os costumes indígenas na comunidade rio d’areia · uma dessas características pode ser a...
TRANSCRIPT
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
1
Os Costumes Indígenas na Comunidade Rio D’Areia
Carla Vanessa Pacheco (UNICENTRO – [email protected])
Ana Marcia Kaliberda (UNICENTRO – [email protected])
Eixo temático: Conhecimento Interdisciplinar
Resumo
Apesar da opressão e repressão vividas pelos povos indígenas, existem mais de 200 povos que resistiram
todo o processo. A reserva investigada é uma prova dessa resistência, esses povos lutam pela vida, pela
continuação de culturas e valores, identidades, manutenção de seus próprios modos de viver, formas de
organizar trabalhos, dividir bens, educarem os filhos, contar histórias de vida, praticar rituais, tomar decisões
sobre a vida coletiva. A história de vida compartilhada entre as pessoas torna evidente a interculturalidade,
constituindo a troca de saberes, o relato do cotidiano dos indivíduos fornece subsídios para resgatar
momentos distintos da comunidade. As práticas culturais desenvolvidas são uma maneira de preservar a
tradição do povo indígena, também a construção do vínculo de pertencimento ao grupo. A Diversidade
Cultural implica uma afirmação do indivíduo como ser histórico, que se manifesta nos espaços das
diferentes culturas. Palavras-chave: Índios Guaranis, Cultura, Educação.
1. INTRODUÇÃO
Comunidade implica a convivência em grupo, segundo crenças, costumes, interesses, conhecimentos
e princípios comuns. Uma dessas características pode ser a cultura, em que os grupos possam conviver em
um contexto de troca de experiências por eles vividas. Dessa forma, ao participar de um determinado grupo
social, o ser humano está se afirmando como indivíduo ao passo que reafirma seus interesses pessoais.
Assim, o individualismo contribui para a formação do ambiente social, uma vez que as pessoas tendem a se
agrupar por características comuns.
“A comunidade é uma unidade estruturada, organizada, de grupos, dispondo de uma hierarquia homogênea de valores e à qual o indivíduo pertence necessariamente; essa necessidade pode
decorrer do fato de se “estar lançado” nela ao nascer, [...] ou de uma escolha relativamente
autônoma do indivíduo já desenvolvido” (HELLER, 1970, p. 70-71).
Assim, esses indivíduos agrupados passam a atuar civicamente de acordo com seus preceitos
culturais, econômicos, religiosos e sócio-ambientais. A cultura é uma condição para que o indivíduo sinta-se
humano, “cultura é o conjunto de conhecimentos, de valores, de crenças, de idéias e de práticas de um grupo
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
2
social, ou de um povo, ou de uma época.” (BESSA, 2008, p.21). Assim, essa convivência com os mesmos
princípios culturais, o homem está se afirmando como indivíduo ao passo que reafirma seus interesses
pessoais.
A história é testemunha de que várias tragédias ocasionadas na vida dos povos originários dessas
terras: escravidão, guerras, doenças, massacres, genocídios, etnocídios e outros males. Esses acontecimentos
se deram pelos colonizadores. Não que os índios não conhecessem esses sofrimentos, mas a diferença era o
propósito, esses colonizadores tinham como projeto ambicioso a dominação cultural, econômica, política e
militar, sendo que os índios, na sua ingenuidade, não conseguiram entender essas disputas como projeto
político civilizatório, de caráter mundial e centralizador, pois tinham experiências de conflitos territoriais
intertribais e interlocais (LUCIANO, 2006).
Apesar da opressão e repressão vividas, existem mais de 200 povos indígenas que resistiram a todo o
processo (LUCIANO, 2006), sendo que ainda lutam pela vida, pela continuação de culturas e valores,
identidades, manutenção de seus próprios modos de viver, formas de organizar trabalhos, dividir bens,
educarem os filhos, contar histórias de vida, praticar rituais e tomar decisões sobre a vida coletiva.
A Reserva Indígena Aldeia de Rio d’ Areia, localizada no interior de Inácio Martins, é constitu ída
por índios guaranis, sendo que também é moradora dessa Aldeia uma índia (78 anos de idade) da etnia Xetá,
que são poucos os sobreviventes que moram no Paraná. Esses povos indígenas brasileiros compreendem
diferentes grupos étnicos, segundo a FUNAI (2004), muitos deles com laços culturais e territórios que
adentram os países vizinhos. De diferentes raízes indígenas, eles falam centenas de línguas diferentes, além
de terem cultura material e espiritual diversificadas. Devido aos massacres e escravização, muitas etnias
desapareceram.
De acordo com a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), as tribos mais ameaçadas de extinção são os
Xetá, do Paraná (restam apenas seis indivíduos), o Juma (do Amazonas, existem sete), e os Avá Canoeiro
(dez, mas somente seis foram contatados). Mais de dez mil grupos étnicos já foram extintos do Brasil
(BUENO, 2003).
A influência de nossa sociedade levou não só a miscigenação, como também ao desaparecimento ou
enfraquecimento de suas crenças religiosas e tradições culturais. Hoje muitos dos diferentes grupos étnicos
sobrevivem em meio à miséria, doenças, problemas territoriais e discriminação social (BUENO, 2003).
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para o desenvolvimento desta investigação visitamos a Reserva Indígena Rio D’ Areia, localizada
no interior do Município de Inácio Martins, composta por 23 famílias, totalizando em média 100 índios, com
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
3
predominância da etnia Guarani, porém reside na aldeia uma índia da etnia Xetá, a qual é casada com um
Índio Paraguaio, recebendo influências dos costumes Guaranis.
A metodologia usada foi pesquisa qualitativa, na qual, o pesquisador deve ser flexível para novas
indagações. “Na pesquisa qualitativa, diferentemente da quantitativa, o grupo não é uma soma de indivíduos,
mas um espaço de reflexão coletiva que necessita da subjetividade grupal.” (GONZALEZ; 2005; P. 86).
A pesquisa qualitativa abre espaço para o pesquisador compreender o objeto de pesquisa no contexto
em que está inserido. O objeto analisado demonstra claramente a representação social no contexto
intercultural.
Utilizamos a observação participante, com registros no caderno de campo, observando situações em
conjunto com o Outro, procurando entender um contexto sem modificá-lo.
“Definimos observação participante como um processo pelo qual mantêm-se a presença do
observador numa situação social, com a finalidade de realizar uma investigação científica. O
observador está em relação face a face com observados e, ao participar da vida deles, no seu
cenário cultural, colhe dados” (MINAYO, 2004, p. 135).
Segundo Minayo (2004), toda sociedade e sua estrutura encontra-se incorporada no mais evasivo de
todos os materiais: o ser humano.
“Há uma série de fenômenos de grande importância que não podem ser registrados através de
perguntas, ou em documentos quantitativos, mas devem ser observados em sua realidade.
Denominemo - los os “imponderáveis da vida real”. Entre eles incluem como a rotina de um
dia de trabalho, os detalhes do cuidado com o corpo, de maneira de comer, de preparar as refeições, o tom das conversas da vida social ao redor das casas da aldeia, a existência de
grandes amizades e hostilidades e simpatias e antipatias passageiras entre pessoas; a maneira
sutil, mas inquestionável em que as vaidades e ambições pessoais se refletem no
comportamento dos indivíduos e nas reações emocionais dos que o rodeiam” (MINAYO,
2004).
Faz-se necessário observar o aspecto legal e o aspecto íntimo das relações sociais; ao lado das
tradições e costumes, o tom e a importância que lhe são atribuídos; as idéias, os motivos e os sentimentos do
grupo na compreensão da totalidade de sua vida, verbalizados por eles próprios, através de suas categorias
de pensamentos.
Nessa perspectiva, não há preocupação com a quantidade de sujeitos participantes da pesquisa, visto
que busca discutir, compreender o cotidiano dos indivíduos estudados, e não formular uma lei geral (PINO,
2005).
No presente trabalho optou-se como meio de recolhimento de informações, as conversas e as
entrevistas informais, sendo “toda a observação participante, e resultado da interação existente entre
observador e observado” (PINO, 2005).
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
4
Optamos por uma conversa informal, deixando os índios à vontade para nos contar sobre o que
queriam, porém levantando as questões de cultura, costumes, crenças, educação, no decorrer das conversas.
Buscamos na análise do conteúdo, pressupostos e aportes teóricos para a presente pesquisa, pois,
segundo Minayo (2004), trata-se da técnica de pesquisa para descrição objetiva, sistemática e quantitativa do
conteúdo manifesto das comunicações e tendo por fim interpretá-la.
“Do ponto de vista operacional, a análise do conteúdo parte de uma literatura de primeiro
plano para atingir um nível mais aprofundado: aquele que ultrapassa os significados
manifestos. Para isso a análise do conteúdo em termos gerais relaciona estruturas semânticas
(significantes) com estruturas sociológicas (significados) dos enunciados. Articula a superfície
dos textos descrita e analisa com os fatores que determinam suas caracteristicas: variáveis psicosociais, contexto cultural, contexto e processos de produção da mensagem” (Minayo,
2004, p. 203).
A análise leva-nos a entender que iremos colocar diferentes pontos de vista, permitindo ainda que,
outros modos de olhar sejam apresentados, e não buscar verdades absolutas, nem mesmo procurar
objetividades onde é lugar das subjetividades. É o lugar das significações.
3. DISCUSSÕES
A educação é uma pratica social onde o ser humano se apropria do conhecimento, para a construção
de valores com o objetivo de socializa-se. A educação acontece em todos os lugares, começando no meio
familiar onde o indivíduo está inserido. É um processo contínuo que acontece todo o tempo desde que
nascemos e se estende por toda a vida, transformando continuamente a visão de mundo.
O educar ocorre, portanto, todo o tempo e de maneira recíproca. Ocorre como uma
transformação estrutural contingente com uma história no conviver, e o resultado disso é que
as pessoas aprendem a viver de uma maneira que se configura de acordo com o conviver da
comunidade em que vivem. (MATURAMA; 2002; p. 29.)
A educação acontece em todos os espaços em que o ser humano está se relacionando com o outro, na
casa, no trabalho, na igreja etc. Essa relação leva o individuo a viver de forma democrática e interativa,
proporciona a capacidade de se adaptar à realidade. Entre os valores investigados, vamos elencar o
aprendizado informal que é transmitido de geração em geração na comunidade guarani. A história de vida
compartilhada entre as pessoas torna evidente a interculturalidade, constituindo a troca de saberes, o relato
do cotidiano dos indivíduos fornece subsídios para resgatar momentos distintos da comunidade. “A história
oral é dispositivo importante para os debates sobre questões teórico-práticas que transversalizam a educaçăo
popular com a problemática da comunidade como práxis intercultural”. (OSÓRIO; 2010, p. 02).
Dentre as práticas sociais desenvolvidas na comunidade, as crianças participam de forma ativa da
maior parte das atividades, podemos elencar a “casa de reza”, os índios mais velhos fazem questão que os
mais jovens aprendam e cultuem os ensinamentos transmitidos pelo “pajé”. O pajé é o líder religioso dentro
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
5
da aldeia, é muito respeitado. A casa de reza é um lugar para “falar com Deus (Nhanderu),” não tem hora
certa para começar ou terminar.
As práticas culturais desenvolvidas são vistas como maneiras de preservar a tradição do povo
indígena, também a construção do vínculo de pertencimento ao grupo. “A visão da Diversidade Cultural e da
interculturalidade implicará numa qualidade da afirmação do ser humano como ser histórico, que se
manifesta nos espaços e etapas das diferentes culturas.” (SIDEkUM; 2004, p. 10).
Dentro da aldeia se instalou uma igreja evangélica, “Assembléia de Deus” os indígenas estão
divididos a respeito da igreja, alguns criticam, outros vêem de forma positiva, conforme o depoimento do
indivíduo I, “acho interessante” segundo ele as crianças aprendem os dois, os cultos da casa de reza e os
cultos evangélicos, com intuito de acolher mais fiéis, os cânticos foi traduzido para o guarani. A cultura é
uma das características agrupante na comunidade.
Os mais velhos transmitem certo saudosismo referente aos costumes e hábitos, segundo os mesmos,
os costumes estão se perdendo, relata uma senhora: antigamente saía com os filhos no “congote e outro no
tiracolo” e ia pro mato colher palmito e mel, fazia bolo na cinza, (massa de trigo com água, amassava e
assava na cinza, depois de assado lavava e colocava no sol para secar, comiam com mel), plantavam milho e
faziam “biju” e “canjica” no pilão, plantavam mandioca para comer assada, também caçavam com laço e
“mondé” (uma espécie de armadilha para caçar). Salienta satisfeita, “hoje meu neto sabe fazer monde”,
comenta que atualmente vem tudo pronto, abre o pacote e faz, mas eu tenho saudades, sempre faço canjica
no pilão.
As crianças aprendem a língua materna guarani convivendo com familiares, situação que permite a
preservação da cultura étnica na comunidade. A língua é um recurso utilizado pelos indígenas para
transmitir o conhecimento aos mais jovens, “fortalecer as práticas sócio-culturais e a língua materna de cada
comunidade indígena; ”(Art. 79 Título VIII da LDB/96; Inciso I). A prática da linguagem oral (Guarani) é
muito utilizada por estes índios.
“Os conhecimento dos Guaranis sempre foram transmitidos oralmente, ao contrário dos
Astecas e Maias, do México e da Guatemala, que tinham escrita. Todas as sociedades
indígenas que habitavam no século XVI o território que hoje é o Brasil eram sociedades
ágrafas, isto é, sem escrita, em que os conhecimentos e experiências de cada povo eram
armazenadas na memória humana e transmitidos de uma geração a outra pela tradição oral.”
(SEED; 2006, p. 40).
A linguagem constitui o ser humano, é através da linguagem que nos constituímos e expressamos
nossos sentimentos pensamentos etc. é uma forma de significar uma situação do cotidiano, “além dessa
capacidade biológica, a linguagem é um sistema simbólico: um conjunto de signos combinados e usados
segundo regras. Esse sistema simbólico é criado culturalmente.” (BESSA; 2008 p. 35). O povo guarani
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
6
mantém sua tradição, usando a comunicação oral como fonte para transmitir seu conhecimento cultural aos
mais novos.
A tecnologia está presente em muitas comunidades, trazendo novos padrões de comportamento e
influenciando os modos de ser e de viver. A mídia pode contribuir muito na criação de uma consciência
social de respeito à diversidade, sem homogeneizar as diferentes tradições, sem tratar os povos como se
fossem únicos e iguais. Portanto, reduzir a cultura indígena a uma só cultura é uma redução perigosa que
compromete o passado, presente e futuro. Todo tipo de mídia tem um dever cívico de promover as diversas
culturas (MUNDURUKU, 2007).
A influência da tecnologia é tão forte na aldeia quanto na casa de qualquer outro cidadão. Nas tribos,
os padrões de comportamento veiculados pelas mídias afetam, muitas vezes, o modelo de ser dos índios,
principalmente dos jovens que acabam questionando suas tradições e identidades. A mídia traz desejos e
anseios que, na prática, não fazem parte do nosso cotidiano. Ela traz também o barulho da cidade
(MUNDURUKU, 2007). Os padrões de comportamento que chegam até eles, através da televisão, rádio e
internet, geram conflitos internos, questionamentos e incertezas.
A Cultura Guarani é predominantemente masculina, essa característica pode ser observada aos fatos
de que as lideranças, tanto políticas quanto religiosas são ocupadas por homens (SCHADEN, 1969). As
mulheres indígenas das aldeias têm preferido participar e somar forças na luta junto ao marido, filhos e
irmãos. Isto talvez porque as mulheres das aldeias não estão preocupadas em criar espaços de poder além
daqueles já existentes (LUCIANO, 2006).
Entretanto, na Aldeia estudada pela presente pesquisa, há uma valorização da mulher na comunidade,
pois ela tornou-se guardiã da cultura e dos conhecimentos tradicionais e ao mesmo tempo uma importante
interlocutora com o mundo não-índio. Este papel da mulher indígena não era exercido anteriormente, hoje,
ela tornou-se responsável pela preservação da tradição Guarani. Assim, a idéia machista, que confere à
mulher um papel inferior, tornou-se errônea nesta aldeia. A comunidade necessita de homens e mulheres
desempenhando suas funções em atividades diversas, porém igualmente valorizadas. Todavia, as decisões e
problemas da aldeia são resolvidos pelos conselheiros (líderes), composto apenas por homens. O cacique,
também é sempre um homem. Mas isso não impede que as mulheres exerçam um papel influente nas
decisões, isso acontece em conversas cotidianas, nos encontros casuais, portanto elas são fortemente
envolvidas nas decisões na comunidade.
Os povos indígenas são altamente organizados, suas organizações sociais seguem princípios e
orientações cosmológicas e ancestrais fortemente marcadas por funções de subgrupos sociais, como pajés,
clãs etc. Estes possuem funções primordiais para a existência do grupo como tal, ou seja, culturalmente e
etnicamente distinto dos outros.
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
7
Segundo Amantino (2001), no momento em que uma índia sentia aproximar-se à hora do parto,
recolhia-se para o mato e só voltava de lá depois que tomava banho e limpava a criança. Além disso,
passavam algumas ervas no corpo do recém-nascido para que ele tivesse resistência ao frio. Esse costume
tornou-se enfraquecido devido à influência dos homens brancos, os hospitais e serviços de atendimento à
saúde, sendo que as índias mais velhas relatavam que tiveram seus filhos e filhas no mato, mas que seus
netos nasceram em hospitais.
Segundo Bueno (2003), a terra para o Guarani, não é um simples meio de produção, mas sim um
espaço sociopolítico. Assim a terra é concebida por esse povo como lugar onde se dão as condições e
possibilidades de modo de ser Guarani. Nesse lugar circulam crenças, normas e valores, podendo absorver
valores novos, desde que não agridam elementos básicos da própria cultura.
A desintegração cotidiana do sistema de relações entre homens e mulheres, entre pais e filhos, com
os adultos em número crescente trabalhando fora das aldeias e para os brancos, sugere um efeito crescente
de desintegração da vida religiosa guarani, que cinco séculos anteriores de catequese não conseguiram
abalar. O prestígio do indivíduo decorre de seu papel nas danças e festas pelas quais se estabelece
comunicação coletiva com o Além, e com antepassados falecidos. Mas tão logo o índio, no afã de obter
umas tantas coisas que antes não conhecia e agora lhe parecem indispensáveis, seja colhido pelas malhas da
economia regional, começa a entrar em jogo também o ideal da eficiência econômica e o da posse de valores
materiais (BUENO, 2003).
4. PALAVRAS FINAIS
O ser humano vive em constante aprendizado interagindo com o outro, produzindo o modo de viver
na sociedade. A educação informal é um exemplo da construção do ser humano convivendo com outros
seres, nessa convivência acontece uma troca de saberes e conseqüentemente a formação cultural. Na
comunidade indígena Rio D’ Areia a cultura se estabelece através dessa transferência de saberes dos mais
velhos para os jovens, com o intuito de preservar sua identidade e seus conhecimentos. As diferentes
culturas revertem em uma reflexão do indivíduo quanto um ser social, pois ele está em constante
transformação, na medida em que evolui muda a forma de pensar.
É necessário estudar a cultura e a arte dos indígenas nas escolas, com respaldo na LDB (Lei de
Diretrizes e Bases da Educação). “Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos
indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo currículo escolar, em especial nas áreas de
educação artística e de literatura e histórias brasileiras (Lei, 9.394/96, Art. 26-A, § 2º); assim poderemos
contribuir na preservação do povo indígena levando ao conhecimento, esse modo peculiar de costumes. O
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
8
processo da investigação ficou evidente as características do povo guarani, com política, conceito de vida
etc. sendo complacente na investigação individual.
A escola é uma instituição social com o objetivo explicito de desenvolver as potencialidades físicas,
cognitivas dos indivíduos, por meio das aprendizagens dos conteúdos sistematizados, sua tarefa é educar
para a cidadania, o espaço onde a educação acontece num sentido amplo. A inserção do aluno índio na
escola regular faz com que aconteça uma troca de culturas, no sentido dos indivíduos dar e receber formas
diferentes de pensar e agir. Nesse contexto a investigação exploratória será muito relevante, pois são duas
formas distintas de costumes.
A oportunidade dessa vivência na Reserva Indígena de Rio d’ Areia foi de grande valia, pois
permite-nos refletir o humano, o indivíduo, os valores, os significados, as defesas e batalhas para poder se
expressar diante de uma sociedade excludente e revogável perante as múltiplas culturas. Esses povos são
persistentes no desejo de manter autônoma a cultura da tribo, mas inevitavelmente inserido, embora muitas
vezes não reconhecido, integrados na sociedade.
Neste contexto, “a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é interpelado ou
representado...” (HALL, 2000, p.21). Vivemos num contexto em que os sistemas de significação e
representação cultural são múltiplos, produzindo identidades. Observa-se que as identidades são
contraditórias, se cruzando ou se deslocando mutuamente e que não há uma identidade exclusiva que
unifique os interesses.
Referências Bibliográficas
AMANTINO. M. História do corpo no Brasil. Ed. UNESP. São Paulo. 2011.
BESSA, D. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Homem Pensamento e Cultura. U. B. 3ª
ED. 92 p. Brasília, 2008.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. (LDB) Lei de Diretrizes e Bases. Brasília: Congresso
Nacional, dezembro, 1996.
BUENO, E. Brasil: uma História. A incrível saga de um país. Editora Ática, São Paulo. 2003.
CUNHA, M. C. História dos Índios no Brasil. Companhia das Letras, São Paulo. 2006.
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
9
FORNET-BETANCOURT, R. Interculturalidade, críticas, diálogos e perspectivas. São Leopoldo: Nova
Harmonia, 2004.
GONZÁLEZ, R. F. Pesquisa qualitativa e subjetividade: os processos de informação. Pioneira Thomson
Learning. São Paulo. 2005.
HALL. S. A identidade cultural na Pós – Modernidade. Editora DP&A. 11ª edição. 1ª reimpressão. 2011.
HELLER, A. Indivíduo e Comunidade. Editora Paz e Terra S/A São Paulo SP, 2004.
LUCIANO, G. O Índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje.
Brasília: Ministério da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. 2006.
MATURAMA, R., H. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: Ed UFMG, 1998.
MENEZES, M. M. Nos interstícios da cultura: as contribuições da filosofia intercultural. Revista
Educação, Porto Alegre, v. 34, n. 3, p. 324-329, set./dez. 2011.
MINAYO; M. C. S. O Desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde, 8 ed. São Paulo: Hucitec,
2004.
MORESI, E. Metodologia da Pesquisa. Programa de Pós-graduação stricto sensu em gestão do
conhecimento e da tecnologia da informação da Universidade Católia, Brasília, 2003.
MUNDURUKU. A influência da mídia nas Aldeias. Acessado em jun/2013. Disponível em:
http://www.direitoacomunicacao.org.br/content.php?option=com_content&task=view&id=428.
OSÓRIO, L. Perspectivas da Pesquisa Bibliográfica e seus Entrelaçamentos com a educação Popular e a
História: Comunidade, Interculturalidade, Histórias Orais de vida em comum, Universidade do Estado do
Rio de Janeiro, 2010. http://www.encontro2010.historiaoral.org.br, acesso em junho/2013.
Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino, na
Pesquisa e na Extensão – Região Sul
10
OZÓRIO, L. A interculturalidade e seus inúmeros começos comunitários. Revista Psicologia e Sociedade.
2005.
PARANÁ; Educação Escolar Indígena/Secretaria do Estado da Educação. Superintendência de Educação.
Departamento de Ensino Fundamental. Coordenação da Educação Escolar Indígena – Curitiba: SEED – Pr.
2006 – 88 p. (Cadernos Temáticos).
PINO, A. As marcas do humano: as origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev S.
Vigotski. São Paulo: Cortez, 2005.
SANTOS; Jorge. Filosofias em La aldea multietnica? Buenos Aires, Argentina. 2010.
SERRES, M. Le Thiers-instruit. Paris: François Bourin. (Também consultada: O Terceiro Instruído. Lisboa:
Ed. Instituto Piaget, 1993).
SIDEKUM, Antonio. Desafios para a filosofia intercultural: Cultura e poder. Disponível
em:<http://www.corredordelasideas.org/docs/set_04/antonio_sidekum.doc> Acessado em abr/2013.