os sabores da nossa terra - charneca ribatejana · vinhos como factores de riqueza regional e...

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Uma viagem ao património gastronómico do Oeste, do Ribatejo, do Ribatejo Norte, da Charneca Ribatejana e da Península de Setúbal OS SABORES DA NOSSA TERRA OS SABORES DA NOSSA TERRA

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Uma viagem ao património gastronómico

do Oeste, do Ribatejo, do Ribatejo Norte,

da Charneca Ribatejanae da Península de Setúbal

OS SABORES

DA NOSSATERRA

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Uma viagem ao património gastronómico

do Oeste, do Ribatejo, do Ribatejo Norte,

da Charneca Ribatejanae da Península de Setúbal

OS SABORES

DA NOSSATERRA

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A gastronomia e o vinho, como seu natural parceiro, constituem hoje, reconhecidamente, um dos mais importantes produtos da oferta turística nacional, com evidentes, e crescentes, reflexos nas economias regionais.

Conscientes desta realidade, cinco Associações de Desenvolvimento das regiões do Oeste, Ribatejo, e Península de Setúbal decidiram promover, em parce-ria, este livro dedicado à culinária e aos produtos das respectivas regiões.

Depois do trabalho de pesquisa junto de autarquias e outras fontes locais, selecionaram-se vinte receitas e produtos de cada espaço geográfico de actuação, da respectiva associação.

Como é habitual, muitas das receitas recolhidas apresentam mais do que uma versão, com maiores ou menores diferenças, e quase sempre reclaman-do-se de que “esta é que é a verdadeira”, numa clara demonstração do valor atribuído às tradições. Sem surpresas, muito do conhecimento já se perdeu, o que valoriza ainda mais a informação que se recupe-ra nesta e noutras publicações.

O facto de, actualmente, se poder comer pratica-mente de tudo em qualquer altura do ano deverá contribuir para valorizar ainda mais a possibilidade de se acompanhar a sazonalidade para apreciar os produtos hortícolas e de mar nas épocas próprias. Se a esta componente acrescentarmos os métodos

de produção e o conhecimento sobre a origem do que comemos e proporcionamos a quem nos visita, facilmente perceberemos a importância de defender os nossos produtos, a nossa gastronomia e os nossos vinhos como factores de riqueza regional e nacional.

Algumas receitas quase esquecidas e produtos em vias de desaparecer têm vindo a ser recuperados e redescobertos ou mesmo descobertos por novas gerações que, mais informadas, optam pelo que tem mais sabor e garante melhor qualidade de vida.

Pretende-se com esta publicação promover a utili-zação preferencial de produtos regionais, isolados ou integrados na confecção culinária, o que, para além de garantir maior autenticidade e sabor à oferta gastronómica, contribui para o desenvolvimento da economia local.

Compete ao consumidor insistir na procura, como forma de estimular a oferta.

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PORTUGALOeste, Ribatejo Norte, Ribatejo,

Charneca Ribatejana e Península de Setúbal

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Entramos num restaurante à procura de emoções. Quando nos sentamos à mesa, esperamos que a ementa tenha um prato genuíno e que a sugestão de um vinho realce os seus sabores, como se ambos fossem um só, numa união perfeita e harmoniosa. Quando somos servidos, os aromas invadem o nosso espírito. Os olhos brilham e a boca saliva, com a vontade urgente de iniciarmos a primeira garfada e o primeiro brinde.

Gostos e sabores, histórias e tradições, emergem no nosso imaginário, revisitam a nossa memória. E no fundo da alma escutamos: “Estes são nossos, são produzidos na nossa terra, foram acarinhados pelos nossos produtores e pelos nossos chefes, foram con-feccionados com a mestria de anos de sabedoria e experiência”. Algumas receitas carregam séculos de existência, trazem consigo histórias e memórias que surgem enquanto conversamos. Pensamos…Espero voltar um dia…Sozinho, em família ou com alguém especial…

À volta da mesa, cinco Grupos de Acção Local da re-gião do Vale do Tejo – ADIRN, ADREPES, APRODER, CHARNECA RIBATEJANA e LEADEROESTE – deci-diram desenvolver um projecto de cooperação finan-ciado pelo PRODER – Programa de Desenvolvimento Rural, com o objectivo de fazer renascer o receituário do Oeste, da Península de Setúbal e do Ribatejo, dando a conhecer as suas origens históricas, reve-lando as suas influências, inventariando os produtos locais utilizados e o modo como são confeccionados.

Os territórios envolvidos apresentam inúmeros recur-sos. Não só os produtos alimentares de excelência e as tradições gastronómicas, mas também os agentes económicos, cada vez mais interessados em associar a sua promoção às tradições e às heranças culturais. Deste encontro, emerge a genuinidade e a diferen-ciação da oferta turística. O presente livro pretende ser uma descoberta surpreendente do mundo da gastronomia, da cultura e da história do Vale do Tejo. Esperamos que todos os leitores sintam o desejo de experimentar e de conhecer as receitas e os vinhos seleccionados, e que partam à descoberta destas regiões singulares.

Um agradecimento especial à Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa, que apadrinhou este projecto desde o primeiro momento, sempre presen-te, sempre atenta e interessada, defensora e pro-motora da gastronomia local além-fronteiras. Uma saudação aos Municípios, Confrarias Gastronómicas, Comissões Vitivinícolas Regionais e Escolas de Hotelaria e Turismo, pela colaboração, pelos es-clarecimentos e pelo acolhimento, e também aos produtores, aos pescadores, aos cozinheiros e aos chefes que todos os dias trabalham para termos à mesa produtos de elevada qualidade, perpetuando a nossa identidade gastronómica local. Esperamos que sejam cada vez mais.

Bem comido, a minha alma de nada quer saber. E nem os maiores desgostos a conseguem comover.

Molière

INTRODUÇÃO

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PeNíNsUla De seTúbal

Sopa CaramelaEnguias Fritas com Favas de CoentradaArroz de Lamejinhas Lamejinhas com CebolaEspetadas de Ostras Choco Frito àSetubalensePolvo no Forno Caldeirada à Fragateiro da Moita Caldeirada de Alcochete Caldeirada à Sesimbrense Massa de Safio Favas à PameloaLebre à Ti Zé da AvóFarrafuzaFarinha TorradaFogaças de AlcocheteFogaças de PalmelaTortas de AzeitãoQueijo de Azeitão Moscatel de Setúbal e Moscatel Roxo

OesTe

Caldeirada à NazarenaEnsopado de Enguias Lagosta Suada à Moda de PenicheCodorniz Recheada com Couve e ChouriçoCavacas das CaldasCornucópiasTrouxas de OvosPão-de-Ló de AlfeizerãoSardinhas Doces da NazaréMimosos do BombarralPastel de FeijãoBruxas de ArrudaUvadaBolo dos GeneraisAguardente DOC LourinhãLicor de GinjaMaçã de AlcobaçaPêra Rocha Mel de MontejuntoCarapau Seco e Enjoado

Notas Associações PromotorasBibliografiaFicha Técnica

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INDÍCE

RIbaTejO NORTe

Sopa de Nabos com FeijãoSopa de LagostinsSopas de VerdeEnguias do Boquilobo Ensopado de EnguiasMigas de BacalhauChícharos com Bacalhau AssadoCaldeirada de Peixe do RioLampreia de SangueAçorda de SávelFrango na Púcara à Templários Cabrito Assado com Batatas e GrelosFriginada Broinhas de AlcanenaBolos de Cabeça Tigeladas de Ferreira do ZêzereMerendeiras Fatias de TomarFiguinhos de Torres Novas

RIbaTejO

Sopa de Peixe do RioSopa de Coelho Caldeirada à FragateiroTiborna de BacalhauLapardana MagustoEnguias à PaúlCabrito Assado no Forno Carne de Porco à Feira dos SantosFavas com EntrecostoGalo com NozesNaco de Boi com Vinho TintoTorricadoArrepiados de AlmosterCelestes de Santa ClaraQueijadinhas de AzambujaPão-de-Ló de Rio MaiorCaspiadas Queijo Maçussa

ChaRNeCa RIbaTejaNa

Sopa de Feijão com CouveSopa de Feijoca com Massa Sopa da PedraRequentadoAçorda de Sável Ensopado de Enguias Cabrito Assado no Forno à Moda do RibatejoCabrito com Grelos à Moda da AzinhagaArroz de BuchoMigas de Batata com Carne de PorcoFavas com Entrecosto Feijoada à LavradorLebre com Couve e Feijão Branco Arroz de CastanhasMorcelas de Arroz GrelhadasTúberas Mexidas com Ovos Patudos Pudim de PãoBroas de Batata Doce e Amêndoa de BenaventeCarne de Toiro Bravo

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RIBATEJONORTE

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Na extensão do panorama ribatejano, conseguimos abraçar três paisagens distintas: a Lezíria, a Charneca e o Bairro. A Lezíria é a planície que o Tejo rasga, lisa, verde, à espera que o rio alastre para que tudo se torne água, nateiro, vida. A Charneca estende-se do Tejo até ao Alentejo, e esse espraiar faz-se de solos arenosos onde lançam raízes os sobreiros que em tanto enriquecem a região. Por último, o Bairro, a margem direita do rio que se impõe, chão de oliveiras, de figueiras, de vinha, numa vista que abarca serras rochosas e vales frondosos rasgados pelo Tejo e pelos seus afluentes, Zêzere, Nabão, Almonda e Ocreza. Estamos no Ribatejo Norte, território dos Cavaleiros do Templo, devotos, em armas, a Cristo, e dos peregrinos de Nossa Senhora de Fátima. Terra de contrastes, abençoada por solos generosos, por água em fartura, mas também por rudeza e austeridade, com um património religioso, arquitectónico e artístico de valor incalculável.

AlcanenaDesconfia-se que se deve aos mouros os primeiros indícios de trabalhos de curtimentos de pele nesta zona; certo é que, nos finais do Século XVIII, este já era um ofício relevante numa comunidade economi-camente viva. Data de 1792 o alvará de D. Maria I a Manuel Francisco Galveias para o assentamento, em Alcanena, da Fábrica de Sola, Atanados e Bezerros, a segunda instalação industrial do género no País. O brasão real que assinala a licença régia resistiu ao tempo, e é hoje uma testemunha em pedra do valor que esta actividade já detinha nessa época. Sabe-se que a indústria de curtumes foi prosperando ao lon-go de oitocentos anos. Em 1867, contavam-se na fre-guesia 472 fogos, o dobro do número existente cem anos antes. A afluência e a fixação de operários foi crescendo à medida que o investimento em unidades fabris ia aumentando, e essa cada vez maior afluên-cia de trabalhadores foi deixando marcas nos usos e nos costumes regionais. A gastronomia também foi influenciada por estes homens que, por serem de uma classe mais remediada, sempre souberam tirar o melhor partido dos recursos que tinham à mão.

Ferreira do ZêzereFoi em 1159 que D. Afonso Henriques doou aos Templários o termo de Ceras, território que hoje inclui cerca de metade da área do concelho. Anos mais tarde, em 1190, já no reinado de D. Sancho I, o monarca legou a Pedro Ferreiro várias herdades na região, como recompensa dos serviços prestados na luta contra as hordas sarracenas. Senhor de vastas propriedades, o besteiro do rei, Pedro Ferreiro, atri-buiu foral a Vila Ferreiro, futura Ferreira do Zêzere. Em 1319, estas terras já se encontravam nas mãos dos cavaleiros do Templo.

Toda esta região é ilustrada por uma paisagem admirável que desde há muito impressiona artistas e viajantes. A célebre Estalagem dos Vales, hoje desa-parecida, foi tecto de ilustres figuras das artes como o pintor José Malhoa e o actor Taborda. D. Carlos I chegou a pernoitar no modesto albergue. Foi lá que Alfredo Keil escreveu “A Portuguesa”, adoptada como hino nacional em 1911. Com o Zêzere a serpentear pelos vales, o rio tomou lugar nas mesas da zona. Os lagostins, antes uma praga, hoje são um interessante contributo para a gastronomia local.

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Torres NovasO concelho de Torres Novas desenha-se com a ajuda da Serra d’Aire, a Norte, da Serra dos Candeeiros, a Oeste e das terras do Paúl, a Sul. A cidade propria-mente dita assenta nas margens do rio Almonda e firma-se nas colinas que o dominam. O castelo, orgulhosamente altaneiro, sobressai do casario que se multiplicou à sua sombra e é uma prova inequívo-co da antiguidade desta terra. No fio da História, fo-ram-se cruzando por aqui vários povos e credos, dos gregos aos cartagineses, dos romanos que conquis-taram a Lusitânia, aos godos, suevos e alanos que expulsaram de novo os latinos, até que chegaram os árabes escorraçados daqui por D. Afonso Henriques nos alvores da nacionalidade. De lá até hoje, o conce-lho foi-se desenvolvendo. No Século XVI era uma das vilas mais povoadas do reino e, após os infortúnios das invasões francesas e das lutas liberais, a região ganhou fôlego abraçando a revolução industrial que agitava a Europa. Tornou-se um importante centro fabril com a criação de várias fábricas de fundição, de fiação, de serralharia, unidades que empregavam muita gente. A primeira fábrica de papel da Renova foi aqui inaugurada em 1818.

A agricultura, tão importante para a subsistência das gentes, sofreu uma alteração no início do Século XX, com a plantação massiva de figueirais em Torres Novas, como alternativa à vinha. Augusto Durão Alves, na monografia “Torres Novas Ontem e Hoje”, em 1942, já referia várias especialidades à base de figo, sublinhando que o mais característico e regional é o Doce de Figo, rústico, apetitoso e apresentado em cestinhas de verga. Este fruto também originou uma aguardente muito apreciada na região.

Vila Nova da BarquinhaCampos bem cultivados na terra fértil da lezíria, oli-vais que se sucedem, as águas do Tejo a recortarem as fundações do castelo de Almourol e a correrem sem tréguas, assim é a paisagem de Vila Nova da Barquinha. Erguido num afloramento granítico, num rochedo de cerca de 18 metros acima da linha de água, Almourol é uma fortaleza única cuja história remonta à ocupação sarracena da Península. Hoje é um monumento único no panorama nacional e um verdadeiro ex-libris do concelho.

William Grant, viajante irlandês que se aventurou por terras lusas em plenas guerras napoleónicas, des-creve assim a sua passagem pela região: Por todos os lados aparecia uma diversidade de bosques (...) e, para fechar e dar vida à cena, surgia na parte detrás uma linda aldeia onde quase todos eram pescadores. Isto oferecia a vista mais formosa que tínhamos visto desde que tínhamos deixado Lisboa. Esta imagem pi-toresca destaca a importância da pesca nesta região, ocupação ancestral das gentes da terra, habituadas à presença líquida do curso do rio. No Século XIX, as dificuldades em tirar do oceano sustento obriga-ram muitos pescadores do litoral a tentar a sorte no Tejo. Alguns instalaram-se no concelho, construindo aldeias piscatórias e aproveitando em muito a abun-dância dos recursos naturais fornecidos pelos três rios que banham a região: o já referido Tejo e os seus afluentes Zêzere e Nabão.

Se o peixe de rio sempre fez parte da mesa dos ha-bitantes da região, o azeite, desde o Século passado, tornou-se um produto vital para a economia local, tendo-se multiplicado lagareiros e lagares por todo o concelho.

OurémTerra de velhos pergaminhos, Ourém já era citada no Século XII, quando ainda era conhecida por Abdegas. Com a expulsão dos árabes do território pelas forças de D. Afonso Henriques, o topónimo foi alterado para Aurem, que viria a dar em Ourém. Frei Bernardo de Brito, na “Crónica da Ordem de Cister”, tem uma ver-são bem mais poética acerca do nome do concelho. Conta que, no distante dia de São João de 1158, João Henriques, um cristão que participou na tomada do castelo de Alcácer do Sal, raptou uma princesa árabe e escondeu-a num recanto da Serra de Aire. Fátima, uma moura de coração doce, apaixonou-se pelo seu sequestrador e converteu-se ao cristianismo, mudando o nome para Oureana. O lugar onde o casal se refugiou na serra viria, segundo Frei Bernardo de Brito, a adoptar o nome cristão da princesa, dando origem a Ourém, a vila de Oureana.

Com a erradicação dos sarracenos desta região, D. Afonso Henriques entregou à Ordem de Cister uma boa parcela de terras. Os monges instalados no Mosteiro de Tomareis amanhavam os solos e tor-naram-se um motor impulsionador da economia da zona. O vinho, elemento tão simbólico na Eucaristia, foi um dos produtos a que a Ordem se dedicou com cuidado. Apreciado por toda a região, os monges transmitiram aos habitantes da zona o seu método de produção de vinho.

Actualmente, este vinho palhete, cujo método de vinificação conta com oitocentos anos de história, constitui uma das muitas ofertas genuínas e de qualidade disponíveis na «Ucharia do Conde», um espaço de promoção dos produtos locais situada no edifício da antiga prisão, no bonito Centro Histórico de Ourém.

TomarGualdim Pais, figura de referência para os naban-tinos, era Mestre da Ordem dos Templários quan-do estes monges guerreiros ajudaram D. Afonso Henriques a tomar Santarém. O monarca, agra-decido, doou aos cavaleiros do Templo o castelo e as terras de Ceras, a que mais tarde se juntou o de Almorol e o de Pombal. Esta era, na altura, uma zona devastada pela guerra, quase deserta pelas desafortunadas consequências das lutas com os sarracenos, um território pronto a ser apaziguado e desenvolvido por estes guerreiros que levavam a cruz de Cristo ao peito. Como o castelo de Ceras era uma ruína desolada, o Mestre Gualdim Pais construi num morro das margens do Nabão o castelo que havia de ser cabeça da melícia. A fortaleza tomou o nome de Tomar, assim como a vila que ia crescendo aos seus pés. Hoje, quase todo o grande acervo patrimonial do concelho está relacionado com a Ordem do Templo e com a sua sucessora Ordem de Cristo. Das muitas edificações, há uma que se destaca, o Convento de Cristo, incontornável e de visita obrigatória. Raul Proença escreveu: Se Guimarães foi o berço dinástico de Portugal, o símbolo da reconquista nacional (…) está em Tomar, no monumento que transplantou para uma das fronteiras de Portugal do Século XII uma evocação do Templo da Cidade Santa, enriquecido de policromias e oiros ardentes.

A herança da Ordem ainda hoje persiste e vai muito além da pedra e da arte. A gastronomia também a lembra com as famosas fatias de Tomar, um doce conventual que, segundo a lenda, era o preferido dos monges. Tal como manda a tradição, exorbita na quantidade de ovos e açúcar, verdadeiros potencia-dores do pecado da Gula.

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AlcanenaMorcela de arroz grelhada, farinheira, sopas de feijão com couves e de nabos com feijão, massa de baca-lhau, migas de bacalhau, cachola, cabrito guisado, favas guisadas com carne de porco e iscas de porco à Ti Violeta. Nos doces, destacam-se as rocas, as broinhas de Alcanena, as rabichas e as broas de mel. O vinho, os vinagres e os licores da serra de Santo António fazem igualmente parte da oferta de sabores deste concelho.

Ferreira do ZêzereQueijo das Areias, omelete de lagostim, lagostim de capote, peixinhos da horta, sopas de lagostim, de fava ou de abóbora, achigã frito com arroz de tomate e migas, risoto de lagostim, coelho na abóbora, leitão à ferreirense ou cabrito assado com grelos. Nos do-ces é difícil resistir às tijeladas, aos bons maridos e boas esposas, às estrelinhas do Zêzere, às queijadas de queijo, aos bolinhos dos santos, às migas doces ou à mousse de fava.

OurémFarinheira branca, broa da Freixianda, merendeiras salgadas, morcela de arroz, papas de milho com abóbora, sopas de verde, sopa de bacalhau, sopas de feijão ou de azeite, mexudas ou esparregado, chí-charos com bacalhau assado, friginada ou tachada, carneiro à Vale Travesso e coelho à bruxa. Nos doces, destacam-se as merendeiras doces, o bolo de arco, de cabeça ou de festas e os bolinhos dos santos.

TomarBolas de carne ou enchidos, bacalhau à Nabão, lampreia com molho de sangue, almôndegas de lebre à D. Henriqueta, couves à D. Prior, cabrito à Templários, frango na púcara à Templários, frango à freire de Cristo, vaca de molho de bruxa e feijoada de caracóis. Nos doces, os bolos de cama ou, sugestiva-mente, os beija-me depressa, e também os caladi-nhos, estrelas de Tomar, queijadas de gila, pudim da sogra, rosas de Tomar, pastelinhos de Santa Marta, broinhas do convento e as cornucópias.

Torres NovasOvos cá do sítio, petingas no forno, morcela de arroz, sopa de couve com feijão à moda de Riachos, sopa de fressura à moda de Riachos, crescidos das couves com feijão, migas à Manuel Pescador com enguias no espeto, enguias do Boquilobo, cabrito assado com batatas e grelos, migas de bacalhau, requentado com bacalhau assado ou petingas fritas. Nos doces, fi-guinhos de Torres Novas, figos de capa rota, doce de amêndoa, bolinhos de farinha de milho, bolos de ca-beça ou bolos de noivos, palitos de Sabóia e sopapos.

Vila Nova da BarquinhaMolhata de enguias, peixinhos do rio de escabe-che, sopa de peixes do rio, sopa de peixe à Sol Tejo, caldeirada de peixe do rio, barbos de molhata, fataça na telha, açorda e sopa de sável, arroz de lampreia e cabrito frito da Praia do Ribatejo. Nos doces, o destaque vai para o pirilau do Padre Ambrósio, mas é difícil resistir também ao bolo de noz, ao bolo de Natal, às velhozes e ao doce de pão.

GASTRONOMIA REGIONAL

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AGENDA GASTRONÓMICA

FevereiroMostra da Lampreia, em Tomar

MarçoFeira dos Produtos da Terra, em OurémMês do Sável e da Lampreia, em Vila Nova da Barquinha (Mar./Abr.)

AbrilFestival de Lagostins do Rio, em Ferreira do ZêzereDe Tomar e dos Conventos – Doçaria Tomarense, em Tomar

MaioVai à Fava - Festival Gastronómico da Fava, em Ferreira do ZêzereCongresso da Sopa, em TomarFestival de Cozinha Medieval, Festa Templária, em TomarFeira d’Época, em Vila Nova da Barquinha

JunhoFestival Gastronómico Coisas d’Ovo, em Ferreira do ZêzereFestival do Azeite e das Ervas Aromáticas, em AlcanenaFeira Medieval, em Torres NovasFesta dos Tabuleiros, em Tomar (de 4 em 4 anos, em Jun./Jul.)

JulhoFestas do Almonda, em Torres Novas

AgostoFestival Gastronómico da Enguia, em Boquilobo, Torres Novas

OutubroTodos com o Feijão... Feijão com Todos, em TomarFeira dos Frutos Secos, em Torres Novas

Novembro Festival Migas com Todos, em Ferreira do ZêzereFestival Gastronómico da Cachola e da Morcela, em AlcanenaProva do Azeite, em Vila Nova da Barquinha (Nov./Dez.)Festival do Chícharo, em Bugalhos, Alcanena.

De Fevereiro a Novembro, jantares temáticos men-sais na “Ucharia do Conde”, em Ourém

Vinhos da RegiãoOs vinhos produzidos nesta região integram a Comissão Vitivinícola Regional do Tejo. Excepção para o município de Ourém, que integra a Comissão Vitivinícola Regional de Lisboa.

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SOPA DE NABOSCOM FEIJÃO

Pela sua consistência encorpada, esta Sopa de Nabos com Feijão é um alimento reconfortante para comer quando a Primavera chega com as novas hortaliças, mas trazendo ainda consigo temperaturas que pedem comida quente. O feijão branco, com a sua textura suave e cremosa, nunca falta na tulha de qualquer casa de lavrador. E basta ir à horta arrancar dos alfobres as verduras, combinando o sabor amargo dos nabos com o adocicado das cenouras. E aí está tudo o que é necessário para fazer uma sopa simples mas nutritiva, com os produtos que foram cultivados pela família.

Ingredientes1 kg de feijão branco; azeite; sal; 2 cenouras; batata q.b; 1 ou 2 cabeças de nabo e a rama dos mesmos.

PreparaçãoCoze-se cerca de 1 kg de feijão branco. Depois de cozido, passa-se pela máquina, reservando duas conchas de feijão inteiro que se junta ao puré. Vai ao lume, com uma pinga de azeite e sal a gosto. De seguida, migam-se as ramas dos nabos, cortam-se em quartinhos as cenouras, as batatas e as cabeças de nabo. Quando o puré estiver a levantar fervura, deita-se tudo na panela e deixa-se cozer bem até a batata começar a desfazer-se. No fim de cozinha-do, serve-se. Há quem acompanhe com pão frito ou quem coma com migas de broa. Também pode servir-se com bacalhau assado, temperado com alho e azeite.

Para acompanhar esta sopa, escolha um vinho jovem tinto da Região Tejo, sem estágio em madeira.

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SOPA DE LAGOSTINS

O lagostim de água doce é uma espécie exótica proveniente do sul dos Estados Unidos, introduzida em Portugal através de Espanha, e que rapidamente se espalhou pelas diferentes bacias hidrográficas da Península Ibérica. A sua proliferação causa enormes prejuízos nas culturas devido à sua actividade escavadora, provocando alterações na hidrologia e nos solos, incluindo a perda de água nos arrozais e em reservatórios. Para tentar lutar contra essa autêntica praga que invade as águas do rio e da albufeira de Castelo do Bode, a vila de Ferreira do Zêzere lançou há alguns anos uma iniciativa que se tem vindo a repetir por alturas da Primavera, subordinada ao mote “Se não podemos vencê-los, vamos comê-los!”. Durante o Festival Gastronómico do Lagostim de Rio, que conta com a adesão de restaurantes da região e a afluência de apreciadores, são propostos diversos pratos inovadores à base do lagostim, confeccionado nas mais diferentes formas, entre as quais a Sopa de Lagostins do Rio.

IngredientesLagostins; batatas, azeite, alho, cebola, tomate, ce-noura, coentros e sal.

PreparaçãoCozem-se os lagostins à parte em água e sal. Depois de frios, descascam-se e reservam-se num prato. Faz-se um refogado com azeite, dentes de alho, bastante cebola, muito tomate, cenoura picadinha e um molho de coentros. Quando já está a refogar, acrescenta-se-lhe uma ou duas batatas aos quartos e um pouco do caldo onde se cozeram os lagostins. Deixa-se cozer bem para apurar e rectificam-se os temperos. No fim, juntam-se os lombos dos lagostins previamente descascados.

Como se trata de uma sopa com marisco, opte, para a acompanhar, por um vinho branco seco, frutado, jovem ou levemente maduro da Região Tejo. Evite os vinhos brancos com presença de madeira.

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SOPASDE VERDE

De acordo com a tradição oral, o nome desta receita, com origem na região serrana, deriva de sangue – “o verde” - pois tem por base a utilização do sangue e das vísceras dos carneiros tradicionalmente abatidos para os banquetes nupciais ou as festividades de cariz religioso, numa perspectiva de aproveitamento máximo dos parcos recursos disponíveis. Com o abandono da pastorícia e o consequente desaparecimento da criação de ovinos, os organizadores das festas passaram a comprar a carne e o sangue nos talhantes que, muitas vezes, em vez de sangue e de vísceras de carneiro, vendem de vaca. Mas, apesar destes desvios, a tradição mantém-se e, em dias de festa, em mesas corridas, sentam-se paroquianos e visitantes para saborear as Sopas de Verde, que ninguém faz em casa, pois ”sabem muito melhor quando são feitas em conjunto por muita gente”.

Ingredientes1 kg de vísceras de carneiro, de cabra ou de vitela e, eventualmente, carne das mesmas reses; sangue dos referidos animais; 1 cebola grande; 2 dentes de alho; 0,5 l de vinho branco; pimentão doce q.b.; 1 folha de louro; 1 raminho de hortelã; 0,5 kg de pão caseiro, de preferência com dois dias de cozedura; sal q.b. e piripiri opcional.

PreparaçãoNum alguidar de barro, coloca-se a carne a mari-nar com o vinho e todos os temperos, durante, pelo menos, 1 hora. Coze-se o sangue, de preferência em panela de ferro, só em água e sal. Já cozido, corta-se em pedaços pequenos para um tacho de barro onde já se deve encontrar alourada a cebola. Junta-se-lhe o conteúdo do alguidar e deixa-se guisar em lume brando. Com o guisado pronto, acrescenta-se-lhe água, para fazer molho e deixa-se ferver um pouco.

Numa terrina, põe-se o pão em fatias, ou migado à mão, com o raminho de hortelã. Sobre ele, derrama-se o molho do guisado, para ensopar e coloca-se a carne por cima. Deve servir-se bem quente1.

Sendo este um prato de carne pouco elaborado, acompanha bem com vinhos tintos da Região Tejo que tenham menor complexidade. Assim, procure um tinto jovem, sem estágio em madeira, para ligar com esta sopa.

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ENGUIAS DO BOQUILOBO

A Reserva Natural do Paúl do Boquilobo situa-se nas margens do Rio Almonda, um afluente do Tejo, na junção dos concelhos de Torres Novas e Golegã. Esta reserva consiste numa zona húmida natural de água doce, rodeada por pântanos e sulcada por numerosas valas, que contribuem para a extraordinária fertilidade desta área. É grande a sua riqueza em termos de habitats tanto para espécies animais como para espécies vegetais, mas as aves constituem o valor fundamental do Paúl do Boquilobo, sendo a principal razão pela qual é classificado como Reserva Natural. Por aqui passam milhares de aves para nidificar ou como ponto de paragem na rota da migração. O Paúl apresenta igualmente um interesse relevante para a conservação da fauna piscícola, oferecendo boas condições para a reprodução de muitas espécies ou para a subsistência de outras, como é o caso da enguia que, subindo o curso dos rios, aqui encontra o local ideal para viver. A abundância de enguias é uma vantagem económica para os habitantes das imediações, que a pescam para comercialização e para consumo próprio, de formas variáveis, tornando famosas as enguias de Boquilobo. De tal maneira que, anualmente, com o patrocínio da Câmara de Torres Novas, se realiza na aldeia de Boquilobo, o Festival Gastronómico da Enguia.

IngredientesPara enguias fritas: 1 kg de enguias; farinha; sal q.b.; vinagre e sumo de limão para temperar

Para enguias grelhadas: 1,2 kg de enguias; 1 ce-bola; azeite; sal q.b.; vinagre e sumo de limão para temperar.

PreparaçãoEnguias fritas: Temperam-se as enguias com sal, envolvem-se em farinha e fritam-se em óleo bem quente durante cerca de 10 minutos. Retiram-se para uma travessa e temperam-se com vinagre e sumo de limão.

Enguias grelhadas: Depois de previamente tempera-das com sal, levam-se as enguias a assar em grelha de carvão durante 15 minutos, aproximadamente.

Qualquer uma destas receitas é normalmente acom-panhadas com migas de bacalhau 2.

Estes dois pratos de peixe têm uma certa complexi-dade, por isso, ambos requerem, para acompanhar, um vinho branco estruturado e untuoso em que o es-tágio em madeira de carvalho lhe traga maior sofisti-cação. A Região Tejo tem uma variedade de brancos assim. As castas base destes vinhos são normal-mente Fernão Pires, Arinto, Verdelho, Trincadeira das Pratas e Viogner.

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ENSOPADODE ENGUIAS

O Ribatejo Norte é uma região cruzada por diversos rios, constituindo a bacia hidrográfica do Tejo, que tem como principais afluentes o rio Zêzere, o Nabão, o Alviela, o Almonda e o Ocreza. Esta abundância de cursos de água veio, desde cedo, definir a cultura e o modo de vida das populações, imprimindo no seu quotidiano a marca da borda de água. Por isso, a pesca e o transporte fluvial de pessoas e bens foram, durante gerações, as actividades principais de grande parte dos habitantes das povoações das margens dos rios, cuja alimentação era condicionada pelos recursos de que mais facilmente dispunham: o peixe do rio. A grande quantidade de enguias que, ainda hoje, sobem os rios, apesar dos diferentes obstáculos que se levantam à sua migração, fez surgir nas diferentes localidades situadas ao longo das margens várias formas de confeccionar este peixe, das quais se destaca o ensopado que, com pequenas variações, faz parte do receituário de toda esta zona.

Ingredientes

1,2 kg de enguias; 3 cebolas grandes; 1,5 dl de azeite; 750 g de tomate maduro; 2 dentes de alho; 1 folha de louro; 1 ramo de salsa; 1 colher de sopa de colorau; 2 dl de vinho branco; 2 pimentos; sal e pimenta q.b.; 300 g de fatias de pão duro frito em azeite ou torra-do na altura.

PreparaçãoAmanham-se as enguias e cortam-se em bocados regulares. Temperam-se com sal. Cortam-se as cebolas em rodelas e alouram-se em azeite. Quando as cebolas estiverem bem louras, junta-se o tomate cortado em bocados grossos, os dentes de alho es-magados, o louro, a salsa, o colorau, o sal e a pimen-ta. Deixa-se refogar um pouco, junta-se os pimentos, o vinho branco e as enguias, envolvendo-as bem no refogado.

Serve-se sobre o pão frito ou torrado.

Acompanhe com vinho branco estruturado, com estágio em madeira. Seleccione um da Região Tejo, terroir de eleição para os brancos portugueses.

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MIGASDE BACALHAU

Tivemos sempre pão,Nem que fosse pouquinho,Era bem dividido,P’ra todos um bocadinho.

Esta simples quadra popular reflecte uma realidade social em que até o pão, mesmo sendo pouco, tinha que chegar para muitos. Era a realidade vivida na zona de origem deste prato, a zona serrana do Ribatejo, em que as pessoas tinham muitas dificuldades económicas e comiam o que aparecesse. Longe do litoral, o peixe era escasso: o único a que tinham acesso era ao bacalhau. Com ele, as mulheres preparavam, de madrugada, numa panela de ferro ou de barro, uma refeição que levavam embrulhada em serapilheira para ser comida ao meio-dia pelo rancho da apanha da azeitona. Ao longo de gerações de camponeses, com restos de pão e uma lasca de bacalhau, às vezes com batatas e azeitonas, era este o alimento para um dia de trabalho de sol a sol.

Ingredientes2 postas de bacalhau demolhado; 1 kg de batatas; 200 g de pão de trigo caseiro ou 300 g de broa de milho; 4 dentes de alho; 3 ovos cozidos; azeitonas; salsa ou coentros picados; 2,5 dl de azeite, sal q.b.

PreparaçãoCozem-se as postas de bacalhau, escorrem-se, aproveitando-se o caldo, e lascam-se. Depois de descascadas, cortam-se as batatas em bocados pequenos, cozem-se em água e sal e, depois de cozidas, escorrem-se e misturam-se com o bacalhau. Esmagam-se grosseiramente dois ovos cozidos e corta-se o outro em gomos ou em rodelas. No fundo de um tacho largo de barro, com tampa e que possa ir ao lume, dispõe-se o pão previamente migado, me-tade da salsa picada e dois dentes de alho picados. Coloca-se o bacalhau com as batatas e, por cima, os restantes alhos e a salsa picados, os ovos cozidos e as azeitonas. Rega-se primeiro com cerca de 3 dl do caldo de cozer o bacalhau e, de seguida, com o azeite. Tapa-se e leva-se ao lume, fervendo cerca de 10 minutos. Retira-se e destapa-se só na mesa.

Prato de sabor intenso, com texturas macias, onde o pão está presente. Pede um vinho com bom volume, não necessariamente pesado. Opte por um branco estruturado, com estágio em madeira, da Região Tejo.

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CHÍCHAROS COMBACALHAU ASSADO

Os chícharos são um tipo de leguminosa que era muito comum em Portugal, sobretudo nas aldeias serranas do concelho de Ourém, onde os terrenos são áridos e pobres, pois a sua cultura não é exigente e resiste bem às secas. Assemelham-se ao termoço, mas têm uma textura suave e aveludada. Muitas vezes usados como forragem, nas casas mais pobres eram a base da dieta alimentar e, por isso, associados a tempos de escassez. Caíram em desuso em meados do século passado, provavelmente devido a essa ligação com a pobreza e à medida que as condições de vida foram melhorando. No entanto, são ricos em nutrientes e muito versáteis. Mais recentemente, voltaram a ser semeados e, para a sua promoção,organiza-se anualmente, desde 2003, no concelho vizinho de Alvaiázere, um festival que atrai inúmeros visitantes desejosos de provar este verdadeiro pitéu bem português. Nesta mesma localidade e com o mesmo objectivo, foi criada em 2010 a Confraria do Chícharo.

IngredientesCebola; azeite; chícharos; miolo de broa; bacalhau assado.

PreparaçãoNa véspera de os chícharos serem cozinhados, são escolhidos para dentro de um alguidar, cobrem-se de água abundante e ficam de molho uma noite. Em seguida, cozem-se como se fossem feijões e, depois de cozidos, deitam-se num prato com miolo de broa e cebola crua picada. Mistura-se tudo e estão pron-tos a comer como acompanhamento de bacalhau assado, regado com bom azeite3.

Este prato de bacalhau com bom porte tem como aliado um vinho branco intenso e estruturado, com estágio em madeira. A acidez e a persistência são fulcrais para compensar a suculência deste prato. Opte por um branco da Região Tejo.

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CALDEIRADA DE PEIXE DO RIO

O concelho de Vila Nova da Barquinha é caracterizado pela presença de três cursos de água que o enquadram e delimitam – o Nabão, o Zêzere e o Tejo. Não admi- ra, por isso, que a sua economia esteja marcada desde sempre pela sua localização ribeirinha, desde o transporte fluvial até à pesca. Da mesma forma, não é estranho que a sua gastronomia seja dominada pelos rios, encontrando neles os principais ingredientes para a sua cozinha tradicional. A Caldeirada de Peixe do Rio é um prato típico deste concelho, confeccionado com peixes capturados no rio Tejo, nomeadamente a fataça, o barbo, a enguia e a carpa. Com o molho da Caldeirada ainda se faz um segundo prato, regando com ele pedaços de pão duro e fazendo uma sopa.

Ingredientes2 kg de vários peixes do rio - fataça, barbo, enguia e carpa; 3 cebolas grandes; 4 tomates grandes; 3 den-tes de alho; sal e pimenta; 1 ramo de salsa; 2 folhas de louro; 1 pimento; 1 dl de azeite; 1 copo de vinho branco; piripiri.

PreparaçãoColocam-se no fundo do tacho os vários peixes já amanhados e cortados. Por cima, uma camada de rodelas de cebola e outra camada de peixe. Cobre-se com rodelas de tomate e, por cima, alho picado, sal e pimenta, alguns pés de salsa e meia folha de louro. Todos os ingredientes formam camadas e, sobre a última camada, coloca-se o pimento cortado em ti-ras. Rega-se com o azeite e o vinho branco e junta-se o piripiri. Leva-se a lume forte para levantar fervura rapidamente. Reduz-se o calor e deixa-se cozer tapado, até o pimento estar macio. Acompanha com fatias de pão duro fritas em azeite ou com batatas cozidas às rodelas.

Sopa de Peixe do Molho da Caldeirada: Miga-se pão de trigo caseiro num alguidar e, de seguida, deita-se o molho que ficou da caldeirada por cima do pão e abafa-se.

Esta caldeirada liga com um vinho branco, jovem, frutado e acídulo. Procure um vinho bem estruturado, feito a partir da emblemática casta Fernão Pires, que domina os brancos da Região Tejo.

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AÇORDADE SÁVEL

Há já vinte anos que o concelho de Vila Nova da Barquinha organiza um certame em que o protagonista é o sável pescado no Tejo. Esta iniciativa tem como principal objectivo promover os sabores do rio e a cozinha típica e tradicional que tem como base os produtos da região. A vida deste concelho está intimamente ligada à actividade piscatória, pois o seu território é banhado por três rios – o Nabão, o Zêzere e o Tejo – cuja presença influenciou desde sempre o modo de viver e a cultura dos seus habitantes, muitos dos quais continuam a dedicar-se à pesca.

Apesar dos inúmeros obstáculos que o sável vai encontrando no seu caminho quando sobe o curso dos rios para desovar perto das nascentes, e que provocam a diminuição dos efectivos que conseguem prosseguir viagem, à sua passagem pelas imediações da Barquinha, muitos são capturados pelas redes dos pescadores fluviais, permitindo, assim, que os apreciadores da gastronomia tradicional se deliciem com algumas especialidades confeccionadas com este peixe de carne saborosa, entre elas a célebre Açorda de Sável.

Ingredientes1 kg de sável; 7 dentes de alho; 1 ramo de coentros e salsa; 1 dl de azeite; 240 g de pão duro; 1 l de água; sal e limão.

PreparaçãoEm água e sal cozem-se a cabeça, o rabo e as ovas do peixe. Noutra panela deita-se o pão cortado aos bocadinhos, escaldando-se bem na água da co-zedura depois de coada. Com uma colher de pau, desfaz-se o pão até se conseguir uma papa uniforme e levemente seca. Juntam-se o azeite e os dentes de alho e leva-se ao lume. Acrescentam-se, sem exage-ro, sumo de limão, salsa e coentros picados. Sobre este preparado, esfarelam-se as ovas e um pouco do peixe desfiado. Depois da açorda pronta, pode adicionar-se uma ou duas gemas de ovo. As postas do sável, cortadas bastante finas, fritam-se numa frigideira em azeite bem quente até ficarem “esmaia-damente” torradas.

Nota – Podem embrulhar-se as postas de peixe, ainda cruas, em toalhas turcas e bater sem moer, de um e de outro lado, para que as espinhas fiquem apresadas nos panos.

A intensidade do sabor da açorda - com o pão, o azeite quente e o alho - e do sável frito pede um vinho branco estruturado, com estágio em madei-ra, para se bater com a estrutura e a suculência do prato. A Região Tejo é pródiga na oferta de brancos desse género.

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LAMPREIA DE SANGUE

A lampreia de Ourém ou lampreia do Nabão, “Lampetra auremensis”, foi identificada recentemente como sendo exclusiva de algumas ribeiras da bacia do Rio Nabão, afluente da margem direita do Rio Tejo, e ainda com populações diminutas nas ribeiras do norte do concelho de Ourém.

Tendo passado parte da sua vida no alto-mar, quando chega à idade adulta, este estranho animal sobe o caudal do rio onde nasceu, para desovar. E a cidade de Tomar, graças à excelência desta espécie pescada nos cursos de água que banham o seu concelho, torna-se, entre o final do Inverno e o início da Primavera, um dos principais destinos dos apreciadores, quase viciados, deste pitéu.

Ingredientes1 lampreia e o sangue; 1 dl de vinho tinto; 1 cebola; 1 cenoura; 2 dentes de alho; manteiga; 1 colher de azeite; vinho branco; sal e pimenta q.b.; sumo de limão.

PreparaçãoAmanha-se a lampreia, aproveitando o mais possí-vel o sangue que ela contém, lavando a barriga com 1 dl de vinho tinto para completo aproveitamento. Depois, Parte-se em postas de 4 cm, que se tempe-ram com sal, pimenta, sumo de limão e 2 dentes de alho finamente picados. À parte, faz-se um refogado com cebola e cenoura picadas, uma colher de azeite e manteiga. Quando a cebola ficar loura, acrescen-tam-se os bocados da lampreia que se deixam ferver um pouco, dando-lhes algumas voltas na gordura. Em seguida, deita-se a marinada, deixando-se cozer a lampreia. Acrescentam-se, de quando em quando, mais colheres de vinho branco e água, em partes iguais. Quando a lampreia está cozida e o molho apurado, junta-se o sangue, deixando-se cozer por uns momentos. Acompanha com arroz de manteiga.

Esta especialidade da gastronomia ribatejana me-rece ser regada com um bom vinho tinto maduro da Região Tejo. Procure um vinho complexo mas harmo-nioso que faça ligação com o tempero da marinada.

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FRANGO NA PÚCARAÀ TEMPLÁRIOS

A receita do Frango na Púcara é, provavelmente, a recriação moderna de um prato da cozinha tradicional da região de Alcobaça. Inicialmente, e até meados do século XX, a receita seria Perdiz na Púcara, que congregava muitos apreciadores. Quando as perdizes começaram a escassear, por volta dos anos 60, um célebre cozinheiro de Alcobaça, António de Sousa, conhecido pelo nome de Bonzíssimo, criou uma variante, o Frango na Púcara, cozinhando a ave doméstica com os ingredientes necessários para que o seu sabor se aproximasse do da receita original. Muito saboroso e muito mais acessível, tornou-se, desta forma, um prato muito popular, não apenas em Alcobaça, mas também um pouco por todo o País, embora com pequenas alterações. De comum, o recipiente onde o frango é confeccionado: uma pequena panela de barro, com duas asas, onde o cozinhado é servido. A popularidade deste prato chegou à terras dos Templários, que introduziram algumas modificações de forma a conferir-lhe um carácter local.

Ingredientes1 frango; 15 batatas; 100 g de toucinho entremeado; 100 g de manteiga; 150 g de cebolinhas; 50 g de cogumelos; 0,5 dl de vinho da Madeira.

PreparaçãoDepois de cortado, tempera-se o frango com sal, deixando-o a marinar em vinho da Madeira durante 24 horas. Depois, barra-se com manteiga e leva-se ao forno, a corar, dentro de uma púcara de barro, tapada. Corta-se o toucinho em dados, cora-se numa frigideira, juntamente com as cebolinhas, e assam-se as batatas. Cortam-se os cogumelos ao meio ou em lâminas grossas, salteiam-se em manteiga e refres-cam-se com vinho. Deitam-se todos os componentes por cima do frango quando este estiver meio assado, acabando de assar tudo junto. Se o frango ficar en-xuto em demasia, adiciona-se um pouco de molho do assado. Serve-se dentro da mesma púcara e tapada, tal como sai do forno4.

O Frango na Púcara à Templários é um prato de sabores honestos a exigir um vinho tinto jovem sem estágio em madeira. Seleccione um vinho tinto da Região Tejo com menor complexidade, pouco tanino-so, frutado e com aromas a frutos vermelhos.

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CABRITO ASSADO NO FORNO

É no Parque Natural da Serra D’Aire que pastam os exemplares caprinos de raça Serrana que servem de base à confecção deste prato. As características únicas da flora da Serra D’Aire, onde abunda uma enorme variedade de plantas aromáticas, são fundamentais para se conseguir o sabor peculiar da carne do cabrito e, consequentemente, desta especialidade gastronómica. A escolha e a combinação dos temperos também revelam o cuidado posto na confecção deste prato. Barrada com uma pasta de tempero aromatizada e salpicada de salsa, a carne de cabrito vai a assar no forno em tacho de barro, produto das mãos dos oleiros da região e representativo do genuíno artesanato torrejano.

Ingredientes1 cabrito pequeno; 100 g de toucinho; 250 g de chou-riço de carne; 5 cebolas; 1 ramo de salsa; 2 dentes de alho; piripiri; sal; 2,5 dl de vinho branco.

PreparaçãoPrepara-se o cabrito como habitualmente, corta-se e dispõe-se numa assadeira. Passa-se pela máquina o toucinho, o chouriço, as cebolas, a salsa, os dentes de alho e o piripiri. Tempera-se com sal e barra-se o cabrito com este preparado. Leva-se a assar no forno e refresca-se o cabrito durante a assadura com o vinho branco. A meio da preparação no forno, intro-duzem-se na assadeira batatinhas novas ou batatas cortadas em quartos. Deixa-se assar. Acompanha-se esta carne suculenta com grelos cozidos em água e sal, regados com um fio de azeite.

O Cabrito Assado no Forno é um prato que pede a presença de uma garrafa de vinho tinto à mesa. Para se harmonizar melhor com os sabores elaborados desta peça de carne, espera-se que o vinho tenha complexidade e persistência, com aroma a fruta pre-ta madura, especiarias e tosta. Os tintos da Região Tejo das castas Touriga Nacional, Aragonês e Syrah, com estágio em madeira de carvalho, são as esco-lhas ideais para este tipo de prato.

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FRIGINADA

A Friginada é um prato típico da região de Ourém, confeccionado na altura da matança do porco e cuja designação é um regionalismo que significa fritada. Depois de morto e chamuscado, seguia-se a lavagem e a esfola do animal, tarefa que cabia aos homens, enquanto as mulheres, na cozinha, cortavam as miudezas, como o fígado e os pulmões, a que vulgarmente se chama bofe, e algumas carnes gordas, que depois eram temperadas e deixadas em repouso algumas horas para apurarem o gosto. Com a entrada em vigor de legislação que proibe o abate do porco em casa, bem como as transformações sócio-económicas ocorridas no mundo rural, foram desaparecendo os rituais inerentes à matança do porco, provocando a alteração parcial dos preceitos que presidiam à confecção deste prato, que passou a ser mais raro e cozinhado com carne comprada no talho. Os próprios acompanhamentos foram sendo diversificados e, embora a broa continue a estar presente, é acompanhada por batatas e grelos de nabo, cuja abundância coincide com a época em que a matança seria feita.

Ingredientes300 g carne de porco cortada em cubos; 300 g de entrecosto cortado em pequenos pedaços; 3 dentes de alho; 2 colheres de sopa de banha; 2 folhas de louro; vinho branco q.b.; sal, pimenta, colorau, comi-nhos, cravinho q.b.

PreparaçãoTempera-se toda a carne cortada com sal, pimenta, colorau, cominhos, cravinho, os dentes de alho pica-do, o louro e o vinho. Deixa-se repousar o preparado durante 2 a 3 horas. Num tacho de barro, coloca-se a banha que vai ao lume para derreter, juntando-se seguidamente o preparado anterior, que se deixa cozinhar em lume brando. Aos poucos, vai-se refres-cando com o vinho. Acompanha com migas de feijão, couve e broa esfarelada ou com grelos5.

Este prato de carne de porco pede para ser acompa-nhado com um vinho tinto complexo, com madeira. Na região vitivinícola do Tejo existem escolhas muito adequadas, principalmente as que nos chegam dos terrois do Bairro e da Charneca.

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BROINHAS DE ALCANENA

As Serras d’Aire e dos Candeeiros, agrestes e elevadas, marcam a paisagem do norte do concelho de Alcanena. A actividade agrícola, apesar dos solos pouco férteis, onde predominam os olivais, os frutos secos, alguns cereais e culturas forrageiras, assume importância social no concelho, sobretudo por constituir um complemento ao rendimento familiar. A produção de mel é também uma prática tradicional bem enraizada, com uma história antiga e particularidades que o distinguem. A vegetação apícola característica desta sub-região é constituída por uma diversidade florística das serras e das matas, onde abunda o cheiro a alecrim, a tomilho, a rosmaninho, a eucalipto, o que imprime a este mel um paladar, uma textura e uma cor característicos.

São os produtos que a terra dá que vão determinar a gastronomia da região. Por isso, a doçaria lança mão do mel e dos frutos secos que, manuseados e combinados de formas diferentes, dão origem a manjares diferentes. É o caso das Broinhas de Alcanena, para cuja confecção a tradição manda que se utilize o mel da Serra D’Aire, com o seu sabor particular. Antigamente, só eram feitas pelo Natal e pelos Santos, para dar às crianças que, de saco na mão, batiam às portas a pedir “Pão por Deus”. Hoje em dia, por força da procura, são confeccionadas ao longo de todo o ano, embora em menores qantidades do que nas épocas festivas.

Ingredientes0,5 kg de farinha; 0,3 kg de açúcar; 2,5 dl de azeite; 3 colheres de sopa de mel; 200 g de nozes picadas grossas; 20 g de canela; 10 g de erva-doce; 0,5 l de água.

PreparaçãoJunta-se tudo num tacho, excepto a farinha, e levan-do-se ao lume até ferver durante cerca de 5 minutos. Acrescenta-se a farinha e volta a ir ao lume a cozer até se despegar, o que significa que a massa está pronta. Distribui-se a massa em montinhos, a que se dá o feitio de broas a estreitarem nas pontas, que vão ao forno e, depois de cozidas, ainda quentes, envol-vem-se em açúcar.

Estas Broinhas de Alcanena são ideais para ser comidas em qualquer altura do dia. Mas, se optar por finalizar uma refeição na sua companhia, pode acompanhá-las com um dos vinhos generosos da Região Tejo.

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BOLOS DE CABEÇA

Quem visitar Torres Novas em dia de festa vai, de certeza, encontrar à venda o exemplar típico da doçaria da região: os Bolos de Cabeça, confeccionados tradicionalmente por altura de casamentos e de romarias do concelho. Feitos com uma massa lêveda, maciça mas fofa, aromatizada com erva-doce e raspa de limão, semelhante à das ferraduras, dos parrameiros, dos bolos de noiva ou dos bolos de festa, tão populares no Oeste, são, no entanto, tendidos de uma maneira diferente. O aspecto final dos Bolos de Cabeça, em forma de oito, esconde um encadeamento de gestos e revela um apreço especial da doçaria popular pelas massas modeladas que se torcem, se enroscam, se entrançam antes, de entrar no forno.

Para a divulgação destes bolos muito tem contribuído a actividade de Antónia Aguiar, que percorre as festas do concelho a confeccioná-los à vista dos compradores, atraindo-os com as chamas do seu forno transportável e com o aroma da massa dos bolos a cozer. Há trinta anos que optou por este modo de vida. Começou por vender bolos numa banca no mercado e depois expandiu o negócio, abrindo uma loja e empregando várias pessoas. Revela, desta forma, que é possível honrar uma tradição modernizando os meios.

Ingredientes1,5 kg de farinha de trigo; 0,2 l de azeite fino; 500 g de açúcar amarelo; sumo e raspa de vidrado de li-mão; uma pitada de canela em pó; 30 g de manteiga; bicarbonato de sódio q.b.; erva-doce q.b.; fermento de padeiro q.b.; sal q.b.

PreparaçãoDissolve-se em água tépida o fermento com uma pitada de sal e trabalha-se um pouco. Junta-se à fari-nha e acrescenta-se-lhes o açúcar, a canela, a raspa do vidrado do limão, a erva doce e o bicarbonato. Mistura-se tudo e rega-se com o azeite e a mantei-ga a ferver. Mistura-se novamente, para desfazer os torrões que se formam e junta-se o sumo de limão e água suficiente para começar a amassar. A massa é trabalhada até ter boa consistência. Embrulha-se depois num pano de algodão e cobre-se com um cobertor de lã, deixando-se em repouso de um dia para o outro, cerca de 10 a 12 horas, até levedar bem. Passado este tempo, tendem-se uns rolos de cerca de 15 cm de comprimento, achatam-se as pontas e apertam-se ao meio para formar um estrangulamen-to, ficando com uma cabeça para cada lado. Os bolos são colocados num tabuleiro untado e pincelados com ovo batido. Cozem em forno bem quente (cerca de 250º C), durante cerca de 10 minutos.

O Bolo de Cabeça é um bolo seco que pede a com-panhia de um chá, de um café ou, caso se prefira, de um cálice de um vinho licoroso ou de colheita tardia da Região Tejo.

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TIGELADAS DE FERREIRA DO ZÊZERE

As populares Tigeladas de Ferreira do Zêzere são uma das muitas variantes de um doce conventual que terá tido a sua origem no Convento da Graça, em Abrantes, cujo Arquivo Histórico já lhes faz referência. Também o Livro de Cozinha da Infanta D. Maria, do século XVI, inclui uma receita de um doce denominado Tigelada, cujos ingredientes e confecção coincidem com os de Abrantes. De acordo com alguns testemunhos, terá sido uma lavadeira de Rio de Moinhos, a quem as freiras do Convento da Graça terão ensinado o segredo do doce, que ofereceu a receita a uma amiga. E assim se começou a divulgar esta especialidade, tornando-se particularmente conhecida em Ferreira do Zêzere. O nome de Tigelada deriva da tigela de barro onde o doce é cozido. A tigela deve ser de barro vermelho não vidrado, e não pode levar qualquer gordura. Cada Tigelada tem a forma de um disco com cerca de dois centímetros de espessura e 10 a 12 centímetros de diâmetro, com uma cor amarelo-torrado e uma textura semelhante à de um pudim.

Ingredientes4 ovos inteiros; 16 gemas; 500 g de açúcar; 1 cháve-na bem cheia de farinha; 1 l de leite; raspa de 1 limão.

PreparaçãoDurante meia hora, batem-se os ovos inteiros com as gemas, o açúcar e a raspa do limão, juntando-se a farinha a pouco e pouco. De seguida, adiciona-se o leite e mexe-se. Em tigelas de barro não vidrado, que foram previamente bem aquecidas, deita-se o preparado, sem que as tigelas fiquem muito cheias. Vão então a cozer em forno forte durante cerca de 20 minutos6.

As Tijeladas de Ferreira do Zêzere são a sobremesa prefeita para acompanhar com um vinho generoso da Região Tejo.

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MERENDEIRAS

As Merendeiras são pequenas broas, cuja pronúncia é, muitas vezes, deturpada para “brendeiras” na região de Torres Novas. A sua designação remete para um pão pequeno, que era comido numa refeição ligeira, a merenda, normalmente de tarde. É mais um exemplo de doçaria de origem popular, com inúmeras variantes em várias zonas de Portugal. Em Ourém, por exemplo, juntam-se, em partes iguais, farinhas de trigo e de milho. Além disso, e apesar de serem frequentemente chamadas “bolos dos pobres”, conforme as disponibilidades de quem as faz, assim podem ter uma maior riqueza de igredientes, tais como frutos secos. O que parece ser comum a todas elas é a sua relação com a festividade de Todos os Santos, a 1 de Novembro, muito embora continuem a ser consumidas até ao dia de Reis. Nas aldeias, ainda é costume, nos Santos, oferecer estas Merendeiras às crianças que vão de porta em porta, pedindo “bolinhos, bolinhos” ou o “pão por Deus”.

Ingredientes500 g de farinha de trigo; 500 g de farinha de milho; açúcar ou mel a gosto, erva doce e canela q.b.; fer-mento de padeiro; 0.5 l de azeite

PreparaçãoAs farinhas são escaldadas com azeite quente, dei-tando-se de seguida a canela, a erva doce, o fermen-to de padeiro e açúcar ou mel a gosto, amassando-se tudo muito bem. Deixa-se levedar a massa durante uma hora. A massa é depois tendida em pequenas bolas que se pincelam com ovo, indo de seguida para o forno até estarem cozidas.

Seco, com um ligeiro travo a erva doce, a Merendeira é um bolo que chama por um copo de vinho fruta-do e aromático. No campo dos vinhos generosos, a Região Tejo tem uma oferta muito variada, desde os licorosos aos colheitas tardias, brancos ou tintos. Escolha aquele de que mais gostar.

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FATIAS DE TOMAR

De acordo com a tradição, as Fatias de Tomar tiveram a sua origem nas cozinhas do Convento de Cristo, onde eram confeccionadas para satisfazer a gula dos freires, que as consideravam a sua sobremesa favorita. É impossível comprovar esta hipótese, pois a primeira referência conhecida ao doce com este nome data de 1876, no livro de João da Mata “Arte de Cozinha”, e, embora tenham começado por ser conhecidas como Fatias da China, na realidade, têm a sua origem em Tomar, conforme afirma Emanuel Ribeiro, em 1928, no seu livro “O Doce nunca Amargou”.

É um doce feito com muitas gemas de ovos, açúcar e água. À partida, nada de muito diferente em relação a qualquer outro manjar da doçaria tradicional portuguesa, não fosse o facto de, neste caso, as gemas serem batidas vigorosamente durante cerca de uma hora e depois cozidas em banho-maria, numa dupla panela concebida para o efeito. Trata-se de uma panela de folha, munida de uma chaminé pela qual se acrescenta água a ferver, permitindo uma cozedura em banho-maria a temperatura constante. Essa panela é, por si só, um produto característico e artesanal da região, inventado por um mestre latoeiro em meados do século XX e só é vendido em Tomar, com a receita no interior.

Este doce possui uma textura única, a que a calda de açúcar, no final, confere outra doçura. Estando pronto, apresenta a forma de fatias de pão bem amarelinho, com uma consistência macia e húmida.

Ingredientes24 gemas de ovos ; 1 kg de açúcar.

PreparaçãoSeparam-se as gemas das claras apenas no momen-to em que vão ser batidas. As gemas são batidas durante uma hora, se for à mão, ou durante vinte minutos, se for com a batedeira. Deita-se a massa numa forma oval com tampa, criada especificamente para o efeito, muito bem untada. Introduz-se a forma em banho-maria, com a água já a ferver, e deixa-se cozer durante uma hora sem nunca interromper a fervura da água. Desenforma-se e corta-se às fatias. Para a calda, leva-se o açúcar ao lume a ferver com um litro de água, até atingir um ponto muito baixo. Introduzem-se as fatias nesta calda, deixando-as ferver um pouco e virando-as. Colocam-se as fatias numa travessa e regam-se com a calda.

As fatias de Tomar são geralmente comidas como sobremesa. Por serem tão doces e calóricas, são, cada vez mais, um prato que sugere excepção e festa. Assim, para o acompanhar, recomenda-se uma flute de espumante, um tipo de vinho que começa a surgir na região Tejo com excelente qualidade. A boa concentração em fruta aliada à frescura do espu-mante limpará o palato dos sabores intensos das gemas e do açúcar.

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FIGUINHOSDE TORRES NOVAS

Data do princípio do século XIX a implantação dos vastos figueirais de Torres Novas, como alternativa à vinha, muito dizimada pela filoxera. Face à boa adaptação ao meio, foi crescendo a importância desta cultura, que se tornou uma actividade bem enraizada e vital e que representa a base económica da maioria dos agricultores torrejanos, originando costumes e tradições que ainda hoje têm boa expressão.

Para além do seu consumo em fresco, a partir das diversas variedades do figo, nomeadamente do Figo Preto de Torres Novas e do Pingo de Mel, característicos desta zona do País, pode fabricar-se uma grande diversidade de produtos, tais como aguardentes e licores; figos secos; pasta de figo; compota de figo; figos secos recheados com frutos secos diversos; figos fresco em calda; bolos à base de figos secos, como os Figuinhos de Torres Novas, que são já uma referência para quem visita esta cidade do norte ribatejano 7.

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Ingredientes10 figos secos; 200 g de miolo de amêndoa; 300 g de açúcar; 150 g de água; 6 gemas; baunilha q.b.

PreparaçãoLeva-se o açúcar ao lume com a água, até se obter ponto de pérola fraco. Nessa altura, mistura-se a amêndoa pelada e passada pela máquina, mexendo sempre, até ferver. Tira-se do lume, deixa-se arrefe-cer e juntam-se as gemas mexidas com um garfo e um pouco de açúcar baunilhado. Volta ao lume para cozer as gemas e engrossar. Põe-se o doce num prato e repousa de um dia para o outro.

No dia seguinte, cortam-se os figos em cruz, abrem-se e coloca-se em cada figo uma bola feita com a massa de amêndoa7.

As bolinhas de ovos e amendoa dentro dos figuinhos secos são uma delícia perfeita para acompanhar com um dos inúmeros vinhos licorosos, abafados ou de colheitas tardias da Região Tejo. Esta região é, pela sua qualidade, uma das poucas no País com uma Denominação de Origem para vinhos deste tipo.

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RIBATEJO

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Por onde passa, o Tejo é o centro de tudo. É o rio que marca o tempo, que condiciona a vida, que fertiliza os solos. Esta importante corrente de água influencia tudo à sua volta, e a sua importância ultrapassa em muito os estritos limites das suas margens. Nos invernos rigorosos, o seu leito adensa-se, invade campos, lugares, vilas. Apesar dos prejuízos, a população agradece: as cheias trazem com elas abundância, bons anos agrícolas e um espectáculo de rara beleza, concretizado na grandiosidade da paisagem espelhada. Nestes solos ubérrimos, terra afamada de vinho, também pastam manadadas de gado bovino e cavalar. O cavalo e o toiro de lide fazem parte do imaginário desta região, e os dois encontram-se cara a cara na, por aqui, mais celebrada das festas, a tourada. Esta é uma tradição que remonta a outros séculos e que está fortemente enraizada no modo de ser ribatejano.

Azambuja

Nas voltas da História, Azambuja começou por ser um lugar habitado por romanos que, em 711 da nossa era, foi tomado pelos sarracenos, a quem deve o topónimo que significa “oliveira brava”. Os cristãos acabaram por prevalecer quando D. Afonso Henriques, com os seus ímpetos conquistadores, subjugou os mouros da região em 1147. Desses tem-pos remotos da reconquista até hoje, Azambuja foi prosperando. O concelho, predominantemente rural, mantém com o rio, que lhe impõe a fronteira a Sul, uma estreita relação. Várias comunidades piscatórias fixaram-se nas margens do Tejo. Algumas, vindas da costa Atlântica nos finais do Século XIX, construíram as curiosas casas palafitas que actualmente ainda se podem encontrar, aqui e ali, ao longo do curso do rio. Esta profunda ligação com a terra e com o Tejo re-flecte-se na gastronomia tradicional, onde é visível a criatividade das suas gentes no aproveitamento dos recursos disponíveis. É daqui o queijo de Maçussa, o único chèvre produzido em Portugal de forma artesa-nal, que conquista espaço, nomeadamente, entre os chamados produtos «gourmet».

Cartaxo

O “Pátio das Cantigas”, uma das mais célebres comédias portuguesas, vive da riqueza dos diálogos carregados de duplo sentido. Num deles, Evaristo, papel desempenhado por António Silva, informa que as dessincronizações do seu fígado obrigam-no a ir a águas para o Cartaxo. O ébrio Narciso, encarnado por um brilhante Vasco Santana, responde “Águas do Cartaxo para o fígado? Hum. Compreendi-te”. No ano em que o filme estreou, em 1941, esta graça era imediatamente compreendida pela plateia, já que, para o público em geral, Cartaxo era sinónimo de vinho. Desde os finais do Século XIX que esta região se tornou num importantíssimo centro vinícola. Em meados do século passado, saíam daqui milhões de litros de vinho para o ultramar. Actualmente, a quan-tidade deu lugar à qualidade. Em 2002, o Cartaxo adoptou a designação de «Capital do Vinho», com o objectivo de preservar a forte ligação do concelho à produção vitivinícola. Este município é um dos fun-dadores e principal impulsionador da Associação de Municípios Portugueses do Vinho, que, desde a sua fundação, aqui tem a sua sede.

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RIO MaIOR

Elevada a vila em 1836 e a cidade em 1985, Rio Maior é sede de um concelho que alia uma entroncada tradição agrícola aos progressos da industrialização. Em tempos, foi um grande centro mineiro, tendo sido as suas reservas de linhite uma das maiores do País. Hoje, possui indústrias alimentares, de madeiras e de cerâmica, mas é o sal que verdadeiramente se destaca neste panorama.

É difícil imaginar, mas as marinhas de Rio Maior têm mais de oito séculos de história. Data de 1177 o mais antigo documento que se conhece que menciona Rio Maior e este é o comprovativo da venda, por parte de Pêro d’Aragão, de uma vasta área de terreno, que abarca o poço e as Salinas de Rio Maior, à Ordem do Templo. O poço original, entretanto, secou com a abertura de um novo. Diz a tradição que este último foi descoberto por uma pastora que apascentava uns animais. Quando a sede apertou, recorreu a uma poça que encontrou por entre uns juncos. A água que lhe chegou à boca tinha um gosto desagradavel-mente salgado e, quando mais tarde comentou em casa o ocorrido, o pai e os vizinhos apressaram-se a cavar a zona.

É de destacar que o sal das marinhas do concelho tem a particularidade curiosa de ser extraído da água de poços, alimentados pelas correntes de água que atravessam a extensa e profunda jazida de sal-gema. Talvez por isso, o produto daqui obtido seja consi-derado superior em qualidade e mais forte que o sal marinho comum. Assim, um bom gastrónomo não vai a Rio Maior sem de lá trazer uns Queijinhos de Sal. A sua forma cilíndrica característica é conse-guida moldando o sal com sinchos e depois cozido em forno de lenha. Para os usar, basta raspá-los com uma faca.

saNTaRéM

Miguel Torga afirmou: O Ribatejo deve ser visto das Portas do Sol de Santarém, num dia de cheia, ou das bancadas duma praça de toiros, numa tarde de Verão. Num dia de cheia, porque o Tejo hipertrofiado mar-ca-lhe exactamente a extensão e os toiros, porque é no redondel que se precisa a sua íntima significação. Com efeito, o concelho de Santarém deve primeiro ser conhecido do alto da antiga alcáçova. As Portas do Sol são uma entrada directa para o céu, para o Tejo e para os campos, para esse horizonte rasgado que se alcança da muralha, que um dia foi defensiva, mas que hoje, feita mirante, nos lança para a mais maravilhosa das vistas. Santarém é tudo quanto se consegue alcançar daqui: é o olival que lança raízes na terra do bairro, é o toiro bravo que pasta no campo, o cavalo que é desbastado no picadeiro, a vinha que é vindimada, o solo que é amanhado, e é o rio, o sempre presente Tejo, que alimenta tudo à sua passagem. Mas é muito mais do que isto, é um lugar cheio de história, de cultura e de património. Conhecida como a “Capital do Gótico”, em Santarém proliferam vestígios deste estilo arquitectónico em igrejas, campanários, conventos.

Nesta cidade, chegaram-se a contar cerca de dezas-seis mosteiros o que, indiscutivelmente, contribuiu muito para a qualidade da doçaria tradicional. As Broas e as Queijadinhas do Céu do Convento de São Domingo das Donas, as Celestes do Convento de Santa Clara e os Arrepiados do Mosteiro de Almoster da Ordem de Cister são disso só um exemplo. É também incontornável a associação de Santarém ao Festival Nacional de Gastronomia que ali se realiza desde 1981 com o objectivo de promover os produtos e as tradições do concelho.

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AGENDA GASTRONÓMICA

MarçoTasquinhas, em Rio MaiorFesta do Vinho, em Alcanhões, Santarém

AbrilÀvinho - Festa do Vinho e das Adegas, em Aveiras de Cima, AzambujaTasquinhas de Manique, na AzambujaFesta do Vinho do Cartaxo, no CartaxoFestival de Sopas, em Alcanhões, Santarém

MaioTasquinhas de Alcoentre, em Alcoentre, AzambujaPraça das Tasquinhas da Feira de Maio, na Azambuja

JunhoFeira Nacional de Agricultura – Salão Prazer de Provar, em Santarém Festival do Arroz-Doce, em Vale de Figueira, SantarémFestival do Caracol, no Vale de Santarém, Santarém

JulhoFestival de Marisco, em Azoia de Cima, Santarém

SetembroFeira Nacional da Cebola, em Rio Maior

OutubroFestival Nacional de Gastronomia, em SantarémParaísabor, em Vale do Paraíso, Azambuja Festa das Vindimas, em Aveiras de Cima, Azambuja

Novembro Feira das Tasquinhas, em Aveiras de Cima, AzambujaFeira dos Santos, no CartaxoProva do Azeite, em Vila Nova da Barquinha (Nov./Dez.)Festival do Chícharo, em Bugalhos, Alcanena

DezembroA Gula – Semana Gastronómica do Concelho de Azambuja, na AzambujaFestival de Sopas, em Abitureiras, Santarém

Vinhos da RegiãoOs vinhos produzidos nesta região integram a Comissão Vitivinícola Regional do Tejo.

ConfrariasConfraria da Gastronomia do Ribatejo Confraria dos Cavaleiros da Adega Confraria Enófila Nossa Senhora do Tejo Confraria Almoçarista de Rio Maior

GASTRONOMIAREGIONAL

AzambujaQueijo de Maçussa, escarapiada, bolo de chouriço, laroias, sopas de batata, de chícharos, de cardos, de ineixas com feijão e de grão com carne de porco, arroz de lampreia, açordão com bacalhau assado, lapardana, manja com sardinha assada, enguias fri-tas ou de ensopado, caldeirada de peixe do rio, sável com migas ou açorda, carne de toiro com repolho, coelho guisado com feijão, borrego no forno, arroz de cachola, torricado com febras. Nos doces, queija-dinhas de Azambuja, bolo de noiva, fatias paridas e arroz-doce de Azambuja.

CartaxoCaracoletas na brasa, pataniscas de bacalhau, torri-cado ou toiras, sopa de feijão com castanhas, sopa de coelho, sopa de grão, açorda de sável, enguias fritas e de ensopado, fataça na telha ou frita com açorda, naco de boi com vinho tinto, carne de porco à cartaxeira, coelho com ervilhas, galinha corada, fran-go à moda do Cartaxo, miolos à moda do Cartaxo e arroz de fressura. Nos doces, destacam-se o arrôbio, cartaxinhos, caspiadas, sopas de cavalo cansado, fatias paridas, pés de abóbora e velhoses.

Rio MaiorTorradas de alho, chícharos com bacalhau assado, salada de rabaça, sopa de pampostos com feijão seco e arroz, sopa de cardos com feijão branco, lapardana, galo com nozes, galucho, galinha caseira à moi-almas, cabrito frito, cachola guisada à campo-nês, arroz da matança e carne de porco à talim-talão. Nos doces, destaca-se o famoso pão-de-ló de Rio Maior, os nógados, o favo de mel com laranja, os bolos de noivos, o arroz-doce dos casamentos e os leões de Rio Maior.

SantarémPetinguinhas de escabeche, molhinhos, morcela de arroz, bucho de porco, sopa de peixe do rio, tomata-da, magusto, fataça assada na telha, massa à barrão, molhinhos com grão, magusto com costeletas de borrego, entrecosto com arroz de feijoca, naco de toi-ro avinhado. No capítulo da doçaria, as propostas vão para os arrepiados de Almoster, celestes de Santa Clara e pampilhos.

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SOPA DE PEIXEDO RIO

Esta Sopa de Peixe do Rio tem origem na cozinha tradicional das populações avieiras, oriundas da praia de Vieira de Leiria, fixadas nas zonas ribeirinhas do Rio Tejo, entre Vila Franca de Xira e Alpiarça. Eram gente do mar que, durante o Inverno, não conseguia ir para a faina devido à bravura das ondas, e o Tejo, rico em peixe, prometia-lhes o sustento que o mar lhes negava. Aí, a safra do sável dava-lhes a ilusão de uma vida melhor.Embora não haja registos, estas migrações ocorreram, sobretudo, nos finais do século XIX, e a designação de avieiros deriva do nome da localidade de origem. Aos poucos, as viagens entre o mar e o rio cessaram, e muitos sedentarizaram-se e criaram pequenas povoações à beira Tejo, às quais imprimiram características próprias. Esta Sopa de Peixe é mais um exemplo da capacidade dos que souberam procurar no rio e no campo os meios de sobrevivência negados pela ausência de recursos financeiros. Pode ser confeccionada com uma ou várias espécies pescadas no rio - carpa, sável, saboga, fataça ou barbo. Pode acrescentar-se pão duro, simples ou torrado.

Com a sua origem nas populações mais pobres, esta Sopa de Peixe do Rio constitui hoje uma proposta que fica bem em qualquer mesa.

Ingredientes1 kg de peixe do rio, tal como carpa, fataça, barbo; 1 kg de batatas; 1 l de água; 1 dl de azeite; 1 cebola grande; 1 pimento; 5 tomates maduros; 2 ovos; 1 ramo de salsa, coentros e hortelã; pão torrado em fatias; alho; louro; sal; piripiri q.b.

PreparaçãoAmanha-se o peixe e tempera-se com sal. Cortam-se as batatas às rodelas. Num tacho, junta-se o azeite, a cebola, os alhos, o tomate limpo, a folha de louro, o pimento e o ramo de cheiros e leva-se ao lume. Quando o tomate estiver desfeito, deita-se a água. Acrescenta-se o peixe e as batatas e leva-se de novo ao lume a ferver e tempera-se com um pouco de piri-piri a gosto. De seguida, escalfam-se os ovos e serve-se a sopa enriquecida com fatias de pão torrado8.

Para acompanhar a Sopa de Peixe do Rio, procure um vinho branco jovem e frutado da Região Tejo que combine a acidez do peixe com a acidez do vinho.

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SOPADE COELHO

O concelho do Cartaxo, situado na margem direita do rio Tejo, é uma região de contrastes, de grande desenvolvimento urbano provocado pela sua localização próxima da capital, mas que convive lado a lado com um mundo rural que teima em preservar as suas tradições. A sua paisagem, fora dos maiores aglomerados urbanos, onde a indústria assentou arraiais, é um variado mosaico de terras de semeadura alternando com os vinhedos que dão origem aos vinhos do Cartaxo. A mancha de verde que os olhos alcançam faz adivinhar a fertilidade do solo. Os seus habitantes, mesmo com outras actividades, mantêm uma forte ligação com a agricultura e não desprezam os costumes ancestrais. A abundância de erva em toda a região foi sempre um pretexto para a criação de coelhos no quintal, ao pé da porta, destinados ao consumo próprio, o que levou, naturalmente, ao aparecimento de muitas receitas com base neste pequeno herbívoro que continuam a fazer parte dos pratos característicos deste concelho.

Para a excelência desta Sopa de Coelho, confeccionada com o coelho doméstico alimentado a erva e a hortaliça, concorrem também os produtos hortícolas de qualidade e o vinho da região, que tão bem combinam com a sua carne suculenta.

Ingredientes1 coelho; 1 cebola média; 1 couve lombarda; 6 batatas médias; 500 g de feijão branco cozido; 3 colheres de sobremesa de calda de tomate; 1 pimento vermelho; 0,5 l de vinho branco; 0,5 l de vinho tinto; 2 dl de azeite; 1 colher de sopa de manteiga; 1 colher de so-bremesa de piri-piri ou a gosto; 1 pão de trigo; 1 ramo de coentros; sal q.b.

PreparaçãoRefoga-se o coelho partido aos bocados com os temperos, a cebola picada, a calda de tomate, os vinhos branco e tinto, o pimento às tiras, o azeite e a manteiga. Quando estiver tudo refogado, acrescen-ta-se meio litro de água, de seguida a couve cortada miudinha, as batatas aos cubos miúdos e, por último, o feijão branco. Na altura de servir, cortam-se as fatias do pão de trigo, espalham-se os coentros pica-dos e coloca-se por cima a sopa9.

A carne de coelho merece ser apreciada com vinhos tintos elaborados, finos e elegantes, de preferência de safras mais antigas e com estágio em madeira. Escolha um vinho da Região Tejo com aroma elegan-te e corpo macio, que se enquadre bem com o sabor único desta carne.

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CALDEIRADAÀ FRAGATEIRO

No rio Tejo, que atravessa a lezíria ribatejana, a abundância de peixe, a cuja pesca muitas das populações ribeirinhas se dedicavam, deu origem a vários pratos, entre eles, a Caldeirada à Fragateiro. Esta designação denuncia o local onde o cozinhado era preparado: o próprio barco onde se encontravam os pescadores, a frajata. Por isso mesmo, teria um modo de confecção relativamente simples, com pequenas variantes, conforme o local de origem dos fragateiros, e usava como ingrediente principal o peixe que vinha à rede – enguia, fataça e tainha, embora também pudesse incluir safio, barbo, tamboril, ou ainda outras espécies. Muito frequentemente, dispensavam-se as batatas, substituindo-as por fatias de pão.

Hoje, que os modos de vida mudaram completamente, o rio já não representa o mesmo papel económico na vida das populações, como também já não é o meio de subsistência de muitas pessoas que viviam exclusivamente da pesca. No entanto, este prato tradicional não deixou de ter os seus adeptos e, actualmente, faz parte da ementa de todos os restaurantes das localidades da beira-rio.

Ingredientes150 g de safio; 180 g de cação; 200 g de enguias; 200 g de fataça; 150 g de lulas; 100 g de amêijoas; 1 cebola; 1 tomate; 1 pimento; 1 ramo de salsa; 1 folha de louro; 1 ramo de coentros; 1 pão caseiro; 1,5 dl de azeite; sal, pimenta e piripiri q.b.; pão caseiro já com dois dias.

PreparaçãoAmanham-se os peixes, cortam-se em postas e tem-peram-se com sal. Num tacho de barro, dispõem-se a cebola, o tomate e o pimento às rodelas e o alho picado. Em seguida, o peixe. Tempera-se com sal, pimenta, piripiri e rega-se com azeite. Repete-se o processo anterior até se esgotarem os ingredientes. Na parte final, espalha-se a salsa picada grossei-ramente e abafa-se com uma tampa o tacho, que vai a cozinhar em lume brando. 5 minutos antes de terminar a cozedura de todos os alimentos, colocam--se as amêijoas e volta-se a tapar. Num recipiente, dispõe-se o pão em fatias e, sobre estas, a caldeirada polvilhada com coentros picados grosseiramente10.

Esta Caldeirada à Fragateiro ficará valorizada com uma fresca garrafa de vinho branco jovem e fruta-do, elaborado com a casta rainha da Região Tejo, a Fernão Pires.

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TIBORNA DE BACALHAU

A Tiborna de Bacalhau faz parte da cozinha tradicional das zonas rurais do Ribatejo e era frequentemente confeccionada tanto na Lezíria como no Bairro. Trata--se essencialmente de bacalhau assado acompanhado com broa de milho e grelos cozidos, regados com o bom azeite ribatejano.

Este prato era geralmente consumido no Outono e no Inverno pelos trabalhadores rurais, que o preparavam e consumiam em apenas uma hora, o tempo de que dispunham para o almoço. Apesar da sua simplicidade, era um prato nutritivo, económico e saudável: o bacalhau, à época o “fiel amigo”, pois era de preço muito acessível e de fácil conservação, muito presente na cozinha ribatejana, que lhe dedicava um verdadeiro culto; as sobras endurecidas de pão de milho; e os produtos da terra.

Hoje em dia, perdida a conotação de comida de gente pobre, a Tiborna de Bacalhau foi redescoberta pelos gastrónomos, tendo-se tornado num verdadeiro petisco que os restaurantes ribatejanos exibem nas suas ementas.

Ingredientes800 g de broa de milho; 1 kg de bacalhau demolha-do; 50 g de alho; 1 kg de grelos; 1,5 dl de azeite; 1 dl de água-pé; sal q.b.

PreparaçãoCom 10 g de alho, esfrega-se a broa inteira e, com a mão, esfarela-se o miolo, que fica em bocados pe-quenos. Aquece-se o forno. Junta-se ao miolo de pão o restante alho picadinho e a água-pé, levando-se tudo ao forno a aquecer durante 10 minutos, a uma temperatura de 150º C. Num tacho, leva-se a água com sal ao lume e, quando a água estiver a ferver, colocam-se os grelos, que se deixam cozer. Assa-se o bacalhau na brasa e depois lasca-se e retiram-se--lhe as espinhas. Junta-se o miolo de broa de milho, os grelos e o bacalhau num recipiente e rega-se com azeite. Recheia-se o interior da broa com a mistura obtida, espalha-se o restante miolo por cima vai ao forno pré-aquecido cerca de 20 minutos11.

Este prato rústico e reconfortante chama por um copo de vinho branco estruturado e untuoso, com estágio em madeira. Normalmente, com as castas Fernão Pires, Arinto, Verdelho, Trincadeira das Pratas e Viogner, desenvolvidas nas terras do Bairro ou da Charneca, os brancos da região do Tejo são uma escolha segura.

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LAPARDANA

A Lapardana é uma comida das gentes da borda d’água do Ribatejo, mais um dos muitos exemplos dos pratos dos tempos em que muitos passavam fome, e para os quais se recorria principalmente ao pão, juntando-se, neste caso, as batatas e as couves, com o azeite e o alho a dar sabor. Era feita tanto pelos camponeses que trabalhavam nas lezírias como pelos avieiros que pescavam nas valas do Tejo. Por essa razão, tinha, muitas vezes, por acompanhamento o peixe do rio, outras vezes, bacalhau, que ainda era, nessa altura, o “fiel amigo”. Mas qualquer que fosse o conduto, a sua quantidade dependia, obviamente, do orçamento familiar.

Ingredientes4 batatas médias; 600 g de pão duro de trigo; 4 folhas verdes de couve; 2 dl de azeite; 12 dentes de alho; 4 postas de bacalhau demolhado; sal e pimenta q.b.

PreparaçãoCozem-se em água e sal as batatas cortadas em ro-delas e a couve em pedaços ripados à mão. Quando a batata estiver cozida, escorre-se e reserva-se a água de cozedura. A couve está, nesta altura, ainda mal cozida mas é assim mesmo. Demolha-se bem o pão na água da cozedura que ficou de reserva. Pode juntar-se também um pouco de broa de milho, se houver. Põe-se o pão num tacho e leva-se ao lume com um terço do azeite, um terço dos dentes de alho migados e um pouco de pimenta, amassando-se bem com uma colher de pau a que se dava o nome de geribalde. Juntam-se as couves e as batatas e deixam-se fervinhar até se obter uma açorda mole. Enquanto a açorda apura, assa-se o bacalhau sobre o lume. Dispõe-se a açorda numa travessa funda, desfia-se o bacalhau em lascas grandes que se põe sobre a açorda. Rega-se tudo com o azeite bem quente e os alhos restantes.

Este é um prato de sabor muito forte, intensificado pelo azeite e pelo alho. Para o acompanhar, é indi-cado um vinho branco intenso e estruturado, cuja acidez vigorosa compense a força do prato. Procure um branco com estas características na Região Tejo.

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MAGUSTO

O Magusto ou Mangusto é o nome dado a um prato regional e tradicional das zonas rurais do Ribatejo, criado, certamente, com o intuito de fazer uma refeição rápida e económica, aproveitando restos de outros pratos, como couves, batatas cozidas, feijão cozido e sobras de pão, e tendo como resultado uma espécie de migas verdes bem apaladadas. Tradicionalmente, serve--se acompanhado de bacalhau assado na brasa ou de peixe frito, carapaus ou petingas. Como tem acontecido com muitas receitas da cozinha regional portuguesa, também o Magusto, aos poucos, tem vindo a ser recuperado na oferta gastronómica ribatejana. Por isso, hoje em dia, há quem sugira que, para além dos peixes referidos, também possa servir de acompanhamento a outros pratos, tais como o entrecosto frito, a fritada de porco, os filetes de pescada, os pastéis de bacalhau, o coelho frito, os rojões ou o polvo à lagareiro, entre outros, mas agora com o Magusto a servir de acompanhamento. Para que volte a fazer parte dos hábitos alimentares ribatejanos, o Turismo de Santarém promove todos os anos, no mês de Fevereiro, um festival durante o qual os restaurantes aderentes à iniciativa propõem ementas em que o Magusto é presença constante.

Ingredientes5 couves portuguesas, 2,5 dl de azeite, 8 dentes de alho, 1 pão de milho e 4 bolas de pão de trigo, sal, 3 postas de bacalhau.

PreparaçãoMigam-se as couves e cozem-se bem; quando estiverem cozidas, escorrem-se. Entretanto, o pão foi posto previamente de molho e esfarelado com as mãos. Em seguida, juntam-se-lhe as couves, o azeite, o alho picado e o sal. Leva-se tudo ao lume, deixan-do-se ferver para acabar o magusto. O bacalhau assa-se, de preferência, em lume de lenha ou carvão para ficar mais gostoso, sendo depois temperado com bastantes alhos picados e o azeite12.

Estas suculentas postas de bacalhau assadas, perfumadas com muito azeite e alho, reconfortam o estômago e exigem um vinho branco de boa estrutu-ra, como os da Região Tejo. O vinho escolhido, para fazer uma boa harmonização com este prato, deve ter uma grande concentração de fruta e uma boa untuosidade, conferida pelo estágio em barrica de madeira nova.

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ENGUIAS À PAÚL

Situada num planalto a sul de Rio Maior, sede do concelho, a Vila da Marmeleira conheceu, na primeira metade do século passado, uma pujança económica fruto de uma agricultura extremamente produtiva, que contribuiu para a sua subida a vila em 1927. Depois de um período de estagnação e de decadência, é hoje uma povoação que pretende reatar antigas tradições, aproveitando todas as potencialidades que a natureza e a mão do homem puseram à sua disposição, e que vão desde o restauro da antiga Praça de Touros à plena fruição do Paúl da Marmeleira. Este é uma enorme superfície alagada, com uma fauna e uma flora típicas de ambientes lacustres, que desde sempre esteve ligado à vida dos habitantes da povoação. Aí sempre se pescaram enguias em tais quantidades que deram origem a um prato típico, as Enguias à Paúl, que continua a ser, ainda hoje, um dos pratos mais apreciados da gastronomia da região

IngredientesEnguias, alho, colorau, azeite, fermento de cevada*, cebola, louro, sal, vinho branco. Acompanhamento: feijão-frade.

PreparaçãoPrepara-se um refogado com todos os ingredientes e deixa-se apurar até ganhar molho. Cozem-se as enguias no molho e acompanham-se com feijão-fra-de cozido em água e sal.

As Enguias à Paúl pedem um vinho muito suave e com taninos bem leves e fácil de beber. Escolha um entre os vinhos brancos jovens e frutados da Região Tejo.

*Actualmente, este ingrediente é, em geral, dispensado.

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CABRITO ASSADO NO FORNO

A Serra dos Candeeiros está na sequência do alinhamento montanhoso do maciço calcário da Estremadura, abrangendo os concelhos de Rio Maior, Alcobaça e Porto de Mós e marcando a fronteira entre o Ribatejo e o Oeste. Os habitantes das aldeias dispersas por este vasto território, prolongado pela Serra d’Aire e fazendo parte de uma área protegida, dedicam-se ainda hoje a uma agricultura de subsistência e à pastorícia, continuando a apascentar os seus rebanhos de gado caprino nos baldios. Assim, o Cabrito Serrano, com o qual é confeccionado este prato, foi sempre criado de forma semi-selvagem, alimentando-se apenas da vegetação espontânea que cresce naquelas serranias, o que confere à sua carne um sabor único, realçado pela forma como é cozinhado. Continuando essa tradição, a oferta gastronómica dos restaurantes da região de Rio Maior inclui um prato que, sendo confeccionado em quase todo o País, se diferencia não só pela qualidade da carne mas também pela forma de o cozinhar em forno de lenha.

Ingredientes1 cabrito com cerca de 5 kg; 3 cebolas grandes; 3 cenouras grandes; 2 kg batatas; 4 dentes de alho; azeite e margarina q.b; 3,5 dl de vinho branco; 2 folhas de louro; 1 ramo de salsa; piripiri, massa de pimentão e sal; 1 couve lombarda grande; 1 farinheira regional.

PreparaçãoCorta-se o cabrito em pedaços pequenos e lava-se. Depois de lavado e muito bem escorrido, tempera-se com vinho, alho, piripiri, louro, sal e azeite. Deixa-se a marinar para o dia seguinte. Numa assadeira, colocam-se cebolas às rodelas, por cima os bocados do cabrito e rega-se com a marinada. Leva-se ao forno a 180º C a assar durante cerca de duas horas e deixa-se alourar, aumentando o calor do forno, se for necessário. Para acompanhamento, preparam-se as batatas fritas aos cubos. Coze-se e salteia-se a couve com a farinheira. Serve-se em travessa, com o cabrito acompanhado pelas batatas fritas e pela couve salteada com a farinheira13.

Para acompanhar o sabor característico do cabrito e o paladar intenso da farinheira combinada com a couve, escolha um vinho que seja sólido, mas com grande maciez. Nos tintos da região Tejo seleccione um vinho da casta Castelão ou Trincadeira.

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CARNE DE PORCO À FEIRA DOS SANTOS

A centenária Feira dos Santos, no Cartaxo, é uma das mais antigas do Ribatejo e até do País. Diz a tradição que esta feira franca remonta a 1654, ano em que se realizou pela primeira vez na Quinta do Senhor Jesus, herdade com propriedades milagrosas, segundo a crença popular da época. Inicialmente, a feira anual decorria no mês de Agosto; mais tarde, passou para o dia 1 de Novembro, dia de Todos os Santos. Por isso, para além dos produtos tradicionais de qualquer certame deste género no Ribatejo, passou a incluir também a oferta de frutos secos, de água-pé e de vinho novo, produtos próprios desta época do ano. Como em qualquer outra ocasião de festa, também os dias da Feira eram assinalados por uma alimentação diferente e mais elaborada, ainda que a opção fosse apenas por partes mais nobres do porco, como é o caso desta Carne de Porco à Feira dos Santos, prato obrigatório no período em que esta decorria e durante o qual a gastronomia ocupava, e ainda hoje ocupa, um lugar de destaque neste acontecimento de fortes raízes populares.

Ingredientes650 g de carne de porco, 400 g de batatinhas, de preferência novas, 4 dentes de alho, 50 g de banha, 2 dl de vinho tinto, 1 limão, colorau, salsa, pimenta e sal q.b.

PreparaçãoCorta-se a carne, em pedaços pequenos, tempera--se com os alhos picados, a pimenta, um pouco de colorau e o vinho tinto. Envolve-se e deixa-se marinar de um dia para o outro. No dia seguinte, escorre-se a carne e frita-se na banha. Lavam-se as batatinhas e levam-se a cozer com pele em água temperada de sal. Quando estiverem cozidas, escorrem-se. Estando a carne quase frita, juntam-se as batatas, adiciona--se a marinada da carne, envolve-se e deixa-se co-zinhar mais um pouco. Polvilha-se com salsa picada finamente e serve-se enfeitado com o limão cortado em gomos.

Esta receita de carne de porco vai bem com um vi-nho tinto com complexidade e persistência. Entre os vinhos da Região Tejo, escolha os que são elaborados com as castas Touriga Nacional, Aragonês e Syrah, com estágio em madeira de carvalho.

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FAVAS COMENTRECOSTO OUAPORCALHADAS

As Favas com Entrecosto constituem um prato tradicional em todo o território nacional, e o Ribatejo, região de grande fertilidade, onde a agricultura e a pecuária representam um papel muito importante em termos económicos, não podia deixar de apresentar a sua versão desta leguminosa tão apreciada e que tão bem casa com a carne de porco. De preparação muito simples, é um prato típico da Primavera, quando as favas estão na altura de ser apanhadas, verdes, tenrinhas. Em qualquer casa de lavrador remediado, basta ir à horta colher as favas e os cheiros, à salgadeira buscar o entrecosto e o toucinho e ao fumeiro escolher o chouriço e a morcela de sangue, e estão reunidos todos os ingredientes para confeccionar um prato que a ninguém deixa indiferente.

Ingredientes4 kg de favas com casca, 750 g de entrecosto; 150 g de toucinho entremeado; meio chouriço, meio chouriço negro, 1 molho pequeno de folha verde de alho; 1 molho pequeno de folha de cebola; 1 molho de coentros; 1 dl azeite; banha de porco; sal q.b.

PreparaçãoTempera-se previamente o entrecosto e o toucinho, deixando-os em repouso durante algum tempo, para depois se iniciar um guisado, juntando os molhos de folhas de alho e cebola, o chouriço e o negro às rodelas. Seguidamente, acrescenta-se um pouco de água quente, juntam-se as favas descascadas e deixa-se cozer em lume brando. Não se mexe com colher, apenas se sacode o tacho para que as favas se soltem e não se peguem.

Este prato, actualmente, pode ser feito em qualquer época do ano, graças às favas congeladas, mas nada substitui os produtos na sua época. Lá diz o ditado: “Favas, o Maio as dá, o Maio as leva”14.

As Favas com Entrecosto devem ser acompanhadas por uma garrafa de vinho tinto da Região Tejo. Como este é um prato de sabores elaborados, opte por um vinho com muita complexidade e persistência.

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GALOCOM NOZES

Até meados do século passado, a vila de Rio Maior era o centro de uma região predominantemente agrícola, de pequenos proprietários, cujas casas tinham sempre um espaço destinado à “criação”, nome genérico que englobava os animais de penas e os coelhos, convivendo numa semi-liberdade. A alimentação dessa população remediada incluía, portanto, com frequência, a carne destes animais. Em dias festivos, era necessário introduzir outros ingredientes que fizessem a diferença em relação ao quotidiano. Dada a abundância de nogueirais e de vinhas, as nozes e o vinho eram, naturalmente, os acessórios mais à mão para transformar um prato vulgar numa especialidade para dias especiais.

As pessoas mais velhas ainda se lembram de comer este prato em casa dos pais, nos dias de festa em que as normas religiosas permitiam comer carne. Mas, entretanto, caiu em desuso. Ultimamente, a receita foi recuperada na Asseiceira e em outras aldeias dos arredores de Rio Maior, tendo sido introduzidas algumas alterações no modo de a confeccionar, e, neste momento, é considerado um prato emblemático do concelho, que, inclusivamente, o apresentou a concurso, em 2011, para a eleição das “sete maravilhas da gastronomia”.

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Ingredientes1 galo do campo, vinho tinto, alho, louro, pimenta preta e sal, cebola, azeite, banha de porco, tomate, salsa, nozes, arroz.

PreparaçãoDepois de limpo, parte-se o galo em pedaços pe-quenos. As nozes são partidas em dois ou quatro bocados, conforme o seu tamanho. Juntam-se todos os ingredientes, cozinhando em lume brando e com o tacho tapado para não secar.

Acompanha com arroz feito do molho. Há quem junte passas de uva ao arroz para dar um perfeito contraste de sabores15.

O Galo com Nozes é confeccionado com vinho. Este acrescenta aromas, sabor e textura, funcionando como receptor e difusor de sabores. Para acom-panhar este prato, sirva o vinho que escolheu para o preparar, de preferência um tinto complexo com madeira, da região Tejo.

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NACO DE BOI COM VINHO TINTO

Situado na margem direita do Tejo, o concelho do Cartaxo é considerado uma das grandes referências na produção de vinho, a ponto de ser chamado “Capital do Vinho”. É, pois, natural que alguns dos seus pratos típicos incluam entre os seus ingredientes este produto emblemático, cuja participação na culinária tem raízes na tradição que as populações têm conseguido preservar. Este Naco de Boi com Vinho Tinto é um prato tipicamente cartaxeiro. Mas, para além do vinho tinto, que deve ser seleccionado criteriosamente, de acordo com o que for escolhido para acompanhar a refeição, para a sua confecção deve optar-se, preferencialmente, pela carne de animais bravos pois, como refere a Confraria Gastronómica do Toiro Bravo, “(…) são animais criados em regime extensivo, vivendo da natureza, com um maneio que não comporta na sua alimentação factores de crescimento, apresenta um grão muscular fino e delicado e, quando a carne devidamente maturada é sujeita a manipulações culinárias, exibe aroma e sabor de excelência”.

Todas estas exigências fizeram deste prato típico uma especialidade gastronómica que actualmente faz parte das ementas dos melhores restaurantes do Ribatejo.

Ingredientes4 nacos de boi, com 150 g aproximadamente cada, 1 cenoura, 1 tomate, 1 cebola, 4 dentes de alho, 200 g de margarina, 1 l de vinho tinto, 1 folha de lou-ro, 1 ramo de salsa, piripiri, sal e pimenta, q.b.

PreparaçãoDispõem-se os nacos num recipiente, temperam-se com sal e pimenta, junta-se o vinho tinto e deixa-se marinar durante 24 horas. Passado este tempo, leva-se um tacho ao lume com a margarina, os alhos picados, a cebola cortada em quartos, a cenoura cor-tada em rodelas e a folha de louro. Deixa-se refogar até alourar. Junta-se o tomate pelado e cortado em cubos, o ramo de salsa e deixa-se cozinhar mais um pouco. Adiciona-se então a carne com a marinada, tempera-se com piripiri e deixa-se estufar até ficar bem tenra. Coloca-se a carne numa travessa, passa--se o molho por um passador fino, rectifica-se o sal, rega-se a carne e serve-se acompanhada de arroz branco.

Embora não seja obrigatório, quando se cozinha com vinho deve servir-se o mesmo tipo a acompanhar o prato. Assim, se puder, escolha para a confecção e para a refeição um vinho tinto da Região Tejo, com aroma a fruta preta madura, especiarias e tosta, das castas Touriga Nacional, Aragonês e Syrah, com estágio em madeira de carvalho.

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TORRICADO

O Torricado é uma refeição típica da zona dos valados do Tejo, à volta de Azambuja, Samora Correia ou Salvaterra de Magos, no Ribatejo, consumida até meados do século passado por gente de fracos recursos económicos que tinha que se alimentar com o pouco que tinha à mão. Quando os jornaleiros passavam uma semana fora para trabalhar nos campos dos grandes lavradores ou dos seareiros da lezíria, nas campanhas da monda do arroz ou do tomate e na altura das vindimas, levavam um farnel à base de pão e de enchidos, com os quais faziam uma “bucha”. Com o pão já duro, esfregavam-no com alho, torravam-no em cima das brasas, nuns espetos de pau, barravam-no com azeite, salpicavam-no com sal e comiam-no com uma lasca de bacalhau ou com azeitonas. É, pois, um prato que surgiu da necessidade de os trabalhadores rurais se alimentarem com produtos que não se deteriorassem durante o período de tempo em que estivessem afastados de casa.

Redescoberto pelos apreciadores de petiscos, o Torricado, já afastada a conotação de comida de pobre, actualmente, é considerado uma das especialidades gastronómicas desta zona ribatejana, tendo-se tornado o potagonista de uma iniciativa anual no início de Novembro, na vila de Azambuja, que pretende promover e divulgar a cozinha tradicional da região.

IngredientesPão caseiro duro, alho, azeite, sal grosso, bacalhau, sardinha, entremeada ou febras.

PreparaçãoEscolhe-se um pão caseiro de cerca de meio quilo, já com alguns dias, que por dentro não tenha buracos. Abre-se o pão ao meio e, com a ponta de uma faca bem afiada, retalha-se o miolo profundamente, mas sem atingir a côdea, em losangos com, aproximada-mente, a grossura de um dedo. Esfrega-se com um dente de alho esborrachado: para cada metade, meio dente de alho. Depois, sobre as brasas, colocam-se as duas metades do pão a “torriscar”, primeiro o lado da côdea, que deve ficar estaladiço mas não tosta-do, depois o lado do miolo, que deve ficar louro. É o próprio pão que indica quando está bom, quando os sulcos começam a abrir ou, como diz o povo, quando o pão “está a rir” ou então a “abrir a boca pedindo o azeite”. Unta-se a côdea e rega-se o miolo com azeite; salpica-se com sal grosso. Põe-se de novo em cima do brazido, mas só do lado do miolo, até o azei-te ferver ou, como se diz, até “chiar”. Nessa altura, está pronto a ser comido acompanhando as febras, a entremada, o bacalhau assado ou as sardinhas, também assadas, conforme o gosto.

Este é um prato muito rústico e, conforme o acom-panhamento que escolheu - febras, entremada, bacalhau ou sardinhas - pode optar por um tinto ou um branco estruturados, em estágio em madeira, da Região Tejo.

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ARREPIADOS DE ALMOSTER

O Convento de Santa Maria, em Almoster, no distrito de Santarém, acolheu as freiras da ordem das Clarissas até 1834, data da extinção das ordens religiosas em Portugal. A estas freiras se deve a criação dos Arrepiados, bolos de feitura simples, para aproveitamento das claras dos ovos cujas gemas terão entrado na confecção de outros doces. Para justificar o seu nome, conta-se que, estando as freiras atarefadas na cozinha preparando os bolos que iriam servir a um grupo de fidalgos de visita ao Convento, uma delas mostrou preocupação por irem apresentar um doce tão singelo a tão ilustres visitantes, ao que outra a terá sossegado, afirmando que os bolos ficariam tão bons que os fidalgos se sentiriam “arrepiados”. Se a história tem algum fundamento, é impossível comprová-lo, mas comer Arrepiados deixará qualquer guloso “arrepiado” com a qualidade e o paladar destes bolos, que são uma das principais referências da doçaria escalabitana.

Ingredientes5 claras; 500 g de açúcar; 500 g de amêndoa com pele; raspa de limão; canela q.b.

PreparaçãoBatem-se as claras em castelo bem firme. acrescen-ta-se o açúcar, continuando a bater até fazer bolhas. Junta-se a raspa do limão e a canela. A este prepa-rado incorpora-se a amêndoa devidamente cortada em lâminas fininhas e inteiras, sem bater. A amêndoa deve ser envolvida na massa das claras com açúcar. Num tabuleiro untado com um pouco de azeite ou óleo de boa qualidade, deitam-se colheradas de mas-sa, afastadas umas das outras. Vão ao forno a cozer durante 15 minutos e devem ficar com um pouco de cor. Estes bolos não devem ser tendidos para ficarem com o aspeto de arrepiados16.

Estes bolinhos de amêndoa fazem as delícias do lan-che acompanhados por uma chávena de chá. Se os quiser apreciar com uma bebida mais forte, escolha um vinho licoroso da Região Tejo.

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CELESTES DESANTA CLARA

Estes pequenos bolos encontram a sua origem no Convento de Santa Clara de Santarém. Durante anos, as monjas Clarissas mantiveram em segredo a sua receita, à base de miolo de amêndoa, ovos e açúcar pilé, com uma protecção de papel de obreia. Porém, há cerca de cem anos, Ajax Augusto da Silva Rato, proprietário de uma mercearia fina entretanto desaparecida, conseguiu adquirir a receita, e foi por seu intermédio que se iniciou a divulgação e a comercialização desta especialidade conventual. Em breve, as Celestes de Santa Clara eram já bem conhecidas. Entretanto, outros estabelecimentos da cidade também conseguiram a tão cobiçada receita e lançaram-se no seu fabrico. Assim, estes maravilhosos doces tornaram-se famosos e passaram a ser uma das imagens de marca da cidade de Santarém.

Ingredientes500 g de açúcar; 250 g de água; 450 g de miolo de amêndoa; 12 gemas; folhas de obreia.

PreparaçãoPõe-se o açúcar ao lume com a água, até atingir o ponto de pérola. Nessa altura, deita-se a amêndoa pelada e passada pela máquina. Volta ao lume para ferver mais um pouco. Deixa-se arrefecer e acrescen-tam-se as gemas, levemente batidas. Volta ao lume, mexendo sempre, até se ver o fundo do tacho. Depois de arrefecida, com esta massa formam-se umas boli-nhas do tamanho de uma noz, que se colocam sobre rodelas de obreia humedecida e picotada, um pouco maiores do que as bolinhas. Apertam-se as rodelas com os dedos, para formar uma caixinha. Levam-se a forno forte durante alguns minutos, só para dourar17.

Estes bolinhos pequeninos podem ser comidos ao lanche ou à sobremesa. No final da refeição, acompa-nhe-os com um vinho licoroso da Região Tejo, cujas complexidade de aroma e suavidade final combinam muito bem com este doce conventual.

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QUEIJADINHASDE AZAMBUJA

Na foz da Vala Real, próximo de Azambuja, encontram-se as ruínas de um edifício imponente, conhecido pelo nome de Palácio das Obras Novas, construído em estilo neoclássico, no tempo da Rainha D. Maria I. A sua localização privilegiada na zona da Lezíria, de onde se avistam grandes extensões de terra de cultivo e pasto de touros de lide, assim como a natureza envolvente, com uma vegetação densa e exuberante, atraía, nos finais do século XIX, destacadas figuras da nobreza que ali vinham descansar. Diz a tradição que o próprio Rei D. Carlos, acompanhado pela família real, costumava passar temporadas no Palácio das Obras Novas para se dedicar à caça na companhia do Infante D. Luís Filipe. Em atenção à Rainha D. Amélia, vinham, talvez do Mosteiro de Almoster, umas deliciosas queijadinhas que ela muito apreciava. Mas quando a brucelose atingiu os rebanhos de cabras e de ovelhas, o queijo para fazer os bolos começou a rarear. Foi então que se inventou uma outra receita para fazer uns bolinhos que, sem o queijo mas com o mesmo aspecto, continuassem a ser dignos de aparecer à mesa real. Por isso, lhes chamaram, na altura, “queijadinhas mentirosas”.

O fundador da Pastelaria Favorita, no centro da vila, recuperou, há mais de trinta anos, essa receita esquecida, que veio a dar fama ao estabelecimento. O actual proprietário, Fernando Serra, faz questão de manter a qualidade desses bolinhos, que continuam a ser motivo de atracção tanto dos naturais como dos visitantes de Azambuja.

IngredientesMassa: 1 kg de farinha; 800 g de margarina. Recheio: 1 kg de açúcar; 0,5 l de água, raspa de 1 limão, 3 paus de canela, 30 gemas de ovos

Preparação

Põem-se a ferver água, o açúcar, a raspa do limão e os três paus de canela. Quando estiverem a ferver bem, deita-se esta mistura por cima das 30 gemas e deixa-se descansar 5 ou 6 horas. Amassa-se a farinha com a água e deixa-se repousar durante 15 minutos. Com um rolo, estende-se a massa até ficar com 1,5 cm de espessura. Com uma espátula, espa-lha-se a mistura da margarina com a banha sobre a massa estivada, como quem barra pão. Dobra-se em 3 partes, volta-se a estivar com o rolo e barra-se novamente com a gordura; dobra-se outra vez em 3 partes, estica-se, volta-se a barrar e enrola-se para formar um rolo. Deixa-se descansar durante cerca de 20 minutos. Estica-se o rolo até ficar com 2 cm de diâmetro. Cortam-se pequenos pedaços com 1,5 cm de comprimento, e colocam-se os pedaços em for-mas tipo pastel de nata. Estica-se esta massa com os dedos molhados de modo a que fique a forma toda coberta. Levam-se ao fogo, em banho-maria, as gemas batidas com o açúcar e as natas até o prepa-rado engrossar. Deixa-se arrefecer um pouco antes de deitar nas formas, que se enchem com o prepa-rado. Por cima, deita-se em cada uma um pouco de amêndoa moída com pele e polvilha-se com açúcar em pó. Leva-se a cozer em forno aquecido a 200º C, até formar uma crosta18.

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PÃO-DE-LÓ DE RIO MAIOR

O Pão-de-Ló é um bolo que se pode encontrar com esta designação em dezenas de povoações portuguesas e que, para o diferenciarem, acrescentam ao nome genérico o da localidade que lhe deu origem. Em comum, todos têm o facto de serem bolos fofos e confeccionados com os mesmos ingredientes – ovos, açúcar e farinha. A proporção em que cada um entra na receita, a forma como são batidos, a temperatura do forno e o tempo de cozedura é que estabelecem a diferença entre os vários produtos finais. O Pão-de-Ló de Rio Maior tem como característica principal o facto de ser baixo e húmido no interior, justamente porque a sua criadora, Alice Sequeira, optou por usar uma temperatura do forno e um tempo de cozedura diferentes do habitual. Esta senhora iniciou a produção deste bolo ainda nos anos 60, de uma forma artesanal durante mais de quarenta anos, para responder a encomendas particulares que lhe eram feitas. As muitas solicitações levaram-na a criar, para a entrega, uma embalagem em cartão com a identificação do bolo, o que foi mais uma forma de o distinguir dos seus congéneres de outras regiões do País. Mais tarde, revelou a receita a familiares, que deram continuidade ao fabrico, já em moldes empresariais, tornando o Pão-de-Ló de Rio Maior uma referência na doçaria desta região ribatejana.

Ingredientes4 ovos inteiros; 8 gemas; 150 g de açúcar; 75 g de farinha.

PreparaçãoPré-aquece-se o forno a 220-230º C. Colocam-se os 4 ovos inteiros numa taça e batem-se energica-mente durante 5 a 10 minutos, até ficarem com uma coloração esbranquiçada e bem fofos. Para melhores resultados, deve usar-se uma batedeira eléctrica. Acrescentam-se, pouco a pouco, as gemas previa-mente desfeitas, batendo sempre durante mais uns 5 a 10 minutos. Envolve-se a farinha que vai sendo peneirada sobre a massa, polvilhando sem bater, usando a batedeira na velocidade mínima e apenas durante alguns segundos. Forra-se uma forma que se possa abrir (o bolo no final não se pode virar), forrada com papel vegetal untado de manteiga e fari-nha. Verte-se a massa para a forma e deixa-se cozer durante 7 minutos. Ao fim de 4 minutos, roda-se a forma 180º. Não se deve deixar o bolo tempo a mais no forno, para não secar. Retira-se a forma do forno e deixa-se arrefecer. Quando o Pão-de-Ló já estiver bem frio, retira-se da forma com o papel vegetal. Separa-se o bolo do papel passando uma espátula metálica e comprida por baixo deste19.

Deve ser comido após algumas horas, pois o bolo vai abatendo, formando as rugas, e a espuma de ovos vai dando origem a uma calda deliciosa. Acompanhe-o com uma flute de espumante da Região Tejo, para reforçar o contraste com o sabor do bolo.

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CASPIADAS

As Caspiadas são uns bolos que, mais uma vez, testemunham a capacidade das nossas gentes em criar receitas de baixo custo, a partir de aproveitamentos. Neste caso, aumentava-se a quantidade de massa com que se fazia o pão e aproveitavam-se folhas de couve para servir de base a esses bolos. E assim se criava um clima de festa entre os mais pobres. Esta modesta iguaria está indissociavelmente ligada a Pontével, freguesia do Cartaxo, não apenas por ser já um bolo tradicional desta povoação, em honra do qual é organizada há mais de vinte anos, no mês de Junho, a Feira da Caspiada, integrada na Artével, mas também porque a Junta de Freguesia, em 2011, requereu ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) o registo da marca Caspiada, bolo típico de Pontével, o que lhe confere um direito exclusivo sobre a mesma.

Ingredientes500 g de massa de pão, 2 colheres de sopa de açú-car amarelo, 1 colher de sopa de azeite, 1 colher de sobremesa de canela em pó, raspa de uma casca de limão, azeite para untar e folhas de couve.

PreparaçãoAdicione à massa de pão o azeite, o açúcar amarelo, a raspa de limão, a canela em pó e amasse muito bem.

Divida a massa em porções, molde-as em bolas achatadas, coloque cada uma em cima de uma folha de couve e unte com azeite. Leve ao forno, de preferência a lenha, até ficarem bem cozidas e deixe arrefecer.

Para acompanhar estes bolos secos, escolha um vi-nho licoroso ou uma colheita tardia.Os seus sabores ricos e aromas intensos harmonizam-se na prefeição com as Caspiadas.

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Os verdadeiros apreciadores de queijo mas, so-bretudo, os que gostam de chèvre, já ouviram falar, certamente, do Queijo de Maçussa. Trata-se de um queijo de pasta mole e sabor intenso, de origem francesa, o único produzido artesanalmente em Portugal com leite de cabra. Para a sua identifica-ção, usa o nome da aldeia de Maçussa, no conce-lho de Azambuja.

O queijo designado “Granja dos Moinhos” é pro-duzido numa pequena empresa criada em 1977 por Adolfo Henriques, com a ajuda da mãe, e na qual trabalham regularmente três pessoas, numas antigas instalações agrícolas que já pertenciam à família. Lançar-se neste nicho não foi tarefa fácil. Para manusear os bolores, teve de frequentar um curso no Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial, que ainda hoje o apoia atra-vés do fornecimento de fermentos lácteos. Depois, importou um pequeno rebanho de cabras suíças da raça Saanen para lhe fornecerem o leite, mas actualmente adquire-o também a vários produto-res da região.

Para dar alguma visibilidade ao seu queijo, Adolfo Henriques contou com a colaboração do che-fe Michel, que criou uma entrada cujo principal ingrediente era justamente o Chèvre “Granja dos Moinhos”. Depois, aos poucos, foi sendo reconhe-cido e hoje o Queijo de Maçussa pode encontrar-se à venda nas mais prestigiadas lojas de artigos de alimentação. Em 2007, para assinalar os 30 anos

da sua empresa familiar de fabrico de queijos, Adolfo Henriques realizou um sonho: lançou o livro de receitas “Puro Chèvre – receitas com queijo de cabra “Granja dos Moinhos”, no qual colaboraram sessenta chefes, cujas criações incluem, como ingrediente, o Queijo de Maçussa, o que constitui uma clara demonstração do reconhecimento na-cional já alcançado por este produto regional.

Este é, seguramente, mais um exemplo de como a dedicação, o empenho e o rigor permitiram criar em Portugal este produto de excelência, valorizan-do a actividade rural e os sabores genuínos, usando técnicas de produção cujo resultado final rivaliza com o melhor chèvre originário do sul de França.

Produto Regional QUeIjO De MaÇUssa

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CHARNECARIBATEJANA

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“Os variados tapizes de flores, nas grandes relvas; os novilhos brincalhões, os toiros bravos a pasto. (...) os barcos do Tejo como prata fundida, em várias e caprichosas voltas, formando canais, lagos e ínsuas, bordadas de salgueiros recurvos; o sol (...) a inundar aquelas campinas, onde a profusão de floritas de diversas cores apresentam cambiantes vários, e nas alturas, atravessando o azul transparente, com o seu voo sereno e largo, a cegonha, solícita amiga do lavrador!” Foi com estas palavras que o poeta e bon vivant Raimundo Bulhão Pato recordou a paisagem ribatejana nas suas memórias. Dificilmente conseguiríamos fazer melhor retrato. Tal como as palavras do ensaísta sugerem, estamos numa terra pintada de fertilidade em tons de verde, território do toiro bravo e do celebrado cavalo Lusitano, animal tão estimado por aqui que se tornou símbolo da região.

alMeIRIM

Terra de caça abundante, Almeirim atraiu desde cedo reis e nobres. D. João I fundou o Paço Real e, durante a Dinastia de Aviz, este foi destino apetecido dos so-beranos portugueses e da sua corte. O Tejo enchia--se de bergantins e de batéis engalanados transpor-tando todos quantos se encontravam inscritos nos livros de moradia de corte; a aldeia ganhava vida e tornava-se palco de intrigas cortesãs e de assuntos de estado. As vicissitudes do tempo e a inconstância dos homens votaram à ruina este palácio do qual hoje não sobra pedra sobre pedra. Mas, em meados do século XIX, o concelho encontrou um novo fulgor com a constituição de grandes casas agrícolas em-penhadas em modernizar o panorama rural e a tirar partido do potencial agrícola da região. Muitas delas ainda hoje resistem, como a quinta do Casal Branco e a da Alorna. Actualmente, Almeirim é reconhecido pela excelência dos produtos da terra, especialmente o vinho e o melão, e pela superioridade das carnes de porco, nomeadamente dos enchidos, ingrediente fundamental para o mais apreciado prato da região: a Sopa da Pedra.

alPIaRÇa

Elevada à condição de vila em 1906, Alpiarça é desde há muito uma terra profundamente ligada ao trabalho dos campos e à produção agrícola. Grandes senhores fixaram-se nas suas cercanias, desenvol-vendo o território e apostando na riqueza do solo. O imponente palácio da Quinta da Lagoalva é disso testemunho, assim como a Casa dos Patudos com o risco de Raul Lino e mandada construir por José Relvas, lavrador e político defensor da causa republi-cana nos alvores do século XX. O edifício foi legado à vila pelo seu proprietário e a sua visita vale bem a viagem. A vocação agrícola do concelho é visível até para o mais distraído viajante. À beira das estradas que cruzam a região, avistam-se grandes extensões de terra trabalhada, vinhas que se intercalam com campos de milho, numa paisagem onde, aqui e ali, se pode encostar à berma e provar uma fresca talhada de melão vendida de baixo de um rudimentar cha-péu-de-sol pelas mãos do próprio produtor. A gastro-nomia do concelho orgulha-se de manter a tradição, mas hoje procura também criar novas propostas com base nos produtos locais.

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CORUChe

A afición corre nas veias dos coruchenses. A festa brava é parte integrante da cultura deste concelho e, por aqui, é vivida com enorme entusiasmo. Daqui saíram grandes nomes do toureio nacional, entre os quais o cavaleiro e ganadeiro David Ribeiro Telles, que é hoje o patriarca de uma família totalmente devotada à tauromaquia.

O panorama da região é dominado pela vasta lezíria alimentada pelo rio Sorraia, onde cresce o melhor arroz de Portugal. O verde dos arrozais alterna, muitas vezes, com extensas áreas de montado de sobro, uma paisagem que evoca já um pouco o vizinho Alentejo. De facto, o concelho de Coruche, embora tenha o coração no Ribatejo, não deixa de ter um pé no Alentejo. No livro “Coruche à Mesa e outros Manjares”, José Labaredas caracteriza assim a gastronomia da região: a nossa mesa tradicional entronca numa comum matriz transtagana pois nos arrimamos fraternalmente ao Alentejo, colhendo e adaptando alguns dos mais saborosos nacos da sua lavra.

Cortiça, agricultura e gado bovino são as grandes riquezas da região. A Comissão Europeia aprovou em 2013 o registo da “Carne de Bravo do Ribatejo”, como produto de Denominação de Origem Protegida. Para usar esta designação, a carne tem de ser proveniente da desmancha de carcaças de bovinos inscritos no Livro Genealógico Português dos Bovinos da Raça Brava de Lide, criados segundo os moldes tradicio-nais na área geográfica de produção definida. Assim, recentemente, Coruche decidiu apostar na promoção da Carne de Toiro Bravo, investindo na recuperação de receitas e no aparecimento de novas propostas gastronómicas.

GOleGÃ

É assim todos os anos: as ruas enchem-se de gente, de amazonas de jaquetas bordadas, de cavaleiros com mazzantinis à banda, o ar satura-se com o aroma das castanhas assadas e, nas casetas que se erguem no Largo do Arneiro, criadores e convida-dos brindam com água-pé à beleza e à aptidão do Lusitano. Estamos em Novembro, por alturas do São Martinho, na Feira Nacional do Cavalo. Aqui celebra--se a actividade equestre em geral e o Puro-sangue Lusitano, o mais antigo cavalo de sela do mundo, em particular, numa tradição que remonta ao século XVIII, ao tempo do Marquês de Pombal. Já nessa altura, esta feira, na Golegã, era um importante pólo de atracção para os melhores criadores de cavalos. No século XIX, instalaram-se nas cercanias da vila grandes lavradores que ajudaram a desenvolver o potencial agrário do território. Alguns deles, tal como Carlos Relvas, Ruy d’Andrade na quinta da Cardiga, e Rafael José da Cunha, na Quinta da Broa, entraram para a história pelo seu importante legado. Herdeiro de Rafael José da Cunha, Manuel Tavares Veiga dedicou-se com rigor e minúcia ao apuramento da raça portuguesa e juntamente com Ruy d’Andrade e com o filho deste, Fernando Sommer d’Andrade, desenvolveram as duas correntes de sangue mais importantes dos Lusitanos: a Andrade e a Veiga. Assim, não é de estranhar que, pela sua história e cultura, a Golegã tenha ganho o estatuto de “Capital do Cavalo”. Mas se a tradição e os desportos eques-tres dominam o concelho, os campos da Golegã, pontilhados de milharais, searas e olivedos, também não são esquecidos. Estas são terras fecundas que anualmente se transformam em alimento.

beNaveNTe

Entalado entre o Tejo e o Alentejo, rasgado pelo Sorraia, Benavente é o concelho da lezíria riba-tejana, terra de toiros e de cavalos. Coudelarias e ganadarias famosas fixaram-se nesta região, entre elas a Companhia das Lezírias, em Samora Correia, e a Palha, na Quinta da Adema, no Porto Alto. Nas margens dos rios, milhares de hectares de pastagens alimentam inúmeras cabeças de gado, mansas e bravas, lideradas pelo senhor da lezíria, o campino. De barrete verde, colete encarnado, meia branca e o ferro da casa ao peito, o campino forma uma unidade com a sua montada e vai comandando a manada brandindo o pampilho. Este homem conhece cada animal desde que nasce até ao dia em que triunfa na arena ou que é conduzido para abate e é uma figura incontornável nas inúmeras festas tradicio-nais. Anualmente, o povo sai à rua para acompanhar com entusiasmo os jogos de cabrestos e a picaria à vara larga, espectáculos típicos desta região. Assim, não surpreende que na gastronomia se destaque o Cozido Bravo à Ribatejana e, com o que sobra do cozido, as empadas de corno.

Grande parte desta região pertenceu, desde D. João IV, à Casa do Infantado, criada a favor de seu filho, o Infante D. Pedro. Com as guerras liberais, acabou por ser extinta com base na Carta de Lei de Março de 1836. Por decreto, a Rainha D. Maria II autorizou a venda em hasta pública das vastas propriedades que compunham as Lezírias do Tejo.

Quase todas estas terras, formadas sobretudo por aluviões, são muitíssimo férteis e revelam-se um solo perfeito para a produção de tomate, milho ou arroz, produtos sempre presentes na gastronomia da região.

ChaMUsCa

Augusto Pinho Leal, na sua monumental obra “Portugal Antigo e Moderno”, refere que, em 1590, a Chamusca não era mais do que uma quinta de Ruy Gomes da Silva, cavalheiro que passou à história com o título fulgurante de príncipe de Eboli, a terra onde Cristo parou. Este filho da terra partiu muito cedo para Madrid e lá, gozando de uma boa estre-la, teve um brilhante destino político no reinado de Filipe II. Valido do rei, conseguiu que, a seu pedido, o soberano elevasse a sua terra a vila. Mas, antes disso, sabe-se que a região já era povoada, pelo menos nas fases finais do Neolítico, como provam as necrópoles que se vão descobrindo nas imediações, e que a cul-tura romana também por lá passou, testemunhada por vestígios de uma antiga estrada do império.

Parece que, com as suas barcaças, a Chamusca tam-bém era um importante porto de passagem, vocação que deixou de fazer sentido com a construção da sua ponte em ferro, em 1909, conseguida graças à acção persistente de um notável político da terra, João Joaquim Isidro dos Reis.

Bafejada pela natureza, toda a região é composta por terrenos muito férteis e produtivos. Assim, todo este território tem uma forte ligação à agricultura e à criação de gado, sendo o concelho muito ligado às suas tradições tauromáquicas e a vila da Chamusca muito orgulhosa da sua bonita praça de toiros, um dos edifícios mais emblemáticos da terra.

Na gastronomia, a memória também se impõe. Com um magnífico património religioso, os doces con-ventuais perpetuam o saber das monjas. Hoje, estas delícias, saturadas de ovos e açúcar, destacam-se e justificam, sem dúvida, uma visita.

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salvaTeRRa De MaGOs

Aqui o Tejo adelga-se, passa em suaves curvas de serpente, enlaça os mouchões dispersos e lá longe, branca, Salvaterra acena-nos. Nas águas, um grupo de homens arranca enguias à lama, projectando-as ao ar para serem apanhadas. O rio oferece alimento e presenteia os pescadores com um pitéu que, por estes lados, ascendeu à realeza. O concelho, com a preocupação de resgatar tradições culinárias, atri-buiu-lhe o título de «Rainha do Tejo».

Até à segunda metade do século XIX, esta era uma paisagem de charneca arenosa mas, com o afora-mento dos baldios municipais, as terras foram sendo amanhadas habilmente, tendo sido transformadas em chão carregado de vida, onde tudo quanto é plantado cresce em abundância. Nas pastagens, manadas de toiros correm soltos de baixo do olhar atento do maioral que, do alto da sua sela mourisca, com o xairel de pele de cabra, comanda a boiada em “ois”! alongados.

O coração do Ribatejo foi, desde há muito, terra de predilecção de reis. Entre o Paço Real de Almeirim e o de Salvaterra de Magos, os monarcas e a sua corte perdiam-se nas coutadas da zona, em jogos de caça grossa. A construção, em 1542, do Palácio em Salvaterra de Magos contribuiu em muito para o crescimento da vila e da região, promovendo a fixação de grandes casas nobres nas imediações. Tendo sido o Ribatejo abrigo para lazeres e vagares de príncipes e nobres, Salvaterra assistiu desolada à decadência, ao incêndio e ao abandono do seu Paço, do qual hoje só resta a capela e a falcoaria, recente-mente recuperada e totalmente dedicada à arte da cetraria, numa clara evocação das tradições cinegéti-cas da região.

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GolegãFarinheira frita, pataniscas, petinguinha albarda-da, cagarrinhas com feijão, favas no azeite, sopa aporcalhada, sopa de feijão com carne, alaparda-na, canelos, requentado com peixe frito, sável de escabeche, enguias no espeto, massa com baca-lhau e cabrito com grelos à moda da azinhaga. Nos doces, arroz-doce, bolos de noiva, merendeiras de abóbora, toureiros, trouxas de ovos e velhoses. A indústria de vinagres da Golegã já tem projecção nacional e internacional e a sua importância levou ao aparecimento de uma proposta de requeijão com vinagre.

Salvaterra de MagosTripa temperada, sopa camponesa, de ossos, de feijoca com massa e de pão. Enguias de caldeirada, de ensopado, fritas com arroz de feijão e outras propostas, tradicionais ou de autor, decorrentes do mês da enguia. Entrecosto à lavradora, galinha assada no forno de pão, perna de cabrito no forno e sarrabulho à moda da Glória do Ribatejo. Nos doces, enguias doces, bolo de amêndoa, papos de anjo, pudim de pão, sonhos, bolos de mel e arroz-doce branco e os barretes da Cabana dos Parodiantes, que ficaram famosos em todo o País graças aos Parodiantes de Lisboa, programa de rá-dio muito apreciado nos finais do século passado.

GASTRONOMIA REGIONAL

AlmeirimSopa da pedra, sopa de feijão, requentado, puré de tomate, massa à Barrão, bacalhau com molho de alho, magusto com bacalhau assado, caldeirada à pescador de Almeirim, lebre com couve e feijão branco, favas com enchidos de Almeirim, cacho-la de porco, chispe com batata frita. Nos doces, bolo finto de Almeirim, bolinhos de limão, broas de Almeirim, espera-marido, pés de abóbora e velhozes. Destaque para as saborosas caralhotas e o famoso melão.

AlpiarçaBolo de sardinha, favas só com ovo, sopa da matança ou três por um, tomatada com sardinha, miga fervida com bacalhau, carneiro à moda de Alpiarça, favas com entrecosto, molhinhos guisa-dos e papas de abóbora com carnes grelhadas. Nos doces, Patudos, pão-de-ló de Alpiarça, quadra-dinhos de Alpiarça, broas de Alpiarça, ferradura ou bolos de noivos e esses de amêndoa. A torta de melão e a mousse de melancia são reflexos da tradicional produção destes dois frutos.

BenaventeEmpadas de corno, túberas fritas com carne, torri-cado do campino, sopa de bacalhau, sopa de car-dos com feijão, sopa de feijão verde com segurelha, enchidos, açorda de ovas de saboga, molhata de peixe, tomatada de peixe, cozido bravo à ribatejana, borrego grelhado, cabrito no forno com massa de catalão, molhata ou migas com entrecosto. Nos doces, bolo podre ou bolo Gungunhana, bolo de chocolate de Benavente, broas fritas de Benavente, broas de batata-doce e amêndoa e doce de tomate.

ChamuscaFarinheira frita, morcelas de arroz grelhadas, sopa de sável, caldeirada de feijão-verde, tomatada, couve a soco com bacalhau assado, cabrito assado no forno à moda do Ribatejo, feijoada à lavrador, cachola e estamenha. Nos doces, trouxas de ovos, peixe doce, queijinhos de amêndoa, lampreia de ovos, bichanas, corações de noiva, ferraduras, cha-muscos, arroz-doce, velhoses, broas, toucinho do céu, belhoses, bolos e rabanadas de mel e migas doces.

CorucheEspargos ou túberas com ovos, migas de espargos, sopa rica de bacalhau do Couço, açorda de baca-lhau à moda de Coruche, açorda de sável. Carne de toiro bravo (várias propostas), arroz de entre-costo, migas de batata com entrecosto, borrego no forno e cabrito frito à lavrador. Nos doces, Areias do Sorraia, Bolo de batata-doce, Bolos fintos, Bolo de nozes, Bolinhos de pinhão, Nógado de pinhão e mel, Queijadas e Pinhoadas em flor de laranjeira.

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AGENDA GASTRONÓMICA

FevereiroFour Weeks- Sopa da Pedra, em Almeirim

MarçoMês da Enguia, em Salvaterra de Magos

MaioSabores do Toiro Bravo, em CorucheMostra de Gastronomia Ribatejana e Salão do Vinho, do Vinagre e do Azeite do Ribatejo, na Golegã

JunhoFestas da Sardinha Assada, em Benavente Festas da Cidade (com tasquinhas), em Almeirim

JulhoFestival do Melão, em AlpiarçaFestival de Gastronomia da Lezíria Ribatejana, em Samora Correia, BenaventeFestas da Sardinha Assada, em Barrosa, Benavente

AgostoFestas da Sardinha Assada, em Benavente

SetembroFestival da Sopa da Pedra e do Petisco, em AlmeirimAlpiagra – Feira Agrícola e Comercial de Alpiarça, em Alpiarça Feira Anual e Tasquinhas, em Benavente

Outubro Jornadas de Gastronomia, em Coruche

Novembro Feira Nacional do Cavalo e Feira de S. Martinho, na Golegã

40 dias após a Páscoa, Semana da Ascensão, na Chamusca

Vinhos da RegiãoOs vinhos produzidos desta região integram a Comissão Vitivinícola Regional do Tejo.

ConfrariasConfraria Gastronómica de Almeirim Confraria Gastronómica do Toiro Bravo Confraria do Torricado com Bacalhau Confraria da Enguia

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sOPa De FeIjÃOCOM COUve

Esta sopa é confeccionada com dois produtos que qualquer casa rural tem sempre à disposição, na tulha e na horta. O feijão encarnado, planta de cultivo simples, bem adaptada às condições climatéricas de Portugal, cujas sementes alimentícias são de fácil conservação e de preço acessível, é um elemento indispensável na alimentação das populações de norte a sul do nosso País. A couve possui numerosas variedades, algumas morfologicamente muito diferentes, mas pensa-se que algumas são autóctones e que, desde muito cedo, fizeram parte da dieta dos povos que habitaram e habitam o nosso território.

Ao fornecer a receita desta sopa, o seu autor esclareceu que ela “serve-se acompanhada…”. Ou seja, o peixe que mais facilmente chegava a estas paragens, as sardinhas e os carapaus, eram considerados acompanhamento do prato principal, a sopa.

Reescrita na actualidade, e tendo em conta a alteração de hábitos alimentares, esta receita, provavelmente, seria apresentada como um prato de sardinhas ou de carapaus, com acompanhamento de Sopa de Feijão com Couve.

O autor referiu, no entanto, que “as nossas sopas são, no geral, de sustância, pois sempre constituíram por si próprias refeições completas”. Muitas vezes, por motivos facilmente entendidos, a sopa era consumida sem acompanhamento, ou, quando muito, com azeitonas.

IngredientesFeijão vermelho; couve cortada; água; pão duro em fatias; azeite; coentros e/ou hortelã. Sardinhas, pe-tingas ou carapaus e azeitonas pretas.

PreparaçãoNum tacho ou numa panela de barro deita-se o feijão vermelho previamente cozido, a que se junta couve cortada e água suficiente para cozer. Depois de cozi-da a couve, deita-se tudo por cima de fatias finas de pão duro, para o escaldar, temperando-se por cima com azeite cru. Pode juntar-se um ramo de coentros picados ou uns raminhos de hortelã, ou ambos.

Esta sopa serve-se acompanhada de sardinhas, de petingas fritas ou assadas ou de carapaus fritos e azeitonas pretas20.

Esta é uma sopa robusta que pede, por isso, um vinho tinto de corpo médio, no qual predomine a uva Castelão. Deve, no entanto, ser frutado com taninos subtis mas presentes. Escolha um vinho da Região Tejo, jovem e sem estágio em madeira.

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SOPA DE FEIJOCA COM MASSA

A consistência desta sopa é dada pela Feijoca ou Feijão--de-Espanha, que pertence à família das leguminosas e encontra a sua origem na América Central e no México, tendo sido introduzida na Europa, provavelmente, no século XVIII. É uma variedade de feijão graúdo que cresce em forma de trepadeira, atingindo, por vezes, cerca de quatro metros de altura. A planta dá muitíssimas e magníficas flores encarnadas que permanecem abertas por muito tempo e possui vagens grossas, pendentes, com as sementes alimentícias. Quando estas são cozinhadas, adquirem um sabor singular e aveludado.

O outro ingrediente principal deste prato, a Massa Alimentícia, tem um valor nutritivo superior ao do pão, pois é normalmente preparada com farinha de trigo não refinada.

Ingredientes1 l de feijoca; 1 cebola grande; 2 batatas; 3 cenouras médias; massa ao gosto q.b.; 2 dentes de alho; 1 colher de chá de colorau; 1 fio de azeite; 1 ramo de hortelã; sal q.b.

PreparaçãoCoze-se a feijoca. Retiram-se algumas feijocas inteiras e reservam-se, sendo as restante trituradas dentro da água de cozer. À parte, faz-se um refogado com a cebola e os dentes de alho picados, o colo-rau e o azeite. Depois, juntam-se ao puré as feijo-cas inteiras, juntamente com as batatas cortadas aos quadradinhos e as cenouras cortadas miúdas. Tempera-se com sal a gosto e deixa-se cozer. Quase no fim da cozedura, deita-se a massa, que pode ser de cotovelos ou mais grossa, consoante o gosto. Deixa-se cozer e apurar. Por fim, numa terrina, colo-ca-se um bom ramo de hortelã no fundo e cobre-se com o preparado anterior.

Esta sopa é quase uma refeição. Os diferentes ingre-dientes que a compõem sugerem um vinho tinto da Região Tejo com muita complexidade e persistência. Como a Sopa de Feijoca com Massa é bastante forte e encorpada, pede um vinho com essa mesma estrutura.

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SOPA DA PEDRA

Tal como quase todos os costumes e tradições, também a gastronomia regional tem uma lenda associada. No caso de Almeirim, é a Sopa da Pedra.

Conta-se que um frade andava no peditório e à porta de um lavrador não lhe quiseram dar nada. O frade, cheio de fome, disse que ia fazer uma sopa de pedra. Cheios de curiosidade, o lavrador e a mulher acederam a fornecer-lhe tudo o que ele pedia para a confecção da dita sopa, desde o tacho de barro e um canto do lume até aos ingredientes, como um pouco de unto, uma pedrinha de sal, um olho de couve ou um pedaço de chouriço. Quando o frade acabou de comer, o lavrador espantou--se por a pedra ter ficado no fundo do tacho, ao que o frade respondeu que ficava para outra vez. E assim comeu à custa de quem não lhe queria dar nada!

Não precisando de recorrer às artimanhas do frade, vão-se acrescentando à sopa os mais substanciais ingredientes, o que tem contribuído, ao longo dos tempos, para a fama que este prato já granjeou. Mas a qualidade dos produtos hortícolas e dos enchidos da região são os principais trunfos desta proposta gastronómica apresentada pelos restaurantes, principalmente no concelho de origem, Almeirim.

Ingredientes1 l de feijão encarnado; 1 orelha de porco; 1 chouriço negro de sangue, da região; 1 chouriço de carne; 150 g de toucinho entremeado; 750 g de batatas; 2 cebolas; 2 dentes de alho; 1 folha de louro; 1 molho de coentros; sal e pimenta.

PreparaçãoSe o feijão for do ano, não necessita ser demolhado. Se for duro, põe-se de molho durante algumas horas. Escalda-se e raspa-se a orelha de porco, que vai a cozer em bastante água com o feijão, os chouriços, o toucinho, as cebolas, os alhos e o louro. Tempera-se com sal e pimenta. Se for necessário juntar mais água, deve ser sempre a ferver. Quando a carne estiver cozida, retira-se e introduzem-se na panela as batatas cortadas aos quadradinhos e os coen-tros picados. Deixa-se cozer a batata. Assim que se retirar a panela do lume, introduzem-se as carnes previamente cortadas aos bocadinhos e uma pedra bem lavada, que deve ir na terrina21.

A Sopa da Pedra pede um vinho tinto jovem da Região Tejo. Escolha um pouco elaborado e sem grande complexidade.

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REQUENTADO

O Requentado é um prato muito popular na Golegã e em muitos outros concelhos do Ribatejo, e é mais um exemplo da ancestral economia doméstica, com o aproveitamento e a valorização das sobras, usando produtos da região. Depois do consumo da sopa, para não repetir o mesmo prato na refeição seguinte, usava-se a criatividade, acrescentando o alho e o pão de milho. Mas há quem afirme que é a segunda fervura que faz toda a diferença.

Quem podia acompanhava o Requentado com bacalhau assado, durante muito tempo conhecido como o “fiel amigo”, ou com sardinhas fritas ou assadas.

IngredientesPara a sopa - que deve ser em quantidade sufi-ciente para duas refeições: 300 g de feijão branco; 1 cebola; 1,5 dl de azeite; 2 couves portuguesas; 3 dentes de alho; 0,5 kg de pão de milho; sal q.b. Para o Requentado: Restos da sopa de feijão branco; 3 dl de azeite; 6 dentes de alho; pão de milho

PreparaçãoSopa: Depois de oo feijão demolhado durante dez a doze horas, coze-se em água abundante com a cebola e um pouco de azeite. Quando o feijão estiver cozido, junta-se a couve cortada em caldo-verde grosso. Tempera-se com sal. Serve-se a sopa à noite, ao jantar, e cada um junta-lhe pão de milho esfarela-do e rega-se com um fio de azeite.

Requentado: No dia seguinte, leva-se o resto da sopa ao lume, até ferver. Junta-se-lhe o azeite, os dentes de alho descascados e inteiros e pão de milho em quantidade suficiente para enxugar o caldo e se obter um preparado com aspecto de uma açorda. Depois de se adicionar o pão, deixa-se o requentado ferver, mexendo sempre para evitar que se pegue ao fundo do tacho. Nesta altura e enquanto se mexe, se for necessário, junta-se mais azeite. Acompanha-se com bacalhau assado, carapaus ou sardinhas fritas.

O vinho a escolher para harmonizar com o Requentado deverá ser um tinto jovem da Região do Tejo, sem estágio em madeira. um vinho de lote em que predomine o Castelão ou a Trincadeira.

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aÇORDa De sÁvel

Nas terras ribatejanas atravessadas pelo Tejo, a cozinha é marcada pela influência do rio, de onde vem o peixe que deu fama à gastronomia ribeirinha: o sável. É um peixe marítimo que, no princípio da Primavera, sobe o curso do rio para desovar, altura em que a sua pesca é autorizada. Mas, embora existam regras para disciplinar a sua captura, actualmente, tanto o sável como outras espécies que povoam o rio estão em risco de desaparecer. As causas são sempre as mesmas: as barragens, que criam obstáculos intransponíveis à passagem dos peixes, a poluição, que os envenena, a pesca desenfreada, que os dizima.

Mas, apesar de, hoje em dia, já não ser o mesmo o número de sáveis que, obedecendo à natureza, procura as águas a montante para se reproduzir, os homens da beira-rio mantêm viva a tradição da pesca e do consumo deste peixe, cozinhado de diversas maneiras.

A Açorda de Sável, feita com as ovas, a cabeça e o rabo do peixe, é o acompanhamento tradicional do sável frito em postas muito finas. É um dos pratos mais típicos e mais apreciados da gastronomia da beira-rio, atraindo todos os anos multidões que acorrem aos festivais dedicados à degustação dos pratos regionais à base deste peixe de carne delicada e gorda, embora com muitas espinhas. Paradoxalmente, estas iniciativas constituem um importante recurso económico para as regiões onde se realizam, mas, ao mesmo tempo, contribuem para um desequilíbrio ecológico que coloca em risco a continuidade da espécie.

Ingredientes3 cabeças e as ovas de sável; 2 pães de trigo duros, de cerca de 1kg; sumo de meio limão; 4 dl de azeite; 1 folha de louro; coentros; sal e piri-piri q.b.

PreparaçãoCozem-se as cabeças e as ovas em bastante água temperada de sal e louro. Entretanto, corta-se o pão em fatias finas para uma tigela funda. Escalda-se este pão com a água em que cozeu o peixe. Há quem triture num passe-vite os restos das cabeças cozidas para que o suco que se mistura ao caldo da cozedura lhe dê ainda mais sabor. Deixa-se abeberar e depois desfaz-se o pão com uma colher até se obter um preparado homogéneo. Deita-se o azeite num tacho e leva-se a aquecer com os dentes de alho, sem os queimar. Junta-se então o pão desfeito e, mexendo sempre, deixa-se levantar fervura. Acrescentam-se as ovas já sem a película que as envolve e, meias desfeitas, mexendo-se sempre. Juntam-se os coen-tros picados, o sumo de limão e o piri-piri. Vai à mesa bem quente, a acompanhar fatias bem finas de sável frito.

Esta é uma receita que exige um branco de bom corpo, com uma boa estrutura. Procure um vinho da Região Tejo, cujo lote contenha Fernão Pires e/ou Arinto. Deve ser estruturado e untuoso, com uma maior complexidade dada pelo estágio em madeira de carvalho.

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ENSOPADO DE ENGUIAS

O Tejo que passa por Salvaterra de Magos é aquele que atravessa o Ribatejo, o que tem já água doce e margens verdejantes. É um rio cheio de vida, com uma grande riqueza natural e paisagística, em que o peixe de rio - como o sável, a saboga, a fataça, a enguia ou o barbo - dita a tradição gastronómica das populações que tão bem sabem casar o que a terra, o clima e o rio, juntos, fornecem, recriando, adaptando e melhorando.

Com a horta ao pé da porta, o rio a dois passos e restos de pão, assim se faz o Ensopado de Enguias, prato tão característico do Ribatejo e que é parte da dieta dos locais. Por isso, actualmente, nos restaurantes de todas as povoações da beira-rio, o Ensopado de Enguias tem sempre um lugar privilegiado na ementa. E depois das chuvas do inverno que, diz-se, é a altura em que as enguias são melhores, o município de Salvaterra de Magos promove anualmente, no mês de Março, um festival gastronómico dedicado a este peixe.

Com pequenas variações, vai-se encontrando esta maneira de cozinhar as enguias um pouco por todo o lado, ao longo dos rios portugueses, por cujos estuários estes animais viajantes e corajosos penetram, depois de terem nascido em pleno Oceâno Atlântico e de terem vagueado durante cerca de dois anos pelo mar alto até encontrarem as águas doces e os fundos lodosos onde gostam de viver e onde acabarão os seus dias, para aparecerem a nadar num molho saboroso que ensopa o pão no fundo do prato.

Ingredientes1,2 kg de enguias; 3 cebolas grandes; 1,5 dl de azeite; 750 g de tomate; 1 dente de alho; 1 folha de louro; 1 ramo de salsa; 1 colher de sopa de colorau; sal e pimenta q.b.; 1,5 dl de vinho branco; 2 pimentos; 200 g de fatias de pão torrado.

PreparaçãoAmanham-se as enguias e cortam-se em bocados. Temperam-se com sal. Cortam-se as cebolas em rodelas e alouram-se no azeite. Quando estiverem louras, junta-se o tomate cortado em rodelas gros-sas, o dente de alho esmagado, o louro, a salsa, o co-lorau, o sal e a pimenta. Deixa-se refogar um pouco e introduzem-se as enguias, envolvendo-as bem no refogado. Regam-se com vinho branco e deixam-se cozer em lume brando. Cerca de dez minutos depois de ter levantado fervura, adicionam-se os pimentos cortados em tiras. Apura e serve-se numa terrina sobre as fatias de pão22.

O Ensopado de Enguias aceita um vinho branco da Região Tejo, de preferência da uva Fernão Pires, que domina nesta zona. A sua acidez e o corpo médio realçam e harmonizam-se bem com os sabores das enguias.

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CABRITO ASSADOÀ MODA DO RIBATEJO

O Cabrito Assado é uma das grandes referências da gastronomia de norte a sul de Portugal e está, em geral, associado a festas religiosas, nomeadamente a Páscoa. É no domingo de Páscoa que se retoma a alimentação normal, terminado o jejum que os cristãos estabelecem durante a Quaresma, período de quarenta dias entre a Quarta-feira de Cinzas e as celebrações pascais. É nesta época que, em geral, os rebanhos têm um maior número de crias, e as refeições à base de jovens ovinos ou caprinos envolvem um ritual de cariz religioso que remete para a Paixão de Cristo.

Com algumas zonas de elevação de terreno, propícias à criação de caprinos, o Ribatejo, região de transição geográfica e de adaptação às diferentes condicionantes culturais e de economia doméstica, também apresenta na sua tradição gastronómica pratos em que o ingrediente principal é o cabrito, não apenas para o período pascal, mas também para outras festividades de índole religiosa, como casamentos, baptizados ou primeiras comunhões.

Ingredientes1 cabrito pequeno; 250 g de chouriço de carne; 150 g de toucinho gordo; 3 dentes de alho; 3 cebolas; 3 malaguetas; 1 raminho de salsa; 2 colheres de sopa rasas de colorau; 3 dl de vinho branco; sal q.b.

PreparaçãoPica-se a cebola muito fina, assim como o chouriço, o toucinho, os dentes de alho, as malaguetas e a sal-sa. Mistura-se tudo com o vinho branco, o colorau e o sal. Barra-se o cabrito interior e exteriormente com esta papa e deixa-se ficar durante algumas horas, de preferência, de um dia para o outro. Em seguida leva-se a assar em forno moderadamente quente, de onde se retira de vez em quando para o expor a uma corrente de ar e o regar com o molho que se vai formando. Se necessário, junta-se mais vinho branco.

Acompanha com batatinhas, que se assam ao mes-mo tempo que o cabrito, e com grelos cozidos.

O Cabrito Assado à moda do Ribatejo é uma carne que exige um vinho elaborado e elegante, envelheci-do em tonéis de carvalho. A estrutura do vinho deve ser conferida pelo estágio em barrica e os seus tani-nos vigorosos são a companhia ideal para um prato de forno, contrabalançando o toque gordo do cabrito.

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CABRITO COMGRELOS À MODADA AZINHAGA

Apesar de ser uma região cuja tradição gastronómica se baseia fundamentalmente nas carnes de suíno e de bovino, o Ribatejo também tem no seu receituário pratos em que o ingrediente principal é o cabrito, testemunho da diversidade gastronómica de uma região de contrastes. Como noutras zonas de características rurais, a origem dos pratos actualmente típicos deriva do aproveitamento dos recursos existentes. E o gado caprino, pouco exigente em termos de alimentação, preenchia as necessidades de famílias de poucas posses. Um pequeno rebanho podia facilmente contribuir, com pouca despesa e pouco trabalho, para o sustento familiar, fornecendo carne para os dias festivos.

O cabrito deve ser abatido com pouco mais de um mês de vida e sempre alimentado com leite materno. Tem por isso, uma carne extremamente tenra e rosada. Na freguesia da Azinhaga, do concelho da Golegã, nas margens do rio Almonda, prepara-se uma receita excelente em que o cabrito é confeccionado em tacho de barro e acompanhado com grelos cozidos, regados com o molho em que foi cozinhado o animal.

Ingredientes0,5 kg de cabrito, 100 g de toucinho alto, 0,5 dl de azeite, cebolas, 3 dentes de alho, margarina, 4 toma-tes grandes, vinho branco, 1 molho de grelos, salsa, louro, piri-piri, vinagre de vinho e pão torrado.

PreparaçãoNuma caçarola com meio decilitro de azeite, dei-tam-se rodelas fartas de cebola, o toucinho picado, os dentes de alho bem pisados, um ramo de salsa e uma folha de louro. Refoga-se. Já da cor do trigo maduro, acrescenta-se um decilitro de vinho branco, meio pacote de margarina, dos pequenos, pimenta e sal q.b., piri-piri a gosto, os tomates pelados, sem sementes e partidos aos quartos. Apura um pouco e junta-se o cabrito partido aos pedaços. Ao mesmo tempo, cozem-se à parte, em água e sal, os grelos que, depois de cozidos e escorridos, levam uma concha de molho do cabrito, uma colher de sopa de margarina e um pouquinho de vinagre de vinho. Envolve-se tudo e dispõe-se à volta de uma travessa, que já tem no fundo rectângulos de pão alvo torrado. Coloca-se, por cima, a carne do cabrito, que vai ser regada com o molho a ferver, já passado por um pas-sador e temperado com umas gotas de limão23.

Acompanhe o Cabrito com Grelos à moda da Azinhaga com um vinho tinto da Região Tejo das castas Touriga Nacional, Aragonês ou Syrah, com uma concentrada acidez das uvas

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ARROZDE BUCHO

É costume dizer-se que, do porco, se aproveita tudo. E este prato confirma esse dito, porquanto o bucho corresponde ao estômago do animal. Existem receitas, sobretudo, noutras regiões do País, como as Beiras, em que o bucho é aproveitado para ser recheado. Mas para os apreciadores, esta peça pode ter outras formas de preparação culinária, como cozido, muito simplesmente. É o caso deste Arroz de Bucho cujo sabor, no entanto, pode ser reforçado pela presença de um osso do peito e da gordura de um naco de toucinho tirado de uma parte específica do animal. Esse sabor é, depois, transmitido ao arroz, cozido no caldo das carnes, ao qual se acrescentou hortaliça.

Ingredientes1 bucho de porco; 1 osso do peito; 1 rabo do porco com toucinho agarrado; 4 nabos com rama; 600 g de arroz; sal q.b.

PreparaçãoLavam-se as carnes muito bem e cozem-se em água e sal. Estando cozidas e bem tenras, escorrem-se e, na mesma água, cozem-se os nabos cortados aos pedaços e a rama tenra dos mesmos. Mede-se o caldo que deve ser três vezes o volume do arroz e, quando este ferver em cachão, deita-se o arroz lava-do e enxuto e deixa-se cozer. Serve-se bem quente numa travessa, com as carnes cortadas aos pedaços dispostas por cima.

Se necessário, o bucho deve ficar 24 horas em água com rodelas de limão, para perder o cheiro característico.

Um vinho jovem da Região Tejo é o pedido para acompanhar este Arroz de Bucho . Espera-se que seja herbáceo nos aromas, com um corpo médio e que tenha um bom preenchimento na boca, graças aos seus taninos jovens, que ajudam na digestão da gordura.

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A Batata é uma das principais culturas do nosso País, estendendo-se o seu cultivo de norte a sul, desde a produção em grande escala até à agricultura familiar de subsistência. A região do Ribatejo é uma das mais representativas em termos de área cultivada e de produtividade. É, pois, um dos produtos agrícolas que assume maior relevância na economia da região e também um alimento que faz parte integrante e fundamental da dieta das suas populações, podendo ser confeccionado das mais diversas maneiras. Diz a tradição que a primeira plantação de batatas no Ribatejo aconteceu no Couço, freguesia de Coruche, cujo produto foi devorado, mesmo cru, pelos soldados comandados pelo capitão Schwalbac, em 1846, aquando do rescaldo das guerras liberais, pois não sabiam da existência daquele tubérculo levantado pelas patas dos cavalos. O conhecimento desta data histórica permite-nos, assim, identificar o ano em que, pela primeira vez, se semeou batata nesta região. A esta actividade pioneira se deve o epíteto pelo qual ficaram conhecidos os naturais do Couço – “batateiros”. Quanto ao Porco, antigamente, para a população de substracto económico essencialmente agrícola, de norte a sul do País, este animal desempenhava um papel central na subsistência e na economia doméstica. Mas, hoje em dia, cada vez é mais rara a sua criação em pocilga. Por isso, a tradição da matança, com todos os seus rituais, tem tendência a desaparecer. Em compensação, a criação intensiva tem registado um aumento. No entanto, apesar desta mudança em termos de produção, há hábitos alimentares que persistem, mantendo viva a tradição gastonómica regional, como esta receita, que conjuga dois alimentos tradicionais do Ribatejo.

IngredientesLombo, costelas, toucinho entremeado da cauda, banha, 1 folha de louro, vinagre, 5 dentes de alho, batatas, sal q.b.

PreparaçãoNuma boa frigideira, deitam-se 3 colheres de banha e fritam-se as carnes. Cozem-se as batatas com pele, descascam-se depois de cozidas e esmagam-se com um garfo ou com esmagador próprio. Na frigideira em que se fritaram as carnes, alouram-se os dentes de alho com a folha de louro e, antes de estarem castanhos, juntam-se as batatas que se deixam «alourar» revolvendo-as sempre, juntando ao mesmo tempo uns pingos de vinagre, cuja presença se detecta mas não se sobrepõe aos outros sabores. Num movimento firme, conformam-se como um bolo oblongo e servem-se em travessa, rodeadas de carnes e acompanhadas de rodelas de laranja.

Algumas pessoas preferem deitar a gordura da frigi-deira nas batatas esmagadas, mexendo e homoge-neizando tudo muito bem e levando então depois ao lume para tostar24.

Sirva as Migas de Batata com Carne de Porco com vinho tinto da Região Tejo, de médio corpo a encorpado, acidez moderada e com taninos mais marcantes.

MIGAS DE BATATA COM CARNE DE PORCO

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FAVAS COMENTRECOSTO

O prato de Favas com Entrecosto está relacionado com o cultivo desta leguminosa e, sobretudo, com a criação e a matança do porco, que constituía um momento alto na região, pois era motivo de festa e de reunião de familiares e de amigos entre o Natal e o mês de Janeiro. As favas, por seu lado, deviam ser semeadas por alturas do dia 8 de Dezembro, obedecendo ao provérbio “Pela Senhora da Conceição, favas ao chão”, e colhidas em meados de Abril e Maio. Era nessa altura que o prato de Favas com carne de porco era mais consumido, pois tudo provinha do trabalho das famílias. A abundância de favas na horta, de carne da matança na salgadeira e de enchidos no fumeiro permitiam a confecção de uma refeição copiosa que se tornou numa das mais populares ofertas culinárias de Portugal e, particularmente, desta zona do País. Não havia horta que não semeasse favas para serem consumidas na Primavera, altura em que ainda há pouca diversidade de hortaliças. É, de facto, um prato substancial e nutritivo, que faz parte da tradição gastronómica de todo o País, ainda que a receita apresente pequenas variações de região para região. Actualmente, a oferta de favas congeladas permite a confecção deste prato em qualquer altura do ano.

Ingredientes3 kg de favas; 4 colheres de sopa de azeite; 3 dentes de alho; 1 cebola; 500 g de entrecosto cortado em pedaços pequenos; 100 g de toucinho; 1 linguiça/chouriça; 1 chouriço negro; 1 molho de coentros; 1 folha de rama de alho verde; 1 raminho de hortelã; 1 folha de louro e 1 folha de rama de cebola verde.

PreparaçãoNum tacho de barro, de preferência, põem-se o azei-te, a cebola, os dentes de alho picados, o toucinho às fatias fininhas, o entrecosto, os enchidos às rodelas e o louro. Por cima, dispõem-se as favas, o raminho de cheiros (metade dos coentros, hortelã, folhas verdes de cebola e alho) e sal a gosto. Tapa-se o tacho e le-va-se a cozer em lume brando, sacudindo fortemente o tacho de vez em quando, para que o cozinhado não agarre ao fundo do tacho. Quase no fim, picam-se os restantes coentros e espalham-se por cima, retiran-do-se o tacho do lume. Serve-se bem quente, acom-panhado de salada de alface cortada em juliana.

Estas Favas com Entrecosto devem ser servidas com um vinho tinto da Região Tejo de corpo médio, acidez mais elevada e um tanto tânicos.

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FEIJOADAÀ LAVRADOR

O feijão manteiga tem grãos de tamanho médio e de sabor aveludado e cremoso. É, por isso, uma das variedades mais apreciadas na gastronomia portuguesa, sobretudo para a confecção das feijoadas. Quando cozido, fica acastanhado.

Se o feijão é aqui o produto de referência, a Feijoada tem o seu grande trunfo nas carnes de porco, gordas e sápidas, e nos enchidos, de sabor acentuado.

Em tempos idos, era o prato que se servia após a matança do porco, no tempo mais frio. Hoje, as feijoadas comem-se em qualquer época do ano e praticamente em todo o País, já que o acesso às carnes está mais facilitado e o feijão continua a ser semeado para auto-consumo e para comercialização, nomeadamente nesta região.

Ingredientes500 g de carnes de porco - chispe, entrecosto e outras; 400 g de feijão manteiga; 2 cebolas médias; 2 dentes de alho; 1 chouriço de carne; 1 farinheira; 1 cenoura; meia couve lombarda; 2 dl de azeite; 1 folha de louro; sal, piri-piri e colorau, q.b.

PreparaçãoPõe-se o feijão de molho de um dia para o outro. Depois escorre-se e vai a cozer numa panela, coberto de água e temperado com sal e um fio de azeite. Entretanto, descascam-se e picam-se as cebolas e os alhos e levam-se a alourar com a margarina, um fio de azeite e a folha de louro. Junta-se o chouriço cortado às rodelas e as carnes de porco em bocados pequenos. Depois da carne alourar e cozinhar um pouco, junta-se o feijão, o respectivo caldo e a cenou-ra em rodelas. Após cozinhar e apurar, rectificam-se os temperos e juntam-se as folhas de couve ripadas miúdas e sem talos. Deixa-se cozer até a couve estar tenra. À parte, pica-se a farinheira com uma agulha e coze-se em água. Quando tudo está cozinhado, serve-se a feijoada bem quente, com a farinheira cortada em pedaços, por cima.

A Feijoada à Lavrador pode ser servida com um vi-nho tinto encorpado. Escolha um da Região Tejo que enfrente bem pratos mais pesados.

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LEBRE COM COUVE E FEIJÃO BRANCO

A Lebre pertence à família do coelho, mas distingue-se facilmente deste por ser maior, pela cor amarelo-acastanhado, pelas grandes orelhas, negras na extremidade, e pelo grande comprimento dos seus membros posteriores, o que lhe permite adquirir grandes velocidades. Nada bem e trepa sem dificuldades. Um excelente sentido do olfacto, uma óptima visão e uma boa audição permitem-lhe escapar aos seus predadores com alguma facilidade Mas sendo uma espécie cinegética muito apreciada, a caça e a intensificação da prática agrícola têm contribuído para o seu declínio, embora possa ter até três ninhadas por ano. Em Portugal, encontra-se em quase todo o território, preferindo os pousios e as terras cultivadas, sobretudo planas, húmidas e pouco cobertas.

Os agricultores dão-lhe caça, não só porque ela se alimenta nos campos amanhados, comendo os rebentos das hortícolas, mas também porque contribui para a economia doméstica, fornecendo carne que não deu despesa a alimentar, afora alguns prejuízos nas culturas. Combinada com dois produtos colhidos na horta, o feijão branco e a couve lombarda, dá origem a um prato delicioso, cheio de contrastes: o sabor intenso da lebre, o aveludado do feijão branco e a rusticidade da couve.

Ingredientes1 lebre; 1 couve lombarda; feijão branco; azeite; tou-cinho; salsa. Para a marinada: alhos picados; vinho tinto; salsa; louro; malagueta; colorau; sal e pimenta.

PreparaçãoComece por cortar a lebre em pedaços e tempe-re com salsa, louro, malagueta, vinho tinto, alhos picados, colorau, sal e pimenta. Deixe marinar durante, pelo menos, umas oito horas. Aqueça 0,5 dl do azeite com um pedacinho de toucinho e deixe a gordura derreter. Junte a lebre e os ingredientes sólidos da marinada e guarde o líquido da marinada. Quando a lebre ficar corada, regue-a com o líquido da marinada e deixe cozinhar cerca de 30 minutos, em lume brando. De seguida, adicione a couve lom-barda cortada aos bocados e deixe cozinhar por mais 25 minutos.Seguidamente, coloque o feijão branco a cozer na panela de pressão, durante cerca de 30 minutos, juntamente com uma cebola às rodelas e 0,4 dl azeite. Quando terminar, tempere com sal a gosto e junte o feijão à lebre. Por fim, adicione 4 dl do caldo da cozedura do feijão ao preparado da lebre com a couve bombarda e deixe cozinhar por mais 15 minutos. Para decorar, utilize um ramo de salsa25.

Sirva com um vinho tinto encorpado e concentrado da Região Tejo. Deve ser complexo, estruturado e vigoroso, com um lote que inclua a casta Trincadeira ou Syrah.

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ARROZ DE CASTANHAS

Antes da introdução da batata na dieta alimentar dos povos da Península Ibérica, a castanha constituía a base da alimentação das populações, sobretudo as rurais. Por isso, ainda hoje se encontram soutos disseminados por todo o território nacional. Todavia, pela sua fertilidade natural, o Ribatejo produz uma grande variedade de espécies comestíveis, nomeadamente em termos hortícolas, e, por essa razão, a área dedicada aos castanheiros é muito menor do que noutras zonas do País. Não é, pois, de estranhar que uma das receitas típicas do Ribatejo seja confeccionada com castanhas secas, oriundas de regiões grandes produtoras de castanhas, as castanhas piladas, cuja capacidade de conservação compensa a pouca abundância do fruto fresco.

O Arroz de Castanhas era um prato tradicionalmente consumido na Sexta-Feira Santa, dia em que os católicos se coibiam de comer carne, mas cujos componentes eram suficientemente nutritivos para alimentar uma família entregue aos trabalhos duros do campo. Já o arroz tem uma presença significativa na dieta dos ribatejanos, pois as margens dos rios que atravessam as suas terras, pela facilidade com que são alagadas, permitem a cultura dessa gramínea, que é, aliás, um dos alimentos mais populares em Portugal.

Ingredientes0,5 kg castanhas piladas; 300 g de arroz; 1 ou 2 den-tes de alho; 1 fio de azeite; água e sal.

PreparaçãoNa véspera, põem-se de molho as castanhas piladas. Depois de bem demolhadas, colocam-se numa pane-la com água, sal, um fio de azeite, um ou dois dentes de alho esmagados e deixam-se cozer. Cerca de dez minutos antes de terminar a cozedura, juntam-se 300 g de arroz, que se deixa cozer, mas sem ficar empapado. Come-se bem quente.

Para acompanhar este prato, escolha um vinho tinto da Região Tejo, ainda jovem e sem estágio em madeira. Um vinho sem complexidade para comple-mentar um prato simples.

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MORCELA DE ARROZGRELHADA

A Morcela é um enchido com grande implantação em todo o território português, uma vez que é um sub-produto confeccionado na altura da matança do porco, acontecimento que ocorria em todas as casas agrícolas, grandes ou pequenas, por todo o País, de norte a sul. O Ribatejo não é, pois, excepção.

O elemento comum a todas as morcelas é o sangue do porco acabado de matar, diluído com vinagre e vinho tinto para não coagular e temperado com sal e pimenta. Os outros ingredientes podem ser, com algumas variantes, gorduras de porco cortadas aos bocados, cebolas e salsa picadas, cominhos, cravinho e arroz mal cozido, preferencialmente da variedade carolino, um produto português proveniente dos estuários dos rios Sado, Tejo e Mondego. Esta massa fica a marinar durante cerca de oito horas. Enchem-se depois as tripas, que, previamente, foram muito bem lavadas com água e esfregadas com limão. Finalmente, são cozidas em água a ferver, temperada com sal, louro e cebola. Picam-se com um garfo e, quando já não sair sangue, estão prontas. Podem ser consumidas apenas cozidas, fritas, grelhadas ou em confecções mais elaboradas, como mais recentemente são apresentadas como entrada em restaurantes.

IngredientesMorcela de arroz

PreparaçãoDepois de cozidas, as morcelas de arroz são postas sobre o lume, preferencialmente de carvão, e grelha-das até ficarem com a pele bem brilhante e estala-diça. Comem-se, em geral, com boas fatias de pão, com migas, com requentado ou mesmo com grelos de nabo.

Escolha, para acompanhar a Morcela de Arroz Grelhada, um vinho tinto da Região Tejo, com pouca acidez, para fazer uma boa ligação com o enchido.

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TúbeRas MeXIDas COM OvOs

As Túberas ou Túbaras são fungos que se desenvolvem em simbiose com as raízes dos carvalhos ou dos sobreiros, debaixo de terra, e que aparecem em Portugal depois das chuvas do Inverno, a partir dos finais de Fevereiro até ao princípio de Maio, principalmente no Ribatejo e no Alentejo. Conforme a zona, também são chamadas tubras, criadilhas ou batatilhas. Pertencem à família das trufas negras do Périgord ou das trufas brancas de Itália e, embora o seu sabor seja suave e delicado, o aroma é menos intenso, pelo que o seu valor comercial é muito inferior ao das suas parentes estrangeiras. Convém, por isso, combiná-las com ingredientes de sabor e aroma discretos para não serem anuladas. Para a colheita das Túberas, percorrem-se os campos, reconhecendo os montículos de terra que surgem na base das árvores, como os das toupeiras. Desenterram-se com auxílio de um sacho ou de um pau, mas, antigamente, recorria-se a um porco, que esgravatava a terra quando reconhecia a presença das Túberas pelo cheiro.

A maioria dos portugueses desconhece esta iguaria, pois o segredo da sua apanha é ciosamente guardado, sendo passado de pai para filho e raramente partilhado fora do círculo familiar.

IngredientesTúberas; azeite ou banha; ovos; salsa; manteiga; sumo de limão; sal.

PreparaçãoArranjam-se as túberas e, com o auxílio de uma escovinha, limpam-se de toda a terra agarrada. Cortam-se depois em pequenas rodelas. Salgam-se e fritam-se em bom azeite ou banha. Batem-se os ovos juntamente com a salsa picada, adicionam-se-lhe as túberas fritas e vai tudo a fritar numa frigideira com manteiga, mexendo sempre e juntando um pouco de sumo de limão. Devem ficar untuosas26.

Tratando-se de um prato à base de ovos, o acompa-nhamento deve ser feito com vinho branco da Região Tejo, de preferência de uva Chardonnay, que é mais encorpada e aromática, e que tenha passado algum tempo em barris de carvalho. Esta uva dá origem a um vinho apelativo de aromas e sabores, que reflecte as características da região onde cresce.

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PATUDOS

A Casa dos Patudos, em Alpiarça, foi residência de José Relvas desde os finais do século XIX até 1929, data da sua morte. Político, diplomata, estadista, lavrador, colecionador de arte e músico amador, José Relvas foi um dos homens que proclamaram a República a 5 de Outubro de 1910.

Em 1904, encomendou ao arquitecto Raul Lino o projecto da sua casa, assente numa linha revivalista e nacionalista, fiel às constantes históricas da nossa tradição construtiva. Nela, José Relvas instalou a sua extensa colecção de arte, que inclui mobiliário, porcelanas, pinturas e tapeçarias. Por testamento lavrado em 1928, José Relvas legou a Quinta dos Patudos, a casa, a colecção de arte, a biblioteca e o arquivo ao Município de Alpiarça, impondo que a residência fosse conservada como núcleo museológico e que mantivesse a designação de Casa dos Patudos. A Casa foi inaugurada como Museu, em 15 de Maio de 1960.

Em homenagem a este homem excepcional e à importância da Casa dos Patudos para o concelho e para o Ribatejo, Ana Tendeiro criou estes bolos, que já se tornaram uma referência para quem visita Alpiarça e aos quais deu o nome da mais prestigiada instituição cultural da vila e da região.

Ingredientes0,5 kg de açúcar; 180 g de amêndoa; 60 g de doce de chila; 20 gemas; 4 ovos inteiros; manteiga para untar; açúcar para polvilhar.

PreparaçãoLeva-se o açúcar ao lume até atingir ponto pérola. Junta-se-lhe a amêndoa e a chila. Acrescentam-se os ovos batidos com as gemas, misturando bem, e retira-se do lume. Unta-se com manteiga um tabulei-ro para onde se deita o preparado. Leva-se ao forno durante 50 minutos, em temperatura média. Depois de cozido, desenforma-se e corta-se em quadradi-nhos que se polvilham com açúcar27.

Estes quadradinhos doces ajudam a finalizar uma refeição da melhor maneira. Pode prová-los com um café, um chá ou com um vinho licoroso da Região Tejo, muito frutados e aromáticos.

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PUDIM DE PÃO

Este pudim é mais um dos muitos exemplos da genialida- de dos nossos avós para superarem as dificuldades económicas, confeccionando um doce com aproveitamento de sobras de pão. Existem registos de receitas, noutras regiões, onde, para maior economia, se acrescentava mais pão, diminuindo-se os restantes ingredientes, nomeadamente o leite, a que se adicionava um pouco de água.

Actualmente, há quem triture o pão com a varinha mágica ou com outros equipamentos com o mesmo efeito, mas os apreciadores deste doce afirmam que nada se compara ao pão desfeito, grosseiramente, com as mãos.

Pelo sabor que reaviva memórias de quem já o provou ou de quem dele ouviu relatos familiares, pode afirmar-se que o Pudim de Pão é, de facto, um doce de tradição.

Ingredientes150 g de açúcar para o caramelo; 100 g de açúcar; 150 g de miolo de pão ; 0,5 l de leite a ferver ; 1 casca de limão ; 2 colheres de sopa de mel; 4 ovos.

PreparaçãoCom o açúcar indicado, prepare o caramelo e forre com ele o fundo e os lados de uma forma de pudim e deixe-o solidificar. Parta o pão em pedacinhos para dentro de uma tigela. Regue o pão com o leite a ferver com a casca de limão e mexa bem. Adicione depois o açúcar, o mel, os ovos e misture bem. Deite o preparado na forma e leve a cozer em banho-maria, cerca de uma hora, em forno médio (150º C)28.

Este pudim pode ser acompanhado por um dos vi-nhos generosos da região Tejo. Os seus aromas ricos e complexos ligam na perfeição com a doçura desta sobremesa.

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BROAS DE AMÊNDOA E DE BATATA-DOCEDE BENAVENTE

A batata-doce é uma planta cuja produção é tradicional em terras ribatejanas. É de fácil cultivo, embora exija regas e sachas. Mas ninguém se nega a tê-la na sua horta. A sua plantação ocorre nos finais da Primavera e em Setembro pode estar colhida. Por isso, nesse mês realizam-se em diversas localidades do Ribatejo festividades em que a batata-doce é a principal protagonista. Cozida, assada, frita ou como ingrediente de receitas mais elaboradas, é bem um petisco próprio do Outono!

Por alturas dos Santos ou no Natal, em Benavente, mas também noutras zonas do Ribatejo, conjugada com as amêndoas, também colhidas na região, é usada na confecção de broas que fazem as delícias de crianças e adultos.

Ingredientes700 g de puré de batata-doce; 200 g de amêndoa ralada; 500 g de açúcar; 5 gemas de ovo; 125 g de farinha de milho; 70 g de farinha de trigo; 2 dl de água.

PreparaçãoLeva-se ao lume o açúcar e a água até fazer ponto de pérola. De seguida, sempre sobre o lume, junta-se a amêndoa, a canela e as farinhas, envolvendo tudo muito bem. Depois de estar tudo misturado e já co-zido, mesmo antes de se retirar do lume, juntam-se as gemas e mexe-se tudo novamente para que fique bem misturado. Retira-se do lume e deixa-se arrefe-cer completamente, até endurecer a massa. Tendem-se broinhas que se vão colocando num tabuleiro. Quando este está completo, pintam-se as broinhas com gema de ovo e vão ao forno a cozer (180º C).

Estes pequenos bolos combinam muito bem com um cálice de vinho licoroso ou de uma colheita tardia da Região Tejo. O aroma frutado que predomina gera um equilíbrio com a doçura das Broas de Amêndoa e de Batata-Doce de Benavente.

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A carne de touro bravo tem um enorme potencial na gastronomia portuguesa pois, desde sempre, os ani-mais bravos, tal como a caça, são preferidos para a alimentação pelos bons gastrónomos. Ora os bovinos de raça brava, oriundos sobretudo do Ribatejo, são criados em grandes espaços livres, em regime exten-sivo, alimentando-se em total liberdade de produtos naturais. Como consequência, apresentam um sabor mais intenso, mas não artificial, de consistência tenra e suculenta, embora com uma aparência mais escura do que a dos animais criados em regime intensivo.

Por desconhecimento, muitas vezes a cor mais escu-ra leva a que erradamente esta carne seja preterida por outras mais rosadas, embora com processos de criação eventualmente duvidosos. A sua associação às touradas é incorreta, pois a carne normalmente comercializada não é proveniente de animais de lide.

O crescente número de gastrónomos que tem vindo a marcar presença nas várias edições dos “Sabores do Toiro Bravo”, certame que se realiza em Coruche anualmente em Maio, prova que este produto está a ganhar cada vez mais apreciadores.

A Confraria Gastronómica do Toiro Bravo, criada em Coruche em 2006, define desta forma a carne de toiro bravo: “… apresenta características quase únicas, que a podem transformar num nicho de luxo entre as carnes bovinas para um mercado exigente. Animais criados em regime extensivo, vivendo da natureza, com um maneio que não comporta na sua

alimentação factores de crescimento, apresenta um grão muscular fino e delicado, e, quando a carne devidamente maturada é sujeita a manipulações culinárias, exibe aroma e sabor de excelência.”

Ligeiramente mais rija que outros tipos de carne, a de toiro bravo é ideal para estufar ou cozer e, quando grelhada, deve ser servida mal passada, ou ao ponto.

Em Novembro de 2013, com a designação de “Carne de Bravo do Ribatejo”, conquistou a Denominação de Origem Protegida (DOP).

Produto Regional CaRNe De TOIRObRavO

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PENÍNSULADE SETÚBAL

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Serra, montado, vinha, salinas, praia, mar, rios, estuários: a riqueza desta região reside na diversidade da paisagem e dos recursos naturais. A linha determinada por Alcochete, Moita e Montijo risca-se paralelamente ao Tejo e todo o ritmo e modo de vida desta região são determinados por esta corrente de água. Palmela, Setúbal e Sesimbra formam, nesta zona, um grupo com características diversas. Destacam-se pelo vinho, pela relação com o mar e pela a interacção com o Sado e com o Tejo. Mas, apesar das suas particularidades, estes seis concelhos formam uma unidade muito própria com tradições e uma história comum. Antiga terra dos cavaleiros da Ordem de Santiago da Espada, este é um território que pode ser avistado do alto, do cimo de uma das torres de menagem dos vários castelos que os monges Espadatários legaram à posteridade. Rica em património natural e cultural, esta é uma região que merece ser visitada com tempo.

alCOCheTe

São quilómetros de água que correm à nossa frente: o Mar da Palha impõe os seus horizontes enquanto espelha a vila que se aninhou nas suas margens. Alcochete escolheu bem a sua localização. A situa-ção privilegiada parece ter atraído desde cedo as populações. Encontraram-se sinais de actividade hu-mana com cerca de dez mil anos e sabe-se, que mais tarde, os romanos andaram por aqui, assim como os árabes que, para além de deixarem vestígios arqueo-lógicos, imprimiram a sua presença no topónimo. Com a reconquista, este território foi doado à Ordem de Santiago de Espada. Nesta terra de Comenda, o povo provou ser gente de trabalho árduo: no solo, o arado, no rio, o leme, e onde a terra e a água se encontram, o engenho das salinas.

Hoje o concelho modernizou-se, mas empenha-se na preservação das tradições ligadas ao mundo rural, ao montado e ao toiro bravo, assim como ao Mar da Palha e ao rio Tejo; costumes que se reflectem na oferta gastronómica, tanto no recurso a produtos hortícolas locais como na variedade e qualidade dos produtos do rio.

MOITa

A vila da Moita deve a sua origem ao grupo de pes-soas que, no princípio do século XIV, escolheu esta zona, situada num dos esteiros da margem Sul do rio Tejo, para se instalar. Gente simples, dedicou-se a tirar da natureza meios de sustento e, à base do seu suor, foi desenvolvendo a região. Situada muito perto da capital, este lugar foi atraindo pessoas e, no ano de 1691, foi elevada a vila por D. Pedro II. O concelho tinha como principais actividades a pesca, a extracção de sal e a agricultura. Em meados do século passado, as suas salinas faziam parte, com as marinhas de Alcochete, do Barreiro e do Montijo, do centro de sal mais importante de Portugal.

Povo de afición e de fé, mantém as suas tradições com devoção. Leva muito a sério a temporada brava e vive com veneração as Festas de Nossa Senhora da Boa Viagem que juntam na terra milhares de visi-tantes para verem passar os barcos engalanados que formam a procissão no Tejo. O convívio natural com o rio está presente em tudo, incluindo na gastrono-mia, em que grande parte dos pratos típicos tem o sabor da pesca.

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sesIMbRa

Mar e montanha enfrentam-se; num medir frontal de forças, moldam este pedaço de terra ímpar. A vila de Sesimbra organiza-se longitudinalmente: para um lado, o Atlântico, para o outro, a avenida, ponto de chegada do xadrez das ruas. Casas de pescadores, armazéns das armações, velhos barracões de salga e fábricas de conservas convivem de perto com urbanizações recentes e com unidades hoteleiras construídas para albergar a leva de turistas e de veraneantes que, em meados dos anos sessenta do século passado, começaram a invadir a povoação.

Sesimbra, desde sempre, foi terra de pescadores e mesmo as freguesias rurais do município dependiam dos humores das marés para sobreviver. Virado para o oceano, o concelho sempre dele se alimentou e por ele se sustentou. As artes da pesca fizeram prosperar a indústria de conservação de pescado, que já existia nesta zona há cerca de dois mil anos e que, no século XVI, teve um papel de destaque no abastecimento das caravelas que partiam à descoberta do Mundo. Nos princípios do século XX, a sardinha começou a escassear no Mediterrânio e na costa atlântica fran-cesa, o que fez com que Portugal se tornasse o prin-cipal centro piscatório dessa espécie. Nessa altura, instalaram-se em Sesimbra numerosas fábricas de conservas. O rebentar da II Guerra Mundial favore-ceu a procura de conservas para alimentar as tropas. Após este período áureo, o negócio começou a entrar em decadência, até desaparecer. De qualquer forma, falar em gastronomia de Sesimbra é falar em peixe, principalmente no espadarte e no peixe-espada preto, mas sem esquecer as tradições – muitas ainda vivas – das zonas rurais.

seTúbal

(…) Solo providencialmente prendado de tudo, e donde, ainda há dois dias, um insigne poeta dina-marquês, o nosso amigo Andersen, estacionado aí depois de percorrida a Europa, me escrevia que tinha encontrado o Paraíso Terreal. É com estas palavras que, nos alvores do século XIX, António Feliciano de Castilho descreveu Setúbal apoiado nas impressões do autor da “Pequena Sereia” e do “Patinho Feio”. A beleza desta região foi sempre muito admirada. Raul Proença , um século mais tarde, destacou a graça e a opulência dos seus campos, a largura e beleza do seu rio, os panoramas que abre vastos, a sua luz admi-rável que nos transporta, o encanto das suas praias abrigadas pela serrania, a proximidade da Arrábida (…), tudo isso faz de Setúbal um ponto de paragem obrigatório. Estas são palavras datadas mas, hoje, apesar da industrialização, o concelho mantém um encanto muito próprio e a baía de Setúbal faz parte, desde 2002, do restrito “Clube das Mais Belas Baías do Mundo”, um grupo constituído por cerca de três dezenas de enseadas em diferentes países do globo.

As praias, o clima, a beleza das paisagens alimentam o turismo, mas este concelho é muito mais do que um destino balnear. Setúbal foi, desde de sempre, uma comunidade piscatória. Em tempos chegou a ser um dos principais portos de pesca em Portugal e também o mais importante centro de produção de conservas de peixe. A forte industrialização deixou consequências mas, hoje, as águas do “Rio Azul”, já despoluídas, permitiram o regresso dos golfinhos, a desova de espécies que fazem as delícias dos gastró-nomos e, também, as famosas ostras do Sado.

MONTIjO

À distância de um olhar estende-se a toalha azul do Tejo recortada, ao longe, pela mancha urbana da capital. Este é o horizonte da cidade do Montijo, estrategicamente plantada com os pés na água. Mas se a sede do concelho convive de perto com o rio, parte das suas freguesias nem o vislumbram. O município é territorialmente descontínuo, estando geograficamente dividido em duas partes: a ociden-tal, onde se encontra a sede do concelho, com uma área mais pequena e ribeirinha; e a oriental, interior, com uma vocação essencialmente agrícola. Estas regiões intervaladas apresentam uma variedade de paisagens e de hábitos que, todas juntas, conferem riqueza e diversidade ao concelho.

Em tempos, parte destas terras estava coberta de talhos de salinas, estirados pelas vastas planícies. O sal saía daqui em faluas carregadas de grandes quantidades para abastecer as cozinhas de Lisboa. Com o advento dos frigoríficos, a procura deste produto passou a ser cada vez mais para a confec-ção dos alimentos e menos para a sua preservação. Houve uma progressiva quebra de procura e, em meados do século passado, a decadência do negócio ditou o seu abandono. Felizmente, o solo abençoado deste concelho oferece muito mais do que chão sal-gado. Esta região já foi considerada um dos maiores centros corticeiros do País, a floricultura representa, só na flor de corte, 75% da produção nacional e a suinicultura, principalmente na transformação de carnes, continua a ter um importante papel na eco-nomia local.

Todas estas condições, a criação de suínos, a proximidade do rio e as tradições agrícolas, deixam naturalmente marcas muito visíveis nos hábitos alimentares dos habitantes do concelho.

PalMela

Da torre de menagem do Castelo de Palmela parece que se alcança Portugal todo. A paisagem altera-se a um voltar de cabeça, aos nossos olhos chega o céu, o mar, o Tejo, o Sado, as vilas, os campos, num horizonte que se vai fazendo ilimitado. O escritor Carlos Malheiro Dias não hesita em afirmar que este é o castelo mais grandioso do País e que o seu panorama é superior pela variedade dos aspectos, aos que se disfrutam na Pena, em Sintra, e das portas de Coimbra, no Buçaco. Enquanto o visitante se perde na amplitude da paisagem que se vai estendendo à sua frente, apercebe-se de, para lá da vila que se fixou na sombra das muralhas, vastas áreas de vinha riscam a verde os campos.

Este é um concelho que mantém a tradição rural e vitivinícola. Pensa-se que já no distante segundo mi-lénio a.C. os tartéssios andavam na região a negociar vinho. Seguiram-se os fenícios, os gregos, os roma-nos, povos que se foram sucedendo e que viriam a consolidar, a aperfeiçoar e a modernizar a técnica de cultivo da vinha. Daí até aos nossos dias, muito foi mudando e progredindo. Nos finais do século XIX, o vinho de Palmela era reconhecido em Portugal e na Europa, recebendo já nessa altura inúmeras distin-ções e hoje, em pleno século XXI, a aposta na ex-celência é ainda mais firme. Nos últimos anos, uma evolução na qualidade dos vinhos tranquilos - tinto, branco e rosé - e generosos - Moscatel de Setúbal e Moscatel Roxo - traduziu-se em inúmeros prémios, a nível nacional e internacional. A Associação de Municípios Portugueses do Vinho nomeou Palmela como a “Cidade do Vinho 2009” e a Rede Europeia de Cidades do Vinho atribuiu-lhe o título de “Cidade Europeia do Vinho 2012”.

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GASTRONOMIA REGIONAL

AlcocheteCaldeirada à fragateiro, linguadinhos fritos, amêijoas alcochetanas, massa de choco, canivetes, berbigão e camarão do rio, sopa alcochetana, sopa adubada de feijão, sopa de ossos carregados, sopa de peixe, tortilha alcochetana, lebre à ti Zé da Avó e raposo. As batatas ensalsadas, herança dos salineiros, são servidas nalguns restaurantes, embora enriquecidas. Na doçaria, destacam-se as fogaças, que resultam de uma promessa dos marítimos a Nossa Senhora da Atalaia, e o arroz-doce alcochetano, confecciona-do sem ovos e servido às fatias.

MoitaCaldeirada à fragateiro, massinha da caldeirada, ensopado de enguias, massa de peixe, arroz de peixe, e lamejinhas com cebola. Dos campos, vem a farra-fuza, à base de tomate, e a sopa de saramagos, uma erva espontânea. Nos doces, o arroz-doce caramelo e as ferraduras, o doce tradicional da Moita.

MontijoSopas de ossos, de abóbora ou de tomate, ervilhas com língua de porco fumada e ovos escalfados, bifes de porco à moda do Montijo, perna de porco assada no forno e carne de porco com enguias, enguias fri-tas com favas de coentrada, com arroz de pimentos ou com açorda, ensopado de enguias, caldeirada à pescador, massinha de safio e arroz de amêijoas. Nos doces, o destaque vai para o bolo de vinagre, o bolo de milho, as queijadinhas de leite, os Franciscos da Atalaia, as broas de Canha e os aldeanos.

PalmelaQueijo de Azeitão e manteiga de ovelha, sopa cara-mela, sopa de favas, sarrafusca, favas à palmeloa, lulas recheadas à moda de Palmela, galinha acereja-da, coelho à camponesa de Palmela, pombo estufa-do, cozido de capado. Nas sobremesas, pêra cozida em moscatel, fogaças de Palmela, suspiros, carolinos, pudim de abóbora e arroz-doce com leite de ovelha. Destaque para a maçã riscadinha (DOP), o vinho de Palmela (DOP), o moscatel de Setúbal e o moscatel roxo.

SesimbraPeixes grelhados, espadarte, peixe-espada preto em filetes ou com ervilhas, caldeirada de Sesimbra ou caldeirada de sardinhas, choquinhos à-pé-descalço, cademontes e sopa de peixe ou só de carapaus. Na doçaria, destaque para a farinha torrada, os zimbros, as catarinas, os almirantes e um licor, o Velho do Mar, que se tornou conhecido na década de 50 do século passado, e também queijo da Azóia, pão caseiro de Alfarim e da Azóia, mel e maçã camoesa ou férrea da Azóia.

SetúbalCaldeirada, cavalas no molho, peixe à pescador, choco frito, polvo no forno, peixe assado, como salmonetes à setubalense, carapau manteiga, mas-sacotes e alcorrazes, duas espécies piscícolas que aqui ganham estas designações, e a sardinha, eleita uma das 7 maravilhas da gastronomia. As ostras, que voltaram aos bons restaurantes da cidade, de Portugal e de França. Na doçaria, destacam-se tortas de Azeitão, esses de Azeitão, amores de Azeitão e pudim Osório e os D. Filipes. Refira-se, ainda, o quei-jo de Azeitão (DOP) e o Moscatel de Setúbal (DOC).

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AGENDA GASTRONÓMICA

FevereiroFestival do Choco, em Setúbal

MarçoFestival da Caldeirada, em Setúbal

AbrilFestival do Queijo Pão e Vinho, na Quinta do Anjo, Palmela

MaioMostra de Vinhos de Marateca e Poceirão, em Fernando Pó, PalmelaFestival Ibérico do Vinho, em SetúbalFim-de-Semana Gastronómico da Cavala, em Setúbal

JunhoQuinzena do Peixe-Espada Preto, em SesimbraFestas Populares de São Pedro, no MontijoFestival da Sardinha, em Setúbal

AgostoFestival do Marisco, em Setúbal Festas do Barrete Verde e das Salinas, em Alcochete Festival do Carapau, em Setúbal

SetembroFestas das Vindimas, em Palmela Quinzena Gastronómica do Espadarte, em SesimbraFestival da Ostra, em Setúbal Festas de Nossa Senhora da Boa Viagem e Feira Comercial e Industrial, na MoitaFeira Nacional do Porco e da Salsicharia, no Montijo

Novembro Semana Gastronómica Sabores de Outono, em SesimbraFestival do Salmonete, em Setúbal

Dezembro Fim-de-semana gastronómico do Alcorraz, em Setúbal

2ª feira de Páscoa, Círio dos Marítimos, com leilão de Fogaças, em Alcochete.

Vinhos da RegiãoOs vinhos produzidos nesta região integram a Comissão Vitivinícola Regional da Península de Setúbal.

ConfrariasConfraria Gastronómica de PalmelaConfraria do Queijo de AzeitãoConfraria do Peixe de SetúbalConfraria do Moscatel de SetúbalConfraria do PeriquitaConfraria dos Amigos da Bacalhôa Vinhos de PortugalConfraria dos Amigos de J. P. VinhosOrdem dos Enófilos de Santiago

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SOPACARAMELA

A origem desta sopa é atribuída às populações rurais que vinham da Beira Litoral em busca de trabalho, sobretudo para a zona de Rio Frio, a quem se dava o nome de “caramelos”. A partir da segunda metade do século XIX, por necessidades de mão-de-obra permanente, os “caramelos de ir e vir” passaram a “caramelos de ficar”, tendo-se tornado rendeiros com casa e horta e fixado, sobretudo, na zona do Pinhal Novo, onde introduziram novos hábitos alimentares trazidos dos seus locais de origem. Vivendo com dificuldades económicas, a alimentação destas populações, embora consistente, baseava-se, sobretudo, em sopa feita com os produtos colhidos na horta – feijão, batata e couve - e, quem os tinha, com enchidos e carne da matança. Assim nasceu a Sopa Caramela. Inicialmente, era semelhante às sopas nortenhas de unto, mas, com o tempo e com um maior desafogo económico, esta sopa foi sendo enriquecida com mais igredientes, tendo-se tornado num prato substancial, símbolo de uma comunidade que preserva as suas tradições e uma das principais referências gastronómicas da região. Por esse motivo, no mês de Junho, a Câmara de Palmela organiza, no âmbito do Programa “Palmela – Experiências com Sabor!” os Fins-de-Semana Gastronómicos da Sopa Caramela, para promover o desenvolvimento turístico e divulgar a qualidade dos produtos do concelho.

Ingredientes500 g de feijão catarino seco; 500 g de batata vermelha para cozer; 2 cabeças de nabo, com cerca de 600 g; 2 cebolas médias; 3 cenouras; 1 repolho; 1 couve-nabo e/ou portuguesa; 1 dente de alho; 1 chouriço de carne; 1 chouriço mouro; 300 g de toucinho entremeado, gordo; 500 g de ossos do espinhaço salgados; 500 g de massa cotovelinhos; 1 folha de louro; sal e azeite q.b.; coentros.

PreparaçãoDe véspera, de 12 a 16 horas antes da confecção, sal-gam-se o toucinho e os ossos do espinhaço e demo-lha-se o feijão em água fria. Coze-se o feijão com as carnes e os enchidos previamente cortados, durante cerca de 1h30, em lume brando. Cortam-se grossei-ramente os nabos e as couves. Pica-se a cebola e o alho, lamina-se a cenoura em “meia-lua”, corta-se a batata em cubos pequenos e junta-se tudo ao feijão com a massa, a folha de louro e o azeite. Deixa-se apurar durante mais 30 minutos. Mexe-se vigorosa-mente no final para libertar o amido da batata e da massa, de forma a homogeneizar o caldo cremoso que envolve os ingredientes. Guarnece-se com os coentros, caso se deseje29.

Esta não é uma sopa ligeira. A variedade e a qualida-de dos ingredientes envolvidos pedem um vinho tinto de corpo médio, um DO Palmela, onde o Castelão tem uma presença obrigatória. Deve ser um vinho jovem, que combine a frescura da fruta madura com notas de madeira pouco acentuadas.

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A gastronomia do Montijo reflecte a influência da sua situação geográfica. A norte, o concelho é banhado pelo Tejo, no interior, há extensas áreas rurais de solos férteis, onde se cultivam produtos hortícolas, como batatas, cebolas, favas ou ervilhas, que tão bem combinam com as espécies pescadas no rio, dando origem a típicos pratos de peixe. Por aqui, é a enguia a rainha, cozinhada das mais diversas maneiras, conforme o seu tamanho. Para estas Enguias Fritas, a escolha recai sobre as mais fininhas; as médias ficam melhor nas caldeiradas e nos ensopados, enquanto as grandes, também chamadas eirós, alcançam o seu melhor momento culinário quando são grelhadas.

IngredientesEnguias; sal; favas; coentros; alho; azeite e vinagre.

PreparaçãoTemperam-se as enguias fininhas com sal gros-so. Selecciona-se um azeite de qualidade média, que deve ser aquecido entre os 175º e 190º C. Mergulham-se as enguias apenas o tempo para ficarem douradas. A esta temperatura, forma-se uma crosta na superfície do alimento que impede a pe-netração do azeite no seu interior, resultando na sua melhor conservação e melhoria de sabor. Retiram-se as enguias e colocam-se sobre papel pardo para que o azeite em excesso seja absorvido. Entretanto, co-zem-se as favas em água e sal. Prepara-se uma boa coentrada com coentros frescos, alho picado, azeite de boa qualidade e vinagre, também ele a condizer. Deita-se esta mistura sobre as favas e envolve-se bem. Esta é uma excelente alternativa ao arroz de tomate para acompanhar as enguias ou outro peixe frito30.

Diz a regra que peixe acompanha com um branco, mas este é frito e guarnecido com um legume rico. Por isso, aconselha-se um vinho tinto jovem. Neste caso, recomenda-se a descoberta da casta Syrah, que em terras da Península de Setúbal encontra um terroir de excelência para o seu cultivo. Um monova-rietal Syrah, ou um bivarietal Syrah/Castelão, em que a fruta se revele intensa, com notas de compota e taninos aveludados, serão combinações perfeitas.

ENGUIAS FRITAS COM FAVAS DE COENTRADA

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ARROZDE LAMEJINHAS

Muitas das características da cozinha do Montijo derivam da sua proximidade em relação ao rio Tejo. Implantado junto de um dos braços que prolongam o Mar da Palha, os seus habitantes desde sempre foram buscar às águas parte do seu sustento. Na maré vazante, emergindo do lodo, as lamejinhas, também conhecidas como lambujinhas, são dos bivalves mais abundantes no estuário do Tejo e, por isso mesmo, os menos valorizados comercialmente. Com preços acessíveis, sempre integraram os momentos de convívio mais populares, sobretudo entre os que os apanhavam. Hoje em dia, continuam a ocupar o mesmo lugar nos hábitos gastronómicos das populações da beira-rio, consumidas como petisco ou usadas na preparação de arroz, podendo servir de refeição completa ou de acompanhamento de enguias fritas, prato típico do Montijo.

Ingredientes0,5 kg de lamejinhas ; 350 g de arroz; 0,5 dl de azei-te; 1 dente de alho; 1 cebola; sal e coentros.

PreparaçãoColocam-se as lamejinhas de molho em água salga-da durante 48 horas para largarem a areia. Lavam-se, depois, em várias águas. Faz-se um refogado com a cebola cortadinha, o alho e os coentros em azeite, deitando-se a seguir as lamejinhas bem lavadas. Há quem tire as cascas antes de deitar o arroz e quem as deixe com cascas. Acrescenta-se água, geral-mente o dobro do arroz, e deixa-se cozer. Devem ser rejeitadas as que não abrem durante a cozedura31.

Para melhor escoltar a untuosidade deste prato, um vinho com base na casta Fernão Pires é o parceiro ideal. Na Península de Setúbal é possível encontrar-se esta casta em muitos vinhos brancos IG Península de Setúbal, na maioria das vezes vinhos de lote, onde também se encontram as castas Moscatel de Setúbal e Arinto. O equilíbrio típico desta casta e os seus aromas frutados enobrecem a combinação com este prato. Um vinho fresco, vívido e guloso.

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LAMEJINHASCOM CEBOLA

No concelho da Moita, o Tejo domina a paisagem, confundindo-se com a terra, porque os braços do rio estendendo-se pelo interior, criam uma uniformidade que, até há poucos anos, incluia as actividades económicas tradicionais, hoje quase desaparecidas. A proximidade com o rio, que ainda oferece várias espécies piscícolas, fez com que se desenvolvesse uma gastronomia regional com características próprias, como as Lamejinhas com Cebola, confeccionadas com estes bivalves, tão abundantes no estuário do Tejo e que podem ser apanhados no lodo durante a vazante da maré. Antigamente, era tradição de muitas famílias das zonas rurais, por altura da Páscoa, deslocarem-se à Moita, “à lamujinha” ou, “lambujinha”, como então se dizia. Hoje, o Toino é um dos poucos pescadores existentes no Rosário, povoação do concelho em frente ao Mar da Palha, que apanha lamejinhas, mas fá-lo só para consumo familiar. Entre as várias maneiras de cozinhar este petisco, o Toino recomenda as Lamejinhas com Cebola.

Ingredientes1 kg de lamejinhas; 2 cebolas; 2 dentes de alho; 1 molho de coentros; azeite, margarina e sal q.b.; 1 limão.

PreparaçãoColocam-se as lamejinhas de molho em água salga-da durante 48 horas para largarem a areia. Lavam-se, depois, em várias águas. Num tacho, dispõem-se as cebolas cortadas às rodelas finas, juntam-se o azeite, os dentes de alho pisados e os coentros picados. Por cima, põem-se as lamejinhas. Tapa-se o tacho e leva-se ao lume até abrirem todas. Devem rejeitar-se as que não abrem durante a cozedura. Servem-se quentes, regadas com sumo de limão32.

Por norma, para acompanhar um prato de marisco, a tendência é optar por um vinho branco. No entanto, para fugir um pouco à regra, propõe-se um vinho ro-sado, hoje entendido como um vinho da “moda” entre os mais jovens. A Península de Setúbal responde às tendências de consumo e é possível encontrar um vinho deste tipo em qualquer supermercado ou gar-rafeira. A escolha deverá ser um rosado com aroma e palato floral, de final fresco e mineral.

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ESPETADAS DE OSTRAS

Nas décadas de 50 e 60 do século XX, abundavam as ostras no estuário do Sado, por isso, na época da apanha, havia mais de 5000 pessoas empregadas nesta tarefa, recolhendo toneladas que, na sua maioria, se destinavam à exportação, sobretudo para França e Inglaterra. Depois, a industrialização, a poluição, a incúria, foram, pouco a pouco, destruindo o habitat destes bivalves, que acabaram por desaparecer. Até que, em 2002, dois empresários de Setúbal resolveram aproveitar umas antigas salinas e relançaram a ostricultura no Sado, cujas águas apresentam características únicas para a criação e a engorda das ostras. Actualmente, já é possível voltar a apreciar estes bivalves com a mesma qualidade das de antigamente, graças à adaptação dos viveiros, que fazem a depuração da água e permitem a sua criação em condições naturais, mas sem poluição. A ostra portuguesa, “Crassostrea angulata”, tem menos defesas naturais do que a “Crassostrea gigas”, produzida noutros países, mas como a sua qualidade é indiscutivelmente melhor, foi ela a escolhida para ser produzida em Setúbal, voltando a ter o reconhecimento internacional.

IngredientesOstras; presunto em tiras ou cubos; gema de ovo; pão ralado; banha.

PreparaçãoPara consumir ao jantar, põem-se de manhã a de-molhar em água fria algumas tiras ou cubos de bom presunto meio gordo. Abrem-se as ostras ao calor do fogo, o suficiente para as retirar das cascas. Em es-petos, enfia-se um pedaço de presunto e duas ostras, alternando e terminando com o presunto. Barra-se cada espetada com gema de ovo batida, polvilha-se com pão ralado e frigem-se em banha fresca de por-co, sem as deixar apertar ao lume. Modernamente, há quem as polvilhe com queijo parmesão33.

Um IG Península de Setúbal branco, robusto e complexo será a escolha ideal para esta iguaria, pois a receita inclui ingredientes fortes no sabor, como o presunto e o queijo parmesão. Este branco deverá ser untuoso e complexo, de carácter persistente, um vinho de lote em que predominem o Fernão Pires e/ou o Chardonnay, tendencialmente feito para ser parceiro gastronómico.

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CHOCO FRITOÀ SETUBALENSE

A cidade de Setúbal estende-se ao longo do rio Sado, na margem direita, mesmo junto à foz. Esta proximidade da água - o rio e o mar - condicionou, desde sempre, a actividade dos seus habitantes, dos quais muitos se dedicaram à pesca. Até meados do século XX, a actividade piscatória desenvolvida na foz do Sado e ao longo da costa, entre Sines e o Cabo Espichel, foi muito importante para a economia da região e o meio de subsistência de muitas famílias, que encontravam nas águas grande abundância de pescado. De entre as espécies mais numerosas, conta-se o choco. A quantidade e, sobretudo, a qualidade do que é capturado na Baía de Setúbal está, certamente, na origem do sucesso do Choco Frito à Setubalense, que é hoje um verdadeiro atractivo gastronómico da cidade, proposto nas ementas da maioria dos restaurantes especializados em pratos de peixe.

IngredientesChoco; farinha; azeite; banha de porco; limão.

PreparaçãoLimpa-se o choco e corta-se em pequenas tiras ou aos quadrados. Seca-se bem, passa-se levemente por farinha e leva-se a fritar numa proporção igual de azeite e banha. Deve servir-se bem quente acompa-nhado com limão para espremer34.

O afamado Choco Frito de Setúbal, já iguaria nacional, é um prato versátil, que tanto pode ser acompanhado por brancos como por tintos. Para proporcionar uma experiência nova, sugere-se um vinho rosado. Ao longo dos anos, a Península de Setúbal tem vindo a adaptar-se ao mercado e hoje quase todas as empresas da região comercializam esta categoria de vinho. A escolha deverá recair so-bre um rosado IG Península de Setúbal, intenso, cujo palato seja rico em frutos vermelhos e com uma boa persistência.

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POLVONO FORNO

O Porto de Sesimbra figura, desde há muitos anos, entre os três primeiros portos de pesca portugueses, tanto no volume de pescado como no valor deste, que compreende uma grande variedade de espécies, de entre as quais se destaca, pela sua importância, o polvo. Embora seja uma espécie muito abundante em toda a costa portuguesa, é, de facto, em Sesimbra que ele é capturado em maior quantidade. São, por isso, numerosos os pratos confeccionados a partir deste cefalópede, dentro da tradição gastronómica desta zona da Península de Setúbal. A originalidade deste Polvo Assado no Forno reside na combinação de um produto do mar com um ingrediente típico da culinária rural, o chouriço, cujo resultado é um prato tão saboroso que passou a fazer parte das ementas de diversos restaurantes da região.

Ingredientes1 polvo com 1 kg, aproximadamente; 2 cebolas médias; 1 chouriço; 5 dentes de alho; 1 dl de azeite; 2,5 dl de vinho branco; 1 pimento verde; 500 g de batata; coentros picados, sal e pimenta.

PreparaçãoDepois de se cozer o polvo, parte-se aos bocados e dispõe-se num tabuleiro. Tempera-se com os alhos picadinhos, as cebolas às rodelas, o pimento às tiras, as rodelas de chouriço de carne, bastantes coentros picados, sal e pimenta, regando-se tudo com o azeite e o vinho branco. Cortam-se as batatas, previamente cozidas, aos quartos, que se juntam ao polvo quando este começa a alourar. Retira-se do forno quando estiver bem apurado35.

Apesar de se tratar de um pescado, é importante casar este prato com um vinho tinto encorpado, de aroma intenso. A confeção do mesmo assim o exige. A estrutura é importante, deve ser um vinho volu-moso, mas elegante. Esta harmonização agradece o estágio em madeira, desde que bem integrada. Não faltarão no mercado bons exemplos de DO Palmela à altura deste desafio.

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CALDEIRADAÀ FRAGATEIRO

A Moita é terra de marítimos e fragateiros, com uma gastronomia estreitamente ligada ao Rio Tejo. E a Caldeirada à Fragateiro da Moita tem mesmo que incluir peixes do Tejo, dos quais a enguia e o choco são absolutamente obrigatórios. O nome denuncia a sua preparação a bordo das fragatas, típicas embarcações do Tejo, usadas não apenas para a pesca mas também para transporte de mercadorias e de passageiros, por isso, a confecção da Caldeirada é muito simples. Habitualmente, os fragateiros usavam os peixes de pesca mais abundante e de menor valor, que iriam talvez sobrar da venda, e produtos da terra que trariam para bordo. Como aconteceu com muitos outros pratos de gente de poucos recursos, a receita desta Caldeirada, tendo sido reconhecida a sua qualidade, foi recuperada e hoje é servida em quase todos os restaurantes da zona ribeirinha.

Ingredientes1,5 kg de peixe; 1 kg de batatas; 1,5 kg de tomates; 2 pimentos grandes; 3 cebolas; 1 folha de louro; 2 dentes de alho; 1 malagueta de piri-piri; 1 ramo de salsa; 1 ramo de hortelã; sal e azeite q.b.

PreparaçãoÉ tudo colocado no tacho em cru, sem água, pois o cozinhado é feito nos próprios sucos dos peixes. Por seu lado, os vegetais devem ser, tanto quanto pos-sível, da época. Os peixes moles, como a enguia, só devem ser acrescentados quando a batata começar a ficar cozida. Outra recomendação importante é que, mesmo no final, quando se retira do lume, não pode faltar o perfume inconfundível da hortelã. Logo que se acaba de servir a Caldeirada, desfazem-se os restos de batata que ficaram no fundo do tacho, junta-se um pouco de água e massinha de cotovelo. A tempo de terminar a caldeirada, com o vagar que lhe é devido, a massa estará pronta para completar a refeição36.

Uma boa caldeirada pede por norma um vinho branco volumoso. Na região da Península de Setúbal as opções são variadas e facilmente se consegue encontrar um bom parceiro para este prato. O ideal será harmonizar com um vinho de aroma suave, com fruta delicada e elegante, cujo comportamento na boca seja redondo, afinado e com acidez discreta; um branco de bom porte, um lote de Fernão Pires e Moscatel de Setúbal é a nossa sugestão.

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CALDEIRADADE ALCOCHETE

A larga frente do concelho de Alcochete virada para o Mar da Palha condicionou o modo de vida das populações ribeirinhas, que encontravam na actividade piscatória um meio de subsistência como complemento do trabalho nos campos ou nas salinas. A bordo dos barcos, os alcochetanos pescavam e comiam o que as águas lhes davam, preparando as suas caldeiradas com os produtos que tinham trazido de terra. Mas o paladar destas caldeiradas era diferente, pois os marítimos, puxando do mar um balde com água, nela amanhavam e lavavam os peixes e demais ingredientes.

Ingredientes3 kg de peixe - tremelga ou tramelga, chocos, pa-ta-roxa, safio, tamboril e eiroses; 1,5 kg de batatas; 1 kg de cebolas; 1 kg de tomates; 2 pimentos; 2 dentes de alho; 2 dl de azeite; 1 molho salsa; 1 molho coentros; 1 folha de louro; sal, pimenta ou piripiri q.b.

PreparaçãoAmanha-se e salga-se o peixe uma hora antes de ser cozinhado. Num tacho, deita-se o azeite, o alho, a folha de louro, os coentros, a salsa e uma cama-da de tomates maduros, outra de cebolas e outra de pimentos, tudo cortado às rodelas. De seguida, colocam-se os chocos cortados aos pedaços e com pele, deixando ferver em cachão durante 5 minu-tos. Acrescenta-se água para o caldo, juntam-se as batatas cortadas aos quadrados e deixa-se ferver um pouco. Finalmente, juntam-se os peixes por ordem de dificuldade de cozedura: tremelga, pata-roxa, safio, tamboril e eiroses. Tempera-se com piripiri ou pimenta, a gosto, e rectifica-se o sal. As eiroses, colocadas no cimo e de cozedura mais rápida, devem ser retiradas para um prato. Se levar sardinhas, sem tripas nem cabeças, o processo é idêntico. Serve-se a caldeirada e só depois se distribuem as eiroses ou as sardinhas com uma escumadeira e com cuidado, para não as escangalhar37.

Procure-se um vinho branco bem estruturado, seco no palato e com álcool equilibrado. Persistente, para acompanhar o sabor a coentros, incluídos na receita.

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CALDEIRADAÀ SESIMBRENSE

A gastronomia de Sesimbra tem por base a sua riqueza e a diversidade piscícola, sendo a Caldeirada o prato mais emblemático e com mais variedade de peixe pescado em Sesimbra - tamboril, caneja, sardinhas, etc. - associada à memória colectiva, nomeadamente aos festejos dos Santos Populares e aos concursos gastronómicos que remontam à segunda metade do século XX. A Caldeirada encontra aqui especificidades próprias: os ingredientes são dispostos em camadas sobrepostas e, sobretudo na confecção comercial, no fundo do tacho colocam-se bivalves para evitar que “pegue”; do caldo faz-se a massa de peixe com raminho de hortelã e nunca se mexe, apenas se agita o tacho.

Ingredientes1,2 kg a 1,5 kg de peixe - tamboril, safio, raia, sardinha e tremelga com os fígados; amêijoas q.b; 2 cebolas; 2 dentes de alho; 2 tomates bem maduros e de bom tamanho; 1 pimento; 1,5 dl de azeite; 3 dl de vinho branco; 1 kg de batatas; 1 ramo de salsa; louro.

PreparaçãoColocam-se as amêijoas no fundo do tacho e vai-se pondo, às camadas, rodelas de cebola, batata, toma-te, pimento às tiras e os peixes aos bocados, depois de previamente amanhados, lavados e salgados. Deita-se o azeite e o vinho branco e deixa-se cozer em lume brando, rodando o tacho, em vez de me-xer, para não desmanchar o peixe. Quase no fim da cozedura, junta-se o ramo de salsa. Do caldo, depois de passado pelo passador e tendo-se acrescentado água, coze-se a massinha de cotovelos38.

Na Península de Setúbal, as opções de brancos para acompanhar este prato são diversificadas. Pela complexidade deste prato, pela nobreza dos peixes escolhidos, a procura de um vinho intenso, volumoso e persistente é imperial. Um branco IG Península de Setúbal, cujo lote inclua, para além de Fernão Pires, castas como Arinto, Verdelho ou Chardonnay, é reco-mendado. A complexidade do lote adicionará riqueza gastronómica ao vinho.

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MASSADE SAFIO

As características da gastronomia do Montijo são o reflexo da sua situação geográfica: por um lado, a sua localização à beira do rio Tejo e, por outro, as extensas áreas rurais de férteis solos que envolvem o concelho, onde se cultivam os produtos hortícolas que contribuem para uma cozinha rica em sabores. A proximidade do Tejo levou a que, desde sempre, parte da população se dedicasse à pesca, no largo estuário do rio, o Mar da Palha, o que deu origem a típicos pratos de peixe, que ainda hoje fazem as delícias dos apreciadores. É o caso da Massa de Safio, cujo principal ingrediente é este peixe de muitas espinhas, que ainda é pescado à entrada do Tejo. A sua receita é uma das especialidades gastronómicas propostas pelos restaurantes do concelho, que se orgulham de a preparar “à montijence”.

Ingredientes1 kg de safio; 150 g de massa de cotovelinhos; 2 cebolas; 2 dentes de alho; 1,5 dl de azeite; 1,5 kg de tomates maduros; 1 folha de louro; 1 raminho de salsa; sal, picante e pão frito.

PreparaçãoO safio é cortado às postas e temperado com sal. Prepara-se um refogado com o azeite, a cebola e o alho picados, o louro e a salsa. Acrescenta-se, em seguida, o tomate limpo de peles e sementes. Junta-se o safio a cozer nesse molho, deitando-se depois a massa, que ferve até cozer. Pode servir-se em cima de fatias de pão frito39.

Esta é uma receita rica nos ingredientes e, como tal, exige um branco de bom corpo, com uma boa estru-tura. Sugere-se a procura de um vinho DO Palmela, cujo lote contenha Fernão Pires e/ou Arinto, duas das castas brancas mais plantadas na Península de Setúbal a seguir à Moscatel de Setúbal. A frescura é importante para bem acompanhar este prato, assim como a persistência do vinho na boca.

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FAVAS ÀPALMELOA

O concelho de Palmela mantém uma forte tradição rural, ocupando a actividade agrícola quase metade da sua área, com culturas hortícolas, vinhas, cereais e pastagens. A gastronomia da região é, assim, o reflexo da abundância de bons produtos da terra, como as favas, que sempre tiveram uma importante presença na alimentação dos trabalhadores do campo, graças às suas qualidades nutritivas. A receita de Favas à Palmeloa é de fácil preparação e resulta num prato de forte sabor, devido às carnes que a integram, e muito aromatizado, pela inclusão da hortelã e dos coentros.

Ingredientes1,5 kg de favas descascadas; 1 cebola média; 125 g de toucinho entremeado; 1/2 chouriço de carne; 1/2 chouriço mouro; 1 ramo de hortelã e de coentros; sal q.b.

PreparaçãoCom a cebola, coze-se o toucinho entremeado, os chouriços de carne e mouro. Pode também incluir-se chispe e orelha, que devem ser salgados de véspera. Depois de estar tudo cozido, retira-se e, no caldo, cozem-se as favas com hortelã e coentros. Logo que estejam cozidas, servem-se numa travessa com as carnes40.

Aqui, não se pode escapar à recomendação de um tinto. Um tinto DO Palmela fará as delícias deste casamento. Quer-se um vinho encorpado, de aroma intenso e de taninos marcantes, um vinho em que o estágio em barrica esteja equilibrado com a fruta e a personalidade do vinho, adicionando riqueza a esta harmonização.

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LEBRE À TI ZÉ DA AVÓ

José Francisco da Avó, mais conhecido pelo nome de Ti Zé da Avó, era um salineiro de Alcochete que, nas proximidades da coutada do conde de Cabral, aproveitava as horas de lazer para caçar. Nesse tempo, abundavam por ali diferentes espécies cinegéticas, por isso, as lebres, apesar da velocidade e das manhas que empregavam para fugir aos caçadores, eram, com frequência, vítimas do passatempo do salineiro. Com o produto da sua caça, criou ele esta receita que se tornou um prato típico desta zona da Península de Setúbal e, actualmente, na época da caça, faz parte da oferta gastronómica de alguns restaurantes desta vila ribatejana, muito ciosa da preservação do seu património cultural.

Ingredientes1 lebre; 300 g de toucinho; 3 tomates; 1 cebola; 1 pimento; 3 dentes de alho; 3 folhas de louro; 2 dl de vinho tinto; 0,5 dl de vinagre; batatas, sal, pimentão e pimenta q.b. .

PreparaçãoCorta-se a lebre aos pedaços e põe-se dentro de uma panela com 3 folhas de louro, sal q.b. e água suficiente para lhe dar uma meia cozedura. Retira-se a lebre da panela e deita-se fora a água. Coloca-se a lebre numa marinada com pimentão, pimenta, alho, cebola picadinha, vinho tinto e um pouco de vinagre, até ao dia seguinte. No recipiente para cozinhar, dei-ta-se o toucinho cortado aos pedaços, os tomates e o pimento. Por cima, deita-se a lebre com a marinada e vai ao lume para acabar de cozer. Para não alterar o gosto à lebre, coze-se à parte a quantidade de bata-tas desejada, com casca, em água e sal, e pelam-se. Por cima das batatas, deita-se a lebre já pronta, com o respectivo molho41.

Este prato deve ser harmonizado com um tinto en-corpado e concentrado da Península de Setúbal, em que o aroma a frutos pretos prevaleça. Para poder acompanhar carne de caça e todos os condimentos usados nesta receita, o vinho terá de ser complexo, estruturado e vigoroso. Recomendamos a procura de um vinho reserva/colheita selecionada tinto, cujo lote inclua a casta Castelão, a Trincadeira ou a Syrah.

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FARRAFUZA

A agricultura sempre ocupou um lugar importante no concelho da Moita, onde a terra e o rio se confundem. A hortaliça que se produzia no campo, como os tomates, as cebolas, as batatas, eram, por vezes, os ingredientes principais de alguns cozinhados, pois em qualquer horta podiam ser cultivados e estavam sempre à mão. A Farrafuza é um exemplo dessa cozinha simples, económica e acessível e que, ainda hoje, é um prato muito apreciado. A sua receita foi passando oralmente de geração em geração e, por isso mesmo, pode ser confeccionado de diferentes maneiras.

IngredientesOvos; 0,5 kg de tomates; 2 dl azeite; 2 cebolas; den-tes de alho; sal q.b.; pimenta q.b.

PreparaçãoLeva-se ao lume uma frigideira grande com as cebo-las cortadas às rodelas e o azeite, até a cebola ficar translúcida. Juntam-se então os alhos bem picados. Os tomates devem ser antecipadamente pelados e limpos de pevides, após o que se cortam aos boca-dos e se juntam à cebolada. Depois de tudo cozido, colocam-se os ovos a escalfar, por cima da tomatada. Deve ser acompanhado com batatas cozidas42.

Porque este é um prato rico e complexo, pede também um vinho com essas características. Na Península de Setúbal, os vinhos são naturalmente ricos e complexos, frutos das castas plantadas e do microclima da zona. Ao explorar a margem sul do Sado, tal como na Península de Setúbal, não será di-fícil encontrar um tinto frutado, com aromas de fruta preta e muito boa concentração, com taninos estru-turados, mas não muito marcantes, que acompanha-rá na perfeição este prato. Trincadeira, Aragonez e as Tourigas Nacional e Franca são as nossas sugestões.

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FARINHATORRADA

A origem da Farrinha Torrada é incerta, mas sabe-se que, em Sesimbra, nos finais do século XIX, começou por ser usada como remédio caseiro para tratamento de algumas maleitas, como a constipação e a tosse. Além disso, como é um bolo seco, bastante energético e de longa duração, servia de alimento aos pescadores que andavam embarcados durante a faina em alto-mar. Durante o processo de registo e fixação da receita pela Inspecção Geral das Actividades Culturais, a Câmara Municipal recolheu testemunhos de vários sesimbrenses, alguns com cerca de 80 anos de idade, que ainda se recordam da Farinha Torrada feita pelas avós. Inicialmente, o bolo era confeccionado apenas com farinha e açúcar. Com a casca de limão, cortada minuciosamente com tesoura, e a canela, a farinha passou a ter um gosto mais característico e diferenciador. Os ovos foram introduzidos para tornar o bolo mais macio. Posteriormente, foi introduzido o chocolate, mas era apenas utilizado pelas famílias abastadas ou em épocas festivas, dada a fragilidade de recursos da sociedade sesimbrense daquela época. Cozido em púcara e em forno a lenha, o bolo era cortado em quadrados e a meio da cozedura. Agora, no âmbito do Programa Integrado de Valorização da Frente Marítima de Sesimbra, a especialidade saltou do âmbito caseiro e tornou-se moda nas pastelarias do concelho.

Ingredientes500 g de farinha, 500 g de açúcar; 4 ovos; 1 tablete de chocolate; 1 colher de sopa de canela; raspa de casca de limão.

PreparaçãoMistura-se a farinha de trigo, os ovos, o chocolate raspado, o açúcar, a canela e a raspa de casca de limão. Espalha-se a massa num tabuleiro e leva-se ao forno a temperatura média durante cerca de 20 minutos. Depois, é só retirar o bolo do tabuleiro, cortar em quadrados e a Farinha Torrada está pronta a comer43.

Este doce, desconhecido muitas vezes pelos turistas que nos visitam, torna-se uma verdadeira delícia quando acompanhado por um Moscatel Roxo (DO Setúbal), o mais raro e delicado dos Moscatéis de Setúbal. Este ligará perfeitamente com os ingredien-tes, sobretudo com o chocolate. O Moscatel Roxo é rico nos aromas e exuberante na boca, revelando, na maioria das vezes, notas a laranja cristalizada, café e frutos secos. Apesar de doce, é fresco e muito elegante. Um vinho cheio de encanto.

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FOGAÇA DE ALCOCHETE

Reza a tradição que, há muitos, muitos anos, um barco de Alcochete foi apanhado por uma tempestade em pleno rio Tejo e os barqueiros prometeram que, se chegassem a bom porto sãos e salvos, organizariam uma confraria em honra de Nossa Senhora da Atalaia para agradecer essa graça. E, desde então, têm cumprido a promessa, festejando anualmente a salvação. É a mais antiga tradição desta vila da borda d’água, atestada por um documento de 1512, que já refere a existência da Confraria dos Barqueiros de Alcochete.

Ainda hoje, durante a semana da Páscoa, realiza-se o tradicional Círio dos Marítimos e, de entre os diversos cerimoniais a cumprir, na segunda-feira faz-se à porta da igreja da Atalaia um leilão de Fogaças. Estas são uns pães doces, pesando um quilo, cujo ritual de oferta e de arrematação assegura abundância e saúde. Se a produção particular continua a respeitar o peso estabelecido, as Fogaças comercializadas, em geral, aparecem já em formato individual.

Ingredientes1 kg de farinha; 700 g de açúcar amarelo; 250 g de manteiga derretida; 200 g de raspa de casca de limão; 25 g de canela em pó; 2 dl de água; gema de ovo.

PreparaçãoNum recipiente, deita-se a farinha, o açúcar ama-relo, a raspa da casca dos limões e a canela em pó. Amassa-se com a manteiga derretida e cerca de 2 dl de água, como se amassa o pão. Fazem-se peque-nas bolas, barram-se com gema de ovo, dando-lhe pequenos golpes para enfeitar. Vão ao forno44.

Estamos sempre perante um casamento feliz quan-do juntamos doçaria tradicional portuguesa a um Moscatel de Setúbal, seja ele branco ou tinto. Neste caso, pelas características da receita, sugere-se a companhia de um Moscatel de Setúbal jovem, em que os aromas a laranja, flor de laranjeira e mel se revelam mais intensos, cuja elegância e suavidade se manifestem na boca.

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FOGAÇADE PALMELA

Tradicionalmente, as Fogaças de Palmela eram feitas em casa das famílias, em vésperas da Festa de Santo Amaro, a 15 de Janeiro. Esses bolos correspondiam a promessas formuladas àquele Santo e, conforme o problema que estava na origem da promessa - a cura de pessoas ou de animais, o pedido de boas colheitas – assim as fogaças tinham formas de animais, de cachos de uva, de corações, etc. Transportadas em cestos para a missa na igreja paroquial, aí eram benzidas. Uma parte dessas Fogaças era leiloada e o valor apurado revertia a favor da igreja e para cobrir as despesas da festa, e a outra parte era levada para casa e distribuída pela família, pelos vizinhos e pelos amigos.

Este ritual foi recuperado pela Confraria Gastronómica de Palmela, com o apoio da autarquia, na intenção de reviver e dinamizar esta tradição antiga de Palmela. Assim, no dia de Santo Amaro, os Confrades, vestidos a rigor, levam ao altar os cestos com as Fogaças para serem benzidas.

Ingredientes500 g de massa de pão; 500 g de açúcar amarelo; 1 kg de farinha *; 125 g de banha; 2 ovos mais 1 ovo para pintar; sumo de 2 laranjas; raspa de casca de laranja; 1 cálice de aguardente; canela (+ -30g)**; erva-doce (+ - 50g).**

PreparaçãoLigam-se os ovos à massa do pão. Em seguida, deita-se o sumo e a raspa da casca das laranjas, a banha, o açúcar, a canela, a erva-doce, a aguarden-te e, por fim, a farinha. Depois de tudo bem ligado e amassado, deixa-se levedar durante 30 minutos. Moldam-se bonecos, decoram-se e pintam-se com ovo batido. Vai a cozer em tabuleiro untado, em forno moderado (180º C)45.

Juntar doçaria tradicional portuguesa a um Moscatel de Setúbal, seja ele branco ou tinto, é sempre uma aposta segura. Porque a receita das Fogaças de Palmela é rica, sugere-se a companhia de um Moscatel de Setúbal com alguma idade (mais de 5 anos), em que os aromas a laranja cristalizada e mel se manifestem com exuberância, proporcionando ao palato disfrutar de toda a sua complexidade.

*Poderá levar um pouco mais de farinha dependendo do tamanho dos ovos e das laranjas.

**A erva-doce e a canela são a gosto, no entanto a quantidade de erva-doce deverá ser sempre superior à da canela.

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TORTA DE AZEITÃO

A receita das Tortas de Azeitão terá tido a sua origem na vila de Fronteira, no Alentejo, tendo sido trazida para Azeitão, no início do século XX, por um familiar de Manuel Rodrigues, por alcunha “o Cego”, de profissão hospedeiro e aguadeiro. A mulher deste, Maria Albina, e a filha tinham já fama de doceiras graças aos “Ss”, uns bolinhos secos feitos por elas e que eram vendidos à porta do seu estabelecimento, juntamente com tremoços e amendoins, aos forasteiros vindos da zona da Arrábida. Foram elas que começaram a fazer as Tortas, inicialmente cozidas no forno da padaria de João Alface, e a vendê-las, primeiro, à fatia, e depois, em doses individuais. E assim foi fundada a pastelaria “O Cego”, especializada nas Tortas de Azeitão, que ainda hoje fazem as delícias dos apreciadores da doçaria genuína, fabricadas com produtos naturais e por processos pouco mais que artesanais. O actual proprietário, José Augusto, que há 30 anos está à frente da pastelaria, faz questão de manter a tradição de qualidade na confecção destes bolos que, muito justamente, tornaram famoso aquele estabelecimento.

IngredientesMassa: 20 claras de ovo; 20 gemas de ovo; 400 g de açúcar; 70 g farinha; doce de ovos. Recheio - Doce de ovos: 12 gemas; 12 colheres de açúcar; 24 colhe-res de água

PreparaçãoBatem-se as gemas com o açúcar até se obter um creme espesso. Adiciona-se a farinha, batendo-se o tempo necessário para a envolver. De seguida, jun-tam-se as claras batidas em castelo. Coloca-se esta massa num tabuleiro untado e forrado com papel vegetal que, por sua vez, também é untado e polvi-lhado de farinha. Espalha-se a massa até ficar muito fina. Espera-se mais ou menos 10 minutos e coze-se no forno à temperatura de 180º C, durante, 15 a 20 minutos. Não deve cozer demasiado para as tortas não se partirem ao enrolar. Entretanto, prepara-se o recheio. Num tacho, coloca-se o açúcar com a água a ferver, até atingir o ponto de fio, o que demora cerca de 10 minutos. À parte, batem-se bem as gemas. Logo que a calda esteja no ponto, retira-se do lume, junta-se imediatamente às gemas, mexendo ao mes-mo tempo. Sem parar de mexer, leva-se de novo ao lume a engrossar. Desenforma-se o bolo por cima de um pano, barra-se de imediato com o doce de ovos, entretanto preparado, e corta-se em tiras com 8 cm de largura e 12 de comprimento, que se enrolam, de forma ficarem com cerca de 5 cm de diâmetro46.

Uma torta de Azeitão e um Moscatel de Setúbal é, para muitos setubalenses, a delícia do final de tarde.

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Corria o ano de 1830 quando Gaspar Henriques de Paiva, vindo da sua Beira natal, se instalou em Azeitão. A abundância de pastagens e o clima ameno levaram-no a dedicar-se à produção de queijo de ovelha, a exemplo do que se fazia na Serra da Estrela. Mas o queijo que fabricou revelou-se diferen-te do esperado, com um sabor característico graças à flora da serra da Arrábida que alimenta os animais e à utilização de uma variedade de flor de cardo, espontânea no sul do País, a cynara cardunculus, para a coagulação do leite, que ainda hoje é feita em enormes potes de barro vidrado. O resultado é um queijo de pasta semi-mole ou amanteigada, branca ou ligeiramente amarelada, com a forma de um ci-lindro achatado, podendo pesar 100 ou 250 gramas. Tem um tempo de cura de vinte dias e, durante este período, é virado e lavado sempre que necessário, para que a crosta fique lisa e limpa. O segredo do seu fabrico foi transmitido a vários proprietários de rebanhos de ovelhas, nos concelhos de Palmela, Sesimbra e Setúbal, que, em conjunto, possuiam cerca de 5000 animais, e que se dedicaram tam-bém a produzir, em queijarias artesanais, o Queijo de Azeitão, como foi desde cedo designado um dos mais apreciados queijos nacionais. Estes concelhos correspondem à área geográfica de produção, que actualmente constitui a região demarcada do queijo de Azeitão. O uso da Denominação de Origem, insti-tuída em 1986, obriga a que o queijo seja produzido de acordo com as regras estipuladas no caderno de especificações, o qual inclui as condições de pro-dução de leite, a higiene da ordenha, a conservação

do leite e o fabrico do produto, bem como a própria rotulagem.

Apesar do nome de Azeitão, actualmente já são pou-cas as unidades de produção de queijo fixadas nesta vila, estando os principais produtores concentrados na Quinta do Anjo, próximo de Palmela. Não obstan-te, o Queijo de Azeitão continua a ser uma referência gastronómica da Península de Setúbal, tanto no País como no estrangeiro e, recentemente, tem vindo a ser usado com grande sucesso na composição de criativos pratos de autor.

Para este tradicional e muito apreciado produto re-gional da Península de Setúbal, nada melhor do que harmonizá-lo com um clássico da região, um vinho monovarietal da casta Castelão, a mais plantada na Região, que proporciona vinhos concentrados, intensos na cor e no aroma, em que se destaca fruta vermelha madura e especiarias.

Produto Regional QUeIjO De aZeITÃO

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As uvas da casta Moscatel de Setúbal, originária do Médio Oriente e introduzida em território peninsular na época do Império Romano, constituem a base do prestigiado vinho Moscatel de Setúbal, cuja fama além-fronteiras terá começado na segunda metade do século XIV, quando Ricardo II de Inglaterra se tornou um importador assíduo deste vinho. Também Luís XIV, o “Rei Sol”, no século XVII, consta que não dispensava nas festas de Versailles este vinho generoso.

Ao longo dos séculos, a casta sofreu diversas mu-tações e, actualmente, existem três variedades de uvas Moscatel em Portugal. A variedade Moscatel de Setúbal é a mais plantada em Portugal, e a sua produção concentra-se na Península de Setúbal, cujo clima ameno permite a maturação ideal dos bagos, que ficam com uma cor dourada, variando entre o topázio claro e o âmbar. É a que apresenta maior concentração e riqueza de compostos aromáticos, dos quais se destacam casca e flor de citrinos, mel, tília, rosa, líchias, pêra, tâmaras e passas de uva.

Apesar da sua produção ser bastante anterior, em 1908, foi instituída a Região Demarcada do Moscatel de Setúbal, cuja área geográfica abrange os con-celhos de Palmela, Setúbal e parte do concelho de Sesimbra.

A partir destas uvas, é produzido o Moscatel de Setúbal, com Denominação de Origem Controlada, vinho licoroso, com uma graduação que se situa

entre 17º e 18º C e uma cor que vai do topázio claro ao topázio queimado.

São dois os tipos de Moscatel de Setúbal, o branco e o roxo, respectivamente designados “Moscatel de Setúbal” e “Moscatel Roxo”. Estas designações só podem ser atribuídas aos vinhos DOC Setúbal elabo-rados com, pelo menos, 67% de mosto proveniente destas castas. Estes vinhos podem ser colocados no mercado a partir dos dois anos de idade e ostentar na rotulagem o ano de colheita ou as indicações “10 anos de idade”, “20 anos de idade”, “30 anos de ida-de” e “Mais de 40 anos de idade”, desde que o vinho em causa ou cada uma das parcelas do lote que o originou, tenha, no mínimo, a idade indicada. A casta Moscatel Roxo, apesar de cultivada em pequena quantidade, permite obter um vinho de produção limitada, mas de grande qualidade, constituído por, pelo menos, 85% de mosto desta casta. O designa-tivo “Superior” é atribuído a vinhos com um mínimo de cinco anos de idade e que tenham obtido, na câmara de provadores, a classificação de qualidade destacada.

Por ocasião do primeiro centenário da criação da Região Demarcada do Moscatel de Setúbal, em 2008, foi fundada a Confraria do Moscatel de Setúbal, com o objectivo de defender, valorizar e pro-mover o Moscatel de Setúbal. Foi também desenha-do um copo específico e lançado um lote especial de Moscatel de Setúbal, comemorativos da efeméride47.

Produto Regional MOsCaTel De seTúbale MOsCaTel ROXO

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OESTE

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Encravada entre a vastidão do oceano e as encostas da Serra do Montejunto, a região Oeste estende-se aos solavancos entre vales e colinas que ligam a costa marítima ao mundo rural. Aqui o mar e a terra fundem-se numa mancha verde, salpicada, aqui e ali, por lugares, aldeias, vilas ou cidades que testemunham no litoral uma vocação piscatória e, caminhando mais para o interior, a aptidão agrícola das suas gentes. Os hábitos do dia-a-dia e aquilo que homem foi conseguindo tirar do chão e das águas determinaram as tradições gastronómicas desta região, reflectindo a proximidade do mar assente numa forte componente rural. Assim, os pratos típicos tanto podem deliciar os apreciadores de carne e dos sabores da terra como os que pendem para os paladares marítimos dos peixes e dos mariscos.

alCObaÇa

Nascida entre os vales do rio Alcoa e do rio Baça, Alcobaça deve a sua fama ao magnífico mosteiro fundado, aquando da Reconquista, por D. Afonso Henriques. Entregue aos monges de Cister, os reis que sucederam ao “Conquistador” foram doando à Ordem novas terras, concessões e regalias, insti-tuindo-lhe um imenso território: o célebre domínio dos treze Coutos de Alcobaça. Os monges, além da sua actividade religiosa e cultural, ensinaram técnicas agrícolas graças às quais arrotearam terras, secaram pauis e organizaram explorações, tendo criado, praticamente, a partir do nada, uma região agrícola que se manteve até hoje. Se é incalculável o valor do legado da Ordem de Cister para o desenvolvimento agrícola da região, menor também não é a sua herança no que se refere às tradições culinárias. Do convento de Cós, funda-do no século XIII pelo abade de Alcobaça, saíram das mãos das freiras Bernardas uns verdadeiros milagres de ovos e açúcar, doces ainda hoje capa-zes de fazer qualquer um cair no pecado da gula e celebrados todos os anos no Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, na Mostra Internacional de Doces Conventuais.

aleNQUeR

Conta-se que nos tempos agitados da Reconquista, D. Afonso Henriques encontrou por estas paragens um aliado inesperado. Do alto das muralhas, apareceu-lhe um cão com a chave do castelo na boca e rapidamente lha fez chegar às mãos. O rei, surpreendido, tomou a atitude por ordem e exclamou “Alão quer!” e, sem perder mais tempo, tomou a fortaleza enquanto, sem o saber, baptizava o local. Lendas à parte, Alenquer é uma povoação antiquíssima que nos oferece uma grande diversidade de paisagens invulgares e uma riqueza agrícola de grande significado. As velhas quintas solarengas, os bons vinhos brancos e tintos e a serra do Montejunto proporcionam, a poucos quilómetros de Lisboa, produtos de grande qualidade. Todo o concelho mantém fortes tradi-ções agrícolas, sobretudo nos pomares de vários frutos e nas vinhas. Localizada numa alcantilada colina, partindo do topo de um outeiro em direc-ção ao vale, a vila conquistou há muito o título de “Presépio de Portugal”. Anualmente, a Sagrada Família, pastores, anjos e os Reis Magos, em tamanho gigante, garantem o seu lugar numa das encostas da povoação.

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CaDaval

Segundo reza a história, terá vindo de Espanha o hábito de consumir bebidas geladas ou de saborear uma “nevada”. Esta moda, importada da corte de D. Filipe II, rapidamente foi absorvida pela elite mais endinheirada. Com efeito, a incapacidade técni-ca de produzir gelo artificialmente fazia com que este fosse um produto considerado de luxo e só ao alcance das bolsas mais abonadas. Em pleno século XVI, sem as modernas tecnologias de refrigeração, o recurso à neve e ao gelo da Serra da Estrela cons-tituía a única alternativa possível. O percurso até à capital era longo e complicado e, como a procura por parte da nobreza deste bem gelado parecia não abrandar, tentou encontrar-se um recurso mais prático para a sua comercialização em Lisboa. A Quinta da Serra, no concelho do Cadaval e no alto do Montejunto pareceu ser a melhor solução. Localizado a cerca de 40 quilómetros da capital e próxima do rio Tejo, então via de acesso privilegiada, este lugar apresentava grandes vantagens. Mas para a escolha terá sido determinante o microclima da região que proporcionaria temperaturas negativas durante um grande período do ano. Foi então construído, já no reinado de D. João V, um inovador complexo indus-trial planeado para a produção regular de gelo, com todo o sistema de produção, transformação, armaze-namento, transporte e distribuição estudado. Este foi um feito notável, único na Europa. No final do século XIX, com o advento dos frigoríficos, o negócio come-çou a decaír. Actualmente, a recuperada Real Fábrica do Gelo foi transformada em núcleo museológico e o concelho do Cadaval já não se dedica ao frio. Hoje são a pêra rocha, o mel e outros produtos rurais que fazem as delícias de Lisboa e de outras urbes.

CalDas Da RaINha

Conta a tradição que a Rainha D. Leonor, mulher de D. Jão II, deslocando-se das suas terras de Óbidos para a Batalha, passou por um local onde algumas pessoas se banhavam numas poças de água quente e de cheiro intenso e desagradável. Informada de que eram doentes que ali procuravam remédio milagroso para os seus males, também quis experimentar os efeitos e, entusiasmada com os resultados, determi-nou, para que os tratamentos fossem feitos de forma condigna, que ali se construísse um hospital, que ficou concluído em 1488. À sua volta foi crescendo uma povoação, que recebeu o nome de Caldas da Rainha, aliando as águas quentes, calda, à sua fun-dadora, a Rainha. No século XVIII, sob o patrocínio do Rei D. João V, assíduo frequentador do hospital termal, este foi completamente reconstruído. Sob a administração de Rodrigo Berquó, o hospital trans-formou as Caldas da Rainha no centro termal em moda nos finais do século XIX e início do século XX, quando a vila se tornou cidade.

Centro de uma região onde a agricultura ocupa um lugar de destaque, a sua Praça é, diariamente, palco de um mercado de produtos hortícolas, que os pro-dutores expõem para regalo dos olhos de fregueses e de forasteiros que ali afluem para compras ou para visita. Às cores e aos cheiros da fruta e da hortaliça junta-se a policromia das bancas da cerâmica cal-dense, que conta na sua história com nomes famo-sos como Maria dos Cacos, Manuel Mafra e, sobre-tudo, Rafael Bordallo Pinheiro. A sua fábrica, fundada em 1884, laborou durante mais de 100 anos. Já no século XXI, após um período de decadência, sofreu um novo impulso, voltando a apresentar as típicas loiças ao lado de peças inovadoras.

aRRUDa DOs vINhOs

Situada num vale fértil e ameno, a vila de Arruda dos Vinhos guarda nas suas paredes o eco das histórias antigas. Ao precorrermos o emaranhado de ruas que riscam a vila, é possível ir encontrando na sua topomínia sugestões à presença de velhos paços ou de um castelo mouro. Em 1172, D. Afonso Henriques doou a povoação à Ordem Religiosa e Militar de Santiago que muito fez pelo crescimento da região. O convento no Sítio do Vilar, destinado a acolher as mulheres dos Cavaleiros que partiam para Sul na altura da Reconquista, foi um verdadeiro motor de desenvolvimento rural da zona. Estas senhoras, para além da oração, dedicavam-se à exploração agrícola, através do arrendamento de terras, promovendo, deste modo, a dinamização da agricultura, especial-mente o cultivo da vinha, dadas as características excepcionais para este tipo de actividade. Ainda hoje, nas aldeias, nos casais e nas quintas do conselho tra-balham-se afincadamente os campos e preparam-se os vinhedos para as célebres e fartas colheitas de Outono que tão bem tipificam e enchem esta terra de cor. Deste longo ritual de labor e de sabedoria resulta, anualmente em Novembro, a Festa da Vinha.

Uma vez que esta região possui, desde muito cedo, terrenos bastante férteis para o cultivo de produtos vinícolas, o vinho, marca desta zona, vinculou-se com naturalidade à toponímia, tal como a arruda, um arbusto do sul da Europa muito abundante nesta re-gião, teve a honra de ter gerado o nome da povoação. Esta planta, com capacidades curativas e terapêu-ticas, permitiu a difusão de alegações a bruxaria e a curandices, tendo sido criado, provavelmente pelas alusões a feitiçarias, um doce designado “Bruxas da Arruda”.

bOMbaRRal

Se se der o caso de chegar ao Bombarral de com-boio, quando se vir na estação, vai ser imediata-mente atraído pelo azul e branco dos seus azulejos. Pintados em 1930 pelo artista plástico Jorge Pinto, estes painéis ilustram o modo de vida das gentes da terra, indiscutivelmente ligadas à terra e ao vinho. Ali estão as mulheres a limpar as cepas, os homens a pulverizar a vinha, a fazer a vindima, a pisar as uvas… O pintor passou para o azulejo um ofício que todos os naturais da zona conhecem e muitos dominam. Com efeito, já vem de longe a herança vitivinícola do concelho. Inserida numa fértil região agrícola, produto do trabalho dos monges de Alcobaça, de foreiros, de colonos e de agricultores, esta zona, situada numa planície de aluvião bastante fértil na margem esquerda do rio Real, goza há muito de terras de grande qualidade. No início do século XX, os vinhedos preenchiam a maior parte da paisagem e tinham ganho quase o estatuto de monocultura. O vinho era, nessa altura, o principal meio de ocupação da maior parte da população, tanto como associados da Adega Cooperativa do Bombarral, que alimentou anos a fio os circuitos de produção do Vinho Verde comercial e da aguardente para o Vinho do Porto, como na qualidade de trabalhadores das grandes casas, como a Pereira Bernardino, a José Berardo, a Patuleias e Patuleias, a Sá Dias e Filho, a Abel Pereira da Fonseca… Grandes viticultores, reconhecendo o potencial das vinhas do concelho, investiram na re-gião, compraram terras, ergueram adegas e construí-ram destilarias. Hoje, muitas destas quintas produto-ras de vinho da região, como a Quinta do Sanguinhal, a Quinta das Cerejeiras, a Quinta dos Louridos, fazem parte da Rota dos Vinhos do Oeste.

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ÓbIDOs

O recorte da marulha vê-se de longe. Altaneira, esta linha defensiva hoje protege uma das jóias do turis-mo nacional: cerca de 14 hectares de história viva e preservada por uma faixa de pedra antiga. Do alto das suas torres, avista-se o concelho. Daqui entre-ve-se o casario disperso, os campos arados, a lagoa, baptizada com o nome da vila, o oceano, ao longe, a provar a escolha privilegiada deste local que parece ter tudo: porto de mar, terras férteis e o sistema lagu-nar costeiro mais extenso da costa portuguesa. Aqui, ainda hoje se capturam espécies como o robalo, o linguado, a solha, a tainha, a amêijoa, o berbigão, o mexilhão, o camarão, o polvo e a enguia que muito influenciam a oferta gastronómica da região.

Desde cedo que as condições geográficas favorá-veis foram reconhecidas pelos povos que por aqui passaram e se fixaram. Ao povoamento neolítico sabe-se que se seguiram, mais tarde, os romanos, os visigodos e os árabes. D. Afonso Henriques, depois de conquistar Lisboa, dedicou-se a submeter as re-giões vizinhas. Óbidos caíu nas mãos lusas em 1148. No século XIV, esta terra já afirmava a sua importân-cia. Poucas eram as povoações que, naquela altura, apresentavam uma área tão extensa intramuros . Depois, com o andar da História, foi perdendo peso, mas talvez tenha sido isso que a salvou. O progresso das Caldas da Rainha, que lhe roubou toda a impor-tância, preservou esta vila acastelada de inovações do ‘fácies antigo’ , fazendo dela (...) um museu. Assim se escreveu, em 1955, no inventário da Academia de Belas-Artes e, actualmente, por se tratar de uma jóia, muito temos que agradecer ao progresso não ter conseguido ultrapassar as muralhas.

PeNIChe

Os bandos das gaivotas, o cheiro intenso da maresia, o vento na cara, provam-nos que estamos em terra atlântica. De facto, a vitalidade e a força das gentes de Peniche encontram-se todas no mar. Estaleiros, empresas de pesca, conservas, tudo o que se liga à vida marítima assume uma legitimidade e um vigor que o turismo ainda não conseguiu alterar. Uma autenticidade bem visível a quem, em dia de semana, se passeie pela zona portuária. A descarga do pesca-do é um espectáculo único, com gestos e linguagens muito próprios, que, embora tenha sofrido trans-formações com o progresso, mantém um pitoresco intemporal. Ali descansa já em caixas o pescado acabado de apanhar, brilham ao sol as sardinhas, as lagostas, as raias, os búzios, debaixo do olhar guloso das gaivotas.

Com uma grande tradição nas artes da pesca, a gastronomia de Peniche oferece, naturalmente, uma grande variedade de pratos de peixe e marisco. A Avenida do Mar e o Largo da Ribeira são os dois locais da cidade onde se acotovela uma grande parte dos restaurantes, especializados, claro está, na confecção irrepreensível do maior tesouro da região, o peixe fresco. Mas, se por aqui o fruto do mar é rei, noutros pontos da cidade e um pouco por todo o concelho, as propostas culinárias passam, também, pela riqueza agrícola das vastas e férteis zonas rurais, mostrando que a região de Peniche é pintada a muitas cores.

De qualquer forma, a vastidão do azul do oceano pode dominar o verde dos campos. Mas a relação com o mar não se limita à pesca: o desporto náutico, principalmente o surf, já ganhou relevância e hoje Peniche é conhecido como a «Capital da Onda».

lOURINhÃ

Em Março de 2014, todos os grandes meios de comunicação, de Washington a Hong Kong, noti-ciaram a descoberta de um novo dinossáurio. Os fósseis do Torvosaurus Gurneyi, um parente do famoso Tyrannossaurus Rex, foram encontrados na Formação da Lourinhã, numa área onde se encontra um tipo de rochas ideais ao processo de fossilização. Este primo do T-Rex, oitenta milhões de anos mais velho, pode ter atingido os dez metros de compri-mento e ter pesado entre quatro a cinco toneladas; com estas medidas, os paleontólogos acreditam que este era o maior predador terrestre da Europa do seu tempo, o Jurássico Superior. Os vestígios deste enorme animal encontram-se num pequeno museu no centro da vila Lourinhã, mantido por um grupo de arqueólogos que conseguiram reunir um espólio hoje considerado como uma das maiores colecções de fósseis de dinossáurios do Jurássico Superior. O mu-seu, para além do núcleo de Paleontologia, também possui outros dedicados à Arte Sacra e à Etnologia e, numa rápida visita, podemos perceber que, para além dos animais já pisarem esta terra há tempos imemoriais, também o ser humano deixou por aqui pegadas antigas.

Romanos primeiro, depois Árabes, por fim Cristãos: o clima e a qualidade do solo parecem ter atraído pessoas desde cedo ao concelho. A sua localização privilegiada, protegido pelo Montejunto e delimitado pelo Cabo Carvoeiro, consegue condições metrológi-cas abençoadas. Esta é uma terra com muita pesca, carne, fruta e marisco, em especial a lagosta. A sua aguardente, embora já seja por aqui uma tradição com mais de duzentos anos, conseguiu ter região demarcada em 1992.

NaZaRé

Existem duas Nazarés. Uma é feita de pescadores, de homens do mar, de mulheres vestidas de preto, gente com os olhos, o coração e o sustento postos no oceano revolto. A outra é uma babel composta por uma população flutuante que aflui aqui, vinda do mundo, à procura da onda gigante perfeita que irá constar num famoso livro de recordes, ou de um bonito tom de pele conseguido num areal a perder de vista e potenciado pelo ar saturado de iodo. Estas duas realidades encontram-se quando os habitantes locais se esmeram na hospitalidade: nos restauran-tes servem com orgulho os pratos confeccionados com o pescado do dia, nas ruelas abrem as suas ca-sas ao turismo numa oferta expressa de Chambres, Rooms e Zimmer.

O turismo e a pesca são as actividades que fazem pulsar a vila. Quando Ramalho Ortigão publicou “As Praias de Portugal - Guia do Banhista e do Viajante” em 1874, já a Nazaré era destino de férias principalmente occupada pelos banhistas das Caldas e pessoas d’aquellas redondezas da Extremadura : Pombal, Leiria, Torres Novas, Santarém. Com o tem-po, internacionalizou-se. Em 2011, o surfista ameri-cano Garrett McNamara levou esta faixa costeira às bocas do mundo, depois de ter cavalgado uma onda de quase 30 metros e, imediatamente, a Nazaré tornou-se destino de peregrinação do amante deste desporto radical de qualquer parte do globo. Mas, esta ondulação furiosa que hoje fascina os turistas foi, desde há séculos, motivo de temor e de luto para a população que dependia do mar para viver. Apesar do risco, a pesca, a transformação do pescado, o pitoresco processo da seca e a venda de peixe, são, ainda hoje, a principal actividade da população.

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sObRal De MONTe aGRaÇO

Nas histórias das famílias antigas do concelho ainda pairam as sombras das Guerras Napoleónicas, ocor-ridas há dois séculos. Nas narrativas populares que recordam esses tempos idos, há sempre um tesouro escondido, ouro emparedado, faqueiros de prata enterrados, mas também há a lembrança de casas destruídas, arquivos incendiados, paços devastados… Estes relatos reflectem uma época de susto, feita de saque e de medo.

O concelho de Sobral de Monte Agraço é justamente reconhecido por ser lugar proeminente das “Linhas de Torres” durante a Terceira Invasão Francesa. Depois da incursão do General Junot, em 1807, e da de Soult, em 1809, o Marechal Massena, um dos mais admirados militares de França, avançava pelo território português à frente do maior exército invasor que até à época tinha entrado por Portugal. Estávamos em 1810. Vindas do norte, as tropas francesas foram avançando para as linhas defensivas de Torres Vedras, construídas com o objectivo de es-tancar as hostes inimigas antes de estas chegarem a Lisboa. Sir Arthur Wellesley, primeiro Duque de Wellington, comandante supremo das forças luso--britânicas montou o seu quartel-general na Quinta dos Freixos, nas imediações de Sobral de Monte Agraço. William Beresford, comandante-em-chefe do Exército Português, instalou-se por perto, na Quinta Nova de Nossa Senhora. É fácil imaginar como o impacto destas movimentações e destes aconteci-mentos afectaram esta terra predominantemente rural. Com efeito, a agricultura foi sempre o factor de desenvolvimento da região, situação que, apesar de ter decrescido nos últimos anos, ainda garante bons produtos e a base da gastronomia local.

TORRes veDRas

Cidade com pergaminhos antigos, a história de Torres Vedras é pródiga em acontecimentos. D. Afonso Henriques conquistou-a aos mouros em 1147, mas foi só em 1250 que D. Afonso III doou aos homens e vassalos do povoado carta de Foral. Foi por aqui que D. João I encetou a campanha de África, quando, em 1413, reuniu o conselho para discutir os planos de Ceuta. Na Restauração, em 1640, foi das primeiras povoações das imediações de Lisboa a sacudir o domínio filipino, mas é, sem dúvida, no período negro das Invasões Francesas que Torres Vedras se destaca.

O Marechal Massena acabado de entrar em Portugal avançava a passos largos para a capital. Com Lisboa como objectivo, foi saqueando o que pôde pelo caminho. Massena só soube da construção das Linhas de Torres quando com elas se deparou. Com os seus homens exaustos, não tentou forçar a passagem sobre esta faixa de defesa da capital. Esperou por reforços e, rendido às evidências, retirou para a região de Santarém. Assim, começava aqui o malogro da Terceira Invasão Francesa e assistia-se ao inicio da progressiva perda de hegemonia do império Napoleónico na Europa. Os Portugueses, agradecidos, entre outras homenagens que presta-ram a Wellington, deram-lhe o título de marquês de Torres Vedras.

Mas a importância deste concelho vai muito além destes feitos bélicos. Desde há séculos que estas terras férteis, abastecem de produtos hortícolas a ca-pital e fornecem a base de uma cozinha rural muito interessante, valorizada pela riqueza do que a vasta costa atlântica dá.

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PenicheSopa de legumes, sopa de peixe, alfaquique com açorda de ovas, lagosta suada, caldeirada de Peniche e à pescador, feijoadas do mar, de chocos e de búzios, massada do mar, sequinho de raia, de robalo e de safio, sardinha e outros peixes grelhados. Na do-çaria, amigos de Peniche, esses de Peniche, pastéis de Peniche e pão-de-ló de Peniche.

Sobral de Monte AgraçoCabrito no forno, fritada, sarrabulho, tiborna, par-rameiros, mão de vaca com grão. Nos doces, filhós espalmadas com aguardente e bolo de perna. Destacam-se também o pão saloio e o queijo fresco.

Torres VedrasSopa de peixe à pescador, canja saloia, arroz de ma-tança, coelho na canoa, cachola de porco, ensopado de enguias à moda da Assenta, mariscos. Na doçaria, pasteis de feijão, sopapos, doce de garfo e suspiros do Turcifal.

GASTRONOMIA REGIONAL

AlcobaçaSopa de lagosta, frango na púcara, cherne à frei João, porco à abade de Cister. Na doçaria, pão-de-ló de Alfeizerão, cornucópias, delícias de Frei João, trouxas de Alcobaça, pudim de ovos do mosteiro de Alcobaça, broínhas de Alcobaça, tachinhos à Dom Abade. São também de destacar as frutas do conce-lho, em especial, a ginja e a maçã de Alcobaça.

AlenquerPão de fabrico tradicional, sarrabulho, mão de vaca e torricado. Na doçaria, uvada - doce com base em mosto - broas de mel da serra de Montejunto,

Arruda dos VinhosBacalhau assado na brasa, coelho no tacho, galinha de cabidela, pato escondido, perú no forno, borrego no forno, costeleta de novilho, guisado de coelho, mão de vaca com grão, sarrabulho, vitela assada. Nos doces, bruxas da Arruda e uvada.

BombarralSopa de misturadas, sopa de feijão catarino, arroz de golada, cabrito assado no forno, gorjões do Palácio. Nos doces, mimosos, pão-de-ló do Bombarral, bolo dos generais. Destacam-se também a pêra rocha e o licor feito com este fruto.

CadavalArroz de golada, cabrito à Montejunto, polvo à laga-reiro, chanfana, coelho à caçador, tornedó com pêra rocha, medalhões de vitela com pêra rocha, borrego assado e cozido à portuguesa. Nos doces, pão-de-ló do Painho, bolo de Ferradura, doce das vindimas e mel de Montejunto.

Caldas da RainhaBacalhau dourado, polvo à lagareiro, ensopado de enguias da Lagoa, fatias de carne frita à moda do Landal. Nos doces destacam-se as cavacas das Caldas, os esses das Caldas, o pão-de-ló do Landal, as trouxas das Caldas e os beijinhos.

LourinhãMariscos cozidos, caldeiradas e feijoadas do mar, arroz de polvo, pataniscas de polvo, polvo assado na brasa, polvo frito, lagosta suada, ensopado de borrego. Nos doces, pão-de-ló de Miragaia, areias brancas, amendoados, delícias do convento. Também se destaca a aguardente DOC da Lourinhã.

NazaréSopa de peixe, sopa de carapaus secos à moda da Nazaré, massa de peixe, espetada de tamboril, arroz de tamboril, arroz de marisco, caldeirada à nazarena, carapau seco e enjoado, garoupa à nazarena, mo-lhanga de petingas à nazarena, raia de escabeche, santola recheada à moda da Nazaré, morcelas e negrinhos. Na doçaria, sardinhas doces da Nazaré, arroz-doce dos casamentos, bolos de noiva, tá-ma-res, merendeiras do Natal ou brendeiros e azevias à antiga.

ÓbidosCaldeirada de peixe da Lagoa de Óbidos, enguias fritas, ensopado de enguias. Na doçaria, trouxas de ovos, lampreia das Gaeiras, alcaides, pegadas, pastéis de moura, lidadores. Também se destacam a pêra rocha e a ginjinha.

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AGENDA GASTRONÓMICA

MarçoFestival Internacional de Chocolate, em ÓbidosQuinzena da Aguardente DOC Lourinhã, na Lourinhã

AbrilFestival das Sopas e do Petisco, em Labrugeira, Alenquer

MaioMês da Gastronomia, em Arruda dos VinhoQuinzena do Polvo, na LourinhãMostra Gastronómica da Região Ribeirinha do Concelho de Alcobaça, em Cela Velha, Alcobaça

JulhoFeira das Tasquinhas Rurais, em Peniche

AgostoFestival do Vinho Português e Feira Nacional da Pêra Rocha do Oeste, no BombarralAljubarrota Medieval, em AlcobaçaExpotur, nas Caldas da RainhaTasquinhas, em Valado dos Frades, Nazaré Feira das Tasquinhas, em Famalicão, Nazaré

SetembroFeira do Arroz-Doce, no Paúl, Torres VedrasConcurso de Gastronomia, nas Caldas da Rainha

Outubro Feira das Tasquinhas, em Sobral de Monte AgraçoFesta das Adiafas e Festival Nacional do Vinho Leve, no CadavalFestival da Codorniz, no Landal, nas Caldas da RainhaFeira de S. Simão, em Alcobaça

Novembro Mostra Internacional de Doces Conventuais, em AlcobaçaFeira de Todos os Santos, em Sobral de Monte AgraçoFesta da Vinho e do Vinho, em Arruda dos Vinhos

Na 5ª feira da espiga, Festa do Pão, Artesanato e Sabores, em Sobral de Monte Agraço

Vinhos da RegiãoOs vinhos produzidos nesta região integram a Comissão Vitivinícola Regional de Lisboa

ConfrariasConfraria da Pêra RochaColegiada de Nossa Senhora da Anunciação da LourinhãConfraria dos Enófilos da Estremadura

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CALDEIRADA À NAZARENA

A Caldeirada de Peixe é um dos pratos típicos mais apreciados em Portugal, por ser rico em sabores intensos graças aos magníficos peixes e aos temperos que a compõem. Existem muitas variações na confecção de caldeiradas, consoante a região que as prepara, mas as mais apreciadas são as dos fragateiros e as dos pescadores. A característica comum é o facto de ser um prato preparado com uma grande variedade de ingredientes. A maioria das zonas piscatórias portuguesas tem uma receita de caldeirada “à sua moda”: por vezes, a principal diferença está nas espécies de peixe, na opção de refogar ou não, ou ainda na inclusão de vinho, de água, ou simplesmente em deixar cozer nos sucos dos ingredientes. No caso desta Caldeirada à Nazarena, a originalidade está no toque de vinagre, no final.

Ingredientes500 g de tamboril; 500 g de safio da parte da barriga; 500 g de raia; 500 g de ruivo; 12 ameijoas sem casca; 5 cebolas grandes; 5 dentes de alho; 12 tomates pequenos; 1,5 dl de azeite;1 ramo de salsa; 0,5 l de vinho branco; 1 kg de batatas; 1 folha de louro; 1 colher de sopa de vinagre; piripiri q.b.; sal e pimenta q.b.

PreparaçãoPara dentro de um tacho, deitam-se as cebolas às rodelas, o tomate aos bocados - sem peles nem sementes - e os dentes de alho picados. Junta-se o azeite, a salsa e o louro. Tempera-se com sal, pimen-ta e piripiri. Leva-se a ferver em lume brando durante cerca de um quarto de hora. Depois, acrescenta-se o vinho branco e as batatas cortadas às rodelas e volta a ferver um bocado, até as batatas estarem meio cozidas. Misturam-se os peixes limpos e cortados às postas, polvilha-se com um pouco de sal, em cima, põem-se as amêijoas e tapa-se o tacho com a tampa. Deixa-se ferver cerca de dez minutos. Finalmente, deita-se por cima uma colher de sopa de vinagre e agita-se o tacho para o envolver no cozinhado48.

Recomenda-se um vinho branco loteado com duas castas muito populares na Região Lisboa, Arinto e Sauvignon, acídulo, fresco e com grande capacidade de realçar a comida. Este vinho tem a acidez certa para a caldeirada e, sem diminuir em nada o gosto e os sabores dos peixes, consegue equilibrar o vinagre usado na sua confecção.

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ENSOPADO DE ENGUIAS

A Lagoa de Óbidos é o sistema lagunar costeiro mais extenso da costa portuguesa. Faz fronteira terreste com o concelho das Caldas da Rainha, a norte, e com o concelho de Óbidos, a sul. A ligação da Lagoa ao mar é feita através de um canal localmente designado por “aberta”. Por ela entram numerosas espécies piscícolas que fazem da Lagoa o seu viveiro, mas também uma espécie migradora de grande valor comercial, a enguia, que escolhe para viver locais de águas bem oxigenadas e pouco frias, com fundos de areia ou lodosos. A pesca é praticada a bordo das bateiras, embarcações tradicionais com duas proas, fundo chato, movidas habitualmente à vara e utilizadas tanto pelos pescadores como pelos mariscadores, que usam diferentes artes conforme a espécie que pretendem capturar. Esta actividade piscatória e de marisqueio, que assume grande importância económica para as populações que vivem nas proximidades da Lagoa e que nela encontraram, desde sempre, parte do seu sustento, influenciou a tradição culinária das famílias que se dedicam há várias gerações à pesca, e que constitui também uma das marcas identitárias dos concelhos de Óbidos e das Caldas da Rainha. O Ensopado de Enguias é um dos pratos tradicionais da zona ribeirinha da Lagoa, no qual se destaca não apenas a qualidade do elemento principal, as enguias, como também o pão que, de acordo com a tradição, deve ser cozido em forno de lenha.

Ingredientes1,2 kg de enguias; 3 cebolas; 1,5 dl de azeite; 750 g de tomate maduro; 1 dente de alho; folha de louro; 1 colher de sopa de colorau; 1,5 dl de vinho branco; 2 pimentos; 200 g de fatias de pão caseiro torrado; coentros; sal e pimenta q.b.

PreparaçãoAmanham-se as enguias, cortam-se em bocados regulares e temperam-se com sal. Cortam-se as ce-bolas em rodelas e alouram-se com o azeite. Quando as cebolas estiverem bem louras, junta-se o tomate cortado em rodelas grossas, o dente de alho esma-gado, o louro, a salsa, o colorau, o sal e a pimenta. Deixa-se refogar um pouco e introduzem-se as en-guias, envolvendo-as bem no refogado. Rega-se com o vinho branco e deixa-se cozer sobre lume brando. Dez minutos depois de levantar fervura, adicionam-se os pimentos cortados em tiras. Deixa-se o enso-pado apurar e serve-se numa terrina sobre as fatias de pão caseiro torrado49.

Sugere-se os vinhos tintos DOC Óbidos, que apresentam cor entre rubi e granada, são frutados, encorpados, com um corpo e uma estrutura bastante agradável. São, em geral, vinhos macios e elegantes, com cor vermelha escura, sem ser opaco, e aromas de frutas vermelhas e maduras. Geralmente, apre-sentam-se com uma presença discreta de estágio em madeira, sem exageros. Vêm de uma zona perto do mar e protegida pelo Montejunto, com vinhas em chão de terra fértil e com muito sol.

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LAGOSTA SUADA ÀMODA DE PENICHE

A lagosta pertence à classe dos crustáceos, munida de fortes antenas, mas sem pinças. Pode atingir o comprimento de cinquenta centímetros e o seu habitat são os fundos rochosos de todos os mares. É caracterizada pela forma subcilíndrica do corpo, pelas patas anteriores curtas e pelas antenas mais compridas que o corpo, grossas, rígidas e espinhosas. O corpo, diferenciado em cefalotórax e abdómen, é de cor vermelho-acastanhada. É uma das muitas variedades de marisco que se pesca em toda a costa portuguesa, mas a de Peniche é reconhecida pela sua qualidade e pela riqueza do seu sabor e da sua textura. Por isso, esta receita tem esta designação. Quanto à técnica utilizada, o termo “suada” remete para um processo de cozedura em lume brando, num recipiente bem fechado, sem recurso a água.

Ingredientes1 lagosta viva; 50 g de manteiga; 3 cebolas; 1 kg de tomate; 2 dentes de alho; 1,5 dl de azeite; 2 dl de vi-nho branco; 0,5 dl de aguardente velha; 2 cálices de vinho do Porto seco; 2 malaguetas de piri-piri; salsa; 1 folha de louro; colorau, sal e pimenta q.b.

PreparaçãoLava-se bem a lagosta e corta-se em crua, viva, pelos anéis, sobre um recipiente para aproveitar todo o líquido que escorrer. Retira-se a tripa de cada bocado, separam-se as patas e corta-se ao meio, longitudinalmente, a cabeça da lagosta, retira-se o saco cinzento, aproveitando todo o restante recheio e o líquido que ficar na tábua. Deitam-se num tacho de barro todos os bocados da lagosta, em camadas sucessivas, alternando com a manteiga, as cebolas às rodelas, os alhos esmagados, o louro, e os tomates pelados. Rega-se tudo com o azeite, o líquido que es-correu, o vinho branco e a aguardente e tempera-se com a salsa picada, as malaguetas, o sal, a pimenta e o colorau. Leva-se o tacho bem tapado a lume forte, sacudindo-o para misturar todos os ingredientes. Baixa-se o lume quando levantar fervura e deixa-se ferver lentamente para a lagosta suar, agitando o tacho várias vezes. Passados 45 minutos a uma hora, adiciona-se o vinho do Porto. Rectifica-se o sal e tapa-se de novo, deixando cozinhar durante mais 15 minutos. Serve-se imediatamente, acompanhada com arroz branco solto50.

Para este prato sugerimos um vinho branco à base de Arinto, como o DOC Bucelas,.

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CODORNIZ RECHEADACOM COUVE E CHOURIÇO

A codorniz é uma pequena ave galinácea implantada em quase todo o território nacional e uma das espécies cinegéticas preferidas dos caçadores portugueses. A sua carne é saborosa e saudável, com um elevado teor de proteínas e muito utilizada em culinária. Por essa razão, há uns anos, uma das suas variedades começou a ser produzida em cativeiro, actividade com um peso substancial na economia do concelho das Caldas da Rainha. Embora se encontrem pequenos produtores por toda a região Oeste, é na freguesia do Landal que são produzidos cerca de três milhões de codornizes por ano, quase 75% do que se consome em Portugal. As grandes linhas de abate, embalamento e comercialização dividem-se entre esta localidade do concelho das Caldas da Rainha e Alenquer.

Com o objectivo de promover o consumo desta ave, realizou-se em 2011 o 1º Festival Nacional da Codorniz, no Landal, certame que se repetiu em 2013, com a colaboração da Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste.

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IngredientesCodornizes; couve lombarda; chouriço; cebolinhas; alho; azeite; vinho branco; polpa de tomate; louro; tomilho; batata; cenoura; piripiri, sal e pimenta q.b.

PreparaçãoDesossam-se as codornizes e recheiam-se com a couve e o chouriço picado. Atam-se com fio do norte e temperam-se com sal e pimenta. Num tacho, aquece-se o azeite e coram-se bem as codornizes. Juntam-se as cebolinhas e refresca-se tudo com o vinho branco. Tempera-se com sal, pimenta e piripiri. Junta-se a polpa de tomate e aromatiza-se com o louro e o tomilho. Deixa-se estufar bem e, por fim, rectificam-se os temperos. À parte, cozem-se as cenouras e as batatinhas, que servem de acompa-nhamento às codornizes, regadas com o molho do estufado51.

Esta iguaria é mais difícil de acompanhar pois tem dois pontos muito importantes: Primeiro, entra vinho branco na sua confecção, embora fosse preferível servir-se o mesmo vinho tinto que vai acompanhar a iguaria. Em segundo lugar, usa-se chouriço, que é um dos enchidos mais típicos portugueses mas dos mais difíceis de acompanhar. Sugerimos então um vinho tinto, encorpado e feito com base num lote de castas da Região Lisboa, sobretudo Cabernet Sauvignon e Trincadeira. Tem corpo e está muito equilibrado no nariz, mostrando taninos e o amanteigado da madei-ra onde estagiou.

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CAVACAS DASCALDAS

Desconhece-se a origem da receita, mas a venda de Cavacas nas Caldas da Rainha é atestada desde o final do século XIX. Por volta de 1874, Jesuína da Conceição Garcia, abriu um comércio onde fabricava e vendia as “Genuínas Cavacas Finas das Caldas”, conforme os dizeres de uma tabuleta colocada à entrada. Com a morte de Jesuína Garcia, aos 65 anos, a sua sobrinha, Gestrudes da Conceição Garcia, tomou conta do negócio. Em 1923, a neta da fundadora, Maria Regina da Conceição Pereira, também abriu uma loja, no largo fronteiro à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pópulo, onde vendia este bolo. Entretanto, na rua em frente do Parque, a Antiga Casa Fausta, a laborar desde os finais do século XVIII, especializou-se no fabrico de vários doces da região, entre eles as Cavacas. Durante anos, as Cavacas eram também vendidas na Praça onde se realiza ainda hoje o mercado diário, expostas em grandes cestos de vime forrados de panos brancos, mas seriam, certamente, as chamadas Cavacas Saloias, que levavam mais claras de ovos. E à chegada dos comboios, na estação do caminho de ferro, também lá estava uma vendedeira, que percorria o cais de uma ponta à outra, apregoando aos viajantes: “Cavacas finas das Caldas!”. O processo de fabrico, hoje em dia, está facilitado, mas quem conhece o ofício recorda bem as exigências de outros tempos, pois, antes de haver máquinas, era preciso amassar durante cerca de três horas. Actualmente, são vários os estabelecimentos comerciais, quase todos localizados nas imediações do Hospital Termal, que fabricam e vendem estes bolos, já embalados em cartuxos de papel, e os turistas são os seus principais compradores.

Ingredientes6 ovos; 1 dl azeite; 300 g farinha; 125 g açúcar; 1 colher sopa de fermento em pó; sal q.b.

PreparaçãoPara uma tigela, partem-se os 6 ovos que se ba-tem muito bem, juntando-se-lhes, depois, o azeite.Continua-se a bater até tudo estar completamente misturado. A pouco e pouco, vai-se deitando a fari-nha misturada com o fermento e uma pitada de sal. Bate-se com a mão fechada até que a massa fique branda e se comece a despegar das mãos. Coloca-se em seguida sobre a mesa, dando-se-lhe a forma de um rolo comprido. Corta-se este em rodelas de 2,5 cm que se colocam num tabuleiro bem polvilhado com farinha e se levam a forno forte a cozer. Depois de frias, pintam-se com calda de açúcar que se levou a ponto de espadana. A calda deve bater-se um pou-co ao ser retirada do lume, para que fique opaca52.

Para acompanhar as Cavacas, recomendamos vinhos generosos, da Região dos Vinhos de Lisboa como o de Carcavelos, vinho meio doce e de uma bonita cor âmbar escura., ou o vinho licoroso de Óbidos, da zona do Sanguinhal e do Bombarral, que são vinhos velhos, muito bem feitos, com doçura equilibrada.

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CORNUCÓPIAS

Embora seja incerta a sua origem, tudo indica que as Cornucópias pertencem ao receituário do Mosteiro de Cós, fundado no século XII, dependente do Mosteiro de Alcobaça. A sua forma inspira-se na de um vaso com feitio de corno, que na Antiguidade simbolizava a fertilidade e a abundância, pois do seu interior jorravam frutos e flores. As de Alcobaça são recheadas de ovos-moles, confeccionados com gemas e açúcar, quase os únicos ingredientes que entram no receituário da doçaria conventual portuguesa, depois da utilização das claras com objectivos mais prosaicos.

IngredientesPara a massa: 250 g de farinha; 3 colheres de sopa de manteiga; 1 colher de chá de fermento em pó; sal q.b.; azeite ou óleo para fritar; açúcar e canela para polvilhar. Para o recheio: 1 chávena almoçadeira de doce de ovos-moles.

PreparaçãoMisture e amasse a farinha, a manteiga, o fermen-to, o sal e a água até conseguir obter uma massa própria para tender. Tenda a massa com a espessura de cerca de 2 ou 3 mm. Corte em tiras de 1.5 cm de largura e enrole em espiral, partindo de cima para baixo, em forma de cornucópias, aconchegando bem. Entretanto coloque a água e o açúcar ao lume. Deixe ferver cerca de 25 minutos. Retire do lume e deixe arrefecer. Assim que estiver frio, mexa as gemas e junte. Envolva bem e leve ao lume a cozinhar. Deixe ferver dois minutos. Frite as cornucópias em azeite ou óleo, ou mistura dos dois, a 160º C. Retire-as, passe-as por açúcar e canela e recheie com o doce de ovos-moles53.

A doçura das Cornucópias pode ser acompanhada por um vinho generoso da região de Carcavelos que, sendo espesso e cheio de aroma, combina muito bem com a delicadeza dos ovos moles.

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TROUXAS DE OVOS

A cidade das Caldas da Rainha possui uma forte tradição na confecção de Trouxas-de-Ovos, embora não esteja ligada a nenhum convento local, o que habitualmente acontece com este tipo de doces. A receita poderá ter tido origem no Convento de Cós, perto de Alcobaça, cujo Mosteiro era abastecido graças à actividade doceira das freiras daquele instituição, algumas delas oriundas de conventos alentejanos, nos quais a tradição doceira estava, há muito, bem implantada. Ignora-se, no entanto, qual o caminho percorrido até a sua receita ter chegado às Caldas da Rainha. Mas qualquer que ele tenha sido, no século XIX, Gertrudes Fausta, considerada grande conserveira e pasteleira, contribuiu com a sua actividade para a divulgação das Trouxas-de-Ovos a partir da loja que possuia na vila termal, localizada em frente ao Parque, na antiga rua do Olival, hoje rua Camões, a Casa Fausta, fundada ainda no século XVIII. Com sua irmã, ambas exerceram grande influência nas gerações seguintes de pasteleiros das Caldas da Rainha. Tendo já passado pelas mãos de sucessivos donos a partir de meados do século XX, a Casa Fausta, agora com outra designação, mantém-se no mesmo local, continuando a honrar a herança doceira dos seus fundadores. É aí que os visitantes das Caldas da Rainha se dirigem para adquirir essas pequenas maravilhas que são as Trouxas-de-Ovos, cujo amarelo vivo atrai primeiro o olhar, seduzindo depois pelo seu sabor delicioso e requintado, tão doce!

IngredientesPara as trouxas: 10 gemas; 1 ovo inteiro. Para a calda: 1 kg de açúcar; 3,5 dl de água

PreparaçãoPrepare a calda, levando ao lume o açúcar com a água e deixe ferver durante 30 segundos. Deite a calda numa caçarola de fundo côncavo e coloque-a sobre um lume pequeno e fino, de modo a só ferver ligeiramente no meio. Passe as gemas com o ovo por um passador de rede três vezes, sem pressionar e sem bater. Deite na calda 0,5 dl das gemas e dei-xe-as alastrar. Com uma colher vá espalhando com muito cuidado para que elas formem um círculo, o mais fino possível, mas sem rasgar. Deixe solidificar e, depois, num golpe rápido mas cuidadoso, com o auxílio de uma escumadeira, vire a folhinha das gemas completamente, sempre com o cuidado de não a rasgar. Espere que acabe de cozer, retire-a da caçarola, sempre com o auxílio da escumadeira, e coloque-a num prato inclinado para escorrer. Repita a operação até usar todas as gemas. A feitura das trouxas exige muita paciência e tempo. À medida que for fazendo as folhas, disponha-as sucessiva-mente umas sobre as outras. Enrole-as depois, com a parte brilhante virada para baixo, formando as trouxas, com feitio de tronco de cone. Coloque-as num prato de serviço e, no fim, regue-as com a calda restante, passada por um passador54.

Acompanhe com um vinho generoso de Carcavelos.

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PÃO-DE-LÓ DEALFEIZERÃO

Diz a tradição que a receita do Pão-de-Ló de Alfeizerão se deve a freiras do Convento de Cós, que, depois do encerramento deste em 1834, na sequência da extinção das ordens religiosas, terão sido acolhidas em Alfeizerão. Para retribuir o abrigo e o carinho com que foram recebidas, confeccionavam a doçaria do Mosteiro. D. Amália Grilo, a quem as freiras tinham passado directamente a receita, começou a fabricar o Pão-de-Ló de Alfeizerão, por encomenda, para gente de posses da região. Inclusivamente, no dia em que D. Carlos foi a Alfeizerão à quinta do seu amigo Vitorino Froes, foi chamada para confecionar um Pão-de-Ló para o Rei. Mas a pressão sentida foi tal que a cozedura ficou incompleta. E o bolo mal cozido foi servido à mesa do Rei que, afinal, não lhe poupou elogios. Depois deste episódio, as poucas pessoas que o sabiam fazer passaram a retirá-lo do forno antecipadamente, mantendo o seu interior quase líquido. Nasceu assim o Pão-de-Ló de Alfeizerão como hoje o conhecemos. Nos anos 20 do século passado, vindo do Alentejo de onde era natural, foi colocado como pároco em Alfeizerão o Padre João de Matos Vieira. Acompanhava-o sua irmã Adília, senhora enérgica e empreendedora, que recuperou a receita do Pão-de-Ló, tendo transformado, em 1925, uma actividade doméstica em negócio, embora em moldes sempre artesanais. Abriu nessa altura a Casa do Pão-de-Ló de Alfeizerão que, rapidamente, se tornou ponto de paragem obrigatória para quem fazia a velha estrada de Lisboa-Porto. Actualmente, há mais estabelecimentos a confeccionarem e comercializarem este doce tradicional, mas a referência continua a ser a antiga Casa do Pão-de-Ló de Alfeizerão.

Ingredientes9 ovos inteiros; 3 claras; 250 g de açúcar; 1 casca de limão; 125 g de farinha; 1 cálice de aguardente; 1 pitada de canela.

PreparaçãoMisturam-se os ovos inteiros, as claras, a casca do limão e o açúcar, batendo tudo muito bem até a massa ficar esbranquiçada. Junta-se depois a farinha peneirada, a aguardente e a canela, envolvendo-se tudo Barra-se uma forma sem buraco com manteiga e polvilha-se com farinha. Retira-se a casca do limão e deita-se a massa na forma que vai ao forno a cozer cerca de 12 minutos, ficando o centro em creme, mas levemente cozido55.

Para acompanhar o Pão-de-Ló de Afeizerão, opte pelo vinho generoso de Carcavelos. Este vinho, já plantado no século XVIII pelo Marquês de Pombal, é hoje uma preciosidade e uma bebida que combina na perfeição com este bolo.

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SARDINHAS DOCESDA NAZARÉ

Este bolo é uma das imagens de marca da vila da Nazaré, cuja forma alongada pretende fazer lembrar um dos peixes que dá mais fama à actividade piscatória dos habitantes da povoação. Como acontece com a maioria dos petiscos regionais, também neste caso se desconhece a sua origem, mas dada a sua divulgação entre os naturais da vila, os veraneantes e os que só passam ocasionalmente pela Nazaré, encontra-se à venda em todas as pastelarias da povoação durante todo o ano.

IngredientesPara a massa: 500 g de farinha de trigo; 200 g de manteiga; 50 g de banha; sal q.b. Para o recheio: 8 gemas de ovos; 2 chávenas de chá de açúcar em ponto de espadana; 1 chávena de chá de doce de gila; açúcar em pó q.b.

PreparaçãoMisturam-se as gorduras às quais se adiciona a farinha, assim como o sal e a água necessária para formar uma massa que fique com a consistência da massa tenra .Estende-se a massa não muito fina e corta-se ao meio. Para o recheio, prepara-se a calda de açúcar em ponto espadana, que se deita em fio sobre as gemas, mexendo rapidamente. Leva-se ao lume e, quando começar a engrossar, junta-se o doce de gila escorrida do xarope. Leva-se de novo ao lume até voltar a ferver, retira-se do lume e deixa-se arrefecer. Numa das partes da massa tendida, dei-tam-se colherzinhas de recheio de ovos, um pouco espaçados. Cobre-se com a outra parte da massa e com a carretilha ou um molde recorta-se a massa com o formato de sardinhas. Vai ao forno. Servem-se envolvidas em açúcar em pó.

As Sardinhas Doces da Nazaré são uns bolos que apetece comer a qualquer hora e em qualquer lugar. Pode prová-los numa qualquer esplanada do Sítio da Nazaré ou subir-lhes o estatuto para sobremesa. Nesse caso, acompanhe-as com um cálice de vinho licoroso de Óbidos, da zona do Sanguinhal e do Bombarral.

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MIMOSOS DOBOMBARRAL

Bombarral é um centro vinícola, cujos vinhos de pasto e Iicorosos há muito alcançaram justa fama, o que fez sentir a necessidade de criar um doce regional compatível com os bons créditos dos seus vinhos, para os acompanhar em ocasiões especiais. Por isso, em 1920, foram lançados os Mimosos do Bombarral, a cuja confecção presidiu o maior escrúpulo, reunindo ingredientes de superior qualidade, para que resultasse um doce mimoso, que agradasse a todos aqueles que tivessem a dita de o saborear. Mas a história destes bolos começa antes desta data. Reza a tradição que a receita dos Mimosos do Bombarral terá nascido, não nesta vila, mas em Torres Vedras,como resultado do gosto pela doçaria de Maria da Conceição Jerónimo. A criadora deste doce, que faz hoje as delícias dos muitos apreciadores, terá oferecido a receita aos cunhados, Artur e Elvira Jerónimo, que viviam no Bombarral, e que, adivinhando o potencial de sucesso dos Mimosos, decidiram passar a confeccionar os bolos para fora e registaram a marca em 1920.

Actualmente, é já bastante conhecida e preferida esta especialidade de doce do Bombarral, por ser incontestavelmente a melhor e mais mimosa lembrança desta vila, fabricado somente com produtos naturais e isento de quaisquer corantes.

IngredientesAmêndoa ralada, açúcar, farinha, ovos.

PreparaçãoMisturam-se todos os ingredientes e deita-se a massa em formas pequenas, indo ao forno durante dez minutos.

Para acompanhar estas pequenas delícias, opte pelos vinhos licorosos da região do Sanguinhal e do Bombarral, já que a origem destes bolos assenta precisamente nesta combinação.

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PASTÉIS DEFEIJÃO

Nos finais do século XIX, em Torres Vedras vivia uma senhora de nome Joaquina Rodrigues, que confeccionava uns deliciosos Pastéis de Feijão, cuja receita ofereceu a uma sua parente, Maria Adelaide Rodrigues da Silva. O marido desta, Álvaro de Fontes Simões, vendo o sucesso que os pastéis faziam junto de familiares e amigos, decidiu explorar comercialmente estes doces. Assim nasceu a marca “Maria Adelaide Rodrigues da Silva”, cujo êxito se estendeu muito para além da região de Torres Vedras e levou muitas pastelarias da vila a também fabricarem e venderem este doce à base de feijão e amêndoa. Nos anos 40, um filho de Álvaro Simões, Virgílio Simões, montou uma fábrica especificamente destinada ao fabrico dos pastéis. Assim nasciam os muito conhecidos pastéis “Coroa”, que tornaram o Pastel de Feijão o doce típico de Torres Vedras, cujo processo de certificação já foi iniciado.

IngredientesPara a massa: 250 g farinha; 2 colheres de sopa de manteiga ou margarina; 1,5 dl de água; sal q.b. Para o recheio: 500 g de açúcar; 100 g de feijão branco cozido; 25 g de miolo de amêndoa; 6 ovos; 6 gemas de ovos; farinha; açúcar.

PreparaçãoDeita-se a farinha numa tigela, junta-se a manteiga derretida, uma pitada de sal e água. Trabalha-se bem até formar uma bola. Tapa-se a massa um pano seco, pondo-se sobre este um outro molhado e bem espre-mido. Deixa-se descansar a massa um pouco. Pelam-se as amêndoas e ralam-se. Passa-se o feijão pelo passador. Juntam-se as amêndoas ao puré de feijão e adicionam-se os ovos inteiros e as gemas passadas por um passador de rede. Leva-se o açúcar ao lume com um pouco de água e deixa-se ferver até atingir o ponto assoprado (150º C). Adiciona-se o xarope ao preparado de feijão, amêndoas e ovos e mistura-se bem. Enquanto o recheio arrefece, forram-se as for-mas de queques com a massa preparada e estendida bem fina. Enchem-se as formas com o recheio e pol-vilha-se com um pouco de farinha e açúcar em pó. Leva-se a cozer em forno quente, a 225º Cdurante cerca de 25 minutos56.

Estes pequenos bolos são deliciosos acompanha-dos por uma chávena de chá. Se preferir sofisticar o paladar, harmonize-os com um tradicional vinho generoso da zona de Carcavelos, bebida apreciada há séculos .

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BRUXAS DE ARRUDA

Histórias de santas milagrosas, de mouras encantadas, de bruxas, de gigantes, de lobisomens, povoam desde sempre o imaginário da vila de Arruda dos Vinhos. Mas se a maioria permanece apenas na tradição oral, a existência de bruxas é atestada pela memória dos mais velhos, que ainda hoje falam das ´´Bruxas da Arruda”. Sob esta designação identifica-se uma sucessão de mulheres da mesma família que teriam transmitido de mães para filhas os seus segredos acerca das propriedades curativas de certas plantas. Ignora-se quando terá tido início esta dinastia, mas presume-se que os seus conhecimentos terão sido herdados das últimas Comendadeiras da Ordem de Santiago, que eram parentes dos cavaleiros de Santiago, quando aquelas, no século XIII, abandonaram a quinta da Arruda, onde viviam reunidas por concessão de D. Afonso Henriques, para se instalar no mosteiro de Santos, em Lisboa. As primeiras bruxas seriam, certamente analfabetas, mas, mais próximo de nós, terão começado a consultar o “Livro de São Cipriano”, para aprofundar os seus conhecimentos. A primeira cujo nome é conhecido, Ana Lérias, da Aldeia das Neves, viveu no século XIX e conhecia bem as plantas características da zona da Arruda dos Vinhos, como a erva arruda, as malvas, as barbas de milho, a hortelã e as tádigas. Também ela legou os seus saberes a uma filha que, por sua vez, os transmitiu à geração seguinte, Adelaide Piedade Louro, como foi confirmado pelo seu próprio neto. Inspirado pelas personagens desta tradição, o senhor Ramalheira, proprietário da Pastelaria Flamingo, na Arruda dos Vinhos, criou um bolo a que deu o nome de “Bruxas da Arruda”.

IngredientesPara a massa: farinha; ovos; açúcar; óleo para amas-sar; nozes. Para o recheio - Creme de pasteleiro: 1/2 l de leite; 6 gemas de ovos; 1 chávena de açúcar; 3 colheres de sopa de farinha; baunilha: q.b. Para a decoração - Creme de chocolate: 1 pacote de natas; 1 tablete de chocolate de culinária

PreparaçãoAmassa-se a farinha com os ovos, o açúcar e o óleo. No final, adicionam-se as nozes. Divide-se e recor-ta-se a massa, em quadrados Para fazer o creme de pasteleiro, misturam-se as gemas com o açúcar, mexendo sempre. Acrescenta-se a farinha a pouco e pouco, sem deixar criar grumos. Junta-se o leite em fio e leva-se a lume muito baixo, sem parar de mexer. Quando o creme ficar espesso, retira-se do calor e deixa-se arrefecer. Junta-se um pouco de essência de baunilha. Recheia-se a massa com o creme de pasteleiro, Leva-se ao forno, a baixa temperatura e decora-se com o creme de chocolate. Para fazer o creme de chocolate levam-se as natas ao lume até ferver. Depois tiram-se do lume e coloca-se o choco-late partido aos bocados. Mexe-se até se obter um creme57.

Pode acompanhar as Bruxas de Arruda com o vinho generoso de Carcavelos ou com o vinho licoroso da região de Óbidos.

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UVADA

A Uvada é um doce que antigamente era confeccionado nas casas agrícolas produtoras de vinho da região Oeste, durante a época das vindimas, em Setembro e Outubro. A sua origem é desconhecida, mas sabe-se de um registo de 1939, realizado por Hipólito da Costa Cabaço, em resposta a um pedido da Câmara Municipal de Alenquer, segundo o qual, para fazer Uvada, podia juntar-se ao mosto “pêros, pêras, abóbora menina ou outros frutos, vai ao fôgo até ficar uma espécie de marmelada, junta-se-lhe cravos de cabecinha e canela em pau”. Não leva açúcar porque é feita com o mosto da uva concentrado, ou “arrobe”, nomeadamente das castas Fernão Pires e Periquita, ao qual se junta canela e fruta, em geral maçãs de varidades regionais, que seriam Repinaldo, Malápio e Bravo de Esmolfe, mas, com o desaparecimento quase completo destas variedades, utiliza-se actualmente a maçã Golden Delicious. A Uvada conserva-se de um ano para o outro e é consumida para barrar pão ou acompanhar frutos secos.

A recuperação da receita deste doce tradicional da região Oeste é da responsabilidade dos técnicos do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária.

IngredientesMosto de uvas tintas; maçãs ou outros frutos da época das vindimas, pau de canela e cravos de cabecinha

PreparaçãoNum tacho deita-se o mosto das uvas e as frutas previamente cortadas em bocados grosseiros e limpas de caroços. Põe-se o tacho ao lume e mexe-se sempre, para não pegar. Deixa-se ferver em lume brando até ter uma consistência de pasta grossa, o que se percebe arrastando a colher de pau no fundo do tacho e verificando se abre “estrada”, como se faz para a marmelada.

Coloca-se o doce em tijelas de barro vidrado e cobre-se com papel vegetal embebido em aguardente.

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As ambições de Napoleão Bonaparte eram muito claras quando em 1807 expediu as suas legiões para solo português. Aliado à coroa espanhola, pretendia dividir o reino de Portugal de modo a, indirectamen-te, atingir os interesses comerciais do Reino Unido. Com a estratégia montada e com o mapa do terri-tório luso riscado pelas linhas estabelecidas pelo Tratado de Fontainebleau, que o fragmentavam em três novas unidades políticas em benefício de Maria Luísa, filha de Carlos IV de Espanha, de Manuel de Godoy, seu primeiro-ministro, e do império francês, o general Jean-Andoche Junot, ao comando das tropas gaulesas, cruzou a fronteira portuguesa a 20 de Novembro. A fraca resistência que as hostes inva-soras encontraram no terreno permitiu que Lisboa caísse dez dias mais tarde.

Foi no início de Agosto de 1808 que as tropas inglesas, chefiadas por Sir Arthur Wellesley, futuro duque de Wellington, desembarcaram na Figueira da Foz para, juntamente com a resistência portuguesa, fazer frente às forças ocupantes. Informado do de-sembarque, Junot enviou o General Delaborde para impedir o avanço inimigo. O corpo expedicionário de Wellesley rumou para Sul e, no dia 16 de Agosto, perto da povoação da Roliça foram avistadas as primeiras tropas francesas.

Para preparar o confronto que se antevia, nesse dia o General Sir Arthur Wellesley comandante do exército luso-britânico, reuniu com os oficiais Generais que compunham o comando estratégico das forças

aliadas, numas instalações agrícolas cedidas, para o efeito, pelos proprietários. Pediu então à sua anfitriã que lhe confeccionasse o seu bolo preferido. Consta que o General, ao provar o bolo, terá exclamado que era o mais saboroso que jamais havia provado. Tal elogio deve-se, certamente, ao facto de os ingredien-tes serem produzidos nesta região do Bombarral, Oeste de Portugal, cujo microclima específico influi nas suas características, tornando-os únicos.

A Casa Agrícola J. Nicolau, à qual, há muitos anos, foi confiada esta receita por um descendente directo dos proprietários das instalações onde decorreu a célebre reunião, situadas perto da povoação da Roliça, tenta reproduzir artesanalmente e o melhor que sabe este maravilhoso bolo que, dados os factos, considera parte da história e do património cultural desta região.

Esta é uma receita registada, por essa razão só é possível referir os ingredientes utilizados: mel, ovos, manteiga, açúcar, farinha, cerejas, pêras, passas de uva, miolo de pinhão, miolo de noz, miolo de amên-doa, arrobe de uva, laranja, limão, vinhos licorosos, fermento de pão.

Produto Regional bOlO DOsGeNeRaIs

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Em 1992 foi criada a Região Demarcada de Aguardente Vínica de Qualidade com Denominação de Origem Controlada (DOC), Lourinhã, que abran-ge todo o concelho da Lourinhã e as freguesias limítrofes de Vale Covo (Bombarral), Serra d’el Rei e Atouguia da Baleia (Peniche), Campelos (Torres Vedras) e Olho Marinho (Óbidos).

Esta é a primeira e única Região Demarcada do País exclusivamente para a produção de Aguardentes, a que acresce o facto de ser uma das três existentes no espaço europeu, em posição de igualdade com as célebres aguardentes francesas das regiões de Cognac e de Armagnac.

A Aguardente DOC Lourinhã é produzida a partir de vinhos elaborados com uvas brancas e tintas das castas autorizadas e recomendadas, que são Alicante, Alvadurão, Broal Espinho, Marquinhas, Malvasia Rei (Seminário), Tália, Cercial, Fernão Pires, Rabo de Ovelha, Siria (Roupeiro), Seara Nova e Vital, nas brancas, e Cabinda, Carignan, Periquita e Tinta Miúda, nas tintas. Só recebem a menção DOC Lourinhã, atribuída pela Comissão Vitivinícola Regional de Lisboa, as aguardentes que respeitarem as condições de solo, as características de cultivo e as tecnologia de vinificação, conservação, destilação, envelhecimento e engarrafamento instituídas pela legislação.

Ao fim de um mês, o vinho segue para destilação. Em média, com 10 litros de vinho produz-se um litro

de aguardente. O envelhecimento efectua-se igual-mente na região, exclusivamente em barris de carva-lho e de castanho, com capacidade até 800 litros. A aguardente é normalmente branca e é o estágio nos cascos que a faz ganhar cor. Esta aguardente não pode ser comercializada antes de cumpridos vinte e quatro meses mínimos de envelhecimento, ainda que a média seja de sete anos. Ou seja, na Lourinhã só se faz aguardente X.O. com, pelo menos, cinco anos de envelhecimento, embora existam ainda as categorias V.S. com três e V.S.O.P. com quatro.

Em 2004, foi criada a Colegiada de Nossa Senhora da Anunciação da Lourinhã, que assume como principal objectivo a defesa, o prestígio, a valorização, a promoção e a divulgação da Aguardente Vínica da Região Demarcada da Lourinhã.

Recorde-se que, durante mais de 200 anos, as casas produtoras dos melhores Vinhos do Porto benefi-ciaram da Aguardente da Lourinhã para produzir os seus afamados vinhos licorosos.

Produto Regional aGUaRDeNTe DOClOURINhÃ

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Pensa-se que a ginja, também conhecida por cereja ácida, é procedente da Ásia Menor, sendo já comum em Portugal nos séculos XV e XVI. José Leite de Vasconcelos relata na sua obra “Etnografia Portuguesa” uma passagem de Ruy Fernandes, do século XVI, referindo as ginjas garrafais de Lamego, o que testemunha a sua presença nos hábitos alimentares dos portugueses por alturas do Renascimento. Este pequeno fruto redondo, de cor vermelha, com sabor agridoce, é produzido, em Portugal, essencialmente na região Oeste. As árvores, de nome ginjeiras, entram em produção ao fim do quarto ou quinto ano de plantação, alcançan-do a produção máxima entre o sétimo e o décimo ano, período em que, em pomares bem cuidados, os ginjais, podem ser colhidos 10 a 15 quilos de gin-jas por árvore. A floração da ginjeira, que no Oeste ocorre normalmente em Fevereiro, justifica passeios só para admirar as lindíssimas imagens proporcio-nadas pelas manchas de flores brancas. A colheita, realizada em Junho, durante cerca de vinte dias, deve ser manual e mantendo inteiro o pedúnculo do fruto. Como indicadores da melhor data para a colheita, podem ser utilizados dois critérios: a cor dos frutos, vermelha em toda a superfície, ou o seu nível de açúcar, medido por um refractómetro.

Alcobaça e Óbidos são as grandes referências geo-gráficas da produção de Licor de Ginja, ou Ginjinha, como também é conhecida esta bebida, que é já um atractivo turístico nos dois destinos da região Oeste, mas também na Baixa da cidade de Lisboa.

Este licor encontra a sua origem, provavelmente, na actividade doceira e licoreira dos conventos, no século XVII, e a sua popularidade e consequente comercialização estará relacionada, no caso de Óbidos, com o início do turismo nos anos 60 do século XX. Por iniciativa de um comerciante de nome Montez, propriatário de uma loja de antiguidades e velharias, foi inaugurado o primeiro bar na vila, o “Ibn Errik Rex”, ponto de encontro da classe abastada da região, que promoveu o Licor de Ginja a bebida da casa, com grande adesão por parte dos apreciadores. Rapidamente a oferta alargou-se a outros bares que, entretanto, abriram e passaram a competir entre si, em busca da «melhor Ginja».

Já em Alcobaça, surgiu na década de 20 do século passado o ainda hoje famoso Licor de Ginja M.S.R., a partir das iniciais do nome de Manuel de Sousa Ribeiro, seu criador. Esta variedade é comercializada numa peculiar garrafa de forma cónica, que foi dese-nhada no início da década de 30 do século passado, registando imediatamente um grande sucesso, o que constituiu um importante contributo promocional. Num folheto de promoção, a empresa destacava que esta Ginja é ”a melhor, por ser fabricada com a essência do próprio fruto”, o que leva a crer que, já na altura, se produziam licores de ginja com corantes.

De Alcobaça ou de Óbidos, «com ou sem elas», a Ginja do Oeste ganhou já um lugar de destaque entre as bebidas tradicionais portuguesas58.

Produto Regional lICOR De GINjaOU GINGINha

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A história agrícola da região de Alcobaça começa em 1154, com a doação, por D. Afonso Henriques, à Ordem de Claraval, das terras onde foi construído o Mosteiro de Santa Maria. Provavelmente, os primei-ros monges já teriam encontrado campos cultivados por populações autóctones, mas com pouco signifi-cado. Desde o início da sua instalação no Mosteiro, os monges de Cister terão reconhecido nas terras da região, situada entre a serra e o mar, condições atmosféricas óptimas para o cultivo de maçãs. Esta tradição de séculos fez com que Alcobaça ficasse co-nhecida como “terra de maçãs”, produto que impreg-nou a cultura das suas gentes. Curiosamente, a área ocupada pelos Coutos de Alcobaça é sensivelmente igual à que hoje se indica como delimitação para a produção da Maçã de Alcobaça.

Actualmente, a Maçã de Alcobaça é uma das riquezas da região e encontra-se sob Indicação Geográfica Protegida, que abrange cerca de catorze concelhos, mas a esta é a mais famosa das maçãs portuguesas incluídas nesta distinção. A existência de um sistema de controlo e certificação garante que só podem beneficiar do uso da IGP as maçãs obtidas em pomares para o efeito autorizados pela Associação dos Produtores da Maçã de Alcobaça (APMA), devendo os produtores obedecer a um con-junto de requisitos. Qualificada pela União Europeia e pelo Ministério da Agricultura em 1994, esta maçã possui características únicas, com um sabor agrido-ce e um aroma intenso. Apresenta-se nas variedades Royal Gala, Delicious, Jonagold, Fuji, Casanova de

Alcobaça, Golden Delicious, Granny Smith e Reineta Parda. A sua produção obedece a uma estratégia inovadora, racional e controlada, que permite me-lhorar a qualidade, proporcionar segurança alimen-tar e contribuir para o equilíbrio ecológico do meio ambiente. Assim, o combate às pragas e às doenças das árvores é feito através de meios de luta cultural, biotécnica e biológica, alternativos ao uso de pestici-das, respeitando o ciclo natural da vida, o ambiente e a saúde do consumidor.

A maçã é colhida normalmente entre os finais de Agosto e meados de Outubro e, para além dos habi-tuais processos de embalamento e de comercializa-ção da fruta, são várias as empresas da região que têm procurado inovar na oferta de maçã no mercado, criando novas formas de consumo deste produto, como sumos naturais, purés, maçã fatiada, compo-tas, tarte de maçã.

Produto Regional MaÇÃ DealCObaÇa

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De acordo com a tradição, foi em 1836 que Pedro António Rocha identificou, numa sua propriedade em Sintra, uma pereira diferente, cujos frutos eram de uma qualidade invulgar e aos quais deu a designação de Pêra Rocha, a partir do seu próprio nome. Como a região Oeste se mostrou particularmente apta para o seu cultivo, foi-lhe atribuída a Denominação de Origem Protegida (DOP), delimitando uma área geo-gráfica com um saber-fazer reconhecido, na qual se concentra a produção desta variedade de pêra. Aqui, destaca-se o concelho do Cadaval, com uma área de cultivo de 2073 hectares, e o do Bombarral, com uma área plantada de 1934 hectares. Pertence a esta região a responsabilidade de exportação de mais de 50000 toneladas de Pêra Rocha para toda a Europa, Canadá e Brasil. É colhida normalmente em Agosto.

Nas definições oficiais, a Pêra Rocha do Oeste é apresentada como um fruto de “polpa de côr branca, macia, fundente, granulosa, doce, não ácida, muito sucosa, de perfume ligeiramente acentuado e com a epiderme amarelo-clara, por vezes com uma mancha tenuemente rosada do lado do sol”.

Quando está mais verde, a Pêra Rocha é crocante. Quando está mais madura, adquire um tom amarela-do, tornando-se mais doce, macia e sumarenta.

Para além de consumida e muito apreciada como qualquer outra peça de fruta, a Pêra Rocha do Oeste também pode ser usada em saladas, pudins, compo-tas, iogurtes ou mesmo servir de acompanhamento

a diversos pratos salgados, nomeadamente de caça. No campo das sobremesas, as mais conhecidas são as chamadas «peras bêbedas», cozidas em calda açucarada, feita com os mais diversos tipos de vinho, que pode ser tinto, branco, Porto, Moscatel…

Para conservação, deve ser guardada no frigorífico, na prateleira inferior, dentro da gaveta de frutas e vegetais. Se o período de conservação for superior a dez dias, não se deve misturar com outros frutos, tais como bananas ou kiwis, porque acelera a maturação das outras frutas.

Produto Regional PÊRa ROCha

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A Serra de Montejunto foi a primeira área de pai-sagem protegida de âmbito regional em Portugal. Localiza-se no concelho do Cadaval, a norte do concelho de Alenquer. É um verdadeiro ecossiste-ma de montanha, que conserva ciosamente as suas lendas, como a crença em lobisomens, e as suas tradições, como a actividade ancestral da apicultura. A produção de mel na Serra já se encontra registada nas alcavalas dos forais que os povos de Montejunto tinham que pagar, o que permite calcular a importân-cia que o mel assumia na economia da região, a par dos cereais, do vinho e do gado.

Os apicultores da Serra de Montejunto dividem o terreno em Serra de Baixo e Serra de Cima. Durante o Inverno, em que os dias são mais curtos, mais frios e há mais vento, as abelhas que habitam as colmeias da Serra de Cima trabalham menos e a quantidade de Mel recolhida das plantas típicas do topo da serra, como o alecrim, é em menor quantidade.

Os pastos e as flores silvestres continuam a alimen-tar as abelhas, conferindo ao Mel cor, paladar, tex-turas e propriedades diferentes. Assim, ao longo do ano, na composição do Mel, registam-se variações na predominância de determinadas plantas que, sa-zonalmente, são polinizadas pelas abelhas. De Março a Maio é o alecrim que abunda, enquanto em Junho e Julho é a época das silvas com as amoras pretas, que contêm anti-oxidantes; de Agosto a Setembro predo-minam as tádigas e de Novembro a Março o eucalip-to, cujas propriedades, como o eucaliptol, ajudam a

descongestionar as vias respiratórias. Mas, em geral, a sua textura é líquida, de um castanho muito claro, entre o amarelo e o dourado.

O Mel foi utilizado como adoçante desde a Antiguidade, só começando a ser suplantado pelo açúcar no século XVI, com a introdução da cultura da cana-do-açúcar. Mas hoje em dia continua a ser apreciado, não apenas pela sua riqueza em termos nutricionais, mas também pela sua versatilidade na culinária e na doçaria.

Guardado fora do frigorífico e em locais sem humi-dade conserva-se durante muito tempo.

Produto Regional Mel DO MONTejUNTO

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Apesar de ser uma das principais imagens turísticas da Nazaré relacionadas com a vida dos pescadores e suas famílias, o peixe preparado ao ar e ao sol da praia é um produto pouco conhecido dos gastróno-mos em geral, sendo os nazarenos e os que habi-tualmente com eles convivem à mesa quem o sabe apreciar, pois os restaurantes apostam pouco na sua inclusão nas ementas.

A tradição de secar o pescado em excesso é de ori-gem desconhecida, mas antigamente seria a melhor maneira de conservar o peixe para os dias de es-cassez. Era desta forma que as peixeiras garantiam sustento para as famílias, num procedimento que também lhes permitia ter peixe para vender noutros mercados.

Na Nazaré, distinguem-se duas formas de seca-gem: o Peixe Seco e o Peixe Enjoado, com carate-rísticas de preparação e de consumo relativamente diferentes.

Começa-se por amanhar o peixe para lhe retirar as tripas. Depois, é lavado e passado por uma salmoura feita com água e sal grosso, ou com água do mar, como dantes se fazia. Seguidamente, é aberto ou escalado e, finalmente, estendido nos “paneiros” e posto ao sol. A secagem demora de dois a três dias, dependendo das condições atmosféricas e da tem-peratura do ar. Este tipo de peixe pode ser comido cru ou desfiado, mas, normalmente, é cozido, acom-panhado de batata cozida com pele e regado com azeite e vinagre ou sumo de limão e alho picado.

O Peixe Enjoado é preparado da mesma maneira, mas passa apenas um dia ao sol, ficando apenas meio seco ou enjoado. A espécie mais utilizada para esta secagem é o carapau de tamanho médio. Acompanha com batata cozida e é regado com azei-te e vinagre ou com uma cebolada.

É a sul da praia, quase em frente ao Centro Cultural da Nazaré, que se encontra o “estindarte”, ou seja, o estendal de secagem de pescado, onde as várias peixeiras secam e vendem directamente, tanto aos locais como aos visitantes, o peixe ali exposto.

O Peixe Seco tem um grande potencial gastronómi-co, podendo ser comido cru, cozido, com batatas às rodelas, sobre um refogado ou, melhor ainda, leve-mente aquecido nas brasas, temperado com azeite, vinagre e alho migado e comido sobre fatias de pão. Com este peixe, faz-se ainda um outro prato típico e muito apreciado na Nazaré, a Sopa de Carapaus Secos.

Produto Regional PeIXe seCOOU eNjOaDO

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1. Manuel P. das Neves, Sabores da Região Leiria-Fátima2 Fonte: Câmara Municipal de Torres Novas / restaurante Zé das Enguias, do Boquilobo3. Isabel Amado, Nas cozinhas das avós,19934. Fonte: Junta de Freguesia da Serra5. Manuel P. das Neves, Sabores da Região Leiria-Fátima6. Ana Soeiro (coord.), Produtos Tradicionais Portugueses7. Fonte: Câmara Municipal de Torres Novas8. Fonte: Adega do Cocharradas / J.F. do Cartaxo9. Fonte: Confraria da Gastronomia do Ribatejo10. Fonte: APRODER11. Fonte: Confraria Gastronómica do Ribatejo12. Felícia Costa; António José Costa e Silva, Rio Maior: Sabores da Terra13. Fonte: APRODER14. Fonte: Confraria da Gastronomia do Ribatejo15. Felícia Costa; António José Costa e Silva, Idem16. Fonte: Confraria da Gastronomia do Ribatejo17. Fonte: APRODER18. Fonte: Câmara Municipal da Azambuja19. Fonte: APRODER20. José Labaredas, Coruche à Mesa e Outros Manjares21. Fonte: Câmara Municipal de Almeirim / José Manuel Toucinho22. Fonte: Câmara Municipal de Salvaterra de Magos23. Augusto do Souto Barreiros, Azinhaga: Livro de Horas24. José Labaredas, Idem25. Fonte: Junta de Freguesia de Fazendas de Almeirim26. José Labaredas, Idem27. Fonte: Câmara Municipal de Alpiarça28. Fonte: Câmara Municipal de Salvaterra de Magos29. Fonte: Câmara Municipal de Palmela / Chefe Helder Martins30. Fonte: Câmara Municipal do Montijo31. Celeste Cavaleiro, Sabores da Costa Azul: Gastronomia de uma Região

32. Maré Cheia n.º 16 – Abril de 200533 Celeste Cavaleiro, Idem34. Celeste Cavaleiro, Idem35 Celeste Cavaleiro, Idem36. Maré Cheia n.º 8 – Agosto de 200437 Odília Costa Pina, Eu…A Culinária Tradicional de Alcochete, Apresento-me38 Celeste Cavaleiro, Idem39. Celeste Cavaleiro, Idem40. Celeste Cavaleiro, Idem41. Odília Costa Pina, Idem42. Maré Cheia n.º 5 – Maio de 200443. Fonte: Câmara Municipal de Sesimbra44. Celeste Cavaleiro, Idem45. Fonte: Câmara Municipal de Palmela (Lourdes Machado)46. Ana Soeiro (coord.), Idem 47. Fonte: Comissão Vitivinícola Regional da Península de Setúbal48. Fonte: Câmara Municipal da Nazaré49. Fonte: Câmara Municipal de Óbidos50. Fonte: Câmara Municipal de Peniche51. Receita criada pelo Chefe Luis Tarenta da Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste - Caldas da Rainha52. «101 receitas experimentadas» - MAM53. António Rosado Silva (chef Silva), Doçaria Conventual na Mostra de Alcobaça / Pastelaria Alcoa54. Casimiro de Almeida, Roteiro Cultural da Região de Alcobaça55. Maria de Lurdes Modesto, Cozinha Tradicional Portuguesa56. Fonte: Pastelaria Flamingo57. Paulo Moreiras, Justino Sobreiro e Gonçalo Lopes, O elogio da Ginja58. Fonte: Câmara Municipal da Nazaré

FONTES

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Associação para a Promoção Rural da Charneca Ribatejana

Em 9 de Agosto de 1994, na vila de Coruche, e por vontade de quatro associações fundadoras, foi lavrada a escritura de constituição da Associação para a Promoção Rural da Charneca Ribatejana, no sentido lato de um mais harmo-nioso e acelerado desenvolvimento rural.Hoje, um total de dezassete entidades colectivas constitui a nossa parceria numa mesma vontade de tudo fazer por um território de 3.029 km2 e com 117.785 habitantes (Censos de 2011).Desenvolvendo-se em 26 freguesias de sete concelhos - Almeirim, Alpiarça, Benavente, Chamusca, Coruche, Golegã e Salvaterra de Magos -, a nossa área de intervenção respondeu no LEADER + e, comparativamente com todas as outras, ao maior investimento privado de todo o território nacional.Notável por muitas razões, a Charneca Ribatejana impres-siona pelo modo como, a dois passos de Lisboa, manteve uma vincada identidade cultural e não se deixou asfixiar pelo abraço da grande cidade.Nem a estrutura empresarial e fortemente mecanizada das grandes explorações agrícolas conseguiu limitar e quebrar a fluidez dos grandes horizontes. O céu, a água e a terra convivem numa rara harmonia a que nem falta o fogo das forjas de ferrador para perfazer os quatro elementos essen-ciais à vida. A quem tivesse dúvidas sobre a autenticidade deste cenário, a naturalidade com que pastam em liberdade os touros bravos, os cavalos Lusitanos e, nalgumas zonas, os cavalos do Sorraia, diz tudo: este é o seu habitat.

Telefone: +351 243 619 060E-mail: [email protected]

Associação para o Desenvolvimento Rural da Península de Setúbal

A ADREPES é uma associação de direito privado, sem fins lucrativos, que tem como objectivo a promoção e a realiza-ção do desenvolvimento rural na Península de Setúbal.Foi fundada em 27 de Novembro de 2001 por um conjunto de onze entidades, públicas e privadas, representativas das populações e dos produtores locais, que se constituíram em Grupo de Acção Local (GAL) e, simultaneamente, também em núcleo fundador da ADREPES.A sua actividade tem decorrido no âmbito de diversos programas comunitários, merecendo destaque o EQUAL e o Leader +.Em outubro de 2008, com a aprovação da sua Estratégia Local de Desenvolvimento, foi-lhe atribuída a gestão do Eixo 3 do PRODER na Península de Setúbal.A Península de Setúbal está enquadrada por diversas áreas naturais classificadas: a Norte, pelo Estuário do Tejo, a Sul, pelo Estuário do Sado e pela Serra da Arrábida, a Oeste, pela Lagoa de Albufeira e a Este, por diversos Corredores Ecológicos que unem Canha à Marateca, estendendo-se na direcção de Sesimbra.A Zona de Intervenção da ADREPES abrange vinte e uma freguesias de seis concelhos da Península de Setúbal, com exclusão dos núcleos urbanos das freguesias de Pinhal Novo (Palmela) e N.ª Sr.ª da Anunciada (Setúbal).Concelhos: Alcochete, Moita, Montijo, Palmela, Sesimbra, Setúbal.

Telefone: + 351 212 337 930E-mail: [email protected]

Associação para o desenvolvimento integrado do Ribatejo Norte

A Associação para o Desenvolvimento Integrado do Ribatejo Norte foi constituída em 3 de Setembro de 1991 por dezanove entidades que assinaram a escritura pública desta associação. A ADIRN é uma entidade de direito pri-vado e sem fins lucrativos que, apoiada nos conhecimentos e experiência dos seus associados, desenvolve projectos e iniciativas que têm em vista o desenvolvimento integrado e a melhoria das condições de vida da população residente. A actividade da ADIRN tem-se direccionado essencial-mente para a gestão de programas de desenvolvimento local que privilegiam a área do turismo, a valorização dos produtos locais e do artesanato, a preservação ambiental, a acção social e a formação profissional.Serras rochosas, rios tranquilos, paisagens admiráveis e vales frondosos, vilas e cidades de encantar, monumen-tos preciosos – eis a região do Ribatejo Norte em todo o esplendor da sua beleza e contraste.Com as Serras D’Aire e Candeeiros a ladeá-la a ocidente, o tipicismo desta região revela-se em aldeias e cidades: de Dornes, em Ferreira do Zêzere, a Tomar, de Vila Nova da Barquinha a Alcanena, de Ourém a Fátima passando por Torres Novas, com igrejas antigas e com castelos misteriosos.

Telefone: +351 249 310 040E-mail: [email protected].

Associação para a Promoção do Desenvolvimento Rural do Ribatejo

A APRODER , constituída em Dezembro de 1991, de acordo com os seus Estatutos, tem como objectivo geral promover o território da sua zona de intervenção, especificamente: prestar assistência técnica; promover e executar acções de formação; divulgar informação; motivar e apoiar iniciativas tendentes à criação e ao desenvolvimento de pequenas e médias empresas, artesanato e serviços de apoio em zonas rurais; promover o turismo rural; fomentar a valorização e a certificação de produtos agrícolas, agro-alimentares, flo-restais e outros produtos tradicionais da região; constituir-se como entidade gestora do programa de Ligação Entre Acções de Desenvolvimento da Economia Rural, vulgo, Programa LEADER, e/ou outros programas de desenvolvi-mento de interesse para a região, nos termos dos mesmos.Com uma área de cerca de 1.250 Km2, o território de intervenção da APRODER insere-se na região normalmen-te designada por Ribatejo e é composto pelos concelhos de Azambuja, Cartaxo, Rio Maior e Santarém (excepto o núcleo urbano). Trata-se de um território de profunda matriz rural e de grande importância do sector agrícola, tendo em conta que apresenta condições de produtividade agrícola das mais elevadas do País. Em termos agro-florestais, assumem especial importância as fileiras do azeite, do vinho e da floresta. No campo do turismo, o território revela um grande potencial de atractividade turística, nomeadamente nas tradições ligadas ao toiro, ao cavalo e ao campino, que são elementos emblemáticos e identitários da região, e no vasto património existente.

Telefone: +351 243 333 869 E-mail: [email protected]

ASSOCIAÇÕES PROMOTORAS

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Leader Oeste Associação para o Desenvolvimento e Promoção Rural do Oeste

A Leader Oeste, associação privada sem fins lucrativos, foi criada em 1994 e tem como objecto social, resumida-mente, levar a cabo acções de dinamização no sentido do desenvolvimento local das freguesias mais rurais da região Oeste, com destaque para a implementação de projectos sociais, culturais e económicos que privilegiam os actores do meio local rural do Oeste.Regionalmente, a Leader Oeste distingue-se por ser gestora do programa Leader e, consequentemente, ser uma organização procurada pelos mais diversos agentes regionais pelo facto de apoiar financeiramente, e a fundo perdido, projectos que lhe sejam apresentados, elegíveis ao abrigo destas iniciativas da União Europeia. A associação tem um papel de serviço público que desempenha dentro de uma lógica funcional do associa-tivismo de direito privado, constituindo-se assim como uma organização diferente de outras organizações regio-nais, que, podendo ser de direito público, não possuem a mesma combinação de características. Os seus actuais 80 associados são todos pessoas colecti-vas com sede ou influência de acção na região. Indo ao encontro do seu objecto e tendo como base de operacio-nalidade os processos de desenvolvimento local onde a parceria é uma parte incontornável (Serafim, 1999), esta organização procura, desde da sua génese, ser represen-tativa dos diversos sectores sócio-económicos do Oeste.

Telefone: + 351 262 691 545E-mail: [email protected]

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Direcção do ProjectoAdirnAdrepesAproderCharneca RibatejanaLeader Oeste

Coordenação do ProjectoTake One

Selecção e recolha do receituárioAmilcar Malhó

TextoMaria Teresa Vieira PereiraJoana GonçalvesAmilcar Malhó

InvestigaçãoMaria Teresa Vieira PereiraJoana GonçalvesAmilcar MalhóIsabel AmadoPedro SampaioVanessa Godinho

Revisão do TextoMariana Sarmento PimentelMaria Isabel Baptista-Ferreira

Fotografia Espólio fotográfico de João Vieira Pereira

Fotografia e Arranjo dos PratosJoana GonçalvesAntónio Maria Gonçalves

IlustraçõesJoana Gonçalves

ProduçãoInês PérezAntónio Gonçalves

Execução CulináriaMarília Ana LeiteMaria Teresa PérezHelena SemedoDeolinda Loureiro de MatosMaria Luíza da Gama Santos

Cenografia e AcessóriosMaria Luíza da Gama SantosJoana GonçalvesMaria Teresa Vieira Pereira

Design Gráfico e PaginaçãoJoana GonçalvesPedro GonçalvesRita Féria

Pós-Produção FotográficaTake One

ImpressãoGIO Gabinete de lmpressão Offset, Lda.

Take One+351 216 086 [email protected]

Depósito Legal : 377772/14 ISBN: 978-989-98148-3-7

Impresso em Julho de 2014

FICHA TÉCNICA

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