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Revista Científica da Associação Médica de Brasília 49(1) 2012 issn 0524-2053 Editorial/Editorial 1 A cirurgia segura Edmundo Machado Ferraz Artigos Originais/Original Articles 2 Utilização da ultrassonografia quantitativa de calcâneo e sua correlação com fatores de risco na osteoporose em campanha de rastreamento populacional na cidade de Curitiba, Paraná Nádila Cecyn Pietszkowski Mañas, Olavo Kyosen Nakamura, Fernando Micheviz, Carolina Monteguti, Viviane Vieira Passini, Érica Couto Calixto, Carolina Aguiar Moreira Kulak e Victória Zeghbi Cochenski Borba 11 Estado de hidratação de atletas amadores após corri- das de média e longa distância Timothy Gustavo Cavazzotto, Daiane Broetto, Bruno Sérgio Portela, Sandra Aires Ferreira e Marcos Roberto Queiroga 18 Detecção da colonização por Streptococcus agalactiae e avaliação da suscetibilidade aos antimicrobianos em gestantes atendidas no Hospital Universitário de Brasília Nícolas Thiago Nunes Cayres de Souza, Hugo Leonardo Gonçalves de Oliveira Magalhães, Maria de Fátima Brito Vogt, Alberto Carlos Moreno Zaconeta, Miriam da Silva Wanderley, Paulo Oliveira Martins Júnior e Paulo Sérgio França 27 Prevalência de fatores de risco em doença cardio- vascular em adultos do distrito de Porto Trombetas, Oriximiná-PA Marcelo Magalhães Sales, Andremara Faria Athayde, José Fernando Vila Nova de Moraes, Pedro Ferreira Alves de Oliveira, Paulo Russo Segundo e Herbert Gustavo Simões Saúde Pública/Public Health 34 Acesso dos usuários às unidades de tratamento intensivo adulto no Distrito Federal Marcelo Moreira Corgozinho e Walquíria Quida Salles Pereira Primo Artigo de Revisão/Review Article 43 Percepções de pacientes em coma a estímulos táteis e auditivos – revisão sistemática da literatura Fernanda Godoy Falcão e Nelson Filice de Barros Artigo Especial/Special Article 49 Hipotensão pós-exercício: considerações sobre intensidade, duração e método do exercício aeróbico Katheryne Kelly Costa e Souza Acerbi, Alexandre Gonçalves, Vickele Sobreira e Roberto Furlanetto Júnior Educação Médica/Medical Education 55 Clube de revista como estratégia de aprendizado na residência médica Luciana Paganini Piazzolla, Francisca Magalhães Scoralick e João Batista de Sousa Prática Médica/Medical Experience 59 Cirurgia segura: armadilhas na prática cirúrgica Paulo Mendelssonh Estudos de Caso/Case Reports 66 Miastenia grave neonatal: relato de caso Paulo Roberto Margotto, Regina Honorato Buffman e Káritas Rios Lima 71 A 68-year-old man with exfoliative erythroderma: a diagnostic dilemma? Vitorino Modesto dos Santos, Lucas Maciel Rodrigues Monteiro, Amanda Dantas Prates, Vinicius Ferreira Campos, Anna Gabriela Oliveira Camilo and Rafael Policarpo Fagundes Badziak História da Medicina/Medical History 76 O símbolo da Medicina e o verme da Guiné Joffre Marcondes de Rezende

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Revista Científica da Associação Médica de Brasília

Brasília Médica - Volum

e 49 (1) – 2012 p. 1-78

49(1)2012

issn 0524-2053

Editorial/Editorial1 A cirurgia segura Edmundo Machado Ferraz

Artigos Originais/Original Articles2 Utilizaçãodaultrassonografiaquantitativade

calcâneo e sua correlação com fatores de risco na osteoporose em campanha de rastreamento populacional na cidade de Curitiba, Paraná

Nádila Cecyn Pietszkowski Mañas, Olavo Kyosen Nakamura, Fernando Micheviz, Carolina Monteguti, Viviane Vieira Passini, Érica Couto Calixto, Carolina Aguiar Moreira Kulak e Victória Zeghbi Cochenski Borba

11 Estado de hidratação de atletas amadores após corri-das de média e longa distância

Timothy Gustavo Cavazzotto, Daiane Broetto, Bruno Sérgio Portela, Sandra Aires Ferreira e Marcos Roberto Queiroga

18 Detecção da colonização por Streptococcus agalactiae eavaliaçãodasuscetibilidadeaosantimicrobianos emgestantesatendidasnoHospitalUniversitário de Brasília

Nícolas Thiago Nunes Cayres de Souza, Hugo Leonardo Gonçalves de Oliveira Magalhães, Maria de Fátima Brito Vogt, Alberto Carlos Moreno Zaconeta, Miriam da Silva Wanderley, Paulo Oliveira Martins Júnior e Paulo Sérgio França

27 Prevalênciadefatoresderiscoemdoençacardio-vascularemadultosdodistritodePortoTrombetas,Oriximiná-PA

Marcelo Magalhães Sales, Andremara Faria Athayde, José Fernando Vila Nova de Moraes, Pedro Ferreira Alves de Oliveira, Paulo Russo Segundo e Herbert Gustavo Simões

Saúde Pública/Public Health34 Acesso dos usuários às unidades de tratamento

intensivoadultonoDistritoFederal Marcelo Moreira Corgozinho e Walquíria Quida

Salles Pereira Primo

Artigo de Revisão/Review Article43 Percepções de pacientes em coma a estímulos táteis e

auditivos–revisãosistemáticadaliteratura Fernanda Godoy Falcão e Nelson Filice de Barros

Artigo Especial/Special Article49 Hipotensão pós-exercício: considerações sobre

intensidade, duração e método do exercício aeróbico Katheryne Kelly Costa e Souza Acerbi, Alexandre Gonçalves,

Vickele Sobreira e Roberto Furlanetto Júnior

Educação Médica/Medical Education55 Clubederevistacomoestratégiadeaprendizadona

residênciamédica Luciana Paganini Piazzolla, Francisca Magalhães Scoralick e

João Batista de Sousa

Prática Médica/Medical Experience59 Cirurgia segura: armadilhas na prática cirúrgica Paulo Mendelssonh

Estudos de Caso/Case Reports66 Miasteniagraveneonatal:relatodecaso Paulo Roberto Margotto, Regina Honorato Buffman

e Káritas Rios Lima

71 A68-year-oldmanwithexfoliativeerythroderma: a diagnostic dilemma?

Vitorino Modesto dos Santos, Lucas Maciel Rodrigues Monteiro, Amanda Dantas Prates, Vinicius Ferreira Campos, Anna Gabriela Oliveira Camilo and Rafael Policarpo Fagundes Badziak

História da Medicina/Medical History76 OsímbolodaMedicinaeovermedaGuiné Joffre Marcondes de Rezende

Atenção, gráficA: confirmar medida da lombada conforme o miolo da publicação!

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século XXI para os hospitais, criando grande núme-ro de protocolos, visando à diminuição das compli-cações e necessariamente da mortalidade.

Contudo, dificuldades necessitam serem ultrapas-sadas para a aplicação eficiente do checklist que aparentemente é uma metodologia de fácil aplica-ção, o que não é verdade, embora o benefício para o paciente seja indiscutível e, portanto, necessita que essas dificuldades sejam resolvidas em benefí-cio dos doentes cirúrgicos.

O excelente artigo publicado neste número por Dr. Paulo Mendelssonh, ilustra e enriquece a im-portância da cirurgia segura no contexto da segu-rança do paciente.

REFERÊNCIA

1. Haynes AB, Weiser TG, Berry WR, Lipsitz SR, Breizat AH, Dellinger EP, et al. A surgical safety checklist reduce morbidity and morta-lity in a global population. N Engl J Med. 2009;360:491-9.

EdItoRIAl

A cirurgia segura

Em 2004 a Organização Mundial da Saúde (OMS), criou o Programa da Segurança do Paciente que atendia à preocupação existente com o erro e os efeitos adversos ocorridos no atendimento dos do-entes. Em 2009, juntamente com a Universidade Harvard, foi criado o Programa da Cirurgia Segura com o objetivo de diminuir as elevadas taxas de mortalidade e morbidade dos pacientes cirúrgicos. Tive o privilégio de participar desse grupo de tra-balho desde essa ocasião. Foi identificada do ponto de vista epidemiológico a Infecção do Sítio Cirúrgico (ISC) como um importante indicador a ser estuda-do, e foram estabelecidas medidas de prevenção para a diminuição de sua incidência, o que levaria a uma relevante queda das taxas de morbimortali-dade de pacientes cirúrgicos que atingiu, em todos os cenários, taxas inadmissíveis.

Um projeto piloto foi realizado para avaliação de resultados e publicado em janeiro de 2009 no New England Journal of Medicine.1 Foi um estudo de 7.688 pacientes avaliados antes e depois da aplicação do checklist em diferentes cidades do mundo, em pa-íses desenvolvidos e em processo de desenvolvi-mento. Foram avaliados dois indicadores: as gran-des complicações e a mortalidade. Os resultados foram surpreendentes. As grandes complicações se reduziram a 36% e a mortalidade diminui para 47%. A notícia correu o mundo e tornou evidente a ne-cessidade da aplicação do checklist. No ano seguin-te, em 2010, a OMS estimou que ocorreu uma dimi-nuição de quinhentos mil óbitos pela aplicação do cheklist no mundo. Na realidade, a utilização desse procedimento vem se tornando uma exigência do

Edmundo Machado Ferraz

Edmundo Machado Ferraz – professor titular, Programa de Pós-Graduação em Cirurgia, Universidade Federal de Pernambuco

Correspondência: Rua Dom Sebastião Leme, n.º 171, ap. 501, bairro Graças, CEP 52011-160, Recife-PE.

Internet: [email protected].

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artigo original

2 • Brasília Med 2012;49(1):2-10

Nádila Cecyn Pietszkowski Mañas – médica, Serviço de Endocrinologia e Metabologia, Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Olavo Kyosen Nakamura – graduando, curso de Medicina, Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Fernando Micheviz – graduando, curso de Medicina, Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Carolina Monteguti – graduando, curso de Medicina, Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Viviane Vieira Passini – graduando, curso de Medicina, Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Érica Couto Calixto – graduando, curso de Medicina, Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Carolina Aguiar Moreira Kulak – médica, Serviço de Endocrinologia e Metabologia, Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Victória Zeghbi Cochenski Borba – médica, Serviço de Endocrinologia e Metabologia, Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil

Correspondência: Victória Zehgbi Cochenski Borba. SEMPR – Serviço de Endocrinologia e Metabologia. Rua Agostinho Leão Junior, n.º 285, Alto da Glória, CEP 80030-110, Curitiba, Paraná.

Internet: [email protected]

Recebido em 6-2-2012. Aceito em 10-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

Nádila Cecyn Pietszkowski Mañas, Olavo Kyosen Nakamura, Fernando Micheviz, Carolina Monteguti, Viviane Vieira Passini, Érica Couto Calixto, Carolina Aguiar Moreira Kulak e Victória Zeghbi Cochenski Borba

ArtIgO OrIgINAl

Utilização da ultrassonografia quantitativa de calcâneo e sua correlação com fatores de risco na osteoporose em campanha de rastreamento populacional na cidade de Curitiba, Paraná

rESUMO

Introdução. A osteoporose é caracterizada por baixa massa óssea e alteração da microarquitetu-ra, com diminuição da força óssea com aumento do risco de fraturas. Para avaliação da densidade mineral óssea a densitometria por absorciometria radiológica de dupla energia (DXA) é considerada o método padrão-ouro. Porém, têm-se como des-vantagens o alto custo e a falta de disponibilidade, sendo o ultrassom um método alternativo.

Objetivo. Estimar a prevalência de fatores de risco de osteoporose em campanha de rastreamento po-pulacional e avaliar a sua correlação com a ultras-sonografia quantitativa de calcâneo.

Método. Em campanha de prevenção e detecção da doença, na cidade de Curitiba, em 2009, volun-tários foram cadastrados e foi aplicado um ques-tionário sobre história mórbida atual e pregressa, obstétrica e ginecológica, fatores de risco de oste-oporose e fratura e coleta de dados antropométri-cos. Realizaram-se exames com ultrassonografia quantitativa de calcâneo no aparelho Sonost-2000 (Osteosys), com avaliação de valores do T-score, sen-do distribuídos em dois grupos, aqueles com T-score < -1.0 e T-score < -2,5 desvios-padrão da uma popu-lação de adultos jovens.

Resultados. Dentre os 660 participantes da campa-nha, 388 participaram do estudo, 82,2% mulheres e 17,8% homens, média etária de 59 ± 12 anos. Entre as mulheres, 46,4% apresentaram ultrassonogra-fia quantitativa de calcâneo sem anormalidades, 47,3% T-score < -1.0 e 6,3% T-score < -2,5. Entre os

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Nádia Cecyn Pietszkowski Mañas e cols. • Ultrassonografia quantitativa de calcâneo e osteoporose

Brasília Med 2012;49(1):2-10 • 3

homens, em 58% não se detectaram anormalidades ao exame, 29% T-score < -1.0 e 13% T-score < -2.5. Os principais fatores de risco de diminuição da massa óssea encontrados foram redução da visão, tabagismo, queda no último ano, fraturas prévias e menopausa. Neste estudo, destaca-se como fator importante na prevenção da doença a prática de atividade física.

Conclusão. A identificação de fatores de risco as-sociados com a redução da massa óssea poderá au-xiliar profissionais da área de saúde em selecionar pacientes com risco de osteoporose e osteopenia.

Palavras-chave. Ultrassom de calcâneo; osteopo-rose; osteopenia; fatores de risco; fratura.

ABSTRACT

Use of calcaneal quantitative ultrasound and its correlation with risk factors for osteoporosis in a campaign for prevention and detection of the dis-ease in Curitiba, Parana

Introduction. Osteoporosis is characterized by low bone mass and changes in bone microarchitecture, with in-creased risk of fractures. Densitometry by dual energy X-ray absorptiometry (DXA) is considered the gold stand-ard for evaluation of bone mineral density. However, it has the disadvantages of high cost and poor availability, with the ultrasound being an alternative method.

Objective. To estimate the prevalence of risk factors for os-teoporosis in a population screening study and to evaluate their correlation with calcaneal quantitative ultrasound.

Method. During a campaign for prevention and detec-tion of the disease in the city of Curitiba, in 2009, volun-teers were enrolled and asked to answer a questionnaire on their obstetric and gynecological history, past medi-cal history and history of present illness, risk factors for osteoporosis and fractures, and anthropometric data. Calcaneal quantitative ultrasound examinations were performed using Sonost-2000 (Osteosys), and T-score values were evaluated. Patients were then allocated into two groups: those with T-score < -1.0 and T-score < -2.5 standard deviations of a population of young adults.

Results. Among the 660 participants in the campaign, 388 participated in the study. Of these participants, 82.2% were women and 17.8% were men; the mean age was 59 ± 12 years. Among the women, 46.4% showed nor-mal calcaneal quantitative ultrasound, 47.3% presented T-score < -1.0 and 6.3% presented T-score < -2.5. Among men, 58% showed normal calcaneal quantitative ultra-sound, 29% presented T-score < -1.0 and 13% presented T-score < -2.5. The main risk factors for reduced bone mass were found in cases of vision impairment, smoking, fall in the previous year, previous fractures, and meno-pause. In this study, it was found that physical activity was an important factor in preventing the disease.

Conclusion. The identification of risk factors associated with low bone mass may assist health professionals in selecting patients at risk of developing osteoporosis and osteopenia.

Key words. Calcaneal quantitative ultrasound; osteopo-rosis; osteopenia; risk factors; fractures

INtrODUÇÃO

A osteoporose é o tipo mais comum de doença me-tabólica do osso, sendo caracterizada por sua baixa massa óssea e por alteração da sua microarquitetu-ra, levando à diminuição da força óssea com conse-quente aumento do risco de fraturas.1

As taxas de ocorrência de osteoporose no Brasil, de acordo com um estudo de prevalência, tiveram grande amplitude, com valores que variam de 0,4% em mulheres em pré-menopausa até 40% naquelas com 70 anos etários ou mais. Quando são conside-radas apenas as estimativas obtidas com base na densitometria óssea no sítio femoral de mulheres com 50 anos de idade ou mais, a prevalência variou de 7,95% a 16%.2

As fraturas decorrentes de osteoporose são re-levantes causas de incapacidade, diminuição da qualidade de vida e de mais custos para o siste-ma de saúde.3 O custo anual no tratamento de fraturas é alto e estima-se que se tornarão ainda maiores em decorrência do aumento na expec-tativa de vida da população.4 Estudos baseados

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em dados hospitalares de países como Colômbia, Chile, Brasil, México, Panamá, Peru e Venezuela relatam casos de 40 a 362 fraturas na região do quadril em 100.000 pessoas por ano com mais de 49 anos de idade.5

A densidade mineral óssea é um preditor isolado do risco de fraturas em mulheres assintomáticas no período pós-menopausa.6,7 Para avaliação des-sa densidade a densitometria óssea do quadril e da coluna por absorciometria radiológica de dupla energia (DXA) é considerada o método padrão--ouro.8 Porém, têm-se como desvantagens a não portabilidade do aparelho, seu alto custo e a falta de sua disponibilidade. Devido a esses fatores, outras técnicas que avaliam o osso em sítios periféricos têm sido utilizadas. Essas técnicas incluem ultrassonogra-fia, densitometria periférica (peripheral dual-energy X-ray absorptiometry _ pDXA) e tomografia computa-dorizada periférica (peripheral quantitative computed tomography _ pQCT) do calcâneo, do rádio e da mão.9 A técnica em que se usam feixes de ultrassom para o estudo ósseo avalia a velocidade, a atenuação e a re-flexão do ultrassom no tecido ósseo. Entre os fatores a favor de seu uso, estão baixo custo, abrangente em termos populacionais, e não exposição à radiação io-nizante. A densidade mineral óssea do rádio distal, das falanges e do calcâneo tem boa correlação com a densidade mineral do esqueleto axial e dos ossos do quadril.10

O objetivo do estudo foi estimar a prevalência de fatores do risco de osteoporose em campanha de rastreamento populacional e avaliar sua correlação com a ultrassonografia quantitativa de calcâneo (USQC).

MÉtODO

Em comemoração ao Dia Mundial da Osteoporose, foi realizada campanha de prevenção e detecção da doença. O evento ocorreu em um ginásio de esportes na cidade de Curitiba, em 2009, com a participação de uma equipe multidisciplinar, incluindo-se profissionais das áreas de endocrino-logia, reumatologia, biomedicina, fisioterapia, nu-trição e enfermagem.

Após o cadastro dos voluntários, foi aplicado um questionário padronizado, inclusas as questões sobre história mórbida atual e pregressa, história obstétrica e ginecológica, fatores de risco de os-teoporose e fratura (consumo de cálcio e cafeína, grau de atividade física, alcoolismo e tabagismo, fraturas prévias), história familiar de osteoporose, causas secundárias de osteoporose e medicações em uso atual e passado.

Realizou-se a coleta de dados antropométricos, como peso, estatura e índice de massa corporal, perímetro abdominal, medida da glicemia capilar e do colesterol total e aplicou-se questionário de inquérito alimentar. A ingestão média diária de cálcio foi baseada nas informações dos partici-pantes quanto ao consumo de leite e derivados. Determinou-se como consumo de álcool posi-tivo a ingestão de uma ou mais doses diárias de bebida alcoólica. O tabagismo positivo foi clas-sificado em atual e pregresso, conforme relato. A atividade física foi definida como regular, quan-do realizada duas ou mais vezes por semana. Foi considerada história familiar positiva a presença de avós, pais ou irmãos com diagnóstico de oste-oporose, antecedentes de fraturas de baixo im-pacto (fraturas por fragilidade, com exclusão de fraturas causadas por acidentes ou grandes que-das) ou presença de cifose torácica com relato de diminuição de altura.

Os participantes foram convidados a realizar o exame ultrassonografia quantitativa de calcâneo no aparelho Sonost-2000 (Osteosys). Foram avalia-dos os valores do T-score, processo atualmente recomendado pela Sociedade Internacional de Densitometria Clínica (ISCD) e pela Sociedade Brasileira de Densitometria Clínica (SDDens). O T-score baseia-se na comparação do exame obtido com a densidade óssea de indivíduos jovens, sendo os pacientes distribuídos em dois grupos, a saber, aqueles com T-score < -1.0 e T-score < -2,5 desvios--padrões da uma população de adultos jovens.

Ao término das avaliações, os pacientes foram ava-liados pela equipe médica, classificados quanto ao risco de doença e posteriormente encaminhados para atendimento médico específico.

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Nádia Cecyn Pietszkowski Mañas e cols. • Ultrassonografia quantitativa de calcâneo e osteoporose

Brasília Med 2012;49(1):2-10 • 5

Os dados obtidos foram analisados estatisticamente por análise multivariada por regressão múltipla.

Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética da instituição e todos os participantes concordaram em participar do estudo.

rESUltADOS

Todos os seiscentos participantes da campanha foram convidados a fazer parte do estudo, 388 concordaram voluntariamente em participar, dos quais 319 (82,2%) foram mulheres e 69 (17,8%)

homens, com a média idade de 59 ± 12 anos. Os pa-cientes foram distribuídos em dois grupos – aque-les com T-score <-1.0 e aqueles com < -2,5. De 319 mulheres, 148 (46,4%) apresentaram USQC normal, 151 (47,3%) T-score < -1.0 e 20 (6,3%) T-score < -2,5. De 69 homens, 40 (58%) apresentaram ultrassono-grafia quantitativa de calcâneo normal, 20 (29%) T-score < -1.0 e 9 (13%) T-score < -2.5 (figura).

Em relação à prevalência de fatores de risco, fo-ram observados: 97 (25%) sofreram queda no últi-mo ano, 79 (20,4%) fratura prévia; 43 (11,1%) com diabetes mellitus; 201 (52,1%) tinham hipertensão

170

165

160

155

150

145Normal Osteopenia Osteoporose

ESTATURA (cm)IDADE (anos)

80

70

60

50

40

30

20

10

0Normal Osteopenia Osteoporose

PESO (kg)

80

75

70

65

60

55Normal Osteopenia Osteoporose

35

30

25

20

15

10

5

0Normal Osteopenia Osteoporose

IMC (kg/m2)

Figura. Dados demográficos de 388 indivíduos, considerando-se o diagnóstico realizado ao ultrassom quanti-tativo de calcâneo. Normal (T-score > -1,0), osteopenia (T-score < -1,0) e osteoporose (T-score <-2,5).

Homens

Mulheres

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arterial; em 273 (70,4%) havia redução da visão; 14 (3,6%) com uso atual de corticosteroide e 61 (15,7%) com uso prévio de corticosteroide; 55 (14,2%) uso de sedativos; 200 (51,5%) anti-hipertensivos. A meno-pausa esteve presente em 286 (89,3%), com a média de início aos 47,4 ± 5,8 anos; terapia de reposição hormonal foi usada em 110 (38,6%). Diagnóstico pré-vio de osteoporose presente em 52 (13,4%) e, com tratamento prévio, 44 (11,3%); história familiar de osteoporose, 96 (24,7%) e, de fratura após 50 anos de idade, 84 (21,6%). Etilismo atual 51 (13,1%) e pré-vio 55 (14,2%); tabagismo atual 41 (10,6%) e prévio 109 (28,1%). Ingestão diária atual de cálcio em mé-dia 767 ± 492 g; ingestão de cafeína atual, em média 2,9 ± 2,9 xícaras por dia. Observou-se que orientação pós-fratura foi fornecida em apenas 10,1% (n = oito pacientes); atividade física praticada por 220 (57%), em média 4 ± 2,5 horas por semana (tabela).

Na análise multivariada por regressão linear múltipla, realizada com os dados das mulheres

para a variável T-Score, observou-se que, com o diagnóstico anterior de osteoporose, o T-score di-minui em -0,683 (variável significativa com beta de -0,683).

Quanto aos homens, a variável significativa para o modelo foi a atividade física com beta de 0,999, ou seja, quando a pessoa realizou atividade física, o valor de T-score aumentou em 0,999 unidades.

Encontrou-se correlação positiva entre a pre-sença da prática de atividade física e a preven-ção da doença na população geral estudada (r 0,124 e beta 0,291). Em outros termos, quando o indivíduo realiza atividade física duas ou mais vezes por semana, o valor do T-score aumenta em 0,291 unidades. Para a variável consumo atu-al de álcool, a correlação encontrada também foi positiva, com r 0,173 e beta 0,417. Houve tam-bém correlação positiva com o sexo masculino, com r 0,2 e beta 0,302.

Tabela. Fatores de risco de osteoporose e fratura nas mulheres (n = 319) e nos homens (n = 69)

FAtOrES DE rISCOMUlhErES

n (%)hOMENS

n (%)

História de queda nos últimos doze meses 91 (28,5) 6 (8,7)História prévia de fratura 64 (20,1) 15 (21,7)Não recebeu orientação de tratamento para osteoporose após fratura* 56 (87,5) 15 (100)Diabetes mellitus 33 (10,3) 10 (14,5)Hipertensão arterial sistêmica 162 (50,8) 39 (56,5)Diminuição da acuidade visual 237 (74,3) 36 (52,2)Uso atual de corticosteroide 11 (3,4) 3 (4,3)Uso prévio de corticosteroide 55 (17,2) 6 (8,7)Uso de sedativo 47 (14,7) 7 (10,1)Uso de anti-hipertensivo 161 (50,5) 39 (56,5)Menopausa 286 (89,7) -Não fez reposição hormonal 176 (61,5) -Diagnóstico prévio de osteoporose 48 (15) 4 (5,8)Tratamento prévio de osteoporose 42 (13,2) 2 (2,9)História familiar de osteoporose 89 (27,9) 7 (10,1)História familiar de fratura após 50 anos de idade 77 (24,1) 7 (10,1)Consumo atual de álcool 37 (11,6) 14 (20,3)Consumo prévio de álcool 37 (11,6) 18 (26,1)Tabagismo atual 33 (10,3) 8 (11,6)Tabagismo prévio 78 (24,5) 31 (44,9)Não ingere cálcio (fármaco) atualmente 82 (25,7) 28 (40,6)Não faz atividade física 133 (41,7) 35 (50,7)

*Amostra: 64 mulheres e 15 homens.

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Nádia Cecyn Pietszkowski Mañas e cols. • Ultrassonografia quantitativa de calcâneo e osteoporose

Brasília Med 2012;49(1):2-10 • 7

DISCUSSÃO

A prevalência de alteração nos resultados do exame com ultrassom na população estudada foi alta, tan-to em homens como em mulheres, sendo 6% e 9% respectivamente, porém apenas 13% com diagnós-tico prévio e 11% com tratamento anterior, seme-lhantes aos achados de Martini e colaboradores em estudo transversal baseado em dados do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção de Doenças Crônicas realizado nas capitais brasilei-ras e no Distrito Federal.11 Recentemente, o estudo Brazos (Brazilian Osteoporosis Study) mostrou que cerca de 6% da população brasileira com mais de 40 anos referiram ter diagnóstico médico de osteo-porose.12 Esses dados também são compatíveis com achados de outros estudos realizados na América do Norte13 e na Europa.14

É relevante notar a falta de diagnóstico pós-fratu-ra, que foi apenas de 10%, o que já havia sido des-crito por Pinheiro e colaboradores em um estudo na cidade de São Paulo15 e ainda é um problema re-latado em vários países. Considerando-se tratar de doença com alto risco de novas fraturas, as quais estão associadas à morbimortalidade, e sendo a os-teoporose uma doença com tratamentos eficazes, tal fato não se justifica.

Os principais fatores de risco de diminuição da massa óssea encontrados foram redução da vi-são, tabagismo, queda no último ano, fraturas prévias e menopausa, fatores previamente esta-belecidos como risco de fraturas em outras po-pulações. Estudo de prevalência de fatores de ris-co de osteoporose realizado na grande São Paulo também encontrou como principais fatores de risco idade avançada, tempo de menopausa, fra-tura prévia e tabagismo.15

Outro dado importante foi a baixa ingestão diária de cálcio, em média de 767 mg por dia. Segundo dados de consumo alimentar obtidos pela pesquisa Brazos de 2007, 90% dos entrevistados ingerem um terço (400 mg) do valor preconizado de cálcio dado pela Organização Mundial da Saúde.15 As estraté-gias para aumentar o consumo de cálcio alimentar na população brasileira são fundamentais.

Neste estudo, destaca-se como fator importante na prevenção da doença a prática de atividade fí-sica, a qual nessa população aumentou o valor do T-score em 0,999. A literatura tem mostrado bene-fício dessa prática, principalmente na prevenção da perda de massa óssea16 e, mais recentemente, foi mostrado aumento do pico de massa óssea em homens17 e aumento da densidade mineral óssea em crianças com diabetes tipo 1.18 Esses achados sugerem que as intervenções populacionais para aumento da atividade física favorecem não só a saúde como um todo, mas também tem impacto favorável na saúde óssea.

No Brasil, devido às dificuldades que cercam a execução de estudos epidemiológicos em um pa-ís de dimensões continentais e com diferentes padrões culturais, os dados populacionais sobre a osteoporose são limitados a algumas regiões. Algumas projeções e alguns levantamentos iso-lados estimam que a osteoporose acometa cerca de 20% das mulheres brasileiras com mais de 50 anos de idade.19 O estudo Sapos, que avaliou fato-res de risco associados com baixa densidade óssea e fraturas por baixo impacto em mulheres, ava-liou 4.332 pacientes com 40 anos etários ou mais, provenientes de serviços de atendimento primá-rio da Grande São Paulo. Encontraram prevalência de osteoporose e fraturas osteoporóticas de 33% e 11,5% respectivamente. Os principais fatores de risco foram idade (odds ratio [OR] = 1,07), tempo desde a menopausa (OR = 2,16), fratura prévia (OR = 2,62), tabagismo atual (OR = 1,45). Foram fatores protetores da atividade física regular (OR = 0,78, índice de massa corporal (OR = 0,43), e terapia de reposição hormonal (OR = 0,43). Os principais fa-tores associados com risco de fratura foram idade (OR = 1,05) tempo de menopausa (OR = 4,12), his-tória familiar de fratura de quadril (OR = 3,59) e baixa densidade mineral óssea (OR = 2,28).15

A baixa densidade mineral óssea está associada com aumento do risco de fraturas, independentemente da técnica usada para medir a densidade mineral óssea,9,20-23 o que reforça a importância do rastrea-mento populacional como o realizado no presente estudo. No entanto, há diferenças nos valores de T-score nos diferentes sítios e com os diferentes

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aparelhos usados para medir a densidade mineral óssea. Esses valores com métodos diferentes e em sítios diferentes não são intercambiáveis.24,25

A ultrassonografia quantitativa pode ser usada pa-ra detecção de osteoporose, sendo este um méto-do de baixo custo, não invasivo e sem exposição à radiação ionizante, comparada à técnica de DXA. Além disso, pela sua portabilidade e pelo seu redu-zido custo, poderia ser levada a lugares de difícil acesso e para regiões subdesenvolvidas.26,27

A ultrassonografia quantitativa é um bom método preditor do risco de fratura osteoporótica,28-30 so-bretudo em mulheres na pós-menopausa. Em um grande estudo prospectivo com 6.189 mulheres aci-ma de 65 anos de idade, a ecografia de calcâneo foi capaz de fornecer dados para se predizer o risco de fratura óssea na área do quadril com a mesma acu-rácia da densitometria por absorciometria radio-lógica de dupla energia de calcâneo ou de fêmur.31 Em outro estudo com 14.824 pacientes, incluindo--se homens e mulheres com idade de 42 a 84 anos, a ultrassonografia em estudo também foi bom predi-tor do risco de fratura na região em estudo.32 Além de predizer o risco de fraturas, outros estudos per-mitiram afirmar que o exame por ultrassom é bom e possivelmente melhor que fatores de risco para classificar mulheres que estão em risco de desen-volver osteoporose.33

Quanto à densidade mineral óssea, a ultrassono-grafia quantitativa se apresenta como um preditor modesto.27 Estudos demonstram que ela poderia es-timar o risco de fraturas tão bem quanto a absorcio-metria radiológica de dupla energia,34,35 a depender da idade, do sexo e da raça,27 mas independente-mente da densidade mineral óssea apresentada.27 Entretanto, nem todos os aparelhos usados no mer-cado têm evidências satisfatórias para estimar o risco de fraturas, sejam elas vertebrais, coxofemo-rais ou em geral.26 Uma queda dos parâmetros da ultrassonografia quantitativa ocorre durante o en-velhecimento, sendo este o principal fator envol-vido, sobretudo nas mulheres. Outros fatores como peso, altura, índice de massa corporal e atividade física também se relacionam positivamente em am-bos os sexos. O tempo após a menopausa seria mais

um quesito no sexo feminino.27,34,36 Atualmente, não existe consenso sobre qual seria o limite ideal do T-score da ultrassonografia quantitativa para diag-nosticar a osteoporose, em virtude principalmente da existência de numerosos aparelhos existentes no mercado com diferenças dignas de notas.35,37 No estudo de Frost e colaboradores,37 demonstrou-se que os critérios da Organização Mundial da Saúde não podem ser aplicados à ultrassonografia quan-titativa de calcâneo, por ter discrepâncias relevan-tes. Apenas um T-score de coluna da re erida ultrassonografia poderia predizer o fator de risco de fratura vertebral38 e somente o T-score da mesma ultrassonografia abordaria todos os casos de osteoporose diagnosticadas por meio da densi-tometria por absorciometria radiológica de dupla energia, podendo-se, de forma confiável, e mesmo sem tal exame, iniciar tratamento, especialmente se associado à história de fraturas.39

Dessa forma, a densitometria por absorciometria radiológica de dupla energia continua sendo o método padrão-ouro para o diagnóstico de osteo-porose,37 e os protocolos de tratamento atuais se baseiam nesse exame, visto que ele reflete a den-sidade mineral óssea, ao contrário de uma estima-tiva da ultrassonografia quantitativa.26 Assim, esta não confirma e não exclui osteoporose prévia diag-nosticada por absorciometria radiológica de dupla energia,35 não podendo ser usada para acompanha-mento da doença.26

Segundo Nayak e colaboradores,35 a ultrassono-grafia quantitativa poderia ser usada como pré--rastreamento de osteoporose, o que minimizaria a necessidade de DXA. Contudo, isso não parece ter custo-benefício relevante, dada a necessidade de realizar densitometria por absorciometria radio-lógica de dupla energia para confirmar o quadro.

Em conclusão, a identificação de fatores de risco associados com a redução da massa óssea, como se mostrou neste estudo, poderá auxiliar profissio-nais da área assistencial em selecionar pacientes com risco de ter osteoporose e osteopenia, consi-derando-se que pilares importantes do diagnóstico ainda são a anamnese adequada e o exame físico cuidadosos. Ainda faltam estudos mais amplos para

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Nádia Cecyn Pietszkowski Mañas e cols. • Ultrassonografia quantitativa de calcâneo e osteoporose

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determinar o T-score ideal para cada aparelho de ultrassonografia quantitativa. Este exame consti-tui, porém, uma forma interessante de selecionar doentes que teriam benefício na realização de den-sitometria por absorciometria radiológica de dupla energia, considerando-se que esse é um exame de alto custo e que muitas vezes não está amplamente disponível. Também são necessários estudos com dados nacionais para elucidar questões sobre pre-venção e fatores de risco de osteoporose na popu-lação brasileira.

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Timothy Gustavo Cavazzotto – educador físico, Laboratório de Fisiologia Experimental e Aplicada à Atividade Física, Departamento de Educação Física, Setor de Ciências da Saúde, Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro), Guarapuava, Paraná, Brasil

Daiane Broetto – graduanda, Educação Física, Laboratório de Fisiologia Experimental e Aplicada à Atividade Física, Departamento de Educação Física, Setor de Ciências da Saúde, Unicentro, Guarapuava, Paraná, Brasil

Bruno Sérgio Portela – educador físico, mestre, Departamento de Educação Física, Unicentro, Guarapuava, Paraná, Brasil

Sandra Aires Ferreira – educadora física, mestre, Departamento de Educação Física, Unicentro, Guarapuava, Paraná, Brasil

Marcos Roberto Queiroga – educador físico, doutor, Departamento de Educação Física, Unicentro, Guarapuava, Paraná, Brasil

Correspondência: Timothy Gustavo Cavazzotto. Rua Simeão Camargo Varela de Sá, n.º 3, bairro Cascavel, CEP 85040-080, Guarapuava, Paraná. Telefone: 42 36298157.

Internet: [email protected].

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

Recebido em 1-3-2012. Aceito em 15-3-2012.

RESUMO

Objetivo. Verificar o estado de hidratação e a taxa de sudorese de atletas amadores de corridas de 10 e de 21 quilômetros.

Método. Participaram do estudo trinta atletas (dezenove homens e onze mulheres), que foram avaliados em três competições oficiais de corrida. Obtiveram-se medidas de massa corporal antes e imediatamente depois da prova. Para padronização das medidas, os atletas foram instruídos a elimi-nar água residual (urina) trinta minutos antes da competição e a restringir a ingestão de sólidos ou líquidos antes da coleta após a competição.

Resultados. Houve diferença estatística em ambas as provas para a massa corporal (de 1,1% a 2,2% de redução). A taxa de sudorese exibiu valores elevados nas provas de 10 km (19,7 mL/min para homens e 12,1 mL/min) e 21 km (16,6 mL/min e 2,4 mL/min) correlatos a homens e mulheres respectivamente.

Conclusão. Em ambas as competições, os atletas apresentaram estado desidratado com redução da massa corporal superior na prova de 21 km. Contudo, com base nas informações obtidas com a taxa de sudorese, a prova de dez quilômetros re-sultou em maior quantidade de líquidos perdidos por minuto.

ARTIGO ORIGInAl

Estado de hidratação de atletas amadores após corridas de média e longa distânciaTimothy Gustavo Cavazzotto, Daiane Broetto, Bruno Sérgio Portela, Sandra Aires Ferreira e Marcos Roberto Queiroga

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Palavras-chave. Hidratação; massa corporal; corrida.

ABSTRACT

Hydration status of athletes in middle-and-long dis-tance running tests

Objective. The purpose of this study was to verify the hydration status and sweat rate of amateur athletes in 10 km and 21 km running tests.

Method. The study included thirty athletes, nineteen men and eleven women, who were assessed in three of-ficial competitions. Measurements of body mass index were obtained before and immediately after the running tests. To ensure standardization of the measurements, athletes were instructed to eliminate residual water (urine) thirty minutes before the competition, as well as to restrict the intake of solids or liquids before the meas-urement procedure after the competition.

Results. Statistical differences were found in both tests regarding body mass (reduction between 1.1 to 2.2 %). The sweat rate was high in the 10 km test (19.7 mL/min for men and 12.1 mL/min for women) and in the 21 km test (16.6 mL/min for men and 2.4 mL/min for women).

Conclusion. In both competitions, the athletes showed dehydration, with a higher reduction of body mass in the 21 km running test. However, based on information about the sweat rate, the 10 km running test resulted in greater liquid loss per minute.

Key words. Hydration; body mass; running

InTRODUÇÃO

Os resultados desportivos são estabelecidos pelo somatório de numerosos fatores e, muitas vezes, os detalhes são fatores determinantes para suces-so ou fracasso entre atletas. Um desses fatores é o estado de hidratação. O equilíbrio hídrico corporal representa a diferença líquida entre a ingestão e a perda de líquidos.1 Por sua vez, o desequilíbrio, resultante de grande perda de água e sais minerais, é caracterizado como desidratação.2-4

Uma leve desidratação, com redução da massa cor-poral superior a 2%, pode reduzir o desempenho do exercício e a função cognitiva4-6 com base em uma série de eventos hemodinâmicos e fisiológi-cos.7 Vale destacar aumento da frequência cardí-aca, diminuição do enchimento ventricular total e do volume de sangue ejetado pelo coração.8 Com a circulação sanguínea alterada a dissipação do ca-lor produzido pelos processos metabólicos torna-se comprometida, o que pode provocar fadiga preco-ce e estresse térmico.7 Adicionalmente, haverá re-dução do transporte de oxigênio8 e das respostas psicomotoras,4-6,9 risco de insolação e, em alguns casos, coma e até óbito.10

Para caracterizar o estado de hidratação, existem numerosos métodos, porém poucos oferecem con-fiabilidade e aplicação acessíveis.5 Dentre eles, desta-cam-se a água corporal total e a osmolalidade plasmá-tica.1,5,10,11 A combinação desses dois métodos constitui o padrão-ouro para avaliação do estado de hidrata-ção.1,5 Sua utilização permanece, entretanto, restrita a condições laboratoriais em razão do rigor metodo-lógico, dos altos custos inerentes aos procedimentos e da necessidade de envolvimento de especialistas para coleta e análise dos resultados.1,5,10

Por sua vez, a determinação do estado de hidra-tação fundamentada em técnicas mais acessíveis é estratégia comum entre pesquisadores, treina-dores e competidores. Nesse sentido, destacam-se informações obtidas em relação à urina (osmolali-dade, densidade e cor da urina), mudanças na mas-sa corporal total e no conteúdo de água corporal (bioimpedância elétrica), além da própria sede, de seus sinais e sintomas.1,5,10,11

Apesar da importância da hidratação, tanto no desempenho esportivo quanto alusiva à própria integridade física do atleta, percebe-se conside-rável falta de pesquisas com corredores que não apresentam resultados expressivos, mesmo trei-nando com cargas próximas de competidores de alto nível. Por não terem acompanhamento pro-fissional especializado, os atletas amadores estão sujeitos a adotarem técnicas de hidratação basea-das na sensação de sede unicamente, o que refor-ça a necessidade de pesquisa em que se investigue

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Timothy Gustavo Cavazzotto e cols. • Estado de hidratação após corridas

a condição de hidratação com base em medidas mais objetivas nessa população.

Diante do exposto, o presente estudo teve como objetivo verificar o estado de hidratação e a taxa de sudorese com base em mudanças na massa cor-poral de atletas amadores de corrida de média e longa distância.

MÉTODO

Trata-se de estudo de coorte. A amostra foi composta de trinta atletas da Associação de Corredores de Guarapuava-PR, que competiram em três provas de corrida no Estado, duas de 10 km e uma de 21 km. Dezenove atletas foram ava-liados em duas competições de dez quilômetros, uma delas em Maringá-PR com seis mulheres e seis homens e outra em Guarapuava-PR com três mulheres e quatro homens. A primeira teve iní-cio às dezessete horas e a segunda às oito horas e trinta minutos. Onze atletas (duas mulheres e nove homens) foram avaliados em meia marato-na (21 km) em Londrina-PR. A prova teve início às seis horas e quarenta minutos para mulheres e às sete horas e dez minutos para homens. A tem-peratura e a umidade relativa do ar do local da corrida foram informadas posteriormente pelo Sistema Meteorológico do Paraná (Simepar).

Foram incluídos no estudo somente atletas que não faziam uso de medicamentos controlados, não fumavam, tinham idades de 18 a 60 anos e não haviam consumido alimentos e líquidos an-tes das medidas de massa e composição corporal após as provas.

Os atletas responderam ao questionário de iden-tificação antes das competições. Todos foram

submetidos às medidas de massa corporal e de es-tatura trinta minutos antes das competições, após eliminar água residual (urina). Depois da corrida, mas antes de o participante ingerir líquido ou ali-mento sólido, aferiu-se novamente a massa corpo-ral. Obteve-se a massa corporal em balança antropo-métrica com precisão de 100 g (GTECH®) e a estatura em estadiômetro de madeira com escala de 0,1 cm.12

A estimação do estado de hidratação foi realizada em valores absolutos (kg), por meio da subtração da massa corporal (MC) final (pós-competição) pela massa corporal inicial (pré-competição), e em valores relativos (%), dividindo-se o produto desse resultado pela massa corporal inicial. A taxa de sudorese foi calculada pela equação: MC pré--competição – MC pós-competição / tempo total da atividade. O produto dessa equação representa a quantidade de líquido perdido por minuto (mL/min) durante a corrida.

Os resultados das medidas de massa corporal obti-das nos momentos pré- e pós-competições foram apresentadas e comparadas em valores absolutos (kg) e relativos (%). Para análise dos dados utilizou--se o software de cálculos estatísticos SPSS 15.0. A normalidade dos dados foi verificada e compro-vada com a utilização do teste de Shapiro Wilk e apresentados em forma de média e desvio-padrão. Utilizou-se o teste t de Student pareado para com-paração entre os momentos pré- e pós-corrida. O nível de significância adotado foi p ≤ 0,05.

Os participantes foram informados sobre os pro-cedimentos de coleta de dados e assinaram o ter-mo de consentimento livre e esclarecido. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Centro Oeste, conforme parecer n.º 331/2010, em atendimento à resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

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RESUlTADOS

Os participantes tinham experiência em corridas de 3,6 ± 3,2 anos, com a média de idade de 32,7 ± 11,1 anos e, de estatura, 167,5 ± 9 cm.

A tabela 1 mostra os tempos médios de duração das provas e as informações de temperatura ambiental e umidade relativa no dia da competição. A duração das provas de dez quilômetros para os homens foi em média 35 minutos, e a mesma distância entre as mulheres foi completada em média 58 minutos.

Para a prova de 21 km os valores médios em ambos os sexos ultrapassaram uma hora e trinta minutos, porém as mulheres tiveram média próxima de duas horas. O tempo médio para completar as corridas de 10 km e 21 km estão muito acima dos recordes mundiais para as mesmas provas.

A tabela 2 expõe os valores de massa corporal ve-rificadas antes e depois das provas de 10 e 21 km, considerando-se todos os participantes e subdi-vididos por sexo dos indivíduos. Houve diferença significativa na massa corporal medida após as

Tabela 1. Duração e características ambientais, temperatura ambiental e umidade relativa do ar nas corridas. QUIlOMETRAGEM

10 km 21 km

Homens (10) Mulheres (9) Homens (9) Mulheres (2)

Duração (min)* 35,5 ± 1,6 58,2 ± 7 90,3 ± 14,8 116 ± 15, 5

Recorde (min)† 27min01s 29min54s 58min23s 66min25s

TEMPERATURA

Mínima Média Máxima Mínima Média Máxima

TA (ºC) ‡ 13,1 17,6 22,2 16,4 24 33,6

UR (%)§ 63,1 77,1 91,2 27,5 55,2 82,9

*Valores da duração da prova expressos em média ± desvio-padrão. †Recorde mundial do tempo da corrida. ‡TA – temperatura ambiental no dia da prova. §UR – umidade relativa do ar no dia da prova pelo Sistema Meteorológico do Paraná.

Tabela 2. Valores de massa corporal e de taxa de sudorese antes e depois das provas de 10 km e 21 km, considerando-se todos os competidores e separados por sexo

10 km* 21 km†

Pré Pós Dif. (%) Dif (kg) TS Pré Pós Dif. (%) Dif. (kg) TS

MC da amostra

62 ± 12,7 61,3 ± 12, 6‡ 1,1 ± 0,6 0,7 - 66 ± 11,4 64,8 ± 11,1‡ 1,8 ± 1 1,3 -

MC doshomens

64,8 ± 13,2 64,1 ± 13‡ 1,3 ± 0,5 0,7 19,7 66,3 ± 11,9 64,8 ± 11,6‡ 2,2 ± 0,7 1,5 16,6

MC dasmulheres

62,9 ± 17 62,1 ± 16,9‡ 1,2 ± 0,7 0,7 12,1 65,1 ± 12,6 64,7 ± 11,2§ 0,5 ± 0,9 0,3 2,4

Valores expressos em média ± desvio-padrão; *n = 9 mulheres e 10 homens; †n = 2 mulheres e 9 homens; ‡p < 0,05 vs pós-corrida; §teste estatístico não efetuado em razão do tamanho amostral (n = 2); MC – massa corporal. Dif. (%) – variação relativa na massa corporal antes e depois da corrida. Dif. (kg) – variação absoluta na massa corporal antes e depois da corrida. TS – taxa de sudorese em mL/min (MC pré – MC pós-competição / tempo total da atividade)

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corridas (10 km e 21 km) quando os participantes foram agrupados (n = 30) ou subdivididos por se-xo. A redução da massa corporal foi 1,1% (valores relativos) e 0,7 kg (valores absolutos) quando com-parada à medida realizada antes da corrida de dez quilômetros. Por sua vez, após a competição de 21 km, a redução na massa corporal foi 1,8% e 1,3 kg em valores relativos e valores absolutos respectiva-mente. Ambas as provas resultaram em valores que caracterizam os competidores como desidratados após a competição.4

Quanto à comparação entre sexos nas provas de dez quilômetros observou-se que as mulheres tiveram diferenças significativas de massa corporal com di-minuição de 1,2% e 0,7 kg dos valores iniciais. Entre os homens, notaram-se diferenças significativas de massa corporal com diminuição de 1,3% e 0,7 kg. Na prova de 21 km, apenas os resultados dos homens foram calculados, uma vez que apenas duas mulhe-res foram avaliadas nessa prova. Os resultados exi-biram diferenças significativas com redução de 2,2% e 1,5 kg na massa corporal. Os valores da taxa de su-dorese foram altos em ambas as provas. Na corrida de dez quilômetros, os homens tiveram taxa supe-rior às das mulheres (19,7 mL/min vs 12,1 mL/min). Na prova de 21 km, os homens produziram 16,6 mL/min e as mulheres, 2,4 mL/min.

DISCUSSÃO

Para caracterizar o estado de hidratação, em alguns estudos, empregam-se métodos laboratoriais, com as variações no equilíbrio hídrico observadas dire-tamente.10,11 Em situações práticas, sendo competi-ção ou treino, o recurso mais indicado é o controle da massa corporal. As medidas dessa massa, obtidas antes e depois da prática de atividade física, podem fornecer informações valiosas sobre o impacto do treino, da redução do conteúdo de água corporal,5 bem como da quantidade de líquidos que deveria ser ingerida para atingir o estado pré-atividade.

O presente estudo teve como objetivo investigar o estado de hidratação, com base nas mudanças na massa corporal e na taxa de sudorese, em um grupo de atletas amadores pertencentes a uma associação

de corredores de Guarapuava, durante suas partici-pações em competições de 10 km e 21 km.

Observou-se que, em valores absolutos, os atletas sofreram decréscimo significativo da massa corpo-ral tanto na prova de 10 km quanto na de 21 km. Essa variação resultou em redução média de 0,8 kg e 1,3 kg nas provas de 10 km e 21 km respectiva-mente. Durante a prova de 10 km, tanto os homens quanto as mulheres perderam em média 0,8 kg. Na prova de 21 km, houve redução de 1,5 kg entre os homens e 0,3 kg entre as mulheres. Contudo, vale destacar que, apenas duas atletas foram avaliadas na prova de 21 km.

A utilização de valores relativos que representem a redução da massa corporal, todavia, é mais indica-da para caracterizar o estado de hidratação. Assim, foi demonstrado que, na competição de 10 e 21 km, a redução na massa corporal dos participantes foi em média 1,1% e 1,8% respectivamente. Entre os ho-mens, a perda foi 1,3% e, entre as mulheres, foi 1,2% na prova de 10 km. Para 21 km houve redução de 2,2% e 0,5%, em homens e mulheres respectivamen-te. Na literatura, a redução da massa corporal su-perior a 1% caracteriza estado desidratado e maior do que 2% está relacionado a aumento dos riscos à saúde e prejuízo para o desempenho dos atletas.4

Desse modo, verificou-se estado desidratado em to-dos os participantes, exceto nas mulheres na prova de 21 km. Os homens que correram a prova de 21 km podem ter comprometido, em algum momento, seu desempenho, uma vez que perderam em mé-dia 2,2% de sua massa corporal durante a corrida. Nessa condição, é provável que parte da energia disponível para a realização do movimento pode ter sido empregada na compensação propiciada pelo sistema cardiovascular para controlar as alte-rações provocadas pelo estresse térmico e redução dos líquidos plasmáticos, bem como para promover aumento na dissipação do calor produzido nos pro-cessos metabólicos.

A sudorese é o principal mecanismo autonômico termorregulatório na transferência de calor do organismo para o ambiente durante o exercício, sendo assim, dependente da taxa metabólica, da

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temperatura corporal e dos fatores externos. Nesse sentido, a taxa de sudorese na prova de dez quilô-metros foi 19,7 mL/min para homens e 12,1 mL/min para mulheres. Na prova de 21 km, os valores foram menores que na corrida de dez quilômetros para homens (16,6 mL/min) e mulheres (2,4 mL/min). A prova de dez quilômetros, mesmo havendo menor redução na massa corporal comparada à de 21 km, teve maior taxa de sudorese, e, consequen-temente, possível agressão por estresse térmico superior, podendo assim prejudicar o desempenho.

As condições do ambiente durante uma competição esportiva, como temperatura, umidade relativa do ar e velocidade dos ventos, interferem diretamente na dissipação do calor e no estado de hidratação do atleta.7 Investigações mostram a existência da desidratação durante testes com cicloergômetro em ambiente quente (40ºC – umidade relativa do ar de 50%) e temperado (20ºC – umidade relativa do ar de 50%); porém, não foi demonstrada em am-biente frio (2ºC – umidade relativa do ar de 50%).6 Outras pesquisas relatam a desidratação e os efei-tos adversos durante competições de futebol,9 ul-tramaratona (Ironman),13,14 maratona,4,15 ciclismo16 e corrida de fundo,17 todos em ambientes abertos, com valores semelhantes aos achados neste estudo.

A caracterização em estado desidratado nos atletas em ambas as provas neste estudo, especialmente na corrida de 21 km, confirma a existente na literatu-ra. Relata-se que a desidratação ocorre mais inten-samente quanto maior for a duração e a distância da prova.18,19 Similarmente, as recomendações sobre in-gestão de líquidos para prevenir a desidratação são documentadas, sobretudo, em atividades com dura-ção superior a uma hora.4,20,21 Nesse aspecto, as prin-cipais recomendações indicam intervalos de quinze a vinte minutos com volume próximo a 200 mL e, ge-ralmente, com adição de eletrólitos e carboidratos.7 No entanto, a prova de dez quilômetros, percurso médio, com duração pouco superior a 35 minutos para os homens, também exibiu estado desidratado entre os atletas, além de taxa de sudorese superior à encontrada na prova de 21 km. Esse resultado deve ser preocupante para os atletas, uma vez que, em tese, por ser curta e rápida (dez quilômetros), não resultaria em elevadas taxas de sudorese.

Apesar de existirem recomendações para reposi-ção hídrica na tentativa de prevenir a desidrata-ção, em exercícios com duração inferior a uma hora, observa-se que os atletas investigados não se preocupam com essa possibilidade. Nessas ati-vidades, todavia, são poucas as evidências fisiológi-cas quando se comparam a ingestão de líquidos com adição de carboidratos e eletrólitos e ingestão apenas de água.4 Dessa forma, a ingestão de líquidos neste estudo ocorreu voluntariamente, ou seja, ad libitum, tanto em quantidade, quanto ao tipo de líquido em todas as provas. Os atletas relataram, contudo, não terem nenhum tipo de orientação profissional para a reposição e adotaram estratégias de reposição com o critério da sensação de sede. Essa sensação, por sua vez, pode ser suficiente para prevenir desidratação durante atividades esportivas.23

Como caráter informativo da reposição, os atle-tas responderam ao fim da corrida, o volume de líquidos consumido durante o percurso, em copos (200 mL). Esse questionamento forneceu valores de aproximadamente 0 mL a 250 mL na prova de 10 km e de 100 mL a 500 mL na de 21 km. Contudo, o achado permitiu julgar, porém não afirmar, que a quantidade ingerida de líquidos foi insuficiente para a reposição, uma vez que além de haver ca-racterísticas de desidratação, como perda de peso, também tiveram altas taxas de sudorese.

Do mesmo modo, as características ambientais não foram controladas, uma vez que o desenvol-vimento da pesquisa ocorreu em ambiente aberto, em diferentes locais, durante competições oficiais, com as condições referentes à data em questão. As causas, bem como as implicações da desidratação, podem ser numerosas;7,17,24 porém, estas não foram o objeto da presente investigação.

Os atletas amadores envolvidos nesta pesquisa estiveram expostos à perda de líquidos. As cargas de treinamento, assim como o trabalho exigido durante competições, são relativamente elevadas – isto atrelado a falta de orientação, acompanha-mento, informações, materiais e investimentos – podem comprometer tanto os resultados quanto a integridade física do atleta. Assim, os resultados deste estudo permitem sugerir que os corredores

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amadores de distâncias de 10 km e 21 km estão ex-postos a estados de desidratação significativos e se transforma em ferramenta capaz de iniciar uma conscientização tanto dos atletas quanto dos pro-fissionais das áreas do esporte sobre as necessida-des dessa população.

Concluindo-se, os participantes mostraram estado de desidratação leve em ambas as competições (10 km e 21 km). Mas o resultado observado na prova de dez quilômetros reforça a necessidade de orien-tações de reposição hídrica em atividades esporti-vas cíclicas de curta distância.

Agradecimentos. À Associação de corredores de Guarapuava-PR e ao grupo de pesquisas do Laboratório de Fisiologia Experimental e Aplicada à Atividade Física (LAFEAF).

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Detecção da colonização por Streptococcus agalactiae e avaliação da suscetibilidade aos antimicrobianos em gestantes atendidas no Hospital Universitário de Brasília

Nícolas Thiago Nunes Cayres de Souza – médico-residente de Ginecologia e Obstetrícia, Hospital Universitário de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Hugo Leonardo Gonçalves de Oliveira Magalhães – graduando do curso de Medicina, Universidade de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Maria de Fátima Brito Vogt – professora adjunta, área de Ginecologia e Obstetrícia, Universidade de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Alberto Carlos Moreno Zaconeta – professor adjunto, área de Ginecologia e Obstetrícia, Universidade de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Miriam da Silva Wanderley – professora adjunta, área de Ginecologia e Obstetrícia, Universidade de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Paulo Oliveira Martins Júnior – farmacêutico, Hospital Universitário de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Paulo Sérgio França – professor adjunto, área de Ginecologia e Obstetrícia, Universidade de Brasília, Distrito Federal, Brasil

Correspondência. Nícolas Thiago Nunes Cayres de Souza. Hospital Universitário de Brasília, Centro de Ginecologia e Obstetrícia, SGAN 604/605, Avenida L2 Norte, CEP 70840-050, Brasília-DF. Telefone: 61 34485204.

Internet: [email protected]

Recebido em 12-2-2012. Aceito em 1-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

RESUMO

Objetivos. Estimar a taxa de colonização pelo es-treptococo do grupo B e a suscetibilidade aos anti-microbianos em um grupo de gestantes atendidas no Hospital Universitário de Brasília.

Método. Estudo observacional transversal re-trospectivo com coleta de dados secundários em prontuário, que elencou 116 mulheres submetidas à obtenção de swab vaginal e ou retal para pesqui-sa de colonização pelo estreptococo do grupo B de 1.º de janeiro de 2010 a 31 de janeiro de 2011. Critérios de inclusão: mulher gestante à época da coleta, submetida à cultura de pelo menos um dos sítios referidos. Foram excluídas mulheres que fizeram uso de agente antimicrobiano por pelo menos quatorze dias antes da coleta das amos-tras. A identificação do patógeno e determinação da sensibilidade aos antimicrobianos seguiram as normas internacionais do Clinical and Laboratory Standards Institute.

Resultados. Atenderam aos critérios de inclu-são 85 pacientes, das quais 74 submeteram-se à coleta de amostras vaginal e retal e 11 à coleta vaginal isoladamente por meio de swabs. A pre-valência de colonização foi 5,9% (cinco casos). Nenhuma amostra retal foi positiva. Observou-se falta de padronização quanto ao sítio anatômico retal mais apropriado para a coleta e em relação às idades gestacionais mínima e máxima para o rastreio. Todas as culturas mostraram suscetibi-lidade à vancomicina e à ampicilina. Quatro cul-turas foram suscetíveis ao ciprofloxacino, uma ao cloranfenicol e uma à eritromicina.

Nícolas Thiago Nunes Cayres de Souza, Hugo Leonardo Gonçalves de Oliveira Magalhães, Maria de Fátima Brito Vogt, Alberto Carlos Moreno Zaconeta, Miriam da Silva Wanderley, Paulo Oliveira Martins Júnior e Paulo Sérgio França

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Nícolas Thiago Nunes Cayres de Souza e cols. • Colonização por S. agalactiae em gestantes

Conclusão. Apesar da utilização de método e meio de cultura não específicos, a frequência encontrada na amostra e o espectro de sensibilidade antimicro-biano são condizentes com os dados apresentados pelos estudos de prevalência da literatura. No en-tanto, a implementação de protocolo sistematizado poderá aumentar a acurácia do rastreio do estrep-tococo do grupo B.

Palavras-chave. Estreptococo do grupo B; Streptococcus agalactiae; gravidez; resistência micro-biana a drogas; colonização.

ABSTRACT

Detection of Streptococcus agalactiae colonization and evaluation of antimicrobial susceptibility in pregnant women seen at the Hospital Universitário de Brasília

Objectives. To estimate group B Streptococcus coloniza-tion and antimicrobial susceptibility in a group of preg-nant women seen at the Department of gynecology of the Hospital Universitário de Brasília.

Method. We carried out a retrospective, observational, cross-sectional study with secondary data collection based on medical records. The study involved 116 wom-en, who underwent vaginal and/or rectal swab testing to screen for group B streptococcus colonization from January 1, 2010 to January 31, 2011. The following inclu-sion criteria were considered: women who were pregnant at the time of sample collection and who had specimens collected of at least one of the sampling locations men-tioned above. Women who had undergone antimicrobial treatment for at least fourteen days before sample col-lection were excluded from the study. Pathogen iden-tification and antimicrobial-sensitivity determination followed the international guidelines of the Clinical and Laboratory Standards Institute.

Results. Eighty-five patients met the inclusion criteria, of which 74 underwent collection of vaginal and rectal swabs and 11 underwent vaginal swab collection only. The prevalence of colonization was 5.9% (five cases). No rectal sample was positive. There was no standardiza-tion in relation to the most appropriate rectal location

for sample collection or in relation to minimum and maximum gestational age. All cultures showed suscepti-bility to vancomycin and ampicillin. Four cultures were susceptible to ciprofloxacin, one was susceptible to chlo-ramphenicol, and one to erythromycin.

Conclusion. Although different methods and culture media were used, the frequency found in the sample and the spectrum of antimicrobial sensitivity are in ac-cordance with data presented in prevalence studies in the literature. Nevertheless, implementation of a sys-tematized protocol can improve accuracy in screening for group B Streptococcus.

Key words. Group B streptococcus; Streptococcus agalac-tiae; pregnancy; drug resistance, microbial; colonization

INTRODUÇÃO

A colonização materna pelo Streptococcus agalactiae, também conhecido como estreptococo do grupo B, tem despertado interesse na literatura mundial, uma vez que constitui a maior causa de sepse ne-onatal. Figura também entre um dos principais agentes etiológicos envolvidos na gênese da corio-amnionite e endometrite puerperal.1-4

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (do inglês Centers for Disease Control and Prevention ou CDC) recomendam a quimioprofilaxia durante o trabalho de parto em todas as gestantes que so-freram colonização pelo estreptococo do grupo B, identificado por meio de cultura rotineira de swab vaginal e retal de 35 a 37 semanas de gestação. A profilaxia antibiótica intraparto está automatica-mente indicada, dispensando a realização do exa-me, quando: identificada na gestante bacteriúria por estreptococo do grupo B ou quando houver história de infecção do recém-nascido pelo agente patógeno em gestação anterior.

Em sua última atualização, os CDC trazem orien-tações específicas quanto ao período e à forma da coleta, bem como quanto ao processamento e à análise das amostras. Preconizam ainda que a an-tiga conduta – o chamado “manejo baseado em fa-tores de risco”, ou seja, profilaxia antibiótica para

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gestantes não rastreadas que se apresentem ao tra-balho de parto com idade gestacional inferior a 37 semanas, ruptura prematura de membranas com duração maior que dezoito horas ou temperatura corpórea maior que 38ºC –, seja indicada apenas em situações especiais e não mais como alternativa ao rastreio pré-natal, uma vez que a conduta atual-mente preconizada é capaz de reduzir o número de casos de sepse neonatal esperados em uma po-pulação em metade do que seria esperado ante o “manejo baseado em fatores de risco”.1

No que concerne à realidade nacional, a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia preconiza o rastreio pré-natal e profilaxia antibiótica intrapar-to. Todavia, chama a atenção, no Brasil, para a falta de recomendação técnica ou consenso sobre o tema e a necessidade do estabelecimento de estratégias eficazes para a detecção da colonização materna e a confirmação dos fatores de risco de infecção neona-tal.5 A pesquisa de rotina com culturas de secreções vaginal e retal durante o seguimento pré-natal ainda não é padronizada pelo Ministério da Saúde.6

No Distrito Federal, não há protocolo no sistema público de saúde para o rastreio do estreptococo do grupo B e a realização da profilaxia antibiótica intraparto, o que se reflete na realidade do Hospital Universitário de Brasília (HUB).7

Em 2010, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estabeleceu que a colonização pelo estrep-tococo do grupo B na gestante, sem quimioprofila-xia intraparto, constitui fator de risco de Infecções Precoces Relacionadas à Assistência à Saúde de Provável Origem Materna, conceito que inclui todas as infecções cuja evidência diagnóstica – clínica, la-boratorial e microbiológica – ocorreu nas primeiras quarenta e oito horas de vida do neonato, com fator de risco materno para a morbidade.8

Dessa forma, a sepse neonatal precoce pelo S. agalactiae começa a ser classificada como infec-ção relacionada à assistência à saúde (IRAS) e, portanto, os centros de assistência devem contar com informações específicas sobre os fatores de risco relacionados ao quadro, para a implemen-tação de medidas profiláticas eficazes, capazes

de evitar prognóstico sombrio para o binômio materno-neonatal.

O presente estudo tem por objetivo estimar a taxa de colonização por Streptococcus agalactiae em um grupo de gestantes atendidas no HUB, bem como avaliar a suscetibilidade aos antimicrobianos das amostras isoladas.

MÉTODO

Trata-se de estudo retrospectivo, observacional, transversal, com coleta de dados secundários ob-tidos dos registros de prontuário de cada pacien-te, que buscou identificar todos os resultados de culturas para S. agalactiae de material colhido de mulheres atendidas no HUB no período de 1.º de janeiro de 2010 a 31 de janeiro de 2011.

Foram considerados os seguintes critérios de inclu-são: paciente gestante à época da coleta e subme-tida à cultura de exsudato da região vaginal e ou retal. Foram excluídas do estudo as mulheres que não eram gestantes à coleta por swab, as que não tiveram seus prontuários localizados e casos em que se identificou registro em prontuário de uso de antimicrobiano por pelo menos quatorze dias antes do recolhimento das amostras.

Para identificação das mulheres que se submete-ram à coleta de secreção vaginal e ou retal no perí-odo do estudo, foi consultado o livro de registro de recepção de swabs do Laboratório de Bacteriologia do HUB, para exames. Em seguida, foi realizada consulta aos prontuários das respectivas pacientes para identificar os casos que preencheram os cri-térios de inclusão estabelecidos. Por meio de ins-trumento de coleta de dados, buscou-se catalogar informações a respeito da idade da mulher à coleta de secreções com swab, se gestante ou não, sítio de coleta, paridade, idade gestacional, realização ou não do seguimento pré-natal e do parto no HUB e número de consultas pré-natais.

As amostras provenientes das gestantes por meio de coleta com swab foram obtidas nos am-bulatórios de acompanhamento pré-natal e na

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enfermaria obstétrica do HUB com swab individu-al. As amostras foram armazenadas em tubo de en-saio estéril contendo meio de transporte de Stuart e encaminhadas ao Laboratório de Bacteriologia do serviço. O processamento das amostras ocor-reu conforme o descrito nos Procedimentos Operacionais Padrões (POP) do Laboratório de Bacteriologia do HUB. Usou-se método quantita-tivo, no qual as culturas são semeadas nos meios de ágar-sangue, ágar-chocolate ou meio de enri-quecimento líquido-tioglicolato de acordo com a origem da amostra. As culturas foram incubadas a 35ºC (± 1°C) durante 24 a 48 horas.

Após isolamento primário, as amostras foram submetidas ao teste da catalase para confirmação de Streptococcus sp. e, então, submetidas à iden-tificação e determinação da suscetibilidade por meio dos painéis automatizados de secreções GP e AST-P585. Estes têm por finalidade a identificação do agente patógeno e determinação da sensibili-dade a antimicrobianos respectivamente. Os pai-néis foram lidos no sistema VITEK 2 (BioMerieux®) após incubação de 18 a 24 horas em temperatura de 35ºC (± 1°C). Testou-se a sensibilidade aos se-guintes antimicrobianos: ampicilina, ciprofloxa-cina, clindamicina, eritromicina e vancomicina. O sistema VITEK 2 foi programado pelo fabricante de acordo com as normas internacionais instituí-das pelo Clinical and Laboratory Standards Institute, o qual preconiza que a sensibilidade à ampicilina é fator preditor de sensibilidade à penicilina,8 de maneira que amostras sensíveis ao primeiro an-timicrobiano também foram consideradas susce-tíveis ao segundo pelo sistema automatizado. Os procedimentos de inoculação, incubação e leitura dos painéis ocorreram conforme a padronização do Instituto em referência.9

As gestantes foram distribuídas em três grupos distintos estratificados quanto à faixa etária na ocasião da coleta. O primeiro foi composto de mu-lheres com 10 a 19 anos de idade, consideradas adolescentes segundo o conceito estabelecido pe-la Organização Mundial da Saúde e adotado pelo Ministério da Saúde.10 As mulheres de 20 a 35 anos foram inseridas em um segundo grupo, e o último grupo foi configurado por grávidas com mais de

35 anos de idade, as quais constituíram grupo à parte devido ao alto risco gestacional que a idade elevada implica.3,5,11

Foram analisadas ainda a idade gestacional em que as amostras foram colhidas, o número de consultas pré-natais e a paridade das pacientes.

Quanto à idade gestacional na ocasião da coleta, as pacientes foram alocadas em três grupos estratifi-cados: antes de 35, de 35 a 37 e após 37 semanas de idade gestacional.

No que diz respeito ao acompanhamento pré--natal, buscou-se identificar quais pacientes rea-lizaram o mínimo de seis consultas, preconizado pelo Ministério da Saúde.5 Com esse objetivo, as mulheres foram reunidas em três grupos estratifi-cados de acordo com o número de visitas no perí-odo pré-natal, assim estabelecidos: inferior a seis consultas, seis ou mais consultas e casos em que não foi possível quantificar o número de consultas pré-natais em virtude de informações faltosas ou inconsistentes em registros nos prontuários, in-clusive pelo fato de uma parcela das gestantes ter sido referenciada de outros serviços de assistência pré-natal de baixa complexidade.

Com relação à paridade, cada gestante foi classifica-da como nulípara, com antecedente de parto ante-rior, primípara, com um parto prévio e multípara, com pelo menos dois partos prévios, sempre inde-pendentes da via de parto pregressa, se vaginal ou cesárea, e da história de abortamentos anteriores.

Em concordância com as normas regulamenta-doras de pesquisas em seres humanos, Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde de 1996,12 o projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília, sob o registro n.º 103/11, de 23 de agosto de 2011.

RESULTADOS

De 116 mulheres inicialmente identificadas nos re-gistros do Laboratório de Microbiologia do HUB, 85

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foram gestantes que preencheram os critérios de inclusão preestabelecidos. Dessas, 74 foram subme-tidas à coleta, por swab, de secreção vaginal e retal e 11 à coleta vaginal isoladamente. Foram excluí-das da amostra 31 mulheres, ou seja, uma gestante, cujo registro no laboratório não informou acerca do sítio de coleta com swab, dado não encontrado após a revisão do prontuário; nove mulheres por não terem seus prontuários localizados, inviabili-zando a confirmação de gestação à época da coleta das amostras e mais 21 casos sem confirmação de serem gestantes.

Quando colhidas as amostras vaginal e retal conco-mitantemente, verificou-se que foi empregado swab distinto para cada sítio em todos os casos analisados. Não constavam nos prontuários registros a respeito do sítio anatômico exato de onde as amostras foram coletadas na vagina (por exemplo, introito vaginal ou terço distal da parede vaginal) e no reto (coleta superficial ou ultrapassou o esfíncter anal).

Tabela 1. Estratificação da amostra de gestantes de acordo com a faixa etáriaFAIxA ETáRIA EM ANOS NúMERO DE GESTANTES PERCENTUAL

14 a 19 11 13

20 a 35 64 75

Superior a 35 10 12

Total 85 100

Tabela 2. Distribuição das gestantes por grupo etário, de acordo com a idade gestacional à coleta de amostras com swab, paridade e número de consultas pré-natais

VARIáVEISFAIxA ETáRIA (ANOS) TOTAL

14 A 19 20 A 35 ACIMA DE 35 n (%)

Idade gestacional à coleta (semanas) Inferior a 35 35 a 37 Superior a 37

0101

8524

460

12 (14)68 (80)

5 (6)Paridade Nulípara Primípara Multípara

1010

252316

325

38 (45)26 (30)21 (25)

Número de consultas no pré-natal Inferior a seis Seis ou mais Desconhecido

470

23365

172

28 (33)50 (59)

7 (8)

A composição etária dos grupos abrangeu onze ges-tantes (13%) de 14 a 19 anos, 64 (75%) de 20 a 35 anos e dez (12%) com mais de 35 anos de idade (ta-bela 1). Dentre as mulheres que sofreram coloniza-ção vaginal por Streptococcus agalactiae, duas eram adolescentes e três tinham idade de 20 a 35 anos.

A distribuição das gestantes por faixa etária, de acordo com a idade gestacional à coleta por swab, paridade e número de consultas pré-natais está descrita na tabela 2.

O crescimento de Streptococcus agalactiae foi obser-vado nas culturas de cinco gestantes (5,9% da amos-tra), com positividade apenas em amostras obtidas de secreções vaginais. Destaca-se que a amostra retal não foi utilizada somente em um desses casos.

Nenhuma das 74 gestantes submetidas à colheita de amostra retal teve a respectiva cultura positiva, o que em números corresponde a 87% da amostra e ao

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percentual de 100% de rastreio negativo, dado que o sítio retal deixou de ser pesquisado em 13% da amos-tra (onze pessoas). A tabela 3 evidencia as diferenças entre os percentuais de positividade e negatividade de acordo com o sítio anatômico da coleta.

A média de idade das cinco gestantes com cultura de secreção vaginal positiva foi 25,6 anos, e a mediana foi 30 anos. Todas eram nulíparas, sendo quatro primi-gestas e uma secundigesta com antecedente de aborto prévio. Quatro realizaram pelo menos seis consultas pré-natais, sendo 7,4 o número médio de consultas. Quanto à época da coleta, três se submeteram ao

Tabela 3. Distribuição das gestantes de acordo com a colonização pelo estreptococo do grupo B e sítio de colonização

SíTIO ANATôMICO

COLONIZAÇÃO PELO ESTREPTOCOCO DO GRUPO B

Positiva Negativa Não rastreado

n % n % n %

Vaginal 5 5,9 80 94,1 0 0Retal 0 0 74 87 11 13Totais 5 5,9 80 94,1 11* 13*

*Apenas o sítio retal deixou de ser rastreado

Tabela 4. Características das gestantes com cultura positiva para Streptococcus agalactiae

PACIENTE IDADE GPANúMERO DE CONSULTAS

pré-nataisIG* à COLETA DO swab

GENITAL

1 14 G1P0 9 38 semanas2 19 G2P0A1 11 36 semanas e 2dias3 30 G1P0 7 36 semanas e 4 dias

4 31 G1P0 6 35 semanas e 2dias

5 34 G1P0 4 18 semanas e 4 dias

IG – idade gestacional. G – gestação. P – paridade. A – aborto.

Tabela 5. Sensibilidade aos antimicrobianos das amostras positivas para Streptococcus agalactiae

ANTIBIóTICOG E S T A N T E

TOTAL (%)1 2 3 4 5

Ampicilina S S S S S 100Vancomicina S S S S S 100Ciprofloxacina S S R S S 80Clindamicina R R R S S 40Eritromicina R R R S R 20Cloranfenicol R R S R R 20

R – resistente. S – sensível.

exame no período de 35 a 37 semanas de gestação, uma foi rastreada com idade inferior a 35 semanas e uma com idade superior a 37 semanas (tabela 4).

Em relação à sensibilidade antimicrobiana, todas as culturas mostraram suscetibilidade à ampicilina e à vancomicina, quatro (80%) foram suscetíveis ao ciprofloxacino, uma mostrou sensibilidade ao clo-ranfenicol (20%) e uma à eritromicina (20%), tal como o expresso na tabela 5. Conforme a padroni-zação do Clinical and Laboratory Standards Institute,13 as culturas sensíveis à ampicilina também foram consideradas sensíveis à penicilina.

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DISCUSSÃO

Foi encontrada frequência de colonização pelo es-treptococo do grupo B de 5,9% na amostra selecio-nada. Apesar de o método empregado ter sido di-ferente, esse valor é compatível com o intervalo de flutuação apresentado pela literatura, que se situa na faixa de 4% a 43,6% e abrange estudos de preva-lência que fizeram uso exclusivo de meios específi-cos para a detecção do germe patógeno, realizados em diversos centros e no Brasil inclusive.12,14-20

A observação de que 13% das gestantes não foram submetidas ao exame de amostra retal e de que, entre aquelas submetidas ao swab vaginal e retal, 100% das culturas do sítio retal foram negativas para o S. aga-lactiae, provoca questionamentos a respeito dos locais de coleta e da técnica mais adequada para a colheita da amostra sítio-específica. Estudos já demonstraram que a coleta da amostra cervical não oferece vanta-gens em relação à coleta de secreção vaginal, visto que ambos fornecem resultados similares e o primei-ro demanda relativa dificuldade técnica por seu ca-ráter invasivo.18,20 Quanto ao swab vaginal, alguns es-tudos recomendam a coleta no terço distal da parede do órgão,4,21 embora as recomendações dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças preconizam a coleta no introito vaginal.1

Em pesquisa realizada na Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp) em que foram avaliadas 405 gestantes submetidas à coleta de secreção do in-troito vaginal ou no terço distal da parede vagi-nal, com o mesmo meio de cultivo, observou-se percentual de positividade de S. agalactiae no pri-meiro grupo superior ao dobro do valor encontra-do no segundo grupo.17

A necessidade de coleta no sítio retal é reforça-da pela comprovação recente de que o achado do estreptococo do grupo B na região retal é o mais importante fator isolado determinante para a co-lonização vaginal.22 Associado à coleta no sítio va-ginal, o rastreio retal pode aumentar sobremaneira a detecção do estreptococo do grupo B.18,23 Segundo os CDC, para coleta satisfatória o material deve ser obtido ultrapassando-se o esfíncter anal, ou seja, diretamente da região distal do canal retal.1

No presente estudo, foram usados os meios de cultura ágar-sangue, ágar-chocolate e caldo tio-glicolato para a semeadura das amostras. Tais meios são classificados como não seletivos por permitirem o crescimento concomitante de ou-tros gêneros de bactérias, o que pode ter influen-ciado os resultados deste estudo, principalmente nas amostras retais, em virtude da inibição de seu crescimento e da sobreposição de outros mi-crorganismos. Por essa razão, atualmente se re-comenda o uso preferencial dos chamados meios seletivos,1,2 o que comprovadamente propicia de-clínio ao redor de 50% na estimação de resultados falso-negativos.1

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças indicam o uso de meios seletivos para a detecção do S. agalactiae,1 como o Todd-Hewitt ou aque-les que contêm pigmentos cromogênicos. O pri-meiro consiste em placa enriquecida com ácido nalidíxico associado a gentamicina ou colistina (meios TransVag® e Lim® respectivamente), o que inibe assim o crescimento polimicrobiano e permite condições ótimas para o crescimen-to máximo de cepas de estreptococo. Os meios com adição de pigmentos cromogênicos como o Granada® coram-se na presença de cadeias beta--hemolítcas e detectam o estreptococo do grupo B pela escala cromática.23

Um estudo realizado em Campinas incluiu 203 mu-lheres com 22 semanas a 36 semanas de gestação com diagnóstico de trabalho de parto prematuro e ou rotura pré-termo de membranas, submetidas à coleta com swab de duas amostras do introito va-ginal e duas da região anorretal. Uma amostra de cada sítio foi semeada em placa de ágar-sangue em meio de cultura Todd-Hewitt. Observaram-se 87,5% de positividade das amostras em meio seletivo e 60,7% em meio não seletivo. Não houve diferenças significativas estatisticamente entre o número de resultados de culturas vaginais e anorretais positi-vas de estreptococo do grupo B.19

Considerando-se a normatização recente da Anvisa, que classifica a sepse neonatal precoce pelo estreptococo do grupo B como infecção relaciona-da à assistência à saúde (IRAS),8 a determinação da

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suscetibilidade antimicrobiana torna-se um fator importante para a adequada profilaxia intraparto em mulheres colonizadas pelo microrganismo pa-tógeno, especialmente nos casos de história prévia de hipersensibilidade ou anafilaxia depois de expo-sição à penicilina.

Segundo os CDC, a penicilina e a ampicilina têm boa resposta contra o estreptococo do grupo B, o que foi reproduzido no estudo vigente. A penicilina é o antibiótico de escolha, pois apresenta menor espectro de ação e, assim, oferece menor risco de resistência a outros microrganismos.24 É comum a resistência cruzada entre clindamicina e eritromi-cina,1 dado que não pôde ser corroborado no es-tudo vigente, uma vez que apenas duas pacientes foram resistentes ao primeiro, uma das quais fora também resistente à eritromicina.

Em consideração ao caráter de colonização in-termitente do estreptococo do grupo B e o risco aumentado de ocorrência de sepse neonatal quan-do presente no trato genital materno no tercei-ro trimestre de gestação, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças preconizam a coleta de amostras vaginal e retal a ser realizada desde a 35.ª à 37.ª semana de gestação, levando-se em conta que o valor preditivo negativo das cultu-ras colhidas em até cinco semanas antes do parto situa-se nas estimações de 95% a 98%, com declí-nio progressivo quando o nascimento ocorre em intervalo de tempo superior.1

No presente estudo (tabela 2), observa-se que 14% da amostra foram submetidas a um rastreio pre-coce, abaixo de 35 semanas de gestação. Portanto, inadequado, quando consideradas as diretrizes dos CDC quanto ao período gestacional oportuno pa-ra a coleta retovaginal. Em 73 mulheres (86% dos casos) a coleta foi realizada em período adequado, no máximo cinco semanas, precedendo o parto. Cinco dessas gestantes (6% da amostra), porém, foram submetidas à coleta em idade gestacional superior a 37 semanas, fugindo do que preconizam os Centros de Controle e Prevenção de Doenças.1 Em relação às gestantes com colonização, a tabe-la 4 mostra que as quatro mulheres submetidas ao rastreio – uma vez que a gestante 5, por ter sido

submetida à pesquisa de infecção do trato genital pelo risco de abortamento trata-se de um caso à parte – foram triadas em período adequado antes do parto. No entanto, a gestante 1 teve rastreamen-to com 38 semanas de gestação, integrando-se aos 6% da amostra inadequadamente rastreada.

Os dados aqui expressos sugerem que a prevalên-cia identificada na amostra pode ter sido subes-timada em virtude de a coleta para a pesquisa de colonização materna pelo estreptococo do grupo B estar abaixo de 35 semanas de gestação em 14% dos casos, de não ter havido coleta retal em 13% da amostra e a semeadura das culturas ter ocorrido em meios não seletivos.

Diante do exposto, acredita-se que a implementa-ção de um protocolo sistematizado padronizado na rotina pré-natal do HUB, seguindo os moldes da literatura vigente, poderá consolidar a qualidade da estratégia pré-natal no serviço. A aplicação de medidas simples, tais como, a pesquisa do estrepto-coco do grupo B em idades gestacionais oportunas, a padronização de seu rastreio na região retal, tan-to na sua indicação quanto na coleta de amostras do sítio anatômico mais apropriado e a detecção do patógeno em meios de cultura seletivos, pode-rão aumentar sobremaneira a eficácia do rastreio do S. agalactiae na gestação. Dessa forma, é possível a realização de estudos mais avançados a respeito do tema, que poderão contribuir de maneira mais efetiva na redução das taxas de morbidade e mor-talidade materna e neonatal.

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Prevalência de fatores de risco em doença cardiovascular em adultos do distrito de Porto trombetas, oriximiná-Pa

RESUMO

Objetivo. Determinar a prevalência de sobrepe-so, obesidade e hipertensão arterial em indiví-duos residentes no distrito de Porto Trombetas, Oriximiná, Pará.

Método. Estudo observacional, descritivo e de corte transversal, em amostra de 121 homens e 76 mulheres com idades de 20 a 60 anos. Avaliaram-se o índice de massa corporal, a espessura de dobras cutâneas e a pressão arterial.

Resultados. Participaram do estudo 121 homens e 76 mulheres (n = 197) com idades de 20 a 60 anos. Os homens tiveram idade maior (p = 0,008), índice de massa corporal (p = 0,01), pressão arterial sistóli-ca (p = 0,0001), pressão arterial diastólica (p = 0,001) e pressão arterial média (p = 0,0001), e as mulheres maior percentual de gordura corporal (p = 0,0001). O percentual de mulheres com índice de massa corpo-ral normal foi significativamente maior em relação aos homens (p = 0,006). Em toda a amostra, o sobre-peso e a obesidade foram mais frequentes (76,1%). Na amostra total, observou-se que 94,4% tinham percentual de gordura classificado como sobrepeso e obesidade. A frequência de pressão arterial nor-mal foi maior nas mulheres em relação à presença de pré-hipertensão e hipertensão comparada com aquela dos homens (p = 0,002). A frequência de pré--hipertensão arterial em relação à hipertensão arte-rial foi maior nos homens (p = 0,01).

Conclusão. Foi encontrada alta prevalência de so-brepeso, obesidade e hipertensão arterial na pre-sente amostra.

Palavras-chave. Sobrepeso; obesidade; hiperten-são; índice de massa corporal

Estudo elaborado no âmbito do Programa de mestrado e doutorado em Educação Física pela Universidade Católica de Brasília, Brasília-DF e financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Marcelo Magalhães Sales – profissional de Educação Física, doutorando em Educação Física, Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, Brasil

andremara Faria athayde – profissional de Educação Física, professora do Centro de Educação Física Mineração Esporte Clube, Porto Trombetas, Oriximiná, PA, Brasil

José Fernando Vila nova de Moraes – Profissional de Educação Física, doutorando em Educação Física, professor assistente da Faculdade de Educação Física, Universidade Federal do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil

Pedro Ferreira alves de oliveira – profissional de Educação Física, mes-trando em Educação Física, professor do Instituto Federal de Brasília, Brasília, DF, Brasil

Paulo russo Segundo – profissional de Educação Física, mestre em Educação Física, professor do Instituto Federal de Roraima, Boa Vista, RR, Brasil

Herbert gustavo Simões – profissional de Educação Física, doutor em Ciências Fisiológicas, pós-doutorando em Proteômica Aplicada à Fisiologia do Exercício, diretor e professor do Programa de mestrado e doutorado em Educação Física da Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, Brasil

Correspondência: Pedro Ferreira Alves de Oliveira. Programa de mestrado e doutorado em Educação Física da Universidade Católica de Brasília. EPTC, QS07, lote 1, bloco G, sala 116, Águas Claras, CEP 72022-900, Taguatinga-DF, Brasil. Telefone: +55 61 33569350, fax: +55 61 3356 9044.

internet: [email protected]

Recebido em 2-1-2012. Aceito em 10-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

Marcelo Magalhães Sales, andremara Faria athayde, José Fernando Vila nova de Moraes, Pedro Ferreira alves de oliveira, Paulo russo Segundo e Herbert gustavo Simões

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ABSTRACT

Prevalence of risk factors for cardiovascular disease among adults in the district of Porto Trombetas, Oriximiná-PA

Objective. To determine the prevalence of overweight, obesity and hypertension among residents of Porto Trombetas, Oriximiná, Pará, Brazil.

Method. This was an observational, descriptive, cross-sectional study with a sample of 121 men and 76 women aged from 20 to 60 years. All subjects underwent mea-surements of body mass index, height, skinfold thickness and blood pressure.

Results. One hundred and twenty-one (121) men and 76 women (n = 197) aged from 20 to 60 years participated in the study. Men had higher age (p = 0.008), body mass in-dex (p = 0.01), systolic blood pressure (p = 0.0001), diastol-ic blood pressure (p = 0.001) and mean arterial pressure (p = 0.0001), and women had a higher percentage of body fat (p = 0.0001). The percentage of women with normal body mass index was significantly higher as compared to men (p = 0.006). Overweight and obesity were more fre-quent throughout the sample (76.1%). We observed that 94.4% of the total sample had fat percentage classified as overweight and obesity. The frequency of normal blood pressure was higher in women in relation to the pres-ence of prehypertension and hypertension as compared to men (p = 0.002). The frequency of pre-hypertension in relation to hypertension was higher in men (p = 0.01).

Conclusion. A high prevalence of overweight, obesity and arterial hypertension was found in this sample.

Key words. Overweight; obesity; hypertension; body mass index.

introDUÇÃo

O sobrepeso e a obesidade vêm aumentando rapi-damente em todo o mundo, sendo considerados graves problemas de saúde pública tanto em paí-ses desenvolvidos como naqueles em desenvolvi-mento.1 Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que existam mais de um bilhão

e meio de adultos com excesso de peso em todo o mundo. Desses, mais de duzentos milhões de ho-mens e quase trezentos milhões de mulheres são considerados obesos.2

Estudos têm mostrado fortes associações entre o excesso de peso com o desenvolvimento de doen-ças cardiovasculares, diabetes melito tipo 2, disli-pidemia, pressão arterial elevada entre outros.3 As doenças circulatórias ainda são as principais causas de morte entre os brasileiros.4

A obesidade é doença crônica e multifatorial que envolve a interação de mecanismos metabólico, ge-nético e ambiental. Este último fator seria devido à adoção de estilo de vida sedentário associada à alimentação inadequada.5

O excesso de peso corporal pode ser estimado por diferentes procedimentos, como a medida do ín-dice de massa corporal, de dobras cutâneas, a re-lação cintura-quadris, o ultrassom, a ressonância nuclear magnética, a absortimetria radiológica de dupla energia (DEXA), pesagem hidrostática, en-tre outras. Contudo, o índice de massa corporal se destaca principalmente em estudos epidemiológi-cos por apresentar fácil aplicabilidade, especial-mente quando se avaliam grandes grupos, pelo baixo custo e pela boa correlação com a gordura corporal.6 Por outro lado, ele apresenta baixa, po-rém significativa correlação com a estatura, com a massa livre de gordura e com a proporcionalidade corporal da relação pernas-tronco em tamanho. Isso põe em risco sua utilização como indicador de adiposidade corporal.7 Assim, o percentual de gordura corporal estimado pela técnica de dobras cutâneas, junto ao índice de massa corporal, pa-rece ser boa estratégia para melhor diagnosticar o sobrepeso e a obesidade.8

A pressão arterial elevada é apontada como um dos principais fatores de risco de desenvolvi-mento de doenças cardiovasculares. Estudos apontam uma forte, positiva e significante as-sociação entre o índice de massa corporal e a elevação da pressão arterial.9 Nesse sentido, condições não desejáveis desse índice, percen-tual de gordura corporal e pressão arterial são

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Marcelo Magalhães Sales e cols. • Fatores de risco cardiovasculares

caracterizadas como fatores de risco do desen-volvimento de diversas doenças.9

Não é do conhecimento dos autores a existência de estudos que tenham abordado a prevalência de fatores de risco de doença cardiovascular no dis-trito de Porto Trombetas, Oriximiná, Pará. O ob-jetivo do presente estudo é verificar a prevalência de fatores de risco antropométricos e hemodinâ-mico de doenças cardiovasculares em residentes desse distrito.

MÉtoDo

Trata-se de estudo observacional, descritivo, trans-versal, realizado em 2010.

Participaram de forma voluntária funcionários de uma mineradora localizada no distrito de Porto Trombetas, Oriximiná, Pará, Brasil. Foi utilizado o software Morepower 4.9 para determinar que o tama-nho da amostra de 197 indivíduos seria o mínimo necessário para fornecer poder estatístico com alfa de 5% para a análise.

Os critérios de inclusão foram ter idade igual ou superior a 18 anos e residir há mais de um ano no referido domicílio.

O índice de massa corporal foi calculado consideran-do-se o quociente entre o peso corporal (Toledo 2096 PP) em quilogramas e a estatura em metros (estadiô-metro SECA® 214, EUA) elevada ao quadrado (kg/m2). Os indivíduos foram classificados conforme sugerido pela OMS,10 que estabelece índice de massa corporal menor que 18,5 kg/m2 de baixo peso, peso normal de 18,5 a 24,9 kg/m2, sobrepeso de 25 a 29,9 kg/m2 e obe-sidade maior ou igual a 30 kg/m2.

A gordura corporal relativa, por sua vez, foi aferida pela medida de dobras cutâneas, em que a densida-de corporal foi estimada com o uso dos protocolos de sete dobras,11 coletadas em cada ponto, em se-quência rotacional, do lado direito do corpo, sendo registrado o valor mediano. As medidas foram re-alizadas por avaliador único, com um compasso de dobras (Lange, Cambridge Scientific Instruments,

Cambridge, Maryland, EUA). Dessa forma, depois de calcular a densidade corporal, esta foi conver-tida em percentual de gordura corporal por meio da equação de Siri.12 As medidas de percentual de gordura corporal foram comparadas e classificadas como proposto por Lohman.13

As aferições de pressão arterial foram realizadas por medidor automático (Microlife, BP 3AC1-1), após os indivíduos permanecerem sentados, com as pernas descruzadas, os pés apoiados no chão, o dorso recostado na cadeira e relaxado, por no mínimo cinco minutos em ambiente tranquilo. O braço foi posicionado à altura do coração – nível do ponto médio do esterno ou quarto espaço in-tercostal –, a palma da mão voltada para cima e o cotovelo ligeiramente fletido. Os indivíduos foram classificados como pré-hipertensos – pressão arte-rial sistólica de 120 a 139 mmHg ou pressão arterial diastólica de 80 a 89 mmHg – e como hipertensos e normotensos com valores acima e abaixo desses respectivamente.14

A estatística descritiva e o teste de Shapiro-Wilk fo-ram usados para caracterizar a amostra e verificar a normalidade dos dados respectivamente. Para a com-paração das médias entre homens e mulheres foram usados o teste t de Student não pareado e o teste de Mann-Whitney. O teste qui ao quadrado foi emprega-do para as comparações entre frequências. Os dados foram analisados no software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) 15.0, adotando-se um nível de significância de 5% (p < 0,05).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Católica de Brasília e se-guiu as determinações da Convenção de Helsinque. Antes da coleta de dados, os voluntários foram es-clarecidos acerca dos procedimentos os quais se-riam submetidos e assinaram um termo de consen-timento livre e esclarecido, conforme Resolução n.º 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

rESUltaDoS

Participaram do estudo 121 homens e 76 mulheres (n = 197) com idades de 20 a 60 anos.

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Como apresentado na tabela 1, as variáveis analisa-das tiveram diferenças significativas entre os sexos. Os homens tiveram valores superiores para a idade (p = 0,008), índice de massa corporal (p = 0,01), pres-são arterial sistólica (p = 0,0001), pressão arterial diastólica (p = 0,001) e pressão arterial média (p = 0,0001), e as mulheres expuseram maior percentual de gordura corporal (p = 0,0001).

Na tabela 2, é mostrada avaliação do índice de mas-sa corporal. O percentual de mulheres com índice normal foi significativamente maior em relação aos homens (p = 0,006). Nestes, ocorreu tendência não significativa (p = 0,06) de sobrepeso em relação à obesidade, em cotejo com os mesmos parâmetros

nas mulheres. Em toda a amostra, o sobrepeso e a obesidade foram mais frequentes (76,1%).

Conforme mostrado na tabela 3, o percentual de gordura corporal normal foi semelhante em ambos os sexos. A frequência de percentual de gordura corporal considerada obesidade em relação àquela normal e sobrepeso em mulheres teve tendência a ser maior, porém sem significância estatística (p = 0,06) em relação aos mesmos parâmetros do homem. Na amostra total, observou-se que 94,4% tinha percentual de gordura classificado como so-brepeso e obesidade. Não foi evidenciada a presen-ça de percentual de gordura corporal abaixo dos valores recomendados.

Tabela 1. Características descritivas da amostra

VariáVEiStotal

(n = 197)HoMEnS (n = 121)

MUlHErES(n = 76)

p

Idade (anos) 38,1 ± 9 40,1 ± 9 34,4 ± 8,1 0,008*IMC (kg/m2) 28,2 ± 4,4 28,8 ± 4,2 27,2 ± 4,5 0,013†

Gordura corporal (%) 29,2 ± 7,9 25,5 ± 6,6 35 ± 6,2 0,0001†

PAS (mmHg) 121,3 ± 18,8 125,5 ± 19,1 113,3 ± 16,1 0,0001*PAD (mmHg) 76,7 ± 12,5 78,9 ± 12,1 72,6 ± 12,6 0,001*PAM (mmHg) 91,6 ± 14,2 94,4 ± 14,0 82,6 ± 13,2 0,0001*

Dados expressos em média e desvio-padrão. IMC – índice de massa corporal. PAS – pressão arterial sistólica. PAD – pressão arterial diastólica. PAM – pressão arterial média. *Teste de Mann-Whitney. †Teste t de Student (não pareado).

Tabela 2. Classificação da amostra por sexo quanto ao índice de massa corporal

ÍnDiCE DE MaSSa CorPoralHoMEnSn (%)

MUlHErESn (%)

total n (%)

Normal 21 (17,4) 26 (34,2)* 47 (23,9)

Sobrepeso 60 (49,6)† 31 (40,8) 91 (46,2)

Obesidade 40 (33,1) 19 (25,0) 59 (29,9)

totais 121 (100) 76 (100) 197 (100)

*p = 0,006 vs homens. †p = 0,06 vs mulheres com sobrepeso.

Tabela 3. Classificação da amostra por sexo quanto ao percentual de gordura corporal

PErCEntUal DE gorDUra CorPoralHoMEnSn (%)

MUlHErESn (%)

totaln (%)

Normal 7 (5,8) 4 (5,3) 11 (5,6)Sobrepeso 44 (36,4) 18 (23,7) 62 (31,5)Obesidade 70 (57,9) 54 (71,1)*† 124 (62,9)totais 121 (100) 76 (100) 197 (100)

*p = 0,06 vs homens. †p = 0,05 vs homens sobrepeso

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Na tabela 4, é apresentada a distribuição da amostra conforme a classificação da pressão arterial. Observa-se que ocorreu maior per-centual de pressão arterial normal nas mulhe-res em relação à presença de pré-hipertensão

e hipertensão em comparação com os homens (p = 0,002). A frequência de pré-hipertensão ar-terial em relação à hipertensão arterial no ho-mem foi mais frequente em comparação com a das mulheres (p = 0,01).

Tabela 4. Classificação da amostra por sexo quanto à pressão arterial

PrESSÃo artErialHoMEnSn (%)

MUlHErESn (%)

totaiS n (%)

Normal 54 (44,6) 51 (67,1)* 105 (53,3)Pré-Hipertensão 49 (40,5)† 18 (23,7) 67 (34,0)Hipertensão 18 (14,9) 7 (9,2) 25 (12,7)totais 121 (100) 76 (100) 197 (100)

*p = 0,002 vs homens normais. †p = 0,0 vs mulheres com pré-hipertensão

Da amostra total, somente 3,1% apresentaram con-comitantemente pressão arterial e percentual de gordura corporal dentro dos padrões recomenda-dos, e 44,2% tinham ambos os fatores acima dos li-mites recomendados.

DiSCUSSÃo

O acúmulo excessivo de gordura corporal e a eleva-ção da pressão arterial estão associados ao desenvol-vimento de doenças crônicas não transmissíveis, as quais vêm aumentando rapidamente em todo o mun-do, bem como em diferentes regiões do Brasil.

O excesso de peso corporal avaliado por meio do ín-dice de massa corporal foi mais frequente em toda a amostra. Isso sugere que os indivíduos residentes no distrito de Porto Trombetas, Pará, acompanham a tendência mundial de excesso de peso na popula-ção, já que 76,1% da amostra manifestam adiposi-dade corporal elevada. Esse resultado é semelhan-te ao reportado na população adulta no Estado de Minas Gerais.15 Em outro estudo com 2.352 adultos paraenses, verificaram preponderância de excesso de peso de 49,3% em homens e 34% em mulheres.16

A última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constatou que, nos últimos trin-ta anos, a prevalência de excesso de peso entre os homens da Região Norte do Brasil aumentou de

21,5% para 47,7%, e o percentual de adultos obesos dessa região cresceu de 3,6% para 10,6%. Nas mulhe-res adultas dessa mesma região, o excesso de peso aumentou de 23,8% para 46,7%, ao passo que a predo-minância de obesidade passou de 6,4% para 15,2%.17

Quando analisada a preponderância de fatores de risco de doença cardiovascular por sexo pelo índi-ce de massa corporal, as mulheres apresentaram maior frequência de peso corporal normal do que os homens. Ocorreu uma tendência não significa-tiva (p = 0,06) de maior percentual de sobrepeso nos homens em relação às mulheres. Esses achados estão em acordo outros autores, que encontraram frequência de 42,7% de excesso de peso corporal nos homens e de 26,8% nas mulheres.18

Contudo, ao avaliar a adiposidade corporal por meio do percentual de gordura, em ambos os sexos e em toda a amostra, a condição de obesidade foi mais prevalente. Esses resultados estão em acordo com outra pesquisa, que também encontrou maior predominância de excesso de adiposidade corporal em comparação com a condição de gordura corpo-ral normal.19

Outro aspecto importante foi que, quando ava-liada a adiposidade corporal pelo índice de mas-sa corporal, os homens e toda a amostra apre-sentaram maior frequência de sobrepeso, o que contrasta com o maior percentual de obesidade quando se aplicou a avaliação do percentual de

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gordura corporal. Isso indica que o índice de mas-sa corporal parece não ser ferramenta totalmente confiável no diagnóstico de sobrepeso e obesida-de, sobretudo em mulheres.20 Além disso, o per-centual de gordura corporal estimado por dobras cutâneas denota maior correlação com o percen-tual de gordura corporal estimado pela DEXA (dual energy X-ray absorptiometry) do que com o índice em questão. A DEXA é considerada como um dos principais métodos de estimativa do per-centual de gordura corporal, mesmo em relação à pesagem hidrostática (padrão-ouro).21 Entanto, é enfatizado que, em análises epidemiológicas, o índice de massa corporal se torna indispensável em razão, principalmente, da ausência de outro indicador que seja tão simples e conveniente.22

A pressão arterial normal foi predominante nas mulheres e em toda a amostra. Os homens tive-ram maior frequência de pré-hipertensão do que as mulheres. Isso configura risco de mortalidade 31% maior em relação àqueles classificados como pressão arterial normal.23

A elevação dos valores de pressão sanguínea arte-rial está fortemente associada às doenças cardio-vasculares, o que inclui infarto agudo do miocár-dio e a morte súbita. Além disso, essa associação se eleva com o aumento do índice de massa corporal.24 Desse modo, grande parte da população aqui anali-sada encontra-se em risco aumentado de acometi-mento por essas doenças porque quase metade de toda a amostra revelou, concomitantemente, gor-dura corporal e pressão arterial acima dos valores normais. Estudos apontam a obesidade como rele-vante fator de risco de hipertensão, isto é, o ganho de peso, ao longo da vida, é importante preditor de desenvolvimento de hipertensão arterial.25

Em conclusão, o presente estudo mostrou frequên-cias elevadas de sobrepeso e obesidade medidos pelo índice de massa corporal e pelo percentual de gordura corporal, em particular no grupo dos homens, além de alta prevalência de pressão san-guínea arterial elevada, o que sugere haver neces-sidade de adoção de medidas terapêuticas, bem como preventivas na população estudada. Nesse sentido, as medidas de controle e prevenção dos

riscos modificáveis para a população estudada es-tão situadas no âmbito da adoção de hábitos sau-dáveis, como prática regular de exercício físico e alimentação saudável, a fim de evitar o desenvol-vimento de doenças crônicas não transmissíveis, que são fortemente associadas ao excesso de peso corporal e à hipertensão arterial.

Agradecimentos. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico e Científico (CNPq), à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e à Micromed Biotecnologia Ltda.

rEFErÊnCiaS

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Marcelo Magalhães Sales e cols. • Fatores de risco cardiovasculares

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SAÚDE PÚBLICA

Acesso dos usuários às unidades de tratamento intensivo adulto no Distrito Federal

RESUMO

Introdução. As unidades de terapia intensiva são altamente especializadas, atendem em nível terci-ário pacientes em estado grave e representa uma questão particular para a gestão de saúde no Brasil.

Objetivo. Analisar por meio da cobertura assisten-cial o acesso dos usuários às unidades de terapia intensiva adulto no Distrito Federal.

Método. Realizados levantamento bibliográfico e análise documental de dados que possibilitaram avaliar a cobertura do atendimento intensivo adul-to no Distrito Federal. Os dados foram extraídos do Ministério da Saúde e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Resultados. A estimativa de leitos obtida na análise da Portaria n.º 1.101-2002 mostra que a quantidade de leitos de unidades de terapia intensiva no Distrito Federal encontra-se dentro dos limites exigidos, ou seja, um a três leitos por dez mil habitantes. A análi-se dos dados trouxe informações que possibilitaram compreender a falta de leitos que a mídia local mos-tra constantemente. A região do Entorno do Distrito Federal referencia seus pacientes aos grandes cen-tros devido à escassez de recursos tecnológicos, o que enseja o excesso da demanda no setor.

Conclusão. Os gestores, os trabalhadores e a popu-lação têm a responsabilidade ética de promoverem mudanças necessárias, priorizando a reorganização da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – RIDE/DF. Pensar em uma po-lítica de inclusão social que enfrente os problemas sociais que transformaram o Distrito Federal e seu Entorno na região entre as mais desigual do País.

Palavras-chave. Acesso; terapia intensiva; regio- nalização.

Marcelo Moreira Corgozinho – enfermeiro, mestre em Bioética pela Facul-dade de Saúde da Universidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil

Walquíria Quida Salles Pereira Primo – médica, doutora em Ciências da Saúde, professora do Programa de Pós-graduação em Bioética, Universidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil

Correspondência: Marcelo Moreira Corgozinho. Rua Buriti, lote 6, ap. 208, Residencial Mondrian, Águas Claras, CEP 71.910-180, Brasília-DF.

Internet: [email protected]

Recebido em 10-2-2012. Aceito em 11-3-2012.

Os autores declaram não haver conflitos de interesses que pos-sam interferir na imparcialidade desta pesquisa.

Marcelo Moreira Corgozinho e Walquíria Quida Salles Pereira Primo

ABSTRACT

Users’ access to adult intensive care units in the Distrito Federal

Introduction. Intensive care units are highly specialized units that serve, at a tertiary level, seriously ill patients; however, they constitute a particular health manage-ment issue in Brazil.

Objective. The aim of this study was to investigate us-ers’ access to intensive care units in the Distrito Federal through health coverage data analysis.

Method. We conducted a literature review and data analysis, which allowed us to evaluate the coverage of adult intensive care in the Distrito Federal. Data were obtained from the Ministry of Health and the Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Marcelo Moreira Corgozinho e col. • Acesso à terapia intensiva

Results. The estimated number of hospital beds obtained through Ordinance n. 1,101-2002 shows that the number of intensive care units beds in the Distrito Federal lies within the required minimum of one to three beds per ten thousand inhabitants. The data analysis made it pos-sible for us to understand the lack of hospital beds that the local media constantly shows. Patients from the sur-rounding areas of the Distrito Federal are referred to large centers due to the lack of technological resources, which leads to excess demand in the sector.

Conclusion. Managers, workers and the community have the ethical responsibility of promoting relevant changes, prioritizing the reorganization of Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – RIDE/DF. They must think of a social in-clusion policy that fights the social problems that have made the Distrito Federal and its surrounding areas the most unequal region of the country.

Key words. Access; intensive care; regionalization.

INTRODUÇÃO

As unidades de terapia intensiva (UTIs) são servi-ços altamente especializados, pois atendem, em nível terciário, pacientes em estado grave e que necessitam de monitorização contínua.1 Pode-se dizer que tais unidades representam uma questão particular para a gestão dos sistemas de saúde do Brasil.2 O envelhecimento geral da população é fe-nômeno novo e estima-se que, em 2050, existirão cerca de dois bilhões de pessoas com sessenta anos ou mais no mundo.3 Dessa forma, os pacientes so-brevivem a doenças que previamente eram fatais e se tornam crônicos, o que representa obstáculos enfrentados no equilíbrio entre a oferta de serviços e o uso racional de recursos.1,2

A Constituição Federal de 1988 contribuiu para o processo de democratização do País e estabeleceu a saúde como direito público, universal e livre à iniciativa privada.4 Essa forma de gestão pública--privada dentro de um sistema de saúde deve ter como papel fundamental fazer o sistema funcionar com lógica organizacional que vise às ações de pro-moção, proteção e recuperação da saúde.5

Fruto do processo de democratização, as ações e os serviços de atenção à saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) devem ser organizadas com participação da comunidade e desenvolvidas por uma rede de unidades de serviços da administração direta e indireta e pelos serviços de saúde conve-niados e contratados, organizados de forma des-centralizada, regionalizada e hierarquizada para compor subsistemas municipais que assegurem o atendimento integral à saúde da população.5,6

Ao abordar a questão da equidade no acesso às uni-dades de terapia intensiva, o gestor deve precisar com clareza os conceitos e o modelo explicativo que emprega nas políticas voltadas para reduzir as de-sigualdades sociais.5 Segundo dados do Ministério da Saúde,9 o Distrito Federal (DF) dispõe de 1,8% da quantidade nacional de leitos de unidades de me-dicina intensiva, divididos entre 49 unidades públi-cas e privadas, que devem atender os cidadãos do Distrito Federal e auxiliar os municípios que inte-gram a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (RIDE-DF).7,8

Para compreender o processo de regionalização é importante identificar três momentos distintos da ocupação socioterritorial. No primeiro mo-mento, o Distrito Federal composto pela Brasília planejada que equivalia à área projetada do Plano Piloto. No segundo momento, Brasília assume uma forma na qual se constitui uma área central – Plano Piloto – e as chamadas cidades satélites – ou Regiões Administrativas e, em um momen-to mais recente, identifica-se a constituição do aglomerado urbano na qual aumenta o número de Regiões Administrativas, consolida a relação en-tre a área central e a sua periferia e forma a Área Metropolitana de Brasília.8

Existe forte interdependência entre os municípios da RIDE-DF, principalmente em virtude da intensa concentração de infraestrutura em setores como a saúde e a oferta de emprego, o que faz o fluxo exis-tente de pessoas dos municípios do entorno, muitos migrantes do Distrito Federal, ser expressivo e consti-tua forte movimento de migração pendular.8 A regio-nalização representa uma diretriz do SUS e um eixo estruturante do Pacto de Gestão que deve orientar a

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descentralização das ações de saúde e os processos de negociação e pactuação entre os gestores.9

Para coordenar e articular as ações integradas existe um Conselho Administrativo da RIDE-DF (Coaride), que está vinculado à Secretaria de Desenvolvimento do Centro-Oeste. É composto do Ministro de Estado da Integração Nacional, que representa como presidente; representante de ca-da um dos Ministérios da Fazenda, Planejamentos e das Cidades; representante da Casa Civil; repre-sentantes do Ministério da Integração Nacional; representante do Distrito Federal, Minas Gerais e Goiás e por representantes dos municípios de integram a RIDE. Os recursos financeiros desti-nados vêm do orçamento da União, dos estados envolvidos, municípios, Fundo de Financiamento do Centro-Oeste, Financiamento de Entidades de Crédito Oficiais, Operações de Crédito Externas e Recursos de Instituições.8

A RIDE-DF é constituída do Distrito Federal e dos seguintes municípios: Abadiânia, Água Fria de Goiás, Águas Lindas de Goiás, Alexânia, Anápolis, Cabeceiras, Cidade Ocidental, Cocalzinho de Goiás, Corumbá de Goiás, Cristalina, Formosa, Luziânia, Mimoso de Goiás, Novo Gama, Padre Bernardo, Pirenópolis, Planaltina, Santo Antônio do Descoberto, Valparaíso de Goiás e Vila Boa, todos no Estado de Goiás; além de Unaí, Cabeceira Grande e Cabeceiras, no Estado de Minas Gerais. Conforme o Ministério da Integração Nacional,8 a RIDE obje-tiva harmonizar as ações administrativas para a re-alização de projetos que visem à dinamização eco-nômica de territórios de baixo desenvolvimento.

Retomando o foco das necessidades específicas da área de saúde, é possível estimar parâmetros de co-bertura assistencial por intermédio de orientações do Ministério da Saúde. Representam recomenda-ções ideais que orientam os gestores dos três níveis de governo no planejamento, programação e prio-rização das ações de saúde a serem desenvolvidas, podendo sofrer adequações regionais ou locais de acordo com realidades epidemiológicas e financei-ras das regiões. Nesse sentido, a Portaria n.º 1.101-2002 orienta os gestores no aperfeiçoamento da gestão do SUS e oferece subsídios para analisar a

necessidade da oferta de serviços assistenciais à população, incluindo-se a cobertura de assistência de leitos em terapia intensiva.10

É sabido que a região da RIDE-DF vive uma crise na área da saúde. Conforme publicação do Correio Brasiliense,11 a crise se acentuou principalmente a partir abril de 2010 quando os hospitais particula-res cobraram do Governo do Distrito Federal (GDF) uma dívida de quase R$60 milhões referentes ao atendimento nos 125 leitos de unidades de terapia intensiva contratados pelo governo. No início de dezembro de 2010, a iniciativa privada denunciou a falta de pagamento do débito, que, segundo os hos-pitais privados, ultrapassou cento e três milhões de reais. Diante da resposta do GDF, que afirmou estar em dia com os compromissos de 2010 e não dispor de previsão orçamentária para os anos anteriores, os hospitais anunciaram a desativação dos leitos “alugados”, o que resultou em uma série de bata-lhas judiciais. O governo de Agnelo Queiroz pagou então R$10 milhões da dívida de 2009 e iniciou sua reavaliação por meio de auditorias.

Este artigo tem como objetivo analisar o acesso dos usuários às UTIs adulto no Distrito Federal. Espera-se que as análises desta pesquisa possam contribuir com reflexões futuras na tentativa de solucionar ou minimizar os problemas sociais, es-pecialmente os relacionados ao acesso ao trata-mento intensivo.

MÉTODO

Realizou-se pesquisa exploratória por meio de pro-cedimento técnico de busca bibliográfica e poste-rior análise documental com dados que se encon-travam disponíveis, portanto, dados secundários que possibilitaram avaliar a cobertura assistencial de UTI no Distrito Federal. O presente estudo foi realizado no período de julho a outubro de 2011.

Os dados quantitativos de leitos públicos e privados foram disponibilizados pelo Ministério da Saúde-Datasus e analisados com os dados demográfi-cos sobre a população adulta do Distrito Federal, extraídos do Instituto Brasileiro de Geografia e

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Estatística (IBGE) em 28 de julho de 2011. A refe-rência para a avaliação da cobertura assistencial em terapia intensiva foi a Portaria n.º 1.101-2002 do Ministério da Saúde.

RESULTADOS

Conforme dados do Ministério da Saúde, o Distrito Federal dispõe de 6.335 estabelecimentos de aten-dimento à saúde registrados no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). Desses, o to-tal de 28 instituições públicas e privadas oferecem atendimento de alta complexidade, distribuídos em 49 unidades de tratamento intensivo.7

A tabela 1 mostra a participação dos setores pú-blico e privado na oferta de unidades de medicina intensiva de acordo com sua classificação: tipo I – unidades em processo de adequação à legisla-ção vigente – Portaria GM/MS n.º 3.432/98 – que, no entanto, continuam em funcionamento; tipo II – unidades credenciadas em conformidade com a referida Portaria, em que constam os critérios minimamente aceitáveis para o atendimento aos pacientes em estado grave; tipo III – atendem aos mesmos critérios daqueles do tipo II, mas atendem a critérios mínimos, o que inclui alguns recursos tecnológicos e humanos, como por exemplo, a ampliação do número de exames complementa-res no hospital, e maior número de equipamentos por paciente.12

Conforme a tabela 1, há maior representativida-de do setor identificado como “não SUS” (priva-do, filantrópico e não classificado) na medicina

Tabela 1. Percentual de leitos de unidade de terapia intensiva para adulto quanto à entidade mantene-dora no Distrito Federal em 2010

MANTENEDORA UTI TIPO I* UTI TIPO II* UTI TIPO III* TOTAL DE LEITOS PERCENTUAIS

SUS 0 215 56 271 42,4Não SUS† 105 196 67 368 57,6Total 105 411 123 639 100

Fonte: Ministério da Saúde CNES-DATASUS9

*Unidade de Terapia Intensiva tipo I – unidades em processo de adequação à legislação vigente (Portaria GM/MS n.º 3.432/98), mas continuam em funcionamento; tipo II – unidades credenciadas conforme a Portaria com os critérios minimamente aceitáveis para o atendimento aos pacientes em estado grave; tipo III – atendem aos mesmos critérios das UTI tipo II, mas inclui também alguns recursos tecnológicos e humanos (referência 12) †Não SUS – estabelecimentos privados, filantrópicos e não classificados

intensiva no Distrito Federal. O SUS participa com 42,4% dos leitos exclusivamente públicos de terapia intensiva e, em caráter complementar, com o siste-ma privado, o que evidencia que os setores público e privado, apesar de desintegrados, em verdade são extremamente interdependentes.13

Cada dia as unidades particulares de saúde do Distrito Federal recebem cerca de cem pessoas cujas contas são pagas pelo SUS. Cada leito de UTI na rede privada custa, em média, um a três mil re-ais por dia. Se o paciente estiver em estado grave e o caso exigir maiores investimentos, a conta pode ser maior. Com base na média de pessoas interna-das diariamente, é possível estimar os gastos do GDF com a terceirização de leitos de UTI em pelo menos três milhões de reais mensais.11

Na Portaria n.º 1.101, de 2002, é possível estimar a necessidade de leitos de unidades de tratamen-to intensivo por meio do cálculo de 4% a 10% do total de leitos hospitalares disponíveis.10 Segundo informação da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB),16 a média desse cálculo cor-responde de um a três leitos de UTI para dez mil habitantes.

A estimativa feita por meio de números de leitos fornecidos pelo Ministério da Saúde e com dados demográficos do IBGE de 2010 mostra que a quanti-dade de leitos de UTI no Distrito Federal encontra--se dentro dos limites exigidos de 2,56 leitos para dez mil habitantes.7,14 Dados demográficos sobre o Entorno do Distrito Federal mostram que a popu-lação foi, em 2003, de 1.100.996 habitantes e sal-tou para 3.716.996 em 2010.14 Ademais, números da

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Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios pu-blicada pelo IBGE em 2008 evidenciaram que 20,9% dos imigrantes vieram para a Região Centro-Oeste, a maioria nordestinos.15

Diante disso, ao estimar a quantidade de leitos para a população do DF e entorno – RIDE/DF – e analisado pela quantidade de leitos disponíveis público e privado – 639 leitos conforme apresen-tado na tabela 2 –, observa-se o resultado de 1,01 leitos para cada dez mil habitantes da RIDE-DF, ou seja, o mínimo exigido pela Portaria n.º 1.101 de 2002.10 Cabe ressaltar que o total quantitativo de leitos da iniciativa privada não está totalmente disponível ao SUS, tornando-os complementares ao sistema público e não disponíveis de forma in-tegral. Poder-se-ia, então, considerar que a quan-tidade de leitos disponíveis atende à demanda de forma adequada?

Na tabela 3, esse cálculo anterior foi feito de for-ma mais justa, somando-se apenas os leitos do SUS com os leitos privados contratados pelo SUS na me-dicina privada.

Tabela 2. Leitos de unidade de terapia intensiva necessários no Distrito Federal e Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (RIDE-DF) em 2010

POPULAÇÃOMíNIMO DE LEITOS

NECESSáRIOSLEITOS DISPONívEIS

PÚBLICOS E PRIvADOSMÉDIA DE LEITOS DE UTI POR 10.000 hABITANTES

Distrito Federal 2.562.963 256 639 2,56

RIDE-DF3.716.996 +2.562.963

628 639 1,01

Fonte: censo demográfico IBGE,18 Ministério da Saúde, CNES-DATASUS9

UTI – unidade de terapia intensiva

Tabela 3. Cobertura de leitos de unidades de terapia intensiva, públicos e privados, contratados para a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (RIDE-DF) em 2010

POPULAÇÃOLEITOS PÚBLICOS E PRIvADOS

CONTRATADOSMÉDIA DE LEITOS DE UTI POR 10.000

hABITANTES

RIDE-DF

2.562.963+ 3.716.99

6.279.959

271+ 125

396

0,6

Fonte: censo demográfico IBGE,18 Ministério da Saúde CNES-DATASUS9

UTI – unidade de terapia intensiva

Ao somar os 271 leitos do SUS (tabela 1) com os 125 leitos privados contratados junto à medici-na privada (tabela 3), observa-se o total de 396 leitos efetivos para a população da RIDE-DF, ou seja, 0,6 leitos para dez mil habitantes. Constata-se que Brasília e o Entorno cresceram de forma rápida, e a estrutura de atendimento não acom-panhou a evolução populacional. Notícia sobre pacientes que chegam em grande quantidade de vários pontos do Entorno e de várias regiões do País são comuns, e quem depende do SUS na atu-alidade conhece a realidade dos ambulatórios e pronto-socorros do Distrito Federal. A problemá-tica da saúde, além de ser um tema visto como prioridade do atual governo é, da mesma forma, alvo da mídia local.11

Dados de pesquisa recente17 sobre perfil de morta-lidade sugerem que o Distrito Federal constitui um polo de atração na área de assistência à saúde, em que 21% dos óbitos ocorridos foram de indivídu-os procedentes de outros estados, principalmente Minas Gerais, Goiás, Bahia, dentre outros não per-tencentes à RIDE-DF.

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DISCUSSÃO

O rápido crescimento populacional da região que integra a RIDE-DF, a proximidade da capital fede-ral e a carência de infraestrutura no Entorno são variáveis de destaque para questão em estudo. Como os grandes centros possuem maiores recur-sos e tecnologias, além de compromisso políticos de desenvolvimento econômico, os municípios do Entorno acabam referenciando seus pacientes ao Distrito Federal, o que origina o conhecido excesso de demanda no setor.

Seria injusto deixar de mencionar que a implan-tação do SUS representou um grande efeito dis-tributivo e de inclusão social, pois, antes, apenas 25% da população brasileira formalmente inserida no mercado de trabalho tinha assegurada a assis-tência à saúde.13,18 Em contrapartida, problemas como falta de assistência à saúde da população, sucateamento da rede pública, subsídio governa-mental à rede privada, indefinição dos limites de lucro, crônica falta de recursos – provocam con-sequente descrédito da população pelo sistema público de saúde.18

Em 1975, com a Lei 6.229, surgiu a Organização do Sistema Nacional de Saúde, que consagrou a dico-tomia entre setor público e setor privado, saúde coletiva e assistência previdenciária. Esse setor rapidamente se constituiu, passando a prescindir do Estado nas suas relações comerciais (planos in-dividuais ou coletivos – empresariais ou não), mas se alicerçando no poder público, seja por intermé-dio da renúncia fiscal, seja na utilização do sistema público para o atendimento considerado de alta complexidade e de alto custo.19

Por meio dos dados deste estudo, observou-se que o misto público-privado persiste com re-presentação do setor identificado como não SUS na oferta de leitos de unidades intensivistas no Distrito Federal (57,6%). Além disso, conforme nota do Correio Brasiliense,16 o GDF participa com despesas de aproximadamente três milhões de reais mensais com a medicina privada e, mes-mo assim, não consegue suprir a demanda de pa-cientes da RIDE-DF.

No momento em que a Constituição Federal garan-tiu direitos universais à saúde e não estabeleceu diretrizes para a medicina privada, levantou-se um paradoxo que pode ter causado impacto nega-tivo sobre o acesso dos brasileiros de baixa renda aos serviços médicos, em decorrência da estrutura produtiva do mercado produtivo de saúde.13,18 Há evidências da dificuldade de gestão de um sistema de saúde considerado perfeito em sua teoria e que, em sua prática, encontra dificuldades em oferecer atendimento integral à população.

Segundo dados do Sistema de Informações de Beneficiários da Agência de Saúde Suplementar, a taxa de cobertura da medicina suplementar em 2009 no Distrito Federal foi 27,9% da população.20 Então, entende-se que os cidadãos que dependem diretamente de um leito de UTI no SUS se encon-tram em situação de vulnerabilidade, uma vez que uma minoria da população detentora de seguros de saúde tem oferta maior de serviços. Tal situa-ção forma uma barreira de acesso aos serviços de alta complexidade para os cidadãos menos favo-recidos economicamente.

O acesso à saúde vem representado pelo conjunto de características da oferta que atua aumentando ou dificultando a capacidade dos indivíduos de uti-lizarem os serviços de saúde.9 Conforme Travassos e Castro,9 a barreira de acesso mais importante é a disponibilidade de serviços e recursos humanos, porém, a mera disponibilidade desses recursos não garante o atendimento, pois existem ainda vários obstáculos aos usuários – barreiras geográficas, políticas, administrativa, financeiras, organizacio-nais, informacionais entre outras – que expressam características da oferta que de modo inter-rela-cionados atuam obstruindo a capacidade dos cida-dãos de usarem os serviços e ocasionam situações de vulnerabilidade humana.

Sabendo-se da insuficiência do efetivo de leitos públicos e privados contratados para a popula-ção da RIDE-DF, constata-se a primeira barreira de acesso aos serviços de terapia intensiva, a in-disponibilidade de serviços de terapia intensiva. Outra questão que merece destaque é a barreira geográfica, principalmente para os casos de risco

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de morte, em que um polo único de referência é especializado para atender tamanha extensão ter-ritorial. É, sem dúvida, um agravante que limita o acesso em tempo hábil pelos usuários localizados no bloco regional da RIDE-DF.

No intuito de equacionar os problemas da região, em 28 de março de 2005, implantou-se no Distrito Federal uma Central de Regulação das unidades de terapia intensiva, que tem a finalidade de regular cem por cento da capacidade instalada de leitos de UTI adulto e pediátrico cadastrados no SUS, per-tencentes à rede pública e iniciativa privada, con-tratados de forma tradicional ou emergencial. A regulação de leitos tem o papel de remanejar doen-tes, direcionar o fluxo de admissão e alta, determi-nar a alocação de pacientes e ainda estabelecer que as direções de hospitais colaborem com as medidas para equacionar a falta de leitos.21

Outra questão que limita o acesso são os desafios enfrentados pelas políticas públicas desde sua ela-boração – barreiras político-administrativas –, pois por serem programas de governo elas tendem a so-frer pressão da oposição partidária, dependem da iniciativa do poder executivo, encontram dificulda-de de adesão e participação da sociedade civil e da iniciativa privada.9

Após reconhecer os desafios enfrentados pelos ges-tores, retoma-se a análise com algumas palavras de Schramm citado por Kottow,22 quando enfatiza que o Estado tem a responsabilidade de oferecer pro-teção sanitária e brigar por sua efetiva realização, com vistas à modificação dos problemas causado-res de vulnerabilidade. Ademais, Brasília colabora com participação significativa no produto interno bruto (PIB), o que representa o terceiro maior do território nacional. Isso mostra sua importância administrativa e mesmo sua participação na for-mação das riquezas do País.15

Levantar a questão político-administrativa como barreira ao acesso significa reconhecer a existên-cia de problemas e, ao mesmo tempo, ser capaz de propor soluções ou sugestões para os conflitos. Pagani e colaboradores23 relatam que a tentativa de superação da pobreza e da exclusão social, antes

atribuída apenas aos governos, passa a ser, na atua-lidade, preocupação e dever de todos. Passou a exi-gir revisão das políticas tradicionais e programas de assistência, culminando na expansão do chama-do terceiro setor. O primeiro setor, o Estado; o se-gundo setor, o mercado e o terceiro setor, a inicia-tiva privada com fins públicos, por intermédio da sociedade civil fortalecida e organizada numa cor-responsabilidade entre os indivíduos. Representa um processo de intervenção iniciado por agentes sociais e organizações sociais que têm como finali-dade a reforma social.

Com a Lei 8.142 os brasileiros adquiriram a faculda-de de fiscalizar o sistema de saúde por meio de sua inserção nos Conselhos de Saúde e Conferências de Saúde. O Conselho de Saúde atua em caráter per-manente e é um órgão colegiado composto de re-presentantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, que atuam na for-mulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros.6

A instituição de práticas de gestão democráticas nos municípios depende de como os Conselhos de Saúde se organizam para bloquear ou minimizar práticas clientelistas – sistema de trocas políticas em benefício particular – e desenvolver práticas e estruturas horizontais de participação, capazes de originar sujeitos políticos autônomos. A concreti-zação de suas proposições depende da forma como funcionam os núcleos de poder e da maneira que se realizam as interações entre os diversos segmentos representantes no conselho, ou seja, governo, pres-tador de serviços, trabalhador e o cidadão-usuário sujeito de transformação social.24

Shimizu e Pereira24 lembram que a implantação dos Conselhos de Saúde não garante a efetiva participação social, pois há evidência em estu-do recente24 que mostra a falta de articulação entre os Conselhos de Saúde e as Secretarias Municipais de Saúde com outros conselhos na região da RIDE-DF.

O mencionado Coaride é outro conselho que tem como finalidade a redução de desigualdades

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regionais no Distrito Federal. É um espaço no qual os gestores das três esferas governistas podem e devem participar ativamente, buscando pactua-ções consensuais para promover melhorias na rede de atenção à saúde dessa região.8 Por isso, é importante estabelecer eficaz articulação políti-ca entre os membros da RIDE-DF, junto à voz do cidadão presente no sistema de saúde por inter-médio dos Conselhos de Saúde, sobre as opções para solucionar as questões da saúde intensiva no Distrito Federal, uma vez que a maioria dos mu-nicípios que compõem a região do Entorno não dispõem dessa assistência.

Dentre os planos de ação da RIDE-DF 2008–2010 foi prevista a construção do Hospital Regional de Santo Antônio do Descoberto, Hospital Regional de Valparaíso, Hospital Regional do Novo Gama, Hospital Regional de Águas Lindas, além de planos de ação para a atenção à saúde.25 Certamente, essas iniciativas contribuirão consideravelmente para aumentar a disponibilidade de serviços, reduzir a dimensão geográfica como barreira aos usuários e, como consequência, facilitar a gestão político--administrativa da saúde no Distrito Federal.

Para auxiliar os gestores regionais em suas pactua-ções existem ainda os Colegiados de Gestão Regional que configuram instâncias de cogestão solidárias dos espaços regionais definidos no Plano Diretor de Regionalização. Eles permitem identificação de problemas, definição de prioridades, soluções para organização da rede assistencial e formalização de novos modelos de relacionamento entre provedores públicos e privados. Composto de representação do Estado – representação regional das Secretarias de Estado de Saúde – e do conjunto de municípios das regiões, os Colegiados de Gestão Regional podem ser considerados como inovação da política de saúde ao criar um canal permanente de negociação e decisão intergovernamental, o que possibilitará preencher o chamado vazio de governança regional.25

Contudo, é preciso tocar em uma questão deli-cada e que faz refletir sobre a problemática do acesso aos serviços de terapia intensiva. A pos-sibilidade de implementação de políticas públi-cas de saúde eficientes ocorre no mesmo espaço

historicamente determinado pelos jogos de po-deres socioeconômicos responsáveis pela pró-pria formação das vulnerabilidades sociais do País. Aqui, se trata com a suposição da existên-cia de um governo sensível às demandas sociais, com vontade de solucionar problemas e indepen-dência política para intervir com honestidade no gasto dos recursos públicos.26

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As barreiras de acesso aos serviços de alta complexi-dade representam forma de agravo e de risco à vida do cidadão. Ao privilegiar a chamada medicina mer-cantil ocorre maximização dos procedimentos cura-tivos com atividades médicas financiadas pelo Estado e, ao mesmo tempo, abandono das ações preventivas.

Em relação à quantidade de leitos de unidade de me-dicina intensiva no Distrito Federal, observaram-se limites exigidos pelo Ministério da Saúde. Ao consi-derar, porém, a região do Entorno do Distrito Federal, a cobertura assistencial fica abaixo do recomendado. Assim, o que explica a falta de leitos seria o rápido crescimento da RIDE-DF, que triplicou sua população em menos de dez anos, e a estrutura de atendimento não acompanhou a evolução populacional.

O Distrito Federal e o Entorno precisam de nova orientação para a saúde, especialmente para a assis-tência em terapia intensiva. Gestores, setor privado, profissionais e população têm a responsabilidade éti-ca de promover mudanças urgentes e priorizar a or-ganização RIDE-DF. Pensar em uma política de inclu-são social que enfrente os problemas da desigualdade social que transformaram o Distrito Federal e seu en-torno em uma das regiões mais desiguais do País.

Deve-se ter em mente que quanto maior for a par-cela da população sem atendimento médico mais difíceis serão as possibilidades de suas necessidades serem atendidas em curto ou médio prazo por meio das políticas públicas de saúde.26 Para que haja de-senvolvimento integrado da saúde na RIDE-DF seria necessário que ocorressem relações solidárias entre seus componentes, ou seja, todas as partes precisa-riam obter benefícios nessas relações.

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ARTIGO DE REVISÃO

Percepções de pacientes em coma a estímulos táteis e auditivos – revisão sistemática da literatura

RESumO

Introdução. A comunicação vem sendo cada vez mais relacionada com a eficácia do tratamento e o incremento na relação médico-paciente, inclusos os pacientes inconscientes.

Objetivo. Analisar publicações relacionadas às per-cepções de estímulos táteis e auditivos de pacien-tes em coma.

Método. Por meio das palavras-chave comuni-cação, coma, percepção, níveis de consciência e estímulos, foram feitas buscas no PubMed e no Medline. Treze artigos foram identificados, lidos, fichados e categorizados.

Resultados. Observa-se que, nos ensaios clínicos, encontraram-se respostas satisfatórias aos estímu-los táteis e auditivos, mas nos artigos com discus-sões acerca das definições de cada estado alterado de consciência definiram o coma como um estado sem nenhum tipo de percepção que o paciente tem de si próprio ou do ambiente ao redor.

Conclusões. Disso se pode inferir que, ou os pa-cientes estudados nos ensaios clínicos foram er-roneamente classificados como comatosos ou a definição de estado de coma precisa ser revista. Além disso, conclui-se que se trata de um tema em expansão, ainda com poucos textos publicados na literatura científica disponível, o que merece des-taque e deve ser estudado mais profundamente pa-ra sanar a contradição identificada.

Palavras-chave. Coma; comunicação; percepção.

Pesquisa financiada pelo PIBIC/CNPq, no período de agosto de 2010 a julho de 2011

Fernanda Godoy Falcão – graduanda, curso de Medicina, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, SP, Brasil

Nelson Filice de Barros – cientista social, professor doutor, Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil

Correspondência: Nelson Filice de Barros. Rua Tessália Vieira de Camargo, 126, Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas, Unicamp, Cidade Universitária Zeferino Vaz, CEP 13083-887, Campinas, SP.

Internet: [email protected]

Recebido em 9-3-2012. Aceito em 25-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

Fernanda Godoy Falcão e Nelson Filice de Barros

ABSTRACT

Comatose patients’ perception of tactile and audi-tory stimuli – a systematic literature review

Introduction. Communication has been increasingly correlated with treatment effectiveness and with an improvement in doctor-patient relationship, including unconscious patients.

Objective. To analyze publications on comatose pa-tients’ perception of tactile and auditory stimuli.

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ARTIGO DE REVISÃO

Method. A search of the following keywords was con-ducted on the PubMed and Medline scientific databases: communication, coma, perception, levels of conscious-ness, and stimuli. Thirteen articles were identified, read, filed and categorized.

Results. We can observe that clinical trials found satisfac-tory responses to tactile and auditory stimuli. However, the articles discussing the definition of altered states of consciousness defined coma as a state in which the patient shows no kind of environmental or self-perception.

Conclusion. We can suggest that either the patients stud-ied in clinical trials were incorrectly classified as comatose patients or the definition of coma needs to be reviewed. Moreover, we can conclude that this is an increasingly important topic which, in spite of its poor availability in the scientific literature, deserves attention and should be studied more deeply to solve the identified contradiction.

Key words. Coma; communication; perception.

INTRODuÇÃO

A comunicação constitui diversas formas, verbais e não verbais.1,2 Esta última ocorre na interação pes-soa-pessoa sem a mediação das palavras. O estudo do não verbal pode resgatar a capacidade do profis-sional de saúde de perceber com mais precisão os sentimentos do doente, suas dúvidas e dificuldades de verbalização, e a potencializar sua comunicação como elemento transmissor de mensagens.3-5 No caso de pacientes em coma, esses elementos são os únicos de que o profissional pode se valer pa-ra ofertar uma boa prática de cuidados.6-8 A falta de relação mais personalizada com esses pacientes acaba relegando-os a meros objetos do tratamen-to.9 Por não terem voz ativa ou quem represente seus anseios e angústias é que se deve estabelecer maior contato com a pessoa em estado de coma, visando-se ao apoio familiar e da equipe ao inter-nado e em seus estímulos como fonte de reações

que podem ser altamente substanciais para seu tra-tamento e sua recuperação.3,10-12

Nos estados de coma, a audição parece ser o último sentido que é perdido e tal afirmação pode ser sus-tentada pelos relatos de pessoas que retornaram desse estado.3,9 Estudos feitos com pacientes em es-tado grave com diminuição do grau de consciência e com uso de imagens de ressonância magnética mostram que, mesmo nos casos de coma mantidos há mais tempo, há atividade cerebral em áreas de processamento cognitivo, emocional e de compre-ensão da linguagem.13,14 Desse modo, é relevante pensar que a forma como são realizados os procedi-mentos nesses enfermos e o cuidado com as infor-mações passadas ao seu redor podem ter influência em seu processo de cura e recuperação.9,15

O objetivo desta revisão é analisar publicações re-lacionadas às percepções de estímulos táteis e au-ditivos em pacientes em coma.

mÉTODO

Foi realizada revisão sistemática em periódicos nacionais e internacionais, indexados e espe-cializados na área da saúde, percorrendo-se os seguintes passos: 1) busca nas bases PubMed, SciELO e Cochrane, na revista Conciousness and Cognition e na página eletrônica do Coma Science Group, pela primeira autora e conferida pelo se-gundo autor (tabela 1); 2) seleção de treze es-tudos com enfoque na comunicação, verbal ou não verbal, sobre a percepção dos doentes aos estímulos utilizados e sua relação com seu estado geral, de acordo com os critérios: uso das pala-vras-chave comunicação, coma, percepção e uso de níveis de consciência e estímulos; ter enfoque na resposta dos pacientes em estado de coma aos estímulos testados. Novamente, a primeira sele-ção foi realizada pela primeira autora e validada pelo segundo autor (tabela 2).

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Fernanda Godoy Falcão e col. • Percepção a estímulos no coma

Tabela 1. Bancos de dados consultados, critérios de busca e total de artigos selecionados

CRITÉRIOS DA BuSCA INICIAlNúmERO

TOTAlSElEÇÃO POR

TíTulOSSElEÇÃO POR

RESumOSARTIGOS

INTEGRAISARTIGOS

SElECIONADOS

PubMedBusca em agosto e setembro de 2010: 1) coma e percepção; 2) coma e comunicação; 3) coma. Últimos cinco anos. Idiomas: português, inglês, espanhol, francês e italiano.

504 21 12 5 2

SciELO/LilacsBusca em agosto e setembro de 2010: coma – sem restrição de data e idiomas (português, in-glês, espanhol, francês e italiano).

232 9 5 3 3

CochraneBusca em outubro de 2010:1) Coma e percepção 11 1 1 1 1*2) Coma e comunicação 39 1 13) Coma 1.293 1 1 1Sem restrição de data e de idiomas (português, inglês, espanhol, francês e italiano).Conciousness and CognitionBusca em novembro de 2010Volume 19 – 2 edições 3 0 0 0 0Volume 18 – 4 edições 0 0 0 0 0Coma Science GroupBusca em novembro de 2010Todos os artigos disponíveis no site do grupo.

63 19 19 19 7

*Este artigo foi da base PubMed e havia sido escolhido pela pesquisa nessa base e, então, foi desconsiderado

Tabela 2. Artigos selecionados

1Lombardi F, et al. Estimulación sensorial para individuos con lesión cerebral en coma o estado vegetativo (Revisión Cochrane traducida). En: La Biblioteca Cochrane Plus, 2008 Número 4. Oxford: Update Software Ltd. Disponível em: http://www.update-software.com. (Traducida de The Cochrane Library, 2008 Issue 3. Chichester, UK: John Wiley & Sons, Ltd.).

2Daltrozzo J, et al. Emotional electrodermal response in coma and other low-responsive patients. Neurosci Lett. 2010;475:44-7.

3 Karma D, et al. Effect of stimulation in coma. Indian Pediatr. 2006;43:856-60.

4Eickhoff SB, et al. fMRI reveals cognitive and emotional processing in a long-term comatose patient. Exp Neurol. 2008;214:240-6.

5Puggina ACG, et al. A percepção auditiva nos pacientes em estado de coma: uma revisão bibliográfica. Acta Paul Enferm. 2005;18:313-9.

6 Puggina ACG, et al. Sinais vitais e expressão facial de pacientes em estado de coma. Rev Bras Enferm. 2009;62:435-41.7 Laureys S, et al. Brain function in coma, vegetative state and related disorders. Lancet Neurol. 2004;3:537-46.

8Demertzi A, et al. Coma, persistent vegetative states and diminished consciousness. Encyclopedia of Consciousness. 2009;1:147-56.

9Demertzi A, et al. Is there anybody in there? Detecting awareness in disorders of consciousness. Expert Rev Neurother. 2008;8:1719-30.

10Qin P, et al. Mismatch negativity to the patient’s own name in chronic disorders of consciousness. Neurosci Lett. 2008; 448 :24-8.

11 Schnakers C, et al. Pain assessment and management in disorders of consciousness. Curr Opin Neurol. 2007;20:620-6.

12Laureys S, et al. Residual cognitive function in comatose, vegetative and minimally conscious states. Curr Opin Neurol. 2005;18:726-33.

13Boly M, et al. When thoughts become action: an fMRI paradigm to study volitional brain activity in non-communicative brain injured patients. Neuroimage. 2007;36:979-92.

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ARTIGO DE REVISÃO

RESulTADOS

Com base na análise dos artigos selecionados foi feita categorização por ano, país de origem, tipo da publicação, local de publicação, amostra utilizada, estímulos usados e forma de avaliação dos estímulos, como se pode observar na tabela 3.

Tabela 3. Categorias, dimensões e frequência dos artigos analisadosCATEGORIAS DImENSõES FREquêNCIA

Ano de publicação

2004200520062007200820092010

1212421

País de origemAlemanha, França, Itália e Índia

BrasilBélgica*

127

Tipo de publicação

Revisão de literaturaEnsaio clínicoRelato de caso

751

Local de publicação

Neuroscience Letters 2

Current Opinion in Neurology 2

Biblioteca Cochrane Plus 1Indian Pediatrics 1

Experimental Neurology 1Acta Paulista de Enfermagem 1

Revista Brasileira de Enfermagem 1

Lancet Neurology 1

Encyclopedia of Consciousness 1

Expert Review of Neurotherapeutics 1

NeuroImage 1

Amostra utilizada

Revisão conceitual5 (conceitos relacionados à distúrbios da consciência e suas manifes-tações)

Revisão de ensaios clínicos 2 (avaliaram-se três e dez ensaios clínicos respectivamente)Relato de caso 1Estudo-modelo 1

Estudo caso-controle

Uma criança em coma por causa não traumática, trinta em cada grupo (controle e experimental).Três com adultos:I. Vinte adultos saudáveis e treze em coma, não equiparáveis em idadeII. Trinta adultos em coma, quinze em cada grupo (controle e experi-mental), controlado, randomizado e unicego para pesquisador.III. 24 adultos em coma, doze em cada grupo, equiparáveis em idade)

Estímulos utilizados

Estudos clínicos

1 (atividade eletrodérmica;1 potencial evocado)2 (estímulos sensoriais diversos)2 estímulos auditivos (exclusivo)

Relato de caso 1 (auditivos, táteis e visuais)

Forma de avaliação dos estímulos

Estudos clínicos e relato de caso

1 (gráfico atividade eletrodérmica)1 (medida do potencial evocado)1 (escala de coma de Glasgow)1 (sinais vitais – pulso, temperatura axilar, pressão arterial, saturação de oxigênio, frequência respiratória – e expressão facial)2 (ressonância magnética funcional)

* A Bélgica foi o país com mais publicações encontradas, mas o Coma Science Group (CSG), que forneceu sete (dois foram feitos em parceria com os Estados Unidos, um com a China e outro com o Reino Unido) dos treze artigos analisados, tem sua atuação na Universidade de Liège.

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Fernanda Godoy Falcão e col. • Percepção a estímulos no coma

DISCuSSÃO

O ano com mais publicações foi 2008 (quatro no to-tal) no período de 2000 a 2010, e o país com mais publicações foi a Bélgica. Porém, o Coma Science Group, um grupo belga, forneceu a maior parte dos artigos, o que pode constituir viés.

Os tipos de publicação foram sete revisões, cinco es-tudos clínicos e um relato de caso. Acredita-se que há mais revisões sobre o tema do que estudos clíni-cos devido à dificuldade em realizar pesquisas com sujeitos em coma por seus aspectos éticos, como dor infringida e consentimento livre e esclarecido.

As revistas em que os artigos foram publicados foram variadas, não houve enfoque em uma área específi-ca. As revisões versaram sobre conceitos relaciona-dos a distúrbios da consciência e suas manifestações (total de cinco). Em duas delas, avaliaram-se três e dez ensaios clínicos respectivamente, os quais foram considerados de baixa qualidade, com número bai-xo de sujeitos, e concluiu-se serem necessários mais estudos clínicos, randomizados, multicêntricos, com mais sujeitos. Dos quatro ensaios clínicos avaliados, três apresentaram número baixo de sujeitos e dois tinham os grupos de controle e experimental não equiparáveis. Só houve um estudo controlado, ran-domizado e unicego para o pesquisador.

Quanto a estímulos utilizados, forma de avalia-ção e principais resultados, observou-se que, nos três estudos que visaram a avaliar percepção dos enfermos em coma sobre o meio externo e sobre si mesmos, foi encontrada percepção positiva, fi-siológica e emocional aos estímulos. Dessa forma, foram identificadas: 1) atividade eletrodérmica – parcialmente preservados os sistema cognitivo e autonômico e a rede de processos semânticos; 2) mudanças em sinais vitais e expressão facial – encontraram-se alterações estatisticamente sig-nificativas nas variáveis: saturação de oxigênio, frequência respiratória e expressão facial; a men-sagem de membros familiares produziu mais efei-tos que a música; 3) resposta cortical aos estímu-los auditivos, visuais e táteis verificada por meio de ressonância magnética – os pesquisadores consideraram que os dados de ativação cerebral

presentes dão evidência de processamento cogni-tivo e emocional da fala na paciente, fatores não revelados em investigações convencionais ou em exames clínicos.

Nos dois estudos que visaram a avaliar mudan-ças no prognóstico baseadas em estímulos senso-riais, foram identificados os seguintes resultados: 1) crianças com estímulos multissensoriais feitos várias vezes por dia tiveram seu período de coma diminuído ou tiveram nota na escala de coma de Glasgow aumentada em relação ao grupo-controle; além disso, quanto mais cedo se iniciaram os estí-mulos, melhor foi o prognóstico; 2) pacientes com resposta ao potencial evocado apresentaram me-lhor prognóstico.

Uma contradição importante foi identificada na literatura investigada. Nos artigos de revisão, há definições de coma bem específicas, como estado em que a pessoa não tem consciência de si mesma e do ambiente em que se encontra. Todos os es-tudos clínicos avaliados mostraram haver, porém, percepção do meio e de si mesmos por parte dos pacientes em coma. Diante desse fato, temos duas possibilidades interpretativas: ou os pacientes ava-liados estavam erroneamente classificados como comatosos ou estamos chegando a uma fronteira do conhecimento que coloca em xeque a definição de coma e da palavra consciência.

Outro ponto importante é que os três estudos – aqueles que avaliaram modelos preditivos de prognóstico e o estudo clínico que demonstrou o grupo experimental com estímulos sensoriais ter retomada de consciência mais rápida que o grupo--controle – entram não só no âmbito do cuidado, mas também no financeiro. Pacientes que se recu-peram mais rapidamente do estado de coma ficam menos tempo dependentes de medicamentos e ma-teriais, que são caros.

Dessa forma, pesquisas nessas áreas devem ser es-timuladas, pensando-se no aspecto financeiro, já que, se for comprovado que os estímulos sensoriais auxiliam na retomada de consciência, essa prática poderá ser usada no intuito não só de tratamen-to, mas também de redução de gastos durante a

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ARTIGO DE REVISÃO

internação. Para isso, é necessário que se estabe-leçam, em futuros estudos, a quantidade de estí-mulos a ser administrada, bem como sua duração.

Questões levantadas nos artigos mostram proble-mas éticos em relação ao consentimento, pois as pesquisas são executadas com enfermos que não podem consentir. Por outro lado, não podemos deixar de pesquisar esse tema, justamente para cuidarmos melhor dos pacientes. Outro aspecto ético a ser considerado é a dor infringida. A maior parte das escalas de medida de consciência trazem a avaliação de dor por meio de estímulo doloroso e esse fato não deve ser ignorado: causa-se dor a esses pacientes, que pode estar sendo sentida mes-mo sem conseguir ser demonstrada. Schnakers e Zasler16 relatam que as escalas de comportamento podem ser usadas para acessar esse dado, mas no futuro deveremos ter escalas especificas para essa população de indivíduos. Com todos esses estudos que surgem no intuito de demonstrar a percepção desses pacientes e de fazer com que seu cuidado seja o melhor possível, não se deve excluir a discus-são sobre o uso do estímulo doloroso.

CONCluSõES

O papel fundamental da ciência consiste na investi-gação dos mais diversos fenômenos. Por isso, pesso-as em coma capazes de reagir a diferentes estímulos sensoriais devem ser investigadas antes de simples-mente negar-se a possibilidade de essa percepção existir. Para isso são necessários mais estudos clí-nicos randomizados, multicêntricos, com amostra significativa, para avaliar essa suposta percepção.

É fundamental o cuidado de classificar os pacientes em estado de coma ou não para que não se cometam erros de diagnóstico, levando sofrimento desnecessá-rio ao doente e à sua família. A resposta aos diferentes estímulos pode ser um fator que auxilia na recupera-ção do estado de coma, diminuindo o tempo de per-manência hospitalar e consequentemente os custos.

Não se pode, porém, ignorar os aspectos éticos desse cuidado e das pesquisas. Assim, deve-se considerar

a necessidade de tratar esses doentes como se es-tivessem conscientes de si mesmos e do ambiente ao seu redor, procurando explicar procedimentos, evitar a indução de estímulos dolorosos e buscar o maior conforto possível numa unidade de tratamen-to específica para o caso. Por isso, é fundamental que haja mais trabalhos sobre este tema de fronteira, vi-sando a alargar o campo de visão da Ciência e huma-nizar progressivamente o cuidado em saúde.

Agradecimento. Ao Pibic/CNPq pelo financiamento desta revisão.

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artigo especial

Hipotensão pós-exercício: considerações sobre intensidade, duração e método do exercício aeróbico

resUMo

Introdução. A ocorrência da redução da pressão arterial no período de recuperação após o exercício dinâmico está bem demonstrada, embora ocorram algumas divergências quanto a sua magnitude e duração. Algumas variáveis estão relacionadas à modulação do efeito hipotensor, como a intensi-dade, a duração da sessão e o tipo do exercício.

Objetivo. Analisar a resposta aguda da pressão ar-terial pós-exercício aeróbico, o que ajuda a definir qual tipo de atividade poderia estar associado a maior magnitude e duração do efeito hipotensivo sem maiores riscos de ocorrência cardíaca.

Resultados. Os dados, embora contraditórios, em relação a intensidade e duração, indicaram que os exercícios de intensidade moderada e com dura-ção de quinze a sessenta minutos podem acarretar maior hipotensão pós-exercício. Estudos mostra-ram que os exercícios realizados de forma inter-mitente e que utilizaram maior massa muscular provocaram maior hipotensão pós-exercício que aqueles executados de forma contínua. Além disso, a hipotensão pós-exercício mostrou-se maior em hipertensos quando comparados a normotensos.

Conclusão. Embora a eficácia do exercício físico aeróbico como anti-hipertensivo esteja se tor-nando mais clara, devem ser realizados estudos com uso de diferentes variações de intensidades estudadas a fim de analisar e comparar seus efei-tos hipotensores e suas aplicações clínicas na pre-venção e no tratamento não medicamentoso da hipertensão arterial.

Palavras-chave. Exercício aeróbico; pressão arte-rial; hipotensão; intensidade; tipo de exercício.

Katheryne Kelly costa e souza acerbi – educador físico, especialista em Personal Trainer, Instituto Passo 1, Uberlândia-MG, Brasil

alexandre gonçalves – educador físico, doutorando em Ciências da Saúde, Universidade Presidente Antônio Carlos, Araguari-MG, Faculdade Atenas, Paracatu-MG

Vickele sobreira – educadora física, especialista em Educação Física e Deficiência, Universidade Presidente Antônio Carlos, Uberlândia-MG.

roberto Furlanetto Júnior – educador físico, especialista em Fisiologia do Exercício Avançada, Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba-MG

correspondência. Alexandre Gonçalves. Rua Izaú Rangel de Mendoça, n.º 718, Progresso, CEP 38408-136, Uberlândia-MG. Telefones: 34 9232-2613 e 34-3219-0365.

internet: [email protected]

Recebido em 1-11-2011. Aceito em 12-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

Katheryne Kelly costa e souza acerbi, alexandre gonçalves, Vickele sobreira e roberto Furlanetto Júnior

ABSTRACT

Hypotension after exercising: considerations on in-tensity, duration and type of aerobic exercise

Introduction. Blood pressure drop in the recovery pe-riod after dynamic exercising is well demonstrated, but there is some disagreement about its intensity and dura-tion. Some variables are related to the modulation of the hypotensive effect, such as intensity, session duration and type of exercise.

Objective. The aim of this study was to evaluate the acute response of blood pressure after aerobic exercising.

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artigo especial

This helps to define which type of activity could be as-sociated with greater intensity and duration of the hypo-tensive effect without cardiovascular risks.

Results. The data, though contradictory regarding in-tensity and duration, indicated that moderate exercise intensity lasting from fifteen to sixty minutes may lead to higher post-exercise hypotension. Studies have shown that exercises done intermittently and requiring greater muscle mass lead to higher post-exercise hypotension than those done continuously. Furthermore, post-exer-cise hypotension was greater in hypertensive individuals as compared to normotensive ones.

Conclusion. Although the efficacy of aerobic exercises to fight hypertension is becoming clearer, further studies should be conducted investigating different variations of exercise intensity to analyze and compare their hypoten-sive effects and their clinical applications in the preven-tion and non-pharmacological treatment of hypertension.

Key words. Aerobic exercise; blood pressure; hypoten-sion; intensity; type of exercise

iNtroDUÇÃo

No Brasil, as doenças cardiovasculares são res-ponsáveis pelo maior número de hospitalização no setor público. Consistem na primeira causa de aposentadoria por doença e apresentam as maiores taxas de mortalidade entre idosos.1 A hipertensão arterial sistêmica afeta cerca de 25% da população mundial, com previsão de aumento de 60% dos ca-sos em 2025.2

As pessoas que não praticam atividade física arcam com o dobro de probabilidade de sofrerem infarto do miocárdio do que pessoas fisicamente ativas.3 Por isso, a população brasileira está envelhecen-do e ao mesmo tempo se tornando mais ativa ao chegar à terceira idade. Sabendo que o sedentaris-mo aumenta a incidência da hipertensão arterial, a atividade física é um importante meio de preven-ção e promoção da saúde dos idosos.4 Segundo a Organização Mundial da Saúde, a atividade física é a principal recomendação para melhorar a qualida-de de vida na terceira idade.5

A redução dos valores pressóricos, mesmo em sujeitos normotensos, é um importante fator para minimizar o risco de doenças cardíacas, e a prática regular de exercícios físicos tem sido amplamente empregada no tratamento não medicamentoso da hipertensão arterial.6,7 Pesquisas demonstram que, após a realiza-ção de uma única sessão de exercício aeróbico agudo, pode-se observar hipotensão arterial pós-exercício, permanecendo seus níveis abaixo dos valores obser-vados no período de repouso pré-exercício.8-10

A frequência cardíaca e a pressão arterial sistólica, durante a realização do exercício físico dinâmico, aumentam de forma linear de acordo com a intensi-dade do esforço, e a pressão arterial diastólica pode permanecer inalterada, aumentar ou até mesmo cair ligeiramente.11,12 Estudos mostraram que o exercício dinâmico apresenta efeito hipotensor maior em in-divíduos hipertensos do que em normotensos.6,9 Tal fato mostra a maior sensibilidade do hipertenso às alterações da pressão arterial pós-esforço.

Há ainda muita discussão quanto aos mecanismos envolvidos no comportamento da pressão arterial no período de recuperação do exercício, podendo estar relacionados à redução do débito cardíaco e da resistência vascular periférica, à modificação do controle barorreflexo e à diminuição da responsi-vidade alfa-adrenérgica, além de substâncias hu-morais e hormonais que podem levar à manuten-ção da vasodilatação periférica pós-exercício.9,11,13

A hipotensão arterial pós-exercício tem sido obser-vada após a realização de variados tipos de exercí-cios aeróbios como caminhada, corrida e cicloer-gômetro. Estudos sobre magnitude e duração desse efeito hipotensivo mostraram que aspectos ineren-tes ao exercício como a intensidade, a duração e o tipo de exercício realizado e os valores iniciais da pressão arterial pré-exercício podem influenciar a resposta pressórica durante o período de recupera-ção pós-exercício.6,9,11

Por isso, a importância da monitorização e o con-trole das respostas agudas cardiovasculares vão além da prescrição de cargas adequadas para ob-tenção dos efeitos desejados. Trata-se de providên-cia fundamental na conduta segura das atividades

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propostas, quando se dispõe a trabalhar com indi-víduos cujas condições clínicas permitem pensar em risco cardiovascular aumentado.

Sendo assim, o objetivo desse estudo é analisar a resposta aguda da pressão arterial pós-exercício aeróbico, ajudando a definir qual tipo de atividade poderia estar associado à maior magnitude e du-ração do efeito hipotensivo sem maiores riscos de ocorrência cardíaca.

Efeito agudo do exercício aeróbico sobre a pressão arterial

A redução da pressão arterial pós-exercício físico está bem estabelecida, principalmente no período de re-cuperação após exercício aeróbico, revelando-se que existe uma relação inversa entre prática de exercícios e níveis pressóricos.14

A hipotensão arterial pós-exercício apresenta dois tipos de resposta fisiológica. A resposta aguda, que acontece em associação direta ao exercício, pode ser observada por meio de aferição da pressão arterial e da frequência cardíaca, durante ou imediatamente depois do término do exercício físico, bem como ao longo das primeiras 24 ou 48 horas que se seguem à sessão de exercício. Por outro lado, a resposta crô-nica resulta do cumulativo das respostas agudas.15,16

Indivíduos com hipertensão arterial sistêmica quando submetidos a treinamento físico apresen-tam reduções significativas tanto da pressão arte-rial sistólica como da pressão arterial diastólica em repouso. A hipotensão arterial pós-exercício nes-ses indivíduos tem sido observada por várias horas após sessão aguda de exercício aeróbico com du-ração de trinta a sessenta minutos, executados em intensidades moderadas situadas em 50% até 60% do volume máximo de oxigênio (VO2 máx). Porém, tem sido sugerido que o exercício realizado duran-te trinta minutos, numa intensidade moderada e com volume mais baixo, pode facilmente produzir hipotensão arterial pós-exercício em indivíduos hi-pertensos, mas não em normotensos.17

Entretanto, há necessidade de mais estudos em que se discuta a ocorrência da hipotensão arterial

pós-exercício em indivíduos hipertensos e normo-tensos, considerando-se os fatores intensidade, du-ração e tipo de exercício.

Influência da intensidade do exercício aeróbico sobre a pressão arterial

Os resultados de estudos sobre a magnitude e du-ração da hipotensão arterial pós-exercício em fun-ção da intensidade são conflitantes. Investigação recente verificou diferenças significativas na mag-nitude da hipotensão arterial pós-exercício entre a prática de exercício intenso e moderado. Foi obser-vado que o exercício aeróbico de intensidade eleva-da é capaz de produzir maior magnitude e duração da hipotensão arterial pós-exercício. Porém, não é seguro prescrever o exercício aeróbico em intensi-dades elevadas para sujeitos hipertensos, já que a manutenção da elevação da pressão arterial nessa circunstância torna-se um risco cardiovascular.18

Estudo realizado com normotensos comparou os efeitos das intensidades de 50% e 75% do VO2 máx sobre a magnitude da hipotensão arterial pós--exercício realizado durante trinta minutos em cicloergômetro. Ocorreu hipotensão arterial pós--exercício por uma hora, em relação às variáveis pré-exercício – pressão arterial sistólica, pressão arterial diastólica e pressão arterial média –, não sendo observada diferença significativa entre as intensidades do VO2 máx.19

Em outro experimento, mulheres e homens idosos com hipertensão arterial foram submetidos a 45 minutos de exercício em esteira ergométrica, com intensidade de 50% a 70% do consumo máximo de oxigênio. Observou-se redução da pressão arterial sistólica por uma a três horas após o exercício.20

Demonstrou-se, também, que a mesma intensi-dade do exercício aeróbico é capaz de sustentar o efeito hipotensivo pós-exercício por até oito horas, similarmente, em mulheres normotensas e hipertensas limítrofes. 21

Em estudo realizado em seis indivíduos do sexo masculino com hipertensão arterial essencial leve foi observada hipotensão arterial pós-exercício por

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artigo especial

aproximadamente treze horas após exercício dinâ-mico com intensidade em 40% e 70% de VO2 máx.22

Foi também demonstrado em estudo com quinze mulheres e cinco homens com idade de 60 a 80 anos, que sessão unida de exercício dinâmico em forma de caminhada, numa intensidade de 50% a 75% da frequência cardíaca de reserva, reduziu em pouco mais de 20 mmHg os níveis de pressão ar-terial sistólica no período de recuperação por até trinta minutos.6

Em conclusão, não há consenso quanto à intensida-de do exercício aeróbico sobre a magnitude e dura-ção da hipotensão arterial pós-exercício.

Influência da duração do exercício aeróbico sobre a pressão arterial

O tempo de execução do exercício interfere na mag-nitude das respostas que regulam e determinam a pressão arterial. Alguns autores evidenciaram maior redução da pressão arterial e maior duração dessa mudança, quando se comparou uma sessão de exer-cício dinâmico com duração de 45 minutos com outra sessão de 25 minutos em cicloergômetro, a 50% do consumo máximo de oxigênio. Observaram maior queda pressórica, mais acentuada e mais du-radoura, após sessão de 45 minutos.23

Em amostra de 207 indivíduos hipertensos acom-panhados por oito semanas e separados em grupos de acordo com a duração e a frequência por sema-na de exercício – 30 a 60, 61 a 90, 91 a 120 e acima de 120 minutos por semana –, foi observado que a magnitude de redução na pressão arterial sistólica foi maior no grupo de 60 a 90 minutos por semana, comparada ao grupo de menor duração (30 a 60 mi-nutos por semana). Não houve redução maior com o aumento da quantidade de exercício.24

Dois estudos foram realizados com uso de um cicloergômetro a 70% do VO2 máx, para obser-var o efeito da duração da hipotensão arterial pós-exercício em normotensos e hipertensos. O primeiro estudo foi executado em normotensos em três sessões com duração de 15, 30 e 45 minu-tos, e ocorreu hipotensão arterial pós-exercício

na pressão arterial sistólica por uma hora nas três sessões e maior decréscimo aos 45 minutos. Entretanto, ocorreu maior diminuição na pres-são arterial diastólica entre 30 e 45 minutos. No segundo estudo, realizado com hipertensos li-mítrofes em duas sessões – 10 e 30 minutos –, ocorreu hipotensão arterial pós-exercício na pressão arterial sistólica por uma hora, com a maior queda aos quinze minutos, na pressão ar-terial diastólica até 45 minutos. Concluiu-se que o exercício com duração de dez minutos provoca hipotensão arterial pós-exercício. Contudo, não ocorreu diferença significativa entre as intensi-dades na resposta da magnitude da hipotensão arterial pós-exercício.25

Foi observada reduções de pressão arterial, de maior magnitude e duração, após exercícios de curta e longa duração, de vinte a noventa mi-nutos.6 Outros demonstraram que uma sessão de exercícios com maior duração potencializa tan-to a magnitude quanto a duração da hipotensão arterial pós-exercício. Porém, não ficou claro se essa potencialização é equivalente para normo-tensos e hipertensos.18

Dados recentes mostram que a relação intensidade versus duração parece ser mais determinante na hipotensão arterial pós-exercício de normotensos do que a ação isolada de tais variáveis. Assim, uma sessão de exercício com menor intensidade e lon-ga duração poderia ocasionar os mesmos resulta-dos de hipotensão arterial pós-exercício que uma sessão de alta intensidade e curta duração. Seria interessante usar essa relação como parâmetro de segurança e controle das respostas agudas cardio-vasculares em sujeitos hipertensos, os quais devem treinar com intensidade controlada.18

Influência do tipo do exercício aeróbico sobre a pressão arterial

O tipo de exercício também influencia na respos-ta hipotensora. Os exercícios físicos que envolvem grandes grupamentos musculares podem causar maior hipotensão arterial pós-exercício. Além disso, a forma de execução da atividade também pode interferir no comportamento da hipotensão

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arterial pós-exercício.18 Foi observado maior efei-to hipotensor 24 horas após exercício intervalado comparado com o exercício contínuo.26

Verificou-se que, em sujeitos que simularam ati-vidades da vida diária, o efeito da hipotensão ar-terial pós-exercício persistiu durante os setenta minutos em que permaneceram em observação durante o período em que realizaram tais ativi-dades.27 As atividades diárias incluíram trinta mi-nutos em repouso, cinco minutos sentados, cinco minutos em pé (parados), dez minutos caminhan-do em esteira ergométrica a 4,8 km/h, quinze mi-nutos sentados, dez minutos em cicloergômetro com uma carga de 100 watts (aproximadamente a 70% do VO2 máx), cinco minutos caminhado em esteira ergométrica a 4,8 km/h, cinco minutos sentados, cinco minutos caminhando com peso de 5,7 kg e dez minutos sentados. Observou-se ainda uma redução pós-exercício da pressão arterial sis-tólica de 12 a 17 mmHg, da pressão arterial dias-tólica de aproximadamente 5 mmHg e da pressão arterial média de 5 a 8 mmHg, comparada com os valores basais.

Em outro estudo, com indivíduos hipertensos, foi analisada a hipotensão arterial pós-exercício ae-róbico após 45 minutos de exercícios realizados com alternância de intensidades (dois minutos a 55% da frequência cardíaca reserva e um minuto a 74% da frequência cardíaca de reserva) e com intensidade constante (65% da frequência cardí-aca de reserva). A hipotensão arterial pós-exer-cício ocorreu em ambas as sessões para a pressão arterial sistólica. Contudo, para a pressão arte-rial diastólica, ocorreu hipotensão arterial pós--exercício apenas após exercício de intensidade constante.28 Tal fato pode ser explicado uma vez que a pressão arterial diastólica tem relação di-reta com a resistência periférica total. Assim, no exercício contínuo, os vasos permanecem dilata-dos por períodos mais prolongados, o que, pro-vavelmente, ocasionou tal resposta.

Com base nessas informações, pode-se supor que os exercícios realizados de forma intermitente e que utilizam maior massa muscular podem acarretar maior hipotensão arterial pós-exercício.18

coNclUsÕes

A eficácia do exercício físico aeróbico como anti--hipertensivo está se tornando mais clara, embora a literatura ainda apresente algumas divergências quanto aos seus mecanismos fisiológicos e a influ-ência da intensidade, duração e tipo de exercício.

Na maioria dos estudos, verificou-se maior tempo e magnitude da resposta hipotensora pós-exercício em indivíduos hipertenso em relação aos normo-tensos. Contudo, essa redução da pressão arterial deve ser analisada, considerando-se a existência de falhas metodológicas, sobretudo ausência de grupos-controle.

Em vista da divergência dos dados disponíveis na literatura quanto a seus efeitos, estudos adicionais devem ser realizados com uso de diferentes varia-ções de intensidades estudadas, a fim de analisar e comparar seus efeitos hipotensores e suas apli-cações clínicas na prevenção e no tratamento não medicamentoso da hipertensão arterial.

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EDUCAÇÃO MÉDICA

Clube de revista como estratégia de aprendizado na residência médica

RESUMO

O clube de revista surgiu como estratagema de aprendizado na pós-graduação médica. Duas abor-dagens adotadas por estudantes para o aprendi-zado têm sido apontadas – o ensino profundo e o superficial. No ensino profundo, há motivação por interesse. No ensino superficial, a busca é motivada por medo ou insucesso. A residência médica compõe parte extremamente prática da formação médica. A educação na residência médica, ainda está pautada pela capacidade da influência do conhecimento dos preceptores e suas habilidades interligadas ao cogni-tivismo. O clube de revistas tornou-se, ultimamente, uma opção interessante de aprendizado na residên-cia médica, por promover interação e comunicação entre os profissionais e atualização de práticas coti-dianas, o que facilita o surgimento de novas ideias e introduz pontos de vista alternativos. A reflexão é um processo metacognitivo que cria maior entendi-mento do aprendiz em sua inserção nas situações de aprendizagem. O clube de revista utiliza o conceito da reflexão, uma das mais indicadas estratégias para promover o ensino ativo e profundo, devendo ser obrigatória sua inclusão na residência médica. O ob-jetivo deste artigo é analisar o clube de revista como estratégia de ensino profundo na residência médica.

Palavras-chave. Aprendizado; clube de revista; edu-cação médica; pós-graduação; residência médica.

ABSTRACT

Journal club as a learning strategy in medical residency

Journal clubs have emerged as a learning strategy in post-graduate medical education. Two learning approaches ad-opted by students have been pointed out: deep and superfi-cial learning. In deep learning, there is motivation based on interest. In superficial learning, students are motivated by

Luciana Paganini Piazzolla – médica, especialista em Geriatria, Centro de Medicina do Idoso, Hospital Universitário de Brasília e Universidade Católica de Brasília, Brasília-DF, Brasil

Francisca Magalhães Scoralick – médica, especialista em Geriatria, Hospital Regional da Asa Norte, Brasília-DF, Brasil

João Batista de Sousa – médico, professor, área de Clínica Cirúrgica, Faculdade de Medicina, Universidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil

Correspondência: Luciana Paganini Piazzolla. SQN 108, blo-co J, ap. 601, CEP 70744-100, Brasília-DF, Brasil. Telefone: 61 32740146.

Internet: [email protected]

Recebido em 29-10-2011. Aceito em 3-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

Luciana Paganini Piazzolla, Francisca Magalhães Scoralick e João Batista de Sousa

fear or failure. Medical residency is an extremely practical part of the medical training. Medical residency is still de-pendent on preceptors’ capacity to influence students with their knowledge and skills in association with cognitivism. In recent years, Journal clubs have become an interesting option for learning in medical residency, since it promotes interaction and communication among professionals and helps them remain informed about current practices, which facilitates the emergence of new ideas and alternative view-points. Reflection is a metacognitive process that promotes greater understanding on the learners’ part when included in learning situations. Journal clubs use the concept of re-flection, one of the most appropriate strategies to promote deep and active learning. It should be mandatory in medical residency. The aim of this paper is to analyze journal clubs as a deep learning/teaching strategy in residency.

Key words. Learning; journal club; medical education; post-graduation; medical residency.

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EDUCAÇÃO MÉDICA

INTRODUÇÃO

Recentes estudos refletem a necessidade de ensino e prática da medicina baseada em evidências com avaliação crítica de artigos. O clube de revista sur-giu como um dos estratagemas de aprendizado na pós-graduação médica para abordagem da valida-ção da informação dos estudos científicos.1

A educação médica tem se modificado nos últimos anos, principalmente pela influência das escolas norte-americanas, que introduziram uma mudan-ça curricular e a implantação do ensino voltada para a comunidade.2 A aprendizagem é proces-so complexo e envolve vários fatores externos, como ambiente físico, cultura institucional, exi-gências da avaliação entre outros, e fatores in-ternos, como motivação pessoal, orientação no processo da aprendizagem, concepção individual do conhecimento.3

Duas abordagens adotadas por estudantes têm si-do identificadas por pesquisadores como ensino profundo e ensino superficial. No ensino profun-do, ocorre a busca do significado do que deseja ser aprendido, havendo motivação por interesse. O material da aprendizagem guarda relação com o saber prévio relacionado ao assunto e está associado à reflexão do aprendizado. No ensi-no superficial, a busca é motivada por medo ou insucesso.4 Há, como tendência central, a me-morização, com dificuldade em relacioná-la ao conhecimento prévio.5

A residência médica compõe uma parte extrema-mente prática da formação médica, sendo realizada em hospitais, ambulatórios e comunidades. Cada vez mais os residentes permanecem no local de trabalho, o que sugere perspectivas educacionais e moderni-zação da educação já na graduação, sendo traduzida por prática clínica voltada mais para o dia a dia. Não há teoria que explique o processo de trabalho pro-fissional e de aprendizado e que resulte em proces-so eficiente na formação de um médico especialista. A educação na residência médica ainda está pautada pela capacidade da influência do conhecimento dos preceptores e de suas habilidades, em que o apren-dizado é mais ligado ao realismo, ao cognitivismo.6

O clube de revistas tornou-se, nos últimos anos, uma opção interessante de aprendizado, na residência mé-dica, por promover interação e comunicação entre os profissionais e atualização de práticas cotidianas, faci-litar o surgimento de novas ideias e introduzir pontos de vista alternativos. Isso se reflete em mudança de comportamento dos aprendizes, melhorando o cuida-do com o paciente, aplicando novos conceitos e parti-cipando mais ativamente dos projetos de pesquisa do departamento do qual o estudante faz parte.7

O objetivo deste artigo é analisar o clube de re-vista como estratégia de ensino profundo na resi-dência médica.

ESTRATÉGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM

O conceito de aprendizagem refere-se à aquisição de conhecimentos ou ao desenvolvimento de habi-lidades e atitudes como resultados de experiências educativas, como aulas, leituras, pesquisas e ou-tras. Há aspectos comuns à maioria das abordagens modernas acerca do problema e, dentre eles, estão diferenças individuais, motivação, concentração, reação, realimentação ou feedback, memorização, retenção e transferência. As estratégias de ensi-no devem contemplar esses aspectos. São várias as opções e algumas delas envolvem – estabeleci-mento da motivação por bom relacionamento com o aprendiz; estímulo a perguntas, cuja curiosidade pelas respostas deve ser despertada; manutenção da atenção por meio de prática aplicada aos temas estudados, de recursos audiovisuais e de participa-ção; favorecimento de discussões para aplicação dos conhecimentos e estudo de casos. Outras bem conhecidas são as aulas expositivas, muito contro-versas por ficar centradas no professor, o que nem sempre reflete em aprendizado profundo. A ava-liação está intimamente vinculada ao processo de aprendizagem, visto que não se pode educar sem considerar algum tipo de avaliação.8

A discussão tem sido recomendada como uma das mais importantes estratégias de ensino, pois fa-vorece a reflexão acerca de conhecimentos ob-tidos mediante leitura ou exposição; desenvolve novos conhecimentos mediante a utilização de

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Luciana Paganini Piazzolla e cols. • Clube de revista na residência médica

conhecimentos e experiências anteriores; favorece o enfoque sob diversos pontos de vista, conscienti-zação e críticas a respeito da informação fornecida.9

A reflexão é processo metacognitivo que cria maior entendimento do aprendiz quando inserida nas si-tuações de aprendizagem. O aprendizado passa a ser autorregulado e continuado ao longo da vida, quan-do há reflexão. Há várias abordagens educacionais que aplicam a reflexão na graduação, pós-graduação e educação médica continuada. Exemplos dessas abordagens são os clubes de revista. Inseridos im-plicitamente no conceito da reflexão, existem outros aspectos do aprendizado que devem ser contempla-dos, tais como o direcionamento dos objetivos por um tutor ou facilitador e a retroalimentação, com o objetivo de melhorar a reflexão.5

O CLUBE DE REVISTA

O clube de revista é uma forma de estudo para aprendizado desenvolvido em grupos de indivídu-os que se encontram para discutirem artigos de li-teratura médica. A primeira evidência formal dessa técnica data de 1875.10

No início, o objetivo dessa abordagem era atualiza-ção da literatura médica. Com a evolução ocorrida durante anos, houve aquisição do conhecimento clí-nico, bioestatístico e, principalmente, de habilidades críticas da interpretação e validação das evidências científicas fornecidas pelas informações obtidas. O clube de revista tornou-se o exemplo mais claro de discussão, como estratégia de aprendizagem. Muitas disciplinas de programas de residência utilizam essa estratégia na residência médica.11-13 O uso de clube de revista já foi sugerido como ferramenta para en-sinar e avaliar o ensino baseado em problemas den-tro da residência médica.10

A discussão na aplicabilidade do clube de revista gi-ra em torno do formato, da utilização de pequenos grupos, de pares, com a finalidade de envolver todo o grupo de estudantes. Para tal aprendizado, é necessá-rio motivar o aprendiz a preparar-se para o clube de revista. Além disso, preparar-se para a exposição por meio da vocalização na sala de aula tem-se mostrado

eficaz, independentemente da estratégia cognitiva usada. Muitas vezes, os estudantes não conseguem ter percepção de suas deficiências, o que fica mais claro na discussão dos artigos, em grupos ou em sistema de pares.1 A participação do clube de revista envolve au-tonomia do aprendiz. Em muitos modelos, o residente deve providenciar um pequeno lanche para o grupo antes de sua apresentação oral.11

Estudos sugerem que o clube de revista é eficien-te para o aprendizado e traz grande satisfação ao residente. Essa atividade é limitada, entretanto, e depende da aplicação da didática, bem como dos modelos de ensino. Isso pode ser otimizado, quan-do há aplicação da contextualização do problema, da participação ativa do aprendiz, do controle do tempo e da construção de feedback.11

O formato do clube de revista deve requerer planeja-mento prévio, local agradável e tempo predetermi-nado. Os artigos devem ser fornecidos previamente. O objetivo deve ser bem claro para incentivar o apri-moramento das habilidades do aprendiz na pesquisa literária em sua especialidade, o desenvolvimento de opinião crítica dos artigos científicos e a aplicação de evidências na prática clínica. A participação do coordenador da residência no clube de revista tem sido apontada, pelos residentes, como benéfica, em virtude de sua experiência acadêmica.14 Ao propiciar a assimilação da medicina baseada em evidências e do conhecimento clínico, o clube de revista propõe uma melhor condução do paciente, permitindo aos residentes aplicarem os conhecimentos adquiridos na prática clínica.15

A inclusão do clube de revista na grade curricular da residência médica, formalmente, poderia con-tribuir com melhor aprimoramento do conteúdo técnico, com a sistematização do pensamento clí-nico e com críticas sobre a medicina baseada em evidências, além de contribuir com a socialização entre residentes e coordenadores.

Esse artigo tem limitações, pois não aborda, den-tre os diversos formatos de clube de revista, qual o mais adequado para atingir o aprendizado profun-do, o que aponta para a necessidade de pesquisas intervencionistas nessa direção.

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EDUCAÇÃO MÉDICA

CONCLUSÃO

O clube de revista, na residência médica, pode pro-mover aprendizado mais eficaz, pois utiliza estraté-gias de ensino-aprendizado que envolve reflexão e discussão. Como os artigos científicos normalmen-te abordam temas pertinentes à prática clínica di-ária, há clara motivação e mais interesse por parte dos residentes. Além disso, o material apresentado guarda relação próxima ao saber prévio, o que, em todos esses aspectos, caracteriza a abordagem de ensino profundo e ativo. A reflexão sobre este ar-tigo sugere a inclusão do clube de revista na grade curricular da residência médica.

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prática médica

cirurgia segura: armadilhas na prática cirúrgica

paulo mendelssonh – médico, cirurgião geral, doutor, professor de Clínica Cirúrgica, Faculdade de Medicina, Universidade de Brasília (UnB), Brasília-DF, Brasil

correspondência. SQN 216, bloco C, ap. 311, Asa Norte, CEP 70875-030, Brasília-DF. Telefones: 61 32425252 e 61 92490200.

internet: [email protected]

Recebido em 3-3-2012. Aceito em 20-3-2012.

O autor declara não haver potencial conflito de interesses.

rESUmO

A mortalidade de pacientes em decorrência de er-ros cometidos por profissionais de saúde é muito elevada. Na área de Cirurgia, esse problema atinge proporções que, segundo a Organização Mundial da Saúde, são inaceitáveis. No presente artigo, anali-sam-se as principais causas dos erros na prática cirúrgica e propõem-se atitudes para atenuar essa grave situação.

Palavras-chave. Erros médicos; efeitos adversos; erros cirúrgicos; doença iatrogênica

ABSTRACT

Safe surgery: pitfalls in surgical practice

The mortality of patients due to medical errors and ad-verse events is disturbingly high. In surgical practice, this problem reaches proportions that are unacceptable according to the World Health Organization. In this pa-per, the main causes of medical errors are analyzed and actions to mitigate this serious problem are suggested.

Key words. Medical errors; adverse effects; surgical er-rors; iatrogenic disease

iNtrOdUÇÃO

There are 98.000 deaths per year that result from medical error.

The Institute of Medicine, 19991

Prestigioso jornal dos Estados Unidos da América estampou, em sua edição de 1.º de dezembro de 1999, que morriam, anualmente, mais cidadãos americanos em decorrência de erros na prestação de serviços de assistência à saúde do que o dobro das perdas humanas ocorridas na guerra do Vietnã.

paulo mendelssonh

Foi como se dia sim e dia não, três aviões a jato, do tipo jumbo, lotados, caíssem –, e todos os passa-geiros morressem.2 Outros influentes veículos de comunicação publicaram na época que os erros de profissionais de saúde em hospitais poderiam estar causando 180.000 mortes nos Estados Unidos3 e que os erros médicos já seriam a quinta causa de morte no país.4 Além de sofrimento e mortes, esses erros resultam em grande custo financeiro, cerca de 37 bilhões de dólares cada ano nos Estados Unidos, dos quais 17 bilhões são gastos com erros passíveis de prevenção.5

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2008 foram realizadas 234 milhões de operações no mundo, aproximadamente uma para cada 25 pessoas vivas. Essas operações resultaram na morte de cerca de dois milhões de pessoas e, aproximadamente, sete milhões tiveram complica-ções com relevantes sequelas. Estima-se que, para cada trezentos pacientes internados em hospitais, um morre. A análise desses dados por parte da OMS permitiu inferir que metade dessas mortes e com-plicações poderia ser evitável. Ressalte-se que, 75%

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prática médica

das operações realizadas no Planeta foram execu-tadas nos países desenvolvidos, que contam com apenas 30% da população mundial.5

Há relatos de que o erro humano cometido por profissionais de saúde seja, no momento, extre-mamente elevado e ocasiona anualmente cerca de 150.000 óbitos nos Estados Unidos e 80.000 na Grã-Bretanha, sendo já a terceira causa de mortalidade nesses países, após as cardiopatias e o câncer.5

Segundo a OMS, erro médico é o erro no planeja-mento ou na execução de um procedimento, e even-to adverso é lesão inesperada, consequente à ativi-dade médica. A intervenção em um rim saudável em lugar do rim doente é um típico erro médico, e a troca de medicação que causa lesão ou morte do paciente é um evento adverso; eventualmente, os limites entre os dois são tênues.

A ocorrência de eventos adversos causada por profis-sionais de saúde pode variar de 10% a 45,8%, e de 3,7% até 21% são eventos graves.6,7 Esses eventos podem ocorrer em qualquer fase do manuseio dos pacientes, e os cuidados diários e as operações são situações que apresentam os maiores índices (tabela 1).7

Tabela 1. Situações em que se apresentam os eventos adversos. Adaptado de Krizek7

EvENtOS advErSOS tOtal dE EvENtOS (%)

Cuidado diário e monitorização 29,3Complicações 19,5Tratamento 13,4Cirurgia 10,5Medicamentos 9,3Diagnóstico 7,5Nutrição 2,3Anestesia 2,1Outras situações 6,9

Os erros mais comuns são problemas na esteriliza-ção, falta de leitos em unidade de terapia intensi-va, medicação trocada, queimaduras, inexperiência profissional, equipamentos defeituosos, uso inade-quado de antibióticos e outros casos.

Estima-se que 40% a 50% dos erros hospitalares ocorrem na sala de operação.1 O estudo de um

grande grupo de erros médicos já julgados e con-denados pela justiça mostra que: a) a maioria das lesões ocorre em pacientes jovens, saudáveis, que recebem tratamento eletivo; b) em sua maioria, os erros ocorridos na sala de cirurgia são técnicos; c) os fatores humanos contribuem para que a ocor-rência da maioria das lesões estejam associadas a erros cirúrgicos; d) a falta de comunicação é im-portante fator de causa de lesões cirúrgicas. Entre os fatores humanos como causa de lesões, a inade-quada vigilância, os esquecimentos e as falhas de comunicação foram os mais constatados.8

Importante ressaltar que deficiências de estrutu-ra básica da instituição hospitalar – causadas por falta de material, por manutenção inadequada de equipamentos, condições impróprias de trabalho, baixos salários, profissionais sobrecarregados, au-sência de protocolos de segurança e falta de pro-gramas de treinamento e outros casos – acarretam, com frequência, tanto erros de profissionais de as-sistência, como eventos adversos.

A OMS tem declarado que esses números são ina-ceitáveis e propõe metas para que essa realidade se transforme. Dentre as propostas, a redução em 25% das infecções em sítio cirúrgico e o combate inten-sivo às infecções hospitalares, que elevam a perma-nência hospitalar em dez a quinze dias e aumentam em cinco vezes o risco de re-hospitalização, além de duplicar a taxa de mortalidade.5 Só nos Estados Unidos, as infecções do sítio cirúrgico têm um cus-to estimado de dez bilhões de dólares por ano.5

Na última década, a ocorrência de erros médi-cos na prática cirúrgica tem sido objeto de nu-merosos estudos. Um dos aspectos fundamentais do problema é a cultura da culpa e da vergonha, a famosa blade and shame culture dos anglo-saxôni-cos, que considera os erros de profissionais de saúde como absolutamente inaceitáveis e motivo de culpa, vergonha e punição. Esse sentimento é cultivado tanto entre os profissionais de saúde como na sociedade em geral, o que motiva omis-sões, ocultação de fatos e dificuldade de dizer a verdade. Perdem-se, dessa forma, muitas oportu-nidades de aprendizado e treinamento para que o fato nocivo não se repita.

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paulo mendelssonh • Cirurgia segura

Bohen e Lingard (2003),9 após análise detalhada do problema, concluíram que “cirurgiões e residen-tes em treinamento precisam aprender, praticar, comunicar, ensinar, investigar e organizar, para trazer o erro, e o combate para evitá-lo, para a cultura da prática cirúrgica”. Esta sábia afirmação externa a necessidade de mudança de paradigma no que diz respeito aos erros médicos, mormente na prática da cirurgia.

O que fazer para tornar a cirurgia mais segura?

A resposta é complexa porque determinados erros são produtos de fatores estruturais que vão desde recursos destinados à saúde em determinada co-munidade, passando pela qualidade das institui-ções em termos físicos e de equipamentos, até a formação dos profissionais de saúde que cuidam diretamente dos enfermos.

Em que pese a complexidade do tema, algumas áreas obtiveram grande sucesso com algumas medidas específicas ao seu trabalho. Os hemo-centros e a anestesiologia foram indubitavel-mente os pioneiros nos progressos relativos à segurança nas últimas décadas. As transfusões de sangue, que há três ou quatro décadas eram uma aventura, são hoje muito seguras, e a ocorrência de acidentes é rara. O principal fator responsável por essa mudança foi a regulamentação normati-va por portaria da Anvisa,10 que estabelece todos os detalhes materiais, humanos e de funciona-mento, obrigatórios em todas as instituições que utilizam esse procedimento.

Na década de 70 do século passado, morria um pa-ciente para cada cinco mil anestesias. Atualmente, com o desenvolvimento de tecnologia, aprimora-mento dos conhecimentos e estabelecimento de um checklist anestésico, a mortalidade diminuiu para um em cada 250.000 anestesias.

Em termos de prática cirúrgica, contudo, há atitu-des a serem tomadas pelo profissional e pela ins-tituição que podem, se não resolver, pelo menos minorar o grave problema. São rotinas que devem ser adotadas nos períodos pré-, trans- e pós-ope-ratórios para evitar as armadilhas que os cercam.

pErÍOdO pré-OpEratÓriO

A indicação de uma operação, a avaliação do risco cirúrgico e os cuidados pós-operatórios foram, até a primeira metade do século XX, de competência de um médico clínico, que requeria o trabalho de um cirurgião tão somente para executar o proce-dimento cruento. Na década de 50 do mesmo sé-culo, começou-se a publicar artigos relacionados a metabolismo do doente cirúrgico, conhecimentos sobre a cicatrização das feridas e, principalmente, reações do organismo humano ao trauma operató-rio. Destacaram-se na época os trabalhos de Francis Moore, que foram difundidos por todo o mundo, e chamaram à atenção a necessidade de o cirurgião conhecer as alterações consequentes ao trauma. Na segunda metade do século passado, muito se estu-dou a respeito das alterações que ocorrem no pe-ríodo pós-operatório dos pacientes, e os cirurgiões assumiram os cuidados para tratá-los.

A avaliação pré-operatória, que era prerrogativa do cirurgião responsável pelo procedimento, sofreu um retrocesso nas últimas décadas, provocado pe-lo agigantamento das instituições de saúde, o que afastou o cirurgião do paciente. Em consequência, os cuidados pré-operatórios nesses hospitais, ora é delegado a um especialista, como os pedidos de risco cirúrgico a cardiologistas, ora é confiada a múltiplos pedidos de exames complementares.

Se for considerado que um quarto da população é diabética, um terço é hipertensa, um quinto abu-sa de álcool e grande parte usa aspirina de modo contínuo, é fácil depreender, sem levar em conta outras condições clínicas menos frequentes, que a ação mais importante na avaliação do risco cirúr-gico continua a ser anamnese e exame físico bem feitos. Sendo o cirurgião o responsável direto pelo resultado da operação, é óbvio que é esse o profis-sional indicado para a avaliação do paciente.

Medidas como manutenção da medicação anti--hipertensiva, suspensão dos antidiabéticos orais, suspensão do uso de aspirina e ginseng, correção da hipocalemia em doentes que usam diuréticos, correção da hipomagnesemia em indivíduos alco-ólicos crônicos, suspensão do tabaco em fumantes,

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prática médica

são medidas que devem ser orientadas pelo cirur-gião assistente. Em pacientes com doenças clínicas dignas de nota, é sempre necessário recorrer a es-pecialista para o correto diagnóstico e tratamen-to do problema, a fim de que o paciente chegue à operação nas melhores condições.

Com relação aos exames complementares, há enor-me variação em seu uso. Esta varia desde nenhum pedido de exame a pedidos excessivos. Uma rotina simples para pacientes cuja anamnese e cujo exa-me físico não revelaram nenhum agravo à saúde é: hemograma, ureia, glicemia e sumário de uri-na e, após os 40 anos de idade, se acrescentaria eletrocardiograma. Esses exames podem ter va-lidade até por seis meses se a condição clínica do paciente for a mesma. Resultados de exames com vencimento recente jamais devem ser motivos para cancelamento de operações. Por outro lado, se o paciente tiver alguma moléstia, recomenda--se solicitar os exames necessários para esclarecer

Quadro 1. Checklist original. Notam-se no rodapé que modificações são encorajadas para adaptações locais

minuciosamente o distúrbio e tratá-lo. É, portanto, pertinente afirmar que “o executor da operação, se não é o único, é o principal responsável pela avalia-ção do risco cirúrgico de seu paciente”.

pErÍOdO traNSOpEratÓriO

Dentre as medidas concretas propostas pela OMS que visam à cirurgia segura, há ampla divulgação, por parte dessa instituição, do trabalho publicado no New England Journal of Medicine em janeiro de 2009.11 Trata-se de estudo conduzido em oito hospitais de países e continentes diferentes – Canadá, Estados Unidos (América do Norte), Inglaterra (Europa), Jordânia (Oriente Médio), Tanzânia (África), Índia e Filipinas (Ásia) e Nova Zelândia (Oceania), cujo ob-jetivo foi aplicar a todos os pacientes um checklist de procedimentos simples, desde o momento em que o assistido entra na sala de cirurgia até o término do procedimento realizado (quadro 1).

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paulo mendelssonh • Cirurgia segura

Foram comparados 3.733 pacientes antes da utili-zação do checklist e 3.955 depois de sua utilização em operações eletivas. O que se observou foi de-créscimo acentuado da taxa de incidência de in-fecção do sítio cirúrgico (6,2% antes do checklist e 3,4% após), diminuição da taxa de incidência geral de complicações (11% antes e 7% após) e principal-mente redução da taxa de mortalidade (1,5% antes e 0,8% após). Isto representa uma redução de 63% nas complicações pós-cirúrgicas e de 55% da taxa de mortalidade pós-operatória (tabela 2).

O mesmo grupo de autores12 publicou em 2010 um estudo em que o checklist foi aplicado em opera-ções de emergências não cardíacas. O resultado foi

Tabela 2. Resultados antes e depois da implementação do checklist nas operações eletivas11 e de urgência12

tipOS dE iNtErvENÇÃON.º dE paciENtES iNfEcÇÃO dE fErida mOrtalidadE cOmplicaÇõES

Antes apÓS aNtES apÓS Antes apÓS Antes apÓS

Cirurgia eletiva 3.733 3.955 6,2% 3,4% 1,5% 0,8% 11% 7%Cirurgia de urgência 842 908 11,2% 6,6% 3,7% 1,4% 18,4% 11,7%

igualmente positivo, com redução de 37% das com-plicações cirúrgicas e de 62% da relativa à mortali-dade (tabela 2).

Reforça esses resultados o fato de que a grande amostra de pacientes foi obtida em realidades mé-dicas muito distintas, e as atitudes propostas no checklist são simples em sua maioria, e deveriam ser rotineiras em qualquer procedimento cirúrgico de qualquer hospital do Planeta – e não são.

Fizemos em 2009 uma versão do checklist da OMS, com adaptação para ser implantada em um hospi-tal público do Distrito Federal (quadro 2), que pas-sou a ser analisada por partes.

Quadro 2. Modelo de checklist adaptado para hospital público no Distrito FederalaNtES da iNdUÇÃO

ENfErmEira E aNEStESiStaaNtES da iNciSÃO

ENfErmEira, aNEStESiSta E cirUrgiÃOaNtES dE O paciENtE Sair

ENfErmEira, aNEStESiSta E cirUrgiÃO

O paciente confirmou seu nome, procedimento, local e consentimento.

Sim

Todos os membros da equipe confirmam, eles mesmos, seus nomes e suas funções.

Sim Não

Confirmação verbal da enfermeira:

nome do procedimento

O local da cirurgia está marcado?

Sim Não se aplica Cirurgião, anestesista e enfermeiro

confirmam verbalmente: nome do paciente, procedimento e onde será a incisão.

Confirmação verbal da enfermeira:

contagem dos instrumentos, compressas e objetos perfurocortantes

O equipamento de anestesia e os medicamentos foram verificados?

Sim

O paciente recebeu antibiótico profilático há menos de 60 minutos.

Sim Não se aplica

Confirmação verbal da enfermeira:

o exame histopatológico está solicitado com formulário preenchido e identificado?

O oxímetro de pulso está no paciente e funcionando?

Sim

Antecipar eventos críticos para o cirurgião

Quais os pontos críticos ou inesperados?

Qual a duração do procedimento?

Qual a perda de sangue prevista?

Confirmação verbal da enfermeira:

equipamento com problema para ser encaminhado à manutenção.

O paciente tem alergia conhecida?

Sim NãoAntecipar eventos críticos para o anestesista.

Há algum cuidado específico para o paciente?

Identificado pelo cirurgião, pelo anestesista e pela enfermagem algum problema relevante na assistência ao paciente?

O paciente apresenta via aérea de difícil intubação ou risco de aspiração?

Sim (equipamento disponível)

Não

Antecipar eventos críticos para a enfermagem.

Esterilização confirmada (agente)?

Há dúvidas sobre o funcionamento de algum equipamento?

Há risco de perda de sangue superior a 500 mL (7 mL/kg em crianças)

Sim (acesso intravenoso adequado e reserva de sangue)

Não

Os exames de imagem estão disponíveis? –

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prática médica

A primeira parte do checklist é realizada antes da indução anestésica e preenchida por membro do corpo de enfermagem ou por alguém designado pa-ra tal. Participam nesse momento a enfermeira de sala e o anestesista.

A primeira pergunta é a confirmação pelo paciente do seu nome, do local a ser operado e de sua per-missão. Aparentemente óbvia essa pergunta, mas sua importância é considerável, principalmente, em hospitais de grande atividade cirúrgica, em que uma troca de paciente não é impossível.

A segunda pergunta, que supõe a marcação prévia do local ou lado a ser operado, evita um dos erros, lamentavelmente frequente, de mudança do lado da operação. Esse tipo de erro é inadmissível por parte do doente, da sociedade, da imprensa e da justiça.

As outras perguntas dizem respeito à anestesia, con-templam a verificação de equipamentos e questio-nam sobre os três grandes perigos das operações: alergias do paciente, dificuldade de intubação de via aérea e possibilidade de grande perda de sangue.

A segunda parte do checklist conta com a participa-ção do cirurgião e da equipe cirúrgica – a enfermei-ra da sala e o anestesiologista –, e é preenchida pelo responsável antes da incisão cirúrgica.

A identificação com a respectiva função de cada membro de toda a equipe poderia ser dispensável em épocas passadas quando a equipe de cirurgiões, o anestesista e a enfermeira sempre trabalhavam juntos no mesmo hospital. Atualmente, nos gran-des hospitais, cada dia os protagonistas das equipes são diferentes, de modo que essa identificação ini-cial, que inclui o nome do doente e do procedimen-to, em muito contribui para atenuar os erros de co-municação que, conforme já discutido, podem ser causas de sérios erros no período transoperatório.8

O item em que se questiona o uso de antibioticopro-filaxia nos últimos sessenta minutos, visa a corrigir o uso inadequado de antibióticos na prevenção de infecções do sítio cirúrgico. Em que pese o conheci-mento já estabelecido há décadas dos fundamentos da antibioticoprofilaxia, seu uso inadequado ainda

é muito comum, sendo o início tardio da medicação o erro mais cometido.

As outras questões são direcionadas à prevenção de surpresas durante o procedimento cirúrgico e para evitar perda de tempo no decorrer da operação.

A terceira seção do checklist, em que participam cirur-gião, enfermeira e anestesiologista, antes de o pacien-te sair da sala, visa a uma nova verificação pela enfer-meira, de rotinas que não podem ser negligenciadas ao término do procedimento, e, finalmente, a identi-ficação e o registro por parte da equipe, de problemas passíveis de ocorrerem no período pós-operatório.

Diante dos inequívocos resultados positivos da utilização do checklist, observa-se que a maioria das instituições e dos profissionais aceita sem dis-cussão sua implantação. Entretanto, sua aplicação correta enfrenta dificuldades na prática, seja pelos profissionais a considerarem óbvia, seja porque seu uso não foi ainda estabelecido de maneira compul-sória. O que se vê nos hospitais são arremedos de checklist, sem que se considerem de fato a perti-nência e a responsabilidade de quem responde aos quesitos no momento da intervenção cirúrgica. A aplicação do checklist na maioria das instituições limita-se a uma folha, que é preenchida por auxi-liar de enfermagem e assinada, ou não, por algum componente da equipe cirúrgica, fato que a torna totalmente sem efeito. A maneira correta de apli-car o checklist está amplamente divulgada na inter-net, basta acessar www.safesurg.org/how-to.html.

pErÍOdO pÓS-OpEratÓriO

Nos hospitais de médio e grande porte, os pacientes submetidos a operações de vulto são encaminhados à unidade de medicina intensiva e acompanhados por médicos intensivistas ou cardiologistas. A ausência do cirurgião assistente no período pós-operatório é causa de três problemas frequentes, principalmente em cirurgia geral. O primeiro diz respeito à reposição hidroeletrolítica pós-operatória. É sabido que o anes-tesiologista no momento da operação empenha-se, com toda a razão, em manter a hemodinâmica nor-mal do paciente, repondo vigorosamente a volemia e

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paulo mendelssonh • Cirurgia segura

levando o ato anestésico a bom termo. É compreensí-vel que, no momento da operação, a questão eletro-lítica esteja em plano secundário. Entretanto, findo o ato cirúrgico e o período pós-operatório imediato, é absolutamente necessário que se procure estabelecer o equilíbrio hidroeletrolítico adequado. Observa-se com frequência, em algumas unidades de terapia in-tensiva, que toda infusão de líquidos tem composição parecida à solução fisiológica. Ora, se forem repos-tos os 2.500 mL de água que um adulto (sem perdas extraordinárias) necessita diariamente com solução fisiológica, estão-se ministrando 375 mEq de sódio, quando a necessidade do paciente é de 75 mEq. Em paciente que habitualmente recebe grande quanti-dade de eletrólitos na sala de operação e sua reação ao trauma tende a reter sódio, se continuamos a administrar grandes quantidades nos dias pós-ope-ratórios seguintes, teremos uma expansão isotônica grave que causa edema digno de nota, sobretudo nos locais em que houve manuseio cirúrgico. Esse edema causa dificuldade mecânica da cicatrização, dificuldade de irrigação sanguínea e, principalmen-te, hipoxia local, que pode comprometer seriamente o resultado pós-operatório. Deiscência de anasto-moses, eventrações e outras complicações graves e mortais podem decorrer dessa conduta equivocada no manuseio pós-operatório.

O segundo problema refere-se ao choque pós-ope-ratório. Em paciente operado, com instabilidade hemodinâmica e sinais de choque, o diagnóstico, até prova em contrário, é choque hemorrágico. É comum pacientes idosos apresentarem choque na fase pós-operatória imediata com abdome flá-cido, indolor e sem distensão. O cirurgião expe-riente sabe que o exame clínico não é confiável para o diagnóstico de hemoperitôneo. Às vezes ocorre perda de dois a três litros de sangue em abdome aparentemente sem dor, sem distensão e sem sinais de irritação peritoneal. O tratamento de qualquer outra causa de choque só deve ser ini-ciado após exclusão de hemoperitônio por meio de ecografia ou de lavado peritoneal realizados na unidade de terapia intensiva.

O terceiro evento, que reclama a presença do cirur-gião, é a dificuldade do diagnóstico de deiscências de anastomoses em operações do trato digestivo.

Mesmo em mãos experientes, esse diagnóstico em sua fase inicial é difícil. É uma complicação catas-trófica e há sempre dificuldade em considerá-la no início do quadro. Em paciente com quadro evolutivo normal, a presença após o quarto dia de sinais de síndrome da resposta inflamatória sistêmica (febre, taquicardia, taquipneia e outros) impõe o diagnósti-co de deiscência de anastomose e implica necessida-de absoluta de esclarecimento, pois o prognóstico do caso dependerá do seu diagnóstico precoce.

Finalizando-se, é fato sobremaneira evidente ha-ver grande frequência de ações civis e penais que requerem a intervenção do Poder Judiciário na ati-vidade médica, às vezes justificadamente e muitas vezes injustificadamente. Em consequência dessa crescente atitude por parte da população, julga o autor ser da maior importância que o cirurgião ja-mais execute procedimentos cirúrgicos sem o de-vido termo de consentimento livre e esclarecido do doente e que reflita sobre a necessidade de se proteger com um seguro, conduta já adotada por médicos de vários países.

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estudo de caso

Miastenia grave neonatal: relato de caso

ResuMo

Objetivo. Descrever o caso de recém-nascido com miastenia grave, filho de mãe portadora da mes-ma doença desde os 11 anos de idade, com enfo-que na abordagem.

Descrição. Recém-nascido do sexo masculino nasceu de parto normal, 30 semanas de idade gestacional, 1.440 g, Apgar 2 e 6 (1º e 5º minutos respectivamente); apresentou hipotonia e apneia logo ao nascer, com necessidade de intubação. Na unidade de terapia intensiva neonatal evoluiu com progressão do desconforto respiratório, recebeu surfactante pulmonar exógeno com quatro horas de vida. Teve também hipotonia e instabilidade hemodinâmica, sendo usadas drogas vasoativas. Iniciado piridostigmina (2 mg/kg/dia a cada quatro horas por sonda nasogástrica). A dose do anticorpo antirreceptor da acetilcolina foi elevada. O recém--nascido teve melhora clínica, porém com movi-mentos mínimos e deficiente respiração espontâ-nea. Apresentou hiperbilirrubinemia no sexto dia, necessitou de fototerapia. No sétimo, dia foi a óbito por pneumonia.

Comentários. A miastenia grave neonatal tran-sitória acomete 10-20% dos filhos de portadoras da doença, não havendo correlação entre títulos de anticorpo antirreceptor de acetilcolina e clí-nica materna com a clínica do recém-nascido. A doença geralmente tem evolução benigna, desa-parece de três semanas e quatro meses com o tra-tamento adequado (anticolinesterásico, ventilação mecânica, suporte nutricional).

Palavras-chave. Miastenia gravis; miastenia gravis ne-onatal; piridostigmina; anti-receptor da acetilcolina

Paulo Roberto Margotto, Regina Honorato Buffman e Káritas Rios Lima

Paulo Roberto Margotto – doutor em Perinatologia pelo Centro Latinoamericano de Perinatologia y Desarrollo Humano (CLAP-OPS/OMS-Montevideo-Uruguai), professor da Faculdade de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS)-Distrito Federal, coordena-dor do Internato em Saúde da Criança no Hospital Regional da Asa Sul, Brasília-DF, Brasil

Regina Honorato Buffman – graduanda, Faculdade de Medicina, Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), Brasília-DF, Brasil

Káritas Rios Lima – graduanda, Faculdade de Medicina, Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS), Brasília-DF, Brasil

correspondência: AOS, quadra 5, bloco D, ap. 205, CEP 70660-054, Brasília-DF. Telefones: 61 99868953 e 32333614.

Internet: [email protected]

Recebido em 11-1-2012. Aceito em 1-3-2012.

Os autores declaram não haver potencial conflito de interesses.

ABSTRACT

Neonatal myasthenia gravis: a case report

Objective. To describe the case of a newborn with myas-thenia gravis whose mother also has myasthenia gravis since the age of 11, focusing on the approach.

Description. The neonate was male, born through vagi-nal delivery (30 weeks of gestation), weighed 1,440 g, with Apgar scores of 2 and 6 (1 and 5 minutes, respectively). He presented hypotonia and apnea shortly after birth, requiring intubation. In the neonatal intensive care unit, the newborn had to respiratory distress syndrome and received surfactant within 4 hours of life. He also had

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Paulo R. Margotto e cols. • Miastenia gravis neonatal

to hypotonia and hemodynamic instability, requiring the use of vasoactive drugs. The newborn was treated with pyridostigmine (2 mg/kg/day every four hours via nasogastric tube). The level of acetylcholine receptor an-tibodies was high. The infant showed clinical improve-ment, but minimal movement and poor spontaneous breathing. He presented hyperbilirubinemia on day 6, requiring phototherapy. On day 7, the neonate died due to pneumonia.

Comments. Transient neonatal myasthenia gravis af-fects 10-20% of children of mothers with myasthenia gravis. There was no correlation between anti-acetyl-choline receptor titers, maternal and newborn clinical symptoms. The disease is usually benign and disappears within 3 weeks to 4 months with adequate treatment (anticholinesterase therapy, mechanical ventilation, and nutritional support).

Key words. Myasthenia gravis; neonatal myasthenia gra-vis; pyridostigmine; acetylcholine receptor antibodies.

INtRoduÇÃo

A miastenia grave é uma doença autoimune ca-racterizada pelo acometimento da junção neuro-muscular, causada por autoanticorpos contra os receptores nicotínicos da acetilcolina (anti AChR).1 Esse distúrbio na transmissão do impulso nervoso para o músculo esquelético produz quadro clínico de fraqueza muscular, inicialmente na face, mas pode tornar-se generalizada, acometendo também os membros, geralmente após repetidos movimen-tos.2 Os sinais e sintomas clínicos mais comuns são: dificuldade na fala, diplopia, ptose, disfagia e oca-sionalmente insuficiência respiratória.1 Este último sinal geralmente está presente na crise miastênica, que é um episódio agudo de insuficiência respira-tória, ocasionado por doenças sistêmicas, fatores emocionais ou drogas.2,3

A doença é duas vezes mais frequente em mulhe-res e frequentemente afeta as jovens em idade fértil, na segunda e terceira décadas de vida.4 O curso da doença durante a gestação é imprevisível e não está correlacionado com o estado clínico da mãe no início da gravidez.4 A piora dos sintomas

ocorre em cerca de um terço dos casos de mulhe-res grávidas, principalmente durante o primeiro trimestre e o primeiro mês após o parto.4 Nos ou-tros dois terços dos casos, o curso da doença per-manece sem mudanças.5 A melhora dos sintomas no segundo e terceiro trimestres coincide com a imunossupressão que habitualmente ocorre nesse período da gravidez.5

Os anticorpos anti-AChR são da classe IgG, que po-dem cruzar a placenta e causar a miastenia neonatal transitória em 10-20% dos filhos de gestantes porta-doras de miastenia, podendo chegar até 30%.4-6

Geralmente são subdivididas duas formas clínicas de miastenia grave: ocular e generalizada.7 Os an-ticorpos anti AChR são detectados em 80-90% dos pacientes com a miastenia generalizada e em 50-70% dos pacientes com a forma ocular.2 Os pacientes com miastenia generalizada sem anticorpos anti-AChR apresentam anticorpos músculo-específicos contra tirosinaquinase (anti-MuSK) em 40-50% dos casos.8 O diagnóstico da miastenia é feito com base na apre-sentação clínica, exame físico e exames complemen-tares, como a eletromiografia e a dosagem sérica dos anticorpos anti-AChR e anti-MuSK.2

Apresenta-se um caso de recém-nascido pré-termo com miastenia grave, filho de mãe também porta-dora da doença, tendo como objetivo, o enfoque na atuação tanto imediata na sala de parto como na uni-dade de terapia intensiva neonatal. O caso ocorreu na Maternidade do Hospital Regional da Asa Sul, Maternidade Escola da Faculdade de Medicina da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.

ReLato do caso

Recém-nascido masculino, peso ao nascer 1.440 g, idade gestacional de trinta semanas, filho de mãe portadora de miastenia grave desde a idade de 11 anos, em tratamento com brometo de piri-dostigmina. Nasceu de parto normal, com período expulsivo prolongado, bolsa rota no ato e líquido amniótico claro. Ao nascer estava hipotônico e sem respirar. Apgar 2 no primeiro minuto. Foi ventilado

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estudo de caso

sob máscara com oxigênio a 5 L/mim, sem respos-ta. No quarto minuto de vida, foi intubado. Apgar 6 no quinto minuto. A criança evoluiu na unidade de terapia intensiva neonatal com agravamento do desconforto respiratório, recebendo surfactante pulmonar exógeno com quatro horas de vida; teve também hipotonia e instabilidade hemodinâmica, necessitou de drogas vasoativas, mantendo-se em ventilação mecânica. Foi feita a hipótese de diagnós-tica de miastenia grave neonatal transitória e inicia-do o tratamento com anticolinesterásico (piridostig-mina na dose de 2 mg/kg/dose cada quatro horas por sonda nasogástrica). A dosagem de anticorpos anti-receptor da acetilcolina (anti AChR) foi realiza-da com resultado positivo (0,44 nmol/L, sendo con-siderados valores normais < 0,20 nmol/L). Criança seguiu com melhora do quadro clínico, porém sem sucção ou abertura ocular, movimentos mínimos e poucas incursões respiratórias espontâneas. No sex-to dia de vida, apresentou icterícia, necessitando de fototerapia. No sétimo dia de vida, teve febre, queda da saturação e taquicardia. Na ausculta pulmonar, havia murmúrio rude com creptos. Foi notada secre-ção espessa e amarela no tubo orotraqueal. O exame radiológico de tórax evidenciou condensação em região peri-hilar à direita e foi iniciada antibiotico-terapia para tratamento da pneumonia. O recém--nascido cursou com quadro séptico, resultando em óbito neonatal no sétimo dia de vida.

dIscussÃo

O neonato apresentou quadro compatível com miastenia neonatal transitória, doença que acome-te 10% a 20% dos filhos de gestantes portadoras de miastenia gravis, podendo chegar até 30%.5,6 Não há correlação entre a gravidade materna da doença e os níveis de anti-AChR e a ocorrência de miastenia grave neonatal. No entanto, o risco de miastenia neonatal aumenta quando há relato de filhos ante-riores com a doença.1,4,6,9-11 A ausência de sintomas e sinais na mãe não garante o nascimento de um recém-nascido normal.1

A timectomia tem sido recomendada para o tra-tamento da miastenia grave, parecendo ocor-rer menores exarcebações nas pacientes não

timectomizadas. No entanto, sem diferenças no desenvolvimento de miastenia gravis neonatal.12,13

Os sintomas aparecem em poucas horas de vida (12-48 horas de vida) a alguns dias (80% dos casos), sendo variáveis em sua apresentação e gravidade, podendo persistir até 3-4 meses de vida.2,10 O atra-so do início das manifestações pode ser devido à passagem pela placenta de medicações anticoli-nesterásicas.14 Os recém-nascidos que não tiveram sintomas na primeira semana de vida deverão ser acompanhados além do período neonatal.10 São inclusos entre os sinais e sintomas: dificuldade na sucção, choro fraco, hipotonia generalizada, ptose e insuficiência respiratória.2 É notória a ocorrência de hipoplasia pulmonar e artrogripose em filhos de miastênicas.2,6 A hipoplasia pulmonar ocorre devi-do ao acometimento do diafragma pela doença, uma vez que a movimentação desse músculo é ne-cessária para o adequado desenvolvimento pulmo-nar intra-útero.6 A artrogripose é uma desordem congênita caracterizada por contraturas provavel-mente resultantes da falta de movimento no pe-ríodo gestacional.2 A hiperbilirrubinemia pode ser um achado esperado em bebês de mães que fizeram uso de anticolinesterásicos e prednisona durante a gestação.2 As manifestações podem ser agrava-das por fatores externos, como infecção, resultan-do na crise miastênica, situação grave em que são necessários suporte ventilatório e maior dose de anticolinesterásicos.6 A crise miastênica deve ser diferenciada da crise colinérgica, situação de qua-dro clínico muito semelhante à anterior, que ocor-re devido a doses muito altas de anticolinesterásico (se assemelha a intoxicação por organofosforado) que pode ocupar o mesmo receptor que a acetil-colina, reduzindo a transmissão neuromuscular.3 A terapêutica consiste na diminuição do antico-linesterásico, podendo ser considerado o uso de anticolinérgicos, como atropina.15

Acredita-se que a doença neonatal seja causada pela transferência de anticorpos contra o AchR na junção neuromuscular e o mecanismo pelo qual os anticor-pos produzem sintomas não está totalmente esclare-cido, podendo resultar da degradação acelerada dos receptores, destruição da membrana pós-sináptica e bloqueio do acesso da acetilcolina aos receptores.16

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Paulo R. Margotto e cols. • Miastenia gravis neonatal

O diagnóstico é baseado na história materna de miastenia grave, teste terapêutico com anticoli-nesterásicos e a detecção do anticorpo anti AChR. O anticorpo anti-AChR detectado no recém-nascido afetado pode não ser todo transferido da mãe e sim sintetizado pela criança afetada.17 Níveis normais de anticorpo antirreceptor de acetilcolina não excluem a doença, pois 15% dos pacientes com a miastenia não apresentam esse anticorpo e, entre esses, 40-50% apresentam o anticorpo contra tirosinaquinase específica (anti-MuSK) como marcador da doen-ça.8,18 Essa molécula pós-sináptica é indispensável na manutenção da estrutura e função da junção neuromuscular, sendo requerida para o acoplamen-to do receptor da acetilcolina e tem importância na diferenciação sináptica; sua deficiência leva a cres-cimento axonal aberrante e diminuição dos recepto-res de acetilcolina nas sinapses.17,19 Eymard11 relatou as seguintes características dos pacientes com mias-tenia grave anti-MuSK positivo: forte predomínio do sexo feminino, maior gravidade clínica (respiratória e bulbar), atrofia facial e de língua, resposta ruim aos inibidores da colinesterase, atrofia tímica e deficien-te resposta a timectomia. Portanto, a detecção do anti-MuSK é o próximo passo na investigação de um recém-nascido filho de mãe miastênica com quadro clínico compatível, porém com anti-AChR negativo.

Geralmente a doença tem evolução benigna. Se tra-tada adequadamente, desaparece entre três sema-nas e quatro meses.2 Três quartos dos bebês afeta-dos requerem drogas anticolinérgicas com resposta geralmente excelente (neostigmine 0,01-0,04 mg/kg/dose intramuscular, intravenoso ou subcutânea cada três horas, 15 minutos depois da dieta, segui-do por piridostigmina 7 mg/kg/dia em 5-6 tomadas via oral quando estável, uma hora e meia antes da dieta, devendo manter o tratamento até a oitava se-mana).2,20,21 O uso de imunoglobulina intravenosa é questionável.22,23 O leite materno pode ser oferecido à criança, mas deve ser evitado caso a mãe apresen-te exacerbação da doença ou altos títulos de anti--AChR, que passam pelo leite materno, o que não ocorre com os anticolinesterásicos. O aleitamento materno é contraindicado se a mãe estiver em uso de azatioprina, ciclosporina A, ciclofosfamida, me-trotexate, fármacos reservados aos pacientes que não respondem à terapia de primeira escolha.2,13

A recuperação completa ocorre em menos de dois meses em 90% dos casos, porém, em 10% dos casos, pode ocorrer aos quatro meses.24

A respeito do modo de nascimento, deve-se dar preferência ao nascimento por parto vaginal, uma vez que o útero não é afetado pelos autoanticor-pos.13 Assim que a musculatura estriada é envolvi-da na segunda fase do trabalho de parto, o uso do fórcepe pode ser necessário.13 A cesariana deveria ser realizada somente se indicação.1,6,13 A anestesia epidural é preferível tanto em parto normal como cesariana, devendo ser evitado o uso de bloqueado-res neuromusculares não despolarizantes, amino-glicosídeos, sulfato de magnésio e grandes quanti-dades de procainamida e benzodiazepínicos.5,10,24,25

As jovens com miastenia grave que desejam en-gravidar não devem ser desencorajadas. Para que ocorra bom desfecho para essas mães e seus bebês deve haver uma harmônica interação entre neu-rologistas, obstetras e pediatras na otimização do tratamento da miastenia grave, minimizando os riscos e garantindo adequado período gestacional e perinatal ao binômio mãe-filho.5,10,26

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Brasília Med 2012;49(1):71-75 • 71

A 68-year-old man with exfoliative erythroderma: a diagnostic dilemma?

ABSTRACT

Exfoliative erythroderma is an uncommon entity with guarded prognosis. It is characterized by gen-eralized erythematous and exfoliative skin lesions, which affect over 80% of the body surface. The pre-disposing factors in adults include psoriasis, eczema (atopic, seborrheic, or contact), drug adverse effects, ichthyosis, cutaneous T-cell lymphoma, pityriasis ru-bra pilaris, Norwegian scabies, and Sézary syndrome. Our aim is to report a case study with conclusive clini-cal and histopathological data, emphasizing diagno-sis challenges. We report the case of a 68-year-old man presenting with exfoliative erythroderma. He had a history of alcoholism, arterial hypertension, and plaque psoriasis, and he had rapidly reduced his daily oral corticosteroid dose. The patient’s manage-ment included prednisone, methotrexate, hydroxy-zine, loratadine, furosemide and diltiazem, in addi-tion to topical care and nutritional support. After a period of clinical improvement, he had a recurrence of exfoliative erythroderma and died due to bacte-rial sepsis. The infectious agent that caused sepsis was a carbapenem-resistant strain of Pseudomonas aeruginosa. Because of frequent diagnosis challenges involving this uncommon and severe clinical entity, main features, predisposing factors, and precipitating factors should be highlighted to enhance the index of suspicion, which contributes to early diagnosis.

Key words. Dermatitis; exfoliative; erythroderma; erythema; psoriasis

Vitorino Modesto dos Santos – physician, PhD, internal medicine, Universidade Católica de Brasília e Hospital das Forças Armadas, Brasília-DF, Brazil

Lucas Maciel Rodrigues Monteiro – physician, internal medicine, Hospital das Forças Armadas, Brasília-DF, Brazil

Amanda Dantas Prates – physician, internal medicine, Hospital das Forças Armadas, Brasília-DF, Brazil

Vinicius Ferreira Campos – physician, internal medicine, Hospital das Forças Armadas, Brasília-DF, Brazil

Anna Gabriela Oliveira Camilo – physician, internal medicine, Hospital das Forças Armadas, Brasília-DF, Brazil

Rafael Policarpo Fagundes Badziak – physician, internal medicine, Universidade Católica de Brasília, Brasília-DF, Brazil

Correspondence. Prof. Dr. Vitorino Modesto dos Santos. Departamento de Medicina Interna, Hospital das Forças Armadas, estrada do Contorno do Bosque s/n, Cruzeiro Novo, CEP 70630-900, Brasília-DF, Brasil. Phone: 55 61 32330812. Fax: 55 61 32331599.

E-mail: [email protected].

Received on February 7, 2012. Accepted on March 3, 2012.

No potential conflict of interest relevant to this article was reported.

Vitorino Modesto dos Santos, Lucas Maciel Rodrigues Monteiro, Amanda Dantas Prates, Vinicius Ferreira Campos, Anna Gabriela Oliveira Camilo and Rafael Policarpo Fagundes Badziak

CASE REPORT

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CASE REPORT

RESUMO

Homem de 68 anos com eritrodermia esfoliativa: um dilema diagnóstico?

A eritrodermia esfoliativa é uma entidade incomum com prognóstico reservado, caracterizada por lesões cutâneas eritematosas e esfoliativas generalizadas, que acometem mais de 80% da superfície corporal. As condições predis-ponentes em adultos incluem psoríase, eczema (atópico, seborréico ou de contato), efeitos adversos a drogas, ic-tiose, linfoma cutâneo de células T, pitiríase rubra pilar, sarna norueguesa e síndrome de Sézary. O objetivo é re-latar um caso de eritrodermia esfoliativa com dados clí-nicos e histopatológicos conclusivos, enfatizando-se difi-culdades diagnósticas. Relata-se o caso de um homem de 68 anos com eritrodermia esfoliativa. Havia antecedente de alcoolismo, hipertensão arterial e psoríase em placas; e ele havia reduzido rapidamente a dose diária de corti-costeroide oral. O tratamento do paciente incluiu predni-sona, metotrexato, hidroxizina, loratadina, furosemida e diltiazem, além de cuidados locais e suporte nutricional. Após um período de melhora clínica, ele teve recorrên-cia de eritrodermia esfoliativa e faleceu em virtude de septicemia bacteriana por Pseudomonas aeruginosa resistente a carbapenêmicos. Por causa de frequentes dificuldades diagnósticas envolvendo essa entidade clínica incomum e grave, as principais características, condições predisponentes e fatores precipitantes devem ser ressaltados para aumentar o índice de suspeita, con-tribuindo para o diagnóstico precoce.

Palavras-chave. Dermatite esfoliativa; eritrodermia; eritema; psoríase.

INTRODUCTION

Exfoliative erythroderm is an uncommon entity with guarded prognosis, characterized by gener-alized erythematous and exfoliative skin lesions, which affect over than 80% of body surface.1-5 In adults, previous psoriasis and eczema (atopic, seb-orrheic, or contact) constitute the main causes. Other predisposing conditions for exfoliative erythroderma include drug adverse effect, ichthy-osis, cutaneous T-cell lymphoma, pitiriasis rubra pilar, Norwegian scabies, and Sézary syndrome.1-5

Detailed anamnesis is necessary to identify possible risk factors like infections, ingestion or topic use of medicines (e.g. anti-inflammatory, anti-hypertensive, sulfonamides, antibiotics, allopurinol, or carbamaze-pine).1-5 Suspicious cases of exfoliative erythroderma must be confirmed by histopathology.1-5 Systemic or oral corticosteroids, methotrexate, cyclosporine, infliximab and etanercept constitute the usual medi-cines to control episodes of exfoliative erythroderm associated with psoriasis.5 The main causes of death among patients with exfoliative erythroderm are sep-tic and thromboembolic episodes.3

CASE REPORT

A 68-year-old man with antecedent of alcoholism, arterial hypertension and psoriasis was referred to Hospital das Forças Armadas, Brasília-DF, with erythematous, desquamative and itching lesions scattered on the trunk and upper extremities, which appeared after the abrupt taper of oral cor-ticosteroid dose. These lesions had a rapid onset and affected almost all his body surface in less than a week. He was taking captopril to control hyper-tension and prednisone for plaque-type psoriasis. He denied personal and family history of atopy, photo- sensibility, as well as arthralgia.

Before his admission, the hypothesis was psoria-sis plus pellagra due to alcoholism, and blood tests showed (normal range = NR): glucose 114 mg/dL (NR = 70 - 99 mg/dL), albumin: 3.54 g/dL (NR = 3.5 - 5.2 g/dL), triglycerides: 144 mg/dL (NR < 150 mg/dL, total cholesterol: 164 mg/dL (NR < 200 mg/dL), HDL: 40 mg/dL (NR > 40 mg/dL, LDL: 95.2 mg/dL (NR < 130 mg/dL, VLDL: 28.8 mg/dL (NR < 40 mg/dL), and normal urinalysis.

On admission, he was eutrophic (body mass index: 23.7 kg/m2); blood pressure: 140/100 mmHg; pulse rate: 98 bpm; temperature: 36.6oC; there was nei-ther lymph node enlargement nor visceromegaly. Confluent scaling plaques were scattered on his face, neck, trunk and limbs (Figure 1), and involved flexural areas, palms and soles. His clinical features were strongly suggestive of exfoliative erythroder-ma; worth of note was the absence of changes on

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Vitorino Modesto dos Santos et al. • Exfoliative erythroderma: a diagnostic dilemma?

Table. Laboratory data of a 68-year-old man with severe exfoliative erythrodermaPARAMETERS ADMISSION DAy 3 DAy 7 DAy 10 DAy 12 DAy 35 8 MONThS*

Hemoglobin (g/L) 9.6 9.6 9.2 9.7 8.6 9.5 8.8Hematocrit (%) 30.6 29.1 27.8 29 25.8 28.4 28.1WBC (x 109/L) 18.2 12 10.4 12.5 15.6 18 9.7Eosinophils (%) 10 20 12 14 3 14 21Lymphocytes (%) 16 6 13 12 25 6 9Platelets (x 109/L) 582 480 454 481 424 609 651ESR (mm/hour) 60 Nd 51 63 48 47 NdUS-CRP Nd 4.9 6.7 6.7 Nd 0.9 23.8Urea (mg/dL) 68.9 48.8 47.3 64.3 51.7 110.9 50Creatinine (mg/dL) 1.7 1.5 1.6 1.5 1.4 1.6 2Sodium (mEq/L) 141 138 138 138 136 132 136Potassium (mEq/L) 4.6 4.7 4.2 4.3 4.2 4.8 5.1Calcium (mg/dL) Nd 9 8.6 Nd 9.5 9 9.5Magnesium (mEq/L) Nd 1.8 1.7 1.7 1.8 1.9 1.7AST/ALT (U/L) Nd 21.7/12.2 Nd 22.6/9.1 18.7/10.6 Nd Nd

*Death. WBC: leukocytes. ESR: erythrocyte sedimentation rate. US-CRP: ultra-sensitive C-reactive protein. AST/ALT: aspartate aminotransferase/alanine amino-transferase. Nd: not done. Abnormal data are showed in italic.

Figure 1. Confluent scaling plaques are disseminated on the trunk and limbs in a subject with exfoliative erythroderma.

Figure 2. (A,B,C) Intracorneal Munro’s microabscesses and spongiform micropustules of Kogoj in the superficial stratum spinosum, irregular hyperplasia of epidermis, hy-perkeratosis and focal parakeratosis (D,E,F). Dilated tortu-ous vessels in the superficial derma, with lymphohistio-cytic and eosinophilic perivascular infiltrates and edema. Hematoxylin and eosin; A and B 10x; C, D, E, and F 40x

the nails and mucous membranes. The electrocar-diogram revealed signs of moderate left ventricle hypertrophy, and the image of chest radiography was normal. Remarkable laboratory findings were anemia, leukocytosis, eosinophilia and renal insuf-ficiency (Table).

Skin biopsy studies supported the diagnosis of acute generalized exanthematic dermatosis due to severe erythrodermic psoriasis (Figure 2). There was irregular hyperplasia of epidermis,

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CASE REPORT

hyperkeratosis with focal parakeratosis and apop-totic keratinocytes; moreover, neutrophilic pus-tules (Munro’s abscesses) and spongiform pustules of Kogoj were found in the stratum corneum and in the superficial stratum spinosum. Superficial der-ma showed edema, vasodilation and congestion, with lymphohistiocytic and eosinophilic perivas-cular infiltrates. Initially, he evolved with wors-ening and dissemination of the skin changes, and development of pitting edema in the lower limbs.

His treatment schedule included prednisone, methotrexate (12.5 mg/week), hydroxyzine (25 mg/day), loratadine (10 mg/day), topical care (antiseptic baths, keratolytics and emollients), vitamin supplements and nutritional support, furosemide and diltiazen (instead of captopril). During hospitalization, the patient presented with respiratory symptoms and chest radiogra-phy images of inflammatory infiltrate on the right lung, which was successfully treated by levofloxa-cin. An acute episode of gouty arthritis (uric acid: 8.1 mg/dL (NR = 3.4 - 7.0 mg/dL) affecting the left wrist was rapidly controlled by nonsteroidal an-ti-inflammatory drugs. His general improvement was gradually achieved, and the erythematous desquamation of the skin completely subsided without any remarkable sequel 35 days after his hospital admission.

After hospital discharge, he was referred to special-ized outpatient surveillance. A new episode of exfo-liative erythroderma flared up seven months later, and he received clinical, nutritional and intensive care support during three weeks. Notwithstanding, his death occurred following a severe bacterial sep-sis, which was unresponsive to treatment.

DISCUSSION

Exfoliative erythroderma constitutes a severe and uncommon condition, with high morbidity and mortality rates.1-5 This entity predominantly af-fects male individuals over 40 years of age, with a skin disease.1-5 We report the occurrence of exfolia-tive erythroderma after rapid tapering of oral cor-ticosteroid used to treat psoriasis in a 68-year-old

Brazilian man with antecedent of alcoholism and arterial hypertension. With diagnosis of plaque-type psoriasis, he was under treatment with pred-nisone in other service.

Fernandes et al performed a study about erythro-derma in 170 Brazilian patients aging from 30 to 80 years, 92 (54.1%) male.2 Previous skin diseas-es were found in 99: 58.23% of the cases, mainly psoriasis (66: 66.7%), contact eczema (18: 18.2%), and atopic eczema (7: 7.1%); followed by sebor-rheic eczema, ichthyosis, Norwegian scabies and pitiriasis rubra pilar. Other causes included drug adverse effect (37: 21.8%) and cutaneous T-cell lymphoma (18: 10.6%); while in 16 patients (9.4%) the origin was not established. Many of our find-ings are in accordance with the data of that study, like male gender, psoriasis, pruritus, lower limb edema, anemia, high erythrocyte sedimentation rate, leukocytosis, and eosinophilia. Nevertheless, lymph node enlargement, lymphocytosis, hypo-albuminemia, elevated aminotransferases, and Sézary cells were not observed in the patient here reported.2 Another Brazilian study about exfolia-tive dermatitis involved 58 patients with mean age of 56.9 years, and 37 (63.8%) were male.4 Previous skin diseases were found in 33: 56.9% of the cases, and the main causes were psoriasis (11: 33.3%), contact eczema (9: 27.3%) and seborrheic eczema (5: 15.1%), in addition to atopic eczema, ichthyosis and pitiriasis rubra pilar. Drug side effect caused 11 (19%) of the cases, and the cause was unclear in 14 patients (24.1%). Similar to our findings, the most common laboratory changes were anemia, leukocytosis, eosinophilia and renal failure; other-wise, hypoalbuminemia occurred in 37% of those cases.4 Recently, Hawilo et al reported a retrospec-tive study of 60 Tunisian patients with psoriasic erythroderma; the mean age of the patients was 53.7 years, 46 were male (76,7%) and 47 (78.3%) of the individuals had an antecedent of psoriasis as follows: plaque psoriasis (40 cases, 85.1%), scalp psoriasis (5 cases, 10.6%), and palmoplantar kera-toderma (2 cases, 4.3%).3 Therefore, in 13 (21.7%) of the patients, erythroderma was the first manifesta-tion of disease; phenomenon that can pose more diagnosis challenges,3 with consequent under/mis-diagnosis. There could be an additional concern in

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Vitorino Modesto dos Santos et al. • Exfoliative erythroderma: a diagnostic dilemma?

the present case study regarding the previous use of captopril, because this drug may be a rare pre-cipitant factor for exfoliative erythroderma in in-dividuals with psoriasis.2,3 Although such hypoth-esis could not be ruled out entirely, our patient was taking captopril for decades with no adverse effect; moreover, exfoliative erythroderma flared up after the rapid tapering of prednisone. Stopping local or oral corticosteroid has been an usual triggering factor for psoriasic erythroderma.3,6 On day 10 of admission, our patient presented classical features of acute gout in the right hallux, following the ele-vation of serum uric acid to 8.1 mg/dL (normal lev-el: ≤ 7 mg/dL). Signs and symptoms rapidly subsid-ed after a short course of oral NSAID, and uric acid lowering. Because of renal impairment, drug dos-age was adjusted according to creatinine clearance. Although the diagnosis of gouty arthritis seemed clinically characterized in the present case, histo-pathological confirmation is lacking because of the risk-benefits of invasive procedures; in fact, there was no clinical or imaging data to support the pos-sibility of psoriatic arthritis. Our patient had the dry form of exfoliative erythroderma,3 without mucous changes or deformities on nails or joints.5 Moreover, skin lesions involved flexural areas as well as palms and soles. Therefore, hypotheses like papuloerythroderma of Ofuji and osteo arthropatic psoriasis were ruled out.1,5 Interestingly, Liu et al (2009) described the first case of coexistent topha-ceous gout, erythrodermic psoriasis and psoriatic arthritis in a 59-year-old man without alcohol abuse, and speculated that urate crystal depos-its in the skin could play a role in erythrodermic psoriasis.6 Previous diagnosis of psoriasis, the rapid tapering of corticosteroid, clinical features, the Munro’s microabscesses and Kogoj’s pustules

characterized erythrodermic psoriasis in our pa-tient.3,7-9 He improved with clinical management and was referred to specialized surveillance; how-ever, he suffered further recurrence of exfoliative erythroderma, which was followed by unrespon-sive sepsis and death. Hawilo et al found 15% of recurrences; sepsis and thromboembolism were causes of death.3

In conclusion, exfoliative erythroderma is a clinical syndrome with guarded prognosis and most of cases are due to previous skin diseases; moreover, it often constitutes a diagnosis challenge and the prognosis is under influence of potential risk factors. Based on early clinical suspicion, three simultaneous biopsies must be performed to confirm the diagnosis.

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história da medicina

O símbolo da medicina e o verme da Guiné

Joffre marcondes de rezende – médico, especialista em gastroenterolo-gia, Professor Honoris Causa da Universidade de Brasília, UnB, Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás, Goiânia-GO, Brasil.

correspondência. Rua João de Abreu, 744, Setor Oeste, CEP 74120-110, Goiânia-GO. Telefone: 62 3251-3768.

internet: [email protected]

Recebido em 15-3-2012. Aceito em 20-3-2012.

O autor declara não haver potencial conflito de interesses.

resUmO

O verdadeiro símbolo da medicina é um bastão com uma serpente que o envolve em espiral. No entanto, o símbolo de Hermes, com duas serpentes e duas asas na extremidade superior, que é na verdade o símbolo do comércio, tem sido erroneamente usado nos Estados Unidos como símbolo da medicina. Recentemente muitas publicações presentes na internet têm pro-pagado a origem do símbolo, em que há o bastão de Asclépio com uma serpente, ser baseada na figura do nematódeo Dracunculus medinensis enrolado em uma varinha, método ainda usado para a extração do ver-me. No entanto, não são apresentados documentos históricos nem há respaldo de eminentes autores e estudiosos sobre História da Medicina. O artigo mais antigo a respeito encontrado pelo autor, é de um mé-dico neozelandês, sem bibliografia, que relata como provável origem do símbolo da medicina a figura do nematódeo enrolado na varinha. Os demais artigos relatam a repetição dessa ideia, constante também na Wikipedia. Diante dos estudos e documentos his-tóricos que demonstram o bastão com uma serpente nele envolta ser símbolo da medicina, questiona-se a convalidação dessa corrente de interpretação.

Palavras-chave. Asclépio; História da Medicina; símbolo da medicina; Esculápio

ABSTRACT

The symbol of Medicine and the Guinea worm

The true symbol of Medicine is a staff with a serpent en-twined around it. However, the symbol of Hermes, which has two serpents twined around a winged staff and which is actually the symbol of commerce, has erroneously been used in the United States of America as the symbol of Medicine. Recently, many publications on the Internet have propagated that the origin of the Rod of Asclepius, the symbol with one serpent, is based on the image of the worm Dracunculus medinensis entwined around a small stick, a

Joffre marcondes de rezende

method which is still used to extract this worm. However, no historical documents or relevant authors and scholars are mentioned in support of this idea. The oldest paper found presenting the image of the nematode winding around a small staff as the probable origin of the symbol of Medicine was written by a New Zealander doctor; however, it has no bibliography. Other articles have repeated this idea, which can also be found on Wikipedia. Validation of this new inter-pretation is questioned based on studies and historical doc-uments that demonstrate the staff with a serpent around it as the symbol of Medicine.

Key words. Asclepius; History of Medicine; symbol of Medicine; Aesculapius

O símbolo da medicina consiste em um bastão com uma serpente em volta, em espiral, conhecido como bastão de Asclépio.

Asclépio é considerado o deus da medicina desde a antiguidade e seu culto teve início na Grécia, de onde se espalhou por toda a Europa.

Em todas as esculturas procedentes dos templos de Asclépio, em achados arqueológicos e em moedas

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Joffre Marcondes de Rezende • O símbolo da Medicina

antigas, o deus está portando o bastão com a serpen-te. O significado de cada um desses elementos tem sido motivo de controvérsia. Em relação ao bastão, três interpretações têm sido consideradas plausíveis: representação da árvore da vida, símbolo de autorida-de e de poder (de curar) e apoio e defesa para as cami-nhadas, já que os médicos da época eram itinerantes e percorriam grandes distâncias a pé.

Quanto à serpente, a explicação se torna mais fácil. A serpente sempre exerceu um fascínio entre todos os povos e todas as civilizações e tem sido associada ao poder de preservar a vida. Sua habilidade em formar um círculo com seu corpo é visto como um símbolo da eternidade, e a mudança periódica da pele, como um sinal de rejuvenescimento. Como um ser ctônico que pode viver tanto na superfície da Terra como em seu interior, entra em contato com o mundo visível e invisível para o ser humano. A ela se atribuem ou-tros predicados, como astúcia, prudência e sabedoria. A serpente está ligada a outros deuses da mitologia grega, como Atenas, Hera, Demeter, Hermes e a seus equivalentes romanos.

O culto a Asclépio estava no auge por volta do século III d.C. Com o domínio do cristianismo foram banidos os deuses pagãos, e o bastão de Asclépio ficou prati-camente esquecido até o século XVI quando ressurgiu como símbolo universal da medicina.

O símbolo de Hermes, chamado caduceu, com duas serpentes e asas na extremidade superior, tem sido erroneamente empregado nos Estados Unidos como símbolo da medicina, quando, na verdade, é o símbolo do comércio.

Nos últimos anos, mais precisamente na última dé-cada, apareceu uma interpretação esdrúxula, de cunho popular, do significado do símbolo da medici-na, associando-o à parasitose causada pelo nemató-deo Dracunculus medinensis, conhecido popularmente como serpente ardente, dragão ou filária de Medina, verme da Guiné.

Esse nematódeo tem um ciclo biológico complexo. As larvas, em meio hídrico, infectam inicialmente um crustáceo microscópico da classe dos copépodes. O hospedeiro animal, inclusive o ser humano, se infecta

com ingestão de água contaminada pelos crustáceos infectados. No estômago do hospedeiro, os crustáceos morrem, liberando as larvas que são resistentes aos sucos digestivos. As larvas atravessam a parede intes-tinal para a cavidade abdominal e então para o siste-ma linfático, dirigindo-se nas primeiras seis semanas para o tecido subcutâneo. Ao fim de um ano, as larvas evoluem para a forma adulta. Os machos, mais delga-dos que as fêmeas, morrem, e as fêmeas sobrevivem no tecido subcutâneo como vermes alongados, que se deslocam lentamente, de preferência em direção aos membros inferiores. Decorrido algum tempo, o verme produz uma úlcera na pele por onde exteriori-za sua extremidade proximal. Como a úlcera é muito dolorosa o doente procura alívio banhando a úlcera e, nessa ocasião, o verme expele larvas pela boca que contaminam a água, que, por sua vez, irá infectar no-vos crustáceos, fechando o ciclo biológico. Morrendo o verme, forma-se um abscesso no local.

O verme pode ser extraído ainda com vida antes da for-mação da úlcera pelo seguinte processo: faz-se uma in-cisão na pele justo à frente do verme e aguarda-se que ele aflore à superfície. Toma-se uma pequena vareta, como um palito fosfórico, e nela se enrola com o máxi-mo cuidado a extremidade do verme e aguarda-se sua progressiva exteriorização, que pode levar dias. A cada dia, enrola-se na varinha o segmento exteriorizado, até a completa saída do verme (figura)

A dracunculose existe desde tempos imemoriais, tendo sido detectada em múmias egípcias. O procedimento terapêutico descrito é tradicional, não se podendo di-zer desde quando é empregado. A varinha e o nemató-deo nela enrolado têm sido considerados ultimamente como a origem do bastão de Asclépio. O símbolo da

Figura. Método de extração do verme

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história da medicina

medicina seria uma simples publicidade do médico, anunciando sua habilidade em extrair um parasito sub-cutâneo. Esta fantasiosa interpretação, como dissemos, é recente. A Internet está inundada de artigos publica-dos na última década sobre o assunto, uns repetem os outros. O registro mais antigo que encontramos data de 2002 e refere-se a um artigo publicado por um mé-dico da Nova Zelândia chamado Keith Thomas Blayley. O citado artigo, com o título de The Caduceus vs. the Staff of Asclepius, foi publicado on-line no site http://drblay-ney.com/Asclepius.html, tendo sido revisado em 2005. Neste artigo, não há bibliografia, e Blayley apenas su-gere como provável origem do símbolo da medicina o modo de tratar a dracunculose. Em 2007, o mesmo autor divulgou sua teoria sob a forma impressa na re-vista Alternative Journal of Nursing July 2007, Issue 14, p. 4. Blayley é citado como fonte bibliográfica na Wikipedia e outras publicações veiculadas pela Internet.

Revimos trinta sites com artigos que mencionam a mesma história, a maioria dos quais sem referência bibliográfica, com uso de expressões como “alguns scholars acreditam”, “aceita-se”, “admite-se” e outras equivalentes. Dos trinta sites, dezessete trazem a data de sua publicação, sendo seis de 2011, o que indica in-teresse pelo assunto na atualidade.

Seria Dr. Blayley o criador dessa estulta interpreta-ção da origem do símbolo da medicina? Ou haveria algum historiador antes dele que aventou essa ideia? Baseado em que documentação? Ou estaremos diante de pura imaginação?

Os clássicos e os modernos historiadores da medici-na, como Dipgen (1932), Laignel-Lavastine (1936), Castiglioni (1947), Major (1954), Sigerist (1961), Garrison (1966), Lain Entralgo (1971) e tantos outros, jamais se referiram a essa possiblidade, assim como os autores de obras especializadas em estudos sobre Asclépio e o símbolo da medicina.

Emma e Ludwig Edelstein fizeram um levantamento completo de todas as obras da literatura greco-roma-na que se referiam a Asclépio. Encontraram 861 refe-rências e, em nenhuma delas, há alusão alguma que possa sugerir a associação do bastão de Asclépio com o tratamento da dracunculose. Também em obras re-centes, como o livro Asclepius the God de Medicine, de

Gerald Hart, editado no ano 2000, não se encontra a novidade sobre o símbolo da medicina que está sendo apregoada como verdadeira.

Estivemos na Grécia por duas vezes, em 1987 e 1996, a última das quais para participar do 35.o Congresso Internacional de História da Medicina, que se realizou na ilha de Cós. Visitamos as ruínas dos templos de Asclépio em Epidauro e Cós, com acompanhamento por guias turísticos. Em nenhum momento, tomamos conheci-mento ou ouvimos qualquer referência a essa provável origem do símbolo da medicina. O mesmo ocorreu no templo de Asclépio em Pérgamo, na Turquia.

Recentemente tivemos informação de que os guias turísticos já incorporaram essa versão em seus relatos aos visitantes.*

Poderá ocorrer com essa bizarra explicação o mesmo que aconteceu com o caduceu de Hermes, que por um equívoco passou a ser aceito como símbolo da medi-cina. É de temer-se que, mesmo tratando-se de mera especulação, sem base histórica, a nova interpretação se propague e seja aceita como verdadeira.

Veremos, então, o bastão de Asclépio reduzido a um palito fosfórico e a serpente a um helminto parasito!

_____

*Comunicação pessoal de Dr. Luiz Rassi Jr., que esteve recentemente na Grécia.

reFerÊncias

1. Castiglione A. História da Medicina (trad.). São Paulo: Cia. Ed. Nacional; 1947.

2. Dipgen P. Historia de la Medicina (trad.). Barcelona: Ed. Labor; 1932. 3. Edelstein EJ. Edelstein L. Asclepius. Collection and interpretation of

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Interamericana; 1966. 6. Hart GD. Asclepius the God of Medicine. London: Royal Society of

Medicine; 2000. 7. Laignel-Lavastine M. Histoire Générale de la Médecine, de la Pharmacie,

de l’Art dentaire e de l’Art vétérinaire. Paris: Albin Michel Ed.; 1936.8. Major RH. A History of Medicine. Oxford: Blackwell Scientific Publ.; 1954.9. Sigerist HE. A History of Medicine. Oxford: Oxford University Press: 1961.

Nota: o nome de Asclépio tem sido escrito de várias maneiras: Asclépio, Asclépios Asclepius, Asklepio, Asklepios, Asklepiós, Asklepius. Optamos pela mais simples, Asclépio, que é a adotada pela Academia Brasileira de Letras.