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materia revista ragga hibrido.cc S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L. Sensacional Pequena Morte

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CULTURA

Amizade, desejos em comum e consciência coletiva movem a efervescente cena cultural belo-horizontina. Construindo o presente com os olhos no futuro, eles querem deixar sua marca na cidade

GERAÇÃO EM TRANSE

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1. Gabriel Assad2. Jana Macruz

3. Rodrigo Borges4. Matheus Rocha

5. Victor Diniz6. André Macedo7. Raul Gustavo

8. Luciano Tiara, o Cafa Sorridente9. Luiz Gabriel

10. Luiz Valente11. Tamás Bodolay12. Yasmini Costa13. Aline Vila Real

14. Flávia Mafra15. Fábio Gruppi

16. Paloma Parentoni17. Yuri Leite, o DJ Yuga

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POR BRUNO MATEUS

Belo Horizonte vive novos dias. A impressão é de que a filosofia preguiçosa do “se não tem mar, vamos para o bar” vai ficando para trás, pelo menos para quem se levanta do sofá e sai às ruas para escutar o que cantam os poetas mais deliran-tes. O novo, o que está repercutindo por aí, tem por trás o que seria algo como uma quadrilha drummondiana. Fulano é amigo de Cicrano, que trabalha com Beltrano. Beltrano toca na banda de Fulano. Fulano mora com a irmã de Beltrano, e ela tem uma produtora cultural com o irmão de Cicrano. A empresa produz a banda de Fulano, que, por sua vez, compõe as letras da banda em parceria com o irmão de Cicrano.

Mas seria ingenuidade dizer que essa cena se conecta pela amizade e só pela amizade. Reconhecimento do talento do outro, mudar o que está estabelecido e, quem sabe, fazer disso um momento histórico — tudo isso em comum move esse sentimento de não querer mais estar à margem dos acon-tecimentos. Seja com música, fotografia, teatro, dança ou ma-nifestações políticas, o importante é se expressar, na alegria ou no descontentamento, é deixar latente o desejo de fazer parte da cidade, de ocupar os espaços com cultura.

A coisa está borbulhando, só não vê quem não quer. Como cantou Dylan, é bom manter os olhos bem abertos, pois a chance pode não vir novamente. E os tempos, bem, os tempos estão mudando.

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Os quatro fazem parte da Malta — “galera”, no português de Portugal –, que tem menos de um ano e seria, segundo Flávia, “uma produtora de coisas”. “É foda definir”, brinca. O que os uniu profissionalmente foi outra reunião de amigos: o Gravelovers, junção do Graveola com o Dead Lovers. A partir de então, o quarteto começou a atuar junto. Hoje, além de produzir o Gra-veola, o Dead Lovers e o Fusile, a Malta também faz trabalhos para além da música.

Rafa, que é conselheiro regional Centro-Sul do Conselho Municipal de Cultura, lembra que um momento importante para o fortalecimento da cena musical de BH foi o surgimento do Outrorock, ajuntamento de bandas de diferentes estilos que acontece desde 2007, e que ganhou muita força a partir de 2010. Valia rock, jazz, ska, heavy metal, rap ou improvisação — o que eles tinham em comum mesmo era a necessidade de se criar um movimento que desse visibilidade aos trabalhos autorais feitos na capital.

Outras atividades foram pensadas, como a Quinta Loki e, paralelamente a isso, surge a Outra Jam, palco aberto para interação e livre improvisação dos músicos, no Nelson Bor-dello, no Hipercentro da capital mineira. “Somado às relações pessoais, vem o sentimento de poder transformar o tempo de agora”, diz Rafa. “Todas essas pessoas buscam trabalhar com prazer, não é blábláblá, funciona mesmo”, completa Flávia. “Acho sensacional o que está acontecendo. São pessoas que já

,NO POMARUm dos focos mais importantes dessa

nova cena cultural belo-horizontina é, certa-mente, o Pomar da Floresta, uma agradável casa na região Leste da capital. Ali, relações de amizade e de trabalho se confundem. É no Pomar, por exemplo, que está a produção das bandas Graveola e o Lixo Polifônico, Dead Lover’s Twisted Hearts, Fusile e Pequena Morte. Também é de lá que saem as ideias e toda a execução de festas como a S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L e a I.N.C.R.I.V.E.L, que ficam a cargo da Híbrido Comunicação, empresa de produção cultural e assessoria de imprensa fundada por três ami-gos que se esbarraram na faculdade — dois dos sócios tocam na Pequena Morte, e o ter-ceiro produz a banda.

Alguns poucos tragos de café pós-almoço na sala do Pomar já são suficientes para ver que a coisa toda não funcionaria tão bem se as pessoas que ali trabalham não tivessem, além dos sonhos em comum, uma estreita re-lação de amizade e admiração pelo trabalho alheio. Flávia Mafra, Rafa Barros, Jana Macruz e Carol Antunes são amigos há alguns anos.

Duas vezes Graveola: no gravação do DVD no Palácio das Artes, em janeiro, e na festa S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L, em fevereiro de 2011

SEJA COM MÚSICA, FOTOGRAFIA, TEATRO,

DANÇA OU MANIFESTAÇÕES POLÍTICAS, O IMPORTANTE É SE EXPRESSAR, É DEIXAR

LATENTE O DESEJO DE FAZER PARTE DA CIDADE, DE OCUPAR

OS ESPAÇOS COM CULTURA

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tiplica a grana com trocas de serviços, existe toda uma economia alternativa envolvida no processo.” Sempre tem um que é amigo do amigo, porém, ressalta Victor, as parcerias só acontecem porque há uma admiração pelo trabalho do outro.

,ARTE, LINGUAGEM DE CONTESTAÇÃOEssa teia de produção cultural, de amizade, de frus-

trações e desejo de mudança não se resume só a um evento aqui, um show acolá ou uma cervejinha gelada naquele bar onde a turma se reúne. Movimentos como a Praia da Estação e o Fora Lacerda ganharam as ruas e bateram de frente com o poder público. Guto Borges, guitarrista e vocalista de Dead Lovers, acredita que o ar-tista tem papel social importante. “O mercado também é uma forma de fazer política, esse é um caráter público do nosso trabalho”, diz, lembrando a importância de se consolidar espaços públicos livres em BH como espaços de interação.

Para Rafa Barros, a cidade está vivendo um processo de cerceamento pelo poder público, e a resposta de parte da sociedade — seja na Praia da Estação; no apoio às ocupações urbanas, como a Comunidade Dandara, onde cerca de mil famílias reivindicam o direito a terra há qua-se três anos; ou na retomada do Carnaval nas ruas de BH — mostra que é possível intervir na política da cidade com arte e irreverência. Flávia Mafra diz que, “no fim das contas, o que a gente faz é festa”. Mas não é festa pela festa. “Tem a razão de ser, é o momento no qual a or-dem instituída é rompida, tem um caráter revolucionário.

eram amigas e se encontraram profissionalmente, fazendo coisas legais”, afirma Jana, que também integra o Alcova Libertina, bloco do Carnaval belo--horizontino responsável pela famosa e anárquica marchinha que chuta a tradicional família mineira.

E um desses encontros foi com o Queijo Elétri-co, outro grupo de amigos que resolveram se juntar e fazer o que lhes dava tesão. Canal de webTV, selo de música independente e programa de rádio da UFMG Educativa. Para Eduardo Drummond, bate-rista do Tempo Plástico, grupo composto por inte-grantes do Queijo, “o interessante é que a cena em BH está sendo feita por uma galera que é contem-porânea, que se formou na mesma época e que acredita que é possível ganhar uma grana traba-lhando com cultura. Foi realmente uma coincidên-cia, de repente tem um tanto de gente trabalhando junto. É importante, é isso que faz com que a coisa toda seja um movimento”.

E, de fato, é mesmo uma teia de amizades e relações profissionais. Tamás Bodolay, baterista da Pequena Morte, é amigo de Victor Diniz, que é produtor da banda e sócio de Tamás na Híbrido. A Pequena Morte já confiou a redação de editais em seu nome à TV Queijo. O Graveola contrata a Híbrido para fazer sua assessoria de comunicação, e a Hìbri-do sempre contrata o Coletivo Imaginário para fazer seus teasers. O Outrorock prioriza o Nelson Bordello na hora de escolher um lugar para fazer seus shows. Tamás acredita que isso “é uma maneira que mul-

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É preciso estar em contato, na rua. A gente quer chegar em toda BH, ainda tem muita gente para enxergar”, comenta Rafa, deixando claro que, se depender deles, o passado sempre será uma velha roupa colorida que não serve mais.

,CORREDOR CULTURAL Yasmini Costa e Bernardo Gontijo Guimarães já trabalha-

vam com produção cultural quando, há um ano e meio, abriram as portas do Bar Restaurante e Cabaré Cultural Nelson Bor-dello. Pensado como um lugar de experimentações, o bar se estabeleceu num ponto importante para a produção cultural belo-horizontina. Ao lado, está o teatro do grupo Espanca!. A menos de cinquenta metros, o Duelo de MC’s. Música, teatro, dança e audiovisual se fundem num espaço que busca dar des-taque aos trabalhos autorais. E tem muita coisa acontecendo por aí. Eles sabem disso e estão com os olhos abertos para essa efervescência. “O Bordello foi pensado não só como um espaço de música, mas também como um espaço de troca”, afirma Yasmini.

Produtora do Espanca!, grupo teatral fundado em 2004, Aline Vila Real sempre pensa o que pode fazer em parceria com

os vizinhos. A relação com o Duelo de MC’s também é muito próxima. Segundo ela, a ideia é mesmo trabalhar com artistas de outras áre-as. “Tem sido uma porta para ouras parcerias.” A relação se torna ainda mais estreita quando o que os une é o desejo e a necessidade de ocupar a cidade com cultura. “Foram iniciativas da sociedade civil, de pessoas que querem fa-zer”, completa.

Roger Dee está envolvido na cultura hip hop desde 1983. Ele é integrante do Família de Rua, que realiza o Duelo de MC’s. Entre 2004 e 2005 havia um encontro na Praça Sete com alguns MC’s fazendo freestyle, jun-to com bboys e bgirls. Ali nascia o importante evento que, anos depois, se tornaria referên-cia para a cultura hip hop no país. Em 2007, após dois anos de hiato, o Duelo voltou à tona e migrou para a Praça da Estação, mas, para fugir da chuva, a solução foi ocupar o Viaduto Santa Teresa, onde atualmente acontece às sextas-feiras.

Para Roger, se não houvesse espírito coletivo, construir uma cena cultural forte em Belo Horizonte seria impossível. “Sempre rola uma interação, um apoio. Todo mundo está enxergando que hoje precisa ter consci-ência coletiva.”

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Matheus Rocha, o Ceará, divide o apartamento com o amigo Luiz Gabriel, vocalista do Graveola. Matheus é um dos responsáveis pela parte administrativa do Espaço Cultural Casi-nha, no Barro Preto, que abriga diferentes expressões artísticas, como capoeira, música, cinema, fotografia e artes plásticas. Foi na Casinha que Matheus conheceu Luiz Gabriel, e foi lá tam-bém um dos primeiros lugares onde o Graveola tocou. “A gente sempre deu vazão a isso, de abrir o espaço. Existe uma vontade muito grande de fazer e de fazer junto, esse é o lance”, com-pleta Matheus.

,ANTES, O AGORA E O QUE VIRÁYuri Leite, o DJ Yuga, começou a discotecar e fazer even-

tos em 1999, três anos após chegar a Belo Horizonte. Em 2004, surgiu a ideia de fazer o tributo Tim Maia Racional com três shows no fim daquele mesmo ano. O DJ, então, antenado à cena, pensou que a única banda em BH que poderia tocar a fase Racional do Síndico era a Black Sonora. Essa reunião definiria o rumo da carreira de Yuga, que, no começo de 2005, foi convidado para fazer parte do grupo, do qual saiu há um ano e meio. Hoje, ele é parceiro da Híbrido na produção da fes-ta I.N.C.R.I.V.E.L e participa como DJ na S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L, além de produzir e tocar em outros eventos.

Fazendo um paralelo entre a produção dos anos 1990 e a de hoje, Yuga vê um diferencial importante: “Era bacana, mas estávamos mais afastados, ninguém dava as mãos. De cinco anos para cá, está tendo uma união muito forte. Hoje vejo a turma mais ligada e a fim de misturar, trabalhar em coletivo”. Outro ponto fundamental para o fomento dessa cena, segundo o DJ, é a abertura das leis de incentivo para mais artistas. A pluralidade do que está sendo feito também é uma caracterís-tica que não se via em outros tempos. “As bandas não imitam, são originais, não forçam uma coisa que já exista no mercado.”

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Praia da Estação (à esquerda) e Fora Lacerda (acima):

o povo vai às ruas

YUGA DIZ QUE, DE CINCO ANOS PARA CÁ, ESTÁ TENDO UMA UNIÃO MUITO FORTE: “HOJE VEJO A TURMA MAIS LIGADA E A FIM DE MISTURAR”OS ESPAÇOS COM CULTURA

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Criador do selo Vinyl Land, único no país a trabalhar exclusivamente com lançamentos em vinil, Luiz Valente é taxativo. “Só dá certo porque a nova geração tem uma mentalidade colaborativa, é o que toca a coisa pra frente”, afirma o DJ, que fundou o selo em 2008 e já lançou bolachas das bandas belo-horizontinas Graveola, Fusile e Dead Lovers, e também de artistas de outros estados, como BNegão, Tu-lipa Ruiz e Autoramas. Assim como Yuga, Luiz enxerga avanços: “BH era muito diferente, a cidade estava muito carente. A cena está mais forte, falta ainda se projetar mais, mas esta-mos trabalhando para isso. Um dia a gente vai olhar para trás e ver que estávamos fazendo coisa nova”.

Sentimento de amizade e um incômo-do causado pelo tratamento que as criações belo-horizontinas recebiam de parte da mídia local e das pessoas que as rodeavam fizeram com que os jornalistas Daniel Silva e Débora Fantini, e o desginer Marcelo Lustosa criassem, em março de 2009, o Mixsórdia, guia on-line semanal de cultura e diversão em BH. “Boa parte das ações que curtíamos ficava dispersa, então criamos o Mixsórdia para concentrá-las e também para que pudessem continuar exis-tindo, não na mesmice, mas de forma dinâmi-ca, criativa”, afirma Débora.

O Mixsórdia prioriza justamente aqueles

eventos que não têm espaço na grande mídia, e isso é um cri-tério importante na definição das pautas. Obviamente, existem limitações, mas a intenção, segundo a jornalista, é cada vez mais diminuir os vazios entre a informação e o público e am-pliar a cobertura dessa cena. Para Marcelo Lustosa, a internet — e aí as redes sociais têm papel fundamental –, proporcionou o fim da barreira entre produtor e consumidor: “Qualquer um pode produzir e divulgar um evento, mas essa informação deve circular além dos círculos de amizades de cada um, e o guia cumpre essa função”.

André Macedo se juntou ao fotógrafo Pedro Furtado e ao publicitário Leonardo Lott para formar, em outubro de 2010, o Coletivo Imaginário. Os três amigos foram da mesma sala na faculdade e tinham um desejo em comum: trabalhar com co-municação com mais liberdade, calma e planejamento. O Cole-tivo Imaginário foi responsável, por exemplo, pela produção do clipe de Meu primeiro elefantinho, da banda Fadarobocoptuba-rão, e está finalizando um clipe da Pequena Morte. “É uma rede de contato, está todo mundo próximo. Somos nós, a juventude da cidade, que estamos fazendo isso acontecer.”

Produtora cultural há 15 anos, Paloma Parentoni já traba-lhou com música, dança, teatro e audiovisual. Realizou, no ano passado, o Intromissões Poéticas, diálogo entre artistas de dife-rentes áreas, no Nelson Bordello. Diretora e produtora executiva do recém-lançado clipe Pressa, do músico Luiz Rocha, Paloma também é DJ. Polivalente, ela considera BH um polo gigante de produção cultural. Tanta movimentação confere aos dias de hoje um momento especial: “A cidade é nossa. Acho lindo a ga-lera não querer sair daqui. Vai ser uma delícia contar para meus filhos, netos. Isso será história para as próximas gerações”.

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Referência no hip hop nacional, o Duelo de MC’s continua firme e forte às sextas, no Viaduto Santa Teresa