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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE O PRECONCEITO LINGÜÍSTICO Por: Fábia Martins Rocha Orientador Prof. Ana Cristina Guimarães Rio de Janeiro 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O PRECONCEITO LINGÜÍSTICO

Por: Fábia Martins Rocha

Orientador

Prof. Ana Cristina Guimarães

Rio de Janeiro

2005

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2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O PRECONCEITO LINGÜÍSTICO

OBJETIVOS:

Apresentação de monografia à Universidade Candido

Mendes como condição prévia para a conclusão do Curso

de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Psicopedagogia.

Por: Fábia Martins Rocha

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AGRADECIMENTOS

A todos os professores do Projeto A Vez do Mestre,

especialmente à orientadora Ana Cristina Guimarães, sempre

paciente e disponível. Aos alunos, que me permitem perceber a

importância do respeito às diferenças. Aos meus colegas,

professores, que com suas experiências contribuíram para este

projeto. Ao meu irmão, Gustavo, por resolver meus problemas

com a informática.

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais e avós, sempre incentivando meu

crescimento profissional. Ao meu marido, Carlos, pelo

companheirismo. À minha filha, Maria Clara, que já está

a caminho trazendo muita alegria.

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RESUMO

Segundo Bagno (1999), existe um preconceito em relação aos falantes nativos

do português que não dominam as regras da norma culta da língua portuguesa: o

preconceito lingüístico.

O objetivo desta pesquisa é mostrar o que é o preconceito lingüístico, como ele

ocorre e quais suas conseqüências no processo de aprendizagem.

Para que se entenda a idéia de preconceito lingüístico, são necessárias algumas

explicações acerca da língua portuguesa, que serão abordadas no primeiro capítulo. No

segundo capítulo serão apresentados alguns mitos em relação à nossa língua,

responsáveis pela perpetuação do preconceito lingüístico. O terceiro capítulo tratará do

preconceito lingüístico propriamente dito e fornecerá sugestões para um ensino de

língua portuguesa mais eficiente e democrático. A Teoria das Inteligências Múltiplas,

que também traz contribuições para a diminuição do preconceito, será apresentada no

quarto capítulo. No quinto capítulo serão mostradas as sugestões dos Parâmetros

Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa e indicações de atividades referentes ao

ensino da língua.

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METODOLOGIA

O presente trabalho é fruto de várias pesquisas, em várias frentes. Em princípio,

foram colhidas informações de diversos livros sobre o tema abordado. Foram

analisados, também, livros didáticos de língua portuguesa do ensino fundamental e as

gramáticas mais utilizadas no meio acadêmico.

Este foi o ponto de partida para o desenvolvimento do tema, que posteriormente

foi complementada com pesquisas na Internet, leitura de artigos publicados em jornais

de grande circulação e revistas especializadas.

Somam-se a essas pesquisas a vivência de sala de aula e a constante troca de

experiências entre professores, assim como relatos de alunos do ensino fundamental e

seus responsáveis.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO 1

Aspectos conceituais da língua portuguesa 10

CAPÍTULO 2

Os mitos em relação à língua portuguesa 17

CAPÍTULO 3

O Preconceito Lingüístico 26

CAPÍTULO 4

A Teoria das Inteligências Múltiplas 32

CAPÍTULO V

Os Parâmetros Curriculares Nacionais 43

CONCLUSÃO 51

REFERÊNCIAS 52

ÍNDICE 53

FOLHA DE AVALIAÇÃO 55

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INTRODUÇÃO

Segundo Bagno (1999), existe um grande preconceito, muitas vezes por parte de

educadores, em relação aos brasileiros que não dominam as regras do padrão culto da

língua portuguesa – o preconceito lingüístico.

Percebe-se uma constante preocupação por parte de alguns estudiosos da

gramática e por certos professores, que tentam mostrar que os brasileiros, falantes

nativos, “maltratam” a língua portuguesa. Colunas em jornais, livros com “fórmulas

mágicas” e até mesmo programas de televisão e comerciais anunciam a forma “correta”

de falar, pressupondo que existe uma só maneira de comunicação e desprezando

quaisquer variedades que, por sua vez, são comuns em qualquer idioma. Somam-se a

isso os vários conceitos errôneos em relação à língua portuguesa, mitos acerca da

competência lingüística e idéias já arraigadas, que colaboram para que o preconceito

aumente cada vez mais, causando problemas na auto-estima do indivíduo e,

conseqüentemente na sua aprendizagem.

Sabe-se que grande parte do povo brasileiro sente-se inferior em relação aos

países desenvolvidos, graças a uma cultura de subserviência, e para não fugir à regra,

acredita não saber falar português. Entretanto, só é possível haver língua se houver

seres humanos que a falem, logo, o povo é o dono de sua língua e não deve se preocupar

se ela não é falada da mesma forma que seus colonizadores.

O sistema tradicional de ensino que, apesar das constantes evoluções do mundo

moderno ainda é utilizado em muitas escolas, ignora que possa haver vários tipos de

inteligência e continua dando importância à gramática em detrimento da produção do

aluno e de suas múltiplas habilidades. Assim, o aluno é massacrado por regras e visto

como inferior toda vez que infringe alguma regra da norma culta, sentindo-se incapaz e

acreditando não poder aprender nenhuma outra matéria, ou desenvolver qualquer outro

tipo de atividade.

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9 Os Parâmetros Curriculares Nacionais já mostram que é necessário um novo

caminho para que o processo de aprendizagem ocorra de maneira mais eficiente. A

utilização dos temas transversais e a teoria das múltiplas inteligências apontam para a

solução de vários problemas que ocorrem nas escolas de nosso país, como a repetência e

a evasão escolar. Serão apresentadas sugestões para um ensino menos preconceituoso,

uma vez que a mudança é necessária não apenas no currículo, mas na mentalidade dos

educadores.

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10 CAPÍTULO I

Aspectos Conceituais da Língua Portuguesa

Serão apresentados alguns conceitos e nomenclaturas referentes à língua

portuguesa, contudo, nem sempre esses conceitos serão vistos como uma verdade

absoluta, uma vez que há pontos de vista diferentes em relação à gramática e ao modo

como esses conceitos são exemplificados. Como o objetivo deste trabalho é discutir e

analisar o preconceito lingüístico, é necessário ressaltar que muitas vezes esses

conceitos são contraditórios, preconceituosos e não totalmente verdadeiros. As

informações foram retiradas das gramáticas tradicionais mais conhecidas e conceituadas

no meio acadêmico, entretanto foram também analisadas gramáticas ditas mais

“modernas” e criadas de acordo com o português falado no Brasil, à luz da lingüística,

ciência da linguagem; por isso podemos dizer que esse último tipo de gramática citada

corresponde mais à realidade do português falado no Brasil.

O homem, por ser social, precisa se comunicar com os indivíduos que o cercam

para que possa viver e sobreviver e, para isso possui um dom inato que é a “faculdade

de (re)criar e manipular sistemas de comunicação”. (LUFT, 1996. p.1) Essa faculdade

criativa é o que chamamos de linguagem, que serve para que o homem estruture seu

mundo interior, para que pense e forme conhecimentos e ainda possa construir

internamente o que irá exteriorizar. Sendo assim, a função interna e externa da

linguagem, respectivamente é de pensar e de comunicar.

“Entende-se por língua ou idioma o sistema de símbolos vocais

arbitrários com que um grupo social se entende. Uma língua

pode ser instrumento particular de um povo único, como

acontece com o chinês, o romeno, ou comum a mais de uma

nação. Este é o caso do português, que serve a Portugal, ao

Brasil e colônias ultramarinas lusas.” (BECHARA, 1992,

p.23)

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11 A língua não existe por si só, sem o homem é apenas uma abstração, e com ele é

considerada um patrimônio cultural cuja sociedade a que ele pertence irá lhe transmitir.

É um conjunto organizado que permite o exercício da linguagem, por isso é vista como

um fato social que é colocado à disposição dos membros de uma comunidade

lingüística.

Apesar dessa definição, muitas vezes afirma-se que o povo “acaba com o

português” e está constantemente “maltratando sua língua”. Tais afirmações revelam

que o conceito não é bem interpretado, uma vez que afirma que a língua é um

patrimônio de seu povo e é utilizada em determinada comunidade lingüística. Nesse

caso, o povo brasileiro é o dono de seu idioma, já que este está ao seu serviço, logo não

cabe afirmar que a população não sabe sua língua, pois ela cumpre sua função com

eficácia: a função da comunicação.

Grosso modo, entende-se por linguagem qualquer processo de comunicação. A

mímica, utilizada pelos surdos-mudos, o sinal de trânsito, mensagens que são

transmitidas através de bandeiras ou espelhos com o reflexo do sol, entre outras. A

linguagem pode ser não-verbal, quando a comunicação ocorre através de gestos,

assobios ou outros tipos de sinais, ou verbal, quando ocorre por meio de palavras. Esse

tipo de linguagem é específico do homem, sendo o verdadeiro significado da palavra,

por isso “linguagem dos animais” é considerado um termo figurado. A lingüística,

contudo, só se interessa pelo tipo de linguagem exteriorizado pela palavra humana,

“fruto de uma atividade mental superior e criadora.” (LIMA, 1972, p.6)

Para que ocorra a comunicação, deve haver um sistema de sinais

convencionados, já que é através de um código que as mensagens são transmitidas.

Pode-se afirmar que o mais perfeito dos códigos é o dos sons vocais. É por meio deste

que o emissor codifica a mensagem para transmiti- la ao receptor, que a decodifica

mentalmente e, se for o caso, elabora sua resposta e a transmite ao interlocutor.

Os interlocutores são o emissor, ou falante, e receptor, ouvinte e falante, assim

alternadamente ocorre a conversação, ou diálogo. Quando a alternância não ocorre, há

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12 apenas um comunicante ativo e chamamos de difusão, exemplificada por conferências,

discursos, rádio, etc. O monólogo, seja em voz alta ou interior, é apenas um variante da

conversação.

Qualquer comunicação ocorre graças a um sistema de sinais convencionados, e

para que haja uma mensagem é necessário que haja um código. Chamamos de língua o

código de comunicação verbal. Toda língua é um sistema de sons vocais que existe

para possibilitar a comunicação entre os indivíduos. O fato de se comunicar oralmente

significa utilizar um sistema de signos vocais, que por sua vez exige um conhecimento

prévio desse sistema, que é coletivo e comum a todos os falantes, enquanto que cada ato

de comunicação é totalmente individual. Dessa forma, quando falamos em

comunicação, falamos em código e mensagem, e quando falamos de linguagem, nos

referimos à língua e fala.

É importante ressaltar que esse prévio conhecimento ocorre de maneira informal,

ou seja, não é necessário que o indivíduo entre na escola pra aprender a falar. As

crianças antes de iniciarem seu processo de escolarização já dominam as funções de sua

língua materna, assim como pessoas que nunca freqüentaram e escola, mas são

perfeitamente capazes de se comunicar, ou seja, são usuários competentes de uma

língua.

Línguas artificiais, como o Esperanto, são as únicas que não possuem variantes e

são consideradas sistemas fixos. As línguas naturais são sistemas flexíveis, possuem

variações, uma vez que o homem está em constante evolução e, da mesma forma, a

língua. Contudo, durante essa evolução, algo deve permanecer, ou então o sistema seria

destruído e a comunicação se tornaria impossível.

O que permanece sem alterações é uma base abstrata ampla, que chamamos de

esquema. Assim, toda língua é um grande esquema de possibilidades dependentes de

épocas e lugares, diferentes tipos de sociedades e de indivíduos, que são os responsáveis

pela adaptação de esquemas e pelos ajustes ou reajustes das normas de seu

funcionamento. Encontramos em todas as línguas o esquema lingüístico (amplo e

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13 abstrato) e as normas (particulares e concretas) do seu uso atual. Se não houvesse

esquema, que é a base que não varia, as mudanças e adaptações levariam o caos à

comunicação, porém enquanto ele fornece suporte, as línguas são capazes de evoluir

sem que se auto destruam, pois sempre há um esquema de referências seguro por trás do

que é novo ou apenas eventual. “Toda língua é unidade (esquema) na variedade

(normas).” (LUFT, 1996, p.6)

A norma, adaptação do sistema lingüístico, divide-se em coletiva e individual.

Dentro da norma coletiva, separa-se o que é comum a toda uma nação – o idioma – e o

que é característico de determinada região – os dialetos. Se formos aplicar esses

conceitos à nossa língua, podemos dizer que a língua portuguesa inclui os idiomas luso

e brasileiro, que por suas vez possuem seus dialetos lusitanos (de Trás-os-Montes,

Baião, etc.) e brasileiros ( nordestino, fluminense).

Sabe-se que há um critério geográfico para classificar as variantes lingüísticas,

porém existe outra variabilidade, de natureza social: assim como existem diferentes

camadas sociais, estas apresentam diferentes camadas lingüísticas, uma vez que a língua

retrata as diferentes realidades humanas. Ao falarmos de língua podemos dividi- la em

nível culto e nível inculto, seguindo o critério de escolaridade. Assim, o nível culto

seria representado por falantes escolarizados e o nível inculto por falantes que não são

capazes de ler, ou não escolarizados.

Para Câmara (1953), a língua possui duas modalidades: oral e escrita. A última

modalidade é definida como:

“resultado de uma civilização mais desenvolvida e surge em

agrupamentos humanos compactos e estáveis, com uma

indústria relativamente desenvolvida, um comércio ativo e uma

Estado organizado, em resposta às necessidades da civilização

urbana”. (CÂMARA, 1953, p. 19)

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14 A língua escrita pose ser dividida em comum e literária, que é caracterizada por

maior cuidado formal e elaboração estética.

“Língua escrita é um instrumento de comunicação menos

freqüente em que o escritor tem de suprir os recursos que estão

à disposição da língua falada. Foge, por isso, muitas vezes às

expressões comuns da linguagem ordinária para fins estéticos

ou expressivos.” (BECHARA, 1992, p. 24)

Esta sempre terá suas características particulares e nunca será idêntica à língua

falada, mesmo que a tentem copiar, a cópia será sempre uma “deformação”, já que a

língua falada vem sempre acompanhada de gestos, expressões faciais, entonações

diferentes, o que a língua escrita jamais poderá captar.

Faz-se necessária uma observação acerca de tal afirmativa. Já que é sabido que

a língua falada é diferente da língua escrita, não há sentido de continuar perpetuando

conceitos errados do tipo “o brasileiro não sabe falar sua própria língua”, pois isso ele

já faz e de forma competente, questionar se o povo escreve de acordo com as regras é

uma outra questão.

Ainda segundo Bechara (1992), a língua falada é

“um instrumento de comunicação cotidiana, que sem

preocupação artística, tem a seu dispor os múltiplos recursos

lingüísticos da entoação e extralingüísticos da mímica,

englobados na “situação” em que se acham falante e ouvinte.”

(BECHARA, 1992, p. 24)

Os falantes, na comunicação oral, podem utilizar a mesma língua de maneiras

diversas. Dependendo do lugar e da situação, utilizam determinado vocabulário e

podem falar à vontade ou de forma mais policiada, o que caracteriza um problema de

adequação do código ao objetivo da comunicação: uma fala informal, com gírias, não

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15 seria adequada para uma palestra científica, ou uma fala totalmente formal prejudicaria

a intimidade em determinada relação afetiva. Como a língua é falada em várias regiões,

principalmente no Brasil devido à grande extensão territorial, não existe uma

uniformidade total, existem muitas peculiaridades que juntas formarão o que chamamos

de regionalismos.

Antes de definir gramática, é preciso evidenciar que existem dois tipos, o que

entretanto é desprezado por alguns gramáticos mais tradicionais.

“A gramática natural é um sistema de regras segundo as quais

os falantes constroem as frases. É um saber intuitivo, o próprio

saber lingüístico ou competência idiomática de cada falante.”

(LUFT, 1996, p.5)

Assim entende-se que todo falante nativo domina a gramática natural sem que

seja necessário que tenha freqüentado a escola. A gramática artificial é a descrição

dessa competência lingüística, que posteriormente é transformada em obra (manual ou

livro) na qual a descrição é registrada.

A gramática, que é fruto de uma herança grega ou latina, é chamada de

tradicional, e tem duas vertentes: normativa e descritiva. A primeira se preocupa em

impor regras de um padrão lingüístico visto como modelo (relativo ao uso culto e

formal) e a segunda tem o objetivo de expor os fatos da linguagem. Entretanto, a

gramática tradicional sempre foi mais normativa que descritiva devido a problemas de

compreensão de certos fenômenos da linguagem e à falta de técnicas apropriadas de

descrição.

Segundo LUFT (1996), pode-se definir gramática como uma função que

“capacita o falante a construir ou a interpretar quaisquer

frases da língua. É um sistema limitado de regras que gera

frases ilimitadas – em número e extensão - , todas as frases

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16 bem formadas da língua, nem mais nem menos, ligando sentido

e som, e aliando às frases geradas uma descrição estrutural.”

(LUFT, 1996, p. 7)

Deve-se lembrar que um falante nativo de uma língua domina essas regras sem

que para isso tenha freqüentado a escola. A gramática normativa tentou reproduzir uma

língua próxima ao padrão culto, mais acertadamente, ao padrão literário, que na verdade

não retrata a linguagem oral. Logo, as gramáticas só têm serventia, se é que se pode

dizer isso, para aqueles que já sabem a língua.

“Cabe à Gramática registrar os fatos da língua geral ou

padrão, estabelecendo os preceitos de como se fala e escreve

bem ou de como se pode falar bem e escrever uma língua”

(BECHARA, 1992, p. 24 )

“ o gramático não é um legislador do idioma nem tampouco o

tirano que defende uma imutabilidade do sistema expressivo.

Cabe-lhe ordenar os fatos lingüísticos da língua padrão na sua

época, para servirem às pessoas que começam a aprender o

idioma também na sua época.” (IBID. p. 25 )

Como já foi dito, analisaremos no decorrer deste trabalho algumas afirmativas

que julgo serem preconceituosas e contraditória. O que será “falar bem”? Se o povo é

dono de sua língua e esta depende dele para existir e está em constante mutação, como

registrar o que se usava em determinada época e dizer que esses registros irão servir

para quem quer aprender uma língua? O falante nativo do idioma pode nunca ter ido

à escola e nem por isso ele deixa de ter competência lingüística, por outro lado, é

notório que ninguém é capaz de aprender uma língua apenas estudando suas regras

gramaticais.

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17 Afirma ainda Lima (1972) que,

“Fundamentam-se as regras da gramática normativa nas

obras dos grandes escritores, em cuja linguagem as classes

ilustradas põem seu ideal de perfeição, porque nela é que se

espelha o que o uso idiomático estabilizou e consagrou.

Refiro-me, decerto, àqueles escritores de linguagem corrente,

estilizada dentro dos padrões da norma culta. Excetuam-se,

pois, os regionalistas acentuadamente típicos, assim como os

experimentalistas de todos os matizes – por admiráveis que

possam ser uns e outros. Estes últimos apreciam-se no âmbito

da estética literária, mas não se prestam a abonar fatos da

língua comum.” (LIMA, 1972, p. 8 )

Ao utilizar estas palavras, o autor despreza qualquer tipo de diferença de região,

afirmando não ser de nenhuma valia a contribuição dos escritores que fogem ao padrão

da língua comum. Cabem algumas perguntas: existiu realmente em alguma época uma

língua comum? Que uso foi estabilizado e consagrado, aquele que encontramos nas

obras de Camões? Certamente essa é mais uma das afirmações preconceituosas e

inconsistentes, pois como já foi exposto, o povo domina sua língua e diferenças não

podem ser consideradas traços de inferioridade.

Cabe ao professor de língua portuguesa ou estrangeira mostrar a seu aluno que

ele tem o “direito” de se expressar como quiser, porém deve sempre levar em

consideração o ambiente e a situação e utilizar a variante mais adequada. Contudo, não

é uma questão de mudar o método de ensino ou o conteúdo programático, é necessária

uma conscientização por parte do corpo docente, pois não é possível “vender” um

produto em que não se acredita.

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18 CAPÍTULO II

Os mitos em relação à língua portuguesa

Para Bagno (1999), existem várias afirmações que não refletem a realidade, que

podemos denominar de mitos do preconceito lingüístico. Esses mitos são escutados a

todo momento e repetidos por intelectuais, pesquisadores, e até por bons observadores

dos fenômenos sociais que ocorrem em nosso país.

Mito nº 1

“O português falado no Brasil apresenta uma unidade surpreendente”

Talvez seja este o mais sérios dos mitos que levam ao crescimento e à

permanência do preconceito lingüístico. Durante muito tempo, houve a tradição de

estudos da filologia e da gramática baseados na idéia errônea de que nosso idioma

apresenta “unidade lingüística” no Brasil.

Essa afirmação equivocada traz grandes prejuízos à educação, pois não se

reconhece a diversidade do português falado no Brasil. São ignoradas as diferenças de

idade, situação socioeconômica e grau de instrução, como se nossa língua não

apresentasse diferenças; e a escola quer a todo custo, impor sua norma lingüística como

se fosse realmente a língua comum utilizada por todos os brasileiros.

Na verdade, apesar de o português ser falado pelo povo brasileiro, esse idioma

possui alto grau de diversidade e de variabilidade (BAGNO, 1999, p. 17). Não é difícil

perceber o motivo essa grande diversidade, já que o Brasil é um país de grande extensão

territorial e injustiça social, causada por péssima distribuição de renda. Esses fatores

podem explicar a existência de um verdadeiro abismo lingüístico entre a camada da

população que utiliza o padrão culto e a que usa as variedades não-cultas da língua

portuguesa.

Sabe-se que o acesso à escola é garantido apenas a uma parcela da população

brasileira, logo existe grande quantidade de indivíduos que não têm acesso à norma

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19 culta. Se virmos como verdade o mito da língua única, afirmaremos que esse grupo que

não tem acesso aos bancos escolares, e conseqüentemente ao padrão culto da língua, é o

grupo dos sem-língua. (BAGNO, 1999, p. 21) Seria correto afirmar que eles não falam

português? Na verdade, esses indivíduos falam uma variedade de português não padrão,

que possui sua gramática, que por sua vez é vista como não válida, é desprestigiada,

ridicularizada, motivo de piadas que partes dos falantes da variante padrão da língua.

Muitas pesquisas mostram que o grupo falante das variações desprestigiadas não

consegue, ou tem grande dificuldade para entender qualquer tipo de mensagem

transmitida pelo poder público, que se utiliza da variante culta da língua. Gnerre mostra

em seu livro Linguagem escrita e poder,

“a Constituição afirma que todos são iguais perante a lei,

entretanto esta lei é redigida numa língua que só uma pequena

parcela de brasileiros consegue entender.” (APUD. GNERRE,

1985)

Pode-se concluir que o próprio texto da Constituição é discriminatório, o que não quer

dizer que deveria ser escrito na variante não-culta, mas que toda a população brasileira

deveria ter acesso à chamada “língua oficial”.

Mito nº2

“Brasileiro não sabe português / Só em Portugal se fala bem o português”

Esta é mais uma afirmação amplamente ouvida, e propagada até mesmo por

educadores, que deveriam a ser os primeiros a lutar contra qualquer tipo de sentimento

de inferioridade. Na verdade, a assertiva reflete a nossa baixa auto-estima, pois até os

dias atuais nos vemos como uma colônia dependente de um país europeu mais antigo e

supostamente mais civilizado.

Essa idéia é cada vez mais difundida por professores de Português que escrevem

artigos em jornais e publicam livros que dizem ajudar a “falar bem” ou a “não errar

mais”. Partindo-se do princípio que a língua é viva e existe se um povo a fala, este deve

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20 ser visto como dono de sua língua, e não massacrado por transgredir certas regras

impostas pela gramática. Não cabe julgar ou condenar esses autores, uma vez que

também são vítimas de um pensamento retrógrado, porém já impregnado na nossa

cultura.

É claro que o brasileiro sabe português, o fato é que o português aqui falado é

diferente do que é falado em Portugal. Muitas vezes há dificuldades de compreensão

devido às diferenças: no uso de determinadas expressões, no vocabulário, nas

construções sintáticas e ainda nas diferenças de pronúncia. Na língua escrita formal, é

possível um entendimento quase total, pois a ortografia é praticamente a mesma.

Mesmo depois de tanto tempo após nossa independência, o ensino da língua

portuguesa se baseia na norma lingüística de Portugal, ou seja, as regras gramaticais são

baseadas na língua falada lá. Vários livros tentam mostrar que o brasileiro não “sabe

português”, logo encontra-se:

“A lua é mais pequena que a Terra”.

“Eis aí uma frase corretíssima, que muitos imaginam o

contrário. Mais pequeno é expressão legítima, usada por todos

os portugueses, que usam menor quando se trata de idéia de

qualidade: poeta menor, escritor menor etc.” (SACCONI

1996, p. 64)

“Fica implícito, então, que para considerar uma expressão

“legítima” basta que ela seja usada por todos os portugueses,

como se eles ditassem a norma lingüística a ser utilizada por

todos os falantes de português.” (BAGNO, 1999, p. 27)

Deve-se perguntar se as normas e dicas para se escrever bem são para brasileiros

ou portugueses. Por que se deve lembrar do que é falado ou não em Portugal? Se

utilizássemos frases como “estou a trabalhar”, forma muito presente no português de

Portugal, certamente causaria estranheza, pois não é uma construção comum no

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21 português falado aqui. Um aluno estrangeiro, ao estudar Português e tomar por base a

gramática tradicional, certamente criaria construções do tipo: “Estou a estudar” e sem

dúvida não estaria de acordo com “nossas” regras do português falado no Brasil.

O ensino de línguas estrangeiras também é afetado por esse mito. Frases como:

“Se eles não falam nem o português, como vão aprender outra língua” são proferidas a

todo instante por professores de outros idiomas, que apresentam grande desânimo ao

ensiná- los, mais uma vez confundindo língua com gramática normativa. Qualquer

indivíduo, exceto os que têm algum problema na fala, são capazes de falar uma língua.

É uma questão meramente geográfica, se nascessem na Inglaterra falaria o inglês, se

nascessem na China, o Chinês.

Como já fora exposto, nosso eterno complexo de inferioridade nos faz alimentar

a idéia errada de que os portugueses são os “donos” da língua, enquanto nós a

utilizamos, de forma errada, apenas por empréstimo.

“Nosso país é 92 vezes e meia maior que Portugal, e nossa

população é quase 15 vezes superior! Além disso, o papel do

Brasil no cenário político-econômico mundial é, de longe,

muito mais importante que o de Portugal.” (BAGNO, 1999, p.

31)

O mesmo não acontece com o povo norte-americano. Certamente se falarmos

com algum americano que seu inglês é “feio” ou “errado”, se comparado ao inglês

britânico, ele achará um absurdo e dirá que estamos dizendo uma grande inverdade.

Muitas vezes escuta-se de alunos frases como “Não vou saber falar Inglês nunca.

Não sem nem o português, que é a minha língua.” E ainda de pais de alunos: “Ele não

tem jeito mesmo. Fala tudo errado, mas a gente também é ignorante, não sabe falar”

Frase que geralmente são rebatidas com outras do tipo: “A senhor não sabe falar? Está

usando sinais de fumaça para se comunicar comigo?” Faz-se uma brincadeira, na

tentativa de mostrar que a afirmativa não é verdadeira, uma vez que a comunicação

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22 ocorre perfeitamente, apenas não utilizam-se as regras definidas pela gramática

tradicional.

Mito nº3

“Português é muito difícil”

Eis mais uma assertiva preconceituosa que foi construída graças ao ensino da

língua portuguesa nas escolas, sempre baseada na norma gramatical de Portugal. Como

a maioria dessas regras não se aplica à maneira que falamos e escrevemos no Brasil,

somos levados a crer que o “português é uma língua difícil”, na verdade, é difícil

decorar conceitos e aprender regras que não têm significado algum para nós.

“Todo falante nativo de uma língua sabe essa língua. Saber

uma língua, no sentido científico do verbo saber, significa

conhecer intuitivamente e empregar com naturalidade as

regras básicas de funcionamento dela” (BAGNO, 1999, p. 35)

Crianças de 3 ou 4 anos de idade dominam as regras gramaticais de sua língua.

Não ouvimos nenhuma criança dizer “Uma bonito garotos chegou aqui amanhã”, o que

ela ainda não conhece são as nomenclaturas e irregularidades no uso de regras.

“Qualquer língua é “fácil” para quem nasceu e cresceu rodeado por ela” (BAGNO,

1999, p. 35), se realmente houvesse línguas difíceis, ninguém no mundo falaria chinês,

japonês ou árabe.

Este mito é escutado com freqüência, e difundido até mesmo por professores da

língua portuguesa. Mais uma vez a idéia errada que se tem de língua faz com que esse

mito seja sempre difundido. Todos nós, falantes do português, conhecemos as regras de

nossa gramática, o que muitas vezes acontece é a falta de domínio de normas ditadas

pelo padrão culto da língua, ou melhor, o que as gramáticas denominam padrão culto.

Mito nº4

“As pessoas sem instrução falam tudo errado”

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23 Como já foi visto, a premissa para o preconceito lingüístico é a crença de que

existe apenas uma língua portuguesa – aquela cujas normas são ensinadas na escola – e

que qualquer variação dessa mesma língua é vista como inferior, deficiente ou errada.

Toda língua é viva e fenômenos fonéticos sempre ocorreram, daí o surgimento do

próprio português, que é derivado do latim. Seguem alguns exemplos:

brando > blandu (latim)

cravo > clavo (latim)

obrigar > obligare (latim)

Existem muitos outros exemplos, mas estes são suficientes para mostrar que as palavras

do português padrão sofreram um fenômeno: palavras que tinham um L em sua origem,

que foi transformado em R. Logo não podemos classificar, de forma preconceituosa,

todas as pessoas que dizem Framengo, praca, grobo como ignorantes ou burras, senão

seria o mesmo que dizer que toda a população da época em que a língua portuguesa

estava se formando tinha esse problema.

“Do ponto de vista exclusivamente lingüístico, o fenômeno que

existe no português não-padrão é o mesmo que aconteceu na

história do português padrão, e tem até um nome técnico:

rotacismo.” (BAGNO, 1999, p. 42)

Esse fenômeno continua presente na variedade não-padrão, pois nesta as tendências

normais se manifestam de forma livre.

Mito nº5

“O lugar onde melhor se fala o português é o Maranhão”

Essa afirmativa é repetida por muitas pessoas e apareceu devido à nossa posição

de inferioridade em relação a Portugal. Sabe-se que no Maranhão o pronome tu é

utilizado seguido das formas verbais clássicas, com a terminação em –s, enquanto que

nas demais regiões do Brasil, o tu foi substituído por você. Na verdade, esse pronome

está perto de desaparecer da fala do brasileiro, e nos lugares onde ainda é utilizado, o

verbo é conjugado na terceira pessoa: tu vai, tu fica.

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Essa conservação de um só aspecto da linguagem que é o mesmo usado em

Portugal faz com que o mito se perpetue. Entretanto, o fato de os maranhenses dizerem:

Aquele é um bom lugar pra ti ir, em vez da forma “correta”, é desprezado pelas mesmas

pessoas que usam o critério de correção do pronome tu e da conjugação dos verbos.

Mito nº 6

“O certo é falar assim porque se escreve assim”

Indivíduos de diferentes regiões do Brasil ao lerem determinada palavra o fazem

de maneira distinta. Não podemos dizer que um está certo e o outro errado, pois em

qualquer língua do mundo ocorre o fenômeno da variação, que significa que não há

língua falada da mesma maneira em todos os lugares.

Existe uma tendência no ensino na língua de ensinar o aluno a pronunciar da

maneira que se escreve, como se fosse o jeito certo de falar português. Muitas vezes

sugere-se ao professor que corrija alunos que dizem “mininu”, “bêjo”, anulando

qualquer variação. Não é uma questão de deixar de ensinar a escrever de acordo com a

ortografia oficial, porém o caminho não é criar uma língua falada que não existe e

classificar como erradas as pronúncias geradas pelas diferentes variações. O ideal seria

mostrar ao aluno que é possível dizer “mininu” e “bêjo”, entretanto na escrita deve-se

respeitar uma única ortografia para que a compreensão do que está escrito ocorra.

A língua escrita é artificial e tenta reproduzir a fala, é necessário treino,

memorização e exercícios para dominá-la. Já a língua falada é viva, está em constante

evolução e é nela que ocorrem as mudanças que transformam a língua. O indivíduo

aprende a língua falada antes da escrita, quando isso acontece, já que há pessoas que

nunca aprenderam a ler e a escrever e são falantes de sua língua materna, alcançando o

objetivo da comunicação.

O estudo da gramática surgiu para observar as regras da língua escrita na

tentativa de preservaras formas mais “corretas” da língua literária. Acontece que as

regras dessa língua foram cobradas da língua falada, principalmente no ensino

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25 tradicional da língua, cujo objetivo é fazer com que as pessoas falem sempre da mesma

maneira. Os fenômenos da língua oral são totalmente desprezados, como se a língua

literária fosse o único objeto digno de ser estudado.

Mito nº7

“É preciso saber gramática para falar e escrever bem”

Essa afirmativa é amplamente divulgada por professores de português, como se

fosse um instrumento indispensável para o domínio do padrão culto da língua. Até

mesmo alguns pais de alunos cobram dos professores o ensino de regras, conceitos e

pontos gramaticais. Se a frase fosse verdadeira, chegaríamos à conclusão de que todos

os gramáticos seriam excelentes escritores, e os bons escritores seriam mestres em

gramática. Contudo, vários escritores, como Rubem Braga, Carlos Drummond e

Machado de Assis já escreveram a respeito desse assunto e foram unânimes em afirmar

que não dominavam conceitos gramaticais e a declarar sua ignorância.

Na verdade, a gramática surgiu para descrever a língua e fixar regras e padrões

que eram utilizados de forma espontânea por grandes escritores e, com o passar do

tempo ocorreu uma inversão. A gramática passou a ser vista “como um instrumento de

poder e controle” (BAGNO, 1999, p. 64) e apareceu a idéia de que os escritores e

falantes da língua precisam dela para falar “corretamente”, assim, a língua se tornou

subordinada à gramática.

Mito nº8

“O domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social”

Se a afirmativa fosse verdadeira, os professores estariam no topo da pirâmide

social, econômica e política do país, o que não acontece. Por outro lado algum

fazendeiro que pouco tenha estudado, mas que tenha indústrias e influência política em

sua região poderá utilizar a padrão não-culto da língua que ninguém irá corrigi- lo. Isto

é, de nada adianta dominar a norma culta se o indivíduo não possuir acesso à tecnologia,

se não tiver um lugar para morar, um trabalho digno e tudo que for necessário para sua

sobrevivência.

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26 CAPÍTULO III

O preconceito lingüístico

“Ensinar bem é ensinar para o bem. Ensinar para o bem

significa respeitar o conhecimento intuitivo do aluno,

valorizar o que ele já sabe do mundo, da vida, reconhecer

na língua que ele fala sua própria identidade como ser

humano.” (BAGNO, 1999)

Como já visto, vários são os mitos transmitidos e eternizados graças à gramática

tradicional, os métodos de ensino tradicionais e os livros didáticos. Forma-se então o

que Bagno (1999) chama de círculo vicioso do preconceito lingüístico, a gramática

tradicional guia a prática de ensino que acentua a demanda pelos livros didáticos cujos

autores recorrem à gramática tradicional.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais citam os preconceitos existentes no

método de ensino tradicional e tentam mudar esse panorama, assim como muitas

editoras que tentam se “modernizar” confeccionando livros didáticos compatíveis com

as idéias e sugestões dos PCNs. Contudo, o preconceito está tão arraigado em nossa

cultura, que é necessário um trabalho constante e lento de conscientização, uma vez que

o preconceito também ocorre quando uma pessoa o exerce contra si própria.

Infelizmente ainda existem mulheres que se sentem inferiores em relação aos homens,

negros em relação aos brancos, homossexuais que se vêem como “anormais” ou

“doentes”. Da mesma forma, existe um grande número de pessoas que acredita não

saber falar o português, apesar de tê- lo como língua materna. Livros que prometem

ensinar regras de ouro para que não se erre mais, anúncios de televisão e colunas de

jornal contribuem para que o preconceito aumente a cada dia, pois somos bombardeados

com afirmações do tipo: “o português é maltratado”, “é necessário que se ensine e

explique o português para seus falantes nativos”. E o povo, que já possui um histórico

de submissão, que se acha inferior, que tem uma baixa auto-estima, vê como verdades

absolutas essas afirmativas, já que elas partem das camadas prestigiadas e da mídia e se

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27 sente cada vez mais desprestigiado, inferiorizado e excluído, uma vez que não domina o

padrão culto da língua e tem consciência disso.

3.1 - Como desconstruir o preconceito lingüístico?

Sabe-se que muitos professores de língua portuguesa, graças a debates,

conferências e estudo de bons textos, não pautam suas aulas apenas na gramática

normativa, entretanto há uma carência de material e instrumentos didáticos que

complementem as atividades propostas por esses professores.

Acredita-se que a norma culta deve ser o objeto de estudos na sala de aula,

porém a pergunta que se deve fazer é: Onde está essa norma culta? Conforme já foi

dito, a norma culta é “patrimônio” de poucos no Brasil, devido a razões de ordem

política, social, econômica, social e cultural, assim como o transporte, educação,

alimentação, habitação etc.

Sabe-se que há um número espantoso de analfabetos no Brasil além de milhões

de crianças em idade escolar que não freqüentam nenhuma escola, soma-se a isso o fato

de que o Brasil pouco investe em educação, apesar de nossa Constituição afirmar que a

educação é “dever do estado.” A norma culta está tradicionalmente ligada à norma

literária e à língua escrita, logo afirmar que o português no Brasil está em decadência,

ou que ocorre um grande desrespeito à norma culta não é uma atitude muito coerente.

Além disso, por motivos históricos e culturais, as pessoas alfabetizadas nem

sempre desenvolvem o hábito da leitura e da escrita. A escola, em vez de continuar

propagando mitos como “português é muito difícil”, deveria incentivar o uso das

habilidades lingüísticas do indivíduo, incentivando-o a se expressar livremente, para

então corrigir possíveis desvios. Contudo, não é o que ocorre, o método de ensino

tradicional faz com que o professor corrija os “erros”, muitas vezes de maneira punitiva,

mesmo que tenha que interromper o fluxo da comunicação e expressão, o que acarreta

nos alunos uma idéia de incapacidade, incompetência, e “burrice”.

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28

O termo norma culta é utilizado pela tradição gramatical conservadora para

denominar uma modalidade da língua que não corresponde à língua “real” usada em

nosso país, mas a uma língua ideal que foi inspirada no português falado em Portugal e

utilizado por seus grandes escritores. Várias descrições acerca do uso da língua

encontradas em gramática não correspondem à realidade, não são encontradas no

discurso de professores universitários, jornalistas e escritores. Se estes não têm o

domínio da norma culta, quem tem?

É necessário separar o ideal do real, ou seja, identificar e descrever a língua

realmente falada pelas classes cultas no Brasil. Com isso seria possível a criação de

uma gramática da norma culta brasileira em linguagem simples, para que pudesse ser

utilizada como ferramenta útil para alunos, professores e usuários da língua. Enquanto

essa gramática não é escrita, ficamos dependentes das gramáticas tradicionais, que

caracterizam como culta uma modalidade da língua que não existe, mas que deveria

existir.

Na tentativa de combater o preconceito lingüístico, já que não há muitas

ferramentas, deve-se mudar de atitude. É necessário que o aluno acredite em seu

potencial e aumente sua auto-estima lingüística, não aceitando velhos mitos que têm a

intenção de menosprezar a sua competência lingüística. O povo é o dono de sua língua,

pois sem um povo que a sustente, a língua tende a desaparecer, logo deve-se saber que

todos os brasileiros são falantes competentes de sua língua materna. Não se pode

continuar aceitando e perpetuando a idéia que “português é uma língua difícil” ou

descriminando indivíduos da zona rural ou de classes sociais mais baixas ao afirmar que

estes “falam tudo errado”. Quanto aos professores, cabe ainda não aceitar antigos

dogmas e adotar uma postura crítica em relação à norma culta. Um estudo mais

questionador junto com os alunos em relação ao que está escrito nas gramáticas

tradicionais seria mais proveitoso, e mais realista, do que a mera repetição e transmissão

de conceitos ultrapassados que não correspondem à nossa realidade lingüística. Assim,

professor e alunos passariam a produzir seu próprio conhecimento, pesquisando,

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29 trabalhando com a língua viva falada e escrita, o que tornaria as aulas mais prazerosas e

certamente mais interessantes e eficientes.

Todo o universo está em constante mudança, e a língua não foge à regra.

Entretanto, o ensino da língua portuguesa no Brasil parece querer formar especialistas,

pois são exigidos dos alunos conceitos, classificações e terminologias, como se o

domínio destes fizesse dos alunos bons leitores, escritores e falantes competentes da

língua culta. Os professores de língua portuguesa devem saber esses conceitos, pois são

os instrutores, especialistas, porém os alunos não.

Antes de entendermos o conceito de erro, é necessário saber que a língua deve

servir a seus falantes para que haja a comunicação. Não podemos dizer, do ponto de

vista científico, que alguém cometeu um erro de português ao escrever numa placa

“Vendemos artezanato” , pois o indivíduo conseguiu transmitir a mensagem. Ocorreu

um erro na grafia, já que existe uma lei responsável pela manutenção da ortografia

oficial. Todo falante nativo de uma língua é capaz de perceber, através de sua intuição,

se alguma construção está de acordo com as regras de sua língua.

“Ninguém comete erros ao falar sua própria língua materna,

assim como ninguém comete erros ao andar ou ao respirar. Só

se erra naquilo que é aprendido, naquilo que constitui um

saber secundário, obtido por meio de treinamento, prática e

memorização: erra-se ao tocar piano, erra-se ao dar um

comando ao computador, erra-se ao falar/escrever uma língua

estrangeira.” (BAGNO, 1999, p. 124)

A língua materna não pode ser vista como um saber desse tipo, pois é adquirida

pela criança, tanto que aos três anos ela já domina a gramática de sua língua.

“O falante nativo possui um conhecimento implícito altamente

elaborado de sua língua, porém não é capaz de explicar esse

conhecimento, que não é resultado de instrução recebida na

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30 escola, mas foi adquirido de forma espontânea e natural

quanto a habilidade de andar.” (PERINI, 1997, p. 25)

Dessa forma, podemos concluir que erros de português podem existir, porém quem

o tem como língua materna jamais irá cometer. Frases do tipo não serão construídas por

falantes nativos do português, mesmo que estes nunca tenham freqüentado a escola,

pois não respeitam as regras de funcionamento de nossa língua:

1. Aquele menina é estudiosa

2. Saí com o João amanhã

3. O homem saiu que comigo trabalhou já

A intenção das questões aqui analisadas não é admitir tudo como certo, porém deve-

se sempre levar em consideração o contexto em que determinada palavra ou expressão é

utilizada. Gírias são totalmente aceitáveis, dependendo de onde e quando são usadas,

assim como o palavrão. Algum torcedor ao ver seu time perder numa final de

campeonato devido ao erro do juiz, no meio da torcida, no Maracanã lotado, certamente

usaria um vocabulário diferente do que utilizaria numa entrevista de emprego.

O papel do professor de português é o de mostrar ao aluno que a língua existe para

servi- lo, mas que ele deve ter consciência do que é ou não adequado a determinada

situação. Assim como ninguém vai à praia de gorro e cachecol num dia de verão, ou vai

de biquini para o trabalho, deve-se saber quando é possível usar determinada variante ou

não.

Sempre que se fala ou se escreve, é necessária uma adequação à situação em que o

indivíduo se encontra, percebendo se é formal, para que a linguagem formal seja usada,

ou se é descontraída, para que seja usada uma linguagem mais informal. Para isso,

devemos analisar o grau de aceitabilidade de quem irá receber nossa mensagem, tudo

depende do que iremos dizer, a quem, quando, onde, por que e com que intenção.

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31 Professores que seguem o método tradicional de ensino, irão, ao receber uma

redação de um aluno, procura os desvios de ortografia e corrigi- los, em vez de prestar

atenção ao conteúdo, ignorando assim que ortografia e língua são coisas distintas e

saberes diferentes.

Bagno, (1999) fornece algumas sugestões para um ensino de língua não

preconceituoso. O professor deve ter consciência de que todo falante nativo de

determinada língua é um falante competente dessa língua, logo sabe falar. Assim, é

fácil aceitar a idéia de que não existe erro de português, o que existe são diferenças no

uso em relação à única regra mostrada pela gramática normativa. Logo, não se pode

confundir erro de português com erro de ortografia, pois esta é artificial, enquanto que a

língua é natural. È necessário o reconhecimento de que tudo o que a Gramática

Normativa considera erro é um fenômeno que tem explicação científica e já ocorreu em

outros momentos. Se determinado uso, diferente da norma culta, está sendo utilizado é

porque existe uma nova regra, logo o problema reside na regra tradicional e não nos

falantes nativos.

O educador deve se conscientizar que toda língua muda e varia, por isso o que

hoje é considerado certo, no passado já foi visto como erro. Da mesma forma, o que

hoje é visto como errado, pode vir a ser considerado certo no futuro. Afirmações do

tipo “a língua portuguesa vai mal” não têm fundamento, pois a língua simplesmente

evolui, como todas as outras coisas no mundo, e não pode ter sua evolução detida. As

variedades lingüísticas devem ser respeitadas, pois isso é o mesmo que respeitar a

integridade física e moral de um indivíduo, pois a língua permeia tudo, logo nos

constitui como seres humanos.

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32 CAPÍTULO IV

A Teoria das Inteligências Múltiplas

Antes de expor as teorias das inteligências múltiplas, é necessário saber o

conceito de inteligência. A palavra “inteligência” se originou de duas palavras latinas:

inter = entre e eligere = escolher. Grosso modo, significa a capacidade que o cérebro

tem de fazer com que os indivíduos compreendam as coisas através do melhor caminho.

O juízo, o raciocínio e a formação de idéias são vistos como atos essenciais à

inteligência. Analisando brevemente as raízes biológicas da inteligência, percebe-se

que ela é fruto de uma operação realizada pelo cérebro que permite que o indivíduo

resolva problemas e até crie novos produtos que sejam relevantes para determinada

cultura, servindo assim para que escolhamos sempre a melhor solução.

No início do século XX, foi solicitado a Alfredo Binet um instrumento que fosse

capaz de prever quais crianças seriam bem sucedidas nos liceus parisienses. O

instrumento criado testava a habilidade verbal e matemática das crianças, pois os

currículos dos liceus enfatizavam essas áreas. Este instrumento originou o primeiro

teste de inteligência, o Stansford-Binet Intelligence Scale, que por sua vez gerou outros

testes de grande influência neste século, apesar de o próprio Binet ter afirmado que

apenas um número não era capaz de retratar uma questão tão complexa quanto a

inteligência dos seres humanos.

A teoria das Inteligências Múltiplas, de Howard Gardner (1985) vai de encontro

à idéia de que a inteligência é uma capacidade inata, geral e única, uma vez que não

acreditava nos testes de Q.I. (coeficente de inteligência). Passou então a avaliar as

atuações de diferentes profissionais em diversas culturas, e do repertório de habilidades

dos seres humanos na busca de soluções, culturalmente apropriadas, para os seus

problemas. Gardner estudou o desenvolvimento cognitivo através do tempo e também o

desenvolvimento de diferentes habilidades em crianças ditas normais e superdotadas,

analisou adultos com lesões cerebrais e percebeu que estes não reduzem sua capacidade

intelectual, mas algumas habilidades sem que outras sejam prejudicadas. Grupos vistos

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33 como excepcionais, como os idiot-savant e autistas também foram observados e

chegou-se à conclusão que os primeiros dispõem de apenas uma competência e são

relativamente incapazes nas outras funções cerebrais, enquanto os autistas mostram

ausências nas suas habilidades intelectuais

Gardner era um psicólogo construtivista muito influenciado por Piaget, porém

não acatava todas suas teorias. Acreditava que uma criança poderia apresentar

desempenho precoce em determinada área e estar na média ou abaixo dela em outra

área, por exemplo, possuía habilidades referentes ao período do pensamento formal e

não dominava as fases do período sensório-motor. Para o psicólogo, o desenvolvimento

cognitivo é uma capacidade de entender e expressar diferentes significados em

determinado contexto cultural, sem que haja necessariamente uma ligação entre os

estágios de desenvolvimentos em uma área de desempenho, já que cada uma dessas

áreas possui um sistema simbólico próprio.

Ao eliminar-se a idéia de que existe uma inteligência geral e aceitar que esta

possui um sentido mais amplo, pode-se dizer que a inteligência é um fluxo cerebral que

leva as pessoas a escolherem a melhor opção na hora de solucionar problemas e superar

qualquer dificuldade.

“É evidente que a inteligência não constitui apenas um

elemento neurológico isolado, independente do ambiente.

Piere Lévy (1993) desenvolveu lucidamente a noção de

ecologia cognitiva, na qual avança para ultrapassar a visão

isolada do conceito, mostrando que fora da coletividade,

desprovido do ambiente, o indivíduo não pensaria. Todas as

nossa inteligências nada mais são do que segmentos

componentes de uma ecologia cognitiva que nos engloba. O

indivíduo, portanto, não seria inteligente sem sua língua, sua

herança cultural, sua ideologia, sua crença, sua escrita, seus

métodos intelectuais e outros meios do ambiente.”

(ANTUNES, 1999, p. 25 )

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Assim, pode-se dizer que a inteligência depende de outros fatores para que se

desenvolva, uma vez que sem estímulos ela permanece estagnada.

Pesquisas recentes na área da neurobiologia apontam a presença de áreas no

cérebro humano, que correspondem, aproximadamente, a diferentes aspectos da

cognição. Seria como se determinado ponto do cérebro fosse responsável por um setor

que contivesse certa forma específica de competência e de processamento de

informações. Apesar de não ser tarefa de fácil realização afirmar certamente quais são

essas áreas, acredita-se que cada uma delas seja capaz de expressar uma forma diferente

de inteligência, ou seja, de ser responsável por uma solução específica de problemas ou

criação de algo válido para determinado momento.

A Teoria das Inteligências Múltiplas defende a idéia de que a mente humana é

regida por diferentes tipos de inteligência existentes e procura ultrapassar a idéia

comum e já conhecida de inteligência, de que esta é uma capacidade ou potencial geral

que cada ser humano possui em maior ou menor grau. Questiona ainda a suposição de

que esta pode ser medida por instrumentos verbais padronizados, mostrando uma visão

pluralista de mente e ampliando o conceito de inteligência única para um leque de

possibilidades. A inteligência é então definida como a capacidade de resolver

problemas ou elaborar produtos valorizados em um ambiente cultural ou comunitário.

Segundo Gardner (1995), para que a cognição humana seja estudada de forma

completa, é necessário que sejam analisadas competências que, geralmente, são

desprezadas. Além disso, os instrumentos para a medição dessas competências não

podem ser apenas verbais, que tomam por base apenas habilidades lingüísticas ou

lógico-matemáticas.

O ponto primordial é a não existência de apenas uma capacidade mental, mas

várias inteligências que funcionam de forma combinada e fazem com que o ser humano

seja capaz de assumir diversos papéis.

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Não é fácil localizar os pontos neurais onde determinado tipo de inteligência

estaria, por isso Gardner (1995) mostrou sinais ou critérios essenciais para que

determinada competência seja caracterizada como inteligência. São eles:

1. Identificação da “morada” da inteligência por dano cerebral

Esse critério é válido se existe a possibilidade de o dano causado a certa parte do

cérebro afetar as habilidades pertencentes a determinada inteligência. Um dano cerebral

que atinja certa parte do hemisfério esquerdo do cérebro pode destruir a capacidade da

fala de um indivíduo, ou sua capacidade de formar imagens através de palavras, sem

contudo, afetar outros pontos ou outros tipos de inteligência em outras áreas cerebrais,

uma vez que existem outras “moradas” para as outras inteligências.

2. Existência de indivíduos excepcionais em áreas específicas na solução de

problemas ou criação

Pessoas consideradas “gênios” ou os chamados idiots savants que possuem

grandes limitações em determinados níveis de inteligência e excepcionalidade em

outras, tornam possível a caracterização dessas inteligências em “isolamento’. Podemos

ilustrar isso com o caso de crianças autistas que desenham muito bem, ou com a

existência de pessoas que possuem grandes delimitações físicas e são excelentes

músicos ou artistas, pois possuem várias inteligências afetadas, mas outras com

destaque.

3. Gatilho neural pronto para ser disparado em determinados tipos de informação

interna ou externa

Esse critério está apoiado na capacidade de alguns indivíduos em fazer funcionar

rapidamente sua inteligência através de estímulos. Por exemplo, alguma criança ao

ouvir pela primeira vez uma orquestra sinfônica, mostraria fascínio e percepção pela

musicalidade, ou pessoas que ao assistirem uma apresentação de balé seriam capazes de

reproduzir passos de dança.

4. Suscetibilidade à modificação da inteligência por treinamento

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36 As inteligências não nascem prontas juntamente com o indivíduo, mesmo que

alguns apresentem níveis mais elevados que outros em uma ou outra inteligência.

5. História de plausibilidade evolutiva

As raízes de nossa inteligência datam de milhares de anos de história e

determinadas inteligências mostram-se mais aceitáveis por ser possível a localização de

antecedentes evolutivos. A biologia e sua história são capazes de revelar essas

antecedências.

6. Exames específicos por meio de tarefas psicológicas experimentais

Algumas pesquisas psicológicas podem estudar os detalhes de um processo

lingüístico, espacial ou musical, possibilitando que a autonomia de determinada

inteligência seja investigada. Para exemplificar essa autonomia, podemos perceber que

existem pessoas com ótima memória verbal e limitada memória numérica, assim como

existem pessoas com excelente memória musical que não são capazes de executar ou

memorizar passos de uma dança.

7. Apoio a exames psicométricos

Os resultados de experiências psicométricas fornecem indícios de inteligências

específicas, já que é comum observar pessoas com grande habilidade lógico-matemática

e pouca habilidade espacial, ou grande expressividade verbal e reduzida capacidade

musical.

8. Criação de um sistema simbólico expressivo

Sabe-se que grande parte da representação e comunicação humana se dá através

de sistemas simbólicos. As letras são símbolos diferentes das notas musicais, da mesma

foram que os sinais cartográficos são diferentes de sinais faciais, mas, em geral, pode-se

perceber oito ou nove sistemas simbólicos específicos que mostram o isolamento das

diferentes inteligências. Uma das mais importantes características da inteligência

humana é a busca natural pela incorporação de um sistema simbólico específico.

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37 Grosso modo, esses oito critérios tornam possível a identificação do grupo das

inteligências múltiplas e os meios que as julgam.

Apesar de serem descritas isoladamente, as inteligências múltiplas não operam

de forma isolada. A solução de problemas envolve a utilização de mais de uma

habilidade, embora sempre ocorra uma predominância, as inteligências estão sempre

integradas. Todas as relações complementares entre as inteligências permitem a

possibilidade de exploração de uma em favor da outra. É o uso da chamada rota

secundária para se alcançar a rota principal de uma determinada inteligência. Todos os

indivíduos já nascem com o potencial das várias inteligências, exceto nos casos de

lesões, porém as relações com o ambiente, incluindo os estímulos culturais, são

responsáveis pelo desenvolvimento de algumas e pela falta de aprimoramento de outras.

Segundo Gardner (1985), seriam nove as inteligências:

1. Lógico-matemática

Os componentes centrais dessa inteligência são descritos como uma

sensibilidade para ordem, sistematização e padrões. Esse tipo de inteligência se

caracteriza pela habilidade, ou grande facilidade de resolver problemas pelo uso de

relações, categorias, padrões através da manipulação de objetos ou símbolos, assim

como a habilidade de dedução e de observação.

Certas áreas do cérebro se destacam mais para cálculos matemáticos do que

outras, como por exemplo, os idiot savants, que são extremamente competentes para

fazer cálculos, porém deficientes em outras áreas. Entretanto, essa inteligência não é

necessariamente verbal, já que a solução do problema pode ser construída antes de ele

ser articulado. Indivíduos com tais habilidades têm facilidade para fazer cálculos

matemáticos e criar notações práticas ao seu raciocínio, certamente se interessam por

atividade de matemática e física. Para desenvolver este tipo de inteligência, o professor

deve propor problemas para que sejam resolvidos, desenvolver jogos matemáticos, fazer

com que os alunos analisem dados e trabalhar com números, medidas, geometria,

probabilidade e noções de estatística.

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2. Lingüística

Os componentes centrais da inteligência lingüística são uma sensibilidade para

os sons, ritmos e significados das palavras, além de uma especial percepção das

diferentes funções da linguagem.

Esse tipo de inteligência caracteriza-se pela habilidade no uso da linguagem para

fazer discursos, transmitir idéias, convencer, agradar ou fazer humor. Pessoas dotadas

dessa inteligência têm facilidade para utilizar palavras e seus significados e valorizam a

semântica e a sintática. A propriedade da linguagem é universal e seu desenvolvimento

nas crianças ocorre de maneira constante em todas as culturas, mesmo quando a

linguagem não é necessariamente oral, as crianças são capazes de inventar suas próprias

linguagens. Como exemplo de atividades ligadas a esse tipo de inteligência podemos

citar profissões de escritor, orador, poeta ou contador de histórias.

Para estimular esta inteligência, o professor deve fazer leituras variadas, pedir

para que os alunos produzam textos e trabalhar com debates e discussões.

3. Musical

Esta inteligência se manifesta através de uma habilidade para apreciar, compor

ou até reproduzir uma peça musical. O indivíduo que possui esta habilidade é capaz de

discriminar sons, perceber temas musicais, além de possuir sensibilidade para ritmos,

texturas e timbres. A criança pequena dotada de inteligência musical percebe desde

cedo diferentes sons no seu ambiente e canta para si mesma com freqüência.

O ideal para o desenvolvimento desse tipo de inteligência é a atividade através

de músicas, a criação de um coral e a utilização de instrumentos musicais.

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39 4. Espacial

Esta inteligência é caracterizada pela capacidade de perceber o mundo visual e

espacial de forma precisa. É a habilidade para manipular formas ou objetos

mentalmente e, a partir dessa percepção, criar equilíbrio e composição numa

representação visual ou espacial. Indivíduos dotados desta inteligência têm habilidade

de encontrar caminhos específicos em algum lugar, reconhecer facilmente faces ou

cenas e perceber detalhes quase imperceptíveis, pois percebem o mundo visual e

espacial de maneira precisa, sendo , por exemplo, capazes de visualizar determinado

objeto de diferentes ângulos. Se destacam em áreas como a navegação, jogo de xadrez,

quebra-cabeças. Engenharia, arquitetura, cirurgia, escultura e pintura.

O professor deve propor a confecção de mapas, plantas e maquetes e ainda a

descrição de trajetos. A utilização de quebra-cabeças e a produção de gráficos também

são excelentes atividades para o desenvolvimento desse tipo de inteligência.

A área responsável pelo processamento espacial é o hemisfério direito.

Qualquer dano ocorrido na região posterior direita está relacionado diretamente à perda

da capacidade de reconhecer rostos ou cenas ou de perceber detalhes, entretanto,

pacientes com esta deficiência são capazes de compensá- la com estratégias lingüísticas.

5. Físico-Cinestésica ou Corporal-Cinestésica

Esta inteligência se refere à habilidade para resolver problemas ou criar produtos

através do uso de parte ou de todo o corpo. Está presente na área especial do cérebro

responsável pelo controle do movimento, o córtex motor, em que o hemisfério em

questão é o oposto do hemisfério dominante. Por exemplo, nos destros, o movimento é

originado no hemisfério esquerdo. Caracteriza-se pela habilidade para resolver

problemas e criar produtos através do corpo, já que os indivíduos possuem refinada

coordenação motora grossa ou fina no controle dos movimentos do corpo e na

manipulação de objetos com destreza. Destacam-se nas seguintes áreas: dança, jogos,

esportes, mecânica.

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O professor deve utilizar dramatizações, brincadeiras, mímicas e adotar a

movimentação física nas aulas, para que esse tipo de inteligência se desenvolva.

6. Interpessoal

Pode-se descrever esta inteligência como uma habilidade para entender e

responder adequadamente a humores, temperamentos motivações e desejos de outras

pessoas. É observada em professores, psicoterapeutas, políticos e vendedores bem-

sucedidos. Em crianças pequenas, é manifestada através da habilidade para distinguir

pessoas e liderar outras crianças, pois são bastante sensíveis às necessidades e

sentimentos de outros.

É interessante que se desenvolvam atividades que exijam cooperação. A

realização de jogos e trabalhos em grupos, assim como a estimulação da comunicação

oral e escrita são importantes para o desenvolvimento desse tipo de inteligência.

Existem dois fatores únicos no ser humano que são importantes para o

desenvolvimento pleno dessa inteligência, além das evidências biológicas: o

relacionamento estreito e prolongado com a mãe e a interação social.

7. Intrapessoal

Esta inteligência se caracteriza pela habilidade em ter acesso aos próprios

sonhos, sentimentos e idéias e utilizá- los na solução de problemas pessoais. É o

reconhecimento de habilidades, necessidades, desejos e inteligências próprios, que se

traduz em uma capacidade de formular uma imagem precisa de si mesmo e utilizá- la de

forma que funcione efetivamente. É a mais pessoal de todas as inteligências, e só pode

ser observada através do sistema simbólico de outras inteligências, isto é, através de

manifestações lingüísticas, musicais ou cinestésicas.

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41 O professor deve estimular a reflexão sobre o raciocínio de seus alunos, e de

seus pontos de vista, fazendo com que eles estabeleçam métodos para si próprios, dessa

forma, estará ajudando para o desenvolvimento desse tipo de inteligência.

8. Pictórica

Esta inteligência se caracteriza pela habilidade de reproduzir, pelo desenho,

objetivos e situações reais ou mentais e de organizar elementos visuais de forma

harmônica, estabelecendo relações estéticas entre elas. Trata-se de uma inteligência que

se destaca em pintores, artistas plásticos, ilustradores e chargistas.

Para que essa inteligência seja estimulada, o professor deve valorizar as artes

gráficas, estimular o desenho como forma de expressão e integrar artes em diferentes

disciplinas.

Gardner (1985) propõe em sua teoria, que todos os indivíduos têm a habilidade

de questionar e buscar repostas utilizando-se de todas as inteligências, pois trazem

consigo habilidades básicas em todas o tipos de inteligência. A linha de

desenvolvimento de cada inteligência, entretanto, será determinada por fatores genéticos

e neurobiológicos e por condições ambientais, logo certos talentos são desenvolvidos

por que são valorizados por determinado ambiente.

A Teoria das Inteligências Múltiplas é de grande valia para a educação, pois dá

importância às diferentes formas de pensamento e defende a criação de um ambiente

educacional mais variado, de forma que não se dê tanta importância ao desenvolvimento

das habilidades lingüísticas e matemáticas. Defende ainda a proposta de se tirar o maior

proveito das habilidades individuais através de avaliações constantes durante atividades

realizadas no dia-a-dia, para auxiliar os alunos a desenvolver suas capacidades

intelectuais.

O professor deve estar ciente de que seu aluno pode se desenvolver mais em

uma área que em outra, por isso deve sempre procurar realizar diferentes tipos de

atividades, para que todos na turma tenham as mesmas chances de aprendizagem. O

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42 professor de língua portuguesa deve se basear nessa teoria antes de rotular seu aluno

caso ele apresente pouca habilidade na leitura, ou dificuldade para produzir um texto. O

aluno provavelmente tem outro tipo de inteligência mais desenvolvido, o que não

significa que ele seja “burro”. Partindo-se desse princípio, o professor não mais agiria

de forma preconceituosa caso um aluno cometesse erros de português, já que a

inteligência não está apenas centrada na habilidade lingüística.

Muitas vezes o aluno não é capaz de fazer uma redação perfeita para os moldes

tradicionais, porém têm extrema habilidade para se relacionar com pessoas e contar

histórias. Se este aluno, muitas vezes extremamente criativo, sofrer algum tipo de

crítica ou constrangimento, existe grande possibilidade de que ele perca o entusiasmo e

para de produzir nas áreas onde possui maior desenvolvimento. Cabe ao educador ter

bastante cuidado na hora de avaliar um aluno, pois por causa de um preconceito, muitas

vezes o talento de um indivíduo pode ser desperdiçado, até mesmo definitivamente.

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CAPÍTULO V

Os Parâmetros Curriculares Nacionais

O mundo e o país passam por diversas transformações, e conseqüentemente a

educação deve adaptar-se às mudanças. Inovações tecnológicas, preocupações com a

ecologia, e vários debates sobe os Direitos do Consumidor, Educação Sexual, política,

racismo entre outros temas mostravam que era necessária uma reformulação no

currículo tradicional. O mercado de trabalho mudou, assim como a maneira como a

sociedade vê certos temas, logo a escola deve acompanhar quaisquer mudanças e o

professor deve estar pronto a ajudar a preparar seu aluno para um mundo competitivo e

ampliar seus horizontes. Foram então criados pelo MEC os Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCNs) em 1998.

Os PCNs entretanto, são orientações gerais de trabalho e só serão válidos quando

as sugestões apresentadas forem adaptadas pelo professor à realidade dos alunos.

Espera-se que as idéias trazidas por eles sirvam de inspiração para a prática em sala de

aula, uma vez que as propostas são flexíveis e nada é obrigatório.

São tratadas as seguintes áreas: Português, Matemática, Ciências, História,

Geografia, Língua Estrangeira, Educação Física e Artes. São abordados também os

temas transversais, que não são considerados novas matérias: Ética, Saúde, Meio

Ambiente, Pluralidade Cultural, Orientação Sexual e Trabalho e Consumo. Estes temas

falam de assuntos que ajudarão a escola a cumprir seu verdadeiro papel: educar e

formar alunos-cidadãos. As escolas não são ilhas e estão inseridas em uma comunidade

que possui conflitos, alegrias e problemas, por isso o professor deve sempre que

possível dar espaço para que os alunos discutam e opinem sobre o que acontece ao

redor. Estes assuntos devem atravessas todas as disciplinas durante o ano letivo, e o

professor deve estar sempre atento ao melhor momento para mencioná- los. Uma notícia

publicada num jornal, uma briga entre alunos no recreio ou uma enchente no bairro:

vários são os “ganchos” que podem ser utilizados pelo professor para criar um debate

em sala de aula.

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Serão aqui expostas as propostas dos PCNs para o ensino de língua portuguesa,

uma vez que é este o tema do trabalho. Conforme publicado na revista Nova Escola

(2000), várias são as habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos do Ensino

Fundamental:

1. Capacidade de se expressar em diferentes situações.

Com a família, amigos ou em público, apresentando trabalhos em classe ou

participando de uma solenidade escolar.

2. Saber expressar-se de diferentes maneiras.

Isso quer dizer que ele deve ser capaz de usar a linguagem adequada para cada

ambiente, coloquial ou formal.

3. Conhecer e respeitar as variedades lingüísticas do português falado.

O aluno deve entender que em um país grande e de variadas culturas como

Brasil, há vários sotaques, expressões regionais e maneiras diferentes de falar, que não

são certas ou erradas, apenas diferentes.

4. Saber distinguir e compreender o que dizem diferentes gêneros de texto.

Bilhetes para um amigo, anúncio de venda de imóveis e uma bula de remédio têm

estilos e vocabulário variados.

5. Entender que a leitura pode ser uma fonte de informação, de prazer e de

conhecimento.

Ela permite que o aluno tenha acesso às informações necessárias para o dia-a-dia

e também ao mundo da literatura e da ciência. Além disso, o aluno deve saber como

buscar informações em diferentes materiais impressos.

6. Ser capaz de identificar os pontos mais relevantes de um texto, organizar

notas sobre ele, fazer roteiros, resumos, índices e esquemas.

Com base em trechos extraídos de fontes diferentes, o aluno deve saber compor

um texto coerente, ou seja, transformar a linguagem num instrumento que lhe dê acesso

e mios para usar as informações contidas no texto que lê.

7. Expressar seus sentimentos, experiências, idéias e opções individuais.

Além disso, ser capaz de ouvir, interpretar e refletir sobre idéias de outros,

sabendo expor suas próprias idéias.

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45 8. Ser capaz de identificar e analisar criticamente os usos da língua como

instrumento de divulgação de valores, preconceitos.

É o que acontece nas piadas “inocentes” sobre judeus, negros ou portugueses.

Como o trabalho de pesquisa foi feito entre jovens que cursavam da 5ª à 8ª série,

serão aqui analisados os aspectos dos PCNs referentes a estas séries.

Os adolescentes e pré-adolescentes vivem uma fase de transformações no

próprio corpo no modo de pensar e agir, buscando constantemente sua própria

identidade e demonstrando interesse em novas formas de analisar seus problemas. É o

momento ideal para que se mostrem textos provocativos e diferentes, que irão motivar

debates, fazendo com que a sala de aula se torne um espaço onde o aluno será capaz de

defender seus pontos de vista e respeitar opiniões diferentes, ganhando cada vez mais

domínio da língua portuguesa, principal objetivo do ensino neste segmento.

Contudo, não é necessário apenas falar e escrever, o domínio da linguagem

necessário para uma participação ativa na sociedade, ocorre quando o indivíduo é capaz

de escolher as palavras certas para cada tipo de situação. A maior preocupação é em

formar seres pensantes que saibam entender e se expressar em diversas situações,

levando em consideração a realidade e os interesses dos alunos. Essa nova postura em

relação ao ensino da língua portuguesa busca fugir de exercícios mecânicos, trabalhando

com o texto em vez de frases soltas, valorizando menos a gramática normativa e

utilizando textos literários como um aprendizado em si e não pensando em regras e

análises, o que acaba por inibir as descobertas e não valorizando o prazer que a leitura

proporciona.

O ensino tradicional muitas vezes transmite e perpetua a falsa idéia de que o

português é uma língua muito difícil, contudo o professor deve estar ciente de que seu

aluno apresenta variações lingüísticas que representam sua origem regional, seu gênero,

sua faixa etária e posição sócio-econômica. Esta proposta, que surgiu graças à

lingüística, traz consigo maior respeito pelas diversidades culturais e regionais e busca

encontrar um caminho para uma democratização do ensino.

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46 O professor, em vez de corrigir o aluno a todo instante, deve usar a linguagem de

seu aluno para mostrar as diferenças e não os “erros”, pois é sabido que não existe um

único jeito de falar português.

A criança ao entrar na escola já possui domínio da linguagem oral. Durante o

ciclo fundamental, o ensino da língua portuguesa tem como objetivo ampliar sua

capacidade de usar a fala de modo competente, através da escolha de palavras

adequadas para determinado discurso. Já nos últimos ciclos, o aluno deve trabalhar o

domínio das pausas, a construção de frases claras e concisas e a percepção da

importância de elementos não-verbais, como a postura, expressão facial ou gestos.

Outro ponto no trabalho de expressão oral é mostrar aos alunos como usar a

linguagem escrita para registrar ou reforçar a fala. A fala, uma vez pronunciada, não

pode ser reconstruída, ao contrário da escrita, por isso deve-se alertar os alunos que

durante exposições é necessário que se montem esquemas para auxiliar o que já deve ser

previamente determinado.

Há vários exemplos de textos de expressão oral que podem ser trabalhados em

classe. O cordel (tipo de literatura coloquial em versos), casos populares (a versão

escrita dos contadores de histórias, em forma de prosa), textos teatrais e canções

( música popular é um tipo de expressão oral muito próxima do cotidiano dos alunos).

Textos jornalísticos são excelentes para se trabalhar, pois permitem a análise de

vários aspectos da linguagem. Trechos de programas de rádio mostram a utilização de

frases curtas e vários tipos diferentes de entonação; entrevistas permitem que seja

analisado o desencadeamento de idéias, a argumentação e até mesmo vícios de

linguagem; depoimentos revelam uma fala geralmente mais emotiva e intimista.

Os textos publicitários como anúncios de rádio e televisão apresentam uma

linguagem mais direta e possuem técnicas de repetição e fixação de nomes. Sempre há

comerciais mais polêmicos que servem de ponte para um debate em sala de aula. Além

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47 disso, o professor pode pedir para que os alunos criem seu próprio produto e então

apresentem para a turma.

Discutir com os alunos algum tema polêmico é uma maneira excelente de

ensinar o aluno a argumentar e trocar opiniões. Pode-se apresentar algum tema que

esteja sendo mostrado na imprensa ou vivenciado por moradores da comunidade,

contudo, deve-se dar preferência a temas trazidos pelos próprios alunos e que geram

opiniões diversas. Após o debate, os alunos devem produzir um texto expondo sua

opinião sobre as questões analisadas.

Pode-se ainda debater um tema já preparado anteriormente. Organizam-se as

regras do debate, como o tempo de exposição inicial, réplica e tréplica, estabelecendo-se

um tempo para cada parte, assim os alunos aprenderão a planejar a fala e a aula não se

torna uma discussão infindável.

Não é uma tarefa fácil a de formar leitores, logo deve-se dar grande importância

à atenção dispensada à leitura. A utilização de textos literários para ensinar

determinado ponto gramatical ou alguma lição moral não é indicada, uma vez que o

objetivo é criar o gosto pela leitura. Ao sugerir que os alunos escolhem um livro de sua

preferência e depois contem para o restante da classe, geralmente o professor faz com

que os outros alunos sintam-se motivados para ler. O importante é não impor esta

tarefa.

Pennac (1993) estabelece uma lista de “direitos do leitor” e, entre eles estão os

seguintes: todo o leitor tem o direito de não ler, o direito de não terminar um livro ou o

direito de pular páginas, logo sob esse ponto de vista, os alunos não são obrigados a

gostar do que o professor sugere.

“O verbo ler não suporta o imperativo. Aversão que partilha

com alguns outros: o verbo amar... o verbo sonhar... Bem é

sempre possível tentar, é claro. Vamos lá: “Me ame!”

“Sonhe!” “Leia!” “Vá para o seu quarto e leia!”

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48 Resultado?

Nulo.” (PENNAC, 1993, p. 13)

Muitas vezes os alunos se deparam com textos que tratam de temas que eles não

estão muito familiarizados, daí a importância de se trabalhar com livros que já foram

adaptados para o cinema ou televisão. Os alunos podem expor suas opiniões sobre o

modo como foi adaptado e dizer como fariam, o que provoca discussões interessantes

em sala de aula.

Sabe-se que cada livro supõe um tipo de leitura diferente. Ficha e resumos são

eficientes para textos científicos, mas não são aconselháveis para um texto literário, pois

desviam o aluno do ponto essencial – o estilo do autor. Uma notícia no jornal deve se

objetiva, ou seja, totalmente diferente de como se lê uma poesia. Essa mistura de textos

e gêneros deve ser trazida pelo professor, pois fará com que os alunos percebam as

diferenças e os vários níveis de leitura.

Escritor é todo aquele capaz de escrever um texto adequado a determinado fim.

Entretanto, para que se escreva um texto coerente, é necessário que o aluno tenha um

domínio da linguagem escrita. Para que esse domínio ocorra, várias categorias podem

ser trabalhadas na sala de aula, como a transcrição, a reprodução, o decalque e a autoria.

A transcrição de um texto pode parecer enfadonha, mas a tarefa exige que o

aluno se concentre e observe o que o autor está dizendo e como. A transcrição de

palestras ou debates também é um exercício interessante, pois faz com que o aluno

adapte a linguagem oral para a escrita.

A reprodução, ou seja, um resumo do texto original, faz com que o aluno treine a

coesão e a objetividade. Não existe a preocupação com o que será dito, pois isso já foi

feito. Sinopses de filmes ou livros e a adaptação de um conto para um texto teatral

também são excelentes exercícios de reprodução.

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49 O decalque é usado no dia-a-dia, em cartas comerciais ou requerimentos, e sua

estrutura formal já existe, o que permite que o aluno se concentre na expressão no

“como dizer”. O trabalho de criar outra letra para uma música já conhecida também é

um exemplo de decalque e é excelente para ser trabalhada em classe.

Na autoria o aluno terá autonomia para desenvolver seu próprio texto, tanto no

plano do conteúdo como no plano da expressão. O professor, ao avaliar o que seus

alunos escreveram, deve se preocupar com o conteúdo e não apenas corrigir todos os

desvios de ortografia, concordância e pontuação. O ideal é que sejam corrigidos

somente os pontos já explicados anteriormente, ou então indicar os pontos não tão

claros do texto para que o aluno redija novamente de forma diferente. Assim ele irá

aprender que todo testo precisa de uma releitura, revisões e adequações.

O ensino de gramática tradicional tomava como ponto de partida a teoria para

depois expor os exemplos, que geralmente eram retirados de textos clássicos, e então

partia-se para os exercícios. Entretanto, sob a óptica da lingüística, passou-se a dar mais

valor a coesão e à coerência de um texto, e muitos detalhes da gramática tornaram-se

dispensáveis.

O ideal para uma análise lingüística é a utilização de exemplos tirados dos textos

criados pelos próprios alunos, sem, é claro, dizer que cometeu o desvio ou fazer

qualquer tipo de brincadeira que possa deixar o aluno constrangido. Já está mais do que

provado que os antigos exemplos retirados de obras literárias não são eficazes para

garantir o domínio de regras da norma culta, uma vez que os termos e estruturas não são

familiares aos alunos.

Os PCNs mostram vários caminhos para um ensino mais inclusivo, menos

preconceituoso e conseqüentemente mais eficaz. Contudo, além de estas idéias não

serem obrigatórias, uma vez que são apenas parâmetros, faz-se necessária uma

conscientização por parte dos educadores, pois deles depende o sucesso no processo de

aprendizagem.

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50 É preciso que se acredite nas propostas e que estas sejam realmente colocadas

em prática, caso contrário a escola permanecerá pouco democrática, muitas vezes

preconceituosa e o problema de repetência e de evasão escolar continuará crescente e o

sonho de formar alunos crítico e preparados para a vida não passará de uma utopia.

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51 CONCLUSÃO

A idéia preconceituosa de que “quem escreve errado” é burro ou ignorante da

língua deve ser abandonada. O professor ao ter contato com um texto, ou ao ouvir

determinados comentários deve ver o que está querendo ser comunicado e depois se

preocupar como isso é comunicado. Deve se perguntar se o texto, ou discurso é

coerente; se traz idéias originais; se é preconceituoso e fere algum princípio da ética; se

reproduz idéias intolerantes ou autoritárias; se ensina alguma coisa entre outras

observações.

Essa é a verdadeira idéia de educação. O professor deve dar a chance ao aluno

para que ele se comunique e incentivá- lo a se manifestar. Muitas vezes é mais válido

ler um texto com “erros de português” com idéias originais e coerentes do que ler um

texto sem conteúdo, ou com conteúdo racista ou debochado, que apresente pontuação,

regência e outras regras da norma culta respeitadas.

Sabe-se que o preconceito existe e não será possível acabar com ele da noite

para o dia, já que para isso seria necessária uma profunda modificação em nossa

sociedade. Entretanto, é preciso que o professor esteja sempre atualizado e abandone a

postura repetidora no ensino da gramática tradicional, que tantas contradições e

incoerências apresenta. Uma crítica constante sobre a atitude em sala de aula é

necessária, mesmo que seja obrigatório o ensino da gramática tradicional, podemos

fazê-lo de forma diferente e crítica. Assim, mesmo sob as cobranças de pais e donos

das escolas, será possível mostrar que todas as ciências evoluem, assim como a ciência

da linguagem, logo o ensino não deve necessariamente ser o mesmo de muitos anos

atrás.

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REFERÊNCIAS

PENNAC, Daniel. Como um romance. Rio de Janeiro: Rocco, 1993

BAGNO, Marcos. Preconceito Lingüístico. 4ª edição, São Paulo: Edições

Loyola, 2002

LUFT, Celso Pedro. Moderna Gramática Brasileira. 13 ª edição, São Paulo:

Globo, 1996

BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. 34 ªedição, São Paulo:

Companhia Editora Nacional, 1992

LIMA, Rocha. Gramática Normativa da Língua Portuguesa. 34ª edição, Rio de

Janeiro: José Olympio, 1997

ANTUNES, Celso. As Inteligências Múltiplas e seus estímulos. 6 ª edição,

Papirus

CAMARA, Joaquim Mattoso. Estrutura da Língua Portuguesa. 21ª edição,

Petrópolis: Vozes, 1973

PERINI, Mário. Gramática descritiva do português. 2ª edição, São Paulo: Ática,

1996

SACCONI, Luiz Antonio. Não erre mais! 23ª edição, São Paulo: Atual, 1998

NOVA ESCOLA: Edição Especial - Parâmetros Curriculares Nacionais, 2000

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ÍNDICE

CAPA

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTOS 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

Aspectos Conceituais da Língua Portuguesa 10

CAPÍTULO II

Os mitos em relação à Língua Portuguesa 17

CAPÍTULO III

O Preconceito Lingüístico 26

3.1 – Como desconstruir o preconceito lingüístico? 27

CAPÍTULO IV

A Teoria das Inteligências Múltiplas 32

Page 54: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS …BIA MARTINS ROCHA.pdf2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE O PRECONCEITO LINGÜÍSTICO OBJETIVOS:

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CAPÍTULO V

Os Parâmetros Curriculares Nacionais 43

CONCLUSÃO 51

REFERÊNCIAS 52

ÍNDICE 53

FOLHA DE AVALIAÇÃO 55

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FOLHA DE AVALIAÇÃO