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Taxas de turismo cobradas pelo setor público no Brasil: um estudo em
Foz do Iguaçu e Fernando de Noronha
Documento para su presentación en el IX Congreso Internacional en Gobierno, Administración y Políticas Públicas GIGAPP. (Madrid, España) del 24 al 27 de
septiembre de 2018.
Carolina Poltronieri Bassani1
Universidade Federal do Paraná – Brasil Email: [email protected]
Bruno Martins Augusto Gomes2
Universidade Federal do Paraná – Brasil Email: [email protected]
ResumoEsse artigo tem como objetivo analisar a instituição das taxas de turismo e as possíveis incorreções que podem se manifestar naquelas referentes a dois destinos relevantes do Brasil (Foz do Iguaçu – PR e Fernando de Noronha – PE). A partir de um marco teórico abordando turismo, políticas públicas e direito constatou-se que as normas apresentam divergências nos aspectos material, pessoal/subjetivo, espacial e temporal, assim como em relação aos sujeitos ativo/passivo e a respeito da alíquota e da destinação do produto da arrecadação. Todavia, elas coincidem na recorrência de falhas. Conclui-se que as taxas estão suscetíveis a desvios na instituição (no poder legislativo), mas também no decorrer da atuação da esfera administrativa e na execução da receita proveniente da arrecadação, os quais sinalizam uma racionalidade limitada dos agentes políticos acerca do tema. Palavras-chave: Turismo. Setor Público. Taxas de Turismo. Constitucionalidade.
AbstractThis article has the objective of analyzing the establishment of tourist taxes and the possible inaccuracies that may occur in those referring to two relevant destinations in Brazil (Foz do Iguaçu - PR and Fernando de Noronha - PE). From a theoretical framework addressing tourism, public policies and law, it was found that the norms present divergences in the material, personal / subjective, spatial and temporal aspects, as well as in relation to the active / passive subjects and regarding the aliquot and destination of the product of the collection. However, they coincide in the recurrence of failures. It is concluded that the rates are susceptible to deviations in the institution (in the legislative power), but also in the course of the administrative sphere and in the execution of revenue from collection, which signal a bounded rationality of the political agents on the subject.Keywords: Tourism. Public sector. Tourism Taxes. Constitutionality.1 Bacharel em Direito (Centro Universitário Curitiba - Brasil). Acadêmica de Mestrado no Programa de Pós-graduação em Turismo (Universidade Federal do Paraná – UFPR - Brasil). Advogada. Membro do Centro de Estudos dos Poderes Legislativo, Executivo e o Turismo (CELEXTUR - UFPR).2 Doutor em Políticas Públicas. Professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR- Brasil) no Bacharelado em Turismo e no Programa de Pós-graduação em Turismo. Coordena o Centro de Estudos dos Poderes Legislativo e Executivo e o Turismo (CELEXTUR - UFPR).
1 Introdução
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), no artigo
145, inciso II autoriza a instituição de taxas em razão do exercício do poder de polícia
ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis,
prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. Assim, o sujeito ativo das taxas
será sempre a pessoa de direito público e o sujeito passivo a pessoa que se beneficia
desse serviço ou que sofre com a intervenção do Estado.
Partindo do enquadramento constitucional da espécie da taxa, o objetivo deste
estudo é constitucionalidade da cobrança das referidas taxas instituídas em diferentes
localidades do Brasil. Para tanto serão analisadas taxas de turismo já instituídas no
território nacional como é o caso da Taxa de Turismo de Foz do Iguaçu, criada pela Lei
Municipal nº 1.377, de 23 de dezembro de 1987, a Taxa de Preservação Ambiental de
Fernando de Noronha, instituída pela Lei nº 10.403, de 29 de dezembro de 1989.
Apesar de possuírem designações diferentes, essas taxas foram eleitas para
contemplar o objeto deste estudo por provirem de destinos turísticos importantes do país
e por terem sido criadas em decorrência da utilização do aparato legislativo como uma
alternativa de contraprestação aos serviços públicos à disposição dos turistas.
Esta pesquisa tem sua importância devido a atual falta de estudos aprofundados
acerca da constitucionalidade da taxa de turismo, imposta em diversas localidades
brasileiras sem a observância das limitações constitucionais ao poder de tributar. Por
isso, foram analisadas as finalidades de instituição dessas taxas de acordo com a
destinação do produto arrecadado, seu fundamento jurídico, objetivando o
enquadramento constitucional da cobrança.
As pesquisas atuais possuem um déficit em um aprofundamento mais incisivo
sobre a constitucionalidade das taxas, em geral, decorrente do pequeno valor da exação
envolvida, considerando a cobrança individual por contribuinte. Porém, ao analisar o
montante arrecadado, trata-se, na maioria dos casos, de uma quantia significativa de
receita.
A abordagem metodológica foi qualitativa, com o método descritivo utilizado na
análise das leis que instituem as taxas nos destinos supracitados, além do método
exploratório que tornará o problema explícito e auxiliará na construção de uma
conclusão.
2. Referencial Teórico
2.1 Taxas de turismo, direito tributário e direito constitucional no Brasil
O direito brasileiro utiliza o vocábulo tributo para designar o gênero de todas as
espécies tributárias abarcadas pelo rol do art. 5º do Código Tributário Nacional, bem
como as demais taxas admitidas constitucionalmente. A taxa como espécie de
tributo deriva de uma construção da doutrina internacional, e seu conceito é de
relevância fundamental para a compreensão de sua natureza jurídica. Luciano Amaro
faz uma descrição do vocábulo para compreender inicialmente sua composição
etimológica:
Taxa, deverbal de “taxar”, também figura nos dicionários como sinônimo de tributo. Vem do latim taxare (avaliar, estimar, determinar o valor) (...). Etimologicamente, taxa é sinônimo de preço (de um serviço ou de um bem), traduzido, pois, a ideia de comutatividade ou contraprestacionalidade. O inglês tax (...) é empregado, na linguagem jurídica, no sentido de imposto. No nosso direito, taxa é espécie de tributo, exatamente a figura na qual está presente, de acordo com o sentido etimológico da expressão, a ideia de contraprestação, dado que a taxa se caracteriza pela conexão a um serviço ou utilidade que o Estado propicia ao contribuinte (AMARO, 2005, p.17).
As taxas compõem o Sistema Tributário Nacional que por sua vez vincula-se
diretamente aos preceitos constitucionais, em especial aos princípios formais e
materiais, direitos fundamentais e sobretudo com as garantias essenciais que vinculam o
poder de tributar e atribuem significado à legislação complementar. O artigo 146 da
Constituição da República Federativa de 1988 (BRASIL, 1988) confere as
competências tributárias privativas à União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito
Federal.
No que se refere aos tributos, a Carta Magna atual não se preocupou em definir e
classificar as espécies, limitando-se a arrolá-los. A previsão legal do artigo 145 da
Constituição da República Federativa de 1988 (CF/88) dispõe que são espécies de
tributo os impostos, as taxas e a contribuição de melhoria. A Lei Complementar nº
5.172, de 25 de outubro de 1966 (BRASIL, 1966), nomeada de Código Tributário
Nacional, supre as necessidades de regulamentação do sistema tributário, dispondo em
seu artigo 3º o conceito de tributo adotado pelo ordenamento jurídico nacional:
Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
A evolução doutrinária do Direito Tributário brasileiro desencadeou o
surgimento de diversas teorias a respeito das espécies tributárias, todas destinadas a
tentar enquadrar didaticamente as diferentes modalidades de tributos criadas pelo
legislador. Sob todo este contexto surgiu a Teoria Pentapartite, também denominada de
Quinquipartite, que prevê cinco espécies de tributos: impostos, taxas, contribuições de
melhoria, contribuições especiais e empréstimos compulsórios.
O artigo 145 da CF/88, em seu inciso II discrimina o fundamento para a
cobrança das taxas, ou seja, essa exação será cobrada “em razão do exercício do poder
de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e
divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição” (BRASIL, 1988).
Conforme Luciano Amaro as taxas são tributos cujo fato gerador é configurado por uma
atuação estatal específica, referível ao contribuinte (AMARO, 2005). Ou seja,
concentra-se em um fato do Estado no exercício de determinada atividade para
determinada pessoa específica, e por isso justifica sua cobrança ao contribuinte que
usufrui desse serviço.
Ainda, para analisar a norma tributária é importante considerar a base de cálculo
e a alíquota de cada taxa. A base de cálculo é a grandeza econômica sobre a qual se
aplica a alíquota, ambas compõem o fator de quantificação da taxa, e são utilizadas para
apurar o valor devido pelo sujeito passivo da relação jurídica tributária. A alíquota
poderá ser tanto um percentual, quanto um valor monetário com base em uma medida
específica, e será determinada discricionariamente pelo legislador de acordo com os
interesses socioeconômicos para a sua instituição e cobrança.
Outrossim, na análise da regularidade da norma tributária são importantes as
circunstâncias posteriores a instituição, como o emprego que se fará das quantias
arrecadadas por meio das taxas para o custeio da atividade estatal. Portanto, caso o
produto da arrecadação resultante da instituição da taxa de turismo seja desviado do
custeio da atividade pública que o sujeito ativo determinado pela norma tributária se
presta a realizar ao contribuinte, haverá a concreta invalidade da norma administrativa.
Consequentemente há uma descaracterização do tributo que não está mais vinculado a
contraprestação da atividade prestada ou posta à disposição pela afronta aos princípios
da retribuição, e da proporcionalidade.
No turismo, conforme exposto por Velasco (2016) o setor público deve ser o
ator central nestas políticas, embora não o único. No mesmo sentido Gomes (2015)
expõe que no turismo é função do setor público, enquanto representante da sociedade,
atuar como coordenador e guardião do desenvolvimento sustentável da atividade. E um
dos instrumentos adotados pelos órgãos pelo setor público é a instituição de taxas,
comumente designadas de taxas de turismo.
Por isso a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) prevê
no artigo 180 a responsabilidade dos entes federados (União, Estados e Distrito Federal)
promoverem e incentivarem a atividade turística como fator de desenvolvimento
econômico. Além disso, a Carta Magna prevê competência para legislar sobre a
proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico e também
sobre a responsabilidade em caso de dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e
direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, previstos no artigo
24, incisos VII e VIII.
As taxas de turismo são taxas vinculadas a uma atuação estatal determinada e
que sua base de cálculo representa a contraprestação pelo custo da atuação estatal
descrita na hipótese de incidência e portanto, não pode ser majorada por qualquer fator
alheio aos custos da atividade estatal.
2.2 Racionalidade Limitada e Políticas Públicas em Turismo
Segundo Herbert A. Simon (1979) o modelo clássico de tomada de decisões
prevê a possibilidade do prévio conhecimento de todas as alternativas que o agente
poderia optar e a capacidade de calcular todas as consequências decorrentes de cada
uma das alternativas existentes. Isso exige precisão e certeza na avaliação presente e
futura do tomador de decisões sobre todas as consequências, podendo compará-las
independente das adversidades e da falta de conhecimento técnico que possam surgir no
curso do processo decisório.
Haja vista a racionalidade limitada dos agentes, as decisões sob o prisma da
ciência econômica devem ir além da utilidade da criação das políticas, moldadas pelas
demandas políticas e sociais no intuito de servir para alcançar respostas uteis aos
problemas de falta de recursos. Para o referido autor as decisões são frutos de interações
complexas, com condições impostas pelo meio em que se inserem e pela capacidade
limitada dos agentes, essa visão contrapõe a visão clássica no sentido de que os
decisores sempre optam pelas opções de maximização dos resultados, e que os
indivíduos sempre fazem a melhor escolha entre as numerosas alternativas.
Wolman e Page (2002) sugerem que a busca de novas ideias de políticas ocorre
em diferentes níveis, desde a varredura geral e a coleta de informações até interações e
trocas informais. Portanto, o intercâmbio entre experiências e agentes influencia no
processo de construção de políticas públicas, e as redes e organizações afetam o grau
das lições que serão tomadas como base para a tomada de decisões (MARSDEN, G.
2012).
A compreensão dos contextos, necessidades e elementos regulatórios devem
estar em mútua comunicação nos processos de criação e implementação de determinada
política pública, haja vista a limitação das habilidades dos agentes para avaliar todas as
possíveis alternativas, bem como lidar com as consequências incertas da decisão
tomada.
Segundo McCaughey e Bruning (2010) por não possuírem conhecimento
suficiente para avaliar adequadamente as informações técnicas e científicas em todos os
domínios das políticas, os decisores políticos se satisfazem com fontes secundárias de
informações que sintetizam os resultados das pesquisas científicas em modelos
abrangentes, desprezando a racionalidade e a maximização da utilidade desses
resultados.
As pesquisas sobre a racionalidade na tomada de decisão demonstram a
subjetividade no processo, e a incidência de inúmeras variáveis que influenciam os
decisores políticos na formulação de políticas públicas. As decisões de grupos tomadas
como um pensamento coletivo podem ser compostas por um compromisso não racional,
prevalecendo comportamentos de decisão cognitiva, desprovida de racionalidade.
Os responsáveis pelas formulações e implementações de políticas públicas em
turismo são encarregados de tomar decisões eficazes e potenciais de utilidade para
maximização da arrecadação de recursos pautados em tão somente em evidências
empíricas e modelos já implementados em outros sistemas, que não necessariamente são
adequados. No entanto, McCaughey e Bruning (2010) argumentam que a compreensão
limitada dos agentes e a complexidade das evidências impossibilita a percepção direta
das evidências reais de maximização de resultados nas decisões.
Em que pese as evidências tenham forte influência positiva sobre os agentes, os
resultados das políticas podem se dar de forma variável e subjetiva, portanto, a tomada
de decisões políticas não deve focar somente no aspecto se a evidência é usada e pode
ser replicada, mas como a evidência é processada para informar a tomada de decisão e o
contexto em que ocorre a decisão e as circunstâncias que legitimam a legalidade dessas
medidas.
Por isso o processo de tomada de decisão na formulação de determinada política
pública é substancialmente mais complexo do que o sugerido por pressupostos que
regem modelos de decisão de escolha racional baseados em evidências e replica de
outros modelos em contextos diversos.
McCaughey e Bruning (2010) sugerem que o processamento cognitivo dos
agentes para a tomada de decisão sobre a implementação de determinada política
pública é composto por três elementos que regem como a informação é processada e
avaliada. A primeira é a utilidade, consubstanciada nos mecanismos para busca de
resultados através das medidas implementadas, o emocional, sendo as influências nas
percepções de risco, certeza de eventos e ganhos/perdas, nas percepções do indivíduo e
as escolhas de decisão subsequentes. E por fim, as influencias heurísticas, do processo
cognitivo que processam através de regras mentais básicas que reduzem a complexidade
do processamento da informação.
Posto isto, a formulação e implementação de políticas não ocorrem
isoladamente, os atores são componentes relevantes e exigem consideração do contexto
que se inserem, exigências dessa realidade, restrições orçamentárias, sendo diretamente
influenciados a implementar políticas utilitaristas sem se atentar que as consequências
da implementação de uma política ilegal acarretam muito mais prejuízos do que
benefícios a administração.
Portanto, a coleta de informações e esclarecimentos sobre os objetivos políticos,
articulado com diversas partes interessadas, bem como com o respaldo técnico científico
ajudaria a definir os objetivos de utilidade de uma determinada política, proporcionando
muito mais eficiência aos fins que se pretendem atingir.
3 Resultados
3.1 Taxa de Turismo de Foz do Iguaçu – PR: Descrição
O município de Foz do Iguaçu está situado no estado Paraná (sul do Brasil), na
fronteira, do Brasil com Argentina e com Paraguai. Segundo o IBGGE (2018) Foz do
Iguaçu possuía em 2017 aproximadamente 264.000 habitantes. O Ministério do
Turismo (2018) relata que em 2016 o município foi o terceiro mais visitado do Brasil
por turistas estrangeiros que visitaram o país. Como expõem Correa e Godoy (2008),
além de outros atrativos, o município conta com as Cataratas de Iguaçu, quedas d’água
impressionam pela bela paisagem cênica e estão localizadas no Parque Nacional de
Iguaçu (PNI). O parque, ilustrado na Figura 1, foi criado em 1939, sendo a primeira
Unidade de Conservação do país a ser instituída como um Sítio do Patrimônio Mundial
Natural pela UNESCO.
Figura 1: Cataratas do Iguaçu – Foz do Iguaçu
Fonte: Paraná Turismo - http://www.turismo.pr.gov.br
Após a breve caracterização do município, passa-se a análise do texto das Leis
Ordinárias Municipais que instituíram a Taxa de Turismo no município de Foz do
Iguaçu. A primeira delas foi a Lei Municipal nº 177/1957. Após esta existiram outras
leis (Lei Municipal nº 1.377/1987, Lei Municipal nº 1.540/1990, Lei Municipal nº
1.727/1992) até a Lei nº 1.913/1994.
A Lei nº 1.913/1994 em seu artigo primeiro da dispõe a hipótese de incidência
da taxa de turismo do município de Foz do Iguaçu para custear a prestação de serviços
de turismo, bem como a assistência médica pré-hospitalar específica ao turista. O
parágrafo primeiro deste artigo especifica o entendimento de serviços de turismo, como
sendo aqueles a serem prestados ou postos à disposição do turista, tais como
informações, orientações, atendimento de reclamações, distribuição de folhetos e
roteiros turísticos. Como se verifica pelo próprio texto legal o aspecto material desta
exação se restringe a utilização de um serviço público, que, pela regulamentação do
artigo 79 do CTN deve ser utilizado efetiva ou potencialmente pelo contribuinte, e
prestado especificamente e suscetível de utilização, separadamente, por parte de cada
um dos seus usuários.
A assistência médica pré-hospitalar colocada também como hipótese de
incidência da referida taxa é um serviço de saúde prestado indistintamente pelo poder
público no Brasil, logo está à disposição de todas as pessoas que ali estiverem. Diferente
seria em caso de uma prestação de serviço público de caráter essencial, como uma
triagem médica para os visitantes que querem usufruir de um parque aquático público
(serviço prestado singularmente a cada visitante e de utilização compulsória), vez que
são prestados de forma específica e divisível, passível de mensuração de seus custos.
A base de cálculo da taxa de turismo de Foz de Iguaçu, prevista no artigo 2º da
Lei Municipal nº 1.377/87, com redação dada pela Lei nº 1.540/90 estabelece que a taxa
será calculada por visitante e por dia de permanência no Município, ou quando hóspede,
por dia de hospedagem em hotel ou congênere.
Com relação aos sujeitos da obrigação jurídica tributária, o artigo 3º, com
redação dada pela Lei nº 1.540/90, designou a responsabilidade pela cobrança da exação
a Companhia Foz do Iguaçu Turismo S/A (FOZTUR) quando se tratar de excursões
terrestres ou aéreas, e os estabelecimentos hoteleiros e congêneres onde esteja
hospedado o contribuinte. A arrecadação da taxa de turismo é realizada em face dos
sujeitos passivos que estiverem usufruindo os serviços de hospedagem no momento da
liquidação da conta do hotel, conforme previsão do artigo 3º.
Para aqueles visitantes que não estivem hospedados no município, a arrecadação
é realizada pela FOZTUR e ocorre nas margens da BR-277 quando o visitante chega em
excursões rodoviárias, conforme descrito no julgamento proferido pelo Desembargador
Relator Leonel Cunha da Apelação Cível e Reexame Necessário nº. 102109-8 em
trâmite perante a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (PARANÁ, 2011).
Com relação ao aspecto temporal das leis municipais tributárias que instituem a
taxa fica claro que o critério designado também foi uma eleição discricionária de um
momento que o legislador entendeu adequado para exigir a cobrança da exação, ou seja,
o momento mais propício para facilitar a arrecadação. Por fim, com relação a destinação
do produto da arrecadação, os valores provenientes da cobrança da taxa de turismo
serão utilizados para a implantação e manutenção dos serviços de turismo, baseados na
Política de Turismo do Município e na prestação de serviços médicos pré-hospitalares
aos turistas, critério este definido no artigo 11 com redação dada pela lei nº 1.913/94.
3.2 Taxa de Turismo de Foz do Iguaçu – PR: Análise
Da análise do dispositivo é possível verificar que os serviços prestados aos
turistas, tanto os “serviços de turismo” quanto a assistência médica pré-hospitalar
possuem caráter geral e não divisível, ou seja, as informações, orientações e distribuição
de folhetos e roteiros podem ser usufruídos de forma genérica e indistinta pelos
contribuintes e até mesmo pelos habitantes do município. Não há parâmetros para
mensurá-los em unidades autônomas, o que desqualifica o seu financiamento mediante a
instituição de taxa, portanto, caracteriza-se como serviço geral do Estado que deve ser
financiado por imposto.
Alegar que esse critério utilizado como base de cálculo da taxa de turismo é
regular pelo fato do serviço público permanecer à disposição do visitante não é
suficiente para adequar a sua exigência aos ditames constitucionais. Os serviços postos
a disposição do visitante são atividades fins do Estado, e, portanto, passíveis de
financiamento pela arrecadação dos impostos.
A designação de sujeito passivo como o hóspede ou o excursionista é
discricionária e controvertida. Por exemplo, se um visitante de Foz do Iguaçu utilizar-se
de veículo próprio e se hospedar em uma cidade vizinha, ou for permanecer no
município por um ou mais dias sem usufruir do serviço de hospedagem, não haverá a
cobrança da exação a esse visitante. É notório que se houvesse uma prestação de serviço
público específico ao turista que permanecer no município não haveria diferença na
visitação de um turista hospedado em um hotel ou àquele que fica em casa de familiares
ou aquele que possui um veículo propício para sua pernoite. Dessa maneira o serviço
prestado seria especificamente a todos aqueles visitantes que não residem no município
e estão lá por tempo determinado por motivos de lazer ou congêneres.
Outrossim, como já declarado corretamente no julgamento do Incidente de
Declaração de Inconstitucionalidade nº 102.109-8/05, que tramitou pela 1ª Vara Cível
da Comarca de Foz do Iguaçu, e decido pelo Desembargador Luiz Lopes, a taxa de
turismo de Foz do Iguaçu é inconstitucional pela afronta ao disposto nos artigos 145,
inciso II, e 150, inciso V, da CF/88 devido ao fato dos serviços prestados aos turistas
designados como “serviços de turismo” não possuírem um interesse público relevante a
ponto de sua utilização ser compulsória para que justifique a contraprestação pela
instituição de taxa.
Assim, fica evidente que a taxa de Foz do Iguaçu apresenta falhas relacionadas
na definição de parâmetro para mensuração dos serviços em unidades autônomas. Ela
também cobra inadequadamente taxas em atividades fins do Estado, e, portanto,
passíveis de financiamento pela arrecadação dos impostos. E há uma dificuldade para
definir o público alvo da taxa, especialmente ao lidar com os conceitos de turista,
excursionista e turistas que ficam em casa de familiares.
3.3 Taxa de Preservação Ambiental de Fernando de Noronha: Descrição
O arquipélago de Fernando de Noronha constitui-se de 21 ilhas, entre elas a ilha
principal possui o nome do arquipélago e é o único distrito estadual no Brasil,
pertencente ao estado de Pernambuco. Segundo senso do IBGE a ilha possuía, em 2017,
aproximadamente 3000 moradores permanentes (IBGE, 2018).
Na década de 1980 foi criada a Área de Proteção Ambiental (APA) de Fernando
de Noronha, Rocas, São Pedro e São Paulo e o Parque Nacional Marinho (Parnamar)
pelos Decretos nº 92.755, e pelo Decreto 96.693, respectivamente. A APA abrange uma
área de 79.706 hectares, cobrindo o Arquipélago de Fernando de Noronha, Atol das
Rocas e o Arquipélago de São Pedro e São Paulo, e o Parnamar ocupa 70% do
Arquipélago (IBAMA, 2015).
Segundo Souza e Vieira (2011) a criação da APA e do Parque foram marcos
para o início da exploração da ilha pela atividade turística, tonando-a um destino
conhecido em todo o Brasil por seus atrativos naturais. De acordo com o Ministério do
Turismo (2018a), em 2016 a ilha recebeu 91 mil turistas. O arquipélago de Fernando de
Noronha, ilustrado na Figura 2, possui restrições em relação ao número de turistas que
pode receber, mas o turismo é a sua principal atividade econômica.
Figura 2: Arquipélago de Fernando de Noronha
Fonte: http://www.noronha.pe.gov.br
Visando assegurar a manutenção das condições ambientais e ecológicas do
Arquipélago de Fernando de Noronha foi instituída pela previsão do artigo 82, inciso I
da Lei Tributária Estadual (Código Tributário Estadual - Lei nº 10.403/1989), com as
alterações introduzidas pela Lei nº 11.305/1995, pela Lei nº 11.704/1999, pela Lei
11.923/2000 e pela Lei 11.949/2001.
Em 2012 também foi instituído um ingresso para visitar a área do Parque
Nacional Marinho devido à concessionária que realiza melhoramentos para a visitação
do espaço. Essa exação diferencia-se da Taxa de Preservação Ambiental (TPA) pois a
natureza jurídica do ingresso é de preço público, e enquanto a TPA é devida a todos os
sujeitos passivos que ingressam na ilha. O preço de visitação é uma verba destinada
exclusivamente à manutenção do Parque Marinho, e portanto, não é devido aos
visitantes que limitam sua visita às praias fora do parque.
A instituição da Taxa de Preservação Ambiental no Arquipélago, objeto dessa
análise, visa a assegurar a manutenção das condições ambientais e ecológicas em
decorrência da exploração pela atividade turística em suas áreas naturais. Para tanto há a
contribuição incidente sobre o trânsito e a permanência de visitantes que utilizam,
efetiva ou potencialmente da infraestrutura física implantada e o acesso e fruição ao
patrimônio natural e histórico do Distrito Estadual, conforme previsões dos artigos 83 e
84 da Lei nº 10.403.
A lei que institui a TPA é o Código Tributário Estadual, e a exação incide
especificamente sobre o arquipélago destinando o produto da sua arrecadação ao Órgão
Fazendário Distrital responsável pela sua instituição, caracterizado como sujeito ativo
da obrigação tributária, conforme previsão do artigo 87 da lei. O artigo 83 em seu
parágrafo primeiro delimita os contribuintes da relação jurídica tributária como todas as
pessoas não residentes ou domiciliadas no arquipélago, que estejam em visita, de caráter
turístico. Portanto, são isentos ao pagamento da TPA os moradores e residentes
permanentes da ilha, incidindo a exação sobre a permanência dos visitantes.
O aspecto espacial da TPA coincide com o âmbito territorial de vigência da Lei
Tributária Estadual, ou seja, a instituição e cobrança da exação incide sobre a área de
jurisdição do Distrito Estadual, conforme previsão do artigo 83 da Lei 10.403. O
momento da arrecadação da TPA é determinado pelo artigo 85 da Lei, que prevê a
possibilidade da cobrança ser realizada em três momentos: antecipadamente, no
momento do embarque quando o visitante acessar o arquipélago pelo transporte aéreo,
ou no momento do desembarque no terminal aéreo ou marítimo já dentro do território
do Distrito Estadual, ou ainda, quando não realizado antecipadamente ou relativamente
ao período não previsto quando do recolhimento antecipado, no momento do embarque
para o retorno ao continente.
A base de cálculo da TPA designada pelo artigo 86 da Lei 10.403 é mensurada
em razão dos dias de permanência do visitante ou turista no Distrito Estadual de
Fernando de Noronha. E o artigo 88 dispõe que a receita proveniente da arrecadação da
TPA será destinada às despesas relativas às condições gerais de acesso e preservação
dos ecossistemas naturais do Arquipélago. Além disso, se destinará à execução de
“benfeitorias em benefício da população local e dos visitantes, inclusive para
remuneração de pessoal com exercício de função na execução das mencionadas
atividades”.
O que se verifica com a destinação do produto da arrecadação da TPA às
despesas relativas às condições gerais de acesso e preservação dos ecossistemas naturais
do Arquipélago, e para a execução de benfeitorias é a aparente prestação de um serviço
público, que, na prática, remunera o exercício regular do poder de polícia. O direito
coletivo tutelado com o planejamento e controle ao acesso ao Arquipélago é a
preservação do meio ambiente, incluindo a proteção aos valores estéticos e artísticos,
históricos e paisagísticos, resguardando as riquezas naturais da APA.
Decorrente da imperatividade do ato de polícia, a contraprestação da TPA é
obrigatória para seu destinatário. Não há facultatividade no exercício de policiamento
administrativo no âmbito do território do Arquipélago. O ente administrativo está
obrigado na atuação e executa as medidas necessárias salvaguardar a ordem pública e
garantia de direito coletivo ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e exige
compulsoriamente a contraprestação através da TPA.
3.4 Taxa de Preservação Ambiental de Fernando de Noronha: Análise
A Taxa de Preservação Ambiental de Fernando de Noronha (TPA) incide sobre
a prestação de serviço público, e, para ser legítima a instituição de uma taxa sobre
serviços essa obrigação deve ser passível de fruição singular para a mensuração da
contraprestação de forma divisível. A da utilização efetiva ou potencial da infraestrutura
física e o acesso e fruição ao patrimônio natural e histórico do destino são atividades
fins do Estado asseguradas pelas disposições constitucionais dos artigos 5º e 225, e
prestadas universalmente a todos os cidadãos, sem distinção de fruição particular entre
usuários, sejam eles visitantes ou moradores.
Se fosse considerada regular a instituição da TPA como contraprestação à
utilização, ainda que potencial, da infraestrutura implantada no Arquipélago, seria
legítimo também cobrar taxas similares pela utilização de praças, viadutos, e vias
públicas. Ressalvasse nesse último caso a cobrança de pedágio que é preço público
constitucionalmente autorizado e que de imediato se esclarece não ser de mesma
natureza jurídica da taxa em análise.
No mesmo sentido, estabelecer uma taxa em função da utilização ou fruição do
patrimônio natural e histórico do Arquipélago ensejaria a admissão da instituição desta
exação em todos os municípios brasileiros que possuem atrações turísticas relacionadas
ao turismo cultural ou em áreas naturais. Consequentemente pelo exercício da
contemplação e fruição do patrimônio, característica da atividade turística, restaria
condicionada ao cumprimento da obrigação tributária.
Além disso, não há uma delimitação no texto legal especificando o tipo de
serviço público que será prestado ao contribuinte da exação. A taxa foi instituída de
forma genérica para a manutenção das condições ambientais e ecológicas. Logo, é
impossível identificar o contribuinte beneficiado pela atuação estatal que exige a
contraprestação através da TPA.
Resta ainda limitada a liberdade de locomoção e caracterizada uma afronta ao
princípio da trafegabilidade de pessoas assegurados pelo artigo 150, inciso V e artigo 5º,
XV, respectivamente, ambos da CF/88. Tal afronta decorre da incidência da TPA sobre
o trânsito e a permanência de pessoas na ilha, com a consequente progressividade em
razão dos dias de permanência.
A instituição da TPA visa a assegurar a manutenção das condições ambientais e
ecológicas nas áreas naturais do Arquipélago. Mas não é possível afirmar que só os
visitantes causam danos e impactos ambientais no espaço geográficos das ilhas. Assim
sendo, a isenção das pessoas prevista no parágrafo 2º do artigo 83, da Lei 10403, enseja
a violação ao Princípio Constitucional da Isonomia Tributária, previsto no artigo 152 da
CF/88.
A instituição da taxa em razão dos dias de permanência do visitante ou turista
pode caracterizar uma limitação ao direito de ir, vir e permanecer previsto no artigo 5ª,
inciso XV da CF/88. Essa proteção constitucional do ao direito de ir e vir deriva do
direito à liberdade assegurado a todos os cidadãos em um Estado Democrático de
Direito. O artigo 150, inciso V da CF/88 veda os entes da federação estabelecer
limitações ao tráfego de pessoas por meio de tributos, ressalvada a cobrança de pedágio
pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público, assegurando ao contribuinte o
direito de ir, vir e permanecer. A ressalva a cobrança de pedágio pela previsão
constitucional deriva do entendimento de que o pedágio visa a contraprestação dos
custos de manutenção das vias operadas pelas concessionárias autorizadas pelo Poder
Público. Nesse caso há a prestação de melhorias e manutenção das estradas, e
contraprestação é realizada pelos usuários que efetivamente se utilizam dessa estrutura
viária.
No caso da taxa instituída em Fernando de Noronha há a efetiva prestação do
poder de polícia que fiscaliza e controla o fluxo de turistas no arquipélago pois
considera-se que as ilhas pertencem a Área de Preservação Ambiental e inclusive foram
decretadas como Reservas da Biosfera. Em razão disso pressupõe um planejamento de
utilização de sua infraestrutura e visitação por pessoas provenientes de outras
localidades.
A atuação típica do exercício regular do poder de polícia se apresenta em
Fernando de Noronha na forma preventiva, por meio de limitações a conduta dos
turistas, através da regulamentação e fiscalização do exercício dessas atividades
turísticas que justificam a referida atuação. Portanto, a instituição da TPA em Fernando
de Noronha visa assegurar a manutenção das condições ambientais e ecológicas do
Distrito Estadual em decorrência da exploração pela atividade turística em suas áreas
naturais. Logo, a incidência determinada pela lei que institui a exação está inadequada
ao exercício regular do policiamento administrativo prestado, haja vista que o artigo 84
da lei prevê a incidência desta TPA sobre suposta prestação de serviço público.
A utilização, efetiva ou potencial, por parte das pessoas visitantes da
infraestrutura física implantada e o acesso e fruição ao patrimônio natural e histórico do
Arquipélago é apenas um critério de mensuração de instituição da TPA. O que não se
pode negar é que esse critério dá margem a vinculação da hipótese de incidência ao
exercício de um serviço público, específico e divisível ao contribuinte da exação. Mas, a
identificação da base de cálculo e da destinação do produto da arrecadação permite
concluir que a real intenção na instituição desta TPA é a contraprestação ao exercício
regular do poder de polícia preventivamente prestado aos visitantes que usufruem do
patrimônio natural das ilhas e causam impactos ambientais diversos dos danos causados
pelos moradores permanentes.
Dessa forma a Taxa de Preservação Ambiental de Fernando de Noronha
apresenta incongruências relacionadas à dificuldade de definição de fruição singular
para a mensuração da contraprestação de forma divisível. Da mesma maneira ela
apresenta um embaraço ao estabelecer o tipo de serviço público que será prestado ao
contribuinte da exação. Ela também é falha na diferenciação entre os efeitos que o
turista causa ao ambiente (e que por isso deveria pagar a taxa) daqueles provocados
pelos residentes. Assim, a referida taxa incorre na ofensa de princípios constitucionais.
Considerações Finais
Essa pesquisa teve como objeto a natureza jurídica das taxas, o aspecto material
posto no núcleo da hipótese de incidência, a competência para a instituição, o
contribuinte designado como sujeito passivo da relação jurídica tributária, a adequação
da base de cálculo ao núcleo da hipótese normativa, e a análise dos fins de destinação
do produto da arrecadação. Estes foram analisados com o intuito de identificar o
fundamento jurídico de cada elemento, bem como a possível existência de desvios e a
consequência dessa inadequação desses elementos para a validade da norma tributária
O artigo 145 da CF/88, em seu inciso II, discrimina a finalidade para a cobrança
das taxas “em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou
potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou
postos a sua disposição”. Diferentemente dos impostos, que são arrecadados para
custear as despesas gerais do Estado, as taxas são tributos vinculados a uma atuação
estatal determinada. Portanto, além da base de cálculo, a destinação do produto da
arrecadação também integra o regime tributário. A não afetação do produto arrecadado
aos fins propostos pela norma, torna-a inválida, inconstitucional, sem juridicidade, por
contrariar a própria natureza jurídica da exação.
Assim, foram analisadas as taxas supracitadas observando-se que a Taxa de
Turismo de Foz do Iguaçu e a Taxa de Preservação Ambiental. A Taxa de Turismo
de Foz do Iguaçu foi instituída em face dos turistas que se hospedam ou visitam o
município para custear a prestação de serviços de turismo, bem como a assistência
médica pré-hospitalar ao turista. Porém, tanto os “serviços de turismo” quanto a
assistência médica pré-hospitalar possuem caráter geral e não divisível, ou seja, não há
parâmetros para mensurá-los em unidades autônomas desnaturando os critérios da
hipótese de incidência e da base de cálculo que prescindem à instituição de taxa.
Além disso, o critério de designação do sujeito passivo não abrange a todos os
turistas e visitantes do município, violando a isonomia tributária legitimada pelos
dispositivos constitucionais. Outrossim, os serviços prestados aos turistas designados
como “serviços de turismo” não possuem um interesse público relevante a ponto de sua
utilização ser compulsória para que justifique a contraprestação pela instituição de taxa.
Já a instituição da Taxa de Preservação Ambiental no Arquipélago de Fernando
de Noronha, visa a assegurar a manutenção das condições ambientais e ecológicas em
decorrência da exploração pela atividade turística em suas áreas naturais. A TPA deste
distrito estadual incide sobre o trânsito e a permanência de visitantes que utilizam,
efetiva ou potencialmente da infraestrutura física implantada e o acesso e fruição ao
patrimônio natural e histórico do Distrito Estadual, conforme previsões dos artigos 83 e
84 da Lei nº 10.403.
Ambas as hipóteses são atividades fins do Estado asseguradas pelas disposições
constitucionais dos artigos 5º e 225, e prestadas universalmente a todos os cidadãos,
sem distinção de fruição particular entre usuários, sejam eles visitantes ou moradores. O
que se verificou com a destinação do produto da arrecadação desta TPA é que na
verdade, remunera o exercício regular do poder de polícia.
Diante da análise dos pressupostos para a instituição de taxas de turismo nos
analisados, é notório que a taxa de turismo se caracteriza como uma exação finalística,
uma espécie tributária instrumental, cobrada com base na competência instituída pela
norma constitucional para atender finalidades estatais específicas. Mas os desvios legais
e executivos dos pressupostos para a sua instituição acarretam a invalidade da norma
instituidora da taxa e sinalizam uma racionalidade limitada dos agentes políticos acerca
do tema.
Esses desvios podem decorrer da esfera de competência para a instituição, ou
seja, no âmbito do poder legislativo, antecedente à cobrança do tributo, ou decorrer da
atuação da esfera administrativa no exaurimento das finalidades da lei instituidora pela
execução administrativa da receita proveniente da arrecadação. E o desvio da destinação
do produto da arrecadação à finalidade proposta para a instituição de uma taxa acarreta
a invalidade da norma que instituiu a obrigação tributária.
A maximização da utilidade buscada pelas administrações públicas dos
municípios acarreta a criação e implementação de inúmeras políticas não
fundamentadas e inconstitucionais, e aplicação de um processo discricionário de
arrecadação forçada de receitas e impositiva por meios inconstitucionais em função de
um contexto político de descentralização da autonomia de arrecadação e escassez de
recursos.
Cumpre salientar ainda, que as taxas instituídas em inúmeros município, assim
como no caso de Foz do Iguaçu e Fernando de Noronha, além de violarem
competências legislativas e normas para a instituição, violam a necessária vinculação da
receita a promoção efetiva da atividade turística, destinando os recursos arrecadados a
outras atividades que não o turismo, evidenciando a criação de uma política irregular e
ineficaz.
Outrossim, as leis continuam sendo questionadas judicialmente sem de fato
serem afastadas de aplicação haja vista que a arrecadação irregular acarreta a necessária
restituição aos contribuintes dos valores despendidos, o que acarretaria um problema
muito maior aos cofres públicos, refletindo o despreparo dos entes locais na formulação
de políticas de arrecadação própria. Além disso, inúmeras taxas ainda continuam sendo
instituídas em todo territorial nacional, sendo passíveis de questionamento, que podem
se tornar objeto de pesquisas futuras.
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Os autores agradecem ao Programa de Apoio a Participação em Eventos – Universidade Federal do Paraná e Fundação Araucária (Governo do Estado do Paraná/SETI).