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GESTÃO EMPRESARIAL Jean-François Chanlat UMA PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA

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A empresa e a gestão se tornaram elementos centrais da vida social na maioria dos países industrializados e em economias emergentes. Mas a visão do ser humano, geralmente colocada nesse universo gestor, é muitas vezes simplista como em aulas e práticas de gestão em vigor. Diante dessa constatação, este livro procura apresentar uma concepção antropológica estendida, baseada tanto em uma série de trabalhos fundamentais em ciências sociais quanto na experiência vivida em contexto organizado. No início do século XXI, essa postura antropológica é essencial para enfrentar os grandes desafios confrontados pelo mundo em geral, e pelo Brasil em particular.

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A empresa e a gestão se tornaram elementos centrais da vida social na maioria dos países industrializados e em economias emergentes. Mas a visão do ser humano geralmente colocada nesse universo gestor é muitas vezes simplista como em aulas e práticas de gestão em vigor.

Diante dessa constatação, este livro procura apresentar uma concepção antropológica estendida, baseada tanto em uma série de trabalhos fundamentais em ciências sociais quanto na experiência vivida em contexto organizado. No início do século XXI, essa postura antropológica é essencial para enfrentar os grandes desafios confrontados pelo mundo em geral, e pelo Brasil em particular.

Esta obra faz parte da Coleção Debates em Administração, que busca fornecer ao leitor informação sucinta a respeito dos assuntos mais atuais e relevantes da Administração.

AplicaçõesObra indicada para estudantes e administração, estudos organizacionais, psicologia, sociologia e outras áreas correlatas de interesse por temas contemporâneos de gestão.

Sobre o autorJean-François Chanlat é professor das universidades DRM-Crepa, Dauphine de Pesquisa em Gestão, CNRS-UMR, Université Paris-Dauphine, e professor afiliado à Escola de HEC de Montreal. Membro da Sociedade Francesa de Administração, presidiu durante doze anos (1994-2006) o comitê de pesquisa “Sociologia das Organizações”, da Associação Internacional de Sociologia, e foi codiretor da comissão de pesquisa “Empresas e Sociedades”, da Associação Internacional de Sociólogos de Língua Francesa, de 1995-2008. Atualmente é diretor do GFR-Crepa do Dauphine de Pesquisa em Gestão, CNRS-UMR, corresponsável pela cátedra “Gestão e diversidade” da Universidade Paris- -Dauphine e diretor-executivo do MBA Dauphine-UQAM.

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Isabella F. Gouveia de VasconcelosFlávio Carvalho de VasconcelosAndré Ofenhejm Mascarenhas

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Jean-François Chanlat

UMA PERSPECTIVA ANTROPOLÓGICA

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SUMÁRIO

Introdução, XV

1. Ação Humana e Organização: As Dimensões Fundamentais, 1

2. Ação Humana, Organização, Culturas e Globalização, 47

3. Ação Humana, Espaço e Organização, 95

4. Ação Humana, Tempo e Organização, 127

5. Ação Humana e Organização Segundo a Teoria da Agência:Uma Crítica Antropológica, 149

6. Ação Humana, Ética, Poder e Organização, 183

Conclusão, 213

Referências Bibliográficas, 217

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introdução

Ao longo de aproximadamente um século, nossas socieda-des têm sido cenário de inúmeras transformações econô-micas, sociais, políticas e culturais. Essas transformações,

cujas origens datam sem dúvida de épocas ainda mais remotas,resultaram no que alguns historiadores e sociólogos chamaramcapitalismo histórico. Essa nova ordem social dinâmica testemu-nhou o nascimento e a multiplicação de muitas organizações di-versificadas, comprovadamente consideradas principais fontescontemporâneas individuais e coletivas de fixação e estruturação.Por isso, não é uma surpresa o fato de terem se tornado, em si,objetos de estudo. Esse interesse pelas entidades organizadas en-veredou por vários caminhos, como economia, sociologia, psico-logia, psicanálise, ciências políticas, gestão e antropologia.

No campo das ciências administrativas, o estudo do compor-tamento humano nas organizações resultou no surgimento deuma esfera de ação conhecida no universo anglo-saxão comocomportamento organizacional. Sucessor do movimento das re-lações humanas, de algumas áreas específicas da psicologia, dasociologia, da teoria da organização, da abordagem sociotécnica,das dinâmicas de grupo e de diversas correntes na área da gestão,o comportamento organizacional parece uma imensa “colcha deretalhos”, pois as pessoas são receptivas a qualquer corrente teó-rica e metodológica de pensamento. Durante a última década,

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introdução

Ao longo de aproximadamente um século, nossas socieda-des têm sido cenário de inúmeras transformações econô-micas, sociais, políticas e culturais. Essas transformações,

cujas origens datam sem dúvida de épocas ainda mais remotas,resultaram no que alguns historiadores e sociólogos chamaramcapitalismo histórico. Essa nova ordem social dinâmica testemu-nhou o nascimento e a multiplicação de muitas organizações di-versificadas, comprovadamente consideradas principais fontescontemporâneas individuais e coletivas de fixação e estruturação.Por isso, não é uma surpresa o fato de terem se tornado, em si,objetos de estudo. Esse interesse pelas entidades organizadas en-veredou por vários caminhos, como economia, sociologia, psico-logia, psicanálise, ciências políticas, gestão e antropologia.

No campo das ciências administrativas, o estudo do compor-tamento humano nas organizações resultou no surgimento deuma esfera de ação conhecida no universo anglo-saxão comocomportamento organizacional. Sucessor do movimento das re-lações humanas, de algumas áreas específicas da psicologia, dasociologia, da teoria da organização, da abordagem sociotécnica,das dinâmicas de grupo e de diversas correntes na área da gestão,o comportamento organizacional parece uma imensa “colcha deretalhos”, pois as pessoas são receptivas a qualquer corrente teó-rica e metodológica de pensamento. Durante a última década,

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outra área despontou repentinamente nesse cenário: a antropolo-gia organizacional.

O objetivo da antropologia organizacional ou de negócios [bu-siness antropology], como também é conhecida, é conhecer as pes-soas dentro de uma organização. Sua abordagem, inspirada pelaantropologia intelectual e pelas tradições metodológicas, é holís-tica. Os pesquisadores dessa corrente tentam entender o valor dosdiversos grupos que executam suas tarefas nas organizações. Seusfundamentos são claramente inspirados pelos estudos da antro-pologia clássica, assim como pelas contribuições da antropologiaindustrial, desde os primeiros trabalhos do movimento das rela-ções humanas, desenvolvido no fim da década de 1930. Os prin-cipais assuntos dessa corrente de pesquisas são agrupamentosculturais, culturas organizacionais, comportamento do mercado edo consumidor, globalização e culturas regionais, gestão intercul-tural e questões éticas. Seu desenvolvimento deve-se ao renovadointeresse em alguns assuntos antropológicos na área de pesquisade gestão e organizacional, assim como às dificuldades enfrenta-das pelos antropólogos em sua área de atuação tradicional.

O foco das pesquisas poderia ser reagrupado em dois temasprincipais. O primeiro conjunto de pesquisas foi criado com basenas noções das culturas corporativas e organizacionais. O obje-tivo era descrever organizações específicas (particulares, públi-cas, pequenas, médias ou grandes), artesanatos e ambientes detrabalho. Os trabalhos espalhados pelo mundo seguindo essalinha são numerosos e mostram a organização, sua cultura e comoo ambiente de trabalho produz identidades profissionais.

O segundo conjunto de pesquisas tem como meta entender ocomportamento no trabalho, as relações com a autoridade, a dinâ-mica da cooperação, a atitude em relação ao tempo e ao espaço, asrelações entre homens e mulheres, as relações com as diferenças se-gundo padrões culturais adequados ao grupo nacional ou regio-

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nal. Em outras palavras, esse conjunto busca mostrar de que ma-neira a organização e a gestão estão profundamente relacionadas àsculturas ambientais. Essas constatações têm importantes conse-quências sobre as práticas e as principais questões de gestão (or-ganização, decisão, negociação, liderança, gestão de qualidade),observadas em um contexto de relacionamentos interculturais.Atualmente, as trocas ocorridas em razão da internacionalização, asfusões e aquisições, o treinamento e a globalização socioeconômicasão particularmente sensíveis a essas diferenças culturais.

Realmente, de acordo com algumas pesquisas de gestão, ofator cultural é a chave para o sucesso ou fracasso em muitas si-tuações de gestão. Tais observações resultaram na estruturaçãode uma nova subdisciplina comercial, a gestão intercultural. Em-bora a cultura aparente ser a estrutura conceitual dessa correntede pensamento, sua grande diversidade indica importantes di-ferenças em relação à sua visão. Alguns, seguindo o ponto devista de Hofstede, veem a cultura como um programa mental e desenvolvem sua metodologia estatística, enquanto outros,como d’Iribarne, destacam-na como um universo de significadose metodologia qualitativa. Se essas duas posturas diferentespodem ser complementares, a segunda parece ser mais abran-gente no contexto concreto, em virtude de sua investigação decampo e postura etnológica.

Aqui, existe pelo menos uma perspectiva adicional, em algunsaspectos relacionada a essas estruturas antropológicas e, também,diferentes delas. Diante da fragmentação do conhecimento nasciências humanas, alguns pensadores franceses tentaram criar emanter uma versão unificada dos seres humanos. De fato, talfragmentação costumava significar que os pesquisadores estavamrestritos à avaliação de um universo relativamente pequeno, atémicroscópico. Ela também resultou no desenvolvimento de umaimagem estilhaçada do ser humano. A visão de um indivíduo

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fragmentado provocou efeito duplo: no que diz respeito ao níveldisciplinar, conduziu muitos pesquisadores aos caminhos do re-ducionismo e do imperialismo biológico, psicológico e socioló-gico; na parte organizacional, resultou, com frequência, em açõese práticas sociais que ignoraram muitas dimensões humanas.

Muitas vezes, esse foi o caso no setor que passou a ser cha-mado ciência administrativa ou organizacional. Tal panorama li-mitado sobre os seres humanos não pode abranger totalmente suacomplexidade. Assim, a visão predominante dos seres humanosna forma de homo economicus, racionais e reativos a estímulos ex-ternos (ocidentais e norte-americanos), cuja universalidade nãodeve ser questionada, foi muito discutida e criticada.

Alguns acadêmicos franceses de gestão e organizacionais ten-tam dar aos gestores uma antropologia, um conjunto de conheci-mentos básicos sobre os seres humanos, e construir uma verdadeiraantropologia das organizações, capaz de recuperar a unidade e aespecificidade dos seres humanos, e identificam as dimensões fun-damentais e os vários níveis de avaliação que tal tarefa exige. Porisso, a expressão, nesse caso, é utilizada no seu sentido etimoló-gico. Existe um mundo adequado para as pessoas e precisamosdescrevê-lo da melhor forma possível. Inspirado por Mauss e ou-tros pesquisadores, esse movimento antropológico também temum objetivo ético: transformar o local de trabalho em um ambientedigno de se viver.

A complexidade dos problemas que nos atingem em escalatanto nacional como internacional, a importância da diversidadecultural, o destaque conferido às aspirações individuais que Michel Foucault denominou autointeresse, a busca por solida-riedade, os desafios técnicos e éticos orientaram-nos a produzirmodelos de gestão e organizacionais estruturados nessa antro-pologia das organizações. Para essa corrente, o que está em jogoé o renascimento do humano nas organizações. No início do sé-

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culo XXI e em razão dos grandes desafios que enfrentamos, talperspectiva não é um luxo, mas uma necessidade. O futuro dahumanidade está em jogo.

Os seis capítulos que se seguem apresentam elementos dessaperspectiva antropológica. O primeiro trata das principais di-mensões da ação humana no contexto organizacional. O segundoaborda a questão dos valores e da cultura no contexto da globa-lização que conhecemos. O terceiro e o quarto capítulos discu-tem, respectivamente, tempo e espaço. O quinto mostra umacrítica antropológica do modelo do ser humano destacado pelateoria da agência, origem de várias concepções contemporâneasde gestão. O último discute o aquecimento do planeta e a criseeconômica mundial, dos pontos de vista ético e da responsabili-dade social.

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culo XXI e em razão dos grandes desafios que enfrentamos, talperspectiva não é um luxo, mas uma necessidade. O futuro dahumanidade está em jogo.

Os seis capítulos que se seguem apresentam elementos dessaperspectiva antropológica. O primeiro trata das principais di-mensões da ação humana no contexto organizacional. O segundoaborda a questão dos valores e da cultura no contexto da globa-lização que conhecemos. O terceiro e o quarto capítulos discu-tem, respectivamente, tempo e espaço. O quinto mostra umacrítica antropológica do modelo do ser humano destacado pelateoria da agência, origem de várias concepções contemporâneasde gestão. O último discute o aquecimento do planeta e a criseeconômica mundial, dos pontos de vista ético e da responsabili-dade social.

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capítulo 1Ação Humana e Organização: As Dimensões Fundamentais

Ao longo das últimas décadas, o mundo passou por mudan-ças profundas. O capitalismo histórico, como era chamadoem outros tempos por Fernand Braudel, conquistou o pla-

neta inteiro. Tal sucesso deveu-se à conjunção de vários fatores,sendo um deles, de grande importância, a queda do Muro de Ber-lim. O fim do comunismo não passou de um evento físico, a des-truição de um muro, que resultou, também – e especialmente –no desaparecimento de um modelo socioeconômico alternativoque travava até então uma luta com ele. A vitória do modelo dedesenvolvimento dos países ocidentais consagrou, portanto, maisuma vez, a dinâmica capitalista como a única forma de geração deriquezas, comprovando sua capacidade de superar as crises e crí-ticas, assumindo seu aspecto de destruição criativa sem trégua(Schumpeter, 1967; Saussois, 2006).

Esse acontecimento social gerou consequências imediatas. Le-gitimou a ideia de Mercado como mecanismo de coordenação dasatividades econômicas por excelência. Promoveu a empresa como

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modelo de organização eficaz em relação a todos os outros pa-drões organizacionais. Instituiu especialmente a gestão privadacomo categoria dominante do campo da gestão. Em outras pala-vras, após esses fatos, o mercado, as organizações e a gestão tor-naram-se instituições e categorias-chave para a compreensão douniverso social da modernidade (Giddens, 1987; Mintzberg, 1989,2004; Chanlat, 1990, 1998; Alvesson e Wilmott, 2003; Alvesson,Wilmott e Bridgman, 2009; Le Goff, 1992, 2000; Stiglitz, 2002, 2003;Saussois, 2006).

Os dois primeiros elementos, mercado e empresa, foram bemevidenciados pelo trabalho fundamental de Max Weber sobre a gê-nese do capitalismo, realizado na virada do século XX, dando con-tinuidade às reflexões de Marx (1909; 1991). O terceiro elemento, agestão, surge no mesmo período e será a base do funcionamentodas grandes organizações americanas que estão por vir (Chandler,1977; Wren, 1994; Bouilloud e Lécuyer, 1995; Chanlat, 2007 a e b).Se essa não foi retomada nos mesmos termos pela reflexão webe-riana, Max Weber falava, de fato, em termos de burocracia, a evo-lução das últimas décadas que fez que a gestão ocupasse umespaço considerável, não uma bela representação do crescimentoda racionalização do mundo, fortemente destacada pela análise do-ravante clássica do sociólogo da Universidade de Heidelberg?

A produção de ideias de gestão, diretamente relacionada àdinâmica do capitalismo moderno, é essencial para a sobrevi-vência e perenidade das organizações. Participando ativamenteda construção do nosso universo social, essas ideias originam--se especialmente de três fontes: dos próprios praticantes, dosconsultores e de pesquisadores universitários. Os primeiros sãocertamente mais numerosos e, entre eles, os engenheiros ocupamuma posição notável nessa produção (Wren, 1994). Os segundossão, talvez, os mais influentes, junto a alguns elementos do ter-ceiro grupo cujo número não parou de crescer ao longo dos últi-mos quarenta anos na maioria dos países industrializados com osurgimento das ciências de gestão (Déry, 1995).

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Entre as inúmeras publicações sobre gestão lançadas todos osanos, as reflexões que elas apresentam sobre a estratégia ocupamuma posição central. Em um mundo que está em plena transfor-mação, a reflexão estratégica é considerada, na verdade, o núcleoda ação de gestão. Ela é associada de bom grado a elementos comovisão, posicionamento, estruturas, identidade organizacional, li-derança, cultura, tecnologia e ambiente organizacional, elementosque a reflexão estratégica busca mobilizar em uma síntese coe-rente. O pensamento e a ação são elementos determinantes para asobrevivência e perenidade da empresa/organização e, na maiorparte do tempo, como atividade dos dirigentes no mais alto grau.Jean-Michel Saussois (2006, p. 65) escreve:

É sempre no último estágio que são elaboradas as estratégias dasgrandes empresas e certamente não é por acaso que os escritórios dosdirigentes das grandes empresas têm uma visão panorâmica domundo. Do alto das torres das sedes sociais das empresas, os diri-gentes gostam de dominar a paisagem para melhor reconfigurá-la.

Na década de 1960, após seu surgimento, nos Estados Uni-dos, a área de pesquisa estratégica (Ansoff, Andrews, Chandler)foi certamente palco para vários debates refletidos em muitas pu-blicações (Rhenman et al., Porter, 1985, Mintzberg, 1994; Larochee Nioche, 1998; Martinet e Thiétart, 2001; Pettigrew, Whittington eThomas, 2001; Koenig, 2004). Recentemente, testemunhamos osurgimento de outra corrente de pensamento da estratégia comoprática, “Strategy as pratice” (Pettigrew, Whittington e Thomas,2001), que constitui uma espécie de crítica do pensamento estra-tégico dominante. Com o passar dos últimos anos, alguns autoresfrancófonos da área estratégica tendem a caminhar por essa via,utilizando a expressão francesa “la fabrique de la stratégie”, fábricade estratégia, apresentando suas diferenças (Golsorkhi, 2006).

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Neste capítulo, não abordaremos as já conhecidas e numero-sas discussões conduzidas na área. Muitas publicações sobre oassunto descrevem muito bem a questão (Mintzberg, 1994;Mintzberg et al., 1998; Laroche e Nioche, 1998; Martinet e Thié-tart, 2001; Pettigrew et al., 2001; Koenig, 2004; Kalika et al., 2006).Partiremos do nosso ponto de vista, ou seja, de uma reflexão an-tropológica, conduzida há mais de vinte anos nas organizaçõese alguns de seus elementos já são conhecidos no Brasil.

Se esta reflexão confirma algumas preocupações em relação à“fábrica da estratégia”, busca também mostrar por outras formasalguns elementos pouco presentes, ocultos ou ainda esquecidosna reflexão gerencial e estratégica. No primeiro momento, fare-mos uma breve explicação de alguns elementos-chave que são aestrutura dessa antropologia da ação nas organizações, com o in-tuito de relembrá-los. Depois, apresentaremos as dimensões nor-malmente esquecidas da antropologia encontradas nos discursose nas práticas estratégicas atuais.

Alguns elementos-chave de uma antropologia da ação humana no contexto empresarial

Seguindo essa reflexão, partimos da ideia de que as práticas de ges-tão são práticas sociais enraizadas no tempo-espaço, ou seja, umasociedade, numa cultura e uma história. Para compreendê-las,como já comentamos na Introdução, é preciso recorrer a uma an-tropologia. Essa é dupla: de um lado, uma antropologia geral,um conjunto de conhecimentos do que constitui o ser humanocomo espécie e como indivíduo, e de outro, uma antropologiaespecífica, um conjunto de conhecimentos sobre os seres huma-nos estudados no contexto. Somente a partir desse olhar duplopoderemos conhecer a experiência humana no contexto empre-sarial (Chanlat, 1990, 1998, 2002, 2007 a e b).

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Neste capítulo, não abordaremos as já conhecidas e numero-sas discussões conduzidas na área. Muitas publicações sobre oassunto descrevem muito bem a questão (Mintzberg, 1994;Mintzberg et al., 1998; Laroche e Nioche, 1998; Martinet e Thié-tart, 2001; Pettigrew et al., 2001; Koenig, 2004; Kalika et al., 2006).Partiremos do nosso ponto de vista, ou seja, de uma reflexão an-tropológica, conduzida há mais de vinte anos nas organizaçõese alguns de seus elementos já são conhecidos no Brasil.

Se esta reflexão confirma algumas preocupações em relação à“fábrica da estratégia”, busca também mostrar por outras formasalguns elementos pouco presentes, ocultos ou ainda esquecidosna reflexão gerencial e estratégica. No primeiro momento, fare-mos uma breve explicação de alguns elementos-chave que são aestrutura dessa antropologia da ação nas organizações, com o in-tuito de relembrá-los. Depois, apresentaremos as dimensões nor-malmente esquecidas da antropologia encontradas nos discursose nas práticas estratégicas atuais.

Alguns elementos-chave de uma antropologia da ação humana no contexto empresarial

Seguindo essa reflexão, partimos da ideia de que as práticas de ges-tão são práticas sociais enraizadas no tempo-espaço, ou seja, umasociedade, numa cultura e uma história. Para compreendê-las,como já comentamos na Introdução, é preciso recorrer a uma an-tropologia. Essa é dupla: de um lado, uma antropologia geral,um conjunto de conhecimentos do que constitui o ser humanocomo espécie e como indivíduo, e de outro, uma antropologiaespecífica, um conjunto de conhecimentos sobre os seres huma-nos estudados no contexto. Somente a partir desse olhar duplopoderemos conhecer a experiência humana no contexto empre-sarial (Chanlat, 1990, 1998, 2002, 2007 a e b).

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Essa antropologia da ação humana no contexto empresarialestá fundamentada nos seguintes princípios:

1. Toda pessoa ou todo grupo é um ator social;2. Toda pessoa ou todo grupo será um ator social na proporção

da sua mobilização;3. Todo indivíduo e todo grupo têm uma identidade;4. Todo indivíduo e todo grupo possuem uma cultura que forma

um universo de significado graças à utilização da linguagem;5. Todo indivíduo ou grupo possui uma vida afetiva e um ima-

ginário;6. Todo indivíduo ou grupo se forma por meio do seu relaciona-

mento com os outros;7. Todo indivíduo ou grupo registra sua ação no espaço-tempo;8. Toda ação humana sempre é “materializada”, ou seja, ela co-

loca o corpo à prova;9. Toda ação humana sempre suscita um questionamento ético.

Em outras palavras, queremos afirmar que as práticas de gestãosão produtos da ação humana, frutos de experiências, e que essaspráticas, em si, destacam a ordem do que foi vivido.

Nossa antropologia da ação considera-se inspiração fenomeno-lógica. Seguindo a linha de Merleau-Ponty, acreditamos que o cien-tífico sempre tem uma concepção implícita da subjetividade ouobjetividade que deforma os dados que reúne (Merleau-Ponty,1944, 1976).

Na concepção fenomenológica, relembra Merleau-Ponty, ocomportamento não é uma simples reação a alguns estímulos,mas, especialmente, significados visados pela consciência. Antesde qualquer intenção, os comportamentos apresentam sentido namedida em que são reações ao significado vital da situação.

A consciência não é um receptáculo passivo das sensações. Entre aconsciência e as coisas existe um universo intermediário, ou seja, o

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universo cultural das instituições e dos símbolos, dos significados jáatribuídos, testemunhados pela cultura e pela história. Por exemplo,se eu sinto a primavera como alegre, isso ocorre porque existe todauma tradição cultural que faz que eu a perceba como tal, já que osgregos a festejavam, ou porque costumamos associá-la historica-mente à revolução. (1976)

Na verdade, toda experiência humana possui uma dimensãohistórica. O sujeito nunca é um espírito puro, um elemento iso-lado do mundo que o circunda. Toda existência é materializada.O corpo não é somente um simples conjunto biofísico, mas tam-bém um conjunto de significados vivenciados. Ele é animado, oespírito é materializado e ambos são indissociáveis. O universoentre a consciência e as coisas constitui-se, em primeiro lugar, nalinguagem. O significado não está nas consciências. Sua existên-cia nasce da interação entre essas consciências. Lembremo-nos dacélebre frase de Albert Camus: “São as outras consciências quenos movem”. A linguagem constitui, portanto, o tecido por meiodo qual se constrói a relação com o próximo. Ela se inscreve na re-lação da consciência e do universo que define nossa condição hu-mana. Em outras palavras, o homo socialis, por definição, é sempreum homo loquens.

A antropologia que nos entusiasma, portanto, é aquela que,de um lado, insiste na necessidade de recuperar a experiência hu-mana tal como é vivenciada e sentida pelas pessoas, em carne eosso, responsáveis pela criação das organizações; de outro, a quenos alerta sobre os efeitos das decisões gerenciais dos corpos e es-píritos das mesmas pessoas. Em face das visões de gestão geral-mente abstratas, universais e não materializados (Dufour eChanlat, 1985; Mintzberg, 1989, 2004; Chanlat, 1990, 1998; Pitcher,1998; Khurana, 2007), nossa postura de inspiração fenomenoló-gica pretende relembrar o enraizamento social, simbólico e cor-poral das nossas ações, sem o qual não existe vida humana dignade assim ser chamada. Ela se inscreve em uma visão ampliada e

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universo cultural das instituições e dos símbolos, dos significados jáatribuídos, testemunhados pela cultura e pela história. Por exemplo,se eu sinto a primavera como alegre, isso ocorre porque existe todauma tradição cultural que faz que eu a perceba como tal, já que osgregos a festejavam, ou porque costumamos associá-la historica-mente à revolução. (1976)

Na verdade, toda experiência humana possui uma dimensãohistórica. O sujeito nunca é um espírito puro, um elemento iso-lado do mundo que o circunda. Toda existência é materializada.O corpo não é somente um simples conjunto biofísico, mas tam-bém um conjunto de significados vivenciados. Ele é animado, oespírito é materializado e ambos são indissociáveis. O universoentre a consciência e as coisas constitui-se, em primeiro lugar, nalinguagem. O significado não está nas consciências. Sua existên-cia nasce da interação entre essas consciências. Lembremo-nos dacélebre frase de Albert Camus: “São as outras consciências quenos movem”. A linguagem constitui, portanto, o tecido por meiodo qual se constrói a relação com o próximo. Ela se inscreve na re-lação da consciência e do universo que define nossa condição hu-mana. Em outras palavras, o homo socialis, por definição, é sempreum homo loquens.

A antropologia que nos entusiasma, portanto, é aquela que,de um lado, insiste na necessidade de recuperar a experiência hu-mana tal como é vivenciada e sentida pelas pessoas, em carne eosso, responsáveis pela criação das organizações; de outro, a quenos alerta sobre os efeitos das decisões gerenciais dos corpos e es-píritos das mesmas pessoas. Em face das visões de gestão geral-mente abstratas, universais e não materializados (Dufour eChanlat, 1985; Mintzberg, 1989, 2004; Chanlat, 1990, 1998; Pitcher,1998; Khurana, 2007), nossa postura de inspiração fenomenoló-gica pretende relembrar o enraizamento social, simbólico e cor-poral das nossas ações, sem o qual não existe vida humana dignade assim ser chamada. Ela se inscreve em uma visão ampliada e

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integrada das ciências sociais, assim como pensaram autores dediferentes pontos de vista, como Max Weber (1991), Marcel Mauss(1968), Lucien Febvre (1992), Fernand Braudel (1985), GeorgesGusdorf (1967), ou, mais recentemente, Edgar Morin (1973, 1999).E seu registro na área de gestão retorna ao que outros e nós mes-mos tentamos fazer valer há mais de vinte anos (Dufour e Chan-lat, 1985; Aktouf, 1989; Chanlat, 1990, 1998, 2002; Enriquez, 1990,1997 a e b).

As dimensões geralmente esquecidas da ação humana no contexto empresarial

Os elementos que nos parecem excluídos em muitos trabalhossobre gestão, ou ainda que permanecem na sombra, são, na nossaopinião, sete: 1. o caráter coletivo e 2. linguístico da ação humana;3. o engaste simbólico da ação humana; 4. o papel dos imaginá-rios individual e coletivo; 5. a relação vivenciada no espaço; e 7. asconsequências vivenciadas da ação humana.

A ação humana no contexto organizacional: relação entre os atores

A ação humana num ambiente organizacional e, especialmente, aação estratégica são frutos de múltiplas ações. Um dos principaispesquisadores franceses sobre estratégia militar, uma das fontes deinspiração do pensamento estratégico francês, afirmou o seguinte:

Pensar estrategicamente não é um privilégio nobre. Conceber, pre-parar e conduzir a ação são atributos comuns, de certa forma estatu-tários, pertencentes aos “grandes” e “pequenos” praticantes cujasfunções básicas são igualmente necessárias, e entre as quais se dis-tribui o trabalho do espírito atuante. O político, o militar, o enge-nheiro, o economista e o generalista, assim como o especialista, todos

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estão igualmente envolvidos em uma mesma ação. Na estrutura po-lítico-estratégica, tanto decisores como executores pensam estrategi-camente. (Lucien Poirier, 2005)

Esse ponto de vista também é defendido por alguns pesquisa-dores da área de Gestão. Eles lembraram muito, ao longo dos últi-mos trinta anos, que a estratégia não foi privilégio único dosdirigentes (Weick, 1979; Martinet, 1983; Giroux, 2002; Pettigrew etal., 2003). Se esses têm, na verdade, um papel importante, não sãoos únicos. Existem outras partes envolvidas, outros atores que têmsua mensagem a transmitir e que pensam a respeito das escolhas eda qualidade do que ocorre após a tomada de decisão. Quanto aoprocesso decisório, só podemos pensar na importância de certosacionistas para as empresas com ações na bolsa, na ação de deter-minados fornecedores, na influência de alguns clientes, no papeldo Estado, nos movimentos de algumas categorias de trabalhado-res ou, ainda, nas manobras de alguns grupos de pressão para con-vencerem-se facilmente. Hoje, essa tomada de consciência cedeulugar a um importante campo de reflexão e de pesquisa acerca dagovernança das organizações (Charreaux e Wirtz, 2006; Gomez,2004; Perez, 2003; Clarke, 2004; Clarke e Chanlat, 2009).

Alguns estudos no campo da estratégia mostram também oquanto os cargos (cadres) intermediários e de nível superior sãoimportantes para o bom andamento estratégico (Vogler e Rou-zies, 2006). Por fim, outras publicações insistem na importânciada atividade cotidiana na recomposição de uma ordem prescritaque nem sempre é adequada para alcançar os resultados estipu-lados. A inteligência astuciosa, que os gregos chamavam Métis(Detienne e Vernant, 1989, 2009), fica, portanto, mobilizada parafazer as coisas no contexto exato em que elas ocorrem e não comodeveriam ser feitas em teoria. Em outras palavras, a transgressãocomum, trazida pelos atores, torna-se, portanto, fundamentalpara o bom andamento da organização (Alter, 2002) e da gestão(Babeau e Chanlat, 2008).

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Por vezes, essa tripla constatação sobressai-se muito com aque costuma ser divulgada no universo da gestão, no qual olíder, no ápice, ocupa um lugar primordial. Para alguns, bastater um dirigente visionário, com todas as qualidades que a si-tuação exige, para a tomada de boas decisões estratégicas. Se esseponto de vista de os dirigentes serem os únicos a ter a verdade,como atores-chave, basta que ele parta de uma concepção umpouco exagerada na verticalização heroica da ação estratégicapara dar conta da realidade da situação. Por isso alguns busca-ram recentemente superar essa visão antiga e valorizar as rela-ções estabelecidas cotidianamente entre os diferentes atores(Johnson et al., 2003) para melhor compreender a construção so-cial da estratégia.

Esses pesquisadores na área estratégica, apoiando-se em algu-mas contribuições das ciências sociais (Giddens, 1987), questiona-ram as abordagens clássicas e restituíram a produção estratégicaao seu contexto social concreto, formado por rotinas, códigos e lin-guagens específicas (Whittington, 2006). Segundo Seidl et al. (2006,p. 2), “Em geral a estratégia é definida como uma atividade socialconstruída por meio de ações, interações e negociações entre vá-rios atores e práticas, assim como por meio das práticas para asquais eles convidam”. Avançando um pouco mais, eles a definemde forma mais restritiva: “a estratégia como fluxo de atividadesno local e cumprida socialmente, com resultados influentes sobrea orientação e/ou a sobrevivência da empresa” (ibidem). Assim,eles buscam evidenciar três elementos ligados entre si: a prática, aspráticas e o praticante (Whittington, 2006).

A prática remete ao conjunto de ações humanas e, mais preci-samente, a “uma rede de conexões entre o que acontece na socie-dade e o que as pessoas fazem” (Seidl et al., 2006, p. 3). As práticasreagrupam todas as fontes cognitivas, comportamentais, proce-dimentais, discursivas e físicas que são mescladas, coordenadas eadaptadas para a construção da prática. E os praticantes são os

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atores que influenciam a construção da prática por meio do queeles são, do que refletem em relação às suas práticas, das suas for-mas de agir e de utilizar os recursos.

Em contrapartida, acreditamos que seja necessário, entre ospraticantes, diferenciar bem o que poderíamos chamar de prati-cantes-estrategistas, pessoas que, de fato, tomam decisões na rea-lidade concreta, como os especialistas de estratégia militar e osestrategistas, pessoas, pesquisadores ou analistas que estudam aposteriori as estratégias aplicadas pelos praticantes-estrategistas eprocuram criar uma tradição intelectual. Como escreve nova-mente Lucien Poirier (2005):

A estratégia e o estrategista não pensam de forma idêntica em relaçãoao seu objetivo comum. Para o primeiro, a estratégia em ação encon-tra seu significado no seu fim e no exercício de uma vontade e dos po-deres direcionados para esse fim. A ação estratégica realiza, a cadainstante, operações da razão; ela trabalha o bom senso, o julgamentoe a imaginação criadora, para avaliar, calcular, comparar e escolher asolução ideal em meio às soluções concebíveis do problema concretoe o local gerado pela busca do objetivo, solução que o ator acredita ser“a melhor”, considerando-se os critérios de escolha que indicam odados da situação político-estratégica, a natureza do objetivo estabe-lecido, os meios pertinentes oferecidos no momento, seus níveis de li-berdade no jogo de suas interações com os Outros […] O próprioestrategista ignora a pressão dos Outros, a tensão das vontades e o es-tresse da decisão responsável por assumir riscos. Seu pensamento élivre e sem consequências práticas imediatas. Ele encontra seu sen-tido na representação plausível e na análise crítica da produção daestratégia. O estrategista propõe uma explicação provável, constróiteorias descritivas da ação, cujas trajetórias reais ele tenta reconsti-tuir interpretando a informação fornecida pela observação de umaação passada ou, melhor, em execução.

Como podemos ver, tal visão redescobre aspectos fundamen-tais abordados anteriormente por várias grandes teorias sociais,

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A empresa e a gestão se tornaram elementos centrais da vida social na maioria dos países industrializados e em economias emergentes. Mas a visão do ser humano geralmente colocada nesse universo gestor é muitas vezes simplista como em aulas e práticas de gestão em vigor.

Diante dessa constatação, este livro procura apresentar uma concepção antropológica estendida, baseada tanto em uma série de trabalhos fundamentais em ciências sociais quanto na experiência vivida em contexto organizado. No início do século XXI, essa postura antropológica é essencial para enfrentar os grandes desafios confrontados pelo mundo em geral, e pelo Brasil em particular.

Esta obra faz parte da Coleção Debates em Administração, que busca fornecer ao leitor informação sucinta a respeito dos assuntos mais atuais e relevantes da Administração.

AplicaçõesObra indicada para estudantes e administração, estudos organizacionais, psicologia, sociologia e outras áreas correlatas de interesse por temas contemporâneos de gestão.

Sobre o autorJean-François Chanlat é professor das universidades DRM-Crepa, Dauphine de Pesquisa em Gestão, CNRS-UMR, Université Paris-Dauphine, e professor afiliado à Escola de HEC de Montreal. Membro da Sociedade Francesa de Administração, presidiu durante doze anos (1994-2006) o comitê de pesquisa “Sociologia das Organizações”, da Associação Internacional de Sociologia, e foi codiretor da comissão de pesquisa “Empresas e Sociedades”, da Associação Internacional de Sociólogos de Língua Francesa, de 1995-2008. Atualmente é diretor do GFR-Crepa do Dauphine de Pesquisa em Gestão, CNRS-UMR, corresponsável pela cátedra “Gestão e diversidade” da Universidade Paris- -Dauphine e diretor-executivo do MBA Dauphine-UQAM.

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Isabella F. Gouveia de VasconcelosFlávio Carvalho de VasconcelosAndré Ofenhejm Mascarenhas

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