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Estado de Mato Grosso MINISTÉRIO PÚBLICO Promotoria de Justiça de São Félix do Araguaia EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA COMARCA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA/MT. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 23, inciso VI, 129, inciso III, e 225 da Carta Magna; artigos 3º, 4º, inciso VII, e 14, § 1º, da Lei nº 6.938/85; Lei nº 7.347/85 e demais disposições da lei adjetiva civil; lastreado nas peças constantes no Inquérito Civil nº 011/2007, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE, COM PEDIDO LIMINAR, C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER em face do MUNICÍPIO DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA/MT, pessoa jurídica de direito público interno, com sede nesta cidade e Comarca, no Estado de Mato Grosso, pelos motivos fáticos e jurídicos que passa a expor: Promotoria de Justiça de São Félix do Araguaia/MT 1

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Estado de Mato GrossoMINISTÉRIO PÚBLICO

Promotoria de Justiça de São Félix do Araguaia

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA COMARCA DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA/MT.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento

nos artigos 23, inciso VI, 129, inciso III, e 225 da Carta Magna; artigos 3º, 4º, inciso

VII, e 14, § 1º, da Lei nº 6.938/85; Lei nº 7.347/85 e demais disposições da lei adjetiva

civil; lastreado nas peças constantes no Inquérito Civil nº 011/2007, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE, COM PEDIDO LIMINAR, C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER

em face do MUNICÍPIO DE SÃO FÉLIX DO ARAGUAIA/MT, pessoa jurídica de direito

público interno, com sede nesta cidade e Comarca, no Estado de Mato Grosso, pelos

motivos fáticos e jurídicos que passa a expor:

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I – DA LEGITIMIDADE ATIVA:

A legitimidade ativa do Ministério Público, in casu,

decorre da Constituição Federal, artigo 129, inciso III, verbis:

“Art. 129. São funções institucionais do Ministério

Público:”

[...]

“III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para

a proteção do patrimônio público e social, do meio

ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;”

Além de o artigo 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, que

estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente, tem-se, a partir da Lei da Ação Civil

Pública, o que segue:

“Art. 5º. Tem legitimidade para propor a ação principal e a

ação cautelar:

I – o Ministério Público;”

No mesmo diapasão é o disposto no artigo 25, inciso IV,

alínea “b”, da Lei 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público):

“Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições

Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis,

incumbe, ainda, ao Ministério Público:”

[...]

“IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na

forma da lei;”

Assim, decorre a legitimidade ministerial na medida em

que se trata de verdadeiro curador do meio ambiente, bem como dos princípios

constitucionais que regem a Administração Pública.

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Este é, inclusive, o entendimento do egrégio Superior

Tribunal de Justiça, cuja ementa peço vênia para transcrever:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LANÇAMENTO EM RIO DE

ESGOTO SEM TRATAMENTO. ANTECIPAÇÃO DOS

EFEITOS DA TUTELA PARA IMPOR À RÉ A

REALIZAÇÃO DE OBRAS PARA SOLUCIONAR O

PROBLEMA. REQUISITOS DO ART. 273 DO CPC.

REEXAME DE PROVA. LEGITIMIDADE DO

MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A DEFESA DOS

DIREITOS DIFUSOS. I - O Ministério Público, segundo

expressa disposição constitucional, tem legitimidade para

promover ação civil pública em defesa do meio ambiente

e de outros interesses difusos e coletivos. É destes

interesses que se cuida no caso, pois visa o parquet a

coibir o lançamento em rio de esgoto não tratado,

problema cuja solução, segundo procura demonstrar o

autor, cabe à recorrente. II – Omissis. III – Omissis. V -

Recurso Especial improvido.” (Superior Tribunal de Justiça

STJ; RESP 397840; SP; Primeira Turma; Rel. Min. Francisco

Cândido de Melo Falcão Neto; julgamento em 21/02/2006).

II – DA RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO NO CASO EM DESLINDE:

A Constituição Federal, em seu artigo 23, incisos VI e VII,

prevê que:

“Art. 23. É competência comum da União, dos Estados,

do Distrito Federal e dos MUNICÍPIOS:

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em

qualquer de suas formas;

VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;”

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Já o art. 30, inc. V, da Carta Magna estabelece:

“Art. 30. Compete aos Municípios:

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime

de concessão ou permissão, os serviços públicos

de interesse local, incluído o de transporte

coletivo, que tem caráter essencial;”

Diante deste quadro, é claro que a coleta e

destinação do lixo urbano se tratam de atividades com repercussão local, o que

justifica a competência municipal para a correta prestação de tal serviço público. Para

HELY LOPES MEIRELLES "a limpeza das vias e logradouros públicos é, igualmente,

serviço de interesse local, de suma importância para a coletividade.” (in Direito Municipal

Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Malheiros, 1998, pág. 348).

Compete aos Municípios, desta forma, a

disciplina e a prestação do serviço de coleta e destinação do lixo urbano, mediante a

observância das normas técnicas aplicáveis no sentido de proteger a qualidade do

meio ambiente e a saúde da população, o que não impede, de certo, a obtenção de

financiamentos junto aos demais entes públicos.

III - DOS FATOS:

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

No bojo do Inquérito Civil nº 011/2007, que instrui a

presente, por vários anos, o Ministério Público Estadual tratou de encaminhar

notificação recomendatória, realizar reuniões e apresentar minutas de termos de

ajustamento de conduta junto ao Município de São Félix do Araguaia/MT, tudo no

intuito de solucionar, extrajudicialmente, o tema em análise, qual seja a instalação e

funcionamento do aterro sanitário.

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No entanto, por 02 (duas) administrações públicas, nada

se efetivou, permanecendo o Município Requerido inerte, sendo a situação

relacionada com os resíduos sólidos idêntica desde o exercício de 2003.

De tal arte, a partir de análise técnica levada a efeito por

perito oficial, propõe-se a presente demanda no intuito, tão-somente, de salvaguardar

o meio ambiente nesta localidade tão bem servida pela Natureza.

3.1 – DA EXPOSIÇÃO FÁTICA:

Visando a cabal apuração de fatos indicadores de que a

Prefeitura Municipal de São Félix do Araguaia/MT estaria dando destinação final aos

resíduos sólidos urbanos inadequadamente, despejando-os em local impróprio,

ocasionando, assim, em severos prejuízos ao meio ambiente e à saúde pública da

população, o Ministério Público Estadual requisitou ao órgão fiscalizatório competente

uma análise criteriosa da situação.

Assim, a partir de requisição ministerial, procedeu-se com

vistoria técnica ambiental na área atualmente destinada pelo Poder Público Municipal

para a emissão e disposição de resíduos e dejetos sólidos.

De certo, o Requerido, sem qualquer critério ou

preocupação, deposita o lixo a céu aberto. Não há qualquer indício de proteção, bem

como obras de contenção do chorume. Ademais, o depósito de resíduos e dejetos não

se encontra cercado, encontrando-se em inobservância das normas sanitárias

exigíveis.

Ressalte-se, ainda, o acúmulo de resíduos hospitalares

com os resíduos sólidos domésticos, sem qualquer medida que vise o isolamento dos

primeiros. Saliente-se que quaisquer resíduos sólidos portadores de agentes

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infectantes, isto é, os materiais provenientes de estabelecimentos hospitalares e

congêneres, estão sujeitos a tratamento específico, bem como a procedimentos

mínimos ao gerenciamento desses resíduos, com vista a preservar a saúde pública e

a qualidade do meio ambiente, nos termos do artigo 1º, incisos III e IV, da Resolução

nº 05 do CONAMA. Ademais, segundo especificações da Associação Brasileira de

Normas Técnicas (ABNT), os resíduos de serviços de saúde deverão ser

acondicionados adequadamente em sacos plásticos brancos leitosos, devidamente

identificados e dispostos separadamente do lixo urbano, evitando assim a proliferação

de agentes patogênicos, o que, de maneira indubitável, no caso em deslinde, não

passa de mera ficção legal.

Invariavelmente, sobras domésticas, sucatas, detritos,

lixo hospitalar, vêm sendo acumulados no depósito acima mencionado. Com tal

prática, tem-se desconforto para parte da população circunvizinha, acarretando, ainda,

em inúmeros malefícios à saúde dos moradores da região, com a proliferação de

milhares de vetores, quais sejam insetos, roedores e aves, tudo isso sem prejuízo dos

danos ambientais em seguida descritos.

Outrossim, conforme já mencionado, o local não se

encontra isolado, havendo, assim, presença freqüente de adultos e crianças

trabalhando clandestinamente no local, dedicando-se, de certo, à atividade de seleção

de materiais recicláveis. De igual maneira, a presença de animais é rotineira, os quais

se alimentam dos dejetos ali depositados, sendo certo que tais animais estão sendo

vendidos na região, demonstrando, assim, o risco com que a população está sendo

submetida.

3.2 – DOS DANOS AMBIENTAIS:

Os “lixões” urbanos similares ao que existe no Município

de São Félix do Araguaia/MT constituem-se sério problema no tocante a aspectos do

meio ambiente, saúde e suas interações.

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O impacto causado por determinados resíduos pode

trazer conseqüências irreversíveis ao meio ambiente. Na questão do lixo doméstico,

resta sabido que materiais tóxicos são ali incluídos, os quais alcançando as águas

subterrâneas podem provocar poluição física, química, bioquímica e biológica das

mesmas. A demonstrar o ocorrido, seguem um breve excerto da perícia técnica

outrora realizada no “lixão” local:

“Esta poluição é compatível com a composição do lixo

disposto no lixão. Como exemplo deste tipo de poluição

ou contaminação, podemos citar as causadas por metais

pesados como o mercúrio, o cádmio e o chumbo,

presentes em lâmpadas de neom e fluorescente, pilhas,

baterias, tintas, amaciantes, ligas metálicas, papéis,

resíduos de galvanoplastia, impermeabilizantes,

anticorrosivos, cerâmica, vidro, plástico, inseticidas, etc.,

que poderão causar distúrbios renais, distúrbios

neurológicos, efeitos mutagênicos, alterações no

metabolismo, deficiências nos órgãos sensoriais, dores

reumáticas, distúrbios metabólicos levando à

osteoporose, perda de memória, dor de cabeça,

irritabilidade, alucinação, anemia, depressão, paralisia,

etc.” (fls. 31/32 do Inquérito Civil nº 11/2007 anexo).

Outra situação originada pela forma atual de despejo dos

resíduos sólidos é a da sua decomposição/fermentação, que contribui para a formação

do gás metano, o qual representa grave risco de incêndios.

Por conseguinte, os danos ocasionados ao meio

ambiente, em razão da atual situação envolvendo o “lixão” local, são diversos, os

quais, em síntese, aqui seguem demonstrados a partir de uma atenta transcrição do

laudo técnico anexo:

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“Pelo que foi visto no local, porém sem condições

nenhuma de medi-los, os danos causados ao meio

ambiente pela disposição inadequada de lixo são os

seguintes:

11-1) Contaminação de parte da camada superficial do

solo que está em contato direto como lixo;

11-2) Poluição atmosférica causada pela queima do lixo

e emanação de gases oriundos da decomposição do

mesmo;

11-3) Proliferação de vetores como moscas, ratos e usa

do excesso de alimento no lixo e facilidade de abrigo;

11-4) Possível contaminação de águas subterrâneas.

Conforme já foi citado, há necessidade de averiguação;

11-5) Poluição visual causada pela distribuição

desordenada de lixo na área e no entorno imediato.” (fl. 32 do Inquérito Civil nº 011/2007 anexo).

Assim, além da poluição das águas subterrâneas e da

poluição atmosférica oriunda, precipuamente, das queimadas e da emissão de gases

provenientes da decomposição dos resíduos, tem-se a poluição visual, posto que o

despejo de dejetos a céu aberto são fétidos e visualmente repugnantes.

Ademais, a proliferação de vetores, intimamente

relacionada com a transmissão de doenças, é um ponto gravoso no “lixão” municipal.

Ora, resta sabido que as moscas apresentam um ciclo reprodutivo de 12 (doze) dias,

com a emissão de cerca de 150 (cento e cinqüenta) ovos diários, as quais são

responsáveis pela transmissão de diversas espécies patogênicas. De igual maneira,

os roedores, agentes de transmissão de doenças como leptospirose e salmonelose,

em apenas 01 (um) ano de vida dão origem a um número próximo de 100 (cem) novos

ratos.

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Nesse sentido, tanto a degradação ambiental, quanto a

proliferação de doenças, advêm da emissão e disposição de resíduos indevidamente

realizada.

Se não bastasse a questão acima mencionada, o

Município não possui qualquer programa de reciclagem de lixo, o que diminuiria, em

muito, a quantidade de resíduos. Estima-se que mais de 40% (quarenta por cento) do

lixo doméstico é constituído por materiais recicláveis, dentre garrafas, papéis, metais e

plásticos.

A Administração Pública que pretenda gerenciar a

questão dos resíduos sólidos não pode considerar uma única tendência para o seu

tratamento, seja ela sob o ponto de vista químico, biológico ou físico. O enfoque

deverá ser interdisciplinar sobre todos os ângulos da atividade humana, desde a

geração do lixo até a sua destinação final. Nesse contexto, cumpre-se considerar que

um programa que englobe a reciclagem do lixo, bem como a conscientização da

população para este aspecto, torna-se imprescindível.

Contrariamente às tendências de compatibilização do

desenvolvimento com a preservação do meio ambiente, a Prefeitura de São Félix do

Araguaia/MT despeja resíduos de toda espécie em um mesmo local, denotando

absoluta falta de respeito à natureza.

Acerca do tema em deslinde, assim enuncia o douto

especialista Paulo Affonso Leme Machado:

“As descargas livres praticadas por particulares ou pelas

prefeituras municipais apresentam, inegavelmente,

perigos certos: poluição das águas subterrâneas e por

conseguinte dos cursos d’ água vizinhos, proliferação de

animais parasitas (insetos e roedores), odores

nauseabundos de fermentação, tendo efeito adverso

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sobre os valores da terra, criando transtorno público, com

interferência na vida comunitária e no desenvolvimento.”

[...]

“Consoante a Sociedade Americana de Engenheiros

Civis, aterro sanitário é ‘método de disposição de refugo

na terra, sem criar prejuízos ou ameaças à saúde e

segurança pública, pela utilização de princípios de

engenharia que confinam o refugo ao menor volume

possível, cobrindo-o com uma camada de terra na

conclusão de cada dia de operação, ou mais

freqüentemente de acordo com o necessário.” (Paulo

Affonso Leme Machado in Direito Ambiental Brasileiro. 14ª

edição. São Paulo: Malheiros. 2006, págs. 552/553).

Assim, gravosos os danos ambientais provenientes dos

depósitos de resíduos sólidos a céu aberto.

IV – DO DIREITO:

O sustentáculo e a fonte de todo direito ambiental

brasileiro é o artigo 225 da Constituição Federal de 1988, que dispõe:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo

e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao

Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe

ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos

essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e

ecossistemas;

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II e III – Omissis;

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou

atividade potencialmente causadora de significativa

degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto

ambiental, a que se dará publicidade;

V e VI – Omissis;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei,

as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,

provoquem a extinção de espécies ou submetam os

animais à crueldade.”

Por seu turno, a Lei Federal nº 6.938/81, que dispõe

sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, prevê, em seu artigo 10, caput, o

seguinte:

“Art. 10. A construção, instalação, ampliação e

funcionamento de estabelecimentos e atividades

utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva

e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob

qualquer forma, de causar degradação ambiental,

dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual

competente, integrante do Sistema Nacional do Meio

Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio

Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em

caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças

exigíveis.”

A Lei Estadual nº 7.862, de 19 de dezembro de 2002, que

dispõe sobre a Política Estadual de Resíduos Sólidos, estabelece:

“Art. 14 Constituem serviços públicos de caráter

essencial à organização municipal, o armazenamento, a

coleta, o transporte, o tratamento e a disposição final dos

resíduos sólidos.”

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“Art. 19 Os responsáveis pela geração de resíduos ficam

obrigados a elaborar o Plano de Gerenciamento de

Resíduos Sólidos - PGRS, de acordo com o estabelecido

no art. 20.

§ 1º Os Planos de Gerenciamento de Resíduos Sólidos

deverão ter um planejamento compatível com o período

de implantação de seus programas e projetos, devendo

ainda ser periodicamente revisados e devidamente

compatibilizados com o plano anteriormente vigente.

§ 2º Os resíduos que apresentem risco potencial à saúde

pública e ao meio ambiente, devido à presença de

agentes biológicos e substâncias químicas perigosas,

deverão receber tratamento diferenciado durante as

operações de manejo, coleta, acondicionamento,

armazenamento, transporte, tratamento e disposição

final.”

“Art. 20. Caberá a FEMA fixar os critérios básicos sobre

os quais deverão ser elaborados os Planos de

Gerenciamento de Resíduos Sólidos - PGRS, para fins

de licenciamento, contemplando, além dos princípios e

fundamentos estabelecidos nesta lei, os itens a seguir:

I - diagnóstico da situação atual do sistema de

gerenciamento de resíduos sólidos;

II - a origem, caracterização e volume de resíduos

gerados;

III - os procedimentos a serem adotados na segregação,

coleta, classificação, acondicionamento, armazenamento,

transporte, reciclagem, reutilização, tratamento e

disposição final, conforme sua classificação, indicando os

locais onde essas atividades serão implementadas;

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IV - as ações preventivas e corretivas a serem praticadas

no caso de situações de manuseio incorreto ou

acidentes;

V - definição e descrição de medidas direcionadas à

minimização da quantidade de resíduos e ao controle da

poluição ambiental causada por resíduos, considerando

suas diversas etapas - acondicionamento, coleta,

segregação, transporte, transbordo, tratamento e

disposição final;

VIII - cronograma de implantação das medidas e ações

propostas; e

IX - a designação do responsável técnico pelo plano de

gerenciamento de resíduos e pela adoção das medidas

de controle estabelecidas por esta lei.

§ 3.º - Ficam sujeitos à elaboração e apresentação do

Plano de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos

de que trata este artigo:

I - os Municípios;

Em observância aos princípios da Política Nacional do

Meio Ambiente, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) editou a

Resolução nº 1, de 23 de janeiro de 1986, que disciplina:

“Artigo 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se

impacto ambiental qualquer alteração das propriedades

físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada

por qualquer forma de matéria ou energia resultante das

atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam:

I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

II - as atividades sociais e econômicas;

III - a biota;

IV - as condições estéticas e sanitárias do meio

ambiente;

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V - a qualidade dos recursos ambientais.”

“Artigo 2º - Dependerá de elaboração de estudo de

impacto ambiental e respectivo relatório de impacto

ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do

órgão estadual competente, e do IBAMA em caráter

supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do

meio ambiente, tais como:

I a IX – Omissis;

X- Aterros sanitários, processamento e destino final de

resíduos tóxicos ou perigosos;”

Quanto à destinação dos resíduos de serviços de saúde,

o Município deve atender ao que disciplina a Resolução CONAMA n.º 358, de 29 de

abril de 2005, promovendo a regularização do atual sistema de incineração junto ao

órgão ambiental.

Como importantes marcos legais aplicáveis ao caso em

tela, podemos trazer, ainda, as disposições do artigo 264 da Constituição do Estado

de Mato Grosso, e artigos 17, 23, 24, inc. X, 86, 87 e 89 do Código Ambiental de Mato

Grosso (Lei Complementar n.º 38/1995).

Portanto, o Município de São Félix do Araguaia/MT vem

se omitindo na preservação dos recursos naturais e no atendimento aos padrões de

qualidade ambiental e de saúde pública, havendo a necessidade premente de coibição

da prática em tela, considerando-se os males à saúde pública e ao meio ambiente

que, a essa altura, já se encontram afetados.

Diante deste quadro e tendo em vista as funções

institucionais imposta pela Constituição Federal ao Ministério Público, em especial

“zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública

aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a

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sua garantia” e ainda “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses

difusos e coletivos” (CF, art. 129, II e III), nada resta senão o ajuizamento da presente

ação civil pública, cabendo ao Poder Judiciário a relevantíssima função de assegurar o

exercício dos direitos constitucionais pelos cidadãos de São Félix do Araguaia/MT,

desta e das próximas gerações.

Em casos similares, já se decidiu:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

DEFESA DO MEIO AMBIENTE. ATERRO SANITÁRIO.

POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. Diante da ampliação, pela Constituição Federal, das funções institucionais do Ministério Público, a quem incumbe promover a ação civil para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, apresenta-se juridicamente possível o pedido formulado pelo Parquet visando a compelir a administração do município a tomar as medidas cabíveis para implantação de aterro sanitário, localizado em área de preservação permanente.” (TJ-SC; AI 98.017550-0;

Urubici; Terceira Câmara Cível; Rel. Des. Eder Graf; Julg.

13/04/1999)(negrito nosso).

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL

PÚBLICA AMBIENTAL. DESTINAÇÃO FINAL DOS

RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS DO MUNICÍPIO.

OBRIGAÇÃO DE FAZER. IMPLANTAÇÃO DE ATERRO

SANITÁRIO ADEQUADO. PROVA DA

IRREGULARIDADE DO SISTEMA DE DESTINAÇÃO

FINAL DO LIXO DO MUNICÍPIO. SENTENÇA ULTRA

PETITA. DECOTE. 1 - Em ação civil pública proposta

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pelo Ministério Público com fundamento na precariedade do sistema de destinação final do lixo urbano do Município, revelando-se incontroversa a ilegalidade praticada e não estando demonstrada a regularização da situação, é de confirmar-se a sentença na parte que condenou os réus a providenciarem a implantação de aterro sanitário adequado. 2 - Se a sentença exorbita o pedido inicial e

condena o requerido à restauração das condições da

área onde era feito o depósito do lixo, cabe decotar o

excesso, assim afastando o vício ultra petita do julgado. 3

- Sentença parcialmente reformada, em reexame

necessário.” (TJ-MG; RN 1.0012.04.000250-8/001; Aiuruoca;

Oitava Câmara Cível; Rel. Des. Edgard Penna Amorim; Julg.

24/08/2006; DJMG 25/10/2006)(negrito nosso).

Não cumprindo com suas incumbências e atribuição, já

esboçadas, o Requerido se torna civilmente responsável, inclusive, por eventuais

danos sofridos pela sociedade e o meio ambiente, em virtude de sua omissão

(negligenciando o policiamento e a execução de medidas preservacionistas do

patrimônio natural e da saúde e segurança da comunidade). Realça-se,

oportunamente, que a responsabilidade, aos termos do artigo 14, § 1º, da Lei nº

6.938/81, é objetiva, pouco importando, pois, qualquer argumentação acerca da

existência de culpa ou de responsabilidade de qualquer outro órgão.

V – DA POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO PODER PÚBLICO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA:

Está se tornando pacífico o entendimento de que os

direitos difusos e coletivos podem ser reivindicados por intermédio de Ação Civil

Pública em face da Administração Pública, inclusive em hipóteses onde a conduta

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administrativa é discricionária, sem que se constitua tal ação numa intromissão

indébita de um Poder, mas, na verdade, um meio legítimo de controle externo, no

âmbito da moralidade, igualdade e razoabilidade, princípios basilares do Direito

Público Pátrio.

A jurisprudência, a seu turno, já tem apresentado

decisões neste sentido, conforme ementas acima descritas que, no entanto, restam

ratificadas pelas que seguem:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. LIXO.

DESTINAÇÃO FINAL. Ação procedente para compelir a

municipalidade a fazer aterro sanitário e a não depositar

detritos noutro local. Recurso não provido.” (Apelação

Cível nº 113.882-1, 5ª Câmara Civil do TJSP, Sertãozinho, Rel.

Des. Ralpho Waldo. Julgamento em 17.08.1987).

“Ação civil pública. Lixão. Adequação. Dano ambiental.

Prevalência do interesse difuso. Requisitos autorizadores

da concessão presentes. 1. O princípio da prevalência do

meio ambiente deve ser observado em face de outros

porque matéria de ordem pública. 2. A concessão da

liminar, assim, há de ser sopesada pelo julgador, pois

que permanente o risco suportado pela sociedade,

princípios observados no caso em testilha. 3.

Considerando que o Poder Público é quem, com

primazia, tem o dever de orientar-se segundo as normas

ambientais constitucionais, por essa mesma razão é que

se impõe a obrigação de adequação de suas

providências. Agravo de instrumento desprovido.” (TJPR -

Agravo de Instrumento nº 0087446800, 1º de maio, 6ª C.Cív.,

Relª Desª Rosene Arão de Cristo Pereira, julgamento em

18.10.2000).

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“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICIPALIDADE. AÇÃO

VISANDO A ERRADICAÇÃO DE DEPÓSITO DE LIXO

URBANO (DOMÉSTICO E HOSPITALAR). LIMINAR

CONCEDIDA PARA ATENDIMENTO ÀS SUGESTÕES

DA CETESB. "PERICULUM IN MORA" INDISCUTÍVEL.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO EM PARTE.

Dá-se provimento em parte ao recurso, para determinar-

se liminarmente a municipalidade, atenda às sugestões

de fls. 46 da CETESB, ou seja passe a reunir o lixo já

espalhado e aquele que chega diariamente,

compactando-o; e execute o cobrimento desse lixo com

terra, no mínimo duas vezes por semana. Não há,

também, se discutir a presença do "periculum in mora". O

laudo da CETESB, é incisivo em afirmar que o depósito

de lixo a céu aberto, sem a mais simples proteção

(aterro), já causa grave e sério prejuízo ao meio

ambiente, "o tipo de destinação final de lixo no Município

de Rio das Pedras é inadequado e prejudicial... e esta

deposição está sendo feita de modo a infringir o Decreto

de 08.09.76 (art. 51 e 52) pertencente a legislação

estadual de controle do meio ambiente" (fls. 45).” (Agravo

de Instrumento nº 109.652-1, 7ª Câmara Civil do TJSP,

Piracicaba).

Vale também ressaltar outro julgado atinente à espécie:

“A verdade é que o ponto sensível da controvérsia em

torno dos problemas da responsabilidade, são os casos

de ação ou falta de providência do serviço. É o que se

chamou de inércia da Administração Pública da

população e dos usuários. A Administração Pública

responde civilmente pela inércia em atender a uma

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situação que exigia a sua presença para evitar a

ocorrência danosa.” (in RDA 97/177).

VI – DOS OBJETIVOS DA PRESENTE DEMANDA:

Aos termos do artigo 3º da Lei nº 7.347/85, são três os

objetivos da Ação Civil Pública: obrigação de fazer, obrigação de não fazer e

indenização.

No caso em comento, o Ministério Público Estadual

materializa seu pedido, consoante da documentação inclusa, com fulcro na Lei nº

7.347/85, na condenação do Município de São Félix do Araguaia a:

I – Obrigação de não fazer, consistente em abster-se de

dispor os resíduos sólidos coletados de maneira irregular

e em área não licenciada pelo órgão gestor ambiental;

II – Obrigação de fazer, consistente em:

a) construir, mediante projeto e EIA/RIMA, previamente

licenciado pelo órgão gestor ambiental, um aterro sanitário de depósito de resíduos

sólidos, tudo em observância à preservação do meio ambiente e da saúde pública,

vedando-se, assim, as descargas livres a céu aberto;

b) apresentar, e executar, projeto dos serviços de limpeza

e coleta dos resíduos sólidos urbanos, especificando a estrutura física e de pessoal a

ser empregada;

c) apresentar, e executar, projeto de educação ambiental

municipal relacionada com o gerenciamento dos resíduos sólidos;

d) remover os resíduos sólidos incorretamente

depositados da atual área conhecida, vulgarmente, como “lixão” e

e) restaurar as condições primitivas da área do atual

“lixão”, especificamente no tocante às condições do solo, dos corpos d’água, e da

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vegetação, na conformidade da recomendação técnica anexa no Inquérito Civil nº

011/2007.

VII – DA NECESSIDADE DA MEDIDA LIMINAR:

A prática nociva ao meio ambiente antes narrada deve

cessar imediatamente. A proliferação de vetores, a contaminação do lençol e a

possibilidade de ocorrência de outros danos, inclusive à fauna e à flora locais, são

iminentes.

Em razão da inexistência do licenciamento ambiental; da

irregular deposição e acondicionamento do lixo urbano em local inadequado para a

destinação que lhe foi dada; do não cumprimento da exigência legal de elaboração de

EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental), nos

termos da legislação pertinente; e por haver o Requerido, com essa atuação,

desrespeitado vários dispositivos legais, além de estar ocasionando degradação

ambiental de caráter irreversível na região; resta imprescindível a concessão de

medida liminar para que cessem os danos e não acarretem maiores prejuízos ao meio

ambiente e à saúda da coletividade.

Conforme Rodolfo Camargo Mancuso ensina,

"Compreende-se uma tal ênfase dada à tutela jurisdicional preventiva, no campo dos

interesses metaindividuais, em geral, e, em especial, em matéria ambiental, tendo em

vista os princípios da prevenção, ou da precaução, que são basilares nessa matéria.

Assim, dispõe o princípio n. 15 estabelecido na Conferência da Terra, no Rio de

Janeiro (dita ECO 92): ‘Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão

aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando

houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não

deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes em

função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente’. Igualmente, dispõe

o Princípio n. 12 da Carta da Terra (1997): ‘importar-se com a Terra, protegendo e

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restaurando a diversidade, a integridade e a beleza dos ecossistemas do planeta.

Onde há risco de dano irreversível ou sério ao meio ambiente, deve ser tomada uma

ação de precaução para prevenir prejuízos." (in Ação Civil Pública. Em defesa do Meio

Ambiente, do Patrimônio Cultural e dos Consumidores. 9 ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2004, pág. 263).

Para a defesa imediata do meio ambiente, fazem-se

necessárias imposições ao Requerido de obrigações de fazer e não-fazer, com

fundamento no artigo 11 da Lei nº 7.347/85, que prevê: "Na ação que tenha por objeto

o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento

da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de

execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou

compatível, independentemente de requerimento do autor."

Estas imposições, ante a irreversibilidade dos danos

ambientais e a farta prova da situação irregular do atual “lixão”, devem ser concedidas

initio litis, conforme previsão do artigo 12 da Lei de Ação Civil Pública (Lei nº

7.347/85). Note-se que tal Lei prevê, inclusive, a tomada de medidas em sede

cautelar, em respeito à relevância e urgência das questões jurídicas que, a um só

tempo, atingem grande parcela da população de determinada comunidade. Dispõe a

LACP:

“Art. 12. Poderá o Juiz conceder mandado liminar, com

ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

§ 1º Omissis;

§ 2º A multa cominada liminarmente só será exigível do

réu após o trânsito em julgado da decisão favorável ao

autor, mas será devida desde o dia em que se houver

configurado o descumprimento.”

“Art. 4º Poderá ser ajuizada ação cautelar para os fins

desta Lei, objetivando, inclusive, evitar o dano ao meio

ambiente, ao consumidor, à ordem urbanística ou aos

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bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,

turístico e paisagístico.”

Com relação ao citado art. 4.º da LACP, deve-se ressaltar

que ele ostenta, inclusive, caráter satisfativo quando dispõe sobre a possibilidade de

se evitar o dano. Para Sérgio Ferraz, "Logo em seu artigo 4º, a lei 7.347/85 já alarga o

âmbito de ação cautelar, fazendo-a mais ampla e mais profunda, no campo da ação

civil pública. É o que se colhe desenganadamente de sua previsão no sentido de que

a ação cautelar possa, aqui, ter o fito de evitar o dano, cuja reparabilidade (este é o

alvo principal consagrado no art. 1º do diploma), ao lado da recomposição do status

quo ante (este o alvo basilar no art.2º), constituem as metas desse precioso

instrumento. É dizer, a ação cautelar na ação civil pública, em razão do ora examinado

art. 4º se reveste inclusive de feição satisfativa, de regra de se repelir nas medidas

dessa natureza." (in Provimentos antecipatórios na ação civil pública, In "Ação civil pública –

Lei 7347/85- 15 anos", 2. ed., São Paulo: RT, págs. 831, 832)(negrito nosso).

Quanto à conveniência de concessão de medidas

liminares, quer em antecipação de tutela, quer de índole cautelar, em sede de ação

civil pública, trazemos novamente a lição de Rodolfo de Camargo Mancuso:

"Conjugando-se os arts. 4º e 12º da Lei 7.347/85, tem-se que a tutela de urgência há de ser obtida através de liminar que, tanto pode ser pleiteada na ação cautelar (factível antes ou no curso da ação civil pública) ou no bojo da própria ação civil pública, normalmente em tópico destacado da petição inicial. Muita vez, mais

prática será esta segunda alternativa, já que se obtém a segurança exigida pela

situação de emergência, sem necessidade de ação cautelar propriamente dita". (in

Ação Civil Pública. Em defesa do Meio Ambiente, do Patrimônio Cultural e dos Consumidores.

9 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, págs. 268, 269)(negrito nosso).

Por força do disposto no art. 21 da LACP, tem total

aplicação à presente ação o disposto no artigo 84 do Código de Defesa do

Consumidor, segundo o qual “Na ação que tenha por objeto a obrigação de fazer ou

não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará

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providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do inadimplemento.”

esclarecendo, no § 3.º do mesmo dispositivo, que “Sendo relevante o fundamento da

demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz

conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.”

O mesmo artigo 84 do CDC, em seu § 4.º, dispõe sobre o

mecanismo escolhido para dar efetividade e poder de coerção aos comandos acima

referidos, dispondo que “§4º O juiz poderá, na hipótese do § 3º ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito.”

Assim, apurada a comprovação da irregularidade do

sistema de coleta e destinação dos resíduos sólidos e de serviços de saúde em São

Félix do Araguaia/MT, por meio de perícias e relatórios técnicos da Secretaria

Estadual de Meio Ambiente, que é exatamente o órgão competente para esta

verificação, e sendo certo que a situação implica necessariamente em danos

ambientais de grande monta, resta evidenciada a presença dos requisitos legais para

a concessão de medida liminar que obrigue o Município à adoção das providências

que ao final serão especificadas, tudo sob pena de pagamento de multa diária pelo

Administrador, em caso de omissão. Isto porque não há dúvida da presença, no caso,

do periculum in mora e fumus boni iuris.

VIII – DOS REQUERIMENTOS FINAIS:

8.1. Liminarmente:

Em sede de liminar, observadas as disposições legais,

inclusive a oitiva prévia do representante judicial do Município, no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.437/92 , requer o

Ministério Público Estadual seja determinado ao Requerido o que segue:

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a) Apresentação de projeto de construção de aterro sanitário, observando-se todos os requisitos legais, no prazo de 30 (trinta) dias, o que, inclusive, deverá ser acostado aos autos;

b) Promoção, junto à SEMA, de pedido de licença

prévia para a construção do aterro sanitário, observados todos os requisitos legais, inclusive o que consta na Resolução nº 04/95, no prazo de 50 (cinqüenta) dias, o que deverá ser demonstrado nos autos;

c) Promoção, junto à SEMA, de pedido de licença de

instalação de aterro sanitário, no prazo de 90 (noventa) dias contados do cumprimento da obrigação prevista no tópico anterior, observados todos os requisitos legais, o que deverá ser demonstrado nos autos;

d) Implementação, no prazo de 60 (sessenta) dias

após a liberação da licença de instalação, do mencionado aterro sanitário, provendo-o de todas as condições para o funcionamento regular, o que deverá ser demonstrado nos autos;

e) Apresentação, junto à SEMA, no prazo de 60

(sessenta) dias contados do início da operação do aterro sanitário, do PRAD referente à área do atual “lixão”, o que deverá ser demonstrado nos autos;

f) Início da execução do PRAD referido no tópico

anterior imediatamente após sua aprovação pela

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SEMA, obedecido o cronograma de ações nele previsto, o que deverá ser demonstrado nos autos;

g) Apresentação nestes autos, no prazo de 60 (sessenta) dias, de projeto de educação ambiental, bem como de coleta dos resíduos sólidos, na condição de medida compensatória, a ser ofertado à municipalidade, os quais deverão ser executados no prazo máximo de 90 (noventa) dias.

8.2 – Ademais, requer:

8.2.1 – O recebimento da presente ação, a fim de que

seja, ainda, autuada e processada na forma e no rito ordinário;

8.2.2 – A citação do Requerido, na pessoa do Prefeito Municipal, Sr. João Abreu Luz, para, querendo, responder aos termos da presente

ação, sob pena de revelia;

8.2.3 – A notificação da SEMA, por meio do Secretário Estadual de Meio Ambiente, dos termos da presente ação, para que dela tome

ciência e promova o conveniente acompanhamento;

8.2.4 – A realização de inspeção judicial na área atualmente empregada para o depósito dos resíduos sólidos, com a assistência

técnica da SEMA;

8.2.5 – A produção de todos os meios de prova admitidos

em lei, notadamente a documental e testemunha, sem prejuízo, por óbvio, da

inequívoca possibilidade de julgamento antecipado da lide;

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8.2.6 – O julgamento final de procedência do pedido, para

o fim de condenar o Município de São Félix do Araguaia/MT nas mesmas obrigações

individualizadas no item “8.1” acima e na obrigação de não-fazer consistente na

abstenção de depósito de resíduos sólidos a céu aberto ou sem licenciamento do

órgão ambiental, com todas as cominações de estilo;

8.2.7 – A fixação de multa diária para o caso de

descumprimento das obrigações impostas em sede de liminar e julgamento de mérito,

no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), pessoal ao administrador incidente em caso de

descumprimento de qualquer dos prazos assinalados nos itens “8.1” e/ou “8.2.6”.

Não obstante os bens jurídicos que se pretende tutelar

sejam economicamente incomensuráveis, atribui-se à causa, para mero fim de alçada,

o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

São Félix do Araguaia/MT, aos 23 de julho de 2.008.

Paulo Henrique Amaral MottaPromotor de Justiça

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