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Universidade Estadual de Maringá – UEM Maringá-PR, 9, 10 e 11 de junho de 2010 – ANAIS - ISSN 2177-6350 _________________________________________________________________________________________________________

MARCAS DA ORALIDADE NA ESCRITA: UM ESTUDO DE TEXTOS DE

FALANTES ESCOLARIZADOS DE LÍNGUA PORTUGUESA1

Tatiana Fasolo Bilhar Fedumenti (G-Unioeste)

2

Ruth Ceccon Barreiros (Unioeste)

3

1 Artigo produzido como trabalho de conclusão da disciplina de História e Formação da Língua Portuguesa, no 1º ano do Curso de Letras em 2009, sob orientação da professora Ruth Ceccon Barreiros. Tratou-se de pesquisa, na qual também participaram as acadêmicas Ediandra de Borba, Kellyn Suzane Cunha Rengel de Freitas, Luana Garbin Baldissera, Poliana Sella Lopes e Raquel Jurkevicz. 2 Acadêmica do Curso de Letras, Unioeste, Campus Cascavel. 3 Docente do Curso de Letras, Unioeste – Campus Cascavel.

Introdução

Muitos alunos, ao término do Ensino Médio, em situação de produção textual em que

se exige a língua escrita padrão culta, como nas redações de vestibular, escrevem seus

textos sob a influência da língua falada, e com isso passam a ser alvos de críticas

daqueles que lidam com tais produções. No início dos estudos linguísticos entendia-se

que fala e escrita eram absolutamente diferentes, quase como se caracterizassem dois

sistemas linguísticos opostos. A fala constituiria um “vale-tudo” no uso da língua,

enquanto a escrita se caracterizaria pelo bom uso do idioma e, em função disso deveria

seguir as regras prescritas na gramática normativa.

Uma nova visão dessa concepção ganha espaço entre os pesquisadores, como

Marcuschi (2001), Bagno (2007) e Leite (2000), em uma perspectiva de que língua

escrita e falada se complementam, assim, alguns casos dos chamados “erros mais

comuns de português” podem constituir-se em inovações da língua presentes na

oralidade, mas ainda não reconhecida na língua escrita. Tais inovações seriam

delineadas na fala e depois passariam a ser considerada na escrita.

Dessa forma, entende-se que, sendo as mudanças inerentes a qualquer idioma em

uso, nem mesmo os vários anos de estudos em uma concepção tradicional (que pauta o

ensino da língua portuguesa apenas na norma padrão, na gramática), são suficientes para

apagar os traços da oralidade nos textos escritos dos estudantes.

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Assim, essa pesquisa teve como objetivo verificar a presença de marcas da oralidade

em textos escritos por pessoas que já concluíram o ensino médio, refletindo sobre se

essas marcas apontam para possíveis mudanças na língua portuguesa. Para tal, além de

pesquisa bibliográfica sobre o assunto, realizou-se a análise de dez redações do

vestibular 2009 da Universidade Estadual do Paraná – UNIOESTE.

1. Fala versus Escrita?

Há no ensino tradicional de língua portuguesa a perspectiva de que escrita e fala são

dicotômicas. A fala é vista, conforme Bagno como espontânea e, portanto, “caótica, sem

regras, ilógica” (2007, p.68). A escrita é tida como planejada, monitorada “mais

homogênea e invariável” (BAGNO, 2007, p.100). Assim, confere-se à escrita um status

elevado que, de acordo com Marcuschi (2001), simboliza educação, desenvolvimento e

poder.

Essa concepção de fala e escrita preconiza a ideia de que a variação lingüística é

possível na fala (considerada de menor prestígio), mas dificilmente aceita na escrita.

Nesse sentido, Perini assevera, “(...) há duas línguas no Brasil: uma que se escreve (e

que recebe o nome de ‘português’); e outra que se fala (e que é tão desprezada que nem

tem nome)” (PERINI, apud BAGNO, 2007, p.100).

O ensino tradicional sempre primou pelo ensino da língua em sua modalidade padrão

escrita, desconsiderando o aspecto da oralidade, tomando como recurso de ensino e

aprendizagem os textos literários, que serviam de base “para o modelo do ‘bom uso’ do

idioma” (BAGNO, 2007, p.68). Nesse contexto, não se admitiam as inovações

linguísticas. A língua concebida como imutável e estanque devia estar sempre de acordo

com as normas prescritas pela gramática. Disso resultou que, a correção da produção

textual dos alunos, era focada muito mais na identificação dos “erros” em relação à

gramática, em detrimento do conteúdo ali apresentado. Embora, esses procedimentos

ainda se apresentam em muitas salas de aula, os estudos linguísticos e socilinguísticos

têm contribuído para desconstruir essa visão de ensino da língua.

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Conforme Marcuschi (2001), a partir da década de 1980, e decorrentes dos estudos

linguísticos, uma mudança na visão sobre fala e escrita aconteceu. Ambas passaram a

ser vistas como modalidades de uso da língua e práticas sociais de igual valor.

Oralidade e escrita são práticas e usos da língua com características próprias, mas não suficientemente opostas para caracterizar dois sistemas lingüísticos nem uma dicotomia. Ambas permitem a construção de textos coesos e coerentes, ambas permitem a elaboração de raciocínios abstratos e exposições formais e informais, variações estilísticas, sociais, dialetais e assim por diante. (MARCUSCHI, 2001, p.17)

A escrita é tão heterogênea quanto à fala. As duas representam usos da língua,

simbolizam relações de poder e possibilitam a organização social e a comunicação

interpessoal. Assim, de acordo com Marcuschi, “não se pode afirmar que a fala é

superior à escrita ou vice-versa”. (2001, p.35).

2. Variações Linguísticas e Ensino

A mudança na concepção de oralidade e escrita possibilitou a delineação de

mudanças no ensino de língua portuguesa (embora nem sempre tais mudanças ocorram

efetivamente nas salas de aula). Hoje, tanto os Parâmetros Curriculares Nacionais

(2008) quanto as Diretrizes para Educação Básica do Estado do Paraná (2008) sugerem

um ensino que contemple as práticas sociais e garanta o letramento 4

Para tal, o ensino de língua portuguesa deve contemplar não só a escrita e a leitura,

mas também a oralidade. Para isso, ambos os documentos propõem um trabalho com

gêneros textuais. O objetivo é que o aluno possa discutir e analisar, em sala de aula, os

dos alunos,

tornando-os cidadãos mais críticos.

4 As Diretrizes para a Educação Básica do Estado do Paraná – Língua Portuguesa conceituam letramento como um processo que vai além da alfabetização: “refere-se ao indivíduo que não só sabe ler e escrever, mas usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, posiciona-se e interage com as exigências da sociedade referente às práticas de linguagem, demarcando sua voz no contexto social”(p.50).

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diferentes tipos de textos (escritos ou falados) que circulam em seu dia-a-dia5

5 As Diretrizes para a Educação Básica do Estado do Paraná – Língua Portuguesa, por exemplo, contemplam o uso, na prática oral, de depoimentos, entrevistas, dramatização, recados, declamação de poesias, troca de opiniões, debates, seminários e júris simulados; e, na prática escrita, convite, bilhete, carta, cartaz, notícia, editorial, artigo de opinião, carta do leitor, relatórios, resultado de pesquisas, resumos. (p.66)

. E com

isso ter a oportunidade de refletir sobre o uso da língua tanto oral quanto escrita.

Essa mudança de concepção, também faz com que a variação linguística e o processo

de formação e história da língua portuguesa sejam considerados em sala de aula.

Utilizando-se da teoria sociolinguística (cujos estudos começaram a ser desenvolvidos

na década de 1960), as diferentes formas de pronúncia do português passam a ser

entendidas como reflexo da identidade cultural do falante e não apenas como “erro” (o

que as caracterizaria como de menor prestígio). Mais do que isso, os erros mais comuns

de ortografia e sintaxe, deixam de ser considerados como absurdos e passam a ser vistos

como possíveis processos de transformação da língua.

(...) na perspectiva das ciências da linguagem, não existe erro na língua. Se a língua é entendida como um sistema de sons e significados que se organizam sintaticamente para permitir a interação humana, toda e qualquer manifestação linguística cumpre essa função plenamente – como é o caso com OS MENINO TUDO VEIO/ OS MENINOS TODOS VIERAM OU ASSISTI O FILME/ ASSISTI AO FILME. A noção de “erro” se prende a fenômenos sociais e culturais. (BAGNO, 2007, p.61) [grifo do autor]

Nessa perspectiva, a noção de “erro” se dá porque a sociedade considera que o

correto é falar e escrever de acordo com as regras da gramática normativa não

considerando as variações da língua. No entanto, é preciso compreender que a

gramática normativa foi escrita por um grupo seleto da sociedade que desconsiderou

diversas variações regionais de uso da língua para contemplar apenas o falar de uma

elite. O objetivo da gramática, conforme Bagno era o de tentar impedir a mudança e a

variação linguística, que foram vistas pelos primeiros gramáticos de forma negativa.

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Por causa de seus preconceitos sociais, os primeiros gramáticos consideravam que somente os cidadãos do sexo masculino, membros da elite urbana, letrada e aristocrática falavam bem a língua. Com isso, todas as demais variedades regionais e sociais foram consideradas feias, corrompidas, defeituosas, pobres etc. (BAGNO, 2007, p.68)

Tais variações, entretanto, são inerentes a qualquer língua natural que esteja em uso.

A variação não é exclusividade dos falantes não-escolarizados, ela também ocorre “na

língua dos falantes ‘cultos’, urbanos, letrados” (BAGNO, 2007, p.74).

Não significa dizer, que a gramática normativa deva ser excluída do contexto escolar

em nome do ensino da língua que está, de fato, em uso na sociedade. O que se pretende

é que o ensino desmistifique o “erro”, apresentando aos alunos reflexões sobre os

diversos usos da língua, e possa, assim, capacitá-los para usá-la nas diversas situações

que lhes sejam apresentadas (formais (padrão) ou informais (coloquial)).

Por mais que os linguistas rejeitem a norma-padrão tradicional, por não corresponder às realidades de uso da língua, eles não podem desprezar o fato de que, como bem simbólico, existe uma demanda social por essa ‘língua certa’, identificada como um instrumento que permite acesso ao círculo dos poderosos, dos que gozam de prestígio na sociedade. (BAGNO, 2007, p.79/80)

Assim, a escola deve ser um local de “interseção entre o saber erudito-científico e o

senso comum, e isso deve ser empregado em favor do/a estudante e da formação de sua

cidadania” (BAGNO, 2007, p.78).

3. Nova perspectiva sobre o “erro”

A língua não é imutável como deixa transparecer o ensino tradicional, baseando-se

exclusivamente na gramática normativa. A evolução/transformação é um processo

natural e, com o passar do tempo, a língua sofre alterações em função dos vários fatores

a que está exposta em situação de uso pela sociedade. É por esse motivo que não

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falamos da mesma forma que os brasileiros do século XIX ou da década de 1950. A

língua é dinâmica.

É lugar-comum a afirmação de que é próprio à língua mudar, evoluir. Auroux (1992), por exemplo, diz que a mudança é um processo tão natural das línguas vivas que, se não existir, a língua não será mais língua viva. Portanto, o raciocínio é simples, o uso leva a variações e estas às mudanças: língua viva = mudança constante, inovações, dinamismo; língua morta = conservação, paralisação, estatismo. (LEITE in PRETI org, 2000, p.135)

Embora exista, ainda, em nossa sociedade a ideia de que as mudanças na língua

provocam sua degradação, de que não seguir os manuais prescritivos na hora de falar e,

principalmente, escrever seria o mesmo que corromper o idioma. Conforme Leite,

Não faltam aqueles que se insurgem contra a variação da língua. Para esses, a língua é entendida como uma entidade monolítica, cuja única face é aquela descrita nos manuais de gramática tradicional e nos dicionários. Sob esse ponto de vista, a língua tem apenas uma possibilidade de realização, e as divergências a tal possibilidade são ‘erros crassos’. (LEITE in PRETI org, 2000, p.135)

O conceito de “erro” decorre, nessa perspectiva, da exigência de que tanto a língua

escrita quanto falada deve seguir a gramática normativa. Porém, é possível inferir que

nem toda variação de uso na língua portuguesa falada pode ser considerado erro, mas

pode tratar-se de “algum fenômeno de transformação pelo qual a língua está passando”

(BAGNO, 2007, p.169). Ademais, mesmo a gramática prescritiva, que se quer imutável,

passa por atualizações para contemplar novos usos da língua. Assim, o que já foi

chamado de erro no passado pode não ser considerado da mesma forma nos dias atuais,

pois os estudos da História e Formação da Língua Portuguesa demonstraram (e

demonstram) que, no processo evolutivo da língua, pode acontecer de o que

consideramos um erro hoje estar contemplado como acerto na gramática de amanhã.

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4. Da fala para a escrita: o caminho da mudança

As mudanças linguísticas, comuns a qualquer idioma em uso, acontecem a partir dos

falantes daquela língua.

(...) as mudanças que ocorrem na língua são fruto da ação coletiva de seus falantes, uma ação impulsionada pelas necessidades que esses falantes sentem de se comunicar melhor, de dar mais precisão ou expressividade ao que querem dizer, de enriquecer as palavras já existentes com novos sentido (principalmente os sentidos figurados, metafóricos), de criar novas palavras para dar uma idéia mais precisa de seus desejos de interação, de modificar as regras gramaticais da língua para que os novos modos de pensar e de sentir, novos modos de interpretar a realidade sejam expressos por novos modos de dizer. (BAGNO, 2007, p.168)

As alterações que uma língua vai sofrendo com o passar do tempo não são aleatórias.

Elas fazem parte, conforme explica Bagno (2007), de um processo complexo, lento e

gradual e surgem a partir de construções possíveis naquela língua. Trata-se de inovações

que são utilizadas inicialmente na fala e, depois de aceitas e reconhecidas, começam a

aparecer nos textos escritos.

Quando as inovações linguísticas que se opõem às prescrições da gramática normativa passam a aparecer com muita freqüência nos gêneros escritos mais monitorados [artigos e notícias de jornais, textos científicos], é porque a mudança linguística já se completou, e muito dificilmente a antiga regra normativa voltará a vigorar. (BAGNO, 2007, p.185)

Nesse sentido, podemos dizer que é a partir da língua falada, que surgem as

mudanças. Logo, as marcas de oralidade que se verificam com maior freqüência em

textos escritos não deveriam ser tratadas somente como um “erro”, mas analisados para

se entender se não se trata de uma possível transformação da língua em curso.

5. Corpus da pesquisa

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A prova de redação do vestibular da Unioeste/2009, corpus de análise da pesquisa

em questão, apresentou duas propostas possíveis para a produção textual dos

candidatos: uma dissertação e uma carta sobre temas distintos. Para a proposta da

dissertação o tema “publicidade” e para a proposta de carta, “refugiados ambientais”.

Para as análises foram selecionadas dez redações, de forma aleatória, sendo cinco

cartas e cinco dissertações. O pequeno número de textos selecionados deve-se ao fato de

que esta pesquisa não pretende trabalhar os dados quantitativamente, mas apenas

verificar se as marcas da oralidade aparecem nos textos. Esclarecemos também que nos

períodos analisados não estarão especificados se foram retirados das produções carta ou

dissertação, visto que esse aspecto não seria relevante para estes estudos.

As redações selecionadas receberam notas variadas, que oscilaram entre 10 e 55

pontos de um total de 60 pontos que representam à nota máxima da redação. Não foi,

também, objetivo desse trabalho quantificar, de acordo com as notas dos candidatos, se

há maior ou menor presença de traços da oralidade nos textos menos ou mais

pontuados. O que se pretendeu foi apenas verificar se haviam marcas de oralidade nas

produções escritas e como ocorriam.

6. Análise do corpus

Todos os textos analisados apresentaram “erros” de acordo com a gramática

normativa, sendo os mais comuns: “erros de acentuação”, “erros de pontuação”.

Entretanto, considerando o objetivo desta pesquisa, não nos deteremos na análise destes

aspectos.

As marcas de oralidade nas redações de vestibular puderam ser percebidas em

diferentes situações, tais como a Concordância Verbal e Nominal e variações na

Ortografia, entre outras, que estão explicadas e exemplificadas a seguir.

6.1 Regência Verbal

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Regência verbal, de acordo com Pasquale e Ulisses (1998, p.512), é o “estudo da

relação que se estabelece entre os verbos e os termos que os complementam (objetos

diretos e objetos indiretos) ou caracterizam (adjuntos adverbiais)”.

Assim, foram verificados usos de regência verbal em desacordo com a gramática

normativa, por exemplo:

1)Esses acontecimentos só tendem

O verbo tender, quando utilizado no sentido de ter tendência, inclinação, pendor ou

propensão para, é transitivo indireto

piorar se não forem tomadas medidas urgentes para

conter o aumento do aquecimento global.

6. A frase se construída com base na gramática

normativa ficaria da seguinte forma: “Esses acontecimentos só tendem a piorar se não

forem tomadas medidas urgentes para conter o aumento do aquecimento global”.

2)Se tivessemos um governo que visasse seu povo teriamos hoje duzentos e cinquenta

projetos na camera

Embora nesse bloco o objetivo de análise seja a regência verbal não se pode deixar

de mencionar o uso da palavra “câmera” por “câmara” um equivoco muito comum na

oralidade de muitos usuários da língua portuguesa que pode também sinalizar para uma

e no senado, visando a educação, segurança e realmente nossa

saúde, não visando limites a publicidade que são infelizmente os projetos que existem.

Visar, “no sentido de ‘ter em vista’, ter como objetivo’, ‘ter como meta’, é transitivo

indireto e rege a preposição a” (PASQUALE e ULISSES, 1998, p.523). Ocorre,

entretanto, que na oralidade a preposição acaba sendo suprimida. Assim, a frase, de

acordo com a norma gramatical ficaria: “Se tivéssemos um governo que visasse a seu

povo, teríamos, hoje, duzentos e cinqüenta projetos na Câmara e no Senado visando à

educação, segurança e realmente nossa saúde, não visando a limites à publicidade que

são, infelizmente, os projetos que existem”.

Para muitos verbos, já há uma regência inovadora, marcadas na oralidade. Conforme

Bagno, “existem muitas regências que hoje passam por variação, numa clara indicação

de que novas mudanças estão se processando”. (2007, p.138).

6 Informação retirada do dicionário de língua portuguesa Michaelis on-line, disponível em : http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=tender

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transformação na língua materna com a simplificação do termo, passando futuramente,

quiçá, ao uso de apenas um deles de forma homônima.

6.2 Concordância verbal e nominal

É comum para muitos falantes brasileiros a não concordância do verbo com o sujeito

e até dos adjetivos e adjuntos com os nomes aos quais se referem. Na fala, há quem se

expresse: “a gente vamos” ou “nós vai” e isso vem se refletindo na escrita.

Bagno) comenta que outro caso comum é a “eliminação do plural redundante,

marcado em geral só nos determinantes: os menino, as casa, aquelas coisa toda etc.”

(2007, p.144). Isso demonstra que também as regras de concordância verbal e nominal

estão sofrendo variações delineadas, inicialmente, pelos falantes da língua.

Assim, nas redações analisadas verificaram-se casos em que não ocorrem à

concordância verbal e nominal conforme prevê a gramática da língua portuguesa. São

eles:

1)Por tudo isso, somos levados à refletir sobre a atual liberdade de expressão das

empresas de publicidade brasileiras, e esperar que algo seje feito pelas autoridades

competentes na tentativa de solucionar ou amenizar o problema.

O verbo encontra-se no tempo presente do modo subjuntivo, logo sua conjugação

deveria ser (...) que algo seja feito(...).

2)Problemas ambientais sempre ocorreram formando vitimas ou não. Porém nos

ultimos anos tornou-se frequenti se for comparado a alguns atrás.

O sujeito do verbo “tornou-se”, nesse caso, está na primeira oração (problemas

ambientais), assim, o verbo deveria ser empregado: “tornaram-se”. O que ocorre é que

esse sujeito estando distante do verbo o produtor o texto não sente a necessidade de

concordância como prescreve a gramática, ocorrência muito comum na oralidade.

6.3 Variações na ortografia

Foram localizados nos textos alguns traços da oralidade na escrita de palavras.

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1) A letra “e” substituída por “i” (devido à pronúncia, na qual ocorre

frequentemente a elevação da vogal /e/ para /i/): PROVINIENTES

2) A letra “o” substituída por “u” (devido à pronúncia, na qual ocorre

frequentemente a elevação da vogal /o/ para /u/): PREUCUPA

3) A redução da preposição “para” conforme sua pronúncia: PRA (fenômeno de

síncope ou supressão de fonema no interior da palavra)

4) A supressão do primeiro “o” de alcoólatra devido a sua pronúncia não ser

enfática: ALCÓLATRAS.

Esses fenômenos de substituição ou deslocamento de fonemas nas palavras são

justificados pelos estudos dos metaplasmos.

6.4 Uso de “onde”

Bagno explica que, atualmente, ocorre “amplo uso de ONDE para se referir a espaço,

tempo, situação etc., ou como organizador do fluxo discurso” (2007, p.152). Essa é uma

prática que foi encontrada nas redações e que contrariam as normas gramaticais, uma

vez que a norma-padrão só admite o uso de ONDE com referência ao espaço físico.

Seguem os exemplos extraídos dos textos analisados:

1) Hoje em dia há uma tendência nos produtos adquiridos pelos

jovens, onde

2) Hoje em dia as pessoas não querem beber em casa querem sair pra

rua bebendo com os amigos dirigindo som ligado nas alturas

se você não utiliza uma determinada marca é excluído do grupo social que

você pertence.

onde

Conforme Bagno, a palavra “onde” apresenta um “caráter plurissemântico (...)

sempre usada com referência a muito mais coisa do que ao ´lugar concreto, espaço

físico´ com que a NP tenta limitar seu emprego” (2002, p.38)

6.6 Pronome oblíquo no início de frase

tudo parece gostoso

porque os comerciais mostra assim (...).

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A norma padrão prescreve que uma sentença não deve iniciar com o pronome

oblíquo. Não seria correto dizer (ou escrever) “Te amo” (comum na oralidade), mas sim

“Amo-te”. Porém, muito do que prescreve a gramática não se observa na oralidade, e

essa, por sua vez, vê-se, cada vez mais, presente nas produções escritas. Por exemplo,

no título de uma das redações analisadas: SE TORNE UM HOMEM

Considerações Finais

Essas reflexões sobre a língua, possibilitadas pela pesquisa realizada, levaram-nos a

perceber que a variação oral da língua fez-se presente em todos os textos analisados.

Isso, na perspectiva da gramática normativa, é considerado “erro” de uso da língua,

especialmente, quando se refere a língua escrita. Durante muitos anos, os estudantes

permanecem na escola vendo e revendo as regras da norma padrão de língua

portuguesa, porém esses estudos não suficientes, para evitar o uso dos termos da língua

falada nas produções escritas. Isso evidencia a força da oralidade da língua, lembrando

que é essa a modalidade que promove a evolução da língua e, consequentemente,

transformações no uso da língua escrita.

A análise do corpus possibilitou-nos verificar que não poucos os traços da oralidade

nos textos dos candidatos a uma vaga na universidade, revelados em expressões típicas

da língua falada, como supressão de preposições, variações de regência verbal e

concordância verbal e nominal entre outros. Ou seja, a perspectiva do ensino

tradicional, que pretende abolir as marcas da fala na escrita, não se efetiva na realidade

escrita de uso da língua. Esses traços sobrevivem mesmo naqueles que se

“pressupunha” estarem devidamente escolarizados.

Nesse sentido, faz-se necessário que o ensino de língua portuguesa possibilite aos

alunos refletirem sobre o uso da língua nas diversas situações de comunicação que se

apresentam no cotidiano. Conforme explica Bagno (2007), é possível que esse “erro”

de hoje seja uma marca de um processo em curso de transformação da língua, isso só o

tempo trará essa confirmação. Contudo, enquanto essa transformação não se estabelece

como norma, a língua padrão culta deve ser amplamente conhecida e usada, nas

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situações exigidas, como na produção da redação de vestibular, com muita proficiência

pelos alunos.

Referências

BAGNO, M. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. São Paulo: Parábola Editorial, 2007. BAGNO, M., STUBBS, M., GAGNÉ, G. Língua Materna: letramento, variação e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2002. CIPRO NETO, P.; INFANTE, U. Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Scipione, 1998. DIRETRIZES CURRICULARES PARA EDUCAÇÃO BÁSICA – Língua Portuguesa. Secretaria de Educação do Estado do Paraná, 2008. GREGORIM, C. O. (coord). Moderno Dicionário da Língua Portuguesa Michaelis Online. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/>, acesso em 02 nov 2009. LEITE, M. Q. A influência da língua falada na gramática tradicional In: PRETI, D. (org.). Fala e Escrita em Questão. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 2000. (p.129-155) MARCUSCHI, L.A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001. PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS – Língua Portuguesa. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro02.pdf>, acesso em 03 nov 2009.