histÓria e filosofia da ciÊncia no ensino de fÍsica...
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ISSN 2176-1396
HISTÓRIA E FILOSOFIA DA CIÊNCIA NO ENSINO DE FÍSICA
MODERNA
Tatiele Chicóra1 - UFPR
Sérgio Camargo2 - UFPR
Andressa Toppel3 - UFPR
Grupo de Trabalho - Didática: Teorias, Metodologias e Práticas
Agência Financiadora: não contou com financiamento
Resumo
O enfoque história e filosofia da ciência ressaltam aspectos que auxiliam na compreensão de
fenômenos, demonstra ao aluno que a ciência é resultado de um árduo e contínuo processo,
desfaz o mito de que o conhecimento científico é imutável e permite discutir a relação do
desenvolvimento da ciência com aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos de
determinado período. Por meio destas reflexões, buscamos analisar de maneira qualitativa
alguns artigos que apresentam a abordagem histórico-filosófica como proposta para o ensino
de física moderna no ensino médio, utilizando como ferramenta a análise textual discursiva
proposta por Moraes e algumas categorias de inserção da história e filosofia da ciência no
ensino, destacadas por Kapitango. Através da categorização dos trabalhos foi possível
verificar que há convergência entre os pesquisadores, em determinados aspectos, sobre os
motivos pelos quais o uso deste enfoque no ensino é de extrema importância. Os resultados
relatados nos trabalhos apontam que o uso da história e filosofia da ciência, como eixo
condutor de ensino, possibilita discussões sobre o processo de construção do conhecimento,
promove um estudo contextualizado e aproxima o aluno do processo evolutivo da ciência.
Esta pesquisa nos permitiu constatar que a discussão sobre essa temática é recorrente e que
apesar de haver grande defasagem na formação epistemológica do professor e ainda
dispormos de poucas propostas passíveis de aplicação em sala de aula, principalmente de
física moderna, essa área evoluiu de mera especulação a propostas de ensino que se tornam
um recurso didático de origem confiável para a utilização desta abordagem em sala de aula.
Palavras-chave: História e Filosofia da Ciência. Física Moderna. Ensino de Física.
1 Universidade Federal do Paraná / Setor de Ciências Exatas/ Licenciatura em Física/Programa Institucional de
Bolsa de Iniciação a Docência. E-mail: [email protected] 2 Universidade Federal do Paraná / Setor de Educação/ Departamento de Teoria e Prática de Ensino/ Professor
Adjunto / Grupo de Pesquisa Processos Formativos e Linguagens na Educação em Ciências da Natureza/
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência /Programa de Pós - Graduação em Educação em
Ciências e em Matemática. E-mail: [email protected] 3 Universidade Federal do Paraná / Setor de Ciências Exatas/ Licenciatura em Física/Programa Institucional de
Bolsa de Iniciação a Docência. E-mail: [email protected].
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Introdução
Em nosso cotidiano estamos cercados por tecnologia: televisões com alta definição,
câmeras digitais, laser, leitor de código de barras, raios-X e celulares. Nos meios de
comunicação é comum ver notícias de novas descobertas científicas ou aparatos tecnológicos,
porém estas informações não são facilmente compreendidas por grande parte da população.
Nos últimos anos, documentos que orientam o ensino: Parâmetros curriculares
nacionais (PCN) e propostas curriculares oficiais das secretarias de Educação dos Estados
(DCE) tentam propor abordagens que salientem esse desenvolvimento científico, visto que
para alguns estudantes esse será o único contato formal com a ciência. No caso particular da
Física, a atualização curricular propõe a inserção de conteúdos a partir do início do século
XX, conhecidos como Física Moderna (FM).
No entanto, muitos anos se passaram desde a publicação destes documentos e o que
mudou? O tema permanece praticamente excluído e o conteúdo predominante continua sendo
a Física Clássica. Um dos principais motivos que corrobora para a continuidade deste quadro
é a falta de preparo para o ensino desta abordagem, que tem suas particularidades.
A preocupação com um ensino que contribua para a formação de um indivíduo atuante
na sociedade já era destacada por Terrazzan (1992), visto que os conteúdos de Física Moderna
e Contemporânea contribuem na formação participativa e modificadora do estudante.
Analisando possíveis caminhos, D'Agostin (2008) aponta, através de resultados de
pesquisa, que é possível a inserção de tópicos de FM no ensino médio, contanto que esta
proposta não seja baseada no formalismo matemático.
Quais seriam então as possibilidades? É possível aproximar o estudante desta “Nova
Física” desprendendo-se do estereótipo de ensino que prioriza equações ao passo que
realmente compreendam o significado, a importância e o contexto da ciência durante seu
desenvolvimento?
Dentre as inúmeras possibilidades encontra-se a proposta de ensino por meio de uma
abordagem histórica e filosófica, visto que inúmeros pesquisadores vêm chamando atenção
para a necessidade de a ciência assumir um papel de formação histórica, cultural e social dos
cidadãos. O enfoque HFC traz aspectos relevantes para a compreensão de fenômenos, pois
quebra com o caráter imutável e estável da ciência, promovendo um intenso debate sobre a
evolução das ideias e as contradições científicas. Procurou-se fazer uma comparação com
algumas propostas de ensino, na tentativa de responder à seguinte questão: que contribuições
20177
os trabalhos com propostas didáticas que abordam conceitos de Física Moderna por meio da
História e Filosofia da Ciência trazem ao ensino e a aprendizagem na educação básica?
História e Filosofia da Ciência no Ensino
A História e Filosofia da Ciência (HFC) têm tido grande destaque entre pesquisadores
da área de Ensino nos últimos anos (ZANETIC, 1989; MATTHEWS, 1995; MARTINS,
2007). Documentos que orientam professores da rede pública também têm chamado atenção
quanto à importância desta abordagem no ensino:
[…] a física, tanto quanto as outras disciplinas, devem educar para cidadania e isso
se faz considerando a dimensão crítica do conhecimento científico sobre o Universo de fenômenos e a não neutralidade da produção desse conhecimento, mas seu
comprometimento e envolvimento com aspectos sociais, políticos, econômicos e
culturais. (PARANÁ, 2008, p. 50)
O Ensino de Física na maioria das escolas prioriza leis e equações que representam os
fenômenos estudados, o que pode levar o estudante a pensar na ciência como algo finalizado,
ou seja, não há nada de novo para se descobrir. Neste sentido, o papel histórico, cultural e
social da Física é excluído. O enfoque da história e filosofia da ciência ressalta aspectos que
auxiliam na compreensão de fenômenos, demonstra ao aluno que a ciência é resultado de um
árduo e contínuo processo e desfaz o mito de que o conhecimento científico é imutável.
Conforme Batista (2004), a abordagem HF contribui na aprendizagem, pois ressalta o
desenvolvimento da ciência como parte da cultura humana e recria o ambiente
contextualizador que permite entender a origem da problemática, os elementos conflitantes e
os desenvolvimentos.
Além de contextualizar, alguns autores ressaltam a importância da HF em demonstrar
a quebra de paradigmas na evolução científica, ressaltando que a evolução das ideias na
ciência passou por vários processos de contradição. A abordagem HF contribui para a
compreensão do por que uma proposição é estabelecida como conhecimento e como ela se
relaciona com outras proposições da Física (BATISTA, 2004). Neves (1998) salienta que o
ensino deve conter uma proposta com tópicos específicos da HFC, onde acertos e erros
constituam o fenômeno estudado, não somente exilando-o na mera repetição e memória
seletiva.
A história da ciência valoriza o caráter mutável da ciência mostrando aos estudantes
sua dependência de contextos históricos e culturais, derrubando mitos, humanizando gênios e
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ainda mostrando que o conhecimento científico aceito atualmente é suscetível de
transformações (SILVA; MARTINS, 2003). Pagliarini (2007), afirma que uma abordagem
historicamente embasada também permite ao estudante perceber as relações existentes entre
diferentes tópicos e disciplinas, explicitando o caráter interdependente das realizações
humanas.
Matthews (1995) cita alguns aspectos relevantes quanto à utilização da História da
Ciência no Ensino:
• A História promove uma melhor compreensão das concepções e métodos
científicos.
• A abordagem histórica conecta o desenvolvimento do raciocínio individual com o
desenvolvimento das ideias científicas.
• A História da Ciência é de grande valor intrínseco.
• A História é necessária para se entender a natureza da ciência.
• A História contribui para neutralizar os dogmas que são comumente encontrados
nos textos de ciências e nas aulas.
• A História, examinando a vida e o tempo individualmente dos cientistas, humaniza
o assunto da ciência, tornando-o menos abstrato e mais motivador para os
estudantes. (MATTHEWS, 1995, p.7)
Neste sentido, torna-se necessário salientar as questões filosóficas a que os cientistas
da época buscavam respostas, bem como relacionar as inúmeras descobertas científicas com o
contexto histórico em que estes estavam inseridos. Nas palavras de (GUERRA et al, 1998) :
Conhecendo a ciência a partir de uma visão histórico-filosófica será possível compreender os
conceitos científicos e, principalmente, usar este conhecimento para entender o mundo
contemporâneo.
Desenvolvimento da Pesquisa
Esta pesquisa foi desenvolvida no âmbito da disciplina de Introdução à Pesquisa II, do
curso de Licenciatura em Física de uma Instituição Federal de Ensino Superior e teve como
objetivo identificar e analisar trabalhos que discutem o ensino de Física Moderna e
Contemporânea por meio da abordagem histórico-filosófica. Nesse sentido foi desenvolvida
revisão de literatura na área de ensino de ciências sobre trabalhos que versam sobre essa
temática.
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A revisão de literatura é um processo de levantamento e análise de informações sobre um determinado assunto que já foi publicado sobre o tema e o problema de
pesquisa escolhidos para ser enfocado no trabalho de curso. Permitirá um
mapeamento de quem já escreveu e o que já foi escrito sobre o tema e/ou problema
da pesquisa (SILVA e MENEZES, 2005, p.16).
A pesquisa bibliográfica ocorreu por meio da localização de artigos e dissertações que
tratavam de maneira geral, sobre a abordagem HFC. A partir de periódicos disponíveis online
(Ciência e Ensino; Ciência & Educação; Caderno Brasileiro de Ensino de Física e Revista
Brasileira de Ensino de Física), nos sites de Programas de Pós-graduação em Educação (USP,
UFPR e UFBA) e nos atas dos Encontros Nacionais de Pesquisa em Educação em Ciências
(ENPEC).
Para a busca foram utilizadas algumas palavras-chave, tais como: Ensino de Física,
História da Ciência, História e Filosofia da Ciência, Física Moderna, Ensino médio, Ensino de
Física Moderna, Ensino de Física Contemporânea no Ensino médio e Natureza da Ciência.
O foco principal foi identificar trabalhos que relatavam propostas de ensino
desenvolvidas em sala de aula na educação básica, desta maneira a leitura do resumo de cada
texto nos permitiu identificar se o mesmo tratava do assunto de interesse. Os materiais
encontrados foram organizados na forma de fichamentos e tomados como base, com vistas à
segunda etapa da investigação, que consistiu na análise de características relacionadas à
abordagem HFC no ensino de FMC.
Propostas para o Ensino de Física que utilizam a abordagem HFC
Durante o processo de pesquisa foram selecionados alguns artigos que atendiam aos
critérios citados anteriormente, os mesmos estão organizados nas tabelas 1 e 2, onde são
ressaltadas as principais características de cada trabalho analisado:
Tabela 1. Principais características dos artigos analisados.
Trabalho Título Objetivos Como utiliza
HFC
Estratégia de
Ensino
T1 Construção de conceitos
de Física Moderna e
sobre a natureza da
ciência com o suporte da
hipermídia
Propor e avaliar um software
educacional que emprega a
hipermídia e enfoca aspectos
históricos, filosóficos,
tecnológicos, sociais e ambientais da ciência, objetivando o ensino
da teoria da relatividade.
Textos
compostos
através de
pesquisa
bibliográfica
Uso do software
educacional
desenvolvido pelos
autores para expor
o conteúdo de maneira atrativa
(computacional).
T2 Uma discussão sobre a
natureza da ciência no
ensino médio: um
exemplo com a teoria da
Apresentar um módulo didático
baseado em HFC e analisar as
mudanças nas concepções dos
estudantes sobre a natureza da
Textos
históricos,
extratos de
textos originais
Desenvolvimento
de atividades em
grupo, visando a
compreensão sobre
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relatividade restrita ciência. e história em
quadrinhos.
a transição da FC
para a FM e a
discussão do
processo de
construção da
ciência.
T3 Tempo relativístico no
início do ensino médio
Promover a ampliação da noção
de tempo dos estudantes por meio
da construção de uma nova zona
associada à compreensão da relatividade do tempo.
Vídeos, músicas
e textos.
Utilizam debates
com intuito de
confrontar as
concepções prévias do conceito de
tempo por meio de
uma experiência de
pensamento.
T4 História e a filosofia da
ciência: caminhos para a
inserção de temas física
moderna no estudo de
energia na primeira série
do Ensino Médio
Apresentar e analisar uma
sequência didática, utilizando uma
abordagem histórico-filosófica,
com intuito de discutir como o
conceito de energia desenvolveu-
se ao longo da história.
Textos, trechos
de filmes, slides
e vídeos
Utilizam o contexto
histórico-filosófico
como eixo
condutor,
ressaltando a
ciência como uma construção humana
e discutindo como
trabalhos de
diferentes
pesquisadores
podem se
complementar.
T5 Teoria da relatividade
restrita e geral no
programa de mecânica
do ensino médio: uma possível abordagem
Apresentar e discutir uma
proposta centrada na abordagem
histórico-filosófica, ressaltando
controvérsias no ambiente científico cultural e questões
éticas acerca do tema
Relatividade.
Imagens
históricas
Por meio do uso de
imagens,
promovem a
reflexão sobre as diferentes
concepções de
tempo e espaço
construídas pelo
homem ao longo da
história.
T6 O uso de imagens como
um caminho capaz de
problematizar questões a
respeito da Natureza da Ciência em torno ao
tema Energia Nuclear
Apresentar e discutir uma
investigação pedagógica, centrada
no uso de imagens, acerca da
concepção dos alunos sobre radiação e Natureza da Ciência.
Imagens
históricas
A partir da
produção textual
com base em
imagens, levantam as concepções
prévias dos alunos
acerca do tema
radiação e
elementos da
natureza da ciência.
Fonte: Dados organizados pelos autores.
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Tabela 2 – Principais características dos módulos didáticos apresentados nos artigos analisados.
Trabalho Conteúdo Número de alunos /
Tempo de duração Instrumentos de avaliação
T1 Teoria da relatividade
7 alunos / 20 horas Questionários e entrevistas.
T2 Teoria da relatividade restrita
31 alunos / 15 horas-aula Pré e pós-testes.
T3 Teoria da relatividade restrita
20 alunos / 20 horas-aula Pré e pós-testes.
T4
Efeito fotoelétrico, quantização de energia e
equivalência massa-energia.
68 alunos / 2 meses letivos Textos produzidos pelos
estudantes e entrevista.
T5
Teoria da relatividade restrita
e geral
Não consta Falas dos alunos durante as
aulas.
T6
Energia Nuclear 73 alunos Falas dos alunos, textos
produzidos pelos mesmos e
anotações feitas pelo
professor durante as aulas.
Fonte: Dados organizados pelos autores, com base nos artigos analisados.
Metodologia de análise e resultados
Para analisarmos os trabalhos selecionados através da pesquisa bibliográfica, levamos
em consideração a análise textual discursiva, que nos permite um diagnóstico qualitativo por
meio de categorizações a priori, ou seja, aquelas já disponíveis na literatura (MORAES,
2003). Utilizamos algumas das categorias de inserção da História e Filosofia da Ciência no
ensino, desenvolvidas por Kapitango (2014), tais como:
CRITICIDADE: fonte de interpretação, desmistificação, resignação e hermenêutica;
CONTEXTUALIZAÇÃO EXTERNA: articulador da evolução de relações
socioculturais, econômicas, políticas e históricas;
SISTEMICIDADE: fonte de relações inter/multidisciplinares e de relações de
integração sistêmica;
FALIBILIDADE EPISTÊMICA: meio de reconhecimento dos limites do
conhecimento científico;
SOCIALIZAÇÃO EPISTÊMICA: fonte de formação do cidadão;
ETICIDADE: meio de discussão filosófica de dimensão ética;
Na tabela 3 apresentamos a distribuição dos trabalhos encontrados com a temática
FMC na educação básica com enfoque histórico-filosófico, distribuídos nas diferentes
categorias.
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Tabela 3. Trabalhos agrupados por categorias.
Categoria Trabalho
CRITICIDADE
T1, T2, T4.
CONTEXTUALIZAÇÃO EXTERNA
T1, T2, T3, T4, T5.
SISTEMICIDADE
T1, T4, T5.
FALIBILIDADE EPISTÊMICA
T1, T2, T3, T4, T5.
SOCIALIZAÇÃO EPISTÊMICA
T1, T4, T5.
ETICIDADE
T1, T4, T5.
Fonte: Dados organizados pelos autores, com base nos artigos analisados.
O trabalho T6 não foi inserido na tabela 3 por se tratar de uma investigação
pedagógica, não sendo desenvolvida ou relatada uma sequência didática.
As categorizações foram efetuadas com vista às descrições dos autores, tanto na
justificativa quanto nos resultados obtidos, sobre o papel da abordagem HFC no ensino.
Justificaremos os motivos para que cada trabalho tenha sido classificado de tal maneira.
Criticidade
Em três trabalhos analisados aparecem argumentos de que a abordagem HF promoveu
uma nova interpretação da Natureza da Ciência e do trabalho científico. Em T1 é ressaltada a
importância da desmistificação quanto à Natureza da Ciência, considerando a abordagem
histórico-filosófica um importante auxílio à interpretação do conhecimento científico e suas
etapas de construção. Segundo os autores do trabalho T2, o módulo didático contribuiu para
mudar significativamente a visão crítica dos estudantes sobre a Natureza da Ciência e do
trabalho científico. Já em T4, é relatado que a proposta didática promoveu a reflexão dos
alunos em torno da Natureza da Ciência.
Contextualização externa
Todos os trabalhos relatam que a abordagem HF permitiu uma evolução na visão dos
estudantes quanto à Ciência, demonstrando que o trabalho científico está diretamente ligado a
20183
questões históricas, econômicas e sociais. Desta forma, há uma contextualização das questões
externas ao desenvolvimento da ciência.
Sistemicidade
Nos trabalhos T1, T4 e T5, os autores demonstram que ocorreram relações
interdisciplinares durante a proposta didática.
T1: Possui um módulo específico de Ciência e Filosofia dentro do software
educacional desenvolvido.
T4: Durante a proposta didática são retomados alguns estudos que os estudantes
haviam realizado na disciplina de História sobre Iluminismo e a Revolução Industrial.
Essa estratégia se mostrou muito eficaz. Os alunos responderam o questionamento da professora e apresentaram afirmações sobre o Iluminismo e sobre o impacto da
Revolução Industrial no século XVIII. Esse momento serviu para que a professora
chamasse atenção para o fato de que o conteúdo estudado em história seria
importante para que eles compreendessem as questões trazidas pelos cientistas que
passariam a conhecer. (MORAIS; GUERRA, 2013)
T5: Traz um diálogo entre Física e arte à sala de aula, com intuito de promover
reflexões sobre as diferentes concepções de tempo e espaço construídas pelos homens ao
longo da História.
Durante as aulas, foi retomada a mudança de representação espacial dos pintores renascentistas para a dos que viveram no início do século XX, como a dos
representantes do cubismo. Esse paralelismo foi importantíssimo, uma vez que
permitiu ao aluno mergulhar no ambiente cultural em que a teoria analisada se
construiu. (GUERRA; BRAGA; REIS, 2007)
Aluno 1 –“Analisando atenciosamente a obra artística contemporânea à formulação
da teoria relativística pode-se notar seu esforço na tentativa de romper com as
antigas relações de espaço e tempo do século XIX, baseada na tese newtoniana com
suporte na geometria euclidiana. A deformidade espaço-temporal proposta por
Einstein, bem representada na pintura cubista, caracterizada pela múltipla percepção
dos objetos, enxergados de variadas angulações e posições, eliminando a perspectiva
renascentista que encerrava emancipadamente os conceitos de massa, tempo e
espaço". (GUERRA; BRAGA; REIS, 2007)
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Falibilidade Epistêmica
Os cinco trabalhos mostram argumentos que a HFC permite demonstrar a limitação do
conhecimento científico, ressaltando as rupturas que ocorrem durante a construção do
conhecimento.
No trabalho T2 a Física Clássica é abordada através dos conceitos e ideias de Newton
e Galileu, instigando os alunos a uma discussão sobre a limitação da Física Clássica. Em
seguida foram apresentados conceitos da mecânica relativística bem como a vida e obra de
Einstein, permitindo aos estudantes obterem comparações entre conceitos destas duas fases da
ciência.
O estudo dos movimentos constituiu-se na porta de entrada para a relatividade
restrita, pois os alunos puderam ser defrontados com os seguintes problemas: o princípio da equivalência e as transformações de Galileu possuem limites, ou são
válidas para quaisquer casos? (GUERRA; BRAGA; REIS, 2007)
O objetivo dos textos 2 e 3 é contribuir para a percepção do fato de que os conceitos
da Física evoluem, o estabelecimento da distinção entre física clássica e física
moderna e a obtenção de uma noção geral e qualitativa de diversos conceitos fundamentais da física moderna. (MACHADO; NARDI, 2006)
Socialização Epistêmica
Os trabalhos T1, T4 e T5 salientam sobre a importância da HFC como fonte de
divulgação científica na formação cidadã do estudante.
Eticidade
Os trabalhos T1, T4 e T5 relatam que se valeram da concepção HFC para discutir o
papel ético do cientista perante a sociedade, considerando que o desenvolvimento científico
emerge de valores e ações, sendo creditado ao cientista o julgamento a respeito das
implicações éticas e morais da ciência.
Constatou-se que quase todos os estudantes desenvolveram noções sobre a
responsabilidade dos cientistas e da população diante de questões científicas e
tecnológicas com repercussões sociais e ambientais, e ampliou sua conscientização
quanto não neutralidade social da Ciência e dos pesquisadores. (MACHADO; NARDI, 2006)
Apresentamos, então, o desenvolvimento científico em meio a Segunda Guerra
Mundial, com o objetivo de debater com os alunos a questão da ciência e seus
produtos, com destaque para a construção da bomba atômica. (MORAIS; GUERRA,
2013)
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Considerações Finais
A revisão nos mostra que há grande discussão entre pesquisadores sobre a inserção do
estudo da Física Moderna no Ensino médio. Alguns salientam que a HFC se torna um
possível caminho no processo de aprendizagem, pois possibilitam ao aluno uma “visão”
próxima da construção da ciência, desfazendo seu estereótipo de imutável e demonstrando
que o conhecimento é resultado da cultura humana. A abordagem HFC pode ser utilizada para
diferentes finalidades educacionais, porém por meio da categorização dos artigos analisados,
fica claro que os autores tinham várias intenções, o que demonstra que se pode trabalhar
durante o mesmo módulo com diferentes aspectos através deste enfoque.
A pesquisa nos revelou que há grande carência de artigos com propostas para ensino
de Física Moderna por meio da abordagem histórico-filosófica. Nos artigos analisados foi
possível perceber grande aceitação dos alunos, quanto à metodologia utilizada, pois passaram
a entender a Física para muito além das equações e fórmulas. Neste contexto é possível
aproximar o aluno do conhecimento científico, demonstrando que não precisa ser gênio para
compreender a Ciência.
Porém os autores ressaltam que não adianta dispormos de propostas para o ensino se o
professor não possuir uma formação epistemológica adequada. Portanto, a mudança curricular
deve ser discutida não somente a nível escolar, mas também em cursos de formação de
professores, visto que é imprescindível o domínio do conteúdo para que a abordagem atinja os
objetivos esperados.
Em relação ao material didático, os autores destacam a importância na análise do
conteúdo, pois vários livros didáticos reforçam a ideia de construção linear e imutável da
Ciência, o que contraria a finalidade das propostas, portanto cabe ao professor distinguir o
material apropriado para utilização ou conseguir neutralizar possibilidades de visão ingênua
da ciência.
Por fim, constatamos que as pesquisas sobre o ensino de Física Moderna por meio da
abordagem histórico-filosófica evoluiu, mesmo que a passos lentos, pois deixaram de ser
somente especulações e passaram a apresentar propostas possíveis para a sala de aula,
ressaltando que por meio desta abordagem os estudantes desenvolveram uma visão crítica e
ampla sobre questões da Natureza da Ciência e a construção do conhecimento científico.
20186
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