infarto agudo do miocárdio

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Infarto agudo do miocárdio Acute myocardial infarction Bráulio Luna Filho Livre-docente da Disciplina de Cardiologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Roberto Márcio Viana Mestre em Cardiologia pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Unitermos: infarto agudo do miocárdio, doença coronariana. Unterms: acute myocardial infarction, coronary disease. Sumário Na introdução, os autores mencionam o infarto agudo do miocárdio (IAM) como a principal causa de óbito nos países ocidentais com o maior porcentual das mortes na fase pré-hospitalar. Mencionam os aspectos epidemiológicos com quase 50% das mortes entre mulheres e homens com mais de 30 anos. Nos EUA estima-se que ocorram 1,5 milhão de IAM. O quadro clínico do IAM evolui desde o evento em repouso e a dor precordial associada a náusea, vômito, sudorese fria e profusa. O diagnóstico do IAM é baseado no eletrocardiograma (ECG), sendo mencionados os fatores que limitam a capacidade diagnóstica, bem como as regiões comprometidas (supradesnivelamento). É mencionado também o IAM sem o supradesnivelamento do segmento ST. Em seguida são mencionados os marcadores séricos da necrose do miocárdio, tais como a CK-MB, a CK-MB massa, a mioglobina e a troponina T e I. Quanto ao tratamento, os autores mencionam as medidas gerais, o uso dos fibrinolíticos e a literatura relacionada, a angioplastia primária, o tratamento medicamentoso coadjuvante de tipo: antiplaquetária (AAS, ticlopidina e clopidogral), anticoagulantes (estreptoquinase, rt-PA com ou sem heparina), os inibidores da glicoproteína Ib/IIIa (abciximab), beta-bloqueadores, nitratos, inibidores do canal do cálcio e os inibidores da enzima conversora da angiotensina. Sumary In the introduction, the authors show that the acute myocardial infarct (AMI) is the main reason of death in the occidental countries, with the major proportion of deaths in the pre-hospitalar period. They point out the epidemiological data with almost 50% of deaths in women and men with more than 30 years old. It is estimated that 1,5 million of deaths occurs in the USA. The clinical picture of AMI has an evolution from the event at rest and the precordial pain associated with nausea, vomits, cold and profuse sudoresis. The AMI diagnostic is based in the eletrocardiogram (ECG), being mentioned the factors that difficult the diagnostic workout, as the compromised areas (supra -

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Page 1: Infarto agudo do miocárdio

Infarto agudo do miocárdio

Acute myocardial infarction

Bráulio Luna Filho

Livre-docente da Disciplina de Cardiologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM).

Roberto Márcio Viana

Mestre em Cardiologia pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM).

Unitermos: infarto agudo do miocárdio, doença coronariana. Unterms: acute myocardial infarction, coronary disease.

Sumário

Na introdução, os autores mencionam o infarto agudo do miocárdio (IAM) como a

principal causa de óbito nos países ocidentais com o maior porcentual das mortes

na fase pré-hospitalar.

Mencionam os aspectos epidemiológicos com quase 50% das mortes entre

mulheres e homens com mais de 30 anos. Nos EUA estima-se que ocorram 1,5

milhão de IAM.

O quadro clínico do IAM evolui desde o evento em repouso e a dor precordial

associada a náusea, vômito, sudorese fria e profusa.

O diagnóstico do IAM é baseado no eletrocardiograma (ECG), sendo mencionados

os fatores que limitam a capacidade diagnóstica, bem como as regiões

comprometidas (supradesnivelamento). É mencionado também o IAM sem o

supradesnivelamento do segmento ST.

Em seguida são mencionados os marcadores séricos da necrose do miocárdio,

tais como a CK-MB, a CK-MB massa, a mioglobina e a troponina T e I.

Quanto ao tratamento, os autores mencionam as medidas gerais, o uso dos

fibrinolíticos e a literatura relacionada, a angioplastia primária, o tratamento

medicamentoso coadjuvante de tipo: antiplaquetária (AAS, ticlopidina e

clopidogral), anticoagulantes (estreptoquinase, rt-PA com ou sem heparina), os

inibidores da glicoproteína Ib/IIIa (abciximab), beta-bloqueadores, nitratos,

inibidores do canal do cálcio e os inibidores da enzima conversora da

angiotensina.

Sumary

In the introduction, the authors show that the acute myocardial infarct (AMI) is

the main reason of death in the occidental countries, with the major proportion of

deaths in the pre-hospitalar period.

They point out the epidemiological data with almost 50% of deaths in women and

men with more than 30 years old. It is estimated that 1,5 million of deaths

occurs in the USA.

The clinical picture of AMI has an evolution from the event at rest and the

precordial pain associated with nausea, vomits, cold and profuse sudoresis.

The AMI diagnostic is based in the eletrocardiogram (ECG), being mentioned the

factors that difficult the diagnostic workout, as the compromised areas (supra -

Page 2: Infarto agudo do miocárdio

elevation). It is mentioned also the AMI without supra-elevation of the ST

segment. Then the serum markers of the myocardial necrosis are pointed out

such as CK-MB, CK-MB mass, myoglobin anot troponin T and I.

Relating to treatment, the authors mention the general measures, the fibrinolytic

use and the related literature, the primary angioplasty, the associated medical

treatment such as: antiplaquetary drugs (AAS, ticlopidine, clopidogrel),

anticoagulants (streptokinase, rt-PA with or without heparin), glycoprotein

inhibitors Ib/IIIa (abciximab), beta-blockers, nitrates, calcium channel inhibitors

and the angiotensin converting enzime inhibitors.

Numeração de páginas na revista impressa: 129 à 132

Introdução

As doenças cardiovasculares representam uma das principais causas de óbito no

mundo contemporâneo. Nos países desenvolvidos as doenças cardiovasculares

são responsáveis por quase 50% das mortes entre mulheres e homens com mais

de 30 anos. Nos Estados Unidos se estima que anualmente 4,5 milhões de

pacientes têm dor torácica, cerca de 500 mil apresentam angina instável e 1,5

milhão infarto agudo do miocárdio (IAM). São aproximadamente 500 mil óbitos

ao ano e se acredita que 50% desses ocorram antes da admissão hospitalar.

Na América Latina as doenças cardiovasculares respondem por um terço de todas

as mortes. A doença cardiovascular também é a principal causa de morte no

Brasil e, dentre essas, a doença isquêmica do coração é a responsável pela

maioria dos óbitos.

Quadro clínico

Mais da metade dos pacientes vítimas de IAM apresentam o evento em repouso.

Apesar do grande avanço da investigação laboratorial do IAM, a história clínica do

paciente associada ao eletrocardiograma permanecem como elementos

primordiais na elucidação diagnóstica e orientação terapêutica.

O sintoma clínico mais comumente referido pelo paciente com IAM é a dor

precordial. Em cerca de 60% dos pacientes é possível extrair sintomas

precedentes ao evento isquêmico. Classicamente a dor precordial referida pelo

paciente é forte, opressiva, pesada, constritiva e limitante, associada à náusea,

vômito, sudorese fria e profusa. Há, no entanto, sintomas gerais inespecíficos,

principalmente no grupo dos pacientes idosos, como, por exemplo: tonturas,

palpitações, calafrios, exaustão e síncope.

Aproximadamente 50% dos IAM não fatais ocorrem de forma silenciosa,

particularmente nos pacientes diabéticos, obesos e hipertensos.

Diagnóstico do IAM

Eletrocardiograma

O eletrocardiograma (ECG) é o método diagnóstico mais utilizado na avaliação

inicial das dores precordiais. O registro eletrocardiográfico não somente pode

estabelecer a relação entre sintoma clínico e diagnóstico das síndromes

coronarianas agudas, como também prover informações relevantes para a

melhor opção terapêutica e a estratificação prognóstica do paciente.

O ECG é essencial no diagnóstico do IAM, representando o elemento inicial de

maior utilidade diante da suspeita clínica.

Page 3: Infarto agudo do miocárdio

Existem, no entanto, muitos fatores que limitam a capacidade discriminadora do

ECG em diagnosticar o IAM, como, por exemplo, tamanho da lesão miocárdica,

tempo de evolução, localização do segmento da parede afetada, presença de

hipertrofia ventricular esquerda e bloqueio do ramo esquerdo. Outras situações

que podem dificultar a análise do ECG são: infartos prévios, pericardite aguda,

síndrome de pré-excitação ventricular e distúrbios eletrolíticos.

No IAM com supradesnivelamento do segmento ST, a corrente de lesão

subepicárdica fica caracterizada pela presença do supradesnivelamento maior ou

igual a 1 mm em mais de uma derivação contígua. Além disso, as derivações do

ECG indicarão a parede ventricular comprometida topograficamente:

· Alterações de V1 a V6, D1 e AVL - parede anterior extensa;

· Alterações de V1 a V4 - parede anterior;

· Alterações de V1 a V3 - parede ântero-septal;

· Alterações de D1, AVL, V5 e V6 - parede lateral e lateral alta;

· Alterações de D1 e AVL - parede lateral alta;

· Alterações de D1, AVL e V3 a V6 - parede ântero-lateral;

· Alterações de V1 a V4, D1 e AVL - diagonal;

· Alterações de D2, D3 e AVF - parede inferior;

· Alterações de V7, V8, V9 e V10 com ondas R amplas em V1 e V2 - parede

posterior (ou dorsal);

· Alterações de V3R a V5R - ventrículo direito.

O supradesnivelamento do segmento ST como expressão do diagnóstico do IAM

tem sensibilidade entre 45% e 68% e especificidade entre 81% e 98%,

respectivamente. A realização do ECG seriado e a observação criteriosa do

comportamento do segmento ST-T, ao lado da realização de derivações

adicionais (V3R, V7-V9), poderão aumentar essa sensibilidade para valores

próximos de 85% a 90%.

O ECG no diagnóstico do IAM sem supradesnivelamento do segmento ST

No IAM sem supradesnivelamento do segmento ST, as manifestações

eletrocardiográficas não são tão típicas como aquelas observadas no IAM com

supradesnivelamento do segmento ST. A principal característica desse tipo de

IAM é a ocorrência de infradesnivelamento do segmento ST e/ou inversão da

onda T. Essas alterações são mais evidentes nas derivações que estão

direcionadas para a parede livre do ventrículo esquerdo. Nessa situação, a

decisão clínica deve ser apoiada na realização do ECG seriado e na realização de

dosagens enzimáticas.

Marcadores séricos de necrose miocárdica

Esses testes utilizam anticorpos específicos contra a subunidade M e B da CK, ou

seja, CK-MB, e são utilizados, até hoje, devido ao baixo custo, disponibilidade e

facilidade de realização.

Inicialmente, utilizava-se apenas a medida da atividade de determinadas enzimas

e se inferia sobre a extensão da lesão miocárdica. Posteriormente, vieram os

testes imunológicos para dosagem da concentração protéica do marcador,

independentemente da enzima estar ativa ou não.

Neste contexto, a mioglobina foi o primeiro marcador protéico a ser empregado,

utilizando-se técnicas de radioimunoensaio. Os testes de troponina T e de

troponina I para diagnóstico do IAM foram descritos há cerca de 12 anos e

representam, hoje, o teste diagnóstico mais importante na detecção precoce de

lesão miocárdica.

Page 4: Infarto agudo do miocárdio

CK-MB

A curva de elevação e normatização da atividade da CK-MB é padrão para o

diagnóstico do IAM. Caracteristicamente esta enzima se eleva em quatro a seis

horas após o início dos sintomas, com pico em torno de 18 horas, e se normaliza

dentro de 48 a 72 horas. Permite o diagnóstico tardio do IAM, após 12 horas do

início dos sintomas, quando sua sensibilidade é de 93%. Entretanto, é pouco

sensível para o diagnóstico precoce, isto é, nas primeiras seis horas.

Concentração da massa da CK-MB (CK-MB massa)

A utilização de testes imunológicos que dosam a concentração protéica da CK-MB

em nanogramas por mililitro (ng/ml) melhorou a sensibilidade e a especificidade

desse exame, superando as outras técnicas de dosagem da CK-MB disponíveis. A

CK-MB massa se eleva entre 3 e 6 horas após o início dos sintomas, com pico

entre 16 e 24 horas e normalização entre 48 e 72 horas.

Esses testes imunológicos são altamente precisos e permitem a detecção de

baixas concentrações de CK-MB na circulação sangüínea. Por isso, pacientes com

isquemia aguda podem apresentar elevações de seus níveis sem preencher os

critérios para diagnóstico de IAM.

Mioglobina

A mioglobina é uma hemoproteína citoplasmática transportadora de O2,

encontrada no músculo-esquelético e cardíaco. É rapidamente liberada pelo

miocárdio necrótico, elevando-se em torno de 2 horas após o início dos sintomas,

com pico entre 6 e 9 horas e normalização entre 12 e 24 horas.

Por seu elevado valor preditivo negativo (de 83% a 98%) é considerada

excelente para excluir o diagnóstico de IAM. Esse valor preditivo negativo é

importante somente em pacientes com alterações eletrocardiográficas que

dificultem o diagnóstico de IAM.

Troponinas

Por serem diretamente ligadas ao complexo contrátil celular, são praticamente

indetectáveis na circulação sangüínea. Apesar da troponina I e T possuírem o

mesmo poder de estratificação de risco, elas devem ser consideradas proteínas

distintas. As troponinas se elevam entre 3 e 8 horas do início dos sintomas, com

pico entre 36 e 72 horas e normalização entre 5 e 14 dias. Apresentam

sensibilidade diagnóstica ligeiramente superior à CK-MB e são imprescindíveis

para o diagnóstico de IAM em pacientes que apresentam doenças que diminuem

a especificidade da CK-MB.

Tratamento do IAM

Medidas gerais - O paciente com suspeita de IAM deve ser monitorizado e ter

imediatamente na admissão uma veia puncionada, além de receber O2 quando

apresentar congestão pulmonar e dessaturação dos níveis periféricos de oxigênio.

O nitrato na formulação sublingual pode ser utilizado na tentativa de reverter um

espasmo coronariano suspeitado. Caso o paciente já tenha o IAM confirmado,

pode-se introduzir o nitrato intravenoso. A analgesia deve ser utilizada a fim de

fornecer ao paciente conforto e cooperação. De preferência, aplica-se meperidina

ou morfina via IM. O ácido acetilsalicílico deve ser utilizado desde o momento da

suspeita do IAM, pois, conforme demonstra o estudo clínico Isis-2, esta droga

quando utilizada isoladamente diminui a mortalidade em nível similar àquele

obtido com a utilização isolada da estreptoquinase.

Page 5: Infarto agudo do miocárdio

Fibrinolíticos - A partir de 1986, com a publicação do estudo italiano GISSI-1,

ficou evidenciada que a estreptoquinase (SK) intravenosa diminuía a mortalidade

de pacientes com IAM. Vários estudos subseqüentes confirmaram esses achados

consubstanciando os conceitos atuais do tratamento fibrinolítico.

O principal critério clínico para o emprego dos fibrinolíticos é a presença de dor

típica com duração maior que 20 min e menor que 12 horas em pacientes que

não responderam à droga vasodilatadora sublingual.

O critério eletrocardiográfico sine qua non é a presença de supradesnivelamento

do segmento ST maior ou igual a 1mm em pelo menos duas derivações

contíguas. Na presença de sintomas indiscutíveis concomitante à presença de

bloqueio de ramo esquerdo, o tratamento trombolítico deve ser realizado,

considerando o alto risco de mortalidade nesse grupo de pacientes.

A escolha da droga fibrinolítica deve levar em consideração disponibilidade e

características do paciente, por exemplo, uso anterior de SK, AVC prévio e risco

de sangramento em outros sítios.

O estudo TIMI-I, comparando a patência da artéria relacionada ao IAM em até 90

minutos após a infusão de SK ou rt-PA, mostrou superioridade do rt-PA. Estudos

posteriores que avaliaram mortalidade, no entanto, não demonstraram

diferenças entre os dois trombolíticos. O estudo Gusto-1, posteriormente,

observou que os pacientes submetidos à trombólise com rt-PA e que fazem uso

de heparinização plena, como tratamento coadjuvante, reduziu de forma

significativa a mortalidade comparativamente ao grupo que recebeu SK. Esse

mesmo estudo demonstrou que em determinados grupos, como os idosos, o uso

da SK é preferível já que apresentou menos complicações hemorrágicas cerebrais

comparativamente àqueles que receberam rt-PA.

Já se encontra disponível no Brasil a tenecteplase (TNK), derivada do t-PA, que

possibilita a utilização em bolus IV. O estudo Assent-2 avaliou em grande número

de pacientes que o TNK e o rt-PA são equivalentes no que diz respeito à taxa de

mortalidade.

Angioplastia primária - A recanalização mecânica primária é hoje o tratamento

preferencial às drogas trombolíticas, desde que esta opção esteja disponível ou o

intervalo para remoção para local com esta infra-estrutura não ultrapasse 2

horas (Danami 2 - ACC 2002) ou até 6 horas, a partir do início dos sintomas

(Prague 2 - ESC 2002).

A angioplastia primária deve ser o tratamento preferencial também nos pacientes

que apresentam contra-indicação à droga fibrinolítica e/ou apresentam quadro de

disfunção ventricular esquerda.

O ensaio clínico Shock demonstrou que a revascularização imediata, seja ela

cirúrgica ou através de angioplastia, beneficiam os pacientes com menos de 75

anos com até 36 horas de IAM, evoluindo com choque cardiogênico.

Tratamento medicamentoso coadjuvante

a. Antiplaquetários - O uso do AAS pós-IAM deve ser por tempo indefinido. O

perfil dessa droga, impedindo a formação do tromboxane A2, comprovadamente

trouxe grande impacto no prognóstico dos pacientes de alto risco. Os derivados

tienopiridínicos, como a ticlopidina e o clopidogrel, agem inibindo a ação do

difosfato de adenosina e impedem a ativação plaquetária. O ensaio clínico Caprie

demonstrou que essas drogas apresentam benefícios comparáveis ao AAS e,

Page 6: Infarto agudo do miocárdio

portanto, podem ser utilizadas como alternativa. Deve-se considerar que sob

critério de custo-efetividade, somente em situações de contra-indicação do AAS

justifica-se o emprego do clopidogrel ou ticlopidina.

b. Anticoagulantes - A eficácia clínica da trombólise depende de um balanço

favorável entre a dissolução do trombo e o retardo ou prevenção da formação de

novo trombo que pode ser obtido com a heparina. É comprovada a eficácia dos

agentes antitrombina em potencializar o efeito trombolítico. Levando-se em

consideração os resultados dos estudos Gissi-2 e do Isis-3 (que demonstraram

que a heparina subcutânea não é melhor que o placebo como coadjuvante à SK)

e os resultados do estudo Gusto-1 (que não houve diferença entre heparina

subcutânea ou intravenosa associadas com SK) não se utiliza heparina quando a

trombólise é feita com a SK. Apesar de não existir um estudo incontestável em

relação à mortalidade, foi demonstrado benefício no uso da heparina IV quando a

droga fibrinolítica utilizada é o rt-PA. A heparina também está indicada em

pacientes com alto risco de embolia, como presença de fibrilação atrial,

fenômeno tromboembólico prévio e trombo intracavitário pedunculado.

c. Inibidores da glicoproteína IIb/IIIa - Foram introduzidos recentemente na

prática clínica drogas que atuam sobre o complexo glicoprotéico como

coadjuvante ao tratamento fibrinolítico e prevenção de obstrução aguda na

angioplastia primária.

O estudo Timi-14 testou várias associações entre trombolíticos e o abciximab,

concluindo que: 1- o grupo que recebeu o abciximab sem o fibrinolítico

apresentou um índice de recanalização aos 90 minutos similar à estreptoquinase

isolada no início da era trombolítica; 2- a associação rt-PA (metade da dose) com

abciximab (dose plena) apresentou o melhor índice de patência aos 60 e 90

minutos; e 3- a associação SK/abciximab deve ser evitada por aumentar a

incidência de hemorragia cerebral. Recentemente, entretanto, o estudo Gusto V

não encontrou nenhuma vantagem, do ponto de vista de redução da taxa de

mortalidade, neste tipo de associação no tratamento do IAM.

Como coadjuvante à angioplastia primária, os dados disponíveis na literatura

indicam que a utilização dos inibidores da glicoproteína IIb/IIIa é cada vez mais

comum. O ensaio clínico Admiral mostrou que a tríade - revascularização de

urgência, reinfarto e óbito - foi menor no grupo que recebeu abciximab, quando

comparado ao placebo. No seguimento desses pacientes, o benefício permaneceu

também após seis meses, o que torna a associação angioplastia primária e

inibidores da glicoproteína IIb/IIIa uma opção favorável.

d. Beta-bloqueadores - Como coadjuvante ao tratamento com fibrinolítico ou com

angioplastia primária, o uso dos beta-bloqueadores não encontra respaldo em

dados da literatura. Naqueles pacientes com IAM e que não foram submetidos a

tratamento trombolítico, o estudo Isis-1 demonstrou diminuição significativa da

mortalidade no grupo que recebeu beta-bloqueador IV, seguido do uso via oral. A

possibilidade da ocorrência de ruptura do ventrículo esquerdo nos primeiros dias

de IAM em pacientes submetidos a tratamento trombolítico, faz com que o uso

de beta-bloqueadores seja rotineiro uma vez que o estudo Isis-1 observou uma

diminuição da incidência de ruptura do ventrículo esquerdo no grupo que recebeu

essa droga.

e. Nitratos - Nos pacientes com IAM e que evoluem com disfunção ventricular,

isquemia persistente e hipertensão arterial sistêmica, o emprego de nitrato na

formulação intravenosa está indicada. Não há na literatura nenhum estudo que

sustente o emprego rotineiro do nitrato pós-IAM. O ensaio clínico Isis-4 não

encontrou diferenças significativas entre o grupo tratado e placebo. Deve-se

ainda lembrar as contra-indicações ao emprego do nitrato, tais como:

hipotensão, infarto de ventrículo direito e bradicardia sintomática.

f. Bloqueadores dos canais de cálcio - Tanto o diltiazem quanto o verapamil são

utilizados como alternativas ao emprego dos beta-bloqueadores em pacientes

Page 7: Infarto agudo do miocárdio

infartados. Do ponto de vista clínico, em pacientes sem disfunção do ventrículo

esquerdo, sabe-se que o diltiazem apresenta um perfil favorável nos IAM sem

supradesnivelamento do segmento ST.

g. Inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) - Os estudos Aire e

Save demonstraram de forma inequívoca que os IECAs são úteis nos pacientes

com IAM e disfunção sistólica do ventrículo esquerdo. Há melhora do

remodelamento ventricular esquerda e diminuição significativa da

morbimortalidade, tanto a curto quanto a longo prazo. O IECA deve ser

administrado ao paciente com IAM nas primeiras horas, desde que não haja

contra-indicação.

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