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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE LUIZ HENRIQUE MILARÉ DE CARVALHO O LICENCIAMENTO AMBIENTAL PELO MUNICÍPIO E A RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL. ESTUDO DE CASO DO CURTUME CURTE FRANCE EM REDENÇÃO-PA REDENÇÃO, PA 2015

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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE

LUIZ HENRIQUE MILARÉ DE CARVALHO

O LICENCIAMENTO AMBIENTAL PELO MUNICÍPIO E A

RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL. ESTUDO DE CASO DO CURTUME

CURTE FRANCE EM REDENÇÃO-PA

REDENÇÃO, PA

2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE

LUIZ HENRIQUE MILARÉ DE CARVALHO

O LICENCIAMENTO AMBIENTAL PELO MUNICÍPIO E A

RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL. ESTUDO DE CASO DO CURTUME

CURTE FRANCE EM REDENÇÃO-PA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Ciências e Meio Ambiente da

Universidade Federal do Pará para obtenção do

título de Mestre em Ciências e Meio Ambiente,

sob orientação do Prof. Dr. José Heder Benatti.

REDENÇÃO, PA

2015

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Carvalho, Luiz Henrique Milar de, 1970- O licenciamento ambiental pelo município e aresponsabilidade civil ambiental: estudo de caso docurtume curte france em Redenção-Pa / Luiz HenriqueMilar de Carvalho. - 2015.

Orientador: Jos Heder Benatti. Dissertação (Mestrado) - UniversidadeFederal do Pará, Instituto de Ciências Exatas eNaturais, Programa de Pós-Graduação em Ciênciase Meio Ambiente, Belém, 2015.

1. Direito ambiental. 2. Meioambiente-Preservação-Legislação-Redenção (PA).3. Curtumes-Redenção (PA). 4. Responsabilidadepor danos ambientais. 5. Licençasambientais-Redenção (PA). I. Título.

CDD 22. ed. 344.046

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)Sistema de Bibliotecas da UFPA

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DEDICATÓRIA

Ao meu saudoso pai Abdoral (in memoriam) pelos ensinamentos de vida e à criança que

esperamos com muito amor.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a minha família, especialmente à minha mãe Dirce e meus irmãos

Abdoral, Cássia e José, sempre compreensivos e apoiadores. Um agradecimento

especial à minha esposa Yone, que sempre acreditou em meus sonhos, fazendo parte

deles. Agradecimento também todos os docentes do Programa de Pós - Graduação em

Ciências e Meio Ambiente da UFPA, em especial meu orientador, Prof. Dr. José Heder

Benatti, pela paciência e ensinamentos dispensados. Agradeço ainda aos colegas da

turma, sempre prestativos e camaradas. Por fim, um merecido agradecimento à FESAR,

propiciando meios para nosso crescimento.

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RESUMO

Este trabalho nasce de um estudo de caso existente no curtume Curte France instalado

na cidade de Redenção, sul do estado do Pará. Após vários ciclos econômicos, a cidade

vivencia a economia baseada na pecuária, com crescimento exponencial de seu rebanho

bovino. Em tal cenário, e como forma paralela de aproveitamento deste ciclo produtivo,

inúmeros curtumes se instalaram na região, gerando renda e problemas ambientais, em

razão dos dejetos produzidos, em especial o Cromo, extremamente nocivo à saúde

humana e de grande potencial poluidor ao meio ambiente. No caso específico do estudo,

lagos artificiais foram usados como forma de reservatório de tais dejetos,

desobedecendo a normas que vedam tais práticas, principalmente o Plano Diretor e o

Código de Meio Ambiente local. Ao fim das atividades industriais, ainda com todos os

dejetos expostos, a área do curtume foi invadida por pequenos produtores de

hortifrutigranjeiros que ali se instalaram com suas famílias, produzindo alimentos que

são consumidos pela população da cidade. Não obstante, parte destes dejetos acabou

lançada em águas ribeirinhas e que servem para o lazer local. Diante de tal problema,

abordamos então no plano jurídico a questão das dimensões dos direitos e do processo

de esverdeamento das legislações e das interpretações das Cortes Internacionais frente à

proteção ambiental e aos direitos fundamentais, no processo denominado greening.

Quanto às condutas identificadas, o estudo do caso passa primordialmente pela análise

do Plano Diretor e do Código de Meio Ambiente do município, que remetem ao

licenciamento ambiental e seus estudos de impactos, bem como a atuação do Poder

Público quanto à prevenção, proteção e reparação dos danos ambientais. Abordamos

ainda as obrigações e responsabilidades imputadas ao empreendedor frente o grave

problema gerado e ainda sem solução na cidade de Redenção-PA, com a imperiosa

modificação de seu Plano Diretor, com a devida adequação e obediência para a efetiva

proteção da saúde dos seres vivos.

Palavras-chave: Licenciamento ambiental. Município. Curtume. Cromo. Plano Diretor.

Responsabilidade civil ambiental.

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ABSTRACT

This work stems from an existing case study in tannery Curte France installed in the

town of Redenção, south of Pará state. After several economic cycles, the city

experiences the economy based on livestock, with exponential growth of its cattle herd.

In such a scenario, and as a parallel form of exploitation of this production cycle,

numerous tanneries settled in the area, generating income and environmental problems,

because of the produced waste, especially Chrome, extremely harmful to human health

and high pollution potential in half environment. In the specific case study, artificial

lakes were used as a form of reservoir of such waste, disobeying rules prohibit such

practices, especially the Master Plan and the Medium code Local Environment. At the

end of the industrial activities, even with all the exposed waste, the area of the tannery

was invaded by small producers of fresh produce that settled there with their families,

producing food that is consumed by the population of the city. However, of these waste

just launched in coastal waters and serving for local leisure. Faced with this problem,

then we address in legal terms the question of the dimensions of the rights and the

greening process of legislation and interpretations of International Courts front of

environmental protection and fundamental rights, in the process called greening. As for

the conduct identified, the case study goes primarily by analysis of the Master Plan and

the Environment Code municipality Environment, referring to environmental licensing

and its impact studies, as well as the performance of the government as the prevention,

protection and repair environmental damage. Yet approached the obligations and

responsibilities charged to the entrepreneur front the serious problem generated and still

unresolved in the town of Redenção-PA, with the urgent modification of its Master

Plan, with due obedience and suitability for the effective protection of the health of

living beings.

Keywords: Environmental licensing. Municipality. Tannery. Chrome. Master Plan.

Environmental liability.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 9

2 DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO ............. 14

3 O ESVERDEAMENTO DAS DECISÕES E LEGISLAÇÕES-GREENING. ...... 18

4 A ORDEM CONSTITUCIONAL PARA O MEIO AMBIENTE .......................... 20

5 BREVE HISTÓRICO DA CIDADE DE REDENÇÃO .......................................... 24

6 A ATIVIDADE DE CURTUME E SEU IMPACTO NO MEIO AMBIENTE ..... 27

7 O PLANO DIRETOR NO ORDENAMENTO BRASILEIRO .............................. 34

8 O PLANO DIRETOR DE REDENÇÃO .................................................................. 37

9 LICENCIAMENTO AMBIENTAL. ......................................................................... 38

9.1 As Competências do art. 23 da CF/1988 e as licenças decorrentes da

Resolução 237/1997 – CONAMA .......................................................................................... 40

10 O CÓDIGO DE MEIO AMBIENTE DE REDENÇÃO. ......................................... 45

11 A BACIA HIDROGRÁFICA DE REDENÇÃO ...................................................... 52

12 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL DO PODER PÚBLICO E

DO EMPREENDEDOR ......................................................................................................... 55

13 A CONDUTA NOCIVA AO MEIO AMBIENTE. .................................................. 58

14 O DANO AO MEIO AMBIENTE DO MUNICÍPIO .............................................. 59

15 O NEXO DE CAUSALIDADE. ................................................................................. 62

16 A REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL. .......................................................... 65

17 CONCLUSÃO ............................................................................................................. 68

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 70

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1 INTRODUÇÃO

As transformações socioeconômicas ocorridas no Brasil durante o século passado,

principalmente a partir dos anos 1930 com a denominada Era Vargas (KOSHIBA, 2014)

fomentaram o crescimento industrial do país, o apelo ao consumo de manufaturados, o

crescimento demográfico e o êxodo rural, que culminaram num processo de urbanização

desordenado, sem o devido cuidado com a saúde dos cidadãos e o meio ambiente.

Sem planejamento específico, muitas habitações ficam localizadas em áreas de grande

risco de contaminação, expondo vidas humanas a toda sorte, notadamente as populações de

baixa renda. Em tal contexto, a região norte do Brasil assume um percentual de ilegalidade em

mais de 50% de suas moradias, sendo que, a partir do ano de 2005, 1.526 municípios

brasileiros criaram os denominados Planos Diretores Participativos (MARICATO, 2014),

com claro intuito de ordenar a ocupação destes espaços urbanos. Tal medida decorre de

exigência constitucional, prevista em seu art. 182, § 1º, onde, nas cidades com mais de 20.000

habitantes devem obrigatoriamente aprovar o denominado Plano Diretor, instrumento básico

da política de desenvolvimento e de expansão urbana. Esse requisito trata do aspecto de

planejamento urbano e da vida das cidades, visto que a maioria guarda sérios problemas de

ordem estrutural.1 Na concepção de Üner Kirdar, trazida por Consuelo Yoshida (CRUZ et al.,

2009):

Cada cidade precisa de um eficiente processo social, em todos os níveis, para

resolver seus conflitos. Esse processo precisa ser holístico, integrativo e

participativo porque a cidade é o foco dos fenômenos sociais em todos os níveis e –

sobretudo – porque a cidade não é apenas o que nela está construído. Uma cidade

são as pessoas – e o habitat das pessoas. As cidades, portanto, devem ser uma fonte

de visões positivas das pessoas – onde todos tenham segurança, saúde, e

desenvolvimento sustentável; serviços básicos e culturais; direitos democráticos e

deveres; possibilidade de escolha livre de empregos; participação nas decisões

públicas. Nenhuma reconstrução de uma infraestrutura decadente será suficiente

para assegurar que as cidades sejam seguras, saudáveis, e habitáveis até que as

ideias, alma e espírito daqueles que nelas residem floresçam.

1 Segundo MARICATO, apesar da ampliação do acesso a água tratada, 5% da população urbana e 18,8% da

população brasileira não fazem parte desse quadro, o que soma 37,6 milhões de pessoas, que corresponde a dez

países do tamanho do Uruguai (MARICATO, op. cit.. p. 17). A cidade de Redenção possui pequeno percentual

de esgotamento sanitário (aproximadamente 1,5% e sem qualquer forma de tratamento) e apenas 2% da

população possui o fornecimento de água tratada encanada (Informações coletadas junto a empresa FOZ

AMBIENTAL concessionária dos serviços na cidade). A maioria das casas tem o fornecimento de água feito por

via de perfuração de poços semi-artesianos e a utilização de fossa sépticas, sendo os dejetos lançados junto com

o lixão a céu aberto e muito próximo da área do curtume (500 metros). Todo esse cenário faz parte da zona

urbana, com pouco mais de 3 km do centro da cidade.

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As cidades devem desempenhar um papel importante na vida das pessoas, com

diversas funções sociais, destacando a figura humana como centro de suas preocupações. 2

Afirma a autora “que para um mundo apropriado para as pessoas, deve-se ter primeiro

cidades apropriadas para as pessoas” (CRUZ et al., op.cit., p.78).

Assim, as políticas públicas e as normas legais devem propiciar tais condições às

cidades. Nesse pensamento, importante para a vida dos e nos municípios, a nova

interpretação constitucional propiciou a aplicação do denominado princípio do predomínio do

interesse local, possuindo o ente público a capacidade de autodeterminar-se, desde que

respeitada às demais competências em matéria ambiental.

Dentro de tal contexto, destaca-se o licenciamento ambiental, importante instrumento

para propiciar condições dignas e adequadas para que os seres humanos possam viver em

ambiente sadio e sustentável, regrando atividades econômicas dentro de tais limites

consagrados no mundo afora, principalmente com a participação na elaboração de planos para

as cidades.3

Porém, nem todos os municípios atentam-se para tais mandamentos, tornando, por

vezes, Planos Diretores, Códigos de Meio Ambiente e licenciamentos ambientais meras letras

formais, não aplicadas ao cotidiano das pessoas.

Em tal cenário, procuramos estudar o caso da cidade de Redenção, localizada na

região sul do estado do Pará, que integra o rol destes municípios com problemas de ocupação

de áreas urbanas, sem a devida intersecção entre Plano Diretor, Código de Meio Ambiente

Municipal e o Licenciamento Ambiental de atividades econômicas com potencial de risco à

saúde de seus cidadãos.

Para consecução do trabalho, com relação a metodologia empregada, seguimos com a

discussão dos temas jurídicos e as implicações do caso concreto do curtume, com

levantamento da legislação pertinente, bem como de coleta de dados e análise de material de

solo, com auxílio do Laboratório BIOAGRI de Piracicaba-SP, além da colaboração do

químico Renato Hilton Reis, integrante do Programa de Mestrado da Universidade Federal do

Pará - UFPA. Analisamos a legislação pertinente, e em especial a local, com destaque para o

2 A autora fala ainda no consenso internacional de que as cidades devem ser apropriadas para as pessoas (cities

fit for people). (YOSHIDA et al.. p. 79) 3 Tratando do tema de Ordenamento Territorial, Benatti (BENATTI, 2003) afirma que quatro pontos devem ser

superados para a eficácia do zoneamento, dentre eles a participação das populações envolvidas. No caso do

Plano Diretor e do Código de Meio Ambiente de Redenção, as audiências foram realizadas em curto espaço de

tempo (menos de 06 meses), aprovando-se toda legislação municipal, como Plano Diretor, Código de Meio

Ambiente, Legislação para Ocupação de Solo, Código de Postura e outros, denotando uma participação popular

apenas de caráter figurativo.

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Plano Diretor e o Código de Meio Ambiente da cidade e a observância de seus preceitos. Os

estudos foram realizados em artigos relacionados ao tema em periódicos com classificação

A1, A2, B1 e B2 da CAPES, livros jurídicos e regramento jurídico local, tudo voltado às

questões de legislação ambiental em uma leitura contextualizada.

Com os resultados laboratoriais, tivemos a constatação de suspeitas que levaram ao

presente estudo de caso, buscando sempre pautar a conduta pela isenção, considerando-se o

trabalho com cunho científico.

Identificamos o local, abordamos pessoas, seguimos o curso dos rios que receberam

dejetos, sempre analisando os desdobramentos do caso sob o prisma jurídico e social.

Objetivamente, constatou-se a presença do elemento químico Cromo, em quantidades

consideradas insatisfatórias para as atividades de indústria, moradia e agricultura.

Pudemos ainda constatar que um dos reservatórios de dejetos teve seu conteúdo

lançado nas águas do Ribeirão do Gago e do rio Pau d’Arquinho, que circundam a cidade e

são importantes meios de abastecimento hídrico e de recreação local.

Não obstante tal fato, as amostras coletadas identificaram o Cromo tanto na superfície

da lagoa (ainda com água) como também em subsolo, penetrando na localidade em

profundidade considerável.

Nos estudos levantados, constatou-se que o Cromo é altamente nocivo à saúde

humana, com ação cancerígena, além de afetar pele, fígado, rins e outras partes e sistemas do

corpo humano. Também se identificou no local, a existência de 155 famílias que formam uma

associação de trabalhadores e reivindicam o local para moradia e sustento, em regime de

economia familiar. A produção de hortifrutigranjeiros abastece a feira municipal,

disseminando produtos potencialmente contaminados.

Quanto aos desdobros judiciais, identificamos apenas o ajuizamento de uma ação de

reintegração de posse, proposta pelo grupo J.B.S. S/A, proprietária da área em substituição a

empresa BERTIN S/A, que também sucedeu a outros empreendedores.

Em seguida, entrando na questão doutrinária para emabasamento do trabalho,

apresentamos a questão primária do direito fundamental ao meio ambiente equilibrado,

premissa inicial para construção e entendimento do tema e sua importância no ordenamento

jurídico nacional. Também abordamos o processo de esverdeamento ou greening das decisões

judiciais e a legislação afeta como passo evolutivo das nações desenvolvidas.

Abordamos ainda a evolução das eras dos direitos e suas dimensões e o papel de cada

constituição ao longo da trajetória histórica na tutela do meio ambiente.

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No item II, tratando de forma específica do estudo de caso, apresentamos a cidade de

Redenção, sua formação histórica e seus diversos ciclos econômicos, desde a corrida do ouro

até a criação de gado e a formação de considerável rebanho, trazendo, em decorrência, as

atividades de curtume na cidade e região.

Especificamente neste item, analisamos o caso do Curtume Curte France, sua

instalação e funcionamento em Redenção, produção de dejetos e armazenamento, com

eventual nocividade aos seres humanos. Ao fim das atividades, literatura especializada afirma

que rejeitos do processo fabril ficaram depositados em lagoas a céu aberto, sem qualquer

proteção ou plano de segurança para evitar contato humano e o contágio da área,

principalmente pelo Cromo (elemento químico Cr), causador de câncer em seres humanos, o

que acabamos por constatar no presente estudo. Ainda há relatos de despejo desse material em

rios que cercam a cidade e que servem de lazer para a população local.

Não obstante, identificamos que a área do curtume e seus problemas ambientais tem

destinação como loteamento aprovado segundo o mesmo Plano Diretor, constituindo-se em

descaso do Poder Público com a saúde humana.

Tratamos também dos aspectos inerentes deste Plano Diretor com o Estatuto das

Cidades e o papel desempenhado na elaboração do Plano Diretor do município de Redenção-

PA. De maneira detida, identificamos a relação dos Institutos Municipais dentro do contexto

das atividades desenvolvidas pelo curtume localizado no município e a determinação legal de

atuação do ente público.

No que se refere ao item 9, inicialmente tratamos do licenciamento ambiental, como

conceito básico de instrumento de política ambiental, sua natureza jurídica, suas etapas para

construção, a competência para sua exigência dentro da ordem jurídica, a análise do

predomínio do interesse local e as audiências públicas realizadas, com a criação do Plano

Diretor da cidade e a atuação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMA).

Logo adiante e pela correlação estreita, abordamos o Código de Meio Ambiente do

município, seus institutos e aplicabilidade, com condutas e penalidades, destacando sua

incidência em atos e omissões apontados na pesquisa realizada, em especial pela destinação

de áreas para loteamento e habitação humana da legislação, coincidindo com região afetada

pelos resíduos do curtume.

E, em razão destes mesmos atos e implicações, tratamos da bacia hidrográfica local,

com as consequências identificadas.

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No item IV, na discussão doutrinária do tema, trouxemos a questão da

responsabilidade jurídica ambiental do empreendedor e do próprio Poder Público, em suas

diversas esferas e a análise das condutas, do dano ambiental e do nexo causal.

E, em decorrência, apresentamos a questão emblemática da reparação do dano

ambiental, além da abordagem da responsabilidade ambiental em outros países.

Esperamos que o trabalho contribua significativamente, principalmente para que

medidas concretas possam ajudar a vida de cidadãos diretamente afetados pelo problema da

poluição e degradação do meio ambiente e da vida humana, tornando-a mais digna e justa.

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2 DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO

A sociedade sempre discutiu a questão dos direitos e deveres. Mesmo em períodos

conturbados, os homens buscam entender a complexa equação estabelecida entre liberdade e

respeito entre si. Segundo o filósofo político italiano Norberto Bobbio (BOBBIO, 2004), a

partir da Revolução Francesa de 1789 e sua Declaração Universal de Direito do Homem e do

Cidadão, estruturaram-se as denominadas era dos direitos, estabelecendo reflexões sob as

mais diversas perspectivas filosóficas, políticas e sociais.

Com uma divisão histórica evolutiva, conceituou-se a primeira era como sendo a

garantia dos direitos civis, exercitáveis contra o Estado, exigindo deste apenas uma prestação

negativa (AZEVEDO, 2005), sintetizada naquela declaração iluminista. Na segunda, ações

positivas do Estado, com questões econômicas sendo colocadas em discussão e afirmando

políticas para a garantia da efetividade dos direitos contidos na primeira geração ou dimensão,

afirmando principalmente os direitos políticos.

Na terceira dimensão, tem-se o respeito à questão da solidariedade, com a utópica

visão (AZEVEDO, op. Cit., p.47) de paz, de desenvolvimento, o respeito à autodeterminação

dos povos e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, como condição de vida e

de extrema relevância. Chama atenção ainda a questão terminológica mais adequada em se

estabelecer entre direitos humanos e direitos fundamentais nas eras ou dimensões, optando

SARLET por este último, representando maior precisão e definição, porquanto positivado

dentro de tempo e espaço, num Estado de Direito constituído em sua forma basilar (SARLET,

2005). O autor fala ainda em dimensões de direito, com a constitucionalização destes,

dividindo tais dimensões na preponderância das normas fundamentais sobre todo o

ordenamento jurídico, na vinculação e da submissão de todos os entes públicos e nos limites

formais de revisão, de acordo com art. 60 da Constituição Federal de 1988 (SARLET, op. cit.,

p.37).

Especificamente de interesse para o presente trabalho, esta última geração discute os

direitos difusos do meio ambiente e da genética. Sob tal prisma, e entendendo a consolidação

do tema, o pensador afirma que o problema fundamental em relação aos direitos do homem,

hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não

filosófico, mas político (BOBBIO, op. cit., p.25).

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Constata-se, dessa forma, uma preocupação com a preservação e proteção ambiental,

trazendo a sustentabilidade 4 como grande tônica das discussões, notadamente após o

encerramento das duas grandes guerras mundiais que marcaram o século XX.

Os horrores e a barbárie sentidos nos dois grandes conflitos mundiais eram recorrentes

em todas as discussões de líderes mundiais, retomando a necessidade de diálogos e a

afirmação de princípios humanitários. A humanidade passou a discutir questões de alta

relevância para o seu futuro, refletindo sobre erros e buscando consolidar mecanismos

permanentes de discussão e resolução de conflitos reinante entre os países.

Na afirmação de Flávia Piovesan (apud MARUM, 2002):

No momento em que os seres humanos se tornam supérfluos e descartáveis, no

momento em que vige a lógica da destruição, em que cruelmente se abole o valor da

pessoa humana, torna-se necessária a reconstrução dos direitos humanos, como

paradigma ético capaz de restaurar a lógica do razoável.

O mundo pós-guerra experimentou a divisão em blocos, liderados pelas potências

econômicas dos EUA e URSS, com a denominada guerra fria.

No entanto, a liderança existente no Ocidente articulou o pensamento de retomada de

valores humanitários, com reafirmação de direitos advindos desde o esfacelamento dos

reinados absolutistas e a adoção repensada dos ideários iluministas.

Nesse sentido, a silenciosa e quase despercebida revolução (SOHN, Louis B. apud

MAZZUOLLI e TEIXEIRA, 2012) ocorrida na cidade americana de São Francisco em 1945,

disseminou o pensamento de criar uma organização internacional capaz de conter os horrores

das guerras mundiais. Nascia o conceito da Organização das Nações Unidas (ONU), com a

conhecida Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em Paris em 10.12.1948,

e que em seu preâmbulo consagra:

Sua fé nos direitos fundamentais do Homem, na dignidade e no valor da pessoa

humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram

resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida

dentro de uma liberdade mais ampla;

As críticas dirigidas à declaração surgem pelo fato de que apenas se faz referência aos

direitos humanos, sem especificar a questão ambiental e a sanção cabível ao Estado membro

que viesse a descumprir as garantias mínimas dos homens. A declaração, na sua origem,

4 Sustentabilidade pode ser definida como a característica de um processo ou sistema que permite que ele exista

por certo tempo ou por tempo indeterminado. Nas últimas décadas, o termo tornou-se um princípio segundo o

qual o uso de recursos naturais para a satisfação das necessidades presentes não deve comprometer a satisfação

das necessidades das gerações futuras. (PEREIRA, Adriana Camargo et al., 2011)

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protege duas espécies de direitos, sendo a divisão consistente em direitos civis e políticos e os

direitos econômicos, sociais e culturais. Era o grande embrião do direito ambiental.5

Como se denota, o passo inicial não se vinculava diretamente ao meio ambiente, mas

propiciou que novas ideias fossem surgindo, principalmente na escalada de conscientização

de preservação dos direitos humanos, atrelando estes às garantias de um meio ambiente

saudável. Em 1966, surge o sistema global de proteção, com a criação de dois grandes

acordos: o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de

Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos consolida o reconhecimento de

uma série de direitos, podendo destacar o direito à vida; a não ser submetido à tortura; a não

ser submetido à escravidão; o direito à liberdade; a garantias processuais; à liberdade de

movimento; à liberdade de pensamento; à liberdade de religião; à liberdade de associação; à

igualdade política e à igualdade perante a lei, conforme estabelecido em suas diretrizes

(NOLETO, 1998).

A adoção de um tratado sobre direitos civis e políticos separado de um pacto ou

tratado sobre direitos sociais gerou grandes discussões, no dizer de Noleto (NOLETO, op. cit.,

p.42).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos traz o reconhecimento da

dignidade humana como um padrão ético mínimo não apenas para direitos civis e políticos,

mas, também, para direitos sociais, econômicos e culturais, sendo todos igualmente

necessários e imprescindíveis para a garantia da dignidade humana (NOLETO, op. cit., p.42).

Avançando no tema de garantias humanitárias, a Assembleia Geral da Organização

das Nações Unidas (ONU) reafirmou a relação entre direitos humanos e a proteção ambiental

na Resolução 45/1994, declarando que todos os indivíduos têm o direito de viver em ambiente

adequado para a sua saúde. Todavia, não aprovou qualquer instrumento normativo geral

específico garantindo direitos ambientais substantivos (SHELTON, 2014), ainda que tenha

adotado resoluções importantes sobre o tema.

Destaque para a resolução 2005/60, de 20.04.2005, que afirma que:

O dano ao meio ambiente pode ter efeitos potencialmente negativos sobre o gozo

dos direitos humanos e sobre uma vida saudável e que a tutela do meio ambiente e

do desenvolvimento sustentável pode contribuir para o bem-estar humano e

possivelmente para o aproveitamento de direitos humanos.

5 Bessa Antunes (ANTUNES, op. cit., p.359. p. 11) define o Direito Ambiental como um direito que tem por

finalidade regular a apropriação econômica dos bens ambientais, de forma que ela se faça levando em

consideração a sustentabilidade dos recursos, o desenvolvimento econômico e social, assegurando aos

interessados a participação nas diretrizes a serem adotadas, bem como padrões adequados de saúde e renda.

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Diferentemente do que se possa concluir, o fato é que a comunidade internacional

avançara no sentido de garantir cada vez mais o meio ambiente saudável como forma inerente

aos direitos humanos fundamentais.

Não se pode conceber o desfrute de direitos humanos em um ambiente degradado e as

políticas públicas devem assim proceder. No mesmo sentido, a Convenção Internacional do

Trabalho 169 (OIT), de 27 de junho de 1989 e atrelada a ONU, estabeleceu, no que tange aos

povos indígenas e tribais, que medidas devem ser adotadas para salvaguardar, proteger e

preservar o meio ambiente, além de exigir estudos de impacto ambiental e social sobre

atividades laborativas desenvolvidas.

Constata-se grande preocupação mundial sobre o respeito ao meio ambiente como

condição de exercício dos direitos fundamentais, inclusive para o desenvolvimento do

trabalho humano (SHELTON, op. cit.).

Evolutivamente, e diante das especificidades locais, o pensamento regionalizado de

garantias trouxe o nascimento de três sistemas de proteção, limitando a soberania estatal com

a adoção de tratados: o europeu (com a Convenção Europeia para a Proteção de Direitos

Humanos e das Liberdades Fundamentais de 1950), o africano (com a Carta Africana de

Direitos do Homem e dos Povos de 1981) e o Interamericano (originado pela Carta da

Organização dos Estados Americanos e pelo Pacto de São José da Costa Rica, de 1969).

No entanto, algumas críticas ainda se identificam aos direitos fundamentais, com

teoria de ataques de politicas neoliberais que visam a sua descontrução, conforme preceitua

Azevedo (AZEVEDO, op. cit., p.47.). O autor inicial sua posição coma diferenciação entre

direitos fundamentais e direitos humanos. A expressão direitos fundamentais possui um

sentido mais estrito do que a de direitos humanos. Para Perez Luño:

Os direitos fundamentais descrevem tão-só o conjunto de direitos e liberdades

jurídicas e institucionalmente reconhecidos e garantidos pelo direito positivo. (apud

AZEVEDO, op. cit., p.47.).

E não há Estado de Direito sem o devido respeito aos direitos fundamentais, o que o

neoliberalismo, como ideologia, afeta e ataca aqueles, em favorecimento de grupos

dominantes que se passam por defensores do interesse geral.

Á margem de tais discussões, a proposta do presente trabalho é identificar elementos

legais de proteção ao meio ambiente, na escala do direito internacional, em linhas gerais,

chegando-se até os diplomas municipais do assunto.

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Nesse aspecto, cumpre analisar o pensamento acerca do tema de proteção ambiental,

como faremos adiante.

3 O ESVERDEAMENTO DAS DECISÕES E LEGISLAÇÕES – GREENING

No plano interamericano, que interessa especificamente ao presente trabalho, a

Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica),

foi omissa quanto à questão específica ambiental, muito embora seja possível falar-se em

garantias e proteções ao meio ambiente no plano do sistema regional interamericano, com a

adoção do denominado greening (“esverdeamento”) do direito internacional (MAZZUOLLI e

TEIXEIRA, 2012).

Tal processo de esverdeamento consiste na adoção de mudança de postura dos países

ligados a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a observância de princípios de

respeito aos direitos ambientais, notadamente em casos concretos de proteção de direitos civis

e políticos, com relevância mundial6.

Porém, as garantias não são constatadas de forma direta nos tratados internacionais e

ordenamentos internos, com penalidades sérias, apesar da Conferência das Nações Unidas

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio de Janeiro em 1992,

reafirmar a relação da dignidade da pessoa humana e a questão ambiental, originada em

Estocolmo em 1972 (ANTUNES, 2014), e que resultou na edição do princípio 1 da Rio 92,

asseverando que:

Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o

desenvolvimento sustentável. Tem direito a uma vida saudável e produtiva em

harmonia com o meio ambiente.

Assim, temos a estreita relação de proteção ao ser humano ligada à proteção

ambiental, como indispensável para atingirmos a dignidade da pessoa humana em todo seus

contornos.

6 O autor cita ainda como exemplo de esverdeamento e mudança de postura e decisão dos tribunais o caso da

Corte Europeia. Em 1990, o desfecho do caso Powell e Rayner deu-se com o entendimento de que os ruídos

provocados pelo aeroporto nos arredores de Heathrow (Reino Unido) não ofendiam as disposições acerca do

direito de vizinhança e propriedade assegurados. Mais tarde, em 2001, em caso semelhante, a mesma Corte

decidiu que o Estado britânico tem o dever de implementar medidas voltadas ao equilíbrio entre o interesse

econômico e o direito à saúde, à propriedade e à vida privada e familiar dos vizinhos do aeroporto.

(MAZZUOLLI e TEIXEIRA, op. cit.).

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O esverdeamento e a busca pela defesa dos direitos humanos trouxe a questão

ambiental em seu contexto, impondo uma mudança de paradigma das nações e dos tratados

firmados a partir da Rio 92.

E, como se constatava a omissão de Estados membros poluidores quanto a sua adesão

aos novos tratados internacionais e ainda com grande atividade poluidora, a saída jurídica

encontrada foi impor a responsabilidade por dano ambiental como fator de agressão à

dignidade da pessoa humana, na técnica denominada de proteção ambiental por via reflexa ou

por ricochete, segundo Orlindo Francisco Borges (BORGES, 2013)

Defendendo um, acaba por defender o outro, como ato reflexo.

A saída encontrada para defesa da proteção ambiental trouxe a incorporação desta

como corolário da defesa dos direitos civis e, em última análise, direitos humanos, como a

dignidade de seus agentes e detentores sendo incorporados nos direitos das nações avançadas.

No Brasil, um dos casos emblemáticos da defesa via reflexa foi com o povo indígena

Yanomami e o Estado Brasileiro7, quando da construção de uma rodovia e exploração de

recursos naturais em território amazônico habitado pela comunidade, afetando a vida, saúde, a

segurança e o direito a residência do grupo (MAZZUOLLI e TEIXEIRA, 2012), trazendo

mortes por doenças contagiosas não tratadas pelo Poder Público. Comissão Interamericana de

Direitos Humanos estabeleceu a relação entre qualidade ambiental e o direito à vida.

Adiante, trataremos da questão constitucional do tema, abordando as implicações

desse pensamento no ordenamento nacional.

7 Também impende destacar a solicitação de Medida Cautelar junto a Comissão Interamericana de Direitos, feito

pelas comunidades tradicionais da bacia do Rio Xingu, visando a paralisação das obras da hidrelétrica de Belo

Monte, em Altamira-PA (MAZZUOLLI e TEIXEIRA, op. cit.).

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4 A ORDEM CONSTITUCIONAL PARA O MEIO AMBIENTE

Internamente, a Constituição Brasileira de 1988, carta de essência política

reconstrutora de cidadania, assegurou o acesso ao direito humano fundamental ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado, no pensamento clássico de Canotilho (CANOTILHO,

2004). Com a ressalva de não comprovação histórica do fato, o pensamento de proteção

ambiental remonta as Ordenações do Reino, com disposições acerca das infrações ambientais

e suas sanções, como afirma Alexandre de Moraes, reportando-se a Paulo Afonso Leme

Machado, nas

Ordenações Filipinas, Livro Quinto, Título LXXV, prevendo pena ao agente que

cortasse a árvore ou fruto, sujeitando-se ao açoite e ao degredo para a África por

quatro anos, se o dano fosse mínimo, caso contrário, o degredo seria para sempre (

apud MORAES, 2005).

Especificamente, no art. 2258 da Constituição vigente, temos assegurado o direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado, o que não se verificava sistematicamente nas

cartas anteriores. O conceito de tal defesa nasce com a edição da Lei de Política Nacional do

Meio Ambiente em 19819, com o mote de proteção à saúde pública, não diretamente ao meio

ambiente.

Historicamente, a Constituição da Mandioca, assim denominada a criada em 1824,

pelo voto censitário mensurado pelas sacas de farinha de mandioca, não dispunha de nenhum

artigo de proteção aos recursos naturais, remetendo às Câmaras Municipais e seus Senhores,

denominados “homens bons”, a tarefa em disciplinar as atividades econômicas, esculpida tal

disposição no artigo 169 (ANTUNES, 2014).

As Câmaras realizam tal tarefa com as posturas, com amplos poderes conferidos aos

municípios.

Na nova constituição, adotada pela república em 1891, ocorreu a preocupação em se

regrar a defesa e proteção da saúde pública, com significativa perda de autonomia e poder

antes conferidos aos municípios.

8 A Constituição assegurou a tutela dos direitos da terceira geração (item específico do trabalho), com

fundamento na fraternidade e solidariedade com base nos interesses coletivos (que ultrapassam a ideia do

indivíduo) e ainda difusos, pertencentes a um número indeterminado de pessoas, que se encontram na mesma

situação fática, mas não tem entre si nenhuma relação jurídica pré-definida (CANOTILHO, 2013. p. 2081) 9 Não havia definição legal para o termo meio ambiente no Brasil até a chegada da Lei 6.938/81 (art. 3º, I), que

conceituou meio ambiente como sendo o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física,

química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

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Em seguida, após o advento da república velha e da política do “café com leite”, surge

um novo cenário político, com a emergente figura de Getúlio Vargas e a quebra da hegemonia

de Minas Gerais e São Paulo. A reação veio com a denominada “Revolução

Constitucionalista de 1932”, com os mártires Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, na sigla

do movimento MMDC. Vargas nomeou interventor e os conflitos foram sentidos em várias

partes. Sufocada a revolta, cabia ainda trazer a ideia da ordem constitucional estabelecida,

ainda mais se tomando o cenário mundial e a eclosão de movimentos políticos autoritários.

Buscando trazer ares de democracia ao governo, uma nova constituição é aprovada em

1934, com forte característica intervencionista na ordem econômica, com a ampliação da

competência legislativa atribuída à União, com relativa preocupação com a proteção

ambiental. O professor Bessa Antunes esclarece que o exemplo de tal preocupação reside na

criação do Código das Águas, de 1934 (ANTUNES, op. cit., p.359).

Com a eclosão da II Guerra Mundial (1939-1945) e o aparecimento de regimes

totalitários, o Brasil também se viu envolto em tal situação, com a criação do denominado

“Estado Novo” de Vargas (1937-1945) e a mudança da ordem constitucional. Nascia a

Constituição de 1937, com a privativa competência da União em legislar sobre os bens de

domínio federal, minas, metalurgia, energia hidráulica, águas, florestas, caça e pesca e sua

exploração, conforme artigo 16, XIV (ANTUNES, op. cit., p.359).

A redemocratização de 1946 e sua nova Carta Política não alterou o regime de

competências legislativas em temas relacionados a saúde pública e infraestrutura, com

enfoque ambiental. A implantação de novo regime em 196410

e a exacerbação dos poderes do

Executivo federal, nas palavras do professor Bessa Antunes (ANTUNES, op. cit., p.359), cria

em 1967 (sem grandes alterações em 1969), uma Constituição Federal voltada ao monopólio

federal das decisões de infraestrutura e de regramento quanto ao direito agrário, às normas

gerais de proteção de segurança da saúde, águas e energia elétrica, jazidas, minas e outros

recursos minerais, metalurgia, florestas, caça e pesca, dentre outros.

10 A Constituição de 1967 foi promulgada durante o regime militar (1964-1985), tendo como característica

principal a centralização do poder em torno dos militares, e a repressão das oposições políticas, além da edição

dos Atos Institucionais (decretos aprovados sem passar pelo Legislativo). Nesse contexto, a Constituição

consagrava o Executivo pelas questões relativas à administração pública e à segurança nacional. Ainda ampliou

o poder do Executivo, enfraqueceu o princípio federativo (reduziu autonomia política de estados e municípios) e

materializou o regime de exceção dos militares por meio de medidas acessórias, estabeleceu a pena de morte

para crimes ligados à segurança nacional e retirou o direito de greve e organização dos sindicatos (Portal Brasil,

2015).

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Com a abertura política em 1985 e o processo de redemocratização sentido nos anos

seguintes, é promulgada em 05 de Outubro de 1988 uma nova Carta Política cercada de vários

anseios e direitos erigidos à condição de norma constitucional. O país saía de um período

conturbado de cerceamento de direitos, notadamente o respeito aos direitos humanos, com a

ocorrência de prisões e torturas nos porões do Destacamento de Operações de Informações do

Centro de Operações de Defesa Interna, mais conhecido como DOI-CODI.

Assim, todos os segmentos da sociedade queriam ver elevados à garantia de ordem

constitucional os seus direitos e anseios, não sendo diferente quanto aos defensores dos

direitos humanos e ambientais, de forma a não se proceder a qualquer retrocesso na conquista

de direitos. Tal compromisso se dá inclusive pela necessidade de solidariedade humana como

dever geral e pelo primado da dignidade da pessoa humana (AYALA, 2010).

Dessa forma, os denominados Direitos Ambientais Substantivos acabam aplicados no

direito interno de mais de 100 países, com suas constituições impondo aos governos o dever

de evitar o dano ambiental ou ainda exigindo a integral proteção do meio ambiente e dos

recursos naturais (SHELTON, 2014).

No Brasil, como já citado, o artigo 225 da Constituição de 1988 assegura que todos

têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida.

Tal preceito também se encontra na constituição de Angola, no artigo 24, onde se

afirma que todos os cidadãos tem o direito de viver em um ambiente saudável não poluído,

bem como na Constituição Argentina, em seu artigo 41 (SHELTON, op. cit.).

E ainda temos a posição defendida quanto a não se permitir o retrocesso das

garantias constitucionais conquistadas, estabelecendo, segundo (AYALA, op. cit., p.29) que

um mínimo de conteúdo ambiental (mínimo de existência ecológica) pode ser

associada à suficiente qualidade de vida enquanto resultado de uma leitura de

dignidade, compreendida esta como a manifestação de diversas posições jurídicas

fundamentais de um direito fundamental como um todo: funções defensivas e

prestacional do direito fundamental ao meio ambiente, além de também ser o

resultado de uma tarefa estatal.

Significa então dizer que as garantias ambientais estabelecidas pela Constituição

Federal de 1988 não podem ser objeto de qualquer diminuição em seu grau de importância ou

de aplicação em políticas públicas, respeitando tal condição mínima como a garantia da

dignidade da pessoa humana, dentro de ambiente ecologicamente equilibrado e, portanto,

sadio.

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E na análise do artigo 225 da Constituição Brasileira de 1988, temos que a proteção

legal afeta a qualidade dos recursos naturais e na vida e saúde das pessoas (CANOTILHO et

al., 2013) e impõe ao Estado um comportamento ativo no sentido de impor uma obrigação de

proteção ao meio ambiente, bem como impedir que terceiros venham a destruir ou degradar,

além de impor uma abstenção no mesmo sentido, na afirmação de Fernanda Medeiros (apud

CANOTILHO et al., 2013).

Constata-se, por evolução do próprio ordenamento constitucional, uma modificação de

consciência até do papel do Estado, impondo obrigações de proteção e fiscalização, em todos

os aspectos e de modo efetivo, garantindo, dessa forma, os direitos humanos, em análise final.

Dentro de tal contexto do ordenamento, impende ainda destacar o conceito de

Constituição Ecológica (CANOTILHO et al., 2013), justamente visa impor normas de

proteção e que ainda exerçam o papel de impor limite e impulso aos Poderes Legislativo e

Executivo, com aplicação imediata, vinculando ainda todas entidades públicas e privadas,

impondo medidas administrativas e políticas nesse sentido.

Dessa forma, toda legislação infraconstitucional deve atender aos preceitos

consagrados pelo legislador constituinte, como respeito à dignidade da pessoa humana, do

meio ambiente equilibrado e da prevenção da saúde pública, valendo sua criteriosa

observância para a elaboração do Plano Diretor dos Municípios, objeto que especificamente

interessa para o presente trabalho.

Sem pretender esgotar toda legislação ambiental aplicável à proteção ambiental,

interessa-nos especialmente a questão do Plano Diretor e sua observância quanto aos preceitos

traçados de proteção ao meio ambiente, notadamente para o licenciamento ambiental.

Dessa forma, partimos de um caso concreto, ocorrido na cidade de Redenção-PA, com

seus desdobros fáticos e legais.

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5 BREVE HISTÓRICO DA CIDADE DE REDENÇÃO

A cidade nasceu em decorrência dos projetos dos governos militares, nos idos de 1960

e 1970, com a atuação da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). O

nascimento do povoado, do ponto de vista histórico, ainda é cercado por diversas correntes e

interpretações. Consta que antes da urbanização, a localidade possuía uma vegetação

exuberante, decorrendo a denominação de Boca da Mata (LIMA, 2013), com a data oficial de

criação em 21 de setembro de 1969.

As divergências históricas acerca do nascimento da cidade se manifestaram de forma

mais acirrada em 2012 por ocasião de homenagens que foram conferidas de Mérito

Legislativo pela Câmara Municipal. Na solenidade, foi lida nota enviada por email da filha do

ex-prefeito Vargas, afirmando que nenhum dos homenageados eram pioneiros e que o real

fundador seria seu pai, Luís Vargas Dumont (LIMA, op. cit., p.20). A ideia inicial de Vargas

era criar uma cidade nos moldes de Belo Horizonte, capital mineira, com ruas e avenidas

largas, com planejamento para o crescimento ordenado e de integração dos moradores com

sua cidade.

Todavia, existem ainda relatos orais mais antigos de pessoas afirmando que, na década

de 1930, missionários da Igreja Católica de Conceição do Araguaia, fronteira com Redenção,

apontam a existência de colonos na beira do rio Pau-d’arco, sendo, dessa forma, a origem do

povoado. Por sua vez, Marlene de Deus Tavares da Silva, na obra Estudos Amazônicos – o

Pará em questão (FERREIRA apud DA SILVA. p.23), afirma haver a divisão de terras

ocorrida no sul do Pará data de 1971, com a deliberada intenção de preencher os espaços

vazios da ocupação regional, sem, contudo, esclarecer tal polêmica, mas reforçando as razões

da ocupação local com política pública da época. Cita inclusive que se editou, em decorrência

de tal posição governamental, o Decreto-lei 1.164/71, anterior ao GETAT (Grupo Executivo

de Terras do Araguaia-Tocantins). Toda ocupação fora baseada no princípio do povoar para

proteger, notadamente a partir de 1964, com a eclosão da Guerrilha do Araguaia, movimento

político armado de resistência de esquerda, fixado nas imediações dos rios Araguaia e

Tocantins.

Formalmente, a emancipação política acontece no início dos anos de 1980, com a

aprovação do Projeto de Lei em 13 de maio de 1982, promulgando-se a Lei nº 5.028, de

autoria do deputado estadual Plínio Pinheiro Neto.

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Ao longo dos anos, a cidade de Redenção experimentou sucessivos ciclos econômicos.

Iniciou-se com a mineração, principalmente com o descobrimento do garimpo de Cumaru,

nos idos de 1980. Juntos, vários migrantes de diversas áreas chegam à Redenção, na sonhada

riqueza do ouro.

Em seguida, a extração da madeira e a consequente devastação de inúmeras áreas,

tanto rural como urbana, altera significativamente a vegetação e paisagem local.

As riquezas individuais conseguidas – bamburrar, que significa enriquecer na

linguagem do garimpo – são contadas pelas ruas, na combinação de riqueza e miséria, vida e

morte, assassinatos e desaparecimentos, típico cenário das novas fronteiras econômicas,

principalmente na Amazônia.

A cidade cresce e, junto, seus inúmeros problemas11

. Em que pese programas sociais

governamentais, a população carente ainda se vê longe do acesso aos bens e riquezas

(MARICATO, 2013). O crescimento da cidade restou feito de forma desordenada, ainda que

incialmente planejada pela administração pública no governo de Arcelide Veronese, primeiro

prefeito da cidade (1984-1989)12

. As primeiras ações do executivo foram no sentido de

fundação de escolas, aberturas de estradas e criação dos órgãos públicos (LIMA, op. cit.,

p.20)13

.

Como consequência da extração de madeira, muitas áreas acabam abertas e propicias

para o cultivo da pecuária, principalmente pelas características regionais de umidade e

vegetação. A madeira cede lugar para o capim, com um crescimento vertiginoso do rebanho,

principalmente bovino, na região sul do Pará.

Segundo Fiorillo (FIORILLO, 2012) em capítulo destinado a pecuária no plano

jurídico ambiental em face do controle territorial, o Brasil em 2004 tinha mais bois do que

habitantes e ainda possui o maior rebanho comercial do mundo.

Afirma ainda o autor que a soja se expande atualmente no leste do estado do Mato

Grosso, ocupando áreas de pastagens abandonadas, empurrando a pecuária extensiva para

localidades com terras mais baratas, principalmente na região amazônica.

11

A cidade de Redenção não possui transporte público e o acesso aos serviços de saúde torna-se extremamente

difícil aos idosos, gestantes e enfermos, mas ainda assim foi palco de manifestações de junho de 2013, retratados 12

Com ele foram eleitos nove Vereadores, a saber: João Tomé de Souza, Roberto de Castro Amorim, Antônio

Vieira Lima, Pedro Alcântara de Souza, Pedro Carneiro de Souza, Natalício Alves Maciel (in memorian), Jonas

Martins dos Santos, Olímpio Luiz de Farias e Antônio Batista da Silva. (sitio oficial do Município.

http://www.redencao.pa.gov.br) 13

Nota Autor: Avenidas foram abertas e planejadas de modo a propiciar um anel viário na cidade, mas o projeto

não seguiu seu curso nas administrações posteriores.

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Figura 1 – Concentração de rebanho bovino na Amazônia

Fonte: IBGE/PPM, 2007

Hoje o estado do Pará se constitui no 4º maior produtor de carne e o maior exportador

de boi em pé do Brasil. O rebanho do Pará conta atualmente com 19.483.636 cabeças de

bovinos e bubalinos, distribuídos em 108.412 propriedades rurais.

Consta no sitio eletrônico do governo estadual (http://www.pa.gov.br, acessado em

20.10.2014) que existem 15 matadouros frigoríficos com SIF (Serviço de Inspeção Federal) e

12 matadouros frigoríficos SIE (Serviço de Inspeção Estadual).

Diante de tal dimensão, destacam-se os municípios da região sul e sudeste do estado,

composta por 44 municípios. Destaque para Tucumã, com 3.112.982 cabeças, equivalendo a

16,1% do rebanho da região. Em seguida, Redenção apresenta 2.592.431 cabeças de gado,

correspondendo a 13,4% do rebanho regional.

São números expressivos e que atraem a indústria derivada de seus subprodutos,

como, no caso, o couro.

Assim, nos idos de 1990, chega a Redenção o curtume Curte France, iniciando o

processo fabril do couro, localizado, na época, na região periurbana da cidade. A

denominação oficial inicial consta como CURTIFRANCE INDÚSTRIA E COMERCIO

LTDA. No decorrer dos anos, várias alterações foram verificadas, sendo a última trazida a

razão social como ARACURT AGRO INDUSTRIAL E COMÉRCIO DE COUROS LTDA.

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Sua localização fica na Rodovia PA 287, Km 8, Loteamento São Leopoldo, com início formal

das atividades em 08/07/1988, encerrando suas atividades em 31/12/2008 – situação cadastral

à época, conforme dados existentes no sitio eletrônico (www.empresasdobrasil.com.br).

As atividades do curtume se desenvolveram até o ano de 2006, época em que se

identificou uma série de irregularidades ambientais, acarretando o encerramento da linha de

produção após forte pressão popular.

Hoje, após toda celeuma criada pelo encerramento das atividades, as instalações do

curtume se tornou objeto de invasão de moradores, constituindo-se em área ocupada pelos

integrantes da Associação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Nova Conquista do

Acampamento Curt-França, com pessoa jurídica constituída e atuando em juízo na defesa de

seus interesses.

Na discussão jurídica, tramita uma ação de reintegração de posse proposta por J.B.S.

S/A, na terceira Vara Cível, sendo o feito originariamente distribuído à Vara Agrária da

Comarca de Redenção. Conforme se depreende dos autos, existem 155 (cento e cinquenta e

cinco) famílias residindo no local, servindo da área para o cultivo de hortaliças que são

revendidas na feira municipal.

A associação referida apresentou oposição ao pedido de reintegração de posse,

argumentando a não obediência à função social desempenhada pela propriedade, não se tendo

nenhuma decisão ainda de caráter definitivo.

6 A ATIVIDADE DE CURTUME E SEU IMPACTO NO MEIO AMBIENTE

No estudo de caso específico, o curtume Curte France produzia volume considerável

de couro, posto que o abate de animais superava 600 cabeças/dia, conforme relato de

funcionários. Como parâmetro, num curtume integrado, que processe 3.000 peles/dia, a

poluição equivale ao de uma população de cerca de 85.600 habitantes (PACHECO, 2005).

O processo de trabalho do couro inicia-se com a ribeira e se aplica a outras subpartes

que tem por objetivo limpar e eliminar substâncias e partes que não são aproveitadas,

preparando esta para reagir com os produtos químicos das etapas seguintes, o curtimento e o

acabamento. A fase seguinte é a do curtimento, onde as peles tratadas na ribeira passam a ter

consistência de material estável e sem o risco de apodrecer, onde este curtimento pode ser

classificado de acordo com o material a ser utilizado. São eles: (1) curtimento vegetal,

destinados principalmente para a produção de solas, que utiliza como material curtente os

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taninos que são substâncias adstringentes encontradas em certos vegetais que combinados

com sais de ferro resultam na coloração azul, pouco usado pelo alto valor. (2) Curtimento

sintético que utiliza curtentes como as resinas, quinona, formol e os taninos sintéticos, que

proporcionam um curtimento mais uniforme e um melhor tingimento posterior. É pouco

empregado, pois são caros, utilizados somente como auxiliares. (3) Curtimento mineral é

realizado à base de cromo (sulfato básico de cromo trivalente – Cr3+

) pelas vantagens do curto

tempo de processo e qualidade final do produto. (PACHECO, op. cit., p.76).

Por último, tem-se a fase de acabamento, servindo como um complemento da fase de

curtimento para assegurar maciez, flexibilidade, cor e impermeabilidade, dentre outros.

(PACHECO, op. cit., p.76).

Os curtumes poluem a água, o ar e o solo. A contaminação hídrica pode acontecer

tanto em águas superficiais como em águas subterrâneas, devido aos efluentes líquidos

gerados no processo de curtimento do couro. No ar, tem-se a emissão de odores que causam

incômodo às populações vizinhas dos curtumes e a emissão de poluentes atmosféricos

advindos do uso de caldeiras. No solo, o tratamento dos efluentes industriais gera resíduo

sólido, designado por lodo, contendo cromo e contamina o solo fazendo com estes fiquem

inutilizados por várias gerações. (CLAAS e MAIA, 1994)

Neste aspecto, Mota (MOTA, 2001) se posiciona destacando que a indústria do

curtume funciona como uma fonte poluidora de cromo e uma quantidade alta de desperdício

de sólido orgânico. Em países como o Brasil os curtumes raramente possuem tecnologias para

o tratamento de efluentes, havendo negligência no tratamento de seus rejeitos antes de

despejá-los nos rios, constituindo-se, no principal e na mais diversificada fonte de introdução

de metais pesados no ambiente aquático.

Em pesquisa de coleta de dados realizada em 16 de fevereiro de 2014, identificamos

três lagoas existentes de resíduos no local do curtume Curte France, com volume líquido

considerável retratado na fotografia do local.

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Figura 2 – Uma das lagoas com resíduo do curtume.

Fonte: Elaborada pelo autor (16 de fevereiro de 2014)

Posteriormente, em 09 de Setembro de 2014, após boatos de que todo conteúdo de um

dos lagos fora lançado no rio Pau d’Arco, que passa a poucos metros do local, procedemos a

coleta de materiais residuais em solo, remetendo-se o material para análise no laboratório

Bioagri de Piracicaba-SP (com todas amostras analisadas em anexo). Constatamos que o lago

inicial já se encontrava praticamente esgotado14

, conforme fotografia abaixo:

14

O lago com os resíduos de curtume teve seu conteúdo despejado, segundo informações de residentes

próximos, nas águas do Rio Pau d’arco, que margeia o curtume e contorna toda a cidade.

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30

Figura 3 - Mesma lagoa, com coleta de material para análise de solo

Fonte: Elaborada pelo autor ( 09 de Novembro de 2014)

Importante salientar que a análise foi feita em solo. Recolheu-se amostra superficial,

bem como de material mais profundo, com quatro pontos de análises colhidas. Em seguida,

após a devida acomodação do material (acompanhado por químico integrante deste Programa

de Pesquisa), foram enviadas as amostras, onde se constatou a presença de Cromo e

Antimônio em quantidades fora dos limites permitidos, conforme tabela a seguir especificada:

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Tabela 1 – Resultado das Análises de Solo

PARÃMETROS UNIDADE LQ RESULTADOS

ANALÍTICOS

VI

AGRÍCOLA*

VI

RESIDENCIAL*

VI

INDUSTRIAL*

Alumínio mg/kg 1 9240 ... ... ...

Antimônio mg/kg 1 55,1 5 10 25

Arsênio mg/kg 1 <1 35 55 150

Bário mg/kg 1 71,7 300 500 750

Boro mg/kg 1 42,7 ... ... ...

Cádmio mg/kg 0,1 <0,1 3 8 20

Chumbo mg/kg 1- <1 180 300 900

Cobalto mg/kg 1- <1 35 65 90

Cobre mg/kg 1- <1 200 400 600

Cromo mg/kg 1 2770 150 300 400

Ferro mg/kg 1- 1670 ... ... ...

Manganês mg/kg 1 22,6 ... ... ...

Marcúrio mg/kg 0,05 <0,05 12 36 70

Molibdênio mg/kg 1 <1 50 100 120

Níquel mg/kg 1 2,46 70 100 130

Prata mg/kg 1 2,22 25 50 100

Selênio mg/kg 1 <1 ... ... ...

Vanádio mg/kg 1 <1 ... ... ...

Zinco mg/kg 1 6,66 450 1000 2000

Umidade % p.p 0,05 70,5 ... ... ...

VI Agrícola* Valores de Investigação para área Agrícola – Conama 420.

VI Residencial* Valores de Investigação para área Residencial – Conama 420.

VI Industrial* Valores de Investigação para área Industrial – Conama 420.

Notas

LQ – Limite de Quantificação

Abrangência

O (s) resultado (s) referem-se somente à (s) amostra (s) analisada (s).

Esse resumo de resultados só pode ser reproduzido por inteiro e sem nenhuma alteração

Dados de Origem

Resumo dos resultados da amostra nº 250726/2014-0 preparado com os dados dos relatórios de

ensaio:250726/2014-0 – Piracicaba anexados a este documento

Declaração de Conformidade

Comparando-se os resultados obtidos para a amostra com os valores estabelecidos pelos Valores de Investigação

para Área Agrícola – Conama 420, podemos observar que: O (s) parâmetro (s) Antimônio, Cromo não

satisfazem os limites permitidos.

Comparando-se os resultados obtidos para a amostra com os valores estabelecidos pelos Valores de Investigação

para Área Residencial – Conama 420, podemos observar que: O (s) parâmetro (s) Antimônio, Cromo não

satisfazem os limites permitidos.

Comparando-se os resultados obtidos para a amostra com os valores estabelecidos pelos Valores de Investigação

para Área Industrial – Conama 420, podemos observar que: O (s) parâmetro (s) Antimônio, Cromo não

satisfazem os limites permitidos.

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Conforme se depreende da denominada declaração de conformidade dos

resultados obtidos, constatou-se a presença de Cromo e Antimônio fora dos padrões

permitidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, por meio da Resolução

nº 420, de 28 de dezembro de 2009, que dispõe sobre critérios e valores orientadores de

qualidade do solo quanto à presença de substâncias químicas e estabelece diretrizes para o

gerenciamento ambiental de áreas contaminadas por essas substâncias em decorrência de

atividades antrópicas.

De maneira específica, interessa ao estudo a existência de cromo, notadamente pelos

seus reflexos na saúde humana. Nesse aspecto, a existência de Antimônio não será objeto do

estudo em questão.

Assim, agregando todos esses aspectos, é fato que os efluentes de curtume agridem o

meio ambiente, provocando poluição e contaminação da água, morte de animais aquáticos,

biocumulação em alimentos produzidos a base dessa água e consequente biocumulação no

organismo humano, além de outros prejuízos. (RODRIGUES et al., 2010).

De acordo com Bayer (BAYER, 2005), a toxidade do cromo VI aos seres humanos

acarreta, além do câncer, danos ao estômago, ao fígado e aos rins, sensibilização e irritação da

pele. É ainda altamente tóxico aos animais, plantas e micro-organismos.

Em destaque, quadro dos danos que podem ser causados à saúde humana em razão dos

riscos ambientais, elaborada por Sérgio Colpacioppo, da Faculdade de Saúde Pública da

Universidade de São Paulo - USP.

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Quadro 1 - Riscos Ambientais e exemplos típicos

Riscos Ambientais Exemplos Exemplos de danos à saúde

Químicos Substâncias químicas na forma

de: sólidos, líquidos, gases,

vapores, poeiras, fumos, névoas,

fumaças

Dermatoses, doenças

pulmonares, câncer, distúrbios

do fígado, rins e outros órgãos,

anemia

Físicos Radiações ionizantes ou não,

ruído, vibrações, temperaturas

extremas, pressão atmosférica

anormal, iluminação

Câncer, anemia, surdez,

estresse, distúrbios circulatórios,

intermação, prostração térmica,

embolia gasosa, fadiga ocular,

acidentes

Biológicos Micro e macrorganismos

patogênicos

Doenças infecciosas

Outras situações Interação física e psíquica entre

tarefa-trabalhador

Fadiga física e psíquica,

estresse, doenças

osteomusculares, pré-disposição

a diversas doenças

Fonte: (PHILLIP Jr., 2005).

Constata-se a existência do Cromo nas dependências do curtume, expondo vidas

humanas a risco concreto de morte, potencialmente contraindo doenças sérias e descumprindo

o dever-obrigação de manter e zelar pelo meio sadio e equilibrado, afetando a dignidade da

pessoa humana.

Ademais, o próprio município ignora suas leis, não observando regramento do Plano

Diretor, como adiante abordaremos.

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7 O PLANO DIRETOR NO ORDENAMENTO BRASILEIRO

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 182, estabelece política de

desenvolvimento urbano, com comando direto ao Poder Público Municipal, com diretrizes

infraconstitucionais objetivando o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e

garantir o bem-estar de seus habitantes. Consta no § 1.° do referido artigo que o plano diretor,

elaborado e discutido com a comunidade, por via de audiências públicas, e após devida

aprovação pela Câmara Municipal, é obrigatório para cidades com mais de 20 mil habitantes,

sendo importante instrumento básico de política de desenvolvimento e de expansão urbana,

segundo Toshio Mukai (MUKAI, 2011).

Todavia, a exigência do Plano Diretor aos municípios com mais de 20.000 habitantes

não possui sanção, acarretando severas críticas na doutrina a respeito, posto afirmação de ser

regra inócua, segundo Toshio Mukai (MUKAI, op. cit., p.21).

Por sua vez, o § 2.° determina que, para a propriedade cumprir com sua função social,

deve atender às exigências contidas no Plano Diretor dos Municípios, sem qualquer ressalva.

Nesse aspecto, a Constituição Federal, em seu art. 29, consagra que os municípios terão sua

organização estabelecida em regras próprias, com o predomínio de interesse local, segundo

suas “Constituições Municipais” ou Leis Orgânicas, como são comumente conhecidas.

Dessa forma, conjugando os fatores, chega-se a conclusão de que o legislador não

poderia, até por invasão de competência, estabelecer as leis orgânicas dos municípios de

forma específica, até pela impossibilidade nata. Mas, ao revés, deixou aos municípios a tarefa

de sua autorregulamentação, com reflexos na ordem econômica e na propriedade,

estabelecendo critérios abertos (a serem definidos por cada município).

Ademais, a não observância quanto ao Plano Diretor acarretaria a

inconstitucionalidade de suas normas urbanísticas, afetando de sobremaneira a vida do

município. Impende ainda destacar que o Plano Diretor fica adstrito ao meio urbano, com

limite máximo até a zona de expansão das cidades. Jamais poderá afetar a zona rural, ainda

que a realidade, por vezes, se mostre um pouco diferente, com áreas de “franja” ou de

transição, caracterizando por ser imprecisa sua caracterização, notadamente nos grandes

centros urbanos modernos.

No que se refere ao mérito ou conteúdo do plano, os municípios poderão dispor de

normas que atendam aos aspectos físico, social, administrativo, ambiental e econômico,

conforme estudos técnicos e respeitando as particularidades preferências da comunidade local,

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consoante inc. X do art. 29 da Carta Magna de 1988.

Quanto ao aspecto econômico, a atual Constituição possibilita ao município intervir na

atividade econômica, condição não contemplada pela Emenda Constitucional de 1969

(MUKAI, op. cit., p.21). O atual art. 179 da CF/88 assim possibilita, afirmando que o Estado,

com emprego lato sensu do termo, poderá exercer fiscalização, incentivo e planejamento,

sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. Por certo, o

município não poderá contrariar normas federais e estaduais sobre a matéria, em razão de se

tratar de competência concorrente.

Decorre assim, dada a obrigatoriedade da existência do Plano Diretor com tais

requisitos, da necessidade das Leis Orgânicas estabelecerem diretrizes para a elaboração do

plano, da participação da sociedade, bem como prazo para sua aprovação.

Nascem, assim, duas situações interessantes: o Plano Diretor deve ser elaborado em

prazo razoável, de forma a não prejudicar a questão urbanística do município, devendo sua

elaboração contemplar as normas gerais contidas em todo ordenamento e ainda obedecer e

contemplar a participação da população em tal elaboração.

Dentro de tal contexto – da normatização – o legislador aprova o denominado Estatuto

das Cidades, lei 10.257, de 10 de julho de 2001, regulamentando o capítulo de Política

Urbana contida na CF/1988, nos artigos 182 e 183. A missão maior da referida lei é definir

qual o significado de cumprir a função social da cidade e da propriedade urbana,

delegando essa tarefa para os municípios, oferecendo para as cidades um conjunto

inovador de instrumentos de intervenção sobre seus territórios, além de uma nova

concepção de planejamento e gestão urbanos (ROLNIK, 2002)

E na mesma linha de obrigatoriedade quanto ao Plano Diretor, reafirmando sua

exigência para cidades com mais de 20.000 habitantes, também o Estatuto das Cidades assim

determinou, estabelecendo o Plano Diretor como o instrumento básico da política de

desenvolvimento e expansão urbana, conforme artigos 39 e 40 da Lei 10.257/2001.

Tradicionalmente, os Planos Diretores normatizavam situações existentes e

consolidadas, como, por exemplo, os centros das cidades, onde se constatava grande

concentração humana (com altos índices de ocupação), permitindo uma verticalização.

Sempre na esteira de uma situação consolidada, tal prática ficou conhecida como Leis

de Zoneamento, significando apenas a formalização do espaço urbano, sem a devida

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36

discussão e planejamento quanto ao crescimento e aproveitamento das cidades15

.

A crítica a tal situação que se faz é que deixa ao mercado a função de determinar as

formas de edificação urbana, com a rentabilidade e lucros sendo fatores determinantes em tal

processo.

Em linhas gerais, o Estatuto das Cidades, na estreita relação com o Plano Diretor16

,

inova em formas de ocupação do solo, fomenta uma gestão com participação direta do

cidadão e a possibilita a regularização de posses urbanas, ocupadas de forma muitas vezes

ilegal. Para tanto, deve-se atentar para a importância de Estudos de Impacto Ambiental (EIA),

bem como de Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV). Este último, eficaz instrumento de

gestão que depende da regulamentação municipal e que permitem a avaliação dos impactos

causados por empreendimentos e atividades urbanas.

E, nessa interação de ação e regra, faculta ao Poder Público uma ação de indução

(ROLNIK, op. cit.), determinando o desejável para cada parcela da cidade, adotando medidas

para sua efetividade, intervindo diretamente nesse sentido.

No caso específico, a cidade de Redenção, por meio da Lei Complementar nº 001, de

07 de novembro de 2005, criou seu Plano Diretor, devendo obedecer a todos os critérios aqui

elencados, desde a exposição constitucional, chegando até o Plano Diretor, sempre como

norte a preservação do meio ambiente, de forma equilibrada e sadia, com respeito ainda a

correta ocupação urbana e a função social da propriedade, nos limites anteriormente traçados.

A atuação do Poder Público, nesse sentido, deve sempre pautar-se pela legitimidade e

respeito às normas, de forma a justificar o bem estar coletivo, missão máxima da gestão da

coisa pública. No caso de Redenção, além do Plano Diretor, houve concomitantemente a

edição do Código Ambiental do município, instituído pela Lei nº 003, também de 07 de

novembro de 2005.

O primeiro ponto que chama atenção em todo processo foi a participação popular por

meio das audiências públicas. Estas, iniciadas em agosto de 2005, trataram de diversos

15

incumbe ao Poder Público exigir a realização de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de obra

ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental e a Resolução Conama 237/97,

explicitando a regra constitucional, prevê quais atividades e empreendimentos urbanos que devem exigir Estudo

de Impacto Ambiental (EIA) como requisito a sua implantação (PRESTES, 2006). 16

Há uma mudança de paradigma caracterizada pela análise da cidade e dos empreendimentos pontualmente

considerados, a partir do direito urbano-ambiental. Este novo direito separa o direito de propriedade do direito

de construir, não reconhece a propriedade se esta não cumprir com a função social, tem no Plano Diretor o

instrumento principal da política urbana e o definidor da função social da propriedade na cidade, bem como

reforça a gestão e os instrumentos para atuação municipal, conforme Vanêsca Buzelato Prestes (PRESTES, op.

cit. 241).

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pontos, sempre com os mesmos participantes. A forma rápida, simultânea e ainda de

questionável participação popular induz ao pensamento de que mais se assegurou a realização

pro forma, sem o devido debate junto à população interessada.

8 O PLANO DIRETOR DE REDENÇÃO

Contando com 173 artigos, o Plano Diretor da cidade de Redenção, criado pela Lei

001, de 07 de novembro de 2005, consagra, já em seu artigo 1º, que o

Plano Diretor integra o processo de planejamento permanente do Município de

Redenção, é o instrumento básico, abrangente e estratégico da política de

desenvolvimento sustentável do Município, compondo um conjunto de objetivos e

diretrizes capazes de orientar a ação governamental e privada na gestão da cidade,

de acordo com a Lei 10.257/01 – Estatuto da Cidade.

De se atentar para o caráter de planejamento suscitado anteriormente, com visão de

sustentabilidade e orientador das políticas públicas e iniciativas privadas, impondo ações

nesse sentido, com base no Estatuto das Cidades. Tais premissas se revelam importantes, com

a gestão municipal pautada por tais interesses.

Adiante, esculpida no art. 2º, VI, constata-se a primeira preocupação com o meio

ambiente, estabelecendo a promoção de políticas públicas, compatibilizando o

desenvolvimento urbano e rural com a proteção do meio ambiente, através de sua utilização

racional, voltada à conservação e recuperação do patrimônio natural, em benefício das atuais e

futuras gerações.

Dessa forma, consagra-se, do ponto de vista programático e legal, a proteção do meio

ambiente, com utilização racional e de caráter preservacionista, como ainda constatado no

mesmo artigo 2º, IX.

Segundo o legislador, a participação popular fica assegurada, dentro da gestão

democrática do município17

. Sem ainda se esquecer do desenvolvimento, o regramento

estabelece ainda a necessidade de se consolidar a área industrial específica definida no

macrozoneamento, com prioridade às indústrias não poluentes, conforme art. 4º, I, b do Plano

Diretor. Especificamente quanto à questão industrial, o Plano Diretor é muito claro, dispondo

no art. 12 que não poderão ser instaladas no Município indústrias poluentes ou perigosas, ou

ainda que estejam em desacordo com as normas municipais vigentes.

Adiante, entrando no tema de saúde pública, o Plano Diretor aduz que caberá ao

17

As audiências públicas foram realizadas com a participação de parte da sociedade civil, em reuniões

agendadas e fortemente cercadas de correligionários do gestor municipal da época.

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município garantir a saúde de todos os munícipes, segundo art. 21 da referida lei. Cabe ainda

ao Município reorientar, implementar e garantir ações básicas dos sistemas de Vigilância

Epidemiológica, Sanitária, Nutricional e Ambiental, conforme disposto no art. 23, I, e do

Plano Diretor.

Na habitação, o Município se compromete, no prazo máximo de 06 meses, prorrogável

uma única vez igual período, em criar um Conselho Municipal de Habitação, com

participação popular e que assegure as diretrizes constantes no próprio Plano Diretor e no

Estatuto das Cidades, conforme art. 49 da lei. Infere-se, dessa forma, que a habitação deve ter

respeitado todos os ditames até aqui traçados, notadamente no que se refere a proteção do

meio ambiente, saúde humana e vedação de atividades nocivas e poluidoras.

Por fim, o Plano Diretor de Redenção destina um capítulo inteiro (capítulo VII) para o

meio ambiente, abordado nos artigos 71 a 107, tratando das Disposições Preliminares, Das

Áreas Verdes e de Preservação, Das Extrações Minerais, Dos Mananciais, do Saneamento

Básico, Dos Resíduos Sólidos e da Extensão Rural. Nesse tópico, de interesse para o trabalho,

a diretriz básica estabelecida pelo Plano Diretor é estabelecer critérios para a instalação e o

controle das atividades que envolvam risco de segurança, radioatividade ou que sejam

emissoras de poluentes, de vibrações ou de radiações, implementando um sistema eficaz e

atualizado de fiscalização18

, nos ditames do art. 71, X da referida lei. Dessa forma,

estabelecem-se novos paradigmas para elaboração de políticas públicas, tendo o Plano Diretor

como grande aliado a proteção do meio ambiente. E, dentro deste, um importante mecanismo

para a proteção do ambiente sadio e equilibrado: o licenciamento ambiental.

9 LICENCIAMENTO AMBIENTAL

Segundo definição do dicionário jurídico (HORCAICO, 2008), estabelece licença

como sendo

ato administrativo pelo qual o órgão competente estabelece as condições, restrições

e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor,

pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos

ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou

potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar

degradação ambiental.

18

Em pesquisa junto a SEMA, constatou-se a existência de dois funcionários encarregados de fiscalização de

todas as atividades da secretaria de Meio Ambiente

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Inicialmente, necessária a discussão acerca da natureza jurídica da licença ambiental,

encarando-a como licença propriamente dita ou autorização, conforme distinção doutrinária.

Tal distinção afeta o regime jurídico e as implicações legais decorrentes de sua conceituação,

conforme posição defendida por Martins (MARTINS, 2005), notadamente como criterioso

instituto para prevenção, implantação e regular defesa dos direitos ambientais. Para o presente

estudo, a licença ambiental conferida (ou não) ao empreendimento revela a conduta da

iniciativa privada e dos entes públicos, abordagem que faremos por ocasião da análise da

responsabilidade ambiental.

Por ora, cumpre citar que a doutrina em absoluto reluta em admitir a complexidade do

instituto e suas particularidades, sendo refutada pelos administrativistas as características do

direito ambiental. No sentido inverso, os ambientalistas relutam em aceitar os contornos

próprios em certos pontos do direito administrativo. Parece-nos mais crível a posição de

Ricardo Marcondes Martins (MARTINS, op. cit., p.186) que se posiciona no sentido de

promover um estudo interdisciplinar.

Segundo a regra esculpida no art. 225, inc. IV, § 1º da Constituição Brasileira de 1988,

ainda que tenhamos abordados os pontos de preservação ambiental em esfera constitucional e

sua vedação ao retrocesso, é fato que o legislador constituinte não proibiu, em absoluto,

atividades que viessem a causar degradação ambiental, como no caso dos curtumes. Porém,

dentro do sistema criado, impôs a adoção de estudos que pudessem mensurar os impactos

causados, permitindo-se ou não o empreendimento.

Em decorrência da necessidade de tal estudo, restou implicitamente (MARTINS, op.

cit., p.186), a necessidade de instauração de processo administrativo, com o ato final sendo

denominado de licença ambiental.

Reside aqui a discussão, em se estabelecer se tal licença se constitui como licença ou

autorização. Para alguns administrativistas, licença ambiental é ato administrativo unilateral e

vinculado (DI PIETRO, 2005). Por meio de tal ato, a administração faculta àquele que

preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade. Na autorização, tem-se como ato

discricionário, enquanto na licença envolve direitos, caracterizando-se como ato vinculado

(JUNIOR e CRETELLA apud DI PIETRO, 2005). Acrescente-se que a autorização é ato

constitutivo, enquanto a licença é ato declaratório.

Por ainda pertinente, a licença é de caráter perene, irrevogável, passível de

desapropriação, em caso de interesse público. No que concerne a autorização, esta é precária,

revogável a qualquer tempo e independente de indenização. Filiam-se ao pensamento de

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40

licença os ambientalistas Edis Milaré (MILARÉ, 2004) e José Afonso da Silva (SILVA,

2003). Adotando a corrente de autorização, o doutrinador Paulo Affonso Leme Machado

(MACHADO, 2003).

Sustentando a discussão acerca do tema, remete-se o pensamento de Paulo Affonso

Leme Machado ao sentido atribuído ao parágrafo único, do artigo 170 da Constituição Pátria.

Sustenta o professor que, a despeito do emprego de palavra, deve prevalecer o significado

atribuído a ela. Nesse sentido, o significado de autorização deve ser entendido dentro de uma

exegese de todo ordenamento, com o emprego da hermenêutica para sua compreensão. Ao se

referir ao artigo 170, parágrafo único da CF/1988 e o emprego de autorização pelo Poder

Público para as atividades econômicas, não pretendeu o legislador, segundo Martins

(MARTINS, op. cit., p.186), atribuir tal característica e natureza. Em confronto com a redação

atribuída ao artigo 225, IV, § 1º, também da CF/1988, teremos sentidos diferentes para o

emprego de autorização. Tudo passa pela necessidade de estudo de impacto, principalmente

para a caracterização de atividade econômica toleravelmente poluidora. No campo

infraconstitucional, a interpretação segue os mesmos rumos, com a prevalência do sentido da

hermenêutica empregada.

Posicionamentos à parte, adotamos, para o presente estudo, a posição de licença

propriamente empregada, sem embargos de pensamentos divergentes.

E, em se tratando de licença, basta o atendimento aos requisitos legais para a outorga

administrativa, sem possibilidade de sua recusa. Tal característica repercute no ato de

concessão e das esferas competentes entre os entes públicos.

Alguns outros defendem ainda que a natureza jurídica da licença não se amolda nem

como autorização simples ou licença simples. Pela complexidade do tema, deve ser entendido

como uma licença de natureza jurídica própria, com características específicas (FARIAS apud

FERNANDES, 2010) e que não se amoldam aos padrões clássicos, constituindo-se com

natureza jurídica própria.

9.1 As competências do art. 23 da cf/1988 e as licenças da resolução 237/1997 -

CONAMA

Em 1997, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) editou a Resolução

Normativa nº 237, estabelecendo critérios para concessão das licenças ambientais de

diferentes setores da vida econômica nacional.

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Em resposta, setores da sociedade questionaram a constitucionalidade de tal

regramento, posto que se discutisse a competência entre os entes públicos para a concessão do

licenciamento ambiental, remetendo-se ao artigo 23 da Constituição Federal de 1988, que

trata da repartição de competência entre os entes públicos, quais sejam União, Estados e

Municípios.

Todavia, não se pode olvidar da complexidade e da imprecisão de tais atribuições,

notadamente destacando aspectos territoriais e de características de empreendimentos

econômicos.

No que se refere ao licenciamento ambiental, entende-se em nível infraconstitucional

que a Lei 6.938/81 cria o licenciamento ambiental em seu artigo 10 no âmbito federal.

Discussões à parte deve-se ter em mente que a edição da referida norma remonta ao período

anterior à Constituição de 1988, de forma que a interpretação deve ser mais ampla, de acordo

com a redação trazida pelo art. 23 da Carta Magna.

Por ainda pertinente, o Decreto 99.274/1990 regulamentou o tema, remetendo ao

CONAMA a deliberação sobre o assunto de licenciamento. Em tal cenário, surge a Resolução

CONAMA 237, de 1997. Com as discussões travadas, a solução veio com a edição da Lei

Complementar 140, de 08 de dezembro de 2011, que estabeleceu normas para a cooperação

entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas

decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais

notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à

preservação das florestas, da fauna e da flora.

Segundo ensinamento de Paulo Affonso Leme Machado (MACHADO, 2010), a Lei

Complementar 140/2011 veio trazer uma nova visão acerca do federalismo reinante na

divisão de competências entre os entes públicos. Antes da edição da lei 140/2011 havia um

verdadeiro federalismo competitivo na visão de Sidney Guerra (GUERRA, 2012), com União,

Estados e Municípios – e o Distrito Federal – disputando a primazia e exclusividade em

matéria de competência legislativa e administrativa para as questões ambientais. Com a

adoção de medidas objetivas na referida lei, passou-se a vislumbrar um horizonte com vistas a

um federalismo cooperativo, estabelecendo-se parcerias e convênios para a adoção de

políticas públicas corretas, notadamente com enfoque para a primazia do interesse local aos

municípios, interessados diretos na eficaz aplicação do instituto do licenciamento ambiental.

Mukai (MUKAI, 2010) assevera que o legislador desejou, a despeito de prevalência de algum,

mas que se efetivasse o federalismo cooperativo, vez que a redação do artigo 23 da CF/1988

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fala em cooperação entre a União e Estados, o Distrito Federal e Municípios. Nesse sentido,

afirma que o constituinte teve a intenção de impor atribuições de ordem administrativas, não

de cunho legislativo. Assim, as atividades desenvolvidas pelos entes públicos devem ser no

sentido de se criar convênios para a correta atuação das licenças ambientais, compartilhando-

se os interesses mútuos e correlacionados.

A Lei Complementar 140/2011 modificou ainda a Resolução nº 237/1997, do

Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama, conceituando o licenciamento ambiental

como o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos

utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob

qualquer forma, de causar degradação ambiental (GUERRA, 2012).

No que concerne então ao licenciamento ambiental, o município possui poderes para,

de acordo com seus interesses locais, identificados por meio de audiências públicas, conceder

o licenciamento e fiscalizar as atividades de natureza econômica dentro de seu território que

possam causar degradação ambiental, exercendo poder de polícia para a autuação e até

cessação das atividades nocivas ao meio ambiente.

Para a concessão do licenciamento ambiental, três etapas deverão ser observadas, de

acordo com o art. 10 da Resolução Conama 237/1997, e segundo os ditames do município

interessado. A tabela estabelece os critérios a serem observados:

Quadro 2 – Critérios de concessão de licenças – Resolução 237/97 CONAMA

LICENÇA CRITÉRIOS PARA CONCESSÃO FUNDAMENTO

LEGAL

Prévia Concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou

atividade aprovando sua localização e concepção, atestando sua

viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e

condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de implementação.

Art. 8º, I, da Res.

237/97 do CONAMA

Instalação Autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as

especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados,

incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da

qual constituem motivo determinante.

Art. 8º, II, da Res.

237/97 do CONAMA

Operação Autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação

do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as

medidas de controle ambiental e condicionantes determinadas para a

operação.

Art. 8º, III, da Res.

237/97 do CONAMA

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43

As etapas definidas são de extrema relevância, principalmente pelo seu caráter

preventivo e protetivo.

Inicialmente, deve-se proceder a definição quanto a identificação de qual será o órgão

(ente público) competente para iniciar o licenciamento ambiental. No caso de pedido de

licenciamento ambiental de curtume no Estado do Pará, a licença decorre de atividade do

Estado-membro, sendo requisito a entrega de declaração do município onde se vai instalar ou

funcionar, atestando o cumprimento de todas posturas e legislação municipal. Isso decorre do

próprio artigo 13 da LC 140/2011, que estabelece

que os empreendimentos e atividades são licenciados ou autorizados,

ambientalmente, por um único ente federativo, em conformidade com as atribuições

estabelecidas nos termos desta Lei Complementar

Deve-se ainda atentar para o fato de que os demais entes podem se manifestar, de

maneira não vinculante, respeitando-se prazos e procedimentos, sem caracterizar novo ou

duplo licenciamento (GUERRA, op. cit., p.153).

Como requisito ainda importante, deve-se apresentar requerimento do empreendedor,

acompanhado dos respectivos documentos, projetos e estudos pertinentes, com a ampla

publicidade assegurada. No caso ainda específico dos curtumes no Pará, deve-se proceder a

realização do PEA – Projeto de Engenharia Ambiental, conforme orientação constante na

Secretaria Estadual (modelo em anexo ao trabalho).

Não obstante tais requisitos, deve-se ainda proceder a análise dos estudos e demais

itens pelo órgão ambiental competente, integrante do SISNAMA – Sistema Nacional do Meio

Ambiente, ligado ao executivo federal. Também são previstas vistorias técnicas e

esclarecimentos necessários, com análise criteriosa de todo estudo realizado.

Após toda análise, cabe ainda eventuais esclarecimentos solicitados pela autoridade

concedente, com juntada de demais documentos pertinentes. Cumpre esclarecer que os

pedidos de esclarecimentos complementares serão solicitados uma única vez, salvo fato novo,

conforme disposição dos §§ 1º e 2º do art. 14, da Lei Complementar 140/2011.

Pode-se ainda proceder a realização de audiências públicas quando couber e o

interesse do tema assim exigir, sempre com ampla participação da sociedade interessada, com

solicitação de esclarecimentos e complementação de diligências, quando não satisfatórios os

pontos esclarecidos. Infelizmente, não nos parece ser a realidade da maioria dos municípios,

que apenas cumprem formalmente os requisitos mínimos, não havendo interesse político sério

para sua implantação. Por seu turno, as audiências públicas se revelam mais um verdadeiro

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palanque eleitoreiro do que propriamente um local de debate para a escolha de interesses

específicos em matéria ambiental pelos municípios.

Por fim, emissão de parecer técnico conclusivo, com a possibilidade de parecer

jurídico e as razões de deferimento ou indeferimento da licença, sempre com ampla

publicidade.

Pelos aspectos até aqui abordados, nota-se que tanto o Estado-membro como o

Município interessado possui forte instrumento de controle ambiental, exercido pela via do

licenciamento, devendo, contudo, ser montada estrutura com recursos humanos, materiais e

capacitação par fins de fiscalização das atividades licenciadas.

Notadamente na indústria de curtume, com alto impacto ao meio ambiente devido suas

atividades potencialmente poluidoras, o descuido de tais etapas e vistorias se torna

extremamente nocivo ao local do empreendimento, comprometendo, em caso de desrespeito,

toda a coletividade e o meio ambiente.

O Município atua como interessado, mormente pelo princípio da primazia do interesse

local, onde a população deve participar para a elaboração de normas capazes de fazer cumprir

as diretrizes protetivas ambientais.

E, em decorrência do próprio interesse local, ao município cabe fiscalizar o exercício

das atividades desenvolvidas, com atuação em conjunto dos demais entes, mormente em se

tratando de atividade como o curtume. O Estado-membro deve fiscalizar regularmente as

atividades desenvolvidas pelo curtume, com seus dejetos, detritos de natureza sólida, líquida e

gasosa, em todas etapas do processo fabril. Ao município cabe também e de forma

concorrente estabelecer mecanismos de atuação por meio de secretaria própria, sempre

exigindo o cumprimento de suas disposições.

No caso específico do curtume Curte France, realizamos pesquisa junto a SEMA –

Secretaria de Meio Ambiente, nenhum arquivo existe a respeito do caso, sendo de inteiro

desconhecimento dos agentes daquele órgão qualquer infração ou punição aplicada a eventual

infração ambiental, muito menos existindo qualquer requerimento com pedido de licença.

Também não se constatou estudo de qualquer natureza acerca dos impactos ambientais e

correlatos.

Por sua vez, a Secretaria Estadual apenas limitou-se a dizer que o curtume foi

inspecionado nos idos do ano 2007, sem fornecer maiores detalhes a respeito de eventual

licença ou punição por poluir o meio ambiente.

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Na esfera federal, apenas uma multa de pouco mais de R$ 40.000,00 (quarenta mil

reais), que ainda pendia de discussão na esfera judicial.

Em pesquisa ao sítio eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, nada se

constatou em andamento acerca de eventual ação civil pública contra o curtume Curte France.

No âmbito federal, identificou-se uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público

Federal, com o escopo de discutir o desmatamento de áreas da Amazônia, em regiões de

pecuária, sem abordar a produção de couro, sempre atrelada esta à aquela.

Em conclusão, todos os entes públicos possuem o dever de respeitar os ditames e

estudos inerentes ao licenciamento ambiental, com as implicações de políticas públicas

adequadas para a preservação dos direitos fundamentais ambientais dos seres humanos.

10 O CÓDIGO DE MEIO AMBIENTE DE REDENÇÃO

Criado pela Lei nº 003, e 07 de Novembro de 2005, o Código Ambiental de Redenção

nasce em conjunto com o Plano Diretor, atendendo a necessiade da fregulamentação

ambiental da cidade19

. Em consonância com os diplomas legais, assenta em seus princípios a

mantença do meio ambiente equlibrado, visando assegurar a qualidade ambiental propicía à

vida, respeitadas as peculiareidades locais e em harmonia com o desenvolvimento social e

econômico, conforme disposição principiológica contida no art. 2º da lei. Para o estudo

presente, procuramos destacar os pontos principais e correlacionados com o tema, implicando

possíveis condutas e infrações identificadas com a pesquisa realizada, bem como as

evidências encontradas.

Ainda no campo dos princípios assegurados no Código, há o controle da produção e da

comercialização de substâncias e artefatos perigosos, do emprego de técnicas e métodos que

comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente (art. 2º, VI do Código

Ambiental de Redenção).

Como se denota, o legislador municipal procurou atender aos ditames impostos pelas

demais legislações em esfera estadual e federal, assegurando a regra de proteção ao meio

ambiente e sendo este equilibrado e sadio.

19

Uma das questões relevantes é a descentralização de poder, com a conceituação de Celso Antonio Bandeira de

Mello, afirmando ser a descentralização política o regime no qual, dentro de um único sistema jurídico global, as

capacidades políticas são distribuídas entre diferentes pessoas jurídicas. Decorre também da própria competência

legislativa prevista na CF/1988. (apud BUENO FILHO, 2011).

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Tanto assim, que impôs à própria administração o respeito aos princípios aqui

elencados, estabelecendo que deve propiciar a articulação e integração de atividades da

administração pública, visando a adoção estratégica de preocupações ambientais em todos os

níveis de decisões (art.2º, VII da referida lei). Evidencia-se aqui a preocupção de que todas as

decisões devem pautar-se pelo respeito abordado, com adoção de medidas e ações visando tal

fim.

E tanto assim o faz que, no art. 3º da lei, em se tratando de objetivos a alcançar, o

Código Ambiental de Redenção assenta que a política municipal do meio ambiente terá por

objetivo compatibilizar o desenvolvimento econômico-social com a preservção do meio

mabiente natural. Deve ainda definir áreas prioritárias para ação do governo municipal,

visando a manutenção da qualidade ambiental, propícia à vida.

No mesmo diapasão, deve ainda estabelecer critérios e padrões de qualidade ambiental

e normas relativas ao uso e manejo dos recursos naturais (inciso III, art. 3º), exigindo a prévia

autorização municipal para a instalação de atividades com potencial de impacto ambiental,

com estudo técnico correspondente (inciso VI, art. 3º da referida lei)20

.

Não obstante, ainda prevê a necessidade de sanção em face do descumprimento de

seus princípios, determinando que se estabeleça meios para punição ao poder público ou a

própria iniciativa privada em razão de atos de agressão ao meio ambiente e recursos naturais,

inclusive com o exercício do poder de polícia.

Para a consecussão de tais objetivos, determina a lei que seja criado o Sistema

Municipal do Meio Ambiente – SIMMA – para a administração da qualidade ambiental em

respeito a qualidade de vida dentro de suas atribuições e comeptências. E dentre as ações

propostas e previstas, a municipalidade deve agir por via da ação civil pública de

responsabilidade. Na esfera adminsitrativa, deliberar acerca da concessão de licenciamento

ambiental para os empreendimentos.

Como se extrai dos pontos até abordados do Código Ambiental de Redenção, há

sincronia entre este edemais diplomas e princípios consagrados notadamente o Estatuto das

Cidades e as disposições constitucionais. Notas-se ainda a condição de cooperação entre os

demais entes públicos no dever de fiscalização, incluisve remetendo informações ao Estado e

União no que deiz respeito a eventuais infrações ambientais, nos termos do art. 4º, XII da lei.

20

Reflexo da predominância do interesse local, onde o peculiar interesse do município é que define o campo de

atuação da legislação municipal. Bueno Filho, reportando a Celso Bandeira de Mello, afirma que o peculiar

interesse deve ser entendido na acepção de predominante. E esta predominância não indica que o interesse seja

exclusivo. Ao contrário indica que a matéria interessa imediatamente ao Município mas pode repercutir

indiretamente nos interesses do Estado ou da União (BUENO FILHO, op. cit., p.917).

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Em especial destaque o licenciamento ambiental como instrumento de política pública

de proteção ao meio ambiente, com a necessiade de observância de todos seus requisitos,

notadamente os estudos de impactos, com previsão nos artigos 10, 23 e 24 do diploma legal

ambiental do município. Nesse sentido, o licenciamento deve preceder de Estudo de Impacto

Ambiental – EIA e Relatório de Impacto Ambiental – RIMA, consoante órgão estadual e

federal, com apreciação destes pelo executivo municipal e Conselho Municipal do Meio

Ambiente, expressamente previsto no art. 17 do Código Ambiental da cidade.

Antecipando parte dos resultados da pesquisa, imperioso apontar que a Secretaria

Municipal de Meio Ambiente de Redenção não dispõe de nenhum documento ou mesmo

estudo nesse sentido em relação as atividades desenvolvidas pelo Curtume Curte France, não

se podendo inferir se, à época de sua instalação, houve atendimento a tais análises exigidas21

.

E o dilpoma legal ambiental estabelece ainda que as atividades industriais, tratando

especificamente da atividade de curtume, exige previamente a apresentação de licença prévia,

bem como para eventuais loteamentos urbanos (em se tratando de área destinada a moradia).

Também cumpre discutir o fato de que, pela localização do curtume e os problemas

levantados com a pesquisa, o Plano Diretor não poderia destinar tal àrea para fins de

loteamento e moradia urbana22

.

Muito menos tal destinação poderia ocorrer em face da não observância ainda da

devida recuperação da área do curtume, conforme determina expressamente o art. 21, que

traz:

qualquer atividade referida no artigo 17 que se utilize, ou modificque, direta ou

indiretamente os recursos naturais, deverá executar Planos de Recuperação

Ambiental, levando-se em consideração todo o ciclo de vida do empreendimento,

inclusive após sua desativação.

E a atividade de curtume se amolda perfeitamente no rol previsto no art. 17 do Código,

devendo ser objeto de recuperação, o que não se constatou com a pesquisa in loco realizada.

Em tal aspecto, não implica responsabilidade apenas do município, até pela

concorrente competência para legislar e fiscalizar. O código municipal remete também aos

demais entes – Estado e União – o dever de fiscalização, inclusive com a necessária

21

Não se localizou nenhum documento referente ao curtume junto ao banco de dados da Secretaria Municipal de

Meio Ambiente - SEMA. A prática é quase que rotineira nos governos locais, onde dados acabam desaparecendo

ao final dos mandatos eletivos. Não há licença ambiental e tampouco EIA e EIV. 22

Aqui reside toda discussão do Plano Diretor e da necessidade de sua revisão. A área destinada aos loteamentos

urbanos coincide justamente com os pontos de contaminação das lagoas do curtume com alta concentração

residual de Cromo, além do lixão a céu aberto e do despejo de conteúdos de fossas sépticas de toda cidade.

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intervenção para fins de recuperação, o que também a pesquisa não identificou ação nesse

sentido.

Também o emprendedor possui a responsabilidade quanto aos atos poulidores e de

recuperação, consoante preconiza art. 25, estabelecendo que, prioritariamente, a

responsabilidade técnica será destes, com auditoria e fiscalização do poder público. Dessa

forma, infere-se que todos os envolvidos – Poder Público em todas esferas – e o próprio

emprendedor devem pautar suas condutas pela obediência aos preceitos apontados.

No caso de infração, as sanções devem ser aplicadas, como multas pecuniárias

revertidas ao Fundo Municipal do Meio Ambiente – FUNDEMA (art. 28 da Lei).

Como foram identificadas condutas que se amoldam aos vedados pela lei, como

despejo de dejetos em rio próximo ao curtume, bem como a existência de Cromo em solo na

área do curtume, como residual às atividades desenvolvidas pela industria, impõe-se a análise

de algums infrações previstas no Código.

Inicialmente o diploma protege os rios e cursos d’água, com preservação de forma

permanente, conforme art. 33, remetendo ainda a observância do Código Florestal (com

redação ainda ao Código revogado de 1989, lei nº 7.803).

Por certo que o presente estudo não tinha como problemática direta a identificação de

metais pesados lançados na água do ribeirão Pau d’arco, ainda que as evidências mostem o

inverso ( em razão do conteúdo de lagoa com cromo do curtume lançado nas águas do rio).

Mas, ao serem lançados os conteúdos do curtume, afeta a qualidade da água, utilizada como

potável para os habitantes, e, em tese, as infrações seriam também gravíssimas, com

desobediência clara aos preceitos do art. 58, em que aparece o cromo como elemento químico

proibido seu lançamento em águas da bacia hidrográfica, conforme disposição legal23

.

E ainda estabelece o Código que tais efluentes deveriam, à época, serem objeto de

coleta separada, de acordo com art. 25, II do diploma.

No mesmo sentido, o art. 61 estabelece que

Os resíduos líquidos, sólidos ou gasosos proveninetes de atividades agropecuárias,

industriais, comerciais ou de qualquer outra natureza, só poderão ser conduzidos ou

destinados de forma a não poluirem as águas superficiais e subterrãneas.

Ainda que não se tenha como pesquisa as àguas lançadas ao rio, por certo a existência

de cromo na superfície (com aprofundamento no subsolo) leva a contaminação de lençóis

23

Como já salientamos, as águas do Rio Pau D’arquinho (que recebeu os dejetos da lagoa do curtume) são

utilizadas amplamente pela população, seja para consumo direto, seja para lazer e recreação.

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freáticos, com potencial de contaminação a toda população, que se abastece justamente de

poços artesianos, utilizando tais águas subterrâneas.

Voltando a abordagem das sanções, estas são classificadas em leves, muito graves e

gravíssimas, com considerações acerca do emprendimento, circunstâncias agravantes e

atenuantes, conforme disposição contida no artigo 133 do Código de Meio Ambiente de

Redenção.

E, para classificarmos as infrações, o legislador estabeleceu um critério, considerando,

conforme art. 134 da lei:

a) Leve - o infrator é beneficiado por circunstâncias atenuantes;

b) Grave - onde se constata uma circunstância agravante;

c) Muito grave – constatadas duas circunstâncias agravantes;

d) Gravíssimas - verificada a existência de três ou mais circunstâncias

agravantes;

E o legislador estatuiu circunstâncias atenuantes, como sendo:

a) Grau de escolaridade do infrator;

b) Arrependimento eficaz, com espontânea reparação do dano;

c) Comunicação prévia às autoridades, de perigo iminente de degradação;

d) Colaboração com agentes de controle e fiscalização;

e) Ser primário e a falta ser de natureza leve;

Em seguida, procedeu a conceituação de agravantes:

a) Reincidência ou cometer a infração de forma continuada;

b) Para obter vantagem pecuniária;

c) Coagir outrem para a execução do material de infração;

d) Ter a infração consequências danosas à saúde pública e/ou ao meio

ambiente;

e) Se, tendo conhecimento de ato lesivo à saúde pública e ao meio ambiente, o

infrator deixar de tomar providências de sua alçada para evitá-los;

f) Ter o infrator agido com dolo direito ou eventual;

g) A infração atingir áreas de proteção legal;

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A conduta, de acordo com § 1º do art. 135 da lei, é tida como reincidente quando o

agente comete nova infração do mesmo tipo, ou quando der causa a danos graves à saúde

humana, ou a degradação ambiental significativa.

Visando coibir a prática nociva ao meio ambiente, o Código disciplina ainda que, em

caso de infração continuada, a penalidade de multa poderá ser aplicada diariamente24

até

cessar a infração. E as penalidades consistirão em advertência, multa, interdição, embargo e

demolição, e apreensão, conforme determina art. 137 do Código Ambiental.

Tipificando as condutas no art. 138, o legislador descreve como infrações ambientais:

I – construir, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território do

município de Redenção, estabelecimentos, obras, atividades ou serviços submetidos

ao regime desta Lei, sem licença do órgão ambiental municipal competente, ou

contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes.

II – Praticar atos de comércio e indústria ou assemelhados, compreendendo

substâncias, produtos e artigos de interesse para a saúde ambiental, sem a necessária

licença ou autorização dos órgãos competentes, ou contrariando as normas legais e

regulamentares pertinentes.

E o dever de noticiar o Poder Público, ainda estabelece o Código:

III – deixar, aquele que tiver o dever legal de fazê-lo, de notificar qualquer fato

relevante do ponto de vista ecológico e ambiental, de acordo com o disposto nesta

lei, no seu regulamento e normas técnicas.

Quanto à utilização de substâncias nocivas e a infração ambiental, também

encontramos regramento específico:

IV – utilizar, aplicar, comercializar, manipular ou armazenar pesticidas, raticidas,

fungicidas, agroquímicos e outros congêneres, pondo em vista a saúde ambiental,

individual ou coletiva, em virtude de uso inadequado ou de inobservância de

normas legais, regulamentares ou técnicas, aprovadas pelos órgãos competentes, ou

em desacordo com os receituários e registros pertinentes.

No caso de despejo de resíduos em águas que compõe a hidrografia do município,

temos a conduta também tipificada:

XII – emitir ou despejar efluentes ou resíduos sólidos, líquidos ou gasosos,

causadores de degradação ambiental, em desacordo com o estabelecido na

legislação e normas complementares.

Quanto à falta de licença:

XIII – exercer atividades potencialmente degradadoras do meio ambiente, sem

licença do órgão ambiental competente ou em desacordo com a mesma.

A poluição do solo:

24

Possui caráter de astreintes, do direito francês.

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XVII - Causar poluição do solo que torne uma área urbana ou rural imprópria para

ocupação.

E, por fim, de forma ainda que genérica, tipifica a infração ambiental:

XVIII – causar poluição de qualquer natureza que possa trazer danos à saúde ou

ameaçar o bem-estar do indivíduo ou da coletividade.

Adiante, no art. 142 do Código sob comento, o legislador estabeleceu as penalidades

de natureza pecuniária, tendo como a unidade Fiscal do Município como indexador para sua

aplicação.

Em mero exercício hipotético das eventuais infrações, por certo as atividades do

curtume estariam sujeitas as penalidades máximas, prevalecendo o índice de 1.501 a 10.000

vezes a Unidade Fiscal do município por infração constatada. Não obstante, em se

caracterizando a reincidência, as multas serão aplicadas de forma cumulativa, segundo a regra

do art. 143, caracterizando majoração quando o infrator cometer nova infração da mesma

natureza e gravidade.

E na hipótese de ser constatada a infração continuada, a imposição da multa será de

100 a 10.000 vezes a unidade fiscal, aplicada diariamente.

Acaso as condutas tivessem, no cenário razoável, a tipificação reincidente de 08 (oito)

tipos, teríamos, em tese, a multiplicação de 80.000 vezes a unidade fiscal, em se

desconsiderando a continuidade delitiva.

E de ainda pertinente, tais penalidades são cumulativas com interdições, embargo e

demolições, além da responsabilização penal dos agentes responsáveis.

Por fim, as sanções de natureza pecuniária devem ser cobradas pelo executivo, com

formação de um fundo previsto para o meio ambiente, inclusive inscritos como dívidas ativa e

cobradas judicialmente, conforme disposição expressa do art. 155 da lei ambiental municipal.

Conforme expusemos, os dejetos das lagoas acabam sendo lançadas nas águas de rios

que formam a bacia hidrográfica do município. Nesse sentido, impende a abordagem do tema,

como apresentamos a seguir.

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11 A BACIA HIDROGRÁFICA DA CIDADE DE REDENÇÃO

O mapa da hidrografia da cidade de Redenção apresenta os córregos Redenção, Acaba

Saco e Córrego do Gago. Dos citados, o Córrego do Gago possui seu leito muito próximo da

área do curtume, com grande vazão de água na época de cheias (período de inverno

amazônico) e baixo volume no período de estiagem ou inverno amazônico (meses de maio a

setembro). Na pesquisa, detectou-se que o volume do reservatório de um dos lagos com

Cromo foi despejado no Córrego do Gago e que despeja suas águas no Rio Pau d’Arquinho,

que por sua vez serve como área de lazer para banhistas de final de semana, como no caso do

balneário Bretas. Também importante destacar que o referido Córrego serve como fonte de

abastecimento de água para a produção de hortifrutigranjeiros de famílias que ocupam a área

do curtume e em torno do Córrego. Ilustrando as afirmações, a imagem a seguir:

Figura 4 - Mapa Hidrográfico de Redenção-PA

A imagem seguinte mostra a área do curtume, sua proximidade com o curtume e sua

grande proximidade com a cidade (além de coincidir com o curso do rio – vide imagem

anterior).

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Figura 5 – Localização do curtume

E por diversas irregularidades, o curtume foi fechado no ano de 2005, deixando um

legado de três piscinas de rejeitos provenientes do processo de curtimento do couro. Estes

resíduos são classificados como classe I (perigosos), devido à presença de cromo e constituem

um grave problema ambiental devido às restrições cada vez mais rigorosas para sua

destinação final (NUNES, 2012).

A opção mais utilizada pelas empresas do setor é dispor seus resíduos em aterros, o

que apresenta vários inconvenientes, como possíveis contaminações ao solo, água

superficiais, lençol freático (NUNES, 2012).

Após o fechamento da indústria, a área foi invadida por populares sem moradia,

passando a se constituir como o lar de muitas famílias que hoje cultivam agricultura de

subsistência no local, plantando mandioca, arroz, milho e hortaliças.

Na estação das cheias, com volume de chuvas altas, no intervalo dos meses de

novembro a abril, o volume represado transborda e acaba por atingir o córrego que é usado

como balneário por muitas pessoas durante os finais de semana.

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Figura 6 - Lazer da população "Balneário Bretas" - recebe os dejetos do curtume

Fonte: Elaborada pelo autor

Na imagem, observa-se a rotineira presença de frequentadores no “Balneário Bretas”,

onde se pratica pesca esportiva (peixe devolvido ao rio) ou pesca para consumo, com ingestão

da carne do peixe logo no estabelecimento ou levado para consumo doméstico. O local do

balneário é muito utilizado aos finais de semana e fica distante apenas 3 km da cidade de

Redenção-PA.

Em visita ao local, realizada em 10.02.2014, constatamos forte odor característico e

semelhante ao verificado junto à lagoa de resíduos do curtume.

Importante afirmar que a distância entre o curtume e o balneário em questão é de

apenas 3 km, com informação de que uma das lagoas de contenção foi “aberta” em abril de

2014, despejando todo conteúdo no Córrego do Gago e no rio Pau D’arquinho, local do lazer

referido.

Não obstante tais graves fatos, repise-se que o Plano Diretor do Município de

Redenção ainda coloca a área como destinada a loteamentos urbanos, com moradias admitidas

pelo Poder Público. A imagem ilustra:

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Figura 7 – Plano Diretor de Redenção-PA - área de potencial urbano para loteamentos

Existe, pela evidência dos fatos, uma grande omissão do Poder Público, que tem o

dever legal de fiscalização das atividades industriais. Não obstante, ainda tem

responsabilidade quanto promover ações que ao menos mitiguem o grave problema ambiental

da cidade. A responsabilidade é clara, extensiva aos entes públicos e ao empreendedor, como

se abordará em seguida.

12 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL DO PODER PÚBLICO E DO

EMPREENDEDOR

Em razão da delimitação do presente estudo, a responsabilidade sob aspecto penal será

desconsiderada, abordando-se a questão da responsabilidade civil e ambiental propriamente

dita25

.

25

O tema de pecuária e seus derivados tem merecido atenção em vários segmentos da sociedade, inclusive com

capítulo próprio do doutrinador Fiorillo (FIORILLO, ob, cit.), em que destina capítulo destinado a pecuária no

plano jurídico ambiental em face do controle territorial.

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Considerando a abrangência e relevância do tema, os tribunais se veem amontoados de

ações para indenizar vítimas, nas mais variadas espécies, demandando grande esforço na

resposta eficiente à sociedade. Dessa forma, ainda mais em se tratando de sua aplicabilidade

às questões ambientais, estabelecemos um estudo preliminar do assunto, especificando em

seguida.

Responsabilidade, no entender de Silvio Venosa (VENOSA, 2005), é

Utilizado em qualquer situação na qual uma pessoa, natural ou jurídica, deva arcar

com as consequências de um ato, fato, ou negócio jurídico. Sob essa noção, toda

atividade humana, portanto, pode acarretar o dever de indenizar.

Também conceituando responsabilidade, Carlos Roberto Gonçalves afirma ser

(GONÇALVES, 2003),

instituto integrante do direito obrigacional, pois a principal consequência da prática

de um ato ilícito é a obrigação que acarreta, para seu autor, de reparar o dano,

obrigação esta de natureza pessoal, que se resolve em perdas e danos.

E conceituando obrigação, o mesmo autor afirma ser o vínculo jurídico que confere ao

credor o direito de exigir do devedor o cumprimento de determinada prestação.

E, sabidamente, segundo o Código Civil, as obrigações são a vontade humana,

traduzidas nos contratos, nas declarações unilaterais de vontade e os atos ilícitos, e a vontade

do Estado, manifestada pela Lei.

E, dessa forma, as ações decorrentes dos atos ilícitos são constituídas por ações ou

omissões culposas ou dolosas do agente, perpetradas de forma a infringir um dever de conduta

e que resulta dano a outrem. Na estrutura do Código Civil pátrio, temos a Parte Geral, prevista

nos artigos 186, 187 e 188. Na Parte Especial, o art. 389 traz o regramento acerca da

responsabilidade contratual, tendo o legislador dedicado dois outros capítulos como

Obrigação de Indenizar e Indenização, sob o título de Responsabilidade Civil. Conceituando

o termo, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2006)

afirmam que a

responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular,

sujeitando, assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária à

vitima, caso não possa repor in natura o estado anterior das coisas.

Com a vênia devida, temos que a definição trazida pelo jurista merece ser interpretada

com ressalvas quando se refere a interesse eminentemente particular, posto que, em matéria

ambiental, o interesse se transmuda para a esfera do metainteresse, de natureza coletiva e

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difusa. A definição trazida apenas se limita ao campo estritamente negocial, não abarcando,

por certo, os bens tutelados em matéria ambiental.

Os elementos estudados na responsabilidade civil são a conduta, que pode ser

identificada como positiva ou negativa, o dano e o nexo de causalidade.

Historicamente, remontamos tal estudo ao direito romano, sendo a vingança privada a

tônica identificada no período pré-romano (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, op. cit. p.

10). Também encontrada na Lei de Talião e nas XII Tábuas, a base consistia justamente na

intervenção nos negócios privados para reparar prejuízos.

Evolutivamente, a imposição de uma recompensa ao agressor, instituída no direito

romano, fez mitigar a ideia da vingança privada, principalmente pelo princípio trazido de

talião, do olho por olho, dente por dente. Deixava-se de impor inclusive uma penalidade

corpórea ao agressor, modificando a forma de restabelecer o equilíbrio na sociedade.

Um marco na evolução do Instituto se dá com a edição da Lex Aquilia, com tamanha

importância que nominou a responsabilidade civil por delito ou extracontratual. A grande

característica desta era propor a substituição das multas fixas por uma pena proporcional ao

dano causado, evoluindo no conceito de reparação, no conceito de Alvino Lima (apud

GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, op. cit. . p. 11).

Passava-se a um modelo fixo, em que as multas previamente estabelecidas davam

lugar a apuração do dano verificado.

Permite-se a inserção da culpa como elemento básico da responsabilidade civil

aquiliana, que substituía a ideia da penalidade pela reparação do dano efetivamente sofrido.

Na Idade Moderna, a adoção do Código Civil Napoleônico e seus ideais burgueses

influenciou diversas codificações mundo afora, inclusive o Código Civil Brasileiro de 1916.

Porém, a teoria clássica da culpa não atendia a todas as demandas existentes, sendo

imperiosa ampliação do conceito de culpa para os diversos casos existentes na vida cotidiana,

inclusive pelo fato ou mesmo em virtude do risco criado.

Legislações mais modernas passaram a adotar o conceito estendido de culpa, com seu

risco previsível, adotando novo posicionamento contrário à teoria clássica da culpa, como

base no Código Civil Pátrio de 2002.

Retomando a discussão dos elementos, cumpre-nos conceituar conduta, dano e nexo

de causalidade.

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13 A CONDUTA NOCIVA AO MEIO AMBIENTE

O Homem, por si ou por ficção criada, como nas pessoas jurídicas, pratica atos que, à

exceção dos fatos da natureza, que escapam a vontade e ação humana, podem acarretar a

resposta reparadora na esfera civil. Em tal contexto, a ação (ou omissão) humana voluntária é

pressuposto necessário para a responsabilização civil do agente. No conceito de Fabio Stolze

e Rodolfo Pamplona (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, op. cit. . p. 27), conduta humana

voluntária é a ação, positiva ou negativa (omissão), guiada pela vontade do agente, que

desemboca no dano ou prejuízo.

Como núcleo fundamental, temos a voluntariedade, consistente na liberdade de

escolha do agente imputável, com discernimento necessário para o ato. Age de maneira

consciente, sem qualquer forma excludente, como no caso das forças naturais invencíveis. E

sem a voluntariedade, não há que se falar em ação humana consciente, muito menos em

responsabilidade civil.

Rui Stoco, reportando-se a Caio Maria Pereira (STOCO, 2001), afirma que não se

insere na voluntariedade o propósito ou a consciência do resultado danoso, ou a consciência

de causar prejuízo.

A conduta humana pode ser classificada em positiva e negativa.

Nesse propósito, a conduta positiva consiste no agir, realizar ato de transformação no

mundo fenomênico por força própria, agindo de forma a trazer alteração de fatos ou coisas

derivada e influenciada pelos atos do agente26

. A forma comissiva se mostra mais sutil, com

as experiências dos criminalistas auxiliando na melhor conceituação. A conduta omissiva – ou

negativa – consiste na abstenção da prática de determinado ato, gerando um dano atribuível ao

agente que nada fez. O art. 186 do Código Civil remete a ação ou omissão voluntária.

Segundo Mauricio Antonio Ribeiro Lopes (LOPES, 1999), a omissão

consiste no fato de o agente deixar de realizar determinada conduta, tendo a

obrigação jurídica de fazê-lo; configura-se com a simples abstenção da conduta

devida, quando podia e devia realizá-la, independentemente do resultado. São os que

objetivamente são descritos com uma conduta negativa, de não fazer o que a lei

determina, consistindo a omissão na transgressão da norma jurídica, sem a

necessidade de qualquer resultado naturalístico. A inatividade constitui, em si

mesma, crime.

26

Aja de modo que os efeitos de tua ação não sejam destrutivos para a possibilidade futura de

uma autêntica vida humana sobre a terra, afirma Hans Jonas (HUPFFER, et al.i, 2012).

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Importante destacar que a ação humana voluntária deve revestir-se da ilicitude, como

aspecto necessário para a responsabilização na esfera civil.

Silvio Venosa (apud GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, op. cit. . p. 31), afirma que

o ato de vontade, contudo, no campo da responsabilidade deve revestir-se da

ilicitude. Melhor diremos que na ilicitude há, geralmente, uma cadeia de atos

ilícitos, uma conduta culposa. Raramente, a ilicitude ocorrerá com um único ato. O

ato ilícito traduz-se em um comportamento voluntário que transgride um dever.

Impende inferir que o comportamento voluntário, de forma consciente, afeta um dever

jurídico do agente, que, ao comportar-se ativa ou passivamente, implica em reação a si pela

norma, implicando uma reação contrária ao seu comportamento.

Não menos importante nesse campo, a antijuridicidade caminha entrelaçada com o

dever de indenizar. Mesmo que licita a conduta, poderá nascer o dever de indenizar, visto que

o dever de indenizar não se condiciona, de forma indissociável, à antijuridicidade.

Em seguida, passamos a abordar o próximo elemento da responsabilidade, qual seja, o

dano.

14 O DANO AO MEIO AMBIENTE DO MUNICÍPIO

Em se tratando do aspecto ambiental do trabalho, limitamos tal abordagem, buscando

maior detalhamento do tema. Como já abordado na discussão dos resultados da análise feita

laboratorial, o Cromo foi constatado na lagoa de dejetos do curtume, inclusive maior parte de

seu conteúdo despejado em rio da bacia hidrográfica, além da contaminação existente nas

camadas do solo.

Com relação ao estudo de dano ambiental, Álvaro Valery Mirra (apud LEMOS, 2006)

o conceitua como

toda degradação do meio ambiente, incluindo os aspectos naturais, culturais e

artificiais que permitem e condicionam a vida, visto como bem unitário imaterial

coletivo e indivisível, e dos bens ambientais e seus elementos corpóreos e

incorpóreos específicos que o compõem, caracterizadora da violação do direito

difuso e fundamental de todos à sadia qualidade de vida em um ambiente são e

ecologicamente equilibrado.

Assim, os danos causados ao meio ambiente em razão do progresso desenfreado

trouxeram a ideia da sustentabilidade e da penalidade aos agentes causadores dos danos. O

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termo sustentabilidade, na crítica feita por Azevedo (AZEVEDO, op. cit., p.47. p.111).

Segundo o autor,

a ideia de sustentabilidade advem do trabalho dos ideólogos do Banco Mundial, que

tem, tradicionalmente, demonstrado uma admirável flexibilidade teórica, produzindo

teorias justificadoras encobridoras dos fracassos desta instituição.

Críticas à parte, inclusive de ordem econômica, o fato é que, somente com a

responsabilização de agentes – naturais ou jurídicos – o meio ambiente passou a ser mais

cuidado, com reflexos na saúde humana.

No específico tema de direito ambiental, podemos ter a responsabilidade civil e penal.

Na esfera penal, como já salientamos, o presente estudo não abordará suas características e

aplicabilidade.

Todavia, já identificamos inúmeros instrumentos normativos que devem ser

observados em matéria de responsabilidade civil ambiental, como a lei 6.938, de 31 de agosto

de 1981, denominada Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, com a responsabilização

objetiva do causador do dano.

Também a Constituição Federal aborda a questão, além do Estatuto das Cidades, a Lei

de Saúde Pública e, no caso específico, o Plano Diretor de Redenção e seu respectivo Código

de Meio Ambiente.

Dentro da seara do dano, as políticas de diversos países impuseram a ideia (como

princípio) do poluidor-pagador, consistente em impor ao poluidor a responsabilidade pelos

danos causados ao meio ambiente, reparando o ambiente, além de suportar os custos da

prevenção e repressão às práticas poluidoras. São princípios intrínsecos ao tema do dano

ambiental e a responsabilização do agente, observado nas mais avançadas legislações

mundiais (inclusive como reflexo do esverdeamento das legislações e decisões pretorianas,

que abordamos em item próprio).

Na definição trazida por Rangel Barbosa (BARBOSA e OLIVEIRA, 2006),

o Princípio do Poluidor Pagador (PPP), propriamente dito, é um princípio de

proteção do direito ambiental, que procura imputar os custos da poluição ao

poluidor. Foi adotado, no ano de 1972, pela Recomendação do Conselho da

Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

E em razão do caráter de ordem pública de que goza a proteção ambiental, instituiu-se

a solidariedade passiva pela reparação do dano, impondo, quando não possível identificar o

agente causador, como exemplo num distrito industrial, todos respondem em solidariedade,

conforme exemplo e pensamento de Lucarelli (apud GONÇALVES, op. cit. p. 89).

Infere-se, por decorrência lógica, que o dano ambiental vincula o agente poluidor a

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toda reparação, prevenção e repressão, suportando os aspectos financeiros, ainda que em

solidariedade passiva. Um cenário muito diferente do início do séc. XX.

E a solidariedade não se presume. Decorre da própria lei ou da vontade das partes,

conforme art. 265 do Código Civil. E a regra de responsabilidade decorre da própria adoção

da responsabilidade objetiva adotada em matéria ambiental, com entendimento pretoriano

nesse sentido. Em sendo objetiva a responsabilidade, impende sua conceituação, diferindo-a

da responsabilidade subjetiva. Tem-se que na responsabilidade civil subjetiva a imputação do

dano irá ligar-se à ideia de previsibilidade. Por outro lado, o requisito da previsibilidade não

existe na responsabilidade objetiva, bastando a prova de que a ação ou omissão foi a causa do

dano, tornando a imputação direta, sem análise de subjetividade. Ainda no mesmo diapasão,

a lição da doutrinadora vai além, instituindo que (STEIGLER, 2003)

o ordenamento supõe que todo aquele que se entrega a atividades gravadas com

responsabilidade objetiva deve fazer um juízo de previsão pelo simples fato de

dedicar-se a elas, aceitando com isso as consequências danosas que lhe são inerentes.

E havendo mais de um causador pelo dano, a solidariedade se impõe, segundo a regra

do art. 942 do Código Civil, que estabelece que

os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à

reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão

solidariamente pela reparação.

Ponto importante para o trabalho é a atuação do Poder Público e seus deveres.

Também os entes respondem pelas omissões de seus agentes, cabendo também o dever de

reparação. E tal dever nasce pela competência atribuída legalmente em conceder licença e

fiscalizar as atividades poluidoras, respondendo em solidariedade com o particular quando se

omite com relação ao seu poder-dever de polícia.

Nos estudos trazidos, tanto o particular como o Poder Público – em todas as esferas, se

omitiram quanto ao dever legal de impor medidas de cunho administrativo e judicial contra as

práticas nocivas identificadas afetando o meio ambiente equilibrado e a saúde humana, bem

como todos os demais regramentos legais identificados.

A solidariedade legal acarreta a desnecessidade da causa exclusiva do dano, de modo

que, mesmo existindo a concausa, permanece o dever de indenizar. O dever de prova é quanto

ao nexo de causalidade, não a causa exclusiva do dano ambiental. E o pensamento

esclarecedor de Antonio Benjamin, afirmando que

o direito brasileiro, especialmente após a Constituição Federal de 1988 (é dever de

todos...), não admite qualquer distinção - a não ser no plano do regresso - entre

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causa principal, causa acessória e concausa. Assim, havendo participação de alguém

na efetivação de um dano, responde pela totalidade do mesmo. (Antonio Herman V.

Benjamin, apud LEMOS, op. cit.)

E a solidariedade, no caso, em nada afetará o polo passivo em face do autor da ação

civil pública, como comumente se observa, onde o Ministério Público propõe, nas esferas de

competências estaduais ou federal, a reparação do dano. Apenas para a via regressa haverá

importância, em se determinando – dentre os integrantes do polo passivo – o responsável com

exclusividade.

Por vezes, os danos ambientais redundam na extrema dificuldade em se identificar o

causador pelo dano. O exemplo trazido por Jorge Alex Nunes Athias (apud LEMOS, op. cit.)

descreve a dificuldade de se determinar de onde partiu o causador do dano ambiental quando

se cuida, por exemplo, de um complexo industrial. Dessa forma, resta associada a

solidariedade à responsabilidade por causas e concausas.

15 NEXO DE CAUSALIDADE

Segundo Sílvio Venosa, o conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de

causalidade deriva das leis naturais (VENOSA, op. cit. . p. 53). O nexo casual é que liga o

agente ao dano ambiental, sendo elemento indispensável. E ainda que a responsabilidade

objetiva dispense a análise da culpa, em matéria ambiental ainda se prescinde do nexo causal

para impor o dever de reparação ao agente.

Ao se estabelecer a relação de causa e efeito, traça-se o elo entre o dano e seus

responsáveis, até com os reflexos da solidariedade, como já vimos.

Indispensável esclarecer que, em matéria de reparação, o caso fortuito e de força maior

são excludentes do nexo causal porque o cerceiam ou o interrompem, segundo lição de

Venosa (VENOSA, op. cit. p. 53). No caso fortuito ou de força maior, a relação de ação do

agente com o dano resta prejudicada, visto que sequer a ação foi voluntariosa – em aspecto

positivo ou omisso – não se estabelecendo relação de causa e efeito.

Todavia, para efeitos de proteção ambiental, e em especial pela integral

responsabilidade assumida pelo agente, a questão do caso fortuito e de força maior torna-se

irrelevante, devendo o poluidor suportar os custos, em razão da teoria do risco integral, ainda

que o dano seja decorrente de caso fortuito ou de força maior (GONÇALVES, op. cit. p. 91).

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A doutrina do risco integral, presente no ordenamento pátrio, consolidou o

entendimento de que todo aquele que se entrega a empreendimentos com responsabilidade

objetiva deve considerar a possibilidade (previsibilidade), aceitando as consequências por

vezes de alto custo, pelo risco do negócio, como verdadeiro garantidor da preservação

ambiental. No ensinamento de Caio Mário da Silva Pereira, não se cogita indagar como ou

porque ocorreu o dano. Basta identificar que houve o dano, vinculado a um fato qualquer,

para assegurar à vítima uma indenização (apud STEIGLER, op. cit.. 83).

Saliente-se que, em matéria ambiental, as dificuldades se avolumam em se estabelecer

o nexo casual entre o dano e a ação responsável.

A primeira dificuldade reside na prova deste elo. Em seguida, a dificuldade reside em

se estabelecer qual a verdadeira causa do dano, principalmente quando se tratar de áreas e

bens com muitos agentes interagindo com o meio ambiente.

Muitas vezes, o dano é resultado de várias causas concorrentes, simultâneas e

sucessivas, conforme ensina Benjamin (apud STEIGLER, op. cit..) afirmando ser

o império da dispersão do nexo causal, com o dano podendo ser atribuído a uma

multiplicidade de causas, fontes e comportamentos, procurando normalmente o

degradador lucrar com o fato de terceiros ou mesmo da vítima, com isso

exonerando-se.

Fixada a premissa da responsabilidade diante da solidariedade e do nexo causal, com

adoção da teoria objetiva, um ponto relevante para o trabalho se mostra quanto a licitude do

empreendimento econômico, notadamente em se tratando do preenchimento dos requisitos

legais. Especificamente, mesmo em se adotando todas as etapas de licenciamento ambiental e

ainda atendendo a todos os requisitos das demais legislações, como o Código Ambiental

Municipal, ainda assim restará a obrigatoriedade de reparação dos danos, segundo

pensamento da maioria dos doutrinadores nacionais27

.

27

A jurisprudência nacional tem se voltado (ainda que com alguns julgados pela responsabilidade civil subjetiva)

para a pacificação da responsabilidade civil por omissão estatal objetiva. Nesse sentido, destacamos julgado do

STJ (Recurso Especial nº 604.725-PR - 2003/0195400-5). Originariamente o Ministério Público Federal, em

razão da construção de via pública que tangencia o rio Paraná, ajuizou ação civil pública de responsabilidade por

danos causados ao meio ambiente contra a União Federal, o Estado do Paraná, o município de Foz do Iguaçu e o

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA. Após recursos, o STJ, por

unanimidade, acompanha voto do relator, min. Castro Meira, do STJ, afirmando no voto que o Estado do Paraná

tinha o dever de preservar e fiscalizar a obra em questão. Asseverou ainda que o Estado, no seu dever de

fiscalização, deveria ter requerido o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo relatório, bem como a

realização de audiências públicas acerca do tema, ou até mesmo a paralisação da obra que causou o dano

ambiental. (HUPFFER, et al.i, 2012).

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Comunga de tal posicionamento Andreas Krell e Lucarelli. Em sentido contrário, Hely

Lopes Meirelles defendia a exclusão da responsabilidade civil diante da autorização

administrativa (apud STEIGLER, op. cit..).

Alguns países também seguem a posição brasileira, se posicionando de modo a não

afastar o nexo pela licitude, como no caso da Espanha, onde o princípio do alterum non

laedere é invocado para a responsabilização de danos produzidos por atos lícitos, conforme

ensina Gonzáles (apud STEIGLER, op. cit..). Já o direito alemão, em caso de as instalações

funcionarem dentro das normas, a responsabilidade por danos materiais será excluída, quando

a coisa seja danificada acidentalmente, ou o seja em medida aceitável para as relações locais,

conforme lei alemã de 12.10.1990,§ 5.º. (apud STEIGLER, op. cit..).

Nos Estados Unidos da América, a situação se mostra similar à Alemanha, com

adoção mais branda do nexo casual. Em especial, quando se tratar de instalações que atuem

dentro dos limites das instalações ou licenças. O mesmo posicionamento tem se verificado na

Proposta do Parlamento Europeu. Todavia, nas decisões americanas contra as causas de

perturbações, nas denominadas condutas perturbadoras, tem-se o método de avaliar se a lesão

ao meio ambiente é superior à utilidade resultante da conduta, resultando em proibição e

demais medidas (PENDERGRASS, 1996).

No Brasil, com o incremento da responsabilidade ambiental decorrente da maior

conscientização e da rigidez legal, além da atuação das Organizações Não Governamentais -

ONG – empresas procuram ser associadas a imagem politicamente corretas e adequadas ao

meio ambiente sustentável, no mesmo sentido que nasce a denominada responsabilidade pós-

consumo (STEIGLER, op. cit..).

Tal responsabilidade decorre do fator de risco do produto, cabendo uma logística

reversa, onde, após a utilização do produto, a fonte geradora do resíduo (fabricante, por

exemplo) deve empenhar meios para sua correta destinação final. Isso já se tem constatado em

relação aos agrotóxicos, pneus, pilhas e baterias de telefone celular, além de embalagens

plásticas do tipo pet.

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16 A REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL

A reparação dos danos ambientais consiste na indenização dos prejuízos ou na

restauração do que foi poluído, destruído ou degradado (GONÇALVES, op. cit.. p. 94), de

forma consumada ou ainda iminente.

O dano ambiente deve ser ainda certo e atual, considerando-se certo como aquele não

pode ser alvo de condição hipotética ou mesmo eventual. Quanto ao conceito de atual,

significa dizer que já existe, de forma concreta. Comporta certa mitigação o conceito de atual,

posto que fatos novos podem vir a ocorrer, com novos prejuízos ambientais relacionados ao

caso. O dano ainda não totalmente mensurado, mas que depende de evento futuro, ficando

também passível de reparação28

.

Carlos Roberto Gonçalves, reportando-se ao ensinamento de Helita Barreira Custódio,

afirma que

todos os danos aos elementos integrantes do patrimônio ambiental e cultural, bem

como às pessoas (individual, social e coletivamente considerados) e ao seu

patrimônio, como valores constitucional e legalmente protegidos, são passíveis de

avaliação e de ressarcimento, perfeitamente enquadráveis tanto na categoria do dano

patrimonial (material ou econômico) como na categoria do dano não patrimonial

(pessoal ou moral), tudo dependendo das circunstâncias de casa caso concreto

(GONÇALVES, op. cit.. p. 95).

O conceito clássico de bens ou coisas fora do comércio, e por isso não passíveis de

mensuração, acabam por serem também calculados, posto que indispensáveis à vida e à saúde

humana. O ar atmosférico, as águas dos rios e bens considerados fora do comércio acabam,

sob a ótica ambiental, passíveis de avaliação para efeitos de indenização, ainda mais no

aspecto coletivo.

Ainda de acordo com o art. 420 do Código Civil, o dano emergente e o lucro cessante

são também passíveis de indenização, englobando no quantum debeatur ambiental.

Muitas ações civis públicas buscam o ressarcimento pelos danos difusos, incluindo

dano moral de natureza coletiva ambiental, buscando atribuir ao empreendedor – e ao Poder

Público – a responsabilidade e o dever de indenizar.

Para a doutrina pátria, a questão da indenização pelo próprio Poder Público enfrenta

resistência, tendo alguns doutrinadores se posicionando no sentido de admitir a

28

Notadamente em matéria de bens imóveis, decorrentes da obrigação propter rem. O titular do domínio da

coisa responde pelos gravames produzidos pelo bem de sua propriedade. Tais obrigações transferem-se junto

com a transmissão da coisa, por meio de negócios jurídicos., transferindo-se a obrigação de reparar o solo

degradado ao adquirente (SALLES, op. cit.)

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responsabilidade objetiva e solidária nas questões ambientais. Tal posicionamento é defendido

por Rodolfo Camargo Mancuso (apud GONÇALVES, op. cit.. p. 97), quando afirma que

a responsabilidade solidária na administração se dará objetivamente nas atividades

sujeitas à aprovação pelo Poder Público, quando o ato administrativo for lícito e,

subjetivamente, quando for ilícito, quando houver omissão do pode de polícia;

Em sentido inverso, temos a posição de Toshio Mukai e Nelson Nery Junior,

afirmando este último que

por timidez em se adotar a teoria do risco integral, não se chegou ainda a uma

completa forma de responsabilização estatal nos danos causados ao meio ambiente

(apud GONÇALVES, op. cit.. p. 97).

Com o respeito devido às posições contrárias, o fato é que prevalece o entendimento

jurisprudencial de que o Estado, nas suas três esferas, acaba respondendo pelos danos

ambientais, mormente em se tratando de ausência ou desrespeito ao licenciamento ambiental.

Nesse aspecto, trazemos entendimento pretoriano do Estado do Pará:

Nº DO ACORDÃO: 114853

Nº DO PROCESSO: 201030164515

RAMO: CIVEL

RECURSO/AÇÃO: Agravo de Instrumento

ÓRGÃO JULGADOR: 1ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA

COMARCA: MARITUBA

PUBLICAÇÃO: Data:07/12/2012 Cad.1 Pág.123

RELATOR: GLEIDE PEREIRA DE MOURA

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFESA E

PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. DEVER DO PODER PÚBLICO E DA

COLETIVIDADE. ART. 225 CAPUT DA CF. RESPONSABILIDADE

SUBJETIVA. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. RECURSO PARCIALMENTE

PROVIDO.

I - O Agravante voltou-se contra a decisão singular que determinou que o Agravado,

juntamente com o Município de Ananindeua e de Marituba, promovesse a

revitalização do curso d'água do Igarapé das Toras, com limpeza e manutenção do

equilíbrio ambiental do referido local, bem como a proteção das nascentes próximas

a este, no prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais),

no caso de descumprimento da decisão.

II - O art. 225 caput da Constituição Federal trata sobre o dever, do Poder Público e

da coletividade em geral, de defender e preservar o meio ambiente, com o intuito de

mantê-lo ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.

III - No caso em tela, ficou constatada a omissão do Estado do Pará em relação ao

dano ambiental, pois este deixou de cumprir o seu dever constitucional de proteger o

meio ambiente, uma vez que falhou na função fiscalizatória de uma área que passou

a ter uma ocupação urbana desordenada; sem prestar-lhe o serviço de saneamento

básico, dando oportunidade para que a comunidade local despejasse detritos sólidos

no afluente conhecido como Igarapé das Toras.

IV Recurso conhecido e provido parcialmente para reconhecer que, no caso em tela,

deve ser adotada a teoria da responsabilidade subjetiva, conforme alegado pelo

Agravante. Contudo, para manter a decisão singular em relação às determinações

imputadas ao Estado do Pará, em virtude de considerar que este foi omisso quanto

à proteção ambiental na área do Igarapé das Toras.

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O caso exemplificativo coloca o Estado-membro como responsável solidário, impondo

uma obrigação ambiental por descumprimento do poder de policia, como no caso do presente

estudo.

Por relevante ainda, cumpre estabelecer uma reflexão sobre o pensamento de Hans

Jonas (HUPFFER, et al.i, 2012), que se debruça sobre o princípio da responsabilidade.

O autor parte da premissa de que o agente público ou privado deve responder por seus

atos e pelas consequências de suas ações, estabelecendo que os danos causados devem ser

reparados, ainda que a causa não tenha sido um ato mau e suas consequências não tenham

sido previstas, nem desejadas (HUPFFER, et al.i, op. cit.).

Estudando a relação do homem com a natureza e o meio ambiente, Hans Jonas fala em

vulnerabilidade da natureza29

como resultado da intervenção tecnológica do homem sobre a

natureza. Tal pensamento coloca os ideais de geocentrismo em contraposição ao

antropocentrismo, conferindo direitos à natureza. Adiante, pondera a democracia moderna e a

constitucionalização dos direitos ambientais colocam a necessidade de um novo pensar a

respeito do papel do Estado e dos cidadãos frente aos desafios econômicos de

desenvolvimento e a preservação do meio ambiente para as futuras gerações. Insere-se aqui o

conceito da responsabilidade solidária, inclusive em âmbito internacional, com obrigações de

prudência, impondo limites na atuação dos Estados e de seus cidadãos.

29

A teoria de Hans Jomas pauta-se pela crítica a visão antropocêntrica da ética moderna, considerando a

existência dos direitos à natureza (HUPFFER, et al.i, op. cit.).

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17 CONCLUSÃO

A questão da poluição por resíduos químicos e derivados industriais gerados pela

atividade dos curtumes tem sido fonte de grandes preocupações no mundo acadêmico e

científico, pois, a par do desenvolvimento vivido, estão os constantes malefícios causados à

população de modo geral.

Assim, como se denota, a questão encontra-se marginalizada da discussão pelo

Município, União e Estados, muitas vezes ocorrendo omissão quanto aos deveres de

fiscalização e implementação adequadas do Instituto do licenciamento Ambiental,

notadamente com seus estudos de impactos em diversas esferas.

Não obstante, mecanismos modernos atribuídos ao licenciamento ambiental permitem

aos municípios o pleno exercício do predomínio do interesse local, gerando uma gestão

participativa e democrática, sempre com políticas públicas que contemplem o ser humano e

sua dignidade.

Nesse aspecto, a junção do licenciamento ambiental e as políticas determinadas pelo

Plano Diretor podem mudar a feição das cidades, com medidas que humanizem suas relações

e ainda obedeça a função social da propriedade. A edificação do Estatuto das Cidades vem de

encontro ao anseio dos que pensam uma cidade mais justa e cidadã, com respeito a todos os

anseios dos munícipes.

Para tanto, deve-se abandonar a mera formalização de diplomas legais que apenas

consolida um modelo superado de gestão das cidades, devendo haver verdadeira simbiose

entre todo ordenamento, inclusive nas esferas de competências administrativas e legislativas,

buscando o fim comum do respeito ao meio ambiente e ao ser humano, na sua integral

dignidade.

A construção da dignidade da pessoa humana passa por todos esses fatores, não se

podendo transacionar com nenhum, sob pena de absoluto retrocesso na linha evolutiva da

conquista de direitos.

Inúmeras infrações constantes no Código Ambiental foram perpetradas, sem nenhuma

ação tomada por parte do Poder Público, em especial o Município de Redenção.

Importa destacar que valores consideráveis podem ser arrecadados em razão das

penalidades e sua destinação para implantação de programas eficazes e do interesse local,

como já previsto pela legislação. Temos que os Municípios devem buscar soluções urgentes

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para problemas de tal magnitude, propondo medidas administrativas e judiciais para

responsabilização dos envolvidos, reparando a qualidade do meio ambiente.

De outra sorte, devem ainda observar políticas que protejam a população de riscos de

exposição à contaminação, com embargos de atividades que se mostram nocivas à qualidade

ambiental e, por via de consequência, da saúde dos seres humanos.

Estudos técnico-científicos mostrados afirmam quanto ao risco de contaminação da

maioria das cidades brasileiras, como no caso específico de Redenção-PA, que ficam à mercê

de autoridades omissas quanto ao seu papel. Nesse sentido, o papel do Ministério Público, das

entidades civis e até do cidadão em gozo com seus direitos políticos mostram a possibilidade

de reversão do quadro, propondo ações judiciais que contemplem, de forma eficaz e com

repercussão ampla, a defesa dos direitos ambientais e, por decorrência, os direitos

fundamentais de todos os seres. Desta forma, buscou-se fazer em todo o trabalho

considerações acerca da questão da contaminação de área urbana por resíduos de atividade de

curtume, quanto à sua destinação final e ainda no que se refere à legislação atual. Não se pode

destinar a área a qualquer atividade de moradia, indústria ou agricultura.

Em suma, constitui-se tanto no campo da aplicabilidade da legislação quanto ao meio

mais eficaz no descarte de tais resíduos um desafio de ordem técnica e executiva. É mister a

necessidade de avançar nessa direção com vistas a sensibilização e a ação mitigadora de

impactos causados pelos descarte de forma irregular de tais resíduos, buscando a preservação

do meio ambiente sadio, equilibrado e possível para as futuras gerações. Mais ainda: as

legislações devem ser revistas, adequadas e obedecidas, em especial o Plano Diretor da cidade

de Redenção-PA.

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