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Capítulo 1 Comunicação, sociedade, cultura e Ciências da Comunicação O conceito de comunicação é difícil de delimitar e, por consequên- cia, de definir. De um determinado ponto de vista, todos os com- portamentos e atitudes humanas e mesmo não humanas, intenci- onais ou não intencionais, podem ser entendidos como comuni- cação. Uma pessoa está a dormir? Para um receptor, ela está a comunicar que dorme. Penteia-se e veste-se de determinada forma? Está a comunicar. Um insecto macho esfrega as asas nas patas para atrair uma parceira? Ele está, certamente, a comunicar. Um cão abana o rabo? Ele comunica alegria e afeição. Uma flor apresenta um maravilhoso colorido e emite determinadas substân- cias bem cheirosas para atrair as abelhas que espalham o pólen, essencial para a fertilização de outras plantas? Também está a co- municar. Uma pessoa reflecte consigo mesma sobre a sua vida? Está a comunicar, ou melhor, a comunicar-se, a consciencializar- se de si comunicando. A comunicação pode ou não ser preten- dida, mas não só ao Homem é impossível não comunicar como também, para o Homem, o mundo é cheio de significados e só é 21

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Capítulo 1

Comunicação, sociedade,cultura e Ciências da

Comunicação

O conceito de comunicação é difícil de delimitar e, por consequên-cia, de definir. De um determinado ponto de vista, todos os com-portamentos e atitudes humanas e mesmo não humanas, intenci-onais ou não intencionais, podem ser entendidos como comuni-cação. Uma pessoa está a dormir? Para um receptor, ela estáa comunicar que dorme. Penteia-se e veste-se de determinadaforma? Está a comunicar. Um insecto macho esfrega as asas naspatas para atrair uma parceira? Ele está, certamente, a comunicar.Um cão abana o rabo? Ele comunica alegria e afeição. Uma florapresenta ummaravilhoso colorido e emite determinadas substân-cias bem cheirosas para atrair as abelhas que espalham o pólen,essencial para a fertilização de outras plantas? Também está a co-municar. Uma pessoa reflecte consigo mesma sobre a sua vida?Está a comunicar, ou melhor, a comunicar-se, a consciencializar-se de si comunicando. A comunicação pode ou não ser preten-dida, mas não só ao Homem é impossível não comunicar comotambém, para o Homem, o mundo é cheio de significados e só é

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Joana Fernandes
Teoria da Comunicação e Teoria da Comunicação e Práticas TextuaisSousa, José Pedro (2006) Elementos de Teoria e de Pesquisa da Comunicação e do Media (http://www.bocc.ubi.pt/pag/sousa-jorge-pedro-elementos-teoria-pequisa-comunicacao-media.pdf), consultado a 28 de Setembro de 2015
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inteligível e compreensível porque lhe atribuímos significados e ointerpretamos.

A definição de comunicação pode complexificar-se. Se váriaspessoas estiverem reunidas à noite, à volta de uma fogueira, cala-das, de olhos fechados, escutando apenas a lenha a crepitar e sócheirando o fumo, elas estarão a comunicar? Num certo sentido,pode afirmar-se que sim, porque estão a partilhar uma experiên-cia.

A convergência de um vasto tipo de fenómenos para debaixodo guarda-chuva da comunicação tem origem na elasticidade eflexibilidade do conceito. A raiz etimológica da palavra comu-nicação é a palavra latina communicatione, que, por sua vez, de-riva da palavra commune, ou seja, comum. Communicatione sig-nifica, em latim, participar, pôr em comum ou acção comum.Portanto, comunicar é, etimologicamente, relacionar seres viven-tes e, normalmente, conscientes (seres humanos), tornar algumacoisa comum entre esses seres, seja essa coisa uma informação,uma experiência, uma sensação, uma emoção, etc.

Assim, pode-se pensar na comunicação em duas grandes as-serções: 1) A comunicação como o processo em que comuni-cadores trocam propositadamente mensagens codificadas (gestos,palavras, imagens...), através de um canal, num determinado con-texto, o que gera determinados efeitos; e 2) A comunicação comouma actividade social, onde as pessoas, imersas numa determi-nada cultura, criam e trocam significados, respondendo, desta for-ma, à realidade que quotidianamente experimentam (Gill e Adams,1998: 41). Estas duas proposições não são, porém, estanques,mas sim complementares. Por exemplo, as mensagens trocadassó têm efeitos cognitivos porque lhes são atribuídos significadose estes significados dependem da cultura e do contexto em geralque rodeiam quem está a comunicar. Por isso se diz também que acomunicação é um processo social. No entanto, as duas posiçõestambém revelam alguma diferença entre elas: a primeira sugere aideia de que a mensagem tem de ser codificada; a segunda expli-cita, de algum modo, que uma mensagem pode não ser codificada

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nem sequer ter um emissor e mesmo assim adquirir significadopara o receptor, pois, de certa forma, o mundo é a mensagem, nosentido de que o mundo é, inevitavelmente, interpretado por cadapessoa, adquirindo significados, pois só assim se torna compreen-sível.

A comunicação é indispensável para a sobrevivência dos sereshumanos e para a formação e coesão de comunidades, sociedadese culturas. Temos de comunicar, entre outras razões:

• Para trocarmos informações;

• Para nos entendermos e sermos entendidos;

• Para entretermos e sermos entretidos;

• Para nos integrarmos nos grupos e comunidades, nas orga-nizações e na sociedade;

• Para satisfazermos as necessidades económicas que nos per-mitem pagar a alimentação, o vestuário e os bens que, deuma forma geral, consumimos;

• Para interagirmos com os outros, conseguindo amigos eparceiros, tendo sucesso pessoal, sexual e profissional, algofundamental para a nossa auto-estima e equilíbrio.

Comunicamos, em síntese, para satisfazer necessidades, que,de acordo com a pirâmide de necessidades de Maslow (1954), po-dem ser básicas (água, comida, vestuário...), de segurança, sociais(ter amigos e ser aceite por outros), de auto-estima (ter competên-cia, auto-confiança e conquistar o respeito dos outros) e de actua-lização pessoal (desenvolver todo o nosso potencial).

Quando alguém tem a iniciativa de comunicar, tem algumaintenção. Só despendemos esforço quando isso nos leva a algumlado e, por isso, só comunicamos intencionalmente quando que-remos atingir alguma coisa, quanto mais não seja a manutençãoda própria comunicação.

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Em conclusão, "A comunicação liga-nos à rede de seres hu-manos, começando na nossa família imediata e continuando pe-los nossos amigos (com a ajuda dos media), pela sociedade e pelomundo inteiro. A forma como nos desenvolvemos como indi-víduos depende muito do grau de sucesso com que construímosessas redes. A comunicação não é apenas uma troca de informa-ções "duras", mas também a partilha de pensamentos, sentimen-tos, opiniões e experiências"(Gill e Adams, 1998: 42).

1.1 Os conceitos de comunicação e de in-formação

É preciso notar que nem toda a comunicação, entendida comotroca de mensagens, comporta informação. Um poema, uma mú-sica, uma canção podem comunicar e exaltar sensações, estadosde alma, emoções, mas, geralmente, não informam, a menos quesejam emitidas com um propósito informativo, diferente do seupropósito original. Por exemplo, uma canção serviu como se-nha para desencadear as operações militares na Revolução De-mocrática Portuguesa de 25 de Abril de 1974. Ou seja, a can-ção informou os revoltosos de que as operações deviam iniciar-se.Suponha-se, porém, que um professor diz a um aluno que o exameda sua classe se realiza num determinado dia, a uma determinadahora. Esta mensagem é informativa, porque transporta uma cargaútil de informação.

A situação narrada mostra também que a partilha de infor-mação necessita de um suporte comunicacional para se efectivar.Isto é, a informação depende da comunicação. Não há informa-ção sem comunicação. Mas, como vimos, num sentido lato podeexistir comunicação sem haver troca de informação (por exemplo,quando várias pessoas partilham experiências).

Vista do ponto de vista da Teoria Cibernética (ou Teoria daInformação), a informação é uma medida da incerteza ou da

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entropia num sistema (Littlejohn, 1988: 153). A informação équantificável e lógica.

Vejamos um exemplo. Imagine-se que um jornalista não sabequando chega o Presidente da República ao aeroporto, vindo deuma visita de estado a outro país. Dentro deste sistema comuni-cacional, o nível de entropia ou incerteza é máximo, o que nume-ricamente pode ser traduzido por um (1). Há muitas alternativas aconsiderar pelo jornalista. Mas o jornalista telefona para o PalácioPresidencial, onde lhe dizem que o Presidente chega às 16 horasem ponto, com toda a certeza. O nível de entropia ou incertezadentro do sistema reduz-se para zero (0). Observa-se, assim, quea informação é quantificável.

Se um outro jornalista disser ao primeiro jornalista que o Pre-sidente da República chega às 16 horas ao aeroporto, essa men-sagem, embora transporte uma carga útil de informação, não con-tribuirá para reduzir o nível de incerteza dentro do sistema, por-que este nível já atingiu zero. A informação pode ser redun-dante, embora, em certos casos, a redundância possa ser útil paraa melhor apreensão e compreensão da mensagem. Noutro exem-plo, uma fotografia de confrontos anti-globalização pode trazer aolado o título "CONFRONTOS ANTI-GLOBALIZAÇÃO". A fo-tografia seria redundante em relação ao texto, mas ajudaria a fazerpassar a mensagem.

Repare-se noutra característica da informação. Escrevendo-se"falar-se frente mais semiótica à vai livro neste de", ninguém vaientender o que se diz. Mas escrevendo-se que "neste livro vaifalar-se de semiótica mais à frente", está a dar-se uma informaçãocapaz de reduzir o nível de incerteza no sistema comunicacional.A informação é sempre codificada. O código precisa de ser co-nhecido e compreendido pelo receptor para que possa ser usadopor um emissor com propósitos comunicacionais. A utilização deum código requer, assim, acordo prévio entre emissor e receptor.

Uma outra característica curiosa da informação é a de que asobre-informação obscurece a informação. Basta imaginar al-guém a consultar um documento de mil páginas para extrair desse

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documento unicamente uma pequena informação para nos aper-cebermos de quanto essa proposição é verdadeira.

Ao contrário da informação, a comunicação é mais eficazquantos mais significados proporcionar, ou seja, quanto maispolissémica for e quanto mais sensações e emoções despertar. OsLusíadas são muito comunicantes mas pouco ou nada informa-tivos. Quando se pretende usar a comunicação para fazer passarinformação, a mensagem será tanto mais eficaz quanto menos sig-nificados possibilitar.

A informação, como se viu, reduz a incerteza num sistema,mas também altera o sistema. As mensagens têm impacto sobreo receptor. A comunicação resulta em mudança, pois nada per-manece igual. A persuasão é o processo de induzir mudançasatravés da comunicação (Littlejohn, 1978: 162-201).

Quando comunicamos intencionalmente para influenciar, en-tramos no domínio da comunicação persuasiva, a que se recorre,por exemplo, na publicidade e propaganda, mas também na comu-nicação interpessoal. Quando informar é o objectivo principal,circunscrevemo-nos ao domínio da comunicação informativa,normalmente patente no jornalismo, por exemplo, mas tambémquando pedimos informação a alguém, no âmbito da comunica-ção interpessoal. Quando entreter é o objectivo principal da men-sagem, falamos de comunicação de entretenimento, observável,por exemplo, na ficção audiovisual, ou quando alguém conta umaanedota num grupo de amigos. Quando comunicamos as tradi-ções da nossa cultura, por exemplo, através da música, do fol-clore ou do artesanato, é de comunicação popular que se trata.Há, efectivamente, muitas formas de categorizar a comunicação eestas nem sequer não são as únicas...

1.2 A comunicação como processoImagine-se uma aula. O professor começa a leccionar. Os alu-nos escutam. Pode ou não existir partilha de informações, mas

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está-se, certamente, perante um acto comunicacional. Quandocomeçou (est)a comunicação? Quando o professor proferiu a pri-meira palavra? Quando atravessou a sala desde a porta até à mesa?Quando olhou os alunos pela primeira vez? Quando preparou aaula? Quando elaborou o programa do curso? Quando lhe distri-buíram essa classe para docência? Quando...? E na perspectivado receptor, quando começou a comunicação? Quando ouviu aprimeira palavra? Quando fixou o olhar no professor? Quando sedecidiu inscrever na disciplina? Quando...?

Imagine-se, agora, que a aula acaba. O professor pára de falar.Acabará aqui a comunicação? Ou só quando o professor peganas coisas e sai da sala? Ou ainda quando os alunos esqueceremdefinitivamente a matéria? Ou quando recordarem pela última vezaos netos como eram as aulas no seu tempo? Ou quando...?

Mais elementos para ponderação. O professor, em sala deaula, encena um papel social, cultiva uma determinada atitude,tenta projectar uma determinada imagem, assume determinadoscomportamentos, acompanha a fala por determinados gestos eolhares, recorre a formas retóricas para convencer os alunos edespertar-lhes a atenção. Num momento o aluno pode estar quaseentorpecido, devido ao arrastar aborrecido da aula, e noutro mo-mento pode estar desperto porque alguma coisa nas palavras doprofessor lhe chamou a atenção. E que mensagem o aluno captou?O discente lembra-se mais dos tiques de linguagem do professorou da matéria leccionada? Que sensações despertaram no estu-dante os gestos, os olhares e o tom de voz do professor? Quantasvezes as intervenções e comportamentos dos colegas ou do pró-prio professor ocasionaram ruído na comunicação?

Responder às questões atrás colocadas evidencia que a co-municação não tem princípio nem fim bem definidos e que oreceptor percepciona configurações globais do acto comunica-tivo. Além disso, como se observou, professor e aluno apresen-taram contínuas mudanças no tempo. No final da aula, o aluno,num certo sentido, não é o mesmo, como também o professor nãoé o mesmo. É por estas razões que, geralmente, se associa ao con-

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ceito de comunicação a noção de processo. A comunicação é umprocesso (Berlo, 1985: 33-37).

Nas palavras de Berlo (1985: 33), a palavra processo de-signa um fenómeno contínuo que apresenta contínuas mudançasno tempo. Heráclito de Éfeso, um pensador pré-socrático, consi-derava que havia um dinamismo inerente às coisas. Para ele, tudoestaria em constante mudança, num devir permanente. Ele terádito que o universo se poderia comparar a um rio. Não nos po-demos banhar duas vezes nas mesmas águas correntes de um rio(Berlo, 1985: 33). O conceito de processo está relacionado comesta movimentação das coisas, com a sua evolução em interacção.

A comunicação é um processo precisamente porque se desen-volve num contínuo espaço-temporal em que coexistem e intera-gem permanentemente múltiplas variáveis. Os elementos do pro-cesso de comunicação podem entender-se como variáveis precisa-mente porque variam, porque apresentam contínuas mudanças notempo, enquanto interagem uns com os outros. Além disso, a co-municação não tem princípio e fim bem definidos porque a cadeiade causas e a cadeia de consequências de um acto comunicativosão parcialmente indetermináveis e, de algum modo, infinitas.

1.3 Factores que influenciam a comuni-cação

Vários factores podem influenciar o processo de comunicação.Bordenave (1984) explica que a recepção envolve a percepção, ainterpretação e a significação. A percepção, em grande medida,depende da expectativa e do envolvimento.

1.3.1 Comunicação e percepçãoAs pessoas portadoras de deficiência auditiva não têm medo defilmes de terror. Porquê? Porque não ouvem a música e outrossons capazes de sobressaltar os ouvintes. A sua percepção é mais

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limitada do que a de um ser humano não portador de surdez. Apercepção limita a comunicação. Mas não é apenas isto que estáem causa. Não tendo tido experiência anterior do som, é possívelque um surdo que de repente começasse a ouvir continuasse, inici-almente, a não ter medo dos filmes de terror, porque a percepçãoé baseada na experiência anterior do sujeito, que não percebeo que está para além dela (Berlo, 1985; Littlejohn, 1978). Alémdisso, a percepção, tal como a memória, é selectiva, baseando-seem associações emotivas (Berlo, 1985; Littlejohn, 1978). Grossomodo, percebemos bem o que queremos perceber e percebemosas coisas como as queremos perceber, conduzidos pela emoçãomais do que pela razão1.

É devido às experiências anteriores que muitas vezes a mesmamensagem significa coisas diferentes para os diferentes recepto-res. Imagine-se que uma árvore cai no meio da floresta. O ruídoque a queda provoca só será um som se houver percepção domesmo. De outra forma, é apenas uma onda sonora. Suponha-se, agora, que um lenhador habituado a ouvir árvores a cair ouveesse som, muito próximo. Provavelmente, procurará abrigar-sede imediato, porque descodificou correctamente o som. Mas umcitadino que penetre pela primeira vez na floresta poderá muitobem ser incapaz de descodificar o som que lhe chega e ser atin-gido pela árvore, por não ter experiência anterior do som de umaárvore a cair.

A frase "foi um prazer"pode ser dita de várias maneiras e tra-duzir diversas intenções. A percepção, associada à experiênciaanterior, permite a um receptor interpretar o que efectivamente umemissor quer dizer. O problema é que, muitas vezes, a percepçãoé incongruente (Berlo, 1985; Littlejohn, 1978). Por consequência,a interpretação pode ser dissonante do significado que o emissorpretendeu dar à frase. As discordâncias e os conflitos entre as pes-soas podem, assim, resultar não de um sentimento hostil, mas sim

1 Recorde-se, a propósito, que António Damásio (1994) sustenta que é aemoção que nos leva à decisão, não a razão.

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das incongruências da percepção, descodificação e interpretaçãode uma mensagem.

A experiência anterior permite ao receptor complementar asmensagens. Quantas vezes, ao ouvirmos rádio, não pensamos norosto que se esconde por trás da voz? Imaginamos, então, esserosto, em função das nossas experiências anteriores. Do mesmomodo, se olharmos para uma fotografia só com o rosto de umapessoa, somos capazes de reintegrar na imagem o seu corpo, emfunção da nossa experiência anterior. A esta capacidade chama-se função de reintegração e deve-se ao facto de o ser humanoperceber sempre configurações globais, como ensina a Teoria daGestalt, e não especificidades isoladas. A exemplo do que sucedena comunicação interpessoal verbal, que está sempre associadaà componente não verbal, a separação artificial de componentesdo processo de comunicação (como a separação entre a voz e orosto, operada pela rádio) leva o receptor, habituado a percepcio-nar globalmente esses componentes, a reintegrar mentalmente oselementos em falta no processo.

1.3.2 Comunicação como expectativaA comunicação mais poderosa é aquela que vai ao encontro dasexpectativas do receptor. A mente humana procura ajustar im-pressões e estímulos a um sistema de expectativas resistente àmudança. É por esta razão que as campanhas eleitorais se des-tinam mais a reforçar as convicções de quem já está convencidoe a fazer decidir os indecisos do que a mudar o sentido de votode quem já decidiu. Quem já está convencido dificilmente mudade opinião. Pelo contrário, tende a rejeitar ou adulterar as mensa-gens que vão contra as suas expectativas e a aceitar as mensagensde acordo com as suas expectativas. O ser humano tende a perce-ber bem unicamente aquilo que deseja perceber bem. Por vezes,pode até acontecer que as mensagens que atingem o sistema deexpectativas de um receptor sejam adulteradas por este último, demaneira a acomodarem-se às suas expectativas. Por exemplo, o

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inqualificável ataque terrorista de 11 de Setembro de 2001 contraos Estados Unidos foi entendido por certas seitas religiosas comoo anúncio do apocalipse.

1.3.3 Comunicação como envolvimentoUm acto comunicacional só é eficazmente desenvolvido quandoo emissor obtém o envolvimento do receptor. Este envolvimentodepende de vários factores, nomeadamente da motivação do re-ceptor. A motivação do receptor pode ser despertada de váriasmaneiras: corresponder às expectativas do receptor; e ir ao en-contro dos valores, propósitos e aspirações do receptor (Little-john, 1978: 162-252) Quando a motivação para a comunicaçãonão existe ou é de fraca intensidade, o receptor pode não se en-volver decisivamente no acto comunicativo. A comunicação podefrustrar-se.

Ir ao encontro, pelo menos parcialmente, das expectativas doreceptor é, como se viu, uma forma de assegurar o envolvimentodo receptor no processo de comunicação. Por exemplo, irá aoencontro das expectativas de uma senhora que trata da roupa decasa ser outra senhora a dizer-lhe num anúncio que o detergenteX lava mais branco. Provavelmente, se fosse um homem a fazer oanúncio, a mensagem talvez fosse menos credível para a senhora,já que não corresponderia às suas expectativas. Do mesmo modo,um homem, provavelmente, espera que seja outro homem a falar-lhe do carro que deve comprar. Quer num quer noutro caso, oenvolvimento do receptor no processo de comunicação dependeda forma como a mensagem se coaduna com as suas expectativas.Nos casos aqui apresentados, as expectativas dos receptores estãoassociadas aos tradicionais papéis sociais masculinos e femininosna nossa sociedade.

Ir ao encontro, pelo menos em parte, dos valores, propósitose aspirações do receptor é outra das formas de motivar o recep-tor a envolver-se no acto comunicativo. A publicidade, a propa-ganda e o marketing direccionado exploram muito estas facetas

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do processo de comunicação. Por exemplo, quando as acções sedesvalorizam, os bancos e correctores das bolsas de valores nãofazem publicidade destes resultados negativos. Podem torná-lospúblicos por força das suas obrigações legais, mas não fazem pu-blicidade deles. Preferem, por exemplo, insistir no facto de oinvestimento em acções poder contribuir para deduções nos im-postos, porque isto vai ao encontro dos propósitos do receptor.Da mesma maneira, a publicidade para a separação doméstica delixos, dentro de um sistema integrado de reciclagem de resíduos,vai reforçar as convicções de quem é sensível às questões ambien-tais e ecológicas. Ou seja, essa mensagem é particularmente bemrecebida junto de receptores que cultivam valores ecologistas.

1.4 Objectivos e recompensas de quem seenvolve na comunicação

Para Schramm (1949), a recompensa do emissor no processo decomunicação pode ser imediata ou retardada. Mas a do receptortambém. Por exemplo, uma pessoa é imediatamente recompen-sada quando vai ao cinema ver um filme de que gosta. No entanto,se for ao cinema para analisar o filme e, posteriormente, usar essaanálise numa pesquisa científica, a recompensa é retardada. Domesmo modo, se um emissor pretende alterar o comportamentode um emissor e o conseguir na hora, a recompensa é imediata.É o que acontece, por exemplo, quando alguém convida outrempara ir ao cinema e o convite é aceite na hora. No entanto, a re-compensa pode ser retardada. Um emissor pode tentar levar umreceptor a alterar o sentido de voto durante vários dias mas serrecompensado unicamente no dia das eleições.

Esta noção de Schramm é similar à noção de objectivo instru-mental e objectivo consumatório da comunicação, apresentadapor Festinger (1950). Para explicitar se uma comunicação temum objectivo instrumental ou consumatório, é necessário saber seé intenção do emissor que a mensagem resulte no momento do

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seu consumo ou se é sua intenção que a mensagem sirva comoum instrumento para a produção de outro comportamento. Porexemplo, um músico compõe uma nova peça com a pretensão dese satisfazer a si mesmo e de satisfazer os ouvintes com o re-sultado da composição. Neste caso, o objectivo da comunicaçãoé consumatório, pois o objectivo da comunicação concretiza-sequando a mensagem é consumida. Mas o músico pode pretenderque as pessoas apreciem a sua música unicamente para compra-rem os seus discos e lhe proporcionarem rendimento. Neste caso,o objectivo da comunicação é instrumental. Obviamente, umamensagem poderá ter ao mesmo tempo objectivos consumatóriose instrumentais. O mesmomúsico poderá querer ao mesmo tempoque as pessoas se sintam satisfeitas ao ouvir a sua música e quecomprem os seus discos, para ganhar dinheiro com eles.

O receptor da mensagem também pode ter objectivos consu-matórios ou instrumentais ao receber uma mensagem. Tal comono exemplo da recompensa retardada, o objectivo do receptor aoir ao cinema poderá ser satisfazer-se de imediato com o filme (ob-jectivo consumatório). Mas também poderá ser conhecer o filmepara depois o poder contar aos colegas (objectivo instrumental). Oreceptor ainda poderá, na verdade, ter os dois tipos de objectivos,consumatório e instrumental, ao consumir uma mensagem.

A incompreensão, os conflitos e os atritos entre emissor e re-ceptor podem resultar da diferença de objectivos. Um professorpode querer que os estudantes beneficiem no imediato da sua sa-bedoria. O seu objectivo é consumatório. Mas os estudantes po-dem ser perfeitamente imunes à sabedoria do professor e quereraprender unicamente o indispensável para tirarem uma nota po-sitiva no exame. Neste caso, o seu objectivo na comunicação éinstrumental.

É possível que emissor e receptor tenham objectivos distin-tos e cada um obter o que deseja da comunicação. Um recep-tor pode ler um livro ideológico, escrito para mudar pensamentose comportamentos, unicamente para cultivar o saber (objectivoconsumatório), mas, posteriormente, poderá modificar o seu pen-

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samento e comportamento, correspondendo aos objectivos instru-mentais do emissor.

1.5 Formas de comunicação humanaHá seis grandes formas de comunicação humana:

1. Intrapessoal - Comunicação de alguém consigo mesmo,usando, por exemplo, frases introspectivas e formas de pen-samento automático;

2. Interpessoal - Comunicação entre dois indivíduos, comu-nicação dentro de um pequeno grupo não formal de indi-víduos ou entre pequenos grupos informais de indivíduos,servindo, por exemplo, para criar e sustentar relações pes-soais;

3. Grupal - Comunicação no seio de grupos "formais"de mé-dia ou grande dimensão;

4. Organizacional - Comunicação desenvolvida no seio de or-ganizações, como as empresas, e destas para o exterior;

5. Social - Comunicação desenvolvida para grupos heterogé-neos e grandes de pessoas, também denominada de difusão,comunicação colectiva ou comunicação de massas (masscommunication). A denominação "comunicação de mas-sas", porém, não dá conta da autonomia perceptiva e inter-pretativa de cada receptor, pelo que talvez não seja a maisadequada (na realidade, como um título de um livro do aca-démico brasileiro Sérgio Caparelli, o que existe é uma es-pécie de "comunicação de massa sem massa");

6. Extrapessoal - Comunicação desenvolvida com animais,commáquinas e, crêem algumas pessoas, com espíritos, ex-traterrestres e outras entidades das quais não existe prova

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física (nem evidência de comunicação). A comunicaçãotelepática, da qual também não existe qualquer evidência,aglutinar-se-ia a esta categoria de comunicação. A comu-nicação extrapessoal, nomeadamente aquela de que não háprova tangível nem evidência, não será objecto deste livro.

A comunicação pode ainda ser:

1. Mediada (comunicação feita recorrendo a dispositivos téc-nicos de comunicação, os media, como acontece quandose escreve um livro para outros lerem, ou quando se faz eemite um telejornal);

2. Directa ou não mediada (comunicação feita sem a inter-mediação de dispositivos técnicos, como acontece numaconversa face-a-face).

Geralmente, a comunicação intrapessoal e a comunicação in-terpessoal são directas. A comunicação grupal e a comunicaçãoorganizacional podem ou não ser mediadas. A comunicação so-cial é sempre mediada.

Se o conceito de comunicação abarca a comunicação intrapes-soal, então engloba a ideia da consciencialização pessoal atravésde um processo auto-comunicativo (em que emissor e receptorcoincidem). "Penso, logo existo", disse Descartes. No entanto,geralmente a definição operatória de comunicação consiste natransmissão de mensagens entre um ou mais emissores e umou mais receptores. Por isso, do ponto de vista das Ciências daComunicação, fala-se da comunicação como um processo sociale, deste modo, tende a secundarizar-se, mas não a excluir-se, acomunicação intrapessoal.

A comunicação interpessoal directa, por definição, é sempreinteractiva e pressupõe a existência de feedback (resposta) cons-tante. Interactividade e feedback são conceitos irmãos. Interac-tividade diz respeito à interacção entre comunicadores, o que sóse consegue plenamente quando a comunicação é directa e, como

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se disse, existe feedback constante. Todavia, o conceito tambémse pode aplicar à relação de um indivíduo com um determinadomeio de comunicação, por exemplo à situação concreta de um in-divíduo a interagir com o computador quando joga, ou navega naInternet, etc. Já o feedback tem a ver com a ideia de resposta doreceptor ao emissor, o que pressupõe interactividade. Na comuni-cação mediada, o feedback, quando existe, pode não ser imediato,mas sim retardado.

A comunicação mediada pode ou não admitir interactividade efeedback. Quando a comunicação mediada admite interactividadee feedback entre emissor(es) e receptor(es), pode designar-se porcomunicação mediada interactiva ou bidireccional.

A interactividade e o feedback podem ocorrer nos vários tiposde comunicação mediada: (1) interpessoal (ocorre, por exem-plo, quando duas pessoas trocam e-mails ou mensagens sms);(2) grupal (ocorre, por exemplo, quando várias pessoas formamum grupo virtual e dialogam num chat room); (3) organizacio-nal (ocorre, por exemplo, quando a direcção de uma organizaçãoresponde por escrito a um pedido igualmente escrito de um fun-cionário de base); ou mesmo (4) social (ocorre, por exemplo, nosprogramas radiofónicos que permitem que os ouvintes participemem directo por via telefónica). Há ainda a considerar que a in-teractividade, num contexto de comunicação social, pode não sertotal, mas parcial. É o que acontece, por exemplo, quando se podeassistir a um programa de televisão e escolher um ou vários ângu-los de câmara entre os disponíveis. Neste caso, não é o espectadora movimentar livremente a câmara. O emissor é que fornece vá-rios pontos de vista de câmara, podendo o telespectador escolherentre eles.

Quando a comunicação mediada não admite ou limita seve-ramente o feedback e a interactividade, pode designar-se por di-fusão. Neste caso, a comunicação ocorre somente, ou essenci-almente, do(s) emissor(es) para o(s) receptor(es). Assim, podeconsiderar-se que a comunicação mediada é de difusão massiva("comunicação demassa"ou "comunicação demassas") quando

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a mesmamensagem é difundida, simultaneamente, para um grande,anónimo e heterogéneo grupo de pessoas através de um ou váriosmedia, como acontece com o telejornal ou os jornais generalistas.Por outro lado, pode considerar-se que a comunicação mediadaé de difusão segmentada quando a mesma mensagem, normal-mente de cariz especializado, é difundida para um segmento espe-cífico de pessoas, através de um ou vários media, como acontececom a imprensa especializada, um jornal interno de uma organi-zação, etc.

A comunicação, de todos os tipos, pode estar sujeita a ruídosque parasitam a mensagem. Além disso, por vezes há barreirasque impedem a comunicação ou afectam a fluidez das trocas co-municacionais. Essas barreiras podem ser:

• Físicas, como um obstáculo entre dois interlocutores que osimpede de dialogar;

• Culturais, como o desconhecimento do código de comuni-cação dentro de uma cultura (saber uma língua, por exem-plo, nem sempre é garantia suficiente para bem se interpre-tar uma mensagem);

• Pessoais, como a maneira de estar, de ser e de agir de cadasujeito envolvido na relação de comunicação, as capacida-des ou deficiências físicas pessoais que facultam ou dificul-tam a comunicação, etc.;

• Psico-sociais, como o estatuto e o papel social que os sujei-tos envolvidos na relação comunicacional atribuem uns aosoutros, que vincam uma dada distância social, ou a satura-ção dos sujeitos envolvidos na comunicação em relação aotema que motiva o acto comunicacional.

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1.5.1 Comunicação intrapessoalA comunicação intrapessoal é a comunicação estabelecida porum indivíduo consigo mesmo através de mecanismos conscien-tes (pensamentos, planos...) ou inconscientes (sonhos).

A comunicação intrapessoal é, sobretudo, um processo men-tal, mas pode contemplar outras formas. Por exemplo, por vezes,quando alguém reflecte consigo mesmo, faz gestos que o ajudama compreender a intensidade das suas emoções e o significado dospensamentos. Noutro exemplo, quando alguém faz uma lista decompras para seu próprio uso, recorre a caneta e papel e escrevepalavras. O mesmo sucede quando alguém verte os seus pensa-mentos pessoais e intransmissíveis para um diário. Quando al-guém toca piano para seu próprio deleite, é à música que recorrecomo instrumento de comunicação. Há, efectivamente, muitasformas de alguém comunicar com si próprio.

Por que é que as pessoas comunicam consigo mesmas? Parareflectir sobre os outros, o mundo e elas mesmas, normalmenteem ordem a aperfeiçoar o seu agir social, ou seja, o seu papelsocial nas interacções que estabelecem com os outros, nos relaci-onamentos, nas comunidades e na sociedade de que fazem parte,mas também para desenvolverem ideias sobre elas próprias e paraavaliarem e darem sentido às suas experiências, pontos de vista evivências. Em suma, para darem sentido à sua existência. Os efei-tos da comunicação intrapessoal podem ser fortes, pois há pessoasque são os mais severos juízes delas mesmas. Depressões, ago-rafobias e outras doenças podem ter raízes na comunicação intra-pessoal.

1.5.2 Comunicação interpessoalA comunicação interpessoal é aquela que se estabelece entre in-divíduos, tipicamente entre dois indivíduos ou pequenos grupos,normalmente informais (amigos que se encontram, por exemplo),ocorrendo no decurso normal do quotidiano.

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Habitualmente, como se disse, a comunicação interpessoalé directa, mas pode ser mediada. É o que ocorre, por exem-plo, quando se telefona, se envia uma carta ou um e-mail. Paraalguns autores, a comunicação interpessoal mediada é descritacomomedio-comunicação, pois, comummente, implica o recursoa redes de comunicação pública, como as redes telefónicas ou aInternet, e afasta fisicamente os interlocutores, reduzindo a inten-sidade do feedback ou mesmo eliminando-o.

A comunicação interpessoal directa é, de alguma forma, amais rica, já que é aquela que integra directamente mais elemen-tos no contexto da comunicação. Na comunicação interpessoaldirecta, a componente não-verbal (gestos, posição dos braços edas mãos, espaço físico entre os interlocutores, posição do corpo,expressões faciais, contacto ocular, vestuário, silêncios, modula-ção da voz, cheiros emanados pelos interlocutores, idade apa-rente dos interlocutores, etc.) é tão relevante quanto a verbal (aspalavras em si). Os gestos, a entoação da voz, as percepções queos interlocutores fazem de si mesmo e dos outros (estatuto, dis-tância social, papel social...), o feedback imediato, o próprio con-texto da situação, entre outros factores, interferem directa, imedi-ata e processualmente no acto comunicativo interpessoal directo.Repare-se, por exemplo, que adaptamos a linguagem, a postura,os gestos, a distância física que nos separa, etc. aos diferentes in-terlocutores (percepcionados diferentemente, no que respeita aoseu estatuto, papel e distância social em relação a nós) e às dife-rentes situações comunicacionais interpessoais que encontramosquotidianamente. Quando o professor diz "por favor, cale-se"a umaluno que está a perturbar a aula, diz mais do que isso, diz maisdo que essa mensagem exacta. O professor invoca o seu estatuto,a sua autoridade e o seu papel social de educador, frisa a distânciasocial que o separa do aluno, mas também impregna a mensagemda cordialidade e da civilidade próprias das relações entre indi-víduos com auto-estima (ao dizer "por favor"). Em suma, com acomunicação o self apresenta-se. Um professor, por exemplo, di-ficilmente diria ao reitor da sua universidade "por favor, cale-se",

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pois neste caso daria lugar a um erro de convivência social, já queo reitor tem um estatuto superior que o distancia socialmente dosimples professor.

1.5.3 Comunicação grupalA denominação "comunicação grupal"não deixa dúvidas - diz res-peito à comunicação que ocorre no interior dos grupos. Não dosgrupos grandes, como organizações, mas sim de grupos peque-nos, como o grupo de amigos, a família, a pequena associação ouo pequeno comité ad-hoc.

Os grupos podem formar-se de diferentes maneiras. A famí-lia, por exemplo, forma-se com base em relações de consangui-nidade, parentesco ou similares. O grupo de amigos forma-sepor afinidades. Os grupos são mais ou menos coesos consoantea relevância que os seus membros dão aos objectivos que sustêmo grupo. A família une-se em torno da sobrevivência, enrique-cimento, progresso e felicidade dos seus membros. O grupo deamigos forma-se por motivos de entreajuda, para entretenimentoem comum, etc.

Normalmente, dentro dos grupos os indivíduos tendem a man-ter relações interpessoais directas de comunicação, mas o número,as personalidades e os estatutos e papéis dos membros do grupoinfluenciam o comportamento dos seus membros. Por exemplo,nos grupos sociais primários, como as famílias, o controlo doscomportamentos e atitudes é intenso, exercendo-se através da co-municação (manifestações de agrado, desagrado, recompensa, pu-nição, marginalização...) e tornando difícil a mudança de atitudes,excepto em questões conjunturais.

Segundo Tuckman e Jensen (1977), a instituição de gruposformais, como uma pequena associação, atravessa várias fases:

1. Formação - As pessoas agregam-se em torno de objectivoscomuns;

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2. Tempestade - Período durante o qual se argumenta em tornoda estrutura do grupo e funções dos seus membros. É a faseem que as pessoas revelam a sua personalidade e, nomeada-mente, revelam se a sua personalidade é consentânea com ados restantes membros do grupo;

3. Normativização - Período em que se determinam as nor-mas de funcionamento e o tipo de comportamento que osmembros do grupo devem esperar uns dos outros. Após afixação dessas normas, os membros do grupo pressionampara que elas sejam respeitadas;

4. Acção.

Bales (1950) chegou às seguintes conclusões sobre a partici-pação dos indivíduos nos grupos:

• O grau de participação de cada elemento no grupo é desi-gual, havendo sempre alguns que participam muito mais doque os outros;

• Os participantes activos dão informação e oferecem opi-niões, enquanto os passivos tendem apenas a concordar oudiscordar e a pedir informação;

• Os membros tendem a distinguir entre quem gostam mais equem consideram mais influente e mais capaz para lideraro grupo;

• Os membros do grupo exibem, normalmente, comporta-mentos gregários, mas outros podem ter comportamentosdesagregadores, que, no limite, podem levar ao fim do grupoou à sua divisão em vários subgrupos.

Os grupos tendem, de facto, a encontrar líderes, normalmenteas pessoas que se relacionam bem com as outras, resolvem pro-blemas, têm espírito de iniciativa, são empenhadas, encorajam,

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lidam bem com as situações e recorrem ao humor (Bales, 1950).A liderança, normalmente, é importante para os grupos cumpri-rem os seus objectivos. No entanto, podem encontrar-se váriostipos de líderes e lideranças:

• Autocrático - Um único membro, normalmente o líder for-mal, impõe a sua liderança aos restantes, que a podem acei-tar ou não consoante o grau de empenho e de capacidadeque o líder demonstra na resolução de problemas. Os efei-tos são a sobrecarga de trabalho sobre o líder e a tendênciapara outros membros do grupo se afastarem;

• Laissez-faire - O grupo não tem um líder efectivo e eficaz,o que, normalmente, contribui para a sua ineficácia colec-tiva e mesmo para a sua desagregação. É um fenómenomais comum em grupos de amigos, cujo único propósito éentreterem-se em conjunto e, eventualmente, entreajudarem-se, do que, por exemplo, em grupos que buscam concretizarobjectivos de mudança social. No entanto, encontram-segrupos formais e até algumas organizações (por exemplo,certas cooperativas) em que a "liderança"é laissez-faire.

• Democrático - O líder encoraja todos a darem o seu con-tributo. Por outro lado, nos grupos democráticos formais(por exemplo, pequenas associações) todos podem aspirara serem eleitos líderes. O efeito que resulta de um estilodemocrático é a maior participação dos membros do gruponas actividades do mesmo. Porém, o processo de tomadade decisões pode arrastar-se no tempo. No limite, discute-se eternamente sem se tomarem decisões.

• Liderança colectiva - Os membros do grupo, ou pelo me-nos alguns entre eles, lideram o grupo como uma equipa. Éum estilo de liderança raro, pois alguns membros do grupotendem sempre a sobressair e a liderar pela sua capacidadede iniciativa e resolução de problemas e pelo seu empenhona vida do grupo.

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Apesar de se poderem encontrar vários tipos de líderes e esti-los de liderança nos grupos, normalmente nenhum deles é "puro".Por exemplo, nas pequenas associações é comum haver lideran-ças que cruzam os estilos autoritário, democrático, colectivo e atémesmo laisez-faire.

A sociografia é muito útil para se perceberem as trocas de in-formação, o estilo de liderança e a organização interna dos grupos:

Liderança centralista

No exemplo acima, tudo no grupo passa por A, líder. As de-cisões são rápidas e a informação circula rapidamente dos mem-bros para o líder, que a aproveita melhor do que todos os restantesmembros do grupo.

Líder centralista e eminência parda

O exemplo acima é uma variante do primeiro modelo, masum dos membros do grupo interage fortemente com o líder, sendouma espécie de "eminência parda"da liderança.

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Isolamento de um dos membros

No exemplo acima, um dos elementos do grupo, o sujeito F,está completamente isolado dos restantes. Estes formam sub-grupos que dependem da centralidade de A: A+B+D; A+B+E;A+E+C; e A+C+D.

Rejeição

O sujeito F, no exemplo acima, é rejeitado por todos os res-tantes elementos do grupo e não aceita ninguém, pelo que é pro-vável o seu afastamento formal do grupo. Internamente, o grupoorganiza-se em subgrupos que dependem da centralidade de A,como no exemplo anterior.

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Membro abandonado

No caso acima, o sujeito F foi abandonado pelos restantesmembros do grupo, embora estes não o rejeitem e F aceite A,que ocupa a posição central no grupo. Como nos dois exemplosanteriores, o grupo estrutura-se em subgrupos em que o sujeito Aocupa a posição central, sendo o principal elemento agregador dogrupo.

Grupinho

No exemplo do "grupinho", todos os elementos interagem en-tre si, trocam informação entre si e ninguém ocupa uma posiçãocentral ou privilegiada. É um modelo de funcionamento comumnos pequenos grupos informais. Por vezes, os grupos maioresestruturam-se em função deste tipo de subgrupos. É comum e na-tural, por exemplo, que numa turma os estudantes se agrupem em"grupinhos", consoante as suas afinidades com os colegas "pare-cidos"(principalmente nos hábitos). Os grupinhos vão mantendo

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laços entre si e formando a "turma"através de elementos que fa-zem a ponte entre eles.

Fraccionamento

O modelo acima traduz um fraccionamento total do grupo emdois subgrupos. A prazo, a situação de "dissidência"graficamenterepresentada, provavelmente, conduzirá à desagregação e desapa-recimento do grupo e ao aparecimento de dois novos grupos.

Um acto comunicativo não se apresenta isolado. Nos grupos,nas organizações e na sociedade, outros actos comunicativos são-lhe associados. Maria Dolores Cáceres (2003: 71-74), por exem-plo, fala, entre outras, da comunicação circular, em X, em ca-deia, em Y e total:

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Os casos anteriores representam também, graficamente, for-mas de circulação da informação dentro de um grupo. Nos gruposem que a troca de informação é linear (emX, mas, principalmente,em Y e em cadeia), essas trocas são mais rápidas e permitem to-madas de decisão igualmente rápidas. Porém, o menor grau defeedback entre os diferentes membros do grupo pode provocarmaiores distorções na compreensão da mensagem. As formas cir-culares e totais de circulação de informação geram grupos maisparticipados mas atrasam o processo de tomada de decisões (Cá-ceres, 2003: 71-74).

1.5.4 Comunicação organizacionalA exemplo do que acontece com a designação "comunicação gru-pal", também é fácil discernir que o conceito de "comunicaçãoorganizacional"diz respeito à comunicação que se estabelece noseio das organizações.

Uma organização, na definição de Gill e Adams (1998: 122), éum grupo de grande dimensão, que possui um propósito definidoe requer elementos com competências diferentes. Por exemplo,uma Universidade é, sem dúvida, uma organização. O seu propó-sito é produzir e difundir conhecimento, formando pessoas. Nelacoexistem professores e investigadores, estudantes, quadros ad-ministrativos, bibliotecários, técnicos de informática, contínuos,funcionários de limpeza, funcionários de bar e restaurante, segu-ranças, etc. Todos são necessários para levar a missão da Univer-sidade a bom porto.

As organizações e os grupos mantêm-se enquanto os seus mem-bros cooperam e se coordenam, comunicando, para atingir os ob-jectivos dessas organizações ou grupos. Grupos e organizações,contudo, estão em constante evolução, acompanhando a contínuareorganização e reorientação dos seus membros. Este processo,contudo, tende a desenvolver-se ao nível superficial, não afec-

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tando os alicerces da estrutura (quando os afecta, a organizaçãodesmorona-se)2.

Uma organização é, essencialmente, um grupo grande. As-sim sendo, a maior parte dos conceitos comunicacionais referidospara a comunicação grupal têm aplicação directa à comunicaçãoorganizacional. É o caso, por exemplo, dos tipos de liderança, dosdados trazidos pelos sociogramas e pelas representações gráficasdos fluxos de comunicação.

Gill e Adams (1998: 122) esclarecem que há, essencialmente,três tipos de organizações:

1. Organizações de benefício mútuo (sindicatos, partidos po-líticos, organizações ambientalistas e outras associações dasociedade civil, clubes desportivos, etc.);

2. Organizações de utilidade e serviço público (universida-des, escolas, hospitais, museus, instituições da administra-ção pública e do Estado, etc.);

3. Organizações lucrativas (empresas, casas comerciais, etc.).

É de salientar que as categorias propostas por Gill e Adams,se bem que úteis, não devem ser entendidas como estanques. Defacto, uma organização pode, por exemplo, prestar um serviço pú-blico e ainda assim ter uma finalidade lucrativa. Uma escola par-ticular pode ser fundada com o objectivo de dar lucro aos inves-tidores mas ainda assim prestar um serviço de interesse público eutilidade social.

Uma organização não é um sistema isolado. Tem de comu-nicar com o exterior para sobreviver. Mas a sobrevivência da or-ganização também depende da capacidade que ela demonstre depôr as pessoas a comunicar eficientemente dentro dela própria.Assim sendo, podem distinguir-se duas formas de comunicaçãoprincipais nas organizações:

2 Ver, neste capítulo, o ponto dedicado à comunicação na sociedade, emespecial as partes referentes aos mecanismos da reprodução cultural e social.

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1. Comunicação interna (comunicação que ocorre dentro dasorganizações);

2. Comunicação externa (comunicação das organizações parao exterior e do exterior para a organização).

Para coordenarem as suas actividades, para obterem informa-ções necessárias ao seu desempenho, para percepcionarem qualé o clima interno, para se manterem a par do que muda, para al-cançarem os seus objectivos pessoais, para prosperarem dentro deuma organização, os seus membros precisam de comunicar e pre-cisam também de estar convencidos de que devem comunicar, oque, paradoxalmente, também só se consegue comunicando. Acomunicação interna diz, essencialmente, respeito a estas reali-dades, devendo ser, tanto quanto possível, planificada, para seevitarem distorções e boatos às mensagens, que podem estragar oclima interno e criar uma cultura organizacional desmotivadora.

De facto, nem toda a comunicação estabelecida dentro de umaorganização é formal. Há também que contar com a comunica-ção informal. Ou seja, as pessoas de uma organização não falamsó "oficialmente"de assuntos respeitantes a essa organização. Elastambém falam "não oficialmente"de assuntos respeitantes à orga-nização ou de outros assuntos. Neste último caso, estamos pe-rante mecanismos de comunicação informal. No primeiro caso,estamos perante mecanismos de comunicação formal. Por exem-plo, numa Universidade os professores não falam do estado doscursos a que leccionam, dos alunos e da instituição apenas emreuniões e documentos formais. Também falam informalmenteentre si, trocando impressões sobre esses e outros assuntos da ins-tituição ou alheios à instituição. Normalmente, a comunicaçãoinformal é mais livre e interactiva, ocorrendo, essencialmente, emcontextos de comunicação interpessoal directa. A comunicaçãoformal é mais burocrática e contida, pois as pessoas, por medodo isolamento3, de represálias e ainda de serem vistas como dis-

3 Ver o ponto dedicado à Teoria da Espiral do Silêncio, no capítulo dedicadoaos efeitos da comunicação social.

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sidentes, evitam, formalmente, fazer críticas exacerbadas, acusarpessoas, denunciar situações, etc. Daí que numa auditoria à co-municação, para se avaliar o clima interno de uma organização,se tenha de ter em atenção a comunicação informal que se produz,até porque esta, por vezes, alimenta rumores e boatos que podemter consequências funestas para a organização.

Uma organização não se dissocia do seu ecossistema. Ela en-via mensagens para o meio externo e acolhe mensagens do meioexterno. Este é, como se viu, o universo da comunicação externa.A imagem, ou seja, a percepção pública da organização (dos seuscolaboradores, produtos, serviços, marcas, etc.), depende, neces-sariamente, da comunicação que a organização estabelece com oexterior. Assim, é melhor que a informação seja planeada e siste-mática do que ocasional e não planeada. Daí que a comunicaçãointegrada externa (marketing, publicidade, relações públicas) sejauma mais valia para as organizações, em especial para as empre-sas, para as instituições do estado, para as organizações cívicas(por exemplo, as organizações ambientalistas), para os grupos delóbingue e para as organizações políticas.

Cada organização tem as suas especificidades estruturais, oque implica, necessariamente, a ocorrência de especificidades co-municacionais. No entanto, normalmente as organizações têmuma das seguintes estruturas:

1. Há organizações tendem a estruturar-se verticalmente sobuma forma piramidal, em especial as grandes empresas pro-dutivas, e horizontalmente em vários departamentos (porexemplo, numa empresa, departamento comercial, depar-tamento de marketing, departamento produtivo, etc.; numhospital, serviços clínicos, serviços administrativos, etc.).Os departamentos ainda podem ser divididos em secções.Um pequeno grupo de pessoas ocupa o topo da pirâmide,assumindo a direcção e administração global da organiza-ção. A meio da pirâmide encontram-se, em maior número,os líderes intermédios, como, nas grandes empresas produ-tivas, os directores de departamento e, na dependência des-

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tes, os chefes de secção. Na base, em maior número ainda,encontram-se os colaboradores em geral. Quanto menos ní-veis hierárquicos uma organização tiver, mais rapidamentea informação circula, menos deturpações ocorrem nas men-sagens (devido a ruídos e outros enviusamentos relaciona-dos com o entendimento e transmissão das mensagens) emenos barreiras estas têm de vencer.Os fluxos de informação numa organização piramidal, de-vido à estrutura desta, tendem a estruturar-se:

a) Do topo para a base (Comunicação ver-tical descendente, como acontece com as or-dens de serviço. É essencial para a eficácia daorganização.);

b) Da base para o topo (Comunicação ver-tical ascendente, como acontece quando um co-laborador faz um pedido à direcção. É essencialpara os directores terem feedback para as men-sagens que emitem para a base e para avaliaremo clima interno);

c)Horizontalmente (comunicação horizon-tal, como ocorre quando um departamento fazum pedido a outro).

2. As organizações podem estruturar-se de outras maneiras.Por exemplo, um único líder pode coordenar vários departa-mentos (funciona, essencialmente, como um coordenador)ou várias pessoas sem compartimentações em departamen-tos. Há cooperativas em que não existem líderes, tendo to-dos os membros igual responsabilidade na definição do des-tino da organização. Algumas empresas (nomeadamente asde alta tecnologia) até têm ambientes de trabalho comple-tamente abertos, em que não há barreiras físicas entre os

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colaboradores. Nestes casos, a comunicação tende a ser ho-rizontal e até global, no sentido de que todos comunicam"interactivamente"com todos, não existindo grandes barrei-ras e formalidades a vencer.

Quando se diagnostica a comunicação numa organização, háainda outras variáveis a ter em conta. O estilo de liderança é umadelas. O líder que se fecha no gabinete é diferente do líder quegere a organização por walking around. Este último, certamente,comunicará muito mais interactivamente com os diversos colabo-radores, situados nos vários patamares hierárquicos da organiza-ção, e conseguirá obter mais informações, quotidianamente, sobreo clima interno da organização que lidera.

O organigrama das organizações normalmente dá pistas paracompreender os fluxos de informação formais que ocorrem, oudeveriam ocorrer, dentro das organizações. Porém, normalmente,as pessoas, dentro das organizações, encontram sempre canais al-ternativos de comunicação, estabelecendo estruturas para os flu-xos de informação não coincidentes com o organigrama. Por isso,numa auditoria à comunicação organizacional deve comparar-se oorganigrama com a estrutura formal e informal de trocas de infor-mação dentro da organização e desta para o exterior, avaliando-seo impacto (não necessariamente negativo) das estruturas parale-las de comunicação. Por exemplo, o organigrama formal de umaempresa, e mapa formal dos fluxos de informação, poderá ser:

Mas ter-se estabelecido, por exemplo, a seguinte estrutura co-municacional (as linhas inteiras representam os fluxos formais,

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correspondentes ao organigrama, e as linhas a tracejado represen-tam os fluxos informais, distorções do organigrama):

No caso representado graficamente acima, os colaboradoresafectos ao Departamento 1 estariam a ter um grande protago-nismo comunicacional, sendo necessário descobrir porquê e ava-liar como isso afecta a organização (negativa ou positivamente)numa auditoria à comunicação organizacional.

É de referir que, na actualidade, várias organizações têm im-plementado sistemas comunicacionais para o incremento da parti-cipação de todos os colaboradores na vida organizacional, tradu-zindo a crescente importância e valorização das relações públicaspara a melhoria do clima interno, para a edificação da identidadeorganizacional e para a consolidação de uma cultura de perfor-matividade que leve a organização a rapidamente atingir os seusobjectivos.

A forma como se comunica numa organização é, assim, umavariável fundamental para a emergência e mutação da culturaorganizacional e do clima interno da organização. É, em con-sequência, um vector estruturante da identidade de qualquer or-ganização, ou seja, daquilo que ela é, algo independente daquiloque os membros da organização percebem que ela é (auto-ima-gem). Quando uma organização se projecta para o exterior, for-mando uma imagem externa (percepções que o público-externotem da organização, dos seus produtos e serviços, das suas mar-

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cas, etc.), parte, precisamente, da sua identidade, adicionando-lhetrabalho comunicativo (Villafañe, 1993; Marín et al., 1999: 120).

1.5.5 Comunicação socialA comunicação social ou comunicação de massas (mass commu-nication) é a comunicação efectuada a grande escala, de formaimpessoal, para uso e benefício de um grande, anónimo e hete-rogéneo número de receptores em simultâneo, que fisicamentepodem estar bastante separados, sendo, habitualmente, diminu-tas as possibilidades de interacção e feedback do receptor com oemissor. Cada receptor, de alguma forma, percebe que as outraspessoas (outros receptores) também são expostas à comunicaçãosocial. Mas a audiência não é personalizada. É tida, ao invés,como um agregado de indivíduos pontualmente unidos pela re-cepção comum de uma mensagem, consumida, por norma, devidoao facto de corresponder aos interesses, necessidades, crenças, va-lores e expectativas desses indivíduos.

A comunicação social requer pessoal técnico e capacidadeeconómica. Assim, normalmente, a comunicação social é pro-videnciada por emissores institucionalizados, habitualmente or-ganizações comerciais (como a SIC) que fabricam produtos in-formativos, persuasivos e de entretenimento, disponibilizados àgeneralidade da população. Empresas públicas (como a RTP),instituições religiosas (Igreja Católica - Rádio Renascença) e ou-tras instituições públicas e privadas sem fins lucrativos tambémpodem "fazer"comunicação social.

A comunicação social, no sentido de comunicação orientadapara um público massivo, mas heterogéneo, está, normalmente,relacionada com o jornalismo, a indústria de entretenimento (au-diovisual, livros, discos...), a publicidade e a propaganda, mas ou-tras actividades de comunicação em sociedade, como as relaçõespúblicas e a comunicação de marketing, também podem promoveracções que devem integrar-se na categoria "comunicação social",embora isto nem sempre aconteça. Consequentemente, a catego-

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ria "comunicação social"não deve aplicar-se, indistintamente, atoda a actividade, ou estratégia, de comunicação em sociedade,mas apenas aos fenómenos que implicam que uma mensagem éenviada, simultaneamente, para um grande e heterogéneo númerode receptores, o que implica o recurso a um meio de difusão dessamensagem. O meio difusor pode, ou não, permitir a interacção doreceptor com a mensagem. A televisão tradicional, a rádio tradi-cional, os jornais e as revistas, limitam bastante a interacção e ofeedback. A Internet e a televisão interactiva potenciam-nos, emmaior ou menor grau. Aliás, o processo de comunicação social ébastante complexo:

"É preciso abandonar o esquema simplista de con-siderar a todas as pessoas da audiência numa supostarelação pessoal, mais ou menos próxima, com o emis-sor, com a consequente influência directa. Nesse mo-delo, o emissor aparece como elemento dominante dacomunicação. Dirige-se a uma audiência sobre a qualtem domínio. O seu estímulo, a sua emissão de infor-mação, teria uma resposta imediata. Pelo contrário,sabemos que na realidade existe uma trama de rela-ções sociais, tanto na audiência como no emissor, queconvertem a relação emissor-receptor em algo bas-tante mais complexo"(Marín et al., 1999: 122).

Em certas análises, por vezes sugere-se que a comunicação demassas está em crise, devido às novas tecnologias da comunica-ção, mas o certo é que, conforme a evidência comprova, os meiostradicionais têm-se aguentado bastante bem e mantido as suas ca-racterísticas gerais, apesar das dificuldades que quem "faz"comu-nicação social tem de vencer, como sejam:

• Necessidade de conhecer a audiência, para que as mensa-gens, normalmente em competição entre elas, possam sus-citar a atenção dos públicos a que se destinam;

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• Necessidade de superar os obstáculos físicos que podemdificultar ou impedir a captação das mensagens (por exem-plo, o sinal de rádio pode ser afectado por tempestades);

• Necessidade de levar as pessoas a reparar numa men-sagem, a seleccioná-la e a consumi-la, o que pode tornar-se difícil, pois os receptores são activos, podendo escolherentre as muitas mensagens que competem pela sua aten-ção. Em última instância, o consumidor pode até ir fazerqualquer outra coisa, se as mensagens disponíveis não sa-tisfizerem o seu sistema de expectativas nem atraírem a suaatenção;

• Necessidade de difundir mensagens com sinal intenso,para que possam chegar à generalidade da audiência;

• Necessidade de confeccionar mensagens simples, numcódigo, à partida, entendido por largos sectores da audiên-cia;

• Necessidade de contornar os problemas decorrentes dasdificuldades de obtenção de feedback, como a dificuldadeem perceber, unicamente pela aferição da audiência, se aspessoas efectivamente gostam ou não da forma e do con-teúdo das mensagens (ou se, por exemplo, as estão a con-sumir o produto comunicativo por uma questão de rotina,ou ainda porque há mensagens de que gostam no produtoque consomem, apesar de também haver mensagens de quenão gostam). Os emissores necessitam de desenvolver es-forços e despender energias, tempo e dinheiro para conhe-cer cientificamente a audiência (em geral e raramente emparticular).

Uma das características principais da comunicação social é a"mobilidade psíquica"que oferece às pessoas (Marín et al, 1999:81). Efectivamente, se as viagens oferecem mobilidade física, acomunicação social favorece a mobilidade mental, psíquica, no

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sentido de que proporciona às pessoas experiências comuns domundo (representações do mundo), gerais e imediatas, que nãoocorriam nas sociedades antigas. Embora a metáfora seja muitoimperfeita, já que há muitos mecanismos que o impedem plena-mente, a comunicação social, num certo sentido, é "uma janelapara o mundo".

Por outro lado, a comunicação social é um agente de socializa-ção e aculturação, de disseminação de informação e de modelaçãosocial do conhecimento4. Alguns conseguem usá-la para garantiro seu enriquecimento pessoal, social e cultural e para ascenderemsocialmente, outros nem tanto5. Porém, é certo que ela contri-bui para que todos "conheçam"mais coisas sobre o mundo, emcomunhão, constituindo, neste sentido, uma instituição que desa-fia educativa e formativamente a própria escola, inclusivamenteatravés da disseminação de mensagens didácticas.

Além disso, a comunicação social (ver também Marín et al.,1999: (124-147):

• Promove o estatuto social das pessoas que atraem a aten-ção dosmedia (figuras públicas), mas em contrapartida podesuscitar a devassa da vida privada;

• Tende areforçar as normas sociais, contribuindo para adefinição do que é e não é desviante e inaceitável, emboratambém possa ter um papel de ruptura às normas em certassituações;

• Tira tempo a outras formas de interacção dos indivíduosuns com os outros e com os grupos, as comunidades e asociedade;

• Dissemina informações e promove conhecimentos-comuns4 Sobre estes pontos, consultar os capítulos dedicados às escolas e autores

do pensamento comunicacional e aos efeitos da comunicação.5 Sobre estes pontos, consultar os capítulos dedicados às escolas e autores

do pensamento comunicacional e aos efeitos da comunicação.

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que favorecem a agregação dos cidadãos na sociedade, jáque estes deixam de se sentir estranhos a ela;

• Funciona, muitas vezes, como um espaço de entretenimentoe mesmo de saudável libertação da imaginação, propici-ando a fuga mental à dureza da vida ou à rotina quotidiana;

• Tem uma função interpretativa, que radica na valorizaçãoe no enquadramento dos acontecimentos que são objectode discurso mediático, embora possa oferecer, simultanea-mente, várias valorizações e enquadramentos em confronto;

• Contribui para a transmissão cultural e para disseminarexplicações que tornam o mundo compreensível, embora,por vezes, gere explicações digladiantes;

• Contribui para a reprodução social e cultural, mecanis-mos através dos quais, quotidianamente, uma sociedade serecria a si mesma e à cultura dominante, a um nível conjun-tural; neste contexto, desenvolve a formação dos consensosque são necessários para a convivência social e para a go-vernação;

• É veículo de mensagens persuasivas, quer digam respeitoà luta pelo poder (propaganda política), quer à luta comer-cial, sendo estas últimas bastante mais comuns;

• Tende a reforçar as atitudes pessoais, pois as pessoas cos-tumam expor-se, principalmente, às mensagens que vão aoencontro do seu sistema de crenças, valores e expectativas;

• Pode favorecer a mobilização pública para se atingiremdeterminados objectivos (políticos, militares, de desenvol-vimento, sociais, religiosos, etc.);

• Coordena actividades separadas, dando-as a conhecer;

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• Promove as negociações entre indivíduos para se co-ori-entarem em relação a terceiros, ao mundo e às coisas,devido às mensagens simbólicas que difunde, que cobramaos receptores um posicionamento em relação àquilo a quese referem;

• Contribui para o desenvolvimento e crescimento econó-mico, ao gerar conhecimentos susceptíveis de melhorar aspráticas produtivas, a educação e a saúde; ao oferecer infor-mações que permitem às pessoas escolher novos produtos,conhecer oportunidades alternativas de ganhar a vida, etc.;ao incentivar o consumo e, portanto, a produção; ao forçaros líderes a governar com maior atenção aos governadose com mais profundo conhecimento dos dossiers, devido àpublicitação e vigia dos actos de poder, etc.

Assim sendo, a comunicação social tem repercussões extre-mamente positivas e outras que podem ser negativas, dependendodos usos que dela fazem produtores e receptores de mensagens edos efeitos que estas e os meios que as veiculam ocasionam.

A propósito, uma referência final à necessidade de distinguirentre a comunicação social em si e o sistema de meios que a su-porta. Uma coisa é a produção e difusão de mensagens e os efeitosque estas geram, outra os suportes usados para essas mensagens(os media difusores)6.

1.6 Comunicação, comunidades, sociedadee cultura

Não há uma definição única de sociedade, mas também não é ob-jecto deste livro definir o que é uma sociedade e como as diferen-tes sociedades comunicam entre elas e qual o estatuto que assu-mem em relação ao indivíduo. De qualquer modo, podemos dizer

6 Ver o capítulo sobre os media.

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que o conceito de "sociedade"é abstracto, descrevendo, na suaessência, relações entre pessoas e estruturas formadas por essasrelações, ou seja, um sistema social. Em síntese, uma sociedade éum sistema de indivíduos, grupos, organizações e instituições eminteracção e vinculados à estrutura resultante dessa interacção.

Igualmente abstracto é o conceito de "comunidade", contra-ponto analítico da noção de "sociedade", apesar de, na sua es-sência, o conceito de "comunidade"também descrever um tipo derelações entre pessoas e a estrutura que delas brota.

A noção de comunidade pode contrapor-se, analiticamente, ànoção de sociedade, pois enquanto na comunidade os indivíduosse unem por laços naturais (descendência/ascendência) e/ou es-pontâneos e por objectivos comuns, na sociedade os indivíduosrelacionam-se com base nos interesses individuais ou nos interes-ses das suas comunidades, o que resulta, muitas vezes, em com-petição e numa certa indiferença face aos outros. A sociedade,contudo, não se dissolve porque aos indivíduos é imposta uma so-lidariedade orgânica, expressa numa estrutura social que agregaorganismos diferentes, com funções individualizadas, e que re-sulta, em grande medida, da divisão social do trabalho7, que tornaos indivíduos interdependentes.

Tendo em conta o propósito deste livro, o que interessa per-ceber é que quer a comunidade quer a sociedade só se formame subsistem porque existe comunicação, pois esta é o substratoem que se desenvolvem as relações e interacções entre os actoressociais, sejam estes individuais ou colectivos, e em que constan-temente se negoceiam e encontram os equilíbrios que assegurama sobrevivência do sistema social e do sistema comunitário. Porexemplo, em termos sociais, é comunicando que se desenvolveo parlamentarismo democrático e se chega a acordo para publicarleis; em termos comunitários, é comunicando que uma família de-cide se está na hora de ter mais um filho, ou de comprar um carronovo...

7 Há quem cultive a terra, quem transforme produtos, quem preste servi-ços...

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Assim, se há interacções entre os elementos estruturantes dascomunidades e da sociedade, em concreto entre os actores sociaiscolectivos e individuais, e se são essas interacções que constroemquotidianamente as identidades, as comunidades e a sociedade edão referências (valores, normas...) a esta última, então a comu-nicação é o elemento vital da coesão social8. A comunicação éessencial para estruturar a sociedade e é ela que permite a repro-dução e recriação da sociedade, quer em termos macrossociais,quer em termos microssociais. Aliás, é também a comunicaçãoque permite que os indivíduos se integrem na sociedade, atravésda socialização.

A socialização é o processo através do qual o indivíduo aprendee interioriza, comunicando, o sistema de valores, de normas ede comportamentos de uma determinada sociedade, com deter-minada cultura. Nesse processo, intervêm vários agentes socia-lizadores, como a família, a escola e os próprios meios de co-municação social. Assim sendo, a socialização é, fundamental-mente, um processo comunicacional, mas também funciona comoum mecanismo de controlo, já que dá estabilidade à estrutura so-cial. Além disso, a socialização contribui para a transmissão daherança cultural de geração em geração, o que também concorrepara a estabilidade social. A socialização é, contudo, um pro-cesso dinâmico e não um processo determinista. Por um lado,cada actor social tem uma determinada autonomia, tanto maiorquanto maior for a sua preparação para lidar com os outros e assituações que enfrenta (para o que a educação e a formação sãofundamentais). Essa autonomia permite-lhe negociar com outrosactores sociais, individuais e colectivos, novos equilíbrios entreos constrangimentos sociais, interiorizados durante o processo desocialização, e as suas intenções pessoais. Por outro lado, em de-terminadas circunstâncias, por exemplo quando um indivíduo échamado a representar um novo papel social sobre o qual pouco

8 Ver o capítulo dedicado às Escolas e Autores do Pensamento Comunica-cional.

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ou nada sabe, ocorrem novos e dinâmicos processos de socializa-ção.

Como se disse acima, a comunicação também é essencial à re-produção social, processo através do qual a sociedade reproduza sua estrutura, ou seja, a sua forma de organização interna. Aestrutura decompõe-se em estruturas, ou seja, há um conjunto deestruturas que organizam a estrutura, como a estrutura das men-talidades, a estrutura económica, a social, a política, a culturale a demográfica, etc. Todos esses factores, ou estruturas, estãoem evolução. Contudo, alguns destes factores são os alicerces daestrutura e tendem a variar pouco ao longo do tempo. Assim, osaspectos fundamentais da estrutura tendem a ser estáveis. Quandoos elementos fundacionais da estrutura são destruídos ou substi-tuídos, a estrutura também é destruída, sendo substituída por umanova. É o que acontece, por exemplo, quando há uma revolução.A Revolução Francesa, por exemplo, simboliza o fim do AntigoRegime, o fim da ordem antiga e o nascimento de uma nova or-dem.

A comunicação é fundamental quer para que uma estruturaseja derrubada e substituída por outra quer para a reprodução quo-tidiana dessa estrutura. Por exemplo, foi comunicando que seabalou a estrutura de mentalidades que gerou o movimento po-pular que suportou a Revolução Francesa, derrubando a estruturaanterior, o Antigo Regime. Mas a comunicação é, igualmente,fundamental para reproduzir a estrutura e para fazer esta últimaevoluir, sem a destruir ou substituir. Por exemplo, sempre que sefaz um negócio à luz da lei, sempre que se celebra um casamento,sempre que se produz um livro para entrar no circuito comercial,sempre que se vota, é a estrutura da sociedade que se reproduz,pois um novo negócio, um novo casamento, um novo livro, os re-sultados das eleições, etc. reproduzem a forma de fazer as coisasnuma determinada sociedade, embora, paradoxalmente, tambéma façam evoluir conjunturalmente. Ora, para se celebrar um negó-cio ou um casamento, para que alguém decida se vai votar e comovai votar, é preciso comunicar. Um livro é, em si mesmo, uma

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