chico Rei” no Google, o primeiro resultado que aparece é uma marca de camisas. Coisas da indús-tria cultural que se apro-pria dos costumes e das tradições, inclusive da sa-ga de um rei. A história de Galanga começa do outro lado do Atlântico. Arranca-do do Reino do Congo pa-ra ser escravo numa mina de ouro em Vila Rica, veio com vários malungos, ter-mo dado aos escravos que chegavam vivos após resis-tirem ao navio negreiro. Lá ele era rei, e repetiu aqui sua nobreza, depois de al-forriar seu povo e construir a igreja de Santa Efigênia, no Alto da Cruz.

As narrativas e refle-xões em torno de Chico Rei, o “herói negro”, que teria vivido em Ouro Pre-to no ápice da corrida do ouro, ainda hoje provo-cam reflexões, tradição e fé. Teria mesmo vivido por aqui o herói africano pai

de Janeiro (Unirio) Hugo Guarilha investiga o ritual. Apesar de não haver com-provação por meio de ves-tígios materiais, os adep-tos do Congado em Minas Gerais acreditam na exis-tência do escravo, batiza-do de Francisco. “O fato é que nós não temos nenhu-ma materialidade que con-firme a existência de Chico Rei. Não existe documen-to. Para os congadeiros ele existiu, e a memória des-sa coletividade é construí-da com base no reconhe-cimento dessa existência”, diz Guarilha.

A professora integrante da Comissão Ouro-Pretana de Folclore e da Associa-ção dos Amigos do Reina-do de Nossa Senhora do

Rosário e Santa Efigênia (Amirei), Solange Palazzi, defende a existência do he-rói com veemência. “Em primeiro lugar, nenhum mi-to surge do nada. Se você for a qualquer Congado de Minas Gerais e perguntar quem te ensinou a fazer o Congo ele vai falar: Chico Rei. Ouro Preto ainda não teve a grandeza de colocá-lo no mesmo patamar de Zumbi dos Palmares”.

Alguns pesquisadores discordam da existência do personagem e questionam a narrativa do livro “Chi-co Rei”, de Agripa Vas-concelos, publicado na dé-cada de 60 e que inspirou o filme Chico Rei, de Wal-ter Lima Júnior, na década de 80. Para alguns estudio-

sos do tema, a construção do mito, feita pela obra, é racista. Autor de “A atua-lização das tradições: per-formances e narrativas afro-brasileiras” (2012), Rubens Alves da Silva diz o seguinte no capítulo em que trata do tema: “Chico Rei é um mito que mere-ce ser ouvido e lido com desconfiança, pois não dei-xa de ser uma invenção de intelectuais representantes da elite mineira que, ao se aventurarem no arrisca-do mundo das letras, não abriram mão dos interesses coletivos como arauto de um discurso dominante”.

Quem também afirma que a narrativa é precon-ceituosa é o historiador e professor do Centro de En-sino à Distância da Uni-versidade Federal de Ouro Preto (Cead/Ufop), Antô-

nio Marcelo. “A história do Brasil é uma história branca. Tudo que fosse re-volta de uma plebe deve-ria ser esquecida. Não há nada que prove a existên-cia de Chico Rei. Den-tro da ordem mercantilista não existe mina improduti-va. Sem estimular revoltas, ele compra a mina. Você tem um negro europeizado. O que é mais interessan-te: dizer que o congado é ligado aos negros quilom-bolas que lutaram de for-ma selvagem pela liberda-de, ou dizer que a tradição é ligada a um lord inglês, que por acaso era um ne-gro, que comprou sua li-berdade sem derramar uma gota de sangue? Por favor, né?”, afirma.

Para Guarilha e também para o vocalista da ban-da Galanga, Juliano Men-des, a existência de Chico Rei não é relevante. “Se ele existiu ou não é o que menos importa”, afirmam os dois.

CulturACr

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O olho vê. A memória revê. A imaginação transvê.Manoel de Barros{ }

As narrativas em torno de Chico rei permeiam a memória coletiva entre o mito e a verdade

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Page 11: Jornal Lampião - 11ª Edição

11Edição: Marina Ibba

Arte: Mariana Borba

Setembro de 2013

De pai para filhoVestindo a menor máscara do mundo,

recolhe sorrisos por onde passa. Dos pi-cadeiros às praças, os palhaços encantam até os mais distraídos, e as crianças não podem faltar. “Furreca é o Sr. Eduardo Dias, e Sr. Eduardo Dias é o Furreca”, se apresenta. Natural de Belo Horizonte, veio para Mariana cursar História e por aqui ficou, se casou e teve dois filhos, que enchem seus olhos de admiração.

Alice, 11 anos, e Francisco, cinco, ex-perimentaram o palco aos três anos, quan-do manifestaram interesse em participar das apresentações do pai, que recorda cada momento com muito orgulho e ad-miração. Observadores, arriscam até fazer análises críticas dos espetáculos que assis-tem em família.

Palhaço Dudu foi batizado Furreca em 2003, em um almoço com um amigo que se confundiu ao contar uma história e usou esse nome. A identificação foi ins-tantânea e ainda se mantém. “Depois co-mecei a refletir sobre a escolha e vi que foi muito perti-nente. Sou filho, sobrinho e primo de caminhoneiro e até hoje não ti-rei minha carteira de motorista. Meu primeiro número solo leva o nome de Carrinho e nasceu antes do Furreca”, conta.

Francisco, antes de subir ao palco como palhaço Lambreta, gostava de se aventurar nos bastidores. Assistia as apre-sentações de Furreca na cochia, de olhos atentos na plateia e no palco.

Recebeu-me pela manhã. O café esta-va na mesa, cuidava da louça na pia. Os biscoitos que Francisco gosta já espera-vam que ele acordasse.

Brinca como uma criança e sua crian-ça o acompanha. Eduardo fala sério sobre o papel social e transformador do palha-ço. Enquanto isso, faz desenhos dobran-

do o pano de prato que também recebe toques especiais de Francisco, de poucas palavras e olhos atentos ao pai.

“O palhaço, o poeta do riso, é essen-cial para a mudança porque ele é o der-rotado, o que apanha, mas não oferece a outra face. Ri de si mesmo, mas princi-palmente ele é o desajustado que não se enquadra no mundo social e, sim, mostra outra forma de ser. Para mim, a maior li-ção que ele passa é: ‘olha para mim, eu sou assim mesmo e posso ser tantos ou-tros do meu jeito’. O palhaço é o imper-feito em um mundo que pretende ser per-

feito”, ensina.Furreca e Lam-

breta subiram ao palco na Praça da Sé, no Encontro de Palhaços, em

Mariana, em 2011, em grande estilo. Na apresentação da peça “Que problema tem isso?” o trapalhão Dedé Santana dividiu a cena com os dois e surpreendeu seu fã Eduardo, que de tanto sorrir, chorou.

Esse homem que provoca um misto de sensações ao se despir de vaidades, colo-car sua máscara e revelar-se para o pú-blico, também busca o riso e a reflexão através da arte, em outros projetos. Re-cém-escolhido delegado de cultura de Ma-riana, Eduardo, além de se preparar para representar a cidade na Conferência Esta-dual de Cultura, trabalha para a manuten-ção de um pequeno teatro, sede da Asso-ciação Orquestra e Coro Mestre Vicente.

O objetivo nobre é transformar o espaço em um centro cultural.

Sobe ao palco na cozinha de casa, com uma bola de malabares nas mãos, me conta que para promover a transfor-mação social é preciso se unir, pois o “trabalho é de formiguinha”.

A arte do palhaço, que se paga com sorrisos sinceros, corre as veias e extra-vasa em poesia. Arte que invade os es-paços, da decoração com miudezas fei-tas à mão, do grafite no muro que se vê na janela da cozinha até a bexiga azul, sorriso de canetinha que chega ligeira no meio do papo, acompanhada de passi-nhos silenciosos do menino que me es-pia. Eu precisava lhe devolver a atenção de seu pai.

Um encontro marcado com o circoFlávia PuPo

De longe ouço o palha-ço: hoje tem marmelada? Tem, sim sinhô. Hoje tem goiabada? Tem, sim sinhô. Hoje tem palhaçada? Tem também, sim sinhô. Res-peitável público, com vo-cês, há 13 anos em cena: o Circovolante.

A praça está lotada com gente de todas as idades, que chora, que ri, que se envolve. O picadeiro está pronto e o espetáculo nas ruas já vai começar.

É exatamente assim que Mariana fica durante o En-contro Internacional de Pa-lhaços, promovido desde 2009 pelo Circovolante. O grupo foi criado em janei-ro de 2000, pelos artistas João Pinheiro e Xisto Si-man. Vindos de Governa-dor Valadares, eles sabiam que daqui não iriam embo-ra tão cedo. Segundo Xisto Siman, 43 anos, a ideia do

Encontro surgiu da possibi-lidade de criar um evento que reunisse artistas, mas que também tivesse uma aproximação com a comu-nidade. “As pessoas que-rem esse evento, elas pro-curam, e você vê que as pessoas que já vieram, vol-tam e vão em peso pra rua”, afirma Xisto.

Com muito suor e tra-balho, o Circovolante che-ga esse ano à quinta edi-ção do evento, contando com o apoio financeiro de empresas, da Prefeitura de Mariana e do Prêmio Fu-narte Carequinha de Estí-mulo ao Circo.

InteraçãoA iniciativa do Circovo-

lante busca um diálogo im-portante na relação com a comunidade. A pesquisado-ra da história do circo no Brasil, Ermínia Alves, 59 anos, afirma que “não é à

toa que a cidade aparece para vê-los, porque durante o ano inteiro tem um tra-balho muito forte deles, e isso faz parte de um pro-jeto artístico, político, so-cial e cultural que envol-ve todos os moradores de Mariana”.

A Cia Lunática é par-ceira do Circovolante des-de o 1º Encontro e, pela terceira vez, realiza o Ate-liê Riso In Formação, em sua sede, no distrito de Passagem de Mariana. As atividades começaram em agosto e terminam na se-mana anterior ao evento.

A atriz Josélia Alves, 43, integrante da Lunática, completa. “Quanto ao pú-blico e ao fato de que as atividades do Encontro de Palhaços sempre ficarem lotadas, imagino que tenha a ver com a maneira como é feita a produção: de for-ma afetiva, que considera

TáciTo chimaTo Ouro Preto, patrimônio

mundial da humanidade. Centenas de turistas nas ruas, com câmeras foto-gráficas a postos e dinhei-ro para comprar lembran-ças. Festas o tempo inteiro, dentro das casas antigas. E bem ali, ao pé da Rua Di-reita, um grupo de teatro realiza uma intervenção.

A moça está senta-da com um saco de frutas cheio de lixo na cabeça e diversos objetos sob um ta-pete, cada um com um va-

lor anexado. Alguns param, olham rápido, e vão em-bora. Comentam entre si, riem. A maioria, só passa.

Onde estão as fotos dessa moça? Nenhum turis-ta parou enquanto estive lá. Vale mais uma lembrança do Fórum, em frente. Al-guns estudantes passavam olhando, mas logo subiam a ladeira. Os comerciantes, cansados da jornada de tra-balho, corriam para o pon-to de ônibus.

E quem são esses que ficam na rua? Quem vê ali

a oportunidade de crescer? No auge da minha infân-cia, sentado à noite com minha mãe vendo o tele-jornal, lembro-me das cha-madas sobre assaltos e roubos na rua. Aí cresci, e, óbvio, saia com meus amigos. Minha mãe dizia: “cuidado, volta cedo, hoje apareceu no jornal...”, e contava um caso tenso so-bre alguém que estava dan-do mole na rua. “A rua não é para ficar dando bo-beira, não seja besta, se for atender telefone, entre em

algum lugar, não converse com ninguém”. Pobre da-queles, que ficam em casa, imaginando as coisas e não conhecem os “bestas”.

Os tolos. Os guerrei-ros. Aqueles que veem na rua a oportunidade de ex-por o que são. Ora, para onde vão os músicos, arte-sãos, atores e atrizes, que não trabalham recebendo um daqueles cachês de no-vela? Não cabe todo mun-do no palco. Mas na rua cabe tudo. E lá estão eles pintando, vendendo, marte-

lando, cantando, escreven-do, fotografando, atuando, jogando, rindo, vivendo.

E, você, viu? Você no-tou o senhor sentado nas escadarias da Igreja da Sé nos finais de semana, jo-gando conversa fora com quem passa e venden-do seus badulaques? Você conversou com algum deles?

Se palavras tivessem valor, ah... eles seriam os milionários. Vivem a vida livre, sem chefes, sem trânsito. Têm de escritó-

rio uma cidade patrimô-nio. Mais, eles são a ci-dade, narradores únicos de quem tem o privilégio de ver o movimento o tem-po todo, de quem adqui-re olhar apurado para as pequenas cenas do cotidia-no. Eles veem beleza onde ninguém mais vê. E co-locam nas suas esculturas, nas suas intervenções. É só olhar.

Então, pare. Veja. Seja a sua cidade. Você pode sair dela. Resta escolher se ela sairá de você.

o público como principal convidado do evento”.

Desse modo, o Circovo-lante consegue fazer da rua o seu palco democrático, onde a alegria gratuita é a atração principal. No cir-

Respeitável público, agora, no picadeiro, o palhaço que carrega a arte no bolso

cultuRA

co é assim: primeiramen-te o público fixa os olhos nos artistas, em suas brincadei-ras, gestos e movimentos.

Depois, como esque-cer esses momentos? Fi-cam sempre na lembrança

as emoções que proporcio-nam, e a imaginação não deixa pra menos. Faz do espetáculo verdadeira má-gica, algo que sempre se reinventará na memória a cada novo encontro.

Muito além do seu cotidiano

“Ele é o desajustado que não se enquadra no mundo social e, sim, mostra outra forma de ser”.

marina ibba

Flávio Ernani

5º Encontrointernacionalde Palhaços

26 a 29 de setembro

Homenageado: palhaço Chicrete

Para enxergar as coisas sem feitio é preciso não saber nada.Manoel de Barros{ }

Flávio Ernani

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Page 12: Jornal Lampião - 11ª Edição

12 Edição: Tácito Chimato

Arte: Gabriela Ribeiro

Setembro de 2013

ENSAIO

Suavidade

Juliana Melo (texto) | nathália Viegas (fotos) Movimentos corporais feitos de uma forma lenta e con-

tínua, trabalhando a harmonia física, mental e emocional com passos inspirados na natureza e nos animais resumem a essência do Tai Chi Chuan. É uma arte milenar que foi desenvolvida nos templos e mosteiros da China e introduzida no Ocidente no sécu-lo passado, como forma psicoterapêutica.

A inspiração vem dos movimentos circulares, lentos e suaves dos tigres, garças, serpentes e ondas do mar. Percebi que o que com-põe o Tai Chi são a respiração, o movimento e o pensamento. Pode ser considerada também uma arte marcial, uma autodefesa. Ao fazer uma aula observamos claramente a possibilidade de se tratar o es-tresse e a ansiedade através de um trabalho intelectual.

O ambiente tranquilo e acolhedor do espaço conhecido como Ma-chu Picchu, no Intituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS), em Mariana, é palco desse espetáculo. Ouvi o mestre Ricardo Silva Tei-xeira, responsável por trazer essa receita de paz para seus alunos. Ele me disse que geralmente quem não consegue completar os movi-mentos é quem realmente está precisando parar um pouco e praticar.

A música serena se junta aos movimentos e ao ambiente verde do Instituto numa só sintonia. Os alunos saem relaxados, e não po-deria deixar de falar com alguns deles. Conversando com a produ-tora cultural Eliane Sandi e a cabelereira Simone Rocha, descobri também que o Tai Chi Chuan trabalha a energização do nosso cor-po. As energias fluem, e os problemas de saúde desaparecem. Além disso, descobri que quem começa a praticar não quer parar mais.

Os movimentos são delineados com a utilização de alguns obje-tos como leques, espadas, sombrinhas, bastões e bancos. Observando cada passo daquela aula, o cuidado com cada movimentação, perce-bi que não só a mente é trabalhada mas o corpo físico como um todo. Conheci Diana Antônia dos Santos que estava ali também en-sinando alguns alunos. Ela me contou que a prática daqueles movi-mentos pode ajudar a combater a insônia, equilibrar a pressão, for-talecer articulações, melhorar a respiração, o trabalho do coração e promover o rejuvenescimento físico e mental. Não é à toa que o Tai Chi é conhecido como a Arte da Longa Vida.

Os movimentos são simples, nada muito complicado de se aprender. O que precisamos é parar, acalmar um pouco, sair da agitação e deixar a música e a suavidade dos movimentos nos guiarem.