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EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL/AUDITIVA: ESTUDOS DESENVOLVIDOS NO CONTEXTO AMAZÔNICO O presente painel trata da inclusão de estudantes com deficiência visual/auditiva a partir dos resultados de pesquisas desenvolvidas de forma independente, em três Estados da Amazônia Legal: Acre, Rondônia e Mato Grosso. Os resultados das referidas pesquisas são debatidos e entrelaçados aos referenciais teórico-metodológicos diferenciados. O estudo desenvolvido no Acre deu centralidade à formação inicial de professores de Matemática, mais especificamente à disciplina Prática de Ensino realizada em escolas do Ensino Médio que incluem estudantes cegos. As análises foram voltadas para a aprendizagem possibilitada pela utilização de recursos táteis (blocos de Luria). O estudo desenvolvido em Rondônia também analisa experiências de formação de professores que enfrentam o desafio de ensinar de Matemática, Física, Química para estudantes cegos. Tais experiências foram realizadas em um curso de extensão que incluiu estudos teóricos, diagnósticos da inclusão, produção de material didático e avaliação dos resultados da utilização dos materiais no ensino. A extensão universitária também foi objeto de estudo da pesquisa realizada no Mato Grosso, porém, o foco foi voltado para a análise dos desafios e potencialidades da configuração de projetos como redes de conversação sobre ciência, cultura e educação na contemporaneidade. Os entrelaçamentos desses três estudos realçam a importância da formação de professores para a adoção de práticas pedagógicas mais inclusivas. Realçam também as potencialidades do trabalho coletivo que aproxima universidade e escola de educação básica, pois, assim, a inclusão constitui-se numa via de mão dupla onde todos aprendem e são incluídos. Palavras-chave: Inclusão. Ciências/Matemática. Formação de Professores. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 10936 ISSN 2177-336X

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EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA PARA PESSOAS COM

DEFICIÊNCIA VISUAL/AUDITIVA: ESTUDOS DESENVOLVIDOS NO

CONTEXTO AMAZÔNICO

O presente painel trata da inclusão de estudantes com deficiência visual/auditiva a partir

dos resultados de pesquisas desenvolvidas de forma independente, em três Estados da

Amazônia Legal: Acre, Rondônia e Mato Grosso. Os resultados das referidas pesquisas

são debatidos e entrelaçados aos referenciais teórico-metodológicos diferenciados. O

estudo desenvolvido no Acre deu centralidade à formação inicial de professores de

Matemática, mais especificamente à disciplina Prática de Ensino realizada em escolas

do Ensino Médio que incluem estudantes cegos. As análises foram voltadas para a

aprendizagem possibilitada pela utilização de recursos táteis (blocos de Luria). O estudo

desenvolvido em Rondônia também analisa experiências de formação de professores

que enfrentam o desafio de ensinar de Matemática, Física, Química para estudantes

cegos. Tais experiências foram realizadas em um curso de extensão que incluiu estudos

teóricos, diagnósticos da inclusão, produção de material didático e avaliação dos

resultados da utilização dos materiais no ensino. A extensão universitária também foi

objeto de estudo da pesquisa realizada no Mato Grosso, porém, o foco foi voltado para a

análise dos desafios e potencialidades da configuração de projetos como redes de

conversação sobre ciência, cultura e educação na contemporaneidade. Os

entrelaçamentos desses três estudos realçam a importância da formação de professores

para a adoção de práticas pedagógicas mais inclusivas. Realçam também as

potencialidades do trabalho coletivo que aproxima universidade e escola de educação

básica, pois, assim, a inclusão constitui-se numa via de mão dupla onde todos aprendem

e são incluídos.

Palavras-chave: Inclusão. Ciências/Matemática. Formação de Professores.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10936ISSN 2177-336X

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO DE

ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL

Marcia Rosa Uliana

Universidade Federal de Rondônia - UNIR/REAMEC

Gerson de Souza Mól

Universidade de Brasília–UnB/REAMEC

RESUMO: O presente estudo objetivou investigar como uma disciplina/curso de

formação para futuros professores de Matemática, Física e Química, centrada em

estratégias de ensino a estudantes com deficiência visual, pode contribuir para a

preparação docente, tendo em vista a promoção do ensino inclusivo. O estudo aconteceu

no Estado de Rondônia e constituiu em uma pesquisa-ação orientada pelo referencial

metodológico da abordagem qualitativa. O processo formativo/investigativo se

subdividiu em três fases: Exploratória/Diagnóstica, Ações Formativas e Avaliação. Ao

todo participaram da investigação 87 pessoas dentre essas professores que enfrentam o

desafio de ensinar Matemática, Física ou Química para estudantes com deficiência

visual; estudantes do Ensino Médio com deficiência visual e licenciandos das três áreas

mencionadas. Foram utilizados questionários, entrevistas semiestruturadas, vídeo-

gravações e narrativas/casos de ensino para produzir/coletar dados juntos aos

participantes. No desenvolvimento do estudo utilizou-se a técnica de Análise de

Conteúdo. Os dados da fase Exploratória/Diagnóstica evidenciaram que estudantes com

deficiência visual do Ensino Médio não estão vivenciando um processo

verdadeiramente inclusivo e que a temática educação de estudante com deficiência está

ausente ou posta de forma muito tímida nos projetos pedagógicos dos cursos de

licenciatura analisados. Professores que estão ministrando aulas para estudantes com

deficiência não tiveram preparação pedagógica específica para esse fim. Concluintes

dos cursos de licenciatura analisados, também, não se sentem preparados para

promoverem um ensino inclusivo. Dados produzidos/coletados durante as ações

formativas/investigativas revelaram que a disciplina/curso centrada em estratégias de

ensino para estudantes com deficiência visual, gerou múltiplas e significativas

contribuições, no que tange principalmente aos saberes docentes para a promoção de um

ensino inclusivo para estudantes com deficiência visual. Dentre as ações formativas

desenvolvidas, as que se mostraram mais produtivas foram as que correlacionaram

teoria e prática, como a produção e testagem de material didático com estudantes com

deficiência visual.

Palavras-chave: Deficiência visual. Formação de professores. Matemática, Física e

Química.

INTRODUÇÃO

Neste artigo apresentamos e discutimos resultados de uma pesquisa de

doutorado que planejou, propôs e avaliou a repercussão de uma disciplina/curso voltada

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10937ISSN 2177-336X

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para o ensino de conteúdos de Matemática, Física e Química para estudantes com

deficiência visual. Trata-se do processo de formação inicial de futuros professores de

tais disciplinas. A pesquisa foi desenvolvida no Estado de Rondônia, entre o segundo

semestre de 2013 e o primeiro de 2015, numa abordagem metodológica referenciada na

pesquisa qualitativa (BOGDAN & BIKLEN (1994) e na pesquisas-ação (THIOLLENT,

2011). O processo formativo/investigativo aconteceu em três fases distintas, que foram

assim intituladas: Exploratória/Diagnóstica, Ações Formativas e Avaliação.

Exploratória/Diagnóstica: Esta fase foi orientada pelo propósito de conhecer

como tem ocorrido a formação e atuação de professores das áreas de Matemática, Física

e Química no que se refere ao fazer pedagógico em salas de aula que possuem

estudantes com deficiência visual.

Ações Formativas: Norteados pelos resultados da análise dos dados da primeira

fase e ancorados na revisão bibliográfica, planejamos e desenvolvemos uma

disciplina/curso. Essa disciplina/curso buscou sensibilizar e preparar futuros professores

de Matemática, Física e Química para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que

atendessem as demandas particulares de estudantes com deficiência visual no processo

de ensino-aprendizagem.

Avaliação: Refere-se ao propósito de conhecer a repercussão da disciplina/curso

na formação de futuros professores. Para tanto, analisamos em que medida as ações

formativas desenvolvidas no curso contribuíram para o desenvolvimento de saberes

docentes. Pautando-nos na organização dos saberes docentes nos conglomerados,

delineados por Tardif (2012): Saberes da formação profissional; Saberes disciplinares;

Saberes curriculares; e Saberes experienciais.

Na realização da pesquisa partimos do entendimento de que o movimento da

inclusão escolar, iniciado na década de 90 do último século, aumentou

consideravelmente o número de alunos com deficiência no âmbito das escolas de

Educação Básica, demandado assim, inovações no fazer pedagógico e de novas

pesquisas na área. Conforme indicam estudos realizados por Costa (2012), Amiralian

(2009), Camargo (2008) os professores não se sentem preparados para promover a

aprendizagem da diversidade de estudantes. Em se tratando do ensino da Matemática,

Física e Química para estudantes com deficiência visual, o professor precisa adotar

metodologias e materiais pedagógicos que permitam a compreensão de conceitos

abstratos e, em muitos casos, de grande complexidade.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10938ISSN 2177-336X

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Diante desses entendimentos orientamos este estudo pela seguinte pergunta:

Quais as possíveis contribuições de uma disciplina/curso sobre estratégias de ensino a

estudantes com deficiência visual, na formação de professores de Matemática, Física e

Química?

Para tanto, a referida pesquisa teve por objetivo investigar como uma

disciplina/curso de formação de futuros professores de Matemática, Física e Química,

centrada em estratégias de ensino a estudantes com deficiência visual, pode contribui

para a preparação docente, tendo em vista a promoção do ensino inclusivo.

Para produzir/coletar os dados da presente pesquisa foram utilizados

questionários, vídeos-gravações, entrevistas semiestruturadas, narrativa/caso de ensino e

observação como instrumento.

O PROCESSO DE INCLUSÃO DE ESTUDANTE COM DEFICIÊNCIA VISUAL

A diversidade humana presente nas escolas de Educação Básica tem exigido a

adoção de práticas de inclusão. “Aceitar a diversidade possui muitas e complexas

implicações” (IMBERNÓN, 2000, p. 84), demandado da escola inovações em termos de

organização do espaço, do currículo (habilidades, conhecimentos, materiais didáticos,

metodologias de ensino e de avaliação) e da formação do quadro de pessoal. Nesse

processo faz-se necessário despir-se dos pré-conceitos construídos historicamente no

que se refere à capacidade de aprendizagem das pessoas com deficiência.

Esteve (1999, p. 122) nos lembra que avançamos em termos da universalização

da educação das nossas crianças, “agora, temos de modificar o nosso sistema de ensino,

para que haja flexibilidade suficiente para nos ocuparmos com essas crianças e seus

problemas reais, com certo nível de qualidade”. Para tanto, é necessário resgatar a

integridade dos professores, melhorar a qualidade da educação num geral, efetivar na

prática o que é de direito de todos os cidadãos e pagarmos uma dívida que a sociedade

tem com essas pessoas marginalizadas socialmente.

Amiralian (2009) ressalta que os professores de estudantes com deficiência

visual precisam saber sobre os efeitos da ausência ou limitação do sentido da visão no

processo de desenvolvimento e aprendizagem para então, definir atitudes e

procedimentos pedagógicos. A autora pontua ainda que “é importante também

incentivar os professores a descobrir o melhor caminho para interagirem com as

crianças cegas [...] de modo que elas possam alcançar seus objetivos” (2009, p. 30).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Oliveira (2009) defende que os professores precisam, mesmo que não dominem,

estimular seus estudantes para utilizarem o código de escrita braille durante as aulas

para fazerem anotações, atividades e realizarem leituras. Esse é o único código de

escrita até o momento que é plenamente acessível ao estudante cego. É até

compreensível que os professores não o dominem, mas o seu uso pelo estudante cego é

de fundamental importância.

Não há modelos prontos para a educação inclusiva. Por isso, é de fundamental

importância que os professores interajam com os estudantes com deficiência e

descubram juntos maneiras de desenvolver práticas pedagógicas que os contemplem.

Cada estudante é um ser único, constituído pelas suas experiências familiares e sociais,

pela sua constituição genética, pelas suas crenças, pelos costumes e hábitos

(AMIRALIAN, 2009).

Claro que existem diferenças significativas entre os estudantes ditos normais, os

de baixa visão, os que já nasceram cegos e os que contraíram a deficiência na infância

ou na fase adulta. Mas, mesmos os que estão na mesma condição em relação à

deficiência, são diferentes uns dos outros. Por isso, promover a inclusão de estudantes

com deficiência é sempre um desafio.

Apresentaremos a seguir a análise de uma experiência que vivenciamos no

processo formativo/investigativo de professores para o ensino de Matemática, Física e

Química para estudantes com deficiência visual. Não se trata de uma receita de

educação inclusiva, mais sim de reflexões sobre possibilidades de formação de

professores para a diversidade.

DISCUSSÃO E RESULTADOS

Na primeira fase – Exploratória/Diagnóstica – intentamos fazer uma leitura

panorâmica de como vem acontecendo a formação docente, tendo em vista o processo

de educação da pessoa com deficiência visual no Estado de Rondônia. Analisamos o

conteúdo de entrevistas semiestruturadas realizadas com três estudantes com deficiência

visual e com quatro professores que enfrentam o desafio de ensinar Matemática, Física e

Química para alunos com deficiência visual. Analisamos também a grade curricular de

cinco projetos pedagógicos de cursos de Licenciatura em Matemática, Física e Química

e as respostas de um questionário aplicado a 54 licenciandos de cinco cursos.

Na Figura 1 apresentemos uma síntese do desvelado com o estudo diagnóstico

realizado e como foi planejadas/estruturadas a ações formativas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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4

Considerando a realidade atual do processo de inclusão de estudantes com

Resultados do estudo diagnóstico

Projetos Pedagógicos

- A temática Educação Inclusiva esta posta de forma

tímida ou ausente nos projetos dos cursos;

- A educação de estudante com deficiência visual não é

mencionada em nenhum dos projetos analisados;

- Dois cursos não oferecem nem a disciplina de Libras

que é obrigatória por força de lei;

- Distanciamento entre a formação proposta e a

demanda emergente da Educação Básica.

Licenciandos

- Inclusão escolar é algo importante e de direito dos

estudantes com deficiência, concebe os licenciandos;

- Os licenciandos conseguem perceber que o ensino

que está sendo praticado nas escolas de Educação

Básica não é o inclusivo;

- Os licenciandos não sem sentem preparados para

promover um ensino que inclua estudante com

deficiência;

- A presença da disciplina de Libras, soma no

entendimento no processo inclusivo além do

atendimento do aluno com deficiência auditiva;

- Disciplina que aborda questões gerais sobre a

Educação Inclusiva, não é o suficiente, mas já suscita

contribuições relevantes no processo formativo;

- Os conhecimentos dos futuros professores sobre as

particularidades da deficiência visual em si e sobre as

adequações metodologia necessária no processo

didático para esses estudantes são muito limitado.

Resultados do estudo diagnóstico

Professores

- A temática Educação Inclusiva, educação de aprendiz

com deficiência visual não foi assunto de estudo na

formação inicial nem continuada dos professores;

- Desconhecimento por parte dos professores das

particularidades do estudante com deficiência visual;

- Ausência de material didático adaptado nas escolas

para estudantes com deficiência visual;

- As ações pedagógicas desenvolvidas pelos professores

com estudantes com deficiência visual estão vinculadas

ao que os mesmos concebem por Educação Inclusiva;

- Descredito por parte de alguns professores da

capacidade intelectual e cognitiva do estudante cego;

- A efetivação da inclusão escolar do estudante com

deficiência visual é possível mediante um somatório de

ações concatenadas.

Estudantes

- Estudantes são alfabetizados em braille, mas não o

utilizam no processo de aprendizagem;

- Os estudantes são críticos com as mazelas do sistema

educacional que não permite que eles participem

ativamente do processo de aprendizagem;

- As escolas não estão preparadas fisicamente e

pedagogicamente para promover a inclusão de

estudantes com deficiência visual;

- A Matemática está sendo, forjadamemte, ensinada

apenas por intermédio de definições teórico;

- O ensino da Física e da Química aos estudantes com

deficiência visual, também, está sendo superficial.

Principais amarras teóricas que nortearam as ações formativas

1 Os professores são os protagonistas no processo de inclusão (MITTLER, 2003).

2 Os professores tem direito de esperar e receber formação que demanda o ensino

inclusivo (BRASIL, 1996).

3 “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”(ONU,

1948).

4 O estudante com deficiência visual é um estudante diferente, mas não menos capaz

no processo de aprendizagem (VYGOSTSKI, 1997).

5“Em geral, atribui-se às pessoas com deficiência uma status de segunda classe, são

consideradas inferiores” (VALLE, CONNOR, 2014, p. 39).

6 O processo de ensino aprendizagem para estudante com deficiência visual precisa

ser assessorado com materiais adaptados (COSTA, 2012; AMIRALIAN, 2009).

7 Os saberes oriundos da experiência são os mais utilizados na prática docente

(TARDIF, 2012).

8 A aprendizagem da docência deve se dá por meio de situações práticas que sejam

efetivamente problemáticas (NÓVOA, 1999).

Estratégias formativas propostas considerando os resultados dos estudosdiagnósticose teóricos

1 e 2 - Promover um curso de formação docente tendo em vista o fazer pedagógico com estudantes com deficiência;

3 - Apresentar aos licenciandos as leis e documentos que ampara o processo educacional dos estudantes com

deficiência evidenciando que atender as demandas educacionais desses alunos não é caridade e sim obrigação

docente;

4 - Apresentar e discutir com os futuros professores as particularidades dos alunos com deficiência visual;

4 e 5 - Sensibilizar os futuros professores de Matemática, Física e Química que é possível ensinar os conteúdos de

suas áreas, proporcionando que eles conheçam experiências exitosas nesse âmbito;

4 e 5 - Proporcionar que os futuros professores conheçam pessoas cegas bem sucedidas no processo educacional e

socialmente para desmitificar a ideia que são pessoas menos capazes;

6 e 7 - Incentivar e assessorar os futuros professores a desenvolver/adaptar materiais e atividades que possibilite o

aluno deficiente visual aprender conteúdos curriculares utilizando como acesso os sentidos remanescentes;

4, 5, 6, 7 e 8 - Viabilizar para que os futuros professores vivencie a experiência de testar os materiais/atividades

desenvolvidos/adaptados por eles com estudantes com deficiência visual.

O que fazer para mudar

essa realidadede

in/exclusãode alunos

com deficiência visual

no processo de ensino

aprendizagem? Uma

disciplina/curso de

formação para futuros

professores? Que ações

formativas favorecem o

desenvolvimento de

saberes demandados no

fazer pedagógico em

contexto de aprendizes

com deficiência visual?

Figura 1- Esquema síntese da Fase Exploratória/Diagnóstica e estruturação das ações Formativas

Fonte: Elaborado pelos autores com base em dados da Primeira Fase da pesquisa

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Considerando os dados do diagnóstico da realidade atual do processo de inclusão

de estudantes com deficiência visual no Estado de Rondônia e ancorados nas

contribuições de pesquisadores que discutem questões como: processo de inclusão de

estudantes com deficiência, formação de professores e o que ditam as leis e documentos

sobre a educação das pessoas com deficiência, promovemos um curso de extensão (com

a estrutura de uma disciplina 40 horas) por isso a designação disciplina/curso, do qual

participaram 26 licenciandos em Matemática, Física e Química.

Esse processo formativo constituiu a segunda fase da pesquisa - Ações

Formativas – que buscou contribuir diretamente com a superação de obstáculos

(apresentado na Figura 1) que dificultam a efetivação do processo de inclusão do

estudante com deficiência visual no Estado de Rondônia. Buscou ainda investigar a

repercussão de um processo formativo nos moldes do desenvolvido na preparação

docente tendo em vista o fazer pedagógico em contexto que possui estudante com

deficiência visual.

Os 26 licenciados que participaram da Segunda Fase da pesquisanão foram os

mesmos que participaram da Primeira. Com isso, julgamos necessário realizar um

diagnóstico inicial para se ter condições de analisar, ao final, a repercussão da formação

desenvolvida. Cabe destacar que a Terceira Fase – Avaliação – aconteceu

simultaneamente e concatenada as ações da segunda fase do estudo.

Aplicamos um questionário com perguntas dissertativas para os 26 licenciandos

no primeiro dia do processo formativo e promovemos situações para que eles

expressassem suas percepções e conhecimentos sobre o processo de inclusão, em

especifico dos de estudante com deficiência visual.

Considerando o exposto, fizemos as seguintes perguntas aos licenciandos: Para

você, o que é Educação Inclusiva? Qual a sua opinião sobre Inclusão Escolar? Para

você, existe diferença entre inclusão e integração? Em sua opinião, quais as vantagens e

desvantagens de aluno com deficiência estudar junto com alunos sem deficiência? Você

acredita que é possível ensinar aluno com deficiência na sala de aula do ensino regular?

Que tipo de ação/metodologia/recursos você, como professor da área de conhecimento

que está se formando, iria utilizar em suas aulas, se possuísse um aluno cego?

Analisamos as respostas apresentadas pelos licenciandos em interface com as

contribuições de Mittler (2003), Valle e Connor (2014), Stainback e Stainback (1999)

sobre o ensino inclusivo e as contribuições de Tardif (2012) e Nóvoa (1999) sobre

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formação de professores. Com isso, conseguimos explicitar requisitos que constituíram

quatro categorias temáticas que expressam o nível de conhecimento e percepção dos

licenciandos sobre aspectos diversos da Inclusão Escolar, inclusão de alunos com

deficiência visual.

No Quadro 1 explicitamos as categorias, os requisitos basilares que nortearam a

constituição dessas categorias e a classificação dos licenciandos nomeando-os com

siglas. Utilizamos a sigla LQ para identificar licenciando em Química, LM licenciando

em Matemática e LF licenciando em Física e o número para identificar e diferenciar os

sujeitos.

Quadro 1 - Classificação dos conhecimentos dos licenciandos sobre inclusão escolar em categorias

Categoria Requisitos Licencian

dos

Inclusivista

(1)

-Conhece os princípios básicos da Educação Inclusiva;

-Percebe que o professor é responsável por promover a aprendizagem

de todos os alunos;

-Acredita que é possível ensinar os conteúdos curriculares para alunos

com deficiência visual junto com os ditos normais.

-Consegue contemplar benefícios proporcionados pela Educação

Inclusiva;

-Acredita na capacidade de aprendizagem dos alunos com deficiência;

-Mostra dominar mecanismos didáticos que possibilitam desenvolver

um ensino no qual os estudantes com deficiência visual possuam

equidade de oportunidades de aprendizagem.

LQ2

Integracion

ista

(7)

- Conhece os princípios básicos da Educação Inclusiva;

-Percebe que o professor é responsável por promover a aprendizagem

de todos os alunos;

- Acredita que é possível ensinar os conteúdos curriculares para alunos

com deficiência visual junto com os ditos normais.

-Consegue contemplar benefícios proporcionados pela Educação

Inclusiva;

- Mostra ter ideia vaga de metodologia que possibilita desenvolver um

ensino no qual os estudantes com deficiência visual possuam equidade

de oportunidades de aprendizagem.

LM20,

LQ1,

LM12,

LM7,

LF4, LM8

e LM11

Sensível

(15)

- Conhece pelo menos em partes, os princípios básicos da Educação

Inclusiva;

- Percebe que o professor deve promover a aprendizagem de todos os

alunos;

- Tem dúvidas se é possível ensinar os conteúdos curriculares de suas

áreas para alunos com deficiência visual junto com os ditos normais;

- Concebe que o objetivo maior da Educação Inclusiva é o convívio

social;

- Mostra não possuir saberes que possibilitam desenvolver um ensino

que contemple os alunos com deficiência visual no processo de

aprendizagem.

LM1,

LM2,

LM3,

LM4,

LM5,

LM6,

LF1,

LM13,

LF3,

LM14,

LM15,LM

16, LM17,

LM18 e

LM19

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Insensível

(3)

- Conhece alguns princípios da Educação Inclusiva;

- Concebe que o objetivo maior da educação inclusiva é o convívio

social;

- Não acredita ser possível ensinar os conteúdos curriculares para

alunos com deficiência visual junto com os ditos „normais‟;

-Não consegue contemplar benefícios proporcionados pela Educação

Inclusiva;

-Evidencia não ter nem ideia, que metodologia poderia utilizar no

processo didático que iria atender as demandas de estudantes com

deficiência visual no processo de aprendizagem.

LM9, LF2

e LM10

Fonte: Elaborado pelos autores

Somente o licenciando LQ2 demonstrou com as respostas e falas que teria

condições no presente momento de desenvolver um ensino numa sala de aula que

possui estudante com deficiência visual de modo que esse estudante tivesse

oportunidade de participar ativamente do processo de aprendizagem. Por isso, o nome

da categoria: inclusivista. Esse futuro professor de Química respondeu que iria “usar

recursos que o aluno possa pegar, sentir o cheiro ou ouvir” (LQ2), evidenciando, assim,

que iria adaptar materiais para explorar os sentidos remanescentes do estudante, algo

que coaduna com as demandas desse público de estudante para a aprendizagem de

conteúdos da disciplina Química.

Sete licenciandos (LM20, LQ1, LM12, LM7, LF4, LM8 e LM11) ficaram

categorizados como Integracionistas, pois suas respostas evidenciaram que

apresentavam noção do como deveriam proceder didaticamente para promover um

ensino que incluísse o estudante com deficiência visual. Todavia, deixaram dúvidas se,

de fato, iriam contribuir para que esses estudantes tivessem aprendizagens

significativas dos conteúdos que iram ministrar, ou se contentariam com a efetivação

dos aspectos sociais do processo de inclusão.

A maioria (15 licenciandos) mostrou ter entendimento coerente do que é

inclusão escolar e da corresponsabilidade em promovê-la. No entanto, esse grupo

evidenciou não saber como gerir um processo didático que atenda as particularidades

de alunos com as diferentes limitações, dentre eles, os estudantes com deficiência visual

no processo didático.

Os licenciandos LM9, LM10 e LF2 deixaram transparecer que tem um

entendimento muito limitado do que seja Educação Inclusiva e não conseguem

vislumbrar os benefícios dessa para os estudantes num geral. Tampouco conhecem

procedimentos didáticos que permitam desenvolver um ensino que contemple a

diversidade de alunos.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Cabe elucidar que o processo formativo vivenciado por esse grupo de

licenciando estruturou-se em 12 encontros de estudos presenciais, correspondendo a 30

horas-aula. Nesses encontros foram realizados estudos teóricos sobre a inclusão de

estudantes com deficiência nas escolas de Educação Básica, mais especificamente do

estudante com deficiência visual, sobre as demandas e particularidades desses

estudantes, e sobre as legislações que ampara a inclusão. Foram realizadas também

palestras por dois professores cegos. Além disso, foi desenvolvida uma investigação de

materiais disponíveis no mercado para identificar aqueles que poderiam ser utilizados

no ensino da Matemática, Física e Química para estudantes com deficiência visual.

Também foram discutidos, planejados e desenvolvidos materiais didáticos e estratégias

com essa finalidade.

Nas atividades realizadas a distância (10 horas aula) os licenciandos foram

organizados em pequenos grupos para planejar, desenvolver e testar materiais e

estratégias pedagógicas para ensinar estudantes com deficiência visual. Cabe destacar,

que todo o curso aconteceu num intervalo de tempo de seis meses entre o segundo

semestre de 2014 e primeiro de 2015 e que todos os encontros presenciais e a distância

foram gravados em vídeo para futura análise. No término do processo formativo foi

aplicado um segundo questionário para o 26 licenciandos, tendo em vista analisar

possíveis mudanças de percepção e desenvolvimento de novos saberes docentes.

O resultado da reavaliação do nível de conhecimento dos licenciandos,

considerando os requisitos basilares que nortearam o processo formativo foi ilustrado no

Quadro 2. Nele são apresentas as categorias, a classificação do licenciando ao iniciar a

participação no curso desenvolvido, e a que passou a ocupar ao término do curso.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Figura 2 - Reavaliação dos conhecimentos dos licenciandos sobre inclusão escolar em categorias

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados produzidos/coletados durante o curso de extensão

Conforme pode ser contemplado na Figura 2, com exceção do licenciando LQ2

que já se enquadrava na categoria de professor inclusivista, todos os outros, ao terem

reavaliado sua „bagagem‟ de conhecimentos e percepções, em específico, sobre inclusão

escolar de estudantes com deficiência visual, mudaram de categoria. Somente oito não

atingiram a classificação máxima de professores que mostraram ter capacidade e estar

preparados para promover a inclusão no processo de ensino aprendizagem de suas áreas

de conhecimento. Ficaram classificados como professores inclusivistas 16 licenciandos.

No início do curso havíamos identificado os requisitos necessários para a classificação

de inclusivista em apenas um licenciando (LQ2).

Cabe enaltecer que dentre as várias ações formativas desenvolvidas as que se

mostraram mais produtivas/significativas foram as que conciliaram/entrelaçaram teoria

e prática, como o planejamento, desenvolvimento/adaptação e testagem de

materiais/atividades com estudantes com deficiência visual e as palestras de dois

professores cegos. No caso das palestras, o diferencial não esteve no que abordaram os

professores, mas no desmitificado, construído ao conhecê-los.

Inclusivista

(1)

Insensível

(3)

Sensível

(15)

Integracionista

(7)

Insensível

(0)

Sensível

(0)

Integracionista

(7)

Inclusivista

(19)

LQ2

LQ1 LM20

LM12 LM7

LF4 LM8

LM11

LM15

LM18

LM1

LM2 LM3

LM5

LF1

LM6

LM4

LM13 LF3

LM19

LM17

LM14

LM10

LF2

LM9

LM16

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Visto que um dos „achados‟ inusitados do curso de formação foi perceber como

é forte o preconceito estigmatizante que os futuros professores traziam sobre a

capacidade das pessoas com deficiência visual ter desenvolvimento cognitivo,

aprendizagem dos componentes curriculares ensinados nas escolas e dessas pessoas

terem uma vida social com qualidade e independência. Isso configurava fortes

condicionantes negativos, os quais ofuscavam/limitavam esses futuros professores a

pensar em práticas pedagógicas inclusivas com esses aprendizes. Esses condicionantes,

por vez, foram desmitificados no momento que os licenciandos tiveram a possibilidade

de conhecerem dois professores cegos que lidam bem com a tecnologia e tem uma vida

independente, trabalham, estudam e se comunicam com o mundo; além da experiência

que tiveram de ensinar conteúdos de suas áreas de formação para estudantes com

deficiência visual.

Ao terem desmitificado as ideias negativas que traziam sobre a capacidade de

aprendizagem dos estudantes com deficiência visual, os futuros professores mostraram-

se mais comprometidos e entusiasmados com o processo de inclusão e em particular

com o desenvolvimento/adaptação de material didático para o ensino de sua disciplina

para estudante com deficiência. E mudaram seus discursos e percepção sobre a

capacidade de aprendizagem das pessoas com deficiência visual.

No entanto, acreditamos que o êxito alcançado no processo formativo, se deve

ao conjunto das ações concatenadas desenvolvidas e não exclusivamente é mérito das

ações de cunho prático e o contato com pessoas cegas. Visto que os estudos teóricos, as

discussões em grupos, os seminários, os estudos de casos de ensino, as vivências de se

colocar no lugar da pessoa com deficiência foram importantes e serviram para

alicerçarem reflexões e tomadas de decisões no planejamento das ações práticas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com os resultados apurados ao procedermos à reavaliação dos conhecimentos e

concepções dos licenciandos e da experiência vivenciada, concluímos que é possível

com uma disciplina/curso, mesmo com uma carga horária pequena, proporcionar

melhoras significativas na formação de futuros professores no que se refere à educação

para estudantes com deficiência e reduzir a discrepância que há entre o que é

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10947ISSN 2177-336X

13

proporcionado na formação inicial de professores e as demandas das salas de aula da

Educação Básica.

Identificamos ainda, na análise dos dados, que a formação desenvolvida

possibilitou que diferentes tipos de saberes demandados no exercício da docência

fossem desenvolvidos/construídos ou mesmo ressignificados. Contudo, os saberes da

formação docente e os da experiência foram os que sobressaíram, seja pela recorrência

seja pela consistência desses nos discursos, nas ações e posturas dos licenciandos.

Confirmamos com esse estudo, que investir na formação do protagonista do

processo didático, do professor, é um caminho próspero e eficiente rumo a melhoria da

qualidade de ensino para todos os alunos, inclusive, do considerado „diferente‟ que se

encontram nas escolas de ensino regular.

Com isso, chegamos ao fim da nossa „viagem‟ na estrada que é infindável de

extensão e possibilidades, ressaltando que o processo formativo/investigativo realizado

está emoldurado no que entendemos e acreditamos sobre inclusão. No entanto, o

deixamos em aberto à possibilidade de olhares críticos da diversidade humana, tendo

ciência que o estudo em pauta tem suas limitações, mas, abre possibilidades para novas

investigações e discussões, além de proporcionar argumentos para estudos futuros no

mesmo ou em outros focos.

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10950ISSN 2177-336X

16

FORMAÇÃO INICIAL DE MATEMÁTICA E NEUROCIÊNCIA: PRÁTICAS

COM POSSIBILIDADES DE INCLUSÃO DE ESTUDANTES CEGOS

Salete Maria Chalub Bandeira

Universidade Federal do Acre - UFAC/FAPAC/ REAMEC

Evandro Luiz Ghedin

Universidade Estadual de Roraima – UERR/REAMEC

RESUMO: Este trabalho relata uma pesquisa na formação inicial de docentes de

matemática privilegiando a práxis para uma formação do professor crítico reflexivo,

com ênfase nos processos cognitivos da aprendizagem que decorrem e emergem das

neurociências aplicadas à educação, destacando os blocos de Luria. A investigação se

desenvolveu na formação inicial de estudantes do Curso de Licenciatura em Matemática

da Universidade Federal do Acre (UFAC) no contexto das disciplinas Práticas de

Ensino de Matemática III e IV e em quatro escolas do Ensino Médio da rede estadual de

Rio Branco (AC) que se encontram em processo de inclusão de cinco estudantes cegos

em classes regulares. Tem por objetivo propiciar a oferta de espaços, tempos, conceitos

e práxis pedagógicas mediadas pelos processos cognitivos da reflexão no contexto da

Formação Inicial de Docentes de Matemática possibilitando a construção de saberes que

tornam possível a inclusão de estudantes cegos nas Escolas de Ensino Médio, ao invés

de sua simples integração escolar. Utilizando-se como referencia central às

recomendações da pesquisa-ação colaborativa, o processo se iniciou em 2011 e aponta

os resultados: desenvolvimento profissional da formadora através da pesquisa e

comunicação científica; construção de saberes e identidade profissional de docentes de

matemática; mudança de paradigma com os envolvidos passando de uma

adaptação/integração de cegos para efetiva inclusão em aulas de matemática; construção

e adaptação de recursos didáticos de forma colaborativa, para o ensino-aprendizagem de

matemática; no âmbito das disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática, a pesquisa

possibilitou uma mudança de prática eminentemente teórica para uma prática inserida

na realidade escolar; a pesquisa aponta que há a necessidade de criar uma política

universitária que implique mudanças no currículo da formação para as disciplinas de

inclusão constar como ofertas a partir do primeiro ano de curso e a formação de

formadores para a educação na diversidade.

Palavras-Chave: Formação Inicial de Matemática. Neurociência – blocos de Luria.

Inclusão de Cegos.

INTRODUÇÃO

Na última década no Estado do Acre, temos acompanhado o aumento de

estudantes com necessidades educacionais especiais em escolas nas classes comuns.

Dados apresentados pela Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais (DEPE), ligado

ao Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) apontam que

no ano de 2011, foram matriculados 4.852 estudantes cegos nas escolas estaduais do

Acre, conforme o censo realizado pela Secretaria de Educação Especial do Estado

XVIII ENDIPE

Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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(SEESP/AC). Em 2013, esse número foi 6.405 estudantes matriculados do 6º ao 9º ano

do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

Com o objetivo de formar professores em matemática para lidar com os desafios

da inclusão de estudantes cegos no espaço escolar, à pesquisa articulou-se em torno do

seguinte problema: como a oferta de espaços, tempos, conceitos e práxis pedagógicas,

no contexto da Formação Inicial de Docentes de matemática, pode favorecer a inclusão

de estudantes cegos nas Escolas de Ensino Médio de Rio Branco-Acre e possibilitar aos

professores em formação inicial uma formação para a inclusão?

No intento de oferecer aos discentes do Curso de Licenciatura em Matemática

“uma formação docente com atenção voltada à diversidade” (BRASIL, 2002)

contemplando conhecimentos para atuar com estudantes com necessidades educacionais

especiais, vinte discentes do 3º período do Curso de Licenciatura em Matemática,

juntamente com a docente da disciplina de PEM III da UFAC construíram um „Kit

Pedagógico de Matrizes e Determinantes – Kit MD’. Esse recurso didático – produzido

com uma prancheta de papelão com cartelas de remédio coladas com cola quente,

tampas de refrigerante pet, semente de mulungu (representando os valores positivos) e

de lentilha (para os valores negativos) – foi utilizado no ensino/avaliação de matrizes e

determinantes para estudantes do 2º ano do Ensino Médio e, em particular, um dos

estudantes cegos que não pode compreender o assunto sem recursos táteis.

Essa experiência foi objeto de uma pesquisa de abordagem qualitativa,

utilizando-se como referencia central às recomendações da pesquisa-ação. A

investigação–formação adotou a proposta de Ibiapina (2008), com ciclos de

planejamento, ação e avaliação/reflexão se sucedendo em três fases: diagnóstico,

intervenção e avaliação. Para efeito do registro dos fatos e acontecimentos ocorridos na

sala de aula com o grupo de professores em formação inicial, na aplicação de

metodologias no contexto da UFAC e da escola utilizamos uma filmadora, um tripé e a

filmagem como instrumento de registro.

Com a intencionalidade de formarmos na UFAC professores para a diversidade

que investigam a própria prática, e dispostos a repensar a formação inicial e contínua

dos professores nos apoiamos em Pimenta (2008, p.16) que têm demonstrado que os

cursos de formação, ao desenvolverem um currículo formal com conteúdos e atividade

de estágios distanciados da realidade das escolas, pouco tem contribuído para gestar

uma nova identidade do profissional docente.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Outro referencial abordado na pesquisa foi a Neurociência Cognitiva definida

como, “o campo de estudos que vincula o cérebro e outros aspectos do sistema nervoso

ao processamento cognitivo e, em última análise, ao comportamento”, de acordo com

Sternberg (2012, p. 29), destacando os blocos de Luria (Oliveira, 1997), Gazzaniga e

Heatherton (2007), Cosenza e Guerra (2011), Coquerel (2011) e outros.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Em quatro escolas pesquisadas, em 2011 e 2012 nos momentos de observações

em aulas de matemática, o único material didático utilizado pelos estudantes cegos era o

livro de matemática do Ensino Médio adaptado em Braille. Entendemos que, o processo

de aprendizagem do estudante cego, se dá através do tato, da audição, da olfação e da

gustação, ou seja, das percepções sensoriais remanescentes. Para a aprendizagem

escolar, quando o estudante é cego, emprega-se o sistema Braille, e com isso “o tato

passa a ser a percepção sensorial mais utilizada, em conjunto com a audição”, pois os

estudantes ficam escutando as explicações do professor no decorrer da aula

(BANDEIRA, 2015, p. 158). Somando-se ao sistema Braille e a explicação verbalizada

com a linguagem matemática utilizada pelo professor, na pesquisa utilizamos recursos

táteis adaptados, destacando dentre eles a “cartela de remédios para ensinar o conceito

de matrizes, reconhecer seus elementos e seus tipos”.

No processo de efetivação desta parte da pesquisa utilizamos os conceitos das

estruturas luriana (Blocos de Luria) e mediações simbólicas para a efetiva abordagem

do conceito de matrizes e seus tipos. No material didático tátil “cartela de remédio” para

conceituar matrizes, colamos cartelas de remédio (para representar os tipos de matrizes

e abstrair seus conceitos) numa prancheta de papelão forrada com papel cartão

vermelho, ilustrado na Figura 1.

Na parte superior da prancheta de papelão representamos primeiramente a matriz

que batizamos de “matriz cela Braille”(com três linhas e duas colunas - B3×2), em

seguida outros tipos de matrizes, dentre elas, a matriz quadrada (com duas linhas e

duas colunas – Q2×2), a matriz coluna (com três linhas e uma coluna – C3×1), a matriz

linha (com uma linha e três colunas – L1×3) e outra matriz quadrada (com uma linha e

uma coluna – Q1×1). Na parte inferior da prancheta representamos outra matriz

quadrada (com três linhas e três colunas – Q3×3), uma matriz M transposta à “matriz

Braille” (com duas linhas e três colunas – M2×3), matriz linha (com uma linha e duas

colunas – L1×2), matriz coluna (com duas linhas e uma coluna – C2×1) e repetimos a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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matriz linha (com uma linha e três colunas – L1×3), para verificar se o aluno perceberia

que tinham matrizes iguais coladas em cantos diferentes da prancheta.

O significado apreendido mediante diferentes associações perceptivas permite

um trabalho mental e se torna uma representação que serve como signo mediador na

compreensão de mundo do sujeito. O grupo cultural em que o sujeito vive lhe fornece

maneiras de perceber e organizar a realidade. Esses elementos são os mediadores entre o

indivíduo e o mundo. Quando o indivíduo não vê e precisa conhecer o objeto “cartelas

de remédio”, por exemplo, ele fará a representação mental do objeto utilizando os

outros sentidos, tais como o tato e a audição. Com o tato ele percebe as linhas, forma,

textura etc. Com a audição precisará que outra pessoa descreva as características do

objeto, qual sua utilidade em nossa cultura. Assim, o conceito “cartelas de remédio”

teve seu significado esvaziado. Em seu lugar, foi atribuído o significado de matrizes,

uma nova representação mental que faz a mediação entre o indivíduo e a matemática.

Figura 1 - Cartelas de Remédio e pastilhas: Matrizes e seus tipos.

Fonte: Acervo da pesquisadora - PEM III - 2013.

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20

Ao relacionar os tipos de matrizes e seu conceito com o recurso didático tátil

com os blocos de Luria conceituados na Figura 1, o estudante cego com o seu foco de

atenção direcionado (em vigília) reconheceu os objetos que estavam na prancheta.

Primeiramente foi tocando com as mãos as cartelas de remédio coladas sobre a

prancheta. Nesse primeiro momento de funcionamento do cérebro, 1º bloco de Luria

(sentir) foi acionado: o estudante cego focou sua atenção tocando a prancheta com as

cartelas de remédio, reconhecendo as formas, apresentando coordenação corporal e

equilíbrio com o uso das mãos para movimentar o braço (integrando as informações

motoras e sensoriais e alguns aspectos da memória relacionados aos movimentos).

Com o uso do tato (lobo parietal) e da audição (lobo temporal), da explicação do

professor, o estudante movimentou suas mãos nas cartelas de remédio. E, reconhecendo

a similaridade da “cela Braille” na primeira cartela tocada verbalizou “parece à cela

Braille”. Nesse momento, o estudante utilizou as funções táteis-cinestésicas e auditivas

para ativar o 2º bloco de Luria (pensar) e relacionar as percepções novas com um

conceito já conhecido. Assim, o estudante recebeu, analisou e armazenou as

informações que chegaram do mundo exterior e dos aparelhos do próprio corpo. A

cinestesia (cine = movimento; estesia = sensação), que informa a posição do corpo no

espaço e os movimentos que estão sendo executados (COSENZA e GUERRA, 2011, p.

20).

Quando ele conseguiu pensar de forma mais elaborada e agir, reconhecendo os

tipos de matrizes quadradas, linha, coluna, transposta, dizendo sua compreensão e

resolvendo situações-problema utilizando o lobo frontal, empregou o 3º bloco de Luria

(agir).

Com o estudante cego Ezequiel do EJORB, desenvolvemos as atividades com

matrizes, primeiramente com o kit de cartela de remédios, identificando seus tipos

(Figura 1). Fazendo uso de outro recurso didático, construído com tampinhas de garrafa

pet, miçangas (representando os números positivos) e argolas (para os números

negativos) fixadas numa prancheta e formamos tipos de matrizes (conforme a sua ordem

- Am×n) em que representamos os valores dentro das tampinhas, de acordo com a sua

lei de formação para em seguida explicar as operações com matrizes e o assunto de

determinantes (Figura 1). No decorrer das ações para representarmos os elementos das

matrizes e calcularmos o determinante passamos a utilizar a semente de mulungu e

grãos de lentilha.

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A intervenção acima descrita teve por base o exercício dos conceitos de

sensação e percepção em relação ao tato.

O CAMINHO PARA A INCLUSÃO: A PESQUISA-AÇÃO

Em nossa pesquisa a investigação–formação foi fundamentada na proposta de

Ibiapina (2008), com ciclos de planejamento, ação e avaliação/reflexão se sucedendo

em três fases: diagnóstico, intervenção e avaliação, com as seguintes ações possíveis,

ilustrados na Figura 2:

Importante salientar que para Ibiapina (2008, p. 19), “os partícipes são

considerados como co-produtores da pesquisa”, é uma colaboração entre os diferentes

sujeitos (pesquisadores, professores, estudantes em formação, gestores, coordenadores)

que realizam na pesquisa a co-produção de conhecimentos e ciclos sucessivos de

reflexão crítica.

Na 1ª. Fase Diagnóstico: Iniciamos com uma investigação exploratória da

literatura da área e do referencial teórico ao longo de todo o processo, dado que a equipe

não dispunha de conhecimento suficiente sobre o tema, especialmente sobre o apoio à

inclusão. Paralelamente procedemos a uma investigação documental para identificar

instituições estaduais, federais e nacionais que desenvolvem ações (e ou políticas) na

área. Buscamos informações também sobre os recursos humanos, materiais disponíveis,

necessidades das escolas, do NAI/UFAC, da clientela escolar. Dessa forma, pudemos

identificar problemas enfrentados pelos professores e gestores para a inclusão efetiva

dos alunos deficientes visuais.

Figura 2- Proposta de investigação-formação adotada na pesquisa.

Fonte: Elaboração da pesquisadora baseada em Ibiapina (2008) e Azevedo (2014).

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Na 2ª. Fase Intervenção: Continuamos os estudos teóricos e realizamos

reuniões com os colaboradores da pesquisa para planejamento, confecção de

instrumentos para coleta de dados, planejamento de atividades de intervenção,

elaboração e implementação do plano de ação. Como recursos didáticos, utilizamos o

multiplano (FERRONATO, 2002), aplicado ao ensino de matemática; o sorobã para

trabalhar problemas contextualizados envolvendo as operações de adição, subtração,

multiplicação, divisão, além de mínimo múltiplo comum, máximo divisor comum, raiz

quadrada e outros; os softwares aplicativos: DOSVOX, Braille fácil, Braille Virtual,

GeoGebra e Materiais didáticos adaptados em alto relevo, voltados para o Ensino

Médio, construídos pelos alunos do curso de licenciatura em matemática e professores

colaboradores envolvidos na pesquisa.

Na 3ª. Fase Avaliação: Realizamos avaliação e replanejamento de ações com

vistas ao desenvolvimento do currículo e ao aperfeiçoamento profissional dos

envolvidos. Promovemos reuniões de avaliação formativa; elaboração de relatórios

parciais e finais; divulgação através de seminários das atividades desenvolvidas;

replanejamento de ações e elaboração de novos planos de trabalho (IBIAPINA, 2008).

Utilizamos uma filmadora e um tripé para o registro em vídeos dos

acontecimentos ocorridos na sala de aula com o grupo de professores em formação

inicial com a aplicação de metodologias no contexto da UFAC e da escola.

Tais atividades foram gravadas com o consentimento de todos, nas aulas na

UFAC e nas escolas. Outros registros utilizados foram os memoriais dos alunos, diário

de campo da pesquisadora e análise de documentos, dentre eles o Projeto Político do

Curso de Licenciatura em Matemática da UFAC e das Escolas, e o banco de dados (de

2011 à 2013) do Estado do Acre de alunos com necessidades educacionais especiais

fornecido pela Secretaria de Estado de Educação e Esporte (SEEE-AC) na Divisão de

Estudos e Pesquisas Educacionais (DEPE), ligado ao Instituto Nacional de Pesquisas

Educacionais Anísio Teixeira (INEP) que realiza a filtragem do censo do Estado do

Acre, obtidos pela Secretaria da Educação Especial do Estado do Acre (SEESP-AC).

A pesquisa-ação desenvolvida com os estudantes cegos e professores em

formação inicial de matemática serviu para comprovar esta realidade. Jesus e Vieira

(2011, p.143) apontam para:

A necessidade de ruptura da escola, como instituição pensada para poucos,

quando aberta ao trabalho educacional com crianças com necessidades

educacionais especiais, se configura na dependência de diagnósticos clínicos

para a elaboração de trabalhos diversificados. Isso reforça a necessidade de

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10957ISSN 2177-336X

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ressignificação dos processos de formação inicial de educadores e

investimentos na formação continuada.

Jesus e Vieira (2011, p. 206) ressaltam também que para construirmos uma

escola inclusiva,“[...] precisamos pensar com o outro, precisamos de um processo de

reflexão-ação-crítica dos profissionais que fazem o ato educativo acontecer”.

Nessa perspectiva, consideramos que um investimento é a existência das

disciplinas de inclusão na Estrutura Curricular do Curso de Licenciatura em

Matemática. No percurso por nós vivenciado foi relevante a colaboração dos

professores especialistas da escola, do CEADV/CAP-AC, do NAI/UFAC, da família e

principalmente dos próprios estudantes cegos que se mostraram dispostos à aprender

matemática e à contribuir com a pesquisa. Esse tipo de pesquisa realça a importância de

“sólidos” processos de formação inicial e continuada para que os professores

se sintam capazes de promover diálogos entre a teoria e a prática e ainda para

que possam refletir sobre o vivido, o experienciado e aquilo que consideram

conflitivo, pois a reflexão sobre essas questões “[...] ajuda o profissional e

seus colegas de profissão a pensar sobre sua identidade e competências e

como elas são construídas, seja no âmbito individual ou coletivo, na

formação acadêmica ou no campo da prática” (FOERSTE, 2005, p. 33-34).

Para possibilitar esse tipo de vivência aos professores em formação inicial de

matemática da UFAC foi necessário a pesquisadora ao longo do percurso adquirir uma

formação para a inclusão, fazendo cursos no Centro de Apoio Pedagógico para

Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual do Acre (CAP-AC), no Núcleo de

Apoio a Inclusão da UFAC (NAI/UFAC) e participar de eventos científicos buscando

minicursos e pesquisadores que ensinam matemática, física, química e biologia para

deficientes visuais.

No caso do deficiente visual, os canais de sensibilização envolvem o contato e a

estimulação dos sentidos remanescentes, evitando o sentimento de isolamento. É

preciso falar com ele, mostrar-lhe os objetos, deixar que o toque, dizer qual é a sua cor,

falar de cheiros; e, ao procurar avaliar o seu processo de desenvolvimento-

aprendizagem, ter como referência as suas potencialidades e não a comparação com as

pessoas que enxergam.

Também é preciso adotar o suporte de recursos mediadores adaptados para

adquirir informações por meios não visuais. Como princípio básico consideramos que o

acesso a informação deve ser proporcionado a todos numa sala de aula, independente

das diferenças individuais para tal apropriação. Para tanto se faz necessário criar

condições que favoreçam a acessibilidade, visto que é tarefa inerente da sociedade

possibilitar instrumentalização que garanta a participação de todos os alunos nos mais

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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variados espaços escolares e sociais. Na seção seguinte apresentamos os resultados de

nossa pesquisa com os depoimentos de nossos colaboradores.

DEPOIMENTOS

Os depoimentos com os momentos de intervenção dos professores em Formação

Inicial de Matemática da UFAC presentes em seu Memorial (M_PFI na Figura 3):

Na sequência mostraremos na íntegra o depoimento gravado do professor de

matemática da turma, de alguns estudantes do 2º ano F (do EJORB) sobre a intervenção

de matrizes e determinantes com o Kit de MD na figura 4, da intervenção do dia

02/10/2013:

Para o Professor de Matemática do 2º ano F:

Trabalhar com esse material foi muito bom. Porque é muito excelente,

porque os alunos além deles terem o conhecimento teórico eles podem

visualizar o que eles estão fazendo. Então o aprendizado dele fica muito

bom em relação a esse material.[Grifo nosso]. (Fonte: Professor de

Matemática do 2º ano do Ensino Médio, 02/10/2013).

Figura 3 - Reflexão dos PFI com os momentos de intervenção com a PEM III.

Fonte:M_PFI I e M_PFI II de PEM III – 30/10/2013.

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O estudante cego Ezequiel destacou que:

Achei muito mais facilitador. Comparado a explicação que o professor

passa, mas não pelo fato dele ser ruim ou não. O professor explica bem. A

diferença é que comigo tocando no material fica melhor para eu

trabalhar em vez de apenas ouvir [Grifo nosso]. (Fonte: Estudante cego do

2º ano do Ensino Médio, 02/10/2013).

A estudante Fátima apontou que “foi uma forma bem fácil que ajudou muito

nosso aprendizado”. Já o aluno Lucas:

Eu achei excelente porque além de visualizar, interagir, é bom que todos

participam das aulas e tem com você, é tipo assim, com uma pessoa

explicando no quadro não tem como a gente ir lá e ver é apenas teórico. Na

prática não, já vai lá pega o material, tem contato com aquilo e facilitou

bastante. A fixação foi ótima e gostaria que voltassem com certeza.

(Fonte: Estudante Lucas do 2º ano do Ensino Médio, 02/10/2013).

Na Figura 4 alguns depoimentos por escrito dos estudantes do 2º ano F da

Escola EJORB dos momentos de intervenção com os PFI do 3º período com a PEM III:

Em nossa reflexão consideramos importante a avaliação positiva dos PFI por

O fato de ainda estarem no 3º período e serem avaliados positivamente lhes deu

segurança para atuar na profissão docente. A intervenção com o conteúdo de matrizes e

determinantes com o material didático tátil adaptado intitulado de Kit de Matrizes e

Figura 4 - Avaliação escrita dos estudantes do EJORB sobre os momentos de intervenção com os PFI

de PEM III da UFAC.

Fonte: Avaliação escrita dos Estudantes do 2º ano F do EJORB - PEM III.

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Determinantes (Kit MD)revelou-se facilitador, inovador e inclusivo no processo de

ensino e aprendizagem da matemática, aliando a teoria com a prática.

Na Figura 5 trazemos outras avaliações dos estudantes do 2º ano F:

Estas foram algumas das vozes mais proeminentes de nossa pesquisa-ação

colaborativa, destacadas como importantes desde o ano de 2012. Professores de

matemática, especialistas da SRM e alunos da escola, PFI do 3º, 4º e 5º períodos do

Curso de Licenciatura em Matemática, gestores das escolas e da SEEESP e do CAP-AC

e NAI/UFAC, todos apontaram caminhos inovadores que possibilitaram a inclusão de

estudantes cegos nas aulas de matemática em turmas do 1º, 2º e 3º ano do Ensino

Médio.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa apontou o potencial dos recursos táteis e a habilidade do professor

em formação inicial em matemática mediar a aprendizagem do conteúdo de matrizes e

determinantes com o kit de matrizes e determinantes, a cartela de remédios e os próprios

alunos da turma construindo matrizes humanas facilitou a aprendizagem do conteúdo de

matemática de todos os estudantes. Diante das vozes, a ida dos professores em formação

inicial apresentar suas intervenções com sequências didáticas inovadoras com o

acompanhamento da docente/pesquisadora da UFAC em todos os momentos de

intervenção facilitou a integração entre a Universidade e a Escola, possibilitando

resolver uma situação de um estudante cego sem nota na disciplina de matemática e aos

professores em formação inicial de fato sentirem-se professores e conhecer a realidade e

os desafios da profissão docente.

Fechamos a trilha percorrida sugerindo a necessidade do diálogo e reflexão com

uma equipe de aprendizagem que atue na e para a diversidade com novas possibilidades

Figura 5 - Avaliação escrita dos estudantes do EJORB dos momentos de intervenção com os PFI de

PEM III da UFAC.

Fonte: Estudantes do 2º ano F do EJORB – PEM III.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10961ISSN 2177-336X

27

de aprimorar as vivências na Formação Inicial de Professores e integrar a Universidade

e a Escola. Nesse contexto, os PFI precisam atuar no seu futuro ambiente de trabalho,

desde o início do curso já com as Práticas de Ensino de Matemática. Sugerimos que o

Estágio Supervisionado seja ofertado por Educadores Matemáticos do Curso de

Licenciatura em Matemática da UFAC com vivências no Ensino Fundamental e Médio.

Também lançamos com a pesquisa que se ampliem as discussões sobre o ato de ensinar

para pessoas com deficiências, ao apontar o diálogo entre a Neurociência e a Educação

Matemática.

REFERÊNCIAS

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inclusão - estratégias e percalços na formação inicial de docentes de matemática. 2015.

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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10962ISSN 2177-336X

28

PARTICIPAÇÃO DE SURDOS EM ATIVIDADES DE EXTENSÃO

UNIVERSITÁRIA: QUEM SÃO OS INCLUIDOS?

Tânia Maria de Lima – Docente PPGE/UFMT

Amanda Yasmim Cezarino – Discente PPGE/UFMT

Ana Paula Medeiros Destro – Discente PPGE/UFMT

Resumo

A palavra extensão está relacionada à expansão de algo em direção ao espaço

circunvizinho, pressupondo movimento unidirecional de dentro para fora. A palavra

inclusão, por sua vez, expressa incorporação de algo/alguém de fora para dentro. Essas

concepções de caráter centralizador são questionadas no presente trabalho face o

entendimento de que elas expressam relações de poder. Busca-se refletir sobre

potencialidades de práticas educativas que se configuram como redes de conversação

tendo como base experiências vivenciadas em um projeto de extensão universitária

pautado na relação entre ciência, cultura e educação. Trata-se de uma rede constituída

por estudantes e docentes vinculados a diversos cursos de graduação e de pós-graduação

da UFMT, bem como por estudantes e professores da educação básica de Mato Grosso.

O referencial teórico foi ancorado em autores que tratam do lugar da ciência na

contemporaneidade mantendo interfaces com a cultura e as práticas pedagógicas. Os

dados sobre desafios e potencialidades da rede de conversação foram extraídos de

relatórios de duas atividades desenvolvidas em 2015, no contexto do projeto estudado,

uma delas realizada na UFMT e outra na escola de educação especial, uma das

instituições parceiras. Os dados foram extraídos também de narrativas elaboradas por

três professores surdos que participam do projeto. As análises impelem ao

reconhecimento de que a extensão configurada como redes de conversação produz

entrelaçamentos de conhecimentos, experiências e culturas que resultam em

aprendizados coletivos. Nessa configuração extensão-inclusão compõem uma via de

mão dupla, na qual todos podem se reconhecer como aprendizes que ensinam e como

incluídos.

Palavras-chave: Extensão universitária, Redes de conversação, Inclusão.

Situando o estudo

Neste trabalho colocamos em pauta o papel pedagógico da extensão universitária

a partir de análises de alguns sentidos que são atribuídos a essa dimensão da vida

acadêmica. O propósito é refletir sobre as possibilidades educativas de projetos de

extensão que se configuram como redes de conversação sobre relações entre ciência,

cultura e prática pedagógica. Nesse sentido, buscamos amparo teórico em autores que

chamam atenção para a crise instaurada na ciência moderna (SANTOS, 2004, SANTOS

et al 2006, LOPES & MACEDO, 2012) e, por conseguinte, no interior das

universidades e de suas ações, incluindo a extensão Recorremos também a autores que

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10963ISSN 2177-336X

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buscam caracterizar o currículo como uma rede de conversação na qual não há um

centro para situar o conhecimento, a aprendizagem e a inclusão (FERRAÇO, 2012a,

2012b).

Para alcançar o objetivo proposto organizamos este trabalho em três partes.

Inicialmente apresentamos algumas considerações sobre o princípio da

indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensão no modelo de universidade

referenciada nos postulados da ciência moderna. Na segunda parte argumentamos que a

crise que se processa dentro do próprio campo científico precisa ser vista, pela

universidade, como uma possibilidade para aprofundar o debate sobre a ciência

enquanto forma de conhecimento e prática social. Isso implica em análises sobre os

princípios que fundamentam as atividades acadêmicas, incluindo a extensão. Com base

neste entendimento discutimos, no tópico terceiro, desafios e possibilidades de

configuração de projetos de extensão universitária como redes de conversação sobre

ciência, cultura, educação e inclusão. Nessa perspectiva, apresentamos uma breve

caracterização do projeto adotado como objeto deste estudo, dando destaque aos

desafios e possibilidades de configurá-lo como entrelugar, como um espaço de fronteira

que não pressupõem um centro para a palavra, para a cultura e exercício do poder.

O lugar da extensão universitária na modernidade

No ocidente, as universidades surgiram durante a Idade Média sob forte controle

da Igreja. Tais instituições configuravam-se como espaços de estudos de base filosófica

desenvolvidos em sintonia com os preceitos bíblicos. Dessa forma, as explicações para

os acontecimentos do mundo eram desestimuladas, pois se supunha que tudo acontecia

por determinação divina. Não havia, portanto, disposição para produção de

conhecimentos voltados à aplicação na vida humana.

Fatos marcantes que caracterizaram a modernidade (grandes navegações,

surgimento das cidades, criação dos estados nacionais, revolução científica, reforma

protestante) promoveram rupturas com o paradigma da sociedade medieval para

desencadear diversas mudanças de ordem religiosa, econômica, política, social e

cultural. Os ideais do iluminismo exigiram que as universidades assumissem a tarefa de

promover o culto à ciência enquanto uma forma de conhecimento fundamentado na

razão para compreensão e explicação dos fenômenos do mundo. Desde então, tudo

passou a ser explicável com base no novo paradigma pautado na lógica mecanicista.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10964ISSN 2177-336X

30

Acreditava-se que a ciência iria ensinar as pessoas a pensar racionalmente rompendo

com dogmas e mitos que restringiam a liberdade humana. Supunha-se que a liberdade

de pensamento resultaria na paz e na felicidade da humanidade, uma vez que o

desenvolvimento da ciência e da tecnologia resultaria em benesses que poderiam acabar

com a miséria, com as doenças e com o trabalho pesado que, a partir de então, passaria a

ser realizado por máquinas. Ao servir de modelo para outros campos da atuação humana

– incluindo a política – a racionalidade técnico-científica apresentou-se também como

um modelo de produção de conhecimento que poderia contribuir para por fim aos

conflitos sociais potencializando o exercício da democracia.

Os postulados da ciência moderna buscaram afastar o sujeito iluminista não

apenas das formas de conhecimentos consideradas irracionais e obsoletas (religião,

senso comum, saberes tradicionais, etc.), mas também da própria natureza, ou seja, dos

seres e fenômenos adotados como objeto de estudo. Paradoxalmente, as ciências

naturais foram produzidas pela negação das intrincadas relações ser humano-natureza.

Essa cisão artificial foi justificada pela necessidade de emergir o conhecimento

supostamente objetivo, imparcial (politicamente neutro) e de valor universal. Acreditou-

se que assim se chegaria ao conhecimento verdadeiro e inquestionável por ser científico.

A universidade moderna foi incitada a se configurar como uma instituição

devotada ao desenvolvimento da ciência e à formação de novas gerações de

pesquisadores e de profissionais qualificados em diferentes campos da atuação humana,

mantendo distância das demais formas de conhecimento. Esse propósito implicaria na

articulação ensino-pesquisa e na tradução dessas atividades em produtos que poderiam

ser apresentados à sociedade por meio da extensão universitária.

Nessa conceituação a extensão universitária é associada à expansão das ações da

universidade para seu entorno (espaço circunvizinho). Pressupõe, portanto, um

movimento unidirecional de conhecimentos, tecnologias e serviços que jorram da fonte

da sabedoria para a sociedade, da mesma forma que a água verte de uma nascente em

direção às áreas mais baixas. Nessa mesma conceituação a inclusão está relacionada

com a ideia de incorporação, pela universidade, de algo ou alguém que está fora,

excluído, distante da ambiência universitária.

Schwartzman (2008), em suas análises sobre a política do conhecimento a partir

da relação entre ciência, universidade e ideologia, amealha argumentos para mostrar que

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10965ISSN 2177-336X

31

os postulados da universidade moderna estão em crise. Na perspectiva do autor os

problemas não ficaram restritos apenas às questões de ordem sociológica. A

universidade enfrentou problema também na proclamada articulação entre ensino e

pesquisa. Uma das explicações para este fato está nas diferenças entre atividades de

pesquisa e atividades de ensino e, sobretudo, no valor a elas estabelecido.

[...] existe uma incompatibilidade quase natural entre as atividades científicas

e as atividades docentes de formação profissional. O estudante que está

adquirindo conhecimentos para o trabalho profissional interessa-se por

informações já digeridas, consolidadas e utilizáveis; o cientista interessa-se

por áreas de conhecimento novas, de fronteira, e por isso mesmo ainda pouco

consolidadas. Além disso, a carreira do cientista é essencialmente orientada

para a obtenção do reconhecimento de sua comunidade pelos trabalhos que

realiza, suas pesquisas e publicações; o ensino, e mais particularmente o

ensino ao nível de graduação, é visto como um estorvo e um desperdício de

tempo em relação a suas atividades mais importantes (p. 76).

No Brasil a articulação entre ensino e pesquisa mostra-se frágil porque nosso

modelo de universidade foi inspirado nas escolas profissionais francesas que difundiram

o "modelo napoleônico". Tais instituições foram voltadas especialmente para o

propósito de outorgar títulos e de qualificar profissionais para alavancar o

desenvolvimento em diversas áreas. A fragilidade está relacionada também com a

tradição religiosa que desvalorizou a atividade científica para não promover abalos na

fé. Ademais, o modo de desenvolvimento econômico adotado pelo nosso país impeliu à

dependência científica e tecnológica arrefecendo o interesse pela pesquisa científica.

[...] a atividade de pesquisa científica pode eventualmente se implantar e

desenvolver em instituições excepcionais relativamente marginais ao sistema

de ensino superior do país; mas nunca coube, e talvez nem deva caber, no

centro do sistema de ensino superior, cujas funções efetivas são, e quase

certamente continuarão sendo, profundamente distintas dos objetivos e

necessidades do trabalho científico. (SCHWARTZMAN, 2008, p. 76)

Consideramos, portanto, que no âmbito das universidades brasileiras, a

indissociabildade ensino-pesquisa-extensão ainda está longe de ser efetivada. Essa

questão precisa ser analisada de forma mais efetiva considerando que, os debates sobre

a crise na ciência potencializam reflexões sobre os processos de produção dessa forma

de conhecimento e suas relações com a prática social (SANTOS et al, 2006).

Crise na ciência, crise na universidade: reflexões sobre possibilidades da extensão

Do nosso ponto de vista, a frágil relação entre pesquisa-ensino-extensão

observada no interior das universidades está relacionada a diversos fatores,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10966ISSN 2177-336X

32

notadamente, a ideia de que a ciência se constitui numa forma de conhecimento

universal que goza de maior status em relação às outras formas de conhecimento. Com

base nesta conceituação a ciência pode promover o apagamento do termo cultura para

dar destaque ao conhecimento. A cultura tornou-se apenas o exterior constitutivo da

ciência (LOPES & MACEDO, 2012, p. 161). Embora a ciência tenha incluído em seu

projeto epistemológico conhecimentos de outras culturas, a exemplo da cultura do

Oriente, ela criou condições técnicas e ideológicas para negar saberes e práticas

consideradas diferentes contribuindo assim, para a expansão colonial que a alimentava.

Ao tentar aproximar o Oriente daquilo que podia compreender, a cultura

científica criou-o como o passado das nações ocidentais, justificando, com

isso, a importância da dominação. Apesar de simétrico inferior do Ocidente o

Oriente seria o berço da civilização mundial, tendo dela se destacado por não

participar da cultura científica moderna (LOPES & MACEDO, 2012, p. 161)

Os vínculos entre ciência e colonialismo permitem compreender as relações de

desigualdades não apenas entre ocidente/oriente, mas também entre ciência/senso

comum, hemisfério norte/hemisfério sul, brancos/negros, ricos/pobres, homem/mulher,

escolarizado/analfabeto, etc. Tais desigualdades não estão restritas às questões sociais

mais amplas. Elas estão presentes no interior das instituições educativas e têm

implicações no currículo e nas práticas pedagógicas extracurriculares, incluindo a

extensão universitária. Nesse caso, elas podem ser observadas na valorização da cultura

acadêmica (científica) em detrimento de outras manifestações culturais. Por

conseguinte, as culturas nativistas, as artes, o senso comum, os saberes populares são

tratados como os “outros” que se opõem à ciência e por isso devem ser subjugados,

ignorados ou excluídos dos espaços educativos.

Ao trazer para o debate a inclusão de surdos em projetos de extensão

universitária julgamos ser necessário abordar a crise na ciência moderna estudada por

Boaventura Sousa Santos. Conforme observou esse autor, tal crise foi forjada dentro da

própria ciência.

A primeira observação, que não é trivial quanto parece, é que a identificação

dos limites, das insuficiências estruturais do paradigma científico moderno é

o resultado do grande avanço no conhecimento que ele propiciou. O

aprofundamento do conhecimento permitiu ver a fragilidade dos pilares em

que se funda. (SANTOS, 2004, p. 54)

Os abalos nos pilares da ciência moderna foram intensificados com novas

formulações teóricas da Física e da Biologia que evidenciam inadequação de conceitos

racionalistas tais como: ser vivo/matéria inerte, orgânico/inorgânico, natural/artificial,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10967ISSN 2177-336X

33

todo/partes. Tais conceitos foram assentados numa concepção mecanicista que não

permite compreender a complexidade dos fatos. Com base nos conflitos enfrentados

pela ciência, o autor faz um delineamento do paradigma que tende a emergir

apresentando quatro teses.

Todo o conhecimento científico-natural é científico-social – A ciência é uma

produção humana e, portanto, uma prática social que não admite distinção rígida entre

as ciências naturais e as ciências sociais. A distinção hierárquica entre conhecimento

científico e conhecimento vulgar tenderá a desaparecer.

Em resumo, à medida que as ciência naturais se aproximam das ciências

sociais estas aproximam-se das humanidades [...] A superação da dicotomia

ciências naturais/ciências sociais tende assim a revalorizar os estudos

humanísticos. Mas esta revalorização não ocorrerá sem que as humanidades

sejam, elas também profundamente transformadas (SANTOS, 2004, p. 69-

70).

Todo o conhecimento é local e total, por isso, a princípio deve-se pensar

globalmente para agir localmente – No paradigma dominante a ciência avança pela

especialização, ou seja, o rigor aumenta na proporção que a análise da parte se dá pela

criação de fronteiras arbitrárias entre os conhecimentos. Faz-se necessário reconhecer

que o conhecimento tem como horizonte a totalidade universal/indivisa. Sendo total é

também local. A produção de conhecimentos tende a se processar em redor de temas

que se convergem.

Todo conhecimento é autoconhecimento – Há um movimento no sentido da

maior personalização do trabalho científico que é a dimensão subjetiva, que sempre foi

combatida pelo paradigma dominante e ganha agora uma importância fundamental. A

ciência moderna consagrou o homem como sujeito epistêmico, mas expulsou-o

enquanto sujeito empírico, pois sendo o conhecimento objeto, factual e rigoroso, as

influências da subjetividade humana na pesquisa deveria ser evitada. Assim, “a

distinção epistemológica entre sujeito e objeto teve de se articular metodologicamente

com a distância empírica entre sujeito e objeto” (SANTOS, 2004, p. 67). Na atualidade

questiona-se essa possibilidade de separar o sujeito epistêmico do sujeito subjetivo.

Todo o conhecimento científico visa constituir-se em senso comum – Atualmente

a ciência procura reabilitar o senso comum por reconhecer nesta forma de conhecimento

algumas virtualidades para pensar o ser humano no mundo. Sabe-se que nenhuma forma

de conhecimento é essencialmente racional e descolada de outras formas de

conhecimento.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10968ISSN 2177-336X

34

Reiteramos os posicionamentos desse autor no que se refere a defesa de

proposições como: configurações mais adequadas da ciência visando sua apropriação

pelos cidadãos; reconhecimento das relações da ciência com o contexto social, análises

das transformações promovidas pela ciência no mundo e inter-relações entre ciência e

outras formas de conhecimento que compõem a cultura.

Por uma extensão universitária configurada como rede de conversação

O Plano Nacional de Extensão Universitária apresentado em 1999, expressa

proposições do Fórum de Pro-Reitores de Extensão das Universidades Públicas

Brasileiras (FORPROEX) como um marco conceitual para a definição de políticas no

âmbito da Universidade. No documento a extensão é concebida como “o processo

educativo, cultural, científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e

viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade” (CORREA, 2003, p.

13). Com base nesta concepção foram definidas as seguintes diretrizes para extensão:

Relação social de impacto, Bilateralidade, Interdisciplinaridade, Indissociabilidade

ensino, pesquisa e extensão (CORREA, 2013, p. 13).

Destacamos aqui a defesa de que a política de extensão universitária seja

configurada numa relação de bilateralidade e, portanto, de quem se põe ao lado de

outros setores da sociedade. Busca-se assim, superar a relação hegemônica que se

estabeleceu entre a universidade e a sociedade sob influências da racionalidade técnico-

científica. Nessa perspectiva a extensão tende a ser assumida como via de mão-dupla,

como troca de saberes, de participação, de interdisciplinaridade, de democratização do

conhecimento e de confronto com a realidade. Enquanto prática social ela pode

favorecer a aproximação entre ensino e pesquisa.

No intento de contribuir com o debate sobre o papel da extensão universitária no

contexto da crise da ciência que hora atravessamos apresentamos a seguir algumas

reflexões resultantes deste estudo. Elas foram ancoradas em experiências vivenciadas no

projeto de extensão “Rede de estudos e colaboração para inclusão social e

desenvolvimento da cultura científica”, financiado pela Capes, no contexto do Programa

Novos Talentos. O prazo de vigência do projeto é de 2013 a 2016.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10969ISSN 2177-336X

35

As análises apresentadas a seguir indicam que, em muitos aspectos, o projeto

coaduna com os postulados do referido Plano Nacional de Extensão Universitária.

Como a própria denominação indica o projeto busca se caracterizar como rede

colaborativa interessada tanto nas relações entre educação e cultura científica como na

inclusão. A configuração como rede expressa a ideia de bilateralidade, de disposição

para se por ao lado do outro. Esse princípio é observado tanto no âmbito da própria

universidade – o projeto envolvimento cerca de 08 docentes e 23 estudantes vinculados

a diversos cursos de graduação e de programas de pós-graduação do campus central da

UFMT. Dessa forma é possível estabelecer conversações entre vários campos do

conhecimento (História, Geografia, Comunicação Social, Química, Física, Biologia,

Geologia, Pedagogia). O movimento no sentido de “estar ao lado” se expressa também

na participação de 125 estudantes e 25 professores de 05 escolas parceiras do projeto,

sendo uma delas de educação especial. Cada escola é representada por 25 estudantes e

05 professores.

As atividades do projeto em tela foram organizadas em três Subprojetos assim

denominados: 1. Cibercultura: a produção e circulação da cultura científica; 2.

Tecnologias da informação e da comunicação: potenciando novos talentos para uma

nova cultura científica; 3. Diálogos entre pesquisa e ensino: em pauta as águas em

Mato Grosso. Cada um desses subprojetos é coordenado por um docente vinculado a

um programa de pós-graduação. O coordenador tem a tarefa de articular o trabalho dos

docentes e dos estudantes (monitores) para o desenvolvimento das atividades.

(seminários, oficinas, minicursos que tratam da ciência e da educação em ciências (no

plural) em interfaces com a cultura. Incluem também atividades nas cinco escolas. Cada

uma delas elaborou e está desenvolvendo um projeto de pesquisa sobre o tema “Águas

em Mato Grosso”, contando com apoio de docentes e estudantes (monitores) vinculados

à UFMT. No desenvolvimento da pesquisa os estudantes são motivados a fazer uso de

tecnologias e dos conhecimentos postos em circulação nas atividades dos subprojetos.

Os resultados dos estudos e atividades realizados no âmbito da escola são apresentados

a cada ano no Seminário final. Em tais seminários a palavra é “pronunciada”

especialmente pelos estudantes da educação básica tendo como público os demais

participantes do projeto. Em todos os eventos as atividades são acompanhadas por

interpretes de Libras. Reconhecemos que as experiências relatadas a seguir não

expressam a dinâmica do projeto em toda a sua complexidade. No entanto, acreditamos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10970ISSN 2177-336X

36

que elas oferecem matéria suficiente para fomentar o debate em torno do tema em

pauta.

A experiência é concebida aqui como “o que nos passa, ou nos acontece, ou nos

toca” (LARROSA, 2004, p, 154 apud FERRAÇO, 2012 p. 100). Trata-se, portanto, de

situações vividas que nos afetam e dão sentido ao que fazemos e somos enquanto parte

de um coletivo.

Do ponto de vista da experiência, o importante não é nem a posição (nossa

maneira de pôr-nos), nem nossa o-posição (nossa maneira de opor-nos), nem

a im-posição (nossa maneira de impo-nos), nem a pro-posição (nossa maneira

de propor-nos), mas a explicação, nossa maneira de ex-por-nos, com tudo o

que isso tem de vulnerabilidade e de risco. [...] é incapaz de experiência

aquele a quem nada lhe passa, a quem nada lhe acontece, a quem nada lhe

sucede, a quem nada lhe toca, nada lhe chega, nada lhe afeta, a quem nada lhe

ameaça, a quem nada lhe fere (LARROSA, 2004, p, 154 apud FERRAÇO,

2012 p. 100)

Nas análises apresentadas a seguir buscamos identificar desafios e possibilidades

da rede de conversação entre surdos e ouvintes. Os dados foram extraídos de relatórios

de duas atividades desenvolvidas em 2015, sendo uma delas realizada na UFMT e a

outra na escola de educação especial que é uma das instituições parceiras. Os dados

foram extraídos também de narrativas elaboradas por três professores (surdos) que

participam do projeto.

Uma das experiências refere-se ao Seminário Raça e ciência nas mídias que foi

realizado, em 2015, em três tardes (12 horas), num auditório da UFMT, sob a

coordenação de três professores e três monitores do curso de História. A programação

desse seminário incluiu apresentação de filmes, documentários, cenas de novela,

imagens de super-heróis. Esses recursos potencializaram as conversas sobre

preconceitos que, em alguns casos, são justificados em bases científicas. Foi

evidenciado então, que embora a ciência traga benefícios para a vida humana ela pode

ser utilizada também para subjugar pessoas e/ou grupos raciais, notadamente negros. A

dinâmica dos trabalhos permitiu a exposição de concepções, de posicionamentos e de

experiências dos participantes em relação ao assunto. Um dos problemas identificados

foi a compreensão dos filmes e documentários por estudantes e professores surdos uma

vez que alguns recursos audiovisuais não tinham legenda e, quando tinham, era

apresentada em Português, no ritmo adequado apenas para um leitor fluente. Esse fato

deu azo para discussão das práticas de inclusão na cultura acadêmica, pois, ela ainda é

pensada para estudantes que não têm deficiência.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10971ISSN 2177-336X

37

Apesar dos limites da participação mais efetiva dos surdos nas atividades

entendemos que elas permitiram praticar alguns dos princípios do projeto: inserção de

estudantes e professores da educação básica no ambiente universitário, socialização de

resultados de estudos e pesquisas por docentes e discentes da educação superior,

promoção de debates/conversações sobre a cultura científica como produção humana.

A presença de surdos na rede de conversação criada pelo do projeto tem exigido

dos sujeitos participantes o reconhecimento de que esse grupo social tem uma cultura

própria. Vale ressaltar que em 2011 foi criado o Movimento surdo que milita em favor

da educação e da cultura surda, bem como das escolas bilíngues para surdos (EDENIA,

2015). A defesa das escolas bilíngues como espaços de fortalecimento da cultura surda e

de construção da identidade surda é apresentada também por Perlin e Quadros (1997).

No projeto que foi objeto deste estudo os participantes ouvintes são motivados a

aprender Libras é a conhecer a cultura surda. Nesse sentido foram realizadas duas

oficinas de Libras na escola de educação especial para todos os sujeitos participantes.

As duas oficinas foram ministradas por professores e estudantes surdos apoiados por

interpretes de Libras. Dados do relatório da experiência analisada (oficina de Libras

realizada em 2015), mostram que além do ensino de alguns sinais considerados básicos,

foi apresentada uma breve encenação em libras por professores surdos. Foram

realizadas também atividades lúdicas que possibilitaram interações entre surdo e

ouvinte. Assim, os sujeitos participantes vivenciaram situações de aprendizagem da

língua/cultura do Outro.

Por entender que neste estudo os dados não poderiam emergir apenas dos

relatórios solicitamos que professores surdos que participam do projeto apresentassem

suas opiniões sobre a experiência por eles vivenciadas. Apresentamos a seguir trechos

de tais narrativas.

O mais importante em participar do Projeto Novos Talentos é a aquisição de

conhecimento, tanto para o professor surdo como para o aluno. Além disso, o

projeto desenvolve o crescimento humano das pessoas envolvidas, pois,

participam de atividades em diferentes espaços como na UFMT e na escola

de educação especial de surdos. (Prof 1)

O Projeto Novos Talentos nos proporciona conhecer diversos espaços como a

UFMT, o Museu Histórico, o Instituto Nacional de Educação de Surdos que

contribuem imensamente para o nosso conhecimento. (Prof. 2)

A troca de experiências entre pessoas surdas e ouvintes é o que eu acho mais

importante nas experiências da escola e do Projeto Novos Talentos. Podemos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10972ISSN 2177-336X

38

ensinar os sinais da Libras para ouvintes e aprender palavras da língua

portuguesa com os ouvintes. Eu me sinto feliz e orgulhoso, pois, esse Projeto

é um meio de mostrar para todo mundo que a inclusão existe nesse espaço.

Após as atividades do projeto, como oficinas, palestras e aulas de campo, os

professores de cada disciplina davam aulas para responder algumas duvidas

que surgiam sobre a água, solo e etc. O professor de educação física explicou

para eles o que era capoeira, pois, tinham visto em uma escola em que

visitaram. (Prof. 3)

Os relatos desses professores surdos reiteram a relevância das atividades

expressas nos relatórios analisados. Fica evidente que o projeto é uma via de mão-dupla

que possibilita não apenas a inclusão de surdos na cultura ouvinte, mas também a

inclusão de ouvintes na cultura surda.

Considerações Finais

As análises apresentadas neste trabalho permitem reafirmar a importância da

extensão universitária na promoção de ações que possibilitam aproximações entre

diferentes campos do conhecimento e entre a universidade e outros setores sociais. No

caso, a extensão pode contribuir na formação de todos os sujeitos participantes,

especialmente no que se refere a inter-relações ciência-educação-inclusão.

Consideramos que o formato da extensão como rede de conversação

experimentada no projeto analisado potencializa aprendizagens a todos os sujeitos

participantes. Nessa configuração a “palavra” não tem um centro e nem um formato

único. Ela não é imposta por alguém em especial, mas proposta por todos os que

manifestam interesse na conversação inclusive em situação de oposição. A “palavra”

não foi apresentada apenas na língua portuguesa. Os surdos fazem uso da Libras (com o

apoio de interpretes) difundindo a sua cultura. Ademais, a palavra não é exposta apenas

na forma de texto oral ou escrito, mas também por meio de imagens potencializadoras

de debates. Em síntese, dando resposta a indagação apresentada no título podemos dizer

que numa rede de conversação todos podem se reconhecer como aprendizes que

ensinam e, portanto, como incluídos

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