história das neurociências
TRANSCRIPT
II Semana do Cérebro de Marabá
História das neurociências
Prof. Dr. Caio Maximino
‘‘Dans les champs de l’observation le hazard nefavorise que les esprits prepare’’
● Séc. VII a.C. - Papiro Cirúrgico de Edwin Smith– Primeira referência ao cérebro
em qualquer registro humano– A palavra só aparece oito vezes
no registro egípcio antigo– A seção descreve os sintomas,
diagnósticos e prognóstico de dois pacientes com fraturas múltiplas no crânio
Antiguidade
Alcmeão de Crotona (535 - ? a.C.)
● Discípulo de Pitágoras na Magna Grécia
● Descreveu o nervo óptico
● Propôs que o encéfalo é a sede das sensações e da atividade mental
Hipócrates de Kos (460-370 a.C.)● “O homem deve saber que de nenhum outro
lugar, mas apenas do encéfalo, vem a alegria, o prazer, o riso e a diversão, o pesar, o luto, o desalento e a lamentação. E por isso, de uma maneira especial, nós adquirimos sabedoria e conhecimento e enxergamos e ouvimos e sabemos o que é justo e injusto, o que é bom e o que é ruim, o que é doce e o que é insípido... E pelo mesmo órgão nos tornamos loucos e delirantes, e medos e terrores nos assombram... Todas essas coisas nós temos de suportar do encéfalo quando não está sadio... Nesse sentido, opino que é o encéfalo quem exerce o maior poder sobre o homem” -Sobre a Doena Sagrada
O Egito da Era Helenística
● Herófilo da Calcedônia (335-280 a.C.) - Distinguia entre cérebro e cerebelo; fez a primeira descrição dos ventrículos
● Erasístrato de Chio (300-240 a.C.) - Descrição dos nervos periféricos e suas origens; acreditava que esses nervos transportavam um “espírito nervoso” a partir do cérebro
Aelius Galenus (129-216 d.C.) e a neuroanatomia comparada
● Dissecou os encéfalos de ovelhas, macacos, cães, suínos e outros mamíferos não-humanos
● Concluiu que, como o cerebelo é mais denso do que o cérebro, deve ser responsável pelo controle dos músculos
● Modularidade dos nervos espinhais
● A substância mental é a substância física; ambas podem ser estudadas fisicamente
● Acreditava que o cérebro funcionava pelo movimento dos espíritos animais através dos ventrículos
O conhecimento do cérebro na Era Dourada do Islã
● Yuhanna Ibn Masawyh (777-857) – 'Distúrbios do Olho' e 'Conhecimento dos Exames dos Oculistas'
● Al Tabari (810-855) – 'O Paraíso da Sabedoria' contém um capítulo sobre afecções do SN
● Al Razi (850-923) – escreveu sobre como o cérebro opera os músculos
● Ibn Al-Nafis (1213-?) - dissecação resolveu várias concepções erradas sobre o cérebro
Trepanações no Império Inca
● Séc. X d.C.
● Técnica usada em homens adultos para tratar ferimentos sofridos em combate
● Técnicas cirúrgicas padronizadas e aperfeiçoadas com o tempo
● Por volta do séc. XV, as taxas de sobrevivência eram de ~90%
Andreas Vesalius (1514-1564)
● Dissecações descreveu →características estruturais do encéfalo e do SN
● Registrou o putamen e o corpo caloso
● Propôs que o encéfalo é constituído por sete pares de nervos, cada qual com uma função especializada
René Descartes (1596-1650)● Propôs o dualismo de substância como forrma
de resolver o problema mente-corpo– O corpo é físico, tem extensão espacial– A substância mental não apresenta extensão
● Propôs que a mente interage com o corpo na glândula pineal;– A mente é unitária, assim como a pineal– A pineal está localizada próxima aos ventrículos,
controlando o movimento dos “espíritos animais” nessa estrutura e os fluindo para os nervos do corpo.
● A mente controla o corpo, mas esse também pode influenciar a mente (p. ex., emoções)
Luigi Galvani e a eletricidade animal● Demonstração do papel da eletricidade na
contração muscular
● Inspirou campos importantes da física, assim como da cultura popular (Frankenstein)
● Controvérsia com Alessandro Volta sobre a origem do fenômeno– Frederick von Humboldt – dois fenômenos
independentes– Carlo Matteucci – detectou o fluxo de corrente
em músculo– Emil du Bois-Reymond – mensuração em
nervos
Camillo Golgi vs. Santiago Ramón y Cajal
O século XIX e a frenologia
Jean Pierre Flourens e o campo agregado
● Produção experimental de traumas cerebrais em pombos e coelhos; observou que funções específicas não eram prejudicadas com as lesões
● Argumentou contra a localização de funções, afirmando que o cérebro funciona como um “campo agregado”, e é a extensão da lesão, e não a localização, que é responsável pelo dano
John Hughlings Jackson
● Estudos anatomo-clínicos em pacientes epilépticos
● Observação dos padrões de convulsões leva à conclusão de que a ativação motora é semelhante, sugerindo localização específica →concepção topográfica do cérebro
Paul Broca e Carl Wernicke
Emil Kraepelin, o pai da psiquiatria● Criou um sistema de classificação de
transtornos psiquiátricos baseada em síndromes – padrões de sintomas constantes no tempo
● Descreveu os transtornos de humor, esquizofrenia, e transtorno de personalidade antissocial
● Junto com Alois Alzheimer, descreveu a base patológica da doença
O surgimento da neuroquímica● Bernard e Vulpian – experimentos com curare demonstram o sítio de ação na placa motora, e não no
músculo
● Elliot (1904): “o ponto no qual o estímulo do excitante químico [adrenalina] é recebido, e transformado no que pode causar a mudança na tensão da fibra muscular, é talvez um mecanismo desenvolvido pela célula muscular em resposta a sua união com a fibra simpática [que faz uma sinapse]. A adrenalina pode ser então o estimulante químico liberado a cada ocasião quando o impulso chega na periferia”
● Otto Loewi: “vagusstoff”
● Cannon: papel da noradrenalina e da adrenalina nas respostas viscerais e comportamentais da ativação simpática
● Dale (déc. 1930) demonstração da liberação da ACh pelo nervo estimulado
A controvérsia entre farmacologistas e eletrofisiologistas
● Controvérsia levantada entre o neurofisiologista australiano John Eccles, o último orientando de Sherrington, e Henry Dale
● “E segue a controvérsia. Dale, ao discuti-la, observou que não faz sentido supor que a natureza iria prover a liberação no gânglio da acetilcolina, o mais potente estimulante de células ganglionares conhecido, somente para enganar os fisiologistas. A isso, Monnier respondeu que tambem é irracional supor que os potenciais de ação cheguem às sinapses com voltagens aparentemente adequadas para excitar as células ganglionares somente para enganar os fisiologistas”
O eletrodo intracelular resolve a controvérsia
● Utilizando microeletrodos que podiam perfurar a membrana celular, diversos grupos (Gopfert e Schaefer (1938) na Alemanha, Feng (1941) na China, Eccles e colaboradores (1939) na Austrália) observaram que o potencial de ação que chega ao terminal nervoso primeiro inicia um “potencial de placa terminal” local no músculo, que só então leva ao início do potencial de ação muscular.
● Esse resultado sugere que uma substância poderia ser liberada pelo terminal pré-sináptico e agir no terminal pós-sináptico, causando um potencial pós-sináptico.
O axônio gigante da lula
Neurobiologia do desenvolvimento no início do séc. XX
● 1919: Spemman funda uma escola em Freiburg que se tornará um centro de estudos de desenvolvimento; Viktor Hamburger e Johannes Holtfreter
● Em 1924, publica um artigo clássico com Hilde Mangold demonstrando a formação de uma segunda placa neural após a implantação, sugerindo propriedades organizadoras do tecido
A descoberta do NGF
● A remoção experimental de membros em embriões produz uma redução dramática do número de neurônios sensoriais e motores na medula espinhal (Margaret Shorey, 1909; Viktor Hamburger, 1932)
1) Os alvos, isso é, a musculatura e os órgãos dos sentidos, geram dois agentes específicos, um controlando os gânglios espinhais e outro controlando as colunas motoras laterais.
2) Os agentes são transportados retrogradamente nos nervos aos seus centros nervosos específicos, as colunas motoras laterais e os gânglios espinhais
3) Os agentes regulam o desenvolvimento dos centros nervosos de forma quantitativa
A descoberta do NGF● Resultados contraditórios com Hamburger o levam a
convidar Levi-Montalcini para rodar experimentos em seu laboratório
● Demonstram morte celular não só na proximidade do membro, mas também em áreas centrais não-afetadas
● Elmer Bueker – um sarcoma implantado estimula fortemente o crescimento de nervos sensoriais sugere uma →preparação que pode produzir um “fator de crescimento”
● Experimentos in vitro realizados na UFRJ registram de forma semi-quantitativa o efeito
● Tentativa de purificar o fator usando veneno de cobra levam à descoberta da presença do fator em glândula salivar de camundongo
Miguel Ozório de Almeida e a neurofisiologia brasileira
● “L'Inhibition et la facilitation dans le système nerveuz central et périphérique” (1944)
● Especial interesse pela epilepsie experimental (trabalho com Haiti Moussatché)
Thales Martins e a endocrinologia brasileira
● 1926-1936: inicia a pesquisa no “laboratório dos Ozório”, iniciando o campo da endocrinologia no Brasil.
● Trabalho de orientação farmacológica, usando principalmente cachorros.
● Década de 1930: Colaboração importante com Ribeiro do Valle no Instituto Butantã (SP) e fundação da cadeira de fisiologia na Escola Paulista de Medicina.
Miguel Rolando Covian● Década de 1950: Miguel Covian vai à
Ribeirão Preto chefiar o Departamento de Fisiologia da Faculdade de Medicina da USP, enquanto Mauricio Rocha e Silva irá chefiar o Departamento de Farmacologia.
● Formou diversos neurocientistas importantes, incluindo César Timo-Iaria (São Paulo), José Antunes Rodrigues (Ribeirão Preto), Negreiros e Paiva (Campinas), e Katsumasa Hoshino (Bauru).
O Instituto de Biofísica● Mensuração do potencial de membrana no
poraquê.
● Efeitos da doença de Chagas nos potenciais em cultura de miocárdio e tecido neural.
● Expandiu-se enormemente, transformando-se em Instituto de Biofísica em 1946.
● Aristides Leão (depressão alastrante), Paes de Carvalho (miocárdio), Eduardo Oswaldo-Cruz Filho (neurofisiologia do sistema visual), Carlos Eduardo Guinle da RochaMiranda (neuroanatomia e neurofisiologia do sistema olfatório), Rita Levi-Montalcini (NGF na retina in vitro)
Depressão alastrante
● Aristides Azevedo Pacheco Leão descreveu o fenômeno, no qual uma onda de redução na amplitude do EEG segue a estimulação epileptogênica