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Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios

Agora Mais Que Nunca

RefoRmas da pRestao de seRvios RefoRmas das polticas pblicas

RefoRmas da cobeRtuRa univeRsal

RefoRmas da lideRana

Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios

Agora Mais Que Nunca

Publicado pela Organizao Mundial da Sade em 2008 sob o ttulo The World Health Report 2008 : Primary Health Care Now More Than Ever Editor da verso Portuguesa Alto Comissariado da Sade, Ministrio da Sade Av. Joo Crisstomo, 9, 1. 1049-062, Lisboa PORTUGAL ISBN 978-989-95146-9-0 Dep. Legal 293537/09 Traduo para Lngua Portuguesa CISCOS Centro de Investigao em Sade Comunitria Departamento Universitrio de Sade Pblica da Faculdade de Cincias Mdicas Campo dos Mrtires da Ptria, 130 1169-056 Lisboa, Portugal Traduo: Dr. Maria Cristina Moniz Pereira, Dr. Ftima Hiplito, Prof. Doutor Paulo Ferrinho (Cap. 36) Reviso Cientfica: Prof. Doutor Jorge Torgal Reviso: Maria Isabel Alves Organizao Mundial da Sade 2008 WHO Library Cataloguing-in-Publication Data The world health report 2008 : primary health care now more than ever. 1.World health trends. 2.Primary health care trends. 3.Delivery of health care. 4.Health policy. I.World Health Organization. ISBN 978 92 4 156373 4 ISSN 1020-3311 World Health Organization 2008 Todos os direitos reservados. As publicaes da Organizao Mundial de Sade podem ser obtidas em WHO Press, World Health Organization, 20 Avenue Appia, 1211 Geneva 27, Switzerland (tel.: +41 22 791 3264; fax: +41 22 791 4857; e-mail: [email protected]). Pedidos para permisso de reproduo ou traduo das publicaes da OMS tanto para venda como para distribuio no-comercial devem ser dirigidos WHO Press, na morada acima (fax: +41 22 791 4806; e-mail: [email protected]). As designaes empregues e a apresentao do material nesta publicao no implicam a expresso de qualquer opinio por parte da Organizao Mundial de Sade no que se refere ao estatuto legal de qualquer pas, territrio, cidade ou rea ou as suas autoridades, nem relativamente s suas fronteiras ou limites. As linhas a tracejado nos mapas representam linhas de fronteira aproximadas para as quais pode no haver ainda um acordo total. A referncia a empresas ou a fabricantes de determinados produtos, no implica que estes sejam apoiados ou recomendados pela Organizao Mundial de Sade em detrimento de outros de natureza similar que no sejam mencionados. Exceptuando erros e omisses, os nomes dos produtos com marca registada so distinguidos com letras iniciais maisculas. Todas as precaues sensatas foram tomadas pela Organizao Mundial de Sade para verificar a informao contida nesta publicao. No entanto, o material publicado est a ser distribuido sem qualquer tipo de garantia, quer expressa quer implcita. A responsabilidade pela interpretao e uso do material recai sobre o leitor. Em quaisquer circunstncias, ser a Organizao Mundial de Sade responsvel por danos causados pelo seu uso. Informao relativa a esta publicao pode ser obtida em: World Health Report World Health Organization 1211 Geneva 27, Switzerland E-mail: [email protected] Podem ser encomendados exemplares atravs de: [email protected] The World Health Report 2008 foi produzido sob a direco geral de Tim Evans (Assistente do Director Geral) e Wim Van Lerberghe (editor-chefe). A equipa principal de escritores foi composta por Wim Van Lerberghe, Tim Evans, Kumanan Rasanathan e Abdelhay Mechbal. Outros colaboradores principais no rascunho do relatrio foram: Anne Andermann, David Evans, Benedicte Galichet, Alec Irwin, Mary Kay Kindhauser, Remo Meloni, Thierry Mertens, Charles Mock, Hernan Montenegro, Denis Porignon e Dheepa Rajan. A superviso organizacional do relatrio foi feita por Ramesh Shademani. Contribuies em termos de caixas de texto, figuras e anlise de dados vieram de: Alayne Adams, Jonathan Abrahams, Fiifi Amoako Johnson, Giovanni Ancona, Chris Bailey, Robert Beaglehole, Henk Bekedam, Andre Biscaia, Paul Bossyns, Eric Buch, Andrew Cassels, Somnath Chatterji, Mario Dal Poz, Pim De Graaf, Jan De Maeseneer, Nick Drager, Varatharajan Durairaj, Joan Dzenowagis, Dominique Egger, Ricardo Fabregas, Paulo Ferrinho, Daniel Ferrante, Christopher Fitzpatrick, Gauden Galea, Claudia Garcia Moreno, Andr Griekspoor, Lieve Goeman, Miriam Hirschfeld, Ahmadreza Hosseinpoor, Justine Hsu, Chandika Indikadahena, Mie Inoue, Lori Irwin, Andre Isakov, Michel Jancloes, Miloud Kaddar, Hyppolite Kalambaye, Guy Kegels, Meleckidzedeck Khayesi, Ilona Kickbush, Yohannes Kinfu, Tord Kjellstrom, Rdiger Krech, Mohamed Laaziri, Colin Mathers, Zoe Matthews, Maureen Mackintosh, Di McIntyre, David Meddings, Pierre Mercenier, Pat Neuwelt, Paolo Piva, Annie Portela, Yongyut Ponsupap, Amit Prasad, Rob Ridley, Ritu Sadana, David Sanders, Salif Samake, Gerard Schmets, Iqbal Shah, Shaoguang Wang, Anand Sivasankara Kurup, Kenji Shibuya, Michel Thieren, Nicole Valentine, Nathalie Van de Maele, Jeanette Vega, Jeremy Veillard e Bob Woollard. Foram recebidas contribuies valiosas sob a forma de revises crticas, sugestes e crticas da parte dos Directores Regionais e do seu pessoal, do Sub-Director-Geral, Anarfi Asamoah Bah, e do Assistente do Director-Geral. A primeira verso do relatrio foi revista numa reunio em Montreux, Sua, com os seguintes participantes: Azrul Azwar, Tim Evans, Ricardo Fabrega, Sheila Campbell-Forrester, Antonio Duran, Alec Irwin, Mohamed Ali Jaffer, Safurah Jaafar, Pongpisut Jongudomsuk, Joseph Kasonde, Kamran Lankarini, Abdelhay Mechbal, John Martin, Donald Matheson, Jan De Maeseneer, Ravi Narayan, Sydney Saul Ndeki, Adrian Ong, Pongsadhorn Pokpermdee, Thomson Prentice, Kumanan Rasanathan, Salman Rawaf, Bijan Sadrizadeh, Hugo Sanchez, Ramesh Shademani, Barbara Starfield, Than Tun Sein, Wim Van Lerberghe, Olga Zeus e Maria Hamlin Zujiga. O relatrio beneficiou grandemente das contribuies dos seguintes participantes num Workshop de uma semana em Bellagio, Itlia: Ahmed Abdullatif, Chris Bailey, Douglas Bettcher, John Bryant, Tim Evans, Marie Therese Feuerstein, Abdelhay Mechbal, Thierry Mertens, Hernan Montenegro, Ronald Labonte, Socrates Litsios, Thelma Narayan, Thomson Prentice, Kumanan Rasanathan, Myat Htoo Razak, Ramesh Shademani, Viroj Tangcharoensathien, Wim Van Lerberghe, Jeanette Vega e Jeremy Veillard. Os grupos de trabalho da OMS forneceram os dados iniciais para o relatrio. Estes grupos de trabalho, incluindo pessoal da Sede e dos Escritrios Regionais, incluiram: Shelly Abdool, Ahmed Abdullatif, Shambhu Acharya, Chris Bailey, James Bartram, Douglas Bettcher, Eric Blas, Ties Boerma, Robert Bos, Marie-Charlotte Boueseau, Gui Carrin, Venkatraman Chandra-Mouli, Yves Chartier, Alessandro Colombo, Carlos Corvalan, Bernadette Daelmans, Denis Daumerie, Tarun Dua, Joan Dzenowagis, David Evans, Tim Evans, Bob Fryatt, Michelle Funk, Chad Gardner, Giuliano Gargioni, Gulin Gedik, Sandy Gove, Kersten Gutschmidt, Alex Kalache, Alim Khan, Ilona Kickbusch, Yunkap Kwankam, Richard Laing, Ornella Lincetto, Daniel Lopez-Acuna, Viviana Mangiaterra, Colin Mathers, Michael Mbizvo, Abdelhay Mechbal, Kamini Mendis, Shanthi Mendis, Susan Mercado, Charles Mock, Hernan Montenegro, Catherine Mulholland, Peju Olukoya, Annie Portela, Thomson Prentice, Annette Pruss-Ustun, Kumanan Rasanathan, Myat Htoo Razak, Lina Tucker Reinders, Elil Renganathan, Gojka Roglic, Michael Ryan, Shekhar Saxena, Robert Scherpbier, Ramesh Shademani, Kenji Shibuya, Sameen Siddiqi, Orielle Solar, Francisco Songane, Claudia Stein, Kwok-Cho Tang, Andreas Ullrich, Mukund Uplekar, Wim Van Lerberghe, Jeanette Vega, Jeremy Veillard, Eugenio Villar, Diana Weil e Juliana Yartey. A equipa de produo editorial foi dirigida por Thomson Prentice, gestor de edio. O relatrio foi editado por Diana Hopkins, assistida por Barbara Campanini. Gal Kernen deu assistncia nos grficos e produziu a verso do website e outros meios electrnicos. Lina Tucker Reinders deu conselhos editoriais. O ndice foi preparado por June Morrison. O apoio administrativo na preparao do relatrio foi dado por Saba Amdeselassie, Maryse Coutty, Melodie Fadriquela, Evelyne Omukubi e Christine Perry. Crditos das fotografias: capa: WHO/Marko Kokic; Fotografia da Directora-Geral: WHO; segunda capa: WHO/Marko Kokic; contra-capa: WHO/Christopher Black (em cima, esquerda); WHO/Karen Robinson (em cima, direita); Alayne Adams (centro esquerda e direita); Federao Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho /John Haskew (em baixo, esquerda); WHO/Marko Kokic (em baixo, direita). Design: Reda Sadki Layout: Steve Ewart and Reda Sadki Figuras: Christophe Grangier Paginao e Coordenao de impresso da verso Portuguesa: Syntaxe Impresso em Portugal (NLM classification: W 84.6)

Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

ndiceMensagem da Directora-Geral Introduo e Viso GlobalResponder aos desafios de um mundo em mudana Expectativas crescentes de um melhor desempenho Dos pacotes do passado s reformas do futuro Quatro conjuntos de reformas dos CSP Aproveitar as oportunidades

viii xixii xiv xv xvi xix

Captulo 1. Os desafios de um mundo em mudanaCrescimento desigual, resultados desiguaisVidas mais longas e melhor sade, mas no em todo o lado Crescimento e estagnao

122 4

Adaptao a novos desafios em sadeUm mundo globalizado, urbanizado e em envelhecimento Pouca antecipao e reaces lentas

88 11

Tendncias que comprometem a resposta dos sistemas de sadeHospitalo-centrismo: sistemas de sade construdos em torno de hospitais e especialistas Fragmentao: sistemas de sade construdos em torno de programas prioritrios Sistemas de sade deixados deriva em direco comercializao desregulamentada

1212 14 15

Valores em mudana e expectativas crescentesEquidade em sade Cuidados que colocam as pessoas em primeiro lugar Garantir a sade das comunidades Autoridades de sade atentas e de confiana Participao

1517 17 19 19 20

Reformas dos CSP: impulsionadas pela procura

20

Captulo 2. Promover e manter a Cobertura UniversalO papel central da equidade em sade nos CSP Promover a cobertura universal Desafios da promoo da cobertura universalFasear o desenvolvimento de redes de cuidados primrios para corrigir a falta de disponibilidade Ultrapassar o isolamento das populaes dispersas Criar servios alternativos aos servios comerciais no-regulamentados

2526 27 3031 34 34

Intervenes para complementar os mecanismos de cobertura universal Mobilizar para a equidade em sadeAumentar a visibilidade das iniquidades em sade Criar espao para a participao e empoderamento da sociedade civil

35 3737 38

iii

Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

Captulo 3. Cuidados Primrios: Dar prioridade s pessoasBons cuidados tm a ver com pessoas O que distingue os cuidados primriosA efectividade e a segurana no so apenas assuntos tcnicos Compreender as pessoas: cuidados orientados para as pessoas Respostas compreensivas e integradas Continuidade dos cuidados Um prestador habitual e de confiana como ponto de entrada

4344 4646 49 51 53 55

Organizao de redes de cuidados primriosTrazer os cuidados para mais perto das pessoas Responsabilidade por uma populao bem identificada A equipa de cuidados primrios como um ncleo de coordenao

5657 57 59

Monitorizao do progresso

61

Captulo 4. Polticas Pblicas para a sade do pblicoImportncia de polticas pblicas saudveis Polticas sistmicas alinhadas com as metas dos CSP Polticas de sade pblicaAlinhar os programas de sade prioritrios com os CSP Iniciativas nacionais de sade pblica Capacidade de resposta rpida

6768 70 7272 72 73

Sade em todas as polticas Compreender o sub-investimento Oportunidades para melhores polticas pblicasMelhor informao e evidncia Um cenrio institucional em mudana Aces globais de sade equitativas e eficientes

74 77 7979 81 82

Captulo 5. Liderana e governo efectivoOs governos como mediadores das reformas dos CSPMediao do controlo social para a sade Descompromisso e as suas consequncias Participao e negociao

878888 89 91

Dilogo poltico efectivoSistemas de informao para reforo do dilogo poltico Reforar o dilogo poltico com a inovao de modelos operacionais Estabelecer uma massa crtica com capacidade para mudar

9393 96 97

Controlo do processo poltico: do lanamento implementao das reformas

99

Captulo 6. Seguir em frenteAdaptar as reformas ao contexto de cada pas Economias da sade com despesas elevadas Economias da sade em crescimento rpido Economias da sade com despesas baixas e crescimento lento Mobilizar os impulsores da reformaMobilizar a produo de conhecimento Mobilizar o empenho da fora de trabalho Mobilizar a participao das pessoas

107108 109 112 113 117118 119 120

iv

ndice

Lista de FigurasFigura 1. Reformas dos CSP necessrias para reorientar os sistemas de sade para a sade para todos Figura 1.1 Pases seleccionados como os que tiveram uma melhor performance na reduo da mortalidade em crianas com menos de 5 anos de idade em, pelo menos, 80%, por regies, 1975-2006 Figura 1.2 Factores explicativos da reduo da mortalidade em Portugal 1960-1991 Figura 1.3 Progresso varivel na reduo da mortalidade em crianas com menos de 5 anos de idade, 1975 e 2006, em pases seleccionados com taxas semelhantes em 1975 Figura 1.4 PIB per capita e esperana de vida nascena, em 169 pases, 1975 e 2005 Figura 1.5 Tendncias do PIB per capita e esperana de vida nascena em 133 pases, agrupados pelo PIB de 1975, 1975-2005 Figura 1.6 Pases agrupados de acordo com as suas despesas totais em sade, em 2005 (em dlares internacionais I$) Figura 1.7 As crianas de frica esto em maior risco de morte devido a acidentes de trnsito do que as crianas europeias: mortes de crianas em acidentes na estrada, em 100 000 pessoas Figura 1.8 A Aumento das doenas no-transmissveis e dos acidentes como causas de morte Figura 1.9 Iniquidades, nos pases, em sade e em cuidados de sade Figura 1.10 Como os sistemas de sade so desviados dos valores essenciais aos CSP Figura 1.11 Percentagem da populao que cita a sade como a sua maior preocupao, mais que outros temas, como problemas financeiros, habitao ou criminalidade Figura 1.12 A profissionalizao dos cuidados nascena: percentagem de partos assistidos por profissionais e outros prestadores de cuidados em reas seleccionadas, 2000 e 2005 com projeces para 2015 Figura 1.13 Os valores sociais que orientam os CSP e os correspondentes grupos de reformas Figura 2.1 Despesa catastrfica relacionada com o pagamento directo no momento em que o servio prestado Figura 2.2 Trs direces mudana em direco cobertura universal Figura 2.3 Impacto da abolio das taxas moderadoras no nmero de consultas externas no distrito de Kisoro, Uganda; consultas externas 1998-2002 Figura 2.4 Diferentes padres de excluso: deprivao generalizada em alguns pases, marginalizao dos pobres noutros. Partos apoiados por pessoal com formao mdica (percentagem), por quintil de rendimento Figura 2.5 Mortalidade entre crianas menores de 5 anos, em zonas rurais e urbanas, Repblica Islmica do Iro, 1980-2000 Figura 2.6 Melhorar os resultados dos centros de sade no meio de catstrofes: Rutshuru, Repblica Democrtica do Congo, 1985-2004 xvii Figura 3.1 O efeito na adeso contracepo da reorganizao da forma de trabalhar nos centros de sade rurais do Nger Figura 3.2 Oportunidades perdidas para preveno da transmisso do VIH da me para filho na Costa do Marfim: s prevenida uma fraco minscula das transmisses previstas Figura 3.3 Os centros de sade com mais compreensibilidade tm melhor cobertura vacinal Figura 3.4 Prescries inadequadas de testes de diagnstico para doentes falsos que se apresentam com dor de barriga ligeira, Tailndia Figura 3.5 Os cuidados primrios como um ncleo de coordenao: redes na comunidade servida e com parceiros exteriores Figura 4.1 Mortes atribuveis ao aborto inseguro por 100.000 nados-vivos, em pases que permitem o aborto legalmente Figura 4.2 Despesa anual com medicamentos e nmero de receitas aviadas na Nova Zelndia, desde que a Agncia de Gesto de Medicamentos foi estabelecida, em 1993 Figura 4.3 Percentagem de registos de nascimentos e de bitos nos pases com sistemas compreensivos de registos civis, por regio da OMS, 1975-2004 Figura 4.4 Funes essenciais de sade pblica que 30 instituies nacionais de sade pblica vem como fazendo parte do seu porteflio Figura 5.1 Percentagem do PIB investida em sade, 20054 Figura 5.2 Despesa em sade na China: desinvestimento do estado, nos anos 80 e 90 e o re-compromisso recente Figura 5.3 Transformar os sistemas de informao em instrumentos para as reformas dos CSP Figura 5.4 Reforo mtuo entre a inovao operacional e o desenvolvimento de polticas nos processos de reforma da sade Figura 5.5 Um mercado crescente: cooperao tcnica como parte da Ajuda Oficial ao Desenvolvimento em Sade. Fluxos de ajuda anual em 2005, ndice de deflao ajustada Figura 5.6 Reemergncia da liderana nacional em sade: o deslocamento do financiamento dos doadores para o apoio a sistemas de sade integrados, e o seu impacto na estratgia dos CSP na Repblica Democrtica do Congo, em 2004 Figura 6.1 Contribuio das despesas gerais do governo, das despesas do privado pr-pago e do pagamento directo, para o crescimento anual na despesa total da sade per capita, percentagem, mdias ponderadas Figura 6.2 Projeco da despesa em sade per capita, em 2015, economias da sade com crescimento rpido (mdias ponderadas) Figura 6.3 Projeco da despesa em sade per capita, em 2015, economias da sade com despesas baixas e crescimento lento (mdias ponderadas) Figura 6.4 Aumento progressivo da cobertura, por centros de sade que so propriedade das e operados pelas comunidades, no Mali, 1998-2007 44 48

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Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

Lista de CaixasCaixa 1 Cinco limitaes comuns na prestao de cuidados de sade Caixa 2 O que foi considerado como cuidados primrios em contextos com recursos adequados foi excessivamente simplificado em ambientes de recursos escassos Caixa 1.1 Desenvolvimento econmico e opes de investimento nos cuidados de sade: a melhoria dos indicadores de sade em Portugal Caixa 1.2 Maior despesa em sade est associada a melhores resultados, mas com grande diferenas entre pases Caixa 1.3 medida que a informao melhora, as mltiplas dimenses da crescente iniquidade em sade vo-se tornando mais bvias Caixa 1.4 O equipamento mdico e as indstrias farmacuticas constituem importantes foras econmicas Caixa 1.5 A sade est entre as principais preocupaes pessoais Caixa 2.1 Boas prticas de promoo da cobertura universal Caixa 2.2 Definir os pacotes essenciais: o que tem de ser feito Caixa 2.3 Reduzir as diferenas entre o urbano e o rural atravs da expanso faseada da cobertura dos CSP em reas rurais na Repblica Islmica do Iro Caixa 2.4 A robustez dos sistemas de sade liderados pelos CSP: 20 anos de expanso da performance em Rutshuru, na Repblica Democrtica do Congo Caixa 2.5 Direccionar a proteco social no Chile Caixa 2.6 Poltica social na cidade de Ghent, Blgica: como as autoridades locais podem apoiar a colaborao intersectorial entre as organizaes de sade e de segurana social Caixa 3.1 Rumo a uma cincia e cultura de aperfeioamento: evidncias para a promoo da segurana do doente e de melhores resultados Caixa 3.2 Quando a procura induzida pela oferta e movida pelo consumidor determinam o tratamento mdico: os cuidados ambulatrios na ndia Caixa 3.3 Resposta dos cuidados de sade violncia domstica contra as mulheres Caixa 3.4 Empoderamento dos utentes para contriburem para a sua prpria sade Caixa 3.5 Tecnologias de informao e de comunicao para melhorar o acesso, a qualidade e a eficincia nos cuidados primrios xiv xviii Caixa 4.1 Mobilizar os recursos da sociedade para a sade, em Cuba Caixa 4.2 Recomendaes da Comisso para os Determinantes Sociais da Sade 3 Caixa 4.3 Como tomar decises sobre polticas pblicas impopulares Caixa 4.4 O escndalo da invisibilidade: onde os nascimentos e as mortes no so contados Caixa 4.5 Orientaes para a avaliao de impacto na Unio Europeia Caixa 5.1 Desinvestimento e re-investimento na China 13 16 Caixa 5.2 Definio de polticas, com recurso ao dilogo poltico: experincias de trs pases Caixa 5.3 Equity Gauges: stakeholderholder collaboration to tackle health inequalities Caixa 5.4 Limitaes dos modelos convencionais de desenvolvimento de capacidades em pases de baixo e de mdio rendimento Caixa 5.5 Reconstruo das lideranas da sade no rescaldo de guerras e do colapso econmico Caixa 6.1 Estratgia nacional da Noruega para reduzir as desigualdades sociais em sade Caixa 6.2 O ciclo virtuoso da oferta e da procura de cuidados primrios Caixa 6.3 Do desenvolvimento de produtos implementao no terreno a investigao faz a ponte 69 73 78 79 80

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Lista de QuadrosQuadro 1 Como a experincia mudou o rumo do movimento dos CSP Quadro 3.1 Caractersticas que distinguem os cuidados de sade convencionais dos cuidados primrios orientados para as pessoas Quadro 3.2 Orientao para a pessoa: evidncia da sua contribuio para a qualidade dos cuidados e de melhores resultados Quadro 3.3 Compreensividade: evidncia da sua contribuio para a qualidade dos cuidados e de melhores resultados Quadro 3.4 Continuidade dos cuidados: evidncia da sua contribuio para a qualidade dos cuidados e de melhores resultados Quadro 3.5 Ponto de entrada regular: evidncia da sua contribuio para a qualidade dos cuidados e de melhores resultados Quadro 4.1 Efeitos adversos na sade de mudanas nas condies de trabalho Quadro 5.1 Papis e funes dos observatrios de sade pblica, em Inglaterra Quadro 5.2 Factores significativos na melhoria da capacidade institucional para governao do sector da sade, em seis pases xv

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Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

Directora-Geral Mensagem

Quando assumi a direco em 2007, tornei claro o meu compromisso em centrar a ateno da OMS nos cuidados de sade primrios. Mais importante do que a minha convico pessoal, este compromisso reflecte a ampla e crescente procura de cuidados de sade primrios, por parte dos Estados Membros. Por sua vez, esta procura revela, por parte dos legisladores, um apetite crescente pelo conhecimento sobre como os sistemas de sade se podem tornar mais equitativos, inclusivos e justos. Tambm reflecte, de forma mais fundamental, uma mudana em direco necessidade de um pensamento mais abrangente sobre o desempenho do sistema de sade como um todo. Este ano assinala, paralelamente, o 60 aniversrio da OMS e o 30 aniversrio da Declarao de Alma-Ata sobre Cuidados de Sade Primrios, em 1978. Enquanto o nosso contexto global de sade se tem vindo a alterar, de forma notvel, durante as ltimas seis dcadas, os valores subjacentes Constituio da OMS e os que constam da Declarao de Alma-Ata tm vindo a ser testados e continuam verdadeiros. Contudo, apesar do enorme progresso em sade em termos globais, as nossas falhas colectivas em prestar cuidados de acordo com estes valores so dolorosamente bvias e merecem a nossa maior ateno. Vemos uma me a sofrer de complicaes no parto e sem acesso a apoio qualificado, uma criana a quem faltam as principais vacinas, um habitante das barracas do interior de uma cidade a viver em condies deplorveis. Vemos a ausncia de proteco dos pees que caminham em estradas e vias rpidas cheias de trfego e o empobrecimento resultante do pagamento directo de cuidados devido falta de seguro de sade. Estas e muitas outras realidades do dia-a-dia personificam os retrocessos inaceitveis e evitveis no desempenho dos nossos sistemas de sade. Ao andar para a frente, importante aprender com o passado e, ao olhar para trs, fica claro que podemos fazer melhor no futuro. Por isso, este Relatrio Mundial de Sade revisita a viso ambiciosa

viii

Mensagem da Directora-Geral

dos cuidados de sade primrios como um conjunto de valores e princpios para orientar o desenvolvimento dos sistemas de sade. O Relatrio representa uma oportunidade importante para aprender com as lies do passado, considerar os desafios que se avizinham e identificar as avenidas mais importantes para os sistemas de sade estrei-tarem os intolerveis vazios entre aspirao e implementao. Estas avenidas esto definidas no Relatrio como quatro conjuntos de reformas que reflectem a convergncia entre os valores dos cuidados de sade primrios, as expectativas dos cidados e os desafios do desempenho de sade que atravessam todos os contextos. Estes incluem: reformas da cobertura universal que garantam que os sistemas de sade contribuem para a equidade em sade, justia social e o fim da excluso, apontando primordialmente para o acesso universal e a proteco social da sade; reformas na prestao de servios que reorganizem os servios de sade em torno das necessidades e expectativas das pessoas, de forma a torn-los socialmente mais relevantes e mais capazes de responder ao mundo em mudana, ao mesmo tempo que produzem melhores resultados; reformas de polticas pblicas que garantam comunidades mais saudveis, integrando aces de sade pblica com cuidados primrios, seguindo polticas saudveis em todos os sectores e ampliando intervenes de sade pblica nacionais e transnacionais; e

reformas de liderana que substituam uma

dependncia desproporcionada entre, por um lado, comando-e-controlo, e por outro, o laissez-faire descomprometido do estado, por uma liderana inclusiva, baseada em negociao e participao, mais adequada complexidade dos sistemas de sade contemporneos. Embora aplicveis universalmente, estas reformas no constituem nenhum plano ou manifesto de aco. Os pormenores necessrios para lhes dar vida em cada pas devem ser guiados por condies e contextos especficos, com base nas melhores evidncias disponveis. No entanto, no h razes para que os pases ricos ou pobres atrasem o incio destas reformas. Como as ltimas trs dcadas demonstraram, o sucesso est ao alcance de todos. Fazer melhor nos prximos 30 anos, significa que precisamos de investir agora na nossa capacidade de alinhar o desempenho real com as nossas aspiraes, expectativas e a realidade em constante mudana do nosso mundo de sade interdependente. Unidos pelo desafio comum dos cuidados de sade primrios, chegou a hora de, agora mais que nunca, incentivar aprendizagens conjuntas e partilhar, entre todas as naes, o desenho da rota mais curta em direco sade para todos.

Dra. Margaret Chan Directora-Geral Organizao Mundial de Sade

ix

Introduo e Viso GlobalPorqu um renovar dos cuidados de sade primrios (CSP), e porqu agora, mais que nunca? A resposta imediata a exigncia palpvel por parte dos Estados Membros no s dos profissionais de sade, mas tambm da arena poltica. Em muitos pases, a globalizao est Responder aos desafios de xii um mundo em mudana a colocar a coeso social sob stress e os Expectativas crescentes xiv sistemas de sade, enquanto constitude um melhor desempenho Dos pacotes do passado intes essenciais da arquitectura das xv s reformas do futuro Quatro conjuntos de sociedades contemporneas, no esto xvi reformas dos CSP claramente a actuar to bem como Aproveitar as xix oportunidades deveriam. As pessoas esto cada vez mais impacientes perante a incapacidade dos servios de sade em prestar nveis de cobertura nacional, que vo ao encontro das exigncias expressas e das necessidades de mudana, bem como perante a sua incapacidade de prestao de servios em moldes que correspondam s suas expectativas. Poucos discordam com a ideia de que os sistemas de sade precisam de responder melhor e mais rapidamente aos desafios de um mundo em mudana. Os CSP podem faz-lo.xi

Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

Existe ainda hoje o reconhecimento que as populaes continuam esquecidas e o mesmo sentimento de oportunidades perdidas que impulsionou, h 30 anos, em Alma-Ata, uma mudana de paradigma no pensar sobre sade. A Conferncia de Alma-Ata mobilizou um movimento de Cuidados de Sade Primrios de profissionais e instituies, governos e organizaes da sociedade civil, investigadores e de pequenas organizaes que decidiram encontrar respostas para as desigualdades em sade, em todos os pases, que eram poltica, social e economicamente inaceitveis 1. A Declarao de Alma-Ata foi clara sobre os valores a seguir: justia social e o direito a melhor sade para todos, participao e solidariedade1. Havia, ento, a sensao de que o progresso em direco a estes valores requeria mudanas fundamentais na forma como os sistemas de sade operavam e que limitava o potencial de outros sectores. A traduo destes valores em reformas tangveis tem sido irregular. No entanto, hoje em dia, a equidade em sade goza de uma grande visibilidade no discurso de lderes polticos e ministros da sade2, bem como de reconhecimento por parte das estruturas de governo local, organizaes profissionais e organizaes da sociedade civil. Os valores dos CSP para alcanar a sade para todos, requerem sistemas de sade que: Ponham as pessoas no centro dos cuidados de sade3. O que as pessoas consideram formas desejveis de viver como indivduos e o que esperam das suas sociedades isto , aquilo que as pessoas valorizam constituem parmetros importantes para governar o sector da sade. Os CSP tm sido o referencial do discurso sobre sade da maioria dos pases, precisamente porque o movimento dos CSP tentou dar respostas antecipatrias, racionais e com base em evidncias s necessidades de sade e a essas expectativas sociais4,5,6,7. Conseguir isto, requer contra-partidas que tm de comear por ter em linha de conta as expectativas dos cidados sobre sade e cuidados de sade e garantir que [a sua] voz e escolha influenciem decisivamente a forma como os servios so designados e como operam8. Um artigo recente sobre CSP faz eco desta perspectiva quando refere o direito ao mais alto nvel de sade que se possa alcanar, maximizar equidade e solidariedade enquanto

se guiado por receptividade s necessidades das pessoas4. Caminhar em direco sade para todos exige que os sistemas de sade respondam aos desafios de um mundo em mudana e s crescentes expectativas de um melhor desempenho. Isto envolve u,ma reorientao substancial e a reforma da maneira como os sistemas de sade operam nas sociedades de hoje: essas reformas constituem a agenda de renovao dos CSP.

Responder aos desafios de um mundo em mudanaEm geral, as pessoas esto hoje mais saudveis, mais ricas e vivem mais tempo do que h 30 anos. Se as crianas ainda estivessem a morrer de acordo com as taxas de 1978, teriam havido 16,2 milhes de mortes globalmente em 2006. De facto, s se observaram 9,5 milhes9. Esta diferena de 6,7 milhes equivale a 18 829 crianas salvas todos os dias. A noo, outrora revolucionria, de medicamentos essenciais est vulgarizada. Tm havido melhorias significativas no acesso gua, saneamento e cuidados pr-natais. Isto mostra que o progresso possvel. E tambm pode ser acelerado. Nunca houve tantos recursos disponveis para a sade como agora. A economia de sade global est a crescer mais depressa que o produto interno bruto (PIB), aumentando a sua quota de 8% para 8,6% do PIB mundial entre 2000 e 2005. Em termos absolutos, ajustado inflao, isto representa um crescimento de 35% em despesas mundiais com a sade num perodo de cinco anos. O conhecimento e o entendimento sobre sade esto a crescer rapidamente. A acelerada revoluo tecnolgica est a multiplicar o potencial para melhorar a sade e transformar a literacia em sade numa sociedade global, bem educada e modernista. Est a emergir uma governao global resultante: de cmbios intensificados entre pases, em resposta, muitas vezes, a ameaas, desafios ou oportunidades que lhes so comuns; duma solidariedade crescente; e do compromisso global com a eliminao da pobreza, exemplificado pelos Objectivos de Desenvolvimento do Milnio (ODM). No entanto, existem outras tendncias que no devem ser ignoradas. Primeiro, o progresso substancial em sade nas dcadas mais recentes tem

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sido profundamente desigual, com convergncia para um melhor estado de sade para uma grande parte do mundo mas, ao mesmo tempo, com um considervel nmero de pases a ficar cada vez mais para trs ou a perder terreno. Acresce a existncia de ampla documentao no disponvel h 30 anos atrs de considerveis e muitas vezes crescentes desigualdades em sade, entre os pases. Segundo, a natureza dos problemas de sade est a mudar, assumindo formas apenas parcialmente antecipadas, e a um ritmo que era totalmente inesperado. O envelhecimento e os efeitos de uma urbanizao e globalizao mal geridas, aceleram a transmisso mundial de doenas transmissveis e aumentam o peso das doenas crnicas e no-transmissveis. A realidade, cada vez mais frequente, de muitos indivduos que apresentam sintomas complexos e mltiplas doenas, coloca prestao de servios desafios a uma gesto de casos mais integrada e abrangente. Est em jogo uma rede complexa de factores inter-relacionados, envolvendo aumentos graduais, num horizonte alargado, no rendimento e populao, alteraes climticas, desafios segurana alimentar e tenses sociais, todos com implicaes bem estabelecidas, mas muito imprevisveis, para a sade nos anos vindouros. Terceiro, os sistemas de sade no esto isolados do ritmo rpido de mudana e transformao que uma caracterstica essencial da globalizao de hoje. As crises polticas e econmicas criam obstculos na resposta do estado e das instituies aos problemas do acesso, da prestao e do financiamento. A comercializao desregulamentada acompanhada pela indefinio das fronteiras entre actores pblicos e privados, enquanto a negociao de direitos est cada vez mais politizada. A era da informao transformou as relaes entre cidados, profissionais e polticos. Em muitos aspectos, as respostas do sector da sade ao mundo em mudana tm sido desadequadas e ingnuas. Desadequadas, na medida em que falham no s na antecipao mas tambm na resposta apropriada: vezes de mais com muito pouco, tarde de mais ou excessivamente no stio errado. Ingnuas, na medida em que falhas do sistema requerem uma soluo ao nvel do

sistema, e no solues temporrias. Os problemas com os recursos humanos para a sade pblica e cuidados de sade, com sistemas de financiamento, infraestruturas ou sistemas de informao estendem-se invariavelmente para alm do sector da sade no seu sentido restrito, para alm de um nico nvel de influncia poltica e, cada vez mais, atravessam fronteiras: isto eleva o patamar em termos de trabalho efectivo entre todos os governos e parceiros. Enquanto o sector da sade se mantm massivamente deficitrio em termos de recursos em demasiados pases, a base de recursos para a sade tem vindo a crescer de forma consistente ao longo da ltima dcada. As oportunidades que este crescimento oferece na induo de mudanas estruturais e na criao de sistemas de sade mais eficazes e equitativos, so muitas vezes desperdiadas. Os processos globais de formulao de polticas e, cada vez mais, os nacionais, tm focado temas individuais, com os vrios constituintes a competirem pelos poucos recursos, enquanto se tem dado ateno pontual aos constrangimentos subjacentes que atrasam o desenvolvimento dos sistemas de sade em contextos nacionais. Em vez de melhorarem a sua capacidade de resposta e anteciparem novos desafios, os sistemas de sade parecem estar deriva entre prioridades imediatistas, cada vez mais fragmentados e sem uma orientao definida. Hoje sabemos que, sem uma orientao clara e uma governao firme, os sistemas de sade no gravitam naturalmente para a finalidade de sade para todos atravs de cuidados de sade primrios, tal como articulado na Declarao de Alma-Ata. Os sistemas de sade esto a desenvolver-se em direces que pouco contribuem para a equidade e justia social e so pouco eficientes na consecuo de melhores resultados em sade. As trs tendncias mais preocupantes, podem ser caracterizadas da seguinte forma: sistemas de sade centrados, de forma desproporcionada, numa oferta limitada de cuidados curativos especializados; sistemas de sade em que a prestao de servios est a ser fragmentada por abordagens de controlo de doenas, com objectivos imediatistas, num esprito de comando-e-controlo;

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sistemas de sade em que uma abordagem

laissez-faire da governao facilitou a expanso duma comercializao desregulamentada da sade. Estas tendncias vo totalmente contra uma resposta compreensiva e equilibrada s necessidades de sade. Em alguns pases, a iniquidade de acesso, os custos empobrecedores e a eroso da confiana nos cuidados de sade resultantes, constituem uma ameaa estabilidade social.

Expectativas crescentes de um melhor desempenhoO apoio renovao dos CSP tem origem na crescente percepo, entre os decisores sobre polticas de sade, de que os CSP podem contribuir para uma definio mais clara de um rumo a seguir e para uma abordagem unificadora no actual contexto de fragmentao dos sistemas de sade, estabelecendo-se como alternativa s curas rpidas que tm vindo a ser promovidas para os males dos sistemas de sade. H tambm uma conscincia cada vez maior de que a prestao de cuidados de sade convencionais, atravs de mecanismos diversos e por razes diferentes, no s menos eficaz do que poderia ser, mas sofre tambm de um conjunto de vcios e contradies ubquos e que esto resumidos na Caixa 1. Este desencontro entre as expectativas e a prestao um motivo de preocupao para as autoridades de sade. Havendo um peso econmico cada vez maior e dado o significado social do sector da sade, ele tambm um motivo de preocupao entre os polticos: revelador que os temas associados prestao de cuidados de sade tenham, em mdia, sido referidos mais de 28 vezes em cada um dos recentes debates para as eleies primrias nos Estados Unidos22. Ficar tudo como dantes no uma opo vivel para os sistemas de sade. A correco das limitaes dos actuais sistemas de sade exigir uma gesto e responsabilizao colectivas mais fortes, orientadas por uma noo mais clara da direco a seguir e dos objectivo desejados. De facto, isto que as pessoas esperam que acontea. medida que as sociedades se modernizam, as pessoas exigem mais dos seus sistemas de sade, para si prprios e para as suas famlias, bem como para a sociedade em que vivem. Assim, h um apoio popular cada vez maior para mais equidade na sade e para o fim da excluso; para servios de sade centrados nas necessidades e expectativas das pessoas; para segurana sanitria para as comunidades em que vivem; e por ter voz activa nas decises que afectam a sua sade e a das suas comunidades23. Estas expectativas fazem eco dos valores defendidos na Declarao de Alma-Ata. Explicam a exigncia actual de alinhamento dos sistemas de sade com estes valores. Conferem s tentativas

Caixa 1 Cinco limitaes comuns na prestao de cuidados de sadeInverso de Cuidados. As pessoas com mais posses em que as necessidades de cuidados de sade so muitas vezes menores consomem mais cuidados, enquanto que aqueles com menos posses e maiores problemas de sade consomem o mnimo10 . A despesa pblica em servios de sade beneficia frequentemente os ricos em detrimento dos pobres11 tanto em pases de rendimento elevado como nos de rendimento baixo12, 13 . Cuidados que empobrecem. Sempre que as pessoas tm falta de proteco social e tm de pagar os cuidados de sade do seu bolso, so confrontadas com despesas catastrficas. Anualmente, mais de 100 milhes de pessoas caem na pobreza porque tm de pagar pelos cuidados de sade recebidos14 . Cuidados fragmentados e fragmentadores. A excessiva especializao dos prestadores de cuidados de sade e o estreito enfoque de muitos programas de controlo de doena, desencorajam uma abordagem holstica aos indivduos e s famlias com quem lidam e no apreciam a necessidade de continuidade dos cuidados15 . Os servios de sade para grupos pobres e marginalizados so muitas vezes altamente fragmentados e apresentam dfices graves de recursos16 , enquanto a ajuda ao desenvolvimento refora com frequncia essa fragmentao17. Cuidados pouco seguros. Um sistema mal pensado que incapaz de garantir nveis de segurana e higiene, leva a elevadas taxas de infeces contradas nos hospitais, juntamente com erros de medicao e outros efeitos adversos que so evitveis e que constituem causas de morte e de falta de sade, muitas vezes subestimadas18 . Cuidados mal direccionados. Os recursos so concentrados nos servios curativos a elevado custo, negligenciando o potencial da preveno primria e da promoo da sade que poderiam prevenir at 70% do fardo da doena19,20. Ao mesmo tempo, o sector da sade no consegue mitigar os efeitos adversos de outros sectores na sade e aproveitar o que estes podem contribuir para a sade21.

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de reforma dos sistemas de sade pelo actual movimento dos CSP validade social e pertinncia poltica.

Dos pacotes do passado s reformas do futuroAs expectativas cada vez maiores e o amplo apoio viso reflectida nos valores de Alma-Ata nem sempre se traduziram numa transformao efectiva dos sistemas de sade. Existiram circunstncias e tendncias vindas de fora do sector da sade o ajustamento estrutural, por exemplo sobre as quais o movimento dos CSP teve pouca influlncia ou controlo. Para alm

disso, e com bastante frequncia, o movimento dos CSP simplificou demais a sua mensagem, o que resultou em receitas tipo chapa trs, iguais para todos, mas mal adaptadas aos diferentes contextos e problemas24. Como resultado disso, as autoridades de sade nacionais e globais passaram, muitas vezes, a olhar para os CSP no como um conjunto de reformas, como eram supostos ser, mas como mais um programa de prestao de cuidados de sade, entre muitos outros, que prestava cuidados pobres a pessoas pobres. O quadro 1 apresenta as diferentes dimenses das primeiras tentativas de implementao dos CSP e contrasta-as com as abordagens actuais. Inerente a esta evoluo est o reconhecimento de

Quadro 1 Como a experincia mudou o rumo do movimento dos CSPPRimEiRAS tEntAtivAS DE imPLEmEntAO DOS CSP Amplo acesso a um pacote bsico de intervenes em sade e a medicamentos essenciais para os rurais pobres Concentrao na sade da me e da criana Focalizao num pequeno nmero de doenas seleccionadas, primordialmente infecciosas e agudas Melhorias em higiene, gua, saneamento e educao para a sade ao nvel das comunidades Tecnologias simples para trabalhadores de sade comunitrios, no profissionais e voluntrios Participao vista como a mobilizao de recursos locais e a gesto de centros de sade atravs de comits de sade locais Servios financiados e prestados pelo Governo, com gesto centralizada e de cima para baixo Gesto da crescente escassez e reduo de postos de trabalho Ajuda e assistncia tcnica bilaterais Cuidados primrios como a anttese do hospital CSP so baratos e requerem apenas um modesto investimento PREOCuPAES ACtuAiS DAS REFORmAS DO CSP Transformao e regulamentao dos sistemas de sade existentes, com o objectivo de acesso universal e da proteco social da sade Preocupao com a sade de todos os membros duma comunidade Resposta integrada s expectativas e necessidades das pessoas, alargando o espectro de riscos e de doenas abrangidas Promoo de estilos de vida mais saudveis e mitigao dos efeitos dos riscos sociais e ambientais Equipas de trabalhadores da sade a facilitar o acesso e o uso apropriado das tecnologias e dos medicamentos Participao institucionalizada da sociedade civil em dilogos polticos e mecanismos de responsabilizao Sistemas de sade pluralsticos num contexto globalizado Pr o aumento dos recursos para a sade ao servio da cobertura universal Solidariedade global e aprendizagem conjunta Cuidados primrios como coordenadores de uma resposta integrada a todos os nveis CSP no so baratos: requerem um investimento considervel, mas mais compensador do que qualquer outra alternativa

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que uma definio mais clara da direco a seguir e dos objectivo desejados, requer um conjunto de reformas especficas, sensveis ao contexto, que correspondam aos desafios de sade de hoje e preparem para os desafios de amanh. O fundamental destas reformas vai muito alm da prestao de servios bsicos e abarca o conjunto dos elementos estruturantes dos sistemas nacionais de sade25. Por exemplo, alinhar servios de sade pelos valores que orientam os CSP exigir polticas ambiciosas de recursos humanos. No entanto, seria uma iluso pensar que elas podem ser desenvolvidas isoladamente das polticas de financiamento ou prestao de servios, das reforma do funcionalismo pblico e dos acordos sobre a migrao transfronteiria de profissionais de sade. Paralelamente, as reformas dos CSP, e o movimento dos CSP que as promove, tm de ser mais sensveis mudana social e ao aumento de expectativas associado ao desenvolvimento e modernizao. As pessoas tm cada vez mais voz activa sobre a sade como parte integrante de como elas e as suas famlias vivem o seu dia-a-dia, e sobre a forma como a sociedade aborda as questes da sade e dos cuidados de sade. A dinmica da procura tem de encontrar voz nos processos de definio de polticas e de tomadas de deciso. A necessria reorientao dos sistemas de sade tem de ser baseada em evidncias cientficas slidas e na gesto racional da incerteza, mas tambm deve integrar o que as pessoas esperam da sade e dos cuidados de sade para si prprias, as suas famlias e a sua sociedade. Isto requer concesses e negociaes, muitas vezes delicadas, com mltiplos parceiros, e o abandono de modelos lineares e imposies de cima-para-baixo observados no passado. Assim, as reformas dos CSP de hoje no so definidas nem pelos elementos estruturantes a que se dirigem, nem pela escolha das intervenes de controlo de doena a universalizar, mas pelas dinmicas sociais que definem o papel dos sistemas de sade na sociedade.

Quatro conjuntos de reformas dos CSPEste relatrio organiza as reformas dos CSP em quatro grupos que reflectem a convergncia entre a evidncia sobre o que preciso para dar resposta efectiva aos desafios de sade do mundo de hoje, os valores da equidade, solidariedade e justia social que orientam o movimento dos CSP, e as crescentes expectativas da populao em sociedades em modernizao (Figura 1): reformas que garantam que os sistemas de

sade contribuem para a equidade em sade, justia social e para o fim da excluso, primordialmente atravs do progresso do acesso universal e da proteco social da sade reformas da cobertura universal; reformas que reorganizem os servios de sade como cuidados primrios, isto , em torno das necessidades e expectativas das pessoas, de forma a torn-los socialmente mais relevantes e que respondam melhor ao mundo em mudana, enquanto produzem melhores resultados reformas da prestao de servio; reformas que garantam comunidades mais saudveis, integrando aces de sade pblica nos cuidados de sade primrios e pugnando por polticas pblicas saudveis nos vrios sectores reformas de poltica pblica; reformas que substituam o comando-e-controlo autoritrio e o laissez-faire descomprometido do estado, por uma liderana com base na negociao, participativa e inclusiva exigida pela complexidade dos sistemas de sade contemporneos reformas da liderana. O primeiro destes 4 conjuntos de reformas tem por objectivo a diminuio da excluso e das disparidades sociais em sade. Em ltima anlise, os determinantes de iniquidade em sade requerem uma resposta da sociedade com escolhas polticas e tcnicas que afectam muitos sectores diferentes. As iniquidades em sade tambm so modeladas pelas iniquidades em disponibilidade, acesso e qualidade dos servios, pelo fardo financeiro que estas impem s pessoas, e at por barreiras lingusticas, culturais e com base no gnero que esto muitas vezes entranhadas na forma como a prtica clnica conduzida26.

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Figura 1 Reformas dos CSP necessrias para reorientar os sistemas de sade para a sade para todosREFORmAS DA CObERtuRA univERSAL Para mais equidade em sade REFORmAS DA PREStAO DE SERviOS Para orientar os sistemas de sade para as pessoas

REFORmAS DA LiDERAnA Para autoridades de sade mais confiveis

REFORmAS DAS POLtiCAS PbLiCAS Para promover e proteger a sade das comunidades

Se os sistemas de sade tm por objectivo reduzir as iniquidades em sade, condio prvia tornar os servios acessveis a todos, isto , aumentar a oferta de servios. As redes de servios so hoje muito mais amplas do que h 30 anos, mas existem grandes bolsas populacionais sem acesso a essas redes. Em alguns locais, a guerra e a instabilidade social destruram infraestruturas, noutros a comercializao desregulamentada aumentou a disponibilidade de servios, mas no necessariamente dos mais necessrios. Falhas na oferta ainda so uma realidade em muitos pases, fazendo com que o alargamento das suas redes de servios seja uma preocupao prioritria, tal como acontecia h 30 anos atrs. Uma vez que, em geral, a oferta de servios de sade melhorou, tornou-se mais bvio que as barreiras ao acesso so factores importantes de iniquidade: as taxas moderadoras, em particular, so importantes fontes de excluso dos cuidados necessrios. Acresce que, quando as pessoas tm de comprar cuidados de sade a um preo que est para alm das suas posses, um problema de sade pode rapidamente precipit-las na pobreza ou na falncia14. por isso que a expanso da oferta de servios tem de se apoiar na expanso da proteco social de sade, atravs de fundos

comuns e de mecanismos de pr-pagamento, em substituio de pagamentos directos pelos servios prestados. As reformas para possibilitar a cobertura universal isto , acesso universal combinado com proteco social da sade constituem condio necessria para uma melhor equidade em sade. Tal como demonstrado pelos sistemas de sade que se aproximaram da cobertura universal, as referidas reformas precisam de ser complementadas com um outro conjunto de medidas pr-activas para alcanar os excludos: aqueles a quem a disponibilidade de servios e a proteco social pouco impacto tm em termos de contra-balanar as consequncias negativas da estratificao social para a sade. Muitos indivduos neste grupo contam com redes de cuidados de sade que assumem a responsabilidade pela sade de comunidades inteiras. aqui que entra um segundo grupo de reformas, as reformas de prestao de servios. Estas reformas da prestao de servios tm o intuito de transformar a prestao tradicional de cuidados de sade em cuidados primrios, optimizando a contribuio dos servios de sade sistemas de sade locais, redes de cuidados de sade, distritos de sade para a sade e equidade, enquanto respondem s expectativas crescentes de colocar as pessoas no centro dos cuidados de sade, harmonizando a mente e o corpo, as pessoas e os sistemas3. Estas reformas da prestao de servios no so mais do que um subgrupo das reformas dos CSP, mas com uma visibilidade to elevada, que tm, muitas vezes, ofuscado os outros elementos da agenda dos CSP. A confuso resultante foi amplificada pelo excesso de simplificao da agenda dos cuidados primrios e do que os distingue da prestao de cuidados de sade convencionais (Caixa 2)24. Existe um corpo substancial de evidncias sobre as vantagens comparativas, em termos de eficcia e eficincia, de cuidados de sade organizados como cuidados primrios orientados para as pessoas. Apesar das variaes na terminologia especfica, os seus traos caractersticos (orientado para a pessoa, compreensividade* e integrao, continuidade de cuidados e participao dos doentes, famlias e comunidades) esto bem identificados15,27. Para os*

Nota dos tradutores: na ausncia de um termo equivalente em portugus, os tradutores optaram por traduzir comprehensiveness por compreensividade.

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cuidados terem estas caractersticas necessrio que os servios de sade estejam organizados em consonncia, com equipas multi-disciplinares prximas dos clientes que sejam responsveis por uma populao definida, colaborem com os servios sociais e outros sectores, e coordenem as contribuies dos hospitais, especialistas e organizaes da comunidade. O recente crescimento econmico trouxe recursos adicionais sade. Combinada com a procura crescente de uma melhor prestao, esta situao cria enormes oportunidades de reorientar os servios de sade j existentes em direco aos cuidados primrios no s em ambientes bem apetrechados, mas tambm onde o dinheiro escasso e as necessidades so elevadas. Em muitos pases de baixo e mdio rendimento, onde a prestao de servios se encontra numa fase de expanso acelerada, existe agora uma oportunidade de traar um caminho que pode evitar a repetio de alguns dos erros que os pases de rendimento elevado cometeram no passado. Os cuidados primrios podem fazer muito para melhorar a sade das comunidades, mas no

suficiente responder aos desejos das pessoas de viver em condies que protejam a sua sade, apoiem a equidade em sade e lhes permitam viver as vidas que valorizam. As pessoas tambm esperam que os seus governos ponham em ordem um conjunto de polticas pblicas para dar resposta aos desafios da sade, tais como os da urbanizao, alteraes climticas, discriminao de gneros ou estratificao social. Estas polticas pblicas englobam polticas e programas tcnicos que do resposta aos problemas de sade prioritrios. Estes programas podem ser criados para trabalhar com, apoiar e impulsionar os cuidados primrios, ou podem no o fazer e, mesmo sem essa inteno, minar os esforos de reformar a prestao de servios. As autoridades de sade tm uma enorme responsabilidade nestas decises. Programas orientados para problemas de sade atravs de cuidados primrios precisam de ser complementados por intervenes de sade pblica a nvel nacional e internacional. Estas podero beneficiar de escalas de eficincia; para alguns problemas, podero mesmo ser a nica opo

Caixa 2 O que foi considerado como cuidados primrios em contextos com recursos adequados foi excessivamente simplificado em ambientes de recursos escassosOs cuidados primrios foram definidos, descritos e estudados exaustivamente em contextos com recursos adequados, muitas vezes com referncia a mdicos com especializao em medicina familiar ou clnica geral. Estas descries constituem uma agenda bem mais ambiciosa do que as receitas inaceitavelmente restritivas e desagradveis de cuidados primrios que tm sido alardeados para os pases de baixo rendimento27,28 . os cuidados primrios criam um espao onde as pessoas se podem apresentar com leque alargado de problemas de sade no aceitvel que em pases de rendimento baixo, os cuidados de sade dem resposta a apenas algumas doenas prioritrias; os cuidados primrios constituem uma central de coordenao da navegao dos doentes no sistema de sade no aceitvel que em pases de rendimento baixo, os cuidados primrios estejam reduzidos a um posto de sade isolado ou a um trabalhador de sade comunitria solitrio; os cuidados primrios facilitam relaes duradouras entre os doentes e os mdicos, criando oportunidades para a participao dos doentes na tomada de deciso sobre a sua sade e sobre os seus cuidados de sade; criam pontes entre cuidados de sade personalizados e os familiares e comunidades dos doentes no aceitvel que em pases de rendimento baixo, os cuidados primrios sejam limitados a um canal de prestao de sentido nico para intervenes prioritrias de sade; os cuidados primrios abrem oportunidades para a preveno da doena e promoo da sade, bem como para a deteco precoce da doena no aceitvel que em pases de rendimento baixo, os cuidados primrios sirvam apenas para o tratamento das doenas mais comuns; os cuidados primrios requerem equipas de profissionais de sade: mdicos, enfermeiros profissionais e assistentes com sofisticadas competncias sociais e biomdicas no aceitvel que em pases de baixo rendimento, os cuidados primrios sejam sinnimo de cuidados no profissionais, com tecnologia pouco diferenciada, para os pobres de zonas rurais que no se podem dar ao luxo de ter melhor; os cuidados primrios requerem recursos e investimentos adequados, dando origem a mais valias muito acima das das alternativas possveis no aceitvel que em pases de baixo rendimento, os cuidados de sade tenham de ser financiados atravs de pagamentos directos, sob a assuno errada de que barato e que os pobres tm capacidade financeira para essa despesa.

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vivel. Existem evidncias impressionantes, de que intervenes seleccionadas, que podem ir da higiene pblica e preveno da doena promoo da sade, podem dar uma enorme contribuio para a sade. Contudo, so surpreendentemente negligenciadas, em todos os pases, independentemente do seu nvel de rendimento. Isto particularmente visvel em momentos de crise e de grandes ameaas sade pblica, quando uma capacidade de resposta rpida se torna essencial no s para garantir a sade, mas tambm para manter a confiana pblica no sistema de sade. As polticas pblicas, no entanto, envolvem mais do que a ideia clssica de sade pblica. As reformas dos cuidados primrios e da proteco social dependem, de uma forma incisiva, da escolha das orientaes polticas dos sistemas de sade, nomeadamente as que se relacionam com medicamentos essenciais, tecnologias, recursos humanos e financiamento, que apoiam reformas promotoras de equidade e orientadas para as pessoas. Acresce que, claro que a sade das populaes pode ser melhorada atravs de polticas que so controladas por outros sectores que no a sade. Os currculos escolares, as polticas da indstria relativamente equidade de gneros, a segurana alimentar e de bens consumveis, ou o transporte de resduos txicos, so assuntos que podem influenciar profundamente ou mesmo ser determinantes para a sade de comunidades inteiras, de forma positiva ou negativa, dependendo das escolhas que forem feitas. Com esforos deliberados de mobilizao da colaborao inter-sectorial, possvel dar relevncia sade em todas as polticas29 para garantir que, em paralelo com os objectivos e metas especficos dos outros sectores, os efeitos na sade passam a assumir papel determinante nas decises de poltica pblica. Para que estas reformas sejam possveis no extraordinariamente complexo sector da sade, ser necessrio reinvestir em liderana pblica de uma forma que siga modelos colaborativos de dilogo poltico* com mltiplos parceiros uma vez que isto o que as pessoas esperam, e porque o que d melhores resultados. As autoridades de sade podem fazer um trabalho muito melhor

na formulao e implementao de reformas dos CSP adaptadas a contextos e constrangimentos nacionais especficos, se a mobilizao em torno dos CSP for informada por lies do passado, incluindo sucessos e falhas. O governo da sade um desafio importante para os Ministrios da Sade e outras instituies, governamentais e no-governamentais, implicadas em liderar a sade. J no basta uma mera administrao do sistema: tm de se estabelecer organizaes aprendizentes. Isto requer uma liderana inclusiva que se comprometa com uma variedade de parceiros mesmo margem do sector pblico, dos clnicos sociedade civil, e das comunidades aos investigadores e acadmicos. As reas de investimentos estratgicos para melhorar a capacidade das autoridades de sade em liderar as reformas dos CSP, incluem tornar os sistemas de informao em sade num instrumento dessas reformas; mobilizar as inovaes no sector da sade e as dinmicas sociais a que do origem em todas as sociedades; e criar capacidade atravs da interaco e da exposio experincia dos outros no pas e com outros pises.

Aproveitar as oportunidadesEstes quatros conjuntos de reformas dos CSP so inspirados em valores partilhados que gozam de um amplo apoio e resultam em desafios comuns a um mundo globalizante. Porm, as realidades marcadamente diferentes entre pases devem orientar a maneira como so impulsionadas. A operacionalizao das reformas da cobertura universal, da prestao de servios, das polticas pblicas e da liderana no pode ser implementada como um plano ou pacote padronizado. Em economias de sade com despesas elevadas, como o caso da maioria dos pases de rendimento elevado, existe um amplo espao financeiro para acelerar a mudana de cuidados tercirios para cuidados primrios, criar um ambiente poltico mais saudvel e complementar o bem estabelecido sistema de cobertura universal com medidas direccionadas para reduzir a excluso. Num grande nmero de economias de crescimento rpido onde vivem 3 bilies de pessoas esse mesmo crescimento oferece oportunidades para, numa fase de plena expanso do sistema de sade, criar sistemas de sade fortemente enraizados

*

Nota dos tradutores: policy dialogue traduzido como dilogo poltico.

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Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

nos cuidados primrios e em princpios de cobertura universal, evitando erros por omisso, tais como o no investimento em polticas de sade pblica, e por comisso, tais como o investimento desproporcionado em cuidados tercirios, que tm caracterizado os sistemas em pases de rendimento elevado no passado recente. O desafio , assumidamente, mais assustador para os 2 bilies de pessoas que vivem nas economias de sade de baixo crescimento de frica e do Sudeste Asitico, bem como para os mais de 500 milhes que vivem em estados frgeis. Contudo, mesmo aqui, existem sinais de crescimento e evidncia de um potencial para o acelerar, evitando o recurso aos pagamentos directos que oferecem possibilidades de expandir os sistemas e servios de sade. De facto, mais do que noutros pases, estes no se podem dar ao luxo de no optar pelos CSP e, como em qualquer outro lado, podem comear a faz-lo de imediato. O meio internacional actual favorvel a uma renovao dos CSP. A sade global est a receber uma ateno sem precedentes, com interesse crescente em aces conjuntas, com apelos cada vez mais fortes a favor de cuidados compreensivos e universais de pessoas que vivem com o VIH, de prestadores de cuidados, de ministros da sade e do Grupo dos Oito (G8) e um crescimento acelerado de fundos comuns de solidariedade global. Existem sinais claros e bem vindos de um desejo de trabalho em parceria para a construo de sistemas de sade sustentveis, em vez de confiar apenas em abordagens intermitentes e fragmentadas 30. Paralelamente, existe uma perspectiva de investimento domstico, para galvanizao dos sistemas de sade em torno dos valores dos CSP. O crescimento do PIB particularmente vulnervel ao abrandamento econmico, s crises de energia e de alimentao e ao aquecimento global est a financiar as despesas de sade em todo o mundo, com a notvel excepo dos Estados frgeis. Este crescimento econmico cria oportunidades para reformar os CSP que no existiam nos anos 80 e 90. Apenas uma pequena parte das despesas em sade so aplicadas correco de distores frequentes no funcionamento dos sistemas de sade ou para ultrapassar os constrangimentos do sistema que dificultam a

prestao de servios, mas o potencial existe e est a crescer rapidamente. A solidariedade global e a ajuda continuaro a ser importantes para complementar e apoiar os pases no seu lento progresso, mas so menos importantes do que a interactividade, a aprendizagem conjunta e a governao global. Esta transio j teve lugar na maior parte do mundo: a maioria dos pases em desenvolvimento j no esto dependentes de ajuda externa. A cooperao internacional pode acelerar a converso dos sistemas de sade mundiais, incluindo atravs duma melhor canalizao da ajuda, mas o progresso real vir de uma melhor governao da sade nos pases, quer sejam de rendimento baixo ou elevado. As autoridades de sade e os lderes polticos esto pouco vontade com as tendncias actualmente observadas no desenvolvimento dos sistemas de sade e com a necessidade bvia de se adaptarem aos desafios duma sade em mudana e procura e expectativas crescentes. Isto est a dar forma a oportunidades para implementar as reformas dos CSP. A frustrao e a presso das pessoas para cuidados diferentes e mais equitativos e por uma melhor proteco da sade para a sociedade, cada vez maior: nunca foram to elevadas as expectativas sobre o que as autoridades de sade e, especificamente, os ministros da sade deveriam estar a fazer neste campo. Ao apostar nesta oportunidade, o investimento nas reformas dos CSP pode acelerar a transformao dos sistemas de sade de forma a produzir resultados em sade, melhores e mais equitativamente distribudos. O mundo tem melhor tecnologia e melhor informao para que possa maximizar o retorno da transformao do funcionamento dos sistemas de sade. O crescente envolvimento da sociedade civil na sade e um pensamento global colectivo associado a escalas de eficincia (por exemplo, nos medicamentos essenciais) contribuem ainda mais para as hipteses de sucesso. Na ltima dcada, a comunidade global comeou a procurar solues para a pobreza e iniquidade em todo o mundo de uma forma muito mais sistemtica estabelecendo os ODM e trazendo a questo da iniquidade para o centro das decises de poltica social. Durante todo

xx

Introduo e Viso Global

este processo, a sade tem sido uma preocupao central. Isto oferece oportunidades para uma aco mais efectiva em sade. Tambm cria as condies sociais necessrias para o estabelecimento de alianas slidas para alm do sector da sade. Desta forma, a aco intersectorial est de novo no centro das atenes. Muitas das autoridades de sade de hoje j no vem a sua responsabilidade pela sade como sendo limitada

ao controlo da sobrevivncia e da doena, mas como uma das competncias chave que as pessoas e as sociedades valorizam 31. A legitimidade das autoridades de sade depende, cada vez mais, da sua capacidade em assumir a responsabilidade por desenvolver e reformar o sector da sade de acordo com o que as pessoas valorizam em termos de sade e daquilo que se espera dos sistemas de sade na sociedade.

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de um mundo em mudanaEste captulo descreve o contexto onde a actual renovao dos cuidados de sade primrios se est a desenrolar. O captulo faz uma reviso dos actuais desafios para a sade e para os sistemas de sade e descreve um conjunto de expectativas sociais amplamente partilhadas, Crescimento desigual, resultados desiguais que determinam a agenda da Adaptao a novos desafios em sade mudana dos sistemas de sade tendncias que do mundo de hoje. comprometem a resposta dos sistemas de sade Mostra como muito pases valores em mudana e expectativas crescentes registaram um progresso Reformas dos CSP: significativo em sade em impulsionadas pela procura pocas recentes e como os ganhos foram partilhados de forma desequilibrada. O fosso entre pases, e entre grupos sociais dentro dos prprios pases, tornou-se maior. As transformaes epidemiolgicas, demogrficas e sociais, alimentadas pela globalizao, urbanizao e populaes envelhecidas, colocam desafios de uma magnitude que no estava prevista h trs dcadas atrs.

Os desafios

Captulo 12 8 12 15 20

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Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

O captulo defende que, em geral, a resposta a estes desafios por parte do sector da sade e das sociedades tem sido lenta e inadequada. Isto tanto reflecte uma incapacidade de mobilizao dos recursos e instituies necessrios para transformar a sade em torno dos valores dos cuidados de sade primrios, como um falhano em fazer frente ou modificar substancialmente as foras que empurram o sector da sade para outras direces, nomeadamente: uma ateno desproporcional sobre os cuidados hospitalares especializados; a fragmentao dos sistemas de sade; e a proliferao de cuidados comerciais no regulamentados. Ironicamente, estas fortes tendncias desviam os sistemas de sade daquilo que as pessoas esperam da sade e dos cuidados de sade. Quando a Declarao de Alma-Ata enalteceu os princpios de equidade em sade, cuidados centrados nas pessoas e um papel central para as comunidades de sade em aco, foram considerados radicais. A investigao social sugere, no entanto, que estes valores se esto a tornar preponderantes em sociedades modernizadas: eles correspondem forma como as pessoas olham para a sade e ao que elas esperam dos seus sistemas de sade. Por esta razo, aumentar as expectativas sociais no que respeita a sade e cuidados de sade deve, ento, ser encarado como o grande impulsionador das reformas dos CSP.

os 2,2 milhes de pessoas que vivem em Om, com uma cobertura agora extensvel a residentes estrangeiros2. Mais de 98% dos nascimentos em Om so agora atendidos por pessoal qualificado e mais de 98% dos bbs esto totalmente imunizados. A esperana de vida nascena, que era menos de 60 anos, em finais dos anos 70, ultrapassa agora os 74 anos. A taxa de mortalidade em menores de 5 anos desceu vertiginosamente em 94%3. Em cada regio (excepto na regio de frica) existem alguns pases onde as taxas de mortalidade se situam agora em menos de um quinto do que estavam h 30 anos. Os principais exemplosFigura 1.1 Pases seleccionados como os que tiveram uma melhor performance na reduo da mortalidade em crianas com menos de 5 anos de idade em, pelo menos, 80%, por regies, 1975-2006a,*Mortes por 1 000 crianas com menos de 5 anos 150 1975 2006

100

50

0

Om (DTS 2006: I$ 382)b

Portugal (DTS 2006: I$ 2 080)b

Chile (DTS 2006: I$ 697)b

Malsia (DTS 2006: I$ 500)b

Tailndia (DTS 2006: I$ 346)b

a Nenhum pas da Regio Africana alcanou uma reduo de 80% b Despesa total em sade (DTS) per capita em 2006, dlar internacional (I$) * Os dlares internacionais derivam da diviso das unidades de moeda local por uma estimativa da paridade do seu poder de compra, comparando com o dlar americano.

Crescimento desigual, resultados desiguaisvidas mais longas e melhor sade, mas no em todo o ladoNos finais dos anos 70, o Sultanato de Om tinha apenas uma mo cheia de profissionais. As pessoas tinham de viajar at quatro dias s para chegar a um hospital, onde centenas de doentes j estariam espera na fila para ver um dos poucos mdicos (expatriados). Tudo isto mudou em menos que uma gerao1. Om investiu consistentemente num servio nacional de sade e manteve esse investimento, ao longo do tempo. Existe agora uma densa rede de 180 instalaes de sade regionais, distritais e locais apoiadas por mais de 5 000 trabalhadores de sade, que facultam o acesso quase universal a cuidados de sade para

so o Chile4, a Malsia5, Portugal6 e a Tailndia7 (Figura 1.1). Estes resultados estavam associados ao acesso melhorado a redes ampliadas de cuidados de sade, tornado possvel atravs de um compromisso poltico sustentvel e do crescimento econmico, que lhes permitiram apoiar o seu compromisso ao manterem o investimento no sector da sade (Caixa 1.1) Em geral, o progresso no mundo tem sido considervel. Se as crianas ainda estivessem a morrer s taxas de 1978, teriam ocorrido, globalmente, 16,2 milhes de mortes em 2006. De facto, ocorreram apenas 9,5 milhes dessas mortes12. Esta diferena de 6,7 milhes equivalente a salvar 18 329 vidas de crianas todos os dias. Mas estes nmeros escondem variaes significativas entre pases. Desde 1975, a taxa de declnio

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Captulo 1. Os desafios de um mundo em mudana

Caixa 1.1 Desenvolvimento econmico e opes de investimento nos cuidados de sade: a melhoria dos indicadores de sade em PortugalPortugal reconheceu o direito sade na Constituio de 1976 no seguimento da sua revoluo democrtica. A presso social para reduzir a enorme falta de equidade na sade da populao do Pas conduziu criao de um Servio Nacional de Sade (SNS), financiado por impostos e complementado por esquemas de seguros pblicos e privados e pagamentos directos8,9 . O SNS foi implementado a partir de 1979, implementao essa que ficou completa em 1983 e foi organizado explicitamente com base nos princpios dos Cuidados de Sade Primrios: uma rede de centros de sade, com mdicos de famlia e enfermeiros, que progressivamente abrangeu todo o pas. Para aceder aos servios do SNS, os utentes tm de se registar Figura 1.2 Factores explicativos da reduo da mortalidade em Portugal num centro de sade, na lista de um mdico de famlia, que 1960-1991 o primeiro ponto de contacto com o Servio. Portugal considera Peso relativo dos factores (%) esta rede o maior sucesso em termos de melhoria no acesso a Crescimento do PIB per capita (preos constantes) cuidados e de ganhos em sade6 . A esperana de vida ao nascer agora 9,2 anos mais elevada do que h 30 anos, enquanto o produto interno bruto (PIB) duplicou. O desempenho de Portugal na reduo da mortalidade nos vrios grupos etrios dos mais consistentemente bem sucedidos no mundo, nos ltimos 30 anos, por exemplo, reduzindo para metade a mortalidade infantil, a cada 8 anos. Este desempenho levou a uma marcada convergncia dos indicadores de sade da populao portuguesa com os dos outros pases na regio10. A anlise multivariada das sries temporais de vrios indicadores de mortalidade, desde 1960, revelou que a deciso de basear a poltica de sade portuguesa nos princpios dos CSP, com o desenvolvimento de uma rede abrangente de cuidados de sade primrios11, teve um papel importante na reduo da mortalidade materna, infantil e das crianas 1-4 anos, enquanto a reduo da mortalidade perinatal esteve associada a um maior desenvolvimento da rede hospitalar. Os contributos relativos do desenvolvimento da rede dos CSP e hospitalar assim como do crescimento econmico na melhoria dos indicadores de mortalidade, desde 1960, esto evidenciados na Fig 1.2.Desenvolvimento das redes de CSP (mdicos e enfermeiros dos CSP por habitante) Desenvolvimento das redes hospitalares (mdicos e enfermeiros dos hospitais por habitante) 100

80

60

40

20

0

Reduo de 71% na mortalidade perinatal

Reduo de 86% na mortalidade infantil

Reduo de 89% na mortalidade das crianas 1-4 anos

Reduo de 96% na mortalidade materna

das taxas de mortalidade em crianas menores de 5 anos de idade tem sido muito mais lenta em pases de rendimento baixo, como um todo, do queFigura 1.3 Progresso varivel na reduo da mortalidade em crianas com menos de 5 anos de idade, 1975 e 2006, em pases seleccionados com taxas semelhantes em 1975aMortes por 1 000 crianas menores de 5 anos de idade

Om Monglia Marrocos Tajiquisto ndia Madagscar Zmbia (DTS 2006: (DTS 2006: (DTS 2006: (DTS 2006: (DTS 2006: (DTS 2006: (DTS 2006: a a a a a I$ 382) I$ 149) I$ 273) I$ 71) I$ 109) I$ 35)a I$ 62)aa Despesa total em sade (DTS) per capita

em pases mais ricos13. Para alm da Eritreia e da Monglia, nenhum dos pases de rendimento baixo hoje em dia, reduziu a mortalidade em menores de 5 anos, em 70%. O desempenho dos pases considerados hoje como de rendimento mdio j foi melhor mas, tal como a figura 1.3 ilustra, o progresso tem sido bastante desigual. Alguns pases tm feito grandes melhorias e esto no caminho certo para alcanar os ODM relacionados com a sade. Outros, particularmente na regio de frica, estagnaram ou perderam mesmo terreno14. Globalmente, 20 dos 25 pases onde a mortalidade, abaixo dos 5 anos de idade, ainda dois teros ou superior ao nvel de 1975, encontram-se na frica Subsariana. O lento progresso tem estado associado a uma falta de progresso frustrante, no acesso aos cuidados de sade. Apesar da recente mudana para melhor, a cobertura

em 2006, dlar internacional (I$)

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Relatrio Mundial de Sade 2008

Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

de vacinao na frica subsariana ainda significativamente mais baixa do que no resto do mundo14. A actual prevalncia contraceptiva est ainda nos 21%, enquanto que noutras regies em desenvolvimento, os aumentos tm sido substanciais, ao longo dos ltimos 30 anos, atingindo agora os 61%15,16. Onde se observa o aumento no uso de contraceptivos, este tem sido acompanhado por uma reduo nas taxas de aborto. Na frica subsariana, no entanto, os nmeros absolutos de abortos tm aumentado, e quase todos esto a ser executados em condies pouco seguras17. Os cuidados nascena para as mes e recm-nascidos tambm continuam a enfrentar problemas: em 33 pases, menos de metade de todos os nascimentos em cada ano so assistidos por pessoal de sade devidamente habilitado, com uma cobertura, num dos pases, to baixa quanto 6%14. A frica subsariana tambm a nica regio do mundo onde o acesso dos profissionais qualificados no trabalho de parto no est a progredir18. Reflectindo as actuais tendncias globais de sobrevivncia das crianas, as tendncias globais na esperana de vida apontam para um crescimento em todo o mundo de quase 8 anos, entre 1950 e 1978, e de mais sete anos desde ento: um reflexo do crescimento no rendimento mdio per capita. Tal como acontece com a sobrevivncia das crianas, o aumento nas desigualdades de rendimento (os rendimentos aumentam maisFigura 1.4 PIB per capita e esperana de vida nascena, em 169 pasesa, 1975 e 2005Esperana de vida nascena (anos) 85 2005 1975

rapidamente em pases de rendimento elevado do que em pases de rendimento baixo) reflecte-se nas crescentes disparidades entre os mais e os menos saudveis19. Relativamente esperana de vida, entre meados de 1970 at 2005, a diferena entre pases de rendimento elevado e pases da frica subsariana, ou estados frgeis, aumentou em 3,8 e 2,1 anos, respectivamente. A relao inequvoca entre sade e riqueza, resumida na clssica curva de Preston (Figura 1.4), precisa de ser qualificada20. Primeiramente, a curva de Preston continua a subir12. Um rendimento per capita de I$1 000 em 1975, estava associado a uma esperana de vida de 48,8 anos. Em 2005, o mesmo rendimento correspondia a uma esperana de vida de quase mais quatro anos. Isto sugere que as melhorias em nutrio, educao23, tecnologias da sade22, a capacidade institucional em obter e utilizar a informao e a forma como a sociedade traduz esse conhecimento em aco eficaz23, quer em termos sociais quer em termos de sade, permitem uma maior produo de sade para um mesmo nvel de rendimento. Em segundo lugar, existe uma variao considervel em termos de resultados em pases com um mesmo nvel de rendimento, particularmente entre pases pobres. Por exemplo, a esperana de vida na Costa do Marfim (PIB I$1 465) quase 17 anos mais baixa do que no Nepal (PIB I$ 1 379), e entre Madagscar e a Zmbia, a diferena de 18 anos. A presena de valores elevados, em cada banda de rendimento, demonstra que o real nvel de rendimento per capita num dado momento no o factor absoluto, limitador da taxa, que a curva mdia parece dar a entender.

75

Crescimento e estagnaoNos ltimos 30 anos, a relao entre crescimento econmico e esperana de vida nascena tem revelado trs padres distintos (Figura 1.5). Em 1978, cerca de dois teros da populao mundial vivia em pases que tiveram aumentos na esperana de vida nascena e um crescimento econmico considervel. Os ganhos relativos mais impressionantes aconteceram num nmero de pases de rendimento baixo na sia (incluindo a ndia), Amrica Latina e norte de frica, totalizando 1,1 bilhes de habitantes, h 30 anos, e

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Nambia frica do Sul

45 Bostsuana 35 Suazilndia 0 5 000 10 000 15 000 20 000 25 000 30 000 35 000 40 000 PIB per capita, em dlares internacionais, a valores constantes de 2000a so apenas identicados os pases perifricos

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Captulo 1. Os desafios de um mundo em mudana

Figura 1.5 Tendncias do PIB per capita e esperana de vida nascena em 133 pases, agrupados pelo PIB de 1975, 1975-2005*Esperana de vida (anos)80 75 Chinah 70 65 60 55 50 45 0 Estados frgeise Pases africanos de rendimentos baixosf 1 000 2 000 3 000 4 000 5 000 6 000 7 000 8 000 9 000 10 000 20 000 25 000 30 000 Pases de rendimentos baixosd ndiac Federao Russa e Novos Estados Independentes g Pases de rendimento mdiob Pases de rendimento elevadoa

a 27 pases, 766 milhes (M) de habitantes em 1975, 953 M em 2005. b 43 pases, 587 M habitantes em 1975, 986 M em 2005 . c ndia, 621 M habitantes em 1975, 1 103 M em 2005 . d 17 Pases de rendimentos baixos, no-Africanos, excluindo os estados frgeis, 471 M habitantes em 1975, 872 M em 2005 . e 20 Estados frgeis, 169 M habitantes em 1975, 374 M em 2005. f 13 Pases Africanos de rendimentos baixos, excluindo os estados frgeis, 71 M habitantes em 1975, 872 M em 2005. g Federao Russa e 10 Novos Estados Independentes (NIS), 186 M habitantes em 1985, 204 M em 2005. h China, 928 M habitantes em 1975, 1 316 M em 2005. * No h dados para 1975 relativamente aos Novos Estados Independentes. No h dados histricos para os restantes pases. Fontes: Life expectancy, 1975, 1985: UN World Population Prospects 2006; 1995, 2005: WHO, 9 November 2008 (draft); China: 3rd, 4th and 5th National Population censuses, 1981, 1990 and 2000. GPD: 200737.

quase 2 bilhes, hoje em dia. Estes pases aumentaram a esperana de vida nascena, em 12 anos, enquanto que o PIB per capita se multiplicou por um factor de 2,6. Os pases de rendimento elevado e pases com um PIB entre os I$3 000 e os I$10 000 em 1975, tambm tiveram um crescimento econmico substancial e um aumento na esperana de vida. Noutras partes do mundo, o crescimento do PIB no se fez acompanhar por ganhos semelhantes em termos de esperana de vida. A Federao Russa e os Novos Estados Independentes aumentaram substancialmente o PIB mdio per capita mas, com o alastrar da pobreza que acompanhou a transio da antiga Unio Sovitica, a esperana de vida das mulheres estagnou desde finais de 1980 e a dos homens caiu vertiginosamente, sobretudo para os no qualificados ou sem segurana no emprego24,25. Aps um perodo de estagnao organizacional e tecnolgica, o sistema de sade colapsou12. As despesas pblicas com a sade foram reduzidas em 1990 para nveis que fizeram com que, em vrios pases, fosse virtualmente impossvel gerir um sistema bsico. Estilos de vida no saudveis, juntamente com a desintegrao de programas de sade pblica e a comercializao desregulada de servios clnicos,

combinados com a eliminao de redes de segurana, todos estes factores contrabalanaram os ganhos do aumento do PIB mdio26. A China j tinha aumentado substancialmente a sua esperana de vida num perodo anterior a 1980 para nveis bastante acima da de outros pases de rendimento baixo nos anos 70, apesar da fome de 1961-1963 e da Revoluo Cultural de 1966-1976. O contributo dos cuidados primrios rurais e do seguro de sade urbano para estes sucessos foi bem documentado27,28. No entanto, com as reformas econmicas do incio dos anos 80, o PIB mdio per capita aumentou de forma espectacular, mas o acesso a cuidados e a proteco social deteriorou-se, particularmente nas zonas rurais. Isto diminuiu a taxa de aumento na esperana de vida para uma taxa moderada, sugerindo que apenas a melhoria das condies de vida associada ao espectacular crescimento econmico evitaram a regresso da esperana mdia de vida29. Finalmente, existe um conjunto de pases de rendimento baixo, representando cerca de 10% da populao mundial, onde, tanto o PIB como a esperana de vida, estagnaram 30. Estes so os pases que so considerados estados frgeis de acordo com os critrios dos pases de rendimento baixo sob stress (LICUS)* , de 2003-200631.

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Cuidados de Sade Primrios Agora Mais Que Nunca

Quase 66% da populao desses pases encontra-se em frica. Fraca governao e conflitos internos prolongados so comuns nestes pases, que enfrentam obstculos semelhantes: fraca segurana, relaes sociais fracturadas, corrupo, colapso do estado de direito e ausncia de mecanismos para impor um poder e uma autoridade legtimos 32. Tm muito por fazer em termos de necessidades de investimentos e muito poucos recursos governamentais para os pr em prtica. Metade deles testemunhou um crescimento negativo do PIB, durante o perodo de 1995-2004 (todos os outros ficaram abaixo do crescimento mdio dos pases de rendimento baixo), enquanto que a sua dvida externa estava acima da mdia33. Estes pases estavam entre os

que tinham a menor esperana de vida nascena em 1975 e conseguiram aumentos mnimos desde ento. Os outros pases africanos de rendimento baixo partilham muitas das caractersticas e das circunstncias dos estados frgeis de facto, muitos deles sofreram longos perodos de conflito, nos ltimos 30 anos que os teriam classificado como estados frgeis, se a classificao de LICUS tivesse existido nessa poca. O seu crescimento econmico tem sido muito l