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O GEN | Grupo Editorial Nacional reúne as editoras GuanabaraKoogan, Santos, Roca, AC Farmacêutica, Forense, Método, LTC,E.P.U.   e   Forense Universitária, que publicam nas áreascientífica, técnica e profissional.

Essas empresas, respeitadas no mercado editorial, con-

struíram catálogos inigualáveis, com obras que têm sido deci-sivas na formação acadêmica e no aperfeiçoamento de váriasgerações de profissionais e de estudantes de Administração,Direito, Enfermagem, Engenharia, Fisioterapia, Medicina,Odontologia, Educação Física e muitas outras ciências, tendose tornado sinônimo de seriedade e respeito.

Nossa missão é prover o melhor conteúdo científico edistribuí-lo de maneira flexível e conveniente, a preços justos,

gerando benefícios e servindo a autores, docentes, livreiros,funcionários, colaboradores e acionistas. Nosso comporta-mento ético incondicional e nossa responsabilidade social eambiental são reforçados pela natureza educacional de nossaatividade, sem comprometer o crescimento contínuo e a rent-abilidade do grupo.

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▪ A EDITORA MÉTODO se responsabiliza pelos víciosdo produto no que concerne à sua edição (im-pressão e apresentação a fi m de possibilitar aoconsumidor bem manuseá -lo e lê -lo). Os víciosrelacionados à atualização da obra, aos conceitosdoutrinários, às concepções ideológicas e referên-

cias indevidas são de responsabilidade do autore/ou atualizador.Todos os direitos reservados. Nos termos da Leique resguarda os direitos autorais, é proibida a re-produção total ou parcial de qualquer forma ou porqualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusiveatravés de processos xerográfi cos, fotocópia egravação, sem permissão por escrito do autor e doeditor.

▪ Direitos exclusivos para o Brasil na língua por-tuguesaCopyright  © 2013 by EDITORA MÉTODO LTDA.Uma editora integrante do GEN | Grupo EditorialNacionalRua Dona Brígida, 701, Vila Mariana – 04111-081

– São Paulo – SPTel.: (11) 5080-0770 / (21) 3543-0770 – Fax: (11)[email protected]   |www.editorametodo.com.br

▪ Capa: Rafael Molotievschi

▪ Produção: TypoDigital

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CIP – BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE.SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS,RJ.

Tartuce, FlávioDireito Civil, v. 6 : Direito das Sucessões / Flávio Tar-tuce, José Fernando Simão; prefácio Zeno Veloso. – 6.ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:MÉTODO, 2013.

Bibliografia

ISBN 978-85-309-4676-0

1. Herança e sucessão. I. Título. II. Título: Sucessões.

07-0355.

CDU: 347.65(81)

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 Aos saudosos civilistas do século XX, dentreeles ORLANDO GOMES, CAIO MÁRIO DA SILVA 

PEREIRA,SILVIO RODRIGUES, WASHINGTON DE BARROSMONTEIRO

e RUBENS LIMONGI FRANÇA.

Por terem deixado importante legadopara a nova geração.

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NOTA DOS AUTORES À 6.ª

EDIÇÃO

 A mudança de configuração dos livros desta coleçãoalcançou os seus fins, quais sejam de atingir principal-

mente o público universitário dos cursos de graduação epós-graduação. No último ano muitos professores e fac-uldades do Brasil passaram a adotar as obras, inclusivecomo leitura obrigatória, o que muito nos honra.

 Visando a ampliar ainda mais a utilização dos livros,incluímos nesta edição novas posições doutrinárias, ori-ginárias de reflexões surgidas no último ano. Também fo-ram incluídos os principais julgados de 2012, notada-mente os publicados nos Informativos de Jurisprudênciado Superior Tribunal de Justiça.

 Ademais, o texto foi revisado, ampliado e atualizado.

 Atendendo aos pedidos de leitores, novas questões,aplicadas nas principais provas e certames, foram incluí-das ao final de cada capítulo. O perfil do estudante con-temporâneo é de pretender exercitar, desde os bancos dagraduação, os testes pelos quais passará em toda a sua car-reira jurídica.

Espera-se que novos horizontes sejam conquistadosno ano de 2013 e que a obra cresça ainda mais.

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São Paulo, dezembro de 2012

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PREFÁCIO

Este volume 6 do   Direito Civil , série “ConcursosPúblicos”, da Editora Método, trata do Direito das Su-cessões. E trata muito bem, com profundidade e carinho.Superou minhas melhores expectativas. É um livro

excelente.Flávio Tartuce e José Fernando Simão, meus jovens e

diletos amigos, companheiros de muitas jornadas acadêm-icas, especialmente de congressos do nosso IBDFAM – In-stituto Brasileiro de Direito de Família, produziram umaobra que não deixa nada a dever às melhores que se escre-

 veram sobre o tema. Destina-se, precipuamente, aos que vão se submeter a concursos públicos, mas ultrapassouesse limite. Vai muito mais adiante. É trabalho de vulto,repleto de informações, de utilidade imensa paraestudantes, advogados, juízes e operadores jurídicos emgeral. Vai estar presente nas bibliotecas dos melhorescursos de graduação e pós-graduação.

Em quatro capítulos, partindo das regras gerais e con-ceitos básicos, prosseguindo com a sucessão legítima e atestamentária, terminando com inventário e partilha, oconteúdo temático é ampla e satisfatoriamente atendido.Nada ficou faltando.

 Além do que é comum e constante em qualquer boa

obra que trate da matéria, José Fernando Simão e Flávio

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Membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas.

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Nota da Editora: o Acordo Ortográfico foi aplicado integral-mente nesta obra.

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SUMÁRIO

1. REGRAS GERAIS

1.1 Introdução

1.2 Da herança e de sua administração

1.2.1 Da natureza jurídica da herança – regrasquanto à cessão de direitos hereditários

1.2.2 Da abertura do processo de inventário

1.3 Da vocação hereditária

1.3.1 Daqueles que herdam por sucessão legítima

1.3.2 Daqueles que herdam pela sucessãotestamentária

1.3.3 Daqueles não legitimados a suceder

1.4 Da aceitação e da renúncia à herança

1.4.1 Das regras de aceitação ou adição da herança

1.4.2 Das regras quanto à renúncia da herança

1.4.3 Das regras comuns à aceitação e à renúncia daherança

1.5 Dos excluídos da sucessão: da indignidade e dadeserdação

1.5.1 Das regras gerais da indignidade e da

deserdação

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1.5.2 Dos efeitos pessoais da indignidade e a dúvidaquanto à deserdação

1.5.3 Da legitimidade para a propositura das de-mandas e seus prazos

1.5.4 Dos motivos para a exclusão1.5.4.1 Dos motivos comuns à indignidade e à

deserdação

1.5.4.2 Dos motivos exclusivos à deserdação

1.5.5 Do herdeiro aparente e da validade de seusatos

1.5.6 Do perdão ou remissão do indigno

1.6 Da herança jacente e da herança vacante

1.6.1 Conceitos de jacência e de vacância. Natureza jurídica

1.6.2 Do procedimento de jacência

1.6.3 Da declaração de vacância1.6.4 Natureza jurídica da sentença de vacância.

Questões de direito intertemporal

1.7 Da petição de herança

1.8 Resumo esquemático

1.9 Questões correlatasGabarito

2. DA SUCESSÃO LEGÍTIMA 

2.1 Considerações iniciais sobre a ordem de vocaçãohereditária

2.1.1 Conceitos fundamentais

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2.1.2 Duas regras fundamentais da sucessão legí-tima e suas exceções

2.1.2.1 Primeira regra fundamental da sucessãolegítima

2.1.2.2 Segunda regra fundamental da sucessãolegítima

2.1.2.3 Das exceções. O estudo específico dodireito de representação

2.2 A sucessão legítima na linha reta descendente

2.2.1 Regras específicas e casos práticos de sucessão

na linha descendente2.2.2 Alterações e acréscimos sobre o tema. Análise

do Projeto de Lei 699/2011

2.3 A sucessão legítima na linha reta ascendente

2.4 A sucessão legítima do cônjuge. Questõescontrovertidas

2.4.1 Análise do Código Civil de 1916

2.4.2 O Código Civil de 2002

2.4.2.1 Requisitos necessários para que o côn- juge seja herdeiro – art. 1.830 do CC

2.4.2.2 A concorrência sucessória com os des-

cendentes do morto – art. 1.829, I, do CC2.4.2.2.1 Regime de bens do casamento.

Meação x Sucessão

2.4.2.2.2 Regimes em que o cônjuge nãoconcorrerá com os descendentes

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2.4.2.2.3 Regimes em que o cônjuge con-correrá com os descendentes

2.4.2.2.4 O quinhão do cônjuge que con-corre com os descendentes

2.4.2.3 A concorrência sucessória do cônjugecom os ascendentes do morto – art. 1.829,II, do CC

2.4.2.3.1 Quando haverá concorrênciaentre cônjuge e ascendentes?

2.4.2.3.2 Qual o quinhão que receberá o

cônjuge do falecido se concorrer comos ascendentes?

2.4.2.4 O cônjuge como herdeiro da totalidadedos bens

2.4.2.5 O projeto de alteração do art. 1.829 doatual CC: PL 699/2011

2.4.2.6 O direito de habitação do cônjugesupérstite. Análise do art. 1.831 do CC

2.5 A sucessão legítima do companheiro. Questõespolêmicas

2.5.1 As leis da união estável – Leis 8.971/1994 e9.278/1996

2.5.2 O Código Civil de 2002 e a sucessão docompanheiro

2.5.2.1 A massa patrimonial que herda o com-panheiro. Análise do art. 1.790,  caput , doCC

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3.7.2.3 Legado de coisa singular

3.7.2.4 Legado de coisa localizada

3.7.2.5 Legado de crédito – legatum nominis

3.7.2.6 Legado de alimentos

3.7.2.7 Legado de usufruto

3.7.2.8 Legado de imóvel

3.7.3 Dos efeitos do legado

3.7.3.1 Do pagamento do legado – transmissãoda posse e da propriedade do bem legado

3.7.3.2 Do pagamento do legado – legado derenda vitalícia ou de prestação periódica

3.7.3.3 Do pagamento do legado – legado decoisa incerta

3.7.3.4 Do pagamento do legado – da re-sponsabilidade e das despesas

3.7.3.5 Da caducidade dos legados

3.8 Do direito de acrescer entre herdeiros e legatários

3.8.1 Conceito de direito de acrescer e regramentos básicos

3.8.2 Regras quanto ao direito de acrescer con-

stantes do Código Civil em vigor3.9 Das substituições testamentárias. conceitos iniciais e

espécies

3.9.1 Da substituição vulgar ou ordinária

3.9.1.1 Regras gerais

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3.9.1.2 Das espécies de substituição vulgar ouordinária

3.9.2 Da substituição fideicomissária

3.10 Da revogação do testamento, de sua nulidade e

caducidade3.10.1 Da nulidade absoluta ou relativa do

testamento

3.10.1.1 Da nulidade absoluta do testamento

3.10.1.2 Da nulidade relativa ou anulabilidadedo testamento

3.10.1.3 Da conversão do testamento nulo ouanulável

3.10.2 Revogação do testamento

3.10.3 Da caducidade do testamento

3.11 Da redução das disposições testamentárias e do

rompimento do testamento3.11.1 Conceito de redução das disposições

testamentárias

3.11.1.1 Das regras gerais de redução das dis-posições testamentárias

3.11.1.2 Das regras de redução em se tratando

de bem imóvel3.11.2 Do rompimento do testamento

3.12 Do testamenteiro

3.12.1 Espécies e regras gerais

3.12.2 Das funções do testamenteiro

3.12.3 Do direito à vintena

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4.7 Da garantia dos quinhões hereditários. a responsab-ilidade pela evicção

4.8 Da anulação, da rescisão e da nulidade da partilha

4.9 Dos pedidos de alvarás em inventário

4.10 Resumo esquemático4.1 1 Questões correlatas

Gabarito

BIBLIOGRAFIA 

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REGRAS GERAIS

Sumário:  1.1 Introdução – 1.2 Daherança e de sua administração:1.2.1 Da natureza jurídica da her-ança – regras quanto à cessão dedireitos hereditários; 1.2.2 Da aber-tura do processo de inventário – 1.3Da vocação hereditária: 1.3.1Daqueles que herdam por sucessãolegítima; 1.3.2 Daqueles que her-

dam pela sucessão testamentária;1.3.3 Daqueles não legitimados asuceder – 1.4 Da aceitação e darenúncia à herança: 1.4.1 Das re-gras de aceitação ou adição da her-ança; 1.4.2 Das regras quanto àrenúncia da herança; 1.4.3 Das re-

gras comuns à aceitação e à

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renúncia da herança – 1.5 Dos ex-cluídos da sucessão: da indignidadee da deserdação: 1.5.1 Das regrasgerais da indignidade e da deser-dação; 1.5.2 Dos efeitos pessoais da

indignidade e a dúvida quanto àdeserdação; 1.5.3 Da legitimidadepara a propositura das demandas eseus prazos; 1.5.4 Dos motivos paraa exclusão; 1.5.5 Do herdeiro apar-ente e da validade de seus atos;1.5.6 Do perdão ou remissão do in-digno – 1.6 Da herança jacente e da

herança vacante: 1.6.1 Conceitos de jacência e de vacância. Natureza jurídica; 1.6.2 Do procedimento de jacência; 1.6.3 Da declaração devacância; 1.6.4 Natureza jurídica dasentença de vacância. Questões dedireito intertemporal – 1.7 Da

petição de herança – 1.8 Resumoesquemático – 1.9 Questões correl-atas – Gabarito.

1.1 INTRODUÇÃO

Explica Euclides de Oliveira que “de origem latina, apalavra   sucessão   significa, dentre outras acepções, su-ceder, vir após, entrar no lugar de outrem. Dá a ideia desubstituição de pessoa no desempenho de certa atividade,cargo ou função, como de uso na atuação política ouempresarial, ou da transmissão da propriedade de benspela troca dos titulares, tal seu emprego nos negócios jurídicos, em que ao alienante sucede o adquirente”

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(OLIVEIRA, Euclides. Direito de herança..., 2005, p. 50).Realmente, o vocábulo sucessão  tem uma pluralidade designificados para o Direito, já que qualquer transmissão de bens importa em sucessão.

Desse modo, podemos dizer que há dois tipos de su-cessão: a sucessão por ato entre vivos (inter vivos) eaquela por força da morte (causa mortis). A sucessão porato entre vivos ocorre quando o acordo entre as partestransfere certos bens, como é comum nos contratos. A título de exemplo, é o que ocorre em negócios jurídicos bi-laterais ou plurilaterais de cunho patrimonial, caso da

doação, da permuta ou da compra e venda. Não é esse otema de estudo no presente volume da coleção, eis que oDireito Contratual está analisado no Volume 3 desta série.

Por outro lado, o chamado Direito das sucessões cuidada transmissão de bens realizada com o advento da mortede determinada pessoa. Lembra Clóvis Beviláqua que “su-cessão em sentido geral e vulgar é a sequência de fenô-menos ou fatos que aparecem uns após outros, ora vincu-lados por uma relação de causa, ora conjuntos por outrasrelações. A sucessão mortis causa ou hereditária é aquelaem que há transmissão de direitos e obrigações de umapessoa morta a outra sobreviva em virtude da lei ou da vontade do transmissor” ( Direito das sucessões..., 1932, p.

15). De qualquer forma, não se pode confundir ou em- baralhar a sucessão   inter vivos   com a sucessão   mortiscausa.  Isso justifica a redação do art. 426 do CC atual,pelo qual não pode ser objeto de contrato a herança depessoa viva. O dispositivo em questão veda os pactos su-cessórios ou pacta corvina.

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 Assim sendo, por meio da sucessão mortis causa, queestudamos neste livro, ocorre a transmissão do patrimôniodo falecido, ou seja, de suas relações jurídicas em geral, se- jam elas ativas (créditos) ou passivas (débitos). Tal su-cessão é chamada de sucessão hereditária. Juridicamente,

costuma-se chamar o falecido, seja ele do sexo masculinoou do feminino, de  de cujus, ou seja, daquele de quem asucessão se trata (de cujus sucessione agitur).

O Código Civil consagra duas espécies de sucessãocausa mortis.

 A primeira delas é denominada   sucessão legítima,

pois os bens do falecido seguirão a ordem de vocaçãohereditária prevista em lei (art. 1.829 do CC). Diz-se  legí-tima, pois decorre da lei, da norma jurídica. Entendemosque o termo sucessão legítima não é dos melhores, pois dáa falsa impressão de que haveria uma  sucessão ilegítima.Entretanto, apesar da crítica, a expressão está cunhadahistoricamente e acompanha, há muito, a legislação brasileira.

 A segunda forma é a  sucessão testamentária, cujosefeitos decorrem do ato de última vontade do falecido quedeixa testamento ou codicilo (art. 1.786 do CC). Nopresente trabalho, o Capítulo 2 cuidará da sucessão legí-tima e o Capítulo 3, da testamentária.

 A sucessão será legítima se não houver ato de última vontade. Também será legítima a sucessão se esse ato dedisposição for nulo (problema a atingir o plano da valid-ade) ou sofrer caducidade (plano da eficácia), nos termosdo art. 1.788 do CC.

Na qualidade de negócio jurídico que é, o testamento

será nulo ou anulável dependendo do vício que o atingir; e

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sofrerá caducidade quando a disposição testamentária,apesar de válida, não prevalecer por obstáculo superveni-ente ao momento da testificação (DINIZ, Maria Helena.Curso..., 2005, v. 6, p. 267).

Por fim, a sucessão será legítima se o testamento nãoabarcar todos os bens deixados pelo falecido (art. 1.788 doCC). Dessa forma, se o testador legar uma casa ao seusobrinho João, todos os seus demais bens, bem como assuas dívidas, seguirão a ordem de vocação hereditária,sendo a sucessão legítima nesse caso. Esse último dispos-itivo citado sofre críticas da doutrina, pois, como bem ex-

plica Ricardo Fiuza, “o Código Civil incorre na erronia já verificada no Código Civil de 1916. Analisando o art. 1.575do Código Civil de 1916 – que equivale à parte final do art.1.788 – Clóvis Beviláqua expõe que sua redação é cen-surável por discrepar da técnica jurídica, e por não dar aopensamento da lei toda a extensão necessária. O pecadotécnico, diz Clóvis, está em usar o vocábulo nulo, para sig-

nificar nulo e anulado; a insuficiência da expressão con-siste em reduzir a ineficácia do testamento aos casos decaducidade e nulidade, deixando de mencionar, como seestivessem contidas nestas palavras, as ideias de ruptura eanulação” (FIUZA, Ricardo. O novo Código Civil e as pro- postas..., 2004, p. 289). Diante disso, propõe-se a seguinte

redação ao artigo nos termos do Projeto de Lei 699/2011,antigo PL 6.960/2002, de autoria do Deputado Fiuza:“Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmitea herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorreráquanto aos bens que não forem compreendidos no testa-mento; e subsiste a sucessão legítima se o testamentocaducar, romper-se, ou for inválido”.

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Com a morte da pessoa natural é aberta a sucessão.Observe-se que a abertura da sucessão não se confundecom a abertura do processo de inventário. A morte põe fimà personalidade jurídica material, aquela relacionada comos direitos patrimoniais, e nesse momento está aberta a

sucessão. Mas qual a importância de saber em que mo-mento ocorreu a morte?

 A primeira razão dessa importância é que a lei queregula a sucessão é aquela do momento do falecimento(art. 1.787 do CC). Sendo assim, se a pessoa faleceu até odia 10 de janeiro de 2003, sua sucessão será regida pelo

Código Civil de 1916, bem como pelas Leis 8.971/1994 e9.278/1996 no caso de uma união estável. Em reforço ànorma em questão, dispõe o Código Civil de 2002 que:“Art. 2.041. As disposições deste Código relativas à ordemda vocação hereditária (arts. 1.829 a 1.844) não se aplicamà sucessão aberta antes de sua vigência, prevalecendo odisposto na lei anterior (Lei 3.071, de 1.º de janeiro de

1916)”.Sobre o tema, proferiu a 4.ª Turma do Superior

Tribunal de Justiça decisão que contraria diretamente anorma em questão, no julgamento do Recurso especial n.1.111.095. O caso é curioso e merece destaque. Em 1950,determinado casal, por meio de pacto antenupcial, adotou

o regime de separação total de bens, e depois se contraiunúpcias. Em junho de 2001, o marido lavrou testamentopúblico, que incluía a totalidade de seu patrimônio, nome-ando como seu único herdeiro um sobrinho. Note-se quecomo o testamento foi celebrado na vigência do CódigoCivil de 1916, época em que o cônjuge não era herdeiro ne-cessário, o negócio poderia produzir efeitos e a esposa

nada receberia.

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do CC). O revogado Código Civil mencionava, em seu art.1.577, a “capacidade para suceder”. Explica José LuizGavião de Almeida que “não se duvida da existência de en-sinamento no sentido da diferenciação entre os termos ca-pacidade e legitimação, estando aquela ligada à aquisição

ou exercício de direito e esta à peculiar situação de alguémfrente a certos bens, certas pessoas ou certos interesses.Melhor era a utilização da expressão capacidade, enten-dida ela em termos genéricos” (Código Civil..., 2003, p.41).

Contudo, em sentido contrário, apontam Jones

Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado o acerto do dip-loma ao substituir as expressões “capacidade para su-ceder” por “legitimação para suceder”. Explicam essesautores que “capacidade para suceder (leia-se capacidadede direito) é a aptidão genérica para a aquisição de direit-os sucessórios por qualquer pessoa, existente ou futura,desde que designadas em lei ou testamento. Já a legitim-

ação é a aptidão específica para receber a herança. Não apossui, por exemplo, o indigno, ainda que plenamentecapaz, nem o cônjuge separado de fato há mais de doisanos, com a ressalva do disposto no art. 1.830” (CódigoCivil..., 2005, p. 909). Nesse   fogo cruzado doutrinário,entendemos que em certos casos o Código Civil cuida da

capacidade como algo genérico e em outros da legitimaçãocomo algo específico. Desse modo, ambas devem estarpresentes no momento da abertura da sucessão.

Dessa forma, na sucessão legítima – aquela que de-core da lei e não de testamento –, com a morte do de cujus verifica-se a capacidade sucessória do herdeiro.

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Quanto à sucessão testamentária, duas observaçõessão pertinentes. A primeira delas é que, se o herdeironomeado em testamento tinha legitimação para sucederna época em que o testamento foi feito, mas a perdeu nomomento do falecimento, não será considerado herdeiro.

Já aquele herdeiro que não tinha legitimação quando otestamento foi feito, mas a adquiriu posteriormente, rece- berá a herança normalmente.

Não se pode confundir a capacidade de quem faz otestamento – capacidade testamentária ativa –, com a le-gitimidade ou capacidade do herdeiro em receber a her-

ança – capacidade testamentária passiva. Assim, para avaliar a capacidade do testador (ativa),

deve-se seguir a lei do momento da elaboração do testa-mento (art. 1.861 do CC). Prevê esse comando legal que “aincapacidade superveniente do testador não invalida otestamento, nem o testamento do incapaz se valida com asuperveniência da capacidade”.

Já a avaliação da capacidade ou legitimidade dos her-deiros   nomeados em testamento se dá no momento daabertura da sucessão (art. 1.787 do CC). Um exemplo podeajudar a esclarecer a questão. Determinado maridoelabora um testamento deixando a parte disponível deseus bens à sua esposa e, posteriormente, em razão de

esclerose, torna-se absolutamente incapaz. Em razão dadoença, a esposa o abandona, vindo ele a falecer cincoanos depois do divórcio do casal. No caso descrito, o testa-dor era capaz no momento da elaboração do testamento esua incapacidade superveniente não retira a validade dotestamento (art. 1.861 do CC). Sua esposa tinha legitimid-

ade para receber a herança quando o testamento foi feito,

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mas perdeu-a no momento da abertura, pois já se encon-trava divorciada. Não será herdeira, portanto.

Só será herdeiro do falecido aquele que, no momentode sua morte estiver vivo. Ilustrando, se o filho morreu se-gundos antes de seu pai, não poderá ser seu herdeiro, porlhe faltar capacidade de direito decorrente da personalid-ade jurídica material. Como decorrência desse fato, não hárelação sucessória entre os comorientes, pois, em caso decomoriência, impossível atestar a pré-morte (art. 8.º doCC: “Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesmaocasião, não se podendo averiguar se algum dos comori-

entes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultanea-mente mortos”).

O mesmo deve ser dito se pais e filhos falecerem namesma ocasião, ou seja, também incidirão os efeitos dacomoriência. Nesse sentido, é interessante transcrever oseguinte julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

“Comoriência – Óbito de pais e filhos na mesma ocasião –Não transmissão de bens entre eles – Menor que não deixa

 bens, irmãos ou descendentes, apenas ascendentes – Aber-tura do inventário dos bens deixados pelos pais – Determin-ação judicial de abertura de inventário dos bens deixadospelo menor – Desnecessidade, entretanto – Inteligência doart. 11 do Código Civil de 1.916 (8.º, do novo) – Decisão re-

formada – Agravo provido” (TJSP, Agravo de instrumento335.348-4/0, 10.ª Câmara de Direito Privado, Limeira, Rel.João Carlos Saletti, j. 31.08.2004, v.u.).

Sobre o tema, dúvida comum se dá no tocante à pos-sibilidade de o herdeiro de um dos comorientes ser cha-mado a receber a herança do outro. Imaginemos um

acidente de carro em que falecem  A  e seu filho  B, sem

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Também é esse o entendimento de Álvaro Villaça Azevedo e Gustavo René Nicolau que concluem: “o ra-ciocínio que se impõe é o de que – na hipótese de seu paifalecer antes de seu avô – o neto já tem direito de repres-entação, quanto mais se o pai faleceu junto com o avô e o

resultado prático se mantém novamente” (Código Civil...,2007, p. 42). Os doutrinadores transcrevem decisão doTribunal de Justiça de São Paulo nesse sentido:

“Investigação de paternidade cumulada com petição deherança. Extinção do processo quanto à petição de herança.Reconhecida a comoriência entre os supostos pai e avó.

Transmissão inocorrida de bens. Necessidade de declaraçãoda filiação para, por representação, pleitear direito à her-ança da suposta avó. Pedido juridicamente possível. Inex-istência de interesse processual. Recurso improvido” (TJSP,

 Agravo de instrumento 246.920-4/8-Pedreira, 4.ª Câmarade Direito Privado, Rel. Carlos Stroppa, 12.09.2002, v.u.).

Sobre o pagamento de impostos, formulamos per-gunta a Euclides de Oliveira que, gentilmente e por e-mail ,nos respondeu o seguinte: “em se tratando de comoriên-cia, a transmissão dá-se direta ao neto D. Haverá incidên-cia do imposto sobre a transmissão de bens imóveis causamortis apenas uma vez, como se fosse sucessão por rep-resentação de B. Para a dupla incidência do tributo seria

preciso que houvesse prova da pós-moriência do neto D”.Outra razão de importância quanto ao momento da

morte é que, ocorrendo esta e sendo aberta a sucessão, aherança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimose testamentários (art. 1.784 do CC). Este é o princípio dasaisine, um dos mais importantes do Direito Civil.

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 A origem da expressão se encontra no Direito Gaulês,ou seja, nos primórdios do Direito francês. ExplicamJones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado que “le mort saisit le vif , ou seja, com a morte, a herança transmite-seimediatamente aos sucessores, independentemente de

qualquer ato do herdeiro. A aceitação da herança temnatureza confirmatória” (Código Civil..., 2005, p. 907).

 As origens históricas do instituto são minuciosamenteensinadas por Eduardo de Oliveira Leite, que afirma ser“regra costumeira que era expressa pelo adágio aceitodesde o século XIII em todos os lugares: ‘ Le mort saisit le

vif ’ (O morto prende o vivo) ou por uma forma um poucomenos lapidar: ‘ Le mort saisit le vif, son hoir pel plus proche, habile à lui succéder’ (O morto prende o vivo, seuherdeiro mais próximo, hábil a lhe suceder). É um dos ex-emplos mais antigos de normas pertencendo ao direitocomum costumeiro” (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 8).

Ocorre, no momento da morte, a  delação  – tambémdenominada de  devolução sucessória  ou  delação hered-itária –, segundo a qual os bens passam do patrimônio dofalecido ao patrimônio dos herdeiros, os novos titulares. Éo período que medeia entre a abertura da sucessão e aaceitação ou renúncia da herança (BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual ..., 2004, v. 4, p. 186). Lem-

 bra Eduardo de Oliveira Leite que “o direito impõe, at-ravés de uma ficção jurídica, a transmissão da herança,garantindo a continuidade na titularidade das relações jurídicas do defunto (...). Na impossibilidade de se admitirque um patrimônio fique sem titular, o direito sucessórioatinge, via transmissão imediata, a permanência da pro-priedade na pessoa dos herdeiros” (Comentários..., 2004,

 v. XXI, p. 5).

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 Aponta José Luiz Gavião de Almeida o acerto daredação do art. 1.784 do atual Código Civil, ao excluir asexpressões “domínio e posse”, contidas no art. 1.572 doCódigo Civil revogado, pois “poderia o autor da herançadeixar, por testamento, bens sobre os quais não tinha a

propriedade, posto de terceiros ou de um dos beneficia-dos. Nesse caso, não se poderia entender que esses bens,que poderiam compor a herança, seriam transmitidosimediatamente após a morte do de cujus a seus herdeiros”(Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 30). Nesse sentido,pode o falecido deixar como legado um bem que não lhepertence, mas que pertence a terceiros. Imaginemos aseguinte disposição: “Deixo meus bens a meu sobrinhoJoão, que deverá entregar seu carro a meu sobrinho José”.Trata-se da hipótese de sublegado, na qual o beneficiadopela deixa é chamado de   sublegatário   (item 3.6.2.1 dapresente obra).

Percebe-se, nesse contexto, que é possível que o testa-

dor determine ao herdeiro a entrega de bem do próprioherdeiro ao legatário. Como não tem o testador poder delegar bem alheio, essa disposição, em princípio, é ineficaz,pois o herdeiro terá possibilidade de decidir se entrega ounão a coisa legada. Trata-se de decisão que decorre doprincípio da autonomia privada, não podendo o herdeiro

ser constrangido a entregar o bem que lhe pertence. Se oherdeiro aceitar cumprir a determinação, recebe a herançado falecido; caso contrário, entende-se que renunciou. Nocaso descrito, a posse do bem que pertence a um terceironão se transfere com o falecimento do   de cujus   aolegatário.

Sobre a não transmissão automática da posse da

herança, deve-se frisar que, no caso de legado, ela também

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não ocorre. Enquanto, na qualidade de proprietário, aposse indireta do bem é transmitida ao legatário, a possedireta do bem não é transmitida automaticamente com ofalecimento. A posse direta permanece com o herdeiro atéque o legatário exerça o direito de pedir. Não pode o leg-

atário entrar por autoridade própria na posse da coisa leg-ada, ou seja, deve pedir ao herdeiro e, quando autorizadopor ele, entrará na posse (item 3.6.3.1 deste livro).

Observe-se que no sistema sucessório atual não se faznecessária a transcrição no registro de imóveis para que se verifique a transmissão da propriedade, pois o Código in-

sistiu “na sistemática da transmissão instantânea da pro-priedade dos bens hereditários aos herdeiros, legítimos outestamentários. Mas não repetiu a disposição que es-tabelecia que os atos cuja transcrição era obrigatória sótransferia a propriedade com ela. Assim, a discussão antesexistente sobre o momento da transmissão da pro-priedade, criada com a vinda da Lei de Registros Públicos,

foi solucionada pelo novo Código Civil” ( ALMEIDA, JoséLuiz Gavião de. Código Civil..., 2003, p. 32).

Isso não significa dizer que a partilha dos bens nãodeva ser transcrita no Registro de Imóveis por força doart. 167, I, 24 da Lei 6.015/1973. Na verdade, isso apenassignifica que não se discute mais qual o momento de

transmissão da propriedade: o da morte do  de cujus ou odo registro. A transmissão, agora e sem mais dúvidas,ocorre com a morte.

Sendo assim, se a posse dos bens, em regra, é trans-mitida desde logo aos herdeiros, poderão estes se valer dasações possessórias para a proteção dos bens herdados. A 

exemplificar a prática, poderão ingressar com   interdito

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 proibitório em caso de ameaça de invasão de terras; comação de manutenção de posse em casos de turbação ou at-entados repentinos à posse; ou com ação de reintegraçãode posse  em caso de invasão consolidada, isto é, de  es-bulho possessório.

 A jurisprudência do STJ, aliás, já entendeu que é pos-sível a propositura de ação possessória do espólio contraum dos herdeiros, ou mesmo de um herdeiro contra ooutro, sendo interessante transcrever a ementa de umdesses julgados:

“Civil e processo civil. Sucessão. Ação de reintegração deposse. Espólio contra herdeiro. Em linha de princípio, podea viúva inventariante, em seu nome ou em nome do espólio,promover ação de reintegração de posse contra herdeiro quepraticar esbulho em bem da herança, mas essa regra deveser interpretada com temperamento. Pelas peculiaridadesda espécie, a ocupação de imóvel do espólio, por um dosherdeiros, não configura esbulho. Recurso conhecido eprovido” (STJ, REsp 515175/RJ (200300502138), 513783Recurso Especial, 4.ª T., j. 02.09.2003,  DJ  03.11.2003, p.322, RSTJ  175/457, RT  821/207).

Superado esse ponto, determina o art. 1.785 da atualcodificação privada que: “A sucessão abre-se no lugar doúltimo domicílio do falecido”. Sobre o tema, o Tribunal de

Justiça do Rio de Janeiro assim decidiu: “É competentepara o processamento do inventário o foro em que aautora sempre manteve como seu domicílio, sendo que aconstituição de residência temporária em outra Comarcanão acarreta o deslocamento da competência. A com-petência para o processo sucessório é relativa, não po-

dendo ser arguida de ofício” (TJRJ, Agravo de

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instrumento 2007.002.36145, 11.ª Câmara Cível, Des.José C. Figueiredo, j. 09.01.2008).

Entretanto, pode ocorrer, conforme lecionam Sílvio deSalvo Venosa e Débora Gozzo, “de o falecido ter váriosdomicílios, isto é, várias residências, onde pode ser encon-trado (CC, art. 70). Se esse for o caso, processar-se-á o in- ventário em qualquer deles, p. ex., no que for mais con- veniente aos interesses dos herdeiros ou do consortesupérstite ou naquele em que se deu o óbito”(Comentários..., 2003, p. 37). O Código de Processo Civilcomplementa a regra em análise, prevendo que o foro do

domicílio do autor da herança, no Brasil, é o competentepara o inventário, a partilha, a arrecadação, ocumprimento de disposições de última vontade e todas asações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenhaocorrido no estrangeiro (art. 96 do CPC).

Porém, será competente: o foro da situação dos bens,se o autor da herança não possuía domicílio certo; e o forodo lugar em que ocorreu o óbito, se o autor da herança nãotinha domicílio certo e possuía bens em lugares diferentes(art. 96, parágrafo único, do CPC). Lembre-se que oCódigo Civil admite o chamado  domicílio eventual , tam- bém denominado habitação ou moradia, ou seja, o dom-icílio da pessoa que não tenha residência fixa será o local

onde for encontrada (art. 73 do CC). São os casos do cir-cense, do nômade, do cigano ou do peregrino. Nessashipóteses, aplicando-se a última regra processual tran-scrita, o domicílio será aquele do lugar dos bens. Por fim,se o morto tiver bens em mais de um domicílio, o foro seráo do lugar em que se encontrava quando morreu (art. 96,II, do CPC).

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O art. 96 do CPC contém regra de competência territ-orial de foro e não de juízo, como explica a jurista PatriciaMiranda Pizzol (Código de Processo Civil interpretado,2007, p. 265). E procedente é a crítica de Celso AgrícolaBarbi a respeito do inciso II do art. 96, pois o legislador

escolheu “um lugar onde pode não estar situado nenhumdos bens. Preferível teria sido estabelecer o foro concor-rente, em qualquer dos lugares onde houver bens do fale-cido” (Comentários..., 1999, v. 1, p. 321).

O último dispositivo material das disposições geraisdo direito das sucessões trata da sucessão do compan-

heiro, o polêmico e tão criticado art. 1.790 do CC. A sualocalização topológica no Código Civil suscita debates in-termináveis na doutrina, mas não verificaremos a questãopor hora. Entendemos que a sucessão do companheiromerece tratamento junto à ordem de vocação hereditáriae, assim, será estudada quando do exame da sucessão legí-tima (Capítulo 2).

1.2 DA HERANÇA E DE SUA  ADMINISTRAÇÃO

Logo após as disposições gerais sobre o Direito Su-

cessório, o Código Civil de 1916 continha um capítulocuidando da transmissão da herança. O novo diplomacivil, por outro lado, traz agora um capítulo denominado“Da Herança e sua Administração”. Nesse capítulo, o atualCódigo privado informa a natureza jurídica da herança, bem como especifica as regras de sua transmissão.

 Vejamos essas regras importantes, de forma pontual.

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1.2.1 Da natureza jurídica da herança – regrasquanto à cessão de direitos hereditários

Sabe-se que a sucessão aberta é considerada um bemimóvel por força de lei, ou seja, um  bem imóvel por de-

terminação legal  (art. 80, II, do CC), ainda que a univer-salidade em questão seja composta apenas por coisas mó- veis, tais como veículos, dinheiro, ações etc. Isso significaque, na qualidade de bem imóvel, a transmissão da her-ança exige escritura pública (art. 1.793, caput , do CC), sobpena de nulidade absoluta do ato de disposição, poispreterida uma solenidade que a lei considera essencialpara a validade do ato (art. 166, IV, do CC). Vale dizerainda que é imprescindível a outorga do cônjuge dodisponente se o regime de casamento não for o da sep-aração absoluta (art. 1.647, I, do CC). A cessão do quinhãohereditário pode ser onerosa ou gratuita.

 A herança também constitui uma  universalidade  ou

universidade de direito (art. 91 do CC), sendo consideradaindivisível  também por força de lei, pois, conforme o art.1.791 do atual Código, “a herança defere-se como um todounitário, ainda que vários sejam os herdeiros”. Por setratar de bem indivisível, os herdeiros serão condôminosaté que ocorra a partilha. Como explica Washington deBarros Monteiro, “o herdeiro tem direito sobre uma parteideal do acervo hereditário, que só na partilha será defin-ido e individualizado. Enquanto se processa o inventáriodos bens deixados, ativos e passivos, essa massa deve ficarsob a administração de alguém, o administrador pro- visório e depois o inventariante, que velará pela suaguarda e manutenção até que, pela partilha, seja objeto de

divisão, concretizando-se o quinhão de cada um, que

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receberá então os bens que lhe tocaram” (MONTEIRO, Washington de Barros.  Curso..., 2003, v. 6, p. 34). Emcomplemento, ensina-nos o mestre Silvio Rodrigues que,apesar do princípio da saisine, “o inventariante conserva aposse direta dos bens do espólio, os herdeiros adquirem a

posse indireta. Ambos ostentam simultaneamente a con-dição de possuidores” ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 15).Nesse sentido, decidiu o Tribunal de Justiça do Rio deJaneiro:

“1. A abertura da sucessão e a transmissão da herança aosherdeiros ocorre no momento da morte do titular do pat-

rimônio. É nesse momento que nasce a indivisão do montehereditário, até a partilha final, o que significa dizer que to-dos os herdeiros têm os mesmos direitos e deveres em re-lação ao todo. 2. A função do inventariante consiste na ad-ministração dos bens do espólio, não lhe sendo admitida a

 venda de bem de qualquer espécie sem oitiva dos interessad-os e autorização judicial, consoante determina o art. 992, I,

do CPC” (TJRJ, Apelação Cível 2007.001.64225, Rel. Des.Benedicto Abicair, j. 23.01.2008).

 Assim sendo, os frutos produzidos pelos bens da her-ança pertencerão a todos os herdeiros de acordo com seusrespectivos quinhões, sendo certo que todos deverão arcarcom as despesas de manutenção dos bens comuns na

mesma proporção. Isso porque há um condomínio entreos herdeiros, aplicando-se a regra que enuncia a divisãoigualitária em casos tais, prevista no art. 1.315 do CC.Outra decorrência da indivisibilidade e do desdobramentoda posse é que cada um dos condôminos poderá exigir acoisa de quem injustamente a detenha. É o que se denom-ina   direito de sequela,   que é garantido a todos os

herdeiros.

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Em decorrência ainda da indivisibilidade da herança,podemos chegar a duas importantes conclusões.

 A primeira delas é que é ineficaz a cessão pelo coer-deiro do seu direito hereditário sobre qualquer bem daherança considerado singularmente (art. 1.793, § 2.º, doCC). Isso significa que se o herdeiro alienar uma casa quecompõe a herança (note-se que ele não está cedendo umauniversalidade – seu quinhão – mas um bem determ-inado), a alienação não produzirá efeitos, ou seja, será in-eficaz. Não se pode falar, aqui, em nulidade absoluta ourelativa (plano da validade), mas apenas que a lei lhe re-

tira os efeitos (plano da eficácia). Com a partilha, se o bemtocar ao herdeiro que fez a cessão, esta produzirá efeitosnormalmente. Não há que se falar, ainda, na necessidadede autorização judicial para tanto, mas será essencial a es-critura pública, sob pena de nulidade de ato (art. 1.793,caput, do CC).

 A segunda conclusão é que, antes da partilha, será in-eficaz a disposição, por qualquer herdeiro e sem préviaautorização do juiz da sucessão, de bem componente doacervo hereditário, se ainda pendente a indivisibilidade(art. 1.793, § 3.º, do CC). Em uma primeira leitura, pareceque a redação do art. 1.793, § 3.º, repete o § 2.º do mesmodispositivo (“É ineficaz a cessão, pelo coerdeiro, de seu

direito hereditário sobre qualquer bem da herança consid-erado singularmente”).

Explica José Luiz Gavião de Almeida que se o disposit-ivo legal fosse mais bem interpretado encerraria determin-ação diversa, porque “inicialmente, então, veda quemesmo o herdeiro único faça disposição sobre bem certo,

enquanto não ultimado inventário, pois até esse ato

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permanece a indivisibilidade da herança. A esseentendimento leva-nos o art. 1.791, ao dizer que a herançase defere como um todo unitário, ainda que vários sejamos herdeiros. A  contrario senso,  mesmo que apenas umseja o herdeiro, a herança também se transfere como um

todo único” (Código Civil..., 2003, p. 88). Concordamoscom as palavras do Desembargador paulista e Professor daUSP.

Em outras palavras, pelo dispositivo em comento, éessencial à eficácia da alienação a autorização judicial,além da forma pública para sua validade. Nesse sentido,

esclarecem Jones Figueirêdo Alves e Mario Luiz Delgadoque “a alienação de bem determinado que compõe oacervo hereditário, pode ser feita pelo inventariante, desdeque haja prévia autorização do juiz da sucessão (CPC, art.992, I)” (Código Civil..., 2005, p. 915).

Pois bem, dessas conclusões, podemos chegar aoseguinte resumo esquemático, o que facilita a visualizaçãoda matéria:

– Se o herdeiro desejar transferir o seu quinhãohereditário (parte da universalidade), que significatransferir as dívidas e os bens recebidos, deveráfazê-lo por forma pública, não necessitando de autor-

ização judicial para que essa disposição produzaefeitos.

– Se o herdeiro resolver transferir apenas seu direitosobre um bem determinado, a cessão será ineficazaté a partilha, produzindo efeitos se o bem tocar aoherdeiro que fez a disposição.

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– Se o herdeiro resolver alienar o bem em si, poderáfazê-lo desde que obtenha autorização judicial, sobpena de ineficácia do ato. Não se trata de cessão deherança, mas de venda de um bem determinado doacervo patrimonial.

Sobre a extensão da cessão dos direitos hereditários, oCódigo Civil determina que esses direitos, conferidos aoherdeiro em consequência de substituição ou de direito deacrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feitaanteriormente (art. 1.793, § 1.º). Isso significa que caso o

herdeiro cedente receba mais direitos em razão do direitode acrescer ou da substituição testamentária (itens 3.7 e3.8), após ocorrer a cessão, o cessionário, em princípio,não receberá a parte acrescida ou o que recebeu em sub-stituição. Acreditamos que a norma é perfeitamente justa,pois como recebeu o herdeiro cedente mais direitos apen-as após efetivada a cessão, ou seja, direitos que não tinhana época da transmissão, tais direitos ao cedente perten-cerão, salvo previsão do contrato de cessão em sentidocontrário. A cessão não poderia englobar direitos que opróprio cedente desconhecia.

O direito de acrescer e a substituição são exceções àregra de que se vários são os herdeiros ou legatários bene-

ficiados por uma disposição testamentária, a renúncia ouexclusão de um deles significa que o seu quinhão será di- vidido entre os herdeiros legítimos. A matéria ainda serápor nós tratada em momento oportuno.

Cumpre destacar que o Código Civil de 2002 criouuma disposição expressa sobre o direito de preferência

entre os coerdeiros, qual seja, a determinação pela qual o

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coerdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pess-oa estranha à sucessão, se outro coerdeiro a quiser, tantopor tanto (art. 1.794 do CC). A regra é decorrência naturalda indivisibilidade e guarda forte relação com a questão da venda de bem indivisível em condomínio, prevista na dis-

ciplina do contrato de compra e venda (art. 504 do CC).Como já escreveu um dos coautores da presente obra,

“Em se tratando de coisa indivisível, os condôminos sofr-em certas limitações impostas pelo direito no tocante à ali-enação de sua parte na coisa comum. A razão decorre doprincípio pelo qual o condômino de coisa divisível per-

manece no regime de condomínio porque quer, pois aqualquer tempo pode manejar a ação divisória e colocarum fim ao condomínio. Já para o condômino de coisa in-divisível não há essa possibilidade: a única forma de ex-tinção do condomínio é a alienação da coisa comum, paraque o valor apurado seja repartido pelos coproprietários.Como o Código Civil pretende facilitar a extinção de con-

domínio, e todas as regras que existem são nesse sentido,pois o condomínio é a mãe das discórdias (condominiummater rixarum est ), não pode o condômino de coisa indi- visível vender sua parte sem dar direito de preferência aosoutros condôminos (CC, art. 504). Com a preferência (a leiutiliza a expressão tanto por tanto), o Código facilita a ex-

tinção do condomínio” (SIMÃO, José Fernando.  Direitocivil ..., 2005, v. 5, p. 106). Vale dizer que a preferência ex-iste nos casos de dação em pagamento e de venda do quin-hão. Nos casos de alienação gratuita ou de permuta, essapreferência não existe.

Não sendo essa preferência respeitada, o coerdeiropreterido terá direito à adjudicação do quinhão, e deposit-

ando o preço, haverá para si a quota cedida a estranho, se

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o requerer até 180 dias após a referida transmissão (art.1.795 do CC).

Observe-se que fixa a lei idêntico prazo previsto na venda de bem indivisível em que houve preterição do con-dômino, com a ressalva de não mencionar o início de suacontagem, o que gera enorme controvérsia, conformeapontado no Volume 3 desta coleção (art. 504 do CC). Nosdois casos, contudo, o prazo é decadencial, pois a ação deadjudicação tem natureza constitutiva (critério científicode Agnelo Amorim Filho –  RT  300/7 e 744/725). Nessemesmo sentido, quanto ao art. 1.795 do CC, posicionam-se

Zeno Veloso ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.490), JonesFigueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado (Código Civil...,2005, p. 1.796) e Eduardo de Oliveira Leite(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 87).

De pronto, surge a seguinte questão: o prazo se iniciacom a alienação do quinhão ou quando dela têm ciência oscoerdeiros preteridos?

No tocante à venda, ao estudar o art. 504 do CódigoCivil a doutrina se divide. Seguindo a noção jurídica dedecadência, o prazo se iniciará quando da venda da coisaao estranho, e não sofrerá suspensão ou interrupção, se-gundo Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., 2005, v. III,p. 52). Para Carlos Roberto Gonçalves, em se tratando de

 bens imóveis, o prazo se inicia com o registro imobiliário,em razão da publicidade ( Direito civil..., 2004, v. III, p.219).

E com relação à cessão do quinhão hereditário? A doutrina silencia-se sobre a questão. Apenas José LuizGavião de Almeida afirma que “nem se poderia considerar

termo inicial do prazo para que fizessem valer seus

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direitos uma data da qual não tiveram ciência. Os prazosdecadenciais, e o disposto no art. 1.795 é um deles, fazperecer o direito de agir pela inércia de seu titular. Masnão se pode entender desidioso aquele que não teve opor-tunidade de defender seus interesses” (Código Civil...,

2003, p. 91). Assim, entende o autor que o prazo se iniciaquando o juiz do inventário determinar a manifestaçãodos coerdeiros com relação à cessão. O coautor desse livro,Flávio Tartuce, também pensa dessa forma, particular-mente diante do princípio da boa-fé objetiva, que valorizaa informação e a ciência dos atos pelas partes envolvidas.

Mas a questão é polêmica, pois em regra a decadênciasurge com o próprio direito potestativo a que se refere. Assim, em mais de um dispositivo de lei o prazo decaden-cial se inicia com a celebração do negócio jurídico e nãocom o seu conhecimento. Como exemplo de prazo decad-encial que se inicia com sua celebração, pode-se citar oprazo para anulação do negócio jurídico em que haja vício

do consentimento (art. 178 do CC), salvo no caso dacoação e de atos de incapazes. Por isso, entende o coautorJosé Fernando Simão que contar o prazo antes da ciênciado coerdeiro seria regra muito injusta, pois haveria adecadência extinguindo direitos, sem que houvesse inérciado titular. Por outro lado, em se tratando de exercício de

direito potestativo, pretende a lei uma rápida solução, sobpena de criar insegurança jurídica.

Sem prejuízo dessas polêmicas, caso haja mais de umherdeiro interessado no quinhão, entre eles se distribuiráo quinhão cedido, na proporção das respectivas quotashereditárias (art. 1.795, parágrafo único, do CC). É in-teressante notar que a lei não cria critérios de desempate

entre os coerdeiros que queiram exercer suas preferências.

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habitual erudição, Sílvio de Salvo Venosa diz que “a palav-ra inventário decorre do verbo invenire, do latim: encon-trar, achar, descobrir, inventar e do verbo  inventum: in- vento, invenção, descoberta. A finalidade do inventário é,pois, achar, descobrir, descrever os bens da herança, seu

ativo e seu passivo, herdeiros, cônjuge, credores, etc.”( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 46). A relação feita peloautor paulista em tom didático serve para elucidar o con-teúdo do inventário.

Em sentido contrário, determina o Código de ProcessoCivil que o inventário seja aberto no prazo de 60 dias (Lei

11.441/2007). O Estatuto Processual determina, ainda, oencerramento do inventário em doze meses (nova redaçãodo art. 983 do CPC determinada pela Lei 11.441/2007).Destaque-se que, com a edição da lei retromencionadarevogou-se o parágrafo único do dispositivo processual emquestão, que previa a possibilidade de o juiz, a requeri-mento do inventariante, dilatar esse prazo se houvesse

motivo justo. Com a nova redação, pode o juiz, tanto deofício quanto a requerimento das partes, dilatar os prazosem questão.

O Código Civil de 2002, de maneira precavida, deixade mencionar o prazo de encerramento, mesmo porque,dependendo da Comarca, do volume de trabalho forense e

das sempre presentes greves do Poder Judiciário, o prazopode ultrapassar em muito os doze meses. Ademais, a fix-ação de prazo final se revela inútil, pois não há sançãoprevista para o seu descumprimento, salvo a eventual re-moção do inventariante, caso ocorra desídia nocumprimento de suas funções (art. 995, II, do CPC).

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Mesmo assim, surge uma dúvida que pode ser formu-lada: o descumprimento do prazo de 60 dias para a aber-tura de inventário é acompanhado de sanção? De início,também não haverá sanção civil, mas permite-se que, como atraso, qualquer interessado peça a abertura (art. 988 do

CPC), ou mesmo que o inventário seja aberto de ofíciopelo juiz (art. 989 do CPC).

O dever de requerer o inventário é daquele que está naposse e na administração dos bens do espólio, que é de-nominado  administrador provisório   (art. 987 do CPC).Todavia, também têm legitimidade para requerer a aber-

tura de inventário as seguintes pessoas, conforme o art.988 do CPC:

I – o cônjuge supérstite;

II – o herdeiro;

III – o legatário;

IV – o testamenteiro; V – o cessionário do herdeiro ou do legatário;

 VI – o credor do herdeiro, do legatário ou do autor daherança;

 VII – o síndico da falência do herdeiro, do legatário, doautor da herança ou do cônjuge supérstite;

 VIII – o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes; eIX – a Fazenda Pública, quando tiver interesse.

Caso o atraso na abertura do inventário seja superior asessenta dias, Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira ex-plicam que isso “acarreta acréscimo dos encargos fiscais,

pela incidência de multa de 10% sobre o imposto a

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recolher, além dos juros de mora. Se o atraso for superiora 180 dias, a multa será de 20%” ( Inventários e partil-has..., 2006, p. 329). Previsões nesse sentido constam doart. 21, I, da Lei Estadual paulista 10.705/2000, que dis-põe sobre a instituição do   imposto sobre transmissão

causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos  –ITCMD. É de se observar que essa penalidade tributária éprevista para as sucessões que se derem apenas no Estadode São Paulo. A título de exemplo, em Minas Gerais, o im-posto é regido pela Lei Estadual 14.941/2003. No Estadodo Rio de Janeiro, é regido pela Lei Estadual 11.427/1989,com as suas posteriores modificações. No Maranhão, édisciplinado pela Lei Estadual 4.912, de 29 de dezembrode 1988.

 Até que o inventariante preste o compromisso, nostermos do art. 990, parágrafo único, do Estatuto Processu-al, continuará o espólio na posse do  administrador pro-visório (art. 985 do CPC). Esse administrador representa

ativa e passivamente o espólio, sendo obrigado a trazer aoacervo os frutos que desde a abertura da sucessão houverpercebido. Além disso, o mesmo tem direito ao reembolsodas despesas necessárias e úteis realizadas na adminis-tração, respondendo pelo dano a que, por dolo ou culpa,der causa quando de sua atuação. Tudo isso consta do art.

986 do CPC.Percebe-se por todas essas regras que antes da assun-ção da inventariança os bens do espólio não podem ficarabandonados à própria sorte, razão pela qual o Código deProcesso Civil criou a figura do administrador provisório,com poderes temporários, para zelar pelo espólio erepresentá-lo, até a nomeação do inventariante e seu cor-

respondente compromisso. Terá o administrador poderes

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de representação do espólio, sendo que a sua adminis-tração se encerra com o início da inventariança.

Pois bem, a dúvida que surge é: quem será esse  ad-ministrador provisório?

Coube ao Código Civil indicar a quem caberá essa ad-ministração provisória dos bens, de forma sucessiva, con-forme art. 1.797, a saber:

1.º) ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia aotempo da abertura da sucessão;

2.º) ao herdeiro que estiver na posse e administração dos

 bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho;

3.º) ao testamenteiro;

4.º) a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das in-dicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem deser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do

 juiz.Sobre o tema, é interessante a decisão do Tribunal do

Rio de Janeiro no tocante ao companheiro homoafetivoque foi admitido como administrador provisório,conferindo-lhe a prerrogativa de requerer o inventário,mas não a qualidade de herdeiro: “Verifica-se que o autor,

ora Apelante, encontra-se na posse e administração dos bens do espólio, uma vez que o falecido, conforme o de-clarado à fls. 24/25 deixou 50% de um bem imóvel, sendoo apelante proprietário dos outros 50%, de acordo com aescritura de compra e venda constante à fls. 27/28. Assim,tem-se que o Apelante figura como administrador pro- visório, art. 987 do CPC. Tal condição lhe confere a prer-

rogativa de requerer o inventário e a partilha. Assim, ao

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contrário do decidido na d. sentença, tem-se que o autortem legitimidade para requerer a abertura do inventário.Contudo, tal não lhe confere a qualidade de herdeiro, eisque tal condição não pode ser alcançada diante dos termosdo § 3.º do art. 226 da CF. Correto o julgado neste ponto.

Sentença que se anula, determinando-se oprosseguimento do feito. Recurso provido, em parte”(TJRJ, Apelação Cível 2006.001.09399, Rel. Des. RonaldoRocha Passos, j. 11.03.2008).

O administrador provisório, em princípio, será aqueleque estiver na posse da herança, pois não se trata de pess-

oa indicada pelo juiz, mas sim em razão de situação defato. Nesse sentido, afirma o processualista Antonio Car-los Marcato “que é lícito concluir que seu exercício inde-penda da nomeação judicial. O encargo será normalmenteatribuído àquela pessoa que já esteja na posse e na admin-istração dos bens integrantes do espólio” (Código de Pro-cesso Civil..., 2004, p. 2.480). Entre os civilistas, Sebastião

 Amorim e Euclides de Oliveira entendem que a ordemprevista no art. 1.797 do CC é apenas de preferência e deveser seguida pelo juiz, sucessivamente ( Inventários e partilhas..., 2006, p. 344). Tal premissa foi confirmada re-centemente pelo STJ, ao atribuir a condição ao cônjugesupérstite. O julgado foi assim publicado no  Informativo

n. 432 daquele Tribunal Superior:“Representação judicial. Administrador provisório. A 

Turma reiterou o entendimento de que, enquanto nãonomeado inventariante e prestado o compromisso (arts. 985e 986 do CPC), a representação ativa e passiva do espóliocaberá ao administrador provisório, o qual, usualmente, é ocônjuge supérstite, uma vez que detém a posse direta e a ad-

ministração dos bens hereditários (art. 1.579 do CC/1916,

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derrogado pelo art. 990, I a IV, do CPC e art. 1.797 do CC/2002). Assim, apesar de a herança ser transmitida ao tempoda morte do de cujus (princípio saisine), os herdeiros ficarãoapenas com a posse indireta dos bens, pois a administraçãoda massa hereditária será, inicialmente, do administradorprovisório, que representará o espólio judicial e extrajudi-cialmente, até ser aberto o inventário com a nomeação doinventariante, a quem incumbirá representar definitiva-mente o espólio (art. 12, V, do CPC). Precedentes citados:REsp 81.173-GO, DJ 2/9/1996, e REsp 4.386-MA, DJ 29/10/1990” (STJ, REsp 777.566/RS, Rel. Min. Vasco DellaGiustina (Desembargador convocado do TJ-RS, j.27.04.2010).

Para concluirmos o presente tópico, como lembraSílvio de Salvo Venosa, “na prática, somente em herançasde vulto, ou quando há dificuldade para nomear-se um in- ventariante, é que surge o administrador provisório”( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 48). Em outras palavras, asua atuação não é a regra, mas a exceção, ou seja, só

ocorre em casos excepcionais.

1.3 DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA 

 Ao tratar da vocação para herdar, cuida o Código Civil

de prever aqueles que poderão ser herdeiros legítimos outestamentários, quando da abertura da sucessão, bemcomo aqueles que não poderão suceder em determinadassituações específicas.

Em suma, trata a lei de terminar a capacidade para su-ceder, rompendo com o sistema do revogado Código Civil,

que apenas se preocupava com a capacidade testamentária

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passiva (arts. 1.717 e 1.718 do CC/1916). Dessa forma, amatéria em questão se divide em três partes:

1.ª parte – daqueles que poderão ser herdeiros legítimos;

2.ª parte – daqueles que poderão ser herdeiros testa-

mentários; e3.ª parte – daqueles que não poderão ser herdeiros.

Estudaremos essas situações de forma separada e de-talhada, a partir do presente momento.

1.3.1 Daqueles que herdam por sucessão legítima

De acordo com o art. 1.798 do atual Código Civil,legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebi-das no momento da abertura da sucessão. O dispositivolegal acaba por reforçar a regra pela qual quem não tempersonalidade jurídica material ao tempo da morte do fa-lecido não terá direitos sucessórios. Por oportuno, anote-se que somente a pessoa natural, e não a pessoa jurídica,herda pela sucessão legítima.

Não só as pessoas já nascidas, como também os nasci-turos, ou seja, aqueles que já foram concebidos, mas aindanão nasceram, terão direito a suceder legitimamente seus

parentes, independentemente da existência de testamentoque os beneficie. A respeito dos direitos sucessórios donascituro, esclarece Zeno Veloso que “o conceptus (nascit-uro) é chamado à sucessão, mas o direito sucessório só es-tará definido e consolidado se nascer com vida, quandoadquire a personalidade civil ou capacidade de direito. Onascituro é ente em formação (spes hominis), um ser que

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ainda não nasceu. Se o concebido nascer morto, a sucessãoé ineficaz” ( Novo Código Civil ..., 2006, p. 1.492).

Pois bem, entendem ambos os autores da presenteobra que os direitos patrimoniais do nascituro são subor-dinados a condição resolutiva, ou seja, ao nascimento com vida. O nascituro terá direito, inclusive, a um curador ao ventre, caso seus pais tenham sido destituídos do poderfamiliar (art. 878, parágrafo único, do CPC).

Certa corrente doutrinária, encabeçada por MariaHelena Diniz, aponta que os conceitos de embrião e denascituro não se confundem. Isso porque o nascituro já se

encontra nidificado no ventre materno. Por outra via, se-gundo essa corrente, as técnicas de reprodução assistidapodem gerar embriões, que, antes da implantação noútero materno, não são considerados nascituros. En-tretanto, a questão não é tão simples quanto pode parecer.

O problema dos embriões e suas consequências é bril-

hantemente exposto por Giselda Maria Fernandes NovaesHironaka no seguinte sentido: “o problema não mais serefere aos nascituros que se encontravam implantados noútero materno, senão aos embriões, congelados emlaboratório. Assiste-lhes a condição de nascituros? Ou, aocontrário, são considerados prole eventual, já que não sesabe se serão efetivamente alojados em útero apto a gestá-

los? A resposta que se dê gerará diferentes soluções no quetoca ao destino da pessoa que morta. Se forem consid-erados nascituros, terão adquirido a propriedade daquota-parte que lhes toque, o que pode causar inconveni-entes gravíssimos se alguns forem embriões congelados.Se, por outro lado, forem considerados prole eventual,

afastados da sucessão legítima, poderão restar excluídos

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da sucessão do pai ou da mãe que não conheceram, mas aquem devem a paternidade biológica” ( CAHALI, Fran-cisco e HIRONAKA, Giselda. Curso avançado..., 2003, v.6, p. 356).

Diante dessa situação de dúvida, há quem entenda queo nascituro e apenas ele sucede legitimamente e não osembriões. Nesse sentido, cristalina é a lição de Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira, pela qual “exige-se, ao in- vés, que ocorra a implantação no útero materno (in animanobile), onde ocorre a nidação, possibilitando seu regulardesenvolvimento até o nascimento com vida” ( Inventários

e partilhas..., 2006, p. 41). Também Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado entendem que a lei “ao sereferir a pessoas ‘já concebidas’, está fazendo alusão aonascituro, cujo conceito pressupõe gravidez, excluindo,portanto, dentre os legitimados a suceder, o embrião con-gelado in vitro, bem como os filhos havidos por insemin-ação artificial ocorrida após a abertura da sucessão”

(Código Civil..., 2005, p. 918).Em sentido contrário e não menos contundente,

levando-se em conta que se presumem concebidas na con-stância do casamento as pessoas nascidas, a qualquertempo, quando se tratar de embriões excedentários, de-correntes de concepção artificial homóloga (art. 1.597, IV,

do CC), Zeno Veloso afirma que “não tenho dúvida degarantir que, mesmo depois da morte do pai, vindo o em- brião a ser implantado e havendo termo na gravidez, onascimento com vida e consequente aquisição de person-alidade, este filho posterior é herdeiro, porque estava con-cebido  quando o genitor faleceu, e dado ao princípio daigualdade dos filhos da Constituição Federal, art. 227, §

6.º” ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.494).

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Francisco José Cahali, ao comentar a questão, assumepostura crítica ao dispositivo e afirma que “embora a con-tragosto, concluímos terem os filhos assim concebidos omesmo direito sucessório que qualquer outro filho, havidopelos meios naturais. E estaremos diante de tormentoso

problema quando verificado o nascimento após anos dotérmino do inventário, pois toda a destinação patrimonialestará comprometida” (CAHALI, Francisco e HIRONAKA,Giselda. Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 132).

Maria Helena Diniz separa os conceitos de personalid-ade jurídica formal e material e afirma que “poder-se-ia

até mesmo afirmar que na vida intrauterina tem o nascit-uro e na vida extrauterina tem o embrião concebido   invitro   personalidade jurídica formal, no que atina aosdireitos personalíssimos, ou melhor, aos direitos da per-sonalidade, visto ter carga genética diferenciada desde aconcepção, seja ela in vivo ou in vitro, passando a ter per-sonalidade jurídica material, alcançando os direitos patri-

moniais e obrigacionais que se encontravam em estadopotencial, somente com o nascimento com vida (CC, art.1.800, § 3.º). Se nascer com vida adquire personalidade jurídica material, mas se tal não ocorrer, nenhum direitopatrimonial terá” e conclui “não distinguimos os conce- bidos dos obtidos in vitro”  (Curso..., 2004, v. 1, p. 185). O

coautor Flávio Tartuce é partidário desse entendimento,conforme consta do Volume 1 da presente coleção, no seuCapítulo 3 (TARTUCE, Flávio. Direito civil..., 2011, v. 1).

 Ao tratar da questão do nascituro e do embrião, nãopodemos deixar de citar as lições de Silmara Juny de Abreu Chinellato. Para a Professora Titular da USP, valendo-se das lições de bioética, embrião é apenas uma

das fases de desenvolvimento do ovo fecundado (zigoto,

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mórula, blástula, embrião e feto) e é termo não jurídico,mas próprio da medicina, apesar de sua utilização em leise documentos internacionais. Assim, o vocábulo jurídico‘nascituro’ inclui o embrião pré-implantatório, qual seja,aquele que ainda não foi inserido no ventre materno. A 

professora entende, portanto, que quer tenha o embriãosido ou não implantando no útero da mulher, é consid-erado nascituro e tem seus direitos protegidos, inclusivepara fins de sucessão legítima. Deve ser tido como her-deiro legítimo, se houver coincidência entre a mãe que ogera e o gesta depois de um tempo de crioconservação(Estatuto jurídico...,  Questões controvertidas..., 2007, v.6, p. 52).

Quando da III Jornada de Direito Civil  realizada emBrasília, em dezembro de 2004, ao analisar o tema, osmembros da comissão de família e sucessões decidirampor maioria que: “A regra do art. 1.798 do Código Civil de- ve ser estendida aos embriões formados mediante o uso de

técnicas de reprodução assistida, abrangendo, assim, a vo-cação hereditária da pessoa humana a nascer cujos efeitospatrimoniais se submetem às regras previstas para apetição da herança” (Enunciado n. 267 do Conselho daJustiça Federal e do Superior Tribunal de Justiça).

Em resumo, naquele importante evento entendeu-se

que o embrião também é considerado sucessor legítimo. Ambos os autores da presente obra não concordam comtal posição, pois acreditam que o embrião, apesar de terpersonalidade formal (direitos da personalidade), não tema personalidade jurídica material (direitos patrimoniais), esó será herdeiro por força de disposição testamentária.

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Ressaltamos, assim, a grande polêmica envolvendo otema em questão, que é dos mais complexos para a ciênciado direito.

Para encerrar, em nossa opinião, para a sucessão legí-tima, a regra de que a pessoa deva existir não comportaexceções, diferentemente do que ocorre na sucessão testa-mentária, em que podem ser chamadas a suceder pessoasnão concebidas (art. 1.799, I, do CC).

1.3.2 Daqueles que herdam pela sucessãotestamentária

a) Aqueles ainda não concebidos

Permite o Código Civil que, por meio de ato de última vontade, o falecido nomeie como seu herdeiro pessoaainda não concebida no momento de sua morte, filha depessoa por ele indicada que deve estar viva quando da suamorte (art. 1.799, I, do CC). Trata-se, portanto, danomeação de um   concepturo   (nondum concepti ) comoherdeiro, pois o concepturo é a pessoa que ainda não foiconcebida e difere do nascituro que já se encontra nidific-ado no ventre materno.

Fazendo confrontação importante, lembre-se de que o

Código Civil revogado utilizava a expressão prole eventual (art. 1.718 do CC/1916). Segundo Zeno Veloso, prole temum significado mais amplo: linhagem, geração, progênie,descendência ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.495). Sendoassim, a primeira observação que se faz é que não poderáo testador nomear como herdeiro a sua própria proleeventual, pois o Código Civil em vigor determina expres-samente que a pessoa cuja prole será beneficiada deve

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estar viva no momento da abertura da sucessão. A ilustrar,o testador nomeia o primeiro filho de seu sobrinho Joãocomo sendo o seu herdeiro. Se na morte do testador, João já tiver morrido, a disposição testamentária caduca,porque, apesar de válida, não prevalecerá por obstáculo

superveniente ao momento da elaboração do testamento. A segunda observação importante sobre a questão é

que não se trata necessariamente de   substituição fideicomissária, que ainda será estudada no presente livro(item 3.8). Isso porque na substituição fideicomissária otestador nomeia João seu herdeiro ( fiduciário), e este

transmitirá quando de sua morte os bens do testador a seuprimeiro filho ( fideicomissário). O art. 1.799, I, do CC,permite que o testador nomeie diretamente e não pormeio de substituição o   concepturo   como seu únicoherdeiro.

 A grande questão que se coloca é a insegurança do in-stituto por dois motivos distintos.

O primeiro deles refere-se ao prazo que se deveráaguardar até que se saiba se realmente o concepturo bene-ficiado nascerá com vida e adquirirá os bens herdados. Osegundo motivo decorre da seguinte indagação: quemcuidará dos bens testados, sendo responsável por sua con-servação até o nascimento com vida do concepturo?

No que tange ao primeiro motivo, se decorridos doisanos após a abertura da sucessão, não for concebido o her-deiro esperado, os bens reservados, salvo disposição emcontrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.Essa regra pode ser retirada do art. 1.800, § 4.º, do CC/2002, que não encontra correspondente na codificação an-

terior. A título ilustrativo, a não concepção em dois anos

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contados da abertura da sucessão também é causa de ca-ducidade do testamento, devendo a herança seguir para osherdeiros legítimos, salvo expressa determinação de sub-stituição testamentária.

 A resposta à última pergunta formulada é que os bensda herança serão confiados, após a liquidação ou partilha,a um curador nomeado pelo juiz (art. 1.800,   caput , doCC). O curador será, salvo disposição testamentária emcontrário, a pessoa cujo filho o testador esperava ter porherdeiro (art. 1.800, § 1.º, do CC). Exemplificando, se otestador deixar seus bens ao primeiro filho do sobrinho

João, será ele nomeado curador para a administração dos bens, até que o concepturo nasça com vida ou, decorridosos dois anos, até que a herança seja entregue aos herdeirosnecessários.

Poderá o juiz nomear, ainda, como curador dos bensdo concepturo, as pessoas indicadas no art. 1.775 doCódigo Civil (art. 1.800, § 1.º, do CC). Primeiramente, sãoelas o cônjuge ou o companheiro, não separado judicial-mente ou de fato. A menção ao separado judicialmente de- ve ser lida com reservas, eis que ambos os autores destaobra seguem a corrente doutrinária e jurisprudencial queprega o fim da separação judicial desde a entrada em vigorda Emenda Constitucional 66, de 13 de julho de 2010.

Desse modo, o dispositivo somente se aplica às pessoasseparadas judicialmente quando da entrada em vigor damencionada Emenda do Divórcio. O tema do fim da sep-aração de direito está aprofundado no Volume 5 dacoleção.

Na falta do cônjuge ou do companheiro, são indicados

pela lei o pai ou a mãe do falecido. Na falta destes, é

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indicado o descendente que se demonstrar mais apto e,entre os descendentes, os mais próximos precedem aosmais remotos. Por fim, na falta das pessoas mencionadas,compete ao juiz a escolha do curador (curador dativo).

O dispositivo não se aplica bem à hipótese, pois o con-cepturo não terá cônjuge ou companheiro, muito menosdescendentes. Ora, se não foi concebido ainda, como podeser casado ou ter filhos? Realmente, do artigo em questãoaplicar-se-ia apenas a nomeação de pessoa de confiançado juiz. Isso porque os pais do concepturo são natural-mente os curadores por força do art. 1.800, § 1.º, do CC.

Em sua ausência, nomeará o juiz pessoa de sua confiançapara assumir a guarda e conservação dos bens testados.

Percebendo o equívoco da lei, o PL 699/2011, antigoProjeto 6.960/2002, de autoria do Deputado Fiuza, pre-tende alterar o dispositivo que teria a seguinte redação:“Art. 1.800 (...) § 1.º Salvo disposição testamentária emcontrário, a curatela caberá à pessoa cujo filho o testadoresperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoasindicadas no art. 1.797”.

 Vale ressaltar que as pessoas indicadas no art. 1.797do CC são o cônjuge ou companheiro, se com o outro con- vivia ao tempo da abertura da sucessão; o herdeiro que es-tiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais

de um nessas condições, ao mais velho; o testamenteiro; ea pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das in-dicadas, ou quando tiverem de ser afastadas por motivograve levado ao conhecimento do juiz. Note-se que comrelação ao cônjuge o projeto não resolve os problemas,pois o concepturo não tem cônjuge nem companheiro.

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Entretanto, quanto às demais pessoas, a solução é bastante adequada.

Os poderes, deveres e responsabilidades do curador,assim nomeado, regem-se pelas disposições concernentesà curatela dos incapazes, no que couber (art. 1.800, § 2.º,do CC). Na realidade, invoca o atual Código Civil para ocaso em questão as regras da tutela por força do art. 1.774,pelo qual: “Aplicam-se à curatela as disposições con-cernentes à tutela, com as modificações dos artigosseguintes”. Lembre-se, por oportuno, de que o CódigoCivil de 2002 passou a tratar da curatela do nascituro no

seu art. 1.779, mas nada disciplinou sobre a matéria.Sendo assim, podem o tutor e, assim, também o

curador do concepturo receber as rendas e pensões doconcepturo, e as quantias a ele devidas; fazer-lhe as despe-sas de administração, conservação e melhoramentos deseus bens; alienar os bens testados destinados a venda;promover-lhe, mediante preço conveniente, a locação bensde raiz. Entretanto, não faz sentido imaginar que ocurador do concepturo poderia realizar gastos com suaeducação, pois ele ainda não nasceu, nem poderia aceitar aherança, pois o estaria fazendo sob condição suspensiva, oque é expressamente vedado pelo art. 1.808 do CC/2002.

Bem lembra José Luiz Gavião de Almeida que o

Código criou um grande problema porque “não deusolução o legislador para a titularidade desses bens, apen-as determinou fossem eles confiados a curador nomeadopelo juiz, o que não resolve alguns problemas decorrentes,como a responsabilidade pelo fato da coisa, em regra doproprietário, que ainda não existe; ou a possibilidade de

aquisição pela simples ocupação, já que se trata de coisa

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sem dono. Melhor era a opção pela sucessão provisória,entregando-se aos herdeiros legítimos, até o advento dacondição suspensiva imposta, qual seja o nascimento com vida do contemplado” (Código Civil..., 2003, p. 110). Maisuma vez, tem razão o ilustre Desembargador e Professor

da USP.Diante disso, deve-se concluir que os bens ficam na

titularidade do espólio, que, na qualidade de ente desper-sonalizado, tem a chamada   personalidade jurídica es-drúxula, ou seja, uma capacidade provisória até a sua ex-tinção. A extinção ocorrerá ao fim dos dois anos, quando

nascer, com vida, o concepturo ou os bens forem en-tregues ao sucessor legítimo. É absolutamente necessárioque o concepturo nasça com vida para que possa adquiriros bens testados e seus frutos e rendimentos relativos àdeixa (art. 1.800, § 3.º, do CC). Interessante frisar que frutos e rendimentos constituem, entre si, expressões re-dundantes, antes existentes no art. 60 do revogado Código

Civil. Isso porque os rendimentos são espécies de frutos,ou seja, são os frutos civis (sobre o tema: TARTUCE, Flá- vio. Direito civil..., 2011, v. 1 – Capítulo 5).

Questão interessante que surge é saber o que ocorrese, ao invés de concepção, houver adoção, situação em queo filho adotivo preenche a condição de “filhos ainda não

concebidos” contida no art. 1.799, I, do Código Civil em vigor. Para Zeno Veloso, a expressão inclui a adoção “nãosó por força da determinação expressa do princípio igual-itário do art. 227, par. 6.º, da Constituição Federal, comodo disposto no art. 41 do Estatuto da Criança e do Adoles-cente” ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.495). O autorparaense, aqui, é acompanhado por Sílvio de Salvo Venosa

e Débora Gozzo (Comentários..., 2004, p. 82), por

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Francisco José Cahali (Curso avançado..., 2003, v. 6, p.130), e por Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira ( In-ventários e partilhas..., 2006, p. 45). Esse é, portanto, oentendimento majoritário da doutrina atual, para fins daprática sucessória.

Por outro lado, Washington de Barros Monteiro écategórico ao afirmar que “a prole eventual a que se referiao Código Civil de 1916, como frisa o Ministro HahnemannGuimarães, seria a descendência natural, compreensiva defilhos legítimos, legitimados ou ilegítimos, mas filhoscarnais”, pois de outra forma “fácil seria burlar a dis-

posição testamentária bastando-lhe realizar o ato de ad-oção” (Curso..., 2003, v. 6, p. 44).

Para nós, é mais acertada a primeira das posições.Fazer qualquer distinção entre o filho adotivo e o biológiconão se coaduna com o sistema constitucional e cheira aranço do passado. Justamente por isso é que o último en-tendimento é totalmente ultrapassado. Se o testador quis-er limitar a qualidade de herdeiros aos filhos biológicosainda não concebidos, que o faça expressamente portestamento.

b) Pessoas jurídicas

Como outrora mencionado, a pessoa jurídica não temcapacidade para herdar por sucessão legítima, pois estasomente decorre do parentesco, do casamento ou da uniãoestável. Por outro lado, nada impede que a pessoa jurídicaseja nomeada herdeira ou legatária de determinado bemdo de cujus pela forma testamentária.

Nesse sentido, determina o Código Civil em vigor que

podem ser chamadas a suceder por testamento as pessoas

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 jurídicas (art. 1.799, II), existentes no momento do faleci-mento do testador. Isso porque, se ainda não existirem,não terão personalidade e a consequente capacidade jurídica para herdar. Para tanto, lembre-se que a pessoa jurídica de Direito Privado, tratada no art. 44 do CC, ad-

quire personalidade com a inscrição de seu ato con-stitutivo no respectivo registro (art. 45).

Se não vier a existir essa pessoa jurídica, ocorrerá acaducidade do testamento e os bens reverterão aos her-deiros legítimos. De qualquer forma, em sentido contrário,entende Eduardo de Oliveira Leite que “quanto às asso-

ciações sem personalidade jurídica a deixa em seu favor éconsiderada feita aos respectivos associados, salvo se otestador a tiver condicionado à aquisição da personalidade jurídica. No tocante às sociedades sem personalidade jurídica, igualmente a deixa considera-se feita aos seus só-cios, nessa qualidade e acresce ao patrimônio coletivo”(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 110). Vale dizer que a

tese defendida pelo autor paranaense, apesar de plausível,é minoritária.

Também podem suceder por testamento as pessoas jurídicas cuja organização for determinada pelo testadorsob a forma de fundação (art. 1.799, III, do CC). Trata-sede exceção em que será sucessora a pessoa jurídica que

ainda não existe, mas que é criada por meio de testa-mento. Para esse caso, salienta José Luiz Gavião de Al-meida que “no entanto, se os bens destinados a umafundação não existente forem insuficientes para a sua con-stituição, será a deixa incorporada a outra fundação defins iguais ou semelhantes. Não se trata de aplicação dasucessão legítima, pois nesta não se admite transmissão à

pessoa jurídica. Não se trata de substituição, pois dispensa

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o legislador a indicação do testador. E não se trata dedireito de acrescer, pois não há necessidade de essa outrafundação estar contemplada entre os herdeiros e os leg-atários. É regra excepcional, que tem natureza jurídica desucessão anômala” (Código Civil..., 2003, p. 108).

Mais uma vez, como não poderia ser diferente, filia-seao professor da Universidade de São Paulo, sendo certoque esse entendimento parece ter fundamento no art. 69do CC em vigor, segundo o qual, no caso de dissolução deuma fundação, os bens serão incorporados por outrafundação que tenha finalidade igual ou semelhante, em

não havendo previsão de destinação no próprio estatuto.Curiosa questão diz respeito à personalidade jurídica

das organizações religiosas, que são pessoas jurídicas deDireito Privado, por força do art. 44, IV, do CC. Issoporque, em se tratando da Igreja Católica, muitas vezes, otestador deixa o bem para certa Diocese ou paróquia. A in-dagação que se formula é se essas paróquias e diocesestêm ou não personalidade para receber os bens testados.

Em texto datado de 1981, Antonio Chaves explica serquestão controversa a da propriedade dos bens eclesiásti-cos. Nada impede que as dioceses – representadas pelo bispo como chefe da respectiva igreja –, e as paróquias,que são sua subdivisão – representadas pelo pároco –, se-

 jam admitidas como pessoas jurídicas autônomas ( RT 548, v. 548, p. 15). Nesse sentido, já se entendeu que nãoestá a Mitra Diocesana impedida de adquirir imóvel porusucapião. Tendo obtido personalidade jurídica definida einscrição como contribuinte nas repartições fiscais, logroua Mitra realizar a secularização da instituição religiosa que

representa na região (TJSP, Embargos Infringentes

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115.748-1, Rel. Des. Ernani de Paiva, j. 29.10.1990, RJTJESP-Lex, v. 132, p. 357).

Em outro julgado do TJSP, decidiu-se que “os legadosfeitos a um santo, a Deus, a Jesus Cristo, se julgam feitos àIgreja Paroquial do lugar onde o testador tinha seu dom-icílio e se Jesus Cristo é o herdeiro, assim deve com-preender a Igreja em seu lugar. (...) E se é a Igreja Católicaa entidade que contém o santo adorado, a ela se destinaráo imóvel, que essa é a verdadeira intenção dos fiéis”(TJSP, Apelação Cível 56.651-1, Rel. Des. Toledo César, j.24.09.1985, RJTJESP-Lex, v. 100, p. 273).

Da mesma forma, admitindo-se a personalidade jurídica da diocese, o Tribunal de Justiça do Mato Grossodo Sul decidiu que se a doação foi destinada à Nossa Sen-hora da Abadia, deve-se retificar o registro imobiliáriopara que, no lugar do santo, fique constando o nome dadiocese da localização do imóvel, tendo presente que aIgreja, que é quem encarna seus símbolos, tem existênciareal e personalidade jurídica e é o agente capaz a que a leise refere para a validade do ato jurídico (TJMS, ApelaçãoCível 184/82, Rel. Des. Mendes Fontoura, j. 04.10.1982, Revista de Direito Imobiliário, n. 12, p. 95). Segundo o re-lator do julgado, a doação para a santa trata de erro plena-mente justificável, porque as partes sabiam que a doação

era para a Igreja em homenagem à santa e, por isso, opadre ali estava como representante da Igreja.

 A questão não é pacífica. Conforme também já decidiuo Tribunal de Justiça de São Paulo, a personalidade jurídica das capelas e igrejas paroquiais distintas da Ar-quidiocese é bastante discutível, porque, embora tenham

elas o direito de celebrar atos, manter registros, herdar

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 bens e movimentar contas, sua situação patrimonial de- verá ser atendida pela Arquidiocese (TJSP, Agravo de In-strumento 120.882-1, Rel. Des. Toledo César, j.20.03.1990, RJTJESP -Lex, v. 128, p. 346).

Note-se que a conclusão a que se chega é que, como asucessão em favor da Igreja ou de qualquer outra pessoa jurídica se dá por testamento, deve-se aproveitar a vont-ade do testador e não simplesmente considerar nulo ou in-eficaz o testamento em favor de certa paróquia ou diocese,mesmo que não tenham personalidade jurídica.

1.3.3 Daqueles não legitimados a suceder

 A lei determina que certas pessoas, apesar de teremcapacidade de direito e de exercício, não têm legitimaçãoou legitimidade sucessória. A norma jurídica, aqui, tratade casos relacionados com a sucessão testamentária.

De antemão, frise-se que não se trata de incapacidadeem geral, mas de falta de legitimação, pois o direito à su-cessão é específico de certas pessoas com relação a certostestadores. Em sentido contrário, José Luiz Gavião de Al-meida (Código Civil..., 2003, p. 112) e Eduardo de OliveiraLeite (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 113) entendem setratar de ausência de capacidade sucessória.

 Assim, não têm legitimidade para suceder por testa-mento ou por legado as seguintes pessoas:

a) A pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem oseu cônjuge ou companheiro, ou os seus ascendentes eirmãos (art. 1.801, I, do CC).

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 A regra tem motivo óbvio, pois beneficiar aquele queescreveu o testamento, ou parentes deste, a pedido dotestador, seria criar enorme possibilidade para fraudes. A suspeição é clara, uma vez que aquele que escreveu o test-amento poderia frustrar a confiança do testador e dele se

 beneficiar.O dispositivo citado não menciona o descendente

daquele que escreveu a rogo como pessoa não legitimada àsucessão, mas, por força do art. 1.802, parágrafo único, doCC, este também se inclui como não legitimado.

 A limitação se aplica ao testamento cerrado (que pode

ser escrito a rogo do testador), mas não ao particular, quedeverá ser escrito necessariamente pelo próprio testador,sob pena de nulidade do ato (art. 1.876,  caput , do CC).Quanto aos testamentos especiais, podem ser escritos arogo, eis que os testamentos marítimo e aeronáutico po-dem assumir a forma cerrada (art. 1.888, caput , do CC).

 b)  As testemunhas do testamento (art. 1.801, II, doCC).

 A testemunha não pode ter interesse no ato, sob penade, quando consultada a testar sua validade ou veracidade,faltar com a verdade como forma de preservação de seusinteresses pessoais. Entende José Luiz Gavião de Almeidaque “caso haja testemunha beneficiada, o testamentoapenas é ineficaz com relação à deixa, podendo ser apro- veitado quanto às demais disposições” (Código Civil...,2003, p. 114), apesar de o art. 1.802 do CC expressamentedeterminar a sua nulidade.

O entendimento do jurista parece perfeito pela ap-

licação do princípio da conservação dos negócios jurídicos.

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Desse modo, estirpa-se a cláusula ineficaz e se aproveita oresto do ato. Esse entendimento, contudo, deve ser consid-erado como minoritário diante do teor taxativo da lei.

c) O concubino do testador casado, salvo se este, semculpa sua, estiver separado de fato do cônjuge há mais decinco anos (art. 1.800, III, do CC).

De imediato, percebe-se que a lei se equivoca redon-damente ao utilizar o termo concubino. Isso porque, comose sabe, o concubino é a pessoa que tem uma relação nãoeventual com quem está legalmente impedido de se casar

(art. 1.727 do CC). Note-se que há ressalva admitindo anomeação do concubino como herdeiro, se o testador est-iver separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos.

Ora, se houver separação de fato e não necessaria-mente há mais de cinco anos, a relação não eventual entrehomem e mulher, pública, contínua e duradoura com o in-

tuito de constituir família será uma união estável (art.1.723, § 1.º, do CC). Como se sabe, a união estável, queconstitui uma entidade familiar com proteção constitu-cional, não se confunde com o concubinato, mera so-ciedade de fato.

Parece-nos que o legislador, aqui, está totalmente de-satualizado em relação ao que consta do próprio CódigoCivil em vigor. Caberia a ele diferenciar o concubino docompanheiro, como o fez no livro de Direito de Família enão criar verdadeira confusão terminológica. Diante disso,as conclusões a que se pode chegar diante da má redaçãodo dispositivo são as seguintes:

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1.ª) Não tem legitimação sucessória para ser nomeado her-deiro ou legatário o concubino, ou seja, a pessoa que viverelação não eventual, mas está impedida de se casar. É ocaso do homem casado que lega bem à sua amante.

2.ª) Se ocorrer união estável, ou seja, a relação não eventual

de homem e mulher que não estão impedidos de se casar,o mesmo se dizendo para o separado de fato ou separado judicial ou extrajudicialmente, não haverá qualquer im-pedimento à nomeação dos companheiros como herdeiroou legatário, sendo desnecessária a existência de cincoanos de separação de fato.

 Aliás, quanto ao lapso temporal mencionado na lei,ensina o jurista Zeno Veloso que “esse prazo é excessivo eaté entra em contradição com a regra do art. 1.830, quenão reconhece direito sucessório ao cônjuge sobreviventese, ao tempo da morte do outro, estava separado de fato hámais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essaconvivência se tornara impossível sem culpa do sobre-

 vivente” ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.499). Exata-mente por isto, propõe o Deputado Ricardo Fiúza a alter-ação do dispositivo em comento por meio do Projeto 699/2011, originalmente 6.960/2002, no seguinte sentido:“Art. 1.801 (...) III – o concubino do testador casado, salvose este, sem culpa sua, estiver separado de fato docônjuge”.

Pelo projeto, retira-se a questão do prazo e admite-seque o  concubino  seja nomeado herdeiro por testamento,se o testador estiver separado de fato de seu cônjuge, semculpa sua. De qualquer forma, não nos parece adequada aproposta. De início, se houve separação de fato, não es-taremos diante de concubino, mas sim de companheiro.

Segundo, não há motivo para se discutir culpa com o

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intuito de verificar a legitimação sucessória do compan-heiro, o que está em sintonia com a mitigação ou desa-parecimento da análise da culpa no Direito de Família.Com a separação de fato, pode o testador nomear o com-panheiro seu herdeiro, tendo ele culpa ou não em sua

separação.Concluímos que melhor seria que o dispositivo

simplesmente se limitasse à possibilidade de nomearcomo herdeiro ou legatário o concubino de pessoa casada,mas não separada de fato ou judicial ou extrajudicial-mente. Essa é, em nossa opinião, a interpretação que deve

ser feita do dispositivo em análise, particularmente em in-terpretação sistemática com as regras da união estável(arts. 1.723 a 1.727 do CC). Na III Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal e pelo Superi-or Tribunal de Justiça em dezembro de 2004, concluiu-seexatamente nesse sentido, com a aprovação do Enunciadon. 269, nos seguintes termos: “A vedação do art. 1.801, III,

do Código Civil não se aplica à união estável, independ-entemente do período de separação de fato (art. 1.723, §1.º)”.

d) O tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou es-crivão, perante quem se fizer, assim como o que fizer ou

aprovar o testamento (art. 1.801, IV, do CC).Por óbvio, não poderia haver para aquele que escreve

o testamento ou o aprova interesse no patrimônio do fale-cido. Aqui poderia ocorrer de a vontade de quem redige otestamento se suplantar à vontade do próprio falecido, oque justifica plenamente a falta de legitimação.

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Superada a análise daqueles que não têm legitimaçãopara suceder, determina o Código Civil que serão nulas asdisposições testamentárias em favor dessas pessoas, ou,ainda, quando simuladas sob a forma de contrato oneroso,ou feitas mediante interposta pessoa (art. 1.802, caput , do

CC). O parágrafo único do dispositivo presume como pess-oas interpostas os ascendentes, os descendentes, osirmãos e o cônjuge ou o companheiro do não legitimado asuceder.

 Vamos aqui aprofundar a análise de todo odispositivo.

Realmente, o testador, para burlar a proibição legal,poderá se valer de determinados expedientes eivados desimulação. Esse vício social, a simulação, pode ser con-ceituado como sendo o desacordo intencional entre a vontade interna e a vontade declarada, no sentido de criaraparentemente um negócio jurídico que, de fato, não ex-iste; ou de ocultar, sob determinada aparência, o negóciorealmente pretendido. Como se sabe, uma das inovaçõesdo atual Código Civil está em prever que o negócio simu-lado é nulo (nulidade absoluta), e não apenas anulável,não havendo mais a outrora existente previsão de nulid-ade relativa (art. 167 do CC/2002). Vejamos alguns casospráticos.

O primeiro deles está presente no caso de venda simu-lada do bem. É exemplo clássico da doutrina o homemcasado que simula a venda de imóvel a sua amante concu- bina para encobrir doação. O exemplo não cuida de situ-ação de deixa testamentária nula, mas de contrato nulo,por encobrir a doação.

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Na realidade, parece-nos que Clóvis Beviláqua dá ex-emplos mais coerentes da situação: “O testador, por exem-plo, faz declaração falsa de que vendeu a coisa legada aoincapaz, ou institui em favor dele uma pensão, como paga-mento de dinheiro que simula ter recebido, ou o nomeia

seu testamenteiro para que receba a título de prêmioaquilo que não poderia receber em legado” (CódigoCivil..., 1955, v. VI, p. 144).

Entendemos que não é necessário que o Código Civilpreveja serem nulas as disposições simuladas sob a formade contrato oneroso, pois a simulação, por si só já é nula,

conforme o citado art. 167 da codificação privada. En-tretanto, o alcance que deve ter a norma em questão é que,sendo simulado o contrato oneroso para favorecer pessoanão legitimada a receber, nulo também será o negócio dis-simulado, oculto, não sobrevivendo quando da nulificaçãodo contrato oneroso. Com a nulidade do negócio simulado(contrato oneroso), desaparece também o negócio dissim-

ulado (deixa testamentária à pessoa não legitimada). Ilus-trando, se o testador vende uma casa à testemunha testa-mentária para encobrir sua disposição de última vontade,nula será a venda – contrato oneroso – e também a dis-posição encoberta.

Dessa forma, não é aplicada a regra do art. 167, caput ,

do CC para o caso em questão, pela qual será válido onegócio dissimulado se o for na substância e na forma.Isso porque a simulação aqui é de extrema gravidade, nãose justificando a aplicação do princípio da conservação dosnegócios jurídicos, até porque a eventual manutenção donegócio jurídico violaria o art. 426 do CC, que traz anotória separação entre os institutos que produzem efeitosinter vivos (contratos) e mortis causa (testamentos). Vale

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dizer que, se o princípio da conservação dos contratos enegócios jurídicos é inspirada na função social dos con-tratos (Enunciado n. 22 CJF/STJ), o art. 426 do CC tam- bém o é (TARTUCE, Flávio.   A função social dos con-tratos..., 2005, p. 142).

O segundo expediente vedado pelo art. 1.802, pará-grafo único, do CC é a interposição de pessoas, o que tam- bém acarreta nulidade absoluta da disposição testa-mentária. Para exemplificar, se o testador casado não legao bem à sua amante, mas ao irmão dela, ocorre a inter-posição de pessoas por  simulação relativa subjetiva, ou

seja, a parte celebra o negócio com uma parte na aparên-cia, mas com outra na essência, entrando no negócio afigura do testa de ferro, laranja ou homem de palha, quemuitas vezes substitui somente de fato aquela pessoa querealmente celebra o negócio jurídico ou contrato.

Em se tratando de herança ou legado a ascendente,descendente, irmão, cônjuge ou companheiro de pessoanão legitimada, a simulação se presume irrefragavelmente(presunção iure et de iure), ou seja, de maneira absoluta,para não admitir prova em sentido contrário. ExplicaEduardo de Oliveira Leite que “desde a proposta tradi-cional de Clóvis Beviláqua (A interposição dispensa prova.Resulta de uma presunção legal que não admite prova em

contrário) até à doutrina atual (Trata-se, segundo adoutrina de uma presunção juris et de jure, conforme re-conhecem Pontes de Miranda, Eduardo Espínola eOrosimbo Nonato), a ideia de que a presunção do citadoartigo é   iure et de iure  sempre se manteve incólume nodireito sucessório brasileiro” (Comentários..., 2004, v.XXI, p. 118).

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Também entendem ser a presunção absoluta ou  iureet de iure   Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka(Curso avançado..., 2003, p. 359), Zeno Veloso ( NovoCódigo Civil..., 2006, p. 1.501), Washington de BarrosMonteiro (Curso..., 2003, v. 6, p. 48), Sílvio de Salvo Ven-

osa (Comentários..., 2004, p. 100) e Maria Helena Diniz(Código Civil anotado..., 11. ed., 2002, p. 1.476). Assimsendo, esse entendimento deve ser considerado como omajoritário para a prática do Direito das Sucessões.

Caso sejam outras as pessoas interpostas  que não asmencionadas no dispositivo, necessária será a prova da

simulação para a nulidade da disposição. Em qualquercaso, por se tratar de negócio nulo, não há prazos para asua declaração (art. 169 do CC), sendo a ação declaratóriacorrespondente imprescritível.

Por fim, como forma de superar uma antiga discussão,que não prospera nos dias atuais, pois perdeu toda a suarazão de ser em razão da igualdade constitucional dos fil-hos (art. 227, § 6.º, da CF/1988), afirma o Código Civilque é lícita a deixa ao filho do concubino, quando tambémo for do testador (art. 1.803 do CC).

Ora, em se tratando de filho do testador, sendo elefilho da esposa, da companheira, da concubina, da namor-ada, ou de um  caso, a deixa será válida sem sombra de

dúvidas. Inútil a disposição de lei que apenas repetiu oteor da Súmula 447 do Supremo Tribunal Federal, quedata de priscas eras: “É válida a disposição testamentáriaem favor de filho adulterino do testador com suaconcubina”. Anote-se que a ementa é de 1.º de outubro de1964 e não tem mais aplicação diante da igualdade entre

filhos consagrada pelo Texto Maior.

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Encerrando o tema, não nos parece adequada a ex-plicação de Sílvio de Salvo Venosa e Débora Gozzo, pelaqual “a leitura do texto sob comento leva à exegese de queo legislador refere-se ao filho do testador casado – concu- bino – que não tenha sido por ele reconhecido”

(Comentários..., 2004, p. 102). Parece-nos que, na ver-dade, a ideia do legislador foi a de afastar a possível inter-pretação pela qual a deixa em favor do filho do testador ede sua concubina seria forma de beneficiá-la, por meio deinterposta pessoa, qual seja o filho do casal.

Exatamente corroborando com nossa opinião, a lição

de Washington de Barros Monteiro, que compila antigadecisão do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual“não há interposição proibida na deixa a filhos da concu- bina, se são também do testador”. Explica, ainda, que emtal hipótese, o favorecido é realmente o filho, e não a mãe,não se podendo naquele vislumbrar simples presta-nome,porque ao pai compete precipuamente velar pela sorte e

pelo futuro da prole, fornecendo-lhe os recursos necessári-os à sua sobrevivência (Curso..., 2003, v. 6, p. 49).

1.4 DA ACEITAÇÃO E DA RENÚNCIA À HERANÇA 

Determina a lei que, aceita a herança, torna-se definit-iva a sua transmissão ao herdeiro, desde a abertura da su-cessão (art. 1.804,   caput , do CC). Em complemento, atransmissão tem-se por não verificada quando o herdeirorenuncia à herança (art. 1.804, parágrafo único, do CC).

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Em que pese a lei apenas mencionar a aceitação erenúncia da herança, essas previsões também se aplicamaos legados, pois o art. 1.808, § 1.º, do CC, expressamenteprevê a possibilidade de aceitação ou renúncia à dis-posição sucessória específica, nos seguintes termos: “O

herdeiro, a quem se testarem legados, pode aceitá-los, re-nunciando a herança; ou, aceitando-a, repudiá-los”.

Facilitando o trabalho didático, o estudo das regras daaceitação e da renúncia da herança será dividido em trêspartes. Na primeira, serão abordadas as regras de aceit-ação da herança, na segunda parte, as regras de renúncia

e, na terceira e última parte, serão trabalhados os precei-tos comuns a ambos os institutos.

1.4.1 Das regras de aceitação ou adição da herança

Segundo Flávio Augusto Monteiro de Barros, a aceit-

ação ou adição da herança “é o ato pelo qual o herdeiroconfirma seu desejo de receber a herança” ( Manual...,2004, v. 4, p. 186). Trata-se de um ato jurídico unilateralque produz efeitos independentemente da concordânciade terceiros, tendo, portanto, natureza não receptícia, poisnão precisa de comunicação para produzir efeitos.

Diante desse conceito, é de se indagar se mesmo hav-endo a transmissão da herança ao herdeiro, pelo princípioda saisine, ainda se faz necessária a aceitação. A resposta épositiva, pois antes da aceitação existe uma situação pro- visória que findará com este ato do herdeiro. Em suma, aaceitação da herança é ato de mera confirmação. Assim oé, mesmo porque o herdeiro tem o direito de sê-lo, se quis-

er, não sendo obrigado a tanto. Em outras palavras, não

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 vale a máxima filius ergo heres (ou seja, o filho é obrigat-oriamente herdeiro).

Entendemos que a aceitação é ato jurídico em sentidoestrito (stricto sensu), e não negócio jurídico, pois seusefeitos decorrem somente da lei e não da convenção daspartes. Nesse sentido, proíbe o legislador a aceitação par-cial, sob termo ou condição (art. 1.808,   caput , do CC).Segue-se, em tal ponto, a definição de Marcos Bernardesde Mello, segundo a qual o ato jurídico em sentido estritoconstitui um “fato jurídico que tem por elemento nucleardo suporte fático a manifestação ou declaração unilateral

de vontade cujos efeitos jurídicos são prefixados pelas nor-mas jurídicas e invariáveis, não cabendo às pessoasqualquer poder de escolha da categoria jurídica ou de es-truturação do conteúdo das relações respectivas” (Teoriado fato jurídico..., 1995, p. 137).

Os efeitos da aceitação da herança são retroativos àdata da abertura da sucessão, tendo conteúdo apenas de-claratório e não constitutivo. O legislador brasileiro ad-otou um sistema híbrido ou eclético de aquisição su-cessória, como bem explica Eduardo de Oliveira Leite,pois “a aquisição se dá pela aceitação, é o que expres-samente estabelece o art. 1.804 ( Aceita a herança...) e deforma automática (... torna-se definitiva a sua transmis-

são desde a abertura da sucessão)” (Comentários...,2004, p. 124). Realmente, como aqui foi dito, a aceitaçãoconfirma a aquisição que já existe desde o momento emque ocorreu o falecimento e a abertura da sucessão.

De acordo com o art. 1.805 do CC em vigor, duas sãoas formas de aceitação da herança:

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a) Aceitação expressa – é aquela que se faz por declaraçãoescrita. Não restringindo a lei, poderá o escrito ser públicoou particular, mas nenhum efeito terá se for apenas

 verbal. Portanto, não se poderá valer de prova testemun-hal para comprovar a aceitação verbal.

 b)  Aceitação tácita  – aquela pela qual o herdeiro ou leg-atário pratica atos que indicam a aceitação e que, port-anto, são incompatíveis com a ideia de repúdio aos bensherdados. É o caso do herdeiro que paga os tributos doimóvel e que contrata funcionários para a sua conser-

 vação. Em síntese, haverá aceitação tácita se o herdeiropratica atos definitivos de administração do espólio ou

dos bens do falecido, havendo atos próprios da qualidadede herdeiro.

Para que se evite qualquer confusão entre a aceitaçãotácita e a prática de certos atos, enuncia o Código Civil em vigor que não exprimem a aceitação de herança os atosoficiosos, como o funeral do finado, os meramente conser-

 vatórios, ou os de administração e guarda provisória (art.1.805, § 1.º, do CC). Na verdade, esses atos são simplesfavores à pessoa do morto ou aos seus herdeiros, inex-istindo a clara vontade de aceitar a herança. Decorrem dagenerosidade daquele que os pratica, como forma de re-solver problemas urgentes que não poderiam esperar.Para facilitar a compreensão da aceitação tácita, podemos

nos valer da noção contida no art. 476 do Código Civilitaliano, reproduzida por Zeno Veloso, nos seguintes ter-mos: “A aceitação é tácita quando o chamado à herançapratica um ato que pressupõe, necessariamente, a sua vontade de aceitar e que não teria o direito de fazê-lo,senão na qualidade de herdeiro” ( Novo Código Civil...,2006, p. 1.503).

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Curiosa é a regra segundo a qual não importa igual-mente a aceitação da herança sua cessão gratuita, pura esimples, aos demais coerdeiros (art. 1.805, § 2.º, do CC),introduzida pelo Código Civil de 2002 e que reproduz par-cialmente o art. 1.582 do diploma revogado. Se houve a

cessão de direitos aos coerdeiros é porque se aceitou a her-ança. Ninguém pode transmitir direitos que não tem. Ex-plica Eduardo de Oliveira Leite que “na realidade, emborao legislador equivocadamente refira-se à ‘cessão’, que im-plica a ideia de transferência de um direito que se acha emnosso patrimônio, está a se referir à renúncia, que indicaabstenção, recusa da herança. Estamos diante de um casotípico de repúdio tácito” (Comentários..., 2004, p. 129).

Zeno Veloso também mostra sua estranheza em re-lação ao dispositivo, porque “no rigor dos princípios, se hácessão de direitos, temos que houve aceitação e posteriortransmissão da herança para os cessionários. Mas a leiconsidera que não houve aceitação, pois, no caso, a her-

ança vai ficar com as mesmas pessoas que seriam chama-das para ocupar a quota do cedente, se ele tivesse renun-ciado” ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.503).

Como se nota, o art. 1.805, § 2.º, do CC é amplamentecriticado, o que se justifica. Aliás, ainda sob a égide doCódigo Civil de 1916, dizia Clóvis Beviláqua que “melhor

fôra usar o termo renúncia que indica abstenção, recusada herança, do que cessão, que implica a ideia de transfer-ência de um direito que se acha em nosso patrimônio”(Código Civil ..., 1955, v. VI, p. 22). Nesse sentido,concorda-se mais uma vez com José Luiz Gavião de Al-meida que “a renúncia, porém, beneficiaria os mesmos co-erdeiros, sem necessidade de pagamento de imposto de

transmissão inter vivos. Provocaria idêntico efeito, apenas

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por outra via. Se idêntica a situação, não pode a cessãogratuita de todos os bens para os demais coerdeiros terefeitos jurídicos diversos da renúncia” (Código Civil...,2003, v. XVIII, p. 129). Note-se que mesmo equivalendo àrenúncia, para que a cessão tenha validade, seguirá a

forma pública nos termos do art. 1.793, caput , do atual CC.Superada a crítica, para alguns autores, como é o caso

de Flávio Augusto Monteiro de Barros, existiria uma ter-ceira forma de aceitação, a presumida, pois o Código Civilnão estabeleceu prazos para a aceitação ( Manual..., 2004, v. 4, p. 187). Nesses termos, o interessado na declaração

de aceitação do herdeiro poderá, vinte dias após aberta asucessão, requerer ao juiz prazo razoável, não maior detrinta dias, para nele se pronunciar o herdeiro (art. 1.807do CC).

No caso em questão, para essa doutrina, o silêncio doherdeiro significa sua aceitação tácita. O que se pode per-ceber é que se trata de exceção à regra pela qual o silêncionão produz efeitos jurídicos (quem cala não consente), quepode ser retirada do art. 111 da atual codificação privada.Nessas hipóteses, deve-se entender que são interessadosem requerer judicialmente a aceitação não só os demaisherdeiros, como também os credores do herdeiro.

Conforme consta do art. 1.809 do CC, o direito de

aceitar a herança não é personalíssimo e se transfere aosfilhos do herdeiro caso este faleça antes de ter aceitado aherança expressa ou tacitamente. Pelo próprio comandolegal, a exceção se verifica quando a herança foi instituídaao herdeiro sob condição suspensiva ainda não verificada.Trata-se da sucessão do direito de aceitar ( jure

transmissionis).

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Têm razão Sílvio de Salvo Venosa e Débora Gozzo aoexplicarem tal exceção que se “a herança só seria ad-quirida com o implemento de um evento futuro e incertoestipulado pelo testador, o herdeiro que faleceu antes da verificação da condição suspensiva, não tem direito à her-

ança. Em outras palavras, seus herdeiros também não ter-ão direito a ela” (Comentários..., 2004, p. 122). A regra de-corre do fato de a condição suspensiva não gerar direitoadquirido, mas mero direito eventual (art. 125 do CC). A título de exemplo, se o testador deixar uma casa ao jogador de futebol, sob condição de a seleção brasileira setornar hexacampeã do mundo, antes de o evento ocorrer o jogador não tem direito adquirido. Se vier a falecer, semaceitar a herança, seus herdeiros não poderão aceitá-la.

Superada a exceção, voltemos à regra da possibilidadede aceitação pelos herdeiros. Surge aqui uma dúvida im-portante: e se um herdeiro aceitar a herança e o outro re-nunciar a ela?

Esclarece José Luiz Gavião de Almeida que isso “nãosignifica ofensa ao princípio da indivisibilidade da herançao fato de, existindo mais de um herdeiro do herdeiro fale-cido, um deles acolher a herança e o outro a recusar. OCódigo Civil italiano resolve expressamente a questão, de-terminando que, nesse caso, aquele que aceita a herança

adquire todos os direitos e fica sujeito a todos os encargosda sucessão, enquanto o que renuncia fica alheio a ela”(Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 139). Filia-se à soluçãoalvitrada, pois aceita a herança por um dos herdeiros e re-cusada pelo outro, ocorre fenômeno semelhante à renún-cia, pelo qual a herança volta ao monte e se partilha entreos demais herdeiros – no caso aqueles que a aceitaram.

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Encerrando o tópico, interessante é a disposição prev-ista pelo Código Civil de 2002 e inexistente no revogadoCódigo Civil, segundo a qual “os chamados à sucessão doherdeiro falecido antes da aceitação, desde que concordemem receber a segunda herança, poderão aceitar ou renun-

ciar à primeira” (art. 1.809, parágrafo único). Tem lógica aregra criada, pois se os herdeiros da pessoa falecida nãoaceitarem receber a sua própria herança, não receberão opoder de aceitar aquela que pertenceria ao falecido. Ilus-trando, se João morre antes de aceitar a herança deixadapor sua tia Maria, seus dois filhos terão o direito de aceitá-la. A solução é que primeiramente os filhos aceitem a her-ança deixada por seu pai João para só, então, aceitar ourenunciar à herança que o pai deles recebera de Maria.

1.4.2 Das regras quanto à renúncia da herança

 A renúncia da herança constitui um ato jurídico uni-lateral e não receptício, pelo qual o herdeiro ou legatáriorecusa a herança ou o legado, não criando, consequente-mente, qualquer direito ao renunciante, pois se consideraque ele nunca tivesse sido herdeiro. A renúncia à herançanão pode ocorrer antes da abertura da sucessão, ou seja,antes da morte de seu autor, sob pena de nulidade abso-

luta, por se tratar de pacto sucessório (art. 426 do CC).Os efeitos da renúncia são retroativos à data da aber-

tura da sucessão, ou seja, são ex tunc (art. 1.804, caput , doCC). Em razão da retroatividade, os filhos do renunciantenão herdam por representação, pois a renúncia significaque o renunciante nunca foi herdeiro. Nesse sentido, pre- vê a primeira parte do art. 1.811 do CC que “ninguém podesuceder, representando herdeiro renunciante”. Aliás, se o

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renunciante ou o seu herdeiro não recebem os bens do fa-lecido, como decorrência lógica não podem transmiti-los aterceiros. Quanto ao destino dos bens depois de efetivadaa renúncia, será estudado em momento oportuno.

Como ocorre com a aceitação, a renúncia da herançatambém tem natureza de ato jurídico em sentido estrito(stricto sensu), pois os seus efeitos decorrem apenas danorma jurídica, e não da vontade do renunciante, con-forme consta do art. 1.808 do CC.

 A doutrina costuma separar a renúncia abdicativa darenúncia translativa.

De acordo com essa estrutura conceitual, a renúnciaserá   abdicativa   quando o declarante simplesmente dizque não aceita a herança ou o legado, que será devolvidoao monte hereditário, visando à partilha entre os herdeir-os legítimos. Por outra via, será translativa, ou in favor-em, aquela renúncia em que o herdeiro recebe a herança e

a transfere a certa pessoa.Entendemos que, tecnicamente, a renúncia  in favor-

em não é renúncia, mas sim uma cessão de direitos. Issoporque, a chamada renúncia   in favorem   necessita daaceitação do beneficiado para se aperfeiçoar. Desse modo,se for onerosa, corresponde a uma compra e venda; e se

for gratuita corresponde a uma doação. Por não admitir-mos a natureza de renúncia, em se tratando de negócio jurídico, dever-se-á seguir a forma prevista no art. 1.793do Código Civil, ou seja, a forma pública.

 A grande diferença entre os dois tipos de renúncia éque se realmente for abdicativa, não haverá a incidênciade imposto inter vivos, pois se trata de ato unilateral e não

 bilateral. Se for translativa, haverá a incidência de

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impostos inter vivos. Nesse sentido, aliás, entendeu o Su-perior Tribunal de Justiça: “A renúncia de todos os her-deiros da mesma classe, em favor do monte, não impedeseus filhos de sucederem por direito próprio ou porcabeça. Esta renúncia não configura doação ou alienação à

 viúva, não caracterizando o fato gerador do ITBI, que é atransmissão da propriedade ou do domínio útil de bensimóveis” (STJ, 1.ª T., REsp 36.076/MG, Rel. Min. Garcia Vieira, j. 03.12.1998,  DJ  29.03.1999, p. 76). Na mesmalinha, vejamos recente julgado do Tribunal do Rio deJaneiro:

“Renúncia abdicativa. Não incidência do ITD. Agravo deInstrumento. Inventário. Aceitação tácita. Retratação.Renúncia abdicativa. Não incidência de Imposto sobreDoações – ITD. Recurso dirigido contra decisão que in-deferiu pedido de abstenção do pagamento do ITD em razãoda renúncia manifestada por um dos herdeiros em favor domonte, por entender configurada a renúncia translatícia.

Embora o decurso de mais de 4 anos do pedido de aberturade Inventário e apresentação das primeiras declarações con-figure aceitação tácita da herança, irretratável pelo art. 1.812do CC/2002, a lei vigente, tanto à época da abertura da su-cessão (CC/1916) como da aceitação, permitia no art. 1.590,2ª Parte, a retratação da aceitação, de forma que, durante oprocedimento do Inventário, enquanto não homologada a

partilha, poderia o aceitante se arrepender, com efeitos  ex tunc, como se nunca tivesse sido chamado a suceder.Hipótese em que ocorreu a renúncia abdicativa, posto queem favor do monte, não incidindo o Imposto sobre Doações.Orientação do C. Superior Tribunal de Justiça e do SupremoTribunal Federal no sentido de que a renúncia translativadeve implicar, a um só tempo, aceitação tácita da herança ea subsequente destinação desta a beneficiário certo, o quenão ocorre quando há abdicação em favor do monte partível,

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sem a intenção de ceder os direitos hereditários, como sedoação fosse a herdeiro determinado. Conhecimento e pro-

 vimento do Agravo” (TJRJ, Agravo de Instrumento2009.002. 43047, 16.ª Câmara Cível, Italva, Rel. Des. MarioRobert Mannheimer, j. 25.05.2010, v.u.).

Para renunciar à herança, deve o declarante fazê-lopor instrumento público ou termo judicial, sendo nula arenúncia por instrumento particular (art. 1.806 do CC).Nota-se que a lei não permite a renúncia tácita, mas apen-as a expressa, pois isso é forma de dar maior segurança aoinstituto. Para elucidar o campo prático de atuação dessa

 vedação, transcreve-se o seguinte julgado do Tribunal deJustiça do Rio Grande do Sul:

“ Inventário. Partilha. Nulidade. Exclusão de herdeiro ne-cessário. Inadmissibilidade de renúncia tácita. 1. Não existerenúncia tácita da herança; a renúncia da herança deve serexpressa sempre e constar de instrumento público ou termo

 judicial. Inteligência do art. 1.806 do CCB. 2. A exclusão deherdeiro necessário na partilha contamina de nulidade o atodivisório, devendo ser desconstituída a sentença homolog-atória a fim de que seja refeita a partilha dos bens, contem-plando corretamente os quinhões legitimários. Recursoprovido” (TJRS, 7.ª Câmara Cível, Proc. 70011821550, Co-marca de Caxias do Sul, Rel. Juiz Sérgio Fernando de Vas-concellos Chaves, j. 10.08.2005).

Cumpre destacar que a forma tácita pode gerar dúvi-das sobre se houve ou não a efetiva renúncia. Ao criticar otexto legal, esclarece Zeno Veloso que “o termo judicialtambém é instrumento público e o que o art. 1.806 quisdizer é que a renúncia da herança deve constar expres-samente da escritura pública ou termo judicial” ( NovoCódigo Civil..., 2006, p. 1.504).

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Questão relevante é saber se a renúncia da herança ex-ige a vênia conjugal para a sua validade.

José Luiz Gavião de Almeida pondera que “sendo atounilateral, de não aceitação de direito hereditário, não sepode exigir a anuência do cônjuge. Esta se faz necessárianos casos de disposição patrimonial relativa a bem imóvel. Aqui não há ato de disposição, mas de não aceitação. Paradispor, há necessidade de ser titular do direito, situaçãoque não acontece quando da renúncia” (Código Civil...,2003, v. XVIII, p. 132). Nesse sentido, Maria Helena Dinizafirma que “renúncia e aceitação da herança é ato próprio

de quem é herdeiro, regendo-se pelo direito das sucessõese não de família, logo o art. 1.647 não é aplicável”(Curso..., 2005, v. 6, p. 75).

Entretanto, em sentido contrário, entendemos que arenúncia da herança necessita, para sua validade, da con-cordância do cônjuge do renunciante, salvo se casado peloregime da separação absoluta de bens (art. 1.647 do CC),pois a sucessão aberta é considerada bem imóvel (art. 80,II, do CC). Nesse sentido posicionam-se, entre outros, Se- bastião Amorim e Euclides de Oliveira ( Inventários e partilhas..., 2006, p. 57), Zeno Veloso ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.504), Francisco José Cahali (Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 100) e Sílvio de Salvo Venosa e

Débora Gozzo (Comentários..., 2004, p. 114). Além disso,há um ato de disposição, nos exatos termos do art. 1.647,I, do CC.

Sobre a questão da desnecessidade em caso de regimeda separação absoluta de bens, vale dizer que a regra en-trou em vigor com o Código Civil de 2002, pois a

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concordância era necessária qualquer que fosse o regimede bens, na vigência do Código Civil de 1916 (art. 235).

Diante disso, a questão que surge é a seguinte: a novadisposição atinge as pessoas casadas sob a vigência doCódigo Civil de 1916 ou apenas as casadas pelo sistema doCódigo Civil de 2002? A dúvida decorre da regra detransição prevista no Código Civil de 2002, pela qual o re-gime de bens nos casamentos celebrados na vigência doCódigo Civil anterior é o por ele estabelecido (art. 2.039do CC/2002).

Para parte da doutrina, o artigo impediria que os casa-

dos sob a vigência do revogado Código Civil, pelo regimeda separação absoluta, alienassem bens imóveis sem aconcordância do cônjuge (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil..., 2005, v. 6). Entretanto, a doutrina major-itária, à qual os presentes autores filiam, afirma que, porforça do disposto no art. 2.035 do CC em vigor, em setratando de validade do negócio jurídico, deve ser aplicadaa lei do momento de sua celebração. Assim sendo, se arenúncia à herança for praticada na vigência do CódigoCivil de 2002 e o regime de bens for o da separação abso-luta, a vênia está dispensada. Já se a renúncia se realizouna vigência do revogado Código Civil, a vênia era impre-scindível qualquer que fosse o regime de bens, e sua aus-

ência geraria a nulidade do negócio jurídico.Nesse sentido, cuidando da venda de imóveis, im-

pecável a decisão do Conselho Superior da Magistraturado Tribunal de Justiça de São Paulo, relatada pelo Desem- bargador José Mário Antônio Cardinale, datado de 7 de ju-lho de 2005:

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“ Registro de Imóveis – Escritura pública de venda e com-pra – Recusa com base no art. 235, I, do Código Civil de1916, combinado com o art. 2.039 do Código Civil de 2002 –

 Ausência de outorga uxória – Dúvida improcedente –Formalidade legal não inerente ao regime de bens adotado –Incidência do art. 1.647, I, do diploma atual, que não afetaou modifica tal regime – Registro cabível – Recurso nãoprovido. E, da mesma forma, não merece guarida o entendi-mento de que a aplicação imediata de seu artigo 1.647, I(dispensando a autorização quando o regime for o da sep-aração absoluta), viola ato jurídico perfeito, qual seja o pactoantenupcial celebrado sob a égide da legislação pretérita. Talpacto versa, evidentemente, sobre o regime de bens em si e

não acerca de aspectos exteriores a ele, como o que aqui seexamina. Assim, impende concluir que os negócios jurídicosrealizados na vigência do velho Código Civil, envolvendoimóveis de pessoas casadas, obedecem às regras por ele es-tabelecidas, enquanto aqueles celebrados sob a vigência donovo estatuto substantivo respeitarão as normas previstasneste último, de modo a dispensar a autorização do outro

cônjuge nos casos de alienação e oneração de imóveisquando o regime for o da separação, ainda que o alienantetenha se casado com pacto de incomunicabilidade patrimo-nial sob a égide da legislação anterior” (TJSP, Apelação Cível356-6/6).

Com a efetivação da renúncia válida na sucessão legí-tima, a parte do renunciante acresce aos demais herdeirosda mesma classe e sendo ele o único daquela classe,devolve-se sua parte aos da classe subsequente (art. 1.810do CC). O texto, na sua literalidade, deve ser compreen-dido da seguinte maneira: a quota do renunciante serápartilhada entre os herdeiros de mesma classe que rece- bem a herança conjuntamente ao renunciante.

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O conceito de classe será explicado com detalhes noCapítulo 2 da presente obra, que cuida da sucessão legí-tima. De maneira sucinta são classes de herdeiros aquelasestabelecidas no revogado art. 1.603 do CC/1916 e no art.1.829 do Código Civil em vigor: os descendentes, os as-

cendentes, o cônjuge sobrevivente e os colaterais até 4.ºgrau; bem como o companheiro (art. 1.790 do CC/2002).

 A título de ilustração, se estiverem B, C  e D na qualid-ade de descendentes e únicos herdeiros do falecido, e re-nunciando o primeiro à herança, a sua quota será divididaem partes iguais entre C  e D, pois os três são herdeiros da

mesma classe (a dos descendentes). Vejamos o diagramasucessório para o caso em questão:

Por outro lado, se o falecido deixou apenas José, seuúnico filho, e Antonio e Deise, seus pais, e nenhum outroparente, cônjuge ou companheiro, se José renunciar à her-ança, inexistindo outros descendentes, a herança vai paraa classe dos ascendentes, e Antonio e Deise a partilharão.

Cabe salientar que ninguém pode suceder represent-

ando herdeiro renunciante. Se, porém, ele for o único

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legítimo da sua classe, ou se todos os outros da mesmaclasse renunciarem à herança, poderão os filhos vir à su-cessão, por direito próprio, e por cabeça, segundo enunciaa segunda parte do art. 1.811 do atual CC. Exemplificando,se o falecido deixa dois filhos e três netos, e o falecido não

era casado nem vivia em união estável, caso todos os filhosrenunciem à herança, os três netos receberão por direitopróprio e não por representação. Vejamos a situação nodiagrama sucessório esquematizado a seguir:

Outra situação de renúncia que vale a pena mencionaré a seguinte: o falecido deixa dois filhos e três netos, e o fa-lecido não era casado nem vivia em união estável, e apenasum de seus filhos renuncia. A herança pertencerá na total-idade ao outro filho, conforme o esquema a seguir:

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Importante frisar que nos parece muito adequada epertinente a lição de José Luiz Gavião de Almeida aoafirmar que a regra contida no art. 1.810 está incompleta,pois “não recebem todos os da mesma classe, mas os da

mesma classe, grau e linha do renunciante” (CódigoCivil..., 2003, v. XVIII, p. 141). Para o jurista citado, caso ofalecido deixe como únicos herdeiros os seus ascendentes,sendo dois avós maternos e dois paternos, caso a avó ma-terna renuncie, seu quinhão irá apenas para o avô mater-no e não para os demais ascendentes. Com a soluçãoapontada concorda também Euclides de Oliveira que eme-mail aos autores dessa obra assim se posicionou: “real-mente, a mens legis é a de que a cota do renunciante fiquepara os coerdeiros não só da mesma classe (dicção do art.1.810), mas também do mesmo grau (é claro, se não trariadistorções absurdas) e, no caso dos ascendentes, ao damesma linha, porque esse é o critério de transmissão a

essa classe de herdeiros (art. 1.836, § 2.º)”.

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Entre os vários autores pesquisados, encontramosapenas duas menções à tese defendida pelo mestre por úl-timo citado, com a qual concordamos integralmente.Primeiramente, nesse mesmo sentido, Clóvis Beviláquaafirma que “se o renunciante for neto, a sua parte será de-

 volvida a seus irmãos e, na falta destes, aos outros herdeir-os” (Código Civil..., v. VI, p. 30). Além dele, Carvalho San-tos, com base nas lições de Baudry-Whal, Pacifici Mazzoni,Laurent e Demolombe, segue idêntica linha de raciocínio.Para ele, o entendimento toma por base a ideia de que orenunciante nunca foi herdeiro (Código Civil..., 1937, v.XXII, p. 179).

 Assim, se o falecido  A  deixar como únicos herdeirosseus netos D e E , irmãos e filhos de B (que morreu antesde seu pai A), bem como F  e G , irmãos e filhos de C  (quetambém morreu antes de sue pai  A) e caso o neto  D re-nuncie à herança (de acordo com José Luiz Gavião de Al-meida, com amparo em Carvalho Santos) a situação da

herança seria a seguinte: o neto E ficaria com 50% dos bens e F  e G  com os outros 50%.

 Vejamos o diagrama:

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Se adotássemos a interpretação literal do dispositivoque é mencionada pela maioria da doutrina, o quinhão doneto renunciante  D   seria dividido em três partes iguaispelos netos E , F  e G . Vejamos o novo diagrama:

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 A questão é polêmica. Entretanto, o espírito do legis-lador não foi o de devolver a quota do renunciante a todosda mesma classe, mas sim da mesma classe, grau e linha.

 Analisemos mais um exemplo de Carvalho Santossobre o tema da renúncia (Código Civil brasileiro..., 1937, v. XXII, p. 180): A, por testamento, deixa sua herança para B e C que não são parentes entre si, mas apenas amigos dofalecido. B falece antes de manifestar sua aceitação e deixadois filhos D e E . E  renuncia à herança e D a aceita. Quemrecolhe o seu quinhão? C  como herdeiro testamentário ou D como irmão do renunciante? A resposta é D, por ser da

mesma classe de E .

Frise-se que na sucessão testamentária, a renúnciapode implicar direito de acrescer ou substituição, con-forme será analisado em momento oportuno nesta obra.

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Para concluir o estudo da renúncia da herança, deve-se entender que, no momento em que o herdeiro prejudi-car os seus credores, renunciando à herança, poderão eles,com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunci-ante (art. 1.813,  caput , do CC). Trata-se de situação em

que o herdeiro renuncia à herança como forma de prejudi-car seus próprios credores. Repare que a lei não mencionacredores do falecido, mesmo porque os credores do fale-cido não precisam “aceitar” a sua herança, podendo se ha- bilitar no inventário para o pagamento.

Cabe salientar que não se está diante da figura da

fraude contra credores como vício do negócio jurídico, queexige a presença dos elementos objetivo (eventus damni ) esubjetivo (consilium fraudis), atinge o plano da validadedo negócio jurídico e gera a anulabilidade do ato por ex-pressa determinação legal (art. 171, II, do CC).

No caso da aceitação pelos credores do herdeiro re-nunciante, não se discute a sua validade, mas apenas a suaeficácia. Assim, a questão se situa no último degrau da Es-cada Ponteana, à luz da clássica divisão, concebida porPontes de Miranda, de divisão dos atos e negócios jurídi-cos em três planos: plano da existência (1.º degrau), planoda validade (2.º degrau) e plano da eficácia (3.º degrau).

Desse modo, conferem-se apenas efeitos parciais a

essa aceitação pelos credores, uma vez que, pagas as dívi-das do renunciante, prevalece a renúncia quanto ao re-manescente, que será devolvido aos demais herdeiros, oque pode ser retirado do art. 1.808, § 2.º, do CC (“O her-deiro, chamado, na mesma sucessão, a mais de um quin-hão hereditário, sob títulos sucessórios diversos, pode

livremente deliberar quanto aos quinhões que aceita e aos

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que renuncia”). Portanto, a renúncia produz efeitos, porexemplo, em relação aos herdeiros do renunciante que nãoherdam por representação.

Seria esse ato dos credores, realmente, uma forma deaceitação? A resposta é negativa, pois se o credor agisse naqualidade de mandatário ou representante do herdeiro aoaceitar a herança, ainda que bens restassem ou sobrassem,após pagas as dívidas, este remanescente pertenceria aorenunciante, o que não ocorre no caso descrito. É o queEduardo de Oliveira Leite chama de  sub-rogação de cre-dores em exceção ao princípio da pessoalidade

(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 151).Não poderia também se tratar de fraude contra cre-

dores pelo fato de o credor do herdeiro, ao se tornarcredor, não poder contar com um patrimônio que esteainda não dispunha, como garantia da dívida. Havia, nomomento da concessão do crédito, apenas uma expect-ativa de direito, pois o devedor poderia nada receberquando do falecimento do de cujus, quer seja pelo fato depré-morrer ao autor da herança, ou por ser declarado in-digno ou deserdado, ou simplesmente pelo fato de o autorda herança nada deixar ao falecer. Os credores não podemcontar com bens inexistentes no patrimônio do falecido nomomento em que a dívida surgiu. Portanto, não será ne-

cessária nenhuma demanda assemelhada à ação paulianaa ser movida pelos credores do renunciante no casodescrito.

 A habilitação dos credores no inventário será feita noprazo de 30 dias seguintes ao conhecimento da renúncia,sob pena de decadência (art. 1.813, § 1.º, do CC). En-

tretanto, como bem salienta Washington de Barros

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Superada a análise dessas regras específicas, veremoso estudo das regras comuns à aceitação e à renúncia daherança.

1.4.3 Das regras comuns à aceitação e à renúnciada herança

 Além de regras específicas relativas aos institutos aquiestudados, o Código Civil de 2002 traz regras comunsquanto à aceitação e à renúncia da herança.

 A primeira regra que se observa é que tanto a renúnciaquanto a aceitação da herança são irrevogáveis (art. 1.812do CC). De fato, não é o herdeiro obrigado a aceitar a her-ança, tendo ampla liberdade para repudiá-la. Contudo, osatos de aceitação e de renúncia não comportam arrependi-mento em razão da insegurança jurídica que isso criaria.

Justamente por isso, na visão romana, a aceitação era

tradicionalmente irrevogável (semel heres semper heres).O que se percebe quanto ao tema é que o Código Civil em vigor rompe com o sistema do seu antecessor, que previaque a aceitação poderia se revogada desde que não causas-se prejuízos a terceiros (art. 1.590 do CC/1916).

Também, o Código Civil de 2002 não reproduz o equí-

 voco conceitual desse dispositivo anterior, que determ-inava ser retratável a renúncia decorrente de violência,erro ou dolo. Realmente, a coação, o dolo e o erro sãomotivos para a anulação do negócio jurídico, já que afetamsua validade de forma até sanável. Na  Escada Ponteana,os motivos de nulidade ou de anulabilidade atuam no pla-no da validade (2.º degrau). Por outro lado, a revogação

por vontade de uma das partes, como espécie de resilição

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unilateral, atinge o plano da eficácia do negócio jurídico(3.º degrau). Em resumo, tanto a aceitação quanto arenúncia poderão ser anuladas em razão de vícios do con-sentimento, independentemente de previsão legal ex-pressa, em decorrência dos vícios, constantes na Parte

Geral do Código Civil, nos prazos do art. 178 do diplomacivil.

Outra importante regra sobre a aceitação e a renúnciaé aquela que diz que não se pode aceitar ou renunciar aherança sob condição ou termo (art. 1.808, caput , do CC).Isso significa que os efeitos da aceitação e da renúncia não

poderão estar subordinados a um evento futuro e incerto– condição –, nem a um evento futuro e certo – termo. A título de exemplo, não pode o herdeiro João aceitar a her-ança se o herdeiro José a ela renunciar (condição suspens-iva). Também não poderá o herdeiro Pedro aceitar a her-ança até o ano de 2010 (termo resolutivo).

Pois bem, mas qual seria a consequência dessa aceit-ação ou renúncia sob condição ou termo? Na doutrinaclássica, o questionamento é respondido com brilhantismopor Carvalho Santos, no sentido de que, em se tratando de“aceitação, a condição ou o termo, a que o herdeiro ativesse sujeitado, seria considerado não escrito, precis-amente porque a renúncia não se presume, enquanto que

a aceitação se presume ainda que em caso de dúvida ou in-certeza. No tocante à renúncia, a condição e o termo quefossem opostos tirar-lhe-iam toda a validade. Tratar-se-iade um ato nulo” (Código Civil brasileiro..., 1937, v. XXII,p. 140).

Também a herança não pode ser aceita ou renunciada

em partes, mas apenas como um todo em razão de sua

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indivisibilidade, regra esta que também é extraída do art.1.808, caput , da atual codificação. Como visto, a herançaconstitui uma  universalidade de direito  e, portanto, nãopode o herdeiro aceitar apenas certos bens ou direitos erenunciar a outros. Seria bom e agradável se ele pudesse

aceitar apenas os bens e renunciar às dívidas, mas isso oherdeiro, por razões óbvias, não pode fazer.

Todavia, a regra em comento comporta duas exceções.

 A primeira dessas exceções refere-se ao herdeiro aquem se testarem legados, que pode aceitá-los, renun-ciando à herança; ou, aceitando-a, repudiá-los (art. 1.808,

§ 1.º, do CC). Realmente, se o herdeiro também fornomeado como legatário, recebe a universalidade dos bens(a herança), bem como o bem destacado e singular(legado). A renúncia e a aceitação de um ou de outro nãofere a ideia de indivisibilidade da herança como universal-idade de direito que é. Ocorre, no caso em questão, umadiversidade de causas sucessórias.

No campo prático, se João e José são herdeiros legíti-mos do testador e José também é nomeado legatário deum piano, o último poderá aceitar a herança repudiandoao piano ou aceitar este e repudiar a herança. A regra é bastante lógica, pois, se o testamento vier a ser anulado ourevogado pelo testador, José perde o legado, mas não a

condição de herdeiro legítimo.Como segunda exceção, há o caso do herdeiro cha-

mado, na mesma sucessão, a mais de um quinhão hered-itário, sob títulos sucessórios diversos. Pelo que consta doart. 1.808, § 2.º, do CC, esse herdeiro pode, livremente,deliberar quanto aos quinhões que aceita e que renuncia.

Ilustrando, se João e José são filhos do testador e José

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recebe, em virtude de testamento, a parte disponível terádireito a dois quinhões hereditários – o da sucessão legí-tima e o da testamentária –, e poderá aceitar um quinhãoe renunciar ao outro.

Nesse ponto, surge mais uma dúvida: se o testadordeixou dois legados em favor de seu sobrinho João, poder-ia o legatário aceitar um e repudiar o outro? A resposta é“depende”. Deve-se verificar a vontade do testador, comolembra Carvalho Santos, “a fim de verificar se ele quisglobal ou divisível o legado; na dúvida é de concluir pelaaceitação na íntegra, considerada nula a renúncia parcial”

(Código Civil brasileiro..., v. XXII, p. 142).Por outro lado, se “um de dois irmãos, herdeiros ne-

cessários, falece, renuncia ou é considerado indigno semdeixar representante, a sua parte acresce ao sobrevivo.Mas este recolhe a totalidade da herança por título único,pelo que não poderia pretender aceitar o que lhe estavasendo deferido originalmente e recusar o acréscimo quelhe veio pela pré-morte, renúncia ou indignidade doirmão” (ALMEIDA, José Luiz Gavião de.  Código Civil...,2003, p. 138). Em se tratando de direito de acrescer, nãose pode aceitar a herança ou legado e repudiar o acréscimoou vice-versa.

Com a análise dessas duas exceções, sendo a última a

mais polêmica, encerra-se o estudo da aceitação e darenúncia à herança. A partir do presente momento, passa-se a analisar os excluídos da sucessão.

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desses atos, incompatibiliza-se ele com a posição deherdeiro, tornando-se incapaz de suceder” (Curso..., 2003, v. 6, p. 62).

 A questão inicial que se coloca é saber se o indigno e odeserdado são realmente incapazes de receber a herançaou se lhes falta legitimação. Para Francisco Cahali, “em- bora didaticamente tratada em conjunto com a legitim-ação, a exclusão por indignidade representa mais propria-mente a retirada do direito à herança de quem é sucessorcapaz, em virtude de atos de ingratidão” (Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 135). Silvio Rodrigues ap-

resenta o debate nos seguintes termos: “Escritores mod-ernos e antigos insistem na diferença que existe entre in-capacidade para suceder, que é a inaptidão de alguém parareceber uma herança por razões de ordem geral que inde-pendam de seu mérito ou demérito e, indignidade, que é aperda da herança, com pena imposta ao sucessor capaz,em virtude de atos de ingratidão por ele praticados contra

o defunto. No dizer de Planiol, a indignidade supõe capa-cidade para suceder e se funda em motivos pessoais do in-digno” ( Direito civil..., v. 7, p. 66). Já Washington de Bar-ros Monteiro trabalha os institutos como causas de inca-pacidades (Curso..., 2003, v. 6, p. 63). Mas, em sentidocontrário, Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado

tratam a matéria como motivo de falta de legitimação(Código Civil..., 2005, p. 909). Essa última interpretaçãoparece ser a mais adequada, pois o caso, realmente, é defalta de capacidade especial exigida para herdar.

Contribui para o debate o jurista Eduardo de OliveiraLeite, para quem “a incapacidade é a falta de aptidão paraadquirir direitos, enquanto a indignidade é a perda desta

aptidão por culpa do beneficiado” (Comentários..., 2004,

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 v. XXI, p. 157). Como se pode perceber, aquele que at-entou dolosamente contra a vida do pai é civilmente capaz(capacidade genérica), mas não legitimado a suceder (situ-ação específica); pode comprar bens, vendê-los ou doá-los,mas lhe falta legitimidade naquela sucessão.

 Após essa visão estrutural, será traçado um import-ante paralelo entre a indignidade e a deserdação, de formapontual.

a) Semelhanças entre os institutos:

– Tanto o indigno quanto o deserdado terão a mesma pena,qual seja a não participação da sucessão do falecido e ummesmo fundamento: a vontade do morto que “não dese-

 jaria, por certo, fossem seus bens recolhidos por quem semostrou capaz de tão grave insídia” (MONTEIRO, Wash-ington de Barros. Curso..., 2003, v. 6, p. 62).

– Tanto a indignidade quanto a deserdação deverão ser ne-

cessariamente confirmadas por sentença (arts. 1.815 e1.965 do CC), sob pena de não produzirem efeitos e o her-deiro participar normalmente da sucessão. Nesse ponto,

 vale dizer que, quando do assassinato do casal Von Rich-thofen, foi proposto perante o Congresso Nacional o Pro-

 jeto de Lei 141/2003, de autoria do Deputado fluminensePaulo Baltazar, que pretendia alterar o art. 92 do Código

Penal, para que a exclusão da sucessão passasse a serefeito automático da sentença condenatória. O projetoacrescia o seguinte inciso ao citado art. 92 do CP: “IV – A exclusão dos herdeiros ou legatários que houverem sidoautores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, outentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar,seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente”.Quanto aos motivos do projeto de lei, seriam eles os

seguintes: “O caso recente noticiado com destaque em

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todos os meios de comunicação – o de Suzane Loise VonRichthofen pelo assassinato dos seus genitores – Manfrede Marísia, é, hoje, alvo prioritário do estudo de criminalis-tas, psicoterapeutas, psiquiatras e legisladores que tentam

 barrar a onda de violência familiar. Este tipo de delito égravíssimo e deve ser reprimido com penas severas,porém não deixará de existir, já que, desde os tempos

 bíblicos, ele ocorre, vez por outra motivado pela ganânciahumana ou pela insensatez dos que deveriam amaràqueles a quem o Direito salvaguarda a legitimidade daSucessão, seja na qualidade de herdeiro ou de legatário,em vez disso expõe a fragilidade dos valores morais e hu-manos de uma sociedade que regula através do Estado os

limites da vida familiar”.– Tanto a ação de indignidade quanto a de deserdação só

podem ser propostas após a morte do  de cujus, pois odireito à herança só surge quando se abre a sucessão, oque não impede que, ainda em vida, ocorra uma medidacautelar de produção antecipada de provas.

– As causas de indignidade coincidem com as de deserdaçãoe vêm previstas no art. 1.814 do Código Civil em vigor. En-tretanto, consagra a lei algumas causas exclusivas para adeserdação (art. 1.962 do CC). Essas causas, segundo oentendimento majoritário, são causas taxativas (numerusclausus), e não meramente exemplificativas (numerusapertus). Em sentido contrário, entende Carlos EduardoMinozzo Polleto, com base nas lições de José de Oliveira

 Ascensão, que enquanto na técnica taxativa (numerusclausus) “a norma fixa todas as especificações possíveis”,restando vedada à analogia, na enumeração exemplific-ativa (numerus apertus), se acolhe tanto a analogia legiscomo a analogia iuris, situando-se entre essas duas a tipo-logia delimitativa, em que “somente é possível a elabor-ação de novas figuras análogas a algum dos tipos norm-

ativamente previstos”, ou seja, admite-se somente o uso

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da analogia   legis   (limitada). Assim, as causas de deser-dação e de extinção do poder familiar, bem como as queautorizam a revogação da doação, por exemplo, podem serperfeitamente aplicadas para afastar o sucessor por indig-nidade. Desse modo, ainda que a recusa injustificada daprestação de alimentos ao de cuius não esteja prevista norol das causas de indignidade, assim poderá se considerar,aplicando-se, por analogia, o disposto no inciso IV doartigo 557 do CC/2002, que cuida da revogação da doaçãopor ingratidão do donatário que, podendo ministrar, recu-sou ao doador os alimentos de que este necessitava ( A ex-clusão da sucessão..., 2009, p. 148).

b) Diferenças entre os institutos.

– Enquanto a indignidade decorre de determinação legal eda vontade dos interessados, que devem propor ação judi-cial para que seja reconhecida, a deserdação resulta da

 vontade do falecido, que assim a determina por meio detestamento.

– A indignidade é matéria de sucessão legítima e testa-mentária; já a deserdação apenas envolve a sucessão test-amentária. Isso não quer dizer que os efeitos da deser-dação não alteram a sucessão legítima, mas sim que adeserdação só se faz por testamento, cabendo ao testadordeclarar expressamente os seus motivos, sob pena de estanão valer (art. 1.964 do CC).

– A pena de  indignidade pode ser cominada aos  herdeirosnecessários (filhos, netos, pais, cônjuge) ou aos herdeiros

 facultativos (sobrinhos, tios, primos, tios-avôs, sobrinhos-netos ou mesmo estranhos nomeados herdeiros por testa-mento). Por outra via, a pena de  deserdação só atinge osherdeiros necessários, sendo forma própria para lhes re-tirar o direito à legítima (art. 1.961 do CC). Um exemplo

esclarece a questão. Se o sobrinho,  herdeiro facultativo,

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assassina dolosamente seu tio, os demais herdeiros po-dem propor a ação de exclusão por indignidade. Se osobrinho, nomeado em testamento, tenta matar seu tio enão consegue, o tio não precisará deserdá-lo para afastá-lo da sucessão. Como não é herdeiro necessário, basta queo tio faça outro testamento que não o contemple. Poroutro lado, se o filho tenta matar o pai dolosamente e nãoconsegue, os demais herdeiros podem propor a ação de in-dignidade ou o pai, se quiser, pode deserdá-lo portestamento.

– Explica José Luiz Gavião de Almeida que “até circunstân-cias posteriores à morte do autor da herança podem ser

reconhecidas como provocadoras da indignidade. A deser-dação só se estabelece por causas anteriores à morte doautor da herança, pois só se estabelece pela via testa-mentária” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 157).

– Enquanto o indigno entra na posse dos bens da herançadesde logo, pois a indignidade decorre de ação judicialque a constitua, o deserdado não entra na posse de forma

imediata, pois enquanto “não se decida a veracidade dascausas da deserdação, os bens da herança permanecerãoem depósito, na posse e guarda do inventariante, do testa-menteiro ou quem o juiz indicar para tal mister”(CAHALI, FRANCISCO e HIRONAKA, GISELDA,  Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 372). A ação apenas confirmaráas causas da deserdação.

Por derradeiro, apontadas as diferenças, percebe-se,desde logo que, no famoso caso de homicídio ocorrido emSão Paulo constante da proposta legislativa aqui mencion-ada, não pode se tratar de situação de deserdação, pois es-ta só corre por testamento. O caso é de indignidadeevidente.

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1.5.2 Dos efeitos pessoais da indignidade e adúvida quanto à deserdação

Uma dúvida que surge quando do estudo das difer-enças entre os institutos em comento decorre da previsão

contida no art. 1.816 do Código Civil em vigor, a saber:“São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes doherdeiro excluído sucedem, como se ele morto fosse antesda abertura da sucessão”.

Pelo que consta desse comando legal, em se tratandode   indignidade,  a pena não atinge os sucessores do in-

digno que não serão punidos pelos atos reprováveis deste,o que é aplicação do princípio da intranscendência ou da personalidade da pena. Portanto, se o indigno é excluídoda sucessão de seu pai, seus filhos herdam por   repres-entação, instituto este que será estudado no próximocapítulo da presente obra.

Nesse sentido, se A, pai de B e C , sem cônjuge ou com-panheiro, falece em razão de homicídio doloso praticadopor seu filho B, com a declaração de indignidade deste, aherança será apenas de C . Entretanto, se B tinha dois fil-hos D e  E , serão eles os herdeiros de 50% da herança porrepresentação a seu pai B. Vejamos o diagrama sucessório,do último caso relatado, a seguir:

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Para a efetividade da punição prevista para o indigno,caso seus descendentes (que herdaram por representação)

sejam menores, não pode o excluído, na qualidade de gen-itor, administrar os bens herdados. Também, não seriacompleta a pena se, em caso de morte de seus filhos, o in-digno recebesse em sucessão os bens em questão. Por issodetermina o Código Civil que o excluído da sucessão nãoterá direito ao usufruto ou à administração dos bens que aseus sucessores couberem na herança, nem à sucessão

eventual desses bens (art. 1.816, parágrafo único, do CC).No último exemplo, se D vier a falecer, os bens que ele

recebeu do avô A, por representação, não se transmitirão aseu pai   B, considerado indigno. Entretanto, os demais bens que pertençam a D (excluindo-se os recebidos de A),serão transmitidos ao seu pai B.

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Com relação ao revogado Código Civil percebe-se quese trocou a expressão “filhos”, contida no art. 1.602daquele diploma, por “sucessores” (art. 1.816, parágrafoúnico, do CC/2002). Parece correta a ampliação legalocorrida, pois em certas hipóteses o chamado a suceder

não será o filho, mas sim um parente colateral do indigno. Vejamos um exemplo desse último caso:  C   e  D   são

irmãos, sendo que os ascendentes de ambos já são fale-cidos, ou seja, ambos não têm pais, avós etc. Os seus úni-cos parentes sucessíveis vivos são seus tios  A e B. Caso osobrinho  C  mate seu tio  A, a herança ficará divida entre

seu tio B e seu irmão D. Assim, visualiza-se o seguinte dia-grama sucessório:

Por outro lado, se o tio B vier a falecer posteriormente,a herança que recebeu de A não será transmitida a C  (in-digno), razão pela qual está correto o Código Civil em vig-

or ao falar que os bens não se transmitem ao sucessor e

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não apenas ao filho. Vejamos o diagrama sucessório comrelação aos bens de A e também de B:

 A questão que precisa ser analisada é se, em caso dedeserdação, podem os descendentes do deserdado herdar

por representação, já que não há menção expressa noCódigo Civil de 2002. De imediato, pode-se dizer que aquestão é polêmica.

O sempre citado José Luiz Gavião de Almeida entendeque enquanto a “indignidade gera efeitos pessoais ao in-digno, a deserdação atinge os herdeiros do deserdado,

conquanto esta observação não seja pacífica” (CódigoCivil..., 2003, v. XVIII, p. 156). Washington de BarrosMonteiro chegou à conclusão de que o tratamento diferen-ciado o ocorre em razão “de que o Código Civil de 1916 nãofazia referência, quanto à deserdação, a efeito previsto daindignidade, que não excluía da herança os sucessores doindigno” (Curso..., 2003, v. 6, p. 247). Em sua atualização

por Ana Cristina Barros Monteiro França Pinto, a

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orientação muda para que haja identidade dos institutosquanto a tais efeitos, sob o argumento de ser “forçoso re-conhecer que ante a natureza de penalidade que acom-panha a deserdação, seus efeitos hão de ser pessoais, nãopodendo ir além da pessoa que de forma tão reprovável

procedeu” (Curso..., 2003, v. 6, p. 247).Carvalho Santos compila voto da lavra de Joaquim

Celidonio, Desembargador do Tribunal de Justiça de SãoPaulo, do distante ano de 1931, que conclui, após análisede legislação estrangeira, que ocorre a representação dosdescendentes do deserdado de acordo com o Código Civil

argentino (art. 3.749), o Código Civil espanhol (art. 857) eo Código Civil uruguaio (art. 902). A conclusão é que não édiferente o sistema brasileiro (Código Civil brasileiro...,1937, v. 22, p. 234).

Silvio Rodrigues entende que os efeitos dos institutossão idênticos, sendo tal posição justificável e conveniente,pois “justificável, porque constitui mera aplicação de umprincípio geral de direito, que impede a punição do ino-cente, consagrando a ideia de personalização da pena (...)e conveniente porque, sendo a deserdação um institutoenormemente combatido, deve-se restringir ao invés deaumentar o seu alcance” ( Direito civil..., v. 7, p. 262). Essaé exatamente a nossa opinião, no sentido de que tantos os

descendentes do deserdado quanto os do indigno herd-arão por representação.

De qualquer forma, a   celeuma   será definitivamentesepultada, pelo menos aparentemente, se aprovado for oPL 699/2011, antigo PL 6.960/2002, que cria um § 2.º aoart. 1.965, nos seguintes termos: “§ 2.º São pessoais os

efeitos da deserdação: os descendentes do herdeiro

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deserdado sucedem, como se ele morto fosse antes daabertura da sucessão. Mas o deserdado não terá direito aousufruto ou à administração dos bens que a seus su-cessores couberem na herança, nem à sucessão eventualdesses bens”. Como se nota, a posição dos últimos juristas

citados está de acordo com o entendimento constante daproposta de lei. Justamente por isso, tal posicionamentopode ser considerado como majoritário para os devidosfins.

1.5.3 Da legitimidade para a propositura das

demandas e seus prazos

Outro aspecto importante a ser observado diz respeitoà legitimidade para a propositura das ações objetivando aindignidade e a deserdação. Vejamos essas regras.

De início, importante dizer que, na hipótese de deser-

dação, o ônus de provar a causa estabelecida em testa-mento será daquele a quem a deserdação aproveita, ouseja, ao herdeiro ou legatário que se beneficiem com adeserdação (art. 1.965 do CC). Já no caso de indignidade éomissa a lei quanto à legitimidade para a propositura dademanda. No silêncio da lei e por se tratar de matéria pat-rimonial e que não interessa à ordem pública, entendemos

que apenas os interessados na indignidade podem pleiteá-la. Explica José Luiz Gavião de Almeida que “alegitimidade estabelece-se pelo interesse material em dis-puta. Aquele que pode vir a se beneficiar com a decisão ju-dicial na ação de indignidade pode promover essa ação”(Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 164).

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Sendo assim, não teria o Ministério Público legitimid-ade para tanto, salvo se objetivasse a exclusão dos herdeir-os para a vacância da herança. Mesmo porque, em setratando de questão meramente patrimonial, não há in-teresse público envolvido. Supondo que o MP agisse con-

tra a vontade dos herdeiros e propusesse a ação de indig-nidade contra um deles, que matou dolosamente seu pai.Tendo em vista a discordância dos demais herdeiros,irmãos do deserdado, poderiam eles beneficiar o deser-dado por meios indiretos, tais como depósitos em dinheirona conta do último. Inócua a ação promovida, então.

 A questão, entretanto, não é pacífica.Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado anotam

a opinião de diversos autores no tocante à legitimidadeque transcrevemos:

“Ressalta Giselda Maria Fernandes Novais Hironaka que‘não terá legitimidade ativa aquele que, embora sucessor do

ofendido, não se beneficiar diretamente com a exclusão. Assim, o irmão do indigno parece não ter legitimidade parapropor a ação quando o indigno tiver filhos, uma vez que op-erada a exclusão estes herdarão no lugar do ofensor’. Nomesmo sentido Guilherme Calmon Nogueira da Gama, anegar, inclusive, a legitimidade ativa do Ministério Público,mesmo nos casos de homicídio. Silvio Venosa e Maria

Helena Diniz defendem expressamente a legitimidade doMP, na omissão dos herdeiros” (Código Civil..., 2005, p.931).

Como se pode perceber, trata-se de questão controver-tida na prática do Direito das Sucessões.

Na  I Jornada de Direito Civil , promovida pelo Con-

selho da Justiça Federal em setembro de 2002, prevaleceu

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o entendimento pelo qual teria o MP legitimidade, diantedo Enunciado n. 116, com o seguinte teor: “O MinistérioPúblico, por força do art. 1.815 do Código Civil, desde quepresente o interesse público, tem legitimidade para pro-mover a ação visando à declaração da indignidade do her-

deiro ou legatário”. Concluindo, pode-se considerar queesse é o entendimento majoritário, inclusive por ser aposição de Sílvio Venosa e Maria Helena Diniz.

Tanto a indignidade quanto a deserdação deverão sernecessariamente confirmadas por sentença, o que pode serretirado dos arts. 1.815 e 1.965 do CC, respectivamente.

Isso, sob pena de não produzirem efeitos, fazendo que oherdeiro participe normalmente da sucessão.

Em ambas as hipóteses, o prazo para a demanda édecadencial, pois a ação terá natureza constitutivanegativa, levando-se em conta o critério científico paradistinguir a prescrição da decadência criado por Agnelo Amorim Filho ( RT  300/7 e 744/725).

Quanto ao prazo, a diferença está no termo inicial decontagem para o seu reconhecimento. A ação contra o in-digno deve ser proposta no prazo de quatro anos, conta-dos da abertura da sucessão (art. 1.815, parágrafo único,do CC), enquanto a ação contra o deserdado deve ser pro-posta também em quatro anos, mas contados da abertura

do testamento (art. 1.965, parágrafo único, do CC). Essadiferença é substancial e deve se observada em eventualcomparação entre os institutos.

Cabe observar, ainda, sobre o tema, que o PL 699/2011, antigo PL 6.960/2002, de autoria original doDeputado Ricardo Fiuza, pretende modificar o prazo para

a propositura das demandas, sob o argumento de que é

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excessivamente longo o prazo de quatro anos. O projeto dealteração legislativa, para as hipóteses de indignidade,pretende reduzir o prazo para dois anos, contados da aber-tura da sucessão, alterando-se o parágrafo único do art.1.815. Para os casos de deserdação, a proposta é de re-

dução também para dois anos, contados da abertura dasucessão (alteração do parágrafo único do art. 1.965, quese transformaria em § 1.º).

O motivo para se alterar o termo inicial do prazo, quepassaria a ser o momento da abertura da sucessão e nãodo testamento, decorre das críticas formuladas por Zeno

 Veloso, que inspiraram o projeto. Afirma o doutrinadorque iniciar o prazo com a abertura do testamento “é umequívoco! O testamento público sempre é aberto; o partic-ular, igualmente, é aberto. Esses testamentos não seabrem, apresentam-se ao juiz, com a morte do testador.Testamento fechado e que deve ser aberto pelo juiz, fale-cido o testador é o cerrado” (Comentários..., 2003, p.

337). Entendemos que as críticas procedem. Todavia,quando da abertura da sucessão (morte do de cujus), nemsempre o testamento é levado ao juízo para a sua ap-resentação. Na prática, podem se passar meses ou anos atéque a deserdação seja conhecida.

Concluímos que seria ideal que o prazo decadencial se

iniciasse com a apresentação do testamento em juízo, mo-mento em que se torna conhecido de todos. Nosso en-tendimento está amparado no direito à informação, quemantém relação direta com a boa-fé objetiva e a eticidade,um dos baluartes da nova codificação privada.

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1.5.4 Dos motivos para a exclusão

O estudo dos motivos que levam à indignidade e àdeserdação se divide em duas partes.

Na primeira delas, há causas comuns que podem ser

motivo tanto de deserdação quanto de indignidade. Estãoprevistas no art. 1.814 do Código Civil em vigor.

Na segunda parte, os arts. 1.962 e 1.963 do CC cuidamde causas exclusivas para a deserdação, além daquelascomuns a ambos os institutos. A divisão a seguir tem in-tuito didático, visando a tornar mais fácil o trabalho do

leitor.

1.5.4.1 Dos motivos comuns à indignidade e à deserdação

Os motivos que levam tanto à indignidade quanto àdeserdação estão relacionados no art. 1.814 do CC, sendo

excluído da sucessão os herdeiros ou legatários:

 I – Que houverem sido autores, coautores ou partícipes dehomicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa decuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, as-cendente ou descendente.

 A pena não se restringe ao homicídio consumado, mastambém ao tentado, exigindo que haja a intenção dematar, tratando, portanto, apenas de homicídio doloso enão do culposo. Tem lógica a previsão legal. Se por umafatalidade o filho atropela e mata seu pai, não haveria porque puni-lo com a exclusão da sucessão.

Explica Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka os vocábulos autor, coautor e partícipe nos seguintes termos:

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“autor é aquele único indivíduo que pratica o delito, pos-suindo domínio sobre a consumação do fato. Coautoressão os indivíduos que praticam, em conjunto, a ação crim-inosa, dividindo as tarefas como se de uma sociedade setratasse; ambos possuiriam aqui o domínio referido, uns

porque realizaram materialmente a conduta, outrosporque a imaginaram, ordenaram, podendo, a qualquertempo, ordenar sua interrupção. Partícipes são aquelesque, sem cometer uma ação tipificada no âmbito penal,contribuem para a ação criminosa do autor ou doscoautores” (Comentários..., 2003, v. 20, p. 146).

Dúvida comum suscitada diz respeito à necessidadeou não de sentença penal condenatória para que se opere aindignidade no âmbito do Direito Civil. A doutrina nãotem dúvidas em afirmar a desnecessidade de sentençapenal condenatória, diante da notória divisão da re-sponsabilidade civil e criminal, constante do art. 935 doCC em vigor (“A responsabilidade civil é independente da

criminal, não se podendo questionar mais sobre a existên-cia do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estasquestões se acharem decididas no juízo criminal”).

José Luiz Gavião de Almeida explica que “a inter-pretação que se deu ao dispositivo paradigma foi no sen-tido da desnecessidade da condenação criminal. A lei nor-

malmente fala, expressamente, quando a condenação énecessária, como faz no art. 1.521, VII, do novo Código.Mas se houver anterior condenação criminal, tal situaçãotorna desnecessário novo pronunciamento judicial a re-speito (art. 935)” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 159).Em idêntico sentido, retomando a lição de Beviláqua, as-severa Sílvio de Salvo Venosa que “para a incidência da

norma basta que tenha havido o crime, não se

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dependendo para a condenação por indignidade do res-ultado da ação no campo penal” (Código Civil ..., 1955, v. VI, p. 138).

Zeno Veloso, comparando o sistema brasileiro com oportuguês e o francês, afirma que enquanto aqueles sis-temas exigem a prévia condenação criminal, “nem oCódigo Civil de 1916, nem o presente mencionam o pres-suposto da condenação criminal. É possível, portanto, no juízo cível, ser verificada a situação e declarada por sen-tença a exclusão do indigno” ( Novo Código Civil..., 2006,p. 1.510). Também Flávio Augusto Monteiro de Barros

afirma que “o reconhecimento da indignidade não de-pende de condenação criminal” ( Manual ..., 2004, v. 4, p.197).

Concorda-se com a doutrina majoritária no sentido deque a prova do fato que conduz à indignidade bem como àdeserdação, no homicídio doloso, tentado ou consumado,pode ser feita tanto no juízo cível quanto no criminal. Além disso, não ocorrerá a suspensão de uma ação emrazão da existência da outra, eis que os objetivos em am- bas são diferentes. O objetivo na ação penal é a con-denação em pena privativa de liberdade daquele que, comsua conduta, ofende a ordem pública e, portanto, sofresanção pessoal. No juízo cível o objetivo é diverso, uma vez

que se trata apenas de uma questão patrimonial, sem re-lação com a ordem pública, e cuja sanção não será pessoal,mas apenas a exclusão da herança com a perda de bensherdados.

Com a sentença penal condenatória, sequer será ne-cessária a ação para declaração por indignidade movida no

 juízo cível, podendo o próprio juiz do inventário

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reconhecer a indignidade (ALMEIDA, José Luiz Gaviãode. Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 162).

O estudioso mais ávido por informações pode lançar aseguinte pergunta: e se o indigno for absolvido no juízopenal, mas condenado no juízo cível? Não haveria contra-dição nas decisões? A pergunta é excelente, típica dosalunos mais preparados.

 A resposta vem a seguir. Se a sentença criminal for ab-solutória por negativa de autoria ou por inexistência do fato (art. 386, I, do CPP), não se pode reconhecer a indig-nidade no juízo cível, por força do citado art. 935 do CC

(BARROS, Flávio Monteiro de.  Manual ..., 2004, v. 4, p.197; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes.  Co-mentários..., 2003, v. 20, p. 147; VELOSO, Zeno.  NovoCódigo Civil..., 2006, p. 1.510; VENOSA, Sílvio de Salvo eGOZZO, Débora. Comentários..., 2004, p. 138).

Entretanto, se a absolvição decorrer da circunstância

de não haver prova da existência do fato no juízo criminal(art. 386, II, do CPP), de não existir prova de ter o réuconcorrido para a infração penal (art. 386, IV, do CPP) oude não existir prova suficiente para a condenação (art.386, VI, do CPP), não haverá impedimento à declaraçãocível de indignidade.

 Ademais, a legítima defesa, o estado de necessidade eo exercício regular de um direito são, como regra geral, fa-tos lícitos para o Direito Civil (art. 188 do CC) e que, port-anto, não geram a exclusão por indignidade nem admitema deserdação de quem os pratica. Em reforço, lembre-sede que tais atos não são considerados crimes para o direitopenal (art. 23 do CP).

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Um último esclarecimento deve ser feito. Na verdade,trata-se de outra indagação que surge. O fato de existirprocesso-crime em trâmite para se apurar a prática dehomicídio doloso, seja ele tentado ou consumado, sus-pende os prazos para as ações cíveis, para decretar a indig-

nidade ou para confirmar a deserdação? A resposta é neg-ativa. Os prazos das ações são de natureza decadencial e,portanto, não se interrompem ou suspendem, salvo ex-pressa previsão legal (art. 207 do CC). Os fatores que im-pedem, suspendem ou interrompem a prescrição, em re-gra, não se aplicam à decadência. Note-se que a previsãocontida em lei é de suspensão da prescrição, e não dadecadência, até a sentença penal definitiva quando a açãose originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal(art. 200 do CC).

 II – Que houverem acusado caluniosamente em juízo oautor da herança ou incorrerem em crime contra a suahonra, ou de seu cônjuge ou companheiro.

 A interpretação do inciso pode ser dividida em duaspartes.

 A primeira parte envolve a denunciação caluniosa em juízo do autor da herança. A denunciação caluniosa estáprevista no art. 339 do Código Penal, nos seguintes ter-

mos: “Art. 339. Dar causa à instauração de investigaçãopolicial, de processo judicial, instauração de investigaçãoadministrativa, inquérito civil ou ação de improbidade ad-ministrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que osabe inocente” (com redação dada pela Lei 10.028/2000).

Nessa hipótese, não há necessidade de condenação

pelo crime de denunciação no juízo criminal para que haja

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a exclusão de quem a praticou no juízo cível. Destaque-seque a prova da denunciação pode ser feita diretamente no juízo cível.

 A segunda parte do artigo gera maior debate. Issoporque também pode ser excluído da sucessão aquele queincorrer em crime contra a honra do autor da herança oude seu cônjuge ou companheiro. Como se sabe, os crimescontra a honra são a injúria, a calúnia e a difamação (arts.138 a 140 do CP).

Cabem breves notas sobre os tipos penais.

Nos termos do art. 138, caput  e § 1.º, do Código Penal,é crime caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fatodefinido como crime e incorre na mesma pena quem,sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. ExplicamCelso Delmanto, Roberto Delmanto, Roberto Delmanto Jr.e Fábio M. A. Delmanto que imputar é atribuir, propalar épropagar, espalhar, e divulgar é tornar público, bastando

para tanto que se dê conhecimento a uma só pessoa, poisnão se pode confundir o ato (divulgar) com o resultado(divulgação) (Código Penal..., 2007, p. 405).

Difamar alguém é imputar fato ofensivo à suareputação, conforme dispõe o art. 139 do Código Penal.Ensinam os Delmanto que a conduta é imputar (atribuir),

e o fato deve ser determinado, mas não precisa ser espe-cificado em todas as suas circunstâncias. A imputação nãonecessita ser falsa. Ainda que verdadeira, haverá o delito. A atribuição deve chegar ao conhecimento de terceirapessoa, não se caracterizando o delito, se é o próprio ofen-dido quem leva ao conhecimento de outro (Código Pen-al..., 2007, p. 411).

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Por fim, pratica injúria quem ofende a dignidade oudecoro de alguém (art. 140 do CP). Enquanto na calúniaataca-se a honra objetiva da pessoa, ou seja, a imagem queterceiros dela têm, na injúria o objeto jurídico é a honrasubjetiva, ou seja, o sentimento que a pessoa tem de si

mesma.Note-se que a expressão “incorrer em crime” indica

que houve necessariamente a condenação criminal(ALMEIDA, José Luiz Gavião de. Código Civil..., 2003, v.XVIII, p. 161; Hironaka, Giselda Maria Fernandes Novaes,Comentários..., 2003, v. 20, p. 149; RODRIGUES, Silvio.

 Direito civil..., 2002, v. 7, p. 69; DINIZ, Maria Helena.Curso..., 2005, v. 6, p. 54). Essa é a correta interpretaçãodo dispositivo e a que deve ser utilizada para as mais di- versas finalidades.

 III – Que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ouobstarem o autor da herança de dispor livremente de

seus bens por ato de última vontade.

 A hipótese que se estuda é aquela em que o herdeiroou legatário tenta impedir o falecido de, livremente, disporde seus bens, empregando para tanto violência (coação),com o intuito de evitar que o testamento seja cumprido.Resume bem a situação Maria Helena Diniz, ao afirmar

que a lei pune o “herdeiro que, fraudulenta, dolosa oucoativamente, praticar atos, omissões, corrupção, alter-ações, falsificação, inutilização, ocultação, atentando con-tra essa liberdade de testar ou obstando a execução do atode última vontade” (Curso..., 2005, v. 6, p. 55).

Pode ser citado como exemplo o caso do herdeiro que

rompe o lacre do testamento cerrado. Um outro caso a ser

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mencionado é o do herdeiro que rasura o testamentoparticular. Pode-se mencionar, também, o caso do her-deiro que não informa a existência de um testamentopúblico do qual tem ciência, para evitar a divisão da her-ança com terceiros, impedindo que se dê cumprimento à

 vontade do morto e cometendo ato suficiente para sua ex-clusão. Da mesma forma, será excluído da sucessão o her-deiro que impede o de cujus de fazer testamento desejado,ou exige ser beneficiado pelo testamento usando de coaçãoou dolo e, também, do herdeiro que impede a revogaçãodo testamento.

Como se pode perceber, não estamos diante de crimestipificados pelo Código Penal, razão pela qual a prova sedará no juízo cível.

1.5.4.2 Dos motivos exclusivos à deserdação

Os motivos exclusivos à deserdação são aqueles con-tidos nos arts. 1.962 e 1.963 do Código Civil em vigor. Asregras de ambos os artigos guardam reciprocidade. As pre- visões do art. 1.962 do CC cuidam das hipóteses de deser-dação dos descendentes por seus ascendentes, ou seja,quando o filho ou neto pratica determinados atos contraseu pai ou avô e, por testamento, perde a legítima que lhe

tocaria. Já o art. 1.963 do CC se preocupa com a situaçãoinversa, ou seja, com as hipóteses em que os ascendentespraticam atos contra os descendentes, ou seja, o pai ou oavô pratica atos contra seu filho ou neto, que permitemsua exclusão da sucessão.

Curiosamente, o Código Civil de 2002 tornou o côn-

 juge herdeiro necessário (art. 1.845), mas não criou

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hipótese específica para a sua deserdação, como o fez comos descendentes e ascendentes. O art. 1.961 da atual codi-ficação dispõe apenas que os herdeiros necessários podemser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos oscasos em que podem ser excluídos da sucessão. Nesse sen-

tido, Zeno Veloso conclui que “embora o Código inclua ocônjuge no elenco dos herdeiros necessários, não o rela-cionou como passível de ser deserdado” (Comentários...,2003, v. 21, p. 311).

Realmente, em se tratando de rol taxativo (numerusclausus), suas hipóteses não podem ser ampliadas. Como

se pode perceber, as normas aqui analisadas são restrit-ivas de direito, não admitindo interpretação extensiva ouaplicação da analogia. Concluímos, assim, que o cônjugesó pode ser deserdado pelos motivos previstos no art.1.814, em razão do dispositivo do art. 1.961; mas não pelosmotivos previstos nos arts. 1.962 e 1.963, todos da atualcodificação. Nesse sentido, Jones Figueirêdo Alves e Mário

Luiz Delgado afirmam que “em que pese a omissão, asolução é facilmente encontrada dentro do próprio sis-tema do Código Civil. É que as hipóteses de deserdaçãonão se restringem àquelas previstas nos arts. 1.962 e1.963, mas também abrangem todas as causas pelas quaisos herdeiros podem ser excluídos da sucessão” (Código

Civil..., 2005, p. 997).Para solucionar a divergência, o PL 699/2011 pre-tende criar o art. 1.963-A com a seguinte redação: “Art.1.963-A. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autor-izam a deserdação do cônjuge: I – prática de ato que im-porte grave violação dos deveres do casamento, ou que de-termine a perda do poder familiar; II – recusar-se, injusti-

ficadamente, a dar alimentos ao outro cônjuge ou aos

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filhos comuns; III – desamparo do outro cônjuge ou dodescendente comum com deficiência mental ou graveenfermidade”.

Realmente, as causas exclusivas de deserdação decorr-em do fato de o herdeiro necessário ter o direito à legí-tima, direito este que é intocável. Por uma questão lógica,tendo um  bônus, terá também alguns  ônus, que, se des-cumpridos, permitem ao falecido retirar dos herdeiros alegítima.

São quatro os motivos que permitem a deserdaçãoquer do ascendente pelo descendente, quer do descend-

ente pelo ascendente, reunindo o que consta dos arts.1.962 e 1.963 do atual CC:

 I – Ofensa física

Para Washington de Barros Monteiro, “ofensas físicas,ainda que de natureza leve, autorizam a deserdação. Seví-

cia demonstra desamor, falta de carinho e respeito, legiti-mando por isso a deserdação. Mas a cominação da penacivil não depende da prévia decisão da justiça repressiva”(Curso..., 2003, v. 6, p. 241). Clara e contundente a liçãode Zeno Veloso no sentido de que “não há que se distin-guir ou questionar, nesse caso, se a ofensa foi leve, ougrave, se a dor causada foi, ou não profunda. O filhodesnaturado que ousa agredir fisicamente e macular, porexemplo, o santo rosto de sua mãe, já demonstra o desviode caráter, a tendência animalesca, pouco importando aintensidade da agressão, que, em qualquer circunstância, éofensa brutal, estúpida e inominável” (Comentários...,2003, v. 21, p. 330).

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Entretanto, a ofensa física do pai com relação ao filhodeve ser analisada em duas situações distintas. Se o menorainda está sob o poder familiar, antes de completar 18anos ou se emancipar, sua educação inclui a possibilidadede castigos moderados. Dentro do limite do bom senso e

da moderação, o castigo não constitui injúria grave, emque pese conhecermos a posição de doutrinadores e psicó-logos completamente avessos a qualquer punição física,por mais moderada que seja. De qualquer modo, a relaçãopai e filho não pode ser uma relação ditatorial na vigênciadesse poder, o que fere o espírito de família democrática,que é pregado atualmente. Por outro lado, findo o poderfamiliar, não há mais a possibilidade de se aplicar castigona relação filial.

 II – Injúria grave

Na doutrina clássica, Clóvis Beviláqua chama de  de-generado aquele que ultraja seu ascendente ou descend-ente (Código Civil ..., 1955, v. VI, p. 174). A figura da in- júria grave é complexa “e tem encontrado na doutrina brasileira as mais diversas exegeses. Quanto à gravidade équestão que deve ser apreciada levando-se em consider-ação as circunstâncias de cada caso particular” (LEITE,Eduardo de Oliveira.   Comentários..., 2004, v. XXI, p.

640). Mais uma vez, Zeno Veloso explica que a injúria semanifesta pela palavra “através da expressão verbal, oral,ou por escrito (telegramas, cartas, bilhetes, etc.), bemcomo por atos (gestos obscenos, condutas desonrosas)”(Comentários..., 2003, v. 21, p. 330).

 A injúria grave atinge a honra subjetiva do agredido,ou seja, a sua autoestima, o que ele pensa de si mesmo. Oofendido se sente humilhado em seu brio, desrespeitado

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na sua integridade físico-psíquica, um direito da personal-idade. É importante ressaltar que a injúria não exige queterceiros conheçam o seu conteúdo, nem que a humil-hação seja pública, atingindo a honra subjetiva da pessoa.

Também é pertinente enfatizar que o que para certafamília pode constituir injúria grave, para outra pode sig-nificar apenas uma forma comum de se relacionar. O usode palavras de baixo calão, comum para certas pessoas,pode ser considerado extremamente ofensivo por outras. Além disso, muitas vezes, o palavrão é utilizado demaneira jocosa e tolerado por alguns, mas considerado in-

 júria grave por outros.Por fim, a época e o local do ato também influenciam a

noção de injúria grave. O rigor da criação dos filhos exist-entes outrora não mais se verifica em grande parte dasfamílias atuais ou pós-modernas. Portanto, a época emque as palavras foram proferidas deve contar na análise judicial da expressão injúria grave, o que nos traz a ideiade interpretação dos fatos de acordo com o meio social( princípio da socialidade).

 III – Os descendentes que tiverem relações ilícitascom a madrasta ou com o padrasto e os ascendentes quetiverem relações ilícitas com a mulher ou companheira

do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiroda filha ou o da neta.

 As relações ilícitas devem ser consideradas como ex-pressão sinônima de relação de cunho afetivo, íntimo ousexual. Dessa forma, beijos lascivos, sexo oral, cópula car-nal são consideradas relações ilícitas. Um romance tórrido

e oculto entre o descendente e sua madrasta é o típico

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exemplo doutrinário para a hipótese. É a lascívia, a concu- piscência. Confessamos, entretanto, que a hipótese lembramais os folhetins e as novelas do que a vida real. De poucaaplicação prática, permaneceu no Código Civil de 2002pelo amor às tradições. De qualquer forma, numa visão

atual, a doutrina aponta que “pouco importa que tais re-lações sejam hetero ou homossexuais. Não há que se dis-tinguir” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil..., 2003, v.7, p. 294).

Imperioso frisar que em se tratando de pena civil, suashipóteses não podem ser ampliadas. Assim, note-se que a

relação ilícita entre o descendente e o companheiro do as-cendente não admite a deserdação, porque a lei mencionaexpressamente a expressão madrasta e padrasto (art.1.962, III, do CC). Nesse sentido, aliás, posiciona-se Wash-ington de Barros Monteiro (Curso..., 2003, v. 6, p. 242).Na doutrina contemporânea, Sebastião Amorim e Euclidesde Oliveira lembram que as causas “constituem  numerus

clausus, por isso não admitem interpretação extensiva,para outros atos de ingratidão ou de ofensa à pessoa doautor da herança” ( Inventários e partilhas..., 2006, p. 54).

Entretanto, em sentido contrário, Zeno Veloso explicaque “há o art. 1.595, que edita que o liame jurídico da afin-idade se estabelece entre cada companheiro e os parentes

do outro, aditando o parágrafo segundo do art. 1.595 que,na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissoluçãoda união estável, que a originou. Acho que o filho quemantém relações ilícitas com a companheira do pai, pode,sim, ser deserdado, e não estou recorrendo à analogia,mas fazendo uma interpretação compreensiva, teleológica,entendendo que a referida causa faz parte da regra legal”

(Comentários..., 2003, v. 21, p. 334). Sua opinião é

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compartilhada por Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil...,2003, v. 7, p. 294). Como se nota, a questão não é pacíficana doutrina.

Na opinião dos presentes autores, parece ser mais ad-equada a interpretação restritiva. Não que deva ser tol-erada a relação ilícita do descendente com o companheiroou companheira de seu pai. Entretanto, o fato de inexistirprevisão legal deixou de fora tal hipótese de deserdação.Lembre-se que é nula a pena sem prévia cominação legal(nulla poena sine lege). Além disso, pode-se utilizar o ar-gumento de que a norma restritiva de direitos não admite

interpretação extensiva.

 IV – O desamparo pelo descendente do ascendenteem alienação mental ou grave enfermidade, bem como odesamparo pelo ascendente do filho ou neto com deficiên-cia mental ou grave enfermidade.

 A hipótese legal é curiosa. Se o ascendente estiver emalienação mental, falta-lhe discernimento para testar enulo será o seu testamento (art. 1.860 do CC). Portanto,torna-se inócua a previsão legal em um primeiro mo-mento. Entretanto, se a alienação mental for temporária,recuperando o ascendente as suas faculdades, poderá se valer de testamento para deserdar os descendentes, já que

o testamento é um ato personalíssimo.No mesmo sentido a deficiência mental do descend-

ente, pois se lhe reduzir o discernimento, não poderá test-ar validamente. Já a enfermidade grave pode ser de ordemfísica e não retirar o seu discernimento para testar.Imagine-se um pai acometido de câncer que, em estado

terminal, é abandonado por seu filho.

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segundo a ordem geral e normal das coisas;  c)  que, nassituações acima, apresente-se o titular aparente como sefosse o titular legítimo, ou o seu direito como se realmenteexistisse.

Por outra via, os requisitos subjetivos são:  a)   a in-cidência em erro de quem, de boa-fé, considere a men-cionada situação de fato como sendo uma situação dedireito; b) a escusabilidade desse erro apreciada segundo asituação pessoal de quem nele incorreu (RÁO, Vicente. Ato jurídico..., 1999, p. 243).

Quando decretada a exclusão do herdeiro, a sentença

produz efeitos retroativos (ex tunc) e, portanto, o herdeirofica excluído desde o momento da abertura da sucessão(RODRIGUES, Silvio.   Direito civil..., 2002, v. 7, p. 73; VELOSO, Zeno.   Novo Código Civil..., 2006, p. 1.514;DINIZ, Maria Helena.   Curso..., 2005, v. 6, p. 57,BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil..., 1955, v. VI, p. 40).

 Aliás, nem poderia ser diferente, pois a perda da con-dição de herdeiro não produz efeitos apenas com a sen-tença que a reconhece (efeitos ex nunc). Vale dizer que, seassim fosse, o herdeiro poderia se valer desse fato para ali-enar todos os bens recebidos e, quando da declaração daindignidade, não mais possuir patrimônio, escapando dapunição legal.

Entretanto, a análise da validade dos negócios jurídi-cos praticados pelo herdeiro aparente será feita à luz doprincípio da boa-fé. Trata-se da análise da   boa-fé sub- jetiva, ou seja, de um estado de consciência, em que o quese verifica é o conhecimento ou não de determinado fato.

Nesse sentido, Judith Martins-Costa explica que boa-

fé subjetiva denota estado de consciência, ou de um

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convencimento individual de obrar em conformidade aodireito. Esta se aplica no campo dos direitos reais e é sub- jetiva, pois se analisa a intenção do sujeito da relação jurídica. Já a boa-fé objetiva é modelo de conduta social, verdadeiro arquétipo,  standard   jurídico, segundo o qual

cada pessoa deve obrar como um homem com retidão,com probidade, lealdade e honestidade ( A boa-fé..., 1999,p. 411).

 A boa-fé subjetiva é chamada de boa-fé-crença, outambém de boa-fé em sentido psicológico e corresponde àGuten Glauben prevista no BGB (PASQUALOTTO. A boa-

 fé..., 1997, p. 111). É a consciência ou ausência desta diantede determinada situação jurídica. Como define MenezesCordeiro, a boa-fé subjetiva é uma qualidade reportada aosujeito, e a lei civil reconhece a locução inversa – má-fé – econsagra-a, associando-lhe efeitos diversos ( Da boa-fé...,2001, p. 407).

Especificamente com relação ao   herdeiro aparente,serão válidos os seguintes atos:

– Os atos onerosos de alienações realizados para ter-ceiros de boa-fé, ou seja, para aqueles que desconheciama indignidade do herdeiro.

Realmente, se estivermos diante de terceiros quecreem estarem comprando bens do herdeiro de fato, nãopoderiam eles ser prejudicados pela posterior declaraçãode indignidade, ainda que esta produza efeitos retroativos. A regra guarda relação com a disposição referente à fraudecontra credores, em que terceiros de boa-fé devem ter osnegócios jurídicos preservados (art. 159 do CC).

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Portanto, se antes de intentada a ação de exclusão oherdeiro aparente aliena o imóvel ao terceiro que descon-hece a indignidade, a venda será válida. Em sendo válida,surgem direitos do herdeiro real com relação ao aparente.No caso concreto, imagine-se que com a indignidade os

 bens do falecido passem a seu sobrinho, único parente naordem de vocação hereditária. O sobrinho, na qualidadede herdeiro real, poderá cobrar perdas e danos do her-deiro aparente indigno que vendeu o imóvel.

Reconhece Silvio Rodrigues que, pela lógica, tambéma alienação a terceiro de boa-fé seria nula, “pois é óbvio

que não pode dispor daquilo que não é seu. Nemo ad alli-um transferre potest quam ipse habet . Essa concepção,todavia, a despeito da lógica irretorquível, colide com oprincípio de maior interesse, ou seja, o de respeito à boa-fédos adquirentes que, inspirados em erro comum e in- vencível, acreditaram na condição de herdeiro do ex-cluído” ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 74). Como se nota, o

próprio jurista reconhece o equívoco do primeiroposicionamento.

– Os atos de administração legalmente praticados pelo herdeiro aparente.

Como há uma autorização legal para essa adminis-

tração, não há que se falar em qualquer nulidade ou an-ulabilidade do ato, desde que o mesmo não contenha os vícios regulares dos atos e negócios jurídicos (arts. 166,167 e 171 do CC).

Superado tal ponto, por outro lado, não serão válidos(nulidade absoluta) os seguintes atos praticados pelo her-

deiro aparente:

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– Os atos onerosos de alienações realizados para ter-ceiros de má-fé, ou seja, para aqueles que conheciam aindignidade do herdeiro e mesmo assim adquiriram benssabendo que não pertenciam realmente ao herdeiroaparente.

Se estivermos diante de terceiros que sabiam daaparência e mesmo assim celebraram negócios jurídicoscom o indigno, impõe-se a nulidade do negócio, pois a má-fé não pode ser protegida. É notório que a torpeza é repu-diada pelo ordenamento. Protege-se o herdeiro real emdetrimento do terceiro de má-fé. Nesse caso, a nulidade

está presente, pois o conteúdo do negócio é ilícito (art.166, II, do CC) e está presente a fraude à lei imperativa(art. 166, VI, do CC), uma vez que a lei enuncia que a her-ança será do herdeiro real, o que comporta análise caso acaso. Vale dizer, inclusive, que pode até estar configuradaa simulação em algumas hipóteses, o que também émotivo de nulidade absoluta (art. 167 do CC).

Então, se após intentada a ação de exclusão do in-digno, este aliena o imóvel a terceiro, há uma presunçãoabsoluta, e que não admite prova em sentido contrário(iure et de iure), de que a indignidade é conhecida e a venda, consequentemente, será nula. Em sendo nula,surgem direitos do herdeiro real contra o terceiro que agiu

de má-fé e que não pode ser beneficiado por sua torpeza.No caso concreto, imagine-se que, com a indignidade, os bens do falecido passem a seu sobrinho, único parente naordem de vocação hereditária. O sobrinho, na qualidadede herdeiro real, poderá nulificar a venda realizada ao ter-ceiro de má-fé, que poderá cobrar o que pagou do herdeiroaparente. Surge, com a declaração da nulidade, uma re-

lação entre o herdeiro aparente e o terceiro de má-fé.

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– Os atos gratuitos de alienações realizados para ter-ceiros, independentemente de sua boa ou má-fé, ou seja,será indiferente o fato de o terceiro conhecer ou não a in-dignidade do herdeiro de quem adquirira gratuitamenteos bens.

 A regra, mais uma vez, guarda relação, mas não iden-tidade, com a fraude contra credores, prevista entre osarts. 158 a 165 do CC. Isso porque quanto à fraude o negó-cio é meramente anulável (art. 178 do CC). Já as alien-ações praticadas pelo herdeiro aparente são nulas.

Nessa hipótese, temos de um lado um terceiro que

ganhou um bem, por meio de uma doação, que de fato nãopertencia ao herdeiro aparente, mas sim ao herdeiro real.De outro, o herdeiro real que teve um prejuízo com a ali-enação gratuita efetuada pelo herdeiro aparente.

O legislador fez uma escolha, pois entre conferir umlucro ao terceiro (qui certat de lucro captando) ou evitar

um prejuízo causado ao herdeiro real pela alienação gratu-ita efetivada pelo herdeiro aparente (qui certat de damnovitando), preferiu evitar o prejuízo a conceder o lucro. Emconclusão, a alienação gratuita é nula, sendo irrelevante a boa ou má-fé do terceiro. Mais uma vez, pode-se falar emfraude à lei imperativa (art. 166, VI, do CC), pois a lei de-termina que a herança será do herdeiro real.

Com a declaração de indignidade, os bens da herançadevem ser restituídos aos herdeiros reais. Tais bens sãochamados de   ereptícios, segundo a nossa doutrina dereferência (VELOSO, Zeno. Novo Código Civil..., 2006, p.1.514).

Da mesma forma, os frutos produzidos pelos bens

também deverão ser restituídos pelo excluído da sucessão,

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Em conclusão e encerrando o tratamento do tema, aoherdeiro indigno, na qualidade de possuidor de má-fé, de- vem ser aplicadas duas seguintes regras:

1.ª Regra – O herdeiro indigno responde pela perda, ou de-

terioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provarque de igual modo se teriam dado, estando ela na posse doherdeiro real (art. 1.218 do CC).

2.ª Regra – Só serão ressarcidas as benfeitorias necessáriase não lhe assiste o direito de retenção pela importânciadestas, nem o de levantar as voluptuárias (art. 1.220 doCC).

1.5.6 Do perdão ou remissão do indigno

Confrontando mais uma vez os institutos aqui estuda-dos, se com relação ao deserdado não há que se falar emperdão, com relação ao indigno o perdão é possível. Isso

porque a deserdação decorre da vontade do falecido e seinstrumentaliza por meio de testamento. Vislumbrando aregra, se o testador quiser perdoar o deserdado, basta quenão determine a sua deserdação; se já o deserdou, bastarevogar o testamento para que a deserdação não produzaos seus efeitos jurídicos.

Com relação ao indigno a situação é diferente. Como oreconhecimento da indignidade decorrerá de um procedi-mento judicial a ser proposto pelos interessados na su-cessão, o indigno pode ser perdoado pela pessoa contraquem praticou atos que conduziriam à indignidade. Aquele que incorreu em atos que determinem a exclusãoda herança será admitido a suceder, se o ofendido o tiver

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expressamente reabilitado em testamento, ou em outroato autêntico (art. 1.818 do CC).

Esse fenômeno é denominado   perdão, remissão   oureabilitação do indigno.   Não se admite no sistema brasileiro, como regra, o perdão tácito, mas apenas suamodalidade expressa, razão pela qual deve constar de test-amento ou outro ato autêntico. A exceção está presente noparágrafo único do art. 1.818 do Código Civil em vigor,pelo qual “não havendo reabilitação expressa, o indigno,contemplado em testamento do ofendido, quando o testa-dor, ao testar, já conhecia a causa da indignidade, pode su-

ceder no limite da disposição testamentária”.Sobre o testamento que reabilita o indigno, a lei não

exige forma e, portanto, pode o testador se valer de umadas formas ordinárias de testar (testamento público, cer-rado ou particular) ou mesmo das formas extraordinárias(testamento militar, marítimo ou aeronáutico). É import-ante ressaltar que também o codicilo é instrumento hábilpara conceder o perdão ao indigno, segundo ensinamSílvio de Salvo Venosa e Débora Gozzo (Comentários...,2004, p. 351).

 A locução “ato autêntico”, constante do caput  do art.1.818 do CC, segundo Zeno Veloso, “suscita ambiguidade eimprecisão”. Conclui o renomado professor que “o que o

art. 1.818 chamou de ato autêntico, sem dúvida, é a es-critura pública, e melhor seria se tivesse se utilizado da de-nominação própria e inequívoca” ( Novo Código Civil...,2006, p. 1.515).

Em razão do afirmado, explica Sílvio de Salvo Venosaque, mesmo “se o testamento caducar, tal não tira a eficá-

cia do perdão, pois que o testamento continua válido,

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Segundo a doutrina nacional, uma das característicasdo perdão é a sua irretratabilidade, “não mais se recon-hecendo aos coerdeiros legitimação para reabrir o debate”(DINIZ, Maria Helena.   Curso..., 2005, v. 6, p. 60;HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes.   Co-

mentários..., 2003, v. 20, p. 167). Realmente, se fosse re-tratável, a insegurança jurídica seria flagrante. Dessemodo, uma vez concedido, não terá o de cujus possibilid-ade de arrependimento. Nesse sentido, ainda que o testa-mento em que se concedeu o perdão seja revogado pelopróprio testador, o perdão terá produzido efeitos, nãosendo necessário que o novo testamento novamente men-cione o perdão já concedido anteriormente.

Sobre o perdão, afirma Giselda Maria FernandesNovaes Hironaka que este é sempre concedido  in totum,ou seja, na totalidade, pois “não se admite que o ofendidoperdoe seu ofensor em parte. Se mais de um tiverem sidoos atos ofensivos e o de cujus tiver liberado seu sucessor

de um ou alguns deles, permanecerá a possibilidade deque o ofensor seja excluído da sucessão” (Comentários...,2003, p. 166). A lição da mestra se aplica no tocante aoperdão expresso. Com relação ao perdão tácito, conformeserá visto a seguir, a situação é outra.

Isso porque inovou o Código Civil de 2002 ao permitir

o perdão tácito do indigno quando o testador, ao testar, jáconhecia a causa da indignidade, e contempla o indigno notestamento. Este poderá suceder apenas no limite da dis-posição testamentária, se não havia reabilitação expressado indigno, conforme o outrora comentado parágrafoúnico do art. 1.818.

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aqueles nomeados por ato de última vontade, seja ele umtestamento ou um codicilo.

Ocorrendo a morte de alguém, os bens da herança de- vem ser arrecadados e ficam sob a guarda e a adminis-tração de um curador até a sua entrega ao sucessor ou adeclaração de vacância (art. 1.819 do CC). Esse é o fenô-meno da   jacência da herança.   O conceito vem de Se- bastião Amorim e Euclides de Oliveira, no sentido de que“é aquela cujos sucessores não são conhecidos ou que nãofoi aceita pelas pessoas com direito à sucessão. A jacênciaconstitui-se em fase provisória e temporária, de expect-

ativa de surgimento de interessados na herança” ( In-ventários e partilhas..., 2006, p. 209).

Importante frisar que a jacência é provisória, pois ter-minará com a entrega da herança aos herdeiros ou com adeclaração de vacância. Em síntese, trata-se de uma situ-ação que logo findará.

Nesse ponto a jacência difere da vacância. Explica Se- bastião Amorim que “considera-se vacante a herança,quando, realizadas todas as diligências, inclusive com apublicação de editais, e passado um ano, não surgirempessoas sucessíveis, deferindo-se os bens arrecadados aoente público designado na lei” (Heranças jacente...,Questões..., 2005, v. 3, p. 361). Sobre a natureza jurídica

da herança jacente e da herança vacante, não se podeafirmar que se tratam de pessoas jurídicas, pois não têmpersonalidade jurídica. Há, apenas, um conjunto de bensarrecadados. Por isso é que se afirma tratar-se de  entesdespersonalizados.

 Além disso, pode-se dizer que, por opção do legis-

lador, a herança jacente e vacante não consta do elenco do

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art. 44 do Código Civil, se seguido o entendimento de queo rol constante desse dispositivo é taxativo (numerusclausus). Aqui, com a finalidade de justificar a existência ea capacidade de direito da pessoa jurídica, adota-se a teor-ia da realidade das instituições jurídicas (Hauriou), cha-

mada de   teoria institucionalista.  A personalidade derivado Direito, pois já se privaram seres humanos da person-alidade (v.g. os escravos, que eram considerados pelos ro-manos como   coisas). Derivando do Direito, é este quepode concedê-la a um grupamento de pessoas ou de bensque tenha por escopo a realização de interesses humanos.Então, a personalidade jurídica é um atributo que a ordem jurídica estatal outorga a entes que o merecem.

De qualquer forma, há quem entenda que o rol con-stante do art. 44 do CC não é taxativo, mas exemplificativo(numerus apertus), eis que o Código Civil de 2002 adotaum sistema aberto. Esse entendimento consta do Enun-ciado n. 144 CJF/STJ, aprovado na III Jornada de Direito

Civil , sendo compartilhado pelo coautor Flávio Tartuce.Mesmo sendo o rol do art. 44 do Código Civil aberto, opresente autor entende que a herança jacente e a vacantenão têm personalidade jurídica, pois os atributos materi-ais e formais da pessoa jurídica de Direito Privado não es-tão presentes.

Pois bem, em ambos os casos, na jacência e na vacância, trata-se de um complexo de relações jurídicasque serão transmitidas aos herdeiros – caso surjam – outransmitidas definitivamente ao ente público (hipótese de vacância).

 Apesar desse reconhecimento, é interessante frisar

que o Código de Processo Civil reconhece que as heranças

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 jacente e vacante poderão ser representadas em juízo ativaou passivamente por seu curador (art. 12, IV, do CPC).Mesmo assim, vale repetir que o entendimentodoutrinário majoritário aponta serem entes despersonaliz-ados, ou seja, são massas patrimoniais especiais que ten-

dem a desaparecer. Até esse seu desaparecimento, a leilhes concede capacidade processual ou uma  personalid-ade jurídica esdrúxula.  Para Sílvio de Salvo Venosa, háuma “entidade com personificação anômala” ( Direitocivil..., 2003, v. 7, p. 62).

Por fim observa Maria Helena Diniz que a herança ja-

cente não se confunde com o espólio “que designa a su-cessão aberta até a partilha dos bens, porque ambos os in-stitutos são entes despersonalizados. Todavia, diferementre si, pois no espólio os herdeiros legítimos ou testa-mentários são conhecidos, ao passo que na herança ja-cente se configura uma situação de fato em que ocorre aabertura da sucessão, porém não existe quem se intitule

herdeiro” (Curso..., 2005, v. 6, p. 88).

1.6.2 Do procedimento de jacência

O procedimento quanto à jacência se divide em trêsfases: fase de arrecadação dos bens, fase de publicação de

editais e fase de entrega dos bens.De início, falecendo alguém sem deixar testamento

nem herdeiro legítimo notoriamente conhecido, os bensda herança, depois de arrecadados, ficarão sob a guarda ea administração de um curador (art. 1.819 do CC e art.1.143 do CPC).

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O juiz da Comarca em que tiver domicílio o falecidoprocederá sem perda de tempo à arrecadação de todos osseus bens (art. 1.142 do CPC). Para tanto, comparecerá o juiz ao domicílio do falecido, acompanhado do escrivão,que lavrará de tudo termo circunstanciado. Eventual-

mente, deverá estar acompanhado do curador já nomeado,ou de um depositário que se responsabilizará pelo espólio,até que o juiz nomeie um curador de sua confiança (art.1.145, § 1.º, do CC). Em casos tais, os bens devem ser en-tregues ao curador, somente sendo entregues a um depos-itário se não houver curador nomeado.

Em casos excepcionais, quando o juiz, por motivo jus-tificado, não puder comparecer, poderá requer que aautoridade judicial proceda à arrecadação que por eledeveria ser presidida (art. 1.148 do CPC). Nessas hipótesesexcepcionais, duas testemunhas assistirão às diligências e,havendo necessidade de apor selos, estes só poderão serabertos pelo juiz (art. 1.148, parágrafo único, do CPC).

O órgão do Ministério Público e o representante daFazenda Pública serão intimados a assistir à arrecadação,que se realizará, porém, estejam eles presentes ou não(art. 1.145, § 2.º, do CPC). Como se percebe, a participaçãodesses entes não é obrigatória, mas apenas facultativa.

 A arrecadação, ensina Sílvio de Salvo Venosa, “é um

procedimento cautelar: os bens são arrecadados paraevitar uma dilapidação por terceiros oportunistas, em proldos futuros herdeiros a serem encontrados ou, em últimaanálise o Estado, que também é herdeiro” ( Direito civil...,2003, v. 7, p. 64). Filiamo-nos a esse entendimento, deque se trata de um procedimento de cautela, apesar de,

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pelo Código Civil de 2002, não podermos considerar oEstado herdeiro.

Não determina a lei quem seja o curador a sernomeado, mas Sebastião Amorim e Euclides de Oliveiraafirmam que o “curador deve ser criteriosamente escol-hido, entre pessoas que mereçam a confiança do juiz, eque tenham recursos para se dedicar com desprendi-mento, capacidade e organização à administração eficientedos bens até que recebam destinação legal. Conforme sejaa entidade beneficiária, por normal destinação dos bensarrecadados em herança jacente (desde que convertida em

 vacante), bom é que se nomeie curador dentre elementoshabilitados daquela própria instituição (no Estado de SãoPaulo há provimento dispondo nesse sentido)” ( Inventári-os e partilhas..., 2006, p. 214).

 Apesar dessa falta de previsão quanto à pessoa, oCódigo de Processo Civil, em seu art. 1.144, detalha as fun-ções do curador, quais sejam:

I – representar a herança em juízo ou fora dele, com as-sistência do órgão do Ministério Público;

II – ter em boa guarda e conservação os bens arrecadados epromover a arrecadação de outros porventura existentes;

III – executar as medidas conservatórias dos direitos da

herança;IV – apresentar mensalmente ao juiz um balancete da re-

ceita e da despesa; e

 V – prestar contas ao final de sua gestão.

Dessas atribuições percebe-se que o curador pode de-

fender a posse dos bens por meio das ações possessórias;

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pode interromper a prescrição de dívidas cujo falecido eracredor; pode propor demandas judiciais tais como a co- brança de aluguéis de inquilinos de bem que componha aherança jacente; pode contratar funcionários para a ma-nutenção dos bens, ou seja, pode praticar todos os atos ne-

cessários à conservação dos bens e que evitem o seuperecimento.

 A função do curador não é gratuita. Explica GiseldaMaria Fernandes Novaes Hironaka que “o curador faz jusà remuneração fixada pelo magistrado que preside o pro-cesso, que levará em conta, para tal fixação, o tempo de

serviço estimado, as dificuldades para a sua execução, omontante dos bens, além de sua situação, cabendo, quantoa isso, lembrar que os bens situados em comarcas diversasserão arrecadados por carta precatória mandada expedirpelo juiz processante (CPC, art. 1.149)” (Comentários...,2003, v. 20, p. 173).

O que se nota é que o objetivo da arrecadação será aconservação dos bens para a sua entrega aos eventuaisherdeiros. Exatamente por isso, deve o juiz, durante a ar-recadação, inquirir os moradores da casa e da vizinhançasobre a qualificação do falecido, o paradeiro de seus su-cessores e a existência de outros bens, lavrando-se de tudoum auto de inquirição e informação (art. 1.150 do CPC).

Com essas informações, poderá o juiz localizar todos os bens do falecido para a sua adequada conservação pelocurador.

Sem prejuízo de tudo isso, caberá ao juiz, no ato de ar-recadação, examinar reservadamente os papéis, as cartasmissivas e os livros domésticos. Verificando que não ap-

resentam interesse, mandará empacotá-los e lacrá-los

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para serem assim entregues aos sucessores do falecido, ouqueimados quando os bens forem declarados vacantes(art. 1.147 do CPC).

 Aqui, surge uma dúvida: qual seria o interesse que osdocumentos poderiam apresentar? Parece que interessamao juiz os documentos que permitem a identificação deeventuais herdeiros, sua qualificação e até a sua localiza-ção. Podemos aqui citar um envelope com o nome de umsobrinho, um cartão postal com notícias de um irmão oumesmo um telegrama com notícias de um filho que moraem outra localidade. Também interessam documentos re-

lativos aos bens do falecido: sua declaração de renda, osextratos bancários, escrituras de bens imóveis, dados deum cofre bancário e assim por diante.

O exame deve ser feito de maneira reservada, comoforma de respeito à intimidade do morto, não havendorazão para o juiz devassá-la a terceiros. Nesse sentido,pode-se aqui citar as previsões segundo as quais a vidaprivada da pessoa natural é inviolável (art. 21 do CC e art.5.º, X, da CF/1988). A preocupação legal com o sigilo e aintimidade do falecido prossegue quando o Código de Pro-cesso Civil determina que os documentos e missivas de- vem ser empacotados e lacrados para sua entrega aos su-cessores (art. 1.147 do CPC). Como se pode perceber, os

direitos da personalidade produzem efeitos post mortem,mesmo quando a   personalidade jurídica material   nãomais existe. Pode-se afirmar, nesse sentido, que os direitosda personalidade do morto, a sua personalidade jurídica formal , permanecem após o falecimento, o que pode serretirado da análise dos arts. 12, parágrafo único, e 20,parágrafo único, ambos da atual codificação privada.

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 A prova de que a arrecadação visa a resguardar os in-teresses de eventuais herdeiros pode ser evidenciadaporque não se fará a arrecadação, ou suspender-se-á estaquando iniciada, se o cônjuge, o herdeiro ou o testamen-teiro notoriamente reconhecido se apresentar para re-

clamar os bens e não houver oposição motivada docurador, de qualquer interessado, do órgão do MinistérioPúblico ou do representante da Fazenda Pública (art. 1.151do CPC). Imagine-se o caso prático da esposa que apóstrinta dias de viagem retorna a casa e encontra o juiz ar-recadando os bens em virtude do falecimento de seu mar-ido no período. Nesse caso descrito, não há razão para seprosseguir a arrecadação, pois existe um herdeiro que teráo encargo de conservar os bens.

Pois bem, cabe ao curador apresentar um inventário,ou seja, uma lista com os bens do falecido e a suadescrição. Praticadas as diligências de arrecadação e ul-timado o inventário, serão expedidos editais na forma da

lei processual (art. 1.820 do CC). Como formalidades es-senciais, devem ocorrer três publicações dos editais no ór-gão oficial (na imprensa oficial) e na imprensa dacomarca. A imprensa será a da comarca em que tramita adeclaração de jacência, ou seja, a do domicílio do falecido(art. 1.142 do CPC). Os prazos para a publicação de editais

estão previstos no art. 1.152 do CPC e são os seguintes:– a primeira publicação – logo após a arrecadação;

– a segunda publicação – 30 dias após a primeirapublicação;

– a terceira publicação – 30 dias após a segunda ou 60 diasapós a primeira publicação.

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Essa é a interpretação do art. 1.152 do CPC que enten-demos ser a mais adequada. Seguimos, nesse ponto, as pa-lavras de Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., 2003, v. 7,p. 66), Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira ( In-ventários e partilhas..., 2006, p. 215), todos magistrados.

Mas, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, emsentido diferente, entende que serão quatro as publicaçõesdo edital, sendo a primeira quando da arrecadação, a se-gunda 30 dias depois desta, a terceira 60 dias após a ar-recadação e, finalmente, a quarta 90 dias após a primeirapublicação (Comentários..., 2003, v. 20, p. 174). O que se

percebe é que a questão não é tão pacífica assim nadoutrina.

Terá o herdeiro prazo para se habilitar de seis meses,contados da publicação do primeiro edital. A habilitaçãose faz em autos em apenso ao da arrecadação de bens,sendo que, se julgada procedente a habilitação do her-deiro, reconhecida a qualidade do testamenteiro ouprovada a identidade do cônjuge, a arrecadação converter-se-á em inventário (art. 1.153 do CPC). Nesses casos, de- vem ser ouvidos na habilitação o membro do MinistérioPúblico e o curador da herança jacente.

Quem pode pleitear a habilitação? A resposta é:qualquer herdeiro legítimo, seja ele necessário ou facultat-

ivo, bem como os nomeados por testamento ou codicilo.É pertinente notar que é possível que o herdeiro se ha-

 bilite mesmo decorridos os seis meses previstos no Códigode Processo Civil, sendo que o descumprimento do prazonão lhe traz uma sanção. Isso se comprova pelo fato deque o parágrafo único do art. 1.822 do Código Civil expres-

samente afirma que os parentes colaterais só estão

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excluídos da sucessão se não se   habilitarem   até a de-claração de vacância. Não afirma o Código Civil se “não pleitearem a herança”, mas se utiliza expressamente do vocábulo “habilitar”. Portanto...

Explica José Luiz Gavião de Almeida que, apesar doexpresso afastamento dos colaterais, os demais herdeiros,sejam parentes em linha reta, o cônjuge ou o compan-heiro, conservam o direito de requerer a habilitação, até adeclaração de vacância (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p.183). Em sentido contrário, Giselda Maria FernandesNovaes Hironaka entende que até seis meses contados da

publicação do primeiro edital, podem os herdeiros se valerda habilitação. Mas, “terminado o prazo, os eventuais her-deiros não poderão mais requerer o reconhecimento deseus direitos sucessórios mediante processo de habilit-ação, podendo fazê-lo, entretanto, por meio de ação diretaproposta nas varas especializadas, e não mais no juízoonde se processou a sucessão. A essa solução se chega me-

diante recurso à analogia, com os casos de herdeiros que busquem ter reconhecida sua qualidade, depois de teremsido declarados vagos os bens (CPC, art. 1.158). É que a leisilencia quanto aos herdeiros que busquem tal reconheci-mento no lapso temporal de seis meses compreendidoentre o termo final do prazo de habilitação e a declaração

de vacância. Tal lapso temporal destina-se ao julgamentode seu pedido antes da declaração de vacância”(Comentários..., 2003, v. 20, p. 186).

 A questão é controversa. Razão parece ter a doutrinaque afirma que a habilitação pode ocorrer até a declaraçãode vacância. Após tal declaração, os colaterais ficam ex-cluídos da sucessão e os demais herdeiros, legítimos ou

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primeiro caso para a integralização, e no segundo, para aremição da hipoteca (art. 1.155, parágrafo único, do CPC).

Já os bens com valor de afeição, como retratos, obje-tos de uso pessoal, livros e obras de arte só serão alienadosdepois de declarada a vacância da herança (art. 1.156 doCPC). A regra tem lógica, eis que bens de valor sentiment-al podem representar muito ao herdeiro que eventual-mente apareça e se habilite. Nada justifica a venda das fo-tografias da lua de mel do falecido, do quadro que foipresente dos filhos quando das bodas de ouro do casal, ouda aliança de diamantes que pertencia à falecida.

 A segunda regra a ser comentada é que os credores daherança podem se habilitar como nos inventários ou pro-por a ação de cobrança (art. 1.154 do CPC). Nesse caso,cabe ao curador providenciar a defesa da herança jacente,contratar advogados e impugnar a habilitação incorreta oucontestar a ação direta de cobrança. O direito dos credoresse limita às forças da herança (art. 1.820 do CC). Isso sig-nifica que as dívidas são arcadas pela herança jacente epelos bens que a compõem, não sendo de responsabilidadepessoal de eventuais herdeiros que se habilitem ou doEstado que a receba na condição de herança declarada vacante.

Por óbvio, não poderia ser diferente. Se no sistema

 brasileiro poderá o credor do herdeiro aceitar a herançaquando este a recusar, sendo possível também aos cre-dores habilitar seus créditos no inventário, da mesmaforma poderão se habilitar junto à herança jacente.

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1.6.3 Da declaração de vacância

 A lei consagra duas situações diversas em que se dec-retará a vacância da herança.

 A primeira delas ocorre quando todos os chamados a

suceder renunciarem à herança (art. 1.823 do CC). Emcaso de renúncia de todos os herdeiros, desnecessária ser-ia a publicação de editais e todos os demais trâmites legaisexigidos durante o período de vacância. Com a renúncia detodos os herdeiros, sejam eles legítimos ou testamentários,a vacância se decreta de imediato, encerrando a jacência.

Se a jacência é fase preliminar à vacância, ocorrendo arenúncia dispensa-se a fase preliminar. Trata-se de umavacância sumária, nas palavras de Giselda MariaFernandes Novaes Hironaka (Comentários..., 2003, v. 20,p. 192).

O segundo caso está presente quando, após praticadastodas as diligências de arrecadação e ultimado o in- ventário, forem expedidos os editais. Decorrido um ano daprimeira publicação dos editais, sem que haja herdeiro ha- bilitado – quer porque não apareceu, quer porque apare-ceu, mas suas habilitações foram julgadas improcedentes–, ou sem que penda habilitação, haverá a declaração de vacância (art. 1.820 do CC e art. 1.157 do CPC). Note-se

que o fato de não ocorrer habilitação no prazo de seismeses previsto no art. 1.152 do CPC não permite a de-claração de vacância, senão antes de decorridos outros seismeses.

Realmente, o prazo inicial de seis meses não se revelaútil, pois não é dotado de sanção. Isso em nossa opinião,ainda que discordemos da mestra Giselda Maria

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(art. 1.822 do CC). Deve-se frisar que, atualmente, não ex-istem mais Territórios federais, pois depois da Constitu-ição Federal de 1988 estes foram extintos, uma vez queRoraima e Rondônia se tornaram Estados.

 Vale também dizer que a Lei 8.049, de 20 de junho de1990, já havia instituído o Município (ou Distrito Federal)como destinatário da herança vacante, em detrimento doEstado e da União. Em razão da lei em questão, percebe-seque foi revogada a disposição do art. 1.143 do Código deProcesso Civil, que determinava que a herança seria incor-porada ao domínio da União, do Estado ou do Distrito

Federal.No Estado de São Paulo, antes da vigência da Lei

8.049/1990, os bens lá situados eram entregues apenas àUniversidade de São Paulo (Decreto 27.219-A/1957) e, apartir de 1985 (Decreto estadual 23.296, de 1.º de marçode 1895) os bens caberiam à USP, à UNESP ou àUNICAMP, conforme suas áreas de influência (AMORIM,Sebastião e OLIVEIRA, Euclides de.  Inventários e partil-has..., 2006, p. 221). Entretanto, com a alteração legis-lativa de 1990, ocorreu a revogação dos decretos emquestão e os bens passaram a pertencer ao Município.

Por fim, superada a questão a respeito de qual entepúblico recebe os bens da herança vacante, cabe salientar

que até que se complete o período de cinco anos, o entepúblico tem a propriedade resolúvel dos bens. Issoporque, se os herdeiros pleitearem por ação própria e quedeverá ser movida nas varas especializadas – se contra oMunicípio ou Distrito Federal nas varas da FazendaPública, se houver, e se contra a União, nas varas da

Justiça Federal, se houver –, perdem a União, os

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problemas. O primeiro diz respeito à mudança do entepúblico beneficiado pelos bens da herança vacante.

Explicam Sebastião Amorim e Euclides de Oliveiraque, para as sucessões abertas antes de 20 de junho de1990, “ainda que a sentença declaratória de vacância sejaproferida depois, competem os bens ao Estado, uma vezque a capacidade para suceder é a do tempo da aberturada sucessão, regulando-se conforme a lei então em vigor”( Inventários e partilhas..., 2006, p. 219). Por outro lado,para as sucessões abertas após tal data, os bens pertencer-ão aos Municípios, Distrito Federal ou União.

Todavia, Sebastião Amorim frisa que a questão épolêmica. Em artigo sobre o tema, explica que há duascorrentes diferentes sobre a natureza jurídica da sentençade vacância: uma que entende ser declaratória e a outraconstitutiva: “no primeiro caso, aplicado o preceito da sae-sina juris, considera-se a transmissão da data do óbito doautor da herança. Então, a sentença declaratória de vacân-cia teria efeitos   ex nunc, propiciando a adjudicação de bens ao Estado, em face da norma legal que vigia na época(...). Há entendimento contrário, no sentido de que sendoo óbito anterior à Lei Federal 8.049, de 20 de junho de1990, e considerando-se como constitutiva de direito aposterior sentença de vacância, competiriam os bens ao

novo ente público beneficiário, isto é ao Município” (Her-anças jacente..., Questões..., 2005, v. 3, p. 370).

 A base jurídica da segunda tese é que é indispensável adeclaração de vacância para que o bem se incorpore aopatrimônio do ente público, pois, antes disso, há apenasuma expectativa de direito, já que se aguarda a habilitação

de um eventual herdeiro. Conclui Sebastião Amorim que

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tal tese é vitoriosa no Superior Tribunal de Justiça, mor-mente nas 3.ª e 4.ª Turmas em que se pacificou o entendi-mento (Heranças jacente...,   Questões..., 2005, v. 3, p.370). Assim, esse é o entendimento que deve ser tidocomo majoritário.

Entretanto, não podemos deixar de manifestar nossadiscordância. A lei que rege a sucessão é aquela do mo-mento de sua abertura. O momento em que a herança foiincorporada nos parece irrelevante, pois deve-se verificarqual ente público estava legitimado a receber os bensquando do falecimento do de cujus. As palavras do Minis-

tro Ruy Rosado de Aguiar, em seu voto constante do REsp61.885/SP, nos parecem perfeitas: “se ao tempo da su-cessão, a lei vigente atribuía ao Estado os bens da herança jacente, a ele deverão ser transferidos, ainda que a trans-missão do domínio tenha ocorrido quando em vigor a Lei8.049/1990, que atribui ao Município a herança jacente”.

Nesse sentido igualmente é a lição de Flávio Monteirode Barros: “a sentença de vacância é meramente declar-atória, de modo que a transmissão da propriedade operou-se, por força do princípio da  saisine, com a abertura dasucessão, destinando-se, portanto, a herança vacante àsfundações universitárias” ( Manual ..., 2004, v. 4, p. 196).

O segundo problema decorrente da natureza jurídica

da sentença de vacância é a verificação da possibilidade ounão de usucapião dos bens que compõem a herança jacente.

Também aqui duas são as correntes que se formam,como resume de maneira clara Flávio Monteiro de Barros“para uns, é possível usucapião de herança jacente se o

usucapiente completar o prazo de usucapião antes da

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sentença de vacância. Argumenta-se que essa sentença de vacância é constitutiva, funcionando como o fato geradorda transmissão da propriedade ao Município (...). Os ad-eptos desse ponto de vista acrescentam, ainda, que oprincípio da saisine não é aplicável ao Município na me-

dida em que este não é herdeiro, mas mero destinatário daherança. Outros sustentam a tese da inadmissibilidade dausucapião. Argumentam que o Município, por força doprincípio da   saisine, adquire a propriedade da herançadesde o momento da abertura da sucessão” ( Manual ...,2004, v. 4, p. 196).

Sebastião Amorim lembra o julgamento da ApelaçãoCível 69.391 pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, naqual se discutiu o tema, sendo que o acórdão foi objeto deação rescisória (115.824-1). Nesta última, houve séria di- vergência e, por maioria de votos, decidiu-se que “só apósa declaração de vacância da herança que ocorre cinco anosapós a abertura da sucessão, é que os bens passam ao

domínio do Estado”. Mas, pelos votos vencidos, “em apoioà tese da saesina juris, que a passagem ou incorporaçãodefinitiva ao domínio público, previstos no art. 1.594, CC/1916 (art. 1.822 do novo CC) são fatos subsequentes àtransmissão, e à posse da herança que se dá, desde logo aabertura da sucessão, aos herdeiros – art. 1.572, CC/1916

(art. 1.784 do novo CC)”.Se adotarmos a teoria da natureza constitutiva, apenascom a declaração de vacância o bem se torna público e in-suscetível de usucapião. Assim, se o prazo se iniciou e con-cluiu antes da declaração, o bem pode ser usucapido porqualquer pessoa. Porém, se o prazo não se ultimou e a vacância for declarada, o bem passa a ser inalienável e não

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pode mais ser objeto de usucapião, estando presente aimprescritibilidade.

Por outro caminho, se adotarmos a natureza mera-mente declaratória da sentença, com a morte o bem pas-sou ao domínio do Poder Público, sendo impossível a usu-capião, salvo se, antes da morte, o prazo já havia se es-gotado. Flávio Monteiro de Barros adota a segunda teoriae afirma que “a tese de que a sentença de vacância é con-stitutiva consagra a teoria de que a herança jacente é umpatrimônio sem sujeito, contradizendo as noções mais cer-tas acerca da natureza do direito” ( Manual ..., 2004, v. 4,

p. 196). Apoia a ideia de natureza constitutiva Giselda Maria

Fernandes Novaes Hironaka, ao afirmar que “o Estado,como se viu, não adquire os bens do acervo no momentoda morte do autor da herança. A lei, buscando privilegiaros herdeiros ignorados, garante-lhes o prazo para que ven-ham requerer o reconhecimento de sua condição de her-deiro. Disso se afirma que o Estado não é herdeiro”. E con-clui a professora explicando que “apenas herda porque oEstado é a personificação da comunidade em que o  decujus viveu, havendo um afeto presumido do morto, se in-existentes parentes sucessíveis” (Comentários..., 2003, p.191). Gustavo Rene Nicolau, com base nas lições de Nelson

Nery Junior, também se filia à natureza constitutiva( Direito civil..., 2005, v. 9, p. 55).

Como somos adeptos da teoria declaratória, somentepoderão ser usucapidos os bens que compõem a herança jacente se o prazo estiver preenchido antes da abertura dasucessão. Nessa hipótese, o direito do usucapiente já se in-

corporou ao seu patrimônio antes mesmo de o bem se

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tornar público e, consequentemente, insuscetível de serusucapido.

 Após esse   fogo cruzado   da doutrina, encerra-se oestudo da herança jacente e vacante e passa-se ao estudoda petição de herança.

1.7 DA PETIÇÃO DE HERANÇA 

O Código Civil de 1916 não continha regras referentesà petição de herança, apesar de a matéria ter sido cuida-

dosamente estudada pela doutrina. Giselda MariaFernandes Novaes Hironaka define a ação de petição deherança como a “pretensão deduzida em juízo pelo her-deiro preterido, no sentido de lhe ser deferida quer aquota-parte que lhe caberia, quer, ainda, a totalidade daherança, reconhecendo-se, em todo caso, a qualidade deherdeiro que lhe é natural” (Comentários..., 2003, v. 20,p. 193). É a chamada  petitio hereditatis. No Código Civilde 2002, a matéria está tratada nos arts. 1.824 a 1.828.

Imagine-se o caso de um filho não reconhecido porseu pai e que, após a morte deste, obtém decisão judicialfavorável e definitiva que o declara filho. Com a morte dopai, os bens podem ter sido distribuídos entre os demais

filhos, hipótese em que este novo herdeiro necessário terádireito a apenas parte do patrimônio de seu pai.

Por outro lado, imagine-se que ocorra o rompimentodo testamento. Se o testador deixou todos os bens a umsobrinho, na ignorância da existência desse filho, o testa-mento estará rompido, e o filho terá direito a todos os

 bens do falecido.

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O que se pode concluir é que o objetivo da petição deherança é duplo. O primeiro deles é a declaração do direitosucessório do herdeiro. O segundo objetivo é a con-denação na restituição dos bens ou da quota que lhe per-tence (art. 1.824 do CC). No campo prático, percebe-se que

pode o filho não reconhecido do falecido pleitear na in- vestigatória de paternidade todos os bens a que teriadireito na condição de herdeiro necessário, por meio dapetição de herança.

 A ação, indiscutivelmente, é de natureza real, pois, porforça do art. 80, II, do Código Civil, a sucessão aberta con-

stitui um bem imóvel (ALVES, Jones Figueirêdo;DELGADO, Mário Luiz.   Código Civil..., 2005, p. 936). Ainda quanto à ação, explica Zeno Veloso que “o réu é apessoa que não tem título legítimo de herdeiro e, não ob-stante, possui bens da herança total ou parcialmente (...)ou seja, no polo passivo desta ação está o falso herdeiro,ou o que possui a herança, ou parte dela, sem título al-

gum” ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.521). Disso se per-cebe que poderá ser réu o indigno declarado por sentença,ou mesmo o herdeiro aparente, no caso de rompimento dotestamento, bem como o herdeiro testamentário cujo test-amento foi anulado.

Deve-se frisar que a ação de petição não se confunde

com a reivindicatória, apesar de ambas terem naturezareal. Luciano Vianna Araújo esclarece que “na ação depetição de herança o autor pede o reconhecimento de suaqualidade de herdeiro e, sucessivamente, a restituição daherança, no todo ou em parte. Na ação reivindicatória,sem discutir a condição de herdeiro, o autor pretende arestituição do acervo hereditário que se encontra na posse

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reivindicatória” (apud   Novo Código Civil..., 2006, p.1.521).

Essa é a corrente majoritária à qual nos filiamos, mashá divergências.

Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, por exem-plo, entende que a petição de herança pode ser requeridacontra quaisquer terceiros que possuam os bens, sejameles herdeiros ou não, por força da parte final do art. 1.824do CC, que assim dispõe: “contra quem, na qualidade deherdeiro, ou mesmo sem título, a possua”.

Encerrando o estudo do tema, completamos a diferen-ciação com a observação de Luciano Vianna Araújo: “napetição de herança pleiteia-se uma universalidade (a her-ança ou parte dela) enquanto na ação reivindicatória sepretende bem (bens) específico(s). Por isso, não há a ne-cessidade de se individualizar, na inicial, da ação depetição de herança, cada um dos bens que se encontram

na posse do réu. Julgado procedente o pedido, o de-mandado deve restituir todos os bens do acervo hered-itário. Ao contrário, na ação reivindicatória, faz-se ne-cessária a correta e precisa individualização dos bens ob- jeto do pedido (art. 286 do CPC)” (A petição de herança...,Questões..., 2003, v. 1, p. 467).

O prazo para a propositura da demanda de petição deherança é questão das mais controvertidas.

Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka afirma cat-egoricamente que “a petição de herança não prescreve. A ação é imprescritível, podendo, por isso, ser intentada aqualquer tempo. Isso sim se passa porque a qualidade deherdeiro não se perde (semel heres, semper heres)”

(Comentários..., 2003, v. 20, p. 196). Jones Figueirêdo

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 Alves e Mário Luiz Delgado compilam a lição de OrlandoGomes no mesmo sentido, com a ressalva de que o her-deiro aparente poderá usucapir os bens recebidos, na con- vicção de que lhe pertenciam (Código Civil..., 2005, p.937). Realmente, essa foi a solução do legislador por-

tuguês: “Art. 2.075. 1. O herdeiro pode pedir judicialmenteo reconhecimento da sua qualidade sucessória, e a con-sequente restituição de todos os bens da herança ou departe deles, contra quem os possua como herdeiro, ou poroutro título, ou mesmo sem título. 2. A acção pode ser in-tentada a todo o tempo, sem prejuízo da aplicação das re-gras da usucapião relativamente a cada uma das coisaspossuídas, e do disposto no art. 2.059”. Zeno Veloso re-lembra que o anteprojeto revisto de 1972 continha dis-posição semelhante “A petição de herança é imprescritível,ressalvadas as regras sobre a usucapião relativamente acada um dos bens singulares do acervo”. Mas a Comissãoque elaborou o anteprojeto mudou a orientação ( Novo

Código Civil..., 2006, p. 1.521). Esse é igualmente o en-tendimento de Flávio Tartuce, que entende haver umcaráter predominantemente declaratório na ação depetição de herança, envolvendo ainda o direito funda-mental à herança, previsto no art. 5.º, XXX, da CF/1988.

Entretanto, José Fernando Simão entende não ser esta

a melhor solução ao problema, pois a petição de herança éação com conteúdo condenatório evidente. Sendo dotadade pedido de dar – entrega dos bens que compõem oacervo hereditário –, existe uma   pretensão, que se ex-tingue pela prescrição (art. 189 do CC). Em outraspalavras, pode-se dizer que pretensão é a possibilidadeconferida ao credor, autor da ação de petição de herança,

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de exigir do devedor, réu da ação, o cumprimento daprestação (entrega dos bens).

Seguindo essa lógica, o Supremo Tribunal Federal ed-itou a Súmula 149 com a seguinte regra: “É imprescritívela ação de investigação de paternidade, mas não o é a depetição de herança”. Com isso Caio Mário da Silva Pereiraafirmava que o herdeiro não teria “mais direito à herançadepois de decorridos 20 anos da abertura da sucessão(petição de herança)” ( Instituições..., 1997, v. 6, p. 55).

O prazo invocado pelo professor era o maior prazoprevisto no revogado Código Civil, aquele que estava no

caput   do art. 177 do CC/1976. Os julgados da épocaajudam a esclarecer a questão:

“Quanto à nulidade pleiteada pelo herdeiro que não inter- veio na partilha, não pairava dúvida quanto a seu prazo pre-scricional de 20 anos, o mesmo que o da ação de petição deherança, de que é inseparável. A respeito dessa interde-

pendência, ponderou o v. Acórdão proferido pelo STF pub-licado na RTJ  52/193: ‘Partilha. Nulidade. O julgamento daprocedência da petição de herança importa a nulidade dapartilha’” (TJRJ, 6.ª Câmara Cível, Apelação Cível 9.047,Rel. Des. Basileu Ribeiro Filho, j. 30.08.1979, RT  543/211).

“Partilha. Nulidade. Herdeiro necessário excluído. Art.1.030 do CPC. Para anular a partilha, os herdeiros dela ex-

cluídos, que não participaram do inventário, devem utilizar-se da ação de nulidade ou petição de herança vintenária enão da rescisória” (STF, RE 93.700, Rel. Min. Rafael Mayer,

 DJU  22.10.1982, RT  567/235).

“O pai da autora faleceu em 29.12.1977, tendo sido re-querido o inventário em 11.01.1978 e julgada a partilha em06.12.1979. A ação de investigação de paternidade foi ajuiz-

ada em 03.04.1978 e reconhecida a paternidade em

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18.09.1981. Em 19.03.1983 promoveu-se a ação postulandoa invalidade da partilha e a consequente inclusão da autorapara fins de recebimento de seu quinhão hereditário. (...) A autora, não tendo participado do inventário, não foi al-cançada pela sentença. Assim, a ação que deveria manejar éa anulatória como o fez e não a rescisória” (TJMG, ApelaçãoCível 72.690, Rel. Des. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j.14.04.1988, RT  631/199).

Como se verifica, reconhecida a qualidade de herdeiro,as decisões consideravam o prazo para a petição de her-ança, coincidente com o da anulação da partilha, como

sendo de 20 anos, nos termos do caput  do art. 177 do CC/1916.

 Assim, para Zeno Veloso o prazo agora seria de dezanos (art. 205 do CC). Em idêntico sentido, Sílvio de Salvo Venosa afirma que “o prazo extintivo para essa ação inicia-se com a abertura da sucessão e, no novo sistema é de 10anos, prazo máximo permitido no ordenamento. No sis-tema de 1916, o prazo era de 20 anos (Súmula 149 doSTF)” ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 349). Também Se- bastião Amorim e Euclides de Oliveira seguem idênticaorientação, frisando que o prazo se inicia com a aberturada sucessão, “salvo se o herdeiro é menor impúbere, hav-endo que se aguardar o atingimento de sua capacidade re-

lativa” ( Inventários e partilhas..., 2006, p. 324).Como foi dito, José Fernando Simão concorda com

essa última doutrina majoritária citada. Em se tratando depretensão, estará realmente sujeita ao prazo prescricionalde dez anos previsto no art. 205 do Código Civil. Para essacorrente, a imprescritibilidade não se coaduna com apetição de herança em razão de seu caráter eminente-mente patrimonial e por envolver uma prestação de dar.

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Esse último entendimento também deve ser adotado naprática do Direito das Sucessões, pois consubstanciado emsúmula do Supremo Tribunal Federal confirmada peladoutrina.

Conforme salientado em capítulo próprio, a herança éum todo uno e indivisível, aplicando-se as regras relativasao condomínio até que ocorra a partilha (art. 1.791 do CC). Assim sendo, a ação de petição de herança, ainda que ex-ercida por um só dos herdeiros, poderá compreender to-dos os bens hereditários (art. 1.825 do CC). É semelhanteà regra presente no condomínio, pela qual qualquer um

dos condôminos tem direito de defender a coisa como umtodo, mesmo sendo titular de apenas parte dela. Peranteterceiros, que não os demais condôminos (no caso, coer-deiros), cada herdeiro age como se fosse proprietário ex-clusivo do todo.

Nesses exatos termos, determina o art. 1.314 doCódigo Civil em vigor que cada condômino pode usar dacoisa conforme a sua destinação, sobre ela exercer todosos direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la deterceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parteideal, ou gravá-la. Bem ponderada a observação deEduardo de Oliveira Leite de que “uma coisa é a relação decotitularidade entre os diferentes coerdeiros; e outra a re-

lação singular de cada um deles com terceiros possuid-ores, ou meros detentores dos bens hereditários, em que alide confere legitimidade, através da petição de herança,para cada um deles agir em nome ou no interesse de todosos demais” (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 201).

Duas dúvidas podem surgir: a ação de petição de her-

ança inclui os frutos produzidos pelo bem que compõe o

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acervo hereditário demandado? Haverá direito de indeniz-ação pelas benfeitorias realizadas no bem?

 A resposta das questões se dá de acordo com a boa oumá-fé do herdeiro que se encontra na posse dos bens daherança, o que pode ser retirado do art. 1.826 do CC, peloqual: “O possuidor da herança está obrigado à restituiçãodos bens do acervo, fixando-se-lhe a responsabilidade se-gundo a sua posse, observado o disposto nos arts. 1.214 a1.222. Parágrafo único. A partir da citação, a responsabil-idade do possuidor se há de aferir pelas regras con-cernentes à posse de má-fé e à mora”.

 A título de exemplo, se o sobrinho do falecido estavana posse dos bens que recebera por testamento, acredit-ando ser o único herdeiro e, posteriormente, ocorre ofenômeno do rompimento do testamento em que apareceum filho até então desconhecido (art. 1.973 do CC), per-derá o sobrinho toda a herança que deverá ser restituídaao filho do falecido. Como o sobrinho estava de boa-fé,pois ignorava o fato de que não era realmente o herdeiro(boa-fé subjetiva), terá os seguintes direitos e deveres:

– Direito aos frutos percebidos (art. 1.214 do CC).

– Dever de restituição dos frutos pendentes ao tempo emque cessar a boa-fé, depois de deduzidas as despesas da

produção e custeio (art. 1.214, parágrafo único, do CC).– Dever de restituição dos frutos colhidos com antecipação

(art. 1.214, parágrafo único, do CC).

– Não responderá pela perda ou deterioração da coisa a quenão der causa (art. 1.217 do CC).

– Tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e

úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem

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pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento dacoisa, podendo exercer o direito de retenção pelo valor das

 benfeitorias necessárias e úteis (art. 1.219 do CC).

– O herdeiro autor da ação de petição de herança, quandoobrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de boa-

fé, deverá fazê-lo pelo seu valor atual (art. 1.222 do CC).

Como se pode perceber, a boa-fé se refere à ignorânciade uma situação, ou seja, desconhece o sujeito que perdeua qualidade de herdeiro, e se trata, portanto, da boa-fésubjetiva aquela estudada quando dos institutospossessórios.

Se, por outro lado, o sobrinho coage seu tio a fazertestamento deserdando o filho e tornando-o seu único her-deiro, e o testamento for anulado em razão do vício doconsentimento, é porque o sobrinho, réu da ação depetição de herança, estava agindo de má-fé, pois sabia quenão tinha direito aos bens do acervo hereditário. No caso

descrito, o sobrinho terá os seguintes direitos e deveres:– Responderá por todos os frutos colhidos e percebidos,

 bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber,desde o momento em que se constituiu de má-fé; temdireito às despesas da produção e custeio (art. 1.216 doCC).

– Responderá pela perda, ou deterioração da coisa, aindaque acidentais, salvo se provar que de igual modo se teri-am dado, estando ela na posse do autor da ação de petiçãoda herança (art. 1.218 do CC).

– Serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias, nãotendo o direito de retenção pela importância destas, nemo de levantar as voluptuárias (art. 1.220 do CC).

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– O herdeiro autor da ação de petição de herança, quandoobrigado a indenizar as benfeitorias ao possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seucusto (art. 1.222 do CC).

 Vale repetir que a boa-fé cessa com a citação do réu naação de petição de herança e, a partir de então, devem seraplicadas as regras referentes à má-fé (art. 1.826, pará-grafo único, do CC).

 Ainda em relação à petição de herança, estabelece oart. 1.827 que o herdeiro pode demandar os bens da her-ança mesmo que em poder de terceiro, sem prejuízo da re-

sponsabilidade do possuidor originário pelo valor dos bens alienados. Em complemento, enuncia o parágrafoúnico do referido dispositivo que são eficazes as alienaçõesfeitas, a título oneroso, pelo herdeiro aparente a terceirosde boa-fé.

Mais uma vez, lembre-se que o  herdeiro aparente  é

aquele que não tem a titularidade dos direitos sucessórios,mas se apresenta como tal. O que a norma visa a protegeré a boa-fé daquele que realiza o negócio com a pessoa quese apresenta como herdeira. Por isso, trata-se de normacom interessante efeito prático, que prestigia a eticidade,um dos princípios do atual Código Civil de 2002, segundoMiguel Reale.

Por fim, o herdeiro aparente que de boa-fé houverpago um legado não estará obrigado a prestar o equival-ente ao verdadeiro sucessor. Entretanto, conforme o art.1.828 do CC, fica ressalvado ao herdeiro real o direito deproceder contra aquele que recebeu a coisa. O objetivo,aqui, é proteger a boa-fé justamente do herdeiro aparente.

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1.8 RESUMO ESQUEMÁTICO

REGRAS BÁSICAS DA SUCESSÃO

– Art. 1.784 do CC. Aberta a sucessão, a herança

transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testa-mentários ( princípio da saisine). Herdeiro legítimo éaquele apontado pela lei; herdeiro testamentário é aquelenomeado por testamento, legado ou codicilo (art. 1.796 doCC).

– Art. 1.785 do CC. A sucessão deve ser aberta no lugardo último domicílio do falecido, o que é importante para oprocessamento do inventário.

– Art. 1.787 do CC. A sucessão e a legitimação para su-ceder serão reguladas pela lei do tempo da abertura da su-cessão, o que é fundamental para resolver problemas deDireito Intertemporal, surgidos principalmente com a en-trada em vigor do novo Código Civil.

– Art. 1.788 do CC. Se a pessoa falecer sem testa-mento, a sua herança será transmitida aos herdeiros legíti-mos. O mesmo vale para os casos de ausência de testa-mento ou de caducidade ou nulidade do ato de disposição.

– Art. 1.789 do CC. Havendo herdeiros necessários(descendentes, ascendentes e cônjuge), o testador

somente poderá dispor de metade da herança. Trata-se dafamosa proteção da legítima, que é a quota dos herdeirosnecessários.

DA HERANÇA E DE SUA ADMINISTRAÇÃO

– A herança defere-se de forma unitária, ainda que

haja pluralidade de herdeiros. A herança, antes da

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partilha, constitui um bem imóvel por determinação legal,indivisível e universal (universalidade jurídica) – art. 1.791do CC. A herança é administrada pelo inventariante, queexerce um mandato legal.

– O herdeiro não pode responder além das forças daherança (art. 1.792 do CC).

– É possível a nomeação de um administrador pro- visório da herança, antes da nomeação do inventariante,conforme o rol constante do art. 1.797 do CC.

 ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA HERANÇA 

– ACEITAÇÃO: ato pelo qual o herdeiro manifesta asua vontade de receber os bens do falecido. Trata-se de umato jurídico unilateral, que produz efeitos independente-mente da concordância de terceiros, tendo, portanto,natureza não receptícia, pois não precisa de comunicaçãopara produzir efeitos. A aceitação da herança pode ser as-

sim classificada:

a) Aceitação expressa – é aquela que se faz por declaraçãoescrita. Não restringindo a lei, poderá o escrito ser públicoou particular, mas nenhum efeito terá se for apenas

 verbal. Portanto, não se poderá valer de prova testemun-hal para comprovar a aceitação verbal.

b) Aceitação tácita  – aquela pela qual o herdeiro ou leg-atário pratica atos que indicam a aceitação e que, port-anto, são incompatíveis com a ideia de repúdio aos bensherdados. É o caso do herdeiro que paga os tributos doimóvel e que contrata funcionários para a suaconservação.

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– RENÚNCIA: a renúncia da herança constitui um ato jurídico unilateral e não receptício, pelo qual o herdeiro oulegatário recusa a herança ou o legado, não criando, con-sequentemente, qualquer direito àquele que renunciou,pois se considera que ele nunca foi herdeiro. Para renun-

ciar à herança, deve o declarante fazê-lo por instrumentopúblico ou termo judicial, sendo nula a renúncia por in-strumento particular (art. 1.806 do CC). A lei não permitea renúncia tácita, mas apenas a expressa, pois isso é formade dar maior segurança ao instituto.

DIFERENÇAS ENTRE EXCLUSÃO DA HERANÇA POR INDIGNIDADE E DESERDAÇÃO

TABELA COMPARATIVA 

Indignidade Deserdação

Decorre de determin-ação legal e da vontadedos interessados, quedevem promover a açãode indignidade.

Decorre da vontade do fa-lecido, por meio detestamento.

Matéria de sucessãolegítima e

testamentária.

Matéria de sucessão

testamentária.

A pena de indignidadepode atingir tanto osherdeiros necessáriosquanto os herdeirosfacultativos.

A pena da deserdação sóatinge os herdeirosnecessários.

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Pode estar relacionadacom causas anterioresou posteriores à mortedo autor da herança.

Apenas relacionadas comcausas anteriores à mortedo autor da herança, jáque decorre de disposiçãode vontade.

O indigno entra naposse dos bens da her-ança, pois a indignidadedepende de ação

 judicial.

O deserdado não entra naposse de forma imediata.

– HERANÇA JACENTE E VACANTEOcorrendo a morte de alguém, os bens da herança de-

 vem ser arrecadados e ficam sob a guarda e a adminis-tração de um curador até a sua entrega ao sucessor ou adeclaração de vacância (art. 1.819 do CC). Esse é o fenô-meno da   jacência da herança.   Importante frisar que a

 jacência é provisória, pois terminará com a entrega da her-ança aos herdeiros ou com a declaração de vacância. Nesseponto a   jacência   difere da   vacância.   Explica Sebastião Amorim que “considera-se vacante a herança, quando,realizadas todas as diligências, inclusive com a publicaçãode editais, e passado um ano, não surgirem pessoassucessíveis, deferindo-se os bens arrecadados ao entepúblico designado na lei” (Heranças jacente...,  Questõescontrovertidas..., 2005, v. 3, p. 361). Sobre a natureza jurídica da herança jacente e da herança vacante, não sepode afirmar que se tratam de pessoas jurídicas, pois nãohá uma personalidade jurídica, havendo apenas um con- junto de bens arrecadados. Por isso é que se afirma tratar-

se de   entes despersonalizados.   Quanto aos

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(E) Os descendentes de herdeiro excluído sucedemcomo se ele fosse morto antes da abertura dasucessão.

2. (MP/ES – 2005) De acordo com a legislação em

vigor, a sentença que determina a abertura dasucessão provisória só produzirá efeito:

(A) Um ano depois de publicada pela imprensa.

(B) Cento e cinquenta dias depois de publicada pelaimprensa.

(C) Três anos depois de publicada pela imprensa.

(D) Dois anos depois de publicada pela imprensa.(E) Cento e oitenta dias depois de publicada pela

imprensa.

3. (MP/ES – 2005) Consoante o Código Civil pátriotodas as assertivas abaixo estão corretas,exceto:

(A) Em falta de descendentes e ascendentes, serádeferida sucessão por inteiro ao cônjugesobrevivente.

(B) Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o re-gime de bens, será assegurado, sem prejuízo daparticipação que lhes caiba na herança, o direitoreal de habitação relativamente ao imóvel desti-nado a família, desde que seja o único daquelanatureza a inventariar.

(C) Os descendentes da mesma classe têm os mes-mos direitos à sucessão de seus ascendentes.

(D) Os descendentes não podem deserdar osascendentes.

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(E) Na linha descendente, os filhos sucedem porcabeça, e os outros descendentes, por cabeça oupor estirpe, conforme se achem ou não no mesmograu.

4. (TJ/SP 176.º) Analise as assertivas a seguir.I – O direito dos coerdeiros, quanto à propriedade eposse da herança, é indivisível até o julgamento dapartilha; depois disso, tal direito fica circunscrito aosbens de seu quinhão.

II – Não estão sujeitas à colação as doações remuner-atórias de serviços feitos ao ascendente.

III – Sucedendo aos avós por representação de seuspais, os netos estão dispensados de trazer à colaçãoo que os pais teriam de conferir, desde que o hajamherdado.

IV – O valor da colação dos bens doados será aqueleque vigorar no momento da abertura da sucessão.

É correto dizer que são verdadeiras somente asassertivas

(A) I e IV.

(B) I e III.

(C) II e III.

(D) I e II.

5. (MP/MG XLVI) Assinale a alternativaINCORRETA.

(A) O reconhecimento de filho extraconjugal pode serfeito antes do nascimento ou posteriormente aoseu falecimento, desde que ele deixedescendentes.

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(B) Os deveres de lealdade, respeito e mútua as-sistência, mais os de guarda, sustento e educaçãodos filhos compõem o contexto da união estávelcomo exigência legal.

(C) A doação e o legado, sendo negócios jurídicos

benéficos, devem ter sua interpretação restrita,tal como a renúncia.

(D) O CC/2002 abandonou a regra de igualdade daslegítimas, quando o cônjuge concorre com filhoscomuns e filhos só do autor da herança.

(E) O indigno, contemplado em testamento do ofen-dido, quando o testador já conhecia a causa daindignidade, receberá o bem legado e, reabilitadoque fora, a herança.

6. (MP/SP 84.º) Assinale a alternativa falsa.

(A) Se o herdeiro prejudicar os seus credores, renun-ciando à herança, poderão estes, com autorização

do juiz, aceitá-la em nome do renunciante.(B) O herdeiro que possui filhos menores não poderenunciar à herança; se o fizer, estes poderão su-ceder no lugar do renunciante, exercendo odireito de representação.

(C) A morte, a abertura da sucessão e a transmissãoda herança aos herdeiros ocorrem num só

momento.(D) Os filhos do herdeiro excluído por indignidade

serão chamados a sucedê-lo, como se mortofosse antes da abertura da sucessão.

(E) O autor de homicídio doloso contra a pessoa decuja sucessão se tratar, mesmo condenado porsentença penal, somente será excluído da

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sucessão mediante pedido expresso de in-teressado, em ação própria.

7. (IX Procurador do Estado – GO) Assinale a al-ternativa correta:

(A) o direito de representação dá-se na linha reta as-cendente, mas nunca na descendente e excep-cionalmente na linha colateral;

(B) o direito de representação dá-se exclusivamentena linha transversal;

(C) o direito de representação dá-se na linha retadescendente, mas nunca na ascendente e excep-cionalmente na linha transversal;

(D) o renunciante à herança de uma pessoa nãopoderá representá-la na sucessão de outra.

8. (IX Procurador do Estado – GO) Assinale a al-ternativa correta:

(A) o credor de dívida líquida e certa ainda não ven-cida, pode requerer habilitação no inventário;

(B) o legatário é sempre parte ilegítima paramanifestar-se sobre as dívidas do espólio;

(C) nenhum dos coerdeiros pode reclamar a univer-salidade da herança ao terceiro, que indevida-mente a possua, não podendo este opor-lhe, emexceção, o caráter parcial do seu direito nos bensda sucessão;

(D) ao cego só se permite o testamento particular.

9. (TJ/SP 178.º) Só uma destas afirmativas éverdadeira. Indique-a.

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(A) Será igual o quinhão de cada herdeiro quandoconcorrerem à herança irmãos bilaterais comirmãos unilaterais do falecido.

(B) A herança transmite-se aos herdeiros na data dadistribuição do inventário.

(C) Somente as pessoas já nascidas no momento daabertura da sucessão têm legitimidade parasuceder.

(D) Na falta de descendentes, são chamados à su-cessão os ascendentes, em concorrência com ocônjuge sobrevivente.

10. (Magistratura/PR – 2012) Assinale a altern-ativa correta.

(A) Dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecerestando grávida a mulher e não tendo o poderfamiliar.

(B) A sucessão e a legitimação para suceder são reg-

uladas pela lei vigente ao tempo do nascimentodo de cujus.

(C) Com dissolução da sociedade conjugal, extingue-se o bem de família convencional.

(D) O direito à meação não é renunciável, mas écessível ou penhorável na vigência do regimematrimonial.

11. (MP/AP – 2005) Assinale a alternativa correta.

Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente,ou, se ele deixou representante ou procurador, em sepassando três anos e não havendo interessados nasucessão provisória, a quem cumpre requerer ao

 juízo competente que se declare a ausência e se abraprovisoriamente a sucessão?

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(A) Ao cônjuge não separado judicialmente;

(B) Aos herdeiros presumidos, legítimos outestamentários;

(C) Ao Ministério Público;

(D) Aos credores de obrigações vencidas e nãopagas.

12. (MP/GO – 2005) É correto afirmar:

(A) Abre-se a sucessão com a morte do autor da her-ança, sendo permitido ao coerdeiro, a partir deentão, alienar seu direito hereditário sob qualquer

bem da herança considerado singularmente;(B) O inventário e a partilha devem ser requeridos

dentro do prazo de trinta dias contados da aber-tura da sucessão, podendo este prazo ser dilatadopelo juiz, havendo motivo justo, mediante requer-imento do interessado;

(C) O direito dos coerdeiros, quanto à propriedade eposse da herança, enquanto indivisível os bens,será regulado pelas normas relativas ao con-domínio, podendo, no entanto, qualquer dos coer-deiros exercer os seus direitos, obedecidas asnormas da indivisão;

(D) Concorrendo com herdeiro de que for ascend-ente, a cota do cônjuge não poderá ser inferior aum terço da herança.

13. (TJ/SP 174.º) A sucessão de bens de es-trangeiros, por morte ou ausência, quando situa-dos tais bens no Brasil, será regulada

(A) sempre pela lei do país em que era domiciliado o

defunto ou o desaparecido.

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(B) sempre pela lei brasileira, quanto aos imóveis, esempre pela lei do país onde era domiciliado o de-funto ou o desaparecido, quanto aos bens nãoimóveis.

(C) sempre pela lei brasileira, desde que aqui aberta

a sucessão.(D) pela lei brasileira, em benefício do cônjuge

brasileiro, companheiro ou companheira brasileir-os legitimados à sucessão, ou dos filhos brasileir-os, ou quem os represente, sempre que não lhesseja mais favorável a lei pessoal do defunto oudesaparecido.

14. (TJ/SP 174.º) O direito à sucessão abertaconsidera-se para os efeitos legais

(A) bem imóvel.

(B) bem móvel.

(C) bem incorpóreo.

(D) bem móvel ou imóvel, conforme resulte de serapreciado em si mesmo o que o integre, tendo emvista o fato de ser ou não suscetível de se mover.

15. (MP/MG XLIV – 2004) Assinale a proposiçãoINCORRETA.

(A) Na promessa de cessão de direitos cabe a prefer-ência ao sublocatário e, em seguida, ao locatário,estando o imóvel sublocado;

(B) apesar de não ser declarado falido, o adminis-trador da sociedade limitada fica sujeito a todasas obrigações impostas em lei ao falido;

(C) intimado o órgão do Ministério Público, o juiz

dirigir-se-á à residência do falecido para

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arrecadar a herança jacente, esteja ou nãopresente o MP;

(D) o advogado apresentará nos autos a cessão dedireito hereditário do menor, lavrada em instru-mento público, representado o menor pela mãe,

cônjuge supérstite;(E) sendo resolutiva a condição, o negócio jurídico

produzirá seus efeitos, gerando direitos ad-quiridos, podendo exercer-se desde a conclusãodeste o direito por ele estabelecido, enquanto elanão se realizar.

16. (MP/MG XLIV – 2004) Assinale a alternativaCORRETA.

(A) A herança destinada aos legitimários é imutável,não importando o número de herdeiros, se poucosou muitos, se todos ou alguns se habilitaram;

(B) existindo herdeiro interditado, seu curador

poderá requerer partilha amigável, comprovada-mente vantajosa, ainda que o testador o proíba;

(C) para igualar as legítimas, o ascendente, concor-rendo com o cônjuge, deverá colacionar os bensque recebeu em doação, do seu finado filho;

(D) o contrato de locação, com renovação com-pulsória garantida pela Lei n.8245/91,poderá pre-

ver sua rescisão de pleno direito, com a de-cretação da falência;

(E) omitida pelo procurador do absolutamente in-capaz, o juiz não pode, embora provocado peloMinistério Público, suprir, de ofício, a alegação deprescrição.

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17. (Procurador do Estado/MS – 2004) Analisandofiguras próprias do direito civil, assinale a al-ternativa falsa:

(A) Comoriência é presunção de morte, da qual de-corre a abertura de uma única cadeia sucessória;

(B) Codicilo é disposição de última vontade externadapor documento escrito, referente a desejos e bensmóveis de pequena monta, tenha ou não o decujus deixado testamento;

(C) Aquestos são os bens adquiridos na constância docasamento;

(D) Herança jacente é aquela cujos herdeiros não sãoainda conhecidos. Herança vacante é a que nãofoi disputada, com êxito, por quaisquer herdeiros,e declarada de ninguém;

(E) A sucessão por cabeça se dá quando todos osdescendentes são do mesmo grau e por estirpe sede diversos graus.

18. (VUNESP/2010 – Analista de Promotoria – 2.ªfase) Assinale a alternativa correta.

(A) No casamento sob o regime da comunhão univer-sal de bens, o cônjuge sobrevivente participa daherança deixada pelo outro, concorrendo com osfilhos do casal, cabendo-lhe igual quinhão ao dos

que sucederem por cabeça.(B) Colação é o ato mediante o qual o coerdeiro, para

assegurar a igualdade das legítimas dos demais,devolve à massa hereditária, em espécie, o bemrecebido em doação pelo autor da herança.

(C) Estão sujeitos à colação os herdeiros necessáriosdo autor da herança, mesmo aqueles renunci-antes ou declarados indignos.

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(D) A pena de sonegados só se pode requerer e im-por em ação movida somente pelos herdeiros doautor da herança.

(E) No caso de deserdação, os motivos que a ense- jam podem ser posteriores à morte do autor da

herança e afasta apenas os herdeiros necessários.

19. (MP/ES – CESPE/2010) Assinale a opção cor-reta com referência ao direito sucessório doscônjuges e companheiros.

(A) O companheiro não concorre com os parentescolaterais do falecido.

(B) Havendo filhos exclusivos do(a) falecido(a), o(a)companheiro(a) herdará uma quota equivalente àque lhes for atribuída.

(C) O direito hereditário do companheiro restringe-seaos bens adquiridos onerosamente na vigência daunião estável.

(D) No regime de separação obrigatória, o cônjugesobrevivo herda porque não tem direito àmeação.

(E) O cônjuge sobrevivo tem direito real de habitaçãoe de usufruto.

20. (VUNESP/2010 – Analista de Promotoria – 1.ª

fase) Considere as afirmações seguintes:I – tanto o instituto da indignidade quanto o da deser-

dação procuram afastar da herança aquele que a elanão faz jus, em razão de reprovável conduta que teveem relação ao autor sucessionis, ou, ainda, contraseu cônjuge, companheiro, ascendente oudescendente;

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II – a pena de indignidade é cominada pela própria lei,nos casos expressos que enumera, ao passo que adeserdação repousa na vontade exclusiva do de cujusque a impõe ao culpado, em ato de última vontade,desde que fundada em motivo legal;

III – somente a autoria em crime de homicídio doloso,tentado ou consumado contra o autor da herança,pode afastar o herdeiro da sucessão.

Está correto o contido em

(A) I, II e III.

(B) I e III, apenas.

(C) II e III, apenas.(D) I e II, apenas.

(E) I, apenas.

GABARITO

1 – E 2 – E 3 – D

4 – D 5 – E 6 – B

7 – C 8 – A 9 – D

10 – A 11 – C 12 – C

13 –D   14 – A

  15 –D

16 – A 17 – A 18 – C

19 – C

  20 –

D

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DA SUCESSÃO LEGÍTIMA

Sumário: 2.1 Considerações iniciaissobre a ordem de vocação hered-itária: 2.1.1 Conceitos fundamen-tais; 2.1.2 Duas regras fundamen-tais da sucessão legítima e suas ex-ceções – 2.2 A sucessão legítima nalinha reta descendente: 2.2.1Regras específi cas e casos práticosde sucessão na linha descendente;

2.2.2 Alterações e acréscimos sobreo tema. Análise do Projeto de Lei699/2011 – 2.3 A sucessão legítimana linha reta ascendente – 2.4 A su-cessão legítima do cônjuge.Questões controvertidas: 2.4.1 Anál-ise do Código Civil de 1916; 2.4.2 O

Código Civil de 2002 – 2.5 A

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sucessão legítima do companheiro.Questões polêmicas: 2.5.1 As leis daunião estável – Leis 8.971/1994 e9.278/1996; 2.5.2 O Código Civil de2002 e a sucessão do companheiro

– 2.6 A sucessão legítima na linhacolateral – 2.7 Os herdeiros ne-cessários: 2.7.1 Quem são os her-deiros necessários?; 2.7.2 A legítimae a disponível – 2.8 Resumo es-quemático – 2.9 Questões correlatas– Gabarito.

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A ORDEM DE VOCAÇÃOHEREDITÁRIA 

2.1.1 Conceitos fundamentais

 A  sucessão legítima, conforme mencionado anterior-mente, recebe esta designação por decorrer da lei, mais es-pecificamente das disposições contidas entre os arts. 1.829a 1.856 do Código Civil em vigor. Essa forma de sucessãoopõe-se à sucessão testamentária, pois esta toma por base

um ato de última vontade do falecido, que pode se consub-stanciar por meio de um testamento ou de um codicilo(arts. 1.857 a 1.990 do CC).

Partindo-se dessa fundamental diferença, enquantona sucessão testamentária serão sucessores a título singu-lar (legatários) ou universal (herdeiros) as pessoas indica-

das pelo próprio falecido, em se tratando de sucessão

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legítima cabe à lei indicar a ordem de vocação hereditária,ou seja, quem são as pessoas chamadas a suceder.

Podem ser imaginadas algumas situações em que a or-dem de vocação hereditária, ou seja, o chamamento legalserá aplicado. Na primeira delas, lembre-se a hipótese emque o falecido não deixou ato de última vontade, situaçãoem que a vontade do morto é substituída pela da lei. Emuma segunda hipótese, o falecido fez testamento dispondoapenas sobre parte de seus bens, situação em que a partedo patrimônio não contemplada pelo instrumento seguiráas regras da sucessão legítima.

Por fim, também são aplicadas as regras da sucessãolegítima na hipótese de nulidade do testamento (testa-mento existente, mas inválido) ou de sua caducidade (test-amento existente, válido, mas ineficaz), matérias estas queexplicaremos no próximo capítulo do presente livro.

Para entender a ordem de vocação hereditária e suas

regras, necessário se faz a fixação de determinados concei-tos de Direito das Sucessões. Muitos desses conceitos,aliás, têm relação com o Direito de Família, particular-mente com o parentesco, e foram estudados no volumeanterior dessa coleção. Vejamos tais categorias, que sãofundamentais para a prática sucessionista:

a) LINHA DE PARENTESCO. Sobre o tema, a claralição de Itabaiana de Oliveira “É a série de pessoas provin-das do mesmo progenitor, que se denomina tronco e podeser reta ou colateral” (Tratado..., 1952, v. 1, p. 65).

Inicialmente, presente o   parentesco em linha retaquando as pessoas estão umas para com as outras na

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relação de ascendentes e descendentes (art. 1.591 do CC).O parentesco em linha reta é infinito, ou seja, não hálimites.

Nesse sentido, haverá um   ascendente   quando naárvore genealógica subimos de uma pessoa para seus pais,avós, bisavós etc. Buscam-se os procriadores de certapessoa.

Por outra via, surgirá o descendente quando descemosde uma pessoa para seus filhos, netos, bisnetos etc.Buscam-se os procriados de certa pessoa.

 A relação de parentesco será   paterna   quando sereferir à família do pai de certa pessoa, sendo  maternaquando se referir à família da mãe de certa pessoa. Em de-terminadas situações, ocorre a divisão da herança entre aslinhas materna e paterna. Assim, quando a lei determina adivisão em linhas, metade da herança vai para a família dopai e metade para a família da mãe.

O parentesco é   colateral, transversal ou oblíquoquando as pessoas provêm de um só tronco, sem descend-erem umas das outras (art. 1.592 do CC). Desse modo, sãoparentes colaterais os irmãos (2.º grau), o tio e o sobrinho(3.º grau), os primos-irmãos, os sobrinhos-netos e os tios-avós (4.º grau). Não há parentesco colateral além do 4.º

grau, conforme determina o referido dispositivo.

 b) CLASSE DE HERDEIROS. A classe é um de-terminado grupo de herdeiros que guarda semelhançasentre si. Sendo assim, a primeira classe de herdeiros é ados descendentes do falecido, ou seja, aqueles que têmcomo semelhança o fato de, na árvore genealógica,

encontrarem-se na posição de filhos, netos, bisnetos,

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tataranetos. Os descendentes são parentes em linha reta enão em linha transversal ou colateral do falecido (art.1.591 do CC). Dessa forma, o sobrinho do morto não é con-siderado seu descendente.

 A segunda classe de herdeiros é a dos ascendentes. Emtermos de árvore genealógica, são aqueles que vieremantes do morto, tendo com ele parentesco em linha reta(art. 1.591 do CC). São ascendentes os pais, os avós, os bis-avós etc. É bom ressaltar que o tio-avô não é ascendente,mas sim parente colateral ou transversal do falecido.

 A terceira classe de herdeiros é a do cônjuge e a do

companheiro. Entre os cônjuges e entre os companheirosnão há parentesco, como se sabe, pois   parentesco, nadefinição de Itabaiana de Oliveira, “é um nexo que uneuma pessoa a outra por laços de sangue, ou por criação ar-tificial da lei, ou que aproxima uma pessoa dos parentesda outra, em virtude de relações sexuais entre elas”

(Tratado..., 1952, v. 1, p. 64).De qualquer forma, conforme será demonstrado, criouo Código Civil de 2002 uma concorrência sucessória entreo cônjuge e os descendentes (dependendo do regime de bens do casamento), entre o cônjuge e os ascendentes (in-dependentemente do regime de bens), bem como a con-corrência entre o companheiro e os descendentes, ascend-

entes e colaterais do falecido. Em razão da grande polêm-ica, a matéria é tratada em tópico específico a seguir.

 A quarta e última classe é a dos parentes colaterais outransversais. Entre os parentes colaterais não há relaçãode descendência ou ascendência (art. 1.592 do CC). Oscolaterais não são parentes em linha reta. A relação entre

os parentes colaterais decorre do fato de estes terem um

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ancestral comum, mas não em linha reta. A título deilustração, lembre-se de que a ideia de classes também é bastante antiga. Com feição muito parecida com a atual,surgiu no  Direito Justinianeu   com as Novelas 118 (543d.C.) e 127 (548 d.C.) ambas do século VI d.C.

c) GRAUS. Os graus de parentesco decorrem donúmero de gerações que separa determinadas pessoas. A sua contagem dependerá do tipo de parentesco (art. 1.594do CC). Se contarmos o grau de parentesco entre o neto eo avô, teremos o parentesco de 2.º grau, pois o avô é par-

ente em 1.º grau de seu filho (uma geração) e em 2.º graude seu neto (mais uma geração). Vejamos o diagrama deparentesco:

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Percebe-se que cada traço vertical do diagrama quesepara um parente de outro corresponde a uma geração.Entre o avô e neto o parentesco é de 2.º grau em linha re-ta. Entre pai e filho é de 1.º grau em linha reta.

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Por outra via, na linha colateral, a contagem de grausexige que se encontre um ancestral comum entre os par-entes cujo grau se pretende contar. Determina o CódigoCivil que na linha colateral também sejam contados osgraus pelo número de gerações, subindo de um dos par-

entes até o ascendente comum, e descendo até encontrar ooutro parente (art. 1.594 do CC). A regra básica para nãoerrar essa contagem é subir ao máximo, para depois des-cer, conforme apontado no volume anterior da presentecoleção (Volume 5). Repise-se, ainda, que essa linha colat-eral pode ser  igual  ou  desigual , caso os parentes distemigualmente ou não do mesmo tronco comum.

 Visualizando, os irmãos são parentes colaterais outransversais em 2.º grau igual. Um grau separa o irmão Ade seu pai e outro grau separa o pai do irmão B. Para nãoerrar na conta, deve-se contar o número de “saltos” (ger-ações) que se dá na árvore genealógica. Vejamos odiagrama:

Por que se trata de parentesco colateral em  2.º grauigual ? Para que saibamos se os graus são iguais oudesiguais, temos que verificar quantos graus subimos naárvore familiar e quantos graus descemos até chegar ao

parente procurado. Seguindo o diagrama acima,

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contamos, na subida, um único grau que separa A de seupai e, na descida, apenas  um grau que separa o pai de  B(que é seu filho e irmão de A). Havendo um grau de cadalado, os graus são iguais.

Já o sobrinho é parente colateral em   terceiro graudesigual  de seu tio. Vamos partir do sobrinho e chegar aotio na árvore da família. Entre o sobrinho e seu pai há umgrau; entre seu pai e seu avô outro grau e, por fim, entre oavô e o tio há mais um grau. São três graus desiguais queseparam o tio do sobrinho. Vejamos o diagrama.

Em suma, para que se conclua se os graus são iguaisou desiguais, há a necessidade de se verificar quantosgraus se sobe na árvore familiar e quantos graus se desceaté chegar ao parente procurado.

Seguindo o diagrama acima, contamos, na subida,dois graus que separam A de seu avô e, na descida, apenasum grau que separa o avô de B (que é seu filho e tio de A).Havendo  dois graus  de um lado e apenas  um grau  dooutro, os graus são desiguais.

Por fim, são parentes colaterais em 4.º grau os tios-

avós, os primos-irmãos e os sobrinhos-netos.

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 A contagem de graus é fundamental para que sejamresolvidos problemas de destino da herança. Todas as re-gras envolvem a contagem de graus, podendo qualquererro gerar um enorme problema na solução das questõespráticas.

Encerrando, tendo sido explicados os conceitos delinha, classe e grau, para facilitar a consulta e possibilitar arápida identificação dos graus de parentesco, elaboramosuma tabela de auxílio de todo o parentesco consanguíneoaté o quarto grau, lembrando que o parentesco colateralnão passa desse limite e o parentesco em linha reta é

infinito.

GRAU LINHA EXEMPLOS EXPLICAÇÃO

a) LinhaRetaascendente

Meu pai eminha mãe

b) LinhaRetadescendente

Meu filho eminha filha

I –Primeirograu

Observação: Não há parente colateral deprimeiro grau

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GRAU LINHA EXEMPLOS EXPLICAÇÃO

a) LinhaRetaascendente

Meu avô eminha avó

b) LinhaRetadescendente

Meu neto eminha neta

II – Se-gundograu

c) LinhaColateral

Meu irmãoe minhairmã

a) LinhaRetaascendente

Meu bisavôe minhabisavó

b) LinhaReta

descendente

Meu bis-neto eminha

bisneta

Meu tio eminha tia

Irmãos demeu pai ou deminha mãe

III –Terceirograu

c) LinhaColateral   Meu

sobrinho eminhasobrinha

Filhos de meu

irmão ou deminha irmã

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GRAU LINHA EXEMPLOS EXPLICAÇÃO

a) LinhaRetaascendente

Meu trisavôe minhatrisavó

b) LinhaRetadescendente

Meu tris-neto eminhatrisneta

Meusobrinho-

neto eminhasobrinha-neta

Filhos deminhasobrinha oude meusobrinho

Meu tio-avôe minhatia-avó

Irmãos demeu avô oude minha avó

IV –Quartograu

c) LinhaColateral

Meu primo-irmão eminhaprima-irmã

Filhos do meutio ou daminha tia

2.1.2 Duas regras fundamentais da sucessãolegítima e suas exceções

2.1.2.1 Primeira regra fundamental da sucessão legítima

Toda sucessão legítima toma por base o seguinte fun-

damento: como o falecido não fez testamento, presume a

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lei sua vontade, determinando o destino de seus bens. Emoutras palavras, presume-se a afetividade do falecido paracom seus parentes, cônjuges e companheiros. A ordem dechamamento dos parentes, cônjuge ou companheiro do fa-lecido decorre, em princípio, dessa   presunção legal de

afetividade.

Isso serve para responder indagações do tipo: por queos sobrinhos do falecido nada herdam se este tiver filhos?Ora, porque a lei presume que, em uma situação de nor-malidade, a pessoa dedica mais carinho e afeto a seu filhodo que a seu sobrinho e, portanto, deseja que seus bens se-

 jam transmitidos ao primeiro.Da mesma forma, por que na hipótese em que a pess-

oa falece deixando seu filho vivo e também seu pai, a leidetermina que a herança vá para o filho? Porque a lei pre-sume que, em uma situação de normalidade, a pessoa ded-ica mais carinho e afeto a seu filho do que a seu pai e,portanto, tem como vontade presumida que seus bens se- jam para ele transmitidos.

Com essa presunção evidente, cria-se a ordem de vo-cação hereditária. Se os filhos dão continuidade à estirpedos pais, nada mais justo que sejam eles os primeiros a re-ceber sua herança.

Surge, então, a  primeira regra  muito importante:  aexistência de herdeiros de uma classe exclui do chama-mento à sucessão herdeiros da classe seguinte.

Se essa primeira regra era praticamente absoluta na vigência do Código Civil de 1916 e na legislação da uniãoestável (Leis 8.971/1994 e 9.278/1996), no sistema doCódigo Civil de 2002 deve a mesma ser vista com cautela.

Isso porque contém o atual Código Civil severas ressalvas

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ou exceções à sua aplicação. Assim, uma presunção queera absoluta e inquebrável (iure et de iure) passou a serrelativa, comportando exceções (iuris tantum).

Como primeira exceção, haverá concorrência su-cessória entre o cônjuge sobrevivente e os descendentes dofalecido em certas situações, dependendo do regime de bens do casamento (art. 1.829, I, do CC/2002). Ato con-tínuo, haverá concorrência sucessória entre o cônjugesobrevivente e os ascendentes do falecido qualquer queseja o regime de bens (art. 1.829, II, do CC/2002). Tam- bém haverá concorrência sucessória entre o companheiro

sobrevivente e os descendentes do falecido sobre os bensadquiridos onerosamente na constância da união estável(art. 1.790, I e II, do CC/2002). Não obstante tudo isso,haverá concorrência sucessória entre o companheirosobrevivente e ascendentes ou colaterais do falecido sobreos bens adquiridos onerosamente na constância da uniãoestável (art. 1.790, I e II, do CC/2002). Por fim, haverá o

direito real de habitação ao cônjuge, independentementedo regime de bens e de sua participação na herança (art.1.831 do CC/2002). Todos esses temas serão explicados demaneira minuciosa no presente capítulo.

Pois bem, verifiquemos alguns desdobramentos práti-cos das normas em estudo.

Se o falecido  A deixar seu filho e seu pai, não tendocônjuge ou companheira, todos os bens irão para o filho, eo pai do morto nada receberá. A classe dos descendentesexclui do chamamento a classe dos ascendentes. Vejamoso diagrama sucessório:

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Da mesma forma, se A falecer, sem ter esposa ou com-panheira, e deixar seu pai e seus irmãos vivos, o pai (as-cendente) recebe toda a herança e os irmãos (colaterais)nada recebem. Vejamos novamente o diagramasucessório:

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Por fim, se   A   falecer sem descendentes ou ascend-entes, deixando cônjuge vivo, independentemente do re-gime de bens, ainda que tenha sobrinhos ou irmãos, o côn- juge receberá toda a herança, e os parentes colaterais nadareceberão.

2.1.2.2 Segunda regra fundamental da sucessão legítima

 A segunda regra sucessória é a seguinte:  dentro deuma classe de herdeiros, os herdeiros de grau mais próx-imo excluem da sucessão os de grau mais remoto. A regra

em questão é basilar para a compreensão da sucessão legí-tima, sendo certo que existia quando da vigência doCódigo Civil de 1916 (arts. 1.604 e 1.613 do CC/1916) e érepetida e reafirmada no Código Civil de 2002 (arts. 1.833,1.835 e 1.840).

Na realidade, a regra é muito antiga e já na Lei das XIITábuas de 450 a.C., dentro da segunda classe de herdeir-os, os   agnados   (que não se encontravam sob o pátriopoder – patria potestas do de cujus), de grau mais próx-imo, excluíam os de grau mais remoto.

Ilustrando, se o falecido deixa dois filhos (descend-entes de 1.º grau) e um neto (descendente de 2.º grau),não tendo esposa ou companheira, apenas os dois filhos

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recolherão a herança; o neto nada receberá. Vejamos asituação descrita no esquema a seguir:

Da mesma forma, se o falecido   A   deixar seus doisirmãos B e C  (colaterais em 2.º grau) e um tio D (colateral

em 3.º grau) vivos, em não tendo descendentes, ascend-entes, cônjuge ou companheiro, os irmãos tudo receberão.Elucidando, lembre-se que o termo premorto significa queo avô e o pai de  A   já eram falecidos quando  A  morreu.Esquematizando:

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 Analisadas essas duas importantes regras basilares,

passa-se ao estudo das suas exceções.

2.1.2.3 Das exceções. O estudo específico do direito derepresentação

Duas são as exceções à regra pela qual dentro de umaclasse de herdeiros, os herdeiros de grau mais próximo ex-cluem da sucessão os de grau mais remoto.

 A  primeira delas refere-se à classe dos colaterais. Se otio do morto (parente em 3.º grau) concorrer com osobrinho do morto (parente também em 3.º grau), osobrinho do morto ficará com toda a herança (art. 1.843do CC). Apesar do tio do morto e do sobrinho serem am-

 bos parentes colaterais de 3.º grau, não havendo, port-anto, grau mais remoto, por opção do legislador osobrinho ficará com a totalidade da herança.

 A   segunda exceção   refere-se ao   direito de repres-entação, tratado entre os arts. 1.851 a 1.856 do CC em vig-or e que passamos a estudar.

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 Apesar da diferença de graus, alguns parentes do fale-cido que estariam excluídos da sucessão por serem par-entes de grau mais remoto receberão parte da herança emrazão do direito de representação, que só ocorre quandohouver diversidade de graus. Portanto, se todos os her-

deiros chamados a suceder forem de mesmo grau, nãohaverá direito de representação.

Desse modo, dá-se o direito de representação quandoa lei chama certos parentes do falecido a suceder em to-dos os direitos em que ele sucederia se vivo fosse   (art.1.851 do CC). Em complemento, prevê o art. 1.854 do CC

que os representantes só podem herdar, como tais, o queherdaria o representado se vivo fosse. Conforme frisa JoséLuiz Gavião de Almeida, “os chamados representantes, na verdade, não o são. Não recebem pelo representado, masno lugar dele. Não estariam representando outros herdeir-os, mas os substituindo. Por isso a expressão por direitode substituição seria mais apropriada” (Código Civil...,

2003, v. XVIII, p. 270).Em razão dessa crítica, que já é antiga, Washington de

Barros Monteiro propõe a seguinte divisão:   vocaçãohereditária direta   e   vocação hereditária indireta. Será“direta, quando o título de herdeiro resulta da atribuiçãodireta feita pela lei, ou pelo testador;  indireta, quando o

título de herdeiro promana da lei, mas a primeira vocaçãonão pode se efetivar pela ausência do convocado, sub-stituído por seu descendente” (Curso..., 2003, v. 6, p. 117).Tais expressões podem ser utilizadas na práticasucessória.

Consigne-se que os representantes recebem exata-

mente aquilo que o representado receberia se vivo fosse,

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parentes de grau mais remoto serão chamados a sucederpelo direito de representação. Itabaiana de Oliveira re-sume com excelência a questão: “a representação é umaficção da lei e ocorre quando, morrendo o presumido her-deiro antes da abertura da sucessão em seu favor, são cha-

mados a suceder seus descendentes, em concorrência comoutros descendentes mais próximos do autor da herança, aocupar o lugar do presumido herdeiro, substituindo-o e verificando-se, então, a desigualdade de graus de par-entesco, para com o autor da herança, desde o momentoda abertura da sucessão” (Tratado..., 1952, v. 1, p. 156).

 A decorrência prática da representação é que apartilha dos bens do falecido se dá por  estirpe. Então, os bens que caberiam ao representado serão divididos entreos membros de sua família, ou seja, justamente de suaestirpe.

Já quando não há representação, os herdeiros rece- bem por direito próprio e a partilha da herança se dá porcabeça. Assim, se os herdeiros concorrerem em grau deigualdade, desde o momento da abertura da sucessão, aherança será dividida em partes iguais e essa sucessão sedará por direito próprio e a partilha por cabeça.

Facilitando o trabalho de compreensão, vejamos otratamento diferenciado das hipóteses em que há ou não o

referido direito de representação.

a) Hipóteses em que há direito de representação (jurerepraesentationis)

Como base do que consta do atual Código Civil, po-demos apontar as seguintes situações em que caberá a su-

cessão por representação e a partilha por estirpe:

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– Na linha reta descendente, quando concorrerem descend-entes de grau mais próximo e de grau mais remoto no mo-mento da abertura da sucessão. Na linha descendente odireito de representação é ilimitado (art. 1.852 do CC).

– Na linha colateral, quando os irmãos do morto (parentes

em 2.º grau) concorrerem com sobrinho do morto (par-entes em 3.º grau). Esse é o único caso de representaçãoadmitido na linha colateral (art. 1.853 do CC).

– Quando o herdeiro legítimo é declarado indigno ou deser-dado e seus descendentes são chamados a suceder (art.1.816 do CC).

– Na hipótese de o renunciante à herança de uma pessoarepresentá-la na sucessão de outra (art. 1.856 do CC). Umexemplo prático ajuda na análise da norma e evita a con-fusão com a matéria da renúncia. Já foi dito no capítuloanterior do presente livro que os filhos do renunciantenão são chamados à sucessão representando-o. Vejamos odiagrama esquematizando a matéria:

Como outro exemplo, imagine-se que  B não renunciea herança de seu pai A. Se D renunciar à herança de seupai B que falece antes do avô A, quando este último (o avô) vier a falecer, poderá D aceitar a herança, representando

seu pai   B. Isso porque a renúncia se interpreta

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restritivamente. A expressão   premorto   significa que   Bmorreu antes de seu pai A.

 Vejamos um novo diagrama que demonstra a sucessãode A:

b) Hipóteses em que não há direito de representaçãoe sim direito próprio (jure proprio)

Também com base na atual codificação privada, nãocaberá a sucessão por representação, mas sim por direitopróprio, sendo a partilha por cabeça, nos seguintes casos:

– Na linha ascendente. Na linha ascendente nunca ocorre odireito de representação por opção legislativa (art. 1.852do CC).

– Quando houver concorrência na linha colateral entre par-entes de 3.º e de 4.º graus. O parente de 3.º grau herda atotalidade da herança e o de 4.º grau nada recebe – sobreo tema, recomenda-se a leitura do presente capítulo noitem 2.6.

– Quando o falecido só deixar parentes colaterais de 4.ºgrau.

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– Quando houver renúncia da herança. Os filhos da pessoaque renunciou não são chamados a suceder, pois o quin-hão será repartido entre os demais herdeiros da classe dorenunciante.

Resumindo, um quadro comparativo ajudará a visual-izar as situações descritas:

Igualdade ounão de graus

Tipo desucessão

Tipo departilha

Hipóteselegais

Se houverigualdade degraus dos her-deiros no mo-mento dofalecimento

Sucessão pordireito próprio( jure proprio)

Partilhaporcabeça(incapita)

– Falecido

deixa apefilhos comherdeiros

– Falecidodeixa apenetos comherdeiros

– Falecidodeixa apeascendencomoherdeiros

– Falecidodeixa ape

irmãos coherdeiros

– Falecidodeixa apesobrinhoscomoherdeiros

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Igualdade ounão de graus

Tipo desucessão

Tipo departilha

Hipóteselegais

– Falecidodeixa ape

colaterais3.º grau(deixa só ou sósobrinhos

– Falecidodeixa ape

colaterais4.º grau(deixa sótios-avós,sobrinhostos e/ouprimos-irmãos)

Se houverdesigualdadede graus dosherdeiros nomomento do

falecimento ea lei determin-ar a sucessãode parentesde grau maisremoto

Sucessão por rep-

resentação ( jurerepraesentationis)

Partilhapor

estirpe(instirpes)

– Falecidodeixa descendentesdiversosgraus (filhvivos e ne

filhos de ufilhapremorta)

– Falecidodeixa irme sobrinho(filhos de

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Igualdade ounão de graus

Tipo desucessão

Tipo departilha

Hipóteselegais

irmãopremorto)

– Falecidodeixa doishos, sendum deles digno. Oshos do in-digno suc

dem porrepresent

Com esse quadro encerra-se o tratamento da matéria,apenas em uma análise preliminar. Serão expostos exem-plos práticos sobre a representação nas seções sub-

sequentes, conforme o oportuno estudo das classes deherdeiros.

2.2 A SUCESSÃO LEGÍTIMA NA LINHA RETA DESCENDENTE

2.2.1 Regras específicas e casos práticos desucessão na linha descendente

 A primeira classe de herdeiros chamada a suceder é ados descendentes.

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Para fins didáticos e com o fito de evitar confusões nacompreensão da questão, em todas as nossas hipóteses ofalecido não tem cônjuge ou companheiro, pois essasquestões envolvendo particularmente a concorrência docônjuge/companheiro serão trabalhadas mais adiante.

Se no momento da abertura da sucessão o falecidodeixar descendentes, ascendentes e colaterais e for ap-licada a regra pela qual a existência de herdeiros de umaclasse exclui os herdeiros da classe subsequente (primeiraregra fundamental do direito sucessório), apenas os des-cendentes serão chamados a suceder. Assim sendo, os as-

cendentes e colaterais não terão direitos sucessórios. Alémdisso, deve-se observar que os descendentes são herdeirosnecessários e terão o direito à legítima, ou seja, a 50% dopatrimônio do falecido (art. 1.845 do CC).

 Vejamos algumas regras e casos práticos relacionados.

a) Entre os descendentes, os de grau mais próximoexcluem os de grau mais remoto, salvo o direito de rep-resentação (art. 1.833 do CC)

Se  A   falece e deixa dois filhos (descendentes de 1.ºgrau) e três netos (descendentes de 2.º grau), todos os bens serão partilhados entre os filhos, pois o grau maispróximo exclui o grau mais remoto. Vejamos o diagrama:

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Entretanto, estabelece a lei o direito de representaçãoilimitado na linha descendente. Exemplo disto se verificaquando   A   falece, sem cônjuge ou companheiro e deixa

como herdeiros seu filho  B   (descendente de 1.º grau) eseus netos D e E  (descendentes de 2.º grau), filhos de seufilho C  (premorto). A expressão premorto significa que C morreu antes seu pai A. Haverá representação em razão dadiversidade de graus.

Nesse caso, 50% da herança serão do filho  B  e 50%

pertencerá, por representação, a   D   e   E   (estirpe de   C ),sendo que cada neto recebe 25% dos bens. Vejamos:

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Podemos dar mais um exemplo de representação nalinha descendente. A falece e deixa os seguintes descend-entes vivos: filho B, neto D e bisnetos F  e G . O filho C , paido neto  E  é premorto. O neto  E , pai dos bisnetos  F  e  G também é premorto. A herança ficará dividida da seguinte

maneira:

– 50% para o filho B.

– 25% para o neto D.

– 12,5% para cada um dos bisnetos F e G.

b) Se todos os descendentes forem de mesmo grau, to-dos recebem por direito próprio, e a partilha será porcabeça (art. 1.835 do CC )

Para ilustrar, se A falece e deixa três filhos (todos des-

cendentes de 1.º grau), a herança será dividida em partesiguais. Vejamos:

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Da mesma forma, se todos os filhos forem premortose, no momento da sucessão, o falecido deixou apenas ne-tos (todos descendentes de 2.º grau), os netos receberãopor direito próprio, não havendo representação. Só haver-ia representação se houvesse descendentes em graus di-

 versos, mas como todos são descendentes de mesmo grau,a partilha se dará por cabeça. Vejamos:

Uma outra situação pode ser objeto de dúvida.

c) Se todos os representantes de uma geração desa- parecerem, os da linha subsequente são chamados aherdar por direito próprio ou por representação?

 A resposta é: herdarão por direito próprio. Exemplific-ando, se A falece e deixa seus netos D e F  vivos, bem comoseus bisnetos G  e H , e premortos, seus filhos B (pai de D) e

C  (pai de E  e F ) e o neto E  (pai dos bisnetos G  e H ), a her-ança será assim partilhada:

– D – 1/3 da herança por direito próprio.

– F – 1/3 da herança por direito próprio.

– G e H – 1/6 da herança cada um em representação a E.

Em esquema:

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Superada a análise desses casos práticos, veremos aspropostas legislativas de alteração da matéria, o que servecomo complementação ao estudo.

2.2.2 Alterações e acréscimos sobre o tema. Análise do Projeto de Lei 699/2011

O art. 1.834 do Código Civil em vigor, sem corres-pondente no Código Civil de 1916, determina que “os des-

cendentes da mesma classe têm os mesmos direitos à su-cessão de seus ascendentes”. É evidente a inutilidade dodispositivo, isso porque todos os descendentes estão namesma classe. Portanto, a leitura que deve ser feita do dis-positivo é a seguinte: todos os descendentes têm iguaisdireitos. A regra decorre da Constituição Federal, que, emseu art. 227, § 6.º, proíbe qualquer discriminação entre osfilhos, sejam eles advindos de casamento, de união estávelou de adoção. Aliás, não se pode admitir, em hipótese al-guma, a utilização das expressões filhos   incestuosos   ouadulterinos,   terminologia arcaica e totalmentecondenável.

De qualquer forma, entendemos que correta seria a

seguinte leitura do dispositivo em comento: os

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inventariar, enquanto permanecer na situação que justi-ficou esse benefício”.

O Código Civil de 1916 já criava direito real de habit-ação ao filho portador de deficiência que o impossibilita aotrabalho (art. 1.611, § 3.º, do CC/1916), em razão do dis-posto na Lei 10.050/2000. O que se percebe é que o pro- jeto pretende criar um direito real sobre coisa alheia a fa- vor do filho (desde que ausentes seus pais), que seja porta-dor de deficiência que o impossibilite para o trabalho eque tenha necessidade pode morar gratuitamente noimóvel que pertencerá aos demais descendentes. A pro-

posta tem inegável valor social e com ela concordamos in-tegralmente, visando à manutenção de um   patrimôniomínimo a favor da pessoa humana, sendo importante lem- brar a célebre teoria do E statuto Jurídico do Patrimônio Mínimo, de Luiz Edson Fachin. Além disso, deve-se apon-tar sempre a proteção constitucional da moradia, con-stante do art. 6.º, caput , da Constituição Federal de 1988.

Surge, aqui e mais uma vez, a faceta do  Direito Civil Per-sonalizado que propomos, aquele que se preocupa com aproteção da dignidade da pessoa humana, nos termos doart. 1.º, III, da CF/1988.

O direito real de habitação seria instituído sob con-dição resolutiva. Se cessada a situação que ensejava o be-

nefício, este se resolverá. Ricardo Fiúza explica que “o dis-positivo enfaticamente protege o portador de deficiência enão a figura do filho em si, partindo-se da máxima aris-totélica de que a igualdade faz-se a partir do tratamentodesigual conferido aos desiguais, posto que aquele se en-contra em situação desfavorável, como o deficiente e oconsumidor, por exemplo, precisa ser tratado com defer-

ência, ou seja, precisa de um sistema que o guarneça com

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muito mais empenho que os demais. Fato é que dito dis-positivo pouco conhecido, pouco discutido e pouco aplic-ado, deixou de figurar no novo Código Civil, em evidenteretrocesso legislativo, do chamado direito civil constitu-cional, que simplesmente o ignorou, como se desconhe-

cesse sua relevância” (O novo Código Civil ..., 2004, p.300). Filia-se ao pensamento que funda a projeção legis-lativa. Tal como se encontra o Código Civil, verifica-se umclaro retrocesso da lei em prejuízo de pessoas portadorasde necessidades especiais, o que não se coaduna com oprincípio da dignidade da pessoa humana, previsto noTexto Maior e sempre invocado.

2.3 A SUCESSÃO LEGÍTIMA NA LINHA RETA ASCENDENTE

 A segunda classe de herdeiros chamada a suceder é a

dos ascendentes. Para fins didáticos e com o fito de evitarconfusões na compreensão da questão, repetimos a obser- vação feita anteriormente de que em todas as hipótesesaqui tratadas o falecido não deixa cônjuge ou compan-heiro, pois essas questões serão trabalhadas nas próximasseções do presente capítulo.

Se, no momento da abertura da sucessão, o falecidonão deixar descendentes, mas deixar ascendentes e par-entes colaterais, aplicando-se a regra pela qual a existênciade herdeiros de uma classe exclui os herdeiros da classesubsequente, apenas os ascendentes são chamados a su-ceder (art. 1.836 do CC). Em casos tais, diante da ordemsucessória outrora comentada, os colaterais não terãoqualquer direito sucessório. Além disso, deve-se lembrar

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que os ascendentes são herdeiros necessários e terão odireito à legítima (art. 1.845 do CC).

 Vejamos algumas regras e as suas decorrênciaspráticas:

a) Na classe dos ascendentes, o grau mais próximoexclui o mais remoto, sem distinção de linhas (art. 1.836,§ 1.º, do CC).  Não há direito de representação na linhaascendente.

Se A falece e deixa sua mãe e seu pai vivos (ambos as-cendentes de 1.º grau), seu pai recebe 50% da herança esua mãe os outros 50%, mesmo que seus avós maternos epaternos (ascendentes em 2.º grau) sejam vivos.Esquematizando:

Entretanto, se A falece deixando vivo seu pai (ascend-ente em 1.º grau) e sendo premorta a sua mãe, mesmo quesejam vivos seus avós maternos (ascendentes em 2.ºgrau), seu pai recolherá a totalidade da herança, pois o

grau mais próximo (1.º grau) exclui o grau mais remoto

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(2.º grau). Não há direito de representação na linha as-cendente. Vejamos:

b) Havendo igualdade em graus e diversidade em lin-has, os ascendentes da linha paterna herdam a metade,cabendo a outra metade aos da linha materna (art.1.836, § 2.º, do CC).

 A regra cuida da chamada sucessão por linhas (in lin-eas). A sucessão ocorre por direito próprio (como já fris-ado à exaustão, não há representação na linha ascend-ente), mas a partilha da herança se dá por linhas: metadepara a linha materna e metade para a linha paterna.

Dois exemplos são relevantes.

Se o falecido deixar apenas seus avós paternos e avós

maternos vivos (todos ascendentes em 2.º grau), pois seu

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pai e sua mãe são premortos, cada um dos avós receberá25% da herança que se dividiu em linhas: 50% para a linhapaterna e 50% para a linha materna. O gráfico es-quemático pode ser assim concebido:

Já se o falecido deixar como herdeiros apenas sua avópaterna (ascendente em 2.º grau) e seus dois avós mater-nos (também ascendentes em 2.º grau), pois seu pai e suamãe são premortos, cada um dos avós maternos receberá25% da herança e a avó paterna 50%, eis que a herança sedividiu em linhas de 50% para a linha paterna e 50% para

a linha materna:

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avóspaternos

– Falecidodeixa apen-as seusavósmaternos

Se houverigualdade de

graus edesigualdadede linhas dosascendentesno momentodo falecimento

Sucessão

pordireitopróprio( jure

 proprio)

Partilhapor lin-has (inlinea)

– Falecidodeixa amãe e o paivivos

– Falecidodeixa vivosum ou am-bos os avóspaternos eum ou am-bos os avós

maternos

Como última observação, consigne-se que os ascend-entes por afinidade – sogro ou sogra do falecido – nada re-cebem com a sua morte, porque a herança se transmiteaos ascendentes que são parentes consanguíneos ou por

adoção – pais biológicos, adotivos ou socioafetivos –, masnão por afinidade. Quanto à   parentalidade socioafetiva,sugere-se a leitura do Volume 5 da presente coleção(TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando.   DireitoCivil ..., 2011).

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2.4 A SUCESSÃO LEGÍTIMA DOCÔNJUGE. QUESTÕESCONTROVERTIDAS

2.4.1 Análise do Código Civil de 1916

No Código de 1916, estava a ordem de vocação hered-itária prevista no art. 1.603, que transcrevemos:

“Art. 1.603. A sucessão legítima defere-se na ordemseguinte:

I – aos descendentes;

II – aos ascendentes;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais;

 V – aos Municípios, ao Distrito Federal ou à União.”

Pelo dispositivo analisado, deixando o  de cujus  des-cendentes, os ascendentes, cônjuge e colaterais não eramchamados a suceder. Dessa forma, pelo Código Civil de1916 deveria ser cumprida a vontade presumida do morto,antes analisada. Tendo filhos, presumia-se que o falecidogostaria que todos os seus bens fossem entre eles partilha-dos, assim não havia concorrência com os ascendentes oumesmo com o cônjuge do falecido. Por outro lado, se nãodeixasse descendentes, chamava-se a segunda classe deherdeiros, os ascendentes. No último caso, excluídos es-tavam o cônjuge e os colaterais. Ato contínuo, não hav-endo descendentes nem ascendentes, o cônjuge era cha-

mado à sucessão. Por fim, se o falecido não deixasse

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descendentes, ascendentes ou cônjuge, só então os colat-erais eram chamados à sucessão.

Como dizia Itabaiana de Oliveira, “esta ordem se dis-tingue por sua simplicidade e corresponde, com a possívelexatidão, ao conceito de família, e, substituindo a este sen-timento, há o de pátria, que se refere no direito hereditáriocom a sucessão do Fisco” (Tratado..., 1952, v. 1, p. 171).Isso porque, na vigência do Código revogado, aplicava-se aregra pela qual a existência de herdeiros de uma classe ex-clui do chamamento da sucessão herdeiros da classeseguinte. Inexistia, como regra, a concorrência sucessória

entre o cônjuge e os descendentes ou ascendentes do fale-cido. A sucessão, na opinião dos presentes autores, eramais simples e assim deveria ter sido mantida, deixandode criar uma série de dificuldades que surgiram para osaplicadores do Direito a partir da nova codificaçãoprivada.

Pois bem, no sistema anterior, exceção era feita à re-gra contida no art. 1.611 do revogado Código Civil, que forainserido por força do Estatuto da Mulher Casada (Lei4.121, de 27.08.1962). Transcreve-se o artigo em questão:

“Art. 1.611. À falta de descendentes ou ascendentes serádeferida a sucessão ao cônjuge sobrevivente, se, ao tempo da

morte do outro, não estava dissolvida a sociedade conjugal.(Redação dada pela Lei 6.515, de 26.12.1977)

§ 1.º O cônjuge viúvo, se o regime de bens do casamentonão era o da comunhão universal, terá direito, enquantodurar a viuvez, ao usufruto da quarta parte dos bens do côn-

 juge falecido, se houver filhos, deste ou do casal, e à metade,se não houver filhos embora sobrevivam ascendentes do de

cujus.

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§ 2.º Ao cônjuge sobrevivente, casado sob regime decomunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo,será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caibana herança, o direito real de habitação relativamente aoimóvel destinado à residência da família, desde que seja oúnico bem daquela natureza a inventariar.”

Pelo comando legal transcrito, é de se observar que na vigência do Código Civil de 1916, de acordo com o regimede bens do casamento, quando do falecimento de um doscônjuges o outro teria os seguintes direitos:

a) Usufruto dos bens do falecido nas hipóteses de concorrercom descendentes ou ascendentes do de cujus, desde quecasado fosse pelo regime da comunhão parcial ou da sep-aração de bens. Tratava-se do que outrora se denominavausufruto vidual . Em concorrência com os descendentesdo falecido, o cônjuge tinha direito de usufruto sobre 1/4dos bens do morto. Se o morto não deixasse descendentes,mas apenas ascendentes, o usufruto se dava com relação àmetade dos bens.

 b) Direito real de habitação sobre o imóvel do casal , casofosse casado com o falecido pelo regime da comunhãouniversal de bens.

Percebe-se que a participação do cônjuge em concor-rência com os descendentes ou ascendentes do falecidonão se dava com relação à propriedade dos bens, ou seja,criavam-se direitos reais sobre coisas alheias: o usufruto eo direito real de habitação.

O objetivo da regra então vigente era o de garantircerto amparo ao cônjuge, casado sob o regime da sep-aração de bens e da comunhão parcial, eis que este não su-

cederia o falecido na qualidade de herdeiro e poderia ficar

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desamparado. Isso porque, em razão do regime escolhidopelos cônjuges, com a morte, os bens iriam para os des-cendentes ou para os ascendentes, de acordo com a regrasucessória contida no art. 1.603 do CC/1916. Pelo sistemaanterior, como visto, a existência de herdeiros de uma

classe excluía os da classe subsequente.Dessa forma, com o usufruto vidual , minimizava-se a

regra sucessória em questão e garantia-se, pelo menos,que o cônjuge sobrevivente tivesse certos rendimentos,que seriam maiores se concorresse com os ascendentes dofalecido (metade dos bens), e menores se concorresse com

os descendentes (1/4 dos bens).Em se tratando de comunhão universal, a preocu-

pação era outra. Neste regime, o cônjuge, na qualidade demeeiro, não ficaria desamparado, pois afinal já era propri-etário de 50% dos bens do falecido. No entanto, corria orisco de ficar sem um imóvel para morar, se os descend-entes do  de cujus   resolvessem vender o imóvel no qualresidia o viúvo ou a viúva. O que se percebia, com a pre- visão de direito real de habitação, é que o problema erasolucionado, pois o cônjuge, já sendo meeiro, teria umimóvel garantido para a sua residência, podendo morargratuitamente no imóvel enquanto permanecesse viúvo.

Concluindo, o cônjuge sobrevivente concorria com os

descendentes e com os ascendentes apenas na qualidadede usufrutuário ou de titular do direito de habitação, masnão como coproprietário dos bens deixados. Esse era o sis-tema anterior, bem mais simples do que o atual.

Mesmo assim, as críticas ao dispositivo não eram pou-cas. Isso porque, realmente, garantir ao viúvo ou à viúva a

condição de usufrutuários, apenas e tão somente, gerava

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problemas práticos intermináveis. Os filhos(descendentes) ou os pais (ascendentes) do falecido, naqualidade de proprietários dos bens herdados, criavam in-úmeras dificuldades ao viúvo usufrutuário, pois estedireito real somente recaía sobre parte dos bens e não

sobre a sua integralidade. Afirmava Álvaro Villaça Azevedo, enquanto vigente o

Código Civil de 1916, que muito estorvo causava a regra,pois na prática atrapalhava o direito dos herdeiros ( Estat-uto da família..., 2002, p. 337). Rolf Madaleno listava osproblemas do instituto: “começa que bloqueava a livre dis-

posição dos bens herdados, que ficavam presos pelo usu-fruto que se estendia sobre a generalidade dos bens deixa-dos de herança. Sempre foi muito discutido o caráter ali-mentar do usufruto vidual, permitindo sua dispensaquando o viúvo recebesse bens considerados suficientespara garantir a sua subsistência pessoal” ( Direito de família..., 2004, p. 113). Silvio Rodrigues, antes da

mudança legislativa, engrossava o coro de críticos àquestão do usufruto vidual, afirmando que “as hipótesescontempladas no direito brasileiro são, de certo modo,tímidas, ao lado das soluções encontradas alhures, em quese vê a cada passo a preocupação do legislador em pro-teger o cônjuge sobrevivente” ( Direito civil..., 1995, v. 7, p.

79).Por fim, inexistindo ascendentes ou descendentes, ocônjuge sobrevivente, independentemente do regime de bens, recebia a totalidade da herança (art. 1.611, caput , doCC/1916).

 Aliás, era equívoco comum imaginar que o cônjuge

não herdaria todos os bens se casado fosse pelo regime da

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separação obrigatória (art. 258, parágrafo único, do CC/1916). Não se tratava da verdade, mas sim de um engano.Em todos os regimes de bens, sem qualquer exceção, fale-cendo o cônjuge sem descendentes ou ascendentes, o viúvo ou a viúva herdavam a totalidade dos bens, regra es-

ta que se manteve no Código Civil de 2002, conforme seráexplicado a seguir.

 A regra segundo a qual os colaterais do falecido(irmãos, sobrinhos) só herdam caso não haja cônjuge, nãoé nova no sistema brasileiro e já existia mesmo antes da vigência do Código Civil de 1916. Isso porque o Decreto

1.839, de 31 de dezembro de 1907, conhecido por Lei Feli-ciano Penna, em seu art. 1.º, elevou o cônjuge à terceiraclasse e colocou os colaterais na quarta classe, independ-entemente do regime de bens do casamento.

Para ilustrar, elucidativo e claro o julgado do Tribunalde Minas Gerais sobre o tema: “1 – À inteligência do art.1.603, do Código Civil/1916, a sucessão legítima defere-sena ordem seguinte: I – aos descendentes; II – aos ascend-entes; III – ao cônjuge sobrevivente; IV – aos colaterais; V – aos Municípios, ao Distrito Federal ou à União, artigocorrespondente ao 1.829, do Código Civil/2002, o qualnão inovou a ordem de vocação hereditária, mantendo ocônjuge sobrevivente em terceiro lugar, antes dos colat-

erais. 2 – Desta forma, infere-se, então, que é a cônjugesobrevivente a contemplada, na ordem de vocação hered-itária, conforme disposto nos artigos supratranscritos,sendo irrelevante o regime de bens, vez que a lei não fazqualquer distinção nesse sentido. 3 – Preliminar rejeitada;recurso a que se dá provimento” (TJMG, 6.ª Câmara Cível, Apelação Cível 1.0625.02.020322-4/001-São João Del-

Rey/MG, Rel. Des. Batista Franco, j. 23.08.2005, v.u.).

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Pode-se concluir que, com relação ao cônjuge, a con-corrência sucessória durante a vigência do Código Civil de1916 era a exceção e não a regra. Com essa conclusão, verifica-se o confuso tratamento trazido pela nova codi-ficação privada.

2.4.2 O Código Civil de 2002

Em razão das críticas apontadas quanto aos prob-lemas surgidos em decorrência do usufruto vidual , partic-ularmente diante de sua pequena proteção ao cônjuge

sobrevivente e ao enorme embaraço aos herdeiros, oCódigo Civil de 2002 rompeu com o sistema tradicional,abolindo essa forma de usufruto.

 A nova ordem de vocação hereditária revoluciona,complica e até choca os aplicadores do Direito. Complica,pois as redações defeituosas dos dispositivos geram

polêmicas infindáveis e quiçá instransponíveis, razão pelaqual mais de um projeto legislativo pretende a sua alter-ação. Revoluciona, porque determina a concorrência su-cessória do cônjuge com descendentes e ascendentes dofalecido. Choca, pois a situação nova altera a norma im- bricada na mente e no coração dos brasileiros no seguintesentido:  com a minha morte, meus bens pertencerão a

meus filhos.Como se pode perceber, várias são as críticas em re-

lação ao dispositivo que consagra a ordem sucessória, pre- vendo especificamente a concorrência do cônjuge comoherdeiro. Transcreve-se o art. 1.829 do CC em vigor, queserá objeto de nosso estudo aprofundado:

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“Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordemseguinte:

I – aos descendentes,   em concorrência com o cônjugesobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regimeda comunhão universal, ou no da separação obrigatória de

 bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime dacomunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais” (destacamos).

Não se pode negar que a ideia de que o cônjuge seráchamado à sucessão conjuntamente com os descendentese ascendentes do falecido tem a sua razão de ser.Preocupou-se o legislador em evitar que, com o faleci-mento de alguém, todos os seus bens passassem à pro-priedade dos descendentes e o viúvo ou viúva ficassem à

míngua, sem condições de sobreviver.O dispositivo, concebido nos idos das décadas de 1960

a 1970, tomava por base a família da época, ou seja, umafamília extremamente sólida, baseada exclusivamente nocasamento, que, até então, era indissolúvel. Lembre-seque, quando do Projeto de Código Civil, em 1974, sequer

existia a possibilidade de divórcio no ordenamento jurídico nacional.

Naquela época não se imaginava que o casamento so-freria um processo de banalização cujo resultado signifi-caria efemeridade. Hoje, estatisticamente, sabe-se queuma boa parte dos casamentos não ultrapassa a barreira

dos dez anos. Certamente, ao prever a concorrência, não

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pensou o legislador que um dispositivo concebido nadécada de 1960 teria aplicação 40 anos depois.

O resultado desse anacronismo é de verdadeira per-plexidade por parte de todos. Doutrinadores se digladiamtentando dar operabilidade ao sistema, enquanto a popu-lação, atônita, sem nada compreender, pergunta aos ad- vogados o que ocorrerá com seu patrimônio após a morte.Sobre tal intrincada questão, interessante transcrever aspalavras de crítica de Giselda Maria Fernandes NovaesHironaka, constantes em seu trabalho de titularidade naFaculdade de Direito da USP:

“Um fato parece-nos absolutamente certo, contudo, noscasos de concorrência sucessória, aos quais nos referimoscomo de difícil ou complicada a solução do dimensiona-mento dos quinhões para cada concorrente, em razão do queexiste na Legislação Civil de 2002: os eventuais desacertos,ou as eventuais decisões judiciais díspares que acontecemaqui e ali, neste país imenso, não resultam, ao menos destafeita, de insuficiência ou do desmando judiciário, mas tãosomente da falha do legislador, por ter produzido, nãoacidentalmente, um vazio de previsão” ( Morrer..., 2011, p.462).

 A problemática do direito das sucessões revela-se tãoevidente que dois importantes projetos de lei tramitam no

Congresso Nacional objetivando profundas reformas es-truturais nessa parte do Código Civil, projetos que serãodevidamente estudados no presente livro.

Enquanto as reformas não chegam, o Poder Judiciárioé chamado a se manifestar sobre a questão e cabe àdoutrina o estudo dos problemas e das suas possíveis

soluções. Até o momento, não há julgados apontando para

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a solução da maioria dos problemas criados pela novaregra.

 Além da questão intrincada da concorrência su-cessória criada pelo novo sistema privado, outro ponto im-portante a ser salientado é que o cônjuge foi alçado à con-dição de herdeiro necessário (art. 1.845 do CC), tendodireito à legítima. Em outras palavras, deixa o cônjuge deser   herdeiro facultativo   e passa a ser  necessário. Con-forme será exposto, a condição de herdeiro necessário ger-ou ao cônjuge enorme proteção, mas não só. Isso porque,em determinadas situações a concorrência com aos des-

cendentes, aliada ao fato de ser o cônjuge herdeiro ne-cessário, gera uma indesejada sociedade quanto à herançado falecido.

 Antes do estudo específico da concorrência sucessóriaentre o cônjuge e os demais herdeiros do falecido, querompeu com a tradição outrora existente, é preciso sep-arar o estudo da sucessão do cônjuge em etapas, queelaboramos na forma de indagações, que são basicamentecinco. Esse caminho foi adotado visando apenas dar umtom didático à presente obra. Vejamos essas formulações.

1.ª indagação: O cônjuge herda os bens deixados pelo fale-cido?  A resposta está no art. 1.830 do CC em vigor, que

será ainda analisado. Sendo o cônjuge herdeiro e a res-posta afirmativa, a situação se desdobra nos casos em queo morto deixou descendentes ou ascendentes.

Se o falecido deixou descendentes, surgirão asseguintes perguntas:

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2.ª indagação: Sendo a resposta acima positiva, o cônjugedividirá os bens herdados com os descendentes do fale-cido?  A resposta está no art. 1.829, I, do CC.

 3.ª indagação: Sendo a última resposta positiva, qual oquinhão que receberá o cônjuge do falecido?  A resposta

está no art. 1.832 do CC.

Se o falecido deixou apenas ascendentes e a resposta àprimeira pergunta for positiva, nasce a seguinte pergunta:

4.ª indagação: Qual o quinhão que receberá o cônjuge do falecido concorrendo com os ascendentes?  A resposta está

no art. 1.837 do CC.

Se o falecido não deixou descendentes nem ascend-entes, e a resposta à primeira pergunta for positiva, surgea última questão:

 5.ª indagação: Se o falecido não deixou descendentes nem

ascendentes, o regime de bens altera a situação su-cessória do cônjuge?  A resposta está no art. 1.838 do CC.

Nosso estudo seguirá a ordem lógica proposta, e osdispositivos legais indicados serão analisados comprofundidade.

2.4.2.1 Requisitos necessários para que o cônjuge sejaherdeiro – art. 1.830 do CC 

 A primeira indagação a ser respondida é se o cônjugeherda os bens deixados pelo falecido. A resposta, comoantes demonstrado, está no art. 1.830 do CC. Caso a res-

posta seja positiva, as indagações prosseguem. Caso a

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resposta seja negativa, nenhuma participação terá o côn- juge na sucessão do falecido.

Pois bem, enuncia o art. 1.830 da atual codificaçãoque: “Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjugesobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavamseparados judicialmente, nem separados de fato há maisde dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa con- vivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente”.

 Assim, pelo comando legal destacado, são requisitospara que o cônjuge seja chamado à sucessão:

a) O cônjuge não pode estar separado judicialmentenem divorciado.

No sistema anterior à  Emenda do Divórcio  (EC 66/2010), a separação judicial colocava termo à sociedadeconjugal, enquanto o divórcio gerava o fim do casamento edo vínculo que dele decorre. A partir da aprovação da

citada Emenda, que alterou o art. 226, § 6.º, da CF/1988,retirando a menção à prévia separação judicial, parte con-siderável da doutrina e da jurisprudência passou a en-tender pelo fim da separação de direito, a englobar a sep-aração judicial e a extrajudicial. Essa é a opinião dospresentes autores, que seguem a linha pregada peloIBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família),idealizador da Emenda. Nessa linha, o casamento e a so-ciedade conjugal somente podem ser dissolvidos pelodivórcio. Ressalte-se que o tema está aprofundado no Volume 5 da presente coleção, que trata do Direito deFamília.

Pois bem, pela redação literal do dispositivo, em am-

 bos os casos, de separação judicial ou divórcio, o cônjuge

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não mais sucederá. Em suma, acertadamente, o diploma vigente afasta o antigo cônjuge da sucessão. Não serialógico incluí-lo, uma vez que os cônjuges não são parentesentre si. Em reforço, também seria inaceitável dizer que,rompida a sociedade ou o vínculo matrimonial, existiria

relação sucessória. Com o fim do casamento, não háqualquer motivo jurídico para chamar o antigo cônjuge àsucessão. Anote-se que a menção ao separado judicial-mente deve ser lida com ressalvas, apenas se aplicando àspessoas que se encontram em tal situação na entrada em vigor da Emenda do Divórcio, o que ocorreu em 13 de ju-lho de 2010.

Surge então uma questão de dúvida: caso haja pro-cesso de separação judicial ou de divórcio em curso e umdos cônjuges vier a falecer, o sobrevivente será herdeiro?Para José Luiz Gavião de Almeida a resposta é positiva:“pendente a ação dissolutória, a morte de um dos cônjugestorna prejudicada a lide, pondo fim ao processo. Embora a

decisão cautelar pudesse, se o feito chegasse ao fim, fazerretroagir os efeitos da sentença de desfazimento da so-ciedade ou do casamento, isso não é mais possível pelo en-cerramento antecipado e sem decisão de mérito da lidematrimonial. Sem sentença, há que se entender mantido ocasamento e, por isso, o direito sucessório do cônjuge

sobrevivente é resguardado” (Código Civil..., 2003, v.XVIII, p. 215). Em idêntico sentido, Mário Luiz Delgadoentende que “nos casos de separação judicial ou divórcio,o direito sucessório do cônjuge só está afastado depois dehomologada a separação judicial consensual ou de divór-cio direto, que só produz efeitos   ex nunc”(Controvérsias..., Questões..., 2005, v. 3, p. 425).

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Superado esse requisito, veremos o próximo, para queo cônjuge seja reconhecido como herdeiro.

b) O cônjuge não pode estar separado de fato há maisde dois anos.

Originalmente, a norma se justificava, pois a sep-aração de fato por mais de dois anos possibilitava o divór-cio direto e, então, como regra, o cônjuge sobrevivente nãoseria herdeiro. Com a Emenda Constitucional 66/2010 odivórcio poderá ser requerido a qualquer tempo pelos côn- juges, sem a exigência de qualquer prazo. De toda sorte, a

norma infraconstitucional não foi alterada, continuando, a priori , em vigor.

De qualquer modo, mesmo se estiver separado de fatohá mais de dois anos, o cônjuge poderá ainda ser chamadoà sucessão, por se tratar de presunção relativa, como lem- bra Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka

(Comentários..., 2003, v. 20, p. 221). Contudo, essa pre-sunção poderá ser afastada pelo cônjuge sobrevivente.

Esclarecendo, se estiver separado de fato há mais dedois anos, poderá o cônjuge ser herdeiro se provar que aconvivência se tornou impossível sem sua culpa. A res-salva do dispositivo merece censura em razão dos inúmer-os conflitos que a matéria probatória pode gerar, mor-mente porque o falecido, por razões evidentes, não poderáse defender no caso concreto.

O debate sobre a culpa, para o Direito de Família, já é,por si, matéria que não agrada, pois os conflitos só tendema se potencializar, tornando mais conturbadas as sensíveisrelações humanas envolvendo entes ligados por vínculo fa-

miliar. Justamente por isso há uma forte corrente

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doutrinária e jurisprudencial que defende a mitigação daanálise da culpa nas ações de Direito de Família. O próprioSuperior Tribunal de Justiça vinha mitigando a análise doelemento culpa em alguns casos, sendo interessante aquitranscrever um desses julgados:

“Separação judicial. Pedido intentado com base na culpaexclusiva do cônjuge mulher. Decisão que acolhe a pre-tensão em face da insuportabilidade da vida em comum, in-dependentemente da verificação da culpa em relação a am-

 bos os litigantes. Admissibilidade. – A despeito de o pedidoinicial atribuir culpa exclusiva à ré e de inexistir recon-

 venção, ainda que não comprovada tal culpabilidade, é pos-sível ao Julgador levar em consideração outros fatos quetornem evidente a insustentabilidade da vida em comum e,diante disso, decretar a separação judicial do casal. –Hipótese em que da decretação da separação judicial nãosurte consequências jurídicas relevantes. Embargos de di-

 vergência conhecidos, mas rejeitados” (STJ, 2.ª Seção,EREsp 466.329/RS, Rel. Min. Barros Monteiro, j.14.09.2005, DJ  1.º.02.2006, p. 427).

 Ademais, com a entrada em vigor da   Emenda do Divórcio, é forte a corrente que prega o desaparecimentototal da culpa no sistema de dissolução do casamento. Re-sumindo a forma de pensar dessa corrente, vejamos as pa-lavras do presidente do IBDFAM Rodrigo da CunhaPereira:

“Substituir o discurso da culpa pelo discurso da re-sponsabilidade significa a possibilidade do sujeito deparar-se consigo mesmo e entender o próprio desamparo, que énatural de cada ser humano. O amor acaba, mas nãoprecisamos materializá-lo em litígio através de processos

 judiciais.

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 A nova redação do art. 226, § 6.º, da Constituição daRepública, consolidando a evolução doutrinária e jurispru-dencial ao eliminar a possibilidade de discussão da culpapelo fim de um casamento, instala um novo ciclo na históriado direito de família no Brasil e propicia a compreensão deque não é necessário fazer do fim do amor uma tragédia, oupelo menos uma tragédia judicial” ( Divórcio..., 2010, p. 52).

Em reforço, no Direito das Sucessões, o problema daanálise da culpa se acentua, eis que o litígio ocorrerá entreo cônjuge supérstite e os herdeiros do falecido. Caberá aocônjuge sobrevivente o ônus de provar que “a convivência

se tornou impossível”, gerando a separação de fato nãopor sua culpa. Na realidade, na maioria das vezes, isso sig-nificará dizer que a culpa foi do falecido. E o falecido nãoestá vivo para se defender!

Ilustrando, se a mulher saiu de casa, pois era espan-cada pelo marido e ocorreu tal separação de fato por maisde dois anos, ela terá direito sucessório, desde que provetal fato. Estaremos diante de hipótese em que fatos serãolevantados e provados também contra a honra e moral dofalecido, sem que este possa se defender. Em muitas situ-ações, estará presente verdadeira lesão aos direitos da per-sonalidade do morto.

Nesse sentido, Zeno Veloso já explicava que, “em mui-

tos casos, não será fácil produzir a prova de quem teveculpa pela extinção da convivência, considerando, espe-cialmente, que um dos parceiros já morreu. Este artigo,com suas regras e exceções, dará margem a inúmerasquestões, para discussões intermináveis” ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.528). Euclides de Oliveira igualmentetecia críticas contundentes ao dispositivo, pois afirmava

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que não se trata de uma solução completa, “uma vez quefaz subsistir o direito sucessório do cônjuge separado defato há menos de dois anos, ou há mais de 2 anos, semculpa sua (...). Num primeiro exame, afigura-se excessiva aestipulação do prazo de dois anos de ruptura da vida em

comum, bastando que se compare com o prazo de um anode separação de fato, suficiente para a separação judicialsem culpa (art. 1.572, § 1.º, do Código Civil, como igual-mente dispunha o art. 5.º, § 1.º, da Lei 6.515/1977). Nãoobstante isso, o dispositivo introduz a possibilidade de dis-cussão de culpa no âmbito do processo de inventário, paraa apuração das causas da separação de fato, o que semostra inadmissível, exigindo o incursionamento daspartes às vias ordinárias, por se tratar de questão de altaindagação, pendente de dilação probatória” ( Direito deherança..., 2005, p. 128).

Sustentávamos, em edições anteriores desta obra, queo debate da culpa deveria ocorrer em ação autônoma, não

nos autos do inventário, ou seja, haveria uma reserva dequinhão em favor do cônjuge, enquanto se discutia suaqualidade de herdeiro. Se não fosse reconhecida tal qual-idade, haveria partilha do quinhão reservado aos demaisherdeiros, mas, se reconhecida sua condição, teria direitoao quinhão reservado. Com o desaparecimento da culpa

do sistema divorcista, tal entendimento anterior deve ser visto com ressalvas

Sobre a questão, de maneira poética, frisa Rolf Madaleno que “corpos e espíritos separados não podemgerar comunicação patrimonial fundada apenas no regis-tro meramente cartorial do casamento. Mola-mestra dacomunicação dos bens é a convivência conjugal, sendo que

a simples separação de fato desativa o regime

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patrimonial”. E o próprio autor não deixava de criticar aredação do atual art. 1.830 ao afirmar que “importa o fatoda separação e não sua causa, pois a autoria culposa nãorefaz o vínculo e nem restaura a coabitação, mote exclus-ivo da hígida comunicação de bens. A prova judicial de o

cônjuge sobrevivente haver sido inocentemente abandon-ado pelo autor da herança ou sair pesquisando qualquercausa subjetiva da separação fatual para caçar a culpa deuma decisão unilateral é, mais uma vez, andar na con-tramão do direito familista brasileiro, que desde a Lei doDivórcio de 1977 já havia vencido estes ranços culturais”( Direito de família..., 2004, p. 119). As palavras do juristamerecem o nosso apoio.

Na verdade, com a Emenda Constitucional 66/2010, aculpa deve ser tida como abolida no debate sucessório,pois se é irrelevante o motivo que levou o casamento aacabar, e tal motivo sequer pode ser abordado para im-pedir o fim do vínculo, razão não há para sua discussão

após a morte de um dos cônjuges.Da mesma forma, a norma exigia uma separação de

fato por mais de dois anos para que o cônjuge perdesse aqualidade de herdeiro. Buscando-se a teleologia da regra,resta claro que tal prazo mantinha estreita relação com oprazo necessário ao divórcio direto (art. 1.580, § 2.º, do

CC). Quem poderia se divorciar em razão da separação defato, perderia assim, a qualidade de herdeiro.

 A partir da   Emenda do Divórcio, basta que tenhahavido a separação de fato para que possa ocorrer o divór-cio e, portanto, qualquer debate de prazos ou de culpa per-deu o objeto em matéria sucessória. Em suma, o disposit-

ivo de lei passa a ser lido da seguinte maneira: “Art. 1.830.

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Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjugesobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavamseparados de direito ou de fato”. A menção aos “separadosde direito” tem incidência às pessoas que se encontravamem tal situação com a entrada em vigor da EC 66/2010.

 A título de ilustração, imagine-se o marido que, nãomais amando sua esposa, sai do lar conjugalabandonando-a, e passa a residir com outra mulher emunião estável. Após 30 anos de separação de fato, o varãofalece. Indaga-se: quem terá direito sucessório em relaçãoaos seus bens? Pela interpretação que os presentes autores

seguem, em regra, o direito sucessório não será recon-hecido à esposa, diante da prolongada separação de fato.

 Voltando ao ponto central da discussão, fica eviden-ciado que não fez o legislador uma boa escolha ao adotar apossibilidade de litígio quanto à culpa na separação defato para fins de o cônjuge ser ou não considerado her-deiro. A entrada em vigor da Emenda do Divórcio tem afunção de encerrar a questão.

2.4.2.2 A concorrência sucessória com os descendentes domorto – art. 1.829, I, do CC 

2.4.2.2.1 Regime de bens do casamento. Meação xSucessão

Pois bem, caso a primeira resposta antes formuladaseja negativa, ou seja, se o cônjuge não estiver legitimadoa suceder, os bens do falecido passarão integralmente àsdemais classes de herdeiros (descendentes, ascendentes,

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colaterais) ou ao Município, e não receberá o cônjuge aherança.

Todavia, caso a primeira resposta seja positiva, ouseja, se o cônjuge for considerado herdeiro legitimado asuceder o falecido, cabe a análise de sua concorrência comos descendentes do morto.

Isso porque, em determinadas situações, o cônjugeconcorrerá com os descendentes (ele e os descendentes di- videm a herança); e em outras situações apenas os des-cendentes receberão a herança (o cônjuge não recebe). Ocritério utilizado pelo legislador para saber se haverá uma

não concorrência é o do regime de bens do casamento.

 A observação evidente é que, pelo novo diploma civil,haverá concorrência entre cônjuge e descendentes doautor da herança, como regra, o que pode ser retirado dodisposto no art. 1.829, I, do CC/2002. Essa é umamudança estrutural importante em relação à codificação

anterior. A premissa que se adota para a interpretação do dis-

positivo em questão é a intenção do legislador em nãodeixar o cônjuge sobrevivente em desamparo ao concorrercom os descendentes. Parte-se do princípio pelo qual, emhavendo meação, afastada estará a sucessão por concor-

rência com os descendentes.E por que se adota a premissa em questão? Porque olegislador de 2002 retirou da codificação os dispositivosreferentes ao usufruto vidual  para alçar o cônjuge à qual-idade de herdeiro concorrente, tirando-lhe o direito deusufruto (direito real limitado) para lhe garantir o direitode propriedade, mais amplo, como se sabe. Nesse sentido,

excluindo a existência do usufruto em caso de falecimento

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sob a vigência do atual Código Civil, decidiu o TribunalPaulista:

“Usufruto vidual. Falecimento do autor da herançaquando já em vigor o Código Civil de 2002. Impossibilidade

de aplicação do disposto do art. 1.611, § 1.º, do Código Civilde 1916. Prevalência da nova legislação ante as circunstân-cias. Incidência dos arts. 1.787, 1.791, 1.831 e 1.829, I, doCódigo Civil de 2002. Recurso não provido. Ementa oficial:Inventário. Pedido a envolver direito sobre usufruto vidual.Falecimento do autor da herança quando já em vigor oCódigo Civil de 2002. Alegado direito à aplicação do dis-posto no art. 1.611, § 1.º, do CC de 1916. Impossibilidade deretroação. Aplicação da nova legislação, nas circunstâncias.

 Arts. 1.787, 1.829, I, 1.791 e 1.831. Decisão de indeferimentoem primeiro grau. Recurso da viúva não provido” (TJSP,

 Agravo de Instrumento 316.674-4/9-00-Batatais, 4.ª Câ-mara de Direito Privado, Rel. Des. J. G. Jacobina Rabello, j.06.11.2003, v.u., JTJ  274/371).

 Antes de dar sequência aos estudos, é preciso afastaruma dúvida presente na cabeça de muitas pessoas: asdiferenças entre meação e sucessão.

Quando são estudados os regimes de bens docasamento (confira o volume de Direito de Família destacoleção), percebe-se que a lei tipifica quatro regimes: a

comunhão parcial de bens (regime legal), a comunhãouniversal de bens, a participação final nos aquestos e aseparação de bens.

Cada um dos regimes terá suas regras próprias e de-pendendo do regime adotado, poderão ter os cônjugesduas espécies de bens: os comuns e os particulares.

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Serão  bens comuns  aqueles de propriedade tanto domarido quanto da esposa (50% cada), dependendo do re-gime de bens adotado. Alguns exemplos ajudam a esclare-cer a questão. Se o casal adotou o regime da comunhãouniversal, todos os bens que eles comprarem durante o

casamento, ou mesmo os bens que os cônjuges ganharem(por doação) ou receberem em herança, serão benscomuns e pertencerão 50% ao marido e 50% à esposa.Essa conclusão pode se retirada da regra básica do regime,constante do art. 1.667 do CC.

Se o regime for o da comunhão parcial, todos os bens

comprados pelo marido ou pela esposa, ainda que emnome de apenas um dos cônjuges, na constância docasamento pertencerão a ambos, sendo considerados benscomuns, nos termos do art. 1.660, I, do CC. Nesse caso, adivisão também ocorrerá na proporção de 50% para cadaum dos cônjuges.

Note-se que, com relação aos bens comuns, marido eesposa são coproprietários, tecnicamente chamados decomunheiros. Isso é o que justamente constitui a meação.É importante dizer que a meação não surge com a mortede um dos cônjuges; ela existe durante o período em quedurar o casamento. A meação é instituto de Direito deFamília, eis que mantém relação com o regime de bens.

Não constitui, portanto, instituto de Direito Sucessório. A título prático e utilizando a corriqueira afirmação de

Zeno Veloso, está incorreta a afirmação de uma viúva nosseguintes termos: “Eu era casada com o meu marido peloregime da comunhão universal. Ele morreu e eu vou herd-ar metade dos bens”. Ora, metade dos bens já era da viúva,

em regime de condomínio. Não se herda a meação!!! A 

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resposta para esse caso seria: “Minha senhora, a metadedos bens já é sua!”.

Em outras palavras, com relação aos bens comuns,com o fim do casamento cada cônjuge terá direito a 50%dos bens, na qualidade de condômino – sua meação. Épatrimônio que já lhe pertence. Destacamos esse esclareci-mento, para fins didáticos:

Se houver separação judicial ou divórcio, cadacônjuge ficará com 50% dos bens comuns, poissão coproprietários desses bens. Caso haja

morte de um dos cônjuges, o outro não recebe ameação que já lhe pertence por força do direitode propriedade.

Serão   bens particulares   aqueles que pertencerem aapenas um dos cônjuges, sem a participação do outro. Per-

tencem 100% ao marido ou 100% à esposa. Com relaçãoaos bens particulares, não há comunhão, não há copro-priedade e, sendo assim, não há meação. Exemplo clássicode bem particular é aquele que a pessoa casada pelo re-gime da comunhão parcial de bens tinha antes de se casar(art. 1.659, I, do CC). Também, será bem particular a her-ança recebida por um dos cônjuges casado no regime da

comunhão parcial de bens (art. 1.659, I, do CC).No regime da separação convencional de bens, todos

os bens são particulares por força do pacto antenupcial.Não há patrimônio comum. Destaca-se:

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Como se percebe, caso haja separação judicialou divórcio, os bens particulares não serão di-vididos, pois não há meação, sendo estes de ex-clusiva propriedade do cônjuge titular (maridoou esposa).

Em conclusão, os conceitos de meação e de herançanão se confundem. Os bens que compõem a herança do fa-lecido podem ser comuns ou particulares.

Se forem bens comuns, como o falecido não é propri-etário de 100%, mas apenas de 50%, tendo o cônjugesobrevivente a sua meação (50%), os outros 50% do pat-rimônio farão parte da herança.

Se forem bens particulares, como o falecido é propri-etário de 100%, não haverá meação, e a totalidade dos bens fará parte da herança.

Como síntese do tema, Sebastião Amorim e Euclidesde Oliveira concluem que “uma coisa é a meação, que de-corre do regime de bens e preexiste ao óbito do cônjuge,devendo ser apurada sempre que dissolvida a sociedadeconjugal. Diversamente, herança é a parte do patrimônioque pertencia ao falecido, transmitindo-se a seus su-cessores legítimos ou testamentários” ( Inventários e

 partilhas..., 2006, p. 95).Superada a questão da meação e sua diferença para a

herança, temos que responder à seguinte pergunta: emque regimes de bens o cônjuge dividirá os bens herdadoscom os descendentes do falecido? A resposta está no art.1.829, I, do Código Civil, que passaremos a abordar deforma detalhada.

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Maria é meeira, mas não é herdeira em concorrência comos descendentes.

Em resumo, fica assim o  diagrama patrimonial , dedivisão dos bens:

– 50% dos bens – meação de Maria;

– 50% dos bens – herança a ser partilhada entre os filhos docasal.

Entretanto, um aspecto interessante de se ressaltar éque mesmo no regime da comunhão universal podem exi-

stir bens que não são comuns, mas que pertencem a apen-as um dos cônjuges, sendo, portanto, bens particulares.

Tais bens estão previstos no art. 1.668 do Código Civilem vigor. Para exemplificar, se o marido receber uma casaem doação gravada com cláusula de incomunicabilidade,apesar de casado pelo regime da comunhão universal de bens, a casa será bem particular e não haverá meação.

José Luiz Gavião de Almeida explica que “é equivoc-ada a ideia de que o cônjuge, casado pelo regime dacomunhão universal de bens, sempre recebe. Por isso, odispositivo deve ser entendido no sentido que ficará eleprivado da sucessão concorrente se houver patrimôniocomum. Não havendo, cabe-lhe quota na sucessão dos

 bens particulares do falecido” (Código Civil..., 2003, v.XVIII, p. 224).

Não é outra a opinião de Francisco Cahali, para quem“haverá de se questionar se terá o viúvo direito sucessório,quando casado no regime da comunhão universal de bens,ou qualquer outro regime convencional, e o falecido pos-

suir apenas bens particulares (p. ex. gravados por cláusula

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de incomunicabilidade na doação ou por testamento). A coerência recomenda seja deferida a sucessão ao cônjugesobre os bens particulares, se a estes for restrita a herançado viúvo, a despeito da literalidade do texto ser de diversoconteúdo” (Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 214).

Leciona Miguel Reale que com a mudança do regimelegal pelo advento da Lei 6.515/1977, que era o da comun-hão universal e passou a ser o da comunhão parcial,“tornou-se evidente que o cônjuge, sobretudo quando de-sprovido de recursos, corria o risco de nada herdar notocante aos bens particulares do falecido, cabendo a her-

ança por inteiro aos descendentes ou ascendentes. Daí aideia de tornar o cônjuge concorrente aos bens particu-lares do autor da herança” ( História do novo CódigoCivil..., 2005, v. 1, p. 230). Seguindo o  espírito da legis-lação, pelo qual em havendo meação não há concorrênciacom os descendentes, porque o cônjuge não estará desam-parado, parece lógica a opinião dos mestres segundo a

qual, se houver bem particular, apesar de o regime ser oda comunhão universal, deverá haver concorrênciasucessória.

 A interpretação literal pela qual não haverá concor-rência sobre os bens particulares torna o casamento peloregime da comunhão universal menos protetivo aos côn-

 juges que o da comunhão parcial em termos de concorrên-cia com os descendentes, conforme será demonstrado nopresente capítulo.

b) Na separação obrigatória de bens (art. 1.641 doCC).

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Duas são as razões para que não haja a concorrênciasucessória entre o cônjuge e os descendentes na hipótesede separação obrigatória de bens.

 A  primeira razão  decorre dos motivos que impõemaos nubentes o regime da separação de bens, que estãoprevistos no art. 1.641 do CC/2002. Vale dizer que há umerro na remissão do legislador, que menciona, no art.1.829, I, o art. 1.640, parágrafo único. Nessas hipóteses, alei impediu a escolha livre de um regime de bens, impondoa separação, razão pela qual ela é chamada de separaçãoobrigatória.

José Luiz Gavião de Almeida explica que “a intençãodo legislador foi manter a vontade da lei e não partilhar os bens na dissolução matrimonial involuntária. Não se en-tregam os bens ao casado pelo regime da separação,quando o casamento tem fim pela morte de um dos con-sortes” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 226). Real-mente, não faria sentido permitir a lei a concorrência docônjuge casado pelo regime da separação obrigatória comos descendentes do falecido. Se a lei impediu a comunhãoem vida, razão terá para impedir a concorrência   post mortem.

 A regra tem a sua lógica, portanto.

 A razão para a existência do regime da separaçãoobrigatória seria a proteção de determinadas pessoas quepoderiam ser prejudicadas pelo casamento. Entendeu o le-gislador originalmente que o maior de 60 anos poderia serenganado por certa jovem, que estaria interessada maisem seus dotes financeiros do que em suas habilidades ecaracterísticas pessoais (art. 1.641, II, do CC), o que, para

nós, diga-se de passagem, é um absurdo. Não se olvide que

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a recente Lei 12.344, de 9 de dezembro de 2010, aumentoutal idade para 70 anos, alterando o dispositivo do CC/2002. Na opinião dos presentes autores, o aumento da id-ade não resolve o problema de inconstitucionalidade danorma, que traz em seu bojo preconceito contra o idoso,

em clara lesão ao art. 5.º, caput , da CF/1998.Superada a crítica, desse modo, em caso de dissolução

 voluntária (divórcio) ou involuntária (morte) docasamento, não haveria razão para permitir que a esposa viesse a receber parte dos bens do casal. Encerrando, oque é vedado por lei não pode ser contornado pela própria

lei em manifesta contradição ao espírito da separação de bens (LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários..., 2004,p. 220).

 A  segunda razão para justificar a disposição é a ma-nutenção do disposto na Súmula 377 do Supremo TribunalFederal, segundo a qual: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância docasamento”. Vale dizer que a súmula é de 3 de abril de1964. Como já exposto no volume anterior desta coleção, aaplicabilidade da súmula divide os autores da presenteobra (TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando.  DireitoCivil ..., 2011).

Mantida a aplicação da súmula mesmo na vigência do

CC/2002, a concorrência seria descabida, pois os cônjugescasados pelo regime da separação legal teriam direito departilhar os aquestos, ou seja, os bens adquiridos na con-stância do casamento. Com esta partilha, o cônjuge sobre- vivente disporia de bens para sobreviver, conforme afirmaEduardo de Oliveira Leite (Comentários..., 2004, v. XXI,

p. 221).

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 A súmula tem por objetivo afastar o odioso enriqueci-mento sem causa de um dos cônjuges em detrimento dooutro, eis que, muitas vezes, apenas o marido trabalha forada residência e amealha bens apenas em seu nome, masposteriormente se verifica que a esposa cuidava do lar e da

família. Esse é o argumento principal daqueles que defen-dem a sua vigência, caso de Flávio Tartuce.

Note-se que a súmula deixa duas dúvidas, ambas solu-cionadas pela doutrina e pela jurisprudência. A primeira ésaber quais são os bens que se comunicam; se todos os bens ou apenas os adquiridos a título oneroso (aquestos).

 A resposta é que apenas os aquestos se comunicam, já quea súmula nasce a partir do art. 259 do Código Civil anteri-or, pelo qual: “Embora o regime não seja o da comunhãode bens, prevalecerão, no silêncio do contrato, os princípi-os dela, quanto à comunicação dos adquiridos na constân-cia do casamento”.

Outra dúvida que surge é se há a necessidade ou nãodo esforço comum. Aqui, não há unanimidade no próprioSuperior Tribunal de Justiça.

Para José Fernando Simão, a resposta é negativa, nosentido de que pela Súmula 377 do STF, ainda que inexistaesforço comum, haveria a comunicação dos bens ad-quiridos a título oneroso na constância do casamento,

ainda que esteja apenas no nome de um dos cônjuges.Nesse sentido:

“Direito civil. Regime legal de separação legal de bens. Aquestos. Súmula 377. Esforço comum. 1. A viúva foi casadacom o  de cujus  por aproximadamente 40 (quarenta) anos,pelo regime da separação de bens, por imposição do art.

258, parágrafo único, I, do Código Civil de 1916. 2. Nestas

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circunstâncias, incide a Súmula 377 do Supremo TribunalFederal, que, por sinal, não cogita de esforço comum, pre-sumido, neste caso, segundo entendimento pretoriano ma-

 joritário. 3. Recurso especial não conhecido” (STJ, 4.ª T.,REsp 154.896/RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j.20.11.2003, DJ  1.º.12.2003, p. 357).

Todavia, Flávio Tartuce entende ser necessária estaprova, o que também está de acordo com outros julgadosdaquele mesmo Tribunal: “Casamento. Regime de bens.Separação legal. Aquestos. Comunicação. Comunicam-seos aquestos adquiridos na vigência do regime de separação

legal, pelo esforço comum. Recurso não conhecido” (STJ,4.ª T., REsp 442.165-RS, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 05.09.2002, DJ  28.10.2002, p. 327; veja também: REsp138.431-RJ,   JBCC    189/326; REsp 1.615-GO; REsp234.482-SP; RDTJRJ  43/71, RDR 16/270).

Pois bem, para aqueles que entendem que a Súmula377 do STF não tem mais aplicação, a constatação que sefaz é a seguinte: tanto o regime da separação convencionalsem exclusão expressa dos aquestos quanto o da separaçãoobrigatória não eram regimes de separação absoluta de bens, pois em ambos havia, quer por força de lei (art. 259do CC/1916) quer por força da jurisprudência (Súmula 377do STF), a comunhão dos bens adquiridos a título oneroso

na constância do casamento. Entretanto, para essa cor-rente, com a vigência do novo Código Civil, o art. 259 doCC/1916 foi revogado e não encontra correspondente leg-al. A primeira conclusão a que se chega é que, após a vigência do Código Civil de 2002, a separação convencion-al de bens é realmente uma separação absoluta, não hav-endo a comunhão dos aquestos.

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 A divergência a respeito da aplicação ou não daSúmula 377 do STF também divide a doutrina.

Para Francisco Cahali, em atualização à obra de SilvioRodrigues, a súmula está superada e não é mais aplicável àseparação obrigatória, que passa a ser um regime deefetiva separação de bens. Mesmo porque sua origem re-monta ao art. 259, que não encontra correspondente( Direito civil..., 2004, v. 6, p. 148). Em idêntico sentidoentendem Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado(Código Civil..., 2005, p. 942), José Fernando Simão eEuclides de Oliveira. O último, em mensagem eletrônica

enviada aos autores, afirma que a súmula perdeu osuporte legal com a revogação do art. 259 do CC/1916 epergunta: “Revogada a lei não se tem como automatica-mente prejudicada, vencida, desfalecida, insubsistente a jurisprudência que naquela se baseava?”.

Em sentido contrário, pugnando pela vigência e ap-licação da Súmula 377 do STF, entre outros, Silvio deSalvo Venosa ( Direito civil..., 2003, v. 6, p. 345), Rolf Madaleno ( Direito de família..., 2004, p. 115) e Flávio Tar-tuce. O fundamento para a permanência de aplicação doentendimento sumular, como antes mencionado, é o deque a Súmula evita o enriquecimento sem causa de um doscônjuges em detrimento do outro, até porque a comu-

nicação exige o esforço comum, conforme orientação par-cial do STJ. Seguindo a trilha desse posicionamento, é dese apontar que o enriquecimento sem causa é vedado noart. 884 do Código Civil em vigor.

Também como reforço para fortalecer a tese da vigên-cia da Súmula 377 do STF, pode-se remontar à análise

histórica do Projeto de Código Civil. Isso porque o art.

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1.641 do antigo Projeto tinha a seguinte redação: “É obrig-atório o regime da separação de bens no casamento, sem acomunhão de aquestos: (...)”. A parte final foi suprimidapela Câmara dos Deputados com a seguinte justificativa:“em se tratando de regime da separação de bens, os aques-

tos provenientes do esforço comum devem se comunicar,em exegese que se afeiçoa à evolução do pensamento jurídico e repudia o enriquecimento sem causa, estandosumulada pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula 377)”.

Bem, se a súmula estiver mantida, a separação obrig-atória não será absoluta. Desse modo, haverá bens comuns

(adquiridos a título oneroso na constância do casamento)e bens particulares do falecido. Sobre os bens comuns, ocônjuge do falecido terá direito à meação, mas não terádireito à concorrência com os descendentes por força daexpressa disposição do art. 1.829, I, do Código Civil.Quanto aos bens particulares do falecido, não terá direitoa nada.

Caso não tenha mais aplicação a Súmula 377 do STF, aconsequência será oposta e a separação obrigatória poderáser considerada uma  separação absoluta. Assim, o côn- juge não terá direito à meação, nem à concorrência su-cessória com os descendentes. Se essa segunda inter-pretação prevalecer, entende Rolf Madaleno que estarão

reduzidas sensivelmente “as históricas conquistas, numinegável retrocesso constitucional” ( Direito de família...,2004, p. 115).

Quem terá razão no embate em questão? Trata-se deuma das questões mais controvertidas do Direito deFamília e do Direito das Sucessões na atualidade. Para

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2.4.2.2.3 Regimes em que o cônjuge concorrerá com osdescendentes

Nos regimes a seguir estudados, o cônjuge dividirá aherança deixada pelo falecido com os descendentes.

Ressalte-se que, no presente tópico, ainda não será dis-cutido qual quinhão será atribuído ao cônjuge, mas apenasas hipóteses de concorrência com os descendentes.

a) Na separação convencional de bens.

Com a revogação do art. 259 do Código Civil de 1916,

conforme explicado anteriormente, fica claro que nãohaverá comunicação de qualquer tipo de bem, mesmo emcaso de silêncio do pacto antenupcial quanto aos aquestos,quando os cônjuges adotarem o regime da separação de bens.

Fica definitivamente superada a questão e não haverá

a comunicação de nenhum bem adquirido durante ocasamento, se os cônjuges optarem pelo regime da sep-aração convencional de bens. Consequentemente, ao finaldo casamento, o cônjuge sobrevivente pode ficar desam-parado. Não havendo meação, haverá sucessão em concor-rência com os descendentes.

 As críticas ao dispositivo não são poucas. Isso porque,mesmo os cônjuges optando pela separação convencionale absoluta de bens, exatamente com o fito de evitar acomunicação de bens presentes, pretéritos e futuros, como falecimento de um deles, o outro será herdeiro em con-corrência com os descendentes.

Não se pode esquecer que, ainda que o falecido

elabore testamento, não poderá o cônjuge ser privado de

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sua legítima por se tratar de herdeiro necessário. Então,geralmente, perguntam os nossos alunos: não poderia ofalecido doar todos os seus bens a seus filhos para evitar aconcorrência sucessória? A resposta é: a doação será nula,por força do art. 549 do Código Civil, que veda a  doação

inoficiosa. A lei criou situação que não pode ser superadapor meio de testamento ou de contrato. A concorrênciaocorrerá pelo menos em relação à legítima, querendo o fa-lecido ou não.

Reconhece Euclides de Oliveira que “boa parte dosproblemas se resolveria com a exclusão do cônjuge do rol

de herdeiros necessários, abrindo campo ao titular dos bens para dispor sobre sua sucessão mediante partilha em vida (por doação) ou por disposição testamentária, sem aspeias do respeito à legítima do cônjuge” ( Direito de her-ança..., 2005, p. 103). Entretanto, não quis o legisladorpermitir que o falecido deixasse o cônjuge em desamparo.Cercou, limitou e restringiu de maneira eficaz a vontade

do morto, que terá que garantir ao cônjuge supérstite pelomenos seu quinhão da legítima.

Essa é a orientação da doutrina majoritária e é aquelaque deve ser seguida. Em sentido contrário, menciona-se aopinião de Miguel Reale. Em polêmico artigo publicadopelo jornal O Estado de S. Paulo, de 12 de abril de 2003,

defendeu o sistematizador do Código Civil de 2002 que oart. 1.829, I, do diploma, ao mencionar o regime da sep-aração obrigatória de bens, disse menos do que deveria, e,portanto, também estaria excluído da concorrência com osdescendentes o cônjuge casado pelo regime da separaçãoconvencional de bens. Reale conclui que não concorremcom os descendentes os cônjuges casados pelo regime da

separação de bens, seja ela obrigatória (art. 1.641 do CC)

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ou convencional (art. 1.687 do CC), em razão de uma in-terpretação sistemática e não isolada do art. 1.829. Paraque não pairem dúvidas, transcrevemos as palavras dopróprio Miguel Reale:

“Essa minha conclusão ainda mais se impõe ao verificar-mos que, se o cônjuge casado no regime de separação de

 bens fosse considerado herdeiro necessário do autor da her-ança, estaríamos ferindo substancialmente o disposto no art.1.687, sem o qual desapareceria todo o regime da separaçãode bens, em razão do conflito inadmissível entre esse artigoe o art. 1.829, I, fato que jamais poderá ocorrer numa codi-

ficação à qual é inerente o princípio da unidade sistemática(...). ‘Em um código os artigos se interpretam uns pelos out-ros’. Eis a primeira regra de hermenêutica jurídica estabele-cida pelo jurisconsulto Jean Portalis, um dos principaiselaboradores do Código Napoleão” ( História..., 2005, v. 1, p.229).

Conclui o Professor Reale seu artigo com a seguinte

nota: “se no entanto, apesar da argumentação por mimdesenvolvida, ainda persistir a dúvida sobre o inc. I do art.1.829, o remédio será emendá-lo, eliminando o adjetivo‘obrigatória’”.

Em contraponto à opinião de Miguel Reale, Carlos Al- berto Dabus Maluf afirma de maneira enfática que “com

efeito, se o próprio articulista entende que deverá haveruma alteração legislativa para deixar claro que o cônjugecasado no regime da separação convencional de bens nãoé herdeiro necessário, nos é lícito concluir que enquantonão ocorrer a alteração por ele proposta o cônjuge queconvolou núpcias no regime da separação convencional de bens é sim herdeiro necessário. De mais a mais, a normaem debate é clara e ‘in claris cessat interpretatio’. Assim

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concluímos que o cônjuge sobrevivente casado no regimeda separação convencional de bens é herdeiro necessário,não estando abrangido pelas exceções previstas no inciso Ido artigo 1.829 do Código Civil de 2002 e, que só perderáele esta condição quando ocorrer uma alteração legislativa

eliminando o adjetivo ‘obrigatória’” (A sucessão do côn- juge...   Disponível em: <http://www.direitofamilia.net/?pagina=detalhaartigo&idartigo=64>. Acesso em: 5 jun.2008).

Na linha das últimas palavras transcritas, discorda-sedo saudoso Mestre Reale. O regime de bens da separação

convencional não fica esvaziado com a regra de concorrên-cia sucessória. Todas as regras produzirão seus efeitoscaso ocorra a separação judicial ou o divórcio do casal. Seo combinado pelo pacto antenupcial foi a inexistência demeação, esta não ocorrerá entre os cônjuges.

Isso não significa dizer que não haverá futura concor-rência sucessória. Repita-se, durante a vida dos cônjuges oregime produzirá todos os efeitos por ele almejados. Con-tudo, caso o casamento termine pela morte, não poderiamos cônjuges exigir que o regime escolhido produzisse efei-tos para além de sua vida. Então, se quiserem evitar o in-conveniente da concorrência sucessória, poderão alterar oregime de bens (art. 1.639 do CC) ou mesmo optar pelo

fim do casamento. Caso permaneçam casados, a concor-rência será inevitável.

Nos dizeres de Mário Luiz Delgado, “afirmação quedeve ser rechaçada é a de que, ao atribuir direito su-cessório ao cônjuge casado sob o regime da separação con- vencional de bens, teria o legislador invadido a autonomia

privada e abalado os pilares do regime da separação por

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permitir a comunicação post mortem do patrimônio. (...)Não se trata de comunicação de patrimônio, não se po-dendo confundir regime de bens com direito sucessório.Com a morte extinguiu-se o regime e o que está em dis-cussão é o direito do cônjuge a uma pequena parte da her-

ança...” (Controvérsias..., Questões..., 2005, v. 3, p. 433).De qualquer forma, como bem ponderado por Dabus

Maluf, para prevalecer o entendimento do ProfessorReale, será necessária alteração legislativa, que, assim, sóatingirá as sucessões abertas após sua efetivação.

 Apesar das críticas formuladas, seguindo a lição de

Miguel Reale, compila-se trecho da decisão de primeirograu, proferida nos autos do Inventário 000.03.096723-6,que tramita pela 7.ª Vara de Família e Sucessões do ForoCentral da Capital de São Paulo: “Trata-se de inventárioonde os herdeiros testamentários da falecida opõem-se àsprimeiras declarações prestadas pelo inventariante,sustentando que o viúvo não é herdeiro necessário, emrazão do casamento celebrado pelo regime da separaçãototal de bens. Além disso, o viúvo, em testamento, não ter-ia sido contemplado pela falecida. Nesse caso, aquele cas-ado em regime de separação total de bens não pode ser en-tendido como herdeiro necessário, sob pena de se descon-siderar a natureza do regime escolhido” (Juíza Adaísa

Bernardi Isaac Halpern, 19 de julho de 2004). A decisão transcrita foi reformada e, em absoluta con-

formidade com a posição e ensinamentos da doutrina, oTJSP proferiu acórdão cuja ementa se transcreve:

“Inventário. Cônjuge sobrevivente. Ausência de descend-entes e ascendentes. Condição de herdeiro necessário únicoe não concorrente (art. 1.829, III, do CC), ao qual deve ser

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assegurada a legítima no espólio de sua falecida esposa, in-dependentemente do regime de bens adotado no casamento,no caso o da separação convencional. Incidência dos arts.1.838 e 1.845 do CC. Impugnação dos herdeiros testa-mentários que até redundou na exclusão do cônjuge docargo de inventariante, afastada. Decisão reformada. Agravoprovido” (TJSP, 1.ª Câmara de Direito Privado, Agravo deInstrumento 364.580-4/6, Rel. Des. José Roberto Bedran, j.22.02.2005, v.u.).

Como não poderia ser diferente, vemos com bons ol-hos e concordamos com a reforma daquela decisão.

O Tribunal Paulista, em situação semelhante, demon-strou entender que, realmente, haverá a concorrência comos descendentes na hipótese de casamento pelo regime daseparação convencional de bens: “Inventário. Viúva cas-ada com o autor da herança no regime de separação con- vencional de bens. Direito de sucessão legítima em con-corrência com a filha do falecido. Inteligência do art.

1.829, I, do Código Civil. Vedação que somente ocorre,entre outras causas, se o regime de casamento for o deseparação obrigatória de bens. Recurso improvido” (TJSP,3.ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento313.414-4/1-Barretos, Rel. Des. Flávio Pinheiro, j.04.11.2003, v.u., RJ  314/102).

O Tribunal de Justiça do Pará, do mesmo modo,seguiu tal orientação ao garantir ao cônjuge casado peloregime da separação convencional a participação naherança:

“Agravo de instrumento. Direito de família. Sucessão.Cônjuge sobrevivente contemplado como herdeiro ne-

cessário. Inteligência do art. 1.829 do Código Civil. I –

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 Admite-se o cônjuge casado pelo regime voluntário de sep-aração de bens como herdeiro necessário concorrendo comos descendentes em iguais partes no inventário. O ver-dadeiro sentido do inciso I do artigo 1.829 do novo CódigoCivil é segundo o qual a sucessão legítima cabe, em primeiralinha, aos descendentes, em concorrência com o cônjugesobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regimede comunhão universal de bens ou no da separação obrig-atória de bens (artigo 1.640, parágrafo único); ou se, no re-gime da comunhão parcial, o autor da herança não houverdeixado bens particulares. II – Agravo de instrumento con-hecido e improvido” (TJPA, Processo 200630046066,

 Agravo de Instrumento, 1.ª Câmara Cível Isolada, Comarca:

Belém, Publicação: 13.04.2007, Rel. Leonardo de NoronhaTavares).

 Apenas para demonstrar como a questão não épacífica, e, para tanto, há um longo caminho a percorrer, oTribunal de Justiça de São Paulo já proferiu decisão emsentido contrário:

“Sucessão. Tendo o autor apelante casado com a ‘de cujus’pelo regime da separação convencional de bens, incide nahipótese o inciso I do artigo 1.829 do Código Civil/2002,equiparada a separação convencional à obrigatória, a im-pedir que o cônjuge sobrevivente ostente a qualidade de her-deiro. Artigos 1.829, I, 1.640, 1.641, I e II e III, todos do

Código Civil de 2002. Ação improcedente. Recurso im-provido” (TJSP, Apelação Cível 535.332.4/6-00, Des. Ber-etta da Silveira, j. 27.11.2007).

Esse também foi o entendimento do Superior Tribunalde Justiça sobre o tema. No Recurso Especial 992.749/MS, decidiu a Terceira Turma do STJ o seguinte: “O re-

gime de separação obrigatória de bens previsto no art.

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1.829, inc. I, do CC/2002, é gênero que congrega duas es-pécies: (i) separação legal; (ii) separação convencional.Uma decorre da lei e a outra da vontade das partes, e am- bas obrigam os cônjuges, uma vez estipulado o regime daseparação de bens à sua observância. Não remanesce, para

o cônjuge casado mediante separação de bens, direito àmeação, tampouco à concorrência sucessória,respeitando-se o regime de bens estipulado, que obriga aspartes na vida e na morte” ( Informativo  n.  418  do STJ,Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 1.º.12.2009).

Mostrar a fragilidade dos argumentos adotados se faz

necessário. Basicamente dois são os argumentos equivoca-dos que serviram de fundamento à decisão.

O primeiro deles é o seguinte: “O regime de separaçãoobrigatória de bens previsto no art. 1.829, inc. I, do CC/02, é gênero que congrega duas espécies: (i) separação leg-al; (ii) separação convencional. Uma decorre da lei e aoutra da vontade das partes”. O grande problema do argu-mento é que ele não encontra guarida na doutrina pátria.Trata-se, na verdade, de tese que contraria todas as lições,dos civilistas mais antigos aos mais novos.

 A doutrina brasileira repudia tal entendimento, sendoque, partindo das lições de Beviláqua e chegando a MariaHelena Diniz, o desacerto da informação contida no

acórdão revela-se evidente. A separação obrigatória não é gênero e não congrega

duas espécies. Trata-se de equívoco conceitual. A   sep-aração de bens é que constitui gênero que congrega duasespécies:   (a)   separação convencional (que decorre depacto antenupcial) e (b) separação obrigatória ou legal (re-

gra restritiva prevista no art. 1.641). Assim, o primeiro

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fundamento não é suficiente para afastar a concorrênciasucessória das pessoas casadas pelo regime da separaçãoobrigatória.

O segundo fundamento é igualmente frágil (“Não re-manesce, para o cônjuge casado mediante separação de bens, direito à meação, tampouco à concorrênciasucessória, respeitando-se o regime de bens estipulado,que obriga as partes na vida e na morte”). Ora, afirmarque o regime de bens   obriga as partes depois de suamorte   revela teratologia.  Obrigação, como se sabe, é o vínculo jurídico entre o credor e o devedor. Na realidade, o

que afirma o julgado, utilizando-se inadequadamente apalavra obriga, é que o regime de bens produz efeitos de-pois da morte dos cônjuges e, portanto, após findo ocasamento. Isso porque a morte põe fim ao casamento,permitindo, inclusive, que o supérstite se case novamente. A morte põe fim à sociedade conjugal por força expressado art. 1.571, I, do Código Civil e, sendo assim, o regime de

 bens também se extingue com a morte.Na verdade, pretende a decisão em comento utilizar-

se da ideia de ultratividade, ou seja, a eficácia de um insti-tuto que não mais existe. Repita-se que se a morte ex-tingue o casamento, extingue a sociedade conjugal e tam- bém o regime de bens, não se admitindo que o instituto

permaneça produzindo efeitos depois de extinto. Haveriaalgo como uma eficácia póstuma do regime de bens  queum dia existiu. Curiosa a interpretação jurisprudencial,porque, novamente, não encontra guarida na doutrinapátria.

Na verdade, o julgado assim concluiu para tentar re-

solver caso específico, de suposto “golpe do baú”.

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Resolveu-se o problema na espécie, mas criaram-se mui-tos outros, pela geração de grande incerteza e dúvida paraa doutrina e para a jurisprudência nacionais. Como bemaponta Zeno Veloso, ao comentar tal julgado, “Apesardesse julgado da Terceira Turma do STJ – que deverá ficar

sozinho –, vão prevalecer e continuar sendo aplicadas asdisposições do Código Civil: o cônjuge casado sob o regimeda separação obrigatória de bens não concorre com osdescendentes do de cujus; o cônjuge casado sob o regimeda separação convencional de bens concorre, sim, com osdescendentes do falecido. É a doutrina adotada neste liv-ro” (VELOSO, Zeno. Direito hereditário..., 2010, p. 72).

Merece relevo o fato de que os ensinamentos acima fo-ram adotados pela 2.ª Câmara de Direito Privado doTribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em decisão dofinal do ano de 2011, que afasta a concorrência sucessóriado cônjuge no regime da separação convencional de bens.O acórdão foi assim ementado:

“Agravo de Instrumento. Inventário. Decisão que declarouque o cônjuge supérstite não é herdeiro nem meeiro. Viúvaque foi casada com o autor da herança pelo regime da sep-aração convencional. Decisão que contraria a lei, em especialos artigos 1.845 e 1.829 do Código Civil. Decisão reformada.

 Agravo provido” (TJSP, Agravo de Instrumento

0007645-96.2011, Agravantes: Silvia Maria Aranha Matar-azzo (inventariante) e outro, Agravada: Flavia Matarazzo,Comarca: São Paulo, Rel. Des. José Carlos Ferreira Alves, j.04.10.2011).

Como se pode perceber, já há resistências em relaçãoao julgado pronunciado pelo Superior Tribunal de Justiça,

aqui devidamente criticado.

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b) Na comunhão parcial em que o autor da herançadeixou bens particulares.

Esta hipótese é uma das mais tormentosas para adoutrina. Isso porque surge a seguinte dúvida: se o autorda herança deixou bens particulares, concorreria o côn- juge com os descendentes na totalidade da herança inclus-ive com relação aos bens em que há meação ou apenasquanto aos bens particulares?

 Antes do estudo das correntes doutrinárias, para quese perceba a dificuldade do tema, compilamos a obser- vação de Fernando Gaburri de Souza Lima: “independ-

entemente de se considerar uma hipótese mais ou menos justa que a outra, a maior dificuldade reside justamente naperfeita possibilidade de se adotar tanto um quanto ooutro posicionamento, uma vez que ambos são juridica-mente sustentáveis” (Questões..., Direito civil..., 2006, p.886). Pois bem, vejamos as duas correntes que surgem.

1.ª corrente – Seguindo o espírito do legislador, peloqual, em havendo meação, não há sucessão em concorrên-cia com os descendentes, conclui-se que o cônjuge só con-correria quanto aos bens particulares e não quantoàqueles em que já teria o direito à meação. Nesse sentido éa lição de José Luiz Gavião de Almeida: “A regra é que o

cônjuge sobrevivo recolha na existência de bens particu-lares. Mas, por óbvio, tem sucessão concorrente apenascom relação a esses bens particulares, não aos comuns,pois desses já retirou sua meação” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 227).

O argumento que nos parece cabal e que confirma o

acerto desta primeira posição vem de Euclides de Oliveira:

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“O assunto é manifestamente polêmico, porém comportadistinta solução, em harmonia com o sistema legislativo,que, ao excepcionar da concorrência na herança o cônjugecasado no regime da comunhão universal de bens, deixouclara a opção de que, havendo direito de meação, não há

direito de herança em concorrência com os descendentes”( Direito de herança..., 2005, p. 108).

Essa parece ser a mais correta interpretação do dis-positivo na opinião compartilhada dos autores da presenteobra. Se no regime da comunhão universal de bens não háconcorrência em razão da meação existente, com relação à

comunhão parcial de bens a concorrência só pode se veri-ficar quanto aos bens particulares, mas jamais com relaçãoaos bens comuns.

São adeptos desta corrente Flávio Monteiro de Barros,Eduardo de Oliveira Leite, Christiano Cassettari, FranciscoJosé Cahali, Gustavo Rene Nicolau, Jorge ShiguemitsuFujita, Mário Luiz Delgado, Euclides de Oliveira, Sebastião Amorim, Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno e Zeno Veloso. Para tanto, confira-se a tabela organizada porChristiano Cassettari e publicada na obra de FranciscoJosé Cahali ( Família e sucessões..., 2004, v. 2, p. 329).

Na III Jornada de Direito Civil  realizada pelo Centrode Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal nos

dias 1.º a 3 de dezembro de 2004, acolheu-se a tese supra,pelo teor do Enunciado n. 270 CJF/STJ, a saber: “O art.1.829, inciso I, só assegura ao cônjuge sobrevivente odireito de concorrência com os descendentes do autor daherança quando casados no regime da separação conven-cional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão

parcial ou participação final nos aquestos, o falecido

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hipóteses em que o cônjuge viúvo fosse proprietário de bens em razão de sua meação.

Entretanto, a jurisprudência interpretou de maneirarestritiva o dispositivo em questão. Entendem osTribunais que, se o cônjuge sobrevivente tiver bens de suameação que lhe garantam a subsistência, não teria direitoao usufruto vidual. Sugere-se, para maiores detalhes sobreo tema, a leitura do acórdão cuja ementa transcreve-se:“Inventário. Usufruto vidual. Regime de comunhão par-cial. Viúva meeira nos aquestos. Reconhecida a comunhãodos aquestos, não tem a viúva meeira, ainda que casada

sob regime diverso do da comunhão universal de bens,direito ao usufruto vidual previsto no art. 1.611, par. 1.º, doCódigo Civil. Precedente do STF” ( RSTJ  64/210, RT  710/178, Rel. Min. Barros Monteiro).

Portanto, tendo a jurisprudência limitado o usufruto vidual, abre-se um precedente para que, agora, sejam lim-itados os direitos sucessórios do cônjuge casado pelacomunhão parcial em concorrência com os descendentesdo falecido. Nesse sentido, recentemente decidiu oTribunal de Justiça de São Paulo:

“Quanto aos embargos de Ivana, o Acórdão declarou queela participa da sucessão dos bens particulares (competindo

definir quais sejam) por ser casada no regime de comunhãoparcial. No entanto, gravou, com equívoco, que deveria elarecolher uma quota proporcional, o que não se faz de acordocom as regras da sucessão. A viúva não é meeira dos bens edeve participar de todos os bens particulares” (TJSP, Em-

 bargos de declaração 635.958-4/3-01, 4.ª Câmara de DireitoPrivado, Comarca de Araçatuba, Rel. Des. Enio Zuliani, j.10.12.2009).

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2.ª corrente – A posição majoritária, entretanto, nãoé pacífica e há argumentos favoráveis à ideia de que o côn- juge participaria da sucessão no tocante à totalidade daherança, surgindo aqui a segunda corrente. Maria HelenaDiniz, adepta dessa segunda corrente, afirma que da

leitura do art. 1.829, I, do Código Civil “infere-se que seerigiu o regime matrimonial de bens do casamento comomero requisito ao direito de suceder do cônjuge, em con-corrência com os descendentes do autor da herança. (...)Meação não é herança, pois os bens comuns são divididos, visto que a porção ideal deles já lhe pertencia. Havendopatrimônio particular, o cônjuge sobrevivo receberá a suameação, se casado sob o regime da comunhão parcial de bens, e uma parcela sobre todo o acervo hereditário” (gri-famos) (Curso..., 2005, v. 6, p. 125).

São adeptos desta corrente, atualmente minoritária,Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Inácio de CarvalhoNeto e Luiz Paulo Vieira de Carvalho, cujos entendimentos

também constam da tabela publicada na obra de FranciscoJosé Cahali, antes referenciada.

O mesmo exemplo que foi exposto acima ajudará a visualizar a situação prática de acordo com a segunda cor-rente. João possui um apartamento adquirido no ano de1990 e se casa com Maria no ano de 1995 pelo regime da

comunhão parcial de bens. O casal tem dois filhos. Já cas-ados, João adquire uma casa de praia em 2004 e falece em2005. Como deve ser feito o inventário de João de acordocom a segunda corrente? Vejamos a divisão:

Dos bens particulares – não há meação e 100% do

bem será partilhado:

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– Um apartamento: partilhado entre Maria e os doisfilhos de João.

Dos bens comuns – 50% pertencem à Maria –meação:

– Uma casa de praia – 50% (herança) – será partil-hada entre Maria e os dois filhos de João.

Como se nota Maria concorre com os filhos na totalid-ade de herança, seja o bem comum ou particular.

Imagine-se um exemplo didático, extremo e jocoso,

mas que facilmente demonstra a injustiça da segunda cor-rente. João, solteiro, proprietário de um Fusca 74, casa-secom Maria pelo regime da comunhão parcial de bens em1978. Após o casamento, compra vários bens: fazendas,iates, carros importados, apartamentos no Brasil e no ex-terior e conserva o Fusca consigo, como memória de seustempos de pobreza. Tem dois filhos. Falece em 2004.

Maria já é meeira das fazendas, iates, carros importa-dos, apartamentos no Brasil e no exterior, não tendodireito à meação apenas sobre o Fusca 74, que é bem par-ticular. Seria justo imaginar que além da meação (50% detodos os bens), teriam os filhos de João que dividir comMaria a herança total (50% dos bens e 100% do Fusca)

apenas pelo fato de existir um bem particular?E se João tivesse vendido o Fusca um dia antes de fa-

lecer? Como com a venda do bem particular todos os bensrestantes são comuns, Maria não teria direito a concorrercom os filhos, pois ficaria apenas com sua meação garan-tida pelo regime de bens.

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Será que a existência de um bem particular (um Fusca74 cujo valor é ínfimo) pode significar a completa alter-ação das regras sucessórias? A resposta é negativa, nonosso entender. A existência de bem particular só significaque o cônjuge concorrerá com os descendentes com re-

lação a este bem particular e não quanto à totalidade daherança, o que ampara a primeira corrente.

3.ª corrente – Pode ser apontada uma terceira cor-rente a respeito do tema, defendida exclusivamente porMaria Berenice Dias em seu artigo denominado Ponto-e-

vírgula, que se encontra publicado no sítio de um dosautores da presente obra (Disponível em: www.flaviotar-tuce.adv.br. Acesso em: 28 ago. 2006).

Por essa terceira corrente, a concorrência sucessóriaentre cônjuge e descendentes só ocorre com relação aosbens comuns e não com relação aos particulares.Transcreve-se trecho do artigo que revela a arguta opiniãoda desembargadora gaúcha e sua linha de raciocínio:

“Ao depois, é usado o sinal de pontuação ponto-e-vírgula,que tem por finalidade estabelecer um seccionamento entreduas ideias. Assim, imperioso reconhecer que a parte finalda norma regula o direito concorrente quando o regime é oda comunhão parcial.

 Aqui abre a lei duas hipóteses, a depender da existênciaou não de bens particulares. De forma clara diz o texto: noregime da comunhão parcial há a concorrência ‘se’ o autorda herança não houver deixado bens particulares. A   con-trario sensu, se deixou bens exclusivos, o cônjuge não con-correrá com os descendentes.

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Outra não pode ser a leitura deste artigo. Não há como‘transportar’ para o momento em que é tratado o regime dacomunhão parcial a expressão ‘salvo se’, utilizada exclusiva-mente para excluir a concorrência nas duas primeiras mod-alidades, ou seja, no regime da comunhão e no da separaçãolegal. Não existe dupla negativa no dispositivo legal, pois naparte final – após o ponto-e-vírgula – passa a lei a tratar dehipótese diversa, ou seja, o regime da comunhão parcial,oportunidade em que é feita a distinção quanto à existênciaou não de bens particulares. Essa diferenciação nem cabenos regimes antecedentes, daí a divisão levada a efeito pormeio do ponto-e-vírgula.

Imperiosa a correta compreensão da norma legal, atéporque, ao colocar ‘o ponto na vírgula’, o legislador visou,exatamente, afastar a perplexidade que tem assaltado todosos intérpretes do novo Código.

Quando o regime é o da comunhão parcial e não existem bens particulares, significa que todo o acervo hereditário foiadquirido depois do casamento, ocorrendo a presunção da

mútua colaboração em sua formação, o que torna razoávelque o cônjuge, além da meação, concorra com os filhos naherança. No entanto, quando há bens amealhados antes docasamento, nada justifica que participe o cônjuge desseacervo. Tal não se coaduna com a natureza do regime dacomunhão parcial, sendo descabido que venha o cônjugesobrevivente a herdar parte do patrimônio quando da mortedo par”.

Em resumo, segundo Maria Berenice Dias não haveriarazão para a concorrência sucessória quanto aos bens par-ticulares, pois não foram eles frutos do esforço comum docasal. Já com relação aos bens comuns, justo seria que ocônjuge além de meeiro fosse herdeiro em concorrência

com os descendentes, pois os bens foram adquiridos na

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constância do casamento como resultado da colaboraçãorecíproca.

Mantendo a sequência do estudo, será trabalhadomais uma vez o exemplo prático da sucessão de João à luzda terceira teoria. João possui um apartamento adquiridono ano de 1990 e se casa com Maria no ano de 1995 peloregime da comunhão parcial de bens. O casal tem dois fil-hos. Já casados, João adquire uma casa de praia em 2004e falece em 2005. Como fazemos o inventário de João deacordo com a terceira corrente? Vejamos o quadro de di- visão patrimonial:

Dos bens particulares – não há meação e 100% dobem será partilhado:

– Um apartamento: partilhado apenas entre os doisfilhos de João.

Dos bens comuns – 50% pertencem à Maria –

meação:– Uma casa de praia – 50% (herança) – será partil-hada entre Maria e os dois filhos de João.

Não há como concordar com essa última corrente, quesalientamos ser isolada. Apesar de a respeitarmos, esta

 vertente não pode ser adotada por contrariar o espírito doque consta do Código Civil de 2002.

De toda sorte, destaque-se que há decisão do STJ quechega a mencionar   uma quarta corrente. Na verdade,trata-se de acórdão que aplica o entendimento de MariaBerenice Dias para a união estável:

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“(...). A regra do art. 1.829, I, do CC/2002, que seria ap-licável caso a companheira tivesse se casado com o ‘de cujus’pelo regime da comunhão parcial de bens, tem interpretaçãomuito controvertida na doutrina, identificando-se três cor-rentes de pensamento sobre a matéria: (i) a primeira,

 baseada no Enunciado n. 270 das Jornadas de Direito Civil,estabelece que a sucessão do cônjuge, pela comunhão par-cial, somente se dá na hipótese em que o falecido tenha deix-ado bens particulares, incidindo apenas sobre esses bens;(ii) a segunda, capitaneada por parte da doutrina, defendeque a sucessão na comunhão parcial também ocorre apenasse o ‘de cujus’ tiver deixado bens particulares, mas incidesobre todo o patrimônio, sem distinção; (iii) a terceira de-

fende que a sucessão do cônjuge, na comunhão parcial, sóocorre se o falecido não tiver deixado bens particulares. (...).É possível encontrar, paralelamente às três linhas de inter-pretação do art. 1.829, I, do CC/2002 defendidas peladoutrina, uma quarta linha de interpretação, que toma emconsideração a vontade manifestada no momento da celeb-ração do casamento, como norte para a interpretação das re-

gras sucessórias. Impositiva a análise do art. 1.829, I, do CC/2002, dentro do contexto do sistema jurídico, interpretandoo dispositivo em harmonia com os demais que enfeixam atemática, em atenta observância dos princípios e diretrizesteóricas que lhe dão forma, marcadamente, a dignidade dapessoa humana, que se espraia, no plano da livre manifest-ação da vontade humana, por meio da autonomia privada eda consequente autorresponsabilidade, bem como da confi-ança legítima, da qual brota a boa-fé; a eticidade, por fim,

 vem complementar o sustentáculo principiológico que devedelinear os contornos da norma jurídica. Até o advento daLei 6.515/1977 (Lei do Divórcio), vigeu no Direito brasileiro,como regime legal de bens, o da comunhão universal, noqual o cônjuge sobrevivente não concorre à herança, por jálhe ser conferida a meação sobre a totalidade do patrimônio

do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio, contudo, o

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regime legal de bens no casamento passou a ser o da comun-hão parcial, o que foi referendado pelo art. 1.640 do CC/2002. Preserva-se o regime da comunhão parcial de bens, deacordo com o postulado da autodeterminação, ao contem-plar o cônjuge sobrevivente com o direito à meação, além daconcorrência hereditária sobre os bens comuns, mesmo quehaja bens particulares, os quais, em qualquer hipótese, sãopartilhados apenas entre os descendentes. Recurso especialimprovido” (STJ, REsp 1.117.563/SP, Rel. Min. Nancy 

 Andrighi, Terceira Turma, j. 17.12.2009, DJe 06.04.2010).

Superado esse ponto de controvérsia, voltamos aoestudo dos regimes em que o cônjuge concorre com os

descendentes.

c) Na participação final nos aquestos.

Não pretendemos na presente obra abordar minu-ciosamente o regime em questão, mesmo porque o estudofoi realizado em nosso volume de Direito de Família

(Volume 5 desta coleção). Ademais, o regime não é bom,tem sérios problemas e não tem sido adotado usualmente,diante da sua conhecida complexidade, razão até da suadenominação como um regime contábil e complexo. En-tendemos que não é nem será utilizado em razão da regu-lamentação obscura e tratamento pouco claro que lhe foi

dispensado pelo Código Civil em vigor, entre os arts. 1.672e 1.698.

Em síntese, no regime de participação final nos aques-tos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, cabendo-lhe,à época da dissolução da sociedade conjugal, direito àmetade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso,na constância do casamento (art. 1.672 do CC). Dessemodo, não há dúvidas de que durante o casamento haverá

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uma separação de bens. No caso de dissolução, não hámais propriamente uma meação, como consagra o CódigoCivil, mas uma participação de acordo com a contribuiçãode cada um para a aquisição do patrimônio, a títulooneroso.

Conforme o art. 1.673 do CC, integram o patrimôniopróprio os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os porele adquiridos, a qualquer título, na constância docasamento. A administração desses bens é exclusiva decada cônjuge, que os poderá livremente alienar, se foremmóveis, na constância da união. Como se pode perceber,

aqui reside a diferença em relação à comunhão parcial,pois no último caso os bens adquiridos durante a união,em regra, presumem-se de ambos.

Mas, ocorrendo a dissolução da sociedade conjugal naparticipação final nos aquestos, deverá ser apurado omontante dos aquestos (parte comunicável), excluindo-seda soma dos patrimônios próprios alguns bens, previstosno art. 1.674 do CC.

Note-se que há duas massas patrimoniais: os aques-tos, sobre os quais haverá a participação quando do fim docasamento, e os demais bens, sobre os quais não hámeação, sendo bens particulares.

Em razão da existência de participação em certos bens(aquestos) e inexistência quanto a outros (bens particu-lares), três situações distintas podem ser imaginadas.

 A primeira situação é aquela em que todos os bensdeixados pelo cônjuge falecido são bens particulares.Nessa hipótese o cônjuge supérstite não terá direito à par-ticipação sobre eles, mas apenas direito sucessório em

concorrência com os descendentes.

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 A segunda está presente quando todos os bens deixa-dos pelo falecido são aquestos. Nesse caso o cônjugesupérstite terá direito à participação sobre todos eles emdecorrência do regime, mas não terá direito sucessório emconcorrência com os descendentes. Havendo participação

em vida, não haverá concorrência quando da morte.Por fim, pode-se falar da situação em que o falecido

deixa aquestos em que há a participação do cônjuge viúvoe bens particulares em que não há a participação. Nessecaso, quanto aos aquestos, em que há participação emrazão do regime, não terá o viúvo direito sucessório em

concorrência com os descendentes; quanto aos demais bens, como não tem direito à participação, terá a concor-rência sucessória.

Euclides de Oliveira resume a problemática dizendoque “pela similitude com a comunhão parcial, quanto aosefeitos finais da apuração da meação sobre os benshavidos durante a convivência (por isso comuns sujeitos àmeação), subentende-se que a hipótese comporta a mesmasolução ditada pela lei para a concorrência sucessória docônjuge casado no regime comunitário, ou seja, concor-rência incidente apenas sobre os bens particulares doautor da herança” ( Direito de herança..., 2005, p. 110).Concorda-se integralmente com o jurista paulista. Tam-

 bém, em idêntico sentido, o Desembargador José LuizGavião de Almeida afirma que a “similitude desse regimepoderia ensejar soluções semelhantes às mencionadas”(Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 227).

Em se tratando de um regime híbrido (separação dur-ante o casamento e comunhão parcial após a sua dissol-

ução), entende Mário Luiz Delgado que ao regime da

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participação final nos aquestos se aplicam “as mesmas re-gras da comunhão parcial no tocante à concorrência docônjuge com os descendentes” (Controvérsias...,Questões..., 2005, v. 3, p. 436).

Foi também nesse sentido o alcance do Enunciado n.270 da   III Jornada de Direito Civil , outrora transcrito,mas que merece mais uma vez uma leitura: “O art. 1.829,inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito deconcorrência com os descendentes do autor da herançaquando, casados no regime da participação final nosaquestos, o falecido possuísse bens particulares, hipótese

em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser partilhados exclusivamenteentre os descendentes”.

Superada a análise detalhada de todos os casos deconcorrência da sucessão do cônjuge, aprofundaremosainda mais o estudo, para verificar em quais hipóteses oquinhão do cônjuge concorrerá com os descendentes, emtodas as situações descritas.

2.4.2.2.4 O quinhão do cônjuge que concorre com osdescendentes

Superadas as duas primeiras perguntas que foram for-muladas no início do estudo da sucessão do cônjuge (Ocônjuge herda os bens deixados pelo falecido? O cônjugedividirá os bens herdados com os descendentes do fale-cido? ), e sendo ambas respondidas afirmativamente, paraa conclusão do estudo da concorrência entre cônjuge edescendentes, precisamos responder à derradeira questão:

Qual o quinhão da herança que receberá o cônjuge do

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 falecido em concorrendo com os descendentes? A respostapode ser retirada do art. 1.832 do Código Civil em vigor.

Como regra, o dispositivo citado determina que o côn- juge herdará quinhão igual ao dos descendentes que su-cederem por cabeça. Entretanto, o artigo faz uma ressalva:a quota do cônjuge não poderá ser inferior a 1/4 se for as-cendente dos herdeiros com quem concorrer.

 Aqui, é importante diferenciar a situação dos filhoscomuns em relação aos filhos exclusivos.

Há duas situações diversas em princípio: casos em queo cônjuge é ascendente dos herdeiros com quem concorrer– filiação comum – e casos em que o cônjuge viúvo não éascendente dos herdeiros com quem concorrer – filiaçãoexclusiva. Nesse primeiro momento, saliente-se que não vamos analisar a chamada filiação híbrida, em que o fale-cido deixa descendentes comuns e exclusivos.

Exemplifica-se com as seguintes hipóteses em que o

falecido deixa:

a) Cônjuge e um filho (comum ou não): 1/2 para o filho e 1/2para o cônjuge.

 b) Cônjuge e dois filhos (comuns ou não): 1/3 para o cônjugee 1/3 para cada filho.

c) Cônjuge e três filhos (comuns ou não): 1/4 para o cônjugee 1/4 para cada filho.

d) Cônjuge e quatro filhos comuns: 1/4 para o cônjuge e 3/4a serem divididos entre os quatro filhos. Há uma reservade quinhão.

e) Cônjuge e  quatro filhos só do falecido  (exclusivos): 1/5para o cônjuge e 1/5 para cada filho.

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paracadafilho

paracadafilho

3 filhos

25% da

herançapara ocônjugee 25%paracadafilho

3 filhos

25% da

herançapara ocônjugee 25%paracadafilho

4 filhos

25% daherança

paracônjuge

e18,75%

para

cadafilho

4 filhos

20% daherança

paracônjugee 20%paracadafilho

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25% daherança

paracônjuge

e 15%paracadafilho

5 filhos

16,66%da her-ançapara

cônjuge

e16,66%

paracadafilho

6 filhos   25% da

herança

  6 filhos   14,285%

da

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paracônjugee 12,5%

para

cadafilho

herançapara

cônjugee

14,285%

paracadafilho

Observa-se, em conclusão, que, quando concorre com filhos exclusivos do autor da herança, terá o cônjuge men-

or participação nos bens deixados, se comparado àhipótese em que concorre com os  descendentes comunscom a garantia do piso de 25%.

 Apesar de nossos exemplos envolverem a existência defilhos (descendentes de 1.º grau), a norma se aplica tam- bém à hipótese de concorrência com netos, bisnetos ouquaisquer outros descendentes de maior grau, caso emque o cônjuge receberá quinhão igual ao que o descend-ente receber sucedendo por direito próprio.

Neste ponto da obra, começaremos a criar situaçõesreais e da vida da pessoa comum. Para tanto, juntaremosas regras estudadas neste capítulo, em especial as refer-entes ao item 2.2 do presente capítulo. Aqui, o falecido

sempre casado, deixa descendentes, e o cônjuge serásempre herdeiro em concorrência com eles. Vejamos taiscasos práticos:

1.º caso  – Concorrência entre o cônjuge e os des-cendentes do falecido, sendo que os descendentes de graumais próximo excluem os de grau mais remoto, salvo o

direito de representação (art. 1.833 do CC).

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Se A falece, casado, e deixa dois filhos (comuns ou ex-clusivos – descendentes de 1.º grau) e três netos (descend-entes de 2.º grau), todos os bens serão partilhados entreos filhos e o cônjuge, pois os descendentes de grau maispróximo excluem os de grau mais remoto na seguinte

proporção:

– 1/3 para o cônjuge;

– 1/3 para o filho B;

– 1/3 para o filho C .

 Vejamos o diagrama:

Entretanto, prevê a lei direito de representação ilimit-ado na linha descendente. Exemplo disso se verificaquando A, casado, falece e deixa como herdeiros seu filho B (descendente de 1.º grau) e seus netos D e E  (descend-entes de 2.º grau), filhos de seu filho  C  (premorto). A ex-pressão premorto significa que C  morreu antes de seu pai A. Haverá representação em razão da diversidade de

graus.

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Nesse caso, a herança será do cônjuge de  A, de seufilho   B   (que herda por direito próprio e partilha porcabeça) e dos netos D e E  (que herdam por representação, já que são da estirpe de C ). O cônjuge terá direito a quin-hão igual ao que recebem os descendentes por cabeça.

 Assim, a herança será dividida na seguinte proporção:

– 1/3 para o cônjuge de A;

– 1/3 para B (direito próprio);

– 1/6 para o neto D (representação);

– 1/6 para o neto E (representação).

 Vejamos o diagrama:

Pode ser apontado mais um exemplo de representaçãona linha descendente.   A, casado, falece e deixa osseguintes descendentes vivos: filhos B e D, neto E  e bisne-tos G  e H . O filho C , pai dos netos  E  e F , é premorto. O

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neto F , pai dos bisnetos G  e H , também é premorto. A her-ança ficará dividida da seguinte maneira:

– 25% para o cônjuge (direito próprio);

– 25% para o filho B (direito próprio);

– 25% para o filho D (direito próprio);

– 12,5% para o neto E (representação);

– 6,25% para cada um dos bisnetos G e H (representação).

2.º caso – Se todos os descendentes forem de mesmograu, todos receberão por direito próprio, e a partilha serápor cabeça (art. 1.835 do CC). Em conclusão, se todos osfilhos forem premortos e, no momento da abertura da su-cessão, o falecido deixou o cônjuge e apenas netos – todosdescendentes de 2.º grau –, os netos receberão por direitopróprio e não haverá representação. Vejamos:

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3.º caso – Se todos os representantes de uma geraçãodesaparecerem, os da linha subsequente serão chamados aherdar por direito próprio ou por representação? A res-posta é que herdarão por direito próprio.

Se A, casado, falece, deixando seus netos D e F  vivos, bem como seus bisnetos G  e H . Ao mesmo tempo seu filho B, pai de D, é premorto; seu filho C , pai de E  e F , tambémé premorto; e E , neto do falecido e pai dos bisnetos G  e H ,também é premorto. A herança então será assim

partilhada:

– 25% para o cônjuge;

– 25% para o neto D (direito próprio);

– 25% para o neto F (direito próprio);

– 12,5% para cada um dos bisnetos G e H (representação a

E).

Esquematizando:

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 Analisadas essas situações, chegou o momento de

abordar a denominada filiação híbrida, hipótese em que ocônjuge concorre com filhos comuns e exclusivos do autorda herança ao mesmo tempo. Trata-se de uma das maiorespolêmicas envolvendo o Direito Sucessório atual.

 A grande dúvida que surge é: nessa sucessão híbrida,haveria ou não a reserva de 1/4 da herança para ocônjuge?

 Algumas correntes doutrinárias se formaram para re-sponder a essa pergunta. Vejamos essas correntes, e quaissão as respostas dadas ao questionamento acimaformulado.

1.ª corrente – SIM, no caso de filiação híbrida, há a

reserva de 1/4 da herança. Afirma Sílvio de Salvo Venosaque “se, porém, concorrer com descendentes comuns edescendentes apenas do de cujus, há que se entender quese aplica a garantia mínima da quarta parte” ( Direitocivil..., 2003, v. 7, p. 109). Essa também é a opinião deFrancisco José Cahali, que bem ilustra a questão “sendo a

prole só do falecido a participação é uma; mas se o

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sobrevivente for ascendente dos herdeiros com quem con-correr, está abrangida a situação híbrida, devendo, pois,ser reservada sua parcela mínima de 1/4 na herança, poisnão fala a lei em ascendente  de todos  os herdeiros comquem disputar, ou   único ascendente   dos descendentes”

(grifos no original) (Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 216).É essa mesma a conclusão de José Fernando Simão

sobre o tema. Se a lei não exigiu que concorresse o cônjugecom a totalidade dos descendentes para ter o direito à re-serva de 1/4 da herança, basta que um descendente sejacomum para que a reserva exista, ainda que o falecido

tenha deixado outros descendentes exclusivos. Ademais, essa posição privilegia o cônjuge com re-

lação aos descendentes e atende ao objetivo do sistema deconcorrência criado pelo Código Civil de 2002. Toda amudança legislativa teve por escopo a proteção do côn- juge, ainda que em detrimento da participação dos des-

cendentes na sucessão. A reserva da quarta parte vem deencontro com o objetivo do legislador: o amparo ao côn- juge sobrevivente. Vale dizer que, para fins da prática su-cessória, esta posição se verifica como   minoritária   nadoutrina pátria.

2.ª corrente – NÃO, no caso de filiação híbrida, não

há a reserva de 1/4. Nesse diapasão, explicam Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira que “pode-se interpretar adisposição do art. 1.832 em caráter restritivo, ou seja, deque o cônjuge somente terá assegurada a quarta parte daherança se for ascendente de todos os herdeiros com quemconcorrer. Assim, havendo outros herdeiros em concurso,

ao cônjuge caberá quota igual a cada um dos

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parte da herança para o sobrevivente no caso de filiaçãohíbrida” (Enunciado n. 527).

Para Mário Luiz Delgado, a intenção do legislador “foi beneficiar o cônjuge, mas sem prejudicar tanto os filhos.Se todos os filhos são comuns, a reserva da quarta parte,ainda que implique em eventual diminuição do quinhãodos filhos, não lhes trará maiores prejuízos, uma vez que omontante a maior destinado ao cônjuge futuramente re- verterá aos filhos. Em princípio, os filhos comuns termin-arão herdando parte dos bens que ficam reservados aocônjuge sobrevivente” (Controvérsias..., Questões..., 2005,

 v. 3, p. 438).

3.ª corrente – A terceira corrente é aquela que trazas teorias de sub-herança, buscando soluções matemátic-as para o problema da concorrência do cônjuge na su-cessão híbrida. Vejamos essas teorias.

– Teoria de Eduardo de Oliveira LeiteÉ a teoria pela qual se adota uma “composição pela

solução mista, dividindo-se proporcionalmente a herança,segundo a quantidade de descendentes, com posteriorabatimento da reserva na quota dos herdeiros comuns” (A nova ordem..., Questões..., 2003, v. 1, p. 459). Imagine-se

que o falecido tenha deixado 5 filhos, sendo 3 comuns e 2exclusivos, além de seu cônjuge. Consideraremos que aherança é de R$ 100.000,00. Vamos seguir os passos in-dicados pelo professor Eduardo de Oliveira Leite:

1.º passo – Divisão da herança entre todos os filhos – R$20.000,00 para cada filho.

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2.º passo – Divisão da herança em blocos – Bloco A – Filhoscomuns – R$ 60.000,00 (porque são 3). Bloco B – filhosexclusivos – R$ 40.000,00 (porque são 2).

3.º passo – Sobre o valor do bloco A (sub-herança dos filhoscomuns), haveria a reserva de quinhão de 1/4 para o côn-

 juge que corresponde a R$ 15.000,00 (correspondente a1/4 de R$ 60.000,00) e os outros R$ 45.000,00 seriampartilhados entre os 3 filhos comuns.

Divisão final da herança

Cônjuge – 1/4 reservadoda parte dos filhoscomuns

R$15.000,00

R$15.000,00

Quota de cada filhocomum

R$15.000,00

(x 3) R$45.000,00

Quota de cada filho

exclusivo

R$

20.000,00

(x 2) R$

40.000,00

Total   R$100.000,00

Finaliza Eduardo de Oliveira Leite seus estudos afirm-ando que “a hipótese sob comento atende tanto o preceitoconstitucional (art. 227, § 6.º), quanto a legislação infra-constitucional (art. 1.832 do CC). (...) Como se percebe, acomposição matemática atende a todos os preceitos legaisenvolvidos (arts. 1.829 e 1.832), garantindo a igualdade dequinhões atribuíveis a cada um dos descendentes con-forme determina o texto legal” (A nova ordem...,

Questões..., 2003, v. 1, p. 460).

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Discorda-se do jurista, pois ao final os filhos exclus-ivos receberão quinhão maior que os filhos comuns. Aindaque, no futuro, com a morte do cônjuge recebam estes her-deiros exclusivos os bens, trata-se de situação incerta, uma vez que o cônjuge poderá ter vendido todos os bens ou

mesmo os perdido para seus credores. Entendemos que,se seguida a proposta, alguns filhos receberão mais e out-ros menos e não estará observada a igualdadeconstitucional.

– Teoria apresentada por Giselda Maria Fernandes

 Novaes Hironaka A querida mestra aventa uma outra solução para o

problema, mas deixa claro que não é a solução ideal e que,portanto, não conta com o seu apoio (Concorrência docompanheiro e do cônjuge, na sucessão dos descendentes.Disponível em: <   www.professorsimao.com.br> e< www.flaviotartuce.adv.br>. Acesso em: 28 ago. 2006).

Imagine-se que o falecido, casado, deixa 2 filhoscomuns e 3 exclusivos, sendo sua herança de R$100.000,00. Vamos seguir os passos indicados pela pro-fessora Giselda Hironaka:

1.º) Divisão da herança entre todos os filhos – R$

20.000,00 para cada filho.2.º) Criação de duas sub-heranças – Filhos comuns: R$

40.000,00; e não comuns: R$ 60.000,00.

3.º) Concorrência no quinhão dos filhos exclusivos: R$60.000,00 divididos em 4 partes (três quotas para os fil-hos e uma para o cônjuge) – Cônjuge ficaria com R$15.000,00.

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2.º) Criação de duas sub-heranças – Filhos comuns: R$50.000,00; filhos não comuns: R$ 50.000,00.

3.º) Concorrência no quinhão dos filhos exclusivos: R$50.000,00 divididos em 5 partes (quatro quotas para osfilhos e uma para o cônjuge) – Cônjuge ficaria com R$

10.000,00.4.º) Concorrência no quinhão dos filhos exclusivos: R$

50.000,00 divididos em 5 partes (quatro quotas para osfilhos e uma para o cônjuge) – Cônjuge ficaria com R$10.000,00.

5.º) Somam-se os quinhões do cônjuge nas sub-heranças –Total: R$ 10.000,00 + R$ 10.000,00 = R$ 20.000,00.

6.º) Pergunta: o valor de R$ 20.000,00 é superior ou igual a25% da herança? NÃO, pois 25% da herança significa R$25.000,00. Então, o valor da diferença (R$ 25.000,00 –R$ 20.000,00) de R$ 5.000,00 deverá ser descontado daquota dos filhos comuns. Desse modo, a quota dos filhoscomuns deixa de ser R$ 40.000,00 e passa a ser R$35.000,00.

Divisão final da herança

Cônjuge (reserva de25%)

R$25.000,00   R$ 25.000,00

Quota de cada filhocomum R$8.750,00 (x 4) R$35.000,00

Quota de cada filhoexclusivo

R$10.000,00

(x 4) R$40.000,00

Total R$ 100.000,00

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– Teoria de Flávio Augusto Monteiro de Barros

O professor paulista também apresenta propostadiferente daquelas até agora estudadas ( Manual..., 2004, v. 4, p. 208). Vejamos os passos que são por eleapontados:

1.ª) Divide-se a herança pela soma dos herdeiros, isto é, ototal de filhos e cônjuge.

2.ª) Subtrai-se da herança a parte dos filhos incomuns(exclusivos).

3.ª) Apura-se 1/4 sobre a herança, sem a parte dos filhos in-

comuns, encontrando, desse modo, o quinhão do cônjuge.4.ª) Subtrai-se da herança a parte do cônjuge, dividindo o

resultado pelo número de filhos.

 Vamos ao exemplo apontado por Flávio Monteiro deBarros. O falecido deixa o cônjuge, 4 filhos comuns e 1filho exclusivo e a herança de R$ 1.200,00.

1.ª) Divide-se a herança de R$ 1.200,00 por 6, totalizando aimportância de R$ 200,00.

2.ª) Retira-se da herança a parte do filho exclusivo, restandoa importância de R$ 1.000,00.

3.ª) Apura-se a parte do cônjuge que corresponde a 1/4 da

herança, sem a parte do filho exclusivo, vale dizer 1/4sobre R$ 1.000,00, totalizando a importância de R$250,00. Este é o valor que o cônjuge herdará.

4.ª) Subtrai-se da herança a parte do cônjuge, dividindo oresultado entre os filhos, ou seja, R$ 1.200,00 – R$250,00 = R$ 950,00. Dividindo-se essa importância pelonúmero de filhos apura-se a quantia de R$ 190,00, que é o

quinhão que corresponde a cada filho.

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 Analisadas essas teorias, é de se apontar que a pro-fessora Giselda Hironaka critica veementemente todas assoluções apontadas pela doutrina para resolver a questãoda filiação híbrida (Concorrência do companheiro e docônjuge, na sucessão dos descendentes. Disponível em:

< www.professorsimao.com.br> e< www.flaviotartuce.adv.br>. Acesso em: 28 ago.2006). Vejamos as suas críticas de forma pontual:

1.ª crítica – Reserva do piso de 1/4 em hipótese de fi-liação híbrida

“Solução desse jaez representaria, no entanto, um certoprejuízo aos descendentes exclusivos do falecido, os quais,por não serem descendentes do cônjuge com quem concorr-em, restariam afastados de parte mais ou menos substan-ciosa do patrimônio exclusivo de seu ascendente morto.Contudo, essa solução poderá ser objeto de crítica por partede certo segmento hermeneuta, sob a alegação de que,aplicando-a, não se satisfará o espírito do legislador do novoCódigo Civil, uma vez que este pretendeu privilegiar o côn-

 juge supérstite – dirão estes críticos – nestas condições dereserva de parte ideal, tão somente quando tal cônjuge fossetambém ascendente dos herdeiros de primeira classe comquem concorresse. Ora, se sujeita a essa crítica, tal propostanão deveria prevalecer como possível, não obstante garanta

quinhões iguais aos filhos de ambos os grupos (comuns e ex-clusivos) e ao cônjuge sobrevivente”.

2.ª crítica – Sem a reserva de 1/4 na hipótese de fili-ação híbrida

“Da mesma forma com a qual se cuidou de refutar a pro-posta anterior, também aqui se pode chegar à mesma

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conclusão de inobservância do espírito do legislador doCódigo Civil. Mas, aqui, tal inobservância se verifica na ex-ata medida em que o tratamento de todos os descendentesdo de cujus como seus descendentes exclusivos acabaria porafastar a reserva da quarta parte do monte partível garan-tida ao cônjuge sobrevivo, como forma de lhe garantir ummaior amparo em sua viuvez. Tratá-los, aos descendentestodos, como se fossem descendentes exclusivos do falecidorepresenta solução que fecha os olhos a uma verdade natural(descendentes por laços biológicos) ou civil (descendentesem razão de uma adoção verificada), que é a única verdadeque o legislador tomou como autorizadora de uma maiorproteção dispensada ao cônjuge que sobreviver.”

 3.ª crítica – Divisão da herança em blocos (sub-heranças)

“Ora, é muito fácil observar que, senão em circunstânciareal excepcionalíssima, essa composição matemática nãoconseguiria atender aos preceitos legais envolvidos (arts.1.829, I, e 1.832), e não garantiria a igualdade de quinhõesatribuíveis a cada um dos descendentes da mesma classe,conforme determina o art. 1.834, de caráter constitucional.Quer dizer, nem se conseguiria obter – por esta propostaimaginada conciliatória – iguais quinhões para os herdeirosda mesma classe (comuns ou exclusivos), nem seria razoávelque a quarta parte garantida ao cônjuge fosse comple-

mentada por subtração levada a cabo tão somente sobre aparte do acervo destinada aos descendentes comuns”.

Conclui a professora seu raciocínio com a seguinteponderação: “não há posição firme e definitiva. A jurispru-dência variará perigosamente e a solução é a mudança dalei ou a consolidação de súmula”.

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Em razão desta conclusão, o PL 4.944/2005, de relat-oria do Deputado Antonio Carlos Biscaia e que refletia osestudos do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito deFamília), pretendia promover a seguinte alteração àredação do art. 1.832: “Em concorrência com os descend-

entes, caberá ao cônjuge ou ao companheiro sobreviventeparte igual àquela que couber a cada um dos herdeiros quesucederem por cabeça”. Todavia, o PL 4.944/2005 foi ar-quivado nos termos do art. 105 do Regimento Interno daCâmara dos Deputados, pelo término do  ano legislativo.No momento, aguarda-se o projeto do Instituto Brasileirode Direito de Família (IBDFAM) denominado   Estatutodas Heranças, para futuros comentários na presente obra.

O que se percebe, na prática, é que as críticas da pro-fessora Giselda Hironaka procedem e se justificam. Paraaqueles que necessitam de soluções imediatas,recomenda-se que seja adotado o entendimento expostocomo majoritário, isto é, de que não deve ocorrer a reserva

de 1/4 ao cônjuge na  concorrência híbrida  com os des-cendentes do falecido.

Superado o estudo da concorrência do cônjuge com osdescendentes, passaremos à análise da concorrência comos ascendentes do falecido.

2.4.2.3 A concorrência sucessória do cônjuge com osascendentes do morto – art. 1.829, II, do CC 

Depois do complexo estudo da concorrência do côn- juge sobrevivente com os descendentes do falecido, ne-cessária se faz a análise da situação em que o falecido

deixa cônjuge e ascendentes.

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Considerando que o cônjuge preenche os requisitosprevistos no art. 1.830 do CC e, portanto, é herdeiro do fa-lecido; e considerando ainda que o falecido não deixoudescendentes, os ascendentes são chamados a suceder emconcorrência com o cônjuge. Vejamos os desdobramentos

dessa concorrência específica.

2.4.2.3.1 Quando haverá concorrência entre cônjuge eascendentes?

 A matéria aqui se revela bem mais simples de explicar.

Isso porque o cônjuge concorre com os ascendentes do fa-lecido qualquer que seja o regime de bens do casamento.Em suma, a resposta à pergunta é: sempre.

 A herança será dividida entre o cônjuge e os ascend-entes se o regime do casamento for o da separação obrig-atória de bens, separação convencional de bens, comun-

hão parcial com ou sem bens particulares, comunhão uni- versal de bens ou participação final nos aquestos. Não há,aqui, que se fazer distinção, como ocorre na concorrênciado cônjuge com os descendentes. Nesse sentido, já se de-cidiu: “Na inexistência de herdeiros descendentes, de rigora participação dos ascendentes na sucessão, em concor-rência com o cônjuge supérstite independentemente do re-

gime de bens adotado entre este e o  de cujus.   Recursoprovido” (TJRS, 8.ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento70010678290-Porto Alegre-RS, Rel. Des. Catarina RitaKrieger Martins, j. 12.05.2005, v.u.).

Mais uma vez, frise-se que a divisão da herança, comoinstituto de direito sucessório, não se confunde com a

meação patrimonial, que existirá ou não, conforme o

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regime de bens, que é estudado em Direito de Família. Al-guns exemplos podem ajudar na compreensão da questão.

– João, casado pelo regime da comunhão universal de bens, falece e deixa como herdeiros apenas Maria, sua es-posa, e seus pais. Como fica a sucessão? Vejamos:

Dos bens comuns – 50% do patrimônio constitui ameação de Maria em razão do regime de casamentoda comunhão universal. Ressaltamos novamente quemeação não é herança!

– 50% dos bens que pertenciam a João constituem a

herança e serão partilhados entre seu pai, sua mãe eMaria.

 Apesar de ter a meação garantida pelo regime de bensadotado, o cônjuge terá também a concorrência sucessóriasobre a herança.

– João possui um apartamento adquirido no ano de1990 e se casa com Maria no ano de 1995 pelo regime dacomunhão parcial de bens. Já casados, João adquire umacasa de praia em 2004 e falece em 2005. João falece edeixa seus pais vivos (sogros de Maria). Como fazer o in- ventário de João, sem levar em conta as frações dos

quinhões?

Dos bens particulares – não há meação e 100% dobem serão partilhados:

– Um apartamento: partilhado entre Maria e os paisde João.

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Dos bens comuns – 50% pertence a Maria a títulode meação:

– Uma casa de praia – 50% (herança) – será partil-hada entre Maria e os pais de João.

– João, casado pelo regime da separação convencionale absoluta de bens, falece e deixa como herdeiros apenasMaria, sua esposa, e seus pais. Como fazer o inventário deJoão sem levar em conta as frações dos quinhões?

Dos bens particulares – 100% do patrimônio com-põe a herança, pois não há meação em razão do re-gime de casamento.

– 100% do patrimônio que pertencia a João constituia herança que será partilhada entre seu pai, sua mãee Maria.

 Verificamos, então, que a concorrência entre o côn- juge e os ascendentes ocorrerá em todo e qualquer regimede bens adotado pelos cônjuges. Cabe, então, responderqual será o quinhão do cônjuge na hipótese de concorrên-cia com os ascendentes.

2.4.2.3.2 Qual o quinhão que receberá o cônjuge dofalecido se concorrer com os ascendentes?

 A resposta está no art. 1.837 do Código Civil, cujaredação é seguinte: “Concorrendo com ascendentes emprimeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança;

caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente,

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ou se maior aquele grau”. Vejamos algumas decorrênciaspráticas do dispositivo destacado.

a) Se o cônjuge concorrer com o pai e com a mãe do falecido, a herança deve ser dividida em três partesiguais, cabendo 1/3 ao pai, 1/3 à mãe e 1/3 ao cônjugesupérstite.

 Analisa-se, então, um caso concreto em que as regrasreferentes à sucessão na linha ascendente são aplicadasconjuntamente com as regras relacionadas à concorrênciado cônjuge. Conforme exposto outrora, na classe dos as-

cendentes, o de grau mais próximo exclui o mais remoto,sem distinção de linhas (art. 1.836, § 1.º, do CC). Alémdisso, não há direito de representação na linhaascendente.

Se  A, casado, falece e deixa sua mãe e seu pai vivos(ambos ascendentes de 1.º grau), seu pai receberá 1/3 da

herança, sua mãe 1/3 e o cônjuge 1/3, mesmo que seusavós maternos e paternos (ascendentes em 2.º grau) sejam vivos.

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 b) Se o cônjuge concorrer apenas com o pai, apenascom a mãe ou com outro ascendente qualquer, terádireito à metade da herança.

Um primeiro caso prático a ser pensado é o seguinte:se A, casado, falece deixando vivo seu pai (ascendente em1.º grau) e sendo premorta a sua mãe, mesmo que sejam vivos seus avós maternos (ascendentes em 2.º grau), seupai recolherá 50% da herança e o cônjuge 50%, pois o graumais próximo (pai – 1.º grau) exclui o mais remoto (avós– 2.º grau).

Em havendo igualdade em grau e diversidade emlinha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade,cabendo a outra aos da linha materna (art. 1.836, § 2.º, doCC). A regra cuida da chamada sucessão por linhas (in lin-

eas). A sucessão ocorre por direito próprio, mas a partilha

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da herança se dá por linhas: metade para a linha maternae metade para a linha paterna.

Dois exemplos são relevantes. Se o falecido, casado,deixar apenas seus avós paternos e avós maternos vivos(todos ascendentes em 2.º grau) e tendo em vista que seupai e sua mãe são premortos, o cônjuge receberá 50% daherança, e cada um dos avós receberá 12,5% da herança,eis que, descontado o quinhão do cônjuge, esta se dividiuem linhas: 25% da herança para a linha paterna e 25%para a linha materna.

Se o falecido, casado, deixar como herdeiros apenassua avó paterna (ascendente em 2.º grau) e seus dois avósmaternos (também ascendentes em 2.º grau) e tendo em vista que seu pai e sua mãe são premortos, o cônjuge rece- berá 50% da herança, cada um dos avós maternos rece- berá 12,5% da herança, e a avó paterna receberá 25%, eisque, descontado o quinhão do cônjuge, a herança se

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dividiu em linhas: 25% da herança para a linha paterna e25% para a linha materna.

 Analisados esses casos de divisão dos quinhões, vejamos o tratamento do cônjuge como herdeiro integral,sem concorrer com ascendentes ou descendentes, aindaaprofundando o estudo do polêmico art. 1.829 do atualCC.

2.4.2.4 O cônjuge como herdeiro da totalidade dos bens

Para encerrarmos as questões que nos propusemos aresponder no início deste capítulo, cabe a derradeira ind-agação:  Se o falecido não deixou descendentes nem as-cendentes, o regime de bens altera a situação sucessóriado cônjuge?

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Não havendo descendentes ou ascendentes, o cônjugerecolherá a totalidade da herança, independentemente doregime de bens do casamento. A resposta à indagação é,portanto: não.

Isso porque o cônjuge sobrevivente é o terceiro na or-dem de vocação hereditária (art. 1.829, III, do CC), e a suaposição independe do regime de bens do casamento. Oscolaterais não concorrem com o cônjuge em hipótese al-guma. Só serão chamados a suceder os colaterais caso ocônjuge não preencha os requisitos contidos no art. 1.830do CC, já estudado.

Deve ser repetida uma observação já feita anterior-mente, no sentido de tratar-se de um equívoco comumimaginar que o cônjuge não herda todos os bens se casadofor pelo regime da separação obrigatória (art. 1.641 doCC). Não se trata de verdade, mas sim de um grande en-gano. Isso porque a meação não se confunde com a her-ança. Em outras palavras, em todos os regimes de bens,sem qualquer exceção, falecendo o cônjuge sem descend-entes ou ascendentes, o viúvo ou a viúva herdam a totalid-ade dos bens. Nesse sentido, do Tribunal de São Paulo:

“Vocação hereditária. Cônjuge sobrevivente à falta de des-cendentes ou ascendentes. Irrelevância do regime de bens

do casamento. Inteligência dos arts. 1.603, III, do CódigoCivil de 1916, 1.829, III, e 1.830, do Código Civil de 2002.Recurso não provido. Ementa oficial: Sucessão. Cônjugesobrevivente (arts. 1.603, III, do CC de 1916 e 1.829, III, doCC de 2002). No caso de inexistir descendência ou as-cendência para suceder o finado, a herança, em suatotalidade, destina-se à viúva, independente de o casamentoter sido celebrado sob o regime de separação obrigatória de

 bens, por figurar o cônjuge supérstite, com exclusividade, na

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terceira linha da ordem sucessória, desde que não separado(jurídica ou de fato) há dois anos (art. 1.830, do novo CC); opropósito dos colaterais, de inversão dessa regra, não encon-tra amparo legítimo, na lei ou na regra moral dasobrigações. Não provimento” (TJSP, 3.ª Câmara de DireitoPrivado, AC 139.185-4/7-SP, Rel. Des. Ênio SantarelliZuliani, j. 03.06.2003, v.u., JTJ  269/226).

É interessante uma nota histórica sobre o tema. Nosistema das Ordenações Filipinas de 1.603, o cônjuge sóherdaria na inexistência de colaterais até o 10.º grau do fa-lecido (“Título XCIV – Falecendo o homem casadoabintestado e não tendo ele parente até 10.º grau contadosegundo o Direito Civil, que seus bens deva herdar e fic-ando sua mulher viva, a qual juntamente com ele estava e vivia em casa teúda e manteúda como mulher com seumarido, ela será universal herdeira”).

Da mesma forma, a Consolidação das Leis Civis deTeixeira de Freitas reproduz a disposição no seu art. 980:

“Na linha colateral, além dos irmãos e filhos de irmãos aposse civil transmite-se aos mais próximos parentes até o10.º grau, por Direito Civil, que tiverem à herança umdireito certo e indubitável”.

Foi a Lei Feliciano Penna (Decreto 1.839, de 31 dedezembro de 1907) que alterou a questão e colocou o côn-

 juge, independentemente do regime de bens, como ter-ceiro na vocação hereditária. Desde 1907, então, os colat-erais nada recebem na existência de cônjuge herdeiro.

Como a sucessão legítima decorre da ordem de vo-cação hereditária, que presume a vontade do falecido e seuafeto quanto a certas pessoas, não faria sentido imaginar

que o falecido tem mais estima por seus irmãos e

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sobrinhos do que por sua esposa. E, se realmente tivermaior apreço, este não é presumido. Portanto, respeitandoa porção legítima, poderá a pessoa fazer testamento em fa- vor dos colaterais quanto à porção disponível.

2.4.2.5 O projeto de alteração do art. 1.829 do atual CC: PL 699/2011

Em decorrência das inúmeras críticas relevantes sus-citadas pela doutrina, entendeu-se ser de extrema im-portância a reforma de determinados artigos do novo

Código Civil, razão pela qual, ainda no ano de 2002, maisexatamente no dia 12 de junho e durante o período de vacância da atual codificação, propôs o deputado RicardoFiúza alterações substanciais de vários dispositivos, queconsubstanciam o conhecido e sempre citado PL 6960/2002, que recentemente recebeu a numeração PL 699/2011.

Curiosamente, no tocante à sucessão, o princípio quenorteia o Projeto Fiúza é o da manutenção do atual art.1.829, I, que trata da sucessão do cônjuge em concorrênciacom os descendentes. A única reforma proposta com re-lação à sucessão do cônjuge seria a correção do inciso I doart. 1.829 quanto à remissão equivocada ao art. 1.640,

parágrafo único. Assim, com o PL 699/2011, o art. 1.829,I, teria a seguinte redação: “aos descendentes, em concor-rência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado estecom o falecido no regime da comunhão universal, ou no daseparação obrigatória de bens (art. 1.641); ou se, no re-gime da comunhão parcial, o autor da herança não houverdeixado bens particulares”.

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O original projeto Fiúza, em nossa opinião, é de pouca valia para a solução dos problemas sucessórios com re-lação ao cônjuge, razão pela qual apenas o mencionamos,sem nos determos em sua análise mais profunda. Com to-do o respeito, parece-nos que a proposta de alteração é

tímida.No tocante ao PL 4.944/2005, que comentávamos na

1.ª edição desta obra de maneira minuciosa, cabe um es-clarecimento. Desde a 2.ª edição, deixamos de comentar oProjeto Legislativo pelo fato de ter sido arquivado em 31de janeiro de 2007, nos termos do art. 105 do Regimento

Interno da Câmara dos Deputados, pelo término do anolegislativo. Desse modo, para a análise de novos projetos,é preciso aguardar o Estatuto das Heranças, projeto queatualmente está sendo elaborado pelo Instituto Brasileirode Direito de Família (IBDFAM).

2.4.2.6 O direito de habitação do cônjuge supérstite. Análise do art. 1.831 do CC 

Como é notório, o direito real de habitação é uma dasespécies de direito real sobre coisa alheia de gozo ou defruição (art. 1.225, VI, do CC). Em se tratando de direitoreal sobre coisa alheia, é imperioso imaginar que sobre um

mesmo imóvel coexistem dois direitos reais de titularesdistintos: há a propriedade de certa pessoa que está limit-ada em razão do direito de habitação de outra.

O titular do direito real de habitação pode morar gra-tuitamente em um imóvel que não lhe pertence. Trata-sede um direito de gozo sobre o imóvel alheio bastante limit-

ado. Isso porque somente seu titular poderá residir no

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imóvel, não podendo alugá-lo nem emprestá-lo a terceiro.Quando se afirmar que o titular residirá gratuitamente,isso quer dizer que o dono do imóvel não receberáqualquer remuneração, ou seja, não poderá cobrar do titu-lar do direito de habitação qualquer espécie de aluguel ou

outra forma de remuneração. Entretanto, ao titular dodireito real de habitação são atribuídos alguns deveres quedevem ser observados.

De início, cabe a ele o pagamento dos tributos incid-entes sobre o imóvel, das despesas condominiais ordinári-as decorrentes do uso da coisa, bem como de todas as

despesas ordinárias para a sua conservação e manutenção.Se o beneficiado não cumprir os seus deveres, poderá oproprietário pedir judicialmente a extinção do direito realde habitação.

Existem duas espécies de direito real de habitação. A primeira é a chamada   voluntária, em que as partesavençam o direito por escritura pública que será regis-trada no Cartório de Registro de Imóveis. A segunda de-corre de previsão legal (independe da vontade das partes)e dispensa o registro imobiliário (art. 167, I, 7, da Lei6.015/1977 – Lei de Registros Públicos). É sobre essa se-gunda espécie que cuidaremos a seguir.

O Código Civil de 2002 ampliou o direito real de hab-

itação com relação ao cônjuge sobrevivente. Isso porque,enquanto na sistemática do Código Civil de 1916 só teria odireito o cônjuge casado pelo regime da comunhão univer-sal (art. 1.611, § 2.º), no sistema do atual Código o cônjugesobrevivente tem o direito de habitação independente-mente do regime de bens do casamento (art. 1.831 do CC/

2002). É a redação do atual dispositivo legal:

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“Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja oregime de bens, será assegurado, sem prejuízo da parti-cipação que lhe caiba na herança, o direito real de habitaçãorelativamente ao imóvel destinado à residência da família,desde que seja o único daquela natureza a inventariar”.

 A segunda e interessante mudança é que no CódigoCivil revogado o direito real de habitação se extinguia emduas situações:

–   por termo incerto, ou seja, quando da morte de seu beneficiário;

–  por condição resolutiva, enquanto não constituir novocasamento.

O Código Civil de 2002 amplia o limite temporal dodireito real de habitação do cônjuge, que não mais se ex-tingue em razão de novo casamento ou união estável, masapenas quando da morte do titular. Em outras palavras,

trata-se de um direito real de gozo ou fruição vitalício. A situação pode se configurar bastante injusta, como

lembram Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado,pois “mesmo depois de casado com um terceiro, continu-ará no imóvel, em prejuízo dos demais herdeiros que se-quer aluguel poderão cobrar” (Código Civil..., 2005, p.949). Para remediar esse problema, o PL 699/2011 pre-tende alterar o dispositivo em comento, que passaria a tera seguinte redação: “Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente,qualquer que seja o regime de bens, enquanto permanecerviúvo ou não constituir união estável , será assegurado,sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, odireito real de habitação relativamente ao imóvel

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destinado à residência da família, desde que seja o únicodaquela natureza a inventariar” (grifamos).

Outro problema bastante sério que se geraria pelaredação do atual art. 1.831 do CC, segundo parte dadoutrina, seria a possibilidade de criação do chamadodireito real de habitação de segundo grau.

Imagine-se um caso prático para a explicação do prob-lema. João, com 87 anos de idade e pai de dois filhos,casa-se com Maria, de 18 anos, pelo regime da separaçãoobrigatória de bens. Com a morte de João, Maria não seráherdeira em concorrência com os filhos de João, mas terá

garantido o direito real de habitação. Anos depois de sua viuvez, Maria se casa com Pedro, rapaz de 21 anos. Mariafalece. Pedro, na qualidade de marido de Maria, teria ochamado   direito real de habitação de segundo grau,mesmo sem ter participação na herança dela e independ-entemente do regime de bens.

Os filhos de João que tiveram que suportar o direitoreal de habitação de Maria, mulher de seu pai, agora teri-am que suportar o de Pedro, marido de sua madrasta.

Não se filia à tese exposta. Isso porque, ao direito realde habitação, aplicam-se, no que couber, as regras do usu-fruto (art. 1.416 do CC). Nesse sentido, o usufruto é direito

personalíssimo e intransferível, ou seja, extingue-se com amorte do usufrutuário. Da mesma forma, o direito de hab-itação o é, ou seja, com a morte do titular, o direito se ex-tingue e não se transfere para terceiros, razão pela qual,no caso exemplificado, Pedro não seria titular do direito.

Outra questão interessante diz respeito à extensão dodireito real de habitação, pois o atual art. 1.831 do CC lim-

ita o direito dizendo que este existe desde que seja o único

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imóvel daquela natureza a inventariar. Qual seria o al-cance da dicção legal? Se o falecido deixou mais de umimóvel residencial, perderia o cônjuge supérstite seudireito real de habitação?

Explica Francisco José Cahali que “se outros imóveisexistirem no inventário, também destinados à residênciada família, ficará privado o cônjuge sobrevivente do direitoreal de habitação sobre qualquer deles, sem prejuízo, nat-uralmente, de sua eventual meação ou quinhão hered-itário” (Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 218). Em outrosentido, afirma Zeno Veloso que “se existirem outros bens

imóveis da mesma natureza no espólio, que possam serutilizados para moradia do cônjuge sobrevivente, não in-cide o aludido direito real de habitação” ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.528).

Parece que realmente a posição de Zeno Veloso é aque deve prevalecer, com o endosso de José Luiz Gaviãode Almeida, nos seguintes termos: “a existência de outrosimóveis residenciais não afasta o direito real de habitaçãosobre o bem que servia de moradia à família do falecido.Nesse caso, o imóvel ofertado em substituição não podeser de conforto inferior. Deve-se garantir ao cônjugesobrevivente a mesma situação que desfrutava em suaresidência anterior” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p.

220).Essa última é a melhor posição à luz do Direito Civil

Constitucional e do princípio da dignidade da pessoa hu-mana (art. 1.º, III, da CF/1988). Além disso, nunca sepode esquecer da proteção da moradia, constante do art.6.º, caput , da Constituição Federal de 1988. Ilógico seria

imaginar que, se o falecido deixou um único imóvel

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residencial, o direito de habitação existe, mas se o falecidodeixou mais de um imóvel residencial, o direito desa-parece, pelo contrário, se deixou apenas um imóvel, sobreaquele recairá o direito real de habitação. Se deixou maisde um, o direito de habitação recairá sobre um deles,

desde que o cônjuge sobrevivente tenha um imóvel pararesidir, em condições semelhantes àquelas em que vivia noimóvel com o falecido.

 A melhor interpretação a ser feita do dispositivo é queo direito de habitação recairá, preferencialmente, sobre oimóvel residencial em que o cônjuge morava com o fale-

cido. O debate dessa questão pode ser encerrado com aspalavras de José Luiz Gavião de Almeida nos seguintestermos: “a interpretação da perda somente da residênciafamiliar, mas não do direito real de habitação, é fórmulaque não ofende a literalidade da lei e ampara situação nãoimaginada pelo legislador atual nos quase 30 anos queteve para a elaboração deste novo Código Civil” (Código

Civil..., 2003, v. XVIII, p. 221).Cabe também a análise de outro ponto polêmico. O

direito real de habitação é absoluto ou pode serrenunciado?

Mário Luiz Delgado, em mensagem eletrônica aospresentes autores, sustenta a posição de que não se trata

de direito absoluto e que pode ser renunciado. São suaspalavras:

“1. São duas coisas distintas: uma coisa é o direito à mora-dia, que é direito da personalidade. Outra é o direito de hab-itação, que é direito real, e cuja transmissibilidade é de suaprópria essência. Essa distinção foi bem posta na obra do

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Sergio Iglesias Nunes de Souza, cuja (re) leitura indicariapara aprofundarmos esse debate.

2. A habitação é o espaço físico e pode ser perfeitamenterenunciado ou alienado. Aquele que é proprietário de umúnico imóvel, por exemplo, não está impedido de aliená-lo

somente porque se trata de um bem de família.3. O direito à moradia não pode ser confundido com

qualquer direito real incidente sobre a habitação. Trata-sede um dos direitos imprescindíveis ao mínimo existencial edeve ser assegurado independentemente da titularidadedominial da habitação. Mesmo renunciando ao direito realde habitação, a viúva poderia, por exemplo, dispor de re-

cursos para morar dignamente em outro local.4. Como direito social, a proteção à moradia tem como

destinatário imediato o Estado, que não pode legislar contraessa proteção, como fez com o fiador, mas não constituióbice legal à disponibilidade do direito real de habitação”.

O entendimento do jurista consubstancia o Enunciado

n. 271 da   III Jornada de Direito Civil   do Conselho daJustiça Federal e do Superior Tribunal de Justiça, de suaautoria: “Art. 1.831. O cônjuge pode renunciar ao direitoreal de habitação, nos autos do inventário ou por escriturapública, sem prejuízo de sua participação na herança”.

Consigne-se que o coautor Flávio Tartuce é um dos

críticos do enunciado em questão, apesar de muito re-speitar o seu autor. Isso porque o enunciado acabatrazendo, de forma indireta, a renúncia a um direito fun-damental consagrado no art. 6.º,  caput , da ConstituiçãoFederal: o direito à moradia.

Contra o teor do enunciado cite-se a tese da  eficácia

horizontal dos direitos fundamentais, segundo a qual as

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normas que protegem a pessoa humana, previstas noTexto Maior, têm aplicação imediata nas relações privadasou particulares. Em outras palavras, as normas que con-sagram os direitos fundamentais da pessoa não sãosomente dirigidas ao Estado ou ao legislador (normas pro-

gramáticas), mas também às pessoas como um todo.Essa aplicação imediata abrange também os direitos

sociais, como decorrência do princípio da solidariedadesocial, na busca de uma sociedade mais justa e solidária(art. 3.º, I, da CF/1988). Nesse sentido, vale transcrever osensinamentos de Daniel Sarmento:

“Existe uma série de razões que justifica, hoje, a con-cepção de que, ao lado do dever primário do Estado degarantir os direitos sociais, é possível também visualizar umdever secundário da sociedade de assegurá-los. Em primeirolugar, porque as relações privadas que se desenvolvem sob opálio da Constituição não estão isentas da incidência dos

 valores constitucionais, que impõe sua conformação a parâ-metros materiais de justiça, nos quais desponta a ideia desolidariedade. Além disto, diante da decantada crise de fin-anciamento do Welfare State, que o impede de atender a to-das as demandas sociais relevantes, é importante encontraroutros corresponsáveis que – sem exclusão da obrigaçãoprimária do Estado – possam contribuir para amenizar odramático quadro de miséria hoje existente, assumindo

tarefas ligadas à garantia de condições mínimas para os ex-cluídos, não já agora, por caridade ou filantropia, mas nocumprimento de deveres juridicamente exigíveis. Assim, épossível afirmar que quando a Constituição estabelece comoum dos objetivos fundamentais da República brasileira ‘con-struir uma sociedade mais justa, livre e solidária’, ela não es-tá apenas enunciando uma diretriz política desvestida de

qualquer eficácia normativa. Pelo contrário, ela expressa um

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princípio jurídico, que, apesar de sua abertura e indetermin-ação semântica, é dotado de algum grau de eficácia imediatae que pode atuar, no mínimo, como vetor interpretativo daordem jurídica como um todo” (SARMENTO, Daniel. Direit-os fundamentais..., 2004, p. 337).

Diante dessa importante tese, pode-se dizer qual auto-nomia privada, ou seja, o direito que a pessoa tem de seautorregulamentar, encontra limitações em normas deordem pública, algumas de índole constitucional, comoaquela que assegura o direito à moradia. E esse direito de- ve ser reconhecido pelos particulares, membros de uma

relação jurídica de cunho privado.Como reforço, pode ser citado o art. 11 do atual Código

Civil, segundo o qual os direitos da personalidade, aquelesinerentes à pessoa humana e à sua dignidade, são irrenun-ciáveis em regra. Reside aqui mais um argumento contra oEnunciado n. 271 CJF/STJ, pois a renúncia à moradia énula, por ter conteúdo ilícito (art. 166, II, do CC).

Superado esse interessante debate, como última e im-portante nota a ser feita, destaque-se que o direito real dehabitação previsto em lei só estará presente quandohouver a morte de um dos cônjuges. Em caso de separaçãoou divórcio, não haverá direito real de habitação para ocônjuge separado ou divorciado.

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2.5 A SUCESSÃO LEGÍTIMA DOCOMPANHEIRO. QUESTÕESPOLÊMICAS

2.5.1 As leis da união estável – Leis 8.971/1994 e9.278/1996

Com relação aos companheiros, antes da vigência doCódigo Civil de 2002, a situação sucessória era semelhanteàquela dos cônjuges.

Isso porque, em atenção ao preceito constitucional(art. 226, § 3.º, da CF), o legislador infraconstitucional ed-itou duas diferentes leis regulamentando a união estável. As Leis 8.971/1994 e 9.278/1996, que disciplinavam o in-stituto, não criavam para o companheiro sobrevivente odireito de concorrência com os descendentes ou ascend-entes do falecido sobre a propriedade dos bens. Apenas

criavam direitos reais sobre coisas alheias: usufruto oudireito real de habitação, em analogia ao casamento.

De início, previa o art. 2.º da Lei 8.971/1994:

“Art. 2.º As pessoas referidas no artigo anterior parti-ciparão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes

condições:I – o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito en-

quanto não constituir nova união, ao usufruto de quartaparte dos bens do de cujus, se houver filhos ou comuns;

II – o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, en-quanto não constituir nova união, ao usufruto da metadedos bens do  de cujus, se não houver filhos, embora sobre-

 vivam ascendentes;

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III – na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) com-panheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade daherança.”

Em complemento, a Lei 9.278/1996 acrescentou

direitos sucessórios aos companheiros no seu art. 7.º,parágrafo único, pelo qual: “Dissolvida a união estável pormorte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direitoreal de habitação, enquanto viver ou não constituir novaunião ou casamento, relativamente ao imóvel destinado àresidência da família”.

Em suma, sob a égide das leis anteriores que regula-mentavam a união estável, o companheiro sobreviventeteria os seguintes direitos sucessórios:

– Usufruto dos bens do falecido nas hipóteses de concorrên-cia com descendentes ou ascendentes do   de cujus. Emconcorrência com os descendentes do falecido, o compan-heiro tinha direito de usufruto sobre 1/4 dos bens domorto. Se o morto não deixasse descendentes, mas apenasascendentes, o usufruto do companheiro se dava com re-lação a metade dos bens.

–  Direito real de habitação  enquanto vivesse ou não con-stituísse uma nova união ou casamento, haveria o direitoreal relativamente ao imóvel destinado à residência dafamília.

O que se percebia era que, enquanto os cônjuges nãoteriam de forma cumulada o usufruto e o direito real dehabitação, em razão dos diferentes regimes de bens, oscompanheiros acabavam acumulando ambos os direitos,em concorrência sucessória com os ascendentes e des-

cendentes do falecido. A situação anterior era injusta? Aos

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presentes autores parece que sim, pelo fato de a sistemát-ica anterior conferir mais direitos aos companheiros doque aos cônjuges. Francisco José Cahali abordou demaneira clara o problema, reconhecendo a profundidadedo tema e afirmando que “apenas como registro, temos a

posição inclinada no sentido de que ambos os efeitos su-cessórios (usufruto e habitação) devem ser aplicados, paraas sucessões abertas na legislação revogada, sob os mes-mos pressupostos, na união estável e no casamento,guardada a grande diferença que entre eles existe notocante ao regime de bens” (Curso avançado..., 2003, v. 6,p. 227).

O professor menciona, também, a solução de Guilher-me Calmon Nogueira da Gama, segundo a qual, “con-sequentemente, para evitar a inconstitucionalidade do dis-positivo legal, pois estaria criando mais direitos aos com-panheiros se comparados aos casados sob regime diversoda comunhão universal de bens, deve ser considerada a

cláusula de maior favorecimento, no sentido de alargar odireito real de habitação entre os casados para todo equalquer regime, aliás, como já ocorre no direito de pro-priedade. Assim, o art. 1.612, § 2.º, do Código Civil de 1916deve sofrer uma modificação em seu alcance, para es-tender o benefício a todo e qualquer regime matrimonial e

não somente à comunhão universal” (CAHALI, FranciscoJosé. Curso avançado..., v. 6, p. 227).

Para Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, a Lei9.278/1996 apenas supriu um esquecimento do legisladorde 1994, não havendo problemas no tocante à mesma(Comentários..., 2003, v. 20, p. 55).

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Na solução deste conflito de normas, segundo JoséLuiz Gavião de Almeida, “prevaleceu o entendimento nosentido de que a Lei 8.971/94 trouxe regra geral de carátersucessório. A Lei 9.278/96 trouxe regra de caráter espe-cial. E norma especial não revoga a geral (art. 2.º, § 2.º, da

Lei de Introdução ao Código Civil)” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 68).

Nesse sentido, pugnando pela manutenção de ambosos diplomas no tocante ao direito sucessório, decidiu o Su-perior Tribunal de Justiça:

“Recurso especial. União estável. Direito de herança. Lei8.971/1994. Lei 9.278/1996. Com a entrada em vigor da Lei9.278/1996 não foi revogado o art. 2.º da Lei 8.971/1994que garante à companheira sobrevivente direito à totalidadeda herança, quando inexistirem ascendentes e descendentes.Quanto aos direitos do companheiro sobrevivente não há in-compatibilidade entre a Lei 9.278/1996 e a Lei 8.971/1994,sendo possível a convivência dos dois diplomas” (STJ, REsp747.619/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª T., j. 07.06.2005,

 DJ  1.º.07.2005, p. 534).

Esclarecedor é o voto da Ministra Relatora: “O direitoà sucessão, por exemplo, foi definido apenas pela Lei8.971/94, tendo sido omissa quanto ao ponto a normaposterior que estabeleceu apenas o direito real de habit-

ação ao companheiro sobrevivente quando dissolvida aunião estável por morte de um dos conviventes. Assim, en-quanto a norma anterior conferiu à companheira o direitoà totalidade da herança, quando inexistirem ascendentesou descendentes, e, se houver filhos, ao usufruto da quartaparte dos bens do falecido enquanto não constituir nova

união; a lei posterior, como já esclarecido, tratou somente

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do direito real de habitação relativamente ao imóvel desti-nado à residência da família. Portanto, quanto aos direitosdo companheiro sobrevivente, não há incompatibilidadeentre as normas, mas integração, sendo possível a con- vivência dos dois diplomas”.

É interessante frisar a controvérsia da questão.

Sobre o tema, no julgamento do REsp 418.365/SP, oMinistro Carlos Alberto Menezes Direito explicou que oTribunal de Justiça de São Paulo entendeu “que a autoranão tem direito à herança porque não é herdeira ao funda-mento de que a Lei 9.278/1996 revogou a Lei 8.971/1994,

sendo que com relação ao direito à herança (art. 2.°, III,da Lei 8.971/1994) a lei nova é omissa e neste aspectopoder-se-ia entender que não há incompatibilidade entreas duas leis, embora a nova regule o § 3.° do art. 226 daConstituição Federal e a união estável. Para o Tribunallocal, a Lei 9.278/1996 previu apenas o direito real de hab-itação para o sobrevivente sobre o imóvel da residência dafamília (art. 7.°, parágrafo único). Tal dispositivo revogouas disposições da lei anterior que concediam o direito deusufruto, posto que tanto a lei antiga quanto a nova es-tabeleceram direito real sobre coisa alheia e o direito dehabitação é mais restrito do que o de usufruto, que o podeconter, além de ser localizado no imóvel de residência da

família”. Os argumentos do Tribunal de Justiça não vingaram no Superior Tribunal de Justiça e a decisão foidiametralmente oposta. São as palavras do MinistroRelator

“A lei anterior não cuidou do direito real de habitação,tratando do usufruto nos casos que especifica. Ora, a meu

sentir, se não houve expressa revogação da parte relativa à

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sucessão, isto é, do direito da companheira ou companheiroà herança, não há razão para considerar que houve regu-lação diversa na lei posterior a provocar a incidência da úl-tima parte do art. 2.°, § 1.°, da Lei de Introdução ao CódigoCivil. Em conclusão, entendo que permanece em vigor o art.2.º da Lei 8.971/1994, que disciplina o direito da compan-heira ou companheiro à herança, não o revogando o adventoda Lei 9.278/1996” (STJ, REsp 418.365/SP, Rel. Min. Carlos

 Alberto Menezes Direito, 3.ª T., j. 21.11.2002,   DJ 28.04.2003, p. 198).

De qualquer forma, sobre o tema da concorrência su-cessória na união estável, indispensável que se anote a

lição de Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira, no sen-tido de que “por essas disposições das leis da união estável verifica-se grande avanço em favor dos direitos dos com-panheiros, por sua equiparação aos direitos dos cônjugesno plano sucessório. Há quem critique essa posição, en-tendendo que seria suficiente a meação dos bens ad-

quiridos em conjunto, como já reconhecia a jurisprudência(Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal) e veio a sercontemplado na legislação especial. Outros acham desca- bida a concessão do usufruto parcial, por resultar em in-desejável associação de interesses dos companheiros comdescendentes ou ascendentes do autor da herança,considerando-se que em geral falta um bom nível de con-

 vivência entre eles. Também há quem defenda a concessãoao companheiro sobrevivente tão só do direito real de hab-itação sobre o imóvel inventariado que lhe sirva deresidência, entendendo que essa previsão, contida na Lei9.278/96, afasta os demais direitos sucessórios tratadosna Lei 8.971/94” ( Inventários e partilhas..., 2006, p. 163).Como se vê, várias eram as opiniões quanto aos direitos

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sucessórios que eram reconhecidos aos companheiros ouconviventes, pela legislação anterior.

Superado esse ponto e por fim, previa a legislação an-terior que, não tendo o falecido descendentes ou ascend-entes, a totalidade dos seus bens era herdada pelo seucompanheiro sobrevivente (art. 2.º, III, da Lei 8.971/1994). Assim, mesmo se o falecido tivesse irmãos, sobrin-hos ou tios, todos os seus bens passavam ao companheirosobrevivente, inexistindo concorrência sucessória nessescasos. Em suma, pode-se concluir que, com relação aoscompanheiros, a concorrência sucessória era excepcional,

não constituindo regra.

2.5.2 O Código Civil de 2002 e a sucessão docompanheiro

De início, cabe ponderar que o Código Civil de 2002

sequer acertou quanto à localização topológica da matériaque aqui estamos estudando. Isso porque a sucessão docompanheiro é trabalhada num único dispositivo, que selocaliza junto às disposições gerais da sucessão, sendoque, evidentemente, deveria estar alocada no Título II (Su-cessão Legítima) em seu capítulo I, qual seja aquele quetrata da ordem de vocação hereditária.

Ora, essa péssima localização, na visão de boa parteda doutrina, reflete a má vontade com que se tratou da su-cessão do companheiro. Nas palavras de Rolf Madaleno,“mais uma vez resta discriminada a relação afetiva ori-unda da união estável que perde sensível espaço no campodos direitos que já haviam sido conquistados após o ad-

 vento da Carta Política de 1988, em nada sendo

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modificada a atual redação do novo Código Civil e serátarefa pertinaz da jurisprudência corrigir estas flagrantesdistorções deixadas pelo legislador responsável pela novacodificação civil” ( Direito de família..., 2004, p. 113). Oartigo está mal localizado, também segundo o mestre Zeno

 Veloso ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.484). Mal não, odispositivo está pessimamente localizado! Vale dizer, aliás,que o atual art. 1.790 do CC/2002, que trata do tema, se-quer constava do Projeto 634/1975, tendo sido introduz-ido pelo então Senador Nelson Carneiro, no ano de 1997.

 A grande crítica da doutrina sobre a sucessão dos

companheiros é rebatida por Jones Figueirêdo Alves eMário Luiz Delgado, com base no Relatório final  ao pro- jeto, de autoria do Deputado Ricardo Fiúza. Apontam osdoutrinadores que “as diretrizes imprimidas à elaboraçãodo Projeto, fiéis nesse ponto às regras constitucionais e le-gais vigorantes, aconselham ou, melhor dizendo, impõemum tratamento diversificado, no plano sucessório, das

figuras do cônjuge supérstite e do companheiro sobrevivo,notadamente se ocorrer qualquer superposição ou con-fusão de direitos à sucessão aberta. Impossibilitado queseja um tratamento igualitário, inclusive por descaracter-izar tanto a união estável – enquanto instituição-meio –quanto o casamento – instituição-fim – na conformidade

do preceito constitucional” (Código Civil..., 2005, p. 910).Com relação à sucessão dos companheiros, exata-mente como ocorreu quanto aos cônjuges, a situação tam- bém se revela complicada e pouco operacional. Porém,sensíveis são os prejuízos sofridos pelos companheirosquanto às novas regras sucessórias, contrariamente aoscônjuges, que amealharam direitos com a edição da nova

codificação.

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 A polêmica gira em torno do art. 1.790 do atual CódigoCivil, um dispositivo que merece, sem dúvidas, transcriçãomais do que destacada, pois sobre ele aprofundaremos osnossos estudos:

“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participaráda sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos oner-osamente na vigência da união estável, nas condiçõesseguintes:

I –  se concorrer com filhos comuns, terá direito a umaquota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II –   se concorrer com descendentes só do autor daherança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada umdaqueles;

III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terádireito a um terço da herança;

IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à total-idade da herança” (grifamos).

De uma leitura imediata do comando legal transcrito,podemos retirar a conclusão de que, com relação aos com-panheiros, a concorrência sucessória que era excepcionalno sistema anterior ao Código Civil de 2002 passou a ser aregra no novo sistema privado. Trata-se de um  giro decento e oitenta graus, uma total reviravolta no tratamentoda matéria.

Deve-se frisar que, a partir da vigência do Código Civilde 2002, estando instituída a concorrência sucessória docompanheiro com descendentes e ascendentes do falecido,ocorreu a revogação tácita do art. 2.º da Lei 8.971/1994que previa, nas mesmas hipóteses, o usufruto em favor do

companheiro. A concorrência prevista no art. 1.790 do CC

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garante a copropriedade ao companheiro revelando-se in-compatível com o usufruto anteriormente previsto, que sógarantia um direito real sobre coisa alheia.

Sobre o tema, conclui-se que a concorrência tal comoatualmente estabelecida, por motivo de lógica, exclui apossibilidade de reconhecimento de usufruto em favor decompanheiro. Curiosamente, o Tribunal de Justiça doParaná, contrariando a unanimidade da doutrina, assimdecidiu:

“1. O art. 1.790 do Código Civil não revogou o art. 2.º da

Lei 8.971/94. 2. Primeiramente, por não haver sido dadotratamento integral à matéria disciplinada pela lei anterior,o que afasta a revogação tácita prevista pelo artigo 2.º da Leide Introdução ao Código Civil. 3. Ainda, por conta do artigo9.º da Lei Complementar 95/1998 (com redação dada pelaLei Complementar 107/2001), faz-se necessária previsão ex-pressa (por meio de cláusula revogatória) de leis conflitantesrevogadas pela atual. No caso do Código Civil, esta cláusula

revogatória está positivada no artigo 2.045, e não abrangeuleis específicas que tratam da união estável. 4. Assim, deixarde reconhecer o direito ao usufruto de quarta parte dos bensdo de cujus, não aplicando a Lei 8.971/1994, por considerá-la revogada pelo Código Civil de 2002, significa relegar aodesamparo o companheiro supérstite na hipótese de nãohaver patrimônio comum, pois quando se trata de sucessão

de companheiro, as leis anteriores são de aplicação ne-cessária face às lacunas existentes no atual diploma civil,que cuidou do direito sucessório na união estável apenas noart. 1790, sem fazer qualquer referência ao usufruto vidual”(TJPR, Agravo de Instrumento 366.279-3-Curitiba, 19.ª

 Vara Cível, Rel. Des. Fernando Wolff Bodziak, j.25.04.2007).

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Superada a questão de direito intertemporal, dividire-mos a análise do tema da sucessão do companheiro emduas partes, que serão as respostas às tormentosas per-guntas: Quais bens herda o companheiro? Quanto herdao companheiro? 

Com relação ao quanto a ser herdado, cuidaremos daconcorrência com os descendentes exclusivos ou comunsdo de cujus, bem como com ascendentes e colaterais. Porfim, estudaremos se ocorrerá ou não a concorrência entreo companheiro e o Município. Destaque-se, de imediato,que várias são as questões controvertidas que surgem da

complicada sucessão do companheiro.De toda sorte, cabe esclarecer que a sucessão do com-

panheiro também engloba as pessoas que vivem em uniãohomoafetiva, ou seja, a união entre pessoas do mesmosexo. Como é notório, o Supremo Tribunal Federal, emmaio de 2011, julgou a ADIN 4.277/DF e a ADPF 132/RJ,concluindo que todas as regras da união estável aplicam-se à união homoafetiva, sem qualquer exceção (publicaçãono Informativo n. 625  do STF). Desse modo, o art. 1.790do CC e as outras regras sucessórias relativas à união es-tável incidem para tais entidades familiares.

2.5.2.1 A massa patrimonial que herda o companheiro. Análise do art. 1.790, caput, do CC 

 A primeira pergunta a ser respondida é a seguinte:Quais bens serão herdados pelo companheiro?   O art.1.790 do CC, em seu   caput , delimita a participação docompanheiro na sucessão do falecido apenas quanto aos

“bens adquiridos onerosamente na vigência da união

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estável”. Pelo que consta do comando legal em comento,como primeira premissa, temos que efetuar a divisão dopatrimônio do companheiro falecido em dois blocosdistintos:

– O primeiro bloco é composto apenas pelos bens móveis eimóveis que o falecido adquiriu onerosamente depois deiniciada a união. São os bens comprados pelo falecido ouos que ele recebeu em dação em pagamento.

– O segundo bloco é composto por todos os demais bens, se- jam eles móveis ou imóveis, desde que existentes antes doinício da união, ou mesmo aqueles adquiridos a título gra-

tuito (doação, sucessão) após o início da união.

Superada essa divisão, que tem interessante intuitodidático, imagine-se a situação geral  em que os compan-heiros não elaboraram contrato escrito, visando à regu-lamentação de suas relações patrimoniais   (contrato deconvivência).

Conforme está exposto em nosso livro referente aoDireito de Família, o regime de bens imposto à união es-tável, na ausência de contrato escrito entre os compan-heiros, é o da comunhão parcial (art. 1.725 do CC). Emrazão das regras desse regime, particularmente aquelasconstantes dos arts. 1.559 e 1.660 do CC, pode-se concluir

que com relação aos bens adquiridos a título oneroso, nocurso da união estável, os companheiros terão direito àsua meação (art. 1.660, I, do CC).

Desse modo, considerando-se a inexistência dequalquer contrato escrito entre as partes, o companheirodo falecido, por força da comunhão parcial, será dono de

metade dos bens adquiridos a título oneroso na constância

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da união e, quando do falecimento, participará também dasucessão em concorrência com os descendentes, os as-cendentes e os colaterais do convivente falecido. Sobre otema, lembre-se mais uma vez que  a meação – institutode Direito de Família – não constitui herança – categoria

de Direito Sucessório.

Com relação aos demais bens do acervo hereditário,ou seja, quanto ao segundo bloco, em se tratando de bensque foram adquiridos gratuitamente pelo falecido, oumesmo se este os recebeu por herança, o companheiro nãoterá direito à meação, em razão do regime da comunhão

parcial de bens, bem como não terá direito a concorrercom os herdeiros do falecido.

Os bens adquiridos por fato eventual, tais como osprêmios de loteria ou sorteios, compõem o segundo blocoe quanto a eles não haverá participação sucessória docompanheiro. Também entende Francisco José Cahali queos bens sub-rogados pertencem ao segundo bloco e sobreeles o companheiro não terá direito sucessório, pois “não épela forma de aquisição, mas pelo acréscimo patrimonial,efetivo ou real, que se identifica a parcela da herança naqual participará o companheiro sobrevivente” (Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 230). Como exemplo de bemsub-rogado, pode ser citada a casa que é comprada dur-

ante a união estável, com recursos da venda de uma outracasa que pertencia exclusivamente ao companheiro antesdela se iniciar.

Destaque-se que  quanto aos bens sobre os quais ocompanheiro tem a meação decorrente da comunhão parcial, terá também direito à sucessão. Já com relação

aos bens particulares, o companheiro não tem a meação,

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em decorrência do regime e não tem também qualquerdireito sucessório.

Curiosamente, fica a conclusão de que com relação àsucessão do companheiro a regra será a seguinte: quantoaos bens em que há meação, o companheiro também seráherdeiro. Sobre os bens em que não há meação, o com- panheiro também não terá direitos sucessórios. Como senota, as regras diferem completamente das previstas paraa sucessão do cônjuge, razão pela qual, conforme opor-tunamente será explicado, há julgados entendendo pelainconstitucionalidade do dispositivo relativo à união es-

tável (cf. item 2.5.2.9).Mas há ainda a situação especial , em que os compan-

heiros elaboraram um contrato escrito quanto ao regimepatrimonial da convivência. Ora, caso os companheirostenham elaborado contrato escrito para regular a sua con- vivência, a situação patrimonial do casal será regida pelasdeterminações do contrato.

Muitas variantes podem ser imaginadas em casos taise seria praticamente impossível abordar todas elas. Dequalquer forma, algo deve ser esclarecido. O fato de o con-trato entre os companheiros ter alterado a relação patri-monial existente entre eles não altera a regra sucessóriaprevista no art. 1.790 do CC.

 Aliás, deve-se lembrar que qualquer disposição con-tratual a respeito da sucessão será nula de pleno direitopor se tratar de pacto sucessório ou pacta corvina, vedadopor lei (art. 426 do CC). A nulidade é  virtual , pois a lei veda o ato sem cominar sanção específica – art. 166, VII,do CC. Sobre o tema, vale dizer que um dos coautores da

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obra fez trabalho aprofundado (SIMÃO, José Fernando. Direito civil ..., 2005, v. 5. p. 31).

 Alguns exemplos práticos podem esclarecer asituação.

Os companheiros podem, por meio de contrato es-crito, estabelecer que adotam a regra da comunhão uni- versal de bens e que todos os bens presentes, pretéritos efuturos pertencerão a ambos os companheiros na pro-porção de 50% para cada um. Isso significa que se o com-panheiro ganhou uma fazenda, a companheira terá 50%do bem (meação); e se o companheiro comprou uma casa

de praia a companheira também terá 50% (meação), porforça do   contrato de convivência.   Por outro lado, se ocompanheiro falecer, deixando dois filhos, terá a compan-heira direito sucessório apenas em relação à casa de praia,mas não à fazenda. Isso por força do art. 1.790 do CC. Ve- jamos o exemplo, de forma destacada:

Bens do falecido

Fazenda:

– 50% (meação) pertencem à companheira por forçado contrato escrito;

– 50% (herança) serão partilhados apenas entre os

filhos do falecido.Casa de praia:

– 50% (meação) pertencem à companheira por forçado contrato escrito;

– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira e os filhos do falecido.

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Imagine-se uma segunda hipótese em que os compan-heiros, por meio de um contrato escrito, adotaram a regrada separação absoluta de bens, não havendo meação denenhum bem, seja ele presente, pretérito ou futuro.

Isso significa que se o companheiro recebeu umafazenda, a companheira não terá direito à meação e o com-panheiro será dono de 100% do bem. Do mesmo modoocorrerá se o companheiro comprou uma casa de praia,por força do que consta do contrato de convivência. Poroutro lado, se o companheiro falecer, deixando dois filhos,terá a companheira direito sucessório apenas em relação à

casa de praia, mas não à fazenda (art. 1.790 do CC).Esquematizando com detalhes:

Bens do falecido

Fazenda

– 100% (herança) serão partilhados apenas entre os

filhos do falecido.Casa de praia

– 100% (herança) serão partilhados entre a compan-heira e os filhos do falecido.

Em suma, a conclusão a que se chega com a leitura doart. 1.790 do CC é que a disposição contratual só terá ocondão de criar ou afastar a meação, mas não alterará asregras sucessórias. Nesse sentido, enfatiza Francisco JoséCahali que “em nada importa o regime patrimonial, se dacomunhão parcial, ou de outra previsão contratual, sendoirrelevante, ainda, eventual titularidade do viúvo sobre

parte deste acervo” (Curso avançado..., 2003, v. 6, p.

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229). Sílvio de Salvo Venosa também segue esse entendi-mento ao afirmar que “o contrato escrito que define even-tual regime patrimonial entre os companheiros não podesubstituir o testamento” ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 119).Como não poderia ser diferente, concorda-se de forma in-

tegral com os doutrinadores citados.Superada a questão da massa patrimonial, sobre a

qual haverá participação do companheiro em termos su-cessórios, caberá a resposta a uma segunda questão:Quanto herda o companheiro?  A questão não é das maisfáceis, como se verá no tópico a seguir.

2.5.2.2 A concorrência sucessória do companheiro com osdescendentes do falecido. O art. 1.790, I e II, doCC 

De imediato, é importante diferenciar duas situações

diversas envolvendo a concorrência sucessória do com-panheiro em relação aos descendentes do falecido.

 A primeira delas é aquela em que o companheiro é as-cendente dos herdeiros com quem concorre ( filiaçãocomum).

 Além dessa situação, temos outra envolvendo aqueles

casos em que o companheiro sobrevivo não é ascendentedos herdeiros com quem concorrer ( filiação exclusiva).Nesse primeiro momento, não analisaremos a chamada fi-liação híbrida – expressão criada por Giselda Hironaka –,em que o falecido deixa descendentes comuns e exclusivosao mesmo tempo.

No caso de   filiação comum, de acordo com o art.1.790, I, do CC, o companheiro, se concorrer com   filhos

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comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por leifor atribuída ao filho. Filhos comuns devem ser compreen-didos como sendo aqueles que são filhos tanto do falecidoquanto do companheiro herdeiro. Em outras palavras, acompanheira é mãe dos herdeiros com quem concorre.

Nessa hipótese, a lei determina que o companheiroherdeiro receba quota equivalente àquela que receberemos filhos. A título de exemplo, se o companheiro, ao fale-cer, tinha dois bens: uma casa de praia que herdou de seupai (bem particular) e um apartamento que comprou apóso início da união estável (bem comum) e deixou dois filhos

comuns e sua companheira, os bens serão partilhados daseguinte forma:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum

– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira e os dois filhos comuns do falecido, ficandocada um com 1/3 dos 50%.

Casa de praia – Bem particular

– 100% (herança) serão partilhados apenas entre osdois filhos comuns do falecido, na proporção de 50%

 para cada um.

É importante notar que a lei, no inc. I do art. 1.790 doCC, não utiliza a expressão descendentes comuns, mas fil-hos comuns. Diante desse detalhe legislativo, surge umadúvida: isso quer dizer que, se o companheiro falece e

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deixa apenas netos comuns – filhos de filhos comuns doscompanheiros –, a regra deixaria de ser aplicada?

Em uma interpretação literal, a resposta seria afirm-ativa e aplicar-se-ia o inc. III do art. 1.790 do CC, pelo qual“se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direitoa um terço da herança”. Entretanto, a maioria absoluta dadoutrina entende que o inc. I do art. 1.790 deve ser aplic-ado também aos netos comuns. Essa é a interpretaçãodominante à qual se filiam os autores da presente obra.Do mesmo modo, são adeptos dessa corrente FranciscoJosé Cahali, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka,

Christiano Cassettari, Guilherme Calmon da Gama,Gustavo Rene Nicolau, Jorge Shiguemitsu Fujita, Inaciode Carvalho Neto, Rodrigo da Cunha Pereira, Euclides deOliveira, Sebastião Amorim, Rolf Madaleno e Zeno Veloso,conforme aquela tabela organizada pelo professor Fran-cisco Cahali antes referenciada ( Família e sucessões...,2004, v. II, p. 329).

Confirmando esse entendimento majoritário, prevê oEnunciado n. 266 CJF/STJ, aprovado na  III Jornada de Direito Civil : “Art. 1.790. Aplica-se o inc. I do art. 1.790também na hipótese de concorrência do companheirosobrevivente com outros descendentes comuns, e nãoapenas na concorrência com filhos comuns”. O enunciado

é de autoria justamente do professor Francisco Cahali, e oseu teor é que deve ser adotado para a prática do Direitodas Sucessões.

Em suma, prevalece então o entendimento pelo qual oinciso I do art. 1.790 do CC deve ser lido da seguintemaneira:   se concorrer com descendentes comuns, terá

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direito a uma quota equivalente à que por lei for at-ribuída ao descendente.

Por outro lado, se o companheiro concorrer apenascom descendentes do falecido (são os chamados filhos ex-clusivos), determina o art. 1.790, II, do CC, que lhe tocaráa metade do que couber a cada um daqueles.

Desse modo, filhos exclusivos são os filhos apenas dofalecido, mas não do companheiro sobrevivente. Portanto,o companheiro dividirá a herança com aqueles que nãosão seus parentes consanguíneos. Exemplificamos: se ocompanheiro, ao falecer, tinha dois bens, uma casa de

praia que herdou de seu pai (bem particular) e um aparta-mento que comprou após o início da união estável (bemcomum) e deixou dois filhos exclusivos e sua compan-heira, os bens serão partilhados da seguinte forma:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira (1/5) e os dois filhos exclusivos (2/5 para cada)do falecido.

Casa de praia – Bem particular

– 100% (herança) serão partilhados apenas entre osdois filhos exclusivos do falecido, na proporção de50% para cada filho.

 A regra que se estabelece é que o companheiro recebemeia quota ( x ) e, portanto, o filho exclusivo recebe o dobro

disso (2 x ). Imagine-se a hipótese em que o falecido deixa

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três filhos exclusivos e a companheira. Para cada filhoexclusivo deve-se atribuir 2 x  (2 x  X 3 = 6 x ). Para a com-panheira atribuímos 1 x . Somemos as quotas dos filhos eda companheira: 6 x  + 1 x  = 7 x . O número 7 será o divisorda fração, e a herança será distribuída da seguinte forma:

– para o companheiro: 1/7 da herança;

– para cada filho exclusivo do falecido: 2/7 da herança.

 A tabela a seguir facilitará a compreensão:

Númerode filhose x clusivosdofalecido

(atribuir2 x  a cada

um)

Companheira

(atribuir 1 x 

sempre)

Somadasquotas

Divisão daherança

1 filho

Quota – 2 x 

1

Quota – 1 x   3 x 

1 /3 para acompanheirae 2 /3 para ofilho

2 filhos

Quota – 4 x 

1Quota – 1 x 

  5 x 

1 /5 para a

companheirae 2 /5 paracada filho

3 filhos

Quota – 6 x 

1

Quota – 1 x   7 x 

1 /7 para acompanheirae 2 /7 para

cada filho

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4 filhos

Quota – 8 x 

1

Quota – 1 x   9 x 

1 /9 para acompanheirae 2 /9 paracada filho

5 filhosQuota – 10

 x 

1

Quota – 1 x   11 x 

1 /11 para acompanheirae 2 /11 paracada filho

6 filhos

Quota – 12

 x 

1

Quota – 1 x   13 x 

1 /13 para acompanheirae 2 /13 para

cada filho

7 filhos

Quota – 14 x 

1

Quota – 1 x   15 x 

1 /15 para acompanheirae 2 /15 paracada filho

8 filhosQuota – 16

 x 

1Quota – 1 x 

  17 x 

1 /17 para acompanheirae 2 /17 paracada filho

Do mesmo modo, ilustrando a incidência do art.1.790, inc. II, do CC, cabe transcrever acórdão publicado

no Informativo n. 474 do STJ:

“Companheira. Herança. Concorrência. Único filho.Trata-se de REsp em que a discussão cinge-se à possibilid-ade de a companheira ainda não reconhecida por sentençacomo tal receber por herança verbas advindas do trabalhopessoal do falecido e, em caso positivo, concorrendo com o

único filho dele, à proporção correspondente ao seu direito.

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 A Turma, ao prosseguir o julgamento, após sua renovação,por maioria, entendeu que, em se tratando de direito su-cessório, incide o mandamento do art. 1.790, II, do CC/2002. Assim, consignou-se que, concorrendo a companheiracom o descendente exclusivo do autor da herança, calculadaesta sobre todo o patrimônio adquirido pelo falecido durantea convivência, cabe a ela metade da quota-parte destinadaao herdeiro, vale dizer, 1/3 do patrimônio a ser partilhado.Diante desse fundamento, entre outros, por maioria, deu-separcial provimento ao recurso para determinar a liberaçãode 2/3 do valor depositado e retido, descontando-se as par-celas adiantadas ao recorrente, até o trânsito em julgado detodas as ações de reconhecimento de união estável que

tramitam envolvendo o autor da herança” (STJ, REsp887.990/PE, Rel. originário Min. Fernando Gonçalves, Rel.para acórdão Min. Luis Felipe Salomão (art. 52, IV,  b, doRISTJ), j. 24.05.2011).

José Luiz Gavião de Almeida rechaça a interpretaçãoliteral do inc. II do art. 1.790 do CC, apontando que “o

mandamento legal entrega parte invariável ao compan-heiro, a qual será sempre de 1/3 da herança, independ-entemente do número de descendentes do sucedido. Seum apenas o sucedido, toca-lhe 1/3 da herança enquanto oherdeiro filho recebe 2/3 dos bens transmitidos. Se quatroos descendentes, o companheiro, a quem cabe a metade doque cada herdeiro vier a receber, recolherá 1/3 da herança;

nesta última hipótese cada descendente ficará com 1/6 daherança, isto metade do que recolherá o companheiro. (...) A interpretação que se pode dar ao inciso II do art. 1.790 éde que o companheiro sobrevivente, concorrendo comfilho apenas do sucedido, receberá metade do que cadaqual dos filhos vier a levantar. Se a cada filho cabe R$

1.000,00, não importando o número de filhos, ao

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companheiro serão entregues R$ 500,00” (Código Civil...,2003, v. XVIII, p. 70). A tese do professor da USP é exata-mente o que foi apontado no último quadro montado.

Pois bem, chegou o momento de discutir uma dasmaiores polêmicas que envolvem o Direito das Sucessões.O problema ocorre na situação batizada por Giselda MariaFernandes Novaes Hironaka de  filiação híbrida, em queconcorrem com o companheiro os filhos comuns e exclus-ivos do falecido. Repise-se que se trata de uma das maiscomplicadas problemáticas trazidas pelo Código Civil de2002 como um todo.

 A pergunta central da polêmica é a seguinte: em con-correndo com filhos híbridos (filhos comuns + filhos ex-clusivos), o companheiro recebe uma quota ou meia-quota do que couber a esses? 

 Algumas correntes doutrinárias se formaram para re-sponder à pergunta.

1.ª Corrente: O companheiro recebe umaquota.

Por meio de uma interpretação literal do dispositivo,chega-se à conclusão que é defendida por Sílvio de Salvo Venosa, segundo a qual, na hipótese de filiação híbrida,

aplicamos o inc. I do art. 1.790 do CC, e a companheiraterá quota igual à dos filhos. “A solução é dividi-la igualit-ariamente, incluindo o companheiro ou companheira.Essa conclusão deflui da junção dos dois incisos, pois nãohá que se admitir outra solução, uma vez que os filhos, nãoimportando a origem, possuem os mesmos direitos hered-itários” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil..., 2003, v.

7, p. 121). Essa solução é adotada porque o dispositivo não

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afirma que o inciso I se aplica se o companheiro só concor-rer com filhos comuns. Não exige a lei esta exclusividadeque restringiria a aplicação do inciso.

Esse é o entendimento do coautor José FernandoSimão e de grande parte da doutrina. Assim, são adeptosdessa corrente Francisco José Cahali, Christiano Cas-settari, Guilherme Calmon da Gama, Jorge ShiguemitsuFujita, Inácio de Carvalho Neto, Rodrigo da CunhaPereira, Maria Berenice Dias, Rolf Madaleno e Mário LuizDelgado (CAHALI, Francisco José. Família e sucessões...,2004, v. II, p. 329). Pelo número de doutrinadores que

seguem esse entendimento, o mesmo deve ser adotadopara a prática sucessória.

De qualquer modo, observe-se que se adotada estacorrente o companheiro sai privilegiado com relação aosdescendentes. Por outro lado, como a primeira teoria émenos benéfica aos filhos, parte da doutrina segue outralinha de raciocínio.

2.ª Corrente: O companheiro recebe meiaquota

Isso porque a interpretação visa à proteção dos des-cendentes, e, portanto, em caso de filiação híbrida, o com-panheiro só teria direito à metade do quinhão que for at-ribuído a cada filho. Em síntese, aplica-se à filiaçãohíbrida o art. 1.790, II, do CC.

Nesse sentido, afirma Euclides de Oliveira que “emface da diversidade de posicionamentos por omissão e du- biedade da norma legal, penso que a interpretação maisconsentânea e que poderá vingar no tumulto interpretat-

ivo da disposição em comento será a de atribuir ao

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companheiro quota igual à dos descendentes apenasquando seja ascendente de todos os habilitados na her-ança” ( Direito de herança..., 2005, p. 171). Essa é a inter-pretação à qual está filiado o coautor Flávio Tartuce. Tam- bém são adeptos dessa corrente Gustavo Rene Nicolau,

Maria Helena Diniz e Zeno Veloso (CAHALI, FranciscoJosé. Família e sucessões..., 2004, v. II, p. 329).

Maria Helena Diniz justifica sua opinião afirmandoque “aplicando-se o art. 4.º da Lei de Introdução aoCódigo Civil, que privilegia o princípio da igualdade jurídica de todos os filhos (Constituição Federal, art. 227,

§ 6.º), só importará, na sucessão, o vínculo de filiação como  auctor successionis  e não o existente entre o compan-heiro sobrevivente, que, por isso, terá, nessa hipótese,direito à metade do que couber a cada um dos descend-entes” (Curso..., 2005, v. 6, p. 142). O coautor Flávio Tar-tuce segue o entendimento da professora da PUC/SP, quefoi sua orientadora de mestrado. Isso porque, se a herança

for do falecido, havendo uma situação de dúvida, deve-seinterpretar que todos os filhos são daquele que morreu. Assim sendo, aplica-se o inc. II do art. 1.790 do CC.

Essa posição privilegia os filhos em detrimento dacompanheira. Argumento a favor dessa corrente é que se acompanheira receber quota igual, quando falecer, de-

 volverá os bens recebidos apenas aos filhos comuns, porser mãe destes, em evidente prejuízo aos filhos exclusivos.José Luiz Gavião de Almeida também segue esse entendi-mento e leciona que “essa interpretação melhor se adaptaà intenção do legislador que privilegiou o filho antes docônjuge ou do companheiro” (Código Civil..., 2003, v.XVIII, p. 71). Consigne-se que essa interpretação

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prevaleceu em recente julgado do Tribunal Paulista quemerece destaque:

“Companheira que concorre com filho comum e filho ex-clusivo do autor da herança. Ausência de regra legal es-

pecífica para a hipótese. Solução que contempla o direito su-cessório da companheira apenas no que toca à metade doque couber a cada um dos filhos. Aplicação por analogia doart. 1.790, II, do CC, de modo a preservar a igualdade entreos filhos. Observância do art. 227, § 6.º, CF/88 e do art.1.834 do CC. Recurso não provido” (TJSP, Agravo652.505-4/0-00, 5.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des.Roberto Mac Craken, j. 09.09.2009).

3.ª Corrente: teoria da sub-herança

 A teoria de sub-herança é explicada por Giselda MariaFernandes Novaes Hironaka, que, aliás, com ela não con-corda (Comentários..., 2003, v. 20, p. 63). Para a sua visu-alização, vejamos os passos indicados pela professora:

1.º) Divide-se a herança em dois blocos, um dos filhoscomuns e outro dos não comuns.

2.º) O companheiro teria uma quota igual à dos filhoscomuns na sub-herança destes.

3.º) O companheiro teria metade da quota dos não comuns

na sub-herança destes.4.º) Somam-se as quotas do companheiro obtidas nos passo

anteriores e se conclui qual será a sua participação naherança.

 A título de exemplo, imagine-se uma herança no im-porte de R$ 100.000,00, e que o falecido tenha deixado

três   filhos comuns   e dois   filhos exclusivos (filiação

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híbrida).   Nesse caso, cada filho teria direito a R$20.000,00 (R$ 100.000,00 divididos por 5).

 Assim, a herança dos   filhos comuns   seria de R$60.000,00 (R$ 20.000,00 X 3) e seria dividida em quatropartes (três dos filhos e uma da companheira). Obedece-seao disposto no inc. I do art. 1.790. A companheira teriadireito a R$ 15.000,00.

Já a sub-herança dos   filhos exclusivos   seria de R$40.000,00 (R$ 20.000,00 X 2) e seria dividida em cincopartes (duas para cada filho exclusivo e uma para a com-panheira). A companheira teria direito a R$ 8.000,00.

 Vejamos todos esses cálculos, de forma detalhada, natabela a seguir:

Divisão final da herança

CompanheiroR$ 15.000,00 +R$ 8.000,00= R$ 23.000,00

R$23.000,00

Quota de cadafilho comum

  R$ 15.000,00   (x 3) R$45.000,00

Quota de cada

filho exclusivo

  R$ 16.000,00  (x 2) R$

32.000,00

Total   R$100.000,00

O grande problema da teoria é que a mesma gera umadesigualdade entre os filhos, ferindo os ditames constitu-

cionais. Em suma, essa teoria é inaplicável diante da

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Um exemplo prático ajuda a intelecção do problema.

O falecido deixa três filhos comuns e dois exclusivos.Como se calcula o coeficiente? Calcula-se da seguinteforma: 3 x1 + 2 x1/2 ÷ 5 = 4/5 (que equivale a 0,8 – menorque 1 e maior que 1/2).

Somam-se: número de filhos comuns ( x1) comnúmero de filhos exclusivos ( x1/2) e depois se divide pelonúmero total de filhos (comuns e exclusivos).

Como então se chega, agora, aos quinhões de cadafilho e da companheira? Todos os filhos têm quinhão igual(5 filhos = 5x ), e a companheira tem o coeficiente 0,8x .

Chegamos ao seguinte cálculo 5x  + 0,8x  = 100%, en-tão x  é igual a 17,24% (100 dividido por 5,8). Dessa forma,cada filho receberá x , ou seja, 17,24%, e a companheira re-ceberá 13,79% (17,24 multiplicado pelo coeficiente 0,8).

 Vejamos uma tabela com os cálculos da   FórmulaTusa:

Númerode fil-hoscomuns

Númerode filhosexclusivos

Coeficiente

Soma dosquinhõesdos filhos edacompanheira

Dnh

9 filhos 1 filho

9 x1 +1 x1/2 ÷ 10= 9,5/10 =0,95

10 x  + 0,95 x = 100%

Cr9oh8

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1 filho 9 filhos

1 x1 +9 x1/2 ÷ 10= 5,5/10 =0,55

10 x  + 0,55 x = 100%

Cr9cr

5

2 filhos 2 filhos

2 x1 +2 x1/2 ÷ 4= 3/4 =0,75%

4 x  + 0,75 x  =100%

Cr2oh1

Esses três exemplos são bem ilustrativos da lógica da Fórmula Tusa.

No primeiro exemplo da tabela, o número de filhoscomuns é grande, e o de filhos exclusivos pequeno. Logo, o

quinhão do companheiro (9,13%) fica muito próximo doquinhão dos filhos (8,67%). A quota é quase igual, o que seaproxima da determinação do inc. I do art. 1.790 do CC.

No segundo exemplo inverte-se a situação, pois onúmero de filhos exclusivos é grande e o de filhos comunsé pequeno. Logo, o quinhão do companheiro (5,21%) ficamuito próximo da metade do quinhão dos filhos (9,47%). A quota é quase igual à metade do que recebem os filhos, oque se aproxima da determinação do inc. II do art. 1.790do CC.

No terceiro e último exemplo é idêntico o número defilhos comuns e de filhos exclusivos. Logo, o companheirofica em situação intermediária, não recebendo quota igual

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(1) nem metade (0,5), mas recebendo 0,75 do que recebemos filhos.

 A fim de tornar  operável  a solução preconizada porGabriele Tusa, o economista Fernando Curi Peres, do De-partamento de Sociologia e Economia da ESALQ/USP,traduziu os princípios em verdadeira fórmula aritmética,que é a seguinte:

Legenda:X = o quinhão hereditário que caberá a cada um dos filhos.

C   = o quinhão hereditário que caberá ao companheirosobrevivente.

H = o valor dos bens hereditários sobre os quais recairá aconcorrência do companheiro sobrevivente.

F = o número de descendentes comuns com os quais con-corra o companheiro sobrevivente.

S = o número de descendentes exclusivos com os quais con-corra o companheiro sobrevivente.

 A fórmula foi reproduzida, de maneira pioneira, porGiselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, em sua

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segunda edição dos Comentários ao Código Civil , da Edit-ora Saraiva, que assim esclarece a questão:

“Como ressaltado, os resultados que serão alcançados coma aplicação dessa fórmula variam proporcionalmente con-

forme o número de filhos exclusivos do falecido e o númerode filhos comuns a ele e ao convivente sobrevivo. A variaçãoé   diretamente proporcional , ou seja, quanto maior onúmero de filhos comuns relativamente ao número de filhosexclusivos, maior será a quota cabível ao companheirosobrevivente, pois que, se apenas descendentes comunshouvesse, estes receberiam quota idêntica à que caberiaàquele (inc. II), ao passo que se maior for o número de des-cendentes exclusivos, menor será a quota do companheiro emais próxima ela se encontrará da metade do quinhão queaqueles recebem (inc. I)” (HIRONAKA, Giselda MariaFernandes Novaes. Comentários..., 2007, v. 20, p. 66-67).

Portanto, com base na ideia de ponderação, a fórmulapoderá ser utilizada em qualquer hipótese de concorrência

do companheiro com filhos exclusivos e comuns dofalecido.

 A solução é engenhosa e genial. Entretanto, não temoscerteza de que sua operacionalidade esteja garantida. Ascontas geram números decimais que fracionam a herançade maneira complexa. De qualquer forma, é uma solução

que não fere a igualdade dos filhos e atende ao espírito dolegislador. Havendo dedicação do aplicador do Direito, amesma pode ser aplicada. Tendo parâmetros matemáti-cos, a fórmula pode ser adotada na prática sucessória.

Superada a análise de todas as concorrências su-cessórias do companheiro com os descendentes, parte-se à

análise da concorrência com os ascendentes.

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2.5.2.3 A concorrência sucessória do companheiro com osascendentes do falecido. O art. 1.790, III, do CC 

Se o companheiro falecido não deixou descendentes,serão chamados à sucessão os ascendentes do falecido em

concorrência com o companheiro (art. 1.790, III, do CC).Nessa hipótese, o companheiro receberá 1/3 da herança.

 Alguns exemplos ajudam a esclarecer a questão. Dequalquer forma, vale dizer que nesse momento necessáriaserá a aplicação das regras referentes à sucessão na linhaascendente, vide item 2.3 do presente capítulo. Vejamos

algumas situações práticas.– Se João, companheiro de Maria, ao falecer sem des-

cendentes tinha dois bens, uma casa de praia que comprouantes do início da união estável (bem particular) e umapartamento que comprou após o início da união estável(bem comum) e deixou sua mãe viva, os bens serão partil-hados da seguinte forma:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum (art. 1.790, III, e1.836, caput , do CC)

– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira (1/3) e a mãe do falecido (2/3).

Casa de praia – Bem particular (art. 1.790, caput , e1.836, caput , do CC )

– 100% (herança) serão apenas da mãe do falecido.

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– Se João, companheiro de Maria, ao falecer sem des-cendentes, tinha dois bens, uma casa de praia que com-prou antes do início da união estável (bem particular) eum apartamento que comprou após o início da união es-tável (bem comum) e deixou sua mãe e seu pai vivos, os

 bens serão partilhados assim:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum (arts. 1.790, III, e1.836, § 2.º, do CC)

– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira (1/3) e a mãe do falecido (1/3) e o pai do fale-cido (1/3).

Casa de praia – Bem particular (art. 1.790, caput, e1.836, § 2.º, do CC)

– 100% (herança) serão partilhados entre a mãe do

falecido (1/2) e do pai do falecido (1/2).

– João, companheiro de Maria, ao falecer sem des-cendentes, tinha dois bens: uma casa de praia que com-prou antes do início da união estável (bem particular) eum apartamento que comprou após o início da união es-

tável (bem comum) e deixou seus avós maternos vivos esua avó paterna viva, pois seu pai e sua mãe eram premor-tos. Nesse caso, a divisão da herança será a seguinte:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum (art. 1.790, III, e

1.836, § 2.º, do CC)

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– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira (1/3), a avó paterna do falecido (1/3), a avómaterna do falecido (1/6) e o avô paterno do falecido(1/6).

Casa de praia – Bem particular (art. 1.790, caput , e1.836, § 2.º, do CC)

– 100% (herança) serão partilhados entre a avó pa-terna do falecido (1/2), a avó materna do falecido (1/ 4) e o avô paterno do falecido (1/4).

Como se percebe, a concorrência do companheiro comos ascendentes do falecido não gera maiores dificuldades.

2.5.2.4 A concorrência sucessória com os colaterais do falecido. O art. 1.790, III, do CC 

Se o companheiro falecido não deixou descendentesnem ascendentes, mas deixou parentes colaterais até o 4.ºgrau (art. 1.839 do CC), estes serão chamados a sucederem concorrência com o companheiro sobrevivo. Issoporque o art. 1.790, III, do CC, menciona parentes sucessí-veis, tendo o companheiro direito a um terço da herança

em casos tais. Vejamos quem são esses  parentes colaterais sucessí-

veis. Serão herdeiros o irmão do morto (parente colateralem 2. º grau), o sobrinho e o tio do morto (colateral em 3.ºgrau), bem como o tio-avô, o sobrinho-neto e o primo-irmão (parentes colaterais em 4.º grau).

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Exemplifica-se. João, companheiro de Maria, ao fale-cer sem descendentes nem ascendentes, tinha dois bens:uma casa de praia que comprou antes do início da uniãoestável (bem particular) e um apartamento que comprouapós o início da união estável (bem comum). Deixou seu

tio-avô vivo. Nesse caso, a divisão da herança será aseguinte:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum (arts. 1.790, III, e1.839 do CC)

– 50% (meação) pertencem à companheira;– 50% (herança) serão partilhados entre a compan-heira (1/3) e o tio-avô do falecido (2/3).

Casa de praia – Bem particular (arts. 1.790, caput,e 1.839 do CC )

– 100% (herança) será apenas do tio-avô do

falecido.

Imaginar que um sobrinho do morto, um primo-irmãoou um tio-avô terão mais direitos que a companheira deuma vida causa certo espanto. Note-se que, diversamentedo que ocorre com o cônjuge supérstite, que herda a her-

ança como um todo, havendo apenas parentes colateraisaté 4.º grau, o companheiro sobrevivo concorrerá e di- vidirá a herança com estes.

Na opinião destes autores, trata-se de um flagranteretrocesso, uma vez que a Lei 8.971/1994 garantia aoscompanheiros o direito de recolher a totalidade da her-

ança caso o falecido deixasse apenas colaterais (art. 2.º,

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adquiridos a título oneroso serão herdados pelo compan-heiro e os bens particulares serão considerados parte deherança vacante e atribuídos aos Estado (Município ouDistrito Federal). São adeptos dessa corrente FranciscoJosé Cahali, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka,

Mário Luiz Delgado, Inacio de Carvalho Neto, Rodrigo daCunha Pereira e Zeno Veloso ( Família e sucessões...,2004, v. II, p. 329). Francisco José Cahali justifica suaopinião dizendo que, mesmo não havendo parentes su-cessíveis, “a totalidade da herança a que se refere o incisoé aquela prevista no caput , ou seja, limitada aos bens ad-quiridos onerosamente na constância da união. Assim,sendo maior o patrimônio do falecido, aqueles bens nãocontemplados no caput  serão tidos como herança jacente”(Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 231).

 A título de ilustração, João, companheiro de Maria, aofalecer sem descendentes, ascendentes, ou colaterais,tinha dois bens: uma casa de praia que comprou antes do

início da união estável (bem particular) e um apartamentoque comprou após o início da união estável (bem comum).Nesse caso, a divisão da herança será a seguinte:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum (art. 1.790, caput  einc. IV, do CC)– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) pertencerão apenas à companheira.

Casa de praia – Bem particular (art. 1.790, caput einc. IV , do CC)

– 100% (herança) serão apenas do Município.

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Por outro lado, se a resposta for a de que o inc. IV de- ve ser interpretado desvinculado do caput , de acordo como sistema criado pelo Código Civil de 2002, a consequên-cia é que os bens que irão compor o acervo hereditário ser-ão todos aqueles deixados pelo falecido, independente-

mente do título de aquisição. Isso porque o Código Civil,em seu art. 1.844, determina que “não sobrevivendo côn- juge, ou companheiro, nem parente algum sucessível , outendo eles renunciado à herança, esta se devolve ao Mu-nicípio ou ao Distrito Federal, se localizada nas respectivascircunscrições, ou à União, quando situada em territóriofederal” (destacamos).

Exemplificamos como ficam as situações práticas.João, companheiro de Maria, ao falecer sem descendentes,ascendentes ou colaterais, tinha dois bens: uma casa depraia que comprou antes do início da união estável (bemparticular) e um apartamento que comprou após o inícioda união estável (bem comum). Nesse caso, a divisão da

herança será a seguinte:

Bens do falecido

Apartamento – Bem comum (art. 1.790, caput  einc. IV, do CC)

– 50% (meação) pertencem à companheira;

– 50% (herança) pertencerão apenas à companheira.

Casa de praia – Bem particular (art. 1.790, IV, eart. 1.844 do C C)

– 100% (herança) serão apenas da companheira.

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Essa segunda posição parece-nos a mais acertada. Issoporque o art. 1.844 do CC, que trata da herança vacante, éexpresso ao afirmar que a herança só será devolvida aoMunicípio se não houver cônjuge, companheiro ou nen-hum parente sucessível.   Contrario sensu, se houver o

companheiro, o Município estará excluído da sucessão. Sóse realmente não houver cônjuge ou companheiro a her-ança será considerada vacante. A conclusão se coadunacom a própria lição de Itabaiana de Oliveira, já compiladano presente livro a respeito da ordem de vocação hered-itária: “esta ordem se distingue por sua simplicidade e cor-responde, com a possível exatidão, ao conceito de família,e, substituindo a este sentimento, há o de pátria, que serefere no direito hereditário com a sucessão do Fisco”(Tratado..., 1952, v. 1, p. 171). O sentimento de famíliaprepondera sobre o de Pátria. Havendo família, a Pátriafica em segundo lugar... Em conclusão, havendo compan-heiro sobrevivo, o Município nada herdará.

São adeptos desta corrente, Christiano Cassettari,Eduardo de Oliveira Leite, Gustavo Rene Nicolau, JorgeShiguemitsu Fujita, Maria Berenice Dias, Maria HelenaDiniz, Rolf Madaleno, Sebastião Amorim e Euclides deOliveira ( Família e sucessões..., 2004, v. II, p. 329). Esseentendimento pode ser adotado como majoritário, sendo

também dele adeptos os coautores Flávio Tartuce e JoséFernando Simão. Maria Helena Diniz contribui decisiva-mente com a questão nos seguintes termos:

“Se o Município, a União e o Distrito Federal só é sucessorirregular da pessoa que falece sem deixar herdeiro, como po-deria se admitir que receba parte do acervo hereditário con-correndo com herdeiro sui generis  (sucessor regular), que,no artigo  sub examine, seria o companheiro? Na herança

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 vacante configura-se uma situação de fato em que ocorre aabertura da sucessão, porém não existe quem se intitule her-deiro. Por não existir herdeiro um sucessor regular, é que oPoder Público entra como sucessor irregular. (...) Isto seriamais justo, pois seria inadmissível a exclusão do compan-heiro sobrevivente, que possuía laços de afetividade com ode cujus, do direito à totalidade da herança, dando prevalên-cia à entidade pública. Se assim não fosse, instaurar-se-ia nosistema uma lacuna axiológica. Aplicando-se o art. 5.º daLICC, procura-se a solução mais justa, amparando o com-panheiro sobrevivente” (Curso..., 2005, v. 6, p. 143).

Concluímos nossas ponderações sobre o tema observ-

ando que o Código Civil de 2002 representa um granderetrocesso com relação às leis anteriores que regulavam amatéria da união estável. Ainda que não se atribua aotermo retrocesso qualquer cunho valorativo ou peso mor-al, certo é que muitos dos direitos obtidos pelos compan-heiros após anos de construção doutrinária e jurispruden-cial restaram drasticamente reduzidos, o que certamenteserá causa de frustração para muitos.

Por outro lado, o Código Civil de 2002, ao contráriodo que faziam as leis anteriormente vigentes, afasta afigura da união estável da figura do casamento, criandodireitos sucessórios bem distintos com relação a esses in-stitutos. Com a vigência do Código Civil de 2002 afasta-se

a ideia de que  casar ou não  é indiferente, porquanto oscasados voltam a ter mais direitos que os companheirospor força da revogação das Leis 8.971/1994 e 9.278/1996,que praticamente equiparavam a união estável aocasamento, pelo menos em matéria sucessória.

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2.5.2.6 Os projetos de reforma do art. 1.790 do CC 

Diante do verdadeiro   caos   instituído pelo legisladordo Código Civil de 2002, conforme demonstrado, a ne-cessidade de reforma do art. 1.790 da atual codificação se

faz imperiosa. Em razão dos clamores da doutrina, há umprincipal projeto de alteração em trâmite no CongressoNacional, que abordaremos no presente estudo.

Trata-se do PL 699/2011, cujo número original era PL6.960/2002, de autoria do Deputado Ricardo Fiúza.

O segundo projeto que era analisado na primeira

edição dessa obra era o PL 4.944/2005, de relatoria doDeputado Antonio Biscaia, e que era fruto dos estudos doIBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família, masque, desde 31 de janeiro de 2007, encontra-se arquivado. Assim, deixamos de explicá-lo de maneira minuciosa. Aguardamos, ainda, a elaboração do   Estatuto das Her-anças pelo IBDFAM para oportunos comentários.

Em decorrência das inúmeras críticas relevantes sus-citadas pela doutrina, entendeu-se ser de extrema im-portância a reforma do artigo em questão, razão pela qual,ainda no ano de 2002 e durante o período de vacância doCódigo, propôs originalmente o deputado Ricardo Fiúza aalteração substancial do art. 1.790 do CC.

O princípio que norteia o antigo Projeto Fiúza é o damanutenção do atual art. 1.829, I, do CC, que trata da su-cessão do cônjuge em concorrência com os descendentes.O marco divisório entre a concorrência ou não com os des-cendentes seria o regime de bens dos companheiros. Sãocriadas regras análogas para a sucessão do companheiro,

sem que haja uma equiparação ao cônjuge, já que o

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companheiro terá sempre meia quota em concorrênciacom ascendentes e descendentes. O projeto consegueafastar as críticas formuladas contra o atual art. 1.790 doCC.

Inicialmente, o caput  teria a seguinte redação: “o com-panheiro participará da sucessão do outro na formaseguinte”. O que se percebe é que o projeto acaba com adivisão entre bens adquiridos onerosamente e demais bens. Neste ponto, o Projeto Fiúza aproxima a sucessão docompanheiro à do cônjuge, determinando a sucessão docompanheiro em todo e qualquer bem que pertencer ao fa-

lecido, independentemente de sua forma de aquisição.O inciso I trata da concorrência com os descendentes,

nos seguintes termos: “em concorrência com descend-entes, terá direito a uma quota equivalente à metade doque couber a cada um destes, salvo se tiver havido comun-hão de bens durante a união estável e o autor da herançanão houver deixado bens particulares, ou se o casamentodos companheiros se tivesse ocorrido, observada a situ-ação existente no começo da convivência, fosse pelo re-gime da separação obrigatória (art. 1.641)”.

O projeto também afasta a expressão filhos contida noinc. I do atual art. 1.790 e utiliza corretamente o termo“descendentes”, não mais diferenciando os comuns dos

não comuns. Dessa forma, põe fim ao debate relativo à fili-ação híbrida e garante aos companheiros uma quota equi-valente à metade do que couber a cada um dos  descend-entes. Prevalece, pelo PL 699/2011, o entendimento que beneficia os filhos, reduzindo a participação sucessória docompanheiro, tese à qual adere Flávio Tartuce.

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 Além disso, o projeto exclui a participação dos com-panheiros na herança, se houve comunhão de bens dur-ante a união estável e o falecido não deixou bensparticulares. Note-se que, pelo PL 699/2011, se o falecidodeixou bens comuns, o companheiro já tem sua meação e,

portanto, não participa da sucessão em concorrência comos descendentes. A regra toma por base a sucessão do côn- juge, que, na hipótese em que tem direito à meação de bens, não concorre com os descendentes na sucessão (art.1.829, I, do CC). Se houver bens particulares, como não hámeação, o companheiro concorre com os descendentes dofalecido.

Dúvida interessante diz respeito ao regime de bens ap-licado aos companheiros na hipótese em que, se fosse secasar, teriam obrigatoriamente como regime a separaçãode bens. Poderiam os companheiros adotar qualquer re-gime se, em caso de casamento, fosse-lhes imposta a sep-aração obrigatória? A matéria é bastante debatida no

 Volume 5 desta coleção.De qualquer forma, a proposta que se explica re-

sponde esta indagação. Se os companheiros casadosfossem, o regime seria o da separação obrigatória (art.1.641 do CC) e não haveria concorrência sucessória com osdescendentes (art. 1.829, I, do CC). Por meio do disposit-

ivo projetado fica claro que, mesmo em não se casando,mas sim convivendo em união estável, não haverá concor-rência sucessória nessa hipótese.

O Projeto 699/2011 pretende a evitar as críticas deque a união estável traria situação mais vantajosa aos con- viventes do que o casamento aos cônjuges. Assim, não

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havendo a concorrência no casamento, pelo projeto, amesma concorrência não haverá na união estável.

Em concorrência com os ascendentes, o companheiroterá direito a uma   quota equivalente à metade  do quecouber a cada um destes (Projeto Fiúza, art. 1.790, II). A situação do companheiro melhorará bastante com o pro- jeto, no tocante à concorrência com ascendentes. Issoporque, na redação atual do art. 1.790, II, o companheirotem direito a apenas 1/3 da herança, composta dos bensadquiridos a título oneroso na constância da união estável.Mesmo assim, os cônjuges ficam em situação privilegiada

nos termos do art. 1.837 do CC (“Concorrendo com as-cendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço daherança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só as-cendente, ou se maior for aquele grau”).

 Ainda, pelo PL 699/2011, na hipótese de inexistênciade descendentes e de ascendentes, o companheiro recol-herá a totalidade da herança, afastando-se a odiosa con-corrência com os parentes colaterais criada pela redaçãoatual do art. 1.790, III, do Código Civil. Nesse ponto, oprojeto merece uma salva de palmas.

Como conclusão, ressalte-se que, se aprovado o antigoProjeto Fiúza, resolvidos estarão os problemas referentes àfiliação híbrida, a questão da concorrência do compan-

heiro com colaterais do falecido, bem como qualquerhipótese de parte da herança ser considerada vacante e,portanto, de propriedade do Município.

Concluindo, vemos com bons olhos a proposta legis-lativa, sendo certo que, apesar de não ideal, no tocante aodireito sucessório do companheiro, melhorará a situação

atual. Acompanharemos o trâmite do projeto de lei em

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questão, bem como o futuro  Estatuto das Heranças  emfase de elaboração pelo IBDFAM, visando a atualizar apresente obra. Na verdade, esperamos que um  bom es- pírito político guie os encaminhamentos das propostas nofuturo. Quem sabe seria até o caso de uniformização dos

projetos legislativos, pelo bem do Direito Civil brasileiro ede toda a sociedade.

2.5.2.7 A concorrência sucessória do companheiro com ocônjuge sobrevivente

De maneira bastante inusitada, permite o Código Civilde 2002, em situação peculiar, que tanto o cônjuge como ocompanheiro venham a concorrer pela herança do fale-cido. Isso mesmo: é possível a concorrência entre cônjugee companheiro.

Isso porque se o cônjuge estiver separado de fato há

menos de dois anos ou se estiver separado de fato há maisde dois anos e não tiver culpa pelo fim da união, terádireito sucessório garantido por força de lei. Nesse sen-tido, lembramos os comentários outrora feitos em relaçãoao art. 1.830 do CC em vigor, notadamente pela atualiza-ção que lhe foi dada com a Emenda Constitucional 66/2010, conhecida como Emenda do Divórcio.

Ora, após a separação de fato, pode o falecido ter ini-ciado união estável, mesmo sem ter se separado judicial-mente, por expressa autorização do art. 1.723, § 1.º, do CC.Nesse contexto, em determinadas situações, pode o fale-cido deixar cônjuge e companheiro, estando ambos habil-itados a suceder de maneira concorrente. Como resolver a

situação não prevista expressamente pelo legislador?

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Trata-se de mais um problema criado pelo Novo DireitoSucessório Brasileiro. E o problema surge justamenteporque o Código Civil admite que o separado de fato con-stitua uma união estável com terceiro (art. 1.723, § 1.º, doCC).

Francisco José Cahali não fica alheio à questão, ensin-ando que “Existe um conflito de normas, na medida emque duas pessoas, pela análise fria dos textos, seriam titu-lares da mesma herança. Para convivência das regras, ca-racterizada a união estável, há que se prestigiar o compan-heiro viúvo, em detrimento do cônjuge, integrante formal

de matrimônio falido, apenas subsistente no registro civil.Mas, à evidência, não se privará o cônjuge de eventualmeação sobre o patrimônio adquirido na constância docasamento, bens estes a cuja comunhão o companheironão terá direito, pois adquiridos anteriormente à união es-tável” (Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 236).

Eduardo de Oliveira Leite aponta solução em outrosentido. Mencionando o entendimento de Guilherme Cal-mon da Gama, o autor paranaense leciona que “será deconsiderar, nesta hipótese excepcional, que o compan-heiro e o cônjuge herdam conjuntamente a herança deix-ada pelo falecido, devendo-se considerar a conjunção adit-iva ‘e’ no inciso III do art. 1.603 Código Civil – de 1916 –,

para o fim de se deferir a sucessão legítima”(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 234). Anote-se, nessesentido, que o último doutrinador citado aprovou enun-ciado na V Jornada de Direito Civil , nos seguintes termos:“Os arts. 1.723, § 1.º, 1.790, 1.829 e 1.830, do Código Civil,admitem a concorrência sucessória entre cônjuge e com-panheiro sobreviventes na sucessão legítima, quanto aos

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 bens adquiridos onerosamente na união estável” (Enun-ciado n. 525).

José Luiz Gavião de Almeida indica uma terceira pos-sibilidade para a solução da questão: “não se pode excluiro direito sucessório do cônjuge, porque não pode ser elepenalizado pela separação que não causou. Mas nãoparece justo excluir o novo companheiro de qualquer par-ticipação da herança, se já constituiu união estável,duradoura e antiga. Fica, nessa hipótese, o companheirocom direito a um terço dos bens adquiridos onerosamentena vigência da união estável. Para tal entendimento, há

que se ampliar a expressão parentes sucessíveis utilizadatanto no inciso III como no inciso IV do art. 1.790, paraabranger qualquer pessoa beneficiada pelas regras da su-cessão legítima, ou seja, qualquer daquelas constantes daordem de vocação hereditária prevista no art. 1.829”(Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 217).

Euclides de Oliveira prega a aplicação da   justiça sa-lomônica, “em que os bens devam ser partilhados meio ameio entre cônjuge e companheiro sobreviventes” ( Direitode herança..., 2005, p. 182).

 A questão é polêmica, mas, a título de contribuição,apresentamos uma outra solução que nos parece mais justa para o problema. Considerando-se toda a orientação

 jurisprudencial vigente no sentido de que a separação defato põe fim ao regime de bens, dividiríamos o patrimôniodo falecido em dois montes.

O primeiro monte seria composto pelos bens ad-quiridos na constância fática do casamento. Quanto aesses bens, apenas o cônjuge teria direitos sucessórios,

não sendo herdados pelo companheiro.

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 A segunda massa de bens seria composta pelos bensadquiridos durante a união estável. Relativamente a tais bens, necessária se faz uma segunda divisão para atenderao caput  do art. 1.790 do CC, nos seguintes termos:

– se os bens foram adquiridos a título oneroso, a sucessão sedefere apenas ao companheiro sobrevivente;

– se os bens foram adquiridos a outro título, como o com-panheiro não é herdeiro, pertencerão apenas ao cônjugesobrevivente.

 A solução em questão é adotada por Eduardo de Oli-

 veira Leite no tocante ao direito real de habitação quandotanto o cônjuge como o companheiro tiverem este direitoassegurado. Nesse sentido, ensina o jurista paranaenseque “A solução possível é viável desde que pautada pelo bom senso e razoabilidade. Se o único imóvel fora ad-quirido na constância do casamento, não há dúvida que ahabitação deferir-se-ia ao cônjuge sobrevivente, independ-entemente de eventual meação; se, ao contrário, fosse res-ultado da união estável, competiria ao companheiro,sobrevivente” (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 234).

Christiano Cassettari discorda da solução apresentada. Afirma o doutrinador que o casamento se dissolve com ofim do afeto e não com a separação de direito ou com o di-

 vórcio. Assim sendo, a separação de fato já demonstra ainexistência de afeto entre o casal, motivo pelo qual seriainconcebível a possibilidade de concorrência entre cônjugee companheiro. Conclui Cassettari o seguinte: o cônjugereceberá sua meação até a separação de fato e o compan-heiro sua meação do período compreendido entre a sep-aração de fato e a morte do companheiro, mas, com

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relação à herança, esta será dividida somente entre os par-entes do falecido em concorrência com o companheirosobrevivente, pessoa escolhida pelo morto para constituiro relacionamento afetivo ( Direito das sucessões..., 2008,p. 104).

Deve ficar claro que o posicionamento proposto pelosautores desta obra vige se mantida a interpretação literaldo art. 1.830 do CC, notadamente pela menção à culpa.Todavia, se seguida a interpretação antes proposta, nosentido de não se reconhecer direitos sucessórios ao côn- juge separado de fato, somente o companheiro herdará, na

linha da última proposta apontada.Como se pode perceber, trata-se de mais uma questão

controvertida, sendo certo que deverá ser solucionada pela jurisprudência no futuro. Ademais, a Emenda Constitu-cional 66/2010 acabou por tornar a questão ainda maispolêmica, pela nova interpretação que pode ser dada aoart. 1.830 do CC.

2.5.2.8 O direito de habitação do companheiro sobrevivo

Contrariamente ao que determinava o parágrafo únicodo art. 7.º da Lei 9.278/1996, o Código Civil de 2002 nãocontém regra expressa a respeito do direito real de habit-ação caso venha a falecer um dos companheiros. O silênciodo Código Civil de 2002 gerou uma pergunta: teria o com-panheiro sobrevivente direito real de habitação garantido?Duas correntes se formaram para responder à questão.

Para a primeira corrente, a resposta é negativa. Issoporque como o art. 1.790 do CC regula inteiramente a su-

cessão do companheiro, as leis da união estável estão

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definitivamente revogadas (ab-rogação), não havendoomissão do legislador sobre o tema, mas verdadeiro silên-cio eloquente   –   beredts Schweigen.   Esse entendimentopode ser percebido pela leitura da obra de Silvio Rodrig-ues, na atualização de Zeno Veloso ( Direito civil..., 2002,

 v. 7, p. 119). Aliás, Zeno Veloso explica que “o silêncio eloquente é

situação diversa e inconfundível. O legislador não men-cionou ou não previu dada situação porque consciente edeliberadamente, não quis fazê-la, não admitia a hipótese,repele-a, rejeita-a, e a falta de menção é o sinal inequívoco

desse propósito de cortar, excluir, suprimir. Se se tratanão de lacuna, mas de silêncio eloquente da lei, o intér-prete não pode preencher o vazio, recorrer à analogia, su-perar a deficiência, suprir a incompletude, pois simples-mente não há vazio, não há omissão que deva ser com-posta ou resolvida” (Direito real..., Questões..., 2004, v. 1,p. 415).

Francisco José Cahali tem a mesma opinião, afirm-ando que “em nosso entender houve revogação dos artigosreferidos por incompatibilidade com a nova lei” (Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 233).

São adeptos desta corrente Inácio de Carvalho Neto eMário Luiz Delgado (CAHALI, Francisco José.  Família e

sucessões..., 2004, v. II, p. 329). Também entende assim oprofessor Flávio Augusto Monteiro de Barros, diante doque consta do art. 2.043 do atual CC, que teria trazido arevogação de todos os preceitos materiais que não foramincorporados pelo novo Código Civil ( Manual..., 2006, v.4, p. 216).

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Contudo, vale dizer que esse entendimentodoutrinário é minoritário para a prática do Direito dasSucessões.

 A segunda corrente, majoritária, entende que o direitoreal de habitação dos companheiros continua garantido.Maria Helena Diniz, em verdadeira aula sobre o DireitoIntertemporal, afirma que estamos diante de “um caso deantinomia de segundo grau, ou seja, um conflito entrenorma anterior especial (art. 7.º da Lei 9.278/1996) enorma posterior geral (art. 1.831 do CC), que, por sua vez,gera antinomia entre o critério da especialidade e o cro-

nológico, para a qual valeria o macrocritério  lex posteriorgeneralis non derogat priori speciali , segundo o qual a re-gra da especialidade prevaleceria sobre a cronológica. Comisso, a Lei 9.278/1996 seria mais forte, ante o princípio daespecialidade. (...) ante a dúvida, surgirá então uma anti-nomia real de segundo grau ou lacuna de conflito (ausên-cia de critério ou metacritério normativo) que só pode ser

solucionada pelos critérios apontados pelos arts. 4.º e 5.ºda LICC. Deveras, num caso extremo de falta de umcritério que possa resolver a antinomia de segundo grau, ocritério dos critérios para solucionar o conflito seria oprincípio supremo da justiça: entre duas normasincompatíveis dever-se-á escolher a mais justa” (Curso...,

2005, v. 6, p. 148).Essa é a interpretação que prevalece na doutrina e queapoiamos integralmente. Nesse sentido, aliás, prevê oEnunciado n. 117 CJF/STJ, aprovado na   I Jornada de Direito Civil , que: “Art. 1.831. O direito real de habitaçãodeve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sidorevogada a previsão da Lei 9.278/96, seja em razão da in-

terpretação analógica do art. 1.831, informado pelo art.

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6.º, caput , da CF/88”. Não há dúvidas de que o enunciadodoutrinário traz como conteúdo o Direito Civil Constitu-cional, pois vai buscar na proteção da moradia, prevista naConstituição Federal, um argumento para sustentar a per-manência de um direito de natureza privada.

Também são adeptos dessa corrente Christiano Cas-settari, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka,Gustavo Rene Nicolau, Jorge Shiguemitsu Fujita, MariaBerenice Dias, Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno,Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira (CAHALI, Fran-cisco José. Família e sucessões..., 2004, v. II, p. 329).

Seguindo essa corrente doutrinária, que tem sidoampla a majoritariamente adotada pelos TribunaisEstaduais, há também as seguintes decisões:

“Ainda que o direito real de habitação da companheira de-corra de lei (Lei 9.278/96, não revogada pelo Código Civil de2002), para que lhe seja assegurado o direito de habitar a

coisa alheia sem a devida instituição através de registroimobiliário, imprescindível a demonstração de que o imóvelpertencia ao ‘de cujus’, o que não ocorre no caso em exame”(TJRS, 7.ª Câmara Cível, Apelação Cível 70021127683, Rel.Ricardo Raupp Ruschel, j. 26.09.2007).

“Tem-se entendido que apesar de o Código Civil/2002

(art. 1.831), nas expressões ‘cônjuge sobrevivente’, não con-ferir expressamente o direito de habitação àquele que viverem união estável, tal direito subsiste no ordenamento

 jurídico, assegurado pela Lei 9.278/96 (art. 7.º, parágrafoúnico), porquanto não há incompatibilidade entre ambas aslegislações, tanto que a CF, para determinados fins, equipar-ou o casamento à união estável” (TJRS, 8.ª Câmara Cível,

 Apelação Cível 70019828201, Rel. Luiz Ari AzambujaRamos, j. 02.08.2007).

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“O art. 7.º, parágrafo único, da Lei 9.278/96 assegura aoconvivente sobrevivente da relação estável direito real dehabitação no imóvel em que residia com o falecido, não im-portando que o bem tenha sido adquirido antes do relacio-namento, mesmo porque o direito real de habitação está cal-cado nos princípios da solidariedade e mútua assistência,ínsitos a união estável. Apelação desprovida” (TJRS, 8.ª Câ-mara Cível, Apelação Cível 70009713736, Rel. Des. José

 Ataídes Siqueira Trindade, j. 21.10.2004).

“Não se desconhece que o novo Código Civil não dispôsexpressamente acerca do direito real de HABITAÇÃO docompanheiro, prevendo-o apenas para o cônjuge sobre-

 vivente, na forma do seu art. 1.831. Todavia, reconhece-se a vigência da Lei 9.278/96, que não foi revogada pelo novoCódigo Civil e é plenamente compatível com os preceitos daConstituição Federal, de valorização da entidade familiar edos direitos da companheira” (TJMG, 3.ª Câmara Cível,

 Agravo 1.0145.06.339966-4/001, Rel. Des. Albergaria Costa, j. 19.07.2007).

“Extinção de condomínio. Bem imóvel utilizado pela com-panheira sobrevivente. Residência da família. Direito real dehabitação. Independente da contribuição para a aquisiçãodo imóvel, é assegurado pelo novo Código Civil ao cônjugesobrevivente o direito real de habitação relativo ao únicoimóvel destinado à residência da família, regra que é esten-

dida à companheira, sob pena de se incorrer em inconstitu-cionalidade, até porque o Código vigente não revogou a Lei9.278/96, que também assegura o direito real de habitaçãoquando do falecimento de um dos conviventes da união es-tável” (TJMG, 11.ª CÂMARA de Direito Privado, ApelaçãoCível 1.0441.05.001560-7/001, Rel. Duarte de Paula, j.02.08.2006).

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“União estável. Direito real de habitação estabelecido aocompanheiro. Novo código civil. Prevalecimento de vigênciado disposto no parágrafo único do art. 7.º da Lei 9.278/96”(TJPR, 12.ª Câmara Cível, Acórdão 6.651, Processo0417391-5-01, Des. José Cichoki Neto, j. 15.08.2007).

“Diante desta circunstância o direito real de habitação de- ve ser garantido ao companheiro sobrevivente, pois se tratade entidade familiar. Neste sentido se apresenta a disposiçãoda Constituição Federal, art. 226, § 3.º, e a Lei 9.278/96,artigo 7.º, parágrafo único (...). Não se pode alegar a re-

 vogação da citada lei, pois ela não é incompatível com onovo Código Civil, não tendo sido revogada pelo mesmo, e,

mesmo entendendo-se revogada a Lei, poderia se utilizar odireito real de habitação pela aplicação do artigo 1.831 doCódigo Civil e da Constituição Federal” (TJPR, 8.ª CâmaraCível, Agravo de Instrumento 170.813-0, Rel. Des. Celso Ro-toli de Macedo, j. 20.04.2005).

“Apelação cível. Ação reivindicatória. União estável.

Direito real de habitação garantido ao ex-convivente. Art.7.º, parágrafo único, da Lei 9.278/1996. Posse injusta. Nãoconfiguração. Pressupostos não demonstrados. Carência deação. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime. – A intenção do legislador, ao assegurar àqueles que viviam emregime de união estável o direito real de habitação foi justa-mente proteger a entidade familiar, quer seja constituída

pelo casamento ou pela união estável, dando efetividade aodisposto no art. 226, § 3.º, da Constituição Federal. – Re-ferida norma tem nítido conteúdo social, de modo que a suainterpretação deve privilegiar o direito à moradia do com-panheiro sobrevivente, sendo irrelevante se o beneficiáriopossua ou não direito à meação ou à sucessão do imóvel emque residia a família, bem como a existência de herdeiros oucondôminos, sob pena de esvaziamento da ratio essendi  da

norma. – Ausente um dos requisitos, no caso, a posse

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injusta do réu, há de ser julgada improcedente a ação reivin-dicatória” (TJSE, Apelação Cível 0022/2009, 9.ª Vara Cível,Rel. Des. Cláudio Dinart Déda Chagas, j. 17.11.2009).

“Apelação cível. Ação executiva   lato sensu.  Reintegração

de posse.  Actio  manejada pelo espólio em face de ex-com-panheira do falecido. Bem ocupado pela ré que servia demorada para o casal. Alegação de posse adquirida mediantesucessão universal. I – Data do falecimento. CC/02 incid-ente sobre a união estável referida. Direito real de habitaçãoestendido à companheira. Art. 1.831 do CC/02. Analogia le-gis. Incidência do dispositivo à espécie. Novel legislação civilque, de qualquer sorte, não revogou expressamente a Lei

9.278/96. II – Imóvel adquirido antes da união estável. Ir-relevância. Direito real que não se confunde com a meação.Direito de habitação reconhecido. Esbulho inexistente. Pro-teção possessória negada ao espólio. Companheira mantidana posse do bem. Sentença reformada. Recurso provido”(TJSC, Apelação Cível. 2008.001068-9, Joinville, Rel.Henry Petry Junior, 3.ª Câmara de Direito Civil ,

08.06.2009).

“União estável. Companheiro sobrevivente. Fixação dealuguel em favor do condômino. Descabimento. Direito realde moradia conferido ao companheiro ou cônjuge supérstiteque não admite contrapartida aos demais condôminos ouherdeiros, sob pena de se desvirtuar o instituto. Recurso

provido” (TJSP, Agravo de Instrumento 622.097-4/1-00, 7.ªCâmara de Direito Privado, Rel. Des. Alvaro Passo, j.05.08.2009).

Na mesma linha, acórdão recente do SuperiorTribunal de Justiça que, implicitamente, reconheceu odireito real de habitação do companheiro, a merecer oapoio dos presentes autores:

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“Direito Civil. Sucessões. Direito real de habitação do côn- juge supérstite. Evolução legislativa. Situação jurídica mais vantajosa para o companheiro que para o cônjuge.Equiparação da União Estável. 1 – O CC/1916, com aredação que lhe foi dada pelo Estatuto da Mulher Casada,conferia ao cônjuge sobrevivente direito real de habitaçãosobre o imóvel destinado à residência da família, desde quecasado sob o Regime da Comunhão Universal de Bens. 2 – A Lei n.º 9.278/1996 conferiu direito equivalente aos compan-heiros e o CC/2002 abandonou a postura restritiva do an-terior, estendendo o benefício a todos os cônjuges sobre-

 viventes, independentemente do regime de bens docasamento. 3 – A CF (art. 226, § 3.º), ao incumbir o legis-

lador de criar uma moldura normativa isonômica entre aunião estável e o casamento, conduz também o intérprete danorma a concluir pela derrogação parcial do § 2.º do art.1.611 do CC/1916, de modo a equiparar a situação do côn-

 juge e do companheiro no que respeita ao direito real dehabitação, em antecipação ao que foi finalmente recon-hecido pelo CC/2002. 4 – Recurso Especial improvido”

(STJ, REsp 821.660/DF, 3.ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 14.06.2011, v.u.).

Pois bem, mas para a solução da ausência de previsãodo direito real de habitação aos companheiros, o projetode alteração do Código Civil enuncia expressamente odireito em questão. Assim, o PL 699/2011 pretende acres-

centar um parágrafo único ao art. 1.790 do CC, para quedele conste o seguinte: “Ao companheiro sobrevivente, en-quanto não constituir nova união ou casamento, será asse-gurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na her-ança, o direito real de habitação relativamente ao imóveldestinado à residência da família, desde que seja o únicodaquela natureza a inventariar”. Dessa forma, o denom-

inado Projeto Fiúza garante ao companheiro e ao cônjuge

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o direito real de habitação em idênticas condições, poisnão só acrescenta um parágrafo ao art. 1.790 como altera aredação do art. 1.831, no seguinte sentido: “haverá direitoreal de habitação sobre o imóvel destinado à residência dafamília, desde que seja o único daquela natureza a invent-

ariar, enquanto o cônjuge ou companheiro não constituír-em novo casamento ou união estável”.

Percebe-se que a norma projetada constitui mais umargumento para dizer que o companheiro tem a seu favoro direito real de habitação.

Encerrando o tema, frise-se que o direito real de hab-

itação do companheiro só surge em razão do falecimento enão da extinção em vida da união estável. Nesse sentido:“Direito real de habitação. Descabimento, na hipótese.Uma vez dissolvida a união estável por circunstâncias quenão o evento morte, não há falar em direito real de habit-ação” (TJRS, 7.ª Câmara Cível, Apelação Cível70020799003, Rel. Ricardo Raupp Ruschel, j.24.10.2007).

No que toca à extinção do direito de habitação, in-teressante a decisão do Superior Tribunal de Justiça a re-speito da renúncia ao direito de usufruto e seus efeitossobre o direito real de habitação: “Direito real de habit-ação. Art. 1.611, § 2.º, do Código Civil de 1916. Usufruto.

Renúncia do usufruto: repercussão no direito real de hab-itação. Registro imobiliário do direito real de habitação.Precedentes da Corte. 1. A renúncia ao usufruto não al-cança o direito real de habitação, que decorre de lei e sedestina a proteger o cônjuge sobrevivente mantendo-o noimóvel destinado à residência da família. 2. O direito real

de habitação não exige o registro imobiliário” (STJ, 3.ª T.,

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REsp 565.820/PR, Rel. Min. Carlos Alberto MenezesDireito, j. 16.09.2004, DJ  14.03.2005, p. 323).

2.5.2.9 O debate quanto à inconstitucionalidade do art.

1.790 do CC 

De início, é interessante notar que a simples leitura doCódigo Civil não é suficiente para a compreensão das re-gras sucessórias referentes ao companheiro. Os Tribunaistêm realizado leituras muitas vezes completamente disso-ciadas do texto da lei, afastando-se do que pretendeu o le-

gislador e mostrando que o Direito não se confunde com alei. Ora, a lei é fonte do direito, mas não o próprio direito.Se a lei não se enquadra no sistema, cabe à doutrina e à jurisprudência ajustá-la ou extirpá-la do sistema jurídico.Em reforço, não vivemos o império do Estado de Legalid-ade, mas do Estado de Direito.

O debate travado em nossos Tribunais a respeito dainconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil passa,necessariamente, pela interpretação que recebe o art. 226,§ 3.º, da Constituição Federal que ora transcrevemos:

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial pro-teção do Estado.

§ 3.º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida aunião estável entre o homem e a mulher como entidade fa-miliar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”(destacamos).

O fato de a lei dever facilitar a união estável emcasamento significa, para alguns, que o casamento é insti-

tuto hierarquicamente superior à união estável e,

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portanto, qualquer vantagem que a lei ordinária atribua àunião estável, que supere as vantagens do casamento, ser-ia considerada inconstitucional.

Para outros, a determinação constitucional apenas im-pede que a lei infraconstitucional dificulte a conversão daunião estável em casamento. Seria uma norma proibitivada imposição de qualquer dificuldade, mas não geradorade hierarquia entre as duas formas de constituição defamília.

São essas duas visões antagônicas do Texto Constitu-cional que refletem os pensamentos presentes nos jul-

gados que comentaremos a seguir. Assim, passa-se à anál-ise de alguns julgados que cuidam da constitucionalidadedo art. 1.790 do Código Civil, pontualmente.

Deve ficar claro que a tese de inconstitucionalidade édefendida por alguns de nossos maiores   sucessionistas,caso de Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, em

sua tese de titularidade defendida na Faculdade de Direitoda USP. Suas palavras merecem relevo: “Por todas as le-tras e críticas, parece ser muito clara a urgente necessid-ade de exclusão ou reforma que merece o Código Civil, naregulamentação dos direitos sucessórios do companheiro,para que a pecha da inconstitucionalidade seja afastada epara que a recolocação das disposições relativas àqueles

que viverem unidos estavelmente encontre seu lugar per-feito e adequado, isto é, que venham a integrar, no campolegislativo da sucessão legítima, o espaço especialmentedeferido à ordem da vocação hereditária” (HIRONAKA,Giselda Maria Fernandes Novaes. Morrer..., 2011, p. 378).

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a) Inconstitucionalidade por preterição do compan-heiro e favorecimento dos colaterais

Determinada pessoa falece após dez anos de união es-tável e deixa como único parente seu irmão (colateral desegundo grau). Em virtude do art. 1790, III, do CódigoCivil, o companheiro só seria herdeiro dos bens adquiridosa título oneroso na constância da união estável e, nessahipótese, caberia ao companheiro 1/3 da herança e aoirmão os 2/3 restantes.

Os argumentos do companheiro se baseavam na in-constitucionalidade do dispositivo “vez que a nova lei re-

 baixou o status hereditário do companheiro sobreviventeem relação ao cônjuge supérstite, violando os princípiosfundamentais da igualdade e dignidade”.

Nesse sentido, Renato Felipe de Souza, advogado emSanta Catarina, em seu artigo  Anotações sobre a incon-stitucionalidade do art. 1.790, III, do Código Civil 

brasileiro   (disponível em:< www.professorsimao.com.br>. Acesso em: 9 jun. 2008),observa que:

“Verifica-se, pois, que o CC/2002, quando tratou da su-cessão dos companheiros, rebaixou o status do companheirosobrevivente em relação ao cônjuge, ao diferenciar o regime

de sucessão na herança. Trata-se, pois, de regra inconstitu-cional, uma vez que vulnerou os princípios da igualdade e dadignidade (...) Assim,   uma vez dada à execução a umanorma constitucional de caráter programático, através delei infraconstitucional, não pode o legislador ordinário ret-roceder através de edição de lei ordinária supervenienteque venha a reduzir o alcance da norma constitucional, sobpena de ser declarada inconstitucional”.

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 A decisão relatada pelo Desembargador RicardoRaupp Ruschel da 7.ª Câmara Cível do Tribunal Gaúcho,de 12 de setembro de 2007, destaca a controvérsia em de- bate: “no caso em exame, o ponto nodal da discussão dizcom o direito ou não de o recorrente, na condição de com-

panheiro, herdar a totalidade da herança de alguém quenão deixou descendentes ou ascendentes. Se a ele se con-fere o status de cônjuge, ou se se lhe impõe as disposiçõesdo Código Civil de 2002, onde restou estabelecida, medi-ante interpretação restritivamente literal, distinção entrecônjuge e companheiro, conferindo àquele privilégio su-cessório em relação a este” (destacamos) (TJRS, Acórdão70020389284).

Realmente, o tratamento do cônjuge como herdeiro edo companheiro são absolutamente distintos. Essa difer-ença de tratamento tem por consequência rebaixar afamília decorrente da união estável, como se aindapudéssemos falar em uma família legítima. Sábias as pa-

lavras do Relator:

“... importa, ao fim e ao cabo, em conferir odioso trata-mento desigual entre cônjuge e companheiro, deixando aodesamparo a família constituída pela união estável, e confer-indo proteção legal privilegiada à família constituída deacordo com as formalidades da lei.

Não se pode perder de vista, ademais, que a própria Con-stituição Federal, ao dispor no § 3.º do artigo 226 que, paraefeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendoa lei facilitar sua conversão em casamento, não conferetratamento iníquo aos cônjuges e companheiros. Tampoucoo faziam as Leis que regulamentavam a união estável antes

do advento do novo Código Civil (Lei 8.971/94 e Lei 9.278/

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96). Não é aceitável, assim, que prevaleça a interpretação lit-eral do artigo 1.790 do CC/2002, cuja sucessão do compan-heiro na totalidade dos bens é relegada à remotíssimahipótese de, na falta de descendentes e ascendentes, inexi-stirem, também, ‘parentes sucessíveis’, o que implicaria em

 verdadeiro retrocesso social  frente à evolução doutrinária e jurisprudencial do instituto da união estável havida atéentão”.

Por fim, invocou o Relator o princípio da vedação doenriquecimento sem causa, que ocorreria por parte doirmão da autora da herança em detrimento do compan-

heiro supérstite, que com a falecida convivia desde o anode 1995, para declarar a inconstitucionalidade do art.1.790, III. Afastou-se, então, o irmão da falecida para quea herança fosse integralmente deferida ao companheiro.

Essa decisão pioneira encontra, hoje, reflexos em di- versos julgados dos Tribunais brasileiros e é compartil-hada pelos autores da presente obra. Vejamos duasementas jurisprudenciais que merecem relevo, a primeirado próprio Tribunal Gaúcho e a segunda do TribunalPaulista:

“Agravo de instrumento. Inventário. Companheiro sobre- vivente. Direito à totalidade da herança. Parentes colaterais.Exclusão dos irmãos da sucessão. Inaplicabilidade do art.1.790, inc. III, do CC/02. Incidente de inconstitucionalid-ade. Art. 480 do CPC. Não se aplica a regra contida no art.1.790, inc. III, do CC/02, por afronta aos princípios con-stitucionais da dignidade da pessoa humana e de igualdade,

 já que o art. 226, § 3.º, da CF, deu tratamento paritário aoinstituto da união estável em relação ao casamento. Assim,devem ser excluídos da sucessão os parentes colaterais,

tendo o companheiro o direito à totalidade da herança.

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Incidente de inconstitucionalidade arguido, de ofício, naforma do art. 480 do CPC. Incidente rejeitado, por maioria.Recurso desprovido, por maioria” (TJRS, Agravo de Instru-mento 70017169335, Porto Alegre, 8.ª Câmara Cível, Rel.Des. José Ataídes Siqueira Trindade, DJERS  27.11.2009, p.38).

“Inventário. Sucessão do companheiro. Inconstitucional-idade do art. 1790 III, do CC/02. Falecida a companheira,sem deixar descendentes ou ascendentes, herda com exclus-ividade seu companheiro. Interpretação sistemática da atualordem constitucional. Art. 1.829, III, CC/02 c/c 226 CF. Fa-lecido o companheiro-herdeiro no curso do inventário,

sucede-o seu filho, único herdeiro, ao qual devem ser adju-dicados todos os bens inventariados, em detrimento doscolaterais da autora da herança. Recurso provido” (TJSP,

 Agravo de Instrumento 654.999.4/7, Acórdão 4034200, SãoPaulo, 4.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. TeixeiraLeite, j. 27.08.2009, DJESP  23.09.2009).

 Ademais, como se extrai de julgados paulistas da 4.ªCâmara de Direito Privado, “uma interpretação literal eexegética do artigo 1.790 – tão ao gosto do pensamentoliberal que orientou o Código Civil de 1916 – levaria à fácilconclusão de que o regime radicalmente distinto da su-cessão do companheiro nada mais é do que a melhor ex-pressão da norma constitucional, que não equiparou o

casamento à união estável, mas, ao invés, conferiuprimazia ao primeiro. Essa conclusão, a meu ver, não podeprevalecer, sob a ótica civil-constitucional. Óbvio que ocasamento não se equipara à união estável, podendo gerar– como gera – direitos e deveres distintos a cônjuges ecompanheiros. O que se discute é a possibilidade da legis-lação infraconstitucional alijar, de modo tão grave, alguns

direitos fundamentais anteriormente assegurados a

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partícipes de entidades familiares constitucionalmente re-conhecidas, em especial o direito à herança” (TJSP, Agravo de Instrumento 567.929.4/0-00, j. 11.9.2008 e Agravo de Instrumento 654.999-4/7-00, j. 27.08.2009).

 Várias decisões se sucederam a respeito da inconstitu-cionalidade do art. 1.790 do Código Civil, merecendoainda colação, para os devidos aprofundamentos, commenção à presente obra:

“Arrolamento. Companheiro sobrevivente. Reconheci-mento incidental da união estável, à vista das provasproduzidas nos autos. Possibilidade. Exclusão do colateral.Inaplicabilidade do art. 1.790, III, do CC, por afronta aosprincípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana eleitura sistematizada do próprio Código Civil. Equiparaçãoao cônjuge supérstite. Precedentes. Agravo improvido”(TJSP, Agravo de Instrumento 609.024-4/4-00, São Paulo,Rel. Caetano Lagrasta, 8.ª Câmara de Direito Privado, j.06.05.2009).

Contudo, a questão não é pacífica, havendo decisõesque determinam a suspensão do processo, pois, por setratar de inconstitucionalidade, a questão deve ser de-cidida pelo Órgão Especial do Tribunal Estadual, deacordo com o art. 97 da Constituição Federal. Nessa linhade pensamento:

“Agravo de instrumento. Constitucional. Arguição de in-constitucionalidade acatada pelo magistrado de 1.º grau.

 Artigo 1.790, inciso III, do Código Civil. Recurso que visa oreconhecimento da constitucionalidade da norma legal.Competência para julgá-la do órgão especial. Art. 97 da Con-stituição Federal. Suspensão do julgamento do recurso de

agravo. Remessa dos autos ao órgão especial. 1. Nos

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tribunais em que há órgão especial, a declaração de incon-stitucionalidade de Lei ou ato normativo do poder público,tanto a hipótese de controle concentrado como na de incid-ental, por força da norma contida no art. 97 da ConstituiçãoFederal, somente pode ser declarada pelo voto da maioriaabsoluta dos membros que o compõem. 2. Se os integrantesdo órgão fracionário – Câmara Cível – se inclinam emmanter a arguição de inconstitucionalidade formulada pelosrecorridos em 1.º grau, o julgamento do recurso de agravode instrumento deve ser suspenso, com a remessa dos autosao órgão especial para que o incidente de inconstitucionalid-ade seja julgado, ficando a câmara, quando os autos lhe for-em restituídos para que o julgamento do recurso tenha

prosseguimento, vinculada, quanto à questão constitucional,à decisão do órgão especial” (TJPR, Agravo de Instrumento0536589-9, Curitiba, 12.ª Câmara Cível, Rel. Des. Costa Bar-ros, DJPR 29.06.2009, p. 223).

“Agravo de instrumento. Inventário. Companheiro sobre- vivente. Direito à totalidade da herança. Colaterais. Exclusãodo processo. Cabimento. Inconstitucionalidade. Artigo

1.790, inciso III do Código Civil. A decisão agravada estácorreta. No caso, apenas o companheiro sobrevivente temdireito sucessório, não havendo razão para os parentescolaterais permanecerem no inventário. As regras sucessóri-as previstas para a sucessão entre companheiros no NovoCódigo Civil são inconstitucionais. Isso porque a nova Leisubstantiva – artigo 1.790, inciso III do Código Civil – re-

 baixou o status hereditário do companheiro sobrevivente emrelação ao cônjuge supérstite. Violação dos princípios funda-mentais da igualdade e da dignidade. Diante do reconheci-mento da inconstitucionalidade da Lei acima citada, deve oincidente de inconstitucionalidade ser apreciado peloTribunal Pleno desta Corte de Justiça, mediante seu ÓrgãoEspecial, nos termos do artigo 97 da Constituição Federal,artigo 481 e seguintes do Código de Processo Civil e artigo209 do RITJRGS. Incidente de inconstitucionalidade

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suscitado” (TJRS, Agravo de Instrumento 70027138007,Porto Alegre, 8.ª Câmara Cível, Rel. Des. José AtaídesSiqueira Trindade, j. 18.12.2008, DOERS  11.03.2009, p. 31).

Consigne-se que uma terceira corrente afasta de plano

a inconstitucionalidade e determina que os bens oner-osamente adquiridos na constância da união estável sejamentregues ao companheiro (1/3) e concorrência com oscolaterais (2/3). Em suma, apega-se à literalidade danorma:

“Agravo de instrumento. Inventário. Companheiro sobre-

 vivente. Herança. Participação. Concorrência com descend-entes. Artigo 1.790 do Código Civil. Privilégio em relação acônjuge sobrevivente. Alegação de inconstitucionalidade.Ofensa ao princípio da isonomia. Inexistência. A Constitu-ição Federal não equiparou o instituto da união estável ao docasamento, tendo tão somente reconhecido aquele como en-tidade familiar (art. 226, § 3.º, CF). Dessa forma, é possível

 verificar que a legislação civil buscou resguardar, de formaespecial, o direito do cônjuge, o qual possui prerrogativasque não são asseguradas ao companheiro. Sendo assim, otratamento diferenciado dado pelo Código Civil a esses insti-tutos, especialmente no tocante ao direito sobre a parti-cipação na herança do companheiro ou cônjuge falecido, nãoofende o princípio da isonomia, mesmo que, em determina-dos casos, como o dos presentes autos, possa parecer que o

companheiro tenha sido privilegiado. O artigo 1.790 doCódigo Civil, portanto, é constitucional, pois não fere oprincípio da isonomia” (TJDF, Recurso2009.00.2.001862-2, Acórdão 355.492, 1.ª Turma Cível,Rel. Des. Natanael Caetano, DJDFTE  12.05.2009, p. 81).

“Ação de declaração de união estável. Reconhecimento da

convivência com animus maritallis somente a partir do ano

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de 2002. Inexistência de prova robusta capaz de comprovaras alegações autorais quanto ao início do relacionamentoamoroso no ano de 1992. Alegada inconstitucionalidade dosartigos 1.790, inciso III e 1.845 do novo Código Civil que serejeita. À companheira apenas se defere o direito sucessórioà herança deixada pelo companheiro falecido, quando veri-ficada a ausência de quaisquer descendentes, ascendentesou herdeiros colaterais. Apelos improvidos. Sentença man-tida” (TJRJ, Apelação 0005772-50.2007.8.19.0209(2008.001.51945), 10.ª Câmara Cível, Rel. Des. Celso Peres,

 j. 21.01.2009).

“Vigora, portanto, na hipótese, a norma do artigo 1.790,

III, do Código Civil. Até mesmo porque, da leitura do artigo226, § 3.º, CF/88, não se conclui que o casamento seja igual,para todos os efeitos, à união estável, já que a norma maiordetermina que a lei deve facilitar a conversão da união es-tável em casamento, nada mais. No caso em exame, o agravodeve ser provido, devendo ser alterada a decisão agravada,aplicando-se a norma expressa do artigo 1.790, III, do

Código Civil. Do exposto, voto pelo provimento do recurso,para que sejam mantidos os herdeiros colaterais no in- ventário” (TJRJ, Agravo de Instrumento 72023423833, 8.ªCâmara Cível, j. 12.06.2008).

“Ocorrida a morte na vigência do atual Código, suas re-gras sucessórias são aplicáveis. Ele trata sobre sucessão e

união estável, não deixando espaço para vigência de dis-posições de leis anteriores que tratavam de forma diversadessas matérias. Houve revogação do disposto no art. 2.º, daLei n. 8.971/94. Não há a inconstitucionalidade pretendida.O art. 226 da Constituição Federal não equipara ocasamento à união estável. Se o fizesse, não se preocupariaem que a lei facilitasse a conversão da primeira emcasamento, porque, estando os dois institutos equiparados,

a conversão seria absolutamente inútil” (TJSP, Agravo de

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Instrumento 641.861-4/8, 10.ª Câmara, Rel. Des. Mauricio Vidigal, j. 25.08.2009).

Como se pode notar, a questão é controversa, havendouma verdadeira Torre de Babel  na jurisprudência nacion-

al. Mas não é só, havendo outra tese de inconstitucionalid-ade do art. 1.790 do Código Civil.

b) Inconstitucionalidade por privilegiar a união es-tável se comparada ao casamento

Em determinado inventário em trâmite perante uma

das comarcas do Estado de São Paulo, discutia-se qual ser-ia o quinhão sucessório que pertenceria à companheira dofalecido, que deixara três descendentes exclusivos comoherdeiros (filhos de uma união anterior) e um filhocomum (julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo, Agravo 467.591-4/7-00, 9.ª Câmara de Direito Privado,data de registro: 29.01.2007).

 A decisão de primeira instância determinou que acompanheira ficasse com 50% dos bens adquiridos a títulooneroso no curso da união estável, a título de meação, eque os outros 50% fossem partilhados da seguinte forma:a companheira receberia metade do que couber a cada umdos filhos (art. 1790, II, do CC).

 A companheira agravou da decisão objetivando de- bater a celeuma decorrente da filiação híbrida, construçãode Giselda Hironaka. Isso porque, se o falecido deixou fil-hos exclusivos e filhos comuns, a doutrina se digladiaquanto à quota que caberá ao companheiro, ou seja, sequota igual a dos filhos (art. 1.790, I, do CC) ou apenasmetade da quota (art. 1.790, II, do CC). A companheira

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entendia que teria quota igual e os filhos, por óbvio, ad-mitiam que ela teria apenas metade da quota.

Surpreendeu a decisão do Tribunal que simplesmenteafastou a aplicação do dispositivo por entendê-lo incon-stitucional. De acordo com o relator DesembargadorGrava Brasil, “como se depreende dos mencionados textoslegais, o cônjuge, casado com comunhão parcial, temdireito à meação dos bens adquiridos a título oneroso econcorre com os descendentes ou, na sua falta, com os as-cendentes, em relação aos bens particulares deixados pelode cujus. O sentido de restringir a sucessão aos bens par-

ticulares decorre do reconhecimento da meação sobre os bens comuns, resguardando e amparando os direitos dosdescendentes (ou ascendentes), evitando incidir sobre ummesmo patrimônio direito de meação e direito de su-cessão. Todavia, se essa interpretação se aplica – e nessesentido vem sendo pacificada – ao cônjuge casado no re-gime da comunhão parcial, por força do artigo 226, § 3.º,

da Constituição Federal, e do artigo 1.725, do Código Civil,o mesmo tratamento haverá de ser dispensado à união es-tável. Eis, no entanto, que se invoca o artigo 1.790, doCódigo Civil, que, em conflito com os dispositivos antesmencionados, disciplina o direito sucessório do compan-heiro de forma diferenciada, atribuindo-se, em princípio,

direito de meação e direito sucessório incidindo sobre omesmo monte-mor. Em outras palavras, a interpretaçãoisolada do dispositivo e sua aplicação irrestrita, levaria,necessariamente, a conceder tratamento privilegiado aocompanheiro, em manifesta violação da equidade com ocônjuge, e em prejuízo direto ao herdeiro” (destacamos).

Desse modo, conclui o julgador: “Em tese, os compan-

heiros poderão estabelecer contrato escrito, afastando a

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comunicação dos bens adquiridos onerosamente, todavia,reconhecida a regularidade do pacto, aplicar-se-ia a regrasucessória do artigo 1.790, impedindo que o companheiroficasse sem nenhuma participação. No caso dos autos, porexemplo,  ausente contrato escrito, inexistindo bens par-

ticulares e reconhecida a meação, a parte da meação quecomporá a herança, deverá ser repartida apenas entre osherdeiros” (destaca-se).

 Aplicou o julgado a máxima pela qual se há meação,não haverá concorrência sucessória com os descendentes.Fato é que a regra é prevista pela lei na hipótese de faleci-

mento do cônjuge (art. 1.829, I, do CC), em razão do en-tendimento do julgador, foi aplicada também à uniãoestável, afastando-se do texto legal (art. 1.790 do CC).

Reformou-se, de ofício, o plano de partilha ap-resentado, determinando que os interessados apresentemnovo plano, com a exclusão da concorrência sucessória dacompanheira, preservando-se apenas a meação.

Em sentido muito próximo, consigne-se que oTribunal de Justiça do Distrito Federal já entendeu pelanecessidade de adequação do art. 1.790 do Código Civil,apesar de não concluir pela sua inconstitucionalidade:

“Direito das sucessões. Apelação cível. Inventário. Cercea-

mento de defesa. Inocorrência. União estável. Direito su-cessório do companheiro. Privilégio em detrimento do côn-

 juge. Adequação do art. 1.790 do Código Civil. A diferen-ciação dos direitos sucessórios previstas no Código Civilentre o cônjuge e companheiro coloca este em situação de

 vantagem em relação àquele, à medida que, de acordo comas novas regras, o companheiro sobrevivente, além da

meação a que tem direito em relação aos bens adquiridos

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onerosamente na vigência da união estável, passou a fazer jus também a uma quota parte na sucessão, em concorrênciacom os herdeiros comuns. 3. Em virtude das inúmeras crít-icas dirigidas aos artigos 1.790 e 1.829 do Código Civil, cer-tamente será necessária a reforma do texto legal para equi-librar o desejo do legislador constituinte aos dispositivosconstantes do código. Contudo, não é o caso de declaraçãode inconstitucionalidade, mas de adequação da norma aocaso concreto, buscando a solução que melhor distribua a

 justiça. 4. Exclusão do direito do companheiro à concorrên-cia na herança com os demais herdeiros, eis que já temdireito a meação do bem comum do casal. 5. Recursoprovido. Sentença reformada, com a expedição de novo

formal de partilha” (TJDF, Recurso 2006.05.1.004528-7, Acórdão 375.003, 3.ª Turma Cível, Rel. Des. Mario-ZamBelmiro, DJDFTE  14.09.2009, p. 209).

Contudo, é de se frisar que o próprio Tribunal deJustiça de São Paulo em caso análogo afastou a tese da in-constitucionalidade e concedeu ao companheiro a meação

e a participação sucessória. Vejamos:

“Tecem os agravantes algumas considerações acerca dainconstitucionalidade do inciso I do artigo 1.790, do CC, queprevê que o companheiro participará da sucessão do outro e,concorrendo com os filhos comuns, terá direito a uma quotaequivalente à que por lei for atribuída ao filho. Segundo os

agravantes, tal disposição é inconstitucional, pois esbarra noprincípio de que aos conviventes não pode ser dado maisque aos cônjuges. Entretanto, em que pese não ter a Con-stituição Federal equiparado o instituto da união estável aodo casamento, tendo tão somente estabelecido, no artigo226, § 3.º, que ‘para efeito da proteção do Estado, é recon-hecida a união estável entre o homem e a mulher como en-tidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão emcasamento’, da leitura desse mesmo dispositivo se vê que

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realmente não se poderia concluir pela equiparação da uniãoestável com o casamento, pois tal entendimento implicariana desnecessidade de se converter a união estável. 3. Não seentrevê, pois a propalada violação ao princípio da isonomia,não sendo caso de discutir a existência de privilégio de umem detrimento do outro (casamento/união estável), uma vezque reconhecida a união estável entre homem e mulhercomo entidade familiar, apenas cuidou a legislação pátria dedestinar regramento diverso para o cônjuge e para o com-panheiro” (TJSP, Agravo de Instrumento 578.361-4/2-00,10.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Testa Marchi, j.1.º.12.2009).

Em conclusão, dos diversos julgados apontados, mui-tos deles apontam a inconstitucionalidade do art. 1.790 doCódigo Civil, mas seus fundamentos são diversos. Algunsacórdãos, por considerarem que o companheiro não deveconcorrer com parentes colaterais do falecido; e outros,por entenderem que o companheiro não pode ter situaçãode privilégio em relação ao cônjuge e, portanto, se o côn- juge que tem a meação não terá concorrência sucessóriacom os descendentes, o mesmo deve ocorrer com relaçãoao companheiro.

Existem também as decisões que concluem pela aus-ência de inconstitucionalidade do art. 1.790, pois a Con-stituição Federal de 1988 trata de maneira diversa o

casamento e a união estável, o que justifica o tratamentodiferenciado no âmbito sucessório. Nessa linha, já de-cidiram o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de SãoPaulo (TJSP, Processo 0434423-72.2010.8.26.0000(990.10.434423-9, Órgão Especial, Rel. Corrêa Viana, j.14.09.2011) e o Órgão Especial do Tribunal de Justiça doRio Grande do Sul (TJRS, Incidente 70032664054,

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 Antônio Prado, Órgão Especial, Rel. Des. Luiz Felipe Sil- veira Difini, j. 16.11.2009, DJERS  03.12.2009, p. 1).

De toda sorte, o Órgão Especial do Tribunal de Justiçado Paraná entendeu de forma diversa, ou seja, pela incon-stitucionalidade do inc. III do art. 1.790, por introduzirtratamento desfavorável ao convivente (TJPR, Incidentede Declaração de Inconstitucionalidade 536.589-9/01, da18.ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da RegiãoMetropolitana de Curitiba. Suscitante: 12.ª Câmara Cíveldo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Rel. Des. Sér-gio Arenhart, j. 04.12.2009).

Na mesma linha, decisão de 2011 do Superior Tribunalde Justiça que remete o processo ao Órgão Especialdaquele Tribunal, em observância ao art. 97 da CF/1988,que consagra a reserva de plenário:

“Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade. Art.1.790, incisos III e IV do Código Civil de 2002. União es-

tável. Sucessão do companheiro. Concorrência com parentessucessíveis. Preenchidos os requisitos legais e regimentais,cabível o incidente de inconstitucionalidade dos incisos, III eIV, do art. 1790, Código Civil, diante do intenso debatedoutrinário e jurisprudencial acerca da matéria tratada”(STJ, AI no REsp 1.135.354/PB, Rel. Min. Luis Felipe Sa-lomão, 4.ª Turma, j. 24.05.2011, DJe 02.06.2011).

 Atualizando a obra, destaque-se que, em outubro de2012, o Órgão Especial dessa Corte Superior concluiu pelanão apreciação dessa inconstitucionalidade suscitada pelaQuarta Turma, eis que o recurso próprio para tanto deveser o extraordinário, a ser julgado pelo Supremo TribunalFederal (publicado no   Informativo  n.  505  do STJ). Em

suma, a questão da inconstitucionalidade não foi resolvida

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em sede de Superior Tribunal de Justiça, aguardando-seeventual julgamento pelo STF. Com a  decisio, o recursoespecial deve voltar à Quarta Turma para ser julgadoapenas nos aspectos infraconstitucionais.

Por todo o exposto, constata-se que a questão da su-cessão do companheiro continua por demais tormentosa,necessitando de um árduo trabalho da doutrina e dosTribunais para ser solucionada definitivamente. Cumpreaguardar novos posicionamentos dos Tribunais Superi-ores, para que a questão atinja um mínimo deestabilidade.

2.6 A SUCESSÃO LEGÍTIMA NA LINHA COLATERAL

Conforme visto nos capítulos anteriores, com relação

aos colaterais pudemos observar o seguinte:1.º) Somente são considerados herdeiros os parentes colat-

erais do falecido até o 4.º grau (arts. 1.592 e 1.839 do CC).São herdeiros: irmãos, tios, sobrinhos, tio-avô, sobrinho-neto e primo-irmão.

2.º) Os colaterais não são herdeiros necessários e, portanto,

para excluí-los da sucessão, basta que o testador disponhade seu patrimônio sem os contemplar (art. 1.850 do CC).Por esse fato, são denominados de herdeiros facultativos.Diante disso, não há que se falar em deserdação do par-ente colateral; basta que o testador faça testamento deix-ando seus bens para terceiros para que automaticamenteo colateral nada receba.

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3.º) Em havendo descendentes, ascendentes ou cônjugesobrevivente, nas condições previstas no art. 1.830 do CC,os colaterais nada herdam, estando excluídos da sucessão.

4.º) Em havendo companheiro sobrevivente, não deixando ofalecido descendentes ou ascendentes, os colaterais serão

herdeiros (art. 1.790, III, do CC), da seguinte forma: datotalidade dos bens  não   adquiridos a título oneroso naconstância da união estável ou concorrentes na proporçãode 1/3 dos bens adquiridos a título oneroso na constânciada união estável.

Superadas as observações iniciais, parte-se para a an-

álise das regras específicas sobre a sucessão legítima nalinha colateral.

De início, em relação aos irmãos (colaterais de 2.ºgrau), é preciso lembrar a sua classificação.

Primeiramente, há os irmãos bilaterais ou germanos,que são aqueles que descendem do mesmo pai e da mesma

mãe. Para alguns, esse parentesco é chamado de complexoou completo, pois vem tanto do pai quanto da mãe.

Deixando o falecido apenas irmãos bilaterais (par-entes em 2.º grau), terão eles direito ao mesmo quinhãoda herança. Note-se que no exemplo abaixo o pai de  A épremorto, ou seja, faleceu antes de A. Vejamos o esquemasucessório:

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Já os irmãos unilaterais, popularmente chamados demeio-irmãos, são aqueles que descendem de apenas umprogenitor (art. 1.842 do CC). Para alguns, o parentescocom o irmão unilateral e seus descendentes seria  simplesou   incompleto. Aprofundando, divide-se em:  a) irmãos

unilaterais consanguíneos – são os que têm o mesmo pai,mas mães diferentes; e  b) irmãos unilaterais uterinos  –são os que têm a mesma mãe, mas pais diferentes.

Ilustrando, deixando o falecido apenas irmãos unilat-erais (parentes em 2.º grau), terão eles direito ao mesmoquinhão da herança. Vejamos:

Pois bem, se em uma determinada situação su-cessória, concorrem irmãos bilaterais e unilaterais, osirmãos unilaterais recebem metade do que recebem os bi-laterais. É o que prevê o art. 1.841 do CC. Vejamos odiagrama:

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 A regra que se estabelece é que o meio-irmão recebemeia quota ( x ) e, portanto, o irmão bilateral recebe odobro deste (2 x ). Exemplificando, imaginemos a hipóteseem que o falecido deixa dois irmãos bilaterais e trêsirmãos unilaterais. Para cada irmão bilateral deve-se at-

ribuir 2 x  (2 x  X 2 = 4 x ). Para cada irmão unilateral atribuí-mos x  ( x  X 3 = 3 x ).

Somemos as quotas de todos os irmãos: 4 x  + 3 x  = 7 x .O número 7 será o divisor da fração, e a herança será dis-tribuída da seguinte forma:

– para cada irmão bilateral, a fração de 2/7 da herança;– para cada irmão unilateral, 1/7 da herança.

 Vejamos essa divisão, de forma esquematizada:

Para facilitar o cálculo, lançamos na tabela a seguir assituações e os resultados da divisão da herança:

Númerode

irmãosbilaterais

Númerode irmãosunilaterais

(atribuir1 x  para

cada)

Somadas

quotas

Divisão daherança

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(atribuir2 x  paracada)

1

Quota –2 x 

1Quota – 1 x    3 x 

2/3 para o bi-

lateral e 1/3para ounilateral

1

Quota –2 x 

2

Quota – 2 x   4 x 

2/4 para o bi-lateral e 1/4para cadaunilateral

2

Quota –4 x 

1

Quota – 1 x   5 x 

2/5 para cadabilateral e 1/5

para ounilateral

2

Quota –4 x 

2

Quota – 2 x    6 x 

2/6 para cadabilateral e 1/6

para cadaunilateral

2

Quota –4 x 

3

Quota – 3 x   7 x 

2/7 para cadabilateral e 1/7

para cadaunilateral

3

Quota –6 x 

2

Quota – 2 x   8 x 

2/8 para cadabilateral e 1/8

para cadaunilateral

3  3

Quota – 3 x   9 x 

  2/9 para cadabilateral e 1/9

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Quota –6 x 

para cadaunilateral

3

Quota –6 x 

4

Quota – 4 x 

  10 x 

2/10 para cadabilateral e

1/10 para cadaunilateral

4

Quota –8 x 

3

Quota – 3 x   11 x 

2/11 para cadabilateral e

1/11 para cadaunilateral

Poder-se-ia até alegar a inconstitucionalidade do art.1.841 do CC, pois o dispositivo traria uma discriminaçãodos irmãos, o que seria uma violação à isonomia constitu-cional prevista no art. 5.º, caput , do Texto Maior.

Os presentes autores não pensam de forma. Isso

porque o princípio da isonomia pode ser consubstanciadonaquela velha oração de Ruy Barbosa no sentido de que  alei deve tratar de maneira igual os iguais, e de maneiradesigual os desiguais. Os irmãos bilaterais e unilateraisestão em situação de desigualdade fática, justificando-se otratamento desigual que lhe é dado quanto à herança. Assim, pela especialidade constante da segunda parte da

isonomia, justifica-se a constitucionalidade do dispositivoprivado. Esse entendimento é compartilhado por Inácio deCarvalho Neto (A constitucional... Disponível em:< www.flaviotartuce.adv.br>. Acesso em: 31 ago. 2006).

Seguindo no estudo da sucessão dos colaterais, sali-entamos que na linha colateral existe um único caso de

representação, presente quando o sobrinho do falecido

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(parente em 3.º grau) concorrer com o irmão do morto(parente em 2.º grau). Imagine-se a hipótese em que A fa-lece, deixando seu irmão bilateral C  (parente em 2.º grau)e seus sobrinhos D e E  (parentes em 3.º grau), filhos de B,seu irmão   bilateral   premorto. A herança se divide da

seguinte forma:

– C: 50% por direito próprio (partilha por cabeça);

– D e E: 25% para cada por representação (partilha porestirpe).

 Vejamos, mais uma vez, de forma esquematizada:

Imagine-se ainda uma segunda hipótese, de concor-rência entre os irmãos do morto (parentes em 2.º grau) eos sobrinhos do morto (parentes em 3.º grau).  A   falece,

deixando seu irmão bilateral C  (parente em 2.º grau), seussobrinhos  E  e  F  (parentes em 3.º grau), filhos de  B, seuirmão  bilateral  premorto e seu sobrinho  G , (parente em3.º grau), filho de  D, seu irmão  unilateral  premorto. A herança se divide da seguinte forma:

– C (irmão bilateral): 2/5 da herança por direito próprio(partilha por cabeça);

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– E e F (sobrinhos representando irmão bilateral): 1/5 paracada por representação (partilha por estirpe);

– G (sobrinho representando irmão unilateral): 1/5 da her-ança por representação (partilha por estirpe).

Percebe-se que e E  e F  recebem o que seu pai receber-ia se vivo fosse. Da mesma forma,  G  recebe o que seu paireceberia se vivo fosse. Como E  e F  são filhos de irmão bi-lateral, herdam o dobro do que herda  G , filho de irmãounilateral (art. 1.841 do CC). Vejamos o gráfico:

Para dar sequência às hipóteses de sucessão do colat-eral, temos a situação em que A falece sem deixar irmãos,mas apenas sobrinhos. Deixando somente estes (sobrin-hos – todos parentes de 3.º grau), filhos de irmãos bilat-erais, todos receberão quinhão igual e por direito próprio

(art. 1.843, § 3.º, do CC). Não havendo parentes de graumais próximo concorrendo com parentes de grau mais re-moto, não há que se falar em direito de representação (art.1.843, § 1.º, do CC). Esquematizando:

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Da mesma forma, se A falece e só deixa sobrinhos (to-

dos parentes de 3.º grau), filhos de irmãos unilaterais (art.1.843, § 3.º, do CC), nesse caso todos receberão quinhãoigual e também por direito próprio. Não havendo parentesde grau mais próximo concorrendo com parentes de graumais remoto, não há que se falar em representação (art.1.843, § 1.º). Eis o gráfico:

Cabe ainda a análise da concorrência sucessória entresobrinhos filhos de irmão bilateral e sobrinhos filhos de

irmão unilateral . Determina a lei que se concorrerem

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filhos de irmãos bilaterais com filhos de irmãos unilat-erais, cada um destes herdará a metade do que herdarcada um daqueles (art. 1.843, § 2.º, do CC).

Nesse sentido, se o falecido deixou como únicos her-deiros os sobrinhos D e E , filhos de seu irmão bilateral B,premorto, e seus sobrinhos F  e G , filhos de seu irmão uni-lateral C , premorto, todos os sobrinhos herdarão pordireito próprio – a partilha será por cabeça e não haverárepresentação – e a herança será divida da seguintemaneira:

– 2/6 para o sobrinho D;– 2/6 para o sobrinho E;

– 1/6 para o sobrinho F;

– 1/6 para o sobrinho G.

Note-se que no caso de concorrência de sobrinhos quesejam filhos de irmãos unilaterais e bilaterais, a tabela decálculos que usamos para os irmãos é plenamente ap-licável, pois os sobrinhos herdam por direito próprio, não

havendo direito de representação.

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 Ainda ilustrando, se o falecido deixou como únicosherdeiros os sobrinhos E  e F , filhos de seu irmão bilateral  B, premorto, e seus sobrinhos G  e H , filhos de seu irmãounilateral C , premorto, e seu sobrinho   I , filho de seuirmão bilateral D, todos os sobrinhos herdam por direito

próprio (a partilha será por cabeça, e não haverá repres-entação), e a herança será divida da seguinte maneira:

– 2/8 para o sobrinho E;

– 2/8 para o sobrinho F;

– 2/8 para o sobrinho I;

– 1/8 para o sobrinho G;

– 1/8 para o sobrinho H.

 Vejamos o diagrama:

Cabe igualmente o estudo de uma situação bastanteespecial e que traz exceção à regra. É o estudo da concor-rência dos colaterais de 3.º grau. O tio do morto e osobrinho do morto são colaterais de 3.º grau. Vamos con-tar o grau de parentesco para, então, verificarmos aquestão sucessória.

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O tio do falecido é seu parente colateral de 3.º grau,pois um grau separa o falecido de seu pai (“subindo”), ooutro separa seu pai de seu avô (“subindo”), e o últimosepara seu avô de seu tio (“descendo”).

O sobrinho do morto também é seu parente colateralem 3.º grau, pois um grau separa o sobrinho do morto deseu pai, que é irmão do morto (“subindo”), outro grau sep-ara o irmão do morto de seu pai (“subindo”), e o últimograu separa o pai do morto dele mesmo (“descendo”).

 Vejamos o diagrama de parentesco:

Tendo em vista que ambos são parentes de 3.º grau,pela regra geral a herança deveria ser partilhada igual-mente entre o tio do morto e o sobrinho do morto, ou seja,50% para cada um. Entretanto, o legislador optou porsolução diferente,   deixando 100% da herança para osobrinho do falecido e nada para o tio do morto   (art.

1.843, caput , do CC).

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Não se trata, por óbvio, de direito de representação,porque, conforme já dito e repetido, só há direito de rep-resentação se houver diversidade de graus. No caso emestudo, só temos parentes de 3.º grau. Transcreve-se odispositivo para a devida compreensão: “Art. 1.843. Na

falta de irmãos, herdarão os filhos destes e, não os hav-endo, os tios”.

E agora a sua tradução: na falta de  irmãos do morto(parentes em 2.º grau do falecido), herdarão os   filhosdestes (sobrinhos do morto e, portanto, parentes em 3.ºgrau do falecido). Realmente, pela regra geral, parente de

grau mais próximo – irmão – exclui o de grau mais re-moto – sobrinho). Por fim, não havendo sobrinhos (colat-eral de 3.º grau), herdará o tio do morto (também colater-al de 3.º grau e por isso a lei diz “e, não os havendo, ostios”).

No presente momento, pode o estudioso do DireitoSucessório formular a seguinte pergunta: por que a opçãodo legislador em beneficiar o sobrinho do morto em detri-mento do tio do falecido? Como primeiro argumento,pode-se pensar que o falecido tenha uma relação afetivamais estreita com seus sobrinhos (filhos de sua irmã ouirmão) do que com seu tio (irmão de seu pai ou de suamãe). Como segundo argumento, imagina o legislador que

enquanto o sobrinho do morto é alguém jovem, iniciandoa vida, o tio do falecido é mais velho e já está com sua vidaresolvida. Assim, melhor beneficiar aquele que mais pre-cisaria de ajuda e auxílio. O último argumento parece-nos bem plausível, mas, na realidade, a regra toma por baseuma questão histórica que remonta ao direito romano,mais especificamente às Novelas CXVIII (543 d.C.) e

CXXVII (548 d.C.) de Justiniano.

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 As Novelas CXVIII e CXXVII de Justiniano modificamprofundamente a questão da sucessão na linha colateral.Explica Moreira Alves, ao mencionar a sucessão dos in-gênuos, ou seja, pessoas livres que nunca foram escravas,que se o de cujus deixar somente irmãos e irmãs germanos

e seus filhos, os irmãos herdam por cabeça (direitopróprio) e, caso um deles seja falecido e tenha filhos, ossobrinhos sucedem por representação (partilha porestirpe) ( Direito romano, 1986, v. 2, p. 482).

Eugéne Petit, em seu  Tratado Elementar de Direito Romano, conclui que se o falecido deixasse apenas sobrin-

hos, apesar da Novela CXVIII nada mencionar, a lógica eespírito geral da Novela impunha a divisão por estirpes, ouseja, o direito de representação seria mantido ainda que sósobrinhos houvesse (lembra que essa é a posição de Ac-cursio, seguido por Dumoulin, mas não de Azón, paraquem a herança seria partilhada por cabeça) (Tratado ele-mentar..., 2003, p. 801).

Dessa forma, conclui o doutrinador que os sobrinhosdo morto sempre herdavam, no direito romano, por rep-resentação e nunca por direito próprio.

Da leitura da Novela CXVIII, concluindo-se que ossobrinhos sempre herdam por representação (são par-entes de 3.º grau, mas representam herdeiros de 2.º grau),

facilmente se conclui que se concorrerem com os tios dofalecido (parentes de 3.º grau), os sobrinhos recebem100% da herança, pois estão representando seus pais(irmãos do falecido), que são parentes de 2.º grau. Rece- bem tudo, pois seriam considerados, em razão da repres-entação, parentes de 2.º grau.

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Sobre a questão, ao comentar as Ordenações Filipinasde 1.603 em suas Instituições de Direito Civil português,esclarece Coelho da Rocha que os colaterais sucedem nafalta de descendente e ascendente na ordem seguinte: odireito de representação não aproveita senão aos sobrin-

hos, filhos de irmão ou irmã do defunto e, por isso, os tiosdo defunto, ainda que estejam no mesmo grau, são excluí-dos pelos sobrinhos deste, mas não pelos filhos dossobrinhos ( Instituições..., 1907, t. I, p. 235).

Teixeira de Freitas, ao analisar o art. 972 de sua  Con-solidação das leis civis, sobre a classe dos colaterais, ex-

plica que os sobrinhos sucedem por direito de repres-entação e, por isso, precedem aos tios do falecido, postoque, como eles, sejam colaterais em 3.º grau. É como seseus pais (irmãos do morto e parentes de 2.º grau) vivosfossem. Todos os demais colaterais, com exceção dossobrinhos, herdam per capta, não havendo representação(Novella 118, Capítulo 3.º, § 1.º) (Consolidação..., 2003, v.

II, p. 577).Esse é o fundamento histórico da regra presente nos

arts. 1.617 do CC/1916 e 1.843 do CC/2002. Como ossobrinhos herdavam sempre representando os irmãos domorto, estariam um grau na frente dos tios do falecido.

Entretanto, para finalizar a questão, deve-se lembrar

que apesar da existência do fundamento histórico, nodireito brasileiro, desde a vigência do CC/1916, em hav-endo somente sobrinhos do falecido, estes herdam pordireito próprio e não por representação (art. 1.843, § 1.º,do CC). Conclui-se, portanto, que o fundamento históricose afasta do direito posto, mas, de qualquer forma, os

sobrinhos do morto herdam 100% dos bens quando

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concorrerem com o tio do falecido em razão da expressaprevisão legal.

De qualquer modo, reconhecemos que se o falecidonão concordar com a determinação legal, poderá fazer umtestamento beneficiando seu tio em detrimento de seusobrinho, uma vez que o colateral é herdeiro facultativo enão necessário.

Resumindo, três conclusões sobre o tema resumem aquestão:

1.ª conclusão: se o falecido deixar apenas sobrinhos, os

sobrinhos herdam tudo.2.ª conclusão: se o falecido deixar sobrinhos e seu tio, os

sobrinhos herdam tudo.

3.ª conclusão: se o falecido deixar apenas tios, os tios her-dam tudo.

Dessa forma, não haverá divisão da herança entre o tiodo morto (colateral de 3.º grau) e o sobrinho do morto(colateral de 3.º grau).

O último caso prático sucessório com relação ao par-ente colateral, trata da questão do colateral de 4.º grau. Anote-se que são colaterais de 4.º grau o tio-avô, osobrinho-neto e o primo-irmão.

Historicamente, a questão da sucessão do colateral so-freu fortes alterações. Na legislação que antecedeu aoCódigo Civil de 1916, eram herdeiros os colaterais até 10.ºgrau (Título XCIV das Ordenações Filipinas e artigo 980da Consolidação das Leis Civis).

O Projeto Clóvis Beviláqua, valendo-se da previsão do

Decreto 1.839 de 1907 (Lei Feliciano Penna), já reduzia o

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parentesco colateral para 6.º grau (art. 1.783 do Projeto) eassim o fazia o Código Civil de 1916 em seu art. 1.612.

Curiosas são as alterações em matéria de sucessão nalinha colateral. O Decreto-lei 1.907, de 20 de dezembro de1919, alterou o art. 1.612 do CC/1916, para limitar a linhacolateral até 2.º grau. Esse decreto-lei foi revogado peloart. 4.º do Decreto-lei 8.027, de 22 de novembro de 1945,que ampliou o direito hereditário ao parente colateral de3.º grau (RODRIGUES, Silvio. Direito civil ..., 2002, v. 7,p. 120). Finalmente, o Decreto-lei 9.461, de julho de 1946,alterou o Código Civil então vigente para que a vocação se

limitasse ao 4.º grau e a regra manteve-se no Código Civilde 2002.

 A sucessão do colateral de 4.º grau é muito simples,uma vez que não há representação e estes só herdarão pordireito próprio.   Sendo assim, caso o falecido deixequalquer colateral de 2.º ou de 3.º grau, o de 4.º graunada herdará, pois os de grau mais próximo excluem osde grau mais remoto (art. 1.840 do CC).

 Analisemos algumas situações práticas sobre o tema.

Se A falece e deixa como herdeiros seu sobrinho (3.ºgrau) e seu sobrinho-neto (4.º grau), o sobrinho herdará100% dos bens. Eis o diagrama concreto:

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Se   A   falece, deixando como únicos herdeiros seusobrinho-neto (4.º grau) e seu tio (3.º grau), o tio receberá100% da herança, pois o herdeiro de grau mais próximoexclui o de grau mais remoto. Vejamos:

Não haveria direito de representação no caso emcomento? A resposta é não, pois não há direito de repres-entação em se tratando de colateral de 4.º grau, que sóherda por direito próprio!

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 Vejamos agora uma situação em que o colateral de 4.ºgrau será herdeiro.

Se  A  falece e deixa vivo seu sobrinho-neto e seu tio-avô, ambos colaterais de 4.º grau, cada um deles recolherá50% da herança. O tio-avô concorrerá com o sobrinho-neto, e a herança ficará dividida em partes iguais.Esquematizando:

É interessante notar que o Tribunal de Justiça de SãoPaulo, em decisão tautológica, por erro na contagem degraus de parentesco, determinou a concorrência do

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parente em 4.º grau (prima-irmã) com os tios do falecido(colaterais em 3.º grau). Vamos à árvore genealógica dafamília em que o Sr. José Eugênio é o falecido de quem asucessão se trata.

Ora, a Sra. Luciana não é sobrinha do falecido, massua prima-irmã (colateral de 4.º grau) e nada deve rece- ber, pois os tios do falecido (Maria de Lourdes, Agenor eIda), na qualidade de parentes colaterais em 3.º grau, tudo

herdam (grau mais próximo exclui mais remoto). Não hárepresentação quanto aos colaterais de 4.º grau, que sóherdam por direito próprio.

 A ementa do estranho julgado é a seguinte: “Sucessão. Ausência de cônjuge supérstite e descendentes diretos.Tios ascendentes herdeiros, um deles premoriente ao ‘de

cujus’. Direito de representação da sobrinha” (TJSP, 5.ªCâmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento400.146-4/7, Rel. Oldemar Azevedo, publicada em16.07.2007).

Se sobrinha fosse, o julgado estaria correto...

 Ainda no tocante à classe dos colaterais, certas ind-

agações precisam ser respondidas. Aqui pode surgir a

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dúvida: mas se concorrem o tio do morto e o sobrinho domorto, não será o caso de o sobrinho ficar com 100% dopatrimônio conforme aqui já explicado? Vamos examinar bem a questão.

Se concorrerem à herança o sobrinho do morto (colat-eral de 3.º grau) e o tio do morto (também colateral de 3.ºgrau), o sobrinho do morto recolherá 100% da herança porforça da exceção contida no art. 1.843, caput , do CC. Já ex-plicamos esse caso.

Por outro lado, se concorrerem à herança o sobrinho-neto do morto (colateral de 4.º grau) e o tio-avô do morto

(também colateral de 4.º grau), a herança será dividaentre eles por força da regra pela qual os herdeiros demesmo grau dividem a herança em partes iguais. Para aexclusão do tio-avô precisaríamos de regra expressa queinexiste no Código Civil. Não se poderia excluí-lo da su-cessão por analogia. Como se sabe, as normas restritivasde direitos não admitem aplicação por analogia ou inter-pretação extensiva, o que visa proteger e resguardar direit-os e a autonomia privada.

Outra dúvida que surge é a seguinte: caso o sobrinho-neto seja neto de um irmão unilateral do falecido (meio-irmão), terá ele direito a uma quota igual à que cabe aosobrinho-neto que é neto de um irmão bilateral do fale-

cido? A questão tem sua razão de ser. Isso porque, con-forme antes estudado, se concorrerem à herança irmãos bilaterais e unilaterais do falecido, os unilaterais terãodireito à metade do que couber aos bilaterais (art. 1.841 doCC). Da mesma forma, os sobrinhos, filhos de irmãos uni-laterais, terão direito à metade do que couber aos sobrin-

hos, filhos de irmãos bilaterais (art. 1.843, § 3.º, do CC).

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Pela lógica, sendo o sobrinho-neto neto de irmão uni-lateral do falecido, teria ele também a metade da quotaque caberia ao sobrinho-neto, neto de irmão bilateral dofalecido. Entretanto, não é essa a interpretação que se faz.Explica José Luiz Gavião de Almeida que “não previu o

Código a hipótese de esses colaterais receberem de formadiversa consoante venham de parentesco simples ou com-plexo. Não se pode, por isso, estabelecer aos sobrinhos-ne-tos de parentesco incompleto metade da capacidade su-cessória que têm os sobrinhos-netos de parentesco com-pleto. A capacidade é regra. A incapacidade, total ou par-cial, é exceção, que, no caso, não veio prevista” (CódigoCivil..., 2003, v. XVIII, p. 245). Concordamos integral-mente, mais uma vez, com os argumentos do professor daUSP e desembargador do TJSP.

Zeno Veloso segue o mesmo raciocínio, lecionandoque “sendo chamados à sucessão parentes colaterais doquarto-grau, segue-se a regra geral, e todos sucedem por

cabeça, não importando que alguns tenham duplo vínculocom o falecido e outros, vínculo singelo ou unilateral.Primos, tios-avós, sobrinhos-netos, que sejam parentes dohereditando por dupla linhagem, não terão, por essa cir-cunstância, nenhuma vantagem” ( Novo Código Civil...,2006, p. 1.539). Giselda Maria Fernandes Novaes

Hironaka contribui com a solução da questão. “A regra,portanto, é que chegando-se ao 4.º grau de vocação hered-itária, todos os primos serão chamados, como também ostios-avós e eventuais sobrinhos-netos do autor da herança,concorrendo todos eles em igualdades de condições. Issose deve ao fato de que não pode o intérprete da lei distin-guir onde o legislador não o fez” (Comentários..., 2003, v.

20, p. 247).

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Como última nota a respeito da sucessão do colateral,Silvio Rodrigues entendia que o legislador se revelava de-mais generoso ao chamar à sucessão o colateral de 4.ºgrau, não devendo ter ido além do 3.º ( Direito civil...,1995, v. 7, p. 12). O Projeto 634/1975 seguia tal orientação

e limitava os direitos sucessórios apenas ao colateral até3.º grau.

 A justificativa que se dá à proposta é que os parentesem quarto grau são, na grande maioria das vezes, muitodistantes do falecido e, não havendo convivência, nãohaveria também o afeto presumido, essencial à sucessão

legítima, que os habilitaria a receber a herança do falecido.Sobre o tema do parentesco em 4.º grau, cabe, ainda,

mencionar-se o Projeto de Lei 2.285/2007, de autoria doDeputado Sérgio Barradas Carneiro, chamado de Estatutodas Famílias, que pretende a completa revogação do Livrode Família do atual Código Civil. Em seu art. 12, o Estatutodas Famílias mantém o parentesco colateral até 4.º grau.

Em conclusão sobre o tema da sucessão na linhacolateral, observa-se que as regras existentes no CódigoCivil de 1916 são idênticas àquelas contida no Código Civilde 2002.

2.7 OS HERDEIROS NECESSÁRIOS

2.7.1 Quem são os herdeiros necessários?

Conforme foi explicado em mais de uma ocasião napresente obra, a liberdade de testar no direito brasileiro

não é ilimitada. Pelo contrário, tendo o falecido

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determinados parentes, o Código Civil limita o direito dedispor gratuitamente de seus bens.

Por essa estrutura, a existência dos chamados herdeir-os necessários limita o direito de doar (disposição   intervivos) e de testar (disposição   mortis causa). Caso adoação exceda aquilo que o doador poderia deixar portestamento, será chamada de inoficiosa e nula quanto aoexcedente (art. 549 do CC). Por outro lado, se houver in- vasão à legítima no testamento, verifica-se o instituto daredução das disposições testamentárias, conformeestudaremos no próximo capítulo da presente obra.

Mas quem são os herdeiros necessários? No sistemado Código Civil de 1916 os herdeiros necessários eram osdescendentes e os ascendentes (art. 1.721 do CC/1916). OCódigo Civil de 2002 estendeu a qualidade de herdeiro ne-cessário também ao cônjuge.

Os herdeiros necessários terão direito à legítima, tam-

 bém chamada de reserva legal , ou seja, a metade dos bensda herança (art. 1.846 do CC). Quando se fala em metadedos bens, por óbvio, trata a lei dos bens de propriedade dofalecido, devendo ser descontada eventual meação perten-cente ao cônjuge existente em decorrência do regime de bens. Exatamente por isso explicamos detalhadamente adiferença entre meação e sucessão.

Os demais herdeiros, ou seja, os parentes colaterais dofalecido e os companheiros são chamados de  herdeiros facultativos, já que não têm direito à legítima. Diferen-ciando as duas classes de herdeiros quanto aos efeitos, en-quanto os herdeiros necessários têm pleno direito à met-ade dos bens do falecido, só podendo ser dela privados por

meio de deserdação, os herdeiros facultativos só herdam

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se não houver ato de última vontade do testador em sen-tido contrário.

Nesse sentido, determina o art. 1.850 do CC em vigorque “para excluir da sucessão os herdeiros colaterais, basta que o testador disponha de seu patrimônio sem oscontemplar”. A regra é inútil e incompleta. Inútil porquese os colaterais não são herdeiros necessários, por óbvio basta que o testador elabore testamento sem os contem-plar para que eles automaticamente nada herdem. E in-completa porque se o companheiro também é herdeirofacultativo, deveria o dispositivo mencioná-lo em sua

redação.Na prática, se o testador falece sem descendentes, as-

cendentes ou cônjuge, pode testar ilimitadamente e dar aseus bens o destino que bem entender. Em outras palav-ras, não será o testador obrigado a deixar bens a seuscolaterais ou a seu companheiro, podendo testar em favorde terceiros a totalidade de seus bens.

Retomando, sintetizando e reunindo tudo o que foi ex-posto até este ponto da obra, os herdeiros podem ser di- vididos em duas classes: os legítimos (que são chamados asuceder pela ordem de vocação hereditária: arts. 1.790 e1.829 do CC) e os testamentários (que são chamados a su-ceder em razão de ato de última vontade do falecido).

Os herdeiros legítimos se dividem em   necessários(descendentes, ascendentes e cônjuge) e   facultativos(colateral até 4.º grau e companheiro). O gráfico abaixodemonstra essa classificação:

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Porém, com relação ao companheiro, em que pese adoutrina majoritária excluí-lo da condição de herdeiro ne-cessário, alguns autores entendem que o companheirotambém seria herdeiro necessário. São adeptos desta cor-rente minoritária Caio Mário da Silva Pereira, GiseldaMaria Fernandes Novaes Hironaka, Maria Berenice Dias eLuiz Paulo Vieira de Carvalho.

Em sentido oposto, consideram o companheiro comosendo herdeiro facultativo Christiano Cassettari, Eduardode Oliveira Leite, Francisco Cahali, Guilherme CalmonNogueira da Gama, Gustavo Rene Nicolau, Inácio de Car- valho Neto, Jorge Fujita, Maria Helena Daneluzzi, MárioDelgado, Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno, Se-

 bastião Amorim e Euclides de Oliveira, Sílvio de Salvo Venosa e Zeno Veloso (CAHALI, Francisco José. Família esucessões..., 2004, v. II, p. 329). Também são filiados aessa última corrente os presentes autores. Esse é o en-tendimento que deve ser considerado como majoritáriopara os devidos fins.

Como última nota a ser feita no tocante aos herdeirosnecessários, o PL 4.944/2005 pretendia devolver ao

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cônjuge a condição de   herdeiro facultativo   e não ne-cessário, alterando a redação do art. 1.845 do CC daseguinte forma: “ São herdeiros necessários os descend-entes e os ascendentes”. Havia argumentos favoráveis aoprojeto de lei, mas ele foi arquivado.

2.7.2 A legítima e a disponível

Em razão da existência de herdeiros necessários, opatrimônio do falecido se divide em duas partes: a   legí-tima  e a  quota disponível . Enquanto a primeira perten-

cerá aos herdeiros necessários, a segunda pode ser objetode testamento pelo falecido.

Como se calcula a legítima? Calcula-se a legítimasobre o valor dos bens existentes no momento da aberturada sucessão, abatidas as dívidas e as despesas do funeral,adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos a

colação (art. 1.847 do CC).O cálculo é feito da seguinte maneira, segundo Silvio

Rodrigues ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 125):

100% do patrimônio do falecido – valor de suasdívidas e despesas de funeral = X (herança

líquida)X (herança líquida) deve ser dividido por 2: X1 seráa disponível e a outra metade será X2.

Ao valor de X2 deverão ser somados os valores dosbens doados como antecipação de legítima (aquelesque não ficaram dispensados da colação). Ao finaldessa soma, chega-se ao valor da legítima.

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De qualquer forma, é correta a observação de Eduardode Oliveira Leite de que “o montante da legítima não seconhece no momento da abertura da sucessão, mas, tãosomente, no curso do inventário, quando será feita aavaliação definitiva do efetivo da herança”

(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 270).Com relação à legítima, não poderão os herdeiros ne-

cessários sofrer qualquer restrição ou limitação. Ilus-trando, se o pai falece e deixa como únicos herdeiros doisfilhos, cada um deles terá o direito a 25% dos bens a títulode legítima. Não poderia o pai, com relação à legítima,

deixar 49% dos bens a um filho e 1% ao outro.Já quanto à quota disponível, a liberdade de testar é

plena. A título de exemplo, se o pai quiser beneficiar umdos filhos com toda a sua quota disponível, poderá fazê-lo,pois o princípio da igualdade dos filhos se restringe ao val-or da legítima.

Portanto, tendo o pai como únicos herdeiros seus doisfilhos, sendo que um deles necessita mais de dinheiro doque o outro, poderá o pai, no tocante à disponível, deixá-la, por testamento, a apenas um dos filhos. Sua herançaficaria, então, dividida da seguinte forma:

Porção legítima (50% dos bens): 25% para o filhoJoão e 25% para o filho José;

Parte disponível (50% dos bens): por testamentodeixada apenas ao filho João.

Com relação à legítima, não só o falecido sofre limit-

ação no tocante a sua distribuição, pois esta

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necessariamente pertencerá aos herdeiros necessários.Também há limitações no direito de apor as cláusulas deincomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilid-ade, pois essas cláusulas apostas sobre a legítima devemser justificadas pelo testador (art. 1.848 do CC). Como úl-

tima nota a fazer, mesmo os bens da legítima clausuladospela inalienabilidade poderão ser excepcionalmente ven-didos desde que haja autorização judicial, e os novos bensficarão sub-rogados nos ônus dos primeiros (art. 1.848, §1.º, do CC). O tema está aprofundado no próximo capítulodesta obra.

Relativamente à parte disponível, esta poderá serclausulada de acordo com a vontade do testador sem quehaja necessidade de motivação ou justificação.

 Além de limitar as cláusulas em questão, o legisladordeterminou que “não é permitido ao testador estabelecer aconversão dos bens da legítima em outros de espécie di- versa” (art. 1.848, § 1.º, do CC). A  conversão significa queo testador determina em seu ato de última vontade a venda de bens deixados que devem ser trocados por out-ros. Exemplo disso se verificaria se fosse determinado àherdeira a venda da fazenda para a aquisição de títulos dadívida pública.

Segundo José Luiz Gavião de Almeida, a conversão se

daria se o testador “para melhor garantir a igualdade dosherdeiros, determinar a transformação dos bens em out-ros da mesma espécie, ou estabelecer que fossem sub-stituídos por outros de melhor ou mais fácil adminis-tração” (Código Civil..., 2003, v. XVIII, p. 263). Fica proi- bida, segundo Eduardo de Oliveira Leite, “a conversão de

 bens móveis em imóveis, ou vice-versa, de dinheiro em

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 bens, de imóveis urbanos em rurais ou vice-versa, de açõesnominativas em preferenciais” (Comentários..., 2004, v.XXI, p. 277).

Discussão que surgia na doutrina durante a vigênciado Código Civil de 1916, época em que a conversão erapermitida, era se primeiro os bens deveriam ser partilha-dos e depois convertidos ou primeiro convertidos e depoispartilhados. A discussão perdeu sua razão de ser pelaproibição ora vigente (art. 1.848, § 1.º, do CC/2002).

2.8 RESUMO ESQUEMÁTICODireito Sucessório no Novo Código Civil:

Casamento e União Estável Por Francisco José Ca-hali – Colaboração: Christiano Cassettari,

Eduardo Avian e Elisa Messias Paolucci

 Fonte:   Coletânea Orientações Pioneiras. In:  Família e Su-cessões no CC/2002-II , São Paulo: RT, 2006.

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(D) O valor correspondente a legado deixado a her-deiro necessário será abatido da parte que lhecouber na legítima.

(E) O direito de representação pode dar-se na linhaascendente.

3. (Ministério Público/PR – 2011) Antônio foi cas-ado com Cecília por 10 anos, sendo que docasamento adveio o nascimento de três filhos,Daniel, Elisa e Fabio. Cecília faleceu no últimodia 30 de novembro de 2009. Sem ter feito o in-ventário dos bens da sua falecida esposa e, por

conseguinte, sem ter dado partilha aos herdeirosdesta, Antônio se casou com Bruna no 1.º de janeiro de 2010, subordinando-se ao regime debens daí decorrente. No dia 10 de outubro de2010, nasce Helena, filha de Antônio com Bruna.No dia de hoje, Antônio vem a falecer. Diantedos fatos narrados, assinale a alternativacorreta:

(A) a herança de Antônio será dividida, em partesiguais, apenas entre os seus quatro filhos.

(B) a quarta parte da herança de Antônio caberá aBruna, sendo que os outros três quartos serão di-vididos igualmente entre os quatro filhos deAntônio.

(C) a herança de Antônio será dividida, em cincopartes iguais, ou seja, entre os seus quatro filhose a viúva.

(D) metade da herança de Antônio caberá a Helena,e a outra metade será dividida entre os três filhosadvindos do primeiro casamento.

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(E) Bruna terá direito à meação dos bens deixadospor Antônio, cabendo aos quatro filhos a divisãodo remanescente em partes iguais.

4. (TJ/SP 177.º) Sobre a sucessão legítima e a or-

dem da vocação hereditária, assinale a respostacorreta.

(A) Quando o cônjuge supérstite concorre à herançacom ascendentes do falecido, cabe-lhe a metadeda herança, mas se concorrer com um só ascend-ente ou estiver no segundo grau na linha ascend-ente de parentesco, cabem-lhe 2/3 (dois terços)

da herança.(B) O cônjuge supérstite concorre à herança com os

descendentes do de cujus, salvo se o casamentose deu pelo regime da separação total de bens;ou, se o foi pelo regime da comunhão parcial, ocônjuge falecido não houver deixado bens particu-lares seus.

(C) O cônjuge supérstite, quando concorre à herançacom descendentes do de cujus, terá direito aquinhão hereditário correspondente a 50% (cin-quenta por cento) do quinhão dos descendentesque sucederem por cabeça; a 1/4 (um quarto) daherança, quando a sucessão dos descendentes seder por estirpe.

(D) O cônjuge supérstite, qualquer que seja o regimedo casamento, concorre à herança com os as-cendentes do de cujus.

5. (TJ/SP 176.º) Analise as assertivas abaixo.

I – São herdeiros necessários os descendentes, os as-cendentes e o cônjuge.

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II – Quando todos os chamados a suceder renunciaremà herança, será ela desde logo declarada vacante.

III – Abre-se a sucessão no lugar onde situada a maiorparte dos bens do de cujus.

IV – O (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito, nasucessão, ao usufruto da metade dos bens do decujus, ainda que haja filhos deste ou filhos comuns.

Pode-se afirmar que as únicas assertivas verdadeirassão as dos itens

(A) I e III.

(B) II e IV.

(C) I e II.

(D) II e III.

6. (MP/SP 83.º) É correto reconhecer, que na faltade ascendentes e descendentes, a sucessão serádeferida totalmente ao cônjuge sobrevivente, se

ao tempo da morte do outro a sociedade con- jugal não estava dissolvida. Diante de tal assert-iva será acertado afirmar que

(A) na hipótese de o casamento ter sido celebradosob o regime da comunhão parcial, e não pos-suindo o morto bens particulares, o cônjugesobrevivente participa da herança, sem direito à

meação.(B) no regime de separação obrigatória, o cônjuge

sobrevivente figurará como meeiro e poderá,outrossim, ser herdeiro concorrente, por nãohaver impedimento legal nesse sentido.

(C) separado apenas de fato o casal quando da mortede um dos cônjuges, e estando cada um delesconvivendo com terceiro na época do falecimento,

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essa circunstância mostra-se como sendo in-transponível obstáculo para a obtenção do direitosucessório.

(D) quando em concurso com descendentes, o côn- juge sobrevivente só participará da herança do

outro se o regime de bens for o da separaçãovoluntária, ou da comunhão parcial de bensquanto aos bens particulares do morto, ou seja,aqueles que não entram na comunhão.

(E) se o cônjuge sobrevivente vier a concorrer comos genitores do de cujus, tocar-lhe-á metade daherança; se apenas com um descendente do

primeiro grau, um terço; se com ascendentes degrau maior, também a metade.

7. (Procurador do Estado/SP – FCC/2012) “A” eracasada sob o regime da comunhão parcial debens com “B”. “B” faleceu em 2011 e deixou umimóvel por ele adquirido antes do casamento,

usado como moradia do casal. Não há descend-entes, mas dois ascendentes em primeiro grauvivos. Neste caso,

(A) além de receber fração ideal de 1/3 do imóvelcomo herdeira necessária, “A” tem direito real dehabitação, que se constitui a partir do registro doformal de partilha no Cartório de Imóveis.

(B) “A” tem direito real de habitação, participa daherança na qualidade de herdeira necessária e re-cebe a metade ideal do imóvel, cabendo a cadaascendente fração ideal de 1/4 do bem.

(C) “A” tem direito real de habitação, cabendo a cadaherdeiro fração ideal de 1/3 do imóvel.

(D) por se tratar de bem incomunicável, “A” não par-ticipa da sucessão, mas tem direito real de

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habitação, cabendo a cada ascendente metadeideal do imóvel.

(E) em razão do regime de bens que regeu ocasamento, “A” tem direito ao usufruto da metadedo imóvel, cabendo, a cada herdeiro, fração ideal

de 1/3 do bem.

8. (VIII Exame de Ordem Unificado – FGV) Comrelação ao direito sucessório, assinale a afirm-ativa correta.

(A) O cônjuge sobrevivente, mesmo se constituirnova família, continuará a ter direito real de hab-

itação sobre o imóvel em que residiu com seufinado cônjuge.

(B) A exclusão por indignidade pode ocorrer a partirda necessidade de que o herdeiro tenha agidosempre com dolo e por uma conduta comissiva.

(C) A deserdação é forma de afastar do processo su-

cessório tanto o herdeiro legítimo quanto olegatário.

(D) Os efeitos da indignidade não retroagem à datada abertura da sucessão, tendo, portanto, efeitoex nunc .

9. (VII Exame de Ordem Unificado – FGV) Edgar,

solteiro, maior e capaz, faleceu deixando bens,mas sem deixar testamento e contando com doisfilhos maiores, capazes e também solteiros, Lú-cio e Arthur. Lúcio foi regularmente excluído dasucessão de Edgar, por tê-lo acusadocaluniosamente em juízo, conforme apurado naesfera criminal. Sabendo-se que Lúcio possui umfilho menor, chamado Miguel, assinale a altern-ativa correta.

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(A) O quinhão de Lúcio será acrescido à parte da her-ança a ser recebida por seu irmão, Arthur, tendoem vista que Lúcio é considerado como se mortofosse antes da abertura da sucessão.

(B) O quinhão de Lúcio será herdado por Miguel, seu

filho, por representação, tendo em vista que Lúcioé considerado como se morto fosse antes daabertura da sucessão.

(C) O quinhão de Lúcio será acrescido à parte da her-ança a ser recebida por seu irmão, Arthur, tendoem vista que a exclusão do herdeiro produz osmesmos efeitos da renúncia à herança.

(D) O quinhão de Lúcio se equipara, para todos osefeitos legais, à herança jacente, ficando sob aguarda e administração de um curador, até a suaentrega ao sucessor devidamente habilitado ou àdeclaração de sua vacância.

10. (VI Exame de Ordem Unificado – FGV) José,

solteiro, possui três irmãos: Raul, Ralph e Ran-dolph. Raul era pai de Mauro e Mário. Mário erapai de Augusto e Alberto. Faleceram, em virtudede acidente automobilístico, Raul e Mário, nadata de 15/4/2005. Posteriormente, José veio afalecer em 1.º/5/2006. Sabendo-se que a her-ança de José é de R$ 90.000,00, como ficará a

partilha de seus bens?(A) Como José não possui descendente, a partilha

deverá ser feita entre os irmãos. E, como não hádireito de representação entre os filhos de irmão,Ralph e Randolph receberão cada um R$45.000,00.

(B) Ralph e Randolph devem receber R$ 30.000,00

cada. A parte que caberá a Raul deve ser

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repartida entre Mauro e Mário. Sendo Máriopremorto, seus filhos Alberto e Augusto devemreceber a quantia que lhe caberia. Assim, Maurodeve receber R$ 15.0000,00, e Alberto e Augustodevem receber R$ 7.500,00 cada um.

(C) Ralph e Randolph receberão R$ 30.000,00 cadaum. O restante (R$ 30.000,00) será entregue aMauro, por direito de representação de seu paipremorto.

(D) Ralph e Randolph receberão R$ 30.000,00 cadaum. O restante, na falta de outro colateral vivo,será entregue ao Município, Distrito Federal ou

União.

11. (TJ/SP – 182.º) Quanto ao direito sucessóriobrasileiro, a família matrimonial e a famíliafundada na união estável diferem

(A) apenas em relação à participação do sobreviventena legítima e à influência do momento de

aquisição do bem herdado pelo sobrevivente.(B) apenas em relação à situação do sobrevivente na

ordem de vocação hereditária, à influência do mo-mento de aquisição do bem herdado pelo sobre-vivente e à concorrência com os demaisherdeiros.

(C) apenas em relação à influência do momento deaquisição do bem herdado pelo sobrevivente e àconcorrência com os demais herdeiros.

(D) em relação à participação do sobrevivente nalegítima, à influência do momento de aquisição dobem herdado pelo sobrevivente, à situação dosobrevivente na ordem de vocação e à concorrên-

cia com os demais herdeiros.

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12. (TJ/SP – 182.º) O direito de representação

(A) verifica-se na linha reta descendente eascendente.

(B) inexiste na linha colateral.

(C) implica divisão por estirpe.(D) implica divisão por cabeça.

13. (TJ/MG – 2009) Marque a opção CORRETA.José, solteiro e sem deixar descendentes e as-cendentes, falece, deixando a inventariar aquantia de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais).

Duas irmãs lhe sobrevivem, bem como duassobrinhas e um sobrinho neto (filho de umasobrinha premorta), assinalando-se que essessobrinhos descendem de um irmão premorto deJosé. Então, concorrerão à sucessão:

(A) somente as irmãs vivas de José.

(B) todos os parentes acima citados, inclusive osobrinho-neto, porque, na hipótese, a sucessão sedefere até o quarto grau de parentesco, herdandotodos em partes iguais, por representação.

(C) as irmãs de José e as filhas do irmão premorto,estas por representação. O sobrinho neto nãoherdará. A herança será dividida em 3 (três)partes iguais. As irmãs do falecido herdam porcabeça e as sobrinhas por estirpe.

(D) todos os parentes acima citados, inclusive osobrinho-neto, sendo que a herança será divididaem 4 (quatro) partes iguais. As irmãs do falecidoherdarão uma parte cada uma e as sobrinhas e osobrinho-neto a outra parte, que será divididaentre eles em partes iguais.

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14. (Magistratura/PR – 2012) Sobre o direito dassucessões, assinale a alternativa correta.

(A) De acordo com o Código Civil, é permitido queseja feito testamento conjuntivo.

(B) Ao cego só se permite o testamento público.

(C) Quando a cláusula testamentária for suscetível devárias interpretações, subsistirá a que melhor as-segure a observância dos direitos dos herdeiros.

(D) É anulável a disposição que deixe a arbítrio doherdeiro, ou de outrem, fixar o valor do legado.

15. (MP/RN – 2009) Com relação ao direito dasobrigações, da família, das sucessões e da pro-priedade imaterial, assinale a opção correta.

(A) Em decorrência do direito de representação, osdescendentes de herdeiro excluído sucedem nolugar deste.

(B) Caducará o legado se o legatário falecer depoisdo legante.

(C) O fideicomisso poderá abranger, no todo ou emparte, a legítima fideicomitente.

(D) Direitos patrimoniais do autor são aqueles emque se reconhece a paternidade da obra, sendo,portanto, inseparáveis de seu autor, perpétuos,

inalienáveis, imprescritíveis e impenhoráveis.(E) O aval posterior ao vencimento do título de

crédito é ineficaz.

16. (MP/PE – 2008) Concorrendo à herança do fa-lecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais,

(A) todos herdarão em partes iguais.

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(B) cada um destes herdará metade do que cada umdaqueles herdar.

(C) somente herdarão os irmãos unilaterais.

(D) somente herdarão os irmãos bilaterais.

(E) estes somente herdarão se habitarem imóvel dofalecido.

17. (26.º Procurador da República – MPF 2012) Emmatéria de sucessões:

(A) Ao cônjuge supérstite cabe sempre, em primeirolugar, a investidura na inventariança;

(B) Havendo testamento contemplando o primeirofilho, o Código Civil dispõe que, nascendogêmeos, serão estes considerados de igual idadepara tal fim;

(C) A declaração de vacância, quando não aparecer-em herdeiros, incorpora a herança definitiva-mente ao patrimônio público;

(D) A indignidade do herdeiro é uma pena e, se elefalecer antes da sua declaração por sentença, seudireito hereditário passa aos sucessores.

18. (OAB Nacional 2009 – I) A respeito do direitodas sucessões, julgue os itens subsequentes. I –O herdeiro necessário não perderá o direito àlegítima se também lhe forem deixados bens emtestamento que constituam a parte disponível dotestador. II – No casamento putativo, o cônjugede boa-fé sucederá o falecido se a sentença anu-latória do casamento for posterior à morte docônjuge de cuja sucessão se trata. III – OCódigo Civil, em se tratando de sucessão legí-

tima, assegura ao cônjuge sobrevivente, caso o

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casamento tenha sido efetuado no regime dacomunhão universal de bens, o direito de con-corrência com os descendentes do autor da her-ança. IV – O testamento pode ser feito direta-mente pelo representante legal do testador. A

quantidade de itens certos é igual a(A) 1.

(B) 2.

(C) 3.

(D) 4.

19. (VUNESP/Magistratura/RJ/2012) Consider-ando as disposições positivadas no Código Civil,é correto afirmar sobre a sucessão dosascendentes:

(A) Na falta de descendentes, são chamados à su-cessão os ascendentes em concorrência com ocônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o

falecido no regime da comunhão universal, parti-cipação final nos aquestos, ou da separaçãoobrigatória de bens se, no regime da comunhãoparcial, o autor da herança houver deixado bensparticulares.

(B) Na falta de descendentes, são chamados a su-ceder os ascendentes em concorrência com o côn-

 juge ou companheiro sobrevivente, salvo se cas-ado este com o falecido no regime da comunhãoparcial de bens, ou da separação obrigatória,desde que haja bens particulares.

(C) Havendo igualdade em grau e diversidade emlinha, os ascendentes da linha paterna herdam ametade, cabendo a outra aos da linha materna.

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(D) Concorrendo com ascendente em primeiro grau,ao cônjuge tocará a metade da herança; caber-lhe-á um quarto desta se houver um só ascend-ente ou se maior for aquele grau.

20. (PGE/PE – 2009) Acerca da disciplina jurídicada sucessão legítima e testamentária, assinale aopção correta.

(A) Podem ser nomeados legatários o concubino dotestador casado, bem como o filho de ambos.

(B) Na sucessão testamentária, podem ser chamadosa suceder os filhos, ainda não concebidos, de

pessoas indicadas pelo testador, desde que estasestejam vivas ao abrir-se a sucessão.

(C) A renúncia à herança pode ser tácita, tendo eficá-cia a partir do momento em que for exarada a de-claração de vontade informal.

(D) A declaração de vacância da herança, em razão

da não identificação de herdeiros, determina a in-corporação da herança ao patrimônio do estadofederado onde faleceu o autor da herança.

(E) No casamento, diante da ausência de descend-entes ou de ascendentes, defere-se a herança aocônjuge sobrevivente em concorrência com oscolaterais.

21. (MP/SE – CESPE/2010) Assinale a opção cor-reta com relação às sucessões legítima etestamentária.

(A) Considere a seguinte situação hipotética. José,viúvo, faleceu sem deixar testamento conhecido.Deixou quatro filhos (sendo um premorto) e três

netos (descendentes do filho premorto). Nessa

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situação, no caso de concorrência entre irmãos esobrinhos (estes filhos do irmão premorto), osprimeiros sucederão por cabeça, e os últimos, porestirpe. Por isso, a herança deverá ser divida emquatro partes iguais, subdividindo-se uma delas

entre os três sobrinhos.(B) Considere a seguinte situação hipotética. Alinevivia em união estável com Jorge, o qual possuíaum imóvel adquirido antes do início dessa união,época em que esse bem foi avaliado em R$100.000,00. Na constância da união, o casalvendeu o imóvel de propriedade de Jorge e, com

os recursos advindos das poupanças de ambos,adquiriu outro imóvel no valor de R$ 400.000,00.Nessa situação, se Jorge falecer sem deixar par-entes sucessíveis, Aline terá direito a recolher aherança em sua totalidade.

(C) O herdeiro que não foi parte no processo de in-ventário pode recorrer a ação de nulidade e

pleitear seu quinhão hereditário, no prazo prescri-cional de um ano, a contar do trânsito em julgadoda ação que homologou a partilha.

(D) A sucessão por direito de representação pres-supõe que o herdeiro necessário, ascendente oudescendente em linha reta tenha morrido antesda abertura da sucessão para a qual se habilit-

aram os representantes.(E) O testamento é ato personalíssimo e que não

pode ser modificado após declaração de vontadedo testador.

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GABARITO

1 – D 2 – B 3 – A

4 – D 5 – C 6 – D

7 – C 8 – A 9 – B

10 – C  11 –

D   12 – C

13 – C 14 – B 15 – A

16 – B   17 –D   18 – B

19 – C 20 – B 21 – A

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SUCESSÃOTESTAMENTÁRIA

Sumário:  3.1 Dos testamentos emgeral e da capacidade de testar:3.1.1 Dos testamentos em geral;3.1.2 Da capacidade de testar – 3.2Das formas ordinárias de testamentoe suas regras gerais: 3.2.1 Do testa-mento público; 3.2.2 Do testamento

cerrado; 3.2.3 Do testamento partic-ular – 3.3 Dos testamentos especi-ais: 3.3.1 Do testamento marítimo edo testamento aeronáutico; 3.3.2Do testamento militar – 3.4 Apolêmica do testamento vital ou bio-lógico – 3.5 Dos codicilos – 3.6 Das

disposições testamentárias: 3.6.1Regras interpretativas; 3.6.2 Regras

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proibitivas e restritivas – da cláusulade inalienabilidade; 3.6.3 Regraspermissivas – 3.7 Dos legados:3.7.1 Noções gerais; 3.7.2 Das mod-alidades de legado; 3.7.3 Dos efei-

tos do legado – 3.8 Do direito deacrescer entre herdeiros e legatári-os: 3.8.1 Conceito de direito deacrescer e regramentos básicos;3.8.2 Regras quanto ao direito deacrescer constantes do Código Civilem vigor – 3.9 Das substituiçõestestamentárias. Conceitos iniciais e

espécies: 3.9.1 Da substituição vul-gar ou ordinária; 3.9.2 Da substitu-ição fideicomissária – 3.10 Da re-vogação do testamento, de sua nul-idade e caducidade: 3.10.1 Da nulid-ade absoluta ou relativa do testa-mento; 3.10.2 Revogação do testa-

mento; 3.10.3 Da caducidade dotestamento – 3.11 Da redução dasdisposições testamentárias e dorompimento do testamento: 3.11.1Conceito de redução das disposiçõestestamentárias; 3.11.2 Do rompi-mento do testamento – 3.12 Dotestamenteiro: 3.12.1 Espécies e re-gras gerais; 3.12.2 Das funções dotestamenteiro; 3.12.3 Do direito àvintena; 3.12.4 Da extinção da test-amentária – 3.13 Resumo es-quemático – 3.14 Questões correl-atas – Gabarito.

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3.1 DOS TESTAMENTOS EM GERAL E DA CAPACIDADE DE TESTAR 

3.1.1 Dos testamentos em geral

Estudadas as regras da sucessão legítima, o CódigoCivil cuida, então, da sucessão testamentária. Como out-rora demonstrado até de forma exaustiva, enquanto na su-cessão legítima os bens do falecido seguem a ordem de vo-cação hereditária prevista nos confusos arts. 1.829 e 1.790do CC, em se tratando de sucessão testamentária a vont-ade do morto é que determinará o encaminhamento dosseus bens.

É claro que a vontade não será absoluta, mas sim ex-plicitada dentro de limites previstos pela lei, que, caso in-observados, podem gerar vícios insanáveis e a nulidade doato de última vontade. Como se sabe, o princípio da auto-

nomia privada, que rege a vontade da pessoa humana, vem encontrando limites previstos na legislação, princip-almente em normas de ordem pública.

Não traz o Código Civil o conceito de testamento. Orevogado diploma dizia que testamento é “o ato revogávelpelo qual alguém, de conformidade com a lei, dispõe, no

todo ou em parte, do seu patrimônio, para depois da suamorte” (art. 1.626 do CC/1916). A ausência de definição nonovo diploma segue a ideia segundo a qual não cabe ao le-gislador dar conceitos dos institutos. Mesmo porque, aoconceituar o testamento, severas críticas sofreu o diplomarevogado, eis que a doutrina considerava incompleta adefinição contida no art. 1.626. Pondera Silvio Rodrigues

que as críticas existiam “não só por omitir a circunstância

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de ser o testamento ato pessoal, unilateral, solene e gra-tuito, como também por circunscrever o objeto do testa-mento à mera disposição de bens” ( Direito civil..., 2002, v.7, p. 145).

De qualquer modo, é importante apontar que o novoCódigo Civil adota o princípio da operabilidade, sendo umde seus sentidos a facilitação da interpretação do DireitoPrivado. Um dos sinais dessa facilitação é justamente aconceituação dos institutos pela norma jurídica, o que sepercebe por vezes na codificação. Não foi o que aconteceucom o testamento, cabendo à doutrina conceituá-lo.

Se é verdade que a grande maioria dos dispositivos delei relacionados com o testamento cuida de disposiçõespatrimoniais, não é verdade que o testamento não possaconter disposição de outra natureza. Pode o testador, pormeio do ato de última vontade, reconhecer o filho, por ex-emplo (art. 1.609, III, do CC). Mesmo assim, o fortecaráter patrimonial do instituto se revela quando o legis-lador inicia o tratamento da matéria determinando quetoda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalid-ade de seus bens, ou de parte deles, para depois de suamorte (art. 1.857 do CC/2002).

Pois bem, na classificação dos fatos jurídicos humanoslícitos, esclarecemos que esses são de três tipos:

a) Atos-fatos jurídicos – são aqueles fatos em que a vontadedo agente que os pratica é desprezada pelo direito, queapenas se preocupa com seus efeitos. Em outras palavras,trata-se de um fato jurídico qualificado por uma vontadenão relevante juridicamente. A questão da incapacidadedo agente não é considerada, eis que o importante são as

consequências fáticas. Podem ser citados como exemplos

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desses atos-fatos os atos materiais ou reais que sãosimples atuações humanas tendentes a produzir efeitos

 jurídicos previstos em lei, caso da descoberta de um te-souro e da especificação (arts. 1.269 a 1.271 do CC em

 vigor).

 b) Atos jurídicos em sentido estrito ou   stricto sensu   –aqueles que geram consequências jurídicas que estãosomente previstas em lei. A vontade do agente é despresti-giada, pois apenas participa da formação do ato, mas nãode suas consequências. Um bom exemplo é o reconheci-mento de filho, uma vez que após o pai reconhecer a cri-ança, todas as consequências advêm da lei, sendo que a

 vontade do pai não pode regulamentar aqueles efeitos deforma diversa. Os atos jurídicos em sentido estrito estãotratados pelo art. 185 do atual Código Civil, que prevê aaplicação a eles dos dispositivos relativos aos negócios

 jurídicos, no que couber.

c) Negócios jurídicos – as partes celebram o ato com intuitode alcançar um efeito jurídico determinado. É a de-

claração de vontade em que o agente persegue determ-inado efeito jurídico. Dessa forma, os sujeitos de direitopodem regular, nos limites legais, seus interesses particu-lares. Como outrora afirmou um dos autores dessa obra, onegócio jurídico é “toda ação humana, de autonomiaprivada, com a qual os particulares regulam por si ospróprios interesses, havendo uma composição de vont-ades, cujo conteúdo deve ser lícito” (TARTUCE, Flávio.

 Direito civil..., 2009, v. 1, p. 322).

Por tais conceitos, dúvida não há de que são exemplosclássicos de negócio jurídico o contrato e o testamento. A grande diferença entre eles está na natureza jurídica e naprodução de efeitos. Sobre a natureza jurídica do institutoé importante enfatizar que o testamento é negócio

 jurídico:

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a) Unilateral – porque se aperfeiçoa com uma única vont-ade. Basta a vontade do declarante (testador) para que onegócio produza efeitos jurídicos. A aceitação ou renúnciados bens deixados manifestada pelo beneficiário do testa-mento é irrelevante.

 b) Gratuito – pois não existe vantagem para o autor da her-ança. Não se trata de um negócio jurídico oneroso, nãohavendo qualquer remuneração ou contraprestação para aaquisição dos bens.

c)  Mortis causa –  pois só produz efeitos após a morte dotestador; antes dela o testamento é ato ineficaz. Dequalquer forma, antes da morte do testador, o testamento

existe (plano da existência), é válido (se seguir as formal-idades prescritas em lei – plano da validade) e apenas éineficaz (plano da eficácia). Fazendo confrontaçãoimportante, lembre-se que o contrato é o negócio jurídicointer vivos por excelência, pois produz efeitos, em regra, apartir da celebração.

d) Formal – pois a lei contém todas as formalidades ne-

cessárias à validade do negócio jurídico. Faltando as form-alidades, a sanção será a nulidade do testamento, nos ter-mos do art. 166, IV e V, do atual Código.

e) Revogável – porque o falecido pode revogá-lo oumodificá-lo a qualquer momento. Qualquer cláusula pre-

 vendo a irrevogabilidade será considerada nula e nãoproduzirá efeitos, nos termos do art. 1.858 do Código em

 vigor.f) Ato personalíssimo – porque ninguém poderá testar con-

 juntamente em um mesmo instrumento ou mesmo porprocuração. Se mais de uma pessoa testar em um mesmoinstrumento, o testamento é nulo, pois o mesmo art. 1.858enuncia que o testamento é ato personalíssimo.

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Reunindo essas características, imperioso anotar queo Código Civil português define o testamento como sendoo ato unilateral revogável pelo qual uma pessoa dispõe,para depois de sua morte, de todos os seus bens ou partedeles. As disposições de caráter não patrimonial que a lei

permite inserir no testamento são válidas se fizerem partedo ato revestido da forma testamentária, ainda que nelenão figurem disposições patrimoniais (art. 2.179 do CCportuguês).

Em nossa opinião, o testamento é um negócio jurídicounilateral, personalíssimo e revogável, pelo qual o testa-

dor faz disposições de caráter patrimonial ou não, paradepois de sua morte. Esse seria um conceito interessante edidático para as provas em geral e para a práticasucessória.

Não existe relação necessária entre testamento e pat-rimônio. Nada impede que o testador só mencionequestões patrimoniais em seu ato de última vontade;pode, também, nada dizer a esse respeito. Por fim, o testa-mento pode conter os dois tipos de disposições: de caráterpatrimonial e não patrimonial (art. 1.857, § 2.º, do CC).

Em termos patrimoniais, conforme já explicado à ex-austão, em havendo herdeiros necessários, não pode odisponente testar ou legar parte dos bens que invada alegítima   (art. 1.857, § 1.º, do CC). Caso o testamentoabarque a legítima, poderemos estar diante de redução dasdisposições testamentárias ou de rompimento do testa-mento, conforme será estudado em momento oportuno.

Em termos não patrimoniais, explica Zeno Veloso queo testamento pode ser feito para “o reconhecimento de fili-

ação, a deserdação, a reabilitação do indigno, a nomeação

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do tutor para filhos menores, de testamenteiro, a confissãoa respeito de qualquer fato, dar instruções sobre o seu fu-neral, determinar sufrágios por almas, dispor de uma oude várias partes do corpo para fins terapêuticos e revogartestamento anterior. São disposições autônomas, não pat-

rimoniais, embora algumas delas de reflexos patrimoniais”(Comentários..., 2003, v. 21, p. 3). Lembramos, ainda, quepor testamento pode-se criar uma fundação (art. 62 doCC), instituir um condomínio edilício (art. 1.332 do CC) ouuma servidão (art. 1.378 do CC), bem como criar bem defamília voluntário ou convencional (art. 1.711 do CC).

Para terminar a presente seção, lembre-se de que,desde o direito romano, entende-se que a vontade do test-ador deve prevalecer sobre a sucessão legítima, buscandodar cumprimento ao ato de última vontade. É o chamado favor testamenti .

3.1.2 Da capacidade de testar

 A capacidade para testar não se confunde com a capa-cidade genérica para a prática dos atos da vida civil emgeral. Isso porque, segundo o Código Civil, não podem te-star os relativa ou os absolutamente incapazes. A con-sequência da incapacidade é a nulidade do testamento,

nos termos do art. 166, I, do atual Código.Deve-se, contudo, ressalvar que o menor púbere, com

16 anos completos, é relativamente capaz nos termos doart. 4.º, I, da codificação em vigor, mas poderá testar vali-damente (art. 1.860, parágrafo único, do CC), e sem a ne-cessidade de qualquer assistência de seus pais ou tutores.

 Aliás, se a assistência fosse necessária, o caráter

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personalíssimo e revogável do testamento estaria bastantecomprometido, o que até poderia ser tido como motivo denulidade do testamento, pelo que consta do citado art.1.858 do Código Civil.

 Além disso, aqueles que forem legal ou voluntaria-mente emancipados poderão testar validamente, pois ad-quirem a capacidade plena por força da própria eman-cipação (art. 5.º, parágrafo único, I, do CC).

Também não poderão testar aqueles que, apesar de juridicamente capazes, não tiverem pleno discernimento(art. 1.860 do CC). Assim, alargam-se as situações de inca-

pacidade. Como é cediço, as incapacidades em razão dedoenças ou vícios (drogas, álcool) necessitam de de-claração judicial, ou seja, o seu reconhecimento não éautomático. Desse modo, imagine-se a situação de de-terminada pessoa muito idosa e com graves problemas deesclerose que não tenha sido judicialmente interditada edeclarada incapaz. Nesse caso, será civilmente capaz, maspela falta de discernimento será incapaz para a prática dotestamento.

Entretanto, o Código Civil cometeu flagrante equívocoao não esclarecer com precisão o alcance do seu art. 1.860.Pela leitura, poder-se-ia concluir, por exemplo, que osébrios ou toxicômanos (relativamente incapazes) não po-

dem fazer testamento. Pondera Zeno Veloso que “não hárazão para se decidir que os ébrios habituais, os viciadosem tóxico e os que, por deficiência mental, tenham o dis-cernimento reduzido (reduzido, note-se bem) sejam proi- bidos de testar. Quanto a estes últimos, se, apesar de re-duzido, diminuído o discernimento, tenham entendimento

ou compreensão suficiente para saber o que estão fazendo

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no momento em que outorgam a disposição de última vontade, isso é bastante e vale o testamento. E o ébrio ha- bitual pode estar sóbrio quando testa; o viciado em tóxicopode estar livre do poder das drogas no momento em quedispõe causa mortis” (Comentários..., p. 30).

 Além disso, parece curioso, por exemplo, a eventualdeterminação pela qual o pródigo não possa testar livre-mente. Nesse sentido, o próprio Código Civil, em seu art.1.782, não prevê o testamento entre os atos que não po-dem ser praticados sem assistência por este incapaz. Etambém não haveria razão para tanto, tendo em vista que

a proteção do pródigo visa a impedir que este atinja umestado de miserabilidade e passe a depender dos amigos,parentes ou do Estado. Em suma, entendemos que opródigo poderá testar livremente, não sendo consideradoincapaz nos termos do art. 1.860 do Código em vigor. Essetambém é o entendimento majoritário da doutrina.

Para corrigir os desacertos apontados, o Projeto 699/2011, antigo PL 6.960/2002, de autoria original dodeputado Ricardo Fiuza, pretende alterar o art. 1.860, quepassaria a ter a seguinte redação: “Além dos absoluta-mente incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem o necessário discernimento”. A justificativada proposta, segundo o saudoso Deputado Fiuza, é que

“trata-se de um equívoco que precisa ser corrigido,sabendo-se que o testamento outorgado por incapaz énulo de pleno direito. Não há razão para proibir que osébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por defi-ciência mental, tenham discernimento reduzido, sejamproibidos de testar se, apesar de reduzido, tem entendi-mento e compreensão suficiente para saber o que estão

fazendo, no momento em que outorgam a disposição de

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última vontade” (FIUZA, Ricardo.  O novo Código Civil eas propostas..., 2004, p. 303). Concorda-se integralmentecom a proposta, diante do seu tom didático e esclarecedor,filiado à doutrina majoritária.

Não podem testar, ainda, as pessoas jurídicas, pois aprerrogativa de elaborar atos de última vontade é exclu-siva das pessoas naturais. Nesse sentido, explica Itabaianade Oliveira que “a capacidade de testamentária ativa é umdireito das pessoas naturais, que se não estende às pessoas jurídicas, porque, se elas são perpétuas, não estão sujeitasao acidente da morte, e, se são temporárias, a sua ex-

tinção, que é um fenômeno essencialmente diverso damorte, é um acontecimento previsto, que, de modo algum, justificaria a disposição de bens por testamento”(Tratado..., 1952, v. 2, p. 410).

Questão importante a ser apontada é que a lei querege a capacidade de testar é aquela do momento em que otestamento é elaborado e não do momento da abertura dasucessão, quando a disposição de última vontade produzefeitos. Dessa forma, se o testador com plena capacidadecivil elabora um testamento e posteriormente se torna in-capaz, o testamento é considerado válido. Por outro lado,se pessoa incapaz elabora um testamento e, posterior-mente se torna capaz, o testamento continua sendo nulo.

Nesse sentido é a determinação do art. 1.861 do atualCódigo Civil, pelo qual a incapacidade superveniente dotestador não invalida o testamento, nem o testamento doincapaz se valida com a superveniência da capacidade.

 Vale lembrar que, visando resolver questões de direitointertemporal, determina o Código Civil de 2002 que a lei

do momento da conclusão do negócio jurídico é aquela

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que deve ser aplicada para a verificação de sua validade(art. 2.035, caput ). Trata-se da aplicação do princípio tem- pus regit actum.

Portanto, a capacidade testamentária para os testa-mentos elaborados na vigência do Código Civil de 1916 de- verá seguir o disposto no art. 1.627 daquele Código,mesmo que a morte do testador tenha ocorrido na vigên-cia do Código Civil de 2002. Por fim, para aqueles queelaboraram seus testamentos a partir de 11 de janeiro de2003, data da entrada em vigor do novo Código Civil, a ca-pacidade testamentária ativa se verifica à luz do disposto

no art. 1.860 do atual Código Civil.

3.2 DAS FORMAS ORDINÁRIAS DETESTAMENTO E SUAS REGRASGERAIS

 As  formas ordinárias  ou  comuns  de testar são tam- bém conhecidas por   formas comuns  ou  vulgares, e sãoelas, segundo o art. 1.862 do CC:

a) o testamento público (arts. 1.864 a 1.867 do CC);

 b) o testamento cerrado (arts. 1.868 a 1.875 do CC); e

c) o testamento particular (arts. 1.876 a 1.880 do CC).

 A essas formas ordinárias se opõem as chamadas formas extraordinárias  ou  especiais, que são admitidaspelo legislador excepcionalmente e nos casos especifica-mente admitidos por lei: os testamentos militar, marítimo

e aeronáutico.

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Como questão jurídica importante, se não foremseguidas as formas previstas em lei, o testamento seránulo, não se admitindo no Brasil a ampla liberdade deopção, ou seja, a autonomia privada plena para testar.Pelo contrário, se o testamento não seguir alguma das

modalidades em estudo, será considerado nulo e nãoproduzirá os efeitos almejados pelo testador.

Exemplificando, não se admite o chamado testamentonuncupativo em que o testador verbalmente narra perantetestemunhas sua última vontade, quando está prestes amorrer. A lei só admite o casamento nuncupativo (in ex-

tremis) e o testamento militar nuncupativo para os feridosem guerra (art. 1.896 do CC). Assim, se João, percebendoque a morte está próxima, reúne em seu leito seus filhos eexpõe sua última vontade, o testamento será nulo de plenodireito (nulidade absoluta, por infringência à forma ou àssolenidades prescritas – art. 166, IV e V, do CC). Nessahipótese, a sucessão passará a ser a legítima, seguindo a

ordem prevista no art. 1.829 do CC. A solenidade é essencial para a validade do testamento

em razão de sua importância, estando no segundo degrauda Escada Ponteana. Lembramos que a Escada Ponteanaestá de acordo com a concepção de Pontes de Mirandaquanto à divisão do negócio jurídico em três planos: plano

da existência (1.º degrau), plano da validade (2.º degrau) eplano da eficácia (3.º degrau).

Como o testamento altera o destino da herança eafasta a vocação hereditária, o legislador é muito rígidoquanto às formalidades necessárias para a sua validade, demodo a garantir que realmente a vontade ali contida seja a

do falecido. Vale dizer que, como a questão é de ordem

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pública, essa nulidade poderá ser declarada de ofício pelo juiz (art. 168, parágrafo único, do CC). Além disso, a nulid-ade não é sanada pelo decurso de prazo (art. 169 do CC),sendo a ação correspondente para pleitear a nulidade doato de natureza imprescritível.

De qualquer forma, interessante comentar que o Su-perior Tribunal de Justiça mitigou a exigência das formal-idades, admitindo que o testamento fosse provado pela viatestemunhal. Elucidativa a transcrição desse importante julgado, conforme o   Informativo   n.   295   daquele E.Tribunal:

“O Tribunal a quo assentou que o testador estava em seu juízo perfeito, que elaborou o testamento por livre e es-pontânea vontade e confirmou a autenticidade daassinatura. Em momento algum, os ora recorrentesalegaram que houve falsidade na assinatura ou que o testa-mento não refletia a vontade do de cujus. Contestou a inob-servância na formalidade (art. 1.876, § 2.º, CC/2002) para aconfecção do ato, qual seja, a falta de leitura do testamentoperante as três testemunhas reunidas concomitantemente.Então, a Turma não conheceu do recurso, por entender que,apesar de ser um ato solene, não se deve priorizar a formaem detrimento da vontade do testador. Ademais, na espécie,foi o próprio testador que levou o documento para as trêstestemunhas assinarem, restando induvidosa sua vontade”

(STJ, REsp 828.616-MG, Rel. Min. Castro Filho, j.05.09.2006).

 A mitigação das formalidades do testamento pareceser a tendência daquele Tribunal Superior, que tem priv-ilegiado a vontade do testador. A título contínuo deilustração, colaciona-se acórdão assim publicado no seu

 Informativo n. 435 :

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“Testamento. Formalidades. Extensão. Busca-se, no re-curso, a nulidade de testamento, aduzindo o ora recorrenteque a escritura não foi lavrada pelo oficial de cartório, maspor terceiro, bem como que as cinco testemunhas não acom-panharam integralmente o ato. O tribunal  a quo   afirmouque não foi o tabelião que lavrou o testamento, mas isso foifeito sob sua supervisão, pois ali se encontrava, tendo, in-clusive, lido e subscrito o ato na presença das cincotestemunhas. Ressaltou, ainda, que, diante da realidade dostabelionatos, não se pode exigir que o próprio titular, em to-dos os casos, escreva, datilografe ou digite as palavras dita-das ou declaradas pelo testador. Daí, não há que declararnulo o testamento que não foi lavrado pelo titular da serven-

tia, mas possui os requisitos mínimos de segurança, deautenticidade e de fidelidade. Quanto à questão de as cincotestemunhas não terem acompanhado integralmente a lav-ratura de testamento, o TJ afirmou que quatro se faziampresentes e cinco ouviram a leitura integral dos últimosdesejos da testadora, feita pelo titular da serventia. Assim, aTurma não conheceu do recurso por entender que o vício

formal somente invalidará o ato quando comprometer suaessência, qual seja, a livre manifestação da vontade da testa-dora, sob pena de prestigiar a literalidade em detrimento daoutorga legal à disponibilização patrimonial pelo seu titular.Não havendo fraude ou incoerência nas disposições de úl-tima vontade e não evidenciada incapacidade mental datestadora, não há falar em nulidade no caso. Precedentecitado: REsp 302.767-PR, DJ 24/9/2001” (STJ, REsp600.746/PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j.20.05.2010).

Deve-se frisar que será nulo o contrato que tiver porobjeto a herança de pessoa viva (art. 426 do CC), diante daconhecida divisão entre os atos inter vivos e mortis causa.São os chamados pactos sucessórios ( pacta corvina), con-ceito tradicional do Direito Civil, com origem romana. A 

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título de exemplo, se em um contrato de união estável es-tabelecerem os companheiros regras patrimoniais para ahipótese de falecimento de um deles, a cláusula será nulapor ferir norma de ordem pública. O caso é de  nulidadevirtual , pois a lei proíbe o ato sem cominar sanção (art.

166, VII, do CC).Como decorrência da regra de separação dos atos

inter vivos e mortis causa, o Código Civil proíbe o testa-mento conjuntivo, seja  simultâneo,  recíproco  ou  corres- pectivo (art. 1.863 do CC).

O testamento conjuntivo ou de mão comum é aquele

feito per mais de uma pessoa no mesmo instrumento. Narealidade, a proibição desse tipo de testamento não temrelação com a forma, mas sim com o fato de o legisladorentender que o testamento é ato personalíssimo e que nãopode ser feito por duas pessoas, sob pena de assumircaráter contratual repudiado pelo ordenamento e lhe retir-ar uma de suas principais características: a pessoalidade ea revogabilidade a qualquer tempo.

Explica Silvio Rodrigues que o testamento “será sim-ultâneo, quando os testadores dispõem em benefício deterceiros; recíproco quando os testadores instituem um aooutro como herdeiros, de modo que o sobrevivente recolhaa herança do outro; e  correspectivo  quando o benefício

outorgado por um dos testadores ao outro, retribui vant-agem correspondente” ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 157).

 Assim, é   simultâneo   o testamento quando João eMaria nomeiam no mesmo testamento Pedro como her-deiro. Será recíproco o testamento quando João dispuserque em seu falecimento seus bens serão de Maria e Maria,

no mesmo instrumento, fizer idêntica disposição a favor

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de João. Por fim, será   correspectivo   se João deixar suacasa para Maria e Maria deixar sua casa para João. No úl-timo caso, há uma troca de benefícios entre os testadoresnum mesmo instrumento.

Note-se que a lei não impede que, em instrumentosseparados, os cônjuges façam disposições simétricas. Po-dem duas pessoas, na mesma data, perante o mesmo Ta- belião, elaborar dois testamentos outorgando-se os bensreciprocamente, desde que em instrumentos separados.Ilustrando, o marido pode testar os bens disponíveis a suamulher em um instrumento, bem como a esposa pode te-

star os bens ao marido em outro instrumento, ainda quecelebrados na mesma data.

Em análise comparada que pode interessar, lembra Washington de Barros Monteiro que em países como Sué-cia e Inglaterra são permitidos e muito comuns os testa-mentos conjuntivos efetuados por marido e mulher(Curso..., 2003, v. 6, p. 133). Exemplificando, Zeno Velosotranscreve o art. 2.265 do Código Civil alemão: “um testa-mento de mão comum só pode ser outorgado pelos côn- juges” ( Novo Código Civil..., p. 1.560). Nosso ordena-mento, entretanto, não admite, nem mesmo entre os côn- juges, essa modalidade testamentária.

Superada essa análise introdutória, passa-se ao estudo

das formas de testamento previstas no Código Civil em vigor.

3.2.1 Do testamento público

O testamento público é aquele elaborado pelo tabelião

ou por seu substituto legal em seu livro de notas (art.

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1.864, I, do CC). Portanto, a elaboração de testamentopúblico é de competência do Tabelionato de Notas. Assev-era Washington de Barros Monteiro que “a lei não diz,mas a primeira preocupação do serventuário é a decertificar-se cuidadosamente da identidade do testador,

não só da identidade como também da sua sanidade men-tal. Está em jogo o supremum judicium defuncti , em que a vontade do testador se assemelha à vontade do legislador”(Curso..., 2003, v. 6, p. 134). Isso não quer dizer que o ta- belião deva exigir exame de sanidade mental do testador,mas apenas significa que, se for evidente o seu estado dedemência ou houver dúvidas sobre sua sanidade, deve otabelião se negar a lavrar o testamento.

 Aponta Zeno Veloso que “o serviço notarial é exercidoem caráter privado, por delegação do Poder Público, comoenuncia o art. 236, caput , da Constituição Federal, que foiregulamentado pela Lei 8.935, de 18 de novembro de1994, cujo art. 7.º, II, dispõe que compete aos tabeliães de

notas, com exclusividade, lavrar os testamentos públicos eaprovar os cerrados. O art. 20 dessa lei autoriza os notári-os, para o desempenho de suas funções, a contratar escre- ventes, dentre eles escolhendo os substitutos” ( NovoCódigo Civil..., 2006, p. 1.561).

 A Lei 8.935/1994, em seu art. 20, § 4.º, proibia aos

substitutos que lavrassem testamentos. O dispositivoconsidera-se tacitamente revogado com a vigência doCódigo Civil de 2002 em razão da incompatibilidade dasnormas, eis que o art. 1.864, I, prevê a possibilidade deatuação do substituto. Curioso notar que a Lei estadualpaulista 12.227, de 12 de janeiro de 2006, reproduz a ori-entação da Lei federal 8.935/1994, em seu art. 13, § 2.º,

contrariando expressamente o texto do Código Civil de

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2002. Não há dúvidas de que se deve considerar que essalei estadual não tem mais aplicação, pois a lei codificadaprevalece tendo em vista o   critério hierárquico (normasuperior prevalece sobre inferior).

Quanto às formalidades do ato, nada impede que otestador apresente minuta de seu testamento, bem comoeventuais notas ou apontamentos, segundo o mesmo in-ciso I do art. 1.864 do CC. Porém, a lavratura será realiz-ada pelo próprio tabelião ou por seu substituto.

 A lavratura do instrumento no livro próprio pode serfeita por meio manual – que praticamente não mais ocorre

–, ou por meio mecânico, tal como a máquina de escreverou o computador. A declaração deve ser inserida empartes impressas do livro de notas, com a assinatura e arubrica do testador em todas as páginas (art. 1.864, pará-grafo único, do CC). O texto deve ser escrito em português,embora a lei não diga isso expressamente. No que con-cerne a esse requisito, lembra Maria Helena Diniz que, nostermos do art. 205, § 4.º, do CC, “se qualquer dos com-parecentes não souber a língua nacional e o tabelião nãoentender o idioma em que se expressa, deverá comparecertradutor público para servir de intérprete, ou, não o hav-endo na localidade, outra pessoa capaz que, a juízo do ta- belião, tenha idoneidade e conhecimento bastantes”

(Curso..., 2005, v. 6, p. 204).Depois de lavrado, o testamento será lido em voz alta

pelo tabelião ao testador na presença de duas testemun-has, ou pelo próprio testador às testemunhas, se este as-sim desejar (art. 1.864, II, do CC/2002). No revogadoCódigo Civil, o número de testemunhas era de cinco (art.

1.632 do CC/1916), sendo certo que a redução do número

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de testemunhas mantém relação com o princípio da oper-abilidade, no sentido de facilitação do Direito Civil. Deve-se perceber que a presença das testemunhas à leitura é es-sencial, e a sua ausência acarreta a nulidade do testa-mento, pois, se assinarem posteriormente, não poderão

comprovar se a declaração corresponde à vontade dofalecido.

Como bem aponta Zeno Veloso, a legislação reconheceo   princípio da unidade   ou   unicidade do ato testa-mentário. São suas palavras:

“Desde o direito romano, a unidade do ato testamentário(uno actu), ou melhor dizendo, a unidade do contexto (unocontextu), é uma rigorosa exigência: o tabelião e astestemunhas devem estar presentes simultaneamente, docomeço até o fim da solenidade, sem intervalos e lacunas.Mas o tema não deve escravizar-se à rigidez romana, mere-cendo temperamentos, uma interpretação inteligente, con-siderando as circunstâncias de cada caso, que consinta

 breves interrupções, por falta de energia elétrica, para re-solver uma emergência passageira, para o atendimento deum telefonema urgente, ou para remediar uma necessidadecorporal do tabelião ou das testemunhas, por exemplo”( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.562).

 A ilustrar a pregada flexibilização, cabe colacionar jul-

gado publicado no Informativo n. 457  do STJ, de novem- bro de 2010:

“Testamento. Princípio da unicidade. O testamento emquestão foi lavrado da seguinte forma: primeiro, o oficial docartório remeteu espécie de minuta do testamento ao testa-dor octogenário (de delicada saúde), que fez nela correções,

e, só após isso, foi à residência do testador com o texto final

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do testamento, que foi lido pelo oficial e assinado pelo testa-dor e testemunhas. Nesse contexto, não há como ter porofendido o art. 1.632 do CC/1916 pela falta de observânciado princípio da unicidade do ato; pois, antes de tudo, há queprivilegiar a vontade do testador, ainda que se sustente aocorrência de eventual inobservância dos requisitos formaisdo testamento. Tal não ocorreria se existente fato concretopassível de causar dúvidas quanto à própria faculdade dotestador de livremente dispor de seus bens, o que não é ocaso, pois o TJ afastou a alegação de incapacidade mental dotestador no momento da elaboração do testamento, decisãocontra a qual sequer se insurgiram os recorrentes. Assim, asassertivas do TJ referentes à perfeição formal do ato testa-

mentário (certificada pelo oficial), sua veracidade eregularidade encontram-se abrigadas na Súm. n. 7-STJ, queimpede sua revisão nesta sede especial. Ao acolher esse en-tendimento, a Turma, dando prosseguimento ao julga-mento, negou provimento ao especial. O voto vista do Min.

 Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ-RS)alude a parecer inserto nos autos que assinala ser possível

mitigar as formalidades testamentárias desde que justific-ado, como no caso. Já o Min. Sidnei Beneti ressaltou queessa é interpretação mais moderna das formalidades con-stantes do art. 1.632 do CC/1916, que dizem respeito a out-ros tempos em que os documentos realmente se produziammanuscritos e diretamente na presença de todas as pessoasenvolvidas. Precedentes citados do STF: RE 21.731-CE, DJ5/10/1953; do STJ: REsp 1.001.674-SC, DJe 15/10/2010;REsp 223.799-SP, DJ 17/12/1999; REsp 828.616-MG, DJ23/10/2006, e REsp 228-MG, DJ 4/12/1989” (STJ, REsp753.261/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j.23.11.2010).

Superado tal ponto, cabe uma indagação de direito in-tertemporal: se o testamento público foi celebrado na

 vigência do revogado Código Civil e só contou com a

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presença de duas testemunhas, mas o falecimento só sedeu na vigência do Código Civil de 2002, o testamentoserá válido ou nulo? Pelo Código Civil argentino, art.3.625, há previsão expressa determinando que “a validadedo testamento depende da observância da lei que o rege

no tempo em que foi feito. Uma lei posterior não trazmudança alguma, nem a favor, nem em prejuízo do testa-mento, mesmo que ocorra ainda vivo o testador”. Para odireito brasileiro a resposta é que o testamento será nulo,pois a lei que se aplica no tocante à validade é a do mo-mento da celebração. No caso em questão, mais uma vez,aplica-se o art. 2.035, caput , importante norma de direitointertemporal do atual Código Civil que adota a divisão donegócio jurídico em três planos do negócio jurídico, con-forme ensina Pontes de Miranda.

 Ainda quanto ao ato em si, terminada a leitura, deve oinstrumento ser assinado pelo testador, pelas testemunhase pelo tabelião (art. 1.864, III, do CC). Caso o testador não

saiba assinar ou não o possa fazer – imaginemos quetenha quebrado as mãos ou tenha sido vítima de umderrame cerebral –, o tabelião declarará a impossibilidadee assinará pelo testador, bem como uma das testemunhasa seu pedido, a seu rogo (art. 1.865 do CC). Nesse caso,não é necessário que um terceiro, que não o tabelião ou a

testemunha, assine por ele.Com relação aos surdos, problema surge quando daelaboração de testamento sob a forma pública, eis que odeficiente auditivo não tem como conferir a leitura oral,exigência esta decorrente da lei quando adotada essaforma. Entretanto, o Código Civil resolve a questão daseguinte maneira, pois se o surdo souber ler, poderá ele,

pessoalmente, efetuar a leitura e depois assinar o

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testamento. Se não souber, deve designar quem o leia (art.1.866 do CC), ou seja, alguém que não seja o tabelião ou astestemunhas, devendo todas essas circunstâncias constardo testamento. No último caso, nada impede que um ter-ceiro presente assine  a rogo, a pedido do testador, mas

isto não se faz necessário.Com relação aos cegos, determina a lei que estes só

poderão testar por instrumento público, que lhe será lidoduas vezes em voz alta: uma pelo tabelião ou substituto eoutra por uma das testemunhas designadas pelo testador(art. 1.867 do CC), constando tudo isso no testamento. A 

dupla leitura é imprescindível em razão da deficiência visual do testador, e a não realização da segunda leituraimplica nulidade do testamento, por desrespeito à solenid-ade. Por se tratar de solenidade legal, tal exigência nãopode ser dispensada pelo testador, ainda que confie plena-mente no tabelião.

Nas hipóteses em que o herdeiro ou legatário benefi-ciado for uma associação de caráter beneficente, os ta- beliães quando lavrarem escrituras públicas de testamentodeverão consultar o testador sobre a conveniência de secomunicarem, por escrito, com a entidade ou entidadesfavorecidas. Idêntica consulta será formulada nashipóteses de escritura pública de revogação de testamen-

tos ou de cláusulas testamentárias favoráveis àquelas asso-ciações. No caso do Estado de São Paulo, as comunicaçõesdesejadas limitar-se-ão ao nome do testador e à data,número do livro e folhas da escritura pública de testa-mento ou de revogação (Normas de Serviço daCorregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo,Provimento n. 25 de 2005, no Capítulo XIV – Do serviço

notarial, Seção I, item 8).

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É necessário frisar que, apesar de ser elaborado pelaforma pública, o testamento não deveria ser deixado à dis-posição de todos para consulta, pois só produzirá efeitosapós a morte do testador. O conceito de publicidade nãosignifica amplo acesso a toda e qualquer pessoa,

incluindo-se aí eventuais curiosos. Melhor seria entenderque o acesso não é realmente livre, pois qualquer pessoapoderia, conhecendo o conteúdo do testamento, pression-ar o testador para alterá-lo. De qualquer forma, não hánada na atual legislação que impeça o acesso ao instru-mento por esses curiosos. O Projeto 699/2011, de autoriaoriginal do Deputado Ricardo Fiuza, pretende acrescentarum § 2.º ao art. 1.864, para dele fazer constar o seguinte:“A certidão do testamento público, enquanto vivo o testa-dor, só poderá ser fornecida a requerimento deste e ou porordem judicial”.

Pois bem, visando a regulamentar a questão da publi-cidade, em São Paulo, no ano de 2002, o Colégio Notarial

criou o Registro Central de Testamentos. Trata-se de um banco de dados com todos os cartórios da capital que re-gistra a existência de mais de 200 mil testamentos e suaeventual revogação desde a década de 1970.

Para disciplinar o assunto, as Normas de Serviço daCorregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo, por

meio do Provimento 25 de 2005 (item 26 da Seção XIV),determinam que os serventuários dos Cartórios de Notas edos Cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos de Notas de todo o Estado de São Paulo remetamao Colégio Notarial do Brasil, Seção de São Paulo, até o 5.ºdia útil de cada mês, relação em ordem alfabética dosnomes constantes dos testamentos lavrados em seus liv-

ros, e suas revogações, e dos instrumentos de aprovação

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de testamentos cerrados, ou informação negativa da prát-ica de qualquer desses atos. Assim, requerida a aberturada sucessão, poderão os MM. Juízes de Direito do Estadode São Paulo oficiar ao Colégio Notarial do Brasil, Seçãode São Paulo, solicitando informação sobre a existência de

testamento.O item 26 ainda determina que a informação sobre a

existência ou não de testamento de pessoa comprovada-mente falecida somente será fornecida mediante re-quisição judicial ou a pedido do interessado deferido pelo juiz corregedor permanente da Comarca. O interessado

deverá recolher a importância equivalente a 0,5 UFESP(Unidade Fiscal do Estado de São Paulo) e apresentar a re-quisição diretamente ao Colégio Notarial do Brasil, Seçãode São Paulo. Isso, inclusive por vale postal ou ordem depagamento, salvo em caso de assistência judiciária. Comose percebe, portanto, o acesso ao testamento público noEstado de São Paulo já foi restringido pelas normas da

Corregedoria do Tribunal de Justiça. Para a consulta aotexto integral das normas, veja-se o site da Associação dosRegistradores do Estado de São Paulo(<http://www.arpensp.org.br>. Acesso em: 15 jul. 2006).

O Código de Processo Civil traz normas procedimen-tais específicas a respeito do testamento público. A 

primeira delas enuncia que qualquer interessado poderá,exibindo-lhe o traslado ou a certidão, requerer ao juiz queordene o cumprimento do testamento (art. 1.128 do CPC),independentemente da atitude do testamenteiro que tem odever legal de fazê-lo.

Em seguida, lavra-se o auto de abertura, que, rubric-

ado pelo juiz e assinado pelo apresentante, mencionará a

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data e o lugar em que o testamento foi aberto; o nome doapresentante e como houve ele o testamento; a data e olugar do falecimento do testador; e qualquer circunstânciadigna de nota, encontrada no invólucro ou no interior dotestamento (art. 1.125 do CPC).

Os autos serão conclusos e o juiz, ouvido o órgão doMinistério Público, mandará registrar, arquivar e cumpriro testamento, se lhe não achar vício externo, que o tornesuspeito de nulidade ou falsidade (art. 1.126 do CPC). Otestamento será registrado e arquivado no cartório, de- vendo o escrivão remeter uma cópia, no prazo de oito dias,

à repartição fiscal, para fiscalização do recolhimento deimpostos eventualmente devidos (art. 1.126, parágrafoúnico, do CPC). A finalidade desse envio é a verificação e aapuração de impostos, segundo aponta a doutrina proces-sualista (MARCATO, Antonio Carlos.  Código..., 2004, p.2.630). Curioso notar que, mesmo se não houver dis-posição patrimonial, o testamento obrigatoriamente deve

ser remetido ao fisco.Por fim, feito o registro, o escrivão intimará o testa-

menteiro nomeado a assinar, no prazo de cinco dias, otermo da   testamentaria. Se não houver testamenteironomeado, estiver ele ausente ou não aceitar o encargo, oescrivão certificará a ocorrência e fará os autos conclusos,

caso em que o juiz nomeará   testamenteiro dativo,observando-se a preferência legal (art. 1.127 do CPC).

 Após a assinatura do termo de aceitação da testament-aria, o escrivão extrairá cópia autêntica do testamentopara ser juntada aos autos de inventário ou de arrecadaçãoda herança. Findo está o procedimento de abertura, regis-

tro e cumprimento de testamento. Destaque-se, contudo,

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que não poderá ser herdeiro ou legatário o tabelião ou oescrivão que elaborar ou aprovar o testamento (art. 1.801,IV, do CC).

Encerrando, interessante apontar que a grande vant-agem do testamento público é que este não se perderá,pois ficará arquivado no Tabelionato de Notas, sendograndes as chances de ser cumprido. Em síntese, pode-sedizer que a segurança de o seu conteúdo ser efetivado naprática é maior. Sua desvantagem se verifica no custo a serpago ao Tabelião, que nem sempre pode ser arcado pelaparte.

3.2.2 Do testamento cerrado

O testamento cerrado é aquele escrito pelo própriotestador ou por outra pessoa a seu pedido, sendo assinadopor aquele e entregue ao tabelião ou a seu substituto para

aprovação (art. 1.868,  caput , do CC). Note-se que nessaforma testamentária o conteúdo não será conhecido porterceiros, e nem necessariamente pelo tabelião, que apen-as fará a aprovação. Daí a sua outra denominação – testa-mento místico –, pois o seu conteúdo é um mistério; antesde sua abertura, apenas o testador conhece seu conteúdo.

Qualquer pessoa, parente ou não do testador, pode es-crever o testamento a seu pedido, mas será nulo o negócio jurídico se tal pessoa for beneficiária dos bens, bem comose o beneficiário for cônjuge, companheiro, ascendente ouirmão de quem escreveu a pedido do testador (art. 1.801, I,do CC). Da mesma forma, a lei não impede que o tabeliãoque escreveu o testamento a pedido do testador o aprove

(art. 1.870 do CC), mas tal oficial não poderá ser nomeado

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como herdeiro ou legatário, sob pena nulidade absoluta dadisposição (art. 1.801, IV, do CC). Todas essas normas têmconteúdo ético indiscutível, visando afastar qualquerdúvida quanto à vontade do testador, o que motiva seremos casos de nulidade absoluta.

O instrumento do testamento cerrado poderá ser es-crito mecanicamente – por meio de máquina de escreverou computador –, e, sendo assim, o testador deverá assin-ar todas as páginas (art. 1.868, parágrafo único, do CC),para que se evitem eventuais trocas de páginas com alter-ação de conteúdo. A ausência das assinaturas nulifica o

testamento cuja veracidade seria questionável. Ainda quanto às formalidades, nada impede que o

testamento cerrado seja escrito em idioma estrangeiropelo próprio testador ou a seu rogo. É o que enuncia o art.1.871 do atual Código.

Por outra via, o surdo-mudo, e também aquele que só

é mudo, que optar por utilizar a modalidade de testamentocerrado deverá escrevê-lo de próprio punho e assiná-lo,não podendo se valer de meios mecânicos, conferindo as-sim maior autenticidade à cédula (art. 1.873 do CC). Nessecaso, pelo mesmo dispositivo, a cédula deve ser entregueperante duas testemunhas, e o testador deve escrever naface externa do papel ou do envoltório que aquele é o seu

testamento cuja aprovação pede, no exato momento emque fizer a entrega.

Como explica Clóvis Beviláqua, o ato deve ser assim“por não poder o testador enunciar, de viva voz, a sua vontade de obter a aprovação do testamento, é que a leilhe faculta manifestá-la por escrito, na face externa do pa-

pel ou do envoltório, na presença das testemunhas”

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(Código Civil ..., 1955, v. VI, p. 85). Segundo o entendi-mento majoritário da doutrina, caso de Washington deBarros Monteiro (Curso..., 2003, v. 6, p. 140) e de MariaHelena Diniz (Curso..., 2005, v. 6, p. 215), a limitação sóatinge os mudos e os surdos-mudos. É de se observar que

o apenas surdo não sofreria tais limitações, pois pode ex-por sua vontade e pedir oralmente a aprovação. En-tretanto, em sentido contrário está Silvio Rodrigues( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 163).

Retornando à análise das formalidades do testamentocerrado, o testador deve declarar que o testamento é seu e

que quer a sua aprovação pelo tabelião (art. 1.868, II, doCC). A intervenção do tabelião nessa modalidade é impre-scindível, sendo considerada uma espécie de testamentonotarial. O tabelião pode ou não ter conhecimento do con-teúdo do testamento. Se tiver, o testamento permanece válido. Se não tiver, a validade é a mesma.

Em seguida, o tabelião lavra o auto de aprovação napresença de  duas testemunhas  e lê o auto (e não o con-teúdo do testamento) ao testador e às testemunhas (art.1.864, III, do CC). O auto de aprovação, conforme lecionaZeno Veloso, é “um instrumento público, um ato notarial,e não tem objetivo de examinar e confirmar o conteúdo dotestamento, de suas cláusulas e disposições, mas, apenas,

atestar a identidade do testador e das testemunhas, e veri-ficar se o documento não contém irregularidades formais,como espaços em branco, borrões, rasuras ou entrelinhasque possam causar dúvidas ou questões” ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.565).

No revogado Código Civil, o número de testemunhas

era de cinco (art. 1.638 do CC), havendo nessa redução do

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número de testemunhas o reconhecimento da facilitaçãodo Direito Civil (princípio da operabilidade). Note-se quea presença das testemunhas à leitura do auto de aprovaçãoé essencial, e sua ausência acarreta a nulidade do testa-mento, pois na hipótese de as assinaturas terem sido apos-

tas em momento posterior, não seria possível comprovarse realmente aquele testamento foi o apresentado pelotestador ao tabelião.

Mais uma vez, se o testamento público foi celebradona vigência do revogado Código Civil e só contou com apresença de duas testemunhas – quando o regime anterior

exigia a presença de cinco testemunhas –, mas o faleci-mento só se deu na vigência do Código Civil de 2002, otestamento será nulo. Isso porque a lei que se aplica para verificar a validade do negócio jurídico é a do momento dacelebração. Trata-se de outra aplicação do semprecomentado art. 2.035, caput , do CC.

Pois bem, logo após o testador declarar que aquele é oseu testamento, de imediato deve o tabelião lavrar o autode aprovação, sempre em português, ainda que o testa-mento tenha sido redigido em outro idioma (art. 1.869 doCC). O auto começará a ser escrito logo após a última pa-lavra escrita na cédula testamentária pelo testador (ou dequem a escreveu a seu pedido), devendo ser assinado por

ele, pelas testemunhas e pelo tabelião (art. 1.868, IV, doCC).

Se não houver espaço em branco na última folha dotestamento, para o início da redação do auto de aprovação,como cautela para que se evite qualquer problema de al-teração ou de complemento futuro, o tabelião deverá apor

seu sinal público, iniciar o auto de aprovação em outra

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encerram quando é extraída a cópia para juntar ao in- ventário (art. 1.127, parágrafo único, do CPC). Já foi ex-plicado detalhadamente o procedimento do testamentopúblico no item anterior, que também se aplica ao testa-mento cerrado.

Prevê o art. 1.872 do CC que não podem se valer dessaforma de testamento as pessoas que não saibam ou pos-sam ler, pois é essencial que se certifiquem do conteúdoescrito do testamento que será entregue ao tabelião paraaprovação. Assim, não poderão se utilizar dela os analfa- betos ou os cegos.

Para concluir, Silvio Rodrigues tece feroz crítica aotestamento cerrado, chamando-o de velharia que só tempor vantagem o sigilo de suas disposições ( Direito civil...,2002, v. 7, p. 163). Não discordamos do mestre da Univer-sidade de São Paulo. Seus inconvenientes são enormes eseus benefícios muito pequenos, principalmente sepensarmos sob o ponto de vista prático.

Em termos processuais, aplica-se ao testamento cer-rado os mesmos procedimentos descritos para o testa-mento público, que estão previstos nos arts. 1.125 a 1.127do CPC e que foram descritos na presente obra.

3.2.3 Do testamento particular

 A última forma ordinária de testar é a particular, quetambém é denominada  hológrafa  (grafa-se também  oló-grafa), uma vez que pode ser redigida pelo próprio testa-dor sem a participação de tabelião ou funcionário doEstado. Segundo Eduardo de Oliveira Leite, a forma cor-

reta de grafia é “hológrafa”, já que “etimologicamente a

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Filia-se às críticas do mestre paraense e profundo con-hecedor da matéria, Zeno Veloso, para quem o CódigoCivil de 2002 perdeu uma ótima oportunidade de tornarmais viável a elaboração de testamento particular noBrasil, eis que não ocorreram mudanças realmente im-

portantes no tocante à matéria ( Novo Código Civil ...,2006, p. 1.571). Nesse contexto, poderia o Código Civil teradotado a forma hológrafa simplificada, que dispensaria apresença de testemunhas. Isso incentivaria a elaboraçãode testamentos, o que não é comum entre nós.

Se elaborado por processo mecânico, o testamento

particular não pode conter rasuras ou espaços em branco,devendo ser assinado pelo testador, depois de o ter lido napresença de pelo menos três testemunhas, que o subscre- verão (art. 1.876, § 2.º, do CC). Garante-se, assim, respeitoà vontade do testador, que, por meio de rasuras ou es-paços em branco, pode ter sua vontade alterada completa-mente. Ilustrando, imaginemos que a palavra “não”

riscada de certa sentença altere todo o testamento.Nada impede que o testamento particular seja escrito

em língua estrangeira, desde que todas as testemunhasque o assinem compreendam o idioma (art. 1.880 do CC).Pondera Sílvio de Salvo Venosa que, se uma das testemun-has não souber o idioma, nulo será o testamento ( Direito

civil..., 2003, v. 7, p. 177). O artigo diz o óbvio, pois se nãocompreenderem o idioma, não compreenderão a dis-posição testamentária e não serão de nenhuma valia nomomento da confirmação.

Para a validade de tal forma de testamento a lei nãoexige a aposição de data e local da elaboração do testa-

mento (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil..., 2003, v.

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7, p. 177; DINIZ, Maria Helena. Curso..., 2005, v. 6, p. 216;CAHALI, FRANCISCO e HIRONAKA, GISELDA.   Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 290), mas apenas a assinaturado disponente.

Obrigatoriamente, o testamento deve ser lido pelotestador, não se admitindo que terceiros o façam. Essaleitura deverá ocorrer na presença das testemunhas, sejaele escrito de próprio punho ou por meio mecânico.

Com a morte do testador, determina a lei que o testa-mento seja publicado em juízo, com a citação dos herdeir-os legítimos, ou seja, daqueles a quem caberia a herança

ou legado se testamento não houvesse (art. 1.877 do CC).Poderão requerer a publicação do testamento em juízo oherdeiro, o legatário ou o testamenteiro, inquirindo-se astestemunhas que lhe ouviram a leitura e, depois disso, oassinaram (art. 1.130 do CPC). A norma processual prevê,ainda, que a petição requerendo a publicação será in-struída com a cédula do testamento particular (art. 1.130,parágrafo único, do CPC).

Diferentemente do que ocorre com os testamentospúblico e cerrado, explica Antonio Carlos Marcato, “cujaidoneidade resulta, em princípio ou da aprovação do ta- belião (no caso do testamento cerrado) ou de sua parti-cipação (no caso de testamento público), o testamento

particular é elaborado pelo próprio testador e assinado portrês testemunhas, daí a necessidade de verificação judicialde sua autenticidade e validade” (Código de ProcessoCivil..., 2004, p. 2.635). Assim, seguindo a  Escada Pon-teana, falta ao testamento particular eficácia quando damorte do testador. Esta eficácia decorre de sua confirm-

ação e do cumpra-se do juiz, conforme aponta a

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respeitável doutrina de Zeno Veloso ( Novo Código Civil...,2006, p. 1.573).

 Além dos herdeiros legítimos que receberiam a her-ança se o falecido tivesse morrido ab intestato, serão cha-mados para a inquirição o testamenteiro, os herdeiros e oslegatários que não tiverem requerido a publicação e oMinistério Público (art. 1.131 do CPC). As testemunhas de- verão ser inquiridas, facultando-se aos interessados, noprazo comum de cinco dias, manifestarem-se sobre o test-amento. Explica, mais uma vez, Antonio Carlos Marcatoque a aferição terá por objetivo verificar a capacidade test-

amentária do testador e a sucessória do herdeiro, bemcomo a observância dos requisitos formais na feitura dotestamento e se no momento em que testou, o testadortinha pleno discernimento do ato e manifestou livrementea sua vontade (Código de Processo Civil..., 2004, p.2.636).

 Ainda no tocante aos procedimentos de abertura, po-dem os interessados presentes, devidamente representa-dos por seus advogados, formular perguntas às testemun-has. Se as testemunhas estiverem de acordo quanto ao fatoda disposição ou pelo menos sobre a leitura perante elas, ese reconhecerem sua própria assinatura bem como a dotestador, o testamento será confirmado (art. 1.878 do CC).

Explica Maria Helena Diniz que “não se exige que se re-cordem do conteúdo do testamento; basta que declaremque a leitura do testamento foi feita perante elas e que re-conheçam suas assinaturas e a do testador e a veracidadedo ato” (Curso..., 2005, v. 6, p. 217).

Determinava o Código de Processo Civil em seu art.

1.133 que “se pelo menos três testemunhas contestes

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reconhecerem que é autêntico o testamento, o juiz, ouvidoo órgão do Ministério Público, o confirmará”. Enten-demos, assim como Antonio Carlos Marcato que o dispos-itivo foi revogado pela introdução de duas novas normasno ordenamento jurídico nacional (Código de Processo

Civil..., 2004, p. 2.637):

1.º) Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e sepelo menos uma delas o reconhecer, o testamento poderáser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova sufi-ciente de sua veracidade (art. 1.878, parágrafo único, doCC). Sobre a hipótese em questão, bem lembra Sílvio de

Salvo Venosa que “o testamento, qualquer que seja suamodalidade, é um dos negócios mais suscetíveis a fraudese ataques de nulidade. Toda a carga de responsabilidade,neste caso, é transferida ao juiz que poderá confirmar otestamento perante apenas uma das testemunhas”( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 178).

2.º) Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o

testamento particular de próprio punho e assinado pelotestador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, acritério do juiz (art. 1.879 do CC). Em realidade, frisa Zeno

 Veloso que o Código cria uma modalidade diferente detestamento, ou seja, o   testamento elaborado em circun-stâncias excepcionais, que impedem ou dificultam ex-tremamente o testador de se valer de outras formas de te-

star ou do próprio testamento particular em sua configur-ação normal ( Novo Código Civil ..., 2006, p. 1.574).

Sobre o último caso, devemos observar que a ex-pressão   circunstâncias excepcionais, constante do art.1.879, constitui uma cláusula geral, um conceito abertodeixado pelo legislador para preenchimento caso a caso.

Ora, diversas são as situações em que é possível imaginar

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alguém impedido de testar normalmente, como, por ex-emplo, se alguém estiver correndo sério perigo de vida emrazão de uma onda de violência que atinge uma grandecidade; se estiver perdido na selva sem conseguir achar acivilização; ou, por fim, em sendo um náufrago perdido

em uma ilha.Exemplo colhido do Tribunal Paulista, além de es-

clarecedor, preenche de maneira adequada a expressão eatende ao espírito da lei. Determinada pessoa, prestes afazer uma séria cirurgia, temeroso quanto à possibilidadede falecimento, lavrou de próprio punho testamento par-

ticular, que não contou com a presença de testemunhas. Vejamos a ementa da decisão:

“Testamento. Particular. Excepcional. Documento lavradode próprio punho, quando da iminência de o disponente,temeroso de vir a falecer, ser submetido a cirurgia. Validade.Excepcionalidade devidamente declarada, consistente no

temor da morte quando do procedimento cirúrgico. Ausên-cia de identificação das testemunhas. Irrelevância. Dispensadas mesmas pelo art. 1.879 do CC. Recurso provido. A ex-cepcionalidade exigida está, por sua vez, devidamente de-clarada no documento em exame. O testador fez consignarexpressamente que temia por sua morte na cirurgia; porisso, naquele ato, deixava seu imóvel à apelante que, se-gundo consta, com ele vivia em regime de união estável.

Justamente a proximidade da morte do dispoente e a im-possibilidade dele recorrer às formas ordinárias têm sidoapontadas pela doutrina como exemplo de situações excep-cionais autorizadoras do ato” (TJSP, Apelação Cível434.146-4/0-00, 7.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des.

 Álvaro Passos, j. 21.05.2008).

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Entendemos, ainda, que a cautela do juiz deve serenorme no caso em questão, como é comum no preenchi-mento das cláusulas gerais. Imagine-se a hipótese em queo testador é forçado a redigir o testamento e logo após émorto pelo beneficiário. Deve o juiz inquirir cuida-

dosamente as partes interessadas, buscando a real ver-dade dos fatos e declarando eventual nulidade do testa-mento que tenha por objetivo fraudar direitos sucessórios.

Encerrando o estudo do tema, concorda-se integral-mente com Eduardo de Oliveira Leite quando afirma que“a aceitação do testamento particular, sem testemunhas,

atinge frontalmente a sistemática empregada no capítuloIII do direito sucessório nacional, ou bem, em respeito àcoerência, mantém-se um sistema formalista; ou bemabandona-se o excessivo formalismo e, em atitudecoerente, resgata-se a forma simplificada de testar priva-damente” (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 396).

3.3 DOS TESTAMENTOS ESPECIAIS

Conforme dito anteriormente, o testamento é um atosolene e, portanto, deverá observar, para a sua validade, asformas previstas em lei, sob pena de nulidade sendo exata-

mente por esse motivo que não são admitidas outrasformas especiais de testar, além das previstas na codi-ficação em vigor (art. 1.887 do CC).

Depois de estudadas as formas ordinárias de testar(pública, cerrada e particular), necessária se faz a análisedas chamadas formas extraordinárias ou especiais (art.1.886 do CC): o testamento marítimo e o testamento aer-onáutico (arts. 1.888 a 1.892); bem como o testamento

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militar (arts. 1.893 a 1.896 do CC). Passaremos ao estudodessas formas testamentárias de modo pontual.

3.3.1 Do testamento marítimo e do testamento

aeronáuticoNão podemos iniciar a abordagem do tema sem tecer

a consideração de que se o brasileiro não tem por hábitotestar pelas formas ordinárias, as formas extraordináriassão resquícios históricos e de pouquíssima ou nenhumautilidade. Na opinião dos presentes autores, as categorias

permanecem no Código Civil de 2002 como mero caprichodo legislador, que, por exemplo, revogou o regime dotalpara o casamento, mas ainda manteve as formas especiaisde testamento seguindo a máxima pela qual o que abundanão prejudica.

Enquanto o Código Civil revogado só tratava do testa-

mento marítimo, ou seja, daquele feito por quem está em viagem a bordo de navio nacional, seja ele de guerra oumercante, o Código Civil de 2002 passou a cuidar tambémdo testamento aeronáutico, para quem estiver a bordo deaeronave militar ou comercial. Ambas as formas especiaisestão previstas nos arts. 1.888 e 1889 da atual codificação,respectivamente.

Já fomos indagados na prática do porquê de a lei nãocuidar do testamento ferroviário ou rodoviário. A respostaé simples. Aquele que viaja de trem ou de ônibus está emterra e pode, a qualquer momento, descer do transportepara testar por uma das formas ordinárias solenes (testa-mento público ou cerrado). Já os que se encontram em na-

 vios ou aeronaves não poderão testar pelas formas

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ordinárias em razão do impedimento físico de sair do na- vio em meio ao oceano ou do avião em pleno voo. Exata-mente em razão da  ratio legis   é que será nulo o testa-mento marítimo se, no momento em que foi realizado,ainda que no curso de uma viagem, o navio estava em

porto onde o testador pudesse desembarcar e testar naforma ordinária (art. 1.892 do CC).

Superado esse ponto, importante dizer que as regrasdo testamento marítimo e do aeronáutico são idênticas.

 A primeira delas é a de que aquele que estiver em na- vio nacional deverá testar perante o comandante – autor-

idade presente –, e também na presença de duastestemunhas, podendo-se utilizar da forma cerrada oupública (art. 1.888 do CC). Da mesma forma, se estiver emaeronave, poderá testar perante pessoa designada pelocomandante e também perante duas testemunhas (art.1.889 do CC). Essa pessoa designada pode ser um comis-sário de bordo, o copiloto, ou ainda um passageiroqualquer. Percebe-se que essa pessoa designada e ocomandante do navio desempenharão as funções dotabelião.

Em se valendo da forma pública, o comandante (denavio ou aeronave) ou pessoa por ele designada lavra otestamento no diário de bordo, colhe a assinatura do testa-

dor e das duas testemunhas. Se o testador não puder ounão souber assinar, a autoridade declarará tal fato, assin-ando pelo testador e, a seu rogo, também uma dastestemunhas. Aplica-se, portanto, a regra antes estudadaprevista no art. 1.865 da norma codificada.

Utilizando o testador a forma cerrada, o comandante

(de navio ou aeronave) ou a pessoa por ele designada lavra

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no diário de bordo o auto de aprovação que também éassinado pelo testador e pelas testemunhas.

Muito procedente é a indagação que faz Eduardo deOliveira Leite sobre o disposto no art. 1.888, que determ-ina que o testamento especial marítimo ou militar sejafeito “da forma que corresponda ao testamento público oucerrado” (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 415). A dúvidaque surge é: todas as exigências previstas para as formasordinárias devem ser respeitadas pelas formas especiaissob pena de nulidade?

Realmente, a falta de regulamentação adequada e

clara pode gerar confusões insuperáveis sobre o tema. Ora,se exigidas fossem exatamente as mesmas formalidades,concluiríamos que as formas especiais, na verdade, nãosão especiais e seguem as formas ordinárias, com todos osseus requisitos. Criar-se-ia o seguinte contrassenso: se asformas especiais são permitidas exatamente por não serpossível ao testador a adoção da forma ordinária, comopodem seus requisitos ser idênticos?

Zeno Veloso indica o real alcance do dispositivo aocomentar que “advirta-se, no entanto, que essa aplicaçãodos preceitos referentes às duas formas ordinárias indica-das no art. 1.888, não deve ser feita mecanicamente, comextremo rigor e compreensão literal. A parificação não

pode ser absoluta e completa, senão o testamento marí-timo não passaria de um testamento público ou cerradofeito sobre as águas, e tendo o comandante do navio comonotário. Não é esta, com certeza a   ratio legis” ( NovoCódigo Civil..., 2006, p. 1.581). Concordamos com omestre paraense.

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Outra regra importante é a de que cabe ao comand-ante a guarda do testamento marítimo e aeronáutico quedeverá ser entregue às autoridades administrativas doprimeiro porto ou aeroporto nacional, contra reciboaverbado no diário de bordo (art. 1.890 do CC).

Prevê ainda o Código Civil que perderão a eficácia otestamento marítimo e aeronáutico se o testador não mor-rer na viagem ou nos noventa dias subsequentes ao seudesembarque em terra e, ainda assim, não tiver feito, naforma ordinária, outro testamento (art. 1.891 do CC). É oque se denomina  caducidade do testamento. A razão de

ser da norma é clara, uma vez que as formas especiais detestar são excepcionais e só podem ser utilizadas caso otestador não possa se valer das ordinárias. No caso emquestão, não morrendo o testador e chegando em terrafirme, terá 90 dias para se valer de uma das formas or-dinárias de testar, sob pena de caducidade e consequenteineficácia das disposições testamentárias.

Por fim, como o Código Civil não limita os testamen-tos aeronáuticos às aeronaves nacionais, sobre a lei quedeve reger o testamento, observa Washington de BarrosMonteiro que “embora omisso o texto legal, considera-se oprincípio locus regit actum, devendo o testamento obser- var a forma do lugar em que está sendo concretizado;

como a aeronave brasileira é considerada território brasileiro, é a lei brasileira que segue a solenidade dessetestamento, segue-se que é a equipamento de nacionalid-ade brasileira que ele se refere” (Curso..., 2006, v. 6, p.156).

Em termos processuais, determina o Código de Pro-

cesso Civil que as disposições referentes aos testamentos

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particulares se aplicam ao testamento marítimo, e, port-anto, também ao testamento aeronáutico (art. 1.134 doCC). Sendo assim, tais modalidades de testamento devemser obrigatoriamente confirmadas pelo juiz, conforme ex-pusemos no presente capítulo.

3.3.2 Do testamento militar

Permite a lei o testamento feito pelos militares e pelosnão militares a serviço das Forças Armadas em campanha,dentro do País ou fora dele, assim como em praça sitiada

ou que esteja com as comunicações interrompidas (art.1.893 do CC). Como se pode perceber, diante da nossafalta de   tradição beligerante, essa forma testamentáriatem pouca aplicação prática. Recentemente, pode sercitado o exemplo das tropas brasileiras enviadas ao Haitipela ONU, em missão de paz .

Todavia, mais uma vez, permite a lei a forma especialem razão da impossibilidade de utilização da forma or-dinária. O militar em campanha ou mesmo o civil que es-teja servindo às Forças Armadas não poderá testar pelasformas ordinárias em razão das dificuldades inerentes àcampanha militar.

Mas quem são os civis em campanha? Washington deBarros Monteiro menciona os médicos, os cirurgiões, osenfermeiros, os observadores os oficiais, os repórteres, osengenheiros, os telegrafistas e os capelães, ocupados emoperações de guerra, dentro ou fora do nosso País(Curso..., 2003, v. 6, p. 156).

Quanto às formas do testamento militar, três são as

previstas em lei:

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a)   Forma que se assemelha à pública. Determina o art.1.893 do atual Código que não havendo tabelião ou seusubstituto legal, o testamento militar pode ser feito anteduas ou três testemunhas. Se o testador não puder, ou nãosouber assinar, assinará por ele uma das testemunhas.Enumera a lei possíveis autoridades presentes para quefaçam as vezes de tabelião: se o testador pertencer a corpoou seção de corpo destacado, o testamento será escritopelo respectivo comandante, ainda que de graduação ouposto inferior; se o testador estiver em tratamento emhospital, o testamento será escrito pelo respectivo oficialde saúde, ou pelo diretor do estabelecimento e, por fim, seo testador for o oficial mais graduado, o testamento será

escrito por aquele que o substituir (art. 1.893, §§ 1.º a 3.º,do CC).

 b)  Forma que se assemelha ao testamento cerrado.  Se otestador souber escrever, poderá fazer o testamento depróprio punho, contanto que o date e assine por extenso, eo apresente aberto ou cerrado, na presença de duastestemunhas ao auditor, ou ao oficial de patente, que lhe

faça as vezes nesse mister (art. 1.894 do CC). Deve serhológrafo e também autógrafo, pois deve ser datado eassinado por extenso pelo próprio testador.

c) Testamento militar nuncupativo. Aqueles que podem se valer do testamento militar e que estejam empenhados emcombate ou feridas podem testar oralmente, confiandosua última vontade a duas testemunhas (art. 1.896 do CC).

Em regra, perderá a eficácia o testamento militar se otestador estiver por noventa dias seguidos em lugar ondepossa fazer, na forma ordinária, outro testamento (art.1.895 do CC). No entanto, se o testamento foi feito pelotestador, de próprio punho, na forma cerrada ou pública,com a nota de aprovação do oficial, o testamento seráeficaz mesmo decorridos 90 dias.

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Também perderá a eficácia o testamento militarelaborado na forma nuncupativa se o testador não morrerna guerra ou convalescer dos ferimentos (art. 1.896, pará-grafo único, do CC). Realmente, a solução legal tinha queser esta, já que a forma nuncupativa é bastante perigosa,

eis que, não havendo registro escrito, a probabilidade denão corresponder à real vontade do testador é enorme.Mais uma vez, há a chamada caducidade do testamento(plano da eficácia na   Escada Ponteana). O motivo é omesmo, ou seja, as formas especiais de testar são excep-cionais e só podem ser utilizadas caso o testador não possase valer das ordinárias. No caso do testamento nuncupat-ivo, não morrendo o testador ou estando por 90 diasseguidos em lugar onde possa testar por uma das formasordinárias (para o testamento militar público ou cerrado),ocorre a ineficácia das disposições testamentárias.

Por fim, determina o Código de Processo Civil que asdisposições referentes aos testamentos particulares se ap-

licam ao testamento militar (art. 1.134 do CPC). Elucid-ando o alcance da norma, tal modalidade de testamentodeve ser obrigatoriamente confirmada pelo juiz, conformeexpusemos no presente capítulo.

 Analisadas todas as formas possíveis de testamento,passaremos ao estudo dos codicilos.

3.4 A POLÊMICA DO TESTAMENTO VITAL OU BIOLÓGICO

 A partir da 4.ª Edição desta obra, resolvemos incluir

um tópico a respeito do tema do   testamento vital   ou

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biológico, assunto amplamente debatido no Brasil nos úl-timos anos. Tal modalidade é também denominada testa-mento em vida, testament de vie ou living will .

Roxana Cardoso Brasileiro Borges conceitua o insti-tuto como “o documento em que a pessoa determina, deforma escrita, que tipo de tratamento ou não tratamentodeseja para a ocasião em que se encontrar doente, em es-tado incurável ou terminal, e incapaz de manifestar sua vontade” (BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponib-ilidade..., 2005, p. 239). Para a jurista, o declarante, pormeio do   testamento vital , visa a influir sobre os profis-

sionais da área de saúde, “no sentido do não tratamento,como vontade do paciente, que pode vir a estar impedidode manifestar sua vontade, em razão da doença”(BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponibilidade...,cit., p. 239).

 A primeira dúvida que surge em relação ao testamento vital é a seguinte: trata-se de um exercício admissível daautonomia privada ou de um exercício ilícito, com con-teúdo nulo? Para responder a tal questão, é importanteaqui, antes de qualquer conclusão, esclarecer os conceitosde eutanásia, distanásia e ortotanásia (como referênciaspara pesquisa e conceituação: DINIZ, Maria Helena. O es-tado..., 2003, p. 320-361; BORGES, Roxana Cardoso

Brasileiro. Disponibilidade..., 2005, p. 233-239).De início, a eutanásia – na tradução etimológica liter-

al   boa morte   –, significa a facilitação da morte, en-gendrada pelos profissionais da área da saúde. A eutanásiase dá por meio de utilização de técnicas que permitam aocorrência da morte, de modo a ser menos dolorosa

quanto possível ao paciente. Para tal prática, há a

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utilização de condutas ativas, como a conhecida máquinade suicídio, criada pelo médico norte-americano Jack Ke- vorkian, conhecido como Doutor Morte.

Por outra via, a distanásia significa o prolongamentodo processo de morte, por meio artificial, o que traz sofri-mento ao paciente. Há, portanto, um prolongamento ex-agerado, uma  obstinação terapêutica, que se mostra, namaioria das vezes, totalmente inútil. Como bem explicaMaria Helena Diniz, “Pela distanásia, também designadaobstinação terapêutica ( L’acharment thérapeutique) oufutilidade médica (medical futility), tudo deve ser feito

mesmo que cause sofrimento atroz ao paciente. Issoporque a distanásia é a morte lenta e com muitosofrimento. Trata-se do prolongamento exagerado damorte de um paciente terminal ou tratamento inútil”(DINIZ, Maria Helena. O estado..., cit., p. 336). Em suma,trata-se de medida que deve ser evitada tanto pelos profis-sionais da área da saúde quanto pelos componentes do

meio social, pois “distorce objetivos da medicina”, como bem esclarece Leo Pessini (PESSINI, Leo. Questões... In:Garrafa, VOLNEI; PESSINI, Leo (Org.). Bioética..., 2003,p. 400).

Por fim, a ortotanásia – na etimologia morte correta– é justamente a situação oposta à  distanásia,  ou seja,

representa o não prolongamento, de forma artificial, doprocesso de morte (BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponibilidade..., 2005, p. 235). A  ortotanásia é práticautilizada para não gerar ao paciente um sofrimento físico,psicológico e espiritual, presente, por exemplo, pelo  nãoemprego de técnicas terapêuticas inúteis de prolonga-mento da vida.

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 As três expressões devem ser esclarecidas, pois, aqui,será trabalhada a ideia de  testamento vital  ou  biológicosomente para os casos de ortotanásia. Quanto ao primeirocaso, da   eutanásia, ainda estão pendentes muitasreflexões.

Desse modo, delimitada a aplicação do conceito, a res-posta destes autores é positiva quanto à possibilidade jurídica do instituto. A partir do conceito de autonomiaprivada, que vem a ser o direito que a pessoa tem de regu-lamentar os seus interesses, decorrentes dos princípiosconstitucionais da liberdade e da dignidade, trata-se de

um exercício admissível da vontade humana. Isso porquea ortotanásia  representa um correto  meio-termo  entre aeutanásia e a distanásia, uma sabedoria a ser procuradapor todos os envolvidos com o fato, de todas as áreas dopensamento. Nesse contexto, merecem transcrições as pa-lavras de Leo Pessini:

“Nasce uma sabedoria a partir da reflexão, da aceitação eda assimilação do cuidado da vida humana no sofrimento doadeus final. Entre dois limites opostos: de um lado, a con-

 vicção profunda que brota das culturas das religiões de nãomatar ou abreviar a vida humana sofrida (eutanásia); deoutro lado, a visão e o compromisso para não prolongar ador, o sofrimento, a agonia, ou pura e simplesmente adiar a

morte (distanásia, tratamento fútil, obstinação terapêutica).No não matar e no não agredir terapeuticamente está o am-arás, isto é, o cuidado da dor e do sofrimento humano, queem última instância aceita a morte e faz desta experiência oúltimo momento de crescimento de vida, como revela todo otrabalho pioneiro da médica psiquiatra norte-americanaElizabeth Kübler-Ross. É o ideal da ortotanásia” (PESSINI,Leo. Questões..., Bioética, p. 406).

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O conteúdo do que se denomina como testamento vi-tal  ou biológico visa, assim, a proteger a dignidade do pa-ciente terminal, dentro da ideia do binômio  beneficência/ não maleficência, sendo o art. 15 do Código Civil o suportelegal para a viabilidade do que se propõe pelo instituto.

Mais do que isso, há uma proteção indireta da dignidadedos familiares do paciente terminal, que também sofremcom todos os males e as dores pelas quais passa a pessoaamada e querida. Nesse sentido, pode-se falar em solidar-iedade familiar, estribada na proteção constitucional dasolidariedade social, nos termos do art. 3.º, I, da Constitu-ição Federal de 1988. Compartilhamos, portanto e emcerto sentido, com a opinião de Diaulas Costa Ribeiro,para quem:

“A suspensão de esforço terapêutico necessita de umamanifestação de vontade do paciente, a qual deve ser feitaantes da perda de sua capacidade civil, no contexto dasdiretivas antecipadas. Para que isso seja possível, quatro al-ternativas se apresentam: uma escritura pública feita emcartório, na qual o paciente declara não aceitar a obstinaçãoterapêutica, nem ser mantido vivo por aparelhos, especific-ando, ainda, que tipo de tratamento tolerará; uma de-claração escrita em documento partilhar, uma simples folhade papel assinada, de preferência com firma reconhecida;uma declaração feita a seu médico assistente – registrada

em seu prontuário, com sua assinatura. A quarta alternativarefere-se àquele paciente que não teve oportunidade deelaborar diretivas antecipadas mas que declarou a amigos,familiares etc. sua rejeição ao esforço terapêutico nos casosde estado vegetativo permanente ou de doença mental: a

 justificação testemunhal da vontade” (RIBEIRO, DiaulasCosta. Um novo testamento... In: PEREIRA, Rodrigo da

Cunha (Org.). Anais ..., 2006, p. 281).

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 A partir das palavras transcritas, insta perceber,quanto às formalidades, que o doutrinador coloca à dis-posição do paciente medidas formais e informais, bastando a prova de sua manifestação de vontade para queas suas decisões sejam respeitadas pelos envolvidos.

No que tange à ética médica, a prática da ortotanásiafoi reconhecida como válida e eficaz, inicialmente, pelaResolução 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina,cujos dispositivos fundamentais merecem transcrição in-tegral, para leitura e reflexões:

“Art. 1.º É permitido ao médico limitar ou suspender pro-cedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doenteem fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeit-ada a vontade da pessoa ou de seu representante legal.

§ 1.º O médico tem a obrigação de esclarecer ao doente oua seu representante legal as modalidades terapêuticas ad-equadas para cada situação.

§ 2.º A decisão referida no caput  deve ser fundamentada eregistrada no prontuário.

§ 3.º É assegurado ao doente ou a seu representante legalo direito de solicitar uma segunda opinião médica.

 Art. 2.º O doente continuará a receber todos os cuidadosnecessários para aliviar os sintomas que levam ao sofri-

mento, assegurada a assistência integral, o conforto físico,psíquico, social e espiritual, inclusive assegurando-lhe odireito da alta hospitalar.”

Todavia, a citada resolução do Conselho Federal deMedicina foi suspensa por decisão da 14.ª Vara Federal doDistrito Federal, com efeitos  erga omnes. Vejamos o seu

trecho principal:

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“Trata-se de ação civil pública, com pedido de antecipaçãode tutela, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALcontra o CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, question-ando a Resolução CFM n.º 1.805/2006, que regulamenta aortotanásia. Aduz, em apertada síntese, que o ConselhoFederal de Medicina não tem poder regulamentar para es-tabelecer como conduta ética uma conduta que é tipificadacomo crime. O processo foi ajuizado em 09 de maio de2007. (...). Na verdade, trata-se de questão imensamente de-

 batida no mundo inteiro. Lembre-se, por exemplo, da reper-cussão do filme espanhol ‘Mar Adentro’ e do filme amer-icano ‘Menina de Ouro’. E o debate não vem de hoje, nem selimita a alguns campos do conhecimento humano, como o

Direito ou a Medicina, pois sobre tal questão há inclusivemanifestação da Igreja, conforme a ‘Declaração sobre aEutanásia’ da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé,aprovada em 05 de maio de 1980, no sentido de que ‘na im-inência de uma morte inevitável, apesar dos meios usados, élícito em consciência tomar a decisão de renunciar a trata-mentos que dariam somente um prolongamento precário e

penoso da vida, sem, contudo, interromper os cuidados nor-mais devidos ao doente em casos semelhantes. Por isso, omédico não tem motivos para se angustiar, como se nãotivesse prestado assistência a uma pessoa em perigo’. En-tretanto, analisada a questão superficialmente, como con-

 vém em sede de tutela de urgência, e sob a perspectiva doDireito, tenho para mim que a tese trazida pelo ConselhoFederal de Farmácia nas suas informações preliminares, nosentido de que a ortotanásia não antecipa o momento damorte, mas permite tão somente a morte em seu tempo nat-ural e sem utilização de recursos extraordinários postos àdisposição pelo atual estado da tecnologia, os quais apenasadiam a morte com sofrimento e angústia para o doente esua família, não elide a circunstância segundo a qual tal con-duta parece caracterizar crime de homicídio no Brasil, nos

termos do art. 121, do Código Penal. E parece caracterizar

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crime porque o tipo penal previsto no sobredito art. 121,sempre abrangeu e parece abranger ainda tanto a eutanásiacomo a ortotanásia, a despeito da opinião de alguns juristasconsagrados em sentido contrário. Tanto assim que, como

 bem asseverou o representante do Ministério Público Feder-al, em sua bem-elaborada petição inicial, tramita no Con-gresso Nacional o ‘anteprojeto de reforma da parte especialdo Código Penal, colocando a eutanásia como privilégio aohomicídio e descriminando a ortotanásia’ (fl. 29). Dessemodo, a glosa da ortotanásia do mencionado tipo penal nãopode ser feita mediante resolução aprovada pelo ConselhoFederal de Medicina, ainda que essa resolução venha de en-contro aos anseios de parcela significativa da classe médica e

até mesmo de outros setores da sociedade. Essa glosa há deser feita, como foi feita em outros países, mediante leiaprovada pelo Parlamento, havendo inclusive projeto de leinesse sentido tramitando no Congresso Nacional. (...). Mas amera aparência desse conflito já é bastante para impor asuspensão da Resolução CFM n.º 1.805/2006, mormentequando se considera que sua vigência, iniciada com a pub-

licação no DOU  do dia 28 de novembro de 2006, traduz o placet  do Conselho Federal de Medicina com a prática da or-totanásia, ou seja, traduz o  placet  do Conselho Federal deMedicina com a morte ou o fim da vida de pessoas doentes,fim da vida essa que é irreversível e não pode destarteaguardar a solução final do processo para ser tutelada judi-cialmente. Do exposto, DEFIRO A ANTECIPAÇÃO DETUTELA para suspender os efeitos da Resolução CFM n.º1.805/2006. Intimem-se. Cite-se. Brasília, 23 de outubro de2007. ROBERTO LUIS LUCHI DEMO. Juiz Federal Substi-tuto da 14.ª Vara/DF”.

Posteriormente, o Novo Código de Ética Médica (Res-olução 1.931/2009 do Conselho Federal de Medicina) re-toma o tema, no seu art. 41, ao estabelecer que é vedado ao

médico abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido

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deste ou de seu representante legal. O parágrafo único danorma é que merece destaque, ao enunciar que “Nos casosde doença incurável e terminal, deve o médico oferecer to-dos os cuidados paliativos disponíveis sem empreenderações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas,

levando sempre em consideração a vontade expressa dopaciente ou, na sua impossibilidade, a de seu represent-ante legal”. Como se pode perceber, o dispositivo autorizaa ortotanásia, dando suporte ético ao testamento vital ou biológico em casos tais.

Mais recentemente, o mesmo Conselho Federal de

Medicina editou a Resolução 1.995/2012, que trata das“Diretivas Antecipadas de Vontade”. Pela nova norma, a vontade do paciente deve prevalecer sobre a dos seus rep-resentantes, o que representa uma notável valorização daautonomia privada. De acordo com a nova norma ética,“Nas decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientesque se encontram incapazes de comunicar-se, ou de ex-

pressar de maneira livre e independente suas vontades, omédico levará em consideração suas diretivas antecipadasde vontade” (art. 2.º,  caput ). Eventualmente, caso o pa-ciente tenha designado um representante para tal fim,suas informações serão levadas em consideração pelomédico (§ 1.º). Porém, de acordo com o § 3.º do disposit-

ivo, “as diretivas antecipadas do paciente prevalecerãosobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobreos desejos dos familiares”. Cumpre destacar, por fim, queas diretivas antecipadas de vontade poderão ser registra-das no prontuário médico, não se exigindo maiores form-alidades para tanto (§ 4.º).

Tendo sido consolidada a questão no âmbito da ética

médica, espera-se que a prática seja disciplinada e

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autorizada por lei, aguardando-se a aprovação de um dosprojetos de lei em trâmite no Congresso Nacional. No pla-no doutrinário destaque-se a aprovação, na V Jornada de Direito Civil , de enunciado reconhecendo a possibilidadedo testamento vital ou biológico, nos seguintes termos: “É

 válida a declaração de vontade, expressa em documentoautêntico, também chamado ‘testamento vital’, em que apessoa estabelece disposições sobre o tipo de tratamentode saúde, ou não tratamento, que deseja no caso de se en-contrar sem condições de manifestar a sua vontade”(Enunciado n. 528).

Reconhecida a sua viabilidade ético-jurídica, fica umadúvida. O   testamento vital   ou   biológico   constitui real-mente um  testamento, no sentido jurídico da expressão,ou o instituto é uma mera disposição unilateral de vont-ade? Como enquadrar esse instituto como categoria jurídica? Estamos inclinados a concluir que o instituto quese propõe não é realmente um  testamento. Isso porque,

conforme exposto, o testamento é instituto jurídico paraproduzir efeitos após a morte. Não é o que ocorre em re-gra, com o que se denomina como testamento vital  ou bio-lógico, que nos casos envolvendo o tratamento médicoproduz efeitos ainda antes da morte da pessoa, particular-mente nos casos em que o paciente é terminal.

 Ademais, a forma desse ato é livre, nos termos do art.107 do CC, bastando que seja devidamente constatada eprovada, não se enquadrando nas complexas solenidadesrelativas ao testamento, um dos atos que apresenta ummaior número de formalidades entre todos de DireitoPrivado.

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Em suma, trata-se, em regra, de um ato jurídicostricto sensu  unilateral, que pode, sim, produzir efeitos,uma vez que o seu conteúdo é perfeitamente lícito. Even-tualmente, apenas nos casos em que houver disposiçõesnão patrimoniais, como aquelas relativas à doação  post 

mortem   de partes do corpo (nos termos do art. 14 doCódigo Civil), ao destino do corpo, ao sufrágio da alma, aoenterro, entre outros, é que o instituto seria assemelhado aum testamento, na verdade, mais próximo de um codicilo,nos termos do art. 1.881 do atual Código Civil brasileiro.

Concluindo, o que se percebe é que a expressão  testa-

mento vital  ou biológico não é correta quanto à categoriz-ação jurídica, pois o que se propõe não é um  testamentoem si. Por isso, propomos que a sua denominação, naprática, seja alterada para declaração vital  ou biológica.

3.5 DOS CODICILOS

 A palavra codicilo tem origem latina, significa pequeno código, pequeno escrito, e sua origem remonta àpalavra  codex . Trata-se de ato de última vontade, assimcomo é o testamento, mas um ato simplificado para o quala lei não exige tanta solenidade em razão de seu objeto ser

considerado de menor importância para o falecido e paraos herdeiros. Exatamente por isso, o codicilo não servepara legar bens imóveis, pois é forma inadequada paratanto, sendo, portanto, nula disposição nesse sentido, pordesrespeito à forma.

O codicilo serve para legar móveis, roupas ou joias depouco valor e de uso pessoal do falecido (art. 1.881 do CC). A noção de pouco valor não se afere em termos absolutos,

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mas sim relativos. Uma joia que valha muito pode ser depequeno valor se comparada à totalidade dos bens do fale-cido. Nesse sentido, Zeno Veloso explica que “há que serfeito um balanço, uma comparação entre o valor da dis-posição contida no codicilo com o montante dos bens

deixados pelo falecido. O que é muitíssimo e quase tudopara um homem de poucas posses pode não significarnada e coisa alguma para um milionário” ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.576). Washington de Barros Monteiro vê “uma tendência no sentido de fixar-se determinadaporcentagem: haver-se-á como de pequeno valor a liberal-idade, podendo por isto ser objetivada num codicilo, senão ultrapassar 10% do valor do monte” (Curso..., 2003, v.6, p. 153).

Para ilustrar, sobre os bens que podem ser deixadosem codicilo, já decidiu o Tribunal Gaúcho:

“Ação anulatória de Codicilo. Meio hábil para legar bens

móveis de reduzido valor. Redução das disposições.Excluem-se do codicilo joias e relógios – bens de alto valor –por serem incompatíveis com a natureza da disposição de

 vontade, restrita a bens móveis de reduzido valor” (TJRS, Apelação Cível 70015923808, Rel. Des. Brasil Santos, j.29.11.2006).

No caso em tela, entendeu o Tribunal do Rio Grandedo Sul que “o codicilo é o meio hábil para legar móveis,roupas ou joias, não muito valiosos, de seu uso pessoal. Oinstituto em questão deve se restringir a diminutasquestões patrimoniais, na forma do disposto no art. 1.881do Código Civil. No entanto, fica ao critério do julgador aapuração dos valores dos bens deixados por meio de codi-

cilo. Sendo um critério subjetivo, os valores dos bens

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devem ser apurados e verificados em cada caso concreto,pelo juiz. Havendo bens de elevada monta, devem ser ex-cluídos e integrar o monte-mor. Portanto, o Douto Jul-gador adequadamente excluiu do codicilo as joias deixadaspara o filho Ricardo. Ocorre que tais joias não podem ser

consideradas de pouco valor como constou no codicilo.São inúmeros relógios, alguns de ouro, outros de marcafamosa (Cartier), além de várias joias de ouro, cujo valornão é insignificante. Assim, apenas devem ser desconsid-eradas as determinações constantes do codicilo sobre as joias, pois são bens de elevada monta, mantendo-se hígidoo ato nas demais deliberações”.

Note-se que pelo princípio da conservação dos negó-cios jurídicos, considerou-se o codicilo apenas ineficaz notocante à parte dos bens de elevada monta legados em fa- vor do filho do falecido. Não se reconheceu a invalidade docodicilo, pois este continua hígido, ou seja, válido e eficaz,quanto às demais disposições.

Também é interessante a decisão do Tribunal de Mi-nas Gerais que seguiu a ideia pela qual o pequeno valordos bens deixados em codicilo se apura de acordo com opatrimônio do falecido:

“Codicilo. ‘Donativo de pequeno valor’. Relatividade. Na

falta de um critério legal para se aferir o ‘pequeno valor’ dadoação, será este considerado em relação ao montante dos bens do espólio, além de dever-se respeitar a última vontadedo doador, máxime não havendo herdeiro necessário”(TJMG, Processo 1.0000.00.160919-7/000(1), Rel. Des. Or-lando Carvalho, j. 14.12.1999).

Superadas tais exemplificações, destaque-se que pode

ainda o autor do codicilo fazer disposições sobre seu

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próprio enterro. A título de exemplo, o autor pode dizerque quer ser enterrado em um determinado cemitério deuma cidade do interior, onde estão os seus parentes, bemcomo determinar que seu desejo é ser cremado.

Também o codicilo é meio idôneo para deixar esmolasde pouca monta a certas e determinadas pessoas, a es-tabelecimentos particulares de caridade ou de assistênciapública e aos pobres de certo lugar. Para a interpretaçãodessa previsão, o Código Civil determina que a disposiçãogeral em favor dos pobres se refere àqueles do lugar dodomicílio do testador quando de sua morte (art. 1.902 do

CC).Podem ainda ser objeto de codicilo:

a) Sufrágios por intenção da alma do codicilante, como é ocaso de celebração de uma missa na Igreja Católica (art.1.998 do CC).

 b) Nomeação e substituição de testamenteiro (art. 1.883 doCC).

c) Perdão do indigno (art. 1.818 do CC).

Diferentemente do testamento, o codicilo tem formasimplificada e basta que o seu autor redija um escrito par-ticular, o date e assine, sem a necessidade de testemunhas

ou de qualquer outra formalidade. Se não for datado ouassinado, o negócio jurídico em questão será nulo, tam- bém por desrespeito à forma.

 A lei não se refere expressamente à possibilidade de ocodicilo ser redigido de forma mecânica, ou seja, por dat-ilografia ou digitação, mas a doutrina e a jurisprudênciaadmitem majoritariamente a validade dos codiciloselaborados dessa forma. Entendendo por essa

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possibilidade, transcreve-se a seguinte decisão, doTribunal Paulista:

“Sucessão hereditária. Codicilo. Saque de valores con-sideráveis, mantidos em contas bancárias pelo ‘de cujus’,

após seu falecimento. Existência de documento onde expôs,o falecido, desejo de que, por sua morte, o dinheiro deposit-ado em caderneta de poupança ficasse para legatária. Dis-posição que não foi revogada por nenhuma outra. Juntadade outras declarações em que se dispôs sobre destino a serdado a bens após a morte do declarante. Documentos queconstituem inequivocamente manifestações de última

 vontade. Contas-conjuntas, outrossim, que revelam entreeles as primeiras declarações prestadas pela inventarianteque não tem o condão de afastar o direito da requerida dereceber o objeto da liberalidade. Recurso improvido” (TJSP,

 Apelação Cível 243.266-4/0-São Paulo, 1.ª Câmara deDireito Privado, Rel. Elliot Akel, j. 02.09.2003, v.u.).

No caso em tela, como bem apreciado pelo Promotor

de Justiça, com citação a outro julgado, “o fato de não tersido observada a forma hológrafa, embora contrarie o con-tido no artigo 1.881, do Código Civil, não deve ser óbice à validade e eficácia do ato, na medida em que o codicilo foidevidamente datado e assinado pelo testador. Logo, nãodevem ser anuladas as disposições de última vontade dode cujus, por simples apego à forma legal, em detrimentoda finalidade do ato e da vontade do autor da herança”.

Em sentido contrário, defendendo a nulidade do testa-mento em casos tais, temos as extensas e históricas liçõesde Carlos Maximiliano:

“O Código Civil consagrou a inovação contida nos arts.

2.456 a 2.458 do Projeto Coelho Rodrigues, adotada nos

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arts. 1.819 a 1.821 do Projeto de Beviláqua: o codicilo é es-crito, datado e assinado pelo disponente e contém determin-ações sobre o seu enterro, esmolas de pouca monta a pess-oas designadas ou aos pobres de certo lugar, nomeação ousubstituição de testamenteiros, bem como legados de imó-

 veis, roupas ou joias do uso pessoal do hereditando e nãomuito valiosas (arts. 1.651-53). Quanto à forma externa, ad-otou exclusivamente a hológrafa simplificada, em vigor naquase unanimidade dos países europeus para disposições deúltima vontade. Nenhuma das outras é admissível, conformese infere das razões seguintes: a) Os preceitos sôbre a formade atos jurídicos são de Direito estrito, não se entendem poranalogia, não se transferem de uma para outra espécie. b)

Em auxílio desta conclusão lógica vem o elemento histórico.Beviláqua propôs que fosse o codicilo – ‘escrito, datado eassinado por pessoa capaz de testar’. A comissão revisorapreferiu manter o disposto na Consolidação das Leis Civis deTeixeira de Freitas; sugeriu o seguinte: ‘Art. 1.993. Os codi-cilos podem ser feitos por oficial público, ou cerrados cominstrumento de aprovação nas costas, ou feitos e assinados

pelo testador, ou por outrem a seu rogo’. Mantinha as trêsantigas formas – pública, cerrada e particular. O Relator Al-fredo Pinto impugnou a galvanização do passado quando ocodicilo desaparecera da legislação da quase unanimidadedos povos cultos; para não romper bruscamente com atradição, transigia apenas relativamente ao codicilo holó-grafo sugerido por Beviláqua e Coelho Rodrigues. A Câmaraacompanhou Alfredo Pinto no restabelecimento do dispostono Projeto Clóvis; e o senado só modificou, ligeiramente, aredação. c) Enfim, a doutrina dos exegetas do Códigogeneraliza-se no sentido de concluir pela existência exclu-siva da forma codicilar hológrafa. 517 – A data é explicita-mente exigida; portanto substancial; se falta, o documentoperde o valor. Neste ponto o repositário de normas afastou-se do sistema por êle adotado, por equívoco, provavelmente;

pois não a considerou essencial em papéis em que sua

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enunciação teria maior utilidade – nos testamentos, por ex-emplo. 518 – Por ser o codicilo um pequeno testamento, nãose faz mister discorrer sobre requisitos comuns aos doismodos de dispor do patrimônio  causa mortis: tudo quantofoi ou será exposto a respeito da capacidade, forma em gerale hológrafa em particular, se aplica também ao codicilo.Consequentemente, não pode ser datilografado, nem pelopróprio disponente. Embora assinado por ele: se é holó-grafo, é manuscrito. A Comissão Revisora propôs que fosseescrito ‘pelo testador, ou por outrem a seu rogo’. O con-gresso preferiu a forma hológrafa simplificada e verdadeira,dos Projetos Beviláqua e Coelho Rodrigues. Logo, prevaleceapenas o que é manuscrito e assinado pelo disponente”

( Direito das sucessões..., 1964, v. I, p. 522-524).

Por oportuno, aproveitamos para indicar julgado doTribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que segue aslições de Carlos Maximiliano e declara nulo o codicilo feitopor meio mecânico, ou seja, em inobservância da formaprescrita em lei: “Verifica-se dos autos que o codicilo foi

datilografado, exigindo-se para a validade formal domesmo que tenha sido manuscrito, ou seja, que tenha aforma hológrafa. Assim, dou provimento ao recurso, paradesconsiderar as determinações constantes do codicilo,por dispor sobre bens de elevada monta, mas sobretudopor impropriedade formal, consistente na ausência de

forma hológrafa” (TJRS, Apelação Cível 70006548143,Des. Stangler Pereira, j. 09.06.2005).

Deve-se frisar que o excesso de formalismo defendidopor Carlos Maximiliano e adotado no julgado em questãoafasta-se das ideias de eticidade e operabilidade que, comoelementos estruturantes do Código Civil de 2002, devemser observados. Desse modo, a forma mecânica do

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testamento particular deve ser aceita, não causando suainvalidade.

 A única ressalva a ser feita é que, assim como ocorrecom testamento particular, se o codicilo for feito mecan-icamente, todas as páginas deverão estar assinadas peloautor do codicilo. Nesse sentido, o Projeto 699/2011, anti-go PL 6.960/2002, corrige o equívoco do atual CódigoCivil e acrescenta um parágrafo único ao art. 1.881, nosseguintes termos: “O escrito particular pode ser redigidoou digitado mecanicamente, desde que seu autor numere eautentique, com a sua assinatura, todas as páginas”.

Quanto à capacidade para fazer codicilo, é a mesmaque se exige para testar, já que ambos são atos de última vontade.

O testamento e o codicilo podem conviver juntamente,segundo o nosso ordenamento jurídico. Dessa forma,mesmo havendo um testamento, nada impede que o testa-

dor elabore ainda um codicilo (art. 1.882 do CC). Poroutro lado, ainda que não queira fazer um testamento,poderá a pessoa fazer um codicilo, prevalecendo o princí-pio da autonomia entre os institutos.

Interessante notar que o codicilo pode ser revogadopor outro codicilo que faça expressa menção à revogação

(revogação expressa) ou que contenha disposição incom-patível com o codicilo anterior (revogação tácita). Poroutro lado, a elaboração de testamento posterior significaa automática revogação do codicilo anterior, se o testa-mento não o confirmar ou modificar (art. 1.884 do CC). Vale aqui dizer que o nosso ordenamento não trata da cha-mada   cláusula codicilar, segundo a qual o testamento

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nulo deve ser aceito, ao menos, como codicilo. Nesse sen-tido, da antiga jurisprudência superior:

“Testamento hológrafo. Nulidade declarada sem a atenu-ação de valer ele como codicilo. Em nosso direito vigente

perdeu o codicilo feição de testamento menos solene, paratornar-se apenas, numa declaração hológrafa, de efeitos eobjeto limitados, escrito, datado e assinado por pessoa capazde testar. Testamento hológrafo. Nulidade. Codicilo. Art. 4.ºdo Código de Processo Civil. Inocorrência de vulneração deletra de lei” (STF, 2.ª T., RE 18.012, Rel. Min. OrosimboNonato, j. 23.01.1951, Ementário 32-02/637).

Dúvida que surge sobre o tema é se poderia um codi-cilo revogar um testamento. A resposta parece ser, em re-gra, negativa. O codicilo não tem o condão de revogar otestamento, mas o testamento pode revogar o codicilo,conforme explicam Sebastião Amorim (Código Civil...,2004, v. XIX, p. 295) e Sílvio de Salvo Venosa ( Direito

civil..., 2003, v. 7, p. 303). Em sentido contrário, afirmaZeno Veloso que, se o codicilo posterior regular matériacontida em testamento anterior e tiver conteúdo possível,poderia haver revogação parcial do testamento(Comentários..., 2003, v. 21, p. 157). Para exemplificar, seo testador deixar todos os seus bens ao sobrinho João edepois, por codicilo posterior, deixar apenas o seu piano à

sobrinha Maria, teria havido revogação parcial do testa-mento. Apesar desse exemplo interessante, a questão écontrovertida.

Por fim, se o codicilo estiver fechado, sua aberturaseguirá os moldes do procedimento previsto para a aber-tura do testamento cerrado (art. 1.885 do CC). Em casos

tais, o juiz, após verificar se o codicilo está intacto, o abrirá

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e mandará que o escrivão o leia em presença de quem oentregou, lavrando-se, em seguida o auto de abertura, queserá rubricado pelo juiz e assinado pelo apresentante (art.1.125 do CPC). Por um equívoco evidente, o Código de Pro-cesso Civil determina que as regras referentes ao testa-

mento particular se aplicam aos codicilos (art. 1.134, IV,do CPC). O equívoco é notado por Sílvio de Salvo Venosaao firmar que, no codicilo, “não há testemunhas a sereminquiridas” ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 189).

3.6 DAS DISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS

Como explica Silvio Rodrigues, quando trata doCapítulo VI do Título III, que se denomina “Das dis-posições testamentárias”, “o legislador edita algumas re-gras que têm caráter meramente interpretativo da vontade

do testador. Ao lado destas, encontram-se outras que sãopermissivas ou proibitivas de determinados comporta-mentos” ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 180). Seguiremos alição do mestre da Universidade de São Paulo e analisare-mos os arts. 1.897 a 1.911 da atual codificação, separando-os de acordo com o tipo de regra que contém, já salient-

ando que a grande maioria das normas tem por objetivointerpretar a vontade do falecido, que não restou clara nadeixa testamentária.

3.6.1 Regras interpretativas

Em se tratando de regras interpretativas, procura o le-gislador suprir a vontade do falecido, buscando seu real

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alcance, quando a disposição de última vontade não é sufi-cientemente clara. Na realidade, teria o legislador duasopções diante da falta de clareza e da dificuldade em fazercumprir a vontade do morto. A primeira seria simples-mente ter por não escrita a cláusula testamentária,

desprezando-se a vontade do falecido em razão da obscur-idade. Nesse caso, seria o testador punido por sua falta declareza, retirando os efeitos da deixa em questão. Contudo,o direito brasileiro, que cultua a inatacável vontade do decujus, faz opção diametralmente oposta, e busca, no textoda lei, dar sentido à vontade que não foi expressa demaneira cristalina.

Em reforço, deve-se deixar claro que as regras aquiestudadas não são normas de ordem pública, mas simformas de preencher eventuais lacunas na vontade do fale-cido. Se a vontade for clara e puder ser cumprida, essas re-gras não serão sequer aplicadas.

Itabaiana de Oliveira compilou algumas regras in-teressantes sobre a interpretação da vontade do falecido(Tratado..., 1952, v. 2, p. 522):

1) A vontade do testador deve ser interpretada do modomais amplo, o que mantém relação com a máxima in test-amentis plenius voluntates testantium interpretamur.

2) A disposição de vontade do  de cujus  deve ser cumprida(defuncti dispositio custodiatur).

3) Deve-se buscar o sentido mais cômodo ao objeto de quese trata e à natureza do ato.

4) Deve-se preferir o sentido próprio geralmente aceito daspalavras, e entender o que, em tais casos, comumente secostuma fazer.

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5) As palavras devem ser interpretadas em seu sentido.

6) Quando uma cláusula testamentária é suscetível de doissentidos, deve-se entender aquele em que pode ter efeito,e não aquele em que nenhum efeito teria.

 A principal regra de interpretação é aquela que de-termina que “quando a cláusula testamentária for sus-cetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que mel-hor assegure a observância da vontade do testador” (art.1.899 do CC). Em nossa opinião, retoma-se o disposto noart. 112 do Código Civil em vigor, para os negócios jurídi-cos em geral, in verbis: “Nas declarações de vontade se

atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que aosentido literal da linguagem”.

O que se percebe é a busca da vontade declarada pelofalecido e não simplesmente a vontade interna que não semanifestou. O preceito tem como inspiração a  teoria daconfiança, que decorre da boa-fé objetiva e se afasta da

teoria subjetivista da declaração. Explica Sílvio de Salvo Venosa que “a interpretação do testamento faz-se sob osmesmos princípios de qualquer ato ou negócio jurídico. Ointérprete deve procurar a real intenção do testador. Osmétodos são os de interpretação em geral: estuda-se aredação, a concatenação lógica, as diversas cláusulas emconjunto, o momento em que foi elaborado o testamento,

o local, a época da vida do testador e seu estado de saúde,as pessoas que o cercavam e com ele conviviam na época,seus amigos e inimigos, seus gostos e desgostos, amores edesamores, tudo, enfim, que sirva para ilustrar o intér-prete, o julgador, em última análise, do real sentido de sua vontade” ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 193).

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Note-se que a determinação da busca pela vontadereal deve ter como base a disposição testamentária em si.Seguindo esse caminho, o intérprete não pode abandonara declaração manifestada na letra do testamento, semfreios, para buscar a vontade do testador (VENOSA, Sílvio

de Salvo. Direito civil..., 2003, v. 7, p. 194).Passa-se então à análise pontual das regras interpret-

ativas previstas na atual codificação civil.

Com relação aos beneficiários de certa disposição,caso o testamento se refira aos “pobres, estabelecimentosparticulares de caridade ou de assistência pública” e não

mencione exatamente as pessoas ou entidades beneficiadas, entender-se-á que são os pobres do lugar dodomicílio do testador ao tempo de sua morte ou os es-tabelecimentos lá localizados (art. 1.902 do CC). Em casostais, os estabelecimentos particulares terão preferênciasobre os públicos (art. 1.902, parágrafo único, do CC). A regra é perfeitamente lógica. Se o testador pretende bene-ficiar determinada instituição indeterminada, presume-seque a vontade do falecido seja de beneficiar alguma en-tidade de seu domicílio, ainda que venha a falecer longedele. Mas se indicar a localidade da instituição, valerá olocal previsto em testamento.

Com relação ao montante a ser recebido pelos herdeir-

os ou legatários nomeados, se o testamento nomear doisou mais herdeiros, sem discriminar a parte de cada um,partilhar-se-á por igual, entre todos, a porção disponíveldo testador (art. 1.904 do CC). A título de exemplo, seMário nomear João e José como seus herdeiros, cada umdeles terá direito à metade da herança, que se presume di-

 vidida em partes iguais. Vale dizer que o texto legal traz

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como conteúdo a regra do  concursu partes fiunt , da di- visão igualitária em referência à obrigação divisível (art.257 do CC).

Por outro lado, o Código Civil prossegue na inter-pretação da vontade do morto de acordo com a forma pelaqual foi redigida a deixa testamentária. Se o testadornomear certos herdeiros individualmente e outroscoletivamente, a herança será dividida em tantas quotasquantos forem os indivíduos e os grupos designados (art.1.905 do CC).

Portanto, se o falecido deixar seus bens para Pedro,

João, Maria e José, a herança será dividida em quatropartes iguais. Porém, se o falecido deixar seus bens paraPedro, João e também para Maria e José, estes emconjunto, criaram-se três grupos: 1/3 para Pedro, 1/3 paraJoão e 1/3 a ser dividido entre Maria e José. Da mesmaforma, se o falecido deixar os bens a Pedro, a Paulo e aosfilhos de Antonio, a divisão será em três partes.

 A regra pela qual, “se forem determinadas as quotasde cada herdeiro, e não absorverem toda a herança, o re-manescente pertencerá aos herdeiros legítimos, segundo aordem da vocação hereditária”, prevista no art. 1.906 doatual Código, realmente nos parece inútil, como apontaSilvio Rodrigues ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 183). Por

óbvio, se não contemplados todos os bens em testamento,ou se parte deles for expressamente excluída, seu destinoserá os herdeiros legítimos, de acordo com a ordem de vo-cação hereditária. Da mesma forma ocorrerá se um bemcerto e determinado for excluído pelo testador (art. 1.908do CC).

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Mais uma vez ilustrando, se o testador deixar 1/3 deseus bens ao sobrinho Pedro e 1/3 ao São Paulo FutebolClube, e nada mencionar com relação ao 1/3 restante, talquinhão seguirá a ordem de vocação hereditária. Damesma forma ocorrerá se deixar todos os seus bens a

Maria, com exceção de um piano. No último caso, o pianoserá partilhado pelos herdeiros legítimos.

Por outro lado, se forem determinados os quinhões deuns e não os de outros herdeiros, distribuir-se-á por iguala estes últimos o que restar, depois de completas asporções hereditárias dos primeiros (art. 1.907 do CC).

Desse modo, se o testador deixar 1/4 de seus bens a Pedroe 1/4 a Maria e o restante a João, Antonio, José eFernando, entregam-se aos dois primeiros seus respect-ivos quinhões e os 2/4 restantes serão divididos em partesiguais entre João, Antonio, José e Fernando, restando 1/8para cada um deles.

Superada a análise dessas intricadas regras de inter-pretação, todas ilustradas, vejamos o estudo das cláusulasrestritivas.

3.6.2 Regras proibitivas e restritivas – da cláusulade inalienabilidade

 As regras proibitivas limitam a vontade do testador,ora retirando a validade, ora a eficácia da deixa testa-mentária, bem como restringindo a ampla liberdade dotestador. Como se nota, as cláusulas em questão são re-stritivas da autonomia privada, da vontade plena do autorda herança.

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 A primeira delas trata da designação do tempo em quedeva começar ou cessar o direito do herdeiro, devendo serconsiderada não escrita, salvo nas disposições fideicomis-sárias. É o que prevê o art. 1.898 do atual Código Civil. Emsuma, não admite a lei que haja herdeiro instituído a

termo, mas apenas sob condição (art. 1.897 do CC). Ex-plica Silvio Rodrigues que a regra visa “evitar a insegur-ança que se pode estabelecer nas relações jurídicas, em virtude da transmissão de bens a termo. Com efeito, é fácilanalisar o inconveniente que representa o fato de ficar odireito do herdeiro testamentário suspenso até o adventodo termo inicial ou de excluir-se tal direito por ocorrênciado termo final” ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 184).

Contudo, não nos parece menos insegura a permissãode herdeiro sob condição. Além disso, se é permitido ofideicomisso, apesar de sua limitação, não compreen-demos os reais motivos que levaram o legislador brasileiroa manter a limitação já existente no Código Civil de 1916

(art. 1.665). De qualquer forma, a norma está em vigor,tendo plena aplicação.

Como a lei só menciona a proibição de herdeironomeado a termo, mas não de legatário, e como as regrasrestritivas de direito não podem sofrer interpretação ex-tensiva, só se pode concluir que é permitida a nomeação

de legatário a termo, como aponta a maioria da doutrina(RODRIGUES, Silvio.  Direito civil..., 2002, v. 7, p. 184; VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil..., 2003, v. 7, p. 197; AMORIM, Sebastião Luiz. Código Civil..., 2004, v. XIX, p.144). O legado de usufruto e de alimentos podem ser con-stituídos a termo.

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 A consequência da nomeação de herdeiro a termo nãomacula a nomeação em si, que apenas ter-se-á por não es-crita, sendo o herdeiro nomeado e desconsiderado otermo. Aproveita-se a parte permitida da declaração,desconsiderando-se apenas a vedada por lei, aplicando-se

diretamente o   princípio da conservação dos negócios jurídicos (utile per inutile non vitiatur). Se houver dúvidaa respeito da existência de um termo ou de uma condição,deve-se concluir pela inexistência do elemento acidental,entendendo-se que a disposição é pura ou simples(VENOSA, Sílvio de Salvo.  Direito civil..., 2003, v. 7, p.197).

Também será nula a disposição em determinadas situ-ações que digam respeito à pessoa do beneficiado peladeixa testamentária. Conforme explica Eduardo de Oli- veira Leite “a lei fulmina de nulidade porque contraria aliberdade essencial das disposições de última vontade etransforma em convenção o que a lei quer que seja es-

pontânea manifestação unilateral” (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 461). Desse modo, enuncia o art. 1.900 do CCque é nula a disposição:

 I – Que institua herdeiro ou legatário sob a condiçãocaptatória de que este disponha, também por testamento,

em benefício do testador, ou de terceiro. A  condição captatória é aquela em que a vontade do

morto não é externada livremente, quer seja porque houvedolo quer porque decorreu de pacto sucessório(BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil ..., 1955, v. VI, p. 103).Entretanto, explica Silvio Rodrigues que “não se trata daproibição genérica da captação dolosa da vontade, em quea cláusula testamentária é anulável, com base no art. 171,

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momento a pessoa é determinável em razão das caracter-ísticas apontadas pelo próprio testador.

Como ilustração, se o testador deixar os bens à pessoamais valorosa da cidade, a disposição é nula. Por outrolado, se deixar à pessoa que recebe menor salário de suafamília, trata-se de disposição válida, por ser determinávelobjetivamente o herdeiro. Relata Washington de BarrosMonteiro que Alexandre Magno, imperador macedônico egrande conquistador da Antiguidade, já moribundo, teriadeixado sua herança “ao mais digno” (Curso..., 2003, v. 6,p. 170). Para o direito brasileiro, a disposição seria nula.

 III – Que favoreça a pessoa incerta, cometendo a de-terminação de sua identidade a terceiro.

Diz Clóvis Beviláqua que “a pessoa incerta, para odireito romano, era aquela que o testador não podia fazeruma ideia clara. Hoje, devemos considerar pessoas incer-

tas as indeterminadas, porque se o beneficiado pelo testa-mento não pode ser determinado, a disposição é irreal-izável” (Código Civil ..., 1955, v. VI, p. 103). A diferençaentre esta hipótese e a anterior é que, na primeira, a pess-oa incerta era indicada pelo próprio testador. Nesta, otestador delegaria ao terceiro indicado o direito de testar,o que revela afronta ao princípio básico do testamento,

pelo qual este é ato personalíssimo e intransferível.

 IV – Que deixe a arbítrio do herdeiro, ou de outrem, fixar o valor do legado.

Novamente, a razão da nulidade é óbvia, pois se o test-ador deixasse a terceiros a fixação do legado, estaria trans-

ferindo o próprio direito de testar, que é personalíssimo. O

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objeto do legado deve ser determinado ou determinável deacordo com os elementos contidos no próprio testamento,para que a efetiva vontade do morto, e não a do herdeiroou legatário, seja respeitada. Aliás, todas as condições decerto negócio deixadas ao arbítrio de certa pessoa são nu-

las, por aplicação analógica da regra que proíbe a condição puramente potestativa (art. 122 do CC).

Como exceção ao dispositivo, valerá a disposição emremuneração de serviços prestados ao testador, porocasião da moléstia de que faleceu, ainda que fique ao ar- bítrio do herdeiro ou de outrem determinar o valor do leg-

ado (art. 1.901, II, do CC). Trata-se de uma sucessão oner-osa, pois a deixa não constitui verdadeira liberalidade, jáque o beneficiário prestou serviços ao falecido.

O instituto traz situação que se assemelha à doação re-muneratória que é feita para agradecer a um serviçoprestado por uma pessoa que não se torna credora emrazão deste, bem como em agradecimento por determin-ada atitude do donatário. Como dispõe o art. 540 do atualCódigo, não se trata de um ato de liberalidade em si, massomente na parte que exceder o serviço prestado. Valedizer, contudo, que a diferença entre os institutos é que,na doação, o disponente celebra contrato que produz efei-tos em vida. Já na disposição testamentária, esta só

produz efeitos após sua morte.

V – Que favoreça as pessoas a que se referem os arts.1.801 e 1.802.

 A lei impede que sejam nomeados em testamento,como esclarece Zeno Veloso, “determinadas pessoas, em

atenção à situação especial em que se encontram,

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possibilitando influências, captação dolosa da vontade,sugestões, comprometendo a autonomia da vontade dotestador, tornando a disposição suspeita ou duvidosa”( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.499). São elas:

– A pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, o seu cônjugeou companheiro, ou os seus ascendentes e irmãos.

– As testemunhas do testamento.

– O concubino do testador casado, salvo se este, sem culpasua, estiver separado de fato do cônjuge há mais de cincoanos.

– O tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão,perante quem se fizer, assim como o que fizer ou aprovaro testamento ou pessoas não legitimadas a suceder, aindaquando simuladas sob a forma de contrato oneroso, oufeitas mediante interposta pessoa.

 A matéria foi analisada no primeiro capítulo da obra,

quando do estudo das regras gerais (item 1.3.3).Também determina a lei que o erro quanto à indicaçãoda pessoa do herdeiro ou do legatário, ou da coisa legada,anula a disposição (art. 1.903 do CC). Entretanto, não seránula a cláusula se, pelo contexto do testamento, por outrosdocumentos ou por fatos inequívocos, for possível identifi-car a pessoa ou coisa a que o testador queria referir-se.

 Assim o é em decorrência do princípio da conservação donegócio jurídico, bem como em razão da busca incansáveldo legislador em respeitar e dar efetividade à vontade domorto ( preservação da autonomia privada). Uma ex-ceção a essa proteção, contudo, pode ser encontrada noart. 1.910 do CC, pelo qual a ineficácia de uma disposição

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testamentária importa a das outras que, sem aquela, nãoteriam sido determinadas pelo testador.

Nas palavras de Zeno Veloso, “o erro, tanto na desig-nação da pessoa do herdeiro ou do legatário (error in per-sonam), como em relação à coisa legada, anula a dis-posição. Este é um caso particular de anulabilidade, pois oerro essencial ou substancial, além deste caso, determina aanulabilidade do testamento (art. 1.859 do CC) ou da dis-posição testamentária (art. 1.909 do CC). Se o erro éacidental, superável, vencível, não há por que deixar deobedecer à vontade do testador” ( Novo Código Civil...,

2006, p. 1.596). No mesmo sentido, Sílvio de Salvo Venosaafirma que “a regra é óbvia e dispensável” ( Direito civil...,2003, v. 7, p. 199) em decorrência das regras previstas naParte Geral do Código Civil, que cuidam do vício do con-sentimento como causa de anulabilidade ou de nulidaderelativa dos negócios jurídicos (art. 138 do CC).

 Vale dizer, todavia, que, nos casos de erro, dolo ecoação, o parágrafo único do art. 1.909 do CC consagra umprazo decadencial de quatro anos, contados de quando ointeressado tiver conhecimento do vício, para anular otestamento. O tratamento é diferente do que consta daparte geral, pois ali o prazo será contado da celebração donegócio ou de quando cessar a coação (art. 178, I e II, do

CC). Ainda no tocante às disposições testamentárias,

permite o legislador que o falecido clausule a herança coma incomunicabilidade, a impenhorabilidade e a inalienab-ilidade do bem. Todas essas cláusulas são restritivas dedireitos, estando previstas no art. 1.911 do CC.

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 A  cláusula de inalienabilidade impede que o herdeiroou legatário transfira a propriedade da coisa herdada oulegada. Com essa cláusula, impossível será sua venda,dação em pagamento, doação ou permuta. Nos termos dasegunda parte do art. 86 do atual Código, o bem passa a

ser inconsumível (inconsuntibilidade jurídica).Em obra sobre o tema, Carlos Alberto Dabus Maluf ex-

plica que “nessa indisponibilidade do bem, nessa paral-isação por algum tempo, em um patrimônio, com a im-possibilidade de transferência ou alienação por seu propri-etário é que consiste o sentido jurídico, a essência da cláu-

sula de inalienabilidade” ( Das cláusulas..., 1986, p. 39).Para o Professor Titular da USP, a cláusula de inalienabil-idade pode ser de quatro espécies (DABUS MALUF, Carlos Alberto. Das cláusulas..., 1986, p. 40):

– Inalienabilidade absoluta: é aquela que proíbe a alienaçãode todos os bens a quem quer que seja.

– Inalienabilidade relativa: é aquela em que é permitida aalienação a determinadas pessoas ou quando estiver re-strita a certos bens da herança.

– Inalienabilidade vitalícia: é aquela em que a proibiçãodura a vida toda do herdeiro ou legatário, sendo proibidaa sua perpetuidade (ou seja, se o testador determinar queseus efeitos ultrapassam a vida do beneficiário). Nessasituação, a cláusula obrigatoriamente se extingue com amorte do herdeiro ou legatário.

– Inalienabilidade temporária: é aquela que termina com oadvento do termo ou realização de certa condição.

Pois bem, não há dúvidas de que, caso o bem clausu-lado com a inalienabilidade seja vendido, o negócio será

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considerado nulo, pois o seu objeto é ilícito (art. 104, II, doCC).

 Anote-se, em reforço, que a inalienabilidade não é ab-soluta. Isso porque o herdeiro ou o legatário poderá per-der a propriedade do bem em decorrência de desapropri-ação, ou, ainda, mediante ação judicial, solicitar a vendado bem clausulado. Em ambos os casos, o produtoapurado, quer seja o dinheiro decorrente da desapropri-ação, quer seja um novo bem adquirido com o dinheirodaquele clausulado, estará sujeito também à inalienabilid-ade (art. 1.911, parágrafo único, do CC).

Também são efeitos da cláusula de inalienabilidade aincomunicabilidade   e a   impenhorabilidade   do bem. Assim, a simples menção à inalienabilidade acarreta auto-maticamente a incomunicabilidade e a impenhorabilidadeda herança testada. Esse efeito também consta do  caput do art. 1.911 do CC. Nesse sentido, explicava ClóvisBeviláqua na vigência da lei anterior que “estabelecida ainalienabilidade temporária ou vitalícia, enquanto ela per-dura, o bem está isento de usucapião ordinário, e de pen-hora, porque o bem inalienável não pode ser transferido aoutrem e nem por outrem adquirido” (Código Civil ...,1955, v. 6, p. 110).

 A  cláusula de incomunicabilidade significa que o bem

permanece exclusivamente no patrimônio do beneficiado,independentemente do regime de bens do casamento.Com a aposição da cláusula, se o testador falece e deixa os bens a seu sobrinho, mesmo se este for casado pelo regimeda comunhão universal de bens, sua esposa não terá nen-hum direito sobre os bens, em clara exceção à regra do re-

gime (art. 1.668, I, do CC). Importante anotar que a

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Súmula 49 do Supremo Tribunal Federal já dispunha quea cláusula de incomunicabilidade estava contida na cláu-sula de inalienabilidade.

Em uma visão tradicional, poder-se-ia afirmar que acláusula de incomunicabilidade seria forma de proteçãodo herdeiro, que pode escolher mal seu cônjuge e, em casode separação judicial ou divórcio, ter que partilhar o pat-rimônio herdado. Porém, acreditamos que na realidadepós-moderna é melhor afirmar que a referida cláusula éapenas um exercício da autonomia privada que decorre dalei.

De qualquer modo, como bem leciona Carlos AlbertoDabus Maluf, “se os bens inalienáveis entrassem nacomunhão, passariam a pertencer em parte ao outro côn- juge; entrariam em partilha pela dissolução da sociedadeconjugal e poderiam tocar a pessoas estranhas ao cônjugeque os recebeu com cláusula de inalienabilidade. Nadamais contrário aos fins da lei, que manda cumprir a risca a vontade do testador expressa por essa cláusula” ( Das cláu-sulas..., 1986, p. 49). Tem razão o professor da USP ao jus-tificar que a inalienabilidade deve gerar aincomunicabilidade.

 A  cláusula de impenhorabilidade significa que os bensnão poderão ser objeto de penhora por parte de credores

do herdeiro ou legatário. Nas palavras de Sílvio de Salvo Venosa, “já, de princípio, diga-se que a inalienabilidadeabrange também a impenhorabilidade. Se assim não fosse,facilmente se fraudaria a impossibilidade de alienar. Bastaque um credor, em crédito e execução simulados, levasse o bem à penhora, praça e consequente alienação a terceiros”

(Código Civil..., 2003, v. 7, p. 214). Essa cláusula de

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proteção é oponível a todos os credores sem distinção deorigem do crédito ou data de seu vencimento. Em outraspalavras, é a garantia que tem o titular de um bem clausu-lado ao ser acionado por seus credores por um negóciomalsucedido, explica Carlos Alberto Dabus Maluf ( Das

cláusulas..., 1986, p. 53). Contudo, o professor aponta aque “ela se opõe às dívidas do herdeiro ou legatário, e nãoas do autor da liberalidade, ou seja, o testador” ( Das cláu-sulas..., 1986, p. 54). Nesse sentido decidiu o SuperiorTribunal de Justiça:

“Recurso especial. Sucessão. Dívidas do morto. Testa-mento que grava os imóveis deixados com cláusulas de inali-enabilidade e impenhorabilidade. Possibilidade de penhora,em execução movida por credor do de cujus. 1. Os bens deix-ados em herança, ainda que gravados com cláusula de inali-enabilidade ou de impenhorabilidade, respondem pelas dívi-das do morto. 2. Por força do art. 1.676 do Código Civil de1916, as dívidas dos herdeiros não serão pagas com os bens

que lhes foram transmitidos em herança, quando gravadoscom cláusulas de inalienabilidade e impenhorabilidade, pordisposição de última vontade. Tais bens respondem, en-tretanto, pelas dívidas contraídas pelo autor da herança. 3. A cláusula testamentária de inalienabilidade não impede apenhora em execução contra o espólio” (STJ, 3.ª T., REsp998.031/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j.

11.12.2007, DJ  19.12.2007, p. 1.230).Ressalta também Carlos Alberto Dabus Maluf, com

 base nos estudos de Itabaiana de Oliveira que “se os cre-dores de herdeiro devedor são anteriores à herança, nãopodem julgar-se prejudicados, pois a herança, então, merapossibilidade, não fazia parte ainda do patrimônio do de-

 vedor; se posteriores à aquisição da herança por parte do

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herdeiro, já encontram os frutos e rendimentos dessa her-ança sujeitos à condição de impenhorabilidade, não po-dendo, por isso, alegar a ignorância desse fato” ( Das cláu-sulas..., 1986, p. 54). Mais uma vez, tem razão o professordas Arcadas.

 Ainda quanto às cláusulas, quatro observações mere-cem ser feitas.

 A primeira delas é que tanto a incomunicabilidadequanto a impenhorabilidade podem ser temporárias ou vitalícias.

 A segunda observação a ser feita é que as cláusulas seextinguem automaticamente com a morte do herdeiro querecebeu os bens clausulados, não se transferindo a seusherdeiros, sob pena de perpetuidade não admitida por lei.No caso da incomunicabilidade, a cláusula se extinguequando o bem é vendido ou doado.

 A terceira observação é que a incomunicabilidade e a

impenhorabilidade não geram automaticamente a inalien-abilidade. Como a norma do art. 1.911 do CC é restritiva,não merece interpretação extensiva.

 A quarta observação, na verdade, é uma pergunta: ainalienabilidade e a impenhorabilidade do bem principalatingem automaticamente seus frutos? A matéria é contro-

 vertida. Para Sílvio de Salvo Venosa, isso só ocorrerá sehouver declaração expressa do testador (Código Civil...,2003, v. 7, p. 214). Para Maria Helena Diniz, a impenhor-abilidade pode se estender aos frutos e rendimentos,desde que mediante cláusula expressa, “todavia, não seconsidera justo estender a inalienabilidade aos frutos erendimentos porque o direito do beneficiado reduzir-se-ia

a nada; além de não ter a disponibilidade do bem, não

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poderia aproveitar suas rendas” (Curso..., 2005, v. 6, p.237).

No Estatuto Processual em vigor admite-se a penhorados frutos e rendimentos dos bens inalienáveis, à falta deoutros bens, salvo se destinados à satisfação de prestaçãoalimentícia (art. 650 do CPC com a redação dada pela Lei11.382/2006). Washington de Barros Monteiro admiteque a questão é controversa e “existem prestigiosas de-cisões e expressivos ensinamentos” em ambos os sentidos.Para nós essa extensão somente é possível se houver pre- visão expressa, pois as cláusulas não admitem inter-

pretação extensiva. Assim já decidiu o Tribunal do RioGrande do Sul, admitindo a penhora dos frutos:

“Pela extensão das áreas pertencentes ao executado, pos-sível inferir que os ganhos auferidos com a atividade agrí-cola não se destinam apenas à sua subsistência e de suafamília. Ressalte-se que neste e em outros processos, con-

forme evidenciam as partes litigantes, a impenhorabilidadedos imóveis foi declarada em virtude de estarem gravadosem favor da União e em garantia de cédulas rurais. Tal im-penhorabilidade não se estende aos frutos respectivos.

 Aplicável, por analogia, o disposto no art. 650 do CPC”(TJRS, Agravo de Instrumento 70022816268, Rel. Des. Or-lando Heemann Junior, j. 13.03.2008).

 Ainda ilustrando a prática, o Tribunal de Minas Geraistambém entendeu pela penhorabilidade dos frutos na aus-ência de cláusula expressa:

“O fato de o bem locado ser gravado com cláusula de im-penhorabilidade não afasta a possibilidade dos respectivosalugueres serem penhorados, pois, para tal, seria necessária

cláusula expressa estendendo a impenhorabilidade do bem

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aos seus frutos e rendimentos” (TJMG, Processo2.0000.00.415512-6/000(1), Rel. Des. Elias Camilo, j.11.03.2004).

“Agravo. Execução. Impenhorabilidade. Plantação.

Frutos. São penhoráveis os frutos percebidos, assim consid-erados o produto que, embora havido de um bem impen-horável, tenha dele se separado, pela pessoa que o possuía”(TJMG, Processo 2.0000.00.375949-9/000(1), Rel. Des.Eulina do Carmo Almeida, j. 22.08.2002).

Por outra via, demonstrando como a questão é contro- versa, o Tribunal Gaúcho já afastou a possibilidade de

penhora:

“Agravo de instrumento. Tratando-se de imóvel gravadocom cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e in-comunicabilidade são impenhoráveis os frutos e rendimen-tos do bem. Agravo improvido” (TJRS, 11.ª Câmara Cível,

 Agravo de Instrumento 198103491, Rel. Manoel Velocino

Pereira Dutra, j. 28.04.1999).

 Ato contínuo de ilustração, a impenhorabilidade dosfrutos foi reconhecida pelo mesmo Tribunal quando acláusula testamentária expressamente a menciona: “Bensimóveis gravados com as cláusulas de incomunicabilidade,inalienabilidade e   impenhorabilidade, inclusive quanto

aos frutos e rendimentos. Se a testadora ou doadoratornou impenhorável não só o bem imóvel como tambémseus frutos e rendimentos, não cabe a penhora dosaluguéis” (TJRS, 16.ª Câmara Cível, Agravo de Instru-mento 70003336047, Rel. Genacéia da Silva Alberton, j.28.11.2001).

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Em conclusão, a par dos conflitos jurisprudenciais,entendemos que a simples cláusula de impenhorabilidadeou inalienabilidade do principal não atinge os frutos que,como acessórios, poderão ser penhorados. Apenas com amenção expressa na cláusula aposta à liberalidade é que a

impenhorabilidade atinge os frutos.Outro ponto interessante é que, na hipótese de o testa-

dor desejar criar apenas a incomunicabilidade ou a impen-horabilidade, poderá fazê-lo não mencionando a inalien-abilidade. Se, por outro lado, desejar apenas a cláusula deinalienabilidade, sem que esta inclua a incomunicabilid-

ade ou a impenhorabilidade, poderá mencionar expres-samente no testamento que a inalienabilidade não implicaautomaticamente a incomunicabilidade ou a impenhorab-ilidade. Isso porque, quando o art. 1.911 do CC dispõe que“a cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por atode liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunic-abilidade”, apenas estende os efeitos da deixa. A norma

não é de ordem pública, mas sim de ordem privada, ad-mitindo previsão em contrário de acordo com a vontadedo falecido.

O art. 1.848, caput, do atual Código cria verdadeira re-strição à previsão das cláusulas à legítima. Vejamos o teorintegral do dispositivo.

“Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no test-amento, não pode o testador estabelecer cláusula de inalien-abilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade,sobre os bens da legítima.

§ 1.º Não é permitido ao testador estabelecer a conversãodos bens da legítima em outros de espécie diversa.

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§ 2.º Mediante autorização judicial e havendo justa causa,podem ser alienados os bens gravados, convertendo-se oproduto em outros bens, que ficarão sub-rogados nos ônusdos primeiros”.

Determina o caput  do comando legal destacado que seforem apostas as cláusulas restritivas de direito à legítima,caberá ao testador motivá-las, justificá-las, sob pena de, seimpugnadas, não valerem. Assim, poderá o herdeiroimpugná-las judicialmente requerendo sua nulidade porausência de motivação ou por serem injustas. Essa açãodeclaratória de nulidade de cláusula, para nós, é impre-

scritível, pois além da questão envolver nulidade absoluta(ordem pública), tem caráter predominantemente declar-atório (critério científico de Agnelo Amorim Filho –  RT 300/7 e 744/725).

O § 1.º do dispositivo visa a proteger a legítima, pre- vendo não ser possível, por meio de cláusula testa-

mentária, retirar o caráter de proteção da cota dos her-deiros necessários. A  conversão  significa a determinaçãodo testador para que os bens da legítima fossem transfor-mados em outros, ou seja, o testador deixa uma fazenda edetermina que esta seja alienada e com o dinheiro se ad-quiram títulos da dívida pública (conversão). A partilhaem vida não se confunde com a conversão, mas a questão

será tratada de maneira mais profunda no Capítulo 4 dapresente obra.

De acordo com o § 2.º do art. 1.848 do CC, é possívelretirar a cláusula de inalienabilidade instituída medianteação judicial específica e desde que haja, mais uma vez, justa causa para tanto. Trata-se do   abrandamento das

cláusulas vitalícias, o que teve aplicação recente na

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 jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conformese extrai de acórdão assim publicado no seu  Informativon. 468:

“Testamento. Cláusulas vitalícias. Abrandamento. A 

Turma asseverou ser possível, em situações excepcionais denecessidade financeira, flexibilizar a vedação do art. 1.676do CC/1916 e abrandar as cláusulas vitalícias de inalienabil-idade, impenhorabilidade e incomunicabilidade impostasem testamento. Na espécie, a autora recorrida, ao promovero procedimento especial de jurisdição voluntária na origem,requereu o levantamento das cláusulas incidentes sobre o

imóvel rural deixado por sua avó sob a alegação de que es-taria passando por graves dificuldades financeiras. Deacordo com a Min. Relatora, o legislador, ao editar o referidodispositivo, buscou responder às preocupações familiares,assegurando aos descendentes a proteção do patrimônio, o

 bem-estar e o amparo financeiro diante das incertezas de or-dem econômica e social. Contudo, consignou que, havendoalterações supervenientes e significativas na situação fática

do herdeiro, como na hipótese dos autos, a impossibilidadede desconstituir os referidos gravames pode ocasionar-lhemaiores prejuízos. Assim, ressaltou que a limitação dodireito de dispor livremente dos bens não pode ser absoluta,devendo ser avaliada à luz da função social da propriedade eda dignidade da pessoa humana. Afirmou ainda que oabrandamento dessas cláusulas constitui medida que mel-

hor atende à vontade do testador nos termos dos arts. 85 e1.666 do CC/1916. Por fim, frisou que o art. 1.911, parágrafoúnico, do CC/2002 passou a possibilitar a alienação de benspor conveniência econômica mediante autorização judicial.Precedente citado: REsp 10.020-SP, DJ 14/10/1996” (STJ,REsp 1.158.679-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.07.04.2011).

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Especifica a lei, ainda, que os produtos dessa vendatambém estarão protegidos pelas cláusulas antes instituí-das. A título de exemplo, uma mulher recebe como her-ança um bem com a cláusula de inalienabilidade. Trata-sede um imóvel que vale R$ 100.000,00. Entretanto, o seu

marido fica gravemente doente e não pode mais trabalhar,sofrendo essa família um sério desfalque em suas rendas.Nesse caso, pode ser proposta uma demanda visando aautorizar a venda do imóvel. Após a autorização judicial, oimóvel poderá ser vendido, permitindo que a famíliapague as dívidas anteriores e, ainda, deposite um bom nu-merário em conta-poupança, conforme determinar a sen-tença. Se com o restante a herdeira comprar uma casa no valor de R$ 30.000,00, sobre este bem incidirão as cláu-sulas anteriores, pois produto da alienação autorizada.

Pois bem, quanto ao  caput  do art. 1.848, o coautorFlávio Tartuce até via com bons olhos a necessidade de justificativa para as cláusulas. Entretanto, como interroga

Zeno Veloso, “por que impor ao testador o constrangi-mento de afirmar, justamente no ato de disposição de suaúltima vontade, que estabelece a inalienabilidade porqueseu filho é um gastador, um perdulário e que, provavel-mente, vai arruinar ou dilapidar o patrimônio que rece- berá, ficando na miséria? Ou que ordena a impenhorabil-

idade porque o herdeiro é viciado no jogo, em bebidas, ouem tóxicos, e vai assumir dívidas, comprometendo os bensde sua legítima? Ou que determina a incomunicabilidadeporque seu filho casou-se com uma aventureira, que só domarido apaixonado e lerdo consegue esconder o objetivode enriquecer, dando o golpe do baú?” ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.544). Os ensinamentos do professor

paraense fizeram Flávio Tartuce mudar seu entendimento,

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pois muitas vezes a justificativa da cláusula pode até serevelar violadora da dignidade humana, como nos exem-plos citados.

Realmente a questão de justificativa das cláusulas é bastante subjetiva e será analisada pelo juiz à luz do casoconcreto e sempre com base na ideia de função social dapropriedade. Um bem inalienável pode, em certos casos,não atender a sua função social, cabendo ao juiz verificaras razões do falecido, que não poderá justificá-las porrazões óbvias. Aconselha-se, na prática, que o testador nãomeça palavras no momento da justificativa para que se

evite a futura alegação de nulidade da cláusula. En-tretanto, essas palavras encontram limites na proteçãomáxima da pessoa, particularmente no princípio da dig-nidade humana.

O que se percebe, na realidade, é que a expressão justacausa constante do art. 1.848 do CC é mais uma cláusulageral, uma janela aberta deixada pelo legislador, parapreenchimento caso a caso.

Conclui-se, ainda, que a intenção do legislador foirealmente limitar os poderes do falecido sobre a legítima,eis que nunca foram vistas com bons olhos as restriçõesimpostas pelo testador. Isso porque denotam certoegoísmo do morto e trazem, na maior parte das vezes, séri-

os prejuízos aos herdeiros.Deve-se salientar, ainda, que o Projeto 699/2011, anti-

go PL 6.960/2002, de autoria do Deputado Ricardo Fiuza,pretende alterar o art. 1.848 para que seja acrescido um §3.º com a seguinte redação: “Ao testador é facultado, livre-mente, impor a cláusula de incomunicabilidade”. Pela pro-

posta legislativa, não haveria mais a necessidade de

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 justificativa para a cláusula de incomunicabilidade. Comisso se abrandam os problemas citados por Zeno Veloso,idealizador da proposta.

 A necessidade de motivação inexistia na vigência doCódigo Civil revogado. Uma questão fica definitivamenteresolvida, uma vez que se o testamento foi elaborado na vigência do CC/1916 e a morte do testador ocorreu na vigência daquele diploma, o CC/2002 não retroage e, port-anto, não há que se exigir a dita motivação às cláusulastestamentárias. Assim já concluiu o Tribunal Mineiro:

“No caso, a sucessão foi aberta em 2001, antes, portanto,da entrada em vigor do novo Código, de forma que a espécieestá regida pelo Código Civil anterior e não pelo atual.

 Aquele não exigia condição ou motivação da cláusula. Este éínsito, porque as cláusulas de inalienabilidade, de impen-horabilidade, de incomunicabilidade foram instituídas noDireito Pátrio como forma de proteger o patrimônio deixadopara herdeiros contra riscos diversos que poderiam levar àperda, à dilapidação ou ao seu desvio. Essa é a motivação dacláusula, de forma que há uma motivação implícita, que nãoprecisa estar expressa, mesmo porque o Código Civil antigonão a exigia” (TJMG, 4.ª Câmara Cível, Processo1.0378.06.019568-2/001(1), Rel. Des. Moreira Diniz, j.25.10.2007).

Todavia, mais uma vez, surge um conflito de direitointertemporal que precisa ser esclarecido. Se o testamentofoi elaborado na vigência do Código Civil de 1916 – sem amotivação das cláusulas –, mas a sucessão ocorreu já na vigência do Código Civil de 2002 – que prevê a necessid-ade de motivação –, as cláusulas produzirão efeitos?

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artigos 1.848 e 2.042, ambos do Código Civil. Intenção denão aditar que se delineia ante o decurso de quase 9meses do prazo. Restrição que não prevalece”(destacamos). A decisão adotou a primeira das possíveisinterpretações, que, segundo o nosso entendimento, não é

a melhor. A interpretação adotada pelos Ilustres Desembar-

gadores foi a literal ou a gramatical. Da leitura dodispositivo poder-se-ia inferir que o Código Civil de 2002determinou ao testador que motivasse as cláusulas, sobpena de não valerem naquele período de um ano. Se essa

interpretação fosse a correta, perguntamos: por que anorma consta das disposições finais e transitórias quecuidam de direito intertemporal? Explicamos a partir depremissas formuladas.

– Premissa n. 1: Para as sucessões abertas na vigência donovo Código Civil, as cláusulas precisam ser motivadas,

sob pena de não valerem (art. 1.848).– Premissa n. 2: Para as sucessões abertas no prazo de um

ano a partir da vigência do novo Código Civil (entre 11 de janeiro de 2003 e 11 de janeiro de 2004) as cláusulas pre-cisam ser motivadas, sob pena de não valerem (art.2.042).

– Conclusão: O art. 2.042 é inútil, pois só repete o teor doart. 1.848 e não trata de regra de transição, já que em todae qualquer sucessão aberta após 11 de janeiro de 2003 ascláusulas necessitam de justificativa.

O alcance da regra é o direito intertemporal. Dessemodo, se a sucessão for aberta entre 11 de janeiro de 2003e 11 de janeiro de 2004 as cláusulas não precisam de mo-

tivação ou justificativa, pois tal prazo é aquele concedido

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para a motivação. Entretanto, se o óbito ocorrer após 11 de janeiro de 2004, a motivação é necessária.

Em verdade, o Código Civil, em seu art. 2.042, sus-pende os efeitos do art. 1.848 por mais um ano. Assim, adisposição dali constante só passou a produzir efeitos em11 de janeiro de 2004 e não antes.

 Aliás, com relação às sociedades e associações, omesmo fenômeno ocorreu (art. 2.031) e, mesmo com as al-terações posteriores (Lei 10.838/2004, Medida Provisória234/2005 e Lei 11.127/2005), as regras do Código Civilnão produziram efeitos até janeiro de 2007. Portanto,

parece-nos equivocada a decisão supratranscrita.Nesse sentido, afirma Mário Luiz Delgado que, para as

sucessões abertas no interstício desse prazo, valem as re-strições, independentemente de justificação no testa-mento. Ocorrendo a abertura da sucessão depois de ex-pirado o prazo de um ano, as cláusulas restritivas não jus-

tificadas serão tidas como não escritas, sem qualquer com-prometimento da validade do testamento ( Problemas...,2004, p. 143). Outra não é a lição do mestre paraenseZeno Veloso sobre o tema: “obviamente, para as sucessõesque se abrirem depois de um ano da entrada em vigor donovo Código Civil, aplica-se o que determina o  caput  doart. 1.848” ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.699).

Resumindo, as conclusões a que se chega são asseguintes:

1) Para o testamento elaborado sob a vigência do CódigoCivil de 1916 e ocorrendo a morte sob a vigência dessediploma: não há necessidade de justificação de cláusulas.

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2) Para o testamento elaborado sob a vigência do CódigoCivil de 1916 e ocorrendo a morte sob a vigência do CódigoCivil de 2002: não há necessidade de justificação de cláu-sulas se o óbito ocorreu entre 11 de janeiro de 2003 e 11 de

 janeiro de 2004.

3) Para o testamento elaborado sob a vigência do CódigoCivil de 1916 e com morte ocorrida sob a vigência doCódigo Civil de 2002: há necessidade de justificação decláusulas se o óbito ocorreu a partir de 11 de janeiro de2004.

4) Para o testamento elaborado sob a vigência do CódigoCivil de 2002: sempre haverá necessidade de motivação

das cláusulas.

Exatamente nessa linha de deduções, decidiu oTribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

“Apelação cível. Registro de testamento. Possibilidade decláusula de inalienabilidade, incomunicabilidade e impen-

horabilidade inserta em testamento, sem escusa de justacausa, para as sucessões abertas até um ano após a entradaem vigor do novo Código Civil. Inteligência do artigo 2.042,do Código Civil vigente. Apelação desprovida. À análise doinstrumento público de testamento, se constata, pronta-mente, a inexistência de qualquer aditamento relacionando

 justa causa à cláusula condicional. Desse modo, resta ob-temperar, como bem salientado pelo magistrado singular, asucessão foi aberta no prazo de um ano após a entrada em

 vigor do Código Civil de 2002. No caso dos autos, o óbito datestadora ocorreu em 05 de agosto de 2003, decorridos setemeses da promulgação do novel diploma civil, razão pelaqual se tem como válida a última disposição da falecida, noponto, ainda que condicionada” (TJRS, 5.ª Câmara Cível,

 Apelação Cível 70014654560, Rel. Ana Maria Nedel Scalzilli,

 j. 25.05.2007).

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também, ser negativa se o falecido estipular que somentedeixará bens ao sobrinho se ele não tiver casa própria. Noúltimo caso, para que a pessoa assuma a qualidade de her-deiro, o fato previsto pelo testador (“ter casa própria”) nãopode ter ocorrido.

Remontando ao estudo da condição constante daParte Geral da codificação, também aqui é importanteapontar que esta pode ser classificada de acordo com osseguintes critérios:

I) Quanto aos efeitos:

• Condição suspensiva: é aquela que impede que a avençaproduza efeitos até o advento da condição, ou seja, subor-dina a eficácia do negócio a um evento futuro e incerto.Exemplo: serás meu herdeiro se estiveres casado. Antesdo evento – casamento – o beneficiário tem apenas direitoeventual e, por isso, não pode exigir a entrega da herança.

•  Condição resolutiva: é aquela em que o negócio produz

efeitos desde logo, podendo tornar-se sem efeito se a con-dição ocorrer. Aqui há uma subordinação da ineficácia donegócio a um evento futuro e incerto. Exemplo: será leg-atário de uma casa, mas, se adquirir outra no período deum ano, deixará de sê-lo. Ocorrendo a compra, a deixatestamentária perde seus efeitos. Com a verificação dacondição, extingue-se o direito do legatário, mas os efeitos

produzidos antes da verificação mantêm-se, desde quecompatíveis com a natureza da condição e com os ditamesda boa-fé. Portanto, no exemplo citado, todos os frutosque o herdeiro recebeu não necessitam ser restituídos como advento da condição resolutiva. Entretanto, se o leg-atário sob condição resolutiva vendeu a casa a terceiro queconhecia a condição, a venda estará desfeita quando se re-solver a sua qualidade.

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II) Quanto à origem, levando-se em conta a vontadedas partes:

• Condição puramente potestativa: é aquela que subordinaos efeitos do negócio jurídico à vontade exclusiva de uma

das partes, ao seu inteiro arbítrio, sem a interferência deato externo. Exemplo:   nomeio João meu herdeiro, seaprouver a Carlos. Conforme consagra o Código Civil em

 vigor, é nula essa condição, o que pode gerar a nulidadedo negócio como um todo (art. 122 do CC).

• Condição potestativa simplesmente ou meramente potest-ativa: é aquela que subordina os efeitos do negócio

 jurídico à vontade de uma das partes e também a umacontecimento que escapa de sua alçada. Exemplo:nomeio João legatário de minha casa se ele conseguir umemprego no Hospital. O ato de conseguir o emprego de-penderá da vontade do legatário, mas não só. Dependetambém do tempo, da existência de vagas, da aprovaçãopelo empregador etc. A doutrina exemplifica como con-dição meramente potestativa a frase do devedor:   Devo,não nego, mas pago quando puder!   A condição mera-mente potestativa é plenamente válida.

III) Quanto à licitude:

•  Condições ilícitas: são aquelas contrárias à lei, à ordempública e aos bons costumes (art. 122 do CC). Como exem-

plo de condição contra os bons costumes, temos aquelaem que o testador nomeia João seu herdeiro, se este trairsua esposa mensalmente. Além disso, será condição con-trária à ordem pública aquela em que o testador legar um

 bem a seu sobrinho, desde que este se case com sua pró-pria mãe, havendo um incesto. Também serão considera-das ilícitas as condições que privam o negócio jurídico de

qualquer efeito, o que se denomina condição perplexa (ou

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incompreensível ou contraditória). Ilustrando, será perpl-exa a condição se o testador nomear João seu único her-deiro, caso ele transfira todos os bens recebidos a uma in-stituição de caridade. Por fim, são ilícitas as condições quesujeitam o negócio jurídico ao puro arbítrio de uma daspartes, ou seja, as condições puramente potestativas.

•  Condições lícitas: são definidas por exclusão, desde quenão estejam contidas na categoria anterior.

Importante apontar que, em se tratando de condiçãoilícita, nulas serão a condição e a deixa testamentária, oque não significa, necessariamente, que todo o testamento

será nulo, pois se aplica o brocardo  utile per inutile nonvitiatur, do qual decorre o princípio da conservação dosnegócios jurídicos. A título de exemplo, se eu nomear notestamento João como legatário de meu carro desde queele mate seu próprio pai, sendo José o herdeiro do rest-ante dos bens, a nulidade do legado em favor de João nãocontaminará a nomeação do herdeiro José.

Superado o estudo da condição, percebe-se que o art.1.897 não faz menção à nomeação de herdeiro a termo,sendo a sua redação: “Art. 1.897. A nomeação de herdeiro,ou legatário, pode fazer-se pura e simplesmente, sob con-dição, para certo fim ou modo, ou por certo motivo”.Como é notório, o termo subordina os efeitos do negócio

 jurídico a um evento futuro e certo e gera ao titular donegócio um direito adquirido, e não apenas direitoeventual.

 A dúvida que surge quanto ao tema é a seguinte: épossível a inserção de um termo no testamento? A res-posta é negativa. O art. 1.898 do CC, antes estudado,

proíbe expressamente a instituição de herdeiro a termo,

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salvo na hipótese de substituição fideicomissária. A matéria será mais bem explicada quando do tratamentodos legados.

Outro problema prático que surge é como distinguir otermo da condição para fins de verificação da validade dadisposição testamentária. Esclarecendo, explica Itabaianade Oliveira que: “a disposição é a termo a) se certo oacontecimento (dies certus an) e certa a época de sua real-ização (dies certus quando), o dia 1.º de janeiro, ou de ho- je a 30 dias, porque a referência é feita para um tempo fix-ado no calendário, ou porque pode ser desde logo calcu-

lado; b) se é certo o acontecimento (dies certus an) e in-certa a época de sua realização (dies incertus quando), nodia em que falecer Tício, porque a morte é certa, emboraincerto o seu dia. É condicional: a) se incerto o aconteci-mento (dies incertus an), mas determinando para certaépoca em que poderá se realizar (dies certus quando), nodia da maioridade de Tício, por que este pode morrer

antes de atingi-la; b) se é incerto o acontecimento (dies in-certus an), é também incerta a época em que poderá serealizar (dies incertus quando), exemplo, no dia docasamento de Tício – porque o casamento pode deixar deefetuar-se” (Tratado..., 1952, v. 2, p. 492).

Permite ainda a lei que o herdeiro ou legatário seja

nomeado por disposição modal (com encargo ou modo).Trata-se de um gravame, um verdadeiro ônus que acom-panha a liberalidade e que pode ser imposto pelo testadorem benefício próprio ou de terceiros. Exemplos: nomeioJoão meu legatário, com o encargo de ele construir umaestátua em minha homenagem ou de um terceiro; nomeioMaria minha herdeira com o encargo de ela cuidar de

minha tia idosa na cidade de Jaú, Estado de São Paulo.

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É muito importante perceber que o encargo não seconfunde com a condição, pois enquanto a condição im-pede a aquisição e o exercício do direito, o encargo só im-pede o exercício do direito e não a aquisição, incorpor-ando, consequentemente, o direito ao patrimônio do her-

deiro ou legatário nomeado. Dessa forma, determina oCódigo Civil que o encargo não suspende a aquisição nemo exercício do direito, salvo quando expressamente im-posto no negócio jurídico pelo disponente como condiçãosuspensiva (art. 136 do CC). Além disso, considera-se nãoescrito o encargo ilícito ou impossível, salvo se constituir omotivo determinante da liberalidade, caso em que se in- valida o negócio jurídico (art. 137 do CC).

Lembre-se de que o herdeiro ou legatário com encargopode ser obrigado pelo beneficiário a prestar uma cauçãochamada de muciana se assim o exigirem os interessados.Essa caução recebe esse nome em homenagem a seu autorMucio Sevola (MONTEIRO, Washington de Barros.Curso..., 2003, v. 6, p. 161).

Caso o encargo não seja executado pelo herdeiro oulegatário, explica Sílvio de Salvo Venosa que “o encargopode ser exigido em ação judicial por qualquer in-teressado. Assim, qualquer coerdeiro pode fazê-lo, já quesem o encargo a coisa voltará a ser partilhada entre os de-

mais herdeiros, se assim dispôs o testador. Caso contrário,o herdeiro ou legatário não é despojado da coisa, massubmete-se a perdas e danos. Vale, outrossim, o exame da vontade do testador” ( Direito civil ..., v. 7, p. 196).

Zeno Veloso, com base nos ensinamentos de Pontes deMiranda, não segue a opinião de Sílvio de Salvo Venosa e

explica que “a inexecução do encargo não tem a

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consequência de,   ipso iure, tornar ineficaz a disposição.Os herdeiros do testador, ou quem apresente interesselegítimo, podem requerer em juízo a ineficácia da liberal-idade, e a sentença opera efeitos  ex nunc” ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.591).

Silvio Rodrigues, por outro lado, reconhece que “emnenhum lugar declarou o legislador, genericamente, que odescumprimento do encargo infirma a eficácia de liberal-idade. O princípio apenas se encontra afirmado especifica-mente, para o caso de doação onerosa, no art. 562 doCódigo Civil. A doutrina, entretanto, opina torrencial-

mente no sentido de que, descumprido o encargo, podequalquer interessado promover a declaração de ineficáciada deixa testamentária, a fim de que os bens da herançaou do legado, em virtude de sentença judicial, saiam dopatrimônio do beneficiário inadimplente e passem a quemde direito” ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 189).

Em caso de expressa previsão testamentária pela qualo descumprimento do encargo gera sua ineficácia, decidiuo Tribunal Gaúcho, em decisão da relatoria da Des. MariaBerenice Dias:

“Cláusula testamentária. Condicionado o legado aocumprimento de determinados encargos, o seu inadimple-

mento implica a revogação do benefício. Apelo improvido. Otestador, em seu testamento, determinou que a universalid-ade de seus bens passasse aos apelantes, desde que cumpri-das certas condições, as quais, em síntese, diziam com seu

 bem-estar. E previa que, em caso de inadimplemento, os bens passariam ao sobrinho. (...) O contexto dos autos cor-robora as alegações da inicial no sentido de que os recor-rentes efetivamente não se desincumbiram dos encargos a

que se condicionava o benefício. Farta é a prova documental

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evidenciando as ameaças e os maus-tratos infligidos ao fale-cido enquanto sob os cuidados dos apelantes. Portanto, nãoresta dúvida de que os encargos estipulados não foram satis-fatoriamente adimplidos pelos recorrentes, o que impõe quese reconheça caberem exclusivamente ao apelado os bensdeixados pelo falecido, conforme estabelecido no própriotestamento” (TJRS, 7.ª Câmara Cível, Apelação Cível70001169655, Rel. Maria Berenice Dias, j. 09.08.2000).

Discorda-se da opinião da doutrina majoritária. Real-mente, a inexecução do encargo permite a revogação dadoação pelo próprio doador, ou por seus herdeiros, emcaso do homicídio doloso, caso este venha a falecer (art.561 do CC). Já com relação à herança, não havendo pre- visão expressa, por ser norma restritiva de direito, nãocomporta interpretação analógica. Em nossa opinião, o beneficiário do encargo pode exigir o seu cumprimento e,se o encargo for de interesse geral, o Ministério Públicotambém pode exigir o seu cumprimento. Como exemplo

do último caso, cite-se o encargo de construir uma bibli-oteca ou de preservar certo parque florestal.

Entretanto, caso fosse acolhida a opinião da doutrinamajoritária, qual seria o prazo para o interessado exigir aineficácia da deixa testamentária pelo não cumprimentodo encargo?

Se adotarmos a ideia de que o encargo é uma con-traprestação, seu inadimplemento seguiria o prazo pre-scricional para a resolução do negócio jurídico (dez anosnos termos do art. 205 do CC). Contudo, se nos afastarmosdo caráter de contraprestação, aproximar-nos-íamos dahipótese de revogação por ingratidão sujeita ao prazo dec-adencial (um ano nos termos do art. 559 do CC). Luciano

de Camargo Penteado, ao trabalhar o encargo instituído

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no contrato de doação, colabora imensamente com asolução do problema ao dizer que não há a necessidade decumular o pedido de revogação da doação por inexecuçãodo encargo com a reivindicação, porque a sentença já con-tém a condenação por obrigação de dar coisa certa. Ex-

plica, também, que o caso é mais assemelhado a uma busca do bem porque se frustrou um fim jurídico es-pecífico, como na resolução dos contratos bilaterais, em- bora o descumprimento do encargo seja diverso dela, doque à ideia de revogação decorrente de ingratidão( Doação..., 2004, p. 183).

Seguindo essa corrente quanto ao prazo, pode-se dizerque o próprio art. 559 do CC, ao fixar o prazo da revogaçãoda doação por ingratidão, supostamente deixa claro que anorma não atinge as hipóteses de inexecução do modo.Isso porque o termo inicial da decadência não é a ocorrên-cia do fato, mas sim quando “chegue ao conhecimento dodoador o fato que a autorizar, e de ter sido o donatário o

seu autor”. Assim, o coautor José Fernando Simão en-tende que não faz sentido estender a regra de um ano paraa inexecução do encargo, eis que, em ocorrendo o des-cumprimento do modo, não haverá discussão sobre autor-ia de fatos, nem mesmo a necessidade de que algum fatochegue ao conhecimento do doador. Em conclusão, a

hipótese de revogação da doação por inexecução do en-cargo não estará sujeita ao prazo decadencial de um ano,mas sim ao prazo de resolução dos contratos por inadim-plemento do contratante, ou seja, o prazo de 10 anos con-tados da inexecução (art. 205 do CC). Da mesma forma, oprazo para se declarar a ineficácia da deixa por inexecuçãodo encargo é de dez anos contados da inexecução, se aceita

tal possibilidade como frisado anteriormente.

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Em sentido contrário, o coautor Flávio Tartuce en-tende que o prazo para a revogação da doação é decaden-cial de um ano, por analogia à revogação por ingratidão. Além disso, essa revogação não está sujeita a prazo pre-scricional, pois o encargo não é uma contraprestação, mas

um ônus. Dessa forma, há um direito potestativo de re- vogação, o que justifica a aplicação do prazo decadencial.O prazo prescricional não pode ser aplicado, uma vez queé próprio das ações condenatórias, o que não é o caso. Porfim, se admitido fosse que os interessados promovessem adeclaração de ineficácia da deixa testamentária, tal prazoseria decadencial de um ano.

De qualquer forma, vale lembrar o alerta feito emoutro volume dessa coleção, de que o tema é controver-tido, envolvendo empolgante debate doutrinário e juris-prudencial (TARTUCE, Flávio.  Direito civil..., 2010, v. 3,p. 341-344).

Superada essa discussão, permite ainda o Código Civilque a nomeação de herdeiro ou legatário seja para certomodo ou fim ou por certo motivo (art. 1.897 do CC). A noção de motivo certo nos remete à ideia de que o testadordeclara as razões subjetivas que o levaram a escolher certapessoa como herdeira ou legatária. O testador justifica asua escolha e dá os motivos para tanto, levando-nos à

noção de   falso motivo, previsto no art. 140 do CC. Se omotivo for declarado como razão determinante da deixatestamentária e se revelar falso, pode-se anular o negócio jurídico por erro essencial (arts. 138, 171, II, e 178, II, doCC).

É exemplo de nomeação de herdeiro por motivo certo

a hipótese em que o falecido nomeia João seu herdeiro,

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declarando que assim o faz pelo fato de ter sido ele o bombeiro que lhe salvou a vida em outra oportunidade,quando, na verdade, posteriormente, descobriu-se que o bombeiro foi José. Como outro exemplo, se o testadornomeia determinada pessoa legatária e declara que só o

fez em remuneração a certo serviço que, na verdade, nãofoi prestado pelo nomeado. A análise que deve ser feita nocaso concreto é se o motivo realmente foi determinantepara a nomeação do herdeiro ou se ocorreu simplesmenção de um fato.

Para terminar, quanto à classificação do motivo,

temos dois tipos:

1.º) O motivo impulsivo, que é meramente acessório à dis-posição e não é a sua razão determinante. Se, por exem-plo, o falecido nomear seu sobrinho médico João comoúnico herdeiro e João não for médico, mas sim dentista, adeixa valerá, pois a qualificação do sobrinho não foi o

motivo determinante para a nomeação.2.º) O   motivo final , que é realmente a razão pela qual a

deixa foi feita, sendo sua razão determinante. Ilustrando,se o testador deixar a casa para o sobrinho João porqueele é médico, sendo que na realidade ele é dentista, a deixaperde efeitos.

Superada a análise dessas cláusulas permissivas dotestamento, encerramos o seu estudo. O momento agora éde discorrer sobre o controvertido instituto do legado.

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3.7 DOS LEGADOS

3.7.1 Noções gerais

O legado é a forma de disposição mortis causa a títulosingular. Segundo Maria Helena Diniz, o legado recai ne-cessariamente sobre uma coisa determinada ou uma cifraem dinheiro, sendo, por isso, uma forma de sucessãocausa mortis  a título singular que se assemelha a umadoação, dela diferindo pelo fato de ser unilateral e sóproduzir efeitos com o falecimento do  de cujus (Curso...,

2005, v. 6, p. 299). Em outras palavras, trata-se de deixatestamentária pela qual um bem ou certos bens são at-ribuídos a certa pessoa, seja ela herdeira ou não, em de-corrência da vontade do falecido. Segundo Sebastião Amorim, caso o herdeiro seja nomeado legatário, o legadorecebe o nome de legado precípuo ou prelegado (Código

Civil..., 2004, v. XIX, p. 178).Em se tratando de legado, estamos diante de sucessãoa título singular, diferentemente do que ocorre com a her-ança na qual o herdeiro recebe os bens a título universal.Tanto o herdeiro quanto o legatário são sucessores do fale-cido em razão de sua morte.

 Assim, o legatário necessariamente será nomeado portestamento ou codicilo e, em regra, não suportará as dívi-das da herança. Pessoas nomeadas em testamento para re-ceber o carro do falecido, os bens contidos em seu cofre,um terço do apartamento de praia ou determinada quantiaem dinheiro são exemplos de legatários.

Na prática, percebe-se que são três as pessoas

presentes no legado. Primeiro, o   testador, também

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chamado de legante; o legatário, que é o beneficiado peladeixa e o onerado, aquele que irá cumprir o legado. Caso otestador não nomeie um herdeiro específico para darcumprimento ao legado, todos os herdeiros serão respon-sáveis pelo seu cumprimento. O Código Civil de 2002 di-

 vide a disciplina dos legados em três partes:

– Disposições gerais – arts. 1.912 a 1.922 do CC.

– Dos efeitos dos legados e seu pagamento – arts. 1.923 a1.938 do CC.

– Da caducidade dos legados – arts. 1.939 a 1.940 do CC.

Estudaremos oportunamente esses dispositivos legais. Agora analisaremos as modalidades de legado.

3.7.2 Das modalidades de legado

O Código Civil cuida de várias modalidades específicasde legado de acordo com o tipo de bem deixado pelo testa-dor ao legatário. De acordo com essas especificidades do bem legado, quer seja ele do testador, quer seja do leg-atário, e sendo a coisa certa ou incerta, haverá previsãolegal específica sobre o legado. Vejamos.

 3.7.2.1 Legado de coisa alheia

Em decorrência do princípio geral pelo qual ninguémpode transferir mais direitos do que possui, se o testadorcontemplar o legatário com um bem alheio, ou seja, quenão é de propriedade do falecido, em regra, tal disposição

será ineficaz, não produzindo, portanto, efeitos jurídicos

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(art. 1.912 do CC). De acordo com a chamada Escada Pon-teana, que segue a divisão do negócio jurídico em três pla-nos, conforme ensinamentos de Pontes de Miranda (pla-nos de existência, validade e eficácia), essa situação de at-ribuir bem alheio não atinge a validade da disposição (2.º

degrau), mas apenas lhe retira os efeitos (3.º degrau).Entretanto, podemos explicar três situações de ex-

ceção em que o legado de coisa alheia produzirá efeitos:

a) Se o bem não pertencia ao testador no momento em quetestou, mas lhe pertencer no momento da abertura dasucessão.

Como o testamento é negócio jurídico unilateral quesó produz efeitos após a morte de seu autor, deve-se verifi-car a propriedade do bem legado no momento da aberturada sucessão. Caso, nesse momento, pertença o bem aotestador, o legado é considerado eficaz. Nas palavras de

Maria Helena Diniz, “a aquisição ulterior produz efeito re-trooperante, convalidando o ato” (Curso..., 2005, v. 6, p.303).

 b) Se o testador determinar que o herdeiro entregue bemque lhe pertence ao legatário.

Isso se verifica quando o testador assim dispuser:“deixo meus bens a meu sobrinho João, que deverá en-tregar seu carro a meu sobrinho José”. É a hipótese desublegado na qual o beneficiado pela deixa é chamado desublegatário.

É possível que o testador determine ao herdeiro a en-

trega de bem do próprio herdeiro ao legatário. Como não

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tem o testador poder de legar bem alheio, essa disposição,em princípio é ineficaz, pois o herdeiro terá possibilidadede decidir se entrega ou não a coisa legada. Trata-se de de-cisão que decorre do princípio da autonomia privada, nãopodendo o herdeiro ser constrangido a entregar o bem que

lhe pertence. Nesse caso, a liberalidade vem acompanhadade um encargo, já que traz um ônus ao herdeiro. Se ex-ecutado o encargo ou modo, o herdeiro receberá a her-ança. Caso o ônus seja descumprido pela não entrega do bem, considera-se que o herdeiro renunciou à herança(art. 1.913 do CC). A noção de ônus se revela perfeita nocaso em questão. Isso porque, segundo Antunes Varela, “oônus exigirá do sujeito que realize determinada condutasob pena de não alcançar um benefício ou suportar certoprejuízo” ( Das obrigações..., 2003, v. I, p. 57).

O ônus será apenas do herdeiro nomeado a entregar o bem, o qual poderá cobrar regressivamente dos demaisherdeiros a quota de cada um, salvo disposição em con-

trário do testador (art. 1.935 do CC). Exemplificando, sequatro herdeiros recebem a herança e apenas João tem oônus de entregar ao legatário um carro de sua propriedadeno valor de R$ 20.000,00, após a entrega do bem poderácobrar de cada um dos herdeiros a importância de R$5.000,00, ou seja, suas quotas, pois não há solidariedade

presumida pelo sistema do Código Civil brasileiro (art. 265do CC).

c) Caso o legado seja de coisa genérica, ou seja, aquela de-terminada apenas quanto a seu gênero, qualidade equantidade, ainda que não mais exista no patrimônio dotestador.

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Nessa hipótese o legado é considerado eficaz (art.1.915 do CC). Trata-se de decorrência lógica do princípiopelo qual  genus non perit , ou seja, o gênero não perece(art. 246 do CC). Ilustrando, se o testador legar 100 sacasde café, ainda que no seu patrimônio inexistam sacas ou

existam apenas 20, o legado é eficaz e caberá ao herdeiroobter o restante delas e entregá-las ao legatário. Isso seriaimpossível em se tratando de coisa certa que, perecendo,extingue a obrigação, já que não pode ser substituída poroutra. No caso em questão, sendo a coisa certa, há cadu-cidade do legado (art. 1.939, III, do CC).

Haverá, assim, um encargo para o herdeiro de ad-quirir o gênero legado. Nessa situação, terá o herdeiroonerado o direito de cobrar dos demais os valores e gastoscom a aquisição do gênero (art. 1.935 do CC), sempre demaneira divisível e não solidária. No entanto, o testadorpode prever expressamente o contrário, ou seja, que odireito de regresso não poderá ser exercido. O legatário

terá o direito de exigir que o herdeiro cumpra o encargoutilizando-se dos meios coercitivos para execução daobrigação de fazer e para a entrega de coisa (arts. 247 a249 do CC e arts. 461 e 461-A do CPC).

Cabe ressaltar que o testador pode elaborar o legadocoisa quase genérica. É aquele em que o testador limita o

gênero legado. Exemplificando, se legar cem cabeças de boi das quinhentas que tem em sua fazenda, caso as quin-hentas cabeças pereçam, o legado é ineficaz, pois o gêneroestava restrito pela própria vontade do testador. Não seaplica, então, o comentado art. 1.915 do CC.

Sendo o legado acompanhado de encargo, aplicam-se

ao legatário as regras referentes à doação com encargo

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(art. 1.938 do CC), em especial a regra do art. 553 da codi-ficação em vigor. No caso em questão, entende Sílvio deSalvo Venosa que, caso o legatário descumpra o encargo,haverá verdadeira anulação do legado, que retornará aomonte hereditário ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 242).

 3.7.2.2 Legado que só pertence em parte ao testador

Caso o testador deixe bens ao legatário que apenas emparte lhe pertençam, por decorrência lógica do princípiopelo qual ninguém pode transmitir mais direitos do que

possui, o legado será eficaz quanto aos bens pertencentesao testador e parcialmente ineficaz quanto aos demais bens (art. 1.914 do CC). Quanto à parte ineficaz, aplicam-se as regras expostas no item anterior. Em idêntico sen-tido, se o testador legar bens que existam em quantidadeinferior à coisa legada (art. 1.916 do CC). A título de exem-plo, se legar dois quadros de Portinari, mas apenas um ex-istir quando do falecimento em virtude de o outro ter sidoroubado, vale o legado quanto ao quadro existente.

 As regras tomam por base o princípio da conservaçãodo negócio jurídico que produzirá, ainda que parcial-mente, os efeitos almejados pelo testador.

 3.7.2.3 Legado de coisa singular

Caso o legado recaia sobre coisa singular, este só teráeficácia se, quando do momento do falecimento, o bem seachar entre os bens da herança (art. 1.916 do CC). A coisasingularizada é aquela infungível, que, além de ser in-

dicada quanto à qualidade e quantidade, é única. Exemplo

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disso ocorre quando o testador constitui como legado de-terminado bem imóvel localizado na Av. Paulista, n. 575,em São Paulo. Se o bem não mais estiver no patrimônio dofalecido quando da abertura da sucessão, o legado é in-eficaz. Da mesma forma se for legado o boi da raça Nelore

Xanegu. Se o touro morrer antes de aberta a sucessão, seráineficaz o legado. Na hipótese em que a coisa legada existirentre os bens do testador, mas em quantidade inferior àdo legado, este será eficaz apenas quanto à existente.

 3.7.2.4 Legado de coisa localizada

O testador, em vez de simplesmente indicar o bem leg-ado, pode mencionar no testamento o lugar no qual os bens se encontram. Isso se verifica, por exemplo, nahipótese em que o testador legar todos os bens que estãoem certo cofre, ou os móveis que estão na sala de jantar,ou todos os dólares que se encontram sob seu colchão.

Caso os bens legados tenham sido removidos peloautor da sucessão, entende-se que a deixa se tornou in-eficaz por vontade do próprio falecido. Trata-se de inter-pretação do art. 1.917 da atual codificação, pela qual o leg-ado de coisa certa que deva encontrar-se em determinadolugar só terá eficácia se nele for achada, salvo se removida

a título transitório. A regra comporta uma exceção: se os bens foram removidos em caráter transitório, ou seja, emcaráter não definitivo, o legado produzirá seus efeitos.Para ilustrar, se os móveis da sala foram retirados emrazão de obras, o legado ainda é eficaz. Por outra via, se osmesmos móveis foram vendidos pelo testador, que precis-ava de dinheiro, ou enviados pelo próprio testador à suacasa de praia, o legado se tornará ineficaz.

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Certo é que, se terceiros removerem os bens do lugarindicado pelo falecido, o legado é considerado eficaz e,portanto, o legatário, como novo proprietário, poderáreivindicá-los de quem injustamente os possua.

 3.7.2.5 Legado de crédito – legatum nominis

O crédito, apesar de ser bem imaterial, pode ser objetode legado, pois dotado de valor econômico. Com a morte,em se tratando de sucessão legítima, o herdeiro receberátodos os bens (inclusive os créditos) e as dívidas do fale-

cido. Portanto, se o falecido quiser destacar um créditoque tem para receber e constituir um legado, cujo objeto éo próprio crédito, poderá fazê-lo.

Note-se que, em vida, a pessoa poderia fazer umacessão gratuita do crédito (art. 286 do CC). Quando damorte, basta que faça um testamento legando o crédito. A 

diferença entre a cessão gratuita de crédito e o legado éque a primeira decorre de negócio jurídico  inter vivos e osegundo, de negócio mortis causa.

 A eficácia do legado dependerá da extensão do créditotestado e do valor deste quando da abertura da sucessão(art. 1.918 do CC). Ilustrando, se o crédito legado for deR$ 100.000,00, mas o devedor já pagou R$ 20.000,00 aocredor antes de sua morte, o crédito legado será de apenasR$ 80.000,00.

Sendo legado o crédito, estarão abrangidos todos osseus acessórios, tais como juros, multa e garantias, in-cidindo a regra pela qual o acessório segue o principal.

Caso o crédito esteja representado por um título decrédito (ex.: nota promissória ou letra de câmbio), deverá

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necessário à subsistência. Deve o testador ser expresso nosentido de tratar de legado com fins alimentares. Surgeuma dívida de valor e não de dinheiro (art. 1.710 do CC).Sobre o tema já decidiu o Tribunal do Rio Grande do Sul:

“Legado. Cumprimento. Alimentos. Fixação. A disposiçãodeve ser interpretada em atenção à vontade da testadora,

 buscando-se sempre atender o desejo de sua volição. Assim,quando determina que a beneficiária tenha casa, sustento,

 vestuário e saúde, indubitavelmente indicou um legado dealimentos, que são periódicos por natureza, devendo persi-stir enquanto viva a pessoa indicada e ser cumprido com as

forças apreciáveis da herança. Apelações desprovidas”(TJRS, Apelação Cível 70009068198, 7.ª Câmara Cível, Rel.José Carlos Teixeira Giorgis, j. 03.11.2004).

Nesse contexto, o legado de alimentos abrange osustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver (art. 1.920 do CC). Se o legatário for menor, inclui

também a educação. A hipótese é de legado a termo,sujeito a evento futuro e certo. Desse modo, caso opte porele, o testador pode, nesse caso, estabelecer termo distintoda morte do legatário. Como exemplo, pode ser citado ocaso de legado de alimentos pelo prazo de cinco anos con-tados da abertura da sucessão.

Se não houver valor fixado pelo próprio testador,

caberá ao juiz fixá-lo considerando as necessidades do leg-atário beneficiado e também as forças da herança, uma vezque por elas será o encargo suportado. Conforme explicaGiselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, nesse caso oquantum alimentar poderá ser alterado se também se al-terarem as causas que determinam sua fixação e, graças a

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sua finalidade, será sempre inalienável e impenhorável(Curso avançado..., 2006, v. 6, p. 403).

Segundo Flávio Augusto Monteiro de Barros, “o leg-ado de alimentos, em vez de ser extraído da herança, podeser imposto como encargo ao herdeiro ou legatário, assu-mindo o perfil de sublegado. Exemplo: diz o testador –Paulo é meu herdeiro, desde que pague uma pensão ali-mentícia de R$ 500,00 para Maria” ( Manual ..., 2. ed.,2006, v. 4, p. 240).

 3.7.2.7 Legado de usufruto

O usufruto é uma das espécies de direito real sobre acoisa alheia previsto no Código Civil (art. 1.225, IV, doCC). Segundo Washington de Barros Monteiro, “trata-sede um direito real de fruir as utilidades e os frutos de umacoisa, enquanto temporariamente destacado da pro-

priedade” (Curso..., 2003, v. 3, p. 293, atualizada por Car-los Alberto Dabus Maluf). Por meio do usufruto, ficam cin-didos os poderes da propriedade, ficando o nu-propri-etário privado do uso e da fruição da coisa, sendo a possedireta transferida ao usufrutuário. Em razão de seu con-teúdo econômico, o usufruto pode ser instituído por meiodo legado, ou seja, pode ser objeto dessa forma de su-

cessão singular.O legado de usufruto poderá ser feito sob termo ou

sob condição. Caso o testamento silencie a respeito, o usu-fruto será considerado vitalício. Se o legado de usufrutofor em favor de pessoa jurídica, estará limitado ao prazomáximo de 30 anos, por aplicação analógica ao que dispõe

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o art. 1.410, III, do CC. É possível, mais uma vez, o legadoa termo.

 Vale dizer que a instituição de legado de usufruto sofrea seguinte limitação: o testador não pode criar um legadode usufruto sucessivo, ou seja, o usufruto do bem paraJoão, sendo que depois da morte de João, este passa paraJosé. Como se sabe, a única forma de sucessividade ad-mitida por lei seria a substituição fideicomissária que seráanalisada oportunamente.

Deve-se salientar, por fim, conforme ensina Itabaianade Oliveira, que se certa pessoa for usufrutuária, não

poderá legar tal usufruto, pois, com sua morte, o usufrutose extingue e, portanto, estaria dispondo sobre direito deterceiro, ou seja, do nu-proprietário, que terá a pro-priedade consolidada (Tratado..., 1952, v. 2, p. 555).

Interessante é a regra do art. 1.946 do Código Civil arespeito do direito de acrescer entre os usufrutuários. Isso

porque o usufruto voluntário pode surgir por um ato intervivos  (acordo de instituição de usufruto) ou por um atomortis causa (testamento criando o usufruto).

Se tiver por origem um ato inter vivos, falecendo umdos usufrutuários, haverá extinção parcial do usufruto,como regra, e o nu-proprietário receberá a parte extinta

(art. 1.411 do CC). Assim, se o instituidor desejar queocorra o acréscimo, tal direito deve estar expresso no atode instituição.

Por outro lado, se o usufruto decorrer de ato de última vontade, o direito de acrescer entre usufrutuários éautomático, pois assim dispõe o art. 1.946 do Código Civil:“Legado um só usufruto conjuntamente a duas ou mais

pessoas, a parte da que faltar acresce aos colegatários”.

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Deve estar presente, para tanto, a conjunção re et verbis,conforme será explicado no item 3.7 referente ao direitode acrescer.

Sobre o tema do usufruto como direito real sobre coisaalheia, recomenda-se a leitura do volume 4 da presentecoleção (TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil ..., 2010, v. 4, p. 366-382).

 3.7.2.8 Legado de imóvel 

Se determinada pessoa legar um imóvel, coisa certa, edepois adquirir novos imóveis, mesmo que contíguos, olegado não compreende as novas aquisições (art. 1.922 doCC). O legado se restringe ao bem indicado no testamento,não podendo ser ampliado por interpretação, mas apenaspor expressa declaração do falecido. Vejamos um exemplo.Se o testador lega o terreno localizado na Praça Geraldo da

Silva Maia n. 100, em Passos, Minas Gerais, ainda queapós o testamento o testador venha a comprar o terreno vizinho, a nova aquisição não comporá o legado, salvo seassim expressamente determinar. Não há relação entre o bem novo e o antigo.

Entretanto, ressalva Itabaiana de Oliveira que se otestador, depois de ter legado um terreno fechado,aumenta-lhe o recinto, é sua intenção compreender nolegado tudo quanto se acha cercado e, portanto, esseaumento não se considera nova aquisição (Tratado...,1952, v. 2, p. 559).

Por fim, se o testador, após a elaboração do testa-mento, realizar benfeitorias necessárias, úteis ou volup-

tuárias no bem legado, estas pertencerão ao legatário, eis

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recebimento dos frutos (ex.: o legatário receberá os frutosa partir de dois anos contados da morte do testador).

 Ainda com relação aos frutos produzidos pelo legado,curiosa é a regra prevista no art. 1.925 do CC para o legadoem dinheiro. Nessa espécie de legado, os juros só passam aser devidos ao legatário quando for constituída em mora apessoa obrigada a prestá-lo. O fundamento da regra, se-gundo Carvalho Santos, é o seguinte: “A quantia em din-heiro considerada genericamente, ou como parte efetivado patrimônio do testador, é considerada mera quan-tidade e não capital frutífero. Para que vença juros, por

isto mesmo, se faz necessário seja constituída em mora apessoa obrigada” (Código Civil..., 1937, v. XXIII, p. 449).Para Itabaiana de Oliveira, por ser o dinheiro bemfungível, a morte do testador não lhe transfere o domínio,nos moldes do que ocorre com os bens infungíveis, pas-sando ao legatário apenas o direito de exigi-lo judicial-mente, caso o herdeiro não o entregue (Tratado..., 1952, v.

2, p. 566). As explicações da doutrina não nos convencem, e

nesse ponto concordamos com Silvio Rodrigues ( Direitocivil..., 2002, v. 7, p. 211). O herdeiro fica com os jurosproduzidos entre a morte do testador e sua constituiçãoem mora, em evidente enriquecimento sem causa diante

do legatário, o que fere o princípio da eticidade, um dosregramentos básicos do Código Civil de 2002. Quanto àcorreção monetária, não há dúvidas, uma vez que o valordeve ser entregue ao legatário monetariamente corrigido,eis que a correção apenas recompõe o valor de compra damoeda corrido pela inflação.

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Pelo fato de assumir a qualidade de proprietário do bem em decorrência da abertura da sucessão, somente aposse indireta do bem é transmitida ao legatário, per-manecendo a posse direta com o herdeiro até que este oentregue ou até a partilha. Não pode o legatário entrar por

autoridade própria na posse da coisa legada, ou seja, devepedir ao herdeiro e, quando autorizado por ele, entrar naposse (art. 1.923, § 1.º, do CC).

O direito de pedir deverá ser formulado ao testamen-teiro ou inventariante (se um deles estiver na posse do bem), a certos herdeiros (se o testador assim o determin-

ar) ou a todos os herdeiros conjuntamente, conforme ex-plica Itabaiana de Oliveira (Tratado..., 1952, v. 2, p. 563).Nos termos do art. 1.924 do atual Código, fica suspensa apossibilidade de exercício do direito de pedir em trêscasos:

1.º) Quando o legado for sob condição suspensiva, até que se

 verifique a condição.2.º) Quando o legado for a termo, até que este se verifique.

3.º) Quando pender litígio sobre a validade do testamento.Nesse caso, necessário será aguardar o trânsito em jul-gado da demanda e o seu desfecho. Entretanto, se a dis-cussão versar sobre determinada cláusula apenas, comopor exemplo o reconhecimento de um filho, a regra não seaplica, pois o vício de uma cláusula não contamina o todo,podendo o legatário pedir o legado desde logo.

Explica Washington de Barros Monteiro que o pedidode entrega do legado deve ser feito judicialmente peranteo Juízo do inventário, sendo ouvidos antes da decisão ju-dicial: o testamenteiro, os herdeiros e a Fazenda. São suaspalavras: “Deferido, lavrar-se-á o termo de entrega ou de

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pagamento, observadas as formalidades legais. Observe-se, porém, desde logo, que o legado não pode ser entreguesem prévio pagamento de direitos fiscais” (Curso..., 2003, v. 6, p. 199).

Qualquer uma das partes ouvidas poderá discordar daentrega da posse do legado, desde que justifique osmotivos para tanto. Um motivo relevante para impedir atransferência do legado está presente quando o falecidomorreu insolvente e, assim, o bem legado será partilhadoentre seus credores. Nesse caso, será necessário ao leg-atário aguardar a partilha para que a posse lhe seja trans-

ferida. Caso venha a falecer o legatário, o direito de pedirse transfere aos seus herdeiros, pois a propriedade já lhefoi transmitida com a morte do testador.

O pedido de entrega pode ser deduzido pelo legatárionos autos do inventário. Todavia, se o herdeiro se recusara entregar o bem legado, caberá ao legatário a propositurade ação reivindicatória autônoma.

 3.7.3.2 Do pagamento do legado – legado de rendavitalícia ou de prestação periódica

Em se tratando de legado de renda vitalícia (prestaçãopaga até a morte do beneficiário) ou de pensão periódica(paga em certo período de tempo), determina o CódigoCivil que estas serão devidas a partir do momento damorte do testador (art. 1.926 do CC). Em casos tais, opagamento deverá ocorrer da forma determinada pelotestador.

Caso o legado determine o pagamento sem mencionar

o seu termo inicial, a sua morte será considerada como tal

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marco (art. 1.927 do CC). A título de exemplo, se o legadodeterminar o pagamento de uma quantia a cada 30 dias, aprimeira prestação vencerá 30 dias após sua morte e assimsucessivamente.

De resto, existe grande semelhança entre tais modal-idades de legado e o contrato de constituição de renda(arts. 810 a 813 do CC), sendo certo que a diferença se dápelo fato de o legado só produzir efeitos mortis causa e aconstituição de renda efeitos inter vivos. Se o pagamentofor feito uma vez por ano, morrendo o legatário noprimeiro dia do ano, terão os herdeiros o direito de exigir

a prestação por inteiro, pois esta não é adquirida dia a dia,como ocorre na constituição de rendas (art. 811 do CC),mas por inteiro, no primeiro dia do período (art. 1.927 doCC).

 Ainda que seja adquirida no início do período deforma integral, a prestação só será exigível ao final do per-íodo estipulado. Aplica-se ao caso o art. 1.928 do CC, peloqual “Sendo periódicas as prestações, só no termo de cadaperíodo se poderão exigir”. O direito se adquire noprimeiro dia, mas sob termo suspensivo, ou seja, os efeitosficam suspensos até o último dia do período, não podendoser exigido antes disso.

Isso porque o direito existe, é válido, mas não é eficaz,

de acordo com os planos do negócio jurídico magistral-mente explicados por Pontes de Miranda.

Exemplificando, se o testador legar a importânciamensal de R$ 1.000,00 ao legatário, e morrer no dia 31 dedezembro de 2006, no dia 1.º de janeiro de 2007 o leg-atário já terá direito ao valor integral de R$ 1.000,00, que

só será exigível em 1 de fevereiro de 2007. Após o prazo de

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exigibilidade, inicia-se o prazo de prescrição da pretensão,que será de três anos (art. 206, § 3.º, II, do atual CC). En-tretanto, se a renda tiver caráter alimentar, estaremos di-ante de exceção à regra, e o pagamento deverá ser feitonão ao final, mas no início de cada período (art. 1.928,

parágrafo único, do CC).

 3.7.3.3 Do pagamento do legado – legado de coisa incerta

 A coisa incerta é aquela determinada pelo seu gênero,qualidade e quantidade; o objeto é indeterminado, porém

determinável. Para ilustrar, o legado será de coisa incertase o testador legar cem bois nelores do seu lote que con-tém quinhentos animais dessa raça.

 As regras da obrigação de dar coisa incerta, previstasnos arts. 243 a 246 do atual Código, são aplicadas ao leg-ado. Como, em regra, o devedor tem o fardo obrigacional,

será dele o direito de escolha das coisas a serem entreguesao credor, salvo se o contrário não resultar do título daobrigação, que no caso seria o testamento (art. 244 doCC). Dessa forma, o herdeiro, considerado o devedor, teráo direito de escolher quais bens deve entregar ao legatário,não podendo entregar os de pior qualidade, pois o critérioadotado pelo legislador foi o do fator médio ou meio-

termo (arts. 244 e 1.929 do CC). A regra atende aos princí-pios da eticidade e da equivalência das prestações. A escolha da coisa média é boa e justa para o herdeiro e parao legatário.

Da mesma forma é possível que o testador determineque a escolha será feita por um terceiro (legatum elec-

tionis) que não seja o herdeiro nem o legatário. Este

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terceiro deve seguir idêntico critério, o de entrega da coisamédia, segundo prevê o art. 1.930 da atual codificaçãoprivada. Pelo mesmo dispositivo, se esse terceiro não quis-er nem puder exercer o ato, ao juiz competirá fazê-lo, tam- bém guardado o meio-termo entre as congêneres de mel-

hor e pior qualidade.Por fim, poderá o testador determinar que o próprio

legatário escolha a coisa legada dentro do gênero (legatumoptionis). Nesse caso, poderá o legatário escolher a melhorcoisa do gênero, não sendo obrigatório seguir o critério domeio-termo, conforme o art. 1.931 da atual codificação. O

motivo para tanto seria o fato de que, se o testador deupoderes de escolha ao legatário, na qualidade de credor, é justamente porque pretendia que este exercesse livre-mente a opção, sem peias. Nos dizeres de Antunes Varela,“as partes devem contar com todas as prestações possíveiscontidas no vínculo obrigacional, e não é aplicável àescolha, o princípio de que ela deva obedecer a regras de

equidade” ( Das obrigações..., 2003, v. I, p. 834). Em quepese o apoio da doutrina, a regra nos parece injusta e, emdecorrência da boa-fé e do respeito à igualdade das partes,não poderia o legatário ser tratado de maneira diferentedo herdeiro, salvo se houvesse expressa disposição testa-mentária nesse sentido. De qualquer modo, a parte final

do art. 1.931 mitiga a regra, prevendo que se não houveruma coisa melhor, a coisa dada será outra congênere, domesmo tipo, observado o meio-termo previsto no outroracomentado art. 1.929.

Em se tratando de   legado alternativo, que é aqueleque recai sobre uma ou outra coisa, determina a lei que aescolha será do herdeiro, na qualidade de devedor que é

(art. 1.932 do CC). Como se vê, o legado alternativo segue

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a regra geral da obrigação alternativa (art. 252, caput , doCC). A obrigação alternativa é aquela que contém duas oumais prestações em seu vínculo, e o devedor dela se exon-era entregando apenas uma; há dois ou mais objetos no vínculo (in obligatione) e apenas um na execução (in

solutione).Caso haja perda de um ou de todos os objetos altern-

ativamente legados, devem ser aplicadas as regras dosarts. 254 e 255 do CC, analisando-se a culpa ou não do de- vedor na perda, bem como a quem competia o direito deescolha. Isso porque o art. 1.940 do Código Civil trata

apenas parcialmente do tema, ao dispor que se uma dascoisas legadas perecer – no todo ou em parte –, o legadosubsiste quanto ao remanescente, ao que sobrar.

No silêncio do testamento, a escolha competirá aoherdeiro e não ao legatário (art. 1.932). Caso o direito deescolha seja do legatário ou do herdeiro e estes venham afalecer antes do exercício do direito que lhe é atribuído,este se transfere a seus herdeiros (art. 1.933 do CC). Casohaja mais de um herdeiro para efetuar a escolha, esta deveser feita por unanimidade e não por maioria, por aplicaçãoanalógica do art. 252, § 3.º, do CC. Pelo mesmo disposit-ivo, caso não haja unanimidade, o juiz deverá fixar prazopara a decisão dos herdeiros e, se, mesmo assim, não

houver consenso, o juiz decidirá.

 3.7.3.4 Do pagamento do legado – da responsabilidade edas despesas

Caberá a todos os herdeiros o cumprimento do legado,

salvo disposição específica do testador em sentido diverso

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(art. 1.934 do CC). Isso porque, sendo sucessor a títulouniversal, é o herdeiro quem recebe todo o patrimônio (at-ivo e passivo) do falecido, e dele deve destacar o bem leg-ado. Desse modo, cada herdeiro responde proporcional-mente por seu quinhão pelo legado a ser pago. Caso in-

existam herdeiros e a herança seja toda dividida em leg-ados, os legatários assumirão o dever de entrega dos bens,na proporção do que herdaram.

Se houver apenas um herdeiro ou legatário indicadopelo testador, somente a ele caberá o cumprimento do leg-ado, podendo, então, cobrar dos demais herdeiros regres-

sivamente seus quinhões na dívida, salvo se o contrárioexpressamente dispôs o testador (art. 1.935 do CC).

Por fim, determina a lei que quando indicados mais deum herdeiro ou legatário para o cumprimento do encargo,os onerados dividirão entre si o ônus, na proporção do querecebam da herança (art. 1.934, parágrafo único, do CC).Com isso, afasta-se da regra que presume a divisão doônus em partes iguais (concursu partes fiunt ), para seguiro montante dos quinhões. Com uma concreção prática, aregra ficará bem compreendida. Em razão do testamento,João recebe 60% da herança, José recebe 30% e Pedroapenas 10%, e o testador institui Maria legatária da im-portância de R$ 1.000,00. Se o testador determinar que

João cumpra o legado, somente ele será responsável pelopagamento da importância de R$ 1.000,00. Contudo, apóspagá-la, poderá cobrar regressivamente de José a quantiade R$ 300,00 e de Pedro, R$ 100,00, ou seja, proporcion-almente às suas quotas.

Se o testador nada determinar sobre a quem cumpre o

legado, todos os herdeiros serão responsáveis pelo

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pagamento, mas não de maneira solidária e sim divisível,de acordo com o quinhão herdado. No exemplo citado,João responderá por R$ 600,00, José por R$ 300,00 ePedro por R$ 100,00.

Da mesma forma, se o testador, no presente exemplo,determinar que o herdeiro João deve entregar à legatáriaMaria o carro de R$ 10.000,00 que pertence a João, estepoderá optar, nos termos do art. 1.935 do CC, por:

– entregar seu carro à legatária e cobrar dos demais herdeir-os suas quotas na dívida, ou seja, R$ 3.000,00 de José eR$ 1.000,00 de Pedro; ou

– não cumprir a ordem do testador, o que significa renúnciaà herança.

 As despesas e os riscos da entrega da coisa correm porconta do legatário, salvo disposição em contrário do testa-dor (art. 1.936 do CC). Isso porque, com a morte do testa-

dor, o legatário se tornou dono do objeto legado, re-cebendo os seus frutos e arcando com os seus custos.Sendo proprietário, aplica-se o brocardo res perit domino,ou seja, a coisa perece para o dono.

Cabe ao legatário pagar o imposto de transmissão do bem. Nas sábias palavras de Washington de Barros Mon-teiro, “deve suportar ainda outros gastos que se tornemimprescindíveis (guarda, depósito, embalagem, trans-porte, sustento); os incômodos devem ser sofridos, curial-mente, por aquele que aufere vantagens (ubi commoda,ibi et incommoda)” (Curso..., 2003, v. 6, p. 206). Por fim,o bem legado será entregue com os seus acessórios, nolugar e no estado em que se achava ao falecer o testador,

passando ao legatário com todos os encargos que o

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onerarem (art. 1.937 do CC). Esclarecendo, é o caso de to-das as obrigações propter rem incidentes sobre a coisa eque acompanham o direito de propriedade (dívidas decondomínio ou IPTU existentes, também as referentes aoforo ou laudêmio, em se tratando de bem enfitêutico), bem

como dos ônus reais (hipoteca, penhor ou anticrese).

 3.7.3.5 Da caducidade dos legados

 A caducidade significa a ineficácia do legado poracontecimentos verificados após ter sido elaborada a liber-

alidade pelo testador, conforme define Sebastião Amorim(Código Civil..., 2004, v. XIX, p. 208). O legado, instituídode forma válida e eficaz, em razão de certos motivos defato ou de direito, perde sua força, sendo então impossívelseu cumprimento ou ficando a deixa sem sentido.

 Vale dizer que não se trata de nulidade da disposição

por vício de consentimento ou em razão de incapacidadeabsoluta do testador. De acordo com os planos do negócio,ou, didaticamente, a  Escada Ponteana, a caducidade dolegado se encontra no plano da eficácia e não no da ex-istência ou da validade.

 As razões para a caducidade podem ser de ordem ob- jetiva, ou seja, dizer respeito ao objeto legado, ou de or-dem subjetiva, quando o motivo se referir à pessoa do leg-atário (art. 1.939 do CC). Vejamos esse tratamentodiferenciado.

São razões de ordem objetiva  para a caducidade doslegados:

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a) Transformação da coisa: se depois do testamento, o test-ador modifica a coisa legada, ao ponto de já não ter aforma nem lhe caber a denominação que possuía (art.1.939, I, do CC). Para Eduardo de Oliveira Leite, ahipótese se aplica quando a coisa legada sofrer   espe-cificação (hipótese de ouro em barras que é transformadoem anéis, ou seja, de alteração da coisa por um trabalhohumano); confusão (quando duas coisas líquidas ou gaso-sas se misturam, tais como vinho e água),   comistão(quando duas coisas sólidas se misturam, tais como o sal eo açúcar) ou quando ocorre   adjunção   (sobreposição decoisas, tal como a tinta que é aplicada sobre a tela, form-ando um todo) ( Direito civil..., 2004, v. 6, p. 249). É im-

portante destacar que a caducidade só ocorre quando atransformação da coisa é feita pelo testador ou à sua or-dem. Na hipótese de alteração provocada por terceiro oude caso fortuito, o legado subsistirá.

 b) Alienação da coisa: se o testador, por qualquer título, ali-enar no todo ou em parte a coisa legada. Nesse caso, o leg-ado caducará até onde a coisa deixou de pertencer ao test-

ador (art. 1.939, II, do CC). Se, em vida, o testador alienoua coisa e esta não é mais do proprietário, clara está a suaintenção de retirar os efeitos do legado, razão pela qual hácaducidade, não sendo relevante se a alienação foi a títulooneroso ou gratuito.

c)   Perecimento da coisa: se a coisa perecer ou for evicta, vivo ou morto o testador, sem culpa do herdeiro ou do leg-

atário incumbido do seu cumprimento (art. 1.939, III, doCC). Caso a coisa pereça por força maior ou caso fortuitoou, ainda, em razão da evicção (quando um terceiro cha-mado evictor prova ser o real proprietário do objeto leg-ado), o legado caducará sem culpa do herdeiro e, port-anto, haverá apenas a extinção da obrigação de entregá-la.Em outras palavras, ocorrerá a sua resolução sem culpa.

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Se o perecimento for parcial, o legado persistirá quanto àparte intacta (art. 1.940 do CC).

Interessante notar que se o legado desaparece depoisda morte do testador, seja por caso fortuito (evento total-

mente imprevisível) ou força maior (evento previsível, masinevitável), o legatário, na qualidade de dono da coisa,suportará a perda (res perit domino). O legatário só nãosuportará tal perda se o herdeiro devedor estiver em mora,pois, nesse caso, o herdeiro suportará os ônus do caso for-tuito e da força maior. No último caso, como se vê, aplica-se a regra do art. 399 do CC.

Por outro lado, caso o perecimento ou a evicção de-corra de negligência ou imprudência do herdeiro, ocorreráa resolução culposa, hipótese em que terá o culpado o de- ver de indenizar o legatário.

Pois bem, por outra via, são razões de ordem subjetivada caducidade:

a) Indignidade: se o legatário for excluído da sucessão, nostermos do art. 1.815 do CC, conforme a previsão do art.1.939, IV. Por óbvio, se excluído da sucessão, perde o leg-atário a legitimidade para suceder o falecido e não poderáser beneficiado pelo legado.

 b)   Premoriência: se o legatário falecer antes do testador

(art. 1.939, V, do CC). Ora, se for premorto o legatário,não terá ele capacidade de direito, pois sua personalidadematerial, para suceder, extinguiu-se com a sua morte.

 Vale lembrar que é requisito essencial para que a pessoaseja herdeira ou legatária que esteja viva quando da aber-tura da sucessão.

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 Além das hipóteses previstas no já analisado art. 1.939do CC, o legado caducará quando houver renúncia do leg-atário, quando este falecer antes do implemento da con-dição suspensiva e quando for incapaz de suceder aotempo da abertura da sucessão (art. 1.801 do CC).

Superado o estudo da caducidade do legado, passare-mos ao direito de acrescer entre herdeiros e legatários.

3.8 DO DIREITO DE ACRESCER ENTREHERDEIROS E LEGATÁRIOS

Em regra, se são vários os herdeiros ou os legatários beneficiados por uma disposição testamentária, a renúnciaou a exclusão de um deles significa que o seu quinhão serádividido entre os herdeiros legítimos, conforme explicaSilvio Rodrigues ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 211). A ex-

ceção se verifica quando o testador nomear um substitutoou quando se verificar o direito de acrescer. Nas próximasseções (itens 3.7 e 3.8), trabalharemos em partes separa-das exatamente as situações excepcionais em que o quin-hão não irá para o herdeiro legítimo, mas sim ao substi-tuto, ou acrescerá ao quinhão do herdeiro ou legatárionomeado em testamento.

3.8.1 Conceito de direito de acrescer eregramentos básicos

Conforme leciona Washington de Barros Monteiro, odireito de acrescer se verifica quando o testador contem-

pla várias pessoas, deixando-lhes a mesma herança ou

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legado, em porções não determinadas. Se, por qualquermotivo, vem a faltar um dos concorrentes, sua parteacresce aos demais (Curso..., 2003, v. 6, p. 215). O insti-tuto não é privativo do direito das sucessões, pois ocorretambém nos atos entre vivos. São exemplos de direito de

acrescer inter vivos:

– A Lei 9.610/1998, que trata dos direitos autorais, determ-ina, em seu art. 42, que “acrescer-se-ão aos dos sobre-

 viventes os direitos do coautor que falecer semsucessores”.

– O usufruto instituído por ato inter vivos em favor de maisde uma pessoa, em regra, não gera direito de acrescer,caso um dos usufrutuários faleça. Entretanto, o instituidordo usufruto pode determinar o direito de acrescer (art.1.411 do CC).

– A doação realizada a mais de um donatário, denominadadoação conjuntiva, não gera o direito de acrescer entre osdonatários, em regra. Entretanto, uma forma de sucessãoirregular ou anômala admitida no ordenamento se verificana doação conjunta realizada para os cônjuges. Issoporque determina o Código Civil que se, em tal caso, osdonatários forem marido e mulher, subsistirá na totalid-ade a doação para o cônjuge sobrevivo (art. 551, parágrafoúnico, do CC). Como se vê, trata-se de um direito de acres-cer de origem legal.

Pois bem, a justificativa ao direito de acrescer é o quea doutrina chama de  jus non decrescendi  (ou jus accres-cendi ), ou seja, o direito de não ver diminuído o seuquinhão. Tratando-se de direito de acrescer nas relaçõessucessórias, as regras do instituto só incidem sobre a su-cessão testamentária.

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São regramentos básicos ou princípios do direito deacrescer:

1.º) O direito de acrescer decorre da vontade presumida dotestador quando, pela mesma disposição testamentária,

nomeia herdeiros para toda a herança ou para uma quotadela, ou então deixa vários legatários para uma coisa ouparte dela (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso...,2003, v. 6, p. 216). Portanto, as normas em questão sóserão aplicadas na ausência de clareza da vontade do test-ador. Sendo clara a vontade, as regras não terãoincidência.

2.º) O direito de acrescer pode ocorrer entre herdeiros e leg-atários, pois a lei não restringe a sua aplicação.

3.º) Quando se verifica o direito de acrescer, além do benefí-cio que recebem, o herdeiro ou o legatário também ficamcom o encargo e as obrigações que oneravam o patrimônio(art. 1.943, parágrafo único, do CC). Suponhamos que otestador tenha deixado os seus bens a José e a Flávio, de-

terminando a este último o encargo de doar R$ 1.000,00por mês a uma instituição de caridade. Caso Flávio re-nuncie à herança, e José tenha o acréscimo em seu direito,ficando com todos os bens da herança, José também rece-

 berá o encargo que era só de Flávio. A exceção se verificaapenas se o encargo for personalíssimo, hipótese em quenão se transfere ao coerdeiro. Exemplo de encargo per-

sonalíssimo se daria se Flávio, pintor, tivesse o encargo deretratar a família do falecido testador. José, médico, nãoresponderia pelo encargo, apesar de ocorrer o acréscimo.

4.º) O herdeiro ou legatário não pode receber a herança oulegado repudiando apenas o acréscimo que lhe caiba porforça de lei (art. 1.945 do CC). Se o testador legar o imóvela João e José, renunciando este ao legado, automatica-

mente haverá acréscimo à parte de João. Não pode Joãoaceitar 50% da casa legada e repudiar a outra metade

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acrescida, pois não se admite a aceitação de partes da her-ança (art. 1.808 do CC). Como exceção, admite a lei orepúdio se o acréscimo vier acompanhado de encargos es-peciais. Nesse caso, repudiado o acréscimo, este perten-cerá ao beneficiário do encargo. Exemplificamos: o testa-dor nomeia João e José legatários do imóvel e determinaque João terá o encargo de cuidar da tia idosa do testador.Caso surja para José o direito de acrescer, ele poderá re-pudiar o acréscimo e, no caso, a tia idosa receberá a met-ade do bem que caberia ao legatário João.

5.º) A presença da conjunção re et verbis, em que, por meiode uma única disposição, o testador nomeia o sucessor

para uma coisa, ou para uma universalidade, sem mençãode frações (RODRIGUES, Silvio. Direito civil..., 2002, v. 7,p. 224). Assim: “Deixo a herança para José e João”. Re é acoisa deixada e   verbis   significa que foi deixada numamesma frase. Esclarece Itabaiana de Oliveira que é a  con-

 junção mista: na coisa e por palavras (Tratado..., 1952, v.2, p. 504).

6.º) A presença da conjunção  re tantum  em que a mesmacoisa é deixada para pessoas distintas, mas em cláusulastestamentárias diferentes. Dispõe o testador: “Deixominha casa para João”. E, depois, no mesmo testamento:“Deixo, também, minha casa para José”. É a  conjunçãoreal : somente na coisa. Note-se que a aplicação do direitode acrescer ocorre por ser a coisa indivisível. Se fosse di-

 visível, não haveria o direito de acrescer.

7.º) Por fim, existe ainda a conjunção verbis tantum em quea mesma coisa, na mesma frase, é deixada para mais deuma pessoa em quotas. É a  conjunção verbal : somentepor palavras. “Deixo metade de minha casa para José emetade para João”. Nesse caso, o direito de acrescer nãose verifica.

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3.8.2 Regras quanto ao direito de acrescerconstantes do Código Civil em vigor

O Código Civil traz algumas regras sobre o direito deacrescer, nos arts. 1.941 a 1.946, que devem ser estudadas.

 Vejamos essas regras de forma pontual, aprofundando-ascom exemplos práticos.

Primeiro, quando vários herdeiros, pela mesma dis-posição testamentária, forem conjuntamente chamados àherança em quinhões não determinados, e qualquer delesnão puder ou não quiser aceitá-la, a sua parte acrescerá à

dos coerdeiros, salvo o direito do substituto (art. 1.941 doCC).

 A ilustrar, se deixar meus bens para João e José, eJosé falecer antes do testador, há o direito de acrescer.Nesse caso, João recolherá toda a herança. Da mesmaforma, haverá direito de acrescer se o testador nomearPedro e Paulo herdeiros de 1/3 de seus bens. É a conjun-ção re et verbis.

E na hipótese de o testador deixar metade dos benspara Pedro e a outra para Maria e João? O direito deacrescer só se verificará entre Maria e João (conjunçãomista ou re et verbis), mas não com relação a Pedro (con- junção verbal ou verbis tantum).

 Washington de Barros Monteiro explica que “o art.1.941 também se aplica quando os herdeiros são chama-dos, coletivamente, a recolher a herança ou certa porçãodela, mas não é imprescindível que a convocação se realizepela mesma frase. Desse modo, ainda que o testadorempregue frases diversas, haverá disposição conjunta (re

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tantum), se atribuir indeterminadamente a mesma coisa apessoas diferentes” (Curso..., 2003, v. 6, p. 226).

Não haverá direito de acrescer se houver especificaçãode quotas para os coerdeiros. Vejamos: deixo 1/3 de meus bens para Maria, 1/3 para Pedro e 1/3 para José; a mesmaestipulação poderia ser feita da seguinte forma: “Deixo osmeus bens a José, Maria e Pedro divididos em três partesiguais” (verbis tantum).

Perceba a sutileza dos detalhes na interpretação que alei faz da vontade do morto. Se o testador apenas disserque deixa seus bens para Maria e José (conjunção mista

ou re et verbis) existirá o direito de acrescer entre os her-deiros, mas se disser que os deixa “em partes iguais” (con- junção verbal ou verbis tantum) o direito de acrescer nãoexistirá.

Em conclusão, caso se verifique o direito de acrescer enão exista determinação de substituição, o coerdeiro

acrescentará o seu quinhão à parte dos coerdeiros conjun-tos nas seguintes hipóteses: a) se o coerdeiro morrer antesdo testador; b) se renunciar a herança ou legado, ou destesfor excluído; ou c) se a condição sob a qual foi instituídonão se verificar (art. 1.943 do CC). Por outro lado, caso odireito de acrescer não se verifique, bem como não hajaherdeiro substituto nomeado, os bens serão entregues aos

herdeiros legítimos, seguindo a ordem de sucessão legí-tima ou de vocação hereditária (art. 1.944 do CC).

Superada essa discussão, haverá direito de acrescerentre os colegatários nomeados conjuntamente a respeitode uma só coisa, determinada e certa, ou quando o objetodo legado não puder ser dividido sem risco de desvaloriza-

ção (art. 1.942 do CC). Trata-se de conjunção mista ou re

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et verbis. Para ilustrar, se eu deixar minha casa para Joãoe Pedro, haverá o direito de acrescer entre os colegatários.

Se o bem for divisível, cada legatário receberá umaparte dos bens e, portanto, não haverá direito de acrescer.Conforme explica Itabaiana de Oliveira, “se o objeto dolegado for divisível, desaparece o direito de acrescer, em- bora não fizesse, entre colegatários, distribuição de partes.Exemplo: ‘Deixo a Pedro meu terreno A’ e, depois, emfrase distinta: ‘Deixo a Paulo meu terreno A’. Nesse ponto,nosso Código Civil se afastou da doutrina romana, que ad-mitia, sempre, o direito de acrescer na conjunção real (re

tantum), sem distinguir se o objeto era ou não divisível”(Tratado..., 1952, v. 2, p. 511).

Não existindo o direito de acrescer entre os legatários,o que acontece com a quota vaga? O Código Civil respondea questão, no seu art. 1.944, parágrafo único, segundo oqual: “Não existindo o direito de acrescer entre os coleg-atários, a quota do que faltar acresce ao herdeiro ou aolegatário incumbido de satisfazer esse legado, ou a todosos herdeiros, na proporção dos seus quinhões, se o legadose deduziu da herança”.

Elucidando esse dispositivo, são percebidas duassituações:

1.ª) Se o testador impôs ao herdeiro ou legatário um certoencargo e não se tratando de hipótese que autoriza odireito de acrescer, o ônus incidente sobre a quota vagaserá extinto. Se o testador nomeou João herdeiro com oencargo de pagar R$ 1.000,00 para Maria e R$ 1.000,00para José, e caso este último venha a falecer antes damorte do testador, o herdeiro João ficará desobrigado a

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pagar essa importância, não sendo acrescentada à quotada colegatária Maria.

2.ª) Se o testador nomeou João legatário de metade da casae José legatário da outra metade (conjunção verbal ouverbis tantum), não haverá o direito de acrescer se no mo-

mento da abertura da sucessão José for premorto. Nessecaso, a sua quota será devolvida aos herdeiros legítimos eseguirá a ordem de vocação hereditária (art. 1.829 do CC).

Encerrando o tema, se o legado consistir em um sóusufruto, conjuntamente a duas ou mais pessoas, a parteda que faltar acrescerá, em regra, a dos colegatários (art.

1.946 do CC). Trata-se de hipótese de conjunção mista (oure et verbis).

Mas se não houver conjunção entre os colegatários, ouse, apesar de conjuntos, só lhes foi legada certa parte dousufruto, consolidar-se-ão na propriedade as quotas dosque faltarem, à medida que eles forem faltando (art. 1.946,parágrafo único, do CC). Como se vê, não haverá o direitode acrescer.

Da mesma forma ocorrerá se for legada parte certa dousufruto (conjunção verbal ou verbis tantum). Para exem-plificar, se o testador deixar 50% do usufruto da casa paraJoão e 50% para José, com a morte de João não haverá ac-réscimo em favor de José, mas sim a consolidação de 50%

em favor do nu-proprietário.Superada a análise do direito de acrescer, passamos ao

estudo das substituições testamentárias.

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3.9 DAS SUBSTITUIÇÕESTESTAMENTÁRIAS. CONCEITOSINICIAIS E ESPÉCIES

Partindo-se da premissa pela qual, na sucessão testa-mentária, é a vontade do morto que determina quem seráou não seu sucessor, seja a título singular (legatário), sejaa título universal (herdeiro), uma pergunta que deve serfeita é a seguinte: caso o testador deixe seus bens a de-terminada pessoa, mas esta vier a morrer antes mesmo dotestador, para quem irá a herança?

Poder-se-ia imaginar que os bens iriam para os her-deiros da pessoa nomeada no testamento. A resposta es-taria equivocada, pois se o testador nomeou certa pessoaem seu testamento, não há intenção de que seus bens se- jam entregues aos herdeiros da pessoa nomeada. Assim,caso o testador faleça e seu herdeiro nomeado por testa-

mento já tenha falecido (seja premorto), não se aplica àsucessão testamentária o instituto da representação. Emresumo, ressalvadas as hipóteses acima estudadas dedireito de acrescer, haverá caducidade do testamento, quenenhum efeito produzirá, e, portanto, a herança seguirá aordem de vocação hereditária prevista no art. 1.829 da co-dificação privada.

Dessa forma, para que a sua vontade seja efetivamentecumprida, pode o testador inserir a cláusula de substitu-ição testamentária, pela qual alguém será substituto doherdeiro nomeado, caso este não queira ou não possasuceder. Trata-se da segunda exceção à regra segundo aqual os bens seriam entregues aos herdeiros legítimos. A 

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primeira exceção, por óbvio, se dá no direito de acrescer,anteriormente estudado.

Pela substituição, indica o testador não só um her-deiro ou legatário em 1.º grau, como também um substi-tuto em 2.º grau. Silvio Rodrigues define o instituto dasubstituição como sendo aquele que “resulta de uma dis-posição testamentária em que o testador indica uma ter-ceira pessoa para receber uma gratificação testamentária,na falta de herdeiro, ou legatário, indicado em primeirolugar, ou após este” ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 240). Visto o seu conceito, podemos dizer, primeiramente, que

duas são as espécies de substituição: a substituição vulgare a fideicomissária.

 A substituição será vulgar quando o testador nomearoutra pessoa para receber a herança caso o herdeiro ou olegatário não possa (exemplo: premorte do herdeiro) ounão queira recebê-la (exemplo: renúncia do herdeiro), nostermos do art. 1.947 do CC.

Por outra via, a substituição será   fideicomissáriaquando o testador nomear certo herdeiro ou legatário( fiduciário), estabelecendo que este, com o advento decerto termo ou condição, transmita a herança à pessoaainda não concebida quando da morte do testador( fideicomissário), nos termos do art. 1.951 do CC em vigor.

Como é óbvio, o fideicomisso não pode ser instituído porcontrato, sob pena de infringir a proibição do pacto su-cessório, constante do art. 426 do CC. Nessa linha, na  V  Jornada de Direito Civil  aprovou-se o seguinte enunciadodoutrinário: “O fideicomisso, previsto no art. 1.951 doCódigo Civil, somente pode ser instituído por testamento”

(Enunciado n. 529).

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Historicamente, explica Sebastião Amorim que adoutrina criava duas categorias especiais de substituição.Chamava-se de   pupilar   a substituição pela qual o painomeava herdeiro para o filho, no caso em que este viessea falecer sem prole e na maioridade. Havia também a sub-

stituição quase pupilar ou exemplar quando o ascendentenomeava substituto ao descendente impedido de testarpor insanidade ou deficiência mental (Código civil...,2004, v. XIX, p. 239). Essas expressões, eventualmente,podem ser solicitadas em provas de graduação e em con-cursos públicos de maior complexidade.

Segundo Maria Helena Diniz, são princípios queregem a substituição testamentária:

a) “o substituto deve ter capacidade para ser instituído em1.º grau, sendo certo que a existência da capacidade dosubstituo é a do tempo da abertura da sucessão;

 b) podem ser dados muitos substitutos a um só herdeiro ou

um substituto a um único herdeiro;c) não é permitida a substituição de mais de um grau (art.

1.959 do CC);

d) a substituição é uma instituição condicional, porém podeser subordinada a outra condição, termo ou encargo;

e) o substituto pode ser nomeado no mesmo testamento em

que for feita a substituição ou em cédula testamentáriaposterior, desde que observados os requisitos subjetivos eformais;

f) o substituto deve cumprir o encargo ou condição impostaao substituído, exceto se o disponente estabeleceu difer-entemente, ou se o contrário resultar da natureza da con-dição ou do encargo (art. 1.949 do CC)” (Curso..., 2005, v.

6, p. 333).

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 Analisadas essas regras introdutórias sobre o tema,parte-se ao estudo específico das espécies de substituiçãotestamentária.

3.9.1 Da substituição vulgar ou ordinária

 3.9.1.1 Regras gerais

Trata-se de uma substituição direta em que nenhumapessoa se interpõe entre o testador e o substituto. Em

suma, o testador pode substituir outra pessoa ao herdeiroou ao legatário nomeado, para o caso de um ou outro nãoquerer ou não poder aceitar a herança ou o legado (art.1.947 do CC). Presume-se que a substituição foi determin-ada para as alternativas de “não querer” e “não poder”,ainda que o testador só a uma se refira.

 Vislumbrando um caso prático, ocorre substituição vulgar quando o testador nomeia Pablo seu herdeiro,sendo que, caso ele não queira ou não possa receber a her-ança, esta será de Rodolfo.

Como se trata de substituição, o substituto fica, em re-gra, sujeito ao encargo ou condição imposta ao substituído(art. 1.949 do CC). Em outro exemplo, se o testador deixar

a casa ao legatário Fernando com o encargo de ele con-struir uma biblioteca para determinado Município, enomear Flávio seu substituto, o encargo da construçãopassará ao último.

 A regra comporta exceções. Se o encargo for person-alíssimo, por exemplo, este não se transfere ao substituto.

Portanto, se o testador deixar o carro ao sobrinho

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Fernando, que é escultor, com o encargo de ele realizaruma escultura do falecido, e nomear Flávio, dentista,como substituto, o encargo, por sua natureza, não serátransferido ao substituto.

Por fim, ressalta-se que nada impede que o testadornomeie vários substitutos sucessivamente. Isso porque,com a nomeação sucessiva, caso o primeiro da lista possaou queira receber a herança, automaticamente todos ossubstitutos subsequentes deixarão de ter direito sobre amesma.

Dessa forma, pode o testador nomear Fernando seu

herdeiro e, caso ele não queira ou não possa receber a her-ança, esta passa a Flávio; caso este também não a queiraou não possa recebê-la, a herança passará para MariaHelena, e assim sucessivamente. Portanto, cria-se uma se-quência: Fernando, Flávio e Maria Helena. Se o primeiroaceitar a herança, não terão direitos os demais nomeados.Esta é a orientação mais adequada para nós.

Finalizando, se o testador deixar seus bens paraFernando, sendo que, em sua falta, herdarão Flávio, MariaHelena e Sílvio, na ordem estabelecida, primeiro um e de-pois o outro, entende-se que os vários substitutos herdamsimultaneamente, já que não existe substituição além desegundo grau, nos termos do art. 1.959 do atual CC

(MONTEIRO, Washington de Barros. Curso..., 2003, v. 6,p. 225).

 3.9.1.2 Das espécies de substituição vulgar ou ordinária

São três as espécies de substituição ordinária ou

 vulgar:

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a) substituição singular;

 b) substituição plural; e

c) substituição recíproca.

De início, será singular a substituição em que o testa-dor nomear um herdeiro ou um legatário e apenas umsubstituto. Como exemplo: “nomeio João meu herdeiro, ese ele não quiser ou não puder Pedro receberá a herança”.

Será   plural   a substituição se houver um herdeironomeado e dois ou mais para substituí-lo. Nessa situação,os substitutos serão chamados de maneira simultânea. Por

exemplo: “nomeio João meu herdeiro, e se ele não quiserou não puder Pedro e Maria receberão a herança”.

Por fim, será recíproca a substituição na hipótese emque dois ou mais herdeiros são nomeados e substituindo-se uns aos outros. Vejamos: “nomeio João e Maria meusherdeiros, e se um deles não quiser ou não puder o outro

receberá a herança”. A possibilidade dessas espécies decorre da permissão

do art. 1.948 do atual Código, segundo o qual: “também élícito ao testador substituir muitas pessoas por uma só, ou vice-versa, e ainda substituir com reciprocidade ou semela”.

O quadro a seguir exemplifica essas espéciesapontadas:

Espécie desubstituição

Herdeiro ouherdeirosnomeados

(substituídos)

Herdeiro sub-stituto ouHerdeiros

substitutos

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Vulgar singular João Pedro

Vulgar plural João Pedro e Maria

Vulgar

recíproca

  João e Maria Maria e João

Maria Helena Diniz (Curso..., 2005, v. 6, p. 335),seguindo o entendimento de Itabaiana de Oliveira, afirmaque a substituição recíproca seria espécie autônoma e nãosubespécie da substituição vulgar, apesar de o doutrinadorafirmar que esta é direta e participa da natureza da vulgar(Tratado..., 1952, v. 2, p. 586). Entendemos que não hámotivos para tal separação. Seguimos a lógica do sistemapela qual a substituição recíproca é subespécie da sub-stituição vulgar, por ser direta, conforme aponta parte dadoutrina tradicional (RODRIGUES, Silvio. Direito civil...,2002, v. 7, p. 243, MONTEIRO, Washington de Barros.

Curso..., 2003, v. 6, p. 225).Quanto à doutrina contemporânea, Eduardo de Oli-

 veira Leite ( Direito civil..., 2004, v. 6, p. 269) informa quea substituição recíproca se divide em geral , quando todossubstituem o herdeiro ou legatário que faltar; e em partic-ular ou especial , quando os legatários determinados sub-

stituem outros determinados reciprocamente. Como ex-emplo da última espécie pode ser citado o seguinte caso:“deixo a herança para Pedro, Maria, Antonio e João, sendoque se Pedro ou Maria não quiserem ou não puderem re-ceber a herança, serão substitutos recíprocos entre si, omesmo ocorrendo quanto a Antonio e João”. Assim, Pedrosó substitui Maria e vice-versa, e Antonio só substitui João

e vice-versa.

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No tocante à substituição recíproca, determina oCódigo Civil que se, entre muitos coerdeiros ou legatáriosde partes desiguais, for estabelecida substituição recíp-roca, a proporção dos quinhões fixada na primeiradisposição entender-se-á mantida na segunda. Entretanto,

se com as outras anteriormente nomeadas for incluídamais alguma pessoa na substituição, o quinhão vago per-tencerá em partes iguais aos substitutos (art. 1.950 do CC).

Separaremos o comando legal em duas partes,exemplificando-o por meio de casos práticos:

1) Se o testador deixar 3/6 de sua herança a João, 2/6 a Josée 1/6 a Maria, nomeando-os reciprocamente substitutoscaso um deles não queira ou não possa receber; caso Joãoseja declarado indigno e excluído por sentença da su-cessão, seu quinhão será dividido entre José (2/6) e Maria(1/6), respeitando-se a proporção determinada.

2) Se o testador deixar 3/6 de sua herança a João, 2/6 a José

e 1/6 a Maria, nomeando-os reciprocamente substitutos, bem como Antonio como substituto, caso um deles nãoqueira ou não possa receber; se João renunciar à herança,seu quinhão será dividido entre José (1/6), Maria (1/6) e

 Antonio (1/6) em partes iguais.

Elucidado o dispositivo, passaremos ao estudo da sub-stituição fideicomissária.

3.9.2 Da substituição fideicomissária

Nos termos do art. 1.951 do atual Código, seráfideicomissária a substituição quando o testador( fideicomitente) nomear certo herdeiro ou legatário( fiduciário), estabelecendo que este, com o advento de

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certo termo ou condição, transmita a herança a pessoaainda não concebida quando da morte do testador( fideicomissário). O esquema abaixo demonstra comofunciona essa forma de substituição testamentária:

Como se nota, trata-se de modalidade indireta de sub-stituição, pois o fiduciário recebe a herança que será trans-mitida ao fideicomissário. A título de ilustração, ocorreráquando o testador assim dispuser: “Deixo meus bens ameu sobrinho José, que, quando falecer, deverá transmiti-los a seu primeiro filho” (prole eventual).

No fideicomisso, conforme explica Sílvio de Salvo Venosa, o testador institui dois sucessores sucessivos: háuma dupla transmissão, pois fiduciário e fideicomissáriosão ambos sucessores do de cujus ( Direito civil , 2003, v. 7,p. 268). É importante dizer que na substituiçãofideicomissária não há relação sucessória entre o fidu-ciário e o fideicomissário, sendo certo que, nesse sentido,

a Lei estadual paulista 9.591/1966 (art. 15), estabeleciaque, quando da morte do testador, deveria o fiduciário re-colher o imposto com redução de 50%, e o fideicomissáriotambém com redução de 50% quando entrasse na possedos bens. A atual lei paulista (Lei 10.705/2000) não re-produz o dispositivo em questão, determinando apenasque o imposto deve ser recolhido pelo fiduciário (art. 7.º).

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Da mesma forma, determina a lei que o fideicomis-sário responde pelos encargos da herança que ainda re-starem, quando a receber (art. 1.957 do CC).

Para autores como Silvio Rodrigues, a substituiçãofideicomissária é sinônima de  substituição compendiosa

( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 240). Em idêntico sentido,Itabaiana de Oliveira afirma que “a substituição tambémse denomina indireta, porque é concebida em termos ob-líquos e deprecativos. É a mesma substituição compendi-osa das Ordenações, liv. 4.º, tít. 87, § 12. Chama-se com-pendiosa porque, debaixo de um compêndio, ou resumo

de palavras, contém, em si, muitas substituições. A sub-stituição fideicomissária não difere da compendiosa senãonas palavras: em vez de usar de palavras imperativas –seja herdeiro Paulo, usa das deprecativas – e lhe rogo quedeixe a herança a Paulo” (Tratado..., 1952, v. 2, p. 589).

Em sentido contrário, afirma Washington de BarrosMonteiro que a compendiosa “é assim chamada porque,sob compêndio de palavras, abrange várias substituiçõesde natureza diferente (sub compendio verborum, contine-bat plures substitutiones). Na verdade, constitui misto desubstituição vulgar e de substituição fideicomissária”(Curso..., 2003, v. 6, p. 237). Seguem o entendimento doúltimo doutrinador Maria Helena Diniz (Curso..., 2005, v.

6, p. 335) e Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., 2003, v.7, p. 269). Assim, para os juristas citados, seria compendi-osa a substituição se o testador determinasse o seguinte:“Deixo meus bens para João, que os transmitirá aoprimeiro filho de José. Caso João não queria ou não possareceber, os bens ficarão com José, que deverá transmiti-los a seu primeiro filho”. Esse último entendimento deve

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ser considerado como majoritário para a práticasucessória.

Não se pode esquecer que o fideicomisso toma por base a confiança do testador (fideicomitente) na pessoa dofiduciário. Lembramos, nesse sentido, que a expressão fidúcia significa justamente  confiança. O Código Civil de2002 limita a possibilidade de instituição de fideicomisso,pois apenas o admite quando o fideicomissário for pessoanão concebida ao tempo da morte do testador, ou seja, achamada prole eventual (art. 1.952 do CC). Sob a égide dorevogado Código Civil, poderia ser fideicomissária

qualquer pessoa, mesmo se nascida ou concebida. A limitação imposta pelo novo diploma desencoraja o

fideicomisso, já que, na prática, grande será o risco de nãosurgir a prole eventual e caducar o fideicomisso no casoconcreto.

O Código Civil determina ainda que se ao tempo da

morte do testador já houver nascido o fideicomissário, ad-quirirá este a propriedade dos bens fideicometidos,convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário (art.1.952, parágrafo único, do CC). Nessa hipótese, a pro-priedade dos bens não é transmitida ao fiduciário, que re-ceberá apenas o direito real de usufruto e, com ele, a possedireta dos bens, enquanto a nua-propriedade ficará com o

fideicomissário. Não informa a lei o prazo máximo de dur-ação desse usufruto, permitindo, assim, a sua previsão vi-talícia se não houver disposição do testador em sentidocontrário.

Pois bem, são três as espécies de substituiçãofideicomissária:

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a)  Substituição fideicomissária por morte do fiduciário  –caso nada diga o testador, a transmissão dos bens do fidu-ciário ao fideicomissário ocorre com a morte do primeiro(fideicomisso quum morietur).

 b)   Substituição fideicomissária sob certa condição   – é

aquela relacionada com um evento futuro e incerto. A título de exemplo: “deixo os bens ao fiduciário João que ostransmitirá ao primeiro filho de meu sobrinho Pedro, seeste for homem”. Caso seja menina a filha de Pedro, nãohaverá a transmissão ao fideicomissário.

c) Substituição fideicomissária a termo  – está relacionadacom um evento futuro e certo. Exemplo: “deixo os bens ao

fiduciário João pelo prazo de 10 anos, após o que este, en-tão, os transmitirá ao primeiro filho de meu sobrinhoPedro”. Há um prazo determinado para que os bens sejamtransmitidos ao fideicomissário.

Com relação ao fideicomissário, sob sua propriedadependerá condição suspensiva. Já a propriedade do fidu-

ciário é resolúvel e restrita, cabendo a ele proceder ao in- ventário dos bens gravados e prestar caução de restituí-los, se assim o exigir o fideicomissário (art. 1.953 do CC).Dúvida comum que surge é se o fiduciário poderá venderos bens recebidos.

 A resposta é positiva, pois na qualidade de propri-etário poderá usar, gozar, dispor, gravar ou reivindicar os bens. Contudo, a venda ou a hipoteca por ele constituídatorna-se ineficaz em relação ao fideicomissário quandoocorrer a resolução da propriedade, conforme nos apontaa melhor doutrina (DINIZ, Maria Helena. Curso..., 2005, v. 6, p. 339). Isso porque, em se tratando de bens imóveis,da matrícula constará o registro do fideicomisso,

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afastando eventual boa-fé de terceiros que sejam titularesde direitos reais.

Como bem pondera Sílvio de Salvo Venosa, em setratando de bem móvel, tendo em vista a facilidade de suatransmissão, difícil será o seu controle e por essa razão de- ve o fiduciário prestar caução ( Direito civil..., 2003, v. 7, p.274). A caução é prestada por processo cautelar devida-mente disciplinado pelos arts. 826 a 838 do CPC. Caso nãopossa prestar a caução exigida, o fiduciário não entrará naposse dos bens.

Mais uma vez, não se pode esquecer que o

fideicomisso toma por base a confiança do testador oufideicomitente na pessoa do fiduciário. De qualquer forma,se “confiar desconfiando”, nada impede que clausule os bens com a cláusula de inalienabilidade, o que sequer ne-cessitará de justificativa, já que os bens deixados em testa-mento não compõem a legítima, mas sim a porçãodisponível (art. 1.848 do CC).

Caso o testador crie um fideicomisso além do 2.º grau,este será nulo quanto aos graus excedentes (arts. 1.959 e1.960 da atual codificação). No campo prático, se João fornomeado fiduciário e o primeiro filho de José, fideicomis-sário (prole futura), não pode o testador determinar que,depois, seus bens devam ser entregues pelo primeiro filho

de José ao primeiro filho de Maria. No caso em questão,estaria sendo criado um 3.º grau de fideicomisso que,portanto, é nulo. Vale dizer que a nulidade de parte da in-stituição não contamina a parte válida, o que é aplicaçãodo princípio da conservação dos negócios jurídicos (utile per inutile non vitiatur).

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Contudo, poderá ocorrer o fenômeno da caducidadedo fideicomisso. A caducidade resulta de certas causas, emconsequência das quais a disposição testamentária, aindaque válida, não produz efeitos. A caducidade se verificapela recusa ou incapacidade do fideicomissário, ou pela

perda da coisa legada, conforme ensina Itabaiana de Oli- veira (Tratado..., 1952, v. 2, p. 599).

 Assim, caduca o fideicomisso se o fideicomissário re-nunciar à herança ou ao legado (art. 1.954 do CC). Nessescasos, deixa de ser resolúvel a propriedade do fiduciário,passando a haver, a partir da renúncia, uma propriedade

plena. Lembramos, por oportuno, que a renúncia só podeocorrer depois de aberta a sucessão. Em outras palavras,só pode renunciar o fideicomissário após a morte do testa-dor, mas não precisará aguardar a morte do fiduciário,pois não há relação sucessória entre ambos, como outrorafoi exposto.

Também caduca o fideicomisso se for a termo e ofideicomissário morrer antes do fiduciário (art. 1.958 doCC), ou se a prole eventual não vier a existir no prazo es-tipulado pelo testador. Na ausência de prazo, caduca a dis-posição se, decorridos dois anos da abertura da sucessão,não for concebido o herdeiro-fideicomissário, o que é ap-licação do art. 1.800, § 4.º, do CC.

Em outro tipo de situação, o bem poderá ser trans-mitido diretamente ao fideicomissário. Um desses casosestá presente na hipótese em que fiduciário renuncia àherança, podendo o fideicomissário aceitá-la, situação emque, na realidade, atinge-se o fim do fideicomisso demaneira direta, recebendo o fideicomissário, desde logo, a

propriedade plena do bem.

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Com a transmissão dos bens fideicometidos aofideicomissário, este recebe os bens deixados pelo testa-dor, bem como eventual acréscimo adquirido ou obtidopelo fiduciário (art. 1.956 do CC). Quanto a eventualdireito de acrescer, a matéria foi tratada nos arts. 1.941 a

1.943 do CC, como já estudado.

3.10 DA REVOGAÇÃO DO TESTAMENTO,DE SUA NULIDADE E CADUCIDADE

Itabaiana de Oliveira explica como se diferencia a nul-idade da revogação e da caducidade: “I – a nulidade dotestamento sempre dá lugar à sucessão legítima; II – a re- vogação do testamento dá lugar: a) à sucessão legítima sefor total; b) à sucessão testamentária se for parcial; III – acaducidade dá lugar: a) à sucessão legítima – se a ineficá-cia abranger a todos os herdeiros ou legatários e eles não

tiverem substitutos; b) à sucessão testamentária – se, nãoabranger todos os herdeiros ou legatários e não tendo elessubstitutos, houver o direito de acrescer entre eles”(Tratado..., 1952, v. 2, p. 613).

Se a questão for analisada à luz da teoria de Pontes deMiranda ou, para fins didáticos, pela chamada   Escada

 Ponteana, parece claro que a nulidade atinge a validadedo testamento enquanto a revogação e a caducidade apen-as atingem a sua eficácia. Feito tal esclarecimento, passa-se ao estudo das nulidades (plano da validade – segundodegrau) e, posteriormente, da revogação e da caducidade(plano da eficácia – terceiro degrau) dos testamentos.

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3.10.1 Da nulidade absoluta ou relativa dotestamento

Na qualidade de negócio jurídico que é, o testamentoserá nulo ou anulável dependendo do vício que o atingir e,

como afirma Maria Helena Diniz, “para produzir efeitos,precisará satisfazer não só condições intrínsecas, atinentesà vontade legalmente manifestada do disponente, mastambém extrínsecas, que objetivam assegurar a autenti-cidade daquela manifestação volitiva, aplicando-se os arts.166 e 171 do Código Civil” (Curso..., 2005, v. 6, p. 269).Sendo assim, se a lei determinar a nulidade absoluta donegócio jurídico é porque entende que este fere norma deordem pública e, portanto, reage de maneira violenta, in-quinando o negócio com um vício insanável que não seconvalida com o decurso do prazo. Como é notório, não háprazos para a declaração da nulidade absoluta, eis que aação será de natureza essencialmente declaratória (art.

169 do CC).Por outro lado, se o vício do negócio apenas significar

forma de proteção aos particulares, ou seja, matéria quenão interessa à ordem pública, o negócio será anulável(nulidade relativa), e, portanto, poderá ser confirmadopelas partes interessadas, sendo que a nulidade relativa seconvalida com o decurso do tempo. Exatamente por isso,para as hipóteses de anulabilidade, prevê a lei prazos dec-adenciais para a sua decretação. A afirmação decorre dofato de a ação a ser proposta ter natureza constitutiva neg-ativa, de acordo com os critérios científicos para distinguira prescrição da decadência propostos por Agnelo AmorimFilho ( RT  300/7 e 744/725).

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Sendo a nulidade absoluta, poderá ser alegada peloMinistério Público ou por qualquer interessado, devendoser pronunciada pelo juiz de ofício, independentemente deprovocação (art. 168 do CC). Já a nulidade relativa só podeser alegada pelos interessados e conhecida pelo juiz, se

provocado. Analisado esse panorama geral da matéria,passaremos ao estudo dos casos específicos de nulidadeabsoluta e relativa do testamento, respectivamente.

 3.10.1.1 Da nulidade absoluta do testamento

São hipóteses de nulidade absoluta do testamento:

– Se feito por pessoa absolutamente incapaz de testar (art.1.860 do CC). Com relação à idade, deve-se frisar que osmaiores de 16 anos podem testar validamente (art. 1.860,parágrafo único, do CC).

– Se o beneficiário nomeado não possuir capacidade para

adquirir por testamento, como, por exemplo, as pessoasnão concebidas até a morte do testador (art. 1.799, I, doCC), com exceção da disposição em favor de prole eventu-al ou de fideicomisso.

– Sendo ilícito ou impossível o objeto (art. 166, II, do CC). Assim, se o testador deixar um bem público em testa-mento, nulo será o negócio, por impossibilidade jurídica

do objeto.– Se o testamento não seguir a forma prescrita em lei (art.

166, IV, do CC). Conforme já exposto quando do estudodas espécies de testamento, a ausência de formalidades ousolenidade torna o testamento nulo. Apenas a título deexemplo, anote-se o caso de um testamento público feitopor pessoa que não é tabelião, mas que se passa por tal.

Não restam dúvidas de que o testamento será nulo.

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– Se não for observada alguma solenidade que a lei con-sidere essencial (art. 166, V, do CC). Exemplificando, seránulo o testamento público feito por pessoa cega, em quenão tenha ocorrido sua dupla leitura, uma pelo tabelião eoutra por uma testemunha (art. 1.867 do CC).

– Quando a lei taxativamente assim o declarar (nulidadetextual – art. 166, VII, do CC) ou lhe negar efeitos. Nessesentido é nulo o  testamento conjuntivo, ou seja, aquelefeito por mais de uma pessoa (art. 1.863 do CC).

– Se as suas disposições forem nulas (art. 1.900 do CC). Assim, é nulo o testamento que institua herdeiro ou leg-atário sob a  condição captatória  de que este disponha,

também por testamento, em benefício do testador ou deterceiro; que se refira a pessoa incerta, cuja identidadenão se possa averiguar; que favoreça a pessoa incerta,cometendo a determinação de sua identidade a terceiro;que deixe a arbítrio do herdeiro, ou de outrem, fixar o val-or do legado; que favoreça as pessoas não legitimadas asuceder. Já explicamos detalhadamente toda a matéria no

presente capítulo quando do estudo das disposiçõestestamentárias.

Em ocorrendo nulidade absoluta do testamento, emprincípio, deveríamos afirmar que os interessados não ter-iam prazo para pleiteá-la. Entretanto, o Código Civil de2002 contém intrigante disposição, no seguinte sentido:

“Art. 1.859. Extingue-se em cinco anos o direito de impug-nar a validade do testamento, contado o prazo da data doseu registro”.

 A dúvida que surge é: o prazo em questão se aplica àshipóteses de nulidade absoluta acima descritas? Destaque-se, de imediato, que a questão é muito controvertida nadoutrina.

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 A resposta é afirmativa para Eduardo de OliveiraLeite, que, ao comentar o dispositivo, leciona que “o artigose refere expressamente à impugnação da validade do test-amento, quebrando a regra geral expressa no art. 169 doCódigo Civil onde o negócio jurídico nulo não é suscetível

de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo”(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 319). Trilha o mesmocaminho o mestre Zeno Veloso ao explicar que “não sepode questionar a validade do testamento em vida do test-ador. O testamento é um negócio jurídico  mortis causa esomente com a abertura da sucessão é que a alegação desua invalidade tem pertinência e poderá ser apresentada.Como a lei não distingue, não cabe ao intérprete distin-guir: o aludido prazo de caducidade se aplica tanto ao casode nulidade como de anulabilidade” (Comentários...,2003, v. 21, p. 21). Gustavo Rene Nicolau afirma queparece ser esta a solução adotada, ou seja, em matéria detestamento ocorre exceção à regra do art. 169 do Código

Civil ( Direito civil: sucessões..., 2005, v. 9, p. 113).Do mesmo modo Sílvio de Salvo Venosa e Débora

Gozzo são enfáticos ao afirmar que o prazo se aplica tantoà hipótese de nulidade relativa quanto de nulidade abso-luta: “Tendo em vista a instabilidade que pode representaruma nulidade latente em um testamento, decorrido o

prazo de cinco anos de seu registro, não permite mais o or-denamento discutir sua validade. Portanto, mesmo a nul-idade do testamento não pode ser discutida após esseprazo. Aliás, não só no testamento, mas nos negócios jurídicos em geral não há conveniência de que um negóciopermaneça indefinidamente com a possibilidade de umadeclaração de nulidade” (Comentários..., 2004, p. 275).

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No mesmo sentido a opinião de Jones Figueirêdo Alves eMário Luiz Delgado (Código Civil..., 2005, p. 964).

De início, cabe uma observação, eis que o prazo emquestão é realmente de natureza decadencial, já que tratade desconstituição do negócio jurídico, nos termos da liçãode Agnelo Amorim Filho. Porém, causa perplexidade aoestudioso imaginar que o testamento, apesar de ser umnegócio jurídico, não segue a máxima milenar de Paulopela qual  quod initium vitiosum est, non potest tractustemporis convalescere, ou seja, que a nulidade absolutanão convalesce com o tempo. Por isso é que entendemos

que o dispositivo somente se aplica à nulidade relativa. Nocaso de nulidade absoluta do testamento, a ação corres-pondente é imprescritível. O nosso entendimento, diga-sede passagem, é minoritário na doutrina.

 Aliás, se analisada a matéria à luz do direito es-trangeiro, notamos que o Código Civil português contémregra específica sobre o tema:

“Art. 2.308. (Caducidade da acção).

1. A acção de nulidade do testamento ou de disposiçãotestamentária caduca ao fim de dez anos, a contar da dataem que o interessado teve conhecimento do testamento e dacausa da nulidade.

2. Sendo anulável o testamento ou a disposição, a acçãocaduca ao fim de dois anos a contar da data em que o in-teressado teve conhecimento do testamento e da causa daanulabilidade”.

No sistema português, a lei cria prazos distintos para adeclaração de nulidade relativa e nulidade absoluta. Em

sentido semelhante, o Código Civil italiano, em seu art.

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591, consagra que será nulo o testamento feito por pessoaincapaz de testar e que a ação prescreve em cinco anos dadata em que foi dada a execução das disposições (Textooriginal: “Nei casi d’incapacità preveduti dal presente arti-colo il testamento può essere impugnato da chiunque vi ha

interesse. L’azione si prescrive nel termine di cinque annidal giorno in cui è stata data esecuzione alle disposizionitestamentarie”).

Não nos agrada a disposição. Imaginar a convalidaçãodo testamento como um negócio jurídico é negar a essên-cia do instituto da nulidade absoluta. Porque um contrato

feito por um menor de 12 anos é totalmente nulo e o seutestamento, após cinco anos, se convalida? Por que apreterição de formalidade na compra e venda de bemimóvel cujo valor supere 30 vezes o salário-mínimo tornao negócio nulo e um testamento público em que não hátestemunhas pode ser convalidado após cinco anos?

Fica a nossa crítica. Todavia, na prática prevalece alição de toda a doutrina mencionada: o art. 1.859 constituiexceção à regra pela qual a nulidade absoluta não se con- valida. Vale dizer, ainda, que o PL 699/2011, antigo PL6.960/2002, de autoria original do Deputado Fiuza, pre-tende alterar o dispositivo, que passaria a ter a seguinteredação: “Art. 1.859. Extingue-se em cinco anos o direito

de requerer a declaração de nulidade do testamento ou dedisposição testamentária, e em quatro anos o de pleitear aanulação do testamento ou de disposição testamentária,contado o prazo da data do registro do testamento”.

Note-se que se aprovado o projeto, será retirada dotexto de lei a expressão “direito de impugnar a validade”,

para constar expressamente “declaração de nulidade” e

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“pleitear a anulação”. A justificativa do autor do projeto, odeputado Ricardo Fiuza, é que “como a lei não distingue,não cabe ao intérprete distinguir: o prazo de caducidade seaplica tanto ao caso de nulidade como de anulabilidade”(O novo Código Civil..., 2004, p. 301). Como fica claro, o

projeto está de acordo com a doutrina majoritária citada,com a qual não concordamos.

Por fim, saliente-se que, seguindo a Escada Ponteana,se o testamento for inexistente em razão, por exemplo, deausência de vontade do testador, não haverá prazos para asua declaração, pois, observa Zeno Veloso, “a inexistência

é uma categoria jurídica diversa. Embora a inexistênciaseja o grau máximo de ineficácia, nada tem a ver, ontolo-gicamente com invalidade” (Comentários..., 2003, v. 21, p.26). Com a observação concorda o coautor José FernandoSimão, que admite a adoção dos três planos do negóciopelo Código Civil de 2002. Já o coautor Flávio Tartuce,como consta do Volume 1 desta coleção, não é totalmente

adepto do plano da existência do negócio jurídico.

 3.10.1.2 Da nulidade relativa ou anulabilidade dotestamento

 As causas de nulidade relativa ou anulabilidade do

testamento são, pelo menos em parte, as mesmas dosnegócios jurídicos em geral, ou seja, o erro, o dolo e acoação (art. 1.909 do CC).

Maria Helena Diniz aventa a possibilidade de nulidaderelativa por fraude contra credores, quando, por exemplo,no testamento, “o próprio testador reconhece dívidas”

(Curso..., 2005, v. 6, p. 276). Concordamos com a jurista e

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entendemos ser possível anular um testamento se esse ví-cio social do negócio jurídico estiver presente.

Resume de maneira clara as causas de nulidade re-lativa do testamento Giselda Maria Fernandes NovaesHironaka, a saber: “a) erro substancial na designação deherdeiro, de legatário ou da própria coisa legada; b) dolocapaz de induzir o testador em erro ou de mantê-lo soberro em que já se encontrava; c) coação contra o testador,impedindo-o livremente de testar; d) fraude, como, porexemplo, o reconhecimento de dívida inexistentes pelotestador, com o intuito de enganar os seus credores, futur-

os credores do espólio” (Curso avançado..., 2003, v. 6, p.390).

Sobre os prazos para a declaração de nulidade relativa,algumas ponderações se fazem necessárias.

Para os negócios jurídicos em geral, pela regra geraldo art. 179 do CC, quando a lei dispuser que determinado

ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear a anu-lação, será este de dois anos, a contar da data da conclusãodo ato. Por outra via, o art. 178 da codificação traz regrasespecíficas para a anulação de negócio jurídico em razãode seus defeitos. Pelo último comando legal, é de quatroanos o prazo de decadência para pleitear a anulação donegócio jurídico, contados, no caso de coação, do dia em

que ela cessar. Já nos casos de erro, dolo, fraude contracredores, estado de perigo ou lesão, o prazo será contadodo dia em que se realizou o negócio jurídico.

Pois bem, com relação aos testamentos, temos doisprazos previstos em lei:

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1) Prazo decadencial de cinco anos contado do registro dotestamento para a declaração de sua nulidade absoluta oupara o reconhecimento da nulidade relativa (art. 1.859 doCC).

2) Prazo decadencial de quatro anos para anular a dis-

posição testamentária inquinada de erro, dolo, coação,iniciando-se a sua contagem a partir do momento em queo interessado tem conhecimento do vício (art. 1.909, pará-grafo único, do CC).

 A dúvida que surge é: como conciliar os prazos geraisdo negócio jurídico com os prazos especiais, aparente-

mente conflitantes? A resposta é a seguinte:– Se o testamento for nulo ou sendo nula uma de suas cláu-

sulas, o prazo para a sua declaração será de cinco anoscontados de seu registro, sob pena de decadência (art.1.859 do CC). Isso, seguindo aquele entendimentodoutrinário majoritário criticado pelos autores dapresente obra. É a hipótese de nulidade absoluta total ouparcial.

– Se o testamento como um todo for anulável, o prazo para oreconhecimento da anulabilidade será de cinco anos, con-tados de seu registro, sob pena de decadência (art. 1.859do CC). É a hipótese de nulidade relativa total.

– Se uma ou algumas das cláusulas testamentárias forem

anuláveis por erro, dolo ou coação, o prazo para sua de-claração será de quatro anos, contados a partir do mo-mento em que o interessado tiver conhecimento do vício(art. 1.909, parágrafo único, do CC). É a hipótese de nulid-ade relativa parcial, com expressa previsão legal.

– Se a nulidade for de apenas uma cláusula e não se tratarde erro, dolo ou coação, o prazo para o reconhecimento da

nulidade relativa deverá ser de cinco anos, contados do

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registro do testamento, sob pena de decadência (art. 1.859do CC). É a hipótese de nulidade relativa parcial, sem ex-pressa previsão com referência a prazos.

Como bem pondera Sílvio de Salvo Venosa, “o prazo

de quatro anos do art. 1.909 não coincide com o prazo doart. 1.859, nem coincidem os termos iniciais de ambos osdispositivos. Essa dicotomia é altamente inconveniente”(Comentários..., 2003, v. 7, p. 395).

Há ainda uma crítica a ser apontada. A crítica que sefaz ao parágrafo único do art. 1.909 do atual Código Civil éque o prazo para anular as disposições decorrentes de

erro, dolo e coação é contado a partir do momento em queo interessado tiver conhecimento. Explica Ricardo Fiúza,ao justificar o Projeto 6.960/2002, atualmente PL 699/2011, de sua autoria, que o prazo “é elástico, não temtermo inicial rígido, certo, e embora possa servir melhorao interesse puramente individual, não convém à so-

ciedade, pois introduz um fator de insegurança jurídica”(O novo Código Civil..., 2004, p. 302).

 A crítica realmente procede. É curioso notar que o dis-positivo em questão se afasta completamente de toda asistemática do Código Civil de 2002. Isso porque, emmatéria de erro, dolo, coação, lesão e estado de perigo, oschamados vícios do consentimento, os prazos para a anu-lação, todos de natureza decadencial, iniciam-se quandoda celebração do negócio jurídico (art. 178 do CC), com ex-ceção da coação, cujo prazo se inicia quando cessa a viol-ência. Aliás, no que concerne ao casamento, também a leidetermina que o prazo é de três anos para a sua anulaçãoquando motivada em erro essencial quanto à pessoa do

cônjuge (art. 1.560, III, do CC) e de quatro anos com

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relação à coação (art. 1.560, IV, do CC), iniciando-se osprazos quando da celebração do casamento (art. 1.560,caput , do CC).

Portanto, realmente seria melhor a adoção da soluçãocontida no Projeto Ricardo Fiuza, pela qual o parágrafoúnico do art. 1.909 passaria a ter a seguinte redação:“Extingue-se em quatro anos o direito de anular a dis-posição, contados da data do registro do testamento” (PL699/2011).

Cabe salientar um ponto importante com relação àcoação. Em se tratando de coação física, a chamada  vis

absoluta, conclui-se que inexiste a vontade, hipótese emque o contrato seria nulo para aqueles que entendem queo Código Civil não adota o plano da existência e, portanto,o prazo para a declaração de nulidade do testamento seriade cinco anos (art. 1.859 do CC). Já para aqueles que ad-mitem a adoção do plano da existência, ocorrendo coaçãofísica, o negócio não se considera existente e, portanto,não há prazos para a declaração.

Para finalizar a questão da nulidade relativa, deve-sefrisar que a nulidade de uma cláusula não contamina, emregra, as demais, em decorrência do brocardo  utile perinutile non vitiatur, ou, na versão atual, diante do princí-pio da conservação do negócio jurídico. Entretanto, se a

nulidade atingir certa cláusula sem a qual outras não teri-am sido determinadas pelo testador, a nulidade pode con-taminar mais de uma disposição (art. 1.910 do CC). A leitrata a questão sob a ótica da ineficácia, aqui entendidaem sentido amplo, ou seja, também aplicada à nulidade.

Se as partes do testamento puderem ser separadas, a

nulidade de uma cláusula não atingirá as demais. A título

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ilustrativo, se o testador, sob coação, lega uma casa aosobrinho Marcos e, por livre e espontânea vontade outraao sobrinho Lucas, a nulidade do legado conferido a Mar-cos não contamina o legado deixado a Lucas.

 3.10.1.3 Da conversão do testamento nulo ou anulável 

Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, de formadireta e brilhante, sintetiza a questão que será tratada nopresente item da seguinte forma: “O ponto central desseassunto diz respeito à seguinte indagação: em face de um

testamento nulo – por ausência de atendimento a re-quisito essencial – seria possível validá-lo sob outra formamodal, desde que essa outra inexigisse os requisitos quedeflagraram a nulidade do primeiro instrumento?” (Cursoavançado..., 2003, v. 6, p. 294).

Quanto ao tema, explica Gustavo Rene Nicolau que “o

negócio nulo não pode ser confirmado pelas partes, prer-rogativa esta exclusiva dos negócios anuláveis. Porém, oCódigo reserva a possibilidade de conversão do negócio jurídico nulo em outro perfeitamente válido” ( Direitocivil: parte geral..., 2005, v. 3, p. 174). Realmente, oCódigo Civil, em seu art. 170, dispõe que: “Se, porém, onegócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, sub-

sistirá este quando o fim a que visavam as partes permitirsupor que o teriam querido, se houvessem previsto anulidade”.

Deve-se ressaltar que a nulidade absoluta decorre deafronta à norma de ordem pública, e, portanto, nem a vontade das partes, nem o decurso do tempo terão o con-

dão de sanar o ato contaminado, sendo impossível sua

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confirmação ou ratificação, seja ela tácita ou expressa, emregra. Contudo, conforme amplamente esclarecido,quanto ao testamento, após 5 anos a nulidade é convalid-ade (art. 1.859).

Como último recurso no intuito de  salvar  o negócio jurídico, apesar de padecer de vício insanável, permite alei sua conversão. Trata-se de decorrência direta do princí-pio da conservação dos negócios jurídicos. Ainda que onegócio almejado seja declarado nulo, a vontade do de-clarante ainda produzirá efeitos sob a forma de outronegócio.

Não poderia ser menos esclarecedora a definição deZeno Veloso sobre o tema, em obra que é referência noestudo da invalidade do negócio jurídico: “um dado negó-cio jurídico, por exemplo, por causa de falhas, defeitos eomissões na sua formação, entrou no mundo jurídico,porém não atendeu às exigências legais para a sua valid-ade. Mas o que se apresenta, o que, afinal, foi feito e realiz-ado, embora insuficiente para aquele determinado negó-cio, é suficiente e bastante, entretanto, para a validade deoutro negócio, que tem conexidade e semelhança com oinválido. A este fenômeno dá-se o nome de conversão”( Invalidade do negócio..., 2005, p. 120).

 A conversão é expressamente prevista no Código Civil

português, que, em seu art. 293, determina: “(Conversão).O negócio nulo ou anulado pode converter-se num negóciode tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os requis-itos essenciais de substância e de forma, quando o fimprosseguido pelas partes permita supor que elas o teriamquerido, se tivessem previsto a invalidade”.

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No caso brasileiro, os requisitos necessários para aconversão do negócio são os seguintes:

– Requisito objetivo: o segundo negócio, em que se conver-teu o nulo, tenha por suporte os mesmos elementos fáti-

cos deste, ou seja, “a manifestação de vontade, o con-teúdo, a causa, a tipicidade ou licitude, a capacidade, a le-gitimidade e a possibilidade do objeto” (TRIGINELLI,

 Wania do Carmo de Carvalho. Conversão..., 2003, p. 99).Sobre os requisitos objetivos, o Enunciado n. 13 aprovadona  I Jornada de Direito Civil , promovida pelo Conselhoda Justiça Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, as-sim dispõe: “O aspecto objetivo da conversão requer a ex-istência do suporte fático no negócio a converter-se”.

– Requisito subjetivo: exige-se a intenção das partes em ob-ter o efeito prático resultante do negócio em que se con-

 verte o inválido. Realmente, se não houver vontade daspartes em celebrar o novo negócio, não haveria sentido al-gum em determinar a conversão, pois a vontade é o ele-mento que fundamenta o negócio jurídico. A ausência de

 vontade, para alguns, como o coautor Flávio Tartuce, ger-aria a nulidade absoluta do negócio jurídico, e para out-ros, como o coautor José Fernando Simão, a suainexistência.

Por fim, quanto às espécies de conversão fala-se em:

– Conversão formal ou legal : segundo Zeno Veloso, “ocorrequando um dado negócio pode ser celebrado por váriasformas e, sendo inválido na forma em que foi feito, é apro-

 veitado, entretanto, e validado sob forma diversa, desdeque, é claro, tenha atendido aos requisitos desta”( Invalidade..., 2005, p. 123). Pensemos no seguinte exem-plo: os contratantes decidem celebrar um contrato de loc-

ação por escritura pública, apesar de esta não ser exigida

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por lei para a validade da locação. A escritura é lavradapor pessoa que não trabalha no tabelionato, mas se passapor tabelião. O contrato de locação por escritura públicaserá nulo; no entanto, será aproveitado como contrato delocação por instrumento particular. Note-se que o negócio

 jurídico continua sendo o mesmo: um contrato de locação,razão pela qual a doutrina entende que não haveria real-mente uma conversão do negócio, já que “o negócio é omesmo, embora com forma diferente” (VELOSO, Zeno.

 Invalidade..., 2005, p. 123).

– Conversão substancial : é aquela em que conteúdo nego-cial é convertido, ou seja, altera-se o tipo contratual.

 Assim, se o sujeito assina uma nota promissória sem apresença de todos os requisitos formais, como, por exem-plo, a falta da denominação “nota promissória” no corpodo título, o negócio se converte em confissão de dívida.Fábio Ulhoa Coelho, por exemplo, menciona o caso emque ocorre a criação de uma fundação por instrumentoparticular e esta se converte em doação dos bens (Curso...,2003, v. I, p. 350). Ocorrendo a conversão substancial, de-

 vem ser aplicadas ao negócio as regras referentes ao negó-cio convertido e não àquele nulo.

Com relação ao testamento, é possível imaginar situ-ações de conversão formal e de conversão substancial.

Primeiramente, um testamento cujo objeto seja um bem de pequeno valor que foi feito sem assinatura detestemunhas pode converter-se em codicilo (conversãosubstancial ). A jurisprudência nacional vem admitindoessa forma de conversão ( RT  327/277).

 Vale dizer que o Código Civil italiano traz exemploclássico de  conversão formal  de testamento. O diplomadetermina em seu art. 607 que o testamento cerrado, uma

 vez que não tenha as características preenchidas, terá

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efeito como testamento hológrafo, contanto que preenchaos requisitos deste (“Il testamento segreto, che manca diqualche requisito suo proprio, ha effetto come testamentoolografo, qualora di questo abbia i requisiti”).

Imagine-se um testamento público que conta com aassinatura de quatro testemunhas (apesar de a lei só exigirduas), que, por um lapso, deixa de ser assinado pelo Ta- belião. Como instrumento público, o testamento é nulo,mas converte-se em testamento particular (que só exige apresença de três testemunhas), ocorrendo a conversãoformal, pois a forma pública nula converte-se em forma

particular válida. Note-se que o negócio jurídico original éum testamento e o convertido também o é.

Por outro lado, uma doação mortis causa pode se con- verter em legado se presentes os requisitos formais de val-idade. Sobre o tema, explica Wania do Carmo de CarvalhoTriginelli que “no sistema jurídico brasileiro não é pacíficaa admissão da figura da doação   mortis causa, emborapareça ser possível aceitá-la até pelo fato (não só) de o art.314 do Código Civil de 1916 a ela se referir expressamente,apesar de a referência encontrar-se no tópico destinado àdoação   propter nuptias. Admitida a figura no sistema jurídico brasileiro, o caso referido seria típico de conver-são do negócio jurídico” (Conversão..., 2003, p. 166).

Em conclusão, com a expressa disposição do art. 170do CC de 2002, a conversão do testamento nulo não só setorna possível, afastando qualquer debate que existia sob aégide do revogado Código Civil, como também desejável,pois dá efetividade à vontade do morto, preservando a suaautonomia privada e conservando o negócio jurídico

celebrado.

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 Assim, conclui-se o seguinte:

– Se passar dos 5 anos do registro do testamento sem suaimpugnação, o testamento nulo é considerado válido (art.1.859 do CC), sanando-se a nulidade.

– Se dentro dos 5 anos algum interessado requerer a nulid-ade do testamento (total e absoluta), ainda poderá ocorrersua conversão se preenchidos os requisitos apontados.

3.10.2 Revogação do testamento

 A noção de revogação implica a perda de eficácia dotestamento por vontade de quem o testou, pois este é es-sencialmente revogável, conforme leciona Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 302). Como se per-cebe, a revogação é fato superveniente (ou posterior) àformação do testamento.

 A revogação pode ser conceituada como sendo o atode vontade do testador que difere da nulidade relativa ouabsoluta do testamento. As nulidades surgem antes darealização do ato ou simultaneamente a este, ou seja, sãomotivos anteriores à celebração do ato.

 A revogação será admitida ainda que o próprio testa-dor tenha dito ser o seu testamento irrevogável (art. 1.858

do CC). A cláusula de irrevogabilidade do testamento nãoproduz efeitos e tem-se por não escrita, já que entra emconflito com a própria natureza jurídica do instituto.

 Assim, a regra máxima com relação à revogação éaquela que determina que o testamento pode ser revogadopelo mesmo modo e forma como pode ser feito (art. 1.969

do CC). Nesse sentido, não deve imaginar o leitor que o

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testamento público, por ser solene, não possa ser revogadopelo testamento particular. Testamentos elaborados pelaforma ordinária podem ser revogados por outros válidospraticados por forma extraordinária e vice-versa. Qu-alquer forma válida de testamento revoga outra forma de

testamento. Portanto, o testamento particular pode revog-ar o testamento cerrado ou o público, assim como o testa-mento militar pode revogar o público, o particular ou ocerrado.

Contudo, deve-se frisar que o codicilo não tem o con-dão de revogar o testamento, mas o testamento pode re-

 vogar o codicilo, conforme explicam Sebastião Amorim(Código Civil..., 2004, v. XIX, p. 295) e Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 303). Em sentidocontrário, afirma Zeno Veloso que se o codicilo posteriorregular a matéria contida em testamento anterior e tenhaconteúdo possível, poderá haver revogação parcial do test-amento (Comentários..., 2003, v. 21, p. 157). Exemplific-

ando, se o testador deixar todos os seus bens ao sobrinhoDaniel e depois, por codicilo posterior, deixar apenas o seupiano à sobrinha Fernanda, teria havido revogação parcial.

Também há de se apontar que não será possível a re- vogação do testamento por simples escritura pública.

Como toda e qualquer revogação, a do testamento

poderá ser total ou parcial (art. 1.970 do CC). Em certassituações, pode o testador apenas revogar determinadadisposição que institui um legado ou cria certa restrição(v.g., a cláusula de incomunicabilidade), hipótese em quea revogação será parcial. Nesse último caso, o antigo testa-mento subsistirá quanto às demais disposições.

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 A revogação poderá ser expressa, caso o testador de-clare sua vontade em revogar o testamento anterior; ou tá-cita, se simplesmente fizer novo testamento com dis-posições contrárias às do testamento anterior. Ilustrando,se no primeiro testamento o falecido deixar seu carro para

o sobrinho Alexandre e em testamento posterior deixar to-dos os seus bens ao sobrinho Renato, o segundo testa-mento, por ser posterior, revogará o primeiro. Ilustrando,sobre o tema da revogação tácita já decidiu o Tribunal deJustiça do Rio Grande do Sul:

“Consoante o teor das disposições de vontade do testador,insertas no testamento posterior, realizado em 15.08.2001,observa-se que tanto os bens legados, como os legatárioscontemplados, são totalmente diversos da disposição realiz-ada em benefício da autora, sendo forçoso concluir que am-

 bos são independentes entre si. Importa mencionar,primeiramente, que os preceitos esculpidos nos artigos 1.746e 1.747 do Código Civil de 1916, que regulavam a revogação

de testamento, foram reproduzidos, em linhas gerais, nosartigos 1969, 1970 e seguintes do novo Código Civil. Port-anto, continua íntegro o raciocínio de que o testamento podeser revogado pelo mesmo modo e forma como foi feito, me-diante revogação parcial ou total. Já se o novo testamento,no que interessa, não contiver cláusula revogatória expressa,o anterior continuará subsistindo em tudo aquilo que não

for contrário ao posterior” (TJRS, Apelação Cível70014619456, 8.ª Câmara Cível, Rel. Luiz Ari AzambujaRamos, j. 01.06.2006).

Porém, se a contradição ocorrer em um mesmo testa-mento, não se aplicará critério pelo qual a cláusula pos-terior revoga anterior. Conclui Washington de BarrosMonteiro que as disposições contraditórias em um mesmotestamento anulam-se (Curso..., 2003, v. 6, p. 257).

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O testamento revogador produz seus efeitos ainda queocorra a sua caducidade por exclusão do herdeironomeado – que é declarado indigno por sentença –, pelarenúncia do beneficiário nomeado, ou por sua incapacid-ade. Ainda que tais situações ocorram, considera-se re-

 vogado o testamento anterior (art. 1.971 do CC). A re- vogação só não produz efeitos em caso de anulabilidade dotestamento revogador por vícios (v.g.   dolo, coação) ouhavendo infração à solenidade essencial (v.g.  testamentopúblico sem testemunhas).

Três últimas observações devem ser feitas quanto à re-

 vogação do testamento. A primeira é que a simples revogação do testamento

revogador não devolve eficácia ao testamento anterior-mente revogado. Em suma, não se verifica o fenômenoautomático da repristinação para os casos em questão.Imagine-se que o testador fez um testamento em 2001, umsegundo em 2002 revogando expressamente o primeiro, eum terceiro em 2005 revogando expressamente o se-gundo. A revogação do segundo testamento não revigora oprimeiro anteriormente revogado, salvo declaração de vontade do testador nesse sentido. No exemplo emquestão, o falecido morreu sem testamento (ab intestato).

 A segunda observação é que, se o testador ou terceiro,

com seu consentimento, abrir ou dilacerar o testamentocerrado ocorrerá a sua revogação (art. 1.972 do CC). To-davia, afirma Maria Helena Diniz que “como o que im-porta é o  animus  do testador, não há a presunção abso-luta; assim sendo, poderão subsistir tais testamentos se seprovar que o rompimento foi acidental; daí a matéria de

fato ser apreciada pelo magistrado no caso concreto”

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(Curso..., 2005, v. 6, p. 265). Apesar de respeitável, esseentendimento é considerado minoritário.

Por fim, como terceira observação, em consequênciada revogação teremos a sucessão legítima, se esta for total,ou a sucessão testamentária, se esta for parcial.

3.10.3 Da caducidade do testamento

Segundo Maria Helena Diniz, ocorre a caducidade deum testamento quando a disposição testamentária, apesarde válida, não prevalecerá por obstáculo superveniente aomomento da   testificação   (Curso..., 2005, v. 6, p. 267). Assim sendo, são hipóteses de caducidade do testamento:

a) Se o herdeiro ou o legatário nomeado morrer antes dotestador ou no mesmo momento que ele (art. 1.943 doCC). Como se sabe, é requisito básico para que o herdeirotenha capacidade sucessória que esteja vivo quando da

abertura da sucessão. Caso seja premorto ao testador, nãoserá seu sucessor, e o testamento caducará. Da mesmaforma, se houver comoriência, inexistirá relação su-cessória entre os falecidos (art. 8.º do CC). Lembre-se quea comoriência é aquela situação em que duas pessoas fa-lecem numa mesma ocasião, não sendo possível apontarquem faleceu primeiro, presumindo então a lei que fale-

ceram ao mesmo tempo. b) Se os herdeiros ou legatários falecerem depois do testa-

dor, mas antes do implemento da condição fixada no test-amento (evento futuro e incerto).

c) Se a condição suspensiva imposta não se realizar. A ilus-trar, se o testador determinou: “deixo meus bens a meusobrinho João se ele estiver casado quando de minhamorte”, e se, ao morrer, João estiver divorciado, a

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condição não se verificou, o que gera a caducidade dotestamento.

d) Se o herdeiro for incapaz de herdar (art. 1.801 do CC) ourenunciar à herança ou ao legado (art. 1.808 do CC), outiver sido excluído da sucessão (art. 1.814 do CC).

e) Se o testador fez testamento marítimo ou aeronáutico enão morreu na viagem, nem nos 90 dias subsequentes aoseu desembarque em lugar em que poderia testar deforma ordinária (art. 1.981 do CC).

f) Nos termos do art. 1.895 do atual Código, se o testador faztestamento militar e, não morrendo na campanha, esteja,por 90 dias seguidos, em lugar onde possa testar na formaordinária, salvo se esse testamento apresentar as solenid-ades previstas no art. 1.894 do CC.

g) Em se tratando de coisa certa, perecendo esta sem culpado herdeiro, extingue-se a obrigação, já que não pode oobjeto certo ser substituído por outro. Também aqui hácaducidade do legado (art. 1.939, III, do CC).

h) Se, depois do testamento, o testador modificar a coisa leg-ada, a ponto de esta já não ter a forma nem lhe caber a de-nominação que possuía (art. 1.939, I, do CC).

Para terminar, como consequência da caducidade,ocorrerá a sucessão legítima se a ineficácia abranger a to-dos os herdeiros ou aos legatários, e eles não tiverem sub-

stitutos. Eventualmente, ocorrerá a sucessão testa-mentária se não abranger todos os herdeiros ou legatáriose, não tendo eles substitutos, houver o direito de acrescerentre eles.

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3.11 DA REDUÇÃO DAS DISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS E DOROMPIMENTO DO TESTAMENTO

3.11.1 Conceito de redução das disposiçõestestamentárias

 A redução das disposições testamentárias decorre doprincípio pelo qual a existência da legítima preserva odireito dos herdeiros necessários (art. 1.845 do CC). Con-

forme outrora explicado, a legítima corresponde a 50%dos bens deixados pelo falecido, sempre se descontandoeventual meação do cônjuge ou da companheira, quecomo vimos não constitui um direito sucessório.

Desse modo, caso haja invasão da legítima quando daelaboração do testamento, em prejuízo aos herdeiros ne-cessários, a sanção prevista em lei será a redução das dis-

posições testamentárias, não se falando em anulação ounulidade do testamento. Isso porque a liberdade ou auto-nomia de testar é limitada por normas de ordem pública.

 A redução ocorrerá se, no momento da elaboração dotestamento, o herdeiro necessário já existir. É o caso dopai que, tendo filhos, deixa 60% de seus bens ao seu time

de futebol. Nesse caso, o juiz reduzirá a disposição em fa- vor do time para apenas 50%, preservando a legítima dofilho.

 A redução aqui estudada, por óbvio, não se confundecom a hipótese de rompimento do testamento (arts. 1.973a 1.975 do CC), em que surge um herdeiro necessário

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desconhecido do testador, conforme será explicado aseguir, e cujas consequências são totalmente diferentes.

É importante ressaltar que os motivos que levaram otestador a invadir a legítima (v.g., erro de cálculo, descon-hecimento da lei ou intenção de prejudicar os herdeirosnecessários) são irrelevantes para que ocorra a redução, bastando que, objetivamente, por meio de cálculos, sejaconstatado que o direito à legítima foi desrespeitado.

Como bem explica Silvio Rodrigues, “o direito que alei reconhece aos herdeiros necessários seria nenhum seela não o garantisse com uma sanção. Essa sanção consiste

na prerrogativa concedida ao herdeiro, porventura preju-dicado pelas excessivas liberalidades do finado, de pleiteara redução destas, a fim de não ficar lesada a quota reser- vatária” ( Direito civil , 2002, v. 7, p. 231). Por outro lado,importante fato é salientado por Giselda Maria FernandesNovaes Hironaka: “o que se descortina, principalmente,nesse assunto é uma dicotômica atenção do legislador,que, por um lado, não perde de vista o interesse jurídicodos sucessores com direito à legítima, mas, por outro, nãose limita a desconsiderar a derradeira vontade do testa-dor” (Curso avançado..., 2003, v. 6, p. 342). Portanto, asdisposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ão aos limites dela (art. 1.967 do CC).

Um bom exemplo de redução das disposições testa-mentárias se verifica na hipótese em que certa pessoa, cas-ada, faz um testamento deixando a totalidade de bens paraseu sobrinho. Note-se que o cônjuge, na sistemática do re- vogado Código Civil, não era herdeiro necessário, e, port-anto, tal testamento produziria normalmente seus efeitos

se o testador falecesse na vigência daquele diploma.

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Contudo, se o testador falece na vigência do atual CódigoCivil, o testamento é parcialmente ineficaz, pois em razãoda disposição do art. 1.845 do Código Civil o cônjuge éherdeiro necessário. Ocorrendo a redução, o sobrinho ficacom 50% dos bens (parte disponível) e o cônjuge com 50%

(legítima). Apenas a título de nota, o Superior Tribunal de

Justiça, no Recurso Especial 1.111.095, decisão comentadano Capítulo 1 da presente obra, decidiu pela não aplicaçãodo Código Civil de 2002, preservando-se, de maneira equi- vocada, a eficácia plena do testamento em favor do

sobrinho (Ver Capítulo1 da obra, item 1.1).Fazendo um paralelo interessante, no caso de doação

(negócio inter vivos), se o doador dispuser de parte super-ior àquela que poderia deixar por testamento no momentoda doação, verifica-se a chamada doação inoficiosa, que énula quanto ao excesso (art. 549 do CC).

Percebe-se, assim, que o Código Civil comina sançõesdiversas ao excesso inoficioso. Se o doador invade a legí-tima, doando a parte inoficiosa, a doação será nula,atingindo-se o plano da validade do negócio jurídico intervivos. Por outro lado, se a ofensa à legítima se dá por meiode ato de última vontade (testamento), não há mácula à validade, mas apenas quanto aos efeitos que serão modi-

ficados pelo juiz (plano da eficácia). A redução poderá ocorrer nos próprios autos do in-

 ventário, já que não se trata de questão de alta indagação a vedar a sua análise. Entretanto, como leciona Sílvio deSalvo Venosa, “não satisfeito qualquer interessado, ou nãosendo possível a redução no curso do inventário, há que se

recorrer à ação própria de redução (denominada

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tradicionalmente de  actio in rem scripta)”. Essa ação sópoderá ser proposta após a morte do testador, momentoem que o testamento começa a produzir seus efeitos, jáque ninguém é considerado herdeiro antes de aberta a su-cessão. Por se tratar de interesse privado, podem os her-

deiros necessários prejudicados renunciar ao direito depromover essa demanda. E, por óbvio, não poderia serdiferente. Se ninguém é obrigado a receber a herança, po-dendo, inclusive, a ela renunciar, não haveria motivospara que não fosse possível a renúncia ao direito depleitear a redução.

 3.11.1.1 Das regras gerais de redução das disposiçõestestamentárias

O Código Civil traz um conjunto de regras quanto aotema, um verdadeiro roteiro, para que se faça a reduçãodas disposições testamentárias (art. 1.967 do CC). Vejamostodas essa regras, mais uma vez de forma pontual e exem-plificando o seu conteúdo.

1.º) Devem ser reduzidas as quotas deixadas aos herdeirosproporcionalmente ao quinhão de cada um. Assim, se otestador, tendo um filho, deixar 60% de seus bens aosobrinho João, caberá a redução em 10% para resguardar

a legítima.

2.º) Se a redução dos herdeiros não for suficiente, devem-sereduzir os legados. Vejamos dois exemplos práticos.

 Exemplo 1. A redução da herança é suficiente. O testa-dor, tendo filho, deixa seus bens ao seu amigo João (conta bancária de R$ 20.000,00) e um imóvel legado em favordo sobrinho José (que vale R$ 10.000,00), sendo certo

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que o total de seu patrimônio é de R$ 30.000,00. João éherdeiro e José legatário. Note-se que o filho do testador(herdeiro necessário) nada receberia em razão dotestamento.

Patrimônio total dofalecido

Legítima –50%

Reduçãonecessária

R$ 30.000,00  R$

15.000,00   R$ 15.000,00

Nessa situação, caberá a entrega da importância de R$15.000,00 ao filho do testador, a ser realizada pelo her-deiro João, tendo ele direito ao restante (R$ 5.000,00).Reduz-se apenas a herança, permanecendo intacto olegado.

 Exemplo 2. A redução da herança não é suficiente. Otestador, tendo filho, deixa seus bens ao seu amigo João(conta bancária de R$ 20.000,00) e um carro legado emfavor do sobrinho José (que vale R$ 50.000,00), sendocerto que o total de seu patrimônio é de R$ 70.000,00.João é herdeiro e José legatário. Note-se que o filho dotestador (herdeiro necessário) nada receberia em razão do

testamento.

Patrimônio total dofalecido

Legítima –50%

Reduçãonecessária

R$ 70.000,00  R$

35.000,00   R$ 35.000,00

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Na última situação, caberá a entrega ao filho do testa-dor da importância de R$ 20.000,00 que pertenceria aoherdeiro João, que, então, nada receberá. Reduz-seprimeiramente a herança. Como a redução não atingiu o valor necessário, o legatário perde o valor de R$

15.000,00, referente à parte do carro legado. Assim, ofilho receberá a importância em bem e dinheiro corres-pondente à legítima, que é de R$ 35.000,00.

 As regras acima explicadas não são de ordem pública,mas apenas refletem a possível vontade do testador, quepoderá, entretanto, estipular como proceder à redução

testamentária (art. 1.967, § 2.º, do CC).Exemplificando de outra forma, se o testador, tendo

filho, deixa todo o seu patrimônio distribuído em testa-mento da seguinte forma: seus bens a seu amigo João(conta bancária de R$ 20.000,00) e suas ações legadas emfavor do sobrinho José (que valem R$ 50.000,00). Con-tudo, determina no testamento que a redução se façaprimeiramente no legado. Considerando-se que o total deseu patrimônio é de R$ 70.000,00, a redução será feita as-sim: caberá a entrega ao filho do testador da importânciade R$ 35.000,00 correspondentes às ações legadas quepertenceriam a José, que então receberá apenas R$15.000,00. Já com relação ao herdeiro João, como a re-

dução do legado atingiu o valor necessário, a herança lheserá entregue integralmente.

Superada a análise das regras gerais, passaremos aoestudo de regras específicas de redução testamentária emse tratando de bem imóvel.

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 3.11.1.2 Das regras de redução em se tratando de bemimóvel 

Caso a redução deva ser feita sobre um bem imóvel, asregras do Código Civil, previstas no art. 1.968, são as

seguintes:

a) Se o imóvel for divisível (exemplo: um terreno), far-se-á adivisão de maneira a respeitar a legítima. Assim, se a re-dução ocorrer em 40% do imóvel, divide-se o terreno emduas partes: uma de 40% em favor do herdeiro necessário,como forma de preservação de legítima; e outra de 60%

para o herdeiro nomeado em testamento. Não haverá con-domínio, mas divisão e, portanto, dois imóveis novos sur-girão a partir desse fracionamento.

 b) Em caso de imóvel indivisível (exemplo: um aparta-mento), são as possíveis consequências da redução:

1.ª consequência – Caso o excesso seja superior a 1/4

do valor do bem, o herdeiro necessário ficará com a pro-priedade e o legatário beneficiado com o prédio só terádireito de exigir deste o valor da parte disponível(MONTEIRO, Washington de Barros. Curso..., 2003, v. 6,p. 253). Exemplificando, se o único bem do testador, umimóvel no importe de R$ 100.000,00, for deixado aosobrinho João, e seu filho, herdeiro necessário nada

recebe, deve-se realizar o seguinte cálculo:

Patrimôniototal dofalecido

Legítima   Reduçãonecessária

Excessoa ser

reduzido

O emaval

d

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R$100.000,00

R$50.000,00

R$50.000,00

R$50.000,00

SIMcorr

R$

Como conclusão, o imóvel ficará com o herdeiro ne-cessário e o legatário João terá direito de exigir o paga-mento de R$ 50.000,00 em dinheiro.

2.ª consequência – Caso o excesso não seja superior a1/4 do valor do bem, o herdeiro necessário não ficará coma propriedade, que pertencerá ao legatário beneficiado,que, entretanto, deverá pagar em dinheiro ao herdeiro ne-cessário o valor correspondente à legítima (RODRIGUES,Silvio. Direito civil..., 2002, v. 7, p. 237). Para ilustrar, se otestador deixar ao sobrinho João um imóvel no importe deR$ 100.000,00 e a importância de R$ 40.000,00 ao seufilho, herdeiro necessário, deve-se realizar o seguinte

cálculo:

Patrimôniototal dofalecido

Legítima   Reduçãonecessária

Excessoa ser

reduzido

O emaval

d

R$140.000,00

R$70.000,00

R$30.000,00

R$30.000,00

SIMcorr

R$

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Desse modo, o imóvel ficará com o legatário João, e ofilho, herdeiro necessário, terá o direito de exigir o paga-mento de R$ 30.000,00 em dinheiro.

 3.ª consequência – Caso o legatário beneficiado pelolegado de bem imóvel indivisível seja também herdeironecessário, poderá inteirar sua legítima no próprio imóvel,desde que a soma do valor do legado e da legítima repres-entem o valor total do imóvel.

3.11.2 Do rompimento do testamento

Segundo a doutrina, o rompimento do testamento,também denominado de   revogação legal,   verifica-sequando ocorre a superveniência de descendente sucessíveldo testador que este desconhecia quando testou, ouporque o reconheceu, nasceu ou adotou posteriormente à

elaboração do testamento (LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito civil ..., 2004, v. 6, p. 306). Note-se que o rompi-mento significa a total desconsideração do conteúdo dotestamento, como se nunca tivesse existido, razão pelaqual o termo revogação legal  exprime bem o alcance doinstituto que ora se comenta.

 Vale dizer que o rompimento do testamento é também

chamado de revogação ficta ou presumida. Nas hipótesesem questão, presume a lei que a vontade do testador seriaa completa revogação do testamento como um todo, deix-ando a inteireza de seus bens para o filho que desconheciaquando testou, ou para aquele que reconheceu, adotou ouainda que nasceu após o testamento ter sido feito.

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O que se percebe é que, em decorrência de uma cir-cunstância posterior, alteraram-se as condições que existi-am quando da elaboração do testamento. Presume a leique, se soubesse da existência de um filho, o testador teriapreferido lhe deixar toda a herança a testá-la a terceiros. O

nascimento de um filho, neto ou bisneto é suficiente pararomper o testamento.

Ilustrando, imagine-se o caso de o testador elaborartestamento deixando todos os bens para o seu sobrinho,logo após a morte de seu único filho. Posteriormente, a es-posa de seu filho, esperando um filho deste, dá a luz uma

menina. O nascimento da neta rompe o testamento.Trata-se de presunção de afetividade criada pela lei.

Isso porque, pela experiência cotidiana, nota-se que, tendoa pessoa descendente, não há o costume de se elaborartestamento em favor de sobrinho ou quem quer que seja.Presume-se, então, que se o falecido conhecesse o her-deiro, não teria feito testamento beneficiando terceiros.

Interessante notar, entretanto, que caso o testador játenha um filho ou neto e venha a nascer outro após aelaboração do testamento, isto não acarretará a ruptura.Como esclarece Washington de Barros Monteiro, “o testa-mento só se rompe com a superveniência de filhos,quando o testador não os tinha anteriormente; se os pos-

suía quando testou, o nascimento não provoca a  ruptiotestamenti ” (Curso..., 2003, v. 6, 259). Note-se que se,sabendo da existência de um filho, deixa o falecido todosos bens a seu sobrinho, deve ocorrer a redução das dis-posições, como outrora analisado.

É requisito essencial para que haja o rompimento que

o descendente esteja vivo quando da morte do testador

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(art. 1.973 do CC). Isso porque, em caso de pré-morte doherdeiro, o testamento não estará rompido. Assim, se Joãonão tinha nenhum filho quando fez seu testamento, masnasce-lhe um dias depois, o testamento estará rompido nocaso de João falecer e seu filho estar vivo nesse momento.

É a morte de João o momento em que se verifica orompimento.

Do ponto de vista prático, segundo Maria Helena Din-iz, o rompimento ocorre sem que seja necessária ação es-pecial, pois pode ser declarado no próprio inventário(Curso..., 2005, v. 6, p. 267). Filia-se mais uma vez ao seu

entendimento.Determina a lei, ainda, que o testamento se rompe se

feito na ignorância de existirem outros herdeiros ne-cessários (art. 1.974 do CC). Exemplificando, se o filhopensa que seu pai faleceu em razão de seu desapareci-mento por um longo período, mas este depois retorna, otestamento estará rompido.

Por outro lado, em decisão interessante sobre aquestão, o Tribunal do Rio Grande do Sul já entendeu que,se o falecido tinha uma filha decorrente de seu casamentoe elabora testamento deixando-lhe a parte disponível, oposterior reconhecimento por meio de ação judicial deduas outras filhas das quais o testador tinha ciência não

causa o rompimento do ato de última vontade. Vejamostal acórdão:

“Ao prever o rompimento do testamento o legislador pre-sume que o testador não disporia dos seus bens por testa-mento se tivesse filhos ou,   desconhecendo a existênciadestes, viesse posteriormente a deles tomar conhecimento.

Bem analisando os dispositivos retro referidos tem-se que,

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pelo art. 1973, rompe-se o testamento se sobrevém determ-inado descendente ao testador que não o tinha ao tempo daconfecção do testamento, ou desconhecia sua existência. Oart. 1974 refere-se ao rompimento do testamento quando otestador ignora a existência de herdeiros necessários deforma geral. Para que ocorra o rompimento do testamento,portanto, basta que sobrevenha novo descendente ao testa-dor, ou venha ele a tomar conhecimento de sua existênciaem momento posterior ao testamento. Portanto, se já sabiada existência desse descendente no momento da lavraturado testamento, não haverá justificativa para o rompimentodo testamento, pois resta claro, nesta circunstância, quedesejou beneficiar um dos descendentes, em detrimento dos

demais, o que é perfeitamente lídimo, desde que se limite àsua parte disponível (art. 1.975, CC)” (TJRS, Agravo de In-strumento 70015732878, 7.ª Câmara Cível, Rel. Luiz FelipeBrasil Santos, j. 06.09.2006).

Intrigante questão diz respeito ao cônjuge que passoua ser considerado herdeiro necessário pelo Código Civil de

2002 (art. 1.845), mas não o era pela sistemática doCódigo Civil de 1916. Imaginemos o testamento elaboradona vigência do Código Civil de 1916 por um sujeito casado,que não tenha descendentes ou ascendentes, deixando to-dos os seus bens para um sobrinho. Seu falecimento se dána vigência do Código Civil de 2002. Será que otestamento considera-se rompido?

 A resposta é negativa.

Euclides de Oliveira, em   e-mail  pessoal enviado aocoautor José Fernando Simão, afirma que “parece-me quea hipótese não é de rompimento, mas de simples reduçãotestamentária. O rompimento a que alude o art. 1.974 doCódigo Civil diz com o desconhecimento da existência de

pessoa sucessível. Aplica-se, por exemplo, quando o

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testador supõe que o pai, desaparecido, esteja morto,quando em verdade permanece vivo. Da mesma forma, seo cônjuge ausente reaparece, então o testamento que omi-tisse seus direitos como herdeiro necessário estaria romp-ido, por força da lei, na suposição de que, se o testador

soubesse, não teria disposto em benefício de outrem. Ainda que depois, pela mudança do Código, o cônjugetenha passado a ser herdeiro necessário, tal fato não at-inge por inteiro a prévia disposição de última vontade. A solução, portanto, será simplesmente a de reduzir o testa-mento à parte disponível, nos termos do art. 1.967 do CC,de modo a garantir a legítima que a lei agora manda at-ribuir ao cônjuge sobrevivo”.

Sobre o tema, decidiu o Tribunal Gaúcho que, se ocônjuge, casado pelo regime da separação convencional de bens, foi beneficiado pelo testamento com a metade dos bens do falecido e a outra metade foi destinada a umsobrinho, não há que se falar em rompimento, mas sim

dar-se cumprimento ao ato de última vontade. A decisãomerece destaque:

“O testamento foi lavrado enquanto vigente o Código Civilde 1916, onde a Cônjuge não estava contemplada, ainda,como herdeira. Necessária, o que veio a se materializaragora com o seu ordenamento, além de que o casal não tinha

filhos ou pais. Desta forma, e por isso, o testador instituiusua mulher como herdeira universal, junto com o agravante,pois era casado pelo regime da separação obrigatória, po-dendo dispor da ‘totalidade do acervo’. Ou seja, em vista doregime adotado não havia meação nem herança, o que pos-sibilitava o testador dispor de todo o seu patrimônio, en-dereçando metade a cada um. Em outras palavras, não havia

‘sucessão legítima’ pela falta de herdeiros necessários, nem

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‘meação’, eis que o regime adotado era da separação univer-sal. Portanto, restava uma ‘sucessão testamentária’, ondeditas partes foram instituídas. Não há porque se cogitar,agora, de eventual ‘meação’ ou ‘herança’, mas apenas de ‘leg-ados’ aos herdeiros testamentários, tal como ordenou aprimeira decisão judicial, com o que se respeita a vontade dotestador” (TJRS, Agravo de Instrumento 70008701724, 7.ªCâmara Cível, Rel. José Carlos Teixeira Giorgis, j.26.05.2004).

Superados esses pontos, não se rompe o testamentonas seguintes hipóteses:

1.ª) O testador que elabora cláusula dispondo expres-samente como ficará sua herança caso surja um herdeironecessário. Se previr esta possibilidade, não há razão pararompimento do testamento, pois este só ocorre pela pre-sunção legal segundo a qual o testador revogaria o testa-mento caso surgissem herdeiros necessários descon-hecidos ou que não existiam quando da elaboração do

testamento.2.ª) Caso o testador apenas deixe em testamento a metade

de seus bens e não contemple os herdeiros necessários decuja existência saiba, ou quando os exclua dessa parte(art. 1.975 do CC). Ora, se o testador não dispõe da total-idade de seus bens, mas apenas de metade, surgindo oherdeiro necessário, terá ele direito à outra metade, em

concorrência com os outros herdeiros necessários que ode cujus   tiver. Da mesma forma, se houver cláusula ex-cluindo os herdeiros necessários da porção disposta emtestamento, o surgimento de um novo herdeiro nãoafetará a vontade do morto, que é, justamente, de deixar aporção disponível para terceiros que não sejam herdeirosnecessários. Nesse sentido, a seguinte cláusula: “Deixo a

parte disponível de meus bens a meu sobrinho João, ex-cluindo meus filhos da participação quanto a tal parte”.

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Para findar o estudo da matéria, é de se apontar que aliberdade do testador com relação à parte disponível étotal, como lembra Eduardo de Oliveira Leite e, caso hajainvasão à legítima, estaremos diante de caso de reduçãodas disposições e não de rompimento ( Direito civil ...,

2004, v. 6, p. 307).

3.12 DO TESTAMENTEIRO

3.12.1 Espécies e regras gerais

O testamenteiro é a pessoa nomeada em testamentopara cumprir a disposição de última vontade do falecido.Para De Plácido e Silva, o testamenteiro é a “pessoa aquem se cometem os encargos de uma testamentaria, paraque cumpra as disposições de um testamento”. Tal insti-

tuto tem caráter personalíssimo, constituindo uma at-ribuição de ordem privada, um ato jurídico   lato sensuformal regido pela autonomia privada (Vocabulário...,1976, p. 1.550).

O que se percebe é que o testamenteiro tem o encargocomplexo e importantíssimo de execução do testamento.Deve-se dizer que não exerce uma função pública, nem ummúnus público, mas um cargo estritamente privado, umserviço de amigo, de caráter essencialmente facultativo, deforma que ninguém é obrigado a aceitar a função, nas pa-lavras de Eduardo de Oliveira Leite (Comentários..., 2004, v. XXI, p. 680).

Conforme ensina Washington de Barros Monteiro,

“pode acontecer que o testador não tenha herdeiros,

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nestes não confie inteiramente, tenha dúvida sobre sua di-ligência e capacidade, ou ocorra a colisão de interesseentre várias disposições” (Curso..., 2003, v. 6, p. 261).Nesses casos, surge a necessidade de nomeação de um ad-ministrador do testamento ou legado, por ato de última

 vontade. Frise-se que não há obrigatoriedade em suanomeação, por se tratar de opção do testador. A ausênciade testamenteiro não gera invalidade do testamento.

Quanto à natureza jurídica do instituto, calorosos sãoos debates, encarando alguns autores a testamentariacomo um mandato especial, post mortem, ou um mandato

sem representação, que se assemelha a uma gestão denegócios.

Pela primeira corrente, à qual aderimos, na testa-mentaria há um mandato legal como instituto sui generis,autônomo em relação aos demais institutos de repres-entação previstos no Direito Contratual Civil ou mesmo noDireito Empresarial. Aqui, o cargo de mandatário somenteé exercido após a morte, uma modalidade de mandato atermo, indelegável e intransmissível.

O testamenteiro pode ser nomeado pelo autor da her-ança por meio de testamento ou até mesmo codicilo.Permite-se que o falecido nomeie um ou mais testamen-teiros para dar cumprimento ao testamento, podendo a

nomeação ocorrer conjunta ou isoladamente (art. 1.976 doCC).

Nada impede que o testador nomeie como testamen-teiro um parente, o cônjuge, um amigo, ou ainda um her-deiro ou legatário nomeados no testamento. Contudo, énecessário que o testamenteiro seja pessoa capaz, já que

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terá funções a desempenhar, que não podem ser exercidaspelos absoluta ou relativamente incapazes.

Segundo Maria Helena Diniz, a   testamentaria   nãopode ser concedida “a certas pessoas, embora tenha capa-cidade jurídica, como: as que têm débito com o testador,ou que estiverem litigando com os herdeiros, ou que foreminimigas do disponente e de seus sucessores (CC, art. 1.735– aplicação analógica)” (Curso..., 2005, v. 6, p. 282). A ca-pacidade para ser testamenteiro encontra os mesmospressupostos da capacidade civil da pessoa natural.

Por ser cargo de confiança, a testamentaria não se

transmite aos herdeiros do testamenteiro com sua morte,nem pode ser delegada (art. 1.985 do CC). Entretanto,pode o testamenteiro fazer-se representar em juízo e foradele mediante mandato com poderes especiais. Por essemotivo, não poderia a testamentaria ser exercida por pess-oa jurídica ou ente despersonalizado, argumento com oqual concordamos, inclusive por vedar a “profissionaliza-ção” do instituto.

 As espécies de testamenteiros variam de acordo com amaneira como são indicados. Explica Silvio Rodrigues queo testamenteiro chama-se instituído se for nomeado pelotestador; dativo se o for pelo juiz; universal  se for aquele aquem se confere a posse e a administração da herança; ou particular, aquele que não desfruta dessa posse e dessaadministração ( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 277).

 Assim sendo, não havendo testamenteiro nomeado, atestamentaria será dativa e competirá ao cônjuge ou, nafalta deste, ao herdeiro nomeado pelo juiz (art. 1.984 doCC).

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O termo   cabeça de casal   foi substituído pela ex-pressão   cônjuge,   mais adequada à realidade atual doDireito de Família. Isso porque a ideia de Família Demo-crática está relacionada a várias cabeças e não a somenteuma. Deve-se ressaltar que se o cônjuge for separado de

fato há mais de dois anos, não há razão para suanomeação, pois sequer estará assegurada a sua parti-cipação na herança em determinadas situações (art. 1.830do CC). Também, nesse caso, em ocorrendo ausência, nãoserá o cônjuge nomeado curador (art. 25 do atual Código).

O testamenteiro universal, por expressa vontade do

falecido, recebe a posse e a administração da herança, oude parte dela, desde que não tenha o de cujus cônjuge ouherdeiros necessários (art. 1.977 do CC). A norma é re-dundante, pois o cônjuge também é herdeiro necessáriono sistema do Código Civil de 2002 (art. 1.845 do CC).

Como bem lembra Clóvis Beviláqua, se a herança fortotalmente dividida em legados, o testamenteiro terá aposse e a administração da herança, ainda que não lhatenha concedido expressamente o testador (CódigoCivil ..., 1955, v. VI, p. 185).

Na verdade, a nomeação do testamenteiro universalsofre limites, pois existindo herdeiros necessáriosrespeita-se a vontade do morto quanto ao testamenteiro

nomeado, mas a posse dos bens não lhe é entregue. Ocorrea simples ineficácia de parte da deixa testamentária emdecorrência do brocardo pelo qual  utile per inutile nonvitiatur.

Por outro lado, mesmo sendo universal o testamen-teiro, podem os herdeiros requerer a partilha imediata ou

a devolução da herança, habilitando o testamenteiro com

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os meios necessários para o cumprimento dos legados oudando caução de prestá-los (art. 1.977, parágrafo único, doCC). Tal substituição somente poderá ocorrer se na situ-ação fática o herdeiro solicitante estiver em plenas con-dições de assumir a administração da herança ou em mel-

hor situação que o testamenteiro nomeado. E essa con-statação e decisão cabem, sem dúvida, ao juiz. Nesse sen-tido, para Clóvis Beviláqua, “o herdeiro é dono e possuidordos bens deixados. Se ele habilita o testamenteiro acumprir as disposições de última vontade do testador,quanto aos legados e outros objetos declarados no testa-mento, não há mais fundamento para que esse estranho seconserve na posse e administração da herança” (CódigoCivil..., 1955, v. VI, p. 186).

Pelo fato de o testamenteiro, nessa situação especial,estar com a posse dos bens da herança, caberá a elerequerer o inventário e fazer cumprir o testamento (art.1.978 do CC). Isso não significa que será ele necessaria-

mente o inventariante, pois o Código de Processo Civil de-termina que o juiz nomeará inventariante de acordo com aseguinte ordem: o cônjuge sobrevivente casado sob o re-gime de comunhão universal, desde que estivesse con- vivendo com o outro ao tempo da morte deste; o herdeiroque se achar na posse e administração do espólio, se não

houver cônjuge supérstite ou este não puder ser nomeado;qualquer herdeiro, nenhum estando na posse e adminis-tração do espólio; o testamenteiro, se lhe foi confiada a ad-ministração do espólio ou toda a herança estiver dis-tribuída em legados; o inventariante judicial, se houver;ou pessoa estranha idônea, onde não houver inventariante judicial (art. 990 do CPC).

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Sob outro prisma, a administração, assim como nomandato, pode assumir a forma singular, quando a funçãode testamenteiro é exercida somente por uma pessoa; ou plural , nas formas  solidária, conjuntiva (conjunta), fra-cionária ou sucessiva.

Deve-se aplicar, como primeira regra, a previsão deúltima vontade do testador. Se há na administração, porexemplo, ordem sucessiva estipulada pelo testador, dever-ão agir os testamenteiros um na falta do outro, comoocorre no mandato sucessivo e na substituiçãofideicomissária.

Se não há previsão de ordem sucessiva, a testamentar-ia assume a forma de mandato conjuntivo ou solidário.Mais uma vez, a autonomia privada é dominante: se oautor da herança não determinar a atuação isolada dequalquer um dos instituídos (mandato plural solidário),deverão estes atuar conjuntamente. Nesse sentido,transcreve-se:

“Testamento. Nomeação de mais de um testamenteiropara atuação conjunta, inobstante a ordem de nomeação.

 Admissibilidade. Inteligência dos arts. 1.753 do Código Civile 1.127 do Código de Processo Civil. Recurso não provido”(TJSP, 1.ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento 244.169-1/SP, Rel. Erbetta Filho, j. 11.04.1995, v.u.).

Cabe então, perquirir se a nomeação se deu   insolidum, hipótese em que um dos testamenteiros poderá,sem o concurso dos demais, executar o testamento. Se nãohouver menção expressa do disponente, entender-se-á quea testamentaria deve ser executada por todos os testamen-teiros, em conjunto, hipótese em que, havendo divergênciaentre eles, prevalecerá o voto da maioria e, havendo

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empate, decidirá o herdeiro ou o magistrado, se o herdeirose escusar (DINIZ, Maria Helena.  Curso..., 2005, v. 6, p.284).

 A consequência da   testamentaria conjunta   é a re-sponsabilidade solidária de todos os testamenteiros pelosatos praticados quanto aos bens confiados. Porém, se anomeação for sucessiva ou, se conjunta, houver divisãodas funções de cada testamenteiro, a solidariedade nãoocorrerá (art. 1.986 do CC). Anote-se que a solidariedadenão se presume, decorrendo de lei ou da vontade daspartes (art. 286 do CC).

 A razão de ser daquela regra, explica Washington deBarros Monteiro, é que “são eles escolhidos pelo testador enão pelos herdeiros. Quis a lei, prudentemente, que estes,obrigados a respeitar a vontade do de cujus, ficassem ple-namente garantidos” (Curso..., 2003, v. 6, p. 269).

Deve-se salientar que a testamentaria impõe ao testa-

menteiro uma limitação, qual seja a de não poder comprar bens da herança, ainda que em hasta pública (art. 497, I,do CC). Trata-se de limitação à liberdade de contratar, oque pode ser causa de nulidade absoluta do contrato, casorealizado.

3.12.2 Das funções do testamenteiro

Na sistemática do Código Civil em vigor, são funçõesdo testamenteiro:

1.ª função – Requerer o registro do testamento.

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Esse pedido de registro pode ser feito pelo própriotestamenteiro, por qualquer interessado ou pelo juiz, quepoderá determiná-lo de ofício (art. 1.979 do CC).

Explica Eduardo de Oliveira Leite que o registro dostestamentos efetua-se no juízo da execução e consiste natranscrição do testamento em livro próprio existente emcada cartório. Em seguida, esse registro deve ser remetidoà repartição fiscal, para também ser inscrito em livro re-spectivo, devendo também a inscrição ficar constando dosautos, mediante declaração do representante do fisco(Comentários..., 2004, v. XXI, p. 690). Como se vê, trata-

se de formalidade legal preliminar ao cumprimento dasdisposições testamentárias.

O Código de Processo Civil determina que o juiz, deofício ou a requerimento de qualquer interessado, orden-ará ao detentor de testamento que o exiba em juízo para osfins legais, se ele, após a morte do testador, não se tiverantecipado em fazê-lo, sob pena de busca e apreensão (art.1.129 do CPC).

Se os interessados têm o direito de requerer o registro,o testamenteiro tem um verdadeiro dever. Não exercendo,nesse contexto, tal atribuição, poderá ser-lhe imputadaculpa in omittendo (culpa por omissão, negligência), coma consequente responsabilidade civil por má

administração.Diante dessa possibilidade de responsabilização e pela

sistemática dos poderes e das atribuições da testamentar-ia, entendemos que pode o testamenteiro promover açãode obrigação de fazer em face daquela pessoa que mantémo testamento em sua posse e se nega a levá-lo a registro.

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2.ª função – Cumprir as disposições testamentáriasno prazo marcado pelo testador e prestar contas do querecebeu e despendeu, sendo responsável enquanto durara execução do testamento (art. 1.980 do CC e art. 1.137, I,do CPC).

Na realidade, o testamenteiro está na posse e na ad-ministração de bens que não lhe pertencem ou que lhepertencem apenas em parte, caso seja herdeiro oulegatário.

O Código Civil em vigor se utiliza do termo “dar con-tas”, quando a expressão adequada seria “prestar contas”.

 Assim como o tutor e o curador administram patrimônioalheio, o testamenteiro deve prestar contas aos herdeiros elegatários de sua administração. Caso o testamenteiro sejao único herdeiro dos bens testados, desnecessária será aprestação de contas para si mesmo, pois se os créditos oudébitos existirem, serão todos de si mesmo.

 Aqui surge outra dúvida: poderia o testamenteiro serdispensado pelo falecido de prestar contas de sua gestão? A resposta é negativa, pois a lei determina ser ineficaz, ouseja, não produzir efeitos, a disposição que o libera desseencargo (art. 1.135, parágrafo único, do CPC).

Entendemos que o prazo dos herdeiros para exigir a

prestação de contas é de natureza prescricional e de 10anos (art. 205 do CC), pois a obrigação do testamenteiro érealizar uma prestação, ou seja, uma obrigação de fazer e,portanto, para os herdeiros e legatários surge a pretensãono momento em que o testamenteiro deveria prestar con-tas, mas não o fez. Nesse sentido filiam-se Itabaiana deOliveira, ao comentar o art. 177 do revogado Código Civil

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(Tratado...., 1952, v. 2, p. 685), e Maria Helena Diniz(Curso..., 2005, v. 6, p. 291).

Em decisão semelhante, relativa à obrigação do man-datário de prestar contas, decidiu o Superior Tribunal deJustiça que o prazo seria de 20 anos, no sistema do CódigoCivil de 1916, contados do momento posterior à práticados atos. Afirma a Ministra Fátima Nancy Andrighi, emseu voto: “Portanto, também a pretensão de exigir as con-tas, e o cômputo do respectivo prazo prescricional, só podenascer em momento ulterior à prática dos atos para osquais se outorgaram os poderes” (STJ, REsp 474.983/RJ,

3.ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 03.06.2003,   DJ 04.08.2003, p. 297). Como se nota, o entendimento aquidefendido pode ser apontado como majoritário, pois adot-ado pela jurisprudência.

Pois bem, o principal dever do testamenteiro écumprir a disposição testamentária no prazo estipuladoou, em sua ausência, no prazo legal de 180 dias, contadosda aceitação da testamentaria (art. 1.983 do CC). A prestação de contas deve ocorrer após tal prazo e no juízodo inventário (art. 1.135 do CPC).

Não impede a lei que o juiz prorrogue o prazo caso,por motivos não imputáveis ao testamenteiro, seja estemuito exíguo para o cumprimento das disposições (art.

1.983, parágrafo único, do CC). Vale dizer que no revogadoCódigo Civil esse prazo era de um ano, norma que não estámais em vigor (art. 1.762 do CC/1916).

Lembre-se de que a redução de prazos ocorreu em to-do o sistema do Código Civil de 2002, exigindo das pess-oas maior rapidez na busca por seus direitos, bem como

na execução de seus deveres.

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Concorda-se com Zeno Veloso quando afirma que oart. 1.983 estaria mais bem localizado se fosse o parágrafoúnico do art. 1.980, pois a ele se relaciona ( Novo CódigoCivil..., 2006, p. 1.652).

Também é importante apontar que o Código de Pro-cesso Civil confere a prerrogativa ao testamenteiro depedir ao juiz que lhe conceda os meios necessários paracumprir a disposição testamentária (art. 1.137, IV, doCPC), o que lhe permite pedir a dilação do prazo, desdeque justifique as razões para tanto.

Itabaiana de Oliveira salienta que são justos motivos

para a prorrogação do prazo as seguintes situações: litígiossobre os bens da herança, impossibilidade decumprimento por dificuldades de liquidação, e impedi-mentos que, evidentemente, tenham impossibilitado a ex-ecução do testamento, não provindo eles da mora, ou danegligência do testamenteiro (Tratado..., 1952, v. 2, p.686).

Por fim, interessante observar que, conforme já de- batido, há na testamentaria um mandato sui generis, po-dendo o testamenteiro responder perante terceiros – oumesmo perante os herdeiros –, por uma má administração(culposa ou dolosa) dos bens.

 3.ª função – Defender a validade do testamento, comou sem ajuda do inventariante ou dos herdeiros instituí-dos (art. 1.981 do CC e art. 1.137, II, do CPC).

Isso significa que na ação em que se discute a validadedo testamento, a citação do testamenteiro é obrigatória,sob pena de nulidade do processo.

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Fazendo um paralelo interessante, o revogado CódigoCivil previa a existência do  curador do vínculo  para de-fender o casamento em caso de ação de anulação, en-quanto o atual diploma incumbe o testamenteiro de pro-teger o testamento dos ataques de herdeiros, legatários ou

terceiros, com o objetivo de fazer cumprir a última vont-ade do falecido.

Problema surge se a nulidade for evidente e inques-tionável, ou se contiver disposição ilegal. Explica Wash-ington de Barros Monteiro que surgem duas correntes emdissídio: “A primeira afirma que o testamenteiro não se

acha obrigado a sustentar os atos de última vontade quenão se revistam de validade, ou que encerrem cláusulasilegais. É o ponto de Clóvis Beviláqua. Para outros, to-davia, lícito não é ao testamenteiro transigir acerca da val-idade do ato; cabe-lhe, portanto, sem vacilações, não im-portam as circunstâncias, pugnar pela sua subsistência elegitimidade. Nesse sentido, Pontes de Miranda” (Curso...,

2003, v. 6, p. 267). A segunda corrente, adotada peloautor, entende que se o testamenteiro não quiser defendero testamento deverá desistir do cargo.

Parece-nos mais lógica e adequada ao princípio da boa-fé a primeira das duas correntes. Imagine-se o casoem que o testador lega um bem a João com o encargo de

assassinar certa pessoa. Como defender o indefensável? A cláusula é nula. Entretanto, se dúvidas houver quanto àsua validade, o testamenteiro deve defender a vontade domorto com persistência. Mais uma vez, a decisão se dá àluz do caso concreto e da eticidade.

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4.ª função – Requerer o inventário dos bens, caso es-teja na posse da herança – testamentaria a título univer-sal (art. 1.978 do CC).

Dúvida que surge, nesse caso, é quem responde se oinventário não for aberto no prazo legal de 30 dias peloCódigo Civil (60 dias pelo CPC), gerando a imposição demulta ao espólio. Pela essência de mandato desta testa-mentaria universal, sendo inerente ao ato a boa adminis-tração por conta do testamenteiro, ousamos imputar a eletal multa no caso de não abertura do inventário por suaconduta culposa ou dolosa. Porém, pela sistemática lógica

da responsabilidade civil, se tal impossibilidade for cau-sada por conduta de algum ou de todos os herdeiros,haverá excludente de responsabilidade para o testamen-teiro ou, eventualmente, responsabilidade concorrente.

 5.ª função – Cumprir as demais atribuições previstasno testamento pelo próprio testador, nos limites da lei (art. 1.982 do CC) e as determinadas por lei (art. 1.137 doCPC).

Cabe ao testamenteiro defender a posse dos bens daherança (art. 1.137, III, do CPC). Para tanto, pode se valerda legítima defesa da posse, do desforço pessoal ou dasações possessórias (art. 1.210 do CC).

De acordo com o sentido da testamentaria, represent-ando o instituto uma espécie de mandato especial,  con-forme expusemos, deverá o testamenteiro agir de acordocom as disposições de vontade estabelecidas pelo autor daherança. Assim é, pois a testamentaria é similar ao man-dato pelo elemento fidúcia, eis que o mandatário não pode

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desprezar as orientações do mandante, por representarmarcha no sentido contrário à representação.

Finalmente, é de se lembrar a advertência consubstan-ciada no final do art. 1.982 do CC: nos limites da lei . Dessaforma, não podem essas obrigações secundárias se sobre-porem às atividades inerentes à administração do testa-mento. Exatamente por isso o testamenteiro terá que pre-star contas, ainda que o testador as dispense (art. 1.135,parágrafo único, do CPC).

3.12.3 Do direito à vintena

O principal direito do testamenteiro será o de receberuma remuneração pelo seu trabalho e esforço despendido.Essa remuneração se chama prêmio ou vintena. Chama-se vintena porque na falta de determinação do testador, otestamenteiro recebe 1/20 avos ou 5% sobre a herança

líquida, fixando o juiz o valor de acordo com a dificuldadena execução do testamento (art. 1.987 do CC e art. 1.138 doCPC).

De Plácido e Silva demonstrava, com o brilhantismoque lhe era peculiar, a origem histórica da expressão, até oadvento do Código Civil de 1916:

“Na linguagem testamentária, a vintena vem, tradicional-mente, designando a retribuição, ou a comissão que cabe aotestamenteiro, em compensação aos serviços que presta naexecução do testamento.

E, originariamente, assim se fixou a expressão porque eraessa retribuição correspondente à vigésima parte do valorapurado no espólio.

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Modernamente, o Código Civil chama-a de prêmio. E, nostermos no Dec. n. 834, de 1.851, deixou de ser a vigésimaparte (vintena), para ser fixada na base de 5% sobre a terça,quando não estipulada expressamente pelo testador.

O Código Civil estabeleceu nova regra, no art. 1.756. A vin-

tena será de um quinto (5%) sobre o valor líquido da her-ança, quando não há herdeiros necessários, ou sobre a met-ade disponível, em caso contrário, desde que o testador nãoa tenha estabelecido” (Vocabulário jurídico, 1976, v. IV, p.1.657).

O Código de Processo Civil determina que o prêmio

não pode exceder os 5% (art. 1.138, § 1.º, do CPC), nos ter-mos também do revogado Código Civil de 1916 (art. 1.766do CPC). No sistema atual, impõem-se limites mínimos emáximos para a fixação da remuneração do testamenteiro(1 a 5% conforme art. 1.987) e dificilmente o juiz fixará im-portância superior aos 5% previstos em lei, quer seja pelatradição da vintena, quer seja pela ausência, na maioria

dos casos, de trabalho que o exija.Quando a lei determina que o cálculo incida sobre a

herança líquida, deve-se apenas considerar a herança ob- jeto do testamento e não todos os bens deixados pelo fale-cido. Conforme afirmam Sílvio de Salvo Venosa ( Direitocivil..., 2003, v. 7, p. 319) e Maria Helena Diniz (Curso...,

2005, v. 6, p. 287), a legítima não deve ser computada. Nomesmo sentido, Clóvis Beviláqua esclarece que “a herançaa que se refere o Código é a testamentária, pois que, para aexecução da última vontade do falecido, é que existe otestamenteiro, que nada tem com a sucessão legítima. Se asucessão for em parte legítima e em parte testamentária,por ter o de cujus usado do seu direito de disposição mor-

tis causa,   somente sobre a parte contemplada em

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testamento deve ser calculado o prêmio” (Código Civil ...,1955, v. VI, p. 197).

O valor deverá ser pago da parte disponível se houverherdeiro necessário (art. 1.987, parágrafo único, do CC). Omotivo da regra é que não deve o herdeiro necessário so-frer redução da legítima para que o testamento sejacumprido, nem se cogita que os herdeiros paguem talquantia com seus bens pessoais. A determinação da leiapenas indica de qual parte da herança deve sair o paga-mento do prêmio. Nesse sentido, ilustre-se com decisão doTribunal de Minas Gerais:

“O prêmio a ser pago ao testamenteiro deverá ser retiradoda parte disponível da herança. A lei dispõe que a vintenadeve ser retirada da herança, e não do patrimônio dos her-deiros. Assim, consoante o art. 1.017 e seu § 3.º, podem serseparados bens, tantos quantos forem necessários para opagamento do prêmio do testamenteiro e nos termos do §4.º, se o testamenteiro requerer que, em vez de dinheiro, lhesejam adjudicados, para o seu pagamento, os bens já reser-

 vados, o Juiz pode lhe deferir a adjudicação dos bens sufi-cientes para o pagamento de seu prêmio, que constituidívida do espólio de não dos herdeiros. Impossível condi-cionar a entrega do formal de partilha e a adjudicação integ-ral dos bens, de forma genérica, ao pagamento do prêmio, oque ofende as disposições do referido art. 1.017” (TJMG,

Processo 1.0702.98.009407-3/002(1), Rel. Des. Vanessa Verdolim Hudson Andrade, j. 12.06.2007).

Isso não quer dizer que o cálculo da vintena seja ne-cessariamente sobre a parte disponível como um todo.Isso porque se o testador legou apenas um imóvel a seusobrinho, a vintena deve ser calculada sobre o valor deste

 bem e não sobre toda a parte disponível. Conforme explica

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Silvio Rodrigues, se, “por testamento, só abranger partedos bens, o testamenteiro terá direito a uma percentagemapenas sobre os valores abrangidos em testamento”( Direito civil..., 2002, v. 7, p. 281). Nesse sentido decidiu omesmo Tribunal Mineiro:

“Inventário. Testamento. Vintena. Testamenteiro. Her-ança líquida. Improvimento da irresignação. Inteligência doart. 1.987 do Código Civil e art. 1.138 do CPC. A herançalíquida que servirá como base de cálculo para a incidênciada percentagem determinada pelo Julgador monocráticolimita-se à herança testamentária, ou seja, a porção dis-

tribuída em testamento” (TJMG, Processo1.0518.04.072649-0/001(1), Rel. Des. Dorival GuimarãesPereira, j. 12.01.2006).

Entretanto, em sentido contrário, já entendeu o Su-perior Tribunal de Justiça que:

“Testamenteiro. Prêmio tem como base de cálculo o totalda herança líquida, ainda que haja herdeiros necessários, enão apenas a metade disponível, ou os bens de que dispôsem testamento o de cujus. Pelo pagamento, entretanto, nãoresponderão as legítimas dos herdeiros necessários,deduzindo-se o prêmio da metade disponível” (3.ª T., REsp39.891/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 04.10.1994,   DJ 24.10.1994, p. 28.753).

Outro problema que surge é: teria o herdeiro ou o leg-atário nomeado como testamenteiro em testamento odireito à vintena? Pela redação do art. 1.988 do CódigoCivil, a resposta é negativa: “O herdeiro ou o legatárionomeado testamenteiro poderá preferir o prêmio à her-ança ou ao legado”.

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Nesse diapasão, pela leitura do dispositivo conclui-seque só o testamenteiro que não foi nomeado herdeiro oulegatário pelo testador teria o direito ao prêmio, já que, senomeado, a remuneração seria desnecessária em razãodos bens que recebeu em testamento. Entretanto, permite

o artigo em questão que ele faça uma opção. Caso a coisalegada ou a herança deixada sejam de valor inferior à vin-tena, pode o testamenteiro preferir a vintena, abrindomão, portanto, dos bens que receberia pela disposiçãotestamentária.

O espírito da lei é que se o testador deixou bens ao

testamenteiro, sua remuneração não será necessária, pois já foi compensado pelos serviços em decorrência dos bensque receberá. Por outra via, como lembra Maria HelenaDiniz “se o testador expressamente autorizar, poderá otestamenteiro receber cumulativamente prêmio e legadoou herança” (Curso..., 2005, v. 6, p. 286).

Da mesma forma, não terá direito ao prêmio o testa-menteiro casado sob o regime da comunhão de bens comherdeiro ou legatário do testador, que, também, poderáoptar entre receber os bens testados ou a vintena (art.1.138, § 2.º, do CPC).

Já se o testamenteiro for herdeiro legítimo não benefi-ciado pelo testamento, sua condição de herdeiro não de-

corre do testamento, mas “preponderante, da lei. A vont-ade do testador entra em segunda linha. Por nosso direito,a testamentária é cargo remunerado; se o herdeiro legí-timo tivesse de exercê-lo sem direito a prêmio, seria gra-tuito, mas gratuito somente para ele, que para os demaisseria remunerado” (BEVILÁQUA, Clóvis.  Código Civil ...,

1955, v. VI, p. 195). Assim, conclui-se que o herdeiro

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legítimo, quando testamenteiro, teria direito à vintena.Em sentido contrário, entendendo que não teria o her-deiro legítimo direito à vintena, temos Washington deBarros Monteiro que segue as lições de Carvalho Santos eCarlos Maximiliano (Curso..., 2003, v. 6, p. 270).

Como bem lembra Silvio Rodrigues, “após algumahesitação, hoje a grande maioria dos doutrinadores e dos julgados entende que o herdeiro legítimo tem direito à vintena quando exercer a testamentaria” ( Direito civil...,2002, v. 7, p. 281).

O pagamento do prêmio será feito em dinheiro em de-

corrência da aplicação do princípio do nominalismo, prev-isto no art. 315 do CC em vigor. Em regra, não é permitidoo pagamento em bens, salvo nas hipóteses em que o testa-menteiro for meeiro, entenda-se o caso de ser cônjuge dofalecido casado pelo regime da comunhão de bens.

 Ainda que as dívidas absorvam todo o acervo, a re-

tribuição continua devida e será arbitrada pelo juiz,tirando-se do monte (MONTEIRO, Washington de Barros.Curso..., 2003, v. 6, p. 271).

Perde o direito ao prêmio o testamenteiro que for re-movido ou não der cumprimento ao testamento (art. 1.989do CC). Na hipótese em que o testamenteiro perder a vin-

tena em decorrência de má administração, haverá umacláusula de reversão presumida, retornando o prêmio aomonte-mor, para ser distribuído entre os herdeiros ne-cessários, se for o caso, ou entre os herdeirostestamentários.

Se o prêmio for arbitrado pelo juiz, não há que se falarem reversão, eis que a vintena não é sequer destacada do

montante sucessório para pagamento do testamenteiro.

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No caso de substituição do testamenteiro por nomeaçãodo Magistrado, terá o novo administrador direito aoprêmio, devido caráter remuneratório da testamentaria.

3.12.4 Da extinção da testamentaria A forma normal de extinção se verifica quando o testa-

menteiro cumpre sua função, executando as disposiçõestestamentárias e prestando contas de sua administração.Em resumo, a extinção normal ocorre com o cumprimentodo mandato especial.

Todavia, a extinção pode ocorrer antes de seu termo,pela vontade do testamenteiro ou por remoção requeridapelos herdeiros ou interessados.

No caso de vontade do testamenteiro, deverá requerera demissão do encargo ao juiz, alegando causa legítima,sendo que, depois de ouvidos os interessados e o Min-

istério Público, o juiz decidirá (art. 1.141 do CPC).Já a remoção ocorre quando forem glosadas despesas

ilegais ou em discordância com o testamento (art. 1.140, I,do CPC) ou, ainda, se o testamenteiro não cumprir as dis-posições testamentárias (art. 1.140, II, do CPC).

Como o testamenteiro pode estar na administração da

herança, deverá prestar contas de seu mister. Caso dascontas apresentadas forem glosadas (retiradas) asdespesas, entende-se que o testamenteiro não agiu cor-retamente e perderá o cargo e o direito à vintena (art.1.989 do CC e art. 1.140 do CPC). Concordamos com Sílviode Salvo Venosa que “sempre, há que se conceder direitode defesa ao testamenteiro. Situação haverá, contudo, emque a suspensão imediata do cargo se faz necessária,

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dependendo da gravidade da situação enfrentada. Pode o juiz usar do poder geral de cautela conferido pelo CPC”( Direito civil..., 2003, v. 7, p. 321).

3.13 RESUMO ESQUEMÁTICO

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3.14 QUESTÕES CORRELATAS

1. (Defensoria Pública/RS – 2011) Assinale a al-ternativa que contém a afirmação correta em re-lação ao assunto indicado. Direito das

Sucessões.(A) Na sucessão universal, o direito de propriedade

imobiliária transmite-se quando do registro dosformais de partilha no Ofício do Registro deImóveis.

(B) Conforme regra expressa do Código Civil, sãoherdeiros necessários os descendentes, os as-cendentes, os cônjuges e os companheiros.

(C) O testador não pode, mesmo justificando, es-tabelecer cláusula de impenhorabilidade sobre osbens da legítima.

(D) O direito de representação, no direito sucessório,dá-se apenas na linha reta descendente e

ascendente.(E) O prazo de decadência para anular disposição

testamentária inquinada de coação é de quatroanos, contados de quando o interessado tiverconhecimento do vício.

2. (MP/ES – 2005) O testamento cerrado será

aberto:(A) Por um dos herdeiros.

(B) Por um escrevente autorizado pelo tabelião.

(C) Pelo juiz.

(D) Pela viúva meeira.

(E) Pelo tabelião que o lavrou.

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3. (19.º PGR/MPF – Procurador da República –2002) A respeito do testamento, podemos afirm-ar que:

(A) apresentando o testamento cerrado violação ex-terna, deverá o juiz declará-lo nulo;

(B) o direito de acrescer beneficia o herdeiro,quando, além de seu quinhão determinado, fornominado substituto do quinhão de outro herdeiroque não possa ou não queira recebê-lo;

(C) o testamento comporta condição suspensiva ouresolutiva, mas a impossibilidade ou ilicitude damesma invalida o testamento;

(D) quando o testador declara o motivo da liberalid-ade, como razão determinante, verificada a falsacausa, é possível sua anulação por erro.

4. (MP/MG XLVI) Assinale a alternativaINCORRETA.

(A) Público é o testamento lavrado no Cartório Civilde Pessoas Naturais, ditado pelo testador, napresença de duas testemunhas, perante o oficial eassinado por todos.

(B) O cônjuge, casado em regime de separação con-vencional, separado de fato há quinze meses,concorre com os descendentes comuns, deixados

pelo falecido.(C) A morosidade na aplicação dos recursos perten-

centes ao tutelado, evitando perda do poder decompra do dinheiro, obriga o tutor a ressarcir poreventuais prejuízos causados.

(D) A oposição dos impedimentos matrimoniais é fac-ultada a qualquer pessoa maior e capaz, tendo ounão relacionamento com os nubentes.

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(E) O MP, vencido o prazo de existência da fundação,promoverá a sua extinção, providenciando a in-corporação do patrimônio a outra congênere.

5. (TJ/MT – 2004) Cleusa, solteira e sem descend-

entes ou ascendentes, deixou todos os seusbens, em partes iguais, para suas duas primas,Maria e Antônia, por meio de testamento cer-rado. Por ocasião da morte da testadora, Maria já havia falecido, deixando como herdeiros ne-cessários seus filhos, João e Pedro. Antônia, umadas beneficiárias do testamento, promoveu aabertura do inventário.

Considerando a situação hipotética apresentada,assinale a opção correta.

(A) Antônia é a herdeira universal dos bens deixadospor Cleusa, porque Maria, tendo falecido antes datestadora, não possui capacidade jurídica paraherdar ou transmitir a herança como legatária.

(B) A quota-parte da beneficiária Maria, falecidaantes da testadora, deve ser dividida entre osseus herdeiros legítimos.

(C) Na situação considerada, não houve disposiçãotestamentária determinando o quinhão de cadalegatária, pois receberam em partes iguais. Por setratar de testamento cerrado, o quinhão deixado

à herdeira testamentária premorta deve ser ob- jeto de decisão em ação própria, em que o juizdeverá interpretar a vontade da testadora.

(D) A cláusula testamentária que determinou que osbens ficarão em partes iguais para Maria eAntônia tem de ser interpretada como destinaçãoconjunta, havendo solidariedade entre as coleg-

atárias. Assim, o patrimônio foi deixado a duas

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pessoas e, como uma das beneficiárias faleceu, oacervo patrimonial passará integralmente àsobrevivente.

6. (TJ/SP 177.º) Sobre sucessão testamentária,

assinale a resposta correta.(A) Em testamento, pode o testador dispor livre-mente de seus bens, dentro da quota dodisponível e respeitada a legítima dos herdeirosnecessários; mas, se a disposição testamentáriaextravasar, em valores ou bens, a quota dodisponível, e alcançar a legítima dos herdeiros ne-

cessários, nulo será o testamento.(B) O legado de usufruto, sem fixação de tempo,

entende-se vitalício para o legatário; mas, se elefalecer antes do testador, caducará o legado, semque os herdeiros dele, legatário, possam sucedê-lo, recolhendo o legado por representação aqualquer título.

(C) A pena cominada por sonegados, em que o her-deiro sonega bens da herança, não os descre-vendo no inventário quando estejam em seupoder, ou omitindo-os à colação a que estiverobrigado a levá-los, é da perda, pelo herdeiro queassim proceder, da metade do seu quinhão hered-itário, que lhe será aplicada, antes da partilha,

nos próprios autos do inventário.(D) As doações em vida, como antecipação da legí-

tima a algum herdeiro necessário, estão sujeitas àcolação, a fim de igualar as legítimas dos herdeir-os, só podendo ser dispensada em testamento edesde que expressamente assim disposto pelotestador.

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7. (MP/SP 84.º) Assinale a alternativa falsa.

(A) O testador pode impor cláusulas de inalienabilid-ade, incomunicabilidade e impenhorabilidadesobre a parte disponível.

(B) O testador pode impor cláusulas de inalienabilid-ade, incomunicabilidade e impenhorabilidadesobre os bens da legítima, desde que declare aexistência de justa causa.

(C) Se o legatário falecer antes do testador, o legadopoderá ser vindicado pelos herdeiros do legatário,desde que o façam no prazo previsto em lei.

(D) O legado é figura exclusiva da sucessãotestamentária.

(E) É válida a disposição testamentária em favor depessoa incerta que deva ser determinada por ter-ceiro, dentre duas ou mais pessoas mencionadaspelo testador.

8. (MP/GO – 2005) Examine as assertivas abaixo:I – Na falta de descendentes e de ascendentes do

morto, ao cônjuge sobrevivente será deferida a su-cessão por inteiro, salvo se casado no regime decomunhão universal de bens com o autor da herança.

II – Permite-se ao testador estabelecer cláusulas restrit-ivas (inalienabilidade, incomunicabilidade e impen-horabilidade) sobre os bens da porção disponível.Vedada é, porém, em qualquer caso, a imposição detais cláusulas sobre os bens da legítima.

III – Para excluir da sucessão os herdeiros colaterais,basta que o testador disponha de seu patrimônio semos contemplar.

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IV – Na linha transversal, somente se dá o direito derepresentação em favor dos filhos de irmãos do fale-cido, quando com irmão deste concorrerem.

(A) I e II são corretas;

(B) II e III são corretas;

(C) III e IV são corretas;

(D) I e IV são corretas.

9. (Procurador do Estado/PR – 2002) Antônio,casado com Maria, é proprietário de um únicoimóvel, situado no município de Londrina. O bem

foi adquirido antes do casamento, celebrado sobo regime de comunhão parcial de bens, de modoque se trata de bem particular do cônjuge varão.O casal não tem filhos. Os pais de Antônio sãofalecidos. Em 1998, Antônio faz testamento emque deixa como legado, para o Estado do Paraná,o único imóvel de sua propriedade, excluindo da

sucessão sua esposa Maria. Em dezembro de2001, Antônio vem a falecer. Todavia, em janeirode 2002, Maria dá à luz um filho de Antônio que,nada obstante isso, nasce morto. Tal fato é devi-damente constatado mediante perícia. A partirdos fatos narrados examine as seguintesafirmações:

I) O Estado não fará jus ao legado, uma vez que, com ofalecimento do filho do casal, herdeiro necessário,Maria herdará a integralidade do bem, exercendo seudireito de representação.

II) O Estado fará jus ao legado, o que não ofende a dis-posição do Código Civil que põe a salvo, desde a con-cepção, os direitos do nascituro.

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III) Maria é herdeira necessária de Antônio, e não po-deria ter sido excluída da sucessão.

IV) O Estado do Paraná fará jus apenas a metade doimóvel legado, uma vez que, diante do direito deMaria sobre a legítima, impõe-se a redução da liber-

alidade inoficiosa praticada por Antônio.ALTERNATIVAS:

(A) Estão corretas apenas as afirmações III e IV.

(B) Estão corretas apenas as afirmações I e III.

(C) Está correta apenas a afirmação I.

(D) Está correta apenas a afirmação II.(E) Está correta apenas a afirmação III.

10. (TJ/SP 175.º) Assinale a alternativa incorretaa respeito do Direito das Sucessões.

(A) O direito à sucessão aberta pode ser objeto decessão por escritura pública, mas o coerdeiro não

poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa es-tranha à sucessão, se outro coerdeiro a quiser,tanto por tanto.

(B) Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura dasucessão.

(C) Na sucessão testamentária, não podem ser cha-madas a suceder as pessoas jurídicas.

(D) Em circunstâncias excepcionais declaradas na cé-dula, o testamento particular de próprio punho eassinado pelo testador, sem testemunhas, poderáser confirmado, a critério do juiz.

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11. (Magistratura/BA – CESPE/2012) Acerca dodireito das sucessões, assinale a opção correta.

(A) Testamento feito por deficiente mental se validacom a superveniência da capacidade.

(B) É vedada a retratação da renúncia à herança,ainda que essa retratação não prejudique oscredores.

(C) Lei nova, se mais benéfica aos herdeiros, podedisciplinar sucessão aberta na vigência de leianterior.

(D) Falecido o herdeiro testamentário antes da morte

do testador, seus descendentes, se houver, osucederão.

(E) Estando mortos todos os filhos do de cujus, osnetos sucederão no direito à herança, de acordocom as quotas destinadas aos seus respectivospais.

12. (VUNESP/Magistratura/RJ/2012) A revogaçãodo testamento

(A) não produzirá seus efeitos, ainda quando o testa-mento, que a encerra, vier a caducar por ex-clusão, incapacidade ou renúncia do herdeiro nelenomeado, assim como se o testamento revog-atório for anulado por omissão ou infração de

solenidades essenciais ou por vícios intrínsecos.(B) não produzirá seus efeitos, ainda quando o testa-

mento, que a encerra, vier a caducar por ex-clusão, incapacidade ou renúncia do herdeiro nelenomeado; valendo, todavia, se o testamento re-vogatório for anulado por omissão ou infração desolenidades essenciais ou por vícios intrínsecos.

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(C) produzirá seus efeitos, ainda quando o testa-mento, que a encerra, vier a caducar por ex-clusão, incapacidade ou renúncia do herdeiro nelenomeado; não valerá, se o testamento revog-atório for anulado por omissão ou infração de

solenidades essenciais ou por vícios intrínsecos.(D) produzirá seus efeitos, ainda quando o testa-mento, que a encerra, vier a caducar por ex-clusão, incapacidade ou renúncia do herdeiro nelenomeado ou quando o testamento revogatório foranulado por omissão ou infração de solenidadesessenciais ou por vícios intrínsecos.

13. (MP/MG XLIII – 2003) É correto afirmar,EXCETO:

(A) A posse pode ser adquirida por terceiro, mesmosem mandato, mas pendente de ratificação.

(B) contrato, título à propriedade fiduciária, deverá,necessariamente, conter a descrição da coisa ob-

 jeto da transferência, o total da dívida e a taxa de juros, se houver.

(C) usufruto pode recair em títulos de crédito e,neste caso, o usufrutuário tem direito a cobrar asrespectivas dívidas.

(D) direito de representação na linha transversal se

dá somente em favor dos filhos de irmãos do fale-cido, se com irmãos deste concorrerem.

(E) direito de demandar a exclusão dos herdeirosextingue-se em quatro anos, a partir do faleci-mento do autor da herança e não são válidas asalienações onerosas de bens hereditários a ter-ceiros de boa-fé antes da sentença de exclusão.

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14. (MP/PB – 2005) Analise as assertivas sobresucessão:

I – Em concorrência com os descendentes (art. 1.829,inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos quesucederem por estirpe, não podendo a sua quota ser

inferior à quarta parte da herança, se for ascendentedos herdeiros com quem concorrer;

II – São herdeiros necessários apenas os descendentese os ascendentes;

III – É proibido o testamento conjuntivo, seja simul-tâneo, recíproco ou correspectivo.

Assinale a única opção correta:(A) Apenas a assertiva I é verdadeira;

(B) Apenas a assertiva II é verdadeira;

(C) Apenas a assertiva III é verdadeira;

(D) As assertivas I e II são verdadeiras;

(E) As assertivas I e III são verdadeiras.

GABARITO

1 – E 2 – C 3 – D

4 – A 5 – B 6 – B

7 – C 8 – C 9 – D

10 – C 11 – B 12 – C

13 – E 14 – C

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DO INVENTÁRIO E DAPARTILHA

Sumário:   4.1 Do inventário. Con-ceito e procedimentos – 4.2 Das es-pécies de inventário e seus procedi-mentos: 4.2.1 Inventário judicial;4.2.2 Inventário extrajudicial ou porvia administrativa – 4.3 Da pena desonegados – 4.4 Do pagamento das

dívidas – 4.5 Da colação ou confer-ência e redução das doações inoficiosas: 4.5.1 Colação; 4.5.2 Re-dução das doações inofi ciosas – 4.6Da partilha: 4.6.1 Partilha amigávelou extrajudicial; 4.6.2 Partilha judi-cial; 4.6.3 Partilha em vida – 4.7 Da

garantia dos quinhões hereditários.A responsabilidade pela evicção –

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4.8 Da anulação, da rescisão e danulidade da partilha – 4.9 Dos pe-didos de alvarás em inventário –4.10 Resumo esquemático – 4.11Questões correlatas – Gabarito.

4.1 DO INVENTÁRIO. CONCEITO EPROCEDIMENTOS

 A encerrar a presente obra, é interessante o estudo doúltimo título do direito sucessório, referente à sua instru-mentalização, particularmente do inventário e da partilha.Na verdade, os institutos abordados a partir do presentemomento complementam tudo o que foi vistoanteriormente.

Maria Helena Diniz conceitua o inventário comosendo “o processo judicial (CC, art. 1.796; CPC, art. 982)

tendente à relação, descrição, avaliação e liquidação de to-dos os bens pertencentes ao  de cujus   ao tempo de suamorte, para distribuí-los entre seus sucessores” (Curso..., v. 6, p. 368). Ensina Zeno Veloso que o inventário tem porobjetivo a arrecadação, a descrição e a avaliação dos bens eoutros direitos pertencentes ao morto, bem como a dis-criminação, o pagamento das dívidas e dos impostos e osdemais atos indispensáveis à liquidação do montante queera do falecido ( Novo Código Civil..., 2006, p. 1.657). Oque se almeja, nesse contexto, é a liquidação dos bens e adivisão patrimonial do acervo hereditário.

Quanto ao instituto, há um único dispositivo inicial noCódigo Civil de 2002, o art. 1.991, segundo o qual: “Desde

a assinatura do compromisso até a homologação da

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partilha, a administração da herança será exercida pelo in- ventariante”. Como exposto, o inventariante é o adminis-trador do espólio, conjunto de bens formado com a mortede alguém, que constitui um ente despersonalizado. Age oinventariante com um   mandato legal , após a devida

nomeação pelo juiz.Na realidade, os principais procedimentos quanto ao

inventário estão previstos no Código de Processo Civil,particularmente entre os seus arts. 982 a 1.021. Apesar dealguns desses dispositivos do CPC já terem sido comenta-dos, para fins didáticos é interessante fazer uma análise

detalhada desses comandos legais no presente capítulo, visando a facilitar o seu estudo pelo leitor.

O primeiro deles é o art. 982 do CPC, alterado pelaedição da Lei 11.441, de 4 de janeiro de 2007. Em suaredação original, determinava a lei que se procederia aoinventário judicial, ainda que todas as partes fossemcapazes. Assim, em regra, o procedimento de inventárioera tido como o procedimento necessário para a partilhade bens do falecido, mesmo havendo plena capacidade eacordo entre os seus herdeiros. Por outro lado, com aaprovação pelo Congresso Nacional do Projeto de Lei4.725/2004, convertido na Lei 11.441/2007, a questão foiprofundamente alterada. A redação atual do art. 982, já al-

terada pela Lei 11.965/2009 pela menção ao defensorpúblico, é a seguinte: “Havendo testamento ou interessadoincapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos for-em capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e apartilha por escritura pública, a qual constituirá títulohábil para o registro imobiliário. § 1.º O tabelião somentelavrará a escritura pública se todas as partes interessadas

estiverem assistidas por advogado comum ou advogados

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de cada uma delas ou por defensor público, cuja quali-ficação e assinatura constarão do ato notarial. § 2.º A es-critura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles quese declararem pobres sob as penas da lei”.

Note-se que em sendo as partes capazes e inexistindotestamento, poderão os herdeiros optar pelo inventário ex-trajudicial. Não se trata de forma obrigatória, mas sim fac-ultativa. Caso prefiram o inventário judicial ao extrajudi-cial, poderão os herdeiros dele se utilizar seguindo todasas normas do CPC que serão comentadas no presentecapítulo.

O Código de Processo Civil, pela ordem, também trazregras quanto às colações (arts. 1.014 a 1.016), ao paga-mento das dívidas (arts. 1.017 a 1.021), à partilha (arts.1.022 a 1.030) e ao arrolamento (arts. 1.031 a 1.038).Trata-se de regras procedimentais também importantesno processo de inventário. Por razões didáticas, analisare-mos essas regras nos tópicos correspondentes a seguir,após a análise das espécies de inventário e seus corres-pondentes procedimentos. Ao final do capítulo apresent-aremos um esquema com todo o procedimento aquiestudado.

4.2 DAS ESPÉCIES DE INVENTÁRIO ESEUS PROCEDIMENTOS

 Após a edição da Lei 11.441/2007, a classificação doinventário sofreu profunda alteração. Isso porque o in- ventário deve ser dividido em judicial e extrajudicial.

 Assim, primeiramente, serão analisados todos os

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dispositivos do CPC sobre o inventário judicial e, por fim,a questão da forma extrajudicial.

4.2.1 Inventário judicial

Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim, em sua obraconsiderada clássica a respeito do tema, apresentam trêsespécies de inventário judicial. Vejamos essa importante visão doutrinária ( Inventários e partilhas..., p. 338):

a)  Inventário judicial pelo rito tradicional  – está previsto

nos arts. 982 a 1.030 do CPC. b) Inventário judicial pelo rito do arrolamento sumário –

está previsto no art. 1.031 do CPC, sendo cabível quandotodos os interessados forem maiores e capazes,abrangendo bens de quaisquer valores.

c) Inventário judicial pelo rito do arrolamento comum – es-tá previsto no art. 1.036 do CPC, sendo cabível quando os

 bens do espólio forem de valor igual ou menor que 2.000OTN.

Partimos ao estudo dessas modalidades de inventário judicial, de forma pontual.

4.2.1.1 Inventário judicial pelo rito tradicional – arts. 982a 1.030 do CPC 

O art. 983 do CPC, outrora comentado, enuncia que oinventário e a partilha devem ser requeridos dentro de 60(sessenta) dias a contar da abertura da sucessão,ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes. Deve-se

ressaltar que o parágrafo único desse dispositivo, que

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previa a possibilidade de o juiz da causa dilatar o últimoprazo havendo motivo justo, foi revogado pela Lei 11.441/2007. Atualmente, determina o art. 983 do CPC que o juizpode prorrogar o prazo de ofício ou a requerimento daspartes.

Como estudado, a grande crítica que se faz ao dispos-itivo é que ele não consagra sanção em caso de des-cumprimento do mencionado prazo. No entanto, a ausên-cia de previsão não impede que cada Estado institua umamulta como sanção pelo retardamento do início ou da ul-timação do inventário, não havendo qualquer inconstitu-

cionalidade (Súmula 542 do STF). A legitimidade para requerer a abertura do inventário

e a respectiva partilha consta no art. 987 do CPC, a favorde quem estiver na posse e na administração do espólio.Esse requerimento, por óbvio, será instruído com a cer-tidão de óbito do autor da herança (art. 987, parágrafoúnico, do CPC).

Nos termos do art. 988 do CPC, têm, contudo, legitim-idade concorrente para requerer a abertura:

I – o cônjuge supérstite;

II – o herdeiro;

III – o legatário;IV – o testamenteiro;

 V – o cessionário do herdeiro ou do legatário;

 VI – o credor do herdeiro, do legatário ou do autor daherança;

 VII – o síndico da falência do herdeiro, do legatário, do

autor da herança ou do cônjuge supérstite;

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 VIII – o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes;

IX – a Fazenda Pública, quando tiver interesse.

 Apesar da ausência de menção expressa, o compan-heiro ou companheira do falecido tem legitimidade para a

abertura do inventário. Ademais, debatia-se se o compan-heiro homoafetivo também teria a referida legitimidade.Com a decisão do Supremo Tribunal Federal de maio de2011, não resta a menor dúvida quanto à equiparação daunião homoafetiva à união estável entre pessoas de sexosdistintos, o que engloba as regras relativas ao inventário(ver Informativo n. 625  do STF).

Segundo a jurisprudência, se o herdeiro não faz aabertura, poderá fazê-lo qualquer credor, justamente pelalegitimidade concorrente prevista nesse dispositivoprocessual:

“Inventário. Reclamação. Art. 1.000, inc. II, CPC. Pedido

de abertura do processo de inventário e exercício da invent-ariança. Legitimidade do credor. Existência de herdeiros ne-cessários. Ordem legal. 1. Decorrido  in albis o prazo para aabertura do inventário de que trata o art. 983 do CPC, temlegitimidade concorrente qualquer interessado, inclusive ocredor do herdeiro. Inteligência do art. 988, inc. VI, CPC. 2.No entanto, essa legitimidade para abrir o inventário não

afeta a legitimação para o exercício da inventariança, de- vendo ser nomeado para tal múnus o herdeiro necessárioque estiver na posse dos bens e administração do espólio, jáque não há cônjuge supérstite. Inteligência do art. 990, II,do CPC. Recurso provido, por maioria” (TJRS, 7.ª CâmaraCível, Proc. 70010615953, Juiz Rel. Sérgio Fernando de Vas-concellos Chaves, Origem: Comarca de Caxias do Sul, j.23.02.2005).

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Caso nenhuma das pessoas mencionadas nos últimosdispositivos requeira a abertura do inventário no prazolegal, o juiz poderá fazê-lo de ofício (art. 989 do CPC).Para Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery,trata-se de uma exceção ao princípio da inércia da juris-

dição, ne procedat judex ex officio, prevista no art. 262 doCPC (Código de Processo Civil..., p. 1.016). Nesse sentido já se decidiu: “Civil. Inventário. Abertura ex officio. Arts.987 e 988 do CPC. Ao tomar conhecimento de que ultra-passado o prazo (art. 983 do CPC) ninguém requereu aabertura do inventário, o juiz deve fazê-lo de ofício. A norma do art. 989 do CPC é imperativa” (STJ, 3.ª T., REsp515.034/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j.08.03.2007, DJ  26.03.2007, p. 231).

Como não poderia ser diferente, pensamos como osrenomados juristas paulistas e concordamos com o jul-gado mencionado.

O administrador do inventário é denominado invent-ariante. Até que o inventariante preste o compromisso,continuará o espólio na posse do administrador provisórionomeado pelo juiz (art. 985 do CPC). Já explicamos queesse administrador representa ativa e passivamente o es-pólio, sendo obrigado a trazer ao acervo os frutos quedesde a abertura da sucessão foram percebidos. Além

disso, tem o administrador direito ao reembolso dasdespesas necessárias e úteis que fez na administração, re-spondendo pelo dano a que, por dolo ou culpa, der causaquando da sua atuação (art. 986 do CPC). Como se vê, asua responsabilidade depende da prova de culpa, sendo,portanto, hipótese de responsabilidade subjetiva. O trata-mento do administrador é o mesmo previsto para um

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possuidor de boa-fé, eis que ele exerce um mandato legal,por nomeação do juiz da causa.

O art. 990 do CPC enuncia as pessoas que podem sernomeadas pelo juiz como inventariante, a saber:

“I – o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde queestivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste;

II – o herdeiro que se achar na posse e administração doespólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobreviventeou estes não puderem ser nomeados;

III – qualquer herdeiro, nenhum estando na posse e ad-

ministração do espólio;IV – o testamenteiro, se lhe foi confiada a administração

do espólio ou toda a herança estiver distribuída em legados;

 V – o inventariante judicial, se houver;

 VI – pessoa estranha idônea, onde não houver inventari-ante judicial”.

Note-se que o dispositivo em questão foi alterado pelaLei 12.195, de 2010, que trouxe duas interessantesmudanças. A primeira é aquela que extirpou do Código deProcesso Civil a regra pela qual apenas seria nomeado in- ventariante o cônjuge casado pelo regime da comunhão de bens. A mudança é curiosa, mas tem sua razão de ser.

Pelas regras sucessórias atuais, ainda que o cônjuge sejacasado pelo regime da separação convencional de bens, einexista meação, poderá ser herdeiro em concorrênciacom os descendentes, nos termos do art. 1.829, I, doCódigo Civil (cf. Capítulo 2).

 A segunda mudança é aquela que acrescentou o com-

panheiro ao rol de possíveis inventariantes. Mesmo antes

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da alteração legal, em razão da proteção constitucional daunião estável constante do art. 226, § 3.º, da CF/1988, jálhe era garantido tal direito, que, agora, passa a ser recon-hecido pela lei ordinária. Por óbvio que a norma do Estat-uto Processual estava desatualizada, uma vez que foi

elaborada em período anterior ao reconhecimento daunião estável como entidade familiar.

Nesse sentido, aos Tribunais cumpria o dever desuprir a lacuna legal existente até a reforma de 2010.Ilustrando:

“Inventário. Companheira do   de cujus   que pretendenomeação como inventariante. Inteligência do art. 990, in-ciso I, do CPC. Observados § 3.º do art. 226 da CF e arts.1.790 e 1.797 do Código Civil. Recurso provido” (TJSP,

 Agravo de Instrumento 378.513-4/9-, 5.ª Câmara de DireitoPrivado, São Paulo, Rel. Francisco Casconi, j. 27.07.2005,

 v.u.)

“Agravo de Instrumento. Inventário. Nomeação da com-panheira para o exercício da inventariança. Alegação deofensa à ordem estabelecida pelo art. 990 do CPC. Inocor-rência. I – Não contraria o artigo 990 do Código de ProcessoCivil a decisão que nomeia como inventariante pessoa queconviveu em união familiar estável com o extinto, durantemais de quatro anos, e que, inclusive, está na administraçãodos bens por ele deixados. II – A ordem estabelecida no art.990 do CPC, não se reveste de caráter absoluto, podendo serinobservada quando verificado pelo Juiz, a existência depessoa mais apta para o exercício da inventariança. III –Havendo reconhecimento expresso por parte da agravanteda convivência ‘more uxório’ da agravada com o inventari-ado, desnecessário se mostra o ajuizamento de ação para oreconhecimento judicial da união estável, podendo a com-

panheira ser nomeada inventariante. Recurso conhecido e

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improvido. Decisão unânime” (TJSE, Agravo de Instru-mento 2001203806, Des. Clara Leite de Rezende, j.18.11.2002).

 A união estável é entidade familiar constitucional-

mente protegida, não havendo qualquer razão para não seadmitir o companheiro do falecido como inventariante.Com relação ao tema, o Tribunal de Justiça do Rio Grandedo Sul já admitia, inclusive, a legitimidade do compan-heiro homoafetivo:

“Sucessões. Inventário. Agravo de instrumento. União ho-

moafetiva. Nomeação do sedizente companheiro como in- ventariante. Possibilidade no caso concreto. Ainda que aalegada união homoafetiva mantida entre o recorrente e ode cujus dependa do reconhecimento na via própria, ante adiscordância da herdeira ascendente, o sedizente compan-heiro pode ser nomeado inventariante por se encontrar naposse e administração consentida dos bens inventariados,

além de gozar de boa reputação e confiança entre os direta-mente interessados na sucessão. Deve-se ter presente queinventariante é a pessoa física a quem é atribuído o múnusde representar o espólio, zelar pelos bens que o compõem,administrá-lo e praticar todos os atos processuais necessári-os para que o inventário se ultime, em atenção também aointeresse público. Tarefa que, pelos indícios colhidos, serámais eficientemente exercida pelo recorrente. Consagrado o

entendimento segundo o qual a ordem legal de nomeação doinventariante (art. 990, CPC) pode ser relativizada quandoassim o exigir o caso concreto. Ausência de risco de dilapid-ação do patrimônio inventariado. Recurso provido (art. 557,§ 1.º-A, CPC)” (TJRS, Agravo de Instrumento 70022651475,7.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Maria Berenice Dias, j.19.12.2007).

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Repise-se que, com a decisão do Supremo TribunalFederal de maio de 2011, não resta a menor dúvida sobre alegitimidade do companheiro homoafetivo para o in- ventário, pois as regras relativas à união estável aplicam-se, por analogia, à união homoafetiva ( Informativo n. 625 

do STF). Assim, decisões como a acima transcrita devemser constantes em nossos Tribunais.

 A respeito do  inventariante judicial , previsto no in-ciso V do referido dispositivo, Sebastião Amorim e Euc-lides de Oliveira apontam ser uma figura totalmente emdesuso entre nós ( Inventários e partilhas..., 2004, p. 344).

Sobre a figura do  inventariante dativo (art. 990, VI,do CPC), este “assume os direitos e deveres da inventari-ança, mas, nos termos do § 1.º do art. 12 do Código de Pro-cesso Civil, não é o representante do espólio em Juízo,uma vez que, em tal hipótese, ‘todos os herdeiros e su-cessores do falecido serão autores ou réus nas ações emque o espólio for parte’” (AMORIM, Sebastião eOLIVEIRA, Euclides.  Inventários e partilhas..., 2006, p.345).

O entendimento majoritário da doutrina é de que oart. 990 do CPC traz uma ordem que deve ser respeitadapelo magistrado (NERY JUNIOR, Nelson e NERY, RosaMaria de Andrade.  Código de Processo Civil..., 2006, p.

1.017; e DINIZ, Maria Helena. Curso..., 2005, v. 6, p. 371). Assim sendo, não caberia uma nomeação aleatória pelo juiz da causa, pois a lei presume que as pessoas constantesdo dispositivo são, pela ordem, as mais indicadas para as-sumir a incumbência. Todavia, desta constatação surgemalgumas dúvidas práticas.

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 A primeira delas refere-se, a saber, se essa ordem éabsoluta. O Superior Tribunal de Justiça já entendeu quenão:

“Inventário. Nomeação de inventariante. Alegação de

ofensa ao art. 990 do Código de Processo Civil. Impugnaçãoformulada por um dos herdeiros do   de cujus   à pessoanomeada, cessionário de direitos hereditários e dela credorpor vultosa soma. Matéria fático-probatória. Recurso espe-cial inadmissível. A ordem prevista no art. 990 do CPC não éabsoluta, podendo ser alterada em situação de fato excep-cional. Em sede de recurso especial não se reexamina

matéria fático-probatória. Incidência da Súmula 7-STJ. Re-curso especial não conhecido” (STJ, 4.ª T., REsp 402.891/RJ (200200013491), 608057 Recurso Especial, Rel. Min.Barros Monteiro, j. 1.º.03.2005, Sucessivos: REsp422.081-M 2002/0034112-0, j. 17.03.2005, DJ  02.05.2005,p. 354; REsp 407.952-ES 2002/0009525-7, j. 17.03.2005,

 DJ  02.05.2005, p. 354, DJ  02.05.2005, p. 353).

Destaque-se que a premissa foi confirmada em jul-gado mais recente, assim publicado no Informativo n. 373do STJ, em caso envolvendo nomeação de inventariantedativo:

“Nomeação. Inventariante dativo. Noticiam os autos que a justificativa para a nomeação de inventariante dativo foi a

animosidade entre as partes: de um lado a viúva, casada sobregime de comunhão universal de bens e a, até então, únicafilha conhecida do falecido; do outro, o recém-descobertofilho menor, possível herdeiro, representado pela mãe.

 Apontam que tal animosidade é compreensível e até mesmoesperada, assim como o questionamento quanto à filiação domenor, uma vez que a esposa e a filha só souberam da ex-

istência do filho a partir de observação na certidão de óbito

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lançada em função da apresentação da certidão de nasci-mento do menor, em que o ora falecido anteriormente o re-conhecera como filho. Questiona o REsp se houve violação àordem legal de nomeação de inventariante conforme prev-ista no art. 990 do CPC. Isso posto, a Min. Relatora observaque este Tribunal já definiu não ter caráter absoluto aquelaordem para nomeação de inventariante, podendo ser al-terada em situação de fato excepcional, quando o juiz tiverfundadas razões para tanto, como no caso de existência delitigiosidade entre partes. Diante do exposto, a Turma nãoconheceu do recurso, pois a firme convicção do juízo form-ada a partir dos elementos fáticos do processo veda oreexame em REsp (Súm. n. 7-STJ). Precedentes citados:

REsp 402.891-RJ, DJ 2/5/2005; REsp 283.994-SP, DJ 7/5/2001, e REsp 88.296-SP, DJ 8/2/1999” (STJ, REsp1.055.633-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 21.10.2008).

Pois bem, a segunda dúvida é saber se a ordem do dis-positivo pode ser quebrada por força de testamento quenomeia o inventariante. Entendemos que a previsão de

cláusula que nomeia inventariante não obsta que o juizsiga a ordem do art. 990 do CPC, pois este deve ser analis-ado de acordo com o caso concreto. Pode-se até defenderque o dispositivo constitui um preceito de ordem pública,que não pode ser contrariado pela última disposição de vontade do morto. De qualquer forma, vale repetir que aordem não é absoluta, mesmo sendo a norma cogente.

O inventariante, intimado da nomeação, prestará,dentro de cinco dias, o compromisso de bem e fielmentedesempenhará o cargo (art. 990, parágrafo único, doCPC). No tocante às suas atribuições, dispõe o art. 12, V,do CPC que o inventariante deve representar ativa e pas-sivamente o espólio. Em complemento, o art. 991 do

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Estatuto Processual em vigor traz essa e outras incumbên-cias ao inventariante, a saber:

I – Representar o espólio ativa e passivamente, em juízo oufora dele, observando-se, quanto ao dativo, o disposto no

art. 12, § 1.º, do CPC, já analisado.II – Administrar o espólio, velando-lhe os bens com a

mesma diligência como se seus fossem. Na visão atual doDireito Privado, pode-se associar a sua conduta à lealdadedecorrente da boa-fé objetiva.

III – Prestar as primeiras e últimas declarações pessoal-mente ou por procurador com poderes especiais.

IV – Exibir em cartório, a qualquer tempo, para exame daspartes, os documentos relativos ao espólio.

 V – Juntar aos autos certidão do testamento, se houver.

 VI – Trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro aus-ente, renunciante ou excluído.

 VII – Prestar contas de sua gestão ao deixar o cargo ousempre que o juiz lhe determinar.

 VIII – Requerer a declaração de insolvência do falecido, sefor o caso.

 Ainda complementando, o art. 992 do CPC lista outrasincumbências do inventariante, que necessitam, no ent-

anto, de autorização do juiz da causa e da oitiva dos in-teressados, sob pena de nulidade absoluta do ato (NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Códigode Processo Civil..., 2006, p. 1.016). Esses atos são: a) ali-enação de bens de qualquer espécie; b) transação em juízoou fora dele; c) pagamento de dívidas do espólio; d) paga-mento das despesas necessárias para a conservação e o

melhoramento dos bens do espólio.

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Seguindo na análise dos procedimentos relacionadoscom o inventário, preconiza o art. 993 do CPC que dentrode 20 dias, contados da data em que prestou o com-promisso, fará o inventariante as  primeiras declarações,das quais se lavrará termo circunstanciado. O dispositivo

determina ainda que no termo, assinado pelo juiz, escrivãoe inventariante, serão exarados:

I – o nome, estado, idade e domicílio do autor da herança,dia e lugar em que faleceu, bem ainda se deixoutestamento;

II – o nome, estado, idade e residência dos herdeiros e, hav-endo cônjuge supérstite, o regime de bens do casamento;

III – a qualidade dos herdeiros e o grau de seu parentescocom o inventariado;

IV – a relação completa e individuada de todos os bens doespólio e dos alheios que nele forem encontrados,descrevendo-se:

a) os imóveis, com as suas especificações, nomeadamentelocal em que se encontram, extensão da área, limites, con-frontações, benfeitorias, origem dos títulos, números dastranscrições aquisitivas e ônus que os gravam;

 b) os móveis, com os sinais característicos;

c) os semoventes, seu número, espécies, marcas e sinais

distintivos;d) o dinheiro, as joias, os objetos de ouro e prata, e as pedras

preciosas, declarando-se-lhes especificadamente a qualid-ade, o peso e a importância;

e) os títulos da dívida pública, bem como as ações, cotas etítulos de sociedade, mencionando-se-lhes o número, o

 valor e a data;

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f) as dívidas ativas e passivas, indicando-se-lhes as datas,títulos, origem da obrigação, bem como os nomes dos cre-dores e dos devedores;

g) direitos e ações;

h) o valor corrente de cada um dos bens do espólio.

Como se pode perceber, a relação é bem detalhadapela lei, e deve ser respeitada para que o processamentodo inventário tenha correto seguimento, sem qualquernulidade processual.

Nesse processamento, enuncia o parágrafo único do

art. 993 do CPC que o juiz determinará, ato contínuo, quese proceda: ao balanço do estabelecimento, se o autor daherança era comerciante em nome individual; e à apur-ação de haveres, se o autor da herança era sócio de so-ciedade não anônima.

Os dispositivos a seguir preveem penalidades contra oinventariante.

No que concerne à pena de sonegados, que ainda seráestudada, expressa o art. 994 do CPC que “só se pode ar-guir de sonegação ao inventariante depois de encerrada adescrição dos bens, com a declaração, por ele feita, de nãoexistirem outros por inventariar”. Como se sabe, quandofor citado, nos termos do art. 999 do CPC, o inventariante

herdeiro terá a oportunidade de informar e descreverquais os bens do falecido que estão na sua posse. Se assimnão o fizer, estará sujeito às penas legais, que ainda serãoabordadas.

O art. 995 do CPC trata das hipóteses em que o invent-ariante pode ser removido. A primeira hipótese de re-

moção ocorre se não prestar, no prazo legal, as primeiras e

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as últimas declarações. A segunda se efetiva se não der aoinventário andamento regular, suscitando dúvidas in-fundadas ou praticando atos meramente protelatórios. Oterceiro caso de remoção ocorre se, por culpa sua, se de-teriorarem, forem dilapidados ou sofrerem danos os bens

do espólio. Também será removido o inventariante quenão defender o espólio nas ações em que for citado, deixarde cobrar dívidas ativas ou não promover as medidas ne-cessárias para evitar o perecimento de direitos. O quintocaso de remoção está presente quando o inventariante nãopresta contas ou se aquelas que prestar não forem julgadas boas. Por fim, haverá remoção do inventariante se elesonegar, ocultar ou desviar bens do espólio.

 A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ad-mite a remoção de ofício, sendo interessante a transcriçãoda seguinte ementa:

“Remoção de inventariante. Ausência de cerceamento de

defesa. 1. Não se configura o cerceamento de defesa no casode remoção de inventariante quando está presente o contra-ditório, e pode o Juiz, constatado qualquer dos vícios do art.995 do Código de Processo Civil, promover de ofício a re-moção. 2. Recurso especial não conhecido” (STJ, 3.ª T.,REsp 539.898/MA (200300644088), 616051 Recurso Espe-cial, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j.

29.03.2005, DJ  06.06.2005, p. 318).Mesmo sendo admitida essa remoção de ofício, o

Código de Processo Civil consagra procedimentos paraque esta ocorra. Primeiramente, requerida a remoção comfundamento em quaisquer dos motivos elencados, o in- ventariante será intimado para, no prazo de cinco dias,

defender-se e produzir provas (art. 996). Vale dizer que o

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incidente da remoção correrá em apenso aos autos do in- ventário (art. 996, parágrafo único, do CPC). Decorrido oprazo, com ou sem a defesa do inventariante, o juiz de-cidirá (art. 997 do CPC). Se remover o inventariante, o juiznomeará outro, observada a ordem estabelecida no art.

990 do CPC, já analisado. Mesmo diante do teor daementa transcrita, percebe-se que o contraditório deve serinstituído no processo de remoção do inventariante.

Decidindo pela remoção, o inventariante entregaráimediatamente ao substituto os bens do espólio (art. 998do CPC). No entanto, se deixar de fazê-lo, será compelido

mediante mandado de busca e apreensão, no caso de bensmóveis, ou de imissão na posse, no caso de bens imóveis.

Dando continuidade ao estudo do procedimento de in- ventário, apresentadas as primeiras declarações, o juizmandará citar, para os termos do inventário e partilha, ocônjuge, os herdeiros, os legatários, a Fazenda Pública, oMinistério Público, se houver herdeiro incapaz ou ausente,e o testamenteiro, se o finado deixou testamento (art. 999,caput , do CPC).

Quanto à forma de citação, serão citadas por oficial de justiça somente as pessoas domiciliadas na comarca poronde corre o inventário ou que aí foram encontradas. Poroutra via, serão citadas por edital, com o prazo de 20 a 60

dias, todas as demais, residentes assim no Brasil como noestrangeiro. Tal é a regra do art. 999, § 1.º, do CPC. Em al-guns casos em que não há a manifestação do herdeiro,sem que se possa concluir pela aceitação ou recusa, a juris-prudência tem admitido a nomeação de um curador espe-cial e provisório:

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“Citação. Edital. Inventário. Ausência de manifestação daslegatárias. Comunicação havida entre as duas legatárias e aadvogada do antigo testamento que não permite concluirpela aceitação ou recusa do legado por não aceitação do en-cargo. Necessidade de nomeação de curador especial que de-

 ve ser estendida na espécie. Art. 9.º, II, do Código de Pro-cesso Civil. Recurso provido em parte, dispensada a ex-pedição de carta rogatória, devendo ser nomeado curadorespecial às legatárias citadas por edital” (TJSP, Agravo deInstrumento 315.142-4/4-São Paulo, 1.ª Câmara de DireitoPrivado, Rel. Elliot Akel, j. 02.03.2004, v.u.).

Cumpre destacar que o Supremo Tribunal Federal de-

 bateu a constitucionalidade da norma, assim concluindo,conforme o seu Informativo n. 523:

“O Tribunal, por maioria, desproveu recurso ex-traordinário interposto contra acórdão do Tribunal deJustiça do Estado do Rio Grande do Norte, e declarou a con-stitucionalidade do art. 999, § 1.º, do CPC [“Art. 999. Feitas

as primeiras declarações, o juiz mandará citar, para os ter-mos do inventário e partilha, o cônjuge, os herdeiros, os leg-atários, a Fazenda Pública, o Ministério Público, se houverherdeiro incapaz ou ausente, e o testamenteiro, se o finadodeixou testamento. § 1.º Citar-se-ão, conforme o dispostonos arts. 224 a 230, somente as pessoas domiciliadas nacomarca por onde corre o inventário ou que aí foram encon-

tradas; e por edital, com o prazo de 20 (vinte) a 60(sessenta) dias, todas as demais, residentes, assim no Brasilcomo no estrangeiro.”]. O acórdão recorrido reputara válidaa citação, por edital, de herdeiro e de seu cônjuge domicilia-dos em comarca diversa daquela em que processado o in-

 ventário. Os recorrentes alegavam que não deveriam ter sidocitados por esse modo, haja vista possuírem endereço certo,e sustentavam ofensa aos princípios da isonomia, da ampla

defesa, do contraditório e do devido processo legal no

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reconhecimento da constitucionalidade do referido disposit-ivo — v. Informativo n. 521. Salientando tratar-se de dispos-itivo vetusto, que já constava do Código de Processo Civilanterior, entendeu-se que a citação por edital em processode inventário seria perfeitamente factível, até mesmo para seacelerar a prestação jurisdicional. Ressaltou-se, também,que qualquer irregularidade poderia ser enfrentada nas in-stâncias ordinárias. Vencido o Min. Marco Aurélio, que davaprovimento ao recurso e assentava a inconstitucionalidadedo art. 999, § 1.º, do CPC, ao fundamento de que o in-

 ventário se processa sob o ângulo da jurisdição voluntária,mas, a partir do momento em que a legislação indica o ne-cessário conhecimento de herdeiros, sabendo-se quem eles

são e onde estão, a ciência não poderia ser ficta, e sim realiz-ada por meio de carta precatória, sob pena de se colocar emsegundo plano a regra segundo a qual se deve, tanto quantopossível, promover a ciência de fato quanto ao curso do pro-cesso de inventário. Vencido, também, o Min. Celso deMello, que acompanhava a divergência, e afirmava que acitação ficta, mediante edital, teria caráter excepcional e não

 viabilizaria o exercício pleno do direito ao contraditório”(STF, RE 552.598/RN, Rel. Min. Menezes Direito,08.10.2008).

 Ainda no que interessa aos procedimentos da citação,prevê o § 2.º do art. 999 do CPC que das primeirasdeclarações extrair-se-ão tantas cópias quantas forem as

partes. Essa exigência tem por objetivo facilitar a citação,sendo certo que o oficial de justiça, ao proceder a ela, en-tregará um exemplar a cada parte (art. 999, § 3.º, do CPC).No que tange à Fazenda Pública, ao Ministério Público eeventual testamenteiro, incumbe ao escrivão remeter cópi-as dos autos (art. 999, § 4.º, do CPC). A última regra domesmo modo vale para o advogado da parte que já estiver

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representada nos autos, visando a dar mais agilidade aoprocessamento do inventário.

Concluídas as citações, abrir-se-á vista às partes, emcartório e pelo prazo comum de dez dias, para se manifest-arem sobre as primeiras declarações (art. 1.000 do CPC).Nesse caso, cabe à parte do processo de inventário arguirerros e omissões, reclamar contra a nomeação do invent-ariante e contestar a qualidade de quem foi incluído notítulo de herdeiro.

Em havendo impugnação quanto a erros e omissões, e julgada essa procedente, o juiz mandará retificar as

primeiras declarações. Se o juiz acolher o pedido de re-clamação da nomeação do inventariante, nomeará outro,observada a preferência legal do art. 990 do CPC. Por fim, verificando que a disputa sobre a qualidade de herdeiroconstitui matéria de alta indagação, remeterá a parte paraos meios ordinários e sobrestará, até o julgamento daação, a entrega do quinhão que na partilha couber ao her-deiro admitido. Todas essas regras constam do parágrafoúnico do art. 1.000 do CPC.

Em relação às questões de alta indagação que re-metem a parte para os  meios ordinários, podemos aquitrazer três exemplos jurisprudenciais.

No primeiro deles, o Tribunal de Justiça de MinasGerais entendeu que a existência de união estável visandoao ingresso da companheira na herança seria questão dealta indagação:

“Agravo de Instrumento. Inventário. Reconhecimento deunião estável. Questão de alta indagação. Remessa às vias

ordinárias. 1. O inventário é um processo com contornospróprios, não havendo como nele serem discutidas questões

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de alta indagação. 2. Deve a pretensa ex-companheira ajuiz-ar a ação própria para o reconhecimento da alegada uniãoestável constituída com o falecido para ter reconhecido o seudireito, sendo aconselhável a suspensão do processo de in-

 ventário em razão de aparentemente não existirem ascend-entes e descendentes do de cujus, caso em que, confirmadaaquela união, terá a companheira direito à totalidade da her-ança (art. 2.º, inc. III, da Lei 8.971/1994). 3. Nega-se provi-mento ao recurso” (TJMG, 4.ª Câmara Cível, Proc.1.0515.05.014147-9/0001-Piumhi, Rel. Célio César Paduani,

 j. 06.04.2006, v.u.).

Concorda-se com esse julgado, pois, como exposto no

 volume anterior dessa coleção, os elementos caracteriz-adores da união estável previstos pelo art. 1.723 do CC po-dem levantar séria polêmica, sendo necessária uma açãoespecífica para o seu reconhecimento e posteriordissolução.

Em outro caso, o Tribunal de Justiça do Rio Grande

do Sul entendeu ser questão de alta indagação a discussãoa respeito da existência de dívidas com empregada. Ve- jamos a ementa do julgado: “A dívida com a empregadanão é do espólio, sendo que a cessão de crédito e as dívidasrepresentadas por notas promissórias, bem como as de-correntes do fornecimento de alimentação, constituemquestões de alta indagação, devendo tal discussão ter lugar

nas vias ordinárias. Recurso provido em parte” (TJRS, 7.ªCâmara Cível, Proc. 70011748951, Comarca de Lagoa Ver-melha, Juiz Rel. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j. 10.08.2005).

Fez o mesmo aquele pioneiro Tribunal quanto às dívi-das médicas relacionadas com o falecido e o seu funeral:

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“Inventário. Habilitação de crédito. Despesas médicascom o inventariado. Discordância. 1. Basta que não se veri-fique a concordância de um dos herdeiros apenas quanto aocrédito a ser habilitado, para que as partes sejam remetidasàs vias ordinárias, mesmo que se trate de despesas médicasou até funerárias com o inventariado. 2. A impugnação nãonecessita de maior fundamentação, pois a discussão deve terlugar nas vias ordinárias, constituindo questão de alta ind-agação a ser solvida. Inteligência do art. 1.997, § 1.º, do CC, eart. 1.018 do CPC. Recurso do Espólio provido em parte edesprovido o dos credores” (TJRS, 7.ª Câmara Cível, Proc.70010714004, Comarca de Porto Alegre, Juiz Rel. SérgioFernando de Vasconcellos Chaves, j. 18.05.2005).

O último caso, como se pode perceber, envolve umahabilitação de crédito no inventário, realizada por terceiro.

 A habilitação de crédito daquele que foi preterido, na verdade, consta do art. 1.001 do CPC, segundo o qual:“Aquele que se julgar preterido poderá demandar a sua

admissão no inventário, requerendo-o antes da partilha.Ouvidas as partes no prazo de 10 (dez) dias, o juiz de-cidirá. Se não acolher o pedido, remeterá o requerentepara os meios ordinários, mandando reservar, em poderdo inventariante, o quinhão do herdeiro excluído até quese decida o litígio”. Conforme apontam Euclides de Oli- veira e Sebastião Amorim, o dispositivo aplica-se à com-

panheira que não foi incluída no inventário, entendimentoque deve ser considerado como majoritário para a práticacível e para as provas em geral ( Inventários e partilhas...,2006, p. 366).

Em complemento, repise-se a regra do art. 984 doCPC, segundo a qual o juiz do inventário decidirá todas as

questões de direito e também as de fato, quando tal fato se

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achar provado por documento, só remetendo para osmeios ordinários as que demandarem alta indagação oudependerem de outras provas. Os casos de remessa às viasordinárias foram exemplificados pelos julgados antescolacionados.

Encerrando essa fase, enuncia o art. 1.002 do CPC quea Fazenda Pública, no prazo de 20 dias, após a vista para amanifestação quanto às primeiras declarações, informaráao juízo, de acordo com os dados que constam de seu ca-dastro imobiliário, o valor dos bens de raiz descritos nasprimeiras declarações.

Depois dessa previsão, o CPC traz regras quanto àavaliação dos bens e ao cálculo do imposto (arts. 1.003 a1.013). Vejamos essas regras, também de forma detalhada.

 A primeira delas prevê que, findo o prazo de dez diaspara a manifestação quanto às primeiras declarações e nãohavendo qualquer impugnação ou já decidida a que tiver

sido oposta, o juiz nomeará um perito para avaliar os bensdo espólio se não houver na comarca avaliador judicial(art. 1.003 do CPC). Anotam Nelson Nery Jr. e Rosa Mariade Andrade Nery, com razão, que essa avaliação é dispens-ada, do ponto de vista fiscal, “quando já há prova do valordos bens cadastrados pelo poder público municipal parafim de cobrança de IPTU” (Código de Processo Civil...,

2006, p. 1.021).Determina a lei, ainda, que, nos casos envolvendo es-

tabelecimento comercial ou empresarial, o juiz nomearáum contador para levantar o balanço ou apurar os haveres(art. 1.003, parágrafo único, do CPC).

Quanto aos procedimentos da avaliação, o perito deve

seguir, no que forem aplicáveis, as regras previstas nos

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arts. 681 a 683 do CPC. É o que determina o art. 1.004 domesmo Estatuto Processual. Vejamos as regras mencion-adas nesse último dispositivo processual.

O art. 681 do CPC prevê que o laudo do avaliador, queserá apresentado em dez dias, conterá: a) a descrição dos bens, com os seus característicos, e a indicação do estadoem que se encontram; b) o valor dos bens. No tocante aeventual imóvel que for suscetível de divisão cômoda, operito-avaliador, tendo em conta o crédito reclamado, oavaliará em suas partes, sugerindo os possíveis desmem- bramentos (art. 681, parágrafo único, do CPC). Não se

pode negar que o último dispositivo tem grande aplicação.Em casos de títulos da dívida pública, de ações de so-

ciedades e de títulos de crédito negociáveis em bolsa, o valor a ser fixado será o da cotação oficial do dia, provadapor certidão ou publicação no órgão oficial (art. 682 doCPC).

Como o perito-avaliador é dotado de fé pública, a re-gra é a não repetição da avaliação. Entretanto, essa regracomporta exceções, pois o art. 683 do CPC trata da possib-ilidade de repetição quando: a) se provar erro ou dolo doavaliador; b) se verificar, posteriormente à avaliação, quehouve diminuição do valor dos bens;  c)  houver fundadadúvida sobre o valor atribuído ao bem. Em sentido quase

semelhante, aliás, é o art. 1.010 do CPC, quanto ao in- ventário. Vale dizer que, em casos de maior gravidade,pode ser requerida até a substituição do avaliador, inclus-ive em processo de inventário.

Seguindo na análise da avaliação dos bens, o herdeiroque requerer, durante a avaliação, a presença do juiz e do

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escrivão, paga as despesas da diligência (art. 1.005 doCPC).

Não se expedirá carta precatória para a avaliação de bens situados fora da comarca por onde corre o inventáriose eles forem de pequeno valor ou perfeitamente con-hecidos do perito nomeado (art. 1.006 do CPC). A normatem a sua razão de ser, visando a uma maior agilidade aoprocesso de inventário, eis que, na grande maioria das vezes, as partes ou herdeiros estão muito ansiosos pelo seufim. Em razão do pequeno valor, a demorada expedição daprecatória traria mais ônus que benefícios aos

interessados.Também visando à facilitação e à agilidade do proced-

imento, preconiza o art. 1.007 do CPC que, sendo capazestodas as partes, não se procederá à avaliação se a FazendaPública concordar expressamente com o valor atribuído,nas primeiras declarações, aos bens do espólio. Se os her-deiros concordarem com o valor dos bens declarados pelaFazenda Pública, a avaliação cingir-se-á aos demais, nocaso, aos bens móveis (art. 1.008 do CPC).

Entregue o laudo de avaliação, o juiz mandará quesobre ele se manifestem as partes no prazo de dez dias,que correrá em cartório. É o que consagra o art. 1.009 doCPC, sendo comum que as partes envolvidas com o in-

 ventário requeiram esclarecimentos ao perito avaliador.Os parágrafos do comando legal trazem outros detal-hamentos importantes.

Em primeiro lugar, havendo impugnação quanto ao valor atribuído aos bens pelo perito, o juiz a decidirá deplano, à vista do que constar dos autos (art. 1.009, § 1.º,

do CPC). Julgando procedente a impugnação, determinará

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o juiz que o perito retifique a avaliação, observando osfundamentos da decisão (art. 1.009, § 2.º, do CPC).

Sendo aceito o laudo pelas partes, ou sendo resolvidasas impugnações suscitadas a seu respeito, lavrar-se-á emseguida o termo de últimas declarações, no qual o invent-ariante poderá emendar, aditar ou completar as primeiras(art. 1.011 do CPC). Ouvidas as partes sobre as últimas de-clarações no prazo comum de dez dias, proceder-se-á aocálculo do imposto, que varia de acordo com a legislaçãoespecífica de cada Estado (art. 1.012 do CPC).

 A encerrar essa fase, feito o cálculo, sobre ele serão

ouvidas todas as partes no prazo comum de cinco dias,que correrá em cartório e, em seguida, a Fazenda Pública(art. 1.013 do CPC). Se houver impugnação julgada pro-cedente, ordenará o juiz novamente a remessa dos autosao contador, determinando as alterações que devam serfeitas no cálculo (art. 1.013, § 1.º, do CPC). Cumprido odespacho, o juiz julgará o cálculo do imposto (art. 1.013, §2.º, do CPC). Após, seguem o recolhimento de imposto edas custas e a partilha.

Por fim, note-se que em razão de lei especial (art. 1.ºda Lei 6.858/1980, e art. 1.º, parágrafo único, I, doDecreto 85.845/1981), o pagamento dos valores devidosao empregado é pago aos sucessores independentemente

de inventário ou arrolamento. Em suma, em se tratandode verbas trabalhistas, os valores podem ser partilhadosentre os herdeiros diretamente pelo juízo do Trabalho, in-dependentemente do inventário na esfera cível.

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4.2.1.2 Inventário judicial pelo rito sumário

Quanto ao   arrolamento sumário, é expresso o art.1.031 do CPC, com a nova redação dada pela Lei 11.441/2007:

“Art. 1.031. A partilha amigável, celebrada entre partescapazes, nos termos do art. 2.015 da Lei n.º 10.406, de 10 de

 janeiro de 2002 – Código Civil, será homologada de planopelo juiz, mediante a prova da quitação dos tributos relat-ivos aos bens do espólio e às suas rendas, com observânciados arts. 1.032 a 1.035 desta Lei.

§ 1.º O disposto neste artigo aplica-se, também, ao pedidode adjudicação, quando houver herdeiro único.

§ 2.º Transitada em julgado a sentença de homologaçãode partilha ou adjudicação, o respectivo formal, bem comoos alvarás referentes aos bens por ele abrangidos, só serãoexpedidos e entregues às partes após a comprovação, veri-ficada pela Fazenda Pública, do pagamento de todos os

tributos”.

Como o artigo em questão fazia remissão ao art. 1.773do Código Civil de 1916, a Lei 11.441, de 4 de janeiro de2007, apenas alterou sua redação para que se faça remis-são ao artigo correspondente, qual seja, o 2.015 do CódigoCivil de 2002. Frise-se que não há mudança no conteúdoda norma, mas simples adequação ao atual Código Civil.Prevê o art. 2.015 do CC/2002 que “Se os herdeiros foremcapazes, poderão fazer partilha amigável, por escriturapública, termo nos autos do inventário, ou escrito particu-lar, homologado pelo juiz”.

Ensinam Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim que

o arrolamento sumário é uma forma abreviada de

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inventário e partilha de bens, havendo concordância de to-dos os herdeiros, desde que maiores e capazes. Observamos juristas que, aqui, não importa os valores dos bens aserem partilhados ( Inventários e partilhas..., 2006, p.457). Em suma, pode-se dizer que o seu fator predomin-

ante é justamente o acordo entre as partes envolvidas.O procedimento, como o próprio nome já diz, é

sumário, visando a uma maior celeridade na partilha de bens. Demonstrando esse intuito célere, dispõe o art.1.032 do CPC que os herdeiros, na inicial: a) requererão ao juiz a nomeação do inventariante que designarem; b) de-

clararão os títulos dos herdeiros e os bens do espólio;  c)atribuirão o valor dos bens do espólio, para fins departilha.

Em regra, o arrolamento sumário não comporta aavaliação de bens do espólio para qualquer finalidade (art.1.033 do CPC). A única ressalva feita pelo dispositivorefere-se à avaliação da reserva de bens (art. 1.035 doCPC).

Também visando a uma maior simplicidade ou facilit-ação, no  arrolamento sumário  não serão conhecidas ouapreciadas questões relativas ao lançamento, ao paga-mento ou à quitação de taxas judiciárias e de tributos in-cidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do

espólio (art. 1.034 do CPC). A taxa judiciária, se devida,será calculada com base no valor atribuído pelos herdeir-os, cabendo ao fisco, se apurar em processo administrativo valor diverso do estimado, exigir a eventual diferençapelos meios adequados ao lançamento de créditostributários em geral (art. 1.034, § 1.º, do CPC). O imposto

de transmissão será objeto de lançamento administrativo,

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conforme dispuser a legislação tributária, não ficando asautoridades fazendárias adstritas aos valores dos bens doespólio atribuídos pelos herdeiros (art. 1.034, § 2.º, doCPC).

Por fim, encerrando os procedimentos, determina oart. 1.035 do Estatuto Processual que a existência de cre-dores do espólio não impedirá a homologação da partilhaou da adjudicação, se forem reservados bens suficientespara o pagamento da dívida. Essa reserva de bens serárealizada pelo valor estimado pelas partes, salvo se ocredor, regularmente notificado, impugnar a estimativa.

Nesse último caso, é que deverá ser realizada a únicaforma de avaliação admitida no arrolamento sumário (art.1.035, parágrafo único, do CPC).

4.2.1.3 Inventário judicial pelo rito do arrolamentocomum

Como outrora destacado, o arrolamento comum é dis-ciplinado pelo art. 1.036 do CPC. De acordo com o caput desse dispositivo, quando o valor dos bens do espólio forigual ou inferior a 2.000 Obrigações do Tesouro Nacional– OTN, o inventário processar-se-á na forma de arrola-mento. Nesse caso, cabe ao inventariante nomeado, inde-

pendentemente da assinatura de termo de compromisso,apresentar, com suas declarações, a atribuição do valordos bens do espólio e o plano da partilha.

Como se pode perceber, essa forma de arrolamentonão leva em conta eventual acordo entre as partes in-teressadas, mas sim o valor dos bens inventariados.

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Sobre o valor de 2.000 OTN (Obrigações do TesouroNacional), tendo em vista a extinção do indexador pela Lei7.730/1989, sua quantificação em reais é matéria conturb-ada. O índice é inadequado e defasado, sendo pratica-mente impossível saber o valor exato, como lembram Euc-

lides de Oliveira e Sebastião Amorim, que também suger-em mudança da lei para que conste o valor de 500salários-mínimos como limite para a adoção do arrola-mento em questão. Para os doutrinadores, no ano de2006, se seguida a Tabela de atualização do Tribunal deJustiça de São Paulo, o valor de 2.000 OTN corresponder-ia a R$ 38.826,41 ( Inventários e partilhas..., 2006, p.503-504).

No que toca aos procedimentos, se qualquer daspartes ou o Ministério Público impugnar a estimativa an-teriormente realizada pelo inventariante, o juiz nomearáum avaliador que oferecerá laudo em dez dias (art. 1.036,§ 1.º, do CPC). O que se percebe é que a elaboração desse

laudo diferencia o  arrolamento comum  do  arrolamentosumário.

 Apresentado o laudo, o juiz, em audiência que desig-nar, deliberará sobre a partilha, decidindo de plano todasas reclamações e mandando pagar as dívidas não impug-nadas (art. 1.036, § 2.º, do CPC). Lavrar-se-á de tudo um

só termo, assinado pelo juiz e pelas partes presentes (art.1.036, § 3.º, do CPC).

Podem ser aplicadas ao arrolamento comum, eventu-almente, as disposições antes analisadas previstas no art.1.034 do CPC, relativamente ao lançamento, ao paga-mento e à quitação da taxa judiciária e do imposto sobre a

transmissão da propriedade dos bens do espólio. É o que

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preconiza o § 4.º do art. 1.036 do CPC, que aproxima asduas formas de arrolamento.

Por fim, provada a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, o juiz julgará a partilha(art. 1.036, § 5.º, do CPC).

 Analisadas essas espécies de inventário, com enormeaplicação prática, interessante aqui anotar a existência deoutras modalidades, que são muito bem apresentadas porFlávio Augusto Monteiro de Barros ( Manual..., 2005, v. 1,p. 304 e 305):

– Inventário orfanológico – havendo herdeiro menor, inter-dito, ausente ou desconhecido.

–   Inventário de provedoria   – quando o  de cujus  houverdeixado testamento ou codicilo.

–   Inventário de maiores   – quando, não havendo testa-mento, todos os herdeiros forem maiores e capazes.

– Inventário conjunto – aquele que abrange mais de um es-pólio. Segundo o professor paulista, seria possível emapenas duas hipóteses: 1.ª) quando o cônjuge meeiro fale-cer antes da partilha do premorto, sendo as duas herançasinventariadas e partilhadas de forma cumulativa, se osherdeiros forem os mesmos (art. 1.043 do CPC); 2.ª)quando, antes da partilha, falecer um dos herdeiros, que

não possui outros bens, além daqueles da herança invent-ariada (art. 1.044 do CPC). Nos dois casos, o inventarianteserá o mesmo.

–  Inventário negativo  – nas hipóteses em que o  de cujusnão deixa bens. No volume anterior dessa coleção vimosque há interesse em fazer esse inventário para que não seimponha a causa suspensiva do casamento prevista no art.

1.523, I, do CC. A jurisprudência vem reconhecendo sua

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 viabilidade e possibilidade, mesmo que não haja um in-teresse patrimonial direto: “Inventário negativo. Possibil-idade da declaração judicial da inexistência de bens emnome do de cujus. Interesse jurídico reconhecido. Afasta-mento do decreto de extinção do feito. Recurso provido”(TJSP, Apelação Cível 261.452-4/1-Suzano, 1.ª Câmara deDireito Privado, Rel. Elliot Akel, j. 08.04.2003, v.u.).

4.2.2 Inventário extrajudicial ou por viaadministrativa

Conforme foi ressaltado no início do presente

capítulo, com a edição da Lei 11.441/2007, o art. 982 doCPC recebeu a seguinte redação, atualizada com a Lei11.965/2009:

“Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz,proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazese concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por es-

critura pública, a qual constituirá título hábil para o registroimobiliário.

§ 1.º O tabelião somente lavrará a escritura pública se to-das as partes interessadas estiverem assistidas por um ad-

 vogado comum ou advogados de cada uma delas ou por de-fensor público, cuja qualificação e assinatura contarão doato notarial.

§ 2.º A escritura e demais atos notariais serão gratuitosàqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.”

Desse modo, como ocorreu com relação à separação eao divórcio extrajudicial, a lei foi demais concisa e dissemuito pouco a respeito do tema, cabendo à doutrina e à

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 jurisprudência sanar as dúvidas decorrentes dessesinstitutos.

 A Resolução 35 do Conselho Nacional de Justiça(CNJ), de 24 de abril de 2007, é de profunda importânciapara a compreensão desse novo instituto, razão pela qualserá mencionada no presente capítulo. A Resolução se di- vide em cinco seções, sendo que a Seção I, com regras decaráter geral, e a Seção II, com disposições referentes aoinventário e à partilha, são as que nos interessam para oestudo em questão.

Os requisitos para que se possa utilizar a via adminis-

trativa são os seguintes:

a) Todos os herdeiros devem ser capazes.

 A capacidade, mencionada na lei, é a capacidade defato, ou seja, a aptidão para praticar pessoalmente os atosda vida civil (arts. 3.º e 4.º do CC). Caso o  de cujus deixe

herdeiro menor que seja emancipado, legal ou voluntaria-mente, poderá ser utilizada a via administrativa. A capa-cidade dos herdeiros deve ser verificada no momento daelaboração da escritura. Isso porque a incapacidade retiraa validade do negócio jurídico e deve ser verificada no mo-mento da celebração, não importando se, no momento damorte, o herdeiro era ou não capaz.

Questão interessante é saber se, em razão da existên-cia de nascituro no ventre materno, a via administrativaseria afastada. O nascituro está concebido e nidificado no ventre materno, mas ainda não nasceu. A questão esbarrano debate a respeito da personalidade jurídica do nascit-uro. Conforme esclarecido no Volume 1 da presente

coleção, duas são as principais teorias no tocante ao início

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da personalidade jurídica do nascituro: a natalista e a con-cepcionista. Pela teoria natalista, o nascituro não poderiaser considerado pessoa, pois o Código Civil exigiria o nas-cimento com vida e o nascituro teria mera expectativa dedireitos. São adeptos dessa teoria Silvio Rodrigues, San Ti-

ago Dantas, Caio Mario da Silva Pereira e Sílvio de Salvo Venosa. De acordo com a teoria concepcionista, o nascit-uro é pessoa humana, tendo seus direitos resguardadospela lei. Seguem a teoria em questão Rubens LimongiFrança, Silmara Juny Chinellato, Giselda Hironaka, Fran-cisco Amaral, Renan Lotufo e Maria Helena Diniz.

Como já nos declaramos filiados à teoria concep-cionista, em nossa conclusão a existência de nascituro im-pede a escolha da via extrajudicial. Nesse sentido o en-tendimento de Francisco José Cahali e Karin Regina Rick Rosa ( Escrituras públicas..., 2007, p. 74) e ChristianoCassettari ( Separação..., 2007, p. 100).

b) Concordância de todos.

Se houver litígio, por óbvio, só a via judicial poderá serutilizada, uma vez que o inventário extrajudicial somente é viável juridicamente na hipótese de consenso entre osherdeiros.

c) O falecido não pode ter deixado testamento.

 A questão da existência do testamento, por si só, nãodeve servir de impedimento à utilização da via extrajudi-cial. Desde que o testamento não tenha conteúdo patrimo-nial (ex.: testamento que reconhece um filho ou perdoa oindigno), a via extrajudicial pode ser adotada

(CASSETTARI, Christiano. Separação..., 2007, p. 95).

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Juliana da Fonseca Bonates vai mais longe. Para ela,as razões para impedir a utilização da via extrajudicial nãoexistem quando o falecido deixa apenas codicilo, e tam-pouco quando o testamento não realiza partilha alguma,limitando-se à revogação do testamento anterior, à deser-

dação de um herdeiro, ou, ainda, se o conteúdo patrimoni-al não for economicamente relevante: esmolas, funerais,etc. (Há hipóteses..., Separação..., 2007, p. 318).

Superada a análise dos requisitos para a incidência dalei, é imperioso apontar que não há que falar em com-petência do Tabelião para a elaboração da escritura

pública. Assim, qualquer Tabelião de Notas, independente-

mente de sua localização, bem como do domicílio do fale-cido ou da localização dos bens a serem inventariados. Iló-gico seria a aplicação da regra de competência prevista noCPC para um ato extrajudicial. A Lei 8.935/1994, em seuart. 8.º, garante a liberdade da escolha do tabelião de not-as, independentemente do domicílio das partes ou dolugar da situação dos bens objeto do ato. Nesse sentido, oart. 1.º da Resolução 35 do CNJ, cuja redação é a seguinte:“Para a lavratura dos atos notariais de que trata a Lei n.11.441/07, é livre a escolha do tabelião de notas, não se ap-licando as regras de competência do Código de Processo

Civil”.Com relação à facultatividade da via extrajudicial, a

simples leitura do art. 982 do CPC espanca qualquerdúvida ao mencionar que “poderá fazer-se o inventário”.Há uma opção das partes maiores e capazes quando o fale-cido não deixou testamento. Entretanto, no início do per-

íodo de vigência da Lei 11.441/2007, alguns juízes

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acabavam extinguindo, de ofício, os inventários judiciais,sob o fundamento da inexistência de interesse de agir. A argumentação dessas decisões trilhava o caminho de que aLei 11.441/2007, seguindo a atual tendência de moderniz-ação do Direito de Família e das Sucessões, e em confor-

midade com o projeto de agilização, racionalização e des- burocratização do Poder Judiciário, veio a permitir in- ventários e partilhas extrajudiciais, sendo que essa viadeveria ser a prioritária. Assim, o Poder Judiciário,cumprindo o anseio de toda a população, deveria sedebruçar apenas sobre questões em que seja impre-scindível sua atuação.

Em que pese a clareza da fundamentação, com ela nãose pode concordar. Se a lei confere uma opção aos in-teressados, não pode o juízo suprimi-la em nome da cel-eridade e do melhor atendimento jurisdicional. É direitodo jurisdicionado levar ao Poder Judiciário a questão,ainda que não haja litígio. Exatamente por isso, a Resol-

ução 35 do CNJ enuncia que é facultada aos interessados aopção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser soli-citada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo detrinta dias, ou a desistência da via judicial, para promoçãoda via extrajudicial. Também, a Portaria da Corregedoria-Geral de Justiça 1/2007, do Tribunal de Justiça de São

Paulo, adota tal entendimento (item 1.1).Partindo para outra questão, não se deve esquecer queo sigilo pode ser requerido na hipótese de inventário judi-cial, enquanto que, em se tratando da via extrajudicial, aescritura é pública. A única questão a se ponderar é que sehá um procedimento judicial em curso, necessária será suasuspensão ou desistência, pois o procedimento judicial ex-

clui o extrajudicial e vice-versa (nesse sentido item 1.2 da

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Portaria CG 1, de 2007, do Tribunal de Justiça de SãoPaulo).

Outro tema relevante diz respeito à eventual necessid-ade de homologação judicial da escritura pública. Se talnecessidade houvesse, o objetivo da lei, qual seja, a cel-eridade e a desburocratização estariam feridos mortal-mente. A homologação é desnecessária. De certa maneira,a lei transfere ao Tabelião certo poder de fiscalização doato e, portanto, inútil a homologação.

Desse fato, conclui-se que a escritura pública é títulohábil não só para o registro imobiliário – conforme ex-

pressa previsão do art. 982 do CPC –, mas também para atransferência de bens e direitos, bem como para a pro-moção de todos os atos necessários à materialização dastransferências de bens e levantamento de valores(DETRAN, Junta Comercial, Registro Civil de PessoasJurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas,etc.), nos termos do art. 3.º da Resolução 35 do CNJ.

Essa mesma conclusão consta da Portaria 01/2007, daCorregedoria-Geral do Tribunal de Justiça de São Paulo,item 1.3. Inútil seria a escritura pública de inventário ref-erente a um carro, se o documento não pudesse ser regis-trado junto ao DETRAN. Isso restringiria a via adminis-trativa apenas à partilha de imóveis.

Com relação aos requisitos que devam constar da es-critura, o art. 982 do CPC apenas menciona que as partesinteressadas devem estar assistidas por advogado comumou advogados de cada uma delas, cuja qualificação eassinatura constarão do ato notarial.

O art. 8.º da Resolução 35 reforça essa determinação,

prevendo que é necessária a presença do advogado,

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dispensada a procuração, ou do defensor público, na lav-ratura das escrituras decorrentes da Lei 11.441/2007,nelas constando seu nome e registro na Ordem dos Ad- vogados do Brasil. No entanto, a dita resolução não men-ciona a consequência da ausência do profissional da área.

Entendemos que a assinatura do advogado é solenidadeessencial que, quando preterida, gera a nulidade absolutado negócio jurídico, nos termos do art. 166, V, do CC.

Sobre a indicação de profissional pelo Tabelião, paraevitar verdadeira mercantilização em que os Tabelionatospoderiam contratar advogados apenas parra assinar es-

crituras públicas, o CNJ determina na Resolução 35/2007ser vedada ao tabelião a indicação de advogado às partes,que deverão comparecer para o ato notarial acompanha-das de profissional de sua confiança. Se as partes não dis-puserem de condições econômicas para contratar ad- vogado, o tabelião deverá recomendar-lhes a DefensoriaPública, onde houver, ou, na sua falta, a Seccional da Or-

dem dos Advogados do Brasil (art. 9.º).Questão que merece ponderação diz respeito à ne-

cessidade ou não da nomeação de inventariante na es-critura pública. O inventariante, como já estudado, é o ad-ministrador do inventário. Esse administrador representaativa e passivamente o espólio. De acordo com o art. 11 da

Resolução 35/2007, é obrigatória a nomeação de in-teressado, na escritura pública de inventário e partilha,para representar o espólio, com poderes de inventariante,no cumprimento de obrigações ativas ou passivas pen-dentes, sem necessidade de se seguir a ordem prevista noart. 990 do Código de Processo Civil.

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Mas a questão não é pacífica. Francisco José Cahali eKarin Regina Rick Rosa entendem que a nomeação é fac-ultativa e só será necessária se o falecido deixouobrigações a serem cumpridas, como, por exemplo, aoutorga de uma escritura ( Escrituras públicas..., 2007, p.

74). A faculdade parece ser mais adequada e, nesse sen-

tido, esclarecedora é a Portaria 1/2007 da Corregedoria doTribunal Paulista, que dispõe que quando houver ne-cessidade, pode ocorrer, na escritura pública, a nomeaçãode um (ou alguns) herdeiro(s), com os mesmos poderes de

um inventariante, para representação do espólio nocumprimento de obrigações ativas ou passivas pendentes(v.g.,  levantamento de FGTS, de restituição de IR ou de valores depositados em bancos; comparecimento para alavratura de outras escrituras, etc.). Uma vez que há con-senso das partes, inexiste a necessidade de se seguir a or-dem de nomeação do art. 990 do CPC (item 4.1).

Pela obrigatoriedade da nomeação há o Provimentodo TJBA (Provimento 04/2007, art. 31), do TJPR (Provi-mento 110 de março de 2007, item 11.11.7.1), do TJMT(Provimento 02/2007, Seção 7, item 9.7.5, VII) e do TJAC(Provimento 02/2007, Capítulo 4, art. 4.º, item VIII),sendo que os dois últimos provimentos determinam,

ainda, que deva ser observada a ordem prevista no art.990 do CPC.

 A Resolução 35 do CNJ ainda resolve a questão dapossibilidade de inventário por procuração. Isso porque oseu art. 12 determina que se admitem inventário e partilhaextrajudiciais com viúvo(a) ou herdeiro(s) capaz(es), in-

clusive por emancipação, representado(s) por procuração

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formalizada por instrumento público com poderes especi-ais, vedada a acumulação de funções de mandatário e deassistente das partes. Os Tribunais de Justiça têm determ-inações semelhantes, mas não mencionam a vedação à cu-mulação contida na Resolução 35. Nesse sentido, o TJSP

(Portaria CG 01/2007, item 4.3), o TJAC (Provimento 02/2007, Capítulo IV, IV), o TJBA (Provimento 04/2007, art.29, § 4.º) e o TJMT (Provimento 02/2007, Seção 7, item9.7.5, IV).

De acordo com o art. 25 da Resolução 35/2007 doCNJ, é admissível a sobrepartilha por escritura pública,

ainda que referente a inventário e partilha judiciais já fin-dos, mesmo que o herdeiro, hoje maior e capaz, fossemenor ou incapaz ao tempo do óbito ou do processo judi-cial. A regra tem sua razão de ser. A sobrepartilha ocorrequando certos bens não foram partilhados e o inventário já se encerrou. Também ocorre se certo bem foi simples-mente esquecido quando do inventário ou, ainda, se foi

sonegado e agora deve ser partilhado (art. 1.040 do CPC). Aplicando-se a teoria de Pontes de Miranda com refer-

ência aos planos do negócio jurídico ( Escada Ponteana), aResolução do CNJ acerta ao mencionar que a sobre-partilha por escritura pública pode ocorrer ainda que oherdeiro capaz fosse incapaz na época do falecimento. Isso

porque a capacidade de fato ou de exercício deve ser veri-ficada no momento da celebração do negócio jurídico, qualseja, a assinatura da escritura (art. 2.035,  caput , do CC).Nesse sentido, a Portaria CG 1/2007 do TJSP (itens 4.16 e4.23), o Provimento 04/2007 do TJBA (art. 29, § 3.º), oProvimento 03/2007 do TJPB (art. 1.º, § 2.º) e o Provi-mento 110 do TJPR (item 11.11.3), sendo que os dois

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últimos não mencionam a questão da incapacidade dosherdeiros à época da sucessão.

Por fim, em havendo um só herdeiro, maior e capaz,com direito à totalidade da herança, não haverá partilha,lavrando-se a escritura de inventário e adjudicação dos bens, nos termos da Resolução 35 do CNJ. A questão é ób- via. Não se partilha o que se defere a uma única pessoa. Érealmente hipótese de adjudicação por escritura pública.

Com esses importantes conceitos para a prática cível,para as provas de graduação e de pós-graduação, e para osconcursos públicos, encerra-se o presente tópico.

Seguindo na análise do Código Civil, passa-se ao estudo dapena de sonegados.

4.3 DA PENA DE SONEGADOS

Enuncia o art. 1.992 do Código Civil em vigor que “oherdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendono inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seuconhecimento, estejam no poder de outrem; ou que osomitir na colação, a que os deva levar, ou ainda que deixarde restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia”.Sonegados, portanto, são os bens que deveriam ter sido in-

 ventariados ou trazidos à colação, sendo ocultados pelo in- ventariante ou por algum dos herdeiros.

O dispositivo conceitua a pena de sonegados, que vema ser uma sanção ou penalidade civil imposta para oscasos mencionados, de ocultação de bens da herança, ger-ando a perda do direito sobre os bens ocultados.

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a ser apurado poderá ser alvo de sobrepartilha. 3. Também anão descrição no rol dos bens partilháveis de máquina col-heitadeira, que foi adquirida mediante financiamento, nãoconfigura sonegado, pois não se verifica omissão dolosa,tratando-se de fato de todos conhecido, devendo tal bem serobjeto de sobrepartilha. Recurso desprovido” (TJRS,

 Apelação Cível 70020009254, 7.ª Câmara Cível, Rel. SérgioFernando de Vasconcellos Chaves, j. 08.08.2007).

“Ação de sonegados. Imóvel destinado aos filhos em vida.Ocultação dolosa não configurada. Imóvel destinado aos fil-hos pelo pai, pela metade, em vida, ainda que em momentosdistintos, não se configura em bem dolosamente ocultado.

Logo, descabe ação de sonegados quanto ao mesmo. Apelação principal provida. Apelação adesiva improvida”(TJMG, Processo 1.0024.99.025790-9/001(2), 2.ª CâmaraCível, Rel. Des. Nilson Reis, j. 23.05.2006).

“Inventário. Ação de sonegados. Pedido de nulidade desentença. Inexistência de julgamento extra petita. Sentença

determinando a sobrepartilha. Concessão aquém do pedido.Ocultação do imóvel. Ausência de prova de dolo doinventariante. Má-fé não caracterizada. Recurso adesivo sempreparo. Desatendimento ao art. 500, parágrafo único, doCPC. Improvimento do recurso principal e não conheci-mento do adesivo” (TJSP, Apelação Cível 140.104-4/1-SãoBernardo do Campo, 8.ª Câmara de Direito Privado, Rel.

Joaquim Garcia, j. 10.09.2003, v.u.). Além dessa pena civil, se o sonegador for o próprio in-

 ventariante, será ele removido da inventariança (art. 1.993do CC). Para tanto, deve-se provar a sonegação ou que elenegou a existência de bens indicados. O ônus dessa prova,por óbvio, também cabe a quem alega, nos termos do art.

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333, I, do CPC. Em suma, percebe-se que no caso de in- ventariante a pena de sonegados é dupla.

Relativamente aos procedimentos, Euclides de Oli- veira e Sebastião Amorim ensinam que a sonegação deveser arguida nos próprios autos do inventário e “havendoapresentação do bem, serão aditadas as declarações, parao regular seguimento do processo. Mas se persistir a re-cusa, a controvérsia haverá de ser resolvida em vias pró-prias, por meio da   ação de sonegados” ( Inventários e partilhas..., 2006, p. 363). Na grande maioria das vezes,estaremos diante de uma questão de alta indagação, o que

 justifica a ação específica.Essa ação somente pode ser promovida pelos herdeir-

os ou pelos credores da herança, conforme determina oart. 1.994 do CC em vigor, correndo no mesmo foro do in- ventário. Quanto ao prazo prescricional para a sua propos-itura, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem aplicando o prazo de 20 anos, constante do art. 177 doCC/1916, que deve ser contado da prática de cada ato ir-regular (STJ, REsp 26.650-SP, Lex-STJ  51/261, RSTJ  50/267, REsp 330.953/ES e REsp 259.406/PR). Adaptando-se esse tratamento ao atual Código Civil, o prazo é de 10anos, pelo que consta do seu art. 205 (AMORIM, Se- bastião e OLIVEIRA, Euclides.  Inventários e partilhas...,

2006, p. 360).Quanto à sentença que for proferida nessa ação, ela

aproveitará aos demais interessados (art. 1.994, parágrafoúnico, do CC). Isso faz com que os bens sonegados voltemao monte para serem sobrepartilhados.

Em casos excepcionais, não sendo possível a restitu-

ição dos bens sonegados pelo sonegador, tendo em vista

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que já não os tem em seu poder, este pagará a importânciacorrespondente aos valores que ocultou mais as perdas edanos. Essa é a regra prevista no art. 1.995 do CC, que de- ve ser analisada tendo como parâmetro o princípio da re- paração integral dos danos. Desse modo, é possível o res-

sarcimento dos danos materiais – nas modalidades danosemergentes (valores que a pessoa efetivamente perdeu) elucros cessantes (valores que a pessoa efetivamente deixoude lucrar) –, nos termos do art. 402 do CC. Sendo o caso,também são reparáveis os danos morais se o herdeiro oucredor sofrer um prejuízo imaterial que possa serdemonstrado. Anote-se que, nos termos dos arts. 403 doCC e 333, I, do CPC, cabe ao autor do pedido também pro- var esse prejuízo suportado.

 A terminar o tratamento da pena civil de sonegados,determina o art. 1.996 do CC quais os são momentos opor-tunos para arguir a sonegação, ou seja, para ingressar coma ação de sonegados. Quanto à sonegação praticada pelo

inventariante, a alegação somente poderá ser feita depoisde encerrada a descrição dos bens, com a declaração, porele feita, de não existirem outros bens por inventariar (emregra, após as últimas declarações). Em relação ao her-deiro, somente cabe a arguição de sonegados depois de eledeclarar no inventário que não possui tais bens. Se a ação

for proposta antes desses momentos, deverá ser extintasem a resolução do mérito, por falta de interesse de agir,não estando presente uma das condições da ação (art. 267, VI, do CPC).

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4.4 DO PAGAMENTO DAS DÍVIDAS

O Código Civil e também o Código de Processo Civilpreveem importantes regras quanto ao pagamento dasdívidas do falecido, e que interessam diretamente ao in- ventário e à partilha. Começaremos pela análise das regrasconstantes do Código Civil de 2002.

Inicialmente, dispõe o art. 1.997 do CC que a herançaresponde pelo pagamento das dívidas do falecido. No ent-anto, se a partilha já tiver sido feita, só respondem os her-deiros, cada qual em proporção da parte que na herança

lhe coube. De qualquer forma, vale dizer que há normasemelhante no art. 597 do CPC, segundo o qual “o espólioresponde pelas dívidas do falecido; mas, feita a partilha,cada herdeiro responde por elas na proporção da parteque na herança lhe coube”.

Por ambos os dispositivos, os herdeiros não podem re-

sponder além das forças da herança (ultra vires heredi-tatis). Não há previsão legal que determine que o herdeirodeva, com seu próprio patrimônio, pagar as dívidas do fa-lecido. Se o falecido deixou mais dívida que patrimônio,faleceu em estado de insolvência e os credores não rece- berão o que lhes é devido.

 Além disso, os herdeiros têm alguns bens protegidos,caso do bem de família, seja  legal  (Lei 8.009/1990) sejaconvencional  (arts. 1.711 a 1.722 do CC), mesmo que desti-nado à residência da pessoa solteira, divorciada ou viúva(Súmula 364 do STJ). Além do bem de família, podem sercitados os bens impenhoráveis, constantes do próprioEstatuto Processual, que mitigam a regra de

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responsabilidade patrimonial dos bens do devedor, tam- bém constante do art. 391 do atual CC.

Em relação ao pagamento das dívidas, estabelece o §1.º do art. 1.997 do CC que, quando, antes da partilha, forrequerido no inventário o pagamento de dívidas con-stantes de documentos – desde que revestidos de formal-idades legais, constituindo prova bastante da obrigação –,e houver impugnação, que não se funde na alegação depagamento, acompanhada de prova valiosa, o juiz man-dará reservar, em poder do inventariante, bens suficientespara a solução do débito, sobre os quais venha a recair

oportunamente a execução.Nesse caso, o credor será obrigado a iniciar a ação de

cobrança no prazo de trinta dias, sob pena de tornar semnenhum efeito a reserva dos bens (art. 1.997, § 2.º, do CC).O prazo constante do dispositivo é decadencial, de perdaou caducidade do direito. Vale dizer que o prazo não serefere à prescrição da pretensão de cobrança da dívida,cujo caráter é eminentemente patrimonial e relacionadocom a ação condenatória, mas apenas quanto à reserva de bens (critério científico de Agnelo Amorim Filho).

No tocante às despesas funerárias do de cujus, haja ounão herdeiros legítimos, sairão do monte da herança (art.1.998 do CC). É o caso de despesas com enterro, caixão,

coroa de flores, velório e túmulo. Pelo mesmo comandolegal, as despesas de  sufrágios por alma  do falecido sóobrigarão a herança quando ordenadas em testamento oucodicilo. Como despesas de sufrágios por alma podem-seentender todas aquelas relacionadas com os valores gastoscom missas em nome do falecido. Por essas despesas o

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monte só responde no caso de previsão decorrente daautonomia privada do morto.

Eventualmente, pode estar presente uma situação emque um herdeiro deve determinada quantia a outro, par-ticularmente porque o herdeiro pagou dívida do espóliocom quantia própria. Nesses casos, havendo ação regres-siva de um herdeiro contra os outros, já que pagou dívidacomum, a parte do coerdeiro insolvente dividir-se-á pro-porcionalmente entre os demais (art. 1.999 do CC).Consagra-se o rateio da quota do insolvente, porque opagamento realizado por apenas um herdeiro beneficiou a

todos os demais. Ainda no tocante ao pagamento das dívidas, enuncia o

art. 2.000 do CC que os legatários e os credores da her-ança podem exigir que do patrimônio do falecido se dis-crimine o do herdeiro e, em concurso com os credores domorto, serão preferidos no pagamento. Trata-se do que adoutrina denomina separação de bens do herdeiro, pois,como o herdeiro é titular da herança desde a abertura dasucessão, pode ocorrer dúvida quanto aos bens que com-põem o seu patrimônio pessoal e aqueles que compunhamo patrimônio do morto. A separação “tem o objetivo deevitar a confusão de patrimônios, e tornar discriminada amassa sobre a qual incidirá a execução dos credores e da

qual sairá o pagamento dos legados. É a separatio bonor-um  do direito romano” (VELOSO, Zeno.  Comentários...,2003, p. 404).

Por derradeiro quanto aos aspectos materiais, ex-pressa o art. 2.001 do CC que, “se o herdeiro for devedorao espólio, sua dívida será partilhada igualmente entre to-

dos, salvo se a maioria consentir que o débito seja

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imputado inteiramente no quinhão do devedor”. O que sepercebe é que a lei traz aqui uma espécie de compensação.Como regra, a compensação é proporcional a favor de cadaum dos herdeiros restantes. Como exceção, a com-pensação ocorrerá somente em relação ao próprio crédito

do herdeiro devedor.No tocante aos procedimentos, dispõe o art. 1.017,

caput , do CPC que, antes da partilha, poderão os credoresdo espólio requerer ao juízo do inventário o pagamentodas dívidas vencidas e exigíveis. A petição do credor,acompanhada de prova literal da dívida, será distribuída

por dependência e autuada em apenso aos autos do pro-cesso de inventário (art. 1.017, § 1.º, do CPC). Trata-se do pedido de habilitação de crédito, muito comum na práticaforense, que segue as regras de jurisdição voluntária.

Concordando as partes com o pedido do credor, o juiz,ao declará-lo habilitado, mandará que se faça a separaçãode dinheiro ou, em sua falta, de bens suficientes para o seupagamento (art. 1.017, § 2.º, do CPC). Separados os bens,tantos quantos forem necessários para o pagamento doscredores habilitados, o juiz mandará aliená-los em praçaou leilão, aplicando-se as regras específicas quanto à venda judicial previstas no Estatuto Processual em vigor(art. 1.017, § 3.º, do CPC). Se o credor requerer que, em

 vez de dinheiro, lhe sejam adjudicados, para o seu paga-mento, os bens já reservados, o juiz deferir-lhe-á o pedido,concordando todas as partes (art. 1.017, § 4.º, do CPC).

No caso da habilitação de crédito realizada por credor,não havendo concordância de todas as partes sobre o pe-dido de pagamento feito pelo credor, será ele remetido

para os meios ordinários (art. 1.018 do CPC). A 

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interpretação correta do dispositivo é que basta a dis-cordância de um dos herdeiros para que surja a necessid-ade de uma ação específica para o pagamento da dívida.

Nesse caso de discordância, porém, o juiz do in- ventário mandará reservar em poder do inventariante bens suficientes para pagar o credor, desde que a dívidaconste de documento que comprove suficientemente aobrigação e, ainda, que a impugnação não esteja fundadaem quitação (art. 1.018, parágrafo único, do CPC). É o casode uma obrigação líquida (certa quanto à existência, de-terminada quanto ao valor) e vencida.

O credor de dívida líquida e certa, ainda não vencida,também pode requerer habilitação no inventário, con-forme consta do art. 1.019 do CPC. Concordando as partescom o pedido, o juiz, ao julgar habilitado o crédito, man-dará que se faça separação de bens para o futuro paga-mento. Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery demonstram a diversidade dos procedimentos, particular-mente quanto ao dispositivo anterior, pois “lá os bens sãoreservados para que se aguarde o pagamento, que os her-deiros não querem aceitar fazer; aqui os bens são reserva-dos para que haja patrimônio para responder pela dívidaque se irá vencer” (Código de Processo Civil ..., 2006, p.1.024).

Prevê o art. 1.020 do CPC que o legatário também éparte legítima para manifestar-se sobre as dívidas do es-pólio quando toda a herança for dividida em legados ouquando o reconhecimento das dívidas importar reduçãodos legados. A norma se justifica pelo interesse direto dolegatário nesses casos.

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Por fim, quanto aos procedimentos, sem prejuízo dasregras específicas quanto à penhora, determina o art.1.021 do CPC que é lícito aos herdeiros, ao separarem benspara o pagamento de dívidas, autorizar que o inventari-ante os nomeie à penhora no processo em que o espólio

for executado.

4.5 DA COLAÇÃO OU CONFERÊNCIA EREDUÇÃO DAS DOAÇÕESINOFICIOSAS

4.5.1 Colação

 A colação (collatio) é conceituada pela doutrina comosendo “uma conferência dos bens da herança com outrostransferidos pelo de cujus, em vida, aos seus descendentes,

promovendo o retorno ao monte das liberalidades feitaspelo autor da herança antes de falecer, para uma equit-ativa apuração das quotas hereditárias dos sucessores le-gitimários” (DINIZ, Maria Helena.  Código Civil..., 2006,p. 1.599). A matéria igualmente está tratada tanto noCódigo Civil (arts. 2.002 a 2.012) quanto no Código deProcesso Civil (arts. 1.014 a 1.016).

De início, o conceito de colação ou conferência podeser retirado do art. 2.002 do CC, segundo o qual: “Os des-cendentes que concorrerem à sucessão do ascendentecomum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferiro valor das doações que dele em vida receberam, sob penade sonegação”. O próprio comando legal disciplina a

sanção para o caso de o descendente não trazer o bem à

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colação: a pena civil de sonegados, já estudada. Dispõe oseu parágrafo único que, para o cálculo da legítima, o valordos bens conferidos será computado na parte indisponível,sem aumentar a disponível.

 A colação está justificada na possibilidade de doaçãodo ascendente ao descendente ou mesmo entre cônjuges,implicando esta em adiantamento da legítima, conformeconsagra o art. 544 do atual Código Civil. Ensina Zeno Veloso que “a regra de que a doação é feita como adianta-mento da legítima não é absoluta, cogente, inafastável,pois o ascendente-doador pode dispensar da colação as

doações feitas ao descendente, seu herdeiro necessário,determinando que saiam de sua metade disponível, cont-anto que não a excedam, e computando o seu valor aotempo da doação (art. 2.003, parágrafo único). Porém, seo ascendente silenciar, se não fizer expressamente a dis-pensa da colação, mandando embutir o que foi doado nasua parte disponível, a regra do art. 544 incide”

(Comentários..., 2003, p. 405).Desse modo, a colação tem por fim igualar, na pro-

porção estabelecida no próprio Código Civil, as legítimasdos descendentes e do cônjuge sobrevivente, obrigandotambém os donatários que, ao tempo do falecimento dodoador, já não possuírem os bens doados. É o que enuncia

o art. 2.003 do atual Código Civil, dispositivo que coloca ocônjuge sobrevivente, ao lado dos descendentes, comopessoa obrigada a colacionar. Apesar de não mencionadonos comandos legais anteriores, filiamo-nos à correntedoutrinária pela qual o cônjuge também é destinatário doreferido dever legal (DINIZ, Maria Helena. Código Civil...,2003, p. 1.356; e VELOSO, Zeno. Comentários..., 2003, p.

417).

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 A opinião que endossamos tem por fundamento adicção do art. 544 do CC/2002, que expressamente con-sagra a doação entre cônjuges como adiantamento de legí-tima (“Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes,ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que

lhes cabe por herança”).Quanto aos descendentes, é de se salientar que os fil-

hos sempre terão o dever de colacionar; já quanto aos ne-tos a questão merece certa ponderação. Se os netos rece- beram a herança   por representação, colacionam o queseus pais colacionariam, ou seja, os bens que seu pai

(premorto) recebeu diretamente por doação do avô,mesmo que o bem não mais exista. Vejamos um exemplo.Um pai recebe casa do avô em doação como adiantamentode legítima. Quando o avô falece, o pai já é premorto e seufilho – neto do falecido – é chamado a suceder em repres-entação. Como o pai deveria colacionar a casa, seu filho –neto do falecido – colaciona, ainda que a casa já tenha sido

 vendida. Por outra via, se os netos receberam a herançapor   direito próprio, devem colacionar os bens que elesmesmos receberam por doação de seu avô.

Essa é a disposição do art. 2.009 do CC. Quando osnetos, representando os seus pais, sucederem aos avós,serão obrigados a trazer à colação, ainda que não o hajam

herdado, o que os pais teriam de conferir. O dispositivo,assim, acaba transferindo o dever aos herdeiros daqueleque deveria colacionar, quebrando com a regra pela qual acolação é pessoal.

Os netos não colacionam os bens a eles doados direta-mente por seu avô, se o seu pai estiver vivo no momento

do óbito do avô, pois não são herdeiros do avô. O herdeiro

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é o pai, que por ser descendente de 1.º grau exclui os netosque são descendentes de 2.º grau. Também os netos nãocolacionam bens recebidos diretamente do avô quandoherdarem por representação (pois estão substituindo o paipremorto).

Um quadro com relação às doações realizadas ajudaráa resolver a questão:

Partes nadoação

Quem rece-beu a her-ança do

avô?

Devem os netoscolacionar?

Doaçãofeita peloavô ao pai

Os netos emrepresentaçãoao paipremorto

SIM. Se o seu paivivo fosse, deveriacolacionar, então osnetos, como repres-entantes, devem

colacionarDoaçãofeita direta-mente peloavô aosnetos

Os netos, pordireitopróprio, e nãohouverepresentação

SIM. Os netos de-verão colacionar osbens que receberam

Doaçãofeita direta-mente peloavô aosnetos

O pai, poisestá vivo nomomento dasucessão doavô

NÃO. Os netos nãodevem colacionar,pois não são her-deiros de seu avô(são descendentesde 2.º grau)

Doação

feita

Os netos em

representação

NÃO. Os netos não

devem colacionar os

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diretamentepelo avôaos netos

ao paipremorto

bens, pois, na su-cessão, estão rep-resentando seu paifalecido

Os ascendentes e colaterais estão dispensados da col-ação, pois a lei não prevê que tais pessoas têm o referidodever. Diferentemente do sistema francês, por exemplo,em que se determina a colação pelo ascendente. Como anorma é restritiva de direitos, não merece interpretaçãoextensiva. O mesmo deve ser dito quanto ao companheiro

que, aqui, não está na mesma situação que o cônjuge, atéporque o convivente não é herdeiro necessário, não tendodireito à legítima. Além disso, o companheiro não estámencionado no art. 544 do CC, que trata somente dadoação entre cônjuges.

O parágrafo único do art. 2.003 do CC expressa que,

“se, computados os valores das doações feitas em adianta-mento de legítima, não houver no acervo bens suficientespara igualar as legítimas dos descendentes e do cônjuge,os bens assim doados serão conferidos em espécie, ou,quando deles já não disponha o donatário, pelo seu valorao tempo da liberalidade”.

Interpretando o dispositivo, conforme ensina MariaHelena Diniz, nosso ordenamento jurídico adotou o sis-tema da   colação em substância, pois “a mesma coisadoada em adiantamento da legítima ao descendente e aocônjuge (arts. 544 e 2.003, parágrafo único, segundaparte, do Código Civil) deve ser trazida à colação.

O ideal seria que o bem doado permanecesse com o

donatário, seja ele descendente ou cônjuge e que, com os

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demais bens do acervo, fossem igualadas as legítimas dosoutros herdeiros necessários.

Entretanto, se, ao tempo da abertura da sucessão pormorte do doador, não houver no acervo hereditário benssuficientes para igualar a legítima, a coisa doada deveráser conferida em espécie, e se os donatários (descendentesou cônjuge) não mais a tiverem, deverão trazer à colação oseu valor correspondente, hipótese em que se terá a  col-ação ideal  (RT 697:154). Tal valor é o que a coisa doadapossuía ao tempo da liberalidade (DINIZ, Maria Helena.Código Civil..., 2003, p. 1.356).

No que concerne ao valor de colação dos bens doados,será aquele, certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato deliberalidade, ou seja, quando da doação (art. 2.004, caput ,do CC). Relativamente ao  valor estimativo, o juiz do in- ventário pode nomear um perito para a sua determinação,se houver dificuldades na fixação do quantum.

Há certa contradição entre esse último comando legale o art. 1.014 do CPC, segundo o qual: “No prazo estabele-cido no art. 1.000, o herdeiro obrigado à colação conferirápor termo nos autos os bens que recebeu ou, se já os nãopossuir, trar-lhes-á o valor. Parágrafo único. Os bens quedevem ser conferidos na partilha, assim como as acessõese benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo val-

or que tiverem ao tempo da abertura da sucessão”. A contradição está presente, pois o Código Civil men-

ciona o valor do bem ao tempo da doação, enquanto o CPCfala no momento da abertura da sucessão. A solução éapontada por Zeno Veloso, que afirma que o Código Civilde 2002 revoga o art. 1.014 do Código de Processo Civil

(Comentários..., 2003, p. 419). Trata-se de uma questão

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de direito intertemporal. Caso o falecimento tenha ocor-rido em período anterior à vigência do Código Civil de2002, as suas regras não produzem efeitos, aplicando-seapenas o previsto no Código de Processo Civil, ou seja, o valor dos bens a ser colacionado é o do tempo da abertura

da sucessão. Já para as sucessões abertas na vigência donovo Código Civil, o valor é o do tempo da liberalidade. Aplica-se, assim, o art. 2.035 do Código Civil de 2002.

No que interessa ao valor do bem ao tempo da doação,eventual valorização ou desvalorização da coisa deve serdesconsiderada, mas de qualquer forma o valor histórico

deve ser monetariamente corrigido até o momento daabertura da sucessão (RODRIGUES, Silvio. Direito civil...,2002, v. 7, p. 319; AMORIM, Sebastião e OLIVEIRA, Euc-lides. Inventários e partilhas..., 2006, p. 378).

Em sentido contrário, apresentando solução diferentepara sanar essa suposta antinomia jurídica, prevê o Enun-ciado n. 119 CJF/STJ, aprovado na I Jornada de DireitoCivil , que, “para evitar o enriquecimento sem causa, a col-ação será efetuada com base no valor da época da doação,nos termos do   caput   do art. 2.004, exclusivamente nahipótese em que o bem doado não mais pertença ao pat-rimônio do donatário. Se, ao contrário, o bem ainda integ-rar seu patrimônio, a colação se fará com base no valor do

 bem na época da abertura da sucessão, nos termos do art.1.014 do CPC, de modo a preservar a quantia que efetiva-mente integrará a legítima quando esta se constituiu, ouseja, na data do óbito (resultado da interpretação sis-temática do art. 2.004 e seus parágrafos, juntamente comos arts. 1.832 e 884 do Código Civil)”.

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Discordamos do teor do enunciado, pois nos pareceque a regra no novo sistema é a colação em substânciacaso o bem ainda integre o patrimônio do donatário.

Se do ato de doação não constar valor certo, nemhouver estimação feita naquela época, os bens serão con-feridos na partilha de acordo com o seu valor ao tempo daliberalidade (art. 2.004, § 1.º, do CC). Só o valor dos bensdoados entrará em colação (art. 2.004, § 2.º, do CC). Peloúltimo dispositivo, não entram na colação os valores cor-respondentes às benfeitorias acrescidas, as quais perten-cerão ao herdeiro donatário, correndo também à conta

deste os rendimentos ou lucros (frutos civis), assim comoas perdas e danos que os bens sofrerem, que deverão sersuportados pelo donatário.

O art. 2.005 do atual Código Civil trata da dispensa dacolação das doações que saíram da parte disponível daherança. A dispensa é possível, desde que tais liberalid-ades não excedam essa parte disponível, ou seja, desdeque não ingressem na parte da legítima, computado o seu valor ao tempo da doação. A lei presume imputada naparte disponível a liberalidade feita a descendente que, aotempo do ato, não seria chamado à sucessão na qualidadede herdeiro necessário (art. 2.005, parágrafo único, doCC). A presunção é relativa ou iuris tantum, e o exemplo a

ser citado é o de uma doação realizada a um neto, cujo pai,sucessor legítimo, está vivo.

 Ainda no tocante à dispensa da colação, esta pode seroutorgada pelo doador em testamento, ou no própriotítulo de liberalidade (art. 2.006 do CC). Assim, a dispensada colação também pode constar do próprio instrumento

de doação, como decorrência da autonomia privada do

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doador. Para tanto, devem-se respeitar todos os requisitosde validade do negócio jurídico, extraídos do art. 104 doCC: partes capazes; vontade livre (sem vícios); objeto lí-cito, possível e determinado ou determinável; forma pre-scrita e não defesa em lei. Isso sob pena de nulidade (arts.

166 e 167 do CC) ou anulabilidade (art. 171 do CC) do atode dispensa da colação.

Não virão à colação os gastos ordinários do ascend-ente com o descendente, enquanto menor, em sua edu-cação, estudos, sustento, vestuário, tratamento de enfer-midades, enxoval, assim como as despesas de casamento,

ou as feitas no interesse de sua defesa em processo-crime.É o que enuncia o art. 2.010 da atual codificação, queapesar da vedação do enriquecimento sem causa, entendeque tais valores foram gastos não como liberalidades, mascomo dever do ascendente.

No mesmo sentido, as doações remuneratórias de ser- viços feitos ao ascendente também não estão sujeitas acolação (art. 2.011 do CC). As doações remuneratórias, nostermos do art. 540 do CC, não constituem ato de liberalid-ade, mas sim valores pagos por um serviço prestado. Se oserviço for feito pelo descendente no interesse do ascend-ente, não haverá necessidade de colacionar o bem doado.Ilustrando, podemos citar o caso de um filho que salva a

 vida de seu pai que iria se afogar, e recebe uma doação porsua atitude heroica. A norma é correta e perfeitamente justificável. Vale lembrar, ainda, que justamente pela inex-istência de liberalidade é que a doação remuneratória nãopode ser revogada por ingratidão (art. 564, I, do CC).

Encerrando o tratamento no Código Civil, prescreve o

seu art. 2.012 que, sendo feita a doação por ambos os

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cônjuges, no inventário de cada um se conferirá por met-ade. No caso em questão, serão aplicadas, de forma con-comitante, as regras de procedimento vistas anterior-mente. Como a norma não é restritiva, não vemos prob-lemas em aplicá-la também para a união estável. Nesse

sentido, ensina Zeno Veloso que, “dando uma inter-pretação compreensiva ao dispositivo, havemos de con-cluir que se aplica ao caso de a doação ser feita ao des-cendente por ambos os companheiros, se a família é con-stituída por uma união estável” (Comentários..., 2003, p.432).

No campo prático e processual, se o herdeiro negar orecebimento dos bens ou a obrigação de os conferir, o juiz,ouvidas as partes no prazo comum de cinco dias, decidiráà vista das alegações e provas produzidas. Essa é a regrado art. 1.016, caput , do CPC, sendo certo que essa decisãodo juiz é interlocutória no processo de inventário, sendopassível de agravo (NERY JR., Nelson e NERY, Rosa

Maria de Andrade.  Código de Processo Civil ..., 2006, p.1.023). Mas, havendo questão de alta indagação, haveráremessa às vias ordinárias (art. 1.016, § 2.º, do CPC). En-quanto pender essa demanda, o herdeiro não poderá rece- ber o seu quinhão hereditário, a não ser que preste cauçãocorrespondente ao valor dos bens discutidos em juízo.

Por derradeiro, determina o CPC que, sendo declaradaimprocedente a oposição, se o herdeiro, no prazo im-prorrogável de cinco dias, não proceder à conferência, o juiz mandará sequestrar-lhe os bens sujeitos à colação,para serem inventariados e partilhados (art. 1.016, § 1.º,do CPC). Cabe, ainda, a imputação ao seu quinhão hered-itário do valor desses bens, se já não os possuir.

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4.5.2 Redução das doações inoficiosas

 A colação dos bens doados não se confunde com a re-dução da doação inoficiosa. Se for o caso de uma doaçãoque exceda a parte que poderia ser disposta (inoficiosa),

fica ela sujeita a redução, conforme o art. 2.007 do CC. Odispositivo em questão é decorrência do art. 549 domesmo Código, que considera nula a doação inoficiosa naparte que exceder o que o doador, no momento da liberal-idade, poderia dispor em testamento.

Haveria prazos para a redução da doação inoficiosa?

Na opinião dos presentes autores, a resposta é negativa,pois, sendo nula, a ação é declaratória e não estaria sujeitaa prazos. Ademais, nos termos do art. 169 do CC, a nulid-ade não convalesce pelo decurso do tempo.

 Assim, não há necessidade de aguardar o falecimentodo doador para propositura da ação de redução, em casode doação inoficiosa. Em outras palavras, poderá ser pro-posta, mesmo estando vivo o doador que instituiu a liber-alidade viciada. Visando a esclarecer, o Projeto de Lei699/2011 (antigo PL 6.960/2002) pretende acrescentarum parágrafo único ao art. 549, com o seguinte teor: “Art.549. (...) Parágrafo único. A ação de nulidade pode ser in-tentada mesmo em vida do doador”. A proposta confirma

o entendimento doutrinário atual, que já pode ser invo-cado na prática cível (ALVES, Jones Figueirêdo.  CódigoCivil..., 2008, p. 500; GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil..., 2007, v. III, p. 270).

Todavia, quanto ao prazo, surge um outro entendi-mento no sentido de que, pelo fato de a questão envolverdireitos patrimoniais, está sujeita a prazo prescricional,que é próprio dos direitos subjetivos. Como não há prazo

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especial previsto, deverá ser aplicado o prazo geral de pre-scrição. Na vigência do CC/1916 esse prazo era de vinteanos; na vigência do CC/2002 é de dez anos (art. 205).Quanto à aplicação do prazo geral de prescrição para essahipótese, entendeu o Superior Tribunal de Justiça:

“Civil e processual. Acórdão estadual. Nulidade não con-figurada. Ação de reconhecimento de simulação cumuladacom ação de sonegados. Bens adquiridos pelo pai, em nomedos filhos varões. Inventário. Doação inoficiosa indireta.Prescrição. Prazo vintenário, contado da prática de cada ato.Colação dos próprios imóveis, quando ainda existentes no

patrimônio dos réus. Exclusão das benfeitorias por eles real-izadas. CC anterior, arts. 177, 1.787 e 1.732, § 2.º. Sucumbên-cia recíproca. Redimensionamento. CPC, art. 21.   Se aaquisição dos imóveis em nome dos herdeiros varões foiefetuada com recursos do pai, em doação inoficiosa, simu-lada, em detrimento dos direitos da filha autora, a pre-scrição da ação de anulação é vintenária, contada da práticade cada ato irregular. Achando-se os herdeiros varões aindana titularidade dos imóveis, a colação deve se fazer sobre osmesmos e não meramente por seu valor, a teor dos arts.1.787 e 1.792, § 2.º, do Código Civil anterior. Excluem-se dacolação as benfeitorias agregadas aos imóveis realizadaspelos herdeiros que os detinham (art. 1.792, § 2.º). Sucum-

 bência recíproca redimensionada, em face da alteração de-corrente do acolhimento parcial das teses dos réus. Recurso

especial conhecido em parte e provido” (STJ, REsp259.406/PR (200000489140), 600816. Data da decisão:17.02.2005, 4.ª T., Rel. Min. Aldir Passarinho Junior,  DJ 04.04.2005, p. 314).

Superada essa questão controvertida, os parágrafos doart. 2.007 do CC disciplinam essa redução. O excesso será

apurado com base no valor que os bens doados tinham no

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momento da liberalidade (§ 1.º). A redução da liberalidadefar-se-á pela restituição ao monte do excesso assimapurado (§ 2.º). De início, a restituição será em espécie. Senão mais existir o bem em poder do donatário, a reduçãoserá em dinheiro, segundo o seu valor ao tempo da aber-

tura da sucessão. Em todos os casos, prevê a lei que devemser observadas, no que forem aplicáveis, as regras previs-tas na codificação para a redução das disposiçõestestamentárias.

Também estará sujeita à redução a parte da doaçãofeita a herdeiros necessários que exceder a legítima e mais

a quota disponível (§ 3.º). Dessa forma, um herdeiro ne-cessário que foi beneficiado além do que deveria tambémpode, por óbvio, ser atingido pela redução. Por fim, sendo várias as doações a herdeiros necessários, feitas em difer-entes datas, serão elas reduzidas a partir da última, até aeliminação do excesso (§ 4.º).

 Além disso, enuncia o art. 2.008 do CC que aquele querenunciou à herança ou dela foi excluído deve, mesmo as-sim, conferir as doações recebidas, para o fim de repor oque exceder a parte disponível. Em suma, mesmo o renun-ciante à herança e o excluído por indignidade devemtrazer à colação, no que tange à parte inoficiosa, os bensrecebidos. A doutrina majoritária entende que o disposit-

ivo também deve incluir aquele que foi deserdado, en-tendimento este que deve ser considerado para fins deprovas, prática e concursos públicos (VELOSO, Zeno. Co-mentários..., 2003, p. 427; e DINIZ, Maria Helena. CódigoCivil..., 2003, p. 1.359).

No mesmo sentido, aliás, determina o art. 1.015 do

CPC que “o herdeiro que renunciou à herança ou o que

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dela foi excluído não se exime, pelo fato da renúncia ou daexclusão, de conferir, para o efeito de repor a parte inofi-ciosa, as liberalidades que houve do doador”. O § 1.º dessecomando processual consagra a licitude do ato dodonatário ao escolher, entre os bens doados, tantos quan-

tos bastem para perfazer a legítima e a metade disponível,entrando na partilha o excedente para ser dividido entreos demais herdeiros. Em casos de exceção, se a parte inofi-ciosa da doação recair sobre bem imóvel, que não com-porte divisão cômoda, o juiz determinará que sobre ela seproceda entre os herdeiros a licitação. Nessas situações, odonatário poderá concorrer na licitação e, em igualdade decondições, preferirá aos herdeiros (art. 1.015, § 2.º, doCPC). Como se pode perceber, o dispositivo processualtraz aqui um direito de preferência a favor do donatário.

Não se deve confundir a redução da doação inoficiosacom a redução das disposições testamentárias, que, con-forme já visto ao se estudar o art. 1.967 do CC, trata das

cláusulas previstas em testamento que invadem a legítima,as quais só produzirão efeitos após a morte do testador. A doação inoficiosa sujeita à redução que acabamos deestudar foi realizada em vida pelo falecido.

Por fim, criamos alguns exemplos que ilustram bem adiferença entre a colação e a redução das doações inoficio-

sas e que podem ajudar na solução de questões práticas.

EXEMPLO 1: José, que é pai de 2 filhos, doa sua casa(único bem) a seu sobrinho.

Pergunta-se:

Houve invasão da legítima? SIM.

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Deve haver redução da disposição? SIM.

Existe o dever de colacionar o bem? NÃO, pois osobrinho não precisa colacionar (art. 2.002 do CC).

Dessa forma, deverão ser aplicadas as regras previstas

no art. 2.007:

Redução da doação em 50% da disposição para preservara legítima, sendo atribuídos 50% da casa para os filhos(herdeiros necessários) e 50% para o sobrinho.

E se a casa já foi vendida? Nesse caso, o sobrinho deverá

colacionar em dinheiro o valor de 50% da casa, apuradona data da sucessão.

EXEMPLO 2: José, que é proprietário de duas casasde igual valor, doou uma delas a seu filho João. Antonio,seu outro filho, nada recebeu.

Pergunta-se:

Houve invasão da legítima? NÃO.

Deve haver redução da disposição? NÃO.

Existe o dever de colacionar o bem? Depende, po-dendo incidir as seguintes variações:

NÃO. Se no título de doação consta expressamente que setrata de doação da parte disponível, não haverá necessid-ade de colação (art. 2.005 do CC). Dessa forma, a casa quesobrou no patrimônio do pai será dividida em partesiguais entre João e Antonio. Portanto, João receberá acasa doada e a metade da outra (que o pai deixou ao mor-rer), pois, em vida, pretendeu o pai deixar mais bens paraeste (da parte disponível) do que para o outro (Antonio).

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SIM. Se o título foi omisso ou declarou que se tratava deantecipação da legítima, então haverá necessidade decolacionar o bem. No entanto, pelo fato de o pai ter fale-cido e deixado uma casa restante em seu patrimônio e deeste bem ser suficiente para igualar a legítima, não há quese colacionar a casa doada (em substância ou em seu valorem dinheiro), bastando atribuí-la ao herdeiro Antonio(art. 2.003, parágrafo único, do CC). Nesta segundahipótese, João ficará com a casa que recebeu em doação e

 Antonio com aquela que seu pai deixou ao falecer. Port-anto, ambos receberão idêntico patrimônio, poispresume-se que o pai, em vida, não pretendeu fazer difer-ença entre os seus filhos.

EXEMPLO 3: José, que é proprietário de uma casa,doou o bem a seu filho João. Antonio, seu outro filho,nada recebeu.

Pergunta-se:

Houve invasão da legítima? SIM.Deve haver redução da disposição? SIM. Como o paidoou 100% de seu patrimônio, invadiu a porção legítima.Logo, 50% do bem deve retornar, a título de redução, aopatrimônio do pai para serem partilhados entre os doisfilhos.

Existe o dever de colacionar o bem? Depende, po-dendo incidir as seguintes variações:

NÃO. Se no título de doação declarou-se expressamente quese trata de doação da parte disponível, não haverá ne-cessidade de proceder à colação (art. 2.005 do CC). Sendoassim, João ficará com 75% do bem (50% recebidos pordoação e referentes à parte disponível dos bens de seu pai

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e 25% que receberá a título de sucessão), enquanto Anto-nio ficará com 25% (referentes à legítima).

SIM. Se o título foi omisso ou declarou se tratar de ante-cipação da legítima, então haverá necessidade de

colacionar os bens. Nesta situação, presume-se que o painão pretendia fazer diferença entre os filhos, razão pelaqual o bem deverá voltar ao seu patrimônio para ser igual-mente dividido entre João e Antonio (50% para cada um).

EXEMPLO 4: José é proprietário de quatro casas deigual valor e pai de dois filhos, Antonio e João. Doou a

João três casas, sendo que a primeira transmissão ocorreuem 1995, a segunda em 1998 e a terceira em 1999. A casaque sobrou permaneceu no patrimônio do pai.

Pergunta-se:

Houve invasão da legítima? SIM.

Deve haver redução da disposição? SIM.

Por quê? Em 1995 José doou uma de suas quatro casas aseu filho João, restando mais três em seu patrimônio. Nãohavia invasão da legítima. Em 1998, doou ao mesmo filhoa segunda casa, o que também não causou invasão à legí-tima, pois o patrimônio considerado remonta à data daprimeira doação. Posteriormente, em 1999, doou a ter-

ceira casa, invadindo, consequentemente, a legítima.

Como fazer a redução (art. 2.007, §§ 2.º e 4.º)? A últimacasa doada (em 1999) deverá retornar ao patrimônio dode cujus em espécie (a própria casa). Entretanto, se a casa

 já foi vendida, deverá ser restituído o seu valor em din-heiro, segundo o valor da casa ao tempo da abertura da

sucessão (art. 2.007, § 2.º).

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Existe o dever de colacionar o bem? Depende, po-dendo incidir as seguintes variações:

NÃO. Se os títulos de doação declararem expressamenteque se trata de doação da parte disponível, não haverá ne-

cessidade de proceder à colação (art. 2.005). Sendo assim,João ficará com as duas casas doadas em 1995 e 1998, atítulo de adiantamento da disponível. A casa doada em1999, que retornou ao patrimônio do falecido pela re-dução da doação inoficiosa e a quarta casa serão partilha-das na proporção de 50% para João e 50% para Antonio.

SIM. Se o título foi omisso ou declarou se tratar de ante-cipação de legítima, então haverá necessidade decolacionar os bens, pois nesta situação presume-se que opai não pretendia fazer diferença entre os filhos. Pelo fatode a casa doada em 1999 (ou seu valor em dinheiro aotempo da sucessão em caso de venda do bem – art. 2.007,§ 2.º) ter retornado ao patrimônio do falecido por força daredução operada, a sucessão ficará da seguinte maneira:

– por se tratar de antecipação de legítima, João deverácolacionar as casas recebidas em 1995 e 1998 e ficará coma propriedade de ambas;

– Antonio ficará com as duas casas: aquela que ficou comseu pai ao falecer e aquela que era de João (doada em

1999), que retornou ao patrimônio do pai em razão da re-dução da doação inoficiosa.

 Assim, o patrimônio foi igualmente dividido entreJoão e Antonio.

EXEMPLO 5: José é proprietário de quatro casas deigual valor, doando todas elas para o seu filho João, sendo

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a primeira em 1995, a segunda em 1998, a terceira em1999 e a quarta em 2000. Antonio, seu outro filho, nadarecebeu.

Pergunta-se:

Houve invasão da legítima? SIM.Deve haver redução da disposição? SIM.

Por quê? Em 1995, quando José era proprietário de quatrocasas, doou uma delas, restando outras três em seu pat-rimônio, sem que tal ato caracterizasse invasão da legí-tima. Em 1998, doou a segunda casa, o que também não

causa invasão à legítima, pois o patrimônio consideradoremonta à data da primeira doação. Em 1999, quandodoou a terceira a João, houve invasão à legítima, o mesmoocorrendo em 2000, época em que o patrimônio foiexaurido.

Como fazer a redução (art. 2.007, §§ 2.º e 4.º)? A última

casa doada (em 2000) deverá retornar ao patrimônio dode cujus em espécie (a própria casa). Em razão de aindapersistir a insuficiência da legítima, também deverá retor-nar ao patrimônio a casa doada em 1999. Entretanto, seuma das casas já foi vendida, o seu valor em dinheiro, aotempo da abertura da sucessão, deverá retornar ao monte(art. 2.007, § 2.º).

Existe o dever de colacionar o bem? Depende, po-dendo incidir as seguintes variações:

NÃO. Se os títulos de doação declararem expressamenteque se trata de doação da parte disponível, não haverá ne-cessidade de proceder à colação (art. 2.005). Sendo assim,João ficará com as duas casas doadas em 1995 e 1998. Ascasas doadas em 1999 e 2000 retornarão ao patrimônio

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do pai em razão da redução e deverão ser partilhadasentre João e Antonio, na proporção de 50% para cada um.O primeiro filho receberá duas casas a título de adianta-mento da parte disponível.

SIM. Se o título foi omisso ou declarou se tratar de ante-cipação de legítima, então haverá necessidade decolacionar os bens. Nessa situação, presume-se que pelofato de ter havido antecipação de legítima não pretendeu opai fazer diferença entre os filhos. Sendo assim, as casasdoadas em 1999 e 2000 (ou os seus respectivos valores emdinheiro ao tempo da sucessão em caso de venda do bem– art. 2.007, § 2.º) deverão retornar ao patrimônio do fa-

lecido por força da redução operada, ficando a sucessão daseguinte maneira:

– por se tratar de antecipação de legítima, João deverácolacionar as casas doadas em 1995 e 1998 e ficará com apropriedade de ambas;

– Antonio ficará com as duas casas restantes anteriormentedoadas, mas que retornaram ao patrimônio do pai emrazão da redução da doação inoficiosa.

 Assim, o patrimônio foi igualmente dividido entreJoão e Antonio.

4.6 DA PARTILHA 

Com é notório, a partilha é o instituto jurídico peloqual cessam a indivisibilidade e a imobilidade da herança,uma vez que os bens são divididos entre os herdeiros do

falecido. Trata-se do momento pelo qual os herdeiros

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aguardam ansiosamente, sendo certo que a partilha temefeito declaratório e não constitutivo (VELOSO, Zeno. Co-mentários..., 2003, p. 1.870).

Em relação à matéria, também devem ser estudadasas regras previstas tanto no Código Civil (arts. 2.013 a2.022) quanto no Código de Processo Civil (arts. 1.022 a1.030). Passaremos à análise desses dispositivos.

De início, prevê o Código Civil que o herdeiro podesempre requerer a partilha, ainda que o testador o proíba,cabendo igual faculdade aos seus cessionários e credores(art. 2.013 do CC). Percebe-se que o direito à partilha con-

stitui um direito do herdeiro inafastável pela vontade dotestador.

 A partir dos ensinamentos da melhor doutrina, e peloque consta do Código Civil, podem ser apontadas três es-pécies de partilha: a amigável (ou extrajudicial), a judiciale a em vida (DINIZ, Maria Helena. Curso..., 2005, v. 6, p.

412).

4.6.1 Partilha amigável ou extrajudicial

 A partilha será amigável na hipótese em que todos osherdeiros forem capazes, fazendo-se por escritura pública,

por termo nos autos do inventário ou por escrito particu-lar, homologado pelo juiz (arts. 2.015 do CC e 1.029 doCPC). Nesse caso, não há qualquer conflito entre osherdeiros.

 A Lei 11.411, de 4 de janeiro de 2007 que instituiu o in- ventário extrajudicial, conforme dito anteriormente, alter-ou a redação do art. 1.031 do CPC para fins de adequaçãoda remissão legislativa. Isso porque o CPC fazia remissão

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ao art. 1.773 do Código Civil de 1916 e, com a alteração, aremissão agora é feita ao art. 2.015 do Código Civil de2002. Frise-se que não há alteração de conteúdo e, assim,tal mudança não produz qualquer feito prático. Aliás, apartir dessa constatação, conforme mensagem eletrônica

enviada por Euclides de Oliveira aos autores desta obra,em 19 de janeiro de 2007, pode-se dizer que o inventárioextrajudicial feito por escritura pública não necessita deposterior homologação judicial.

Explica o mestre Euclides de Oliveira que “com efeito,o art. 1.º da Lei 11.441, ao dar nova redação ao art. 982 do

CPC, contém duas disposições separadas por ponto e vír-gula: primeiro, mantém o inventário judicial, ‘havendotestamento ou interessado incapaz’; depois, abre exceçãopara a hipótese de serem todos ‘capazes e concordes’, pro-clamando que poderão fazer o inventário e a partilha porescritura pública, ‘a qual constituirá título hábil para o re-gistro imobiliário’. Nada fala sobre homologação judicial.

Sucede que o art. 2.º da nova lei, ao modificar o art. 1.031do CPC, que cuida do arrolamento sumário, diz que apartilha amigável, celebrada por partes capazes, nos ter-mos do art. 2.105 do CC, será ‘homologada de plano pelo juiz’. Então, nesses termos, seria necessária a homo-logação de todas as partilhas amigáveis celebradas por

pessoas capazes e concordes? Não. O art. 1.031 do CPCprecisava ser reparado, e por isso a nova redação, masapenas para substituir a antiga referência ao art. 1.773 doCC revogado, pondo, em seu lugar, o art. 2.015 do atualCC, que cuida da partilha amigável”.

 Vai além Euclides de Oliveira: “O procedimento judi-cial, para tais casos, permanece mas fica reservado aos

casos de exigência dessa via, quando haja testamento, ou

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quando as partes optem pela abertura do inventário emJuízo. Por outras palavras, mantém-se o art. 1.031 do CPC,com arrolamento sumário pela via judicial, mas só para ashipóteses em que seja necessária essa forma procediment-al ou que essa seja escolhida pelas partes. Nos outros

casos, quando não haja testamento e as partes maiores ecapazes optem pela via administrativa, será bastante a es-critura pública, como título hábil para o registroimobiliário, nos precisos termos da nova redação dadapelo art. 1.º da nova lei ao art. 982 do CPC. Não fosse as-sim, teríamos retornado à estaca zero do sistema legal an-terior que sempre admitiu partilhas amigáveis por es-critura pública nos inventários e arrolamentos sob homo-logação judicial. E a lei, nessa absurda situação, somenteteria inovado com relação aos processos de separação e di- vórcio consensuais, fazendo   tabula rasa  da extensão aoinventário e partilha, constante da própria ementa que ex-plicita o objetivo da norma inovadora. Anoto que os

notários já estão praticando escrituras de inventário epartilha com plenos efeitos, independente de homologação judicial, e sem maiores questionamentos a esse respeito.”

Como o objetivo da Lei 11.441/2007 foi a celeridade,diminuindo a burocracia, deve-se concordar plenamentecom as palavras de Euclides de Oliveira.

4.6.2 Partilha judicial

Essa espécie de partilha é obrigatória para os casos emque há divergência entre os herdeiros ou quando algumdeles for incapaz (art. 2.016 do CC). O CPC traz procedi-mentos específicos. Vejamos tais regras.

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De início, dispõe o art. 1.022 do CPC que separados os bens para pagamento dos credores para a respectiva praçaou leilão, o juiz facultará às partes que, no prazo comumde dez dias, formulem o pedido de quinhão.

Em seguida o juiz proferirá, também no prazo de dezdias, o despacho de deliberação da partilha, resolvendo ospedidos das partes e designando os bens que devem con-stituir quinhão de cada herdeiro e legatário.

Nos termos do art. 1.023 do CPC, o partidor – denom-inação dada ao agente do órgão do Poder Judiciário re-sponsável pela organização da partilha – fará o esboço da

partilha de acordo com a decisão, observando nos paga-mentos a seguinte ordem: 1.º) dívidas atendidas; 2.º)meação do cônjuge; 3.º) meação disponível; 4.º) quinhõeshereditários, a começar pelo coerdeiro mais velho. Feito oesboço, dirão sobre ele as partes no prazo comum de cincodias. Resolvidas as reclamações, será a partilha lançadanos autos (art. 1.024 do CPC).

Enuncia o art. 1.025 do CPC que da partilha constará:

I) Um auto de orçamento, que mencionará:  a) os nomes doautor da herança, do inventariante, do cônjuge supérstite,dos herdeiros, dos legatários e dos credores admitidos; b)o ativo, o passivo e o líquido partível, com as necessárias

especificações; c) o valor de cada quinhão.II) De uma folha de pagamento para cada parte, declarando

a quota a pagar-lhe, a razão do pagamento, a relação dos bens que lhe compõem o quinhão, as características queos individualizam e os ônus que os gravam.

O auto e cada uma das folhas serão assinados pelo juiz

e pelo escrivão (art. 1.025, parágrafo único, do CPC). Pago

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o imposto de transmissão a título de morte e juntada aosautos a certidão ou a informação negativa de dívida paracom a Fazenda Pública, o juiz julgará por sentença apartilha (art. 1.026 do CPC). Trata-se da sentença homo-logatória da partilha, que é passível de recurso de

apelação.Passada em julgado essa sentença, receberá o herdeiro

os bens que lhe tocarem e um   formal de partilha, queserve de prova da divisão dos bens, do qual constarão asseguintes peças, nos termos do art. 1.027 do CPC: I) termode inventariante e título de herdeiros; II) avaliação dos

 bens que constituíram o quinhão do herdeiro; III) paga-mento do quinhão hereditário; IV – quitação dos impos-tos; V – sentença. Vale dizer que o formal de partilha éfundamental para o registro da aquisição da propriedadeimóvel, visando prová-la.

Se for o caso, o formal de partilha poderá ser sub-stituído por certidão do pagamento do quinhão hered-itário, quando este não exceder cinco vezes o salário-mín-imo vigente, na sede do juízo (art. 1.027, parágrafo único,do CPC). Nesse caso, se transcreverá na certidão a sen-tença de partilha transitada em julgado.

 Ainda depois de passar em julgado a sentença homo-logatória, a partilha poderá ser emendada nos mesmos

autos do inventário, convindo todas as partes, quandotenha havido erro de fato na descrição dos bens (art. 1.028do CPC). Sem prejuízo disso, preconiza o mesmo comandolegal que o juiz, de ofício ou a requerimento da parte,poderá, a qualquer tempo, corrigir-lhe as inexatidõesmateriais.

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4.6.3 Partilha em vida

Constitui a forma de partilha feita por ascendente adescendentes, por ato   inter vivos  ou de última vontade,abrangendo os seus bens de forma total ou parcial, desde

que respeitados os parâmetros legais, caso da reserva dalegítima (art. 2.018 do CC); bem como o mínimo para queo estipulante viva com dignidade –   estatuto jurídico do patrimônio mínimo, que pode ser retirado, por exemplo,do art. 548 do CC.

Nesse sentido, também, pode o testador indicar os

 bens e valores que devem compor os quinhões hereditári-os (art. 2.014 do CC). Mais especificamente, determina taldispositivo que pode o testador deliberar o procedimentoda partilha, que prevalecerá, salvo se o valor dos bens nãocorresponder às quotas estabelecidas. Segundo MariaHelena Diniz, essa forma de partilha facilita a fase de li-quidação do inventário no processo de partilha,

“homologando-se a vontade do testador que propôs umadivisão legal e razoável” (Curso..., 2005, v. 6, p. 415).

Como bem explica Zeno Veloso, a partilha em vidapode se realizar de duas maneiras. A primeira equivale auma doação, e a divisão dos bens entre os herdeiros temefeito imediato, antecipando o que estes iriam receber

somente após a morte do ascendente (partilha-doação). A segunda é a partilha-testamento, feita no ato   mortiscausa, que só produz efeitos com a morte do ascendente edeve seguir a forma de testamento (Comentários..., 2003,p. 437).

Superada a análise dessa relevante classificação, bemcomo dos seus respectivos procedimentos, o art. 2.017 doCC traz uma importante recomendação para todas as

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espécies de partilha, ao prever que, “no partilhar os bens,observar-se-á, quanto ao seu valor, natureza e qualidade, amaior igualdade possível”. Trata-se do   princípio daigualdade da partilha, regramento importantíssimo parao instituto em estudo.

Também no tocante aos procedimentos de todas as es-pécies de partilha, os bens insuscetíveis de divisão cô-moda, que não couberem na meação do cônjuge sobre- vivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor apurado, a não serque haja acordo para serem adjudicados a todos (art.

2.019, caput , do CC).Contudo, não se fará a venda judicial se o cônjuge

sobrevivente ou um ou mais herdeiros requererem lhesseja adjudicado o bem, reembolsando aos outros, em din-heiro, a diferença, após avaliação atualizada (art. 2.019, §1.º, do CC). Se a adjudicação for requerida por mais de umherdeiro, observar-se-á o processo da licitação, e aqueleque pagar o melhor preço ficará com o bem disputado (art.2.019, § 2.º, do CC).

Os herdeiros em posse dos bens da herança, o cônjugesobrevivente e o inventariante são obrigados a trazer aoacervo os frutos que perceberam desde a abertura da su-cessão (art. 2.020 do CC). Como os frutos são bens

acessórios, por óbvio seguem o principal, compondo oacervo hereditário. Todavia, os herdeiros que estão comtais bens têm direito ao reembolso das despesas necessári-as e úteis que fizeram, e respondem pelo dano a que, pordolo ou culpa, deram causa. Como se vê, o tratamento ésemelhante ao   possuidor de boa-fé, constante dos arts.

1.219 e 1.217 do CC, respectivamente.

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Se parte da herança consistir em bens remotos dolugar do inventário, litigiosos, ou de liquidação morosa oudifícil, poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dosoutros, sobre os quais não paira a dificuldade de partilhaou a litigiosidade (art. 2.021 do CC). Nesse caso, deve-se

reservar aqueles bens para uma ou mais  sobrepartilhas,sob a guarda e a administração do mesmo ou de diversoinventariante, e consentimento da maioria dos herdeiros.

Por fim, preconiza o Código Civil em vigor que tam- bém ficam sujeitos à sobrepartilha os bens sonegados equaisquer outros bens da herança de que se tiver ciência

após a partilha (art. 2.022 do CC). Somente para lembrar,a sobrepartilha importa em uma nova partilha de bens,devendo ser observados os procedimentos de acordo comas espécies já comentadas.

4.7 DA GARANTIA DOS QUINHÕESHEREDITÁRIOS. A RESPONSABILIDADE PELA EVICÇÃO

Julgada a partilha no processo de inventário, cada umdos herdeiros terá direito aos bens correspondentes ao seuquinhão. Essa é a regra do art. 2.023 do CC, que traz comoconteúdo a cessação do caráter imóvel e indivisível da her-ança, bem como o outrora citado caráter declaratório dapartilha.

Como efeito dessa declaração, os coerdeiros são recip-rocamente obrigados a indenizar-se no caso de   evicção

dos bens aquinhoados (art. 2.024 do CC). A garantia

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quanto à evicção é a única prevista em relação à partilha,não havendo tratamento quanto aos vícios redibitórios,como acontece com relação aos contratos comutativos.

Como é notório, a evicção constitui a perda de umacoisa em virtude de uma decisão judicial ou de ato admin-istrativo que a atribui a terceiro (arts. 447 a 457 do CC). Assim, também quando da partilha há uma garantia legalem relação à evicção. A norma do art. 2.024 do CC se justi-fica, pois a regra da responsabilidade e dos efeitos refer-entes à evicção são contratuais e, como se sabe, os insti-tutos de direito sucessório não recebem o mesmo trata-

mento que os contratos.Mas, eventualmente, cessa essa obrigação mútua, hav-

endo convenção em contrário (art. 2.025 do CC). Nessesentido, entendemos que são aplicáveis à partilha todas asregras referentes à evicção previstas na teoria geral doscontratos em seus arts. 447 a 457 do CC (confira-se o Volume 3 da presente coleção, Capítulo 5).

Pelo mesmo dispositivo, cessa a garantia legal quantoà evicção e a responsabilidade dos demais herdeiros, se aperda ocorrer por culpa do evicto, ou por fato posterior àpartilha. Em resumo, como se pode perceber, três são oscasos em que não haverá mais a responsabilidade recíp-roca pela evicção:

a) havendo acordo entre as partes sobre exclusão dessaresponsabilidade;

 b) se a perda se der por culpa exclusiva de um dos herdeiros,não respondendo os demais;

c) se a perda da coisa se der por fato posterior à partilha,

como é o caso de extravio da coisa ou usucapião.

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Por fim, dispõe o art. 2.026 do CC que o evicto será in-denizado pelos coerdeiros na proporção de suas quotashereditárias. Mas, se algum dos herdeiros se achar insolv-ente, responderão os demais na mesma proporção pelasua parte, menos a quota que corresponderia ao

indenizado.

4.8 DA ANULAÇÃO, DA RESCISÃO E DA NULIDADE DA PARTILHA 

 A encerrar o livro sucessório, o Código Civil trata daanulação da partilha em um único dispositivo. Prevê o art.2.027, caput , do CC que: “A partilha, uma vez feita e jul-gada, só é anulável pelos vícios e defeitos que invalidam,em geral, os negócios jurídicos”. Faz o mesmo, em parte, oart. 1.029,   caput , do CPC, segundo o qual: “A partilhaamigável, lavrada em instrumento público, reduzida a

termo nos autos do inventário ou constante de escrito par-ticular homologado pelo juiz, pode ser anulada, por dolo,coação, erro essencial ou intervenção de incapaz”.

Desse modo, a partilha só é anulável nos casos previs-tos no art. 171 do CC, que trata das causas da anulabilid-ade do negócio jurídico, quais sejam a presença de incapa-

cidade relativa do agente, o erro, o dolo, a coação, a lesão,o estado de perigo e a fraude contra credores.

Consigne-se que o estado de perigo e a lesão não con-stam do CPC, pois a lei processual é anterior ao CódigoCivil de 2002, que introduziu essas duas novas formas de vícios do negócio jurídico. De qualquer forma, enten-

demos que é possível anular a partilha pela presença

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desses vícios, desde que estes ocorram na vigência do atu-al Código Civil, o que é aplicação do art. 2.035,  caput , doCC. Em relação à fraude contra credores, compreendemosque esta pode gerar a anulação da partilha que não sejaamigável.

Quanto aos procedimentos, o parágrafo único do art.2.027 do CC consagra prazo decadencial de um ano paraanular a partilha. Como se vê, o dispositivo não trata doinício da contagem do prazo, o que é elucidado pelo pará-grafo único do art. 1.029 do CPC, pelo qual se decai dodireito de propor ação anulatória de partilha amigável, em

um ano, contado este prazo:

– no caso de coação, do dia em que ela cessou;

– no de erro ou dolo do dia em que se realizou o ato;

– quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade.

Não utilizaremos a expressão prevista no dispositivodo Código de Processo Civil “prescreve”, pois de acordocom o Código Civil e o critério científico de Agnelo Amor-im filho, o prazo em estudo tem clara natureza decaden-cial, eis que a tutela pretendida é desconstitutiva dapartilha.

Por uma proximidade legal, entendemos que essa con-

tagem também deve ser aplicada à partilha não amigável,por analogia (art. 4.º da Lei de Introdução).

Do mesmo modo, aqui a lei silencia quanto ao estadode perigo e à lesão, situações que até podem ser raras, masnão impossíveis. Quanto à possibilidade de lesão, aliás,adverte Silvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., v. 7, p.

399). Nesses casos, o aplicador do direito deve procurar

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socorro em uma regra analógica, ou seja, aplicada nahipótese semelhante. Assim, aplicando-se o art. 1.029 doCPC, o prazo a ser considerado é de natureza decadencial eé de um ano, contado da data em que se realizou o ato(partilha).

 Além dos casos de anulação da partilha analisados, oart. 1.030 do CPC trata da rescisão da partilha julgada porsentença, por motivo posterior, a saber:

I – nos casos de anulação da partilha;

II – se feita com preterição de formalidades legais;

III – se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja.

Relativamente ao prazo para essa rescisão, a doutrinaé unânime em apontar a aplicação do prazo decadencial dedois anos previsto para o ajuizamento de ação rescisória(art. 485 e ss. do CPC), contados do trânsito em julgado dahomologação da partilha.

É interessante perceber que a lei silencia quanto à nul-idade da partilha. Por óbvio, aqui devem ser aplicadas asregras de nulidade do negócio jurídico, previstas nos arts.166 e 167 do CC. Nesse sentido concluem Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil..., v. 7, p. 400), Maria Helena Diniz(Curso..., v. 6, p. 421) e Zeno Veloso (Comentários...,

2003, p. 443). Como os casos de nulidade absoluta nãoconvalescem com o tempo (art. 169 do CC), entendemosque a ação de nulidade não está sujeita a prescrição oudecadência.

Em relação ao último doutrinador, prefaciador destaobra, é sempre citado o seu convencimento de que, inde-

pendentemente da forma como foi feita a partilha, se

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amigável ou judicial, havendo exclusão do herdeiro, ahipótese é de nulidade absoluta, “e o herdeiro prejudicadonão fica adstrito à ação de anulação nem à rescisória, eseus respectivos prazos de decadência, podendo utilizar daquerela nullitatis, da ação de nulidade ou de petição de

herança, existindo decisões do STF (RE 97.546-2) e doSTJ (REsp 45.693-2) que afirmam estar sujeita a prazo deprescrição longi temporis, de vinte anos, devendo ser ob-servado que, por este Código, o prazo máximo de pre-scrição é de dez anos (art. 205)” (VELOSO, Zeno.   Co-mentários..., 2003, p. 443).

 A única ressalva que deve ser feita é que o jurista, aolado de outros e do entendimento majoritário, defende aaplicação da regra geral dos prazos de prescrição, queantes era de vinte anos (art. 177 do CC/1916) e agora dedez anos (art. 205 do CC/2002). Como já dissemos, paranós não há prazo para requerer a nulidade absoluta dapartilha, até porque a questão é de ordem pública.

4.9 DOS PEDIDOS DE ALVARÁS EMINVENTÁRIO

 Além de todos os procedimentos analisados neste

capítulo, é possível que, no inventário ou no arrolamento,constem pedidos de alvarás por parte dos herdeiros.Quanto ao tema, ensinam Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim que a expressão alvará tem o sentido de autoriz-ação, “por ser uma faculdade ou permissão ao interessado,sem obrigá-lo à utilização do instrumento. No campo dosinventários e arrolamentos, várias são as espécies de al- varás, conforme sejam requeridos nos autos do processo,

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ou em peças autônomas” ( Inventários e partilhas..., p.480). Aqui iremos demonstrar algumas formas de autoriz-ação que interessam à prática, seguindo o roteiro trilhadopela ótima obra dos doutrinadores paulistas.

 A forma mais comum de alvará é aquela denominadaalvará incidental , “que será juntado aos autos, independ-entemente de distribuição, ensejando decisão inter-locutória. As hipóteses mais comuns são de levantamentode depósitos, alienação, recebimento ou permuta de bens,outorga de escrituras, aplicação de numerários etc.”(AMORIM, Sebastião e OLIVEIRA, Euclides. Inventários

e partilhas..., p. 481). Em relação aos procedimentos, lem- bram os juristas citados que deverá a Fazenda manifestar-se, bem como o Ministério Público, quando houver in-teresses de incapazes ou ausentes. Após, essa manifest-ação, decidirá o juiz. Como essa decisão é interlocutória,estará sujeita a recurso de agravo.

 Ainda é possível o alvará em apenso na hipótese emque os pedidos são formulados por terceiros, que não osherdeiros, sendo o caso mais comum o de pedido deoutorga de escritura definitiva de imóvel, conforme jul-gado a seguir:

“Apelação Cível. Pedido de Alvará em Inventário para

outorga de escritura definitiva de compra e venda a ces-sionários. Deferido o alvará para outorga de escritura aocomprador. Recurso provido” (TJSP, Apelação Cível383.175-4/7-São Paulo, 5.ª Câmara de Direito Privado, Rel.

 A. C. Mathias Coltro, j. 1.º.06.2005, v.u.).

Nesse caso, além da manifestação da Fazenda e doMinistério Público, eventualmente deverão se manifestaros herdeiros do falecido, bem como o inventariante. Em

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havendo discordância ou divergência, o juiz do inventáriopode determinar a instrução probatória. Decidindo o juiz,sua sentença estará sujeita a recurso de apelação.

Com outra categoria importante, há o  alvará inde- pendente  ou  autônomo, naqueles casos em que os bensdeixados não necessitam de um processo de inventário oude arrolamento. Como exposto, o art. 1.037 do CPC ex-pressa prevê que independerá de inventário ou arrola-mento o pagamento dos valores previstos na Lei 6.858/1980. Tais valores são aqueles que dependentes e su-cessores deveriam ter recebido quando era vivo o falecido.

 A título de exemplo, podemos citar valores devidos aempregados do   de cujus, levantamento de valores doFGTS, restituições de impostos de renda e levantamentosde saldos em contas bancárias, particularmente nos casosem que o pedido é formulado por pessoa que não seja de- pendente do falecido. Em relação ao procedimento, é ele bem simples, com pedido dirigido ao juiz do inventário,

instruído com a devida prova documental, citando-se osherdeiros e a Fazenda Pública. O Ministério Público, maisuma vez, somente intervém nos caos envolvendo in-capazes ou ausentes.

Por fim, em algumas situações, dispensa-se até o pe-dido de alvará. É o caso de pedido formulado por quem é

dependente do falecido, quanto ao levantamento de saldode salários, FGTS, PIS/PASEP, saldos em bancos, restitu-ição de tributos e seguro de vida. Nesses casos, cabe apen-as um pedido administrativo perante a entidade pagadoraou depositária, sem a necessidade de intervenção judicial.

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4.10 RESUMO ESQUEMÁTICO

Esquema do procedimento do inventário judicial

(arts. 982 a 1.021 do CPC)

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Fonte: Inventários e Partilhas. Euclides de Oliveira e   Se-bastião Amorim. 18. ed. São Paulo: Leud, 2004 p. 386.

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4.11 QUESTÕES CORRELATAS

1. (MP/MG – 2011) Quanto ao Direito das Su-cessões, é INCORRETO afirmar:

(A) Os herdeiros capazes, bem como os incapazes,mediante representação por instrumento público,poderão fazer partilha amigável, por escriturapública, termo nos autos do inventário, ou escritoparticular, homologado pelo juiz.

(B) Os herdeiros em posse dos bens da herança, ocônjuge sobrevivente e o inventariante são obri-gados a trazer ao acervo os frutos que perce-beram, desde a abertura da sucessão; têm direitoao reembolso das despesas necessárias e úteisque fizeram, e respondem pelo dano a que, pordolo ou culpa, deram causa.

(C) Ficam sujeitos a sobrepartilha os bens sonegadose quaisquer outros bens da herança de que setiver ciência após a partilha.

(D) A partilha, uma vez feita e julgada, só é anulávelpelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, osnegócios jurídicos.

2. (MP/MG XLIV – 2004) Assinale a alternativaINCORRETA.

(A) A lei não ilide a presunção legal da paternidadepelo simples fato de ter a mãe praticado e confes-sado o adultério na constância do casamento;

(B) é defesa a condição puramente potestativa queobsta o negócio jurídico de todo efeito, mas sãopermitidas as condições que coadunam com a or-dem jurídica;

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(C) o inventário, que será sempre judicial, deve serrequerido pelos herdeiros no prazo de 30 (trinta)dias e ultimando-o dentro de 1 (um) ano, salvoprorrogação por justa causa;

(D) são bens particulares os vencimentos dos fun-

cionários públicos, embora casados no regime decomunhão universal, sendo, portanto,incomunicáveis;

(E) considera-se válida a emancipação voluntáriaconcedida pelos pais, mediante escritura pública,sem homologação do Juiz e oitiva do MinistérioPúblico (MP).

3. (MP/MG XLIV – 2004) Das alternativas abaixo:

I – A sentença proferida em ação de sonegados, movidapor um único herdeiro, aproveita aos credores dosdemais herdeiros;

II – não está sujeita ao Código de Defesa do Consum-

idor (CDC) a empresa pública que presta serviços àpopulação, aplicando-se a ela a legislação própria;

III – pode ser excluído por indignidade o legatário quedifama o testador três (3) anos após sua morte econcluído o inventário com partilha de bens;

IV – verificando o Ministério Público que o pai alienabens do filho, dilapidando seu patrimônio, poderá ad-

otar medida que lhe pareça reclamada pela segur-ança do menor e requerer em juízo a suspensão dopoder familiar;

V – pode o consumidor requerer ao Ministério Públicoque ajuíze a competente ação para ser declarada anulidade de cláusula contratual que contrarie o CDC,não assegurando o justo equilíbrio entre direitos e

obrigações das partes.

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Estão CORRETAS:

(A) somente I, II e V.

(B) somente II, IV e V.

(C) somente II, III e IV.

(D) somente I, III e IV.(E) somente I, III e V.

4. (MP/ES – 2004) Assinale a alternativa correta:

(A) O imposto sobre doação de bens móveis, títulos ecréditos, compete ao Estado onde se processar o

inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio odoador, ou ao Distrito Federal.

(B) O vigente Sistema Tributário Nacional define o IPIcomo um imposto obrigatoriamente não cumulat-ivo e seletivo, enquanto para o ICMS a adoção danão cumulatividade e da seletividade foi deixada acritério do legislador estadual.

(C) O imposto provisório sobre a movimentação fin-anceira (IPMF) e a contribuição provisória sobre amovimentação financeira (CPMF) foram instituídospelo exercício da competência tributária residualda União Federal.

(D) As contribuições para a manutenção da segurid-ade social são tributos não cumulativos.

(E) O ISS, de competência dos Municípios e do Dis-trito federal, em razão de sua natureza de tributoindireto, é um imposto tipicamente nãocumulativo.

5. (Juiz de Direito TJSP – 179º) Assinale a afirm-ação incorreta.

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(A) Compete ao inventariante dativo ajuizar açõesem nome do espólio e defendê-lo nas ações queforem propostas em face dele.

(B) No inventário, não havendo concordância de to-das as partes sobre pedido de pagamento feito

por credor do espólio, será ele remetido para osmeios ordinários.

(C) No inventário, a partilha, depois de transitada em julgado, poderá ser emendada nos mesmos autospara corrigir erro de fato na descrição dos bens,desde que concordes todas as partes.

(D) Reservados bens para garantir os direitos de her-deiro excluído, a medida perderá eficácia se elenão propuser a ação ordinária que lhe competirno prazo de trinta dias contados da intimação dadecisão que não o admitir no inventário.

6. (MP/PR 2009) A propósito da sucessão, pode-seafirmar:

(A) A partilha por instrumento particular, uma vez fir-mada pelos herdeiros e homologada judicial-mente, é anulável pelos vícios e defeitos que con-duzem à anulabilidade dos atos jurídicos, respeit-ado, porém, o prazo decadencial de 01 (um) ano.

(B) O direito de representação dá-se na linha reta

descendente, não sendo outorgado em favor deascendente; na linha transversal não há direito derepresentação, mesmo em favor dos filhos deirmãos do falecido, quando com irmãos destevierem a concorrer.

(C) É nula de pleno direito qualquer disposição testa-mentária que se revista de caráter não

patrimonial.

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(D) A cláusula de inalienabilidade, instituída em test-amento, poderá recair sobre os bens da legítima,a critério do testador, independentemente da ex-istência de justa causa.

(E) n.d.a.

7. (87.º MP/SP – 2010) Assinale a alternativacorreta:

(A) a abertura da sucessão ocorre com a distribuiçãodo inventário dos bens deixados pelo “de cujus”.

(B) realizada a partilha dos bens do falecido e hav-endo ainda dívidas, os herdeiros por elas respon-dem integralmente.

(C) JOSÉ veio a falecer em decorrência de acidentede trânsito, sendo que seu irmão JOÃO, tambémvítima do mesmo acidente, sobreviveu por algunsdias, vindo a falecer. JOSÉ não possuía ascend-entes, descendentes, cônjuge ou companheira,

mas tão somente outros três irmãos. Aberta a su-cessão e realizada a partilha, coube 1/4 (umquarto) dos bens por ele deixados a cada um dosirmãos.

(D) aquele que pretender estabelecer disposições es-peciais sobre o seu enterro deverá fazê-lo, neces-sariamente, por meio de testamento público, cer-

rado ou particular.(E) o direito de representação, segundo estabelece oCódigo Civil, dá-se na linha ascendente e des-cendente, assim como na linha transversal, masneste caso somente em favor dos filhos de irmãosdo falecido.

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GABARITO

1 – A 2 – C

3 – E 4 – A

5 – A 6 – A

7 – C

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