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DIREITO CIVIL III Contratos O contrato tem uma função social, sendo veículo de circulação da riqueza, centro da vida dos negócios e propulsor da expansão capitalista. Segundo Clóvis Beviláqua, contrato é "um acordo de vontades que tem por fim criar, modificar e extinguir direitos". No sistema jurídico francês o contrato opera a transferência dos direitos reais. Já no direito alemão e no nosso direito, o contrato só cria obrigações. O Estado intervém constantemente na relação contratual privada para assegurar a supremacia da ordem pública, prevalecendo o interesse público (a coletividade), razão do dirigismo contratual em certos setores. contrato é uma das fontes das obrigações. Outra fonte das obrigações são os atos ilícitos. É uma responsabilidade extra-contratual (arts. 186 e 927 NCC). Quando uma pessoa contrata outra, e esta deixa de cumprir com a obrigação, surge para o credor o direito de ajuizar uma ação, porque houve uma responsabilidade contratual (art. 389 NCC). DIREITO SUBJETIVO DIREITO POTESTATIVO Existe um SUJEITO ATIVO, que é titular de um direito, e um SUJEITO PASSIVO, que tem um dever jurídico (dar, fazer, não fazer = direito obrigacional). O SUJEITO PASSIVO pode descumprir com a obrigação, quando então Só existe o SUJEITO ATIVO. Não existe o SUJEITO PASSIVO, nem o dever jurídico. Um exemplo é o sujeito que quer vender o seu imóvel. Outro exemplo é a promessa de recompensa (quando o fato se concretizar, passa a ser um direito subjetivo

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Page 1: Direito Civil III

DIREITO CIVIL III

Contratos

 

O contrato tem uma função social, sendo veículo de circulação da riqueza, centro da vida dos negócios e propulsor da expansão capitalista.

Segundo Clóvis Beviláqua, contrato é "um acordo de vontades que tem por fim criar, modificar e extinguir direitos".

No sistema jurídico francês o contrato opera a transferência dos direitos reais. Já no direito alemão e no nosso direito, o contrato só cria obrigações.

O Estado intervém constantemente na relação contratual privada para assegurar a supremacia da ordem pública, prevalecendo o interesse público (a coletividade), razão do dirigismo contratual em certos setores.

 

contrato é uma das fontes das obrigações. Outra fonte das obrigações são os atos ilícitos. É uma responsabilidade extra-contratual (arts. 186 e 927

NCC). Quando uma pessoa contrata outra, e esta deixa de cumprir com a obrigação, surge para o credor o

direito de ajuizar uma ação, porque houve uma responsabilidade contratual (art. 389 NCC).

DIREITO SUBJETIVO DIREITO POTESTATIVO

Existe um SUJEITO ATIVO, que é titular de um direito, e um SUJEITO PASSIVO, que tem um dever jurídico (dar, fazer, não fazer = direito obrigacional).

O SUJEITO PASSIVO pode descumprir com a obrigação, quando então surge a responsabilidade (e, em conseqüência, uma ação).

Existe, entre eles, uma RELAÇÃO JURÍDICA.

Um exemplo é o contrato de locação (que é um título executivo extrajudicial). O locador pode entrar com ação de despejo, ou então com ação de execução.

Só existe o SUJEITO ATIVO. Não existe o SUJEITO PASSIVO, nem o dever jurídico.

Um exemplo é o sujeito que quer vender o seu imóvel. Outro exemplo é a promessa de recompensa (quando o fato se concretizar, passa a ser um direito subjetivo – uma relação jurídica).

Outros exemplos são a dissolução de sociedade, de condomínio, a rescisão de contrato de trabalho.

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Com relação ao contrato, estamos diante de um DIREITO SUBJETIVO. O contrato cria, modifica ou extingue direitos.

NEGÓCIO JURÍDICO ATO JURÍDICO

Seus efeitos são provocados pelas partes, embora estejam na lei.

Exemplo: aluguel de um imóvel.

O direito é pós-existente.

Pode-se criar cláusulas no contrato, desde que não contrarie a lei.

Seus efeitos são provenientes da própria lei.

Exemplo: reconhecimento da paternidade (registro de um filho); o pai passa a ter obrigação de mantê-lo.

O direito é preexistente.

A parte não pode criar direitos; a própria lei diz quais são os direitos.

São diferenciados pelos seus EFEITOS (preexistentes/pós-existentes).

São diferenciados pelo Código Civil de 2003.

OBRIGAÇÃO DE MEIO – Ele só é obrigado a aplicar as diligências (a técnica). É o caso de um advogado. No entanto, se ele promete ganhar uma causa, a obrigação que era de meio passa a ser OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. Um cirurgião, ao realizar uma cirurgia reparadora, tem obrigação de meio; ao realizar uma cirurgia estética, tem obrigação de resultado.

 

Princípios fundamentais do regime contratual

1. AUTONOMIA DA VONTADE

Ampla liberdade de contratar. A promessa deve ser comprida (pacta sunt servanda).

Art. 421 NCC.

As partes são livres para contratar. Não pode haver nenhuma coação, caso contrário o contrato será anulado.

Esta autonomia da vontade não é absoluta; ela é relativa: não é possível violar a norma, porque prevalece a supremacia da ordem pública (prevalece o interesse público). O Estado está sempre interferindo nas relações jurídicas para preservar o interesse público. Um exemplo é o CDC, a Lei de Economia Popular, a Lei de Locações, etc.

2. SUPREMACIA DA ORDEM PÚBLICA

Limita o princípio da autonomia da vontade, dando prevalência ao interesse público, razão da intervenção do Estado. São exemplos a Lei do Inquilinato (Lei 8245), o CDC e a Lei de Usura.

O interesse público prevalece sobre o interesse particular.

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O conteúdo do contrato não pode violar a norma. A forma é livre, e as partes são livres para contratar, mas desde que não viole a norma, porque existe a supremacia da ordem pública.

Também não se pode contratar sobre um objeto impossível. O contrato tem que ser lícito, possível e determinado. Tendo estas características, surge a obrigatoriedade dos contratos.

3. FORÇA OBRIGATÓRIA (OBRIGATORIEDADE) – Pacta Sunt Servanda

É a força vinculante das convenções. Pelo princípio da autonomia da vontade, ninguém é obrigado a contratar mas, se o fizerem, devem cumprir o contrato. Existe a necessidade da segurança dos negócios, por geraria a balbúrdia e o caos. Qualquer modificação no contrato terá que ser bilateral (todos os envolvidos têm que participar). Uma exceção a este princípio é a revisão dos contratos através da onerosidade excessiva (art. 478 NCC).

Segundo a teoria da onerosidade excessiva, se a situação do fato modificar-se em razão de acontecimento extraordinário e imprevisível que torne excessivamente oneroso para o devedor o seu adimplemento, poderá este requerer ao juiz que o isente da obrigação, parcial ou totalmente, e ainda podendo adequar o contrato. Um exemplo é o art. 6º, V, do CDC. É o caso das guerras, das calamidades públicas, do contrato de leasing atrelado ao Dólar.

Se não houver nenhuma violação da norma, prevalece a obrigatoriedade. Os pactos têm que ser cumpridos, mas desde que não violem a norma (desde que não tenham nulidades: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão , fraude).

O estado de perigo foi inserido no art. 156 do NCC, e a lesão foi inserida no art. 157 do NCC.

Mas há exceções quanto a este princípio:

TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA – Quando ocorrer, após a elaboração do contrato, algum fato superveniente, imprevisível e extraordinário, que cause prejuízo a uma das partes, aquela parte prejudicada pode rever o contrato (onerosidade excessiva). Foi o caso dos contratos de leasing, feitos em Dólar. Nestes casos, este princípio pode ser quebrado. Esta teoria só pode ser argüida nas prestações continuadas. Além disso, para argüi-la, deve-se estar em dia com as obrigações.

TEORIA DA IMPREVISÃO – Alguns autores falam na cláusula rebus sic stantibus (Teoria da Imprevisão).

Outros autores dizem ainda que não há diferença nenhuma entre as duas teorias.

4. CONSENSUALIDADE OU CONSENSUALISMO

O contrato resulta do consenso, do acordo de vontades, independentemente da entrega da coisa.

Os contratos são, em regra, consensuais. Alguns, no entanto, são reais, porque se aperfeiçoam com a entrega da coisa. É o caso, por exemplo, do contrato de depósito, de comodato e de mútuo.

Os contratos se perfazem com o consenso. Não é preciso a entrega da coisa. Os contratos se aperfeiçoam sem a necessidade da entrega da coisa.

Há exceções, que são o DEPÓSITO, o MÚTUO e o COMODATO.

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No caso da venda de um imóvel, tem que ser feito o registro da escritura (direito real). Atualmente a promessa de compra e venda é um direito real.

5. BOA-FÉ

Exige que as partes se comportem de forma correta, clara, transparente, sem segundas intenções, não somente durante as tratativas, como também durante a formação e o cumprimento do contrato.

Se coaduna com o seguinte princípio de Direito: "ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza".

Significa transparência, ética. As partes têm que ser transparentes desde as tratativas até o cumprimento do contrato.

6. RELATIVIDADE

A força de lei que a convenção adquire somente se manifesta entre os próprios contratantes e seus sucessores. Há casos em que nem mesmo aos herdeiros se manifesta a força contratual. É o caso, por exemplo, dos contratos personalíssimos (cirurgião plástico famoso, cantor conhecido, advogado prestigiado, etc).

Somente as partes que contrataram podem pleitear alguma coisa (ou seus sucessores). Somente eles podem ter direitos e deveres. No entanto, se a obrigação for personalíssima (infungível), os sucessores não poderão pleitear nada.

7. PROBIDADE

Significa honradez.

Este princípio, segundo o entendimento de alguns autores, está dentro do princípio da boa-fé.

8. FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

O contrato foi feito para gerar circulação de riqueza.

 

Pressupostos e requisitos de validade do contrato

1. PRESSUPOSTOS

São as condições sob as quais se desenvolve e pode desenvolver-se o contrato. Agrupam-se em três categorias:

a. Sujeitos

É necessário que haja capacidade das partes (agente capaz).

A regra é que o nulo não convalece. No entanto, se o sujeito é absolutamente incapaz e ninguém reclama, o ato está produzindo efeitos (o nulo convalece).

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b. Idoneidade do objeto

É necessário que seja um objeto lícito e possível.

Não é possível que a herança de uma pessoa viva constitua objeto de contrato (art. 426 NCC). Trata-se, neste caso, de um objeto ilícito. Também não é possível um contrato sobre o transporte de uma praia. Neste caso, o objeto é impossível.

c. Legitimação das partes

Para exercer o direito de ação, não basta ao titular ser capaz. Requer ainda que seja parte legítima e tenha interesse a ser protegido. Uma pessoa não pode, por exemplo, dar em penhor uma coisa que não lhe pertence (sem que ela tenha poderes para isto).

1. REQUISITOS

São considerados elementos intrínsecos, indispensáveis à validade de qualquer contrato.

a. Consentimento

A declaração de vontade há de ser emitida em correspondência ao conteúdo do contrato que o declarante tem em vista. Muitas vezes ocorre divergência entre a vontade real e a declarada.

São vícios do consentimento:

O erro O dolo A coação A lesão (art. 157 NCC) novo! O estado de perigo (art. 156 NCC) novo!

a. Causa

É a motivação econômica do contrato. É o que leva o contratante a perseguir seu objeto.

b. Objeto

É a prestação das partes.

c. Forma

Vigora o princípio da forma livre. Os contatos formais ou solenes constituem exceção (art. 108 NCC).

Há duas exceções ao fato da compra de imóveis exigir instrumento público. Em ambos os casos a compra pode ser feita por instrumento particular.

Compra de imóvel pelo Sistema Financeiro de Habitação. Compra de lote em loteamento.

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NULIDADE

É a sanção por meio da qual a lei priva de eficácia o contrato que é celebrado contra preceito Pode ser total (atinge todo o contrato) ou parcial (atinge apenas uma ou algumas de suas cláusulas). Pode ser arguída por qualquer interessado. Não convalece pelo decurso de tempo.

 

Formação dos contratos

A formação do contrato nasce com a assinatura. O contrato é um direito obrigacional. Ao pegar o contrato de venda de um imóvel e levar a registro imobiliário, nasce um direito real (com a transcrição do contrato no registro imobiliário). No direito real há a necessidade da tradição. No caso dos bens imóveis, a entrega é o registro da escritura. No caso dos bens móveis a tradição é a entrega da coisa.

O direito real só se aperfeiçoa com a entrega da coisa. Já no direito pessoa (caso dos contratos), não há necessidade da entrega da coisa. Basta a formalização (a assinatura). Esta é diferença entre o direito real e o direito obrigacional.

O contrato consensual torna-se perfeito e acabado no momento em que nasce o vínculo entre as partes.

O contrato, como acordo de vontades, pressupõe uma proposta, denominada POLICITAÇÃO, feita pelo policitante ou proponente à outra parte, denominada oblato ou solicitado. Quando há aceitação, o oblato torna-se aceitante.

Os dois elementos imprescindíveis para a formação do contrato são:

A proposta e A aceitação

O vínculo contratual nasce quando a proposta e a aceitação se integram.

PROPOSTA

É a firme declaração receptícia de vontade dirigida à pessoa com a qual pretende alguém celebrar um contrato ou um ato público.

Deve conter todas as cláusulas essenciais, de modo que o consentimento do oblato implique a formação do contrato.

Para verificar o momento exato da formação do contrato é preciso distinguir os contratos entre presentes e entre ausentes. O contrato entre presentes é realizado por pessoas que estejam juntas ou mediante acordo telefônico. Já no contrato entre ausentes, também denominado contrato por correspondência (efetuado por carta, telegrama, fax), encontramos as teorias da:

Informação ou cognição Agnição ou declaração Expedição

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TEORIA DA INFORMAÇÃO OU COGNIÇÃO

Considera-se aperfeiçoado o contrato epistolar (por correspondência) somente quando a aceitação chega ao conhecimento do proponente.

O inconveniente desta teoria é deixar ao arbítrio do proponente a formação e o momento do contrato, pois poderia, por exemplo, o proponente dizer que não recebeu a aceitação.

TEORIA DA AGNIÇÃO OU DECLARAÇÃO

Considera-se aperfeiçoado o contrato epistolar desde o momento em que o oblato aceitasse a proposta.

Uma crítica a esta teoria é o fato de que ela deixa ao arbítrio do aceitante a formação e o momento do contrato, pois o aceitante poderia alegar que não o aceitou.

TEORIA DA EXPEDIÇÃO

Considera-se aperfeiçoado o contrato epistolar no momento em que o oblato expedisse a aceitação.

O nosso Código Civil de 2003, em seu art. 434, acolheu a Teoria da Expedição. Mas os incisos do art. 434 apresentam exceções a esta teoria.

NEGOCIAÇÕES PRELIMINARES

Antes de aceitar, uma das partes pode pretender apenas obter informações para saber se interessa ou não o contrato.

As indagações, apontamentos, minutas, visitas, troca de cartas para esclarecimentos, não vinculam as partes, não têm força vinculante, ou seja, não advém a obrigação de contratar. Estas etapas estão no âmbito das tratativas.

 

Lugar da formação dos contratos

O contrato reputa-se celebrado onde foi proposto, nos termos do art. 435.

Entre pessoas presentes, o contrato se forma onde elas se encontram.

Entre pessoas distantes uma da outra, o contrato se forma no lugar em que foi proposto.

Interessa saber onde os contratos se formam para determinar o foro competente.

 

Forma e prova dos contratos

Aplica-se à prova dos contratos o disposto em relação aos atos jurídicos em geral.

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Algumas vezes há necessidade de escritura pública (caso de venda de imóvel de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no país).

Quando não há exigência legal quanto à forma, pode o contrato tanto ser verbal como por escrito, realizando-se por documento particular ou público.

Segundo o art. 107, a regra geral é que os contratos são de forma livre, salvo quando a lei exigir.

O art. 108 dispõe sobre a escritura pública de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo do país. Se um imóvel for comprado por escritura particular, não se poderá fazer o registro (no registro de imóveis). Este direito é pessoal (obrigacional), e não real. É um direito pessoal entre as partes.

Há exceções: se a compra foi feita pelo Sistema Financeiro de Habitação, ou se a compra é de um lote, esta pode ser feita por instrumento particular (e pode-se registrar no RGI). Mas pode ser feita por instrumento público.

Mesmo tratando-se de um contrato verbal, nada impede que a prova seja feita mediante a apresentação de um documento denominado "começo de prova por escrito". Exemplo: um contrato verbal de locação pode ser provado pelo recibo dado pelo locador ao locatário, complementando-se com a prova testemunhal.

O valor da prova testemunhal é limitado aos contratos cujo valor não ultrapasse o décuplo do maior valor de referência do salário mínimo, conforme dispõe o art. 401 do CPC.

Sendo o valor maior que 10 vezes o salário mínimo, a prova não pode ser exclusivamente testemunhal.

Há de ser feita uma interpretação sistemática (Código Civil + CPC).

É admissível a prova testemunhal em negócios jurídicos de maior valor existindo começo de prova por escrito.

Se um locatário faz o pagamento dos alugueres mediante cheque nominal ou depósito em conta corrente do locador, neste caso ocorrerá uma inversão do ônus da prova, cabendo ao locador provar que as quantias recebidas correspondiam a outro negócio existente entre as partes (aplicação do CDC, por analogia).

 

Interpretação dos contratos

Toda manifestação de vontade necessita de interpretação para que se saiba o seu significado, tendo em vista a falta de técnica com a qual são feitos os contratos.

São aplicáveis os princípios gerais de interpretação da lei, havendo normas próprias de hermenêutica. Ou seja, são aplicáveis a interpretação literal, histórica, sociológica, sistemática e lógica.

No Direito brasileiro, o Código Civil fixa os princípios de hermenêutica contratual nos seus arts. 112 (intenção das partes), 113 (boa-fé e usos do lugar), 114 (interpretação estrita) e 819 (não admite a interpretação extensiva da fiança; além disso, este contrato acessório também tem que ser por escrito):

Encontramos o princípio do respeito à intenção das partes no art. 112. Encontramos o princípio da boa-fé e do uso do lugar onde ocorreu a celebração no art. 113.

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Encontramos a interpretação restritiva dos contratos benéficos em geral no art. 114, e da fiança, onde não se admite interpretação extensiva, no art. 819.

OBSERVAÇÃO:

O contrato de fiança tem vênia conjugal (os dois cônjuges têm que assiná-lo). Denomina-se outorga uxória. Alguns julgadores entende que somente um dos cônjuges assinou, ele só responderá pela parte dele.

Com relação ao CDC, devemos dar importância aos arts. 46 e 47:

O art. 46 impõe a ineficácia para os contratos não comunicados previamente de seu conteúdo ao consumidor, e redigidos de modo obscuro.

O art. 47 assevera que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

O CDC também prevê a inversão do ônus da prova: cabe ao fornecedor provar tudo aquilo que o consumidor está afirmando.

 

Classificação dos contratos

Os contratos dividem-se, quanto aos efeitos, em:

a. CONTRATOS UNILATERAISb. CONTRATOS PLURILATERAIS

Não devemos confundir o ato jurídico unilateral com o contrato unilateral.

Na classificação dos atos jurídicos atende-se o número de declarações de vontade. Ocorre ato jurídico unilateral quando só há uma única declaração de vontade. Exemplo: testamento, promessa de recompensa.

Quando ocorre mais de uma declaração de vontade, o ato jurídico passa a ser bilateral, podendo ou não ter natureza contratual.

O ato jurídico bilateral torna-se contrato quando cria, extingue ou modifica obrigações, de conteúdo exclusivamente patrimonial (exemplo: locação, compra e venda, etc).

Quando ocorre a doação de um bem, seu conteúdo é exclusivamente patrimonial.

Não é contrato quando cria, modifica, extingue direitos ou deveres sem conteúdo patrimonial (exemplo: adoção, casamento – são atos jurídicos bilaterais). O casamento e a adoção criam deveres jurídicos sem conteúdo patrimonial (existe dever de assistência moral, educacional, etc, mas falta o conteúdo exclusivamente econômico).

 

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Classificação dos contratos baseada no número de partes contratantes sobre as quais recai o dever jurídico

Se somente um dos contratantes tiver dever jurídico em virtude do contrato, este será unilateral. Um exemplo é a adoção pura: somente o doador se obriga, devendo entregar ao donatário a coisa doada, inexistindo qualquer obrigação por parte do donatário.

Já nos contratos bilaterais, ambas as partes têm dever jurídico, ou seja, gera obrigações para ambos os contratantes – obrigações recíprocas, denominados contratos sinalagmáticos. Este termo tem origem na palavra grega sinalagma, que significa reciprocidade de prestações. Um exemplo é o contrato de compra e venda (art. 481) – o comprador deve pagar o preço e o vendedor deve entregar a coisa. O mesmo ocorre na locação de coisas, onde o locador cede o uso e gozo (fruição) do objeto, e o locatário deve pagar o aluguel.

No momento da formação do contrato de compra e venda o comprador não adquire a coisa. Ele adquire um mero direito obrigacional (pessoal), ou de crédito. Ele só será o proprietário da coisa quando houver a tradição. A tradição, na coisa móvel, se dá com a entrega da coisa. Na coisa imóvel, se dá com a inscrição da estrutura no registro imobiliário. Numa compra e venda, a simples formação do contrato, com preço pago, não gera para o comprador a propriedade (não cria para ele um direito real). Ele só passa a ser proprietário da coisa com a tradição. Se a promessa de compra e venda for registrada, ela é considerada como direito real.

 

Contratos unilaterais imperfeitos

Alguns autores os denominam contratos bilaterais imperfeitos.

É uma categoria intermediária entre os contratos unilaterais e os contatos bilaterais, ou seja, sendo unilateral, torna-se bilateral em virtude de uma modalidade ou cláusula contratual.

Um exemplo é o contrato de doação (unilateral por excelência) com a criação de um encargo para o donatário, obrigando-o a construir um monumento, uma praça, uma escola, etc. A doação com encargo importa em transformação do contrato em bilateral. A doação com encargo é um contrato unilateral imperfeito (enquanto que a doação pura é um contrato unilateral).

A doação é um contrato, enquanto que o testamento, por sua vez, é um ato jurídico unilateral.

Parece absurdo denominar-se um contrato de unilateral, porque todo contrato resulta, no mínimo, de duas manifestações de vontade.

Sob o critério da formação, o contrato é sempre bilateral, pois somente se constitui mediante concurso de vontades.

Sob os efeitos que acarreta, os contratos se classificam em unilaterais e bilaterais.

Os que geram obrigações recíprocas são bilaterais (contratos sinalagmáticos – geram obrigações recíprocas), e os que criam obrigações unicamente para um dos contratantes são chamados unilaterais.

 

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Contratos gratuitos ou benéficos

São contratos em que apenas uma das partes aufere benefício ou vantagem. Para a outra parte, só há obrigação, sacrifício. É o caso da doação pura.

 

Contratos onerosos

Ambos os contratantes obtêm proveito, ao qual corresponde um sacrifício. É o caso da compra e venda.

Na compra e venda, o vendedor tem a vantagem ou benefício de receber o preço, e tem o sacrifício de entregar a coisa. Já o comprador tem a vantagem ou benefício de receber a coisa, e tem o sacrifício de pagar o preço.

Há uma reciprocidade entre vantagem e sacrifício.

Na doação pura, o doador só tem sacrifício, enquanto que o donatário só tem vantagem (ele apenas tem que ir ao cartório dizer que aceita a doação).

Na doação, pode-se reservar para si o usufruto daquilo que está sendo doado. Pode-se também colocar uma cláusula de reversão (doar para o filho e colocar cláusula de reversão para o caso da morte do filho).

A doação pura é diferente da doação com gravame.

Os contratos onerosos subdividem-se em COMUTATIVOS e ALEATÓRIOS. Comutativos são aqueles de prestações certas e determinadas, onde as partes podem antever as vantagens e os sacrifícios, que geralmente se eqüivalem porque não envolvem nenhum risco. É o caso da compra e venda.

Há, porém, contratos tipicamente comutativos, como a compra e venda, que, em razão de certas circunstâncias, tornam-se aleatórios e, por isso, denominam-se CONTRATOS ACIDENTALMENTE ALEATÓRIOS. Estes são de duas espécies:

1. VENDA DE COISAS FUTURAS – Caracteriza-se quando alguém vende a colheita futura declarando que a venda ficará perfeita e acabada haja ou não safra.

2. VENDA DE COISAS EXISTENTES MAS EXPOSTAS A RISCO –

Os CONTRATOS ALEATÓRIOS caracterizam-se pela incerteza para ambas as partes, com relação às vantagens e sacrifícios que um deles pode advir, pois a perda ou lucro dependem de um fato futuro que significa sorte, risco, acaso. Um exemplo são os contratos de jogo, as apostas e o seguro.

 

Contratos paritários

São os contratos do tipo tradicional, em que as partes discutem livremente as condições, porque se encontram em pé de igualdade. Um exemplo é o contrato de compra e venda. Esta é a regra mas, no entanto, algumas vezes não ocorre assim, como no caso do contrato bancário.

Page 12: Direito Civil III

 

Contratos de adesão

Não permitem esta liberdade, devido à preponderância da vontade de um dos contratantes, que elabora todas as cláusulas. O outro adere ao modelo previamente confeccionado, não podendo modificá-lo. São exemplos o seguro, o consórcio, o contrato bancário, o contrato com concessionárias de serviço público (água, energia elétrica, etc).

Alguns autores incluem como exemplo o transporte coletivo (que é um contrato verbal).

Alguns autores entendem que o assalto a ônibus é um fato fortuito externo, enquanto que outros entendem que é uma responsabilidade objetiva (é um fato previsível, pelo menos na cidade do Rio de Janeiro).

RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

RESPONSABILIDADE OBJETIVA

Dano Nexo causal Culpa (lato sensi – abrange

também o dolo)

Dano Nexo causal

 

Momento em que os contratos devem ser cumpridos

1. CONTRATOS DE EXECUÇÃO INSTANTÂNEA OU IMEDIATA

Estes contratos se consumam num só ato, sendo cumpridos imediatamente após a sua celebração. Um exemplo é a compra e venda à vista.

2. CONTRATOS DE TRATO SUCESSIVO OU DE EXECUÇÃO CONTINUADA

Estes contratos são aqueles que se cumprem por meio de atos reiterados. São exemplos a compra e venda a prazo e o contrato de locação (pagamento do aluguel).

O Princípio da Onerosidade Excessiva só se aplica a estes contatos.

3. CONTRATOS DE EXECUÇÃO DIFERIDA

Devem ser cumpridos em um só ato, mas a entrega da coisa se dá em momento futuro. Um exemplo é um contrato onde fica pactuado que a entrega da coisa será em data futura (uma colheita, por exemplo).

 

Tipos de contrato

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1. CONTRATOS PERSONALÍSSIMOS OU INFUNGÍVEIS OU INTUITO PERSONA

São os celebrados em atenção às qualidades pessoais de um dos contratantes. Por isso, o obrigado não pode fazer-se substituir por outrem. São intransmissíveis aos sucessores, e não podem ser objeto de cessão.

É o caso de um contrato feito com um cantor famoso, com um cirurgião plástico famoso, com um advogado famoso (desde que a procuração não tenha poderes para substabelecer, quando então o contrato deixa de ser personalíssimo).

2. CONTRATOS IMPESSOAIS

São aqueles cujas prestações podem ser cumpridas pelo obrigado ou por um terceiro. O que importa é que seja executado. Um exemplo é o contrato com um pintor de parede, com uma oficina mecânica, com um empreiteiro, etc.

3. CONTRATOS PRINCIPAIS

São os que têm existência própria e não dependem de qualquer outro. São exemplos o contrato de compra e venda, o contrato de locação e o comodato.

4. CONTRATOS ACESSÓRIOS

São os que têm uma existência subordinada à do contrato principal. Eles seguem o destino do principal: nulo este, nulo também será o negócio acessório. São exemplos a fiança (cujo contrato principal é o contrato de locação) e a cláusula penal.

Art. 184.

5. CONTRATOS DERIVADOS OU SUB-CONTRATOS

São os que têm por objeto direitos estabelecidos em outro contrato, denominado principal. São exemplos a sublocação e a sub-empreitada.

Se o contrato não permite a sublocação e o locatário subloca, há uma infração contratual, e a ação é de despejo. Com relação ao sublocatário, ele deverá ser notificado (para constituir em mora), com prazo para desocupação (se ele não desocupar, se configurará o esbúlio possessório, que enseja uma reintegração de posse). Ou então, na petição inicial da ação de despejo, deve-se discriminar o locador ou terceiros ocupantes.

6. CONTRATOS SOLENES

São os que devem obedecer à forma prescrita em lei para se aperfeiçoarem. Quando a forma é exigida como condição de validade do negócio, constitui a substância do ato. Um exemplo é a escritura de compra e venda de imóvel cujo valor seja superior a 30 salários mínimos (art. 108); esta é a regra, mas existem exceções no caso da compra de imóveis pelo Sistema Financeiro de Habitação e no caso da compra de lotes – em ambos pode ser utilizado instrumento particular.

7. CONTRATOS NÃO SOLENES

Page 14: Direito Civil III

São os contratos de forma libre, bastando o consentimento para a sua formação. Pode ser verbal ou escrito. Em regra, os contratos têm forma livre. São exemplos o contrato de locação e o contrato de comodato.

8. CONTRATOS CONSENSUAIS

São os que se aperfeiçoam, com o consentimento, independentemente da entrega da coisa (art. 482).

O contrato de compra e venda, de modo geral, é consensual.

9. CONTRATOS REAIS

São os que exigem, para se aperfeiçoarem, além do consentimento, a entrega da coisa que lhes serve de objeto. São exemplos o comodato, o depósito e o mútuo.

Nos contratos bilaterais nenhum dos contratantes pode, antes de cumprir a sua obrigação, exigir a do outro, conforme dispõe o art. 476. Nesta hipótese, tem direito de invocar a exceção do contrato não cumprido, visto que a essência dos contratos bilaterais é o sinalagma (reciprocidade das obrigações).

A exceção de inadimplemento somente pode ser oposta quando a lei ou o próprio contrato não determinar a quem cabe primeiro cumprir a obrigação.

Com relação ao art. 477, as prestações têm que ser simultâneas. Se forem sucessivas não cabe a aludida exceção.

Se não foi estipulado o momento da execução, entendem-se simultâneas as prestações.

Em homenagem ao princípio da autonomia da vontade, é válida a cláusula contratual que restringe o direito das partes de se utilizarem do art. 476. Trata-se de cláusula solve et repete, pela qual obriga-se o contratante a cumprir a sua obrigação mesmo diante do descumprimento da do outro, podendo, posteriormente, voltar-se contra a outra parte para pedir o cumprimento da prestação ou as perdas e danos.

Esta cláusula é encontrada nos contratos administrativos, considerando o princípio da continuidade dos serviços públicos.

 

Extinção dos contratos

Os contratos se extinguem normalmente por sua execução voluntária. O cumprimento é o fim normal do contrato. Os contratos em geral têm um ciclo: nascem do acordo de vontades, produzem os efeitos que lhes são próprios e extinguem-se.

A extinção dá-se , em regra, pela execução, seja instantânea, diferida ou continuada. O cumprimento da prestação libera o devedor e satisfaz o credor.

Algumas vezes o contrato extingue-se antes de ter alcançado o seu fim, ou seja, sem que as obrigações tenham sido cumpridas voluntariamente.

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Exemplos:

1. CAUSAS ANTERIORES OU CONTEMPORÂNEAS (extinção dos contratos por anulação)

a. Defeitos decorrentes do não preenchimento de seus REQUISITOS SUBJETIVOS (capacidade das partes e libre consentimento), de seus REQUISITOS OBJETIVOS (objeto lícito e possível) e de seus REQUISITOS FORMAIS (forma prescrita em lei), que afetam a validade do negócio. Em conseqüência, acarreta a nulidade absoluta ou a nulidade relativa.

NULIDADE ABSOLUTA

Decorre de transgressão a um preceito de ordem pública, e impede que o contrato produza efeitos desde a sua formação (ex tunc).

NULIDADE RELATIVA (anulabilidade)

Advém de imperfeição da vontade. Ela ou é emanada de um relativamente incapaz não assistido ou então contém algum dos vícios de consentimento (erro, dolo, coação, fraude, lesão).

Como pode ser sanada, e até mesmo não argüida no prazo prescricional, não extinguirá o contrato enquanto não se ajuizar uma ação que a decrete, sendo ex nunc os efeitos da sentença.

CONDIÇÃO RESOLUTIVA

Pode ser EXPRESSA quando convencionada para a hipótese de inadimplemento, ou TÁCITA. Em todo contrato bilateral há uma cláusula resolutiva TÁCITA, autorizando o lesado pelo inadimplemento a pleitear a resolução do contrato com perdas e danos (arts. 474 e 475 NCC, art. 53 CDC).

DIREITO DE ARREPENDIMENTO

Quando expressamente previsto no contrato, autoriza qualquer das partes a rescindir o ajuste mediante declaração unilateral da vontade, sujeitando-se à perda do sinal (art. 420).

1. CAUSAS SUPERVENIENTES À FORMAÇÃO DO CONTRATO

a. RESOLUÇÃO

Decorre de comportamento culposo de um dos contratantes, causando prejuízo ao outro. Produz efeitos ex tunc. É o remédio concedido à parte para romper o vínculo contratual mediante ação judicial.

Possui uma modalidade, que é a redibição (existência de vício redibitório como, por exemplo, na compra de um terreno que, na escritura, reza ter 1000m2 e, quando se faz a medição, observa-se que tem 850 m2).

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Admite-se como causa de resolução dos contratos comutativos de execução diferida, continuada ou periódica, a excessiva onerosidade que, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, sobrevenham, dificultando o cumprimento da obrigação por parte de um dos contratantes.

A prestação não deve ser excessivamente onerosa apenas em relação ao devedor, mas a toda a qualquer pessoa que se encontra naquela mesma posição (caso do leasing, por exemplo).

Não é cabível a onerosidade excessiva nos contratos aleatórios.

b. RESILIÇÃO

Modo de extinção dos contratos por vontade de um ou dos dois contratantes.

Emprega-se também o vocábulo RESCISÃO.

RESILIÇÃO BILATERAL

As próprias partes deliberam dissolvê-lo, mediante o negócio extintivo. O modo normal da resilição bilateral é o DISTRATO.

RESILIÇÃO UNILATERAL

Pode ocorrer somente em determinados contratos, pois a regra é a impossibilidade de um contratante romper o vínculo contratual por sua exclusiva vontade.

Um exemplo é uma execução continuada cujo contrato seja por prazo indeterminado (qualquer uma das partes pode romper).

Outro exemplo é o mandato (que pode ser revogado).

a. CESSAÇÃO

Quando ocorre a morte de um dos contratantes.

 

Contrato de Compra e Venda

O contrato de compra e venda é "aquele pelo qual uma das partes se obriga a transferir a propriedade de uma coisa à outra, recebendo, em contraprestação, determinada soma de dinheiro ou valor fiduciários equivalente" (Orlando Gomes). Ele é, portanto, o negócio jurídico em que as partes visam, como vantagem econômica, a transferência do domínio de determinado bem mediante uma contraprestação em dinheiro.

No Brasil, quando um contrato é celebrado, ele gera um mero direito pessoal. Tratando-se de um bem imóvel, só existe o direito real quando o contrato é levado a registro (quando então o comprador passa a ser o proprietário). No caso de um bem móvel, a propriedade é transferida no momento da entrega da coisa (quando ocorre a tradição).

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No direito brasileiro e no direito alemão o contrato de compra e venda não transfere a propriedade; ele cria a obrigação de transferir a propriedade, realizando-se a transferência pela tradição (bens móveis – art. 1267 e bens imóveis – art. 1245).

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

§ 2o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel.

Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição.

Parágrafo único. Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório; quando cede ao adquirente o direito à restituição da coisa, que se encontra em poder de terceiro; ou quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico.

O direito francês e o direito italiano admitem a transferência da propriedade pelo simples consenso entre as partes, manifestado no contrato.

 

CARACTERÍSTICAS DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA

1. BILATERAL OU SINALAGMÁTICO

Pois gera obrigações recíprocas para o comprador (de pagar o preço em dinheiro) e para o vendedor (de transferir o domínio da coisa). Ambas as partes têm dever jurídico.

2. CONSENSUAL

Se aperfeiçoa com o acordo de vontades, independentemente da entrega da coisa (art. 482):

Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço.

Se o vendedor não entregar a coisa, se diz que ele inadimpliu com a obrigação. Neste caso, cabe ação, proposta pelo comprador.

3. ONEROSIDADE

Ambos os contratantes obtêm proveito, ao qual corresponde um sacrifício.

Vendedor PROVEITO = receber o preço

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SACRIFÍCIO = entregar a coisa

Comprador PROVEITO = receber a coisa

SACRIFÍCIO = pagar o preço

4. CUMUTATIVIDADE

Em regra, os contratos de compra e venda são cumutativos, ou seja, as prestações são certas e as partes podem antever as vantagens e os sacrifícios, que geralmente se equivalem, podendo transformar-se em aleatório quando tem por objeto coisas futuras ou coisas existentes mas sujeitas a risco. Um exemplo de contrato aleatório é a venda de uma colheita futura, venha ou não a haver safra.

5. FORMA LIVRE

Em regra, a forma dos contratos é livre, ou seja, não solene (não exige solenidade). Em certos casos se exige a escritura pública, como, por exemplo, no caso do art. 108:

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

No caso do art. 108, a substância do ato é a escritura pública, mas há exceções, como nos casos do financiamento pelo SFH e do loteamento. Nestes casos, pode-se utilizar o instrumento particular.

Estes exemplos de exceções quando à necessidade de escritura pública encontram-se nas seguintes legislações:

Lei 4380/64, art. 61, §5º - Sistema de Habitação Decreto-Lei 58/37, art. 11 – Loteamentos Lei 6766/79, art. 26

 

ELEMENTOS ESSENCIAIS NO CONTRATO DE COMPRA E VENDA

Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.

Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço.

1. CONSENSO (manifestação de vontade)2. COISA

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3. PREÇO EM DINHEIRO

Faltando um desses elementos, o ato é nulo.

 

COISA

Em princípio, todas as coisas no comércio podem ser objeto de venda: os bens corpóreos, as coisas presentes, as futuras, as próprias e as alheias.

A venda de bens incorpóreos, compreendidos os direitos, denomina-se CESSÃO. A cessão não tem a finalidade de transferência do domínio, porque este só se exerce sobre coisas. Na cessão de herança, por exemplo, o cessionário se torna titular das relações jurídicas da sucessão, uma vez que o herdeiro não vende os bens que lhe caberão no quinhão, mas sim transfere o patrimônio ativo e passivo tal qual como se encontrava no momento da abertura da sucessão. O vendedor só está obrigado a garantir a sua qualidade de herdeiro.

O herdeiro pode fazer uma cessão de direitos hereditários. Neste caso, é lavrada uma escritura (escritura de cessão de bens hereditários). Com ela, o cessionário pode até mesmo abrir o inventário;

Admite-se a venda de coisas futuras. Uma vez que o contrato não transfere a propriedade do bem, mas apenas cria a obrigação de transferi-la, nada impede a venda de coisa que ainda não existe. Um exemplo são os frutos de colheita esperada. Se o vendedor não entregar a coisa, resolve-se em perdas e danos (toda obrigação não cumprida resolve-se em perdas e danos, a não ser que se comprove o caso fortuito ou força maior).

Se um herdeiro quiser vender um bem, ele é obrigado a dar preferência aos demais herdeiros.

A cessão de direitos hereditários cede o todo. O cessionário entra no processo sucessório na qualidade de herdeiro. Não é possível discriminar o(s) bem(ns), a não ser que os herdeiros já tenham elaborado a partilha. Ainda nestes casos, existe entendimento de que, se o juiz ainda não homologou a partilha, ainda não há como discriminar o(s) bem(ns).

É ilícita a venda de herança de pessoa viva (art. 426):

Art. 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.

Se o comprador tinha conhecimento de que a pessoa se encontrava viva, estará sujeito a uma regra em Direito segundo a qual não se pode alegar o desconhecimento da lei. Este contrato será nulo.

No entanto, se o comprador alegar que foi levado a erro, configura-se uma fraude. Neste caso, o negócio jurídico pode ser anulado.

Somente é lícita a cessão de direitos hereditários (pessoa morta).

VENDA DE COISA ALHEIA:

Nada obsta que se efetue a venda de bem que ainda não lhe pertence. Se o vendedor consegue adquiri-lo para fazer a entrega prometida, cumprirá a obrigação. Caso contrário, a venda resolve-se em perdas e danos.

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Existem coisas que não podem ser vendidas, tais como o ar, a luz natural, a água fluente, e bens públicos tais como praças, praias e estradas.

 

PREÇO

É a quantia que o comprador se obriga a pagar ao vendedor, e deve consistir em dinheiro. Se for outra coisa, o contrato define-se como PERMUTA OU TROCA. Não se exige que seja exclusivamente em dinheiro, bastando que constitua a parcela principal (maior).

O preço deve ser sério, pois é inadmissível o preço simulado, irrisório, vil. O preço deve ser fixado em moeda corrente do país. A substituição de dinheiro por outra coisa, consentida pelo vendedor, depois de concluído o contrato, não o converte em troca ou permuta; haverá, neste caso, uma DAÇÃO EM PAGAMENTO (que é uma forma de extinção da obrigação).

 

CONSENTIMENTO

Deve ser livre e espontâneo, sob pena de anulabilidade do negócio jurídico.

Requer capacidade das partes.

RELATIVAMENTE INCAPAZ Pode vender.

O ato é anulável.

O responsável tem que ratificar, pois não é um ato perfeito.

ABSOLUTAMENTE INCAPAZ

O ato é anulável.

Trata-se de exceção da regra de que "o nulo não convalece jamais" (Orlando Gomes)

Regra: a nulidade absoluta não convalece.

 

ELEMENTOS SECUNDÁRIOS OU NATURAIS

Ao lado dos elementos essenciais existem elementos secundários que se presumem existentes na compra e venda:

1. DEVERES DECORRENTES DA LEI

VÍCIOS

Art. 492. Até o momento da tradição, os riscos da coisa correm por conta do vendedor, e os do preço por conta do comprador.

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§ 1o Todavia, os casos fortuitos, ocorrentes no ato de contar, marcar ou assinalar coisas, que comumente se recebem, contando, pesando, medindo ou assinalando, e que já tiverem sido postas à disposição do comprador, correrão por conta deste.

§ 2o Correrão também por conta do comprador os riscos das referidas coisas, se estiver em mora de as receber, quando postas à sua disposição no tempo, lugar e pelo modo ajustados.

VÍCIO REDIBITÓRIO

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

EVICÇÃO

Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.

A doação pura é um contrato gratuito e, portanto, não é possível aplicar o instituto da evicção. Já na doação com encargo, é possível.

O art. 442 fala do ato de REDIBIR (rescindir), ou seja, da AÇÃO REDIBITÓRIA.

Art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441), pode o adquirente reclamar abatimento no preço.

O comprador pode reclamar abatimento através da AÇÃO ESTIMATÓRIA ou quanti minoris.

A AÇÃO REDIBITÓRIA e a AÇÃO ESTIMATÓRIA são as duas espécies do gênero AÇÃO EDILÍCIA.

1. CORREM POR CONTA DO COMPRADOR AS DESPESAS DE ESCRITURA, E POR CONTA DO VENDEDOR AS DE TRADIÇÃO:

Art. 490. Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da tradição.

O vendedor é o responsável pelas certidões negativas (despesas da tradição).

O imposto de transmissão inter vivos (ITBI) deve ser pago pelo comprador.

A venda à vista é realizada mediante o pagamento do preço, não sendo o vendedor obrigado a entregar a coisa antes de receber o preço, nos termos do art. 491:

Art. 491. Não sendo a venda a crédito, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa antes de receber o preço.

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Os ascendentes não podem vender ao descendente sem que os outros descendentes expressamente consintam (art. 496):

Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.

Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória.

Isto de destina a evitar quaisquer fraudes.

Numa sucessão, metade do patrimônio pertence à meeira, caso o casamento tenha sido realizado em comunhão de bens. 50% da outra metade constituem a legítima e os outros 50% constituem a parte que o testador pode dispor como quiser.

 

MODALIDADES ESPECIAIS DE VENDA

Dentre as vendas imobiliárias, a mais importante distinção se faz entre a venda ad corpus e a venda ad mensuram.

 

VENDA AD CORPUS

Se faz sem determinação da área do imóvel ou estipulação do preço por medida de extensão. O bem é vendido como corpo certo, individualizado por suas características e confrontações, e também por sua denominação, quando for rural. A referência à dimensão não descaracteriza a venda ad corpus se não tem a função de condicionar o preço.

 

VENDA AD MENSURAM

Na venda ad mensuram a determinação da área do imóvel constitui elemento determinante da fixação do preço. A área é expressamente condição do preço quando este se estipula por medida de extensão (quando, por exemplo, alguém compra um terreno à razão de "x" Reais por metro quadrado).

Observação:

Se a venda for ad corpus, o comprador não tem pretensão alguma quando as dimensões do imóvel forem inferiores às que se pactuou, ou seja, só se pode pedir a complementação da área (ação ex empto), a resolução do contrato (ação redibitória) ou o abatimento do preço (ação estimatória ou quant minores) quando a venda for ad mensuram.

 

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RETROVENDA

Encontra-se normatizada nos artigos 505 a 508:

Art. 505. O vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo máximo de decadência de três anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias.

Art. 506. Se o comprador se recusar a receber as quantias a que faz jus, o vendedor, para exercer o direito de resgate, as depositará judicialmente.

Parágrafo único. Verificada a insuficiência do depósito judicial, não será o vendedor restituído no domínio da coisa, até e enquanto não for integralmente pago o comprador.

Art. 507. O direito de retrato, que é cessível e transmissível a herdeiros e legatários, poderá ser exercido contra o terceiro adquirente.

Art. 508. Se a duas ou mais pessoas couber o direito de retrato sobre o mesmo imóvel, e só uma o exercer, poderá o comprador intimar as outras para nele acordarem, prevalecendo o pacto em favor de quem haja efetuado o depósito, contanto que seja integral.

A retrovenda só se aplica aos imóveis, e pode ser exercida durante um prazo de caducidade de, no máximo, 3 anos, a partir da data da venda, conforme dispõe o art. 505. Tem efeitos reais, valendo contra terceiros. Verdadeira cláusula resolutória da propriedade, extingue todos os direitos de terceiros posteriores à alienação primitiva.

A retrovenda tem sido utilizada para a garantia de direitos, substituindo a hipoteca e permitindo ao credor, na hipótese de não pagamento do devedor, de ficar com o imóvel dado em garantia, sem necessidade de que o bem seja vendido em hasta pública, fazendo com que prevaleça uma espécie de pacto comissório, proibido pelo nosso Direito no tocante à garantia hipotecária (art. 1428):

Art. 1.428. É nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento.

Parágrafo único. Após o vencimento, poderá o devedor dar a coisa em pagamento da dívida.

É uma propriedade resolúvel, sujeita a condição ou a termo resolutivos. Trata-se de uma propriedade temporária. Os tribunais de justiça passaram a entender como nulo o pacto de retrovenda com a finalidade usurária.

 

PREEMPÇÃO OU PREFERÊNCIA (artigos 513 a 520)

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É uma faculdade pessoal que se assegura ao vendedor para readquirir a coisa vendida em igualdade de condições com o terceiro comprador, na hipótese de revenda do bem.

É aplicável tanto aos bens móveis como aos bens imóveis, importando na criação de um direito obrigacional que se resolve em perdas e danos, e não num direito real, como ocorre na retrovenda.

O direito de preferência é intransferível.

Se a alienação ocorrer sem o conhecimento do titular do direito de preferência ou, se dada a ciência, o titular da preferência declarar que pretende usar o seu direito e a venda for realizada em favor de terceiro, poderá exigir a coisa do terceiro que a houver adquirido, nos termos do art. 504, ou reclamar a indenização correspondente por parte do alienante.

Maria faleceu, deixando João, seu marido (meeiro) e três filhos.

Seu patrimônio incluía um imóvel avaliado em R$ 300.000,00.

Um dos filhos queria comprar este imóvel e seu pai, inventariante, requereu alvará judicial para a venda do mesmo.

Ocorre que foi feita uma escritura com o valor de R$ 50.000,00, o que prejudicaria os demais herdeiros no momento da partilha.

Foi feita, então, uma escritura de retificação, no valor de R$ 300.000,00.

 

LEI 6899 (Processo Civil)

Determina a aplicação de correção monetária.

Se alguém entrar com ação e não requerer os juros e a correção monetária, o pedido estará implícito, nos termos da lei.

 

A preferência tem sido assegurada ao locatário conforme dispõe o art. 33 da Lei 8245/91.

 

PACTO COMISSÓRIO

Encontra-se normalizado no art. 1166 do Código Civil de 1916.

É a cláusula resolutiva incluída numa compra e venda a prazo, pela qual se faculta ao vendedor resolver o contrato se o comprador não pagar o preço até certa data.

Orlando Gomes assevera que a cláusula está subentendida em todos os contratos bilaterais (condição resolutiva tácita), tornando-se desnecessário mencioná-la expressamente (contudo, não há inconveniente em explicitá-la).

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Esta cláusula, no entanto, é vedada em casos de hipoteca, penhor e anticrese.

A estipulação do pacto comissório não afasta a intervenção judicial para a resolução do contrato (é necessário entrar com uma ação).

Desfeita a venda, volta o bem ao patrimônio do vendedor.

 

VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO

O Código Civil de 1916 não normalizava esta hipótese, mas o Código Civil vigente o faz, nos termos dos artigos 521 a 528:

Art. 521. Na venda de coisa móvel, pode o vendedor reservar para si a propriedade, até que o preço esteja integralmente pago.

Art. 522. A cláusula de reserva de domínio será estipulada por escrito e depende de registro no domicílio do comprador para valer contra terceiros.

Art. 523. Não pode ser objeto de venda com reserva de domínio a coisa insuscetível de caracterização perfeita, para estremá-la de outras congêneres. Na dúvida, decide-se a favor do terceiro adquirente de boa-fé.

Art. 524. A transferência de propriedade ao comprador dá-se no momento em que o preço esteja integralmente pago. Todavia, pelos riscos da coisa responde o comprador, a partir de quando lhe foi entregue.

Art. 525. O vendedor somente poderá executar a cláusula de reserva de domínio após constituir o comprador em mora, mediante protesto do título ou interpelação judicial.

Art. 526. Verificada a mora do comprador, poderá o vendedor mover contra ele a competente ação de cobrança das prestações vencidas e vincendas e o mais que lhe for devido; ou poderá recuperar a posse da coisa vendida.

Art. 527. Na segunda hipótese do artigo antecedente, é facultado ao vendedor reter as prestações pagas até o necessário para cobrir a depreciação da coisa, as despesas feitas e o mais que de direito lhe for devido. O excedente será devolvido ao comprador; e o que faltar lhe será cobrado, tudo na forma da lei processual.

Art. 528. Se o vendedor receber o pagamento à vista, ou, posteriormente, mediante financiamento de instituição do mercado de capitais, a esta caberá exercer os direitos e ações decorrentes do contrato, a benefício de qualquer outro. A operação financeira e a respectiva ciência do comprador constarão do registro do contrato.

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Consiste na cláusula inserida na compra e venda a crédito de objetos individuados ou infungíveis, pela qual o comprador, não obstante tenha a posse da coisa comprada, só adquire a proipriedade após integralizar o pagamento do preço, geralmente dividido em prestações.

A coisa deve ser inconfundível para ser passível de busca e apreensão, se não se realizar o pagamento.

Normalmente, são objetos do contrato eletrodomésticos, automóveis e outros bens individualizados.

O vendedor prossegue sendo o proprietário da coisa até a solução do preço. Já o comprador permanece na posse da coisa na condição de depositário, tendo direito a uso e gozo da coisa.

O contrato deve ser registrado no Registro de Títulos e Documentos para surtir efeitos em relação a terceiros.

Diz o art. 129 da Lei 6015/73 (Lei de Registros Públicos):

Art. 129. À margem dos respectivos registros, serão averbadas quaisquer ocorrências que os alterem, quer em relação às obrigações, quer em atinência às pessoas que nos atos figurarem, inclusive quanto à prorrogação dos prazos.

O instituto da venda com reserva de domínio perdeu muito com a introdução em nosso Ordenamento Jurídico do instituto da alienação fiduciária em garantia, que se revelou mais eficaz na proteção do credor.

 

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA

O compromisso de compra e venda, também chamado de promessa de compra e venda, é um contrato preliminar, ou pré-contrato, que tem por fim a celebração de uma escritura de compra e venda.

 

PROMESSA UNILATERAL DE VENDA (opção)

É aquela em que uma das partes, que pretende alienar, se obriga a aguardar a resposta de um pretendente.

Tilico pretende adquirir um imóvel com financiamento, devendo levar um compromisso escrito do proprietário de que o mesmo irá vender o imóvel tão logo seja aprovado o financiamento, num prazo fixado.

 

PROMESSA DE COMPRA E VENDA BILATERAL

Ocorre quando uma das partes se obriga a vender e, a outra, a comprar determinado bem, cujo preço, na maioria das vezes, é pago parceladamente (em prestações).

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Satisfeitos os deveres das partes (documentação do alienante – e do adquirente – e preço pago pelo adquirente), assina-se a escritura de compra e venda, impropriamente chamada por alguns de escritura definitiva.

 

AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA

É possível quando o vendedor não quer assinar a escritura de compra e venda. Neste caso, a sentença do juiz corresponde a uma escritura. O comprador, no entanto, tem que provar que pagou o preço.

 

Se o bem for comprado à vista, poderá ser lavrada promessa de compra e venda em vez da escritura de compra e venda?

Poderá ser feita uma promessa de compra e venda com quitação de preço, e o vendedor pode outorgar procuração para três pessoas de confiança do comprador, que então assinarão a escritura de compra e venda. É necessário registrar a promessa de compra e venda, para que surja o direito real.

Geralmente este fato ocorre quando o comprador não dispõe ainda do valor necessário para o pagamento do imposto de transmissão.

 

 

Doação

A doação encontra-se normalizada no art. 538.

Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.

Toda liberalidade pressupõe gratuidade, e a doação se caracteriza por ser a título gratuito (diferentemente da compra e venda, que é a título oneroso).

A doação é um contrato em que uma pessoa transfere para outra bens do seu patrimônio, a título gratuito, onde o donatário os aceita. O donatário pode aceitar tácita ou expressamente. O donatário aceita tacitamente quando o doador estipula um prazo; neste caso, findo o prazo sem que o donatário tenha se manifestado, entende-se que ele aceitou a doação tacitamente.

A doação é sempre inter vivos e, em relação aos bens imóveis, é necessário o pagamento do imposto de transmissão.

 

ELEMENTOS DA DOAÇÃO

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a. ELEMENTO SUBJETIVO

É a vontade de doar.

b. ELEMENTO OBJETIVO

Consiste na diminuição do patrimônio do doador.

 

CARACTERÍSTICAS DA DOAÇÃO

Em regra, a doação é:

a. GRATUITA (é um contrato gratuito), pois constitui uma liberalidade, não sendo imposto qualquer ônus ou encargo ao beneficiário. No entanto, o contrato será oneroso se houver tal imposição.

b. UNILATERAL, pois cria obrigações para somente uma das partes (o doador). Será bilateral quando for MODAL ou COM ENCARGO.

c. CONSENSUAL, pois se aperfeiçoa com o acordo de vontades entre doador e donatário, independentemente da entrega da coisa. A exceção é a doação verbal de bens móveis de pequeno valor:

Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.

Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.

A regra, nos contratos, é a consensualidade. Portanto, para que os contratos se aperfeiçoem, não há necessidade da entrega da coisa. Basta que haja um acordo de vontades (manifestação de vontade). Mas há exceções quanto a isto. É o caso do comodato, do mútuo e do depósito. No caso da doação de bens móveis de pequeno valor, para que este contrato se aperfeiçoe é necessária a entrega da coisa (contrato real).

d. SOLENE (em geral, a lei impõe a forma escrita)

É necessário realizar uma interpretação sistemática dos artigos 541 e 108:

Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.

Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

De acordo com esta interpretação, entende-se que o art. 541 se refere aos bens móveis, pois o art. 108 refere-se aos bens imóveis.

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Portanto, no caso, por exemplo, da doação de um bem que vale R$ 100.000,00, será necessário o instrumento público. Se ela for feita através de instrumento particular, ao ser levada para registro, o oficial rejeitará. Se o vendedor negar o instrumento público, surgirá para ele uma obrigação de fazer – obrigação de que seja lavrada outra escritura, por instrumento público.

Se a escritura adequada não há como levar a registro.

Se o imóvel é financiado, é lavrada a promessa de compra e venda. Ao final do pagamento, o vendedor terá que assinar a escritura, e o comprador pode exigir o cumprimento da obrigação de fazer, por parte do vendedor. Se o juiz prolatar uma sentença, esta equivale à escritura e, portanto, pode ser levada a registro.

 

PROMESSA DE DOAÇÃO

Se, por exemplo, um pai promete doar para seu filho (e há testemunhas disto) e, afinal, ele não cumpre com a sua promessa, estaremos diante de uma matéria controvertida.

Há argumentos no sentido de que é inerente à doação o ânimo de liberalidade. Desta forma, não haveria como o promissário exigir do prometente o cumprimento da promessa.

No entanto, uma segunda corrente admite a utilização de perdas e danos (esta corrente, porém, é minoritária).

É muito comum nas separações consensuais a destinação, pelo casal, do único imóvel aos filhos.

O STF já decidiu que a promessa de doação aos filhos do casal em acordo de separação judicial, com a devida ratificação, não pode ser unilateralmente retratada por um dos cônjuges.

A separação judicial consensual, na qual os cônjuges podem constituir um único advogado, ou dois – um para cada um. É elaborada uma petição com cláusulas: com quem ficará a guarda dos filhos (e se será compartilhada), a questão dos alimentos, do nome do cônjuge mulher, etc. O juiz é obrigado a marcar uma audiência de conciliação (ele não pode homologar a separação, pois cabe ao Estado-juiz tentar preservar a família).

O juiz só poderá homologar a separação quando perceber que o casal não tem condições de viver junto.

Tem que ser feita uma ratificação das cláusulas pelas partes, perante o juiz, sob pena de nulidade. Na ratificação, as duas partes precisam afirmar que concordam com o que está na petição.

 

ACEITAÇÃO DA DOAÇÃO

É imprescindível, podendo ser expressa ou tácita, nos termos do art. 539:

Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro

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dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo.

A aceitação tácita só vale no caso da doação pura (neste caso, se o promissário se mantiver calado, subentende-se que ele aceitou). Se a doação for com encargo, a aceitação terá que ser expressa.

Só será possível a forma de aceitação tácita (caso em que o silêncio vale como manifestação de vontade) se o donatário tiver conhecimento do prazo assinalado, e ocorrendo nas doações puras.

O art. 542 dispõe sobre a doação ao nascituro:

Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.

A doação ao nascituro submete-se à condição suspensiva de seu nascimento com vida. Se não ocorrer, caduca a liberalidade. Se, no entanto, ele nasce e vem a morrer algum tempo depois, abre-se o processo sucessório (o bem doado vai para os seus ascendentes).

Com relação à aceitação antes do Código Civil vigente, existiam duas correntes:

1. Uma delas entendia que somente os menores púberes poderiam aceitar2. E outra entendia que todos poderiam aceitar, pois havia falta de limitação na lei (esta era a decisão do

STJ).

O dispositivo do Código Civil de 1916 que dispunha sobre esta questão era o art. 1170.

No Código Civil vigente esta questão está disposta no art. 543:

Art. 543. Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura.

Se o donatário for relativamente incapaz, há necessidade de aceitação. Sendo absolutamente incapaz, não existe esta necessidade.

A tendência jurisprudencial, por sua vez, é no sentido de que não há mais necessidade.

Na doação de pai a filho menor ou na doação com imposição de ônus (reserva de usufruto), exige-se a nomeação de curador especial para a aceitação, conforme dispõe o art. 1692 (o pai não pode ser, ao mesmo tempo, doador e representante – neste caso, configura-se uma colisão de interesses).

Art. 1.692. Sempre que no exercício do poder familiar colidir o interesse dos pais com o do filho, a requerimento deste ou do Ministério Público o juiz lhe dará curador especial.

O pai e o Ministério Público são partes legítimas para requerer o suprimento judicial.

O falecimento do doador antes de ser aceita a doação acarreta a resolução, pois a doação, para se aperfeiçoar, é essencial que ocorra a aceitação (não havendo, o ato é nulo).

 

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ESPÉCIES DE DOAÇÃO

A doação pode ser:

PURA OU TÍPICA – Sem qualquer restrição COM ENCARGO, MODAL OU ONEROSA – Com restrição

O encargo pode ser em benefício do doador, de terceiro ou no interesse geral. Exemplo: a doação de um imóvel para a construção de uma escola, um hospital, uma creche, etc (interesse geral).

Pode ser estipulado um prazo, findo o qual se encontra o donatário em mora ou, se não foi assinado, por ser nela constituído (mora ex persona – se não há prazo, ele pode ser constituído em mora através de uma notificação).

Quando o contrato não tem prazo para ser cumprido (contrato por prazo indeterminado), é necessário que o devedor seja notificado, dando-lhe um prazo razoável. Se este não for cumprido, ele fica inadimplente (em mora).

Com prazo – Interpelação tácita Sem prazo – Interpelação expressa

Se o encargo é de interesse geral, o Ministério Público detém legitimidade para exigir o seu cumprimento após a morte do doador, conforme dispõe o parágrafo único do art. 553.

Art. 553. O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral.

Parágrafo único. Se desta última espécie for o encargo, o Ministério Público poderá exigir sua execução, depois da morte do doador, se este não tiver feito.

A doação com reserva de usufruto não é onerosa, muito embora a propriedade deixe de ser plena. Logo, a mesma é pura.

Na doação remuneratória, visa-se a recompensa de serviços ou favores prestados ao doador (nesta parte, ela eqüivale a pagamento, constituindo liberalidade no excesso). É o caso, por exemplo, de um médico que presta serviços e não cobra, quando então o doador lhe faz uma doação pelos serviços prestados.

A doação de ascendente a descendente está sujeita a colação no inventário do primeiro (art. 2002), com exceção da doação remuneratória, mesmo quando o serviço tenha sido prestado em cumprimento do dever filial (art. 2011)..

Art. 2.002. Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação.

Parágrafo único. Para cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos será computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível.

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Art. 2.011. As doações remuneratórias de serviços feitos ao ascendente também não estão sujeitas a colação.

O fato da doação sujeitar-se a colação no inventário do doador se destina a evitar que um herdeiro seja prejudicado. O doador só pode doar a sua parte disponível.

Metade do patrimônio do doador (cônjuge varão), sendo ele casado em regime de comunhão universal de bens, pertence à meeira (cônjuge mulher). 50% do patrimônio restante é a parte legítima (será dividida entre os herdeiros necessários). Os outros 50% são a parte disponível (que ele pode doar para quem quiser, exceto para amante, sendo ele casado).

Se o doador tem apenas um herdeiro necessário, não haverá necessidade de colação.

A doação pode ser celebrada com cláusula de reversão, e terá lugar em se verificando a condição resolutiva (morte do donatário), conforme o art. 547.

Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário.

Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.

O CPC não disciplina procedimento para o doador obter a reversão. Há os que entendem que basta ser apresentada a certidão de óbito do donatário ao oficial do cartório do Registro Geral de Imóveis, para que seja feita a averbação. O oficial receberá o óbito, e encaminhará ao juiz (para que haja uma decisão judicial). Note que não se tributa a reversão.

A doação aos filhos eqüivale a uma antecipação da sua legítima. É possível a dispensa da colação se a doação for de bem que integre a metade disponível do doador (art. 2005).

A colação serve para igualar a legítima (para não prejudicar os demais herdeiros necessários).

É possível a dispensa da colação se a doação for de bens que integram a metade disponível do credor (arts. 2005, 2006 e 1847).

Art. 2.005. São dispensadas da colação as doações que o doador determinar saiam da parte disponível, contanto que não a excedam, computado o seu valor ao tempo da doação.

Parágrafo único. Presume-se imputada na parte disponível a liberalidade feita a descendente que, ao tempo do ato, não seria chamado à sucessão na qualidade de herdeiro necessário.

Art. 2.006. A dispensa da colação pode ser outorgada pelo doador em testamento, ou no próprio título de liberalidade.

Art. 1.847. Calcula-se a legítima sobre o valor dos bens existentes na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas do funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos a colação.

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Os bens, ao serem submetidos à colação, devem ter seus valores ajustados à época da sucessão (art. 1014, parágrafo único, do CPC).

É nula a doação de todos os bens, sem reserva de partes.

A doação de bens em detrimento de credores enseja a sua revogação, por via de ação pauliana.

A ação pauliana ou revogatória é utilizada em casos de fraude contra credores.

É o caso, por exemplo, de um devedor que não quer pagar. Se o que garante o pagamento da dívida é o patrimônio do devedor (art. 591), se ele fizer uma doação do seu patrimônio para um herdeiro, se caracteriza uma fraude.

O credor pode então ajuizar ação pauliana para anular o negócio jurídico.

No pólo passivo deverão constar o devedor e o terceiro que recebeu o bem em doação.

Ao final, aquele bem retorna ao patrimônio do devedor, e o credor pode executá-lo.

É nula a doação inoficiosa na parte em que exceder a de que podia o devedor dispor. Importa em que se reduza às justas proporções da legítima (art. 1967).

Art. 1.967. As disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ão aos limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos seguintes.

§ 1o Em se verificando excederem as disposições testamentárias a porção disponível, serão proporcionalmente reduzidas as quotas do herdeiro ou herdeiros instituídos, até onde baste, e, não bastando, também os legados, na proporção do seu valor.

§ 2o Se o testador, prevenindo o caso, dispuser que se inteirem, de preferência, certos herdeiros e legatários, a redução far-se-á nos outros quinhões ou legados, observando-se a seu respeito a ordem estabelecida no parágrafo antecedente.

Um indivíduo tem um patrimônio de 300.000 e dois filhos.

Metade do seu patrimônio é a legítima (pertence aos herdeiros necessários). Os outros 50% são a parte disponível, que ele pode doar para quem quiser, exceto para a amante, sendo ele casado.

Se ele doa a um dos herdeiros mais de 50% do seu patrimônio (ultrapassa e alcança a legítima), esta doação é INOFICIOSA.

No caso da morte do indivíduo, o herdeiro que recebeu a mais tem que trazer para o inventário, para acertar com os demais herdeiros (trazer à colação).

A colação se destina a igualar a legítima (seu valor é corrigido desde a época da doação).

Aprecia-se o excesso no momento da liberalidade, e não no momento da sucessão, porque pode ocorrer a redução do patrimônio doado, mediante seu empobrecimento subsequente.

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Os bens que excederem devem ser restituídos in natura ou por seu valor, se na primeira hipótese não for mais viável.

Um indivíduo, que possui um patrimônio de 300.000 e três filhos. doa bens para um de seus filhos no valor de 130.000 (correspondente a uma sala comercial). Nota-se que ele ultrapassou a legítima em 30.000. Este filho deverá trazer para o inventário a sala comercial ou o equivalente em dinheiro.

A doação do cônjuge adúltero a seu cúmplice é anulável pelo outro ou por seus herdeiros necessários, num prazo máximo de até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal, conforme preceitua o art. 550:

Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.

 

REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO

A revogação da doação encontra-se normalizada nos artigos 555 e seguintes do Código Civil vigente:

Art. 555. A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, ou por inexecução do encargo.

Art. 556. Não se pode renunciar antecipadamente o direito de revogar a liberalidade por ingratidão do donatário.

Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:

I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele;

II - se cometeu contra ele ofensa física;

III - se o injuriou gravemente ou o caluniou; (percebe-se que este dispositivo não atinge os casos de difamação)

IV - se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava.

Art. 558. Pode ocorrer também a revogação quando o ofendido, nos casos do artigo anterior, for o cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou irmão do doador. (DISPOSITIVO NOVO – Não existia no Código Civil de 1916)

Art. 559. A revogação por qualquer desses motivos deverá ser pleiteada dentro de um ano, a contar de quando chegue ao conhecimento do doador o fato que a autorizar, e de ter sido o donatário o seu autor.

Art. 560. O direito de revogar a doação não se transmite aos herdeiros do doador, nem prejudica os do donatário. Mas aqueles podem prosseguir na

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ação iniciada pelo doador, continuando-a contra os herdeiros do donatário, se este falecer depois de ajuizada a lide. (O direito de revogar a doação é, portanto, um DIREITO PERSONALÍSSIMO)

Art. 561. No caso de homicídio doloso do doador, a ação caberá aos seus herdeiros, exceto se aquele houver perdoado. (DISPOSITIVO NOVO – Não existia no Código Civil de 1916) (É o caso, por exemplo, de um indivíduo que doa antes de ser vítima do homicídio e, antes de morrer, perdoa o donatário)

Art. 562. A doação onerosa pode ser revogada por inexecução do encargo, se o donatário incorrer em mora. Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar judicialmente o donatário, assinando-lhe prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida. (É o caso, por exemplo, de um indivíduo que doa um terreno para alguém, para que este construa um hospital e, passados dois anos, ele não o faz; para constituir o donatário em mora, o doador o notifica, dando-lhe um prazo razoável; se o donatário, ainda assim, não realizar a obra, o doador poderá pedir a revogação da ação)

Art. 563. A revogação por ingratidão não prejudica os direitos adquiridos por terceiros, nem obriga o donatário a restituir os frutos percebidos antes da citação válida; mas sujeita-o a pagar os posteriores, e, quando não possa restituir em espécie as coisas doadas, a indenizá-la pelo meio termo do seu valor.

Art. 564. Não se revogam por ingratidão:

I - as doações puramente remuneratórias;

II - as oneradas com encargo já cumprido;

III - as que se fizerem em cumprimento de obrigação natural;

IV - as feitas para determinado casamento.

Só podem ser revogadas as doações puras. As onerosas só podem sê-lo em decorrência da inexecução do encargo, comprovada a mora do donatário.

A revogação reclama a propositura de uma ação no prazo de um ano, a contar da ciência do fato pelo doador (art. 559). A ação é personalíssima; os herdeiros do doador podem apenas prosseguir na ação que foi ajuizada.

João doa um terreno ao médico Pedro para que o mesmo edifique uma clínica geriátrica. Pedro não constrói no terreno doado a alegada clínica, e acaba vendendo o terreno. João, então, promove ação contra Pedro.

De acordo com o art. 1360, se o terreno foi vendido antes da propositura da ação, a venda é válida; neste caso, João só vai poder reaver o correspondente em dinheiro.

Art. 1.360. Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o possuidor, que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será considerado proprietário perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício

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houve a resolução, ação contra aquele cuja propriedade se resolveu para haver a própria coisa ou o seu valor.

Revogar é o poder em que o doador torna sem efeito a doação, recuperando a coisa doada em virtude do não cumprimento do encargo. O efeito é ex nunc (não retroage), ou seja, não afeta os atos praticados pelo donatário anteriormente. Assim, prevalecem as alienações praticadas pelo donatário. Neste caso, o doador, não podendo recuperar a coisa, tem direito de exigir do donatário ou de seus herdeiros a competente indenização.

Podem ser revogadas as doações pura e com encargo. A doação remuneratória não pode ser revogada.

O médico Pedro presta serviços durante muito tempo a João e este, em troca dos serviços prestados, lhe faz uma doação no valor de 70.000.

Se os serviços prestados representam 50.000, considera-se 20.000 como doação pura, e 50.000 como doação remuneratória.

Sendo revogada a doação pura, deve-se buscá-la no patrimônio do médico Pedro. Caso ele não possuam mais nenhum patrimônio, a execução ficará prejudicada.

 

Empréstimo

Abrange o COMODATO e o MÚTUO, nos quais se entrega uma coisa para uso e restituição.

 

COMODATO

É um contrato unilateral (somente uma das partes se obriga), a título gratuito, pelo qual alguém entrega a outrem coisa infungível, para ser usada temporariamente e, após, ser restituída.

Encontra-se regulamentado nos arts. 579 e seguintes:

Art. 579. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto.

 

CONTRATO DE

COMODATO

CONTRATO DE

COMPRA E VENDA

Gratuito Oneroso

Unilateral Bilateral ou sinalagmático

Real Consensual

 

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Em regra, o contrato se perfaz com o acordo de vontades, com exceção do COMODATO, do MÚTUO e do DEPÓSITO, que se perfazem com a entrega da coisa.

Não haverá comodato se o uso for cedido mediante compensação. É o caso, por exemplo, de um indivíduo que cede uma casa a título de comodato, em troca de uma vaga em um determinado colégio particular para o seu filho. Neste caso, trata-se de CONTRATO INOMINADO.

Contrato inominado é aquele que não está tipificado no Código Civil (mas que, no entanto, não pode violar a lei e os princípios).

RESERVA MENTAL

Ocorre, por exemplo, quando, desde o momento do contrato, uma das partes já pensa em não cumprir a sua obrigação.

No contrato de comodato poderá constar uma cláusula determinando que a pessoa não pagará nenhuma outra despesa (taxa de condomínio, etc). Se o contrato nada disser, a lei determina que esta obrigação é do comodatário.

O comodato acarreta para o comodatário a obrigação de restituir a coisa, permanecendo o comodante como o dono da mesma. Haverá esbúlio possessório a justificar ação de reintegração de posse se não houver a devolução do bem. Não é o caso de ação de despejo, pois não há relação locatícia.

MORA EX RE – Já existe um termo – Art. 397. MORA EX PERSONA – Tem que haver notificação, dando um prazo – Parágrafo único do art. 397.

Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.

Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação (notificação) judicial ou extrajudicial.

Um indivíduo cede um imóvel em comodato com prazo de 5 meses. Terminado este prazo, a pessoa não restitui o imóvel, e é constituído em mora. A ação que cabe neste caso é a de reintegração de posse, pois trata-se de esbúlio possessório.

Se o contrato for por prazo indeterminado, o comodante terá que notificar o comodatário (judicial ou extrajudicialmente). Se, findo o prazo estipulado na notificação, o comodatário não entregar a coisa, se caracteriza o esbúlio possessório.

 

MÚTUO

É o contrato pelo qual uma das partes transfere a coisa fungível a outra, obrigando-se esta a restituir-lhe coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade (arts. 586 e seguintes).

Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade.

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É um contrato real, pois se aperfeiçoa com a tradição.

No mútuo transfere-se o domínio da coisa para o mutuário, que pode inclusive aliená-lo. No comodato, o comodatário não pode alienar a coisa, sob pena de praticar crime de estelionato, nos termos do art. 171, §2º, I, do Código Penal.

 

CARACTERÍSTICAS DO MÚTUO

1. CONTRATO REAL2. GRATUITO, podendo tornar-se oneroso se houver contraprestação para o mutuário como, por exemplo,

o pagamento de juros (mútuo feneratício ou frutífero, que significa mútuo com juros).3. UNILATERAL (se oneroso, será bilateral, embora alguns autores entendam que, mesmo com o

pagamento de juros, o contrato continua sendo unilateral)4. TEMPORÁRIO5. Implica em TRANSLAÇÃO DO DOMÍNIO DA COISA PARA O MUTUÁRIO.

O mútuo recai em coisas fungíveis, e o seu objeto mais comum é o dinheiro.

A jurisprudência, a partir de 1965, começou a discutir sobre a validade dos juros contratados por instituições financeiras em bases superiores às fixadas pela Lei de Usura (Decreto 22626/33), tendo em vista que a legislação da reforma bancária (Lei 4595/64) atribuiu expressamente competência ao Conselho Monetário Nacional para limitar as faixas de juros (art. 4º, IX). Esta lei fez com que o STF entendesse que o art. 192 da CRFB/88 não se aplica às instituições financeiras, com a justificativa de que estas são limitadas pela reforma bancária.

É vedada a capitalização (juros sobre juros) dos juros (anatocismo).

 

Depósito

Importa na guarda temporária de um bem móvel pelo depositário até o momento em que o depositante o reclame (arts. 627 e seguintes).

Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame.

O depósito é um contrato real.

É um contrato intuito personae, que decorre da confiança que o depositário merece do depositante. Pode ser gratuito ou oneroso, unilateral ou bilateral.

No Direito Brasileiro, só se admite o depósito de bens móveis, embora consinta o depósito judicial ou seqüestro de bens imóveis (arts. 666 e 822 a 825).

O contrato de depósito implica na guarda temporária de móvel (infungível) pelo depositário, obrigando-se este à devolução do bem quando exigido pelo depositante.

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Já o depósito de coisas fungíveis equipara-se ao mútuo, conforme prevê o art. 645. O depósito de bens fungíveis é considerado depósito irregular, pois o depositante não pode exigir a devolução dos mesmos bens que entregou, mas sim de igual quantidade de unidades e da mesma qualidade.

 

ESPÉCIES DE DEPÓSITO

1. DEPÓSITO VOLUNTÁRIO OU CONVENCIONAL – Decorre da vontade das partes. Exige forma escrita (art. 646). Só se realiza o contrato com a entrega real da coisa depositada.

2. DEPÓSITO OBRIGATÓRIO – É o realizado em desempenho de obrigação legal (depósito legal – art. 1233) ou em virtude de calamidade pública (depósito miserável). Um exemplo de depósito legal é a entrega de um objeto achado na rua à uma autoridade (o indivíduo tem que fazê-lo, caso não consiga encontrar o dono do objeto). Um exemplo de depósito miserável são os casos de guerra, incêndio, inundação, revolução, quando os móveis das pessoas (que foram salvos da calamidade pública) vão para um depósito.

O depósito é regular quando se tratar de coisas infungíveis, e irregular quando se tratar de coisas fungíveis.

Sendo o contrato de depósito normalmente unilateral, só cria obrigações para o depositário, podendo ser bilateral quando o depositante remunera o depositário ou indeniza despesas por este feitas.

 

EXTINÇÃO DO CONTRATO E PRISÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL

O contrato se extingue:

1. Decurso do prazo.2. Pelo distrato.3. Pelo depósito judicial da coisa por parte do depositário, quando não puder continuar a guardá-la ou

quando suspeitar que se trata de coisa furtada ou roubada.4. Pelo perecimento da coisa.5. Pela morte do depositário.

Protegendo a confiança, que é o fundamento do contrato de depósito, a lei civil admite a prisão do depositário infiel como medida coercitiva a fim de obrigá-lo a devolver a coisa depositada (art. 652).

Art. 652. Seja o depósito voluntário ou necessário, o depositário que não o restituir quando exigido será compelido a fazê-lo mediante prisão não excedente a um ano, e ressarcir os prejuízos.

A CRFB/88 proíbe a prisão por dívida, mas reconhece a possibilidade de prisão do depositário infiel e do devedor de alimentos (art. 5º, LXVII).

O Pacto de São José da Costa Rica determina que não cabe prisão com relação a dívidas.

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Na alienação fiduciária (não pagamento de prestações), a instituição pode retomar o bem. Caso o bem não esteja mais com a pessoa, o juiz pode converter esta busca e apreensão em depósito, e pedir a prisão.

 

Mandato

Se o interessado na realização de um negócio jurídico não pode ou não quer praticá-lo tem a possibilidade de efetuá-lo por intermédio de outra pessoa. Neste caso, diz-se que há REPRESENTAÇÃO.

MANDATO é a relação contratual pela qual uma das partes se obriga a praticar por conta da outra um ou mais atos jurídicos (o contrato cria ocrigações).

A REPRESENTAÇÃO surge em virtude:

a. DISPOSIÇÕES LEGAIS – REPRESENTAÇÃO LEGAL DO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ – Para qualquer ato não é necessário mandato, contrato, outorga, procuração, etc.

b. DECISÕES JUDICIAIS – Nomeação do advogado dativo ou do defensor público.c. ACORDO DE VONTADE DAS PARTES – Representação convencional. A base do mandato decorre

de confiança entre os contratantes.

 

PARTES DO MANDATO

a. MANDANTE – Quem concede o mandato, investindo o mandatário de poderes para representá-lo.b. MANDATÁRIO – É aquele que passa a atuar na vida jurídica, em nome e por conta do mandante.

 

CARACTERÍSTICAS

1. CONSENSUAL – Não há necessidade de entrega da coisa (diferentemente do mútuo). Basta o acordo entre as partes.

2. NÃO SOLENE3. PRESUMIDAMENTE UNILATERAL E GRATUITO – Podendo, em convenção das partes, tornar-se

imperfeitamente BILATERAL E ONEROSO, quando tratar-se de ato profissional e houver remuneração.

O mandato só é admissível para os atos que não têm natureza personalíssima (não se pode conceder mandato para fazer testamento, por exemplo), embora se admita o mandato para, em nome do mandante, casar com pessoa determinada (art. 1542).

O mandato só passa a existir depois de aceito pelo mandatário. Não necessita ser explícito, podendo ser tácito, decorrendo do começo da execução do contrato.

A PROCURAÇÃO é o instrumento (é a forma) do mandato (art. 673, segunda parte).

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Todas as pessoas capazes podem outorgar mandato, inclusive os relativamente incapazes, que deverão ser assistidos.

São exemplos de casos em que o relativamente incapaz não precisa da intervenção do seu assistente:

Conflitos trabalhistas (CLT, art. 792) Faculdade de apresentar queixa crime (CPP, arts. 34 e 50) Requerer o registro de nascimento (Lei 6005, art. 50, §3º)

O analfabeto só pode conceder procuração por instrumento público (art. 215, §2º).

 

CLASSIFICAÇÃO

1. PODERES GERAIS – Referente a todos os negócios do mandante (só confere poderes de administração).

2. PODERES ESPECIAIS – É para um fim específico e determinado. Por exemplo: outorgar escritura do imóvel da rua "x", número "y", a determinada pessoa (CPC, art. 38).

3. CIVIL – Realizado entre não comerciantes, sem fim mercantil.4. COMERCIAL – Quando um comerciante confia a outrem a gestão de um ou mais negócios mercantis.

 

Numa separação consensual, pode-se renunciar ao direito de recorrer. Se isto acontecer, a sentença automaticamente transita em julgado.

 

PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA (art. 685)

Outorgada no interesse do mandatário, que fica isento de prestar constas, tem poderes amplos, equivalendo à venda ou cessão de direitos. É usada na cessão de títulos de clube e na alienação de bens imóveis. É um mandato irrevogável e subsiste após a morte do mandante (é uma exceção ao disposto no inciso II da Lei 682).

Exemplo:

Não podendo João realizar uma escritura pública de compra e venda de um imóvel, uma vez que não tinha numerário suficiente para pagar o ITBI, o vendedor lhe outorga uma procuração, nomeando-o seu procurador em causa própria, para vender determinado imóvel pelo preço "x", dizendo que o preço já foi pago.

A procuração é aparente pois, na realidade, o que se fez foi uma compra e venda. É necessária a existência dos três elementos: a coisa, o preço e o consenso (assim como na compra e venda).

Quando tem por objeto o bem imóvel, a procuração em causa própria exige a forma de escritura pública (arts. 108 e 215).

 

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POSTULAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA

Consiste na atuação do advogado que move ou se defende em juízo seu próprio interesse.

 

SUBSTABELECIMENTO

É o negócio unilateral derivado pelo qual o procurador transfere no todo ou em parte os poderes recebidos do outorgante.

Se divide em:

1. COM RESERVA – O procurador permanece cumulativamente (ele e o substabelecido).2. SEM RESERVA – Ele deixa de ser procurador e é substituído pelo substabelecido.

 

IMPLICAMENTOS NO SUBSTABELECIMENTO

1. QUANDO O OUTORGANTE PROÍBE – O procurador, ao substabelecer, responde até pelos prejuízos resultantes do caso fortuito, a menos que prove que sobreviriam ainda que não tivesse ocorrido o substabelecimento.

2. QUANDO A PROCURAÇÃO É OMISSA QUANTO AO SUBSTABELECIMENTO- O procurador continua responsável perante o outorgante, como se estivesse agindo pessoalmente. Alguns autores entendem que, neste caso, o procurador responde somente se o substabelecido proceder culposamente.

3. COM AUTORIZAÇÃO – O procurador só será responsável pelos atos do substabelecimento se este for pessoa notoriamente incapaz. Trata-se, neste caso, de culpa in eligendo, ou seja, culpa em eleger aquela pessoa.

 

EXTINÇÃO DO MANDATO (art. 682)

RENÚNCIA – É uma declaração unilateral de vontade do mandatário.

REVOGAÇÃO – É o ato unilateral do mandante, pelo qual rescinde. Pode ser expressa ou tácita, ocorrendo esta última quando o mandante nomeia novo mandatário (art. 687).

 

GESTÃO DE NEGÓCIOS

É o caso de atuação sem mandato, em que o gestor, sem autorização do dono da coisa, pratica atos em favor deste último, sem que exista um contrato entre as partes. A gestão se aproxima do mandato, mas depende, para que lhe sejam aplicáveis as normas sobre o mandato, da ratificação do dono, transformando-se em mandante e fazendo do gestor um mandatário (art. 861).

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Fiança

Ocorre FIANÇA quando alguém se obriga a pagar dívida alheia.

 

ELEMENTOS ESSENCIAIS

1. Existência de uma obrigação principal válida.2. Existência de uma obrigação acessória com caráter de garantia.

 

A garantia do pagamento de dívida, também denominada CAUÇÃO, pode ser:

a. REAL (direitos reais de garantia: hipoteca, penhor, anticrese)

A anticrese se dá quando o devedor tem um imóvel e o credor, para receber seu crédito utiliza os frutos deste imóvel. O imóvel abate a dívida.

b. PESSOAL (garantia fidejussória, ou fiança).

 

A FIANÇA se caracteriza pela fé depositada no fiador, explicando-se a denominação de caução fidejussória.

 

REAL – É inerente à coisa. Por exemplo: um sujeito empresta dinheiro e, como garantia, existe a hipoteca de um imóvel. Com o penhor ocorre o mesmo: o que garante o empréstimo é a jóia, o bem imóvel. Assim também se dá na anticrese, onde a garantia são os frutos do imóvel.

PESSOAL – A garantia é a pessoa. O que está em jogo é o nome da pessoa. São verificados os bens da pessoa, se ela tem o "nome limpo" (é bom pagador, idôneo). Mas o imóvel que a pessoa possui não garante nada (ele pode inclusive vendê-lo). A fiança é pessoal; é a confiança que o credor deposita no fiador.

No caso da hipoteca, o bem não pode ser alienado (a pessoa não pode dispor dele). Neste caso, obviamente, o credor tem mais garantia.

O bem de família é impenhorável.

A fiança (fidejussória) é pessoal (não é uma garantia real).

 

Trata-se de um contrato ACESSÓRIO, ou seja, decorre de seguir a obrigação do fiador o destino da obrigação principal, extinguindo-se e anulando-se com esta.

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É um contrato UNILATERAL, pois cria dever para o fiador em relação ao credor.

É um contrato GRATUITO, podendo se tornar oneroso quando o afiançado remunera o fiador pela fiança prestada (as fianças bancárias).

O STF e o STJ vêm entendendo ser nula a fiança prestada sem a outorga do outro cônjuge, se o fiador for casado. Trata-se da outorga uxória ou marital.

Antigamente só o marido assinava, ou vice-versa. Quando uma ação incidia sobre o bem do casal (para penhorá-lo), como havia meação (50%), o outro cônjuge tinha que entrar com embargos de terceiro.

Os analfabetos não podem prestar fiança, salvo tendo dado poderes especiais por instrumento público.

Trata-se de uma interpretação teleológica – com base no fim social ao qual a norma se destina. Se procura salvaguardar o analfabeto, para que não seja lesado (o que pode ocorrer devido ao fato da pessoa não saber ler).

 

ESPÉCIES DE FIANÇA

1. LEGAL

A própria lei fala. É uma imposição da lei (imposição legal).

Um exemplo é o art. 1745 ("mediante termo" significa caução – ele se responsabiliza).

Outro exemplo é o art. 1280 (caução pelo dano iminente).

2. JUDICIAL

Em geral, sendo exigida uma garantia de uma das partes no processo, a lei usa o termo de caução.

Um exemplo é o art. 835 do CPC.

Outro exemplo é o art. 799 do CPC. É o caso, por exemplo, de um sujeito que possui um título que será protestado (e vai negativá-lo no SPC). Ele pode entrar com processo cautelar pedindo ao juiz uma liminar, solicitando uma caução para garantir. Normalmente é assinada uma promissória, e esta é anexada aos autos. Ele terá então 30 dias para propor a ação principal.

3. CONVENCIONAL

Decorre da vontade das partes, manifestada por escrito, em contrato próprio ou no contrato principal, cujas obrigações se garante, também podendo constar de simples carta ou declaração na qual seja inequívoca a vontade do fiador de garantir pagamento de dívida alheia, não valendo como fiança as simples referências à idoneidade do devedor, cartas de recomendação ou aquela em que o terceiro promete fazer o melhor esforço para que o devedor pague a dívida.

 

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A FIANÇA é um contrato, enquanto que o AVAL é um título de crédito. Ambos são garantias.

 

Tornou-se tradicional todo contrato de locação estabelecer a responsabilidade do fiador. Assina-se, portanto, locação e fiança.

Mas nada impede que a fiança seja feita à parte do contrato de locação (um contrato de fiança separado do contrato principal).

 

A fiança não se presume, não admitindo-se interpretação extensiva. O fiador só responde pelas obrigações explicitamente assumidas.

A fiança pode ser estipulada sem o consentimento do devedor (art. 820).

 

ESTRUTURA DA FIANÇA

1. RELAÇÃO EXTERNA – Entre o fiador e o credor.2. RELAÇÃO INTERNA – Entre o fiador e o afiançado.

Na relação externa, o fiador pode opor ao credor os benefícios de ordem e de divisão, salvo convenção em contrário existente entre as partes ou se a fiança for solidária.

 

CONCEITO DE BENEFÍCIO DE ORDEM

É a possibilidade dada ao fiador de, até a contestação da lide, indicar bens do devedor livres e desembaraçados, existentes no município e suficientes para solver o débito, a fim de evitar a execução dos seus próprios bens (decorre da natureza subsidiária da responsabilidade do fiador), desaparecendo quando o fiador renuncia expressamente a este benefício ou se obriga como principal pagador e devedor solidário, ou ainda sendo o afiançado pessoa insolvente ou falida.

Geralmente quando o contrato de locação tem fiança e é elaborado pelo locador, é colocada cláusula através da qual o fiador renuncia aos benefícios de ordem e de divisão.

Pode haver vários fiadores para um único débito. No caso de pluralidade de fiadores, entende-se que são solidários, salvo se limitaram a responsabilidade de cada um ou convencionaram a divisão das responsabilidades. Nesta última hipótese admite-se que aleguem, em juízo, na defesa de seus direitos quanto ao credor, o benefício de divisão.

Pode haver mais de um fiador e o locador entrar com ação mandando citar somente um deles (apesar de não ter havido renúncia).

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Na relação interna, ou seja, o vínculo existente entre o fiador e o afiançado, admite-se a SUB-ROGAÇÃO do primeiro nos direitos do credor. O fiador, tendo pago o débito do devedor, sub-roga-se nos direitos do credor contra o afiançado, podendo obter não somente a devolução do que pagou, como ainda os juros do desembolso e a indenização em perdas e danos.

A lei diz que ela pode se sub-rogar, para que não haja enriquecimento sem causa. O fiador pode se sub-rogar porque é um terceiro interessado, e a lei fala que este se sub-roga automaticamente. É diferente do terceiro não interessado, o qual, para se sub-rogar, precisa que o credor expressamente transfira aquele crédito.

Se o afiançado não paga, o credor pode ajuizar ação de cobrança cumulada com despejo. Ele manda citar o afiançado e o fiador. O fiador, como garantidor, tem que pagar (senão o credor pode acionar os seus bens – o que garante uma dívida é o patrimônio. Se o fiador pagar, ele terá direito de se sub-rogar – nos próprios autos ele cobra do afiançado.

Na fiança por tempo ilimitado, admite-se que o fiador possa exonerar-se da fiança em qualquer tempo, mediante acordo ou sentença, continuando responsável pelo débito existente até a sua exoneração.

A sentença é proferida em ação declaratória de exoneração, não bastando para isentar de responsabilidade o fiador a simples notificação do credor (art. 835).

Há discussão na jurisprudência. Quando, na hora do contrato, existe cláusula dizendo que "se responsabiliza até a entrega das chaves".

O contrato é temporário, e não perpétuo. Tem que haver possibilidade de se desobrigar. O fiador não pode ser obrigado a sê-lo ad eternum.

A morte, por exemplo, extingue a fiança. Mas outro motivo justificável pode ser a idade do fiador, ou uma viagem. Neste caso, notifica-se o locador dizendo que não se tem mais como se responsabilizar. Se ele não resilidir (não houver resilição), ou seja, não haver ajuste amigável, pode-se entrar com declaratória de exoneração. O locador, então, vai notificar o locador para arrumar outro, sob pena de infringir o contrato.

A ação é de despejo por infringência contratual. A ação de despejo pode ser por:

Falta de pagamento Retomar (para uso próprio, para descendente ou para ascendente) Infringência contratual

Se a fiança tiver prazo, executa-se o mesmo processo (notificação, etc).

 

EXTINÇÃO DA FIANÇA

Como qualquer contrato, a fiança também é temporária, e deve um dia chegar ao fim (arts. 836 a 839).

 

VERBETE N° 214 DA SÚMULA DO STJ:

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O fiador, na locação, não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.

Trata-se de uma exoneração, que é uma forma indireta de resolução da obrigação (a forma direta é o cumprimento espontâneo da obrigação).

A este instituto se chama NOVAÇÃO OBJETIVA – cria-se uma nova obrigação, extinguindo-se a anterior.

O aditamento para aumento do aluguel tem que ter a concordância do fiador. Caso isto ocorra, podem se dar duas situações:

Extingue-se a obrigação O fiador só se exonera do excesso do valor

 

COTA CONCOMINIAL

É uma obrigação propter rem (obrigação híbrida) – parte real e parte obrigacional.

Ela decorre de um direito real.

Uma ação de cobrança terá que cobrar do proprietário (é inerente à coisa). Pouco importa se há contrato entre o proprietário e outra pessoa.

Numa promessa de compra e venda não registrada (não tem publicidade), a ação tem que ser movida contra o proprietário, e não contra o promitente comprador.

 

O art. 77, II do CPC permite o chamamento ao processo, na própria ação em que o fiador seja réu, dos outros fiadores, quando para a ação seja citado apenas um deles.

Pluralidade de fiadores – existe solidariedade.

O credor pode ajuizar contra todos ou contra um.

O fiador pode chamar ao processo os outros, para que seja dividida a responsabilidade.

O chamamento ao processo é para evitar um tratamento diferenciado uma injustiça).

O juiz vai então declarar na sentença as responsabilidades dos co-obrigados.

 

CLÁUSULAS GERAIS

O novo Código Civil possui muitas CLÁUSULAS GERAIS.

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Elas são normas orientadoras sob a forma de diretrizes dirigidas precipuamente ao juiz, vinculando-o ao mesmo tempo em que lhe dão liberdade para decidir (a norma não prevê a conseqüência – o juiz cria a solução).

Exemplos:

Art. 187 Art. 421 Art. 422 Art. 623 ("razoável") Art. 868 ("operações arriscadas")

 

Vantagem das Cláusulas Gerais

Deixa o sistema do Código Civil com mais mobilidade, abrandando a rigidez da norma.

 

Desvantagem das Cláusulas Gerais

Confere certo grau de incerteza, dada a possibilidade de o juiz criar a norma pela determinação dos conceitos. É dado demasiado poder ao juiz, e cada um tem um pensamento.

O juiz, quando se depara com um contrato onde se discute a função social do mesmo, deve preencher os claros para se entender o que seja "função social".

 

 

QUESTÕES

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1. 1.        Diferencie rescisão, resilição e resolução.

Rescisão – extinção do contrato em razão de possuir um vício em sua gênese, tal como a existência, nulidade (arts. 166 e 167) e anulabilidade (art. 171).

Resilição – extinção do contrato por vontade das partes ou pela vontade de uma delas somente. Pode ser unilateral (nos casos que a lei expressa ou implicitamente prever) ou bilateral (distrato).

Resolução – extinção do contrato em decorrência de evento superveniente posterior à realização do contrato. Tais motivos são o inadimplemento imputável ou voluntário, o inadimplemento inimputável ou involuntário e a onerosidade excessiva.

1. 2.        Na hipótese de nulidade ou anulação dos contratos, as partes serão reconduzidas ao status quo? Haverá direito a indenização pelas perdas e danos?

Na rescisão, tanto a nulidade quanto a anulabilidade produzem efeitos ex tunc, todos os efeitos do contrato são extintos desde a sua pactuação, retornando as partes ao status quo.

1. 3.        João da Silva tabulou contrato de transporte com a Coamo em que se obrigava a transportar, por prazo indeterminado, mercadorias de Toledo a Paranaguá. A Coamo exigiu que ele adquirisse 20 caminhoes novos para tal mister. Passado um mês do início da contratação, a Coamo notifica o transportador de que não tem intenção de continuar com o contrato e que o considera extinto a partir daquele dia. É lícita a conduta da Coamo? Que direitos tem o transportador neste caso? Fundamente.

Neste caso a conduta da Coamo é ilícita, por configurar abuso de direito (previsto no art. 473, parágrafo único) caso em que deveria ter havido um aviso prévio da Coamo, levando em conta os investimentos feitos pelo empregado, para, só após o término desse aviso prévio, poder extinguir o contrato. O transportador pode ingressar com ação judicial para requerer fixação de tal prazo pelo juiz, podendo reclamar indenização por perdas e danos.

1. 4.        André pactuou com Bernardo contrato de locação residencial pelo prazo de 30 meses. Pode o locador dar por extinto o contrato antes deste prazo? E o locatário?

O locador não pode dar por extinto o contrato, podendo o locatário faze-lo a qualquer tempo, segundo dispõe o art. 4º da Lei 8.245/91. É caso de resilição unilateral expressa.

1. 5.        A resolução tratada no art. 475 tem como pressuposto o inadimplemento. Parte da doutrina considera que somente o inadimplemento absoluto lhe dá ensejo. É correto esse entendimento? Justifique.

O entendimento de que se aplica ao art. 475 somente em casos de  inadimplemento absoluto não é correto, pois tal dispositivo dá uma faculdade para o lesado pelo inadimplemento, sem mencionar que seja absoluto ou relativo. Portanto, pode ser aplicado em inadimplemento relativo, devendo, porém, analisar-se se o inadimplemento é grave, considerável, para que o exercício do direito não seja abusivo.

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1. 6.        Qual o fundamento legal para a resolução do contrato em virtude do caso fortuito ou de força maior?

O fundamento legal para a resolução do contrato em virtude de caso fortuito ou força maior são os artigos 234, 238, 248 e 250.

1. 7.        O art. 479 diz que a resolução poderá ser evitada se o réu oferecer-se a modificar equitativamente as condições do contrato. processualmente falando, como que o réu realizará tal oferecimento?

A parte contrária pode, considerando que lhe é mais vantajoso, manter o contrato, oferecer-se para modificar equitativamente suas condições, restabelecendo o seu equilíbrio econômico.

1. 8.        Qual a diferença entre o acontecimento extraordinário descrito no art. 478 do caso fortuito ou de força maior descrito no art. 393?

Embora a onerosidade excessiva se assemelhe ao caso fortuito ou de força maior, visto que em ambos os casos o evento futuro e incerto acarreta a exoneração do cumprimento da obrigação, diferem pela circunstância de que o caso fortuito ou força maior impede, de forma absoluta, a execução do contrato, enquanto a onerosidade excessiva determina apenas uma dificuldade, não exigindo para a sua aplicação, a impossibilidade absoluta, mas a excessiva onerosidade, admitindo que a resolução seja evitada se a outra parte se oferecer para modificar equitativamente as condições do contrato.

1. 9.        Estando presentes os requisitos do art. 478, o devedor tem o direito de pleitear a resolução do contrato por onerosidade excessiva. Se for reconhecido tal direito e decretado em sentença a resolução, o credor terá direito a exigir perdas e danos do devedor? Fundamente.

1. 10.      Num compromisso de compra e venda de imóvel a prestações, as partes pactuaram que o atraso no cumprimento de qualquer delas extinguia o contrato com o perdimento das parcelas já pagas. É válida tal cláusula? Fundamente.

1. 11.      A doação é um contrato real? Justifique.

A doação é um contrato real, vez que só se perfaz com a entrega das coisas doadas (art. 538). Enquanto não entregues as coisas, haverá apenas promessa de doação.

1. 12.      O que se entende por doação universal?

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Doação universal é aquela em que o doador doa todos os bens que possui, sem reservar qualquer parte para sua subsistência. É nula a doação universal na parte que exceder naquilo em que o doador não poderia ter disposto.

1. 13.      João doou um carneiro a Maria. Este animal encontrava-se infectado com um vírus que contaminou e dizimou todo o rebanho de Maria. Qual a responsabilidade de João no caso?

Em regra geral, o doador não está sujeito aos vícios redibitórios, porém, se houver agido com dolo, responderá pelas perdas e danos, segundo o art. 392.

1. 14.      Quais são as causas de revogação da doação?

A doação pode ser revogada por inexecução do encargo ou por ingratidão, nas hipóteses previstas no art. 557.

1. 15.      O que se entende por ingratidão do donatário?

Ao aceitar o benefício, o donatário assume, tacitamente, obrigação moral de ser grato ao benfeitor e de se abster da prática de atos que demonstrem ingratidão e desapreço. No entanto, as hipóteses de ingratidão que ensejam à revogação da doação encontram-se limitadas no art. 557, não sendo admitida nenhuma outra que ali não esteja prevista.