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INTERAÇÕES Revista Internacional de Desenvolvimento Local Universidade Católica Dom Bosco Instituição Salesiana de Educação Superior v. 10 n. 1 jan./jun. 2009

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Page 1: INTERAÇÕES - UCDB · A Revista Internacional de Desenvolvi-mento Local – Interações - apresenta em seu primeiro número de 2009 uma variedade de artigos, nacionais e estrangeiros,

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local

Universidade Católica Dom BoscoInstituição Salesiana de Educação Superior

v. 10 n. 1 jan./jun. 2009

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Chanceler: Pe. Lauro Takaki Shinohara

Reitor: Pe. José Marinoni

Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação:Prof. Dr. Hemerson Pistori

Editora UCDBAv. Tamandaré, 6.000 - Jardim Seminário79117-900 Campo Grande-MSFone/Fax: (67) 3312-3373e-mail: [email protected] www.ucdb.br/editora

U n i v e r s i d a d e C a t ó l i c a D o m B o s c o

Conselho EditorialAdyr Balastreri Rodrigues (Universidade de São Paulo)

Alberto Palombo (Florida Atlantic University - USA)Alicia Rivero (CONSULT-AR - Bonn - Alemanha)

André Joyal (Université du Québec à Trois-Rivières – Canadá)Antonio Elizalde Hevia (Universidad Bolivariana de Chile-UBC)

Bartomeu Melià (Universidad do Sacramento - Asunción - Paraguay)Cezar Augusto Benevides (Universidade Federal de MS)

Christian Krajewski (Institut für Geographie – Un.Münster -Munique – Alemanha)

Denis Maillat (IRER- Université de Neuchâtel - Suisse)Doris Morales Alarcón (Pontificia Universidad Javeriana)

Emiko Kawakami Rezende (EMBRAPA-MS)João Ferrão (Instituto de Ciências Sociais – Lisboa - Portugal)

Jorge Bacelar Gouveia (Universidade Nova Lisboa - Portugal)José Arocena (Universidad Catolica del Uruguay - UCU)

José Carpio Martín (Universidad Complutense de Madrid)Leila Christina Dias (Universidade Federal de SC)

Leo Dayan (Université Panthon Sorbonne – Paris I - França)Marcel Bursztyn (Universidade de Brasília)

Maria Adélia Aparecida de Souza (UNICAMP)Maria Helena Vallon (Fund. João Pinheiro)

Marília Luiza Peluso (Universidade de Brasília)Marisa Bittar (Universidade Federal de São Carlos)

Maurides Batista de Macedo Filha Oliveira (Univ. Católica de Goiás)Michel Rochefort (IFU - Université de Paris VIII)

Miguel Ángel Troitiño Vinuesa (Univ. Complutense de Madrid)Paulo TarsoVilela de Resende (Fund. Dom Cabral)

Rafael Ojeda Suarez (Universidad Agraria de la Habana - Cuba - UAH)Ricardo Méndez Gutiérrez del Valle (Univ. Complutense de Madrid)

Rosa Esther Rossini (USP)Sérgio Boisier (Santiago de Chile - Chile)

Conselheiros fundadores Milton Santos (in memoriam)

Nilo Odália (in memoriam)

I N T E R A Ç Õ E SRevista Internacional de Desenvolvimento Local

Conselho de RedaçãoCleonice Alexandre Le BourlegatMaria Augusta de CastilhoOlivier Francois Vilpoux

Editora ResponsávelMaria Augusta Castilho

Coordenação de EditoraçãoEreni dos Santos Benvenuti

Editoração EletrônicaGlauciene da Silva Lima Souza

Revisão de Texto e Traduções:Os próprios autores

CapaProjeto: Marcelo MarinhoFoto: canavial-interna.jpg / Disponível em:http://www.camponews.com.br/noticia.asp?codigo=2031. Acesso em: 6/3/2009

Tiragem: 1.000 exemplares

Distribuição: Bibliotecas universitárias

Cecília LunaBibliotecária - CRB n. 1/1.201

Interações. Revista Internacional de Desenvolvimento Local,n. 1 (jan./jun. 2009). Campo Grande: UCDB, 2009.123 p. v. 10ISSN 1518-7012Semestral1. Desenvolvimento Local.

Publicação do Programa Desenvolvimento Local da Universidade Católica Dom Bosco.Indexada em:

SciELO - Scientific Electronic Library Online (www.scielo.br)Latindex, Directorio de publicaciones cientificas seriadas de America Latina, El Caribe, España y Portugal

(www.latindex.org)GeoDados, Indexador de Geografia e Ciências Sociais. Universidade Estadual de Maringá (www.dge.uem.br/geodados)

Dursi, Sistema d’informació per a la identificació i avaluació de revistes, Catalunha(www10.gencat.net/dursi/ca/re/aval_rec_sist_siar_economia_multidisciplinar.htm)

Clase, Base de datos bibliográfica en ciencias sociales y humanidades (www.dgb.unam.mx/clase.html)IAIPK, Instituto Ibero Americano do Patrimônio Prussiano (http://www.iai.spk-berlin.de)

IBSS, International Bibliography of the Social Sciences, London (www.ibss.ac.uk)

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A Revista Internacional de Desenvolvi-mento Local – Interações - apresenta em seuprimeiro número de 2009 uma variedade deartigos, nacionais e estrangeiros, commúltiplos pontos de vista, destacando semprealternativas de sustentabilidade. Em tempode globalização, torna-se necessário estimulara geração de conhecimento constante emnível local, regional e nacional para interna-cionalizar a troca de experiências, tão impor-tantes para a difusão do conhecimento cien-tífico.

Este exemplar contempla inicialmenteartigos voltados para a agricultura familiar,sustentabilidade em áreas rurais e pesquei-ras, enfatizando aspectos de governança emvários municípios, e reflexões jurídicas sobrea preservação do patrimônio natural.

O artigo de Fausta Calado Silva e Mariado Rosário de Fátima Andrade Leitãointitulado Extensão rural e floricultura tropicalpara o Desenvolvimento Local: a cooperação noprocesso de inclusão competitiva dos agriculto-res familiares em Pernambuco apresenta polí-ticas de Desenvolvimento Local e os proces-sos de cooperação entre os agricultores fami-liares da região pesquisada. Os estudos deMariza Zeni de Castro Tomasetto, JandirFerrera de Lima, Pery Francisco AssisShikida, sobre o Desenvolvimento local e agri-cultura familiar: o caso da produção de açúcarmascavo em Capanema - Paraná estabeleceuma opção para a produção da agriculturafamiliar ao criar alternativa de renda nas uni-dades agroindustriais, além de possibilitar adiversificação da produção. Outra pesquisaimportante é a de Andréa Haruko Arakaki,Gessiel Newton Scheidt, Eduardo José deArruda e Reginaldo Brito da Costa referindo-

Editorial

se a O baru (Dipteryx alata Vog.) como alter-nativa de sustentabilidade em área de fragmentoflorestal do Cerrado, no Mato Grosso do Sul,abordando a coleta e utilização de frutosnativos em áreas de ocorrência natural comoalternativa econômica para as populaçõeslocais. Em um outro aporte, Christian Luizda Silva, Carminda Lopes e William MichonJunior mencionam a Intervenção do estado edesenvolvimento local: em uma análise crosssection dos municípios paranaenses, objetivan-do a melhoria das condições de desigualda-de no Estado Paraná. Antonia Railda Roel,Cristiane Maria Vendramini Momesso e Si-mone Palma Favaro fazem um levantamentodo potencial de comercialização de produtos or-gânicos para o Estado de Mato Grosso do Sul,esclarecendo que a exposição de pesticidasagrícolas é frequentemente associada a ris-cos para a saúde humana. O artigo seguintede Alaide Brum de Mattos, Angela MariaZanon, Domitilla Medeiros Arce, Joana Ma-galhães e Solange Mattos Iorio intitulado Aperspectiva da educação ambiental e o processohistórico do saneamento básico: a instalação dasredes de água e esgoto nos municípios de Cam-po Grande/MS e Dourados/MS objetivamapresentar, por meio de um levantamentohistórico, a evolução do sistema de sanea-mento básico nos municípios de CampoGrande e Dourados ressaltando a educaçãoambiental como uma importante ferramentade sensibilização que acompanha a dinami-cidade social. Os autores: Rosa Maria Sarai-va e Angelo Brás Fernandes Callou investi-gam as Políticas públicas e estratégias de co-municação para o desenvolvimento local de co-munidades pesqueiras de Pernambuco, correla-cionando as estratégias de comunicação

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utilizadas pelo Projeto Renascer e Programade Apoio ao Desenvolvimento Sustentávelda Zona da Mata de Pernambuco(PROMATA), nas comunidades de Atapuz,Barra de Catuama e Tejucupapo, Municípiode Goiana, litoral norte do Estado de Per-nambuco. No contexto do aspecto jurídico,Lídia Maria R. L. Ribas e Luciani Coimbrade Carvalho apresentam Cavidade naturalsubterrânea: natureza jurídica, estabelecendoque o patrimônio espeleológico é de grandeimportância cultural, ambiental e econômi-ca para determinada região ou país. Na se-ção de experiência compartilhada, via teoria-prática, encontra-se a pesquisa de Ione deSouza Coelho e Vicente Fideles de Ávila de-nominada Performances comunitárias e vie-ses teóricos sobre potencialidades de participação

no Jardim Sayonara – Campo Grande-MS – emótica de Desenvolvimento Local, o estudo volta-se para a análise de potencialidades e de par-ticipação na localidade, compatíveis comimplementação de Desenvolvimento Local.

A INTERAÇÕES é uma revista queprocura suprir a ausência de publicações quepermitem análises de dinâmicas territoriaisfronteiriças, regionais e outras, em uma abor-dagem multidisciplinar, evidenciando a im-portância do desenvolvimento das relaçõeslocais por meio de intervenções inovadoras,tão necessárias ao desenvolvimento comu-nitário.

Maria Augusta CastilhoEditora

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Sumário

Artigos

Extensão rural e floricultura tropical para o desenvolvimento local: a cooperação no processo deinclusão competitiva dos agricultores familiares em Pernambuco ......................................................................9Extension rural and tropical floricultura for the local development: the cooperation in the processof competitive inclusion of the familiar agriculturists in Pernambuco ..................................................................9Extension agricole et floriculture tropicale pour le développement local: la cooperation dans leprocessus d’inclusion concurrentielle des agriculteurs familiers dans Pernambuco ............................................9Extensión agrícola y floricultura tropical para el desarrollo local: la cooperación en el proceso d’inclusióncompetitiva de los agricultores familiares en Pernambuco ..................................................................................................9

SILVA, F.C.LEITÃO, M.R.F.A.

Desenvolvimento local e agricultura familiar: o caso da produção de açúcar mascavo emCapanema – Paraná ........................................................................................................................................................... 21Local development and family agriculture: the brown sugar production case in Capanema city–Paraná state in Brazil ......................................................................................................................................................... 21Développement local et agriculture familiale: le cas de la production de sucre brun dans la ville deCapanema dans l’état du Paraná au Brésil ................................................................................................................... 21Desarrollo local y la agricultura familiar: el caso de la producción de azúcar marrón en la ciudad deCapanema - estado de Paraná en Brasil ............................................................................................................................... 21

TOMASETTO, M.Z.C.LIMA, J.F.SHIKIDA, P.F.A.

O baru (Dipteryx alata Vog.) como alternativa de sustentabilidade em área de fragmentoflorestal do Cerrado, no Mato Grosso do Sul ............................................................................................................. 31The baru (Dipteryx alata Vog.) as alternative for sustainability in the area of Cerrado forestfragment in the Mato Grosso South ................................................................................................................................ 31Le baru (Dipteryx alata Vog.) comme alternative pour la durabilité dans le domaine du fragmentCerrado du Mato Grosso do Sul ....................................................................................................................................... 31El baru (Dipteryx alata Vog.) como alternativa para la sostenibilidad en el ámbito Cerrado del fragmentoen el Mato Grosso do Sul ....................................................................................................................................................... 31

ARAKAKI, A.H.SCHEIDT, G.N.PORTELLA, A.C.ARRUDA, E.J.COSTA, R.B.

Intervenção do Estado e desenvolvimento local: uma análise cross section dos municípios paranaenses ... 41The State intervention and local development: the cross-section analyze of the paranaenses municipalities .. 41Intervention de l’État et développement locale: une analyse cross section des villes paranaenses .............. 41Intervención del Estado y del desarrollo local: una sección representativa del análisis de las ciudades paranaenses ..... 41

SILVA,  C.L.LOPES, C.MICHON JUNIOR, W.

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Levantamento do potencial de comercialização de produtos orgânicos para o estado de MatoGrosso do Sul ....................................................................................................................................................................... 55Evaluation of the potential market for organic products in the state of Mato Grosso do Sul (Brazil) ........ 55Levantamiento del potencial de comercialización de productos orgánicos para el estado de MatoGrosso del Sur (Brasil) ........................................................................................................................................................ 55Suppression du potentiel pour la commercialisation de produits biologiques pour l’état du Mato Grosso do Sul ....... 55

MOMESSO, C.M.V.ROEL, A.R.FAVARO, S.P.

A perspectiva da educação ambiental e o processo histórico do saneamento básico: a instalaçãodas redes de água e esgoto nos municípios de Campo Grande/MS e Dourados/MS ................................. 63The environmental education and history of basic sanitation: the installation of the water andsewerage system in the municipalities of Campo Grande/MS and Dourados/MS ....................................... 63L’accent mis sur l’éducation à l’environnement et l’historique de l’assainissement de base: l’installationde l’eau et de réseaux d’assainissement dans les municipalités de Campo Grande/MS et Dourados/MS............. 63La perspectiva de la educación ambiental y la historia de saneamiento básico: la instalación de las redes deagua y alcantarillado en los municipios de Campo Grande/MS y Dourados/MS ........................................................ 63

IORIO, S.M.ARCE, D.M.MAGALHÃES, J.MATTOS, A.B.ZANON, A.M.

Políticas públicas e estratégias de comunicação para o desenvolvimento local de comunidadespesqueiras de Pernambuco ............................................................................................................................................. 73Public policy and strategies of communication for the local development of the fishing communitiesof Pernambuco ....................................................................................................................................................................... 73Politiques publiques et strategies de communication pour la construction du developpement localdes communautes de pecheurs a Pernambuco .............................................................................................................. 73Políticas públicas y estrategias de comunicación para el desarrollo local de las comunidades costeñas de Pernambuco .. 73

SARAIVA, R.M.CALLOU, A.B.F.

Cavidade natural subterrânea: natureza jurídica .................................................................................................... 83Cnderground natural caves: juridical status ............................................................................................................... 83Cavidad natural subterránea: naturaleza jurídica ...................................................................................................... 83Cavité naturelle souterraine: nature juridique ................................................................................................................... 83

RIBAS, L.M.L. R.CARVALHO, L.C.

Teoria e Prática

Performances comunitárias e vieses teóricos sobre potencialidades de participação no JardimSayonara – Campo Grande-MS – em ótica de Desenvolvimento Local .......................................................... 97Communitary performances and theoretical points of view about potentialities of participation atJardim Sayonara – Campo Grande-MS – under a perspective of Local Development.................................... 97Performances communautaires et points de vue théoriques sur des potentiels de participation auJardin Sayonara – Campo Grande-MS – en perpective de Développement Local .............................................. 97Performances comunitárias y sesgos teóricos sobre potencialidades de participación en Jardin Sayonara –Campo Grande-MS – en perspectiva de Desarrollo Local ................................................................................................ 97

COELHO, I.S.ÁVILA, V.F.

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Artigos

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Extensão rural e floricultura tropical para o desenvolvimento local: a cooperação noprocesso de inclusão competitiva dos agricultores familiares em Pernambuco*

Extension rural and tropical floricultura for the local development: the cooperationin the process of competitive inclusion of the familiar agriculturists in Pernambuco

Extension agricole et floriculture tropicale pour le développement local: lacooperation dans le processus d’inclusion concurrentielle des agriculteurs familiers

dans PernambucoExtensión agrícola y floricultura tropical para el desarrollo local: la cooperación en el proceso

d’inclusión competitiva de los agricultores familiares en Pernambuco

Fausta Calado Silva**Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão***

Recebido em 7/11/2008; revisado e aprovado em 17/12/2009; aceito em 2/2/2009

Resumo: As políticas de Desenvolvimento Local e os processos de cooperação entre os agricultores familiaresconstituem os temas centrais deste artigo. Buscou-se investigar o papel da Cooperação na Extensão Rural noprocesso de Inclusão Competitiva dos Agricultores familiares da Floricultura Tropical em Pernambuco.Palavras-chave : Desenvolvimento Local. Cooperação. Floricultura tropical.Abstract: The politics of Local Development and the processes of cooperation between the familiar agriculturistsconstitute the subjects central offices of this article. One searched to investigate the role of the Cooperation in theAgricultural Extension in the process of Competitive Inclusion of the familiar Agriculturists of the Tropical Floriculturain Pernambuco.Key words: Local development. Cooperation. Tropical floricultura.Résumé: Les politiques de Développement Local et les procédures de coopération entre les agriculteurs familiersconstituent les sujets centraux de cet article. Il s’est cherché enquêter le rôle de la Coopération dans l’ExtensionAgricole dans le processus d’Inclusion Concurrentielle des Agriculteurs familiers de la Floriculture Tropicale dansPernambuco.Mots-clés: Développement local. Coopération. Floriculture tropicale.Resumen: Las políticas del desarrollo local y de los procesos de la cooperación entre los agrónomos familiaresconstituyen sede de los temas de este artículo. Se ha buscado investigar el papel de la cooperación en la extensiónagrícola e el proceso de inclusión competitiva de los agrónomos familiares del Floricultura tropical en Pernambuco.Palabras clave : Desarrollo local. Cooperación. Floricultura tropical.

* Este artigo faz parte da pesquisa mais ampla desenvolvida para obtenção do título de mestre do Programa dePós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX).** Bacharel em Letras pela Universidade Federal de Pernambuco /UFPE, Mestranda em Extensão Rural eDesenvolvimento Local. E-mail: [email protected]*** Professora Doutora da Universidade Federal Rural de Pernambuco/ UFRPE - Doctorado en EstudiosIberoamericanos por la Universidad Complutense de Madrid. - Docente do Programa de Pós-Graduação emExtensão Rural e Desenvolvimento Local - Posmex. Recife– PE. E-mail: rosá[email protected]

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 10, n. 1, p. 9-19, jan./jun. 2009.

Introdução

Além de pioneiro no setor de floricul-tura tropical no país, desde a década de1990, o Estado de Pernambuco tem dinami-zado esse segmento, liderando as exporta-ções no Brasil e incorporando um grande ecrescente número de produtores nessa ativi-dade econômica. Contudo, há duas realida-des bem distintas na floricultura tropical doEstado. Constatou-se a existência de um pe-queno conjunto de produtores familiares

bem estruturados e totalmente consolidadostanto no cenário nacional como internacionale por outro lado, muitos não-estruturados enão-consolidados.

A inclusão competitiva1 dos produto-res familiares não-estruturados a partir dodesenvolvimento de processos de coopera-ção, a ser liderado por eles próprios e tendoa participação fundamental dos produtoresestruturados e consolidados, tende a possibili-tar uma promoção, mais efetiva dessa formade Desenvolvimento Local.

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INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 10, n.1, p. 9-19, jan./jun. 2009.

10 Fausta Calado da Silva; Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão

É dentro desse contexto que se insereo presente artigo, que tem como objetivo le-vantar e analisar as instâncias e áreas emque a cooperação existe, está faltando e tempossibilidades de conduzir a um processo deinclusão competitiva dos produtores familia-res não-estruturados.

Acredita-se que a análise dos fatoresdeterminantes da cooperação entre os agri-cultores familiares, dando-se ênfase aos ele-mentos vinculados à teoria sociológica cons-titui um esforço que merece ser empreendi-do junto ao setor de floricultura tropical doestado de Pernambuco.

Espera-se com essa pesquisa de cam-po contribuir para uma melhor compreen-são da realidade local dos produtores fami-liares de modo a subsidiar a elaboração, aimplementação e a avaliação de estratégias,públicas e privadas que busquem o desenvol-vimento local do Setor.

Quanto aos procedimentos metodoló-gicos o trabalho foi constituído em duas eta-pas, uma envolvendo a pesquisa bibliográficae outra sendo composta pela pesquisa empí-rica. A presente pesquisa deve ser compreen-dida como exploratória e de caráter qualita-tivo, onde a base de informações foi levanta-da a partir da utilização de formulário estru-turado e complementado por entrevistas(semi-estruturadas) e não estruturadas. Estapesquisa está no campo das ciências sociais,tem natureza aplicada, conforme classificaAnder-Egg (1978, p.33) apud Marconi eLakatos (1986, p.19). Tem preocupações des-critivas, buscando-se analisar e interpretarrelacionamentos entre os produtores. Tam-bém, segundo Hymann (1967, p.107-108)apud Marconi e Lakatos (1986, p.19), a pre-sente pesquisa também se classifica como ex-perimental, uma vez que procedeu a levan-tamento explicativo, avaliativos e interpre-tativos, buscando-se subsídios para melho-rias futuras nos relacionamentos cooperati-vos dos produtores da floricultura tropical.

Deve advertir que os dados levantadosbuscaram compreender, principalmente, aperspectiva dos próprios produtores familia-res sobre os temas aqui analisados. Essa foia preocupação básica para se inferir sobreas reais possibilidades de cooperação na vi-são desses atores. A partir da perspectiva dospróprios produtores familiares, as principais

características, problemas, instituições e as-pectos das articulações cooperativas existen-tes entre os atores sociais e econômicos en-volvidos com o setor, dando ênfase nas ins-tituições (públicas e privadas) que poderiamexercer papel importante na dinamização dosetor de floricultura tropical do Estado, deforma que possam participar de uma inclu-são competitiva dos agricultores familiares.

Competição e cooperação

No contexto deste trabalho, pode-seentender competição como uma disputa en-tre pessoas que tentam maximizar suas van-tagens às expensas dos demais. Diferente-mente, cooperação corresponde ao esforçocoordenado por indivíduos para se atingirobjetivos comuns. Duas questões podem serrelacionadas a essas idéias: a competição énecessariamente nociva? E qual delas, coope-ração ou competição, tende a prevalecer nassociedades urbanas?

Sociológicos como Herbert Spencer(conforme JOHNSON, 1997) consideravama competição um mecanismo necessáriopara promover o progresso social, opiniãoesta que concordava em grande parte com osistema capitalista então emergente, aproxi-mando-se, inclusive da metáfora da “mãoinvisível”, que dizia que na busca de seuspróprios interesses individualistas os atoressociais terminavam por promover o bem-estar geral da coletividade. A Escola deChicado também enfatizou o papel da com-petição nos padrões de crescimento urbano,à medida que vários grupos étnicos, raciaise de classe, entre outros, competem por es-paço e Max Weber considerava a competiçãouma forma pacífica de conflito. Contraria-mente, Karl Marx, em sua crítica ao capita-lismo, argumenta que a competição entrecapitalistas, entre trabalhadores e entre capi-talistas e trabalhadores eram as principaiscausas da contradição. Na abordagem mar-xista fica, portanto, a idéia de que a compe-tição própria do sistema capitalista provocaconseqüências claramente negativas, parti-cularmente as relacionadas com a explora-ção da classe trabalhadora e a falta de cons-ciência e unidade dessa classe quanto à suasubordinação.

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INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 10, n. 1 p. 9-19, jan./jun. 2009.

11Extensão rural e floricultura tropical para o desenvolvimento local: a cooperaçãono processo de inclusão competitiva dos agricultoras familiares em Pernambuco

Elementos fundamentais no processo decooperação destacados pela Sociologia

Parte-se do conceito de socialização,que se refere às interações que induzem osindivíduos a partir dos componentes básicosda personalidade necessários à sua participa-ção na sociedade, conforme Turner (1999,p.253). Para Galliano (1981, p.307) a sociali-zação pode ser compreendida como sendoum processo de “aquisição de conhecimen-tos, padrões, valores, símbolos”. Adiciona,ainda o autor, que o conceito compreendetambém a aquisição, durante toda a vida doindivíduo, de “maneiras de agir, pensar esentir próprias dos grupos, da sociedade, dacivilização em que o indivíduo vive”. Logo,o modo de produção – que compreende,como será visto adiante neste trabalho, asforças produtivas e as relações de produção– são elementos fundamentais influenciado-res do processo de socialização em qualquersociedade. Considera-se que o modo de pro-dução prevalecente em determinada socie-dade seja um elemento básico a influenciara socialização e, portanto, as percepções dosindivíduos e grupos, estabelecendo umamaior ou menor propensão para se agir emdeterminado sentido.

As forças produtivas de uma determi-nada sociedade são compostas por meios deprodução (máquinas e equipamentos) e pes-soas. Em todo processo produtivo há tam-bém um processo de interação entre pessoase o resultado, a produção, é fundamental-mente um resultado de um ato social. Emtodas as fases do circuito econômico (produ-ção, distribuição e consumo) estabelece-seum emaranhado de relações entre pessoas,resultando nas chamadas relações de produ-ção. O traço mais característico das relaçõesde produção no capitalismo é dado pela exis-tência, de um lado, dos proprietários dosmeios de produção e, de outro, a existênciados trabalhadores assalariados detentoresapenas de sua força-de-trabalho. O concei-to de modo de produção, ou sistema econô-mico, de uma determinada sociedade é de-terminado pelas forças produtivas e pelasrelações de produção que estão vinculadasa essa sociedade. Sendo assim, o modo deprodução é definido pela maneira através daqual uma dada sociedade produz os seus bens

e serviços, os utiliza e os distribui, sendo omodo de produção o centro organizador detodos os aspectos da sociedade, conformeOliveira (2001).

O modo de produção é, portanto, oconceito básico a partir do qual se pode ten-tar compreender os aspectos levantados pelasociologia do conhecimento relativamente àspossibilidades de cooperação dentro de umdeterminado grupo de pequenos produtores.Vale ressaltar que a condição dos pequenosprodutores não os caracteriza como classedominante, aproximam-se eles muito maisdas vulnerabilidades próprias dos trabalha-dores assalariados. Na verdade, mesmo oscamponeses proprietários são consideradoscomo proletário, segundo Merton (1970,p.574). O mencionado autor mostra também,que a classe dominante finda por impor oconteúdo da cultura e, por conseqüência,ideológico que mais lhe serve.

Análise dos resultados

Privilegiando-se a percepção dos pro-dutores familiares entrevistados, buscou-senessa análise caracterizar as unidades pro-dutivas investigadas, os principais proble-mas enfrentados pela floricultura tropical doestado de Pernambuco, bem como as intera-ções com os entes que compõem o entornoinstitucional do setor e as iniciativas vincu-ladas à cooperação, como meio de fortalecera competitividade do setor. Pretendeu-se,como mencionado, obter a visão dos produ-tores entrevistados sobre quais os temas (ouquestões) que poderiam ser considerados osmais relevantes dentro da floricultura tropi-cal no Estado de Pernambuco.

O conjunto de produtores entrevista-dos2 foi selecionado, principalmente, a par-tir do nível de estruturação e consolidaçãoque apresentavam por ocasião das entrevis-tas. Assim, considerou-se para os propósi-tos perseguidos no presente trabalho, como“estruturado” o produtor que conseguia con-trolar todo ciclo de produção e vendê-la nomercado, caso contrário o produtor foi consi-derado “não-estruturado”. Ou seja, esse pro-dutor não consegue concluir o ciclo dos negó-cios das flores tropicais, ao não sistematizaros canais de distribuição necessários à siste-matização de suas vendas. E considerou-se

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INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 10, n.1, p. 9-19, jan./jun. 2009.

12 Fausta Calado da Silva; Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão

“consolidado” o produtor que já tenha rea-lizado vendas para outros estados brasilei-ros ou para mercados internacionais, casocontrário o produtor foi considerado “não-consolidado”. Em outras palavras, produtorconsolidado já adquiriu maturidade suficien-te para exportar a sua produção atendendo,conseqüentemente, aos requisitos de eficiên-cia e qualidade necessária para atender osrequisitos de qualidade produtiva e operacio-nal (logística) e regulatória para tanto.

Considerando essa classificação, oconjunto selecionado (e entrevistado) de pro-dutores foi assim constituído: dois produto-res considerados estruturados e consolidados;dois produtores estruturados e não-consolida-dos e dois produtores não-estruturados e não-consolidados. Esses produtores foram estuda-dos em profundidade nessa pesquisa, o queenvolveu longas entrevistas, estruturadas esemi-estruturadas e visitas às suas proprie-dades, mantendo-se entrevistas com os tra-balhadores das unidades produtivas.

Ressalta-se que todas as unidades pro-dutivas entrevistadas se caracterizam comode base familiar. Vale observar, no entanto,que alguns entre os produtores estruturadosmantêm mão-de-obra assalariada para aexecução de um conjunto de tarefas específi-cas. No entanto, todos os produtores investi-gados caracterizam-se por manter uma ges-tão familiar dirigidas pelos próprios donos eseus familiares. Esses familiares desempe-nham, em geral, outras tarefas na produçãoe distribuição de flores tropicais e dedicamtempo integral ou parcialmente a elas.

Cabe observar que, levando-se em con-ta a grande heterogeneidade do grupo deprodutores selecionados, em termos de estru-turação e consolidação, a visão dos proble-mas que emergiu mostrou-se muito conver-gente e, conseqüentemente, consistente como que na realidade marca as questões maisfundamentais para a floricultura tropical noEstado de Pernambuco.

É óbvio, como mencionado acima, queos resultados acima não poderão ser utiliza-dos para extrapolações estatisticamente ro-bustas sobre os temas tratados para toda afloricultura tropical do Estado, pois isso nãofaz parte do escopo do presente trabalho,mas certamente os resultados aqui obtidospoderão servir de úteis subsídios para o de-

lineamento de pesquisas futuras, formalmen-te quantitativas. Afinal esse pode constituirum dos objetivos legítimos de uma pesquisaqualitativa e exploratória como a presente.

Felizmente, acredita-se que os resulta-dos encontrados na presente pesquisa exce-deram a mera provisão desses subsídios, res-salvadas as limitações colocadas acima. Aconvergência obtida nas respostas levanta-das permite que as mesmas sejam exploradasno sentido de se inferir sobre o papel da coo-peração como elemento fundamental na in-clusão competitiva dos agricultores familia-res entrevistados.

Nesse processo de dinamização, o se-tor de flores aparece com uma estrutura di-vidida, onde de um lado se encontra um pe-queno conjunto de produtores estruturadose consolidados competitivamente, inclusivecom experiência de exportações, e, de outro,um conjunto de produtores não-estruturados,que estão desenvolvendo forte esforço no sen-tido de obterem uma inclusão competitivadentro do setor.

Observe-se que a floricultura tropicaldo Estado apresenta elevada possibilidadede expansão, podendo gerar um expressivonúmero de pontos de trabalho e renda, alémde suas possibilidades de geração de divisase tributos. Tudo isso só será possível, no en-tanto se houver uma inclusão competitivade inúmeros produtores familiares que aindase encontram não-estruturados. Torna-se,portanto, indispensável entender na pers-pectiva desses produtores, como se poderiadesenvolver esforços, públicos e privados,convergentes com os interesses de todos.Com isso poderão ocorrer processos de coo-peração mais efetivos e com resultados ex-tremamente promissores.

Deve-se destacar primeiramente, nes-sa análise, que a produção de flores tropicaispoderá ser significativamente ampliada atra-vés das seguintes possibilidades, entre outras,que se mostram viáveis: i) Aumento da áreaplantada pelos atuais agricultores familiares(estruturados, não-estruturados, consolidados enão-consolidados); ii) Incremento da produti-vidade das pessoas e da terra dos produtoresfamiliares, principalmente dos não-estrutura-dos; iii) Aumento do número de produtorespela inclusão de outros produtores que se-riam atraídos em caso de sucesso mais efeti-

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vo (e visível) dos atuais produtores familia-res não-estruturados; iv) Maior nível de espe-cialização de todos os produtores, em varie-dade de plantas e funções mais claras dentroda cadeia produtiva; v) Melhor coordenaçãoentre os processos e elos da cadeia produti-va; vi) Aumento dos lucros potenciais e, con-seqüente, maiores possibilidades de re-inves-timentos no setor; vii) Redução de riscosempresariais e financeiros pela consolidaçãodo setor; viii) Maior capacidade de oferta,maiores quantidades de um conjunto deplantas mais diversificado, implicando emmaior regularidade na oferta e, conseqüente-mente, maior confiabilidade dos clientesquanto ao atendimento da demanda.

Tudo isso remete à grande potenciali-dade apresentada pelo setor de floriculturatropical em termos de geração de emprego,renda, divisas e tributos. Uma eventual re-dinamização do setor implicará, como argu-mentado acima, numa maior oferta, tenden-do a se observar uma relevante redução decustos por conta da escala produtiva. Isso,em si, pode gerar maiores lucros e, portanto,aumento das atratividades sobre novos in-vestimentos, o que poderia caracterizar, emúltima instância, em função do caráter retro-alimentado do processo, uma promissoraestratégia de desenvolvimento local.

Perfil socioeconômico dos produtoresfamiliares entrevistados

Neste artigo priorizamos o perfil dosprodutores não-consolidados que correspondeaos associados da Cooperativa dos Produ-tores de Flores Tropicais do Município dePaudalho, Copaflora, que se caracterizacomo agricultores familiares com baixa esco-laridade (em geral analfabetos) e se mostrammuito dependentes de ações do órgão a queestão vinculados; não existe contratação demão-de-obra assalariada, nem a contrataçãodireta de técnicos. As orientações técnicasdemandam da cooperativa, que, no casoanalisado, ainda se encontra em processo dereestruturação3.

Os produtores agricultores familiaresse apresentam como famílias de baixa rendae que vivem, quase que exclusivamente, doque plantam. Com relação à unidade produ-tiva, todos estão envolvidos totalmente com

a produção. Apenas o escoamento da pro-dução depende da cooperativa, pois eles nãotêm recursos e nem conhecimento parapromovê-los.

Caracterização das unidades produtivasentrevistadas quanto à mão-de-obraempregada

Todas as unidades produtivas entrevis-tadas4 caracterizam-se por uma administra-ção baseada na família. De fato, os produto-res entrevistados participam diretamente docontrole da gestão dos negócios de suas res-pectivas unidades produtivas, junto comseus familiares. No total, são 14 pessoas (pro-prietárias e membros da família) na gestãodas unidades produtivas. Além desses, noconjunto das unidades produtivas entrevis-tadas, foram registradas mais 6 pessoas naárea administrativa, esses assalariados. Tra-balhando diretamente na produção, regis-trou-se mais 22 trabalhadores, totalizandojuntamente com os mencionados trabalha-dores da área administrativa, em todas asunidades entrevistadas, 28 trabalhadoresassalariados.

Ressalte-se, que nas unidades produti-vas dos produtores estruturados, apesar daexistência de trabalhadores assalariados, in-clusive na área administrativa, o controle éfeito diretamente pelos proprietários ou al-guém da família. Quanto aos agricultores fa-miliares não-estruturados e não-consolidadostodos da família estão envolvidos com a uni-dade produtiva, participando das tarefas emtodo o processo da produção, exceto nasvendas.

Caracterização das unidades produtivasentrevistadas quanto à área e espéciesplantadas, possibilidades de exportaçãoe padrão de qualidade

Considerando-se os produtores entre-vistados, o total da área plantada de florestropicais chegou a 54 hectares, sendo 30 hec-tares a área plantada pelos associados daCooperativa dos Produtores de Flores Tropi-cais do Município de Paudalho (Copaflora).

Com relação à exportação de flores tro-picais, como já mencionado, só os produto-res estruturados e consolidados já conseguiram

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realizar exportações, para outros estadosbrasileiros ou para outros países. Nos últimosanos, segundo relatos dos mesmos, as expor-tações do setor mostram-se praticamenteparalisadas em função da variação do dólarfrente ao real5.

Os demais produtores, principalmen-te os da Copaflora, ainda estão distantes deconseguirem exportar, primeiramente, pelasdificuldades de acessar o mercado interna-cional, e depois pelos requerimentos de qua-lidade impostos pelo mercado internacionale, ainda, pelos problemas apontados pelosprodutores que já exportaram (problema dataxa de câmbio, custos logísticos e pelos en-cargos tributários).

Caracterização das unidades produtivasentrevistadas quanto às espéciescultivadas

Na produção de flores tropicais asprincipais espécies cultivadas6 são as Helico-nias (pequenas, médias, grandes e pendentes)com suas variedades; Bihai, Golden Torch,Rostrata, Rauliniana, Alan Carle, e outras,seguida da Alpinia (Ginger), o Bastão-do-imperador (Etlingera Elatior ,Torch Ginger),o Sorvetão (Zingiber Spectabilis), o CostusTapeinochillus e outras flores tropicais, alémdas folhagens7.

Na produção da Cooperativa dos Pro-dutores de Flores Tropicais do Município dePaudalho, a Copaflora, no projeto foi inicia-do com 12 espécies de flores tropicais, oscooperados cada um recebeu inicialmenterizomas de três espécies, sendo que todosreceberam a Heliconias Golden Torch.

Caracterização das unidades produtivas– aspectos da comercialização – vendasda produção de flores tropicais

Todos os produtores mencionaram asdificuldades de mercado como sendo o prin-cipal entrave dos produtores não-estrutura-dos. Na verdade, pode-se depreender dosrelatos dos entrevistados, que as dificuldadesda comercialização dos produtores decorremde inúmeros outros fatores entre os quaisvalendo mencionar: qualidade das plantas,dificuldades no pós-colheita (preparação doproduto para venda e produção de arran-

jos), dificuldade logística, dificuldade deacesso a crédito e dificuldades no estabeleci-mento de estratégias de mercado adequadasao setor. Essas últimas requereriam um fluxode informações e conhecimento específicosque possibilitassem a identificação e seleçãodos segmentos de mercado a explorar a par-tir de estratégias mercadológicas válidas. Issoestá, de fato, muito distante da possibilidadedos produtores não-estruturados e só podeser viabilizado através de iniciativas associa-tivas ou cooperativistas, como é o caso daCopaflora para os produtores de flores tropi-cais de Paudalho.

Apurou-se nas entrevistas que, no casoda Copaflora, a venda da produção é inci-piente e os cooperados, estão ainda em pro-cesso de aprendizagem sobre todo o cicloprodutivo e comercial do segmento das florestropicais. Destaque-se que os mesmos vêmtentando estabelecer parcerias com empresasque atuam na comercialização de produtos,restaurantes, e outros locais para poder es-coar a sua produção de forma mais regular.Na verdade, os cooperados têm consciênciada importância do mercado consumidor,inclusive de suas potencialidades para o se-tor de floricultura tropical.

No que pese as dificuldades na comer-cialização dos produtos, os produtores não-estruturados acreditam no potencial e ven-das de seus produtos, o mercado se mostramuito promissor, pois ainda existem merca-dos que ainda não foram explorados.

O segmento está sujeito à sazonalidadetanto na produção das flores (cada espécieobedecem ao seu ciclo natural) e, também,quanto às oscilações da procura pelos pro-dutos durante o ano. Existem épocas do anoem que se vende mais no setor de floricultu-ra tropical, principalmente em datas come-morativas8.

Para aproveitar determinadas épocasos produtores não-estruturados têm organi-zado determinados eventos coletivos, comoa organização de lugares para a exposiçãodos produtos, demonstrando disposição paraunir forças e cooperar uns com os outros.

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Principais problemas citados dafloricultura tropical do estado dePernambuco

A análise dos principais problemas dafloricultura tropical do estado de Pernam-buco, na perspectiva dos próprios produto-res, foi realizada por áreas e subáreas, (assis-tência técnica, crédito, comercialização/mercado, cooperação, distribuição, pós-co-lheita, produção, recursos humanos, regula-ção do setor e tecnologia da informação) con-forme organização do formulário utilizadonas entrevistas.

O grupo dos produtores não-estruturadoapresenta como o principal problema no se-tor as dificuldades no âmbito da comerciali-zação/mercado, porque eles produzem masnão têm como escoar a produção. Depen-dem quase que totalmente das ações da coo-perativa. Contudo, eles reconhecem tal difi-culdade e têm consciência que estão numafase de total aprendizado sobre todo o cicloprodutivo do setor.

Análise a partir das áreas dos principaisproblemas citados

Ainda conforme o formulário aplica-do, foram hierarquizados os três problemasconsiderados mais graves pelos produtores,buscando-se destaca-los. Assim os três pro-blemas apontados como “mais graves”, poráreas, foram: o primeiro problema mais gra-ve a comercialização/mercado; o segundoproblema “mais grave” às áreas de produçãoe pós-colheita e o terceiro problema maisgrave relaciona-se aos recursos humanos.

Dentro da área de comercialização/mercado, os principais problemas enfrenta-dos pelos produtores por subáreas foram:“falta de acesso a canais de distribuição”(distribuidores, representantes, varejistas,etc.). Este foi o item mais apontado como o“muito importante”, seguido dos itens, “au-sência de uma marca comercial reconheci-da”, “falta de cultura para o consumo”, “as-sistência técnica”. Em terceiro lugar aparececom os itens “alta carga tributária” e a “faltade divulgação do produto (no mercado inter-nacional)”.

Na área da produção as principaissubáreas apontadas foram: as mais impor-

tantes: “adubação e/ou correção do solo” e“baixa profissionalização dos produtores”,seguidas de “análise do solo”, “assistênciatécnica”, “ausência de pesquisa/estudos”,“baixa qualidade do produto”, “falta dequalificação de mão-de-obra”, e “insumos(herbicida, inseticida)”. Mesmo alguns dosprodutores estruturados, apontam tambémcomo a “integração da cadeia produtiva naprodução” como algo muito importante.

Registre-se que o planejamento dasações a serem realizadas no âmbito dacomercialização aparece como uma necessi-dade fundamental a ser atendida. Nestecaso, a coordenação das ações articuladaspor produtores e instituições parece tambémconstituir uma preocupação básica.

Investir na capacitação dos produtorese nas técnicas produtivas adequadas mostra-se, também, como uma preocupação a serconsiderada nas ações a serem empreendi-das para a consolidação do setor através dainclusão competitiva dos agricultores fami-liares. Parcerias e articulações cooperativassão indispensáveis para que na consolidaçãode uma nova etapa de dinamismo do setor.

Na área de pós-colheita as principaissubáreas que são consideradas as mais im-portantes são: “ausência de pesquisa/estu-dos”, seguida das subáreas de “inadequaçãodos meios de apoio logístico (na unidade pro-dutiva”), “inexistência de material com infor-mações técnicas e tecnologia pós-colheita”.

Conhecimento técnico, apoio logísticoadequado configuram-se como limitantes aserem resolvidos.

Na área de recursos humanos assubáreas consideradas importantes são: a“falta de pessoal qualificado (na Produção)”e a “falta de interesse da população local portreinamento”. Investimentos em capacitaçãodo pessoal, na opinião dos entrevistados,destaca-se como uma prioridade consensual.

Instituições relacionadas com o setor deflores tropicais

Entre as instituições com as quais osentrevistados tem mais interagido nos últi-mos anos, destaca-se como a mais importan-te o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro ePequenas Empresas, o SEBRAE de Pernam-buco. A importância do Sebrae estadual tem

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sido apontada por todos os entrevistados res-saltando-se o seu papel no desenvolvimentodo setor no Estado na década de 1990.

Já, os cooperados da Copaflora tam-bém destacam a participação do Programade Apoio ao Desenvolvimento Sustentável aZona da Mata de Pernambuco, PROMATA,no nascedouro da cooperativa junto com oapoio da Ong CEAC (Centro de Apoio àsFamílias Carentes), e a Prefeitura Municipalde Paudalho. Também foram citados, comoinstituições que interagem, os bancos oficiaisbrasileiros (BB e BNB), que liberaram finan-ciamento para os agricultores familiares.Também merece destaque a UniversidadeFederal Rural de Pernambuco, a UFRPE atra-vés Departamento de Agronomia – Área deFitotecnia – Laboratório de Floricultura noPrograma de Pós-graduação em Melhora-mento Genético de Plantas na Área deFitotecnia que participa com seus alunos depesquisa de campo junto a produtores.

Existem outras instituições governa-mentais e privadas que poderiam estar en-volvidas direta ou indiretamente com o setorde floricultura tropical do estado de Pernam-buco, porém elas não foram citadas pelosprodutores entrevistados.

Ações na produção de flores tropicais -estratégia de marketing

Os agricultores familiares associadosda Copaflora têm se preocupado com a cria-ção de um selo (ou logomarca) para a coope-rativa e já providenciaram a criação da mar-ca da cooperativa. Vale mencionar as prin-cipais estratégias de dinamização mercado-lógica do setor de Floricultura Tropical dePernambuco, segundo os entrevistados, asaber: i) Eventos envolvendo técnicos e aca-dêmicos, produtores e outros atores ligadosao setor, ii) Sensibilizando os órgãos públicosde pesquisa a se envolverem mais com o se-tor, iii) Sensibilização dos próprios produto-res a se organizarem, iv) Feiras de negócios.

A expectativa dos agricultores familiaresda Copaflora – ambiente favorável ainclusão competitiva

Atualmente os agricultores familiaresque fazem parte da Copaflora, diante das

dificuldades passadas, sabem melhor comoenfrentarão problemas que certamente apa-recerão e não parecem temerem os percalçosfuturos. Os entrevistados demonstraram tercerta convicção da importância da coopera-ção articulada através da cooperativa parao enfrentamento de problemas comuns. Ébem representativo este sentimento, comomostrado no relato de um dos agricultoresfamiliares entrevistado:

[...] o que eu entendo é estas visitas que agente faz, no sítio do outro, por que cadauma pessoa trabalha de um jeito, né, o caravai pegando(conhecimento) um do outro,um do outro, ... oxente, é outra coisa, a gentesozinho não faz nada não [...]. (ENTREVIS-TADO B, 2008). [grifo nosso].

Isso manifesta um claro sinal da dispo-sição de ajudar (e de ser ajudado) para terresultados promissores, revelando um am-biente favorável à inclusão competitiva.

A coordenação das ações de coopera-ção a serem dirigidas na busca das soluçõesdos problemas mais importantes, dentre elesa comercialização do produto, constitui fatorfundamental no processo de desenvolvimen-to local na sua área da atuação desses produ-tores, devendo o aprendizado sobre essa ar-ticulação/cooperação ser incorporado comopremissa de um programa mais efetivo deextensão rural para o setor.

Não houve relatos de atividade com-partilhada de forma sistemática entre os pro-dutores no Setor de Floricultura, mas existemprodutores que dão palestras e capacitam al-guns interessados na área e esse tipo decapacitação vem se repetindo com freqüên-cia. Ademais, alguns produtores chegam atrocam informações, quando são solicitadosa fornecer flores tropicais entre si para ajudarno atendimento de demandas.

Também se constatou que a maioriados entrevistados faz parte de algum grupocomo associação e cooperativa. Porém, osprodutores estruturados não dependem deassociações ou cooperativas, como mencio-nado tem condições financeiras e operacio-nais muito boas, e alguns tem relacionamen-tos com algum tipo de associação.

Esses produtores mais estruturados econsolidados poderiam ter ganhos substan-ciais se pudessem conduzir mercadologica-mente os não-estruturados, fazendo-os tam-bém ganhar. Trata-se da busca de uma visão

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empreendedora por parte dos produtoresconsolidados que estariam em uma atividadeque já dominam e poderiam obter retornoselevados.

Na verdade, se chamados por um enteque tem credibilidade, como o Sebrae ou aUFRPE, acredita-se que a maioria dos pro-dutores participaria na criação de uma ins-tância que agregasse todos os produtores,pois eles demonstram interesse em ações quepudessem ser articuladas conjuntamentecom os outros envolvidos com o setor.

Entre os menos estruturados, registra-se, por exemplo, que a Copaflora mantémarticulada conjuntamente entre os agricul-tores familiares, reuniões regularmente e vi-sitas por parte da diretoria para estimular,apoiar e incentivar os cooperados, existindouma troca de experiências e de informações,tendo como um assunto recorrente à buscade soluções para o escoamento e venda daprodução.

Levantamento dos atores sociaisefetivamente envolvidos com o setor deflores tropicais de Pernambuco

Segundo os produtores, atualmentenão há instituições que estejam promovendoações específicas em torno do setor. Comrelação a Copaflora, entre as instituiçõesdestacam, também o governo municipal dePaudalho, tem dado bastante apoio aos agri-cultores familiares; a ONG CEAC – Centrode Apoio a Pessoas Carentes – que foi a ope-radora de negócios do projeto inicialPromata e a UFRPE, que tem apoiado nocampo da pesquisa, os bancos oficiais tam-bém foram lembrados. Os entrevistadosapontaram, também, o Sebrae como sendode muita importância nos primórdios dodesenvolvimento do setor.

Possibilidades de formação decooperação no setor de flores tropicais

Os produtores entrevistados quandosolicitados a se posicionarem sobre algumasfases ligadas à sua disposição de cooperaçãoentre si, demonstram concordar fortementeque “Pequenas empresas, operando de formaarticulada, tornam mais fácil a inclusão com-petitiva”, “Reunião de pequenas empre-

sas facilita o desenvolvimento local” e “Coo-peração e espírito empreendedor entre em-presas gera maior competitividade na Flori-cultura Tropical”.

E concordam que “Sozinho no negó-cio, é difícil uma inclusão competitiva”,“Grupo de empresas chama a atenção decompradores, de fornecedores e do própriogoverno” e “Grupo de empresas têm maisfacilidade de participação em feiras no Brasile no exterior”.

E também concordam que “Sua em-presa teria vantagens se trabalhasse em con-junto com outras”. Logo, demonstraram boadisposição à cooperação entre si na buscapor soluções a seus problemas comuns.

Ressalta-se que, quanto ao nível decooperação entre as empresas do setor deflores tropicais do estado de Pernambuco osagricultores familiares consideram de nívelmédio. Todavia, os agricultores familiares dosetor de floricultura tropical do estado dePernambuco não costumam cooperar para:comprar insumos, vender, treinar mão-de-obra, produzir, distribuir.

Levantamento da interatividade entre osatores sociais envolvidos com o setor deflores tropicais de Pernambuco – açõesdesenvolvidas de cooperação

Os produtores consideram as parceriasdentro do setor muito raras e, em geral, osprodutores mais estruturados e consolidadosjulgam não necessitar das mesmas. Há, con-tudo, parcerias informais e embrionárias daUFRPE com algumas unidades produtivas,podendo essas iniciativas ser mais desenvol-vidas no futuro.

Ademais, os agricultores familiares jáfizeram parcerias com empresa de comercia-lização e prontamente buscam parceriascom: órgãos públicos, fornecedores, associa-ções, universidades, Ong’s, empresas domesmo setor, empresas de outro setor.

Em resumo pode-se dizer que as possi-bilidades de cooperação entre os produtorese entre esses e as instituições ainda são poucodesenvolvidas. Há, contudo, uma atividadepositiva por parte dos produtores no sentidode buscarem coletivamente por soluções aosseus problemas comuns. Na verdade, a coo-peração institucional aparece como uma

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promissora alternativa uma vez que podeefetivamente conduzir a uma nova dinami-zação do setor através da articulação deações e geração de sinergias.

Considerações finais

A cooperação legítima entre os produ-tores deve ser resultado de um entendimen-to entre eles sobre a necessidade de juntarforças para que todos os envolvidos saiamefetivamente ganhando, para isso necessitase basear num clima de confiança mútua.

Então, a base para o desenvolvimentode uma estratégia de efetiva cooperação deveser composta de dois ingredientes fundamen-tais: confiança mútua entre as pessoas envol-vidas (particularmente entre os próprios pro-dutores); visão comum quanto às possibili-dades de ganhos futuros (visão comum ba-seada, principalmente, no conhecimentoque se tem sobre a realidade em que atuame nas oportunidades que podem ser geradasdentro dessa mesma realidade).

Na discussão sobre as possibilidades deconvergências de interesses entre os produ-tores de flores tropicais não-estruturados eos já estruturados e consolidados no processode dinamização do setor de flores tropicaisdo Estado de Pernambuco, que fossem favo-ráveis à inclusão competitiva dos produto-res familiares, merece ressaltar que são possí-veis diversos ganhos adicionais para todos apartir de uma visão mais empreendedora porparte dos produtores estruturados e conso-lidados sobre a realidade e potencialidadesdo setor.

Acredita-se que este trabalho tenhaproporcionado uma visão sobre o setor quesubsidie outras pesquisas futuras queaprofundem o conhecimento sobre a flori-cultura tropical do Estado de Pernambuco,sejam elas de caráter qualitativo ou quanti-tativo. Especificamente, recomenda-se a ela-boração de pesquisas que promovam o le-vantamento de dados quantitativos abran-gentes sobre o setor. Propõe-se, também, queoutras pesquisas busquem analisar a questãoambiental do setor que ajudem na antecipa-ção dos impactos ambientais decorrentes deuma eventual expansão de sua produção.

Espera-se com essa pesquisa contribuirpara uma melhor compreensão da realida-

de local dos produtores familiares de modoa subsidiar a elaboração, a implementação ea avaliação de estratégias, públicas e priva-das e de uma extensão rural do setor, queprivilegie a perspectiva dos produtores fa-miliares, e que busquem o desenvolvimentolocal do Setor de Floricultura Tropical doEstado de Pernambuco.

Notas1 Na terminologia aqui empregada, o termo “Inclusão

Competitiva“ está sendo usado para indicar uma situ-ação em que os agricultores familiares estão prepa-rados para competirem no mercado mesmo na au-sência de apoio assistencialista do governo ou dequalquer outro ente, público ou privado. Ou seja,produtores familiares que conseguem, a partir de suaprópria produção, sobreviverem no mercado.

2 Todos os entrevistados dedicam-se a Floricultura Tro-pical, porém os mesmos também atuam em outrasatividades rurais ou urbanas.

3 Trata-se da Cooperativa dos Produtores de FloresTropicais do Município de Paudalho - Copaflora doMunicípio de Paudalho-PE.

4 Essas unidades produtivas estão localizadas em: Al-deia/Camaragibe, Paudalho, Paulista e Ribeirãomunicípios do estado de Pernambuco.

5 Segundo relatos dos produtores, como as exporta-ções ocorriam através de uma espécie de consócio, aformalização das exportações junto aos órgãos regu-ladores federais e estaduais fica a cargo apenas deum representante dos produtores, onerando-o maisdesproporcionalmente por remete-lo à outra catego-ria de contribuinte, em função das remessas de pro-dutos ao exterior. Para uma equalização dos custostributários e logísticos pertinentes.

6 Todas essas espécies são muito valorizadas na produ-ção de arranjos com flores tropicais Além das folha-gens com seus diversos tipos que compõem os arran-jos e buquês. Os retornos potenciais das flores tropi-cais e seus arranjos, comparando com a ociosidadeda terra e com o emprego em outras culturas tradicio-nais.

7 As folhagens são um item de grande importância nafloricultura tropical, uma vez que 60% dos arranjos éde folhagem. No mercado local as hastes são vendi-das a centavos, os arranjos por terem a arte e acom-panhados de folhagens pode sair com um preço deR$ 130,00 (Arranjo Tropical R$ 130,00 cód.: 012, Co-roa com Antúrios R$ 450,00 cód.: 048), segundo fon-tes no site da Teleflores Silvestre (2008) (http://www.telefloressilvestre.com.br) e ainda os arranjospoderão sofrer variações em função da disponibili-dade das flores.

8 Os principais momentos de atividades sociais em queos produtores têm mais contatos visando à competi-tividade do Setor é nas “feiras e exposições” conside-rada pelos entrevistados como muito importante,seguida pelos “eventos e workshopings” e pelas “con-ferências, seminários, cursos” ou “treinamentos eencontros”.

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19Extensão rural e floricultura tropical para o desenvolvimento local: a cooperaçãono processo de inclusão competitiva dos agricultoras familiares em Pernambuco

Referências

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MERTON, Robert K. Sociologia: teoria e estrutura. SãoPaulo: Mestre Jou, 1970.

OLIVEIRA, Pérsio S. Introdução à Sociologia. 24. ed. SãoPaulo: Ática, 2001.

TURNER, Jonathan H. Sociologia conceitos e aplicações.Trad. Márcia Marques Gomes Navas. Revisão técnicaJoão Clemente de Souza Neto. São Paulo: MarronBooks, 1999. p.253.

TELEFLORES SILVESTRE. Buquês, arranjos, ramalhetes,cestas de flores, coroas de flores, cestas de café da manhã. Av.Cons. Rosa e Silva, 1312, Aflitos, Fone: (81) 3241.8257,Recife, 2008

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Desenvolvimento local e agricultura familiar: o caso da produção de açúcarmascavo em Capanema – Paraná

Local development and family agriculture: the brown sugar production case inCapanema city– Paraná state in Brazil

Développement local et agriculture familiale: le cas de la production de sucre brundans la ville de Capanema dans l’état du Paraná au Brésil

Desarrollo local y la agricultura familiar: el caso de la producción de azúcar marrón en laciudad de Capanema - estado de Paraná en Brasil

Mariza Zeni de Castro Tomasetto*Jandir Ferrera de Lima**

Pery Francisco Assis Shikida***

Recebido em 24/10/2008; revisado e aprovado em 29/11/2008; aceito em 17/12/2009

Resumo: Esse estudo analisa, por meio de um estudo exploratório, o aporte dos produtos derivados da cana-de-açúcar no contexto do desenvolvimento local no município de Capanema – Paraná. Essa atividade se apresenta comoopção para a produção da agricultura familiar ao criar alternativa de renda nas unidades agroindustriais, além depossibilitar a diversificação da produção. Os resultados mostram que a produção de açúcar mascavo e os demaisprodutos derivados da cana-de-açúcar, assim como os já tradicionais produtos da agricultura familiar, têm contribuídopara aumentar a renda e melhorar as condições de vida dos agricultores e, conseqüentemente, vem impulsionando odesenvolvimento local, uma vez que tem incentivado o homem a permanecer no campo.Palavras-chave : Economia agrícola. Agricultura familiar. Desenvolvimento local.Abstract: This research analyzes the products input derived from the sugar cane through an exploratory study in thelocal development context of Capanema city in Paraná State. This activity is shown as an option for the familyagriculture production as it raises an income alternative at agriculture and industry units, besides providing aproduction diversification. The results show that brown sugar production and all other sugar cane derived products,as well as the family agriculture traditional products, have contributed to increase the income and improve producerslife conditions. As a consequence, it has stimulated the local development, once it has encouraged people to stay in thecountryside.Keywords: Agricultural economics. Family agriculture. Local development.Résumé: Cette recherche analyse l’entrée de produits dérivés de la canne à sucre à l’aide d une étude exploratoire dansle contexte local de développement de la ville de Capanema dans l’état du Paraná. Cette activité est vue comme uneoption pour la production agricole familiale et comme une alternative de revenu aux unités d’agriculture et d’industrie,sans compter qu’elle fournit une opportunité de diversification de production. Les résultats prouvent que la productionde sucre brun et toute autre canne à sucre et des produits dérivés, aussi bien que les autres produits traditionnelsd’agriculture familiale ont contribué à augmenter le revenu et améliorer la qualité de vie des producteurs. Parconséquent, elle a stimulé le développement local, incitant les personnes à demeurer dans la campagne.Mots-clés: Économie agricole. Agriculture de famille. Développement local.Resumen: Esta investigación analiza, a través de un estudio exploratorio, la producción de azúcar marrón en elcontexto de desarrollo local de la ciudad de Capanema en el Estado de Paraná en Brasil. Esta actividad se muestracomo una opción para la producción en el contexto de la agricultura familiar, ya que plantea una alternativa deingresos para las unidades familiares, además de proporcionar una diversificación de la producción agrícola. Losresultados de la investigación muestran que la producción de azúcar marrón y todos los demás derivados de la cañade azúcar, así como los productos de la agricultura tradicional, han contribuido a aumentar los ingresos y losproductores de mejorar las condiciones de vida de los pequeños agricultores de la ciudad de Capanema. Comoconsecuencia de ello, se ha estimulado el desarrollo local, una vez que ha alentado a la gente a permanecer en elcampo.Palabras clave : Economía agrícola. Agricultura familiar. Desarrollo local.

* Administradora. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio, naUniversidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE/Toledo-PR). E-mail: [email protected]** Doutor em Desenvolvimento Regional (Ph.D.) pela Université du Québec (UQAC). Professor Adjunto do Programade Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da UNIOESTE/Toledo. Pesquisador do CNPq edo Grupo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional e Agronegócio (GEPEC). E-mail: [email protected]*** Doutor em Economia Aplicada (ESALQ/USP). Professor Associado do Programa de Pós-Graduação emDesenvolvimento Regional e Agronegócio da UNIOESTE/Toledo. Pesquisador do CNPq e do Grupo de Pesquisasem Desenvolvimento Regional e Agronegócio (GEPEC) da UNIOESTE/Toledo. E-mail: [email protected]

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Introdução

Em meados do século XX teve início oprograma chamado “Revolução Verde”, re-sultando em grande impacto social, na me-dida em que ajudou a diminuir a fome nomundo. Entretanto, a sustentabilidade doprograma foi questionada por fazer elevadouso de fertilizantes e agrotóxicos, desenca-deando danos ao meio ambiente. Desde en-tão, o segmento rural – no que tange a suaestrutura produtiva – tem buscado alternati-vas de produção que contemplem, ao mes-mo tempo, os âmbitos ecológicos e econômi-cos (CUNHA e LEMOS, 1997).

A partir dos anos 1990, a agriculturafamiliar, como forma de diversificação daprodução, vem se desenvolvendo em todosos pontos do mundo e tem como caracterís-tica a predominância da mão-de-obra egerenciamento por membros da família. Aocontrário da agricultura convencional, aagricultura familiar busca equilibrar o usodos recursos naturais atuando ativamente noprocesso de transição para uma agriculturasustentável. De acordo com Schneider (2003,p.117), em relação ao debate sobre a agri-cultura familiar, as formas familiares de or-ganização do trabalho e da produção nãoestão mais restritas somente ao setor agríco-la e ao espaço rural, existem outras ativida-des – daí a questão do debate em torno dapluriatividade – na qual se pode observaruma estratégia de reprodução social e econô-mica das famílias rurais.

No município de Capanema – Paraná,a cadeia produtiva da cana-de-açúcar orgâ-nica, assim como a produção, transforma-ção e a comercialização de açúcar mascavoe outros derivados da cana-de-açúcar, co-meçou a se definir com a implantação dasagroindústrias de agricultores familiarescomo estratégia para o desenvolvimento ru-ral local.

Por isso, este trabalho tem o propósitode analisar, por meio de um estudo explo-ratório, o aporte dos produtos derivados dacana-de-açúcar no contexto do desenvolvi-mento local no município de Capanema –Paraná, com o intuito de contribuir para adiscussão do desenvolvimento rural local e,ao mesmo tempo, divulgar experiências pas-síveis de serem adotadas em outros espaços.

O foco da análise é a produção de açúcarmascavo, que, segundo Departamento deEstudos Sócio-econômicos Rurais – DESER(2005), tem na cana-de-açúcar a sua base deprodução, sendo grande parte desse produ-to proveniente da agricultura familiar. Por-tanto, buscou-se responder à seguinte ques-tão: a produção do açúcar mascavo e os de-mais produtos derivados da cana-de-açúcarcontribuem com o desenvolvimento local domunicípio e mantêm a família no campo?

Como esse estudo é exploratório, envol-veu pesquisa bibliográfica e documental so-bre agricultura familiar, desenvolvimento lo-cal e agroindústria familiar. Segundo Gil(1999), as pesquisas exploratórias têm comoobjetivo principal desenvolver, esclarecer emodificar conceitos e idéias, tendo em vista aformulação de problemas ou hipóteses. Osdados secundários foram coletados em órgãosgovernamentais e não-governamentais, comoda Secretaria Municipal de Agricultura doMunicípio de Capanema, Sistema de Coope-rativas da Agricultura Familiar (COOPAFI)e Empresa de Assistência Técnica e ExtensãoRural (EMATER), entre outros.

Os dados primários foram obtidos pormeio da pesquisa de campo e envolveu visi-tas em quatro das dez agroindústrias familia-res localizadas em Capanema, que tem comoalternativa de renda a produção de açúcarmascavo, entre outros produtos derivados dacana-de-açúcar, mais uma agroindústria queproduz bolacha e rapadura, e também comentrevistas feitas aos agricultores responsá-veis pelas unidades pesquisadas, com umroteiro previamente elaborado e abordandoos aspectos necessários para atender ao obje-tivo do estudo.

Além desta introdução, este estudoconstitui-se de uma breve caracterização doterritório estudado, algumas consideraçõessobre agricultura familiar, desenvolvimentolocal, agroindústrias familiares, produção deaçúcar mascavo e principais agentes dina-mizadores do processo do desenvolvimentolocal (seção 2). Os resultados e discussões(seção 3) e as conclusões do estudo (seção 4)completam este trabalho.

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1 Caracterização do território do estudo

Segundo Instituto Paranaense de De-senvolvimento Econômico e Social –IPARDES (2004), a Região Sudoeste doParaná, com uma área de 11.687 km2, pos-sui 37 municípios e do total das proprieda-des, 87% são familiares e destas, 94% possu-em áreas inferiores a 50 ha. As condições deuso do solo, do processo migratório e outrosfatores de ordem social e econômica fazemcom que predominam no Sudoeste do Paranámicro e pequenas propriedades rurais, pro-porcionando a diversificação de culturas e,por iniciativa do setor público, órgãos/enti-dades de assistência técnica e empresas dosetor privado, deu-se ênfase na agriculturafamiliar, o que tem contribuído para mantero homem no campo com certa qualidade devida (MINISTÉRIO DO TRABALHO E EM-PREGO – MTE, 2004).

O território estudado – Capanema –corresponde à mesorregião geográfica Su-doeste Paranaense, microrregião geográficaCapanema, localizada na Região Sul doBrasil. De acordo com Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística – IBGE (2007), o mu-nicípio de Capanema conta com uma popu-lação de 18.103 habitantes e está situado nadivisa com a Argentina e o Parque Nacionaldo Iguaçu, conforme figura 1.

a ocupação do espaço pela agricultura fa-miliar e, conseqüentemente, seus produtosapresentam característica de produtos orgâ-nicos oriundos dessa atividade econômica,em especial, a produção de açúcar mascavo.

1.1 Agricultura familiar

Segundo Lamarche (1993), a família,o trabalho e a propriedade são os elementoscentrais da agricultura familiar. Essas sãoalgumas das características das unidades deprodução agrícola que utilizam principal-mente a mão-de-obra familiar. Além disso,de acordo com Veiga (1996), as vantagensda agricultura familiar vão além da diversi-ficação da produção, pois apresenta um per-fil essencialmente distributivo e sustentável,bem como o fortalecimento dos agricultores.

Para Abramovay (2000), um projeto dedesenvolvimento local sustentável para aagricultura familiar deve observar as espe-cificidades regionais e adaptar culturas commaior potencial de produção, visto que amaior parte da produção agrícola mundialtem origem nos estabelecimentos familiares.Isso mostra a importância da formação deidentidades e da diferenciação das regiõesao pensar em desenvolvimento local, enfa-tizando as preocupações com os aspectossociais.

Deve-se ressaltar, ainda, que o poten-cial do desenvolvimento sustentável é medi-do pela sua capacidade de satisfazer as ne-cessidades humanas de maneira a integraros aspetos sociais, ambientais e econômicos.Nesse sentido, é extremamente importanteque haja um equilíbrio entre esses pontos emrelação à agricultura familiar de produçãoorgânica, visando ao aspecto econômico ga-rantir renda ao produtor rural. Do ponto devista social, por ser um sistema pouco meca-nizado, demanda maior número de mão-de-obra e promove a inclusão social. Além dis-so, com as acirradas discussões sobre meioambiente, na produção orgânica, os impac-tos são limitados (FERRERA DE LIMA,2002).

A organização e a participação dosagricultores familiares no processo de desen-volvimento local, buscando distribuição derenda e eqüidade social e ao mesmo tempopromovendo uma relação mais equilibrada

Figura 1 - Localização do Município deCapanema - PRFonte: IPARDES (2008)

Segundo a Prefeitura Municipal deCapanema (2007), como a economia domunicípio é essencialmente agrícola e acana-de-açúcar se destaca como uma dasprincipais atividades agrícolas do município,há um esforço local para oferecer novas al-ternativas de produção para manter o ho-mem na terra, já que tem como característica

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com a natureza, corroboram as palavras deSantos e Silveira (2005, p. 118), de que “ino-vações técnicas e organizacionais na agricul-tura concorrem para criar um novo uso dotempo e um novo uso da terra”.

1.2 Desenvolvimento local: elementosteóricos

Segundo o Institut de Formation emDéveloppement Communautaire – IFDEC(1992), o desenvolvimento local pode serdefinido como uma estratégia de intervençãosocioeconômica por meio da qual se incentivao empreendedorismo dos representantes lo-cais do setor privado, público ou social, avalorizar os recursos humanos, técnicos efinanceiros de uma sociedade, com o objetivoprincipal de crescimento da economia local.

A abordagem do desenvolvimento lo-cal ganhou destaque nas últimas décadasfrente aos desafios impostos pela nova dinâ-mica econômica, ou seja, reestruturação pro-dutiva, em que propostas administradas pe-los governos locais e regionais procuram as-segurar o desenvolvimento econômico de ci-dades e regiões. As experiências de desen-volvimento local indicam que o caminho aseguir passa pela formulação e aplicação deuma estratégia de desenvolvimento, opera-cionalizada com base em ações que busquemrealizar os objetivos de produtividade ecompetitividade, para estimular o desenvol-vimento local (BARQUERO, 2001).

Martins (2002) complementa que acaracterística do desenvolvimento local é amaneira de atribuir e garantir à comunida-de a função de agente em prol do desenvolvi-mento ao invés de simplesmente beneficiária.

Enfim, pode-se entender o desenvolvi-mento local como uma resposta, num con-texto de globalização e reestruturação produ-tiva, às vicissitudes de desenvolvimento. Otermo Local alcançou uma importância fun-damental no contexto econômico, graças àsoportunidades decorrentes desse novo am-biente produtivo. A qualidade de vida tam-bém é essencial no desenvolvimento localcomo representação da sustentabilidade deuma economia local (MARTINELLI eJOYAL, 2004; SHIKIDA et al., 2008).

1.3 As agroindústrias familiares e o desen-volvimento local

Mior (2005) define a agroindústria fa-miliar rural como uma forma de organiza-ção e transformação da produção familiar,com vistas a agregar valor ao produto nahora da comercialização e, de acordo comPrezotto (2000), a agroindústria familiar éuma ferramenta capaz de impulsionar odesenvolvimento local sustentável por meioda geração direta e indireta de novos postosde trabalho e renda para os agricultores fa-miliares, melhorando sua qualidade de vida.

Além disso, as agroindústrias familia-res têm desempenhado importante papel nodesenvolvimento do país e com grande im-portância sócio-econômica, principalmentena geração de empregos no campo, distri-buindo melhor a renda e melhorando a qua-lidade de vida dos agricultores, diminuindoassim, a migração campo-cidade. Comu-mente, as tecnologias empregadas são as tra-dicionais ou artesanais e seus produtos sãoligados à cultura local (LOUREZANI eSILVA, 2000).

A partir da década de 1990, desenca-dearam-se na Região Sudoeste Paranaenseiniciativas voltadas à constituição deagroindústrias familiares rurais como diver-sificação da economia agrícola e promoçãodo desenvolvimento local. O município deCapanema, além de desenvolver a agricul-tura familiar e a produção de alimentos or-gânicos, incentivando o associativismo e aformação de agroindústrias, conta com oapoio do Parque Nacional do Iguaçu, poisvem ao encontro das atividades indicadaspara a área de entorno de uma unidade deconservação por ser menos agressiva ao meioambiente (MINISTÉRIO DO MEIO AMBI-ENTE - MMA, 2008).

Nesse contexto, as agroindústrias emCapanema foram projetadas e construídascom o objetivo de facilitar o trabalho detransformação, aumentar a produtividade emelhorar a qualidade do produto final, ini-ciativa que visa transformar o município empólo de produção de açúcar mascavo e ou-tros produtos derivados da cana-de-açúcar.

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1.4 Produção de açúcar mascavo e agentesdinamizadores do processo de desen-volvimento local em Capanema –Paraná

Entre 1970 e 1990, a produção de canae a fabricação de açúcar mascavo foram dei-xadas de lado pelos agricultores familiares,mas, em 1995, no Sudoeste do Paraná, aCoordenação Regional de Associações ini-ciou o processo de comercialização de açú-car mascavo e assim esse produto se tornouuma importante atividade econômica paraum número cada vez maior de famílias eassociações dessa região (COORDENAÇÃOREGIONAL DE ASSOCIAÇÕES - CRAPA,1999).

Ainda hoje os incentivos à produçãode derivados da cana-de-açúcar se justificampela tradição que Capanema tem nesse seg-mento, fazendo com que essa atividade pro-cure se desenvolver e se organizar. O muni-cípio é grande exportador de produtos or-gânicos, possui ainda algumas áreas volta-das para o turismo ecológico e vem despon-tando no cenário nacional como um muni-cípio de destaque no Sudoeste Paranaense.

Nesse cenário, destaca-se a união deforças e recursos em novos arranjos com oobjetivo de criar empregos e impulsionar odesenvolvimento local, como no caso dasagroindústrias de açúcar mascavo.

Segundo Ferrera de Lima et al. (2005),as agroindústrias de açúcar mascavo se de-senvolveram em Capanema e nos municípiosda fronteira Sudoeste para diminuir proble-mas como desemprego e êxodo rural, alémde impulsionar o desenvolvimento local.

Isso ocorre porque os produtores rece-bem assistência de diversas entidades gover-namentais e não-governamentais e essa par-ceria se tornou indispensável para propor-cionar aos produtores maior competitividadena comercialização dos produtos.

Assim, o Governo do Estado participadessa assistência aos agricultores, por meioda Secretaria de Estado da Agricultura eAbastecimento – SEAB; Instituto Paranaensede Assistência Técnica e Extensão Rural –INSTITUTO EMATER (com 91 técnicos atu-ando em agricultura orgânica). Outros ór-gãos que atuam na agricultura orgânica noSudoeste do Estado são as Associação de

Estudos, Orientação e Assistência Rural –ASSESOAR; Centro de Tecnologias Alterna-tivas- CETAP; Centro Paranaense de Apoioao Pequeno Agricultor-CAPA; Sistema deCooperativas da Agricultura Familiar-COOPAFI; Coordenação Regional de Asso-ciação de Pequenos Agricultores-CRAPA;Organizações não Governamentais-ONGs;Universidades; Prefeituras Municipais;Associações de Produtores Orgânicos; Asso-ciações de Consumidores e Empresas deProcessamento e Comercialização(EMATER, 2008). As Organizações e Asso-ciações citadas são algumas das que forne-cem assistência técnica e apoio ao projetoorgânico de grãos e açúcar mascavo do Su-doeste, fomentando o desenvolvimento daagricultura, o desenvolvimento local susten-tável e a promoção da cidadania e da quali-dade de vida dos produtores rurais.

Essas ações fazem parte do processode diversificação da pequena propriedade eagregação de valor de produto primário,beneficiando as agroindústrias rurais deCapanema na produção e comercializaçãodos produtos derivados da cana-de-açúcar.

Sobre a produção de açúcar mascavoe agentes dinamizadores do processo de de-senvolvimento local em Capanema, vale des-tacar também o estudo feito por Perondi eKiyota (2002, p.366), que apontou para aimportância, neste município, da Feira doMelado. Ademais, “existem várias agroin-dústrias de açúcar mascavo, que concorremno preço, por isto estas famílias buscam umnovo espaço no mercado com as bolachas;tal segmento de mercado foi conquistadopela rápida percepção e reorientação da pro-dução, reorganizando o trabalho dos ho-mens e mulheres”.

2 Resultados e discussões

Nas agroindústrias pesquisadas, amédia de residentes na propriedade é dequatro pessoas, porém a média de trabalha-dores familiares nas agroindústrias é de duaspessoas. Normalmente os filhos exercem ati-vidades não-agrícolas fora da unidade deprodução familiar.

Em Capanema estão instaladas dozeagroindústrias familiares e dez delas produ-zem açúcar mascavo e demais produtos de-

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De acordo com a tabela 1, em 2007, asagroindústrias localizadas em Capanematotalizaram uma produção de 147.500 kg deaçúcar mascavo, 71.000 kg de melado,14.320 kg de bolachas de melado, 9.315 kgde rapadura e 15.000 litros de cachaça. Natotalidade, essas agroindústrias são predo-minantemente familiares, administradaspela família e associadas à cooperativa. To-dos são pequenos produtores e o plantio éfeito manualmente.

Uma das unidades agroindustriais fa-miliares pesquisadas – AgroindústriaPIAMOLIN, possui uma área de 6,05 ha, éadministrada pelo proprietário da terra equatro pessoas da família estão envolvidasnas atividades de produção dos produtosderivados de cana-de-açúcar. Segundo o Sr.Ivo Piamolin, a agroindústria foi instaladaem 2000 e, antes disso, as atividades desen-volvidas estavam relacionadas com a pro-dução de leite, fumo, soja e milho. Atualmen-te, o açúcar mascavo é seu principal produ-to, seguido dos outros derivados da cana.Para essa família, após a implantação daagroindústria, os resultados foram positivos,pois construíram uma casa melhor, compra-ram um carro e conseguiram terminar depagar o empréstimo feito para a construção

do Galpão de fumo, além de ter de volta umdos filhos que trabalhava na cidade. Segun-do o Sr. Ivo, os produtos são vendidos nomercado orgânico do município, a famíliaparticipa da tradicional Feira do Melado queacontece a cada dois anos no município, ven-de nas cidades vizinhas e para os turistasque visitam a agroindústria por meio do con-vênio entre as agroindústrias e PrefeituraMunicipal, o que ajudou bastante na comer-cialização dos produtos. Outro fato que temcontribuído com essa prática é o uso do seloNatural do Campo, que identifica os produ-tos da agricultura familiar elaborados nomunicípio. Os produtos mais vendidos sãoas bolachas e o melado, ele ressaltou aindaque a EMATER e a Prefeitura atuam naorientação e organização da produção. Mes-mo assim, segundo o agricultor, a forma decomercialização ainda não atingiu níveissatisfatórios. A renda obtida com o açúcarmascavo fica acima de R$ 1.000,00/mensais.

Agroindústria TERRA BOA – De pro-priedade do Sr. Dalmir Trento, com 7,26 hade terra, iniciou as atividades em 2000, comrecursos próprios e apoio da EMATER. Ad-ministrada pelo proprietário, emprega qua-tro pessoas da família, mais dois trabalha-dores temporários. Sua produção está volta-

rivados da cana-de-açúcar, entre outros pro-dutos tradicionais da agricultura familiar.Duas agroindústrias produzem outros deri-vados da cana, porém, já em vias de iniciar aprodução de açúcar mascavo. A tabela 1

Agroindústria Açúcar Mascavo kg

Melado kg

Bolacha de Melado kg

Rapadura kg Cachaça litros

Pingo de Mel 43.000 3.000 15.000 Pé de Cana 10.000 3.000 Nova Sul 5.000 3.000 Terra Boa 2.000 3.000 Piamolim 4.500 6.000 1.200 2.640 Manguaba 6.000 6.000 4.320 2.775 Pavão 10.000 Loli 3.800 Nascer do Sol 8.000 APALGE 11.000 Pinheiro(01) 20.000 30.000 2.000 900 Pinheiro(02) 30.000 20.000 1.000 Total 147.500 71.000 14.320 9.315 15.000

Fonte: Dados da pesquisa (2008)

mostra a produção de açúcar mascavo e pro-dutos derivados da cana-de-açúcar emCapanema na safra 2007 e as respectivasagroindústrias.

Tabela 1 – Agroindústrias e produção de açúcar mascavo e produtos derivados da cana-de-açúcar em Capanema, PR – 2007

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da principalmente para bolachas e rapadu-ras e está com projeto para iniciar a produ-ção de açúcar mascavo. Com a renda daagroindústria, construiu casa, espaço paracomercializar os produtos na propriedade(onde trabalha uma das filhas) e tambémcomprou um carro. Essa agroindústria tam-bém faz parte do turismo rural e ele entregaprodutos no mercado orgânico do municípioe participa da Feira do Melado. A renda des-sa família está situada entre R$ 1.000,00 eR$ 1.500 mensais.

Agroindústria PÉ DE CANA – Essaagroindústria produz açúcar mascavo emelado e possui uma área de 6,05 ha. Suasatividades se iniciaram em 2002, com duasfamílias associadas. No entanto, devido adivergências de idéias, hoje a agroindústriaé administrada por uma só família, na qualtrabalham o casal de agricultores. Um dosfilhos, por opção, trabalha na cidade duran-te meio período e no outro ajuda a família.Antes de começar a produção de cana-de-açúcar e a agroindustrialização, o proprietá-rio dessa agroindústria trabalhava na cida-de. Nesse caso, a agroindústria possibilitoutrazê-lo de volta para o meio rural, o quenão aconteceu com os outros dois membrosda família que preferem trabalhar na cida-de. Segundo o Sr. Davi Agnes, a bolacha é oproduto mais vendido, ainda assim para afamília a produção de açúcar mascavo é eco-nomicamente viável, pois gera uma rendamédia de R$ 1.000,00/mês e estar associadoà cooperativa tem apresentado vantagenssomente na hora da comercialização, masjá existe uma possibilidade de futuramenteproduzir também para exportação.

Agroindústria MANGUABA – Se-gundo a Sra. Erani Morgenstern – uma dasassociadas – a agroindústria iniciou as ativi-dades em 1998, com sete famílias integra-das, sendo que a proposta inicial e que se-gue até hoje foi de que só os casais trabalha-riam na agroindústria, os filhos e demaismembros da família deveriam desenvolveratividades alternativas, ou seja, trabalhar emoutras atividades agrícolas ou não-agrícolas.Assim, iniciaram a produção de açúcarmascavo e melado e depois a produção debolachas, sendo esse produto o carro-chefeda agroindústria. Para esses associados, aprodução de derivados da cana-de-açúcar

contribuiu sim para mantê-los no campo ese não fosse pela agroindústria todos játeriam migrado para a cidade. Antes dessasatividades, as famílias plantavam fumo ecriavam gado de leite. Essa agroindústriatrabalha em regime de empresa, a diretoriamuda a cada ano e cada família produzcana, trabalhando e dividindo os lucros emigual medida. Se alguém falta ou chega atra-sado ao trabalho é descontado no final domês da sua parte a receber. Nessa agroindús-tria, as mulheres cuidam da produção debolachas e contam com uma cozinha total-mente industrial adquirida com resultadosfinanceiros da própria agroindústria, e oshomens cuidam da produção de açúcarmascavo. A renda das famílias gira em tornode R$ 1.000,00 a R$ 1.500,00 mensais. Hoje,a agroindústria conta com apenas três famí-lias associadas, pois motivos diferentes leva-ram as famílias a desistirem da agroindústria.Quanto aos produtos, estes são comerciali-zados no mercado local, inclusive para me-renda escolar. Essa agroindústria é associadaà COOPAFI – Cooperativa de Comerciali-zação da Agricultura Familiar Integrada econtam com apoio da EMATER e PrefeituraMunicipal, além de fazer parte do roteiro deturismo vendendo seus produtos na própriaunidade produtiva.

Agroindústria PINGO DE MEL – Em1999, a família Hass e mais sete famílias ins-tigadas com a possibilidade de organizar umaagroindústria começaram a produzir açúcarmascavo e demais produtos derivados dacana-de-açúcar. Porém, atualmente, só a fa-mília proprietária da terra onde está inseridaa agroindústria continua na unidade agroin-dustrial, pois as demais famílias desistiram pornão se adaptarem e também pela dificuldadede conciliar os cuidados com as outras cultu-ras. A renda, inicialmente, só era suficientepara pagar o financiamento, o que levou asfamílias a abandonarem o projeto. Os princi-pais problemas enfrentados pelas famílias noinício das atividades, além da renda, foram aconvivência entre os membros e divergênciasno gerenciamento da agroindústria. As famí-lias que desistiram dessa agroindústria conti-nuam no campo cuidando das suas proprie-dades e das atividades agrícolas.

A família que continuou com a agroin-dústria é composta por quatro pessoas que

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anteriormente plantavam soja, feijão e milho.Depois da agroindústria, cultivam apenascana-de-açúcar e o principal produto comer-cializado é o açúcar mascavo. Há quatroanos iniciaram a produção de cachaça e aperspectiva é de gradualmente focar somentenesse produto, pois a cooperativa de cachaçado Sudoeste iniciou negociação para expor-tar. Essa família enfatiza que suas condiçõeseconômicas mudaram para melhor depoisda agroindústria, mesmo que o trabalho te-nha aumentado. Das cinco agroindústriasvisitadas, essa é a única que contrata emmédia de dois a três trabalhadores temporá-rios na época de cortar a cana-de-açúcar. Aárea da propriedade é de 4,84 ha e tem par-ceiros que fornecem cana-de-açúcar para aagroindustrialização dos produtos derivadosda cana. A produção de açúcar mascavo é amaior geradora de renda da família, que ficaentre R$ 1.000,00 e R$ 1.500,00.

A comercialização da produção dessaagroindústria é feita pelo proprietário na re-gião Sudoeste e no Estado de Santa Catarina,além disso, também é vendida para a coope-rativa e ainda para o programa Fome Zero.

No geral, verificou-se que a produçãode bolachas é feita normalmente pelas mu-lheres das famílias, em locais distintos da pro-dução de açúcar mascavo e melado, traba-lho feito pelos homens, por exigir mais forçabraçal, pois segue as seguintes etapas: colhei-ta da cana de açúcar, moagem, fervura, ba-tedor, peneira e embalagem. Ressalte-se quea produção de bolachas – que é responsávelpor boa parte da renda das famílias – não éproduzida em sua totalidade com açúcarmascavo, e sim de maneira tradicional.

Conclusão

A diversificação da agricultura fami-liar para um desenvolvimento local susten-tável aponta para a importância das agroin-dústrias no sentido de agregar valor aos pro-dutos, gerar trabalho e renda para os produ-tores, além de viabilizar a comercializaçãodos produtos derivados da cana-de-açúcar,a exemplo da Feira do Melado, que já é even-to tradicional em Capanema (Paraná).

O município já se tornou tradicionalna produção de açúcar mascavo e os agentesque atuam nas estratégias, na valorização e

na comercialização dos produtos derivadosda cana-de-açúcar se empenham em dar su-porte para que os agricultores familiarestransformem os produtos artesanais emagroindustriais, mantendo o estilo e a receitatradicionais, para então, expor os produtosem nível local, regional e até mesmo exportarderivados de cana-de-açúcar, com destaquepara o açúcar mascavo, que é um dos prin-cipais produtos elaborados nas agroindús-trias familiares do município.

Um aspecto verificado no decorrer dapesquisa e que tem influenciado na promo-ção do desenvolvimento local em Capanemaé o turismo rural. Essa nova tendência turís-tica que os atores sociais do território estu-dado buscam desenvolver destaca aindamais a atividade econômica natural do lo-cal. O turismo rural, abrangendo as unida-des produtivas da agricultura familiar, as-sume considerável papel na divulgação dosprodutos locais.

Nota-se que as agroindústrias familia-res que estão mais próximas da cidade sãomais independentes e se beneficiam mais dasalternativas de comercialização. Quanto àsassociações, de acordo com os agricultorespesquisados, elas são eficientes na organiza-ção da produção, mas em relação à comercia-lização, ainda não se mostram totalmentesatisfatórias.

Outra particularidade se refere ao fatode que nas agroindústrias normalmente sãoos casais que trabalham, o que já é pré-de-terminado no início das atividades e, dessaforma, os filhos vão trabalhar na cidade,mesmo que alguns continuem residindo naárea rural. Em relação ao sistema de traba-lho, quando há participação de mais de umafamília nas unidades agroindustriais, cadafamília deve contribuir com o mesmo núme-ro de pessoas para trabalhar, assim como ofornecimento da cana-de-açúcar. Isso temfeito com que o espírito de cooperação eassociativismo venha, ao longo do tempo,diminuindo, pelo fato de que em determina-das situações existem divergências adminis-trativas.

Nas agroindústrias visitadas é unânimeentre os agricultores que a produção de açú-car mascavo e outros produtos derivados dacana-de-açúcar contribuem para a melhoriadas condições de vida das suas famílias,

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29Desenvolvimento local e agricultura familiar: o caso da produção de açúcarmascavo em Capanema - Paraná

embora não vivam somente com a renda daprodução de açúcar mascavo. A maioria temoutras atividades produtivas para comple-mentar a renda, como a criação de algumascabeças de gado leiteiro. Ainda assim, a ren-da dos agricultores familiares pesquisadossitua-se dentro da renda média anual dasunidades familiares, que segundo EMATER(2006), é de R$ 10.000,00 embora algumastenham renda acima desse valor. Os dadosmostram que para os agricultores familiaresdas unidades pesquisadas o açúcar mascavo– como único e exclusivo produto dessa ati-vidade – não é economicamente viável, e sima produção dos derivados da cana-de-açú-car de maneira geral.

Apesar da desistência de algumas fa-mílias que buscaram aposentadoria e migra-ram da área rural para a cidade seguindoseus filhos ou decidiram exercer outras ati-vidades agrícolas, os agricultores pesquisa-dos enfatizam que após a implantação daagroindústria e com a produção de açúcarmascavo e demais produtos derivados dacana-de-açúcar, conseguiram melhorar suascasas, comprar carros, investir na infra-es-trutura e aumentar a capacidade produtiva.

Nesse sentido, pode-se dizer que acana-de-açúcar tem contribuído como alter-nativa de produção, assim como o açúcarmascavo, porém, não é esse produto o prin-cipal elemento que tem mantido o homemno campo e que desencadeia desenvolvimen-to local, mas está entre os que contribuemcom a renda com os demais produtos deriva-dos da cana.

Enfim, essas atividades de produçãorelacionadas com a cana-de-açúcar gradati-vamente vêm dando condições para que es-sas famílias continuem na área rural. Noentanto, ainda há muito a fazer principal-mente em relação à comercialização, paraque realmente se possa dizer que a produçãode açúcar mascavo e demais produtos deri-vados da cana-de-açúcar contribuem efeti-vamente para o desenvolvimento local e apermanência do homem no campo.

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O baru (Dipteryx alata Vog.) como alternativa de sustentabilidade em área defragmento florestal do Cerrado, no Mato Grosso do Sul

The baru (Dipteryx alata Vog.) as alternative for sustainability in the area of Cerradoforest fragment in the Mato Grosso South

Le baru (Dipteryx alata Vog.) comme alternative pour la durabilité dans le domainedu fragment Cerrado, du Mato Grosso do Sul

El baru (Dipteryx alata Vog.) como alternativa para la sostenibilidad en el ámbito Cerrado delfragmento en el Mato Grosso do Sul

Andréa Haruko Arakaki*Gessiel Newton Scheidt**

Augustus Caeser Portella**Eduardo José de Arruda***

Reginaldo Brito da Costa****

Recebido em 12/10/2008; revisado e aprovado em 11/11/2008; aceito em 16/12/2009.

Resumo: O presente trabalho refere-se à experiência do Assentamento Andalúcia no sentido de valorizar aimportância do manejo dos recursos naturais associado aos seus próprios anseios, com a utilização, especialmentedo baru em um contexto de sustentabilidade, mantendo a biodiversidade local. Nesse contexto, aborda-se a coletae utilização de frutos nativos em áreas de ocorrência natural constituindo alternativas econômicas para as populaçõeslocais.Palavras-chave: Baru. Extrativismo vegetal. Fragmentação florestal.Abstract: This work is based on the action of communities, with the example Seating Andalúcia in valuing theimportance of natural resource management linked to their own desires, seeking to nature conservation and maintenanceof biodiversity. Thus, enhance the collection of native fruit in areas of natural occurrence and provide technicalassistance is qualified some of the economic alternatives for local people can create.Keywords: Baru. Harvesting. Forest fragmentation.Résumé: Ce travail est basé sur l’action des communautés, avec l’exemple de l’Andalúcia dans le règlement degestion mettant en évidence l’importance des ressources naturelles liées à leurs propres désirs, et tendant à laconservation de la nature et la biodiversité. C’est ainsi, renforcer la collecte de fruits dans les zones de catastrophenaturelle et de fournir l’assistance technique est qualifié certaines des alternatives économiques pour les populationslocales.Mots-clés: Baru. Extrativismo végétale. La fragmentation des forêts.Resumen: Este trabajo se basa en la acción de las comunidades, con el ejemplo de Andalucía en la solución degestión destacando la importancia de los recursos naturales vinculados a sus propios deseos, a la búsqueda de laconservación de la naturaleza y la biodiversidad. Por lo tanto, mejorar la recolección de frutas nativas en las zonasde ocurrencia natural y prestar asistencia técnica está calificado algunas de las alternativas económicas para lapoblación local.Palabras clave : Baru. Extrativismo vegetal. La fragmentación de los bosques.

* Curso de Pós-graduação em Processos Biotecnológicos da Universidade Federal do Paraná, Centro Politécnico –2° andar do Prédio de Administração. Rua: Cel. Francisco H. dos Santos, 100 - 81531-990 - Curitiba-PR – Brasil.Telefone: (41) 3361-3271. Autor para correspondência. E-mail: [email protected]** Curso de Pós-graduação em Processos Biotecnológicos da Universidade Federal do Paraná, Centro Politécnico.*** Universidade Federal da Grande Dourados – Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia/FACET, RodoviaDourados - Itanhum, km 12, CEP 79804-970 - Dourados-MSTel./Fax: (67) 3411-3894. E-mail: [email protected]**** Programa de Mestrado em Ciências Florestais e Ambiental, Faculdade de Engenharia Florestal, UniversidadeFederal de Mato Grosso. Av. Fernando Corrêa, s/n – 78060-900 Cuiabá-MT, Brasil. E-mail: [email protected]

Introdução

Os Cerrados são reconhecidos devidoàs suas diversas formações ecossistêmicos.Sob o ponto de vista fisionômico, tem: o

Cerradão, o Cerrado típico, o campo Cerra-do, o campo sujo de Cerrado e o campo lim-po, que apresentam altura e biomassa vegetalem ordem decrescente (IBAMA, 2008). OCerrado típico é constituído por árvores

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32 Andréa A. Arakaki; Gessiel N. Scheidt; Augustus C. Portella; Eduardo J. de Arruda;Reginaldo B. da Costa

relativamente baixas (até vinte metros),esparsas, disseminadas em meio a arbustos,subarbustos e uma vegetação baixa constituí-da, em geral, por gramíneas.

Assim, o Cerrado contém, basicamen-te, duas interligações: um superior, formadopor árvores e arbustos dotados de raízes pro-fundas que lhes permitem atingir o lençolfreático, situado entre 15 a 20 metros; e uminferior, composto por um tapete de gramí-neas de aspecto rasteiro, com raízes poucoprofundas, no qual a intensidade luminosaque as atinge é alta, em relação ao espaça-mento. Na época seca este tapete rasteiroparece palha, favorecendo, sobremaneira, apropagação de incêndios (IBAMA, 2008).

O Ministério do Meio Ambiente (2002)descreve que, no domínio morfo-climático doCerrado, um amplo número de espécies ve-getais está-se perdendo antes mesmo de serconhecido pela humanidade. Tendo em vis-ta que os habitats fragmentados correspon-derão a fontes residuais de recursos naturaisdo futuro, tornam-se indispensáveis ações demanejo do ambiente para se evitar a erosãode sua diversidade biológica e, com ela, aperda de seu pleno aproveitamento por gera-ções futuras.

É consenso, entre grande parte dos pes-quisadores, que o manejo dos recursos na-turais deve considerar a paisagem como umtodo (HOBBS e HUMPHRIES, 1995). A ges-tão de áreas naturais específicas, como asunidades de conservação, apenas, não é sufi-ciente. É necessária uma política de gestãoambiental capaz de promover a permanên-cia de áreas mais amplas que exercem in-fluência sobre tais unidades de conservação,uma vez que é influenciada pela matrizcircundante, em que fragmentos menores ecorredores de habitat são, também, impor-tantes para a conservação da biodiversidade(FRANKLIN, 1993).

Sabe-se, porém que, atualmente, al-guns dos fragmentos florestais de maior im-portância para a conservação da biodiversi-dade em Mato Grosso do Sul são protegidospor leis específicas de nível Estadual e Federal,como o Sistema Nacional de Unidades deConservação (SNUC), com a criação de uni-dades de conservação (UC’s) de uso direto ede uso sustentável. Estas UC’s (Unidades deConservação), no Brasil, são, na sua maior

parte, as zonas núcleo de biodiversidade(hotspots) que devem ser conectados por meiode corredores de biodiversidade (SNUC,2008).

Mesmo nos últimos anos, a base prin-cipal econômica da região Centro-Oeste foia pecuária extensiva e a agricultura, de ma-neira que imensas áreas com espécies nativasforam substituídas por pastagem e monocul-turas agrícolas. Observa-se, também, que, aolongo dos anos, a substituição da vegetaçãonativa de Cerrado vem causando imenso de-sequilíbrio no bioma, restando apenas frag-mentos de vegetação remanescentes noEstado.

Por fim, o presente trabalho fundamen-ta-se no papel da população local do Assen-tamento Andalúcia, ressaltando-se a impor-tância do manejo dos recursos naturais asso-ciado aos anseios da comunidade em dispo-nibilizar o material vegetal obtido de formaextrativista do baru, visando à conservaçãoda natureza e a manutenção da biodiver-sidade.

1 O Cerrado e o DesenvolvimentoSustentável

O processo de assoreamento dos rioscausado pelo impacto humano sobre esseecossistema é uma das causas da diminuiçãodas espécies com valores econômicos com-provados, industrial, alimentar ou terapêu-tico (POR, 1992). Dessa forma, a fragmenta-ção de habitat é a ameaça mais séria à biodi-versidade e sua conseqüência está relacio-nada à crise de extinção de diversas espéciesarbóreas e arbustivas (WILCOX e MURPHY,1985).

Segundo Araújo (2000, p. 10), o Cerra-do é um tipo de vegetação de ampla distri-buição geográfica, estendendo-se pratica-mente do trópico meridional, na fronteiracom o Paraguai, até o Equador.

Autores como Cavalcanti (2002),Costa et al. (2002) e Rodrigues e Carvalho(2001) apontam a importância da “conser-vação do Cerrado” que é um domínio fito-geográfico essencial para a manutenção dabiodiversidade mundial.

Rosado e Carvalho (2001) descrevemque a cada ano importantes florestas sãocortadas visando à exploração comercial de

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33O baru (Dipteryx alata Vog.) como alternativa de sustentabilidade em área de fragmentoflorestal do Cerrado no Mato Grosso do Sul

madeira e a liberação de novas áreas parauso na da agropecuária, abertura de rodo-vias, exploração mineral e na formação delagos artificiais por barragens hidroelétricas.

Nesse contexto, as ações sobre o meioambiente ocasionadas pela urbanização eexpansão da fronteira agrícola deverão seravaliadas cuidadosamente por estar em jogoa biodiversidade (COSTA et al., 2002, p. 25).

Assim, o setor agropecuário, acrescidoa um acentuado extrativismo, concorre parao processo de extinção de espécies, sendo aconservação de fragmentos de grande impor-tância para a manutenção da ampla biodi-versidade de que é formada, e que não é com-pletamente conhecida (DOBSON, 1995).

Até a década de 1950, os Cerradosmantiveram-se quase inalterados. A partirde 1960, com a interiorização da capital e aabertura de uma nova rede rodoviária, largosecossistemas deram lugar à pecuária e à agri-cultura extensiva, como a soja, arroz e otrigo.

Tais mudanças apoiaram-se, sobretu-do, na implantação de novas infra-estruturasviárias e energéticas, bem como na descober-ta de novas vocações desses solos regionais,permitindo outras atividades agrárias rentá-veis, em detrimento de uma biodiversidade,até então, pouco alterada (IBAMA, 2008).

Deve-se lembrar que grandes áreas deCerrado estão em solos ácidos e com baixafertilidade natural, apresentando valoresrelativamente baixos das somas de bases aolongo dos horizontes (RIZZINI e HERINGER,1962; MELO, 1999).

Dadas essas características fitofisionô-micas e de solos, tornou-se fácil a interven-ção antrópica, por meio da expansão agrícolaestimulada por políticas públicas de desen-volvimento e incentivo à produção manufa-turada.

Por outro lado, a adoção de mecanis-mos de apoio, tais como incentivos fiscais,geração e transferência de conhecimento ede tecnologia, soluções de mercado envolven-do públicos consumidores e direitos de pro-priedade, associados às políticas que tornema atividade de degradação vegetal menosatrativa aos agentes destrutivos, podem serutilizados visando à manutenção dasustentabilidade (RICHARDS, 2000). Essasalternativas retratam a importância da que-

bra de paradigma sócio-cultural e podempermitir o desenvolvimento local, sem com-prometer as gerações futuras.

Na Região Centro-Oeste, desde o sé-culo XIX, sociedades organizadas, a partirda exploração das riquezas minerais, aco-modou, por longos anos, grandes fazendasde pecuária, organizadas internamente sobrelações sociais típicas do latifúndio brasi-leiro.

Paralelamente, especialmente junto àfaixa de fronteira, vem-se manifestando des-de o início do século XX, um modelo tradicio-nal de agricultura familiar, através dos váriosassentamentos agrícolas incentivados peloEstado nacional. Por outro lado, na faixa le-galizada da fronteira nacional e na organi-zação de várias comunidades, manifesta-seum traço de trans-culturalidade próprio defronteira (LE BOURLEGAT, 2003).

As novas alterações de paisagem pro-moveram a necessidade do uso sustentávelque surge no contexto, como o registro deum limite e o indício que reorienta o proces-so civilizatório da humanidade, certificandoa função de suporte da natureza, condiçãoe potencial do processo de conservação deremanescentes existentes no Brasil Central.

Pott e Pott (2003) confirmam que gran-de população de notáveis recursos alimen-tares, como o baru e pequi, foram destruídose continua sendo desperdiçada. Atualmen-te, com a necessidade de conservação e dereposição florestal, está havendo muita de-manda de informação sobre plantas nativas.

O desenvolvimento é definido porÁvila et al. (2001) como um processo, e oalvo central é o ser humano responsável desuas conquistas e derrotas, podendo dina-mizar, ou não, o meio ambiente onde ocor-rem as diversas alterações. O desenvolvimen-to, assim, unindo-se ao local implica a consti-tuição e educação da própria comunidadeem relação à matéria de capacidades, habi-lidades, competências e ritmos do progressocultural, respeitando as potencialidades pre-sentes.

O desenvolvimento pauta-se unica-mente na valorização do ser humano en-quanto agente promotor do próprio proces-so evolutivo, tanto individual como coletivo.Ou seja, a visão economicista, construídainicialmente, estava cedendo lugar para a

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34 Andréa A. Arakaki; Gessiel N. Scheidt; Augustus C. Portella; Eduardo J. de Arruda;Reginaldo B. da Costa

prerrogativa de desenvolvimento no âmbitosocial (do ser humano como um todo), pois:[...] o verdadeiro diferencial do desenvolvi-mento local não se encontra em seus objeti-vos (bem-estar, qualidade de vida, endoge-nia, sinergias, etc.), mas na postura que atri-bui e assegura à comunidade o papel deagente e não apenas de beneficiária do de-senvolvimento (MARTINS, 2002, p. 52).

Partindo desse princípio, o desenvolvi-mento é uma ação que exige continuidadepor ser uma operação lenta e gradual. Nestesentido, Ávila (2001) sugere o termo “agir-agenciando”, ou seja, toda a comunidadedeve se envolver voluntariamente para quesimultaneamente se torne propriamenteagente do seu desenvolvimento e gerencia-dora do seu destino, detectando suas aspira-ções, bem como os problemas a serem solu-cionados para que o desenvolvimento possarealmente ser articulado.

Os mecanismos endógenos de criaçãode competências e de transformação de co-nhecimentos genéricos em específicos, tantonos agentes como nas redes produtivas, assimcomo nos distintos ambientes, são importan-tes em uma reavaliação no ponto de vistapolítico e social (YOGUEL, 2000). De acordocom Santos (1996, p. 219): “Não basta, pois,produzir. É indispensável pôr a produção emmovimento. Em realidade, não é mais a pro-dução que preside à circulação, mas é estaque conforma a produção”.

Por fim, de acordo com Paulista et al.(2008) evidencia-se que os padrões de com-portamento dos grupos sociais, em sua in-teração com o meio ambiente, não são focode grande parte das abordagens de desen-volvimento sustentável. É notória a carên-cia de foco no ser humano, enquanto agentepromotor de comportamentos sociais e deresponsabilidade individual pelo meio am-biente. No entanto, ao incluir-se o indivíduocomo unidade relevante para a sustentabi-lidade, a dimensão psicológica revela-se deimportância básica para o desenvolvimentosustentável. Desconsiderá-la, ou não cons-truir indicadores para medi-la, pode ser umadas relevantes causas das debilidades dosmodelos propostos.

2 Baru: indicador de sustentabilidade

O baru é encontrado em toda a áreacontínua do domínio Cerrado brasileiro e,com mais freqüência, nos Cerradões e MatasSecas. Sua distribuição é esparsa nos Estadosde Tocantins, Goiás e Mato Grosso do Sul,enquanto no Mato Grosso, concentra-se aoSul e Leste do Estado (RATTER et al., 2000).

Sob esse enfoque, Pott e Pott (1994)afirmam que sua ocorrência é abundante emcordilheiras, capões e solos arenosos, alémde uma distribuição fora de domínio Cerra-do, também no Paraguai e Bolívia. Porém,ressalta que a espécie apresenta ocorrênciacomo em Amazonas, Bahia, Distrito Federal,Maranhão e São Paulo. Também se consideracomo árvore ornamental, apresentando lar-ga copa, boa sombra e ramos de grande re-sistência aos ventos (CEMIG, 2001).

Conforme descrições de Sano et al.(1999), o fruto apresenta, em média, 12 mde altura por 8 m de diâmetro de copa. Cadaárvore pode produzir de 1000 a 3000 frutoscujo diâmetro maior é de 5 a 7 cm e o diâ-metro menor de 3 a 5 cm, com peso entre 26a 40 g e encerra uma única semente de, apro-ximadamente, 1,17 g. A casca e a polpaapresentam cor amarronzada e a semente,de coloração creme a branca, é envolvida poruma película marrom escura. Segundo esti-mativas de Ribeiro et al. (2000), um plantiocomercial de baru poderia produzir em tor-no de 850 kg de amêndoas e 19 toneladas depolpa por hectare.

Cabe ressaltar que o fruto baru apre-senta uma polpa aromática e de agradávelsabor semelhante ao do amendoim, pode serconsumida ao natural ou torrada e, também,sob a forma de pé-de-moleque e paçoquinha(ALMEIDA et al., 1998). É também avida-mente consumida por mamíferos (por exem-plo, o gado, o morcego) e aves (como o tuca-no), conforme relata Lorenzi (1998). A amên-doa é oleaginosa, com propriedades revigo-rantes e estimulantes ao suor; das sementesextrai-se o óleo de baru fino, sendo, ainda,potencialmente medicinal (CEMIG, 2001).

Dentre os vários atributos associadosà vegetação do domínio Cerrado, os recursoshídricos e a elevada biodiversidade sãodestacadamente mais relevantes. Contudo,com o contínuo processo de desfloresta-

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mento, esses atributos podem, em um futu-ro próximo, estar comprometidos (CAVAL-CANTE et al., 2000). Após perturbaçãoantrópica, na maioria dos casos, corte e quei-ma de floresta e uso agropastoril, observam-se o estabelecimento e a extinção de ervas,arbustos, árvores pioneiras de ciclo de vidacurto e árvores pioneiras de ciclo de vidapouco mais longo, consecutivamente(TABARELLI e MONTOVANI, 1999).

A perturbação antrópica pode ser ex-tinta, caso a comunidade local não encontresoluções para a utilização dos recursos na-turais sem comprometer domínio Cerrado.Os sistemas agroflorestais (SAF’s) podem,por exemplo, promover a integração de áreasrurais, considerando a participação dos ato-res locais. Os SAF’s podem ocorrer com acombinação de bananeiras, café e uma espé-cie produtora de madeira (preferencialmen-te nativa), por exemplo, o baru, pode sercaracterizado como um consórcio agroflores-tal, bem como silvipastoril com a inclusãode uma gramínea nativa ou exótica (COSTA,2002).

Nesse sentido, nos assentamentos ru-rais, os fragmentos, embora devessem man-ter a reserva legal, têm as espécies madeirá-veis consistentemente exploradas. Esta é asituação da espécie em foco, em função dautilização na construção de portas, janelas,tacos para assoalho, forros, moirões, entreoutros (LORENZI, 1998). O ideal seria a im-plantação de SAF’s que conciliasse o uso derecursos florestais, não somente com o usoda madeira, com uma agricultura familiarque conservasse o solo mantendo a matériaorgânica, essencial para o desenvolvimentovegetal e animal, aumentando, assim, o lucrodo proprietário (POTT e POTT, 2003).

As espécies que constam como pionei-ras no Cerrado servem para reposição flores-tal e recuperação de áreas degradadas. Seuma determinada espécie for utilizada pelafauna, torna-se um fator adicional para in-cluí-la em projetos com esse propósito, por-que as plantas zoocóricas atraem aves emamíferos frugívoros que dispersam as se-mentes e trazem sementes de outras espécies,enriquecendo a diversidade local (POTT ePOTT, 2003).

Portanto, percebe-se claramente atra-vés dos referencias citados anteriormente

que, a importância ecológica, econômica esocial do baru na manutenção dos fragmen-tos florestais remanescentes do Cerrado.

Nos trabalhos de Costa et al. (2002),Costa (2003) e Primack e Rodrigues (2001)elencaram-se as relações desenvolvimentosócio-econômico, a utilização racional e aproteção do meio ambiente. A instalação deAssentamentos no Brasil exemplifica a situa-ção de abandono após a entrega das terras.São pessoas que, muitas vezes, necessitamde amparo do governo, pois advêm de váriosEstados brasileiros, como Alagoas, Sergipe,Bahia, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná,Santa Catarina, Minas Gerais, Mato Grossodo Sul, entre outros, e que estão apenas reali-zando um sonho, porém sem muita infraes-trutura (EMPAER, 1998).

No Assentamento Andalúcia, não seencontra diferença no que concerne ao aban-dono. Mesmo com o Plano de Desenvolvi-mento elaborado pela Empresa de Pesquisa,Assistência Técnica e Extensão Rural deMato Grosso do Sul - EMPAER (1998), nãose encontra o fator primordial que é a pró-pria valorização humana. Por outro lado,esta valorização será mais efetiva se houvera integração do homem com o meio ambien-te e o desenvolvimento na tomada de deci-sões, de forma a assegurar a sustentabilidadedos recursos ambientais e melhoria na qua-lidade de vida. Mesmo assim, o combate àpobreza, à desigualdade ou à exclusão socialaparece como dimensão que permeia esseconjunto amplo e difuso de iniciativas(SILVEIRA et al., 2001).

Sob esta ótica, Jara (1999) afirma, ondehá relacionamento de confiança, reciproci-dade e cooperação, a construção de proces-sos de mudança social e desenvolvimentohumano, pode gerar o fortalecimento do teci-do social numa visão ampliada ou sistêmica.Portanto, o desenvolvimento sustentávelapresenta dimensões ambientais, econômi-cas, sociais, políticas e culturais.

Por outro lado, sabendo-se dos custose benefícios derivados da criação e manuten-ção destas áreas, têm-se indicativos da eficá-cia de políticas públicas que abrangem estesetor, podendo-se, então, atribuir recursosfinanceiros para elas em uma escala de priori-dades que pode ser comparada a outras polí-ticas, como saúde e educação, por exemplo.

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Assim, de uma perspectiva ecológica,pode-se inferir que uma análise social decusto benefício, visando a sustentabilidadedos recursos da biodiversidade, deve incluir,também, uma valoração monetária destesatributos.

Paulista et al. (2008) defende a impor-tância da cons­trução de indicadores docompor­tamento individual e das interaçõesentre os indivíduos. Essa construção podefortalecer a compreensão do desenvolvimen-to sustentável e oferecer pautas para apren-dizagem.

As ações de educação ambiental nãodevem ter âmbito apenas local, mas envolvermeios de comunicação em massa, educado-res e educados, além de líderes locais, no sen-tido de envolver as comunidades, buscandoa melhoria na qualidade de vida no seu sen-tido mais amplo, principalmente em assenta-mentos (ROEL e ARRUDA, 2003).

Para muitos assentamentos, a melhoriada qualidade de vida dependeria, não so-mente do assistencialismo do Governo, e simdo despertar de alternativas que, muitas ve-zes, estão latentes em cada indivíduo. Asidéias poderiam efetivar-se por meio de tro-cas de experiências e potencializadas paraoutras soluções, antes desconhecidas.

Nessa abordagem, a utilização dabiodiversidade do Cerrado, para algumasespécies, poderia ser de uso sustentável, comuso dos alguns frutos e seus derivados, obje-tivando a comercialização, como é o caso dopequi, buriti (mais vendido na forma dedoce), cumbaru, entre outros (OLIVEIRA eDUARTE, 2004).

O fortalecimento dos atores ligados aesses produtos nativos poderia adequar for-mas de organização social, de maneira asuscitar atividades e distintas maneiras deuso e explora­ção dos recursos naturais. Umadas principais vantagens seria disponibilizaralternativas com as espécies nativas do domí-nio Cerrado, estando estas adaptadas às suascondições edafoclimáticas e, portanto, certa-mente sendo menos dependentes do uso deinsumos, em sua maioria importados, o queonera o custo de produção e pode degradaro meio ambiente.

Os pesquisadores Roel e Arruda (2003)argumentam que o plantio de espécies ali-mentares do Cerrado é uma alternativa para

o local. Produções caseiras são importantes,principalmente para o turismo, agregando,assim, particularidades para a culinária dospratos típicos da região.

De acordo com Silva et al. (2001), apolpa do cumbaru pode ser consumida “innatura” em forma de doces e geléias. Nessalinha de pensamento, o autor retrata quepesquisadores da EMBRAPA/Cerrados deBrasília também desenvolveram alguns pro-dutos a base do cumbaru, como bombom,paçoquinha, pé-de-moleque, tira-gosto erapadurinha.

Opção para uso da amêndoa do cum-baru e para a comercialização seria incorpo-rá-lo como amêndoa tostada em barra decereais. Uma iniciativa desse tipo foi avalia-da em Pirenópolis/GO, onde o projeto deuma barra de cereais foi desenvolvido.

A espécie é potencialmente medicinal,pois o óleo extraído da amêndoa é de quali-dade e costuma ser utilizado pelas comuni-dades locais como aromatizante para elimi-nar o odor do fumo e como anti-reumático(AGRO-FAUNA, 2008). Contudo, Lorenzi(1998) aponta que uma espécie em particu-lar, o cumaru (Dipteryx odorata Willd), pre-dominante na região Amazônica, apresen-ta características semelhantes ao cumbaru(Dipteryx alata Vog.).

Porém, a comercialização do cumaru,sendo uma espécie semelhante, já apresentavendas no Brasil como um todo, desde a pro-dução de óleo essencial (aromatizante) eperfumaria, o que agregou valores rentáveispara a planta.

Como instrumento de pesquisa paramedir o grau de cooperativismo dos mem-bros do assentamento Andalúcia, utilizou-se um questionário com questões fechadasdo tipo múltiplas escolhas ou do tipo classifi-cação hierárquica (47 entrevistados). Osquestionários foram enviados a cada famíliado assentamento e as dúvidas existentes nasinterpretações foram sanadas pessoalmente,através de visitas aos entrevistados. De acor-do com as respostas obtidas pelos questioná-rios (indicadores), as famílias foram identi-ficadas pelo seu índice de desenvolvimentoeconômico, social e de educação. No levan-tamento observou-se que as famílias queparticipam do grupo de extrativismo forma-do para coletar o fruto e sementes como

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37O baru (Dipteryx alata Vog.) como alternativa de sustentabilidade em área de fragmentoflorestal do Cerrado no Mato Grosso do Sul

Figura 1 – Dificuldades vivenciadas pelosassentados.

A maior dificuldade é a saúde obtendo31 % dos entrevistados, isso reflete principal-mente uma falta de estrutura básica, pois opaís precisa atender melhor as comunidades,a exemplo do eixo central de base mais desta-cada.

Entretanto, minimizando estas carên-cias, foi constatado na localidade que existematividades sociais sendo realizadas, numaação de entrelaçamento de amizades (Figura2).

Figura 2 – Atividades sociais realizadasconstantemente.

É observado na figura acima que valorde R 2 de 0, 821 demonstrou uma boa corre-lação entre todas as variáveis abordadas, oque proporciona uma boa conduta dos entre-vistados no que se trata de atividades sociaisdo local. Os fatores ou estilos referentes aoagregamento de pessoas obtiveram umíndice Alpha de Combrach de 78%, demons-trando a confiabilidade do instrumento paraa avaliação e diagnóstico deste estilo pelosrespondentes.

Algumas mulheres do AssentamentoAndalúcia tiveram a oportunidade de realizarcurso de capacitação com nutricionistas daUniversidade Católica Dom Bosco (UCDB).Elas aperfeiçoaram receitas caseiras com as nor-mas de conduta para manipulação de alimen-tos (Figura 3). Além disso, a busca por alterna-tivas de trabalho dentro do assentamento le-vou à criação da oficina de tecelagem. As mãos,calejadas pelo trabalho na roça, agora tecempeças delicadas. A percentagem de 70% querecebem fica com as mulheres e o restante éreinvestido na oficina. As peças, feitas sob enco-menda, já foram exportadas para Alemanha,Inglaterra e Estados Unidos (MSTV, 2004).

Pequi, Jatobá e Cumbaru adquiriram umamaior conscientização e descobrindo que éuma fonte de alimento não só para a família,como também para os alunos das escolas.

Contudo, existe uma preocupaçãomaior, pois foram identificados muitos pro-blemas vivenciados pelos próprios assentadosem sua localidade, como é apresentado naFigura 1.

Figura 3 – Processo de elaboração de receitas caseiras de Baru.Fonte: Autor.

Desta forma, o desenvolvimento dacomunidade, por meio de produtos alimen-tícios do Cerrado, que era potencialmenteinexplorado, como o baru, pode contribuirpara a susten­tabilidade de comunidades

locais e, também, para a recomposição dapaisagem natural e mes­mo do turismo, va-lorizando a culinária com produtos típicos,como ocorre em outras regiões.

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Conclusões

O estudo aponta para a ampliação dageração de renda e melhoria da qualidadede vida no Assentamento Andalúcia, comênfase no aproveitamento dos recursos vege-tais do Cerrado sul-mato-grossense, agre-gando valores ao produto, produzindo e es-tabelecendo mudas do baru, envolvendo acomunidade como um todo.

Este cenário poderá incentivar novasiniciativas extrativistas para os assentamen-tos rurais em áreas de fragmentos florestaisdo estado, melhorando as condições sócio-econômicas e a qualidade de vida, favorecen-do o processo de desenvolvimento local comsustentabilidade.

Agradecimentos

Os autores agradecem aos grupos en-trevistados do Assentamento Andalúcia e àECOA pela apresentação à referente comu-nidade.

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Intervenção do Estado e desenvolvimento local: uma análise cross section dosmunicípios paranaenses

The State intervention and local development: the cross-section analyze of theparanaenses municipalities

Intervention de l’État et développement locale: une analyse cross section des villesparanaenses

Intervención del Estado y del desarrollo local: una sección representativa del análisis de lasciudades paranaenses

 Christian Luiz da Silva*Carminda Lopes**

William Michon Junior***

Recebido em 24/09/2008; revisado e aprovado em 23/12/2008; aceito em 02/02/2009.

Resumo: A intervenção do Estado tem o propósito de fomentar o desenvolvimento local. O objetivo deste artigo édiscutir essa capacidade de intervenção para a melhora das condições de desigualdade no Estado Paraná, medianteuma análise cross section dos municípios paranaenses. A pesquisa foi aplicada, descritiva e quantitativa, com análisedos dados para o ano de 2000. O estudo evidencia que as finanças públicas ainda não representam um papel efetivopara mudança das desigualdades socioeconômicas, mas afetam positivamente os indicadores sociais.Palavras-chave : Desenvolvimento local. Municípios. Paraná. Finanças Públicas.Abstract: The intervention of the State has the intention to foment the development local. The objective of this articleis to argue this capacity of intervention for the improvement of the conditions of inequality in the Paraná State, bymeans of an analysis cross section of the Paraná cities. The research was applied, descriptive and quantitative, withanalysis of the data for the year of 2000. The study it evidences that the public finances not yet represent an effectivepaper for change of the socioeconomics inequalities, but affect the social pointers positively.Key words: Local development. Municipalities. Paraná. Public finances.Résumé: L’intervention de l’État a l’intention de fomenter le développement local. L’objectif de cet article est discutercette capacité d’intervention pour l’amélioration des conditions d’inégalité dans l’État Paraná, moyennant une analysecross section des villes paranaenses. La recherche a été appliquée, descriptive et quantitative, avec analyse desdonnées pour l’année de 2000. L’étude il prouve que les finances publiques ne représentent encore pas un papierefficace pour changement des inégalités socioeconômique, mais touchent positivement les indicateurs sociaux.Mots-clé: Développement locale. Villes. Paraná. Finances Publiques. Resumen: La intervención del estado tiene la intención de fomentar al local del desarrollo. El objetivo de este artículoes discutir esta capacidad de la intervención para la mejora de las condiciones de la desigualdad en el estado deParaná, por medio de una sección representativa del análisis de las ciudades de los paranaenses. La investigación eraaplicada, descriptiva y cuantitativa, con el análisis de los datos por el año de 2000. El estudio evidencia que lasfinanzas del público no todavía para representar un papel eficaz para el cambio de los inaqualities de lossocioeconômicas, sino afectar los indicadores sociales positivamente.Palabras clave : Desarrollo local. Ciudades. Paraná. Finanzas del Público.

* Economista, Pós-doutor em Administração pela USP, professor do PPGTU/ PUCPR e da UTFPr. Pesquisador doCNPq - projeto de pesquisa intitulado: “Modelo dinâmico de desenvolvimento local para o apoio ao PlanejamentoPúblico” (processo 40085/2006-3)** Economista e especialista em gestão econômica de negócios pela UniFAE Centro Universitário Franciscano doParaná. Foi bolsista de iniciação científica da UNIFAE vinculada ao projeto “Modelo dinâmico de desenvolvimentolocal para o apoio ao Planejamento Público” (processo 40085/2006-3). E-mail: [email protected]*** Economista pela UniFAE Centro Universitário Franciscano do Paraná. Foi pesquisador da UNIFAE vinculadaao projeto “Modelo dinâmico de desenvolvimento local para o apoio ao Planejamento Público” (processo 40085/2006-3). E-mail: [email protected]

Introdução

Os modelos de desenvolvimento localcom intervenção do Estado pressupõem quea sua ação e influencia na orientação de ele-mentos afetam positivamente no curto e no

longo prazo a dinâmica da região. Entre osdiscursos políticos, saúde, educação e atra-ção de empregos e investimentos são açõesdeterminantes para reduzir a desigualdadesocial, violência e melhora da qualidade.Pode-se exemplificar a materialização destes

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42 Christian Luiz da Silva; Carminda Lopes; William Michon Junior

discursos nos Planos Plurianuais do gover-no do Estado do Paraná de 2008 a 2011(SEPL, 2007) ou o Plano de Governo de 2003a 2006 deste Estado (SEPL, 2003). A interven-ção do Estado Federal, responsável pela re-ceita maior que 1/3 do PIB brasileiro(IPEADATA, 2008), distribuído entre gover-nos estaduais e municipais, se transforma emuma importante injeção de recurso para con-cretizar as ações consideradas fundamentaispara o processo de desenvolvimento, contu-do as disparidades regionais permanecem ese consolidam, em alguns casos.

O Paraná apresenta a situação maisdesigual entre os municípios se comparadoaos demais Estados do sul e sua conforma-ção ocorreu pela construção e colonizaçãodas diferentes regiões do Estado, cuja histó-ria recente da maioria dos municípios, me-nos de 60 anos, e dependente de ciclos deexploração de recursos naturais demonstraquanto foi impreciso o modelo de descentra-lização do Estado paranaense.

Alguns estudos recentes foram desen-volvidos, principalmente pelo Ipardes (Ins-tituto Paranaense de Desenvolvimento Eco-nômico e Social), sobre o diagnóstico da si-tuação socioeconômico e ambiental doParaná (IPARDES, 2003 e 2004), entretantoo enfoque desse artigo é avaliar se a interven-ção do Estado vem contribuindo para reduziressas disparidades. Cabe questionar, destaforma, se o problema é a falta de recursos, aeficiência ou eficácia da aplicação dos recur-sos que tornam pouco efetivo o processo dedesenvolvimento no Paraná. Considerandoque este processo está vinculado a forma deintervenção do Estado, parte-se da hipóteseque não se trata de falta de recursos, mas deuma alocação essencialmente pouco eficaz,que torna o resultado sem efetividade pararetomar um processo de desenvolvimentopor todo Estado. A Lei de ResponsabilidadeFiscal contribui para acompanhamento daeficiência dos recursos, mas não há um ins-trumento que permita avaliar os resultados.

Neste contexto, cabe discutir a capaci-dade de intervenção do Estado para melho-ra das condições de desigualdade no Estadodo Paraná. Em parte pode-se argumentarque o Estado não reduziu a desigualdadesocioeconômica no Paraná, mas não permi-tiu que se aprofundasse. Contra-argumen-

tado, o presente artigo objetiva avaliar aefetividade da intervenção do Estado, pormeio dos governos municipais, no processode desenvolvimento local. Para isso será feitouma análise cross section com dados dos mu-nicípios para o ano de 2000, relacionandoindicadores socioeconômicos com informa-ções de receita e despesas municipais. Parte-se do princípio que se houver uma relaçãoentre a alocação do recurso e o indicadorresultante daquela ação será considerado quehá efetividade na ação pública. Caso nãohaja a hipótese será validada e será justifi-cado que falta avaliação da eficácia daalocação do recurso público para se avaliare aprimorar a efetiva intervenção do Estadono processo de desenvolvimento. A metodo-logia será exposta na terceira seção, contu-do cabe destacar que não se trata de avaliarum município específico e a evolução dasações municipais ao longo do tempo, masespecificamente de correlacionar as diferen-tes realidades municipais em termos de fi-nanças públicas com a situação socioeconô-mica. Se os municípios com melhor condi-ção financeira tiverem melhores indicadorescomprova-se que a questão é a falta de re-cursos. Se isso não se confirmar, valida-se ahipótese, como salientado.

de desenvolvimento. A terceira seçãoapresenta a metodologia e a quarta seçãoanalisa os resultados para o Estado doParaná, considerando a situação dos muni-cípios em 2000. A quinta seção evidencia asconclusões e propõe novos estudos.

1 Intervenção do Estado no processo dedesenvolvimento local: abordagemteórica

A intervenção estatal pode acontecerde diversas formas na economia. Silva(2005a, p. 89-92) apoiado no Relatório doBanco Mundial (1997, p. 4) cita que o Estadotem cinco tarefas fundamentais e, portanto,funções de intervenção: formar uma basejurídica; manter políticas não-distorcionistas,inclusive a estabilidade macroeconômica;investir em serviços básicos e infra-estrutu-ra; proteger os grupos vulneráveis; protegero meio ambiente. Iglesias (2006) ainda incluio importante papel para o Estado no desen-volvimento tecnológico e de inovações, bem

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como para promover consensos nacionais.Além disso, essas tarefas devem ser execu-tadas com a eficiência e eficácia da gestãopública a fim de traduzir a melhor qualitati-va da prestação de serviços aos cidadãos(LERDA, ACQUATELLA e GÓMEZ, 2005).

Como expõe Frey a intervenção esta-tal está presente nos discursos contemporâ-neos do desenvolvimento. O autor ressaltaisso ao afirmar que “a intervenção estatal,via planejamento, é considerada indispen-sável para reduzir ou evitar os efeitos noci-vos dos processos de crescimento econômico,ou ainda, para poder eliminar ou reparardistúrbios e danos já existentes” (2001, p. 7).

A intervenção do Estado está atreladaà aplicação de políticas públicas, e mensuraresta correlação passa a ser prioridade paraestabelecer eficiência no direcionamento dosrecursos públicos, que crescem proporcional-mente menos que as demandas por serviçospúblicos. As políticas públicas atendem aquestões que vão além da visão unidimensio-nal, ou seja, uma ação com foco na saúdepode afetar também a questão econômica esocial (SILVA, 2005b).

Para acompanhar essas políticas, asquais têm influência em mais de uma dimen-são, há que se ter meios de avaliar sua efi-ciência. Souza (2007) faz uma exaustiva dis-cussão sobre o conceito de políticas públicase sintetiza com o conceito de Lowi apudRezende (2004, p. 13) onde se define como“uma regra formulada por alguma autori-dade governamental que expressa uma in-tenção de influenciar, alterar, regular, o com-portamento individual ou coletivo através douso de sanções positivas ou negativas”. Ain-da para Lowi (1972) a política pública podeassumir quatro formatos: distributiva, regu-latória, redistributiva e constitutiva. Cadauma dessas políticas gera pontos ou gruposde vetos e de apoios diferentes, processan-do-se localmente de forma diferente. O objetode discussão desse artigo é como essas polí-ticas, em funções diferentes a partir do exer-cício da administração pública municipal noParaná, podem ter contribuído para melho-ra efetiva dos indicadores socioeconômicosmunicipais.

O impacto do investimento públicosobre a renda per capita (efeito direto sobreo produto) e sobre a produtividade total dos

fatores (efeito indireto sobre o produto) écontroverso. Cândido Junior (2006) estudoua Argentina, o Brasil e o Chile, com informa-ções de 1970 a 2000, e concluiu que, para aamostra estudada, há uma relação positivaentre investimento público e produto. Con-tudo, a exceção do Chile, houve uma rela-ção inversa entre investimento e produtivi-dade. O autor se referiu a esta diferençacomo sendo a eficiência do uso dos recursos.

Cândido Junior (2006), contudo,acresceu, em sua análise, não somente a in-jeção de recursos, como a necessidade deavaliar sua eficiência. A conclusão a favordo Chile, na relação positiva do investimentopúblico tanto em termos do produto quantoda produtividade, foi explicada, pelo autor,como a eficácia dos investimentos públicos.Neste sentido, um investimento eficaz pro-duziria um efeito direto positivo na econo-mia e indireto por meio do aumento da pro-dutividade. Monteiro Neto (2006) não dis-cute a eficiência do investimento público,mas o considera “um dos elementos maisimportantes para a ativação da formação decapital na economia brasileira da últimametade do século XX” (2006, p. 24). O autorcomplementa afirmando que “há elementosindicativos de que as reduções no gasto eminvestimento governamental, entre os perío-dos de 1991-1995 e 1996-2000, tiveram efei-tos propagadores sobre a queda no nível ge-ral de atividade mais que proporcionais aoque se poderia esperar” (MONTEIRO NETO,2006, p. 26). Contudo, pondera MonteiroNeto, em consonância com Prichett (2000),ao afirmar que a intervenção estatal nãopode ser vista como uma panacéia para aresolução de todos os problemas e da econo-mia brasileira.

Pritchett (2000) já alertava sobre o usoindiscriminado do investimento públicocomo panacéia da eficiência e da resoluçãodos problemas. Ao estudar essa questão,Oliveira (2006, p. 275) argumenta que “umdos motivos que leva a falhas nos resultadospúblicos é a dissociação que se faz entre ela-boração e implementação no processo deplanejamento de acordo com algumas visõesda prática ou escolas de pensamento”. Oautor cita outro trabalho de sua autoria parajustificar as falhas de políticas públicas emdesenvolvimento por motivos político

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institucional, financeiros e técnicos (OLIVEI-RA, 2002).

O primeiro motivo se refere a articula-ção e funcionamento do sistema político eda interação entre Estado e sociedade civil.O amadurecimento das bases institucionaisdepende de processos específicos e históricosem cada país e é um condicionante impor-tante para garantir a implementação de polí-ticas públicas. A questão financeira, segundoo autor, é “a razão mais direta para explicaras falhas em planejamento nos países emdesenvolvimento” (OLIVEIRA, 2006, p.280). A falta de recursos inibe qualquer pos-sibilidade de implementar as políticas públi-cas da forma planejada, o que dificulta sobre-maneira para alcançar resultados efetivos.Menicucci (2007) exemplifica esse problemaao discutir a questão da implementação dareforma sanitária.

Por fim, a capacidade técnica se referea recursos humanos capacitados e motiva-dos, equipamentos, experiência e competên-cia técnica dos órgãos responsáveis para pla-nejar e implementar as políticas públicas.Com pesos diferentes, os tópicos sintetizadospor essa capacidade técnica são responsáveisde alguma forma para a ineficiência da im-plementação das políticas públicas. Às vezesé a falta de recursos humanos o mais preemi-nente, outras são equipamentos.

A avaliação da eficiência do investi-mento público poderia ser feita sob quatroóticas: eficiência na avaliação prévia da po-lítica pública; na interação entre os agentesque administram a política; na capacidadetécnica para implementação; e no resultado,relacionando o proposto com o alcançado.Cada uma delas se refere a uma etapa doprojeto. A primeira seria avaliada quanto aconcepção (estágio inicial); a segunda se re-fere a etapa intermediária entre a concepçãoe a imple­mentação; a terceira se refere aimplementação e a quarta ao resultado. Casoa concepção ocorra no mesmo âmbito daimplementação (agente público local, porexemplo) haveria apenas as duas últimasfases para avaliação. Este artigo consideraesta hipótese e avalia somente a última fase(ver metodologia na seção 3). As dificulda-des de uso da avaliação das políticas públicaspara melhorar a efetividade do uso dos re-cursos públicos é discorrida por Faria e

Filgueiras (2007) e exemplificado para o casodos sistemas de avaliação. Assim, as alter-nativas de uso das avaliações tornam a polí-tica pública retroalimentadas e redirecio-nada para sua efetividade, quando utiliza-da de forma educativa.

Neste sentido Dubresson e Fauré (2005)convidam a repensar, também, sobre a fre-qüente relação entre descentralização e de-senvolvimento local tida como mecânica. Aoestudar regiões da África do Sul, Brasil, Mé-xico, Índia e Senegal os autores demonstramque existem desajustes entre os organismosinstitucionais de descentralização e o nívelde formação ou de consolidação das dinâ-micas econômicas locais.

A interação entre capacidade técnicae ambiente institucional pode ser verificada,desta forma, na relação entre Estado maiore as instituições locais. Adicionalmente a ine-ficiência de intervenções estatais pela faltade sintonia entre esferas estatais e realida-des locais, pode haver a incapacidade técni-ca para implementação do projeto. Algumassituações podem colaborar com essa afirma-ção, quando, por exemplo, o planejamentoocorre centralizado, sem sintonia com a re-alidade local, que deve efetivamente imple-mentar o projeto. O insucesso decorre dafalta de habilidade para desenvolver o que émais próximo ao desejado e pela baixa sin-cronia entre o Estado e as instituições locais.Brakely (1994, p. 41) avalia as opções depolíticas nacionais e desenvolvimento e argu-menta que as políticas nacionais seriam maisefetivas se acoplada com uma ativa políticaregional que garantisse a implementação deprogramas e desse suporte as atividades dodesenvolvimento econômico. A eficiênciadesta implementação aconteceria, portanto,segundo o autor, se houvesse integração en-tre o poder local e nacional.

A descentralização não é, contudo, umconsenso. Froehlich (1998, 88-89), citandoMattos, argumenta que a descentralizaçãorespalda um discurso de melhoria da demo-cracia social, a participação popular e a jus-tiça social, com propósito de viabilizar o de-senvolvimento regional. Contudo, paraMattos citado em Froehlich, esta retórica se-ria do interesse somente dos que defendema reforma do Estado, visando aprimorar osprocessos de acumulação e crescimento do

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capital. Por outro lado, Blakely (1994, p. 49)menciona que o desenvolvimento local re-presenta não apenas uma nova retórica, masuma importante alternativa que associa asatividades econômicas com o desenvolvi-mento local. O autor não marginaliza a par-ticipação do Estado, mas ressalta a necessi-dade de uma ação oriunda dos poderes lo-cais, sejam eles públicos ou privados.

Contudo, Rodrigues (2007) mostra, pormeio de um estudo evolutivo dos gastos pú-blicos catarinenses de diferentes municípios,que não há grandes variações do direciona-mento da verba público entre os locais anali-sados, mesmo com forte divergência ideoló-gica e partidária. O autor argumenta, sobreeste fato, que isso decorre da não-liberdadede aplicação dos recursos, pois os destinossão previamente definidos, restando poucoa ser aplicado livremente.

Neste contexto cabe verificar até queponto ações propositivas são possíveis pormeio de políticas públicas para melhora dosindicadores socioeconômicos e se elas estãosendo efetivas ou não. Assim, a participaçãodo Estado neste artigo será considerado pormeio das finanças públicas e correlacionadocom os indicadores socioeconômicos dosmunicípios do Estado a partir de corte tem-poral (2000). O modelo teórico pressupõe,portanto, que as finanças públicas represen-tam uma importante forma de intervençãodo Estado e são variáveis explicativas da re-dução das desigual­da­des socioeconômicasa partir da educação, saúde e emprego, ex-plicadas para o processo de desenvolvimen-to. Antes de apresentar os resultados a próxi-ma seção retrata a metodologia de pesquisa.

2 Metodologia

A hipótese desse artigo é que a efeti-vidade da intervenção do Estado para redu-ção da desigualdade socioeconômica do Es-tado é fruto de uma alocação essencialmen-te pouco eficaz, e não pela falta de recursos.A validação desta hipótese parte da avalia-ção da relação entre a alocação dos recursospúblicos e os indicadores socioeconômicosresultantes daquela ação. Se houver corre-lação pressupõem-se haver efetividade naação pública, caso contrário se valida a hi-pótese e se considera que a mesma depende

de uma gestão mais eficaz dos recursos pú-blicos. Para isso, fez-se uma análise crosssection (corte temporal) do ano 2000 paratodos os municípios paranaenses. A escolhado ano 2000 deve-se ao fato de se ter o mai-or número de variáveis para análise (últimabase censitária para todos os municípios).

Foram levantadas 95 variáveis e clas-sificadas em 8 áreas: desigualdade socioeco-nômica, finanças públicas, educação, produ-ção e consumo, infra-estrutura e demografia,emprego, renda e saúde, que foi subdividi-da em longevidade e saneamento. A listagemdas variáveis e respectivas fontes se encon-tra no apêndice 1. O quadro 1 apresenta arelação das áreas e da quantidade de variá-veis envolvidas para todos os municípiosparanaenses.

ÁREAS QUANTIDADE DE VARIÁVEIS

Desigualdade socioeconômica 3 Educação 8 Finanças Públicas 20 Infra-estrutura e demografia 11 Emprego 6 Produção e Consumo 22 Renda 12 Saúde (longevidade e saneamento) 13 TOTAL 95

Quadro 1 – Quantidade de variáveis por áreaanalisada para os municípios paranaense –2000Fonte dos Dados Brutos: IBGE, PNUD, COPEL,IPEA, STN.Nota: Ver lista de todas variáveis utilizadas noapêndice 1.

A pesquisa realizada é aplicada já quedepende dos conhecimentos desenvolvidospela pesquisa pura, mas tem como interesseà aplicação e conseqüências práticas do co-nhecimento. A pesquisa pode ser classifica-da como descritiva no que se refere ao obje-tivo geral, pois busca a descrição das carac-terísticas de determinada população ou fenô-meno a partir da utilização de técnicas pa-dronizadas de coleta de dados. Trata-se tam-bém de uma pesquisa quantitativa, segundoa abordagem do problema, pois o enfoque éa coleta e tratamento de informações pormeio de técnicas estatísticas, com corte tem-poral (cross section) para 2000, como já foijustificado, especialmente análise de corre-

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lação bivariada e análise de regressões paravariáveis chaves, como educação, saúde,emprego e desigualdade (GIL, 2000; DIEHLe TATIM, 2004; BÊRNI, 2002).

As etapas de consecução da coleta etratamento dos dados foram: 1) escolha dasvariáveis de dados disponíveis para o ano2000 nas fontes indicadas, que são as maisrepresentativas para informações municipaisno Brasil; 2) coleta e estruturação das infor-mações; 3) definição de indicadores compos-tos, conformados por variáveis diretas, como,por exemplo, despesas municipais percapita. As variáveis iniciais mais estas trata-das totalizaram 95 dados para este períodoe para todos os municípios. (Alguns municí-pios não tinham observações de alguns da-dos e neste caso foi atribuído valor nulo); 4)foi realizado a análise de correlaçãobivariada entre todas as variáveis; 5) desta-cou-se as correlações significativas (Corre-lação Pearson próximo de zero); 6) para es-sas correlações distribui-se entre correlaçõesfortes (valores absolutos acima de 0,7), mé-dias (entre 0,69 e 0,40) e fracas (menor que0,4). 7) avaliaram-se as variáveis explicativase correlacionadas de cada área usualmenteobjeto de ações públicas, determinadas comosendo desigualdade, educação, saúde e em-prego e, verificou-se a significância do sinalda correlação (positiva ou negativa) frente ateoria e o nível de correlação (forte, médiaou fraca); 8) analisou-se os resultados com afinalidade de validar ou não a hipótese, apre-sentando-se inicialmente alguns indicadoresdas mesoregiões paranaenses a fim de mos-trar as disparidades do Estado. Cabe salien-tar que toda análise estatística foi realizadacom o suporte do software SPSS versão 12.0.

Algumas limitações metodológicas sãopertinentes: primeiro, ressalta-se que a limi-tação de estudos a partir de modelos estatís-ticos e econométricos tradicionais, apontadopor Soto Torres e Fernandez Lechón (2006),referente a perda da componente histórica éuma limitação deste artigo também. Contu-do, essas limitações são justificadas pelo pro-pósito do trabalho. Não se pretende avaliara evolução dos municípios, mas se a diferen-ça de recursos públicos é suficiente para ex-plicar a desigualdade socioeconômica. Vali-dar essa hipótese abre campo para pesquisamais qualitativa e histórica das diferenças de

cada município, mas primeiro é importanteter a melhor definição do problema de pes-quisa a partir deste estudo descritivo.

Outra limitação, associada a esta, é nãoconsiderar a diferença de eficácia da gestãoentre os municípios, por não tratar da evo-lução histórica. Novamente, o propósito éidentificar em termos gerais, sem, neste mo-mento, entrar no mérito de cada município,que será fruto de novos trabalhos.

3 Análise dos resultados

A compreensão do processo de desen-volvimento paranaense origina-se nas dife-rentes formas de colonizações das regiões,tanto em termos de período histórico quantomotivação (MAGALHÃES FILHO, 1999).Desta forma, inicialmente serão apresenta-dos alguns indicadores socioeconômicos queretratam essas disparidades para em seguidaanalisar a correlação desses indicadores, con-forme a metodologia descrita anteriormente.

3.1 Evolução do desenvolvimentoparanaense recente

Durante o processo de reconfiguraçãoda estrutura produtiva na década de 1990(SILVA e MICHON JUNIOR, 2008), os gran-des centros passaram a ofertar mais empre-gos e a infra-estrutura destes centros atraiama migração da zona rural para a zona urba-na, em busca de melhor qualidade de vida,uma vez que eram ofertados serviços públi-cos que muitas vezes não eram ofertados naquantidade ou qualidade necessária nas zo-nas rurais. A tabela 1 apresenta a migraçãoentre 1980 e 2000, ressaltando a migraçãoocorrida no Paraná da zona rural para ur-bana.

Tabela 1 – População residente urbana

POPULAÇÃO URBANA 1980 1991 1996 2000BRASIL 67,6% 75,6% 78,4% 81,2%BA - Bahia 49,3% 59,1% 62,4% 67,1%MG - Minas Gerais 67,1% 74,9% 78,4% 82,0%PR - Paraná 58,6% 73,4% 77,9% 81,4%RJ - Rio de Janeiro 91,8% 95,3% 95,5% 96,0%RS - Rio Grande do Sul 67,5% 76,6% 78,7% 81,6%SC - Santa Catarina 59,4% 70,6% 73,1% 78,7%SP - São Paulo 88,6% 92,8% 93,1% 93,4%Demais Estados 54,8% 65,0% 69,4% 73,5%

Fonte: IPEADATA.

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No Paraná observou-se o mesmo pro-cesso entre as mesorregiões, no qual houvemigração das mesorregiões menos industria-lizadas para os grandes centros. A tabela 2mostra a dinâmica populacional entre 1980e 2000. A região metropolitana de Curitibacresceu 31% neste período, liderado pelocrescimento de 33% da população urbana.A população de outras regiões do estadomigrou para a região urbana de RMC (Re-

gião Metropolitana de Curitiba), a medidaque a população urbana de outras regiõesdecresceu na sua participação na populaçãourbana paranaense, enquanto a RMC apre-sentou o movimento inverso. O movimentoda zona rural para a urbana ocorreu inter-namente no Paraná, principalmente no in-terior à medida que os postos de trabalhamse abriam nas cidades.

DISTRIBUIÇÃO POPULACIONAL 1980 1991 1996 2000Estado do Paraná

População 7.629.392 8.448.713 9.003.804 9.563.458Part. % População Estado 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%Grau de Urbanização 58,6% 73,4% 77,9% 81,4%Part. % População Urbana Estado 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

Metropolitana de CuritibaPopulação 1.703.787 2.319.526 2.734.500 3.053.313Part. % População Estado 22,3% 27,5% 30,4% 31,9%Grau de Urbanização 86,3% 89,4% 89,8% 90,6%Part. % População Urbana Estado 32,9% 33,5% 35,0% 35,5%

InteriorPopulação 5.925.605 6.129.187 6.269.304 6.510.145Part. % População Estado 77,7% 72,5% 69,6% 68,1%Grau de Urbanização 50,7% 67,3% 72,7% 77,1%Part. % População Urbana Estado 67,1% 66,5% 65,0% 64,5%

Tabela 2 – Distribuição populacional no Paraná

Fonte: IPARDES.

A abertura da economia e o novo pro-cesso de industrialização demandaram am-pliação da infra-estrutura, para atender ocrescimento da produtividade e de novasmáquinas utilizadas no processo de produ-ção. A tabela 3 apresenta dados sobre o abas-tecimento de água e energia elétrica. O cres-cimento industrial pode ser apresentado apartir da proxy consumo de energia elétrica.Tanto a RMC quanto o interior apresenta-ram um crescimento elevado, pela maior dis-ponibilidade de energia no estado, e pelocrescimento da demanda por energia. Ocrescimento da utilização da energia advémdo uso mais intensivo da tecnologia tanto dosconsumidores quanto do setor industrial, quepode ser visto pelo crescimento da razão

consumo por consumidores nas localidadesapresentadas.

No comparativo de consumo de ener-gia elétrica brasileira com o Paraná, o consu-mo paranaense cresceu em escala superiorao brasileiro, em função do processo indus-trializante da década de 1990, que não serefletiu com tal grau de intensidade nos ou-tros estados brasileiros que apresentam me-nor dinâmica industrial e que possuem mai-or dependência nos produtos primários oupouco manufaturados. Enquanto o consu-mo brasileiro total e consumo brasileiro in-dustrial cresceram 41,9% e 66,3% respecti-vamente, o Paraná experimentou um cres-cimento de 73,1% e 75,0% ao longo do mes-mo período.

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Desta forma, houve incrementos sig-nificativos de recursos energéticos e aumentoda rede de abastecimento de água. A ener-gia é um indicador comumente utilizadocomo proxy para análise do grau de desen-volvimento de países e regiões, uma vez quequanto maior for o emprego e acessibilidadeaos recursos tecnológicos, maior tende a sera utilização de energia elétrica. Contudo, épossível haver incrementos tecnológicos quenão representou incrementos diretamenteproporcionais aos incrementos tecnológicos,uma vez que os aparelhos elétricos estão sen-do projetados para poupar energia, aumen-tando sua eficiência na utilização do recurso,como por exemplo, a tecnologia empregadanas geladeiras nos últimos anos.

Partindo de tais premissas, foi possívelidentificar que houve incrementos significa-tivos tanto na RMC quando no interior para-naense, demonstrando que o crescimentoeconômico atingiu todo o estado. A urbani-zação da população contribuiu mutuamen-te para tal fato, uma vez que se tratou deum sistema adaptativo positivo, pois a me-dida que as cidades se industrializavam, aspessoas se deslocavam do campo para a ci-dade em busca de oportunidades de traba-lho. Enquanto a demanda por trabalho era

maior que a oferta esta tendência manteve-se ao longo do período analisado, contribuin-do para o crescimento da demanda porenergia elétrica.

Os processos de transformação da eco-nômica brasileira e paranaense causaramefeitos na dimensão social, uma vez que foiidentificado o processo de urbanização edesemprego ao longo do período. Portanto,nesta dimensão serão apresentados dados eindicadores que configuram os panoramassociais, tais como da educação e violência,visando avaliar como as mudanças econô-micas dos anos 1990 influenciaram as variá-veis não-econômicas no decorrer desta déca-da. Serão feitas algumas comparações entreos principais estados para situar a relevânciadas transformações.

As teorias mais recentes sobre desen-volvimento, sempre apontam a importânciada educação para o processo de desenvolvi-mento no longo prazo. Somente a educaçãopermite que a melhoria da produtividadeseja continua sem causar impactos negativosno mercado de trabalho. A principal proxyutilizada para quantificar a variável educa-ção é o anos de estudo da população acimade 25 anos. Segundo dados do IPEA, oParaná foi um dos estados que mais aumen-

Tabela 3 – Dados sobre a infra-estrutura paranaense 1990-2000

Fonte: IPARDES.

INFRA-ESTRUTURA 1990 1995 2000?%

1990 x 2000Estado do Paraná

Abastecimento de Água - Ligações 1.169.279 1.574.529 1.913.973 63,7%Abastecimento de Água - Ligações Industriais 7.037 8.404 9.302 32,2%Abastecimento de Água - Unidades Atendidas 1.478.727 1.948.773 2.347.877 58,8%Abastecimento de Água - Unidades Atendidas Industriais 8.091 8.767 9.594 18,6%Energia Elétrica - Consumidores 1.946.241 2.466.815 2.918.680 50,0%Energia Elétrica - Consumo (mwh) 9.767.876 12.996.213 17.093.971 75,0%Energia Elétrica no Setor Secundário - Consumidores 28.241 36.226 45.372 60,7%Energia Elétrica no Setor Secundário - Consumo (mwh) 4.076.554 5.350.977 7.057.546 73,1%

Metropolitana de CuritibaAbastecimento de Água - Ligações 361.311 510.265 639.568 77,0%Abastecimento de Água - Ligações Industriais 2.369 2.708 2.880 21,6%Abastecimento de Água - Unidades Atendidas 516.910 702.829 872.139 68,7%Abastecimento de Água - Unidades Atendidas Industriais 2.588 2.775 2.919 12,8%Energia Elétrica - Consumidores 620.266 818.061 997.408 60,8%Energia Elétrica - Consumo (mwh) 3.706.194 4.891.816 6.662.968 79,8%Energia Elétrica no Setor Secundário - Consumidores 10.298 13.481 17.101 66,1%Energia Elétrica no Setor Secundário - Consumo (mwh) 1.795.586 2.202.507 2.913.437 62,3%

InteriorAbastecimento de Água - Ligações 807.968 1.064.264 1.274.405 57,7%Abastecimento de Água - Ligações Industriais 4.668 5.696 6.422 37,6%Abastecimento de Água - Unidades Atendidas 961.817 1.245.944 1.475.738 53,4%Abastecimento de Água - Unidades Atendidas Industriais 5.503 5.992 6.675 21,3%Energia Elétrica - Consumidores 1.325.975 1.648.754 1.921.272 44,9%Energia Elétrica - Consumo (mwh) 6.061.682 8.104.397 10.431.003 72,1%Energia Elétrica no Setor Secundário - Consumidores 17.943 22.745 28.271 57,6%Energia Elétrica no Setor Secundário - Consumo (mwh) 2.280.968 3.148.470 4.144.109 81,7%

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49Intervenção do Estado e desenvolvimento local: uma análise cross sectiondos municípios paranaenses

Fonte: IPEA.

A distribuição de renda durante o pe-ríodo apresentou uma leve piora no índicede Gini em todos os estados brasileiros, resul-tante dos processos analisados anteriormen-te. A medida que o grau de urbanização cres-ceu, devido a migração das pessoas para oscentros urbanos em busca de trabalho, e aprodutividade das indústrias juntamentecom competitividade do mercado, levou aoaumento do nível de desemprego da econo-mia, influenciado negativamente pelas crisesinternacionais. No caso paranaense, o Índicede Gini passou de 0,597 para 0,607 entre1991 a 2000, segundo dados do IPEA (Insti-tuto de Pesquisa Econômica Aplicada), ape-sar de haver redução da pobreza entre 1991e 2000 conforme dados do IPEA, o que indi-ca que embora a população pobre e indigenteesteja reduzindo, a população mais rica estácrescendo na participação da renda apro-priada da população. A violência medida apartir do indicador de taxa de homicídiospor 100 mil habitantes, cresceu 28% noParaná entre 1990 e 2000 de acordo comdados do IPEA, enquanto a média brasileirafoi de 22% para o mesmo período.

Em síntese a história recente paranaen-se pode ser tratada pela elevação da desi-gualdade, devido ao desemprego e a maiorconcentração de renda pelos mais ricos,mantiveram o crescimento da violência ana-lisada a partir da taxa de homicídio. Contu-do, o maior grau de urbanização e a deman-da por mão de obra qualificada melhorarama educação da população, além da criaçãode novas universidades no estado e da alte-

ração do sistema educacional do ensino fun-damental, reduzindo a evasão escolar e au-mentando a quantidade média de anos deestudos da população adulta, ou seja, hou-ve uma melhora quantitativa na educação.

4.2 Correlação das finanças públicas comindicadores socioeconômicos dosmunicípios paranaenses

As variáveis componentes da análiseenvolveram a qualidade da educação, a mor-talidade infantil, a desigualdade e a receitamunicipal. Avaliaram-se as variáveis expli-cativas e correlacionadas com estas a fim decompreender como a diferença de realidadeentre os municípios paranaenses em 2000justificava a variação das mesmas. As refle-xões a seguir se referem aos dados apresen-tados nas tabelas A1 a A4 do apêndice.

Ao analisar a correlação das diversasvariáveis a fim de compreender a importân-cia e com capacidade explicativa da dinâ-mica dos municípios paranaense pode-severificar que as variáveis são interdepen-dentes, como se pretende explicar. Uma va-riável atinge a outro com a mesma força esentido. Observou-se que o IDEB (Índice deEducação Básica), que mensura a qualidadedo ensino básico, tem forte correlação com amortalidade infantil, em sentido inverso(quanto melhor a qualidade do ensino menoré a mortalidade infantil, que traz mais saúdee melhora o desempenho escolar). O IDEBtem correlação positiva com o nível de estudodas pessoas com mais de 25 anos, o que sig-nifica que a educação básica com qualidadeestimula as pessoas a darem valor a educa-ção, que por usa vez impacta positivamenteo IDH (Índice de Desenvolvimento Huma-no). Quanto maior a escolaridade, maior é onível de desenvolvimento humano. Em sen-tido oposto, o IDEB tem uma correlação ne-gativa com a taxa de pobreza (quanto maispobres, menor o desempenho; e quanto me-nor o desempenho mais eles continuam po-bres), mas positiva com a renda per capita(quanto maior o nível de escolaridade, maiora renda média per capita). Notou-se, contu-do, que a participação pública, por meio dasdespesas públicas não é representativa e sig-nificativa para explicar o nível de desenvol-vimento do IDEB. Os gastos públicos se

taram os anos de estudo entre 1990 e 2001.Apesar de o Paraná estar acima da médiada maioria dos estados, ainda há um gapentre o Paraná e os principais estados brasi-leiros, conforme mostra a tabela 4.

Tabela 4 – Anos de estudo nos estados 1981-2001.

1981 1990 1995 2001

Distrito Federal 6,3 7,5 7,7 8,2Minas Gerais 3,6 4,6 4,9 5,7Paraná 3,4 4,6 5,2 6,0Rio de Janeiro 5,4 6,2 6,7 7,2Rio Grande do Sul 4,3 5,3 5,8 6,3Santa Catarina 3,9 5,0 5,6 6,4São Paulo 4,7 5,7 6,1 6,9Demais Estados (Média) 3,2 4,3 4,6 5,2

ESTADOS ANOS DE ESTUDOS

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relacionam mais com o formalismo burocrá-tico, como está fazendo, e com a populaçãoem geral, significando que o problema dosrecursos na educação não é quanto se gasta,mas como se gasta. Esse é um problema con-tundente para qualquer avaliação de políti-ca pública.

A saúde também mostra uma relaçãofraca com o gasto público da saúde, sendoque a educação, mensurada pelo IDEB, émais representativa para explicar a mortali-dade infantil que o gasto com saúde, corro-borando com a hipótese acima. O grau deurbanização também influência positiva-mente a redução da mortalidade infantil peloacesso aos domicílios com serviço de esgoto,água e lixo. A mortalidade infantil tem forterelação inversa com o IDH, com a expectati-va de vida ao nascer, com a própria renda ecom a educação. Quanto maior a mortali-dade infantil, maior é a desigualdade men-surada pelo índice de Gini, maior é a pobre-za e a taxa de fecundidade. Isso significa quea condição de vida do indivíduo conformaas necessidades vitais em termos de renda esaúde e retrata o nível da mortalidade in-fantil.

A desigualdade socioeconômica, men-surada pelo índice de Gini, diminui à medidaque aumentam os anos de estudos, os domi-cílios com saneamento, a renda e o grau deurbanização. Os municípios mais urbanossão mais desiguais, quando viabilizam o aces-so de domicílios com água encanada, esgotoe coleta de lixo é freqüente. Além disso, otempo de estudo é uma variável importantepara reduzir essa desigualdade. Em síntese,nesta etapa, pode-se evidenciar, a partir dosdados dos municípios paranaenses, como aeducação com qualidade é um elementocrucial para buscar alternativas de desenvol-vimento que sustentem um processo maiscontínuo de oportunidades e novas ações.

A receita municipal, contudo, apresen-ta uma situação reativa, ou seja, ela é influ-enciada pela economia e não o contrário.Quanto maior o PIB, o emprego e o númerode estabelecimentos maior será a receita dogoverno. Enquanto isso, o aumento da po-breza e a redução da renda per capita, nãodiminuem a desigualdade também. A recei-ta será proveniente de uma dinâmica eco-nômica que fortaleça a origem dos recursos.

Tais correlações permitem inferir queo maior problema relativo a efetividade daaplicação dos recursos públicos se refere acomo é utilizado e não a falta dele. Por isso,há um entendimento equivocado entre oprocesso de orçamento e execução orçamen-tária e o planejamento estratégico municipal.O primeiro não substitui o outro, como aler-ta Rezende e Castor (2006). O planejamentoestratégico municipal deve estabelecer aspotencialidades e as dificuldades ao tratardo uso dos recursos públicos frente as de-mandas existentes, seguindo princípios deeficiência e eficácia dos recursos aplicadospara atender essa demanda. Isso pode gerara competição entre municípios, que é nega-tiva no longo prazo pelos malefícios da con-centração regional. Por isso, um plano estra-tégico municipal deve estar alinhado comuma visão regional e local. Contudo, cabedestacar alguns problemas de execução desseplano estratégico: 1) a administração dosrecursos muda a cada 4 anos e, eventual-mente, modifica o planejamento estratégicomunicipal, mesmo que não seja significativo;2) as limitações legais para aplicação dosrecursos (RODRIGUES, 2007); 3) visão decurto prazo em detrimento ao longo prazo ea visão municipal em detrimento a regional;4) histórico fortemente construído a despei-to da administração pública naquele mo-mento (SOUZA, 1997; BLAKELY, 1994); 5)recursos humanos pré-determinados e nãonecessariamente com o perfil desejado peloadministrador (OLIVEIRA, 2006).

Superar esses problemas permitiria queo planejamento estratégico municipal fosseexecutado e as dificuldades oriundas da desi-gualdade regional sejam superadas e poten-cializadas as oportunidades, contudo essesproblemas ainda estão distantes de seremresolvidos pela estrutura institucional doEstado no Brasil.

Conclusões

O objetivo desse artigo era avaliar aefetividade da intervenção do Estado, pormeio dos governos municipais, no processode desenvolvimento local e pode-se destacara sua contribuição para academia, socieda-de e administração pública. Para academia,traz uma discussão ampliada sobre a

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51Intervenção do Estado e desenvolvimento local: uma análise cross sectiondos municípios paranaenses

efetividade da intervenção do Estado, mos-trando que no Paraná não houve uma con-tribuição efetiva das administrações muni-cipais para reduzir as desigualdades. Parasociedade pode-se inferir justamente sobreas limitações da administração pública nesseprocesso e mostrar que não existe grandemargem de manobra para aplicação dos re-cursos e uma preocupação excessiva com aeficiência e não com a eficácia dessa aplica-ção. Para a administração pública mostrou-se a importância de um planejamento estra-tégico municipal e vinculo com as proposi-ções regionais, não somente municipais, parabuscar otimizar o uso dos recursos, mesmocom as limitações mencionadas.

Assim, cabe destacar que as finançaspúblicas ainda não representam um papelefetivo para mudança das desigualdadessocioeconômicas dos municípios paranaen-ses. Verificou-se que há uma dinâmica pró-pria em cada município a partir das oportu-nidades de desenvolvimento econômico localque incrementam as finanças públicas e afe-tam positivamente os indicadores sociais.Com isso, mostrou-se a necessidade de discu-tir a capacidade de intervenção do Estado.Não pela eficiência na alocação dos recursos,controlado pelas instâncias de fiscalização,mas pela eficácia da aplicação.

Por fim, propõem-se como novos tra-balhos um estudo qualitativo de administra-ções públicas que conseguiram superar osproblemas, estabelecer e implementar umplanejamento estratégico municipal com efe-tiva mudança da desigualdade social.

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53Intervenção do Estado e desenvolvimento local: uma análise cross sectiondos municípios paranaenses

Apêndice 1 – indicadores socioeconômicos selecionados e respectiva correlações

Observa-se que a apresentação da matriz de correlação com todos os indicadores nãofoi apresentada por dificuldade de representação da mesma, pois possui 95 linhas e 95 colu-nas. Desta forma, as tabelas 1A a 4ª representam a síntese dos dados tratados e utilizadospara reflexão.

Pearson

CorrelationSig.

(2-tailed) NPearson

CorrelationSig.

(2-tailed) N

Pobreza - pessoas pobres (P0) - (%) (0,38) 0,00 383 IDHM - Longevidade (0,99) - 390

Pobreza - pessoas indigentes (P0) - (%) (0,32) 0,00 383 Esperança de vida ao nascer - Ano (0,99) - 390

Mortalidade até um ano de idade (por mil nascidos vivos) (0,29) 0,00 383 IDHM - Esperança de Vida ao Nascer (anos) (0,99) - 390 Mortalidade até cinco anos de idade (por mil nascidos vivos) (0,29) 0,00 383 Índice de Desenvolvimento Humano (IDH-M) (0,77) 0,00 390 Taxa de fecundidade - (%) (0,28) 0,00 383 Domicílios - com energia elétrica e geladeira - pessoas - (%) (0,53) 0,00 390 Despesas por função - educação e cultura - municipal - % RC (0,17) 0,00 383 Domicílios - com carro - pessoas - (%) (0,49) 0,00 390 Área Geográfica publicada nos Censos - Km2 (0,10) 0,04 383 IDHM - Educação (0,49) 0,00 390

Taxa de Crescimento Geométrico Populacional - Urbana (%) (0,10) 0,05 383 IDHM - Renda (0,44) 0,00 390 Índice de Gini (0,09) 0,07 383 Anos de estudo - média - pessoas 25 anos e mais - Ano (0,44) 0,00 390 PEA Total por Estabelecimentos (0,09) 0,09 383 Domicílios - com água encanada e banheiro - pessoas - (%) (0,42) 0,00 390 Grau de Urbanização (%) 0,08 0,10 383 Domicílios - com energia elétrica e televisão - pessoas - (%) (0,42) 0,00 390 Despesas por função - saúde e saneamento - municipal - R$ 0,08 0,10 383 IDHM - Renda per Capita (R$1,00) (0,41) 0,00 390 Empregos - Total 0,08 0,10 383 Renda per capita - R$ de 2000 (0,41) 0,00 390 Produto Interno Bruto a Preços Básicos - Serviços (R$1,00) 0,09 0,08 383 IDHM - Taxa Bruta de Freqüência Escolar (%) (0,39) 0,00 390 Energia Elétrica - Consumo (mwh) 0,09 0,07 383 Domicílios - com telefone - pessoas - (%) (0,39) 0,00 390

Produto Interno Bruto a Preços Básicos - Indústria (R$1,00) 0,09 0,07 383 IDHM - Taxa de Alfabetização (%) (0,38) 0,00 390 Valor Adicionado no Comércio (R$1,00) 0,09 0,07 383 Renda - rendimentos do trabalho - (%) (0,35) 0,00 390 Empregos por PEA 0,09 0,07 383 Domicílios - com energia elétrica - pessoas - (%) (0,35) 0,00 390

Despesas por função - educação e cultura - municipal - R$ 0,09 0,06 383 Domicílios - com água encanada - pessoas - (%) (0,34) 0,00 390

Despesas por função - assistência e previdência - municipal - PER CAPITA R$ 0,10 0,06 383 Domicílios - com água encanada - pessoas - (%) (0,34) 0,00 390 Valor Adicionado - Total (R$1,00) 0,10 0,06 383 Domicílios - com serviço de coleta de lixo - pessoas - (%) (0,34) 0,00 390 Domicilios - com água canalizada rede geral - número - Domicilios 0,10 0,06 383 Domicílios - com computador - pessoas - (%) (0,33) 0,00 390

PEA (10 anos e mais) - Rural 0,10 0,06 383 IDEB - rede estadual 2ª fase EF (0,30) 0,00 386 População Urbana - Total 0,10 0,06 383 IDEB - rede municipal 1ª fase EF (0,29) 0,00 383

Produto Interno Bruto a Preços Básicos - Total (R$1,00) 0,10 0,05 383 Produto Interno Bruto per Capita (R$1,00) (0,25) 0,00 390 PEA (10 anos e mais) - Urbana 0,10 0,05 383 Grau de Urbanização (%) (0,22) 0,00 390 Energia Elétrica - Consumidores 0,10 0,05 383 Despesas por função - saúde e saneamento - municipal - PER CAPITA R (0,20) 0,00 390 POT TOT 0,10 0,05 383 DESPESAMUNICIPAIS PER CAPITA R$ (0,20) 0,00 390 Domicilios - com iluminação elétrica - número - Domicilios 0,10 0,05 383 PIB Básico por PEA Total (0,18) 0,00 390

Estabelecimentos - Total 0,10 0,05 383 Despesas por função - habitação e urbanismo - municipal - PER CAPITA R (0,17) 0,00 390 PEA (10 anos e mais) - Total 0,10 0,04 383 Despesas por função - indústria , comércio e serviços - municipal - % RC (0,17) 0,00 390 Densidade Demográfica (hab/km ²) 0,10 0,04 383 Despesas por função - assistência e previdência - municipal - PER CAPITA R (0,17) 0,00 390

DESPESAMUNICIPAIS PER CAPITA R$ 0,11 0,04 383 Investimentos / Receita Total (0,16) 0,00 390

Despesas por função - saúde e saneamento - municipal - PER CAPITA R $ 0,11 0,03 383 Empregos por PEA (0,16) 0,00 390

Valor Adicionado por PEA 0,12 0,02 383 Despesas por função - indústria , comércio e serviços - municipal - PER CAPITA R(0,14) 0,00 390 Despesas por função - habitação e urbanismo - municipal - % RC 0,12 0,01 383 Despesas por função - educação e cultura - municipal - PER CAPITA R$ (0,14) 0,01 390 Despesas por função - habitação e urbanismo - municipal - PER CAPITA R $ 0,13 0,01 383 Despesas por função - habitação e urbanismo - municipal - % RC (0,13) 0,01 390 Valor Adicionado por Empregos 0,14 0,01 383 Despesas por função - administração e planejamento - municipal - PER CAPITA R(0,13) 0,01 390 PIB Básico por PEA Total 0,14 0,01 383 Valor Adicionado por PEA (0,13) 0,01 390 Despesas por função - indústria, comércio e serviços - municipal - R$ 0,14 0,01 383 Despesas por função - indústria , comércio e serviços - municipal - R$ (0,12) 0,02 390 Despesas por função - indústria, comércio e serviços - municipal - PER CAPITA R 0,18 0,00 383 IDEB - rede municipal 2ª fase EF (0,11) 0,79 8 Domicílios - com serviço de coleta de lixo - pessoas - (%) 0,18 0,00 383 Despesas por função - administração e planejamento - municipal - R$ (0,10) 0,04 390

Investimentos / Receita Total 0,19 0,00 383 Valor Adicionado na Produção Primária (R$1,00) (0,09) 0,07 390 Valor Adicionado na Produção Primária (R$1,00) 0,20 0,00 383 Despesas por função - saúde e saneamento - municipal - % RC (0,09) 0,09 390 Produto Interno Bruto a Preços Básicos - Agropecuária (R$1,00) 0,21 0,00 383 PEA Total por Estabelecimentos 0,11 0,04 390 Produto Interno Bruto per Capita (R$1,00) 0,21 0,00 383 Taxa de Crescimento Geométrico Populacional - Urbana (%) 0,11 0,03 390 Despesas por função - indústria, comércio e serviços - municipal - % RC 0,22 0,00 383 Despesas por função - educação e cultura - municipal - % RC 0,17 0,00 390 Domicílios - com água encanada - pessoas - (%) 0,24 0,00 383 Área Geográfica publicada nos Censos - Km2 0,22 0,00 390 Domicílios - com água encanada - pessoas - (%) 0,24 0,00 383 Índice de Theil 0,23 0,00 390 Domicílios - com energia elétrica - pessoas - (%) 0,27 0,00 383 Índice de Gini 0,29 0,00 390 Domicílios - com água encanada e banheiro - pessoas - (%) 0,28 0,00 383 Taxa de fecundidade - (%) 0,35 0,00 390 Renda - rendimentos do trabalho - (%) 0,29 0,00 383 Pobreza - pessoas indigentes (P0) - (%) 0,45 0,00 390 IDHM - Taxa Bruta de Freqüência Escolar (%) 0,30 0,00 383 Pobreza - pessoas pobres (P0) - (%) 0,52 0,00 390 IDHM - Longevidade 0,30 0,00 383 Mortalidade até cinco anos de idade (por mil nascidos vivos) 1,00 - 390 Esperança de vida ao nascer - Ano 0,30 0,00 383 Mortalidade até um ano de idade (por mil nascidos vivos) 1,00 . 390 IDHM - Esperança de Vida ao Nascer (anos) 0,30 0,00 383Domicílios - com computador - pessoas - (%) 0,31 0,00 383Domicílios - com energia elétrica e televisão - pessoas - (%) 0,31 0,00 383Domicílios - com telefone - pessoas - (%) 0,33 0,00 383Anos de estudo - média - pessoas 25 anos e mais - Ano 0,34 0,00 383Renda per capita - R$ de 2000 0,37 0,00 383IDHM - Renda per Capita (R$1,00) 0,37 0,00 383Domicílios - com energia elétrica e geladeira - pessoas - (%) 0,38 0,00 383IDHM - Renda 0,40 0,00 383IDHM - Taxa de Alfabetização (%) 0,41 0,00 383Índice de Desenvolvimento Humano (IDH-M) 0,45 0,00 383IDHM - Educação 0,46 0,00 383Domicílios - com carro - pessoas - (%) 0,48 0,00 383IDEB - rede estadual 2ª fase EF 0,53 0,00 380IDEB - rede municipal 2ª fase EF 0,71 0,05 8IDEB - rede municipal 1ª fase EF 1,00 . 383

Fonte dos Dados Brutos: IBGE, PNUD, COPEL, IPEA, STN

TABELA 2A - Correlações Significativas da Mortalidade até um ano de idade (por mil nascidos vivos) com Indicadores Socioeconômicos dos Municípios Paranaenses - 2000

TABELA 1A - Correlações Significativas da IDEB - rede municipal 1ª fase EF com Indicadores Socioeconômicos dos Municípios Paranaenses - 2000

Fonte dos Dados Brutos: IBGE, PNUD, COPEL, IPEA, STN

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Levantamento do potencial de comercialização de produtos orgânicos para o estadode Mato Grosso do Sul

Evaluation of the potential market for organic products in the state of Mato Grossodo Sul (Brazil)

Levantamiento del potencial de comercialización de productos orgánicos para elestado de Mato Grosso del Sur (Brasil)

Suppression du potentiel pour la commercialisation de produits biologiques pour l’état du MatoGrosso do Sul

Cristiane Maria Vendramini Momesso*

Antonia Railda Roel**

Simone Palma Favaro***

Recebido em 20/9/2008; revisado e aprovado em 10/10/2008; aceito em 29/1/2009

Resumo: Na avaliação sobre o potencial de mercado consumidor de produtos orgânicos em Campo Grande, MS,conclui-se que a maioria das mulheres entrevistadas afirmou conhecer o produto orgânico, porém, apenasaproximadamente a metade realmente sabe seu significado. Cerca de 52% delas pagaria mais caro por esse produtoe estariam dispostas a procurar local próprio de comercialização (63,23%). Após esclarecimentos sobre os benefíciosdo produto orgânico, quase a totalidade (99,35%) optaria por estes produtos.Palavras-chave : Desenvolvimento local. Agroecologia. Sustentabilidade. Segurança alimentar.Abstract: Evaluation the potential market in Campo Grande for organic products, it was concluded that most of theinterviewed women declared to know organic product is, although only a half part of them actually knew its meaning.Around 52% of the evaluated group would spend higher values to acquire organic products, and 66.23% were willingin going to a specific market place. Almost the entirely interviewed women (939.35%) would choose organic productsafter an explanation about their benefits.Keywords: Local development. Agroecology. Sustainability. Food assurance.Résumé: Pour évaluer le potentiel du marché de consommation pour les produits biologiques à Campo Grande, MS,a conclu que la majorité des femmes interrogées ont déclaré connaître les produits biologiques, cependant, seulementenviron la moitié sait vraiment son importance. Environ 52% d’entre eux paient plus cher pour ce produit et être prêtsà chercher leur propre mise sur le marché (63,23%). Après des éclaircissements sur les avantages des produitsbiologiques, la quasi-totalité (99,35%) optent pour ces produits.Mots-clés: Le développement local. Agroécologie. La durabilité. La sécurité alimentaire.Resumen: La evaluación del potencial de mercado consumidor de productos orgánicos en Campo Grande, MS, hellegado a la conclusión de que la mayoría de las mujeres entrevistadas afirmaran conocer el producto ecológico, sinembargo, sólo aproximadamente la mitad sabe realmente su significado. Aproximadamente el 52% de ellas pagaríanmás caro por ese producto y estarían dispuestas a ir asta tiendas específicas para su comercialización (63,23%).Después de una aclaración sobre los beneficios del producto ecológico, casi la totalidad (99,35%) optarían por estosproductos.Palabras clave : Desarrollo local. Agroecología. La sostenibilidad. La seguridad alimentaria.

* Nutricionista - Mestre em Desenvolvimento Local. Universidade Católica Dom Bosco, UCDB, Campo Grande,MS. E-mail: [email protected]** Engenheira Agrônoma, Dra. Entomologista pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” ESALQ/USP. Atualmente profa. Mestrado em Biotecnologia, UCDB, Campo Grande, MS. E-mail: [email protected]*** Engenheira Agrônoma, Dra. Ciências dos Alimentos pela Universidade Estadual de Londrina UEL. Atualmenteprofª Mestrado em Biotecnologia, UCDB, Campo Grande, MS. E-mail: [email protected]

Introdução

A exposição a pesticidas agrícolas é fre-quentemente associada a riscos para a saúdehumana, e atualmente com a promoção aomal de Parkinson (XUE-FENG WANG et al.,2006). O meio ambiente também é fortementeimpactado pelo uso contínuo dos pesticidas.

Estudo de impacto ambiental causado pelo usode pesticidas agrícolas na Inglaterra mostrouuma redução nos índices avaliados e o autoratribuiu este comportamento uma exigênciados consumidores e reforça que esta tendên-cia deveria ser acompanhada por políticas go-vernamentais e nortear a produção industrial(CROSS e EDWARDS-JONES, 2006).

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56 Cristiane Maria V. Momesso; Antonia Railda Roel; Simone Palma Favaro

Recena et al. (2006) realizaram um le-vantamento epidemiológico no período de1992 a 2002 no estado do Mato Grosso doSul quanto às ocorrências de intoxicação re-gistradas oficialmente. O estudo mostrou quea média de letalidade neste estado foi trêsvezes superior à média brasileira. A capitaldo estado, Campo Grande apresentou o índi-ce mais alto no ano de 2000, com 100,5 casospara cada 100.000 habitantes.

Em opção ao uso massivo de pesticidasa agricultura orgânica apresenta-se como ummecanismo de produção, baseado no conhe-cimento dos processos ecológicos, buscandomudanças socioeconômicas para a promo-ção da sustentabilidade de todos os setoresdo sistema alimentar (GLIESSMAN, 2001).A produção por mecanismos orgânicos alémde oferecer alimentos inócuos tem mostradosuperioridade na qualidade nutricional.Worthington (2001) realizou um estudo apartir da literatura existente sobre a compa-ração do produto orgânico e o convencionalde frutas, vegetais e grãos e concluiu que oproduto orgânico contém mais vitamina C,ferro, magnésio e fósforo; menos nitrato emenor teor de metais pesados que o produtoconvencional, porém não obteve resultadossignificantes quanto às proteínas.

De acordo com Soel (apud YUSSEF,2004) mais de 24 milhões de hectares sãoadministrados organicamente no mundo. Aparte mais significativa desta área está loca-lizada na Austrália (10 milhões de hectares).A agricultura orgânica é praticada em apro-ximadamente 100 países. A América Latinaé a segunda em cultivo de terras orgânicas,estando a Argentina em primeiro lugar, se-guido do Brasil com aproximadamente 841mil hectares (YUSSEF, 2004). Em torno de70% da produção brasileira, situa-se nos Es-tados do Paraná, São Paulo, Rio Grande doSul, Minas Gerais e Espírito Santo. O cresci-mento nas vendas de orgânicos tem alcan-çado um ritmo de 50% ao ano (DAROLT,2002). O Estado de Mato Grosso do Sul estáiniciando a produção de orgânicos com al-guns produtores em associações, mas compotencial considerável de crescimento.

A agricultura orgânica destaca-se pelorespeito ao meio ambiente e à humanidade,pois é tida como agricultura sustentável. Háconsiderável redução da dependência do

comércio e da indústria. Sendo assim, estáinserida no processo de desenvolvimento lo-cal, abrindo portas para o pequeno agricul-tor neste mundo globalizado. Segundo Ávilaet al. (2000), considera que o Desenvolvimen-to Local não é um processo que usa em umprimeiro momento reativar a economia e sima cultura, a visão, o entendimento das pes-soas, ou seja, o processo flui do sócio-culturalpara o econômico. O Desenvolvimento Localé ativador da capacidade das pessoas a gera-rem atividades, e daí criarem renda.

Órgãos governamentais envolvidosdiretamente com a reforma agrária estudamformas de viabilizar a sustentabilidade daspopulações em assentamentos rurais, aldeiasindígenas e pequenos produtores em geral,freqüentemente em regiões próximas a áreasde preservação. Cerca de três quartos daárea do bioma Pantanal pertence ao estadode Mato Grosso do Sul e as práticas agrícolaspodem constituir-se ou não em fontes de con-taminação a esse ecossistema. Portanto, háuma oferta considerável de prováveis pro-dutores rurais que buscam a alternativa maisviável rumo a agricultura sustentável, sendoassim nos encontramos diante da questãofundamental: há mercado potencial para osprodutos orgânicos em Campo Grande?

Objetivou-se analisar o potencial demercado consumidor do produto orgânicoem Campo Grande, MS, maior populaçãodo estado. Pretendeu-se conhecer o mercadoconsumidor do produto orgânico; verificarse o público alvo está sensibilizado quanto àqualidade do produto; identificar se o com-prador destes produtos irá a um mercadolocal específico e detectar se as pessoas even-tualmente pagariam mais por estes produtos.

Material e métodos

A partir do censo demográfico de 2000(IBGE), obteve-se o total de bairros existentesem Campo Grande e o total de mulheres re-sidentes nestes bairros, optando-se por seisbairros com maior faixa de renda mensal,pois o produto orgânico ainda é utilizado poruma clientela diferenciada, devido ao eleva-do custo atual. O tamanho da amostra po-pulacional foi obtido de acordo com Rea eParker (1999), trabalhando com erroamostral de 10%, totalizando 100 mulheres

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57Levantamento do potencial de comercialização de produtos orgânicos para o estado deMato Grosso do Sul

no mínimo Os dados foram obtidos por meioda aplicação de questionários totalizando154 mulheres, no período de maio a setembrode 2005. As informações contidas nos ques-tionários aplicados foram agrupadas poridade, escolaridade e renda familiar para seobter o perfil do atual consumidor e o poten-cial em Campo Grande, MS.

Em uma segunda investigação dedemanda, foi realizada uma pesquisa nostrês hipermercados existentes na cidade deCampo Grande, MS. Esta pesquisa aconte-ceu verbalmente, com o objetivo de conheceros produtos cadastrados em cada loja e a de-manda em relação aos mesmos.

Os dados coletados, resposta das pes-

soas que participaram da entrevista, foramtransformados em porcentagem inseridos emtabelas ou gráficos.

Resultados e discussão

A distribuição da faixa etária das pes-soas que fizeram parte da pesquisa mostrouque a maioria possui idade acima de 21 anos,40,91% possuem de 36 a 50 anos de idade,27,92% de 21 a 35 anos, seguido de 25,97%,acima de 50 anos. Sobre a escolaridade, amaioria delas possui o superior completo,com 55,19%, seguido de 16,23% com segun-do grau completo e 14,29% com superiorincompleto (Tabela 1).

Tabela 1 - Perfil da População Amostrada (154 Mulheres), para o levantamento do MercadoConsumidor Potencial de Produtos Orgânicos no Município de Campo Grande, MS.

Faixa etária Grau de instrução Renda familiar

Proporção (%)

Idade (anos)

Proporção (%)

Escolaridade Proporção

(%) Salários mínimos

3,90 até 20 3,90 1° grau incompleto 5,19 até 2

27,92 21 a 35 5,19 1° grau completo 16,23 3 a 5

40,91 36 a 50 4,55 2° grau incompleto 11,69 6 a 8

25,97 > de 50 16,23 2° grau completo 14,94 9 a 11

1,30 sem resposta 14,29 superior incompleto 50 > de 12

- - 55,19 superior completo - -

- - 0,65 sem resposta - -

Sobre a renda familiar 50% das mu-lheres questionadas referem-se ao recebimen-to de mais de 12 salários mínimos mensais,resultado semelhante observado porRuchinski et al. (1999) sobre o perfil dos con-sumidores de orgânicos nas feiras verdes nomunicípio de Curitiba.

Apesar de Campo Grande estar inici-ando a comercialização, 55,19% destes afir-maram que consomem produtos orgânicosàs vezes, 14,94% “sempre consomem”,18,83% não responderam e 11,04% “nuncaconsomem” (Gráfico 1). As pessoas que co-nhecem orgânicos, nunca consomem por“não achar o produto”.

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Para identificar se realmente sabem oque significa o produto orgânico, foi solicita-da a descrição deste. Das pessoas que afir-maram saber, a maioria (54,40%) respondeucorretamente, limitando-se a responder que“o produto orgânico é um produto sem agro-tóxico ou sem produtos químicos”. Das de-mais, 16,0% não sabiam responder, inclusiveparte delas respondeu que “eram produtoscultivados na água”, enquanto 29,6% nãoresponderam, o que denuncia que não sa-biam seu significado (Gráfico 3).

Ficou evidente que as pessoas confun-dem “produtos orgânicos” com “integrais”,“naturais” e “hidropônicos”. Nos supermer-cados esses produtos são colocados próximosaos orgânicos, o que pode provocar tal equí-voco. A falta de informação leva os consumi-dores preocupados com a saúde, a adquirirhidropônico, que são cultivados com insu-mos agrícolas sintéticos. Em hidroponia, assoluções usadas são ricas em nitrato, na for-ma prontamente disponível e em condiçõesfavoráveis à absorção pelas raízes. Assim, osteores de nitrato nos produtos hidropônicos

tendem a ser superiores aos observados nasplantas cultivadas em outros sistemas(FAQUIN e ANDRADE, 2004). Em Florianó-polis 94,50% dos entrevistados responderamcorretamente o significado de produto orgâ-nico, maior que a encontrada na presenteinvestigação (KOHLRAUSCH et al., 2004).A autora ainda relata que naquela cidadehá informações em supermercados e namídia, o que não ocorre em Campo Grande.

Quando o assunto é preço, 37,01% daspessoas que participaram da avaliação nãoresponderam à questão. Apenas 24,03% pa-gariam 10% a mais pelo produto, 22,73%pagariam 5% a mais, 9,74% pagariam 20%ou mais e 6,49% pagariam 15% a mais (Grá-fico 2). O produto orgânico apresenta fre-qüentemente preço superior ao produto con-vencional, no entanto não é necessariamentemais caro, pois não há utilização de produtossintéticos que encarecem a produção, poroutro lado há maior utilização de mão de obrae perdas ocasionais. Há ainda a questão dademanda maior que a oferta e disposição deconsumidores em pagar pelo produto.

Gráfico 1 -Freqüência de consumo de produtos orgânicos dos entrevistados sobre potencialde consumidores de produtos orgânicos em Campo Grande, MS, 2005.

Gráfico 2 -Porcentagem excedente que os entrevistados sobre potencial de consumidores deprodutos orgânicos em Campo Grande, MS, 2005, pagariam por estes produtos.

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A afirmação de que o “consumidor empotencial pagaria mais caro pelo produtodiferenciado” é semelhante a pesquisas rea-lizadas em outros estados, como a do Paranáfeita por Darolt (2002), que, apesar da maio-ria (62,7%) afirmar que considera os preçosmais caros em relação aos convencionais, oconsumo continua crescendo.

Altieri e Mazera (1998) demonstraramque os métodos são inadequados para umaanálise mais ampla, nos quais é dada dimen-

são econômica sem abordar análises em lon-go prazo, como mudanças ambientais, per-das de solo, de recursos genéticos além dereflexos sociais e da qualidade dos alimentos.

Sobre a comercialização, 81,17% afir-mam conhecer o produto orgânico (Tabela2), mas apenas 54,40% realmente conhecem(Gráfico 3). A falta de informação é um pro-blema atualmente encontrado para comer-cialização desses no estado e campanhas dedivulgação são necessárias.

Quase a metade dos entrevistados dizprocurar por produtos orgânicos (44,80%).A maioria destes está disposta a pagar mais

Gráfico 3 - Respostas descritivas das 125 mulheres que afirmaram que sabem o que significao produto orgânico no questionário aplicado sobre potencial de consumidores de produtosorgânicos em Campo Grande, MS, 2005.

caro por estes produtos, 51,95% dos entre-vistados, os quais 5%, a 20% a mais que odos produtos convencionais (Tabela 2).

Tabela 2 - Respostas afirmativas e negativas, referentes à comercialização de produtosorgânicos, dos entrevistados sobre o potencial de consumidores destes alimentos em CampoGrande, MS, 2005.

Questões Sim Não Não respondeu

Sabe o que significa produto orgânico? 81,17% 18,83% -

Procura por produtos orgânicos? 44,80% 33,77% 21,43%

Pagaria mais caro por este produto orgânico? 51,95% 27,27% 20,78%

Iria a um local específico de venda? 63,23% 13,64% 20,13%

Sobre o local de comercialização,63,23% das mulheres estão dispostas a sedeslocarem ao local específico, desde queencontrem variedade de produtos em localacessível. A comercialização em algumas ci-dades é feita em locais próprios e vendas di-retamente do produtor.

Após a explicação sobre as vantagense qualidades do produto orgânico aos entre-vistados, foram novamente questionados:“Você agora, compraria produtos orgâni-cos?” Como resposta 99,35% das pessoasafirmou que “sim” (Tabela 3).

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60 Cristiane Maria V. Momesso; Antonia Railda Roel; Simone Palma Favaro

Confrontando os dados obtidos a par-tir das mulheres que realmente sabem o quesignifica o produto orgânico e os consomem,obteve-se uma amostragem do perfil do con-sumidor atual de Campo Grande, MS. Em

relação à freqüência de consumo apenas11,76% afirmam consumir com freqüênciae 70,59% às vezes, 14,71% dizem nunca con-sumir produtos orgânicos e 2,94% não res-ponderam (Gráfico 4).

Tabela 3 - Comparação entre as respostas afirmativas de compra do produto orgânico antese após a sensibilização, na qual se explica resumidamente o que significa e as vantagens doproduto orgânico em Campo Grande, MS, 2005.

Questões Antes da sensibilização Após sensibilização Comprariam produtos orgânicos 71,43% 99,35% Não comprariam produtos orgânicos 1,30% 0,65% Comprariam dependendo do preço 14,93% - Comprariam dependendo da facilidade 9,74% - Não responderam 2,60% -

Faixa etária Grau de instrução Renda familiar Proporção

(%) Idade (anos)

Proporção (%)

Escolaridade Proporção (%)

Salários mínimos

25 21 a 35 3,57 1° grau incompleto 1,79 < de 2 25 36 a 50 19,64 2° grau completo 7,14 3 a 5

21,42 > de 51 1,79 2° grau incompleto 7,14 6 a 8 1,79 sem resposta 8,93 superior incompleto 14,28 9 a 11 - - 64,28 Superior completo 67,86 > de 12

Tabela 4 - Perfil do Consumidor de Produtos Orgânicos no Município de Campo Grande,MS, 2005.

Estabeleceu-se o perfil do real consumi-dor deste tipo de produto em Campo Gran-de, MS (Tabela 4). Constatou-se que as pes-soas que conhecem o produto e o consomem,enquadram-se na faixa etária de 36 a 50anos, possuem grau superior completo e ren-da superior a 12 salários mínimos. De acor-

do com Darolt (2002) existem dois tipos deconsumidores: os mais antigos, motivados ebem informados e exigentes em termos dequalidade biológica do produto, e os maisrecentes de pouca escolaridade, freqüenta-dores das grandes redes de supermercados.

Gráfico 4 -Freqüência de consumo de produtos orgânicos dos entrevistados sobre potencialde consumidores de produtos orgânicos em Campo Grande, MS, 2005, que realmenteconhecem o que significa o produto orgânico.

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61Levantamento do potencial de comercialização de produtos orgânicos para o estado deMato Grosso do Sul

Uma pesquisa encomendada peloSEBRAE-PR realizada pelo Datacenso (2002)nos Estados do Sul e Sudeste mostrou que53% das pessoas entrevistadas responderamque possuem o hábito de consumir alimentosorgânicos, principalmente da classe A (60%).Ruchinski e Brandenburg (1999) após pes-quisa em duas feiras verdes no município deCuritiba descreveram o perfil do consumidororgânico: profissional liberal, na maioria dosexo feminino (66%), idade entre 31 e 50anos (62% dos casos), nível de instrução ele-vada, maioria com curso superior. Declaramque conhecem os males dos agrotóxicos, temainda o hábito de praticar esporte (54,9%) e62,9% procuram estar em contato com anatureza (62,9%). Os mesmos autores con-frontaram a escolaridade de freqüentadoresde feiras tradicionais e orgânicas e constata-ram que os últimos têm maior escolaridade(maioria curso universitário) e os primeiros,primeiro grau, sendo que destes somente2,7% sabem da existência de feiras orgânicas.A maior parte dos consumidores das feirasconvencionais tem renda de até dez saláriosmínimos, e os de feira orgânica, 68% temrenda superior a nove salários mínimos.

Estudos efetuados na Itália, Inglaterra,França e Alemanha por Sylvander (1998),mostraram as razões para o baixo consumode produtos orgânico pela população, emprimeiro lugar está o preço, seguido da ofer-ta insuficiente e ainda a dúvida sobre a pro-cedência. A pesquisa mostrou que 15% dosconsumidores estão sensibilizados a respeitodos alimentos orgânicos e que as informaçõespara os consumidores ainda são insuficientesem 72% dos casos.

Apesar das dificuldades nas pesquisasnos três hipermercados da cidade, obtiveram-se algumas informações. No setor de mercea-ria o gerente afirmou ter apenas café orgâ-nico, porém verificou-se que havia aindaduas marcas de açúcar. De acordo com asrespostas dos funcionários ficou a dúvida seestes sabem o que significa produtos orgâni-cos? No setor de frutas, verduras e legumeshá grande variedade de produtos, como:sucos prontos, rúcula, almeirão, cenoura,batata, espinafre, chuchu, abobrinha, e mui-tas frutas, como laranja, morango, bananaprata e nanica. Todos os produtos com certi-ficado do IBD ou Ecocert, entidades de certifi-

cação conceituadas no Brasil. “As vendasdestes produtos estão crescendo muito”, con-forme informou o gerente do setor; justifican-do o aumento da variedade dos orgânicos.

No segundo hipermercado, foram en-trevistadas três pessoas, que não souberaminformar sobre o produto, e deixaram evi-dente que confundem produtos orgânicoscom naturais e integrais. A responsável pelosprodutos naturais, relatou que vendeu orgâ-nicos, feijão, soja, arroz, milho de pipoca eaçúcar, por onze meses, e cessaram os pedi-dos por não haver saída. No terceiro hiper-mercado o gerente do setor da merceariarelatou que há demanda e que pretendemaumentar a variedade destes produtos.

Observa-se, portanto, que mesmo osgerentes de grandes centros de venda des-conhecem o que significa produto orgânico.De maneira geral não há informação no lo-cal sobre estes produtos. O desconhecimen-to não só do consumidor como dos funcio-nários responsáveis pelas vendas e confun-dem com outros como “naturais, light, inte-grais e hidropônicos”, muitas vezes coloca-dos estrategicamente lado a lado e embala-dos de forma similar, também relatado tam-bém por Darolt (2002).

Considerações finais

Pequenos produtores, em especial as-sentados, na busca da sustentabilidade eco-nômica de suas propriedades, vêem diantede uma questão fundamental “há mercadopara produtos orgânicos?”. Este questiona-mento evidencia a necessidade de um levan-tamento de dados que responda a esta preo-cupação.

Sendo assim, analisando os dados ob-tidos nesse levantamento de potencial dacomercialização de produtos orgânicos napopulação feminina de Campo Grande, MS,em que: (1) Das 125 mulheres que afirmamsaber o que significa o produto orgânico,54,40% realmente sabem o que significa esteproduto ou pelo menos já ouviu falar, porémas demais confundem alimentos orgânicoscom naturais, hidropônicos e outros; (2) Amaioria da população amostrada está dis-posta a pagar até 15% a mais para o produ-to orgânico em relação ao convencional e adeslocar-se até um local específico de ven-

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62 Cristiane Maria V. Momesso; Antonia Railda Roel; Simone Palma Favaro

da; (3) O perfil do consumidor feminino atu-al em Campo Grande, MS encontra-se entrea faixa etária de 36 a 50 anos, com grau deinstrução superior completo e renda familiaracima de 12 salários mínimos (4) Após co-nhecimento do produto, a população avalia-da consumiria produtos orgânicos.

Os dados evidenciam a necessidade decampanhas de esclarecimento sobre o quesignifica alimentos orgânicos e seus benefí-cios. Pois a população anseia por alimentos“limpos” e está disposta a consumi-lo e pa-gar por ele, garantindo assim, a comerciali-zação. Após esse procedimento, produtoresrurais que querem adotar os métodos orgâ-nicos de produção de alimentos, podem sededicar a essa atividade para comerciali-zação em Campo Grande, MS. Desta manei-ra, assentados rurais, comunidades indíge-nas e demais pequenos agricultores poderi-am alcançar a sustentabilidade econômicainserida em uma agricultura que por defini-ção é ambientalmente sustentável e social-mente justa. Contribuindo assim para o queocorra o desenvolvimento local.

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A perspectiva da educação ambiental e o processo histórico do saneamento básico:a instalação das redes de água e esgoto nos municípios de Campo Grande/MS e

Dourados/MSThe environmental education and history of basic sanitation: the installation of the water

and sewerage system in the municipalities of Campo Grande/MS and Dourados/MSL’accent mis sur l’éducation à l’environnement et l’historique de l’assainissement debase: l’installation de l’eau et de réseaux d’assainissement dans les municipalités de

Campo Grande/MS et Dourados/MSLa perspectiva de la educación ambiental y la historia de saneamiento básico: la instalación delas redes de agua y alcantarillado en los municipios de Campo Grande/MS y Dourados/MS

Solange Mattos Iorio*

Domitilla Medeiros Arce**

Joana Magalhães***

Alaide Brum de Mattos****

Angela Maria Zanon*****

Recebido em 27/8/2008; revisado e aprovado em 10/11/2009; aceito em 12/12/2009.

Resumo: O presente artigo objetiva apresentar por meio de um levantamento histórico, a evolução do sistema desaneamento básico dos municípios de Campo Grande e Dourados. Neste contexto, a educação ambiental constitui-se uma importante ferramenta de sensibilização que acompanha a dinamicidade social. Almeja-se que esta pesquisacontribua com a sensibilização ambiental e mudança de conduta da sociedade, que precisa zelar pelo meio ambiente.Palavras-chave: Abastecimento de água. Esgotamento sanitário. Educação ambiental.Abstract: This article presents through an historical survey, the evolution of the sanitation system of municipalitiesCampo Grande and Dourados. In this context, environmental education is an important tool that accompanies thesocial dynamics. This research aims to contribute to environmental awareness and behavior change in society, whichneeds protect the environment.Keywords: Water supply. Sewerage system. Environmental education.Résumé: Cet article vise à présenter par le biais d’une enquête historique, l’évolution du système d’assainissementpour les communes de Campo Grande et Dourados. Dans cet contexte, l’éducation à l’environnement lui-même est unoutil important pour accroître la sensibilisation qui accompagne la dynamique sociale. Les objectifs que cette recherchecontribue à la sensibilisation à l’environnement et le changement de comportement dans la société, qui a besoin de laprotection de l’environnement.Mots-clés: L’approvisionnement en eau. Les eaux usées. L’éducation à l’environnement.Resumen: Este artículo tiene la finalidad de presentar a través de un estudio histórico, la evolución del sistema desaneamiento de los municipios de Campo Grande y Dourados. En este contexto, la educación ambiental es unaherramienta importante que acompaña la dinámica social. Se objetiva que esta investigación contribuya a la concienciaambiental y el cambio de comportamiento de la sociedad, que necesita cuidar del medio ambiente.Palabras clave : Abastecimiento de agua. Alcantarillado. Educación ambiental.

* Geógrafas e alunas especiais da disciplina de Educação Ambiental, Mestrado em Geografia – UFMS, CampusAquidauana-MS. E-mail: [email protected]; [email protected]** Turismólogas e alunas especiais da disciplina de Educação Ambiental, Mestrado em Geografia – UFMS, CampusAquidauana-MS. E-mail: [email protected]; [email protected]***** Bióloga, Profa. Dra. do Departamento de Educação – UFMS. E-mail: [email protected]

Introdução

O jovem estado de Mato Grosso doSul, contemplado por dois diferentes biomas,o pantanal e o cerrado, possui ainda umarica hidrografia que abrange o maior manan-cial de água doce subterrânea transfrontei-riço do mundo, o Aqüífero Guarani. No en-

tanto, essa opulência hídrica vem sendoameaçada pela poluição e erodibilidade, de-correntes da ausência de mata ciliar e/ousaneamento básico adequado.

Em Mato Grosso do Sul, a Empresa deSaneamento do Estado de Mato Grosso doSul S/A (SANESUL) é a instituição responsá-vel pelo saneamento básico, que inclui abas-

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tecimento de água potável, bem como coletae tra1tamento de esgotos. Já a mudança com-portamental é uma tarefa que cabe à educa-ção, mais precisamente à educação ambien-tal, que atua como uma medida preventivae tem por finalidade sensibilizar a populaçãoa refletir sobre sua conduta em relação aomeio ambiente, seja ele natural ou cultural,pensando nas gerações atuais e futuras –agindo conforme o chamado desenvolvimen-to responsável. Dessa forma, o sucesso dotrabalho realizado pela SANESUL tambémdepende da atuação da comunidade, a qualdeve zelar pela qualidade de vida.

Esta pesquisa tem como objetivo a aná-lise da evolução histórica do saneamento bá-sico de Campo Grande, nos últimos 100 anose em Dourados a partir dos anos 1960. Nacapital, buscar essas informações e ordená-las em uma cronologia foi sem dúvida o de-safio maior, em razão da pulverização dasinformações nos diversos arquivos das insti-tuições públicas envolvidas nesta análise.Por outro lado, a disponibilidade dos recur-sos humanos destas instituições muito contri-buiu para atingir o objetivo da pesquisa, quepermitiu traçar um perfil das duas vertentesprincipais do saneamento básico – água e es-goto, como condição de melhoria da saúde,da qualidade de vida da população e dascondições ambientais.

Em Campo Grande, a ordenação douso racional dos recursos naturais, já erauma preocupação política desde a sua im-plantação ainda como vilarejo, mesmo deforma tênue, mas já pensando num planeja-mento para o futuro. Sem dúvida, os compo-nentes econômico, financeiro e político forama maior barreira na implantação progressivadesta infra-estrutura. Além disso, na épocajá corria a idéia de que toda obra que ficaembaixo da terra por estar escondida nãorende dividendos políticos – o voto. Por isso,água e esgoto nunca caminharam juntos.Atualmente, enquanto a rede de água deCampo Grande tem um índice de atendi-mento da população de 98%, o esgoto estácaminhando para em 2008, chegar à marcade 50%.

Na segunda maior cidade do estado,as informações referentes à implantação dasredes de águas e esgoto se concentram noCentro de Reservação Dilma Luzia Silveira,

SANESUL/Regional Dourados e na Secreta-ria Municipal de Planejamento e Meio Am-biente (SEPLAN). O desafio da pesquisafoi concluir o levantamento histórico, vistoque alguns dados se perderam com o tempo.Em Dourados o índice de atendimento darede de água é de quase 90%, enquanto que25% da população é beneficiada com redede esgoto, a qual será ampliada para 65%nos próximos quatro anos.

1 O nascimento da SANESUL

Em 1977, a divisão do Estado de MatoGrosso por força da Lei Complementar n.31 de 11 de outubro de 1977 motivou a cisãoda Companhia de Saneamento do Estado deMato Grosso (SANEMAT), que teve suas es-truturas funcional, administrativa e patrimo-nial modificadas. Surgiu então, a Compa-nhia de Saneamento do Estado de MatoGrosso do Sul (SANESUL), responsável peloabastecimento de água e pela rede coletorade esgoto – constituída a partir do Decreton. 71 de 24 de janeiro de 1979, como umaempresa pública com personalidade jurídicade direito privado, patrimônio próprio e au-tonomia administrativa e financeira(BARRETO, 2005, p.15).

A SANEMAT originou-se da Empresade Força Luz e Água (EFLA), criada pela Lein. 419, de 18 de setembro de 1951, no Gover-no do cuiabano Fernando Correa da Costa(1951-1956). A autarquia era encarregadade manter a distribuição de energia elétricae água potável à cidade de Cuiabá e, aomesmo tempo, supervisionar a construçãoda Usina n. 2, do rio da Casca. A EFLA eraoriunda da antiga Diretoria de Luz e Água,departamento vinculado à Secretaria de Es-tado de Agricultura, responsável pelo abas-tecimento de água potável. A EFLA foi extin-ta por meio do Decreto n. 803 de 30 de janei-ro de 1969. O acervo relativo à água foi trans-ferido para a SANEMAT e o referente à ener-gia, coube a CEMAT, Centrais ElétricasMato-grossenses S.A. (ibidem).

Segundo Marcos Gomes (Gerência deOperação Técnica da SANESUL), na épocada SANEMAT, as tubulações eram constituí-das basicamente de manilhas cerâmicas. Emalguns trechos, a tubulação atendia a umasérie de usuários e, ao mesmo tempo em que

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servia de rede coletora, funcionava tambémcomo ramal predial ou rede condominial.

Em 1994, a SANESUL foi convertidaem sociedade anônima com participaçãomajoritária do governo do estado de MatoGrosso do Sul, através de Lei Estadual n.1496 de 12 de maio de 1994. Cinco anos de-pois, em 1999, aconteceu uma transforma-ção na estrutura organizacional da empre-sa que passou a ser administrada com siste-ma de gestão compartilhada, tendo comopremissas a participação do poder conce-dente na gestão do saneamento no âmbitode seu município; a elaboração dos PlanosDiretores de água e esgoto do município; ainstituição de um Fundo Municipal de Sa-neamento, equivalente a 15% da receita nomunicípio para reinvestir no próprio sistema;e a garantia de atendimento com serviços desaneamento da comunidade carente atravésda instituição da Tarifa Social e um descon-to de 50% no valor da tarifa dos órgãos pú-blicos municipais e entidades assistenciais oubeneficentes (SANESUL, 2007).

2 Campo Grande-MS

2.1 Evolução histórica

Os primeiros habitantes de CampoGrande, aproveitando o declive do terrenoabasteciam-se de água do córrego“Cachoeirinha”. Essa água era desviada pormeio dos regos até as proximidades dos ran-chos em que habitavam. Os regos delimita-vam também os lotes dos posseiros. A águaque vinha através dos regos era empregadanas necessidades domésticas e utilizada tam-bém para movimentar monjolos usados parabeneficiar arroz, milho e café.

Preocupado com o crescimento da po-pulação e com o uso desordenado dos recur-sos hídricos disponíveis na época, o entãoIntendente do município, determinou em1905, a elaboração do Código de PosturasMunicipais, em cujo conteúdo há dois artigosque tratam da regulamentação do uso daágua: “Todos que quiserem servir-se d’águacanalizada do rego existente serão obrigadosa fazer pequenos regos até suas casas, tendoo cuidado de fazer bicas e tapar por cimaquando atravessarem ruas ou praças”(Art.31). “Ninguém poderá proibir que pas-

se por seus quintais a água que é destinadaao seu vizinho e nem lavar nela coisa imun-da que possa prejudicar o vizinho” (Art. 32).

Como a maioria dos “mundanceiros”,como eram chamados na época, os morado-res da vila, não respeitavam às determina-ções do Código e como as águas continua-vam a extravasar do rego e de suas ramifica-ções, formando grandes lamaçais e gerandotranstornos, pois, porcos se afundavam nalama e cavalos o pisoteavam dia e noite, oentão Intendente Geral, Antonio Norbertode Almeida, mandou aterrar em 1911, osregos, que beneficiavam na época 48 proprie-tários. Diante dessa nova realidade, com osregos aterrados, a solução encontrada foi aabertura de poços nos quintais, muitas vezespróximos às fossas (RODRIGUES, 1980,p.119-120).

No Relatório de Rosário Congro, porvolta de 1918, é muito clara a preocupaçãodo então Intendente do município quanto aoproblema de contaminação da água. Assimele escreveu:

O perigo das cisternas e das fossas abertasna terra flácida, absorventes, não tardará, porcerto, a infiltração destas para aquelas, con-taminando o lençol aquoso, construídascomo estão, à pequena distância uma da ou-tra. Fácil é adivinhar as endemias que advirãodaí. Urge, portanto, que os poderes compe-tentes voltem, quanto antes, a sua atençãopara este problema de máxima importância ede fácil realização. (CONGRO, 1918, p.6).

Em 1921, o Intendente Arlindo deAndrade Gomes, aproveitou a vinda de en-genheiros à Campo Grande com o objetivode estudar o fornecimento de água para osquartéis que estavam sendo construídos nacidade e firmou um acordo com o governofederal. A Prefeitura doaria terrenos aosquartéis, desapropriaria as áreas de verten-tes, obteria permissão para a passagem daadutora pelas propriedades particulares edoaria áreas para o reservatório.

Em contrapartida o governo federal secomprometia a captar as águas dos córregosJacinto e Chaves para abastecer quinze milpessoas, construir a adutora e reservatórios,assentamento da rede de água e canalizaçãopara os quartéis e pagar a metade do preçodos canos que indo para o Quartel General,já serviriam para o abastecimento da cidade.Todavia, o governo federal falhou no cumpri-

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mento desse acordo, não acontecendo a ca-nalização da água (Ibidem).

Somente por volta de 1926, na Inten-dência de Arnaldo Estevão de Figueiredo, acidade foi dotada de água encanada. Esse sis-tema captava águas represadas do CórregoJacinto, afluente do Segredo que abastecia acidade e os quartéis. Consta no Relatório daIntendência, de 1926, que a rede de águatotalizou 12.835 metros, distribuída no qua-drilátero central da cidade, compreendidoentre as avenidas Afonso Pena e Mato Gros-so e ruas Calógeras e João Pessoa (atual RuiBarbosa), bem como todas as ruas ai inseridas,atendendo 179 instalações domiciliares.

Em fins da década de 1930, CampoGrande contava ainda com o mesmo sistemade água implantado em 1926, que se encon-trava em colapso devido a obsolescência darede existente e também pelo aumento sig-nificativo da população. Assim, em 1937, naadministração de Eduardo Olímpio Macha-do foi contratado o Escritório Técnico deSaturnino de Brito para elaboração de umprojeto urbanístico e de saneamento básico(Ibidem).

Todavia, a implantação não aconteceuporque o empréstimo requerido pelo muni-cípio às instituições financeiras, apesar deaprovado pelo poder legislativo, não foi li-berado pelas instituições em virtude de pro-blemas econômicos pelos quais passava opaís e a crise mundial em face à SegundaGuerra Mundial. Esse sistema tinha comosuporte à captação das águas dos córregosDesbarrancado e Joaquim Português e eradenominado de “Sistema Desbarrancado”.

Somente em abril de 1942, o PresidenteGetúlio Vargas autorizou o empréstimo, po-rém com trâmites a serem cumpridos dentrodo Estado. Diante da morosidade burocráti-ca característica da coisa pública, encerrou-se 1943 sem que a operação de crédito fosseconcretizada.

A partir desse período, a rede de dis-tribuição de água foi sendo implantada semnenhum planejamento, conforme necessida-de e interesses pessoais. Dessa maneira, em1957, o Prefeito Marcilio de Oliveira Limaestendeu a rede de água até o BairroAmambaí (PERFIL SOCIOECONÔMICODE CAMPO GRANDE, 2007-2008, p.106).

Em razão de problemas políticos, osaneamento básico de Campo Grande só foi

analisado na década de 1960, na adminis-tração de Wilson Barbosa Martins. Nova-mente o escritório de Saturnino de Brito foicontratado para fazer estudos e traçar o pla-no para ampliação da rede de água, esgotoe captação de águas pluviais na cidade. Nes-sa época, a rede de abastecimento de águacontava com 6.740 ligações e 2.728 ligaçõesde esgoto sanitário (BUAINAIN, 2006, p.74).

Em 1966, foi criada a Autarquia Mu-nicipal, denominada: Serviço Autônomo deÁgua e Esgoto de Campo Grande (SAEE)que tinha por objetivo gerir os serviços deágua e esgoto da cidade. Na época, a exten-são da rede de abastecimento de água con-tava com 71.935 metros. Em 1969, agora soba administração do SAEE entrou em funcio-namento a primeira etapa da captação daságuas do Córrego Lajeado.

Para amenizar o problema da carên-cia de infra estrutura e de recursos financei-ros capazes de atender a demanda reprimi-da do setor, o então Prefeito Levy Dias, san-cionou a Lei 1.462, de 24.09.1973, que dis-punha sobre a execução de serviços públi-cos sob a forma de “Planos Comunitários”;.Muitos bairros foram atendidos por esse sis-tema de parcerias.

Em 1975, a concessão de água e esgotofoi transferida para a SANEMAT. Com adivisão do estado, em 1979, a concessão foitransferida para a SANESUL. Em 1998, foicriada a Companhia de Saneamento Águasde Campo Grande, assumindo os serviços deágua e esgoto da capital. Dois anos depois,em 2000, a empresa Águas Guariroba S/A,venceu a licitação e foi adjudicada como anova prestadora dos serviços de água e es-goto da cidade.

Em 2005, os grupos Bertin e Equipav,assumiram o controle acionário da EmpresaÁguas Guariroba S/A, detendo 91% dasações e 9% ficando com a SANESUL. A con-cessão dos serviços é por um período de 30anos e o objetivo é a prestação de serviçospúblicos que compreende a execução de:captação, adução e distribuição de água tra-tada; coleta e tratamento de esgoto sanitá-rio; conservação e preservação ambiental dossistemas públicos de tratamento de água eesgotamento sanitário e dos mananciais deabastecimento de água do município.

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67A perspectiva da educação ambiental e o processo histórico do saneamento básico: a instalaçãodas Redes de Água e Esgoto nos Municípios de Campo Grande/MS e Dourados/MS

2.2 Sistema de abastecimento de água

Uma das variáveis mais importantesque se deve considerar ao se projetar um sis-tema de abastecimento de água de uma ci-dade, além das fontes de abastecimento dessesistema, é o seu contingente populacional, esua projeção para o futuro.

Assim, o sistema implantado emCampo Grande, constitui-se de duas fontesde captação de águas: superficial e subterrâ-nea. A produção superficial está estruturadana captação das águas dos córregos Desbar-rancado, Lajeado e Guariroba, responsávelpor 62% do abastecimento. Antes de chegarao consumidor, essa água passa por Estaçõesde Tratamento de Água (ETAs), denomina-

das pelo nome dos córregos que as originam.Daí seguem para a reservação e em seguidaà rede de distribuição. Enquanto, que a pro-dução subterrânea, compõe-se atualmente de84 poços simples e de 11 poços profundosque captam água do Aqüífero Guarani(ÁGUAS GUARIROBA, 2007). Os 95 poçossão responsáveis por 38% da produção. Essaágua recebe cloro e flúor para ser distribuí-da. Todo esse processo passa por um rígidocontrole de qualidade, assegurando um pro-duto de alta potabilidade constatada pelo re-cebimento da Certificação ISO 9001:2000. Astabelas abaixo explicitam as fontes de supri-mento (Tabela 1) e a evolução da rede deágua e esgoto de Campo Grande (Gráfico 1):

Manancial Sistema

Produtor Contribuição para o sistema

Contribuição Total

Volume Produção m³/h

Entrada em operação

Captação Superficial

Guariroba Lajeado Desbarrancado

49% 12%

1%

62%

4.535,08 1.159,60

84,10

1985 1969 1939

Captação Subterrânea

Poços Poços especiais

17% 21%

38% 1.551,36 1.935,37

- -

Tabela 1 - Sistema de abastecimento de água de Campo Grande – 2006

Fonte: Águas Guariroba S.A.Perfil Socioeconômico de Campo Grande – Edição 2007-2008

REDE DE ÁGUA E ESGOTO DE CAMPO GRANDE DE 1997 - 2006

24872725 2503

2938 3082 3115 3158 3205

4716

3 6 6 3 6 6 3 6 9 3 9 7 436 450 498 520 634 745

2979

010002000300040005000

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10ANO

KM

REDE DE ÁGUA REDE DE ESGOTO

Gráfico 1 - Evolução da rede de água e esgoto instaladaFonte: Solange de Mattos Iorio, 2007.Nota: Os dados foram disponibilizados pela SANESUL, Águas Guariroba S/A e PLANURB/PerfilSocioeconômico de Campo Grande – Edições 2001, 2003, 2007-2008.

2.3 Aqüífero Guarani

O Aqüífero Guarani é provavelmentea maior reserva de água doce subterrâneado planeta com 1,2 milhões de km² de área

linear, inserido na Bacia do Paraná e parteda Bacia do Chaco-Paraná. Localizado naregião centro-leste da América do Sul, entre12º e 35º de latitude sul e entre 47º e 65º delongitude oeste, estendendo-se pelo Brasil

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68 Solange M. Iorio; Domitilla M. Arce; Joana Magalhães; Alaide B. de Mattos;Angela M. Zanon

(840.000l km²), Paraguai (58.500 km²), Uru-guai (58.500km²) e Argentina (255.000 km²).Sua maior ocorrência se dá em território bra-sileiro (2/3 da área total), abrangendo osEstados de Goiás, Mato Grosso, Mato Gros-so do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná,Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Suas águas surgem preenchendo espa-ços de rochas, que constituem-se de diver-sas camadas arenosas que se depositaram nabacia sedimentar do Paraná ao longo da eraMesozóica, entre 200 e 132 milhões de anos.A espessura das camadas pode variar de 50a 800 metros e de profundidades de até 1800metros. Seu nome é uma homenagem aosíndios da região, batizado pelo geólogo uru-guaio Danilo Anton. Antes desse novonome, no Brasil era conhecido como AqüíferoBotucatu.

No ano de 2003, em Montevidéu, noUruguai, foi assinado um documento orien-tador da monitoração e retirada da água doaqüífero denominado “Aqüífero Guarani”.No Brasil, o órgão competente que acompa-nha o seu uso é a Agência Nacional deÁguas, com sede em Brasília.

2.4 Proteção ambiental dos mananciais doSistema de Abastecimento Superficiais

Os mananciais dos córregos Guarirobae Lajeado são considerados como Área deProteção Ambiental (APA), e estão inseridasno Sistema Nacional de Unidades de Con-servação da Natureza (SNUC), cuja criação,implantação e implementação está regula-mentada pela Lei 9.985, de 18 de julho de2000. Portanto, são considerados como Uni-dades de Conservação, instituídas legalmentepela municipalidade, “os espaços territoriaisespecialmente protegidos, destinados à pro-teção da fauna, flora e à preservação da di-versidade do patrimônio genético e dos pro-cessos ecológicos essenciais, possibilitando omanejo ecológico de espécies e ecossistemasimportantes” (PERFIL SOCIOECONÔMI-CO DE CAMPO GRANDE, 2007-2008,p.34).

A APA do Guariroba foi criada em 21de setembro de 1995, e tem uma área deaproximadamente 40 ha e a do Lajeado, comaproximadamente 3,6 ha, foi criada em 27de junho de 2001. O órgão responsável pelo

seu monitoramento é um Comitê nomeadopelo Prefeito de Campo Grande. Quanto aomanancial do córrego Desbarrancado por seencontrar dentro da reserva ecológica esta-dual, seu monitoramento é feito pela atualSecretaria de Estado de Meio Ambiente, dasCidades, do Planejamento, das Ciências eTecnologia (SEMAC).

2.5 Rede de Esgotamento Sanitário

Foi lançado em 14 de março de 2006 oPrograma “Sanear Morena”. Até o final de2008 serão aplicados no município R$198.000.000, 00, na implantação de 688 kmde rede de esgoto, com atendimento a 172bairros, beneficiando 238 mil pessoas. Ain-da serão construídos 46,07 km de inter-ceptores, 15,50 km de linhas de recalque,construídas sete estações elevatórias de esgo-tos e cinco novas estações de tratamento.

No primeiro momento, as obras serãotocadas com recursos próprios, e posterior-mente, com recursos federais. Na ocasião, oprefeito de Campo Grande, Nelson Trad Fi-lho, citou: “a economia que a médio e longoprazo, será feita com a implantação do pro-grama, pois dados da ONU indicam que acada real investido em saneamento básico,economiza-se quatro reais em gastos comsaúde”.

2.6 Saneamento básico e educaçãoambiental

O Programa Sanear Morena possibili-tará à população beneficiada livrar-se dasfossas, que acarretam riscos para a saúde,podendo provocar doenças como diarréia,hepatite A, giardíase, difteria, leptospirose eoutras.

Ambientalmente, esse programa irádiminuir o risco de contaminação do lençolfreático e dos corpos d’água e principalmenteevitar as ligações clandestinas nas redes deáguas pluviais. Consta no Programa, plantar67 mil árvores nativas no entorno da Estaçãode Tratamento de Esgoto (ETE) Los Angeles,recuperando uma área que hoje está degra-dada.

Dentro do Programa “Sanear More-na”, a Águas Guariroba, desenvolveu umprojeto de educação ambiental intitulado

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Saúde Nota 10, que contém folders, cartilhas,vídeo, teatro e campanhas educativas nasescolas. A mascote do Programa é uma capi-vara chamada Guaribinha. O objetivo doprograma é conscientizar as crianças e ado-lescentes sobre os benefícios do esgoto trata-do para a saúde e o meio ambiente.

3 Dourados-MS

O município de Dourados, com coor-denadas geográficas situadas entre22º13’16"S e 54º48’20"W, localiza-se a 224km ao sul de Campo Grande, em uma zonade planalto que pertence à bacia do RioParaná. Sua altitude média é de 430m, comárea de 4.086 km² e população de 182.747(IBGE, 2007).

É o 850º município no ranking brasi-leiro de IDH (Índice de DesenvolvimentoHumano) com pontuação de 0,788. Portan-to, se insere entre as regiões consideradas demédio desenvolvimento humano, ou seja,com IDH entre 0,5 e 0,8 (PNUD, 2000).

3.1 A implantação das redes de água eesgoto em Dourados: dos primórdiosaos dias de hoje

Atualmente, Dourados possui 720 kmde rede de água e 280 km de rede de esgoto– que atende 25 % da população, aproxima-damente 46 mil habitantes. A implantaçãoda rede de abastecimento de água potávelteve início na década de 1960 e da redecoletora de esgotos há aproximadamente 30anos, nos anos 1970. Já a instalação das pri-meiras galerias pluviais aconteceu durantea administração municipal do governo JoséElias Moreira (1977-1982).

No período entre 1988 e 1992 (admi-nistração Prefeito Brás Melo), o municípiopossuía 6.500 ligações de esgoto, totalizando32.260m de extensão de rede de esgoto. Pos-teriormente, o sistema separador de esgotosubstituiu o sistema unitário ou combinado,tendo como vantagem a separação das águasresiduárias das pluviais (MUSEU HISTÓRI-CO DE DOURADOS, 1992, p.10).

Nesta época, Dourados contava com13 poços com capacidade de vasão de 430mil litros de água por hora e produção men-sal de 275 milhões de litros de água. A rede

de água possuía 27 mil ligações ativas, queatendia 13 mil habitantes. A capacidade dereservação era de 11.540m³, 472 km de redede abastecimento com volume de água de1,6 milhões de litros por hora. As Estaçõesde Tratamento de Água (ETAs) tinham ca-pacidade de 1,2 milhões de litros de águapor hora (Ibidem).

Segundo Marcos Gomes, Gerência deOperação Técnica, as ETAs obedecem à nor-malização da Deliberação do Conselho Es-tadual de Controle Ambiental – CECA/MSn. 003 de 20/06/1997 e do Conselho Nacio-nal de Meio Ambiente – CONAMA n. 357de 17 de março de 2005, que dispõe sobre aclassificação dos corpos de água, diretrizesambientais para seu enquadramento, condi-ções e padrões de lançamentos de efluentes.Ambas versam sobre a concentração máxi-ma de determinados poluentes, que pode serlançada nos corpos receptores.

Hoje, Dourados possui 9.544 ligaçõesde esgoto e três ETAs: Guaxinim – a maior,localizada na região do Cachoeirinha, filtra120 litros por segundo; A Água Boa e LaranjaDoce têm capacidade de 40 litros por segun-do cada.

De acordo com o gerente regional daSANESUL/Dourados, Odilon Azambuja,com R$ 75,6 milhões do Programa de Acele-ramento do Crescimento (PAC) serão inves-tidos R$ 39,4 milhões (R$31,5 milhões dogoverno federal e R$7,8 do governo estadual)para expandir a cobertura de esgoto sanitá-rio de Dourados de 25% para 65% – índiceacima das médias estadual e nacional (OPROGRESSO, 2007, p.05).

O governo estadual entrará comcontrapartida de R$2,6 milhões para rece-ber o recurso federal de R$10,5 milhões e in-vestir no sistema de abastecimento de água.A SANESUL utilizará o montante de maisde R$13 milhões para ampliar a ETA ÁguaBoa – que passará a filtrar 110 litros porsegundo – e substituir a rede de distribuiçãode água, de cimento amianto, o que acarre-tará a interdição periódica de algumas ruasda área central, retirando parte do asfalto ecalçamento. Em alguns trechos a rede temmais de 40 anos (FOLHA DE DOURADOS,2007, p.14).

A rede de água tratada será ampliadaem 46 km, passará de 720 km para 786 km.

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No total, 84 bairros da cidade serão benefi-ciados com as obras de saneamento, as quaisdeverão ser iniciadas em janeiro de 2008 econcluídas até 2011. Atualmente há 36.830ligações de água com volume de produçãode 2.076m³/hora (DIÁRIO MS, 2007, p.06).

3.2 O sistema de esgoto e os impactosambientais

A Lei Complementar n. 055, de 19 dedezembro de 2002 dispõe sobre a PolíticaMunicipal de Meio Ambiente de Dourados– institui o Sistema Municipal de Meio Am-biente e o Fundo Municipal de Meio Ambien-te – em seu artigo 87 (Capítulo III – Dos Es-gotos Sanitários) afirma que “os esgotos sa-nitários deverão ser coletados, tratados e re-ceber destinação adequada, de forma a seevitar contaminação de qualquer natureza,sendo proibido o seu lançamento in naturaem quaisquer corpos hídricos a céu abertoou na rede de águas pluviais”.

O artigo 89 defende que “Em não ha-vendo rede pública coletora de esgoto é obri-gação do proprietário do imóvel a execuçãode adequadas instalações domiciliares dearmazenamento, coleta e esgotamento dosefluentes, cabendo ao usuário do imóvel ne-cessária conservação do sistema” (Ibidem).

Há 30 anos não havia uma definiçãoexata sobre os impactos decorrentes de obrasde saneamento. A primeira legislação referen-te a impactos ambientais surgiu com a Resolu-ção n. 001 de 23 de janeiro de 1986 do Conse-lho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA,que dispõe sobre critérios e diretrizes geraispara avaliação do impacto ambiental. Com aevolução da legislação, surgiu a Resolução n.380 de 31 de outubro de 2006, que isenta asobras de saneamento das três etapas dolicenciamento, sendo-lhes exigida apenas aLicença de Instalação/Operação – LI/O.

Conforme a LI/O, os impactos positi-vos das redes de esgoto, das estações eleva-tórias ou estações de tratamento, são maissignificativos que os impactos negativos ouadversos – os quais muitas vezes são tempo-rários, existindo somente durante a implan-tação do empreendimento, tais como, emis-são de particulados, ruídos, complicações notráfego. É importante salientar que a esta-ção de tratamento de esgotos não gera esgo-

tos, concentra o esgoto gerado pela ativida-de humana e lhe imprime um determinadograu de tratamento.

Os demais fatores associados ao licen-ciamento simplificado versam sobre impos-sibilidade de se estabelecer uma alternativalocacional para determinado empreendi-mento, pois uma rede que atenderá aos mo-radores da rua X, somente poderá serexecutada na rua X. Além disso, a própriaalocação de recursos, normalmente de ori-gem federal exige o licenciamento ambiental.

Atualmente, as medidas adotadaspara mitigar os impactos ambientais se res-tringem ao meio sócio-econômico e tem porobjetivo evitar acidentes, através de sinaliza-ção adequada (inclusive noturna), reposiçãode pavimentos para reduzir a emissão departiculados. A implantação de redes coleto-ras unicamente acontece em área antropi-zada, onde a pressão sobre a biota e o meiofísico é menor, como é o caso dos centrosurbanos e vias públicas. A recuperação dasáreas degradadas pode ocorrer a partir daretirada de material para aterro, contudo, écomum re-aterrar as valas com o materialretirado da escavação, evitando assim a utili-zação de áreas de empréstimo ou bota-foras.

Como o fluxo natural dos esgotos é porgravidade, ou seja, fluem naturalmente dospontos mais altos para os pontos mais bai-xos, as canalizações necessitam de certadeclividade que viabilize o transporte daságuas residuárias até seu destino final, defini-do após criterioso estudo técnico-econômico.

Os sistemas de tratamento de esgotode Mato Grosso do Sul, em sua maioria, pos-suem, além do tratamento preliminar, o tra-tamento secundário ou biológico. Em algunscasos o tratamento biológico ocorre por regi-me de anaerobiose (ausência de oxigênio).Nos Reatores UASB (Upflow Anaerobic SludgeBlanket) ou Reator Anaeróbio de FluxoAscendente e Manta de Lodo, o fluxo ascen-dente dos esgotos proporciona a formaçãode um manto de lodo contendo microrganis-mos que se alimentam da matéria orgânicapresente e dela obtém energia para sua ma-nutenção e reprodução. Estes reatores, am-plamente empregados na Europa, foram in-troduzidos no Brasil e são viáveis onde oscustos de aquisição de área para implanta-ção de lagoas de estabilização são restritivos.

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Já os Reatores Anaeróbios de LeitoFluidizado (RALF), não são encontrados emMato Grosso do Sul. Seu princípio de funcio-namento está relacionado à existência de umsubstrato fixo ou leito fluidizado no interiordo reator (areia, plástico ou outro materialinerte, por exemplo), que se expande após aentrada do esgoto afluente, onde se fixa ofilme microbiológico.

De acordo com Marcos Gomes, “Aconfusão que se faz normalmente é a substi-tuição do termo ‘leito fluidizado’ por ‘lodofluidizado’. Mas, no meio acadêmico os rea-tores UASB são consagrados e as pesquisasem torno dos reatores RALF ainda prosse-guem nas escolas de saneamento do país.Portando, reator UASB é a denominaçãocorreta dos reatores anaeróbios empregadosem Dourados”.

O Gerente Regional da SANESUL/Dourados, Odilon Azambuja revelou que aSANESUL está trabalhando em conjuntocom a Promotoria do Meio Ambiente no com-bate as ligações clandestinas de esgoto nacidade. Para detectar as ligações clandesti-nas utiliza-se o fumacê (instrumento que pos-sui altíssima concentração de organofosfo-rados, compostos orgânicos derivados do áci-do fosfórico) para localizar as ligações clan-destinas por meio de processo químico.Quando detectada a ligação clandestina, aSANESUL encaminha a denúncia para oMinistério Público (FOLHA DE DOURA-DOS, 2007, p.14).

A SANESUL garante que os municí-pios de Mato Grosso do Sul terão um PlanoDiretor de Água e Esgoto, instrumento téc-nico à adoção de políticas públicas relaciona-das ao saneamento básico, que inibirá as liga-ções clandestinas de esgoto.

3.3 A SANESUL e a educação ambiental:mobilização comunitária

Com o objetivo de estimular a conscien-tização ambiental e reflexão, a SANESUL rea-liza, por meio de seus técnicos, palestras emescolas, associações e comunidades em geral;participa de campanhas educativas e promo-ve visitas aos seus sistemas de água e esgoto.

Nas escolas, é desenvolvido um traba-lho de educação ambiental salientando arelevância da água para a vida. A educação

ambiental tem como princípios: consideraro meio ambiente em sua totalidade, isto é,em seus aspectos naturais e criados pelo ho-mem (político, social, econômico, científico-tecnológico, histórico-cultural, moral e esté-tico); constituir um processo contínuo e per-manente, através de todas as fases do ensinoformal e não-formal; aplicar um enfoqueinterdisciplinar, aproveitando o conteúdoespecífico de cada disciplina, de modo quese adquira uma perspectiva global e equili-brada (DIAS, 2004). As atividades utilizamrecursos áudios-visuais, dinâmicas e são pla-nejadas em conjunto com os professores,coordenadores e diretores para serem desem-penhadas pelos alunos da pré-escola ao ensi-no médio, os quais produzem desenhos, pin-turas, textos, poesias, maquetes relacionadasao tema.

A mobilização comunitária é feita naárea de implantação do projeto por meio dereuniões com temática voltada para a cida-dania, preservação do meio ambiente e cor-reta utilização de um sistema de esgotamentosanitário e de abastecimento de água (BAR-ROS, 1995).

A SANESUL afirmou que nos municí-pios de Ponta Porã, Dourados, Três Lagoase Corumbá, o projeto de ação social aconte-cerá paralelo às obras de esgoto. As equipesda Gerência de Meio Ambiente e Ação Socialexecutarão o trabalho de orientação com asfamílias. A meta é sensibilizar por volta de 7mil pessoas sobre a importância de providen-ciar a ligação com a rede de esgoto.

Todavia, a questão financeira ainda éum empecilho para algumas famílias efeti-varem a ligação com a rede de esgoto, pois,posteriormente ao investimento da instala-ção, a taxa de esgoto representará 70% contade água.

Considerações finais

A presente pesquisa demonstrou queem aproximadamente um século, a água e oesgoto, seguiram caminhos diferentes emCampo Grande, cuja realidade não difere dosmunicípios brasileiros.

Em Dourados, enquanto quase 90% dapopulação têm acesso à água encanada potá-vel, pouco mais de um quarto desse total éatendido pela rede de esgoto. Todavia, com a

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ampliação da rede de esgoto prevista nos pró-ximos quatro anos, pelo menos 60% da popu-lação terá acesso ao esgotamento sanitário.

É preciso investir na ampliação do sis-tema de coleta e tratamento do esgoto sani-tário em níveis proporcionais ao sistema deabastecimento de água, com a implantaçãode uma infra-estrutura moderna, capaz deacompanhar a demanda crescente dessesmunicípios. O esgotamento sanitário é semdúvida, o “calcanhar de Aquiles” dos admi-nistradores públicos, com um longo caminhoa percorrer.

Outra preocupação que deve ser cons-tante é que a inexistência de rede de esgotocompromete o meio ambiente, à medida queos resíduos são despejados in natura nos ma-nanciais, com conseqüências danosas à saú-de da população.

Portanto, as adequações impostas aosaneamento básico para a exploração dosmananciais foram conseqüências da neces-sidade de conservar o meio ambiente paraobter qualidade de vida, onde a educaçãoambiental atua como um elemento dinâmi-co transformador da sociedade.

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Fonte

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Políticas públicas e estratégias de comunicação para o desenvolvimento local decomunidades pesqueiras de Pernambuco

Public policy and strategies of communication for the local development of thefishing communities of Pernambuco

Politiques publiques et strategies de communication pour la construction dudeveloppement local des communautes de pecheurs a Pernambuco

Políticas públicas y estrategias de comunicación para el desarrollo local de las comunidadescosteñas de Pernambuco

Rosa Maria Saraiva*Angelo Brás Fernandes Callou**

Recebido em 10/12/2008; revisado e aprovado em 29/1/2009; aceito em 2/2/2009

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo analisar as estratégias de comunicação utilizadas pela extensãopesqueira do Programa de Combate à Pobreza Rural e Projeto Peixe de Rede para o desenvolvimento local dascomunidades pesqueiras de Atapuz, Barra de Catuama e Tejucupapo, município de Goiana, Pernambuco.Palavras-chave: Estratégias de comunicação. Desenvolvimento local. Extensão pesqueira.Abstract: The present work has as objective to analyze the strategies of communication used by the fishing extensionof Program of Combat to the Agricultural Poverty e Project Fish of Net for the local development of the fishingcommunities of Atapuz, Barra of Catuama and Tejucupapo, cities of Goiana, Pernambuco. Keywords: Strategies of communication. Local development. Fishing extension.Résumé: La presente étude analyse les stratégies de communication concernant l‘Extension Pêcherie, dans le cadre duProgramme gouvernamemental de Combat Contre la Pauvreté Rurale e du Projet Poisson de Filet, dont le but est laconstruction du dévéloppement local des communautés de pêcheurs, dans les petites villes de Atapuz, Barra deCatuama e Tejucupapo à Pernambuco, Brésil.Mots-clés: Stratégies de communication. Développement local. Extension pêcherie.

Resumen: El articulo hace el análisis de las estrategias de comunicación utilizadas por las atividades de extensión,en el universo de la pesca, de dos Políticas Públicas para el desarrollo local de las comunidades costeñas de Atapuz,Barra de Catuama y Tejucupapo. El estudio, aqui realizado, incluye el Programa de Combate a la Pobreza Rural y elProyecto Pescado en la Red.Palabras clave : Estrategias de comunicación. Desarrollo local. Extensión pesquera.

* Mestra em Extensão Rural e Desenvolvimento Local pela Universidade Federal Rural de Pernambuco.** Professor Titular da Universidade Federal Rural de Pernambuco e Vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX). E-mail: [email protected]

Introdução1

O objetivo deste artigo é analisar asestratégias de comunicação utilizadas peloProjeto Renascer e Programa de Apoio aoDesenvolvimento Sustentável da Zona daMata de Pernambuco (PROMATA), nas co-munidades de Atapuz, Barra de Catuama eTejucupapo, Município de Goiana, litoralnorte do Estado de Pernambuco. Especifica-mente, pretende-se analisar as contribuiçõesdesses projetos governamentais para o de-senvolvimento local, no âmbito da ExtensãoPesqueira, no período de janeiro de 2005 adezembro de 2006.

O Projeto Renascer, da Secretaria deDesenvolvimento Social e Cidadania do Es-

tado de Pernambuco, hoje sob a marcaProrural, incorporou, por meio do Programade Combate à Pobreza Rural, particularmen-te na sua segunda fase (PCPR II), as ativida-des de pesca e aqüicultura como estratégiade desenvolvimento local das comunidadesrurais e pesqueiras.

Avaliações realizadas em 2004 revela-ram um descompasso entre os objetivos doProjeto Renascer e o nível de organizaçãodas associações envolvidas para responderàs exigências de gestão das Unidades deBeneficiamento do Pescado, instaladas emAtapuz, Barra de Catuama e Tejucupapo(CALLOU, 2004). Essas unidades de benefi-ciamento se encontram praticamente para-lisadas em virtude de questões burocráticas

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e, principalmente, dada à frágil habilidadedos pescadores e pescadoras para gerenciaresse projeto como empreendimento econô-mico. (CALLOU, 2004).

Ao reconhecer a importância da pes-ca artesanal no Município de Goiana, o Pro-jeto Renascer não admitia que investimentosdaquela envergadura se tornassem obsole-tos. Assim, o Projeto Renascer, em parceriacom o Programa de Apoio ao Desenvolvi-mento Sustentável da Zona da Mata dePernambuco (Promata), elaborou o ProjetoPeixe na Rede, por meio de uma consultoria.Um dos argumentos dessa parceria era o deque o Município de Goiana estava no campode abrangência do Promata. Portanto, umaação conjunta na esfera governamental erabem-vinda considerando, sobretudo, que nosprocessos de desenvolvimento local, comodesejam essas organizações, a participaçãodos atores sociais é condição fundamental(FRANCO, 2005). Nessa perspectiva, TaukSantos (2002) enfatiza que o desenvolvimen-to local tem levado a novos arranjos institu-cionais e estabelecimento de parcerias comos atores sociais e que cabe à Extensão Ruralcontemporânea o papel de promover a con-certação, ou seja, a articulação, entre os ato-res envolvidos.

Nesses termos, pensar o desenvolvi-mento local no âmbito da Extensão Rural eExtensão Pesqueira contemporâneas exigeplanejar as estratégias de comunicação, poissão por meio delas que é possível instaurarprocessos de mobilização e participação dosatores sociais em suas diferentes instâncias.Rabelo (2003), a partir dos estudos de Toro(2004), explicita, pelo menos, três persona-gens fundamentais nos processos de mobili-zação popular. São eles: O Produtor Social(organização que tem condições econômicas,técnicas e profissionais para atuar localmen-te); o Reeditor Social (pessoa que tem capa-cidade para introduzir, modificar e rejeitarmensagens na sua área de atuação); e o Edi-tor (instituição ou indivíduo com a tarefa deestruturar informações à mobilização.

Estudos recentes revelam que as orga-nizações governamentais e não-governamen-tais vêm dando pouca atenção ao planejamen-to da comunicação à ação extensionista(CALLOU & BRAGA, 2005; ANDRADENETO, 2007). Aspecto que compromete a

participação dos atores sociais nos processosde mobilização para o desenvolvimento local.

É dentro desse cenário que emergemas seguintes questões: quais os resultadosobtidos por meio de uma terceirização de ser-viço de Extensão Pesqueira do Projeto Renas-cer e Promata nas comunidades de Atapuz,Barra de Catuama e Tejucupapo, e qual arelação desses resultados com as estratégiasde comunicação para a mobilização? Res-postas a essas perguntas parecem oportunas,na medida em que esforços estão sendo em-preendidos pelos pesquisadores para conso-lidar, do ponto de vista teórico, a perspectivada Extensão Rural e Pesqueira voltada parao desenvolvimento local dos contextos popu-lares desfavorecidos. Portanto, ao se afastardos ditames da teoria da Difusão de Inova-ções, a Extensão Rural procura atualmentese alinhar aos estudos contemporâneos lati-no-americanos da Comunicação. Esses estu-dos têm revelado a importância das culturaspopulares locais nos processos de desenvolvi-mento. São vários os resultados de pesquisaque já sinalizam no campo da Extensão Ru-ral, e também Pesqueira, o lugar e as implica-ções dessas culturas, particularmente no con-tato com as organizações governamentais(CALLOU e TAUK SANTOS, 2001, 2003;CARVALHO, 2007).

Nesse sentido, o presente trabalho vemna esteira dessas preocupações e se enqua-dra na linha de pesquisa Políticas e Estraté-gias de Comunicação do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvol-vimento Local (POSMEX), da UniversidadeFederal Rural de Pernambuco. Faz parte,ainda, de um projeto de pesquisa mais amplofinanciado pelo CNPq – Pescando Pescado-res: Políticas Públicas e Extensão Pesqueirapara o Desenvolvimento Local –, desenvol-vido pelo POSMEX, em parceria com o Pro-grama de Pós-Graduação em Serviço Socialda Universidade Federal de Pernambuco.

Para a realização deste estudo de caso(CHIZZOTTI, 2001) foi feito um levanta-mento documental dos projetos deconsultoria, relatórios, documentos básicosdas instituições aqui mencionadas – ProjetoRenascer e Promata – pertinentes à temáticadesta pesquisa.

A pesquisa empírica foi realizada pormeio de entrevistas semi-estruturadas com

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gestores e técnicos Projeto Renascer ePromata, envolvidos com as atividades pes-queiras de Atapuz, Barra de Catuama eTejucupapo. Também foram realizadas en-trevistas com pescadores, pescadoras e diri-gentes das colônias. Participou-se do conví-vio familiar dos pescadores das comunidadesestudadas, bem como da atividade pesqueiradas mulheres na captura de mariscos. O pri-meiro contato com as comunidades foi reali-zado em 2006, quando o projeto Peixe deRede ainda estava sendo executado.

Extensão pesqueira: a intervenão emAtapuz, Barra de Catuama e Tejucupapo

As atividades de Extensão Pesqueiradesenvolvidas pela consultora técnica, con-tratada pelo Promata, em Atapuz, Barra deCatuama e Tejucupapo contavam com aassessoria do corpo técnico do Projeto Renas-cer, que se revezava na assistência técnica.Entretanto, a falta de uma equipe técnicapermanente dificultava, em determinadosmomentos, as ações extensionistas.

Diante das dificuldades encontradas,as estratégias de comunicação foramimplementadas de acordo com a realidadeencontrada nessas comunidades, com o ob-jetivo de possibilitar a melhoria econômica,social e política dos grupos de trabalho. Aintrodução da consultora nas comunidadesfoi realizada pelo técnico social do ProjetoRenascer, que já vinha desenvolvendo outrasatividades no local.

Em um processo de mobilização social,como se pretendia para reestruturar as uni-dades de beneficiamento do pescado, reque-ria-se um ato comunicativo entre emissor ereceptor. Desse modo, Rabelo (2003) enfatizaque divulgar as informações é apenas umadas etapas necessárias para se promover oenvolvimento e a mobilização social.

Nessa perspectiva, o Projeto Peixe deRede constrói cartazes para informar ospescadores e pescadoras as datas das reu-niões e cria a logomarca do Projeto, que sina-liza a dinâmica da cadeia produtiva dapesca. Foram também elaborados o folderexplicativo do trabalho e embalagens paraos produtos pesqueiros das unidades debeneficiamento do pescado. Assim se expres-sam os entrevistados sobre esse aspecto da

intervenção:A forma de divulgar foi por meio de reuniões,de boca-a-boca, cartazes para marcar as reu-niões. (Supervisora do Promata)

Tinha cartazes, fazíamos reuniões, chegueia ir até ao mangue para falar com os pesca-dores. (Consultora técnica – Promata)

A mobilização era realizada com o contatocom as lideranças, a diretoria mobilizava ogrupo, e envolveu mais associados, comopescadores e pescadores e alguns jovens.(Consultor técnico)

Ir de casa em casa para explicar o Projeto.Mais de setenta pessoas participaram doprojeto. (Consultora técnica)

Ela mostrou o Projeto através de conversas,reunimos com as colegas e tivemos variasreuniões. Depois vieram outros técnicospara ensinar cursos. (Pescadora 5 – Barrade Catuama)

Essas estratégias de comunicação po-dem ser consideradas, segundo Beltrán(1981), como um ato de tornar algo comum,uma idéia, um pensamento, a um grupo quetroca informações e conhecimento. É umprocesso de interação social sob as condiçõesde acesso livre, igualitário e participativo.Ainda nesse contexto de intervenção, a par-ticipação é estimulada pelo convívio de lide-ranças locais, técnicos, pescadores e pesca-doras, vivenciando a mesma realidade social.Dizem as pescadoras:

A comunidade ficou mais participativa, ti-nha aquele momento de acreditar que ia darcerto. (Pescadora 1- Atapuz)

Para mim, foi conhecimento e, para a comu-nidade, ajudou muitas pessoas. (Pescadora2 - Atapuz)

Eu gostei muito desse Projeto, logo na apre-sentação, como já conhecia a técnica, nesseprojeto levantou muito a auto-estima damulher. (Pescadora 6 – Barra de Catuama)

Tais esforços levaram os técnicos e aconsultora a continuarem com as estratégiasde comunicação, no sentido de mobilizar acomunidade em torno do projeto. As reu-niões eram marcadas conforme a prioridadedas ações que estavam sendo desenvolvidas.

No que se refere à mobilização para aexecução das oficinas de boas-práticas (bene-ficiamento do pescado), a consultora utiliza-se do seu conhecimento profissional e daexperiência das comunidades pesqueiras.

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Essa estratégia facilitou, a julgar pelas opi-niões das entrevistadas, o desenvolvimentodas oficinas. Dizem elas:

Conheci muitas coisas, com os cursos nósaprendemos mais. (Pescadora 2 - Tejucupapo)

Tinha um quadro e ele escrevia. Pedia a opi-nião de cada um e todos escreviam. Apre-sentava através de desenho. Usavam lápis,cartolina, papel ofício. Eles trabalhavam combastante material usavam apostila. Casohouvesse dúvida era esclarecida na próxi-ma reunião. (Pescadora 6 - Tejucupapo)

Os técnicos explicam muito bem, além defalar a linguagem simples eles davam forçae orientavam. (Pescadora 4 - Barra deCatuama)

Os resultados dessas oficinas trouxe-ram, segundo depoimentos abaixo, algumtipo de aprendizado para os pescadores:

Um pouco de conhecimento ficou para a co-munidade, antes ninguém sabia tanto as-sim. (Pescador 8 – Tejucupapo)

Tínhamos tempo para trabalhar juntas, agente pescava e depois ia trabalhar na colô-nia e tinha produção para vender e ganharalgum dinheiro. (Pescadora 5 – Barra deCatuama)

Essas oficinas foram desenvolvidas deacordo com as necessidades de funciona-mento das unidades de beneficiamento,visualizando alternativas de renda para ospescadores na cadeia produtiva do pescado.Em todas as etapas da cadeia produtiva, fo-ram trabalhadas técnicas que viessem a me-lhorar a qualidade do produto, contemplan-do as exigências técnicas de beneficiamento,que vão desde a captura até à comerciali-zação dos produtos beneficiados, aquisiçãoe agregação de valores dos recursos naturais.Nesse sentido, dizem as pescadoras entrevis-tadas:

Aprendemos muito sobre higiene, perigo napescaria e cuidado com o meio ambiente,sobre o plástico que demora muitos anospara se decompor. (Pescadora 4 – Barra deCatuama)

Conheci com os cursos de filetamento ecatação de siri sem gordura. (Pescadora 3 -Barra de Catuama)

Na catação do siri tinha uma grande preo-cupação com a higiene para não ter conta-minação, o trabalho era feito com amor.(Pescadora 6 - Atapuz)

As estratégias de comunicação utiliza-das possibilitaram, ainda, o alcance de algumnível de mobilização dos pescadores em tor-no do Projeto. Isto fica percebido nas falasdos entrevistados:

Ela conseguiu mobilizar a colônia deAtapuz, as pescadoras vieram para dentroda colônia, colocavam pescado dentro daColônia. (Gestora do Promata)

Com o trabalho da técnica, teve até um res-gate, uma aproximação dos pescadores, da-quelas pessoas que, nas discussões, não co-nheciam bem as atividades da Colônia. (Con-sultor técnico)

Acho que ela soube informar, nas reuniões enos cursos. (Pescadora 2 – Tejucupapo)

Para mim foi conhecimento e para a comu-nidade ajudou muitas pessoas. (Pescadora2 – Atapuz)

Porque tinha força de vontade, para partici-par e aprender e ir para frente. (Pescadora 5– Barra de Catuama)

Elas souberam que são capazes, o aprendi-zado técnico (Atapuz); elas compreenderamo processo que desencadeia lá (Tejucupapo).Isso foi muito importante. Sair da comuni-dade para entrar no mundo dos negócios(Atapuz). Intercambio de informação entreos participantes de Barra de Catuama eAtapuz. (Consultora técnica - Promata)

Se, de um lado, algum nível de partici-pação foi alcançado pelos pescadores e pes-cadoras para discutir as unidades de benefi-ciamento do pescado nas suas colônias, poroutro, não se pode afirmar que essa partici-pação induzida garantiu o bom andamentoda cadeia produtiva do pescado nessas co-munidades, como veremos a seguir.

Fragilidades da participação

A participação dos pescadores e pes-cadoras no Projeto Renascer/Promata é ob-servada como fragilizada, por parte dos ges-tores e técnicos. Dizem estes que os ganhosobtidos só foram observados durante a exe-cução do Projeto, mediante assessoria. Assimse expressam:

Esse projeto de pesca eu avalio como umaparticipação muito frágil da comunidade.

A questão organizacional não estava fortepara a implantação de um modelo de gestão.(Gestora do Promata).

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Embora as participantes dos projetosadmitam que ganharam conhecimento e queo projeto trouxe alguma satisfação pessoal eprofissional, por outro lado, em relação àsquestões econômicas, eles consideram que oprojeto não teve tanto êxito. Dizem elas:

Não mudou muita coisa, mas ganhei muitaexperiência. (Pescadora 4 – Barra deCatuama)

Não mudou nada, está tudo na mesma.Acontece também que teve falta de uniãoentre os participantes. (Pescadora 2 – Barrade Catuama)

Não mudou muito não, fizemos várias coi-sas, vendemos mais, não ganhamos muito.(Pescadora 3 - Barra de Catuama)

Nada, não ficou nada. (Pescadora 2 –Tejucupapo)

Para mim nada, eu não tenho nada que com-prei com o trabalho da colônia. (Pescadora 5– Tejucupapo)

Nessa perspectiva, pode-se inferir que,do ponto de vista do desenvolvimento local,no que diz respeito à dinamização das poten-cialidades econômicas endógenas, o Projetonão apresentou essa dimensão na atividadepesqueira. Entretanto, as pescadoras deixamrevelar, nas entrelinhas de suas falas, outrasdimensões importantes do desenvolvimentolocal, como a aquisição de novas habilidadese conhecimento (FRANCO, 2001).

O Projeto Peixe de Rede revela limita-ções durante a sua execução, seja ela de or-dem estrutural ou burocrática. Para os técni-cos, a gestão significa a palavra-chave daExtensão Pesqueira para o desenvolvimento.Dizem eles:

A gestão para mim é o principal fator no pro-cesso de implementação de um projeto. E agestão tem que caminhar em uma outra pers-pectiva, por que dentro dessa perspectivatradicional, onde cada um faz a sua parte,cada organização faz o seu projetinho e exe-cuta é muito precária. As possibilidades deimpactos reais são muito pequenas. (Gestorado Renascer)

A gente quer tornar o pescador para entrarno agronegócio, mas a gente ainda é muitofrágil em relação à comercialização do ne-gócio, a gente trabalha o negócio muito pri-mitivo. (Consultor técnico)

Fechando o cerco às questões coloca-das, podemos inferir que projetos de desen-

volvimento local para contextos sociais des-favorecidos, cujos níveis de organização eparticipação são, ainda, fragilizados, o esfor-ço de uma ação extensionista deve ser desen-volvida, principalmente, no campo da gestãoe da organização. Considerando que a açãodo Renascer / Promata em Atapuz, Barrade Catuama e Tejucupapo buscou recondu-zir as unidades de beneficiamento do pesca-do, cujo projeto não foi efetivamente pensa-do pelos pescadores e pescadoras, a fragili-dade da participação da comunidade era,por assim dizer, previsível.

Atapuz, Barra de Catuama e Tejucupapo:perspectivas de futuro

Depois de todas as implementaçõesdessas ações, o que, de fato, ficou para os pes-cadores e pescadoras? Quais os desafios en-frentados para que essas políticas públicaspossam funcionar, efetivamente, depois detodo o trabalho da equipe técnica e da comu-nidade? As unidades de beneficiamento depescado construídas nessas comunidades e osgrupos que foram capacitados para fomen-tarem ações de boas-práticas no manuseio dopescado encontram, atualmente, diversas di-ficuldades para a sustentabilidade dessesempreendimentos. As unidades permanecemsem funcionar adequadamente, demonstran-do as barreiras que enfrentam um projetoprodutivo dessa natureza. Barreiras que di-zem respeito principalmente ao estabeleci-mento de parcerias, ao capital de giro, aoassociativismo, à comercialização do produ-to e à organização comunitária dos grupos.

Entretanto, os grupos mobilizados nascomunidades de Atapuz, Barra de Catuamae Tejucupapo ainda têm esperança que ou-tro projeto possa vir a se desenvolver na loca-lidade. Em Atapuz, foi possível perceber osentimento de grupo quanto à necessidadede mudança. Algumas pescadoras partici-pantes dos grupos continuam nas atividadesde pesca de forma artesanal. Os produtosque são beneficiados por elas são vendidospara o atravessador. Outras conseguiramemprego em uma empresa de pesca. De cer-ta forma, as oficinas realizadas beneficiaramas mulheres e estas não escondem o desejode mudança e de serem reconhecidas comoprofissionais da pesca.

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Na comunidade de Barra de Catuama,as participantes entrevistadas ficaram desa-pontadas com os resultados do projeto Re-nascer/Promata na comunidade. Teve umadas participantes que se negou a falar sobreo assunto. Depois, em conversa com pessoasda comunidade, teve-se a informação de que,após o término do projeto, uma pescadoratentou dar continuidade às ações de benefi-ciamento do pescado, sem obter resultadosefetivos.

Ainda em Barra de Catuama, as pes-cadoras que foram capacitadas pelo Projetopara beneficiar o pescado continuam bene-ficiando da mesma forma que sempre reali-zaram. Algumas participantes comentaramque ainda escutam dos seus maridos que oProjeto não tinha viabilidade econômica.Não observaram mudança em nada. Conti-nuam trabalhando mais de seis horas entrepegar o marisco, cozinhar e beneficiar o pro-duto de maneira artesanal. Precisam catarsete quilos de siri com casca, para obter umquilo de produto beneficiado.

Em Tejucupapo, os resultados não sãomuito diferentes das outras comunidadesestudadas. Na unidade de beneficiamentodessa comunidade, parte dela está sendo uti-lizada para trabalhos burocráticos da colô-nia. O material adquirido para o beneficia-mento do pescado continua sem utilizaçãodiária:

O material que veio para o Projeto ainda estálá. (pescadora 6 – Tejucupapo)

Depois desse projeto tudo parou depois atécnica não veio mais e tudo acabou. (Pesca-dora 7 – Tejucupapo)

Por outro lado, alguns participantes doProjeto, juntamente com o presidente dacolônia e secretário do Município de Goianaestão se mobilizando para fundar uma Asso-ciação de Mulheres Pescadoras, que temcomo objetivo buscar recursos para o grupode mulheres trabalharem com corte e costu-ra. Esse aspecto pode significar uma alter-nativa de renda, diante da precária ativida-de pesqueira. Assim se expressa uma pesca-dora de Tejucupapo:

Que viessem para cá outros projetos que nãotivessem relação com a pesca. Na maré, hojeem dia, está dando pouco, quase não tempescado, seria outra alternativa de renda.(Pescadora 3 – Tejucupapo)

Os técnicos entrevistados têm uma vi-são crítica sobre a colônia de Tejucupapo. ,Referem-se a ela como sendo do presidente.A unidade de beneficiamento foi construídadentro do terreno da família do presidente.Talvez isso explique o porquê de estar hátanto tempo como presidente da colônia deTejucupapo e o porquê de os pescadores oupescadoras não se sentirem responsáveispela unidade de beneficiamento.

Um aspecto a ser observado nas estra-tégias de comunicação utilizadas pela equipetécnica do Projeto Renascer/Promata emTejucupapo é que elas estavam muito maisvoltadas à questão mercadológica e sanitá-ria do beneficiamento do pescado do que dasnecessidades imediatas dos pescadores epescadoras envolvidas com as ações. Nessesentido, houve certa resistência de algumaspescadoras e do próprio presidente da Colô-nia, que não concordava com o trabalho queestava sendo desenvolvido pela equipetécnica.

A técnica queria que a gente fosse para amaré para trazer o pescado e aqui na Colô-nia beneficiar e armazenar. (Pescadora 6 –Tejucupapo)

Eu mudaria a forma de execução desse pro-jeto, a técnica queria de um jeito e a comuni-dade via que não ia dar certo, porque, trazerpara unidade de beneficiamento produtosna casca, era mais difícil de beneficiar. Masa técnica acha que não era correto. (Pesca-dora 3 – Tejucupapo)

O fato é que as atividades foram exe-cutadas por um determinado tempo, para,logo depois, não ser mais possível finalizaras ações. Momento em que houve um afas-tamento dos técnicos diante da impossibili-dade de continuar o trabalho.

Conclusões

Os dados apresentados ao longo destetrabalho apontam, principalmente, para as-pectos corriqueiros vividos pelos contextospopulares excluídos do meio rural brasileiro:a fragilidade organizacional dos associadose cooperados na dinâmica das suas entidadesde representação social e produtiva. Pormaiores que sejam os esforços – teóricos epráticos –, das organizações governamentaise não-governamentais para promover o

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desenvolvimento social desses contextos des-favorecidos, via mobilização e participaçãopopular, as respostas das comunidades àsofertas de mudança social nem sempre (paranão dizer na maioria das vezes) coincidemcom os objetivos das organizações promoto-ras. Aspectos históricos, políticos e sociaisexplicam, em parte, esse descompasso dosenvolvidos nos projetos públicos de desenvol-vimento local.

Essas explicações, entretanto, tornam-se mais complexas quando visualizamos ocenário da mundialização dos mercados edas culturas e sua repercussão no territóriorural e pesqueiro. Estudos no campo da Ex-tensão Rural e da Extensão Pesqueira, comovimos, têm mostrado que as culturas popu-lares, no seu movimento ambivalente de sere estar e nas suas diferentes e atuais formasde consumo de bens materiais e simbólicos,ressignificam as mensagens canalizadas nãoapenas pelos meios massivos de comunica-ção, mas, também, pelas propostas de desen-volvimento das organizações governamen-tais e não-governamentais. No caso especí-fico das atividades de pesca, cuja tradiçãono contexto popular brasileiro não saiu doterreno artesanal, e a aqüicultura procura,ainda, o seu lugar nesse cenário, pedir queesse artesanal adquira, num tempo prede-terminado, novas habilidades tecnológicas,mesmo que elas sejam consideradas popula-res, é esperar o mais comum dos resultados:a descontinuidade dos projetos e as tentati-vas de recondução dos processos, como seobservou ao longo deste trabalho. Por outrolado, o vetor participação, se for consideradoos pescadores do litoral, sabe-se que a elesfoi negado, historicamente, como em nenhu-ma outra categoria social, o direito de atuare dirigir suas próprias associações, as colôniasde pescadores.

Nos casos de Atapuz, Barra deCatauama e Tejucupapo, apesar dos esfor-ços dos técnicos e consultores dos projetosRenascer e Promata, no sentido de estabele-cer formas de comunicação com os pescado-res e pescadoras locais, os resultados alcan-çados parecem insuficientes. As unidades debeneficiamento do pescado – foco central daatuação do Renascer/Promata nessas comu-nidades – não avançaram, como desejaramos técnicos e gestores dessas organizações.

Do ponto de vista dos pescadores epescadoras, os dados revelam que algumasexperiências, aprendizado e, até, certo nívelorganizacional foram logrados, mas não po-demos afirmar que esses resultados tenhamcontribuído, efetivamente, para o desenvol-vimento local das comunidades estudadas.Como se pôde observar, as potencialidadeslocais, particularmente a pesca artesanal,não atingiram um patamar econômico queimplicasse a melhoria das condições sociaise econômicas dos atores envolvidos. Por ou-tro lado, o tipo de gestão com que se defron-tam as colônias de pescadores nas comunida-des de Atapuz, Barra de Catuama e Tejucu-papo impede, por conseqüência, que as uni-dades de beneficamento do pescado cum-pram a função para a qual foram destinadas:atender os pescadores e pescadoras locaisnas atividades de pesca e comercializaçãodo pescado.

Do ponto de vista das estratégias decomunicação utilizadas pelo Renascer/Promata para instaurar um processo de de-senvolvimento local em Atapuz, Barra deCatuama e Tejucupapo, podemos concluirque elas ficaram aquém do que determinamos aspectos teóricos pontuados por Rabelo(2003). Dos três personagens principais su-geridos como fundamentais para instaurarprocessos de moblização para o desenvolvi-mento – Produtor Social, Reeditor Social eEditor –, o que ficou em destaque foi a atua-ção comunicacional dos técnicos do Renas-cer/Promata, portanto o Produtor Social. Osdemais personagens tiveram papel secundá-rio em todo o processo de redinamização dasunidades de beneficamento do pescado. Apartir daí, talvez, pode-se explicar, em par-te, o frágil nível de mobilização dos pesca-dores e pescadoras em diversas situações dotrabalho de Extensão Pesqueira levado pe-los técnicos, bem como as rudimentares ar-ticulações com outros parceiros institucio-nais, além do incipiente embate político dospescadores e pescadoras com as liderançasdentro das colônias.

Em síntese, podemos dizer que as difi-culdades encontradas para o trabalho deExtensão Pesqueira do Renascer/Promatavão desde a frágil habilidade dos associadospara tocar uma unidade de beneficiamentocomo empreendimento econômico, até as

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dificuldades (históricas) de organizaçãosociopolítica para uma participação maisefetiva na vida das Colônias. Por entre essesfatores, passam, como um fio condutor, asnecessidades básicas – legítimas –, e imedia-tas, de sobrevivência dos pescadores e pes-cadoras. Como uma espécie de movimentodas marés, arremessam-se às colônias quan-do estas acenam com benefícios (governa-mentais ou não-governamentais), e recuam(o que é mais comum) quando os benefíciosescasseiam essas possibilidades. Acrescente-se a isso, as características do projeto de cria-ção dessas unidades de beneficiamento, querevelaram muito mais se tratar de uma neces-sidade técnica identificada pelos agentes dedesenvolvimento do que mesmo uma neces-sidade sentida pelos seus potenciais“beneficiários”.

Considerando esses aspectos, parecefundamental levantar algumas questões quepoderão auxiliar na montagem de novas es-tratégias de Extensão Pesqueira e abrir novasperguntas de pesquisa: 1) podemos apoiar ofortalecimento organizacional das associa-ções populares aliado a um projeto produti-vo, cujo espaço temporal de execução estejapreviamente estabelecido? 2) podem astecnologias de beneficiamento de pescadonão-tradicionais nas comunidades pesquei-ras, a exemplo do bolinho de peixe, filé desiri, empadas de siri, risole de siri, sereminternalizadas de maneira coletiva em con-textos populares fragilmente mobilizados emassociações e sem tradição nessas atividades?e 3) é possível as organizações governamen-tais e não-governamentais desenvolveremparcerias para financiar, capacitar, acompa-nhar e prestar assistência técnica aos con-textos populares nas situações acima levan-tadas?

Por último, há que se pensar nos avan-ços e fracassos dos contextos populares e dasorganizações promotoras de desenvolvimen-to, em relação às novas demandas de con-sumo dos contextos populares e sobre os usosque esses contextos fazem das mensagens epropostas de desenvolvimento. Um caminhotrilhado nessa direção possibilitará à Exten-são Pesqueira abandonar o pólo histórico damera transmissão de mensagens e projetospara o pólo do diálogo, da comunicação edo desenvolvimento local.

Notas1 Esta pesquisa é resultado da dissertação de mestrado

defendida em 2008 no Programa de Pós-Graduaçãoem Extensão Rural e Desenvolvimento Local(POSMEX) da Universidade Federal Rural dePernambuco.

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Cavidade natural subterrânea: natureza jurídicaCnderground natural caves: juridical status

Cavidad natural subterránea: naturaleza jurídicaCavité naturelle souterraine: nature juridique

Lídia Maria L. R. Ribas*Luciani Coimbra de Carvalho**

Recebido em 10/12/2008; revisado e aprovado em 29/1/2009; aceito em 2/2/2009

Resumo: As cavidades naturais subterrâneas são bens que apresentam um ecossistema frágil e delicado, contendo,normalmente, além do corpo rochoso, conteúdo mineral e hídrico, fauna, flora, sítios arqueológicos e paleontológicos.Apresenta uma grande importância ambiental, cultural e econômica e um forte apelo turístico, face à beleza cênicados espeleotemas, dos rios e lagos subterrâneos, das cachoeiras e dos vestígios históricos. Todavia, são escassas asproduções jurídicas que têm por objeto analisar a natureza jurídica do bem. A pequena literatura tem se restringidoa analisar aspectos das cavidades como a preservação do patrimônio natural, o aspecto cultural ou mesmo econômico.Este artigo tem por finalidade apresentar uma contribuição para a análise da natureza jurídica do bem, pois poucose escreve sobre o assunto; até as literaturas mais especializadas referentes aos bens públicos ou ambientais não sedetiveram em analisar as cavidades. A pesquisa desenvolvida é bibliográfica exploratória e, para se atingir o objetivo,foram analisadas as posições doutrinárias existentes sobre a classificação dos bens, sacando-se as notas principais.Nesse ponto foram apresentadas as teorias que se baseiam na titularidade do bem e as que adotam o regime jurídico.Posteriormente, foram levantadas as principais fundamentações para adoção de classificação dicotômica e tricotômica.Tendo por base a legislação e os atos normativos relacionados ao bem objeto de estudo, procurou-se sacar assemelhanças e diferenças entre as possibilidades de subsunções. Por fim, optou-se por uma classificação tricotômica,esposada por Silva (1997), que classifica os bens entre público, privado e de interesse público. As cavidades pertenceriamaos bens de interesse público, pois, embora pertencentes à União, possuem um regramento que as diferenciam dosbens de uso comum, de uso especial e de uso dominical. A diferença tem por base a necessidade de forte regramentoexpedido pelo poder público com o objetivo de preservar o bem, o que impede o seu uso de forma indistinta econcorrente por todos, sem necessidade de autorização prévia. Da mesma forma, não podem ser caracterizadascomo bem de uso especial, pois não se prestam ao funcionamento de repartição pública ou à prestação de um serviçopúblico. Também não se enquadram como bem dominical, pois são bens que possuem uma finalidade de interessepúblico, cabendo ao Estado a obrigação de preservá-los. São bens indisponíveis e, ainda que se possibilite a exploraçãosustentável pelo particular, como no caso do turismo, a relação será regida por normas de direito público e não dedireito privado.Palavras-chave : Cavidade natural subterrânea. Bem de interesse público. Bem público.

Abstract: Underground natural caves are assets that present a tender and fragile ecosystem, usually containing notonly the rocky part, but also mineral and hydra content, fauna, flora, archeological and paleontological sites. They areimportant from the environmental, cultural and economic points of view and constitute an impressive tourist appeal,because of the beauty of speleothems, of the underground rivers and lakes, waterfalls and historical vestiges. However,there are few law writings that aim to analyze the juridical nature of the asset. The scarce literature has been restrictedto the analysis of the caves in relation to the preservation of their natural heritage, their cultural and even theireconomic value. This article aims to present a contribution to the analysis of the juridical nature of the asset, becausevery little has been written about it so far; even more specialized literature dealing with public or environmental assetshas not been concerned with the cave study. Research developed here is bibliographical and exploratory and, to reachthe goal, the doctrinal positions about the classification of the assets have been analysed, enhancing the main notes.The theories based on the asset titularity and the ones that adopt the juridical regime have been presented. Later, themain fundaments for the adoption of the two-fold and three-fold classifications were taken into account. On the basisof the legislation and of the normative acts related to the asset at issue, the similarities and differences between thepossibilities of subsumptions have been studied. At last, the choice fell on a three-fold classification, supported bySilva (1997), that categorizes the assets into public, private and of public interest. The caves would thus fit into thelast group because, although belonging to the Union, they have a system of rules that makes them different from theassets of common use, the assets of special use and the assets of dominical use. The difference is based on thenecessity of a consistent system of rules expelled by the government with the objective of preserving the asset, which

* Mestre e Doutora em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica – PUC de São Paulo. Pós-doutoraem Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Museu Social da Argentina. Pesquisadora, professora eorientadora na graduação e na pós-graduação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e da Universidadepara o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal. Membro da Academia de Direito Tributário efundadora da Academia Semiologia e Direito. E-mail: [email protected]** Mestre em direito administrativo pela PUC/SP. Pesquisadora, professora e orientadora na graduação e pós-graduação “lato sensu” da Universidade Católica Dom Bosco e Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.Advogada e sócia do escritório Carli, Muritiba, Guimarães, Coimbra e Ribas advogados. E-mail:[email protected]

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inhibits its use in a concurrent and indistinctive way by everybody, dispensing with previous authorization. Likewise,they cannot be characterized as assets of special use because they cannot be used as public buildings or be lent torender public service. They cannot fit into dominical asset either, because they are assets that have a purpose of publicinterest, and it is the State that has the obligation to preserve them. They are non-disposable assets and, even if it ispossible the have a sustainable exploration by private ownership, tourism for example, the relation will be ruled bynorms of public rather than private law.Keywords: Underground natural cave. Public interest asset. Public asset.Résumé: Les cavités naturelles souterraines sont des biens qui présentent un écosystème fragile et délicat, contenanten général, outre son corps rocheux, du contenu mineral et hydrique, une faune, une flore, des sites archéologiques etpaléontologiques. Leur importance tient à des facteurs à la fois environnementaux, culturels et économiques, ainsiqu’à leur intérêt touristique majeur, de par la beauté scénique des spéléothèmes, leurs rivières, lacs souterrains, chutesd’eau et vestiges historiques. Néanmoins, les productions juridiques consacrées à l’étude de la nature de ce bien sontà ce jour peu importantes. En effet, la littérature existante se restreint à analyser les seuls aspects des cavités tels quela préservation du patrimoine naturel, ses traits culturels et économiques. Cet article a pour but de contribuer àl’analyse de la nature juridique de ce bien en partant du constat que la littérature spécialisée concernant les bienpublics ou environnementaux n’ont véritablement pas encore fourni une étude systématique des cavités. La méthodologieemployée dans cette recherche consiste à faire une exploitation bibliographique des positions doctrinaires existantessur le thème du classement des biens, en en relevant les principales remarques. À ce point-là, nous avons présenté lesthéories concernant la titularité du bien et celles qui adoptent le régime juridique. Dans une deuxième étape, nousavons relevé les principales références en vue d’adopter le classement dichotomique et trichotomique. En nous guidantpar la législation et les actes normatifs relatifs au bien, objet de cette étude, nous avons cherché à relever les similitudeset différences qui séparent les possibilités de subsomptions. Finalement, nous avons opté pour un classementtrichotomique, partagé par Silva (1997), selon que les biens sont publics, privés ou d’intérêt public. Les cavitésappartiendraient ainsi aux biens d’intérêt public car, tout en étant partie intégrante de la Fédération, elles possèdentun règlement qui les différencie des biens d’usage commun, d’usage spécifique et d’usage domanial. Cette différencetient à la nécessité d’un règlement strict expédié par le pouvoir public afin que le bien soit préservé, ce qui empêcherason usage indistinct, concomitant et sans autorisation préalable. De la même manière, les cavités naturelles souterrainesne peuvent être caractérisées comme bien d’usage spécifique puisqu’elles ne sauraient tenir place d’établissementspublics. Elles ne se casent pas non plus comme bien domanial car il s’agit de biens servant à l’intérêt public, il revientdonc à l’État de le préserver. Ces biens sont en outre indisponibles, ainsi, même si l’exploitation durable par desparticuliers est autorisée, à l’instar du tourisme, le rapport sera régi par des normes de droit public et non pas de droitprivé.Mots-clés: Cavité naturelle souterraine. Bien d’intérêt public. Bien public.

Resumen: Las cavidades naturales subterráneas son bienes que presentan un ecosistema frágil y delicado, conteniendo,normalmente, allá del cuerpo rocoso, contenido mineral e hídrico, fauna, flora, sitios arqueológicos y paleontológicos.Presenta una gran importancia ambiental, cultural y económica y una fuerte invocación turística, en razón de labelleza escénica de los paisajes espeleológicos, de los ríos y lagos subterráneos, de las cascadas y de las huellashistóricas. Todavía, son raras las producciones jurídicas que tienen por objeto analizar la naturaleza jurídica del bien.La poca literatura se ha restringido en analizar aspectos de las cavidades como la preservación del patrimonionatural, el aspecto cultural o mismo económico. Este artículo tiene por finalidad presentar una contribución para elanálisis de la naturaleza jurídica del bien, pues poco se escribe sobre el asunto; hasta las literaturas más especializadasque se refieren a los bienes públicos o ambientales no se detuvieron en analizar las cavidades. La investigacióndesarrollada es bibliográfica exploratoria y, para que se alcance el objetivo, fueron analizadas las posiciones doctrinariasexistentes sobre la clasificación de los bienes, sacándose los apuntes principales. En ese punto fueron presentadas lasteorías que se basan en la titularidad de los bienes y las que adoptan el régimen jurídico. Más adelante, fueronlevantadas las principales razones para la adopción de clasificación dicotómica y tricotómica. Teniendo por base lalegislación y los actos normativos relacionados al bien objeto del estudio, se ha buscado sacar las semejanzas y lasdiferencias entre las posibilidades de adecuaciones. Finalmente, fue optado por una clasificación tricotómica, adoptadapor Silva (1997), que clasifica los bienes como públicos, privados y del interés público. Las cavidades perteneceríana los bienes de interés público, pues, mismo pertenecientes a la Unión, tienen una reglamentación que las diferenciande los bienes de uso común, de uso especial y de uso dominical. La diferencia tiene por base la necesidad de fuerteregalamiento remitido por el poder público con el objetivo de preservar el bien, lo que obstaculiza su uso de formaindistinta y concurrente por todos, sin necesidad de autorización anterior. De la misma forma, no pueden sercaracterizados como bien de uso especial, puesto que no son útiles al funcionamiento de la secretaría pública o a laprestación de un servicio público. También no caben como bien dominical, pues son bienes que poseen un propósitode interés público, cabiendo al Estado la obligación de preservarlo. Son bienes indisponibles y, mismo que sea posiblela exploración sustentable por el particular, como en el caso del turismo, la relación será conducida por normas dederecho público y no del derecho privado.Palabras clave : Cavidad natural subterránea. Bien de interés público. Bien púbico.

Introdução

As cavidades naturais subterrâneassão bens que apresentam um ecossistemafrágil e delicado, normalmente contêm alémdo corpo rochoso, conteúdo mineral e hídri-

co, fauna e flora, bem como sítios arqueoló-gicos e paleontológicos. Embora o patrimônioespeleológico seja de grande importância cul-tural, ambiental e econômica, são escassosos trabalhos jurídicos sobre o tema e recentesas preocupações governamentais sobre o

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adequado tratamento jurídico, pois a primei-ra norma específica foi expedida em 1990 eem 1997, foi criado o CECAV- Centro Nacio-nal de Estudos, Proteção e Manejo de Caver-nas, que recebeu a competência para execu-tar o Programa Nacional de Proteção aoPatrimônio Espeleológico. Não obstante, apreocupação do governo com a adequadapreservação e exploração do bem, aclassificação jurídica da cavidade naturalsubterrânea, merece um estudo mais apro-fundado. Como não existem trabalhos espe-cíficos sobre o tema, constantemente são clas-sificadas como bens públicos federais, oracomo de uso comum, ora como dominical,ao mesmo tempo em que é considerada comopatrimônio ambiental, bem difuso ou de in-teresse público. A todo o momento chocam-se conceitos de ramos diferentes do direito,como o ambiental e o administrativo, o quese repete nas parcas legislações sobre o tema.Face às constantes divergências, o presenteestudo bibliográfico exploratório tem porobjeto analisar as principais característicasutilizadas para classificar os bens, confrontá-las com as normas jurídicas relacionadas aotema e após a sistematização das premissase conclusões, apresentar elementos para aclassificação jurídica das cavidades naturaissubterrâneas.

1 Apresentação da problemática

A Constituição da República Federaldo Brasil estabelece no seu artigo 20, X, queas cavidades naturais subterrâneas são bensda União, o que lhe rende a denominaçãode bem público. O Código Civil, no art. 99,classifica o bem público, como de uso co-mum, especial ou dominical. As normas quese referem especificamente às cavidades na-turais subterrâneas como o art. 1o do Decreto99.556 de 1.10.96, as classificam como pa-trimônio cultural, aplicando-se o artigo 216,V, da CF/88 que estabelece que “constituipatrimônio cultural brasileiro os bens denatureza material e imaterial, tomados in-dividualmente ou em conjunto, portadoresde referência à identidade, à ação, à memó-ria dos diferentes grupos formadores da so-ciedade brasileira, nos quais se incluem: ...V– os conjuntos urbanos e sítios de valor histó-rico, paisagístico, artístico, arqueológico, eco-

lógico e científico”. O mesmo decreto fazreferência à Lei 6938/81 e ao Dec. 99227/90 que se referem respectivamente à Lei dePolítica Nacional do Meio Ambiente e suaregulamentação. Ambos prestam aplicabili-dade ao artigo 225 da CF/88 que estabeleceque “Todos têm direito ao meio ambiente eco-logicamente equilibrado, bem de uso comumdo povo e essencial à sadia qualidade devida, impondo-se ao Poder Público e à cole-tividade o dever de defendê-lo e preservá-lopara as presentes e futuras gerações”. Asmesmas disposições se aplicam ao projeto delei 5071/90 que dispõe sobre a proteção dascavidades naturais subterrâneas, e afirmaque no art. 1o estabelece que as cavidadessão “bens da União, considerados patrimô-nio cultural e natural do povo brasileiro”,estabelece também que o projeto encontra-se em conformidade com “os Arts. 20, incisoX; 216, inciso V da Constituição Federal” .O projeto de lei 2832/03, fixa como baseconstitucional os artigos 20,V; 216,V e 225,§1o, todos da CF/88.

Os artigos constitucionais supracitadostêm gerado na doutrina classificações dife-renciadas, pois os bens elencados no artigo20 da CF/88 são chamados de bens públi-cos, em contraposição aos bens privados.Uma vez classificados como bens públicos,são os mesmos classificados em função dadestinação em uso comum, especial e domi-nical. Já os bens constantes nos artigos 216 e225 são chamados de bens ambientais, osprimeiros culturais e os segundos naturais erecebem a classificação de difusos ou de in-teresse público, que têm por base a indivisi-bilidade do mesmo. Constantemente as ca-vidades naturais subterrâneas são chamadasde bens ambientais naturais e culturais. Faceàs inúmeras classificações, torna-se necessá-rio analisar qual é a classificação do bem, ouseja, é bem público ou não?

2 As cavidades naturais subterrâneas

O parágrafo único do art. 1o do De-creto 9556/90 conceitua a cavidade naturalsubterrânea como

[...] todo e qualquer espaço subterrâneopenetrável pelo homem com ou sem abertu-ra identificada, popularmente conhecidocomo caverna, incluindo seu ambiente,

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conteúdo mineral e hídrico, a fauna e a floraali encontrados e o corpo rochoso onde osmesmos se inserem, desde que a sua forma-ção haja ocorrido por processos naturais, in-dependentemente de suas dimensões ou dotipo de rocha encaixante. Nesta designaçãoestão incluídos todos os termos regionais,tais como gruta, lapa, toca, abismo, furna eburaco.

As cavidades são formações subterrâ-neas constituídas por espaços vazios dispos-tos horizontal e verticalmente, com presençasde fraturas e fendas irregulares, causadaspela ação de águas aciduladas provenientesdas chuvas e dos cursos de superfícies. A es-cassez de luz e a pequena variação de umi-dade e temperatura abrigam seres altamenteespecializados, cegos ou albinos, diversos ti-pos de morcegos e plantas não clorofiladas,o que as torna ambientes frágeis, delicados ediferenciados. Abrigam também os espeleo-temas, deposições minerais em cavernas, for-mados por processos químicos de dissoluçãoe precipitação que produzem ornamentaçõesminerais de rara beleza. Soma-se ainda o fatode geralmente, conservarem vestígios fósseis,pinturas rupestres, sepultamentos, restos defogueira e outros testemunhos arqueológicose paleontólogos.

São consideradas patrimônios naturais,culturais, científicos e turísticos. A justifica-tiva para tal fato se dá pelos muitos interessesque despertam. Conforme Lino & Allievi(1980, p.7)

A entrada de uma caverna nunca se repetena forma, mas é sempre igual no sentimentoque desperta quando a encaramos pela pri-meira vez: temor, desejo, respeito e ansie-dade...São entradas para uma nova dimen-são, de um mundo envolto em mistério e ondea escuridão e o silêncio andam de mãos da-das. Encerra-se aqui o mundo da luz, do ver-de vegetal, do calendário, das estações e dopróprio homem, que aqui não passa de in-truso, um visitante ocasional.

O estudo da caverna desperta o inte-resse de vários ramos da ciência, além daEspeleologia, como a Geologia, a Biologia, aPaleontologia e Arqueologia, a Ecologia en-tre outros. As formações e dimensões de al-gumas cavidades destacam-se pela rarida-de em que ocorrem. No Brasil existem cavida-des que se destacam tais como: a) Toca daBoa Vista, na Bahia, com 65,5 quilômetrosde desenvolvimento é considerada a maior

gruta da América do Sul e a 19a do mundo;b) Gruta Casa da Pedra, em São Paulo, con-siderada a mais alta entrada de cavernas,com 215 metros de altura; c) Grutas dasBromélias, em Minas Gerais, considerada amaior caverna horizontal em quartzito domundo, com 2.560 metros; d) Caverna doCentenário, em Minas Gerais, consideradoo segundo mais profundo abismo emquartzito do mundo, com 360 metros de des-nível; e) a Gruta dos Ecos, no Distrito Fede-ral, é a maior caverna em micaxisto conhe-cida, com 1.380 metros de comprimento,apresentando ainda um lago subterraneocom 300 metros de comprimento e f) a Grutado Janelão, em Minas Gerais, possui a maiorestalactite do mundo, com 28 metros (LINOe ALLIEVI, 1980).

Seguno LINO & ALLIEVI, a “presen-ça de gigantescos salões subterrâneos, cacho-eiras com mais de 20 metros de queda, lagoscom mais de 120 metros de profundidade eenormes espeleotemas”, aliados “ao grandepotencial de descoberta de novas cavida-des”, contribuem para transformar o Brasilem um dos países mais procurados por ex-pedições espeleológicas internacionais.

A Geologia tem um campo fértil paraestudo de formações minerais diferenciadasque ocorrem dentro das cavidades, como ossedimentos clásticos e os espeleotemas. Emestudos foram encontrados aproximadamen-te 80 tipos de minerais, sendo 20 comumenteencontrados. No Brasil os mais comuns são:calcita, aragonita, gipsita, goetita, malaquitae calcedônia(LINO & ALLIEVI, 1980, p.40).Os espeleotemas adquirem forma e colora-ção diferentes que instigam os cientistas, sen-do que muitos ainda não possuem uma cer-teza quanto a origem e o porquê da formaapresentada. Os tipos que mais ocorrem são:estalactite, estalagmite, coluna, cortina,helictite, flores de aragonita, cascata de pe-dra, cristais “dente de cão”, pérolas de caver-nas, vulcões e represas de travertino (LINO& ALLIEVI, 1980, p.43).

A flora e a fauna encontrada no inte-rior das cavidades são compostas por seresaltamente especializados que não conseguemviver em outro habitat. Segundo Lino &Allievi (1980, p. 85), os troglóbios (animaiscavernícolas), apresentam como caracterís-ticas freqüentes: órgãos de visão inexistentes

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ou atrofiados; despigmentação; ausência deasas nos insetos; crescimento maior dosapêndices, tais como antenas, palpos, cíliose patas e alta sensibilidade química e mecâ-nica. A flora mostra-se muito diferente de-vido à presença ou ausência de luz, no pri-meiro caso abriga uma flora rica e perene,justificada pela maior umidade, menor va-riação climática, abrigo dos ventos, acúmulode nutrientes e maior proximidade da água.No segundo caso é praticamente impercep-tível a olho nu, composta por fungos e algas,muitas vezes de tamanho microscópico.

A cavidade subterrânea é um local dedepósito de vários tipos de sedimentos apre-sentando-se como local propício para a ar-queologia e a paleontologia. Em estudos rea-lizados em algumas cavidades foram encon-trados fósseis pré-históricos, que datam dopleistoceno e plioceno. As grutas da regiãodo Vale do Ribeira foram pesquisadas pelonaturalista Ricardo Kröne no final do séculopassado, e nelas foram encontrados fósseisde vários animais, dentre eles, roedores, ta-tus, lebres, felinos, porcos-do-mato, veados,preguiças, morcegos e marsupiais. Arqueó-logos têm se dedicado ao estudo de algunssítios encontrados nas cavernas, compostosde esqueletos, sepultamentos, petróglifos,ossos e conchas trabalhados, cerâmicas, res-tos de fogueiras e painéis pictográficos(SIMÕES, 2008).

Os números de cavidades estudadas noBrasil ainda é muito pequeno, sendo escassosos trabalhos desenvolvidos no sentido deapreender todo o potencial que a cavernapode revelar, sendo que, muitas vezes, pos-suem ecossistemas intactos em seu interior.Soma-se a isso o papel da água, pois alémde ser responsável pela própria formação dascavidades, apresenta-se como fonte de rea-bastecimento.

Muitas cavidades são procuradas porfins religiosos e tornam-se templos religiosos,visitados por milhares de peregrinos anual-mente como as grutas de Bom Jesus da Lapa,na Bahia e Lapa da Terra Ronca, em Goiás.Outras atraem pela beleza cênica e o espíri-to de aventura, que decorrem da presençade grandes entradas e salões internos, lagose cachoeiras subterrâneas, e os espeleotemas.Atualmente existem mais de 50 cavernasturísticas espalhadas pelo País, destacando-

se: a) em São Paulo: Caverna de Santana eCaverna do Diabo; b) em Minas Gerais:Maquiné, Lapinha e Rei do Mato e Vale doRio Peruaçu; c) no Ceará: Gruta de Ubajara;d) no Paraná: Furnas de Vila Velha, e) noMato Grosso do Sul: Gruta do Lago Azul(LINO & ALLIEVI, 1980).

3 Classificação dos bens

3.1 Dicotomia público/privado

Para Gasparini (2003, p. 682) a locu-ção bens públicos é formada por duas pala-vras “equivocadas”: bem e público. A pri-meira pode ter acepção filosófica ou jurídica,no primeiro caso, “é tudo aquilo que satisfazo homem”, tais como a inteligência, bonda-de, saúde, amor. Em sentido jurídico, “todovalor material ou imaterial que pode ser obje-to de direito”, tais como glebas de terra, cré-ditos, semoventes, livros. A segunda palavrapode expressar o proprietário do bem ou ousuário do bem, no primeiro caso, a União,os Estados-membros, Municípios e no segun-do o usuário, administrado, povo, público.

No mesmo sentido Meirelles (1995)afirma que bem público, ora significa o “po-der que o Estado exerce sobre os bens pró-prios e alheios”, ora designa a “condiçãodesses bens”. Pode significar ainda “o con-junto de bens destinados ao uso público (di-reto ou indireto – geral ou especial – uti singuliou uti universi), como pode designar o regimea que se subordina esse complexo de coisasafetadas de interesse público” (MEIRELLES,1995, p. 432).

A equivocidade gerada pelo termogera divergências entre o conceito legal e odoutrinário, pois o primeiro tem por base atitularidade do bem e a doutrina tem prefe-rido o regime jurídico aplicável aos bens, ounotas características desse regime.

O Código Civil de 1916 estabeleceu noseu artigo 65 a dicotomia entre a titularidadedos bens, em público e privado: “São públi-cos os bens de domínio nacional pertencen-tes à União, Estados ou aos Municípios. To-dos os outros são particulares, seja qual forapessoa a que pertencem”. Tal redação foimantida pelo atual Código no artigo 98. Ocritério utilizado pelo Legislador ordináriofoi o da propriedade, ou titularidade.

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Bandeira de Mello (2005, p. 838) en-tende ser insuficiente a conceituação de benspúblicos dada pelo Código Civil, pois o Có-digo adota como critério a propriedade quan-do o correto seria o regime jurídico aplicadoao bem. Para o autor “todos os bens que es-tiverem sujeitos ao mesmo regime públicodeverão ser havidos como bens públicos”.Por este prisma, todos os bens regidos peloregime de direito público, seriam bens pú-blicos, ainda que a propriedade pertencessea um particular. A justificativa está afetaçãodo bem a um interesse público que geraria aparalisação do direito subjetivo pela aplica-ção da relação de administração. Por estateoria o rol de bens públicos seria maior queos previstos no Código Civil.

Meirelles (1995) também entende queo rol dos bens públicos é maior que o elen-cado pelo Código civil. O autor conceitua o“domínio público” em sentido amplo e res-trito. No primeiro: “é o poder de dominaçãoou de regulamentação que o Estado exercesobre os bens do seu patrimônio (bens públi-cos), ou sobre o patrimônio privado (bensparticulares de interesse público), ou sobreas coisas inapropriáveis individualmente,mas de fruição geral pela coletividade (resnullius)”. Incluem-se neste sentido as águas,as jazidas, as florestas, o espaço aéreo e osbens que interessam ao patrimônio históricoe artístico nacional. Em sentido restrito, sub-divide em domínio patrimonial e eminente.O primeiro se aplica aos bens pertencentesàs entidades públicas, e pode ser bens dodomínio público (bens de uso comum dopovo) ou bens patrimoniais indisponíveis(uso especial) ou disponíveis (dominicais).Enquanto o segundo sobre todas as “coisasde interesse público”. O domínio eminentedecorre do poder de soberania do Estado,que o autoriza a submeter os bens a um re-gime diferenciado, o que ocorre, por exem-plo, quando estabelece limitações, servidões,tombamentos e desapropriações (MEIRELLES,1995, p.432).

Para Di Pietro (2005) a conceituaçãodo bem deve ocorrer em razão do aspectojurídico, ou seja, em função do regime quese diferencia conforme a destinação do bem,que pode se dar por natureza ou por lei.Adota a dicotomia bem público/privado,todavia subdivide os bens públicos em dois,

de domínio público e de domínio privado doEstado. Entre os bens de domínio públicoestariam os de uso comum, insuscetíveis devaloração patrimonial e os de uso especial,com valoração patrimonial, todavia indispo-níveis. Os bens dominicais pertenceriam aodomínio privado e, portanto, possuiriam va-loração econômica e possibilidade de aliena-ção, desde que obedecido o procedimentolegal. Frisa que existem apenas dois regimes,o público aplicado aos bens de domínio pú-blico e o parcialmente privado, aplicados aosbens de domínio privado (DI PIETRO, 2005,p. 579-580).

Para Fiorillo (2000) existe uma tricoto-mia, além dos públicos e privados, existemos difusos que foram disciplinados pela Lei8078/90 que teria criado a “estrutura quefundamenta a natureza jurídica de um novobem, que não é público nem privado: o bemdifuso”. Este bem seria indivisível e transin-dividual, ou seja, há a impossibilidade defracionamento dos bens pela vontade daspartes ou da lei e também a indeterminaçãodos sujeitos, pois a importância do bem trans-cenderia a esfera individual. Para o autor, adiferença entre o bem difuso e o público re-side na titularidade, um pertence a toda acoletividade e o outro ao Estado. Afirma ain-da que bens de uso comum do povo erronea-mente são tratados como públicos e justificaa sua tese no texto constitucional vigenteuma vez que a própria Constituição Federalteria separado o patrimônio público de ou-tros bens, como o meio ambiente, tanto noartigo 5o, LXIII e LXXIII, quanto no art. 129,III e que o art. 225, expressamente determi-na que o meio ambiente é um bem de usocomum do povo. Por esta teoria o rol de benspúblicos é menor do que o previsto no CódigoCivil, pois os bens ambientais, consideradospúblicos de uso comum do povo, seriamdifusos e os entes políticos teriam apenas asua gestão e não a propriedade (FIORILLO,2000, p. 49-54).

Silva (1997) também utiliza de umatricotomia, dividindo os bens em públicos,privados e de interesse público. Seriam deinteresses públicos os bens que independenteda propriedade estariam “subordinados auma particular disciplina para a consecuçãode um bem público”. Estariam subordinadosa um regime jurídico peculiar relativamente

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a seu gozo e disponibilidade e também a umparticular regime de polícia, de intervençãoe de tutela pública. A disciplina teria porobjetivo o controle do seu uso que pode serbem de interesse público de “circulação con-trolada e uso controlado”. Para o autor es-tariam entre os bens de interesse público, “osbens imóveis de valor histórico, artístico, ar-queológico, turístico e as paisagens de notá-vel beleza natural, que integram o meio am-biente cultural, assim como os bens que in-tegram o meio ambiente natural”. Afirmaainda o autor que existem bens de interessepúblico que são insuscetíveis de apropriaçãoprivada, como o ar e a água que seriam bensde uso comum do povo (SILVA, 1997, p. 56).

As teorias apresentadas trabalham doiscritérios, a propriedade do bem e o regimejurídico. Ambos os critérios serão objetos deanálises. A CF/88 e diversas leis estabelecemquais são os bens considerados públicos e asregras para os bens considerados privados.Partindo-se da análise da CF/88, art. 20 e26, pode-se falar que as terras tradicional-mente ocupadas pelos índios, os terrenos demarinha, o mar territorial, as jazidas mine-rais, os potenciais de energia hidráulica, ossítios pré-históricos e arqueológicos e as ca-vidades naturais subterrâneas, são bens daUnião. E que as águas superficiais ou sub-terrâneas que não decorram de obras daUnião e que se encontrem em território bra-sileiro pertencem aos Estados-membros ouao Distrito Federal. Aplicando-se este crité-rio só poderão ser considerados bens públicosos que estão expressamente determinadospor lei, sendo os demais, privados.Todavia,existem bens que não estão na propriedadede pessoa alguma, pois foram consideradospelas leis como inapropriáveis, como o ar,as águas internacionais, bem como algunsespécimes da flora e da fauna.

Quanto ao regime jurídico, há diver-gência entre as notas diferenciadoras do re-gime jurídico. Para Bandeira de Melo (2005),todos os bens que pertençam às pessoas ju-rídicas de direito público interno, mais ospertencentes aos particulares que sirvam àprestação de um serviço público, seriam con-siderados bens públicos, pois estariam sujei-tos aos princípios de direito público. Já a pro-fessora Di Pietro (2005) diferencia os benspúblicos e privados pela titularidade e de-

pois subdivide os bens públicos através daanálise de sua destinação, ou seja, estar ounão destinado (afetado) a um interesse pú-blico. No primeiro caso (uso comum e espe-cial), submetem-se a um regime jurídico pú-blico, que tem por suporte dois princípios, asupremacia do interesse público sobre o pri-vado e a indisponibilidade pela administra-ção do interesse público. Na segunda hipó-tese (dominicais), o regime aplicado será par-cialmente privado, podendo a Administra-ção recorrer a institutos típicos do direitoprivado, como por exemplo, a alienação, lo-cação, cessão etc.

Ao analisar os regimes jurídicos apli-cados aos bens, identificam-se pelo menostrês regimes, o público, o privado e o parcial-mente público. No primeiro caso, os benssofrem a incidência de princípios de direitopúblico, como é o caso dos bens de uso co-mum e especial pertencentes às pessoas ju-rídicas de direito público interno. No segun-do caso, as normas que regem os bens sãoexclusivas do direito privado. No terceirocaso, há aplicação parcial dos regimes, in-dependente da titularidade do bem. Caso obem pertença a uma pessoa jurídica de di-reito público interno, e for considerado do-minical, aplica-se a impenhorabilidade eimprescritibilidade, todavia não se aplicasempre a inalienabilidade, pois é possível aalienação de alguns bens, desde que obede-ça ao procedimento previsto em lei. Permi-tem-se também, algumas formas de uso ex-clusivo do bem, típicas do direito privado,como a locação e o comodato, desde que al-teradas para obedecerem aos princípios ge-rais de direito público que regem a Admi-nistração. O regime parcial também se apli-ca aos bens pertencentes a pessoas regidaspelo direito privado, que são consideradosessenciais a prestação de um serviço público,pois, estes sofrem a derrogação de princípios,agora privados, pois o serviço público seráregido por princípios de direito público queatingirão os bens e prevalecerão sobre os dedireito privado. Como é o caso dos bens dosconcessionários, essenciais à prestação deserviços públicos, que recebem o benefício daimpenhorabilidade.

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3.2 Bem de uso comum do povo

O art.98 do Código Civil classifica obem público em bem de uso comum do povo,bem de uso especial e dominical. O únicobem conceituado é o dominical “constituemo patrimônio das pessoas jurídicas de direitopúblico, como objeto de direito pessoal oureal, de cada uma dessas entidades”.

Para os bens de uso comum, são “osdestinados ao uso indistinto de todos”; os deuso especial, são os “afetados a um serviçoou estabelecimento público” e os dominicais,são os “próprios do Estado como objeto dedireito real, não aplicados nem ao uso co-mum, nem ao uso especial, tais os terrenos eterras em geral, sobre os quais tem senhoria,à moda de qualquer proprietário, ou que, domesmo modo, lhe assistam em conta de di-reito pessoal” (BANDEIRA DE MELLO,2005, p. 838).

Para Gasparini (2003) os bens de usocomum “são as coisas móveis ou imóveis per-tencentes ao Poder Público (União, Estado-membro, Município, Distrito Federal), usá-veis sem formalidade, por qualquer dopovo”. Continua dizendo que “o uso e gozodesses bens é permitido a qualquer ser hu-mano, sem distinção entre nacionais e es-trangeiros, pessoas físicas ou jurídicas, ouentre pessoas públicas ou privadas”. E aindaque “para esse uso e gozo nada se exige emtermos de autorização ou permissão”(GASPARINI, 2003, p. 685).

No mesmo sentido Di Pietro (2005), ouso comum é o “que se exerce, em igualdadede condições, por todos os membros da cole-tividade”. É “aberto a todos ou a uma coleti-vidade de pessoas, para ser exercido anoni-mamente, em igualdade de condições, semconsentimento expresso ou individualizadopor parte da Administração”. Afirma aindaque o bem de uso comum pode ser ordinárioou extraordinário e recorre a Diogo doAmaral (1972, p. 108), para apresentar asdiferenças. No uso ordinário, o bem estariasujeito as seguintes regras: a) generalidade(exercidos por todos); b) liberdade (dispen-sada autorização prévia); c) igualdade (igual-dade de condições a todos); d) gratuidade(dispensa qualquer prestação pecuniária). Noextraordinário aplica-se exceção a algumadas características, causando alterações par-

ciais ao regime que não possuem o condãode transformá-lo em especial. Pode-se citarcomo exemplo a limitação ao número de pes-soas, ou a categoria de pessoas, a exigênciade licença ou autorização para utilizar obem, a cobrança etc. Afirma ainda que (598)os bens de uso comum geram dois tipos dedireitos para o administrado: a) a participa-ção do interesse coletivo na preservação euso do bem, como membro da coletividadee b) como usuário do bem, apresentando-secomo “titular de um direito subjetivo públi-co, defensável na via administrativa e judi-cial”. (597-600)

O bem de uso comum pode ocorrerpela própria natureza ou por ato jurídico.No primeiro caso o bem é de uso comum enão pode ser transformado em dominical,pois há a impossibilidade de desafetação domesmo, como por exemplo, os mares e rios.Existem bens que se tornam de uso comumpor determinação de um ato jurídico comoas praças, as ruas, os passeios públicos etc.Neste caso, há a possibilidade de transfor-mação dos bens em dominicais por meio deato jurídico, tome-se por exemplo, a necessi-dade de urbanização de uma determinadaárea do Município que leva à desapropriaçãopor zona de uma grande área que irá com-por a nova feição da cidade. Aqui ocorreráa transformação dos bens de uso comum emdominicais.

3.3 Os bens ambientais

Para Fiorillo (2000) os bens ambientaissão bens difusos e apresentam duas caracte-rísticas: bens de uso comum do povo e bemessencial à sadia qualidade de vida. Diz queo art. 225 da CF/88 configurou uma novarealidade jurídica: pois fixa “a existência deuma norma vinculada ao meio ambiente eco-logicamente equilibrado, reafirmando, ain-da, que todos são titulares desse direito”. Econtinua dizendo que “não se reporta a umapessoa individualmente concebida, mas sima uma coletividade de pessoas indefinidas,o que demarca um critério transidividual, emque não se determinam, de forma rigorosa,os titulares do direito”. O bem de uso comumdo povo é um bem que pode ser “desfrutadopor toda e qualquer pessoa” e que este uso,deve ser nos limites que assegure “às

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próximas gerações as mesmas condições queas presentes desfrutam”. Frisa ainda que “to-dos poderão utilizá-lo, mas ninguém poderádispor dele ou então transacioná-lo”. O ou-tro fator é ser considerado como bem essen-cial à sadia qualidade de vida, que implica-ria em garantir a dignidade da pessoa hu-mana. Afirma que uma vida com dignidade“reclama a satisfação de valores (mínimos)fundamentais descritos no art. 6o da Consti-tuição Federal”. Diz que a Constituição fixaum “piso vital mínimo de direitos” que deveser assegurado pelo Estado. (53). Elencacomo bens tipicamente difusos os que estãono art. 20, III, IV, V e VIII da CF/88(FIORILLO. 2000, p. 52).

Não se pode falar em bem ambientalsem trazer a lume o que se entende por meioambiente e a classificação utilizadas pelosdoutrinadores. A Lei n. 6938/81 (Lei de Po-lítica Nacional do Meio Ambiente), em seuart. 3o, I, conceitua “meio ambiente, o con-junto de condições, leis, influências e inte-rações de ordem física, química e biológica,que permite, abriga e rege a vida em todasas suas formas”.

Para Fiorillo (2000) a Constituição“buscou tutelar não só o meio ambiente na-tural, mas também o artificial, o cultural e odo trabalho”, pois o objetivo da preservaçãodo meio ambiente é o de tutelar a vida sau-dável. Partindo-se dessa classificação tem-se que: a) meio ambiente natural ou físico éconstituído por solo, água, ar atmosférico,flora e fauna e constitui a homeostase, “con-sistente no equilíbrio dinâmico entre os seresvivos e o meio em que vivem”; b) meio am-biente artificial: “compreendido pelo espaçourbano construído, consistente no conjuntode edificações (chamado de espaço urbanofechado), e pelos equipamentos públicos (es-paços urbano aberto)”; c) meio ambiente cul-tural: “traduz a história de um povo, a suaformação, cultura e portanto, os próprios ele-mentos identificadores de sua cidadania”ed) meio ambiente do trabalho: “local ondeas pessoas desempenham suas atividadeslaborais, sejam remuneradas ou não, cujoequilíbrio está baseado na salubridade domeio e na ausência de agentes que compro-metam a incolumidade físico-psíquica dostrabalhadores, independente da condiçãoque ostentem” (FIORILLO, 2000, p. 19-21).

Para Silva (1997, p. 96) os bens am-bientais são “bens de interesse público” eseriam dotados de um “regime jurídico espe-cial, enquanto essenciais à qualidade de vidae vinculados, assim, a um fim de interessecoletivo”. Para o autor, é inegável que osbens que compõem o meio ambiente culturale natural são de interesse público, indepen-dente da propriedade.

4 Cavidade natural subterrânea: bem deinteresse público

Existem vários critérios utilizados paracaracterizar os bens, o que consequentemen-te conduz a várias classificações, algumasmais úteis que as outras. Logo a tarefa docientista do direito é adotar a que lhe pareceútil e que corresponde às notas sacadas nomomento do estudo do objeto. Esse é o obje-tivo desse trabalho, apontar qual o critérioútil para estabelecer a natureza da cavida-de natural subterrânea.

A classificação dos bens obedece nor-malmente a dois critérios, o da titularidadee o formal, neste analisa-se o seu regime jurí-dico. Como bem observado por Gasparini(2003), o vocábulo bem público, possui signi-ficações díspares, pois a mesma nomenclatu-ra pode ser utilizada tanto para designar atitularidade, ou seja, a quem pertence o bem,como a quem ele serve, ou seja, o usuário dobem. Adotando-se o critério da titularidadeas cavidades naturais subterrâneas, seriambens públicos, pois indubitavelmente, porforça expressa do art. 20, X, da CF/88, per-tencem à União, pessoa jurídica de direitopúblico. Todavia a titularidade do bem nãoapresenta ser o mais útil, pois como bem fri-sado por diversos autores, o regime jurídicoseria o melhor critério para identificação dosbens.

Adotar-se a dicotomia bens públicos eprivados adotados por alguns autores, comoBandeira de Mello (2005), apresentaria umbom resultado para diferençar os bens pú-blicos dos privados, o que facilmente se che-garia ao analisar as duas notas: a quem obem pertence e a aplicação de princípioscomo a impenhorabilidade, imprescritibili-dade e inalienabilidade. Entretanto serianecessário subclassificar os bens públicospara realmente distinguir as notas que

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interessam ao presente trabalho e para tan-to a subclassificação que tem por base a des-tinação do bem, comumente utilizada e quesepara os bens em de uso comum, especial edominical também não respondem a con-tento.

A classificação dos bens públicos quan-to à destinação tem por base a afetação dobem a um interesse público, dessa forma, osbens de uso comum e de uso especial estãoafetados, enquanto os dominicais, desafeta-dos. Aos bens de uso comum são atribuídascomo características o uso indistinto e igua-litário, independente de autorização do po-der público. Esta é a classificação utilizadapor àqueles que consideram os bens ambien-tais como de uso comum e que tem sido apli-cada às cavidades, tanto pelo aspecto de serconsiderada bem natural quanto patri-monial.

Não existem dúvidas sobre a importân-cia que as cavidades naturais subterrâneaspossuem, mas pelo seu ambiente frágil e de-licado, não se pode dizer que é bem de usocomum do povo, pois a visitação às cavida-des obedece a um forte regramento estabe-lecido pelo Poder público e que tem por basea própria preservação do bem. Conforme acavidade, o poder público pode ou não auto-rizar a visitação e uma vez autorizada, édemarcado um perímetro em seu interiorpara a visitação e realização de algumas prá-ticas como o mergulho.

A classificação da cavidade como deuso especial também não se aplica, pois es-tes se configuram como os bens que servemàs repartições públicas ou que são essenciaisà prestação de um serviço público. Tambémnão se aplica a dominical, pois estes são dodomínio do estado e não atendem a qualquerfinalidade de interesse público, tanto que sãoos únicos bens que podem ser disponibili-zados ou serem utilizados por particularespor intermédio de instrumentos típicos dodireito privado, respectivamente, a venda ea locação, seriam exemplos. A cavidade é umbem inalienável, ainda que o particular ad-quira a terra, na qual esteja a cavidade, estacontinuará pertencendo à União, além dis-so, a União não poderá alienar a cavidade,ainda que realize uma licitação. Não parecebom senso concluir que a cavidade seja umbem dominical que aguarda a afetação uma

vez que a sua natureza reclama a atençãodo poder público no sentido de preservá-la,não só pela beleza cênica mas também peloseu ecossistema.

Não foi aceita a classificação do bemdifuso de natureza ambiental por váriasquestões: primeiro, porque há uma confu-são entre o público e o difuso, principalmentequanto à substituição da titularidade do bem,pois é difícil sustentar que a Constituiçãoafirma que a cavidade é um bem da União,mas que na realidade não é pois pertence atodos; segundo, porque a delineação dos li-mites também apresentam-se inexatos, a re-lação entre os bens ambientais naturais e osculturais são tênues em muitos momentos.

Optou-se pela classificação tricotômicade Silva (1997, p. 56), ou seja, a cavidadenatural subterrânea é um bem de interessepúblico, pois está sujeita, “a uma particulardisciplina para a consecução de um bempúblico”. O ambiente especial da cavidadenatural subterrânea obriga o poder públicoa implementar um forte regramento que tempor objetivo a preservação do bem, sendo quea sua utilização por particulares só será per-mitida se ocorrer em consonância com osprincípios conservacionistas.

Conclusão

A cavidade natural subterrânea temem seu interior um ambiente frágil e delica-do, decorrente de um ecossistema diferencia-do. Soma-se a isso a existência de reservató-rios de águas e de objetos de forte apelo cê-nico, como os espeleotemas, as quedasd’água, sumidouros, ressurgências, cachoei-ras, lagos e rios subterrâneos. Há também agrande possibilidade de encontrar vestígioshistóricos relacionados à arqueologia e pa-leontologia.

Embora pertença à União, o bem nãopode ser considerado apenas como bem pú-blico, pois a sua destinação não se enquadraem nenhuma das classificações do bem pú-blico, visto que falta à cavidade característi-cas inerentes às classificações dos bens pú-blicos. Não pode ser considerada bem de usocomum do povo, visto que sua utilização estácondicionada a regras estabelecidas pelopoder público, relacionadas à preservação eque condicionam o “usuário” ou visitante, a

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uma autorização especial, dito de outra for-ma, não cabe o uso concorrente e indistintode todos, sem autorização prévia, sendo que,há ainda a possibilidade de ser proibida avisitação. Por outro lado, não é possívelconsiderá-la bem dominical, pois não existesem o seu interior, é impossível, separá-la dosespeleotemas, dos animais cavernículas, daságuas, das reminiscências históricas, etc.,tanto que a lei a considera patrimônio natu-ral e cultural. A preservação da cavidade éde interesse de todos e não só da União.Quando a União estabelece as regras de pre-servação e uso sustentável, o faz em nomedo interesse público primário e não secun-dário. Adota-se, portanto, neste trabalho atricotomia proposta por SILVA, na qual acavidade natural subterrânea é um bem daUnião de interesse público e sujeita a um forteregramento que decorre da preservação doseu uso.

Referências

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BANDEIRA DE MELLO, C. A. Curso de direitoadministrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

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FIORILLO, C. A. P. Curso de direito ambiental brasileiro.São Paulo: Saraiva, 2000.

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Teoria e práticaExperiência Compartilhada –

Jardim Sayonara –Campo Grande-MS

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Performances comunitárias e vieses teóricos sobre potencialidades de participaçãono Jardim Sayonara – Campo Grande-MS – em ótica de Desenvolvimento LocalCommunitary performances and theoretical points of view about potentialities of

participation at Jardim Sayonara – Campo Grande-MS – under a perspective of LocalDevelopment

Performances communautaires et points de vue théoriques sur des potentiels departicipation au Jardin Sayonara – Campo Grande-MS – en perpective de

Développement LocalPerformances comunitárias y sesgos teóricos sobre potencialidades de participación en

Jardin Sayonara – Campo Grande-MS – en perspectiva de Desarrollo Local

Ione de Souza Coelho*Vicente Fideles de Ávila**

Aceite

Resumo: Esta matéria se refere à pesquisa, norteada por critérios fenomenológicos básicos da pesquisa qualitativo-descritiva, realizada no Jardim Sayonara de Campo Grande-MS, ao longo do biênio 2005-06, com o objetivo deidentificar e analisar potencialidades de participação, nessa territorialidade, compatíveis com implementação deDesenvolvimento Local. Neste texto, as abordagens não apenas se voltam sobre as principais ênfases dessa pesquisa,como também acrescentam observações teóricas e interpretativas, destacando, além de esclarecimentos introdutórios(item 1): contexto de territorialidade do Jardim Sayonara (item 2); relação entre vieses teóricos, informações eperformances de participação (item 3); três importantes ponderações decorrentes, com explicitação de aspectosteóricos básicos implicados em dinâmicas de comunitarização para DL (item 4); e destaques rememorativo-conclusivos(item 5).Palavras-chave : Potencialidades de participação. Desenvolvimento Local. Fenomenologia comunitária.Comunitarização em Desenvolvimento Local.Abstract: This paper presents and discusses a descriptive-qualitative phenomenological research conducted at theSayonara Garden, a neighbourhood of the city of Campo Grande-MS, from 2005 to 2006, aiming at identify andanalise potentialities of participation, inside this territoriality, compatible with the implementation of local development.This text enlarges the discussion of the original research, thus pointing to (1st) some introductory informations; (2nd)the context of territoriality of Sayonara Garden; (3rd) relationship between theoretical views, informations andperformances of participation; (4th) three important considerations that follow, developing basic theoretical aspectsimplied in comunitarization dynamics to Local Development; and, finally, (5th) some final summary conclusions.Keywords: Potentialities of participation. Local Development. Communitary phenomenology. Comunitarization inLocal Development.

Résumé: Cet article concerne à une recherche guidée par des critères phénoménologiques essentiels de la recherchequalitative-descriptive, qui a eu lieu au Jardin Sayonara, un quartier de Campo Grande-MS, pendant les années 2005et 2006, avec l’objectif d’indentifier et analyser des potentiels de participation, dans cette territorialité, compatiblesavec la mise en ouvre du Développment Local. Dans ce text, les approches ne se revienent pas seulement auxprincipaux emphases de cette recherche, ainsi qu’ajoutent des remarques théoriques et interpretatives, en mettantl’accent, en plus d’éclaircissements introductives (section 1), sur les autres suivantes sections: contexte de territorialitédu Jardin Sayonara (2); rapport entre vues théoriques, informations et des performances de participation (3) ; troisimportantes pondérations conséquentes, avec l’explicitation d’aspects théoriques essentiels, impliqués en dynamiquesde communauté pour Développement Local (4) ; et remarques de remises conclusives (5).Mots-clés: Potentiels de participation. Développement Local. Phénoménologie communautaire. Communauté enDéveloppement Local.

* Graduada em Serviço Social e Mestre em Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco-UCDB,de Campo Grande-MS; Assistente Social concursada do Município de Campo Grande-MS; ex-Superintendente daPolítica de Assistência Social na Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social (SETAS/MS); atual Gerentede Unidade Básica de Saúde da Família, da Secretaria Municipal de Saúde Pública; e docente da disciplina PolíticaSocial II no curso de Graduação em Serviço Social da UCDB. E-mail: [email protected]** Doutor em Políticas e Programação do Desenvolvimento pela Université de Paris I/Panthéon-Sorbonne/França; professor aposentado da UFMS; atual docente das disciplinas Teoria do Desenvolvimento Local (obrigatória)e Desenvolvimento Local, Comunidade e Comunitarização (optativa) no Programa de Pós-Graduação-MestradoAcadêmico em Desenvolvimento Local da Universidade Católica Dom Bosco–UCDB, de Campo Grande-MS; eCoordenador do Projeto de Pesquisa “Essência Consitutiva de Comunidade no Prisma do SesenvolvimentoLocal”, viculado ao referido Programa e cadastrado no CNPq. E-mail: [email protected].

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Resumen: Esta materia se refiere a la pesquisa conducida por criterios fenomenológicos básicos de pesquisa cualitativo-descriptiva, realizada en Jardim Sayonara de Campo Grande-MS, durante los años 2005 y 2006, con el objetivo deidentificar y analizar potencialidades de participación en esta territorialidad, compatibles con implementación deDesarrollo Local. En este texto, los abordajes no solamente se vuelven sobre los principales énfasis de esta pesquisa,como también añaden observaciones teóricas e interpretativas, destacando, además de aclaraciones introductorias(artículo 1): contexto de territorialidad del Jardin Sayonara (art. 2); relación entre sesgos teóricos, informaciones yperformances de participación (art. 3); tres importantes ponderaciones consecuentes, con explicitación de aspectosteóricos básicos implicados en dinámicas de comunitarización para Desarrollo Local (art. 4); y destaques rememorativo-conclusivos (art. 5).Palabras clave : Potencialidades de participación. Desarrollo Local. Fenomenologia comunitária. Comunitarizaciónen Desarrollo Local.

Introdução

A presente matéria se relaciona com aefetiva dinâmica de atuação compartilhadano Grupo de Pesquisa “Essência Constitutivade Comunidade no Prisma de Desenvolvi-mento Local”, cadastrado no Conselho Na-cional de Desenvolvimento Científico eTecnológico-CNPq, vinculado ao Programade Mestrado em Desenvolvimento Local, daUniversidade Católica Dom Bosco-UCDB.

Pretendeu-se, pela pesquisa a que estamatéria se refere, conhecer e analisar tipos epotencialidades de participação na territoria-lidade do Jardim Sayonara, à frente detalha-damente descrito, na ótica do Desenvolvi-mento Local (DL).

A investigação se pautou por procedi-mentos de Pesquisa Qualitativo-Descritiva,com visitas in loco, observações, registros,Análise de Conteúdos, interpretações eclassificações de fatos . Isso também reque-reu aplicação de formulário e entrevistassemi-estruturadas, gravadas e transcritas. Aanálise foi baseada na realidade estudada econsubstanciada no que se refere à visão demundo e interações dos pesquisados, tantoquanto possível nos prismas, por um lado,de abordagens fenomenológicas (retro-pros-pectivas) e, por outro, de referências lógico-teóricas do DL. Isso, em virtude de que, se-gundo Masini (1999, p. 66), “[...] o enfoquefenomenológico constitui-se, pois, como eta-pas de compreensão e interpretação do fenô-meno, que pode ser retomado e visto sobnova interpretação”.

As interpretações finais dos resultadosenvolveram discussões com as principais li-deranças e representações do universo po-pulacional focado, que também participa-ram da inicial coleta de dados e informações,obtidos pelos procedimentos acima mencio-

nados. Tais discussões fizeram com que pau-latinamente a metodologia se evoluísse atépara a de pesquisa-participante, vez que aspróprias lógicas e significações concludentesdesses resultados também contaram com oenvolvimento dos pesquisados, principal-mente no que respeita a “Análise de Discur-sos”. Até mesmo os primeiros esboços de con-clusões finais foram submetidos a reuniõesde discussão (sobre fidelidade aos fatos ob-servados ou interpretados) com representan-tes da população.

Essas maneiras procedimentais am-pliaram relações, por um lado, entre teoriae prática, em termos de DesenvolvimentoLocal versus performances comunitárias, e,por outro, também entre “comunidade” pes-quisada e pesquisadores, considerando pes-quisadora-vanguarda a co-autora – desta ma-téria – Ione de Souza Coelho (quando aindaMestranda do Programa de Pós-Graduação– Mestrado em Desenvolvimento Local daUniversidade Católica Dom Bosco-UCDB,de Campo Grande-MS) e pesquisador-reta-guarda o Prof. Dr. Vicente Fideles de Ávila,que, nas simultâneas condições de seu Orien-tador e Coordenador do Projeto de Pesquisamencionado no parágrafo inicial desta Intro-dução, não só acompanhou como tambémpartilhou de todos os passos da pesquisa, doprojeto original aos últimos acabamentospara a defesa da concernente Dissertação (cf.COELHO, 2006).

Aliás, importa notar que a partilha co-autoral nesta matéria se tornou de relevadaimportância, porque as contribuições deambos se intercomplementaram para amplia-ção e aprofundamento da supra-referidarelação entre teoria e prática. Quer-se dizer,pois, que, ao longo da elaboração desta ma-téria, a co-autora (enquanto pesquisadora-vanguarda) se esmerou em trazer à tona

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dados e informações de coletas formais econvivenciais da “comunidade” pesquisa-da. E o co-autor, na supramencionada con-dição de pesquisador-retaguarda e tambémcomo responsável docente pela disciplinaTeoria do Desenvolvimento Local no aludidoMestrado da UCDB, orientou seus esforçosmais para o foco da relação entre perfor-mances comunitárias e vieses teóricos, re-lação esta enfaticamente frisada já no títulogeral que encabeça a presente matéria.

As amostragens dos membros da “co-munidade”, que participaram da pesquisa,se constituíram de: 20 (vinte) moradoresantigos; 14 (quatorze) principais liderançasindicadas pelos moradores; 3 (três) agentesinternos, que atuaram intensamente para aformação e organização da comunidade,sobretudo nas primeiras iniciativas de organi-zação formal da Associação de Moradores,do Clube de Mães e da cata de lixo reciclável;e 3 (três) agentes externos de alguma formainfluentes na dinamicidade do bairro. Aliás,o princípio metodológico que norteou a op-ção por todos os membros dessas amostra-gens foi o do respectivo reconhecimento co-munitário, captado inclusive mediante pré-vias reuniões com várias outras pessoas decomunidade.

A coleta de informações junto aos mem-bros das amostragens assim se procedeu: as14 (quatorze) principais lideranças, aborda-das pessoalmente pela Pesquisadora, forne-ceram respostas a 20 (vinte) questões de umformulário-base-comum e os outros 6 (seis)– dos quais 3 (três) agentes internos e mais 3(três) agentes externos – concederam entre-vistas semi-estruturadas, gravadas em tem-po real e posteriormente grafadas em texto.Constituem-se apêndices, da supramencio-nada Dissertação, tanto o aludido formulá-rio quanto o roteiro das entrevistas e suastranscrições textuais. Depois de processadasas informações (colhidas através de formulá-rio e entrevistas), os resultados aí apuradosforam discutidos com representações de to-das as referidas amostragens, por sistemáticade reuniões-para-discussões e não mais deinstrumentos coletores. Isso quer dizer, pois,que as interpretações de resultados comuni-tários da pesquisa – inclusive as focadas àfrente – se enriqueceram, sobremaneira, aoextrapolarem os horizontes estritamente pes-

soais da Pesquisadora (com seu Orientador)e se tornarem expressões também dessas re-presentações de intenso convívio com a “co-munidade” Sayonara.

Observa-se, ainda, que as próximasseções deste trabalho se constituem de: con-texto de territorialidade do Jardim Sayonara(item 2); potencialidades de participaçãocomunitária nas óticas das lideranças e dosagentes internos e externos (item 3); três im-portantes ponderações resultantes (subitens4.1, 4.2 e 4.3); e destaques rememorativo-conclusivos (item 5).

1 Contexto de territorialidade do JardimSayonara

O Jardim Sayonara, surgido por voltado ano de 1987, se localiza na região oesteda cidade de Campo Grande-MS, a cerca desete quilômetros do centro, tendo como bair-ros limítrofes: Jardim Aeroporto, Vila Popu-lar, Jardim das Reginas, Silvia Regina, AnaMaria do Couto, Jardim do Zé Pereira e NovaCampo Grande.

Situa-se na Região Urbana do Imbirus-su, nas proximidades tanto do Aeroporto In-ternacional “Antonio João”, quanto de ins-talações industriais, de distribuidoras de pe-tróleo e dos Córregos Serradinho e Imbirussu,às margens dos quais se encontra significati-va área de mata ciliar, com aproximadamen-te sessenta hectares.

Desde o início, o Jardim Sayonara re-sultou de movimento migratório, após atransformação do município de CampoGrande em capital do Estado (desmembradodo Estado de Mato Grosso em 1977), à taxamédia de crescimento anual de 7,6% entre1970 e 1980. Posteriormente, também conti-nuou a manter médias relativamente eleva-das de crescimento populacional, fato queocasionou alterações em seu perímetro urba-no, apesar da significativa existência de espa-ços vazios.

A origem desse bairro se relaciona, porum lado, com o Movimento de “MoradoresSem Teto”, originários do interior do Estadode Mato Grosso do Sul, que vieram à capitalcom a esperança de melhores condições devida, de tratamento médico e de escolas paraseus familiares; por outro, a ocupação deterras urbanas naquela área contou com

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apoio de religiosos, por se tratar de pessoasque não dispunham de poder aquisitivo paraa compra de terreno ou casa, mas dependi-am de aluguel ou acolhimento por familiarese amigos. Esse apoio muito contribuiu paraa organização e efetivação da referida ocu-pação (por invasão de área urbana). Portan-to, a busca de lugar para se estabelecer cons-tituiu o principal fator para a definitiva con-solidação de ocupação territorial do bairro.

Quanto ao nome Sayonara, antigosmoradores explicaram que uma família ja-ponesa era a proprietária da área e, a partirda sua convivência com os demais ocupan-tes, tornou-se hábito se despedirem usandoa expressão japonesa sayonará (adeus, atélogo). Em seguida, todo o bairro passou a sedenominar Jardim Sayonara.

O Jardim Sayonara é, pois, uma áreaurbano-periférica com lotes irregulares, mashoje geo-referenciados pelo município e ca-dastrados pela Empresa Municipal de Habi-tação-EMHA, da Prefeitura de Campo Gran-de-MS. A quantidade de moradias é de apro-ximadamente 406 residências, sendo que,desse total, 107 famílias passaram pela frus-trante experiência de remoção do local, nofinal de 2006, conforme observação maisdetalhada no final do subitem 4.3.

Mas, à época inicial da ocupação daárea (1987 aproximadamente), as famílias seexpunham (e viviam de fato) a grave situa-ção de risco social, caracterizada por efeti-vos enfrentamentos, para efeito de rompi-mento dos ciclos-viciosos da pobreza, a co-meçar pela total falta de condições habita-cionais. Todavia, e em verdade, acabaramsaindo de uma e passando para outra situa-ção de risco. Isto, em razão de que a ocupa-ção das margens do Córrego Serradinho logoexigiu novas e rápidas formas de interven-ção como solução social, pois a populaçãoaí residente se tornou alvo exposto a am-bientes de riscos e ameaças, canalizados pelocórrego, mas resultantes dos excessos da“moderna” sociedade de produção indus-trial. E a convivência com tais excessos podelevar à “distorcida” generalização da per-cepção, segundo Beck (1997), de se começara focar todo “[..] o mundo como um risco[...]” ao invés de apenas se identificarem os[“...] riscos do mundo [...]”. Portanto, a traje-tória dessas famílias ocupantes foi marcada,

ainda na década de 1980, por diferentes eta-pas de conflitos com o Poder Público munici-pal, desde a ocupação e demarcação terri-torial até a posse e controle do espaço.

Na seqüência, são rapidamente co-mentadas as seguintes três dimensões ter-ritoriais do Jardim Sayonara: a econômica;a de ambientes construídos de uso coletivo;e a do ambiente natural.

Começando pela dimensão econômi-ca, de início se observa que o bairro todo seconfigura como exposto a grande situaçãode marginalidade e de exclusão social, vistoque a maior parte dos moradores ainda so-brevive de atividades econômicas informais,dentre elas predominando os pequenos ser-viços urbanos e as atividades relacionadas àcoleta e prensa de lixo urbano.

Quanto à diversificação de estabeleci-mentos e à geração de empregos, as ativida-des mais usuais são: prestação de serviçosmecânicos de motocicletas; consertos de bi-cicletas (bicicletaria); transporte com carro-ça (carroceiros); encomendas de salgados(salgadeiras); cabelereiras; bares; padarias;ambulantes; venda de cosméticos; serviço detapeçaria; e comércio em feira livre.

No tocante a ambientes construídosde uso coletivo, envolvendo infra-estruturafísica e serviços coletivos, o Jardim Sayonarareproduz as formas periférico-territoriais dagrande maioria das cidades brasileiras. Emoutros termos, o próprio ambiente geofísicotende a reproduzir e a expor toda a comuni-dade a riscos cada vez maiores, tanto de ex-clusão social quanto de agravamento de es-tados de carências, se comparado a ambien-tes estruturados nas áreas urbanas mais cen-trais ou que abriguem segmentos sociais maisprivilegiados.

Grande parte do que já foi construídocomo infra-estrutura física, e de serviços,resulta de conquistas da comunidade local edo “Programa de Urbanização de ÁreasPeriféricas” da Prefeitura Municipal, cujoobjetivo principal tem sido o de inserir osbairros na trama das principais vias de cir-culação da cidade. Os maiores problemassempre se referem a infra-estruturas de sa-neamento básico (esgotos), serviço postal einclusão digital.

Até mesmo no que concerne às ativida-des econômicas e sociais anteriormente men-

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cionadas, o Jardim Sayonara já conta comapoio de ambientes construídos de uso cole-tivo, como nos casos das três Igrejas (umaCatólica e duas Evangélicas) lá existentes, deum Centro Comunitário (com a finalidadede capacitação e geração de renda) e de umCentro de Educação Infantil.

A sede da Associação de Moradoresdo Jardim Sayonara também é utilizada noperíodo noturno, oferecendo aulas do Pro-grama de Educação de Jovens e Adultos, emparceria com a Secretaria Estadual de Edu-cação e implementado pelo Projeto Movi-mento de Alfabetização de Jovens e Adultos-MOVA-MS. Os Ensinos Fundamental e Mé-dio são prestados por escolas localizadas nosbairros próximos (Vila Eliane e Vila Popu-lar), por não existir escola instalada no local.

Os serviços de saúde pública são reali-zados pela Unidade Básica de Saúde “Dra.Eleonora Moura Quevedo Gomes” e pelaPoliclínica Odontológica, ambos localizadosna Vila Sílvia Regina, a aproximadamenteum quilômetro do Jardim Sayonara. E a As-sistência Social é prestada à população pelaUnidade Descentralizada de AssistênciaSocial (UNIDAS) “Valéria L. da Silva” e peloCentro de Referência da Assistência Social(CRAS) “Albino Coimbra Filho”, respectiva-mente localizados nos bairros Vila Populare Jardim Aeroporto.

As ruas são utilizadas para atividadesde cultura, esporte e lazer. Há parceria coma Igreja Católica local, que permite o uso deárea livre para a prática esportiva de fute-bol. As demais atividades de esporte e lazerrealizadas se limitam a diversões com pipas,torneios de vôlei, jogo de tacos com garrafas-pet, passeios de bicicleta e jogo de sinuca nosbares.

No quesito urbanização e pavimenta-ção, o Jardim Sayonara tem a rua principalpavimentada com asfalto, contendo guias,coletores de águas pluviais e desvios deáguas para evitar a erosão do solo. Nas pa-radas de ônibus, há coberturas (com pisoscimentados) de proteção contra chuva e sol.

O ambiente natural da região urbanado Jardim Sayonara se caracteriza principal-mente pelo buritizal existente no local, aolongo das margens dos Córregos Serradinhoe Imbirussu, destacado ponto de repouso emoradia de tucanos e araras.

A presença de espécies remanescentesda vegetação nativa, às margens dos referi-dos córregos, pode ser vista como potencia-lidade para a produção de manufaturados,portanto de geração de emprego e renda, aexemplo de trabalhos já produzidos atravésda Incubadora Municipal “Zé Pereira”.

2 Potencialidades de participação noJardim Sayonara

Circunstanciado pelo cenário de fundodo anterior item 2, a continuidade do pre-sente estudo se encaminhou para a busca desubsídios, junto a lideranças e agentes tantointernos quanto externos dessa “comunida-de”, sobre potencialidades de participaçãocompatível com Desenvolvimento Local.

Para tanto, a tônica do sentido teóricode participação consistiu em que:a) Segundo Bordenave (1994, p. 22),

“[...] participação é fazer parte, tomar parte eter parte, que é próprio da natureza do ho-mem, tendo acompanhado sua evoluçãodesde as tribos e os clãs dos tempos primiti-vos, até as associações, empresas e partidospolíticos de hoje, que se assemelha à demo-cracia participativa”.

b) E no entender dos autores Ávila, Cam-pos, Rosa, Ferro e Paulitish (2001, p. 67-69):

b.1) [...] o agente de desenvolvimento local defato age, [...] trabalhando e influenciandopara que a comunidade mesma desabrochecapacidades, competências e habilidades dedesenvolvimento, sem a imediatista preten-são de querer levar o desenvolvimento paraa comunidade ou de querer erigir iniciativasdesenvolvimentistas na comunidade, quenão fluam de seu real estágio de cultura,condições e política de progresso coletivo.

b.2) “(...) o ‘núcleo conceitual’ do desenvol-vimento local consiste no efetivodesabrochamento – a partir do rompimentode amarras que prendam as pessoas em seusstatus quo de vida – das capacidades, com-petências e habilidades de uma ‘comunida-de definida’ (portanto com interesses co-muns e situada em (...) espaço territorial-mente delimitado, com identidade social ehistórica), no sentido de ela mesma – medi-ante ativa colaboração de agentes externos einternos- incrementar a cultura da solidarie-dade em seu meio e se tornar paulatinamen-te apta a agenciar (discernindo e assumindo

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dentre rumos alternativos de reorientaçãodo seu presente e de sua evolução para ofuturo aqueles que se lhe apresentem maisconsentâneos) e gerenciar (diagnosticar, to-mar decisões, agir, avaliar, controlar, etc.) oaproveitamento dos potenciais próprios – oucabedais de potencialidades peculiares àlocalidade –, assim como a ‘metabolização’comunitária de insumos e investimentospúblicos e privados externos, visando à pro-cessual busca de soluções para os proble-mas, necessidades e aspirações, de toda or-dem e natureza, que mais direta e cotidiana-mente lhe dizem respeito

instâncias externas; e) desde que – e sempre –tais somas contribuam para que cada comu-nidade-localidade se torne paulatino-proces-sualmente sujeito/a de seus específicos e pe-culiares rumos e meios de desenvolvimento,naturalmente com a indispensável parceriacontributiva da ajuda formativa de agênciase agentes externos, públicos e privados.

Aliás, é o próprio Ávila que caracterizaa supramencionada intensidade diferencia-dora de participação em política e estratégiade desenvolvimento comunitário-local, dis-tinguindo – como já aludido acima – Desen-volvimento Local (DL = de dentro para forae de baixo para cima de cada comunidade-localidade) de Desenvolvimento No Local(DNL = aquele levado de fora para dentro ede cima para baixo da respectiva comuni-dade-localidade), mesmo que neste últimocaso se argumente que foi levado, mas com aparticipação da comunidade visada. Em rela-ção ao entendimento de participação, nes-ses dois casos (1o = DNL ou DPL e 2o = DL)o seguinte texto do autor é direto, auto-explicativo e reforça a citação em b.1, lá nocomeço deste item 3:

No primeiro caso, os agentes externos sãoos promotores do desenvolvimento e a comu-nidade apenas se envolve participando. Nosegundo, a própria comunidade assume oagenciamento do seu desenvolvimento e osagentes externos são os que se envolvem par-ticipando, inclusive no sentido de “combus-tíveis” e “baterias” que acionam o “motorda comunidade” para que ela mesma poucoa pouco se torne capaz de tracionar o pro-gresso de suas condições e qualidade devida, sob todos os pontos de vista (social,econômico, cultural, etc.), inclusive no quese refere à contínua atração e metabolizaçãode contribuições exógenas alimentadoras.(ÁVILA, 2000a, p. 69).E aqui, uma vez mais na condição de

co-autor, Ávila continua a enfatizar apeculiar intensidade do sentido de partici-pação no contexto do DesenvolvimentoLocal. Ou seja, ele coteja o sentido geral (ecorrente) de participação – transcrito ante-riormente à letra b – com o da última cita-ção e observa que, no DesenvolvimentoLocal, inverte-se a relação sobre quem-par-ticipa-em/de-quê, isto é: 1º, do ponto de vis-ta do primeiro sentido (o de Bordenave), ascomunidades-localidades é que participam

Ora, a significação de participação seevolui do sentido geral, focado porBordenave, para performance muito maisintensa, interativa e compromissada no âm-bito do Desenvolvimento Local (DL), pelasabordagens de Ávila, Campos, Rosa, Ferroe Paulitish (2001, supra), no que respeita tan-to ao seu “núcleo conceitual” quanto às ma-neiras de atuar dos Agentes de Desenvolvi-mento Local (DL).

Isso (enfatiza Ávila, também na con-dição de co-autor desta matéria), em virtudede que o Desenvolvimento Local se respal-da e flui de constante processo formativo-comunitário da cultura solidariamenteinterativo-construtiva (em termos de idéias,de descoberta e aproveitamento de condi-ções-e-potencialidades, de iniciativas, de pla-nejamento e ação, e assim por diante), consti-tuída por constantes somas de fragmentos(referentes a capacidades e condições tantoreais quanto potenciais de gregarização esolidarização, fenômenos estes retomadosem 4.3, à frente), visceralmente contrárias aqualquer tipo de coletivização uniformizada.

Trata-se, pois, de somas de fragmentos :a) tanto coletivos quanto individuais; b) tantoexplícitos quanto latentes; c) quer existentesquer emergentes no/do seio da própria comu-nidade-localidade visada; d) tanto disponíveisquanto possíveis a partir de outras alçadas e

As distinções entre Desenvolvimento NoLocal (DNL), Desenvolvimento Para oLocal (DPL) e Desenvolvimento Local(DL) foram detalhadamente explicitadaspor Ávila em seu livro Cultura de sub/de-senvolvimento e desenvolvimento local(2006, p. 70-100).

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das iniciativas de agências e agentes exter-nos; 2º, no Desenvolvimento Local (DL),são as agências e os agentes externos queprogressivamente se tornam participantesdas iniciativas de cada comunidade-locali-dade em processo de auto-efetivação comosujeito/a de seus rumos e dinâmicas dedesenvolvimento em escala local.

Enfatizando a supramencionada in-versão, Ávila acrescenta que o 1º sentido –acima- de participação se respalda no fatohistórico de que praticamente todas/os as/os vigentes teorias, políticas, iniciativas, pro-gramas e projetos de desenvolvimento dire-cionados a comunidades-localidades concre-tas, no Brasil e mundo afora, sempre as visa-ram (e ainda visam), assim como as trataram(e ainda tratam), como meros-objetos dedesenvolvimento. Nesse contexto, pois, sãoas COMUNIDADES QUE PARTICIPAM de programas,projetos e iniciativas externos. E o pior é que,na esmagadora maioria das ocorrências decomunidades-localidades visadas comoobjeto-de-desenvolvimento, tais participa-ções acabam sendo manipuladas e reduzi-das muito mais a perversos mecanismoslegitimadores da intervenção externa que reale verdadeiro auto-envolvimento gerador deauto-engajamento comunitário-local.

Então, e em relação ao 2º sentido (tam-bém supra), Ávila continua enfatizando que,ao se avançar o processo de implementaçãodo Desenvolvimento Local (tal como concei-tuado em b.2, no início deste item 3): por umlado, a cada comunidade-localidade em di-nâmica de DL cabe – de direito e fato – a pro-gressiva, porém inalienável, incumbência dese posicionar como sujeito/a do seu próprioprocesso de autodesenvolvimento; por outro,há que se entender que o primeiro, principale necessário papel de qualquer participaçãoexterna em processo de DL tem de se consti-tuir essencialmente como contribuiçãomaiêutico-indutiva (para formação e emersãode capacidades, competências e habilidades),visando a que cada comunidade-localidadede fato conquiste e exercite justamente asqualidades humanas, sociais, econômicas eoperacionais requeridas para se evoluir dacondição de mero-objeto para a de efetivo-sujeito da sua dinâmica de desenvolvimento.

Mas, retomando o enunciado desteitem 3, a maior expressão de potencialidades

de participação dos líderes locais pes-quisados se concentra (53%) em participação(“comunitária”, “religiosa” e “em associaçãode pais e mestres”), imediatamente seguidapor “participações em Conselhos Munici-pais” (36%). Isso enseja a impressão de que,e de alguma forma, essas participações po-dem significar pelo menos certa maneira deinterlocução das concernentes lideranças nosprocessos de formulação, acompanhamentoe avaliação das políticas públicas para a loca-lidade.

No campo das potencialidades de parti-cipação, como cooperação associativa real,detectou-se que apenas 4% dos 14 entrevista-dos afirmaram fazer parte de cooperativa e7% participavam de “[...] associações coope-rativas nas áreas de reciclagem de lixo urbanoe grupo de produção de tapetes em retalho”.

No entanto, quando os líderes foraminquiridos se a participação social haviadespertado seus interesses por questões liga-das ao exercício da cidadania, 57% afirma-ram, primeiro, que participavam dos movi-mentos da comunidade, em busca de desen-volvimento, e, segundo, tais participaçõesmuito ampliaram suas atenções para o signi-ficado real de cidadania.

Aliás, esses mesmos líderes enfatiza-ram que a solidariedade (ou mais adequada-mente gregariedade, de acordo com as pon-derações do subitem 4.3, à frente) entre mo-radores do Jardim Sayonara é uma daspotencialidades mais presentes na comu-nidade, apesar de sua concretização só sematerializar quase sempre por ocasião denecessidades emergenciais, a exemplo dequando ocorrem as enchentes nos córregosque margeiam o bairro. Mesmo assim, no to-cante aos líderes formais e informais, aspotencialidades de participação social fica-ram bem evidenciadas.

Agora, e somando antigos moradorestambém consultados com os acima mencio-nados líderes formais e informais, outrapotencialidade de participação detectadadiz respeito ao compromisso que manifestamem relação à participação nas reuniões doConselho Regional Urbano do Imbirussu, in-clusive quando subsidia a elaboração do or-çamento municipal. A maioria dos líderespesquisados (61%) considerou produtiva,importante e motivadora a presença nas

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reuniões desse Conselho e observou que esteespaço de participação lhe possibilita efetivocontrole social no âmbito do planejamentourbano do município. Mas vale registrar,também, que outros 27% dos pesquisadosresponderam sequer conhecerem a existên-cia dos Conselhos Regionais Urbanos deCampo Grande-MS, deles apenas tomandoconhecimento no momento da pesquisa.

Considerando reuniões também comoformas de participação, 47% dos líderes dis-seram que realizam reuniões com periodici-dade mensal para tratar de interesses coleti-vos, muito provavelmente ainda refletindoe remontando o próprio processo de consti-tuição do Jardim Sayonara.

No Jardim Sayonara, os motivos quelevaram os líderes a representarem a comu-nidade foram assim expressos: 35% por indi-cação dos próprios moradores; 29% por von-tade própria e por amigos. Estes dois motivospermitem inferir que há proximidade entreos líderes e a maioria dos demais membrosda comunidade.

O Desenvolvimento Local pressupõeque a comunidade assuma (não apenas par-ticipe em sentido geral, como referido atrás)os diferentes processos vivenciados, para quebusque a melhoria de vida de seus compo-nentes, vez que tal ato de assumir aconteceentre os integrantes enquanto agenciadoresdo processo e não como meros expectadores.E essa conotação de agentes de processo serevelou de modo bem perceptível nos depoi-mentos dos agentes internos e externos, du-rante as entrevistas com eles realizadas.

Os agentes internos enfatizaram os se-guintes aspectos reveladores de interativida-de: união dos moradores (todos); importân-cia dos moradores antigos; presença nas reu-niões; força da mobilização; formação dasassociações e entidades comunitárias; senti-mento de pertença; relações com vizinhan-ça; reivindicações e suas conquistas; conta-tos; visitas; e a solidariedade ou gregarie-dade (cf. 4.3) como pano de fundo.

[§19] Já os agentes externos enfatiza-ram estas outras iniciativas: mobilização daigreja na organização urbana; participaçãoem parcerias na localidade; contatos; diálo-gos; espaços públicos para a Educação Infan-til; formação e construção do Centro Comu-nitário; existência e fomento dos ConselhosRegionais Urbanos; interlocução com o po-der público, preferencialmente no própriolocal; papel das diretorias da Associação deMoradores e Clube de Mães; troca de infor-mações e orientações; iniciativas de capaci-tação e geração de emprego e renda; e elabo-ração de projetos para elevação da qualida-de de vida dos moradores da comunidade.

Com base em depoimentos e percep-ções junto aos agentes tanto internos quantoexternos, foi possível inferir que a dinâmicade participação, naquela comunidade, se vol-ta bastante para as perspectivas da cidada-nia e da democratização da gestão local. Estainterpretação condiz inclusive com as sinali-zações dos depoimentos no sentido de já exis-tirem, na comunidade, fatores tão importan-tes como: fortalecimento do controle social(por meio do concernente Conselho RegionalUrbano), assessoramentos técnicos, capacita-ção dos moradores e implementação de es-tratégias para mobilização da comunidade.

[§21] No entanto, cumpre ressaltar queas iniciativas de participação e desenvolvi-mento não aconteceram de um dia para ou-tro: começaram aos poucos, isto é, conformeo ritmo da comunidade, pela paulatinaconscientização dos seus membros de que assoluções dos problemas viriam fundamental-mente da união de todos. Mas, reitera-se, ospassos iniciais foram dados por orientaçõesde religiosos atuantes no bairro.

Deflagrou-se a ocupação da área pelapopulação oriunda de várias localidades e,a cada chegada de uma família, seus espaçoseram demarcados e negociados com aquelesque ali já haviam se fixado, promovendopaulatinamente a formação da comunidade.Portanto, o processo de evolução construtivase deu em marcha contínua. A participaçãodos moradores foi acontecendo com base emdiálogos, visitas e até enfrentamentos parapermanência no local.

Por outra, as conquistas também conta-ram com parcerias externas além de religio-sos, embora no começo os moradores tenham

Os números [§19], [§21], [§24] e [§28] dospróximos parágrafos – deste item 3 – sãoassim explicitados, porque – lá no final –os dois últimos Destaques do item 5 a elesse remetem.

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lutado contra investidas para retirá-los da lo-calidade. Em termos concretos, as ações in-ternas e parcerias externas foram acontecen-do conjuntamente com o surgimento de movi-mentos coletivos, principalmente os de cria-ção da Associação de Moradores e do Clubede Mães. Houve, pois, mobilizações em buscade proteção contra a retirada dos moradores.

[§24] Em relação a isso, informou umagente interno, por ocasião daquelas entre-vistas anteriormente mencionadas, que oentão Prefeito Municipal (Dr. Juvêncio Césarda Fonseca) garantiu, durante recepção aoslíderes locais, que todos os moradores “[...]ficassem tranqüilos, pois ninguém os tirariade lá”. Daí em diante, as coisas caminharamcom base mais em reivindicações e negocia-ções do que confronto, visto que, após seismeses da ocupação, postes de madeira paraa energia elétrica foram instalados, seguidosde água encanada e, posteriormente, de visi-ta a cada mês dos representantes da Prefeitu-ra. Aliás, a sede da Associação de Moradoresfoi construída por doações de materiais e mu-tirão de mão-de-obra, demonstrando que aunião e o fortalecimento do movimento co-munitário de fato resultaram em conquistas.

Portanto, o que se apurou das opiniõesdos agentes tanto internos quanto externos,em relação a potencialidades de participa-ção da comunidade, para efeito de Desenvol-vimento Local (independentemente de ciên-cia por parte deles sobre o que de fato se en-tende por DL), se orientou para a capacidadede conquistas coletivo-interativas, como a docultivo de boas relações de vizinhança e ado construtivo exercício da gregariedade,sobretudo por participação ativa emagremiações, dentre as quais se destacandoa Associação de Moradores, o Clube de Mãese o Time de Futebol. Isso quer dizer, como sereferiu atrás, que, desde o início de formaçãodo bairro, seus habitantes não só começarama descobrir endogenamente que a união faza força como também dela aprenderam a fa-zer uso para ações, reivindicações e conquis-tas que permearam/permeiam contínuos en-caminhamentos de comunitarização, uns jáconcretizados e outros aí emergindo em fasede latência.

E, no intuito de concluir este item 3,outras quatro observações merecem especialdestaque:

Primeira, a de que tal processo de par-ticipação (convergente para comunitariza-ção em perspectiva de Desenvolvimento Lo-cal, mas ainda nos limites do nível gregáriode mobilização, como explicita o subitem4.3), foi marcado: a) por muitas dificuldades,superadas por esforços de consenso e comu-nhão de sentimentos, assim como da agre-gação construtiva de valores por parte tan-to dos moradores quanto dos líderes e agen-tes internos da “comunidade”; e, b) por inte-ratividades e investimentos de agências e/ou agentes externos (considerados em deter-minados depoimentos como conquistas dopróprio bairro, porque de alguma formatambém se constituíram itens de reivindica-ção comunitária), tais como os das instala-ções do Posto de Saúde, da rede de água, darede de energia e do Centro de EducaçãoInfantil.

[§28] Segunda, a mediação de agentesreligiosos muito contribuiu para tal processode comunitarização. De acordo com depoi-mentos dos líderes e agentes externos e váriasalusões anteriores, os membros da IgrejaCatólica atuaram junto à população do bair-ro como semeadores e fomentadores dessadinâmica de comunitarização, que é reto-mada no subitem 4.3 à frente.

Terceira, acentuada ênfase ao senti-mento de vitória tanto dos líderes quanto detodos os moradores pela conquista da demar-cação do território comunitário. De fato, ademarcação e posse desse território já confir-ma, hoje, a seguinte passagem, de Dias (1994,p. 124), no sentido de que: “[...] a existênciade territórios definidos em comunidade podeser constatada pelos espaços livres devegetação, que são deixados em volta de bar-racos e pela distância entre os moradores”.

Quarta, e última, o orgulho de ter par-te, fazer parte, tomar parte na construçãodo todo da “comunidade” do JardimSayonara, para se chegar ao que ela é ago-ra, foi uma constante de todos os depoentes,ao se referirem: às ruas que surgiram dosmovimentos urbanos; aos postes de luz queforam fincados um a um; à água chegandopor meio de tubulações planejadas; à Edu-cação Infantil tendo sede e se constituindoporta de descortínio para novos horizontes;ao transporte urbano com horários de ida evolta; ao asfalto substituindo o lamaçal; aos

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estabelecimentos comerciais surgindo paraatender às necessidades de consumo; à es-cola como porta de entrada de futuras no-vas perspectivas para crianças, jovens, adul-tos e idosos.

Enfim, a pesquisa de fato fez emergira percepção de que todos os tipos e formasde participação, detectados na “grande co-munidade” do Jardim Sayonara, se apresen-tam como potencialidades no contexto doDesenvolvimento Local, mas – reitera-se –apenas nos limites do nível gregário demobilização, conforme análise em 4.3.

Entretanto, há duas considerações arespeito dessa percepção: se, por um ângulo,a “grande comunidade” Sayonara aindanão galgou os degraus da efetiva evoluçãoparticipativa em termo de DesenvolvimentoLocal (até porque essa população nunca ti-nha ouvido falar – direta e sistematicamen-te – sobre DL antes desta pesquisa), por ou-tro, ela já percorreu caminhos básicos e ge-rou potencialidades, sobretudo associativo-construtivas (enfatizando-se: mesmo queainda só em nível gregário) para caminharna direção dos limites do nível solidário demobilização, também requerido no processode comunitarização para DesenvolvimentoLocal, analisado e enfatizado nos desdobra-mentos do próximo item.

3 Três importantes ponderaçõesdecorrentes

Qualquer análise sobre potencialidadesde participação comunitária implica neces-sariamente conhecimento das reais perfor-mances fenomenológicas da comunidadeestudada. E, no que respeita à “grande co-munidade” do Jardim Sayonara (portantoa do bairro como um todo), desvendou-se,pela pesquisa, que após dezenove anos deexistência ou de 1987 a 2006, seus fluxos or-ganizacionais e funcionais se tornaram posi-tivamente mais complexos, como se vê ime-diatamente pelas seguintes ponderações de-correntes:

3.1 Sobre “comunidades menores” no seioda “grande comunidade” Sayonara

Como dito anteriormente, do constan-te aumento de complexidade e dinâmica dos

fluxos estruturais e funcionais da “grandecomunidade” do Jardim Sayonara, emergi-ram desdobramentos de organizações territo-riais de menor amplitude, constituídos poragremiações aqui denominadas “comunida-des menores”, tanto formais quanto infor-mais. Mas o que de fato se constatou é que adinâmica fenomenológico-sistêmica (tantoestrutural quanto funcional) da referida“grande comunidade”, também muito seplasmou e dinamiza através do próprio pro-cesso de articulação conjunta das ações desuas “comunidades menores”.

Trata-se, pois, de comunidades especí-ficas ou agremiações diferenciadas, visandoa interesses e necessidades coletivo-indivi-duais quer no âmbito de toda “grande comu-nidade”, a exemplo da Associação de Mora-dores, quer no tocante a interesses ou neces-sidades típicas de cada uma das “comuni-dades menores”, no caso as AgremiaçõesReligiosas (uma Católica e duas Evangéli-cas), o Clube de Mães, o time de futebol,as rodas e os encontros de conversas infor-mais de jovens e mulheres.

No que respeita à categorização decomunidades formais e informais, e porinspiração nos arcabouços lógicos pelos quaisTönnies (apud TIMASHEFF, 1965, p. 134-137) e Pierson (1968, 109-124) se referem a“comunidade” e “sociedade” (o primeiroaté cunhando esses dois termos e Pierson tra-tando-os explicitamente como questões deEcologia Humana), esclarece – a seguir – ojá mencionado Ávila nesta co-autoria.

As comunidades formais contam compredomínio de vínculos dos relacionamen-tos secundários sobre os primários (ambosexplicitados nos próximos parágrafos), por-tanto, de alguma forma já se aproximandodas fronteiras configuracionais da categoria“sociedade” (que se rege por forte predo-mínio dos relacionamentos secundáriossobre os primários).

Isto, sabendo-se que os vínculos de re-lacionamentos secundários sãoimplementados pelos vieses formais deregulação coletivo-societária: a) tanto daregulação por participação ou adesão, quan-do as pessoas se envolvem na confecção dosmecanismos de interação-controlada que asabranjam ou pessoalmente a eles se aderem;b) quanto da regulação corporativa, pelo

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critério dedutivo da pertença ou compulsó-ria aplicação dos mecanismos interativosreguladores (direitos, deveres e outros) de de-terminada coletividade societária a todos osindivíduos por ela abrangidos, mesmo nãohavendo participação ou adesão pessoal.

Exemplo bem real de um viés deregulação corporativa (por relacionamentosecundário) é o caso de todos os dispositivosda Constituição da República Federativa doBrasil (que é o mecanismo máximo de regu-lação no âmbito de todo o território e socieda-de brasileira) abrangerem todos e quaisquerbrasileiros natos e naturalizados (evidente-mente após a consumação do processo denaturalização, porque a concretização destaimplica necessariamente formal adesão aosrespectivos termos). Seus dispositivos não sóvaleram para todos os brasileiros vivos àépoca de sua promulgação, como tambémcontinuam a valer automaticamente (pelocorporativo critério de pertença à Nação)para todas as sucessões de gerações brasilei-ras no seu oficial curso de vigência.

A mesma coisa acontece com outrosmecanismos reguladores oficiais (isto é, seinstituídos por instâncias ou competentesautoridades das sociedades a que se referem),como no caso de quaisquer leis com seusanexos (inclusive Constituições Estaduais,Leis Orgânicas Municipais, Código Civil,Código Penal, Código do Consumidor, e as-sim por diante), regimentos, regulamentos,contratos, portarias, resoluções, e similares,em seus respectivos universos de abrangên-

cia aplicativa.No caso do Jardim Sayonara, a Asso-

ciação de Moradores, os Grupos Religiosos(organizados em torno de uma capela Cató-lica e duas sedes Evangélicas) e o Clubede Mães se constituíram exemplos desta-cados de comunidades formais.

Já as comunidades informais sãoaquelas que, não importando de que tama-nho ou amplitude, também contam com sig-nificativo predomínio de vínculos dos rela-cionamentos primários sobre os secundá-rios. Os relacionamentos primários se cons-tituem vínculos relacionais espontâneos, con-tínuos ou fortuitos, formados por dinâmicoslaços naturais de interatividade, portanto apartir das próprias cotidianidades de encon-tros e convivências das pessoas.

Por sua vez, tais vínculos relacionaisacabam gerando e mantendo (às vezes atédesfazendo) mutualidades de conhecimen-tos, simpatias, antipatias, convergências edivergências tanto entre as pessoas quantoentre elas e as respectivas ambiências (ouperformances meio-ambientais) ao longo detodos os processos e raios das territorialidadesde suas cotidianidades de convivências. OGrupo de Jovens, o Time de Futebol e oGrupo de Mulheres foram exemplos de co-munidades informais constados no JardimSayonara.

Feitas tais considerações, a percepçãovisual do desdobramento da “grande comu-nidade” do Jardim Sayonara em “comunida-des menores” é bem parecida com a que sesegue:

“GRANDE COMUNIDADE”

JARDIM SAYONARA

Grupo de Jovens

Clube de Mães

Grupo de Mulheres

Time de Futebol

Grupos Religiosos

s

Associação de

Moradores

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Observadas as setas externas desta ilus-tração (indicativas de dinâmica no sentidorelógio) e as setas pontilhadas de desdobra-mentos (direcionadas da “grande comunida-de” para cada uma das “comunidades me-nores”, destacadas nos respectivos círculospontilhados), o imaginário perceptivo que sedescortina é o de que, à medida que as “co-munidades menores” se formaram, tambémcomeçaram a funcionar como espécies de,pilares de sustentação e rolamentos de sen-sibilização, mobilização e dinamização da“grande comunidade” Sayonara ou, maisespecificamente, do seu processo de comu-nitarização, tal como ponderado em 4.3.

3.2 Sobre divergências-convergênciasdialéticas de participação no JardimSayonara

De início, Ávila esclarece – tambémnesta co-autoria – os sentidos dialéticos deconvergência e divergência, consideradosem todo o âmbito do Projeto de Pesquisa“Essência Constitutiva de Comunidade noPrisma do Desenvolvimento Local” (mencio-nado na Introdução inicial). Não se conotamúnica e necessariamente como dinâmicasnem só positivo-apreciativas (convergências)ou apenas negativo-depreciativas (divergên-cias), embora também haja ocasiões em queuma e/ou outra vertentes dessas conotaçõesde fato aconteçam. No contexto geral aquifocado, constituem-se apenas referências depolarização (convergência) e despolariza-ção (divergência) geradas e implementadaspor não importa que tipo ou natureza derelacionamentos, quer primários quer se-cundários.

Por exemplo, ao se mudar de uma lo-calidade para outra, qualquer pessoa se en-volve até nas simultaneidades de recompo-sição das suas dinâmicas relacionais, pois,convergindo-se (polarizando-se) para anova localidade, ao mesmo tempo e auto-maticamente estará se divergindo (despola-rizando) em relação a todas as referênciasque estão sendo deixadas para trás. Então,os termos divergir, divergindo, divergên-cia, etc., têm, aqui, tanto os mesmos senti-dos que teriam desconvergir, desconver-gindo, desconvergência etc. (se existissem norol oficial de nosso vocabulário lingüístico),

quanto aquele significado de não-concor-dância também implicado nas variaçõessemânticas do verbo divergir: “[...] afastar-se um do outro a partir de um ponto de par-tida comum; [...] não se combinar; discordar;[...] diferir na forma, caráter ou opinião [...]”(MICHAELIS, 1998, p. 742), questão estaretomada no quarto parágrafo à frente.

Ademais, a lei newtoniana da atraçãouniversal, segundo a qual todos os corposmateriais se atraem mutuamente nas ra-zões direta de suas massas e inversa doquadrado de suas distâncias (ÁVILA;CAMPOS; ROSA; FERRO; PAULITISCH,2001, p. 88), também ajuda o entendimentosobre a lógica simultaneamente convergen-te/divergente dessas duas dinâmicas relacio-nais (convergência e divergência), mesmonão se constituindo corpos materiais. Issoquer dizer que quaisquer convergênciaspara novas referências-focais (ou estadosde coisas) geram concomitantes divergên-cias em relação aos focos-referenciais dasanteriores convergências, assim como to-das e quaisquer divergências (em relaçãoa focos-referenciais anteriores de conver-gências) tendem a gerar novas convergên-cias, e assim por diante.

Isso, desde que se tenha em mente quequalquer processo de polarização (conver-gência) para determinada direção-focal im-plica (natural, concomitante e inexoravel-mente) alguma forma mais ou menos radicalde despolarização (divergência) em relaçãoa direções-focais da polarização (conver-gência) anterior, cuja lógica fundamentaltem muito a ver com a supramencionada leida atração universal, bem como, ainda, como lavoisiano “Princípio da Conservação daMassa” (segundo o qual – em essência – nanatureza, nada se perde, nada se cria; tudose transforma) e a atualíssima einsteinianalei da relatividade.

No que respeita a divergências rela-cionais entre as “comunidades menores”,como as do Jardim Sayonara, Ávila volta aobservar que, de início, ela constitui o prin-cípio motriz de todos e quaisquer desdobra-mentos (despolarizações) que ocorrem tam-bém em todos e quaisquer grupos humanos,assim como em quase tudo na natureza.Aliás, exemplo muito real e ilustrativo dissovem das abelhas (como também de formigas,

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cupins, etc.): quando as unidades de espaço,organização e função das colméias-bases co-meçam a ficar demasiadamente exíguas, aspróprias colméias se mobilizam para gerarnovas rainhas (com respectivos séquitos), quesempre capitanearão desdobramentos tam-bém de novas colméias.

No contexto humano, em termos deprimeira variável de despolarização e demaneira similar ao das abelhas, há grupos-bases que também agem assim: famílias quepreparam os filhos para constituírem novasfamílias, organizações empresariais que semobilizam para surgimento de filiais, e assimpor diante. Entretanto, e ainda nos contextostanto humano quanto de alguns outros ani-mais, também a todo instante ocorre umasegunda variável-motriz de despolari-zação, em sentido oposto ao da anterior. Ade os próprios membros buscarem se desdo-brar (despolarizar) de seus grupos-bases poruma ou mais destas três razões: a) a de seacharem (perceberem ou sentirem) que seusinteresses (objetivos e afinidades) são de algu-ma maneira tolhidos nos respectivos grupos-bases; b) a de – mesmo não se sentindo tolhi-dos nos grupos-bases – se julgarem aptos aampliarem e melhorarem as situações espa-ciais, organizacionais e funcionais de seusobjetivos e afinidades em grupos ou comu-nidades mais específicas; c) a dos desdobra-mentos que acontecem por explícitas ou im-plícitas discordâncias (desacordos) compor-tamentais, culturais, ideológicas, religiosas,políticas (estas quatro últimas bem típicas dosseres humanos), e congêneres.

E o surgimento das “comunidadesmenores”, no seio da “grande comunidade”do Jardim Sayonara, não fugiu a essas variá-veis. À medida que a “grande comunidade”começou a se organizar e funcionar em tor-no dos seus principais e abrangentes objeti-vos (os de, primeiro, garantir a permanênciana área invadida e, segundo, conseguir con-dições minimamente decentes de moradiapara todos os ocupantes dessa área), começa-ram os processos internos de despolariza-ções-divergentes de segmentos da “grandecomunidade” e das conseqüentes repolari-zações-convergentes para interesses (ob-jetivos e afinidades) de grupos ou “comu-nidades menores”, como visto pela ilustra-ção gráfica no final do anterior subitem 4.1.

Ademais, e de acordo com todo o tra-balho de campo da pesquisa, as razões quemais pareceram influenciar a ocorrências dosdesdobramentos comunitários menores, noJardim Sayonara, foram: as dos Grupo deJovens, Time de Futebol, Grupo de Mulherese Clube de Mães, em relação à anterior le-tras b; e as dos Grupos Religiosos (IgrejaCatólica e 2 Igrejas Evangélicas), no tocanteà letra c (vez que a Associação de Moradoresse ocupava dos interesses básicos/comunsde toda a “grande comunidade”).

E o interessante, no contexto estuda-do, é que até mesmo as divergências (des-polarizações) discordantes entre as “comu-nidades menores” religiosas (Igreja Católicae 2 Igrejas Evangélicas, por exemplo) nãoimplicaram despolarização ou divergênciaem relação aos interesses maiores e comunsda “grande comunidade”. Pelo contrário, oque se constatou foi justamente que a diver-sificação e o dinâmico funcionamento dessadialética divergente-convergente, no seio da“grande comunidade” estudada, não sópropiciaram o surgimento das já menciona-das “comunidades menores” como tambémvêm induzindo a formação da cultura decomunitarização para outros interesses einiciativas tanto do bairro (enquanto “gran-de comunidade”) quanto de seus desdobra-mentos e subdesdobramentos em mais e di-ferentes tipos de “comunidades menores”.

Essa dialética, ao mexer com interessese relações interpessoais divergentes-con-vergentes (e vice-versa), acaba provocandoa emersão de movimentos e eventos interati-vamente dinamizadores das macro e micro-vivências comunitárias, a exemplo da velhaimagem da irradiação de ondas quando sejoga pedra no lago: se apenas uma pedra éjogada, a onda circular se espalha, mas logoperde força e se esvai; no entanto, se pedrassão sucessivamente jogadas, novas ondas seformam, se encadeiam e impulsionam as jáem movimento, ganhando sempre maisvolume, força, dinamismo, profundidade eamplidão.

No caso da próxima ilustração gráfica(complementar à mostrada em 4.1), os aludi-dos movimentos e eventos, observados à épocada pesquisa, se configuraram como Reuniões,Rodas de Conversa, Encontros Religiosos eConcatenação de Redes: esta, aqui entendida

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como esforço de sintonização das diferentes“comunidades menores” para interesses co-munitários comuns e/ou mais abrangentes,inicial e principalmente destacada por deci-siva contribuição mediadora inicial dos reli-giosos católicos atuantes na localidade.

Então, no caso específico do JardimSayonara, os desdobramentos em “comuni-dades menores” ao invés de só se constituí-rem confrontos relacionais, também e de fato

implementaram e melhoraram suas poten-cialidades de comunitarização (pelo menosno nível gregário, como se verá à frente) in-clusive para interesses e objetivos maioresque os de cada grupo em particular. É o que,nesta ilustração (com mais elementos acres-centados aos já existentes na anterior, no fi-nal do subitem 4.1), se visualiza pelas res-pectivas setas convergentes no sentido da“GRANDE COMUNIDADE”:

Rodas de Conversa

Associação de

Moradores

Time de Futebol

Grupos Religiosos

Grupo de Mulheres

Grupo de Jovens

Clube de Mães

Concatenaçãode Redes

Encontros Religiosos

Reuniões

“GRANDE COMUNIDADE”

JARDIM SAYONARA

Trata-se, pois, de potencialidades mui-to importantes, visto que, pelos estudos reali-zados nos quatro anos de vigência do Projetode Pesquisa “Essência Constitutiva de Co-munidade no Prisma do DesenvolvimentoLocal” (mencionado na Introdução), a im-plementação do Desemvolvimento Localimplica necessário e constante processo decomunitarização convergente para as fina-lidades específicas desse tipo de desenvol-vimento associativo-cooperativo.

Mas, por esses mesmos estudos, duasconstatações vieram à tona. Primeira, a feno-menologia do processo de comunitarização,para qualquer finalidade mobilizatória, podese delimitar por dois níveis de mobilizaçõesobjetivadas: o da coesão gregária e o da co-esão solidária. Segunda (e por questões deexplícitas e assumidas ciência, consciência,adesões e compromissos simultaneamentepessoais/comunitários), só o nível da coesãogregária não basta para a formação e gera-ção dos vínculos culturais e operacionais damobilização associativo-cooperativa reque-

rida para que cada comunidade-localidadese alce da tradicional dependência de mero-objeto para a emancipatória performance desujeito/a do seu próprio processo de desen-volvimento. E é sobre isso que, a seguir, seconversa um pouco mais.

3.3 Sobre coesão gregária, coesão solidáriae comunitarização para Desenvolvi-mento Local

De início, convém observar – frisa o co-autor Ávila – que o título em questão implicae requer explicitação pelo menos destes seteprincipais conceitos, referentes a fenômenosmobilizadores de pessoas: gregariedade,solidariedade, coesão, coesão gregária, co-esão solidária, comunitarização e Desen-volvimento Local (este já enucleado lá atrás,em 3-b.2).

Então, no que respeita aos seis concei-tos restantes, e reproduzindo formulações jápublicadas pelo co-autor Ávila:

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a) Diferenciação básica entre gregarieda-de e solidariedade:

[...] o ser humano é essencialmente gregáriomas apenas perifericamente solidário. Aessencialidade gregária lhe é conferida peloinstinto de preservação e autopreservaçãoda espécie, ao passo que a solidariedade selhe afigura como fenômeno residual, resul-tante da intuição (em estado mais primitivo)e do raciocínio analítico (em estágios maisavançados), sobre a necessidade e/ou con-veniência de se estender aos “outros” aquiloque extrapola pelo menos os limites mínimosda autopreservação individual”. (ÁVILA,2000b, p. 117).

b) Gregariedade:[...] a gregariedade é impulsiva diante dequalquer ameaça ou até interesse deautorpreservação: vários se unem, quandose trata de união voluntária ou instintiva,mas cada um [também] com o objetivo ouimpulso de se preservar. [...] A gregariedadesem solidariedade foi sempre a “razão” detodas as guerras, de todos os conflitos, detodos os desentendimentos, de todos os des-calabros ecológicos e do próprio subdesen-volvimento [...] (ÁVILA, 2000b, p. 117-118).

c) Solidariedade:[...] representa o estado de ânimo (impres-sões, crenças e convicções) que gera voliti-vos, afetivos e efetivos laços de mobilizaçãoe cooperação (nos âmbitos de uma pessoapara com outra, de um grupo para com ou-tros, dos membros de um grupo para comtodo o grupo ou de membros para com mem-bros do mesmo grupo [...]. (ÁVILA; CAMPOS;ROSA; FERRO; PAULITISCH, 2001, p. 41-42).

d) Coesão:[...] se caracteriza pela real concretização doestado de mobilização e cooperação de umgrupo de pessoas, pequeno ou grande [...].(ÁVILA; CAMPOS; ROSA; FERRO;PAULITISCH, 2001, p. 42).

e) Coesão gregária:[...] a que se efetiva com base em impulsosinstintivos (ou algo bem próximo de senti-mentos, interesses e finalidades primários-comuns) de autopreservação e/ou conserva-ção de todo o grupo ou de parte dele, [...].(ÁVILA; CAMPOS; ROSA; FERRO;PAULITISCH, 2001, p. 42).

f) Coesão solidária:[...] resultante de volitivos, afetivos e efetivoslaços de mobilização e cooperação [...] para

cuja formação [...] boa dose de idealismo al-truísta se soma a sentimentos, interesses efinalidades comuns, conferindo à união dogrupo significância e relevância social quetranscendem as imputadas aos esforços edispêndios individuais implicados. (ÁVILA;CAMPOS; ROSA; FERRO; PAULITISCH,2001, p. 42-43).

g) Comunitarizar/comunitarização:Embora ainda não constantes de nos-

sos léxicos, o verbo comunitarizar e o deriva-do substantivo comunitarização vêm assu-mindo importância cada vez maior no con-texto do Desenvolvimento Local, pelos mo-tivos de que:- primeiro,

[...] inexistem comunidades-prontas paraDL, valendo dizer que mesmo os agrupamen-tos humanos que se configurem como “co-munidades”, em razão de determinados cri-térios e situações de reciprocidades intera-tivas, só decolarão na rota do Desenvolvi-mento Local se movidos por processo deconstante autocomunitarização para DL.(ÁVILA, 2008, p. 88);

- segundo, a implementação das lógicas re-ferenciais do DL implica permanente for-mação comunitário-cultural tanto paraentendê-las, desvinculadamente de qual-quer conotação assistencialista, quantopara assumi-las endógena e operativame-nte como coisas próprias (portanto, nãoimpingidas de fora para dentro) de cadacomunidade-localidade que as adote.

Mas, continua Ávila, a significação doverbo comunitarizar (que também se subs-tantiva em comunitarização) no contexto doDesenvolvimento Local, pode ser combina-da dos sentidos destes três termos, já devida-mente dicionarizados (MICHAELLIS, 1998,p. 550 e 1191): a) “Comunidade [...]. 3 SociolAgremiação de indivíduos que vivem emcomum ou têm os mesmos interesses e ideaispolíticos, religiosos etc. [...]” ; b) “Comunitá-rio [...]. Designativo da formação dos povos,em que prepondera o sentimento de comu-nidade.”; e c) “- izar suf (gr - ízein, pelo lat- izare) Forma verbos que indicam idéia de[...] converter, tornar [...]”.

Nesta mesma matéria já se fez referên-cia, várias vezes, aos fluxos relacionais com-preendidos nas tramas vivenciais de deter-minada “comunidade” (principalmente noque respeita a processo de equilibração entre

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relacionamentos primários e secundários).No entanto, ainda faltava explicitar as signi-ficações conceituais básicas de comunitarizare comunitarização (no contexto de DL)para mobilizações nos limites dos níveistanto gregário quanto solidário , comoanunciado no parágrafo anterior a estesubitem 4.3.

Então, nos limites gerais do nívelgregário de mobilização, esses dois termostêm os sentidos de: agremiar (se referir acomunitarizar) ou agremiação de (no casode comunitarização) pessoas, instintivo-im-pulsivamente, para tornarem comuns vivên-cias, interesses e ideais imediatos, relaciona-dos com preservação e autopreservação cole-tiva e individual, principalmente em situa-ções de fortes ameaças, agudas necessidadese/ou intensas comoções no horizonte exis-tencial do grupo envolvido.

Já os mesmos vocábulos, nos limites donível solidário de mobilização para Desen-volvimento Local (de acordo com o “núcleoconceitual” lá no item 3-b.2) significam:agremiar (se comunitarizar) ou agremiaçãode (se comunitarização) pessoas para con-verterem (afetiva, efetiva, associativa, coo-perativa e produtivamente) interesses, ideais,princípios, objetivos, metas e/ou iniciativasgeradoras e implementadoras de sadio eequilibrado desenvolvimento (no seu âmbitode existência humano-ambiental, assimcomo nas perspectivas de curto, médio e lon-go prazos) em saberes, vivências e compro-missos comuns, visando à continua forma-ção educativo-cultural para, de um lado, aequanimidade compreensivo-contributiva determos e propostas objetivadas e, de outro,tornar os membros do conjunto agremiadocapazes e competentes de assumirem e ati-varem responsabilidades no processo de de-senvolvimento comunitário-local em que seenvolvam.

E quando se quiser destinar esta concei-tuação a outras finalidades de mobili-zação (que não a do DesenvolvimentoLocal), sem precisar mexer integralmen-te em seu teor, basta ajustar as termino-logias designativas dessas finalidades nosespaços gráficos em que se localizem.

A diferenciação fundamental entre asduas categorias de conceituação, acima,pode ser facilmente percebida. Nos limitesgerais do nível gregário de mobilização, oprocesso de comnitarizar/comunitarizaçãopode: primeiro, ser incentivado de fora, ouseja, alguém (por exemplo, religioso, políticoou qualquer outro agente social externo) vaiabrindo os olhos das pessoas para que elas seunam e reajam a situações que as oprimam;e, segundo, brotar das próprias premênciaspor meio de alguma liderança interna ou,comparativamente: quando o vento sopraforte e se debate com obstáculos que o fazemcircular em terreno pulverizado, redemoinhosemergem sem que se necessite de ventiladoresexternos; a premência mesma pode tornar-se força gravitacional para a comunitari-zação.

Já a mobilização nos limites do nívelsolidário para Desenvolvimento Local re-quer muito mais ciência, consciência, afei-ção-construtiva, alteridade e compromissodas próprias pessoas envolvidas. Neste caso,os redemoinhos sempre precisam ser provo-cados e alimentados por agentes internos eexternos (sobretudo agentes de DL), sem tré-gua e para horizontes que vão muito alémdas fronteiras instintivo-impulsivas da pre-servação ou autopreservação, no âmbito damobilização gregária.

Nos limites do nível solidário demobilização para DL, os entendimentos econsensos se tornam muito mais comple-xos e difíceis, porque o contexto e osposicionamentos pessoais são fundamen-talmente diferentes daqueles do nívelgregário. Neste, a premência da comoção ouemergência desarma as pessoas, que buscamo processo de agremiação ou agrupamentotanto por encaminhamentos e soluçõesquanto porque esse tipo de coletivização tam-bém – e muito fortemente – funciona comoabrigo ou refúgio compartilhado, em virtu-de dos impulsos de gregariedade que, emtermos de Ecologia Humana, começam afluir desde a fase pré-sociológica da competi-ção biótica pela existência. Tal competiçãose inicia com características ecológicas idênti-cas às que ocorrem com plantas e outros ani-mais (PIERSON, 1968, p. 111 e 113-114), sóse diferenciando depois, quando entra emcena a própria dinâmica sociológica humana.

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Aliás, no livro Comunidade: a buscapor segurança no mundo atual, Bauman(2003) destaca a idéia de que, na base daexistência humana, a comunitarização semove pelo imaginário da “comunidade”como ambiência de refúgio “[...] que pro-duz uma ‘sensação de aconchego’”. No en-tanto, logo de início Bauman ressalta suaopinião sobre esta fundamental diferença:em ideário de “comunidade imaginária” seaspiram proximidade, apoio e proteção, en-quanto que, na concretude de uma “comu-nidade real”, proximidade, apoio e proteçãocustam o preço da submissão à coletividade,por significativa restrição a liberdades indi-viduais.

Mas, no nível solidário de mobili-zação para DL, os contextos são ou se tor-nam diferentes: são diferentes, quando osurgimento do processo de comunitarizaçãovisa diretamente o DL; tornam-se diferentesse o início desse processo acontece em mo-mentos de comoção ou emergência (portan-to, lá nos horizontes da gregariedade mobi-lizatória) mas se evolui progressivamentepara os limites da comunitarização solidáriapara DL, o que é perfeitamente possível so-bretudo em se tratando de DL relacionadocom “comunidades” de origens carentes ouperiféricas.

[E aqui se abrem colchetes para enfatizartrês lembranças: primeira, o DL não écoisa só de “comunidades” pobres, perifé-ricas ou carentes; segunda, o DL é, sim,coisa de “comunidades definidas” comtudo o que elas abranjam (pobrezas, ri-quezas e não importa quê mais); tercei-ra , “AFINAL DE CONTAS ESOCIOCULTURALMENTE FALANDO,QUANDO E ONDE RIQUEZA SE TOR-NOU SINÔNIMO DE DESENVOLVI-MENTO E RICO DE DESENVOLVI-DO?” (ÁVILA, 2006, p. 60)].

E os ser ou tornar-se diferentes, acima,não dizem respeito só às mencionadas (nopenúltimo parágrafo) ciência, consciência,afeição-construtiva, alteridade e compro-misso das próprias pessoas envolvidas. Aestas complexidades, acrescenta-se a da per-manente latência de irrupções conflituosasentre os membros agremiados. Isto, pela ine-

quívoca razão de que (além das necessáriasoperações-tapa-buracos de sobrevivência,típicas principalmente da fase gregário-mobilizatória, de alguma forma conectadaa comoções e/ou emergências) o DL se proje-ta planejadamente para dimensões futurasde interesses e conquistas. E é, sobretudo,nesses momentos estratégicos de debates eacertos que emergem conflitos referentes tan-to a maneiras de pensar e agir quanto a con-corrências também de interesses e caprichos,até mesmo das alçadas pessoais ou de gruposávidos por proveitos próprios.

Portanto, o maior desafio em relaçãoa tudo o que mais exija alerta, nesse proces-so de comunitarização, talvez consista emnão deixá-lo paralisar-se por exposição econtaminação continuadas a climas internoe externo de desconfiança. Se persistentes,esses climas desarticulam, solapam e implo-dem qualquer processo de comunitarizaçãopara DL. Daí se destacar, no conceito decomunitarizar/comunitarização lá atrás, aimportância da continua formação educa-tivo-cultural explícita e especificamentepara DL. Essa continuidade de formação-específica também se estende indispensavel-mente a quantos se envolvam em agencia-mento de DL: “[...] que os Agentes de Desen-volvimento Local se insiram, com o passar dotempo, em contexto mais abrangente e capi-larizado de formação e educação comunitário-local para essa nova perspectiva de desenvol-vimento [...]” (ÁVILA, 2006, p. 94).

É por aí que as pessoas em dinâmicade comunitarização se tornam aptas adiscernir e relevar conflitos e equilíbrios en-tre estas duas categorias dimensionais: ados interesses-coletivos e a dos interesses-individuais. Do contrário, tudo irá bem atéos limites do nível gregário de mobilização,mas tenderá a se descambar quando come-çar a percorrer os degraus da comunitari-zação solidária para DL, esta mais exigentede capacidades humanas de diálogo, assimcomo de negociações e partilhas de responsa-bilidades de toda ordem.

Nesse sentido, não se precisa campearexemplos em outros países ou até mesmolonge do alcance de nossa real vivência, maso caso – abaixo – narrado por FernandoCardenal (1994), referindo-se a projeto emárea da reforma agrária sandenista

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nicaragüense, ilustra muito bem a situaçãode nocivo conflito entre as aludidas duascategorias de interesses:

Um de nossos primeiros projetos, o realiza-mos com um grupo de mulheres. Começa-mos alfabetizando-as e, pouco a pouco, pu-deram ir superando sua desconfiança, ne-las mesmas e em sua capacidade de produ-zir eficazmente. Depois de todos os estudosnecessários, decidiram que trabalhariamcom uma granja de criação de porcos. Rece-beram capacitação: da alvenaria, para queelas mesmas construíssem a cobertura paraos porcos, até o cuidado com a saúde dosanimais. Tudo ia bem. Os porcos crescerame engordaram e os venderam bem. E come-çou a aumentar a confiança das mulheres,tanto nelas mesmas quanto no seu retornoeconômico. Mas, num aprazado dia, houveuma disputa entre elas e, como não se en-contrava solução, umas poucas pegaram aparte de porcos que lhes correspondia e sesepararam do grupo. Porque faltou capaci-dade humana de diálogo, reconhecimentodos erros cometidos, solidariedade e domí-nio das paixões, um grupo renunciou ao seufuturo de desenvolvimento.

Entretanto, podem-se destacar trêsrelevantes ênfases quanto ao anteriormen-te mencionado processo de continua forma-ção educativo-cultural para comunitari-zação na perspectiva do DL:

Primeira, a tendência de descamba-mento, acima mostrada e realçada pela ci-tação, não anula ou minimiza o fato de quea ocorrência de comunitarização já nos li-mites do nível gregário de mobilização (alu-dido atrás) se configure como potencialidadeextremamente importante para sua extensãoaté os limites do nível solidário de mobiliza-ção para DL.

Segunda, o que não pode acontecer ésupor que só a comunitarização já conse-guida no nível gregário seja suficiente paraa seqüência implementadora do DL alémdas fronteiras das sobrevivências comunitá-rio-pessoais no nível solidário.

Terceira, e conseqüentemente, a cons-tante geração e alimentação da menciona-da “[...] capacidade humana de diálogo, re-conhecimento dos erros cometidos, solidarie-dade e domínio das paixões [...]” implicanecessariamente: por um lado, a enfatizadacontinua formação educativo-cultural paracomunitarização na perspectiva do DL; e,

por outro, também (segundo Fernando Car-denal, no mesmo artigo citado) que essa per-manente dinamização formativa se impreg-ne em todas as políticas e iniciativas de edu-cação formal e informal, na condição de in-cessante diálogo com “[...] ‘os veios educa-tivos’ [...] da vida mesma [...]”, inclusive deforma a se “[...] ‘educar produzindo’ ou‘produzir educando’”.

Assim, o que fundamentalmente seintenciona por essa contínua formaçãoeducativo-cultural é que a decorrente esupracitada “[...] capacidade humana de diá-logo [...]” se constitua indispensável lastroformativo para que os membros-comunitá-rios se tornem aptos a endogeneizarem eexercitarem também as seguintes duas com-petências interativas: a) a de discerniremquais interesses coletivos e individuais são(ou não são) pertinentes, justos e compatíveiscom processo de DL; e b) a de encontraremencaminhamentos consensuais, logísticos eoperacionais para que, ao invés de conflitos,confrontos e mútuas anulações entre perti-nentes interesses dessas duas categorias, unse outros se harmonizem, interativem e pro-pulsionem (a exemplo do que faz um “mo-tor de dois tempos”) na dialética processua-lística de animação evolutiva, construtiva eprodutiva do próprio DesenvolvimentoLocal almejado.

Cabe indagar, após essas análises so-bre gregariedade, solidariedade, coesãogregária e coesão solidária no processo decomunitarização para DL: como as perfor-mances de comunitarização, no âmbito doJardim Sayonara de Campo Grande-MS, tan-to as já concretamente existentes quanto asainda caracterizadas como reais potenciali-dades (focadas até o final do anterior subitem4.2), se situam no contexto dos acima focadosvieses teóricos da comunitarização nos limi-tes dos níveis gregário e solidário de mobi-lização?

Para facilitar e encurtar tal análise, amelhor estratégia parece ser a de desdobrá-la em dois momentos: o anterior e o posteriorà explicitação dos supramencionados viesesteóricos ou, simplesmente, antes e depois –mas até aqui – da redação deste subitem 4.3.

No tocante ao momento anterior,quando se garimpam fluxos fenomenológicosde determinada “comunidade” e se desco-

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brem, por um lado, a extrema precariedadede sua origem e, por outro, os reais e signifi-cativos avanços de auto-sensibilização,automobilização e auto-organização, a pri-meira sensação conclusiva que brota é a deentusiasmo em relação ao êxito do processode comunitarização já conseguido nesseâmbito comunitário, em relativamente tãopouco tempo (no caso Sayonara, a partir de1987, como visto no item 2). E nem é necessá-rio que se reiterem, aqui, fatos e ilustraçõesa esse respeito, vez que podem ser relidosatrás, até o final do subitem 4.2.

Mas, já adentrando ao cenário do mo-mento posterior de análise (isto é, após a ex-plicitação dos vieses teóricos da comunita-rizar/omunitarização em níveis gregário esolidário de mobilização, neste subitem4.3), também se percebe que todo o exitosoprocesso de comunitarização auto-imple-mentado no Jardim Sayonara se situava (em2006, quando a pesquisa foi realizada) nopatamar da comunitarização ainda comcaracterísticas essencialmente gregárias.

Isso, em razão de que até ameaçadoresriscos comunitários continuavam a existir(caso de enchentes, por exemplo), emboramuitas outras carências já tivessem sendoequacionadas pelos movimentos internos decomunitarização. Convém reiterar, no en-tanto, que tais movimentos não emergirampor geração espontânea. Foram inicialmentedespertados com a ajuda de agentes-exter-nos, no começo os religiosos e em seguidatambém os municipais, estes a partir de apro-ximadamente seis meses da ocupação daárea, dado que até então a ameaça de reti-rada das famílias invasoras vinha de própriaPrefeitura, como registrado principalmentenos anteriores itens 2 e 3.

Mas, quanto à comunitarização noslimites do nível solidário para DL, impor-tantes depoimentos de agentes internos de-nunciaram a existência daquilo que (à épo-ca da investigação de campo no JardimSayonara) foi interpretado como situação dedormência. Tal situação assim se caracteri-zou pela inexistência de motivação, em sig-nificativa parcela de moradores, quanto aengajamentos em novas mobilizações paraconquistas comunitárias. Segundo os depo-entes, esses moradores atribuíam à exclusivacompetência dos órgãos públicos (sobretu-

do municipais) tanto a promoção quanto aelevação da qualidade de vida de todos osmunícipes.

Tal interpretação ensejou o entendi-mento de que, até então, a “comunidade”Sayonara não havia se apropriado de seusdestinos e, conseqüentemente, de suas capa-cidades e competências tanto de digerir emetabolizar quanto de prover e implementarseus rumos e dinâmicas de desenvolvimen-to comunitário-local. Permitiu interpretar,portanto, que o processo de comunitariza-ção, já bastante adiantado e exitoso nos li-mites do nível gregário de mobilização (pe-las análises anteriores deste item 4), aindanão se estendera decisivamente aos limitesdo nível solidário, requerido pelo Desen-volvimento Local, embora já se configuras-se como importante potencialidade-básicapara tanto.

Mas há esperança de que o processode comunitarização nos limítrofes JardinsAeroporto e Sayonara recebam mais incen-tivos e investimentos externos. Trata-se doProjeto Urbanistico Imbirussu/Serradinho(inserido no Plano de DesenvolvimentoLocal Integrado da Prefeitura Municipal deCampo Grande-MS), já em implementação,que objetiva melhorias infra-estruturais eurbanísticas, como a capacitação de líderescomunitários e de grupos de produção, aconstrução de espaços físicos e equipadospara a comercialização da produção local eo exercício do lazer coletivo das populaçõesaí residentes, dada a inexistência de tais es-paços em toda a região. Esse Projeto se origi-nou de aporte financeiro do Banco Interna-cional para a Reconstrução e Desenvolvimen-to–BIRD, através do Ministério das Cidades,e sua implementação conta com as parceiraslideranças dos Presidentes da Associação deMoradores do Jardim Aeroporto e da Asso-ciação de Moradores do Jardim Sayonara.

Importa observar, ainda e como aludi-do anteriormente, que a Prefeitura Munici-pal de Campo Grande-MS se valeu dessemesmo Projeto para remanejar, no final de2006, 107 famílias do Jardim Sayonara parao Jardim Aeroporto. A exemplo do que sereferiu a desmembramentos comunitários nosubitem 4.2, esse remanejamento de famíliastambém se caracterizou como despolariza-ção, só que excepcionalmente por iniciativa

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de agência externa – a Prefeitura – e não daspróprias pessoas envolvidas, como lá sefocou.

Embora não se tenha se estendido apesquisa ao remanejamento dessas famílias,o que se presume é que a vivência anterior(para os primeiros passos do processo decomunitarização no Jardim Sayonara, ain-da que de cunho eminentemente gregário)lhes haja propiciado potencialidades de mo-bilização para organização e implementaçãoda vida comunitária outra vez recomeçadano Jardim Aeroporto. Entretanto, é de se res-saltar que o recomeço dessas 107 famíliascontou com condições iniciais muito positi-vas, visceralmente diferentes daquelas doJardim Sayonara, visto que, graças ao men-cionado Projeto Urbanistico Imbirussu/Serradinho, o translado já ocorreu com aexistência de várias benfeitorias infra-estru-turais: unidades habitacionais, Centro deEducação Infantil, sede da Associação deMoradores, área de lazer coletivo, quadra deesporte, Centro de Referência de AssistênciaSocial, bem como asfalto e abrigos na linhade ônibus.

Mesmo assim, informações posterioresaos trabalhos de campo desta pesquisa jáapontavam para a seguinte estratificaçãodessas mesmas famílias. Uma parte delasapenas deslocou endereço e maneiras de agirpara a configuração de seu novo territóriourbano. Mas, quanto à outra parte, as famí-lias mudaram também seus próprios objetose enfoques de lutas territoriais, tornando-semembros de grupos organizados de “SemTerras” e respectivos acampamentos, talvezaté inspiradas no caso do primeiro Presiden-te da Associação de Moradores do JardimSayonara, que, à época, já tinha seu terrenocom casa no bairro, mas trabalhava no cam-po, em área de assentamento previamenteregularizado.

Enfim, quanto a Projetos como oUrbanistico Imbirussu/Serradinho e quais-quer outros investimentos externos relacio-nados com DL: QUE SE TORNEM SIMUL-TANEAMENTE OPORTUNIDADES E MEI-OS OPERACIONAIS DE PROMOÇÃO,NAS COMUNIDADES-LOCALIDADES AQUE SE DESTINEM, DA ANTERIORMEN-TE ENFATIZADA CONTINUA FORMA-ÇÃO EDUCATIVO-CULTURAL PARA

COMUNITARIZAÇÃO NA PERSPECTIVADO DESENVOLVIMENTO LOCAL. Do con-trário, correrão o sério e grave risco de fun-cionarem como impulsores dessas comunida-des para a areia movediça da dependência aoassistencialismo, este essencial e criminosa-mente inibidor – na maioria das vezes atémesmo assassinador – de capacidades e ini-ciativas locais de desenvolvimento.

4 Destaques rememorativo-conclusivos

Em prisma retrospectivo, os seguintestrês destaques merecem especial atençãopelas relevâncias de suas influências no pro-cesso de participação mobilizatória paracomunitarização, nos termos da pesquisa aque todo este texto vem se referindo:

Primeiro, o do próprio contexto de pre-cariedade e risco que marcou a história doJardim Sayonara, desde o seu início, por con-vivência com duplas frentes de ameaças vi-tais: por um lado, a da pobreza somada aosperigos impostos pela natureza (sobretudoenchentes, relembrando que esse bairro seformou às margens dos Córregos Serradinhoe Imbirussu) e, por outro, a da tentativa ini-cial de o próprio poder público municipalretirar a população dessa área, não só peri-gosa como também ocupada à maneira deinvasão urbana.

Segundo, o da mediação orientadorade religiosos. Lá no parágrafo 19 do item 3,atrás, registrou-se que houve “[...] mobiliza-ção da igreja na organização urbana” [...]”.O posterior parágrafo 21, de modo mais ex-plícito, assim se refere à dinâmica de imple-mentação do processo de participação no seioda “grande comunidade” do Jardim Sayo-nara: “[...] cumpre ressaltar que as iniciativasde ‘participação e desenvolvimento’ nãoaconteceram de um dia para o outro: come-çaram aos poucos [...]. E os passos iniciaisforam dados por orientações de religiososatuantes no bairro.”. Já o seguinte parágrafo28 registrou a ênfase de que “De acordo comdepoimentos dos líderes e agentes externosentrevistados, os membros da igreja católicaatuaram junto à população do bairro comosemeadores e fomentadores dessa dinâmicade ‘comunitarização’”. Trata-se de observa-ções extremamente importantes, porque osreligiosos que entenderem o significado de

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participação/comunitarização no contextodo DL (da mesma forma que as significaçõesteóricas e metodológicas do próprio Desen-volvimento Local, como “nucleado” no ante-rior item 3-b.2), por um lado perceberão suaperfeita compatibilidade com os princípiosbásicos de todas as dimensões da pastoralsócio-religiosa cristã, islâmica, budista, etc.,e, por outro, prestarão inestimável contribui-ção ao processo de endogeneização dessamodalidade de desenvolvimento em todas ascomunidades-localidades a que dedicaremseus serviços pastorais.

Terceiro, o da inversão postural dosagentes da Prefeitura Municipal. Frisou-se,ainda nos anterior item 3, que inicialmentea Prefeitura de fato ameaçou retirar a popu-lação da área. Entretanto, depois da audiên-cia em que o Prefeito Municipal garantiu quetodos os moradores “[...] ficassem tranqüilos,pois ninguém os tiraria de lá” e, continua oparágrafo 24: “[...] após seis meses da ocu-pação, postes de madeira para a energia elé-trica foram instalados, seguidos de água en-canada e, posteriormente, de visita a cadamês dos representantes da prefeitura”. Ain-da, por outros depoimentos, essa contínuapostura dialogal entre a Prefeitura e a “gran-de comunidade” do Jardim Sayonara conti-nuou a se materializar e fortalecer inclusivepela efetiva participação dos líderes locaisno respectivo Conselho Regional Urbano.

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Art. 6º - A entrega dos originais para a Revista deveráobedecer aos seguintes critérios:

I - Os artigos deverão conter obrigatoriamente:a) título em português, inglês, espanhol e francês;b) nome do(s) autor(es), identificando-se em rodapé

dados relativos à produção do artigo, ao(s) seu(s)autor(es) e respectivas instituições, bem como aauxílios institucionais e endereços eletrônicos;

c) resumo em português, inglês, espanhol e francês com,no máximo seis linhas ou 400 caracteres, rigorosa-mente corrigidos e revisados, acompanhados, res-pectivamente, de palavras-chave, todas em númerode três, para efeito de indexação do periódico;

d) texto com as devidas remissões bibliográficas nocorpo do próprio texto;

e) notas finais, eliminando-se os recursos das notas derodapé;

f) referências bibliográficas.II - Os trabalhos devem ser encaminhados dentro da

seguinte formatação:a) uma cópia em disquete no padrão Microsoft Word

6.0;b) três cópias impressas, sendo uma delas sem

identificação de autoria e outra acompanhada deautorização para publicação, impressa e on-line,devidamente assinada pelo(s) autor(es);

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f) os caracteres itálicos serão reservados exclusiva-mente a títulos de publicações e a palavras emidioma distinto daquele usado no texto,eliminando-se, igualmente, o recurso a caracteressublinhados, em negrito, ou em caixa alta; todavia,os subtítulos do artigo virão em negrito;

III - Todos os trabalhos devem ser elaborados emqualquer língua e encaminhados em três vias, comtexto rigorosamente corrigido e revisado .

IV - Eventuais ilustrações e tabelas com respectivaslegendas devem ser contrastadas e apresentadasseparadamente, com indicação, no texto, do lugaronde serão inseridas. Todo material fotográfico será,preferencialmente, em preto e branco.

V - As referências bibliográficas e remissões deverãoser elaboradas de acordo com as normas dereferência da Associação Brasileira de NormasTécnicas (ABNT - 6023).

VI- As opiniões e conceitos emitidos pelos autores dosartigos são de sua exclusiva responsabilidade.

VII - Os limites estabelecidos para os diversos traba-lhos somente poderão ser excedidos em casos real-mente excepcionais, por sugestão do Conselho Edi-torial Internacional e a critério do Conselho deRedação.

Art. 7º - O(s) autor(es) deverá(ão) enviar declaração deelaboração, domínio do conteúdo e autorização parapublicação do artigo (disponível no site do periódico).

Art. 1º - Interações, Revista Internacional do Programade Desenvolvimento Local da Universidade CatólicaDom Bosco, destina-se à publicação de matérias que,pelo seu conteúdo, possam contribuir para aformação de pesquisadores e para o desenvolvi-mento científico, além de permitir a constanteatualização de conhecimentos na área específica doDesenvolvimento Local.

Art. 2º - A periodicidade da Revista será, inicialmente,semestral, podendo alterar-se de acordo com asnecessidades e exigências do Programa; o calendáriode publicação da Revista, bem como a data defechamento de cada edição, serão, igualmente,definidos por essas necessidades.

Art. 3º - A publicação dos trabalhos deverá passar pelasupervisão de um Conselho de Redação compostopor cinco professores do Programa de Desenvolvi-mento Local da UCDB, escolhidos pelos seus pares.

Art. 4º - Ao Conselho Editorial Internacional caberá aavaliação de trabalhos para publicação.

§ 1º - Os membros do Conselho Editorial Internacionalserão indicados pelo corpo de professores doPrograma de Mestrado em Desenvolvimento Local,com exercício válido para o prazo de dois anos, entreautoridades com reconhecida produção científica emâmbito nacional e internacional.

§ 2º - A publicação de artigos é condicionada a parecerpositivo, devidamente circunstanciado, exarado pormembro do Conselho Editorial Internacional.

§ 3º - O Conselho Editorial Internacional, se necessário,submeterá os artigos a consultores externos, paraapreciação e parecer, em decorrência deespecificidades das áreas de conhecimento.

§ 4º - O Conselho Editorial Internacional poderá proporao Conselho de Redação a adequação dosprocedimentos de apresentação dos trabalhos,segundo as especificidades de cada área.

Art. 5º - A Revista publicará trabalhos da seguintenatureza:

I - Artigos originais, de revisão ou de atualização, queenvolvam, sob forma de estudos conclusivos,abordagens teóricas ou práticas referentes à pesquisaem Desenvolvimento Local, e que apresentemcontribuição relevante à temática em questão.

II - Traduções de textos fundamentais, isto é, daquelestextos clássicos não disponíveis em língua portu-guesa ou espanhola, que constituam fundamentosda área específica da Revista e que, por essa razão,contribuam para dar sustentação e densidade àreflexão acadêmica, com a devida autorização doautor do texto original.

III - Entrevistas com autoridades reconhecidas na áreado Desenvolvimento Local, que vêm apresentandotrabalhos inéditos, de relevância nacional einternacional, com o propósito de manter o caráterde atualidade do Periódico.

IV - Resenhas de obras inéditas e relevantes que possammanter a comunidade acadêmica informada sobreo avanço das reflexões na área do DesenvolvimentoLocal.

I N T E R A Ç Õ E SRevista Internacional de Desenvolvimento Local

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Art. 8º - Não serão aceitos textos que não obedecerem,rigorosamente, os critérios estabelecidos. Os textosrecusados serão devolvidos para os autores acom-panhados de justificativa.

Art. 9º - Ao autor de trabalho aprovado e publicadoserão fornecidos, gratuitamente, dois exemplares donúmero correspondente da Revista.

Art. 10 - Uma vez publicados os trabalhos, a Revistareserva-se todos os direitos autorais, inclusive os detradução, permitindo, entretanto, a sua posteriorreprodução como transcrição, com a devida citaçãoda fonte.

Para fins de apresentação do artigo, considerem-se osseguintes exemplos (as aspas delimitando os exemplosforam intencionalmente suprimidas):

a) Remissão bibliográfica após citações:In extenso: O pesquisador afirma: “a sub-espécie Callithrixargentata, após várias tentativas de aproximação,revelou-se avessa ao contato com o ser humano”(SOARES, 1998, p.35).Paráfrase: como afirma Soares (1998), a sub-espécieCallithrix argentata tem se mostrado avessa ao contatocom o ser humano...

b) Referências bibliográficas:

JACOBY, Russell. Os últimos intelectuais: a culturaamericana na era da academia. Trad. Magda Lopes.São Paulo: Trajetória/Edusp, 1990.SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo,razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.______. A redefinição do lugar. In: ENCONTRONACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA, 1995, Aracaju. Anais...Recife: Associação Nacional de Pós-Graduação emGeografia, 1996, p. 45-67.______. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1987.SOJA, Edward. Geografias pós-modernas: a reafirmaçãodo espaço na teoria social crítica. Rio de Janeiro: JorgeZahar, 1993.SOUZA, Marcelo L. Algumas notas sobre a importânciado espaço para o desenvolvimento social. In: RevistaTerritório (3), p.14-35, 1997.WIENER, Norbert. Cibernética e sociedade: o uso humanode seres humanos. 9. ed. São Paulo: Cultrix, 1993.

c) Emprego de caracteres em tipo itálico: os programasde pós-graduação stricto sensu da universidade emquestão...; a sub-espécie Callithrix argentata tem semostrado...

Endereço para correspondência e envio de artigos:Universidade Católica Dom Bosco

Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Local – Mestrado AcadêmicoINTERAÇÕES – Revista Internacional de Desenvolvimento Local

Av. Tamandaré, 6.000 – Jardim SeminárioCEP 79117-900 Campo Grande-MS

Fone: (67) 3312-3594e-mails: [email protected] / [email protected]

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCOCENTRO DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO LOCALMESTRADO ACADÊMICO

____________________________________Assinatura

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local

ASSINATURA ANUAL

NOME COMPLETO __________________________________________________________

CPF_______________________________________________________________________

ENDEREÇO _____________________________________________________ N._______

BAIRRO _______________________________________CEP _______________________

CIDADE ___________________________________________________________________

TELEFONE ___________________________ CELULAR ____________________________

E-MAIL _____________________________________________________________________

DATA DA ASSINATURA _____/_____/__________

VALOR ANUAL VÁLIDO PARA 2009: R$ 50,00 (CINQÜENTA REAIS).

OBS.: PERIODICIDADE SEMESTRAL (MARÇO E SETEMBRO).

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Procedimentos:

Fazer depósito bancário em favor da Fundação Tuiuiú, no valor de R$ 60,00 (sessenta reais),

em uma das seguintes contas: Banco do Brasil, agência 2609-3, conta corrente 5902-1; ou

HSBC, agência 0842, conta corrente 11822-40. Enviar comprovante do depósito com a ficha

de assinatura via fax ou para Editora UCDB: Av. Tamandaré, 6.000, Jardim Seminário, CEP

79117 900 - Campo Grande-MS.

Para qualquer dúvida, entrar em contato pelo fone/fax: (67) 3312-3373; ou e-mail: [email protected].

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCOCENTRO DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO LOCALMESTRADO ACADÊMICO

____________________________________Assinatura

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local

DECLARAÇÃO

Eu, _________________________________________________________________,

declaro, para fins de publicação nesta revista, que elaborei e domino o conteúdo do presente

artigo, intitulado ______________________________________________________________

___________________________________________________________________________,

bem como atendi a todos os critérios exigidos e autorizo o Conselho de Redação a publicar o

meu artigo.

Data:_____/_____/_____.

Obs.: Quando o artigo tiver mais de um autor, todos deverão enviar esta declaração.

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