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A Peleja da Fundação Ignácio da Catingueira/Romano da Mãe D’água Dizem que esta seria a peleja fundadora de todas as pelejas. Nada ficou escrito pelos cantadores. Talvez sequer soubessem ler. Há fragmentos anotados aqui e acolá nos cordéis de outros cantadores. Inácio da Catingueira seria escravo. Romano da Mãe D’água, dito Romano Caluete, seria um pequeno proprietário rural, ambos paraibanos, e teriam travado esta peleja na feira da Vila de Patos, PB, em 1870. O poeta Luiz Nunes Alves fez esta unificação tomando por base os diversos fragmentos que correm na boca do povo, já registrados por Ugolino do Cabugi, Leandro Gomes de Matos, Leonardo Mota, Silvino Pirauá, Chagas Batista, Padre Manuel Otaviano, Rodrigues de Carvalho e Nestor Diógenes. Ignácio Romano Me tirem de um engano: Me apontem com o dedo Quem é Francisco Romano, Pois eu ando no seu piso Já não sei há quantos anos. Negro, me diga o seu nome Que eu quero ser sabedor, Se é solteiro ou casado, Aonde é morador, Se acaso for cativo, Diga quem é seu senhor. Eu sou muito conhecido, Aqui nesta ribeira, Este é o seu criado da Catingueira. Dentro da Vila de Patos, Compro, vendo e faço feira. Negro, vieste a Patos Procurando quem te forre Volta pra trás, meu negrinho Que aqui ninguém te socorre; E quem cai nas minhas unhas Apanha, deserta ou morre. Seu Romano, em vim a Patos Pela fama do senhor, Que me disseram que era Mestre e rei de cantador; E que dentro de um salão Tem discurso de doutor. Inaço, que andas fazendo Aqui nesta freguesia, Cadê o teu passaporte, A tua carta de guia Aonde tá teu sinhô Cadê a tua famia. Seu Romano, eu sou cativo, Trabalho para meu sinhô... Quando vou para uma festa Foi ele quem me mandou, E quando saio escondido Ele sabe pronde eu vou. Inaço, deixa-te disto, Não te possa acreditá Pois eu também tenho nego E só mando trabaiá... Como é que teu sinhô Vai te mandá vadiá? Inaço da Catinguera, Este aqui é seu Romano

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A Peleja da Fundao

A Peleja da FundaoIgncio da Catingueira/Romano da Me Dgua

Dizem que esta seria a peleja fundadora de todas as pelejas. Nada ficou escrito pelos cantadores. Talvez sequer soubessem ler.H fragmentos anotados aqui e acol nos cordis de outros cantadores. Incio da Catingueira seria escravo. Romano da Me Dgua, dito Romano Caluete, seria um pequeno proprietrio rural, ambos paraibanos, e teriam travado esta peleja na feira da Vila de Patos, PB, em 1870. O poeta Luiz Nunes Alves fez esta unificao tomando por base os diversos fragmentos que correm na boca do povo, j registrados por Ugolino do Cabugi, Leandro Gomes de Matos, Leonardo Mota, Silvino Pirau, Chagas Batista, Padre Manuel Otaviano, Rodrigues de Carvalho e Nestor Digenes.

IgncioRomano

Me tirem de um engano: Me apontem com o dedo Quem Francisco Romano, Pois eu ando no seu piso J no sei h quantos anos. Negro, me diga o seu nome Que eu quero ser sabedor, Se solteiro ou casado, Aonde morador, Se acaso for cativo, Diga quem seu senhor.

Eu sou muito conhecido, Aqui nesta ribeira, Este o seu criado da Catingueira. Dentro da Vila de Patos, Compro, vendo e fao feira. Negro, vieste a Patos Procurando quem te forre Volta pra trs, meu negrinho Que aqui ningum te socorre; E quem cai nas minhas unhas Apanha, deserta ou morre.

Seu Romano, em vim a Patos Pela fama do senhor, Que me disseram que era Mestre e rei de cantador; E que dentro de um salo Tem discurso de doutor. Inao, que andas fazendo Aqui nesta freguesia, Cad o teu passaporte, A tua carta de guia Aonde t teu sinh Cad a tua famia.

Seu Romano, eu sou cativo, Trabalho para meu sinh... Quando vou para uma festa Foi ele quem me mandou, E quando saio escondido Ele sabe pronde eu vou. Inao, deixa-te disto, No te possa acredit Pois eu tambm tenho nego E s mando trabai... Como que teu sinh Vai te mand vadi?

Inao da Catinguera, Escravo de Man Luiz Tanto corta com risca, Como sustenta o que diz! Sou vigaro capelo E sacristo da matriz. Este aqui seu Romano Dentaria de elefante, Barbatana de baleia, Fora de trinta gigante, ouro que no mareia, Pedra fina e diamante.

Inao da Catinguera nego desengonado: Abre cacimba no seco D em baixo do muiado... Aperta sem s troqus, Corta pau sem s machado. Romano, o meu martelo, Por bom ferreiro forjado; Tanto ele bom de ao, Como est bem temperado; A forja onde ele foi eito toda de ao blindado.

Seu Romano, eu lhe garanto Que resisto ao seu martelo; Ao talho do seu faco, Ao corte do seu cutelo; Se eu morrer na peleja, Lhe vencerei no duelo. Negro criado vadio Tem por fim acabar m; Uns casam com mulher forra Outros do pra roub. Outros fogem do servio Com medo de trabalh.

Eu felizmente no sou Escravo de senhor cru, Que trabalha todo o dia De noite faz quinguingu Aparpando no escuro Fossando que nem tatu. Estou ouvindo as tuas loas, No te possa acreditar. Que eu tambm tenho escravo Mas no mando vadiar, Que eu saio pra divertir Os negros vo trabalhar.

Seu Romano, sou cativo, Mas trabalho no comum. Dar descanso a seus escravos gosto de cada um Meu sinh tem muito negro, Seu Romano s tem um. Pra negro eu tenho chicote E palmatria e trabuco. Boto-o na mesa do carro Passo por cima e machuco Vadeio de l pra c: Traco-traco! Truco-truco!

Seu Romano, meu faco Tambm trabalha em seu quengo! Desmastreio-te a carreira Como um cavalo de rengo E vou de uma banda pra outra Traco-traco! Tengo-tengo! Negro, se eu te pegar Numa volta de caminho Eu te fao um agrado, Com meu chicote um carinho Se a camisa for nova S te deixo o colarinho.

Sou abelha de ferro Sou besouro de caboclo, Se eu pegar seu Romano, Dou um arrocho, deixo-o rouco De quebrar-lhe as canelas S deixar-lhe dois catoco. Negro voc no me venha Que se vier eu lhe abeco Sacudo-o em cima da forja, Com os fole eu te sapeco, Boto-te em cima da safra, Com dois malhos, teco-teco!

Seu Romano, no se alegre Que a hora no acabou-se. Eu derrubo de machado, Acabo, pico de foice. Valento que vir a mim Mato-o de queda e de coice. Negro se tu me cercares Com quatrocentos caifai Cem de uma banda, cem de outra Cem adiante, cem atrai Isto que tapa que dou Isto que nego que cai.

Seu Romano faz isso T arriscado a passar m Vai o chumbo, vai a bala Vai o n do caru. D-lhe os nego, d-lhe as nega E os molequim tambm d. Romano Na minha no passa Negro sem carta de guia Boto-lhe o surro abaixo Para fazer vistoria Se cativo ou se liberto Se casado e tem famia.

Seu Romano, a fazer isto Certamente passa m Vai a bala, vai o chumbo, Vai a corda de crau D-lhe os negro, d-lhe as negra D-lhe tudo, tudo d. Romano da Catingueira Madeira do Pianc Eu boto-lhe no meu machado E tiro-a toda no p Boto-lhe a rgua em cima E desempeno de enx.

Seu Romano carapina, Carregue boa ferrage Sou brana, angico torto Sou pedra mrmore, em lage, Sou lagedo, penedia, Logo seu ferro bobage. Romano, olha que eu tenho Fora e muita inteligncia, No me falta no meu estro A veloz reminiscncia; Muitas vezes tenho dado Em cantador de cincia.

Seu Romano eu s garanto que cincia eu no tenho, Mas para desengan-lo Cantar consigo hoje venho; Abra os olhos, cuide em si, Pra no perder seu desenho. Inao faa um fav Me diga l num repente Qual a dor que mais di, Que mais atormenta a gente. Eu penso que o panario dorzinha impertinente;

Mas porm tem muitas outra Que eu lhe digo, no repente: Ferroada de lacrau Faz o p ficar dormente; Tem outra d condenada, pis-se em brasa quente. Sou que nem dois telegrama: Quando um assobe outro desce... Inao, voc me diga, Que nunca achei quem dissesse, Qual a erva do mato Que o prprio cego conhece.

Neste negcio de mato Sou quase decurio... Corto o baraio onde quero, Dou carta e jogo de mo; No mato tem uma erva, Queima e arde como o cho, O prprio cego conhece: urtiga ou cansao. Inao, se s to sabido, Responda sem estud, Qual o tranze da vida Que mais nos faz apert, Que at nos tira a alegria, O jeito de convers, O sono durante a noite, A vontade de almo.

Seu Romano me parece, Eu que no sou aprendido, quando morre a mulh, Ou quando morre o marido, Nosso pai ou nossa me, O nosso filho querido, Quando chega em nossa porta Um cred aborrecido. Tomara achar quem me mostre Uma casa sem Maria, Ms que no tenha semana, Uma semana sem dia, Alt de igreja sem santo, Vigaro sem freguesia, Moa nova sem namoro E via sem ser titia.

Eu nunca vi filho nico Que no fosse preguioso! Quem anda com guarda-costa No valente, medroso! O homem se faz por si, Ningum nasce poderoso! O pobre fica maluco, O rico fica nervoso... H certas coisas na vida Que, se dando, raridade: Menino no quer leite, Soldado ter castidade, Rapariga sem enfeite, Gente sonsa sem maldade, Moa passar dos trintanos, Dizer direito a idade.

H dez coisas neste mundo Que toda gente procura: dinheiro e bondade, gua fria e formosura, Cavalo bom e mulh, Requeijo com rapadura, Mor sem ser agregado, Com carne sem gordura... Quando eu era pequenino, No tempo em que eu vadiava, No lug onde eu nasci A minha fora eu mostrava: No deixei pau pra semente, Pela raiz eu cortava.

Nunca vi ningum no mundo Indigest sem cum, Navio corr no seco, Atolero sem chuv... Tambm nunca vi no mundo, Por isso queria v Tir pau pela raiz S vendo que posso cr: S se era mata-pasto, Canapum ou muamb. O pau que eu tir de foice, Tu no tira de machado; No mato que eu entr nu, Cabra no entra encourado; Barbato que eu peg solto Botas no mato, peado.

Seu Romano inda no viu O tamanho do meu roado: Grita-se aqui num aceiro Ningum ouve do outro lado, Eu fao coisa dormindo Que outro no faz acordado, O que o sinh fiz em p Eu fao mesmo deitado. No lugar onde eu campeio Tu mesmo no tira gado; Fao figura no limpo Fao mi no fechado No poo que eu tom p Voc morre afogado.

Coisa que eu fao no mato Ningum faz no tabolero O que o branco faz no duro eu fao num atolero; O que faz no ms de maro Eu tenho feito em janeiro, O branco bem amontado O nego em qualquer sendeiro A concesso que lhe fao correr no meu acero Embora o diabo lhe ajude Eu derrubo o boi primeiro. Eu j tenho dado em touro Que quando ronca estremece Tenho domado leo At que ele me obedece; J dei em muitos cantores Mas nunca achei quem me desse!

Com touros e com lees Seu Romano j brigou Mas se o povo se acalmar Eu hei de mostrar quem sou Quero dar em seu Romano Que diz que nunca apanhou. Se voc v que no pode Comigo, bom que se aquete: Enquanto derrub um, Eu despacho mais de sete! O que voc faz de espada Desmancho de canivete...

O senhor nunca me viu Frangi o couro da venta, Meu cabelo se arpo E a testa ficar cinzenta... Cantad, quando eu me agasto, Esfria com gua benta. Quando pego um cantador, Adoece de repente, D-lhe uma dor de cabea E uma coceira ardente um vexame to grande Que no h diabo que agente.

Meu martelo tem azougue Cantador dele no sai, D-lhe um frio com tontura, Seca a carne a lngua cai, Fica o corpo sem governo A alma vai-e-no-vai. Inao, tu tem cabea Porm juzo no tem! Um gigante nos meus braos Aperto no ningum! Aperto um dobro nos dedo Fao virar um vintm.

Tem coisa que d vontade Me meter na vida alheia: Quem mata assim tanta gente Inda no foi pra cadeia! Peg um gigante mo E no fic ca mo cheia! Rebentar dobro nos dedo E no quebr uma veia: Esse dobro de cera, Esse gigante de areia... Inao, fica sabendo Que sou rei nesta ribera! T me dando uma veneta Faz uma brincadera: Eu quero mud-te o nome De Inao da Catinguera... Desse pau to duro e forte Eu fao burra leitera E se me d na cabea Fao vir bananera...

O branco mais muita gente, O negrinho mermo s, O branco vem de cacete, E eu recebo a cip... No pau que fiz entalha Eu lavro sem deix n: O branco corta a machado, Eu lavro mermo de enx... Romano da Catingueira Se mete a cantar repente, Negro me trata melhor, Que estamos em meio de gente Queira Deus voc no saia Da sala de couro quente.

Meu branco dou-lhe um conselho, Espero o sinh tomar, Se tire desse sentido, Se arrede desse pensar, Juro com todos os dedo Que um homem s no me d. Inao da Catinguera Fala como uma folhinha... No quero escut bobage, Guarda a tua ladainha, No s pra me d conselho: Quando tu ia eu j vinha...

Seu Romano, eu pra cant No preciso passaporte... um dom da natureza Um favor da minha sorte! Em negcio de cantiga Tenho feito muita morte. Negro, se tu pretendes Contra mim te armar em guerra, Vers eu tirar-te a vida, Deixar-te inerte, na terra, E botar no teu cadver Serra por cima de serra.

Seu Romano, eu tenho visto Cantor que diz que sabido, Vir pelejar contra mim Mas quando se ver perdido, Chora pedindo desculpas Dizendo: estava iludido. Negro, as tuas faanhas Eu delas no fao conta, Tu te opondo contra mim Ds murro em faca de ponta; Eu monto no teu cangote Mas no meu ningum se monta.

Seu Romano no faz conta Porm eu hoje desmancho Tudo o que o sinh fizer: Toco-lhe fogo no rancho, Cuide em si que o negro velho D-lhe um servio de gancho. Inao, tu nunca viste Eu mais meu mano em servio. Somo como dois machados, No tronco de um pau macio; Um raio abrasador, Outro trovo inteirio.

Eu bem sei que seu Verssimo No martelo rei croado; Mas, leve ele Catingueira Muito bem apadrinhado, E ver como que apanha O padrim e o afilhado. Coitadim de Catingueira Aonde vei se socar, Dentro de uma mata escura Onde no pode enxergar, Ele vei por inocente, No volta sem apanhar.

Coitadim de seu Romano, Aonde ele vei ca, Nas unhas de um gavio, Sendo ele um bentivi, Est se vendo apertado Como peixe no jiqui. Romano quando se zanga Treme o Norte, abala o Sul Solta bomba envenenada Vomitando fogo azul Desmancha nego nos are Que cai virado em paul.

Inao quando se assanha Cai estrela, a terra treme, O Sol esbarra o seu curso, O Mar abala-se e geme, Pega fogo o mundo em roda E nada disso o nego teme. Hoje aqui tem de se ver Relampos de caracol, Os nevoeiros pararem E eclipsar-se o Sol; Secarem as guas do Mar, Pescar baleia de anzol.

Hoje aqui tem de se ver Como o ferreiro trabalha, Como se caldeia ferro, Como o ao se esbandalha; Como se broqueia pedra, Como se estoura a metralha. Meu Deus, o que tem Que no cantar se atrapalha? Sustenta o ferro na mo, Que estou na primeira entalha, Teu ferro est se virando E o meu no mostra falha.

Meu Deus, que tem seu Romano Parece que est doente? Est temendo a desfeita, Ou o bote da serpente, Ou est com medo de Ou com vergonha da gente. Inao, tenho cantado Com muita gente de tino; No sul com Manoel Carneiro, No Sabugi com Ugolino, Como no canto contigo Que s fraco e pequenino?

Seu Romano, abra os olhos Com esse preto moreno Tenha medo da botada Da serpente e do veneno; Eu j tenho visto grande Apanhar dum mais pequeno. Negro, ainda me abalo L da serra do Teixeira, Levo meu mano Verssimo Vamos dar-te uma carreira, Dar-te uma surra em martelo E tomar-te a Catingueira.

Meu branco, dou-lhe um conselho Se voiminc me atende; Se for para ns brincar Pode ir que no me ofende Mas pra tomar Catingueira No v no que se arrepende. Negro, tu me conheces, J sabes bem eu quem sou; Mas quero te prevenir Que na Catingueira eu vou Derrubar o teu Castelo Que nunca se derrubou.

mais fcil um boi vo Um cururu ficar belo, Aru jogar cacete E cobra calar chinelo, Do que haver valento Que derrube o meu Castelo. Quem quer ferir inimigo No faz ponto nem avisa; Quando eu for Catingueira, Nesse dia o sol se incrisa; Inda vou l, fique certo, Somente dar-te uma pisa.

Me diga o dia em que vai, Quais so os seus companheiros. O senhor pode levar Dez ou doze cangaceiros; Que a todos eu saio a peito Como um valente guerreiro. Antes de eu ir, outro dia, Te mandarei um aviso Voc, tando em casa, corre Porque voc tem juzo... E eu vou s faz estrago: Quebro, rasgo, queimo e piso!

Quando for procure um padre Que o oua em confisso, Deixa a cova bem cavada E deixe a encomendao Leve a rede onde de vir E j prontinho o caixo. Inao, eu sei que duro, Mas l na Catingueira Na Me dgua, onde eu moro, No descambas a ladeira. Mais fcil o diabo ir ao Cu Do que ires ao Teixeira.

Meu branco no diga isso Que o sinh no me conhece Veja quando o Sol sair Com a luz que resplandece Olhe para os quatro lados Que o negro velho aparece. Negro, eu s canto contigo Por um amigo me pedir Visto me sacrificar, No me importa de ferir... Cavo onde achar mais mole E bato enquanto bulir.

Seu Romano, lhe aconselho, No cometa tal perigo, a Deus que lhe defenda Do lao do inimigo, Antes morrer enforcado Do que pelejar comigo. Negro, canta com mais jeito, V a tua qualidade. Eu sou branco, tu um vulto perante a sociedade. Eu em vir cantar contigo Baixo de dignidade.

Esta sua frase agora Me deixou admirado... O sinh para ser branco, Seu couro muito queimado, Sua cor imita a minha, Seu cabelo agastado. Com negro no canto mais Perante a sociedade. Estou dando cabimento Ele est com liberdade. Por isso vou me calar, Mesmo por minha vontade.

O sinh me chama negro, Pensando que me acabrunha. O sinh de home branco S tem os dente e as unha, A sua pele queimada, Seu cabelo testemunha. Inao, eu estou ciente Que tu s um negro ativo; Mas no estou satisfeito, Devo te ser positivo: Me abate hoje em cantar Com um negro que cativo.

Na verdade, seu Romano, Eu sou negro confiado! Eu negro e o sinh branco Da cor de caf torrado! Seu av vei ao Brasil Para ser negociado. Negro, eu vou te pedir, Vamos deixar o passado, Esquecer quem foi cativo, Que nos d mais resultado. Acabar a discusso Esquecer todo o atrasado.

Isso a outra coisa. Eu no luto sem motivo. O sinh tambm esquea O povo que foi cativo. Quem tem defunto ladro No fala em roubo de vivo. A desgraa do home rico dar importncia a pobre. Sendo eu a prata fina Vim me misturar com cobre. Grande castigo merece Quem se abate sendo nobre.

Esta agora engraada, Eu digo com toda f: De prata se faz arreio, Faz faca, garfo e cui, De prata se faz espora Pra negro botar no p. J fao tu te calar No quero articulao. Vamos geografia Que chama o povo ateno. V se sabes ou se podes Me dar uma explicao.

Seu Romano, ainda me lembro Que meu sinh me dizia Que o mundo tem cinco partes, sia e Oceania, Europa, Amrica e frica, Assim diz a geografia. Ento deves conhecer Cabos, estreiros e mar, Os golfos, as raas todas Onde puderam habitar. Afina tua memria Que eu quero te perguntar.

No respondo sua pergunta, No conheo academia, Vivo s do meu roado, Nunca vi uma livraria. V perguntar a um dout Que quem sabe geografia. Meu Deus, que tem esse negro Que no cantar se maltrata! Agora Romano velho Canta um ano e no se mata; Quanto mais canta mais sabe E n que d ningum desata.

Eu bem sei que seu Romano T na fama dos anis; Canta um ano, canta dois, Canta seis, sete, e dez; Mas o n que der com as mos Eu desmancho com os ps. Inao, vamos parar, Estou com dor de cabea. Preciso de algum repouso Antes que o dia amanhea. Estou com cara de sono Sem ter mais quem me conhea.

Sua doena, seu Romano, Est muito conhecida. Melhor rasgar o tumor Antes que vire ferida. O reis por perder o trono No deve perder a vida. Latona, Cibele, Ra, ris, Vulcano, Netuno, Minerva, Diana, Juno, Anfitrite, Androcia, Vnus, Climene, Amaltia, Pluto, Mercrio, Teseu, Jpiter, Zoilo, Perseu, Apolo, Ceres, Pandora, desata, agora, O n que Romano deu.

Seu Romano, desse jeito Eu no posso acompanh-lo. Se desse um n em martelo Viria eu desat-lo Mas como foi em cincia Cante s que eu me calo.

...Fim...