revista plural 43

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1º Congresso do Patrimônio Público avalia os 18 anos da Lei de Improbidade Administrativa ano 7 nº 43 Julho-agosto-setembro de 2010 Uma publicação da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo

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Page 1: Revista Plural 43

1º Congresso do Patrimônio Público avalia os 18 anos da Lei de Improbidade Administrativa

ano 7 nº 43 Julho-agosto-setembro de 2010

RIN

O C

OM

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Uma publicaçãoda Escola Superiordo Ministério Públicode São Paulo

Page 2: Revista Plural 43

2 e 3 de dezembro de 2010

Justiça e AdministraçãoPública

ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

Auditório “Julio Fabbrini Mirabete”

Rua Treze de Maio, 1259 - Bela Vista - São Paulo - SP

9h00 - 9h15 - ABERTURA

ELOISA DE SOUSA ARRUDA

9h10 - 10h - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

POR OMISSÃO LEGISLATIVA INCONSTITUCIONAL

RAUL DE MELLO FRANCO JUNIOR

10h00 - 10h30 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

10h30 - 10h45 - COFFEE BREAK

10h45 - 11h35 - A PRIVATIZAÇÃO DA FUNÇÃO PÚBLICA

PRISCILLA NASCIMENTO RAMOS RÁTIS

11h35 - 12h05 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

Procuradora de JustiçaDiretora do CEAF/ESMP

Expositor

Promotor de Justiça de Araraquara e Professor Universitário

Expositora

Advogada e Professora Universitária

9h00 - 9h50 - O PRINCÍPIO DO DIREITO À SUFICIENTE

DEFESA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO

CLEDI DE FÁTIMA MANICA MOSCON

09h50 - 10h20 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

10h20 - 10h35 - COFFEE BREAK

10h35 - 11h25 - O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E NA JURISPRUDÊNCIA

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

EBE PIMENTEL GOMES LUZ

11h25 - 11h55 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

Expositora

Advogada e Professora Universitária

Expositora

Advogada e Professora Universitária

Público-alvo:

Inscrições gratuitas:

Membros, Servidores e Estagiários do Ministério Público do Estado de São Paulo, Magistrados,

Defensores Públicos, demais operadores do Direito, e ao público em geral.

até às 15h do dia 01 de dezembro de 2010, pelo preenchimento de formulário on-line,

disponível no sítio da ESMP, www.esmp.sp.gov.br (Vagas limitadas)..Será conferido certificado aos que comparecerem ao evento.

Coordenação Geral

Procuradora de Justiça Diretora do CEAF/ESMPELOISA DE SOUSA ARRUDA

Realização Apoio

Centro de Estudos e Aperfeiçoamento FuncionalESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

DIA 2/12 (quinta-feira) DIA 3/12 (sexta-feira)

Mais informações na homepage da ESMP: www.esmp.sp.gov.br

Seminário

Dia 01 de dezembro de 2010 (quarta-feira) - das 9h às 12h

Auditório “Julio Fabbrini Mirabete”

Rua Treze de Maio, 1259 - Térreo - Bela Vista - São Paulo - SP

9h - 9h10 - Abertura

9h10 - 09h25 - Exibição do documentário

“Uma história Severina”

9h25 - 09h50

ELOISA DE SOUSA ARRUDA

DÉBORA DINIZ

JANAÍNA LIMA PENALVA DA SILVA

Procuradora de JustiçaDiretora do CEAF/ESMP

Expositoras

Professora da Universidade de Brasília ePesquisadora da Anis: Instituto de Bioética Direitos Humanose GêneroPesquisadora visitante na University of Leeds, Universidade do RJInstituto Oswaldo Cruz e University of MichiganDoutora em Antropologia pela Universidade de BrasíliaPós-Doutorada pela Universidade de Brasília

Pesquisadora da Anis: Instituto de Bioética Direitos Humanose GêneroMestre em Direito pela Universidade de Brasília

Público-alvo:

Inscrições gratuitas:

Membros, Servidores e Estagiários do Ministério Público do Estado

de São Paulo, Magistrados, Advogados, operadores do Direito, Estudantes de Direito,Profissionais da Saúde e ao público em geral.

até às 17h do dia 29 de novembro de 2010, pelo preenchimento

de formulário on-line, disponível no sítio da ESMP, www.esmp.sp.gov.br (Vagas limitadas)Será conferido certificado aos que comparecerem ao evento.

Coordenação Geral

Procuradora de Justiça Diretora do CEAF/ESMPELOISA DE SOUSA ARRUDA

Realização Apoio Apoio cultural

Centro de Estudos e Aperfeiçoamento FuncionalESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

9h50 - 10h40 - “Aborto e Anencefalia”

10h40 - 10h50 - Intervalo

10h50 - 11h20 - “Os cuidados paliativos sob

a ótica médica”

11h20 - 12h00 - “Direito de morrer com

dignidade”

Expositora

Professora da PUC/SP e da Escola Superior do Ministério PúblicoMestre e Doutora em Direito pela PUC/SP

Expositor

Médico do Sírio Libanês e do Hospital das ClínicasEspecialista e Doutorando pela Faculdade de Medicina da USP

Expositor

Advogado e ProfessorMestre pela PUC/SPPós-Graduado em Direito pela Universidade de CoimbraEspecialista em Direito pela Escola Superior do Ministério Públicode São Paulo

CAROLINA ALVES DE SOUZA LIMA

DANIEL FORTE

LUCIANO DE FREITAS SANTORO

PROGRAMAÇÃO

Mais informações na homepage da ESMP: www.esmp.sp.gov.br

PalestraPalestra

no início e no fim da vida

O Direito e a Medicina

no início e no fim da vida

O Direito e a Medicina

Page 3: Revista Plural 43

O trimestre de julho a setembro foi de vida intensa em nossa Escola Superior do Ministério Público. Entre as novidades, destacamos o I Congresso do Patrimônio Público de São Pau-lo que realizou um balanço dos 18 anos da Lei de Improbidade Administrativa procurando refletir sobre seus erros e acertos. Os resultados da aplicação da lei foram apresentados em números que indicaram, por exemplo, que de 1992 a 2009, o Ministério Público já ajuizou 764 ações de improbidade administrativa e cobrou o retorno de R$ 32 bilhões ao erário, sendo que quase R$ 6 bilhões em valores e bens já foram bloqueados pela justiça. Foi gratificante perceber a parti-cipação no evento de mais de 180 promotores de justiça de 21 estados brasileiros, que tiveram uma oportunidade inédita na troca de experiências com os colegas. Também fez parte das novidades o 1º Júri Simulado para estagiários do Minis-tério Público de São Paulo, atividade que mobilizou mais de 300 estagiários da instituição, que se inscreveram para assistir como ouvintes ou participar como promotor de justiça, defensor, réu e testemunhas. Foi bonito ver nossos jovens estagiários comprometidos com a preparação e concretização do julgamento do “Caso Euclides da Cunha”. O envolvimento foi tanto, que no dia marcado para o Júri, 11 de agosto de 2010, no Salão Nobre do Tribunal de Justiça de São Paulo, lá estavam eles, para nossa surpresa e por iniciativa própria, com trajes da época do início do século, tornando mais realista a simulação. Fizemos um passeio pela história, que culminou com a visita guiada ao museu do Tribunal de Justiça.Três seminários internacionais, o de Criminologia, o de Proteção de testemu-nhas, e o Ministério Público e Política e dois nacionais que trataram do Planeja-mento Municipal - Mudanças climáticas e a sustentabilidade dos aquíferos e da violência contra a mulher tiveram lugar nesse trimestre, todos com importantes debates entre especialistas do Brasil e do mundo.Sempre cumprindo a proposta de discutir temas relevantes e por vezes urgentes, para a solução de questões relacionadas ao dia-a-dia dos Promotores de Justiça, as oficinas trataram dos problemas relacionados à capitalização dos juros utili-zada nos contratos de financiamentos habitacionais para população de baixa ren-da; das audiências concentradas previstas na Lei de Adoção; do monitoramento de locais de privação de liberdade e das alterações promovidas pela lei 12.015/09 no artigo 213 do Código Penal.O tema Ministério Público e Educação desdobrou-se em palestras pelo interior do Estado sendo que os riscos intra e interpessoais do bullying foram discutidos em evento ocorrido na Capital.Enfim, muitas realizações, muitas alegrias e muito ainda a concretizar.

Um abraço a todos!

Eloisa Arruda

editorial

PluralBoletim informativo da Escola Superior do Ministério Público

DiretoraEloisa de Sousa [email protected]

AssessoresEduardo Luiz Michelan CampanaEverton Luiz ZanellaKarina Keiko KameiTomás Busnardo [email protected]

Jornalista responsável:Carina Rabelo (MTB: 48.211 / SP) [email protected]

Direção de arteGuen Yokoyama

Editora de arteVanessa Merizzi

Revisor de textoSárvio Nogueira Holanda

CTP, impressão e acabamentoImprensa Oficial do Estado de São Paulo

Tiragem3 mil

PeriodicidadeTrimestral Escola Superior do Ministério PúblicoRua 13 de Maio, 1259 Bela Vista – São Paulo/SPTelefone: (11) 3017-7990www.esmp.sp.gov.br

Page 4: Revista Plural 43

índice artigo

entrevista

oficina

homenagem

capa

Alexandre Coelho As Fraudes nos Contratos de Compra/Prestação de Serviços de Engenharia 04

Congresso do Patrimônio Público 14 Precisamos ampliar o debate sobre o crime organizado” Fernando Grella Vieira 10

As audiências concentradas são obrigatórias? 19

O que está por trás da capitalização de juros 21

De olho nos presídios 34

Eloisa Arruda é homenageada na OAB/SP 26

Page 5: Revista Plural 43

matéria

palestra

seminário

notas

Eventos no interior de SP

48

livros 51

Dilermando de Assis, absolvido na vida e na arte 24

O debate sobre a legitimidade de investigação do MP é exclusivamente político 36

ESMP debate o novo crime de estupro 8

O mal da invisibilidade 28 Por uma nova São Paulo 27

Por dentro da mente do criminoso 30

Um desafio para o combate ao crime organizado 39

Pela constitucionalidade da Lei “Maria da Penha” 45

Page 6: Revista Plural 43

6

As Fraudes nos Contratos de Compra/Prestação de Serviços de Engenharia

artigo

Em palestra proferida por ocasião do encerramento do I

Congresso do Patrimônio Público e Social do Ministério

Público do Estado de São Paulo, o Ministro Antonio Her-

man de Vasconcellos e Benjamin, do Superior Tribunal de

Justiça, revelou o resultado de pesquisa apontando que a

corrupção tem um custo médio anual de R$ 41,5 bilhões a

R$ 69,1 bilhões para o Brasil.

Aqueles que militam na defesa do patrimônio público sa-

bem que a fraude em procedimentos licitatórios é, sem

duvida, a forma mais utilizada para o desvio de tais valo-

res.

O crescimento vertiginoso das fraudes nos últimos

anos, sobretudo nos pequenos e médios municípios, é

um dos reflexos do crescimento das organizações cri-

minosas em nível global e, especialmente, nacional.

Page 7: Revista Plural 43

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Considerado o “estágio supremo do capitalismo”1 o crime organizado encontrou em nosso país as condições ideais para o desenvolvimento de suas atividades: desigualdade social, baixa escolari-dade da maior parte da população, ausência de cidadania, banalização do crime, instituições públicas corroídas pela corrupção, sistema ju-rídico incapaz de afastar pessoas notoriamente desonestas da vida pública, falta de integração dos órgãos policiais entre si e com o Ministério Público, hipertrofia do Poder Executivo, legisla-ção caótica etc.

Diante de tal quadro as corporações – cujos lu-cros foram sensivelmente reduzidos com a esta-bilidade econômica alcançada na segunda metade da década de 90 – encontraram nos cofres públicos uma fonte inesgotável e permanente de recursos. Essa circunstância, somada à facilidade gerada pela inexistência de vitima determinada que pos-

1 Cf. “Os Senhores do Crime – As Novas Máfias Contra a Demo-cracia”, Jean Ziegler, Editora Record, São Paulo, 2.003, p.52/54.

sa alertar os órgãos de controle da Administração Pública, tornaram as licitações terreno fértil para a criatividade dos fraudadores.2

Assim, assistimos surgir uma nova categoria de “empresários” que se especializou em elaborar esquemas para fraudar licitações para quase todo tipo de produto ou serviço, os quais são “vendidos” para administradores públicos por “consultores” e “representantes” que percorrem todo o país.

2 “Em Ibirataia/BA, a CGU constatou que a cópia de uma página do Diário Oficial do Município, incluída em um dos processos li-citatórios analisados, fora falsificada de modo a estampar uma imagem do aviso de edital da referida licitação. O relatório da CGU informa que não houve publicação do aviso do edital em di-ário oficial nem em jornal de grande circulação, conforme exi-gido pela Lei de Licitações. Trata-se da Tomada de Preços 002, feita em abril de 2007, para aquisição de 197 itens de material didático e de escritório, ao preço total de R$ 178 mil. Consta do processo uma página supostamente do Diário Oficial do Muni-cípio, edição de 15 de março de 2007, com a imagem do aviso de edital que teria sido publicado. Contudo, uma consulta ao site do Diário Oficial na internet constatou que tal página não cor-responde à verdadeira publicação do diário, tendo havido uma falsificação da mesma para simular a publicação” (cf. http://www.cgu.gov.br/imprensa/Noticias/2008/noticia13908.asp).

Alexandre CoelhoPromotor de Justiça

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Este despretensioso artigo tem por objetivo fomentar a discussão em torno de uma das mo-dalidades de fraude muito utilizada nas unidades administrativas do interior do Estado de São Paulo e apontar um caminho a ser seguido pelos colegas que trabalham na defesa do Patrimônio Público.

2. As Fraudes nos Contratos de Compra/Prestação de Serviços de Engenharia.

Para assegurar as contratações pelas Adminis-trações Públicas os contratados e os agentes públi-cos desonestos utilizam os mais diversos expedien-tes fraudulentos: inclusão de cláusulas restritivas da competitividade nos editais, fracionamento dos obje-tos dos contratos em diversas licitações, oferecimen-to de propostas com preços abaixo daqueles pratica-dos no mercado, criação de empresas “fantasmas”, participação no mesmo procedimento de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, alteração do objeto após a assinatura dos contratos, simulação de impugnações, aditamentos fraudulentos etc.

Dentre os inúmeros expedientes utilizados trata-remos nestas poucas linhas de uma modalidade que vem crescendo exponencialmente nos pequenos e médios municípios de todo o país: a caracterização fraudulenta dos objetos dos contratos de compra e venda como prestações de serviços para eliminar o caráter competitivo dos procedimentos licitatórios.

A aquisição de produtos como radares de trânsi-to, computadores, painéis de votação, placas de si-nalização de vias, dentre outros, são definidos como prestação de serviço para dirigir os resultados dos certames em favor dos cartéis responsáveis pela produção e/ou comercialização.

A fraude consiste, basicamente, em caracterizar o objeto “acessório” do contrato (instalação, adapta-ção, montagem etc) como o “principal” para desfi-gurar as “compras” para “prestação de serviços de engenharia” e, dessa forma, possibilitar a adoção da

modalidade de convite em prejuízo de outras com maior publicidade/competitividade.3

Assim, por exemplo, temos assistido as com-pras de painéis eletrônicos de votação para casas legislativas se transformarem em “contratação de empresa especializada para execução de obras e serviços de engenharia de implantação de sistema de controle de votação legislativa”, as aquisições de radares de fiscalização de trânsito no fornecimen-to de “serviços técnicos especializados destinados à implantação e ao processamento de sistemas de fiscalização de trânsito” e a compra de equipamen-tos de informática em “contratação de empresa especializada para a prestação de serviços de im-plantação de sistema de informática com o forneci-mento de materiais”.

Em seguida, são convidadas para participar do certame empresas inexistentes, pertencentes ao mesmo grupo, ligadas a outro ramo de atividade ou desprovidas de quaisquer condições técnico-eco-nômicas de executar o contrato e que, obviamente, serão desclassificadas caso cheguem a apresentar propostas.

Tal procedimento configura ato de improbida-de administrativa previsto nos artigos 10, VIII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/924, crime contra a Admi-nistração Pública tipificado no artigo 90 da Lei nº 8.666/935 e implica na nulidade do certame por vio-lação aos artigos 3º, § 1º, I, 6º, I e II, 22, § 3º e 23, I, “a”, II “a”, e § 5º, dentre outros da Lei nº 8.666/93.

E, obviamente, a nulidade da licitação por vio-lação ao princípio da legalidade induz, necessa-

3 Cf. artigo 23, inciso I, “a” e II, “a”, da Lei nº 8.666/93.4 Cf. TJSP, Apelação nº 994.08.172631-5, 10ª Câmara de Direito Público, Rel. Antonio Celso Aguilar Cortez, Comarca de Poá, j. em 21/12/2009.5 Cf. TJSP, Ação Penal nº 163.681-3/8-00, 5ª Câmara Criminal, Rel. Barbosa Pereira, j. em 12/08/2004.

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riamente, a do contrato e não gera obrigação de indenizar por parte da Administração Pública.6

Dessa forma, para a identi-ficação das fraudes e a adoção das providências faz-se neces-sária a correta análise da natu-reza dos objetos das licitações, distinguindo “compras” (obri-gações de dar) de “serviços” (obrigações de fazer) e as obri-gações “principais” das “aces-sórias”: A distinção se faz em função da prestação principal, que dá núcleo e identidade à prestação. É per-feitamente possível, porém, avençar obrigações acessórias de natureza distinta da principal, sem que isso afete a natureza da contratação. Assim, uma obrigação de dar (principal) pode ser acom-panhada de uma de fazer (acessória) e vice-versa. Como exemplo, uma compra pode ser acompa-nhada do dever de entregar em determinado lo-cal o bem vendido. O transporte da coisa vendida é obrigação de fazer, de natureza acessória. Sua existência não transforma a compra em serviço. Deve-se apurar o fim visado pelas partes e é ób-vio que a Administração não realizou o contrato buscando obter prestação de transportar. O fim que motivou a contratação foi a aquisição do do-mínio sobre o produto. Não há possibilidade de mascarar contratos de compra em prestação de serviço. De nada serve adicionar à transferência de domínio do bem em favor da Administração (objetivo fundamental das partes) alguma presta-ção de fazer. Se o núcleo do contrato é uma pres-

6 Cf. artigo 49, §§ 1º e 2º, da Lei 8.666/93.

tação de dar, não se aplicará o regime do dispositivo ora comentado”.7

Instrumentos essenciais para a identificação de tal modalidade de fraude – e dos próprios cartéis em ge-ral – são a colheita e a cor-reta análise de informações sobre as licitações e con-tratos. Contudo, apesar dos inúmeros avanços no contro-le da Administração Pública, ainda não possuímos um cadastro ou banco de dados

unificado de todos os certames, providência que poderia ser adotada pelos Tribunais de Contas dos Estados e que reduziria de sobremaneira o núme-ro de ilícitos.

3. Conclusão.A existência das organizações criminosas vol-

tadas para o desvio de verbas públicas é realidade inegável em nosso país que merece especial aten-ção dos órgãos de controle interno e externo da Administração Pública e, sobretudo, do Ministério Público.

A caracterização das “compras” como “pres-tação de serviços de engenharia” é mais uma das inúmeras modalidades de fraude utilizadas pelos cartéis para fraudar licitações e deve ser consi-derada durante as investigações de atos de im-probidade administrativa e/ou de crimes contra a Administração Pública, sobretudo por ocasião da análise dos respectivos editais.

7 Cf. “Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrati-vos”, Marçal Justen Filho, 10ª ed. Dialética, 10a ed., página 209, obra citada, pág. 493).

Uma nova categoria

de “empresários” se

especializou em elaborar

esquemas para fraudar

licitações para quase

todo tipo de produto

ou serviço, os quais

são “vendidos” para

administradores públicos

por “consultores” e

“representantes” que

percorrem todo o país.

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A Lei n.º 12.015/09 alterou a redação do artigo 213 do Código Penal, nela incorporando o conteúdo do anteriormente previsto no artigo 214 do mesmo diploma legal, revogado na referida modificação legislativa.

O novo tipo do artigo 213 unificou os crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Com isso, surgiu entendimento doutrinário no sentido de que as condutas libidinosas constituem crime único. No entanto, membros do Ministério Público, após debaterem o assunto, consideraram que esta tese favorece, em muito, o autor de crimes contra a dig-nidade sexual, por limitar a pena em, no máximo, 10 anos – nos casos que não resultaram em morte ou que não foram cometidos contra vítimas vulne-ráveis. Na forma anterior à alteração, a pena para estes casos poderia chegar a 20 anos, somada as previsões nos diferentes artigos.

Para debater o tema e discutir as mais recen-tes interpretações da lei nos tribunais superiores, a Escola Superior do Ministério Público promoveu no dia 30 de setembro a palestra “As alterações promovidas pela Lei nº 12.015/09 no artigo 213

do Código Penal”. O evento, realizado no Fórum Criminal da Barra Funda, teve como expositor o Procurador de Justiça aposentado Vicente Greco Filho, e os debatedores Marco Antônio Garcia Baz, Procurador de Justiça, e Walter Tebet Filho, Pro-motor de Justiça Criminal. Estiveram presentes procuradores, promotores de justiça e estagiários do Ministério Público.

O Professor Vicente Greco considerou que, no atual momento da prática de diversos tipos de vio-lência, da preocupação com o respeito à dignidade da pessoa humana, de combate à pedofilia e vio-lência sexual, a reforma só pode ser interpretada a partir desta realidade. “Ameaça-se uma inter-pretação que nega estes componentes, prestigia a violência sexual e afronta o bom senso e o princípio da proporcionalidade e preventividade do Direito Penal”, afirmou.

Para ilustrar os riscos da nova lei sobre os casos concretos, Vicente Greco apresentou uma hipótese. Se em um cativeiro, o agente manter com a vítima conjunção carnal repetida e vários outros atos libi-dinosos, como coito anal ou penetração de objetos,

ESMP debate o novo crime de estupro

palestra

Unificação dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor pode favorecer réus

Page 11: Revista Plural 43

11

estaria caracterizado, de acordo com a doutrina do crime único, o instituto do crime continuado (artigo 71 do Código Penal). No entanto, em consonância com a teoria defendida pelo Professor expositor, cada uma dessas condutas caracteriza um crime diferente, cuja pena seria cumulativamente aplica-da (artigo 69 do Código Penal).

“Não é porque os tipos estão fundidos formal-mente em um único artigo que a situação mudou”, avaliou o procurador. “O que o estupro mediante conjunção carnal absorve é o ato libidinoso em pro-gressão àquela e não o ato libidinoso autônomo e independente dela”.

Consonante com o entendimento de Vicente Greco, no dia 23 de junho de 2010, a quinta turma do STJ adotou a tese de que o novo crime de estupro é um tipo misto cumulativo. Portanto, as condutas de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou praticar ou per-mitir que com ele se pratique outro ato libidinoso, embora reunidas em um mesmo artigo de lei, com uma só cominação de pena, serão punidas individu-almente se o agente praticar ambas, somando-se

as penas. O colegiado entendeu também que, ha-vendo condutas com modo de execução distinto, não se pode reconhecer a continuidade entre os delitos.

A Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, alterou o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal e outros dispositivos, substituindo a antiga denominação de “Crimes contra os costumes” para “Crimes contra a dignidade sexual”.

De acordo com Everton Luiz Zanella, Promotor de Justiça Assessor da ESMP, “o evento foi de gran-de importância para que o Ministério Público possa estabelecer uma linha de atuação institucional, uma vez que, após as exposições e debates realizados na data de hoje, chegou-se à inequívoca conclusão de que o novo crime de estupro (atual art. 213 do Códi-go Penal) é um tipo misto cumulativo, de forma que se o agente, mediante ações distintas, constranger a vítima à conjunção carnal e, também, à prática de qualquer outro ato libidinoso, ele será responsabi-lizado por ambas as condutas, em concurso mate-rial de crimes, sendo inadmissível a figura do crime continuado”.

“Ameaça-se uma interpretação que prestigia a violência sexual e afronta o bom senso e o princípio da proporcionalidade e preventividade do Direito Penal.”

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plural. Diante da crescente demanda e aumen-to populacional do Estado de São Paulo, quais são os principais desafios do Ministério Público Esta-dual na atualidade?

FGV - Para lidar com estar realidade, a institui-ção precisa se organizar e estar preparada com os meios adequados, tanto materiais como de pesso-al. A isto se inclui a informatização, que é o gran-de instrumento que as instituições dispõem para se organizar, estabelecer os seus planos de atuação e fazer a gestão das informações. É neste sentido que temos procurado desempenhar este objetivo desde a primeira gestão, com continuidade na segunda. Incentivamos também diferentes formas de atua-ção dos promotores de justiça: fora dos gabinetes e

entrevista

Fernando Grella Vieira

“Precisamos ampliar o debate sobre o crime organizado”

Eleito por 1.147 membros do Ministério Público – a maior votação da história da instituição – Fernando Grella Vieira foi o primeiro colocado na lista tríplice dos candidatos a procurador-geral de Justiça. Nomeado pelo governador do Estado no dia 22 de março, ele comandará a institui-ção até o final de março de 2012. Caracterizado por um novo modelo de gestão – baseado no profissionalismo, transparência e adoção de crité-rios objetivos para a tomada de decisões – nos últimos dois anos, Fer-nando Grella promoveu o compartilhamento do poder, a fim de pacificar a classe e cultivar um ambiente sereno para as mudanças que se im-punham. Defensor da ampliação do conhecimento e da necessidade do constante aperfeiçoamento dos membros do Ministério Público, o atual procurador-geral aposta no aprofundamento dos debates em todas as áreas de atuação da justiça, especialmente, nas áreas da criminalidade e improbidade administrativa, que carecem de congressos especializados.

através das promotorias comunitárias. Lembramos sempre aos colegas da necessidade do atendimento ao público, que é o grande canal de informações de que o Ministério Público dispõe para tomar conhe-cimento dos problemas sociais de cada localidade. Entendemos também que a criminalidade é um dos maiores problemas a ser enfrentado atualmente. O fenômeno do crime em massa é uma realidade, mas não podemos deixar de reconhecer que o crime or-ganizado nos vários setores é o que maior prejuízo traz para a sociedade. Portanto, temos que atentar para esta realidade através de ações integradas, da implementação do laboratório de combate à lavagem de dinheiro, da criação do Grupo de Atuação Especial de Repressão à Formação de Cartel e à Lavagem de

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Dinheiro e de Recuperação de Ativos. Estamos fa-zendo todo um trabalho de preparação da instituição para esta nova realidade. É uma criminalidade que extrapola os limites do Estado e até os limites na-cionais. Precisamos oferecer aos colegas condições de aprimoramento na sua formação e capacitação, dando a eles condições humanas e materiais para que possamos obter uma resposta razoável.

plural. Quais são as prioridades do MPSP para este ano? Há um planejamento estratégico?

Não temos propriamente um planejamento es-tratégico porque estamos numa fase de organização, mas um plano geral de atuação que elege temas em cada uma das áreas, seja na criminal ou de tutela co-letiva. Para listar estas prioridades, ouvimos os ór-gãos de administração e os colegas das promotorias de justiça da capital e do interior. Corrigimos os da-dos enviados no relatório de diagnósticos, formulado no ano passado, com base nos relatórios de desem-penho do ano anterior. Este relatório de diagnósticos está permitindo que a instituição se organize melhor. Precisamos melhorar o processo da informatização, a estrutura física e a cultura institucional, que deve privilegiar a organização com parâmetros para que possamos partir no futuro para um planejamento estratégico. Será necessário oferecer aos colegas meios para que eles operacionalizem este planeja-mento. Nós completamos no ano passado a nossa rede de informatização. Implantamos o sistema de difusos, para que todos os inquéritos civis e ações civis públicas passem a constar de um registro único para a consulta de todos e para a gestão de informa-ções nesta área. Doravante, poderemos saber qual o volume de ações que temos na área ambiental, de improbidade, sobre o que elas versam. Então, pode-remos falar em planejamento estratégico. Estamos empenhados a construir a partir do ano que vem o banco de dados criminal.

“Nós estamos muito felizes com a atual gestão da Escola. A informação e a capacitação são fundamentais e o aprimoramento é indispensável. A vida é dinâmica, portanto, os conhecimentos precisam ser renovados constantemente, em todas as áreas.”

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plural. De que forma a Escola do Ministério Pú-blico pode contribuir para o alcance dos objetivos institucionais do MPSP?

Muito, e tem contribuído bastante. Nós estamos muito felizes com a atual gestão da Escola. A infor-mação e a capacitação são fundamentais e o aprimo-ramento é indispensável. A vida é dinâmica, portanto, os conhecimentos precisam ser renovados constan-temente, em todas as áreas. Nós pedimos à atual diretora da Escola, a Dra Eloisa, que nos ajudasse a introduzir na nossa instituição dois congressos: o do patrimônio público, que envolve improbidade, e o da área criminal. Ao contrário do que acontece na área ambiental, que já dispõe de congressos há 14 anos, e de habitação urbanística, há sete anos, não temos congressos sobre aqueles temas. Sem estes encon-tros anuais, os colegas não têm a oportunidade de dis-cutir as principais questões relativas a este assunto, portanto, não se forma uma doutrina, uma orientação ou uma linha majoritária de entendimento do Minis-tério Público. Esta é uma grande carência que temos. E a Escola, muito sensível a isso, se pôs à frente e organizou em agosto o 1º Congresso de Improbidade. Ao lado disso, muitos cursos têm sido realizados no sentido de propiciar aos colegas o aperfeiçoamento

desejado. Eloisa tomou o cuidado de consultar as di-versas regiões para colher dos nossos colegas os te-mas e as matérias sobre as quais havia um interesse de se aprofundar o conhecimento. O evento de capaci-tação e treinamento ao combate da lavagem de dinhei-ro, realizado em Bauru, foi muito importante. A Escola vem dando uma excelente contribuição no sentido de propiciar aos colegas o aprimoramento na sua forma-ção, em face das grandes mudanças que assistimos na esfera do conhecimento.

plural. Qual a sua opinião sobre a criação do Conselho Nacional do Ministério Público?

Não sou contrário ao Conselho. Acredito que tem um lado extremamente positivo e que pode aju-dar muito a instituição. É um órgão novo que ainda está procurando construir os limites da sua atuação a partir das diretrizes constitucionais. É natural que algumas decisões sejam passíveis de crítica, que te-nham se excedido de algum modo por terem invadido esferas do Poder Legislativo ou por terem ido além do poder disciplinar conferido pela constituição. Mas tudo isso é normal. É um período de ajustes. No geral, o Conselho soma-se à missão do Ministério Público. Um órgão de controle externo tem o seu papel. Não

“Precisamos oferecer aos colegas condições de aprimoramento na sua formação e capacitação, dando a eles condições humanas e materiais para que possamos obter uma resposta razoável.”

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que fosse indispensável, mas acredito que prejuízo não causará. Poderá tornar mais sólida a instituição.

plural. O que traz mais benefícios para o forta-lecimento do Ministério Público – a independência funcional ou a uniformidade das decisões, funda-mentadas em uma bandeira institucional?

Estamos vivendo um período em que este as-sunto vai se colocar de maneira mais concreta. A independência funcional é, sem dúvida nenhuma, fundamental. Sem ela, não temos promotores ou juízes. O que precisa é estabelecer os limites desta independência funcional, mas nunca colocá-la em dúvida. E quais são os limites? A instituição dizer que um determinado assunto deve ser trabalhado com prioridade interfere na independência funcio-nal? É uma indagação que teremos que discutir com maturidade. Independência funcional não me parece conferir ao promotor a prerrogativa de ele eleger, isoladamente, as prioridades, desconside-rando aquilo que a instituição como um todo enten-deu que deve ser atacado em primeiro lugar.

plural. O que levou o Congresso Nacional a se preocupar em limitar o poder do Ministério Públi-co ao longo dos anos?

É uma questão histórica e cultural. A primeira legislação especifica em matéria de enriquecimen-to ilícito é de 1958, que previa medidas para coibi-lo, no entanto, não previa sanções ou pena. A lei previa apenas o perdimento e conferia legitimidade à pessoa jurídica de direito - as prefeituras, a União, os Estados e os Municípios – e não ao Ministério Público. Foi uma legislação, importante e avançada, mas raramente aplicada. Sucedeu-se, em 1965, a regulamentação da ação popular. Foi quando tivemos este importante instrumento que veio a se prestar à tutela da mora-lidade, da probidade, posta à disposição do cidadão, que pode promover a ação popular. O Ministério Públi-

co participava como ‘custos legis’. Depois, tivemos a Constituição de 1988, que reconheceu que as leis an-teriores não foram suficientes para que a sociedade estivesse protegida e defendida no zelo da coisa públi-ca. Foi criado então o princípio da probidade, que deu ao Ministério Público, no artigo 129, a responsabilida-de pelo zelo pelo patrimônio público e social. A partir da regulamentação desta matéria pela lei 8.429, em 1992, toda a sociedade assistiu a uma grande e inten-sa atuação do Ministério Público no campo da defesa da probidade. Foram instaurados diversos inquéritos civis e ações civis públicas. Isto representou uma novi-dade. Nunca se viu, de maneira tão intensa, iniciativas de controle ou de punição pelo meio judicial de pre-feitos, deputados, vereadores. Os nossos administra-dores públicos não estavam acostumados a terem os seus atos questionados. Seria natural que houvesse – como ainda há – uma reação ao Ministério Público. A lei tem sido muito positiva. Se há hoje a proibição do nepotismo e uma redução no número de vereadores nas câmaras municipais, isso se deve ao Ministério Público. Assim, tantas outras regras e preceitos fo-ram construídos pelo Judiciário a partir de ações civis públicas nesta área da improbidade movidas pelo MP. É lógico que isso contraria interesses e não agrada ao segmento político. São ações que expõem o homem público ao questionamento. O Ministério Público está pagando o preço por esta atuação como braço da so-ciedade. O projeto de lei de autoria do deputado Pau-lo Maluf é um equivoco. Acena punições de caráter subjetivo, que vão gerar inseguranças e inibir o bom promotor de justiça de atuar. Não precisamos de mu-danças neste sentido porque o nosso ordenamento já prevê mecanismos e órgãos para apurar e punir os abusos cometidos. Na grande maioria dos casos, a iniciativa do Ministério Público é legitima, com o intui-to de acertar dentro da lei e favorecer a sociedade.

Entrevista realizada em 5 de julho de 2010

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Nos últimos 18 anos, desde que o Ministério Público passou a ter entre as suas atribuições a fiscalização da probidade dos agentes públicos, finalmente, o Brasil pôde contar com um combate mais efetivo à corrupção nas três esferas do poder. De 1992 a 2009, a instituição ajuizou 764 ações de improbidade ad-ministrativa e cobrou o retorno de R$ 32 bilhões ao erário. Quase R$ 6 bilhões em valores e bens já foram bloqueados pela justiça. Desde 2003, 2.356 pessoas físicas e jurídicas foram condenadas em todo o País por atos de improbidade, principalmente pelo uso do dinheiro público para proveito pessoal ou para acei-te de suborno. A corrupção tem um custo médio anual para o Brasil entre R$ 41,5 bilhões a R$ 69,1 bilhões.

Seis bilhões de reais de volta aos cofres públicos

Congresso apresenta o balanço dos 18 anos da lei de improbidade administrativa

capa

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O Ministério Público do Estado de São Paulo – que contribuiu com mais de 300 emendas durante a formulação do Projeto da Lei de combate à improbi-dade – é o responsável por quase metade das con-denações judiciais por este tipo de crime no País. No entanto, segundo dados da ONG Transparência Brasil, caminhamos a passos lentos no escopo in-ternacional, ocupando o 75º lugar no ranking da percepção social da corrupção.

Para realizar um balanço dos 18 anos da Lei de Improbidade Administrativa, a Escola Superior do Ministério Público e a Procuradoria Geral de Justiça, com o apoio da APMP, realizaram, entre os dias 18 e 21 de agosto, o I Congresso Patrimônio Público e Social do Ministério Público do Estado de São Paulo. Participaram do evento 180 promotores de justiça de 21 estados brasileiros, que tiveram uma oportunida-de inédita na troca de experiências com os colegas. “Concretizamos um sonho, promovendo um evento democrático, saudável e extremamente produtivo”, avaliou o Procurador Geral de Justiça Fernando Grella Vieira. Em paralelo aos debates e exposições, foram apresentadas durante o evento 24 teses relati-vas ao tema elaboradas por membros do MP.

Estudos revelam que o dinheiro público desviado em apenas um ano seria suficiente para elevar dos atuais 34 milhões para 51 milhões o número de alunos

“A Convenção de Mérida não trata apenas do âmbito criminal, mas também visa retirar o dinheiro do corrupto”Silvio Marques, promotor de justiça

matriculados na rede pública de ensino. Na saúde, se-ria possível dobrar o número de leitos hospitalares do SUS em apenas um ano. “Cada R$ 50 mil desviados do erário representam a morte de uma criança”, afirmou a Procuradora de Justiça Eloisa de Sousa Arruda, di-retora da Escola Superior do Ministério Público.

O Congresso contou com a exposição de con-vidados ilustres, entre eles, Gilson Dipp e Antônio Herman de Vasconcelos e Benjamin, Ministros do STJ; Maria Schnebli, membro do Ministério Público Federal da Suíça; Adam Kauffman, membro do Mi-nistério Público de Nova York, além dos promotores de justiça que se destacam pelas ações na área, en-tre eles, Silvio Marques, Saad Mazloum, Alexandre Mauro Alves Coelho e Wallace Paiva Martins Júnior. O evento também contou com a participação dos renomados jornalistas Eliane Cantanhêde, da Folha de S. Paulo; Marcelo Beraba, do Jornal O Estado de São Paulo, e Roberto Cabrini, do SBT, que aborda-ram o papel da imprensa no combate à corrupção.

“A lei de improbidade trouxe grandes benefícios, mas os seus mecanismos ainda são insuficientes para o combate à corrupção”, afirmou Gilson Dipp, ao defender mudanças legislativas que permitam a responsabilização criminal de pessoas jurídicas envolvidas em atos de corrupção (previstas no Pro-jeto de Lei 6826/2010). O ministro ressaltou que,

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dos crimes antecedentes à lavagem de dinheiro, a corrupção é o que gera maior lucro às organizações criminosas, superando até mesmo o tráfico interna-cional de drogas, o tráfico de pessoas, a pirataria e o contrabando. “O afastamento cautelar do investiga-do é fundamental para a credibilidade da sociedade na justiça”, afirmou o Ministro, considerando que o foro privilegiado é um dos maiores empecilhos no combate à impunidade. “A sua extensão é inconce-bível no Brasil”.

Além da avaliação crítica da Lei de Improbidade e a apresentação de resultados concretos, o Con-gresso do Patrimônio Público também cumpriu o seu papel na capacitação de promotores de justiça

IMPROBIDADE EM NÚMEROS* Dados coletados entre 1992 e 2009

764 é o número de ações propostas com

base na lei 8.429/92 (lei de improbidade

administrativa)

R$ 32 bilhões é o montante cobrado ao

erário

R$ 6 bilhões é o total bloqueado aos

cofres públicos

2,3 mil pessoas físicas e jurídicas foram

condenadas por atos de improbidade

601 agentes públicos foram afastados de

suas funções

1.347 pessoas tiveram suspensos os

direitos políticos

na utilização de uma importante ferramenta do pro-cesso investigatório - a cooperação jurídica inter-nacional. Entre os maiores expoentes do Ministério Público que contaram com o apoio jurídico de ou-tros países, destaca-se o promotor de justiça Silvio Marques, responsável pelo bloqueio dos bens do deputado Paulo Maluf no Brasil e no Exterior. “A Convenção de Mérida não trata apenas do âmbito criminal, mas também visa retirar o dinheiro do corrupto”, afirmou o promotor, ressaltando que a norma que regulamenta a cooperação entre os paí-ses no combate à corrupção, também criminaliza o enriquecimento ilícito e o tráfico de influências pra-ticado por agentes públicos.

Para apresentar um panorama prático da cola-boração multilateral, Maria Schnebli ressaltou que o Brasil é o país que mais encaminha pedidos de coo-peração à Suíça, que conta com assistentes técnicos de bancos para auxiliar nas investigações de lavagem de dinheiro. “O Estado requerido analisa o pedido do Estado requerente com base no seu próprio Código, através de analogias”, afirmou a promotora de justiça da Suiça, ressaltando a importância de que as cartas rogatórias, penal e civil, sejam encaminhadas em con-junto, para que os promotores de cada área saibam que se trata do mesmo objeto de investigação.

A experiência internacional também foi relatada pelos promotores de justiça Daniel Alonso e Adam Kaufmann, do Ministério Público de Nova York, que apresentaram os resultados do sistema norte-americano de transação penal, pelo qual o réu pode fazer um acordo com a promotoria, declarando-se culpado para evitar o julgamento. Alonso citou o caso do desmantelamento da máfia Cosa Nostra, que operava em Nova York em um forte esquema de crimes e lavagem de dinheiro. Atualmente, gra-ças a atuação do Ministério Público, o grupo é visto apenas como uma “gangue de rua comum”. “Pro-cessamos os chefes das cinco maiores famílias da

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máfia nova-iorquina”. Os promotores destacaram a importância dos informantes para a obtenção de provas contra os corruptos, além de réus colabora-dores que admitem a culpa em troca da flexibiliza-ção da pena e depõem em juízo contra outros crimi-nosos. “A barganha é uma ferramenta importante no combate à corrupção”, disse Alonso.

Adam Kaufmann, conhecido entre os brasileiros pela parceria estabelecida com o Ministério Público de São Paulo no combate à corrupção sem frontei-ras, analisou uma operação conjunta entre autori-dades brasileiras e americanas para desmontar um esquema de remessa ilegal de dinheiro do Brasil para paraísos fiscais, por meio do escritório Bea-con Hill, sediado em Nova York. “Com a velocidade que as organizações criminosas operam, jamais te-remos acesso a todo o esquema”, disse o promo-tor. “Cada um de nós terá apenas a parte do todo de um crime financeiro”. Entre as práticas citadas, Kaufmann ressaltou o Hawalla System, que promo-ve virtualmente o desvio do dinheiro. Os doleiros já possuem contas no exterior e apenas autorizam, via telefone ou fax, a transferência da quantia. “É impossível seguir o dinheiro sem uma cooperação entre a jurisdição de origem da transferência e do

“Devemos buscar nas ações de licitação a prova do prejuízo, comparando o preço adquirido com o menor preço de mercado”Evelise Pedroso Prado VieiraProcuradora de Justiça

Acima, os jornalistas Eliane Cantanhêde, Marcelo Beraba e Roberto CabriniAbaixo, os promotores de justiça americanos Daniel Alonso e Adam Kaufmann

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destino”, afirmou. A investigação realizada pelo promotor de justiça em Beacon Hill se iniciou a partir de um simples telefonema. Um agente dis-farçado ligou para o banco e pediu informações so-bre como transferir o dinheiro de forma ilegal, sem pagar os devidos impostos. “No mesmo momento, o banco o instruiu sobre como fazer”. Segundo Adam Kaufmann, os promotores americanos podem obter a quebra do sigilo bancário de pessoas sob investi-gação sem necessidade de autorização judicial.

Entre as técnicas de investigação dos atos de improbidade administrativa, a Procuradora de Justiça Evelise Pedroso ressaltou a importância do olhar atento do MP aos contratos públicos. “Deve-mos buscar nas ações de licitação a prova do pre-juízo, comparando o preço adquirido com o menor preço de mercado”. O promotor de justiça Alexan-dre Coelho, que afastou e prendeu o prefeito da sua comarca após 114 medidas cautelares, apre-sentou ricos relatos na sua experiência com as di-versas técnicas de investigação, ressaltando que a prática premeditada da corrupção ocorre ainda na fase de elaboração dos projetos. “O esquema do

desvio já está previamente montado antes mesmo da execução da obra”, disse o promotor, conside-rando que a carta convite por si já viola o princípio da impessoalidade.

“Até hoje, o MP tem se concentrado na perse-cução dos ímprobos”, afirmou o Ministro Hermann Benjamin. “Precisa atacar na redução das oportuni-dades de improbidade administrativa”. Entre outras mudanças, o Ministro defendeu a inversão do ônus da prova na investigação dos atos de improbidade. “Os profissionais liberais ou agentes públicos que enriqueceram de forma desproporcional aos seus ganhos devem provar como o fizeram”, disse.

Também participaram do Congresso do Patri-mônio Público Márcio Fernando Elias Rosa, Sub-procurador Geral de Justiça de Gestão; Cláudio Ferraz de Alvarenga, Vice-Presidente do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo; Tiago Cintra Es-sado, Promotor de Justiça; José Roberto Pimenta Oliveira, Procurador da República; Márcio Camma-rosano, Advogado; Cláudio Abramo, Presidente da ONG Transparência Brasil; e Jorge Donizete San-chez, Presidente da Amarribo.

Evento reúne promotores de justiça de todos os estados brasileiros

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Durante o Encontro Nacional de Coordenado-rias de Infância e Juventude, promovido no plená-rio do CNJ no dia 16 de abril de 2010, foi definida a realização da “Semana Nacional das Audiên-cias Concentradas”, a partir do dia 27 de julho, com a participação de todo o Poder Judiciário. O objetivo da norma é revisar a situação pessoal e processual das crianças acolhidas institucional-mente. Para discutir o tema e esclarecer as dú-vidas relativas à determinação, a Escola Superior do Ministério Público promoveu no dia 23 de julho a oficina “As Audiências Concentradas e a Lei de Adoção: Aspectos Práticos”, realizada no auditó-rio da Associação Paulista do Ministério Público. O evento foi transmitido simultaneamente, via in-ternet, a 89 promotores de justiça e demais ope-radores do direito.

O evento, de caráter prático, contou com a ex-posição de quem lida diariamente com as varas da infância - os promotores de justiça Lélio Ferraz de Siqueira Neto, 5º Promotor de Justiça de São Ca-etano do Sul; Carlos Cabral Cabrera, 3º Promotor de Justiça da Praia Grande; Fernando Henrique de

As audiências concentradas são obrigatórias?

oficina

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Moraes Araujo, 5º Promotor de Justiça de Mogi das Cruzes; e Luis Roberto Jordão Wakim, 7º Promotor de Justiça de Barueri.

Os membros do Ministério Público traçaram um panorama das implicações práticas da Lei 12.010/09 – a Lei Nacional de Adoção - que tem o objetivo de acelerar os processos e impedir que crianças e adolescentes permaneçam mais de dois anos em abrigos públicos. Apesar da busca pela celeridade do judiciário, a lei não versa concretamente sobre a realização das audiências concentradas, propos-tas em forma de instrução normativa pelo CNJ. “As audiências concentradas não estão previstas em lei, portanto, não são obrigatórias”, explicou Lélio, acrescentando que a recomendação do Tribunal de Justiça de São Paulo também não é vinculante. “A idéia é boa no sentido de traçar um plano para or-ganizar o processo, mas concentrar as audiências pode ter conseqüências complicadas”.

Fernando Henrique alertou para o risco de que as audiências concentradas resultem em mais bu-rocracia para o trâmite processual. “Podem atrasar a saída da criança do abrigo porque o juiz terá cen-tenas de audiências para deliberar em pouco tem-

Oficina: “As Audiências Concentradas e a Lei de Adoção - Aspectos Práticos” Data: 23 de julho de 2010

po”, afirmou o promotor. “Eles não vão conseguir dar conta de todos os processos da noite para o dia”.

Cabral pontuou de forma clara a inviabilidade da medida pela falta de estrutura do judiciário. Segun-do ele, os poucos técnicos credenciados ao Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) não terão as condições necessárias para atender aos milhares de casos individuais de menores. “Ainda que os promotores de justiça consigam dar conta das ações, os cartórios não vão conseguir acompa-nhar o ritmo”, acrescentou o promotor de justiça da Praia Grande.

Wakim e Fernando Henrique apresentaram aos promotores de justiça alguns procedimentos e fer-ramentas jurídicas práticas para lidar com a nova instrução normativa.

Na plateia, estavam reunidos promotores de justiça, psicólogos e assistentes sociais. O público foi unânime no entendimento de que falta estrutura para atender à demanda do CNJ, elaborada de tal forma extraordinária.

Promotores de justiça alertam para o risco de aumento da burocracia no trâmite processual

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O que está por trás da capitalização de jurosEspecialistas demonstram o risco do superendividamento causado pelos juros compostos

Com o objetivo de abordar questões teóricas e práticas, discutindo a capitalização de juros e os seus reflexos para o consumidor, a Escola Superior do Mi-nistério Público e o CAO Cível e de Tutela Coletiva pro-moveram no dia 6 de agosto a oficina ‘O Consumidor e a Capitalização de Juros’.

Anísio Costa Castelo Branco, perito judicial e fun-dador do Instituto Nacional de Proteção ao Consumi-dor, diferenciou os juros compostos da Tabela Price e os juros simples do Método de Gauss. O matemático esclareceu que a Lei 9.514/97, que dispõe sobre o sis-tema de financiamento imobiliário, não define o tipo de capitalização que deve ser aplicado. “Os bancos utilizam os juros simples ou compostos a depender do que seja mais interessante”, disse.

O perito explicou que os sistemas de amortização a juros simples ou juros compostos resultam no mes-mo valor em financiamentos até 12 meses. A longo prazo, a Tabela Price (juros compostos) torna-se ex-tremamente onerosa.

Neide Ayoub, economista e técnica da Fundação PROCON, afirmou que o órgão pretende implantar o Método Gauss para amparar a população que preten-de entrar com ações contra os juros calculados atra-vés da Tabela Price. “Os juros compostos, em longo prazo, promovem a onerosidade excessiva”, afirmou a economista. “Permite com que as pessoas que não têm condições tornem-se superendividadas em lon-gos financiamentos”. De acordo com os dados de uma pesquisa apresentada pela economista, pessoas com

Dados do IBGE e do Banco Central revelam que 42 milhões de brasileiros sofrem com o endividamento crônico, sem qualquer perspectiva de quitar as suas dívidas. Quase 85% das famílias brasileiras têm despesa superior à renda e buscam nas facilidades do crédito a chance de adquirir bens e imóveis. As oportunidades são tentadoras e nem toda a população, nem mesmo os operadores do Direito, têm consciência do que está por trás dos juros oferecidos nos longos financiamentos. A legislação, que deveria regular, mostra-se confusa e contraditória, permitindo a existência de juros que apenas remuneram os juros que já estão sendo cobrados pelas instituições financeiras.

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apenas sete anos de estudo terão uma elevação sa-larial muito pequena no decorrer da vida economica-mente ativa e, portanto, dificuldades para quitar finan-ciamentos de longo prazo pela Tabela Price, por um sistema de amortização com prestações constantes.

“O Produto Interno Bruto não pode ter o seu cres-cimento sustentado à custa do consumo das famílias da forma que vem ocorrendo, ou seja, apoiado mais no crédito do que no aumento da massa salarial”, afir-mou a economista ao alertar sobre o crescimento do número de consumidores com dívidas que superam consideravelmente a renda familiar, conforme reve-lam pesquisas sobre o endividamento das famílias, realizadas pelos mais diversos institutos. Em 2000, o PROCON contabilizava quase 300 mil reclamações de onerosidade dos juros bancários. No ano passado, este número chegou a 570 mil. Em 2009, 17% destas reclamações de referiram às taxas abusivas de finan-ciamento. A inadimplência do crédito pessoal com atraso de mais de 90 dias chega a 56% do total de em-préstimos, o equivalente a R$ 7,7 milhões.

No período de 04/09 a 3/10, das reclamações fundamentedas da Área de Assuntos Financeiros - as quais representam aproximadamente 25% do total das reclamações no órgão, cerca de 70% de-correram de contratos de cartões de crédito/loja, empréstimo consignado e de financiamentos. A inadimplência no crédito pessoal com atraso su-perior a 90 dias chega a 56% do total de contratos, o equivalente a R$ 7,7 milhões, conforme levanta-mento do Inepad - Banco Central. . “Pretendemos

inserir ao tema do superendividamento uma abor-dagem emocional através de Intervenções Psicoe-ducassionais com o Grupo Avançado de Transtornos do Controle do Impulso, formado por profissionais da Psiquiatria do Hospital das Clínicas”, afirmou a técnica do PROCON, que defende que o Banco Cen-tral, como uma agência reguladora, tenha a res-ponsabilidade por estabelecer junto às Instituições Financeiras programas eficazes de conscientização a população antes excluída do mercado de crédito.

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Amaury Martins de Oliva, co-ordenador jurídico do Departa-mento de Proteção do Direito do Consumidor da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, falou sobre a juris-prudência relativa ao tema, entre elas, o Decreto 22.626, de 7 de abril de 1933, que proíbe a contabilização de juros sobre os juros nos contratos. O coordenador também apresentou a sú-mula 121 do STF que veda a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada.

No entanto, após a súmula do STF, a Lei 11.977/09 (Minha Casa, Minha Vida) passou a permitir a capitali-zação de juros, a Tabela Price e o livre pacto entre as partes do sistema de amortização do saldo devedor. “O sistema jurídico ficou confuso e contraditório”, ponderou o coordenador que apresentou ainda um recurso especial repetitivo do STJ que veda a capita-lização de juros em qualquer periodicidade nos con-tratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação até 1999.

Dados do Ministério da Fazenda revelam que o programa ‘Minha Casa, Minha Vida’ viabiliza a aqui-sição de uma unidade habitacional de R$ 40 mil para 26,8 milhões de pessoas, enquanto o Sistema de Amortização Constante (SAC) restringiria este núme-ro para 19,2 milhões de pessoas. Se o valor de R$ 100 mil for financiado em 360 meses pelo SAC a uma taxa de 1% ao mês, os juros pagos seriam de R$ 180 mil. Pela Tabela Price, nas mesmas condições, o va-

lor pago chegaria a R$ 270 mil, montante inviável para grande parte deste público.

Amaury ressaltou ainda que o consumidor tem o direito de modificar as cláusulas con-tratuais que geram onerosida-

de excessiva ou desproporcional. “A capitalização de juros é incompatível com o equilíbrio contratual ga-rantido pelo Código de Defesa do Consumidor”.

Roberto Senise Lisboa, 5º promotor de justi-ça do consumidor, fez uma avaliação crítica dos aspectos legais do financiamento. “O desconhe-cimento dos operadores do Direito em relação ao tema se expressa no histórico legislativo da nos-sa jurisprudência”, afirmou o promotor, que con-sidera a alta taxação dos juros uma conseqüên-cia do período histórico em que o País precisava crescer. “O objetivo do crescimento econômico não pode prevalecer ao social nos dias de hoje. A legislação é muito flexível com a cobrança de juros sobre juros quando praticada por instituição financeira.”

Os palestrantes foram unânimes ao considerar a Tabela Price como uma opção extremamente one-rosa ao consumidor. “Significa o acesso de grande parte da população à linha de crédito que, muitas vezes, não terá condições de amortizar a dívida”, afirmou Amaury. “Financiar pela Tabela Price em longo prazo é um suicídio econômico e financeiro”, finalizou Anísio Castelo Branco.

A inadimplência

no crédito pessoal

com atraso superior a

90 dias chega a 56%

do total de contratos,

o equivalente

a R$ 7,7 milhões,

conforme levantamento

do Inepad -

Banco Central.

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O ‘11 de agosto’ ganha mais um motivo para se re-afirmar como um marco na história. Foi na consagra-da data de instalação dos cursos jurídicos no Brasil que ocorreu o 1º júri simulado do Ministério Público de São Paulo. O evento mobilizou mais de 300 estagi-ários da instituição, que se inscreveram para assistir como ouvintes ou participar como promotor de justi-ça, defensor, réu e testemunhas.

“É fundamental que os estagiários do Ministério Público participem de júris simulados, quer para des-pertar o interesse pela atuação tão importante e de tanta visibilidade do Promotor de Justiça, quer para prepará-los para o início de suas carreiras”, afir-mou Eloisa de Sousa Arruda, Procuradora de Justiça

Dilermando de Assis, absolvido na vida e na arteA defesa vence o 1º júri simulado do Ministério Público de São Paulo

e Diretora da Escola Superior do Ministério Público. Foi escolhido como tema para o 1º júri simulado o

emblemático caso da acusação do cadete Dilermando de Assis pela morte do célebre escritor brasileiro Eu-clídes da Cunha, em 1909.

“A dimensão psicológica dos envolvidos, a gran-de repercussão dos fatos e o clamor público gerado à época puderam ser sentidos pelos estagiários. As dificuldades da apreciação das provas exigiram que eles se debruçassem não somente sobre o institu-to da legítima defesa, mas também analisassem as circunstâncias que envolveram o ocorrido, com forte carga emocional”, avalia o promotor de justiça Eduar-do Campana, assessor da ESMP.

No júri simulado, a arte imitou a história. Assim como no julgamento real, realizado em 1911, no si-mulado, Dilermando também foi absolvido. Por cinco votos a dois, o júri decidiu que o cadete agiu por legíti-ma defesa, rejeitando a tese de homicídio qualificado por motivo torpe, apresentado pela promotoria.

“Fiquei muito feliz com a experiência. Desde que entrei na faculdade, decidi que queria ser promotor. Foi interessante conhecer o outro lado e fazer a de-fesa do réu”, afirmou Felipe da Silva Almeida, esta-giário do Ministério Público e estudante do 4º ano do curso de Direito. “Achei que seria mais difícil, mas fluiu bem na hora”.

matéria

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O júri, organizado pela Escola do Ministério Público de São Paulo com o apoio das estagiárias Maria Caro-lina da Rocha Medrado e Mariana Corrêa Viana, trouxe como juiz do processo o magistrado Maurício Fossen, do II Tribunal do Júri da Capital e, no corpo de jurados, Mauro Aranha, conselheiro do Cremesp e presidente do Conselho Estadual de Políticas sobre Drogas; José Vicente, reitor da Unipalmares; Ilana Casoy, pesqui-sadora de crimes violentos e assassinatos em série, e Maurício Ferraz, repórter da Rede Globo.

Participaram como promotores de justiça Ra-fael Henrique de Souza Victorio e Selma Regina de Paula; e como defensores, Felipe da Silva Almeida e Thais de Cássia dos Santos. Pedro de Mattos Russo figurou como Dilermando de Assis; Thiago da Cunha Machado, como Dinorah Cândido de Assis – irmão de Dilermando; Ana Paula Ramires Bittencourt, como Anna Emília Ribeiro da Cunha – esposa de Euclides da Cunha; e Karina Suelen Santos, como Celina Fontai-nha Medeiros – testemunha presencial. Para conferir realidade ao simulado, todos os personagens vestiam figurino de época.

O cenário não poderia ser mais adequado à im-portância do evento. O julgamento foi realizado na imponente e suntuosa sala da Tribuna do Júri do Tribunal de Justiça de São Paulo, inaugurado no dia 17 de abril de 1927. Atualmente, o espaço está aber-

to apenas para visitação e realização de cerimônias. O mobiliário da sala do júri, tombado pelo patrimô-nio histórico, exibe ricas peças trabalhadas em de madeira de lei, vitrais com deuses gregos que sim-bolizam a justiça, dois grandes lustres clássicos e uma grande cúpula ornamentada.

Entre os julgamentos célebres que se desenrola-ram na Tribuna do Júri no início do século XX, estão o caso da mãe que matou o filho para não vê-lo marca-do com a pecha de ladrão, conhecido como o “Crime da Rua Salete”; e o julgamento do italiano Giuseppe Pistone, que esquartejou a mulher e tentou embar-car com as parte do corpo dentro de uma mala.

O júri simulado do cadete Dilermando, cujo caso transborda os principais elementos das grandes tra-gédias – com requintes de emoção, ciúmes e paixões – encontrou o espaço perfeito para a sua realização. A Tribuna do Júri, palco dos grandes julgamentos de crimes passionais dos anais da justiça brasileira.

“A imponência do salão do júri ‘Desembargador Paulo Costa’ é uma inspiração para todos aqueles que, pela primeira vez ou não, assistam a um Júri simulado, mas igualmente alerta para o significado da solenidade dos julgamentos, das fórmulas sa-cramentais, e acerca da responsabilidade do Juiz, do Jurado, do Ministério Público e da Defesa”, afir-ma Eduardo Campana.

Foto página ao lado, estagiários participam de júri como os personagens da trama

Julgamento ocorreu na sala do júri do Tribunal de Justiça de São Paulo

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Eloisa de Sousa Arruda recebe homenagem da OAB-SPInstituição reconhece o trabalho de mulheres na promoção da justiça

Homenagem

Na quinta-feira, 9 de setembro, a Procuradora de Justiça Eloisa de Sousa Arruda, Diretora da Es-cola Superior do Ministério Público, foi homenage-ada pela OAB-SP com o prêmio Maria Immaculada Xavier da Silveira, que reconhece o trabalho signifi-cativo de mulheres na promoção da justiça no País.

“As 13 laureadas com o prêmio este ano hon-ram a participação feminina na esfera jurídica e continuam o pioneirismo de Maria Immaculada”, afirmou Luiz Flávio Borges D’Urso, presidente da OAB-SP, em referência à mulher que, há mais 75 anos, superou obstáculos e se tornou a primeira advogada do País.

Na premiação, o trabalho de Eloisa Arruda foi destacado pela bravura, coragem e senso de justi-ça com que conduz a sua vida profissional. Eloisa, a primeira mulher na direção da Escola Superior em 23 anos, também foi a primeira e única promoto-ra brasileira a atuar na criação do Tribunal Penal, instituído durante a administração transitória da ONU no Timor Leste, participando ativamente da reconstrução do país assolado pela guerra. No Tri-bunal do Júri, se destacou pela assertividade das suas ações e como diretora da ESMP, pela dedica-

ção ao resgate do papel acadêmico da instituição. “É surpreendente o crescimento da participa-

ção da mulher nas várias esferas da justiça nesses últimos 75 anos. Partimos de uma única advogada no ano de 1935 e contamos hoje com mais de 50% de mulheres integrando os quadros da OAB-SP. No Ministério Público e na Magistratura, os índices de aprovação de mulheres nos concursos públicos também vêm crescendo a cada ano”, avalia Eloisa Arruda. “Isso reflete a diminuição do preconceito nas instituições e o esforço das mulheres na con-quista do seu espaço no mundo jurídico”.

Entre as homenageadas, estão a procuradora do Estado e professora Flávia Cristina Piovesan – auto-ra de diversos livros na área de Direitos Humanos – e a advogada Silvia Carlos da Silva Pimentel, que co-ordena pesquisa do Comitê Latino Americano e do Caribe da ONU para a Defesa dos Direitos da Mulher.

“Fico feliz em homenagear mulheres que fazem a justiça ser mais equilibrada e feminina”, afirmou Fabíola Marques, presidente da Comissão da Mulher Advogada, responsável pela realização do evento.

Confira a relação completa das homenageadas no site www.esmp.sp.gov.br

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Dados da Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente revelam que a cidade de São Paulo lança 15 milhões de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera. Do total utilizado na combustão do petróleo (75%), a frota de veículos a diesel é res-ponsável por 30% das emissões e os veículos a ga-solina contribuem com 25%. Os resíduos sólidos na capital paulista produzem 23% da geração destes gases, em especial, o metano.

Entre as possibilidades de alteração no Plano Di-retor, está o planejamento e controle da aglomeração urbana, com o objetivo de melhorar a ocupação ra-cional do solo, a distribuição de recursos e ofertas de trabalho para a diminuição dos deslocamentos diários na cidade. São Paulo tem cerca de 400 mil imóveis de-socupados no centro expandido da cidade, enquanto mais de 3 milhões de pessoas vivem em 1,5 mil favelas e, pelo menos, mil loteamentos irregulares.

Com o objetivo de reavaliar os impactos sociais e ambientais das mudanças climáticas; as interações entre o uso e ocupação do solo urbano e águas sub-terrâneas; e a relação da sociedade civil com a revi-são do Plano Diretor de São Paulo, a Escola Superior do Ministério Público e o CAO Cível e de Tutela Co-letiva – Áreas da Habitação e Urbanismo e do Meio Ambiente – promovem o Seminário: “Planejamento Municipal: Mudanças Climáticas e a Sustentabilidade dos Aquíferos”, nos dias 11 e 12 de agosto.

O evento contou com o apoio do Sindicato da In-dústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP) e do Sindicato das Empresas de Com-pra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Re-

Por uma nova São PauloSeminário reúne especialistas para discutir as mudanças climáticas, a sustentabilidade dos aquíferos e o planejamento municipal na capital paulista

sidenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP). “O planejamento urbano influencia na nossa qualidade de vida, do nosso humor, da nossa saúde”, afirmou o procurador Jorge Luiz Ussier, ao ressaltar a impor-tância do evento. “Precisamos lutar por uma cidade possível que garanta bem estar para a nossa popula-ção”, afirmou a promotora de justiça Karina Keiko Ka-mei, assessora da ESMP e organizadora do seminário.

José Police Neto, vereador do município de São Paulo, falou sobre os avanços no processo revisio-nal do Plano e como são aproveitadas as informa-ções técnicas nos trabalhos do executivo e do legis-lativo. “Precisamos reconhecer como a cidade de São Paulo vai determinar em qual região da cidade é recomendado edificar ou não e a intensidade do uso do solo urbano”. O plano diretor tem que apon-tar a cidade possível à luz dos critérios da sustenta-bilidade e do crescimento econômico.

“São Paulo já se encontra no seu limite de sustentabilidade ambiental”, afirmou Ros Mari Zenha, representante do Movimento Defenda São Paulo, ao lembrar do aumento na cidade do número de tempestades abruptas e dias quen-tes, além do crescimento das áreas horizontal e vertical, gerando as ilhas urbanas de calor. “A verticalização na cidade não atende à finalida-de do aumento da densidade populacional e não traz benefícios ao meio ambiente”, ponderou. O debate foi enriquecido com a presença dos es-pecialistas do IPT e do Instituto Astronômico e Geofísico da USP, que apresentaram diferentes perspectivas para uma nova São Paulo.

seminário

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A prática do bullying tem efeitos silenciosos e invisíveis sobre as suas vítimas. Segundo relató-rio da UNICEF, cerca de 40% das crianças e jovens brasileiros são vítimas de bullying. Na maioria das vezes, sofrem calados e evitam partilhar com os pais a dor e a humilhação a que são expostos. O pá-tio da escola, nem sempre fiscalizado pela direção, torna-se o palco das agressões. Em casa, o menor também não está protegido. A exposição vergonho-sa encontra eco na prática do cyberbullying (humi-lhação em comunidades de relacionamento na in-ternet), que facilita o anonimato do agressor e viola, sem fronteiras, a dignidade do agredido.

Para debater o tema, a Escola Superior do Mi-nistério Público do Estado de São Paulo promoveu a palestra “Educar para a convivência: os riscos intra e interpessoais do cyberbullying”, no dia 24 de agosto. A instituição convidou ao debate Gabriel Chalita, doutor em Direito e em Comunicação e Se-miótica e mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP; Lélio Ferraz de Siqueira Neto, promotor de justiça e coordenador da área do CAO Cível e de Tutela Co-letiva – Infância e Juventude; Luis Fernando Rocha, 1º promotor de justiça de Paraguaçu Paulista, e Luis Antônio Miguel Ferreira, promotor de justiça e coordenador da área do CAO Cível e de Tutela Co-letiva – Educação.

Apesar das diferentes abordagens de caráter interdisciplinar, todos os palestrantes foram unâ-nimes ao considerar que o tema não pode ser tra-tado de forma autoritária e repressora. Antes da

O mal da invisibilidadeGabriel Chalita debate o Bullying com promotores de justiça, professores e psicólogos

responsabilização do agressor, é prioritária a preo-cupação com o acolhimento à vítima e a contextuali-zação do fato. “A situação é complexa. Não podemos esquecer que o agressor também pode ser vítima do bullying”, avaliou o promotor Luis Fernando Rocha.

“Quanto mais pesado a gente lida com o bullying, pior ele fica”, avaliou Gabriel Chalita – autor do pro-jeto de lei que dispõe sobre a inclusão de medidas de conscientização, prevenção e combate ao bullying no projeto pedagógico das escolas. Chalita ressal-tou que, muitas vezes, o ato é praticado de forma inconsciente até mesmo pelos professores, através de comentários preconceituosos ou encorajando a exclusão em sala de aula. “Não se trata de maldade, mas ignorância. Muitos percebem o bullying como uma brincadeira inofensiva”. “Quanto mais admira-dos são os professores, maior o impacto das suas frases sobre os seus alunos”.

Chalita citou o exemplo de uma garota que tentou suicídio após uma piada racista da professora que

palestra

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mais admirava. A mãe encontrou a filha estirada no chão e uma carta ao lado: “Por que nasci negra?”, indagou a garota no bilhete. Chalita ressaltou que a febre de avaliação em provas e seleções – promovi-das em algumas instituições de ensino, a partir dos 2 anos através de ‘vestibulinhos’ – também pode reforçar o sentimento de inferioridade. “Os pro-fessores podem prevenir o bullying trabalhando as emoções de cada um dos seus alunos, não apenas o rendimento”, afirmou. “O afeto é uma forma de retirar o outro da invisibilidade”.

O promotor de justiça Luis Antônio Miguel Ferrei-ra falou dos diversos tipos de bullying – que pode ser físico, verbal, social, direto ou indireto – e do risco da ‘inclusão excludente’, quando o aluno está incluído na escola, mas excluído pelos colegas. “Há algum tempo nos preocupamos com a inclusão dos dife-rentes até a porta da escola. Precisamos olhar para o que ocorre dentro dela”, afirmou. O promotor citou exemplos que comprovam os danos psicológicos do bullying sobre as suas vítimas, como o caso de um garoto que ameaçou colocar uma bomba na escola para tentar se livrar das agressões. “O bullying não é um rito de passagem, mas um grave problema so-cial que pode transformar vítimas em agressores”.

Dos casos que encontrou na vara da infância e juventude, o promotor Luis Fernando Rocha, que também é mestre em psicologia, citou o exemplo de um adolescente que ficou 10 anos sem sair do quarto após ter sido vítima de bullying. “Um dia, ele chegou em casa, jogou os livros no chão e disse que jamais voltaria a escola”. O menino sobrevi-veu por uma década num quarto escuro, adaptado com um banheiro, enquanto assistia tevê embaixo de um cobertor. Os pais permaneciam omissos. “Os promotores precisam sair do gabinete e ver de perto a situação destes menores”, avaliou. Apenas após longas visitas do promotor de justiça à sua casa, o jovem revelou as causas do seu isolamen-to social. Ele foi ridicularizado pela professora por ser ‘branco demais’.

Consonante com a importância do atendimen-to comunitário à população e a quebra do cordão de isolamento que separa os promotores da sociedade, Lélio Siqueira criticou a percepção da justiça de que a prática do bullying faz parte das pequenas causas ou dos atos de menor potencial ofensivo. “Precisamos qualificar as nossas instituições para lidar com esta realidade de forma construtiva, não apenas nos limi-tando ao processual”, disse. Lélio, que integra a pro-motoria da infância e da juventude desde 1993, aposta na justiça restaurativa para lidar com o bullying. “A ló-gica da justiça tradicional é contrária ao afeto. Ela não está preparada para as sutilezas do bullying”.

Pesquisa realizada pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adoles-cência (Abrapia) revela que 28% das crianças bra-sileiras já foram vítimas de bullying nas escolas e 15% sofriam agressões todas as semanas. Dados do Centro Multidisciplinar de Estudos e Orientação sobre o Bullying Escolar, que acompanha pesquisas em ao menos oito cidades do País, revela que 45% dos estudantes de ensino fundamental do País já fo-ram vítimas, agressores ou ambos.

Gabriel Chalita, autor de projeto de lei de combate ao Bullying

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Para construir a base teórica da sua tese, o pro-fessor desenvolveu durante seis anos uma pesquisa qualitativa em um grande presídio italiano. Foram entrevistados sete homens condenados por diversos crimes hediondos, entre eles, homicídio e abuso se-xual. “Queríamos que a pessoa contasse a sua histó-ria e contexto que a levou a cometer o crime”, disse. Para facilitar o contato com o universo simbólico dos

Por dentro da mente do criminosoEstudiosos europeus discutem as teorias da criminologia em seminário internacional

Para uma plateia de mais de 200 pessoas, o primeiro dia do Seminário Internacional de Criminologia foi marcado por uma enriquecedora aula de Adolfo Ceretti, criminólogo, psicólogo e professor doutor da Universidade de Milão, na Itália.O professor fez uma breve exposição sobre as principais teorias da criminologia e apresentou a sua tese do universo simbólico e os diálogos internos na mente do criminoso, que originou o livro “Cosmologia da Violência – Percursos de vidas criminosas” (Cosmologie Violente – Percorsi di vite criminali).

participantes, os pesquisadores exibiram obras cine-matográficas durante as entrevistas.

Um dos entrevistados justificou ter assassinado um negro porque o enxergava como um animal. Acre-ditava que se o deixasse vivo, ele poderia violentar uma mulher. “O entrevistado disse não se referir a todos os negros, mas àqueles que vivem em solo branco”, explicou o professor. Portanto, o gesto violento é coe-

seminário

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de cada um. “Ainda que não faça sentido para nós, o comportamento do criminoso faz sentido dentro da sua comunidade fantasma”.

O objetivo do trabalho do Ceretti é a construção de uma justiça moderna que considere a cosmolo-gia da violência na percepção do crime e que consi-dere a existência de uma legitimidade do comporta-mento do sujeito dentro da sua própria moralidade. “Está claro que o uso da força para entender o cri-me é incompatível com o atual desenvolvimento da sociedade”, afirmou.

No segundo dia do Seminário, Adolfo Ceretti abor-dou a violência como ataque do corpo e o domínio da violência no Estado Democrático de Direito, com a presença dos debatedores Osvaldo Henrique Duek Marques, Procurador de Justiça, e Messias José Lou-renço, Procurador do Estado.

O professor explicou que o ponto de partida do processo de violentização do indivíduo é a brutalida-de a qual ele está exposto. A submissão às atitudes bruscas de um pai, da mãe ou de outra figura que exerça autoridade leva o sujeito a agir de maneira agressiva de forma naturalizada. Ceretti citou como exemplo o depoimento de um detento proveniente da máfia italiana que diz ter sido, quando criança, obrigado pelo avô a matar um homem. “O avô disse que se o garoto não executasse o inimigo, jamais se tornaria um homem e não poderia entrar para a família”, explicou o professor ao exemplificar a sub-missão à violência por coerção.

“Neste indivíduo, surge um enorme sentimento de vingança sobre quem o está brutalizando”. O sujeito submetido à violência ingressa na fase do adestra-mento, quando passa a dominar a sua agressividade de forma semelhante a um treinamento militar. “A violência não nasce espontaneamente de uma hora para outra. Ela é adestrada ao longo do tempo”.

Da brutalidade, o indivíduo passa à fase da belige-rância, quando confere sentido à sua violência, perce-

rente com o universo interno do sujeito que o pratica e os objetos sociais são frutos das suas experiências passadas. “O criminoso comete o crime com o objeti-vo de resolver um conflito pessoal.”

Segundo Ceretti, a decisão sobre o cometimen-to do crime parte de um diálogo do indivíduo com os seus próprios valores, o que ele chama de ‘parlamen-to interno’ do criminoso. “A pergunta que devemos fa-zer é com quem ele dialoga ininterruptamente antes de tomar uma decisão?”.

O professor defende a existência de uma espécie de ‘comunidade fantasma’, formada por personagens interiores que visam melhorar a ‘reputação’ do indiví-duo de acordo com uma moral determinada. “Somos habitados por um parlamento interior de opiniões di-versas, que influenciam as nossas decisões futuras”. Esta tese explica a existência de indivíduos nascidos num ambiente violento e que são incapazes de come-ter um crime, por estabelecerem ‘comunidades fan-tasmas’ contrárias àquilo que estão expostos.

Ceretti criticou o argumento da psicopatologia como justificativa para todos os crimes que não são compreensíveis à justiça. “A pesquisa metodológica derruba o mito psicopatológico. Mais importante do que saber se ele é boderline ou narcisista, é com-preender o seu universo simbólico”. Ainda que as emoções sejam universais, a percepção delas é indi-vidualizada de acordo com as experiências pessoais

Adolfo Ceretti, criminólogo e professor doutor da Universidade de Milão

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bendo-a como algo internalizado, atenuado e necessá-rio para a resolução de um conflito. “É como fazer o mal ao outro antes que ele faça a você”, explica o professor.

Após a beligerância, segue a fase da ‘perfor-mance da violência’, quando o sujeito planeja a exe-cução do ato violento. Por fim, o indivíduo ingressa no estado de virulência, quando saboreia a vitória sobre o adversário.

“Este é um percurso significativo para a cons-trução de uma comunidade fantasma que reforça a violência”, afirmou o professor, em referência às vozes interiores que balizam as atitudes humanas.

Apesar da cadeia de formação do homem vio-lento, Ceretti ressaltou que a condição da agressi-vidade não é necessariamente imutável. Transfor-mações dramáticas na mente podem reformular os padrões da autocensura e fazer com que o in-divíduo mude. O professor citou como exemplo um homem que se cortou com uma faca por se considerar um inútil e drogado. “Esta atitude pode revelar o início de uma grande transformação na comunidade interna deste indivíduo, que passou a censurar o seu comportamento”, avaliou.

Questionado sobre a imputabilidade de indivídu-os psicopatas, psicóticos ou de perfil violento, Ceretti explicou que, na Itália, a psicopatologia ou o compor-tamento violento não tornam o indivíduo inimputável (isento de punição). “No entendimento da justiça ita-liana, até mesmo os psicopatas têm plena consciência do que fazem, portanto, são imputáveis”, afirmou.

No dia 27, para debater o tema “O Absurdo de uma Prisão Readaptadora”, ministrou a exposição Roberto Bergalli, criminólogo e professor doutor da Universi-dade de Barcelona, e Edson Luis Baldan, delegado de polícia.

Roberto Bergalli fez uma análise das atribuições do Ministério Público nos diversos países e no Brasil, enfati-zando a importância de uma sociologia do Direito. “Cabe à instituição as reflexões críticas e pontuais dos seres humanos que estão sujeitos ao crime”, disse. “O siste-ma penal é muito mais do que normas e regras jurídicas. Abrange também os comportamentos humanos”.

Sobre a recuperação de detentos no sistema pe-nal brasileiro, Edson Baldan foi enfático. “A idéia de recuperação do criminoso é utópica”, pontuou. “Nin-guém duvida que os sociopatas são irrecuperáveis”.

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O delegado considerou que as reformas na legis-lação penal no País se caracterizam pelo tratamen-to seletivo para cada criminoso - com enrijecimento para os crimes hediondos e maior garantia aos deli-tos de menor potencial ofensivo. “Temos hoje quem sustente que o indivíduo que rompeu o contrato social tornou-se inimigo do Estado”, disse. “Deixando de ser cidadão e tornando-se criatura”.

O delegado explicou que o modo de vida no pre-sídio, muitas vezes, determinado pelas organizações criminosas, culmina na aculturação do presidiário. “Ele aprende outras formas de conduta e de sobre-vivência no cárcere”, avaliou. “É um processo de aculturação que pode inviabilizar a ressocialização do preso após o cumprimento da pena”.

Edson enfatizou que a responsabilidade pela ineficiência do sistema penal não se deve aos po-deres do legislativo ou judiciário, mas às precárias condições dos cárceres geradas pela inoperância

do poder executivo, a quem cabe a construção e manutenção dos presídios.

Sobre as condições das penitenciárias, Edson ressaltou que uma cela chega a abrigar 200 ho-mens, tendo espaço para apenas 40, ferindo os princípios da dignidade da pessoa humana. “Os de-tentos precisam se amarrar nas portas das celas para dormir em pé”, afirmou. “Isto não está previsto na lei de execuções penais”.

O delegado, doutor em Direito Penal pela PUC-SP, apresentou pesquisas que mostram o aumento das detenções na capital paulista nos últimos 10 anos - que passou de 232 mil presos em 2000, para 480 mil presos neste ano. “Se pena reduzisse a cri-minalidade, o índice de homicídios não seria tão alto nos Estados Unidos, que registram 50 homicídios para cada 100 mil pessoas na sua capital”, avaliou. “Mas ainda não inventaram sistema que pudesse substituir o cárcere”, finalizou.

Livro: “Cosmologia da Violência – Percursos de vidas

criminosas”’ de Adolfo CerettiDe onde vem o ato de violência? Com quais palavras, que aprovam a

violência, disse o indivíduo a si mesmo os seus próprios gestos ferozes? Nem mesmo as mais refinadas teorias podem sempre explicar as ações cruéis do ponto de vista dos seus autores, na palavra crua com que as descrevem.

Nesta perspectiva, o desafio de Adolfo Ceretti na obra “Cosmologia da Violência – Percursos de vidas criminosas” (Cosmologie Violente – Percorsi di vite criminali) é construir novas lentes através das quais seja possível observar e compreender o percurso das vidas criminosas. O material é equipado da intuição original do criminólogo norte-america-no Lonnie Athens, expoente de destaque do interacionismo simbólico.

Assim orientado, o percurso empreendido pelos autores ao partir de entrevistas realizadas em presídios e dos diálogos retratados a partir de célebres roteiros cinematográficos apontam para o conceito da cosmologia da violência, a esfera simbólica constituinte dos atores violentos, no curso de suas interações e experiências do mundo em que vivem..

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De olho nos presídiosReunidos em oficina, promotores de justiça monitoram locais de privação de liberdade

oficina

Para avaliar a situação dos presídios paulistas, a Escola Superior do Ministério Público (ESMP) e a Associação para a Prevenção da Tortura (APT) pro-moveram nos dias 16, 17 e 18 de setembro a “Ofi-cina Internacional de Monitoramento dos Locais de Privação de Liberdade no Brasil”. O objetivo do en-contro, inédito na história do Ministério Público em São Paulo, foi aprimorar as técnicas e metodologias destes monitoramentos como meio para a preven-ção da tortura e outros maus-tratos. Foi distribuído aos cerca de 40 promotores de justiça presentes um manual prático, com a reflexão sobre os desa-fios e troca de experiências.

Foram visitados quatro presídios em São Paulo. Os presos concederam entrevistas espontâneas e fizeram comentários sobre as condições dos cár-ceres. Entre os aspectos avaliados pelos visitantes estão as medidas jurídicas e administrativas aplica-das dentro do presídio; as condições de vida duran-te a detenção; as atividades internas desenvolvidas pelos presos e o contato com o mundo externo; o

As autoridades dos sistemas prisionais devem garantir condições de detenção que assegu-rem o respeito aos direitos humanos. Portanto, o monitoramento das condições dos presí-dios constitui parte integral do sistema de proteção de pessoas que se encontram privadas de liberdade. Um elemento essencial dentro deste sistema é a visita regular e não anunciada aos lugares de detenção por parte dos órgãos independentes, acompanhadas de relatórios e recomendações para as autoridades, e de um acompanhamento sistemático da implemen-tação destas recomendações.

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acesso à assistência médica; a organização e a ges-tão dos detentos e do corpo técnico das prisões e as relações entre os detentos e as autoridades respon-sáveis. Os resultados das visitas foram discutidos no último dia do evento e serão posteriormente encami-nhados à direção da ESMP por meio de relatório para conhecimento da Procuradoria Geral de Justiça.

Participaram do evento como expositores Sylvia Diniz Dias, delegada da APT no Brasil; Walter Sun-tinger, membro do conselho deliberativo da APT na Áustria; Fernando Pastorelo Kfouri, promotor de justiça assessor do Centro de Apoio Operacional Criminal (CAO Criminal); Claudia Cesaroni, diretora adjunta do escritório da APT para a América Latina, e Hugo Lorenzo, diretor do Escritório da APT para a América Latina.

Na cerimônia de abertura, o evento contou ainda com a participação de Lourival Gomes, secretário da administração penitenciária do Estado de São Pau-lo; Eloisa de Sousa Arruda, procuradora de justiça e diretora da ESMP; e Gianpaolo Poggio Smanio, pro-curador de justiça e coordenador do CAO Criminal. Ministrou a exposição de encerramento Maria Auxi-liadora de Almeida Cunha Arantes, coordenadora-geral de combate à tortura da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.

“Foi uma oportunidade extremamente valiosa po-der trabalhar com membro do Ministério Público do Estado de São Paulo em um tema tão prioritário e caro à instituição. Restou claro pela postura do MP e da sua Escola o destaque que vem sendo conferido institu-cionalmente a este tema buscando-se continuamente fortalecer e fomentar o papel imprescindível que os promotores de justiça têm na busca pela proteção das pessoas privadas de liberdade através do combate à tortura e aos maus tratos nas unidades de detenção”, afirmou Hugo Lorenzo. “Esperamos ter contribuído positivamente para o fortalecimento do trabalho que o Ministério Público realiza nesta área”.

Relatório elaborado pelo Comitê Contra a Tortura da ONU em 2001 apontou diversas recomendações para o efetivo combate à tortura no Brasil. “Medi-das urgentes devem ser adotadas para melhorar as condições de detenção nas delegacias. O Estado também deve redobrar os esforços para remediar o problema da superlotação e monitorar o tratamen-to dado a população carcerária”, recomendou o do-cumento. Entre os pontos considerados críticos no País, destacam-se:

• A superlotação nos presídios, falta de higiene, de serviços básicos e de atendimento médico, além da prática constante de violência entre os prisioneiros e abuso sexual.

• Os longos períodos de prisão preventiva e demo-ras nos procedimentos judiciais levam presidiários a permanecerem por muito tempo em detenções não apropriadas para uma longa permanência.

• A falta de mecanismos institucionais que garan-tam às vítimas de atos de tortura o direito de serem transferidas do presídio e compensadas pelo que so-freram.

• A falta na legislação brasileira de uma proibição explícita da validade de depoimentos obtidos através de prática de tortura, que ainda servem como prova nos procedimentos judiciais.

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O debate sobre a legitimidade de investigação do MP é exclusivamente políticoEvento reúne autoridades para debater o papel do MP na efetividade da democracia

matéria

As políticas publicas são fundamentais para que os direitos sociais previstos na Constituição, e até mesmo os infraconstitucionais, se tornem realida-de. Para aproximar as instituições jurídicas da esfe-ra política, a Escola Superior do Ministério Público, a Universidade Presbiteriana Mackenzie e a asso-ciação ‘Ministério Público Democrático’ promove-ram o evento “Ministério Público e Política”, reali-zado nos dias 21 e 22 de setembro de 2010.

Para uma avaliação internacional da relação en-tre o MP e a política, Antônio Cluny, Procurador da República em Portugal e vice-presidente da Medel (Movimento Europeu de Magistrados pela Demo-cracia e Liberdade), defendeu que as opções polí-ticas dos magistrados sejam utilizadas como base para a análise das suas decisões. “É fundamental a transparência sobre a opção política de quem jul-ga”, disse. O procurador defende também que a lei determine que o magistrado declare não apenas as suas filiações partidárias, mas também, em organi-zações secretas ou iniciáticas.

O procurador também defendeu a pluralidade ideológica entre os membros do judiciário. “Não podemos conceber um judiciário ou um Ministério Público com uma ideologia própria”, disse. “A socie-

dade é pluralista, tem as suas opções. Portanto, as suas instituições assim também devem ser”.

Claudio Lembo, secretário Municipal de Negócios Jurídicos, comparou a efetividade da democracia em Portugal com a realidade brasileira, ressaltando que, no Brasil, a democracia está muito presente no pro-cesso eleitoral, por reunir desde juízes e intelectu-ais até representantes mais simples do povo entre os candidatos. “Temos muito o que ensinar aos eu-ropeus. Na França, o Ministério Público faz parte do Governo e a promoção de um juiz depende do políti-co”, afirmou.

O ex-governador de São Paulo criticou a postura de alguns membros do Ministério Público que enca-ram todo e qualquer agente público como alguém que deve ser permanentemente investigado. “Sinto que há alguns exageros. Os agentes públicos não podem ser tratados como um ‘qualquer’. São pesso-as eleitas pelo povo com legitimidade para ocupar o cargo”. Segundo Lembo, esta postura gera um clima de paralisia entre os gestores.

O procurador de justiça Gianpaolo Poggio Smanio, concordou sobre a necessidade do Ministério Público estudar as fronteiras da sua ação. “É a própria demo-cracia que define os limites dos três poderes”, disse.

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O coordenador do CAO-Crim também fez uma ava-liação constitucional sobre a prerrogativa o MP em atuar sobre políticas públicas. “As políticas de ação do Estado também são de categoria jurídica”, ava-liou. “Não somos intrusos nesta questão”.

O promotor de justiça Marcelo Daneluzzi res-saltou que o conceito de democracia não abran-ge apenas as questões políticas, mas também os Direitos Sociais, e traçou um panorama histórico sobre a prática eleitoral até o final do século XX. “Até 1999, era necessário garantir que o poder não fosse conquistado pela fraude”, afirmou. Na épo-ca, a impugnação de uma candidatura precisava ser julgada em três meses para garantir a inele-gibilidade, o que nunca ocorria na prática. A par-tir da Lei 9.840/99, foi proibido ao candidato doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, sob pena de ter o mandato cassado. “Estamos avançando ao longo do tempo”, disse o promotor. “Se aprovada, a lei dos ‘fichas limpas’ será uma grande conquista.”

Luiz Antônio Miguel Ferreira, promotor de justi-ça da educação falou da importância da formulação de políticas públicas nesta área, que teve tratamento

como direito social no artigo 6º da Constituição Fe-deral e diversas leis específicas, que culminaram no Plano Nacional de Educação, formulado em 2001. “O problema não é legal. As leis existem. O que pre-cisamos é garantir a educação através de políticas públicas, que é a ponte que liga a legislação à reali-dade”, afirmou. Em relação à legitimidade das insti-tuições jurídicas atuarem nesta área, o promotor foi enfático. “Quando há inoperância do executivo e do legislativo, o judiciário deve atuar e não pode aceitar a omissão dos outros poderes”.

Anna Trotta Yaryd, promotora de justiça da área da saúde, ressaltou a importância de centralizar a atuação do MP no novo modelo de administração vi-gente, que não se caracteriza mais pelo patrimonia-lismo, nepotismo e corrupção do passado. “O Esta-do passou a se preocupar com a defesa dos direitos sociais e a zelar pelo interesse público e redução de custos”, afirmou. Neste novo modelo, a sociedade civil passou a ter uma atuação pública mais forte, com a inserção na carta constitucional dos concei-tos de dignidade da pessoa humana e cidadania. A Constituição também transformou o Estado de prestador em gerenciador de serviços, trazendo o conceito de eficiência da máquina pública. “As po-

“A lei portuguesa entende que o fato da investigação ser de competência da polícia, não significa que também não é do Ministério Público”

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líticas públicas devem zelar pelos direitos sociais negligenciados pelo Estado”.

O segundo dia do evento trouxe como temas o poder de investigação do Ministério Público na esfera criminal e a importância do inquérito civil na proteção dos interesses difusos e coletivos. Antônio Cluny, procurador da república em Portu-gal, falou sobre as atribuições do MP em seu país, que divide o poder de investigação com o juiz de instrução do processo. “A lei portuguesa entende que o fato da investigação ser de competência da polícia, não significa que também não é do Minis-tério Público”, afirmou o magistrado, que defendeu através de moção formulada pela Medel em cortes internacionais a legitimidade do poder de investi-gação do Ministério Público. O documento foi en-caminhado às cortes brasileiras.

O promotor de justiça José Reinaldo Guima-rães Carneiro, membro do GAECO (Grupo de Atu-ação Especial de Repressão ao Crime Organiza-do) comentou que o debate sobre a legitimidade da investigação do MP é uma discussão mera-mente política e lamenta que a questão não seja devidamente regulamentada no novo código de processo penal. “A questão foi polarizada contra o Ministério Público, mas o poder de investiga-ção está previsto além da esfera do judiciário, permitindo as investigações às comissões par-lamentares de inquérito e até mesmo à Receita Federal”, disse. “É um debate exclusivamente político.” O promotor de justiça considerou que se o Ministério Público for totalmente imparcial, a própria atividade da instituição estará com-prometida. “Precisamos de entidades livres que busquem a verdade real”.

O advogado Alexandre de Moraes, ex-secretário de justiça do Estado de São Paulo, falou sobre a teoria dos poderes implícitos. “Todos os órgão do Estado tem o poder de investigar, a menos que isto

esteja expressamente proibido em lei”, afirmou. O professor de Direito Constitucional do Mackenzie fez algumas críticas à instituição, como a escolha por algumas causas menores, em detrimento de grandes casos. “A operação Castelo de Areia foi a mais importante dos últimos 50 anos”, disse. “O MP poderia ter acompanhado de perto as intercep-tações telefônicas e as prisões temporárias, que envolveram uma grande variedade de criminosos do alto escalão”.

Luiz Moreira, membro do Conselho Nacional do MP, pontuou que o Ministério Público deveria apos-tar numa aproximação com o Parlamento, como a polícia faz há algum tempo. “Se a instituição esta-belecer uma pauta permanente de criminalização do corpo político, jamais terá o apoio do Congresso Nacional”, afirmou.

A procuradora de justiça Evelise Pedroso Prado Vieira explicou que o inquérito civil é uma grande ferramenta na promoção da democracia, que con-feriu ao Ministério Público, à Administração Pú-blica e às associações civis o poder de zelar pelos direitos sociais. “Foi a lei da ação civil pública que garantiu a efetividade dos direitos difusos e cole-tivos. O Compromisso de Ajustamento de Conduta também foi um grande avanço”. A procuradora também ressaltou que a instituição deve ajudar a sociedade a se organizar para fazer uso destes instrumentos jurídicos. “O MP não pode dar conta de tudo”, afirmou.

José Horácio Cintra, advogado e desembargador aposentado do TJSP, defendeu a formação específi-ca entre os magistrados na matéria dos direitos di-fusos e coletivos para facilitar o entendimento sobre as questões. “O judiciário deveria ter uma estrutura única para que juízes e promotores de justiça atu-assem juntos nesta área”, disse. “O promotor desta matéria deveria ter uma sala no fórum, ao lado do juiz competente”, afirmou.

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seminário

O réu colaborador tem sido cada vez mais o protagonista do desmantelamento das organizações criminosas – que tem como hábito não deixar vestígios de suas ações. Portanto, é dever do Estado garantir a preservação do bem-estar físico e psíquico dos delatores para o combate efetivo ao crime organizado, apreendidos os requisitos legais. Não se trata de recompensá-lo pela colaboração com a justiça, mas, sim, de garantir a sua segurança física, a reinserção social e, se possível, o perdão judicial.

Um desafio para o combate ao crime organizadoSeminário internacional aborda a importância da proteção aos réus colaboradores para a efetividade da justiça

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A presença do réu colabo-rador na realidade jurídica brasileira veio acompanhada da complexidade operacio-nal da organização do crime. Até pouco tempo, a sociedade

contava com poucos réus colaboradores. Os rela-tos, em geral, vinham de testemunhas presenciais ou vítimas, sem participação na criminalidade. A situação mudou. “Atualmente, 90% dos casos de quem está no programa de proteção a testemunhas tem histórico de passagem na criminalidade”, afir-mou Nilda Turra, coordenadora geral de proteção a testemunhas da Secretaria Especial de Direitos Hu-manos. Atentos a esta realidade, a Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania e o Consulado dos Estados Unidos promoveram nos dias 23 e 24 de se-tembro o I Seminário Internacional de Proteção a Testemunhas - “A proteção aos réus colaboradores como desafio para o enfrentamento ao crime orga-nizado”. O evento proporcionou aos operadores do direito que lidam diretamente com o tema uma rica troca de experiências, inclusive a partir da exposi-ção acerca do funcionamento do modelo americano de proteção.

O evento, que abordou a temática de forma inédita, trouxe ao Brasil Paul O’Brien, Diretor do Escritório de Operações Policiais, seção da Divisão Criminal do De-partamento de Justiça dos Estados Unidos, responsá-vel pela aprovação dos requerimentos dos promoto-res federais para a inserção de pessoas no programa de proteção a testemunhas (WITSEC Program). O seminário contou ainda com a rica contribuição das experiências práticas dos membros do Programa Es-tadual de Proteção a Testemunhas (Provita/SP), que há mais de 10 anos promove a reinserção social de testemunhas, que deixam as suas vidas para trás e assumem uma nova identidade, em outras cidades,

e até mesmo, por vezes, em outro estado. De acor-do com dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, entre 1997 e 2009, cerca de 9.530 pessoas foram inseridas no programa nacional de testemunhas no Brasil.

Ministrou a exposição de abertura do evento a Sra. Katrina Buggy, superintendente da Polícia Federal da Austrália e coordenadora do Programa de Prote-ção a Testemunhas no seu país, que apresentou um panorama sobre a estrutura administrativa da polícia judiciária australiana. “Trabalhamos apenas com tes-temunhas de alto risco”, afirmou Katrina, que mos-trou a concentração de esforços da Rede Internacio-nal de Proteção a Testemunhas na Ásia e no Pacífico Sul para combater os tráficos de drogas e de pesso-as. Acompanhou a superintendente o agende federal australiano Greg Corin, que apresentou os procedi-mentos dos agentes federais no sistema de proteção através de um material didático mostrando as etapas do programa. Na Austrália, apenas são aceitos os ca-sos em que o risco possa ser gerenciado e que a pro-teção seja economicamente viável. As vítimas devem ser 100% protegidas, transferidas a um local seguro e com acesso a novos documentos. A continuidade dos direitos do protegido após a investigação também deve estar garantido pelo Estado. O programa austra-liano também inclui a proteção da vítima de origem estrangeira, através de parcerias e termos de coope-ração com agências nacionais e internacionais.

O palestrante americano Sr. Paul O’Brien ressal-tou a importância de uma resposta rápida do Esta-do no combate ao crime organizado, sob pena de o narcotráfico ditar as regras em diversos países. As estatísticas do Witsec programm apresentadas pelo especialista norte-americano revelam que, desde o começo, em 1971, o programa protegeu com sucesso mais de 8 mil testemunhas e quase 10 mil familiares no país. Os depoimentos das testemunhas protegi-das resultaram em 80% de condenações. As bases

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do programa nos Estados Unidos surgiram nos anos 60, através do Procurador-Geral Robert Kennedy, que estabeleceu um rígido enfrentamento contra o crime organizado tradicional, em particular, a máfia italiana Cosa Nostra. O programa de proteção a testemunhas nos EUA foi estabelecido em 1970, sob a responsabili-dade do U.S. Marshals Service.

Em 1984, a partir da Reforma na Lei de Proteção a Testemunhas nos Estados Unidos, foram estabe-lecidos critérios restritos de admissão, com a ava-liação dos riscos decorrentes da realocação dos cri-minosos, um fundo de compensação às vítimas, um memorando de entendimento resumindo as obri-gações das testemunhas, as penalidades por viola-ções de sigilo e a proteção dos direitos de terceiros, como custódia ou visitações, e a proteção de cre-dores. O colaborador deve aderir voluntariamente ao programa, estar disposto a mudar de identida-de, ser realocado, promover a sua auto-suficiência e respeitar rigorosamente as regras do programa.

Do total das prisões resultadas do depoimento de testemunhas protegidas, 66% envolvem gangues de rua; 10%, o sindicato das ‘famílias criminais’ (máfias); e 24%, praticantes de terrorismo, milícias, ‘colarinho branco’, corrupção pública e tráfico de drogas. Em re-lação às novas testemunhas principais integradas ao programa, 80% estão encarceradas e 97% delas têm antecedentes criminais. Entre os critérios de admis-são, estão os casos de importância nacional, partici-pação do crime organizado, casos que envolvam nar-cóticos, tráfico de pessoas, tráfico de armas de fogo, corrupção pública ou terrorismo.

Das Testemunhas aos RéusO juiz federal Paulo Sérgio Domingues fez uma

avaliação sociológica e psicológica da prática da dela-ção. “A sociedade não gosta muito da figura do réu co-laborador”, afirmou. “A compreensão dos princípios que este depoente especial terá que adotar é contrá-rio aos seus próprios princípios. È de se pensar até

Seminário reúne autoridades brasileiras, australianas e americanas

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que ponto o seu arrependimento é real”, avaliou. O juiz atentou para os desafios de evitar que o réu colabora-dor traia o Estado e de providenciar a ele a reinserção digna na sociedade.

Wagner Roby Gídaro, juiz de direito, fez uma análise da atual sofisticação do crime, que precisa ser acompanhada de perto pelo judiciário. “Há al-guns anos, as ações traziam, em geral, um único réu”, disse. “Hoje, é comum uma ação com mais de 40 réus”, afirmou o magistrado, referindo-se à dis-seminação das organizações criminosas. “O crime organizado não está nas cadeias. Está nas escolas, nas empresas de fachada e até mesmo nos altos escalões do poder público”, disse. Entre as possí-veis medidas de enfrentamento, o juiz destacou a quebra de sigilo fiscal e bancário, as interceptações telefônicas e a delação premiada. “O nosso siste-ma precisa ser adaptado para garantir a proteção do réu colaborador e os juízes devem acompanhar de perto o programa de proteção a testemunhas”.

O seminário também cumpriu o seu papel agre-gador na troca de experiências entre os Ministérios Públicos dos outros Estados brasileiros. O promotor de justiça da Paraíba Octávio Celso Godin Paulo Neto, membro do Grupo Nacional de Combate às Organiza-ções Criminosas (GAECO), relatou um caso concreto de colaboração de réu na Paraíba, ressaltando a im-portância do trabalho em rede. “O Estado se comunica bem com outras agências, mas não se comunica bem internamente”, disse o promotor, que parabenizou o esforço da Polícia Federal na integração com os pro-motores de justiça, frequentemente convidados pelo órgão a acompanhar as operações. Octávio enfatizou que a prova testemunhal deve ser o último recurso no processo de investigação, sendo apenas utilizada na ausência total de provas periciais, para que o colabo-rador não seja exposto. “Precisamos humanizar a forma de perceber a questão”, disse. “Quem paga o maior preço é a testemunha, o réu colaborador e

a vítima. É fundamental zelar pela integridade des-tas pessoas”.

A delegada de Polícia Federal, Carolina Patriota Martins, chefe do Serviço de Proteção aos Direitos Humanos e ao Depoente Especial, ressaltou que, nos casos de tráfico de pessoas e de organizações crimi-nosas, é raro o sucesso na obtenção da prova técnica. “Precisamos do depoimento das testemunhas”. Em geral, os protegidos são testemunhas de homicídios que envolvem autoridades policiais ou membros do crime organizado, que não deixam vestígios. A dele-gada informou que no dia 23 de agosto foi firmado um acordo entre a Polícia Federal e o Departamento Peni-tenciário Nacional (Depen) para garantir apoio ao réu colaborador preso no Brasil. Será disponibilizada aos depoentes uma cela especial, sob a proteção de agen-tes penitenciários treinados. A Polícia Federal oferece 56 vagas para réus colaboradores presos no presídio Federal em Campo Grande (MS).

O promotor de justiça José Reinaldo Guimarães Carneiro, ex-Secretário Executivo do GAECO, criticou a falta de uma legislação específica para o tema. “A mesma lei que combate o crime organizado nega a inserção do réu colaborador no programa de prote-ção a testemunhas”, avaliou o promotor, que teme um retrocesso caso o STF defina que o crime organizado não é antecedente à lavagem de dinheiro. Nenhum país conseguiu vencer as organizações criminosas sem a proteção ao réu colaborador e a infiltração de agentes. Segundo o promotor, a Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999 não é suficiente por restringir a prote-ção aos réus colaboradores condenados em primeiro grau. “Temos que prestigiar todo e qualquer crimino-so que queira deixar o crime e entregar os seus anti-gos pares”.

Ao relembrar o passado recente, na era da ‘cri-minalidade menos sofisticada’, o promotor de justiça Tomás Busnardo Ramadan, assessor da ESMP, res-saltou a importância da valorização do réu colabora-

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dor para o processo investigatório nos tempos atuais. “Temos que agradecer a existência dele. Muitas ve-zes, as testemunhas sequer existem, dado o alto nível de organização do crime, que atinge, no mais das ve-zes, bens jurídicos difusos”.

Foi apresentado um caso de sucesso no depoi-mento de vivência prática do promotor de justiça Luiz Alberto Segalla Bevilacqua, que desbaratou um es-quema altamente organizado na adulteração de com-bustíveis na cidade de Limeira, interior de São Paulo, em 2009. Através da colaboração de um dos crimino-sos, foi possível identificar todo o sistema de inteli-gência da quadrilha, que durante oito anos, burlou as blitz sistemáticas realizadas pela polícia federal. Os dutos dos depósitos movimentavam cerca de 1 milhão de litros de gasolina adulterada na calada da noite. O sistema era facilmente interrompido através de válvu-las acionadas em manetes clandestinos quando havia o risco de abordagem policial. “Jamais poderíamos detectar esta logística sem a colaboração do ex-inte-grante do esquema”, afirmou o promotor. O chefe do grupo foi condenado a 10 anos e seis meses de reclu-são. Foi estabelecida multa de R$ 18,9 milhões para cada um dos 10 réus.

A História do ProvitaAnália Belisa Ribeiro, coordenadora do Núcleo de

Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria da Justiça, é uma memória viva na proteção a teste-munhas. Numa brilhante exposição, a psicóloga apre-sentou o panorama histórico do Provita, que come-çou a sua atuação no bairro ’Peixinhos’, na fronteira entre as cidades Recife e Olinda, em Pernambuco. O local era dominado por um grupo de extermínio for-mado por policiais militares que atuavam no vácuo da fiscalização das duas prefeituras. “Acolhíamos as testemunhas nas nossas casas e nas residências dos vizinhos”, contou a psicóloga. Com o crescimento do serviço, que garantia a sobrevivência das famílias

amedrontadas naquela localidade, foi necessário res-gatar processos de proteção a testemunhas, desen-volvidos durante a ditadura militar, quando redes soli-dárias da sociedade civil abrigavam pessoas em risco.

“Passamos a abrigar as pessoas em clausuras, abrigos e fazendas”, contou a psicóloga. A partir do interesse do secretário estadual de justiça na épo-ca, o grupo de proteção foi sistematizado no Gajop (Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares), com a integração do trabalho dos juízes, promotores de justiça e delegados envolvidos na in-vestigação. Diante dos resultados positivos, o progra-ma foi replicado nos outros estados brasileiros. Assim surgiu o Provita. A proteção a testemunhas se tornou uma realidade na Bahia, Espírito Santo (na proteção das vítimas ameaçadas pela Escuderia Le Cocq) e no Acre (vítimas e testemunhas dos crimes cometidos por Hildebrando Pascoal). “Fiz cursos de proteção a

“É preciso que o Governo dê mais suporte às pessoas que fazem a coisa certa. Senão, elas vão desaparecer”Paul O’Brien, Divisão Criminal do Departamento de Justiça dos EUA

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testemunhas no exterior e trouxe professores inter-nacionais para treinar as equipes no Brasil com apoio das embaixadas e consulados”, afirmou a coordena-dora. Com o surgimento da lei do depoente especial, em 2000, foi possível ao Estado, pela primeira vez, ga-rantir a mudança de identidade de uma testemunha no Brasil.

O programa, concebido inicialmente para proteger pessoas sem histórico de criminalidade, tem como desafio incluir no sistema de proteção aqueles que estiveram envolvidas no crime e manter o sigilo ne-cessário para o sucesso da operação. “Nenhum de nós sabe onde estão os réus colaboradores”, afirmou o promotor de justiça Augusto Eduardo de Souza Ros-sini. “Nem o promotor, nem o juiz, nem os policiais. Apenas os voluntários da sociedade civil”. Em 11 anos o Provita recebeu 667 pedidos de proteção. “Trata-se de um trabalho conjunto que só funciona bem em rede”, afirmou um dos membros do programa.

A mente do réu colaborador Um dos grandes problemas enfrentados pelos

membros do programa de proteção é a conscientiza-ção do réu de que o Estado não poderá custear as suas despesas e lhe oferecer uma vida de conforto no exte-rior – uma expectativa comum entre eles. Não é raro que o réu colaborador entenda a delação como uma oportunidade para obtenção de benefícios financeiros do Estado. Nilda Turra, coordenadora do programa na Secretaria de Direitos Humanos, ressaltou as dificulda-des no dia-a-dia do programa de proteção na relação com o universo de expectativas do réu colaborador. “É extremamente árdua a tarefa de inserir uma pessoa de identidade sigilosa no mercado de trabalho”, disse. “O que podemos fazer é garantir uma estrutura mínima para que ele possa se manter por conta própria, torna-se um sujeito ativo da sua própria vida”. Inácio da Silva, representante do Fórum Nacional das Organizações Não Governamentais gestoras dos programas de pro-

teção a vítimas e testemunhas brasileiras, ressaltou a importância de garantir ao réu cidadania e dignidade para que ele possa reconstruir a sua vida.

“Em geral, os réus colaboradores protegidos têm poucas habilidades profissionais para conseguir um emprego”, afirmou Paul O’Brien, relatando as suas experiências no Witsec Program (Programa de Prote-ção a Testemunhas) nos Estados Unidos. “Muitos en-frentam dificuldades com a língua do local para onde foram transferidos”. Paul ressaltou a importância do Estado valorizar este depoente especial, sendo ele uma das grandes ferramentas para o combate efeti-vo ao crime organizado. “É preciso que o Governo dê mais suporte às pessoas que fazem a coisa certa. Se-não, elas vão desaparecer”.

Entre os desafios inerentes apresentados pelo especialista norte-americano, estão o momento da realocação do depoente, e a sua ansiedade em re-lação à separação da família, as pressões familia-res, a falta de nível educacional, o perfil profissional, a dificuldade com os idiomas e o seu histórico de vida. Além disso, os programas são caros. O custo dos programas de proteção varia de 1 a 8 milhões de dólares, sem incluir salários, despesas e custos administrativos. “Programas devem ser designados para salvar as vidas das testemunhas, não para ele-var substancialmente o seu padrão de vida”.

Participaram ainda como expositores do seminá-rio, a promotora de justiça Luciene Angélica Mendes e o juiz Pedro Luís Sanson Corat, da vara de inqué-ritos policiais de Curitiba e presidente do Conselho Deliberativo do programa de Proteção a Testemunhas do Estado do Paraná, que apresentaram o panorama legislativo acerca do tema.

Ricardo Dias Leme, secretário da justiça e da defe-sa da cidadania do Estado de São Paulo, parabenizou a iniciativa do evento e informou que os resultados dos debates serão utilizados como base para a elaboração da regulamentação da lei sobre o depoente especial.

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Pela constitucionalidade da Lei “Maria da Penha”

Seminário avalia os quatro anos da Lei 11.340/06

seminário

Quando os direitos humanos previstos na Cons-tituição não são assegurados na prática, se faz ne-cessária uma lei para reforçar o que já está determi-nado na Carta Magna. Mesmo após tantos avanços na luta pela igualdade entre os sexos, não é raro que estes mínimos direitos, garantidos a qualquer indivíduo, ainda seja negado às mulheres.

Apesar de reconhecida internacionalmente como um avanço nesta questão, há quem acuse a Lei Maria da Penha de ser inconstitucional. Há três anos, uma decisão da 2ª Turma Criminal do Tribu-nal de Justiça do Mato Grosso do Sul considerou que a lei privilegia a mulher em relação ao homem e que, por ferir o princípio constitucional da isono-mia, deveria ser revogada. Para debater as agres-sões de gênero e avaliar a constitucionalidade da lei 11.340/06, a Escola Superior do Ministério Público e a Comissão da Mulher Advogada da OAB/SP promo-veram o Seminário Violência contra a Mulher, nos dias 27 e 28 de setembro de 2010.

“A lei está fundamentada em diversas con-venções internacionais da ONU”, avaliou a pro-motora de justiça Eliana Faleiros Vendramini

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Carneiro, promotora de justiça, que há dois anos foi convidada a visitar a Itália para elaborar lei semelhante no País. “Juridicamente, somos uma referência nesta área”. A promotora de jus-tiça Beatriz Augusta Pinheiro acrescentou que a lei não se refere à violência contra a mulher em quaisquer circunstâncias, mas à violência de gênero. “Trata-se da subjugação de uma mulher por um homem de sua relação íntima que se sente superior a ela”, disse.

Eliana Vendramini apontou para a necessidade de um trabalho interdisciplinar para lidar com a questão da violência de gênero por serem agres-sões que normalmente ocorrem dentro de casa, praticadas por pessoas íntimas da vítima. “Não é fácil para a mulher denunciar o seu companhei-ro. A ida à delegacia pode ser um momento muito árduo”, refletiu a promotora, que revelou não ser raro que a mulher faça a queixa e mude de idéia até o oferecimento da denúncia. “Só conseguiremos entender alguns comportamentos com a ajuda de psicólogos”, disse. A advogada criminalista Zulaiê Cobra acrescentou que muitas mulheres desistem de denunciar os seus maridos por acreditarem que “se é ruim com ele, fica pior sem ele’. “As mulhe-res precisam entender que a sua vida sempre esta-rá melhor longe de homens que não as respeitam”, afirmou a deputada federal.

A violência do EstadoAs palestrantes também criticaram a falta de

preparo de alguns policiais na delegacia da mu-lher, que intimidam a vítima no momento de co-lher o seu depoimento. Perguntas como: “a se-nhora tem certeza de que deseja fazer isto?” ou “tem consciência das consequências da sua ati-tude?” são exemplos de abordagens que estimu-lam a desistência da denúncia. Também não é raro que a justiça se negue a oferecer assistência

às mulheres que não foram vítimas da violência física, mas da psicológica, que pode causar um sofrimento ainda mais grave do que uma lesão corporal. “Houve um aumento da procura destas mulheres por assistência, mas não foi suficiente a capacitação dos funcionários das delegacias para recebê-las”, afirmou Edna Pacheco, que ocupou durante 15 anos, chefiou a Delegacia de Defesa da Mulher de Santos. “Poucas são as mulheres que desejam trabalhar na delegacia da mulher, justa-mente por ser extremamente trabalhosa”, disse a delegada Edna, ao debater a realidade do aten-dimento a mulher nas delegacias especializadas. “Alguns escrivães não sabem o que fazer com a vítima e não conhecem as possibilidades de assis-tência estabelecidas pela lei. Outros consideram este crime como de menor importância e que deve ser resolvido no juizado”.

Alguns fatores intimidam a busca da vítima pela justiça, entre eles, a falta de testemunhas - situação comum nos casos das agressões sofridas dentro de casa - e o medo da retaliação do companheiro. “É comum que muitas delas mudem o depoimento ao voltar à delegacia”. Segundo Edna, algumas desis-tem no momento do exame de corpo-delito por se sentirem constrangidas. Outras temem a acusação de abandono do lar e a perda da guarda dos filhos, caso procurem um abrigo longe do agressor. “Cada mulher tem o seu tempo para buscar ajuda e re-gistrar a ocorrência. Não podemos julgá-la por não ter feito a denúncia logo após a primeira agressão”, afirmou a delegada.

Zulaiê Cobra defendeu a criação de plantões ju-diciários com juízes e promotores disponíveis em período integral para atender os casos emergen-ciais de agressão contra a mulher, que muitas ve-zes, ocorrem durante a madrugada.

A promotora de justiça Beatriz Augusta Pinheiro informou que estão em fase de implantação juiza-

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dos regionais para agilizar os processos de violên-cia contra a mulher e permitir o atendimento multi-disciplinar dos casos.

“A efetividade da Lei Maria da Penha depende do poder público não fechar as portas para a mu-lher, e oferecer a elas toda a orientação necessá-ria”, afirmou a juíza Tatiana Franklin Regueira, da Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar da Capital. A magistrada entende que a represen-tação da vítima se configura no momento em que ela compareceu pela primeira vez na delegacia para fazer a denúncia da violência que sofreu. “A lei é muito recente. Ainda precisamos de algum tempo para mudar a cultura nas delegacias e nos tribunais”, disse.

Mulheres machistasNem sempre os homens são os únicos respon-

sáveis pela discriminação de gênero. A deputada federal Zulaiê Cobra criticou a existência de mu-lheres machistas na sociedade brasileira, que, por vezes, apóiam as agressões dos homens contra ou-tras mulheres consideradas “vulgares”. “Há muita

má vontade da mulher em relação à mulher”, dis-se. “Deve haver uma mudança na mentalidade das mães, que tem um papel decisivo na criação dos filhos”, complementou a delegada Edna Pacheco Fernandes Garcia, atual diretora-adjunta do Distrito Policial de Santos.

Um problema socialA socióloga Wânia Pasinato, pesquisadora do Nú-

cleo de Estudos da Violência da USP e da Unicamp, apresentou uma visão histórica da violência de gêne-ro, ressaltando o problema político do reconhecimen-to da violência como um problema social e o entrave teórico na formulação de conceitos. A origem da vio-lência está no desequilíbrio nas relações de poder. As diferenças entre homens e mulheres são construções sociais. Os papeis do masculino e do feminino variam culturalmente, portanto, podem ser transformados”.

Dados apresentados pela advogada Tamara Amo-roso Gonçalves, membro do Comitê Latino-America-no e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), ilustram as práticas de violência contra a mulher no Brasil e no mundo (quadro abaixo). “O fato de a violência ser praticada por pessoa próxima a vítima também indica a assimetria de poderes na relação pessoal e a persistência de valores e este-reótipos machistas a orientar os relacionamentos”, afirmou a advogada. “Por isso que é tão importante repensar a feminilidade e a masculinidade”.

Também participaram da exposição a procu-radora de justiça Luiza Nagib Eluf, ex-secretária nacional dos direitos da cidadania e autora de inúmeras obras sobre a violência de gênero; e as maiores referências jurídicas no País sobre o tema que atuaram na elaboração da Lei Maria da Penha: Flávia Piovesan, procuradora do estado e membro do Cladem, e a advogada Silvia Pimentel, vice-pre-sidente do Comitê sobre a Eliminação da Discrimi-nação contra a Mulher da ONU.

Zulaiê Cobra, advogada criminalista

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Eventos no interior de SPJulho, Agosto e Setembro de 2010

notas

Corrupção e Relação entre Poderes Executivo e Legislativo Data: 05 de julho, em Ribeirão PretoA exposição foi ministrada por André Luiz dos Santos, Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social do Guarujá, que desbaratou o esquema do ‘mensalinho’ na cidade em 2006. Na época, o Ministério Públi-co recebeu gravações anônimas obtidas nas dependências da Câmara de Vereadores, que mostraram a oferta de vantagens aos vereadores que votassem favoravelmente aos interesses do prefeito da cidade. O Promotor de Justiça ajuizou ação de improbidade administrativa e ofereceu denúncia por corrupção (ativa e passiva) e formação de quadrilha. O procedimento adotado por André Luiz se tornou uma referência no Ministério Público pelo ajuizamento quase simultâneo de ação civil e penal, uma vez que as provas colhidas serviram para a instrução dos dois processos. Para a efetividade do sistema democrático, André Luiz ressaltou, no início da palestra, a importância da devida atuação dos três poderes em um sistema de contrapesos, em que um controla e fiscaliza o outro. Após traçar um panorama conceitual da divisão do Legislativo, Executivo e Judiciário de acordo com os fundamentos da Constituição Brasileira, o Promotor de Justiça alertou que quando os poderes não se fiscalizam de maneira adequada, a relação entre eles torna-se espúria e promíscua. O evento foi realizado com a coordenação local de Karina Beschizza Cione, de Luiz Henrique Pacini Costa e de Sebastião Sérgio da Silveira, Promotores de Justiça e Coordenadores do 1º Núcleo Regional da ESMP - Ribeirão Preto.

O Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas – FuncionamentoData: 13 de julho de 2010, em Ribeirão PretoDurante o evento, foi apresentado aos presentes um material de conteúdo confidencial, com detalhes dos pro-cedimentos práticos e metodológicos do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas, que vão além do que está disponível na lei. Após a palestra, o evento teve caráter de capacitação e treinamento, com perguntas e respostas sobre o programa. Ficou aberto um contato permanente entre os promotores e os especialistas no tema para o esclarecimento de dúvidas. O evento contou com a exposição de João Rodrigues da Costa Bonvici-no, Secretário Executivo e Conselheiro Titular do Programa Estadual de Proteção a Testemunhas, sendo o de-batedor Augusto Martinez Perez, Juiz Federal da Vara Especializada em Crimes de Lavagem de Bens e Dinheiro e Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional de Ribeirão Preto. O evento foi realizado com a coordenação local de Karina Beschizza Cione, de Luiz Henrique Pacini Costa e de Sebastião Sérgio da Silveira, Promotores de Justiça e Coordenadores do 1º Núcleo Regional da ESMP - Ribeirão Preto.

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Eleições 2010: Questões Práticas da Atuação do Ministério Público EleitoralData: 21 de julho, em Assis, 24 de agosto em São José do Rio Preto e 2 de setembro em CampinasEm 2010, ocorrem as eleições majoritárias para os mandatos de Senador, Governador e Presidente da República e as eleições proporcionais para os mandatos de Deputados Estaduais e Deputados Fede-rais. A magnitude do processo eleitoral, em todas as suas fases, demanda a atualização dos operado-res do Direito para o enfrentamento de temas recentes e polêmicos da legislação eleitoral. Para pro-piciar um panorama sobre toda a legislação eleitoral vigente, fornecendo os recentes entendimentos da doutrina e da jurisprudência, a Escola Superior do Ministério Público realizou no dia 21 de julho a palestra “Eleições 2010 – questões práticas da atuação do Ministério Público Eleitoral”, em Assis (São Paulo). Foram abordados pelos palestrantes temas como a Lei dos ‘fichas-limpas’ e o financiamento de campanhas.

O Ministério Público e a EducaçãoData: 30 de julho, em Araçatuba e 24 de setembro, em Santa Cruz do Rio PardoDando continuidade ao ciclo de palestras promovido pela Escola Superior do Ministério Público, em con-junto com Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Cíveis e de Tutela Coletiva – área da educação, foi realizado no dia 30 de julho, na sede regional de Araçatuba, o evento “O Ministério Público e a Educação”. A palestra contou com a participação de promotores de justiça, estagiários, servidores do Ministério Público e representantes de entidades preocupadas com a melhoria da educação. As ex-posições foram ministradas por Luiz Antônio Miguel Ferreira, Coordenador da Área da Educação do CAO Cível e de Tutela Coletiva, e Eduardo Dias de Souza Ferreira, Coordenador da Área de Direitos Humanos – Idoso e Pessoa com Deficiência, do mesmo Centro de Apoio. Luiz Ferreira apresentou um panorama geral sobre o papel do Ministério Público na efetivação das Políticas Públicas relacionadas à educação, destacando que os promotores de justiça devem estar cada vez mais preparados para o enfrentamento das demandas acerca do tema. Na sequência, Eduardo tratou da inclusão de alunos com deficiência no sistema educacional brasileiro numa perspectiva histórica. O promotor de justiça Luís Fernando Rocha, da Comarca de Assis, falou sobre a prática do bullyng nas escolas.

Crimes contra a Dignidade SexualData: 10 de agosto em Guaratinguetá e dia 30 de agosto em AraraquaraPara debater as alterações promovidas pela Lei nº 12.015/09 no artigo 213 do Código Penal, a Escola Su-perior do Ministério Público promoveu a palestra “Crimes contra a Dignidade Sexual� no dia 10, no Salão do Júri do Fórum da Comarca de Guaratinguetá, com a exposição do advogado João Daniel Rassi e da pro-fessora doutora Alessandra Greco, coordenadora das áreas de Direito Penal e Processual Penal da Escola

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Paulista de Direito. No dia 30, o evento foi realizado no Centro Universitário de Araraquara, com a presença de uma das maiores autoridades no assunto – o juiz de direito Guilherme de Souza Nucci – em um evento que reuniu mais de 500 pessoas, entre promotores de justiça, juízes, delegados de polícia, advogados e estudantes de Direito. Os palestrantes fizeram uma análise da nova lei e trataram das alterações dos tipos penais e das questões processuais suscitadas por conta das novidades implementadas.Em Araraquara, a noite também foi de homenagens. Após 40 anos de dedicação ao Ministério Público, A Escola Superior reconheceu o trabalho do colega Rafael Valentim Gentil, conhecido como ‘Tim’, que honrou e dignificou a instituição com o seu trabalho. O promotor de justiça se aposentou em março de 2010.

Projeto de Reforma do Código de Processo PenalData: 8 de setembro, em Presidente PrudenteO Projeto de Reforma do CPP (PLS 156/09) está tramitando no Senado Federal e ainda não foi submetido à votação em plenário, em dois turnos, por se tratar de projeto de código. A perspectiva é que o projeto seja aprovado ainda neste ano no Senado, seguindo para a Câmara, oportunidade em que a discussão e a possibilidade de modificação são reabertas. Para discutir o tema, a Escola Superior do Ministério Público promoveu a palestra “Projeto de Reforma do Código de Processo Penal”, no auditório da Sede regional da Associação Paulista do Ministério Público em Presidente Prudente. Ministrou a exposição o promotor de justiça e assessor do Procurador Geral de Justiça Fábio Romazzini Bechara, doutor em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo. Dentre as principais inovações tem-se a criação do juiz de garan-tias, cuja competência restringe-se ao controle de legalidade da investigação. “Trata-se de um ponto bas-tante polêmico, que conta com a manifestação favorável do STF”, afirmou Fábio Bechara. “Outra questão que merece destaque é o não reconhecimento expresso do poder de investigação do MP, muito embora a sistemática do texto, ao utilizar a expressão ‘investigação’ em diversas passagens, não afaste tal possibi-lidade”, concluiu o promotor.

Principais Alterações da Lei 12.010/09 – Nova Lei de Convivência Familiar / Lei de AdoçãoAtendendo aos pedidos dos promotores da vara da infância e da juventude de diversas comarcas do estado, a Escola Superior do Ministério Público realizou 29 de setembro a palestra “Principais Alterações da Lei 12.010/09 � Nova Lei de Convivência Familiar / Lei de Adoção”, no Salão do Tribunal do Júri do Fórum da Comarca de Piracicaba. As exposições foram ministradas pelo promotor de justiça Lélio Ferraz de Siquei-ra Neto, coordenador da infância e juventude do Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva, e pelo juiz de direito da vara da infância e juventude Richard P. Pae Kim, coordenador da Escola Paulista da Magistratura de Campinas (EPM).

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livros

Compromisso de Ajustamento de Conduta AmbientalAutor: Fernando Reverendo Vidal AkaouiEditora Revista dos Tribunais3ª Edição

O livro demonstra a importância do referido instrumento de tutela dos direi-tos e interesses difusos e coletivos, notadamente, na área ambiental. A obra esmiúça os seus mais controvertidos aspectos, bem como realiza ampla pes-quisa para verificar como está a atualização deste instrumento em todo o País. A polêmica sobre o tema está centrada principalmente quanto à legitimidade para firmar o compromisso, sobre a forma e conteúdo do mesmo, bem como de seus efeitos e execução em caso de descumprimento de suas cláusulas. O autor considera o compromisso de ajustamento de conduta – criado em 1990 com a incorporação em nosso sistema jurídico do Código de Defesa do Consu-midor – como o mais eficaz instrumento de tutela ambiental, ainda que diante de várias dificuldades práticas.

Crimes de Preconceito e de DiscriminaçãoAutor: Christiano Jorge SantosEditora Saraiva1ª Edição

O trabalho aborda minuciosamente a Lei n. 7.716/89, que trata da discrimi-nação e do preconceito de raça, cor, etnia, religião, e procedência nacional. Embora promulgada há 11 anos, pouco se escreveu sobre essa norma. Em sua análise, o autor pesquisou áreas distintas do conhecimento. Questões correlatas como as regras de imprescritibilidade e inafiançabilidade tam-bém foram analisadas. Após a análise do texto legal propriamente dito, o autor oferece o resultado de pesquisas realizadas junto ao Ministério Públi-co e ao Poder Judiciário a fim de verificar o número de casos registrados e as interpretações dadas nas hipóteses concretas de aplicação da lei. O livro apresenta ainda rico estudo do direito comparado.

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A Superação do Positivismo Jurídico no Ensino do DireitoUma releitura de Kelsen que possibilita ir além de um positivismo restrito e já consagradoOrganizador: João Virgílio TagliaviniEditora: Junqueira e Martins Editores1ª Edição

O grupo de pesquisa Educação e Direito na Sociedade Brasileira Contemporâ-nea apresentou sua crítica à fundamentação epistemológica e metodológica dos cursos de Direito no Brasil, apontando alguns caminhos para a sua supe-ração. Por entender que a educação é muito mais processo do que produto, esta é uma obra aberta, inacabada. Estudantes, profissionais das carreiras jurídicas, profissionais docentes do direito e de outras áreas, principalmente aqueles que se dedicam à formação de professores, são convidados a conti-nuarem esta obra, numa contribuição à melhoria do ensino do direito e à prá-tica da justiça no Brasil. Textos de Márcio Satalino Mesquita; Lauro Teixeira Cotrim; Renato Cássio Soares de Barros; Plínio Antônio Brito Gentil; Angélica Luciá Carlini; e Fernando Frederico de Almeida Júnior.

Julgamentos Históricos do Direito AmbientalCoordenador: Vladmir Passos de FreitasEditora: Millennium1ª Edição

A obra resgata as grandes decisões judiciais sobre o tema do Direito Am-biental. O livro traz comentários de autores de diversos estados brasileiros envolvidos com a matéria e os mais importantes julgamentos do Judiciário brasileiro. Trata-se de estudo inédito e de consulta obrigatória aos que atu-am na área, inclusive em pesquisas acadêmicas. O leitor terá uma boa visão de como o Direito Ambiental evoluiu em nossos tribunais. A obra coletiva traz nomes representativos na área. Vladimir Passos de Freitas é Desem-bargador Federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi Corregedor e Presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, é professor de Direito Ambiental da graduação e da pós-graduação da PUC-PR.

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2 e 3 de dezembro de 2010

Justiça e AdministraçãoPública

ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

Auditório “Julio Fabbrini Mirabete”

Rua Treze de Maio, 1259 - Bela Vista - São Paulo - SP

9h00 - 9h15 - ABERTURA

ELOISA DE SOUSA ARRUDA

9h10 - 10h - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

POR OMISSÃO LEGISLATIVA INCONSTITUCIONAL

RAUL DE MELLO FRANCO JUNIOR

10h00 - 10h30 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

10h30 - 10h45 - COFFEE BREAK

10h45 - 11h35 - A PRIVATIZAÇÃO DA FUNÇÃO PÚBLICA

PRISCILLA NASCIMENTO RAMOS RÁTIS

11h35 - 12h05 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

Procuradora de JustiçaDiretora do CEAF/ESMP

Expositor

Promotor de Justiça de Araraquara e Professor Universitário

Expositora

Advogada e Professora Universitária

9h00 - 9h50 - O PRINCÍPIO DO DIREITO À SUFICIENTE

DEFESA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO

CLEDI DE FÁTIMA MANICA MOSCON

09h50 - 10h20 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

10h20 - 10h35 - COFFEE BREAK

10h35 - 11h25 - O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E NA JURISPRUDÊNCIA

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

EBE PIMENTEL GOMES LUZ

11h25 - 11h55 - PALAVRA ABERTA AO PÚBLICO

Expositora

Advogada e Professora Universitária

Expositora

Advogada e Professora Universitária

Público-alvo:

Inscrições gratuitas:

Membros, Servidores e Estagiários do Ministério Público do Estado de São Paulo, Magistrados,

Defensores Públicos, demais operadores do Direito, e ao público em geral.

até às 15h do dia 01 de dezembro de 2010, pelo preenchimento de formulário on-line,

disponível no sítio da ESMP, www.esmp.sp.gov.br (Vagas limitadas)..Será conferido certificado aos que comparecerem ao evento.

Coordenação Geral

Procuradora de Justiça Diretora do CEAF/ESMPELOISA DE SOUSA ARRUDA

Realização Apoio

Centro de Estudos e Aperfeiçoamento FuncionalESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

DIA 2/12 (quinta-feira) DIA 3/12 (sexta-feira)

Mais informações na homepage da ESMP: www.esmp.sp.gov.br

Seminário

Dia 01 de dezembro de 2010 (quarta-feira) - das 9h às 12h

Auditório “Julio Fabbrini Mirabete”

Rua Treze de Maio, 1259 - Térreo - Bela Vista - São Paulo - SP

9h - 9h10 - Abertura

9h10 - 09h25 - Exibição do documentário

“Uma história Severina”

9h25 - 09h50

ELOISA DE SOUSA ARRUDA

DÉBORA DINIZ

JANAÍNA LIMA PENALVA DA SILVA

Procuradora de JustiçaDiretora do CEAF/ESMP

Expositoras

Professora da Universidade de Brasília ePesquisadora da Anis: Instituto de Bioética Direitos Humanose GêneroPesquisadora visitante na University of Leeds, Universidade do RJInstituto Oswaldo Cruz e University of MichiganDoutora em Antropologia pela Universidade de BrasíliaPós-Doutorada pela Universidade de Brasília

Pesquisadora da Anis: Instituto de Bioética Direitos Humanose GêneroMestre em Direito pela Universidade de Brasília

Público-alvo:

Inscrições gratuitas:

Membros, Servidores e Estagiários do Ministério Público do Estado

de São Paulo, Magistrados, Advogados, operadores do Direito, Estudantes de Direito,Profissionais da Saúde e ao público em geral.

até às 17h do dia 29 de novembro de 2010, pelo preenchimento

de formulário on-line, disponível no sítio da ESMP, www.esmp.sp.gov.br (Vagas limitadas)Será conferido certificado aos que comparecerem ao evento.

Coordenação Geral

Procuradora de Justiça Diretora do CEAF/ESMPELOISA DE SOUSA ARRUDA

Realização Apoio Apoio cultural

Centro de Estudos e Aperfeiçoamento FuncionalESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO

9h50 - 10h40 - “Aborto e Anencefalia”

10h40 - 10h50 - Intervalo

10h50 - 11h20 - “Os cuidados paliativos sob

a ótica médica”

11h20 - 12h00 - “Direito de morrer com

dignidade”

Expositora

Professora da PUC/SP e da Escola Superior do Ministério PúblicoMestre e Doutora em Direito pela PUC/SP

Expositor

Médico do Sírio Libanês e do Hospital das ClínicasEspecialista e Doutorando pela Faculdade de Medicina da USP

Expositor

Advogado e ProfessorMestre pela PUC/SPPós-Graduado em Direito pela Universidade de CoimbraEspecialista em Direito pela Escola Superior do Ministério Públicode São Paulo

CAROLINA ALVES DE SOUZA LIMA

DANIEL FORTE

LUCIANO DE FREITAS SANTORO

PROGRAMAÇÃO

Mais informações na homepage da ESMP: www.esmp.sp.gov.br

PalestraPalestra

no início e no fim da vida

O Direito e a Medicina

no início e no fim da vida

O Direito e a Medicina

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1º Congresso do Patrimônio Público avalia os 18 anos da Lei de Improbidade Administrativa

ano 7 nº 43 Julho-agosto-setembro de 2010

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