transformaÇÃo dos valores em preÇos de produÇÃo na contemporaneidade

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A necessidade de compreenso da transformao dos valores em preos de produo para o entendimento da acumulao material da riqueza em tempos de dominao do capital financeiro Joo Claudino Tavares1 REA 3: Economia Poltica, Capitalismo e Socialismo Sub-rea 3.1. Teoria do ValorResumo: Anlise do processo de transformao dos valores em preos de produo. Apresentao dos elementos da polmica em torno da transformao apreendida e explicitada por Karl Marx em O Capital e destaque de aspectos fundamentais da controvrsia. Consideraes sobre a importncia da compreenso da transformao dos valores em preos de produo para desmistificao do processo de acumulao estritamente financeira do capital na contemporaneidade. Conclui-se que s o movimento real da produo da riqueza possibilita a acumulao material de capital. Palavras-chave:Valor. Preos de Produo. Reproduo do Capital. Crises Abstract: Analysis of the transformation of values into prices of production. Presentation of controversy surrounding the transformation perceived and explained by Karl Marx in "The Capital" and highlighting key aspects of the controversy. Considerations on the importance of understanding the transformation of values into prices of production to demystify the process of accumulation of capital in financial strictly contemporary. We conclude that the only real movement enables the production of wealth accumulation of material capital. Keywords: Values. Prices of Production. Reproduction of Capital. Crisis

IntroduoAs verdades cientficas so sempre paradoxais, se julgadas pela experincia de todos os dias, a qual somente capta a aparncia enganadora das coisas. (Karl Marx)

A transformao dos valores em preos de produo, conforme realizada por Karl Marx, em O Capital, se constituiu posteriormente na controvrsia do valor. Sobre isto, centraram-se as discusses relacionadas com Teoria Econmica e, de modo particular, do1

Docente do Departamento de Economia e do Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento Socioeconmico da Universidade Federal do Maranho (UFMA); Doutor em Geografia rea de concentrao Desenvolvimento Regional e Urbano pelo Programa de Ps-Graduao em Geografia (PPGG) do Centro de Filosofia e Cincias Humanas (CFH) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); Orientador do Grupo de Estudo sobre Processos de Produo e Relaes de Trabalho nas Economias Dependentes Linha de pesquisa: Trabalho e transitoriedade; Coordenador do Ncleo de Estudos e Pesquisas Marx-Engels.

2 referentes teoria marxiana do valor. O processo segue um duplo caminho. Por um lado, pode ser considerado inexistente e, por outro lado, deve ser resolvido para o entendimento do movimento de acumulao do capital, especialmente para o entendimento da mobilidade do capital. No sculo XX a discusso se tornou relevante principalmente entre os marxistas e os neoricardianos, sem falar nos neoclssicos que fizeram crticas mais externas por ser bastante diferenciada a posio por eles defendida. Segundo uma boa parte dos autores que comentam a Teoria Econmica de Marx, apresentada em O Capital, um dos problemas internos estaria no fato de Engels ter publicado na forma inacabada, portanto, lacunosa como estava nos rascunhos (cadernos de anotaes) deixados por Marx o Livro III de O Capital, principalmente quando se refere s aproximaes das categorias mais concretas. Para muitos, este seria o fundamento do problema da transformao dos valores em preos de produo. A verdade que o problema foi resgatado pelos crticos de Marx e mais especificamente pelos neoclssicos e neoricardianos para argumentarem contra a teoria do valor de Marx. Os neoclssicos e particularmente o austraco Eugen Von Bohm-Bawerk assegurou haver incoerncia na teoria marxiana do valor. Os neoricardianos argumentam que Marx deixou inacabado o processo de transformao do valor em preos, bem como, entendem no haver necessidade de partir dos valores para entender (explicar) os preos, da a razo para ser relacionado com a perspectiva desenvolvida por David Ricardo. Eles trabalham no sentido de explicar simplesmente os preos relativos ou os preos pelos preos. Assim, limitados aos preos relativos acham ser possvel determinar simultaneamente os preos e a taxa de lucro sem necessidade de recorrer teoria do valor-trabalho. Nesta perspectiva desenvolvem realmente a teoria ricardiana, mas apresenta vrias limitaes se comparada com a teoria de Marx. Assim sendo, pergunta-se: Qual a possvel relao entre a transformao do valor em preos de produo de Marx com a teoria dos preos tcnicos de reproduo desenvolvida pelos neoricardianos? Por outro lado, entendemos que a preocupao de Marx no foi fundamentalmente com a relao entre os preos seno enquanto forma de reproduo das relaes sociais

3 inerentes ao modo de produo capitalista (processo de acumulao e reproduo do capital). A necessidade de se entender a natureza do valor se deve ao fato de ser a nica maneira possvel de se entender a origem do lucro. Mesmo que se pretendesse entender a natureza das relaes capitalistas a partir dos preos de custo no seria possvel perceber a natureza da valorizao do capital. Pois, atravs dos preos de custos j desaparece a composio orgnica do capital de maneira que pode-se imaginar que todas as partes componentes do capital criam igualmente valor.

2 A metamorfose do valor aos preos de produo ou de como a composio contbil mistifica a natureza da mais valia

A polmica em torno da relao entre valor e preo de produo apareceu imediatamente aps a publicao do Livro III dO Capital por Engels, ou seja, em 1895, com o trabalho de Eugen von Bohm-Bawerk afirmando haver uma incoerncia na teoria dO Capital. Para ele, a publicao do Livro III se desenvolveu uma espcie de corrida com prmio sobre a questo da taxa de lucro e sua relao com a lei do valor sem que ningum tenha conseguido obter o prmio. Finalmente, quando apareceu o Livro III e, portanto, a possibilidade de se resolver o esperado problema, ou a promessa de soluo no sentido de se completar a teoria do valor. O esperado era que se pudesse encontrar uma soluo plausvel para a verificao concreta da existncia da teoria do valor de Karl Marx. Dessa forma, imediatamente aps a publicao do Livro III todos os estudiosos da teoria marxiana partiram para investigar se realmente o sistema havia sido concludo e poderia ser seguido fielmente ou, no caso de Bohm-Bawerk, realmente se comprovaria a sua inaplicabilidade do complemento ao que apresentou nos Livros I e II. A anlise de Bohm-Bawerk pretendeu passar do valor diretamente aos preos sem investigar as intermediaes e interdeterminaes entre ambos. Ela supe a troca de equivalentes e nesse caso apenas os preos interessam. Mais especificamente, Bohm-Bawerk identifica uma contradio de Marx no captulo VIII do Livro III afirmando que nele Marx abandona a idia de que as mercadorias so vendidas (so intercambiadas) por seus valores.

4 Um problema identificado na anlise de Bohm-Bawerk que ele entende que valor e preos so sinnimos e o fato das mercadorias serem vendidas por preos diferentes dos respectivos valores, conforme sustenta Marx, significa dizer que a teoria do valor de Marx incoerente e no permite explicar a realidade concreta, portanto, irreal. Em resposta a Bohm-Bawerk apareceu, em 1905, o trabalho de Rudolf Hilferding, defendendo a coerncia interna da teoria marxiana do valor. Ressalte-se, entretanto, que a posio de Hilferding se manifesta como se a teoria elaborada por Marx no pudesse ser questionada ou pelo menos no era essa a preocupao do mencionado autor. No obstante, Hilferding consegue responder satisfatoriamente critica de Bohm-Bawerk. Posteriormente apareceu o trabalho de Bortkiewicz, que, segundo Paul Sweezy foi o primeiro intento de resolver o problema e por isso ele constitui o ponto de partida efetivo de qualquer trabalho posterior ao tema. O objetivo do artigo de Bortkiewicz, em sua opinio, no era de atacar a teoria marxista seno defend-la. Aceitando esta suposio seria o trabalho de Bortkiewicz um ponto de partida central e, deste o ponto de vista, uma critica interna ao problema da transformao do valor em preos de produo de Marx. Analisando matematicamente, atravs de um sistema de equaes, o processo de transformao de valor em preos de produo, Bortkiewicz identifica um problema e diz ser um erro de Marx. O problema se deve ao fato da anlise demonstrar uma indeterminao. Pois, analisando o processo da transformao atravs dos esquemas de reproduo e da necessidade de se justificar as igualdades entre valor e preos da produo e mais-valia e lucro, em suas totalidades. Pelo esquema de reproduo do capital chega-se a um conjunto de trs equaes e quatro incgnitas, portanto, a um sistema indeterminado. A partir disso, procura uma forma de torn-lo determinado, ou seja, pelo menos igualar o nmero de equaes ao de incgnitas. Como alternativa rompe com uma das igualdades, no caso, com a igualdade entre valor e preos de produo na sua totalidade aceitando a argumentao de que a desigualdade entre mais-valia e lucro. Para este autor a desigualdade entre valor e preos no se constitui num problema porque so medidos em unidades diferentes, ou seja, o valor medido em quantidade de trabalho e o preo em quantidade de dinheiro. Assim, para observar do ponto de vista do valor, far-se-ia equivalncia de todas as mercadorias com a quantidade de ouro existente e que funcionasse como equivalente geral.

5 Bortkiewicz assume que a diferena entre valor e preos decorre da variao na composio orgnica do capital do setor III (Departamento III) que produz ouro. Outro momento da discusso sobre o problema da transformao, decorrente e ainda a prevalecer como dominante, diz respeito ao trabalho do italiano Piero Sraffa. Isso aconteceu a partir de 1960 com a publicao do Livro PRODUCTION OF COMMODITIES BY MEANS OF COMMODITIES: prelude to a critique of Economics Theory (Produo de mercadorias por meio de mercadorias: preldio a uma critica da teoria econmica). A discusso passou a ter Sraffa como ponto de referncia, seja no momento importante tanto por ser o centro das discusses atuais quanto pelo fato de, a partir de Sraffa mesmo alguns marxistas aderiram ao neocardianismo, como parece ser o caso de Cludio Napoleoni (NAPOLEONI, 1981, p. 163), Ronald Meek e outros. Em sntese, o problema pode ser apresentado utilizando as palavras de Ronald Meek quando diz: O debate iniciado por Bohm-Bawerk sobre as alegadas grandes contradies entre os Volumes I e III de O Capital no foi ainda resolvido a contento de todos os interessados. De uma forma ou de outra, e com vrios graus de refinamentos, certo nmero de aspectos da questo continua a ser calorosamente discutido. Em particular, a literatura sobre o chamado problema da transformao multiplicou-se

consideravelmente desde que Paul Sweezy chamou a ateno dos autores ingleses, em 1946, em sua obra Theory of capitalist Development.

3 O processo de transformao dos valores em preos de produo

Antes de iniciarmos a nossa exposio sobre o processo de transformao dos valores em preos de produo em Marx, faz-se necessrio alguns esclarecimentos importantes. Em primeiro lugar, deve-se ter presente a diferena entre os nveis de abstrao dentro da investigao ao longo do Capital e a dimenso particular inerente ao Livro III, do qual nos ocuparemos mais de perto. Em segundo lugar, no podemos esquecer que a unidade de medida de preos de produo horas de trabalho. Assim, embora a analise se trate da relao entre valor e preo, deve-se ter claro que o preo de produo uma intermediao entre valor e preo

6 de mercado, e no visa explicar imediatamente a flutuao deste ultimo. Isto se torna mais claro quando compreendemos que o preo de produo nada mais do que um valor transformado e aproprivel em condies de uniformidade da taxa de lucro.

3.1 O Capital e suas dimenses apresentadas por Marx

Conforme esclareceu o prprio Marx, o Livro I trata do processo de produo direto, no Livro II a anlise se prende ao processo de circulao como mediao da reproduo do capital e o Livro III trata-se do processo de sua reproduo global. Em outras palavras, podemos entender o Livro III como sendo a anlise do processo de concreo das relaes sociais inerentes as formas fenomnicas ou aparenciais da sociedade mercantil capitalista. Na anlise da natureza dos fenmenos, faz-se o retorno a aparncia expondo e explicando a relao entre a essncia e a manifestao concreta e transmutada da essncia em aparncia. Assim o caso da relao entre valor e preo de produo ou produo e apropriao da riqueza capitalista, considerando a

repartio/apropriao da mais-valia. Podemos ainda distinguir as particularidades dos Livros I, II e III do Capital desde a perspectiva das trs dimenses mais gerais apresentadas. Neste sentido, o Livro I se refere a formulao e exposio da teoria do valor-trabalho e as contradies entre capital e trabalho que no capitalismo se encerra. No Livro II encontramos a analise do processo de realizao do valor enquanto atribuio da circulao isto atravs dos ciclos e esquemas de reproduo do capital. No Livro III a analise busca explicar mais de perto as transmutaes inerentes metamorfose do capital na perspectiva concreta, no nvel da concorrncia e mobilidade dos capitais intersetorialmente, aqui caracterizado pela metamorfose da mercadoria ou s revolues do valor. Neste contexto, transformao dos valores em preos de produo, da qual nos ocuparemos mais de perto, aparece nas duas primeiras sees do Livro III. No obstante, nestas sees, Marx expe progressiva e detalhadamente a transformao visando esclarecer o processo de mistificao e como se manifesta a tendncia dos fenmenos negarem a sua natureza. O que Marx se ocupa com a explicao da realidade concreta das relaes sociais bem como os limites da compreenso do senso comum e dos economistas vinculados ou influenciados pelo pensamento burgus. Dessa forma, a preocupao de

7 Marx com a demonstrao das contradies, desde o ponto de vista superficial das relaes capitalistas e como estas dissimulam a lei do valor e, por conseguinte, o processo de real valorizao do capital.

3.2 Anlise da transformao dos valores em preos de produo ou a mistificao da essncia pelos fenmenos

O processo de transformao dos valores em preos de produo deve ser visto de acordo com a seguinte sequncia lgica: 1) anlise da categoria preo de custo; 2) transformao da mais-valia em lucro; 3) formao e equalificao da taxa mdia, geral, e de lucro; 4) transformao dos valores em preos de produo ou, em outros termos, estudo da apropriao da riqueza na sociedade capitalista, considerando a repartio da mais-valia e as conseqentes transferncias de valores. No nvel de abstrao do Livro I, a frmula do valor-mercadoria (w) : w = c + v + mv, onde (c) representa o capital constante, (v) o capital varivel e (mv) a mais-valia. Marx apresenta progressivamente as categorias concretas e expe as determinaes inerentes intermediao entre valores e preos de produo na perspectiva de demonstrao do que d sentido a acumulao capitalista. Nesse processo a primeira categoria concreta relevante com que Marx se defronta o preo de custo. Inicialmente Marx diferencia o custo de produo do custo capitalista. O custo capitalista representa o valor-capital adiantado na produo (c + v) enquanto que o custo de produo igual ao valor-mercadoria (c + v + mv), ou seja, o valor passado pelos meios de produo e o valor novo criado pela fora de trabalho. Neste ponto aparece a primeira dissimulao da natureza do valor, que diz respeito ao fato do capitalista no diferenciar valor de preo (para ele, o capitalista, ambos os termos so sinnimos, chamar de valor ou preo no faz diferena). Depois de finalizada a produo, o capitalista soma os custos de produo e vai ao mercado tentar encontrar o valor de sua mercadoria e assim a valorizar. Dessa forma, o mercado seria o responsvel pela valorizao do seu capital. Pois, qualquer preo de venda acima do preo

8 de custo possibilita a apropriao de um lucro, independente da sua mercadoria ser vendida acima ou abaixo do valor. Para Marx, o mercado nada mais faz do que reconhecer ou no um determinado valor o qual resulta exclusivamente do processo de produo. No entanto, Marx chama a ateno para o processo de dissimulao da realidade provocada pelo no entendimento dos aspectos essenciais das relaes sociais no capitalismo. Entre outros aspectos, na medida em que o mercado no reconhece o valor individual, mas sim o valor social das mercadorias e ainda por cima dissimulado pela forma preo, poderia-se aceitar que a teoria do valor-trabalho no teria nenhum sentido real. Tomando como ponto de partida o preo de mercado e a este se restringindo, desde o ponto de vista estritamente quantitativo monetrio, a afirmativa acima estaria correta. Pois, aos capitalistas apenas interessa o resultado final, isto , o lucro mximo, sem se importar com a sua origem. Agora, tendo em conta a circularidade das mercadorias (metamorfoses), o fato delas poderem ser utilizadas como matrias-primas em outras produes e a possibilidade de ter sido adquirida por um preo diferente do seu valor - o que extremamente normal evidencia-se a dificuldade ou mesmo a impossibilidade de se partir do sistema de preos para explicar a lei da valorizao do capital. Neste sentido, devemos ter em conta as dimenses micro e macroeconmicas da identidade e diferena entre valor e preo. Visto que, as relaes individuais tendem a negar os aspectos macroeconmicos. Para superar esta dificuldade a nica possibilidade parece ser atravs do estudo da lei do valor, depois chegar ao entendimento das transformaes dos valores em preos de produo e dissimulaes inerentes s intermediaes e interdeterminaes na lei do valor (produo) at o sistema de preos de mercado, ou da relao entre a produo e apropriao da riqueza na sociedade mercantil capitalista. Voltando anlise dos custos, observa-se que a diferena entre preo de custo e valor-mercadoria deve ser entendida como o primeiro aspecto a se ter em mente no processo de transformao. Com relao aos elementos constante (c) e varivel (v) do capital, respectivamente, temos a observar que estes aparecem completamente dissimulados em relao ao que Marx havia demonstrado no Livro I. Na contabilidade capitalista, o capital

9 aparece subdividido entre capital fixo (Cf) e capital circulante (Cc). Com isso a transformao pode ser vista pelo seguinte processo: Inicialmente tinha-se que o capital adiantado, que corresponde ao custo de produo para o capitalista (K) era K = C + V; Com a transformao, os custos so contabilizados considerando as partes fixas e circulantes do capital. Assim sendo, tem-se que observar que isso faz desaparecer a composio orgnica do capital e, por conseguinte, no mais se pode identificar nem a questo da explorao do trabalho pelo capital ou, em outros termos, a natureza da valorizao do capital. Em conseqncia o excedente aparece apenas como acrscimo aos custos. O que era considerado capital constante passa a ser parte fixa e parte circulante; sendo fixa a parte imobilizada e que tem seu desgaste num perodo considerado no inferior a um ano. Parte do capital constante tambm aparece como circulante (Cc1), tratase das matrias-primas e matrias auxiliares. Enquanto isso, o capital varivel (V) aparece como a outra parte do capital circulante (Cc2). Portanto, a frmula que era K = C + V passa a ser K = Cf + Cc1 + Cc2. Apesar do processo representar, aparentemente, s mudanas de nomes, portanto, de ponto de vista tem bastante importncia no processo de transformao, nele se encobre a efetiva possibilidade de se perceber a valorizao do capital. No obstante, mesmo que admitisse a origem do excedente no processo de produo, o capitalista justificaria que o excedente teria sido criado por todo o valor-capital adiantado, mas jamais pela fora de trabalho. Alm disso, teria-se a justificativa de que nem o capital varivel (fora trabalho) nem o capital constante (meios de produo) criariam valor-excedente isoladamente. A necessidade de combinao entre os "fatores de produo" dissimularia a possibilidade de que fosse a fora de trabalho (nas condies histricas do capitalismo) que valorizaria o capital. Por fim, aqui deve ser considerado que para o capitalista, o preo de custo seria o verdadeiro valor intrnseco da mercadoria e a valorizao da mercadoria aconteceria com a sua venda por um preo superior a este preo de custo. Na verdade o preo de custo o parmetro mnimo para a produo, abaixo do qual o capitalista no conseguiria nem repor o seu capital adiantado e a produo capitalista no teria sentido ou mesmo no existiria. Mesmo que o capitalista no consiga vender a sua mercadoria por seu valor, qualquer

10 preo acima do preo de custo considerado lucro. No entanto, o que um capitalista ganha representa perda para outro ou outros capitalistas de maneira que no final das contas os desvios se anulariam, como Marx demonstrou e apresentaremos posteriormente.

3.3 A metamorfose da mais-valia em lucro e do valor em preo de produo

Depois de analisado a relao entre o valor-mercadoria e o preo de custo e a mistificao da valorizao do capital, Marx passa a analisar a relao entre o excedente (mais-valia) e a sua transformao em lucro. No Livro I Marx havia mostrado que como valorizao do capital se deve explorao da fora de trabalho sendo a fora de trabalho mercadoria especial pelo fato de ser capaz de produzir valor acima do seu prprio valor e, portanto, se constituir na fonte da valorizao do capital. Por outro lado, o capitalista se apropria do excedente (maisvalia) na forma de lucro. Mas o lucro nada mais do que a forma aparente e aproprivel do excedente. Para Marx, o lucro nada mais do que a mais-valia vista de outra forma. Porm, tendo em conta o preo de custo e o lucro como excedente a este, a frmula do valor-mercadoria que era M = c + v + mv passa a ser M = k + l. At aqui, o lucro igual mais-valia, a diferena diz respeito unicamente taxa. No entanto, o prprio Marx sustenta que aps a transformao o lucro se torna tambm numericamente diferente da mais-valia. A respeito diz que "na prxima seo (seo II do Livro III) veremos como a alienao prossegue e o lucro tambm se apresenta numericamente como grandeza diferente da mais-valia". De acordo com a concepo de Marx a mais-valia (excedente da riqueza capitalista) tem origem exclusivamente na produo e se explica pelo processo histrico de separao entre os possuidores, por um lado, dos meios de produo e, por outro lado, exclusivamente da fora de trabalho. Mas, devemos ter presente que pela dimenso particular perceptvel ao capitalista, dada a sua necessidade de reproduo social e ao senso comum, a observao se torna diferente. Antes, tinha-se a taxa de mais-valia que era encontrada dividindo o excedente pelo capital varivel (mv/v). Agora, dada a dissimulao inicial da composio orgnica do capital aparece taxa de lucro, que representa a valorizao do capital em nvel contbil, a

11 qual obtida dividindo o excedente pelo capital adiantado (mv/c + v). Embora o lucro ainda seja numericamente igual mais-valia as taxas so diferentes. No obstante, com a repartio da mais-valia entre os diversos capitalistas a mistificao da origem desse excedente causa a impresso de que a circulao seria o momento da valorizao do capital, quando, na verdade este momento representa apenas a efetivao da valorizao ltima em que o capital retorna forma dinheiro. Lembrar o processo de valorizao do capital por sua forma geral, D - M - D '. Como se pode observar, capitais de diferentes composies orgnicas produzem mais-valia tambm diferentes. No entanto, chegado a uma identificao de uma composio orgnica mdia social percebe-se que a tendncia dos capitais de procurarem, pelo menos, se adequarem a esta composio e dessa forma se deslocarem dos nveis inferiores para os nveis superiores, no sentido de garantirem a prpria sobrevivncia no processo de acumulao. A participao dos capitais na repartio da mais-valia total (produto excedente) se d, como havamos dito, de acordo com a parte alquota em relao ao capital social total. Acreditamos que isto torna claro que os capitais participam da repartio da maisvalia total no de acordo com o que produzem. Isto importante porque esclarece as distines entre produo e apropriao. O que d sentido a este processo a lgica da concorrncia. Pois, atravs da concorrncia que os capitais buscam obter o mximo de lucro possvel. A aparente contradio que o capital produz mais-valia de acordo com a sua composio orgnica e participa da repartio, via apropriao, de acordo com a sua participao percentual no capital total. As transferncias de valor que ocorrem na apropriao, perceptvel ao nvel dos preos de produo, se explicam quando percebe-se que o que um capitalista ganha corresponde ao que outro ou outros perdem e assim os desvios dos preos de produo dos seus respectivos valores se anulam. O que d sentido e efetivamente explica a sua lgica a concorrncia capitalista onde cada capital busca atingir um lucro mximo e esta busca motiva a mobilidade dos capitais. Dessa forma, observa-se que a taxa mdia, geral, de lucro nada mais do que uma tendncia ou aproximao e se explica por meio de suposio de um possvel equilbrio no sistema capitalista, embora Marx tenha chamado ateno dizendo que o equilbrio algo inexistente no sistema capitalista.

12 A percepo disto no possvel desde o ponto de vista da observao do capitalista individual. Visto que, s eventualmente que o preo de produo corresponde ao valor individual e para isto necessrio que a composio orgnica de determinado capital coincida com a composio orgnica social mdia. Porm, veremos que ao nvel do capital social total, necessrio que o preo de produo seja igual ao valor como afirmou Marx e defende o professor Reinaldo Carcanholo no seu trabalho "Dialtica de la Mercancia y Teoria del Valor". Caso os capitalistas vendessem as suas mercadorias pelos respectivos valores implicaria que a taxa de lucro resultaria desigual e se assim fosse no teria sentido a lgica do sistema capitalista. Afirmamos que a taxa mdia, geral, de lucro encontrada pela mdia ponderada a partir das "diferentes taxas de lucro so igualadas pela concorrncia numa taxa geral de lucro que a mdia de todas essas diferentes taxas de lucro. Chegado a este ponto podemos ento realizar a transformao dos valores em preos de produo. Pois, conforme definiu o prprio Marx, os preos de produo so os preos que surgem do clculo da mdia das diferentes taxas de lucro das diferentes esferas da produo, adicionado aos preos de custo das diferentes esferas da produo. Neste sentido, entendemos o preo de produo como sendo um preo terico de equilbrio e uma categoria tambm terica fundamental para a compreenso da relao entre produo e apropriao da riqueza na sociedade mercantil capitalista. Ainda podemos cham-lo de preo necessrio de reproduo do capital. A frmula mais simples do preo de produo : pp = k + 1m, sendo (pp) preo de produo, (k) preo de custo e (1m) lucro mdio. O preo de produo um regulador da distribuio e do processo de mobilizao dos capitais entre as diferentes esferas da produo. Para Marx, s podemos chegar aos preos de produo partindo-se do sistema em valores e no ao contrrio. As tentativas de se explicar o preo de produo sem partir dos valores leva a que se confunda Marx com Ricardo em que termine por prevalecer a idia dos preos relativos, mesmo que isto ocorra inconsciente ou displicentemente. Pensamos que os equvocos se desfazem quando se admite que o preo de produo um valor aproprivel em condies de uniformidade da taxa de lucro e que a

13 sua unidade de medida horas de trabalho e no uma unidade de medida monetria como pensam os neoricardianos. Atravs dos preos de produo Marx demonstrou que motiva a mobilidade e distribuio dos capitais entre os diversos ramos da produo, no sentido de identificar a lgica do processo de apropriao do valor (riqueza) e a lgica do processo de acumulao. Sendo, portanto, este um parmetro terico que explica os elementos necessrios para que um determinado produtor possa permanecer na concorrncia capitalista. Para melhor evidenciar a transformao, a reproduziremos utilizando os exemplos numricos apresentados por Marx, como se segue.SISTEMA EM VALORES Capitais I. 80c + 20v II. 70c + 30v III. 60c + 40v IV. 85c + 15v V. 95c + 5v Soma 390c + 110v Mdia 78c + 22v Mais-valia 20 30 40 15 5 110 22 Valor-produto 120 130 140 115 105 610 Taxa de lucro 20% 30% 40% 15% 5%

-22%

122

Tomando cinco capitais com distintas composies orgnicas, mesma taxa de mais-valia (m) de 100%, temos o seguinte sistema em valores; a partir dele encontremos a composio orgnica social mdia e a taxa mdia, geral, de lucro. Do sistema acima observe-se que as taxas de lucros resultam diferentes para os diversos setores mas a concorrncia a equaliza em 22%. Ela pode ser encontrada a partir do capital social total ou da composio orgnica social mdia que de 78c + 22v. No obstante, vale salientar que supomos que todo o capital seja reposto no perodo de um ano e assim eliminamos a questo da depreciao do capital fixo. A transformao resulta no seguinte sistema:SISTEMA EM PREOS DE PRODUO Capitais I. 80c + 20v Mais-valia 20 Valor das mercadorias 120 Lucro mdio 22

Preos de Produo122

Desvios+2

14II. 70c + 30v III. 60c + 40v IV. 85c + 15v V. 95c + 5v Soma 390c + 110v Mdia 78c + 22v 30 40 15 5 110 22 130 140 115 105 610 22 22 22 22 110 122 122 122 122-8 - 18 + 17 + 17

610 122

0

122

22

--

Com o presente sistema, percebe-se que se mantm as duas igualdades fundamentais, depois de realizada a transformao, e que os desvios se anulam automaticamente. Mas, a manuteno das igualdades fundamentais deve ser considerado um caso particular, ou seja, a uma situao de equilbrio, bem como, pelo fato de Marx ter se limitado, nos exemplos numricos, a transformar a mais-valia em lucro e o lucro em lucro mdio. Pensamos que faltou apresentar um exemplo numrico, transformando tambm os preos de custos, representados pelo capital adiantado, em preos de produo, atravs do que provavelmente Marx tivesse percebido, que a simultaneidade das duas igualdades tidas como fundamentais no seria possvel na realidade da sociedade capitalista e talvez tivesse pensado em aprofundar a discusso no sentido de encontrar uma soluo completa. Marx adverte que a diferena de grandeza entre lucro e mais-valia nas esferas particulares de produo serve para ocultar a verdadeira natureza do lucro; embora aqui Marx estivesse se referindo s esferas particulares. A simultaneidade das duas igualdades tidas como fundamentais no seria possvel na realidade da sociedade capitalista e talvez tivesse pensado em aprofundar a discusso no sentido de encontrar uma soluo completa. Com relao a no igualdade entre mais-valia e lucro, depois de efetivada a transformao, Marx demonstra que tinha conscincia, mas no parece ter dado importncia, visto que, o que realmente lhe interessava era entender e explicar as transferncias de valores entre os diversos setores quando se analisa de perto a concorrncia entre os capitais, a partir da categoria preo de produo. A este respeito Marx observa que o preo de custo de uma mercadoria, no qual o preo de produo de outra mercadoria est includo pode estar acima ou abaixo do seu respectivo valor.

15 Mesmo assim, Marx adverte que a diferena de grandeza entre lucro e mais-valia nas esferas particulares de produo serve para ocultar a verdadeira natureza do lucro embora aqui Marx estivesse se referindo s esferas particulares. No entanto, aps a transformao completa percebe-se que a nvel das totalizaes necessariamente o lucro divergir quantitativamente da mais-valia. Depois de efetivada a transformao, ou seja, observada a lgica de reproduo do capital em condies de concorrncia entende-se que as mercadorias so vendidas por preos diferentes dos seus respectivos valores e que isto uma condio necessria para a existncia da sociedade mercantil capitalista. Em resumo, pensamos que a transformao conforme trabalhada por Marx deve ser encarada considerando os aspectos tericos e algbricos. Desde o ponto de vista terico, entendemos que Marx completou a transformao. Por outro lado, nos exemplos apresentados no Livro III do Capital a transformao se torna parcial, porque apesar de ter observado que os elementos que constituem o preo de custo do capital adiantado, desde a tica do vendedor, se constituem no preo de produo e normalmente j se desviam dos respectivos valores. Em outras palavras, aps a transformao, o que preo de custo para o comprador representa o preo de produo para o vendedor. Entendemos isto quando percebemos as transferncias de valores ao nvel da apropriao da riqueza. Retornando questo terica dissemos que Marx a completou ou que no existe "erro" porque atravs dela pode-se chegar a um sistema que auxilie a complementao algbrica da transformao. Neste sentido, muitos autores trabalharam e buscaram adequar vrios modelos, dentre os quais destacamos, no presente trabalho, os modelos de Bortkiewicz e Sraffa. Reenfatizamos, entretanto, a necessidade de ter claro o conceito de preo de produo. Pois, preo de produo quer dizer valor aproprivel em condies de uniformidade da taxa de lucro. A compreenso deste conceito passa necessariamente pelo entendimento do processo de transformao do valor em preo de produo, de acordo com o processo de concreo-mistificao, ou seja, de acordo com a progressiva anlise de Marx desde a essncia a aparncia incorporando categorias mais concretas e, por conseguinte, complexificando o processo de anlise.

16 3.4 A polmica das solues ao problema da transformao dos valores em preos de produo

Preo de produo se refere a uma aproximao dos fenmenos da realidade capitalista, mas no deve ser confundido com estes fenmenos. Isto quer dizer que, embora seja uma aproximao e, portanto, uma categoria terica extremamente relevante no tem a pretenso de explicar as flutuaes dos preos de mercado. Pois, no podemos esquecer que o preo de produo ainda medido em trabalho enquanto que, como evidente, a unidade de medida do preo de mercado se refere ao aspecto monetrio quantitativo. Chamamos ateno para a unidade de medida porque consideramos decisiva no que diz respeito interpretao da transformao. Assim, por um lado, existem os que entendem que a unidade de medida horas de trabalho e concluem que o problema da transformao praticamente inexiste. Enquanto que, por outro lado, os que acreditam no problema como se devendo escolha da unidade de medida, buscam ou assumem determinadas concluses para resolverem os problemas ou erros deixados por Marx, mas, na verdade nem chegam a resolver os prprios problemas que parecem ser de compreenso. De maneira geral, esta ltima posio caracterizada como a corrente de pensamento neoricardiana. Um aspecto empobrecedor do neoricardianismo que podem at entendem o problema, mas no conseguem explicar o equivalente e admitem que o equivalente continua sendo explicado por um imaginrio. Apenas disfaram isso admitindo a aceitao dos metais enquanto equivalente. Quando a discusso inclui o numerrio nos parece haver uma confuso de Marx com Ricardo, onde termina prevalecendo a proposta de Ricardo. Por outro lado, mesmo tendo sido discutida por muitos anos, uma soluo adequada perspectiva de Marx ainda permanece na marginalidade acadmica. Como muitos outros estudiosos da teoria marxiana do valor, Carcanholo tambm analisa a transformao a partir do possvel erro de Marx no que diz respeito simultaneidade das duas identidades fundamentais, ou seja, dos valores serem iguais aos preos de produo e da mais-valia ser igual ao lucro, nas totalidades. Segundo a anlise de Carcanholo, a interpretao de que a massa de mais-valia no pode diferir da massa, de lucro na totalidade, sob o pressuposto de que a teoria

17 marxiana da explorao se comprometeria, corresponde a uma falsa e/ou ideolgica interpretao. Para Carcanholo, a diferena entre mais-valia e lucro, depois da transformao, se deve a que a mais-valia medida em valor e o lucro a partir da taxa mdia de lucro medida em preos de produo. Por outro lado, a necessidade de igualdade entre valores e preos de produo nas suas totalizaes se deve a que ambos so medidos em horas de trabalho abstrato, mas em nada isto parece contradizer na perspectiva da teoria de Marx. Com respeito relao entre o valor e o preo de produo de uma mesma mercadoria, Carcanholo mostra outra forma de perceber os desvios atravs da diviso de cada valor por seu respectivo preo de produo. Ou seja, digamos que o valor de uma mercadoria seja x e seu preo de produo seja y, neste caso o desvio para cima ou para baixo pode ser representado por uma certa taxa percentual, no caso: x/y = 1 +/- t%. Na totalidade estes desvios se anulam automaticamente. Este aspecto importante porque basicamente a partir dele que Carcanholo desenvolve o seu raciocnio algbrico para a superao do problema da transformao dos valores em preos de produo. Uma anlise cuidadosa demonstrar que a interpretao adequada a que a totalidade dos preos tem que ser igual totalidade dos valores. Isso porque ambos tm como unidade de medida horas de trabalho social e os preos de produo no so nada mais nada menos do que os valores apropriveis em condies de uniformidade da taxa de lucro. Dessa forma, o preo de produo nada mais do que o valor transformado. Vale salientar, entretanto, que as concluses no podem tomar como alternativa algbrica a aceitao de uma das duas identidades fundamentais como vlida. Se a alternativa algbrica fosse facultativa, como matematicamente poderia ser, admitir-se-ia uma pluralidade nas concluses de Marx, mas far-se-ia. Assim, devemos investigar, dentro do universo das investigaes e das diferentes opinies qual a que apresenta argumentos mais adequados, principalmente quando se trata de interpretaes. Pensamos que a via pela qual se justifica a diferena quantitativa ou algbrica entre mais-valia e lucro, aps a transformao, se torna clara quando se observa dois aspectos apresentados por Marx. Um deles, por sinal decisivo, diz respeito questo da mistificao inerente ao processo progressivo de observao aparencial das relaes sociais no capitalismo, dados os seus mecanismos fenomnicos. O outro, que nos parece ainda mais relevante, diz respeito questo da transferncia de valores e uma observao de que

18 os preos de custos dos produtos j podem conter desvios do valor dos meios de produo, ou seja, incluem mais-valia de outras mercadorias. E, uma vez realizada a transformao, dissimula-se a origem da mais-valia. Outro aspecto fundamental a se ter presente e que tambm demonstra um equvoco interpretativo relacionado preocupao com a escolha do numerrio, parece ser o de confundir a preocupao de Marx com a dos neoclssicos. Qual seja: Marx se preocupou em mostrar dentro do processo concorrencial, como entender a reproduo e mobilidade do capital. Os neoclssicos, por outro lado, se preocuparam fundamentalmente com a compreenso dos preos de mercado e deste nvel no saram. Ento, a preocupao com o aspecto monetrio, acima de qualquer coisa, ou mesmo tomando os preos de mercado como ponto de partida, tem induzido mesmo autores considerados marxistas a se perderem no caminho e terminarem por se envolverem com os resultados da proposta ricardiana. Supondo que tanto os valores quanto os preos de produo tem a mesma unidade de medida se torna difcil aceitar que na totalizao ambos possam diferir. Aceitando a diferena, como demonstra as simulaes matemticas, seria o mesmo que dizer que a lgica de Marx estaria comprometida, pois o valor no seria a riqueza capitalista resultante da produo. verdade que o preo inferior ao valor significa aceitar que a sociedade no reconheceu o valor total, mas tem-se de levar em conta que isto resultado de medidas de mesma coisa em perodos diferentes. No decorrer da circulao haveria acontecido destruio do valor. Mas, avaliando no mesmo momento, ambas as quantidade no podem diferir. Na relao entre mais-valia e lucro ocorre algo diferente. Inicialmente tem-se a dissimulao da mais-valia pelo lucro, a partir da observao dos preos de custos observando-se as transferncias dos valores tanto para os elementos do capital constante quanto eventualmente para o capital varivel, na concorrncia capitalista. Mas, o fato que estas transferncias s podem ser percebidas nas dimenses totais pela observao dos desvios. Segundo a opinio do professor Reinaldo Carcanholo, talvez Marx no tivesse deixado espao para confuses se ao invs de ter utilizado a denominao preo de produo tivesse usado a terminologia valor transformado, como indica a essncia do prprio conceito (CARCANHOLO, 1987, p. 13-14).

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Comentrios finais

Qual a importncia da compreenso do processo de transformao dos valores em preos de produo para entender as questes do nosso tempo? Vivemos um perodo histrico dominado pela acumulao financeira em escala mundial. Diante disto parece que a riqueza nasce do nada, isto , que a valorizao do capital decorre simplesmente do movimento mundial da taxa de juros e que esta acumulao est descolada da produo material. Num primeiro momento parece que a valorizao provm do fato de vender mais caro do que se comprou. Isso verdade, mas s em parte. Neste contexto, a transformao de valores em preos de produo fundamental para a compreenso de que no processo de circulao o que acontece a apropriao de valor de acordo com o tamanho do capital e condicionado taxa mdia de lucro. A taxa mdia de lucro sendo, portanto, uma referncia para a mobilidade do capital. As crises de superproduo do capital so momentos em que demonstra-se que s pode-se apropriar de riqueza no limite da produo. Achamos que o fundamental da teoria marxiana do valor, no contexto aqui estudado, se refere preocupao com a explicao das relaes sociais de produo e apropriao, portanto, da reproduo da riqueza na sociedade capitalista. Neste sentido, se a transformao permite explicar o acima referido, a flutuao dos preos de mercado no se torna a preocupao de Marx, visto que, est estritamente relacionada com as conjunturas especficas representadas nos ciclos de reproduo.

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