educacao e desenvolvimento

396

Upload: artifex2010

Post on 21-Nov-2015

78 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

educação

TRANSCRIPT

  • educao e desenvolvimentofundamentos econceitosjorge carvalho arroteiaunidade de investigaoconstruo do conhecimento pedaggiconos sistemas de formao

  • ttuloEducao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    autorJorge Carvalho Arroteia

    design e servios de prpressGabinete de ImagemFundao Joo Jacinto de Magalhes

    impressoGrafi gamelas Indstria Grfi ca, Lda

    edioUniversidade de Aveiro, Comisso EditorialDepartamento de Cincias da EducaoCampus Universitrio de Santiago3810-193 Aveiro

    tiragem350 exemplares

    depsito legal?????????????

    ISBN978-972-789-250-1

    catalogao recomendadaArroteia, Jorge de Carvalho, 1947-

    Educao e desenvolvimento : fundamentos e conceitos / Jorge CarvalhoArroteia. - Aveiro : Universidade de Aveiro. Comisso Editorial.Departamento de Cincias da Educao, 2008. - 391 p.Unidade de investigao construo do conhecimento pedaggico nos sistemas de informaoISBN 978-972-789-250-1 (brochado)

    Desenvolvimento da educao // Fundamentos da educao // Polticaseducativas // Avaliao da educao

    CDU 37.014

    Reservados todos os direitos. Esta publicao no pode ser reproduzida ou transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo, elec trnico, mecnico, fotocpia, gravao ou outros, sem prvia autorizao do editor.

  • minha Famlia,Aos Mestres e Alunos,Sempre presentes no meu trabalho.

  • ndice

    Apresentao 13

    Aco educativa 17Programa 19Projecto 20

    Administrao 25Direco 29Motivao 29Participao 30

    Administrao educacional 33

    Anlise social da educao 39Aprendizagens escolares 40Planos de estudos 41Planos curriculares 42Sucesso escolar 45Recursos educacionais 46Tecnologia e educao 47

    Avaliao 49Avaliao do ensino superior 52

    Carta escolar 55

    Democratizao do ensino 63Acessibilidades 66Apoios educativos e sociais 67Igualdade de oportunidades 70Educao para todos 72

  • Demografi a escolar 75Diagrama de Lexis 76Esperana de vida escolar 77Populao escolar 78

    Demografi a e sociedade 83Migraes e ensino 87Prospectiva 91

    Desempenho 95Efi cincia 96Efi ccia 96Qualidade 97

    Desenvolvimento da educao 103Capital humano 105Oferta escolar 107Redes 108

    Economia e educao 111Despesas em educao 112Financiamento da educao 113Gastos em educao 113

    Educao 115Educao de base 116Educao de adultos 116Educao no formal 117

    Educao comparada 119

    Educao em centros urbanos 123

  • Educao e desenvolvimento 127Desenvolvimento humano 128Desenvolvimento comunitrio 130Desenvolvimento socioeconmico 133Ensino superior e desenvolvimento regional 137

    Educao e direitos 145Direito educao 145Educao e direitos humanos 147

    Escola 153Estabelecimento de ensino 155Instituio escolar 156Sistema escolar 157

    Escola efi caz 159

    Famlia e educao 161

    Formao inicial de professores 165

    Formao ao longo da vida 169Andragogia 171Educao e formao de adultos 172

    Formao profi ssional 175

    Funes da educao 179

    Gesto 183Clima escolar 184Estratgia 185Liderana 186

  • Indicadores 189Indicadores da OCDE 195

    LBSE 197Modalidades especiais de educao escolar 198

    Mtodos de investigao 199Investigao-aco 201Estudos de caso 203Estudos monogrfi cos 203Anlise organizacional 203

    Mobilidade social 205Meio social 206Seleco social 206

    Mudana social e educao 209Analfabetismo 212Inovao 214

    Organismos internacionais 219BIE Bureau International dducation 219ONU Organizao das Naes Unidas 219UNESCO United Nations Educational, Scientifi c and Cultural Oganization 220CE Conseil de lEurope 220OCDE Organisation de Coopration et de Dveloppement conomiques 221UE Unio Europeia 221

    Organizao escolar 223Organograma 225

  • Pedagogia social 227Aco pedaggica 232Incluso social 233Tempo de lazer e animao 233

    Planeamento 235Planeamento da educao 237Mtodos de planeamento da educao 242

    Poder 245Autonomia 247Descentralizao 249Desconcentrao 249Regionalizao 250

    Poltica educativa 253Construo da poltica educativa 255Dimenses de anlise 257Contextos 258

    Procura social da educao 261Alunos 264Escolarizao 264Massifi cao escolar 266Crise de educao 266

    Profi sso docente 269

    Reformas de ensino 275

    Regulao do sistema educativo 283

  • Regulao do ensino superior 287Regulao pela mo da avaliao 290Regulao pela mo da inspeco 290

    Rendimento escolar 295Abandono escolar 295Desperdcio escolar 296Resultados 297Sucesso escolar 298

    Sistema 299Sistema de ensino 300

    Sistema educativo portugus 303Subsistemas 307

    Sistema de informao educacional 327

    Socializao 333

    Territrio 341Assimetrias regionais 342Comunidade 344

    Tipologia dos sistemas educativos 347A base morfolgica 349A organizao social 350Coerncia interna 352Organizao interna 354

  • Unio Europeia 357Fundamentos da poltica educativa 357Orientaes relativas educao e formao 359Questes em aberto 361

    Nota fi nal 365

    Bibliografi a 367

  • Apresentao

    Porque na muita sabedoria h muita arrelia, e o que aumenta o conhecimento, aumenta o sofrimento.Eclesiastes, 1, 18

    Ao longo da nossa actividade docente e profi ssional, fomos diversas vezes chamados a participar em tarefas relacionadas com a direco, a administrao e a avaliao do sistema educativo, no seu todo, ou de algum dos seus subsistemas e instituies, em particular. Esta colaborao veio reforar o interesse pelo aprofundamento dos aspectos relativos gesto e orientao de certas medidas atinentes ao desenvolvimento, ao planeamento e evoluo prxima do sistema educativo portugus. Frequentemente, constatmos como muitas das decises relativas ao planeamento e administrao deste sistema nem sempre pareciam concordantes com os princpios tericos, a racionalidade cientfi ca e os ensinamentos acadmicos de algumas escolas de pensamento.

    Com agrado, registamos como, no decurso das ltimas dcadas, muitos temas relacionados com a anlise scio-organizacional do sistema educativo portugus tm vindo a ser aprofundados, sobretudo em estudos de natureza acadmica, levados a cabo em diferentes instituies de ensino superior e segundo perspectivas diferenciadas. Tal facto tem vindo a fortalecer uma dinmica investigativa e uma matriz terica e refl exiva, indispensveis ao progresso de muitas cincias, nomeadamente as que integram, no seu corpus, a anlise social dos fenmenos educacionais, a administrao pblica e a poltica educativa. Contudo, apesar do enriquecimento do acervo bibliogrfi co em diversas reas do saber, os resultados de muitas das tomadas de deciso de natureza poltica continuam a ser contraditrios em relao a certos pressupostos tericos, atinentes matriz de funcionamento das organizaes educativas entendidas como organizaes sociais ou, mesmo, quanto aos resultados esperados, gorando as expectativas da populao escolar e da sociedade em geral. Por isso, apesar da retrica dos discursos ofi ciais, muitas delas devem ser equacionadas face aos pressupostos inscritos na Constituio da Repblica Portuguesa (CRP), relacionados com a construo de um Estado de direito democrtico, assente na democracia econmica, social e cultural e no aprofundamento da democracia participativa (art 2), bem como na sua extenso a toda a populao.

    No cabe no mbito deste texto apreciar nenhuma medida concreta, sobretudo as que foram tomadas depois da segunda metade de Novecentos, quando o sistema educativo portugus, seguindo as tendncias que se haviam verifi cado noutros contextos europeus, passou a registar os efeitos do processo de democratizao da educao, responsvel pelo aumento progressivo

  • 14 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    da populao escolar, pelo alargamento da rede de estabelecimentos de ensino e de formao e pelo desenvolvimento dos diversos subsistemas de ensino. To pouco nos cabe apreciar os seus refl exos sobre as organizaes escolares, a populao estudantil, o sistema de ensino no seu todo ou sobre a sociedade portuguesa. Tal facto exigiria uma anlise aprofundada das mltiplas medidas de aco educativa ditadas por princpios ideolgicos e programticos enunciados nos textos de aco governativa e que, no seu conjunto, confi guraram polticas de educao distintas consoante o momento, as opes estratgicas, os interesses, as disponibilidades e a viso dos seus responsveis. O trabalho em questo pretende, sim, recordar os fundamentos e os conceitos relacionados com o desenvolvimento dos sistemas educativos. Assim:

    serve de roteiro anlise da desenvoluo e planeamento, da aco e da poltica educativa e da sua relao (e dependncia), em relao aos fenmenos sociais que os acompanham. Por fenmenos sociais entendemos, semelhana de Gurvitch (1979, p. 27), os fenmenos sociais totais, como totalidades reais em marcha, em movimento permanente, sendoo elemento vulcnico da realidade social, a origem das erupes desta ;

    toma em considerao o desenvolvimento de cada indivduo e de todos os homens, segundo processos que apontam para o conjunto de dimenses do ser humano;

    tem presente a disponibilidade e a utilizao dos recursos postos disposio do sistema educativo, reunindo as mesmas unidades e factores na aco educativa, atributos quePerroux (1987, p. 31-32) identifi ca como fazendo parte do novo desenvolvimento: global, endgeno e integrado. Juntamos-lhe uma outra caracterstica, o desenvolvimento sustentado, tendo em considerao a evoluo dos sistemas sociais e ambientais e a pertinncia da aco pedaggica e educativa na preservao dos equilbrios societais e naturais, resultantes da explorao incontida destes recursos, da explorao humana e do agravamento das desigualdades sociais.

    Neste sentido, justifi ca-se o ttulo que escolhemos para este trabalho: educao e desen-volvimento. De facto, entendemos que a educao deve ser considerada como um fenmeno social, em evoluo permanente, exigindo coerncia, motivao e participao dos seus actores, em articulao com o projecto, a identidade e a viso prospectiva das polticas educativas, de formao e de investigao que as orientam. Por outro lado, ela o principal factor responsvel pela evoluo dinmica das sociedades actuais, na busca do desenvolvimento e do bem-estar humano e social, conducente ao crescimento, inovao tecnolgica (LOUREIRO, 1985), incluso social e procura de solues contra as ameaas humanas, naturais e outras, que pairam sobre a humanidade. E como recordam Debesse e Mialaret (1974, p. 367), qualquer sociedade, capitalista ou socialista, assenta na produo e no trabalho, semelhantes nos meios, diferentes nos fi ns, mas sujeitas mesma evoluo tcnica que caracteriza as duas sociedades (Loc. (Loc. ( cit.).

    Para o desempenho destas funes, cabe aos sistemas de ensino organizarem-se, de forma no s a perpetuar os valores e as competncias dos seus habitantes, mas tambm para preparar esta populao para as mudanas que o progresso reclama (UNESCO, 1965, p. 13). De acordo com este documento da UNESCO (Loc. cit(Loc. cit( .), todo o sistema de ensino o produto da sociedade () depende da estrutura social dominante e das aspiraes culturais

  • 15Jorge Carvalho Arroteia

    da populao, das oportunidades oferecidas pelas diferentes profi sses e do seu prestgio, das disponibilidades oramentais e dos recursos fi nanceiros, enfi m do conjunto do regime politico e administrativo. Complementarmente, consideramos o desenvolvimento como um processo complexo, que tem a ver no s com o expanso e o crescimento do sistema econmico, mas tambm com as mudanas sociais e culturais que lhe andam associadas. Neste contexto, ganha particular relevncia a formao dos recursos humanos e o acrscimo de conhecimentos, de competncias, de aptides laborais () de todos os membros de uma sociedade (Op. cit., p. 74).

    O estudo dos diferentes fenmenos educacionais que fazem parte do nosso quotidiano enquanto actores de um sistema responsvel pela formao, investigao e prestao de servios comunidade, como o subsistema de ensino superior obriga-nos a refl ectir sobre as decises, as prticas e sobre os programas que fazem parte desta actividade, sobretudo os que se relacionam com a docncia, a investigao e a formao dos nossos alunos. Esta vivncia leva-nos a ter em considerao diversos tipos de abordagens dos fenmenos sociais e dos processos de evoluo e de mudana que refl ectem o processo civilizatrio que vivemos e as infl uncias da abertura das fronteiras do conhecimento e do saber que experimentamos.

    A perspectiva que seguimos neste trabalho atendeu, portanto, s preocupaes acadmicas que nos assistem no domnio da anlise social e organizacional da educao e vivncia de situaes diversas, com o acompanhamento e o cumprimento de funes burocrticas, integradas em cadeias hierrquicas de organizaes pblicas, relacionadas com a direco,a gesto e a regulao do sistema educativo portugus. A experincia a recolhida, completada com a leitura e a pesquisa individual, foram enriquecedoras para a nossa refl exo, contribuindo para a identifi cao de alguns eixos estruturantes de anlise dos fenmenos sociais e educacionais. De acordo com esta matriz, procuramos sistematizar, seguindo uma ordem, sempre que possvel, alfabtica e ordenada, os fundamentos e os conceitos que nos pareceram apropriados compreenso dos aspectos relacionados com o desenvolvimento, a administrao e o planeamento da educao.

    No trabalho que realizmos, evocamos alguns dos autores que, primeiramente, nos alertaram para a importncia de temas contidos nos programas das disciplinas do Departamento de Cincias da Educao da Universidade de Aveiro, e que nos serviram de base formaoao longo da vida que encetmos. Assim, procurmos estruturar este trabalho dando primazia aos conceitos que, em nosso entender, esto associados ao assunto que elegemos como tema, a comear pelas notas sobre aco educativa e, a concluir, com a referncia sobre algumas das preocupaes da UE sobre a educao e a formao no seio dos pases europeus, e sobre os desafi os que se colocam identidade e diversidade dos seus sistemas sociais e educativos (GARRIDO, 1996).

    Como se ver em algumas abordagens, no prescindimos de referenciar obras e autores que, para alguns, podem ser considerados histricos. Fazemo-lo seguindo o entendimento de Mendras e Fors (1983, p. 8), de relembrar o passado, de raconter une histoire pour construire un paradigme qui doit servir comprendre dautres transformations sociales relevant du mme type. Esta a nossa opo, por considerarmos, tambm, que, apesar da multiplicidade de estudos e de anlises recentes que incidem sobre os diferentes assuntos sociais e educacionais,

  • 16 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    h uma matriz a ser tida em conta nos estudos actuais, a qual, nem sempre, devidamente valorizada em estudos recentes. A sua evocao constitui um testemunho do contributo de certas obras para a compreenso da mudana social e o reforar da conscincia colectiva e do legado cientfi co de diversos autores que nos ajudam a compreeender as marcas dos diversos ciclos sociais e que as geraes mais novas sobretudo as que esto mais prximas do nosso contexto de trabalho no devem, de todo, ignorar.

    Muitos outras referncias podiam ou deveriam ser evocadas. Por se tratar de um primeiro ensaio, reconhecemos o interesse de uma eventual actualizao ou mesmo do seu aprofundamento, sobretudo numa perspectiva comparada. Para tanto, esperamos o contributo dos que, generosamente, entenderem pronunciar-se sobre o interesse, a oportunidade e a validade deste roteiro.

  • Aco educativa

    Em sentido amplo, a aco educativa uma forma de aco social, entendida por Weber (ARON, 1982, p. 509) como um comportamento humano (), uma atitude interior ou exterior voltada para a aco, ou para a absteno, relacionada com o comportamento de outras pessoas. Este tipo de aco, considerada no como revolucionria, mas como uma tarefa dinmica de desenvolvimento das potencialidades sociais, como assinala Ansart (1990, 265), encara esta concepo dinmica, aberta antropologia, histria, atenta complexidade e mudana (Op. cit., p. 266), como indispensvel a qualquer tipo de anlise, de cariz sociolgico, sobre fenmenos que afectam a escola e a nossa sociedade.

    Diz-nos Sarmento (1997, p. 41) que a abordagem da aco inscreve uma problemtica que dominada pela extrema heterogeneidade dos conceitos que para ela so convocados (). Prossegue o mesmo autor, referindo que esta abordagem faz-se sob as lentes das diversas disciplinas que constituem as cincias sociais (a Sociologia, a Antropologia, a Psicologia Social, a Cincia Poltica, as teorias organizacionais, etc.), cada uma delas interessada em promover os seus prprios quadros conceptuais, em apresentar as suas prprias defi nies, em dilucidar as antinomias e os dualismos que se colocam a propsito da relao da aco com o seu objectivo cientfi co prprio (aco e sociedade, aco e cultura, aco e sujeito, etc.).

    No domnio que nos interessa, relacionado com o desenvolvimento, a poltica e o planeamento da educao, a aco educativa abarca diferentes tipos de iniciativas, sobretudo de carcter pedaggico e administrativo, conduzidas pela escola, pelos professores, pelo poder central, no mbito do ministrio da tutela e servios centrais dependentes, e levadas a cabo pelas organizaes escolares, pelo poder local e por entidades locais, direccionadas para a populao escolar (alunos e docentes) ou para a comunidade. Estas podem abarcar programas especfi cos, de natureza educacional e formativa, de interveno scio-educativa e projectos diferenciados, orientados para determinados estratos da populao.

    Parte integrante da aco educativa o acto educativo, que Formosinho (O sistema educativo-conceitos bsicos, in: ALVES-PINTO, ALADA, SILVA, 1986/88, p. 277-290) defi ne por vrias componentes (Op. cit., p. 279):

    a) instruo a transmisso de conhecimentos e tcnicas;b) socializao a transmisso de normas, valores e crenas, hbitos e atitudes;c) estimulao a promoo do desenvolvimento integral do educando (desenvolvimento

    intelectual, afectivo, motor, psicolgico).

  • 18 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    Como nos recorda Rocha (1988, p. 117), a interveno educativa tem por razo ltima ajudar o educando a realizar-se integralmente como ser humano. Da a necessidade de se atender natureza humana: o homem activo e realiza-se atravs de tarefas que, alterando o ambiente, o modifi cam a ele prprio. Por outro lado, tendo presente as orientaes de DHainaut (1980, p. 22), a aco educativa efectua-se em trs nveis de deciso:

    ao nvel poltico, determinam-se os fi ns da aco; ao nvel da gesto da educao, precisam-se as fi nalidades que deveriam conduzir a

    realizar as intenes da poltica educativa; ao nvel da realizao, determinam-se os objectivos, que exprimem os resultados

    esperados das aces que se empreendem para alcanar fi nalidades propostas ao nvel da gesto.

    Como qualquer aco humana, a aco educativa condicionada por diversos factores, relacionados com o tipo de sociedade, o regime poltico, a natureza da instituio de ensino, a diversidade da populao escolar (docente e discente), o envolvimento dos seus actores, bem como pela relao escola-meio. Por actores, entendemos todos os interessados no desenvolvimento das polticas educativas pertencentes quer ao sistema poltico formal (instituies ofi ciais: representantes eleitos, funcionrios, dirigentes partidrios, etc.) como os que dispem de estatuto poltico informal (grupos de interesse, associaes voluntrias, etc.) (FIGUEIREDO, 2001, p. 22). Da considerarmos que qualquer aco educativa depende do projecto educativo, de mbito nacional, regional ou local, e assenta na elaborao de um diagnstico da realidade educacional, social e escolar, dos meios e recursos, dos objectivos especfi cos e da programao e no desenvolvimento de aces concretas, a realizar nas escolas ou de interveno sobre o meio.

    Dada a diversidade de situaes e a multiplicidade de factores que condicionam o aprovei-tamento escolar da populao discente, imperioso o conhecimento do sistema educativo no seu conjunto, dos alunos e das suas identidades, das organizaes escolares e das suas particularidades, das estratgias a seguir em cada uma das situaes, dos actores no seu conjunto e da prpria sociedade. Este conhecimento deve assentar no desenvolvimento da investigao cientfi ca, baseada no s na descrio dos fenmenos sociais e educativos, mas tambm na sua interpretao, compreenso e explicao, assim como na prtica da autonomia institucional e no apoio, no acordo e na colaborao entre os diversos parceiros responsveis pela educao e formao cvica da populao discente.

    O desenvolvimento destas aces, consubstanciada em iniciativas diversas, integradas em projectos, programas e em planos de aco, sobretudo locais e regionais, devem traduzir as opes de poltica educativa do poder central, os seus objectivos, os meios e as estratgias relacionadas com as reformas institucionais, pedaggicas e de desenvolvimento da educao na sua articulao com os demais sistemas sociais. Tal deve acontecer, igualmente, em relao s autarquias: municpios e freguesias.

    Havendo organismos internacionais que se preocupam com as questes do ensino e da fomao, transcrevemos do Portal da Unesco http://portal.unesco.org 22AGO06) o enunciado de alguns tipos de aco, articulados com a poltica e as estratgias educativas:

  • 19Jorge Carvalho Arroteia

    i) acesso e participao educao de base;ii) equidade e reduo das disparidades de gnero, das disparidades regionais, das

    disparidades rural/urbano e das desigualdades sociais;iii) qualidade e pertinncia da formao nos diferentes nveis (educao de base, ensino

    secundrio geral, ensino tcnico e profi ssional, ensino superior, educao de adultos, etc.;

    iv) lugar do sector privado e das comunidades locais na organizao da educao;v) regulao dos fl uxos de alunos entre o ensino formal e no formal; pblico e privado;

    secundrio geral, tcnico e profi ssional; superior curto e longo; elementar e secundrio; secundrio e superior, etc.;

    vi) aspectos institucionais, como a gesto, o planeamento e o equilbrio entre a descen-tralizao, a desconcentrao e a centralizao;

    vii) partenariado e comunicao entre os actores e os parceiros sociais, os nveis de participao assim como as formas de participao e de comunicao;

    viii) a gesto dos custos ao nvel das despesas correntes e de capital;ix) as polticas e as estratgias de mobilizao de recursos em articulao com a descen-

    tralizao e o desenvolvimento do sector privado e o desenvolvimento de parcerias.

    Recorde-se que a importncia da educao na promoo do desenvolvimento humano e sustentvel tem vindo a ser reconhecida por diversas instituies internacionais, pelo que a aco e divulgao das boas prticas educativas devem ser incentivadas ao nvel da escola, dos servios centrais e regionais e consideradas na gesto dos sistemas educativos. Para tanto, o recurso a programas de formao especfi cos e a projectos curriculares e extracurriculares, que permitam o desenvolvimento local e a participao alargada dos elementos que fazem parte da escola e do seu meio envolvente, constitui um intrumento de valorizao da aco educativa, quer seja de natureza pedaggica ou de interveno comunitria. No devemos, no entanto, esquecer que, face s mudanas constantes da nossa sociedade, a aco educativa de hoje exige dos pedagogos uma ateno redobrada, no sentido de acompanharem esta evoluo, adaptando a sua actividade s exigncias presentes e futuras dos alunos e da sociedade onde vivem.

    ProgramaO conceito de programa suscita diferentes interpretaes, consoante o tipo de anlise a

    empreender. Por isso, referimos vrias propostas de defi nio. Para Landsheere (1979, p. 217), o programa o conjunto integrado de actividades concebidas para atingir um determinado fi m. Estas podem ser de diferente natureza, social, econmica, cultural ou outra, incluindo um leque de aces da mesma natureza ou complementares, mas levadas a cabo pela mesma organizao. Por programa educativo, entende o mesmo autor (Loc. cit.) o plano de aco em matria de educao.

    Ainda no mbito da educao, o programa pode ser entendido de formas complementares. Para DHainaut (1980, p. 19), o programa , em princpio, uma lista de matrias a ensinar acompanhadas de instrues metodolgicas que eventualmente a justifi cam e do indicaes sobre o mtodo ou sobre a abordagem que os seus autores julgam a melhor, ou a mais pertinente, para ensinar essas matrias. Por sua vez, Vidal, Crave e Florncio (1992, p. 120)

  • 20 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    entendem o programa escolar como o conjunto ordenado de contedos escolares, e, para Senz (1988, p. 474), como o conjunto de actividades com objectivos educativos que o professor ou a equipa de professores prepara, com vista sua concretizao no centro escolar. Neste caso, estas devem ter em ateno o contedo, o grau de instruo dos alunos, os nveis a atingir no fi m do curso, o material didctico disponvel, a idade dos alunos e as caractersticas, em termos de homogeneidade/heterogeneidade do grupo escolar.

    Por sua vez, Zabalza (1991, p. 12-23) entende o programa como o documento ofi cial de carcter nacional ou autonmico em que indicado o conjunto de contedos, objectivos, etc., a considerar em determinado nvel. Mais, ainda: o programa traduz os mnimos comuns a toda uma sociedade, constituindo a estrutura comum de uma cultura e as previses gerais relativamente s necessidades de formao e de desenvolvimento cultural e tcnico dessa mesma sociedade. A sua gesto e aprofundamento so assegurados na escola pelos professores, mas aos pais, comunidade, s autoridades educativas e aos prprios alunos exigida uma larga participao no seu desenvolvimento. Tal justifi ca-se, na medida em que, constituindo um programa escolar uma estrutura central de referncia, torna-se imprescindvel ultrapassar as desigualdades existentes, de forma a que as metas a atingir pelos alunos que frequentam o sistema educativo, qualquer que seja a sua origem geogrfi ca e social,sejam cumpridas.

    Recorda-nos o mesmo autor (Op. cit., p. 17) que o programa, assim considerado, constitui um primeiro passo do desenvolvimento curricular, entendido este como um continuum que se desenvolve em fases sucessivas e a diversos nveis do sistema escolar: administrao central, regies, escolas, turmas concretas.

    Na lgica do desenvolvimento curricular, o desenvolvimento progressivo do programa, tendo em conta as condies especfi cas de cada escola, das turmas, dos alunos, dos diferentes contextos educativos, consubstancia a actividade de programao atravs da qual cada escola pode responder s necessidades educativas dos seus alunos e, inclusivamente, () colaborar no desenvolvimento comunitrio de todo o grupo social de que faz parte.

    Projecto semelhana do conceito anterior, tambm a noo de projecto pode ser utilizada em

    diferentes contextos, sociais, polticos, pedaggicos e outros. Em quaisquer deles, porm, o projecto tem subjacente uma determinada aco, destinada a melhorar ou modifi car uma ou um conjunto de situaes, surgindo como uma constelao organizada de actividades que so dirigidas para a realizao de certos objectivos e para a obteno de certos resultados (ERASMIE, LIMA, 1989, p. 63).

    Para Vidal, Crave e Florncio (1992, p. 120), falar de projecto em educao signifi ca falar de intenes e de adequao (), a exposio, adaptao e desenvolvimento dos objectivos e experincias educativas que se pretendem para um nvel de ensino, etapa, ciclo ou rea concreta de ensino. Por sua vez, M. Rodrguez (SENZ, 1988, p. 432) defi ne projecto como um documento pedaggico, elaborado pela comunidade, que, com carcter temporal, expressa, de forma realista e concreta, o que fazer no domnio educativo, tendo presente a coerncia de aco e a organizao acadmica do centro. Nesta perspectiva, o projecto situa-se entre o iderio o que a escola quer ser e as programaes concretas que cada

  • 21Jorge Carvalho Arroteia

    dia levam a cabo os elementos da mesma o que a escola faz. O projecto expressa o que a escola pretende (Op. cit., p. 433).

    A importncia dos projectos pedaggicos uma necessidade para dinamizar o acto educativo, como refere Boutinet (1986, p. 20), uma vez que o seu desenvolvimento permite mobilizar a motivao dos alunos, aumentar a efi ccia do sistema educativo, substituir uma lgica de contedos, uma lgica de objectivos, de distinguir, enfi m, no mbito de um programa, os elementos centrais e os elementos subsidirios. Tal aplica-se no s a este tipo de projecto, mas tambm aos projectos de ensino, de aprendizagem e aos projectos didcticos e educativos. Estes ltimos tm vindo a merecer a ateno redobrada por parte de alguns cientistas nacionais (ERASMIE, LIMA, 1989; COSTA, 1990, 1991 e 1997; CANRIO, 1992; BARROSO, 1992), que atravs da sua investigao tm chamado a ateno para a pertinncia e oportunidade do projecto educativo.

    De acordo com Costa (1990a, p. 12), a questo do Projecto Educativo de Escola aparece () suportada por uma concepo poltica de sociedade que assenta num modelo de democracia participativa com relevo para o papel de interveno da sociedade civil. A traduo deste modelo, ao nvel educativo, passa por um sistema de ensino descentralizado e por uma escola (comunidade educativa) com um grau de autonomia sufi ciente para defi nir e implementar o seu prprio Projecto Educativo. A sua relao com a autonomia, a direco, a participao e a comunidade educativa , em data posterior, realada por Formosinho (Prefcio. in: COSTA, 1991, p. 5), que entende o projecto educativo como um instrumento organizacional de expresso da vontade colectiva desta escola-comunidade educativa, um documento que d um sentido til participao, a corporizao operativa da autonomia da escola comunidade.

    Neste sentido, o Projecto Educativo de Escola , no dizer de Costa (Op. cit., p. 10), um documento de carcter pedaggico que, elaborado com a participao da comunidade educativa, estabelece a identidade prpria de cada escola atravs da adequao do quadro legal em vigor sua situao concreta, apresenta o modelo geral de organizao e os objectivos pretendidos pela instituio e, enquanto instrumento de gesto, ponto de referncia orientador na coerncia e unidade da aco educativa, elaborado de acordo com o iderio da escola, o plano anual e o regulamento interno (Op. cit., p. 20) e seguindo um conjunto de procedimentos, tal como o preconiza o estudo de Costa (1991).

    Cremos do maior interesse recordar uma outra proposta relativa importncia da pedagogia do projecto, com particular relevncia para a de Projecto de Classe. Para Hugon (1992, p. 108, in: ESTRELA, FALCO, 1992), este ser defi nido como o conjunto de prticas pedaggicas organizando situaes educativas, concebidas em torno da realizao de aces fi nalizadas por uma produo concreta, desenvolvido numa lgica de inovao e investigao-aco.De acordo com experincias realizadas na regio de Paris, esta autora (Loc. cit.), acrescenta: ao nvel pedaggico, o projecto de classe globalizao do ensino, valorizando o saber-fazer, pela multiplicao das prtica. a aquisio de utenslios medida de situaes verdadeiras Ao nvel social, uma noo que abre a escola para um outro tipo de relaes: o estatuto da criana modifi ca-se. Activa, torna-se parceira dos adultos e implicada nas aprendizagens.E que dizer da sua aplicao perante a diversidade de contextos e de pblicos que caracterizam o nosso sistema educativo, sobretudo em certas reas residenciais na periferia de grandes centros urbanos?

  • 22 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    De acordo com a legislao que consagra o Regime de autonomia, administrao e gesto dos estabelecimentos da educao pr-escolar e dos ensinos bsico e secundrio (Dec.-Lei n 115-A/98, de 4 de Maio art 3), o projecto educativo o documento que consagra a orientao educativa da escola, elaborado e aprovado pelos seus rgos de administrao e gesto para um horizonte de trs anos, no qual se explicitam os princpios, os valores, as metas e as estratgias segundo os quais a escola se prope cumprir a sua funo educativa.

    Tendo em conta o avano de estudos sobre este tema, recordamos que, no domnio cientfi co, um projecto de investigao a descrio de uma pesquisa a realizar e dos meios necessrios sua realizao (LANDSHEERE, 1979, p. 217), a qual deve contemplar os aspectos seguintes:

    1. problema;2. como a soluo do problema poder contribuir para o progresso da teoria ou da prtica

    pedaggica (objectivos gerais e objectivos especfi cos);3. hipteses de soluo;4. defi nio dos principais termos utilizados;5. primeira sntese da literatura;6. etapas de observao ou da experincia:

    a) o que se far e como (plano experimental);b) que dados se pretende reunir;c) como sero registados;d) como sero validados;e) como sero analisados;

    7. calendrio de trabalho;8. necessidades de pessoal e de material;9. oramento.

    O sentido, amplo, da noo de projecto e a sua aplicao em diferentes contextos organi-zacionais, escolas, empresas, associaes e outras entidades, permite apresentar uma outra defi nio de projecto (NOCE, PARADOWSKI, 2005, p. 14): um projecto consiste numa aco especfi ca que permite estruturar metodolgica e progressivamente uma realidade futura.Um projecto permite elaborar uma resposta s necessidades de um utilizador; de um cliente ou de uma clientela e implica um objectivo e aces a realizar com base num conjunto de recursos. Se tivermos ainda em conta a oportunidade do lanamento de projectos que tenham como referncia as necessidades bsicas do indivduo (sade, educao, emprego e condies de vida) (SERRANO, 2000, p. 21), ento podemos falar em pojecto social, direccionado para um grupo ou para uma organizao ou instituio social, mas confi nados, sempre, a uma rea territorial.

    Em suma, de acordo com Costa (2006, p. 89-90), o desenvolvimento de projectos educacionais obedece a metodologias especfi cas, que podem dar origem a projectos de natureza distinta, tais como:

    Projectos educativos locais situados, fundamentalmente, no mbito de actuao da administrao autrquica, designadamente a municipal, desenvolvidos sob a sua coordenao e superviso, traduzem-se em propostas de desenvolvimento educativo de uma colectividade local, na base das quais se devero construir as cartas educativas municipais ().

  • 23Jorge Carvalho Arroteia

    Projectos de desenvolvimento local e interveno comunitria trata-se de projectos que dirigem a sua ateno para as comunidades locais e para as suas potencialidades de desenvolvimento, identifi cando problemas comuns, construindo colectivamente as solues e os modos de realizao atravs da mobilizao dos recursos e vontades locais ().

    Projectos de formao associados inicialmente aos programas de alfabetizao, os projectos de formao e educao de adultos abarcam hoje tambm outros domnios, como os da formao contnua, da formao e do reconhecimento de competncias, da requalifi cao e reconverso profi ssional (e mesmo do ensino profi ssional) ou seja, da chamada educao permanente e formao ao longo da vida ().

    Na apresentao deste tema, podemos ainda evocar Serrano (2000, Introduo), que, a propsito das caractersticas da sociedade actual e da mudana que a identifi ca, nomeadamente as de natureza cientfi ca, tcnica, e, sobretudo, educacional, considera que os projectos de natureza social ajudam o homem a tomar conscincia dos seus prprios problemas, podendo contribuir, desta forma, para a transformao e humanizao da sociedade (Op. cit., 19).Para tanto, aponta como exemplo o desenvolvimento de projectos sociais, com o intuito de melhorar uma determinada realidade social na qual fl orescem situaes que importa remediar.

    Pelo seu interesse, transcrevemos a defi nio que esta autora apresenta de projecto social orientado para um grupo social, uma instituio ou uma unidade territorial bem como as fases que importa considerar na sua realizao (Op. cit., p. 20-21): o projecto um plano de trabalho com carcter de proposta que concretiza os elementos necessrios para conseguir os objectivos desejados. Tem como misso prever, orientar e preparar o caminho para o que se vai desenvolver. Todo o projecto compreende:

    uma descrio do que se quer alcanar, indicando com preciso a sua fi nalidade; uma adaptao do projecto s caractersticas do ambiente e s pessoas que o vo

    desenvolver; dados e informaes tcnicas para o melhor desenvolvimento do projecto, assim como

    os instrumentos de recolha de dados; os recursos mnimos indispensveis sua aplicao; uma calendarizao precisa do desenvolvimento do projecto.

    Estas so algumas das questes que se prendem com o desenvolvimento de diferentes tipos de iniciativas, relacionadas com os problemas sociais contemporneos, que convivem com a instituio escolar, a qual tem uma palavra a dizer relativamente ao seu desempenho pedaggico e relao com a comunidade.

  • Administrao

    Em sentido amplo, a administrao tem uma funo especfi ca, que a de assegurar o cumprimento das polticas defi nidas pelo Governo. Tal conceito est ligado ao exerccio da direco, da gesto ou da governao, sobretudo de natureza pblica. Assim, para Birou (1978, p. 23), a administrao a actividade que consiste em gerir e em fazer funcionar instituies, empresas ou qualquer organizao econmica e social, pblica ou privada.Por sua vez, Sumpf e Hugues (1973, p. 11) falam-nos de administrao como o conjunto de relaes sociais estabelecidas num grupo (), relativas prossecuo de uma produtividade mais racional, porque assenta num conjunto de decises e na harmonizao das motivaes de todos os membros do grupo.

    Entendida, ainda, como a cincia e a arte de planejar, organizar, dirigir e controlar os empreendimentos humanos (SANTOS, 1964, p. 16), a administrao prev o exerccio de um conjunto de tarefas e de funes que permitem a consecuo dos grandes objectivos a atingir por qualquer empresa ou grupo organizado. Trata-se, portanto, de um processo que engloba diversas fases e funes, que tm acompanhado a evoluo das actividades laborais e de produo, relacionadas com o crescimento da indstria e da prpria sociedade.Deste modo, constatamos a existncia de etapas decisivas que facilitaram o seu desenvolvimento e que levaram racionalizao da actividade humana no seio das organizaes sociais, pblicas e privadas. Assim aconteceu, primeiramente, com a revoluo industrial e a mecanizao que permitiu aumentar a produtividade manufactureira e a produo nas grandes unidades laborais.

    Os principais escritos relativos teoria da administrao surgiram no incio do sculo XX, quando o engenheiro de empresas, Frederick W. Taylor, publicou, em 1911, um trabalho relativo aos Princpios da administrao moderna, ainda hoje aplicveis actividade humana. Dando nfase s tarefas e pensando, sobretudo, no aumento da produtividade e na realizao dos trabalhos rotineiros dentro da empresa, pela adaptao e treino do operrio ao trabalho que deve executar, Taylor assinalou alguns princpios fundamentais que, ainda hoje, se aplicam s organizaes modernas (BENTEZ, 1986, p. 26).

    Destes, destacamos: cada actividade laboral deve ser estudada de modo a defi nir-se a melhor maneira de a

    realizar. Uma vez defi nida essa actividade, devem ser dadas a cada trabalhador instrues escritas quanto ao modo de fazer o seu trabalho;

    () cada trabalhador deve ser seleccionado com base em critrios objectivos de forma a atingir uma maior efi cincia. Na fase seguinte deve garantir-se um aperfeioamento especfi co e um aperfeioamento contnuo;

  • 26 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    () necessrio um sistema de controlo a fi m de garantir que toda a actividade seja realizada de acordo com o plano previamente estabelecido;

    () deve haver uma separao ntida entre planeamento e execuo. A elaborao do plano cabe direco e a sua execuo ao trabalhador.

    Alguns anos mais tarde, em 1916, um outro engenheiro, Henry Fayol, num trabalho sobre Administrao industrial e geral, defendeu que em todas as organizaes existe uma srie de funes de cuja inter-relao e efi ccia depende o xito de qualquer instituio (Op. cit., p. 27).

    Contrariamente anterior, conhecida pela teoria da administrao cientfi ca do trabalho (ou do homem-mquina), a teoria clssica de Fayol passou a dar maior ateno estrutura organizacional das empresas, assinalando como funes essenciais da administrao as seguintes: tcnicas, relativas produo de bens e servios; comerciais, destinadas compra e venda de matrias; fi nanceiras, relacionadas com a gesto de capitais; segurana, abarcando a proteco de pessoas e bens; contabilsticas, relacionadas com a contabilidade da empresa; e administrativas. O exerccio desta ltima funo engloba as seguintes fases: planeamento, organizao, direco, coordenao e controlo. Estas tarefas devem integrar as diferentes fases que assinalam a administrao, nomeadamente a administrao educacional, que prossegue um determinado nmero de fi ns e de objectivos especfi cos.

    Note-se que a administrao dos sistemas de ensino, pela diversidade de estruturas que a compem e extenso territorial onde exercida, deve ser igualmente encarada como uma vasta organizao, dominada por estruturas, centralizadas ou no, mas sujeitas aplicao de princpios reconhecidos como indispensveis boa gesto. Destacamos dentre eles: diviso do trabalho, autoridade e responsabilidade, disciplina, unidade de comando e de direco, subordinao dos interesses individuais aos colectivos, centralizao, hierarquia, ordem, equidade e estabilidade (COSTA, 1996, p. 29).

    Devido evoluo das tarefas e das prprias organizaes sociais, hoje em dia as funes relativas administrao das organizaes sociais tm vindo a aumentar, contando actualmente o management empresarial com novas funes. Destas, destacamos: previso; planifi cao management empresarial com novas funes. Destas, destacamos: previso; planifi cao management(que compreende vrias fases no seu processo, desde a recolha de dados defi nio de objectivos e elaborao de planos e de programas); organizao; direco e coordenao; motivao; comunicao; avaliao (GHILARDI, SPALLAROSSA, 1989).

    Convir recordar que o desenvolvimento das sociedades industriais e a especializao crescente das funes e das organizaes sociais sugeriram novas propostas relativas ao modo de conduo racional dessas actividades e ao aparecimento de novos contributos tericos. Dentro destes, destacamos a abordagem sugerida por Max Weber (CRUZ, 1989), que, no enunciado da teoria burocrtica, chama a ateno para a necessidade da racionalizao das actividades econmicas e sociais, atravs da criao de rgos especializados, dotados de autoridade legal e racional. O poder exercido por esses rgos privilegia a hierarquizao, bem defi nida (pela dependncia dos cargos e no das pessoas, como sucedia no caso da submisso tradicional e carismtica), e a diviso do trabalho social, com base numa especializao funcional, atravs da departamentalizao. Igualmente necessrios so o ingresso e a progresso na carreira, assentes na competncia tcnica e no noutros privilgios sociais, tais como relaes familiares, amizades ou o carisma pessoal. Tais procedimentos so legitimados por regras

  • 27Jorge Carvalho Arroteia

    formais, que defi nem, com preciso, os direitos e deveres de cada trabalhador, garantindo, assim, a objectividade e as relaes impessoais entre os diferentes membros da organizao.

    Uma das caractersticas do aparelho administrativo construdo de acordo com este modelo , segundo Fernandes (1992, p. 36), o sistema de normas exaustivamente defi nidas e a estrutura de relaes hierrquicas entre os diferentes nveis da organizao para Weber o meio adequado para assegurar a coordenao efi caz da aco societria que a elite dirigente pretende exercer sobre toda a sociedade. Alm destas, a existncia de vnculos administrativos, impedindo a proeminncia dos direitos pessoais, devem apontar para o cumprimento de grandes objectivos comuns que orientam as organizaes burocrticas. Por outro lado, a previsibilidade do seu funcionamento constitui uma das ltimas caractersticas destas organizaes que reservam para o centro delas a responsabilidade da deciso, da inovao e da coordenao de toda a actividade e informao, respeitante ao seu conjunto.

    A falncia dos procedimentos relativos s teorias j referidas, principalmente em relao teoria burocrtica, que se revelou sede de inmeras disfunes relacionadas com a despersonalizao, o formalismo, a rotina e a resistncia mudana , centradas, essencialmente, na estrutura e no funcionamento das organizaes sociais, acabou por mostrar, ainda durante os anos trinta do sculo passado, a necessidade de se repensar o seu funcionamento, dando maior nfase s pessoas que as servem. Para tanto, contriburam as experincias efectuadas, na Western Electric (estudos de Hawthorne), por Elthon Mayo (em 1942), que mostraram como a conduta do trabalhador no depende tanto da sua personalidade, mas sim do grupo laboral onde se insere. Por outro lado, realaram a importncia da comunicao como elemento fundamental para evitar os confl itos nas organizaes (BENTEZ, 1986,p. 27). Esta postura favorece a compreenso das necessidades sociais dos trabalhadores, a motivao, o comportamento em grupo e a satisfao profi ssional das necessidades humanas(das fi siolgicas s de auto-realizao), podendo trazer um acrscimo da produtividade por parte dos elementos de qualquer empresa.

    Por sua vez, as propostas contidas na teoria das relaes humanas de Elthon Mayo foram enriquecidas com o enunciado de novos contributos relativos ao comportamento organizacional, dando ainda maior nfase s pessoas. Referimo-nos anlise comportamental representada pelas Teorias do X e do Y de Douglas Mac Gregor. Assinalou Mac Gregor (Teoria do X) a grande repugnncia do ser humano pelo trabalho e mudana, o desinteresse em assumir responsabilidades de direco e de procurar acima de tudo a segurana, pouco lhe interessando, dado o seu carcter egosta e ambio reduzida, os objectivos da organizao. Estes pressupostos serviram ao autor para procurar justifi car, atravs de outro enunciado, a Teoria do Y, a integrao do homem nas organizaes, a sua motivao e interesses.

    Novamente de Bentez (Op. cit., p. 28), transcrevemos alguns dos princpios bsicos desta ltima teoria:

    o trabalho to importante para o homem como o jogo, a diverso ou o descanso. Segundo circunstncias que podem variar, o trabalho pode constituir uma fonte de satisfao (caso em que o far voluntariamente) ou um castigo (caso em que o evitar);

    o controlo e as sanes no so os nicos meios para que o homem prossiga os fi ns da organizao. A satisfao induzida pelas caractersticas da personalidade () so um estmulo para a actividade laboral;

  • 28 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    a capacidade de imaginao, de engenho e de esprito criativo existem em grande nmero de indivduos. Se o homem encontra as condies adequadas para desenvolver estas capacidades ento no s as reunir como tentar assumir a sua responsabilidade;

    no estado actual das organizaes, a capacidade intelectual do ser humano s utilizada parcialmente.

    Como j notmos, a evoluo das organizaes sociais, na actualidade, tem vindo a sugerir novas pistas para a sua interpretao e anlise. Por isso, diversos contributos tm surgido nos ltimos anos, relacionados com a vida das sociedades e com a sua complexifi cao actual. Entre as novas propostas, salientamos a teoria sistmica, que considera a administrao como um sistema de variveis mltiplas e dinmicas, como um todo dinmico, que tem em conta os diferentes elementos da organizao, como um todo de partes interligadas, relacionadas entre si e orientadas para os mesmos objectivos.

    Tal perspectiva, no sendo inovadora no domnio do estudo das organizaes sociais, contempla igualmente as relaes entre estas e o seu meio envolvente e a sua modifi cao atravs de mecanismos complexos de auto-regulao. Tal acontece, principalmente, com os sistemas abertos, conhecidos pela sua capacidade de adaptao e de reaco ao meio retroaco que permite a adaptao contnua do produto fi nal s necessidades do prprio meio, a continuidade e a sobrevivncia das organizaes sociais. Caso assim no se verifi que, predomina a certeza, a previsibilidade, o planeamento e o controlo cerrados, caractersticos dos sistemas fechados e das teorias clssica e burocrtica da administrao.

    A exposio destes aspectos referentes teoria geral da administrao no esgota o enunciado de outros pressupostos, nomeadamente a teoria da contingncia, que defende no existirem normas ideais para dirigir as organizaes sociais, j que estas dependem, essencialmente, de factores contextuais. Se aplicadas administrao educacional, podemos referir novas abordagens tericas, tais como as teorias da anarquia, da democracia, da arena poltica e outras. No seu conjunto, estas sugerem-nos a necessidade de uma anlise mais aprofundada da escola e das suas imagens organizacionais. Trata-se, alis, de assunto desenvolvido por outros autores, nomeadamente por Costa (1996).

    A apresentao acima descrita no esconde a existncia de novos atributos que devem caracterizar a administrao no seu conjunto, sobretudo se esta for entendida numa perspectiva mais dinmica e inovadora. Neste caso, a administrao pode revestir os seguintes atributos:

    dinmica: permevel a mudanas internas dentro da organizao e a um melhor aprovei-tamento dos seus recursos humanos;

    inovadora: facilitadora dessas mudanas; efi caz: garantindo os melhores resultados face ao planeamento realizado; estvel e duradoura: funcionando independentemente das fl utuaes polticas; participativa: fomentando o envolvimento de todos os actores sociais afectados pelas

    medidas de poltica educativa.

    Tendo em conta o processo de crescimento econmico e social das sociedades industriais, estas tm vindo a registar um aumento crescente do sector pblico, devido oferta acrescida de bens e servios que acompanham o bem-estar e o progresso social. Esta situao tem

  • 29Jorge Carvalho Arroteia

    levado ao aumento crescente das despesas pblicas, isoladamente e na sua relao com o PIB, conduzindo, por isso, a uma maior racionalidade da teia burocrtica do Estado e a uma gesto mais cuidada e responsvel dos seus agentes.

    DirecoA direco, entendida como a aco de dirigir, consistindo em estabelecer e manter uma

    linha de actuao determinada, exige o planeamento, execuo e controle de um conjunto de actividades a desempenhar no seio de uma organizao social (DACAL, 1986, p. 154)., ainda, entendida como um processo aberto e fl exvel, que pretende harmonizar os recursos e os elementos pessoais com vista a alcanar metas previamente determinadas (Loc. cit.) e constitui uma das tarefas fundamentais de toda a actividade administrativa.

    Se aplicada educao, as actividades relacionadas com a preparao de iniciativas no mbito da aco e da poltica educativa exigem o domnio de um conjunto de princpios estruturantes, sobretudo na rea da administrao pblica e da gesto dos recursos humanos. Por outro lado, requer um conhecimento aprofundado da estrutura e da organizao do sistema educativo, dos diversos subsistemas que o formam, do universo de instituies que o integram e das pessoas que nele trabalham e frequentam. O cumprimento dos seus princpios directores, a articulao entre os seus rgos e a comunicao entre os seus elementos constituem a essncia do funcionamento deste sistema.

    Tendo presente o desenvolvimento cientfi co das teorias relacionadas com a organizao cientfi ca do trabalho, as mudanas de ambientes e a importncia crescente dos aspectos atinentes direco dos recursos humanos, o conceito de direco, tal como a referimos, tem vindo a evoluir, cabendo-lhe novas tarefas concernentes gesto e liderana das organizaes sociais. De facto, partilhando das mesmas responsabilidades de direco, a gesto e a liderana permitem alcanar os melhores resultados em termos de execuo e desempenho, de processos, de participao e de resultados, permitindo transformaes profundas no seio das organizaes educativas.

    MotivaoO cumprimento das funes clssicas do management (empresarial e educacional) deve

    contemplar a motivao, que constitui um dos factores mais relevantes a assumir pelos comportamentos individuais no seio das organizaes. Dacal (1986, p. 306) refere-se motivao como revestindo uma componente dinmica, de estmulo actividade para objectivos e metas previamente estabelecidas e aceites pelo indivduo. Por isso, e sem esquecer a hierarquia das necessidades que, segundo Maslow, poderiam justifi car o cumprimento de certas tarefas ou os trabalhos de Mc Gregor sobre as motivaes individuais, entendemos, semelhana de Ghilardi e Spallarossa (1989, p. 35), que a participao nas actividades de direco constitui um dos factores positivos na motivao do pessoal docente e na prossecuo dos objectivos consignados em textos de reforma do sistema educativo. Este facto pressupe que o sucesso deste passa, necessariamente, pelo envolvimento dos docentes na gesto do sistema educativo e, sobretudo, pela sua motivao em relao s propostas de mudana e das reformas em curso. Sem pretendermos esgotar as funes clssicas do management (empresarial e escolar), recordamos que a motivao constitui

  • 30 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    um dos factores mais relevantes no assumir dos comportamentos individuais no seiodas organizaes.

    Reportando-nos realidade portuguesa, a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) defende nos seus princpios gerais (art 43) que a administrao e gesto escolares devem assegurar o pleno respeito pelas regras de democraticidade e de participao que visem a consecuo de objectivos pedaggicos e educativos, auxiliados pelo job enrichment do pessoal docente, que, segundo Ghilardi e Spallarossa (Op. cit., p. 35), constitui um terceiro requisito indispensvel motivao do pessoal docente.

    A leitura de diversas obras e contributos sobre esta matria expressa orientaes distintas que hoje animam os modelos do management educacional. Com efeito, se tivermos em conta os aspectos essenciais das teorias clssicas da administrao, constatamos no ser possvel, em muitos dos seus aspectos, uma aplicao imediata desses princpios gesto das instituies escolares. Consideremos alguns exemplos. Para Fayol, tido como o pai do management moderno, qualquer organizao considerada como uma mquina construda segundo normas rgidas, que funciona fora de presses internas ou externas. Assim entendida, a rigidez e o mecanicismo constituem as caractersticas fundamentais das organizaes sociais que funcionam de acordo com os seguintes princpios basilares (Op. cit., p. 24): especializao das incumbncias; estandartizao do rendimento; unidade de comando e centralizao da tomada de decises.

    Outras abordagens mais recentes, baseadas na teoria das relaes humanas, tiveram em considerao o estudo dos componentes humanos da organizao, do conhecimento do seu comportamento, dos hbitos e das motivaes dos trabalhadores. Nesta perspectiva assentam as teorias de Mc Gregor, nas suas relaes com a teoria de Maslow (baseada na hierarquia das necessidades humanas). Aqui as necessidades sociais de estima e de auto-realizao so apontadas to importantes como as necessidades primrias de natureza fi siolgica e de segurana. Ainda, de acordo com Ghilardi e Spallarossa (Op. cit., p. 25), no mbito do management educacional qualquer instituio escolar tem de ser entendida como um complexo sistema aberto, em condies de exprimir elevados nveis de interaco com o ambiente. Por estas razes, a administrao educacional surge-nos como uma operao complexa identifi cada por diversas funes (cf: Fayol, Weber, Mayo, McGregor e outros), sujeitas a interaces vrias entre a escola e o seu meio ambiente, como assinalam outros autores como Emery, Trist, Aldrich e outros.

    ParticipaoA participao um dos requisitos fundamentais para o bom funcionamento de qualquer

    organizao social, uma vez que implica um envolvimento pessoal no cumprimento dos objectivos e colaborao em tomadas de deciso que dizem respeito ao grupo e aos seus elementos. Em regra, estes esto animados por sentimentos de identifi cao, de pertena e por laos de solidariedade, levando-os, geralmente, a ajustar os seus comportamentos aos interesses colectivos. Modernamente, a cooperao constitui um dos pressupostos bsicos para os modelos de governao em networks.

    Em relao escola, observa Lima (1991, p. 164) que a participao uma das palavras--chave da poltica educativa depois de 25 de Abril de 1974 (e, de certa forma, j o era antes,

  • 31Jorge Carvalho Arroteia

    enquanto reivindicao), omnipresente nos discursos poltico, normativo e pedaggico. Esta participao exige o envolvimento de outros pblicos em actividades promovidas pela instituio escolar, que no s os seus alunos e docentes, mas tambm os pais, as autarquias e outras entidades, sendo uma consequncia do processo de democratizao do ensino e do desenvolvimento de projectos de aco orientados para a participao pblica dos pais e da sociedade em geral. Da o interesse do envolvimento de entidades exteriores escola nas suas actividades, nos seus rgos de gesto e em actividades diversas que promovam uma maior proximidade entre a instituio escolar e o seu meio.

    A mobilizao de entidades exteriores escola permite partilhar diferentes responsabilidades relacionadas com a gesto, a mobilizao e o fi nanciamento de actividades inerentes ao ensino, facilitando, por esta via, os resultados conseguidos pela instituio escolar. Tal facto resulta frequentemente da prpria alterao das estruturas e da organizao do sistema de ensino, levando a uma maior interveno do poder regional e do poder local em relao aos problemas que afectam a comunidade. Um exemplo desta atitude a participao dos pais, das autarquias, das associaes locais, representadas nos rgos de gesto da escola, bem como na possibilidade de elaborao de projectos educativos prprios, indiciadores da autonomia acrescida das escolas no contexto local da sua actuao.

    A participao dos cidados na vida das instituies democrticas insere-se no estabelecido na CRP. Entre os diferentes rgos abertos participao democrtica, refere-se o caso do Conselho Nacional de Educao, com funes consultivas, sem prejuzo das competncias prprias dos rgos de soberania, para efeitos de participao das vrias foras sociais, culturais e econmicas na procura de consensos alargados relativamente poltica educativa (). Por sua vez, a Constituio Europeia consagra no seu artigo I-47 o Princpio da democracia participativa, que permite o estabelecimento, atravs de canais adequados, do dilogo entre e Unio e o cidado.

    Quanto administrao e gesto dos estabelecimentos de educao e ensino, estes soregidos pelos princpios de democratizao e de participao. A sua conduo deve orientar-se por uma perspectiva de integrao comunitria, prevalecendo os critrios de natureza pedaggica e cientfi ca sobre critrios de natureza administrativa. Estes aspectos esto defi nidos no s na Lei de Bases (art 45), mas tambm nos documentos reguladores do exerccio desta gesto e administrao escolar. Assim, de acordo com Sarmento (1997,p. 557), a construo de uma administrao participativa da educao passa pela defi nio de nveis de responsabilidade e pela construo de dispositivos que assumam o territrio como nvel de administrao, ou seja, a ultrapassagem de uma lgica predominantemente vertical e compartimentada da administrao para uma lgica predominantemente horizontal e integrada, aos diferentes nveis (central, regional, municipal, de territrio educativo e de estabelecimento de ensino).

    A importncia da participao dos pais na organizao escolar levou Nvoa (1992, p. 27) a afi rmar que as escolas com melhores resultados so, normalmente, aquelas que conseguem criar condies propcias a uma colaborao das famlias na vida escolar, uma vez que estes podem ajudar a motivar e a estimular os seus fi lhos, associando-se aos esforos dos profi ssionais do ensino. Por outro lado, se atendermos aco educativa, o grande desafi o que se coloca s polticas de educao o de manter vivas dinmicas de reforma permanente

  • 32 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    e de ajustamento contnuo, gerindo social e politicamente a instabilidade da decorrente, ou seja, conquistando a sociedade para a participao nos processos de mudana (AZEVEDO, 1994, p. 31).

    Estas so, com efeito, algumas das questes que se levantam administrao dos sistemas sociais e educativos e ao envolvimento da sociedade nos seus processos.

  • Administrao educacional

    A administrao do ensino corresponde a uma rea especfi ca da administrao pblica, que incide sobre o sistema educativo, no seu conjunto, e as ofertas de formao das escolas integradas no servio pblico. A administrao educacional, prosseguindo as fi nalidades gerais da administrao pblica, tem natureza prpria e mtodos especfi cos que levam ao cumprimento das polticas educativas, pelo que pode ser encarada sob diferentes perspectivas: uma perspectiva funcional, relacionada com o exerccio da funo administrativa; uma outra, institucional, relacionada com o funcionamento das estruturas e das organizaes educativas; outra ainda, mais social, relacionada com as novas funes atribudas educao por via da mudana e da dinmica social, em contextos rurais e urbanos, nacionais e globais.

    Como afi rma Azevedo (1994, p. 181), parafraseando Kant, h duas invenes humanas que podem ser consideradas mais difceis do que quaisquer outras a arte da governao e a arte da educao; e as pessoas ainda se digladiam acerca do seu verdadeiro signifi cado.De facto, tal como os demais sistemas sociais, o sistema educativo est marcado por uma estrutura complexa, resultado de inmeras interaces sociais e da aco de diversos condicionalismos (de ordem fi losfi ca, poltica, histrica, cultural, religiosa e comportamental, agindo isoladamente ou em conjunto). Estes aspectos ganham maior signifi cado se tivermos em conta as funes especfi cas que este tem sido chamado a desempenhar, tais como a transmisso s geraes mais jovens das tcnicas, dos conhecimentos, dos costumes, dos usos, das crenas e, em geral, do patrimnio cultural criado ao longo da histria (DACAL, 1986, IX).

    Note-se que, para alm de agente de socializao, o sistema educativo assume, com outros agentes de socializao, um papel activo nesse processo, estimulando a transmisso do saber e as aprendizagens orientadas, igualmente, para a especializao laboral, caracterstica das sociedades desenvolvidas e com elevada diviso do trabalho. Para alm destas responsabilidades, reconhecemos que ao sistema educativo caber ainda facilitar o desenvolvimento das capacidades de refl exo crtica, tarefa que exige, na sua essncia, a assuno de um modelo democrtico de gesto. Neste caso, os membros das organizaes educativas assumem um papel essencial no cumprimento dos objectivos que as instituies escolares se propem alcanar.

    No cabendo, agora, a anlise das funes da educao, recordamos, semelhana de Faure, esse tipo de relao dialctica que entre ambos se estabelece: o sistema escolar reproduz e contribui, simultaneamente, para a transformao da prpria sociedade. Trata-se da mudana social decorrente da acumulao e da valorizao de conhecimentos que permitem educao ser considerada como um poderoso factor residual desta mudana, promovendo

  • 34 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    o progresso e a formao das geraes vindouras, com recurso aos conhecimentos acumulados pelos seus antepassados. Note-se que esta capacidade de vencer as barreiras sociais, culturais e tecnolgicas, abrindo caminho ao avano da sociedade, depende no s do teor dos conhecimentos transmitidos, mas, acima de tudo, do modelo de organizao e funcionamento das estruturas educativas que permitem a aco educativa conducente mudana. Este , tambm, o entendimento de Caillods (1989, p. 26), ao defender a mudana das estruturas educativas como uma das condies fundamentais para a melhoria institucional e da qualidade dos sistemas educativos.

    Como o reconheceu Habermas, o nvel de desenvolvimento de uma sociedade depende da capacidade de aprender permitida pelas instituies. Assim, entendemos como til relacionar a capacidade de inovao dos sistemas sociais com o tipo de organizao, a estrutura formal dos sistemas educativos e o modelo da sua administrao. De entre outros factores, tal depende, tambm, da procura social da educao que, de forma constante, tem vindo a modifi car os padres de funcionamento, os modelos de gesto e a efi ccia interna e externa dos sistemas educativos. Reconhecemos como a massifi cao da escola trouxe novos problemas (pedaggicos, institucionais e humanos), aos quais, nem sempre de forma satisfatria, a organizao e a gesto educacional conseguem responder. Este fenmeno reala o papel da educao na formao dos recursos humanos, como factor de mobilidade e de promoo social, e a aco da escola, como uma necessidade para responder s necessidades, cada vez mais variadas, da nossa sociedade, conforme o reconheceu Caillods (Op. cit., p. 11).

    Recorde-se que a procura de instruo tem alimentado os fl uxos escolares, sugerindo a sua importncia, quer como um bem de investimento, quer como um bem de consumo. Nestas circunstncias, compreendem-se as expectativas que se colocam aos modelos de gesto do sistema escolar, que tero obrigatoriamente de privilegiar, nos seus princpios e fundamentos, uma estreita relao com o meio. Da que o conhecimento e a participao da sociedade sejam imprescindveis para que o sistema educativo, como sistema aberto, possa cumprir cabalmente as suas funes. Entre estas, cabe assegurar a participao alargada da populao, principalmente da populao escolar (docentes e discentes). Reportando-nos realidade portuguesa, a Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei 46/86, com as alteraes que posteriormente foram introduzidas) defende, nos seus princpios gerais (art 43), que a administrao e gesto do sistema educativo devem assegurar o pleno respeito pelas regras de democraticidade e de participao que visem a consecuo de objectivos pedaggicos e educativos, nomeadamente no domnio da formao social e cvica.

    A consulta de outros documentos evidencia orientaes distintas, que animam os modelos actuais do management educacional. Estes fundamentam-se em diversas teorias da administrao, embora no seja possvel uma aplicao imediata de todos esses princpios gesto das instituies escolares. Vejamos alguns exemplos. Para Fayol, considerado como o pai do management moderno, qualquer organizao entendida como uma mquina construda segundo normas rgidas, funcionando independentemente das presses internas e externas que sobre ela se exeram. Da que a rigidez e o mecanicismo constituam as caractersticas fundamentais das organizaes que funcionam de acordo com os seguintes princpios basilares (GHILARDI, SPALLAROSSA, 1989, p. 24):

  • 35Jorge Carvalho Arroteia

    especializao das incumbncias; estandartizao do rendimento; unidade de comando e centralizao da tomada de decises.

    Mais prximas do modelo que perfi lhamos, as abordagens que sustentam a teoria das relaes humanas desenvolveram-se a partir do estudo das componentes humanas da organizao, do conhecimento do seu comportamento, dos hbitos e das motivaes dos trabalhadores. Nesta perspectiva assentam as teorias de Mc Gregor nas suas relaes com a teoria de Maslow (baseada na hierarquia das necessidades humanas). De facto, as necessidades sociais, de estima e de auto-realizao so to importantes como as necessidades primrias de natureza fi siolgica e de segurana. Contudo, se aplicadas ao management educacional, management educacional, managementqualquer instituio escolar tem de ser entendida como um complexo sistema aberto, em condies de exprimir elevados nveis de interaco com o ambiente (Op. cit., p. 25). Nestas circunstncias, a administrao escolar surge como uma operao complexa, identifi cada com diversas funes (prever, organizar, dirigir, coordenar e controlar, na perspectiva de Fayol, ou j, planifi car, organizar, seleccionar, dirigir, coordenar, informar e oramentar POSCORB segundo Gulik e UrwicK), sujeitas a interaces diversas entre as organizaes educacionais e o seu meio ambiente.

    Da, portanto, que o conhecimento da comunidade onde a escola se insere constitua uma das primeiras condicionantes da deciso estratgica e da orientao global das actividades a desenvolver pela escola. Esta funo dever ser mesmo estimulada pelo Estado, como uma das condies fundamentais para se conseguir o almejado desenvolvimento endgeno e a promoo social das diferentes regies. Com efeito, como nota Tedesco (CAILLODS, 1989, p. 331), a funo do Estado no dever ser a de impor um modelo cultural determinado mas a de encorajar o recurso a valores e a formas de organizao refl ectindo um acordo essencial, reconhecendo-se como essenciais a solidariedade, a criatividade, a participao e a efi cincia.

    Anotemos outros ensinamentos relacionados com a teoria sistmica. Se identifi carmos as instituies educacionais com uma empresa interessada em manter o maior nmero de relaes com o seu meio ambiente, tal s efectivado a partir de um processo organizacional que permita uma optimizao perfeita dos recursos humanos e materiais, de forma a garantir-se o cumprimento de um conjunto de objectivos comuns da sua populao. Assim, a melhoria da qualidade de instruo, a produtividade educativa e a prpria inovao so objectivos difceis de alcanar, mesmo com o recurso a sofi sticados meios de informao tecnolgica, caso as expectativas dos seus agentes no sejam tomadas em considerao.

    Se aceitarmos como premissa essencial da escola (e dos sistemas de ensino) a promoo do desenvolvimento humano, pensamos, semelhana do que escreveu Loureiro (1985, p. 19), que tal mudana uma questo poltica e uma questo pedaggica e, por isso, as estratgias respectivas devem ser cumulativamente polticas e pedaggicas: estratgia poltica que passar, necessariamente, pela redefi nio clara dos objectivos e das metas a atingir pelo sistema educativo portugus; estratgia pedaggica, assente na melhoria objectiva das condies institucionais e na formao permanente dos agentes educativos, de forma a concretizar-se a to almejada democratizao do ensino, o desenvolvimento humano dos alunos e a promoo do sucesso educativo. Resta-nos inserir uma terceira alternativa, a incluso de

  • 36 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    uma estratgia administrativa e organizacional, que favorea a descentralizao administrativa e a autonomia institucional, promovendo um maior empenhamento e participao nas tarefas educativas por parte, dos pais, professores e de toda a comunidade. S assim ser possvel integrar os diferentes pressupostos da administrao educativa e a manuteno das componentes estruturais bsicas ao nvel quer dos sistemas de deciso, quer do sistema operativo.

    Recorde-se que o sistema de deciso abarca o planeamento, a informao e o controlo, integrando o sistema operativo a aco de todos os rgos responsveis pela realizao e execuo dos planos e programas e pela gesto dos recursos materiais, humanos, tcnicos e econmicos que fazem parte da administrao central e local. Compreende-se, desta forma, que, ao estabelecer a existncia de estruturas administrativas de mbito nacional regional autnomo, regional e local (art 43 LBSE), o Estado atribua administrao central funes de natureza distinta (art 44):

    a) concepo, planeamento e defi nio normativa do sistema educativo, com vista a assegurar o seu sentido de unidade e de adequao aos objectivos de mbito nacional;

    b) coordenao global e avaliao, da execuo das medidas da poltica educativa a desenvolver de forma descentralizada ou desconcertada;

    c) inspeco e tutela, em geral, com vista, designadamente, a garantir a necessria qualidade do ensino;

    d) defi nio dos critrios gerais de implantao da rede escolar, da tipologia das escolas e seu apetrechamento, bem como das normas pedaggicas a que deve obedecer a construo de edifcios escolares;

    e) garantia da qualidade pedaggica e tcnica dos vrios meios didcticos, incluindo os manuais escolares.

    J a nvel regional, e com o objectivo de integrar, coordenar e acompanhar a actividade educativa, ser criada em cada regio um departamento regional de educao ().

    Reduzindo os diversos atributos de forma mais expedita e seguindo uma terminologia proposta por Dacal (1986, XXVIII), so funes prprias da administrao educacional:

    fi xao de objectivos; planeamento e organizao; informao e controle.

    A primeira funo est ligada funo poltica de concepo do sistema, tendo embora presente que a determinao daqueles pressupostos est relacionada com as necessidades do sistema social, s quais o poder poltico deve atender. Esta posio assenta no pressuposto da existncia de um paradigma multidimensional, num tipo de abordagem multidisciplinar, que contempla as transformaes operadas no sistema educativo nas suas diversas dimenses: humana, sociopoltica, pedaggica e econmica. Assim sendo, e tendo presente a prevalncia da dimenso humana sobre todas as outras dimenses, encaramos como fundamental a implementao de estratgias educacionais que garantam um adequado desenvolvimento econmico, a repartio da riqueza, a promoo das igualdades de acesso e de sucesso educativos, a harmonia entre a quantidade e a qualidade do ensino, a satisfao das necessidades bsicas e profi ssionais populao docente e discente, a adequada insero das instituies

  • 37Jorge Carvalho Arroteia

    escolares no tecido social econmico e cultural e a afi rmao de um modelo de gesto, humanista e participativo. Este modelo passa pelo cumprimento de uma condio fundamental: a autonomia.

    A relao entre a administrao educacional e o planeamento , hoje em dia, mais estreita e complementar, dada a mudana social em curso e as necessidades de recursos materiais, humanos e fi nanceiros, justifi cados pelas exigncias, sempre burocrticas, implementadas pelo poder. Por outro lado, a relao entre ambas justifi ca-se, tendo em conta a maior procura social da educao e o aumento da esperana de vida escolar, a necessidade de uma adequada e justa repartio dos recursos, a transparncia da governao e a construo de novos cenrios resultantes da evoluo da sociedade portuguesa, da sociedade europeia e da marcha dos processos gerais de globalizao.

    Em Portugal, a poltica da educao da responsabilidade dos Ministrios da Educao que integra os servios centrais e as direces regionais de educao e do Ministrio da Cincia, Tecnologia, Inovao e Ensino Superior. Nas Regies Autnomas, da responsabilidade dos Governos Regionais. De acordo com a LBSE (art 45), a direco de cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos dos ensinos bsico e secundrio assegurada por rgos prprios, para os quais so democraticamente eleitos os representantes dos professores, alunos e pessoal no docente (). Por sua vez, de acordo com a legislao relativa ao regime de autonomia, administrao e gesto dos estabelecimentos da educao pr-escolar e dos ensinos bsico e secundrio (Dec-Lei n 115-A/98, de 4 de Maio art 7), so rgos prprios de administrao e de gesto das escolas ensino no superior (ME):

    Assembleia: rgo responsvel pela defi nio das linhas orientadoras da actividade da escola (com a participao e representao da comunidade educativa);

    Conselho executivo ou director: rgo de administrao e gesto da escola nas reas pedaggica, cultural, administrativa e fi nanceira.

    Conselho pedaggico: rgo de coordenao e orientao educativa da escola, nos domnios pedaggico e didctico, da orientao e acompanhamento dos alunos e da formao inicial e contnua dos professores e funcionrios;

    Conselho Administrativo: rgo deliberativo em matria administrativa e fi nanceira.

    A estes compete respeitar os princpios orientadores da administrao das escolas (art 4 Dec.-Lei n 115-A/98):

    democraticidade e participao de todos os intervenientes no processo educativo (); primado de critrios de natureza pedaggica e cientfi ca sobre critrios de natureza

    administrativa; representatividade dos rgos de administrao e gesto da escola (); responsabilizao do Estado e dos diversos intervenientes no processo educativo; estabilidade e efi cincia da gesto escolar (); transparncia dos actos de administrao e gesto.

    O cumprimento destes princpios aplica-se administrao educativa e ao exerccio da sua autonomia, na qual o regulamento interno tem um papel fundamental. De facto, este estabelece (art 3 Dec.-Lei n 115-A/98) o regime de funcionamento da escola, de cada um

  • 38 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    dos seus rgos de administrao e gesto, das estruturas de orientao e dos servios de apoio educativo, bem como os direitos e os deveres dos membros da comunidade escolar.

  • Anlise social da educao

    A anlise social da educao abarca o conjunto de procedimentos de natureza cientfi ca que permitem conhecer as relaes entre os fenmenos educacionais e os fenmenos de natureza social, isoladamente, e nas suas relaes com o sistema educativo. Este tipo de anlise pressupe a identifi cao dos fenmenos em estudo, a sua interpretao, compreenso e explicao, com base em metodologias especfi cas carreadas das diversas Cincias Sociais, em particular da Sociologia, da Demografi a, da Economia, da Antropologia ou da Geografi a Social. Assim, o mesmo fenmeno social e educacional, tal como o (in)sucesso dos alunos, pode ser abordado de forma distinta, consoante a cincia que o retrata: interessa sociologia, nas suas relaes com o meio e o grupo social; administrao, na anlise das estruturas que o enquadram; psicologia, nos aspectos individuais e comportamentais do aluno; demografi a, na anlise quantitativa do mesmo; economia, no que respeita aos custos; geografi a da educao, na anlise da sua distribuio territorial, em relao s caractersticas da sociedade.

    Se entendermos a educao como um fenmeno que deve atender s necessidades sociais, a anlise social da educao deve ocupar-se da compreenso dos fenmenos educativos, entendidos aqui como o conjunto de prticas, de modos de procedimento, de costumes que constituem fenmenos perfeitamente defi nidos e que tm a mesma natureza que os outros fenmenos sociais (DURKHEIM, 1980, p. 72). Assim entendida, a anlise social da educao debrua-se sobre os fenmenos educativos, segundo perspectivas diferenciadas, consoante a natureza e o objecto de estudo. Esta abordagem permite um entendimento alargado da realidade escolar e social dos fenmenos e das questes fulcrais com que se debatem os sistemas educativos na actualidade. A anlise destas questes concretizada atravs do recurso a mtodos apropriados que garantem a cientifi cidade desta abordagem, nomeadamente atravs da conceptualizao dos fenmenos em apreo, da seleco e crtica das fontes, do processo de recolha dos dados, do tratamento da respectiva informao, da divulgao dos resultados e dos processos de avaliao do estudo.

    Tal como apontam Pires, Fernandes e Formosinho (1991, p. 32), a anlise social da educao est fundamentada na sua gnese, exerccio e objectivos, uma vez que esta aparece como tendo a sua origem na sociedade ou num grupo social (e no apenas na vontade individual de cada membro); uma aco exercida por vrias pessoas e tem por objectivo responder a necessidades ou projectos sociais (e no apenas a necessidades ou projectos individuais). Mais, ainda, a educao uma aco global, visando a formao e desenvolvimento total do homem e no apenas um aspecto parcelar.

  • 40 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    O aprofundamento de estudos nesta rea no desmerece o aprofundamento de outras abordagens, sobretudo no mbito da Sociologia da Educao, cujas preocupaes, de acordo com Morrish (1979, p. 29-30), incidem na anlise dos processos sociolgicos implicados nas instituies educativas (), na investigao dos aspectos sociolgicos dos fenmenos e instituies docentes, considerados essencialmente como problemas de natureza sociolgica, mais do que da prtica educativa. Se pretendermos inserir a natureza destes trabalhos numa perspectiva mais ampla, relacionada com as tarefas a desempenhar por um socilogo(de acordo com o Departamento do Trabalho dos EUA), ento podemos aceitar, como base da sua interveno, a defi nio que Horton e Hunt (1980, p. 30) registam sobre o seu desempenho: desempenha pesquisa sobre a origem e o desenvolvimento de grupos de seres humanos e de padres de cultura e organizao social que surgiram da vida grupal da sociedade; coleta e analisa dados cientfi cos concernentes a fenmenos sociais, minorias tnicas, classes sociais e mudana social ().

    Aprendizagens escolaresA aprendizagem de toda uma vasta gama de conhecimentos bsicos, de tradies, de

    modelos, de normas, de valores, de smbolos e de prticas sociais constitui um processo lento, no qual participamos ao longo da nossa vida atravs de uma rede complexa de iniciativas, interdependncias e infl uncias mtuas que se exercem entre o indivduo e o meio onde vive. Para tanto, contribui em primeiro lugar a socializao, processo amplo de natureza psicossocial, atravs do qual se forma a personalidade de base, sob infl uncia do meio e particularmente das instituies educativas, familiares, religiosas, etc. (BIROU, 1978, p. 380).

    O processo de aprendizagem que se inicia com o domnio das primeiras letras e a aquisio das regras do comportamento familiar, de prticas sociais, de valores familiares,colectivos e outros, fazem parte do nosso quotidiano e desenvolvem-se ao longo de estdios sucessivos do crescimento humano, sendo auxiliadas por aco de mltiplos factores e agentes que garantem o conhecimento de um nmero elevado de papis e de atitudes comportamentais, facilitadoras do processo de integrao no nosso meio ambiente. Entre outras defi nies deste fenmeno, retemos a de Cabanas (1984, p. 145), que defi ne a socializao como um processo interaccional de aprendizagem social que permite pessoa humana durante toda a sua vida assumir, interiorizar e integrar na estrutura da sua personalidade as formas e os contedos culturais do seu meio ambiente, bem como incorporar-se progressivamente na sociedade na qual h-de viver como membro activoda mesma.

    Embora com outro signifi cado, fazem ainda parte deste processo as aprendizagens, os mtodos e as tcnicas especializadas que se vo desenvolvendo ao longo de vrios ciclos de estudos e que permitem uma adequada capacitao profi ssional, capaz de garantir o exerccio de uma actividade, produtiva ou de servios, no seio das sociedades industrializadas e de servios em que vivemos. Note-se, ainda, que a especializao laboral, prpria das sociedades desenvolvidas e com elevada diviso do trabalho social, realiza-se no s dentro das prprias instituies escolares, mas, fundamentalmente, fora delas, privilegiando a aco de outros agentes, que no s a escola, neste processo de socializao. Tal leque de conhecimentos faz parte da chamada educao informal ou paralela, cuja relevncia nas sociedades

  • 41Jorge Carvalho Arroteia

    ps-industriais por demais evidente, concorrendo, assim, com os processos clssicos de ensino-aprendizagem, assegurados pela escola tradicional.

    As aprendizagens ofi ciais so traduzidas em planos de estudos, ou planos curriculares, que contm os programas especfi cos de cada disciplina, aprovados ofi cialmente. Por sua vez, estes so elaborados a partir de um conjunto de teorias e de mtodos de ensino, elaborados de acordo com os quadros tico, cultural, fi losfi co e pedaggico, e de diferentes contextos sociais e polticos que defi nem o modelo de ensino, em articulao com o modelo de sociedade. Contudo, a expanso da sociedade de informao, no s no domnio educacional, mas tambm na indstria, nos servios, nas comunicaes, etc., oferece, cada vez mais, oportunidades em relao s aprendizagens e s competncias desenvolvidas na escola.

    Tendo em conta o fenmeno actual da mundializao, baseada na comunicao e inovao e a necessidade de novas aprendizagens, transcrevemos de Carnoy (1999, p. 75) o seguinte: os principais obstculos melhoria do ensino na maior parte dos pases reside na difi culdade de defi nir as melhores prticas na sala de aula e os materiais necessrios para a sua aplicao. Em consequncia, para que a avaliao tenha um impacto signifi cativo nos resultados escolares do pas, estes devem fazer um esforo contnuo para ajudar os professores (e a escola) a melhorarem as prticas na sala de aula. Por isso, como afi rma Azevedo (1998, in: MARQUES et al., p. 9), o currculo escolar tem de ser profundamente revisto, as polticas pblicas de educao devem fazer tudo para evitar o surgimento de novas desigualdades no seio da sociedade de informao, as instituies escolares precisam de ser incentivadas a construir ambientes humanos de ensino e aprendizagem que lhes permitam inovar estruturalmente, alm de se poderem equipar tecnologicamente.

    Estas so algumas questes relacionadas com a obsolescncia e a perenidade dos saberes escolares e com a necessidade da adopo de novos mtodos de ensino que favoream uma formao permanente dos cidados, a sua motivao e interesse permanente; a oferta de oportunidades e de recursos para que sejam estes a construir, de forma estimulante e diversifi cada, novos objectivos e conhecimentos baseados na descoberta e na aquisio de outras competncias (RODRGUEZ, RODRGUEZ, 1992).

    Planos de estudosDe acordo com Dacal (1986, p. 337), o plano de estudos consiste num conjunto ordenado

    de matrias e disciplinas que devem ser frequentadas num nvel do sistema educativo, e cujo aproveitamento d direito obteno de um certifi cado, ttulo ou diploma de valor acadmico ou profi ssional. Refere, ainda, o mesmo autor (Loc. cit.) que a seleco de matrias a incluir nestes planos determinada por diversos critrios:

    psicolgicos (interesses e capacidades do aluno), sociolgicos (necessidades da sociedade), ideolgicos (valores e ideais fi losfi cos, polticos e religiosos), cientfi cos (matrias fundamentais no mbito do conhecimento), pedaggicos (matrias de maior valor formativo).

    Tendo presente o estipulado na LBSE (art 6), relacionado com a universalidade, obrigatoriedade e gratuitidade do ensino bsico, bem como nos seus objectivos (art 7 LBSE), os planos de

  • 42 Educao e desenvolvimento: fundamentos e conceitos

    estudos integram diferentes reas curriculares disciplinares, reas curriculares no disciplinares e uma rea facultativa. Esta confi gurao procura assegurar uma educao que favorea o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade de qualquer indivduo, em particular da criana, colocando a aco educativa no centro do prprio desenvolvimento humano, e constitui uma das preocupaes do nosso sistema educativo. Neste sentido, o sistema educativo organiza-se de acordo com um conjunto de princpios estruturantes, em nveis distintos, cada um deles com fi ns especfi cos e uma organizao adequada de forma a promover a permanente aco formativa orientada para favorecer o desenvolvimento global da personalidade, o progresso social e a democratizao da sociedade, como estipula o art 1, da Lei de Bases do Sistema Educativo Portugus.

    Planos curricularesO desenho dos planos curriculares tem em considerao o conceito de curriculum,

    entendido por DHainaut (1980, p. 21) como sendo um plano de aco pedaggica muito mais largo que um programa de ensino, compreendendo no s os programas para as diferentes matrias, mas tambm uma defi nio das fi nalidades da educao pretendida, uma especifi cao das actividades de ensino e de aprendizagem () e, fi nalmente, indicaes precisas sobre as maneiras como o ensino ou o aluno sero avaliados. Contudo, como recorda Pardal (1993, p. 14), um currculo escolar no corresponde a uma mera construo tcnica de planos de estudos, de estratgias de aprendizagem e de mecanismos de avaliao. Um currculo escolar uma construo scio-pedaggica elaborada por uma estrutura poltica, assente num conjunto de valores.

    De acordo com a LBSE (art 8), e tendo presente a existncia dos trs ciclos sequenciais nos quais se divide o nosso sistema de ensino (o ensino bsico, o ensino secundrio e o ensino superior), o ensino bsico (EB) compreende trs ciclos sequenciais (art 8), sendo globalizante e da responsabilidade de um s professor, no 1 ciclo; organizado em reas interdisciplinares de formao bsica, no 2 ciclo; e integrando reas vocacionais diversifi cadas, no 3 ciclo.

    Destaca-se, no 1 ciclo do EB, o desenvolvimento da linguagem oral, a iniciao e progressivo domnio da leitura e da escrita, das noes essenciais de clculo, do meio fsico e social, das expresses plstica, dramtica, musical e motora. No 2 ciclo, salienta-se a formao humanstica, artstica, fsica, desportiva, cientfi ca e tecnolgica, bem como a educao moral e cvica. J no 3 ciclo, aponta-se para a aquisio sistemtica e diferenciada da cultura moderna, nas suas dimenses humanstica, literria, artstica, fsica e desportiva, cientfi ca e tecnolgica.

    Relativamente a cada um dos ciclos do ensino bsico, transcrevem-se as componentes de cada uma das outras reas curriculares.

    Quanto ao desenvolvimento curricular, estipula a LBSE (art 47) que a organizao curricular da educao escolar ter em conta a promoo de uma equilibrada harmonia, nos planos horizontal e vertical, entre os nveis de desenvolvimento fsico e motor, cognitivo, afectivo, esttico,