hermeneutica

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CURSO SUPERIOR DE TEOLOGIA DISCIPLINA: HERMENÊUTICA

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hermeneutica

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  • CURSO SUPERIOR DE TEOLOGIA

    DISCIPLINA: HERMENUTICA

  • CONCEITO GERAL

    INTRODUO

    Procuramos ao mximo fazer um resumo de cada questo, pois caso contrrio a disciplina se tornaria muito extensa, razo pela qual sugerimos que se h algum tpico que seja de interesse expressivo do aluno, ele pesquise por conta prpria, para enriquecimento de sua prpria cultura teolgica.

    LIVROS HISTRICOS

    O que histria?

    Histria : Narrao dos fatos notveis ocorridos na vida dos povos, em particular, e da humanidade em geral. Conjunto de conhecimentos adquiridos atravs da tradio e/ou mediante documentos, acerca da evoluo da humanidade.

    HERMENUTICA BBLICA Definio de Hermenutica: a arte e a interpretao da linguagem. Objetivos da Hermenutica: Relao entre: Autor - Leitor:

  • O objetivo tornar o autor contemporneo do leitor, aproximando-os compreenso da mesma poca. O leitor deve compreender o escritor na poca em que o texto foi escrito e no na poca em que o texto est sendo lido.

    Um segundo objetivo da hermenutica e esclarecer tudo que haja de obscuro. Tornar o assunto compreensvel para uma posterior exposio - II Pedro 3:15 e 16.

    possvel dizer a verdade de forma errada. Nas escrituras encontramos a verdade, mas por falta de conhecimento possvel ensinar ela de forma errada.

    Concordamos, tambm, que o pregador ou professor est por demais inclinados a escavar primeiro, e a olhar depois, e assim encobrir o significado claro do texto, que freqentemente est na superfcie. Seja dito logo de incio, e repetido a cada passo, que o alvo da boa interpretao no a originalidade, no se procura descobrir aquilo que ningum jamais viu Fee/Stuart, Entendes o que ls? Pgina 13.

    Hermenutica:

    A palavra hermenutica deriva do termo grego Hermeneutikos, por sua vez deriva de um verbo hermeneou cujo significado : arte de interpretar os livros sagrados e os textos antigos. De modo geral e mais abrangente, se fala da teoria da interpretao de sinais e smbolos de uma cultura e a arte de interpretar leis.

    Cincia - Porque contm regras definidas, organizadas.

    Arte - Porque na hora de aplicar as regras h necessidade de bom senso, sensibilidade.

    H espao para a criatividade no estudo da Bblia, porm, esta s deve ocorrer quando ela dirigida pelo Esprito Santo. O mximo cuidado sugerido quando levamos a imaginao a criar verdades sem base bblica e a expor estas mesmas como doutrina quando na verdade no passa de uma questo da imaginao e fruto muitas vezes de uma deduo.

    H uma diferena enorme entre interpretao e aplicao.

  • Interpretao - S o significado pretendido pelo autor, ou seja, por Deus. A interpretao bblica dever extrair do texto apenas o que o Deus pretendia dizer atravs do autor humano, e no o que ns pretendemos que o texto diga.

    Aplicao - Podem ser vrias, dependendo da situao em que as pessoas se encontram.

    Hermenutica Bblica - Geral e Especial

    Geral - aquela que trata as Escrituras como um todo. Princpios gerais, bsicos. Elabora os princpios. Os princpios de estudos de hermenutica so a base para uma teologia sadia e bblica.

    Especial - aquela que trata de questes particulares das Escrituras. Esta classe de hermenutica no pode elaborar princpios.

    Distino acadmica, didtica:

    Hermenutica - Parte terica do processo (teoria). Exegese - Parte prtica do processo interpretativa (prtica); tirar para fora o significado do texto.

    CNON No nos compete mais a pesquisa para determinar os livros cannicos (inspirados), o estudo da formao do Cnon um estudo de outra disciplina.

    Existem muitos livros inspirados que no foram includos no cnon bblico pelo fato de se tratarem de problemas especficos para aquela regio, igreja ou pessoa. Exemplos: I Cor. 5:9 (uma Carta anterior a esta que considerada a primeira) --- Col. 4:16 (havia uma carta para os Laodicenses). Obs: O profeta inspirado no exerccio de sua funo.

  • Crtica Textual

    Cincia que estuda as possveis mudanas que ocorrem com o texto bblico.

    - Como foi escrito?

    Crtica Histrica

    aquela que estuda os fatos histricos envolvidos com o texto. - Quem escreveu? Para quem escreveu?

    - Em que circunstncias? Relao da Hermenutica com outros campos do estudo bblico.

    CNON CRTICA TEXTUAL CRTICA HISTRICA EXEGESE - BBLICA E - SISTEMTICA

    V se o texto o melhor em grego, o mais prximo ao original

    Quando foi escrito

    Porque foi escrito

    Quem foi o autor

    Para quem escreveu

    Depois de definir os aspectos histricos, chegamos exegese. De uma correta exegese depende a minha teologia.

    Teologia:

    Bblica - Limita o estudo a um livro ou um grupo de livros. Ela focaliza o livro em s. Focaliza o livro.

    Sistemtica - Pega um tema bblico e nos vamos para toda a Bblia para ver o que se fala sobre esse tema. Focaliza o tema.

    Exemplo:

    - O problema do sofrimento humano no livro de J (Teologia Bblica). - O problema do sofrimento humano em toda a Bblia (Teologia Sistemtica).

  • - No fica limitada a situao de J apenas, mas vemos tudo o que Deus mostrou sobre o sofrimento humano.

    - Conhecido:

    - Deus s pode ser compreendido na medida em que Ele se revela.

    Nas Escrituras, ns temos uma revelao necessria e no revelao absoluta, pois Deus no nos revelou tudo, apenas o necessrio para a nossa salvao.

    A teologia sistemtica do ponto de vista acadmico formulada em bases filosficas.

    Nas Escrituras Sagradas temos apenas revelao necessria e no revelao absoluta.

    A necessidade da Hermenutica

    Mesmo as Escrituras defendem a necessidade de uma Hermenutica Bblica.

    a) - II Pedro 3:15, 16 Algumas coisas difceis de serem entendidas.

    possvel torcer as Escrituras. Pedro tinha dificuldade para entender alguns dos escritos de Paulo

    Naquela poca, alguns j torciam a Bblia. b) - Lucas 24:27 Os apstolos estavam deprimidos por no interpretarem devidamente as profecias messinicas.

    O prprio Senhor Jesus reconheceu a necessidade de explicar as Escrituras.

    Expunha-lhes Em grego (diermeneuo). Jesus fez hermenutica com os discpulos.

  • c) - II Tim. 2:15 Manejar bem a palavra da verdade Explorar bem e ensinar corretamente a palavra da verdade.

    Paulo recomenda a Timteo que maneje bem as Escrituras. Entender bem e ensinar corretamente a palavra da verdade.

    d) - II Cor. 2:17 Mercadejando - Falsificando Do grego (capeleuo) = corromper, falsificar, adulterar No devemos corromper, falsificar as Escrituras.

    BLOQUEIOS COMPREENSO ESPONTNEA DA BBLIA

    1o - Histrico

    Estamos largamente separados da poca dos escritores bblicos.

    A Bblia cobre um perodo de cerca de 1.500 anos.

    Com o tempo, muita coisa se perde.

    Quando compreendemos os fatos histricos, nos podemos compreender melhor os fatos bblicos.

    2o - Cultural

    Um dos mais difceis a serem transpostos.

    A cultura distinta dos povos bblicos.

    Nos apenas vemos aquilo que estamos condicionados a ver.

    O ideal nos colocarmos em uma posio neutra.

  • a) - Costumes Gen. 15:2 - Foram achados documentos na cidade enterrada de Nuzu (c. 2000 - c.1500 a.C.), que mostraram que o costume daquela poca era adotar um filho quando no se tinham filhos legtimos para herdar a herana. Se, porm, o primognito nascesse, o adotado passaria para segundo plano.

    Gn. 31:34 - dolos do lar (no hebr. - Terafins), eram pequenos objetos que serviam como documentos que comprovavam a posse das terras e propriedades. Raquel roubou a herana de seu pai.

    Prov. 22:28 - Marcos das propriedades das terras. O documento que garantia o terreno, assim como as escrituras de uma casa de hoje. Deut. 22:5 - Naquela poca, as roupas dos homens e mulheres eram iguais, a diferena estava apenas nas roupas ntimas. Muitos naquela poca, como hoje, usavam as roupas ntimas do sexo oposto por perverso.

    b) - Pensamento A maneira oriental de pensar totalmente diferente da ocidental.

    Silogismo - A anlise de argumento formal baseando-se na proposio de uma premcia maior e de outra menor, as quais se verdadeiras levam concluso de que determinado fato verdadeiro.

    Silogismo a estrutura do pensamento grego.

    * Premissa maior: Toda virtude louvvel

    * Premissa menor: Ora, a bondade virtude.

    * Concluso: Logo, a bondade louvvel.

    No Velho Testamento no existe silogismo

    No Velho Testamento a lgica baseia-se na experincia humana e no no raciocnio dedutivo.

    O pensamento hebraico um pensamento concreto e no abstrato.

  • O hebreu aceita o fato quando este fato se traduz em experincia.

    O que Deus para estes homens?

    Davi - Deus o meu refgio e minha fortaleza.

    Moiss - O Senhor forte e poderoso

    Hagar - Deus um Deus que ouve

    Personagens bblicos no esto preocupados com a fisionomia, mas de acordo com a experincia de cada um.

    Um telogo deve ser conhecido com um profundo conhecedor da Bblia. Temos conseguido viver isto em nossa vida, nossa experincia diria. Este conhecimento de nada nos aproveitar se no traduzirmos este conhecimento em vida.

    por isso que no devemos fazer certas perguntas Bblia. Exemplo: Como foi a fuso em Cristo (Humanidade e Divindade)?

    3o - Lingstico - (Hebraico, aramaico e grego) Nas melhores tradues h problemas.

    Idiomalismo: expresso especfica de uma lngua, de um povo.

    Falta de equivalncia entre as palavras traduzidas.

    I Pedro 1:20 Qual verdadeiro significado da palavra: (grego = eplucis) = iniciativa, impulso.

    Nenhuma profecia da Escritura foi feita pelos profetas ou de sua conta, mas iluminados por Deus.

    Produo da profecia e no interpretao.

  • O CONCEITO BBLICO DE INSPIRAO Defendemos o ponto de vista ortodoxa sobre a inspirao.

    Inspirao Bblica:

    A Bblia conquanto tenha mantido os estilos pessoais de expresso e liberdade dos escritores humanos, a palavra de Deus em suas fontes originais, toda e totalmente inspirada por Deus mediante o Esprito Santo, sem nenhuma diferena qualificativa na inspirao de qualquer de seus livros, cuja autoridade assim normativa para a f e a vida, para a doutrina e proclamao, para pensamento e investigao.

    I Cor. 7:10 - Digo eu, no o Senhor.

    Paulo faz uma distino entre o que Cristo diz e o que ele (Paulo), diz. Ensino indireto por meio do Esprito Santo (Paulo era apstolo). No se trata de inspirao e sim, de uma posio:

    Algo que havia sido dito por Jesus e algo que apenas Paulo havia falado e no Jesus. Porm, inspirado do mesmo modo, pois provm de Deus.

    (1) A Unicidade da Bblia Somente a Bblia apresenta uma dupla natureza:

    1o - Sua origem divina.

    2o - Sua dimenso humana.

    Por causa de sua origem divina, a Bblia a palavra de Deus (Aqui temos duas grandes posies em relao ao significado de inspirao bblica, uma posio defende que a Bblia contem a palavra de Deus, enquanto que outra posio defende que a Bblia a palavra de Deus).

    1 - Origem Divina

    II Pedro. 1:20

  • Iniciativa, mpeto, impulso

    II Pedro. 1:21

    Vontade, desejo, inteno Os profetas bblicos no tiveram desejo nem iniciativa para escrever as Escrituras Sagradas.

    Ser levado, ser movido.

    Usado na poca para dizer o que o vento fazia com um barco a velas, era levado, conduzido pelo vento.

    Do mesmo modo, os profetas eram movidos e conduzidos pelo Esprito Santo.

    II Tim. 3:16

    Inspirao de Deus

    2 - Sua dimenso humana

    a) Linguagem humana (Hebraico, Aramaico e Grego, eram lnguas usadas na poca, no s pelo povo de Deus, mas tambm por povos vizinhos). b) Caractersticas peculiares (os profetas tinham sua prpria personalidade e peculiaridades na forma de escrita, e isso foi vertido para seus escritos).

    a) - Linguagem A linguagem bblica humana.

    A linguagem no mecnica, no verbal.

    Podemos concluir com certeza de que o profeta preservado de erro quando se trata de uma doutrina.

    II Pedro. 1:21 - Homens falaram.

  • Joo 1:1

    E Deus era o verbo - Diz que s h um Deus? (No h Pai e Filho?). E o verbo era um Deus - um em grego de fato um artigo indefinido, porque antes do substantivo Deus no tem artigo.

    E o verbo era Deus - o fato de Deus vir antes do verbo torna o artigo indefinido anulado.

    Isto uma regra: Torna-se claramente definido. Sistema este facilmente comprovado em diversos escritos do grego normal da poca. Isto comprova que os escritores se valiam das regras de gramtica da poca para seus escritos em linguagem humana. Da a importncia do conhecimento da poca para entender melhor a Bblia, caso contrrio faremos confuso doutrinria. Este um dos trabalhos da hermenutica.

    A Bblia no nos foi dada numa elevada linguagem, acima da compreenso humana, pois se assim fosse perderia sua finalidade que revelar Deus ao homem.

    Tudo quanto humano imperfeito. Por essa razo devemos ter em mente que muitas vezes os escritores escreveram de forma errada, isto , cometeram certos erros gramaticais. Mas devemos fazer uma clara distino, veja: - A linguagem da Bblia imperfeita

    - A mensagem da Bblia perfeita.

    O Senhor falou aos seres humanos em linguagem compreensvel (a fim de que os seres humanos possam entender). Devia, portanto, utilizar uma linguagem e idioma da poca e no de uma linguagem sobre humana, incompreensvel.

    O fato de a linguagem ser imperfeita no afeta a perfeio moral da mensagem.

    A Bblia foi escrita por homens inspirados, mas a maneira em que eles escreveram no a maneira de pensar e exprimir-se de Deus, notamos isso ao comprovar a variedade de estilos literrios entre Paulo e Pedro, entre Pedro e Joo, entre Marcos e Mateus, e assim por diante.

  • Perfeita como o , sem por isso deixar de ser simples, a Bblia no corresponde s grandes idias de Deus. Se Deus pudesse expressar Seu pensamento ao nvel de divindade, com certeza o homem finito no poderia compreender esse pensamento.

    Os dois Aspectos das Escrituras:

    Moral Fsica

    Bblia Santa (Mensagem) Imperfeita (Linguagem).

    b) - Caractersticos peculiares dos profetas: Atenagras dizia que Deus usou os profetas assim como um msico usa a sua flauta. Isto seria possvel se a inspirao fosse mecnica. Que acredita que at as palavras foram ditadas por Deus.

    Jeremias foi um dos profetas que mais demonstrou sua personalidade na sua maneira de escrever.

    A personalidade do profeta toda preservada na sua maneira de escrever.

    No so as palavras da Bblia que so inspiradas, mas os homens que o foram. A inspirao no atua nas palavras do homem.

    O Criador de todas as idias pode impressionar mentes diversas com o mesmo pensamento, mas cada um pode exprimi-lo por diferentes maneiras, e ao mesmo tempo, sem contradies - (Tratando-se especificamente dos Evangelhos).

    O QUE INSPIRAO BBLICA?

    A Bblia a Palavra de Deus inspirada. Mas como se d essa inspirao? Talvez imaginemos um ditado mecnico como a de um chefe sua datilgrafa. Esta escreve coisas que no entende e que so entendidas apenas pelo chefe e sua equipe. Isto o que muitos chamam de inspirao mecnica. Isso no a inspirao bblica. Pois, ela no dispensa certa compreenso do autor humano (o hagigrafo), nem sua participao na redao do texto sagrado.

  • A inspirao bblica tambm no revelao de verdades que o autor humano no conhea. Existe sim, a Revelao, especialmente nos profetas, e Revelao algo mais elevado do que inspirao. O estudante de teologia deve manter em mente esta clara distino, ou seja, a diferena entre inspirao e revelao. Revelao diferente da inspirao bblica. A Inspirao se exercia, por exemplo, quando o hagigrafo descrevia uma batalha ou outros fatos documentados em fontes histricas, sem receber revelao divina.

    Inspirao Bblica a iluminao da mente do autor humano para que possa, com os dados de sua cultura religiosa e secular, transmitir uma mensagem fiel ao pensamento de Deus. O Esprito Santo fortalece a vontade e as qualidades do autor para que realmente o hagigrafo escreva o que ele percebeu.

    Tais livros so todos humanos (Deus em nada dispensa a atividade racional do homem) e divinos (Deus acompanha a redao do homem escritor). A Bblia um livro divino-humano. Transmite o pensamento de Deus em roupagem humana. Assemelha-se um pouco a Jesus, onde Deus se revestiu de carne humana, pois na Bblia a Palavra de Deus se revestiu da palavra do homem (judeu, grego, com todas as suas particularidades de expresso). A finalidade da inspirao bblica estritamente religiosa. No foi escrita para nos ensinar cincias naturais, mas aquilo que ultrapassa a razo humana (o sentido do mundo, do homem, da vida, da morte, etc diante de Deus). Portanto, no h contradio entre a Bblia e as cincias naturais. Mesmo Gnesis 1-3 no pretende ensinar como nem quando o mundo foi feito, mas apenas nos revelar que Deus a origem de todas as coisas.

    A Bblia s inspirada quando trata de assuntos religiosos? H pginas na Bblia no inspiradas?

    Toda a Bblia, em qualquer de suas partes, inspirada, qualquer que seja a sua temtica. Ocorre, porm, que Deus comunica sua mensagem em linguagem familiar pr-cientfica, bem entendida no trato quotidiano. Por exemplo, quando falamos em "nascer-do-sol" ou "pr-do-sol", supomos o sistema geocntrico (ultrapassado, pois, a verdade que o sol no se pe e nem nasce), mas no somos taxados de mentirosos, porque no pretendemos definir assuntos de astronomia. Assim, quando a Bblia diz que a luz foi feita antes do sol e das estrelas, ela no ensina teorias astronmicas, mas alude ao mundo em linguagem dos hebreus antigos para dizer

  • que o mundo todo criatura de Deus. Portanto, em assuntos no-religiosos, a Bblia adapta-se ao modo de falar familiar ou pr-cientfico dos homens que, devidamente entendido, no portador de erro.

    Tambm o pensamento expresso em palavras, como o pensamento bsico das Escrituras inspirado. Os conceitos dos homens esto sempre ligados s palavras. Quando o Esprito Santo iluminava a mente dos autores sagrados, iluminava tambm o pensamento expresso nas palavras. por isto que os prprios autores bblicos fazem questo de realar vocbulos da Bblia: Joo 10:34-35; Hebreus 8:13; Glatas 3:16.

    Notemos, porm, que somente as palavras das lnguas originais (hebraico, aramaico e grego) foram assim iluminadas. As tradues bblicas no gozam da mesma inspirao. Por isso, ao ler a Bblia, devemos nos certificar de estarmos usando uma traduo fiel e equivalente aos originais.

    "Toda a Escritura inspirada por Deus, e til para ensinar, para repreender, para corrigir e para formar na justia". (2Tm 3:16)

    O PROBLEMA SINTICO At o sculo XVII, a Bblia era considerada absolutamente como palavra ditada por Deus. Partindo do conceito de inspirao bblica como sendo um ditado, ningum duvidava de nada. Esta compreenso havia sido tema de inevitveis e incontveis polmicas interpretativas.

    A partir de 1776, comeou a ser despertada uma crtica do texto bblico, motivada pelos problemas levantados pelos filsofos racionalistas. O racionalismo j estava influenciado pelo iluminismo, defendendo a auto-suficincia do homem e comeou por negar no Evangelho tudo que era transcendental, restando assim pouca coisa. Esta crtica causou grande constrangimento no meio do cristianismo.

    O racionalismo queria demonstrar seu ponto de vista atravs da crtica textual. O trabalho deles despertou os evanglicos para fazerem o mesmo, mas enfatizando o outro lado, ou seja, a defesa da f. E eles concluram que a mesma critica literria tinha possibilidades de ajudar a entender melhor o Evangelho. Contriburam para isto os progressos das novas cincias da psicologia e da arqueologia. Ento surgiu o

  • mtodo crtico-histrico, que comeou a ser usado no sentido positivo pelos telogos cristos.

    Foi ento, no sculo XVIII, descoberto o assim chamado problema sintico. O estudo crtico demonstrou que no texto dos evangelhos h divergncias e diferenas que evidenciam o trabalho pessoal do escritor, sem deixar de lado a inspirao divina. Desde ento, os exegetas se viram na contingncia de considerar o Evangelho como um livro escrito por homens, que tm suas qualidades e seus defeitos, e esto sujeitos tambm critica. Surge ento a chamada crtica textual. O problema sintico se funda na constatao de que os trs primeiros Evangelhos (Mateus, Marcos e Lucas) tm muitos aspectos em comum; por outro lado, tm tambm muitas diferenas. As semelhanas chegam a ser desde palavras a textos inteiros. As diferenas esto no fato de alguns narrarem certos detalhes e outros omitirem, alm de haver discrepncias em alguns detalhes.

    Colocando em nmeros, o problema sintico apresenta-se da seguinte forma:

    a) Dos 661 versculos do Evangelho de Marcos, 600 esto tambm no de Mateus, e 350 esto no de Lucas.

    b) O evangelho de Mateus e de Lucas tem 240 versculos em comum, e que no constam no Evangelho de Marcos.

    c) Alm disso, tanto Mateus como Lucas tem versculos prprios a cada um. Como exemplos destas semelhanas, podemos citar uma passagem no qual Marcos descreve assim: "caindo a tarde, quando o sol descia..."; no Evangelho de Mateus est apenas a primeira parte; no de Lucas est a segunda. H diversas outras passagens assim, como no episdio do marido que morreu sem deixar descendncia.

    Descoberto o problema, procurou-se interpretar. Isto se tornou difcil, porque ao lado de grandes semelhanas, h tambm contrastes. Como se pode explicar isto? No caso da infncia de Jesus, por exemplo, Marcos no diz nada. Mateus diz alguma coisa, enquanto Lucas apresenta diversas informaes.

    Numa concepo tradicional, no haveria esta dificuldade, porque todos acreditavam que os apstolos ouviram tudo de Jesus e depois escreveram o que sabiam e que eles haviam usando por isso at as mesmas palavras. Mas descobriu-se que os Evangelhos foram escritos bastante tempo depois da morte de Cristo, em

  • pocas diferentes, baseados em tradies orais. Como pode ter acontecido que os Evangelistas usaram as mesmas palavras, estando em lugares diferentes e at em pocas diferentes?

    A a crtica histrica entrou em ao e surgiram vrias explicaes. Ainda no sculo XIX, dava-se como resposta que Mateus teria sido o primeiro a ser escrito. Mas Mateus um texto muito elaborado e deve ser de poca posterior. Alm disso, no foi escrito em aramaico, como se pensava, mas seu original em grego. Portanto, no aquele do qual Eusbio noticia, que "Mateus escrevera em aramaico e cada um entendeu e interpretou como pde".

    Posteriormente, explicou-se que haveria uma 'fonte' ou tradio oral bem antiga, e baseado nesta tradio cada autor escreveu os fatos ao seu modo. Esta explicao de inicio foi aceita, mas a coincidncia de palavras no pode ser justificada por uma tradio apenas oral. H necessidade de um instrumento literrio.

    Da surgiu a teoria das "duas fontes", hoje aceita pela maioria, porque explica tudo. Como dissemos, nos evangelhos sinticos podemos distinguir trs partes: 1. Aquelas que so narradas pelos trs; 2. aquelas que so narradas apenas por dois; e 3. Aquelas narradas apenas por um.

    Quanto primeira parte, a crtica mostrou que o primeiro evangelho a ser escrito foi Marcos, por ser mais rstico e incompleto, em contraposio aos outros, mais elaborados e mais evoludos. Foi escrito em Roma, porque ele no explica certos termos latinos, enquanto os outros explicam. A data aproximada entre 60 e 70, mas seguramente antes de 70, pois este foi o ano da destruio de Jerusalm, e eles ainda confundiam este acontecimento com o fim do mundo. Os outros j no fazem assim. Por tudo isto se concluiu que Marcos escreveu primeiro, provavelmente baseado na pregao de Pedro e na tradio oral.

    Os outros dois (Mateus e Lucas) copiaram de Marcos, melhorando o texto e adaptando conforme e ocasio, usando tambm uma tradio oral. Assim se explica o fato de coincidncia entre os trs evangelistas.

    A segunda parte, a princpio foi explicada como se um tivesse copiado do outro, mas provavelmente eles no se conheceram. Portanto, ambos devem ter se inspirado em outra fonte, talvez j em grego (no se sabe se oral ou escrita) que servia de base para um ensino primitivo. Talvez at aquele texto a que se refere Eusbio, pois anterior aos Evangelhos escritos. a chamada "FONTE Q" (de Quelle, em alemo, fonte). Esta fonte s foi conhecida de Mateus e Lucas.

  • A terceira parte tem explicao mais fcil: cada escritor fez uso de certas fontes que havia em suas regies, e que os outros no conheceram. Como eles moravam longe entre si, ento um no conheceu as fontes particulares do outro. Assim em Mateus, por exemplo, discriminam-se: as partes copiadas de Marcos so principalmente os fatos extraordinrios (milagres...); as copiadas de Q so acima de tudo os discursos (parbolas...); as copiadas das fontes particulares so outros pormenores.

    Convm notar que nem Marcos nem a fonte Q eram crnicas, ou seja, relatos dos acontecimentos, mas escritos elaborados pela Igreja primitiva para uso no ensino. Cristo morreu em torno do ano 30. O evangelho de Marcos s foi escrito por volta de 65. Neste meio termo, a tradio foi transmitida oralmente, ou por meio de pequenos folhetos, uns contendo as parbolas, outros contando os milagres, outros contando os fatos da infncia; outro contando a paixo... Em outras palavras, havia grande proliferao de escritos esparsos nas vrias Igrejas e nas vrias regies. O prlogo de Lucas faz-nos supor 3 estgios na formao do Evangelho: a) h as testemunhas oculares, que contaram o que presenciaram; b ) h os que tentaram compilar isso, as pequenas fontes; como diz Lucas "muitos empreenderam... "; c) a obra do evangelista; como diz Lucas: "Escrevi a exposio ordenada dos fatos".

    Quando dizemos que houve 'cpias' uns dos outros, devemos entender que o Evangelista no copiou simplesmente o outro, mas comps baseado em suas pesquisas, e acrescentou algo de si. Alm disso, o Evangelho no um documento histrico narrativo da vida de Jesus, mas reproduz a sua mensagem, muito embora no sua mensagem total, pois tudo que Jesus ensinou no est nos Evangelhos. Eles escreveram apenas o que interessava quela Igreja, naquelas circunstncias. Assim, por exemplo, no traslado do fato do centurio, retirado da fonte Q, Mateus escreveu que o centurio veio em pessoa falar; e Lucas diz que ele mandou os ancios falarem. E Mateus colocou neste contexto o final que Lucas s colocou no Cap.13 "muitos viro do oriente e do ocidente sentar-se com Isaac e Jac...".

    Noutra passagem, Mateus fala em paralisia, porque ele queria salientar apenas que os judeus no reconheceram o reino de Deus, o que os chocava. Mas Lucas diz 'doente quase morte', porque o que impressionava aos gregos era o Cristo, Senhor da vida. S para mostrar como o contexto importante, em Joo no episdio do centurio, este convida Jesus para ir casa dele. Joo no tinha interesse em mostrar nenhuma faceta da personalidade de Jesus, mas apenas e como um sinal: o

  • homem chegou desconfiando de Jesus, mas no fim tanto ele como sua famlia, todos creram.

    Mateus 22,1-14 e Lucas 14,16-24 narram a mesma parbola. Mas Mateus junta duas parbolas numa s: a dos convidados ao banquete com a da veste nupcial. Mateus, que seria mais longo, no especificou as funes de cada um. Alm disso, acrescenta o episdio de incendiar a cidade e maltratar os servos. Lucas omite estes detalhes, mas especifica as ocupaes dos convidados. Omite, porm a veste nupcial. Mateus, escrevendo para judeus, tinha interesse em acentuar a rejeio deles e o convite aos pagos; Lucas, escrevendo para gregos, no tinha esta meta.

    Os textos de Mt 19:1-9; Mc 10:1-10; Lc 16:18 falam no divrcio. Era discutida no tempo de Jesus uma prescrio que estava contida na lei de Moiss. Os textos em grego divergem por uma palavra, dando margem a duas interpretaes. Um destes textos gregos apresenta a expresso "m ep pornias = no em caso de fornicao", e no outro diz: "parctos logo pornias = a no ser no caso de fornicao. uma questo difcil de resolver, pela dificuldade da traduo de "porneia". Esta palavra vem do grego "porn (meretriz). "Porneia" deve significar qualquer "atividade sexual" fora do matrimnio. Alm da dificuldade textual h a dificuldade jurdica. No se pode dizer que Jesus tenha aconselhado isto, porque assim estaria anulando todo o NT nem se poderia entender o seu raciocnio na ocasio.

    O problema ainda permanece. Uma das solues que teve aceitao em certo tempo foi a de um autor francs, interpretando assim: esta palavra grega 'porneia' teria sido empregada para traduzir a palavra hebraica 'zent', que quer dizer 'concubinato', um costume muito difundido entre os judeus. O concubinato consistia num contrato bilateral entre um casal interessado que vivia como casados, sem efeito legal. Ento o texto se referiria a eles: o divrcio proibido, 'a no ser em caso de concubinato', pois no sendo casados legalmente, no haveria bice. Os outros autores (fora Mateus) no colocaram esta ressalva, porque nas situaes deles no havia o costume. Esta soluo no foi aceita porque seria um pleonasmo da parte de Jesus repetir um conselho ou uma ordem.

    VALOR DOS EVANGELHOS

    Os Evangelhos so livros histricos? Jesus Cristo viveu realmente? Disse tudo aquilo que foi escrito?

  • Em primeiro lugar, dizemos que os Evangelhos, muito mais do que narrativas de fatos histricos, eles so baseados em fatos histricos, fundamentados no fato histrico da vida e obra de Jesus Cristo. No se pode provar fato por fato, ou seja, com todas as mincias. Mas no se pode negar o valor histrico geral dos fatos, por exemplo, que Cristo fez milagres. O modo como os autores escrevem, os costumes, a cultura, as palavras, a mentalidade, corresponde s das pessoas que viviam naquela poca.

    Os impostos e as leis, as religies (saduceus, publicanos, fariseus, zelotes...), as cidades e aldeias da poca, a personalidade de Cristo (s vezes contradizendo o que era comum na poca), a originalidade de Jesus, etc, tudo isso forma um conjunto de fatos que seriam quase impossveis de inventar mais tarde, organizados com tanta coerncia e perfeio. Outros fatos que no se concebe terem sido simplesmente inventados, mesmo por pessoas que acreditassem neles: a paixo, a morte e a ressurreio. Hoje a cruz glria e smbolo, mas na poca era a mais humilhante das condenaes. A histria da paixo seria contraproducente, vergonhosa para quem queria apregoar aquela doutrina. A covardia dos Apstolos ao abandonarem o Mestre... Estas coisas, decididamente no seriam perpetradas por quem aceitava Cristo. Eles se esforaram por justificar estes fatos associando com as profecias do AT, muitas vezes apenas por acomodao, por coincidncia.

    Finalmente, podemos dizer: os Evangelhos no so livros histricos no sentido que se entende esta palavra atualmente, mas seguramente so baseados em acontecimentos histricos. Alguns autores, alm dos evangelistas, falaram de Jesus. Flvius Josephus, fariseu, historiador contemporneo de Jesus, conta detalhes daquele tempo, embora com aspecto tendencioso para a tica dos fariseus, mas isto era mesmo de se esperar, isto , que ele no falasse mais de Jesus e de outros movimentos messinicos, preciso se notar que em vista da dominao dos romanos, ele foi cauteloso para no assust-los escrevendo sobre estes movimentos considerados por eles 'subversivos'. Assim, s trataram mais sobre Jesus os que se interessavam por ele (os apstolos, no caso). Tambm Tcito, historiador romano, escreveu os "Anais" no tempo de Trajano (116/117) e fala na execuo de Cristo e no surgimento do Cristianismo. Portanto, mesmo outras pessoas que no eram cristos do testemunho da vida, paixo e morte de Cristo.

  • A questo da inerrncia bblica

    Duas posies evanglicas:

    1o - A Bblia totalmente privada de erros.

    2o - A Bblia sem erro toda vez que fala sobre salvao e f, mas pode possuir erros em outros pontos.

    Os liberais, por sua vez, acreditam que a Bblia fruto da mente religiosa dos judeus. Contextos polmicos produzem posies extremadas.

    Argumentos:

    1) - A Bblia plena e completamente inspirada. 2) - Inerrante em todas as matrias que toca. 3) - Verbalmente inspirada. 4) - Nenhum erro pode ser afirmado se no puder ser comprovado no texto original. Pode esta Palavra (Bblia), ser livre de qualquer erro no seu catgrafo original? Ela completamente digna de confiana em matria de histria e doutrina? Os autores bblicos sob a liderana do Esprito Santo foram preservados de cometer erro factual, histrico, cientfico e quaisquer outros erros?

    Observao. Estes pensamentos e perguntas refletem a posio dos inerrantistas, sem que entendemos por inerrncia algo que est livre de qualquer erro. Podemos afirmar algumas verdades bsicas: (1) A Bblia um livro singular, muito especial, que se diferencia dos demais livros e compndios da literatura universal. (2) No podemos compreender as Escrituras apenas com nossa inteligncia humana, a menos que contemos com a fora, o poder e em especial a iluminao do Esprito Santo que sonda as profundezas de Deus e esclarece os mistrios da Sua Palavra (Joo 16:13) 1) - Premissa Maior - Tudo o que Deus faz perfeito 2) - Premissa Menor - Deus inspirou a Bblia 3) - Concluso: - Logo, a Bblia perfeita.

  • Este argumento a base dos que defendem a inerrncia bblica.

    Analogia: Assim como Jesus foi divino-humano, e nunca cometeu pecado, tambm a Bblia divino-humana e no contm erro.

    Os inerrantistas dizem que negar a inerrncia negar a inspirao e a autoridade da Bblia.

    O Argumento do Domin: Derrubando a 1a pedra (inerrncia bblica), todas as outras pedras caem.

    A primeira pedra seria a inerrncia bblica.

    A segunda seria a inspirao.

    Derrubando-se estas duas pedras, todas as outras caem.

    Exemplos de dificuldades na Bblia: Considere com especial ateno a palavra dificuldades empregada neste caso, pois no estamos usando a palavra erro

    a) - Mat. 27:37 - (comparar com Mar. 15:26; Luc. 23:38; Joo 19:19) Mateus - Este Jesus o Rei dos Judeus.

    Marcos - O Rei dos Judeus.

    Lucas - Este o Rei dos Judeus.

    Joo - Jesus Nazareno, o Rei dos Judeus.

    Cada evangelista escreveu inspirado por Deus, mas de sua maneira. Cada um usou o prprio estilo literrio.

    Ver Mat. 6:9 a 15 com Lucas 11:1 a 4 - (Orao do Pai Nosso). Na inspirao, a personalidade do profeta preservada, sua linguagem preservada, sua maneira de escrever tambm preservada.

    b) - I Cor. 10:8 com Nm. 25:9

  • Paulo disse que haviam morrido 23.000 pessoas

    Moiss disse que haviam morrido 24.000 pessoas.

    c) - Levticos 11:6 A lebre, porque rumina, mas no tem unhas fendidas, esta vos ser imunda.

    Obs: A lebre no rumina.

    Duas classes de linguagem:

    Em muitas passagens a Bblia emprega como recurso literrio uma linguagem fenomenolgica

    Em outros casos os escritores da Bblia usaram uma Linguagem literal que descreve os fatos como eles realmente so.

    Linguagem fenomenolgica - descreve os fatos como eles parecem ser.

    O importante no se a lebre rumina ou no, mas o ponto central era se o povo de Israel deveria ou no deve comer a carne da lebre.

    Podemos perceber no caso de Corntios com Nmeros que a questo em pauta arredonda os nmeros, pois, se for fiel ao relato seria impossvel ser nmeros exatos, no poderiam ser 23.001 ou 23.999 e Paulo arredondou para a cifra menor?

    d) - Mar. 6:8 com Luc. 9:3 Marcos - Levem um bordo (bengala) Lucas - No levem nada, nem bordo.

    O fato de levar ou no o bordo, no muda o objetivo de Jesus, que era o fato de eles dependeram inteiramente de Deus. Notamos aqui que h apenas uma divergncia de tica e no um erro de objetivo, seria diferente se Marcos falasse de no ir e Lucas de ir para a ao missionria requerida.

    e) - Mat. 26:34 c/ Marc. 14:30 Antes que o galo cante... = Aqui o autor est sendo em sua argumentao mais genrico.

  • Antes que o galo cante, 3 vezes... = Em contraste aqui outro autor est sendo mais especfico

    Um estava sendo mais preciso que o outro, mas isto no muda o sentido fundamental da mensagem que era o fato de que Pedro iria negar a Jesus.

    Erro:

    Para muitos opositores da Bblia, quando a cincia erra apenas um sinnimo de imperfeio, inexatido, porm... Para estes, quando encontram uma informao cientfica equivocada na Bblia ento : sinnimo de engano, fraude.

    Os profetas no estavam preocupados com o aspecto cientfico, histrico, geogrfico, etc, mas com uma mensagem espiritual.

    A finalidade da Bblia no dar informaes cientficas, histricas ou geogrficas, mas uma informao de vida e salvao.

    Na Bblia:

    O Verdadeiro Erro no estar de acordo com a vontade de Deus.

    A Verdade Bblica se expressa unicamente na vontade e Deus.

    Os mesmos argumentos servem para:

    Histria Poltica - A Bblia no se preocupa com isto.

    Histria Espiritual - A Bblia se preocupa com esta histria. Que conhecemos como Plano de Salvao, que exatamente a relao correta entre Deus e seu povo e se povo com Deus.

    A Bblia s menciona fatos polticos quando esta tem que ver com a Histria Espiritual do povo.

    Considere com ateno a leitura de Joo 21:25 Se um leitor levar em considerao de forma literal este trecho, obviamente acusaria a Joo de estar dando uma falsa informao Todavia o que temos aqui que conhecemos em literatura como: Exagero potico - Os evangelhos no so uma biografia exata da vida de Jesus.

    A explicao para o texto anterior pode ser encontrada na leitura de: Joo 20:30, 31 - S se encontram as coisas necessrias nossa salvao.

  • Nem tudo que Jesus fez foi escrito.

    Os escritos foram fatos selecionados.

    A Bblia tem um duplo propsito:

    Cristolgico: Revelar a pessoa de Cristo

    S. Joo 5:39 / Joo 14:6

    Soteriolgico: Informa ao ser humano os meios providos por Deus para a salvao do homem.

    II Tim. 3:15

    Deus fala atravs das Escrituras no com o propsito de tornar-nos eruditos, mas com o propsito de tornar-nos cristos.

    Dentro da Bblia existem coisas secundrias por natureza. Estas coisas contribuem para entender o ponto central, mas no essas narrativas so o ponto central.

    O conhecimento que temos acerca de Deus um conhecimento Parcial.

    Consideremos a questo do conhecimento de Deus com esta viso: Jamais poderemos compreender Deus, essa compreenso ser sempre parcial, e muitas vezes cometemos o erro de olhar os conceitos desde nossa viso humana, vejamos um exemplo:

    Em grego temos duas palavras para o conceito de tempo: Kronos e Kairos A primeira, Kronos, a viso humana sobre o tempo, a segunda a viso divina, a forma como Deus compreende o tempo, por essa razo insistimos em afirmar que nosso tempo no o mesmo tempo de Deus, e isto se aplica orao, pedimos para j, conforme nosso tempo, e Deus nos responde sim, de acordo com seu tempo, somente quando o tempo de Deus Kairos se cruza com nosso Kronos ento e s ento acontece o milagre.

    A Bblia no contem uma revelao total de Deus, mas uma revelao parcial daquilo que necessrio para a nossa salvao.

  • Calvino e a Hermenutica Adendo Cultural

    Orare e labutare foram palavras empregadas por Calvino para resumir a sua concepo hermenutica. Com estes termos ele expressou a necessidade de splica pela ao iluminadora do Esprito Santo e do estudo diligente do texto e do contexto histrico, como requisitos indispensveis interpretao das Escrituras. Com o mesmo propsito, Lutero empregou uma figura: um barco com dois remos, o remo da orao e o remo do estudo. Com um s destes remos, navega-se em crculo, perde-se o rumo, e corre-se o risco de no chegar a lugar algum.

    Palavras e figuras como estas revelam a conscincia que os reformadores tinham do carter divino-humano das Escrituras e o equilbrio fundamental que caracteriza a hermenutica reformada da Palavra de Deus.

    I. Delimitao do Assunto

    O termo hermenutica tem sido empregado em dois sentidos. Historicamente, nos compndios clssicos de interpretao bblica, designa a disciplina que, partindo de pressupostos bsicos, estuda e sistematiza a teoria da interpretao das Escrituras, enquanto a exegese designa a prtica. Neste sentido, o objetivo da hermenutica descobrir e sistematizar os princpios e mtodos apropriados para a compreenso do sentido que o autor intentou transmitir aos seus leitores originais.

    Mais recentemente, entretanto, estes termos tm sido usados com sentidos diferentes: exegese, para designar o estudo das Escrituras com vistas a descobrir o sentido original pretendido pelo autor, e hermenutica, no sentido restrito da sua contemporaneidade. Ou seja, a exegese seria uma primeira tarefa histrica pela qual se busca compreender o que os leitores originais entenderam; enquanto que a hermenutica seria uma tarefa teolgica prtica e posterior, na qual se busca compreender a relevncia da sua mensagem para ns, hoje, no nosso contexto especfico. (Nota 1) Neste Estudo estes termos so usados no sentido histrico mais comum: hermenutica, designando a disciplina que estuda e sistematiza os princpios e tcnicas, com as quais, partindo de determinados pressupostos, se busca compreender o sentido original do texto bblico; exegese, designando a prtica destes princpios e tcnicas; e aplicao, designando a busca da relevncia do texto ao nosso contexto especfico. Isto : tendo compreendido qual a mensagem do texto

  • para os seus leitores originais, em que sentido esta mensagem aplicvel aos nossos dias e ao nosso contexto?

    Convm esclarecer tambm que o termo: reformada, no empregado neste estudo para designar especificamente a hermenutica dos reformadores. No se desejamos fazer uma descrio especfica e detalhada da hermenutica desenvolvida e praticada por Lutero, Melanchton, Calvino e outros. O termo tambm no se refere denominao reformada (ramo da reforma como ficou conhecido especialmente na Europa). O termo hermenutica reformada, neste trabalho, refere-se a uma corrente ou escola de interpretao bblica histrica, distinta de outras correntes, fundamentada em pressupostos bblicos quanto natureza das Escrituras, e que emprega princpios e mtodos especficos. Trata-se de uma escola ou corrente de interpretao que adota o mtodo histrico-gramatical, em contraposio aos mtodos intuitivos (da corrente espiritualista) e histrico-crtico (humanista) de interpretao bblica. Com a expresso hermenutica reformada, quer-se designar neste estudo o modelo de interpretao bblica defendida e aplicada pelos reformadores, pelos principais smbolos de f protestantes, inclusive batista (Nota 2), pelos puritanos ingleses, pelos huguenotes franceses, e pelas igrejas evanglicas ortodoxas em geral at os nossos dias. Esta corrente de interpretao poderia ser chamada de hermenutica protestante ou hermenutica evanglica. Mas, ao que parece, estes termos j no caracterizam muita coisa pelo menos no campo da hermenutica , pois englobam, sem qualquer distino, defensores e praticantes de todas as correntes de interpretao bblicas: desde a corrente espiritualista (intuitiva) at a corrente humanista (histrico-crtica). II. Importncia do Assunto

    A importncia do assunto dificilmente pode ser exagerada, pois a hermenutica a base terica da exegese, que, por sua vez, o alicerce tanto da teologia (quer bblica, quer sistemtica) como da pregao. Parece que, atualmente, pelo menos no Brasil, estas disciplinas tm sido parcialmente relegadas por alguns segmentos evanglicos a um segundo plano. Exegese, a doutrina e a pregao tm sido substitudas por coisas mais prticas (tais como a ao social, o engajamento poltico, a administrao eclesistica, o evangelismo, a liturgia, as exortaes morais, etc.). Quando no se nega a importncia da exegese, da doutrina e da pregao, na teoria, nega-se na prtica.

  • Convm observar, entretanto, que o apstolo Paulo exorta Timteo a cuidar de si mesmo e da doutrina, de modo que possa ser ele mesmo salvo bem como os seus ouvintes (1 Tm 4.16). Ele o admoesta a apresentar-se a Deus aprovado, como obreiro que no tem do que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade (2 Tm 2.15). E afirma que devem ser considerados merecedores de dobrados honorrios (ou honra) os presbteros que presidem bem, com especialidade os que se afadigam na Palavra e no ensino (1 Tm 5.17). No se pode esquecer de que aprouve a Deus salvar aos que crem, pela loucura da pregao (1 Co 1.21); e de que a f vem pela pregao e a pregao pela palavra de Cristo (Rm 10.17). A importncia da doutrina vista especialmente nas cartas do apstolo Paulo e no tratamento que faz da questo da justificao pela f na carta aos Glatas. Nem a Igreja de Corinto, com todos os seus problemas morais, foi to duramente tratada pelo apstolo quanto s igrejas da Galcia, em funo do seu desvio doutrinrio. A verdade de Deus expressa em sua Palavra o instrumento empregado pelo Esprito Santo para salvar e santificar. So as sagradas letras que podem tornar-te sbio para a salvao pela f em Cristo Jesus, e fazer com que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra (2 Tm 3.15, 17). Richard Baxter, um dos puritanos mais conhecidos do sculo XVII, foi o instrumento nas mos de Deus em um re-avivamento na sua cidade. Autor de dezenas de obras, a maioria de cunho prtico, usou uma figura para expressar a relao entre a verdade da Palavra e a santidade. Eis suas palavras:

    ... As verdades de Deus so os prprios instrumentos da santificao de vocs; essa santificao o resultado produzido por essas verdades sobre o entendimento e a vontade de vocs. As verdades so o selo e a alma de vocs a cera; a santidade a impresso feita. Se vocs receberem apenas algumas verdades, tero apenas uma impresso parcial... Se vocs as receberem de modo desordenado, a imagem que produziro nas almas de vocs ser igualmente desordenada; como se os membros dos corpos de vocs fossem unidos de modo monstruoso. (Nota 3) A est a importncia da hermenutica: ela a base terica da exegese, que por sua vez o fundamento da teologia e da pregao, das quais depende a sade espiritual da igreja, e da nossa prpria vida. Uma hermenutica deformada fatalmente resultar em exegese deformada, produzir teologia e pregao deformadas, e se manifestar tragicamente em igrejas e vidas deformadas.

  • III. Necessidade da Hermenutica

    Todo leitor um intrprete. Mas ler no implica necessariamente em entender. Quando no h barreiras na compreenso de um texto, a interpretao automtica e inconsciente. Mas isso nem sempre ocorre. De conformidade com a doutrina reformada da clareza ou perspicuidade das Escrituras, a Bblia substancialmente, mas no completamente clara. As verdades bsicas necessrias salvao, servio e vida crist so evidentes em um ou outro texto, mas nem todos os textos das Escrituras so igualmente claros.

    Por ser um livro divino-humano, inspirado por Deus, mas escrito por homens, admite-se que h dificuldades de ordem espiritual e de ordem humana para a compreenso das Escrituras. O apstolo Pedro reconheceu essa dificuldade com relao aos escritos do apstolo Paulo, dizendo que neles h certas coisas difceis de entender... (2 Pe 3.16). Isto significa que a compreenso das Escrituras no necessariamente automtica e espontnea. , sim, o resultado da ao iluminadora do Esprito Santo, por um lado, e por outro, do estudo diligente da lngua e do contexto histrico em que foi escrita.

    A. Dificuldades de Ordem Espiritual

    O aspecto espiritual envolvido na interpretao das Escrituras demonstrado claramente em passagens bblicas tais como 1 Corntios 2.14 e 2 Corntios 4.3-6:

    Ora, o homem natural no aceita as coisas do Esprito de Deus, por que lhe so loucura; e no pode entend-las, porque elas se discernem espiritualmente.

    ...se o nosso evangelho ainda est encoberto, para os que se perdem que est encoberto, nos quais o deus deste sculo cegou os entendimentos dos incrdulos, para que lhes no resplandea a luz do evangelho da glria de Cristo, o qual a imagem de Deus... Porque Deus que disse: De trevas resplandecer luz, ele mesmo resplandeceu em nossos coraes, para iluminao do conhecimento da glria de Deus na face de Cristo.

    Nestes textos o apstolo Paulo ensina claramente a absoluta incapacidade do homem natural (no regenerado) de compreender a revelao de Deus. A razo desta incapacidade a cegueira espiritual em que se encontra como resultado da

  • queda do homem do seu estado original, e da ao diablica. E a cura desta cegueira no intelectual, mas espiritual. S o Esprito Santo pode fazer resplandecer a luz do Evangelho da glria de Cristo num corao em trevas.

    Outro texto que demonstra o carter espiritual envolvido na interpretao das Escrituras 2 Corntios 3.14-15. Neste texto o apstolo Paulo explica que os judeus tinham como que um vu embotando os seus olhos espirituais, de modo que no podiam compreender o significado do que liam, por causa da incredulidade:

    Mas os sentidos deles se embotaram. Pois at ao dia de hoje, quando fazem a leitura da antiga aliana, o mesmo vu permanece, no lhes sendo revelado que em Cristo removido. Mas at hoje, quando lido Moiss, o vu est posto sobre o corao deles.

    Como este vu pode ser retirado? Pela converso, responde o apstolo no verso seguinte: Quando, porm, algum deles se converte ao Senhor, o vu retirado Na carta aos Efsios, o apstolo Paulo ensina a mesma coisa com relao aos gentios:

    ...No mais andeis como tambm andam os gentios, na vaidade dos seus prprios pensamentos, obscurecidos de entendimento, alheios vida de Deus por causa da ignorncia em que vivem, pela dureza dos seus coraes (Ef 4.17-18). A ao iluminadora do Esprito Santo , portanto, indispensvel na interpretao e apreenso do ensino das Escrituras. A erudio piedosa preciosa e indispensvel para a preservao da s doutrina. Um erudito, por mais bem equipado que esteja hermeneuticamente, desprovido, porm, da ao regeneradora e iluminadora do Esprito, possivelmente no alcanar o sentido da Escritura tanto quanto um crente simples e fiel, mesmo que indouto em mtodos e tcnicas de interpretao.

    Mesmo o crente precisa da ao iluminadora contnua do Esprito Santo para progredir na compreenso das Escrituras. Seu corao no est embotado como o dos judeus descrentes; nem seu entendimento est obscurecido, como o dos gentios incrdulos. Mas ainda h muito a compreender; e a ao iluminadora do Esprito Santo permanece indispensvel. Com esse propsito o apstolo Paulo orava insistentemente pelos crentes, a fim de que Deus lhes iluminasse mais e mais, para compreenderem mais profundamente a natureza do evangelho e a suprema riqueza da sua graa. Eis um exemplo apenas na carta aos Efsios:

    ... No cesso de dar graas por vs, fazendo meno de vs nas minhas oraes, para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glria, vos conceda esprito

  • de sabedoria e de revelao no pleno conhecimento dele, iluminados os olhos do vosso corao, para saberdes qual a esperana do seu chamamento, qual a riqueza da glria da sua herana nos santos, e qual a suprema grandeza do seu poder para com os que cremos... (Ef 1.16-19). Textos como este revelam o papel do Esprito Santo e da f na compreenso das verdades espirituais. A interpretao e a compreenso das Escrituras torna-se essencialmente uma tarefa espiritual embora no rejeitando habilidades naturais ou tcnicas.

    B. Dificuldades Naturais

    Deve-se observar, entretanto, que as Escrituras tambm revelam, por ensino direto e por inmeros exemplos, que o corao do homem mais enganoso do que todas as coisas e desesperadamente corrupto (Jr 17.9), no sendo, portanto, totalmente confivel. Alm disso, no existe somente o Esprito da verdade; h tambm o esprito do erro (1 Jo 4.6). O pai da mentira est sempre pronto a enganar, se possvel for, at os eleitos. Logo, o carter espiritual envolvido na interpretao das Escrituras no elimina, de modo algum, o lado humano, tambm necessrio para a sua correta interpretao e compreenso. Afinal, pela prpria Palavra, e atravs da Palavra, que o Esprito Santo realiza essa obra iluminadora.

    Por haver sido escrita em lnguas humanas, em contextos histricos, sociais, polticos e religiosos especficos, um conhecimento adequado da lngua e do contexto histrico tambm necessrio para uma melhor interpretao e compreenso das Escrituras. Deve-se lembrar tambm que o ministro da Palavra aquele que se afadiga no estudo dela (1 Tm 5.17). Logo, para uma interpretao e compreenso adequada das Escrituras, fazem-se necessrios requisitos de natureza espiritual, bem como requisitos de natureza intelectual. Ambos so necessrios e imprescindveis.

    IV. Principais Correntes de Interpretao

    As classificaes normalmente pecam pelo simplismo. de fato difcil resumir e agrupar adequadamente as diversas nfases, tendncias, princpios e prticas de uma determinada rea de estudos, sem negligenciar peculiaridades importantes. Com a hermenutica no diferente. Contudo, observando as diferentes nfases, tendncias, princpios e prticas de interpretao das Escrituras adotados no curso da histria da Igreja, pode-se perceber pelo menos trs correntes gerais nas quais as diversas escolas podem ser de certo modo agrupadas:

  • A. Corrente Espiritualista

    Muitos grupos na histria da interpretao bblica se caracterizaram por superenfatizar o carter espiritual (mstico) das Escrituras, em detrimento do seu carter humano. Esta corrente distingue-se especialmente pela insatisfao generalizada com o sentido natural, literal das Escrituras. Dois dos textos mais explorados so 2 Corntios 3.6: ...a letra mata, mas o Esprito vivifica e 1 Corntios 2.7: ...falamos a sabedoria de Deus em mistrio. O maior perigo dessa corrente de interpretao o subjetivismo e o misticismo. Nenhuma das duas passagens mencionadas prescreve a supremacia de sentidos "espirituais" e ocultos da Escritura sobre sentidos naturais e bvios. 2 Corntios 3.6 faz um contraste entre os dois ministrios ou alianas exercidos por Moiss e por Cristo; 1 Corntios 2.7 trata do mistrio de Deus, que Cristo, mistrio agora revelado. Nada h nestas passagens que exaltem sentidos ocultos da Escritura, disponveis apenas aos "espirituais" ou avanados. Alguns sistemas hermenuticos pertencentes corrente espiritualista so descritos abaixo.

    1. A Hermenutica Alegrica

    Trata-se de um dos mtodos de interpretao mais antigos. Fortemente influenciados pelo platonismo e pelo alegorismo judaico, os defensores desse mtodo de interpretao atribuam diversos sentidos ao texto das Escrituras, enfatizando o sentido chamado de alegrico.

    Clemente de Alexandria (215) e Orgenes (254) so os dois principais nomes da escola alegrica de Alexandria, no Egito. Clemente identificava cinco sentidos para um dado texto das Escrituras: 1) histrico, 2) doutrinrio, 3) proftico, 4) filosfico e 5) mstico. Orgenes distinguia trs nveis de sentidos: 1) o literal, ao nvel do corpo, 2) o moral, ao nvel da alma, e 3) o alegrico, ao nvel do esprito. A hermenutica alegrica prevaleceu durante toda a Idade Mdia, especialmente em sua forma qudrupla. Sua origem provavelmente o sistema hermenutico de Agostinho. Segundo este mtodo, as passagens das Escrituras teriam quatro sentidos: um sentido literal, e trs sentidos espirituais: moral, alegrico e anaggico. O sentido literal seria o registro do que aconteceu (o fato); o sentido moral conteria uma exortao quanto conduta (o que fazer); o sentido alegrico ensinaria uma doutrina a ser crida (o que crer); e o sentido anaggico apontaria para uma promessa a ser cumprida (o que esperar). Assim, uma referncia bblica sobre a gua, teria um sentido literal (a gua), um sentido moral (exortao a uma vida

  • pura), um sentido alegrico (o sacramento do batismo), e um sentido anaggico (a gua da vida na Nova Jerusalm). (Nota 4) Este mtodo pode fornecer esplndidas interpretaes, mas rouba o real significado do texto, desviando a ateno do leitor do seu verdadeiro sentido, que o Esprito Santo intentou transmitir.

    O carter deste mtodo de interpretao fica manifesto na conhecida interpretao alegrica de Orgenes (Nota 5) da parbola do bom samaritano (Lc 10.30-37). Segundo ele, o homem atacado pelos ladres simbolizava Ado (a humanidade); Jerusalm, os cus; Jeric, o mundo; os ladres, o diabo e suas hostes; o sacerdote, a lei; o levita, os profetas; o bom samaritano, Cristo: o animal sobre o qual foi colocado o homem ferido, o corpo de Cristo (que suporta o Ado cado); a estalagem, a igreja; as duas moedas, o Pai e o Filho; e a promessa do bom samaritano de voltar, a segunda vinda de Cristo. (Nota 6) Outro exemplo do carter desse mtodo de interpretao pode ser percebido nas diferentes interpretaes alegricas atribudas s duas moedas mencionadas nessa parbola: o Pai e o Filho, o Antigo e o Novo Testamento, os dois mandamentos do amor (a Deus e ao prximo), f e obras, virtude e conhecimento, o corpo e o sangue de Cristo, etc.

    2. A Hermenutica Intuitiva

    Muitos so consciente ou inconscientemente adeptos desta corrente de interpretao bblica. Tambm chamados de impressionistas, (Nota 7) os hermeneutas intuitivos caracterizam-se por identificar a mensagem do texto com os pensamentos que lhes vm mente ao l-lo, sem contudo dar a devida ateno gramtica, ao contexto e s circunstncias histricas, geogrficas, culturais, religiosas, etc. Um passo adiante esto os msticos, que aqui e ali aparecem na histria da igreja, com a sua nfase na iluminao interior. Uma verso moderna do mtodo de interpretao intuitiva pode ser verificada na prtica de abrir as Escrituras ao acaso para pregar ou encontrar uma mensagem para uma ocasio especfica, sem o devido estudo do texto e do seu contexto histrico.

    3. A Hermenutica Existencialista

    H uma escola contempornea de interpretao das Escrituras que enfatiza excessivamente o conhecimento subjetivo em detrimento do seu sentido gramatical e histrico. Trata-se da assim chamada nova hermenutica, que nada mais do que

  • um desenvolvimento dos princpios hermenuticos de Bultmann, com sua nfase na relevncia da mensagem do Novo Testamento para o homem contemporneo.

    Para Bultmann e para a nova hermenutica reconhecidamente influenciados pela filosofia existencialista de Martin Heidegger (Nota 8) o importante no a inteno do autor, nem o que o texto falou aos seus leitores originais, mas o que fala a ns, hoje, no nosso contexto: esse o sentido do texto. Para a hermenutica existencialista o importante mesmo no o texto, mas o que est por trs dele. No interessa tanto o que o texto diz (historicamente), mas o que ele quer dizer (existencialmente). Logo, as Escrituras s sero interpretadas realmente se lidas existencialmente, se forem experimentadas. Ou seja, as Escrituras no so objetivamente a Palavra de Deus, elas se tornam Palavra de Deus, quando nos falam subjetivamente. Talvez as principais crticas hermenutica existencialista sejam que ela rejeita o elemento sobrenatural das Escrituras (milagres, encarnao, ressurreio, etc.) como sendo mitos, e que torna subjetivo o conceito de Palavra de Deus, com sua nfase existencialista. Com isso, ela esvazia a mensagem bblica e, assim como o mtodo alegrico e o mtodo intuitivo, abre espao para se ler no texto quaisquer idias ou conceitos originados na mente do leitor. (Nota 9) B. Corrente Humanista

    No extremo oposto da corrente espiritualista encontra-se a corrente que se pode chamar de humanista. Esta corrente caracteriza-se por dar nfase excessiva ao carter humano das Escrituras e por uma averso ao seu carter sobrenatural. A nfase dessa corrente est no mtodo, na tcnica, nos aspectos literrios ou histricos das Escrituras, em detrimento do seu carter divino, espiritual e sobrenatural.

    Calvino e a Hermenutica Adendo Cultural Parte II

    1. Precursores de Interpretao Bblica

    Os saduceus, com o seu repdio doutrina da ressurreio e descrena na existncia de seres angelicais, podem ser considerados como precursores dessa corrente de interpretao das Escrituras. Pouco se sabe sobre a origem desse

  • partido judaico, mas parece haver adotado uma posio secular-pragmtica de interpretao das Escrituras. (Nota 10) Ao negarem verdades bsicas das Escrituras, os saduceus podem ser considerados, guardadas as devidas propores, como os modernistas ou liberais da poca. (Nota 11) 2. Humanismo Renascentista

    Os humanistas renascentistas, com seu interesse meramente literrio e acadmico nas Escrituras, e com sua nfase na moral, tambm podem ser includos nesta corrente de interpretao bblica. Alguns se dedicaram ao estudo das Escrituras, outros chegaram at a editar textos bblicos na lngua original. Mas o interesse deles era meramente acadmico, lingstico, literrio e histrico. Estavam interessados nas Escrituras por sua antigidade e no por ser a Palavra de Deus.

    3. Escola Crtica

    A escola mais caracterstica e influente desta corrente de interpretao bblica a escola crtica, com o seu mtodo histrico-crtico. Uma das razes para o surgimento do mtodo histrico-crtico parece ter sido a pretenso de tornar cientficos os estudos bblicos, ou seja, faze-los compatveis com o modelo cientfico e acadmico da poca (Nota 12) E o resultado desta nova postura para com as Escrituras (crtica, ao invs de gramatical) foi o liberalismo teolgico que tem sido a postura de muitos telogos desde o sculo passado.

    Trata-se sem dvida de uma hermenutica racionalista. Ao invs da revelao governar a razo, a razo que determina a revelao. A razo e o intelecto passaram a ser determinantes, sendo rejeitado como erro, fbula ou mito tudo o que no puder ser explicado ou harmonizado com a razo.

    Os adeptos desta corrente rejeitam as doutrinas reformadas das Escrituras, tais como inspirao, autoridade, inerrncia, e preservao; enfatizam a moralidade e descartam o sobrenatural. Sob forte influncia do evolucionismo de Darwin e da dialtica de Hegel, as Escrituras deixaram de ser vistas como a Palavra de Deus inspirada na qual ele se revela ao homem, passando a ser considerada como um registro do desenvolvimento evolucionista da conscincia religiosa de Israel (e mais tarde da Igreja). (Nota 13). O conceito liberal de inspirao das Escrituras s objetivo no sentido de as Escrituras serem o objeto da inspirao. No mais, subjetivo: elas so o sujeito: elas que inspiram, com o seu poder de inspirar experincias religiosas. (Nota 14)

  • Na prtica, portanto, a principal caracterstica da escola crtica de interpretao o pressuposto de que as Escrituras devem ser estudadas do mesmo modo que as demais literaturas antigas, pelo emprego das mesmas metodologias. Esta postura, crtica, com sua nfase apenas no carter humano das Escrituras, resultaram em uma srie de metodologias crticas de carter histrico ou lingstico que vm sendo empregadas na interpretao das Escrituras.

    A crtica ou histria da tradio uma dessas metodologias, cuja pretenso descobrir a histria percorrida por determinado trecho, no mbito da tradio oral, ou seja, na fase anterior sua fixao literria mais antiga. (Nota 15). Isto : estudar como os eventos histricos e ensinos originais de Jesus teriam dado origem s diversas formas de tradies orais at o seu registro escrito. Seu propsito destradicionalizar (semelhante desmitologizao de Bultmann) os Evangelhos, em busca do fato ou ensino original. (Nota 16) A crtica da forma outra metodologia crtica. Sua pretenso classificar os escritos do Novo Testamento em gneros literrios e identificar as tradies que teriam dado origem s fontes empregadas pelos autores do Novo Testamento. Segundo os tericos da crtica da forma, (nota 17), os evangelhos provm de tradies orais no cronolgicas existentes (chamadas de paradigmas, novelas, lendas, mitos e exortaes). Posteriormente essas tradies orais teriam sido organizadas em relatos cronolgicos escritos que foram empregados pelos evangelistas. Mas a teoria extremamente especulativa, visto que no explica como esses gneros teriam surgido e se desenvolvido. Alm disso, no existe registro histrico dessas supostas colees no cronolgicas. (Nota 18). Outra metodologia desenvolvida pela escola crtica de interpretao a crtica das fontes. De acordo com esta teoria h muito pouco nos evangelhos (especialmente nos sinpticos) originrio dos evangelistas. Eles teriam sido mais coletores e editores dos diversos relatos (tradies escritas) existentes sobre a vida de Jesus do que propriamente autores. A teoria se baseia nas palavras de Lucas no incio do seu evangelho (cf. Lc 1.1, 3), e na observao de que os evangelhos de Mateus e Lucas normalmente concordam literalmente com o evangelho de Marcos (ambos ou cada um isoladamente), enquanto que raramente concordam entre si, quando discordam de Marcos. A concluso mais comum a que se chegou que Mateus e Lucas foram copiados de Marcos (quando concordam com ele) e de outra suposta fonte chamada "Q", quando concordam entre si, mas discordam de Marcos.

  • No h, contudo, concordncia entre os crticos da forma. As evidncias internas (baseadas em supostas inconsistncias cronolgicas, estilsticas, teolgicas e histricas) a favor dessa teoria so bastante limitadas, subjetivas, ambguas e contraditrias com as evidncias externas (afirmativas dos pais da igreja que apontam de modo unnime em direo oposta). (Nota 19). Muitas outras possibilidades tornam qualquer concluso extremamente incerta. Marcos poderia ter usado Mateus e Lucas; os trs evangelistas podem ter usado as mesmas fontes; Jesus pode ter repetido ensinos e parbolas com palavras diferentes em ocasies diferentes, etc. A verdade que no se sabe com exatido como os evangelistas escreveram seus evangelhos.

    Parece evidente que pelo menos um, Lucas, lanou mo de algumas fontes, mas conforme ele mesmo afirma, ele e suas fontes basearam-se no que lhes transmitiram testemunhas oculares dos acontecimentos (Lc 1.2). Entretanto, no h meios de saber concretamente que fontes foram estas e at que ponto e como as usaram. Isso torna a crtica da forma necessariamente especulativa. De concreto, mesmo, tm-se os Evangelhos, como Palavra de Deus escrita por homens inspirados (movidos) pelo Esprito Santo, fundamentados no que testemunharam e no testemunho de outras testemunhas oculares, e, portanto, fidedignas.

    Alm dessas metodologias, h tambm a crtica da redao, que se prope a estudar como os evangelistas teriam usado (editado) as suas supostas fontes na composio dos evangelhos; isto , que mudanas peculiares (ou contribuies) teriam sido introduzidas pelos evangelistas s fontes que usaram, e com que propsito (especialmente teolgico). (Nota 20) Mas, a que concluses seguras se podem chegar com a crtica da redao, se nem mesmo h certeza alguma com relao ao uso das fontes?

    Por fim, pode ser mencionado o criticismo histrico. Sua pretenso avaliar a historicidade das narrativas bblicas, ou, como escreve Marshall, ...testar a preciso do que se prope ser uma narrativa histrica. (Nota 21) Mas este propsito no somente pretensioso (inconsistente do ponto de vista bblico); tambm tendencioso, na medida em que explora as aparentes contradies internas (especialmente entre as passagens paralelas dos evangelhos) e externas (com fontes seculares e histricas); e encara os relatos de ocorrncias sobrenaturais por uma perspectiva altamente especulativa. Assim, o criticismo histrico no v os textos paralelos como complementares, mas como contraditrios; atribui s fontes

  • seculares autoridade superior das Escrituras; rejeita as intervenes sobrenaturais; e considera muitas narrativas histricas como inveno da igreja, novelas ou mitos. Os resultados de todas estas metodologias crticas so inseguros, questionveis e dbios, e sua aplicao prtica extremamente limitada (se possvel). So hipteses construdas sobre especulaes infrutferas que no contribuem em praticamente nada para a compreenso do texto do Novo Testamento, a no ser para lanar dvidas sobre a sua inspirao, autoridade e inerrncia. (Nota 22). No obstante, parece que a corrente humanista de interpretao das Escrituras tem comeado a prevalecer em um nmero considervel de seminrios teolgicos no nosso pas. A nfase hermenutica destes seminrios est no mtodo, na tcnica, nos aspectos literrios ou histricos das Escrituras, em detrimento do seu carter divino, espiritual e sobrenatural. A metodologia predominante tem sido o mtodo histrico-crtico. E, em virtude da impossibilidade de conciliar este mtodo com as doutrinas bblicas da inspirao, autoridade, suficincia, inerrncia e preservao das Escrituras, muitos destes seminrios tm se afastado cada vez mais da verdadeira fides reformata (f reformada). Como os resultados das metodologias crticas empregadas pelo mtodo histrico-crtico so quase sempre infrutferos, e sua aplicao prtica extremamente limitada, no incomum que o produto final de muitos dos nossos seminrios seja formandos despreparados para o ofcio de ministros da Palavra. Nesta condio, no de estranhar que, como observou Lopes, ... os plpitos de bom nmero das igrejas evanglicas destilam uma espcie de sermo onde pouca ou nenhuma ateno se d ao sentido original do texto bblico. (Nota 23). Destilam tambm, acrescento, teologias imprecisas e inconsistentes, que pouco edificam os membros de suas congregaes.

    C. Corrente Reformada

    A corrente reformada de interpretao das Escrituras (objeto especfico deste estudo) posiciona-se entre as duas correntes extremas j consideradas. Ela (a corrente reformada) caracteriza-se pelo equilbrio resultante do reconhecimento do carter divino-humano das Escrituras. Em funo disso, os intrpretes desta corrente reconhecem a necessidade da iluminao do Esprito falando atravs da prpria Palavra, ao mesmo tempo em que admitem a necessidade de interpretao gramatical e histrica das Escrituras. A interpretao reformada rejeita, por um lado,

  • a alegorizao indevida das Escrituras e, por outro, repudia uma postura primariamente crtica com relao a elas.

    1. Mtodo Gramtico-Histrico

    O mtodo de interpretao adotado e praticado pela corrente reformada ou protestante conservadora conhecido pelo nome de mtodo gramtico-histrico; o mtodo de interpretao honrado pelo tempo, no dizer de M. Lloyd-Jones. Trata-se de um mtodo fundamentado em pressuposies bblicas quanto prpria natureza das Escrituras, que emprega princpios gerais e mtodos lingsticos e histricos coerentes com o carter divino-humano da Palavra de Deus.

    2. Precursores: Escola de Antioquia e Agostinho

    Os reformadores no criaram este mtodo de interpretao bblica do nada. Eles se fundamentaram no prprio ensino bblico sobre a sua natureza e na prtica apostlica. As origens da interpretao reformada tambm so encontradas na escola de Antioquia da Sria, que pode ser considerada precursora do mtodo gramtico-histrico. Seus principais representantes foram Teodoro de Mopsustia (428) e Joo Crisstomo (407), o Boca de Ouro. Eles rejeitaram tanto o literalismo judeu, como o alegorismo de Alexandria; defendiam uma interpretao literal e histrica das Escrituras; criam na realidade histrica dos eventos descritos no Antigo Testamento; defendiam a unidade das Escrituras e admitiam o desenvolvimento ou progressividade da revelao. (Nota 24). Agostinho tambm pode ser considerado precursor do mtodo gramtico-histrico de interpretao bblica. Ele no parece haver sido consistente na aplicao do seu mtodo. De fato, sua distino de quatro sentidos das Escrituras foi to influente que prevaleceu por toda a Idade Mdia, como j foi visto. Apesar disso, ele estabeleceu importantes princpios de interpretao bblica no seu manual de hermenutica e pregao, De Doctrina Chistiana. Eis alguns desses princpios: (Nota 25) 1. A f um pr-requisito fundamental para o intrprete da Palavra de Deus.

    2. Deve-se considerar o sentido literal e histrico do texto.

    3. O Antigo Testamento um documento cristolgico.

    4. O propsito do expositor descobrir o sentido do texto e no atribuir-lhe sentido.

    5. O credo ortodoxo deve controlar a interpretao das Escrituras.

  • 6. O texto no deve ser estudado isoladamente, mas no seu contexto bblico geral.

    7. Se o texto for obscuro, no pode se tornar matria de f. As passagens obscuras devem dar lugar s passagens claras.

    8. O Esprito Santo no dispensa o aprendizado das lnguas originais, geografia, histria, cincias naturais, filosofia, etc.

    9. As Escrituras no devem ser interpretadas de modo a se contradizerem. Para isso, deve-se considerar a progressividade da revelao.

    3. Princpios Reformados

    Tem sido reconhecido que a reforma teolgica e eclesistica do sculo XVI foi o resultado de outra reforma: uma reforma hermenutico-exegtica. (Nota 26). De fato, a redescoberta das doutrinas bblicas pelos reformadores e a reforma eclesistica decorrente foram precedidas por um evidente rompimento com os princpios hermenuticos e com a prtica exegtica medieval.

    a. A nica Regra Infalvel de Interpretao A Reforma Protestante rejeitou veementemente a hermenutica alegrica medieval, e registrou seu repdio em alguns dos seus principais smbolos de f. Eis um exemplo: o pargrafo IX do captulo I da Confisso de F de Westminster (idntico ao mesmo pargrafo da Confisso de F Batista de 1689): A regra infalvel de interpretao da Escritura a mesma Escritura; portanto, quando houver questo sobre o verdadeiro e pleno sentido de qualquer texto da Escritura (sentido que no mltiplo, mas nico), esse texto pode ser estudado e compreendido por outros textos que falem mais claramente.

    Este pargrafo estabelece o princpio reformado fundamental de interpretao bblica, segundo o qual a nica regra infalvel de interpretao das Escrituras a prpria Escritura. Ela se auto-interpreta, elucidando, assim, suas passagens mais difceis. O que estas confisses querem dizer com essa afirmativa que o sentido de uma passagem obscura no pode ser autoritativamente determinado nem por tradio, nem por deciso eclesistica, nem por argumento filosfico, nem por intuio espiritual, mas sim, unicamente, por outras partes das Escrituras que expliquem e esclaream o seu sentido.

    b. Repdio Interpretao Alegrica Medieval

  • O pargrafo acima, citado da Confisso de F, tambm representa o repdio dos reformadores ao mtodo de interpretao qudrupla medieval. Em lugar dele, os reformadores ensinavam que cada passagem das Escrituras tem um s sentido, que literal a no ser que o prprio contexto ou outro texto das Escrituras requeiram claramente uma interpretao figurada ou metafrica.

    John Colet (c. 1467-1519) foi um dos primeiros reformadores a romper com o mtodo alegrico medieval, ao expor em 1496, em Oxford, as cartas do apstolo Paulo em seu sentido literal e no seu contexto histrico. (Nota 27). Trs anos depois, em 1499, ele j sustentava o princpio de que as Escrituras no podem ter seno um nico significado: o mais simples. (Nota 28) Lutero tambm rejeitou a interpretao alegrica. Defendeu que ns devemos nos ater ao sentido simples, puro e natural das palavras, como requerido pela gramtica e pelo uso do idioma criado por Deus entre os homens. (Nota 29) Quanto a Calvino, sua averso interpretao alegrica era de tal ordem que ele chegou a afirmar ser satnica, por desviar o homem da verdade das Escrituras. uma audcia prxima do sacrilgio, escreveu ele, usar as Escrituras ao nosso bel-prazer e brincar com elas como com uma bola de tnis, como muitos antes de ns o fizeram. (Nota 30). c. Necessidade de Iluminao Espiritual

    Os reformadores reconheceram a natureza divino-humana das Escrituras, e enfatizaram o papel do Esprito Santo no processo de interpretao da sua mensagem. Para eles, o impedimento maior estava na cegueira espiritual do homem, em funo da queda, e no nas Escrituras. Tanto para Lutero, como para Calvino, (Nota 31) nenhuma pessoa poderia interpretar corretamente as Escrituras sem a ao iluminadora do Esprito Santo atravs da prpria Palavra. Eis as palavras de Lutero sobre o assunto:

    ...a verdade que ningum que no possui o Esprito de Deus v um til sequer do que est na Escritura. Todos os homens tm seus coraes obscurecidos, de modo que, mesmo quando discutem e citam tudo o que est nas Escrituras, no compreendem ou conhecem realmente qualquer assunto dela... O Esprito necessrio para a compreenso de toda a Escritura e cada uma de suas partes. (Nota 32) d. Interpretao Gramatical e Histrica

  • Por outro lado, reconhecendo a natureza histrica das Escrituras, os reformadores defendiam a sua interpretao literal, enfatizando tambm a importncia da gramtica e da histria na compreenso da sua mensagem.

    Melanchton foi um dos responsveis pela nfase reformada na exegese gramatical. Em um discurso proferido em 1518 em Wittenberg, ele exortou seus ouvintes a recorrerem s Escrituras nas lnguas originais, onde encontrariam Cristo, livre das discordncias dos telogos latinos. Lutero ficou to impressionado com o que ouviu, que passou a assistir s aulas de grego de Melanchton, dedicando-se com afinco ao estudo do grego. (Nota 33) Mas foi Calvino, sem dvida, quem melhor praticou a exegese gramatical e histrica. Ele tem sido considerado por muitos o maior intrprete da Reforma e um dos maiores de todas as pocas. A profundidade, lucidez e erudio dos seus comentrios, que abrangem praticamente todos os livros da Bblia, (Nota 34) continuam a ser admirados e considerados atuais e raramente igualados. (Nota 35) E no se pense que essa a opinio apenas dos calvinistas (um compreensvel exagero presbiteriano deste autor). Mesmo Jacobus Arminius (1560-1609), um dos mais conhecidos opositores das doutrinas de Calvino, reconhecia a excelncia dos comentrios dele, e chegou a recomend-los como incomparveis. Eis suas palavras:

    Depois da leitura das Escrituras..., e mais do que qualquer outra coisa,... eu recomendo a leitura dos Comentrios de Calvino... Pois afirmo que na interpretao das Escrituras Calvino incomparvel, e que seus Comentrios so mais valiosos do que qualquer coisa que nos tenha sido legada nos escritos dos pais tanto assim que atribuo a ele um certo esprito de profecia no qual ele se encontra em uma posio distinta acima de outros, acima da maioria, na verdade, acima de todos. (Nota 36) e. Desenvolvimento do Mtodo Gramtico Histrico

    Estes e outros princpios de interpretao praticados pelos reformadores (Lutero, Calvino e demais reformadores alemes, suos, franceses e ingleses) viriam a ser desenvolvidos e adotados pelo protestantismo ortodoxo em geral desde ento, (Nota 37) e se tornaram conhecidos pelo nome de mtodo gramtico-histrico de interpretao bblica.

    Foi este o mtodo empregado pelos puritanos no sc. XVII;38 pelos lderes evanglicos do sculo XVIII na Europa e Amrica do Norte (tais como George

  • Whitefield e Jonathan Edwards); pelo anglicano J. C. Ryle, pelo batista Charles Spurgeon na Inglaterra e pelos presbiterianos Charles e Alexander Hodge no Seminrio de Princeton nos EUA, no sculo passado; e pelos intrpretes e pregadores protestantes (luteranos, anglicanos, presbiterianos e batistas) ortodoxos deste sculo.

    Os manuais de hermenutica de Davidson, Patrick, Imer, Terry, Berkhof, Berkeley, Mickelsen e Ramm pertencem todos a essa escola de interpretao bblica, bem como os comentrios bblicos de Keil e Delitzsch, Meyer, Matthew Henry, Lange, Alford, Ellicot, Lightfoot, Hodge, Broadus e muitos outros.

    O mtodo gramtico-histrico de interpretao bblica desenvolvido pela corrente reformada , de fato, a hermenutica honrada pelo tempo. um mtodo coerente com a natureza das Escrituras; fundamenta-se em pressuposies teolgicas bblicas; e emprega princpios gerais adequados e mtodos lingsticos e histricos extremamente frutferos.

    CONCLUSO A teologia e a praxis eclesistica deformadas do evangelicalismo moderno clamam por reforma; clamam por um novo retorno s Escrituras. A corrente espiritualista de interpretao bblica j foi colocada na balana e achada em falta: as hermenuticas alegrica, intuitiva e existencialista, por no darem a devida considerao ao carter humano das Escrituras, abrem espao para todo tipo de exesegese. O carter fantasioso destas hermenuticas acaba desviando a ateno do leitor ou ouvinte do verdadeiro sentido do texto bblico (aquele que o Esprito Santo intentou transmitir). A corrente humanista de interpretao bblica tambm j foi colocada na balana e achada em falta: a hermenutica dos saduceus, dos humanistas renascentistas e da escola crtica, por no darem a devida ateno ao carter divino das Escrituras, tendem a atribuir razo a autoridade que pertence revelao. Este carter racionalista da hermenutica humanista induz ao liberalismo teolgico que acaba negando a legtima f reformada.

    A corrente reformada de interpretao bblica tambm j foi colocada na balana da histria, mas foi aprovada com louvor: o mtodo gramtico-histrico fundamentado no prprio ensino bblico sobre as Escrituras e desenvolvido e aplicado pelos reformadores e seus legtimos herdeiros, por dar a devida ateno tanto ao carter

  • divino como ao carter histrico das Escrituras, promoveu as reformas teolgicas e eclesisticas mais profundas j experimentadas pela igreja crist. Durante a Reforma Protestante do sculo XVI e a reforma puritana do sculo XVII, por exemplo, muito entulho religioso teve que ser rejeitado. Muitas doutrinas e prticas eclesisticas acumuladas no decurso dos sculos tiveram que ser abolidas, quando reformadores e puritanos dedicaram-se com labor e orao a perscrutar as Escrituras para ver se as coisas eram de fato assim. A hermenutica reformada das Escrituras j demonstrou ter a capacidade de revelar a falcia de doutrinas e prticas eclesisticas fundamentadas em interpretaes alegricas, intuitivas, existencialistas e racionalistas.

    O evangelicalismo brasileiro tem acumulado nos ltimos cem anos especialmente nas ltimas dcadas considervel entulho religioso. No possvel entrar em detalhes aqui. Mas a proliferao de teologias estranhssimas, prticas litrgicas inusitadas e condutas eclesisticas no mnimo excntricas, j descaracterizaram a f e o culto reformados. Mesmo denominaes historicamente reformadas tm absorvido doutrinas e prticas de culto inconsistentes com o ensino bblico e com seus smbolos de f. Esta descaracterizao se explica, pelo menos em parte, pelo emprego das hermenuticas deficientes que estivemos considerando.

    No tempo, portanto, de reconsiderarmos os rumos que estamos tomando? De nos desvencilharmos das hermenuticas alegricas, intuitivas, existencialistas e racionalistas, e de retornarmos hermenutica reformada aprovada pela histria? No tempo de fazermos da orao uma prtica hermenutica, suplicando pela iluminao do Esprito Santo; e de labutarmos no estudo diligente das Escrituras, dando a devida ateno lngua e s circunstncias histricas em que foram escritas?

    Orare e labutare o caminho. No um caminho fcil nem mgico. Requer sinceridade e diligncia. Talvez no fornea interpretaes esplndidas nem realce a criatividade, imaginao e genialidade do pregador. Mas o antigo e bom caminho aprovado com louvor pela histria. Ele deixa que a verdade de Deus opere e que as Escrituras falem com poder e graa, promovendo profundas reformas teolgicas e eclesisticas.

  • Notas

    1 Gordon D. Fee e Douglas Stuart, Entendes o Que Ls? Um Guia para Entender a Bblia com o Auxlio da Exegese e da Hermenutica (So Paulo: Vida Nova, 1986) 19, 25.

    2 Ver o captulo primeiro da Confisso de F Batista de 1689.

    3 Richard Baxter, "Directions for Weak Distempered Christians," em The Practical Works of Richard Baxter (Grand Rapids: Baker, 1981) 677. 4 F. F. Bruce, "The History of New Testament Study," em New Testament Interpretation: Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 28. 5 Um dos iniciadores e um dos principais nomes da escola alegrica de interpretao das Escrituras.

    6 Bruce, "The History of New Testament Study," 28.

    7 Ralph P. Martin, "Approaches to New Testament Interpretation," em New Testament Interpretation: Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 220. 8 Bruce, "The History of New Testament Study," 51.

    9 Outros dados sobre a hermenutica existencialista podem ser encontrados em Bernard L. Ramm, "La Nova Hermeneutica", em Diccionario de la Teologa Prctica; Hermeneutica, ed. Rodolf G. Turnbull (Grand Rapids: Subcomisin Literatura Cristiana de la Iglesia Cristiana Reformada, 1976) 83-88. 10 S. Taylor, "Saduceus," em Enciclopdia Histrico-Teolgica da Igreja Crist, vol. III (So Paulo: Vida Nova, 1990) 332. 11 B. J. Van der Walt, Anatomy of Reformation: Flashes and Fragments of a Reformed Cosmocope (Potchefstroom: Potchefstroom University for Christian Higher Education, 1881) 10, 26. 12 Enio Ronald Mueller, "O Mtodo Histrico-Crtico: Uma Avaliao," em Entendes o Que Ls? Um Guia para Entender a Bblia com o Auxlio da Exegese e da Hermenutica, eds. Gordon D. Fee e Douglas Stuart (So Paulo: Vida Nova, 1986) 245.

  • 13 Henry A. Virkler, Hermenutica: Princpios e Processos de Interpretao Bblica (Miami: Editora Vida, 1987) 52. 14 Bernard Ramm, Protestant Biblical Interpretation: A Textbook of Hermeneutics, 3a. ed. rev. (Grand Rapids: Baker, 1973) 64. 15 Mueller, "O Mtodo Histrico-Crtico," 257.

    16 Mais sobre o assunto em David R. Catchpole, "Tradition History," em New Testament Interpretation: Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 165-180. 17 Tais como K. L. Schmidt, M. Dibelius e R. Bultmann.

    18 Mais sobre o assunto pode ser encontrado em Stephen H. Travis, "Form Criticism," em New Testament Interpretation: Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 153-164. 19 David Wenham, Source Criticism, em New Testament Interpretation: Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 144. 20 Stephen S. Smalley, "Redaction Criticism," em New Testament Interpretation; Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 181. 21 I. Howard Marshall, "Historical Criticism," em New Testament Interpretation; Essays on Principles and Method, ed. I. H. Marshall (Exeter: The Paternoster Press, 1979) 126. 22 Uma crtica em portugus ao mtodo histrico-crtico de interpretao das Escrituras pode ser encontrada em Mueller, "O Mtodo Histrico-Crtico," 255-271. Nestas pginas Mueller expe resumidamente as metodologias crticas e apresenta as objees ao mtodo histrico-crtico levantadas por Gerhard Maier, de Tbingen, no livro Das Ende der Historisch-kritischen Methode ("O Fim do Mtodo Histrico-Crtico"), publicado em 1974, e no artigo Concrete Alternatives to the Historical Critical Method," em Evangelical Review of Theology 6/1 (abril 1982). 23 Augustus Nicodemus Lopes, Lutero Ainda Fala: Um Ensaio em Histria da Interpretao Bblica, em Fides Reformata 1/2 (1996) 110. 24 Ramm, Protestant Biblical Interpretation, 48-50.

  • 25 De acordo com Ramm, Protestant Biblical Interpretation, 36-37, e Virkler, Hermenutica, 45.

    26 Ramm, Protestant Biblical Interpretation, 52.

    27 Bruce, "The History of New Testament Study," 29.

    28 Marvin W. Anderson, La Reforma y la Interpretacion," em Diccionario de la Teologa Prctica; Hermeneutica, ed. Rodolf G. Turnbull (Grand Rapids: Subcomisin Literatura Cristiana de la Iglesia Cristiana Reformada, 1976) 52. 29 Em sua obra Sobre a Escravido da Vontade (citada por F. F. Bruce, The History of New Testament Study, 31). Este livro de Lutero, publicado inicialmente em 1525, foi condensado por Clifford Pond e publicado em ingls em 1984 com o ttulo Born Slaves, e em portugs em 1992 pela Editora Fiel, com o ttulo Nascido Escravo.

    30 Ramm, Protestant Biblical Interpretation, 58.

    31 Lamberto Floor enfatiza com muita propriedade este aspecto da interpretao bblica de Calvino no artigo "The Hermeneutics of Calvin," em Calvinus Reformatur: His Contribution to Theology, Church and Society (Potchefstroom, South Africa: Potchefstroom University for Christian Higrer Education, 1982) 181-191. 32 Citado por Ralph A. Bohlmann, Princpios de Interpretao Bblica nas Confisses Luteranas (Porto Alegre: Casa Publicadora Concrdia, 1970) 29. 33 Anderson, "La Reforma y la Interpretacin," 54-55.

    34 Com exceo de 2 e 3 Joo e Apocalipse (no Novo Testamento). 35 Ver Ramm, Protestant Biblical Interpretation 57; e Louis Berkhof, Principios de Interpretacin Biblica (Grand Rapids: Subcomisin Literatura Cristiana, 1976) 52. 36 Carta escrita a Sebastian Egbertsz, publicada em P. van Limborch e C. Hartsoeker, Praestantium ac Eruditorum Virorum Epistolae Ecclesiasticae et Theologicae (Amsterdam, 1704), n 101 (citado por Bruce, "The History of New Testament Study," 33). 37 Cf. Virkler, Hermenutica, 49.

    38 Breves exposies em portugus dos princpios de interpretao puritana das E