deficiência auditiva fundamentos e metodologias

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2018 DEFICIÊNCIA AUDITIVA: FUNDAMENTOS E METODOLOGIAS Profª. Jacqueline Leire Roepke Prof. Kelvin Custódio Maciel Prof. Valdecir Reginaldo de Oliveira

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Page 1: Deficiência auDitiva funDamentos e metoDologias

2018

Deficiência auDitiva: funDamentos e metoDologias

Profª. Jacqueline Leire RoepkeProf. Kelvin Custódio MacielProf. Valdecir Reginaldo de Oliveira

Page 2: Deficiência auDitiva funDamentos e metoDologias

Copyright © UNIASSELVI 2018

Elaboração:

Profª. Jacqueline Leire Roepke

Prof. Kelvin Custódio Maciel

Prof. Valdecir Reginaldo de Oliveira

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

R716d

Roepke, Jacqueline Leire

Deficiência Auditiva: Fundamentos e Metodologias. / Jacqueline Leire Roepke; Kelvin Custódio Maciel; Valdecir Reginaldo de Oliveira – Indaial: UNIASSELVI, 2018.

254 p.; il.

ISBN 978-85-515-0188-7

1.Distúrbios da audição – Brasil. 2.Surdos - Educação – Brasil. I. Maciel, Kelvin Custódio. II. Oliveira, Valdecir Reginaldo de. III. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 371.912

Impresso por:

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III

apresentação

Olá, prezado acadêmico! Que alegria ter você conosco, na disciplina de Deficiência Auditiva: Fundamentos e Metodologias! Nós preparamos este livro de estudos com o intuito de que você acesse informações históricas e teóricas sobre o tema, visualizando ainda, pesquisas que têm sido feitas re-centemente, além de orientações voltadas à prática docente com estudantes que tenham deficiência auditiva ou que sejam surdos.

Na Unidade 1, você verá assuntos que tratam da deficiência auditiva ou surdez ao longo da história. Os surdos, nas primeiras civilizações do Ocidente, não tinham uma vida comum, eram tratados com desconfiança, com menosprezo, des-caso, abandono e até foram condenados à morte. Após o surgimento de instituições de caridade, como a Igreja, percebe-se uma preocupação, ainda que pequena, com os surdos, considerados, muitas vezes, na Idade Média, como seres amaldiçoados, como também, pessoas que possuíam uma sabedoria de ordem divina.

Você entenderá que na modernidade, por mais que são criados inúme-ros mecanismos que visam à qualidade de vida dos surdos, também, foram feitas experiências desumanas para chegar a um resultado desejado. Além dis-so, é na modernidade que o surdo cada vez mais é considerado um doente, e seu corpo passa a ter uma utilidade dentro da sociedade capitalista, que bus-ca a todo momento, investir e produzir através dos corpos. Nesse sentido, a Unidade 1 apresentará, passo à passo, quais foram os marcos históricos que deram visibilidade e conscientizaram as pessoas de que os surdos também são pessoas, e que possuem igual dignidade. Você aprenderá conceitos que fazem parte da educação inclusiva, que auxiliam significativamente na compreensão do que trata a deficiência auditiva ou surdez. Por isso, apresentamos não so-mente uma corrente teórica para afirmar os pressupostos dos conceitos e das abordagens históricas e filosóficas que permeiam a educação dos surdos, mas buscamos confrontar ideias, e trazer as críticas de pensadores e estudiosos que discutem a temática da educação especial com maior atenção.

Na Unidade 2, o foco está sobre a pessoa com deficiência auditiva ou sur-

dez. Você aprenderá o que ocasiona as alterações no sentido da audição. Você verificará quais são os árduos e compridos caminhos que a família geralmente percorre desde a desconfiança de que há algo errado com a audição da pes-soa, até o recebimento do diagnóstico. Terá informações sobre como acontece o diagnóstico, e as reações que tanto o surdo comumente apresenta, quanto a sua família, diante dessa constatação. Na sequência, descobrirá quais são os desafios que o surdo precisa superar dia após dia, em sua própria casa, nos locais públi-cos, nos ambientes de trabalho e estudo. Geralmente pensa-se que o surdo não requer adaptações no ambiente voltadas à acessibilidade. Mas, ele precisa sim, de que algumas mudanças sejam feitas para que ele se integre ativamente nos espaços em que circula. Depois, conhecerá um pouco sobre alguns profissionais

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IV

que costumam atender ao surdo, e seus objetivos e ações. Ali, você verá quais são algumas das opções em termos de reabilitação da audição, ou seja, formas de tratamento e intervenções. Para encerrar, essa unidade mostramos quais são as peculiaridades de comunicação que os surdos apresentam. Oralmente, é fácil deduzir que eles têm dificuldades para se expressarem e compreenderem o que os outros dizem. Mas, e na escrita? Será que ela também é afetada?

Por fim, a Unidade 3 trata acerca da pessoa com deficiência auditiva e a educação. A unidade inicia com reflexões sobre diferenças individuais e aprendizagem. Em seguida, ela aborda a proposta atual da educação especial, trazendo reflexões também sobre a educação inclusiva, e mostra brevemente o percurso histórico que foi tecendo a atual concepção de educação especial. Essas ponderações desembocam na polêmica entre escolas inclusivas e escolas bilín-gues, na atualidade. O penúltimo tópico discorre sobre os desafios e as perspec-tivas da ação docente com crianças, ou seja, quando o professor possui um estu-dante com surdez em sua sala de aula, quais são os aspectos que ele precisa levar em conta para que essa criança seja contemplada durante as aulas, de modo que possa desenvolver um processo de aprendizagem? O livro termina abordando os desafios e as perspectivas da ação docente com jovens, adultos e idosos sur-dos. Assim, focaliza quais são os desafios que o estudante surdo enfrenta no ensino médio e na educação superior, bem como, os desafios que se apresentam àqueles que se dedicam a ensiná-lo – professores e intérpretes.

Caro acadêmico! Conforme a célebre escritora Helen Keller (surda e cega), “A ciência poderá ter encontrado a cura para a maioria dos males, mas não achou ainda remédio para o pior de todos: a apatia dos seres humanos”. Então, o nosso desejo é que esse livro colabore para o seu desenvolvimento, de modo que seja acolhedor e sensível diante dos alunos com necessidades educacionais especiais que você encontrará. Já não é mais concebível que os surdos fiquem do lado de fora das escolas e universidades e que os poucos que nelas entram saiam antes do tempo, ou fiquem lá como se não existissem.

Esperamos que esse livro contribua na sua formação docente auxi-liando nos estudos que permeiam os desafios que serão encontrados pelos alunos surdos quando escolhem trilhar a vida educacional, lembrando que estudantes surdos estão cada vez mais buscando chegar ao mundo acadêmi-co, vislumbrados por políticas públicas lentas, mas, atentas a essa situação.

Nós também ansiamos por seus estudos durante esta disciplina, que sejam feitos com dedicação e alegria. Afinal, como a própria Helen Keller dizia: “A alegria é o fogo que mantém aquecido o nosso objetivo, e acesa a nossa inteligência”.

Bons estudos!

Profª. Jacqueline Leire RoepkeProf. Kelvin Custódio MacielProf. Valdecir Reginaldo de Oliveira

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V

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

UNI

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VII

UNIDADE 1 – DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA ...................................................................................................................... 1

TÓPICO 1 – MARCOS HISTÓRICOS: DA INVISIBILIDADE À CONSCIENTIZAÇÃO ...... 31 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 32 COMO A DEFICIÊNCIA FOI SENDO VISTA AO LONGO DA HISTÓRIA .......................... 33 O SURDO NA HISTÓRIA .................................................................................................................. 10RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 15AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 17

TÓPICO 2 – A EDUCAÇÃO DOS SURDOS AO LONGO DA HISTÓRIA ................................ 191 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 192 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS NO MUNDO ................................................... 193 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS NO BRASIL .................................................... 32LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 36RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 38AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 41

TÓPICO 3 – DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS ............................. 431 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 432 DEFICIÊNCIA AUDITIVA: CONCEITOS ...................................................................................... 433 DEFICIÊNCIA AUDITIVA: DESAFIOS ......................................................................................... 51RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 55AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 57

TÓPICO 4 – CLASSIFICAÇÃO DAS PERDAS AUDITIVAS: QUANTO AO TIPO E GRAU .................................................................................................................................. 591 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 592 PERDAS AUDITIVAS: CLASSIFICAÇÕES QUANTO AO TIPO .............................................. 593 PERDAS AUDITIVAS: CLASSIFICAÇÕES QUANTO AO GRAU ........................................... 61RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 63AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 64

UNIDADE 2 – A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA ......................................................... 65

TÓPICO 1 – DEFICIÊNCIA AUDITIVA E SUAS CAUSAS ........................................................... 671 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 672 AS CAUSAS DA DEFICIÊNCIA AUDITIVA ................................................................................. 683 A EXPOSIÇÃO AOS ELEVADOS RUÍDOS E A DEFICIÊNCIA AUDITIVA .......................... 724 DIAGNÓSTICO TARDIO E AGRAVOS ......................................................................................... 74RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 75AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 76

sumário

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VIII

TÓPICO 2 – DIAGNÓSTICO DE DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ANTES E DURANTE O PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA SAÚDE AUDITIVA .......................................... 77

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 772 CAMINHOS PERCORRIDOS DIANTE DA SUSPEITA DE PERDA AUDITIVA ................. 783 O DIAGNÓSTICO ............................................................................................................................... 824 A REAÇÃO DA FAMÍLIA E DO DEFICIENTE AUDITIVO FRENTE AO DIAGNÓSTICO .................................................................................................................................... 845 AS DIFICULDADES DE COMUNICAÇÃO ENTRE PACIENTES SURDOS E

PROFISSIONAIS DA SAÚDE ........................................................................................................... 89RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 93AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 94

TÓPICO 3 – DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA ....... 951 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 952 DESAFIOS QUE SURDOS PRECISAM SUPERAR NO DIA A DIA ......................................... 963 SURDEZ E PRECONCEITO .............................................................................................................1014 SURDEZ E AUTOCONCEITO .........................................................................................................104LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................109RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................110AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................111

TÓPICO 4 – PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES ..........................................................................1131 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1132 OS PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AOS DEFICIENTES AUDITIVOS ..........................1143 TRATAMENTOS ................................................................................................................................1154 PSICÓLOGOS ....................................................................................................................................1205 FONOAUDIÓLOGOS .......................................................................................................................1226 PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO ...............................................................................................124RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................126AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................127

TÓPICO 5 – ESPECIFICIDADES DA LINGUAGEM DOS SURDOS ........................................1291 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1292 A LINGUAGEM E SUAS ESPECIFICIDADES ...........................................................................1303 A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS............................................................................................1334 AS ESPECIFICIDADES NA LINGUAGEM ESCRITA DOS SURDOS ...................................1395 AS ESPECIFICIDADES NA APRENDIZAGEM DA LEITURA POR PARTE DE ALUNOS SURDOS ............................................................................................................................1426 LINGUAGEM E SURDEZ: PROVOCAÇÕES FINAIS ...............................................................143RESUMO DO TÓPICO 5......................................................................................................................146AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................147

UNIDADE 3 – A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO ................................................................................................................149

TÓPICO 1– DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM E AVALIAÇÃO ....................1511 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1512 DIFERENÇAS INDIVIDUAIS .........................................................................................................1533 A DEFICIÊNCIA AUDITIVA E A APRENDIZAGEM ................................................................1564 DIFERENÇAS INDIVIDUAIS E AVALIAÇÃO ............................................................................163RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................166AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................167

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IX

TÓPICO 2 – A PROPOSTA ATUAL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL ..............................................1691 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1692 DEFICIÊNCIA .....................................................................................................................................1703 EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................................................................................1714 EDUCAÇÃO INCLUSIVA COM ESTUDANTES SURDOS......................................................173RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................176AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................177

TÓPICO 3 – ESCOLAS INCLUSIVAS OU ESCOLAS BILÍNGUES ...........................................1791 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1792 ESCOLAS BILÍNGUES ......................................................................................................................179RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................186AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................187

TÓPICO 4 – PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO DOCENTE COM CRIANÇAS SURDAS ...........................................................................................................................189

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1892 CRIANÇAS SURDAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O BRINCAR .........................................190

2.1 OS SENTIDOS DO BRINCAR ....................................................................................................1912.2 O BRINCAR E A SURDEZ ..........................................................................................................192

3 APRENDIZAGEM DE CRIANÇAS SURDAS NA ESCOLA .....................................................1963.1 A IMAGEM QUE PROFESSORES TÊM ACERCA DO ALUNO SURDO .............................1973.2 AÇÕES EDUCACIONAIS COM ALUNOS SURDOS ..............................................................200

4 CRIANÇAS SURDAS: LETRAMENTOS E APRENDIZAGEM DA LEITURA E ESCRITA ...............................................................................................................................................2055 A LITERATURA E AS CRIANÇAS SURDAS ...............................................................................2116 CRIANÇAS SURDAS E O USO DE TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E

COMUNICAÇÃO EM PROL DA EDUCAÇÃO ...........................................................................213RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................215AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................217

TÓPICO 5 – PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO DOCENTE COM JOVENS, ADULTOS E IDOSOS ...................................................................................................219

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................2192 TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NO ENSINO DE SURDOS ...2213 O ENSINO MÉDIO E A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO .....................................................2244 O ENSINO SUPERIOR E A INCLUSÃO DO ACADÊMICO SURDO ....................................226

4.1 ACESSO ...........................................................................................................................................2274.2 PERMANÊNCIA ...........................................................................................................................228

LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................234RESUMO DO TÓPICO 5......................................................................................................................236AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................237REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................239

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1

UNIDADE 1

DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA

HISTÓRIA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir dos estudos esta unidade, você será capaz de:

• conhecer como o surdo era tratado ao longo da história;

• refletir sobre os avanços no tratamento fornecido as pessoas com deficiên-cia auditiva;

• compreender a visão de alguns teóricos e educadores na história da educa-ção dos surdos; bem como, as primeiras formas de metodologia de ensino aplicados aos surdos;

• conhecer a história dos principais termos e seus significados que envolvem a educação inclusiva: deficiência, surdo, educação especial e/ou necessida-des educacionais especiais.

• refletir sobre os desafios da deficiência auditiva atualmente;

• conhecer as classificações das perdas auditivas, os tipos de surdez, e os graus de surdez.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – MARCOS HISTÓRICOS: DA INVISIBILIDADE À CONSCIENTIZAÇÃO

TÓPICO 2 – A EDUCAÇÃO DOS SURDOS AO LONGO DA HISTÓRIA

TÓPICO 3 – DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS

TÓPICO 4 – CLASSIFICAÇÃO DAS PERDAS AUDITIVAS: QUANTO AO TIPO E GRAU

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TÓPICO 1UNIDADE 1

MARCOS HISTÓRICOS: DA INVISIBILIDADE À

CONSCIENTIZAÇÃO

1 INTRODUÇÃO

Nesta primeira unidade do livro, você acessará os aspectos históricos e culturais que formaram entendimentos sobre a deficiência auditiva.

Para situar você, prezado acadêmico, que deseja se aprofundar nesse universo tão rico que é a educação especial, saiba que a nossa pretensão é fornecer as ferramentas necessárias para sua melhor compreensão do que se trata quando falamos em deficiência auditiva, quais passos foram dados para a sua visibilidade nos dias atuais, quais os desafios atualmente enfrentados pela deficiência auditiva, quais as perdas nas classificações auditivas ao longo da história e, mais ainda, como a deficiência auditiva interage com o campo da Educação.

2 COMO A DEFICIÊNCIA FOI SENDO VISTA AO LONGO DA HISTÓRIA

Na Antiguidade, durante as primeiras civilizações do Ocidente até o declínio do Império Romano em 476 d.C., surgem as primeiras formas de tratamento fornecidas às pessoas com deficiência. O período greco-romano é marcado pelas relações de produção baseadas na escravidão, na qual o poder estava centralizado na figura do rei ou chefe de Estado, que detinha o poder sob o território e seus exércitos. O poder era passado de geração para geração, do rei para o príncipe, configurando por séculos a dominação de outros povos, através das guerras e conflitos travados pelos governantes. Deste modo, as pessoas que não eram aptas para as guerras ou para o trabalho, ou seja, que não tinham utilidade dentro da sociedade, estavam destinadas ao abandono e à morte.

Vemos que na Antiguidade as pessoas que apresentavam algum tipo de deficiência, física ou mental, eram imediatamente descartadas, rejeitadas e até condenadas à morte. As sociedades antigas consideravam que essas pessoas eram subumanas, ou seja, que não tinham plena capacidade de viver em sociedade, em convívio social, e muito menos ter alguma serventia para o governo. Segundo

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

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Aranha (1979), a deficiência inexistia enquanto problema, sendo que as crianças que apresentavam deficiências eram imediatamente detectáveis, e a atitude praticada na época era da exposição, ou seja, o abandono ao relento, até a morte.

Nas sociedades antigas, a busca pelos ideais de perfeição não permitia a inclusão das pessoas deficientes no contexto social. As civilizações gregas e romanas tinham a meta de construir uma sociedade perfeita, e para isso os homens teriam que ser plenamente aptos para as atividades diárias, inclusive para o trabalho braçal, que era praticado pelos escravos. Logo, para permanecer vivo nesse modelo de sociedade, era preciso cultivar um corpo em plena funcionalidade, caso contrário, se portasse alguma deficiência era considerado, muitas vezes, alguém amaldiçoado, castigado pelos deuses.

FIGURA 1 – INFÂNCIA NA ANTIGUIDADE

FONTE: Disponível em: <http://centauroalado.blogspot.com.br/2015/10/historia-da-infancia-na-antiguidade.html>. Acesso em: 10 abr. 2018.

Mais especificamente ligado ao sistema auditivo, o filósofo grego Aristóteles já dizia no século IV a.C, que para atingir a consciência humana era preciso que tudo penetrasse em um dos órgãos do sentido, a audição. Para ele, esse órgão era superior aos demais órgãos sensoriais do homem, pois a audição era considerada o principal meio para o aprendizado. Nesse sentido, para o filósofo grego, alguém que nascia surdo ou mudo naquela época era incapaz de compreender as coisas e aprender. Assim, durante séculos os surdos estavam à margem da sociedade, tanto na Grécia Antiga, considerando os surdos inaptos para o aprendizado, quanto na Roma Antiga, onde os surdos não poderiam nem fazer testamento e sempre necessitavam de um curador para fazer algum negócio (DUARTE et al., 2013, p. 1717).

Para Pessotti (1984), qualquer criança portadora de alguma deficiência na cidade-estado de Esparta era eliminada de imediato, por decisão do Estado. Logo que a criança nascesse, antes mesmo de receber os cuidados e o afeto dos pais, ela era inspecionada, ou seja, o Estado fiscalizava os nascimentos para garantir que as crianças recém-nascidas fossem sadias, que não portassem nenhuma deformação, diferente de Atenas, na qual a decisão se a criança era digna de viver ou não, era tomada unicamente pelos pais.

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TÓPICO 1 | MARCOS HISTÓRICOS: DA INVISIBILIDADE À CONSCIENTIZAÇÃO

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DICAS

O filme 300 (2007) mostra algumas batalhas persas, dando enfoque ao desempenho do exército espartano. Dirigido por Zack Snyder, o filme possui uma cena que retrata essa reação diante do nascimento de uma criança deficiente. No começo do filme, quando mostram o personagem Leônidas ainda bebê, sendo minuciosamente analisado por dois sujeitos no alto de uma colina na escuridão da noite, aparece a seguinte legenda em língua portuguesa:

“Quando o menino nasceu...Como todos os espartanos, ele foi examinado...

Se ele fosse pequeno, frágil...Doente ou deformado...Teria sido descartado”.

A cena contém tochas de fogo, que clareiam o corpo do bebê, diante dos olhos do ancião que o segura friamente. Em seguida, aparecem centenas de caveiras na profundeza do penhasco, abaixo dessa colina, dando a entender que muitos “eram descartados”.

Segundo Silva (2012), na Roma Antiga, logo que a criança nascia, caso ela fosse do sexo feminino ou apresentasse alguma deficiência, tão logo era submetida à decisão do pai. Caberia ao pai julgar as condições de seu filho, decidindo se manteria vivo ou se condenava ao abandono ou morte. Portanto, essas práticas cruéis para com os deficientes eram recorrentes na Antiguidade e aconteciam em muitas regiões europeias. Na visão de Sueli (2011, p. 38), são comuns as narrativas dos filósofos, dos trabalhadores e intelectuais daquela sociedade sobre o extermínio de crianças com deficiências:

Há relatos que comprovam como era comum o ato de abandonar crianças em montanhas e florestas ou atirá-las de penhascos ou nos rios, por serem consideradas uma ameaça à manutenção daquela forma de divisão social do trabalho: homens livres versus escravos, trabalho manual versus trabalho intelectual.

Com o declínio do Império Romano no século V, em decorrência da invasão dos povos bárbaros, as riquezas passam a se concentrar nas mãos de poucas pessoas, levando ao colapso o modo de produção escravista, iniciando um novo ciclo econômico baseado nas relações de servidão. A expansão do cristianismo por toda as regiões da Europa ocidental, “tem suas raízes materiais na hegemonia de uma nova classe proprietária de terras, cuja economia era fortemente subsidiada na agricultura, pecuária e artesanato: o clero” (SUELI, 2011, p. 39). Assim, a partir de uma visão teocêntrica do mundo, o cristianismo impõe sua visão de mundo através dos dogmas religiosos, estabelecendo uma nova ordem social e condenando os prazeres mundanos, tão presentes nas civilizações gregas e romanas.

Page 16: Deficiência auDitiva funDamentos e metoDologias

UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

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Desse modo, a relação de produção que antes se baseava na escravidão, onde o trabalho essencialmente estava ligado à atividade manual e era indigno ao homem livre, na Idade Média essa ideia cai por terra. As relações de trabalho se ancoram nos ideais religiosos, em que o trabalho exige sacrifício, exige que o homem supere as dificuldades físicas e se submeta a um estado de docilidade para que haja o enriquecimento do seu espírito. Portanto, a divisão do trabalho neste período da Idade Média se dá pelos servos, que eram considerados os vassalos e obedeciam aos comandos dos senhores feudais que possuíam grandes propriedades de terras, e que, por sua vez, eram subordinados ao clero e à nobreza.

Assim, é no século XII, quando se configura essa dinâmica econômica-social da Idade Média, que se passa a questionar a situação do aniquilamento das pessoas que apresentavam deficiência. Afinal, a visão do cristianismo sugere que todos os homens são criaturas de Deus e, portanto, têm o direito à vida, se contrapõe à condenação da morte (SUELI, 2011). Logo, a morte de crianças que eram rejeitadas pelos pais passou a ser condenada.

DICAS

Sugestão de filme: O filme O nome da rosa, escrito por Umberto Ecco, é um romance que retrata o século XIV, ou seja, a Idade Média. É indicado para quem deseja compreender mais a fundo os dogmas e as imposições religiosas exercidos pela Igreja Católica.

Essa atenção dada às pessoas com deficiência na Idade Média, por parte da Igreja, era vista de uma forma ambígua, pois como destaca Sueli (2011), havia uma tendência a interpretar o nascimento de uma pessoa com deficiência como um castigo de Deus, ou seja, uma punição dada em virtude dos pecados cometidos pelos seus pais ou familiares. Nesse sentido, as pessoas que apresentavam deformidades no corpo, de acordo com essa interpretação, estavam sob a posse de um ser maligno. Por exemplo, as pessoas que sofriam de epilepsia ou atitudes psicóticas eram tratadas como criaturas possuídas por demônios, ou também, enfeitiçadas por bruxas, ou simplesmente loucas.

É comum, da Idade Média, ouvir relatos de pessoas que possuíam deformidades nos corpos, ou alguma deficiência mental, serem taxadas de loucas e servirem de divertimento para a população, de distração para a corte. No caso dos anões, comumente se fazia uso dessas pessoas para a distração dos nobres, expondo-os em praça pública.

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TÓPICO 1 | MARCOS HISTÓRICOS: DA INVISIBILIDADE À CONSCIENTIZAÇÃO

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FIGURA 2 – OS ALEIJADOS, DE PIETER BRUEGHEL (1568)

FONTE: Disponível em: <http://medicineisart.blogspot.com.br/2010/10/os-aleijados-pieter-bruegel.html>. Acesso em: 14 abr. 2018.

NOTA

Na figura apresentada, supostamente o pintor quis ilustrar que as pessoas saudáveis não se importavam com as demais. Repare, que além dos bastões que utilizam, dando a entender que possuíam dificuldades de locomoção, eles também apresentam expressões faciais intrigantes. Além do mais, você notou que os cinco estão juntos, dando a impressão de que estão à margem da sociedade? Notou que apenas a pessoa de cabelos brancos parece “normal” e ela parece indiferente à existência deles?

A Idade Média foi o palco de inúmeras doenças epidêmicas. Os relatos das causas dessas doenças fatais estão relacionados à falta de higienização da população e, também, ao comércio realizado pelos navios, que traziam em seus porões ratos que encontravam nas cidades europeias, o ambiente propício, pois não existia um sistema de esgoto fechado e uma preocupação com o lixo depositado nas ruas, o que ocasionou a morte de um terço da população europeia, em decorrência da peste bubônica, chamada de “peste negra” pela população.

IMPORTANTE

A Idade Média foi marcada pela supremacia da Igreja, pela economia rural, pela sociedade estática e hierarquizada, pela ausência de condições de higiene e a presença de doenças epidêmicas. Foi em meio a esse cenário que surgiu a necessidade de instituições precursoras dos modernos hospitais (DUARTE et al., 2013, p. 1718).

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Portanto, houve a necessidade de instalações de hospitais, que nesta época funcionavam como instituições assistencialistas de caridade, já que eram de matriz religiosa e se amparavam nos princípios cristãos. Alguns dos maiores hospitais europeus que se desenvolveram nesta época foram: Hôtel-Dieu, em Paris; Santo Espírito, em Roma e St. Thomas e St. Bartholomew, na Inglaterra.

Os atos de caridade, como um meio de conduzir a alma à vida eterna, à salvação, moldou as instituições filantrópicas do século XVI e motivou a criação de asilos e abrigos de assistência às pessoas com deficiências. Como destaca Sueli (2011, p. 41):

Esse movimento histórico caracteriza o chamado período de segregação das pessoas com deficiências em instituições, que tinha o objetivo de enclausurar aqueles que não se encaixavam nos padrões da normalidade, como os leprosos, os paralíticos, os doentes venéreos, os doentes mentais e toda sorte de desajustados.

Com a onda revolucionária por toda a Europa, que ocorreu a partir do século XVIII, com a revolução na Inglaterra em 1640, a Revolução Francesa em 1789, o cenário econômico e político das sociedades europeias sofreu uma grande transformação. A Igreja já não é mais detentora do poder absoluto, o poder monárquico não atende às demandas dos revolucionários, que lutam segundo os ideais do Iluminismo, da liberdade do homem, da igualdade e do livre mercado. Os estados modernos começam a se desenhar e ganhar forma com o processo de industrialização e de transformação da produção capitalista. É neste período que se institui o poder disciplinar, o poder da norma, o nascimento das ciências naturais.

DICAS

Para ter um panorama melhor do período concernente à Revolução Francesa, que tal assistir a um filme?

• Maria Antonieta (1938), dirigido por W. S. Van Dyke.• Maria Antonieta (2007), dirigido por Sofia Coppola.

As duas versões permitem compreender alguns dos motivos que levaram à famosa Queda da Bastilha. Paris sendo moradia de centenas e centenas de miseráveis que dividiam as ruas com os ratos, enquanto no palácio de Versalhes, uma minoria de pessoas vivia regalada, gastando quantias exageradas em comida, festas e roupas requintadas.

Os filósofos foram personagens centrais dessa revolução, pois levaram a população a questionar tamanha desigualdade social e a se levantar em protestos.

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O grande crescimento demográfico da população urbana, gerado pelo impulso da economia capitalista, faz com que os estados invistam em mecanismos de prevenção à vida da população. Logo, tem-se um maciço investimento em saúde, no controle da natalidade, no tratamento de doenças venéreas, na preocupação com a higiene etc. Se na Idade Média o poder estava centralizado na figura do soberano que decidia sobre a vida do povo, no Estado moderno a finalidade é manter de todas as formas possíveis o investimento nos corpos dos indivíduos, pois eles fazem parte da economia e produzem economicamente.

Como ressalta Sueli (2011, p. 42-43), “a explicação da vida humana e de seus fenômenos entra em contraposição ao pensamento fundado no misticismo e em dogmas que regeram a visão teológica medieval”. Dito de outro modo, se na Idade Média a mentalidade teocêntrica proposta pela Igreja através de seus dogmas de fé tentavam explicar a realidade e impor a verdade para os homens, a partir da criação do Estado moderno e das ciências da natureza o homem passa a buscar a explicação do mundo através da ciência. A nova mentalidade antropocêntrica passa a fundamentar a visão de mundo, com o homem no centro do universo, aquele que busca desvendar a verdade à luz da ciência.

Nas sociedades modernas, o trabalho manual, a mão de obra humana sede o espaço para a produção em grande escala. Surge a necessidade de substituir o homem pela máquina, que é mais eficiente e mais lucrativo para o sistema capitalista de produção. Logo, há pouco espaço aos deficientes no contexto de produção, causando uma intensa desigualdade operada pelo modo de produção, que ao mesmo tempo que “apregoa a liberdade da propriedade do corpo como força de trabalho na esfera da circulação, opera, contraditoriamente, como a condição que potencializa a desigualdade” (SUELI, 2011, p. 43).

Por causa das desigualdades impregnes no sistema econômico capitalista, nos séculos XVIII e XIX são criados os primeiros espaços específicos para a educação de pessoas com deficiências na Europa e nos países colonizados por ela (SUELI, 2011). Portanto, nesta época emergem inúmeras instituições de caráter assistencialista, sobretudo na América, na qual o objetivo sinalizava para o máximo aproveitamento dessas pessoas com deficiência para inseri-los no mercado de trabalho.

As instituições funcionavam como asilos, alimentando e abrigando os internos; como escolas, oferecendo instrução básica na leitura, escrita e cálculo; como oficinas de produção, pois as pessoas com deficiências constituíam mão de obra barata no processo inicial de industrialização (SUELI, 2011, p. 44).

Em tese, a economia capitalista ocupa a totalidade do espaço social, não deixando escapar corpo desviante algum. Todo corpo é aproveitado no sistema capitalista que investe, seja através do sistema carcerário, ou das instituições como hospitais, os manicômios, os asilos, as escolas etc. Nas sociedades modernas, o corpo se torna objeto do poder, e por ser útil, também é dócil. Para o filósofo

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francês Michel Foucault (1977), esse momento em que a disciplina aparece como um mecanismo estratégico de funcionamento do poder, é que brota uma arte do corpo humano, que tem por objetivo não somente aprofundar a sua sujeição ou aumentar as habilidades e aptidões, mas como uma maquinaria, ela funciona na fabricação de corpos padronizados, aptos para assumirem uma função na sociedade.

FIGURA 3 – CENA DO FILME “TEMPOS MODERNOS”

FONTE: Disponível em: <https://www.portalraizes.com/80-anos-de-tempos-modernos/>. Acesso em: 16 abr. 2018.

O filme Tempos modernos (1936), interpretado por Charlie Chaplin, ilustra diversos mecanismos adotados pela gestão da fábrica, no intuito de disciplinar o corpo do operário para que seja o mais produtivo possível, rendendo mais lucros à instituição para a qual trabalha.

Logo, a medicina tem um papel importante no controle e no processo de adestramento dos indivíduos que, por algum motivo, escapam da normatividade social. Em síntese, historicamente as pessoas com deficiência eram classificadas ora como amaldiçoadas, ora como seres semidivinos, apesar disso, sempre foram exclusas do contexto social e viviam mediante ações de caridade da comunidade.

3 O SURDO NA HISTÓRIA

De acordo com Duarte et al. (2013), a humanidade certamente sempre teve representantes surdos. O que difere é que, dependendo do período histórico, os surdos eram vistos de modo diferente pela sociedade, e assim eram tratados, também, de modos diferenciados. Nem sempre eles foram (são) respeitados em suas diferenças. Existiram momentos em que nem eram considerados como seres humanos.

Duarte et al. (2013) acrescentam que antigamente os surdos eram perseguidos, e até supliciados em praça pública, por serem vistos como aberrações

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da natureza. Por outro lado, em determinadas civilizações do Egito e da Pérsia os surdos eram honrados, pois acreditava-se que eram pessoas privilegiadas, enviadas pelos deuses. Pensava-se dessa forma, pois viviam em silêncio, então talvez tinham poderes de conversar secretamente com os deuses. Isso fazia com que os surdos fossem respeitados, estimados e até mesmo venerados. Entretanto, ainda assim eles eram privados da vida social, já que eram mantidos acomodados e não precisavam ser instruídos, por serem pessoas especiais.

Com o avanço da medicina no século XIX, o surdo passa a ser entendido como um doente. Para Lunardi (2002), a institucionalização da norma, que constituiu no século XIX o conceito de anormal, age sob a forma de diferentes técnicas e dispositivos: a escola, a família, o hospício, a prisão, e no caso deste trabalho, a educação especial.

Como destaca Maciel (2008, p. 41), “o modelo médico interpreta a deficiência como sendo um desvio padrão normal do ser humano”. Dito em outras palavras, o objetivo da ciência está alinhado à “correção” de certa anormalidade, de um certo “desvio” presente neste ser humano. Segundo o autor, “o modelo assistencialista interpreta a deficiência como algo inconciliável com a vida ‘normal’, portanto, sua orientação é voltada à manutenção de redes paralelas de atendimento” (MACIEL, 2008, p. 41).

Neste sentido, a partir da modernidade é que a situação dos deficientes auditivos começa a ter um rumo diferente. Se antes, na Antiguidade e na Idade Média, o surdo era tratado como indiferente, como alguém marginalizado, por vezes nem reconhecido como ser humano, no período moderno inicia-se a conscientização de que os deficientes também ocupam um lugar na sociedade.

Há uma institucionalização de metodologias e práticas educacionais que

amparam os deficientes auditivos, mas não sejamos ingênuos de generalizar essas ações. Para Skliar (2013), o despreparo dos profissionais ao atendimento aos surdos e a visão apenas clínica discriminou os surdos como sujeitos totalmente incapazes. A título de exemplo, temos os povos de matriz religiosa judaico-cristã, que durante o período moderno passaram por diversos tipos de torturas físicas e até holocausto, em virtude de atitudes eugênicas.

Reconhece-se que as pessoas que possuíam algum tipo de deficiência eram afastadas do convívio social e as ações direcionadas a esse grupo eram basicamente assistencialistas, com objetivo curativo, e engendradas por motivação religiosa ou caritativa. Esta situação ainda é presente, mas vem se tornando menos frequente, em parte, como resultado das atitudes e comportamentos das próprias pessoas com deficiência (FIGUEREDO, 2013, p. 445).

Neste sentido, as instituições especializadas no século XX, iniciam um processo de transição entre abordagens clínicas e pedagógicas, conhecida mais tarde por “escolas especiais” (SUELI, 2011). Devido à compreensão da deficiência

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como um desvio da normalidade, viu-se a necessidade de um estudo para compreender as suas causas, os seus fatores etiológicos. Beyer (2005 apud SUELI, 2011, p. 47-48), sintetiza os posicionamentos de diversos estudiosos em relação a esse modelo na educação especial:

1. A explicação da origem da deficiência localizada no indivíduo, por meio da investigação de fatores genéticos-hereditários, relativos às circunstâncias pessoais ou familiares.2. A imutabilidade na condição da deficiência, posto que se considerava impossível reverter quadros de atraso social, intelectual e linguístico.3. A adoção de um padrão de normalidade físico que balizava a avaliação dos desvios apresentados.4. A identidade entre a deficiência e a doença mental, uma exótica fusão entre psiquiatria e pedagogia, determinando tratamento clínico, independentemente da natureza do “desvio” apresentado.

Como se percebe, essa concepção da deficiência relacionada à doença, a tratamento e à cura, fez com que as pessoas reproduzissem o senso comum de que “lugar de deficiente é no hospital” (SUELI, 2011, p. 48). Essa crença explícita, em diversos posicionamentos de estudiosos da ciência, que consideraram o deficiente um ser doente na qual só alcançaria a cura através de tratamento adequado, é extremamente atual.

Você conhece alguém que acredita ainda que “lugar de deficiente é no hospital”? Qual postura você tomaria frente a um posicionamento desses?

ATENCAO

As pessoas com deficiência auditiva, ao longo da história, além de não terem visibilidade, foram privadas de realizar atividades comuns no meio social. Os motivos que inviabilizaram os direitos dessas pessoas na história foram diversos. A falta de compromisso do Estado em prestar o assistencialismo adequado, a cultura do descaso e do preconceito, também colocaram essas pessoas à margem da sociedade. Mas o motivo principal que fez com que os deficientes auditivos não possuíssem seus direitos foi, definitivamente, por não se comunicarem oralmente, e consequentemente, não estarem incluídos na cultura da sociedade ouvinte (DUARTE et al., 2013).

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NOTA

Você sabia que o termo ouvinte é utilizado para se referir às pessoas não surdas, que decorre de ouvintismo, que trata de um conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e a narrar-se como se fosse ouvinte? (SKLIAR, 2013).

Neste cenário, nas palavras de Skliar (2013, p. 21):

A configuração do ser ouvinte pode começar sendo uma simples referência a uma hipotética normalidade, mas se associa rapidamente a uma normalidade referida à audição, a partir desta, a toda uma sequência de traços de outra ordem discriminatória. Ser ouvinte é ser falante e é, também, ser branco, homem, profissional, letrado, civilizado etc. Ser surdo, portanto, significa não falar – surdo-mudo – e não ser humano.

Deste modo, o tratamento com as pessoas com deficiência auditiva era de exclusão do meio social, sendo que as ações que eram empregadas não passavam de um simples e básico assistencialismo, prestado por instituições religiosas ou de caridade. Essas características de desprezo e de despreocupação com os deficientes auditivos ainda estão presentes no convívio social contemporâneo. Entretanto, há uma forte iniciativa que vem dos próprios deficientes auditivos, fazendo com que a visão excludente e preconceituosa seja substituída pelo engajamento, pela participação e competência dessas pessoas no âmbito social.

No que se refere à história dos surdos no Brasil, um dos marcos mencionados por Duarte et al. (2013) ocorreu em 1855, no momento em que o imperador dom Pedro II trouxe um professor francês, que era surdo – Hernest Huest –, para começar um trabalho educativo com os surdos.

Para Figueredo (2013, p. 5):

Observou-se maior respeito a esse grupo no momento em que a legislação brasileira, através do Decreto nº 5.626/20054 , em seu art. 2º, considerou a pessoa surda como aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e a pessoa com perda auditiva como aquela com perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500, 1.000, 2.000 e 3.000Hz.

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Nesse sentido, o processo de conscientização das pessoas com deficiência auditiva começa a ganhar força. A partir da modernidade, há um salto qualitativo na inclusão e na educação das pessoas surdas, com a fundação de diversas escolas que começam a usar a Língua de Sinais, na qual os surdos podem aprender a dominar muitos assuntos, exercendo diversas profissões.

Contudo, até hoje o surdo precisa desenvolver suas habilidades para factualmente se inserir na sociedade letrada e, para isso, ele precisa se esforçar muito, precisando contar com a ajuda de profissionais da saúde e da educação para que isso realmente se efetive.

Em outras palavras, no decurso da História, os surdos eram considerados dignos de pena e vítimas da incompreensão, tanto da sociedade quanto da própria família. Felizmente essa situação vem mudando e a sociedade está percebendo que a pessoa com deficiência auditiva é um ser humano igual aos demais.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Na Antiguidade, as pessoas que tinham algum tipo de deficiência eram excluídas e marginalizadas, pois não eram aptas para as guerras ou para o trabalho.

• Na Antiguidade, as pessoas que apresentavam algum tipo de deficiência, física ou mental, eram imediatamente descartadas, rejeitadas e até condenadas à morte.

• Para Aristóteles, alguém que nascia surdo ou mudo, na Grécia Antiga, era incapaz de compreender as coisas e aprender.

• Na Roma Antiga, os surdos não poderiam fazer testamento e sempre necessitavam de um curador para fazer algum negócio.

• O cristianismo impôs sua visão de mundo através dos dogmas religiosos, estabelecendo uma nova ordem social e condenando os prazeres mundanos.

• Com a visão cristã de que todos os homens são criaturas de Deus, feito a sua imagem e semelhança, a morte de crianças que eram rejeitadas pelos pais por possuírem algum tipo de deficiência, passou a ser condenada.

• As pessoas que sofriam de epilepsia ou atitudes psicóticas eram tratadas como criaturas possuídas por demônios, ou também, enfeitiçadas por bruxas, ou simplesmente loucas.

• Os atos de caridade moldaram as instituições filantrópicas do século XVI, e motivou a criação de asilos e abrigos de assistência às pessoas com deficiências.

• A partir do século XVIII, com as grandes revoluções na Inglaterra e na França, o cenário econômico e político das sociedades europeias sofre uma grande transformação.

• Concomitantemente à Revolução Francesa, a Igreja perde o seu poder absoluto; o poder monárquico não atende às demandas dos revolucionários; o processo de industrialização começa a ganhar força baseado nos princípios capitalistas. Nascem os estados modernos.

• O grande crescimento demográfico da população urbana, gerado pelo impulso da economia capitalista, faz com que os estados invistam em mecanismos de prevenção à vida da população.

RESUMO DO TÓPICO 1

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• A nova mentalidade antropocêntrica passa a fundamentar a visão de mundo, com o homem no centro do universo; surgem as ciências naturais.

• Surge a necessidade de substituir o homem pela máquina, que é mais eficiente e mais lucrativo para o sistema capitalista de produção.

• Nos séculos XVIII e XIX são criados os primeiros espaços específicos para a educação de pessoas com deficiências na Europa e nos países colonizados por ela.

• Com o avanço da medicina no século XIX, o surdo passa a ser entendido como um doente; há uma institucionalização de metodologias e práticas educacionais que amparam os deficientes auditivos.

• As pessoas reproduzem o senso comum de que “lugar de deficiente é no hospital”.

• A partir da modernidade há um salto qualitativo na inclusão e na educação das pessoas surdas.

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1 Nas civilizações gregas e romanas era almejada a construção de uma sociedade perfeita, em todas as dimensões, e para isso os homens teriam que ser plenamente aptos para as atividades diárias, inclusive para o trabalho braçal, que era praticado pelos escravos. Diante disso, descreva como eram vistas as pessoas com deficiência na Antiguidade.

2 A partir do século XII, na Idade Média, se configura uma nova dinâmica econômica-social, na qual a situação do aniquilamento das pessoas com deficiência passa a ser questionada pela Igreja. Qual foi a postura da Igreja diante do abandono e da morte de pessoas que apresentavam algum tipo de deficiência?

3 Com as grandes revoluções nos séculos XVII e XVIII, na Inglaterra e na França, o cenário econômico e político das sociedades europeias sofre uma grande transformação. A Igreja já não é mais detentora do poder absoluto, o poder monárquico não compactua com os ideais dos revolucionários, que reivindicam a liberdade do homem, a igualdade e o livre mercado. Neste período, surgem os estados modernos junto ao processo de industrialização e a economia capitalista. Diante do exposto, elenque as principais medidas que o Estado passa a empregar frente ao crescimento da população urbana e explique a situação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

A EDUCAÇÃO DOS SURDOS AO LONGO DA

HISTÓRIA

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

No segundo tópico desta primeira unidade, trataremos da história da educação dos surdos no mundo e no Brasil. Quais foram os principais teóricos e educadores na história da educação dos surdos? Quando surgiu a educação formal para os surdos? Como eram as primeiras formas de metodologia no ensino dos surdos? Para responder a estas questões, você encontrará ao longo deste tópico um estudo detalhado sobre a história da educação dos surdos, com livros e artigos de estudiosos sobre o tema.

Além disto, este tópico apresenta ao leitor alguns acontecimentos que marcaram a história da educação dos surdos, por exemplo, o primeiro Congresso Internacional de Educação de Surdos em Paris, no ano de 1878, e o segundo Congresso Internacional de Educação de Surdos, que ocorreu na cidade de Milão, em 1880. Veremos que na modernidade a educação dos surdos toma um rumo diferente, em que surgem critérios internacionais e científicos que norteiam os parâmetros educacionais. Por outro lado, é na modernidade que o surdo passa a ser entendido, cada vez mais, como um doente, seja pela comunidade científica, como também pela sociedade em geral. Para entendermos os aspectos educacionais que constituíram o surdo até a modernidade, convidamos você, acadêmico, para que mergulhe, sem pressa, neste tópico da Unidade 1 e para que amplie sua visão quanto à importância histórica que a comunidade surda tem em nossa sociedade e no mundo.

2 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS NO MUNDO

O primeiro registro na história da educação dos surdos é em 673 d.C., com o professor de surdos, o arcebispo inglês John Beverly. Entretanto, o método praticado pelo professor foi desconsiderado, já que o fato de ter ensinado um surdo a falar de forma compreensível foi considerado um milagre (DUARTE et al., 2013). Após esse acontecimento, tem-se o registro na Europa no século XV, entre os sacerdotes médicos; há presença de educadores que desenvolviam métodos em prol da comunidade surda. Um século mais tarde, surge o médico de Pádua, Girolamo Cardano (1501-1576), ensinando aos surdos através do uso de

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símbolos, levando uma melhor compreensão social desses indivíduos, “deixando como legado maior o conceito de que os surdos são educáveis, logo, aptos para o convívio social” (DUARTE et al., 2013, p. 1718).

Antes do século XVI, os surdos não eram considerados aptos para receberem uma educação formal, pois a palavra oral tinha enorme importância. Logo, a educação formal inicia-se com o padre beneditino Pedro Ponce de Léon (1520-1584), que ficou conhecido como “o primeiro professor de surdos, tendo consolidado um trabalho de ensino de filhos surdos da aristocracia espanhola no mosteiro beneditino de São Salvador em Oña” (REILY, 2007, p. 320-321).

FIGURA 4 – ESTÁTUA DO FREI PEDRO PONCE DE LEÓN E JUAN PABLO BONET

FONTE: Disponível em: <https://www.minube.com.br/fotos/sitio-preferido/115564>. Acesso em: 22 maio 2018.

Segundo Duarte et al. (2013), o ensino de Ponce de Léon incluía a datilografia (alfabeto manual), a escrita e o treino para a fala (oralização). Além disso, o monge beneditino utilizava de rótulos, ou seja, nomes escritos pregados em tudo. Com isso, Ponce indicava as palavras escritas a seus alunos, associando a escrita com a pronúncia da palavra (REILY, 2007).

NOTA

Você sabia que, segundo testemunhas oculares, o alfabeto manual utilizado era um modo de soletrar no ar formando letras com os dedos? Supõe-se que se tratava do alfabeto publicado pelo monge franciscano Mechor Sánchez de Yebra (1526-1586), que afirmava que a fonte original desse alfabeto se remetia a San Buenaventura (Frei Juan de Fidanza, 1221-1274). Mesmo sendo de ordens distintas, alguns pesquisadores suspeitam que Yebra e o beneditino Pedro Ponce de León tiveram ocasião de encontrar-se, pois ambos se relacionavam com a nobreza da corte espanhola. Ponce de León faleceu antes da publicação da obra de Yebra; no entanto, os alfabetos manuais manuscritos certamente circulavam nos mosteiros da Espanha, inclusive em várias pinturas renascentistas medievais (REILY, 2007).

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FIGURA 5 – DATILOLOGIA OU ALFABETO MANUAL

FONTE: Disponível em: <http://senceydarwin.blogspot.com/2015/10/primero-bachillerato.html>. Acesso em: 22 maio 2018.

Deste modo, a primeira forma de educação formal fornecida pelo monge aos filhos dos aristocratas espanhóis tinha como objetivo reconhecer essas pessoas surdas como cidadãos frente à lei e à sociedade, para que assim pudessem herdar os títulos e a fortuna da família (DUARTE et al., 2013). O sucessor de Ponce de Léon foi o professor Manuel Ramírez de Carrión (1579-1652), que se dedicou ao ensino dos surdos da nobreza castelhana, tendo publicado Maravilhas da natureza, em 1629. Entretanto, Carrión nada esclarece sobre seu método de trabalho com os surdos.

Os padres e educadores espanhóis Juan Pablo Bonet (1573-1633) e Lorenzo

Hervás Panduro (1735-1809) são os pioneiros em trabalhos escritos sobre a educação de surdos. Segundo Duarte et al. (2013), o trabalho de Bonet Redução das letras e arte de ensinar a falar os mudos, de 1620, baseava-se numa arte da articulação e do uso do alfabeto manual, enquanto Hervás escreveu em dois volumes a obra Escuela española de sordomudos, datada de 1795.

Além dos padres e educadores espanhóis, os britânicos John Wallis (1616-1703), John Bulwer (1606-1656) e John Locke (1632-1704), tiveram grande influência na educação dos surdos com suas produções teóricas. Para Duarte et al. (2013), os estudos realizados pelo professor John Wallis, sobre a linguagem, consideravam que o ouvido é o principal órgão para a manifestação da linguagem, sendo que os ouvidos que apresentassem algum tipo de problema alterariam a natureza física da aquisição da linguagem e comprometeriam a fala. Os autores ainda afirmam que, para que a fala se desenvolva nesse contexto, seria preciso “treinos com a garganta, língua, lábios e outros órgãos da fala para que ocorra a emissão dos diferentes tipos de som” (DUARTE et al., 2013, p. 1720).

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Já a contribuição do médico britânico John Bulwer, gira em torno dos estudos das expressões artísticas, como maneira da auxiliar o orador. Sua produção de 1644 se baseou na linguagem natural da mão, ou quirologia, enquanto sua obra de 1648, Philocophus, ou O amigo do homem surdo e mudo, se inspirou em pessoas surdas, sendo o primeiro livro em inglês a relacionar a surdez com o problema de linguagem (DUARTE et al., 2013).

DICAS

Você sabe o que é quirologia?

Algumas pessoas confundem esse estudo com a quiromancia, que é a leitura das mãos com base na adivinhação. Ao contrário, a quirologia está baseada na lógica e pode explicar traços da personalidade do indivíduo, como explica a especialista Karine Maria Zancanaro. Veja o que é possível saber analisando apenas a palma da mão: "Vale lembrar que as linhas das mãos podem mudar, assim como nossa vida, pois elas apontam o que estamos carregando, que caminhos podemos seguir e, se não queremos isso, como podemos mudar". Veja a entrevista com a especialista na íntegra, no programa Mais Você, disponível no site Gshow: Quirologia: veja o que as mãos podem dizer sobre a sua vida física e mental.

FIGURA 6 – QUIROLOGIA

FONTE: Disponível em: <http://gshow.globo.com/programas/mais-voce/O-programa/noticia/2012/10/quirologia-veja-o-que-maos-podem-dizer-sobre-sua-vida-fisica-e-mental.html>. Acesso em: 22 maio 2018.

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A contribuição do filósofo John Locke, considerado o “pai do liberalismo” e representante do empirismo britânico, é de fundamental importância para o processo de ensino das pessoas com deficiência. Para Pessoti (1984), a produção teórica de Locke enfatiza que a experiência sensorial é que deve nortear a prática pedagógica, havendo individualidade no processo de aprendizagem, na qual a experiência é a condição fundamental dos processos complexos de pensamento. Na obra Ensaio acerca do entendimento humano, John Locke afirma que o objeto da sensação é uma fonte das ideias. Segundo Locke (1999, p. 57):

Primeiro, os nossos sentidos, familiarizados com os objetos sensíveis particulares, levam para a mente várias e distintas percepções das coisas, segundo os vários meios pelos quais aqueles objetos os impressionaram. Recebemos, assim, as ideias de amarelo, branco, quente, frio, mole, duro, amargo, doce e todas as ideias que denominamos de qualidades sensíveis. Quando digo que os sentidos levam para a mente, entendo com isso que eles retiram dos objetos externos para a mente o que lhes produziu estas percepções. A esta grande fonte da maioria de nossas ideias, bastante dependente de nossos sentidos, dos quais se encaminham para o entendimento, denomino sensação.

O médico holandês Johann Conrad Ammann (1669-1724) também foi um personagem importante na história da educação dos surdos, haja vista que o médico escreveu em 1692 o livro Surdus Ioquens (O homem surdo falante), no qual, segundo Duarte et al. (2013, p. 1720), “tratou da patologia da linguagem, escrevendo pela primeira vez sobre a voz e a diferença entre ela e a respiração”. Além disso, Ammann também descreveu a natureza da produção dos sons da fala, estabelecendo em seu livro um programa educacional para ensinar o surdo a falar. Para Duarte et al. (2013), o trabalho do médico holandês teve grande repercussão, dando eco à filosofia oral.

Conforme Silva (2012), na segunda metade do século XVII, o abade francês Charles Michel de L’Epée (1712-1789), conhecido como “pai dos surdos”, funda a primeira escola pública para surdos em Paris, conhecido como Instituto Nacional de Surdos-mudos de Paris, inaugurando na história da educação dos surdos, uma língua comum aos surdos. Por meio dela, ensina-se aos surdos os sinais correspondentes aos objetos e aos eventos concretos. O religioso L’Epée, segundo Duarte et al. (2013, p. 1720-2721), “aprendeu com os surdos pobres que viviam na rua de Paris a língua de sinais e introduziu esse sistema de signos na educação de outros surdos, possibilitando uma transformação significativa da realidade”.

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FIGURA 7 – ABADE CHARLES-MICHEL DE L’ÉPÉE

FONTE: Disponível em: <http://sospedagogia-andrea.blogspot.com.br/2010/08/abade-monge-charles-michel-de-lepee.html>. Acesso em: 22 maio 2018.

O abade francês L’Épée utilizava uma metodologia de ensino que se baseava na própria linguagem dos surdos, ou seja, sistematizando os sinais que os surdos utilizavam, criando outros sinais. Segundo Reily (2007, p. 323), o abade “acrescentava movimentos aos elementos lexicais para demarcar funções gramaticais francesas no conjunto de sinais que considerava fundamentais para a comunicação e a aprendizagem das lições”.

Nesse sentido, L’Épée foi de grande importância na educação dos surdos, pois além de contribuir com uma metodologia de ensino que se baseava na linguagem de sinais, tinha grande interesse em divulgar seu trabalho e deixar seu legado para outras pessoas que desejassem seguir o ensino para os surdos. Segundo Reily (2007), com esse trabalho missionário na educação dos surdos, o abade francês contribuiu muito para que países como os Estados Unidos e posteriormente o Brasil, herdassem o sistema francês de sinais, em vez da metodologia oralista inglesa ou alemã.

Entretanto, como destaca Reily (2007), enquanto o abade convencia os estudiosos e interessados que seu método era eficaz e produzia sucessos na educação dos surdos, posteriormente os mestres que o seguiram perceberam que os alunos haviam reproduzido respostas de forma mecânica, sem realmente compreender as perguntas. Nas palavras de Reily (2007, p. 323):

Verificavam que os sinais metódicos ensinados pelo abade L’Épée não atravessavam para as interações cotidianas: os surdos utilizavam-se de outra língua nas interações pessoais. A tentativa de fazer vingar uma língua artificial podia funcionar em contextos rígidos de ensino religioso para responder a questões fechadas, mas jamais atenderia às necessidades do cotidiano.

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Segundo Lourenço e Barani (2011), a educação de surdos tem um salto qualitativo na modernidade, pois se consolidaram diversas escolas que utilizavam da Língua de Sinais que permitiam aos surdos aprender e dominar inúmeros assuntos, inclusive para atuarem profissionalmente. Para as autoras, quando o médico francês Jean Itard (1774-1838) assume o cargo de médico residente no Instituto Nacional de Surdos, em Paris, é que as experiências com os surdos começaram a ser publicadas e divulgadas, e os surdos, por sua vez, cada vez mais eram considerados doentes. Para Veloso e Maia Filho (2009), o médico francês não mediu esforços para erradicar a surdez, para que os surdos tivessem acesso ao conhecimento.

O médico-cirurgião e psiquiatra, Jean Marc Gaspard Itard, realizou várias experiências científicas com surdos, as quais envolviam até mesmo cadáveres e utilizavam de técnicas particulares, como cargas elétricas, sanguessugas, fratura de crânios e membranas timpânicas para chegar a um resultado e publicar seus artigos (LOURENÇO; BARANI, 2011). Seu aparelho ficou conhecido como Sonda de Itard.

FIGURA 8 – SONDA DE ITARD

FONTE: Disponível em: <http://www.ortop.com.br/detalhes_produto/83-Sonda-de-Itard>. Acesso em: 23 maio 2018.

Além disso, também ficou conhecido mundialmente por ter sido o pioneiro da Educação Especial, com a experiência de educar um menino selvagem encontrado na floresta convivendo com animais. Batizado por Itard de Victor de Aveyron, o menino selvagem era considerado ineducável, por ter passado a vida toda sem o contato com os humanos e por apresentar deficiência mental. Para Sueli (2011, p. 46), “Itard desenvolveu um programa baseado em procedimentos médicos e pedagógicos, que tinha por objetivo recuperar o potencial cognitivo do menino, oportunizando o desenvolvimento de suas capacidades humanas”.

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FIGURA 9 – VICTOR DE AVEYRON E O MÉDICO FRANCÊS JEAN ITARD (1744-1838)

FONTE: Disponível em: <https://www.landrucimetieres.fr/spip/spip.php?article3988>. Acesso em: 22 maio 2018.

Algumas obras publicadas por Itard tiveram grande contribuição na educação dos surdos, como nos anos de 1807 e 1808, em que publicou Sobre os métodos de restauração de desenvolver a palavra dos surdos e Sobre os métodos de restauração de audição para surdos. Segundo Duarte et al. (2013), o método do médico francês se baseava em:

1- Melhorar a capacidade de detectar e discriminar sons.2- Treinar a discriminação de vogais.3- Treinar a discriminação das consoantes. 4- Apresentar diferentes pares de sílabas.5- Transcrever essas sílabas e lê-las.6- Apresentar diferentes palavras. 7- Apresentar diferentes frases.

Além disso, Itard considerou, mais tarde, que para se educar um surdo era indispensável introduzir a língua de sinais. Portanto, publicou em 1821 o clássico Tratado das doenças do ouvido e da audição. Nesta obra, Itard divulgou novas perspectivas de educação de surdos, como salientam Duarte et al. (2013, p. 1721):

[...] a enfermidade que acometia as crianças surdas podia ser tratada pela estimulação acústica dos resíduos auditivos, de forma que as informações pudessem ser processadas auditivamente, facultando o desenvolvimento da língua oral pelo uso de sua língua natural, ou seja, a língua de sinais.

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DICAS

O filme O garoto selvagem, dirigido por François Truffaut, retrata a experiência do médico francês Jean Itard em educar Victor de Aveyron. Para quem deseja ter maior conhecimento das experiências do médico Itard, o filme se baseia nas anotações do médico francês e fornece ao telespectador uma comovente e sensível obra cinematográfica.

Outro personagem importante na história da educação dos surdos no mundo foi o professor americano Thomas Hopkins Gallaudet (1787-1851). No ano de 1815, Gallaudet viaja para a Inglaterra em busca de novos métodos para a educação dos surdos. O professor americano encontrou auxílio no Instituto Nacional de Surdos-mudos de Paris, onde aprendeu a língua de sinais francesa e os métodos de ensino. Para Duarte et al. (2013), quando Gallaudet volta de sua experiência no Instituto de Paris para os EUA, em 1817, acompanhado do surdo francês Laurent Clèrc (1785-1869), ele funda a primeira escola exclusiva para alunos surdos, denominada American School for the Deaf.

FIGURA 10 – THOMAS HOPKINS GALLAUDET E ALICE COGSWELL, EM DETALHE DE ESCULTURA DE DANIEL C. FRENCH, NA UNIVERSIDADE GALLAUDET, WASHIGNTON, EUA

FONTE: Disponível em: <https://www.researchgate.net/figure/Figura-3-Thomas-Hopkins-Gallaudet-e-Alice-Cogswell-em-detalhe-de-escultura-de-Daniel-C_fig3_259960058>. Acesso em: 23 de maio 2018.

Segundo Larrosa e Skliar (2001), a partir de 1860, com os avanços tecnológicos que facilitavam a aprendizagem da fala dos surdos, muitos profissionais da educação e reabilitação se interessam em investir no aprendizado da língua oral. Duarte et al. (2013) ressaltam que, na medida em que Laurent Clèrc, ícone da educação de surdos na abordagem educacional da língua de sinais, faleceu, o contexto político-social era de opressão e intolerância com as minorias

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linguísticas, religiosas e étnicas. Portanto, a educação dos surdos neste contexto é marcada por revoltas, conhecidas como ouvintistas, que tinham como objetivo a negação do sucesso adquirido com os métodos que priorizavam a língua de sinais, agitando a sociedade para que se voltasse contra a minoria surda e sua comunicação visuoespacial (DUARTE et al., 2013).

Entretanto, mesmo com a proibição da própria sociedade com o uso da linguagem de sinais, ela sobreviveu graças à própria resistência da comunidade surda, que a praticavam às escondidas entre si. Como relata a autora Emmanuelle Laborit, em sua autobiografia intitulada O grito da gaivota, de 1994:

Quando um dos professores se virava para escrever no quadro-negro, tínhamos hábito de trocar informações na língua de sinais, persuadidos de que ele não nos escutava, já que não nos via. Ora, no começo, ele se voltava todas as vezes, era estranho, não compreendíamos imediatamente por quê. Com o passar do tempo, dei-me conta de que, ao falar com as mãos, sem saber, emitíamos ruídos com a boca. Cuidamos então de não mais emitir nenhum som e, desde aquele dia, trocamos nossas lições o mais tranquilamente possível (LABORITT, 1994, p. 84).

DICAS

Sugestão de leitura: Que tal mergulhar nessa obra autobibliográfica da autora Emmanuelle Laborit?

FIGURA 11 – LIVRO DE EMMANUELLE LABORIT, O GRITO DA GAIVOTA, DE 1994

FONTE: Disponível em: <http://www.bulhosa.pt/livro/grito-da-gaivota-o-emmanuelle-laborit/index.ud121?from_zone=logo>. Acesso em: 23 maio 2018.

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"O Grito da Gaivota" confronta-nos com uma realidade que em geral pouco conhecemos. Convida a partilhar as experiências, tantas vezes dolorosas, do dia a dia dos que vivem envoltos no silêncio e na incompreensão. Emmanuelle Laborit é a protagonista deste testemunho, marcado pela memória de um crescimento diferente. A escritora é surda profunda e, através deste livro, relata a história pessoal de alguém que sempre viveu no silêncio e que nunca conseguiu viver à distância da comunicação. Gaivota, em francês "muette", confunde-se com "muette", muda. Foi o apelido que a família colocou em Emmanuelle Laborit quando era pequena e se esforçava para se comunicar. Uma das ideias essenciais da obra consiste na defesa da língua gestual como um meio de comunicação tão eficaz como a linguagem oral. Trata-se do primeiro livro escrito por um surdo destinado a surdos e ouvintes. Um relato intenso de uma vida vista pelos olhos de uma menina e contada pelo sentir de uma mulher.

FONTE: Disponível em: <https://palavrasnosilencio.blogs.sapo.pt/18712.html>. Acesso em: 23 maio 2018.

No ano de 1878, aconteceu em Paris o I Congresso Internacional de Educação de Surdos, um marco histórico na educação dos surdos. Segundo Duarte et al. (2013), neste evento houve a aprovação de uma resolução que privilegiava somente a instrução oral a função de incorporar o surdo na sociedade, fazendo do método articulatório, que incluía a leitura labial, o principal meio para ensinar os surdos.

Dois anos mais tarde, ocorreu o II Congresso Internacional de Educação de Surdos, na cidade de Milão. O propósito desse segundo congresso, segundo Duarte et al. (2013), era estabelecer critérios internacionais e científicos para a educação dos surdos. Este congresso teve grande impacto na vida dos surdos, decidindo através de uma votação qual seria a língua usada na educação dos surdos. Logo, foi estabelecido que somente a língua oral de seu país deveria ser aprendida, fazendo da língua de sinais um retrocesso. Carvalho (2007, p. 66-68) elenca as oito resoluções que foram aprovadas neste II Congresso Internacional de Educação dos Surdos, que ecoaram durante quase um século:

1- O uso da língua falada, no ensino e educação dos surdos, deve preferir-se à língua gestual.2- O uso da língua gestual em simultâneo com a língua oral, no ensino de surdos, afeta a fala, a leitura labial e a clareza dos conceitos, pelo que a língua articulada pura deve ser preferida.3- Os governos devem tomar medidas para que todos os surdos recebam educação.4- O método mais apropriado para os surdos se apropriarem da fala é o método intuitivo (primeiro a fala, depois a escrita); a gramática deve ser ensinada através de exemplos práticos, com a maior clareza possível; devem ser facultados aos surdos livros com palavras e formas de linguagem conhecidas pelo surdo.

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5- Os educadores de surdos, do método oralista, devem aplicar-se na elaboração de obras específicas desta matéria.6- Os surdos, depois de terminado o seu ensino oralista, não esqueceram o conhecimento adquirido, devendo, por isso, usar a língua oral na conversação com pessoas falantes, já que a fala se desenvolve com a prática. 7- A idade mais favorável para admitir uma criança surda na escola é entre os 8-10 anos, sendo que a criança deve permanecer na escola um mínimo de 7-8 anos; nenhum educador de surdos deve ter mais de 10 alunos em simultâneo.8- Com o objetivo de se implementar, com urgência, o método oralista, deviam ser reunidas as crianças surdas recém-admitidas nas escolas, onde deveriam ser instruídas através da fala; essas mesmas crianças deveriam estar separadas das crianças mais avançadas, que já haviam recebido educação gestual, a fim de que não fossem contaminadas; os alunos antigos também deveriam ser ensinados segundo este novo sistema oral.

Duarte et al. (2013) destacam que com essas resoluções, a educação dos surdos assumiu a responsabilidade de reabilitação, colocando em segundo plano a função pedagógica e encarregando-se dos treinos auditivos, para que assim todos os sinais sonoros que pudessem ser recebidos se transformassem em informações somadas ao treino da leitura orofacial. Vale ressaltar que grande parte dessas decisões tomadas no II Congresso Internacional de Educação dos Surdos, tiveram a influência direta de Alexander Graham Bell. Bell tinha grande prestígio e autoridade, defendia a eugenia e o ensino da língua oral, criticando o uso da língua de sinais como língua natural dos surdos.

FIGURA 12 – ALEXANDER GRAHAM BELL (1849-1922)

FONTE: Disponível em: <http://www.teknolojivetasarim.org/alexander-graham-bell-kimdir/>. Acesso em: 23 maio 2018.

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NOTA

Você sabia que em 1877, Alexander Graham Bell fundou a Companhia Telefônica Bell que, mais tarde, tornou-se a American Telephone & Telegraph (AT&T), a maior companhia telefônica do mundo? A Telefônica Bell abriu a primeira linha transcontinental, de Nova York a São Francisco, em 1915. Além da invenção do telefone, que deu a Bell muito dinheiro e fama, ele também inventou o fotofone e o audiômetro, além das gravações fonográficas em chapas ou cilindros revestidos com cera. Graham Bell se aposentou, mas continuou ativo como coordenador do Instituto Smithsonian, em Washington.

FONTE: Alexander Graham Bell em Só História. Virtuous Tecnologia da Informação, 2009-2018. Disponível em: <http://www.sohistoria.com.br/biografias/graham/>. Acesso em: 23 maio 2018.

A partir da década de 1960 e 1970, o período do império oralista começa a ruir. Segundo Duarte et al. (2013, p. 1724), “a partir de 1960, a filosofia educacional denominada oralismo sofreu uma série de críticas pelas restrições que impunha. Assim, surgiam pesquisas defendendo que a língua de sinais teria todos os atributos de uma língua oral. Com a publicação do artigo Sign language structure: an outline of the visual communication system of the american deaf (Estrutura da linguagem de sinais: um esboço do sistema de comunicação visual dos surdos americanos), de William Stokoe, deu-se um grande passo para o reconhecimento da língua de sinais na vida dos surdos, que por sua vez, alcançaram uma mudança na denominação deficiente auditivo para surdo (DUARTE et al., 2013).

Na década de 1970, houve uma intensa publicação de pesquisas na área da Linguística que buscavam provar a eficiência das línguas de sinais. Como deixam claro Duarte et al. (2013, p. 1726):

[...] as línguas de sinais podiam ser comparadas às línguas orais em complexidades, singularidade, expressividade e função estética. Há várias línguas de sinais pelo mundo, de modo que não são universais; são diferentes umas das outras e independem das línguas orais. Cada língua de sinais tem sua própria estrutura gramatical. As pessoas surdas que estão inseridas nacionalmente em sua cultura surda possuem sua própria língua; cada comunidade de surdos desenvolveu a sua língua de sinais, ao longo dos tempos, assim como cada comunidade de ouvintes.

Ainda na década de 1970, surge nos EUA uma nova filosofia educacional,

que foi difundida para outros países, com o nome de Comunicação total. Nessa filosofia educacional, o que está em jogo é dizer não ao isolamento e possibilitar a aproximação e o contato com as pessoas. Para que isso se concretize, seria necessário utilizar todas as maneiras possíveis para uma comunicação total, seja pela linguagem oral, pela linguagem de sinais, pela datilologia ou pela

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combinação desses modos. Assim, segundo Duarte et al. (2013), a visão do sujeito surdo deixa de ser focada na diferença patológica para se pautar na diferença linguística, ocasionando a viabilização da interação entre os surdos e entre a comunidade ouvinte. Posteriormente, na década de 1980, apareceu a filosofia educacional denominada de bilinguismo, cujo objetivo era que o surdo fosse bilíngue, desenvolvendo o mais cedo possível a exposição da criança a duas línguas, a de sinais e a oral de seus pais.

DICAS

Um artigo que aborda alguns pontos da história da interface educação e deficiência auditiva é: A construção do projeto bilíngue para surdos no Instituto Nacional de Educação de Surdos na década de 1990 (LOPES; FREITAS, 2016). Trata das relações de poder que perpassaram a tentativa de construção de um projeto de educação bilíngue para surdos, na década de 1990, no Colégio de Aplicação do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines).

A investigação debruçou-se sobre as ações protagonizadas por agentes escolares que visavam reconceitualizar a visão sobre a surdez e os surdos, retirando-os da esfera da deficiência, inscrita na concepção oralista, apostando em um modelo socioantropológico de educação de surdos [...]. Inferiu-se que, apesar de o bilinguismo ter assumido centralidade no projeto político-pedagógico da instituição desde 1996, existe ainda um longo caminho a percorrer entre as intenções do currículo oficial e as daquele presente no cotidiano do Ines (LOPES; FREITAS, 2016, p. 372).

ESTUDOS FUTUROS

Prezado acadêmico! Na Unidade 3, nós estudaremos as escolas bilíngues (no contexto da surdez).

3 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS NO BRASIL

A educação de crianças deficientes no Brasil surge na forma institucionalizada, sob a influência das ideias liberais no fim do século XVIII. Tais ideias já se faziam presentes em movimentos, como por exemplo, a Inconfidência Mineira (1789), a Conjuração Baiana (1798) e a Revolução Pernambucana (1817), que reuniam numa mesma luta vários profissionais: médicos, advogados, professores etc. (JANNUZZI, 2004). As ideias liberais estavam vinculadas à elite brasileira, que correspondiam as suas aspirações particulares, como a luta

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pela abolição das instituições coloniais, a crítica ao dogmatismo, a defesa pela liberdade de expressão e a propriedade privada. Neste cenário, a educação dos deficientes no Brasil também sofria a influência do liberalismo, pois o movimento estava vinculado com a democratização dos direitos para todos os cidadãos.

Deste modo, segundo Jannuzzi (2004), as Santas Casas de Misericórdia também tiveram uma grande importância na história das pessoas deficientes no Brasil, haja vista que essas instituições atendiam e acolhiam as pessoas carentes e doentes. Segundo Silva (2012), a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a partir de 1717, acolheu crianças abandonadas até a idade de 7 anos. Depois dessa idade as crianças eram enviadas para seminários, que as preparavam para o futuro. Para Silva (2012, p. 22), “é possível que algumas crianças com deficiência leve tenham recebido esse mesmo tratamento, atitude que não era comum na época”.

No dia 12 de setembro de 1854, foi criado por Dom Pedro II o Instituto dos Meninos Cegos. Segundo Jannuzzi (2004), o instituto tem sua origem ligada ao cego brasileiro José Álvares de Azevedo, que estudava no Instituto dos Jovens Cegos, em Paris, fundado no século XVIII por Valentin Haüy. Januzzi (2004, p. 11) relata que “Azevedo regressara ao Brasil em 1851 e, impressionado com o abandono do cego entre nós, traduziu e publicou o livro de J. Dondet História do Instituto dos Meninos Cegos de Paris”.

Para Lourenço e Barani (2011), no ano de 1855 chega ao Brasil o professor surdo francês Eduard Huet (1822-1882), por intermédio de Dom Pedro II, com o objetivo de criar uma escola de surdos no país. Logo em seguida, no dia 26 de setembro de 1857, criou-se por vontade de Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, o Instituto Pioneiro na Educação dos Surdos, hoje denominado de Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. Segundo Lourenço e Barani (2011), esse espaço funcionava como um colégio interno, onde as crianças e os adolescentes ficavam durante todo o ano em constante aprendizado com as oficinas profissionalizantes e a disciplina dos conteúdos.

FIGURA 13 – O IMPERIAL INSTITUTO DOS SURDOS-MUDOS (1854), HOJE, INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS – INES (2018)

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FONTE: Disponível em: <https://diariodecaratinga.com.br/?p=46003>. Acesso em: 23 maio 2018.

Silva (2012) destaca que embora implicitamente, o direito das pessoas com deficiência já estava na primeira constituição do Brasil, de 1854. A partir de 1857, o Brasil teve um grande crescimento econômico, de estabilização do poder imperial, e uma forte influência de ideias liberais advindas da Europa, principalmente da França e EUA. A criação do Imperial Instituto de Surdos-mudos foi um importante marco na história da educação dos surdos, haja vista que se constituiu de uma escola preocupada com o ensino literário e profissionalizante de meninos surdos na faixa etária entre 7 e 14 anos (SILVA, 2012).

Após cinco anos na direção do Imperial Instituto de Surdos-mudos, o professor pioneiro na educação dos surdos no Brasil, Ernest Huet, por motivos pessoais deixa de seus trabalhos e viaja para o México em 1861 (STROBEL, 2008). Desta forma, a direção do instituto fica sob responsabilidade dos diretores ouvintes. Para Silva (2012), o Imperial Instituto de Surdos-mudos era mantido pelo poder central, cujas influências de sua criação se deram tanto do âmbito geral do próprio contexto, como também do meio político. Além disso, essa escola foi a primeira instituição séria do Brasil que amparava as pessoas com deficiência, mesmo que o atendimento ainda era precário, havia por parte do instituto a abertura para discussões sobre assuntos relacionados à educação de pessoas com deficiência no Primeiro Congresso de Instrução Pública, em 1883 (JANNUZZI, 2004).

Além disso, o instituto era uma referência para a comunidade surda e para os professores surdos da época. Segundo Mori e Sander (2015), os professores e estudantes do instituto utilizavam a língua de sinais francesa, trazida pelo pedagogo Huet, misturando com a língua existente no país. Dessa mistura surgiu, mais tarde, a Língua Brasileira de Sinais (Libras), usada até hoje. Vale lembrar que assim como as línguas orais, as línguas de sinais também se constituem a partir de outras já existentes.

Neste sentido, foi no contexto da década de 1980 até os anos 1990 que floresceu, no Brasil, o uso da língua de sinais, mais precisamente a filosofia educacional, denominada Comunicação Total (MORI; SANDER, 2015). Como já abordado anteriormente, essa filosofia educacional originou-se nos EUA, com o

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objetivo de aperfeiçoar a educação dos surdos por meio de todas as formas de comunicação possíveis: a fala, os sinais, a dança, a mímica, o teatro etc.

As escolas especiais iniciaram lentamente o uso de sinais, já que elas estavam enraizadas no oralismo. Aos surdos se deu voz e os professores ouvintes aprenderam os sinais com seus próprios alunos. Um clamor se levantou na educação especial para a abertura de novos caminhos, caminhos estes mais democráticos, mais naturais com o uso dos sinais. A língua de sinais no Brasil ainda não era oficial e não era ainda entendida como uma língua (MORI; SANDER, 2015, p. 10).

Vieira e Bondezan (2011) concordam que em 1970 chega no Brasil a filosofia da comunicação total. As autoras também ressaltam que na década de 1980, com os estudos na área da Linguística, sobretudo da professora de linguística Lucinda Ferreira Brito, se iniciam os estudos da Língua de Sinais (Libras), abrindo espaço para estudos relacionados à filosofia educacional do bilinguismo. Ainda que os estudos sobre o bilinguismo no Brasil são recentes, poucos países aderiram a esse sistema.

Neste sentido, as concepções de surdez e de pessoa surda na história do Brasil passaram por algumas modificações, utilizando-se de várias metodologias em distintas abordagens educacionais para surdos, entre elas se destacam o oralismo, a comunicação total e o bilinguismo. Sob o ponto de vista da educação bilíngue, essa concepção ocupa uma posição fundamental no que diz respeito às discussões sobre modalidade de ensino mais adequado para a aprendizagem da criança surda, sendo que “a premissa básica da proposta bilíngue é o acesso à língua de sinais, a qual deve ser trabalhada com a criança por educadores bilíngues” (VIEIRA; BONDEZAN, 2011, p. 101).

Para Mori e Sander (2015), com o Manifesto dos Educadores Democratas em Defesa do Ensino Público, em 1959, houve o clamor dos educadores brasileiros por uma educação com mais qualidade, chamando a atenção da sociedade e da classe política. “O manifesto reivindicava uma visão democrática e cidadã, de valores eternos como a honestidade, a verdade, o respeito, a responsabilidade” (MORI; SANDER, 2015, p. 10).

Um movimento semelhante ocorre no contexto paranaense entre as décadas de 1980 e 1990, quando educadores reivindicam por “uma escola aberta e democrática, com uma política educacional centrada em valores democráticos e onde alunos, pais e educadores pudessem ser livre na convivência e vivência cultural e na experimentação e pesquisa científica” (MORI; SANDER, 2015, p. 11).

Deste modo, tanto no contexto da escola de surdos como na escola de ouvintes, houve um renascimento que estava sendo clamado. Os manifestos clamavam pela atenção da sociedade e do governo, de que a situação da educação deveria melhorar. “Enquanto os surdos clamavam pela sua língua, por uma língua que poderiam usar para pensar, comunicar e interagir, ambos os manifestos reivindicavam abertura, democracia, respeito, liberdade, cidadania” (MORI; SANDER, 2015, p. 11).

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LEITURA COMPLEMENTAR

A ESCOLA, AS LIBRAS, UM BRASIL DE INCLUSÃO

Marina Rubini

Você sabia que o tema da redação do Enem de 2017 foi sobre os desafios para a formação educacional de surdos no Brasil? A seguir você terá acesso a uma redação redigida pela Professora Marina Rubini, sob o título: “A escola, as Libras, um Brasil de inclusão”.

Pela Constituição Brasileira, Carta Magna do país, o acesso à saúde, a educação e a segurança são direitos invioláveis. Assim, todos os cidadãos a partir dos 5 anos de idade devem frequentar a escola. A escola brasileira, porém, apresenta algumas limitações. Limitações em sua estrutura física, em que faltam rampas de acesso e elevadores para deficientes físicos, como cadeirantes, faltam professores-tutores para aqueles que possuem transtornos de desenvolvimento como o autismo e também faltam profissionais especializados e métodos educacionais que contemplem às necessidades dos deficientes auditivos.

A deficiência auditiva não é rara como se pensa. Existem milhares de famílias brasileiras que diariamente vivenciam o drama da falta de inclusão. Os surdos são indivíduos com uma deficiência que impossibilita a comunicação da maneira como se conhece, mas que podem viver uma vida absolutamente normal se pequenos ajustes forem realizados. Um exemplo claro é o sistema de Libras, conhecida popularmente como linguagem de sinais. Através de sons, movimentos labiais e gestos manuais, o indivíduo entende e se faz entender. Não se trata apenas de uma adaptação de linguagem, é muito mais que isso, é a porta da inclusão que se abre e permite a transformação de vidas.

Hoje, concursos públicos ou mesmo vestibulares oferecem a prova no sistema de Libras, o que possibilita que os surdos tenham acesso à universidade e ao mercado de trabalho. Nessas provas existem também vagas reservadas a esse público. No entanto, os desafios da inclusão são ainda maiores. As mudanças devem vir desde a base, isto é, na creche, nas séries iniciais, ainda quando as crianças tiverem o primeiro contato com a educação. Somente assim, um brasileirinho ou uma brasileirinha com surdez poderá se desenvolver e competir igualmente com os demais. Enquanto pouco compreenderem e pouco forem compreendidos, a inclusão não está sendo suficiente.

Profissionais que lidam com a educação, como professores e psicopedagogos, precisam dominar as Libras, bem como encorajar que cada vez mais crianças não deficientes possam aprender essa nova maneira de se comunicar.

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TÓPICO 2 | A EDUCAÇÃO DOS SURDOS AO LONGO DA HISTÓRIA

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As crianças vão compor o Brasil de amanhã. Profissionais da saúde, como médicos, fonoaudiólogos e até mesmo psicólogos também são essenciais nesse âmbito de inclusão. Uma equipe multiprofissional precisa estar apta a atender as demandas dessas pessoas, que sofrem pela dificuldade de comunicação e de se inserir nos meios sociais e até mesmo eventualmente bullying pela sua condição.

Aos governantes fica o dever de oferecer cursos de reciclagem e aperfeiçoamento aos profissionais da educação bem como incentivar que os estabelecimentos públicos e privados ofereçam condições de atendimento desse público com base nas Libras. Adam Smith, o pai do Liberalismo Econômico, sempre deixou claro que a riqueza de uma nação não está contida na riqueza de seus príncipes, mas sim na riqueza de seu povo. Assim, para o Brasil crescer e o povo brasileiro desenvolver seus potenciais faz-se necessárias mudanças, que passam obrigatoriamente pela inclusão social das minorias. Oferecer acessibilidade é garantir mais justiça e igualdade, eixos de uma sociedade democrática (RUBINI, M. Tema Redação Enem 2017: educação de surdos no Brasil.

FONTE: Disponível em: <http://oenem.com.br/blog/tema-redacao-enem-2017-educacao-de-surdos-no-brasil/>. Acesso em: 5 jul. 2018.

ESTUDOS FUTUROS

Voltaremos a refletir sobre o tema de redação do Enem 2017, na Unidade 2.Bons estudos!

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Antes do século XVI, os surdos não eram considerados aptos para receber uma educação formal, pois a palavra oral tinha enorme importância.

• A educação formal se inicia com o padre beneditino Pedro Ponce de Léon (1520-1584), o primeiro professor de surdos, a qual ensinava os filhos surdos da aristocracia espanhola no mosteiro beneditino de São Salvador em Oña.

• O ensino de Ponce de Léon incluía datilografia (alfabeto manual), a escrita e o treino para a fala (oralização). Tinha como objetivo reconhecer os filhos surdos dos aristocratas espanhóis como cidadãos frente à lei e à sociedade, para que pudessem herdar os títulos e a fortuna da família.

• O sucessor de Ponce de Léon foi o professor Manuel Ramírez de Carrión (1579-1652), que publicou a obra Maravilhas da natureza, em 1629.

• Os padres e educadores espanhóis Juan Pablo Bonet (1573-1633) e Lorenzo Hervás Panduro (1735-1809) são os pioneiros em trabalhos escritos sobre a educação de surdos com os seguintes livros. Bonet escreveu a Redução das letras e arte de ensinar a falar os mudos, de 1620. Hervás escreveu em dois volumes a obra Escuela española de sordomudos, datada de 1795.

• Os estudos do professor britânico John Wallis (1616-1703) postulam que o ouvido é o principal órgão para a manifestação da linguagem, sendo que os ouvidos que apresentassem algum tipo de problema, alterariam a natureza física da aquisição da linguagem e comprometeriam a fala.

• Os estudos do filósofo John Locke (1632-1704) enfatizam que a experiência sensorial deve nortear a prática pedagógica, havendo individualidade no processo de aprendizagem, na qual a experiência é a condição fundamental dos processos complexos de pensamento.

• O abade francês Charles Michel de L’Epée (1712 – 1789), conhecido como “pai dos surdos”, funda a primeira escola pública para surdos em Paris, o Instituto Nacional de Surdos-mudos de Paris. O abade francês L’Épée utilizava uma metodologia de ensino que se baseava na própria linguagem dos surdos, ou seja, sistematizando os sinais que os surdos utilizavam, criando outros sinais.

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• Na modernidade, a educação de surdos tem um salto qualitativo, pois se consolidaram diversas escolas que utilizavam da Língua de Sinais, que permitiam aos surdos aprender e dominar inúmeros assuntos, atuando profissionalmente.

• O médico-cirurgião e psiquiatra francês Jean Itard (1774-1838) considerou que para se educar um surdo era indispensável introduzir a língua de sinais. Suas obras tiveram grande contribuição na educação dos surdos, como: Sobre os métodos de restauração de desenvolver a palavra dos surdos, de 1807, e Sobre os métodos de restauração de audição para surdos, de 1808. O aparelho que usava em suas experiências com os surdos ficou conhecido como Sonda de Itard.

• O professor Americano Thomas Hopkins Gallaudet (1787-1851), quando retorna de sua experiência no Instituto de Paris em 1817, com o surdo francês Laurent Clèrc (1785-1869), funda nos EUA a primeira escola exclusiva para alunos surdos, denominada American School for the Deaf.

• No ano de 1878, aconteceu em Paris o I Congresso Internacional de Educação de Surdos, um marco histórico na educação dos surdos.

• Em 1880 ocorreu o II Congresso Internacional de Educação de Surdos, na cidade de Milão. O propósito desse segundo congresso era estabelecer critérios internacionais e científicos para a educação dos surdos.

• Com a publicação do artigo Sign language structure: an outline of the visual

communication system of the american deaf (Estrutura da linguagem de sinais: um esboço do sistema de comunicação visual dos surdos americanos), de William Stokoe, deu-se um grande passo para o reconhecimento da língua de sinais na vida dos surdos, que por sua vez, alcançaram uma mudança na denominação deficiente auditivo para surdo.

• Na década de 1970, surge nos EUA uma nova filosofia educacional, que foi difundida para outros países com o nome de Comunicação Total. Tinha como objetivo aperfeiçoar a educação dos surdos por meio de todas as formas de comunicação possíveis: a fala, os sinais, a dança, a mímica, o teatro etc.

• Em 1980 até os anos 1990, a filosofia educacional da Comunicação Total chega ao Brasil.

• Na década de 1980, surgiu a filosofia educacional denominada bilinguismo, cujo objetivo era que o surdo fosse bilíngue, desenvolvendo o mais cedo possível a exposição da criança a duas línguas, a de sinais e a oral de seus pais.

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• A educação de crianças deficientes no Brasil surge na forma institucionalizada, sob a influência das ideias liberais no fim do século XVIII.

• No dia 12 de setembro de 1854, foi criado por Dom Pedro II o Instituto dos Meninos Cegos, ligado ao cego brasileiro José Álvares de Azevedo.

• No ano de 1855, chegou ao Brasil o professor surdo francês Eduard Huet (1822-1882), por intermédio de Dom Pedro II, fundando em 26 de setembro de 1857, no Rio de Janeiro, o Instituto Pioneiro na Educação dos Surdos, hoje denominado de Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES.

• A partir de 1980, com os estudos na área da Linguística, sobretudo da professora de linguística Lucinda Ferreira Brito, se iniciam os estudos da Língua de Sinais (Libras) no Brasil, ganhando força os estudos na área do Bilinguismo.

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1 Antes do século XVI, na história da educação dos surdos no mundo não havia registro de nenhuma instituição que fornecia uma educação formal para os surdos. Somente com o padre beneditino Pedro Ponce de Léon (1520-1584), o primeiro professor de surdos, se consolidou um trabalho formal na educação dos surdos na Europa. A partir do exposto, responda qual era o principal objetivo da primeira forma de educação formal para os surdos e para qual classe social era fornecida.

2 Além dos padres e educadores espanhóis, os teóricos britânicos John Wallis (1616-1703), John Bulwer (1606-1656), John Locke (1632-1704) e o médico holandês Johann Conrad Ammann (1669-1724) tiveram grande influência na educação dos surdos com suas produções teóricas. A partir da informação exposta, analise as proposições a seguir:

I- Os estudos realizados pelo professor John Wallis consideram que a visão é o órgão principal do corpo humano, o qual tem um papel importante na aquisição da linguagem, pois compromete diretamente a fala.II- A contribuição do médico britânico John Bulwer para com a educação dos surdos está relacionada aos seus estudos sobre as expressões linguísticas, sobretudo com sua produção de 1648, Philocophus, que se inspirou em pessoas surdas, sendo o primeiro livro em inglês a relacionar a surdez com o problema de linguagem.III- O filósofo John Locke, considerado o “pai do liberalismo” e representante do empirismo britânico, postula que a experiência sensorial é que deve nortear a prática pedagógica, havendo individualidade no processo de aprendizagem. O filósofo concluiu em Ensaio acerca do entendimento humano, que o objeto da sensação é uma fonte das ideias.IV- O médico holandês Johann Conrad Ammann escreveu o livro Surdus Ioquens (O homem surdo falante), em 1700, que trata de questões relacionadas à linguagem e à diferença entre os sons da voz e a língua de sinais.

Com base nas informações apresentadas, marque a alternativa com a sequência CORRETA:

( ) As afirmações I, II, III e IV estão corretas.( ) As afirmações II e IV estão corretas.( ) As afirmações II, III estão corretas. ( ) Somente a afirmação III está correta.

AUTOATIVIDADE

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3 Na segunda metade do século XVII, o abade francês Charles Michel de L’Epée (1712 -1789), conhecido como “pai dos surdos”, funda a primeira escola pública para surdos em Paris, o Instituto Nacional de Surdos-mudos de Paris, inaugurando na história da educação dos surdos uma língua comum. Com base no exposto, responda qual era a metodologia utilizada pelo religioso L’Épée na educação dos surdos e qual era a crítica feita pelos professores que o seguiram posteriormente.

4 Na modernidade, a educação dos surdos tem um salto qualitativo, pois se consolidaram inúmeras escolas que utilizavam a Língua de Sinais que permitiam aos surdos aprender e dominar inúmeros assuntos, inclusive atuar profissionalmente. Entretanto, é neste período que as experiências com os surdos começaram a ser publicadas e divulgadas, e os surdos cada vez mais passaram a ser considerados doentes. O médico-cirurgião e psiquiatra Jean Marc Gaspard Itard (1774-1838) realizou várias experiências científicas com surdos, utilizando uma metodologia particular. Com base no exposto, responda quais eram as técnicas realizadas nas experiências de Itard com os surdos e quais eram os objetivos de seu método.

5 No ano de 1855, chegou ao Brasil o professor surdo francês Eduard Huet (1822-1882), por intermédio de Dom Pedro II, com o objetivo de criar uma escola de surdos no país. Dois anos mais tarde, no dia 26 de setembro, surge no Rio de Janeiro o Imperial Instituto dos Surdos-mudos, pioneiro na educação dos surdos, hoje denominado de Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES. Diante do exposto, caracterize as principais funções do instituto na época em que foi fundado.

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TÓPICO 3

DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E

DESAFIOS

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Prezado acadêmico! Neste terceiro tópico, você adentrará no universo dos conceitos e desafios que assolam a educação especial, em particular, a deficiência auditiva. Sabe-se que termos como “deficiência”, “surdo”, “educação especial” ou “necessidades educacionais especiais” (NEE) possuem em sua polissemia diversos entendimentos e direcionamentos na prática. Você verá que com os estudos da filósofa e pesquisadora Mary Warnock, introduziu-se na história da educação especial o conceito de necessidades educativas especiais, que por sua vez, foi adotado na Declaração de Salamanca em 1994. A terminologia não foi muito bem recebida por estudiosos da educação especial, que teceram algumas críticas que você ficará sabendo ao longo de sua leitura. Você também ficará por dentro de abordagens que tratam o surdo não como deficiente, mas como diferente. Vamos ao que interessa, boa leitura e bom estudo!

2 DEFICIÊNCIA AUDITIVA: CONCEITOS

Antes do século XIX, a educação de surdos era transmitida através de sinais e os professores majoritariamente eram surdos. Segundo Brasil (2006), devido às opiniões distintas entre os professores falantes e os surdos quanto ao método de ensino, em 1880, no Congresso Mundial de Professores de Surdos, determinou-se que a educação destes deveria ser promovida pelo método oral puro, exigindo dos deficientes auditivos e surdos o comportamento de pessoas ouvintes.

Outro evento decisivo para a determinação do oralismo como método e da condenação do uso da Língua de Sinais para a educação de crianças surdas foi o Congresso de Milão, de 1880. Lembramos duas resoluções estabelecidas neste congresso:

• Dada a superioridade incontestável da fala sobre os sinais para reintegrar os surdos-mudos na sociedade e dar-lhes o maior conhecimento de linguagem é que o método oral deve ter preferência sobre o de sinais.

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

• Considerando que o uso simultâneo da fala e sinais tem a desvantagem de prejudicar a fala, a leitura labial e a precisão de ideias é que o método oral puro deve ser preferido.

Portanto, na visão de Haguiara-Cervellini (2003), a partir do Congresso de Milão o oralismo toma o lugar na educação dos surdos, sendo que a vitória do oralismo sobre a língua de sinais aponta para a questão da não aceitação do diferente, ou seja, há um ideal de normalidade que deve ser perseguido. Na modernidade, isso não acontece somente com a comunidade surda, mas com todos os sujeitos que se apresentam fora da normalidade, fora dos ditames da sociedade. Assim, ou esse sujeito se enquadra nas regras estabelecidas pela sociedade, ou ele é estigmatizado.

Segundo Haguiara-Cervellini (2003), no século XX, o oralismo ganha um novo impulso diante das conquistas da medicina, especialmente na área de diagnóstico, com os avanços tecnológicos e o desenvolvimento da eletroacústica, que indicaram possibilidades de amplificação do som. Deste modo, relata Haguiara-Cervellini (2003, p. 34):

O aproveitamento dos resíduos auditivos, mediante aparelhos de amplificação sonora cada vez mais potentes e sofisticados, ou mesmo por meio de intervenções cirúrgicas, como o implante coclear, passou a apontar para a audição residual do surdo como a porta e o caminho para o desenvolvimento de sua língua oral.

Para Haguiara-Cervellini (2003), o implante coclear se dá numa intervenção cirúrgica, indicada para os sujeitos com surdez neurossensorial bilateral profunda. Composto de próteses computadorizadas, como eletrodos implantados no interior da cóclea, cuja função é substituir parcialmente as funções do órgão lesado. Assim, o trabalho de habilitação e reabilitação auditiva faz parte dessa proposta.

Os primeiros aparelhos de amplificação sonora surgiram nos anos de 1940, em meio aos progressos da audiologia, do diagnóstico, e a partir das medições auditivas e da indicação de aparelhos, que passaram a dominar o surdo de deficiente auditivo. Na visão de Haguiara-Cervellini (2003), a denominação “deficiente auditivo” compreende todas as crianças com perda auditiva cuja extensão necessita de cuidado educacional especial. Essa denominação corresponde aos diferentes tipos de graus e de perdas auditivas, conforme as recomendações da Conferência de Executivos das Escolas Americanas.

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TÓPICO 3 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS

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ESTUDOS FUTUROS

Prezado acadêmico! Na próxima seção, você verá as classificações dos tipos de grau, bem como das perdas auditivas.

Na perspectiva de Honora e Frizanco (2008, p. 25), a diferença entre deficiência auditiva e surdez consiste em:

A deficiência auditiva e a surdez apresentam características bem diferentes, porém ambas ocasionam uma limitação para o desenvolvimento do indivíduo. Consideramos que a audição é fundamental para a aquisição da linguagem falada e sua deficiência pode ocasionar muita dificuldade nas relações sociais, psicológicas e na interação.

Para Haguiara-Cervellini (2003), com as recomendações da Conferência de Executivos das Escolas Americanas, surdo passa a ser todo sujeito cuja perda de audição se estabelece ao nível ou acima de 70 dB (decibéis). Diante disso, o surdo busca a sua própria identidade, se afirmando como Surdo, com “S” maiúsculo, e com apoio dos movimentos das minorias. Nas palavras de Haguiara-Cervellini (2003, p. 35): “Atualmente, as expectativas do Oralismo giram em torno da possibilidade de transformar o surdo em “ouvinte” ou como o ouvinte e oralizá-lo, visando a sua inclusão na sociedade”.

Para Mainieri (2012), a etimologia do termo deficiência corresponde a uma qualidade de incapaz, insuficiência, incompleto, de algo que falta ou que está faltando. Na origem da palavra, deficiência quer dizer falta de eficiência. Desta forma, inúmeros eventos que ocorreram no Brasil desencadearam descontentamento e repúdio da comunidade surda em relação à expressão deficiente auditivo, pois a noção de incapaz, de incompleto está presente no termo.

É a partir dos anos 1970 que os termos surdo e surdez passam a ser vinculados à patologia, ou seja, à incapacidade do órgão e não ao sujeito. Nesse sentido, conforme Mainieri (2012), a pesquisadora Mary Warnock, nos anos de 1978, realizou uma pesquisa que investigou as condições da educação especial inglesa, apresentando os resultados ao parlamento do Reino Unido, para a Educação e Ciência, Secretaria do Estado para a Escócia e a Secretaria do Estado para o País de Gales. Na visão de Mainieri (2012, p. 63), a pesquisadora concluiu que:

[...] a presença da deficiência não significa necessariamente incapacidade de aprendizagem, pois muitos alunos apresentavam distúrbios de aprendizagem sem terem nenhuma dificuldade física, sensorial, mental ou comportamental. Ou seja, cerca de 20% das crianças apresentam NEE em algum período da sua vida escolar. A partir desses dados, o relatório propôs o conceito de NEE.

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

FIGURA 14 – MARY WARNOCK

FONTE: Disponível em: <http://www.greatthoughtstreasury.com/author/mary-warnock-fully-helen-mary-warnock-baroness-warnock>. Acesso em: 28 maio 2018.

NOTA

Algumas frases da filósofa e pesquisadora Mary Warnock:

• “Inclusion must embrace the feeling of belonging – necessary for well-being and successful learning”. (A inclusão deve abranger o sentimento de pertencer – necessário para o bem-estar e o aprendizado bem-sucedido).

• “Special equipment may make it possible that some children with sensory deprivation …can be taught in the ordinary classroom”. (Equipamentos especiais podem tornar possível que algumas crianças com privação sensorial ... possam ser ensinadas na sala de aula comum).

• “The fact is that, if educated in mainstream schools, many such children are not included at all”. (O fato é que, se educadas em escolas regulares, muitas dessas crianças não são incluídas).

• “The idea of inclusion should be rethought”. (A ideia de inclusão deve ser repensada).

Para Mainieri (2012, p. 63), a contribuição de Warnock “ampliou o olhar a respeito das necessidades educacionais especiais também no âmbito escolar, ao incluir nesse conceito todas as crianças que não estejam conseguindo se beneficiar com a escola seja por qual motivo for”. Nesse sentido, segundo Marchesi e Martín (1995), Warnock revelou dados contrários à ótica até então adotada sobre problemas de aprendizagens, já que, segundo a pesquisadora, aproximadamente 2% da população escolar apresentava dificuldades cuja origem fossem quadros permanentes, como deficiências ou outros distúrbios orgânicos que ocasionam atrasos, lentidão na compreensão, problemas de linguagem, distúrbios emocionais ou de conduta.

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TÓPICO 3 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS

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Deste modo, onde reside o fato da ineficácia do sistema de ensino? Segundo Sueli (2011), um dos maiores problemas do sistema de ensino está no fato de atender às diferenças econômicas e culturais que se fazem presentes na escola. Sabe-se que, com o crescimento demográfico, a profunda pobreza, a imigração, a fome e outros problemas sociais, ocasionam maior índice de problemas de aprendizagem sobre os filhos das classes desfavorecidas.

Nas palavras de Sueli (2011, p. 137):

O fracasso maciço se explicava, no entanto, pela gama intensa de problemas socioeconômicos como a fome, o isolamento social, os maus-tratos, as drogas, entre outros, que poderiam ser revertidos se as respostas educacionais dispensadas pela escola fossem mais efetivas. Ou seja, a pesquisadora constatou que é na escola que algumas dificuldades de aprendizagem e problemas de adaptação originam-se ou intensificam-se, quanto mais rígida, tradicional e homogênea for a proposta educacional.

Portanto, Warnock concluiu que ambos os grupos necessitaram da ação da escola para superação de possíveis problemas no processo de aprendizagem, a qual deveria se estruturar e organizar para ofertar recursos educacionais a cada caso, seja no caso de necessidades permanentes (deficiência e distúrbios) ou temporárias (congênitas sociais, culturais e familiares) (SUELI, 2011). Esses recursos educacionais que a escola deveria investir para o atendimento dessas duas necessidades, são tanto de natureza humana como da parte técnica, material, estabelecendo uma reorganização da matriz curricular, acerca dos objetivos, da avaliação e da metodologia.

A partir dessa teorização se introduziu o conceito de necessidades educacionais especiais (NEE), que segundo Sueli (2011), passou equivocadamente a substituir a categoria das deficiências, pelo motivo de que o termo deficiência busca localizar o problema apenas no aluno. Na visão de Sueli (2011), o equívoco reside justamente nos grupos contemplados na nova categoria, que não se restringe apenas a pessoas com deficiências. No dizer de Sueli (2011, p. 136), “todos os alunos que possam apresentar necessidades especiais ao longo de sua escolarização, que exijam recursos muito diferenciados daqueles utilizados para a maioria dos alunos para supri-las, estariam contemplados nessa terminologia”.

Assim, o conceito de NEE passou a ser adotado a partir da Declaração de Salamanca, passando a abranger todas as crianças e jovens cujas necessidades envolvam deficiências ou dificuldades de aprendizagem. Segundo Ferreira (2006, p. 224-225):

[..] abrange todos os estudantes que estão fracassando nas escolas por uma ampla variedade de razões, que têm necessidade ou não de apoio adicional e demandará da escola adaptação de currículos, ensino/organização e/ou oferta de recursos humanos ou materiais adicionais de forma a estimular a aprendizagem eficiente e efetiva para este aluno.

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

As propostas, diretrizes e recomendações formuladas nos cinco seminários no Congresso de Salamanca, na Espanha, de 7 a 10 de junho de 1994, levaram em conta o estabelecimento de uma política para orientar os governos, as organizações internacionais e nacionais, bem como as organizações não governamentais, à implementação da Declaração de Salamanca sobre princípios, políticas e prática na área das necessidades educativas especiais.

Algumas considerações importantes na Declaração de Salamanca (1994, s.p.) foram que:

• Cada criança tem o direito fundamental à educação e deve ter a oportunidade de conseguir e manter um nível aceitável de aprendizagem.

• Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias.

• Os sistemas de educação devem ser planeados e os programas educativos implementados tendo em vista a vasta diversidade destas características e necessidades.

• As crianças e jovens com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas regulares, que a elas se devem adequar através duma pedagogia centrada na criança, capaz de ir ao encontro destas necessidades.

• As escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios mais capazes para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos; além disso, proporcionam uma educação adequada à maioria das crianças e promovem a eficiência, numa ótima relação custo-qualidade, de todo o sistema educativo.

Além disso, a Declaração de Salamanca (1994, s.p.) apelou aos governos para:

• Conceder a maior prioridade, através das medidas de política e através das medidas orçamentais, ao desenvolvimento dos respectivos sistemas educativos, de modo a que possam incluir todas as crianças, independentemente das diferenças ou dificuldades individuais.

• Adotar como matéria de lei ou como política o princípio da educação inclusiva, admitindo todas as crianças nas escolas regulares, a não ser que haja razões que obriguem a proceder de outro modo.

• Desenvolver projetos demonstrativos e encorajar o intercâmbio com países que têm experiência de escolas inclusivas.

• Estabelecer mecanismos de planeamento, supervisão e avaliação educacional para crianças e adultos com necessidades educativas especiais, de modo descentralizado e participativo.

• Encorajar e facilitar a participação dos pais, comunidades e organizações de pessoas com deficiência no planeamento e na tomada de decisões sobre os serviços na área das necessidades educativas especiais.

• Investir um maior esforço na identificação e nas estratégias de intervenção precoce, assim como nos aspectos vocacionais da educação inclusiva.

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TÓPICO 3 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS

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• Garantir que, no contexto duma mudança sistémica, os programas de formação de professores, tanto a nível inicial como em serviço, incluam as respostas às necessidades educativas especiais nas escolas inclusivas.

Sueli (2011) salienta que, no contexto brasileiro, a expressão necessidades especiais foi adotada oficialmente no art. 58 da LDBEN de 1996, ocasionando uma interpretação ampliada do alunado da educação especial no contexto da inclusão, pois avançava na ideia de que aplicava apenas aos alunos com deficiências e abarcava os demais alunos excluídos ou marginalizados no meio escolar. Nesse sentido, os alunos com necessidades especiais, na visão de Coll, Palácios e Marchesi (1995, p. 11), são aqueles “que por apresentarem algum problema de aprendizagem ao longo de sua escolarização, exigem uma atenção mais específica e maiores recursos educacionais do que os necessários para os colegas de sua idade”.

Desta forma, Sueli (2011) ressalta que embora a terminologia necessidades educacionais especiais ampliou o olhar sobre o fracasso escolar, chamando a atenção para os fatores sociais que também originam múltiplos problemas de aprendizagem, ela vem recebendo críticas de estudiosos e pesquisadores que defendem que a educação especial deve retomar sua natureza da modalidade voltada a um grupo específico de alunos. Segundo Sueli (2011, p. 143), as principais críticas à terminologia são:

1- Termo muito abrangente, que se refere a alunos com e sem deficiência, incluindo as que apresentam dificuldades de aprendizagem ou, até mesmo, superdotação.

2- Expressão muito vaga, que necessita ser explicada para alcançar-se sua definição.

3- Eufemismo para encobrir a real situação de deficiência, como se ela não existisse, acarretando prejuízos àqueles que necessitam ser identificados para terem suas necessidades atendidas.

4- Ampliação desmedida do universo de alunos a serem atendidos pela educação especial, descaracterizando o caráter e a função dessa modalidade educacional.

Para Sueli (2011), a concepção de deficiência, que norteia as políticas e os projetos educacionais da escola inclusiva; deve ser dinâmica e interativa, como compreende a Resolução nº 4/2009 da política em vigor: “considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental ou sensorial que, em interação com diversas barreiras, pode ter restringida sua participação plena e efetiva na escola e na sociedade” (Res. nº 4/2009). Dentro dessa perspectiva, para Sueli (2011, p. 145):

[...] parte-se do pressuposto de que as definições e o uso de classificações para se referir a grupos de alunos não devem se esgotar na especificação atribuída a quadros de deficiência ou outras patologias, pois as pessoas são transformadas pelo contexto social em que se inserem e uma atuação pedagógica adequada pode alterar uma situação de exclusão inicial.

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

A trajetória educacional que os surdos percorrem no Brasil acompanha uma série de desafios, com inúmeras implicações sociais, em que a escola e a sociedade ainda não têm definido seu papel diante do assunto, que é a educação inclusiva de alunos deficientes auditivos e surdos nas escolas regulares. Segundo a LDB (Lei de Diretrizes de Base) nº 9394/96, em seu Capítulo V, art. 58:

Entende-se por Educação Especial, para efeitos desta lei, a modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos que apresentem necessidades especiais. 1º Haverá quando necessário serviço de apoio especializado na escola regular para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. 2º O atendimento educacional será feito em classes ou serviços especializados sempre que em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.3º A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a Educação Infantil (LDB nº 9394/96).

Nesse sentido, como destaca Tessaro (2011), na tentativa de uma educação com mais qualidade e um melhor desenvolvimento, tanto do aspecto cognitivo como do emocional para os surdos, muitos métodos de trabalho têm sido propostos no decorrer da história da educação dos surdos. Como já sabemos, é no final dos anos 1970 que surge a proposta bilíngue de educação para os surdos, fundamentada nas concepções sociológicas e filosóficas. Nas palavras de Tessaro (2011, p. 37), “essa proposta tem por intuito oferecer ao surdo a possibilidade de utilizar duas línguas, ou seja, a língua oral/escrita (que pertence à comunidade ouvinte) e a língua de sinais (que pertence à comunidade surda)”. Dentro dessa ideia de educação, o surdo não é visto como deficiente, mas é percebido como diferente. Como afirma Kyle (1999, p. 16):

É relativamente óbvio que as crianças surdas deveriam ser bilíngues. Elas possuem uma língua natural visual e espacial que irão adquirir se forem agrupadas nas escolas. Elas vivem numa sociedade que é dominada pela língua falada e escrita. Para alcançar o potencial que é aparente em seu funcionamento cognitivo, precisam acessar a língua da maioria.

Deste modo, como lembra Souza (1998), atualmente devido ao conjunto de ideias que compõem e estruturam uma nova perspectiva que visa considerar o sujeito surdo, tem-se visto novas possibilidades da educação de surdos. Isso é possível por causa do deslocamento do enfoque sobre a patologia para a consideração das diferenças sociolinguísticas que caracterizam as relações surdos e ouvintes. Nas palavras de Souza (1998, p. 133-134), “trata-se de entender o surdo como sujeito que construirá sua identidade nas tensões discursivas promovidas por "falantes" de duas línguas diferentes: a língua majoritária e a de sinais”. Sendo assim, deve-se evidenciar a condição bilíngue da pessoa surda.

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TÓPICO 3 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS

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IMPORTANTE

Leitura importante sobre a ação docente no contexto da educação escolar, para o atendimento especializado dos alunos surdos:

Alunos surdos – A singularidade desses alunos tem como pressuposto a implementação de uma proposta da educação bilíngue, que contemple a interação e a mediação da aprendizagem realizada pela utilização de duas línguas em sua escolarização: a língua brasileira de sinais – Libras – e a língua portuguesa. Essa perspectiva implica a reorganização dos sistemas de ensino e dos projetos político-pedagógicos das escolas, de modo a garantir o bilinguismo desde a educação infantil até o ensino superior, contemplando a formação de profissionais bilíngues (professores surdos e ouvintes, tradutores e intérpretes de Libras/Língua Portuguesa), a incorporação da produção histórica e cultural das comunidades surdas no currículo (arte, história, literatura surda), a adoção da pedagogia visual como meio preferencial para o desenvolvimento da proposta curricular, estratégias bilíngues que incorporem tecnologias visuais na avaliação escolar, entre outros aspectos essenciais. Pela estreita relação entre língua-cultura, a comunidade surda politicamente organizada reivindica a escola e as classes bilíngues para surdos como espaço alternativo a sua escolarização. Essa luta histórica vem ganhando dimensões mundiais consistentes, alinhando-se ideologicamente às reivindicações de outros grupos culturais, como os indígenas brasileiros, em detrimento de sua planificação e execução nos limites territoriais da educação especial (SUELI, 2011, p. 181).

3 DEFICIÊNCIA AUDITIVA: DESAFIOS

Na visão de Lopes e Leite (2011), as concepções de surdez estão presentes na sociedade há muitos anos, caracterizadas por divergências teóricas sobre possibilidades comunicativas e sucedidas por maneiras específicas de perceber a surdez. Na contemporaneidade, diante de diversos entendimentos sobre a surdez, prevalece a compreensão de duas conjunturas existentes: a defesa do ensino da língua oral, na medida em que aparece como um meio necessário para a inserção social daqueles sujeitos que são considerados deficientes; e a língua de sinais, na medida em que aparece como representação de um grupo social minoritário, que não é constituído por sujeito deficiente, mas diferente (LOPES; LEITE, 2011).

Diante desses dois posicionamentos divergentes, na visão de Lopes e Leite (2011), há uma relação entre concepção de surdez e comunicação. Devido a um longo tempo de disputas teóricas, que perduram até os dias de hoje, é importante refletirmos sobre os desafios da deficiência auditiva atualmente. Desta forma, Lopes e Leite (2011) nos auxiliam com algumas problematizações: A surdez é uma deficiência ou uma diferença? A língua de sinais constitui o surdo enquanto sujeito ou é a apropriação de uma língua – oral ou gestual – que garante a constituição da subjetividade? Há apenas duas formas distintas para se compreender a surdez?

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

Como destaca Tessaro (2011, p. 36), “a deficiência auditiva constitui um dos problemas mais desafiantes para a educação em geral e para a educação especial, pois a perda auditiva interfere tanto na recepção da linguagem como na sua produção”. Por isso, a área com maior prejuízo para o deficiente auditivo é a da comunicação, resultando no isolamento acadêmico, na dificuldade de sociabilidade e convivência. Na visão de Carvalho (1997), a pessoa surda tem dificuldades de conceituação, pela falta de código linguístico que é utilizado no contexto social dos ouvintes, interferindo diretamente no seu desenvolvimento intelectual, e refletindo na sua vida acadêmica e profissional.

Lopes e Leite (2011) lembram que, embora é extremante importante considerar o aspecto linguístico para a compreensão do desenvolvimento do homem, na medida em que este é um ser social, é necessário primeiro que o surdo tenha condições de se apropriar de uma língua. Portanto, a língua de sinais tem uma importância singular, pois “ao considerar que nem sempre as crianças surdas conseguem tornar-se bem-sucedidas na aprendizagem oral, a língua de sinais deveria ser oferecida como primeira língua à criança surda, buscando-se evitar o atraso no desenvolvimento da linguagem” (LOPES; LEITE, 2011, p. 306).

Na visão de Souza (1998), a tarefa desafiadora de se repensar a educação para os surdos, possibilitando-lhes o exercício efetivo da cidadania, não é uma tarefa fácil. Para a autora, ainda hoje sofremos os efeitos das profundas desigualdades nas oportunidades educacionais, no qual o ensino público não preza pela qualidade.

DICAS

É interessante destacar os estudos realizados por Souza (1998), que estabelece reflexões para repensar a relação entre o sujeito surdo e os profissionais ouvintes.

• SOUZA, Regina Maria de. Sujeito surdo e profissionais ouvintes: repensando esta relação. Estilos da Clínica. São Paulo, v. 3, n. 4, p. 130-145, 1998. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-71281998000100018&lng=pt&nrm=iso>.

Segundo os estudos de Bisol e Sperb (2010, p. 8):

Ser Surdo (com “S” maiúsculo) é reconhecer-se por meio de uma identidade compartilhada por pessoas que utilizam língua de sinais e não veem a si mesmas como sendo marcadas por uma perda, mas como membros de uma minoria linguística e cultural com normas, atitudes e valores distintos e uma constituição física distinta.

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TÓPICO 3 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA HOJE: CONCEITOS E DESAFIOS

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Os estudos na área da Psicanálise vêm contribuindo, recentemente, para uma perspectiva em que o foco está na constituição subjetiva do surdo, ou seja, em considerar o lugar que a surdez ocupa na estruturação da personalidade (BISOL; SPERB, 2010). Portanto, a questão da identidade, habitualmente vinculada à ideia de que haveria uma essência para o sujeito, segundo Bisol e Sperb (2010, p. 8), “algo de permanente ou pontos fixos de referência (preocupação frequente à perspectiva socioantropológica) não se coloca para a psicanálise”. Para as autoras, uma explicação do ponto de vista da psicanálise lacaniana é de que não existe um significante que se represente a si mesmo e, portanto, nenhum significante, ou conjunto de significantes, que dê conta do sujeito.

Na perspectiva psicanalítica, há uma distância da preocupação demasiada com “a reparação ou cura de algo que seria um déficit a partir de um fato puramente orgânico, característico do modelo clínico-tradicional” (BISOL; SPERB, 2010, p. 9). Tal corrente de pensamento não procura reduzir o surdo a uma deficiência àquilo que lhe falta, deslocando a questão da cura da surdez para o tratamento de um sujeito que, a partir de uma determinada situação, faz um sintoma. Mas os psicanalistas se preocupam sobre o lugar que a surdez ocupa na estruturação da personalidade, “propondo-se em pensar que a alteração de uma modalidade sensorial ocasiona mudanças qualitativas na construção do eu” (BISOL; SPERB, 2010, p. 9).

Deste modo, percebe-se que diante de todos os desafios que o surdo encontra impregne na sociedade por ser mal compreendido, há outras maneiras de pensar e compreender a surdez. Segundo Bisol e Sperb (2010), mesmo dentro do modelo socioantropológico é possível perceber que as discussões têm avançado muito nas últimas décadas. Basta vermos que, no final da década de 1960, as línguas de sinais passaram a integrar o rol das línguas humanas; já na década de 1970, viu-se a emergência da retórica da cultura: aos Surdos devem ser reconhecidos o direito a uma educação e política próprios, bem como o direito de viver de maneira criativa sua relação com o mundo.

A partir das décadas de 1980 e início da década de 1990, para Bisol e Sperb (2010, p. 12), “colocou-se com ênfase a necessidade de definir o s/Surdo em um eixo identitário único, porém na segunda metade dessa década, a relação complexa dos surdos com o mundo pôde ser reconhecida”. Percebe-se ainda, na década de 1990, que tentativas de superar a noção de uma identidade cultural autônoma, para uma que, segundo Bisol e Sperb (2008, p. 11), “está mais consciente das diversas maneiras de ser Surdo em uma montagem complexa de fronteiras, pois pessoas s/Surdas serão encontradas em cada raça, etnia, tribo, nacionalidade, classe econômica, gênero, orientação sexual e região geográfica”.

Nesse sentido, os estudos por meio da psicanálise podem trazer muitos frutos para auxiliar as ciências que se preocupam com a surdez. “Mais do que uma discussão ou polarização entre deficiência e diferença, tanto a psicanálise

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

quanto os estudos da narrativa parecem contribuir com questões próprias que redimensionam a centralidade e alguns conceitos” (BISOL; SPERB, 2010, p. 12). Bisol e Sperb (2010) advertem que é preciso renovar, constantemente, os nossos modelos e inventar novas perspectivas de análise. Assim como o conceito de deficiência pode não ser um rótulo adequado para os surdos, outros conceitos como de minoria, de eticidade, mundos exclusivos, também podem não ser, pois não se adaptam às formas flexíveis e não hierárquicas de ser que emergem no mundo contemporâneo (BISOL; SPERB, 2010).

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Diante de oposições entre os professores falantes e os surdos quanto ao método de ensino, em 1880, no Congresso Mundial de Professores de Surdos, determinou-se que a educação deveria ser promovida pelo método oral puro, exigindo dos deficientes auditivos e surdos o comportamento de pessoas ouvintes.

• A partir do Congresso de Milão, o oralismo toma o lugar na educação dos surdos.

• No século XX, o oralismo ganha um novo impulso, com as conquistas da medicina, especialmente na área de diagnóstico, com os avanços tecnológicos e o desenvolvimento da eletroacústica.

• Os primeiros aparelhos de amplificação sonora surgiram nos anos de 1940.

• A deficiência auditiva e a surdez apresentam características bem diferentes, porém ambas ocasionam uma limitação para o desenvolvimento do indivíduo. Consideramos que a audição é fundamental para a aquisição da linguagem falada e sua deficiência pode ocasionar muita dificuldade nas relações sociais, psicológicas e na interação.

• Com as recomendações da Conferência de Executivos das Escolas Americanas, surdo passa ser todo sujeito cuja perda de audição se estabelece ao nível ou acima de 70 dB (decibéis).

• A etimologia do termo deficiência corresponde a uma qualidade de incapaz, insuficiência, incompleto, de algo que falta ou que está faltando.

• A partir dos anos de 1970 é que os termos surdo e surdez passam a ser vinculados à patologia, ou seja, à incapacidade do órgão e não ao sujeito.

• A contribuição de Warnock ampliou o olhar a respeito das necessidades educacionais especiais também no âmbito escolar, ao incluir nesse conceito todos as crianças que não estejam conseguindo se beneficiar com a escola, seja por qual motivo for.

• O conceito de NEE passou a ser adotado a partir da Declaração de Salamanca, passando a abranger todas as crianças e jovens cujas necessidades envolvam deficiências ou dificuldades de aprendizagem.

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• A concepção de deficiência, que norteia as políticas e os projetos educacionais da escola inclusiva, deve ser dinâmica e interativa.

• A língua de sinais tem uma importância singular, porque considera que nem sempre as crianças surdas conseguem ser bem-sucedidas na aprendizagem oral; a língua de sinais deveria ser oferecida como primeira língua à criança surda, buscando-se evitar o atraso no desenvolvimento da linguagem.

• Os estudos na área da Psicanálise vêm contribuindo, recentemente, para uma perspectiva em que o foco está na constituição subjetiva do surdo.

• Na perspectiva psicanalista não se procura reduzir o surdo a uma deficiência, àquilo que lhe falta, deslocando a questão da cura da surdez para o tratamento de um sujeito que, a partir de uma determinada situação, faz um sintoma.

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1 Os primeiros aparelhos de amplificação sonora surgiram nos anos de 1940, em meio aos progressos da audiologia, do diagnóstico, e a partir das medições auditivas e da indicação de aparelhos, que passaram a dominar o surdo de deficiente auditivo. Diante do exposto, conceitue a terminologia “deficiente auditivo”.

2 Os estudos da filósofa Mary Warnock vão na contramão do que se pensava na época. Sua contribuição gira em torno do respeito das necessidades educacionais especiais no âmbito escolar, ao incluir no conceito de NEE todos as crianças que não estejam conseguindo se beneficiar com a escola, seja por qual motivo for. Sabendo disso, escreva as principais ideias da autora e as principais críticas feitas por estudiosos.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4

CLASSIFICAÇÃO DAS PERDAS AUDITIVAS:

QUANTO AO TIPO E GRAU

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Prezado acadêmico! Neste último tópico de nossa primeira unidade, você verá as classificações das perdas auditivas em relação ao tipo de surdez e também quanto ao grau de surdez. Para isso, é importante destacar que há distintas compreensões e estudos que realizam a classificação da surdez quanto ao grau. No entanto, nossa abordagem se baseou no Conselho Federal de Fonodiaudiologia, de fevereiro de 2013 e, também, nos estudos realizados por Tessaro (2011).

2 PERDAS AUDITIVAS: CLASSIFICAÇÕES QUANTO AO TIPO

As perdas auditivas podem ser classificadas levando em consideração a comparação dos limiares entre a via aérea e a via óssea de cada orelha. Deste modo, é preciso realizar a pesquisa dos limiares tonais por via aérea e via óssea para localizar as estruturas afetadas do aparelho auditivo. Sem a comparação desses dois limiares não é possível saber o tipo da perda auditiva. As perdas auditivas, quanto ao tipo, podem ser classificadas como: condutiva, neurossensorial (sensorioneural) ou mista, como é demonstrado na classificação de Silman e Silverman (1997):

• Perda Auditiva Condutiva: Limiares de via óssea menores ou iguais a 15 dBNA e limiares de via aérea maiores do que 25 dBNA, com gap aéreo-ósseo maior ou igual a 15 dB.

• Perda Auditiva Neurossensorial ou Sensorioneural: Limiares de via óssea maiores do que 15 dBNA e limiares de via aérea maiores do que 25 dBNA, com gap aéreo-ósseo de até 10 dB.

• Perda Auditiva Mista: Limiares de via óssea maiores do que 15 dBNA e limiares de via aérea maiores do que 25 dBNA, com gap aéreo- ósseo maior ou igual a 15 dB.

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

FIGURA 15 – APARELHO AUDITIVO

FONTE: Disponível em: <http://www2.ibb.unesp.br/Museu_Escola/2_qualidade_vida_humana/Museu2_qualidade_corpo_sensorial_audicao1.htm>. Acesso em: 23 maio 2018.

Segundo os estudos de Santos, Lima e Rossi (2003, p. 37):

• A perda auditiva condutiva é causada por uma alteração que acontece na orelha externa (meato acústico) e/ou média (membrana timpânica, cadeia ossicular, janelas oval e redonda e tuba auditiva). Na avaliação audiológica básica, os limiares tonais por via aérea estão alterados, enquanto que por via óssea encontram-se normais. Nesse tipo de perda o índice de reconhecimento de fala está em torno de 100% de acertos.

• Na perda auditiva neurossensorial, as causas estão relacionadas às alterações que afetam a cóclea e/ou nervo auditivo. As causas que levam a esse tipo de perda são múltiplas e de difícil diagnóstico. Na avaliação audiológica básica podemos observar limiares auditivos por via aérea e óssea alterados e equivalentes. Portanto, não há gap entre eles. O índice de reconhecimento de fala encontra-se alterado e pior será quanto maior for a perda auditiva.

• Já a classificação das perdas auditivas mistas são perdas auditivas que apresentam características condutivas e neurossensoriais. Encontraremos limiares alterados tanto na via aérea quanto na via óssea, mas não equivalentes, há um gap entre eles. Os resultados do índice de reconhecimento de fala são bons, porém prejudicados em relação à audição normal ou à perda condutiva, pela presença do componente neurossensorial.

Cóclea

NervoAuditivo

Janelaoval

Membranatimpânica

Meatoacústico

PavilhãoAuricular

Ossículos

Orelha Externa Orelha Média

Orelha Interna

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TÓPICO 4 | CLASSIFICAÇÃO DAS PERDAS AUDITIVAS: QUANTO AO TIPO E GRAU

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3 PERDAS AUDITIVAS: CLASSIFICAÇÕES QUANTO AO GRAU

O grau da perda auditiva está relacionado com a habilidade de ouvir a fala. Há divergências entre autores na área da Educação Especial quanto a uma definição de deficiência auditiva. Na visão de Tessaro (2011, p. 35), “há definições que se baseiam no enfoque quantitativo e as que se fundamentam no aspecto funcional”. Deste modo, há várias classificações que caracterizam o grau das perdas auditivas. Segundo o Conselho Federal de Fonoaudiologia (2013, p. 13):

Todas as classificações utilizam a média dos limiares tonais de via aérea em determinadas frequências para esse cálculo, o que gera controvérsias sobre qual dessas classificações seria a mais adequada. Entretanto, a maioria considera a média dos limiares entre 500, 1.000 e 2.000 Hz.

Segundo os estudos de Telford e Sawrey (1988), as definições que correspondem aos aspectos quantitativos indicam a incapacidade auditiva relativa ao grau da perda de audição audiometricamente medido em termos de decibéis (dB). Isto quer dizer que a perda auditiva está ligada ao déficit no ouvido na faixa de frequências da fala. Para Tessaro (2011, p. 35), os autores que defendem esse posicionamento se baseiam nas seguintes definições e classificações:

• Classe 1: perdas leves – 20 a 30 dB. A pessoa que possui perda auditiva nessa intensidade consegue aprender a falar, utilizando-se do processo comum de desenvolvimento, e se encontra no limite entre a audição normal e a difícil.

• Classe 2: perdas marginais – 30 a 40 dB. A pessoa que possui esse tipo de perda normalmente apresenta alguma dificuldade em ouvir a voz humana (fala) a uma distância superior a alguns metros; entretanto, a fala pode ser aprendida.

• Classe 3: perdas moderadas – 40 a 60 dB. A pessoa que apresenta esse tipo de perda poderá aprender a falar mediante amplificação do som e apoio da visão.

• Classe 4: perdas graves – 60 a 75 dB. A pessoa que apresenta perda auditiva nessa faixa apenas conseguirá aprender a falar se fizer uso de técnicas especializadas. A maioria das pessoas que se encontram nessa classe são consideradas “educacionalmente surdas”. Encontram-se entre a audição difícil e a surdez.

• Classe 5: perdas profundas – superiores a 75 dB. A pessoa que pertence a essa classe dificilmente aprende a linguagem falada, mesmo com amplificação máxima do som.

Segundo a análise de Tessaro (2011), de acordo com essa classificação, as pessoas que se enquadram numa audição difícil pertencem às classes 1, 2 e 3, e as pessoas surdas pertencem às classes 4 e 5. Ainda, segundo Tessaro (2011, p. 35-36), outra classificação estabelecida segundo o padrão ANSI (1969), considera:

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UNIDADE 1 | DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ENTENDIMENTOS AO LONGO DA HISTÓRIA

• Normal: 0-25 dB. • Perda leve: 26-40 dB. Escuta qualquer som, desde que seja um

pouco mais alto.• Perda moderada: 41-70 dB. Em uma situação convencional pergunta

muito “hem”; ao telefone não ouve com clareza, trocando a palavra ouvida por outra foneticamente semelhante.

• Perda severa: 71-90 dB. Ouve sons fortes como latido de cachorro, avião, caminhão etc., mas não é capaz de escutar a voz humana sem o AASI.

• Perda profunda: 91 dB em diante. Escuta apenas os sons graves que transmitem vibrações (avião, trovão etc.).

Carvalho (1997, p. 23) constata que o sujeito considerado surdo é aquele que tem:

[...] a perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da capacidade de compreender a fala através do ouvido. De acordo com o grau de perda auditiva, avaliada em decibéis (dB), a surdez manifesta-se como leve (perda entre 20 e 40 dB), moderada (entre 40 e 70 dB de perda); severa (entre 70 e 90 dB) e profunda (acima de 90 dB de perda) – impede o indivíduo de ouvir a voz humana e de adquirir, espontaneamente, o código da modalidade oral da língua, mesmo com uso de prótese auditiva.

ESTUDOS FUTUROS

Prezado acadêmico! Sobre as definições de perda auditiva congênita ou adquirida, você verá adiante na Unidade 2, no Tópico 4.

Uma definição que se baseia mais no enfoque funcional do que o quantitativo é a da Conference of Executives of American Schools for the Deaf (Conferência dos Executivos das Escolas Americanas para Surdos), que compreende a pessoa surda como aquela em que a perda auditiva dificulta o sucesso do processamento de informações linguísticas através da audição, com ou sem auxílio de aparelhos que fazem amplificação de som (TESSARO, 2011).

IMPORTANTE

Com as recomendações da Conferência dos Executivos das Escolas Americanas para Surdos, define-se “surdo” como todo sujeito cuja perda de audição se estabelece ao nível de 70 dB.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• As perdas auditivas podem ser classificadas levando em consideração a comparação dos limiares entre a via aérea e a via óssea de cada orelha.

• As perdas auditivas, quanto ao tipo, podem ser classificadas como: condutiva, neurossensorial (sensorioneural) ou mista.

• A perda auditiva condutiva é causada por uma alteração que acontece na orelha externa (meato acústico) e/ou média (membrana timpânica, cadeia ossicular, janelas oval e redonda e tuba auditiva).

• Na perda auditiva neurossensorial, as causas estão relacionadas às alterações que afetam a cóclea e/ou nervo auditivo. As causas que levam a esse tipo de perda são múltiplas e de difícil diagnóstico.

• Perdas auditivas mistas são perdas que apresentam características condutivas e neurossensoriais,

• O grau da perda auditiva está relacionado com a habilidade de ouvir a fala.

• Na classificação quanto ao grau da perda auditiva, existem definições que se baseiam no enfoque quantitativo e as que se fundamentam no aspecto funcional.

• Para o Conselho Federal de Fonoaudiologia (2013), todas as classificações utilizam a média dos limiares tonais de via aérea em determinadas frequências para esse cálculo, o que gera controvérsias sobre qual dessas classificações seria a mais adequada. Entretanto, a maioria considera a média dos limiares entre 500, 1.000 e 2.000 Hz.

• Segundo Carvalho (1997), o sujeito considerado surdo é aquele que tem a perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da capacidade de compreender a fala através do ouvido.

• Com as recomendações da Conferência dos Executivos das Escolas Americanas para Surdos, define-se “surdo” como todo sujeito cuja perda de audição se estabelece ao nível de 70 dB.

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AUTOATIVIDADE

1 Sem a comparação dos dois limiares, entre a via aérea e a via óssea de cada orelha, não é possível saber o tipo da perda auditiva. Nesse sentido, as perdas auditivas podem ser classificadas como: condutiva, neurossensorial (sensorioneural) ou mista. Diante do exposto, explique as causas das respectivas perdas auditivas.

2 O grau da perda auditiva está relacionado com a habilidade de ouvir a fala, porém existem divergências quanto a uma definição de deficiência auditiva e sua classificação quanto ao grau. Para o Conselho Federal de Fonoaudiologia (2013), todas as classificações utilizam a média dos limiares tonais de via aérea em determinadas frequências para esse cálculo, o que gera controvérsias sobre qual dessas classificações seria a mais adequada. Entretanto, a maioria considera a média dos limiares entre 500, 1.000 e 2.000 Hz. Isto quer dizer que a perda auditiva está ligada ao déficit no ouvido na faixa de frequências da fala. Diante do exposto, cite as definições e classificações da perda auditiva por autores que defendem esse posicionamento.

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UNIDADE 2

A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir dos estudos desta unidade, você será capaz de:

• conhecer algumas das causas mais frequentes da deficiência auditiva e os aspectos que comumente são vivenciados pelas pessoas antes e durante do processo de diagnóstico, bem como dos seus familiares;

• refletir sobre os entraves com os quais deficientes auditivos se deparam no seu cotidiano;

• identificar quais são os profissionais que frequentemente atendem aos de-ficientes auditivos, e conhecer algumas das possibilidades de intervenção e tratamentos;

• compreender peculiaridades da linguagem dos deficientes auditivos.

Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – DEFICIÊNCIA AUDITIVA E SUAS CAUSAS

TÓPICO 2 – DIAGNÓSTICO DE DEFICIÊNCIA AUDITIVA: ANTES E DU-RANTE O PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA SAÚDE AUDITIVA

TÓPICO 3 – DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

TÓPICO 4 – PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

TÓPICO 5 – ESPECIFICIDADES DA LINGUAGEM DOS SURDOS

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TÓPICO 1

DEFICIÊNCIA AUDITIVA E SUAS CAUSAS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

E, passando Jesus, viu um homem cego de nascença. E os seus discípulos lhe perguntaram, dizendo:

Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?Jesus respondeu: Nem ele pecou nem seus pais;

mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus.

João 9:1-3

Agora que você já viu como a deficiência auditiva foi considerada ao longo da história, talvez você esteja se perguntando algo similar ao que os discípulos perguntaram a Jesus:

“Por que nascem pessoas com deficiência?” “Por que nascem pessoas surdas?” “Por que algumas pessoas ficam surdas subitamente?”

Hoje, a ciência já consegue identificar algumas causas da deficiência auditiva e é sobre isso que você aprenderá neste tópico. É extremamente importante saber quais fatores causam a perda auditiva, para que se possa realizar um tratamento adequado e realizar ações de saúde no âmbito da promoção e prevenção. O avanço na área da Biomedicina tem auxiliado consideravelmente no tratamento clínico, corrigindo muitos problemas relacionados aos danos na audição.

Você verá também, no decorrer deste tópico, que a perda auditiva é

muito comum nas sociedades do mundo inteiro, inclusive em pessoas famosas. Portanto, quanto mais cedo acontecer o diagnóstico do problema auditivo, maior será a qualidade de vida. O interessante, neste tópico, são os artigos que trazem números e estatísticas, proporcionando reflexões para quem deseja se aprofundar neste tema tão atual e urgente para a sociedade brasileira.

Como você já viu na unidade anterior, ainda hoje, a forma com que a sociedade brasileira trata o deficiente auditivo, reflete o desconhecimento da história e as condições de vida das pessoas que portam a deficiência auditiva. Para Strobel (2007, p. 13), de uma maneira geral, a sociedade atual ainda vê os

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

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deficientes auditivos como “coitadinhos, tratando-os de forma paternal, ou então como agressivos e mal-educados, são chamados, por exemplo, de “surdos-mudos”, “mudinhos”, “deficientes”, entre outros termos pejorativos, sendo considerados incapazes de ter autonomia”.

Diante disso, percebe-se uma diferenciação entre as pessoas portadoras de deficiência auditiva, que são aquelas que não possuem o sentido da audição, mas que possuem sua própria cultura e língua. A pessoa com perda auditiva é aquela que se identifica com a cultura ouvinte e, “quando necessário, busca meios de reabilitação auditiva para se comunicar através da fala” (FIGUEREDO, 2013, p. 5).

Ao longo desta unidade, você notará que dentro das deficiências humanas, a deficiência auditiva é a que mais tem impacto no convívio social, pois interfere diretamente na linguagem, na fala e, consequentemente, na socialização. Além disso, a deficiência auditiva tem grande impacto na aprendizagem, dificultando o desenvolvimento escolar, bem como a vida profissional.

2 AS CAUSAS DA DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Para Cruz et al. (2009, p. 1123), no artigo denominado Prevalência de deficiência auditiva referida e causas atribuídas: um estudo de base populacional, a deficiência auditiva nos adultos pode impactar um declínio cognitivo, além de depressão e redução do estado funcional.

A incidência de deficiência auditiva congênita no mundo é estimada em 1 para cada mil recém-nascidos. No Brasil, pelo censo demográfico realizado em 2000, constatou-se que existiriam aproximadamente 24,5 milhões de pessoas com deficiência, ou seja, 14,5% da população total da época. Destes, 3,4% declararam incapacidade, com alguma ou grande dificuldade de ouvir (IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico de 2000. <http://www.ibge.org.br>, acesso em: 25/Mai/2005). O Estado de São Paulo apresentou a menor prevalência de deficientes (11,35%) e o Estado da Paraíba, a maior (18,75%).

Para maior precisão sobre as causas mais frequentes nas pessoas portadores de deficiência auditiva, foi examinado o artigo de Cruz et al. (2009), no qual se realizou uma pesquisa de campo em seis áreas urbanas em São Paulo, no período de 2001 e 2002, através de um questionário multidimensional. No artigo, foram entrevistadas 5.250 pessoas, deste número, 480 apresentavam deficiência auditiva, sendo que 387 (80,6%) tinham dificuldade auditiva, 76 pessoas (15,8%) apresentavam surdez unilateral e 17 (3,5%) surdez bilateral. A média de idade da população acima de 12 anos que referiu deficiência auditiva foi de 52,35 anos.

O resultado do artigo constatou que as causas atribuídas à deficiência auditiva foram: “doenças (19,82%), idade avançada (12,71%), acidente de trabalho (9,37%), causas congênitas (5,6%), acidente doméstico (1,3%), acidente de trânsito

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(0,5%), violência/agressão (0,3%), outras causas (34,6%) e não sabiam ou não responderam (15,8%)” (CRUZ et al., 2009, p. 1125).

O artigo ainda apresenta uma análise das causas da deficiência auditiva por faixa etária. Numa faixa entre 12 a 19 anos, o item mais frequente foi o fator “congênito”, em 26% dos sujeitos. Já as pessoas na faixa etária de 20 a 59 anos, apresentaram como causa mais prevalente para a deficiência auditiva, doenças (21%) e o trabalho (10,1%). No grupo de pessoas entre 60 e 75 anos, a presbiacusia configurou-se como a causa mais frequente para o transtorno auditivo (17,7%), seguido pelo item “doenças” (17,5%), também encontrado no grupo acima de 75 anos, entretanto com taxas mais elevadas (41,4% e 27,9%, respectivamente) (CRUZ et al., 2009, p. 1125).

NOTA

Você sabia que o termo presbiacusia se refere à diminuição da acuidade auditiva para as frequências elevadas? Essa perda de audição está relacionada ao envelhecimento, conforme a idade aumenta.

FONTE: Disponível em: <https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/presbiacusia>. Acesso em: 2 maio 2018.

A deficiência auditiva pode se manifestar pelo fator congênito ou pode ser adquirida com o tempo. Para Rinaldi et al. (1997, p. 32), as principais causas da deficiência congênita são: “hereditariedade, viroses maternas (rubéola, sarampo), doenças tóxicas da gestante (sífilis, citomegalovírus, toxoplasmose), ingestão de medicamentos ototóxicos (que lesam o nervo auditivo) durante a gravidez”. Na visão de Rinaldi et al. (1997), quando se trata de deficiência auditiva adquirida, há predisposição genética (otosclerose), quando ocorre meningite, ingestão de remédios ototóxicos, exposição a sons impactantes (explosão) e viroses.

Nesse sentido, Rinaldi et al. (1997, p. 32) destacam que no âmbito biomédico algumas condições de causas em potencial da deficiência auditiva estão associadas:

• Causas pré-natais (a criança adquire a surdez através da mãe, no período de gestação):

o desordens genéticas ou hereditárias;o relativas à consanguinidade;o relativas ao fator Rh;o relativas a doenças infectocontagiosas, como a rubéola;o sífilis, citomegalovírus, toxoplasmose, herpes;

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o remédios ototóxicos, drogas, alcoolismo materno;o desnutrição/subnutrição/carências alimentares;o pressão alta, diabetes;o exposição à radiação;o outras.

• Causas perinatais (a criança fica surda porque surgem problemas no parto):

o prematuridade, pós-maturidade, anóxia, fórceps;o infecção hospitalar;o outras.

• Causas pós-natais (a criança fica surda porque surgem problemas após seu nascimento):

o meningite;o remédios ototóxicos, em excesso, ou sem orientação médica;o sífilis adquirida;o sarampo, caxumba;o exposição contínua a ruídos ou sons muito altos;o traumatismos cranianos;o outros.

Ainda sobre a perda auditiva congênita, Jardim, Maciel e Lemos (2017) explicam que pode acontecer tanto no período pré-natal quanto nos primeiros dias após o parto. Entre as causas mais comuns, destacam-se:

• o muito baixo peso ao nascimento (abaixo de 1500 g);• a ocorrência da hiperbilirrubinemia;• as infecções congênitas, como rubéola, toxoplasmose, citomegalovírus, sífilis;• o uso de drogas ototóxicas no período neonatal;• as causas de malformação congênita de cabeça e pescoço ou síndromes.

Guimaraes e Barbosa (2012) também citaram indicadores de risco para surdez:

• 20,8%: neonatos com permanência maior que 48 horas na UTI neonatal;• 3,5%: história familiar de deficiência auditiva congênita;• 1,8%: alguma infecção congênita (sífilis, toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus,

herpes);• 0,9%: síndromes não necessariamente associadas a alterações auditivas.

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DICAS

Quer saber mais sobre as causas da surdez em recém-nascidos? Então recomendamos a leitura de dois artigos:

• Correlação entre perda auditiva e indicadores de risco em um serviço de referência em triagem auditiva neonatal – escrito por Ana Carolina Sena Barboza et al. (2013). Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2317-64312013000400009&lng=en&nrm=iso>.

• Prevalência de alterações auditivas em recém-nascidos em hospital escola – escrito por Valeriana de Castro Guimaraes e Maria Alves Barbosa (2012). Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-48642012000200005&lng=en&nrm=iso>.

Todavia, com as ciências biomédicas, através dos tratamentos clínicos e o avanço das próteses auditivas, muitos problemas auditivos podem ser sanados. Em contrapartida, ainda há resistência à reabilitação auditiva, seja por parte do próprio surdo ou de sua família, optando pelo desenvolvimento da língua de sinais. Como ressalta Figueiredo (2013, p. 7-8):

[...] existem algumas pessoas com perdas auditivas que anseiam pelo tratamento através da amplificação sonora individual e abordagem oral, no entanto este tratamento não se torna possível, geralmente nos casos de perdas de grau severo e profundo, pré-linguais, que são detectadas tardiamente.

ESTUDOS FUTUROS

Você aprenderá as formas de tratamentos da deficiência auditiva no Tópico 4 desta unidade.

Barboza et al. (2013) destacam que a ocorrência de perda auditiva parece ser maior no grupo de crianças com indicadores de risco. É importante identificar tais indicadores para desenvolver estratégias de promoção da saúde, visando diminuir as circunstâncias que acarretam a surdez na população.

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3 A EXPOSIÇÃO AOS ELEVADOS RUÍDOS E A DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Como você notou nas estatísticas apresentadas até aqui, por vezes é o trabalho que interfere na saúde do sistema auditivo.

Muitas profissões são mais suscetíveis a acarretarem problemas de audição. Existem vários músicos que afetaram sua audição em virtude do trabalho. Alguns músicos famosos da atualidade possuem problemas de audição, tais como Luis Miguel, Chris Martin (vocalista do Coldplay), Will.i.am, Phil Collins, Neil Young, Ozzy Osbourne e Eric Clapton (CRÔNICAS DA SURDEZ, 2018).

IMPORTANTE

O famoso cantor Bono Vox não tem 100% da audição. O líder da banda irlandesa U2 sofre há muitos anos de tinnitus, uma espécie de "zumbido" nos ouvidos. Bono abordou o tema dos seus ruídos auditivos agonizantes em algumas de suas canções, como Staring at the Sun.

FIGURA 1 – SOM ALTO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

FONTE: Disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/celebridades-que-tem-deficiencia-auditiva-contam-como-superaram-os-obstaculos-22031605>. Acesso em: 21 maio 2018.

Segue a tradução da parte da música que retrata os incômodos dos zumbidos:

Tem um inseto na sua orelha Se você o ignorar ele não desaparecerá Isso vai irritar e queimar e atormentar

Você quer ver o que essa ignorada causa Ondas que me deixam fora de alcance

Que rompem as suas costas como uma praia Nós viveremos em paz algum dia?

FONTE: Disponível em: <https://www.letras.mus.br/u2/63015/traducao.html>. Acesso em: 21 maio 2018.

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Considerando que este livro sobre deficiência auditiva esteja sendo lido por muitas pessoas que almejam trabalhar na área de Educação, vale ressaltar que muitas salas de aula, e escolas de forma geral, apresentam ambientes altamente ruidosos. Vale ressaltar que além de possivelmente trabalhar com alguns estudantes que apresentem dificuldades de audição, o professor também precisa ser responsável com sua saúde.

DICAS

Você sabia que já existem estudos sobre surdez ocupacional voltados para o trabalho do professor? Um deles é o de Regina Helena Garcia Martins et al. (2007, p. 243), intitulado Surdez ocupacional em professores: um diagnóstico provável, que chegou às seguintes conclusões:

A elevada frequência de sintomas auditivos, o relato constante de ruído excessivo nas classes, a detecção de uma porcentagem expressiva de exames audiométricos alterados, com predomínio do traçado em gota acústica e as aferições de níveis elevados de ruído ambiental, sugerem a presença de surdez ocupacional entre os professores, secundária à exposição ao ruído. Para a confirmação desse diagnóstico é necessária a implementação de exames audiométricos pré-admissionais e periódicos, bem como um maior número de estudos criteriosos nessa linha de pesquisa.

Para saber mais sobre o artigo, procure-o na internet. Acesse <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-72992007000200015&lng=pt&nrm=iso> e confira!

Diante dessas informações é recomendável que profissionais da educação tomem cuidado com seu sistema auditivo. Veja algumas orientações nesse sentido:

• Esteja atento ao volume de rádio, televisão, iPods e de outros tocadores de mídia digital.

• Procure diminuir o tempo das conversas ao celular.• Algumas doenças podem afetar a audição, bem como alguns medicamentos.

Seja prudente. • Seus ouvidos também precisam de repouso. Procure passar um período do seu

dia em ambiente silencioso. • Procure consultar-se com um médico e examinar sua audição de tempos em

tempos.

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

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4 DIAGNÓSTICO TARDIO E AGRAVOS

Outro assunto relacionado às causas da deficiência auditiva é a procura do diagnóstico tardiamente, o que pode contribuir para o mal desenvolvimento da linguagem. Para Quadros e Cruz (2011, p. 12), a questão do diagnóstico tardio no Brasil é algo comum:

No Brasil, a idade média do diagnóstico de deficiência auditiva (DA) está em torno de 3 a 4 anos, podendo levar até dois anos para ser concluído e, dessa forma, acarretar danos irreparáveis para a criança e onerar os custos da sociedade. Em 1994, num trabalho de tese desenvolvido por Nóbrega (1994), foi concluído que a confirmação diagnóstica de DA até 2 anos ocorreu apenas em 13% dos pacientes estudados, embora 56% tenham sido suspeitados nesta fase. Assim, havia um tempo perdido de mais de dois anos entre a suspeita clínica e a confirmação de DA.

Para Jardim, Maciel e Lemos (2017), quando a perda auditiva inicia na infância, pode comprometer o desenvolvimento adequado da fala, linguagem, cognição e socialização. Em casos de adultos, os efeitos negativos são relativos às limitações de atividades, interferência nas habilidades de compreender o discurso no silêncio e no ruído, restrição na participação da pessoa em eventos sociais e, consequentemente, redução na qualidade de vida. Já os efeitos nos idosos, refere-se ao comprometimento da função cognitiva, da qualidade de vida e do bem-estar emocional, comportamental e social.

ESTUDOS FUTUROS

Os agravos que decorrem dos diagnósticos tardios serão melhor detalhados no próximo tópico desta unidade. Continue sua leitura e descubra os prejuízos decorrentes do diagnóstico tardio. Você também entenderá por que ele costuma demorar tanto. Boa leitura!

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RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Atualmente, a sociedade ainda vê os deficientes auditivos como “coitadinhos”, tratando-os de forma paternal, como se fossem pessoas que não têm autonomia ou que são incapazes.

• Ao longo da história, os deficientes auditivos foram tratados com indiferença, com despreocupação, e ações simples de assistencialismo eram empregadas.

• Na atualidade, os deficientes auditivos estão ganhando espaço através do próprio engajamento, da participação e da competência profissional.

• Dentro das deficiências humanas, a deficiência auditiva é a que mais tem impacto no convívio social, pois interfere diretamente na linguagem, na fala e na socialização.

• A incidência de deficiência auditiva congênita no mundo é estimada em um para cada mil recém-nascidos.

• No Brasil, pelo censo demográfico realizado no ano 2000, existem aproximadamente 24,5 milhões de pessoas com deficiência auditiva congênita.

• A deficiência auditiva pode se manifestar pelo fator congênito ou pode ser adquirida.

• Várias são as causas da surdez: podem ser originadas geneticamente ou acontecem por algum tipo de acidente ou doença (vírus, bactérias etc.), de problemas do coração, entre outras.

• As principais causas da deficiência congênita são: hereditariedade, viroses maternas (rubéola, sarampo), doenças tóxicas da gestante (sífilis, citomegalovírus, toxoplasmose), ingestão de medicamentos ototóxicos (que lesam o nervo auditivo) durante a gravidez.

• As principais causas da deficiência auditiva adquirida existem quando há predisposição genética (otosclerose), quando ocorre meningite, ingestão de remédios ototóxicos, exposição a sons impactantes (explosão) e viroses.

• Com as ciências biomédicas, pelos tratamentos clínicos e o avanço das próteses auditivas, muito dos problemas auditivos podem ser corrigidos.

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AUTOATIVIDADE

1 Embora atualmente existam muitos avanços na área das ciências biomédicas, através dos tratamentos clínicos e das próteses auditivas, muitos dos problemas auditivos podem ser corrigidos. No âmbito biomédico, há algumas condições de causas em potencial da deficiência auditiva. Cite pelo menos três causas vinculadas aos períodos: pré-natal, perinatal, pós-natal.

2. Muitas profissões são mais suscetíveis a acarretarem problemas de audição. Os músicos são exemplos de profissionais que tiveram ou têm problemas com sua audição em virtude do trabalho. Alguns músicos famosos da atualidade possuem problemas de audição, como Bono Vox, Luis Miguel, Chris Martin (vocalista do Coldplay), Will.i.am, Phil Collins, Neil Young, Ozzy Osbourne, Eric Clapton etc. Outra classe de profissionais que estão suscetíveis à poluição sonora, são os professores ou profissionais da educação. Diante do exposto cite as principais recomendações para o cuidado com o sistema auditivo.

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TÓPICO 2

DIAGNÓSTICO DE DEFICIÊNCIA AUDITIVA:

ANTES E DURANTE O PROCESSO DE

AVALIAÇÃO DA SAÚDE AUDITIVA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da

gente é coragem.

Guimarães Rosa

Até receber o diagnóstico de surdez de uma criança, a família tende a lidar com algumas situações que vão gerando apreensão e angústia. Antes de terem a palavra de um profissional da saúde, de que a criança tem problemas de audição, geralmente a família já percebe que há algo diferente no comportamento da criança, afinal, a criança não responde como as demais, aos estímulos sonoros. Porém é frequente que ocorra a negação da possibilidade de que o filho possui deficiência auditiva, como apontam os estudos de Cortelo e Francozo (2014) e de Monteiro, Silva e Ratner (2016). Assim, os pais tendem a protelar a busca por um profissional para fazer a avaliação da saúde auditiva da criança, pois dizem a si mesmos que a criança é normal e que logo tudo ficará bem.

Neste tópico, você poderá refletir sobre os sentimentos que os familiares experimentam desde a suspeita de deficiência auditiva até a constatação diagnóstica dela. Informações sobre quanto tempo tem levado para a obtenção do diagnóstico, e os caminhos que antecedem o acesso a ele, são apresentadas.

Na sequência, você verificará como se dá o processo de avaliação diagnóstica, inclusive conhecerá um pouco sobre os exames que são feitos e os profissionais que os aplicam. Terá acesso a informações sobre dados estatísticos acerca do diagnóstico de surdez.

Depois, poderá entrar em contato com estudos científicos que tratam das reações das famílias ante o diagnóstico de surdez, bem como as atitudes que costumam ser adotadas e as consequências delas.

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Por fim, encontram-se alguns entraves que as famílias (e/ou os surdos) enfrentam na relação com os profissionais da saúde, seja pelas dificuldades de comunicação com eles – já que raramente esses profissionais conseguem comunicar-se através da Libras, ou pelas resistências diante do diagnóstico e prognóstico apontados pelo profissional da saúde.

E então, prezado acadêmico? Preparado para ampliar seus conhecimentos sobre essas circunstâncias? Vamos lá?

Talvez você esteja se perguntando: Qual é a valia dessas informações para o profissional da educação especial, já que não compete a ele fazer o diagnóstico? Ao longo do tópico, você perceberá que por vezes são os profissionais da educação que instigam a família a procurar um profissional da saúde para averiguar a saúde auditiva da criança. Além do mais, ter contato com as informações desse tópico possibilita maior sensibilidade e compreensão por parte do profissional de educação especial frente a uma criança com deficiência auditiva, ou ao relacionar-se com a família dela. Afinal, os dilemas e sofrimentos compartilhados pelos familiares se tornam mais evidentes por intermédio das pesquisas que serão apresentadas mais adiante.

ATENCAO

2 CAMINHOS PERCORRIDOS DIANTE DA SUSPEITA DE PERDA AUDITIVA

Sigolo e Lacerda (2011) realizaram uma pesquisa tencionando identificar e pormenorizar como ocorre o diagnóstico e atendimento de crianças surdas em municípios de São Paulo. Para tanto, analisaram 320 prontuários referentes a pacientes com diagnóstico de surdez pré-lingual no período de 1996 a 2005, em duas instituições de saúde. As autoras concluíram que a suspeita da perda auditiva emergiu em torno de 1 e 9 meses de vida, ao passo que a idade média em que ocorreu a primeira consulta com o médico ou fonoaudiólogo foi de 3 anos e 6 meses, sendo que o diagnóstico da surdez ocorreu por volta dos 4 anos e 3 meses; para o início de intervenção clínica 6 anos e 1 mês; e para a adaptação de aparelho de amplificação sonora individual (AASI) 7 anos e 5 meses.

Ao se considerar o espaço de tempo entre a suspeita, primeira consulta médica, diagnóstico, intervenção e adaptação de AASI, fica notório o quanto o processo é longo, fazendo com que o tratamento inicie tardiamente. Os recursos públicos disponíveis são insuficientes, por isso a fonoterapia demora a iniciar, e o processo de reabilitação da criança se torna moroso (SIGOLO; LACERDA, 2011).

Segundo Cúnico et al. (2013), é fundamental que o diagnóstico precoce da surdez seja realizado, pois ele afeta diretamente o desenvolvimento social,

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TÓPICO 2 | DIAGNÓSTICO DE DEFICIÊNCIA AUDITIVA:

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educacional e psicológico do sujeito que é acometido por ela, e o diagnóstico precoce pode auxiliar na melhora da qualidade de vida do surdo. Além do mais, os problemas auditivos são mais frequentes na fase neonatal (3 a cada 1000 crianças apresentam o diagnóstico) do que em outras patologias que costumam ser identificadas no teste do pezinho.

A Triagem Auditiva Neonatal (TAN) é uma das maneiras de possibilitar o diagnóstico precoce da surdez, porque é a única estratégia capaz de detectar alterações auditivas com antecedência. Deste modo, Cúnico et al. (2013) realizaram uma investigação sobre percepções e sentimentos maternos frente à TAN. Os resultados obtidos indicam que seria mais adequado que os profissionais da saúde municiem as mães com informações sobre os exames que são realizados com os bebês, a fim de minimizar a ansiedade experimentada pelas mães, já que não possuem informações claras e detalhadas acerca dos objetivos e procedimentos dos exames.

Alguns motivos realçam a importância de realizar a TAN com todos os

recém-nascidos, segundo Cúnico et al. (2013):

• A surdez não gera dor e/ou desconforto no corpo, por isso há pessoas que buscam uma avaliação com profissionais da saúde tardiamente.

• Por ser invisível, a surdez tende a ser ignorada ou incompreendida pelos ouvintes.

• A TAN oportuniza que a intervenção fonoaudiológica inicie antecipadamente nas crianças que forem diagnosticadas com alterações na audição.

• As famílias de bebês que são surdos e que não foram submetidos à TAN, costumam descobrir o diagnóstico da surdez aos dois anos de idade.

• Crianças submetidas à TAN recebem o diagnóstico dentro de seis meses de vida.

• Os governos de inúmeros países têm investido na TAN, diante da crescente disseminação de informações atinentes às consequências irreversíveis da perda auditiva sobre o desenvolvimento social, emocional, cognitivo e linguístico da criança.

DICAS

Para compreender quais são os prejuízos que vêm sobre a criança surda que demora para obter um diagnóstico, e para as consequências do diagnóstico tardio para a família, assista ao filme E seu nome é Jonas (1979). O filme mostra que até receber o diagnóstico, o menino permaneceu tratado como um deficiente mental. Seus pais acabaram tendo problemas no relacionamento conjugal. Quando o menino acabou perdido na rua e foi encontrado por um policial, foi encaminhando ao hospital onde foi totalmente imobilizado por acreditarem que ele tinha problemas mentais. As cenas em que o menino e sua família sofrem preconceito são várias!

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

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Agora, vamos descobrir como a TAN se processa, de acordo com a pesquisa de Cúnico et al. (2013)?

• Quando o bebê é submetido pela TAN e não apresenta as respostas esperadas, ele deve ser submetido novamente pelo teste, dentro de 15 dias.

• Se ele apresentar as mesmas respostas no reteste, outros exames serão solicitados, sendo finalizado o processo diagnóstico até os três meses de idade.

• Quando a surdez é constatada, a intervenção fonoaudiológica deve começar de imediato, antes dos seis meses de idade.

Você sabia que quando a intervenção fonoaudiológica inicia depois do sexto mês de vida, o bebê fica suscetível a prejuízos irreversíveis ao seu desenvolvimento e ao seu modo de relacionar-se com as pessoas que fazem parte do cotidiano dele?

ATENCAO

Embora a TAN seja tão benéfica para os bebês, ela tem suscitado sentimentos de ansiedade nas mães, pois as leva a pensar na possibilidade de terem gerado um bebê que não seja saudável e perfeito como haviam idealizado ao longo da gestação. Esse é um dos motivos que justifica a relevância de um trabalho interdisciplinar, sobretudo nos casos em que a surdez é confirmada no processo diagnóstico.

Um ponto importante a ser destacado é que as mães, mesmo não sabendo exatamente qual era o objetivo do exame, associavam a ele a garantia de que, caso seu filho fosse diagnosticado com algum problema, este seria facilmente resolvido por ele ser ainda uma criança (CÚNICO et al., 2013, p. 88).

Tão somente por saberem que os filhos seriam submetidos ao exame TAN, as mães já manifestavam preocupação com o resultado, e declaravam que independentemente do que viesse a ser constatado no exame, certamente a criança estaria curada em curto prazo de tempo. Em virtude disso, Cúnico et al. (2013) recomendam que os profissionais da saúde prestem suporte às famílias no decurso do processo de investigação da surdez, abrangendo até mesmo as famílias em que a deficiência auditiva não for confirmada. Inclusive, a autora propõe que os programas de atendimento à gestante (pré-natal) acrescentem informações no que se refere a todos os exames que seu bebê realizará, sanando suas dúvidas em linguagem acessível. A desinformação pode trazer sentimentos desagradáveis sobre os exames, pensamentos equivocados e até mesmo o descaso por eles.

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ESTUDOS FUTUROS

Ainda, neste tópico, você observará os sentimentos que costumam emergir nos familiares de bebês que apresentam perdas auditivas.

Ficou curioso para saber mais sobre o trabalho interdisciplinar prestado às crianças com deficiência auditiva e seus familiares? O Tópico 4 desta unidade trará mais informações acerca do assunto.

Outro estudo, que reforça a relevância de medidas diagnósticas precoces de surdez, foi realizado por Piatto e Maniglia (2001). Os autores objetivavam examinar a audição de crianças de 3 a 6 anos de idade, matriculadas em instituições educacionais de um município do estado de São Paulo. Foram realizados exames de audiometria com 103 crianças que participaram da pesquisa, das quais 10 apresentaram alterações na função auditiva. Logo, a prevalência de 9,7% de alterações na função auditiva detectada nos sujeitos de pesquisa, salientam a necessidade da implantação de programas de prevenção e diagnóstico precoce da deficiência auditiva, de modo a alcançar inclusive a população infantil, que não tem acesso a serviços médicos especializados.

Conforme Piatto e Maniglia (2001), tais programas de prevenção propiciariam valiosas informações aos profissionais da saúde, aos profissionais da educação, aos pais e às autoridades locais, de modo que essas crianças possam ser encaminhadas aos devidos tratamentos e consigam ter uma vida digna.

Embora projetos de leis já tenham sido aprovados, no que tange à triagem auditiva, os programas de identificação precoce da perda auditiva não estão conseguindo alcançar toda a população, fornecendo o diagnóstico, intervenção e adaptação de AASI antes do sexto mês de vida. Todavia, a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva foi estruturada na região de Campinas, em 2004, o que deve, com o passar do tempo, trazer dados mais otimistas. Ainda assim, os dados gerados na pesquisa não trouxeram mudanças consideráveis neste quesito (SIGOLO; LACERDA, 2011).

Em resumo, por se tratar de uma condição que é visivelmente impercebível e indolor, não é raro que as crianças com alterações na função da audição recebam o diagnóstico tardiamente, ou seja, quando já estão, muitas vezes, inseridas no seu processo escolar. Esse atraso no diagnóstico é lamentável, pois a lentidão entre a suspeita e o diagnóstico reduz irremediavelmente as chances de tratamento e reabilitação dessas crianças. Afinal de contas, danos na área da comunicação podem abalar as relações interpessoais da pessoa com deficiência auditiva – o que poderia ser evitado – mediante diagnóstico precoce. A TAN parece ser a melhor alternativa para driblar esses obstáculos.

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Agora, vamos verificar quais são os passos do processo diagnóstico?

3 O DIAGNÓSTICO

Conforme Piatto e Maniglia (2001), o diagnóstico de alterações auditivas é realizado por testes audiométricos, já que a audição é medida pela audiometria. Esses testes são feitos por intermédio de aparelhos eletrônicos.

FIGURA 2 – EXAME DE AUDIOMETRIA TONAL

FONTE: Disponível em: <https://www.quantocusta.org/quanto-custa-um-exame-de-audiometria/>. Acesso em: 11 maio 2018.

Conheça alguns dos exames listados por Piatto e Maniglia (2001):

• audiometria de tons puros;• logoaudiometria: essencial no diagnóstico de crianças, por confirmar os limiares

tonais por via aérea, diagnostica trocas fonéticas com ou sem deficiência auditiva associada;

• audiometria de potenciais evocados auditivos;• audiometria de reforço visual;• audiometria de jogo;• audiometria de campo livre;• otoemissões acústicas.

IMPORTANTE

O tipo de teste e o aparelho que são usados variam conforme a idade do paciente, a atitude, a cooperação da criança e a suspeita diagnóstica.

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O passo a passo do processo diagnóstico também pode mudar dependendo dos fatores citados nesse último UNI. Mas, muitas vezes, ele inicia com o exame otoscópico, realizado por um médico.

FIGURA 3 – EXAME OTOSCÓPICO

FONTE: Disponível em: <http://www.gruppodatamedica.net/categorie/otorinolaringoiatria/>. Acesso em: 11 maio 2018.

Quando o exame otoscópico não traz indícios de alterações, por vezes o paciente é submetido à audiometria tonal, em campo livre, que é realizada por um fonoaudiólogo. Este exame costuma ser realizado em sala silenciosa. A audiometria tonal convencional (via aérea, via óssea e logoaudiometria, em cabine acústica) costuma ser conduzido por um fonoaudiólogo. Muitas vezes, também se utiliza o audiômetro de diagnóstico (PIATTO; MANIGLIA, 2001).

FIGURA 4 – AUDIÔMETRO DE DIAGNÓSTICO

FONTE: Disponível em: <http://www.medicalexpo.com/pt/prod/interacoustics/product-70798-436465.html>. Acesso em: 11 maio 2018.

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Além dos exames, também é utilizada a tabela de classificação da deficiência auditiva da OMS (Organização Mundial da Saúde) para se enquadrar os pacientes. Os pacientes que revelarem alterações na audiometria de triagem necessitam fazer uma segunda audiometria completa em cabine acústica (feita por fonoaudiólogo). Apenas depois desses procedimentos pode se obter o diagnóstico de deficiência auditiva. Quando o paciente recebe o diagnóstico, ele precisa ser orientado de acordo com o grau de sua perda auditiva, pelo profissional da saúde (PIATTO; MANIGLIA, 2001).

NOTA

Talvez você ainda esteja pensando na utilidade de saber informações sobre o diagnóstico da surdez, já que está objetivando trabalhar na educação. Porém, você sabia que alterações no sentido da audição podem refletir no rendimento da criança na escola?

"Há relação causal entre otite média serosa e deficiência auditiva associada ou não a distúrbios da fala e aprendizado. Esse tipo de otite, ocorrendo mais frequentemente em crianças, raramente ocasiona mais de 20 dB a 30 dB de perda auditiva, sendo comum uma flutuação do limiar em relação a resfriados, otites médias agudas e estações do ano, aumentando, portanto, a perda auditiva nessas intercorrências. A otite média serosa, quando em estágio avançado e persistente, chega a atingir limiares iguais a/ou maiores do que 40 dB-50 dB, influenciando de maneira negativa a capacidade auditiva e, como consequência, o aprendizado" (PIATTO; MANIGLIA, 2001, p. 128).

4 A REAÇÃO DA FAMÍLIA E DO DEFICIENTE AUDITIVO FRENTE AO DIAGNÓSTICO

Agora que você já sabe um pouco sobre o processo diagnóstico, talvez esteja interessado em saber como a família e o próprio paciente costumam lidar com essa notícia. Portanto, esta seção está subdividida da seguinte forma:

• As reações diante de informações no momento pré-natal.• As reações durante o diagnóstico recebido na infância.• As reações quando o deficiente auditivo já passou da infância.

Cúnico et al. (2013) recomendam que o profissional da saúde, o qual dirá para a família que a criança apresenta alterações auditivas, leve em consideração que os familiares tendem a demonstrar que estão fragilizados. Assim, o profissional da saúde precisa atentar para o seu discurso, pois o diagnóstico tende a transportar a atitude dos pais – daquela dirigida ao "filho idealizado perfeito" para a nova, diante do "filho real". Entretanto, praticamente todas as famílias idealizam um filho no decurso da gravidez, e após o nascimento, mais cedo ou

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mais tarde, precisarão reelaborar as expectativas previamente fantasiadas, tendo em vista que as crianças costumam apresentar algumas características que fogem da idealização feita pelos pais.

Assim, não significa que o profissional da saúde deva suavizar a informação, pois essa atitude tende a levar os pais a levarem ainda mais tempo na procura por um tratamento. O profissional precisa, outrossim, esclarecer que a audição interfere no desenvolvimento infantil. Cúnico et al. (2013) sugerem que diálogos sobre esse tema já sejam estabelecidos pelos profissionais da saúde, no pré-natal, alertando os pais sobre como proceder diante de um possível diagnóstico de surdez e das consequências do quadro clínico para a vida da criança. Esses diálogos já podem gerar reflexões por parte da família e um comportamento mais positivo frente a um diagnóstico precoce.

No período que antecede o nascimento do bebê, quando os profissionais da saúde já possuem elementos para supor que a criança possa nascer com problemas auditivos, a notícia pode acarretar reações emocionais seguidas de desequilíbrios psíquicos. Contudo, o diagnóstico precisa ser repassado com clareza, afinal, a família já pode ir levantando importantes informações sobre a situação, bem como o desenvolvimento de uma reação mais positiva no que toca o desenvolvimento futuro da criança, o que pode se desdobrar num processo de aceitação do filho real, ou de rejeição (CÚNICO et al., 2013).

No que se refere ao diagnóstico recebido após o nascimento da criança, Silva, Pereira e Zanolli (2012) se propuseram a investigar a vivência das mães entre a suspeita, o diagnóstico de surdez e o encaminhamento para habilitação. Essas autoras também tencionaram identificar a percepção das mães dos pacientes que receberam diagnóstico de surdez acerca do modo pelo qual foi dado o diagnóstico. O estudo contou com a participação de dez mães ouvintes com filhos surdos.

Alguns dos resultados obtidos com a pesquisa de Silva, Pereira e Zanolli (2012) foram:

• O diagnóstico de 60% das crianças que participaram da pesquisa foi realizado antes de um ano de idade.

• O diagnóstico poderia ter sido feito com maior antecedência, se a fala das mães fosse valorizada pelos profissionais da saúde.

• Quando as mães receberam o diagnóstico de surdez de seus filhos, lidaram com múltiplos sentimentos.

• Ficou evidente que nem todos os profissionais da saúde conseguiram prestar uma "escuta" apropriada em relação às dúvidas, queixas e questionamentos das mães.

• Verificou-se que a falta de encaminhamentos adequados para locais que trabalham na área da surdez atrasou o atendimento à criança, mesmo quando a triagem auditiva neonatal ou o diagnóstico oportuno tenham sido feitos apropriadamente.

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• As condições sociais, culturais e emocionais das mães nem sempre foram levadas em conta no momento do diagnóstico em que a surdez foi comunicada à família.

Para Silva, Pereira e Zanolli (2012), ficou evidente a necessidade de qualificação e de maior atenção por parte dos profissionais da saúde, o que favoreceria que os diagnósticos fossem realizados o quanto antes, antecipando, assim, o encaminhamento para os profissionais especializados, o apoio aos familiares e o acompanhamento propício dos casos de surdez.

Cortelo e Francozo (2014) examinaram as vivências de pais de filhos surdos, incluindo os sentimentos engendrados na significação da surdez de seus filhos, desde a suspeita até o enfrentamento. Cinco genitores de filhos com diagnóstico de surdez foram os sujeitos dessa pesquisa. Os resultados indicaram uma variedade de sentimentos e reações experienciados pelos pais, que na maioria, não possui informações suficientes sobre a surdez. A maioria dessas famílias possui escassos recursos internos para reagir ante a nova situação. Dentre os sentimentos relatados pelos pais, destacam-se: imobilidade, impotência, fragilidade e tristeza.

Esses autores também constataram insuficiência de recursos de ordem

psicológica, emocional e afetiva por parte dos pais perante os filhos, o que obstaculiza as tomadas de decisões necessárias em tempo hábil para a reabilitação da criança com surdez. Foram observadas algumas fases atravessadas pelos pais diante do diagnóstico, como podemos ver a seguir:

FIGURA 5 – FASES DE REAÇÕES DIANTE DO DIAGNÓSTICO DE SURDEZ

FONTE: Os autores

Conforme Cortelo e Francozo (2014), as três fases se desenrolam comumente da seguinte maneira:

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• Negação: envolve inúmeras formas de invalidar o diagnóstico recebido, por meio de explicações que eliminem qualquer chance de se ter um filho surdo. A família pode afirmar que o médico está equivocado, que a criança demonstrou ter ouvido alguma coisa dias atrás etc.

• Raiva: por vezes é expressa verbalmente pelos pais, misturada com sentimento de culpa (DIAS, 2004). Por outro lado, pode manifestar-se transferida para os profissionais de saúde que estão fazendo o diagnóstico e acompanhamento da criança.

• Aceitação: costuma ser edificada, na medida em que todas as tentativas de aniquilar o diagnóstico vão sendo frustradas. Por vezes, os pais procuram outro médico, refazem os testes na criança em outras instituições de saúde. Diante dos mesmos resultados, a aceitação vai sendo tecida. Ela é fundamental para ir ao encontro das necessidades da criança surda – iniciando a reabilitação o mais urgente possível. "O tempo e a convivência se mostraram fatores importantes na ressignificação da surdez e aceitação do filho" (CORTELO; FRANCOZO, 2014, p. 3).

Silva, Zanolli e Pereira (2008) também realizaram um estudo sobre as reações das mães diante do diagnóstico de surdez do seu filho. Dez mães participaram da pesquisa e, para todas, a notícia da surdez equivaleu a um choque. Os comportamentos das mães frente ao diagnóstico de surdez dos filhos foram variados, incluindo sentimentos ambivalentes, contrastantes e procurando características de normalidade na criança. Essas reações parecem similares ao que Cortelo e Francozo (2014) classificaram como "fase da negação".

Silva, Zanolli e Pereira (2008) constataram que outras mães foram se adaptando com a circunstância com o passar do tempo, conseguindo integrar o filho surdo em sua vida como um todo, o que parece coincidir com a "fase da aceitação" – na perspectiva de Cortelo e Francozo (2014).

Silva, Zanolli e Pereira (2008) notaram que as atitudes das mães dependeram de alguns fatores:

• Quando as mães já suspeitavam da surdez do filho (em termos de quantidade de tempo e de elementos que aumentavam a suspeita).

• Do momento em que o diagnóstico foi feito.• De como o diagnóstico foi apresentado.• Da forma pela qual os profissionais da saúde passaram as informações sobre a

surdez.• A quantidade de conhecimentos que a família possuía acerca da surdez.• As crenças, preconceitos e noções que a mãe trazia ao longo da vida, no que

toca a pessoa surda.

O filme E seu nome é Jonas (1979) também mostra todos os sentimentos que o diagnóstico de surdez (e tudo que o antecede) desencadeia na mãe de Jonas. Ela passa por todas as fases descritas pelas pesquisas.

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Outra pesquisa que trata sobre temática semelhante é a de Silva e Gonçalves (2013). Trata do "processo de diagnóstico da surdez em crianças na percepção de familiares e gestores". A pesquisa objetivava examinar a percepção de familiares e de gestores tanto da educação quanto da saúde, diante do diagnóstico de surdez em uma cidade do Paraná. Os sujeitos de pesquisa foram dez pais e gestores, e os resultados encontrados indicam que:

• O processo diagnóstico, de acolhimento e orientação é perpassado por frustração.

• Há impasses e dificuldades na relação intersetorial entre saúde e educação.

A pesquisa de Silva e Gonçalves (2013) ainda apontou que o diagnóstico tardio da surdez interferiu nas esferas circunscritas à educação e à saúde. A maior parte das crianças não pôde contar com o diagnóstico precoce e o acolhimento adequado. Mais de um ano havia passado, considerando a demora na liberação de exames diagnósticos e o tratamento das crianças, desembocando em entraves no desenvolvimento delas.

Os pais e professores têm papel importante nesse processo de readequação

da criança com surdez no convívio social, cobrando dos governantes mais apoio em políticas que promovam o progresso no processo de ensino e aprendizagem da comunicação da criança surda, para que esta possa ter uma melhora na sua qualidade de vida. As escolas regulares deveriam ter mais projetos – contraturnos, por exemplo – com programas que objetivam desenvolver habilidades que favorecem o processo de aprendizagem, o desenvolvimento da linguagem, os processos cognitivos (desenvolvimento da memória) e perceptuais, a socialização e a autonomia (SILVA; GONÇALVES, 2013).

As secretarias de saúde públicas deveriam ter maior direcionamento no caso de diagnóstico precoce, para tratamento imediato da surdez. É claro que, em muitos casos, os tratamentos para a criança surda não farão com que esta consiga se expressar na língua falada em sua totalidade, no entanto, com tratamentos fonoaudiológicos – entre outros – a criança surda tem significativas melhoras no desenvolvimento da sua gesticulação com as pessoas ao seu redor, que fazem uso da língua falada. Segundo dados de estudos, as primeiras palavras emitidas por uma criança em seu desenvolvimento normal de linguagem serão a partir do oitavo mês de vida, porém apresentam comportamentos comunicativos a partir dos três meses, com a presença do sorriso, do olhar e de tentativas de fala. Diante desses elementos, torna-se necessário o encaminhamento de uma criança antes dos dois anos para avaliação audiológica (SILVA; GONÇALVES, 2013).

Depois da breve apresentação sobre pesquisas acerca das reações dos familiares e de outras pessoas que fazem parte do convívio da criança com alterações auditivas, passaremos, agora, a atentar para as reações do próprio sujeito que recebe a notícia de que possui deficiência auditiva.

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Monteiro, Silva e Ratner (2016) realizaram uma pesquisa que contou com a participação de cinco surdos adultos, em situação de baixa renda econômica, atendidos por uma equipe multidisciplinar (pedagoga, psicóloga e intérprete de língua de sinais), em Brasília, no ano de 2013. Os resultados da pesquisa mostram que há facetas correlativas no que se refere ao impacto do diagnóstico da surdez na constituição do surdo:

a) o efeito iatrogênico;b) o reposicionamento dramático das relações parentais após o diagnóstico.

Os autores investigaram a relação entre a chegada do diagnóstico de surdez e o processo de constituição da identidade e da personalidade de pessoas surdas. Eles constataram que após o recebimento do diagnóstico, os sujeitos da pesquisa passaram a ser vistos a partir do lugar da deficiência indesejada, já que eles expressaram ter vivido situações conturbadas no seio familiar, tais como: desprezo, negação, raiva, tristeza, desapontamento e luto.

Monteiro, Silva e Ratner, (2016) recomendam que mais pesquisas sejam feitas acerca de interfaces entre: psicologia, saúde, educação e linguística, visando colaborar nas políticas públicas em saúde e educação. Os autores ainda chamam a atenção para a importância de levar em conta o impacto do diagnóstico na vida do surdo, incluindo os desdobramentos da notícia no âmbito familiar. Por fim, esses autores salientam que a equipe de saúde precisa conhecer o desenvolvimento cultural e linguístico dos surdos. É sobre essa temática que a próxima seção aborda. Vamos lá?

5 AS DIFICULDADES DE COMUNICAÇÃO ENTRE PACIENTES SURDOS E PROFISSIONAIS DA SAÚDE

De acordo com Ribeiro, Figueiredo e Rossi-Barbosa (2014), a comunicação é imprescindível para que os sujeitos socializem com seus pares nos diversos âmbitos da sociedade. Assim, a pessoa pode se apropriar de novas experiências e participar ativamente de atividades junto aos familiares e colegas. Quando o processo comunicativo se torna debilitado, o sujeito pode optar pelo afastamento social, e ele se verá imerso em frustrações, isolamento e sentimento de tristeza.

De maneira geral, muitas pessoas se queixam de não entenderem a

letra dos médicos ou algumas coisas que eles dizem, por usarem jargões da área médica, termos muito específicos que praticamente só eles entendem. Se a população em geral já tem essas reclamações, imagine como é para os surdos procurarem ajuda com profissionais que muitas vezes não falam a mesma língua que eles! Já imaginou o que pode acontecer? Eles encontram inúmeras barreiras de comunicação que podem acarretar em alguns revezes:

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• Interferir na formação do vínculo com o profissional da saúde.• Impedir que a transmissão das mensagens se dê com clareza, de modo que não

haja entendimento entre profissional da saúde e paciente.• Afetar a elaboração do diagnóstico, por parte do profissional.• O diagnóstico mal estabelecido pode, consequentemente, gerar prescrições de

tratamento equivocadas.• O tratamento "equivocado" pode prejudicar o desenvolvimento do surdo.• O diagnóstico e tratamento podem ser elaborados corretamente pelo

profissional, mas o paciente pode não conseguir entendê-los com clareza. Assim, ele tende a não seguir as orientações por falta de compreensão delas, desdobrando em danos para o seu desenvolvimento.

Tendo isso em vista, Chaveiro, Barbosa e Porto (2008) realizaram uma pesquisa nas bases de dados científicas informatizadas, com o objetivo de levantar o que a produção científica vem investigando e edificando acerca das inter-relações entre comunicação entre pacientes surdos e profissionais da saúde. Os autores consideraram que há poucas pesquisas sobre a temática e agruparam os achados em três eixos:

• Comunicação: trata dos obstáculos na comunicação, linguagem escrita e a presença do intérprete.

• Formação dos profissionais da saúde: o foco recai na formação dos profissionais referentes à comunidade surda.

• Aspectos legais: relata o que a legislação determina sobre o atendimento ao paciente surdo.

O estudo levou à conclusão de que há empecilhos na comunicação entre paciente surdo e profissional da saúde, de modo que o atendimento a esse público se torne um desafio. Evidenciou ainda a necessidade de novos estudos e ações em prol da formação sobre o paciente com alterações no sentido da audição (CHAVEIRO; BARBOSA; PORTO, 2008).

Posteriormente, Chaveiro, Porto e Barbosa (2009) realizaram uma pesquisa que levantou algumas sugestões que podem facilitar a comunicação entre pacientes surdos e os profissionais da saúde:

• As instituições públicas poderiam promover programas que visem à formação dos profissionais para a apropriada assistência aos pacientes surdos.

• Os profissionais da saúde poderiam receber orientações acerca da linguagem não verbal, que tantas vezes é empregada pelos surdos. É uma forma de comunicação que requer conhecimento e valorização por parte da equipe de saúde.

• Não se pode exigir que todos os profissionais da saúde dominem Libras, no entanto, eles poderiam ter noções para conseguirem interpretar alguns gestos, expressões faciais e corporais.

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• Além de ter algumas noções de Libras, seria ideal que os profissionais da saúde conhecessem as peculiaridades da identidade e da cultura surda. Isso os auxiliaria a estabelecer o vínculo com esses pacientes e melhoraria a relação com eles.

Você conhece o que diz a legislação sobre Libras?

"Como determina a Lei de LIBRAS nº 10.436/02, os direitos da comunidade surda precisam ser resguardados, assegurando a formação dos profissionais da área de saúde na adequada assistência a esta parcela significativa da população" (CHAVEIRO; PORTO; BARBOSA, 2009, p. 150).

ATENCAO

Tedesco e Junges (2013) fizeram uma pesquisa na qual participaram doze profissionais da saúde do Rio Grande do Sul, que corrobora com os dados apresentados pelas outras pesquisas aqui citadas. A investigação deles foi sobre o acesso aos serviços de saúde pelas pessoas com deficiência auditiva. Também tratou de aspectos da atenção primária à saúde, por exemplo, o acolhimento.

Para os autores, o acolhimento e a formação do vínculo entre paciente e profissional da saúde são essenciais para o andamento do tratamento de pessoas surdas. Os surdos demandam uma atenção especial, para que a compreensão de suas necessidades aconteça, afinal, a "escuta qualificada" é atravessada por embaraços na comunicação. Os resultados encontrados por Tedesco e Junges (2013) demonstram que os profissionais procuram diferentes ferramentas para remediar as dificuldades da comunicação com os pacientes surdos, e que os profissionais da saúde expressam desconforto e despreparo para atender às necessidades dos pacientes com alterações na função auditiva.

NOTA

Você sabia que a confiança é um importante fator na construção do vínculo com o profissional da saúde? Por que é preciso que os pacientes formem um vínculo com os profissionais da saúde que os atendem?

"Entende-se que o estabelecimento deste tipo de relação entre a equipe de saúde e os usuários tende a melhorar o conhecimento por parte dos profissionais, dos reais problemas da população atendida pelos serviços de saúde, e facilitar o relacionamento dos usuários com os mesmos, a fim de ambos buscarem juntos as soluções dos problemas e a melhoria dos serviços" (BRUNELLO et al., 2010, p. 134).

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Outra possível solução para os desencontros comunicacionais entre pacientes surdos e profissionais da saúde seriam as capacitações ou formações sobre a temática, com as equipes de saúde. Nesse sentido, Ribeiro, Figueiredo e Rossi-Barbosa (2014) abordaram "a importância da capacitação em saúde auditiva: uma revisão integrativa". Entretanto, as capacitações pouco parecem ter se voltado às problemáticas da linguagem. Os autores concluíram que as capacitações em saúde auditiva são primordiais, tendo em vista que a saúde auditiva é importante para o processo comunicativo e social dos indivíduos. Entretanto, até mesmo as atividades direcionadas à promoção e prevenção de alterações nessa área estão muito limitadas.

À guisa de conclusão, pode-se afirmar que a saúde auditiva da criança depende de cuidados e para isso a capacitação permanente dos profissionais da saúde (pública e particular) é de grande importância. Sendo capacitados, os profissionais podem diagnosticar e prescrever o nível de surdez na criança e posterior tratamento clínico e educacional (RIBEIRO; FIGUEIREDO; ROSSI-BARBOSA, 2014). Contudo, os estudos indicam que o acolhimento ao surdo (e as suas famílias) não tem sido satisfatório nos serviços de saúde, e que as orientações iniciais após o diagnóstico de surdez nem sempre têm sido adequadas.

Portanto, de acordo com Silva, Zanolli e Pereira (2008), as famílias de sujeitos com alterações na audição precisam contar com a ajuda de profissionais que lhe deem apoio, suporte, orientação para que possam, no seu ritmo, ir ressignificando, reelaborando sua relação com o sujeito surdo. Assim, irão repensar, modificar suas crenças, imagens e atitudes em relação ao filho surdo.

É importante que a equipe de saúde consiga integrar os outros membros da família, especialmente o pai, nos atendimentos. Dessa forma, a mãe pode encontrar um suporte maior no meio familiar, no que diz respeito a colocar em prática as orientações feitas pelo profissional da saúde, além de contar com mais pessoas para efetivar a comunicação entre o paciente surdo e o profissional da saúde (SILVA; ZANOLLI; PEREIRA, 2008).

IMPORTANTE

Assim, como disse o célebre escritor brasileiro Guimarães Rosa (também novelista, romancista e diplomata): o que a vida quer de todos – principalmente dos deficientes auditivos, seus familiares e das pessoas que trabalham com eles – é coragem! Coragem e paciência, afinal, é preciso ter consciência de que a vida tem fases em que esquenta, outras em que esfria, tem momentos de aperto, e momentos de folga, momentos de sossego e outros de desassossego.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico apresentamos:

• A surdez consiste em um problema de saúde pública, levando em consideração suas taxas de prevalência e os danos que influenciam no desenvolvimento humano da pessoa com surdez.

• O diagnóstico precoce de surdez em crianças é muito importante, pois pode-se, com isso, iniciar um tratamento adequado já nos primeiros meses de vida da criança, evitando tratamentos tardios e com menos eficácia.

• A disseminação de informações no que tange à surdez é muito indicada às famílias. Quanto melhor e mais informada a família da criança for sobre o que pode melhorar no dia a dia desta para que tenha uma vida mais comunicativa junto às pessoas, mais empenho será dado pelos pais ao tratamento da criança surda.

• O diagnóstico da surdez pode conturbar os sentimentos do próprio surdo e de sua família, além de poder abalar o funcionamento intersubjetivo dos integrantes do seio familiar.

• Apesar de ser instituída no ano de 2004 a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva (PNASA) pelo poder público, o deficiente auditivo ainda recebe pouca atenção no processo de recuperação ou facilitação da comunicação com a sociedade.

• Infelizmente, o Brasil possui muitas famílias com baixa renda, que têm dificuldades de acessos a serviços públicos de reabilitação da criança com surdez. Com maior poder aquisitivo pode-se ter um tratamento adequado e garantir uma melhor qualidade da audição na criança.

• Ao entregar o diagnóstico de surdez para a família, o profissional da saúde precisa considerar as condições sociais, culturais e emocionais da família.

• Há entraves em termos de capacitação com profissionais da saúde sobre Libras e especificidades no atendimento aos surdos, como um todo. Esses temas parecem pouco valorizados na formação dos profissionais da saúde, consequentemente eles vêm a apresentar inaptidão ao lidar com pacientes surdos no cotidiano profissional.

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AUTOATIVIDADE

1 Diante das informações desse tópico, você encontrou algumas que podem ser úteis no cotidiano do trabalho de um profissional da educação especial. Cite duas delas.

2 Cite três prejuízos que o surdo sofre quando é atendido por profissionais da saúde que não são fluentes em libras.

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TÓPICO 3

DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE

AUDITIVO ENFRENTA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Nada é suficientemente bom. Então vamos fazer o que é certo, dedicar o melhor de nossos esforços para atingir o inatingível,

desenvolver ao máximo os dons que Deus nos concedeu, e nunca parar de aprender.

Ludwig van Beethoven

No tópico anterior, você pôde observar uma porção de dificuldades que os sujeitos surdos enfrentam ao tentar buscar ou realizar atendimento em saúde. A dificuldade de estabelecer diálogo com profissionais da saúde é uma das principais queixas encontradas nas pesquisas disponíveis nas bases de dados científicas informatizadas.

Você já imaginou quais são as outras dificuldades e desafios que os sujeitos surdos precisam se esforçar para driblar no dia a dia deles? Antes de dar continuidade à leitura, faça uma pausa e procure imaginar três dificuldades que você acredita que o surdo costuma enfrentar. Atenção! Anote-as em algum local, pois, posteriormente você irá precisar delas nas autoatividades.

Independente dos percalços e desafios que se revelam aos surdos, concorda-se com Beethoven, que dar o melhor de si pode ser a melhor saída. Além do mais, frisa-se o incentivo a continuar aprendendo algo, incessantemente. Essas são duas maneiras de driblar os obstáculos.

Agora que você já pôde registrar seus palpites para alguns dos entraves que os surdos vivenciam, que tal, conferir quais são os assuntos que serão abordados nesse tópico? Ele tratará de dificuldades no âmbito da comunicação, dificuldades de acessibilidade, preconceito, falta de investimentos governamentais, excesso de proteção dos familiares e despreparo deles. Também podem acontecer dificuldades de relacionamentos, dilemas com a autoestima, revezes com aparelhos que objetivam melhorar a captação de sons, impaciência por parte de ouvintes, segregação, etc.

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

2 DESAFIOS QUE SURDOS PRECISAM SUPERAR NO DIA A DIA

Nesta seção propõe-se alguns gatilhos para o processo reflexivo em torno das dificuldades, desafios, impasses que os surdos enfrentam na sua vida cotidiana. Pense na lista que você redigiu sobre essas dificuldades. A lista que você fez incluiu alguma dificuldade no acesso à educação?

DICAS

A relevância da dificuldade de acessibilidade à educação é tamanha, que o tema da redação do ENEM, de 2017, tratava da importância da inclusão dos estudantes surdos na educação, você sabia? Que tal conferir a página da prova do ENEM que abordou essa temática?

FIGURA 6 – TEMA DE REDAÇÃO DO ENEM 2017

FONTE: Disponível em: <https://g1.globo.com/educacao/enem/2017/noticia/tema-da-redacao-do-enem-2017-fala-sobre-a-educacao-de-surdos-no-brasil.ghtml>. Acesso em: 14 maio 2018.

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TÓPICO 3 | DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

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• “Enem: quais as dificuldades que os surdos enfrentam na Educação brasileira?”

Acesse <https://novaescola.org.br/conteudo/7094/enem-quais-as-dificuldades-que-os-surdos-enfrentam-na-educacao-brasileira> e confira. Ao ler os temas geradores da redação, você poderá identificar conteúdos acerca da história do acesso à educação, por parte dos sujeitos surdos, como você já pôde verificar na primeira unidade desse livro. Encontrará ainda algumas questões relativas a Libras – sobre as quais poderá ampliar seus conhecimentos ao longo dessa unidade. Que tal sua turma fazer uma produção escrita coletiva? Procurem realizar a redação proposta pelo ENEM. É uma atividade que pode gerar valiosos diálogos na sua turma!

Agora, volte à lista que você foi instigado a escrever, imaginando alguns contratempos que os surdos costumam encarar no cotidiano. Que tal conferir se você citou algumas dessas dificuldades?

• Dificuldade de comunicação: a maior dificuldade citada nas pesquisas em bases de dados científicas é no contato entre surdos e ouvintes, como por exemplo, mencionado por Tedesco e Junges (2013); por Santos, Vieira e Faria (2013) e por Gesueli (2006). Mas, considerando que nem todos os surdos usam a mesma forma de linguagem, a comunicação pode ter barreiras mesmo sendo estabelecida entre os surdos, pois uns utilizam Libras, outros, a leitura labial, outros, a língua portuguesa escrita, outros utilizam o implante coclear e se manifestam pela oralidade.

• Dificuldade de acessibilidade: deriva da dificuldade de comunicação. A falta de intérpretes em instituições educacionais, palestras, igrejas, instituições de saúde, estabelecimentos comerciais, nos serviços públicos em geral, podem gerar embaraços para os surdos. Mais especificamente no que tange à acessibilidade na educação, Seno (2009) explica que não são todos os alunos com perda auditiva que podem contar com professores que se comuniquem por intermédio da Libras. “A dificuldade de comunicação interfere diretamente no aprendizado e priva o aluno de informações importantes para o seu desenvolvimento e aprendizagem” (SENO, 2009, p. 383). Muitos surdos também se queixam da falta de legendas nas produções cinematográficas brasileiras exibidas nos cinemas do nosso país. Também há reclamações pela falta de legenda em alguns canais da televisão aberta nacional.

• Preconceito: pode envolver dificuldades para fazer amizades, iniciar relacionamentos amorosos, ingressar no mercado de trabalho etc. Conforme Santos, Vieira e Faria (2013), os deficientes auditivos enfrentam dificuldades para se inserirem no mercado de trabalho, seja por questões atinentes à dificuldade de comunicação/interação com os demais profissionais, seja pela “crença por parte das empresas de que as pessoas com deficiência auditiva são incapazes para o trabalho ou não se adaptarão a ele” (SANTOS; VIEIRA; FARIA, 2013, p. 99). Essas autoras acrescentam que diversos empregadores desconhecem as capacidades, potencialidades, expectativas, necessidades e limitações dos profissionais com deficiência auditiva, o que redunda em reduzidas iniciativas inclusivas no ambiente organizacional.

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

DICAS

O filme de romance Hear me (2009, Taiwan) faz menção a uma história de amor entre um ouvinte e uma garota surda. Seu título foi traduzido para Escuta-me, e traz uma série de reflexões sobre o início de um relacionamento amoroso envolvendo uma pessoa surda e sobre algumas reações da família do namorado, ao tomar conhecimento de que ele está se relacionando com uma pessoa surda.

FIGURA 7 – ESCUTA-ME

FONTE: Disponível em: <http://egloos.zum.com/mlkangho/v/10804812>. Acesso em: 16 maio 2018.

• Falta de investimento governamental: são raras as iniciativas do governo na atenção ao desenvolvimento profissional e pessoal dos deficientes auditivos (SANTOS; VIEIRA; FARIA, 2013).

• Excesso de proteção e despreparo das famílias: por vezes, há famílias que numa tentativa de proteger seus filhos de atitudes preconceituosas na sociedade, induzem o deficiente auditivo a passar o maior tempo possível no lar. Existem famílias que preferem que os filhos deficientes auditivos, mesmo na idade adulta, fiquem em casa, numa tentativa de compensá-los, já que nasceram privados da possibilidade de ouvir. Esse tipo de atitude acaba influenciando negativamente no desenvolvimento das pessoas com deficiência auditiva. Outras atitudes que manifestam o despreparo das famílias foram mencionadas por Cortelo e Francozo (2014); Dias (2004); Figueiredo e Gil (2013) e Silva, Zanolli e Pereira (2008).

• Dificuldades nos relacionamentos: há relatos de surdos que se queixam de que seus colegas, amigos, ou parceiros amorosos falam oralmente com eles – dando a impressão de que vez ou outra se esquecem de que estão se relacionando com

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TÓPICO 3 | DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

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uma pessoa surda. Há surdos que se sentem ofendidos, ao serem convidados para shows de músicas, recitais de música, eventos que envolvem o ato de dançar etc. Por outro lado, há outros que se ofendem quando seu grupo de amigos ouvintes vai a estes lugares e não inclui o surdo na lista de convidados. Há surdos que se queixam de que simplesmente, por não terem o sentido da audição, as demais pessoas não tentam sequer estabelecer algum tipo de comunicação com eles, agindo como se fossem invisíveis. Por exemplo, em uma consulta médica, o médico se dirige o tempo todo ao acompanhante do paciente surdo, e olha apenas para o acompanhante, como se o paciente não tivesse o menor discernimento do que possa estar ocorrendo ali. Os filmes Nada que eu ouça (2008), Black (2005), Mr. Holland – adorável professor (1995) – que estão indicados nos UNIs ao longo desse livro, retratam situações semelhantes a essas.

DICAS

Situações de preconceito e de dificuldades de relacionamentos fazem parte do filme BABEL (2007), cuja parte do elenco é formada por Brad Pitt, Cate Blanchett e Gael García Bernal. No filme, a atriz Rinko Kikuchi interpreta uma jovem surda que se comunica por meio da escrita e da leitura labial. Há cenas que se passam em danceterias, e o corte do som, no vídeo, nos remete a como ela se sente lá, sem perceber os sons das músicas. Também há cenas em que ela flerta com um jovem que se mostra bastante interessado nela. Quando ele vem conversar com ela, e se dá conta de que ela é surda, ele sai de fininho.

• Autoconceito: há surdos que se deparam com o desafio de incessantemente se automotivarem e acreditarem que apesar de tantos empecilhos, tenham plenas condições de serem felizes e realizados. Então um dos desafios é lidar com seu autoconceito e autoestima (ZUGLIANI; MOTTI; CASTANHO, 2007).

• Revezes dos aparelhos auditivos: Quanto ao uso de aparelhos auditivos que muito se fala tratar-se de um facilitador da comunicação para os surdos, pode muitas vezes se tornar um tormento. Ruídos externos, como falas exaltadas de alunos em salas de aula, barulho de veículos automotores, eventos externos de todos os tipos, podem dificultar a audição da pessoa com surdez (WITKOSKI, 2009).

UNI

Talvez você tenha sinalizado em sua lista alguma dificuldade que não foi elencada aqui. Que tal socializar com a sua turma?

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Considerando que as dificuldades específicas com a acessibilidade nos espaços atinentes à saúde já foram tratadas antecedentemente nessa unidade de estudos, e que as especificidades com a linguagem serão abordadas no Tópico 5 desta, esse tópico focalizará os seguintes desafios:

• lidar com aspectos de origem externa (o preconceito);• lidar com aspectos de origem interna (o autoconceito, a autoestima).

DICAS

Antes de dar seguimento à leitura, que tal uma pipoquinha?

O filme A Família Bélier (França/2014) é uma comédia dirigida por Eric Lartigau, no qual a protagonista Paula (Louane Emera) vive todos os conflitos comumente associados à adolescência (amor, escola, divergências na família). Como se não bastasse tudo isso, sua família tem algo que a maioria das outras famílias não tem: três integrantes surdos (pai, mãe e irmão). Assim, Paula acaba tomando a frente de várias situações de sua família, sendo a pessoa que faz a intermediação da comunicação dos familiares com as demais pessoas com quem interage na sociedade. O filme mostra algumas situações que foram citadas nas páginas antecedentes, no que toca as dificuldades que os surdos precisam encarar dia após o dia.

FIGURA 8 – A FAMÍLIA BÉLIER

FONTE: Disponível em: <http://cinecartaz.publico.pt/Filme/350613_a-familia-belier>. Acesso em: 16 maio 2018.

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TÓPICO 3 | DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

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3 SURDEZ E PRECONCEITO

Como você já viu na primeira unidade deste livro, antigamente a comunidade surda era considerada defeituosa, anormal, não sendo aceita no convívio social. Logo, boa parte dos preconceitos direcionados aos surdos é sustentada por questões históricas. Entretanto, se historicamente a surdez era julgada como uma doença, nos dias atuais esse estereótipo tende a deixar de existir. Nos centros universitários, o surdo já é visto com outros olhos e já não encontra tanta discriminação. A sociedade dotada de oralidade, aos poucos vem aceitando o surdo em seu convívio, até mesmo auxiliando-o em algumas de suas dificuldades (WITKOSKI, 2009).

De qualquer modo, como centenas de anos foram necessárias para solidificar pensamentos, atitudes e preconceitos acerca da surdez, alguns preconceitos ainda perduram, tais como:

• Olhares discriminatórios: o preconceito que está nos olhares das pessoas, direcionado ao sujeito surdo. Ele se sente visto como alguém que não se enquadra nos moldes sociais “normais”. O fato de usar um aparelho auditivo, ou de ser visto utilizando Libras, já é suficiente para que as pessoas que estão ao seu redor olhem-no de modo diferente, transmitindo desaprovação, ou mesmo, assombro. Os olhares de outrem tendem a ser mais impiedosos quando o surdo tenta se expressar oralmente, pois seu tom de voz pode sair mais alto do que o esperado. A impressão que o surdo tem é de que está desajustado na sociedade, como se fosse alguém que não se comporta adequadamente no convívio social. Muitas vezes, o surdo sente-se discriminado e assimila os preconceitos emitidos pelas pessoas, conformando-se com essa triste realidade (WITKOSKI, 2009).

DICAS

O filme The Hammer (2010) mostra que às vezes o preconceito se materializa em forma de bullying, como aconteceu na vida de Matt Hamill, um dos mais emblemáticos lutadores surdos dos Estados Unidos. Quando criança, ele reagia ao bullying com a violência física, e com o tempo ele passou a praticar a luta como esporte. Um filme inspirado em fatos reais. A seguir, uma foto de Matt Hamill, na vida real:

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

FOTO 9 – MATT HAMILL LUTA NO UFC 152

FONTE: Disponível em: <http://sportv.globo.com/site/combate/noticia/2012/08/unico-ter-vitoria-sobre-jones-hamill-larga-aposentadoria-e-luta-no-ufc-152.html>. Acesso em: 29 maio 2018.

• Resistências ante as especificidades de linguagem do surdo: mesmo submetida a treinamentos de fala, a pessoa surda é vista como sendo deficiente em sua comunicação. Muitas vezes é desprezada por não possuir a capacidade natural da linguagem falada e apresentar sua oralidade distorcida. Um erro é tratar a palavra falada como superior à língua de sinais, um pressuposto errôneo que ainda persiste nos dias atuais. O surdo ainda tem grande dificuldade de vincular a sua comunicação e moldá-la nas regras gramaticais da língua portuguesa. Atualmente, a língua falada significa muito para o surdo. É o meio pelo qual o surdo procura expressar suas ideias, pensamentos e atos. Nossa sociedade, junto ao poder público, lança sentimentos de amparo ao surdo, porém, algumas vezes, representam sentimentos maquiados de hipocrisia e preconceito. Em determinadas situações, o surdo é interpretado como uma pessoa que não tem o que dizer ou falar, e sua vontade de se expressar é ignorada pelas pessoas que se utilizam da linguagem oral (WITKOSKI, 2009).

ESTUDOS FUTUROS

Não se esqueça de que o Tópico 5 desta unidade aprofundará justamente as especificidades da linguagem dos surdos!

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TÓPICO 3 | DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

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• Impaciência dos ouvintes: para Witkoski (2009), a pessoa surda tem dificuldade de interpretar a fala de seu interlocutor e perde as percepções de ideias que ficam nas entrelinhas, principalmente os surdos que fazem a leitura labial, pois são privados de acompanhar as oscilações no tom de voz – que tanto pensam na construção do sentido das palavras e frases. Então, não é raro que o surdo leve mais tempo para compreender o que está sendo dito. Assim, o ouvinte que está tentando se comunicar com ele, tende a revelar impaciência com o surdo, que, por sua vez, tem a sua comunicação limitada e não é compreendido. Sem falar que existem muitas pessoas que nem se esforçam para interpretar ou entender o surdo na sua forma de comunicação gestual. Uma estratégia que muitos surdos adotam nestas situações é a utilização de “disfarces” para evitar conflitos com outrem, numa tentativa de inserção social. Para se sentirem aceitos, por vezes preferem transparecer que estão entendendo seu interlocutor perfeitamente, fazendo discretos sinais positivos, como fazem os ouvintes, num diálogo trivial.

• Desprezo: o surdo ainda tem que conviver com o estigma de que ele é deficiente e considerado abaixo da linha falante da sociedade. A pessoa com surdez pode se sentir desprezada frente ao convívio social, no sentido de que possui menos capacidade do que a pessoa que não tem a limitação da surdez. Até pouco tempo atrás, o surdo percebia que era discriminado e aceitava essa situação, concordava que realmente não poderia conviver – ou fazer parte – de uma sociedade que se comunica pela linguagem falada e regrada (WITKOSKI, 2009).

• Segregação familiar: ao longo dessa unidade, você já viu que muitas famílias expressam sentimentos de recusa diante do diagnóstico de uma pessoa surda, no seu meio familiar. Assim, alguns surdos não são integrados plenamente na rotina da família da qual fazem parte. Existem casos em que a família apresenta resistência ao uso de Libras, para que na rua as demais pessoas não percebam que estão acompanhadas de um surdo. Afinal, Libras é uma forma de identificação da comunidade surda, é a genuína expressão da identidade surda. Por isso há famílias que tanto insistem em adotar o método oralista – como forma de disfarçar, ou camuflar a surdez na sociedade. Quando o surdo percebe que está vivenciando a segregação na própria família, tende a tornar-se indiferente ou até mesmo agressivo. Afinal, ao invés de sua família batalhar pela melhora de sua qualidade de vida, age de modo inverso, recusando-se a aceitar a condição do seu filho, chegando ao ponto de manifestar-se envergonhada por ele (WITKOSKI, 2009).

DICAS

Para você compreender melhor as dificuldades que a pessoa surda enfrenta na sociedade, assista ao vídeo (de menos de 10 minutos): “SURDO E PRECONCEITO”, da Universidade de Brasília, acessando o link: <https://www.youtube.com/watch?v=i8dz2lMmZnw>. Bons estudos!

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

4 SURDEZ E AUTOCONCEITO

Zugliani, Motti e Castanho (2007) realizaram uma pesquisa sobre “o autoconceito do adolescente deficiente auditivo e sua relação com o uso do aparelho de amplificação sonora individual”. As autoras salientam que o adolescente surdo tem mais dificuldades nas interações sociais do que o adolescente que não possui a limitação da surdez. Isto porque, além de todas as situações por que passam os adolescentes em decorrência da transição da infância para a vida adulta, eles ainda precisam enfrentar novas situações por se encontrarem no âmbito da surdez. Uma dessas adaptações está no uso e hábito do AASI (aparelho de amplificação sonora individual).

O autoconceito “é o conhecimento que o sujeito desenvolve sobre si mesmo” (MARTINS; NUNES; NORONHA, 2008, p. 94). As autoras explicam que o adolescente vai construindo uma visão de si mesmo por meio da interação com o seu entorno social e ambiente onde vive. O autoconceito abrange aspectos cognitivos, afetivos e comportamentais, e pode influenciar a vida do sujeito nas mais variadas áreas. Por exemplo, se a pessoa acredita que é incapaz de fazer algo, certamente ela nem tentará fazer. A figura a seguir pretende ilustrar a definição de autoconceito:

FIGURA 10 – O AUTOCONCEITO

FONTE: Os autores

Exigências Sociais

Em construção

Dinâmico Inacabado

Autoconceito

Auto

atrib

uiçã

o

Imag

em

Sentimentos

PercepçõesJuizo de

Valor

Sobre si Mesmo

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É de conhecimento geral que a adolescência, na nossa cultura, é composta por tensões e revoltas vivenciadas pelos adolescentes, ao ponto de serem intitulados de rebeldes. Essa rebeldia frequentemente expressa pelos adolescentes se agrava para o adolescente surdo, que, por sua vez, em acréscimo às diversas mudanças culturais e hormonais que vivencia nessa fase da vida, enfrenta situações embaraçosas e tensas na comunicação com outros adolescentes.

Para Zugliani, Motti e Castanho (2007), o uso de aparelho auditivo é muitas vezes aceito pelo adolescente surdo até pelos benefícios e facilidades na comunicação que o equipamento traz, porém, o adolescente deficiente auditivo procura fazer parte do grupo de amigos na sociedade onde vive, parecendo ser “igual” a eles, para não se sentir excluído. Então, o adolescente deficiente auditivo comumente adota uma dessas duas posturas frente a um desconhecido:

• Aceita suas limitações e procura estabelecer contato com outras pessoas, mostrando prontamente que é deficiente auditivo. Existem adolescentes deficientes auditivos que enfrentam os problemas de comunicação no convívio com estranhos e se esforçam para desmitificar os rótulos impostos pela sociedade que utiliza a linguagem oral.

• Isola-se tentando esconder a sua limitação.

Conforme Zugliani, Motti e Castanho (2007), a presença e o apoio da família do adolescente surdo são muito importantes, pois este sente segurança e encontra ânimo para desvendar todas as nuances da surdez. A atenção de pessoal qualificado do setor público também auxilia bastante. O autoconceito que o adolescente surdo forma de si está atrelado, em sua grande parte, ao apoio de seus pais. O adolescente com surdez pode elevar a sua autoestima e acreditar que é possível ter uma vida normal, quando seus pais transparecem aceitação em ter um filho surdo. Toda a acolhida ao filho com deficiência auditiva traz benefícios vastos para ele. Contudo, existem adolescentes surdos com maior tendência a se tornarem independentes, sentindo que a sua limitação não deve separá-los do convívio em grupo.

NOTA

Você sabia que alguns adolescentes deficientes auditivos vêm apresentando melhoras na sua autoestima, depois de praticarem atividades relacionadas à dança? Montezuma (2011) realizou um estudo com o intuito de identificar se a realização de aulas de dança do tipo jazz dance trouxe mudanças para a vida do adolescente surdo. Ela constatou que houve melhora nos seguintes aspectos:• coordenação motora;• atenção;• participação;• interação;• autoestima;• compreensão de adolescentes com deficiência auditiva.

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Logo, infere-se que a dança pode representar uma excelente oportunidade para que o sujeito lide com suas necessidades, desejos, expectativas, além de contribuir no desenvolvimento individual e social. Sem dúvida é uma atividade que proporciona inúmeros benefícios educativos e físicos.

Agora, vamos destacar a relação entre o uso de aparelho de amplificação auricular e o autoconceito. Nem todas as pessoas surdas gostam ou sequer usam tal equipamento, no entanto, a maioria utiliza e percebe a necessidade da sua utilização, pois agrega benefícios ao surdo no que se refere a ouvir melhor. Você já viu nas páginas anteriores dessa unidade, que a correta utilização da prótese auditiva é uma medida primorosa para que o deficiente auditivo desenvolva seu potencial. Nesse sentido, o estudo de Zugliani, Motti e Castanho (2007) mostra que são poucos os adolescentes deficientes auditivos que optam pela não utilização do AASI, ou que revelam descontentamento com o aparelho (irritação, desconforto). Curiosamente, os adolescentes que demonstram maior resistência ao uso do AASI são aqueles que possuem autoconceito desfavorável. Portanto, Zugliani, Motti e Castanho (2007, p. 109) constataram que: “Assim, o uso efetivo do AASI pelos adolescentes com deficiência auditiva está diretamente relacionado às boas condições de seu autoconceito”.

É válido ressaltar que o aparelho deve ser retirado do ouvido somente quando a pessoa for tomar banho e quando for dormir. Alguns adolescentes surdos sentem desconforto com o aparelho diante de ruídos externos e outros não utilizam para passeios, sendo que não querem ser percebidos como pessoas surdas (o aparelho é bem visível, pois seu suporte passa por detrás da orelha). É preciso ponderar sobre essas situações em que o surdo tira o aparelho de audição com frequência. O adolescente surdo precisa compreender que a opinião alheia pode prejudicar consideravelmente sua saúde, interferindo no processo de tratamento (ZUGLIANI; MOTTI; CASTANHO, 2007).

A conclusão que chegamos até aqui é de que a maioria dos pais de adolescentes deficientes auditivos comprova a aceitabilidade do uso do aparelho de audição por seus filhos, assim uma maior parcela de pessoas surdas busca ter uma melhor qualidade de vida. A grande tendência é que o surdo sinta vontade de participar de todas as etapas de uma sociedade, para que seja visto como alguém útil e que tenha a mesma capacidade dos demais (ZUGLIANI; MOTTI; CASTANHO, 2007).

Você sabia que o desempenho da pessoa surda pode ser melhor em uma escola onde o surdo é atendido com atenção e aceito mesmo com sua limitação, do que em casa, quando a família não vê potencial nenhum nele?

ATENCAO

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TÓPICO 3 | DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

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Em conclusão, nos dias atuais os surdos ainda são – na maioria das vezes – discriminados por terem limitações auditivas e orais (FRANCELIN; MOTTI; MORITA, 2010). Em contrapartida, aos poucos a comunidade surda está ganhando mais aceitação. As pessoas estão viabilizando e aceitando a reinserção do surdo na sociedade. O surdo está sendo mais compreendido por amigos, pela família, por profissionais da área da saúde, enfim, todos estão cada vez mais próximos da pessoa surda, uma vez que esta última está sendo vista como um ser humano que apenas possui uma dificuldade para se comunicar e não uma deficiência incapacitante. O surdo deve ser visto como uma pessoa que pode e consegue se comunicar, tendo apenas algumas limitações que não são obstáculos intransponíveis para o convívio entre falantes. Além disso, as pessoas que têm surdez possuem sua própria identidade, ou seja, suas características pessoais e familiares, de convívio com outros surdos etc., adquirem peculiaridades que são inerentes a sua pessoa (DUARTE et al., 2013).

IMPORTANTE

Toda pessoa precisa ouvir e falar para se comunicar no meio em que vive e é aí que começam os problemas do surdo. Ele precisa enfrentar essas situações com determinação, pois somente assim poderá desenvolver sua autoestima e conviver com pessoas usuárias da língua falada com maior normalidade (FRANCELIN; MOTTI; MORITA, 2010).

Além dos obstáculos que o surdo enfrenta no convívio social, ainda existem problemas no seu ambiente de trabalho. Muitos adultos surdos pedem demissão por não se adaptarem ao cargo exercido e também – muitas vezes – por seu chefe imediato desconhecer as limitações do deficiente auditivo e exigir além do que ele pode realizar. Devemos lembrar que, neste caso, o respeito deve prevalecer em primeiro lugar. Recomenda-se que a empresa entre em contato com um profissional de saúde que possa auxiliar no bom desempenho do deficiente auditivo. Seria ideal, também, que a empresa disponibilizasse um acompanhamento terapêutico na questão de relacionamentos entre chefe x surdo x colegas de trabalho (FRANCELIN; MOTTI; MORITA, 2010).

Vários setores sociais como educação, assistência social, família, entre outros, podem e devem contribuir para a melhora no quadro de surdez do deficiente auditivo. Tendo apoio e incentivo dessas instituições, o adolescente surdo tem maiores chances de superar essa etapa da vida, bem como melhorar sua condição de vida (ZUGLIANI; MOTTI; CASTANHO, 2007).

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Consideramos relevante apresentar termos e algumas características sociais e históricas da pessoa surda para que você tenha melhores condições de ajudá-la em seu processo de melhora. Procure conhecer e aplicar situações em que o diálogo prevaleça e, assim, o surdo possa desenvolver a sua própria dinâmica de aprendizado (SOLIA; SILVA, 2017).

ATENCAO

IMPORTANTE

Você sabia que o autor da epígrafe desse tópico – o compositor alemão Ludwig van Beethoven – também ficou surdo? Em três décadas, ele viu pouco a pouco sua audição lhe escapar. Mesmo assim, não esmoreceu. Ele aproveitou sua memória para continuar compondo suas músicas, mesmo depois de surdo. A 'Nona Sinfonia', criada poucos anos antes de sua morte, foi declarada patrimônio mundial pela Unesco.

FONTE: Disponível em: <http://revistagalileu.globo.com/Galileu/0,6993,ECT611093-1716-5,00.html>. Acesso em: 25 maio 2018.

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TÓPICO 3 | DESAFIOS COTIDIANOS QUE O DEFICIENTE AUDITIVO ENFRENTA

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LEITURA COMPLEMENTAR

SURDEZ E PRECONCEITO: A NORMA DA FALA E O MITO DA LEITURA DA PALAVRA FALADA

Sílvia Andreis Witkoski

A surdez foi construída historicamente a partir da diferença enquanto desvio da normalidade, numa abordagem patologizante. Apesar do novo discurso socioantropológico da surdez estar em voga, principalmente no meio acadêmico, esta é ainda uma escrita recente. Podemos encontrar muitas contradições inclusive entre alguns dos que fazem uso de um discurso que impressiona positivamente, contradições essas que também os surdos apresentam quando assimilam os preconceitos. Entre estes não posso deixar de fazer referência a mim mesma, como surda, que também em muitos momentos me encontrei nas amarras do ouvintismo.

Para enfatizar a importância e a urgência de desconstruir as representações preconceituosas que envolvem o ser surdo, entre os quais a norma da fala e o mito da leitura da palavra falada, construindo outra narrativa na qual sejamos "vistos como sujeitos surdos e não sujeitos com surdez" (LOPES, 2007, p. 9), finalizo fazendo uso do discurso de Dalmo Dallari (apud RULLI NETO, 2002, p. 217-219, citado por BOLONHINI, 2004, p. 286-289):

O preconceito acarreta a perda do respeito pela pessoa humana. [...] faz com que certas pessoas sejam estigmatizadas, sofrendo humilhações e violências, que podem ser impostas com sutileza ou relativo disfarce ou então de maneira escancarada, mas que em qualquer circunstância são negações do respeito devido à dignidade de todos os seres humanos. [...] O preconceito introduz a desigualdade [...]. Em consequência dos preconceitos, as pessoas direta ou indiretamente atingidas por eles são julgadas negativamente e colocadas em situação de inferioridade social [...]. O preconceito estabelece e alimenta a discriminação. [...] promove a injustiça [...] anulando a regra básica segundo a qual nenhuma pessoa vale mais do que a outra [...]. A par disso, onde atua o preconceito não importam os méritos, as aptidões, o valor moral e intelectual. [...] O preconceito cria superioridades e inferioridades”.

FONTE: Witkoski (2009, p. 565-575)

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• O deficiente auditivo enfrenta diversos desafios em sua vida social e familiar.

• Existem adolescentes surdos que não se consideram tão diferentes das demais pessoas (que se utilizam da linguagem falada). Assim, levam uma vida muito parecida com a dos ouvintes – fazendo atividades similares, frequentando ambientes parecidos etc. – estando integrados na sociedade.

• Por outro lado, existem adolescentes surdos que se sentem “diferentes” das demais pessoas e sentem vergonha da sua condição, optando por uma vida mais solitária, restrita ao seio familiar.

• Grande parte dos surdos precisa enfrentar algumas dificuldades em situações rotineiras, por exemplo: dificuldades para comunicar-se, dificuldades de acessibilidade, preconceito, falta de investimentos governamentais para o desenvolvimento pessoal e profissional dos surdos, excesso de proteção das famílias, ou despreparo delas, dificuldades nos relacionamentos interpessoais, autoconceito fragilizado e incômodos com o aparelho auricular.

• O preconceito dirigido ao surdo é perceptível por meio de olhares discriminatórios, resistências com as especificidades da linguagem deles, impaciência dos ouvintes nas tentativas de estabelecer comunicação (entre surdo e ouvinte), desprezo e segregação – inclusive no meio familiar.

• O autoconceito corresponde ao que uma pessoa pensa de si mesma, e há surdos que apresentam autoconceito diminuído. A forma pela qual a família lida com a deficiência do filho, costuma interferir no autoconceito dele.

• Acompanhamento psicológico e atividades como a dança podem auxiliar na melhora do autoconceito.

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1 Santos, Vieira e Faria (2013, p. 92) investigaram a percepção de empregadores no que tange à contratação e inclusão social dos funcionários surdos. Eles constataram que o processo de comunicação é ineficaz e que parte de as empresas contratar pessoas surdas “por conta de uma determinação legal imposta pelo Estado. As barreiras sonoras e as concepções dos empregadores são obstáculos ante a inclusão social das pessoas com deficiência auditiva no ambiente organizacional”. Tendo isso em vista, que tipo de ações poderiam contribuir efetivamente para a inclusão do surdo no mercado de trabalho?

2 Retorne para os palpites que você escreveu antes de ler este tópico sobre possíveis dificuldades que o surdo enfrenta no seu dia a dia. Hoje, você responderia indicando as mesmas situações? Você acessou dificuldades aqui neste livro, sobre as quais nunca havia pensando? Quais foram?

3 Depois de ter lido esse tópico, na sua opinião, as pessoas surdas são...

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4

PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE

AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Nunca se pode concordar em rastejar, quando se sente ímpeto de voar.

Helen Keller

Como você pôde observar no decorrer da leitura deste livro, o entorno da criança surda exerce influências no desenvolvimento da sua linguagem e seus pais desempenham importante função nesse contexto. Dessa forma, se levarmos em consideração a perspectiva de Sacks (1998 apud SOLIA; SILVA, 2017), não olharemos mais para a surdez como uma deficiência, mas como uma diferença linguística e cultural. Entretanto, isso não significa que a pessoa surda não necessite de tratamentos de saúde. Outrossim, os sistemas educacionais e de saúde necessitam disponibilizar meios para concretizar a educação bilíngue – garantida por lei – para este público (SOLIA; SILVA, 2017).

Desse modo, os profissionais da saúde e os professores são os profissionais que costumam atender aos surdos, e poderiam contribuir para que o envolvimento dos pais se intensifique na vida da criança surda. Então, cabe a esses profissionais instigar os pais a ampliarem seus conhecimentos sobre a condição de seus filhos. Esses profissionais ainda precisam atender aos surdos e suas famílias, permanecendo atentos às demandas específicas dos pacientes que requerem atenção especial. Vale ainda esclarecer que quando os pais se envolvem mais no(s) tratamento(s) de seus filhos, e se comunicam melhor com eles, estão contribuindo muito mais para o progresso da criança do que os pais que não participam do processo (FIGUEIREDO; GIL, 2013).

Contudo, a surdez não acomete apenas crianças, por isso o Brasil dispõe de políticas públicas que cada vez mais procuram implementar melhorias na saúde e na educação para todas as pessoas, incluindo as pessoas com deficiências (SOLIA; SILVA, 2017) e pessoas das mais variadas faixas etárias. Existem tratamentos direcionados às pessoas surdas, mesmo na fase adulta, ou na velhice, tais como: o uso de aparelho de amplificação sonora (aparelho auditivo), implante coclear, entre outros (FRANCELIN; MOTTI; MORITA, 2010).

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Com o envelhecimento, a audição pode ficar comprometida e com isso surge a necessidade de estudar os casos de surdez em idosos com maior atenção. Para o uso de novos aparelhos auditivos e para que as pessoas surdas com mais idade possam continuar desenvolvendo suas atividades cotidianas, devemos lembrar que os casos de surdez entre os idosos apresentam variações. Ou seja, uns perdem mais audição e outros menos, conquanto, cada situação deve ser avaliada separadamente. O uso de próteses auditivas melhora consideravelmente a audição na pessoa surda e, com isso, melhora a participação em atividades sociais e de interação. Também há melhoras no aspecto psicológico, como por exemplo, o aumento da autoestima do deficiente auditivo (LUZ; GHIRINGHELLI; IORIO, 2018).

Por conseguinte, a proposta desse tópico é lhe fornecer noções sobre alguns tratamentos e intervenções relacionadas com a deficiência auditiva, bem como apresentar resumidamente os profissionais que costumam atender aos deficientes auditivos.

ESTUDOS FUTUROS

Você terá a oportunidade de aprender educação bilíngue no próximo tópico desta unidade e poderá aprofundar seus conhecimentos sobre ela na Unidade 3. Bons estudos!

2 OS PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AOS DEFICIENTES AUDITIVOS

O deficiente auditivo deve sentir a importância de aprender e aprimorar a sua comunicação, e para isso precisa contar com profissionais – tanto da saúde quanto da educação – que possam despertar nele a motivação para tal, e que consigam orientá-lo (RIBEIRO; FIGUEIREDO; ROSSI-BARBOSA, 2014).

Por vezes, o deficiente auditivo é atendido por algum profissional da saúde ou da educação, de forma individual, e em outras situações, é uma equipe multiprofissional ou interdisciplinar que lhe presta atendimento.

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TÓPICO 4 | PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

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NOTA

Equipe multiprofissional. O trabalho em equipe multidisciplinar consiste numa forma especial de organização, que visa, principalmente, à ajuda mútua entre profissionais de uma mesma área, no caso da Psicologia, a área de saúde.

FONTE: Disponível em: <https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/psicologia/equipe-multiprofissional/12319>. Acesso em: 24 maio 2018.

Veja a lista de profissionais que podem integrar as equipes que atendem aos deficientes auditivos ou que trabalham sozinhos no atendimento a eles:

• Assistente social • Enfermeiro• Fonoaudiólogo• Geneticista• Médico neurologista• Médico neuropediatra• Médico otorrinolaringologista • Médico pediatra • Neonatologista• Professor e profissionais da educação• Psicólogo

Na próxima seção, você irá aprender um pouco sobre dispositivos eletrônicos que são utilizados e aliados ao tratamento da deficiência auditiva. Na sequência, irá verificar acerca do papel do fonoaudiólogo, do psicólogo e dos profissionais da saúde no atendimento ao deficiente auditivo.

3 TRATAMENTOS

Na deficiência auditiva de grau severo ou profundo, a criança não consegue perceber qualquer som da fala na conversação normal, o que impossibilita o desenvolvimento espontâneo de fala e linguagem, gerando problemas graves de fala, além de dificuldade de comunicação em grupo, ou na presença de ruído. Essas habilidades podem ser desenvolvidas por meio do treinamento extensivo e amplificação sonora, dependendo da idade em que for iniciada a intervenção (FIGUEIREDO; GIL, 2013).

O uso de dispositivos eletrônicos, tanto um AASI como um IC podem oferecer maior audibilidade para a criança e um melhor desenvolvimento das habilidades de comunicação, ou seja, os dispositivos eletrônicos são muito

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

eficientes para o ganho de audição. Não são somente as pessoas surdas que ganham com isso, mas também as pessoas ao seu redor, bem como seus familiares, que poderão interpretar e compreender melhor o sujeito surdo (FIGUEIREDO; GIL, 2013).

Como você já estudou, no que tange ao diagnóstico, quanto antes for descoberta a surdez na criança melhores resultados ela terá no tratamento do desempenho da fala e consequentemente melhor vínculo com a sociedade com a qual interage. Assim, reiteramos que o diagnóstico precisa ocorrer antes dos seis meses de vida, para se obter melhor intervenção e prognóstico, garantindo, assim, o melhor aproveitamento do potencial auditivo da criança. Além disso, não podemos esquecer que as expectativas dos familiares, o grau de envolvimento com o tratamento e os aspectos relativos às condições socioeconômicas e culturais interferem no uso efetivo do aparelho auditivo ou implante coclear, e consequentemente, no prognóstico (MIGUEL; NOVAES, 2013).

FIGURA 11 – EXEMPLOS DE IC E AASI

ICImplante Coclear

AASIAparelho de Amplificação

Sonora Individual

FONTES: IC – Disponível em: <https://saude.abril.com.br/bem-estar/uma-lista-de-musicas-para-pessoas-com-implante-coclear/>; AASI – Disponível em: <https://fissuraeaudicao.wordpress.com/adaptacao-de-aasi/selecao-do-aasi/>. Acesso em: 25 maio 2018.

Bittencourt et al. (2012) fizeram um estudo comparativo entre o implante coclear (IC) e o aparelho de amplificação sonora individual (AASI). O AASI traz grande benefício para os casos de perda severa de audição, porém existem situações em que o IC traz melhores resultados. Cada caso deve ser avaliado por um especialista para se recorrer à melhor alternativa de tratamento.

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TÓPICO 4 | PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

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QUADRO 1 - IC x AASI

IC(Implante Coclear)

AASI(Aparelho de Amplificação

Sonora Individual)

• Atua diretamente no nervo sensorial auditivo desenvolvendo melhores estímulos ao ouvido da pessoa com surdez.

• É direcionado aos casos mais graves.• Tem propiciado benefícios notáveis

no desenvolvimento linguístico, na percepção dos sons ambientais, na fala, na aprendizagem, na afetividade, e no convívio social.

• Pode ser utilizado por crianças a partir de dois anos de idade.

• Tem sido considerado o dispositivo tecnológico mais efetivo para o tratamento da surdez neurossensorial severa à profunda.

• A expressão verbal (fala) se deu em grande parte com sucesso em pessoas surdas com esse implante (BITTENCOURT et al., 2012).

• Tem sido recomendado para pessoas com surdez leve.

• Crianças com surdez leve, que passam a usar o AASI, apresentam melhoras em sua oralidade e na audição (BITTENCOURT et al., 2012).

• É salutar para se obter sucesso no tratamento da pessoa com surdez, e para que isso aconteça é preciso haver monitoramento dos pais ou responsáveis (MIGUEL; NOVAES, 2013).

FONTE: Os autores

A decisão por qual tecnologia será utilizada é tomada mediante alguns critérios, e muitas vezes é realizada em conjunto por diferentes profissionais da equipe multiprofissional. Luz, Ghiringhelli e Iorio (2018, p. 6) explicam que:

[...] é extremamente importante que o clínico utilize, além dos exames para avaliação da audição, instrumentos para verificar as necessidades auditivas e não auditivas (problemas visuais, cognitivos, psicológicos, entre outros) dos pacientes com deficiência auditiva. Tal avaliação serve de suporte para a escolha da tecnologia, seleção e regulagem das características eletroacústicas, algoritmos e recursos necessários a cada caso, bem como para mensurar a eficácia da intervenção, ou seja, a avaliação de resultados e necessidade de novas condutas.

Além do mais, é fundamental que a família do surdo esteja engajada no processo de uso do AASI (Aparelho de Amplificação Sonora Individual). A boa notícia é que os pais têm acompanhado – em sua maioria – esse processo de adaptação do uso do AASI em terapias fonoaudiológicas dos seus filhos surdos (MIGUEL; NOVAES, 2013).

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

A presença da família permitirá um melhor resultado no tratamento fonoaudiológico. Felizmente, a aproximação dos familiares para com a criança com surdez é – na maioria das vezes – efetiva, porém muitos pais acompanham o tratamento, mas não seguem as orientações do fonoaudiólogo (exemplo: a criança deixa de usar o aparelho auditivo em casa). A política pública já trabalha junto às famílias dos surdos com estímulos ao acolhimento de seus filhos no processo de reabilitação da fala e da comunicação escrita (MIGUEL; NOVAES, 2013).

Nos dias de hoje percebe-se a presença da mãe, em grande parte do seguimento das terapias. Um dos grandes motivos apresentados pelos pais é de que a figura masculina da família trabalha fora e não dispõe de tempo para levar/acompanhar seu filho surdo à clínica. Cabe ao profissional da saúde ou da educação, procurar inserir o pai no andamento das consultas fonoaudiológicas e psicológicas dos seus filhos surdos (MIGUEL; NOVAES, 2013).

DICAS

Cabe lembrar da importância do uso do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) e do implante Coclear (IC), que devem ter seu uso monitorado.

Para saber mais sobre o implante coclear, veja o vídeo "Dicas da Fono – Implante Coclear: o que você precisa saber!" Acesse: <https://www.youtube.com/watch?v=aQYrNGqBVWo>. O vídeo tem duração de apenas cinco minutos e fala a respeito dessa tecnologia para pessoas com deficiência auditiva.

Até aqui, enfocamos o tratamento de crianças surdas, mas como já vimos, há jovens, adultos e idosos que também aderem aos tratamentos disponíveis. De modo geral, o surdo tende muitas vezes a se isolar, se irritar, ter raiva, sentir-se triste, ter ansiedade, entre outros, por motivo da sua limitação. O uso de prótese auditiva nesses casos vai ajudar o surdo a ter maior estímulo no contato com as pessoas que se utilizam da língua falada. Além disso, o uso de próteses auditivas melhora a acústica da audição, consequentemente melhorando a atenção e o acesso ao aprendizado (LUZ; GHIRINGHELLI; IORIO, 2018).

Como você viu no começo desta unidade, a velhice pode estar associada com a perda auditiva. A população idosa no mundo está crescendo tanto em países desenvolvidos como em países em desenvolvimento. No ano de 2015, 12,5% da população era idosa. Estimativas indicam que até a metade do século esse percentual passará para 30%. A expectativa média de vida também tem crescido acentuadamente no país. Conforme previsões da Organização Mundial de Saúde, o Brasil será o sexto país do mundo em número de idosos até 2025 (LUZ; GHIRINGHELLI; IORIO, 2018).

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TÓPICO 4 | PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

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Os idosos têm maior propensão a deficiências físicas e mentais e as principais delas são a perda gradativa da visão e da audição. O aumento dessas deficiências pode ser agravado pela falta de incentivos públicos ao tratamento precoce da surdez. Prova disto é o aumento de idosos com deficiência auditiva (CRUZ et al., 2013).

Por outro lado, temos a pouca procura pelos serviços públicos oferecidos ao idoso com surdez. Isto pela falta de compreensão no que tange ao tratamento precoce ou pelo simples fato de acharem que não fará diferença a procura pelo atendimento fonoaudiológico (CRUZ et al., 2013). Na opinião de Cruz et al. (2013), o Brasil é carente em serviços públicos adequados ao tratamento da surdez. Francelin, Motti e Morita (2010) expressam que em nosso país a situação de pobreza é muito grande e, além disso, nossos governantes não dispõem de políticas públicas que possam reverter a situação crítica no atendimento à saúde.

Algumas instituições médicas, como as Unidades Básicas de Saúde e Unidades de Saúde da Família, apresentam formas de tratamento que são importantes ao idoso surdo. Outro fator que tende a aproximar as famílias é a localização dos postos de saúde, sendo que, quanto mais próximo de suas casas maior a adesão aos tratamentos. Vale salientar que em idosos o tratamento é mais difícil, por motivo da idade e os problemas terem sidos agravados ao longo do tempo (CRUZ et al., 2013).

A deficiência auditiva pode agravar mudanças cognitivas resultantes do envelhecimento. Luz, Ghiringhelli e Iorio (2018, p. 7) realizaram uma pesquisa sobre a restrição de participação em atividades diárias por idosos, novos usuários de próteses auditivas. Também investigaram processos cognitivos desses idosos, e constataram que:

Os idosos com deficiência auditiva apresentaram redução da autopercepção de restrições de participação, com a estimulação acústica por meio das próteses auditivas, tanto com relação ao aspecto social, quanto ao emocional. Não houve relação entre o gênero e a restrição de participação em atividades de vida diária.Os idosos com perda auditiva de grau moderadamente severo apresentaram maior autopercepção das restrições de participação em atividades de vida diária, determinada pelos aspectos sociais e situacionais, bem como pior desempenho em tarefas que envolveram os processos cognitivos de orientação, atenção e cálculo e de linguagem, quando em comparação aos idosos com perdas auditivas de menor severidade.A adaptação de próteses auditivas promoveu melhora nos processos cognitivos de orientação, memória imediata, atenção e cálculo, evocação e linguagem.

Quanto ao uso do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI), Cruz et al. (2013) destacam alguns motivos pelos quais os idosos não se adaptam a ele:

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

• não percepção de melhora;• crença de que o aparelho é desnecessário;• quebra do aparelho;• falta de orientação adequada para o seu uso;• dificuldade de manuseio do equipamento, em função do pequeno tamanho

das próteses auditivas, sobretudo considerando-se a presença frequente de alterações motoras finas em alguns idosos.

É lamentável que tantos idosos deixem de usar o AASI, afinal, ele pode contribuir na melhoria da fala, da comunicação de modo geral, e em consequência oportuniza que o idoso tenha mais condições de relacionar-se com as pessoas do seu entorno. Outro possível fator que dificulta o acesso ao AASI, entre os idosos, é a reduzida procura deles pelo atendimento público de saúde. Supostamente porque imaginam que terão dificuldades de conseguir atendimento no SUS devido à burocracia do programa. Além disso, o idoso pode deduzir que terá pouca ajuda caso procure um especialista relacionado à surdez, achando, ainda, que o uso de aparelho auditivo pouca diferença fará em sua vida (CRUZ et al., 2013).

É válido recordar que os países em desenvolvimento possuem o maior índice de deficientes auditivos (dois terços da população mundial), isto porque as condições nesses países requerem atenção voltada à saúde e à educação. A situação financeira da pessoa surda também cria muitas barreiras (FRANCELIN; MOTTI; MORITA, 2010).

As próximas seções trazem indícios do papel de três profissionais que fazem parte do tratamento da deficiência auditiva: os psicólogos e os fonoaudiólogos, bem como o papel do profissional da educação frente aos educandos com deficiência auditiva.

4 PSICÓLOGOS

De acordo com Yamada e Bevilacqua (2005), o papel do psicólogo numa equipe interdisciplinar para a reabilitação de pessoas com deficiência auditiva é realizado por meio de uma atuação constantemente voltada aos sentimentos do paciente, englobando ainda a relação familiar e acompanhamento das modificações que ocorrem na vida do paciente e de sua família durante o processo de IC (implante coclear). Por vezes, o trabalho do psicólogo se volta, também, aos anseios e angústias da equipe multiprofissional. Mais especificamente com o paciente, Yamada e Bevilacqua (2005) destacam que o papel do psicólogo abrange as seguintes etapas:

1) Estudo de caso e avaliação psicológica: o psicólogo averigua se o paciente está em condições psicológicas de passar pela cirurgia.

2) Preparação pré-cirúrgica: é composta pelo processo de tomada de decisão e pela internação:

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TÓPICO 4 | PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

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2.1) Tomada de decisão: quando se define se o paciente será submetido ao IC ou não. Pode ser uma fase conflitiva para o paciente e sua família. Os diálogos com o psicólogo costumam girar em torno das possibilidades de uma cirurgia e do aspecto visível da unidade externa do IC. Quando se trata de uma criança, o psicólogo geralmente acrescenta o uso de estratégias lúdicas, utilizando bonecas ou brinquedos concernentes ao âmbito hospitalar, para que a criança vá se familiarizando com essa realidade. Às vezes, ela pode manipular materiais reais ou réplicas em forma de brinquedo de instrumentos, como estetoscópio, seringas, gaze etc. Essas medidas são empregadas já que a criança tende a passar por um processo cirúrgico que vem repleto de circunstâncias que até então eram desconhecidas por ela. Pessoas desconhecidas, profissionais da saúde de diferentes áreas, injeções, circulação em locais que ela ainda não conhece, somados a procedimentos dolorosos, comumente acarretam sentimentos e reações de medo e insegurança por parte da criança. Assim, com o psicólogo, a criança tem a possibilidade de ir se ambientando com as rotinas da área da saúde, podendo, inclusive, fazer dramatizações de partes do processo cirúrgico. Além do mais, esse procedimento médico requer um corte de cabelo específico, então é importante que criança seja preparada e esteja sabendo de tudo o que envolverá a cirurgia.

2.2) Internação: muitas vezes é a fase em que se fazem presentes a ansiedade, o medo, a angústia, as preocupações. Desse modo, o psicólogo escuta, presta acolhimento, focalizando os sentimentos do paciente/da família. Ele também pode trabalhar com o intento de desmistificar as fantasias sobre os procedimentos e sobre as expectativas do pós-cirúrgico. O psicólogo ainda pode acompanhar o paciente no momento da internação, visando mantê-lo informado dos acontecimentos que o cercam e estabelecer um novo contato antes da cirurgia, na sala de pré-operatório, objetivando tranquilizá-lo.

3) Acompanhamento pós-cirúrgico, na internação, nas primeiras ativações do implante coclear: nesse período, o psicólogo objetiva auxiliar no processo de recuperação do paciente. Assim, muitas vezes emergem verbalizações e sentimentos do paciente e o psicólogo faz suas intervenções atreladas a eles. Em geral, as questões que eclodem estão relacionadas a estes aspectos:

• vergonha por estar com uma parte da cabeça raspada;• conflitos com sua imagem corporal no relacionamento com o outro;• a saída do ambiente rotineiro para a internação – o distanciamento da família

(saudades, por exemplo) e do trabalho; • a dinâmica da deficiência auditiva em sua vida e/ou a vivência familiar, que

apresentam necessidade de elaboração; • a alta, priorizando-se orientações acerca do retorno ao cotidiano,

preparando o paciente para uma nova etapa, trabalhando com as angústias e expectativas de sua volta ao seu ambiente e atividades rotineiras (YAMADA; BEVILACQUA, 2005).

Ainda para Yamada e Bevilacqua (2005), invariavelmente, o psicólogo irá atentar para as expectativas e atitudes do paciente e da família, com vistas

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

a esclarecer algumas esferas da dinâmica limite-possibilidade. Quando se trata de uma criança, comumente o trabalho do psicólogo é realizado utilizando brinquedos, objetos lúdicos que remetem o contexto hospitalar; solicitando que desenhos sejam feitos pela criança, agora com a intenção de possibilitar que a criança vivencie e elabore sua situação (YAMADA; BEVILACQUA, 2005).

Vale destacar que as primeiras ativações do IC acontecem até mais ou menos seis meses após a cirurgia. Assim, começa a etapa de adaptação do IC propriamente dita – tanto para o paciente, quanto para a família. No princípio, costumam ocorrer momentos repletos de emoção, pois é só a partir dessa etapa que a pessoa passa a captar sons. Então ela é apresentada a um mundo totalmente novo: o mundo dos barulhos, ruídos, sons de todos os tipos. Isso pode gerar sensações agradáveis ou perturbadoras (YAMADA; BEVILACQUA, 2005).

Assim, sentimentos confusos e ambivalentes tendem a eclodir, levando a pessoa a sentir angústia, pois suas expectativas sobre o que é ouvir são confrontadas com a realidade. O psicólogo é indispensável nestes momentos. Quando se trata de uma criança, a propensão à ansiedade e angústia é ainda maior (para ela e sua família), uma vez que a criança pode vir a recusar o uso da parte externa do IC. Vale lembrar que, somado a isto, ainda estão as expectativas da família com a fala da criança. Nesse período, sugere-se que além do atendimento individual, também seja associado o trabalho terapêutico de grupo (para paciente e família) (YAMADA; BEVILACQUA, 2005).

4) Acompanhamento na reabilitação: inicia após a fase de adaptação ao IC,

quando o psicólogo irá trabalhar com as demandas trazidas pelo paciente e sua família, ou seja, as particularidades de cada caso.

5 FONOAUDIÓLOGOS

Por volta dos anos 1960, aqui no Brasil a fonoaudiologia começou a ser ensinada. O objetivo desse estudo era aliar o tratamento fonoaudiológico para melhorar a comunicação, sendo a surdez vista como um problema do organismo a ser curado. Há tempos atrás, o ensino de fonoaudiologia era apenas direcionado aos problemas e distorções da comunicação. Infelizmente ainda hoje existem tratamentos fonoaudiológicos pautados na ideia de que a surdez é uma deficiência e que não existe tratamento. Nesse caso, o paciente surdo é tratado para se comunicar apenas com gestos. Na década de 1990, alguns fonoaudiólogos reconheceram a surdez como uma diferença e apoiaram o ensino da língua de sinais. Nesse sentido, pensou-se em utilizar uma proposta metodológica bilíngue, por meio da qual o surdo apreende a Libras e a Língua Portuguesa simultaneamente. Nessa proposta, as clínicas fonoaudiológicas tornam-se instituições dialógicas (têm o diálogo na proposta de ensinar) (MARIANI et al., 2016).

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TÓPICO 4 | PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

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Assim, hoje o fonoaudiólogo precisa apresentar e explicar aos pais das crianças com surdez o curso do tratamento da deficiência auditiva e as opções disponíveis. Isso pode incluir o uso do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) para o desenvolvimento oral e auditivo, bem como quais outros benefícios poderão ser obtidos com o uso do equipamento (MIGUEL; NOVAES, 2013). A família participa da decisão sobre o tratamento fonoaudiológico para o seu filho surdo, de acordo com o seu histórico e nível de surdez (DUARTE; BRAZOROTTO, 2009).

Para Mariani et al. (2016), o fonoaudiólogo também precisa apoiar a família e o paciente surdo a apreender tanto a língua de sinais quanto a língua portuguesa. O ideal é que este possa frequentar instituições onde possa estudar com prioridade a Libras. Com apoio do fonoaudiólogo, o surdo terá maior motivação e seu caminho para o estudo da língua portuguesa estará mais próximo de acontecer. Ao participar de estudos bilíngues (língua de sinais e língua portuguesa), o surdo terá a capacidade de:

• expressar suas ideias em textos;• comunicar-se por meio da língua de sinais e oralmente.

O ensino bilíngue é um enorme desafio para o Brasil, especialmente no interior, por não contarem com profissionais capacitados (tanto na área da educação como na área da saúde). Apesar desse problema social no Brasil é pertinente lembrar que a Constituição Nacional Brasileira assegura que a educação e a saúde são direitos de todos (SOLIA; SILVA, 2017).

ATENCAO

Os pais da pessoa surda devem ser informados sobre a metodologia a ser ensinada no tratamento, ressaltando que a língua de sinais deve ser aprendida precocemente para depois o surdo apropriar-se da língua portuguesa. A partir de atividades dialógicas, o surdo terá como primeira língua a Língua de Sinais para interação imediata na sociedade (MARIANI et al., 2016).

ESTUDOS FUTUROS

O próximo tópico irá aprofundar essa questão da aprendizagem de Libras e da língua portuguesa. Lembre-se de que na unidade três você também aprenderá mais sobre escolas bilíngues.

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

6 PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO

Como você viu, a pessoa surda precisa aprender duas línguas. Assim, ela precisará contar com professores, E Esses têm a evidente missão de ensinar a Libras e a língua portuguesa, sem falar dos conteúdos que fazem parte do currículo da educação básica até a superior (dependendo do grau de escolaridade que o surdo quiser conquistar). Mas há outros ensinamentos que cabem ao profissional da educação, como você verá nos parágrafos que seguem.

Leitura e escrita ocupam papéis centrais na vida das pessoas que vivem em sociedades grafocêntricas como a nossa, isto é, que é centrada na escrita. Afinal de contas, os signos linguísticos (orais e escritos) se tornam o meio básico para dominar e dirigir a construção das funções psíquicas superiores. Sabe-se ainda que atualmente a maioria das informações podem ser apreendidas através da leitura e da escrita. Nos primeiros anos de vida, a criança precisa ter um acompanhamento mais atencioso no tocante a sua fala, visto que esta poderá sofrer prejuízos futuros para conciliar a sua oralidade. O uso do lúdico, o apoio de terceiros e da família são itens importantes no processo de aprendizagem da língua escrita (DUARTE; BRAZOROTTO, 2009).

O processo de ensino-aprendizagem deve considerar os conhecimentos que a criança surda já possui e ser elogiada por isso. Nesse processo, o surdo sentirá que é competente e habilitado para vivenciar novas experiências (RIBEIRO; FIGUEIREDO; ROSSI-BARBOSA, 2014). Por motivo de suas limitações, a criança surda encontra dificuldades para apreender a correta colocação da palavra falada e escrita. Para conseguir estabelecer caminhos entre a linguagem oral e escrita, a criança precisa de recursos variados (tecnológicos, por exemplo) e atenção específica e individual (DUARTE; BRAZOROTTO, 2009).

O papel do pedagogo é muito importante, pois será este profissional que colocará em prática com maior ênfase as recomendações do fonoaudiólogo para aquisição da escrita. É importante destacar o importante papel do professor, pois será ele que ficará grande parte do tempo ensinando a criança com surdez a assimilar a escrita (DUARTE; BRAZOROTTO, 2009).

ESTUDOS FUTUROS

Não podemos nos esquecer de que a criança com surdez poderá ter menor desenvolvimento escrito em consideração à criança que faz uso da língua falada (DUARTE; BRAZOROTTO, 2009). No próximo tópico, você acessará as justificativas para tal.

É preciso ter paciência no processo de ensino da linguagem escrita para a criança surda, pois sabemos que ela possui limitações. Também devem ser

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TÓPICO 4 | PROFISSIONAIS QUE ATENDEM AO DEFICIENTE AUDITIVO: TRATAMENTO E INTERVENÇÕES

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considerados os níveis de aprendizagem a que a criança tem acesso (qualidade do ensino, entre outros) (DUARTE; BRAZOROTTO, 2009).

Além desses conteúdos escolarizados em nossa sociedade, o surdo pode também ser ajudado no seu autocuidado, ou seja, é muito importante que ele saiba os cuidados que deve ter, zelar por sua saúde e educação e que com isso terá uma melhor qualidade de vida (SOLIA; SILVA, 2017).

As ações de autocuidado constituem a prática de atividades que os indivíduos desempenham de forma deliberada em seu próprio benefício com o propósito de manter a vida, a saúde e o bem-estar. Essas ações são voluntárias e intencionais, envolvem a tomada de decisões, e têm o propósito de contribuir de forma específica para a integridade estrutural, o funcionamento e o desenvolvimento humano. Constituem a capacidade humana ou o poder de engajar-se no autocuidado. Essas ações afetadas por fatores básicos, tais como idade, sexo, estado de desenvolvimento e de saúde, orientação sociocultural, fatores do sistema de atendimento à saúde − modalidades de diagnóstico e de tratamento, fatores familiares, padrões da vida, como por exemplo, engajamento regular em atividades, fatores ambientais, adequação e disponibilidade de recursos (SOLIA; SILVA, 2017, p. 155).

As diferenças locais e socioculturais irão definir quão fácil – ou não – será a adesão ao autocuidado. O autocuidado precisa partir da pessoa surda e não como imposição do sistema. O surdo precisa entender o que o leva a cuidar de si, quais serão os benefícios que ele terá em sua vida. Ao cuidar de si, o surdo tende a não depender de outra pessoa para ajudá-lo, ele buscará a sua autonomia. Com isso, o dia a dia da pessoa com surdez será mais produtivo, ou seja, ela sentirá maior capacidade para enfrentar os desafios da sua rotina diária e ainda se sentindo útil no mundo em que vive (SOLIA; SILVA, 2017).

O objetivo da educação em saúde é prevenir doenças e promover a saúde, por meio de saberes devidamente orientados, onde o conhecimento científico produzido deve atingir o cotidiano das pessoas. Deve criar circunstâncias favoráveis às reflexões sobre a saúde do indivíduo, voltadas para as práticas do cuidado, as mudanças de comportamento potencialmente prejudiciais à saúde, a aquisição de hábitos favoráveis ao bem comum e à saúde pessoal (RIBEIRO; FIGUEIREDO; ROSSI-BARBOSA, 2014, p. 1322).

Em suma, o papel do professor abrange o ensinamento das línguas (libras e portuguesa), dos conteúdos curriculares e orientações voltadas à saúde, ao cuidado de si. Logo, ele ocupa um papel de grande importância, pois nas condições de verdadeira aprendizagem, os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo, que não apenas ensina o conteúdo, mas vai além, ensina a pensar certo. Assim, deve-se reconhecer que a educação para a saúde deve se dar de maneira contextualizada, partindo de cada sujeito e sua história, do seu espaço e tempo, valorizando a experiência sociocultural de cada pessoa (SOLIA; SILVA, 2017).

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• A participação dos pais é importante durante o processo terapêutico da criança surda, que deriva no sucesso ou no insucesso do tratamento. Infelizmente nem todos os pais participam ativamente das terapias que seus filhos surdos fazem parte, não têm o envolvimento ideal para que o resultado do tratamento seja alcançado com sucesso (FIGUEIREDO; GIL, 2013).

• O IC e o AASI são duas opções de tratamento para os deficientes auditivos.

• O IC coloca o paciente e sua família diante de uma fase de readaptação para uma nova realidade.

• A decisão pelo tratamento é tomada, muitas vezes, pela equipe multiprofissional em saúde, em conjunto com a família ou paciente. O trabalho em equipe é fundamental e o paciente deve ser considerado na sua totalidade, aspecto que deve estar presente especialmente na construção da atitude interdisciplinar de todos os profissionais que lidam com ele (YAMADA; BEVILACQUA, 2005).

• A atuação do psicólogo junto ao paciente é fundamental em todas as etapas do programa de IC, pois o ajuda a elaborar suas questões emocionais, compreendendo seu mundo e dando-lhe suporte durante todo o processo do programa (YAMADA; BEVILACQUA, 2005).

• A população idosa está em ascensão e com isso maiores problemas de saúde pública acontecerão, pois com a velhice, os problemas fisiológicos tendem a aumentar (LUZ; GHIRINGHELLI; IORIO, 2018).

• Os profissionais que comumente atendem ao deficiente auditivo são: assistente social, enfermeiro, fonoaudiólogo, geneticista, médico neurologista, médico neuropediatra, médico otorrinolaringologista, médico pediatra, neonatologista, psicólogo, professor e outros profissionais da educação.

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1 Como você pôde ver, há pelo menos doze profissões que fazem parte das propostas de tratamento da deficiência auditiva. Esse tópico pormenorizou apenas três delas, que foram as mais recorrentes nas pesquisas encontradas nas bases de dados eletrônicas. Assim, que tal fazer uma pesquisa na internet e completar o quadro a seguir?

AUTOATIVIDADE

PROFISSIONALO QUE FAZ ESSE

PROFISSIONAL EM GERAL

O QUE FAZ ESSE PROFISSIONAL

ESPECIFICAMENTE COM OS SURDOS/

DEFICIENTES AUDITIVOS

Assistente social Enfermeiro

Fonoaudiólogo Geneticista

Médico neurologistaMédico neuropediatraMédico oftalmologista

Médico otorrinolaringologista

Médico pediatraProfessor

Médico Neonatologista

PsicólogoRadiologista

Psicopedagogo

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TÓPICO 5

ESPECIFICIDADES DA LINGUAGEM DOS

SURDOS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Podemos fazer tudo que quisermos se formos perseverantes.

Helen Keller

Você já ouviu falar na norte-americana, Helen Adams Keller? Ela foi a primeira pessoa surda e cega a concluir um bacharelado em uma universidade. Viveu entre 1880 e 1968, e surpreendeu a sociedade de sua época, tornando-se uma escritora, conferencista e ativista social. Talvez você esteja se perguntando: Como ela conseguiu fazer tudo isso, sendo privada de dois sentidos (visão e audição)? Como ela fez para estudar, sendo que presumivelmente não podia ver/ler/escrever ou ouvir durante as aulas que participava? E como ela fazia para se comunicar com seus colegas de aula? Ou talvez sua imaginação tenha lhe conduzido a imaginá-la atuando como palestrante, sem a possibilidade de ver sua plateia ou de ouvi-la.

FIGURA 12 – HELEN KELLER

FONTE: Disponível em: <https://www.goalcast.com/2017/05/05/top-helen-keller-quotes-inspire-you-never-give-up/>. Acesso em: 7 maio 2018.

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Tradução: "Evitar o perigo não é mais seguro a longo prazo do que a exposição direta. Os medrosos são apanhados com a mesma frequência que os ousados" (Helen Keller).

É neste momento que fica explícito o quanto a linguagem oral ou mesmo os processos de ler e escrever são tão intrínsecos em nossa rotina, que é difícil imaginar como é o dia a dia das pessoas que não têm acesso às mesmas formas de linguagens que as nossas. A linguagem é um processo tão complexo, que faz com que pensemos que o que nos diferencia dos animais é a capacidade de expressar o pensamento, comunicando-nos com nossos semelhantes.

É sobre as peculiaridades da linguagem dos sujeitos surdos, que trata esse tópico.

2 A LINGUAGEM E SUAS ESPECIFICIDADES

Segundo Quadros e Karnopp (2004), ainda não foram observados traços da fala humana no reino animal, nem mesmo indícios de criatividade, raciocínio, entre outros, com a mesma complexidade com que se verifica nos humanos. Muitas habilidades que conhecemos no ser humano raramente encontraremos no mundo animal. Talvez você esteja se perguntando: E os golfinhos? Será que eles não possuem um sistema de comunicação? Ou mesmo os cães, que parecem avisar os cães vizinhos acerca da circulação de pessoas desconhecidas na rua, dando a impressão de que o cachorro da primeira casa da rua emite um alerta que é repassado pelos outros cães até chegar ao último da rua?

De acordo Quadros e Karnopp (2004), ainda não é possível afirmar que

existam habilidades de expressão em situações de fala na comunicação animal, o que encontramos nos animais são comunicações instintivas (que são próprias dos animais – eles nascem com elas) e que não se assemelham à linguagem humana, por não estar tão desenvolvida em fundamentos, e por não ter a capacidade de – por exemplo – emitir opiniões. Afinal, a língua humana possibilita a emissão de falas contendo significados oriundos de reflexão pessoal.

Ainda segundo Quadros e Karnopp (2004), podemos afirmar que a

língua constitui um conjunto de elementos intelectualmente organizados de sinais e/ou sons que não segue regras ou normas; possui estrutura independente, criatividade, deslocamento, dualidade e transmissão cultural. Esse pensamento é descrito em todo o mundo nas mais diversas línguas, que são semelhantes em suas características.

Para Bakhtin (2004), a língua não é transmitida de geração para geração. Ela vai sendo mantida por intermédio da interação social dos interlocutores, configurando assim um incessante processo evolutivo. Esse autor defende que a língua é muito mais ampla do que o sistema de normas (gramaticais, por exemplo) que é convencionado acerca dela. Na visão de Vygotsky (1989), a principal função

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da linguagem é a comunicação, ou seja, a interação social. Para Bakhtin (2003), a língua foi criada por conta da necessidade que as pessoas possuem de se expressarem e exteriorizarem o que pensam.

Diante do exposto até o momento, podemos afirmar que a língua é uma forma de comunicação de elevado grau. Poderiam surgir algumas dúvidas, conforme ilustra Quadros e Karnopp (2004, p. 29): “Como e quando a criança começa a falar? Como a língua começou? Por que a língua começou?” Podemos concluir que essas questões já não nos deixam mais tantas dúvidas nos dias de hoje. Uma explicação mais plausível seria de que o ser humano, para sobreviver, precisa se comunicar com o outro, precisa haver uma cooperação mútua, em que a língua seria uma forma de expressar o pensamento e ideias e intermediar soluções de problemas.

Conforme Quadros e Karnopp (2004), nossos sentimentos e emoções

requerem o uso da linguagem. Exemplificando, temos atualmente o uso em larga escala das redes sociais, que nada mais são do que instrumentos para disseminar nossos pensamentos e opiniões, e dispositivos onde podemos acessar os pensamentos e opiniões de outrem. Há trocas de informações por meio das mensagens emitidas e recebidas pelas redes sociais. As pessoas se comunicam com seus amigos através da internet constituindo o que chamamos de comunicação fática. A linguagem também se manifesta nos diálogos cotidianos com nossos colegas de trabalho, ou familiares, bem como nos poemas escritos ou declamados – imbuídos dos sentimentos despertados nos seus respectivos autores. Estes foram apenas alguns simplórios exemplos de funções da linguagem.

Entretanto, pela privação do sentido da audição, os surdos estão necessariamente excluídos desse processo cultural que se dá por meio da comunicação? Talvez você tenha se lembrado da Libras – a Língua Brasileira de Sinais –, que é utilizada por muitos surdos brasileiros, ou tenha deduzido que os surdos se inserem nos processos comunicacionais por meio da leitura dos lábios, ou dos processos de ler e escrever. Sim, todas estas alternativas fazem parte dos modos de comunicação dos surdos. Contudo, você sabia que eles possuem especificidades na linguagem, seja ela a de libras, ou a de leitura e escrita? Algumas páginas adiante irão elucidar esses questionamentos.

Antes disso, vamos conhecer um pouco sobre uma teoria que atribui ainda outros papéis à linguagem? Para Vygotsky (1989), o pensamento precisa da linguagem para existir, embora muitas pessoas acreditem que primeiro aprendemos a pensar, para depois aprendermos a falar/nos comunicar. Vygotsky (1989) defende justamente o contrário. Ele deduz que pensamentos são formados por palavras, e se a pessoa não conhece um código para comunicar-se, como ela será capaz de pensar sobre algo? Sem acesso à linguagem, o pensamento de uma pessoa se reduziria a imaginar imagens? Ou lembrar-se das imagens que já viu?

Conforme Vygotsky (1989), a relação entre linguagem e pensamento

é processual. É por meio das palavras que o pensamento pode surgir, ou seja,

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as palavras não são necessárias apenas para expressar um pensamento. Elas são essenciais para que o pensamento nasça! O autor ainda afirma que sem a linguagem, a consciência não pode emergir, tampouco a autoconsciência. A consciência é resultado da experiência social, na concepção vygotskyana.

DICAS

Você está com dificuldades para entender que os pensamentos dependem da linguagem para aflorarem? Então, que tal uma “pipoquinha” para tornar essas informações mais palpáveis?

O filme O enigma de Kaspar Hauser (1974), cuja direção é de Werner Herzog, pode ajudá-lo a clarear seu entendimento sobre esse assunto. Ele conta a história real de Kaspar Hauser, um moço de aproximadamente 15 anos que apareceu misteriosamente em Nuremberg, no ano de 1928. As pessoas ficaram atônitas ao encontrá-lo, pois ele não sabia falar, nem andar e seu comportamento não parecia ser de um humano. O filme ajuda a refletir sobre como se articulam linguagem e pensamento no desenvolvimento cognitivo deste jovem, na medida em que ele vai sendo apresentado a um mundo totalmente novo para ele. Tudo indica que o rapaz havia vivido isolado, aprisionado em uma espécie de porão, pois tudo o que ele ia enxergando parecia ser algo totalmente desconhecido para ele.

Talvez, a essas alturas, você esteja torcendo o nariz, pensando então que, para Vygotsky, as pessoas surdas não seriam capazes de pensar. Alto lá! Para Vygotsky (1989), a linguagem não requer necessariamente a utilização de sons. A linguagem de sinais, ou mesmo a leitura dos lábios, também são consideradas linguagens, no caso, por intermédio da interpretação de movimentos. Para ser considerada linguagem, independe a natureza do material que emprega. E é sobre Libras que a próxima seção trata. Vamos lá?

DICAS

Antes de passarmos para reflexões da Libras, que tal dar uma pausa na leitura e procurar na internet algum dos muitos vídeos que mostram Helen Keller discursando publicamente? Ou você pode assistir a algum dos filmes que tratam da biografia dela e de sua brilhante relação com a professora Anne Sulivan.

Você tem a opção de assistir ao filme The Miracle Worker, de 1962, cuja direção é de Arthur Penn, ou The Miracle Worker, versão do ano 2000, quando foi dirigido por Nadia Tass. O título dos filmes foi traduzido como O Milagre de Anne Sullivan.

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DICAS

Se mesmo depois dos filmes persistirem muitas dúvidas sobre a relação entre pensamento e linguagem, ou se você ainda tem dúvidas sobre a existência de linguagem entre os animais, pode elucidá-las com o livro Pensamento e Linguagem, de Vygotsky (1989).

3 A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

Você já deve ter tido contato com informações acerca de Libras em outras disciplinas, ou mesmo nas mídias, porém você já se perguntou se a língua brasileira de sinais possui factualmente todos os critérios linguísticos ao ponto de ser considerada uma língua propriamente dita? Será que por meio dela, uma pessoa consegue gerar uma quantidade infinita de sentenças?

Desde a década de 1960, a quantia de pesquisas sobre linguagem na modalidade visuoespacial aumentou consideravelmente. Há estudos sobre a estrutura, aquisição e funcionamento das línguas, que vêm sendo realizados no Brasil e no exterior.

Há algumas divergências entre os importantes estudos feitos por Whitney, Saussure e Chomsky. Eles questionavam se a linguagem oral e a gestual teriam pontos em comum ou se seriam totalmente diferentes.

DICAS

Você já ouviu falar desses autores? Willian Dwight Whitney nasceu em 1826 e faleceu em 1894. Era um linguista e filólogo americano. Ferdinand de Saussure foi um linguista e filósofo suíço, que viveu entre 1857 e 1913. Avram Noam Chomsky nasceu nos Estados Unidos, em 1928. É um linguista, filósofo e cientista cognitivo.

Você notou que todos eles são linguistas? As pessoas que se dedicam ao estudo e ensino de línguas são chamadas de linguistas.

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DICAS

Quer saber a opinião desses autores sobre as diferenças entre línguas orais e gestuais? Então leia o livro de Quadros e Karnopp (2004), que é considerado referência básica para essa disciplina.

• QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.

De qualquer modo, atualmente está convencionado que a língua de sinais é uma forma linguística legítima de comunicação. Ela não pode ser vista como língua mórbida, utilizada por pessoas que têm alguma anomalia (QUADROS; KARNOPP, 2004). Vale lembrar que a surdez não torna a pessoa um ser com possibilidades a menos ou impossibilitada, mas com possibilidades diferentes. Afinal, o surdo possui condições necessárias ao desenvolvimento e aquisição da linguagem, e requer professores que levem em conta as diferenças culturais e linguísticas do sujeito surdo. Ou seja, ele precisa ter professores que acreditem no potencial dele, ao invés de pessoas que subestimem suas capacidades cognitivas e linguísticas (RODRIGUERO; BORGHI, 2000). Não é por acaso que os títulos dos filmes que trazem a biografia de Hellen Keller foram traduzidos para o português colocando os holofotes sobre o nome da professora dela. É evidente que Hellen precisou se esforçar muito para aprender, mas se ela tivesse tido professores que achassem que ela não tinha capacidade para tanto, dificilmente ela teria forças sozinhas para aprender a falar e fazer tantas conquistas na esfera acadêmica.

Libras é uma língua completa. Considerando que a informação linguística da Libras é obtida pelo sentido da visão e produzida pelas mãos, a língua de sinais passou a ser classificada como língua gestual-visual ou espaço-visual (QUADROS; KARNOPP, 2004).

NOTA

Você sabia que o Brasil possui duas línguas oficiais? A Língua Portuguesa e a Libras!

Apesar de tantos estudos que consolidam a importância da língua de sinais, ainda pairam alguns mitos que colocam em xeque a sua validade. Vamos refletir e desmistificar cada um deles?

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Mito 1 – A língua de sinais não passa de uma combinação de mímicas e gestos, portanto é impossibilitada de expressar conceitos abstratos.

Segundo Quadros e Karnopp (2004), é possível comunicar-se sobre temas abstratos na Libras. Hoje, pode-se falar de sinais sobre qualquer assunto específico (psicologia, política, economia, matemática, física etc.) respeitando sempre as questões regionais do referente. Por muitos anos a ciência tem comprovado que os conceitos abstratos da língua de sinais existem e evoluem, respeitando sempre as peculiaridades de cada país. Isso quer dizer que a língua de sinais consegue exprimir sentimentos tanto quanto os que são expressados na linguagem oral ou escrita.

Mito 2 – A língua de sinais é universal, portanto pode ser usada por todas as pessoas surdas.

Para Quadros e Karnopp (2004), a língua de sinais difere de país para país e até mesmo de região para região dentro de um determinado país. Por exemplo, no Brasil, o sinal manual para “NÃO”, apesar de ser considerado icônico, apresenta um significado completamente diferente na língua de sinais americana.

Para podermos entender melhor a situação de que a língua de sinais é diferente em cada país – ou região – vamos associá-la com a utilização os diversos idiomas do mundo. Nos Estados Unidos da América se fala o idioma inglês, já no Brasil fala-se a língua portuguesa, e no Japão fala-se o idioma japonês e assim sucessivamente nos demais países com seus respectivos idiomas. Diante disso entenderemos que a língua de sinais britânica também difere da língua de sinais brasileira, que difere da japonesa etc.

Todavia, teoricamente a língua de sinais apresenta aspectos comuns em todo o mundo. O que muda é a forma local com que ela é gesticulada. Para você entender melhor, lembre-se de que aqui no Brasil há regionalismos mesmo na língua portuguesa falada. Há gírias e expressões no Rio Grande do Sul que são totalmente diferentes das que circulam nas conversas do sertão nordestino. Essa é uma forma para entender melhor, porque as línguas de sinais são entendidas de formas diferentes pelo mundo afora.

Além do mais, é necessário lembrar que os idiomas falados e a Libras são línguas vivas! Portanto, o significado das palavras vai mudando de acordo com o tempo. Os significados e sentidos das palavras não são estáticos! Passam a ser formações dinâmicas que se transformam à medida que as pessoas se desenvolvem e se modificam, inclusive com as diversificadas formas de como o pensamento funciona (VYGOTSKY, 1989).

Ainda com dúvidas? Que tal ler o trecho a seguir para experienciar as mudanças que a língua sofre com o tempo?

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"Ouviu-se um frolido de sedas, e Aurélia assomou na porta do salão.Trazia nessa noite um vestido de nobreza opala, que lhe assentava

admiravelmente, debuxando como uma luva o formoso busto. Com as rutilações da seda que ondeava ao reflexo das luzes, tornavam-se ainda mais suaves as inflexões harmoniosas do talhe sedutor" (ALENCAR, 2006, p. 57).

Conseguiu perceber que o excerto possui palavras que não são mais utilizadas na língua portuguesa? Trata-se de um pedacinho do romance Senhora, publicado pelo escritor brasileiro José de Alencar, em 1875.

Mito 3 – As línguas de sinais possuem falhas em sua organização gramatical, afinal, são derivadas das línguas orais. Assim, não possuem estrutura própria e são inferiores em relação às línguas orais.

A língua de sinais é uma língua independente da língua falada. A língua de sinais possui uma estrutura tal qual independe das normas exigidas na língua escrita/oral (QUADROS; KARNOPP, 2004). Um fato importante, caro acadêmico, é o de que a língua de sinais não possui uma compilação extensa de normas. Outro fator é a não necessidade de a língua de sinais ter uma forma morfológica ou sintática. Simplesmente a pessoa com surdez a utiliza para comunicar-se eficientemente. Recentes pesquisas confirmam que a língua de sinais não é apenas um conjunto de sinais a serem expressos, mas uma nova modalidade da língua moderna (QUADROS; KARNOPP, 2004).

Mito 4 – A língua de sinais é um sistema fraco de comunicação, com conteúdo reduzido, sendo estética, expressiva e linguisticamente de menor valor, em comparação ao sistema de comunicação oral.

Conforme Quadros e Karnopp (2004), até mesmo alguns autores dão a entender que a língua de sinais é pobre, nos quesitos lexical e gramatical. Contudo, o surdo se expressa também no momento da informalidade – por exemplo – ao contar uma piada, fazer uma brincadeira, expressar seus sentimentos etc. Ao utilizar-se de gestos, a pessoa passa o que está sentindo, de acordo com a sua memória no momento da gesticulação. É claro que existe a falta da pronúncia “correta” da língua falada, entretanto isso não impede que a comunicação se efetive.

Tomamos como exemplo as línguas de sinais dos Estados Unidos e do Canadá. Nesses países, a língua de sinais é retratada como sendo léxica no momento em que é difundida em determinadas situações específicas (esportes, tipografia e impressão, por exemplo). Resumindo, pode-se afirmar que o léxico pode existir na língua de sinais se for trabalhado em situações que exigem tal aplicabilidade. Não podemos esquecer que a língua de sinais é considerada visuoespacial (sinais realizados através de movimentos ou outros recursos linguísticos) e por esse motivo não exige uma adequação formal pormenorizada tal como a língua escrita (QUADROS; KARNOPP, 2004).

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NOTA

Ficou em dúvida quanto ao significado da palavra léxico?

Trata-se do dicionário, ou seja, um conjunto de palavras que fica à disposição daqueles que se comunicam pela fala ou escrita para ampliarem o seu vocabulário, ou procurarem termos desconhecidos para eles.

Mito 5 – As línguas de sinais procedem dos gestos espontâneos dos ouvintes.

Um conceito que vem de longa data é de que os “gestos” não eram aceitos e a pessoa com surdez era obrigada a falar mesmo de forma limitada, não produtiva e, na maioria das vezes, sem significado para o surdo.

Souza e Gediel (2017) esclarecem que os sinais da Libras não são feitos de qualquer jeito, pois são pautados por parâmetros da gramática das Línguas de Sinais. Essa gramática está ligada à forma pela qual os surdos entendem o universo simbólico do qual fazem parte. Assim, atribuem significados conforme os códigos de uma língua espacial visual. Isto é, os sinais precisam ser precisos para a comunicação se processar. Os sinais também influenciam no processo de compreender o mundo que os cerca e das formas como se identificam e são identificados.

Quadros e Karnopp (2004) explicam que os sinais são formados e orientados gramaticalmente a partir dos cinco parâmetros:

• o uso da Configuração de Mão (CM); • da Locação (L);• do Movimento (M); • da Expressão Não Manual (ENM); • da Orientação de Mão (Or).

Portanto, as combinações dessas unidades mínimas são utilizadas tanto na elaboração dos sinais próprios como na construção dos demais sinais nessa língua.

Mito 6 – Já que as línguas de sinais são organizadas espacialmente, certamente estão concentradas no hemisfério direito do cérebro, uma vez que esse hemisfério é responsável pelo processamento de informação espacial. Já as línguas orais estão relacionadas ao hemisfério esquerdo – responsável pela linguagem.

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Quadros e Karnopp (2004) apresentam resultados de pesquisas realizadas com surdos com lesões nos hemisférios direito e esquerdo do cérebro. As pesquisas mostram que aqueles com lesão no hemisfério direito tinham condições de processar todas as informações linguísticas das línguas de sinais, mesmo sendo visuoespaciais. Por outro lado, os surdos com lesão no hemisfério esquerdo tinham condições de processar as informações espaciais não linguísticas, mas não conseguiam lidar com as informações linguísticas. Portanto, tais estudos indicaram que as línguas de sinais são processadas no hemisfério esquerdo, assim como em quaisquer outras línguas. Esse estudo comprova que a linguagem humana independe da modalidade das línguas.

IMPORTANTE

Concluímos então que as línguas de sinais – sob o ponto de vista linguístico – são completas, complexas e possuem uma abstrata estruturação nos diversos níveis de análise.

Na concepção vygotskyana é fundamental que a criança surda aprenda a língua de sinais, e é desnecessário que ela aprenda a linguagem oral de forma mecanizada. É ideal que as crianças aprendam a linguagem desde cedo. A criança surda não pode ser discriminada pela sociedade em que se insere pelo motivo de não poder expressar o seu pensamento na forma linguística. Devemos proporcionar meios viáveis – incluindo-se a língua de sinais – para que ela seja inserida em um mundo mais solidário e que possa compreender as limitações que a surdez implica (RODRIGUERO; BORGHI, 2000).

A língua de sinais deveria ser utilizada mais vezes por pais e professores junto à criança com surdez. No entanto, eles se sentem despreparados para auxiliar na comunicação dessa população específica (ou seja, o surdo), sendo desprezados pela falta de políticas educacionais no Brasil. Uma das provas disto é o desdém pela inclusão do ensino de Libras, que não faz parte do Programa Curricular Nacional Brasileiro (CRATO; CARNIO, 2009).

Ainda assim, com o passar do tempo pequenos avanços têm sido vistos. O aluno com surdez tem tido melhores condições de interagir com os colegas de sala de aula, por conta dos aprendizados da língua de sinais e de outras maneiras de expressar o que pensa. Do mesmo modo, os demais integrantes da sala de aula também vão desenvolvendo as habilidades para receberem as informações advindas dos alunos surdos, de modo que a comunicação entre ouvintes e surdos vá ficando mais clara (SILVA, 2014).

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Resumindo, cada vez mais existe o interesse em explorar as línguas de sinais, que por suas particularidades têm em si características até então desconhecidas nas línguas orais. Essas especificidades abrangem a interação entre a percepção visual e a produção visual (QUADROS; KARNOPP, 2004).

Caro acadêmico, esteja certo de que a língua de sinais é uma língua importante para a pessoa com surdez e que realmente é capaz de levar ao interlocutor a sua mensagem. Qualquer língua humana – com certeza – pode receber contribuições imensas das línguas de sinais, incorporando uma forma nova e útil de se comunicar com o surdo!

A língua de sinais não é a única especificidade na linguagem dos surdos. Você sabia que até mesmo na linguagem escrita eles se expressam de modo muito singular? É o que veremos a seguir.

4 AS ESPECIFICIDADES NA LINGUAGEM ESCRITA DOS SURDOS

A pessoa com surdez enfrenta muitos obstáculos para o seu aprendizado, por exemplo, como a colocação gramatical de suas expressões, que na maioria das vezes não consegue ser entendida pelo interlocutor. A literatura aponta que a competência linguística se encontra prejudicada nos surdos usuários de Libras. Isso pode dificultar a organização de um texto mais elaborado e pode refletir na competência enciclopédica, na organização de ideias e na utilização adequada do vocabulário a ser expresso pela pessoa com surdez. A escrita do surdo costuma apresentar uma sequência que foge dos parâmetros em que se estabelecem sequências textuais estruturadas, coesas e coerentes (RODRIGUES; ABDO; CARNIO, 2012).

Quando o aluno surdo tenta fazer a transposição da Libras para o uso da escrita, ele encontra dificuldades, pois muitas vezes desconhece quais são as normas gramaticais que devem ser empregadas em suas frases. A escrita do surdo pode apresentar sinais de dislexia, problema encontrado em muitas pessoas que não têm o problema da surdez. Além do mais, infelizmente os alunos surdos costumam apresentar baixo rendimento escolar, apesar de frequentarem a escola por um longo período de tempo (ALMEIDA; FILASI; ALMEIDA, 2010).

Essas dificuldades de escrita podem acontecer porque, na maioria das vezes, o surdo aprende primeiro a Libras, e depois vai se inserindo na língua portuguesa. Então ele tende a pensar e a se expressar fazendo maior uso das características da Libras do que língua portuguesa. Assim, ao escrever é mais confortável para ele seguir o mesmo padrão, transpondo as características da Libras para o papel. Um processo similar é observado pelos ouvintes. Estes costumam aprender primeiro a língua falada e depois a escrita. Então, conforme vão iniciando a aprendizagem da escrita, tendem a escrever do mesmo jeito que falam, tendo em vista que a oralidade não possui tantas regras quanto a

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modalidade escrita – que comumente é mais formal, portanto a língua portuguesa normalmente equivale a uma segunda língua para o aluno com deficiência auditiva (ALMEIDA; FILASI; ALMEIDA, 2010).

Como aponta Bakhtin (2003), ao aprender a primeira língua (geralmente isso acontece na infância), a criança realiza uma aprendizagem que ocorre naturalmente, sendo exposta às conversas nos locais em que ela circula. Isto é, nenhuma pessoa aprende sua primeira língua debruçada em dicionários e manuais de gramática. Inicialmente, a língua é aprendida "na prática" em situações reais. Vygotsky (1989) explica que a aprendizagem da escrita não segue o mesmo curso da aprendizagem da fala. A linguagem escrita possui funções linguísticas particulares, que fazem com que ela seja dessemelhante da linguagem oral, seja pela sua função, seja pela sua estrutura. A aprendizagem da língua escrita demanda um alto nível de abstração, pois é isenta de qualidades musicais, expressivas e de entoação características da linguagem oral.

Crato e Carnio (2009) esclarecem que, apesar de ser inquestionável a dificuldade do emprego das flexões dos verbos na escrita de língua portuguesa por alunos surdos, a causa dessa dificuldade ainda é controversa. Será que realmente é interferência da Libras? Ou dificuldade de acesso à língua portuguesa? Ou é fruto de práticas de ensino descontextualizadas?

É preciso levar em conta que os estudantes surdos têm preocupação em não cometerem erros em sua escrita e que, por esse motivo, normalmente escrevem frases simples. Além disso, com certa frequência esses alunos são estimulados a reproduzir modelos frasais fornecidos pelos professores, resultando na produção de frases que atendem aos requisitos morfossintáticos (ou seja, que tem ao mesmo tempo relação com a morfologia e a sintaxe) da língua portuguesa, mas sem criatividade e muitas vezes sem sentido (CRATO; CARNIO, 2009).

Por isso, o professor necessita levar em consideração vários aspectos ao realizar a avalição da escrita de um aluno surdo. É recomendável que mais pesquisas sejam feitas no que se refere à avaliação e às práticas docentes que sejam compatíveis com as necessidades dos surdos, já que o desenvolvimento da escrita é tão dispendioso para eles (RODRIGUES; ABDO; CARNIO, 2012).

Rodrigues, Abdo e Carnio (2012) realizaram um estudo sobre a "Influência do tipo de estímulo visual na produção escrita de surdos sinalizadores sem queixas de alterações na escrita", no qual observaram que alguns aspectos parecem interferir no desempenho da escrita dos alunos com deficiência auditiva, como por exemplo, o grau de perda auditiva, o tipo de escola e de metodologia de ensino aos quais foram submetidos, a língua que usam para se comunicarem, a presença do intérprete ou de professores proficientes em língua de sinais. O resultado da pesquisa delas é que o desempenho dos surdos foi abaixo do esperado para a faixa de escolaridade, tanto no que concerne à competência enciclopédica quanto na linguística. Assim, ficou notório que o conhecimento da língua portuguesa escrita é parcial para tais alunos com deficiência auditiva.

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Algumas possíveis soluções para esse baixo rendimento foram propostas pelas mesmas autoras. Segundo Rodrigues, Abdo e Carnio (2012), pesquisas indicam que os indivíduos surdos são capazes de aprender a utilizar estratégias de referência na língua portuguesa escrita durante a interação com um interlocutor que tenha conhecimentos sólidos sobre esse idioma. Além disso, a produção de escrita desenvolvida pela pessoa com surdez acontece de maneira mais eficaz quando utilizadas imagens no processo de aprendizagem, pois o surdo utiliza mais o canal visual para o seu entendimento. Por fim, o aluno surdo não pode prender-se aos conceitos gramaticais da língua oral, ele precisa comunicar-se e é no campo de planejamento de ideias que essa comunicação acontece. Pode-se realizar um estudo com as crianças surdas trabalhando com imagens não sequenciadas, para que elas desenvolvam sua capacidade mental de organizar suas ideias e revelar o que querem explanar através das suas gesticulações.

Almeida, Filasi e Almeida (2010) acrescentam que o nível de escolaridade, diálogo e interação com pessoas fluentes na língua de sinais influencia no aprimoramento do estudo e aprendizado da escrita pelos surdos. Para que aconteça uma melhor compreensão da mensagem pela pessoa que se utiliza da língua falada, é importante que a escrita realizada pelo surdo tenha um aspecto o mais coeso possível. Os signos utilizados pela pessoa com surdez na escrita são resumidos, tendo como expressão de suas ideias através de palavras-chave que tentam explicar uma situação completa. As autoras explicam que um texto escrito por uma pessoa surda pode não apresentar coesão, mas pode haver uma sequência. Pode existir também encadeamento de fatos, apresentando um seguimento lógico, mesmo não existindo elementos gramaticais seguindo a norma culta.

A pesquisa feita por Almeida, Filasi e Almeida (2010), sobre coesão textual na escrita de adultos surdos usuários da língua de sinais brasileira, constatou que possivelmente a Libras afeta a escrita em língua portuguesa. Os textos produzidos pelos alunos surdos (usuários de Libras) apresentaram coesão textual sequencial e referencial, no entanto estavam prejudicadas, de modo que dificilmente os textos escritos por eles eram compreendidos sem a interação direta entre leitor e escritor. Todavia, o estudo demonstrou que esses sujeitos são capazes de construir produções escritas com sentido e coesão.

Crato e Carnio (2009) redigiram uma pesquisa no que tange à "Análise da flexão verbal de tempo na escrita de surdos sinalizadores". Os dados obtidos mostram que os sujeitos manifestaram dificuldades na flexão verbal de tempo, sendo que a forma nominal do infinitivo preponderou. Os estudantes integrantes de séries mais avançadas demonstraram melhor uso das flexões verbais de tempo, além da aplicação mais presente de outros marcadores de tempo. Contudo, a despeito do tempo considerável que os sujeitos frequentam instituições educacionais, grande parte dos estudantes surdos não soube realizar a flexão verbal de tempo da língua portuguesa de modo apropriado. "Este fato demonstra a necessidade de repensar as práticas de ensino da língua portuguesa, como segunda língua, para que os surdos tenham a oportunidade de apropriar-

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se cada vez mais cedo da escrita e participar ativamente da sociedade" (CRATO; CARNIO, 2009, p. 233).

Guarinello, Massi e Berberian (2007) investigaram a surdez e a linguagem escrita por intermédio de um estudo de caso, com um sujeito no momento inicial da apropriação da escrita. As autoras concluíram que o sujeito começou a empregar a língua escrita com alternâncias e justaposições entre português e Libras. Ainda assim, a escrita passou a ser mais uma possibilidade de expressão para o sujeito, que simultaneamente refletiu e ressignificou a história de seu contato com a linguagem.

5 AS ESPECIFICIDADES NA APRENDIZAGEM DA LEITURA POR PARTE DE ALUNOS SURDOS

Já vimos que o surdo se expressa de modo singular na escrita. Você sabia que o processo de aprendizagem da leitura também é marcado por especificidades por parte do aluno surdo? Vamos saber um pouco sobre elas?

Silva (2014) realizou um estudo sobre o processo de ensino-aprendizagem da leitura em uma turma de alunos surdos, mediados por Libras em suas interações. De acordo com a autora, não basta estar dentro da sala de aula para que o acesso aos eventos de leitura se concretizem. É necessário que o aluno tenha oportunidades de interagir com texto, portanto precisa ter competência comunicativa e noções sobre a natureza do trabalho escolar. Para que a aula de leitura se processe com eficiência, os alunos precisam compreender o conteúdo do texto, porém há momentos em que a sinalização em Libras, feita na ordem sintática do português, torna-se sem sentido para o aluno surdo. Tendo em vista que a leitura pressupõe um processo social, o surdo pode definir o uso da língua de sinais para fazer-se entender e seus colegas procuram auxiliar na interpretação, construindo caminhos em que ambos produzam consistente aprendizagem, tanto na língua oral quanto gesticulada.

Quando a língua natural é utilizada em sala de aula, a pessoa com surdez procura – ou deve procurar – compreender vocábulos que desconhece frente à gramática usual. Explicando melhor, o surdo quando não entende determinado assunto ou vocábulo procura exemplificar através de sinais o seu entendimento (ou a vontade de querer aprender). O professor pode – na falta de um sinal de Libras – explicar o tema com gesto(s) equivalente(s). Os alunos com surdez podem aprender a confrontar o uso de Libras com o português, inicialmente encenando, por exemplo, expressões teatrais ou outras formas de gestos que possam viabilizar a similaridade com a linguagem de sinais (SILVA, 2014).

O estudo de Silva (2014) apontou padrões interacionais concernentes ao uso da língua portuguesa sinalizada e da Libras, colaborando para a compreensão da importância de estratégias didáticas que considerem as diferenças entre as duas línguas e a utilização sistemática de técnicas baseadas na alternância de línguas.

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TÓPICO 5 | ESPECIFICIDADES DA LINGUAGEM DOS

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6 LINGUAGEM E SURDEZ: PROVOCAÇÕES FINAIS

Diante das informações contidas neste tópico, é esperado que você, prezado acadêmico, possa tecer reflexões acerca do desenvolvimento da linguagem e a sua relação com o desenvolvimento cognitivo e a educação do surdo (RODRIGUERO; BORGHI, 2000).

É válido lembrarmos que outrora os gestos eram considerados como vilões, sendo culpabilizados pelas dificuldades de integração do sujeito surdo no meio social, ao passo que, hoje, há quem afirme que o acesso à linguagem oral é um desrespeito aos surdos. Os que pensam dessa forma se pautam no argumento de que o ensino da linguagem oral (ou escrita) para surdos representa um ato de dominação da maioria da população – os ouvintes – sobre uma minoria – os surdos (BUENO, 1998).

FIGURA 13 – PRESSÕES DA CULTURA OUVINTE SOBRE A CULTURA SURDA

FONTE: Os autores

A figura apresentada pretende ilustrar as imposições que a cultura ouvinte faz sobre a cultura surda, requerendo mascarar as diferenças desta última, exigindo que se portem tal qual os indivíduos ouvintes.

Em contrapartida, para Gesueli (2006), a proposição de educação bilíngue defende que é necessário respeitar a língua de sinais como língua natural, além de ser um direito do surdo. Além do mais, é válido oportunizar que o surdo alcance a condição bilíngue (deverá ter acesso à língua de sinais por meio do contato com a comunidade surda e com a língua majoritária, oral e escrita, como segunda língua). O ato de aceitar a língua de sinais dá indícios que a cultura surda está tendo aceitação pela sociedade, já que a língua de sinais está diretamente ligada à cultura surda.

CulturaOuvinte

"Cultura Surda"

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UNIDADE 2 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

ESTUDOS FUTUROS

Ficou curioso para saber mais sobre as proposições da educação bilíngue? No terceiro tópico da Unidade 3, você poderá aprender mais sobre isso.

Não podemos nos esquecer do papel da linguagem no processo de constituição do sujeito. Isto é, nenhum ser humano nasce pronto. Ao contrário, todos os humanos vão se constituindo por meio da interação com seus semelhantes – e é um processo mediado pela linguagem. Tendo em vista que a linguagem tem, portanto, um papel constitutivo na identidade de cada um, pode-se afirmar que linguagem, cultura e identidade são conceitos interligados (GESUELI, 2006).

DICAS

Para saber mais sobre o papel constitutivo da linguagem na construção da identidade dos sujeitos, procure ler as seguintes obras:

• BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Trad. de Maria Hermantino Galvão Gomes Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1992. p. 277-289. (Texto escrito em russo entre 1952-1953).

• GERALDI, J. W. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação. Campinas: Mercado de Letras/ALB, 1996.

• ORLANDI, E. P. Identidade linguística escolar. In: SIGNORINI, I. (Org.). Lingua(gem) e identidade: elementos para uma discussão no campo aplicado. Campinas: Mercado de Letras, 2001.

Por outro lado, há quem veja essa pressão do modo inverso. Ao dispor a possibilidade de inserção na linguagem oral (e escrita) aos surdos, seria uma forma de possibilitar sua inserção/integração na sociedade, pois quando o surdo não tem acesso à aprendizagem da língua portuguesa, existe maior tendência de que fique segregado, ou seja, à margem da sociedade, pois não possui uma das formas necessárias para participar ativamente da sociedade.

Assim, deparamo-nos com um impasse: deve-se respeitar a cultura surda e todos os comportamentos, atitudes, valores, estilos, práticas, ações que a caracterizam, isentando-a da "necessidade" de se apropriar de comportamentos, atitudes, valores, estilos, práticas e ações característicos da cultura ouvinte? Ou dispõe-se dos itens que compõem a cultura ouvinte para aprendizagem e uso da cultura surda, e recai-se na acusação de que se trata da sobreposição de uma

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TÓPICO 5 | ESPECIFICIDADES DA LINGUAGEM DOS

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cultura majoritária (ouvinte) diante da minoritária (surda)? Assim, de acordo com Bueno (1998, p. 8), incorre-se principal contratempo da relação entre linguagem e surdez: "o problema da surdez reside na imposição de uma língua (a dos ouvintes) para uma comunidade que não tem possibilidade de acesso a ela".

Na concepção de Gesueli (2006), no intento da sociedade de apagar a surdez, esta reagiu de modo inverso: fortalecendo-se de modo que a prática em língua de sinais tornou-se pública. Ainda assim, os surdos têm agido com resistência, lutando pelo reconhecimento de sua cultura, esforçando-se para marcarem presença como minoria linguística, mesmo que até agora estejam divididos entre o grupo que mantém a resistência e o outro, que se submete à hegemonia cultural.

Por fim, vale destacar algumas medidas que têm contribuído para o reconhecimento da surdez, segundo Gesueli (2006):

• a garantia do uso da língua de sinais na esfera escolar (afinal, é através da linguagem que significamos o mundo e consequentemente nos significamos);

• a presença do professor surdo colabora grandemente para que as crianças se apropriem da língua de sinais e passem a identificar-se com este sujeito que apresenta um papel de destaque no âmbito educacional;

• a convivência entre surdos e dos surdos com os ouvintes colabora para a disseminação do reconhecimento da identidade surda;

• a possibilidade de o aluno surdo identificar-se com a "comunidade surda" propicia uma identificação política e social, na medida em que a história da "comunidade surda" se personifica na sala de aula, incluindo as lutas e vitórias que a compõem.

DICAS

Para ampliar seu ponto de vista acerca desse impasse, recomenda-se a leitura de um artigo que você encontra na internet: <https://www.researchgate.net/publication/26356695_Surdez_linguagem_e_cultura>.• BUENO, José Geraldo Silveira. Surdez, linguagem e cultura. Cad. CEDES, set. 1998, v. 19, n.

46, p. 41-56. Boa leitura!

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RESUMO DO TÓPICO 5

Neste tópico, você aprendeu que:

• A língua de sinais brasileira é uma língua completa.

• Essa língua apresenta um campo riquíssimo de conhecimentos para os estudos linguísticos no Brasil.

• Pesquisadores discutem a aplicabilidade da língua de sinais tal qual a língua falada, ou seja, como a língua de sinais pode ser inserida na sociedade e representar de fato uma comunicação eficiente.

• Entendemos, neste livro, de estudos que as derivações visuoespaciais seguem lógicas semelhantes às das derivações orais-auditivas, ou seja, muito se assemelham ao uso da língua de sinais com o uso da língua falada, entendendo que as normas cultas de qualquer língua seguem os mesmos preceitos.

• A expressão visuoespacial (movimentos e gesticulações no espaço) consegue ser completa, assim como é entendida a língua oral, todavia, por meio da língua de sinais também é possível exprimir conceitos abstratos.

• Os estudantes surdos têm apresentado dificuldades na escrita de língua portuguesa, de modo que têm sido alvo de pesquisas nacionais e internacionais.

• Muitos alunos surdos apresentam baixo rendimento escolar, e professores de alunos surdos se queixam das dificuldades de conduzir intervenções pedagógicas.

• Pesquisas nacionais apontam que os surdos estão com dificuldades principalmente na escrita do português, no que tange ao uso de verbos.

• A linguagem tem um papel essencial na mediação da interação entre as pessoas.

• Linguagem, cultura e identidade são processos relacionados.

• A discussão acerca da identidade surda está associada com a cultura surda.

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1 Chegou a hora de registrar sua opinião sobre alguns impasses apresentados. Leia as duas perguntas escritas por Bueno (1998) e escreva a sua resposta pessoal para ambas. Lembre-se de justificar a sua opinião!

a) "Defender a existência de comunidades surdas, considerando a língua de sinais como sua primeira língua em contraposição a uma língua imposta pela 'sociedade ouvinte', é contribuir para a superação de sua condição socialmente adversa?"

b) "Por outro lado, desconsiderar o fato de que existem agrupamentos de surdos que se utilizam de formas de representação diferentes daquelas utilizadas pelos ouvintes, e exigir deles a mesma produtividade em relação à linguagem oral dos que ouvem, é a resposta?"

AUTOATIVIDADE

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UNIDADE 3

A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A

EDUCAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir dos estudos esta unidade, você será capaz de:

• refletir acerca das diferenças individuais articuladas ao processo de apren-dizagem;

• ponderar sobre a proposta atual da educação especial;

• distinguir escolas inclusivas de escolas bilíngues;

• conhecer desafios e perspectivas da ação docente com crianças;

• conhecer desafios e perspectivas da ação docente com jovens e adultos.

Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No texto, você encontrará auto-atividades com o objetivo de reforçar os conteúdos apresentados.

TÓPICO 1 – DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM E AVALIAÇÃO

TÓPICO 2 – A PROPOSTA ATUAL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

TÓPICO 3 – ESCOLAS INCLUSIVAS OU ESCOLAS BILÍNGUES

TÓPICO 4 – PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO DOCENTE COM CRIANÇAS SURDAS

TÓPICO 5 – PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO DOCENTE COM JOVENS, ADULTOS E IDOSOS

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TÓPICO 1

DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

E AVALIAÇÃO

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nem todos os caminhos são para todos os caminhantes.

Goethe

Na unidade que você acabou de ler, foi abordado o preconceito que as pessoas surdas enfrentam em seu cotidiano. Existem inúmeros tipos de preconceitos dirigidos às pessoas em geral (ou grupos de pessoas,) pelos mais diversos motivos. Há preconceitos positivos, inclusive. Eles acontecem quando olhamos para uma pessoa e por alguma característica que ela possua, pensamos que ela seja "superior". Por exemplo, ao ver um homem vestindo terno e gravata, já se pressupõe que ele seja rico ou alguém "importante".

Todavia, a maioria dos preconceitos consistem em atitudes culturais negativas dirigidas aos membros de um grupo. Preconceitos e estereótipos trazem uma forma padronizada de conceber a realidade e de relacionar-se com ela.

As pessoas que atuam na educação precisam estar atentas aos preconceitos que carregam. Os preconceitos tendem a formar estereótipos e interferem diretamente na ação do professor frente aos alunos que possuem as características que o professor deprecia. Por exemplo, quando um professor acredita que os surdos não são capazes de aprender, os está estigmatizando, considerando-os anormais, desviantes em relação aos demais.

Isso vai muito além da imputação de culpa aos professores que acreditam nas próprias imagens que eles têm dos alunos. Não basta apenas levar aos professores um saber ou explicações de como eles poderiam ensinar mais e melhor. É preciso que seja alcançado algo da ordem da ética. Algo mais amplo, que só se alcança por meio de profundas reflexões.

Essa não é uma temática que envolve apenas os alunos com deficiência, pois as diferenças apresentadas por indivíduos nas salas de aula são inúmeras e perpassam por questões econômicas, sociais, culturais, afetivas, biológicas, religiosas, étnicas, geradoras de discriminação preconceito e estigmatização (SOUZA; MACEDO, 2012, p. 278).

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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Por isso, esse tópico não focará tão somente a deficiência auditiva, mas trata de diferenças individuais num geral. Além do mais, como já foi visto na unidade antecedente, por vezes a perda auditiva está relacionada com dificuldades na aprendizagem.

Antes de tudo é essencial esclarecermos que é compreensível que os educadores do ensino regular não tenham conhecimentos específicos sobre a deficiência auditiva. Não se tem por objetivo criticá-los ou recriminá-los pela falta de informações sobre o tema. Contudo, na educação inclusiva, esses professores precisam empregar condutas apropriadas para cada estudante com perda auditiva, sob recomendação de especialistas (DELGADO-PINHEIRO; OMOTE, 2010).

Para isto é primordial aprender a conviver com as diferenças, com as mudanças, com aquilo que está além das imagens. Uma maneira do professor apostar no aluno é se abrir para escutar a diferença. Conforme Souza e Macedo (2012), é indispensável que a visão que se tem dos alunos comece a abraçar também o contexto social do qual fazem parte, quer dizer, uma sociedade controversa e frequentemente excludente que rejeita potencialidades humanas.

Muitas vezes, os preconceitos são perpassados pelo etnocentrismo. Somos

etnocêntricos quando pensamos que nós somos os certos, que a nossa cultura é a melhor, que a nossa língua é mais completa, que o nosso comportamento é mais adequado ou elegante. Em suma, somos etnocêntricos quando acreditamos que a nossa cultura é melhor que as outras, que somos melhores que os outros.

A lógica do etnocentrismo consiste, pois, em pensar o mundo por meio de um referencial único, ou seja, tendo como referência a cultura, os valores e costumes de uma sociedade em detrimento de outra, manifestando-se por meio de julgamento de valores da cultura do outro, seu modo de pensar e agir (NAKAMURA, 2011, p. 98).

Quando se está em sala de aula, ensinando algum conteúdo, vez ou outra uma criança faz um questionamento que parece incabível. Então, o professor respira fundo e pensa: "Como é que ela não sabe disso ainda?". Nesse momento, o professor está sendo autocentrado, se julgando mais inteligente do que a criança. Esquece que um dia precisou aprender aquilo que está ensinando, e que aquela mesma criança sabe sobre inumeráveis assuntos que ele desconhece.

DICAS

Sugestão de leitura: Livro O que é etnocentrismo, escrito por Everardo P. Guimarães Rocha (1994). 11. ed. São Paulo: Brasiliense – coleção primeiros passos. Trata-se de um livro pequeno, estilo livro de bolso, com apenas 95 páginas. Essa seria uma leitura obrigatória para todos os cidadãos. Depois de acessar e refletir sobre a obra, tende-se a ser menos preconceituoso, menos prepotente.

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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Paulo Freire (2011) já dizia que todas as pessoas possuem alguns conhecimentos. É impossível que alguém não saiba nada, da mesma forma que é impossível que alguém detenha todos os conhecimentos existentes. Por isso, sempre há mais por aprender.

2 DIFERENÇAS INDIVIDUAIS

Para iniciar a reflexão sobre as diferenças individuais, que tal pensar um pouco sobre o conceito de "normalidade"? Você já percebeu que a normalidade é um conceito relativo? Ou seja, o que hoje é normal, pode não ter sido ontem, e não sabemos como será amanhã. Por exemplo, lembre-se do que aprendeu na Unidade1 deste livro, ao ler a história de como a surdez era vista antigamente e como tem sido considerada nos dias atuais.

Além da variável "tempo" para definir o que é normal ou não, ainda existe a variável "espaço". Isto é, o que é normal aqui pode ser anormal em outros lugares. Essa relativização ocorre porque o normal e não normal não se situam dentro de uma pessoa, mas fora dela: é aquilo que os outros percebem sobre essa pessoa. Desse modo, ao invés de querer "normalizar" a pessoa, modificando-a, adaptando-a, pode-se inverter a lógica e promover a mudança de atitude da sociedade perante o indivíduo.

Não se trata de eliminar as diferenças, mas de aceitar a sua existência como diferentes modos de ser dentro de um contexto social. Isso também não significa classificar todos como iguais, mascarando as diferenças. As diferenças existem. O que não precisa existir é o preconceito e a discriminação. O aluno que apresenta necessidades educacionais especiais, além de ser visto à luz da sua deficiência, deverá ser visto como ser global e único. Essa é uma atitude que contribui para respeitar as diferenças.

No que respeita às diferenças individuais e a educação, o modelo de escola para todos é o que opta pela educação especial integrada, fazendo frente à educação especial segregada que se realiza à parte da educação geral regular. Trata-se de escolas abertas às diferenças, nas quais todos os alunos são beneficiados. Afinal, tanto alunos deficientes quanto os demais têm a oportunidade de vivenciar a riqueza que a diferença representa, e com isso fortalecer o sentimento de solidariedade.

Escolas democráticas acolhem a todos os alunos, ensinam a todos,

respeitam as diferenças individuais e estimulam o desenvolvimento da capacidade de aprender a aprender. Assim, cabe à escola encontrar respostas educativas para as necessidades de seus alunos.

Para Carvalho (2011), são necessárias mudanças no estilo de trabalho de alguns professores, bem como nas atitudes de toda comunidade escolar. A vontade do professor e sua criatividade podem ser fortes aliados na superação

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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de barreiras que persistem nas salas de aula. Para que isso aconteça é preciso que os professores repensem alguns conceitos, pensamentos, crenças, atitudes e comportamentos que exercem diante das diferenças individuais expressas pelos estudantes, e sobre o papel de sua própria profissão.

Quando o professor se percebe como um mero transmissor de informações, tende a ter pouca força de vontade para avançar sobre os obstáculos que emergem das diferenças individuais. Por outro lado, quando o professor se percebe como profissional da aprendizagem, ele tende a se esforçar para tornar a aprendizagem interessante e proveitosa, trabalhando, assim, na remoção dos obstáculos (CARVALHO, 2011).

Quatro atitudes que beneficiam o processo de ensino e de aprendizagem são:

• O professor acreditar que a criança é capaz de aprender.• O professor querer ensinar.• O estudante acreditar que é capaz de aprender.• O estudante querer aprender.

Quando o professor não vê chances de que a criança aprenda, ele tende a ficar apático em relação a ela, inerte, deixando a criança entregue "à própria sorte", ou seja, ela tem grandes probabilidades de experimentar a improdutividade na sala de aula. Em contrapartida, quando o professor acredita que a criança tem condições de aprender, ele irá ficar atento aos interesses dela (CARVALHO, 2011).

A criatividade do professor somada à sua convicção de que a aprendizagem é possível para todos os alunos e de que ninguém pode estabelecer os limites do outro, certamente contribuirão para remover os obstáculos que tantos e tantos alunos têm enfrentado. A flexibilidade é outro fator que contribui para a remoção das barreiras. Modificar planos e atividades à medida que as reações dos alunos vão oferecendo novas pistas (CARVALHO, 2011, p. 66).

Algo que vem minando as chances de aprendizagem das crianças são os diagnósticos. Eles não existem para isso, mas muitos professores acabam desistindo (por vezes inconscientemente) de tentar conduzir a criança rumo à aprendizagem, quando tomam conhecimento de que a criança possui um laudo, um diagnóstico, uma deficiência, ou mesmo uma dificuldade de aprendizagem. No entanto, os testes que são utilizados para elaboração de diagnósticos, geralmente mostram somente como a criança se encontra naquele momento.

Muitas vezes, os testes não dão indícios do potencial das crianças. Por isso, realizar e repassar um laudo é algo bastante complexo e perigoso. Complexo, pois não pode se pautar apenas em baterias de testes. São muitas as variáveis que precisam ser levadas em conta. E perigoso, pois muitas vezes um laudo de "deficiência mental" – por exemplo – acaba desembocando em

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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um rótulo, e consequentemente, a família pode vir a diminuir o investimento afetivo e acadêmico na criança, e os professores também podem acabar deixando a criança "de lado" durante as aulas. Laudos e rótulos são propensos a ficarem impregnados nas pessoas que os leem.

Na sala de aula, um laudo pode fazer com que os professores passem a proferir frases semelhantes a estas:

- Vou poupar esse aluno de fazer essa atividade, pois seria exigir muito que ele a compreendesse.

- Melhor deixar essa criança fazendo atividade livre neste momento, ou colorindo, ao invés de tentar integrá-la à atividade de hoje, afinal, é uma atividade com alto grau de dificuldade e certamente essa criança não tem capacidade cognitiva de acompanhá-la.

- Essa criança não tem maturidade suficiente para realizar essa proposta pedagógica que será aplicada com a turma da qual ela faz parte.

Ou na hora da intermediação de um conflito entre crianças, o professor pode se posicionar assim:

- Deixe esse aluno em paz, você não percebe que ele é deficiente?

Na verdade, algumas dessas colocações podem ter raízes em determinadas teorias. Por exemplo, conforme Fontana e Cruz (2002), as "dificuldades de aprendizagem", tão frequentemente citadas pelos professores, podem ser interpretadas à luz de abordagens maturacionistas. Assim, as dificuldades de aprendizagem são vistas sob a égide da relação de dependência do aprendizado ao desenvolvimento. Portanto, o que está por trás da não aprendizagem da criança é falta de maturidade dela, ou algum atraso no desenvolvimento dela. Ou seja, a causa do fracasso escolar parece repousar exclusivamente sobre a criança que está apresentando baixo rendimento na escola.

Em contrapartida, os professores cujas crenças, atitudes e pensamentos são mais próximos da abordagem histórico-cultural, tendem a conceber que a aprendizagem produz o desenvolvimento. Logo, as dificuldades de aprendizagem são compreendidas em meio às condições em que a relação de ensino é estabelecida. O foco deixa de recair sobre a criança e passa a abranger também as condições de produção no contexto interativo do qual ela é participante (FONTANA; CRUZ, 2002). Ela não está aprendendo por conta do material didático que está sendo utilizado? É a metodologia de ensino? Os empecilhos para a aprendizagem estão relacionados a aspectos culturais ou sociais?

De acordo com Carvalho (2011), são vários os fatores que podem interferir no processo de aprendizagem, e eles podem se apresentar mesclados:

• Fatores biológicos – aspectos orgânicos, em suas estruturas e funcionalidades.• Dimensão cognitiva – aspectos psicológicos, tais como motivação, percepção,

memória e atenção.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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• Dimensão social – componentes políticos, culturais, que intervêm no produto da aprendizagem, e respectivamente recebem influências dele.

Desse modo, pode-se afirmar que a queixa de baixo rendimento escolar não está ligada necessariamente a um problema situado na criança. Pode ser fruto de propostas educacionais inapropriadas ou até mesmo da falta de investimento dos responsáveis pela criança e sua escolarização.

De qualquer modo, espera-se que práticas segregadoras sejam substituídas por experiências integradoras no meio educativo. Isto é, não basta colocar os deficientes no mesmo ambiente escolar e laboral dos demais indivíduos. Compartilharem o mesmo espaço físico não equivale à educação inclusiva. Conquanto, a proposta de inclusão parte do princípio de que eles participem ativamente do processo de aprendizagem. Assim, as escolas regulares precisam se adaptar às necessidades dos diferentes alunos (mudanças arquitetônicas, estruturais, formação de professores).

Segundo Carvalho (2011, p. 72), "pensar em respostas educativas da escola é pensar em sua responsabilidade para garantir o processo de aprendizagem para todos os alunos, respeitando-os em suas múltiplas diferenças". Para respeitar as diferenças é necessário assumir que elas existem, admitir que vivemos em uma sociedade repleta de diversidades. A inclusão requer reflexões sobre a percepção que temos do outro, quebra de paradigmas, e a aceitação de que cada pessoa é distinta, diversa, única, e concomitantemente somos todos iguais no que condiz aos direitos, deveres, vontades, necessidades e em valor (CARVALHO, 2011).

DICAS

• Sugestão de Filme: A cidade das tristezas (1989), um drama dirigido por Hsiao-Hsien Hou. O filme trata de circunstâncias que ocorreram em Taiwan entre 1945 e 1949, inclusive sobre o massacre que liquidou a vida de 20 mil tailandeses. Também mostra as interações entre integrantes de uma família composta por quatro filhos, um patriarca e alguns agregados. O caçula é um personagem surdo cuja principal maneira de se comunicar é a escrita. O caçula é fotógrafo e acaba sendo encaminhado à prisão.

• Sugestão de leitura do livro Ninguém mais vai ser bonzinho na sociedade inclusiva, de Claudia Werneck (2009). Rio de Janeiro: WVA, 3.ed. 314 páginas.

3 A DEFICIÊNCIA AUDITIVA E A APRENDIZAGEM

Delgado-Pinheiro e Omote (2010, p. 633) realizaram uma pesquisa com o objetivo de "verificar os conhecimentos dos professores sobre a perda auditiva, suas opiniões sobre a educação de alunos com esse tipo de privação sensorial e

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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também conhecer suas atitudes frente à proposta da inclusão". Os sujeitos que fizeram parte dessa pesquisa eram professores do ensino fundamental, com e sem experiência com aluno(s) com perda auditiva.

Delgado-Pinheiro e Omote (2010) procuraram averiguar o conhecimento dos professores acerca da deficiência auditiva, sobre os diferentes graus de perda auditiva, os recursos tecnológicos para o melhoramento da audição resi dual e a distância para se estabelecer a comunicação. Todos os professores explicitaram que a perda auditiva pode acontecer em diferentes graus, mas nem todos conseguiram justificar suas respostas. Ressaltamos que é fundamental saber sobre graus da perda auditiva e, sobretudo, sobre as consequências pertinentes às habilida des auditivas e comunicativas. Afinal, essas informações podem ser contributivas para o desenvolvimento acadêmico de um aluno com perda auditiva.

Grande parte dos professores revelou que não conhecia os recursos utilizados (AASI, IC, FM) para propiciar o acesso ao som às pessoas com perda auditiva. Até mesmo os professores que possuem experiência com alunos com perda auditiva não demonstraram conhecimentos sobre recursos de amplificação sonora. Seria ideal que todos os profissionais que interagem com deficientes auditivos, conhecessem o potencial e as limitações dos recursos de amplificação. Apesar disso, a pesquisa apontou que os professores expuseram mínimos conhecimen tos sobre esses recursos tecnológicos (DELGADO-PINHEIRO; OMOTE, 2010).

NOTA

É possível que você se lembre do AASI e do IC e esteja curioso para saber o que é o FM. O Sistema FM objetiva captar apenas o som que a pessoa com deficiência auditiva quer ouvir naquele momento. Por exemplo, na sala de aula, a criança solicita que a professora coloque um pequeno microfone no pescoço e adiciona uma peça no aparelho que utiliza. Desse modo, o som ambiente não é captado, sendo que a voz da professora se torna preponderante. Isso favorece para que as pessoas com perda auditiva abaixem o volume dos ruídos indesejáveis, tornando a comunicação mais agradável e clara.

FONTE: Disponível em: <http://desculpenaoouvi.com.br/sistema-fm-para-implante-coclear-e-aparelhos-auditivos/>. Acesso em: 1 jun. 2018.

No que toca à necessidade de se falar com mais proximidade do estudante deficiente auditivo, também não foram percebidas diferenças significativas nas respostas de professores com experiência ou sem experiência com alunos com perda auditiva. A maioria dos professores que possui alunos com perda auditiva, afirmou que fazia uso da comunicação oral durante as aulas. Alguns professores mencionaram outras estratégias de comunicação, tais como: gestos de apoio, recursos didáticos e monitoria, equipe especializada, bom relacionamento e

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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formação específica. Os professores que não estabeleciam comunicação oral com os alunos deficientes auditivos, explicaram que pediam ajuda para outras pessoas (profissionais ou alunos que conheçam a língua de sinais), ou acrescentavam a comunicação escrita como apoio. Contudo, os professores não fizeram menções se as estratégias utilizadas eram apropriadas para os estudantes com perda auditiva, com os quais atuavam no ensino regular (DELGADO-PINHEIRO; OMOTE, 2010).

As estratégias de comunicação utilizadas pelo professor de um aluno deficiente auditivo, usuário de aparelho de amplificação sonora individual ou de implante coclear, que possui possibilidades de per-cepção dos sons da fala, precisam ser diferentes daquelas utilizadas com alunos que se apropriam da Língua Brasileira de Sinais. Os professores par ticipantes deste estudo não demonstraram conhe cer tais estratégias, fato este que certamente difi culta a construção de um ambiente social acolhedor na sala de aula, para alunos deficientes auditivos, o qual poderia auxiliar o desenvolvimento de lingua gem e de aprendizagem desses alunos (DELGADO-PINHEIRO; OMOTE, 2010, p. 638).

Prezado acadêmico! Lembre-se de que você pôde aprender os diferentes graus da perda auditiva na Unidade 1 deste livro. As informações sobre os recursos tecnológicos para melhorar a audição foram apresentadas na Unidade 2. As estratégias de comunicação (e inclusive ações pedagógicas) que são mais adequadas para serem empregadas com alunos que têm perda auditiva, fazem parte dessa atual unidade do livro, ao longo desses cinco tópicos.

ATENCAO

A pesquisa de Delgado-Pinheiro e Omote (2010) também evidenciou que a maior parcela dos professores defende que o ensino especial seja o mais apropriado para o aluno defi ciente auditivo. Independentemente de terem ou não experiência com alunos com perda auditiva, os professores deram respostas parecidas para os itens ideológicos, ou seja, relacionados às atitudes sociais diante da proposta de inclu são. Certamente as respostas estavam associadas à questão da igualdade de direitos.

No que concerne à dimensão operacional, os professores com experiência com estudantes que apresentam perda auditiva demonstram avistar mais probabilidades de se concretizar a proposta da inclusão em termos práticos. Esses professores manifestaram atitudes sociais mais favoráveis, quando comparados aos professores inexperientes com alunos deficientes auditivos. Essa dimensão operacional está atrelada às modificações no ambiente social, visando promover a aprendizagem tanto dos alunos com necessidades educacionais especiais quanto dos demais (DELGADO-PINHEIRO; OMOTE, 2010).

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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Delgado-Pinheiro e Omote (2010) chamam a atenção para o diagnóstico precoce, bem como para a utilização de recur sos tecnológicos de dispositivos que permitam o acesso aos sons da fala. Ainda destacam o acompanhamento das famílias, como importantes estratégias que colaboram para a participa ção efetiva do aluno com perda auditiva no contexto escolar. Esses autores também enfatizam que as crianças com perda auditiva possam desenvolver habilidades de comunicação (orais ou gestuais) no período pré-escolar, pois essas medidas tendem a influenciar positivamente o posterior desenvolvimento acadêmico delas.

IMPORTANTE

Recorde-se de que as sugestões apontadas por Delgado-Pinheiro e Omote (2010) reforçam o que já aprendemos na Unidade 2:

• importância do diagnóstico precoce;• utilização de recursos tecnológicos com o AASI e o IC;• acompanhamento das famílias;• aprendizagem de forma(s) de linguagem(ns) ainda na infância (libras, língua portuguesa na

oralidade e na escrita).

Em síntese, os resultados do estudo de Delgado-Pinheiro e Omote (2010) apontam que tanto os professores experientes com alunos deficientes auditivos quanto os inexperientes (de 1ª a 4ª séries), registraram respostas similares quanto às atitudes sociais acerca da inclusão, em termos ide ológicos e operacionais. Já os professores de 5ª a 8ª séries, com e sem experiência com alunos com perda auditiva, mostraram respostas equivalentes nos aspectos ideológicos, entretanto divergiram nos aspectos operacionais. No tocante aos conhecimentos, os professores com experiência não deram mostras de conhecimentos diferenciados acerca de particularidades da perda auditiva, quando contrastados com professores sem experiência, e ambos enfocaram aspectos comunicativos.

Os dados provenientes de instrumentos diferen tes utilizados se complementam e sugerem que os professores são ideologicamente favoráveis à inclu são, mas não têm conhecimentos suficientes para operacionalizar a proposta de educação inclusiva. Torna-se evidente a importância da realização de programas de apoio aos professores e programas que atendam às necessidades de crianças com perda auditiva, nos primeiros anos de vida, em momentos que antecedem o início do período esco lar. Essas medidas poderão refletir pontualmente na relação professor/aluno e no desenvolvimento acadêmico dessas crianças (DELGADO-PINHEIRO; OMOTE, 2010, p. 639).

Depois de acessar alguns pontos da pesquisa de Delgado-Pinheiro e

Omote (2010, convém refletirmos sobre a perda auditiva e a aprendizagem. É válido recordarmos que o espanhol Pedro Ponce de León é considerado um dos primeiros a pensar e promover o ensino para surdos, e isso foi no século XVI.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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Para Souza (1998), nos anos noventa já se observava uma mobilização de cunho político para que os surdos fossem integrados às escolas regulares. Contudo, a estrutura de ensino vinha deixando a desejar no que concerne à satisfação das necessidades educativas das crianças surdas, e até mesmo das ouvintes. Era notória a falta de informações sobre questões linguísticas das crianças com perda auditiva. Um discurso que prevalecia era o que propagava a igualdade de condições de oportunidades entre todas as pessoas. Esse discurso refutava a reclusão e a discriminação, ao legitimar que surdos devem ser considerados e tratados da mesma forma que os demais.

De outro lado, a interpretação do fracasso escolar das crianças com perda auditiva pesava unicamente sobre elas:

- Não aprendem porque são surdas, e não há nada que possamos fazer por elas.

Diante disso, Souza (1998, p. 139) esclarece que os propósitos da inclusão são nobres, no entanto, esses princípios têm sido utilizados para "legitimar o literal, e perverso, ajuntamento de crianças com necessidades e particularidades linguísticas e sociais tão diversas". Para essa autora, esta interpretação vem sendo embasada pelas "grandes transformações econômicas que vêm condicionando uma radical alteração na forma de se considerar o ser humano e seu papel social" (SOUZA, 1998, p. 139).

Souza (1998) acrescenta que muitas crianças surdas têm experimentado a negação de sua diferença, uma vez que são inseridas nas escolas regulares desfrutando tão somente de uma integração em termos de espaço físico, com as crianças ouvintes. Quantas crianças surdas, ou mesmo os alunos do ensino superior que têm perda auditiva, ficam à margem dos diálogos estabelecidos em língua oral na sala de aula? São oferecidas condições para que eles participem das discussões em torno dos textos escritos, que tantas vezes lhes parecem sem significado e sem sentido? "Dito de outro modo, a escola estará promovendo deliberadamente seu isolamento social, linguístico e cognitivo" (SOUZA, 1998, p. 141).

Os surdos que dominam a língua de sinais, ainda que não falem oralmente, não se consideram mudos, pois para eles mudo é quem não consegue se expressar. Mas, e quando a língua de sinais não encontra lugar em sala de aula? Esses alunos não estão ali apenas de corpo presente? Sem falar daquela palavrinha que trazemos na introdução desse tópico: etnocentrismo. A atitude de forçar a aprendizagem da língua majoritária não seria um ato etnocêntrico?

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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DICAS

Você sabia que o Congresso de Milão de 1880 ofereceu subsídios para que os surdos no Brasil fossem proibidos de se comunicarem através da língua de sinais? (FALCÃO, 2012). No filme E seu nome é Jonas (1979), há uma cena em que é dito que ao tentarem ensinar as crianças a se inserirem na língua majoritária, as mãos das crianças eram amarradas, para proibir a utilização de gestos.

No filme Mr. Holland – Adorável professor (1995), dirigido por Stephen Herek, quando os pais são informados pelo profissional da saúde que o filho é surdo, são prontamente advertidos de proibir que a criança aprenda a língua de sinais.

Um filme que subverte essa questão da linguagem é: Hush – a morte ouve (2016). No início do filme, há uma cena em que a protagonista, a escritora Maddie – que é surda – está conversando face a face com sua vizinha. Embora Maddie utilize a leitura labial para se comunicar, a vizinha insiste em querer aprender a língua de sinais para interagir melhor com ela. É algo que inverte a lógica a qual estamos acostumados a vivenciar. Apesar da surda ter se apropriado da leitura labial e da escrita da língua majoritária, a amiga ouvinte ainda assim quer aprender a língua minoritária (de sinais). O filme é interessante para refletir sobre a surdez, já que em muitas cenas o som é totalmente retirado, para que o telespectador consiga ter uma dimensão de como as circunstâncias se apresentam à pessoa surda.

A pergunta que o filme parece instigar é: "Ser surdo é viver em desvantagem?" Entretanto, antes que você comece a assistir, é importante alertar que o gênero desse filme é: suspense, terror, thriller. Classificação 16 anos, por conta de cenas violentas e sanguinárias.

As tendências atuais procuram olhar para o aluno sem focar na deficiência, mas considerando-o como um aluno que apresenta uma diferença individual. Isto é, a diversidade não é defeito. Assim, ele não precisa ser isolado para receber tratamento especializado.

É preciso respeitar o ritmo de cada um, fazer problemas mais concretos, ensinar onde suscita o desejo de aprender do aluno. Isso demanda da escola respostas educativas com melhor qualidade, mais intervenções pedagógicas. A ação pedagógica passa ser centrada na aprendizagem dos alunos.

Neste sentido, as duas cenas mais marcantes do filme E seu nome é Jonas (1979) são interligadas. Na primeira, Jonas encontra um vendedor de cachorro-quente no parque, e o menino sai correndo na direção da mãe, na tentativa de mostrar para ela que ele quer esse alimento. Porém, ele não consegue se fazer entender, e a mãe chora, por não conseguir compreender o filho. Ele a empurra, a puxa para onde o vendedor estava, porém, até chegarem lá, o carrinho de cachorro-quente havia se deslocado para outro local, fora do alcance da vista deles. É uma cena angustiante, onde Jonas lamenta, abraçado à mãe, que também chora copiosamente com ele.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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Mais para o final do filme, quando a mãe faz amizade com adultos surdos, e solicita que eles apresentem a língua de sinais para Jonas, percebe-se que ele não tem muito interesse em aprender. Porém, fazem um passeio, para que os adultos lhe mostrem objetos, e assim vão ensinando os sinais respectivos a eles. Nesse passeio, Jonas avista um carrinho de cachorro quente. Só então ele demonstra vontade de saber como nomear aquele alimento, pois quer saber como deve se expressar para pedi-lo à mãe. A partir daí, Jonas parece ampliar seu interesse para aprender os sinais que representam outros objetos e palavras.

No entanto, atentar para o interesse dos alunos requer a flexibilização de planejamentos de aula, requer, também, mais atenção do professor em sala de aula. Portanto, os desafios que se levantam à educação dizem respeito à capacitação de recursos humanos. Isso posto, percebe-se que está intrinsecamente ligada à vontade política e à consciência da sociedade. Estamos vivendo uma época de mudanças estruturais, em que as preocupações se deslocam:

• Das deficiências do aluno.• Para valorização de suas potencialidades.

Em outras palavras, o objetivo central passa a ser relacionado ao

oferecimento de condições para que as crianças desenvolvam suas potencialidades ao máximo. Por conseguinte, é necessário oferecer aos profissionais da educação subsídios que possam se tornar instrumentos teóricos e práticos, bem como a reflexão sobre o redesenho da escola de acordo com este novo paradigma. Porém, paralelamente às escolas regulares que vêm procurando operacionalizar um ensino mais integrador, inclusivo, coexistem escolas em que as atitudes continuam sendo reflexo de uma história marcada pela discriminação.

Para Carvalho (2011), a aprendizagem consiste em um processo imensamente complexo, perpassado por incontáveis variáveis (algumas intrínsecas ao aluno – de dentro – e outras extrínsecas – de fora) que se entrecruzam e se influenciam mutuamente. "Parece impossível, pois compreender ou explicar os aspectos orgânicos psicológicos ou sociais, banalizando a importância de cada um, isoladamente, ou desconsiderando suas intrincadas inter-relações" (CARVALHO, 2011, p. 73). Por isso, a autora sugere que o sucesso escolar, ou o fracasso, não devem ser atribuídos a uma única dimensão.

ESTUDOS FUTUROS

Os próximos dois tópicos irão aprofundar a temática da proposta atual da educação especial e das escolas bilíngues. Bons estudos!

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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DICAS

Filme: As Borboletas de Zagorsk. É um documentário produzido pela BBC em 1990. Desde 1963, a Escola de Zagorsk vem lutando para ensinar crianças deficientes a aprender. Crianças surdas e cegas são ensinadas a se comunicarem através de tipos especiais de linguagem (palavra falada, língua de sinais, braile, toque nas mãos, vibração da caixa de voz, alfabeto manual etc.).

Muitos ingressaram na escola de Zagorsk tendo em mãos o diagnóstico de deficientes mentais, mas depois de algum tempo na escola, percebia-se que não tinham deficiência mental, pois quando se introduziam no mundo da linguagem, encontravam lugar no mundo e se encaminhavam para a vida.

Essa escola se pauta nas premissas de Lev Vygotsky, para quem é possível superar as mais graves deficiências, seja de que natureza forem, aplicando técnicas físicas e psicológicas de compensação, de forma que os alunos possam ir à escola, se desenvolverem em meio às outras pessoas e crescerem com as pessoas "normais". A escola entende que toda criança pode ser alcançada e transformada.

"Antes de ir para Zagorsk, eu tinha uma ideia muito confusa do mundo. Tenho gratidão à paciência dos meus professores. Lá, passei a compreender direito as coisas e a agir corretamente" Natasha Kriladov (surdocega).

4 DIFERENÇAS INDIVIDUAIS E AVALIAÇÃO

"Como avaliar para a inclusão, considerando as diferenças, sem relativizá-las ou centrá-las apenas nas limitações físicas, intelectuais ou sociais?" (SOUZA; MACEDO, 2012, p. 275).

Até aqui, você pôde ter noção de que as diferenças individuais existem e que elas emergem nas salas de aula, requisitando propostas pedagógicas diferenciadas. A avaliação faz parte do processo de aprendizagem e também salvaguarda suas especificidades diante de alunos com necessidades educacionais especiais, ou mesmo, com dificuldades de aprendizagem.

Para Souza e Macedo (2012), nem todas as escolas estão sendo capazes de

lidar adequadamente com as diferenças individuais, enquanto perpetuam:

• padrões representados por classes homogêneas;• currículos estanques;• sistema de avaliação voltado à medição de conhecimentos nivelados;• atribuição de notas no formato de medidas padronizadas.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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É necessário repensar a avaliação, tendo em vista as diferenças individuais e sociais, levando em conta as particularidades que se apresentam (deficiências, dificuldades de aprendizagem e demais elementos limitadores). Vale destacar que essas particularidades não impedem a aprendizagem. A avaliação precisa propiciar o levantamento das progressões dos alunos, de todos eles – independentemente das suas diferenças (SOUZA; MACEDO, 2012).

Considerar as diferenças individuais envolve reconhecer a realidade, incluindo suas contradições, o conhecimento da história do que levou a sociedade a se assentar sobre a exclusão durante tanto tempo, e quais são os fatores que estão nos bastidores dos discursos que defendem a inclusão. Cada sujeito é único, portanto, cada um tem características diferentes (que podem ser alteradas com o passar do tempo), toma decisões pautado em motivos ímpares, expressa-se, percebe, e interpreta de modo singular. Talvez você esteja pensando como essas informações podem ser articuladas com o processo de avaliação. Se cada aluno é exclusivo, cada um pode reagir de modo dessemelhante ao realizar uma prova. Os professores podem utilizar estratégias de avaliação distintas, e levar em conta a forma de aplicação e momento em que será feita. Essas variáveis podem gerar respostas ainda mais díspares (SOUZA; MACEDO, 2012).

Para uma avaliação da aprendizagem escolar a serviço da inclusão, é preciso ultrapassar os instrumentos descontextualizados e as etapas dissociadas da história e de seu caráter processual, para a compreensão da sociedade e dos seus reflexos como contradições que precisam ser superadas (SOUZA; MACEDO, 2012, p. 280).

Para se atingir esse ideal, no que se refere à avalição, é necessário que mais pesquisas sejam feitas no campo da Educação – sobretudo as pesquisas em abordagens críticas – que olham para a educação escolarizada como um meio de desenvolvimento humano, que atua sobre sua própria história, conforme trilha o seu caminho, situado em determinado espaço e período histórico (SOUZA; MACEDO, 2012).

Da mesma forma, as pesquisas da psicologia são úteis, na medida em que põem os olhos sobre a inclusão, fundamentada na abordagem histórico-cultural, isto é, sem menosprezar os determinantes sociais que disseminam e reforçam a exclusão. Essas pesquisas enfocam o desenvolvimento e as potencialidades dos estudantes, bem como o processo de aprender. Ao invés de colocar os holofotes nas desvantagens ou no que falta aos alunos, eles passam a ser colocados sobre suas potências. Assim, o discurso de que o fracasso escolar se centra na criança vai sendo desmantelado, já que, como já foi visto, podem ser diversos fatores (até mesmo externos) que acarretam o baixo desempenho escolar (SOUZA; MACEDO, 2012).

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TÓPICO 1 | DIFERENÇAS INDIVIDUAIS: APRENDIZAGEM

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Antes de dar início ao próximo tópico, vale a pena refletir que cada um é ao mesmo tempo agente e consequência do processo educativo que estabeleceu. Os componentes ideológicos da Educação, isto é, as concepções oriundas de determinadas classes sociais se encontram internalizadas nos próprios sujeitos. Alunos, professores, pais, funcionários e equipes técnicas atuam de maneira inconsciente, sem ter um pleno conhecimento de seus atos. Nem sempre se consegue identificar quais são as teorias que estão por trás dos fenômenos ideológicos e dos discursos que tanto se defende.

Hoje, defende-se que as melhores escolas são aquelas que aceitam a diversidade e são abertas a ela. Que têm clareza do seu papel em termos pedagógico, social e político. As escolas democráticas parecem ser a melhor opção, afinal, mais vale oferecer um espaço que privilegia a formação da cidadania e o seu exercício, do que priorizar a transmissão de conteúdos (CARVALHO, 2011).

Espera-se que os estudantes passem a ser vistos como seres inacabados, em incessante movimento, visando firmarem-se como pessoas únicas, autônomas, que conduzem o próprio caminho a despeito das diferenças, em vez de serem os estudantes rotulados pela sua deficiência ou dificuldade de aprendizagem (SOUZA; MACEDO, 2012).

No papel de cidadãos, e de (futuros) profissionais da Educação, cientes de tantos desafios que se descortinam aos nossos olhos, façamos nossas as palavras da admirável Helen Keller: "Não peçamos tarefas iguais às nossas forças, mas forças iguais às nossas tarefas".

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Neste tópico, você aprendeu que:

• A sociedade está repleta de preconceitos e os profissionais da Educação precisam examinar a si mesmos na tentativa de descobrir quais são os preconceitos que possuem, principalmente porque os preconceitos interferem em sua prática educativa.

• Etnocentrismo está relacionado à ideia de que a "minha" cultura, o "meu" estilo de pensar, o "meu" comportamento são os corretos e que as outras pessoas poderiam ajustar-se ao meu modo de ser (até mesmo copiando-o).

• As diferenças existem. Não adianta fingir que as diferenças não estão aí, tampouco classificar todos como iguais, mascarando as diferenças. Mais vale aceitar a sua existência como diferentes modos de ser dentro de um contexto social. O que não precisa existir é o preconceito e a discriminação.

• Quando o professor não vê chances de que a criança aprenda, ele tende a ficar apático em relação a ela, inerte, deixando a criança entregue "à própria sorte", ou seja, ela tem grandes probabilidades de experimentar a improdutividade na sala de aula. Em contrapartida, quando o professor acredita que a criança tem condições de aprender, ele ficará atento aos interesses dela (CARVALHO, 2011).

• A análise de Delgado-Pinheiro e Omote (2010) indica que os professores são ideologicamente aderentes à inclusão, todavia não possuem conhecimentos satisfatórios para operacionalizar tal proposta.

• A avaliação faz parte do processo de aprendizagem e, também, salvaguarda suas especificidades diante de alunos com necessidades educacionais especiais, ou mesmo, com dificuldades de aprendizagem.

• É necessário repensar a avaliação, tendo em vista as diferenças individuais e sociais, levando em conta as particularidades que se apresentam (deficiências, dificuldades de aprendizagem e demais elementos limitadores). Vale destacar que essas particularidades não impedem a aprendizagem. A avaliação precisa propiciar o levantamento das progressões dos alunos, de todos eles – independentemente das suas diferenças (SOUZA; MACEDO, 2012).

• Ao invés de colocar os holofotes nas desvantagens ou no que falta aos alunos, eles passam a ser colocados sobre suas potências. Assim, o discurso de que o fracasso escolar se centra na criança vai sendo desmantelado, já que podem ser diversos fatores (até mesmo externos) que acarretam o baixo desempenho escolar (SOUZA; MACEDO, 2012).

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 O que significa ser etnocêntrico?

2 O que são escolas democráticas?

3 Os laudos realizados só desencadeiam circunstâncias positivas? Justifique sua resposta.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

A PROPOSTA ATUAL DA EDUCAÇÃO

ESPECIAL

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

A experiência humana não seria tão rica e gratificante se não existissem obstáculos a superar. O cume ensolarado de uma montanha

não seria tão maravilhoso se não existissem vales sombrios a atravessar.

Helen Keller

De acordo com Lacerda (2007), a inclusão escolar é um tema que tem sido discutido em âmbito nacional. Para a autora, apesar de tantos debates e polêmicas sobre o assunto, vários países assumiram a inclusão como tarefa fundamental da educação pública e têm buscado concretizá-la.

A educação especial e a educação inclusiva existem, pois a sociedade faz diferença entre pessoas ditas normais e aquelas que possuem alguma limitação. Caso contrário, esse debate nem entraria em questão na sociedade. Portanto, para compreender a proposta de educação especial é necessário passar pelo conceito de deficiência.

Como você viu na Unidade 1, a noção de que um corpo com limitações exprime a diversidade humana é recente, e abarca uma série de desafios para as comunidades democráticas e para as políticas públicas. Ou seja, faz pouquíssimo tempo que as limitações dessas pessoas foram vistas sob a ótica dos direitos humanos, pois até então imperavam os saberes biomédicos e/ou os religiosos, com vistas à medicalização dos corpos com limitações, para que fossem normalizados. Isto é, a segregação, que tirava essas pessoas de circulação da sociedade, confinando-as em instituições onde passavam grande parte de sua vida (DINIZ; BARBOSA; SANTOS, 2009).

Já não é suficiente na sociedade atual, que as pessoas com impedimentos em alguma parte do corpo, possam acessar bens e serviços de saúde. Espera-se que elas possam degustar uma vida digna, na qual os obstáculos sejam retirados e o ambiente social acolha também os corpos com limitações – sejam elas físicas, intelectuais ou sensoriais (DINIZ; BARBOSA; SANTOS, 2009).

Assim, este tópico contempla reflexões sobre o conceito de deficiência, na sequência focaliza a educação especial, e finaliza com um olhar sobre a educação de surdos.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

2 DEFICIÊNCIA

O que é deficiência? Para Diniz, Squinca e Medeiros (2007), a maior parte dos conceitos de deficiência partem do princípio da existência de alterações de habilidades, causadas por restrições ou lesões, porém não há uma concordância de ideias quanto a quais alterações de habilidades e funcionalidades que configurariam deficiências. Enquanto parte das pessoas que possui alguma lesão não se considera deficiente, há outras que se consideram. Para delimitar quem é deficiente ou não é necessária uma intensa atividade intelectual, que atua pautada em diferentes conhecimentos, como o médico e o das ciências sociais, por exemplo. Não é por acaso que existem tantos debates sobre o que pode ser considerado deficiência, articulando-a com a justiça social (DINIZ; SQUINCA; MEDEIROS, 2007).

Algumas pessoas defendem que deveria ser criada uma lista minuciosa de quais alterações das habilidades humanas são consideradas deficiências. Em contrapartida, há aqueles que argumentam que essa medida é inviável, pois fecha os olhos para as complexidades que envolvem cada caso, como por exemplo, o grau de alteração de habilidades e as consequências do mesmo em termos de funcionamento do corpo humano, e a relação dessas consequências com o contexto social e a vida de cada pessoa.

A ideia de deficiência é frequentemente relacionada a limitações naquilo que se considera como habilidades básicas para a vida social. Não é fácil determinar quais são essas habilidades, muito embora grande parte do debate as relacione à mobilidade, ao uso dos sentidos, à comunicação, à interação social e à cognição. Uma outra condição para caracterizar uma variação de habilidade como deficiência é que essa se expresse no corpo como um estado permanente ou de longa duração (DINIZ; SQUINCA; MEDEIROS, 2007, p. 2591).

Diante de tantos impasses, a Organização Mundial da Saúde (OMS) formalizou uma classificação sobre deficiência em 2001. Trata-se de uma classificação internacional que atenta para a funcionalidade e a incapacidade que o problema em uma função ou estrutura do corpo pode causar, como por exemplo, na perda de função ou capacidade, ou no forte desvio de uma delas. Essa classificação ainda leva em consideração o estado de saúde da pessoa, e como ela se relaciona com o meio ambiente, e com as demais pessoas do seu entorno (DINIZ; SQUINCA; MEDEIROS, 2007). Essa classificação da OMS se propõe a orientar as políticas públicas de nação. A partir de 2007, essa classificação foi adotada na legislação brasileira para a implementação do Benefício de Prestação Continuada (BPC), um benefício de cunho assistencial (DINIZ; BARBOSA; SANTOS, 2009).

Vale lembrar que, assim como foi dito no início desse tópico, a forma que a sociedade encara uma circunstância pode fazer dela um problema ou não. Como apontam Diniz, Barbosa e Santos (2009), as desigualdades sociais experimentadas pelas pessoas com deficiência não são determinadas pela natureza. Pelo contrário, são forjadas social e culturalmente, pautadas em discursos e atitudes que

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TÓPICO 2 | A PROPOSTA ATUAL DA EDUCAÇÃO

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apregoam a normalidade definindo que pessoas com impedimentos do corpo não sejam dignas à vida social. O modelo social da deficiência vai na contramão dessas argumentações, questionando, colocando em xeque essa crença de que pessoas com deficiência precisam viver confinadas em locais criados para elas, ou mantidas escondidas dentro das próprias casas. Portanto, quando se vive em um ambiente que rechaça a diversidade corporal, a pessoa que possui alguma limitação tende a sofrer. Por isso, designar que uma pessoa é deficiente ou não (por exemplo, num caso de perícia), requer a análise do corpo dela, as habilidades que ela possui (ou não) e a forma pela qual ela interage com a sociedade (DINIZ; SQUINCA; MEDEIROS, 2007).

Sob essa perspectiva, ainda hegemônica no debate sobre deficiência no Brasil, a deficiência seria a expressão de uma limitação corporal do indivíduo para interagir socialmente. Para a comprovação da deficiência, a pessoa é submetida a uma perícia médica realizada pelo INSS, o que, na prática, atrela a definição de deficiência a avaliações médicas ad hoc (DINIZ; SQUINCA; MEDEIROS, 2007, p. 2591).

O modelo social preconiza a igualdade e apresenta um novo conceito de deficiência em contraste com as teorias sobre desigualdade e opressão. Além disso, transforma a maneira de identificação do corpo com limitações e seu vínculo com a sociedade. A adoção da Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência olha para a temática da deficiência sob o viés da justiça, dos direitos humanos e da promoção da igualdade. Ela busca que as pessoas com deficiência que vivem no solo brasileiro usufruam de bem-estar e de dignidade (DINIZ; BARBOSA; SANTOS, 2009).

3 EDUCAÇÃO INCLUSIVA

No Brasil, no começo dos anos 80, se intensificou o movimento pela Integração Escolar, que tencionava ir além da segregação, do afastamento entre crianças consideradas normais e as demais, por meio da criação de espaços comuns na sociedade (LACERDA, 2007).

Por volta dos anos 1990, as escolas especiais eram defendidas por boa parte dos teóricos da educação. As crianças consideradas normais iam às escolas regulares, e as crianças com deficiência frequentavam escolas especiais, voltadas às necessidades delas. Em determinado momento, passou-se a questionar se distribuir as crianças desta maneira não seria uma forma de segregação, apoiada em discriminação, e que acaba disseminando o isolamento.

A partir de então, os discursos sobre solidariedade e respeito às diferenças individuais passaram a ser difundidos, e a expressão da moda tornou-se "educação inclusiva". Ou seja, agora todos estudam juntos, no mesmo tipo de escola: a regular – que passa a ser inclusiva. Com a Declaração de Salamanca (1994), o movimento da Integração Total se expande, passando a ser denominado de "inclusão" (LACERDA, 2007).

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

Lacerda (2007) esclarece que a implantação da inclusão não ocorreu tranquilamente. Afinal, as crianças são diferentes entre si. Sobretudo as crianças com deficiência, que demandam atendimentos diferenciados, logo precisam de professores com formações específicas, ambiente adaptado, cuidados individualizados e ajustamentos curriculares. Isto é, é necessário que diversos representantes da educação pensem em conjunto e trabalhem para oferecer os recursos que essas crianças precisam (LACERDA, 2007).

Os defensores da inclusão, como Bunch (1994), Cohen (1994), Kirchner (1994), Silveira Bueno (1994) e Sassaki (1997) argumentam que todos os estudantes devem ter as mesmas oportunidades de frequentar classes regulares próximas ao local de sua residência, com crianças de mesma faixa etária, ou frequentar a mesma escola que seus irmãos. Reconhecem que para isso se faz necessário um programa educacional adequado às capacidades dos diferentes alunos, e indicam ainda a importância de oferecer suporte e assistência às crianças com necessidades especiais e aos professores para que esta integração seja a melhor possível e defendem também que as escolas especiais e a formação de pessoal qualificado para esse tipo de trabalho devam ser mantidas, já que certas crianças demandam uma atenção realmente diferenciada, e a escola especial pode ser o recurso mais indicado (LACERDA, 2007, p. 259-260).

A questão é que em termos práticos, poucas crianças com deficiência têm usufruído dessas condições básicas ao seu efetivo aprendizado. Afinal de contas, a inclusão requer o compromisso da escola com a aprendizagem de cada criança, independente de questões sociais, étnicas ou linguísticas. Passa-se a ver a diversidade como algo positivo na sala de aula. Quanto mais diversificada for a composição de alunos de uma sala, mais riqueza nas interações, mais possibilidade de aprender a conviver com as diferenças. No entanto, como já foi visto, nem todas as crianças têm suas condições particulares atendidas (LACERDA, 2007).

Não se pode esperar que um sistema que levou décadas para ser sedimentado possa ser substituído por outro fácil e instantaneamente. A inclusão é processual, leva tempo para ser viabilizada. Ela pode convergir em processos linguísticos apropriados, de aprendizagem de conteúdos acadêmicos e práticas sociais de leitura e escrita (LACERDA, 2007).

Em outras palavras, para Lacerda (2007), uma coisa é acreditar nos valores e no potencial da educação inclusiva, em termos de promoção da justiça, e de uma infinidade de benefícios na superação da segregação. Outra coisa, é fingir que ela não possui arestas que necessitam de reparos. Por exemplo, a realidade educacional brasileira é conivente com a inclusão, tendo em vista as salas de aula superlotadas, instalações físicas insatisfatórias, quadros docentes que não possuem a devida formação (LACERDA, 2007).

Nesse sentido, Silva e Mendes (2008) realizaram uma pesquisa sobre a educação especial e suas articulações com a relação família-escola e parceria colaborativa. Essas pesquisadoras intentaram averiguar se os comportamentos

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TÓPICO 2 | A PROPOSTA ATUAL DA EDUCAÇÃO

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dos profissionais da educação e dos familiares de crianças com deficiência condiziam com uma parceria colaborativa efetiva e bem-sucedida.

Fez parte da pesquisa delas um levantamento de como acontece essa

relação em outros países, nos quais o empoderamento dos pais aparece como algo primordial para a participação do processo decisório quanto aos serviços que serão escolhidos para seus filhos e para si mesmos. Já na pesquisa feita no Brasil, esse quesito nem foi mencionado pelos participantes, o que dá a entender que familiares e profissionais da educação ainda não se colocam em posição de igualdade nessa nação (SILVA; MENDES, 2008).

Assim, quando se parte da premissa de que a igualdade entre parceiros é indispensável para o desenvolvimento de um processo colaborativo, pode-se inferir que familiares e profissionais brasileiros necessitam amadurecer, até para que fique claro qual é o papel de cada um. Ainda assim, a pesquisa deu indícios de que ambos estão andando nessa direção, de modo que características essenciais do processo colaborativo foram observadas: "respeito mútuo, comunicação, confiança, participação, amabilidade, sinceridade, seriedade e imparcialidade" (SILVA; MENDES, 2008, p. 233).

Posteriormente, as duas pesquisadoras fizeram outra pesquisa sobre educação especial/inclusiva, abrangendo a relação entre pais e profissionais da educação. Desta vez, incluíram a figura do psicólogo nesta relação. Para elas, o papel do psicólogo parece ter boas perspectivas no contexto da inclusão educacional. Assim, elas observaram a prestação de Consultoria Colaborativa Escolar, por psicólogo atuante em parceria com professores e familiares (SILVA; MENDES, 2012).

As pesquisadoras concluíram que a Consultoria Colaborativa Escolar pode ser recomendada nos programas de intervenção das escolas brasileiras. Porém, a pesquisa evidenciou que ainda há muito por fazer no que concerne o investimento nos prédios escolares, na valorização e formação de professores e, sobretudo, na contratação e qualificação de profissionais que auxiliem no desenvolvimento de relações de parceria colaborativa entre professores e familiares. Essas iniciativas contribuem para o atendimento da diversidade nos espaços escolares e na promoção do desenvolvimento de todos os alunos (SILVA; MENDES, 2012).

4 EDUCAÇÃO INCLUSIVA COM ESTUDANTES SURDOS

Resgatando a pesquisa de Diniz, Squinca e Medeiros (2007), observa-se que alterações na habilidade de ouvir fazem parte da lista de incapacidades permanentes:

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

A lista de incapacidades permanentes elegíveis foi definida por um decreto em 1999 e excluiu algumas incapacidades tradicionalmente associadas à deficiência. Basicamente, a lista de incapacidades reduziu-se a limitações visuais e auditivas graves, tipos de paralisia física de origem neurológica, ausência de algum membro e uma lista vaga de incapacidades mentais manifestadas antes dos 18 anos. Se as definições fossem estritamente seguidas, pessoas com problemas neurológicos degenerativos, artrite, limitações circulatórias graves, HIV/AIDS sintomática, doenças renais e esquizofrenia intermitente, só para citar alguns, não seriam elegíveis ao BPC, mesmo quando essas condições impedissem o trabalho, causassem dependência para os cuidados de atividades de vida diária e resultassem em extrema pobreza (DINIZ; SQUINCA; MEDEIROS, 2007, p. 2592, grifo da autora).

Portanto, por mais que há uma convenção social de que ser surdo não é ser deficiente, depara-se com controvérsias. Por exemplo, no filme Nada que eu ouça, há um momento em que se questiona porque alguns surdos recebem verbas de cunho assistencial, já que não se consideram pessoas com deficiência.

Além do mais, como já foi repetido algumas vezes, só faz sentido se pensar em educação inclusiva ou especial, quando se considera que existam alunos com deficiência. Por exemplo, nunca se ouviu falar em escolas especiais para alunos canhotos, pois as pessoas canhotas não são consideradas doentes ou deficientes. Isso não faz com que elas sejam colocadas em salas de aulas regulares sem qualquer adaptação. Já existem carteiras específicas e até mesmo materiais escolares adaptados para as pessoas canhotas, ou seja, se há tantas pesquisas e mobilizações acerca de escolas especiais ou inclusivas para alunos surdos, é porque parte da sociedade os vê como pessoas que precisam de um conjunto de circunstâncias especiais no âmbito educacional.

A inserção de estudantes surdos em escolas regulares precisa antever certos aspectos, conforme Lacerda (2007):

• Assegurar sua possibilidade de acesso aos conhecimentos que estão sendo trabalhados.

• Respeito por seu modo peculiar de funcionamento. • Respeito por sua condição linguística.

Conforme Aspilicueta et al. (2013), sob a perspectiva linguística, a melhor opção para a educação de surdos é a escola específica para eles. Quando a opção mais viável for a escola regular, se faz necessário que tanto os aspectos de ordem legal sejam cumpridos, quanto as políticas públicas e condições concretas nas quais se processa a intervenção profissional. Ou seja, estão inclusos nestes pontos os recursos humanos, as condições do espaço físico, os tempos escolares, e formação continuada de professores.

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TÓPICO 2 | A PROPOSTA ATUAL DA EDUCAÇÃO

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De acordo com Lins e Nascimento (2015), parece consensual que o respeito à língua de sinais é imprescindível para a educação de surdos. No entanto, pouco vale o discurso, se na realidade as crianças se deparam com essas situações em sala de aula:

• A presença de intérprete efetiva em sala de aula, mas a criança desconhece a língua de sinais.

• Quando a criança ainda desconhece a língua de sinais, mesmo que um intérprete eficiente esteja em sala de aula, ela não conseguirá compreender o que o intérprete estará tentando transmitir.

• Aulas ministradas apenas em português, com a proposta de que no contraturno escolar a criança seja atendida pelo AEE (Atendimento Educacional Especializado).

• Ou no pior dos casos, a criança é matriculada numa sala de ouvintes e não conta com quaisquer mudanças em termos didáticos ou curriculares.

O próximo tópico aprofundará as reflexões sobre a proposta inclusiva para surdos e a proposta de escolas bilíngues, porém, antes de finalizar o presente tópico, destacamos o posicionamento de Aspilicueta et al. (2013): pode-se dizer que a inclusão acontece, de fato, quando um conjunto de reflexões e ações são tomadas e acarretam na entrada de estudantes no ensino regular, que é seguida pela sua permanência nele, e coroada com a conclusão dos estudos. Quando os alunos são devidamente preparados e instrumentalizados para vida em sociedade, pode-se dizer que experimentaram uma verdadeira inclusão educacional.

É a confluência de esforços da educação básica, com a educação superior e a educação especial, que propicia o desenvolvimento de competências essenciais para lidar com os diversificados desafios que perpassam a esfera escolar. Quando o aluno com deficiência nem consegue entrar na escola, ou entra, mas não consegue permanecer nela, ele não foi assistido por uma proposta factualmente inclusiva. No máximo, ele esteve diante de "práticas pedagógicas excludentes ou, no mínimo, dissimuladoras de uma realidade que prima pela exclusão" (ASPILICUETA et al., 2013, p. 408).

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Por volta dos anos 1990, acreditava-se que as melhores escolas para estudantes com deficiência eram as especiais – que eram geridas ao encontro das necessidades particulares que eles tinham.

• Depois dos anos 1990, começou o movimento de inclusão educacional, que afirmava que todas as crianças deveriam estudar em escolas regulares independentemente de suas características individuais ou deficiências.

• Embora o discurso da inclusão educacional seja belíssimo, colocá-lo em prática não tem sido tarefa fácil. Afinal, há pessoas que possuem necessidades diferenciadas para conseguirem aprender.

• A investigação científica de Silva e Mendes (2008) constatou que pais de estudantes com deficiência e profissionais da educação apresentam características básicas do processo colaborativo: respeito bilateral, comunicação, confiança, participação, amabilidade, sinceridade, seriedade e imparcialidade.

• Os obstáculos que se levantam às iniciativas inclusivas não devem ser motivo para desistir delas. Apenas significam que é necessário trabalhar com mais afinco para que todas as crianças tenham acesso efetivo à educação e consigam concluir seus estudos.

RESUMO DO TÓPICO 2

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AUTOATIVIDADE

1 Quais são os pontos positivos e os pontos que precisam ser desenvolvidos no que tange à proposta inclusiva nos dias atuais?

2 Escreva um parágrafo relacionando a epígrafe deste tópico aos temas que ele tratou: (Epígrafe: "A experiência humana não seria tão rica e gratificante se não existissem obstáculos a superar. O cume ensolarado de uma montanha não seria tão maravilhoso se não existissem vales sombrios a atravessar" Helen Keller).

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TÓPICO 3

ESCOLAS INCLUSIVAS OU ESCOLAS

BILÍNGUES

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

"– Quer dizer que a surdez é uma cultura?– A língua é a cultura deles. O sentido que têm de si

mesmos como pessoas. Sua história, tradições, dignidade, poder,tudo. Tudo isso progride e vive nas mãos deles".

Filme Nada que eu ouça

De acordo com Falcão (2012, p. 32), é necessário que – uma nova escola seja constituída, que "ensine/trabalhe/interaja/reflita/argumente/dialogue sobre os caminhos para uma nova vida, uma nova cidadania, uma nova forma de ver, [...] acolher e conviver com os diferentes e suas diferenças".

Porém, como se configuraria essa nova escola? Nunes et al. (2015) questionam qual destes quatro tipos de escola seria o mais apropriado para alunos surdos:

• Uma escola inclusiva? Ou seja, que possibilita o convívio entre surdos e ouvintes?

• Uma escola bilíngue? Isto é, uma instituição educacional para alunos surdos, em que as duas línguas são trabalhadas: a língua de sinais e a língua portuguesa (principalmente na modalidade escrita).

• Uma escola que mescle as duas possibilidades, com uma sala apenas para surdos?

• Uma escola bilíngue para surdos apenas durante a educação infantil e o ensino fundamental?

2 ESCOLAS BILÍNGUES

Se a escola bilíngue é destinada aos alunos surdos, ela não equivale a um retrocesso? Não voltaríamos às escolas ditas especiais décadas atrás? Uma escola bilíngue não caracteriza uma proposta segregadora?

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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A proposta bilíngue foi aceita pelo Estado. Ela delineia que a língua de sinais se faça presente em sala de aula, e que depois as crianças também aprendam a língua portuguesa, podendo abranger as modalidades oral, auditiva e escrita. A partir do momento em que a surdez é compreendida como uma diferença linguística, e não como uma deficiência, faz sentido possibilitar que a criança surda acesse a Libras o quanto antes, para que posteriormente consiga ter acesso às informações que possam ser do interesse dela (NUNES et al., 2015).

Para Aspilicueta et al. (2013), a concepção bilíngue se embasa na perspectiva de que o surdo é um sujeito bilíngue e bicultural, afinal é integrante de uma comunidade surda com língua e cultura próprias, e ao mesmo tempo pertence à comunidade ouvinte majoritária.

Gesser (2008) esclarece que apesar do discurso sobre a surdez tenha tido progressos, estando mais vinculado ao multiculturalismo e ao respeito à diversidade, porém, será que os serviços que estão sendo prestados aos surdos condizem com esses discursos?

Parece haver uma concordância de ideias sobre a abordagem bilíngue na escolarização dos surdos, todavia, ela está pautada em quais valores, princípios, discursos ideológicos? Quem está tomando as decisões atinentes a ela? Há participação dos surdos nestas formulações e escolhas? Ela está sendo representativa? Afinal, de que educação bilíngue estamos falando? (GESSER, 2008).

Esses questionamentos são válidos, até porque, propor a educação bilíngue para o surdo e não a alinhavar com políticas públicas que amparem o uso da língua de sinais nos espaços sociais é insensato. Além disso, não se pode esquecer que aprender a conviver com as diferenças é uma tarefa árdua, mas proveitosa para o bem comum (NUNES et al., 2015).

Quanto aos fenômenos ideológicos que norteiam as práticas educacionais, Gesser (2008) percebeu que as interações na sala de aula ora estão embasadas no modelo conceitual clínico, ora no modelo conceitual socioantropológico – no que se refere às concepções da surdez:

Esta forma dicotômica e reducionista de se olhar o surdo e a surdez faz com que novas propostas e narrativas pedagógicas possam também ser mascaradas, criando-se um falso consenso de mudança, impedindo-nos de tratar tais indivíduos e temas em suas complexidades, multiplicidades, ambiguidades, irregularidades, contradições, ambivalências e tensões (GESSER, 2008, p. 236).

Aspilicueta et al. (2013) defendem que escolas pautadas na perspectiva bilíngue têm acarretado no sucesso da educação de crianças surdas. Nunes et al. (2015) explicam que as escolas bilíngues não podem ser classificadas como segregadoras em virtude do seu objetivo: preparar o estudante surdo para ingressar no ensino médio, superior e no mercado de trabalho. Além disso, conforme a

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TÓPICO 3 | ESCOLAS INCLUSIVAS OU ESCOLAS

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disposição legal, as escolas bilíngues podem abranger a educação infantil e o ensino fundamental. Ou seja, “A escola bilíngue seria o espaço de socialização, de construção de uma identidade positivada, de acesso ao conhecimento e uma comunicação significativa para os que costumeiramente são ‘sem-lugar’” (NUNES et al., 2015, p. 542).

O que deve ser entendido é que não existirá uma discriminação, tanto é que uma sala para o ensino da Libras proporcionará grande benefício para o surdo, pois além de ensinamento específico ele estará interagindo com pessoas que se utilizam da língua falada, ou seja, há inclusão nesse sentido (MARTINS, 2016).

Aceitar a língua de sinais consiste em valorizar os surdos, possibilitando que eles sejam representados e ouvidos. É por meio dela, também, que eles conseguem se apropriar dos conteúdos de português, ciências, geografia etc. Inclusive, ela é fundamental para a acessibilidade digital. Quando a criança desenvolve a língua portuguesa, amplia infinitamente suas possibilidades de utilização das ferramentas digitais. Em suma, “o bilinguismo pode ser um caminho de integração do surdo à escola e à sociedade por valorizar e facilitar a comunicação do indivíduo surdo” (NUNES et al., 2015, p. 542). Lacerda (2007) acrescenta que, ao se apropriar da língua de sinais, a criança surda tem melhores condições de se desenvolver em termos cognitivos e linguísticos, em conformidade com suas capacidades, de modo similar ao que acontece com as crianças ouvintes quando aprendem a falar.

DICAS

Assista ao filme Black.

Uma cena do filme que retrata brilhantemente esse momento em que uma criança descobre o mundo da linguagem, e que os objetos possuem um nome, e que esse nome tem um significado ou sentido, é o momento em que a personagem surda e cega, chamada Michele, contracena com seu professor Sahai.

Ele faz com que ela tenha uma experiência ímpar com a água de um chafariz, mostrando a ela, por meio do toque, os sinais que representam a água, e pelo toque nos lábios, a vibração e movimento labial que produz a palavra “água”. Quando ela descobre a ligação entre a água e suas formas de representação comunicacionais, ela sai apalpando tudo o que vê pela frente e mostra os sinais que já associa, e dá a entender que está aberta a aprender novas palavras.

Black (2005) é um drama indiano dirigido por Sanjay Leela Bhansali.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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FIGURA 1 – BLACK

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-gRQh2bSX7o>. Acesso em: 20 jun. 2018.

Como já foi apontado diversas vezes ao longo deste livro, é fundamental que existam políticas públicas acerca de formação profissional para os diferentes profissionais que têm contato com os surdos e seus familiares. Além das instituições educacionais, a Libras pode circular nos espaços destinados aos serviços de saúde, é indispensável que os profissionais façam uso da Libras com os pacientes surdos. A Libras também pode fazer parte de eventos sociais, espaços religiosos, páginas da internet, programas da televisão, cinema etc. (NUNES et al., 2015).

No que se refere especificamente ao espaço da escola, Aspilicueta et al. (2013) realizaram uma pesquisa com vistas a comparar o que acontece em uma escola em que há concentração de alunos surdos, com outra instituição em que há somente uma estudante surda incluída. Concluíram que, na primeira, havia vários professores fluentes em Libras e que os investimentos na formação específica da equipe contribuíram para que a Libras se apresentasse em abundância nas interações entre os integrantes da escola. Inclusive os alunos ouvintes utilizavam a Libras – ainda que associadas com a linguagem oral ou com a gestual, para interagir com os surdos. Já a escola em que uma aluna surda estava incluída, a Libras era pouco presente, sendo mais ressaltados os princípios oralistas, portanto a aluna não fez uso considerável de Libras, tampouco da linguagem oral (ASPILICUETA et al., 2013).

A pesquisa de Lacerda (2007) parece corroborar partes desses resultados, já que, ao analisar um contexto de inclusão de aluno surdo em escola regular, constatou que não parecia haver envolvimento verdadeiro entre crianças surdas e ouvintes. Essa superficialidade pode acontecer porque as crianças ouvintes não conhecem muitos sinais, o que restringe os atos comunicativos entre elas. Como geralmente o aluno surdo está habituado a conviver com ouvintes, em sua maioria, pode aceitar essa situação, pois não tem experiências suficientes com seus pares. Assim, os laços que crianças surdas e ouvintes tentam estabelecer tendem a ser frágeis.

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TÓPICO 3 | ESCOLAS INCLUSIVAS OU ESCOLAS

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Então, na escola regular inclusiva, tudo indica que a única interação satisfatória acontece entre o aluno surdo e a intérprete. O aluno surdo perde a oportunidade de ter um relacionamento mais próximo com a professora regente e com os demais docentes da escola. O aluno surdo fica excluído das conversas paralelas entre as crianças, tendo em vista que as intérpretes focalizam a fala da professora, ou as falas dos alunos que aparecem em destaque nas interações. Em resumo, pode-se afirmar que o aluno surdo até pode frequentar a classe, porém sua inclusão tende a ser parcial, pois por mais que o intérprete tente ajudá-lo, ele perderá oportunidades de estabelecer contato efetivo de modo autônomo com os outros integrantes do seio escolar (LACERDA, 2007).

Vale reiterar que, como já foi mostrado nas unidades anteriores, por vezes as crianças surdas não conseguem acompanhar o desenvolvimento escolar das demais crianças, por causa de aspectos da linguagem. Muitas vezes não conseguem construir o conhecimento esperado para a faixa etária. Os estudantes surdos possuem necessidades singulares, que demandam a elaboração de propostas educativas e práticas pedagógicas que as levem em consideração (LACERDA, 2007).

Prezado acadêmico! Você alguma vez já vivenciou uma situação em que estava no meio de pessoas que não falam a sua língua? Talvez já tenha viajado para o exterior, ou tenha grupos de amigos que usem outras línguas para se comunicar – como o espanhol e o inglês – por exemplo. Se você já passou por essa experiência, deve se lembrar de que ela pode ser constrangedora e até desagradável. Essa sensação é experienciada pelos surdos dia após dia.

ATENCAO

Recapitulando, quando uma criança surda é inserida numa escola regular, ela acaba sendo prejudicada por diversos fatores, tais como:

• interações comunicativas limitadas;• relações interpessoais (com crianças e professores) menos aprofundadas;• reduzida participação nas dinâmicas da aula;• escassa participação nas brincadeiras e interações que ocorrem espontaneamente

nas classes, paralelamente à aula.

Assim, Lacerda (2007) sugere que ao formular práticas inclusivas com estudantes surdos, esses pontos sejam observados. Além da relevância da língua de sinais, da presença do intérprete em sala de aula, e da necessidade de formação continuada do professor, é necessário que o professor ainda tenha compreensão dos diferenciados processos através dos quais os alunos surdos empregam para

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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se tornarem leitores e escritores de uma língua que não dominam (GUARINELLO et al., 2006).

É importante estar atento ao que diz a legislação sobre as propostas de inclusão. A pesquisa de Lacerda, Albres e Drago (2013) abordou essa temática:

A análise da legislação indica a previsão de figuras profissionais novas e necessárias à educação de surdos; a intenção de promover formação continuada para seus quadros, de modo a ampliar as possibilidades de um atendimento de qualidade aos alunos surdos; e o intento de assumir compromisso com uma perspectiva educacional bilíngue, seja na escola de surdos, seja no espaço inclusivo (LACERDA; ALBRES; DRAGO, 2013, p. 78).

DICAS

Assista a dois filmes para refletir sobre os surdos sob o viés da diferença linguística.

No drama romântico americano Filhos do silêncio (1986), dirigido por Randa Haines, a personagem Sarah se esforça para exprimir-se utilizando a língua de sinais e resiste às propostas oralistas. Ao invés de procurar aprender a língua de seus familiares e amigos, ela espera que eles aprendam a sua, pois não se considera uma pessoa inferior em relação a eles. Será que as pessoas que fazem parte do cotidiano dela irão atendê-la? Ou tentarão convencê-la de que é ela quem precisa se adaptar ao mundo deles? Um motivo a mais para não perder esse filme é que a atriz Marlee Matlin – que dá vida à personagem Sarah, conquistou o Oscar de Melhor Atriz.

FIGURA 2 – OS FILHOS DO SILÊNCIO

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=VyPVxht-0hk>. Acesso em: 18 jun. 2018.

Já no segundo filme – Mr. Holland – adorável professor (1995) – o filho do Mr. Holland, que se chama Coltrane “Cole” Holland, nasce surdo. Mr. Holland é um exemplar professor de música e tem dificuldades de lidar com a frustração de ter um filho que não pode contemplar as músicas compostas e tocadas pelo pai. Mr. Holland acaba deixando a família em segundo plano e se dedica ainda mais como professor – na escola em que trabalha com jovens. Mr. Holland mostra-se contrário à matrícula do filho na escola especial. Os pais de Cole acabam tendo uma série de discussões, e numa das mais emotivas delas, a mãe desabafa: “Você passa seus dias com seus alunos normais enquanto eu estou aqui com ele, incapaz de

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TÓPICO 3 | ESCOLAS INCLUSIVAS OU ESCOLAS

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conversar com meu filho, saber o que ele pensa, o que ele sente, dizer a ele o quanto eu o amo”. A mãe procura aprender a língua de sinais para se comunicar com o filho. No final da trama, o garoto retorna, já adulto, e expressando-se por meio da oralidade. Assim consegue, finalmente, comunicar-se com o pai.

FIGURA 3 – ADORÁVEL PROFESSOR

FONTE: Disponível em: <https://clickidealequilibrio.com.br/filme-adoravel-professor/>. Acesso em: 18 jun. 2018.

Regular, inclusiva ou bilíngue, o ideal é que a escola reconheça o surdo como uma pessoa que está ali para aprender e aprender a aprender. É um estudante que precisa da Libras para conseguir dar continuidade aos estudos. Esse modelo de escola bilíngue pode ser implementado em qualquer escola, desde que contemple: organização pedagógica e curricular, bem como planejamentos e projetos educacionais, que levem as especificidades do surdo em conta. Ou seja, que possam aceitar e ensinar o aluno surdo, tendo em vista sua história de vida e sua cultura, para que o professor e o profissional clínico consigam desenvolver as suas estratégias de tratamento de acordo com a vivência deste aluno (MARTINS, 2016).

Cada pessoa tem uma particularidade e o surdo não é diferente. Essa particularidade individual é muito importante, pois de acordo com o histórico familiar – por exemplo – de cada pessoa se tem um tratamento mais lento, lembrando que mesmo a pessoa que não é surda também possui tal especificidade (MARTINS, 2016).

Na perspectiva de Nunes et al. (2015), não há unanimidade no que se refere à prática cotidiana da educação do surdo. Há quem defenda a escola bilíngue, outros defendem a escola inclusiva, e ainda há um grupo que acredita que a melhor opção é mesclar as duas possibilidades. O que precisa ficar claro é que quando o surdo não for limitado à patologia, e dispuser de um espaço educacional que aceite a Libras de fato, ele estará usufruindo dos parâmetros da educação inclusiva.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Um argumento que permeia nossa sociedade é que o surgimento de salas de aula direcionadas ao público surdo seria uma segregação (separação) do surdo para com a sociedade onde ele vive. Isso quer dizer que alguns estudiosos, ou mesmo familiares de pessoas surdas, acham que o surdo deveria estar normalmente incluído com pessoas ouvintes.

• A compreensão da importância da língua de sinais para o surdo é um dos principais argumentos adotados pelas escolas bilíngues.

• Quando há mais surdos estudando juntos, e a escola investe na formação dos professores voltada ao público surdo, bem como busca oferecer um ambiente inclusivo, o processo de aprendizagem dos surdos parece ser beneficiado (ASPILICUETA et al., 2013).

• Escolas em que um aluno surdo é inserido numa sala onde só existem alunos ouvintes, fornecem menos possibilidades de interação genuína para essa criança. Ela deixa de interagir com mais pessoas que integram a cultura surda. Portanto, pode-se afirmar que a inclusão de alunos surdos em escolas regulares não dá conta dos desafios linguísticos impostos por essa inclusão (ASPILICUETA et al., 2013).

• A presença do intérprete de Libras e o respeito à língua de sinais, na escola regular, não garante uma inclusão efetiva do aluno surdo, pois a dificuldade de acesso à Libras por parte das crianças ouvintes associada com a presença de um único surdo em sala, que precisa do intérprete para intermediar todos os seus diálogos, desemboca condições muito diferentes daquelas vivenciadas pelos alunos ouvintes (LACERDA, 2007).

• O surdo seria muito melhor assistido caso houvesse salas de aula que promovessem o ensino da Libras, para a compreensão da linguagem falada ou escrita (língua portuguesa). Essas salas de aula poderiam comportar também pessoas ouvintes (como ampara a lei), que podem ser parceiras no sucesso do aprendizado da língua de sinais pelo surdo.

• A sala de ensino bilíngue corresponde ao ensino do conteúdo das disciplinas através da Libras, quando a atitude familiar dos pais, em matricular o filho surdo em uma escola que ensine a língua de sinais, é muito importante!

• A proposta inclusiva efetiva é aquela que procura disponibilizar um espaço educacional condizente com as necessidades pedagógicas dos estudantes surdos.

RESUMO DO TÓPICO 3

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AUTOATIVIDADE

1 Para facilitar a inclusão do surdo, basta somente preparar e capacitar professores e outros profissionais (também da área da saúde, como fonoaudiólogos)? Justifique sua resposta.

2 Para que o aluno surdo entenda as explicações e possa progredir em sua jornada escolar, é suficiente a presença de um intérprete em sala de aula? Justifique sua resposta.

3 Como você diferencia a escola inclusiva da escola bilíngue?

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TÓPICO 4

PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO

DOCENTE COM CRIANÇAS SURDAS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nenhum pessimista jamais descobriu os segredos das estrelas, nem velejou a uma terra inexplorada, nem abriu um novo céu

para o espírito.

Helen Keller

Atualmente, veem-se poucos alunos surdos na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental nas escolas regulares. Muitas vezes, essas crianças acabam entrando tardiamente na escola. Quando ingressam, não é raro vê-las sozinhas nos momentos de recreação, com um semblante acabrunhado (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015). No entanto, esse isolamento acontece, na maioria das vezes, por conta da linguagem – por não utilizarem o mesmo código de comunicação das crianças ouvintes, como indica Falcão (2012, p. 90):

Observamos que as brincadeiras com crianças surdas ocorrem individualmente. Geralmente crianças mais tímidas e menores são discriminadas pelas crianças maiores porque ainda não sabem se comunicar em sinais ou não aguentam o ritmo e a intensidade da atividade, ou em grupos, geralmente com outros surdos que costumam se isolar, acreditamos que pela diferença linguística e falta de inserção da Libras para outras crianças ouvintes.

Deste modo, este tópico tem por objetivo averiguar como as crianças surdas costumam se portar na educação infantil. As perguntas que esse tópico buscou responder são: as crianças surdas gostam de brincar tanto quanto as outras? Como elas brincam, se nem sempre conseguem se comunicar com as crianças ouvintes? E depois que saem da educação infantil, quais são as especificidades do processo de aprendizagem delas na educação fundamental? Elas podem aprender tanto quanto as demais crianças? Precisam de estratégias pedagógicas diferenciadas? Por quê? Quais? Quais são os pontos de vista dos professores acerca dos alunos surdos? As crianças surdas se inserem em práticas de letramentos? De que maneiras? A aprendizagem da leitura e da escrita tem obstáculos diferentes para crianças surdas, quando se leva em consideração as crianças ouvintes? As crianças surdas estabelecem relações com a literatura? Há tecnologias de informação e comunicação que podem auxiliar o professor no que tange ao processo de ensino com crianças surdas?

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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DICAS

Antes de dar continuidade à leitura, que tal um filme para incrementar o seu processo de reflexão?

FIGURA 4 – O PAÍS DOS SURDOS

FONTE: Disponível em: <http://www.ensaiosababelados.com.br/o-pais-dos-surdos-de-nicolas-philibert/>. Acesso em: 18 jun. 2018.

O filme francês O país dos surdos”(Le Pays des Sourds), dirigido por Nicolas Philibert (1992), é um documentário que subverte a lógica em termos de filmes sobre surdos. Ao invés de ser estrelado por vários atores ou especialistas ouvintes que falam sobre os surdos, os protagonistas desse filme são os próprios surdos, enquanto os ouvintes assumem os papéis coadjuvantes. Trata-se de um filme de não ficção, que discute questões da língua de sinais e do oralismo. É válido lembrar que o filme retrata a década de noventa e o sistema de ensino da França. Hoje as concepções do ensino de crianças surdas estão sendo transformadas. Ensiná-los a falar já não é um dos principais objetivos da escola. Ainda assim, vale a pena assistir ao filme, pois há cenas em que as crianças surdas aparecem no contexto escolar, e há várias ponderações sobre formas de comunicação dos surdos (por meio do tato e da visão), e sobre como eles encaram e saboreiam a vida.

2 CRIANÇAS SURDAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O BRINCAR

A criança surda é uma criança que gosta de brincar tanto quanto as outras crianças, porém quando se vê sem interlocutores com os quais consegue se comunicar, pode perder a vontade de brincar. Isso é preocupante, visto que brincar é uma atividade vital da infância (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

Nessa perspectiva, almeja-se criar novas políticas que possam atrair as crianças surdas para este convívio possibilitado pela educação infantil, em que,

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além do brincar, vão sendo ensinadas a língua de sinais (Libras) e também tópicos da Língua Portuguesa. A presença de professores surdos bilíngues (Libras X Língua Portuguesa) oportuniza um aprendizado mais congruente para a criança surda (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

O ideal seria o encaminhamento bilíngue (Libras e Língua Portuguesa) da criança surda já na Educação Infantil, com professores preparados para tal, ainda com auxílio da área da saúde. Infelizmente, aqui no Brasil as políticas públicas neste sentido nem sempre são satisfatórias (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

A família e a sociedade em geral também podem contribuir para a viabilização da educação de surdos. A alteridade, ou seja, o processo de interação por meio do qual se conhece o outro, se entende o outro, é fundamental neste contexto. Pode-se se chegar à alteridade através da socialização, do convívio entre o eu e o outro. Com isso, a comunicação no espaço de ensino-aprendizagem se realizará de tal maneira que a criança surda será vista como um ser humano que quer aprender a se comunicar. Esta comunicação está contida na língua de sinais, que será intermediada pela Língua Portuguesa (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

Quanto antes as crianças surdas se apropriarem de formas de comunicação, antes elas conseguirão interagir com seus pares e poderão brincar livremente com os mesmos.

2.1 OS SENTIDOS DO BRINCAR

Para Falcão (2012), há brincadeiras com regras, enquanto outras são espontâneas, desregradas. Estas últimas podem desenvolver a inventividade e a criatividade. "Também estimula a interação, rompe e supera conflitos, libera do corpo a imaginação, sentimentos, valores, frustrações, conflitos, reconstruindo o ser pessoa, constituindo-se de sujeito com vitalidade paixão" (FALCÃO, 2012, p. 85).

Brincar é uma atividade perpassada por questões culturais, portanto nem

sempre brincar significou a mesma coisa na sociedade. Como explicam Oliveira et al. (2006), antes do século XIX, brincar era considerado desnecessário, ou minimamente desimportante. A única serventia do brincar era o entretenimento e o lazer. Depois da obra Emilio, de Rousseau (1972), as atividades espontâneas das crianças passaram a ser tidas em alta conta, quando a concepção de criança foi modificada. A criança foi deixando de ser vista como um adulto em miniatura. Hoje, as pesquisas da área da Psicologia afirmam que, para a criança, o brincar é coisa séria.

A criança aplica toda a sua atenção nas brincadeiras e busca fazer o melhor possível, pois tem estímulo para isso (brinquedos e jogos) (OLIVEIRA et al., 2006). Os brinquedos propriamente ditos nem sempre são imprescindíveis,

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já que a criança tende a ser criativa e utilizar objetos para representar o que está imaginando, por exemplo, um cabo de vassoura pode significar um cavalinho. Além disso, por intermédio do brinquedo, a criança pode executar atividades que lhes são impossíveis na vida real (MARQUES; BARROCO; SILVA, 2013).

Também verificamos que alguns jovens surdos se apoderaram de uma vassoura e a "transformaram" numa guitarra com microfone, musicalidade e dança. A brincadeira liberta a criança ao uso de objetos, que seriam, a princípio, inacessíveis, e que precisariam de intermediadores ouvintes, oferecendo condições de deslocarem-se das suas limitações e assumem posições e brincadeiras (FALCÃO, 2012, p. 93).

O brincar auxilia a criança a compreender o mundo que a cerca, as formas de relacionamentos e o autoconhecimento. Ao brincar de casinha, de escolinha, de heróis, a criança vai imitando comportamentos que presenciou e acrescentando elementos da imaginação. Então, ela vincula o real ao imaginário. O resultado são ensaios, simulações, hipóteses de formas de se relacionar com outrem. Brincar lhe concede oportunidade para refletir sobre o mundo dos adultos, o mundo infantil, a sua realidade. As brincadeiras ainda estimulam a criança a pensar e podem contribuir para o desenvolvimento do pensamento abstrato, numa época em que impera o pensamento concreto. Assim, o brincar contribui para que a criança se desenvolva em termos cognitivos, psicológicos, motores e sociais (OLIVEIRA et al., 2006).

No ato de brincar, a criança reproduz em sua imaginação situações vividas pelos adultos diante da realidade. Nesse aspecto, a criança cria e desenvolve suas aptidões utilizando brinquedos ou jogos. Através do lúdico, a criança recria cenários reais, tentando reproduzi-los em suas brincadeiras. A criança escreve o mundo da sua maneira através do lúdico, interpretando e tentando entender a vida ao seu redor (SILVA, 2006).

2.2 O BRINCAR E A SURDEZ

A maioria das crianças com surdez são filhas de pais ouvintes, e contrário do que se pensa, estas não conseguem adquirir a linguagem falada em família, muitas vezes pelo fato de os pais da criança acharem que ela é deficiente e não é capaz de conviver igualmente com crianças ouvintes. Essa situação traz prejuízos para a criança surda, pois ela não terá apoio para acessar e apreender a língua de sinais para poder melhor se comunicar (SILVA, 2006).

[...] além do brincar com objetos e sozinhos, os bebês e crianças surdas também carecem de estímulos com brincadeiras socializadoras e reguladoras. Contudo, o padrão de interação entre surdos e familiares ouvintes geralmente é empobrecido, a iniciar pela baixa qualidade de comunicação e da representação dos pais em relação à surdez e se a

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criança constrói seus valores e princípios a partir do exemplo dos mais velhos na qualidade de educadores experientes não se confirmam um parâmetro socializador. Nesta ocasião, a Rede de Apoio familiar popular ou institucionalizada fundamenta uma melhor relação parental (FALCÃO, 2012, p. 89).

Conforme Silva (2006), a criança surda muitas vezes é classificada como deficiente e, por esse motivo, não é compreendida como capaz de entender os significados reais da realidade expressos nas brincadeiras e nos jogos. É válido lembrar que uma vez inserida no mundo da linguagem, ela se desenvolve cognitivamente de modo muito semelhante às crianças ouvintes. Inclusive, obviamente ela tem sentimentos, consciência, e não deixa de notar quando é posta de lado.

DICAS

O filme Depois do silêncio (1996) conta a história de uma jovem surda que ficou trancada dentro de casa por aproximadamente 20 anos, sendo vítima de diversos abusos por parte do pai. Uma assistente social auxilia a moça a deixar aquela cruel realidade, e assim passa a transitar em novo mundo, iniciando seus estudos, sendo apresentada a muitas pessoas, se apropriando da língua de sinais, e aos poucos consegue se proteger daqueles que querem oprimi-la.

Ao brincar, a criança surda utiliza-se de sinais motivada pela intenção de descobrir e desmistificar o brinquedo. Nesse sentido, o aprendizado da Libras ocorre com maior incitação, pois a criança com surdez sente que necessita da língua de sinais para poder brincar e descobrir onde pode chegar com as suas brincadeiras (OLIVEIRA et al., 2006). Através do lúdico, a criança surda se expressa com gestos e movimentos corporais, atividade importante no aprendizado da língua de sinais (Libras) (SILVA, 2006).

A criança, ao tentar representar uma situação lúdica (por exemplo, através de uma boneca ou carrinho), procura gesticular ou até mesmo falar. Esse é um dos principais momentos do processo de aprendizagem da Libras, ou seja, ao querer expressar o que percebe e vê, a criança usa algum sinal. No brincar, a criança interpreta situações do dia a dia, por exemplo, quando fazem o papel de pai e de mãe, conversando com seus “filhinhos” (SILVA, 2006). Ao brincar, as crianças estão aprendendo a língua de sinais da sua maneira, adquirem descomplicadamente a desenvoltura para conhecerem – aos poucos – a Libras (SILVA, 2006).

Quando a criança surda tem a oportunidade de brincar com outras crianças, todas são beneficiadas. O processo cultural é importante, as vivências com crianças ouvintes e a interação com elas faz com que a criança com surdez elabore sua limitação comunicacional com a sociedade em que vive (SILVA, 2006).

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Devemos destacar o lúdico no espaço educacional/clínico em que a criança permanece, pois é no brincar que a criança surda entende melhor a realidade do outro e consequentemente a sua comunicação será mais viabilizada. Isso quer dizer que o ouvinte (criança que faz uso da língua falada) interage com a criança surda e estas seguirão compreendendo o outro, percorrendo o caminho da alteridade (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

Assim, o brincar remete a criança surda aos significados que ela traz de acordo com o seu histórico de vida, ou seja, cada criança tem a sua especificidade diante do lúdico, fazendo com que ela retrate o seu conhecimento da vida familiar e social nas brincadeiras (OLIVEIRA et al., 2006). No faz de conta, as crianças surdas interpretam personagens vivenciados na vida real (padeiro, mãe, pai, professor, médico, entre outros) e simula situações vividas por adultos. É neste momento que a criança se coloca no lugar do “outro”, interagindo com o ouvinte e adaptando-se a esta realidade (SILVA, 2006).

No entanto, quando a brincadeira acontece entre crianças surdas e ouvintes, e não há uma língua em comum, nem a intervenção de profissionais que intermedeiem essa relação, fica difícil existir um equilíbrio entre as crianças (FALCÃO, 2012).

Deixar as crianças, surdas e ouvintes, decidirem por si só o como brincar [...] é um risco, poderá levar a situação de constrangimento quando se tratar de atividades que explorem o som e o grito, devendo ser adaptadas em sinais, com movimentos e números (FALCÃO, 2012, p. 88).

Para Falcão (2012), em ambientes educacionais, a brincadeira entre surdos e ouvintes precisa ser observada por educadores, com vistas à adaptação dos ambientes, ao oferecimento de condições especiais para que todas as crianças se sintam incluídas. Se a brincadeira tiver algum viés competitivo, todos precisam ter os mesmos parâmetros e as mesmas chances de vencer. Além do mais, por vezes a criança surda precisa de auxílio para compreender as regras da brincadeira. "O que não pode acontecer é perder sempre ou favorecerem a vitória sem atender à liberdade de oportunidades e o desenvolvimento de habilidades" (FALCÃO, 2012, p. 89).

Falcão (2012) acrescenta que brincadeiras competitivas precisam ser conduzidas de modo saudável e equilibrado, de acordo com o viés da inclusão educacional. Respeitando a diversidade, incentivando a criação de um sentimento cooperativo, solidário, levando em conta as especificidades físicas e sensoriais dos competidores, em vez de suscitar ainda mais o afastamento.

Além disso, é preciso estar atento às interações entre crianças surdas e ouvintes ao brincarem. Será que ambos podem opinar sobre do que irão brincar, sobre quem ficará com determinado papel etc.? "[...] essa falta de acerto entre os brincantes, algumas vezes dificulta a relação e o entendimento entre jovens

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surdos e ouvintes fazendo com que as brincadeiras não assumam um caráter inclusivo e socializador" (FALCÃO, 2012, p. 89).

Na visão bakhtiniana, as brincadeiras em grupo propiciam expressões que são provocadas externamente, ou seja, quando crianças brincam em conjunto, estabelecem comunicação, de modo que a fala (ou expressão gestual) de uma criança requeira uma resposta da outra criança. Esses diálogos que entremeiam a brincadeira não nascem tão somente daquele momento do brincar. Eles vêm carregados de influências do que essas crianças veem em casa, na televisão, nas mídias, na rua etc. Esses diálogos, ou interações, refletem condições de vida das comunidades linguísticas das quais as crianças estão inseridas (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

O brincar propicia o imaginário, assim, a criança surda interpreta ações que vão ao encontro da realidade e o seu processo de aprendizagem da Libras se acentua gradativamente (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015). Em outras palavras, a criança surda utiliza-se do ato de brincar para fortalecer o seu processo de conhecimento da língua de sinais através das brincadeiras e jogos infantis (OLIVEIRA et al., 2006).

A língua de sinais é crucial no processo de brincar quando a criança surda assimila muito mais o aprendizado brincando com outras crianças ouvintes. No lúdico, as crianças surdas e ouvintes passam a se preocupar umas com as outras e, assim, a vivência no processo educacional e clínico se desenvolve com maior motivação e estímulo (MARTINS; ALBRES; SOUSA, 2015).

Para Marques, Barroco e Silva (2013), quando as crianças ouvintes têm a possibilidade de estarem na mesma sala de aula que crianças surdas, e ambas têm acesso ao ensino de Libras, todas elas têm ganhos no que diz respeito ao desenvolvimento das funções psicológicas superiores. A aprendizagem de Libras gera também o desenvolvimento psicomotor e é socialmente proveitoso. “Brincar de ser surdo ou comunicar-se de modo mais lúdico, com regras e imaginação explícitas, foram aspectos que notamos naquelas crianças” (MARQUES; BARROCO; SILVA, 2013, p. 515).

Assim como a criança ouvinte que está aprendendo a falar erra na pronúncia ou na forma de encaixar as palavras nas frases, a criança surda também confunde os sinais, inicialmente, ou não designa o sinal correto (para algum objeto ou intenção), ou se atrapalha na movimentação da mão ao tentar expressar um sinal (SILVA, 2006). Esses equívocos não tendem a ser reprovados nos contextos de brincadeira, favorecendo novas tentativas por parte da criança, sem medo de que será reprimida, como pode ocorrer com maior frequência em situações mais formais de ensino.

Por isso, enquanto a criança surda está brincando é bom observar os recursos linguísticos que ela aciona, para estabelecer os papéis na brincadeira, as negociações das regras, a expressão dos sentimentos por meio do faz de conta.

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Afinal, estes elementos dão indícios de como está a apropriação da Língua de Sinais pela criança (FALCÃO, 2012).

Muitas brincadeiras infantis contam com o uso das mãos. As mãos seguram as bonecas, levam a comidinha à boca, trocam as roupinhas delas, mexem as colheres nas panelinhas, conduzem o carrinho na pista, riscam a lousa com giz etc. Assim, quando a criança surda brinca, ela precisa fazer o uso simultâneo das mãos tanto como instrumento da brincadeira quanto para comunicar-se. Isso pode fazer com que elas prefiram manipular os brinquedos do que se dedicarem a fazer uma comunicação incrementada.

É um brincar "silencioso" que se desperta com o ruído aparentemente de um motor que pode ser de um avião, de um carro, de um barco de uma moto e que, na maioria das vezes, passa despercebida ou sem o devido valor a sua sociogênese, as suas necessidades individuais afetivas e cognitivas (FALCÃO, 2012, p. 92).

Considerando que as mãos das crianças surdas avocam uma multifuncionalidade ao brincar (comunicação, afetividade, movimento, representações), ela pode acabar apresentando um modo diferenciado de brincar. Pode precisar de incentivos, a se lançar de fato a uma brincadeira feita com interação com outras crianças, pois através das brincadeiras coletivas, muito se tem a aprender sobre o convívio com outrem, a cooperação e a socialização (FALCÃO, 2012). Por isso, comumente se ouve tantos pais dizendo que matriculam as crianças em instituições de educação infantil, ‘pois elas aprendem a repartir os brinquedos e a viver com outras crianças’. Assim, as crianças surdas também podem fazer parte desse universo educativo. A utilização da palavra "pode" se justifica pelo fato de que a educação infantil não é considerada obrigatória no Brasil.

A próxima seção abordará a aprendizagem das crianças surdas no seio educacional. Mostrará o que pensam alguns professores acerca das crianças surdas. Logo após, serão tratados aspectos do processo de alfabetização e letramento por parte das crianças surdas.

3 APRENDIZAGEM DE CRIANÇAS SURDAS NA ESCOLA

Ao se reconhecer e respeitar as diferenças individuais, é um erro utilizar uma única estratégia de ensino para todos os estudantes (CARVALHO, 2011). Quando estudamos as diferenças individuais, no Tópico 1 desta unidade, aprendemos que as impressões que os professores têm de seus alunos afetam diretamente o comportamento deles com tais alunos. Por isso, neste tópico, verificaremos qual é a imagem que professores costumam formar acerca dos estudantes surdos.

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Para além das imagens que os docentes têm desses alunos, refletiremos sobre ações pedagógicas voltadas às crianças surdas. São informações relevantes, já que atualmente os professores se veem com dificuldades para associar o plano de ensino e aprendizagem com seus alunos surdos, mesmo estes tendo atenção e comportamento exemplar nos bancos da escola (SILVA; PEREIRA, 2003b).

De acordo com Silva e Pereira (2003a), ao contatar mães de crianças surdas, depara-se com objeções quanto à maneira pela qual a inclusão escolar vem se apresentando. Essas crianças parecem enfrentar mais dificuldades para aprender. A falta de preparo especializado por parte dos educadores parece ser um fator que contribui para essa situação.

As responsabilidades se dividem nas escolas públicas: vários professores se mostram indignados com o sistema educacional, exteriorizando sobretudo duas queixas: 1) a falta da assessoria especializada em sala de aula (como segundo professor, por exemplo); 2) a falta de preparo, tanto para se comunicar com os alunos por meio da Libras, quanto para ensinar essa língua às crianças. Por outro lado, há professores que não demonstram responsabilidade pelo aluno com perda auditiva e pouco se empenham para que ele tenha algum sucesso em seu aprendizado utilizando-se da língua de sinais (SILVA; PEREIRA, 2003a).

Uma das reclamações de alguns professores nos dias atuais é de que muitos alunos surdos não dispõem de aparelhos de amplificação sonora, com isso a dificuldade de aprendizagem tende a se agravar (SILVA; PEREIRA, 2003a).

Diante dessas questões, pretendemos pensar sobre o ato educativo com crianças surdas. "[...] a ideia é diversificar, ao máximo, a intervenção pedagógica, ajustando-a às características e necessidades de cada um e segundo a natureza do que se está ensinando" (CARVALHO, 2011, p. 83).

3.1 A IMAGEM QUE PROFESSORES TÊM ACERCA DO ALUNO SURDO

Como já vimos no primeiro tópico desta unidade, infelizmente alguns professores rotulam seus alunos surdos, vendo-os como pessoas que não conseguem aprender por sua limitação (ausência de percepção de sinais sonoros). Por conta disso, pouco se esforçam para que eles melhorem a sua comunicação oral e falada, para poder realizar um significativo processo de ensino e aprendizagem junto aos alunos ouvintes (SILVA; PEREIRA, 2003a).

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IMPORTANTE

Você já deve ter notado, ao longo da Unidade 2 e no decorrer desta, que há opiniões divergentes nas interrelações entre língua, surdez e escolarização. Talvez até tenha pensado que esse livro está incoerente, ou que ele se contradiz. Essa impressão advém das diferentes concepções que os autores vêm defendendo sobre a temática, em suas pesquisas nesse Brasil afora. Nós, como autores deste livro, optamos por não apresentar apenas argumentos de uma dessas concepções. Pelo contrário, procuramos suscitar estranhamentos e reflexões, para que você analise qual concepção é mais favorável ou aderente:

• Há autores que defendem a educação oralizada, ou seja, que as crianças precisam fazer uso da audição residual, aprender a realizar a leitura labial e desenvolver a fala para se comunicarem e estarem integradas no mundo.

• Há autores que são favoráveis à comunicação total, isto é, a criança é livre para adotar quantas estratégias quiser para se comunicar (comunicação oral, gestos, uso de sinais, escrita, soletração etc.).

O argumento de que há necessidade de prover os surdos de todos os recursos comunicacionais possíveis é utilizado pelos seguidores da filosofia da Comunicação Total. Nessa filosofia, os sinais são vistos, sobretudo, como meio de promover uma comunicação mais eficiente entre professor e aluno, levando em conta as dificuldades do professor (a maioria deles ouvintes) de se apropriar da língua de sinais. Por isso, a sinalização é realizada na estrutura gramatical das línguas orais majoritárias, como é o caso do Português Sinalizado (DORZIAT, 1999, p. 186).

• Há autores que reconhecem que a Libras é a melhor opção em termos de comunicação para surdos.

A preferência por uma língua processada pela modalidade oral/aural ou visual/gestual na educação de surdos está estreitamente vinculada à concepção de surdez que se tem: a clínico-terapêutica (surdez como deficiência) e a socioantropológica (surdez como diferença) (SILVA; PEREIRA, 2003a, p. 176).

"O fato de o professor não estar devidamente preparado para receber o aluno surdo é realidade e acontece com a maioria dos professores de escola regular" (SILVA; PEREIRA, 2003a, p. 173). Ressalta-se que a interação entre duas pessoas é interligada com as imagens que uma faz da outra. As imagens que vão sendo formadas e disseminadas não nascem por acaso. Como já vimos, elas têm elementos geradores compartilhados em uma dada sociedade, composta por tradições, circunstâncias históricas e fatores econômicos (SILVA; PEREIRA, 2003a).

"Assim, quando o professor recebe esse aluno, muitas vezes exibe ideias preconcebidas ou concepções equivocadas a respeito da surdez, muitas vezes atribuindo ao aluno imagens depreciativas" (SILVA; PEREIRA, 2003a, p. 173).

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Na literatura, por exemplo, verificam-se duas concepções sobre a surdez: clínico-terapêutica e socioantropológica.

A primeira compreende a surdez como sendo uma deficiência (ou doença), que requer tratamento para que o aluno com surdez se aproxime da linguagem oral, melhorando também a sua audição (SILVA; PEREIRA, 2003b). Em outras palavras, a vertente clínico-terapêutica percebe o aluno surdo como um "deficiente" auditivo, portanto precisa ser tratado para que ele consiga melhorar a forma como se comunica com o mundo (exemplo: tratamentos com fonoaudiólogo, otorrinolaringologista, dentre outros profissionais da área médica) (SILVA; PEREIRA, 2003a).

A segunda entende que o aluno surdo é uma pessoa que tem dificuldades para se comunicar, verbal ou oralmente. Porém, ele que pode participar de processos de aprendizagem que ajudam a atenuar essas dificuldades, de modo que ele consiga manter um convívio satisfatório com seus colegas de classe (ouvintes). Logo, na vertente socioantropológica, o aluno não é visto como um deficiente, mas como alguém que precisa da atenção do professor para se desenvolver, assim como um aluno usuário da fala tem dificuldades para aprender determinado conteúdo disciplinar (por exemplo: a matemática) (SILVA; PEREIRA, 2003b). Sob esse prisma, o aluno surdo tem a capacidade de se comunicar, todavia, de uma forma diferente (gestos, língua de sinais). Assim, ele tem condições de apreender normalmente um dado conteúdo (SILVA; PEREIRA, 2003a).

A pesquisa de Silva e Pereira (2003b) aponta que, de um modo geral, os professores consideram seus alunos surdos espertos, atentos e participativos. Os professores também afirmam que a surdez não compromete o desenvolvimento intelectual do aluno, apenas no aprendizado da linguagem é que a situação se torna mais difícil. No entanto, estudos revelam que a surdez pode prejudicar o desenvolvimento intelectual do aluno, dificultando, assim, o processo de aprendizagem.

Em contrapartida, Gesser (2009) defende que quando é permitido que o surdo utilize a língua de sinais em todas as esferas sociais que ele percorre, pode desenvolver suas habilidades cognitivas e linguísticas (desde que não haja outro impedimento). Isso porque não é a surdez em si que traz danos ao desenvolvimento do surdo, mas a falta de acesso a uma língua. Os aspectos cognitivos, linguísticos e até mesmo afetivos podem ser desenvolvidos no sujeito surdo quando ele começa a se apropriar e utilizar uma língua que não exija dele o recurso da audição.

Há estigmas de que o surdo é irritadiço, agressivo, nervoso, inclusive, débil mental. Entretanto, esses estereótipos se calçam em concepções inapropriadas, geralmente, difundidas por aqueles que insistem em inserir os surdos, forçosamente na língua oral – uma língua que difere da sua forma de perceber e se expressar na sociedade (GESSER, 2009).

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Para Silva e Pereira (2003a), as opiniões divergem entre professores quanto ao comportamento em sala de aula do aluno surdo, ou seja, para alguns professores estes alunos mantêm comportamento adequado, não sendo a surdez o motivo de má conduta. Já outros professores concordam que a surdez é motivo de rebeldia e aversão ao aprendizado.

Existem, ainda, outras ideias preconcebidas acerca dos surdos:

• o aluno surdo já sabe tudo, somente não consegue se comunicar;• não sabe nada, afinal, não é capaz de aprender.

Coexiste também, com toda essa situação a postura do aluno surdo, que pode ser de irritabilidade, resistência ao aprendizado, não aceitação de qualquer ajuda por ele ser surdo, dentre outras particularidades. Nestes casos, recomenda-se a intervenção de psicólogo, lembrando que muitos desses traços no aluno advêm de seu histórico afetivo/familiar, cultural ou histórico (SILVA; PEREIRA, 2003a).

IMPORTANTE

O professor precisa ver o aluno surdo como alguém que precisa e pode desenvolver o processo de ensino e aprendizagem – dentro das suas limitações. Cabe ao professor mostrar caminhos/viabilidades que conduzam o estudante a tal processo, mesmo que basicamente. O estudante surdo pode aperfeiçoar a sua linguagem tanto falada quanto oral (utilizando-se da Libras) (SILVA; PEREIRA, 2003a).C

Uma boa notícia é que grande parte dos professores concordam que o aluno surdo tem capacidade para aprender. Isso quer dizer que consideram o surdo como alguém que possui uma dificuldade parecida com a do aluno ouvinte em uma determinada disciplina (SILVA; PEREIRA, 2003a).

3.2 AÇÕES EDUCACIONAIS COM ALUNOS SURDOS

Notadamente, a grande dificuldade do aluno surdo está na linguagem e seus professores, muitas vezes, não se encontram preparados para lidar com essa situação, ou seja, não têm qualificação necessária para fazer a intermediação entre a língua oral e língua de sinais (SILVA; PEREIRA, 2003a).

O que não pode ocorrer é o professor conceber a perda auditiva como algo impeditivo ao aprendizado – e insolucionável. O professor não deve fingir que o aluno aprende e encobrir a realidade de que o surdo deve ser instigado

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à criticidade, à autonomia. Dizer que o aluno surdo é inteligente para apenas deixá-lo feliz pelo aprender e não o motivar a estudar para a melhora da sua oralidade e fala é um prejuízo para ele. O que gostaríamos de explicar aqui é que, tanto o aluno surdo como o ouvinte, ambos precisam desenvolver o senso crítico e precisam tentar aprender de alguma forma, a mais viável possível, mas que aconteça – de fato – o aprendizado direcionado aos dois (aluno surdo e ouvinte) (SILVA; PEREIRA, 2003b).

É um grande lapso, uma falta grave, tratar o aluno surdo como "já sabe tudo", sem ao menos acompanhá-lo e mostrar a ele quais caminhos ele precisa seguir para aprender a aprender – plano este que serve para o aluno ouvinte também, cada um com a sua necessidade específica (SILVA; PEREIRA, 2003b).

Outro fato importante a ser lembrado aqui é de que alguns docentes dizem que tratam o aluno surdo do mesmo modo que tratam o aluno ouvinte, porém o deixam à vontade para trafegar no âmbito da sala de aula, ir ao banheiro, realizar qualquer ação de movimento sem ter que pedir ao professor, diferente do que acontece com os demais alunos. Desta forma estão tratando o deficiente auditivo como "diferente" dos demais, que deve seguir as mesmas normas estabelecidas pela escola (para que a inclusão seja realizada) (SILVA; PEREIRA, 2003a).

O que se vê, muitas vezes, é um sentimento de exclusão do aluno surdo, uma ideia de que o deficiente auditivo não tem solução e deve ser tratado com liberdade maior do que os alunos ouvintes, justamente por ele ser "diferente" (SILVA; PEREIRA, 2003a).

Diante do exposto, o processo de ensino com crianças surdas parece transcorrer sem bases sólidas para se chegar a um resultado satisfatório, sendo o aluno surdo ensinado de "qualquer maneira" (SILVA; PEREIRA, 2003a). Para Dorziat (2004), as escolas direcionadas para estudantes surdos vêm se deparando com vultosos obstáculos, em seus esforços de disponibilizar espaços que promovam o ensino e a aprendizagem com eficiência. Grande parte desses obstáculos está enraizado na visão clínico-reabilitadora, na qual os surdos, classificados como portadores de uma patologia, necessitam aprender a exprimir-se oralmente, caso queiram de fato estar inseridos de modo ativo na sociedade. Por conta disso, as discussões em torno de aspectos pedagógicos acabam ficando em segundo plano “(para quem ensinar; onde ensinar; o que ensinar; como ensinar; quando ensinar; para quem ensinar)" (DORZIAT, 2004, p. 88).

Em 1999, a mesma autora – Dorziat – realizou uma pesquisa que envolveu 13 professoras de duas grandes escolas para surdos que trabalhavam sob a concepção da Comunicação Total. O intuito da pesquisa era analisar o nível de reflexão dessas educadoras, no que tange às percepções docentes atinentes as suas práticas pedagógicas, aspirando melhorá-las. Desse modo, as professoras indicaram algumas sugestões tencionando colaborar o fazer pedagógico, e essas sugestões foram sistematizadas em quatro temáticas:

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• Ação docente.• Recurso de ensino.• Assistência ao aluno.• Habilidade docente.

Seguem mais informações sobre cada eixo temático, definidos por Dorziat (1999):

Ação docente – está relacionada ao estudo do professor, em termos de metodologias de alfabetização e da língua de sinais. Também abrange o ato de compartilhar experiências com outros profissionais que atendem aos surdos (fonoaudiólogos, psicólogos, outros professores especializados). Contudo, Dorziat (1999) chama a atenção para que a dinâmica das equipes multidisciplinares não redunde na fragmentação do aluno. Isto é, ele não deveria ser visto como um ser repartido (isso é com o psicólogo, isso é com fonoaudiólogo, isso é com médico), e sim, em sua totalidade, integralidade. Ainda foram apontadas interações comunicativas com surdos adultos (para aperfeiçoamento da aprendizagem da língua de sinais). Essa ação poderia se estender para o contato entre adultos surdos e crianças surdas, com vistas a estabelecer os fundamentos da estruturação da identidade social e do revigoramento da autoestima. Outra sugestão diz respeito ao estabelecimento de contato entre professores e crianças surdas que tenham menos de três anos de idade (DORZIAT, 1999). Ela poderia possibilitar um suporte na preservação (ou reativação) do vínculo mãe-filho. Afinal, como foi visto na Unidade 2, as reações diante do recebimento de diagnóstico de surdez de um filho, pode evocar diferentes reações por parte da mãe. Muitas vezes, antes de tomar conhecimento da surdez, a mãe fazia uma série de investimentos afetivos na criança, conversando com ela, brincando, cantando. A partir do diagnóstico, tende a abandonar tais comportamentos, supondo que são inúteis, já que a criança não a ouve. Assim, é fundamental que a mãe seja orientada a dar continuidade a esses comportamentos, pois eles germinam frutos pelos processos de percepção visual (a criança vê a mãe sorrindo, mandando beijos, nota o movimento dos lábios), tátil (muitas vezes essas interações incluem abraços e afagos), olfativa (estando próximas, a criança sente o cheiro da mãe, perfume etc.).

Recurso de ensino – abastecer os pais com informações sobre sistemas de amplificação sonora. Além disso, em sala de aula, disponibilizar para os alunos textos variados, explorando textos representantes dos diversos gêneros discursivos. Em outras palavras, não ficar restrito ao uso de apostila ou material didático. Também abarca o uso de recursos de ensino apropriados ao surdo, ou seja, que vão ao encontro dos seus interesses (DORZIAT, 1999).

Assistência ao aluno – salvaguardar o acompanhamento fonoaudiológico ao aluno surdo.

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Atualmente, com a nova tendência de resgate dos direitos linguísticos e de cidadania dos surdos e, consequentemente, com as reivindicações de uma maior presença do caráter pedagógico (o que, por que, para que ensinar) nas instituições voltadas para essas pessoas, tem-se revisto o papel do fonoaudiólogo nessas escolas. Cabe aos próprios profissionais envolvidos redimensionarem esse papel, em consonância com as exigências de uma nova postura em relação à surdez e com as aspirações da classe diretamente envolvida (DORZIAT, 1999, p. 195).

ATENCAO

Habilidade docente – corresponde às habilidades do professor relativas à língua de sinais. Conseguir comunicar-se por meio da Libras seria um pré-requisito para trabalhar com alunos surdos. Espera-se que o professor possua um vocabulário amplo de sinais e faça as devidas adaptações às normas da Língua Portuguesa. Acrescenta-se, ainda, a presença de um monitor surdo e a revisão dos cursos de formação de professores (DORZIAT, 1999).

Por fim, Dorziat (1999) chega à conclusão de que é vital que aconteça

uma inversão de valores no âmbito da surdez. Durante o tempo que a noção de deficiência perseverar, ainda que acobertada, disfarçada, prevalecerá a desvalorização e o desdém para com esse grupo. Os princípios da normalidade e da adaptação à sociedade continuam embasando os discursos de inovações pedagógicas. No entanto, já dão mostras de um movimento na direção de uma atuação de mais envergadura pedagógica no ensino de surdos. Seria melhor, ainda, se esses discursos estivessem pautados no respeito à diferença e na primordialidade de participação ativa dos surdos na sociedade. Tem como objetivos contribuir para sua transformação.

Portanto, pareceu-me não ser possível, para as professoras, desvencilharem-se de valores socialmente construídos que, mesmo aparentemente superáveis no terreno do discurso acadêmico, estão presentes e de modo muito forte nas relações sociais informais, influenciando decisivamente na construção de sua prática. Isso reforça a noção de que não adiantam planos mirabolantes de reforma no ensino impostos aos professores. É preciso ouvi-los, entendê-los e envolvê-los numa nova perspectiva de educação, em que não existam parâmetros estáticos de homem e de sociedade, mas respeito ao indivíduo e as suas condições de desenvolvimento como ser humano pleno (DORZIAT, 1999, p. 196-197).

Desse jeito, voltamos ao mesmo debate da abertura do primeiro tópico desta unidade: os preconceitos, valores, imagens que os professores possuem, pesam em sua prática educativa e na forma pela qual se relacionam com as crianças. Assim, vale lembrar que foram confiadas à escola (e consequentemente ao professor) diversas funções:

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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• Ensinar conteúdos.• Cuidar das crianças.• Intermediar conflitos.• Socializar o aluno. • Ensinar a conviver.• Manter laços afetivos/familiares.• Preparar o estudante para o mercado de trabalho.• Ensinar boas maneiras.• Ensiná-los a pensar.• Ensiná-los a aprender a aprender.

Considerando-se as funções da escola, e tudo o que você leu até aqui sobre o ensino para surdos, será que “estão sendo respeitadas as formas de assimilação de mundo das crianças surdas?" (DORZIAT, 1999, p. 189).

Dorziat (2004) esclarece que ainda subsistem alguns obstáculos no que toca o ensino de surdos. Ela também explica que não adianta procurar “fórmulas mágicas”, ou um “método universal” de ensino. Sob outra perspectiva, existem fundamentos epistemológicos que podem nortear a construção da prática. Antes de tudo, é preciso tecer reflexões aprofundadas sobre a pessoa surda e suas particularidades. Afinal, quais são os referenciais ideológicos que sustentam as concepções de ensino que contemplam os surdos como seres humanos na sua plenitude? O primeiro passo é não focar a ausência, a falta e sim privilegiar a afirmação de suas potências, possibilidades, aceitando as diferenças, objetivando oferecer uma igualdade de oportunidades.

A insegurança é uma barreira comunicacional e a dificuldade de expressão, de ser compreendida nas suas necessidades e interesses, pode levar a situações desestabilizantes, e a intervenção de pessoas adultas sinalizadas é de vital importância. Para a criança surda, os caminhos educacionais são quantitativamente indescritíveis e o potencial de aprendizagem também. Não existem regras nem limites que definam onde ou quando uma aprendizagem pode chegar, para isto, vários tipos de estímulos, representações visuais, figuras, vídeos, gráficos que expressem e visualizem situações vividas ou previstas devem ser utilizadas à medida que o desenvolvimento mental atinge níveis de subjetividade e abstração (FALCÃO, 2012, p. 87).

Da mesma maneira que acontece com todas as crianças, as crianças surdas possuem potencialidades latentes, e para que elas se consolidem e se desenvolvam em termos cognitivos, psicossociais, afetivos e neuromotores é necessário que sejam apresentados estímulos multidimensionais. Com as crianças surdas, sugere-se que se utilizem estímulos direcionados à cognição visual para expandir as possibilidades de qualidade e de igualdade de oportunidades nas experiências (FALCÃO, 2012).

Falcão (2012) ainda destaca que, muitas vezes, a criança surda se sente um pouco perdida no âmbito escolar, pois há professores que fazem mais

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uso de estratégias audíveis em sala de aula, e ela nem sempre acompanha o raciocínio deles. Assim, "encontra-se num ambiente estranho, constituído de lacunas conceituais e com isto sente profundas dificuldades para a aquisição de conhecimentos a partir de estímulos não visuais" (FALCÃO, 2012, p. 91).

4 CRIANÇAS SURDAS: LETRAMENTOS E APRENDIZAGEM DA LEITURA E ESCRITA

Conforme Schemberg, Guarinello e Santana (2009), práticas significativas de leitura e escrita são essenciais no processo de constituição de sujeitos. Assim, duas instituições sociais, que exercem importantes papéis alusivos à leitura e à escrita, são a família e a escola. Geralmente, na esfera familiar se dão os primeiros contatos e a formação de uma relação entre a criança e a linguagem escrita. A escola, por sua vez, costuma dar continuidade às práticas de leitura e escrita de modo mais sistematizado (SCHEMBERG; GUARINELLO; SANTANA, 2009).

Schemberg (2009) fez uma pesquisa sobre a inclusão do surdo no ensino regular, com o intuito de conferir como se tem edificado esse processo de inclusão, do ponto de vista de pais e de professores envolvidos. Ela focalizou a visão que esses sujeitos têm da educação escolar e do letramento (práticas sociais em torno da leitura e da escrita) com um grupo de crianças surdas. Ela concluiu que, para que a inclusão do surdo no ensino regular se concretize devidamente, há que se rever diversos quesitos. Um deles é a repetitiva exclusão do surdo dos contextos linguísticos, na família e na escola, tendo em vista que a exclusão faz com que a criança surda acabe enfrentando desvantagens em seu processo de letramento (SCHEMBERG, 2009).

Para Schemberg, Guarinello e Santana (2009), as crianças surdas ficam numa situação de desigualdade, ou seja, sofrem prejuízos no que concerne à participação em práticas sociais de escrita. Essa desigualdade se avoluma na medida em que as crianças surdas, por vezes, parecem ter menos noções e expectativas sobre a palavra escrita. Essas três autoras observaram em sua pesquisa que as crianças surdas presenciaram práticas de leitura no seio familiar, que se limitaram praticamente à bíblia, enquanto que, na escola, não foram muito além do livro didático. Em vista disso, elas deixam de acessar uma infinidade de diversidade de gêneros discursivos que circulam na sociedade.

Essa restrição de suportes de texto culmina em poucas situações de interação com a palavra escrita, em situações significativas. Parece camuflar, ainda, uma negligência quanto ao processo de apropriação do letramento por crianças surdas. Além do mais, nem sempre a criança surda conta com uma família e/ou uma instituição educacional em que ela pode se expressar e estabelecer diálogos por meio da Língua de Sinais. Isso intensifica suas dificuldades ao tentar aprender a ler e a escrever, [...] “considerando ser esta a língua a partir da qual constitui seus conceitos de modo significativo, o que contribui sobremaneira para sua inserção no mundo da escrita” (SCHEMBERG; GUARINELLO; SANTANA, 2009, p. 266).

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Marques, Barroco e Silva (2013) fizeram uma pesquisa mais voltada para a dificuldade de acesso à língua de sinais. A despeito do Decreto-lei nº 5.626/2005 (BRASIL, 2005), que determina a Libras como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores, ainda há uma distância entre o que está legitimado por lei e a aplicação da lei no setor educacional. “Temos notado o despreparo da comunidade escolar para acolher pedagogicamente o aluno surdo” (MARQUES; BARROCO; SILVA, 2013, p. 514).

Assim, Marques, Barroco e Silva (2013) defendem que:

• os conteúdos da Libras oferecidos no ensino superior sejam significativos;• é preciso que os intérpretes superem a tradução mecanizada;• o ensino da Libras na esfera escolar requer intencionalidade, sistematização e

planejamento;• no contexto escolar, Libras representa a primeira língua para os surdos e a

segunda língua para os ouvintes; • além de proporcionalizar um meio de comunicação, a Libras também constitui

um saber científico;• quando a Libras é ensinada numa sala composta por crianças ouvintes e surdas,

com o passar do tempo há maior frequência do uso de Libras entre as crianças (surdas e ouvintes / ouvintes e ouvintes);

• inclusive, as crianças ouvintes foram manifestando interesse pela Libras e deram sinais de terem aprendido sobre a língua de sinais.

Os argumentos desses autores soam como uma oração de súplicas, como se pode verificar na citação que segue:

A Libras é fundamental para que o sujeito surdo alcance o patamar mais alto no desenvolvimento, tornando-se humanizado no nível cultural próprio aos dias contemporâneos. Por isso, salientamos a necessidade de uma formação técnica com aprofundamento e com compromisso com esse processo formativo, para que não ocorram o abandono presencial e nem o abandono intelectual. Com o exposto, destacamos a necessidade de que os profissionais da educação conheçam a Libras e as especificidades que envolvem a educação do aluno surdo. Reafirmamos, ainda, a expectativa ética de que os centros de Educação Infantil assumam o compromisso de oportunizarem ao aluno surdo as condições para que se dê o processo de hominização, como resultado da apropriação de conteúdos escolares em língua de sinais, e que para o aluno ouvinte se descortinem novas oportunidades de aprendizagem por meio do acesso ao maior patrimônio da comunidade surda brasileira: a língua brasileira de sinais. Entendemos que o ensino da Libras na educação infantil é uma medida que pode verdadeiramente favorecer a consolidação de uma escola inclusiva (MARQUES; BARROCO; SILVA, 2013, p. 516).

Uma pesquisa que reforça os argumentos de Marques, Barroco e Silva (2013) é a de Welter, Vidor e Cruz (2015). Elas fizeram um levantamento das pesquisas que propõe metodologias de ensino, ou estratégias de intervenção

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TÓPICO 4 | PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO

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no que tange ao ensino da escrita da língua portuguesa para crianças surdas. Para tanto, utilizaram as pesquisas existentes nas bases de dados, dando enfoque nas temáticas sobre o letramento (os primeiros contatos com suportes textuais de leitura e com materiais de escrita; práticas de letramentos das famílias das crianças surdas, das próprias crianças, e das escolas com alunos surdos. Ainda foram realçados os entendimentos das crianças surdas sobre os usos e funções da escrita, a aprendizagem da escrita no contexto escolar ou nos contextos de terapia com crianças surdas.

Essas autoras tinham por objetivo verificar, na literatura que estão

à disposição nas bases de dados eletrônicas, intervenções e metodologias direcionadas ao processo de aprendizagem da escrita por sujeitos surdos. As palavras que fizeram parte da pesquisa nas bases de dados foram: “leitura”, “escrita”, “aprendizagem”, “distúrbios de aprendizagem” e “bilinguismo”, associados à “surdez”. Assim, essas autoras selecionaram dezoito artigos para a realização da pesquisa (WELTER; VIDOR; CRUZ, 2015).

Destes, onze artigos explicam que a língua de sinais é importante para o surdo: “A língua de sinais é a língua materna do surdo, uma vez que, quando expostos precocemente a esta, ela se desenvolverá plenamente, sem que haja necessidade de condições especiais de aprendizagem” (WELTER; VIDOR; CRUZ, 2015, p. 462). As autoras explicam que as crianças surdas podem aprender a Libras espontaneamente, desde que se relacionem frequentemente desde cedo com pessoas que utilizem essa língua. Nota-se, portanto, que a maioria dos artigos analisados asseguram que a Libras é oficialmente a língua primária do surdo. Foram encontradas pesquisas investigando acerca de ações pedagógicas, estratégias metodológicas e de intervenção para a aprendizagem da escrita desses sujeitos, já que a língua portuguesa é a segunda língua dos surdos (WELTER; VIDOR; CRUZ, 2015).

Welter, Vidor e Cruz (2015) localizaram artigos que trazem recomendações para otimizar o processo de aprendizagem da escrita de estudantes surdos. Dentre elas, destaca-se o uso de materiais visuais (imagens, vídeos e dramatizações) que atendam aos interesses desses alunos, e a apresentação de diversificados gêneros do discurso, tais como: bilhetes, jornais, cartas, receitas, revistas etc. É fundamental que o contexto que cerca cada gênero do discurso seja levado em consideração, pois a escrita precisa fazer sentido para o estudante. Isso é imprescindível para a aprendizagem da criança e para que a criança compreenda as funções da escrita.

Schemberg, Guarinello e Santana (2009) concordam que propiciar

um trabalho em torno da palavra escrita, no qual sejam favorecidas práticas significativas com a linguagem, seguramente influenciará na constituição do sujeito enquanto leitor e autor, para o surdo. Dependendo das experiências que ele tem com a palavra escrita, desde sua mais tenra idade, ele formará noções sobre a leitura e escrita, usos e relações singulares com a palavra escrita. Quanto menos contato com a escrita durante sua infância, maior a probabilidade de que não consiga fazer uso efetivo dessa modalidade de linguagem.

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NOTA

O que são práticas significativas com a linguagem? Nas escolas, grande parte das leituras e das atividades são feitas em simulação. Por exemplo, ao ensinar a redigir uma carta, o professor pode mostrar uma carta (sem explicar o contexto no qual foi escrita), ou pedir que as crianças escrevam uma carta (sem intenção de ser enviada para alguém, tão somente, com o objetivo de averiguar se a criança aprendeu o gênero discurso – carta). Com frequência essas estratégias parecem sem significado para as crianças, perdendo a atratividade.

Assim, práticas significativas compreendem o contato com textos escritos (leitura e/ou escrita) dentro da realidade (e não como mera demonstração ou ensaio). Exemplificando, se o gênero discursivo que está sendo trabalhado for “carta”, deve-se conduzir as crianças a escreverem o que acham conveniente, para remeter a produção textual a um determinado destinatário.

Conforme Dorziat (1999), deixar a criança surda exposta a diversificados tipos de leitura é valioso, pois assim ela pode conhecer pessoas com características variadas, pode também conhecer objetos, animais, experimentar situações que nem sempre são acessíveis no dia a dia, por conta da inacessibilidade de informações auditivas. É recomendado que as leituras colaborem para o desenvolvimento do seu pensamento, para a elaboração de conceitos, inicialmente, na língua de sinais. Até porque não é suficiente dispor material didático brilhante, termos de situações e opiniões, e ao mesmo tempo tolher sistemas de interpretação.

Você recorda que já vimos que o surdo pode ter algumas dificuldades com a escrita, mesmo na fase adulta? O artigo de Schemberg, Guarinello e Santana (2009) menciona esse fato, mas busca soluções para ele: “[...] uma necessidade de mudança e conscientização (da escola e da família) sobre as práticas de leitura e de escrita como significativas para o processo de letramento da criança, seja ela surda ou ouvinte” (SCHEMBERG; GUARINELLO; SANTANA, 2009, p. 266-267).

ATENCAO

Outro ponto mencionado por Welter, Vidor e Cruz (2015) é o relacionamento entre o profissional da educação e o estudante, que precisa possibilitar uma efetiva comunicação entre ambos. Espera-se que, com o tempo, após exploração mais concreta da leitura, o educador possa auxiliá-lo no desenvolvimento da escrita, de modo que consiga seguir escrevendo sozinho.

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DICAS

Prezado acadêmico! Sugerimos que você leia este artigo na íntegra: Intervenções e Metodologias Empregadas no Ensino da Escrita e Leitura de Indivíduos Surdos: Revisão de Literatura. Assim, você terá um panorama sobre o ensino da leitura e escrita para surdos. Você terá acesso a métodos e intervenções utilizados com eles, com maiores detalhes, podendo ampliar seus estudos a partir das referências citadas no artigo.

• WELTER, Gabriela; VIDOR, Deisi Cristina Gollo Marques; CRUZ, Carina Rebello. Intervenções e Metodologias Empregadas no Ensino da Escrita e Leitura de Indivíduos Surdos: Revisão de Literatura. Revista brasileira de educação especial, set. 2015, v. 21, n. 3, p. 459-470.

IMPORTANTE

Existem metodologias de ensino da língua portuguesa escritas para surdos. Não se pode continuar acreditando que servem os mesmos métodos que se empregavam com os estudantes ouvintes.

As intervenções ou metodologias a serem utilizadas com os sujeitos surdos no seu processo de aquisição da escrita devem considerar cada um em seu desenvolvimento linguístico, bem como a utilização da língua de sinais nas suas interações, materiais e metodologias, para que sejam adequadas a este fim (WELTER; VIDOR; CRUZ, 2015, p. 468).

Na pesquisa de Bandini, Oliveira e Souza (2006), ficou evidente que quando as crianças surdas, usuárias de Libras, vão entrando em contato com material letrado (livros, por exemplo) já na Educação Infantil, vão se mostrando mais familiarizadas com estes materiais, e começam a se ver como futuras leitoras, possíveis escritoras – o que facilita o processo de apropriação da leitura e da escrita. Esses comportamentos são encontrados mesmo entre crianças oriundas das classes sociais mais baixas.

As autoras notaram que no começo da coleta de dados para a pesquisa, a professora fazia pouco uso de livros paradidáticos em sala de aula, porém, com o passar do tempo, ela passou a utilizar esses importantes recursos didáticos, e até destinou um espaço para o “cantinho da leitura”. Esse estímulo à leitura e a semanal contação de histórias em Libras para as crianças, pareceu aumentar o interesse delas pelos livros (BANDINI; OLIVEIRA; SOUZA, 2006).

Bandini, Oliveira e Souza (2006) utilizaram, como um dos instrumentos metodológicos, a Escala de Letramento Emergente, proposta por Saint-Laurent,

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Giasson e Couture, em 1998. Bandini, Oliveira e Souza (2006) constataram que o processo de evolução de escrita é muito parecido entre crianças ouvintes e surdas.

[...] a interpretação da produção da escrita pode ser feita através dos aspectos construtivos, ou seja, pelo que ela quis representar e como chegou a produzir tal representação. A partir dessa interpretação, leva-se em consideração a evolução das conceituações sobre a escrita, com a identificação de três períodos fundamentais: o primeiro caracterizado pela busca de parâmetros de diferenciação entre as marcas gráficas figurativas e as não figurativas, o segundo pela construção de modos de diferenciação entre os encadeamentos das letras, baseando-se alternadamente em eixos de diferenciação quantitativos e qualitativos e o terceiro corresponde à fonetização da escrita (BANDINI; OLIVEIRA; SOUZA, 2006, p. 57).

De acordo com essas autoras, as práticas sociais sobre leitura e escrita, que as crianças presenciam desde pequeninas, influenciam suas práticas posteriores de ler e escrever. Crianças que vivem em locais onde há poucos livros, revistas e jornais à vista, tendem a ter mais dificuldade de manejar suportes textuais quando ingressam na escola. Precisam de tempo até que se familiarizem com as letras, frases, imagens e até com o manuseio do papel (virar folhas, modo de segurar o livro). O terceiro período da evolução das conceituações sobre escrita das crianças surdas equivale à relação entre os grafemas e a datilologia em Libras. “Com base nos dados obtidos, pode-se observar que os participantes apresentaram desenvolvimento compatível com a idade cronológica de acordo com a literatura destinada para as crianças ouvintes” (BANDINI; OLIVEIRA; SOUZA, 2006, p. 57).

O estudo de Bandini, Oliveira e Souza (2006) deu indícios de que as crianças surdas que puderam aprender Libras (durante 16 meses, no mínimo) no ensino formal, tiveram desenvolvimento satisfatório de letramento, dentro do esperado para sua idade cronológica. Ainda assim, as autoras mencionaram três aspectos que podem ser ainda mais contributivos para a aprendizagem da leitura e da escrita por crianças com perda auditiva:

• Mais participação da família na aprendizagem de Libras.• Acesso a mais recursos pedagógicos.• Melhor formação dos profissionais que atuam em termos educacionais com

crianças surdas (BANDINI; OLIVEIRA; SOUZA, 2006).

[...] os surdos (quase sempre) não aprendem a leitura e a escrita do mesmo modo que um ouvinte, uma vez que não estabelecem uma relação entre letra e som. A aprendizagem deveria ser promovida por meio de elementos visuais e com metodologias próprias, tendo como base as utilizadas com usuários de segunda língua (SILVA, 2017, p. 795).

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Nesse sentido, Schemberg, Guarinello e Santana (2009) também esclarecem que as práticas sociais em torno da escrita precisam ocorrer mediadas pela Libras, no caso das crianças surdas. Contudo, tanto na família quanto na escola, tem-se percebido que acontece a exclusão linguística – ou da língua de sinais, ou da modalidade escrita. Isto posto, o surdo necessita procurar outras rotas para desenvolver seu processo de letramento.

5 A LITERATURA E AS CRIANÇAS SURDAS

Todas as pessoas são praticamente obrigadas a aprender a língua principal do país onde vivem (no nosso caso, a Língua Portuguesa) e a pessoa com deficiência auditiva não fica de fora dessa obrigatoriedade. O surdo precisa apropriar-se da língua falada e escrita e utilizar-se da Libras para se comunicar. No entanto, ele possui dificuldades por não ouvir e por falar com dificuldade. Entra, neste contexto, a dificuldade de acesso à literatura escrita. Muitas pessoas que têm dificuldade de ler os livros de literatura, recorrem às opções no formato de áudio, todavia, também não são acessíveis aos surdos. Diante desta situação, podemos dizer que o surdo precisa ser bilíngue, ou seja, apropriar-se da língua de sinais para em seguida compreender a língua oficial do país e se tornar bilíngue. Destacamos aqui que a língua oral e falada são desafios para o surdo, visto que é uma limitação natural dele, no entanto, a fala e a escrita podem ser parcialmente desenvolvidas (SILVA, 2017).

Nesse sentido, uma atividade muito importante é a contação de histórias. Nesta situação, o surdo interage com o contador na forma visual, ou seja, na contação de histórias, o surdo prende mais a sua atenção, motivado pelo mistério – entre as imagens dos livros e a performance do contador, por exemplo – e busca entender o que está acontecendo e o que está por vir na essência do texto narrado. É claro que o texto precisa – ou não – ser adaptado para a linguagem gestual, para que o deficiente auditivo possa compreender melhor o tema em questão (do livro). No caso desta adaptação não existir, o contador de histórias poderá interpretar o que está escrito no livro através de gestos. A história deve ser contada por uma pessoa que tenha uma inclinação para tal, ou seja, o contador precisa ter uma performance no sentido de tornar a história a mais inteligível e incitadora possível, com gestos/sinais que o surdo possa ter compreensão (SILVA, 2017).

DICAS

Para ter mais informações sobre a performance do ensino da Libras no meio visual, veja o – curto – vídeo: A importância das expressões faciais e corporais na Libras, de Madson Barreto. Disponível no link: <https://www.youtube.com/watch?v=zpJnVrxtPgU&t=68s>.

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UNIDADE 3 | A PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA OU SURDEZ E A EDUCAÇÃO

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Na contação de histórias, alguns trechos poderão ser mostrados através da língua escrita, que pode ser em Libras. Uma contação de histórias – que pode ser “encenada” através da gestualização, ou mostrada em vídeos – pode refletir efeitos bastante promissores no desenvolvimento do ensino da Libras. O repertório a ser abordado na contação de histórias é melhor assimilado e aceito devido às aulas visuais (SILVA, 2017).

DICAS

Caso seja possível, faça para o aluno surdo uma contação de histórias que envolva a história familiar deles (por exemplo: uma contação que remeta o aluno surdo aos tempos dos seus avós). Uma reflexão sobre a família do surdo tende a prender mais a atenção e tornar o texto algo significativo.

Martins e Oliveira (2015, p. 1044) nos dizem que:

[...] destacamos a importância da aquisição da língua de sinais desde cedo para um trabalho posterior com a literatura, e ainda, a necessidade de textos em Libras para facilitar o gosto pela leitura em sinais e o envolvimento com a estrutura literária. Por esses caminhos iniciamos nossa andança por meio da literatura e das estratégias visuais que achamos pertinentes para um desenvolvimento mais pleno e inclusivo para alunos surdos, para que seja produzido, primeiramente, o contrato com tais textos literários na língua de sinais, e quem sabe esta atividade tradutória de aproximação cultural mova no sujeito surdo um gosto pela leitura em Libras, e porque não, seu interesse pela obra original. Uma atuação que busca uma proposta bilíngue baseada na perspectiva cultural.

Meritório seria uma situação em que todos os cursos para surdos fossem realizados de forma bilíngue, ou seja, com Libras e Língua Portuguesa. Explicando melhor, queremos dizer – por exemplo – que o uso das duas línguas promoveria para o surdo uma transcrição do texto escrito em português para Libras. Desse modo, o entendimento é melhor aceito e praticado pelo deficiente auditivo. É claro que o tradutor precisa saber Libras e é uma dessas situações que foram comentadas em textos anteriores: uma educação de qualidade está atrelada a professores capacitados (MARTINS, OLIVEIRA, 2015).

Lembramos aqui, que toda forma visual de se comunicar com a criança surda terá uma interação motivadora, em que o surdo acompanha todas as etapas visuais da atividade, tentando até mesmo fazer parte, tirar dúvidas e contribuir com opiniões a respeito do que está sendo passado pelo professor (MARTINS, OLIVEIRA, 2015).

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TÓPICO 4 | PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO

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DICAS

O filme Nada que eu ouça, título original Sweet Nothing In My Ear (2008), possui algumas cenas envolvendo a literatura infantil e crianças surdas. No início do filme há uma cena em que as crianças surdas estão interpretando por meio do teatro o "Mágico de Oz", na escola, utilizando a linguagem de sinais. E os pais delas "traduzem" essa linguagem para a linguagem oral. Em outro momento do filme, o pai do protagonista aparece lendo Pinóquio para o garoto antes que ele adormeça, no aconchego de sua cama. O filme é muito interessante, pois mostra uma família em que a maioria dos integrantes é surda, e o pai ouvinte (interpretado pelo famoso ator Jeff Daniels) muitas vezes se sente "o diferente", como mostra, por exemplo, essa fala dele:

" – Mas desde o começo, ele [pai de sua esposa] nunca me aceitou.– Claro que aceitou você.– Não, não. Ele me tolera. Um pouco. A filha dele casando com um homem que ouve. O orgulho surdo é uma coisa, mas o preconceito é outra [...] não subestime o preconceito.".

O filme ainda traz à tona inúmeros argumentos a favor do implante coclear (IC) e contrários a ele, quando os pais do menino surdo entram em atrito quanto a essa escolha. Um filme emocionante, que mostra algumas nuances da criança surda e as brincadeiras, e sobre decisões que envolvem o tipo de escola em que o menino "deve" estudar. As especiais? As regulares?

6 CRIANÇAS SURDAS E O USO DE TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO EM PROL DA EDUCAÇÃO

Muito se fala em novas tecnologias de informação e comunicação, mas poucas vezes ouvimos algo sobre isso relacionado à surdez. O Ministério da Educação até propaga novas ideias através de melhorias no tocante ao acesso sensorial (equipamentos) a pessoas com alguma deficiência. Mas o enfoque aqui é o estudante surdo, por isso vamos trazer informações que poderão ajudá-lo no envolvimento com o que as tecnologias podem oferecer. Isso inclui alguns recursos tecnológicos de que o surdo pode se apropriar, até mesmo para ter acesso adequado e de qualidade para o seu aprendizado da língua de sinais (Libras) (VIEIRA; PACHECO, 2004).

O meio mais próximo que o deficiente auditivo tem de se apropriar das tecnologias digitais é através da internet. Muitos itens negativos se encontram nesta rede, porém muitos positivos também, que podem auxiliar e muito a pessoa com surdez a desenvolver a sua comunicação através da Libras. Na internet, por exemplo, encontramos videoaulas direcionadas ao estudo da gestualização de surdos com detalhes sucintos e práticos. Também são encontrados professores versados em Libras, que podem ajudar o surdo a se desenvolver de acordo com as suas particularidades (nesse caso o ideal é o acompanhamento de uma pessoa – que pode ser da família – para escolher qual é o melhor site a se estudar) (VIEIRA; PACHECO, 2004).

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DICAS

Você pode encontrar vários vídeos e canais no Youtube voltados aos surdos. Ali estão professores que, por meio da Libras, explicam conteúdos específicos de disciplinas, ou pessoas surdas que compartilham suas vivências e as formas que empregaram para superar algumas dificuldades. Há ainda, blogs com esses mesmos objetivos, e até mesmo as redes sociais apresentam algumas páginas dirigidas ao público surdo.

Na internet existem portais específicos para a entrada de pessoas surdas, facilitando o acesso às informações globais (em Libras). O que instiga o acesso do deficiente auditivo aos portais em que se têm como objeto a língua de sinais e o aperfeiçoamento da comunicabilidade da pessoa surda, é a intenção sempre alta de que os criadores dos sites educacionais têm para que tenham muitos acessos e o site se torne popular. Com isso, os desenvolvedores dos sites se motivam a inovarem suas publicações e atividades direcionadas (VIEIRA; PACHECO, 2004).

Nos dias de hoje, a tecnologia evolui/muda constantemente e torna o nosso presente uma “era” totalmente digitalizada. Existem sites na internet que procuram aprimorar os estudos da língua de sinais, propiciando aos surdos aplicativos (programas) desenvolvidos de forma que o processo de ensino e aprendizagem seja abrilhantado de uma forma diferente (desenhos, imagens, vídeos, pessoas interagindo com a Libras etc.) (VIEIRA; PACHECO, 2004).

Os portais oferecem uma grande diversidade de serviços, como jornais, jogos, classificados, busca avançada, páginas amarelas, portfólio de ações, dicionário, personalização de conteúdo, internet banking, chat via voz, tradutor, mapas, gerenciador de contatos, cartão eletrônico, e muitos outros serviços (VIEIRA; PACHECO, 2004, p. 5).

Além disso, existem recursos tecnológicos para facilitar a vida do deficiente auditivo, tanto na esfera pública quanto na privada. O poder público disponibiliza equipamentos (como computadores acessíveis) para pessoas com surdez, no entanto essa política ainda está longe de se tornar realidade, pois poucos são os equipamentos que chegam até as escolas (VIEIRA; PACHECO, 2004).

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Neste tópico, você aprendeu que:

• A criança precisa brincar e os jogos fazem com que seja desenvolvido o lado psicológico, com estímulos que farão com que o aprendizado da língua de sinais seja algo muito fácil e divertido (OLIVEIRA et al., 2006).

• Se a criança faz do brinquedo um mundo imaginário, onde ela pode realizar qualquer feito, também terá a língua de sinais viabilizada nesse seu mundo “mágico” (OLIVEIRA et al., 2006).

• Quanto à definição de surdez, não devemos caracterizá-la como deficiência, mas como uma diferença que pode ser tratada. A criança surda não terá uma reversão total no seu quadro de surdez, no entanto, ela pode melhorar – e muito – através de técnicas de estudo e métodos clínicos, a sua comunicação com o ouvinte (OLIVEIRA et al., 2006).

• Nosso comportamento é afetado por nossos valores, preconceitos e princípios.

• A vertente clínico-terapêutica entende que a surdez é uma deficiência (ou patologia) que demanda tratamento e reabilitação para que o aluno com deficiência auditiva consiga ingressar na linguagem oral, melhorando também a sua audição.

• Na vertente socioantropológica, o aluno surdo é aceito como alguém que possui uma dificuldade para se comunicar, mas que essa dificuldade pode ser melhorada, assim como qualquer dificuldade de aprendizagem que um aluno ouvinte tem.

• Não existem receitas prontas acerca de metodologias de ensino para surdos.

• Professores apontam que melhorias nestes pontos (ação docente, recurso de ensino, assistência ao aluno e habilidade docente) podem contribuir para a aprendizagem de crianças surdas.

• Antes de procurar propostas educativas certeiras para surdos, mais vale fazer reflexões com profundidade, identificando e analisando as teorias que embasam os discursos de ensinagem para surdos.

• Geralmente é no domínio familiar que começa o contato com textos escritos, cabendo, assim, à escola a função de ampliar esse contato e oferecer o ensino e a diversidade da linguagem escrita (SCHEMBERG; GUARINELLO; SANTANA, 2009).

RESUMO DO TÓPICO 4

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• Os resultados do estudo de Welter, Vidor e Cruz (2015) apontaram que a maioria das pesquisas presentes nas bases de dados eletrônicas, defende que a língua de sinais é a língua materna do surdo, e que por meio dela, ele pode aprender a escrever em língua portuguesa.

• Há investigações científicas sobre melhorias para o ensino e desenvolvimento da escrita de sujeitos surdos.

• O emprego de métodos visuais (textos escritos, imagens, dramatizações etc.) é recomendado como suporte para o ensino da escrita. Também são indicadas conversas para refletir sobre o uso social da escrita. Os interesses dos estudantes surdos também precisam ser levados em conta, para abordar assuntos que sejam atrativos a eles. O professor ainda pode organizar a sala de aula de modo que facilite as interações comunicativas com os estudantes (WELTER; VIDOR; CRUZ, 2015).

• Bandini, Oliveira e Souza (2006) realizaram uma pesquisa sobre a relação de crianças surdas com o letramento, no período em que estão aprendendo a ler e a escrever de modo convencional. A pesquisa foi feita com crianças deficientes auditivas com perda bilateral de grau severo a profundo ou profundo, usuárias de Libras. As autoras concluíram que o desenvolvimento de habilidades dessas crianças está similar ao das crianças ouvintes.

• Marques, Barroco e Silva (2013) expuseram que a aprendizagem da Libras na educação infantil configura um recurso na mediação entre crianças ouvintes e surdas, sendo relevante para a inclusão e para o desenvolvimento humano.

• Por meio da Libras, as crianças pluralizam a quantidade de interlocutores. Além de possibilizar trocas linguísticas efetivas entre crianças surdas e ouvintes, permite que todas elas acessem um universo cultural.

• As tecnologias de informação e comunicação podem auxiliar pessoas com deficiências sensoriais a superar suas dificuldades e ter acesso ao grandioso mundo virtual que a cibernética propicia.

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AUTOATIVIDADE

1 Discorra sobre como o “brincar” é compreendido na atualidade.

2 A criança surda, ao brincar com outras crianças, é beneficiada? Justifique sua resposta.

3 Welter, Vidor e Cruz (2015) localizaram artigos que trazem recomendações para otimizar o processo de aprendizagem da escrita de estudantes surdos. Disserte sobre estes artigos.

4 O que diz Dorziat (1999) a respeito da exposição da criança surda a diversificados tipos de leitura?

5 O que acontece com crianças que vivem em locais onde há poucos livros, revistas e jornais à vista?

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TÓPICO 5

PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO

DOCENTE COM JOVENS, ADULTOS E IDOSOS

UNIDADE 3

Toda generalização é perigosa, inclusive esta.

Alexandre Dumas

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico – que é o último do livro – você encontrará mais algumas reflexões sobre a educação de surdos, agora, direcionadas aos surdos jovens, adultos e idosos. É possível encontrar representantes desses grupos tanto na educação de jovens e adultos quanto no ensino superior.

Cada vez mais pode-se acompanhar em determinados noticiários que uma pessoa da terceira idade concluiu um curso superior. Vale recordar que a velhice é uma fase da vida que costuma ser caracterizada por dificuldades auditivas. É preciso que os profissionais da educação levem isso em consideração, ao atuarem com estudantes dessa faixa etária.

DICAS

O filme O aluno, também intitulado Lição de vida (2009), conta a história de um queniano pra lá de persistente, que após os 80 anos fez tudo o que estava ao seu alcance para voltar a estudar. O filme é emocionante, sobretudo, por retratar uma história real, de Kimani N'gan'ga Maruge, um verdadeiro herói – que posteriormente foi recebido na Casa Branca.

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FIGURA 5 – O ALUNO

FONTE: Disponível em: <http://fabianemello.com.br/filme-da-semana-o-alunouma-licao-de-vida/>. Acesso em: 18 jun. 2018.

Para que aconteça educação de qualidade é preciso que o sistema de ensino (público e privado) sejam eficientes, e que os profissionais envolvidos (professores, psicólogos, fonoaudiólogos, médicos, entre outros) sejam realmente engajados. É válido ser insistente e reiterar que o surdo não é um indivíduo que possui uma doença incurável. Neste prisma, o estudante surdo é visto como um aluno que pode ter dificuldades e que precisa se esforçar mais e ter mais atenção, para que progrida em sua vida escolar e pessoal.

No entanto, a sociedade costuma ver no surdo alguém que possui um problema quase insolúvel. Assim, frequentemente o surdo sofre discriminações, sendo muitas vezes deixado de lado, ignorado. Em outras palavras, como vimos ao longo do livro, a pessoa surda, em vez de ser incluída, acaba sendo excluída frente à política de amparo ao surdo que é deficitária.

De acordo com Martins (2016), para que o surdo acesse um sistema de

ensino com qualidade é necessário que sejam desenraizadas do cotidiano aquelas “verdades” impostas ao surdo que vêm sendo disseminadas há tempo e que não servem de base alguma para que o tratamento da pessoa com surdez possa se desenvolver. Durante muito tempo, o surdo vem sendo rotulado e qualificado como uma pessoa que possui uma patologia irremediável, sem chance alguma de tratamento. O ideal seria o diálogo constante entre os profissionais da área da saúde e da educação para avançarem sempre no que pode ser realizado no campo da surdez e poder proporcionar uma melhor qualidade de vida para a pessoa surda.

Conforme Martins (2016), grande falta faz uma escola inclusiva de fato, que possa entender e interpretar a linguagem do surdo e que tenha um plano pedagógico coerente e realmente motivacional, com professor especializado em Libras e que inclua o surdo no mesmo ambiente do ouvinte, para que este possa se habituar a conviver e se comunicar com todos através da língua de sinais em consonância com a língua portuguesa (bilinguismo).

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Além do mais, é representativa a quantidade de surdos que têm se mostrado resistente em buscar aceitação da sociedade, lutando para que a sua língua seja respeitada, de modo que não sejam mais obrigados a aprender a falar e utilizar a língua portuguesa. Não são poucos os que se sentem violentados diante dessa “obrigatoriedade”. Martins (2016, p. 721) faz a seguinte indagação:

Como a aparição surda pode se dar em uma escola que não acolhe a língua que o constitui? Como ser alguém diante de outros que se relacionam por meio da opressão ou apagamento de uma língua minoritária, na lógica de uma língua oral, veiculada socialmente de modo comum, numa sociedade majoritariamente ouvinte? Desta lógica, da resistência, e tentativa de construção da aparição surda na escola, surgem algumas iniciativas institucionais que operam pela fratura da mesmidade posta à surdez. Apresenta-se aqui como alegoria destes movimentos um programa de educação bilíngue, que se origina como projeto, através da afirmação subsidiada pelo Decreto nº 5.626/05.

Como já vimos, a lei brasileira obriga a existência de salas de aula que possuam instrução da Libras para o aluno surdo desde a educação infantil, porém, infelizmente ainda está longe disso acontecer. O que existe atualmente são dirigentes de instituições educacionais ou mesmo gestores públicos (políticos locais) que não promovem tal situação – benéfica para a pessoa surda – por várias justificativas nada plausíveis.

Tendo isso em vista, esse tópico pretende contribuir para as suas reflexões sobre o uso de tecnologias de informação e comunicação no processo de ensino de surdos, algumas especificidades sobre estudantes surdos no ensino médio e, por fim, algumas especificidades dos acadêmicos surdos no ensino superior.

2 TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NO ENSINO DE SURDOS

Flor et al. (2015) realizaram uma pesquisa envolvendo a acessibilidade, a surdez e a plataforma Modular Object Oriented Distance Learning (Moodle), que tem sido muito utilizada em cursos de nível superior, na educação a distância. A análise dos pesquisadores mostrou que o Moodle é utilizado por estudantes ouvintes e surdos do Instituto Federal de Santa Catarina. Os surdos foram mais rígidos na avaliação do uso do equipamento no que se refere a problemas encontrados no respectivo ambiente virtual.

Nesta pesquisa, procurou-se obter informações individuais para posterior discussão com o grande grupo, ou seja, melhoramentos das características da plataforma, sugestões para o aprimoramento das questões formuladas para estudos, entre outros itens. Tanto surdos quanto ouvintes puderam opinar sobre a facilitação do processo de acessibilidade que a plataforma oferece, mencionando pontos de dificuldade que precisam ser corrigidos. Os usuários desse sistema

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(surdos e ouvintes) tiveram um leque variado de informações a serem acessadas, como fóruns, chats, bibliotecas virtuais, vídeos, links que direcionam para outras fontes de informações etc. Algumas características do programa virtual podem ser revistas, como: acesso e consulta de vídeos em Libras, bibliotecas virtuais também em Libras e outras informações baseadas na língua de sinais. Nesta avaliação da plataforma, pelos usuários surdos e ouvintes, foram aceitas novas sugestões para que fosse facilitado o acesso ao sistema virtual de informações com acessibilidade (FLOR et al., 2015).

Melhorias foram sugeridas tanto por surdos quanto por ouvintes nos quesitos navegação e organização, alegando que encontraram certas dificuldades no momento do acesso (FLOR et al., 2015).

Os surdos, por sua vez, detectaram faltas na interface gráfica, solicitando mudanças no que se refere ao acesso virtual em Libras, facilitando o manuseio da ferramenta. Já o grupo de ouvintes reclamou do uso excessivo de textos dispostos desorganizadamente e solicitaram um tradutor automático para a língua de sinais. Ficou evidenciado que melhorias como animações, vídeos e textos dispostos de forma clara e sucinta facilitariam o acesso e o estudo ficaria mais motivador. Essas colocações – de surdos e ouvintes – são consideradas para Ambientes Virtuais de Ensino e Aprendizagem (AVEA), bibliotecas virtuais e outras plataformas de acessos a informações educacionais (FLOR et al., 2015).

Através da assertiva colocada pelos grupos – de surdos e ouvintes – foi entendido que o problema no uso de outra plataforma virtual (Moodle) não está apenas na estrutura e na colocação dos textos. Para que se obtenha acesso facilitado para surdos e ouvintes é necessário o envolvimento de programadores, professores e desenvolvedores de conteúdos digitais. Ou seja, tudo o que for colocado na plataforma virtual deve ser destacado em Libras (arquivos em PDF, aplicativos do Office ou Open Office), bem como livros e outros textos (FLOR et al., 2015).

É necessário destacar que todas as mudanças feitas no ambiente virtual devem ser direcionadas às necessidades dos usuários (que neste caso são os surdos e os ouvintes), isso quer dizer que tudo o que for alterado deve demonstrar facilidade de acesso para uma assimilação realmente efetiva e motivadora para todos. Para que isso aconteça é imprescindível que os programadores e outros profissionais envolvidos com o desenvolvimento da plataforma conheçam as dificuldades que as pessoas que possuem alguma deficiência enfrentam no momento do acesso ao mundo virtual. Caso contrário, essa plataforma não terá diferença no momento da inclusão e existirá grande dificuldade de compreensão das informações lá descritas (FLOR et al., 2015).

Para que haja inclusão é necessário um amparo para que a vontade de aprender seja viabilizada por meios utilizáveis e fáceis. Deparamo-nos aqui com um outro problema: os altos custos de manutenção dos sites tanto na Libras quanto na língua tradicional, em que essa situação se torna comprometedora aos avanços

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no ensino virtual da língua de sinais. Atualizações dos tradutores automáticos – por exemplo – são importantes para o acesso do surdo aos ambientes virtuais. Infelizmente, os tradutores automáticos são vistos pelos ouvintes como algo que atrase a pesquisa, ou seja, muitas pessoas esquecem que a pessoa surda precisa de caminhos que facilitem a sua pesquisa e não valorizam a acessibilidade. A construção de uma plataforma virtual é uma situação delicada e complexa, pois deve-se aliar o ensino lexical da Língua Portuguesa com o da datilologia (o alfabeto manual de surdos-mudos) e reportar ao deficiente auditivo uma “tradução” para completar o entendimento do que é abordado no site (FLOR et al., 2015).

De modo geral, a pesquisa indicou que o mundo virtual – bem como a plataforma Moodle – do Instituo Federal de Santa Catarina – pode e deve ser um ambiente facilitador do ensino, tanto por surdos como para ouvintes, fazendo com que os usuários dessa ferramenta e de outras existentes na internet possam facilitar o acesso de todas as pessoas. Mas essa facilidade deve acontecer através de meios que instiguem a pessoa que acessa o meio digital, ou seja, devem existir “acessórios” visuais que animem a pessoa, como: vídeos explicativos diretos e objetivos de curta duração, textos fáceis de compreender, recursos de áudio, bem como outros itens que fazem do ambiente digital algo útil e agradável para quem o utiliza (FLOR et al., 2015).

No que se refere às tecnologias que estão sendo utilizadas por surdos, com fins educacionais, Bisol e Valentini (2014) também fizeram uma pesquisa voltada à educação especial e inclusão educacional. Desta vez, a pesquisa está articulada à formação de professores. A partir de 1990, vem sendo discutidos pela política educacional brasileira meios para facilitar o acesso de pessoas com necessidades especiais no meio virtual.

Para facilitar a inclusão, professores e outros profissionais – também da área da saúde, como fonoaudiólogos – devem ser preparados e capacitados. Todavia, não basta somente a formação e capacitação de pessoas, é preciso que estas estejam dispostas a ajudar a pessoa que tem limitação, ao invés de terem apenas o olhar mecanicista. Nesse prisma, falaremos um pouco sobre o OA Incluir (Objeto Virtual de Aprendizagem Incluir), que apresenta facilidade na formação e capacitação de profissionais envolvidos na inclusão. Propostas interacionistas e construtivistas estão inclusas dentro desta plataforma virtual, com reflexões dirigidas ao ensino específico de acessibilidade (BISOL; VALENTINI, 2014).

A utilização do OA Incluir para capacitar profissionais implica ter uma reflexão ética para auxiliar o próximo a progredir positivamente na sua limitação. Também deve-se ter uma atitude reflexiva e crítica para com o processo de ensino e aprendizagem, ou seja, não criar algo apenas com muita informação técnica que não leve a pessoa com alguma limitação a desistir de acessar esses ambientes virtuais, por motivo de serem enfadonhos, tediosos, com falta de recursos motivadores, animados e de fácil acesso (BISOL; VALENTIM, 2014).

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O OA incluir propicia um modo de ensino totalmente prático, que utiliza movimentos de mobilização e provocação (explicando melhor, é a forma fácil que a internet deve possuir para que todos tenham “ânimo” para utilizar o meio virtual, que é tão buscado atualmente), itens importantes para conduzir acessos de pessoas com necessidades especiais. É claro que meios técnicos são necessários para se construir/desenvolver qualquer site, no entanto, após a estrutura técnica desenvolvida, cria-se a essência do material que será oferecido aos usuários dos programas, que nada mais é do que a informação passada de forma agradável e prática. Em contrapartida, essa linguagem acessível e convidativa não deve fugir do rigor fundamental do conteúdo a ser abordado, melhor falando, a informação colocada em qualquer ambiente virtual por melhor que seja a sua interface (com cores, animações, sons etc.) não pode fugir do tema que é objeto de estudos. O OA Incluir apresenta aspectos que são utilizados por professores e acadêmicos de área afins (BISOL; VALENTINI, 2014).

Outra informação importante é de que tanto o OA Incluir quanto qualquer outro site/ambiente virtual de aprendizagem pode ser alterado e remoldado sempre, de acordo com a demanda de sugestões de melhorias das pessoas que os utilizam.

3 O ENSINO MÉDIO E A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO

Como costuma acontecer o desenvolvimento do aluno surdo no decorrer da sua vida escolar no ensino médio e profissionalizante? Quando o mesmo espaço educacional é ocupado por estudantes ouvintes e surdos, não dá garantias de que os adolescentes tenham experiências de aprendizagem efetivas. Nesse processo é importante saber quais são os projetos dos professores e intérpretes da Libras e quais os pontos positivos e os desafios que surgem em sala de aula quando se propõem a ensinar a língua de sinais, juntamente com a língua padrão do país, que no nosso caso é a língua portuguesa (MALLMANN et al., 2014).

Um grande problema é a falta de entendimento entre professores e alunos surdos. Não basta a presença de um intérprete em sala de aula se o aluno surdo não compreende o tema abordado, ou seja, é preciso que ele entenda as explicações para poder progredir em sua jornada escolar. Para que isso aconteça é preciso o envolvimento do professor e do professor intérprete, de modo que os dois trabalhem alinhados, em consonância, para que o aluno surdo consiga conciliar a língua de sinais com a língua escrita e falada, e possa compreender os conteúdos abordados em sala de aula (MALLMANN et al., 2014).

Como já vimos no tópico sobre as diferenças individuais, não é conveniente que os professores desconsiderem as limitações dos alunos e adotem um estilo tradicional de ministrar aulas. Algumas das dificuldades que se levantam na sala de aula do ensino médio são desencadeadas porque professores têm

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pouco conhecimento sobre a surdez, o desenvolvimento do surdo em termos educacionais e de desenvolvimento humano propriamente dito. Além do mais, os professores nem sempre sabem como proceder diante de processo de alfabetização e letramento de alunos surdos (MALLMANN et al., 2014).

Evidentemente, não se pode culpabilizar os professores. Afinal, é esperado que eles possuam diversificados conhecimentos, que talvez nem sejam abordados com profundidade em seus cursos de formação de professores. De qualquer maneira, o professor também não pode cruzar os braços e afirmar que não recebeu as informações mínimas necessárias em sua graduação para trabalhar com alunos surdos, e que, portanto, continuará dando suas aulas como sempre fez.

Esse é um dos motivos pelos quais fizemos tantas indicações de filmes neste livro de estudos. Esperamos que você, prezado acadêmico, quando estiver trabalhando com alunos surdos, possa ter empatia, sensibilidade e noções de como eles compreendem o mundo a sua volta. Para se chegar a isso, talvez leituras não sejam suficientes. Os filmes são excelentes motivadores de estranhamentos, reflexões, pensamentos. Infelizmente, a preparação de professores para o recebimento de alunos surdos nem sempre é adequada, e é preciso que, além de uma capacitação, os professores tenham um olhar afetivo e possam entender as particularidades de seus alunos surdos. Para além disso, professores precisam dar continuidade aos seus estudos, seja por meio de formação continuada, seja pelos estudos autodidatas.

Como vimos, muitas propostas educacionais apontam que o ensino bilíngue deve acontecer (língua de sinais e língua portuguesa) e as diferenças culturais de cada aluno surdo precisa ser conhecida pelo professor. Em outras palavras, cada aluno surdo possui uma cultura distinta e essa situação interfere em seu processo de aprendizagem, facilitando-o ou tornando-o mais complicado. Afinal, tem uma visão diferenciada de cada situação por motivo de suas características pessoais e familiares, no que tange ao entendimento acerca dos processos de ensino e aprendizagem. Ele pode mostrar resistências caso se sentir deixado de lado ou desrespeitado (MALLMANN et al., 2014).

Muitas vezes, a inclusão é feita, no entanto, sem qualidade e atenção necessárias para um eficiente processo de aprendizagem do aluno surdo. Isso também acontece por falta de conhecimento do professor no tocante ao ensino da Libras, o que torna a comunicação com o aluno surdo dificultosa. Pretende-se aqui mostrar um olhar mais dinâmico e eficiente no ensino do deficiente auditivo, que ele possa ter acesso a condições realmente favoráveis, práticas e de acordo com as suas necessidades de comunicação por meio da língua de sinais (MALLMANN et al., 2014).

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DICAS

Você notou que muitos dos desafios enfrentados no ensino médio são os mesmos do ensino fundamental? Caso queira ampliar seus conhecimentos, especificamente sobre a inclusão de alunos no ensino médio, leia o artigo A inclusão do aluno surdo no ensino médio e ensino profissionalizante: um olhar para os discursos dos educadores na íntegra. Ele está disponível na internet. • MALLMANN, Fagner Michel et al. A inclusão do aluno surdo no ensino médio e ensino

profissionalizante: um olhar para os discursos dos educadores. Rev. bras. educ. espec., mar. 2014, v. 20, n. 1, p. 131-146. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbee/v20n1/a10v20n1.pdf>.

4 O ENSINO SUPERIOR E A INCLUSÃO DO ACADÊMICO SURDO

As vicissitudes que os surdos podem enfrentar na educação infantil, na educação fundamental e no ensino médio já foram pontuadas. Infelizmente esse quadro não tende a melhorar miraculosamente quando tentam ingressar no ensino superior.

Poucos surdos tentam estudar em uma universidade e, quando conseguem, enfrentam dificuldades como rejeição, intolerância e impaciência, sem contar que muitas vezes são ignorados e rotulados como um ser “doente”. Muitas vezes, os surdos necessitam de práticas fora dos horários de aula para que consigam acompanhar o processo de ensino e aprendizagem ao lado dos ouvintes. Isso porque nem todas as instituições de ensino disponibilizam professores bilíngues ou intérpretes que façam um trabalho – além do realizado em conjunto com ouvintes. Desse modo, o surdo precisa se esforçar para recuperar o que perdeu durante as aulas, por motivos de comunicação.

Essas dificuldades são infundadas, já que, como já foi visto, os surdos

apenas possuem uma diferença em nível linguístico e cultural. São representantes de um grupo minoritário, que é dirigido tantas vezes para escolas que são organizadas para ouvintes e padronizada a atender a alunos ouvintes (CRUZ; DIAS, 2009).

Não podemos nos esquecer de que todas as pessoas (deficientes ou não) têm direito legal ao ensino, mas o que pode ser feito para que esse acesso seja realmente consolidado?

No que diz respeito ao surdo, assim como na educação básica, no ensino superior também é muito importante a presença de um intérprete ao lado do surdo, pois somente assim o aluno deficiente auditivo exercerá o seu direito de

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vincular a sua língua (Libras) aos ensinamentos direcionados a ele e aos ouvintes, isto é, os alunos ouvintes agregarão a língua do surdo ao contexto da sala de aula e o ensino acontecerá normalmente, sem diferenças e com acesso aos conteúdos abordados pela grade curricular de uma universidade (CRUZ; DIAS, 2009).

4.1 ACESSO

Verifica-se certa diferença no rendimento do aprendizado da pessoa surda em comparação ao aluno ouvinte. Pode-se constatar essa diferença nos testes realizados no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), nos quais os ouvintes tiveram maior pontuação em relação ao deficiente auditivo: “A média nacional dos estudantes é 478,11 pontos e a situação torna-se mais crítica quando o foco se dirige para os estudantes surdos, cuja média é de 360,82 pontos” (MARTINS; LACERDA, 2015, p. 98).

Esta situação pode ser reflexo de que a inclusão não esteja sendo feita adequadamente pelo nosso sistema de políticas educacionais, como as próprias autoras apontam:

Esse resultado pode indicar que a educação ofertada a este público não tem alcançado a qualidade esperada, ou seja, essa população não tem sido contemplada com uma educação que favoreça sua aprendizagem dentro dos parâmetros previstos para este nível de ensino (MARTINS; LACERDA, 2015, p. 98).

Assim, outros questionamentos emergem: O problema estaria concentrado no próprio ensino médio? Ou no ensino fundamental? Ou o problema é que poucas crianças surdas iniciam a vida escolar na educação infantil? Ou será que todo o sistema público direcionado à educação de surdos é falho no Brasil? Existem outros fatores que podem dificultar o ingresso do deficiente auditivo no ensino superior? Ou será que o sistema educacional é eficiente, mas a forma de aplicação do exame prejudica o aluno surdo? Ou seria a forma de correção da prova que precisa ser repensada?

Várias dessas perguntas requerem pesquisas para que sejam respondidas de forma precisa. Mas, tendo em vista as pesquisas já vistas nesse livro, pode-se inferir que, por causa da ineficiência das políticas públicas o estudante surdo tem uma formação deficitária durante a educação básica, esse é um dos motivos para que o ingresso de estudantes no ensino superior seja tão restrito (GUARINELLO et al., 2009).

Como foi repetidamente visto nesse livro, essas e outras muitas questões ainda permeiam a vida acadêmica do aluno surdo. Há tantas polêmicas nos bastidores da educação de surdos, tantos desafios, e enquanto isso, ainda existem inúmeros estudantes surdos que sonham com uma melhor qualidade de ensino desde a educação infantil, com professores fluentes em Libras trabalhando em

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conjunto com professores regentes, para que eles possam aprender a Libras precocemente, para na sequência desenvolverem a língua portuguesa.

De acordo com Moura (2016), alguns dos impasses que dificultam a entrada do surdo no ensino superior são:

• aspectos linguísticos;• particularidades do percurso educacional;• implicações advindas da relação entre surdos e ouvintes;• expectativa de acesso ao ensino superior.

Esses pontos resumem o que foi visto até aqui. Os três primeiros já foram pormenorizados e, quanto ao último, está relacionado ao desejo desse aluno de dar continuidade aos estudos, em termos universitários. Alguns deles já sabem que será uma empreitada que exigirá muito esforço, pois as condições oferecidas deixam a desejar. Então, isso faz com que nem sequer visualizem a opção de serem universitários, ou quando torcem por isso, acabam se desmotivando diante de tantos obstáculos.

Essa desmotivação pode ser acrescida pelo descaso de familiares de adolescentes surdos frente aos estudos universitários. Já que, por vezes, o surdo é visto em casa como uma pessoa que está à margem da sociedade. Assim ele é ignorado, negligenciado, rotulado como um integrante familiar que não alcançará o êxito em sua vida acadêmica (MOURA, 2016). Ou os pais, cientes de tudo o que está por vir na vida universitária de surdos, podem querer poupar os filhos de se depararem com tantos entraves.

Ainda assim, Moura (2016) explica que há estudantes surdos que querem ingressar no ensino superior. Entretanto, como foi visto, há contratempos para tal. Nem sempre o ensino médio viabiliza essa continuação dos estudos, entre outros fatores.

Até aqui foram levantados aspectos que focalizam o ingresso do aluno surdo no ensino superior. E quanto aos que ingressam? Conseguem concluir o curso? É sobre isso que trata o texto subsequente.

4.2 PERMANÊNCIA

Nos dias de hoje, muitas universidades procuram oferecer recursos para que as pessoas com deficiência tenham acesso ao mundo universitário, porém sem ajuda do poder público, a viabilidade desta investida torna-se um pouco dificultosa.

Da mesma maneira que na educação básica, não é suficiente que o intérprete "traduza" as informações passadas pelo professor. Ele precisa intermediar a comunicação do acadêmico surdo para os ouvintes em sala (professores e outros acadêmicos) – através da língua de sinais (CRUZ; DIAS, 2009).

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Outro grande problema é a tradução realizada no mesmo tempo em que o professor está explicando o conteúdo, desse jeito, o intérprete, muitas vezes, não consegue abordar a fala completa do professor e acontece que a tradução não define um raciocínio adequado expressado pelo professor. Algumas informações podem se perder para o acadêmico surdo (GUARINELLO et al., 2008).

Além do mais, o intérprete precisa fornecer ao surdo condições de entendimento da disciplina, ou seja, do mesmo modo que o professor ensina o aluno ouvinte, o aluno surdo precisa entender a explicação, e não somente a interpretação do que é dito pelo professor. Nesse contexto, os professores (regente e intérprete) devem convergir para que esse entendimento aconteça (CRUZ; DIAS, 2009).

Sugere-se que os professores (regente e intérprete) façam juntos os planejamentos, com o intuito de preparar aulas estratégicas e direcionadas ao aluno surdo, para que este acompanhe o desenrolar das aulas e possa vivenciar os conteúdos abordados. Essa sugestão possibiliza uma situação que até então rarissimamente acontece no meio acadêmico. De acordo com Cruz e Dias (2009), o diálogo entre o surdo e o ouvinte, utilizando a língua de sinais, é o caminho para o sucesso no ensino superior. Esse diálogo social aumenta as chances de que o surdo se sinta incluído, ou seja, parte do meio, e também contribuirá com seus pares para um fim comum: a tão esperada conclusão do ensino universitário (CRUZ; DIAS, 2009).

Desde os anos 1980, o apoio de um intérprete em sala de aula é uma norma que deveria ser implantada, porém esta normativa não vem sendo amplamente aplicada. O descaso das autoridades em relação à acessibilidade e à inclusão do surdo em uma universidade (assim como no ensino fundamental e médio) é muito grande e o estudante surdo perde muito com isso. Todavia, não é somente o surdo que perde, mas toda a sociedade, pois como já foi visto, a diversidade beneficia a todos, já que o convívio entre pessoas com características diferentes aumenta as chances de pensar sob outros pontos de vista, de ter paradigmas confrontados e revistos. Seria primoroso se surdos e ouvintes pudessem se comunicar livremente (através da Libras e da língua escrita – Português). Isso traria muitas vantagens à sociedade, propiciando que os conhecimentos dos dois grupos fossem aliados, com vistas na criação de um mundo melhor, mais comunicativo e solidário. Infelizmente isso ainda está longe de acontecer, mas aqueles que se encaminham nessa direção estão dando os primeiros passos para um mundo mais justo e igualitário (GUARINELLO et al., 2008).

A leitura e escrita do surdo é um processo delicado que também precisa ser visto com atenção, não esquecendo o seu contexto de vida que reflete diretamente no seu aprendizado. Isso quer dizer que cada ser humano – independentemente de ter alguma limitação ou não – possui seu histórico familiar e este histórico pode influenciar no seu desempenho no meio acadêmico (GUARINELLO et al., 2009).

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Por exemplo, o universitário surdo, que tem uma família que o apoia em seu desenvolvimento escolar, vai progredir com mais facilidade. Por outro lado, o surdo que vem de um contexto em que seus pais não entendem o valor dos estudos de seus filhos, poderá ter mais dificuldade e demorará mais para aprender. "Esse estudo aponta, assim, a importância de um trabalho de letramento, desde a escola fundamental até a universidade, que envolva práticas nos mais diversos tipos de gêneros” (GUARINELLO et al., 2009, p. 118).

A prática da leitura e escrita é muito importante em nossa sociedade, tanto para ouvintes quanto para surdos. Isso deve acontecer aliando-se (como falado anteriormente) a Libras e a Língua Portuguesa desde o ensino fundamental. Nossa sociedade tem o prejuízo de poder contar com pouco público surdo nas universidades e todos os cidadãos – em especial os políticos – ainda têm muito por fazer para poder viabilizar esse caminho e poder facilitar a entrada e permanência da pessoa surda no ensino superior.

Assim como foi visto na educação durante a fase de alfabetização, podemos ainda constatar que a dificuldade da interpretação textual e de manuseio dos gêneros não parte somente do estudante surdo, mas também do ouvinte, pois é sabido que nas escolas – tanto públicas quanto particulares – existem alunos com dificuldades diversas que podem afetar o processo de letramento e alfabetização (GUARINELLO et al., 2009).

Deveria se pensar – além de todas as propostas mencionadas até aqui – em facilitações instrumentais através das novas tecnologias, ou seja, ajudar o aluno surdo com equipamentos físicos (computadores acessíveis) e programas (softwares/aplicativos) que viabilizem o processo de ensino e aprendizagem com proposições adequadas e instigantes (MOURA; 2016).

Moura (2016) ainda esclarece que ao classificar o surdo como um deficiente, corre-se o risco de deixar de acreditar no seu potencial de aprendizado que é igual ou até melhor do que o potencial de muitos ouvintes. É claro que ele tem a limitação de acessar os estímulos sonoros, e que se comunica através da Libras, no entanto, a pessoa surda tem condições de contemplar novos conhecimentos. Evidentemente, ela precisa de um acompanhamento diferenciando, e estar assistida adequadamente, com políticas de inclusão. Eventualmente, ela precisará do auxílio de professores, intérpretes, fonoaudiólogo, assistentes sociais, entre outros profissionais ligados à promoção da educação e da inclusão.

Conforme Fernandes e Moreira (2017, p. 146), não basta focar na figura do tradutor-intérprete de Libras, ou no Atendimento Educacional Especializado. Essas medidas não são satisfatórias para atender às necessidades dos estudantes surdos adultos que chegam ao ensino superior. Outrossim, é necessária uma "nova forma de abordagem e intervenção centrada em medidas de política linguística de educação bilíngue como pressupostos ao processo de inclusão de surdos no ensino superior".

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Sugere-se que, para nortear estratégias de acesso e permanência de surdos no ensino superior, seja instituída uma proposta de educação bilíngue comunitária, abrangendo todos os membros do contexto universitário. A Libras precisa estar atrelada à circulação de gêneros textuais diversos, a começar pelos editais de concursos e vestibulares até avaliações e textos complementares das disciplinas. Essas ações promovem a Libras como língua de cultura no ensino superior, e legitima o respeito e a valorização da comunidade surda na universidade (FERNANDES; MOREIRA, 2017).

O letramento acadêmico bilíngue de estudantes surdos pode colaborar no desenvolvimento de metodologias peculiares para produção de materiais bilíngues, em diversificados gêneros textuais, bem como na expansão dos referenciais de atuação do tradutor-intérprete no processo de inclusão educacional (FERNANDES; MOREIRA, 2017).

De acordo com Fernandes e Moreira (2017), o planejamento de ações e o processo decisório que envolvem o acesso e permanência de surdos no seio universitário precisa ser fruto do trabalho conjunto de:

• pesquisadores;• profissionais especializados;• estudantes surdos, • representantes da política educacional da universidade.

À guisa de conclusão, é gritante o motivo de poucos alunos surdos conseguirem ingressar e permanecerem no ensino superior. Há tantos aspectos nada atrativos para eles, ou seja, o que tem sido feito para facilitar o acesso deles nas faculdades ou universidades? E quando ele ingressa, o que tem sido disponibilizado a ele para que consiga concluir o curso? Onde estão os projetos, estratégias ou planejamentos para a permanência dele na instituição de ensino? (MOURA, 2016).

Políticas de inclusão com qualidade e professores capacitados e comprometidos com o aprendizado de surdos no ensino superior são o que a sociedade precisa para poder reverter o atual quadro de desatenção com o nosso acadêmico surdo. No entanto, muito ainda precisa ser feito para que de fato o ensino superior seja um local de aprendizado efetivo para estudante surdo (GUARINELLO et al., 2008).

"Concluiu-se que os surdos são capazes, produtivos, solidários e interessados em avançar no seu processo de escolarização, apesar dos empecilhos encontrados no interior do espaço escolar" (CRUZ; DIAS, 2009, p. 65).

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DICAS

Para saber mais sobre o assunto, indica-se a leitura do artigo Políticas de educação bilíngue para estudantes surdos: contribuições ao letramento acadêmico no ensino superior, de Sueli Fernandes e Laura Ceretta Moreira (2017). O artigo aprofunda várias questões que vieram sendo discutidas até aqui, tais como: educação bilíngue para surdos, acesso e permanência no ensino superior; letramento acadêmico bilíngue; Libras. Segue o resumo do artigo:

O ingresso progressivo de estudantes surdos ao ensino superior, na última década, demandou mudanças institucionais importantes quanto ao direito à educação bilíngue, ou seja, oportunizar acesso e produção de conhecimento em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e em Língua Portuguesa na modalidade escrita. Nesse sentido, este artigo tem como objetivo discutir o processo de educação bilíngue de estudantes surdos no ensino superior, apresentando ações desenvolvidas no âmbito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), com destaque às contribuições trazidas ao processo de letramento acadêmico bilíngue nos cursos de graduação e pós-graduação. Entendemos que a centralidade, atribuída à figura do tradutor intérprete de Libras e ao atendimento educacional especializado na política nacional de educação inclusiva, não responde às necessidades dos estudantes surdos adultos trabalhadores que chegam ao ensino superior, com dificuldades na leitura e escrita do português e experiências pouco significativas em língua de sinais. Como resultados positivos, apontamos as contribuições ao letramento acadêmico bilíngue de estudantes surdos, o desenvolvimento de metodologia específica para elaboração de materiais bilíngues – em diferentes gêneros textuais – e a ampliação dos referenciais de atuação do tradutor-intérprete no processo de inclusão. O processo inclusivo se constitui na interação dialógica, entre pesquisadores e profissionais especializados, com centralidade ao protagonismo dos estudantes surdos, sujeitos da política educacional, no planejamento de ações e decisões que envolvem seu acesso e permanência na UFPR (FERNANDES; MOREIRA, 2017, p. 127).

E o que dizer sobre os acadêmicos que possuem problemas auditivos, de modo que tenham dificuldades para ouvir? Estes geralmente desconhecem a Libras. Minimamente espera-se que os professores e colegas de classe possam tratá-los com respeito, usem o tom de voz um pouco mais elevado, falem de frente para eles, para que a leitura labial facilite a comunicação. Certamente será necessário repetir o que se disse até que compreendam. A paciência é imprescindível.

Por fim, tanto as pessoas com dificuldades auditivas quanto as surdas devem ser admiradas quando se engajam a dar prosseguimento aos estudos. Afinal, elas não se intimidam pelos diversos obstáculos que se apresentam.

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Nesta unidade, a leitura complementar consiste de um recorte do artigo produzidor por Pagnez e Sofiato (2014), que abordou a educação de surdos, a língua brasileira de sinais e as pesquisas que têm sido feitas sobre a interface entre esses dois temas.

Prezado acadêmico! Para você compreender melhor esse trecho do artigo, é importante que saiba que as autoras levantaram as pesquisas efetivadas no Brasil, entre 2007 a 2011, em termos de teses e dissertações existentes no Banco de Teses da Capes <www.capes.gov.br>, tendo como palavras-chave: educação de surdos e Libras (PAGNEZ; SOFIATO, 2014).

A título de informação, os trabalhos finais de uma graduação são denominados de TCC – Trabalho de conclusão de curso, ou de TG – Trabalho de graduação. Quando uma pessoa termina uma especialização, ela faz, como trabalho final do curso, uma monografia. Dissertações são os trabalhos finais do mestrado e as teses equivalem aos trabalhos finais do doutorado.

De acordo com Pagnez e Sofiato (2014), naqueles cinco anos foram realizados 349 trabalhos, dentre os quais: 281 dissertações de mestrado, nove mestrados profissionais e 16 teses de doutorado sobre libras e educação de surdos. A Universidade Federal de Santa Catarina foi a instituição em que foram desenvolvidas 32 pesquisas naquele intervalo de tempo, na qual a área da Educação concentrou a maioria dos trabalhos, perfazendo 129. A escolarização de surdos foi o assunto mais recorrente, com 30 trabalhos defendidos. Vygotsky foi o autor mais mencionado nos trabalhos.

Prezado acadêmico, fique agora com um fragmento do artigo de Pagnez e Sofiato (2014, p. 243-244):

ATENCAO

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LEITURA COMPLEMENTAR

O ESTADO DA ARTE DE PESQUISAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE SURDOS NO BRASIL DE 2007 A 2011

Karina Soledade PagnezCássia Geciauskas Sofiato

[...] Com base em Felipe (2008), destacamos que pesquisas linguísticas sobre a língua brasileira de sinais (Libras) passam a fazer parte do cenário acadêmico e de discussões de grupos de pesquisas afins, além dos temas relacionados à educação de surdos. Tanto que o primeiro registro no banco de teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) sobre o tema surdez data de 1987, configura-se como uma dissertação de mestrado e traz como tema: A criança surda: educação para a marginalização.

Na década de 1990, há um crescimento em relação ao número de trabalhos acadêmicos publicados, seja em forma de dissertação de mestrado, teses de doutorado, artigos científicos ou livros, e muitos abordavam aspectos referentes à Libras.

Com a promulgação da Lei nº 10.432, de 2002, a língua brasileira de sinais passa a ser reconhecida como língua oriunda de comunidades de pessoas surdas do Brasil. E por meio do Decreto nº 5.626, de 2005, tal lei é regulamentada e ainda há, em nove capítulos, a disposição da língua em questão, enfatizando-se os aspectos da educação e da saúde.

Esses fatos, além de serem historicamente importantes e marcantes para a área da surdez e educação de surdos, pois asseguram os direitos da comunidade surda em vários âmbitos e servem de referência para os movimentos sociais, engendram novos estudos e pesquisas a partir do momento em que surgem.

[...]Dentre os 349 trabalhos defendidos no período investigado, 129

foram realizados na área da Educação, a área da Linguística somada às três modalidades perfaz 55 trabalhos; há ainda números expressivos nas áreas de Letras, Fonoaudiologia e Educação Especial. Para as pesquisadoras, duas áreas que se destacam são Ciência da Computação e Ensino de Ciências e Matemática, as quais, a princípio, não eram consideradas áreas de pesquisa voltadas para esta temática. Nas demais 49 áreas, foram defendidas apenas duas ou três pesquisas

[...]O estudo revela que a temática da educação de surdos tem se consolidado

como área de interesse para investigação em diferentes universidades, ocorrendo

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TÓPICO 5 | PERSPECTIVAS E DESAFIOS DA AÇÃO DOCENTE COM JOVENS, ADULTOS E IDOSOS

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em diferentes áreas temáticas. Com relação aos aspectos formais referentes à pesquisa, ao realizarmos nossas buscas no banco de Teses da CAPES, foram encontradas limitações nos resumos de pesquisas.

[...]A pesquisa em questão nos permitiu conhecer a evolução das produções

referentes à educação de surdos nos últimos cinco anos. O histórico apresentado sobre as primeiras produções, que obedeciam a uma lógica da área médica, mesmo sendo desenvolvidas em instituições definidas como educacionais, permite que se constate a mudança na proposta e a consolidação de pesquisa fundamentalmente na e da área da educação; o abandono de uma abordagem médico-pedagógica, como define Mazzotta (2001), e a consolidação de pesquisas sócio-históricas ou socioantropológicas iniciadas no século XX.

Observa-se que os registros referentes ao processo educacional dos sujeitos surdos ao longo da história se deram por meio de relatórios, pareceres, livros e artigos em periódicos, até chegarmos às produções geradas nas instituições de ensino superior, em forma de dissertações de mestrado e teses de doutorado. Em que pese o fato de ainda contarmos com variados tipos de produções na área da surdez, as dissertações e as teses, a partir do momento em que começam a surgir no contexto das universidades, também promovem a divulgação do conhecimento a partir das pesquisas engendradas.

A partir da indexação das dissertações e teses no Banco de Teses da CAPES, apesar dos problemas técnicos constatados neste estudo, a circulação dessas produções passa a ser mais efetiva, partindo-se do princípio de que o acesso a essa base é irrestrito e amplo, o que consolida um desafio para as instituições em que são defendidas as dissertações e teses: a qualidade dos resumos nela inseridos. É fundamental que os resumos apresentem elementos centrais do trabalho científico que possibilitem que outros pesquisadores conheçam as produções e encontrem interlocutores para suas investigações.

A partir das análises realizadas no período proposto, observa-se que a produção relacionada às áreas de educação de surdos e Libras tem sido constante em universidades públicas e privadas e perpassa todas as regiões brasileiras. As agências de fomento de pesquisa têm uma parcela de participação neste processo. Entretanto, o financiamento é outro desafio para as pesquisas e sua consolidação.

A caracterização de cinco anos de produção aponta temas prevalentes, temas silenciados e, principalmente, subsidia, a partir do que já foi produzido, novas investigações na área.

FONTE: Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40602014000200014&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 18 jun. 2018.

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RESUMO DO TÓPICO 5

Neste tópico, você aprendeu que:

• Uma minoria de surdos ingressa no ensino superior e nem todos os ingressantes conseguem finalizar o curso.

• É preciso que as tecnologias de informação e comunicação adotadas pelas instituições de ensino superior atendam às especificidades dos acadêmicos surdos.

• Um dos grandes entraves para o deficiente auditivo é justamente o fato de as universidades não realizarem ensinamentos bilíngues e multiculturais que assistam o surdo que, por sua vez, precisa aprender a língua de sinais (Libras), a Língua Portuguesa (escrita) e com isso apreender os conteúdos e as explicações acadêmicas (CRUZ; DIAS, 2009).

• As universidades que mantêm intérpretes para auxiliar o acadêmico surdo não contam com estratégias citadas aqui anteriormente (planejamentos entre professor e intérprete) e a aula se torna improdutiva, sendo que o professor universitário explana a frente da classe e o intérprete apenas traduz, sem explicar e sanar dúvidas da disciplina. Daí a importância do planejamento antecipado do intérprete com o professor de disciplina específica (GUARINELLO et al., 2008).

• A figura do intérprete não é suficiente para efetivar a inclusão. Outras medidas precisam ser tomadas, tais como: professores da disciplina e intérprete fazerem planejamentos de aula juntos. A Libras deve estar presente desde a prova do vestibular até a formatura. Vários atores sociais precisam dialogar para oferecer melhores condições de aprendizagem aos acadêmicos surdos, como por exemplo, professores, intérpretes, acadêmicos surdos, pesquisadores e demais profissionais da educação que estejam integrados à política da instituição.

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AUTOATIVIDADE

1 Como a sociedade costuma ver o surdo?

2 É suficiente a presença do intérprete em sala de aula, para efetivar a inclusão educacional de alunos surdos? Por quê?

3 Cite três medidas que podem contribuir com a educação de acadêmicos surdos.

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