direito das sucessões(t)

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Direito das Sucessões 4.º Ano Direito das Sucessões Objecto do direito das sucessões – Constitui objecto fundamental deste ramo de Direito o destino dos bens de uma pessoa que morreu. Esta ideia, que se infere da noção de sucessão constante do artigo 2024.º, pode ser desenvolvida à luz deste mesmo preceito. Trata-se de apurar quem vai ser chamado para lhe serem atribuídos ( devolvidos, na letra da lei ) os bens que pertenciam ao falecido. Trata-se de um sistema normativo em que se dá um sub ingresso aos bens do “de cuius . O Direito das Sucessões está enquadrado no Direito Civil, sendo um sub ramo de Direito Privado. Artigo 2133.º - Classes de sucessíveis. Modalidades de Sucessão: Sucessão legítima – O fundamento da sucessão legítima tem de ser analisado... Sucessão legitimária ( artigos 2156.º e ss. ) – Trata-se de uma sucessão a favor da família, limitada à família nuclear: cônjuge, descendentes e ascendentes, por a função familiar do património ser, quanto a eles, mais nítida. Para assegurar a função específica que domina a sucessão legitimária, é reservada a tais sucessíveis uma parte dos bens do falecido – legítima, quota legitimária ou quota indisponível ( artigo 2156.º ) –, sobre a qual não pode ele exercer a sua liberdade de disposição mortis causa e, mesmo, quanto a negócios gratuitos, dentro de certos limites, a de disposição inter vivos. Sucessão testamentária ( artigos 2179.º e ss. ) – A sucessão testamentária representa a via através da qual se manifesta significativamente a liberdade de o autor da sucessão dispor dos seus bens, por ser muito limitado o papel reservado à outra modalidade de negócios mortis causa, que são os pactos sucessórios. Sucessão contratual artigo 2028.º - remissão para o 1700.º - existência de pactos sucessórios. 8. Caracterização do sistema sucessório português. Fenómeno sucessório. 3 Sistemas típicos distintos: Sistema capitalista – assenta em dois grandes princípios: o do reconhecimento pleno da propriedade privada da generalidade dos bens e o da autonomia privada. A partir desta base consagra-se uma ampla transmissibilidade dos bens individualmente apropriados, nomeadamente mortis causa. Sistema familiar – por seu turno, o sistema familiar tem na actualidade menos relevância pois assenta na ideia de um património familiar, afecto aos interesses de certo grupo, a quem está atribuída a sua propriedade. Sistema socialista o sistema socialista é dominado por um diferente regime de apropriação dos bens, dominando nele um sistema de propriedade colectiva, a que se contrapõe a chamada propriedade pessoal, limitada a certas categorias de bens, mais ligados às necessidades do seu titular. O sistema socialista desconhece qualquer desigualdade de tratamento da família legítima e ilegítima. Em Portugal temos um sistema misto – familiar / capitalista. 1

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Direito das Sucessões

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Page 1: Direito Das Sucessões(t)

Direito das Sucessões 4.º Ano

Direito das Sucessões

Objecto do direito das sucessões – Constitui objecto fundamental deste ramo de Direito o destino dos bens de uma pessoa que morreu.

Esta ideia, que se infere da noção de sucessão constante do artigo 2024.º, pode ser desenvolvida à luz deste mesmo preceito. Trata-se de apurar quem vai ser chamado para lhe serem atribuídos ( devolvidos, na letra da lei ) os bens que pertenciam ao falecido.

Trata-se de um sistema normativo em que se dá um sub ingresso aos bens do “de cuius ”.

O Direito das Sucessões está enquadrado no Direito Civil, sendo um sub ramo de Direito Privado.

Artigo 2133.º - Classes de sucessíveis.

Modalidades de Sucessão:

Sucessão legítima – O fundamento da sucessão legítima tem de ser analisado...

Sucessão legitimária ( artigos 2156.º e ss. ) – Trata-se de uma sucessão a favor da família, limitada à família nuclear: cônjuge, descendentes e ascendentes, por a função familiar do património ser, quanto a eles, mais nítida.

Para assegurar a função específica que domina a sucessão legitimária, é reservada a tais sucessíveis uma parte dos bens do falecido – legítima, quota legitimária ou quota indisponível ( artigo 2156.º ) –, sobre a qual não pode ele exercer a sua liberdade de disposição mortis causa e, mesmo, quanto a negócios gratuitos, dentro de certos limites, a de disposição inter vivos.

Sucessão testamentária ( artigos 2179.º e ss. ) – A sucessão testamentária representa a via através da qual se manifesta significativamente a liberdade de o autor da sucessão dispor dos seus bens, por ser muito limitado o papel reservado à outra modalidade de negócios mortis causa, que são os pactos sucessórios.

Sucessão contratual – artigo 2028.º - remissão para o 1700.º - existência de pactos sucessórios.

8. Caracterização do sistema sucessório português.

Fenómeno sucessório.

3 Sistemas típicos distintos:

Sistema capitalista – assenta em dois grandes princípios: o do reconhecimento pleno da propriedade privada da generalidade dos bens e o da autonomia privada.

A partir desta base consagra-se uma ampla transmissibilidade dos bens individualmente apropriados, nomeadamente mortis causa.

Sistema familiar – por seu turno, o sistema familiar tem na actualidade menos relevância pois assenta na ideia de um património familiar, afecto aos interesses de certo grupo, a quem está atribuída a sua propriedade.

Sistema socialista – o sistema socialista é dominado por um diferente regime de apropriação dos bens, dominando nele um sistema de propriedade colectiva, a que se contrapõe a chamada propriedade pessoal, limitada a certas categorias de bens, mais ligados às necessidades do seu titular.

O sistema socialista desconhece qualquer desigualdade de tratamento da família legítima e ilegítima.

Em Portugal temos um sistema misto – familiar / capitalista.

9. Fontes do Direito das Sucessões:

A fonte mais relevante é o Código Civil.Neste diploma legal, por obediência à sistematização germânica que a ele preside, o regime da sucessão é objecto de um

livro próprio – o Livro V, que começa no artigo 2024.º.

11. Aplicação do Direito das Sucessões no tempo.

Artigo 2031.º - Momento e lugar.

Artigo 2050.º - Aceitação da herança – efeitos.

Artigo 2062.º - Repúdio da Herança – efeitos

Se houver dúvidas aplica-se o n.º 2, 1.ª parte do artigo 12.º do Código Civil.

12. Aplicação do Direito das Sucessões no espaço.

A matéria contém-se no Título I da Parte Geral do Código Civil, nos artigos 14.º e seguintes. Em particular, ao Direito das Sucessões cabem os artigos 62.º a 65.º.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

A chamada lei da sucessão, que rege, em geral o fenómeno sucessório, é a lei pessoal do autor da sucessão, no momento da sua morte.

Assim dispõe o artigo 62.º, apurando-se da sua conjugação com o artigo 31.º n.º 1 que, em regra, se considera como pessoal a lei da nacionalidade da pessoa, in casu, do autor da sucessão.

Noção de Sucessão.

14. Diversos sentidos de sucessão.

A palavra sucessão não é unívoca na sua significação em Direito para o efeito que nos ocupa, interessa distinguir um sentido amplo e outro estrito.

Numa distinção sumária, sucessão lato sensu significa o mesmo que transmissão, qualquer que seja a sua modalidade. Em sentido estrito ( stricto sensu ), sucessão identifica a transmissão ( ou aquisição ) mortis causa.

Uma das mais relevantes distinções a estabelecer no conceito amplo de sucessão reparte-a em sucessão inter vivos e mortis causa.

17. Noção legal de sucessão.

Segundo o artigo 2024.º, sucessão é « o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a esta pertenciam».

Poucos autores defendem esta definição legal.

Âmbito da Sucessão

18. Noção de âmbito da sucessão.

Por âmbito da sucessão entende-se o seu objecto, isto é, os direitos e vinculações que podem ser adquiridos pelos sucessores.

Em rigor, o que está em causa é apurar se esses direitos e vinculações se extinguem com a morte de quem deles era titular ou de quem a eles estava adstrito ou se subsistem para além dela, podendo ser adquiridos pelos seus sucessores.

19. Direitos patrimoniais intransmissíveis.

A intransmissibilidade pode ser absoluta se disser respeito tanto a actos inter vivos como aos actos mortis causa ou, por outro lado relativa se, se dirigir a apenas uma das modalidades.

Exemplo clássico da situação de intransmissibilidade absoluta de direitos patrimoniais é o dos direitos reais de uso e de habitação ( artigos 1485.º e 1488.º ).

Verificam-se, porém excepções que respeitam apenas a uma das referidas modalidades de transmissão. Assim, há direitos patrimoniais que admitem transmissão por acto inter vivos, mas não mortis causa. Exemplo deste regime encontra-se no usufruto ( artigos 1444.º, 1443.º e 1476.º n.º 1 alínea a) ).

Mas há também direitos cuja transmissão por negócio inter vivos é significativamente restringida, como sucede no arrendamento para habitação ( artigos 64.º n.º 1 alínea f) e 84.º do RAU ), mas admitem transmissão por morte, embora sujeita a regime especial ( artigo 85.º e seguintes do RAU ).

20. Direitos não patrimoniais transmissíveis.

A regra da intransmissibilidade dos direitos não patrimoniais, correntemente identificados (hoc sensu) como pessoais, à semelhança da transmissibilidade dos patrimoniais, assume, normalmente, carácter absoluto. Não é, consequentemente, admitida a sua transmissão, quer por actos inter vivos quer mortis causa.

Mas também aqui há excepções, que permitem identificar casos de transmissibilidade relativa, por morte.

Temos então o direito potestativo de invalidação de um negócio jurídico (seja por nulidade, seja por anulabilidade), que, em si mesmo, não tem conteúdo patrimonial, não admite transmissão por acto inter vivos, mas é transmissível mortis causa, como o artigo 125.º n.º 1 alínea c) sobejamente ilustra.

Regime semelhante seguem certos direitos morais de autor e o direito de revogar a doação por ingratidão, os quais, em certos casos, são transmissíveis por morte ( artigo 976.º n.º 3 ).

O direito de investigar a maternidade e a paternidade é apenas transmissível por morte ( artigo 1818.º e 1873.º ).

Alguma doutrina admite também a transmissão dos direitos de personalidade em geral, com fundamento no artigo 71.º n. º1.

21. Transmissibilidade das obrigações.

O regime exposto nos números anteriores, embora dirigido especificamente aos direitos subjectivos, vale genericamente para as obrigações patrimoniais.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

Deve-se considerar-se também a hipótese da transmissão de obrigações como elementos de patrimónios autónomos, nomeadamente a herança de terceiro ainda não partilhada ( artigos 2124.º e 2128.º ).

22. Transmissibilidade do direito de indemnização em geral.

A referência específica à transmissibilidade mortis causa do direito de indemnização justifica-se, sobretudo para demarcar algumas questões que em redor dela se desenvolvem.

Assim, quando estejam em causa danos patrimoniais, mesmo que o bem violado seja não patrimonial, não pode haver dúvidas quanto à natureza patrimonial daquele direito. A doutrina tem-se apoiado nos artigos 496.º e 494 para resolver estes problemas.

23. Transmissibilidade do direito de indemnização do dano de morte.

Convém distinguir se a morte foi instantânea ou não.

24. Fundamentos e causas da intransmissibilidade: análise do artigo 2025.º.

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MODALIDADES DA SUCESSÃO

Quanto á fonte da vocação

26. Enumeração das modalidades da sucessão.

A morte é o facto que determina a abertura da sucessão. Só com a morte do autor da sucessão os sucessíveis adquirem o direito de, em alternativa, aceitar ou repudiar a herança.

As fontes de chamamento á herança ( vocação ) são duas: a lei e a vontade do autor da sucessão de acordo com o artigo 2026.º.

No primeiro caso, ocorrida a morte do de cuius, a identificação das pessoas chamadas a suceder resulta directamente de certas normas jurídicas, independentemente da vontade do falecido ou até contra ela. Estamos perante a sucessão legal que, por seu turno se subdivide em legítima e legitimária. Diz-se legal precisamente por estarem em causa efeitos sucessórios da morte que decorrem directamente da lei.

No segundo caso, a eficácia jurídica da morte, como causa da sucessão é conformada mediante um acto jurídico ( secundário ) da autoria do de cuius que é um verdadeiro negócio jurídico. Por isso, a sucessão se diz voluntária, sem que tal signifique que a sua causa seja a vontade do falecido.

Também a sucessão voluntária admite duas modalidades, que dependem do tipo que este negócio reveste quanto à sua estrutura. Ele pode ser unilateral – e diz-se testamento, havendo então sucessão testamentária; mas pode ser também bilateral, caso em que estamos perante um verdadeiro contrato que recebe a denominação tradicional de pacto sucessório. Daí há neste caso sucessão contratual ou pactícia.

27. Sucessão legal e as suas modalidades.

O critério geral que preside à distinção, na sucessão legal, entre sucessão legítima e legitimária é fácil de extrair do artigo 2027.º.

Segundo este preceito, a sucessão legítima pode ser afastada pela vontade ao autor da sucessão, ao contrário do que acontece com a legitimária.

28. A sucessão voluntária e as suas modalidades.

Com prejuízo do equilíbrio legislativo, não existe no Código Civil qualquer preceito que, homólogo do artigo 2027.º, se refira genericamente à sucessão voluntária e às suas modalidades. Assim, é no artigo 2026.º que, por contraposição à sucessão « deferida por lei » se referem os casos em que ela tem por fonte o testamento ou o contrato.

29. Possibilidade de coexistência das várias modalidade da sucessão.

.......................................

Quanto ao objecto

30. Generalidades.

Outro factor que interfere com o regime do fenómeno sucessório, além das diferentes formas de vocação, é o próprio objecto, visto agora na perspectiva dos bens que os sucessores vão adquirir. Por outras palavras, não está em causa saber a que título se sucede mas no que se sucede.

Nesta base se estabelece a distinção entre heranças e legados e, correspondentemente, entre herdeiro e legatário.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

O Código Civil ocupa-se da questão, segundo este ponto de vista no artigo 2030.º. Por isso, no seu n.º 1, « os sucessores são herdeiros ou legatários ».

31. Noção de herdeiro e legatário.

A distinção entre herdeiro e legatário vem estabelecida no n.º 2 do artigo 2030.º nos seguintes termos: « diz-se herdeiro o que sucede na totalidade ou numa quota do património do falecido e legatário o que sucede em bens ou valores determinados ».

Esta norma deve ser complementada com os n.ºs 3 e 4 do mesmo preceito, dos quais resulta ser havido como herdeiro quem sucede no remanescente dos bens da herança, sem especificação destes, e ser havido como legatário o usufrutuário, mesmo quando o seu direito recaía sobre todo o património hereditário.

A conjugação da primeira parte do n.º 2 do artigo 2030.º com o n.º 3 do mesmo preceito permite-nos identificar três situações típicas da disposição a título de herança ou, o mesmo é dizer, da instituição de um herdeiro:

a) Sucessão na “ totalidade” do património do falecido.

b) Sucessão em quota desse património;

c) Sucessão no remanescente dos bens do falecido, sem especificação dos mesmos.

32. Diferenças de regime jurídico do herdeiro e do legatário.

A plena compreensão da distinção entre herança e legado não se basta com a identificação dos critérios que a ela presidem. Para total esclarecimento desta importante questão, necessário se torna apurar as diferenças de regime da sucessão inerentes à qualidade de herdeiro e de legatário.

II - A herança, enquanto conjunto de bens deixados pelo autor da sucessão, constitui uma universalidade de direito, que compreende elementos activos e passivos. Por outro lado, da morte do de cuius e do próprio desenvolvimento do fenómeno sucessório resultam encargos que, no seu conjunto, constituem o que podemos designar genericamente por encargos da herança – artigo 2068.º.

À responsabilidade pelos encargos da herança preside o seguinte princípio:- os herdeiros respondem por eles; os legatários não. Estes só respondem, em regra, pelos encargos do próprio legado (

artigo 2276.º ), que são realidades diversas dos encargos da herança.Este regime resulta, desde logo, dos artigos 2068.º e 2097.º e implica, enquanto os bens não são partilhados entre os

herdeiros, a responsabilidade colectiva dos bens da herança pelos respectivos encargos. Após a partilha, rege o artigo 2098.º, que atribui a cada herdeiro responsabilidade pelos cargos da herança na proporção da sua quota.

III – Outra nota característica da posição do herdeiro, que não se justifica quanto aos legatários, respeita à partilha.A partilha constitui, sumariamente, o acto através do qual são atribuídos a cada um dos herdeiros, os bens ( concretos ) que

hão-de integrar a sua quota.Mantém, pois, uma relação íntima com a natureza da herança ou da quota ( indivisa ) atribuída ao herdeiro como

universalidade.O direito à partilha é expressamente consagrado no artigo 2101.º, que afirma também o seu carácter irrenunciável ( n.º 1 e

n.º 2 ). O mais que os herdeiros podem convencionar é a indivisibilidade da herança e, ainda, assim, em termos limitados.

IV – Outro ponto de regime que é correntemente analisado a propósito da distinção entre herdeiro e legatário respeita ao direito de acrescer.

Extrai-se do artigo 2301.º que no direito de acrescer está em causa a instituição de vários herdeiros na universalidade da herança ou numa quota dela.

Verifica-se, então, uma situação de vocação plural. Sendo assim, pode dar-se o caso de um dos instituídos, por qualquer razão, não querer ou não poder aceitar a herança. Dispõe, para o efeito, o artigo 2301.º que a parte do não aceitante acresce, em geral, à dos demais, na proporção das quotas destes.

V – Passamos agora a analisar a aponibilidade de cláusulas acessórias à instituição de herdeiros e à nomeação de legatário.Tratamos aqui, sob feição específica do Direito das Sucessões, de regimes já genericamente conhecidos da Teoria Geral do

Direito Civil, de que interessa, neste momento, recordar o regime do termo.O termo inicial é aponível à nomeação de legatário, mas não à instituição de herdeiro ( n.º 1 e n.º 2, primeira parte, do artigo

2243.º ). O termo inicial aposto à instituição de herdeiro é nulo, mas não afecta a instituição em si mesma ( n.º 2, segunda parte, do artigo 2243.º ).

VI – Menos significativo é o caso da alienação do quinhão hereditário ( artigo 2124.º ) revista a modalidade de venda ou dação em cumprimento e o adquirente seja um estranho, o artigo 2130.º n.º 1, confere o direito de preferência aos co-herdeiros.

Este direito, como o preceito em causa claramente deixa perceber, não cabe aos legatários.As funções de cabeça-de-casal, para cujo exercício os herdeiros são, em certos casos, qualificados só cabem aos legatários,

quando toda a herança for distribuída em legados ( artigos 2080.º e 2081.º ).

34.

O Fenómeno Sucessório

35. A sucessão como facto complexo.

É um facto complexo e de formação sucessiva que engloba várias etapas. A aquisição sucessória só se concretiza depois da realização de certos factos que pode ser até a própria morte.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

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36. Fases do fenómeno sucessório.

Asas.................

Pressupostos da sucessão

39. A morte como pressuposto típico da sucessão.

A morte, no sentido físico ou natural, já conhecido, consagrado no artigo 68.º, qualquer que seja a sua causa – natural ou voluntária –, constitui o pressuposto típico ou normal da sucessão. Tomada nesta perspectiva, a morte precede o fenómeno sucessório, tendo como efeito, precisamente a abertura da sucessão, com que esse fenómeno se inicia.

40. Efeitos patrimoniais não sucessórios da morte.

Efeito clássico da aquisição por efeito da morte de certa pessoa, fora do regime sucessório, verifica-se na modalidade do seguro de vida. O beneficiário do seguro, que não é, necessariamente, o autor do respectivo contrato, recebe, por morte deste, o valor do seguro pago pela companhia seguradora. A correspondente quantia nunca esteve, porém, no património do segurado. A aquisição dá-se por sua morte, mas completamente fora do regime sucessório ( artigo 460.º do Código Comercial ).

Como oportunamente vimos, a respeito da transmissibilidade do direito de indemnização por dano de morte, casos há em que determinadas pessoas adquirem direitos que decorrem da morte de outra, mas por direito próprio e não por sucessão.

Também alheios ao fenómeno sucessório são os efeitos que, no usufruto simultâneo ou sucessivo, a morte de um dos usufrutuários produz na esfera jurídica dos demais ( artigos 1441.º e 1442.º ).

Outro exemplo de efeito patrimonial, mas não sucessório, da morte ocorre, no regime do arrendamento urbano, quando se verifica a aquisição do direito a novo arrendamento, a favor de certas pessoas, por morte do arrendatário ( artigo 90.º e seguintes do R.A.U. ). Os critérios de atribuição de tal direito, como resulta claramente dos n.º 1 e n.º 2 do artigo 90.º, são todos alheios ao regime do fenómeno sucessório.

41. Efeitos sucessórios da ausência justificada.

I - A justificação da ausência, nos termos do artigo 99.º, desencadeia vários efeitos, alguns dos quais apresentam manifesta similitude com os produzidos na sucessão mortis causa.

Assim, segundo se dispõe nos artigos 101.º a 103.º 1 109.º:

a) o tribunal da ausência requisitará certidões dos testamentos públicos do ausente;

b) O mesmo tribunal mandará proceder à abertura dos testamentos cerrados do ausente;

c) Os bens do ausente serão entregues aos seus legatários e herdeiros e ainda às pessoas que por morte daquele tenham direito a bens determinados.

d) Havendo herdeiros, procede-se a partilha e, enquanto esta não for feita, os bens em causa ficam sujeitos à administração do cabeça-de-casal.

e) Pode haver repúdio da sucessão do ausente e disposição dos respectivos direitos sucessórios.

Importa saber, do ponto de vista do direito sucessório, em particular pelo que respeita aos pressupostos da sucessão, qual o verdadeiro sentido destes efeitos da justificação da ausência.

II - A doutrina portuguesa mostra-se dividida quanto a esta questão.

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42. Efeitos sucessórios da declaração de morte presumida.

A justificação da ausência, nos termos do artigo 99.º, desencadeia vários efeitos, alguns doa quais apresentam manifesta similitude com os produzidos na sucessão mortis causa.

Assim, segundo se dispõe nos artigos 101.º a 103.º e 109.º:

a) o tribunal da ausência requisitará certidões dos testamentos públicos do ausente.

b) O mesmo tribunal mandará proceder à abertura dos testamentos cerrados do ausente.

c) Os bens do ausente serão entregues aos seus legatários e herdeiros e ainda às pessoas que por morte daquele tenham direito a bens determinados.

d) Havendo herdeiros, procede-se a partilha e, enquanto esta não for feita, os bens em causa ficam sujeitos à administração do cabeça-de-casal.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

e) Pode haver repúdio da sucessão do ausente e disposição dos respectivos direitos sucessórios.

A doutrina portuguesa mostra-se dividida quanto a esta questão.Segundo Oliveira Ascensão, que acentua o facto de a aceitação e o repúdio da sucessão do ausente pressuporem a sua

abertura, a ausência justificada determina a abertura da sucessão.Em sentido contrário se manifestam Pereira Coelho, Pamplona Corte-Real e R. Capelo de Sousa, que fala, contudo, de

efeitos para-sucessórios da morte presumida.

Fase Pré-Sucessória: a Designação.

43. Noção de designação.

A designação consiste na determinação ou fixação, em vida do autor da sucessão, das pessoas que podem vir a suceder-lhe, por morte dele. As pessoas designadas são os sucessíveis.

Adasdasd…………

46. Regime da designação.

Os factos designativos têm como efeito típico a determinação de um ou mais sucessíveis. No seu conjunto, estes factos estabelecem um elenco ou quadro de sucessíveis.

Contudo, o elenco dos sucessíveis, em vida do autor da sucessão é instável na medida em que se altera pela verificação de novos factos designativos, pela projecção recíproca dos efeitos dos factos designativos e até pela verificação de factos que, não sendo em si mesmos designativos, interferem com a eficácia designativa de outros.

Ex. Suponhamos que A, solteiro e sem ascendentes, faz testamento, nomeando como seus herdeiros os sobrinhos B e C. Posteriormente, A casou com D, mas manteve o testamento antes feito. B e C não deixam de ser susceptíveis de A, somente, por efeito do casamento deste, a sua posição sucessória alterou-se. A superior hierarquia do novo facto designativo – o casamento de A – implica que B e C, de sucessíveis únicos de A, passaram a sucessíveis da ( futura ) quota disponível da herança dele.

No exemplo anterior, se o matrimónio de A se extinguir por divórcio ou se D morrer antes de A, sem ter havido, em qualquer dos casos, descendentes nascido do casamento, não só este perde eficácia designativa, como a posição de B e de C, enquanto sucessíveis, volta a alterar-se, ganhando o testamento – seu facto designativo – a eficácia que tinha anteriormente ao casamento de A.

II – Das considerações anteriores extrai-se que, até se fixar com a morte do de cuius, o elenco de sucessíveis pode sofrer modificações muito diversas.

Assim, o número dos sucessíveis altera-se:

a) Pela verificação de novos factos designativos.

b) Pela perda de eficácia de designações anteriores, com a consequente extinção da qualidade de sucessível da pessoa por ele designada.

Há ainda a referir factos verificados em vida do autor da sucessão que afectam a designação, por constituírem fonte de indignidade ou de deserdação.

A instabilidade do elenco dos sucessíveis só cessa com a morte do de cuius. Fixa-se nesse momento a lista dos sucessíveis, de entre os quais se vai fazer a selecção dos sucessores, segundo a hierarquia que nesse mesmo momento entre eles exista.

Tal não significa, porém, que factos ocorridos após a abertura da sucessão não possam interferir com o quadro dos sucessíveis; assim acontece, por exemplo, se a sentença que reconhece um filho do de cuius for proferida após a sua morte ( artigo 1819.º ), ou de, na indignidade, a condenação por crime que a determina ser posterior a este momento ( artigo 2035.º n.º 1 ).

Abertura da Sucessão

47. Fontes da abertura da sucessão.

O fenómeno sucessório, em sentido próprio, inicia-se com a abertura da sucessão, sem prejuízo da relevância que, no seu desenvolvimento, é exercida pelos factos designativos.

A expressão abertura da sucessão é, de há muito correntemente usada pela doutrina para identificar o primeiro momento do fenómeno complexo que há-de conduzir à atribuição do património do falecido a uma ou mais pessoas, mas tem também consagração na lei, como evidência, desde logo, a epígrafe da Secção que começa no artigo 2031.º.

48. Momento da abertura da sucessão.

A abertura da sucessão ocorre « no momento da morte do seu autor » assim estatui expressamente o artigo 2031.º.

49. Lugar da abertura da sucessão.

A abertura da sucessão considera-se verificada no lugar do último domicílio do de cuius. Sobre esta matéria rege o artigo 2031.º.

Vocação.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

50 Noção de vocação.

Diz-se vocação o chamamento dos sucessíveis à herança de uma pessoa falecida com a consequente atribuição do direito de suceder.

Ocorrido o chamamento, os bens da herança ficam à disposição dos sucessíveis – que os podem adquirir mediante uma manifestação de vontade nesse sentido (aceitação). È o que, por facilidade de linguagem, e sem pôr em causa o nosso entendimento do fenómeno sucessório, podemos chamar devolução.

A atribuição do direito de suceder e a devolução dos bens, comportam-se como efeitos da vocação, dela decorrendo em regra, automaticamente.

51. Modalidades da vocação.

A vocação é feita em função de factos designativos ocorridos antes da morte do autor.

52. Vocação originária, subsequente e sucessiva.

A grande regra que domina a vocação e que se extrai do n.º 1 do artigo 2032.º, é a de ela ocorrer no momento da abertura da sucessão. São então chamados, segundo a hierarquia dos factos designativos, aqueles que têm melhor qualidade: os sucessíveis prioritários.

Como é manifesto, tal só se dá se em relação a esses sucessíveis se verificarem os pressupostos da vocação.È esta vocação, que, coincidindo com a morte do de cuius, se designa por originária.

Há, porém, casos em que a vocação só ocorre em momento posterior à abertura da sucessão; por isso mesmo diz-se subsequente.

O caso paradigmático da vocação subsequente verifica-se quando a vocação do sucessível prioritário não se mantém por causas diversas, identificadas, no n.º 2 do artigo 2032.º, sob a fórmula genérica de os primeiros sucessíveis não querendo ou não poderem aceitar. Por força do mesmo preceito, são então chamados os sucessíveis subsequentes, segundo a ordem hierárquica do respectivo título designativo.

II. A delimitação rigorosa entre a vocação originária e a subsequente não é isenta de dúvidas, que se prendem, nomeadamente, com o facto de na vocação subsequente se poderem englobar situações bem diversas.

Assim pode dar-se o caso de a vocação originária respeitar a vários sucessíveis ( vocação múltipla ).Cabe, então, perguntar se a vocação subsequente depende do afastamento de todos os originariamente chamados ou se pode

verificar se tal ocorrer apenas em relação a um deles.

III. Outras dúvidas, prendem-se com certos requisitos da vocação e com outras modalidades que ela pode revestir.Assim, em função do requisito da personalidade – situação dos nascituros e das pessoas colectivas a instituir –, a questão

que se coloca é a de saber se há uma vocação, sujeita a uma conditio iuris, ou uma vocação subsequente, por vezes dita sucessiva.

Dúvida semelhante se suscita quanto à vocação condicional, quando a condição é suspensiva.

IV. Um caso particular de vocação não originária verifica-se na substituição fideicomissária, em relação à vocação do fideicomissário. Tanto como o fiduciário são herdeiros do instituidor do fideicomisso, mas o fideicomissário só é chamado após a morte do fiduciário ( artigo 2293.º n.º 1 ) se, quanto àquele, se verificarem os pressupostos da vocação.

53. Vocação pura, condicional e a termo.

A distinção entre vocação pura, de um lado, e condicional ou a termo, do outro, interessa à vocação testamentária e prende-se com o regime de aposição de cláusulas acessórias às disposições testamentárias.

54. Vocação una e múltipla.

A vocação una é identificada com a situação de haver um só sucessível chamado por um só título.Todos os demais casos são de vocação múltipla

A vocação una, hoc sensu, só pode verificar-se quanto à sucessão de herdeiro, vulgarmente dito único e universal.

A vocação do legatário é sempre múltipla, pois pressupõe, pelos menos, a existência de outro legatário ou de um herdeiro, ou o seu chamamento por mais de um título: como herdeiro legítimo e como legatário, por exemplo.

O mesmo sucessível pode ser chamado à sucessão por vários títulos: com herdeiro legitimário e legítimo, como herdeiro legítimo e testamentário, como herdeiro e legatário.

55. Vocação directa e indirecta.

Há vocação indirecta quando um sucessível é chamado, não apenas em atenção à relação existente entre ele e o de cuius, « mas também em função da sua posição perante um terceiro, que não entra na sucessão, mas serve de ponto de referência » para a vocação.

A vocação directa define-se por exclusão de partes, constituindo esta modalidade a regra da vocação.

São modalidades de vocação indirecta, a substituição directa, o direito de representação e o direito de acrescer.57. O momento e o regime da vocação.

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A vocação, no seu regime normal, dá-se no momento da abertura da sucessão como claramente resulta do n.º 1 do artigo 2033.º.

Segundo este preceito, o chamamento é dirigido aos sucessíveis « que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis », desde que preencham certos requisitos da própria vocação.

58. Requisitos da vocação. Enumeração.

1- Personalidade.2- Capacidade3- Sobrevivência.

59. Resolução da vocação.

1- Repúdio.2- Indignidade.3- Verificação de condição resolutiva.4- Caducidade do direito de suceder.

Requisitos comuns

60. Personalidade.

A lei não se refere explicitamente à personalidade jurídica como requisito da vocação; ao regular os termos em que ela se verifica ( artigo 2032.º n.º 1 ), menciona apenas a capacidade e de modo não muito satisfatório.

Da lei pode, quanto muito deduzir-se que, dependendo a vocação da capacidade do sucessível, tal implica a existência de personalidade, porquanto não faz sentido, atribuir capacidade a quem não seja pessoa jurídica.

61. A situação jurídica dos nascituros.

O nascituro, enquanto tal, não é pessoa jurídica, também não o são os concepturos.Daí justamente a necessidade de explicar os termos em que se pode dar a sua vocação, uma vez que, no momento da

abertura da sucessão, não têm personalidade jurídica.O artigo 2033.º atribui capacidade sucessória aos nascituros. – conjugar com 66.º

Verifica-se contudo, do artigo 2240.º que a herança ou o legado a favor do nascituro lato sensu implicam sempre um regime de administração dos bens correspondentes.

Se o beneficiário da disposição estiver já concebido ( nascituro stricto sensu ), a administração cabe a quem a administraria se ele já tivesse nascido ( n.º 2 do artigo 2240.º ). Está aqui em causa o exercício do poder paternal, e o seu suprimento, segundo as diversas situações que nele podem ocorrer.

Se se tratar de concepturo, a remissão contida no n.º 1 do artigo 2240.º para os artigos 2237.º a 2239.º equipara a situação à da herança sob condição.

62. A procriação assistida.

Na sucessão legal, a lei reconhece capacidade sucessória passiva a nascituros já concebidos ( ou seja, stricto sensu )no momento da abertura da sucessão ( artigo 2033.º n.º 1 ).

O afastamento dos concepturos, na sucessão legal, dá ao período legal da concepção, como limite da relevância do nascimento de pessoas nascidas após a morte do autor da sucessão, um significado que nos leva a excluir da sucessão os que nasçam para além dele, com ressalva, naturalmente, do disposto no artigo 1800.º.

Na sucessão voluntária a capacidade sucessória de nascituros e concepturos está expressamente prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 2033.º desde que, no segundo caso, descendam de pessoa determinada viva ao tempo da abertura da sucessão.

63. Situação sucessória das pessoas colectivas.

As pessoas colectivas, sendo, por definição, dotadas de personalidade jurídica, satisfazem o requisito da vocação relativo a esta qualidade jurídica.

Contudo, o artigo 2033.º, salvo quanto ao caso particular do Estado, só lhes reconhece capacidade na sucessão voluntária e, ainda assim, numa formulação que está longe de ser isenta de dúvidas, porquanto contrapõe pessoas colectivas e sociedades.

66. Sobrevivência.

Outro requisito da vocação é o da sobrevivência do sucessível ao autor da sucessão.Também a razão de ser da exigência deste requisito é intuitiva: uma pessoa já falecida não pode ser chamada à titularidade

dos bens deixados por morte de outra. Para além de estar implícito no n.º 1 do artigo 2032.º, pode ainda ver-se uma afloração deste requisito no artigo 2317.º alínea a), quanto à sucessão testamentária.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

68. Direitos eventuais do ausente.

Agora trata-se de saber qual o regime a aplicar aos bens que, estando instaurado um regime de ausência, sobrevierem ao ausente. È o que o Código Civil identifica, na subsecção que abrange os artigos 120.º e 121.º como « direitos eventuais do ausente ».

A dúvida levanta-se quanto a saber qual o regime aplicável se o ausente regressar ou dele houver notícias.Segundo pensamos, há que aplicar, em tais casos, correspondentemente, o artigo 19.º.

69. Capacidade.

O ultimo dos requisitos gerais da vocação respeita à capacidade.A capacidade como requisito da vocação, vem especificadamente regulada nos artigos 2032.º e 2033.º.

A capacidade para suceder conforma-se como uma qualidade das pessoas para adquirirem, mortis causa, direitos e vinculações.

Por outras palavras, estamos perante uma capacidade de gozo.

71. A indignidade sucessória.

Nos termos expressos do n.º 1 do artigo 2034.º, carece de capacidade sucessória quem for autor de uma série de actos criminosos ou ilícitos identificados nas várias alíneas do preceito.

Artigo 2035.º - ilegitimidade sucessória.

72. Declaração da indignidade e seus efeitos.

A indignidade, uma vez declarada, produz dois efeitos com relevo no desenvolvimento do fenómeno sucessório.A vocação do indigno é tida por inexistente ( n.º 1 do artigo 2037.º ), havendo, portanto, lugar ao chamamento de

sucessíveis subsequentes.

O segundo efeito da declaração de indignidade respeita à posse de bens hereditários que o sucessível declarado indigno tiver: ela é considerada de má fé, com todas as consequências que tal implica.

73. Reabilitação do indigno.

A eficácia dos actos enumerados no artigo 2034.º, como causa da indignidade, não é irremediável. O autor da sucessão pode perdoar ao indigno, reabilitando-o ( artigo 2038.º ).

A reabilitação pode verificar-se mesmo após a indignidade ter já sido judicialmente declarada, mas tem de ser feita mediante declaração expressa.

74. A deserdação: noção e regime.

A deserdação vem regulada nos artigos 2166.º e 2167.º em sede de sucessão legitimária, por ser nesta modalidade de sucessão que os seus efeitos se produzem. De resto, só nela, e em função do regime particular dos legitimários, o instituto faz sentido.

A deserdação constitui o meio jurídico específico através do qual o autor da sucessão pode, por acto de sua vontade, privar um sucessível legitimário da sua legítima. È esta a noção que se extrai do corpo do n.º 1 do artigo 2166.º.

Para a deserdação ser possível, têm de se verificar certas causas, que o legislador identifica, e sem as quais a deserdação representaria uma frustração inaceitável da situação jurídica dos legitimários.

As causas da deserdação são as que vêm contidas nas três alíneas do n.º 1 do artigo 2166.º.

78. Vocações indirectas.

A vocação indirecta apresenta várias manifestações – substituição vulgar ou directa, direito de representação e direito de acrescer –, com naturais e relevantes diferenças de regime entre si.

79. Requisitos.

A análise das noções legais que do Código Civil se extraem quanto ao direito de representação, à substituição vulgar e ao direito de acrescer, as duas primeiras directamente expressas nos artigos 2039.º e 2281.º, respectivamente, e a última implícita nos artigos 2301.º e 2302.º, mostra que todas dependem da verificação da circunstância de um sucessível não poder ou não querer aceitar a sucessão.

80. Efeitos.

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As vocações indirectas produzem um efeito geral comum: ao sucessível a quem é dirigida a vocação indirecta vão ser atribuídos, em regra, os mesmos direitos e obrigações que caberiam ao sucessível que não quer ou não pode aceitar.

Direito de representação

81. Noção.

A representação sucessória, figura típica deste ramo de Direito, que nele assume um significado técnico-jurídico específico, claramente afastado da representação por substituição de vontades, vem regulada nos artigos 2039.º a 2045.º.

Segundo o primeiro destes preceitos, verifica-se direito de representação « quando a lei chama descendentes de um herdeiro ou legatário a ocupar a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado ».

Importa aditar imediatamente a seguinte nota: aos descendentes são equiparados os adoptados plenamente ( artigo 1986.º n.º 1 ).

83. Representação na sucessão testamentária.

A admissibilidade da representação na sucessão testamentária não se verifica em relação a todos os pressupostos comuns da vocação indirecta. Abrange, apenas, na letra do n.º 1 do artigo 2041.º, a pré-morte do sucessível e o repúdio da sucessão, seja herança ou legado.

84. Representação na sucessão legal.

O direito de representação tem o seu campo de aplicação por excelência na sucessão legal; quanto a esta, ele é admitido em todos os casos que constituem pressuposto comum da vocação indirecta, como resulta da conjugação dos artigos 2042.º e 2043.º.

85. Efeitos do direito de representação.

O direito de representação importa relevantes desvios ao desenvolvimento normal do fenómeno sucessório.

É na sucessão legal que o direito de representação tem os seus efeitos mais relevantes, pois afasta duas das regras gerais que dominam a sucessão legítima e a legitimária.

III. O direito de representação projecta também os seus efeitos sobre a regra que, na sucessão legal, manda dividir a herança em partes iguais – por cabeça – entre os sucessores ( artigo 2136.º ).

A derrogação desta regra traduz-se em a divisão se passar a fazer por estirpes e sub estirpes, funcionando como cabeça de estirpe ( ou subestirpe ) o sucessível representado.

86. Âmbito da sucessão representativa por estirpes.

Para além do esquema de partilha por estirpes e subestirpes atrás exposto, consagrado no artigo 2044.º, o artigo 2045.º esclarece que há direito de representação, mesmo quando:

a) Todos os membros das estirpes se encontrem no mesmo grau.

b) Exista uma só estirpe.

Substituição Directa.

88. Noção e requisitos.

A substituição directa, também dita substituição vulgar ou comum, consiste na nomeação, pelo testador, de uma pessoa para suceder no lugar de outra ( substituição ), no caso de o sucessor instituído não poder ou não querer aceitar a herança ou o legado.

Embora a noção legal deste fenómeno, contida no n.º 1 do artigo 2281.º, venha expressamente referida ao herdeiro, o alargamento genérico do regime da substituição directa aos legatários, previsto no n.º 1 do artigo 2285.º, permite formular a noção ampla acima estabelecida.

A substituição diz-se directa por o substituto suceder directamente ao autor da sucessão ( só há uma sucessão ). Ex.: o testador A institui B como seu herdeiro e se este não quiser ou não puder aceitar, sucede C ( pode estipular isto no

testamento ).

A substituição não tem limite de grau, pelo que o testador pode designar tantos substitutos, sucessivamente, quantos entender.

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Nestes casos, os sucessores serão chamados segundo a ordem fixada pelo testador, ficando a designação de cada substituto sujeita à condição suspensiva de o anterior não querer ou não poder suceder.

90. Modalidades da substituição directa.

A substituição directa pode assumir várias modalidades, em larga medida dependentes da vontade do testador.Assim, fala-se em substituição directa singular, plural e recíproca ( artigos 2282.º e 2283.º ).Noutro plano a substituição pode ser expressa ou tácita, embora a primeira seja a modalidade mais corrente.

II. A substituição directa é singular ou plural consoante o número dos substitutos e independentemente do número dos substituídos. Atendendo a estes vários aspectos, são possíveis diversas situações, como resulta do artigo 2282.º.

III. A substituição directa recíproca verifica-se quando são substituídos vários co-herdeiros ou quando vários legatários são nomeados, conjuntamente ou não, em relação ao mesmo objecto.

A substituição diz-se recíproca por os co-herdeiros ou os colegatários se substituírem uns aos outros ( reciprocamente, diz a lei ). È o que se entende dos artigos 2283.º n.º 1 e 2285.º n.º 2.

Direito de acrescer.

92. Noção prévia.

È a faculdade que tem o sucessível, herdeiro ou legatário, chamado conjuntamente ou não com outros á mesma herança ou legado, de ver acrescido á sua parte com a de algum ou de alguns que não quiseram ou não puderam aceitar.

Requisitos positivos – artigo 2301.º

1- a falta de herdeiro instituído ou de legatário nomeado é o primeiro pressuposto do direito de acrescer.

2- hajam sido instituídos vários herdeiros ou nomeados vários legatários, existindo vários herdeiros ou colegatários, com o direito de acrescer a parte acrescida é dividida proporcionalmente nos respectivos quinhões hereditários.

É portanto um requisito do direito de acrescer a pluralidade de sucessíveis, ainda que a títulos diferentes.Porém, é no entanto indispensável que ocupem uma posição paralela na hierarquia dos sucessíveis.

3- seja objecto do legado seja herança, na totalidade ou em quota, tem sempre de existir unidade de objecto para ter de haver direito de acrescer.

Requisitos negativos: ( excluem o direito de acrescer ).

1- Substituição vulgar – artigo 2281.º2- Direito de representação – 2039.º3- Direito de transmissão – 2058.º

95. Direito de acrescer entre herdeiros.

O funcionamento do direito de acrescer entre herdeiros deve ser estudado tanto no âmbito da sucessão testamentária como no da sucessão legal, sendo certo que, quanto a esta, o regime fixado para a sucessão legítima vale, por força da remissão do artigo 2157.º para a legitimária.

96. Direito de acrescer entre legatários.

A admissibilidade do direito de acrescer entre legatários vem expressamente prevista nos artigos 2032.º e 2033.º.

98. Regime do direito de acrescer.

Os efeitos do direito de acrescer são regulados pelo artigo 2307.º. Dele consta que o beneficiário do acrescer, seja herdeiro ou legatário, sucede « nos mesmos direitos e obrigações, de natureza não puramente pessoal, que caberiam àquele que não pôde ou não quis receber a deixa ».

O artigo 2306.º estatui, como princípio fundamental, que a aquisição da parte acrescida se dá por força da lei.

Vocação sucessiva: Substituição fideicomissária.

100. Noção.

A substituição fideicomissária – ou fideicomisso – é a disposição através da qual o testador impõe a um sucessor o encargo de conservar a herança ou o legado, para reverterem, por morte do onerado, a favor de outra pessoa.

Á semelhança do que se verifica quanto à substituição vulgar, embora a noção legal de substituição fideicomissária contida no artigo 2286.º, se refira apenas ao herdeiro, o artigo 2296.º, ao alargar o seu regime ao legatário, permite a definição genérica acima estabelecida.

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Ao contrário do que sucede na substituição vulgar, em que há um só sucessor, no fideicomisso há dois sucessores efectivos e sucessivos.

102. Regime da cláusula fideicomissária.

O funcionamento normal da cláusula fideicomissária implica a aceitação da herança por parte do fiduciário e do fideicomissário. Se tal ocorrer, o primeiro recebe de imediato os bens da herança, revertendo os mesmos, por morte dele, para o fideicomissário.

103. Situação jurídica do fiduciário.

Quanto ao fiduciário regem especialmente os artigos 2290.º a 2292.º, mas releva também o artigo 2293.º. Do conjunto destes preceitos resulta que o fiduciário é titular de um direito sobre os bens que são objecto do fideicomisso,

que se aproxima do usufruto, mas com ele se não identifica.

O direito do fiduciário atribui-lhe, como se estatui do artigo 2290.º, o gozo e a administração dos bens, segundo um regime moldado sobre o direito de usufruto, cujas disposições se aplicam ao fiduciário em tudo o que não seja incompatível com a natureza do fideicomisso.

Em princípio, o fiduciário não pode alienar ou onerar os bens que são objecto do fideicomisso. Há, porém, casos especiais em que esta proibição é afastada; admite-se então a alienação ou a oneração, mas, ainda assim, é necessário obter autorização judicial.

No n.º 1 do artigo 2291.º, a lei admite a alienação ou oneração se os actos correspondentes se impuserem por « evidente necessidade ou utilidade para os bens » do fideicomisso.

A segunda hipótese vem contemplada no n.º 2 do artigo 2291.º e está ligada a casos de « evidente necessidade ou utilidade para o fiduciário ». Ex. doença do fiduciário.

104. Situação jurídica do fideicomissário.

O fideicomissário é sucessor do autor do fideicomisso tal como o fiduciário. È o regime que se extrai dos artigos 2293.º e 2294.º.

105. Fideicomissos irregulares.

O artigo 2295.º qualifica como fideicomissos irregulares certas disposições de bens que participam de alguns dos elementos dos verdadeiros fideicomissos – e que deles se aproximam nos aspectos estrutural e funcional –, mas não preenchem plenamente o tipo legal.

Herança Jacente.

107. Noção.

O artigo 2046.º identifica herança jacente como a que ainda não foi aceite nem declarada vaga para o Estado.

108. Medidas cautelares da herança jacente.

O período em que a herança se encontra jacente envolve o risco de os bens, não tendo quem se ocupe da sua administração, virem a sofrer danos, já que mais não seja pela deterioração inerente ao decurso do tempo ou à sua imobilização.

Sendo esta situação contrária aos interesses da economia em geral e aos dos chamados ou outros interessados em particular, a lei predispôs meios jurídicos destinados a prevenir tal risco.

Consistem eles na adopção de providências relativas à administração dos bens hereditários ( artigo 2047.º ) e na nomeação de curador da herança jacente ( artigo 2048.º ).

O regime da nomeação de curador à herança jacente consta do artigo 2048.º.

A lei reconhece legitimidade ao Ministério público e ainda a quaisquer interessados para requerer a nomeação de curador à herança.

A nomeação de curador à herança jacente depende de dois requisitos: falta de pessoa que legalmente a administre e risco de perda ou deterioração dos bens ( n.º 1 do artigo 2048.º ).

Pelo que respeita aos poderes do curador da herança, o n.º 2 do mesmo preceito manda aplicar à curadoria da herança o regime da curadoria provisória dos bens do ausente; ( artigo 94.º ) – poderes de administração ordinária.

110 – Notificação dos herdeiros.

A causa determinante de a herança estar jacente reside no facto de o sucessível chamado não aceitar nem repudiar. Como sucede em outras situações em que a inércia do titular de um direito interfere com direitos de terceiros ou com o interesse geral, o

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artigo 2049.º estabelece a possibilidade de ele ser notificado para, em determinado prazo, tomar uma decisão quanto ao exercício do direito, sob pena de se entender que adopta uma das opções possíveis.

Há aqui um processo cominatório de aceitação ou repúdio, funcionando a cominação nos termos adiante expostos. È a chamada actio interrogatoria.

O n.º 1 do artigo 2049.º limita o recurso ao meio judicial em análise aos casos em que o sucessível chamado seja conhecido. Deste modo, o primeiro requisito da chamada notificação dos herdeiros respeita ao sei conhecimento.

111. Natureza jurídica da herança jacente.

A natureza jurídica da herança no período de pendência que a caracteriza como jacente tem merecido, desde há muito, uma cuidada atenção da doutrina portuguesa, sendo diversas as teorias apresentadas para a construção da figura.

- Temos por artificiosa e desajustada do artigo 68.º n.º 1, a tentativa de explicar a situação mediante a ideia de prolongamento da personalidade do autor da sucessão.

- De igual modo inadequada, é a tentativa de conceber a herança jacente como pessoa colectiva.

- A invocação da qualidade da herança jacente como património autónomo ( ou mesmo, como património colectivo ), ainda que correctas enquanto identificam, in casum, um fenómeno de separação patrimonial, nada adiantam para o efeito que estamos a considerar.

- Melhor consideração, embora passíveis de alguns reparos, merecem as construções de Paulo Cunha e de M. Gomes da Silva.

Para o primeiro, verifica-se, na herança jacente, uma situação de obnubilação do sujeito, dando-se a congelação da relação jurídica, tornando-se os direitos contra a herança meramente potenciais.

Para M. Gomes da Silva, há uma privação temporária de sujeito, o que não impede a manutenção da organização concreta ( objectiva ) do direito, que não é inteiramente eficaz mas que assegura a futura afectação do bem em causa a certa pessoa. Não há um direito sem sujeito, antes, segundo a terminologia do autor, um direito à espera de sujeito.

Aquisição da Herança.

112. O direito de suceder.

O direito de suceder é um direito potestativo instrumental, através de cujo exercício, mediante a manifestação da sua vontade, o sucessível chamado à herança a pode fazer sua ou afastá-la.

Contém-se, pois, neste direito, uma opção conferida ao sucessível, traduzida na escolha, em alternativa, de uma de duas faculdades de sinal oposto, cujo exercício consubstancia um de dois actos jurídicos que se designam por aceitação e repúdio.

O regime jurídico da aceitação e do repúdio contém-se nos artigos 2050.º a 2067.º.

O legislador, no artigo 2049.º, manda aplicar aos legatários, « com as necessárias adaptações, o disposto sobre a aceitação e repúdio da herança ».

Os artigos 2050.º e seguintes acabam, deste modo, por valer para a aceitação e o repúdio da sucessão, em geral.

113. Características comuns à aceitação e ao repúdio.

- Não consentem termo ou condição.- São negócios sucessórios.- São negócios unilaterais singulares.- São negócios não receptícios.- São negócios pessoais.- São negócios irrevogáveis.- São negócios indivisíveis. ( há excepções ).

A sucessão não pode ser aceite ou repudiada sob condição ou a termo ( artigo 2054.º n.º 1 e 2064.º n.º 1 ).

Artigo 2050.º - indivisibilidade dos legados.

114. Aspectos particulares da aceitação e do repúdio.

Em matéria de aceitação, a mesma pode ser expressa ( artigo 2056.º n.º 2 conjugar com 217.º n.º 1 ) ou tácita ( artigo 2056.º n.º 3 e artigo 2057.º ).

O regime do repúdio não conta com uma norma equivalente à do artigo 2056.º. Assim, há de reconhecer que a lei não prevê expressamente a possibilidade de ele ser tácito; há contudo, que esclarecer se deve ser atribuído ao silêncio do legislador o sentido de afastar, em absoluto, a modalidade de repúdio tácito.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

115. Aceitação pura e simples e aceitação a benefício de inventário.

A distinção entre aceitação pura e simples e a benefício de inventário estabelece-se mais facilmente a partir da segunda destas modalidades. Segundo o artigo 2053.º, ela implica a existência de um processo judicial de inventário. O sucessível pode, para fazer a aceitação segundo este regime, ou requerer ele próprio o inventário ou intervir em processo de inventário que esteja em curso. A aceitação pura e simples determina-se por exclusão de partes.

Artigo 2102.º n.º 2 – Necessidade de partilha judicial.

116. Caducidade do direito de aceitação.

O direito de aceitação da sucessão deve ser exercido dentro de certo prazo, sob pena de caducidade. Contém-se este regime no artigo 2059.º para a herança, mas o mesmo vale para os legados, por força da remissão genérica do artigo 2249.º.

117. A sub-rogação dos credores.

O Código Civil, no artigo 2067.º, identifica a faculdade concedida aos credores pessoais do sucessível como um fenómeno de sub-rogação. Em plena coerência com tal qualificação, manda seguir os termos dos artigos 606.º e seguintes, onde se contém o regime comum da acção sub-rogatória.

A aceitação deve fazer-se no prazo de seis meses, contados do conhecimento do repúdio pelos credores ( artigo 2067.º n.º 2 ).

A aceitação feita pelos credores visa assegurar-lhes a satisfação dos seus créditos. Por assim ser, uma vez que estes sejam pagos, o remanescente não aproveita ao repudiante, mas aos herdeiros imediatos, a quem caiba o direito de suceder por efeito do repúdio.

118. Transmissão do direito de suceder.( artigo 2058.º )

O direito de transmissão só opera em caso de falecimento de um sucessível.

Regime da aquisição sucessória.

119. O artigo 2050.º n.º 1 estatui que « o domínio e posse dos bens da herança » se adquirem pela aceitação « independentemente da sua apreensão material ». Por seu turno, o n.º 2 do mesmo preceito esclarece que os efeitos da aceitação retroagem ao momento da abertura da sucessão.

122. Aquisição do Estado.

O regime particular de aquisição sucessória pelo Estado está ligado à posição que ele ocupa na sucessão legítima a qual determina como sabemos, a desnecessidade de aceitação e a impossibilidade de repúdio ( artigo 2154.º ).

Artigo 2155.º - Processo especial denominado – liquidação da herança vaga em benefício do Estado ( artigos 1132.º e 1134.º do Código de Processo Civil ).

Consiste em apurar os activos e os passivos da herança e colocar editais por 30 dias.

Regime da herança adquirida.

124. Prova da qualidade de sucessor.

A invocação prática da qualidade de sucessor implica, com frequência, a sua demonstração ou prova.

A ordem jurídica põe, para o efeito, ao dispor do sucessor, meios de diversa natureza: extrajudicial, judicial e administrativa. Interessam em particular para o nosso estudo os dois primeiros.

Como meio extrajudicial temos a habilitação notarial.A habilitação notarial consta de um acto jurídico, que deve revestir a forma de escritura pública, e que se materializa numa

declaração feita por três testemunhas, ou pelo cabeça-de-casal, que afirmam que os sucessores de certa pessoa são os que elas próprias indicam, não havendo outras pessoas com igual ou melhor direito à sucessão ( artigo 83.º do Código Notariado ).

Os meios judiciais consistem num processo especial – inventário – ou num incidente de um processo em curso – habilitação judicial.

Esta está em certos casos limitada ao inventário; assim acontece se este for obrigatório.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

125. Petição da herança.

O n.º 1 do artigo 2075.º atribui ao herdeiro o direito de « pedir judicialmente o reconhecimento da sua qualidade sucessória, e a consequente restituição de todos os bens da herança ou de parte deles, contra quem os possua como herdeiro ou por outro título, ou mesmo sem título ».

O pedido, na acção de petição da herança é complexo, porquanto se dirige:

a) Ao reconhecimento da qualidade de herdeiro do demandante.b) À restituição de todos os bens da herança ou de parte deles, por quem indevidamente os detenha.

Quem tem legitimidade para ser demandante tem de ser herdeiro.

Quanto á legitimidade passiva, decorre do n.º 1 do artigo 2075.º que ela cabe, genericamente, a quem tenha os bens em seu poder.

Um dos aspectos significativos do regime de petição da herança respeita ao tempo em que pode ser proposta.Vista a estatuição do n.º 2 do artigo 2075.º, importa atender aqui à relação que existe entre a petição da herança e a

aceitação, uma vez que na parte final do preceito se ressalva a caducidade do direito de suceder, ao remeter-se para o artigo 2059.º.

Tal significa que o facto de a acção de petição poder ser, em princípio, intentada a todo o tempo não implica que o direito de suceder não caduque, se for excedido o prazo referido no artigo 2059.º.

Artigo 2076.º - alienação a favor de terceiro.

Administração da Herança.

O meio normal estabelecido pelo Código Civil para a administração da herança é o cabeçalato, tendo como órgão o cabeça-de-casal ( artigo 2079.º ).

128. O cabeça-de-casal.

A lei estabelece várias regras sobre a selecção da pessoa que vai exercer as funções de cabeça-de-casal ( artigo 2080.º a 2083.º ).

Na falta de acordo, funcionam, então, as regras supletivas da lei. Aqui há a referir a ordem por que o artigo 2080.º defere o cargo a certas pessoas. ( várias alíneas ).

III. O exercício do cargo de cabeça e casal é obrigatório, havendo apenas a ressalvar a possibilidade de escusa.

Para além disso, é de exercício pessoal, não admitindo a sua substituição por representante, salvo legal, e, quando o exercício deva ser judicial, relativamente aos actos que tenham de ser praticados no processo por mandatário judicial ( artigo 32.º n.º 3 do Código de Processo Civil ).

È também, intransmissível, tanto em vida como por morte. Assim estatui o artigo 2095.º.

Finalmente é um cargo gratuito ( artigo 2094.º ). Esta regra só admite o seguinte desvio: sendo exercido por testamenteiro, o autor da sucessão pode estabelecer retribuição ( artigo 2333.º n.º 1 ).

IV. As funções do cabeça-de-casal têm o seu termo normal ligado à cessação da própria administração da herança, com a sua liquidação e partilha como resulta do artigo 2079.º.

Mas podem cessar antes disso, para além, manifestamente, do caso de morte do seu titular, por escusa ou remoção.

A escusa, vem regulada no artigo 2085.º e, é o acto de iniciativa do cabeça-de-casal, mas não discricionário, porquanto depende da ocorrência de factos que a lei considera justificativos, enumerados nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 2085.º.

A remoção pelo contrário, é imposta ao cabeça-de-casal, podendo ser requerida por qualquer interessado e pelo ministério público, quando tenha intervenção principal ( artigo 2086.º ).

A remoção constitui uma sanção imposta ao cabeça-de-casal, atendendo a comportamentos inadequados ocorridos no desempenho do seu cargo.

Estão em causa:

a) Actos dolosos de ocultação da existência de bens ( sonegação ) ou de doações feitas pelo autor da sucessão, ou de denúncia de doações ou encargos inexistentes;

b) Falta de zelo e prudência na administração dos bens;

c) Incumprimento de deveres legais no processo de inventário;

d) Incompetência no exercício do seu cargo.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

129. Poderes do cabeça-de-casal.

A função específica do cabeça-de-casal é a de administração dos bens hereditários, como logo dispõe o artigo 2079.º.

(...)

131. O testamenteiro.

O artigo 2320.º atribui ao de cuius a faculdade de, no testamento, nomear uma ou mais pessoas para exercer certas funções em relação à sua sucessão que integram o que se designa por testamentaria. Correspondentemente, tais pessoas são os testamenteiros.

Alienação da Herança.

A alienação da herança, como, de resto, a da quota hereditária, segundo resulta das considerações preliminares, respeita sempre a um conjunto de bens, tomados uti universum.

Liquidação da Herança.

A liquidação da herança implica a satisfação – até onde for possível – das dívidas do autor da sucessão e de outros encargos que a oneram.

138. Encargos da herança.

A identificação de quais são os encargos da herança é feita no artigo 2068.º; Compreendem-se neles:a) as despesas com o funeral e os sufrágios do falecido.b) Os encargos com a testamentaria.c) Os encargos com a administração e liquidação da herança.d) As dívidas do autor da sucessão.e) Os legados.

Há apenas a ressalvar os legados remuneratórios, que são considerados como dívidas da herança ( artigo 2278.º in fine ) e participam, portanto, da preferência destas.

139. Âmbito da herança.

O artigo 2068.º estabelece a responsabilidade da herança pelos seus encargos, o que implica a determinação dos bens à custa dos quais a sua satisfação é feita.

1401. A responsabilidade dos herdeiros: a herança indivisa.

Nos termos do artigo 2097.º, os bens da herança indivisa respondem colectivamente pela satisfação dos seus encargos.

A interpretação sistemática dos dois números do artigo 2071.º mostra que os credores de encargos da herança só pelos bens hereditários se podem fazer pagar. Neste aspecto se funda a afirmação de os herdeiros só responderem dentro das forças da herança ( intra vires hereditatis ) e não para além delas ( ultra vires ), pelos seus bens pessoais.

Se a aceitação for a benefício de inventário, entendem-se como bens da herança os que no respectivo processo judicial forem inventariados. Se os credores se não conformarem com tal conteúdo patrimonial da herança, cabe-lhes o ónus de provar que, para além dos inventariados, outros bens existem ( n.º 1 do artigo 2071.º ).

Havendo aceitação pura e simples, são os herdeiros que ficam onerados com a prova de na herança não haver bens suficientes para o cumprimento dos encargos.

Os credores de encargos da herança têm preferência, no seu pagamento, em relação aos credores do herdeiro. Por força deste regime, estatuído no n.º 1 do artigo 2070.º, os credores pessoais do herdeiro não se podem fazer pagar pelos bens hereditários que ao seu devedor caibam, enquanto os credores da herança não estiverem satisfeitos.

Esta preferência mantém-se por cinco anos a contar da abertura da herança, ou no caso de a constituição do crédito ser posterior a este facto, a contar dessa constituição ( n.º 3 do artigo 2070.º ).

Se o herdeiro for, ele próprio, credor ou devedor da herança, determina o n.º 1 do artigo 2074.º que, até à liquidação e partilha, os seus direitos e obrigações para com o falecido, se mantêm; são apenas excluídas deste regime as situações jurídicas que se extingam por morte do autor da sucessão.

142. A responsabilidade dos herdeiros: a herança partilhada.

A responsabilidade dos herdeiros que, anteriormente à partilha, se reportava colectivamente aos bens da herança indivisa, passa, agora, a respeitar a cada herdeiro; de acordo com o princípio da limitação intra vires que continua a reger esta matéria, cada um responde só em proporção do valor da sua quota ( artigo 2098.º n.º 1 ).

Este regime pressupõe, como resulta do n.º 2 deste preceito, que na partilha nada foi estipulado sobre esta matéria. Na verdade, segundo nele se estatui, os herdeiros podem deliberar que o pagamento dos encargos da herança seja feito:

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Direito das Sucessões 4.º Ano

a) à custa de dinheiro ou de certos bens separados para o efeito;

b) por algum ou alguns dos herdeiros, a cargo de quem, então ficam.

143. Responsabilidade dos legatários.

O regime geral fixado na lei para os legatários vem previsto nos artigos 2072.º e 2073.º.(…)

146. Natureza jurídica da herança.

Em sentido técnico-jurídico, por herança deve entender-se um conjunto de bens patrimoniais, activos e passivos, em geral, todos pertencentes a certa pessoa falecida no momento da sua morte, mas que pode abarcar também outros que à herança se agregam por razões diversas.

Vista de outra perspectiva, na herança concorrem, em certos casos, ainda, elementos que a aproximam do património colectivo, estamos a referir-nos à situação da herança indivisa, havendo vários herdeiros.

Não temos dúvida em afastar liminarmente e com breve justificação a ideia de a herança constituir uma universalidade de facto. Basta confrontar a noção do artigo 206.º para se apurar a distância que existe entre estas duas realidades.

A herança não é, manifestamente, uma universalidade de facto.A resposta é muito menos nítida quando passamos a considerar a hipótese de qualificação da herança como universalidade

de direito.

Partilha da Herança.

138. Modalidades da partilha.

A partilha pode revestir duas modalidades, como se extrai do artigo 2102.º, n.º 1: extrajudicial e judicial.

A partilha extrajudicial, designada, na linguagem corrente por amigável, por razões óbvias, pressupõe o acordo de todos os interessados.

Estamos, pois, neste caso, perante um negócio jurídico, como tal subordinado ao seu regime geral, em tudo o que não seja objecto de regulamentação especial.

Este negócio jurídico deve obedecer a forma especial – escritura pública – quando a herança seja integrada por coisas imóveis. Nos demais casos é um negócio não formal.

A partilha judicial é feita num processo especial, designado por inventário, regulado nos artigos 1326.º e seguintes do Código de Processo Civil; como consta do n.º 1 daquele preceito, o fim específico deste processo é o de pôr termo à comunhão hereditária.

O recurso à partilha judicial deixou de ser necessário e, casos e, que antes dominava o inventário obrigatório. Ainda assim em relação a incapazes, ausentes e pessoas colectivas, situações ocorrem em que a partilha tem de ser judicial.

149. O direito à partilha.

Pode requerer a partilha qualquer co-herdeiro e o artigo 2101.º atribui-a também ao cônjuge meeiro.A lei processual atribui, ainda, legitimidade para requerer o inventário ao Ministério Público, quando a herança seja

atribuída a incapazes, ausentes em parte incerta e pessoas colectivas.

150. Conteúdo da partilha.

A partilha consiste fundamentalmente no preenchimento, com bens determinados, da porção ou quota de cada herdeiro.

Pode chegar-se ao ponto de um interessado não receber, sequer, qualquer bem da herança, sendo preenchida a sua quota com dinheiro, no valor equivalente ao dos bens que lhe competiam, a receber dos outros herdeiros ou de algum deles: são as chamadas tornas.

Mas também é possível que um mesmo bem seja atribuído a vários interessados, ou a todos eles, na proporção das suas quotas, substituindo-se, aqui, à situação de indivisão, uma situação de contitularidade do tipo da compropriedade.

Com a reforma do Código civil de 1977 introduziu-se um aspecto muito importante e que consta dos artigos 2103.º-A a 2103.º-C relativamente a partilha em benefício do cônjuge sobrevivo.

Está em causa assegurar ao cônjuge sobrevivo direitos especiais na partilha relativamente à casa de morada de família e ao seu recheio, no preenchimento da sua quota.

Assim, a sua extinção só se dá, segundo este preceito, se o cônjuge não habitar a casa durante mais de um ano.

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151. Efeitos da partilha.

A partilha, segundo a noção antes estabelecida, tem como efeito atribuir, a cada herdeiro, a qualidade de sucessor único dos bens que lhe couberem. Esta afirmação, contida no artigo 2119.º, sem deixar de ser correcta, enquanto traduz a solução normal a que a partilha conduz, tem de ser entendida em termos hábeis.

Outro efeito da partilha refere-se à entrega dos documentos relativos aos bens da herança. O regime que passamos a expor extrai-se do artigo 2120.º.

Há ainda que distinguir entre documentos relativos a bens determinados e os bens relativos a toda a herança.

152. Partilha adicional.

A partilha, na normalidade dos casos, abrange todos os bens da herança; nada impede, porém, que, de caso pensado, e por razões de vária ordem, os interessados façam partilhas parciais. Haverá, então, que proceder a partilha adicional.

153. Impugnação e invalidade da partilha.

A lei admite a impugnação da partilha nos termos gerais dos contratos ( artigo 2121.º ).O Código Civil regula, porém, especificamente um vício que assume, na realidade, na partilha, alguma feição especial.

Estamos a referir-nos ao regime consignado no artigo 2123.º para o caso na partilha terem sido incluídos bens não pertencentes à herança.

154. Natureza jurídica da partilha

A natureza jurídica da partilha bem pode ser considerada uma vexata quaestio do direito das Sucessões, tanta é a polémica que em redor dela se tem gerado na doutrina e nos tribunais.

A questão surge, em geral, colocada em função de duas orientações alternativas, reservando uma delas à partilha um efeito meramente declarativo e outra conferindo-lhe natureza constitutiva ( aquisitiva ) ou atributiva.

Sucessão Legítima.

A natureza supletiva da sucessão legítima permite definir, por via indirecta, o seu âmbito, ou, o mesmo é dizer, o seu campo de aplicação.

157. Situação jurídica dos sucessíveis legítimos

A situação jurídica dos sucessíveis legítimos, em vida do de cuius, determina-se em termos simples, que não levantam dúvidas na doutrina.

Segundo elementos que já dispomos, a sua relação em relação ao futuro autor da sucessão é precária a mais de um título.

158. As categorias de sucessíveis legítimos.

A sucessão legítima opera mediante a vocação, por determinação da lei, de certas pessoas, à herança de outra. Deste modo, um dos elementos essenciais na fixação do regime da sucessão legítima respeita às pessoas que podem ser chamadas a suceder: sucessíveis legítimos.

O artigo 2132.º atribui a qualidade de sucessíveis legítimos ao cônjuge sobrevivo, a certos parentes do falecido e ao Estado.Tem também relevância para esta matéria, o familiar adoptivo, e a união de facto.

159. Regras da sucessão legítima.

São três as regras comuns ou gerais da sucessão legítima: preferência de classe, preferência de grau de parentesco e divisão por cabeça.

II. A regra da preferência de classe assenta na seguinte ideia fundamental. As várias categorias de sucessíveis legítimos não são todos chamados a suceder conjunta e indiscriminadamente. Pelo contrário, o Código Civil ordena-se em grupos que recebem a designação tradicional de « classes de sucessíveis ».

As classes de sucessíveis, segundo o n.º 1 do artigo 2133.º, são:

a) cônjuge e descendentes;b) cônjuge e ascendentes;c) irmãos e seus descendentes;d) outros colaterais até ao quarto grau;e) Estado.

Há, porém, que chamar a atenção para duas situações.Desde logo, tem de mencionar-se, como encoberta, subentendida ou implícita, outra classe, a colocar-se entre a segunda e a

terceira, ocupada pelo cônjuge, quando concorre à herança isolado, isto é, sem descendentes nem ascendentes.

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O artigo 2137.º determina que só são chamados os sucessíveis da classe imediata se os da anterior não quiseram ou não puderam aceitar.

III. A regra da preferência do grau de parentesco, ou, sendo caso disso, de adopção, funciona em relação às classes em que se incluem sucessíveis dessas categorias.

O artigo 2135.º- que a consagra – formula-a nos seguintes termos: « dentro de cada classe os parentes de grau mais próximo preferem aos de grau mais afastado ».

IV. A última das regras comuns da sucessão legítima é a da divisão por cabeça, também expressamente consignada no artigo 2136.º.

Determina este preceito que « os parentes de cada classe sucedem por cabeça ou em partes iguais, salvas as excepções previstas neste Código».

A lei ressalva expressamente excepções à regra da igualdade, que acabam por se verificar na maioria das classes. Assim acontece em certos casos de concurso do cônjuge com descendentes ( artigo 2139.º n.º 1 ), no concurso do cônjuge com ascendentes ( artigo 2142.º n.º 1 ) e na sucessão de irmãos do autor da sucessão, se concorrerem germanos com consanguíneos ou uterinos ( artigo 2146.º ).

Regime da sucessão legítima.

161. Sucessão conjunta do cônjuge e dos descendentes.

O cônjuge sobrevivo só é chamado à herança se o casamento subsistir, sem vicissitudes, à data da morte do autor da sucessão. Estão aqui em causa o divórcio, a separação judicial de pessoas e bens e a invalidade do acto de casamento.

No caso de concorrerem à herança o cônjuge e descendentes, a regra que preside à divisão hereditária é influenciada pelo número de descendentes.

Com efeito, o artigo 2139.º n.º 1 começa por estabelecer um regime de partilha por cabeça, mas logo o afasta em benefício do cônjuge, a quem garante uma quota mínima de uma quarta parte da herança.

Assim, havendo mais de três filhos, é esta a regra que funciona e não a da igualdade.Consideremos, por exemplo, que o cônjuge concorre à sucessão com quatro filhos. O cônjuge recebe um quarto, sendo os

restantes três quartos divididos pelos filhos.

Ex. Por morte de A, sucedeu-lhe o seu cônjuge B e quatro filhos, C, D, F, G.Os bens deixados por A – hoc sensu a sua herança, admitindo não haver passivo – têm o valor de 21.000 euros. Havendo,

como é manifesto, herdeiros legitimários, só quanto à quota disponível funcionariam as regras da sucessão legítima. Neste caso, sendo a quota indisponível de 2/3 da herança, o valor dos bens a atribuir pela sucessão legítima seria de 7.000 euros. Se porém A, tivesse deixado, em testamento, um legado em favor do seu sobrinho M, no valor de 1.000 euros, a divisão acima enunciada só quanto ao valor de 6.000 euros é feita.

Nestes termos, B receberia 1.500 euros e C, D, F, e G, 1125 euros, cada.

163. Sucessão conjunta do cônjuge e dos ascendentes.

O chamamento conjunto do cônjuge e dos ascendentes verifica-se quando não há descendentes. Assim o determina o n .º 1 do artigo 2142.º.

A divisão da herança entre ascendentes e o cônjuge não é igualitária: o cônjuge recebe duas terças partes e os ascendentes, em conjunto, independentemente do seu número, o restante.

Se, por exemplo, o pai do autor da sucessão não quiser aceitar, a sua parte acresce à da mãe. Mas, se esta não quiser ou não puder aceitar, acrescerá a parte dos pais à do cônjuge, como parece sugerir a letra da lei na segunda parte do artigo 2143.º.

165. Regime geral da sucessão dos irmãos e seus descendentes.

A sucessão dos irmãos do autor da sucessão verifica-se quando não há sucessíveis de qualquer das duas classes anteriores. A lei traduz esta ideia, segundo uma terminologia constante nesta matéria, referindo-se à falta de cônjuge, descendentes e ascendentes.

166. regime especial da sucessão dos irmãos germanos e unilaterais.

Resulta do artigo 2146.º que a quota de cada irmão germano é igual ao dobro da de cada irmão unilateral. Esta regra funciona tanto quando a divisão se faz por cabeça, como quando, havendo direito de representação, se faz por estirpe.

167. Sucessão dos colaterais até ao quarto grau.

O chamamento dos colaterais que não sejam irmãos e sobrinhos do de cuius verifica-se quando, nos termos oportunamente definidos para cada uma delas, falte sucessíveis de todas as classes anteriores ( artigo 2147.º ).

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Não há direito de representação entre os colaterais.

168. Chamamento do Estado.

O Estado ocupa a posição de sucessível legítimo, integrando a última das respectivas classes, uma vez esgotada a relevância sucessória dos familiares do de cuius: o cônjuge, parentes sucessíveis, adoptados ou adoptantes.

Assim o determina o artigo 2152.º.

170. Efeitos sucessórios da adopção plena.

O Código Civil não se ocupa especificamente, no Livro V, dos efeitos sucessórios da adopção plena. É pois, pela conjugação do artigo 2133.º, no qual se prevê a relevância da adopção no fenómeno sucessório, com o artigo 1986.º, onde se estatuem os efeitos gerais da adopção plena, que o correspondente regime deve ser definido.

Por força do n.º 1 deste último preceito, a adopção plena atribui ao adoptado a situação de filho do adoptante, integrado na família deste, com a consequente extinção do vínculo que ligava o adoptado à sua família natural.

171. Efeitos sucessórios da adopção restrita.

A adopção restrita produz um vínculo familiar muito menos relevante do que a adopção plena, como logo resulta do artigo 1994.º. Nos termos deste preceito, e salvo quando a lei disponha diferentemente, o adoptado restrito conserva todos os direitos e deveres em relação à família natural.

Esta irrelevância sucessória da adopção restrita é, porém, de algum modo atenuada, quanto à sucessão legítima, pelo artigo 1999.º n.º 2 e n.º 3.

172. A posição sucessória do membro sobrevivo na união de facto.

Se a união de facto, validamente constituída ( artigo 2.º da Lei n.º 7/2001 ), tiver a duração de dois anos, ocorrida a morte do seu membro que seja proprietário da casa de morada comum, o n.º 1 do artigo 4.º atribui ao sobrevivo o direito real de habitação sobre essa casa, pelo período de cinco anos.

A parte final do n.º 1 do artigo 4.º confere também ao membro sobrevivo da união de facto direito de preferência na venda dessa mesma casa, no mesmo prazo.

Estes direitos são, porém afastados em dois casos, regulados no n.º 2 do artigo 4.º.

174. Sucessão legitimária.( artigo 2156.º e seguintes )

Importa agora analisar a noção de legítima contida no artigo 2156.º.Desde logo, deve ter-se presente que o legislador se refere aqui à legítima objectiva ou quota indisponível, caracterizando-a

como « a porção de bens de que o testador não pode dispor, por ser destinada aos herdeiros legitimários ».

Desde logo, não é rigoroso identificar a legítima como uma porção de bens. Em verdade, ela é uma quota da herança, variável em função da qualidade e da quantidade dos sucessíveis legitimários.

177. categorias e classes dos sucessíveis legitimários.

São três as categorias dos sucessíveis legitimários, segundo se dispõe no artigo 2157.º: Cônjuge sobrevivo, descendentes e ascendentes.

178. Situação jurídica dos sucessíveis legitimários.

A situação jurídica dos sucessíveis legitimários, em vida do autor da sucessão, apresenta uma configuração que claramente os demarca da dos sucessíveis legítimos.

A doutrina hoje largamente dominante identifica no caso uma verdadeira expectativa jurídica, embora nem sempre recorra para tanto aos mesmos pontos de regime.

179. Regras da sucessão legitimária.

A sucessão legitimária rege-se pelas mesmas regras que domina a sucessão legítima. Assim se dispõe na parte final do artigo 2157.º.

Contém-se, pois, neste preceito, uma remissão para os artigos 2134.º a 2138.º, cujo alcance importa esclarecer.

Para além disso, são aplicáveis à sucessão legitimária as regras particulares da sucessão do cônjuge, dos descendentes e dos ascendentes que se contêm nos artigos 2139.º a 2144.º.

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Regime da sucessão legitimária.

181. Diversidade e variabilidade da legítima objectiva.

A primeira nota com que nos deparamos, ao analisar o regime da legítima objectiva, é a da diversidade do seu montante ou valor. A mais rápida leitura dos artigos 2158.º a 2161.º revela, na verdade que em função da qualidade e da quantidade dos sucessíveis chamados, a legítima objectiva pode ter três valores distintos: 1/3, 1/2 e 2/3 da herança.

Por ora, interessa-nos determinar, em termos gerais, a interferência que o regime da vocação tem no montante da quota indisponível, o que se prende com a determinação do montante em que ela se fixa.

Podemos aqui assinalar, como ponto de partida fundamental, que a medida da legítima se apura no momento da abertura da sucessão. Mas esta afirmação tem de ser complementada com a referência a certos incidentes ligados á vocação.

Assim, se houver nascituros, só no momento do seu nascimento e consequente vocação se verifica qual o número efectivo de filhos a quem vai ser atribuída a quota indisponível.

182. A noção de herança para cálculo da legítima objectiva.

A noção de herança com que fundamentalmente temos lidado refere-se aos bens deixados por morte do autor da sucessão – os relicta –, ainda que, para efeitos do apuramento da responsabilidade pelo seu passivo, a lei estabeleça um sentido próprio que daquela noção se afasta ( artigo 2069.º ).

Em, relação ao cálculo da quota indisponível vamos agora encontrar uma noção de herança diferente de qualquer destas.

A herança, em função da qual se calcula a legítima é uma realidade muito mais complexa, conforme se apura do artigo 2162.º.

De acordo com o n.º 1 deste preceito, para o cálculo da legítima atende-se:

a) aos bens existentes no momento da morte do de cuius.

b) Ao valor dos bens doados.

c) Ao valor das despesas sujeitas a colação;

d) Às dívidas da herança.

A determinação do alcance desta norma – que não é pacífico – começa pela identificação de três elementos incluídos nesta noção.

Para além do património existente no momento da morte – relictum –, manda o preceito atender a certos valores de que o autor da sucessão dispôs em vida ( doações e despesas ), genericamente designadas por donata ( no singular donatum ).

Quanto ás doações, há que esclarecer que se compreendem todas as que sejam feitas em vida do autor da sucessão, independentemente de os donatários serem sucessíveis ou terceiros. Não releva, portanto, se estão ou não sujeitas a colação.

Quanto às dívidas da herança, não fornecendo o artigo 2162.º qualquer indicação sobre o passivo a considerar, a doutrina tende a incluir nelas todos os encargos enumerados no artigo 2068.º, com excepção dos legados.

A questão mais controversa do cálculo da legítima é, porém, a de saber como conduzir as operações do respectivo apuramento.

Debatem-se aqui duas concepções contrapostas.

Segundo uma das teses, por vezes dita da Escola de Coimbra, o donatum não responde pelo passivo, sendo a sua inclusão na herança dirigida à tutela do legitimário e não e não à tutela dos credores, que não podem ter, após a morte do devedor, melhor posição do que a que tinham em vida dele – e esta confinava-se ao seu património.

Ex. Relictum - Passivo + donatum: Sobre o resultado atingido calcula-se a quota indisponível.

A segunda tese – denominada Escola de Lisboa – sustenta que o alargamento do quinhão hereditário legitimário, por via do artigo 2162.º, vem traduzir aquilo que o herdeiro efectivamente recebe nessa qualidade, ou seja, aquilo por que ele responde pelo passivo hereditário, segundo o artigo 2071.º, em conexão com o artigo 2068.º. Por isso, o donatum havia de ser afectado pelo passivo.

Ex. Donatum + Relictum - Passivo.

Como é manifesto, em termos práticos, estas duas teses só conduzem a resultados diferentes, se a herança for deficitária, isto é, se o passivo for superior ao relictum.

A, tendo como sucessíveis prioritários dois filhos, deixou bens no valor de 5.000 e um passivo de 2.000; fez em vida uma doação no valor de 3.000 euros.

Independentemente do método de cálculo usado ( 5.000 – 2.000 + 3.000 ou 5.000 + 3.000 – 2.000 ), o valor da herança é sempre de 6.000.

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Sendo, neste caso, a quota indisponível de 2/3, o seu valor é 4.000. A doação era inoficiosa e podia ser reduzida a 2.000.

183. Colação.

A colação vem regulada nos artigos 2104.º a 2118.º, sendo configurada como um instituto privativo da sucessão dos descendentes.

Segundo o n.º 1 do primeiro destes preceitos, a colação é dirigida à igualação da partilha dos descendentes; consiste, grosso modo, na restituição fictícia à herança de bens que foram doados em vida ao descendentes que pretenda entrar na sucessão.

Ex. Por morte de A, sucedem-lhe como únicos herdeiros, os seus filhos B e C. Em todos os casos expostos, A deixou bens no valor de 7.000 euros, não havendo passivo. A legítima é de 2/3 ( artigo 2159.º n.º 2 ).

Como primeira situação, suponhamos que A fez, em vida, uma doação a B, sujeita a colação, no valor de 2.000 euros, pelo que, para o efeito do cálculo da quota indisponível, o valor da herança é de 9.000 euros. Neste caso, a legítima é de 6.000 euros ( 2/3 de 9.000 ), cabendo nela 3.000 euros a cada filho, a quota disponível é de 3.000 euros, sendo 1.500 euros a parte nela reservada a cada filho.

Aplicando o artigo 2108.º, B, além da doação, recebe 1.000 euros a título de legítima e 1.500 pela sua participação na quota disponível; ficam portanto, consumidos 2.500 dos 7.000 euros deixados pelo autor da sucessão; os restantes 4.500 euros cabem a C, ficando igualada, em absoluto, a partilha.

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184. Colação: campo de aplicação; a posição do cônjuge sobrevivo.

No número anterior fixámos o conceito de colação, referindo-o intencionalmente à configuração que lhe é dada nos artigos 2104.º e seguintes: igualação da partilha dos descendentes.

A questão que se coloca agora é de saber se, quando concorre com descendentes, ocupando uma posição análoga à destes, o cônjuge sobrevivo deve estar ou não sujeito à colação.

Segundo Oliveira Ascensão, três soluções se apresentam como mais significativas na busca da resposta para o problema.1- Assim, seguindo de perto a letra da lei, o cônjuge não está sujeito à colação, mas vem a beneficiar do regime de colação

dos filhos.

2- Como variante a este entendimento, o cônjuge não estaria sujeito a colação, mas também não beneficiava dela, funcionando a igualação apenas aos descendentes.

3- Como é evidente, a terceira solução, é a de entender o cônjuge sujeito a colação tal como os descendentes, quando com estes concorra à sucessão.

185. Colação: regime jurídico; a obrigação de conferir.

O regime jurídico da colação desdobra-se em vários pontos, de seguida analisados em separado:a) obrigação de conferir;b) Objecto.c) Valor a conferir;d) Modo de operar.

186. Colação. Regime jurídico; objecto.

O objecto privilegiado da colação são as doações a favor dos descendentes. Contudo, a lei equipara às doações, para efeito de colação, outras atribuições patrimoniais gratuitas feitas aos descendentes.

Embora a formulação do n.º 1 do artigo 2110.º aponte no sentido de todas as despesas deste tipo estarem sujeitas a colação – « tudo quanto o falecido tiver despendido » -, o n.º 2 do mesmo preceito logo mostra que várias despesas não estão, de facto abrangidas. O afastamento da colação quanto a certas despesas depende de dois elementos: natureza e valor das mesmas.

Quanto ao primeiro, a lei identifica como dispensadas da colação as despesas feitas com o casamento, com a alimentação, com o estabelecimento e a colação do descendente.

Contudo estas despesas só são excluídas da colação se se mostrarem adequadas ao fim a que se destinam, interferindo, portanto, aqui, o seu valor.

O donatário faz seus os frutos da coisa doada recebidos em vida do doador; só os recebidos depois da abertura da sucessão devem ser conferidos ( artigo 2111.º ).

Por outro lado, o donatário sujeito a colação, quanto a benfeitorias feitas na coisa doada, beneficia do tratamento do possuidor de boa fé, mandando o artigo 2115.º aplicar, com as necessárias adaptações, o regime dos artigos 1273.º e seguintes.

Relativamente á perda da coisa doada, nos termos do artigo 2112.º, há que distinguir em função da causa de perecimento. Se esta for imputável ao donatário, este continua sujeito à colação; caso contrário, não há colação.

Correspondentemente, o donatário responde pelas deteriorações que, com culpa sua, o bem doado tenha sofrido ( artigo 2116.º ).

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190. Imputação.

O modo como a colação opera é mediante a regra da imputação do valor da doação, calculado nos termos atrás expostos, que a lei acolhes ( primeira parte do n.º 1 do artigo 2108.º ).

O legislador não traçou um regime geral da imputação, nem dedicou consequentemente, qualquer divisão específica do Código à definição do seu regime. Faz-lhe, porém, referências dispersas, em matérias onde o instituto aflora: artigo 2108.º, 2114.º e 2165.º.

Com ressalvas de questões particulares sobre que teremos de nos pronunciar adiante, são imputadas na quota indisponível:

a) as liberalidades sujeitas a colação e a ela trazidas, salvo na parte em que excedam a quota do legitimário ( artigo 2108.º n.º 1 ).

b) as liberalidades sujeitas a colação, se o sucessor repudiar a sucessão, sem ter descendentes que o representem ( artigo 2114.º n.º 2 ).

c) o legado em substituição da legítima e o legado por conta da legítima, salvo na parte em que excederem o valor da legítima subjectiva ( artigo 2165.º n.º 4 ).

São imputadas na quota disponível:

a) as liberalidades feitas a descendentes não sujeitas a colação ( artigo 2114.º n.º 1 ).

b) as liberalidades em vida ou por morte feitas a terceiros ( artigo 2114.º n.º 1 ).

c) as liberalidades sujeitas e trazidas à colação na parte em que excedam a quota do legitimário ( artigo 2108.º n.º 1 a contrario ).

d) os legados em substituição e por conta da legítima na parte em que excedam a quota do legitimário ( artigo 2165.º n.º 4 a contrario ).

e) o pré-legado ( artigo 2264.º ).

192. Tutela da legítima.

O artigo 2163.º proíbe o autor da solução de impor encargos sobre a legítima e também de, contra a vontade dos legitimários, designar os bens que a hão-de integrar.

A partir deste regime estabelece-se um princípio de intangibilidade da legítima do ponto de vista qualitativo – e meramente quantitativo, como veremos – pois respeita, para além do seu valor, aos bens que devem caber ao legitimário e à qualidade desses bens, uma vez que eles não podem ser onerados com encargos.

Esse princípio não pode contudo, ser entendido com a rigidez qua letra do preceito sugere, porquanto ela é logo atenuada pelo disposto nos artigos seguintes, em matéria da chamada cautela sociniana e do legado em substituição da legítima.

O regime de cálculo da legítima não constitui, só por si, uma tutela eficaz da intangibilidade quantitativa da legítima. Há que atribuir ao sucessor o direito de atacar as atribuições gratuitas feitas pelo autor da sucessão, seja por acto inter vivos seja mortis causa, quando, pelo seu valor, ultrapassem a quota disponível e atinjam a legítima. É a redução por inoficiosidade.

193. cautela sociniana.

O artigo 2164.º com ressalva da proibição genérica contida no preceito anterior, permite ao testador, mesmo quando tenha sucessíveis legitimários, deixar a outrem um usufruto ou constituir a favor de alguém uma pensão vitalícia que, em qualquer dos casos, atinja a legítima.

A tutela que este instituto assegura aos legitimários não consiste em manter a intangibilidade da legítima – pois não têm meios para se opor à disposição testamentária –, mas em atribuir-lhe, em alternativa, e à sua opção exclusiva, o direito de adoptar um de dois comportamentos perante a disposição do testador.

194. Legado em substituição da legítima.

O legado em substituição da legítima constitui outro instituto que tem de ser analisado para estabelecer a justa medida do princípio da intangibilidade qualitativa da legítima. È que, neste caso, são, pelo testador, atribuídos, ao herdeiro legitimário, a título de legado, os bens que ele vai receber.

Como a designação sugere, e o artigo 2165.º n.º 1 confirma, no legado em substituição da legítima a vontade do autor da sucessão é a de dispor, a favor do legitimário, de bens determinados que substituem a sua quota legitimária.

Assim, com resulta do n.º 2 do artigo 2165.º o sucessor legitimário é livre de aceitar o legado ou a legítima. Contudo, apura-se do mesmo preceito, que a aceitação de um importa o repúdio do outro.

O legislador manda aplicar, no caso de o legitimário atrasar a opção, o regime do artigo 2049.º. Feita a notificação prevista neste preceito, se o herdeiro nada declarar, o n.º 3 do artigo 2165.º considera que ele aceita o legado. Estamos perante um caso de valor declarativo legal do silêncio ( artigo 218.º ).

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Direito das Sucessões 4.º Ano

Por razões decorrentes da tutela dos demais legitimários, o legado em substituição da legítima está sujeito a redução se, ultrapassando a quota hereditária do legitimário a quem é atribuído, chegar a atingira a legítima de outros.

Em contrapartida, se o legado for inferior ao valor da legítima subjectiva do legitimário, mas, este, mesmo assim, aceitar o legado, perde igualmente o direito á sua legítima.

Não havendo outros legitimários, a legítima objectiva fica limitada ao valor do legado e a parte livre passa a considerar-se disponível.

195. Legado por conta da legítima.

No legado por conta, o testador faz uma atribuição de bens a certo legitimário, para estes serem levados em conta ( imputados ) na sua quota legitimária. Adoptando a letra da lei ( artigo 2163.º ), o testador designa bens para preencher essa quota.

È no fundo, um caos de herdeiro ex re certa.

196. Redução por inoficiosidade.

A garantia da legítima não pode bastar-se com a proibição de o autor da sucessão fazer, em vida ou por morte, disposições patrimoniais gratuitas que a ofendam. É necessário que, caso tais atribuições patrimoniais se verifiquem, seja assegurado aos sucessores legitimários um meio de contra elas reagir e de reintegrar a legítima.

Este meio é a redução por inoficiosidade, assim designada por ofender o officium pietatis familiar de que a sucessão legitimária retira o seu fundamento. Nestes termos, como resulta do artigo 2168.º, são inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima dos herdeiros legitimários.

Verificada uma situação de inoficiosidade, aos herdeiros legitimários é reconhecido o direito ( potestativo ) de redução da liberalidade violadora da legítima, « em tanto quanto for necessário » para esta ser preenchida.

Assim se dispõe no artigo 2169.º, resultando ainda deste preceito que a redução pode também ser requerida pelos sucessíveis dos herdeiros legitimários.

Este direito de redução obedece a um prazo de dois anos e conta-se a partir da aceitação da herança pelo herdeiro legitimário ( artigo 2178.º ).

A relevância do direito de redução das disposições inoficiosas justifica a sua irrenunciabilidade em vida do autor da sucessão, como se dispõe no artigo 2170.º. Deste modo, é nulo o acto jurídico de renúncia, em tais circunstâncias, por ser contrário à lei, nos termos gerais do artigo 294.º.

197. Regime jurídico; ordem da redução.

As

198. Modo como opera.

Resta agora apurar como opera a redução, ou seja, os termos em que ela se faz.Es face do disposto nos artigos 2174.º e 2175.º, verifica-se que, em princípio, a redução se faz em espécie, enquanto tal seja

possível. Se assim não puder acontecer, por causas que são de diferente natureza, a redução faz-se em valor.

Teoricamente, como o próprio nome indica, a redução tende a projectar-se apenas sobre uma parte dos bens que são objecto da liberalidade. Compreende-se, por isso que o legislador tenha aqui dedicado uma atenção especial à natureza divisível ou indivisível dos bens deixados ou doados, como consta dos n.º 1 e n.º 2 do artigo 2174.º.

Dos herdeiros legitimários e da sua legítima.

Desde logo, ocupando estes as classes dos legítimos, devem ser consideradas, esquematicamente, três classes diferentes, consoante concorram à sucessão:

a) O cônjuge e descendentes.

b) O cônjuge e ascendentes.

c) O cônjuge isolado.

200. Sucessão do cônjuge e descendentes.

Na primeira classe da sucessão legitimária, preenchida pelo cônjuge sobrevivo e descendentes, podem verificar-se duas situações:

a) Vocação do cônjuge e descendentes.

b) Vocação de descendentes.

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Direito das Sucessões 4.º Ano

No primeiro caso, a quota indisponível, independentemente do número de filhos, é de 2/3 da herança ( n.º 1 do artigo 2159.º ).

201. Sucessão do cônjuge e dos ascendentes.

Na segunda classe de sucessíveis, cabe também distinguir consoante são chamados:

a) o cônjuge e os descendentes; ou

b) os ascendentes isolados.

Se o cônjuge concorrer na sucessão com os ascendentes, qualquer que seja o grau destes, a quota indisponível é de 2/3 da herança ( n.º 1 do artigo 2161.º ).

202. Sucessão do cônjuge isolado.

Neste caso, segundo se estatui no artigo 2158.º, a quota indisponível é de metade da herança.

Sucessão Testamentária.

205. Noção de testamento.

O n.º 1 do artigo 2179.º define testamento como « o acto unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles ».

206. O testamento como negócio unilateral e singular.

No sistema jurídico português o testamento assume a configuração simultânea de negócio unilateral e singular.Extrai-se este regime do artigo 2181.º, que não admite a possibilidade de, ao mesmo tempo, duas ou mais pessoas testarem

no mesmo acto, quer fazendo disposições « em proveito recíproco, quer em favor de terceiros ».

Por outras palavras, e segundo uma terminologia que a própria epígrafe do preceito em análise consagra, não é admitido, no Direito português, o testamento de mão comum.

207. O testamento como negócio pessoal.

In casu, como se apura do artigo 2182.º o testamento diz-se acto pessoal por ser exigida nele uma coincidência entre a autoria moral e a material do negócio, sendo excluída a intervenção de terceiros.

Esta forte componente pessoal de testamento é ainda reforçada pela proibição do chamado testamento per relacionem, estatuída no artigo 2184.º.

208. Noção de substituição pupilar.

A substituição pupilar dá-se quando o progenitor substitui « aos filhos os herdeiros ou legatários que bem lhe aprouver, para o caso de os mesmos filhos falecerem antes de perfazer dezoito anos de idade ». É a noção que se extrai do n.º 1 do artigo 2297.º.

Só é admitida a substituição pupilar, enquanto faculdade do progenitor, como a própria noção legal revela, em relação a filhos menores.

Verificados os requisitos referidos na alínea anterior, a substituição pupilar é válida, mas pode vir a tornar-se ineficaz, em dois casos.

A primeira causa de ineficácia da substituição pupilar é a maioridade do filho.A substituição pupilar fica também sem efeito se, verificando-se, embora o falecimento do filho durante a menoridade, este

deixar descendentes ou ascendentes.

211. Substituição quase popular.

A substituição quase-pupilar demarca-se da pupilar por a faculdade de o progenitor substituir ao filho os sucessores que bem entender lhe ser atribuída no caso de este, qualquer que seja a sua idade, estar interdito por anomalia psíquica e, como tal, incapacitado de testar ( artigo 2298.º n.º 1 ).

212. Modalidades do testamento.

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Comuns:- Testamento público.- Testamento cerrado.

Especais:- Testamento militar.- Testamento marítimo.- Testamento a bordo de aeronaves.- Testamento em caso de calamidade pública.

213. Modalidades comuns.

A modalidade mais corrente de testamento, na realidade das relações sociais, é o testamento público.Caracteriza-se este, como decorre do artigo 2205.º, por ser escrito pelo notário, em livro próprio, muito embora este

funcionário público deva seguir, na elaboração do testamento, a vontade que, no acto, lhe seja manifestada pelo testador.

Admite-se, porém, desde há muito tempo, que o testamento seja escrito e assinado pelo testador, ou escrito por outra pessoa a rogo do testador e por este assinado. È o que se chama testamento cerrado ( artigo 2206.º n.º 1 ).

214. Modalidades especiais.

Uma das modalidades de testamento especiais é o militar que, por seu turno, pode ainda revestir duas submodalidades e ser público ou cerrado.

( Artigos 2210.º, 2211.º e 2212.º ).

O testamento marítimo caracteriza-se pelo lugar da sua feitura. No fundo, é o testamento feito a bordo de navio de guerra ou mercante, que se encontra em viagem por mar ( artigo 2214.º ). Podem ser autores de tal testamento quaisquer pessoas que se encontrem a bordo.

Por remissão expressa do artigo 2215.º o testamento marítimo pode também ser público ou cerrado, aplicando-se, correspondentemente, as disposições dos artigos 2211.º e 2212.º.

O testamento a bordo de aeronave, como a sua própria designação indica, é o feito por quaisquer pessoas que se encontrem a bordo de uma aeronave em viagem.

Artigo 2219.º.

O testamento em caso de calamidade pública caracteriza-se pelas circunstâncias do tempo em que é feito. O artigo 2230.º identifica um dos casos clássicos de calamidade pública – a epidemia –, mas logo manda aplicar o mesmo regime a outras calamidades.

215. Testamento de portugueses em país estrangeiro.

Do artigo 2223.º do Código Civil resulta que à disposição dos cidadãos portugueses é ainda posta a possibilidade de fazer testamento em país estrangeiro, quando aí se encontrem.

216. A capacidade testamentária e as suas limitações.

A determinação da capacidade testamentária respeita à capacidade de gozo; fundamentalmente do que se trata é de saber quem tem a faculdade de dispor dos seus bens por actos mortis causa e não de poder ou não celebrar tal negócio, por si, pessoal e livremente.

A regra que domina quanto à capacidade testamentária, contida no artigo 2188.º, é a de as pessoas singulares terem, em geral, capacidade de gozo nesta matéria e, consequentemente, em face de tudo o que fica exposto, também capacidade de exercício.

Importa recordar que não podem testar, nos termos do artigo 2189.º: os menores não emancipados; os interditos por anomalia psíquica.

217. Efeitos da incapacidade testamentária.

A falta de capacidade testamentária, estando em causa a capacidade de gozo, implica, quanto ao valor do negócio praticado pelo incapaz, as consequências típicas desta incapacidade. Assim, como expressamente determina o artigo 2190.º, o testamento é nulo.

Também a incapacidade acidental, segue, no domínio do testamento, o regime comum deste vício: o testamento feito por quem se encontre em situação de incapacidade acidental é anulável ( artigo 2199.º ).

218. As indisponibilidades sucessórias.

A indisponibilidade testamentária traduz-se numa limitação à livre e válida disposição de bens pelo testador, quando a correspondente faculdade seja exercida em relação a determinadas pessoas que mantêm ( ou mantiveram ) com o testador uma relação que pode perturbar o seu exercício livre e esclarecido.

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