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AMANDA CAROLINE ZARPELLON DÉBORA FACHINELLI NISHI DE SOUZA RELAÇÃO ENTRE PREFERÊNCIA PALADAR AO DOCE E NÍVEIS DE MICRORGANISMOS CARIOGÊNICOS EM ESCOLARES DE 12 ANOS DE ARAUCÁRIA/PR CURITIBA 2012

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AMANDA CAROLINE ZARPELLON

DÉBORA FACHINELLI NISHI DE SOUZA

RELAÇÃO ENTRE PREFERÊNCIA PALADAR AO DOCE E NÍVEIS DE

MICRORGANISMOS CARIOGÊNICOS EM ESCOLARES DE 12 ANOS DE

ARAUCÁRIA/PR

CURITIBA

2012

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AMANDA CAROLINE ZARPELLON

DÉBORA FACHINELLI NISHI DE SOUZA

RELAÇÃO ENTRE PREFERÊNCIA PALADAR AO DOCE E NÍVEIS DE

MICRORGANISMOS CARIOGÊNICOS EM ESCOLARES DE 12 ANOS DE

ARAUCÁRIA/PR

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao Curso de Odontologia da

Universidade Federal do Paraná como

requisito à obtenção do título de Cirurgião

Dentista.

Orientadora: Fernanda de Morais Ferreira

CURITIBA

2012

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RESUMO

O objetivo desse estudo foi avaliar a possível associação entre preferência paladar ao doce (PPD) e

níveis salivares de estreptococos do grupo mutans (EGM) e lactobacilos (LB) em crianças.

Participaram da pesquisa 60 crianças de 12 anos de idade matriculadas em escolas públicas do

município de Araucária/PR. A avaliação da PPD foi feita utilizando-se uma versão modificada do

indicador Sweet Preference Inventory (JAMEL et al., 1996), avaliando-se a preferência das crianças

por 6 soluções de chá com diferente concentrações de sacarose: 0,0 M (sem açúcar), 0,075 M, 0,15

M, 0,30 M, 0,60 M e 0,90 M. Os níveis salivares de microrganismos cariogênicos (LB e EGM)

foram analisados a partir de kits comerciais Dentalcult I®

e Dentalcult II®, respectivamente, de

acordo com as instruções do fabricante. No teste PPD, a maioria das crianças (37,8% e 36,1%)

optou pelos chás com concentrações altas (0,6M e 0,9M) ou moderada (0,3M) de sacarose. Os chás

com concentrações baixas de açúcar (0,075M e 0,15M) foram preferidos por 22,9% das crianças e

somente duas crianças (3,3%) escolheram o chá sem adição de açúcar. Aproximadamente metade

da amostra (46%) apresentou nível salivar de EGM correspondente a 106

UFC/ml e 9,8%

apresentaram contagem de LB de 105 UFC/ml. Não houve associação entre a PPD e os níveis

salivares de EGM ou LB (rs= -0,168/ rs= 0,066; p= 0,196/ p= 0,615; respectivamente). Apesar dos

altos níveis registrados no teste PPD e nos níveis salivares de bactérias cariogênicas, não houve

associação entre essas variáveis no presente estudo.

Palavras-chave: Cárie Dentária, Sacarose na Dieta, Streptococcus mutans, Lactobacillus.

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ABSTRACT

The aim of this study was to assess the relationship between the sweetness preference and salivary

levels of mutans streptococci (MS) and lactobacilli (LB) in children. The research was conducted

on a convenience sample of 61 children at the age of 12-year-old, who were regularly attending

public schools from Araucaria/PR. Taste preference for sugar was measured by means of a

modified version of the Sweet Preference Inventory (Jamel et al, 1996), which assessed the

children´s taste preference between 6 solutions of tea containing different concentrations of sucrose:

0.0 M (no sucrose), 0.075 M, 0.15 M, 0.30 M, 0.60 M and 0.90 M. Saliva samples were analyzed

for LB and MS levels using commercial kits Dentalcult I™ e Dentalcult II™, respectively,

according to manufactory’s instructions. The highest sweetness levels (0.60 M and 0.90 M) was

preferred by 37% of the children on the SPI, whenever 22.9% of them chose the less sweet

solutions (0.075 M and 0.15 M) and only two kids chose the tea with no sucrose. Near half (46%)

of the children had high levels of salivary MS (106 UFC/mL) and 9.8% had LB counts up to 10

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UFC/mL. There was no statistical relationship between taste preference for sugar and MS or LB

salivary levels (rs = -0.168 / rs = 0.066; p = 0.196 / p = 0.615, respectively). Besides high levels of

sweetness preference and of salivary cariogenic bacteria were simultaneously detected, these

potential predictors of dental caries were not associated in the studied sample.

Key Words: Dental Caries, Dietary Sucrose, Streptococcus mutans, Lactobacillus.

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INTRODUÇÃO

A cárie dentária é uma doença crônica e tem seu desenvolvimento a partir da associação de

vários fatores, sendo um deles a presença de microrganismos cariogênicos. Porém, apenas a

presença dessas bactérias não é suficiente para desmineralizar o tecido dentário, sendo necessário

um ambiente favorável associado à dieta rica em sacarose (que pode ser modelada pela preferência

do paladar), falta de higiene e outros fatores (LEITES; PINTO; SOUSA, 2006). Um consumo

aumentado de carboidratos fermentáveis na dieta proporciona alterações específicas na microflora

bucal, o que permite maior acúmulo de biofilme e uma maior concentração de microrganismos

acidogênicos e acidúricos, como por exemplo os Lactobacilos (LB) e os Estreptococos do grupo

mutans (EGM) (BEIGHTON; ADAMSON; RUGG-GUNN, 1996). A ativa fermentação dos

carboidratos da dieta pelas bactérias, especialmente a sacarose, acaba tornando o biofilme dental

mais ácido e, por conta do pH baixo, a proliferação destas bactérias acidúricas e acidogênicas é

favorecida (KUTSCH; YOUNG, 2011). Quando há um reequilíbrio no ambiente da cavidade bucal

e o pH volta ao valor neutro, o número destes microrganismos cariogênicos diminui (GUEDES-

PINTO; BÖNECKER; RODRIGUES, 2010). O EGM é apontado como o principal microrganismo

relacionado à instalação da cárie dentária em humanos, enquanto que LB estão mais relacionados

com a evolução da lesão de cárie por colonizarem áreas clinicamente cavitadas (LEITES; PINTO;

SOUSA, 2006). A presença ou ausência de lesões cariosas pode modificar o número de colônias de

Lactobacilos encontrados na cavidade bucal do indivíduo, assim como a higiene inadequada pode

causar um aumento no número destes microrganismos (CAMPUS; LUMBAU; BACHISIO, 2000).

É conhecida a relação entre o consumo de carboidratos fermentáveis (principalmente entre

refeições), os níveis presentes de EGM e LB e a presença de lesões de cárie. Entretanto, poucos

estudos relacionam a Preferência Paladar ao Doce (PPD), que pode influenciar no consumo

individual de carboidratos fermentáveis, e os níveis salivares de microrganismos cariogênicos.

O teste de PPD serve como importante meio de avaliação do consumo de sacarose, pois a

preferência por doces pode representar um fator relevante no consumo individual de açúcar

(TOMITA et al., 1999). Estudos indicam que adultos sem experiência de cárie apresentam limiar

gustatório para o doce mais baixo, sendo capazes de detectar a presença de mínimas quantidades de

sacarose em soluções, enquanto adultos com maior experiência de cárie conseguem detectar a

presença deste carboidrato apenas quando a concentração de sacarose na solução é bem mais alta

(CATALANOTTO; GAULIN-KREMER; SHAW, 1978; MOJARRAD; MAASOUM; VAZIRI,

2008). Desta forma, espera-se que indivíduos com paladares mais sensíveis a sacarose apresentem

menor consumo deste açúcar já que sua sensibilidade a este sabor é maior, resultando assim em

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menor probabilidade ao desenvolvimento da doença cárie. Sugere-se que a preferência pelas

soluções mais concentradas de sacarose também possa ser conseqüência da exposição aumentada ao

açúcar, primeiramente na infância com o início do aleitamento artificial quando há o desmame

precoce, o qual facilita a introdução de sacarose na dieta (FRAIZ, 1997) e, posteriormente, com a

urbanização em que a disponibilidade de açúcar nos alimentos industrializados é grande (JAMEL et

al., 1996). Para Tomita et al. (1999), o nível de instrução dos pais associado ao conhecimento a

respeito dos efeitos prejudiciais do consumo excessivo de açúcar agem como fatores reguladores no

consumo do mesmo na dieta dos filhos.

Beuchamp e Moran (1984) observaram em bebês a capacidade de detecção de açúcar, o que

influencia posteriormente no comportamento dietético. Nesta faixa etária eles indicam suas

preferências através de expressões faciais, o que pode resultar em um aumento da oferta pelas mães

dos produtos que contém açúcar buscando serem recompensadas por expressões faciais de prazer

dos filhos (FRAIZ, 1997). A suplementação da amamentação com o uso de chás e outros líquidos

adocicados disponibiliza o contato precoce com açúcar, além de favorecer a colonização pelo S.

mutans (quando houver dentes decíduos na cavidade bucal) (GUEDES-PINTO; BÖNECKER;

RODRIGUES, 2010). Bebês expostos precocemente a sacarose, no futuro, optarão por produtos

ricos neste substrato, tendo uma predileção maior pelo doce (BEUCHAMP; MORAN, 1984).

Bretz et al. (2006), em seu estudo, encontraram um fator hereditário importante responsável

pela preferência ao doce em crianças, mesmo naquelas com traços culturais e sociais diferentes,

sugerindo que a PPD na infância é determinada por fatores genéticos e não genéticos. O estudo de

Liem e De Graaf (2004) buscou observar a influência de repetidas exposições a soluções doces e

azedas em diferentes concentrações (sendo crescentes a cada dia) por 8 dias na preferência ao

paladar em crianças entre 6-11 anos e adultos. Como resultados, apenas as crianças tiveram sua

preferência paladar ao doce modificado depois das diversas exposições (passaram a preferir a

solução mais adocicada). Não houve mudança no paladar em relação ao azedo tanto nas crianças

como nos adultos. Já o consumo da solução doce pelas crianças aumentou ao final dos 8 dias de

estudo. Como conclusão, sugere-se que a PPD em crianças pode ser modificada conforme a

quantidade de sacarose a qual ela é exposta durante a infância. Esta conclusão está de acordo com

Bretz et al. (2006) quando estes autores citam que os fatores hereditários são importantes na

preferência ao doce apenas durante a infância por causa do reajuste do cálculo da herança da PPD

conforme a idade aumenta.

Carlsson (1989) comparou os níveis de estreptococos do grupo mutans presentes em uma

amostra de pré-escolares poloneses que apresentavam alto consumo de açúcar, aos níveis salivares

encontrados em outras 2 populações com baixo consumo de sacarose, sendo uma amostra de

crianças moçambicanas de 10 a 12 anos e a outra composta por residentes do Sudão. Não foi

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observado altos níveis de EGM na população com alto consumo de açúcar, mostrando que as

diferenças nas dietas das populações estudadas não foram suficientes para alterar os níveis de EGM.

Beighton, Adamson e Rugg-Gunn (1996) publicaram um estudo avaliando a relação entre

dieta, experiência de cárie e os níveis salivares de estreptococos do grupo mutans e lactobacilos de

uma amostra de 328 escolares ingleses de 12 anos. Para a observação dos padrões de dieta os

autores se valeram do método recordatório, analisando a dieta e a frequência alimentar de 3 dias

consecutivos. De acordo com os resultados obtidos, os autores não encontraram relações

significativas entre a dieta e os níveis salivares de microrganismos cariogênicos. Uma hipótese

justificativa considerada pelos autores foi a de que os níveis salivares destes microrganismos podem

aumentar significativamente devido a pobre, ou inadequada, higiene oral e ocorre, desta maneira,

independente da sacarose presente na dieta.

García-Closas, R., Garcia-Closas, M. e Serra-Majem (1997), em um estudo transversal,

encontraram resultados que sugeriram que a associação entre o consumo de alimentos contendo

açúcar refinado e a experiência de cárie dentária é modificada pela contagem de estreptococos do

grupo mutans. Os achados do estudo podem indicar que existe um limite mínimo no número de

colônias de EGM na cavidade bucal que permite que os carboidratos fermentáveis exerçam danos à

estrutura dental. Nos resultados foram encontrados que apenas 22% das crianças com alta

frequência de consumo de alimentos que continham açúcar refinado apresentaram contagens

moderadas a altas de EGM e experiência de cárie.

Em um estudo conduzido com pré-escolares brasileiros (MACIEL; MARCENES;

SHEIHAM, 2001) não foi encontrada associação estatisticamente significante entre o hábito de

ingestão de carboidratos fermentáveis entre as refeições e os níveis salivares de estreptococos do

grupo mutans. Os resultados indicaram que o hábito de ingestão de alimentos que contém sacarose

entre as refeições e os níveis salivares de EGM são potenciais fatores de risco para experiência de

cárie nesta população, mas o mesmo não foi observado com relação à preferência paladar ao doce.

Embora 67% das crianças tenham preferido as duas soluções com maior concentração de sacarose e

grande proporção de crianças tenha apresentado altos níveis de EGM (76,5%), estes dados não se

relacionaram estatisticamente.

Foi demonstrado num estudo conduzido com crianças brasileiras de 3 a 4 anos de idade que

altos níveis salivares de estreptococos do grupo mutans, dieta contendo alta exposição à

carboidratos fermentáveis e a presença de biofilme dental, se associam significantemente à lesões

de cárie incipiente (PARISOTTO et al., 2010). Entretanto os autores não avaliaram as relações

destas variáveis entre si.

O único trabalho descrito na literatura com metodologia semelhante ao presente estudo é o

de Maciel, Marcenes e Sheiham, publicado em 2001, porém ele foi realizado com crianças pré-

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escolares, o que torna relevante a escolha do atual tema a fim de obter novos resultados nesta linha

de pesquisa. Portanto, o objetivo desse estudo é avaliar a possível associação entre preferência

paladar ao doce (PPD) e níveis salivares de Estreptococos do grupo mutans (EGM) e Lactobacilos

(LB) numa amostra de crianças escolares de 12 anos do município de Araucária/PR. Esta

informação pode ser útil para o aconselhamento dietético destas crianças e na identificação de

grupos de risco, uma vez que os fatores estudados podem se associar a cárie dentária.

1. MATERIAL E MÉTODOS

Após a aprovação do Comitê de Ética em pesquisa do Setor de Ciências da Saúde da

Universidade Federal do Paraná (Sisnep 2210.0.000.091-09) e autorização da Secretaria Municipal

de Educação (SMED) de Araucária, foi desenvolvido um estudo transversal com uma amostra de

conveniência constituída por 61 crianças de 12 anos de idade, de ambos os gêneros, escolares

regularmente matriculados nas escolas Eglê (Escola Professora Eglê Cordeiro Machado Pinto) e

Marcelino (Escola Marcelino Luís de Andrade) do município de Araucária, PR. O município de

Araucária se situa a 28,9km de Curitiba, capital do estado do Paraná. A população do município

compreende aproximadamente 119.123 habitantes, sendo 110.293 destes residentes na área urbana

(BRASIL: IBGE, 2010). Segundo dados preliminares do senso escolar 2008, 10.102 crianças estão

matriculadas nos anos finais do ensino fundamental regular do município de Araucária, sendo que

destas crianças 9.607 estão vinculadas a rede pública e 495 vinculadas à rede privada de ensino

(BRASIL: INEP, 2008). A escolha das instituições de ensino se deu através de sorteio aleatório

simples a partir de uma listagem das escolas da rede pública de ensino do município de Araucária

fornecida pela SMED. Os diretores das duas instituições de ensino sorteadas assinaram um Termo

de Autorização para a realização do estudo. Além disso, embora todas as crianças de 12 anos das

escolas previamente citadas tenham sido convidadas a participar, só foram incluídas na pesquisa

aquelas cujos pais/responsáveis consentirem formalmente, através de um Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido, e que individualmente concordaram em participar. Foram excluídas da amostra

as crianças que relataram apresentar alguma contra indicação para o consumo de açúcar ou chá ou

aos componentes das soluções a serem testadas; as crianças que estavam com alguma condição

“debilitante” no dia da coleta de dados como febre (acima de 38ºC), diarréia, coriza, vômito; assim

como aquelas crianças que faltaram no dia do exame.

A avaliação da preferência paladar ao doce das crianças foi feita utilizando-se uma versão

modificada do indicador Sweet Preference Inventory – SPI (JAMEL et al., 1996). Este indicador

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avalia a preferência por diferentes concentrações de uma solução açucarada. As modificações no

teste original se deram nas concentrações de sacarose. Optou-se por trabalhar com concentrações de

açúcar previamente empregadas em pesquisas com crianças paranaenses (MACIEL; MARCENES;

SHEIHAM; 2001), pois se imaginou que estas crianças apresentariam hábitos alimentares mais

parecidos aos da amostra deste estudo. Assim, cada criança recebeu chá mate, da marca Leão®, à

temperatura ambiente, em copos plásticos descartáveis (contendo 10 ml), em sequência crescente de

concentração de açúcar (0,0 M = sem açúcar; 0,075 M; 0,15 M; 0,30 M e 0,60 M e 0,90 M). O chá

com as diferentes concentrações de açúcar era preparado no dia do exame, a partir da erva mate

tostada e triturada, comercializada a granel, seguindo orientações do fabricante, e acondicionado em

galões térmicos devidamente identificados. O chá mate foi escolhido para ser o veículo das soluções

doces considerando-se o clima da região e os hábitos preferenciais de crianças em idade escolar:

está entre as bebidas mais consumidas no sul do Brasil, possui baixo custo, é de fácil preparo, além

de ser encontrado em embalagens prontas para consumo. Entre uma degustação e outra as crianças

eram questionadas sobre qual solução lhes agradava mais e, ao final do teste, elas eram orientadas a

escolher o chá de sua preferência. Também entre as degustações de chás com diferentes

concentrações de açúcar era ingerido um biscoito de água e sal para neutralizar o paladar e garantir

que não ocorresse interferência da solução anterior. Em caso de dúvida, era permitido às crianças

repetir o teste.

Para a avaliação dos níveis salivares de EGM e LB foram utilizados os kits Dentalcult I e

Dentalcult II (Laborclin®,Pinhais-PR, Brasil). Previamente à utilização destes kits, eles foram

validados para uma amostra de adultos e crianças (PINTARELLI, 2011). Foi então coletado uma

amostra de saliva estimulada de cada criança. Um frasco coletor (JProlab®, São José dos Pinhais-

PR, Brasil) e um bloco de parafina (Parafilm M®, Laboratory Film, Chicago, EUA) de 2 cm2 foram

entregues a cada escolar, sendo utilizados de acordo com as instruções do fabricante. No primeiro

minuto, ao mastigar o bloco de parafina, a criança foi orientada a engolir o líquido acumulado. Por

sua vez, a saliva que se formasse nos três minutos seguintes deveria ser dispensada no frasco.

Imediatamente após a coleta, uma alíquota de saliva foi inoculada nos meios de cultura nas

superfícies das lâminas dos kits Dentalcult I e Dentalcult II. Ao fundo do frasco Dentalcult II pôs-se

um comprimido de CO2 (dióxido de carbono) e um disco de bacitracina foi colocado sobre uma das

superfícies do meio de cultura. Os frascos foram transportados ao laboratório lacrados para cultivo

microbiológico em estufas, a 37ºC, por 48 horas e 72 horas (Dentalcult II e Dentalcult I,

respectivamente). A leitura dos resultados e contagem das colônias de EGM e LB seguiram-se após

o término do período de incubação, usando-se o método da comparação visual com o gabarito

fornecido pelo fabricante nos Kits (Laborclin®, Pinhais-PR, Brasil). O número de unidades

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formadoras de colônias (UFC) de EGM e LB / mililitro (ml) de saliva foi calculado para cada

amostra de acordo com os níveis bacterianos ilustrados no gabarito (TABELA 1).

TABELA 1 - NÚMERO DE UFC/ML NOS KITS DENTALCULT I E II, ADAPTADO DO

GABARITO DE COMPARAÇÃO (LABORCLIN®,PINHAIS-PR, BRASIL)

Kit Dentalcult I* Kit Dentalcult II*

Ausência de LB Ausência de EGM

102 UFC de LB/ml de saliva 10

3 UFC de EGM/ml de saliva

103 UFC de LB/ml de saliva 10

4 UFC de EGM/ml de saliva

104 UFC de LB/ml de saliva 10

5 UFC de EGM/ml de saliva

105 UFC de LB/ml de saliva 10

6 UFC de EGM/ml de saliva

106 UFC de LB/ml de saliva >10

6 UFC de EGM/ml de saliva

*Adaptado de Laborclin®, Pinhais-PR, Brasil.

FONTE: PINTARELLI, 2011

Os dados foram tabulados e tratados estatisticamente. Foi realizada uma análise descritiva

das variáveis PPD e níveis salivares de EGM e LB e uma possível associação entre estas variáveis

foi testada através do coeficiente de correlação de Spearman (rs), utilizando-se o programa

Statistical Package for the Social Science (SPSS, versão 15.0; SPSS Inc. Chicago, IL, USA).

Também foi usado o teste de qui-quadrado para avaliar a relação entre PPD e as variáveis gênero e

escola. O nível de significância adotado em todas as análises foi de 5%.

2. RESULTADOS

Participaram da pesquisa 61 escolares de 12 anos do município de Araucária (32 meninos e

29 meninas). No teste de PPD, a maioria das crianças (37,8% e 36,1%) optou pelos chás com

concentrações altas (0,6 M e 0,9 M) ou moderada (0,3 M) de sacarose. Os chás com concentrações

baixas de açúcar (0,075 M e 0,15 M) foram preferidos por 22,9% das crianças e somente 2 crianças

(3,3%) escolheram o chá sem adição de açúcar (Tabela 2). A PPD não diferiu de maneira

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significante entre os gêneros masculino e feminino (p = 0,880; teste qui-quadrado). Também não

houve diferença estatisticamente significante entre a PPD de crianças de diferentes escolas (p =

0,481; teste qui-quadrado).

TABELA 2 – DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DAS CRIANÇAS ESCOLARES DE 12

ANOS DE IDADE DE ACORDO COM A PREFERÊNCIA PALADAR AO DOCE AVALIADA

ATRAVÉS DE UMA VERSÃO MODIFICADA DO INDICADOR SWEET PREFERENCE

INVENTORY. ARAUCÁRIA, PR, BRASIL. 2010.

Concentração de Crianças

sacarose n % % acumulada

0,0 M 2 3,3 3,3

0,075 M 3 4,9 8,2

0,15 M 11 18,0 26,2

0,3 M 22 36,1 62,3

0,6 M 14 23,0 85,2

0,9 M 9 14,8 100,0

Total 61 100,0 100,0

FONTE: AS AUTORAS (2012)

Quase metade das crianças (46%) apresentaram altos níveis salivares de EGM (106 UFC/ml)

e 9,8% apresentaram contagem de LB maiores que 105 UFC/ml (Gráficos 1 e 2).

No gráfico 1 é possível observar que em algumas crianças não foi detectado a presença de

LB, porém todas as crianças da amostra apresentaram níveis salivares de EGM e a maioria em

grande quantidade. As duas crianças que preferiram o chá sem adição de açúcar tiveram as

concentrações salivares de LB de 102 a 10

3UFC/ml e de EGM de 10

5 a 10

6UFC/ml. Já as nove

crianças que preferiram o chá com 0,9M de sacarose (maior concentração de sacarose) tiveram

níveis salivares de LB variando de zero a 105UFC/ml e níveis salivares de EGM variando de 10

3 a

106UFC/ml. Das 22 crianças que optaram pelo chá com concentração de 0,3M de sacarose, treze

delas tiveram a contagem de EGM = 106UFC/ml.

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GRÁFICO 1 - DISTRIBUIÇÃO DAS CRIANÇAS (N = 61) DE ACORDO COM OS NÍVEIS

SALIVARES DE LACTOBACILOS (LB) E A PPD

FONTE: AS AUTORAS (2012)

GRÁFICO 2 - DISTRIBUIÇÃO DAS CRIANÇAS (N = 61) DE ACORDO COM OS NÍVEIS

SALIVARES DE ESTREPTOCOCOS DO GRUPO MUTANS (EGM) E A PPD

FONTE: AS AUTORAS (2012)

Não houve associação significativa entre preferência ao doce e os níveis salivares de EGM e

LB (rs = - 0,68 / rs = 0,066; p = 0,196 / p = 0,615; respectivamente), e entre os dois grupos de

bactérias (rs = 0,144; p = 0,384).

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3. DISCUSSÃO

A preferência paladar ao doce das crianças escolares de 12 anos de Araucária/PR observada

neste estudo foi por soluções com concentrações altas (0,6 M e 0,9 M) ou moderada (0,3 M) de

sacarose (37,8% e 36,1%; respectivamente), o que está de acordo com os resultados encontrados em

outros estudos como o de Tomita et al. (1999), Novais et al. (2004), Bretz et al. (2006) e Mojarrad,

Maasoum, Vaziri (2008), para PPD em crianças e adolescentes de diversos países.

No estudo de Tomita et al. (1999) em que foram avaliados a PPD de crianças pré escolares

em Bauru/SP de diferentes estratos econômicos e o índice de cárie dentária, também houve

predileção pela maior concentração de sacarose, sendo que em média 71,8% das crianças

escolheram a solução de 1,17M de açúcar refinado, independente do sexo, como no nosso estudo,

ou da condição socioeconômica e da idade, embora a faixa etária estudada seja pequena. Neste

estudo, a concentração de sacarose foi aumentada em todas as soluções para o teste PPD porque no

estudo piloto do mesmo a grande maioria das crianças (74,4%) escolheu a solução mais concentrada

(0,59M). Isso sugere que esta população está exposta a produtos, na maioria, com altas

concentrações de açúcar.

Já o estudo de Novais et al. (2004) em que a preferência paladar ao doce foi avaliada com o

intuito de estabelecer associação entre o consumo de açúcar e lesões de cárie em escolares de 7 a 10

anos, também obteve resultado semelhante. Quase metade das crianças teve predileção pela solução

mais concentrada de sacarose (0,59M). Juntas, as soluções mais concentradas (0,44M e 0,59M) são

responsáveis por 69% da preferência destas crianças, o que sugere alto consumo de açúcar. Apenas

7% preferiram o suco sem adição de açúcar. Todos os resultados não dependeram do sexo, como no

nosso estudo, nem da idade, embora a faixa etária estudada seja pequena.

Bretz et al. (2006) também obteve resultados mais elevados para preferência paladar ao doce

em crianças de 4 a 7 anos, residentes em Montes Claros/MG – Brasil. Seu estudo utilizou soluções

de suco de uva e sacarose no qual a solução mais escolhida foi a que continha 1,17 M de açúcar.

Neste estudo, além da concentração de sacarose da solução mais doce ser acima dos valores

geralmente utilizados no SPI (0,59M), o suco de uva já é naturalmente adocicado, o que, somado ao

açúcar adicionado, deixa a solução ainda mais doce. Portanto, sugere-se que há uma maior

preferência de consumo de alimentos contento altas concentrações de açúcar. Os resultados

mostraram que não houve associação significativa entre preferência ao paladar doce com cárie

dentária primária na infância e que fatores genéticos contribuem tanto para as características da

cárie dentária como para a preferência ao doce.

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Os resultados do presente estudo também estão de acordo com os dados obtidos por

Mojarrad, Maasoum e Vaziri (2008) em pesquisa realizada com escolares de 6 a 12 anos de

Hamedan – Iran, onde 15% dos indivíduos avaliados tiveram PPD pela concentração de 0,9 M,

26,4% da amostra à concentração de 0,6 M e 30,9% dos escolares preferiram a solução adoçada

com 0,3 M de sacarose. Estes valores foram muito próximos aos resultados obtidos no presente

estudo no qual 14,8 % dos escolares avaliados preferiram a solução com maior concentração de

sacarose (0,9 M), 23% tiveram PPD pela solução com 0,6 M, e 36,1% da amostra preferiu a solução

adoçada com 0,3M de sacarose. Também não houve diferenças significantes entre idade e sexo no

estudo de Mojarrad, Maasoum, Vaziri (2008).

No estudo de Beighton, Adamson e Rugg-Gunn (1996), com uma amostra também

composta por escolares de 12 anos, avaliando-se uma possível relação entre dieta, experiência de

cárie dentária e níveis salivares de EGM e LB, os autores também não encontraram relações

significativas entre o consumo de sacarose e os níveis de microrganismos. No entanto ambas

variáveis, dieta e níveis salivares de microrganismos, independentemente ou combinadas, foram

relacionadas à experiência de cárie, mas entre si não se associaram.

O estudo de García-Closas, R., Garcia-Closas, M. e Serra-Majem (1997) realizado com 236

escolares espanhóis também avaliou a associação entre a prevalência de cárie dentária, frequência

de consumo de vários grupos alimentares e a contagem de estreptococos do grupo mutans. Não foi

encontrada associação significante entre nenhum dos grupos de alimentos estudados e a prevalência

de cárie na amostra. Este dado pode ser devido ao baixo índice de CPO-D apresentado por esta

população estudada (1,3 na idade de 10,6 anos). No entanto, os resultados desse estudo sugerem que

a associação entre o consumo de alimentos contendo sacarose e a prevalência de cárie é modificada

pela contagem de estreptococos do grupo mutans. Especificamente, os resultados indicaram que um

maior consumo dos alimentos contendo açúcar refinado pode determinar a prevalência de cárie em

indivíduos com moderada a alta contagem de EGM (≥107

UFC S. mutans/L, mas não em sujeitos

com baixos níveis (<107 UFC/L).

Campus, Lumbau e Bachisio (2000) investigaram o índice CPO-D e os níveis salivares de

estreptococos do grupo mutans e lactobacilos de uma amostra de 172 crianças italianas entre 6 e 8

anos de idade. Foram encontradas diferenças significativas na contagem de EGM e LB entre

aqueles com ou sem lesões de cárie na dentição decídua. As crianças com altas concentrações de

EGM e LB são consideradas pacientes de alto risco à cárie, mas apenas a desenvolverão se tiverem

uma dieta rica em sacarose associada à falta de higiene e outros fatores, mas esse risco não se

relaciona diretamente à preferência paladar ao doce do indivíduo.

Acredita-se que a PPD sofra forte influência de fatores genéticos, sociológicos e culturais

enquanto que a concentração de microrganismos é influenciada por fatores locais, dependentes do

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ambiente encontrado na cavidade bucal, principalmente do pH do biofilme. Nesta linha de

pensamento, Parisotto et al. (2010) analisou a relação entre a composição microbiológica da placa

dental, a exposição ao açúcar e a presença de biofilme de 169 pré escolares brasileiros. Eles

concluíram que a presença de açúcar na dieta interfere na composição microbiológica da placa

dental. Por sua vez, a presença do açúcar na dieta, grande parte devido à maior exposição à sacarose

na infância, pode modificar positivamente a PPD em crianças.

O estudo de maior semelhança ao presente foi o de Maciel, Marcenes e Sheiham (2001),

contudo esta pesquisa foi desenvolvida com crianças pré-escolares de 4 a 5 anos em Maringá/PR.

Uma predileção maior pelas soluções contendo mais sacarose também foi encontrada, sendo que

67,5% das crianças preferiram os chás de 0,6M e 0,9M e 17,3% escolheram o chá de 0,3M. Quanto

à contagem de microrganismos, 76,5% das crianças apresentaram altos níveis salivares de EGM

(>106 UFC/ml) e 12% apresentaram níveis moderados de EGM (10

5 – 10

6UFC/ml). Essa

preferência maior pelas soluções mais concentradas de sacarose pode ser pela exposição aumentada

ao açúcar, principalmente com a urbanização em que a disponibilidade de açúcar através dos

alimentos industrializados é grande, o que culmina nessa criança exigir um montante cada vez

maior de alimentos açucarados para chegar ao nível satisfatório de doce do seu paladar (JAMEL et

al., 1996). Também não foi encontrada nenhuma associação significativa entre PPD e os níveis

salivares de estreptococos do grupo mutans no estudo de Maciel, Marcenes e Sheiham (2001) (p =

0,57). Os autores sugeriram que essa possível relação poderia ser melhor estudada avaliando-se uma

amostra maior e com indivíduos mais velhos.

Assim, era esperado que os níveis de EGM das crianças com preferência por soluções de

menor concentração de sacarose fossem menores do que os níveis de EGM das crianças com

preferência por soluções com maior concentração de sacarose, o que não aconteceu, pois neste

estudo, em ambas as soluções de 0,0M e 0,9M as crianças apresentaram níveis moderados a altos

deste microrganismo (105 e 10

6UFC/ml). Os níveis deste patógeno também foram altos nos que

preferiram as outras soluções (pelo menos uma criança de cada grupo apresentou contagem de

EGM = 106UFC/ml). Sugere-se que isto ocorreu porque os níveis salivares de EGM e LB são mais

influenciados pelas condições locais disponíveis no meio bucal, principalmente as provenientes da

quantidade ou idade do biofilme dental (com pH favorável ou não aos microrganismos

cariogênicos) do que a composição da dieta (BEIGHTON; ADAMSON; RUGG-GUNN, 1996).

Portanto, é importante atentar que ao se ter uma predileção ao paladar doce, não significa

necessariamente que esta pessoa terá um consumo excessivo de sacarose suficiente para modificar o

meio bucal e transformá-lo em alto poder cariogênico com altos níveis salivares de EGM e LB. O

mesmo se aplica ao inverso, quando não há predileção ao paladar doce, mas se tem alto consumo de

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carboidratos fermentáveis que deixam o meio propício à grande concentração destes

microrganismos. “O alto ou baixo nível de concentração dos Lactobacilos reflete o alto ou baixo

consumo de carboidratos” (GUEDES-PINTO; BÖNECKER; RODRIGUES, 2010). Esta associação

entre PPD e níveis salivares de EGM e LB depende de diversos fatores genéticos, biológicos e não

biológicos, dentre estes últimos principalmente os culturais, que influenciarão no consumo de

sacarose (que é o elo de ligação entre estas duas variáveis). Dentro da esfera cultural é interessante

citar que o consumo de açúcar pelas crianças é considerado um hábito aprendido pela observação

aos pais, o que prevê que “a melhor estratégia é fazer com que as opções alimentares mais

saudáveis sejam frequentemente escolhidas pela família, para que sejam parte da dieta da criança

também” (GUEDES-PINTO; BÖNECKER; RODRIGUES, 2010).

A relevância do presente estudo é atentar à importância da preferência paladar ao doce como

um possível indicador do consumo de açúcar, de forma que seu conhecimento pode ser útil para o

aconselhamento dietético de crianças com vistas a um consumo racional deste carboidrato e para a

identificação de grupos de risco, uma vez que os fatores estudados podem ser associados à cárie

dentária. Contudo, novos estudos com uma amostra maior podem contribuir para esclarecer a real

relação entre estas variáveis.

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CONCLUSÃO

Com base nos dados obtidos pelo presente estudo é possível concluir que embora tenha sido

detectada neste grupo de crianças de Araucária/PR alta preferência paladar ao doce e altos níveis

salivares de microrganismos cariogênicos, estes fatores não apresentaram associação significante

entre si.

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ANEXOS

1. Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Paraná

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2. Registro do projeto de pesquisa no site do Sistema Nacional de Informação sobre Ética em

Pesquisa (SISNEP).