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INVESTIGAÇÃO DE PERDAS SEGUNDO O SISTEMA TOYOTA DE PRODUÇÃO: ESTUDO DE CASO EM UMA INDÚSTRIA DE GASES Raissa Araujo Borges (UFPE) [email protected] Maurilio Jose dos Santos (UFPE) [email protected] A análise de perdas de processos produtivos tem se mostrado ferramenta bastante valiosa ao auxiliar o gerenciamento de diversos tipos de indústrias. Através de conceitos do Sistema Toyota de Produção (STP), este trabalho tem como objetivo identificar os desperdícios presentes num processo de enchimento de cilindros de uma empresa de gases. Dentre as 7 perdas descritas pelo STP, algumas estão presentes e são sugeridas formas de eliminá-las. Palavras-chave: Sistema Toyota de Produção, perdas, indústria de gases, enchimento XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

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INVESTIGAÇÃO DE PERDAS SEGUNDO

O SISTEMA TOYOTA DE PRODUÇÃO:

ESTUDO DE CASO EM UMA INDÚSTRIA

DE GASES

Raissa Araujo Borges (UFPE)

[email protected]

Maurilio Jose dos Santos (UFPE)

[email protected]

A análise de perdas de processos produtivos tem se mostrado

ferramenta bastante valiosa ao auxiliar o gerenciamento de diversos

tipos de indústrias. Através de conceitos do Sistema Toyota de

Produção (STP), este trabalho tem como objetivo identificar os

desperdícios presentes num processo de enchimento de cilindros de

uma empresa de gases. Dentre as 7 perdas descritas pelo STP,

algumas estão presentes e são sugeridas formas de eliminá-las.

Palavras-chave: Sistema Toyota de Produção, perdas, indústria de

gases, enchimento

XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

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1. Introdução

O controle e a busca pela eliminação de perdas conquistaram grande relevância na área

industrial com a difusão do Sistema Toyota de Produção (STP) a partir da crise do petróleo da

década de 70. A Toyota Motors Company, indústria automotiva japonesa, foi o berço desse

sistema, que tem como objetivo direcional a completa eliminação de perdas para reduzir

custos e aumentar a eficiência de um processo. Usando como ponto de referência a produção

da concorrente norte-americana Ford, e diante de dificuldades de mão-de-obra e recursos, o

STP se desenvolve buscando inovações organizacionais sem deixar de lado a responsabilidade

de produzir eficientemente uma grande variedade de modelos para um reduzido mercado. O

resultado é uma produção puxada, que funciona de acordo com a demanda, e com o objetivo

principal de aumentar a eficiência da produção através da eliminação consistente e total de

desperdícios (SANTOS, 2003).

Por ser um sistema com princípios de melhoria contínua, visando a eliminação de perdas, essa

ideia básica pode ser utilizada pelos mais diferentes tipos de processos e/ou serviços que

necessitam de processos rápidos e flexíveis que deem aos clientes o que eles desejam, quando

o desejam, com o máximo de qualidade e a um custo interessante (LIKER, 2005).

A concorrência acirrada obriga as empresas a melhorarem seus sistemas produtivos de forma

permanente, combatendo incessantemente toda e qualquer perda. (BRUM, 2006). Segundo

Bornia (1995), as empresas devem se adaptar à nova realidade do mercado e se aperfeiçoar de

maneira eficiente e contínua. Assim como em muitas organizações busca-se quantificar e

reduzir perdas sistematicamente segundo diversos tipos de gestão, este artigo é direcionado à

identificação de perdas através da ótica do STP visando oportunidades de melhoria no

gerenciamento de uma etapa do processo produtivo de uma indústria de gases industriais e

medicinais.

2. O Sistema Toyota de Produção

O STP ganhou notoriedade nos meios acadêmicos e industriais de todo o mundo, em grande

parte devido ao impacto do Just-In-Time (JIT) sobre os métodos de gerenciamento da

produção vigentes (SHINGO, 1996a). A relação entre o JIT e princípio de redução de custos

através da eliminação de perdas faz do STP um sistema extremamente eficaz. No entanto, o

que sustenta o sistema são seus dois pilares: o próprio JIT e a Autonomação. Toda a cadeia

produtiva da Toyota é reflexo dos seus dois pilares.

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Segundo Falcão (2001), a compreensão e utilização do JIT e da Autonomação são importantes

para o eficaz funcionamento do STP, mas se faz necessário também o conhecimento e

interpretação de sua base. Ela é composta por três princípios básicos: i) o Mecanismo da

Função Produção (MFP); ii) Princípio do não-custo e iii) análise das perdas nos sistemas

produtivos. A seguir é feita uma explanação do conceito e da importância dos pilares do STP,

assim como dos três princípios mencionados.

a) Just-in-time: técnica de gerenciamento que gira em torno de produzir peças e produtos

exatamente na quantidade requerida e apenas quando necessário, não antes disso;

b) Autonomação: consiste em facultar ao operador ou a máquina a autonomia de parar o

processamento sempre que for detectada qualquer anormalidade (GHINATO, 1996).

A autonomação propõe a separação entre o trabalhador e a máquina;

c) Mecanismo da Função Produção: O conceito de mecanismo da função produção, ou

simplesmente produção, pode ser entendido como uma rede funcional de processos e

operações. A estrutura da produção é caracterizada pelo dinamismo de processos e

operações combinados em fluxos ortogonais, como é possível observar na figura

seguinte:

Figura 1. A estrutura em rede da produção

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Fonte: Shingo (1996a)

O Mecanismo da Função Produção permite analisar a produção como uma

combinação de fluxos de materiais, pessoas, equipamentos e dispositivos no tempo e

no espaço (SHINGO, 1996a; FALCÃO, 2001);

d) Princípio do não-custo: a perspectiva de lucro das empresas foi revolucionada com o

princípio do não-custo. Tradicionalmente, o preço de seus produtos era determinado

através da soma do lucro pretendido ao custo. Em outras palavras, o preço de venda

era imposto ao mercado, ou como disse Shingo (1996a), é fazer o consumidor

responsável por todo o custo. O Sistema Toyota de Produção não admite esse

princípio, defende que o custo de manufatura não possui importância para o

consumidor e sim se o produto tem ou não valor para ele. A fórmula abaixo traduz o

princípio do não-custo.

Preço de Venda – Custo = Lucro

Aplicando a fórmula acima, que presume que o preço de venda é determinado pelo

consumidor, o lucro não é nada mais que o resto da subtração do custo sobre o preço

de venda. Logo, a redução de custo se torna o meio para manter ou aumentar lucros da

empresa. É necessário um sistema de gestão total que desenvolva que desenvolva a

habilidade humana até sua mais plena capacidade, a fim de realçar a criatividade e a

operosidade, para utilizar bem instalações e máquinas, e eliminar todo o desperdício

(Ohno, 1997);

e) Análise das perdas no sistema produtivo: As perdas são operações ou movimentos

completamente desnecessários que geram custo e não agregam valor e que, portanto,

devem ser eliminados, tais como esperas, transporte de material para locais

intermediários, estocagem de material em processo, etc. (GHINATO, 1996). Segundo

Ohno (1997) e Shingo (1996a), o Sistema Toyota de Produção é em essência a

constante perseguição às perdas e sua completa eliminação.

Para Ohno (1997), os seguintes pontos são essenciais à compreensão do conceito de perdas:

(i) aumentar a eficiência só faz sentido quando se busca redução de custos e, para isso, deve-

se produzir apenas o necessário utilizando a mínima mão-de-obra; (ii) a eficiência deve ser

melhorada em cada estágio da produção e, ao mesmo tempo, para a fábrica como um todo.

Para sustentar o processo sistemático de identificação e eliminação de perdas do Sistema

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Toyota de Produção, Ohno e Shingo sugerem sete classes de perda, que serão tratadas nos

tópicos a seguir.

2.1. Perdas por superprodução

Considerada a maior fonte de desperdício, é capaz de mascarar outros tipos de perdas além se

ser a mais difícil de ser eliminada. De acordo com Shingo (1996a), a superprodução pode

acontecer de duas formas:

a) Por superprodução, quando se é produzido além do planejado e sobram peças ou

produtos. É um tipo que perda que é inadmissível sob qualquer hipótese e está

completamente superada na Toyota (SHINGO, 1996a).

b) Por antecipação, quando a produção é realizada antes do momento necessário, fazendo

com que peças ou produtos fiquem estocados aguardando a próxima etapa de

processamento ou seu consumo. Esta é a perda mais perseguida no Sistema Toyota de

Produção (GHINATO, 1996).

2.2. Perdas por transporte

Movimentação excessiva de estoque, materiais ou informações, que não agregam valor e, por

isso, podem ser consideradas perdas que devem ser eliminadas. Para alcançar redução ou

eliminação das perdas por transporte, é importante utilizar a ótima do mecanismo da função

produção. Quando já não existem alternativas de melhorias no processo, parte-se para a

introdução de melhorias nas operações de transporte.

2.3. Perdas por processamento em si

Etapas dispensáveis do processamento, uso inadequado de ferramentas ou execução de

procedimentos ou sistemas errados. Atividades que poderiam ser eliminadas sem afetar as

características e funções básicas do produto/serviço.

2.4. Perdas por fabricação de produtos defeituosos

Fabricação de produtos não conformes, que não satisfazem os requisitos de uso. Para que ela

ocorra, basta que alguma das características de qualidade do produto esteja fora de uma

especificação ou padrão estabelecido, e por isso não é satisfeito o requisito de aplicação. É a

perda mais comum e visível, pois atinge o produto ou serviço diretamente, fazendo com que

seja necessário o retrabalho ou até mesmo o sucateamento.

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2.5. Perdas por movimentação

Acontecem através de movimentos desnecessários realizados por operadores na realização de

uma operação. Um estudo de tempos e movimento pode dar origem a melhorias que

potencialmente racionalizam os movimentos nas operações. Isso também é atingido através da

mecanização de operações, transferindo para a máquina atividades manuais realizadas pelo

operador. No entanto, Shingo (1996b) recomenda que melhorias nas operações por meio da

mecanização só devem ser implantadas após o esgotamento de todas as possibilidades de

melhorias na movimentação do operário e eventuais mudanças nas rotinas das operações.

2.6. Perdas por espera

Caracterizada pelo intervalo de tempo no qual nenhum processo ou operação é executado,

seja pelo operador ou pela máquina. A perda por espera dos trabalhadores acontece quando o

operário precisa ficar junto a máquina acompanhando o processamento, e a perda por espera

das máquinas acontece por atrasos no suprimento de material ou problemas no fluxo de

produção.

2.7. Perdas por estoque

As perdas por estoque são geradas pela manutenção de estoques de matérias-primas, de

materiais em processamento e de produtos acabados. O Sistema Toyota de Produção

considera as perdas por estoque as origens de todos os problemas (SHINGO, 1996b). O

estoque de materiais em processamento ocorre, quando peças já processadas esperam o

restante passar pelo processamento para completar o lote e seguir para a próxima etapa no

fluxo. Essa perda é imposta a cada uma das peças do lote. Ela também pode acontecer antes

de um processamento, onde as peças não processadas esperam o processamento das que estão

adiante no processo.

3. Estudo de caso

3.1. Descrição do processo

A empresa na qual esse estudo é feito é de grande porte e está presente em diversas áreas do

país. Este artigo foca apenas no processo de enchimento de cilindros de alta pressão de uma

unidade, que possui variações, mas será usado como referência o enchimento do argônio puro.

No caso presente, o processo é conduzido por 16 operadores divididos em 3 turnos por dia e

funciona do primeiro turno da segunda-feira até o segundo turno do sábado. Não há

expediente no restante da semana.

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O processo, basicamente, consiste no recebimento do produto e enchimento dos cilindros. O

gás na forma líquida é armazenado em um tanque criogênico. A transferência para a

plataforma de enchimento inicia-se pela sucção do argônio líquido do tanque através de uma

bomba criogênica, fazendo-o passar por um vaporizador atmosférico, garantindo que as

condições de pressão e temperatura sejam adequadas para o enchimento. Em seguida ele

atravessa, já na forma de gás, tubulações subterrâneas e finalmente alcança as instalações de

enchimento na plataforma de enchimento. Nesta, os cilindros vazios são agrupados o mais

próximo possível uns dos outros nas áreas designadas, e enchidos simultaneamente.

Antes do processo de enchimento em si, os cilindros vazios que retornam à unidade passam

por uma inspeção visual, onde qualquer irregularidade é suficiente para a retirada do cilindro

para o setor de manutenção. Essa etapa de pré-enchimento continua com a despressurização

de todos os cilindros e aplicação de vácuo no seu interior a fim de expulsar o gás

remanescente e eliminar resíduos que possam contaminar o produto. A válvula de enchimento

é aberta e a bomba de enchimento ligada. Após o término do enchimento e dos passos pós-

enchimento, os cilindros passam por uma análise e, sendo aprovados, são liberados para

distribuição. Todo o processo é ilustrado no fluxograma de blocos da figura 2.

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Figura 2. Fluxograma do processo de enchimento de cilindros de alta pressão.

Matéria-prima armazenada

Inspeção pré-enchimento

Cilindro aprovado na

inspeção?

Movê-lo para manutenção

Não

Transporte dos cilindros para a área de enchimento

Conectar os cilindros às válvulas dos chicotes

Verificar se a bomba de vácuo está desligada

Desligue a bomda de

vácuoNão

Sim

Sim

Despressurização dos cilindros

Vácuo nos cilindros

Abertura da válvula de enchimento no painel

Operador caminha até a área do tanque

Verificação da pressão e nível

do tanque

Pressão e nível Ok?

Aliviar pressão

Não

até permitido

Sim

Escorvar bomba (15 min)

Válvula de retorno do tanque é fechada e a bomba

criogênica ligada

ENCHIMENTO

Desligar bomba (no painel) e fechamento da válvula de alimentação dos cilindros

Fechamento das válvulas de todos os cilindros

Despressurizar linha de distribuição (vent manifold)

Operador vai até o tanque para fechar válvula de líquido do tanque

Desconectar os cilindros dos chicotes

Verificação final de vazamento

Cilindro vazando pela

válvula?Não

Sim Mover o cilindro para a manutensão

Transporte dos cilindros para a área de

cilindros cheios

Fonte: Elaborado pelos autores.

O software Microsoft Visio é usado na construção desse fluxograma, que classifica cada

operação do processo como Processamento, Decisão, Transporte, Inspeção e Espera. Ele é a

base para a classificação das operações de acordo com a simbologia dos fenômenos do

processo de Shingo (1996a) utilizada adiante para facilitar a identificação das perdas nas

etapas do procedimento.

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Tabela 1. Simbologia dos fenômenos do processo segundo Shingo

Símbolo Fenômeno Descrição

Estoque de Material Estocagem de matéria-prima

Processamento Uma mudança física no material ou na sua qualidade

Inspeção Comparação com um padrão estabelecido

TransporteMovimento de materiais ou produtos; mudança nas

suas posições

Espera do ProcessoUm lote inteiro esperando enquanto o lote precedente é

processado, inspecionado ou transportado

Espera do LoteDurante as operações de um lote, enquanto uma peça

é processada, outras se encontram esperando

Estoque do Produto Estocagem de produto acabado

Fonte: Adaptado de Shingo (1996a)

O diagnóstico de perdas é relatado em seguida, onde cada uma das sete perdas é detalhada

dentro do processo.

3.2. Diagnóstico das perdas

Cada operação do processo em estudo foi devidamente classificada de acordo com a

simbologia referida e a tabela 2 foi construída.

Tabela 2. Fluxograma do Processo de Enchimento de acordo com a simbologia de Shingo (1996a)

1Matéria-prima (MP)encontra-se estocada no tanque

x

2Inspeção visual dos cilindros na plataforma (Inspeção pré-

enchimento)x

3Transporte dos cilindros aprovados para a área de

enchimentox

4Conectar os cilindros às válvulas dos chicotes com o cabo

de aço de segurançax

5Verificar se a bomba de vácuo está desligada

x

6Despressurização dos cilindros (vent)

x

7Vácuo nos cilindros

x

Item OperaçõesFenômenos do Processo

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8Abertura da válvula de enchimento (painel)

x

9Operador caminha até o tanque

x

10Verificação da pressão e nível do tanque (aliviar pressão se

necessário)x

11Escorva da bomba (15 min)

x

12A válvula de retorno para o tanque é fechada e a bomba

ligadax

13 Enchimento (operações durante enchimento) x

14A bomba criogênica é desligada e a válvula de enchimento

é fechada (painel de enchimento na plataforma)x

15Fechamento das válvulas de todos os cilindros

x

16Despressurização da linha de distribuição (vent manifold)

x

17Operador caminha até o tanque para fechar a válvula de

líquidox

18Operador retorna à plataforma para os passos pós-

enchimentox

19 Desconexão dos cilindros das linhas de enchimento x

20 Verificação final de Vazamento x

21 Transporte dos cilindros para a área de cilindros cheios x

22Pequenos lotes se formam e esperam para serem

distribuidosx

23 Estocagem dos lotes para distribuição x

1 7 4 6 1 3 1Quantidade dos fenômenos do processo.

Fonte: Elaborado pelos autores

Na classificação feita para a elaboração da tabela acima, é preciso esclarecer que foi

considerado como produto apenas o gás envasado em cilindros, e como matéria-prima o gás

na forma líquida armazenado no tanque criogênico.

3.2.1. Perdas por superprodução

De acordo com as palavras de Shingo (1996a), existem dois tipos de perdas por

superprodução, por quantidade e por antecipação. A demanda pelos produtos da unidade é

sempre grande, de modo que o tempo de armazenamento de cilindros cheios a esperar pelos

caminhões da distribuição é mínimo. No entanto, é comum que aconteça sobra de cilindros

para serem distribuídos após o enchimento porque nem sempre a quantidade de cilindro

cheios é a mesma da dos pedidos feitos pelos clientes. Os equipamentos usados para o

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enchimento necessitam de um mínimo de cilindros para operar. Assim, mesmo havendo uma

programação de venda para um certo dia, é normal que essa demanda seja feita em quantidade

menor que a quantidade de um enchimento.

Apesar de Shingo (1996a) afirmar que a superprodução por quantidade é inadmissível e está

superada no STP, identificamos essa perda no processo de enchimento na área de cilindros

cheios para distribuição. Por outro lado, é muito difícil evitar esse tipo de perda mantendo as

condições atuais de operação e distribuição. Seria necessário rever o processo, de modo a

otimizar o fluxo de produção ou mesmo as máquinas usadas para o enchimento, para que tudo

se adeque às programações rotineiras de vendas e distribuição.

3.2.2. Perdas por transporte

O transporte é uma operação bastante presente no processo de enchimento analisado. Diversas

áreas são designadas para cada etapa específica do processo, o que faz com que seja

necessário o transporte de cilindros para as baias correspondentes a cada operação.

A tabela 4 mostra que o fenômeno do processo mais presente é o processamento. Em seguida

encontra-se o transporte. Shingo (1996a) diz que o transporte normalmente demanda custos de

mão de obra tão altos quanto os requeridos para o processamento. No caso atual, percebe-se

que o transporte realmente está muito presente nas condições do processo. Desde o momento

em que se arruma os cilindros para a inspeção de pré-enchimento, até a separação dos

cilindros cheios para distribuição, existem vários momentos de deslocamento dos cilindros. A

separação dos cilindros em baias é necessária e requer o transporte de cilindros sempre. Um

aprimoramento do layout deve ser considerado nesse caso.

3.2.3. Perdas por processamento em si

Este tipo de perda não foi identificado no que se refere a uma reavaliação das funções do

produto.

3.2.4. Perdas por fabricação de produtos defeituosos

Os produtos defeituosos no processo analisado podem ocorrer de duas formas:

i) Cilindros que não passaram pela inspeção pós enchimento por contaminação

do gás ou defeito no cilindro: Isso leva ao desperdício do gás, manutenção do

cilindro (que o mantém fora de operação por no mínimo um dia, dependendo

da demanda) e, retrabalho do processo de enchimento. Os cilindros submetidos

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aos testes da manutenção podem também ser condenados caso algum defeito

irrecuperável seja encontrado, saindo permanentemente de operação;

ii) Cilindros retornados pelo cliente: o cliente tem o direito de retornar os

cilindros que apresentem defeito ou gás contaminado. Um formulário

detalhando o problema apresentado retorna junto com o cilindro e há a

substituição com cilindro cheio.

3.2.5. Perdas por movimentação

A necessidade de deslocamento do operador entre a plataforma de enchimento e a área dos

tanques pode ser considerada como perda por movimentação se for desempenhada de forma

ineficiente, o que diz respeito à má divisão das tarefas entre os operadores na plataforma. O

mesmo pode ser dito às outras poucas operações manuais pertencentes ao procedimento de

enchimento.

3.2.6. Perdas por espera

Perdas por espera foram percebidas durante as operações de pré-enchimento, quando os

cilindros são submetidos à despressurização e vácuo. Nesses momentos, os operadores devem

permanecer junto ao painel de enchimento acompanhando a realização da ventagem e o

trabalho da bomba de vácuo. Além disso, a escorva da bomba criogênica é caracterizada outra

perda por espera, já que nem o operador executa operação alguma nem a bomba está de fato

trabalhando, mas só em preparação.

Eventualmente ocorrem paradas na produção por problemas na bomba criogênica ou nas

tubulações em torno do tanque de armazenamento, causando perdas por espera das máquinas,

como caracteriza Ghinato (1996). Porém, a causa mais frequente de parada da produção é

quando, antes de iniciar a escorva da bomba, existe uma relação pressão-nível do tanque fora

do padrão, evidenciando que existe muito produto na forma gasosa no tanque, o que eleva sua

pressão. Os riscos de operar numa situação desse tipo são enormes e por isso é necessária

muita atenção dos operadores. A medida tomada quando isso acontece é a abertura da válvula

de alívio do tanque para que a pressão seja aliviada até um ponto dentro dos limites

operacionais. Outra grave consequência disso é a perda de matéria-prima para a atmosfera.

3.2.7. Perdas por estoque

À primeira vista, essas perdas poderiam ser consideradas sempre presentes pelo fato do

constante armazenamento de matéria-prima no tanque. Esse ponto de vista, no entanto, será

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relevado, pois a programação de abastecimento do tanque, feita pela matriz, é calculada e

agendada de acordo com a média de produção da unidade.

Na tabela 2, onde as operações são classificadas de acordo com a simbologia de Shingo

(1996a), as esperas dos lotes e a espera do processo se encaixam como perdas por estoque de

material em processamento. As operações de conexão e abertura das válvulas dos cilindros

são executadas em cada cilindro antecedendo uma etapa do procedimento. Assim, semelhante

ao exemplo dado por Ghinato (1996), num enchimento de 40 cilindros, o primeiro é

conectado ao chicote e aguarda os 39 restantes serem conectados para que o enchimento siga

adiante. Essa espera é caracterizada como perda por estoque de material em processamento.

Já o estoque de produtos acabados (cilindros cheios estocados aguardando venda ou ordem de

distribuição) está presente sutilmente e é uma consequência das perdas por superprodução.

4. Conclusões

Mesmo tendo se originado há mais de 5 décadas numa indústria automobilística, a grande

aplicabilidade dos princípios e ferramentas do STP é evidente nas indústrias que ainda hoje

utilizam o sistema. Adequando-o de forma a atender a realidade de cada empresa, o STP é

uma excelente estratégia para a empresa aumentar sua produtividade e se destacar no mercado

em que atua.

Com o objetivo principal de identificação de perdas, ferramentas como o fluxograma usado

no estudo facilitam o mapeamento desses desperdícios que prejudicam a eficiência do

processo. De acordo com o diagnóstico de perdas feito nesse trabalho, observou-se a

necessidade de uma reavaliação da programação de produção para que haja melhor

balanceamento do fluxo produtivo considerando a demanda do mercado da unidade. Isso irá

atingir as perdas por superprodução, espera e estoque. Um estudo de tempos e movimentos

pode ser feito para otimizar as operações e reduzir movimentações desnecessárias. Além das

sugestões feitas, deve ser considerada a viabilidade de instalação de um sistema de

enchimento automatizado, tecnologia presente na própria empresa em outras unidades.

Através da utilização de ferramentas e conceitos do STP revisados e aplicados nesse trabalho,

resultados relevantes podem ser alcançados na indústria analisada, mesmo sendo um campo

pouco explorado para o uso do STP. É muito importante frisar a importância da análise do

processo como um todo, abordando-o desde a entrada da matéria-prima até sua transformação

no produto acabado, incluindo as relações entre os operadores e suas tarefas. Assim, a

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utilização de métodos que visem a eliminação de perdas pode ser feita de forma efetiva

através da clara visualização das atividades que agregam valor e livrando-se do que é

desnecessário.

REFERÊNCIAS

BORNIA, Antonio Cezar. Mensuração das perdas dos processos produtivos: uma abordagem metodológica

de controle interno. 1995. 125 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção). Programa de Pós Graduação de

Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina.

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