dicas e análise de uma redação nota 1000 no enem 2017

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DICAS E ANÁLISE DE UMA REDAÇÃO NOTA 1000 NO ENEM-2017 “Eu não me considero inteligente, não era uma aluna excelente, mas sempre me esforcei ao máximo”, conta a estudante Maria Beatriz, de 20 anos, de Ipatinga (MG), que conseguiu nota máxima na redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2017. Ela é uma das 53 estudantes em todo o Brasil que conquistou a nota. Escrever sempre foi uma das habilidades da jovem, que desde pequena já sonhava em cursar medicina. Sabendo que as vagas deste curso são muito concorridas, ela sempre foi estudiosa, como conta a mãe, Suzana Gonçalves. “Meu marido e eu nunca tivemos que mandá-la estudar, que cobrar nota, ela sempre foi dedicada. Já oramos e agradecemos, mas a ficha ainda nem caiu”. Apesar da facilidade com as letras, Maria Beatriz sabia que não seria fácil passar em medicina, motivo pelo qual continuou a ter aulas particulares com a professora de redação que lhe dava aula no Ensino Médio. Por semana, ela fazia três redações, sendo duas nas aulas particulares com a professora Gisele Aquino , e mais uma pelo cursinho, onde também realizava simulado semanal; foram três anos de cursinho. “Eu estudei em escola pública e por isso tinha muita defasagem, tinha que estudar muito. Depois consegui bolsa integral em uma escola particular e pude correr atrás e ganhar mais conhecimento. Já durante o cursinho eu me dediquei ao máximo. Toda semana eram três temas diferentes e além dos estudos tradicionais eu buscava ler muito, para conhecer diversos temas e ter argumentos, independente do tema que caísse na redação do Enem”, revela Maria Beatriz. Para alcançar a meta de ser médica, a jovem conta que abdicou de muitas coisas. Terminou um namoro e deixou a vida social em último plano. Mas ela não se arrepende e comemora o resultado obtido na prova. “Nos últimos dois anos eu havia tirado 940 na redação, mas não era suficiente para passar. Dessa vez, além da nota mil na redação, também fui melhor que eu esperava no restante da prova. Agora penso que vou conquistar minha vaga em medicina. Acredito que valeu à pena todo o esforço, porque se não for para viver em busca dos nossos sonhos, a gente vive em vão”, conclui. Apenas 53 no país Apenas 53 alunos tiraram nota mil na redação do Exame Nacional

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Page 1: Dicas e análise de uma redação nota 1000 no enem 2017

DICAS E ANÁLISE DE UMA REDAÇÃO NOTA 1000 NO ENEM-2017

“Eu não me considero inteligente, não era uma aluna excelente, mas sempre me esforcei ao máximo”, conta a estudante Maria Beatriz, de 20 anos, de Ipatinga (MG), que conseguiu nota máxima na redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2017. Ela é uma das 53 estudantes em todo o Brasil que conquistou a nota.

Escrever sempre foi uma das habilidades da jovem, que desde pequena já sonhava em cursar medicina. Sabendo que as vagas deste curso são muito concorridas, ela sempre foi estudiosa, como conta a mãe, Suzana Gonçalves. “Meu marido e eu nunca tivemos que mandá-la estudar, que cobrar nota, ela sempre foi dedicada. Já oramos e agradecemos, mas a ficha ainda nem caiu”.

Apesar da facilidade com as letras, Maria Beatriz sabia que não seria fácil passar em medicina, motivo pelo qual continuou a ter aulas particulares com a professora de redação que lhe dava aula no Ensino Médio. Por semana, ela fazia três redações, sendo duas nas aulas particulares com a professora Gisele Aquino, e mais uma pelo cursinho, onde também realizava simulado semanal; foram três anos de cursinho.

“Eu estudei em escola pública e por isso tinha muita defasagem, tinha que estudar muito. Depois consegui bolsa integral em uma escola particular e pude correr atrás e ganhar mais conhecimento. Já durante o cursinho eu me dediquei ao máximo. Toda semana eram três temas diferentes e além dos estudos tradicionais eu buscava ler muito, para conhecer diversos temas e ter argumentos, independente do tema que caísse na redação do Enem”, revela Maria Beatriz.

Para alcançar a meta de ser médica, a jovem conta que abdicou de muitas coisas. Terminou um namoro e deixou a vida social em último plano. Mas ela não se arrepende e comemora o resultado obtido na prova.

“Nos últimos dois anos eu havia tirado 940 na redação, mas não era suficiente para passar. Dessa vez, além da nota mil na redação, também fui melhor que eu esperava no restante da prova. Agora penso que vou conquistar minha vaga em medicina. Acredito que valeu à pena todo o esforço, porque se não for para viver em busca dos nossos sonhos, a gente vive em vão”, conclui.

Apenas 53 no país

Apenas 53 alunos tiraram nota mil na redação do Exame Nacional

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do Ensino Médio (Enem) de 2017, de acordo com o Ministério da Educação (MEC). O número representa uma queda no total, já que no ano anterior foram 77 notas máximas obtidas na prova.

O número de alunos com nota máxima na redação foi um dos dados apresentados pelo MEC nesta quinta-feira (18), data da liberação das notas do Enem 2017. Das 4,72 milhões de redações corrigidas, 309.157 tiveram notas zero. A fuga ao tema da prova foi o motivo para zerar a redação.

Apesar de haver menos “notas mil” em comparação com o Enem do ano anterior, em que 77 alunos tiraram a nota máxima na redação, o rendimento dos estudantes foi melhor. A nota média da redação passou de 541,9 para 558.

Fonte: https://g1.globo.com/mg/vales-mg/noticia/sempre-me-esforcei-ao-maximo-

diz-aluna-de-ipatinga-que-conquistou-nota-mil-na-redacao-do-enem.ghtml.

A REDAÇÃO NOTA 1000

Na obra “Eichmann em Jerusalém”, a filósofa Hannah Arendt desenvolve “as banalidades do mal”, termo que aponta a passividade das pessoas frente aos impasses que assolam a sociedade.De maneira análoga, o preconceito de parte significativa da população em relação aos surdos e à falta de preparo e de infraestrutura adequada na maioria das instituições de ensino para recebê-los enquadram-se nesse conceito filosófico, uma vez que se constituem como desafios para a formação educacional dos indivíduos portadores de surdez. Dessa forma, é necessário discutir os aspectos sociais e políticos inerentes à questão no Brasil, em prol da promoção do bem coletivo, proposto por Rousseau.

Em primeira análise, é valido ressaltar que a discriminação em relação às pessoas surdas ainda é latente no Brasil hodierno. Nesse contexto, não obstante a isonomia ser assegurada pelo quinto artigo da “Constituição Cidadã” — promulgada em 1988, no Governo de Sarney —, esse grupo continua marginalizado na contemporaneidade, posto que são alvos comuns de injúrias e de ações preconceituosas, a exemplo do bullying sofrido por crianças com deficiência auditiva nas escolas. Ademais, tal preconceito estende-se aos ambientes de trabalho, uma vez que muitas empresas deixam de contratar candidatos portadores de surdez, ainda que estes possuam a qualificação requerida. Essa realidade evidencia e ratifica o pensamento do historiador Maquiavel, de que os preconceitos têm raizes mais profundas que os princípios, posto que são persistentes ainda no século XXI e dificultam a consolidação de uma

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formação educacional de qualidade a essa parcela social.

Em segunda análise, infere-se que a falta de preparo dos professores e de uma infraestrutura adequada aos surdos são inegáveis. Nesse prisma, muitas escolas não possuem educadores preparados academicamente para instruir as pessoas portadoras de surdez, uma vez que estes devem ser auxiliados por meio de Libras durante todo o processo formacional. Além disso, poucas instituições têm infraestrutura adequada para fornecer a completa assistência aos alunos surdos, devido aos baixos investimentos governamentais quanto aos recursos necessários, o que prejudica a formação e a integração desses indivíduos futuramente no mercado de trabalho, o qual já apresenta pouca abertura para as pessoas portadoras de deficiência. Tal conjuntura enquadra-se no estado anômico de Durkheim, o qual caracteriza uma sociedade ausente de valores coletivos, logo, desorganizada, demonstrando a imprescindibilidade de politicas públicas mais efetivas quanto à educação dos surdos no Brasil.

Evidencia-se, portanto, a necessidade de que os desafios inerentes à formação educacional dos surdos sejam enfrentados com urgência no Brasil. Para isso, é substancial que o Ministério da Educação invista mais vultosamente na capacitação dos professores e na infraestrutura das instituições de ensino, por meio de cursos qualificativos para os educadores sobre técnicas didáticas voltadas aos alunos portadores de deficiência auditiva e pela melhoria dos recursos em sala — material didático e meios assistivos —, com o intuito de assegurar uma instrução educacional efetiva a essas pessoas. Outrossim, é mister que a escola, como potencial formadora opinativa, insira o ensino de Libras a todos os estudantes e realize palestras nas salas de aula sobre a importância da inclusão dos surdos com profissionais da área — psicólogos e sociólogos —, a fim de coibir o preconceito e formar futuros cidadãos mais inclusivos. Dessa maneira, o corpo-social tornar-se-á mais próximo do bem coletivo de Rousseau, mitigando, assim, “as banalidades do mal”, discorridas por Hannah Arendt.

ANÁLISE DA INTRODUÇÃO

a) tema: o preconceito de parte significativa da população em relação aos surdos e à falta de preparo e de infraestrutura adequada na maioria das instituições de ensino para recebê-los enquadram-se nesse conceito filosófico, uma vez que se constituem como desafios para a formação educacional dos indivíduos portadores de surdez.

b) tese [projeto de texto]: é necessário discutir os aspectos sociais e

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políticos inerentes à questão no Brasil.

c) contextualização: Na obra “Eichmann em Jerusalém”, a filósofa Hannah Arendt desenvolve “as banalidades do mal”, termo que aponta a passividade das pessoas frente aos impasses que assolam a sociedade.

d) articuladores: de maneira análoga [explicação]; uma vez que [causa]; dessa forma [conclusão, fechamento do parágrafo]; em prol da [finalidade].

ANÁLISE DO PRIMEIRO ARGUMENTO

a) frase 1: apresentação da ideia geral do parágrafo: Em primeira análise, é valido ressaltar que a discriminação em relação às pessoas surdas ainda é latente no Brasil hodierno.

b) frase 2: conexão do tema com conhecimento sociocultural [que funciona como prova concreta]: Nesse contexto, não obstante a isonomia ser assegurada pelo quinto artigo da “Constituição Cidadã” — promulgada em 1988, no Governo de Sarney —, esse grupo continua marginalizado na contemporaneidade, posto que são alvos comuns de injúrias e de ações preconceituosas, a exemplo do bullying sofrido por crianças com deficiência auditiva nas escolas.

c) frase 3: ampliação do tema + análise do tema pela técnica de causa: Ademais, tal preconceito estende-se aos ambientes de trabalho, uma vez que muitas empresas deixam de contratar candidatos portadores de surdez, ainda que estes possuam a qualificação requerida.

d) frase 4: ampliação do tema + conexão com conhecimento sociocultural [de caráter teórico] + análise do tema por meio da técnica de causa: Essa realidade evidencia e ratifica o pensamento do historiador Maquiavel, de que os preconceitos têm raizes mais profundas que os princípios, posto que são persistentes ainda no século XXI e dificultam a consolidação de uma formação educacional de qualidade a essa parcela social.

e) substantivos temáticos: discriminação, pessoas surdas, Brasil, isonomia, grupo, marginalizado, injúrias, ações preconceituosas, bullying, deficiência auditiva, escolas, preconceito, ambiente de trabalho, empresas, candidatos portadores de surdez, qualificação, realidade, preconceitos, formação educacional, parcela social.

f) modalizadores: é valido ressaltar, ainda, latente, hodierno, isonomia, continua marginalizado, alvos comuns, injúrias, ações preconceituosas, estende-se, deixam de contratar, qualificação, evidencia, ratifica, raízes

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mais profundas, persistentes, ainda, dificultam, consolidação, formação educacional de qualidade.

g) articuladores: Em primeira análise, Nesse contexto, não obstante, esse grupo, posto que, a exemplo do, Ademais, tal preconceito, uma vez que, ainda que, Essa realidade, posto que, ainda, e.

h) projeto de texto: injúrias, ações preconceituosas, bullying, ambiente de trabalho, deixam de contratar candidatos portadores de surdez;

ANÁLISE DO SEGUNDO ARGUMENTO

a) frase 1: apresentação da ideia geral do parágrafo: Em segunda análise, infere-se que a falta de preparo dos professores e de uma infraestrutura adequada aos surdos são inegáveis.

b) frase 2: análise do tema por intermédio da técnica de causa: Nesse prisma, muitas escolas não possuem educadores preparados academicamente para instruir as pessoas portadoras de surdez, uma vez que estes devem ser auxiliados por meio de Libras durante todo o processo formacional.

c) frase 3: ampliação do tema + análise do tema pelas técnicas de causa e de consequência: Além disso, poucas instituições têm infraestrutura adequada para fornecer a completa assistência aos alunos surdos, devido aos baixos investimentos governamentais quanto aos recursos necessários, o que prejudica a formação e a integração desses indivíduos futuramente no mercado de trabalho, o qual já apresenta pouca abertura para as pessoas portadoras de deficiência..

d) frase 4: ampliação do tema + conexão com conhecimento sociocultural [de caráter teórico]: Tal conjuntura enquadra-se no estado anômico de Durkheim, o qual caracteriza uma sociedade ausente de valores coletivos, logo, desorganizada, demonstrando a imprescindibilidade de politicas públicas mais efetivas quanto à educação dos surdos no Brasil.

e) substantivos temáticos: professores, surdos, escolas, educadores, academicamente, instruir, pessoas portadoras de surdez, Libras, processo formacional, instituições, infraestrutura, alunos surdos, governamentais, recursos, indivíduos, mercado de trabalho, pessoas portadoras de deficiência, sociedade, valores coletivos, políticas públicas, educação de surdos, Brasil.

f) modalizadores: infere-se, falta de preparo, adequada, inegáveis, preparados, auxiliados, poucas, adequada, completa, baixos,

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necessários, prejudica, formação, integração, futuramente, pouca, enquadra-se, ausente de valores coletivos, desorganizada, imprescindibilidade, mais efetivas.

g) articuladores: em segunda análise, nesse prisma, uma vez que, além disso, devido aos, quanto, o que, o qual, tal conjuntura, logo.

h) projeto de texto: falta de preparo dos professores, infraestrutura adequada aos surdos, muitas escolas não possuem educadores preparados academicamente;

ANÁLISE DA CONCLUSÃO

a) primeira proposta de intervenção: é substancial que o Ministério da Educação invista mais vultosamente na capacitação dos professores e na infraestrutura das instituições de ensino, por meio de cursos qualificativos para os educadores sobre técnicas didáticas voltadas aos alunos portadores de deficiência auditiva e pela melhoria dos recursos em sala-material didático e meios assistivos, com o intuito de assegurar uma instrução educacional efetiva a essas pessoas;

b) segunda proposta de intervenção: é mister que a escola, como potencial formadora opinativa, insira o ensino de Libras a todos os estudantes e realize palestras nas salas de aula sobre a importância da inclusão dos surdos com profissionais da área — psicólogos e sociólogos —, a fim de coibir o preconceito e formar futuros cidadãos mais inclusivos;

c) retomada do conhecimento sociocultural apresentado na introdução [funciona, tal qual as duas propostas, como fechamento do projeto de texto]: Dessa maneira, o corpo-social tornar-se-á mais próximo do bem coletivo de Rousseau, mitigando, assim, “as banalidades do mal”, discorridas por Hannah Arendt.

d) articuladores: portanto, para isso, por meio de, para, e, com o intuito de, outrossim, como, a fim de, dessa maneira, assim.

ANÁLISE DAS COMPETÊNCIAS

COMPETÊNCIA 01: brilhante domínio gramatical, evidenciado, entre outros, no elevado número de orações subordinadas [e de articuladores] dentro dos períodos que estruturam os parágrafos. Note-se que a candidata teve apenas um desvio [silepse de número, no primeiro parágrafo]; por isso, manteve-se primorosamente no nível 5!

COMPETÊNCIA 02: No primeiro parágrafo, estão evidenciados, de forma muito clara, o tema e a tese. Em seguida, foram articulados dois

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argumentos coerentes e consistentes. Por último, são solucionados os problemas debatidos no desenvolvimento. É pertinente destacar a presença de repertório sociocultural bastante diversificado: os cinco itens estão totalmente alinhados não só à argumentação, mas também ao projeto de texto.

COMPETÊNCIA 03: Brilhante execução do projeto de texto: os dois itens referidos na introdução foram competentemente retomados, debatidos, comprovados e analisados no desenvolvimento; por último, solucionaram-se os problemas. Merece destaque o fato de os dois itens da outra área do conhecimento apresentados no pórtico do texto terem sido retomados como fechamento da tese e do [projeto de] texto.

COMPETÊNCIA 04: A candidata demonstrou brilhante conhecimento de repertório coesivo para ligar as unidades semânticas e sintáticas.

COMPETÊNCIA 05: A candidata construiu duas propostas de intervenção: a primeira, com quatro elementos e com detalhamento; a segunda, com três elementos.