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ECOS do ATLÂNTICO CASA DE SAÚDE CÂMARA PESTANA Nº 77 Março/Abril 2020 Editorial do Boletim A Gente Vai Continuar!As portas fecharam-se. O silêncio impôs-se nos corredores ocupados pelo vazio. Lá fora também. As ruas desertas, despidas de gente. Peran- te a incerteza e o desconhecido o medo veio, ficou e quis instalar-se nos nossos corações. E agora? E depois? Agora temos de continuar! Continuar a cuidar, a ze- lar, a proteger, a amparar e a auxili- ar. E depois? Depois, devagarinho, o medo foi dando o seu lugar e o seu espaço à esperança. Nos dias em que o cansaço quis apoderar-se de nós (e foram mui- tos, todos bem o sabemos), foi na- quele abraço inesperado, foi na- quele beijo roubado, foi naquele olhar de bondade e naquele sorriso encantado, que fomos beber a for- ça para continuar. E a gente vai continuar! Enquanto houver estrada para andaren- quanto houver ventos e mar a gen- te não vai parara gente vai conti- nuar!Dídia Ferreira

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ECOS do ATLÂNTICO CASA DE SAÚDE CÂMARA PESTANA Nº 77 Março/Abril 2020

Ed

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Bo

leti

m

‘A Gente Vai Continuar!’

As portas fecharam-se. O silêncio

impôs-se nos corredores ocupados

pelo vazio. Lá fora também. As ruas

desertas, despidas de gente. Peran-

te a incerteza e o desconhecido o

medo veio, ficou e quis instalar-se

nos nossos corações.

E agora? E depois? Agora temos de

continuar! Continuar a cuidar, a ze-

lar, a proteger, a amparar e a auxili-

ar. E depois? Depois, devagarinho,

o medo foi dando o seu lugar e o

seu espaço à esperança.

Nos dias em que o cansaço quis

apoderar-se de nós (e foram mui-

tos, todos bem o sabemos), foi na-

quele abraço inesperado, foi na-

quele beijo roubado, foi naquele

olhar de bondade e naquele sorriso

encantado, que fomos beber a for-

ça para continuar.

E ‘a gente vai continuar! Enquanto

houver estrada para andar… en-

quanto houver ventos e mar a gen-

te não vai parar… a gente vai conti-

nuar!’

Dídia Ferreira

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PÁGINA 2 E C O S DO ATLANTICO

FESTA SÃO JOÃO DEUS

F oi no dia 09 de Março que foi celebrada a

eucaristia em honra de São João de Deus.

São João de Deus, nascido em Montemor- O

- Novo, de seu nome João Cidade é o santo que se

distinguiu na assistência aos pobres e aos doentes,

através de um hospital por ele fundado em Granada,

em 1539. Criou a Ordem dos Irmãos de São João de

Deus que o ajudarem nessa missão e noutras exten-

sões que viriam depois a surgir.

Na Eucaristia, que foi muito participada a monitora de

ocupação e uma utente da unidade cujo padroeiro é

São João de Deus realizaram uma pequena encena-

ção, onde apontaram alguns momentos da vida deste

homem que foi o grande impulsionador da grande

Obra que é a Obra Hospitaleira. Foi em São João de

Deus que Bento Menni, enquanto Irmão desta Ordem

se inspirou e fundou, em conjunto com Maria Josefa e

Maria Angústias a Congregação das Irmãs Hospitalei-

ras do Sagrado Coração de Jesus.

Dídia Ferreira

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PÁGINA 3 E C O S DO ATLANTICO

Reflexão Pascal

A 11 de Março do corrente ano, fomos convidados a parar um pouco a azáfama do nosso dia-a-dia e re-

fletir sobre a Mulher Samaritana, um dos ícones do Documento do XXI Capitulo Geral – Praticai a Hospi-

talidade na reflexão quaresmal, com o tema principal “Dá-me de Beber” preparada pela equipa do Servi-

ço de Pastoral da Saúde.

Muitos de nós cristãos, conhecemos a história desta mulher que está à beira do poço, onde estava a tirar água e

apareceu Jesus que lhe pediu água para beber. Como seria possível um Judeu pedir água a uma samaritana? Na

sua humildade, aquela mulher viu naquele Homem, o Messias. Ele conhecia-a melhor que ninguém, tal como acon-

tece connosco. Jesus conhece-nos melhor que ninguém, sabe bem o que somos e o que precisamos.

Aquela mulher trazia uma sede dentro de si, que não era capaz de saciar. Por vezes, esta vontade de matarmos a

sede, faz com que não consigamos ver o essencial das coisas e andamos perdidos à procura. Daí a importância de

percebermos onde é a verdadeira fonte. Não basta uma água que nos traga uma alegria passageira, mas uma água

viva, que nos mate a sede e dê satisfação plena, mudando o nosso viver e mudando o dia das pessoas com quem

trabalhamos e por quem trabalhamos.

No nosso dia-a-dia, por vezes, os gestos mais insignificantes podem ser capazes de transformar o dia de alguém,

num pequeno abraço, um pequeno sorriso, ou o simples escutar. E são estes pequenos gestos hospitaleiros que nos

fazem querer beber sempre desta fonte para termos força e ter sede de ser melhor.

No fim fomos convidados a levar connosco, de forma simbólica através de uma gota, alguns gestos de hospitalida-

de com o compromisso de o fazer no dia-a-dia com aqueles que nos são próximos.

Para alguns, como eu, esta foi a primeira reflexão quaresmal neste caminho hospitaleiro. Foi de facto ir à fonte reno-

var a força para o dia a dia, um parar e alimentar-se desta palavra; escutar e acolher esta palavra, para fazer mais e

melhor.

Joana Gonçalves

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PÁGINA 4 E C O S DO ATLANTICO

Testemunho...

Novidades…. Mudanças…. Nem sempre estamos recetivos a alterar as nossas atitudes, comportamentos, rotinas.

Mas quando estamos a acomodar-nos na nossa zona de conforto o mundo vem, e ZAS… COVID-19, uma grande

mudança na vida de toda a sociedade.

Também nós, Casa de Saúde Câmara Pestana tivemos que mudar. Mudar os nossos hábitos, as nossas rotinas e até

prioridades. No entanto não deixamos para trás o que move todo o nosso serviço, as que são o centro da nossa

missão – as pessoas assistidas.

Para tal, tivemos que alterar a dinâmica dos serviços e das próprias unidades, e todos nós (colaboradores) fomos

desafiados a algo novo: estar ao serviço durante 12 horas por 14 dias consecutivos. Algo inédito e desafiante para

todos, parecendo uma missão quase impossível de ser realizada, “difícil e esgotante”. No entanto todos levámos

esta missão avante e “abraçámos de braços abertos”, mas alguns desafiaram-se um pouco mais - passar estes 14

dias sem ir a casa, pernoitando na residência das irmãs. Dez colaboradores, de diferentes unidades e serviços, inte-

graram este grupo batizado “Campo de férias de adultos”.

Vivemos esta experiência diariamente. Todos os dias foram diferentes, uns mais desafiantes que outros, pois o me-

do, o cansaço físico e psicológico e as saudades de casa, foram-nos moldando diariamente. Em compensação à

ausência de casa e dos nossos familiares, as pessoas assistidas e as equipas em que estivemos integrados ajudaram

-nos a ultrapassá-las de diferentes modos: com os sorrisos e alegrias de cada uma das pessoas assistidas, com os

abraços em que fomos apanhados desprevenidos, os beijos proibidos que nas unidades de deficiência intelectual,

de uma forma excecional foram permitidos quando dados na mão (para que se possam aplicar as medidas de se-

gurança esperadas). Estes pequenos gestos ajudaram a apaziguar as nossas saudades e cansaços, mas também a

dar ânimo e alegria à nova rotina que se vive nas unidades. Também os elementos das equipas foram fundamentais

nesta jornada. Graças à entreajuda, compreensão, boa-disposição e companheirismo, tornou-se mais fácil chegar

ao fim.

Por último, mas não menos importantes, não esquecemos as irmãs. Elas também foram responsáveis por nos con-

fortar nestes dias, tanto a nível das instalações que disponibilizaram para que pernoitássemos cá, a nível das delici-

osas refeições que para nós foram preparadas, e também de toda a oração que dirigiram ao Pai e aos nossos fun-

dadores, para que nos apoiassem nesta jornada e nos dessem ânimo e alento para chegarmos até ao fim.

Concluímos estes 14 dias cansados, e até mesmo exaustos física e psicologicamente… mas saímos com a sensação

de que a missão está a ser cumprida da melhor maneira que sabemos, vamos para casa de coração cheio.

O Campo de Férias de Adultos – 1º Turno

Joana Neves

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PÁGINA 5 E C O S DO ATLANTICO

Unidade Santa Isabel

S anta Isabel, tal como todas as unidades desta casa está a cumprir o plano de contingência defi-

nido pela CSCP, fazendo por manter as rotinas e atividades das utentes. Como já vem sendo

habitual, após o pequeno-almoço estas utentes gostam de rezar o terço, é um momento de

tranquilidade e encontro. Depois, após o lanche da manhã, gostam de ver televisão e têm oportunida-

de para fazer algumas atividades, nomeadamente pintar e realizar jogos simples pois rapidamente

chega a hora do almoço. Na parte da tarde, começam por fazer a “hora do silêncio”, momento para

descansar e relaxar. De seguida, o tempo é aproveitado para efetuar e receber chamadas e videocha-

madas das famílias. Também é altura de ouvir música, cantar, e ainda de pintar e realizar atividades e

jogos simples com cores, números, sons, tecidos, cartas, encaixes, puzzles... e assim passam a tarde até

a hora de jantar. São dias bem passados com bons momentos de serenidade mas também de muita

animação e boa disposição.

Mesmo estando todas restritas à unidade celebraram a Páscoa. Na quinta-feira foi tempo de preparar

os cânticos, cada utente contribuiu e cantou o que sabia e desta forma foram escolhidos os cânticos

para esta época. Na sexta-feira santa foi realizada a via-sacra com todas as utentes e colaboradoras da

unidade. Sábado foi dedicado a pintar desenhos alusivos à Páscoa e domingo foi dia de ler uma bela

mensagem hospitaleira e comer chocolate. Foi uma Páscoa muito diferente, mas não deixou de ser

Chegar ao coração por videochamada

E m tempo de isolamento e restrição social

o anseio por ver a família é muito. Foi

então que surgiu a ideia de concretizar-

mos videochamadas, e que bela ideia! Inicialmen-

te algo confusa para algumas utentes, mas tam-

bém muito gratificante para todos os envolvidos.

Quem está do outro lado emociona-se ao ver a

sua familiar… quem está deste lado fica surpreen-

dido por conseguir ver e ouvir a sua querida famí-

lia. A recetividade tem sido muito boa! Algumas

falam, outras expressam-se à sua maneira entre

sorrisos e choros de emoção, mandam beijos e

querem agarrar e tocar. Em tempo de pandemia

tivemos de substituir o beijo pelo sorriso, o abra-

ço pelo aceno e a presença física pela imagem

num ecrã. Mas os sentimentos e as emoções não

foram substituídos, estão lá e permanecem a cada

dia e a cada momento que falamos… até ao dia

do verdadeiro encontro… aí sim, o tempo será

pouco para tudo o que iremos querer expressar e

concretizar.

Liliana Teixeira

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PÁGINA 6 E C O S DO ATLANTICO

SABIA QUE….

O Dr. João Francisco de Alma-

da foi diretor Clínico desta

Instituição entre 1907 e 1942.

Natural de Santana, estudou no Liceu

do Funchal e depois entrou na Facul-

dade de Medicina de Coimbra, conclu-

indo a sua licenci-

atura a 26 de Ju-

lho de 1899.

Da sua ação co-

mo médico ao

serviço da popu-

lação madeirense,

destaca-se o fac-

to de ter sido o

impulsionador da

luta contra a tu-

berculose na Ma-

deira.

Assim, a ele se

deve a criação do

primeiro dispen-

sário de luta antiturbeculosa, no Cam-

po da Barca, posteriormente designa-

do por Centro Dr. Agostinho Cardoso.

Foi ele o ‘responsável’ pela vinda das

Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Cora-

ção de Jesus para a Madeira. ‘Quando

foi nomeado diretor clínico do então

Manicómio Câmara Pestana, na altura

servido por pessoal laico, verificou,

com grandes dissabores e amarguras

que esta instituição não podia satisfa-

zer ao fim para que fora criada en-

quanto o trabalho de enfermagem não

fosse entregue às Irmãs Hospitaleiras

do Sagrado Coração de Jesus’, que

possuíam experiência no cuidado aos

doentes mentais

no Continente.

Começou então

uma campanha

nesse sentido e,

dentro de pou-

cos meses, a Jun-

ta Geral do Dis-

trito do Funchal

contratou esta

Congregação pa-

ra tomar conta

da direção e en-

fermagem desta

Casa de Saúde.

Há quem faça

um paralelo entre o Dr. João Francisco

de Almada e São Bento Menni uma

vez que, tal como este último, ‘a sua

atividade e abnegação pelos pobres

não conheciam limites e, da sua profis-

são de médico fez um sacerdócio e

não uma profissão lucrativa, visitando

e interessando-se por todas as casas

de caridade do Funchal’.

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PÁGINA 7 E C O S DO ATLANTICO

VIA SACRA - UNIDADE SÃO JOÃO DE DEUS

S exta-feira Santa. O peso do silêncio a invadir-

nos. A dor derramada pela humanidade, pen-

durada numa cruz de braços e coração aberto

a desafiar-nos. A via sacra também caiu sobre as nos-

sas vidas. As nossas rotinas tornaram-se enormes e

gigantes, densas de horas a cumprir. As portas fecha-

ram-se. Os afetos ficaram congelados em braços en-

colhidos, obrigados a não se estenderem e os beijos

escondidos nos desejos. Os dias tornaram-se incertos.

Sexta-feira santa e percorremos o corredor da Unida-

de, arrastando a cruz que nos doía no coração, a rezar

e a cantar, a sentir a dor de Deus sofrida em Jesus…

Inventámos a 16ª estação, onde cada uma pendurou a

via sacra da sua vida e fez as suas preces de gratidão e

de esperança… clamou pela ressurreição, pela vida

nova de portas abertas e a oração brotou espontânea

daquelas que quiseram expressar-se: “Peço-te Senhor

pelas empregadas que estão aqui a trabalhar muitas

horas, para que nós tenhamos mais qualidade de vi-

da…pelas nossas famílias que não nos podem visi-

tar…”. E a Carla que não fala nem ouve, também se

colocou em atitude orante e foi gesticulando numa

linguagem e expressão que talvez apenas Deus en-

tendesse, direcionando o olhar e os gestos para a sua

amiga mais próxima! Os amigos estão com os amigos

na hora da tribulação…! Uma emoção transbordou

dos nossos olhos. Sentimos o aconchego do abraço

de Deus ali a rodear-nos…

Todos vivemos a décima sexta estação como o mo-

mento da verdadeira via sacra no caminho da vida… e

ficámos com a certeza de que Jesus haveria de res-

suscitar e dar-nos-ia a força da esperança!

Délia Gomes

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24 de Abril

O dia de S. Bento Menni e da Família Hospitaleira foi passado de forma muito diferente este ano. Foi um

desafio maior, na busca de ser vivido acima de tudo de forma mais íntima, mais contida, mais profunda

ainda.

Todos fomos nestes últimos meses intimados a um ainda maior empenho, dedicação, a ser um luz de

hospitalidade em cada sítio, com cada utente. A Casa tornou-se mais silenciosa, mas estamos todos pre-

sentes, e é esta dádiva de entrega que é um rasgo de hospitalidade nestes dias mais sombrios. Mesmo

de uma forma mais contida, em cada unidade, em cada serviço não foi esquecido aquele que junto com

Maria Josefa e Maria Angustias Gimenez abriu caminho para este tesouro da humanidade germinar e

expandir-se pelo mundo. É uma semente que cresceu e está nas mãos de cada um de nós dar fruto. E

esse fruto vemos a cada dia, e nestes tempos, na enorme dedicação de todos, no modo como enfrenta-

mos e gerimos dificuldades e capacidades.

Acreditamos que Deus continuará a ser Vida e Força interior para continuarmos a FAZER O BEM, BEM

FEITO, o melhor que conseguimos, com o melhor de nós, pois uma pessoa vale mais que o mundo intei-

ro.

Ricardo Gomes