convergência midiática: a problematização do conceito no âmbito da comunicação digital

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Convergência Midiática: a problematização do conceito no âmbito da comunicação digital Media Convergence: the questioning the concept in the context of digital communication Maria Clara Aquino Jornalista, Mestre em Comunicação e Informação pelo Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutoranda pela mesma instituição. Atualmente é professora do curso de Comunicação Social/Jornalismo na Universidade Luterana do Brasil. E-mail: [email protected] Resumo: Diante da proliferação de discursos em torno de um novo panorama da comunicação, o artigo propõe abordar o tema da convergência midiática, recuperando o debate acadêmico sobre o conceito. O artigo é motivado pela multiplicação de matérias, na imprensa, e de artigos acadêmicos que falam sobre convergência, e discute o conceito levantando questionamentos sobre o papel da Internet, da web e das tecnologias digitais no processo de convergência midiática. O conceito é problematizado através de uma observação sobre o comportamento de usuários do Twitter na noite de estreia da décima edição do reality show Big Brother Brasil. Palavras-chave: convergência midiática; digital; fluxo midiático Abstract: Given the proliferation of discourses around a new landscape of communication, the article proposes to address the issue of media convergence, restoring the academic discussion about the concept. The article is motivated by the proliferation of reports in the press and academic articles that talk about convergence and discusses the concept raising questions about the role of Internet, web and digital technologies in the process of media convergence. The concept is questioned by an observation about the behavior of Twitter users on the opening night of the tenth edition of the reality show Big Brother Brazil. Keywords: media convergence, digital, media flow Introdução Na edição de fevereiro de 2007 a revista Superinteressante trouxe na capa a frase Lost e o fim da TV 1 (CORDEIRO, 2007). Em 2010, a revista Veja, edição de 20 de janeiro, publicou uma matéria intitulada Big Brother no computador 2 (MEIER, 2010). Ambas as matérias recorreram à dois programas que ultrapassaram os limites de seu meio de comunicação originário, a televisão, para mostrar como a Internet, a web e as tecnologias digitais de comunicação têm se aproximado dos meios de comunicação de massa. As matérias das duas revistas são mencionadas aqui a título de exemplificação, para que se possa dar início à discussão do tema que se pretende abordar nesse texto: convergência midiática; que hoje aparece com destaque em diversos veículos de comunicação que estampam em seus suportes, sejam eles impressos, online, televisivos ou radiofônicos, 1 Lost: seriado americano da emissora ABC, criado por Jeffrey Lieber, Damon Lindelof e J.J. Abrams. 2 Big Brother Brasil, da Rede Globo, é a versão brasileira do reality show Big Brother, criado por John de Mool.

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Artigo publicado na Revista Opino.

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Page 1: Convergência Midiática: a problematização do conceito no âmbito da comunicação digital

Convergência Midiática: a problematização do conceito no âmbito da comunicação digital

Media Convergence: the questioning the concept in the context of digital communication

Maria Clara AquinoJornalista, Mestre em Comunicação e Informação pelo Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutoranda pela mesma instituição. Atualmente é professora do curso de Comunicação Social/Jornalismo na Universidade Luterana do Brasil. E-mail: [email protected]

Resumo: Diante da proliferação de discursos em torno de um novo panorama da comunicação, o artigo propõe abordar o tema da convergência midiática, recuperando o debate acadêmico sobre o conceito. O artigo é motivado pela multiplicação de matérias, na imprensa, e de artigos acadêmicos que falam sobre convergência, e discute o conceito levantando questionamentos sobre o papel da Internet, da web e das tecnologias digitais no processo de convergência midiática. O conceito é problematizado através de uma observação sobre o comportamento de usuários do Twitter na noite de estreia da décima edição do reality show Big Brother Brasil.

Palavras-chave: convergência midiática; digital; fluxo midiático

Abstract: Given the proliferation of discourses around a new landscape of communication, the article proposes to address the issue of media convergence, restoring the academic discussion about the concept. The article is motivated by the proliferation of reports in the press and academic articles that talk about convergence and discusses the concept raising questions about the role of Internet, web and digital technologies in the process of media convergence. The concept is questioned by an observation about the behavior of Twitter users on the opening night of the tenth edition of the reality show Big Brother Brazil.

Keywords: media convergence, digital, media flow

IntroduçãoNa edição de fevereiro de 2007 a revista Superinteressante trouxe na capa a frase Lost

e o fim da TV1 (CORDEIRO, 2007). Em 2010, a revista Veja, edição de 20 de janeiro,

publicou uma matéria intitulada Big Brother no computador2 (MEIER, 2010). Ambas as

matérias recorreram à dois programas que ultrapassaram os limites de seu meio de

comunicação originário, a televisão, para mostrar como a Internet, a web e as tecnologias

digitais de comunicação têm se aproximado dos meios de comunicação de massa.

As matérias das duas revistas são mencionadas aqui a título de exemplificação, para

que se possa dar início à discussão do tema que se pretende abordar nesse texto: convergência

midiática; que hoje aparece com destaque em diversos veículos de comunicação que

estampam em seus suportes, sejam eles impressos, online, televisivos ou radiofônicos,

1 Lost: seriado americano da emissora ABC, criado por Jeffrey Lieber, Damon Lindelof e J.J. Abrams.2 Big Brother Brasil, da Rede Globo, é a versão brasileira do reality show Big Brother, criado por John de

Mool.

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observações e, muitas vezes, até arriscam palpites sobre o futuro dos meios de comunicação

diante desse momento de convergência. No entanto, no campo acadêmico esse assunto não é

recente da forma como a mídia hoje insiste em destacar.

O termo “convergência”, segundo Corrêa & Corrêa (2007, online) possui definições

ambíguas entre si, tem sido usado de forma exaustiva e diversificada em múltiplos contextos e

“em toda a literatura que envolve o status das mídias contemporâneas, as tecnologias digitais

de informação e comunicação – TIC’s, a cibercultura, as linguagens e narrativas, apenas para

ficarmos no campo maior das Ciências da Comunicação”.

Em termos de mídia, desde as primeiras experimentações com a Internet e, depois com

a web e demais tecnologias digitais de comunicação, pode-se dizer que o panorama midiático

vem se alterando. Essa afirmação é encontrada em textos acadêmicos, dos mais ensaísticos

aos mais detalhados empiricamente, e em matérias jornalísticas, desde as escritas apenas para

seguir a avalanche de informações sobre o tema até às que buscam em fontes acadêmicas

justificativas de tais alterações no cenário midiático do século XXI. Diante dessa proliferação

de discursos em torno da possibilidade de um novo panorama da comunicação, como abordar

o tema da convergência midiática? Pode-se atribuir a ocorrência do processo apenas à

Internet, à web e às tecnologias digitais de comunicação? Se a opção for tomar essa afirmação

como verdadeira, talvez Henry Jenkins seja o principal responsável pela adoção dessa

posição. Jenkins tem sido apontado como “papa da convergência”, após a publicação de

Convergence Culture: Where Old and New Media Collide, em 2006. Publicado originalmente

nos Estados Unidos e traduzido para o português em 2008, sob o título de Cultura da

Convergência, o livro traz vários exemplos sobre o que o autor considera como convergência

midiática:

Por convergência refiro-me ao fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de entretenimento que desejam. Convergência é uma palavra que consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar falando (JENKINS, 2008, p. 27).

Desse conceito é possível extrair três frentes que o compõem: o fluxo dos conteúdos, a

cooperação entre os mercados midiáticos e o comportamento dos públicos. Fragmentar o

conceito do autor torna-se útil para esclarecer os diferentes componentes de um processo que

não decorre apenas da mistura de suportes ou da possibilidade de comunicação desprovida das

limitações de tempo e espaço, possibilitada pela Internet. Com tal fragmentação, percebe-se

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que a convergência midiática, de acordo com Jenkins (2008), pode ser analisada sob o ponto

de vista dos fluxos de conteúdo, dos mercados midiáticos e do público que consome os

conteúdos midiáticos. Obviamente que se poderia aqui propor discussões em torno de cada

um desses enfoques; no entanto, o objetivo desse estudo ainda não pretende abordar essa

esfera do debate, mas sim discutir e questionar o conceito em si.

A motivação para a elaboração desse texto, de caráter ensaístico, surge a partir da

observação acerca da proliferação de matérias como a da Superinteressante e a da Veja, bem

como a retomada do debate sobre o tema da convergência midiática dentro do meio

acadêmico. Assim, pretende-se problematizar a discussão sobre o conceito de convergência

midiática em relação à Internet, à web e às tecnologias digitais de comunicação. Tal relação,

no entanto, não vai ao encontro de postulados favoráveis à ideia de que a convergência

midiática resulta do agrupamento de diferentes mídias dentro do espaço online. Essa relação

feita hoje não só pela própria mídia, como também pela academia, é o que desperta as dúvidas

desse ensaio.

Recuperando o debate acadêmico sobre o conceito de convergência midiática, bem

como as origens do processo, o trabalho discute a relação entre o conceito e o cenário digital

atual, levantando questionamentos sobre o papel da Internet, da web e das tecnologias digitais

no processo de convergência midiática e problematizando o conceito diante do uso excessivo

da expressão, tanto na mídia como na academia. Para ilustrar a argumentação construída ao

longo do texto, apresenta-se no último item uma breve análise de dados3 coletados acerca da

relação entre o reality show Big Brother Brasil o serviço de microblog Twitter4.

2. As divergências da convergênciaUma rápida pesquisa pelo significado do termo convergência5 nos dicionários aponta

resultados como “ato ou efeito de convergir”, “direção comum para o mesmo ponto”; sendo

que convergir6 significa “dirigir-se, tender para um ponto comum”, ou então “concorrer, afluir

ao mesmo lugar”.

Em termos de mídia, Jenkins (2008) não foi o primeiro a pensar a mídia em termos de

convergência, muito menos sua obra mais conhecida, Cultura da Convergência, é o primeiro

trabalho sobre o tema. Por mais que venha sendo considerado “papa da convergência”, por

3 Tal análise de dados é meramente ilustrativa e foi realizada em caráter de observação, sem pretensões de aprofundamento empírico.

4 http://www.twitter.com5 Fonte:http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-

portugues&palavra=converg%EAncia Acesso em 25/01/106 Fonte:http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-

portugues&palavra=convergir Acesso em: 25/01/10

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Cultura da Convergência, Jenkins desde o início dos anos 90 já apresentava estudos sobre as

relações entre meios de comunicação e produtos midiáticos7. Assim como Jenkins, outros

autores (POOL, 1990; SANTAELLA, 2003; FRAGOSO, 2005, ONLINE, PELLANDA,

2003) também já trabalhavam o assunto bem antes desse boom da convergência midiática que

tem permeado a mídia e o campo acadêmico. Boom porque o que se percebe é uma espécie de

volta à meados da década de 90, quando havia um certo encantamento com as tecnologias

digitais de comunicação. É bem verdade que os avanços no campo digital atualmente são

rápidos e a cada dia uma nova tecnologia é criada para facilitar os processos comunicacionais.

Mas foi só com a digitalização que ocorreu a convergência midiática? Como a tecnologia

digital atua nesse processo de convergência? Apenas como suporte para a reunião de

diferentes mídias? E qual o papel dessa tecnologia nas relações entre produtores e

consumidores de conteúdo dentro de um cenário fortemente marcado pelo uso da Internet, da

web e de tecnologias digitais de comunicação?

Para autores como Pellanda (2003) – e aqui compartilha-se desse posicionamento – o

fenômeno da convergência de mídias ainda não tem definição totalmente amadurecida. Pode-

se dizer que há uma espécie de disparidade entre a velocidade com que novas tecnologias e

dispositivos são criados e a velocidade com que os indivíduos usam e se apropriam dessas

possibilidades; e é essa disparidade que atrasa o amadurecimento do conceito. Mesmo assim,

Pellanda (2003, p. 3) diz que “a convergência de mídias se dá quando em um mesmo

ambiente estão presentes elementos da linguagem de duas ou mais mídias interligados pelo

conteúdo”. Trata-se de uma definição tecnicista, com base no fato de que apenas a reunião de

diferentes linguagens num único ambiente criaria uma nova linguagem ou, até mesmo, uma

nova mídia. Pellanda (2003, p. 8) chega a afirmar que não há mais “vinculação

linguagem/suporte, o que possibilita o entendimento da comunicação de forma mais natural e

global para os usuários”, de forma que o foco estaria agora na mensagem “e não mais no

meio, pois este está constituído em forma de um ambiente midiático transparente que suporta

as diversas linguagens”. Sua argumentação evolui para a premissa de uma “mídia 'invisível'”,

que está em todas as partes, passando despercebida como mídia e podendo criar um novo

ambiente de comunicação; tudo em função das possibilidades atuais de união de diversas

funções num único aparelho constantemente conectado a Internet.

O conceito de convergência de mídias proposto por Pellanda (2003) é absolutamente

condizente com suas afirmações sobre a união de diferentes linguagens dentro de um

7 Em 1992 o autor publicou trabalhos sobre a cultura participativa, como, por exemplo, JENKINS, Henry (1992). Textual Poachers: Television Fans & Participatory Culture. Studies in culture and communication. New York: Routledge.

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ambiente digital potencializado hoje pelo uso de tecnologias móveis, que permitem que os

indivíduos estejam sempre conectados. No entanto, é uma definição marcada por

possibilidades técnicas e que pouco considera o impacto das relações entre produtores e

consumidores sobre o fluxo de conteúdos midiáticos, através de todas essas tecnologias

usadas em conexão.

Que a convergência entre linguagens não é novidade trazida pelas tecnologias digitais,

há muito já se sabe. Como lembra Fragoso (2005, online), “a combinação de diferentes

linguagens compondo meios essencialmente intersemióticos é muito anterior à digitalização”

e, “a rigor, todas as mídias, desde o jornal até as mídias mais recentes, são formas híbridas de

linguagem, isto é, nascem na conjugação simultânea de diversas linguagens.” A autora afirma

que as mídias nunca existiram isoladas umas das outras e que, por fazerem parte de um

sistema complexo, afetam-se mutuamente desde sempre e, assim, cada uma se torna

referência para qualquer tecnologia com pretensões midiáticas.

Fragoso (2005, online) difere a convergência dos modos de codificação da

convergência dos tipos de suporte e da convergência dos modos de distribuição dos produtos

midiáticos. À qual delas Jenkins (2008) se refere? Certamente que não à convergência dos

modos de codificação, nem mesmo a confluência dos processos de distribuição que

determinam a visibilidade de uma mensagem são os principais motivos de estudos desses

autores em torno da convergência midiática. Não que tais “convergências” não tenham seus

impactos, mas a pista que ainda desperta maior atenção refere-se ao fluxo dos conteúdos

midiáticos num ambiente de convergência entre meios, tecnologias e pessoas, que tanto

produzem quanto recebem conteúdo.

Partilha-se aqui do consenso entre esses autores de que se trata de um equívoco

considerar que a convergência midiática seja a mera transposição de diferentes linguagens

para dentro de um único ambiente ou suporte. Enquanto Fragoso (2005, online) acredita que

“a migração das estratégias e finalidades comunicativas que hoje identificamos com o rádio, a

televisão e os meios impressos para as redes digitais de comunicação (não raro, ainda mais

restritivamente, para a World Wide Web)” pareça demonstrar a intenção de extinguir as

diferenças entre tais mídias e, consequentemente, diminuir cada vez mais as especificidades

de cada uma delas, Jenkins (2008) identifica como “falácia da caixa preta” a idéia de que num

futuro próximo um único aparelho será materializado como o agregador exclusivo e

veiculador de diversos conteúdos midiáticos.

Sendo assim, não se trata da convergência de modos de codificação, nem de suportes,

nem de modos de distribuição, mas do fluxo midiático, de como os conteúdos perpassam

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diferentes mídias e, principalmente, de como se dá a relação entre o público desses conteúdos,

diante da diversidade de mídias e do uso de diferentes canais e ferramentas de comunicação, e

os produtores de conteúdo que atuam nesse múltiplo ambiente midiático. Logo, será que ao

invés da fragmentação do conceito de Jenkins (2008) em fluxo de conteúdos, cooperação

entre mercados e comportamento dos públicos, não seria mais adequado fragmentar o

conceito em fluxo de conteúdos e comportamentos de produtores e consumidores de

conteúdos? A cooperação entre os mercados não seria consequência de um fluxo fortemente

influenciado pelo comportamento de produtores e consumidores? E o que há com o

comportamento desses atores que está provocando alterações no fluxo de conteúdos

midiáticos atual?

3. As origens da convergência e sua potencialização pela digitalizaçãoAntes de tentar responder tais perguntas, é preciso resgatar um pouco da história da

dinâmica das mídias. Fragoso (2005, online) afirma que todas as mídias resultam de formatos

híbridos de linguagens e Santaella (2003) lembra que, no início dos anos 80, percebe-se uma

intensificação das misturas entre linguagens e meios, misturas que ela afirma terem

funcionado como um multiplicador de mídias. Tal multiplicação gerou a produção de

mensagens híbridas, bem como de equipamentos e dispositivos que caracterizaram o que ela

chamou de cultura do disponível e do transitório, em função de fotocopiadoras,

videocassetes, videogames e TV a cabo, entre outras tecnologias. A escolha e o consumo

individualizados foram propiciados por equipamentos e linguagens criados para circularem

nessas tecnologias, constituindo o que ela chamou de cultura das mídias. A partir daí,

Santaella (2003) diz que o comportamento dos indivíduos se alterou em termos de busca de

informação e entretenimento; através dessas tecnologias os indivíduos começaram a

abandonar a “inércia da recepção”, tornando-se consumidores ativos na busca por conteúdo.

Nessa mudança de comportamento Santaella (2003, p. 27) visualizou a preparação da

sensibilidade dos indivíduos para a chegada dos meios digitais, cuja “marca principal está na

busca dispersa, alinear, fragmentada, mas certamente uma busca individualizada da

mensagem e da informação”. A autora formaliza tal pensamento no início dos anos 2000,

porém, Pool (1990), no fim dos anos 80 já falava sobre a evolução da comunicação em termos

de personalização e individualização, tanto em termos de produção quanto de recepção dos

conteúdos midiáticos.

O autor falava em uma inversão da revolução dos meios de difusão ao dizer que o que

começava a acontecer era que, ao invés de se difundirem as mesmas mensagens para milhões

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de pessoas, a tecnologia começava a permitir a adaptação de mensagens à necessidades

específicas e singulares de cada indivíduo. Para ele, o avanço da tecnologia ampliou as

possibilidades de adequação do conteúdo dos meios aos interesses dos pequenos públicos,

mais específicos, e essa adequação era consequência direta da flexibilidade de produção

através do computador.

Las tecnologías de las comunicaciones que evolucionan hoy están menos congeladas en la producción uniforme de un medio de masas, que las tecnologías de las comunicaciones del pasado; contienen la promesa de estar modeladas para las necesidades de los auditorios pequeños o de usuarios individuales. La recepción de la comunicación de masas es pasiva en alto grado; las nuevas tecnologías de las comunicaciones están adaptadas a la búsqueda más activa de información (POOL, 1990. P. 250)8

Visionário ou não, Pool (1990) acertou. Hoje os indivíduos tem inúmeras fontes de

informação e aproveitam essa diversidade buscando conteúdos diversos, via diferentes

suportes e canais. Mas isso, definitivamente, não começou com a digitalização.

Em um texto intitulado O que aconteceu antes do YouTube, Jenkins (2009, p. 144)

afirma que muito do que já foi escrito sobre o YouTube9 sugere que tecnologias da Web 2.0

possibilitaram o surgimento de 'culturas participativas', porém, acredita mesmo é no contrário:

“o surgimento das culturas participativas de todas as espécies ao longo das últimas décadas

estabeleceu o caminho para a assimilação pioneira, rápida adoção e usos diversos dessas

plataformas.” O que Jenkins (2009, p. 145) na verdade tenta mostrar é que antes da

digitalização da comunicação já havia um “longo histórico de produção de mídia” e que

plataformas como o YouTube não foram o ponto de partida dessas produções. Ainda que

mesmo sem a mistura de linguagens, os indivíduos sempre produziram e buscaram conteúdo,

de uma forma ou de outra. O que de novo surgiu não foram as práticas, mas sim as maneiras,

os suportes através dos quais passaram a ser realizadas. O caso do YouTube serve como

ilustração desse raciocínio:

Se o YouTube parece ter aparecido da noite para o dia, é porque já havia uma miríade de grupos esperando por algo como o YouTube; eles já tinham suas comunidades de prática que incentivavam a produção de mídia DIY, já haviam criado seus gêneros de vídeos e construído redes sociais por meio das quais tais vídeos podiam trafegar. O YouTube pode representar o epicentro da cultura

8Tradução da autora: As tecnologias de comunicação que evoluem hoje estão menos congeladas na produção uniforme de um meio de massa, que as tecnologias de comunicação do passado; contém a promessa de estar moldadas para as necessidades de audiências pequenas ou de usuários individuais. A recepção da comunicação de massa é passiva em alto grau; as novas tecnologias de comunicação estão adaptadas a busca mais ativa de informação. 9 http://www.youtube.com

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participativa atual, mas não representa o ponto de origem para qualquer das práticas culturais associadas a ele (JENKINS, 2009, P. 145).

A Internet, a web e as tecnologias digitais de comunicação foram responsáveis por

potencializar práticas anteriormente existentes, facilitando atividades e contribuindo para

alterações nos comportamentos dos indivíduos, mas não foram pioneiras em misturar

elementos e linguagens de comunicação. Tais misturas iniciaram antes da configuração desse

presente cenário digital, e o que mudou, e vem mudando, são os comportamentos em torno da

produção e da recepção de conteúdo. Trata-se também, inegavelmente, de evolução técnica,

criação de novos suportes e ferramentas que impulsionam práticas já consolidadas mas, por

enquanto, nada novo a ponto de justificar o conceito de convergência midiática.

Quando Santaella (2003) afirma que, nos idos dos anos 80, os indivíduos começaram

a abandonar a “inércia da recepção”, questiona-se: como se deu esse abandono? Os indivíduos

perceberam a oferta de mais opções e usaram o controle remoto para fazerem suas escolhas,

compraram pacotes de TV a cabo, videocassetes, personalizaram fitas cassete para escutarem

em seus walkmans?

A diferenciação que Jenkins (2008) faz entre os termos participação e interatividade é

útil para se entender como se deu esse abandono, essa evolução de uma postura passiva para

outra mais ativa, pois gera um raciocínio sobre as mudanças ocorridas desde as primeiras

misturas entre linguagens até o contexto atual, dito convergente.

Jenkins (2008, p. 182) coloca a interatividade como o “modo como as novas

tecnologias foram planejadas para responder ao feedback do consumidor”, assim que, podem

existir diferentes níveis de interatividade em função de cada tecnologia de comunicação. Já a

participação é, segundo Jenkins (2008, p. 183), “moldada pelos protocolos culturais e

sociais”, é mais ilimitada que a interatividade e controlada mais pelos consumidores dos

produtos midiáticos que por seus produtores. Diante dessa diferenciação, poder-se-ia dizer

que desde as primeiras misturas entre linguagens, que, como aponta Santaella (2003),

iniciaram em meados da década de 80, o abandono da inércia da recepção foi abrindo o

caminho para um cenário midiático mais interativo, em diferentes níveis, para, a partir do fim

dos anos 90, além de interativo tornar-se mais participativo10.

A popularização da web teve um papel de destaque nessa evolução. Como afirma

Jenkins (2008, p. 183), “inicialmente, o computador ofereceu amplas oportunidades de

interação com o conteúdo das mídias e, enquanto operou nesse nível, foi relativamente fácil

10A diferenciação entre interatividade e participação apresentada por Jenkins (2008) mostra a recorrente incidência de equívocos quanto ao uso dos termos interatividade/interativo(a).

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para as empresas midiáticas controlar o que ocorria”, porém observa que “cada vez mais,

entretanto, a web tem se tornado um local de participação do consumidor, que inclui muitas

maneiras não autorizadas e não previstas de relação com o conteúdo midiático.” O que

aconteceu foi que, com o desenvolvimento da web e ferramentas que oferecem mais liberdade

de produção, edição e publicação de conteúdo online ao indivíduos, a interatividade começou

a dividir espaço com a participação.

Os exemplos dessa divisão de espaço entre interatividade e participação aparecem em

vários setores da comunicação digital, como no caso do Youtube; dos blogs, que no início dos

anos 2000 foi sinônimo de liberdade de emissão de conteúdo por qualquer internauta; e até

mesmo no caso do jornalismo na web que, por exemplo, de acordo com Mielniczuk (2001,

online) passou por três fases que iniciaram com a mera transposição do conteúdo impresso

para o ambiente online até o jornalismo digital que é produzido hoje, com práticas bem mais

definidas e até mesmo a incorporação dos leitores na produção de notícias através do que

alguns chamam de webjornalismo participativo.

A interatividade não perdeu seu lugar, pelo contrário, tem sido incorporada como

característica dos meios de comunicação, ainda que em diferentes graus. E a participação vem

seguindo o mesmo caminho, porém, um caminho ainda marcado por obstáculos.

Proporcionar mecanismos interativos que permitam às audiências a escolha e a personalização

do conteúdo trata-se de atitude referente à interatividade, enquanto que observar a reação dos

públicos, monitorar o seu comportamento e incorporar os consumidores de informação no

processo de produção de conteúdo refere-se à participação. Porém, a afirmação de Jenkins

(2008, p. 182) de que “na cultura da convergência, todos são participantes – embora os

participantes possam ter diferentes graus de status e influência” demonstra claramente o

equívoco em se considerar determinados produtos, conteúdos e comportamentos como

caracterizadores de um processo de convergência midiática. Conteúdos potencialmente

interativos e participativos nem sempre configuram um fluxo convergente e esse é o principal

alerta que esse trabalho se propõe a fazer.

Nota-se que a convergência entre linguagens sempre existiu, a interatividade foi sendo

aperfeiçoada e utilizada em diferentes níveis e, no momento atual, a participação vem sendo

exaltada como uma das principais características do atual fluxo de conteúdos midiáticos. O

maior equívoco ou incerteza do momento no entanto surge quando é preciso definir como

ocorre esse processo de convergência midiática. Como ressalta Jenkins (2008, p. 183),

“permitir aos consumidores interagir com as mídias sob circunstâncias controladas é uma

coisa; permitir que participem na produção e distribuição de bens culturais – seguindo as

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próprias regras – é totalmente outra.” Sendo assim, a convergência midiática não ocorre pelo

simples ato de povoar um site com diversas mídias e formatos potencialmente interativos e

participativos, nem de criar uma história e veiculá-la em diversos formatos como cinema,

DVD, revistas em quadrinhos, games, etc. A mistura de linguagens e meios desempenha um

importante papel no conceito de convergência midiática, mas como já foi mencionado, o

centro desse conceito parece estar no fluxo dos conteúdos midiáticos, fluxo que hoje se

movimenta sob o impacto do comportamento de produtores e consumidores de conteúdo que

se relacionam através de diferentes tecnologias e suportes de comunicação digital.

4. Problematizando a convergência midiáticaAs considerações de Jenkins (2008) sobre a convergência são absolutamente

pertinentes diante da configuração midiática atual, mas devem ser questionadas. Logo no

início de Cultura da Convergência o autor parece afirmar com ampla certeza o que é essa

convergência, porém, através de exemplos detalhados, pouco esclarece como ocorre o

processo. Ao fim da obra chega-se a conclusão de que o autor mais afirma o que não é do que

o que realmente é tal convergência.

Para ele “a convergência representa uma transformação cultural, à medida que

consumidores são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em meio a

conteúdos midiáticos dispersos (JENKINS, P. 27 e 28).” Pode-se relacionar tal afirmação

diretamente com a noção de hipertexto e, consequentemente, de web. O que fazem hoje os

internautas? Procuram informações e fazem conexões entre os dados que encontram. E isso

não é novidade, já que desde o fim dos anos 90 a proliferação de ferramentas que permitem a

qualquer internauta inserir conteúdo online permitem que se façam tais conexões. O próprio

hipertexto não é novo, oriundo apenas da web, e se levado ao extremo poderia ser considerado

intrinsecamente convergente, já que tem o poder de interligar mídias diferentes, ainda que

dentro de um mesmo suporte. O ponto a que se quer chegar é de que se os processos de busca

e conexão de conteúdos midiáticos dispersos caracteriza o processo de convergência, então tal

processo é inerente ao desenvolvimento da web e não tão recente como tem sido propagado

por aí.

Sobre o que chama de 'novas mídias', Manovich (2005, p. 24) lembra que “embora a

geração e a manipulação de mídias em tempo não real por meio de computadores digitais

possam ser consideradas como aceleração de técnicas artísticas previamente existentes, a

interligação e o controle em tempo real parecem constituir fenômenos qualitativamente

novos”. A afirmação de Manovich (2005) enfatiza dois aspectos das tecnologias digitais que

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podem representar o diferencial trazido pela digitalização da comunicação ao fluxo midiático

atual: a interligação e o controle em tempo real.

Se as diversas convergências aqui mencionadas, como a de linguagens, de suportes, de

modos de distribuição já existiam antes mesmo da Internet e das tecnologias digitais e se a

participação e o comportamento de produtores e consumidores de conteúdo resulta em

alterações na relações entre esses dois atores, é visível então que a interligação e o controle

em tempo real são características de destaque do que então se poderia chamar de convergência

midiática nos termos aqui analisados. Tais características são percebidas nas linhas a seguir, a

partir de uma observação de postagens no Twitter realizadas nos dias 12 e 21 de janeiro e 02

de fevereiro de 2010.

5. Convergindo meios, pessoas e conteúdosNa noite de 12 de janeiro de 2010, estreia da décima edição do Big Brother Brasil,

veiculado pela Rede Globo, percebeu-se o impacto do programa no Twitter Uma busca pela

hashtag11 #bbb mostrava que até 20 minutos antes do início do programa os usuários do

sistema já teciam comentários sobre o que aconteceria no primeiro episódio do reality show.

Além da grande quantidade de postagens expressando ansiedade pelo início do programa, o

que chamou a atenção foi também o nível de rejeição ao programa. Vários usuários postavam

mensagens demonstrando repúdio ao reality show, além de diversas outras mensagens que

criticavam o fato de o Twitter estar, naquela noite, tomado por postagens a respeito do

programa.

@biahtavora Não adianta, até quem não gosta acaba falando do #BBB aqui no twitter. - 21h39; @gabr_x vai começar essa merda de #BBB –' - 21h42; @fe_oneda hje tem #BBB vai ser um lixo, mais eu vou assistir - 21h43; @vibrito Ainda bem que as pessoas que eu sigo não twittam nada sobre #BBB - 21h45 ; @lucaslrocha Daqui a pouco começa #BBB quem quiser dar #unfollow sinta-se a vontade ;D – 21h57; @xkruts @RT@dulcetti: não bastadeixar a tv desligada pra não acompanhar o #bbb tem que ficar off do twitter – 22h21(TWITTER – HASHTAG #BBB - 12/01/10)

As mensagens acima demonstram o poder de interligação não só entre dois meios de

comunicação – televisão e Internet – como também o poder de interligação entre os

telespectadores que, ao mesmo tempo em que assistiam (ou não) ao programa na televisão,

teciam comentários, em tempo real, no Twitter.

@Pattywypych Total investimento em web no #bbb - 22h13

11 Uma hashtag é uma espécie de etiqueta, uma palavra ou conjunto de letras acompanhada do símbolo #. A hashtag facilita a pesquisa de assuntos no Twitter.

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@gurtat A maior novidade no #BBB é o twitter na casa!! @boninho acreditou na ferramenta mais popular da web - 22h37 (TWITTER – HASHTAG #BBB - 12/01/10)

Desde os primeiros comentários acerca dos participantes do grupo que iria compor o

programa, havia boatos de que José Bonifácio Oliveira, conhecido como Boninho, o diretor

do programa, iria colocar na casa pessoas já “conhecidas” na Internet. E foi o que realmente

aconteceu. Dos 17 participantes, cinco tinham alguma visibilidade online. Além disso, antes

da estreia, Boninho afirmou que os brothers, como são chamados os participantes do reality

show, teriam permissão para publicar mensagens no Twitter, de dentro da casa. Não foi

exatamente o que aconteceu, pois os participantes postam mensagens em um serviço de

microblog criado exclusivamente para rodar dentro da página do programa, no portal da

Globo. Ainda assim, Boninho, que possui um perfil no Twitter, vem interagindo com a

audência do Big Brother e, muitas vezes, acatando sugestões do público, como mostra a

matéria da Veja citada no início desse texto:

Encerrado o episódio de estreia da décima temporada de Big Brother Brasil, na última terça-feira, o diretor do programa, Boninho, correu para o computador. Queria monitorar o que os espectadores comentavam no Twitter […] Naquela altura, os competidores do reality show passavam por uma prova de resistência para disputar a imunidade à eliminação: tinham de se equilibrar sobre cilindros rolantes enquanto se esguichava água sobre eles. A disputa se estendeu pela madrugada – e os twitteiros ajudaram a incrementar sua dificuldade. Um deles pediu que aumentassem a velocidade de rotação dos cilindros, e lá foi Boninho ligar para a produção para satisfazer o pedido. Outro sugeriu mais água, e também foi atendido. O mais sádico deles sugeriu que a prova fosse embalada com um funk carioca tocado a todo o volume. “Infernizei o pessoal até as 4 e meia da manhã”, diz Boninho. Esse é o BBB da Internet. (MEIER, 2010, P. 126, 127)

Segundo a própria revista (MEIER, 2010), o uso do Twitter pela emissora “não se trata

de um investimento isolado na Internet. Entre os executivos da emissora, corre um debate

sobre como fazer da rede um complemento, e não um competidor, da televisão aberta” .

Observando as chamadas feitas na televisão ao longo da programação diária, percebe-

se que os textos dessas chamadas convidam as pessoas a assistirem o programa para que

descubram o que aconteceu durante o intervalo de tempo entre um episódio e outro,

transmitido sempre após a novela das 21h. No entanto, hoje em dia, existem outros canais por

onde flui um programa como o Big Brother Brasil. A web e os canais pay per view permitem

que se saiba o que está acontecendo no programa em tempo real e é devido a esses canais que

fluem as conversas no Twitter e em outros espaços da rede, o que permite que a produção

monitore o comportamento dos públicos e possa então interferir no andamento do programa e

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até mesmo incorporar sugestões distribuídas em diversos espaços da rede.

Outro exemplo que mostra a interligação entre os produtores do programa e o público,

foi a prova do líder realizada em 21 de janeiro, na qual os brothers tinham que acertar

respostas de perguntas previamente disponibilizadas ao público no site do programa. Vencia a

prova aquele que respondesse as perguntas com as mesmas respostas dadas pela maioria do

público. No dia 02 de fevereiro, num momento de eliminação, onde o público deveria

escolher, por votação através de telefone ou através do site do programa, um entre três

participantes para ser eliminado do programa, o apresentador Pedro Bial, em seu discurso

final no qual elimina um participante, afirmou ter elaborado seu texto com a ajuda de

internautas. Enquanto lia seu discurso, Bial citava frases colhidas na Internet e ainda citava a

autoria das frases, porém não dizia nome e sobrenome, referia-se a codinomes, ou no caso,

nicknames, identidades criadas para uso na Internet.

Esses são exemplos de como a Globo vem integrando a Internet, a web e as

tecnologias digitais de comunicação, como o Twitter e o próprio site do programa, ao Big

Brother Brasil não só como uma forma de divulgar o programa e chamar o público a assistir a

programação na televisão aberta ou através de canais pay per view, mas também como uma

forma de aumentar a interatividade do programa, ampliando possibilidades de participação do

público. Se em outras edições do Big Brother Brasil o público ficava limitado a apenas fazer

uma ligação ou votar no site para eliminar um candidato, hoje o público pode emitir suas

sugestões pelo Twitter, pode ligar em noite de votação e dizer quem votou em quem e assim

alterar posições de imunidade e eliminação, além de ter um canal direto com o diretor do

programa que tem utilizado a ferramenta Twitter como canal de comunicação com seu público

não apenas para divulgar o programa, mas para efetivamente interagir e acatar sugestões do

público, muitas vezes em tempo real, como se viu no caso da prova dos cilindros.

Essas interligações entre produtores e receptores de conteúdo, que como se pode

perceber no caso do uso do Twitter no Big Brother, e que podem acontecer até mesmo em

tempo real, possibilitam alterações no conteúdo midiático em função da reação das

audiências. A interligação entre produtores e consumidores através de ferramentas de

comunicação digitais permitem mudanças de conteúdo veiculado em meios como a televisão,

como no exemplo aqui apresentado. No entanto, há que se salientar que o tempo real não é,

obviamente, fator essencial para a configuração de um processo de convergência midiática. A

ocorrência, em tempo real, de uma alteração de fluxo midiático em função da interligação

entre produtores e consumidores de conteúdo, apenas destaca o potencial das tecnologias

digitais de comunicação, porém, não é determinante dessa convergência midiática.

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Cada suporte hoje apresenta suas funcionalidades e peculiaridades que permitem cada

vez mais a aproximação entre os produtores e os públicos. A intensificação dessa aproximação

mexe com níveis de interatividade e participação que tornam-se os elementos principais de

um conceito de convergência midiática regido pelo comportamento de produtores e

consumidores de conteúdo que comandam o fluxo midiático atual através das relações que

estabelecem através do uso de diferentes ferramentas, plataformas, instrumentos e canais de

comunicação.

Esse conceito de convergência midiática aqui proposto e colocado em discussão não é

definitivo, nem único. Também não se apresentam aqui respostas definitivas para os

questionamentos levantados. O conceito, assim como o cenário midiático atual marcado pela

digitalização, é dinâmico e passível de reflexão por diversos ângulos. O objetivo foi

problematizar a discussão do conceito, apresentando questões complexificar o tema e avançar

na busca por definições mais claras, ainda que nunca definitivas, mas sempre orientadas de

forma a destacar o relacionamento entre produtores e consumidores de conteúdos midiáticos.

O próximo passo é evoluir tal ponto de vista, observando comportamentos, participando do

fluxo e convergindo, de uma forma ou de outra, com o resto da academia na investigação

sobre o tema.

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