cartografias da aprendizagem em rede: rastros das ... cristina... · ecologia midiática e, assim,...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC - SP Izabel Cristina Goudart da Silva Cartografias da aprendizagem em rede: rastros das dinâmicas comunicacionais do Visualizar’11, Medialab Prado DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA SÃO PAULO 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC - SP

Izabel Cristina Goudart da Silva

Cartografias da aprendizagem em rede:

rastros das dinâmicas comunicacionais do Visualizar’11, Medialab Prado

DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

SÃO PAULO

2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC - SP

Izabel Cristina Goudart da Silva

Cartografias da aprendizagem em rede:

rastros das dinâmicas comunicacionais do Visualizar’11, Medialab Prado

DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Comunicação e Semiótica sob a orientação da Prof.ª. Drª. Maria Lucia Santaella Braga.

SÃO PAULO

2012

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Banca Examinadora

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Dedico esta tese a meus pais, Durval (in

memoriam) e Judite.

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Por todas as nossas relações

Eu agradeço, eu agradeço, eu agradeço

Ao Universo que conspirou a meu favor na construção deste trabalho;

A meus amados e queridos pais, por todo amor, cuidado e dedicação empregada na educação

de seus quatro filhos biológicos e muitos outros de coração; a meus dois sobrinhos e a meus

alunos, que me ensinam a transitar nesse novo mundo; e às minhas irmãs e a meu irmão com

os quais cresci compartilhando outros universos;

À Lucia Santaella, amiga e orientadora, por me conduzir à autoria de um modo delicado,

amoroso e inteligente, qualidades tão preciosas no exercício da formação e direcionamento

para o crescimento e evolução humana;

À Marcia Marinho, pelo amor e cuidado nesses quatro anos em que caminhamos juntas, pela

confiança inabalável em minha capacidade para chegar até aqui;

Às minhas amigas, Vick Alves e Alexandra Supranni, pelo apoio incondicional.

Aos queridos amigos, Marcelo Moraes e Renata Lemos, pela estimulante e amorosa

convivência;

A meus amigos, Felipe Campos, Javier Lópes, Ale Galasso, Cecília Araújo, Paula Salazar e

Gustavo Rick, que me acolheram em suas casas e em seus corações;

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A meus colegas do CAP/UFRJ e ao amigo e diretor do Colégio Estadual Souza Aguiar (RJ),

Marcio Soledade, pelo apoio e pelo compromisso como educadores na luta pela qualidade e

inovação na educação;

A todos os artistas, programadores, hackers, designers, ciberativistas, que conheci nesses

quatro anos e com os quais aprendi novos valores, em especial, aos integrantes do laboratório

nômade LaboCA, Jarbas Jácome, Jeraman, Ricardo Brazileiro e Felipe Caligário, e à Desirée

Santos, por sua generosidade e sua dedicação no desenvolvimento e na parceria no projeto

Aprender Brincando.

À CAPES pelo incentivo `a pesquisa na concessão de bolsa parcial para o PEPGCOS

PUC/SP.

Ao Instituto Claro, pelo reconhecimento e pelo apoio para a concretização no ambiente

escolar de um laboratório cidadão aberto, participativo e colaborativo, o Aprender Brincando.

Projeto premiado na 3.a edição (2011) do prêmio Instituto Claro, Novas Formas de Aprender e

Empreender.

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GOUDART, Izabel Cristina da Silva. Cartografias da aprendizagem em rede: rastros das dinâmicas comunicacionais do Visualizar’11, Medialab Prado. São Paulo, 2012. Tese (Doutorado em Comunicação e Semiótica) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

Resumo Nas últimas três décadas, presenciamos um crescente e evolutivo processo de multiplicação, hibridização, produção e disseminação de signos e linguagens propiciados pela digitalização. Novos ambientes cognitivos, comunicacionais e culturais surgem como frutos de uma ecologia midiática e, assim, configuram um ecossistema comunicacional, que ganha importância tal qual o ecossistema verde. Mutações perceptivas e cognitivas, relacionadas ao impacto da tecnologia moderna e das tecnologias digitais, ganham maior visibilidade por meio das sensibilidades juvenis e da des-ordem cultural provocada pela difusão e pela descentralização do saber. Mudanças que problematizam os sistemas de transmissões educativas da modernidade, centralizados em torno da escola e do livro, acentuam uma espécie de fosso geracional e uma inversão de papéis, em que a juventude, por sua maior empatia, plasticidade neuronal e apropriação das tecnologias digitais, assume a condução desse processo. A hipótese proposta por Margaret Mead de uma cultura pré-figurativa ganha força no surgimento de subjetividades juvenis que transitam por outros ambientes e por dinâmicas cognitivas mediados pela linguagem hipermídia e por softwares culturais. Uma ecologia cognitiva, expressa nas dinâmicas próprias da aprendizagem em rede, desponta como uma expressão de mentes conectadas, mentes que permanecem sustentadas por uma ecologia digital. Corpos e espaços, caracterizados por sua capacidade de interconexão e de trocas, produzem fluxos comunicativos e têm, na ética hacker, na cultura livre e nos commons digitais, um fundamento no qual ancoram as possibilidades abertas para a participação, para a partilha e para a colaboração e, assim, realizam uma comunicação multimídia e multimodal em rede. Objetivando mapear essas novas condições da subjetividade dos jovens, foi realizado o estudo de caso do Visualizar' 11, programa concebido pelo Medialab Prado como um projeto de pesquisa aberto, participativo e colaborativo, que aborda as teorias, as ferramentas e as estratégias de visualização de dados. Fundamentado teoricamente e metodologicamente pela Teoria Ator-Rede, o estudo de caso do Visualizar’11 possibilitou elaborar uma cartografia de dinâmicas da aprendizagem em rede e rastrear sua indissociável relação com um ecossistema comunicacional, cognitivo e digital, por meio da reconstrução das associações entre actantes humanos e não humanos, que agem como mediadores tecendo uma rede de conexões. Dessas relações, foram extraídas as bases para uma reflexão que utiliza uma abordagem ecossistêmica-semiótica para identificar padrões presentes na apropriação e na mediação da linguagem hipermídia na construção de dinâmicas cognitivas realizadas em rede. Novos padrões, que potencializam e propiciam o surgimento de ambientes de aprendizagem cooperativos, surgem a partir da reciprocidade interativa, no reconhecimento da interdependência entre os processos de pensamento e de construção de conhecimento e o ambiente geral, voltados para uma educação para a era relacional, que não separe o indivíduo do mundo em que vive e de seus relacionamentos. Palavras-chave: Comunicação. Educação. Aprendizagem em rede. Teoria ecossistêmica. Teoria ator-rede.

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GOUDART, Izabel Cristina da Silva. Networked learning maps: traces of communicational dynamics at Visualizar'11, Medialab Prado. São Paulo, 2012. Thesis (Ph. D. in Communication and Semiotics) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

Abstract Over the last three decades, we have witnessed a growing and evolving process of multiplication, hybridization, production and dissemination of signs and languages enabled by digitalization. New cognitive, communicative and cultural objects emerge as a media ecology, configuring a new communication ecosystem, which becomes as important as natural ecosystems. Perceptual and cognitive mutations related to the impact of modern digital technologies are achieving greater visibility via processes of knowledge diffusion and decentralization around youth sensibilities and their countercultures. These cultural mutations challenge modern systems of educational broadcast centered around the school and the book, and emphasize what might be understood as a generational gap or role reversal, wherein youth - by virtue of their greater empathy and neuronal plasticity - assume ownership of digital technologies and therefore become the main driving force in this process. A cognitive ecology that expresses itself in the dynamics of networked learning emerges as an expression of connected minds, minds that remain supported by a digital ecology. Bodies and spaces become marked by their interconnection, communicative flow capacity, against the background of Hacker ethics and free culture. The digital commons becomes a shared ground for the possibilities of open participation, sharing and collaboration, and the implementation of a multimedia, multimodal network. In order to map these new digital features of youth subjectivity, a study about Visualizar'11 was conducted. Visualizar'11 is a Medialab Prado program designed as an open research project, participatory and collaborative, which addresses theories, tools and strategies for data visualization. Theoretically and methodologically based upon Actor-Network Theory, this research studied Visualizar'11 as a case of inquiry, mapping the development of a learning network by following its traces within a cognitive and digital ecosystem of communication, and reconstructing the associations between human and nonhuman actants, which act as mediators weaving a web of connections. The inseparability of communicative, cognitive and digital ecosystems is evidenced within a system-integrated environment that fosters the emergence of a collective mind as a shared property. These relationships were used as references for theoretical reflections based on an ecosystemic, semiotic approach which identified patterns present in the appropriation and mediation of hypermedia language in dynamic cognitive networks. These new standards enhance and foster the emergence of cooperative learning environments, which arise from interactive reciprocity, in recognition of the interdependence between thought processes, knowledge building and the environment; and are oriented toward an education which belongs to the relational era, one that does not separate the individual from her relationships and the world.

Keywords: Communication. Education. Networked learning. Ecosystemic theory. Actor-network theory.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Mapa interativo on-line aberto para coleta colaborativa de dados sobre a

estrutura, tipo de atividades e interconexão entre os diversos laboratórios de mídia no

mundo ............................................................................................................................ 7

Figura 2: M. C. Escher Bond of Union (1956) …………………………………….. 25

Figura 3: Possíveis campos de aplicação da convergência tecnológica ...................... 54

Figura 4: Oneness ........................................................................................................ 60

Figura 5: Estudo da NSFNET de visualização do tráfego de entrada, medido em

bilhões de bytes, do backbone T1 para o mês de setembro de 1991. A faixa de volume

de tráfego é retratado de roxo (zero bytes) ao branco (100 bilhões de bytes). Ele

representa os dados coletados por Mérito Network, Inc. Os nós de backbone NSFNET

são mostrados no topo, redes regionais abaixo ............................................................ 68

Figura 6: Um modelo de inteligência coletiva a serviço do desenvolvimento humano

...................................................................................................................................... 86

Figura 7: Deitch Projects ............................................................................................. 92

Figura 8: Estrutura ressonante do anel benzênico ou aromático ................................. 93

Figura 9: Estrutura proposta por Kékule baseada no sonho com o Ouroboro.............. 93

Figura 10: Imagem obtida pelo captura da tela do software interativo disponibilizado

no site www.uff.br/cdme/platonicos/platonicos-html/tetraedro-br.html, que possibilita

a visualização tridimensional do tetraedro, incluir esferas circunscritas e inscritas,

planificar e girar o polígono ....................................................................................... 111

Figura11: Molécula do Metano (CH4) ....................................................................... 111

Figura 12: As quatro faces do tetraedro ..................................................................... 113

Figura 13: Tetraedro planificado contendo uma esfera circunscrita (semiosfera) e uma

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esfera inscrita (aprendizagem em rede) ..................................................................... 113

Figura 14: As quatro faces do tetraedro ..................................................................... 129

Figura 15: Tetraedro planificado ............................................................................... 130

Figura 16: Relações e agenciamentos da linguagem hipermídia ............................... 140

Figura 17: Ecologia cognitiva e comunicacional ....................................................... 141

Figura 18: Ecologia digital ........................................................................................ 147

Figura 19: Captura de tela da interface da Pearltrees nomeada Cartografias da

aprendizagem em Rede, em que foi aberta a pearl Visualizar’11. É possível agrupar

diversas pearls em uma única, que pode ser fechada clicando no x, ao lado do círculo.

A imagem capturada é do dia 19/08 e não corresponde à versão final ...................... 154

Figura 20: Detalhe capturado da Figura 19, janela aberta com a interação do mouse

sobre a pearl correspondente. A janela permite uma visualização ágil do conteúdo da

pearl, além de: disponibilizar recursos para comentários e partilha nas redes google+,

twitter e facebook; obter o código que permite postá-la em outra página ou enviar um

convite por e-mail; e obter a url completa ou reduzida para uma postagem no twitter,

por exemplo, bastando clicar em cada ícone correspondente. Essa janela se difere das

demais, pois corresponde à pearltree que nomeia o coletivo. Pode ser adicionado um

editorial para descrevê-la. O número de pearls conectados é disponibilizado, bem

como o número de visualizações (hits) e picks (uma variação do curtir do facebook).

Convites para editar a pearltree podem ser feitos, compondo o team up ................. 156

Figura 21: Janela de comentários do pearl da página Processing.org. Quando foi

adicionada, a página continha 7 comentários de usuários. Os comentários abordam o

software Processing, disponibilizado para download na plataforma processing.org. O

usuário Trackingnewtech descreve o software e Noncom acrescenta suas críticas e

outras opções de programas para o mesmo fim. Essa página é um dos itens coletados

na pearl Cartografias da aprendizagem em rede visualizada no iPad ...................... 157

Figura 22: Curiosidade + escolha .............................................................................. 168

Figura 23: Intenção + atenção ................................................................................... 168

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Figura 24: Vista a partir da Plaza de las Letras ........................................................ 175

Figura 25: Detalhes do projeto da fachada digital, vista lateral ................................. 175

Figura 26: Plaza das Letras, vista frontal da fachada digital .................................... 176

Figura 27: Apresentação do AVLAB ........................................................................ 180

Figura 28: Segundo dia de trabalho da oficina internacional Visualizar’ 11: compreender as infraestruturas; dedicado a visualização de infraestruturas compreendidas como grandes sistemas que suportam processos globais, desde os que produzem energia e água aos que possibilitam a comunicação global e mobilidade .................................................................................................................................... 181

Figura 29: Imagem capturada da tela de computador da janela do Flickr, busca Visualizar’11, na lateral direita motores de busca relacionam outros participantes, redirecionando para imagens correlatas ao tema ....................................................... 182

Figura 30: Mesa realizada em 05/05/2011 sobre o tema dados abertos .................... 182

Figura 31: Recorte da página da convocatória, vídeo apresentando o programa ...... 185

Figura 32: Storyboard elaborado para apresentação final e exposição dos projetos do

Visualizar’11 .............................................................................................................. 192

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SUMÁRIO

MITAKUYE OYASIN (POR TODAS AS NOSSAS RELAÇÕES) ................. 1

CARTOGRAFIAS DA APRENDIZAGEM EM REDE ......................................... 5

CONTEXTUALIZANDO: CAMINHOS E DESCAMINHOS DE UMA

AVENTURA NÔMADE ........................................................................................

11

COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO: O CRESCIMENTO DOS SIGNOS ............. 20

UM SOBREVOO: JUSTIFICATIVA E LIMITES ................................................. 27

1.0 MUTAÇÕES DA ERA DIGITAL ................................................................. 30

1.1 MUTAÇÕES E A DES-ORDEM CULTURAL ................................................ 40

1.2 CAINDO NA REDE ......................................................................................... 47

1.3 MUTAÇÕES EM EDUCAÇÃO ....................................................................... 54

2.0 REDES, CONECTIVIDADE E APRENDIZAGEM ................................... 60

2.1 CONECTIVISMO ............................................................................................. 61

2.2 REDES E CONECTIVIDADE NA EDUCAÇÃO ........................................... 67

2.2.1 Ciberespaço como um ambiente virtual de aprendizagem ....................... 70

2.2.2 Interatividade, fluxos informacionais e os nós da rede ............................. 76

2.2.3 Os objetos técnicos começam a ganhar vida... ........................................... 83

2.2.4 Redes sociais da internet .............................................................................. 87

2.2.5 Colaboração em foco .................................................................................... 89

2.3 APRENDIZAGEM EM REDE: UM CONCEITO QUE ESCAPA AO

PENSAMENTO DA REPRESENTAÇÃO? ...........................................................

90

2.4 REDES E MEDIAÇÃO: SOCIAL X COLETIVO ........................................... 94

2.5 APRENDIZAGEM, CONECTIVIDADE E SEMIOSE ................................... 103

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2.5.1 Complexidade e aprendizagem em rede ..................................................... 103

2.5.2 Conectividade e mediação ............................................................................ 106

2.5.3 Aprendizagem e semiose .............................................................................. 114

2.5.4 Aprendizagem em rede como um processo evolutivo ............................... 119

3.0 AS TRÊS ECOLOGIAS E A APRENDIZAGEM EM REDE .................... 127

3.1 ECOLOGIA COGNITIVA E COMUNICACIONAL: A LINGUAGEM

HIPERMÍDIA .........................................................................................................

131

3.2 O SOFTWARE: ATOMIZANDO A CULTURA .............................................. 136

3.3 ECOLOGIA DIGITAL ..................................................................................... 142

4.0 SEGUINDO OS RASTROS: .......................................................................... 149

4.1 METODOLOGIA ............................................................................................. 149

4.2 CARTOGRAFIAS DA APRENDIZAGEM EM REDE ................................... 158

5.0 CARTOGRAFIAS DA APRENDIZAGEM EM REDE .............................. 161

5.1 ESTUDO DE CASO DO VISUALIZAR’11 .................................................... 160

5.2 LINGUAGENS LÍQUIDAS ............................................................................. 163

5.3 MEDIALAB PRADO: PLATAFORMA ABERTA DE PROTOTIPADO

COLABORATIVO ................................................................................................... 172

5.4 VISUALIZAR’11: PLATAFORMA DE INVESTIGAÇÃO E

APRENDIZAGEM .................................................................................................

184

6.0 IVY-MARÃEN: A TERRA SEM MALES, ANO 2297 ............................... 190

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 197

ANEXO 1 ................................................................................................................ 222

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1  

 

MITAKUYE OYASIN1: POR TODAS AS NOSSAS RELAÇÕES

A saudação nativa que convoca o estar atento ao princípio de interconexão entre tudo e

todos, sejam humanos ou não-humanos, é aqui o ponto de partida e de chegada, que se fez

eixo norteador deste estudo. Um caminho que teve início na interface entre arte, ciência e

tecnologia, resultando em uma gama de associações, algumas levadas pelo acaso, outras fruto

de seguir os rastros deixados pelas pistas da experimentação e abertura da experiência

estética.

Acolhendo o conceito de partilha do sensível de Jacques Rancière (2005, p. 13),

consideramos as práticas artísticas como um campo de partilha do comum no que estas,

“articulando maneiras de fazer, formas de visibilidade de maneiras de fazer e modos de

pensabilidade de suas relações”, intervêm na experiência coletiva. Um modo de ser específico

daquilo que pertence à arte, ao modo de ser de seus objetos, configurando um regime estético

que a desobriga de qualquer regra especifica, hierarquias, temas, gêneros e artes, e remete

para a invenção de formas sensíveis, para os possíveis modos de transformação que estas

assinalam, as linhas de passagem e rotas de fuga que possibilitam. “São os artistas que

sinalizam rotas para a adaptação humana às novas paisagens a serem habitadas pela

sensibilidade” (SANTAELLA, 2007, p. 67).

Num sentido mais abrangente, compreendemos a estética como um princípio universal

de razoabilidade direcionada para o crescimento e corporificação da razão criativa. Na

filosofia de Charles Sanders Peirce2, a estética, a ética e a lógica ou semiótica3 reúnem os

                                                                                                                         1 Mitakuye Oyasin (Eu sou aparentado com tudo o que existe) é uma oração tradicional da tribo Lacota Sioux, com a sua frase de abertura usada como refrão em muitas outras orações e canções da tribo. Reflete a crença inerente da maioria das tradições nativas americanas de que tudo está interconectado. 2 “A obra de Peirce é oceânica, de uma imensidão tamanha que seus limites se perdem de vista” (SANTAELLA, 1994, p. 112). No presente estudo, não apresentaremos sua filosofia e conceitos em capítulo à parte, mas inseridos ao longo da argumentação. Para um maior aprofundamento de sua filosofia consultar Santaella (1994, 1995; 2005). A abreviação CP será utilizada quando nos referirmos aos Collected Papers. 3A estética, ética e lógica são ciências normativas para Peirce, aquelas que estudam o que deve ser, isto é, fins, propósitos, valores, metas e ideais que atraem e guiam a conduta deliberada (SANTAELLA, 1994). A lógica lida com o raciocínio sob a tutela do autocontrole e da autocrítica, o que implica em direcionar a conduta de forma deliberada em direção a um propósito último do pensamento, sendo este determinado pela ética. A ética vem responder às perguntas: “Para onde a forca da minha vontade deve ser dirigida?” (CP 2.198), que normas e ideais

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2  

 

princípios que orientam a sensibilidade, a vontade e a mente para um ideal admirável: “metas

ou ideias que descobrimos porque somos atraídos por eles, empenhando-nos na sua realização

concreta” (SANTAELLA, 2003, p. 329). Num movimento tríplice, a razão inteligente é

orientada pela ética, que pergunta para que fim todo esforço deve ser dirigido. Esta, por sua

vez, apela para a estética para ajudá-la a determinar um fim último, o summum bonum (CP

1.191, 1.573-575, 2.116, 5.566 e 6.290). A estética ganha um outro contorno com Peirce, é a

ciência geral do admirável contida na espontaneidade da vida, na variedade e diversidade

características do universo, na tendência da natureza para o crescimento, aprendizagem,

aquisição e mudança de hábitos, leis gerais que são resultados de um processo evolutivo (CP

7.515).

Seguindo o princípio de interconexão de todas as coisas, o eixo ético que orienta este

estudo vem do aprendizado com a natureza, dos seus ecossistemas e do reconhecimento de

que é necessária uma profunda mudança de percepção e pensamento que possa garantir a

sobrevivência desse complexo sistema que organiza a permanência da vida em nosso planeta.

Uma ética ecológica alicerçada em valores ecocêntricos, na qual “a percepção ecológica

profunda reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que,

enquanto indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos processos cíclicos da

natureza” (CAPRA, 1995, p. 16). Na ecologia, a metáfora da rede é uma questão central – “a

teia da vida consiste em redes dentro de redes” (CAPRA, 1995, p. 35), nas quais conexões de

diferentes tipos se alternam, se sobrepõe ou se combinam, sem hierarquias. A passagem de

uma visão de organização hierárquica da sociedade para o padrão de redes é proposta por

Capra (1995) como uma mudança de paradigma, em que a interdependência ecológica funda

uma ciência das relações.

Guatarri (1990) é outro autor que nos adverte para a necessidade de uma articulação

ético-política, que denomina de ecosofia, entre três registros ecológicos: o do meio ambiente,

o das relações sociais e o da subjetividade. Articulação que propicie uma re-invenção do meio

ambiente, não apenas no contexto do que, no senso comum, se compreende por natureza, mas

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           guiam nossas ações? Por sua vez, compete à estética responder que fins últimos são estes. “O que é que se deve deliberadamente admirar per se, em si mesmo, independentemente daquilo a que se é conduzido e independentemente das suas aplicações sobre a conduta humana?” Essa investigação Peirce chamou de Estética. (CP 5.36 apud SANTAELLA, 1994, p. 125).

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no sentido de uma re-singularização individual e/ou coletiva dos dispositivos de produção de

subjetividade, afetando os domínios moleculares de sensibilidade, de inteligência e de desejo.

“Precisamos aprender a pensar transversalmente as interações entre ecossistemas,

mecanosferas e Universos de referências sociais e individuais” (GUATARRI, 1990, p. 25),

fazer emergir uma eco-lógica que detecte vetores potenciais de subjetivação e singularização,

modos de agenciamentos processuais provocando desterritorializações suaves e produtivas,

que coloque em causa os modos de produção de subjetividade – conhecimento, cultura,

sensibilidade e sociabilidade – e provoque a instauração de novos sistemas de valorização. “O

princípio particular à ecologia ambiental é o de que tudo é possível tanto as piores catástrofes

quanto as evoluções flexíveis” (GUATARRI, 1990, p. 52).

Nessa linha de pensamento, Moraes (1997; 2008) propõe a adoção de um paradigma

educacional ecossistêmico. Paradigma que reconhece a complexidade existente no universo,

cujas qualidades emergem a partir de uma rede de relações e conexões definidoras das

propriedades do sistema, perspectiva que a autora extrai, principalmente, do pensamento de

Morin (1995; 1996). Da física quântica, acrescenta a inseparabilidade dos fluxos entre matéria

e energia, o dinamismo constante das mudanças e transformações, onde tudo está em

processo, em fluxo, incluindo o pensamento:

Assim, pensar sistemicamente é pensar de maneira complexa, de maneira global, de maneira ecológica. É compreender os contextos como sendo contextos ecologizados e as ações como sendo ações ecologizadas, lembrando que toda a ação individual é também influenciada pelos pensamentos, pelos sentimentos e ações dos outros. Uma ação que não envolve apenas a intenção de quem atua, já que o resultado pode ser diferente do esperado ou da intenção inicial. Toda ação envolve interação e, para Morin, ela estaria também sujeita ao princípio de incerteza e do acaso. (MORAES, 2008, p. 83).

Pensar e agir a partir de contextos e ações ecologizadas é voltar a intenção e atenção

para a configuração de espaços de convivência mais harmoniosos, alegres, amorosos, criando

um ambiente agradável e emocionalmente sadio para o desenvolvimento do aprendiz.

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A era das relações requer, por sua vez, uma nova ecologia cognitiva, traduzida na criação de novos ambientes de aprendizagem que privilegiem a circulação de informações, a construção de conhecimento pelo aprendiz, o desenvolvimento e compreensão e, se possível, o alcance e a sabedoria objetivada pela evolução da consciência individual e coletiva. Uma nova ecologia cognitiva significa uma nova relação com a cognição, com o conhecimento e com os outros, uma nova dinâmica nos processos de construção do saber, que esclareça a existência de relações, diálogos e interações entre diferentes organismos, que indique que tudo o que existe coexiste e que nada existe fora das conexões e relações. (MORAES, 2008, p. 27)

“Novas figuras da razão” (MARTÍN-BARBERO, 2006; OROZCO GÓMEZ, 2006;

SANTAELLA, 2010) estão emergindo fruto de uma tecnicidade ou mediação tecnológica que

vem gerando mutações comunicacionais e culturais observáveis no fluxo evolutivo do reino

dos signos e nos novos modos de percepção e de linguagem, novas sensibilidades e escritas.

Mutação que se manifesta na circulação do saber fora da escola e dos livros (descentramento),

na dissolução das fronteiras que separam o conhecimento acadêmico do saber comum

(disseminação) e na semiodiversidade cada vez maior, expressa na lógica característica da

hipermídia (SANTAELLA, 2010), propondo uma redefinição do sujeito da educação

(MARTÍN-BARBERO, 2003).

Pensar em termos de mutação, enquanto fluxo contínuo de mudança, conduz-nos a um

princípio evolutivo universal. Os ideogramas do I Ching4 (Livro de Mutações) são compostos

por linhas inteiras e interrompidas, superpostas em conjuntos de três e seis linhas, chamadas

“Kua” (signo). Associa-se aos Kuas o ideograma I que, segundo alguns autores, teria sua

origem na imagem do camaleão, significando movimento (devido à agilidade dos lagartos) e

mutação (em virtude do mimetismo), fluir contínuo da mudança. “Não há o que mude, não há

quem mude, só ha o mudar” (WILLEIN, 1999, XII). Segundo o Livro de Mutações, se algo ou

alguém muda, significa supor esse algo ou alguém fora da mutação, sofrendo-lhe a ação.

                                                                                                                         4 Plaza (2008, p. 187-204) apresenta no livro Tradução Intersemióitca uma síntese de estudos e traduções sobre o I Ching, que possibilita uma introdução ao pensamento oriental, entre elas considera o I Ching como “um largo poema circular de 64 textos, flutuando entre a sutil alusão e a referência direta, cujo tema é a transformação de todas as coisas que formam o universo ou uma descrição da mudança apresentada como verdadeira imagem da realidade. Esta última consideração levou John Blofeld a titular sua tradução para o inglês como The Book of Change e a assinalar que o aspecto mais interessante da obra é a forma como as coisas se sucedem e vão se transformando em outras, seguindo os princípios ordenadores da realidade.”

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Atribuindo à mutação uma universalidade, não se pode propriamente falar de algo que mude

ou alguém que muda, é preciso compreender os modos e estágios da mutação.

Antes de tudo, é preciso reconhecer que a convergência da globalização e da revolução tecnológica configura novo ecossistema de linguagens e escritas. A cada avanço que se opera no mundo da linguagem, passamos a habitar em novas ecologias comunicacionais e culturais que apresentam uma semiodiversidade cada vez maior. As estruturas digitas híbridas de textos, imagens, áudios, vídeos e programação têm possibilitado a criação de uma lógica nunca antes explorada, uma lógica característica da hipermídia que é própria das redes nas quais os meios de produção, de armazenamento, de distribuição e de recepção se fundem em um todo complexo. Neste, borram-se as tradicionais bordas comunicativas entre produção, de um lado e recepção, de outro. Não são poucas as consequências culturais e cognitivas que isso traz para os modos de se produzir informação, conhecimento, ciência, arte e entretenimento, trazendo para o foro dos debates questões candentes que precisam ser exploradas, livres de preconceitos e saudosismos. (SANTAELLA, 2010, p. 63)

CARTOGRAFIAS DA APRENDIZAGEM EM REDE

“A reflexividade para ter algum peso tem que ser coletiva”

(SANTOS, 1996, p.22)

No fluxo das transformações e mudanças impulsionadas pelo crescimento e profusão

das tecnologias e linguagens digitais, fomos levados em direção aos ambientes onde as

comunicações e as artes se cruzam na contemporaneidade, articulando um complexo

ecossistema comunicacional, cultural e cognitivo. Ambientes onde transitam as linguagens

interativas da era digital e que sinalizam rotas para adaptação humana às novas paisagens...

Considerando que linguagem e pensamento5 andam de mãos dadas, tais rotas são como um

“decalque que capta pontos de estruturação, entendidos como estabilizações temporárias do

funcionamento e criação dos rizomas” (KASTRUP, 2010, p. 82). A figura do rizoma de                                                                                                                          5 A linguagem compreendida como sinônimo de pensamento é um conceito extraído da filosofia de Peirce. A semiose ou ação dos signos compreende o próprio movimento do pensamento em processo. A exteriorização do pensamento é mediada pela produção de linguagem e processo comunicacionais e culturais que originam, transcriação de formas, tradução intersemióticas, na profusão e diversidade de signos que originam.

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Deleuze e Guatarri (2000) vem sendo adotada como a metáfora que captura as características

e propriedades dessas novas paisagens, cuja topologia descreve a lógica das redes. Lógica que

também podemos compreender como semiose ou pensamento, cuja mediação tecnológica

remete a “novos modos de percepção e de linguagens, novas sensibilidades e escritas, que

vem modificando o estatuto cognitivo e institucional das condições do saber e das figuras da

razão” (MARTÍN-BARBERO, 2006, p. 54). Motivos pelos quais traçar os contornos e

desenhos dos rizomas em sua multiplicidade de formas e caminhos é realizar uma cartografia

das associações, das relações e conexões, das traduções e mediações operadas pelos processos

sígnicos que ocorrem nos entremeios da vida que pulsa no acoplamento entre humanos e não-

humanos. Andanças por trilhas que permitiram tornar visível o que aqui denominamos de

cartografias da aprendizagem em rede.

Novos ambientes de produção de conhecimento e aprendizagem que se multiplicam a

cada dia, entre os quais encontramos os medialabs − laboratórios de experimentação em novas

mídias − sejam no formato de instituições culturais (Medialab Prado, LabMIS-SP) e

científicas (MIT) ou uma mistura das duas, bem como na forma de coletivos artísticos

(LaboCa, Metareciclagem, Garoa Hackerlab), pontos de cultura etc. Laboratórios concebidos

menos como espaços físicos e mais como uma atitude coletiva, fundada na disposição de

exercitar novos modos de relacionar pessoas, informação, sociedade e o planeta. Labs que se

vaporizam na dinâmica dos dispositivos móveis e das conexões sem fio, na diversidade de

formatos, finalidades e concepções (FONSECA, 2012).

Iniciativas de compreender a dinâmica emergente desses laboratórios. seu papel e

função na sociedade contemporânea têm articulado reflexões que buscam identificar pontos

comuns, diferenças fundamentais e possibilidades de intercâmbio. No Brasil, resultou na

criação da plataforma Rede//Labs6, uma plataforma de pesquisa e desenvolvimento com o

objetivo de buscar pontos de contato entre o referencial internacional de medialabs e as

características únicas do que vem se desenvolvendo como uma cultura digital brasileira. No

âmbito da América Latina, resultou na criação do LabSurLab, organização autônoma que

                                                                                                                         6 Conferir: http://redelabs.org

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reúne laboratórios oficiais, marginais, institucionais e independentes da América Latina com o

objetivo de analisar os possíveis vetores e estratégias culturais da sociedade em rede7.

Figura 1: Mapa interativo on-line aberto para coleta colaborativa de dados sobre a estrutura, tipo de atividades e interconexão entre os diversos laboratórios de mídia no mundo8.

Fonte: http://fictionlab.hu/mappa/

A Figura 1 é uma imagem capturada do Mappa, projeto colaborativo que objetiva

mapear os diversos laboratórios de mídias e reunir informações sobre arte, ciência e

tecnologia e sobre a cultura global DIY (do it your self - faça você mesmo). É possível

realizar um registro e acrescentar informações de localização, estrutura, finalidades, natureza

institucional, etc. Uma espécie de google maps com a localização é gerado, além do diagrama

de conexões entre os diversos labs. Mapas semelhantes estão em construção como o

archivovivo.org9, uma parceria entre o Centro Cultural da Espanha de SP, Hacklab e o projeto

Mapas de Vista.

                                                                                                                         7 Conferir: http://labsurlab.org. O primeiro encontro foi em abril de 2011 em Medellín, Colômbia, o segundo está previsto para junho de 2012, em Quito, Equador. 8 Conferir: http://mappa.fictionlab.hu/ 9 O Centro Cultural da Espanha em São Paulo, em parceria com o Hacklab e o projeto Mapas de Vista, desenvolveram um tema de worpress dedicado a realizar cartografias. O tema pode funcionar como um portal de

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Na busca de formação no uso das tecnologias digitais e suas linguagens, objetivando

incorporá-las na produção de conhecimento escolar, o deslocamento de um ambiente formal

de aprendizagem para os ambientes dos media labs foi uma consequência inerente à condição

própria implícita desses espaços/ambientes. No entanto, o resultado dessa interação foi muito

além do que simplesmente adquirir competências meramente técnicas, propiciou vivenciar a

experiência estética própria da cultura digital, afinal:

Como se pode ver, na era digital, tanto quanto em outras eras, os artistas lançam-se a frente do seu tempo. Quando surgem novos suportes e recursos técnicos, são eles que tomam a dianteira da exploração das possibilidades que se abrem para a criação. Desbravam esses territórios tendo em vista a regeneração da sensibilidade humana para a habitação e trânsito dos nossos sentidos e da nossa inteligência em novos ambientes que, longe de serem meramente técnicos, são também vitais. (SANTAELLA, 2007, p. 67)

Explorando a habitação e trânsito nesses novos ambientes, este estudo se propõe a

realizar: o estudo de caso do Visualizar’11, um dos programas desenvolvidos pelo Medialab

Prado no formato de projeto de pesquisa aberto, participativo e colaborativo que aborda as

teorias, ferramentas e estratégias de visualização de dados. Estudo narrado como cartografia,

segundo o método de Deleuze e Guatarri (2000) e o método da Teoria Ator-Rede (TAR).

Acrescentamos um relato do resultado da participação no Visualizar’11 e sua reverberação

futura no ambiente escolar, na materialização do projeto Aprender Brincando10 e sua conexão

com as oficinas nômades realizadas pelo Laboratório de Computação e Artes (LaboCa), em

2010, - coletivo formado por quatro artistas de software, os brasileiros Jarbas Jácome,

Jeraman, Ricardo Brazileiro e Felipe Calegário e projeto de imersão e experimento em arte

digital com o objetivo de ensinar e pesquisar sobre o uso da computação para fins artísticos.

A cartografia, compreendida tal como Deleuze e Guattari (2000)11 chamaram essa

prática, problematiza um território subjetivo, investiga-o processualmente, sem representá-lo,

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           mapas e receber de maneira fácil customização de cores, pins, categorias e filtros. Para os desenvolvedores de software é um tema aberto a mudanças e interferências variadas. 10 Projeto vencedor do III Prêmio Instituto Claro: Novas formas de Aprender e Empreender. O projeto é fruto dos desdobramentos desta pesquisa, cujos resultados não serão incluídos por ter sua implantação prevista, após sua finalização. 11Conferir, especialmente, Deleuze e Guattari (2000), Rizoma, e Rolnik (1989).

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sem interpretá-lo. Esse método de pesquisa não pretende apreender ou imobilizar ditos

movimentos, mas pensar seus efeitos enquanto eles acontecem, como também seus rastros

pelo terreno12. Criam-se formas de expressão para impactos sofridos por um território

subjetivo, para produzir com eles algum sentido, para produzir conhecimento com e a partir

da experiência (FARINA, 2007). Como diz o artista Olafur Eliasson (2011) a respeito de suas

investigações artísticas: o que é a experiência e o que é o efeito da experiência?

Por sua vez, eleger a Teoria Ator-Rede (TAR) como método e teoria é assumir o ponto

de vista da sociologia das associações e um socius que se estrutura como rede, enfatizando o

papel que as relações e conexões entre actantes humanos e não humanos assumem para

provocar alguma diferença ou tradução. O objetivo principal é confrontar com formas de

conhecimento ainda instáveis, nas quais não existe um guia claro e, assim, narrar suas

relações e construções enquanto elas estão se atualizando.

Ao elegermos este estudo de caso, intencionamos narrar o modo como a cultura digital

articula a autonomia e memória dos ecossistemas comunicacional, cognitivo e digital,

propiciando o surgimento e permanência de novos ambientes de aprendizagem. Ambientes

baseados em dinâmicas colaborativas e comunicacionais, configurados como aprendizagem

em rede.

A hipótese levantada é a de que nessas experiências - que representam um recorte

específico e um microssistema dos laboratórios experimentais de mídias e cultura digital, que

tem se multiplicado pelo mundo e que, no Brasil, tem sua expressão nos diversos pontos de

cultura digital e hacklabs que se difundiram pelo país -, encontraremos traços expressivos e

metodológicos que, explicitando a característica rizomática da linguagem interativa digital

(linguagem hipermídia), revelam um novo padrão perceptivo-cognitivo. Exprimir é envolver e

explicar. A expressão envolve, implica o que ela exprime, ao mesmo tempo ela explica e

desenvolve (CARVALHO, 2007).

Envolver implica dobrar a ordem interna, dobrar para dentro e explicar, em

desenvolver, dobrar para fora. Nesse movimento nos deparamos com a relação entre

linguagem e comunicação, pensamento e expressão. Pensamento é semiose, e semiose, a ação

do signo. Ação de gerar um interpretante que também é um signo que, por sua vez, ao ser

                                                                                                                         12Sobre esse método, conferir Kastrup (2007).

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realizado como signo, gera outro interpretante, e assim por diante. A teoria semiótica de

Charles Sanders Peirce nos possibilita compreender esse movimento ao localizar o

pensamento nos meios de sua expressão (RANSDELL, 2007). Por esta razão é que a

linguagem hipermídia é a porta de entrada dessa cartografia, no que esta, a partir de suas

mediações e modos de apropriação, revela dos padrões de organização e interdependência dos

ecossistemas cognitivo, comunicativo e digital, de uma mente coletiva, e sua relação com a

construção de dinâmicas cognitivas externalizadas, distribuídas e colaborativas realizadas em

rede. Uma ilimitada rede semiótica, tomando as concepções da teoria da ação dos signos de

Peirce:

As cognições são, consequentemente, nós na rede semiótica ilimitada que tem suas fundações no princípio de que 'todo pensamento é um signo' que deve se dirigir a um outro, deve determinar algum outro, visto que essa é a essência de um signo. (CP 5.253)

Tratando-se de abordar uma rede semiótica, a perspectiva ecossistêmica é adotada

como égide estética-ética-lógica elegendo os seguintes pressupostos:

1. As mutações que estamos presenciando implicam uma consciência da mudança, cuja

manifestação pode ser percebida no “fosso entre as gerações” ou sensibilidades

juvenis, mas que abrange toda a sociedade (MEAD, 1970; MARTÍN-BARBERO,

2000).

2. As mudanças estão relacionadas com uma remodelização do corpo e uma

reconfiguração da mente humana e da consciência (SANTAELLA, 2009).

3. Que a mente não é somente um atributo humano e que está presente em tudo que

cresce com o tempo, evoluí, aprende (PEIRCE, CP).

4. A mente humana tem evoluído, configurando-se com uma mente coletiva conectada.

5. A necessidade de priorizarmos princípios estéticos e éticos que levem em conta a

ecologia como um referente, uma ecosofia (GUATTARI, 1990), princípios que

articulem três dimensões do ecossistema: o ambiental, o social e o subjetivo.

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6. O princípio de autonomia como possibilidade de criação de novos sentidos. No caso

da autonomia do sistema, a capacidade de elaborar adequadamente seu meio

ambiente, criar estoques de informação e função memória e, assim, permanecer

(VIEIRA, 2008).

7. O papel da educação no sentido de propiciar o desenvolvimento da autonomia

individual, coletiva e sistêmica.

8. A compreensão da educação enquanto processo dialógico, um estar aí em relação.

Relação que envolve cooperação/participação/comunicação.

CONTEXTUALIZANDO: CAMINHOS E DES-CAMINHOS DE UMA AVENTURA

NÔMADE

Foi no SESC da Avenida Paulista que um encontro inesperado e provido pelo acaso13

iniciaria um processo, que designo de uma aventura nômade, encontro que se desdobraria no

ingresso do doutorado em Comunicação e Semiótica na PUC/SP, sob orientação de Lucia

Santaella, em agosto de 2008. Dele derivaram caminhos por estradas e trilhas bem pouco

conhecidas por esta caminhante, seguindo os rastros deixados pelas teorias de comunicação

com foco na análise das mídias, pela semiótica perciana, pelos estudos culturas dos softwares,

pela antropologia, pela filosofia de Deleuze e Guattari (2000) e tantos outros.

No início dessa trajetória, este estudo foi se delineando a partir das teorias da

comunicação, em especial as que abordam os aspectos da cibercultura e tecnologias digitais e

as transformações nas sensibilidades juvenis. Assim, foi dado o primeiro impulso para realizar

uma pesquisa sobre as mudanças de percepção e cognição dos jovens que vem provocando o

que Martín-Barbero (2008) assinala como “des-ordem cultural” e que tem se mostrado como

uma constante exponencial, desde que ingressei no universo da educação básica no início dos                                                                                                                          13 Conheci Marcelo Santos de Moraes, aluno da Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, da PUC/SP, ao participar de uma oficina no SESC, cuja inscrição fora resultado de um erro. Este viria a se tornar um amigo e interlocutor presente e fundamental para o desenvolvimento desta pesquisa. O mais interessante é que ambos participavam de um curso prático de vídeo-arte, cuja dinâmica nos provocava a experimentar o revezamento de papéis de atores, produtores e editores. Esta foi a primeira de várias oficinas que participei durante quatro anos de pesquisa com foco nas mídias digitais e suas linguagens e que teriam marcante influência na definição do corpus desse estudo.

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anos 9014. Diálogo proposto entre comunicação e educação, uma leitura de processos que

estariam ocorrendo no campo cognitivo e da aprendizagem dos “nativos digitais” a partir do

viés comunicacional e do impacto das “novas tecnologias”15 no cotidiano juvenil.

Propunha realizar um trabalho de campo com um grupo de alunos do ensino médio

com o objetivo de, por meio da elaboração de hipermídia, realizar o que denominei de

cartografia semiótica dos nativos digitais. A partir de relações diagramáticas, tomando o

conceito de hipoícone diagramático de Charles Sanders Peirce, a teoria das matrizes da

linguagem e pensamento de Santaella (2005) e o conceito de tradução intersemiótica

desenvolvido por Plaza (2008), pretendia inferir como a linguagem hipermidiática constitui-se

como uma cartografia da “lógica” dos jovens estudados e em que medida revela alguns

aspectos da mudança de percepção e da estrutura cognitiva operada pela imersão desses

jovens nos ambientes digitais.

No segundo semestre de 2010, realizei um pré-teste no Colégio Estadual Souza

Aguiar/RJ (CESA), convidando alunos do segundo ano do ensino médio para participar do

Laboratório de Hipermídia (Labhiper)16. O Labhiper objetivava ser um espaço de

experimentação do uso da linguagem visual, sonora e verbal e suas misturas no

desenvolvimento de novas formas de escritura por alunos do ensino médio. A metodologia

consistia em realizar oficinas de edição de som, fotografia e vídeo e programação para,

posteriormente, desenvolver um projeto em hipermídia. O confronto com a realidade da

estrutura e funcionamento da escola pública estadual no Rio Janeiro17 e da cultura da

                                                                                                                         14 Iniciei minhas atividades na educação em 1992, no ensino secundário de Física e Química. Dos laboratórios de análise e controle, onde trabalhava como técnica em Química, realizei uma transição gradual para as salas de aula. Do primeiro, trouxe a perspectiva da ciência e da técnica enquanto modo de produção de um mundo social-histórico marcados pela lógica capitalista e pela eficácia do saber científico. Na educação, me deparei com uma atividade sem fim em si mesma, por tratar de um outro que se desdobra em busca de singularização. Utopia que retroalimenta a atividade educativa. Ainda que possamos assumir a institucionalização do saber como um modo de regulação, um artefato de governamentalidade na perspectiva foucaultiana, “Nós precisamos da utopia, não para sonhar realizá-la, mas para tê-la conosco e nos dar assim os meios de reinventar o cotidiano.” (AUGÉ, 2010, p. 108). 15 O termo “novas tecnologias” vem sendo empregado de forma generalizada para designar as tecnologias digitais ou as tecnologias de informação e comunicação (TICs). Não há nada de novo embaixo do céu, as tecnologias digitais já não são tão “novas”, mas seu caráter mutante e de atualização e inovação constante, seu estado “beta” parece estar se tornando uma condição universal. A versão beta de um software é a versão experimental e que é submetida aos usuários para identificação de erros e sugestões de melhorias, essa prática vem da cultura de desenvolvimento dos softwares livres e tornou-se padrão para maioria dos lançamentos de softwares. 16 Registros do processo encontram-se em http://labhipermidia.wordpress.com. 17 Minha atividade docente (19 anos) foi desenvolvida, predominantemente, no Colégio de Aplicação da UFRJ,

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educação formal, da “escolarização”, no contraste com as práticas de produção de

conhecimento da cultura digital, colocaram em questão a viabilidade de desenvolver um

projeto sem que, ao final, reduzisse a pesquisa a um diagnóstico das condições operacionais

da transposição da cultura digital para a cultura escolar. Alves (2008), educadora que realiza

pesquisas com a utilização de games nas práticas pedagógicas escolares, acerca da condição

de se realizar um estudo dessa natureza nas escolas, comenta:

Este cenário tecnológico aquém das necessidades dos sujeitos que nasceram imersos em uma cultura digital que exigem cada vez mais interatividade e participação em suas atividades mediadas pelas tecnologias digitais e telemáticas, pode não despertar o prazer de interagir com tais artefatos, comprometendo muitas vezes os resultados das pesquisas que intencionam investigar os processos cognitivos nesses lócus de aprendizagem. (ALVES, 2008, p. 2)

Deparei-me com uma segunda limitação quanto ao tempo necessário para

implantação, desenvolvimento e reformulação do Labhiper18. Este mostrou se exíguo para

superar as dificuldades subjetivas relativas aos modelos de ensino-aprendizagem

interiorizados ao longo de uma vivência e prática escolar centrada na cultura do livro, tanto

como aluna quanto como professora, e, operacionais, no que diz respeito aos entraves

relativos às normas e procedimentos institucionais. Daniel Puig, professor de música do

CAp/UFRJ, relata, no blog do eletriCAp19- projeto de aprendizagem e produção em rede de

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           cuja natureza universitária o diferencia da estrutura e funcionamento das demais escolas públicas por ser um espaço de pesquisa aplicada em educação e de formação de professores. O CAp/UFRJ é uma referência nacional em termos de qualidade em educação. Tratando-se do sistema de educação pública do Estado do Rio de Janeiro, o IDERJ (Índice de desenvolvimento da Educação Básica do Rio de Janeiro), em uma escala de 0 a 10, obteve o valor médio de 1,7 para as escolas públicas estaduais, no primeiro semestre de 2011. 18O primeiro contato coma direção foi realizado no segundo semestre de 2009. No ano de 2010, foi realizado o planejamento das atividades, no primeiro semestre, e a aplicação do pré-teste, no segundo semestre do mesmo ano. Em 2011, foi proposto um outro formato resultante das análises parciais do pré-teste. Apesar da inscrição de 40 alunos, somente dois efetivamente iniciaram as atividades, interrompida com a greve das escolas estaduais, que perdurou até o segundo semestre de 2011. Diante das dificuldades resolvi interromper as atividades e após o retorno do Visualizar’11, elaborei uma segunda reformulação do Labhiper. Transformado na versão que recebeu a nomenclatura Aprender Brincando: programando com Processing e Arduíno, o projeto recebeu apoio financeiro do Instituto Claro para execução no ano de 2012. 19 O projeto teve início em 2007, contudo somente no terceiro ano ganhou forma e estrutura começando a dar seus frutos e, ao longo do ano de 2010, se estruturou em termos expressivos e metodológicos. O projeto é desenvolvido no Colégio de Aplicação da UFRJ, Setor Curricular de Música. Ganhou o XII Prêmio Arte na Escola Cidadã (2011), que privilegia ações que valorizem o “Protagonismo juvenil” entendido por Costa (1996, p. 90) como a “participação do adolescente em atividades que extrapolam os âmbitos de seus interesses

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música utilizando recursos digitais -, os entraves institucionais que encontrou ao longo de

quatro anos de desenvolvimento do projeto:

Um dos contras mostrou-se persistente ao longo de todo o projeto: o despreparo natural de uma instituição de ensino para receber um projeto dessa natureza. Mesmo com toda preparação possível, houve sempre que lutar com a falta de material, a necessidade de esclarecimento acerca do tipo de utilização da tecnologia que estávamos fazendo, as demonstrações da validade da metodologia empregada para o ensino de música, a dependência crítica de uma boa administração do laboratório de informática, etc. Todas essas questões fazem parte do dia a dia de uma escola e amplificam-se quando se trata de inovar no ensino, esbarrando nas resistências naturais.20

Paralelamente às atividades da pesquisa, desde o início de 2009, vinha procurando

realizar cursos que me capacitassem para desenvolver uma hipermídia. Assim, entrei no

universo da programação e do uso de softwares que, trabalhando com a programação por

objetos, permitiam-me integrar linguagem sonora, visual e verbal. Foi nesses (des)caminhos

que encontrei o LaboCA. Seguindo essa trilha, organizei a exposição de fotografia Gelatina

(abril/junho) - uma experiência de produção colaborativa e em rede - e, logo em seguida,

embarquei para participar, ainda em junho de 2011, do Visualizar' 1121, no Medialab Prado

(Madrid/ES). Aventura que o nomadismo próprio das tecnologias móveis (laptops, celulares,

pads) proporcionou reunindo pessoas de várias nacionalidades e idades no desenvolvimento

colaborativo presencial em rede22 de um projeto de visualização de dados.

No decorrer de cada uma dessas experiências, dessas aventuras nômades, minha

atenção foi fisgada pelo modo de organização dos diversos grupos unidos em torno de uma

motivação comum: a arte e a experimentação e sua mistura com a tecnologia e ciência. As

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           individuais e familiares e que podem ter como espaço a escola, os diversos âmbitos da vida comunitária”. O histórico, metodologia, processo, produções podem ser acessados em http://www.danielpuig.me/eletriCAp/home.html 20 Conferir :http://www.danielpuig.me/eletriCAp/eletriCAp_historico.html 21 O projeto Visualizar, dirigido por José Luis de Vicente, é concebido como um projeto de pesquisa aberto e colaborativo que enfoca a teoria, ferramentas e estratégias da visualização de informação. 22 A condição de estar em rede não elimina o caráter presencial, estamos sempre geo localizados e, simultaneamente, deslocalizados no universo que integra os espaços físicos e virtuais. Destaco com essa observação, os ambientes em rede que se configuram pela reunião de um grupo e/ou grupos de indivíduos para a realização de uma dada atividade, que ocorre presencialmente mediado pela comunicação multimídia em rede e multimoldal.

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dinâmicas que se originaram mantinham uma estreita relação com a tecnologia disponível em

termos de hardware e software, estrutura de rede e banda, bem como a proposta de

experimentação de uso da linguagem digital para desenvolvimento da expressividade de cada

integrante e do coletivo. Cada um com seu laptop, conectados em rede via redes sociais, chats

de e-mails, lista de grupos, softwares diversos de registro compartilhado e armazenamento e

troca de arquivos. No mesmo espaço físico, diversos grupos trabalhavam em projetos

distintos, comentando, discutindo, conversando, levantando, criando um movimento, um

fluxo na busca da ajuda de seus pares para solução dos problemas. O trabalho em grupo é

concomitante ao individual, a conexão permite um diálogo silencioso via rede, ao mesmo

tempo, o ambiente é habitado pelas vozes e outros sons, uma auto-organização surge para

autolimitar o nível de ruído de forma que não atinja níveis intoleráveis. Tudo isso

acompanhado da possibilidade de utilizar fones de ouvido e neutralizar as interferências

ouvindo música enquanto trabalham. Ambientes que, em sua arquitetura, física e/ou virtual,

caracterizam-se por uma mobilidade de arranjos apropriados para cada momento, permeados

pela construção de laços afetivos e interesses comuns que motivam o trabalho e geram

desdobramentos e contatos que se perpetuam ao final dos projetos.

O incremento da conectividade em função da difusão dos meios de comunicação e

processamento, mesclados com apresentações, aulas expositivas, debates - antigos formatos

revitalizados na incorporação criativa das novas mídias -, mostraram-se como fatores

mobilizantes e dinamizadores da colaboração na resolução dos problemas, do retorno da

curiosidade e da busca pela presença, de uma corporificação. Tratando-se de experimentações

mediadas pelas tecnologias digitais e em rede, a presença nem sempre constitui o primeiro

contato, mas se configura como um elemento importante e diferenciador. O tempo parece ser

insuficiente, é preciso dizer que está na hora de fechar o espaço, as pessoas permanecem

produzindo e retornam no dia seguinte com a mesma disposição. Condição semelhante

encontrei em um relato do projeto eletriCAp:

Depois de dois tempos de aula (1h40min):

- Gente, a aula acabou e bateu o recreio... pessoal... vocês não vão?... tudo bem, se quiserem continuar, só estou avisando que o recreio já começou... vou tomar um café e já volto, ok?

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Voltei e eles ainda estavam lá! Coisa rara isso, mas é bom saber que a gente consegue subverter a estrutura da própria escola com trabalhos criativos. (20/05/2010)23

O que esse projeto tem em comum com as experiências citadas? Utiliza as tecnologias

digitais de forma criativa e experimental na produção de conhecimento e linguagem (musical)

desenvolvendo estratégias que incluem: o planejamento participativo, aulas abertas, o trabalho

por projetos, pesquisa, apresentações orais e aulas expositivas, o uso de softwares livres, o uso

de comunidades virtuais, cloud computing, o registro on-line do processo, etc.

A pedagogia por projetos, o planejamento participativo, a pesquisa, o trabalho em

grupo e outras estratégias pedagógicas nada tem de novo, o que muda de fato é a inclusão das

tecnologias digitais nesse processo, um modo criativo e experimental de utilizá-las, um modo

doce. Esse termo é utilizado por Milton Santos (2001) para designar o modo como essas

tecnologias divisíveis, flexíveis e dóceis, são adaptáveis a todo tipo de meio e cultura e para

assinalar a possibilidade de uso democrático das tecnologias de informação, um uso contrário

ao modo perverso de sua apropriação pelo capital. A consequência é uma transformação das

dinâmicas perceptivas e cognitivas que conduzem a valorização e efetivação de termos como

partilha, colaboração, cooperação, participação, coletivos, motivação, afetos etc.

Ampliando o significado do papel da mediação tecnológica para além do simples uso e

inclusão de tecnologia, propomos neste estudo compreendê-la segundo o significado

conferido por Manovich (2001) ao termo “novas mídias”: como novos objetos culturais e

paradigmas capacitados pela computação e tecnologias de comunicação em rede e que

apontam para a profunda revolução cultural que estamos presenciando nos modos de produzir,

distribuir e comunicar e suas implicações em todos os campos do agir e viver em sociedade e

de habitar o mundo. Lembrando que, no atual estágio que vivemos, já teríamos passado da

fase das “novas mídias” para “mais mídias”, o que significa incluir o impacto de uma

explosão exponencial de dados que estão sendo gerados, capturados, analisados, visualizados

e estocados, criando uma nova situação cultural e modificando as formas usuais de investigar

e estudar a cultura (MANOVICH, 2008, p. 1).

                                                                                                                         23 O relato encontra-se no antigo blog do projeto eletriCAp: http://eletricap.blogspot.com/.

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Não é por acaso que a recuperação, organização, visualização - uma estética de banco

de dados -, norteiam essas experiências. Oliveira (2009) associa a disseminação generalizada

de agentes cognitivos à entrada em cena da Ziliônica, a ciência dos zilhões. A proliferação de

fontes de informação, gerando dados em quantidades assombrosas, requer meios de

processamento autônomos, isto é, não humanos. Algoritmos automatizados, que se

comportam como ciber-robôs autônomos, saem em busca de correlações de todos os tipos,

emergindo um modo original de inteligibilidade, manifesto pela descoberta de padrões

inesperados, e porventura significativos, que, no entanto, se realiza independente de nossa

inteligência, compreendendo um ramo da Computação Intensiva, chamado de Analítica

Correlacional (OLIVEIRA, 2009). Manovich (2009) defende a necessidade de

desenvolvimento de métodos analíticos que permitam perceber esses padrões em termos

culturais, a partir do uso de softwares que utilizem a visualização de um massivo banco de

dados e suas correlações. Oliveira (2009) esclarece como essa forma cibernética de produção

de conhecimento escapa aos cânones clássicos do método científico:

De fato, o procedimento consagrado na implementação do método científico envolve a formulação de uma hipótese ou modelo, elaborado a partir de dados obtidos em observação prévia; as consequências dessa hipótese, convertida em previsões, são submetidas ao crivo de uma nova observação, sendo assim validadas – ou não. Já nas novas abordagens da Ziliônica, hipótese não são indispensáveis: dados são produzidos, quanto mais, melhor; algoritmos autônomos buscam estabelecer correlações significativas, e tudo o que o investigador precisa fazer é interpretar e avaliar os resultados das associações encontradas – que ele mesmo seria incapaz de colecionar. Tais sínteses de padrões emergentes, extraídas de um território em que a inteligência humana, isoladamente, não é capaz de operar, configurariam uma forma peculiar (para alguns, francamente bizarra) de produção de conhecimento, um tipo de “ciência sem teoria”- ou, pelo menos, envolvendo hipóteses implícitas somente, modelos indiretos que se manifestam apenas pela efetividade dos resultados (OLIVEIRA, 2009, p. 314).

Todo esse conjunto de eventos e processos originam outros ambientes de produção de

conhecimento e aprendizagem, refletindo aspectos das mudanças perceptivas e cognitivas que

desejava investigar. Nesse instante dei-me conta de que esta era apenas a ponta do iceberg, o

que está por trás envolve todo um amplo leque de significações vinculado a uma ecologia

cognitiva, comunicacional e digital e a uma emergente dinâmica cognitiva organizada em

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rede. Se considerarmos que a mutação de nossos tempos inclui a passagem de uma sociedade

de sistemas de aprendizagem para uma sociedade de aprendizagem (MARTÍN-BARBERO,

2000), o que isso significa? Se podemos afirmar, segundo uma perspectiva sócio-semiótica,

que:

[...] a cultura abarca o conjunto de processos sociais de significação e se, ao nos propormos estudar o cultural, abarcamos o conjunto de processos através dos quais dois ou mais grupos representam e intuem imaginariamente o social, concebem e gerem as relações com outros, ou seja, as diferenças, ordenam sua dispersão e sua incomensurabilidade mediante uma delimitação que flutua entre a ordem que torna possível o funcionamento da sociedade, as zonas de disputa (local e global) e os atores que a abrem para o possível (CLANCLINI, 2010, p. 49).

Então, neste estudo de caso, podemos extrair uma ligação entre as mudanças

perceptivo-cognitivas e a relação cultura/comunicação/educação?

Apesar da disseminação do conceito de inteligência coletiva (LÉVY, 1993), das

análises de Castells (1996) de uma sociedade da economia em rede e de fluxos

informacionais, da popularização e ascensão das redes sociais como o Facebook e Twitter e

dos diversos estudos que abordam a comunicação mediada por computador e a aprendizagem

colaborativa (McLELLAN, 1997; BONK, REYNOLDS, 1997; DIAS, 2000; SILVA, 2000,

GIORDAN, 2008), incorporando o conceito de interatividade e de rede, fica a impressão de

que precisamos nos debruçar sobre as implicações de se pensar um socius concebido como

rede e as múltiplas significações que envolvem a educação de mentes conectadas, incluindo o

próprio conceito que temos da mente. Quais as consequências da afirmativa de Siemens

(2008, p. 12), quando diz que “os múltiplos significados potenciais do termo rede, precisam

ser reconhecidos e refletidos por educadores para comunicar mais precisamente conceitos de

conectividade e aprendizagem em rede”?

Indo além, acrescenta-se a dimensão conferida nas palavras de Santaella (2009, p. 1),

“Na medida em que compreendemos as novas mídias, não somente no contexto de uma mera

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mudança dos meios, mas também como uma profunda revolução cultural, a reconfiguração do

corpo e da mente humana e da consciência não pode mais ser negada” 24.

Na filosofia peirciana, feeling (impressão) é aquilo que nos vem imediatamente à

consciência (o que normalmente traduzimos por intuição), é uma forma primeira de

consciência, está na categoria da primeiridade, cujo atributo é a qualidade de sentimento,

mera talidade, irrepetível, intraduzível (SANTAELLA, 1995).

Essa primeira impressão, ainda carregada de indeterminação, traz o gérmen da

consciência da mudança, ainda que não saibamos, bem ou completamente, como nomeá-la.

Lévy (2009), em entrevista para o grupo de pesquisa Atopos25, ao falar sobre o conceito de

inteligência coletiva26- desenvolvido em 1994, quando a internet estava dando seus primeiros

passos - , alerta para o fato de que, apesar dessa noção não ser mais tão intuitiva como há 18

anos, estamos engatinhando no desenvolvimento dessa nova dinâmica cognitiva. Esse estado

de provisoriedade desfez qualquer intenção de buscar, nessas experiências, modelos

cognitivos que possam ser generalizados, mas sim padrões que sinalizem traços dessa nova

dinâmica, tendências às quais precisamos estar atentos para não perdermos o fio da meada. Na

mistura entre arte, ciência e tecnologia, seguimos o espírito livre e antecipatório das

experimentações no campo da arte, a natureza investigatória e metodológica da ciência e a

condição da abertura própria dos sistemas hipermidiáticos, dos quais podemos traçar uma

cartografia que nos oriente em sua estrutura alinear e rizomática, mas que não nos permite

prever de antemão aonde vamos chegar.

                                                                                                                         24 As far as we understand new media not only in the context of a mere change in the media but also as a profound cultural revolution, the remodeling of the human body and the reconfiguration of human mind and consciousness can no longer be denied. 25 http://www.atopos.usp.br/ 26 Lévy (1998) aponta para um novo tipo de interação do tipo Todos e Todos, que realiza o que denomina de inteligência coletiva. A inteligência coletiva é o meio ecológico que associa as mentes humanas e as redes técnicas de armazenamento, de transformação e de transmissão de representações contemporâneas, originando novas formas de cooperação e de coordenação em tempo real. O resultado é uma potencialização da sensibilidade, da percepção, do pensamento, da imaginação.

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COMUNICAÇÃO E EDUCAÇÃO: O CRESCIMENTO DOS SIGNOS

O que fará o sistema educacional para formar pessoas com capacidade de serem

interlocutoras desse entorno de informação em que tudo está mesclado numa profusão de

signos? Um dos desafios epistemológicos27 dos sistemas de educação formais na atualidade é

relativo à construção de ambientes dialógicos e não-lineares, expressos nas estruturas

interativas e por subjetividades interconectadas. Desafio colocado pela expressividade em

ambientes digitais, entre os quais destaca-se o desafio do sistema de construção de

pensamentos em equipe abertos a intervenções (BAIRON, 2004). Desafio contido no

significado de presenciarmos uma transição da passagem de uma sociedade de sistemas de

aprendizagem para uma sociedade de aprendizagem ou de redes de aprendizagem, que vem

ganhando corpo nas novas formas de configuração do saber.

Aprendizagem, na filosofia do semioticista Charles S. Peirce, é um outro termo para

designar terceiridade. Essa é a terceira das três categorias do pensamento e da natureza

propostas por Peirce, sinônimo também de representação, mediação, continuidade,

crescimento, evolução. A terceiridade implica generalização e lei. Nas palavras de Peirce: “O

modo de ser que consiste no fato de fatos futuros da secundidade virem a adquirir caráter

geral, eu chamo de terceiridade” (CP 1.26). Um segundo ou secundidade é uma experiência

diádica da ação e reação, oposição, conflito, choque com a experiência da realidade e, por

fim, um primeiro ou primeiridade, pura qualidade de sentimento, potência, possibilidade,

acaso. As três categorias vão estar presentes na semiose, ou ação do signo, ocorrendo de

forma simultânea e integrada. A noção de signo de Peirce expressa essa relação:

Signo ou Representamen é um Primeiro, que está em genuína relação com um Segundo, chamado seu Objeto, de forma a ser capaz de determinar que um Terceiro, chamado seu Interpretante, assuma a mesma relação triádica (com o Objeto) que ele, signo, mantém em relação ao mesmo objeto. (CP 2.274)

                                                                                                                         27 Bairon (2004) discute a necessidade de criarmos uma releitura teórica do conhecimento científico. Teríamos como fruto de uma revisão da metodologia tradicional, que elegeu a matriz verbal da escrita como a grande representante do pensamento analítico reflexivo, a incumbência de produzirmos nosso pensamento a partir de uma “leitura” e de uma criação hipermidiática.

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A semiose é a ação de um signo que, ao ser interpretado, gera um outro signo num

movimento continuo e triádico, estabelecido entre três elementos que, interconectados,

compõem a estrutura triádica do signo: fundamento, objeto e interpretante28. Segundo a tese

fundamental de Peirce de que “todo pensamento se dá em signos”, a semiose é o próprio

processo de pensamento. Plaza (2008) destaca que, por seu caráter de transmutação de signo

em signo, qualquer pensamento necessariamente é uma tradução intersígnica ou

intersemiótica29. Essa tradução ocorre tanto no nível “interno” do pensamento, quanto em sua

externalização mediada pela linguagem, que permite a interação comunicativa.

Considerando a linguagem como pensamento e este sinônimo de semiose, podemos

considerar que a lógica (ou semiose) da expressividade no ambiente digital está contida na

linguagem hipermídia, sistema-padrão que organiza a cultura digital e a linguagem da rede, a

mente coletiva. Surgem novos modos de percepção e cognição resultantes de uma ecologia

cognitiva, comunicacional e digital. Os modos de comunicação e socialização são

prioritariamente mediados por esses ecossistemas, organizando práticas culturais que

permeiam universos físicos e virtuais. Um universo multifacetado que mescla a cultura local e

a cultura digital, a linguagem natural e a linguagem digital, o biológico e o sintético como

partes de seu Umwelt.

O conceito de Umwelt foi desenvolvido na biologia por Jacob Von Uexkull e pode ser

compreendido como “a interface que conecta uma realidade objetiva e um sistema cognitivo,

também real, mas que para permanecer teve que codificar esta realidade…” (VIEIRA, 2007b,

p. 101). Na produção de um sistema representativo, necessário para que ocorra a

sobrevivência dos indivíduos, produzem-se duas interfaces: a de natureza biológica, o

Umwelt, e outra, que resulta da expansão da interface biológica e que permite e elabora signos

psicossociais e culturais, uma evolução do Umwelt biológico, a semiosfera. Nessa direção, a

juventude contemporânea e as novas gerações, constituem os genuínos representantes de uma

                                                                                                                         28 Segundo Santaella (2005), o fundamento é uma propriedade ou caráter ou aspecto do signo que o habilita a funcionar como tal; o objeto é algo diferente do signo, algo que está fora do signo, um ausente que se torna mediatamente presente a um possível intérprete graças à mediação do signo; o interpretante é um signo adicional, resultado do efeito que o signo produz em uma mente interpretativa, não necessariamente humana, uma máquina , por exemplo, ou uma célula interpretam sinais. 29 A tradução intersemiótica foi definida por Jakobson (apud PLAZA, 2008, p. 8) como sendo o tipo de tradução “que consiste na interpretação de sistemas de signos verbais por meio de sistemas de signos não verbais”. Plaza (2008) vai desenvolver esse conceito estendendo para a tradução de um sistema de signo para outro, seja ele verbal, sonoro ou visual

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natureza híbrida entre o orgânico e sintético, cuja mente não pode ser mais compreendida na

dualidade entre interior e exterior, mas em continuidade com os artefatos cognitivos físicos ou

abstratos com os quais e por meio do qual realizam seu pensamento e na perspectiva do

significado de uma aprendizagem em rede.

Essa intrincada teia de relações, que envolve a constituição de uma rede sociotécnica,

acompanha o desenvolvimento do homem e seu aprendizado, redes de aprendizado têm

sempre acompanhado o desenvolvimento do conhecimento humano (SIEMENS, 2008). As

tecnologias contemporâneas tornaram explícito esse processo e o tornaram mais complexo,

principalmente, por se caracterizarem como tecnologias cognitivas e máquinas semióticas.

Permitiram o desenvolvimento de uma cultura de compartilhamento, conectividade,

interatividade e novos modos de comunicação. Incorporar esses princípios na aprendizagem

formal pressupõe termos em mente que a aprendizagem em rede, essencialmente, constitui-se

na e pelas pessoas, mas que não podemos ignorar a dimensão que os objetos técnicos

adquiriram na constituição de nossa cognição e de que aprendemos a partir deles, bem como,

o fato de que pensar em rede é pensar na dimensão de uma inteligência coletiva, onde

humanos e objetos técnicos têm o seu grau e devida participação.

Lévy (1993) propõe um estudo das dimensões técnicas e coletivas da cognição que

denomina ecologia cognitiva a partir da ideia de um coletivo pensante de homens-coisas, em

que a razão não seria um atributo essencial e imutável da alma humana, mas sim um efeito

ecológico, que repousa sobre o uso de tecnologias intelectuais variáveis no espaço e

historicamente datadas (LÉVY, 1993, p. 152). A inteligência coletiva é o meio ambiente do

ecossistema contemporâneo propiciado pela constituição de uma rede sócio-técnica de

equipamentos coletivos de percepção, pensamento e comunicação. Do ponto de vista de uma

ecologia cognitiva, recoloca-se a questão do humano frente à técnica para pensá-la como uma

dimensão constituinte do humano e de seu habitat. Passamos a viver imersos e conectados em

um ambiente técnico que vai se tornando cada vez mais natural e parte de nossa corporeidade,

mobilidade e cognição, configurando um ambiente tecnológico e um ecossistema

comunicativo, hoje socialmente, tão estratégico como o “ecossistema verde” (MARTÍN-

BARBERO, 2008).

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Fluxos, conectividade, ubiquidade, onipresença, convergência, mobilidade, entre

outros termos, expressam características de manifestações e materialização de um ecossistema

comunicativo (MARTÍN-BARBERO, 2000; 2008), que tem como um dos principais efeitos, a

difusão e descentralização do saber. Surgem “ambientes de informação e conhecimento

múltiplos, não centrados em relação ao sistema educativo que nos rege e que têm muito claro

seus dois centros: a escola e o livro” (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 4). Um novo modelo

comunicativo descentralizado e plural, que coloca em contato de forma multidirecional graus,

idades e grupos de conhecimento. Santaella (2010) utiliza o termo ecologia pluralista da

comunicação para caracterizar a fertilidade que o processo de digitalização proporcionou ao

possibilitar o crescimento da diversidade semiótica das mídias, resultante da mistura entre elas

e das múltiplas possibilidades de seus usos. Dos termos conectividade, mobilidade e

onipresença, extrai desdobramentos epistemológicos das práticas e dos processos

comunicacionais atuais em espaços ubíquos:

Estes são espaços hiperconectados, espaços de hiperlugares, múltiplos espaços em um mesmo espaço, que desafiam os sentidos de localização, permanência e duração. São espaços povoados por mentes multiconectadas e, por consequência coletivas, compondo inteligências fluidas. Estas costumam ser definidas pela capacidade de encontrar significado na confusão e de resolver novos problemas, pela habilidade de inferir e compreender as relações entre vários conceitos, independentemente dos conhecimentos já adquiridos. No hiperfluxo dos infodados e infotenimentos, dos relâmpagos de conversação multidirecionadas e multidimensionais propiciadas pelas redes de relacionamentos, os espaços ubíquos intensificam a potência inata da mente para fluidez, pois permitem que múltiplas realidades desfilem de modo simultâneo em nossa mente.

Tudo indica que o destino da inteligência é crescer e se espalhar pelo mundo circundante. É para essa direção que caminham as inovações atuais. (SANTAELLA, 2010, p. 18)

Como um ritornelo, a aprendizagem, que se configura nesses novos ambientes, e os

novos modos de produção de conhecimento, assumem essa característica tríplice que Deleuze

e Guattarri (1997, p. 118) expressaram nesse conceito:

Ora se vai do caos a um limiar de agenciamento territorial: componentes direcionais, infra-agenciamento. Ora se organiza o agenciamento:

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componentes dimensionais, intra-agenciamento. Ora se sai do agenciamento territorial, em direção a outros agenciamentos, ou ainda a outro lugar: inter-agenciamento, componentes de passagem ou até de fuga. E os três juntos. Forças do caos, forças, terrestres, forças cósmicas: tudo isso se afronta e concorre no ritornelo.

Com outras imagens-palavras, aproximam aí o movimento descrito no ritornelo da

ação dos signos, da semiose − movimento de um signo que gera um interpretante que, por sua

vez, é outro signo e que, ao ser realizado como signo, gera também outro interpretante, numa

relação triádica, que se dá continuamente, entre signo, objeto e interpretante −, Ferraz et al

(2010, p. 2) assim descrevem o ritornelo:

Para fazer nascer este conceito, eles buscam na música sua principal imagem. Uma criança que canta para afugentar o escuro, alguém que canta enquanto arruma a casa, alguém que canta criando seu lugar, ou alguém que canta um canto de partida “adeus amor, vou partir”. De um primeiro giro se faz um centro, um eixo de sobrevida, mas um segundo giro se faz necessário e o eixo se amplia pela extensão que lhe envolve. Mas como tudo aquilo que abriga também obriga, os filósofos imaginam sua ciranda indo além desta simples fundamentação de um lugar, para enfim desfazer-se no seu afundamento: forças diversas invadem o pequeno terreno e atraem para fora o seu principal personagem que, estando fora, mergulha em um novo ciclo ou mergulha no sem ciclo.

É assim que o ritornelo consiste em três aspectos inseparáveis: 1. escolher um eixo; 2. desenhar um domínio – território – em torno deste eixo; 3. traçar a partir deste domínio, ou território, linhas de fuga que levem a outro ritornelo (no qual novamente será desenhado um território em torno de um eixo, do qual serão traçadas linhas de fuga etc…). Não seriam três etapas, mas três aspectos que devemos conceber como simultâneos no ritornelo. Sendo o terceiro aspecto este vetor de desterritorialização, em que o território se precipita em sua própria dissolução.

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Figura 2: M. C. Escher Bond of Union (1956)

Fonte: http://www.cavetocanvas.com/post/13895533388/bond-of-union-mc-escher-1956

Ritornelo de múltiplas esferas que envolvem e habitam, interagem com a esfera física-

virtual de mentes conectadas, como poeticamente representado em Bond of Union30 de

Escher. As múltiplas esferas representam redes no interior de redes, micro-células do universo

simbólico de cada entidade que integra os ecossistemas cognitivo, comunicacional e digital.

Os inputs e outputs, gerados pelas interações entre as múltiplas redes, criam as condições

prévias para que um certo traço surja e não outro. O universo dos individuais, expresso na

multiplicidade sígnica, geram informação para que um outro sistema/rede surja, um ambiente

multifocal sonoro, visual, textual, uma semiosfera que envolverá a esfera de mentes

conectadas. É através dessa integração, entre o macro e o micro, o privado e o público, o

homem e as coisas, o orgânico e o sintético, as sensações, sentimentos e símbolos, que o

sistema/rede é gerenciado pela evolução universal. Na medida em que a internalização das

informações ocorre, um banco de dados é gerado. Esse banco de dados acumula-se no

sistema/rede ao longo do tempo, assumindo uma característica discursiva na perspectiva de

processos evolutivos como semiose. O banco de dados gera uma “função memória” do

sistema (BUNGE, 1977 apud VIEIRA, 2008) que conecta o sistema/rede presente com seu

passado, possibilitando possíveis futuros, uma estrutura, organização, que pode ser

                                                                                                                         30 A gravura teve como inspiração o romance de H. G. Wells intitulado O homem invisível, um homem que toma uma poção que deixa o seu corpo translúcido, mas que para reconquistar sua visibilidade enfaixa o rosto com gaze. Escher (apud TIJABBES, 2011, p. 120) aborda o tema do infinito, de ciclos, metamorfoses, espaços interligados: “Aqui duas espirais delineiam as cabeças de um homem e de uma mulher, unidas por uma faixa sem fim. Com suas testas entrelaçadas, elas formam um vínculo indissolúvel. As esferas flutuam diante das faixas das cabeças vazias, entre elas e atrás, têm a função de sugerir espaço e tempo infinitos.”

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comparada, semioticamente, à semântica do sistema, o sentido dado.

A totalidade de um sistema não pode ser explicada pela simples soma de suas partes,

por outro lado, na concepção de Latour (2005) aplicada à noção de rede e à teoria ator-rede, o

todo não é maior do que as partes, por estas razões, é necessário aplicar um método geral que

permita visualizar as propriedades do sistema sem reduzi-las às propriedades de suas partes e

conciliar uma perspectiva que compreenda um individual contendo o todo. Por outro lado,

precisamos articular um pensar em termos de ecologias, partindo do princípio de que “o

pensamento ecológico é relacional, aberto e traz consigo a ideia de movimento, de fluxo

energético contínuo, de propriedades globais, de processos autorreguladores, auto-

organizadores, indicando a existência de um dinamismo intrínseco que traduz a natureza

cíclica e fluída desses processos” (MORAES, 2000, p. 8).

Objetivando mapear as novas condições da subjetividade juvenil expressas nas

dinâmicas da aprendizagem em rede e por mentes conectadas, por meio do estudo de caso

citado anteriormente, propomos seguir os rastros dos actantes humanos e não-humanos e

deixar emergir os possíveis padrões que indiquem tendências expressivas e metodológicas da

lógica da linguagem hipermídia. A partir desses padrões, buscaremos relacionar as tendências

identificadas com eventos e processos que definem o ambiente ou umwelt, que favorece a

produção de autonomia e memória de um ecossistema comunicativo, cognitivo e digital

realizados em rede.

No capítulo 1, apresentamos um panorama inicial que problematiza as transmissões

educativas na atualidade a partir da tese da des-ordem cultural desenvolvida pelas análises de

Martín-Barbero (2000; 2003; 2008; 2008b), relacionando com as proposições teóricas que

articulam comunicação, cultura e linguagem de Santaella (2003; 2003c, 2007, 2010) e o

pensamento ecossistêmico comunicacional de Di Felice (2009).

No capítulo 2, abordamos os conceitos de rede, conectividade e aprendizagem em

rede. Iniciamos com um breve estado da arte do conceito de conectividade e rede como

abordado na educação, seguido da perspectiva adotada neste estudo, onde a noção de rede

como mediação na perspectiva da Teoria Ator-Rede (TAR), é desenvolvida e finalizamos

relacionando parâmetros sistêmicos e a filosofia de Charles Sanders Peirce na definição dos

conceitos de conectividade, mentes conectadas e aprendizagem em rede.

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No capítulo 3, discutimos a integração dos ecossistemas comunicacionais, cognitivos e

digitais. A linguagem hipermídia será abordada no seu papel mediador entre os novos

ecossistemas comunicacionais e cognitivos, a partir à luz da filosofia de Deleuze e Guatarri

(1997; 2000) na imagem do rizoma, do ritornelo e no conceito de agenciamento e das análises

de Santaella (1997; 2000). A ecologia digital será abordada a partir da discussão do software

livre e da ética hacker, da cultura livre e colaborativa em sua relação com a emergência de

novos ambientes de aprendizagem baseados em dinâmicas colaborativas e na cultura

participativa e do compartilhamento, e da experiência dos medialabs.

No capítulo 4, apresentamos os fundamentos metodológicos da elaboração de uma

cartografia a partir da Teoria Ator-Rede. Finalmente, no capítulo 5, apresentamos

respectivamente o estudo de caso do Visualizar’11 e sua conexão com o LaboCA, o Labhiper

e o Aprender Brincando.

UM SOBREVOO: JUSTIFICATIVA E LIMITES

A hipercomplexidade que envolve a tríplice relação entre comunicação, cultura e

educação na era digital, exige que possamos nos deslocar entre campos de conhecimentos

diversos. O objeto de estudo aqui proposto transita em uma linha tênue entre os campos da

comunicação e educação, pois, ao tomar a linguagem hipermídia e a multiplicidade cultural

dos meios de comunicação para analisar os sentidos e os regimes por eles constituídos no

campo do saber e da aprendizagem, mescla a análise das mídias com as dinâmicas cognitivas

e de aprendizagem. É a partir do viés comunicacional e de uma ecologia midiática que

transitamos pelos modos como os meios de comunicação afetam e participam das mutações

nas sensibilidades, percepções e modos de cognição contemporâneos, principalmente, no

modo como alteram as formas de educar e aprender.

Inovações tecnológicas e comunicativas moldam a organização social porque são estruturadoras das relações espaço-temporais às quais o pensamento e a sensibilidade do ser humano se conformam. Mais do que isso, tecnologias de linguagem produzem mudanças neurológicas e sensórias

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que afetam significativamente nossas percepções e ações. (SANTAELLA, 2010, p. 1)

A importância da mistura e convergência dos campos da comunicação e educação e de

estudos que abordem essa intersecção, é visível na emergência de um novo campo de saber

que vem sendo denominado como Educomunicação. Um campo ainda pouco explorado, que

busca articular uma reflexão epistemológica sobre a inter-relação entre comunicação e

educação, bem como, formar profissionais, os educomunicadores, capazes de ajudar a formar

cidadãos críticos, participativos e inseridos no meio social do contexto do século XXI

(SCHAUN, 2002). Um outro aspecto, diz respeito a visibilidade da dimensão e alcance do

campo da comunicação em sua diversidade e multiplicidade de sentidos e no reducionismo de

compreendê-lo como um campo cujo objeto se restringe à sua aplicação em áreas como

jornalismo, publicidade e marketing, televisão, rádio, cinema, etc.

Quantos aos limites, é preciso alertar para o fato de que a abordagem do objeto parte

do estudo de caso de micro-sistemas, cujo hipótese é a de que sinalizam tendências de

dinâmicas perceptivo e cognitivas contemporâneas. Face a própria multiplicidade e abertura

da linguagem hipermídia e seu caráter heterogêneo, as rotas e linhas de fuga também se

multiplicam e diversificam, o que significa que as experimentações que vem sendo realizadas

pelos chamados laboratórios de mídias, como o LaboCA e o Medialab Prado, constituem

somente uma dessas linhas de fuga entre tantas outras possíveis, mas que acreditamos

orientam-se na direção de processos de singularização.

A escolha de uma perspectiva ecossistêmica traz, por um lado, o exercício de aplicar

um método geral que permita comparações e conexões inter e transdisciplinares, ou melhor,

permita o exercício de uma transversalidade entre as várias áreas do saber, e, por outro lado, o

risco de ao “transitar pelo território do saber como as sinapses viajam pelos neurônios, uma

viagem aparentemente caótica que constrói seu(s) sentido(s) a medida em que desenvolvemos

sua equação fractal” (, 2008, p. 79), cair na superficialidade dos conceitos ou mesmo de

ficarmos presos na matriz do rizoma sem construir as rotas e linhas de fuga. De qualquer

forma, trata-se de um sobrevoo, que “aponta para reconhecimento da pulverização, da

multiplicização, para a atenção das diferenças e à diferenciação, construindo possíveis

trânsitos pela multiplicidade dos saberes, sem procurar integrá-los artificialmente, mas

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estabelecendo policompreensões infinitas” (GALLO, 2008, p. 79) ou, pelo menos,

intencionando estabelecer. Trata-se de um sobrevoo de uma generalista, atividade própria

daqueles que atuam na educação básica e que, apesar de toda disciplinarização, buscam um

trânsito entre os diversos campos do conhecimento, que permita uma formação geral e

integradora.

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1.0 MUTAÇÕES DA ERA DIGITAL

Hoje, não se encontram em nenhum lugar do mundo pessoas mais velhas que sabem o que as crianças sabem, por mais distantes e simples que sejam as sociedades onde vivem essas crianças. (MEAD, 1970, apud FORQUIN, 2003, p.1)

Em 1970, Margaret Mead31 publica o livro Culture and Commitment: A Study of the

Generational Gap (Cultura e Vinculação: Um Estudo do Fosso entre Gerações), fruto de três

conferências proferidas em março de 1969, no Museu Americano de História Natural (NY),

sobre o homem e a cultura. Propunha nesse pequeno ensaio as seguintes hipóteses: que a

evolução cultural é uma teoria válida; que uma sequência evolucionária nas culturas poderia

ser caracterizada em termos de interações geracionais; que estávamos experimentando uma

evolucionária e irreversível mudança, da qual pela primeira vez na história do homem

tínhamos plena consciência; e que o “fosso entre gerações” não somente era uma realidade

como também um divisor de águas que se anunciava na história da humanidade (DUBOIS,

1971, p. 1).

Mead propõe três categorias culturais baseadas nas interações geracionais: a cultura

pós-figurativa, co-figurativa e pré-figurativa, cujas orientações, respectivamente, estariam

voltadas para o passado, o presente e o futuro. A ideia de uma cultura pré-figurativa32

marcada por mudanças aceleradas, onde as antigas ferramentas, os antigos pensamentos se

tornaram obsoletos e onde as crianças e jovens são melhor informados, mais competentes e

adaptados ao mundo que seus primogênitos, vai caracterizar uma ruptura e/ou uma inversão

                                                                                                                         31 Antropóloga cultural norte-americana, entre os anos de 1946 e 1963, Margaret Mead integrou o grupo reunido sob o nome de Macy Conferences contribuindo para a consolidação da teoria cibernética ao lado de outros cientistas renomados: Arturo Rosenblueth, Gregory Batenson, John von Neumann, Norbert Wierner, Claude Shannon, entre outros. 32 A cultura pós-figurativa é aquela onde predomina a tradição, a autoridade dos anciões, as marcas do passado, caracterizada por mudanças lentas e imperceptíveis. Podemos associar essas características às escolas e ao sistema acadêmico, instituições que, de modo geral, carregam a marca da tradição; numa cultura co-figurativa, a influência dominante provém dos pares, dos contemporâneos, daqueles que pertencem a mesma classe ou categoria de idade, são relações culturais de vida curta e transicionais. Relação percebida entre os jovens e adolescentes e sua associação em grupos ou em “tribos” conforme um perfil: skatistas, geeks, hip-hop, etc. A hipótese de uma sequência evolucionaria não exclui a coexistência das três culturas em maior ou menor grau dependendo de condições geográficas, econômica, de interação global, etc.

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nos modos de transmissão educativa entre as gerações. Como pensar uma sociedade onde, em

certo sentido, não existem descendentes, herança e nem predecessores? “[...] será a criança e

não os seus pais ou avós que irão representar o que estar por vir” (MEAD, 1970, p. 88). “Fora

do seu novo conhecimento, novo para o mundo e novo para nós, fica o questionamento de

quem está pronto e equipado por sua educação e experiência para buscar pelas respostas.”

(MEAD, 1971, p. 94). Na cultura pré-figurativa são os jovens que definem os objetivos e

caminhos a serem seguidos pelos mais “velhos”.

O questionamento colocado por Margaret Mead emerge com força no final do século

XX realçado nos diversos discursos acadêmicos, midiáticos e mercadológicos (TASPCOTT,

1999; ALVES, 1998; NEGROPONTE, 1995) que trazem como tópica o conceito de geração

associado às questões de emergência das Tecnologias de Informação e Comunicação33 (TIC)

e seu impacto na formação das crianças e dos jovens, principalmente, em seus aspectos

perceptivos-cognitivos.

Freire Filho (2008, p. 9) situa a identificação da “cultura tecnológica” com a “cultura

juvenil” na década de 80, quando surgiram os computadores pessoais, os videogames e a

internet. Destaca o papel de jovens “geniais” que, sem mesmo terem terminado a graduação,

foram responsáveis pela criação de algumas dessas tecnologias, como Bill Gates (que fundou

a Microsoft com 19 anos) e Steve Jobs (que fundou a Apple com 21 anos) e como esse

imaginário permanece como uma referência atribuindo à juventude um talento natural para as

tecnologias: “Ainda hoje, passada a fase inicial da “revolução” dos computadores pessoais, a

imagem do jovem que detém uma espécie de talento natural para o computador prevalece, e

novos mitos alimentam este imaginário” (FREIRE FILHO, 2008, p. 9.). Em suas análises,

Freire Filho (2006; 2008) aborda a midiatização do conceito de juventude e realiza a crítica de

como os discursos presentes nas mídias elaboram uma visão eufórica e acrítica da relação dos

jovens com a tecnologia adotando os novos hábitos de consumo e as novas práticas de

                                                                                                                         33 No desenvolver desse estudo, o termo Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) será abordado a partir da perspectiva de uma ecologia midiática, o que significa pensá-las em termos dos ambientes híbridos e “redes de conhecimento, redes de sentimento e redes de memória” (SANTAELLA, 2010, p. 194) que produzem e agenciam, propiciados pela digitalização. Também serão compreendidas como sinônimo de mídias digitais, incluindo a complexa rede sócio-técnica que as conecta (telecomunicação, elétrica, humana, servidores, computadores pessoais, dispositivos móveis, etc.). São tecnologias que propiciam o fluxo de informação e que “incrementam a capacidade humana de produzir linguagem, portanto, tecnologias comunicativas” (SANTAELLA, 2007, p. 195). Não se exclui os meios de comunicação de massa, mas consideramos sua integração ou hibridização pela digitalização.

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sociabilidade e comunicação da juventude, frequentemente, como modelos ideais de conduta.

Modelos afinados com as premissas do atual estágio do capitalismo.

Sem adotar uma posição ingênua, que exclui a construção midiática como parte

integrante dos agenciamentos de produção de subjetividade conformadores ao modelo do

capital, optamos por destacar as perspectivas que vão ao encontro do que Guattari (1990)

denomina de singularizantes, de descentramento que, instaurando rupturas, abrem

possibilidades para uma re-singularização individual e/ou coletiva da subjetividade.

A historiadora Annie Kriegel, num artigo sobre o conceito político de geração, destaca

três fatores que conferiram uma eficiência social ao tema geracional e que explicam a

emergência dessa nova representação como um “novo princípio de inteligibilidade para a

classificação dos destinos individuais” (KRIEGEL, 1979 apud FORQUIN, 2003). O primeiro

desses fatores diz respeito ao prolongamento da esperança de vida, o que facilita e fortalece os

vínculos com os nossos “contemporâneos”. O segundo fator vem do fato de que, na sociedade

moderna, os atributos de “classe” e “status” social foram perdendo sua força na definição de

identidades, face à falência progressiva das grandes narrativas para justificar a condição do

sujeito contemporâneo. E o terceiro, que tomamos como relevante para este estudo, aquele

que diz “respeito à aceleração da temporalidade histórica que perturba o ciclo das reproduções

das gerações e que introduz de maneira sensível, no cerne dos percursos de vida individuais, a

existência da mudança e a consciência da mudança, fazendo pesar sobre as transições e as

transmissões entre gerações a fatalidade das transformações” (FORQUIN, 2003, p. 2).

Segundo Forquin (2003), o conceito de geração pode ser compreendido a partir de três

acepções: aquela que aborda a questão genealógica ou de grau de filiação a partir de um

indivíduo tomado como origem, considerado um poderoso fator estruturante da sociedade nos

estudos etnográficos. O fator cronológico define as chamadas gerações jovens, gerações

adultas e gerações mais velhas; na sua acepção histórica e sociológica, a que designa um

conjunto de pessoas que nasceram mais ou menos na mesma época e que têm em comum uma

experiência histórica idêntica e/ou uma proximidade cultural, por exemplo, um conjunto de

indivíduos nascidos no mesmo ano ou caracterizado por um mesmo evento; tomando essa

acepção num sentido mais amplo, o termo abrange pessoas que sofreram um mesmo tipo de

influência educativa, política ou cultural criando um sentimento de vínculo comum, “um

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sentimento de geração” ou uma “consciência de geração”, independente de possuírem a

mesma idade ou de terem nascido numa mesma época.

Trazendo para o cerne dessa discussão a contribuição de Karl Mannheim em Le

probléme des générations (1928, traduzido para o francês somente em 1990), Forquin (2003)

discute o problema de vinculação, isto é, o que significaria pertencer a uma mesma geração,

para salientar a complexa problemática das transmissões educativas, no contexto

contemporâneo. Compreendendo o fenômeno de vinculação em sua dimensão histórica e

sociológica, Mannheim desenvolve uma especificação progressiva em torno das noções de

“situações de geração”, de “conjuntos de gerações”, de “unidades de geração”, de “grupos

concretos”. De grosso modo (dado o caráter extremamente redutor aqui apresentado desses

princípios), os vínculos vão se tornando progressivamente mais fortes e estruturantes em cada

uma dessas noções. Parte-se de um potencial geracional, de uma “situação de geração”, que

pode ser caracterizado por um senso de participação comum em um mesmo momento

histórico e social, sem, necessariamente, ocorrer a partilha de uma espécie de “consciência de

geração”, até o refinamento de “grupos concretos” que, partilhando conteúdos comuns de

consciência, representações, crenças, engajamentos se manifestam a partir de ações e

intervenções. É a partir das nuances que se manifestam as dinâmicas sociais de cada momento

social-histórico. Seguindo a linha da abordagem de Mannheim, Forquin (2003, p. 2) adverte

para a importância do exercício das transmissões educativas:

Finalmente, numa última especificação, Mannheim salienta que as próprias «unidades de geração» se cristalizam a partir da ação ou da intervenção do que ele chama de «grupos concretos», isto é, escolas de pensamento, minorias ativas ou comunidades militantes, dentro e por meio das quais uma «situação de geração» pode conseguir encontrar um modo de expressão e de simbolização que seja verdadeiramente motivador. Contudo, este fenômeno não ocorre nem de maneira necessária, nem de maneira regular, e depende fortemente da intensidade e da forma que a dinâmica de uma sociedade toma num dado momento. Com efeito, não é só, nem principalmente, porque as gerações não se renovam biologicamente que elas se diferenciam culturalmente e sociologicamente, já que esse fenômeno de renovação existe tanto nos períodos de grande estabilidade como nos períodos de perturbação histórica. Mas, antes, é muito mais quando e porque ocorrem rápidas mudanças históricas que a renovação biológica das gerações pode dar origem a rupturas sociológicas entre gerações, rupturas essas que tornam inevitavelmente mais difícil e mais problemática (porém, sem dúvida, tanto mais necessário) o exercício das transmissões educativas.

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Assim, a atualização das potencialidades que dormem dentro de cada «situação de geração» depende amplamente, na análise de Karl Mannheim, de fatores extra-biológicos, entre os quais a natureza particular da dinâmica social que prevalece num momento dado da história de uma sociedade.

Talvez, seja na noção proposta por Mannheim de “grupos concretos”, organizados na

forma metafórica de pequenos nós da infinita rede que constitui o ambiente cognitivo da

atualidade, que possamos encontrar indícios dos caminhos que estão sendo criados. Grupos

que serão aqui abordados na perspectiva da rede de laboratórios experimentais, que vem se

disseminando como novos ambientes de transmissão educativa otimizados na hibridização da

interface humano/máquina e possibilitados pela mediação das tecnologias da informação e

comunicação, quer no seu aspecto simbólico da linguagem ou pela sua dimensão técnica. O

“talvez” incorpora aqui a incerteza contida na atualização das potencialidades que dormem

dentro de cada “situação geracional” e que, no embate das leis da mutação, recorrendo à

interpretação dada no I Ching, Livro das Mutações, ao estabelecer que toda mutação supõe

um ponto constante que lhe sirva de referencial, alerta que “o problema consiste agora em

escolher o seu próprio ponto de referência de modo a que coincida com o ponto de vista do vir

a ser cósmico.” (1996, p. 217). Essa concepção será melhor explorada no decorrer deste

estudo na concordância com Charles Sanders Peirce de que a aprendizagem é uma

propriedade fundamental de qualquer coisa que cresce no tempo, concepção que De Tienne

(2007, p. 75) enriquece comentando:

A essência da aprendizagem consiste tanto na apreensão da tendência geral que sugere uma direção para o futuro quanto na implementação criativa, ou atualização desta sugestão percebida. (Aqui, começamos a compreender em que sentido Peirce se referia à filtragem de verdades ideais e eternas: a natureza desta filtragem tem muito a ver com a noção de causalidade final). Se este é o caso, então a aprendizagem torna-se uma característica do universo, caso aceitemos a visão de Peirce de que as leis da natureza são produto da evolução e estão sujeitas ao crescimento. A natureza como um todo, corresponde a uma implementação contínua e aleatória de regras condicionais e gerais que determinam as formas possíveis que são oferecidas para a atualização. A aprendizagem cresce dentro dos limites de um plano geral condicional.

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35  

 

A sucessão e renovação das gerações está contida no próprio ciclo da vida, na

renovação permanente das espécies e do mundo que, no universo do humano, além da

dimensão biológica, encontra-se inscrita na dimensão da cultura. Considerando as

transmissões educativas como representações culturais que visam preservar, dar continuidade

e renovar um mundo pré-existente, na medida em que surge uma nova formação cultural que

parece anunciar uma descontinuidade com um mundo pré-existente - sustentada por um

mundo acelerado em sua renovação - essa condição parece exigir que façamos como

Niestzsche (apud LATOUR 1994, p. 17) dizia, sobre os grandes problemas, que eram como

banhos frios: é preciso entrar rápido e sair da mesma forma. A brevidade aqui exigida não

significa ausência de profundidade, mas uma agilidade requerida, tal qual um choque térmico

que atomiza a cristalização e cria uma maior superfície de contato, acelerando a velocidade

das reações. Nas palavras do filósofo inglês Alfred Whitehead34, nesses termos, diz ele:

A questão é que no passado o intervalo de tempo necessário para uma mudança de vulto era consideravelmente maior do que uma vida humana, assim a humanidade aprendeu a se adaptar a condições fixas. Hoje o intervalo de tempo é consideravelmente menor do que o de uma vida humana, e por isso, nosso aprendizado deve preparar os indivíduos para a renovação continuada e intensa das produções.

Dos anos 70 aos tempos atuais, o ritmo acelerado das mudanças e transformações

adquiriu o caráter de “espírito do tempo” (Zeitgeist). Presenciamos à consolidação e/ou

surgimento de pelo menos três formações culturais35: a cultura de massa, a cultura das mídias

e a cultura digital, compondo uma complexa camada cultural onde as novas formações vão

coexistindo com as anteriores e ao mesmo tempo reajustando-as e reformulando-as

(SANTAELLA, 2003). “Não há cultura sem comunicação, não há comunicação sem signos”

(SANTAELLA, 2010, p. 12). Modificando e multiplicando os modos de criar, registrar,

transmitir e armazenar linguagens e informações, esse complexo ecossistema comunicacional

vem produzindo novos agenciamentos que modificam os ambientes cognitivos, estimulando o

crescimento exponencial dos níveis de informação. O ponto de vista fixo cede lugar à                                                                                                                          34 Citação extraída de notas de palestras do I Encontro Ciências e Cognição: novas fronteiras cognitivas, 16 a 18 de março de 2011, Rio de Janeiro. 35 Santaella (2003a; 2007) propõe seis formações culturais: a cultura oral, escrita, impressa, de massa, das mídias e a cultura digital.

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percepção multidimensional inclusiva, mediado por tecnologias da inteligência36 e redes de

aprendizagem.

A partir da análise de políticas culturais na Colômbia, Martín-Barbero (2000) defende

a necessidade de articulação de políticas conjuntas de Cultura/Comunicação/Educação como

forma de viabilizar a nação tanto política como culturalmente, tanto social e laboralmente, o

que passa pela necessidade de que o ecossistema comunicacional se articule e se organize

com as dinâmicas da cultura e da educação. No Brasil, a iniciativa do Ministério da Cultura

sob a tutela do Ministro Gilberto Gil, introduziu uma experiência singular e inédita em âmbito

mundial, o Cultura Viva, ação principal do projeto Cultura, Educação e Cidadania. A

articulação política integrando as três dimensões citadas por Martín-Barbeiro (2000) são

concretizadas no apoio à criação e difusão dos Polos de Cultura Digital37, que se espalharam

por todo o país. O programa se baseia em três pilares conceituais – autonomia, protagonismo

e empoderamento –, que se relacionam, respectivamente, às três dimensões da cultura, na

visão proposta pelo MinC: a simbólica, a cidadã e a econômica (COSTA, 2011).

No discurso de transmissão do cargo, o Ministro Gilberto Gil (2003) expôs os

princípios norteadores dessa iniciativa ao anunciar um novo desafio do Ministério da Cultura:

Fazer uma espécie de “do-in” antropológico, massageando pontos vitais, mas momentaneamente desprezados ou adormecidos, do corpo cultural do país. Enfim, para avivar o velho e atiçar o novo. Porque a cultura brasileira não pode ser pensada fora desse jogo, dessa dialética permanente entre a tradição e a invenção, numa encruzilhada de matrizes milenares e informações e tecnologias de ponta.

A difusão desses pólos vem estabelecer uma rede no país que articula arte, cultura,

educação e tecnologia criando um outro cenário educacional conectado com as realidades

locais, realizando em ações concretas um descentramento do saber e autorizando mediadores

                                                                                                                         36 As tecnologias da inteligência são aquelas que propiciam a mediação, isto é, “devem estar implicadas a afecção, a percepção e a cognição mediada pelo mundo da linguagem, pelos signos” (SANTAELLA, 2007, p. 207). 37 Para um maior aprofundamento sobre os Pontos de Cultura Digital e o potencial de transformação suscitado pelos novos paradigmas de produção, circulação e consumo cultural do contexto das redes, conferir a dissertação de mestrado “Com quantos gigabytes se faz uma jangada, um barco que veleje”: o Ministério da Cultura, na gestão Gilberto Gil, diante do cenário das redes e tecnologias digitais” (COSTA, 2011).

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37  

 

culturais em sua disseminação, principalmente, no que compete ao desenvolvimento de

competências comunicacionais utilizando as mídias digitais. O projeto prevê a implantação de

estúdios digitais multimídia e de conexão à rede nos pontos de culturas e pontões, o que

permite viabilizar a criação de conteúdo multimídia em vários formatos e a difusão da

produção local via web, possibilitando uma visibilidade e expressão de culturas locais

integradas à apropriação da tecnologia digital. A criação do site culturadigital.br38 vem

sintetizar essas ações reunindo informações, históricos, publicações atualizadas com base na

participação colaborativa em rede dos diversos atores e interessados nesse processo.

Um outro eixo, que nos anos 80 tem como referência a criação do MIT Medialab39 e

nos anos 90 centros culturais como o ZKM40, e que ressurge, nos últimos dez anos, em

formatos diversos integrando tecnologia, cultura, comunicação e educação em âmbito

nacional e mundial, são os laboratórios experimentais de mídias, que generalizando podem ser

chamados e compreendidos como medialabs. Laboratórios que tem sua origem tanto em

iniciativas públicas e privadas vinculadas a instituições acadêmicas e/ou culturais, quanto em

iniciativas da sociedade civil na forma de laboratórios autônomos, coletivos, hacker clubes e

laboratórios diversos. Em sua grande maioria, atuam na interface arte, ciência, tecnologia e

sociedade voltados para ações de apropriação das “novas mídias”, ciber ativismo, mídia arte e

arte eletrônica ou outras denominações que possamos associar que envolvem arte e tecnologia

na contemporaneidade. São de natureza, finalidades e formatos diversos, mas mantêm essa

denominação comum, seja na nomenclatura ou na descrição, de laboratórios. Tema ou

conceito que tem sua visibilidade e representação associada as ciência ditas duras ou naturais,

onde o laboratório surge como um ambiente controlado de experimentação e pesquisa

                                                                                                                         38 http://culturadigital.br 39 O Medialab do Massachussets Institute of Technology é um dos mais renomados centros de pesquisa na convergência entre artes e ciência. Foi criado em 1985 por iniciativa de Nicholas Negroponte. Denomina-se como um espaço onde “o futuro é vivido e não imaginado”, direcionado para o desenvolvimento e aplicação de pesquisas orientadas para a previsão e antecipação do impacto das tecnologias emergentes no cotidiano, - “tecnologias que fundamentalmente transformam nossas noções mais básicas relativas `as capacidades humanas”. Está associado a grandes corporações mundiais, que tem participação como membros do laboratório e provêm grande parte do financiamento da instituição, o que vincula suas produções e pesquisas à inovação industrial. Conf.:http://www.media.mit.edu/about 40 ZKM (Zentrumfür Kunstund Medientechnologie Karlsruhe) é uma instituição cultural, um centro de arte e mídia, sediado em Karlsruhe (Alemanha) que combina produção e pesquisa, eventos e exibições, coordenação e documentação. É composto por um museu de arte contemporânea, um museu de mídias, um instituto de mídias visuais, um instituto de música e acústica e um instituto de mídias, educação e economia que desenvolvem projetos interdisciplinares e promovem colaborações internacionais. A ideia foi concebida no início dos anos 80, mas sua inauguração ocorreu em 1997.

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instituindo uma prática de separação entre natureza e cultura, ainda que nessa ação de

purificação tenha provocado o efeito contrário propiciando a proliferação dos híbridos

(LATOUR, 1994; 2005). No contexto dos laboratórios experimentais (medialabs), essas

bordas ficam mais difusas na articulação de uma mistura que coloca o rigor da pesquisa

científica lado a lado com o experimental da arte e a liberdade de criação, ganhando corpo e

visibilidade no remix e materialidade da digitalização, na ubiquidade da difusão da

informação, na constituição de redes transdisciplinares de colaboração. Mistura de pesquisa,

oficina, equipamentos, tecnologia de ponta (high tech) e das mais simples do tipo faça você

mesmo (low tech), cultura da convergência, colaboração, articulação em rede, criação,

inovação.

O lab de mídia como existe hoje é precedido por diversas tipologias de espaços de trabalho e formas de institutos de pesquisa: a oficina de produção, o estúdio de artista e o lab de pesquisa, mas também o museu, o centro comunitário, a biblioteca e a escola. Hoje entendemos labs de mídia como organizações de pesquisa que procuram respostas para as demandas de uma sociedade da informação. Essas “demandas” não são recursos fixos nem são conhecidas e definidas por si mesmas. Elas dependem de contexto. Qual é o objeto de desejo, ou quem está perguntando? Estas questões podem ser consideradas desde perspectivas políticas, sociais, culturais e educacionais. (Labtolab, Laboratórios de meio de caminho, apud FONSECA, 2012, p.54)

Os laboratórios de hoje são menos espaços que têm sua centralidade na oferta de

estrutura e acesso às “novas mídias” e conexão (hoje disseminadas nos formatos e

possibilidades de laboratórios nômades configurados em laptops e conexão móvel, da

computação pervasiva e ubíqua) e mais espaços que atuam catalisando encontros, reflexões e

ações que dinamizam “redes de articulação, produção e distribuição de cultura digital”

(FONSECA, 2010). São exemplos o Medialab Prado (Madrid, Es), o Eyebean (NY, EUA), o

Hangar.org (Barcelona, Es). São espaços de bricolagem como o MetaReciclagem41 e de

                                                                                                                         41Rede auto-organizada que propõe a desconstrução da tecnologia para a transformação social. A MetaReciclagem é uma rede distribuída que atua desde 2002 no desenvolvimento de ações de apropriação de tecnologia, de maneira descentralizada e aberta. A rede começou em São Paulo em parceria com a ONG Agente Cidadão, como um projeto de captação e remanufatura de computadores usados que, posteriormente, eram distribuídos para projetos sociais de base. A Metarreciclagem sempre teve por base a desconstrução do hardware, o uso de software livre e de licenças abertas, a ação em rede e a busca por transformação social. Desde então, a Metarreciclagem teve a oportunidade de atrair centenas de colaboradores e influenciar a criação e a implementação de diversos projetos de grande alcance. Recebeu menções honrosas no Prix Ars Electronica 2006

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cartografias, como o Macospol42. São também laboratórios experimentais dedicados às

pesquisas colaborativas transdisciplinares, cujas finalidades ultrapassam os limites das

disciplinas de um campo específico, o que exige formas híbridas ainda pouco estabilizadas ou

definidas de metodologias e status epistêmico e ontológico do conhecimento produzido. O

que são exatamente? Que novo conhecimento eles produzem ou possibilitam? O que podemos

aprender com as experiências transdisciplinares, cooperativas e em rede que estão sendo

produzidas e como podem nos ajudar a delinear um futuro e pensar os rumos da des-ordem

cultural que atravessamos?

Shanken (2010) finaliza o texto A história e futuro dos labs: pesquisa colaborativa na

interseção entre arte, ciência e tecnologia sinalizando que o sucesso dessa nova onda de

laboratórios experimentais será mensurado por uma “redundante” repercussão futura, isto é,

um futuro que ateste como as mudanças correntes de concepção e construção de

conhecimento e da sociedade, como um critério evolutivo, adquiriram reconhecimento

científico e valor cultural e uma distribuição ubíqua. Futuro indeterminado que ganha corpo

enquanto uma tendencialidade para o crescimento, seguindo o princípio do pragmatismo

peirceano de que “no processo de evolução, aquilo que existe vai, mais e mais, dando corpo a

certas classes de ideais que, no curso do desenvolvimento, se mostram razoáveis”

(SANTAELLA, 1994, p. 137)

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           (categoria Digital Communities) e Prêmio APC Betinho de Comunicação (2005), e foi listada como pré-selecionada no Prêmio APC Chris Nicol de Software Livre em 2007. Em 2009, foi contemplada com o Prêmio Mídia Livre, do Ministério da Cultura. A partir do intercâmbio com a plataforma Waag-Sarai (Holanda-Índia), a Metarreciclagem passou a definir-se não mais em função de um grupo que reciclava computadores, mas uma rede aberta que promovia a desconstrução e apropriação de tecnologias. Conf.: http://rede.metareciclagem.org/wiki/MetaReciclagem 42Macospol (Mapping Controversieson Science for politics) é uma iniciativa de investigação conjunta que reúne estudiosos em ciência, tecnologia e sociedade em toda a Europa. Seu objetivo é criar uma plataforma colaborativa para ajudar estudantes, profissionais e cidadãos em mapear as controvérsias científicas e técnicas. http://www.mappingcontroversies.net/Home/AboutMacospol

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1.1 MUTAÇÕES E A DES-ORDEM CULTURAL

A difusão e o descentramento dos ambientes educacionais e o surgimento de um

sensorium novo são dois aspectos apreendidos na manifestação e materialização do

ecossistema comunicativo (MARTÍN-BARBERO, 2000). Estes aspectos são de fundamental

importância para o desenvolvimento das análises que aqui propomos, manifestação e

materialidade que nos confrontam e que reafirmam a proposição de Mead (1970) e de Kriegel

(1979) de que vivemos um momento histórico que introduz a existência da mudança e a

consciência da mudança a partir da interações geracionais, ouçamos o autor:

A primeira manifestação e materialização do ecossistema comunicativo é a relação com as novas tecnologias - desde o cartão que substitui ou dá acesso ao dinheiro, até as grandes avenidas da Intemet - com sensibilidades novas, muito mais claramente visíveis entre os mais jovens. Eles têm maior empatia cognitiva e expressiva com as tecnologias e com os novos modos de perceber o espaço e o tempo, a velocidade e a lentidão, o próximo e o distante. Trata-se de uma experiência cultural nova, ou, como chamou Walter Benjamin, um sensorium novo. Novos modos de perceber e de sentir; uma nova sensibilidade que, em muitos aspectos, se choca e rompe com o sensorium dos adultos. […]

Uma segunda dinâmica, que faz parte desse novo ecossistema no qual vivemos, e que é a dinâmica da comunicação, liga-se ao âmbito dos grandes meios, ultrapassando-os porém. Ela se concretiza com o surgimento de um ambiente educacional difuso e descentrado, no qual estamos imersos. Um ambiente de informação e de conhecimentos múltiplos, não-centrado em relação ao sistema educativo que ainda nos rege e que tem muito claros seus dois centros: a escola e o livro. (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 4)

Na linha tênue da tríplice convergência entre comunicação, cultura e educação é,

afinal, a partir de uma ecologia midiática e de uma comunicação que se converte em

ecossistema, que emerge um dos seus principais desdobramento, - a forte diversificação e

descentralização do saber; o que muito propriamente é colocado por Martín-Barbeiro como

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uma passagem de uma sociedade de sistemas de aprendizagem para uma sociedade de

aprendizagem, “uma transformação nos modos de circulação do saber é uma das mais

profundas transformações que pode sofrer uma sociedade” (MARTÍN-BARBERO, 2000, p.

5). Surge um saber disperso e fragmentado no fluxo informacional, deslocalizado e des-

temporalizado dos espaços e tempos legitimados socialmente, cada vez mais resultante da

mistura entre saberes especializados, saberes provenientes da experiência social e das

memórias coletivas. Surge um outro sujeito da educação, não mais o sujeito do racionalismo

moderno identificado como o sujeito do conhecimento, sujeito da razão, da separação radical

entre mente e corpo, de referenciais definidos e sólidos como a família e a escola, para dar

lugar a “um sujeito muito mais frágil e quebradiço, [...] onde as certezas do plano do saber,

bem como da ética e da política são cada vez menores” (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 3).

Parente (1993, p.14) coloca a questão em termos dos agenciamentos que as recentes

formações culturais vêm produzindo relativo às formas de produção de subjetividade:

Vivemos hoje numa dessas épocas de crise das antigas ordens de representação e de saberes, e, mais profundamente, de uma grande complexidade em relação às formas de produção de subjetividade. Nenhuma reflexão séria sobre o devir da cultura contemporânea não pode deixar de constatar que existe uma multitude de sistemas maquínicos, em particular a mídia eletrônica e a informática, que incidem sobre todas as formas de produção de enunciados, imagens, pensamentos e afetos.

Compreender a dimensão de um olhar sobre a cultura e o sistema comunicacional

como constituintes de um complexo sistema engendrado na interação de camadas sobrepostas

de ambientes físicos, virtuais e intersticiais, demanda uma reconfiguração do que entendemos

por espaço-tempo e da dicotomia corpo/mente supondo que cada um desses atributos são

interações perceptivas-cognitivas definidas, predominantemente, a partir de um estar no

mundo e pensar o mundo constituído por um habitat cuja natureza é simultaneamente

orgânica e sintética, material e imaterial. Assim, quando um ecossistema tecnológico e

comunicativo ganha o mesmo status de ecossistema verde em importância na constituição da

realidade que nos cerca e de nossa subjetividade, o significado amplo dessa concepção nos

coloca no olho do furacão da mutação que presenciamos nesta era. Essa discussão permeia a

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obra de Santaella (2003; 2010) que a partir da articulação entre os processos comunicacionais,

culturais e sígnicos analisa os amplos significados da evolução das tecnologias midiáticas e o

crescimento da diversidade midiática. Destacamos no trecho abaixo a dimensão da metáfora

ecológica aplicada ao campo da comunicação:

Que a comunicação também faça uso da metáfora ecológica não deve causar espanto. A história da humanidade confunde-se com a história do aparecimento contínuo das novas mídias comunicacionais. Começando com a invenção das escritas e do alfabeto, continuou com a prensa manual e, depois mecânica, com a fotografia, o telégrafo, o jornal, o telefone, o cinema, o rádio, a TV, etc. A constituição progressiva de uma ecologia midiática salta à vista. (SANTAELLA, 2010, p. 15)

Observamos a emergência da temática geracional repaginada a partir das dinâmicas

sócio-técnicas que envolvem o processo de digitalização. O que coloca em questão a

dimensão e o papel que os objetos técnicos43 adquiriram com a digitalização, principalmente,

na sua relação com a constituição dos sujeitos e do ambiente que os cerca. Fatores

considerados determinantes para pensar a complexidade na qual situamos as transmissões

educativas no contexto atual, onde a questão comunicacional adquire centralidade na

comparação dos modelos comunicacionais (SILVA, 2000; PRENSKY, 2001; ABREU, 2006)

mediados pelas tecnologias digitais e o modelo unidirecional de transmissão de saberes

praticados pelos sistemas educacionais da modernidade. Além da crise da razão, que ao longo

do século XX colocou em cheque os valores basilares que organizam o sistema educacional

formal, - no qual a crença no progresso representado pela ciência e seus saberes originaram

uma arquitetura de saberes disciplinarizados -, acrescenta-se o impacto da revolução digital e

a consequente mudança de paradigma comunicacional. A difusão e descentralização de saber

coloca em questão o papel da escola nas transmissões educativas da atualidade.

A crise da escola, que já não pode impor sua autoridade e ainda não consegue estabelecer sua nova legitimidade baseada no diálogo e na

                                                                                                                         43 Bruno (2002), no texto Tecnologias cognitivas e espaços de pensamento, discute o papel dos objetos técnicos em sua relação com o pensamento. Partindo da suposição que somos sistemas cognitivos constituídos por trocas informacionais com o meio, propõe que os objetos técnicos que construímos e usamos integram nossas ‘mentes’, nossos pensamentos, incitando uma redefinição da espacialidade do pensamento.

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consideração das novas características da criança e do adolescente, tem muito a ver com as transformações da sociedade, particularmente aquelas relacionadas com o processo de socialização das novas gerações (BELLONI, 2010, p. 16).

O educador Paulo Freire (1977) considera equivocada a concepção de que o fazer

educativo é uma questão de transmissão ou de extensão sistemática de um saber. Para ele, esta

é uma situação gnosiológica em seu sentido mais amplo, isto é, uma relação do objeto

cognoscível com os sujeitos cognoscentes que se constrói em um ato dialógico de busca de

significação, um ato comunicativo por excelência:

A intersubjetividade, a intercomunicação é a característica primordial desse mundo cultural histórico, daí que a função gnosiológica não possa ficar reduzida à simples relação do sujeito cognoscente com o objeto cognoscente. Sem a relação comunicativa entre o sujeito cognoscente em torno do objeto cognoscível desapareceria o ato cognoscitivo, a relação gnosiológica por isto mesmo não encontra seu termo no objeto conhecido, pela intersubjetividade se estabelece a comunicação entre os sujeitos a propósito do objeto. […] Não há realmente pensamento isolado, na medida em que não há homem isolado. Todo ato de pensar exige um sujeito que pensa, um objeto pensado que mediatiza o primeiro sujeito do segundo e a comunicação entre ambos, que se dá através de signos linguísticos. O mundo humano é desta forma um mundo de comunicação. (FREIRE, 1977, p. 69)

Dialogismo que transpassa a expressividade dos sujeitos interlocutores. Para Freire

(1977), uma comunicação eficiente, que resulte em um que-fazer educativo, exige que os

sujeitos interlocutores, ao se referir a um objeto, expressem-no através de signos linguísticos

pertencentes a universos compartilhados. Signos produzidos a partir de uma realidade

histórico-cultural numa unidade dialética entre a subjetividade e o agir:

E, se o que-fazer educativo, como qualquer outro que-fazer dos homens, não pode dar-se a não ser “dentro” do mundo humano, que é histórico-cultural, as relações homens-mundo devem constituir o ponto de partida de nossas reflexões sobre aquele que-fazer. […] O homem é homem e o mundo é histórico-cultural na medida em que, ambos inacabados, se encontram numa relação permanente, na qual o homem, transformando o mundo, sofre os efeitos de sua própria transformação. (FREIRE, 1977, p. 76)

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A grande lição que Paulo Freire nos legou está em pensar o fazer educativo como uma

ação inserida em um contexto histórico-cultural e em práticas que permeiam a relação entre os

sujeitos e o mundo, ancoradas em um cotidiano e no universo cultural vivenciado por seus

atores. É na dialética entre os jogos que permeiam o agir humano sobre o mundo, seu reverso

e o ato dialógico da busca da significação, que a educação para Freire é compreendida como

duração e no sentido da duração, como permanente, o que “não significa permanência de

valores, mas a permanência do processo educativo, que é o jogo entre a permanência e as

mudanças culturais” (FREIRE, 1977, p. 84).

Duração e permanência são dois atributos da mutação, retornando ao I Ching. Na

perspectiva oriental, a duração é um movimento de um todo organizado que se renova e se

integra, que se processa em harmonia com leis imutáveis, podendo ser compreendido como

continuidade, crescimento no tempo. Tempo cíclico, tal qual a renovação e repetição de cada

estação da natureza. O caráter da mudança é seu estado constante, “mudança: isto é o

imutável”. É a mudança que possibilita a diversidade e, é na sua duração e na consequente

permanência que as leis gerais se manifestam. É no jogo dialético das polaridades entre o que

permanece e o que muda que ocorre a fusão e a síntese, nas palavras de Freire, o processo

educativo. Plaza (2008, p. 180) bem exemplifica essa dinâmica: “quando a neve se acumula

sobre o galho do pinheiro, se o galho se torna rígido, ele quebrará. Sua flexibilidade diante do

rígido é, no caso, sua força.” No modo de ver de Paulo Freire: “A educação que não se

transformasse ao ritmo da realidade não ‘duraria’, porque não estaria sendo” (FREIRE, 1977,

p. 89).

Segundo esse mesmo princípio, contido no jogo entre a permanência e as mudanças,

precisamos estar atentos para o que Santaella (2007; 2010) define como a constituição

progressiva de uma ecologia midiática configurada no crescimento da diversidade semiótica

das mídias e das múltiplas possibilidades que surgiram no campo da comunicação e

linguagem na era digital. Multiplicidade e fertilidade que se refletem na educação e nos

caminhos plurais que a convergência desses campos apontam no surgimento de novos

ambientes educacionais. Ambientes a partir dos quais pode ser observada a configuração de

uma ecologia cognitiva nos moldes do que propõe Lévy (1994) e que somente foi

possibilitada a partir da popularização dos computadores em meados da década de 80 e o

surgimento da interface gráfica (os softwares culturais como defendido por Manovich, 2001;

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2008; 2008a); da integração dos computadores ao sistema de telecomunicações; do

surgimento da internet na década de 90; sua expansão e evolução para o que denominamos

como Web 2.0 e 3.0, na última década; o desenvolvimento e popularização das tecnologias

móveis e de acesso à conexão e banda larga; e as apropriações, funcionalidades e

significações que a juventude tem atribuído a esse complexo sistema, que traz na metáfora e

no conceito de rede sua expressão.

Juventude, que desde os idos anos 80, cresceu acompanhando a disseminação da

Internet e a expansão da comunicação móvel. Esta geração e as vindouras encontram-se cada

vez mais imersas em uma vivência de virtualização, interatividade, desterritorialização como

referências de elaboração dos processos de subjetividade. Transitam em um ambiente ubíquo

e pervasivo, isto é, onde o acesso à informação, à comunicação e à aquisição de conhecimento

pode ser dar a qualquer tempo e em qualquer lugar, prevalecendo o crescimento das práticas

de aprendizagem colaborativas em rede e da cultura do remix, mediadas pelas tecnologias de

linguagem e comunicação designadas como tecnologias de acesso e, em um segundo estágio,

de conexão contínua, da mobilidade. Essa terminologia é atribuída por Santaella (2010b, p. 3)

às tecnologias que são fruto, respectivamente, da convergência entre computação e rede de

telecomunicações e, posteriormente, “de uma rede móvel de tecnologias e pessoas que

operam em espaços não contínuos”.

Do ponto de vista da ecologia cognitiva, as conceituações centradas no desenvolvimento

cognitivo do indivíduo cedem lugar para que sejam compreendidas no quadro de sua

conectividade na rede, acrescido da participação das “coisas”, denominada de cognição

distribuída. “O ser cognoscente é uma rede complexa na qual os nós biológicos são

redefinidos e interfacetados por nós técnicos, semióticos, institucionais, culturais” (LÉVY,

1993, p. 161). Nesse contexto, as “sensibilidades juvenis”, como Martín-Barbero (2000)

assinala, emergem como um contraponto tornando visível mutações e transformações que a

revolução digital vem conduzindo nas esferas culturais, sociais e sígnicas, operando como

ponto de partida para análises que estabelecem uma relação entre cultura, comunicação e

educação.

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O acesso as TICs pode estar gerando um abismo tecnológico entre as gerações, ou seja, um afastamento (ou incomunicação) técnico entre adultos e crianças, invertendo radicalmente os papéis tradicionais na relação entre o adulto-que-sabe e a criança que-não-sabe e criando uma nova espécie de diversidade cultural intergeracional e interclasses, cuja característica mais marcante é uma fissura em torno de questões éticas que envolvem a compreensão de muitos elementos do mundo, especialmente aqueles ligados à política e a violência que circunda nossas vidas. Estas diferenças extremas entre gerações, de abordagem da tecnologia, de perspectivas estéticas e éticas e de formas de perceber o mundo, vêm ocorrendo principalmente nas classes sociais que têm acesso domiciliar às TICs, nas quais crianças e os adolescentes são em geral os maiores usuários dos computadores conectados. (BELLONI, 2010, p. 13).

Novaes (2009, p. 9) nos lembra que a mutação enquanto uma passagem de um estado

das coisas para outro, configura-se hoje como “uma aventura que se inscreve na nossa história

de maneira veloz, com deslocamentos conceituais ainda em formação pela filosofia e

antropologia, antecipação de categorias ainda incertas: não sabemos nomear este novo estado

das coisas.” Pensando a partir da tradição, corremos o risco de julgar por uma certa

comparação entre o que antecedeu e o que está por vir, fundada numa visão de perdas e

ganhos. Por outro lado, na ausência de concepções de mundo que davam um sentido às coisas,

podemos também nos perder na indefinição do que nos acontece.

Enfrentamos, de início, as dificuldades postas pelo próprio objeto e seu tempo: nem tudo pode ser descrito hoje em linguagem antiga e pouco coisa pode ser pensada como a ajuda de conceitos que dominaram o saber até bem pouco tempo. Muito menos podemos recorrer a dualidades exacerbadas – a começar pela tentação de comparar o acontecido com o vir a acontecer. (NOVAES, 2009, p. 10)

Necessário perceber movimentos em curso e, portanto, como um presente para o qual

precisamos projetar um futuro ainda indeterminado e repleto de possibilidades cujo destino

não temos como prever, a não ser que tomemos o determinismo tecnológico como uma

certeza.

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1.2 CAINDO NA REDE

Retornamos ao questionamento de Mead (1970) sobre quem poderá responder a essas

questões ou de que modo. Afinal, ainda que estejamos vivendo tempos pós-modernos,

carregamos a herança da modernidade. O que, de certo modo, justifica o temor e insegurança

na impossibilidade de colocarmos algo em seu lugar pelo simples fato de que os novos

valores não fazem parte do modo como até então nos construímos, além de que possuem

sentidos distintos para aqueles que nasceram e cresceram na era digital e as demais gerações.

Permanecemos interiorizados na modernidade? Ou, jamais fomos modernos no sentido

proposto por Latour (1994)?44.

Turkle (2009), em entrevista para o Frontline/digitalnation45, sintetiza esse dilema na

assertiva de que as mudanças tecnológicas desafiam-nos a afirmar nossos valores humanos, o

que significa, antes de tudo, que precisamos descobrir quais são eles ou aqueles que

permanecem como um valor a ser preservado. De fato, a preocupação demonstrada por pais e

educadores diz respeito não só ao confronto de valores entre gerações e a perturbações na

ordem estabelecida por uma cultura herdada. Relaciona-se, principalmente, com a

responsabilidade e autoridade de conduzir a criança e o jovem à fase adulta, como discutido

por Arendt, no texto de 19, em sua crítica ao sistema educativo americano. Autoridade que é

colocada em cheque no momento em que duas instituições tão sólidas como a família e a

escola são penetradas por bit, bytes, terabytes, um dilúvio de informação, trazendo para dentro

dos muros e paredes de nossas casas e escolas o mundo. Até então, o educador era, em relação

aos jovens, o:

[...] representante de um mundo pelo qual deveria assumir a responsabilidade, embora não o tenha feito e ainda que secreta ou

                                                                                                                         44 Em Jamais Fomos Modernos, Latour (1994) propõe que a modernidade foi constituída por um duplo procedimento: o trabalho de purificação crítica, que cria duas zonas ontológicas distintas, de um lado os humanos e do outro lado os não humanos; e um conjunto de práticas que cria, por tradução, misturas entre gêneros de seres completamente novos, híbridos de natureza e cultura. Enquanto mantemos distintos e separados essas práticas, seremos realmente modernos. No momento que tomamos consciência que as duas práticas estiveram operando desde sempre no período histórico que se encerra, deixamos de ter sido modernos, no sentido pretérito, isto é, jamais fomos modernos. 45 Entrevista realiza em 22/09/2009 e postada em 2/02/2010, conferir em Http://www.pbs.org/wgbh/pages/digitalnation/interwiews/turkle.html. Acesso em: 15 set. 2011.

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abertamente possa querer que ele fosse diferente do que é. [...] A qualificação do professor consiste em conhecer o mundo e ser capaz de instruir outros acerca deste, porém sua autoridade se assenta na responsabilidade que ele assume por esse mundo (ARENDT, 1997, p. 239).

Os muros da escola permanecem em seus lugares, mas se tornaram porosos aos fluxos

de informação. Essa porosidade provoca um deslocamento invisível, re-ordenando

investimentos de energia cognitiva, emocional e psíquica, ainda que o corpo físico esteja

preso às carteiras escolares. Desprovidos de materialidade, transformados em fótons

conduzidos por um meio tão fluído como o ar, o fluxo de bytes realiza uma espécie de sonho

de teletransporte. Os dispositivos móveis (celulares, pads, e-books, notebooks, etc.)

conectados em rede e as redes wi-fi completam essa deslocalização misturando os espaços

físicos e virtuais, criando superfícies híbridas. Apesar de toda essa permeabilidade, a

penetração da cultura digital no ambiente escolar encontra uma resistência por oposição. Não

é por acaso que Martín-Barbero (2008) assinala a escola como esse espaço de visibilidade dos

contrastes que permeiam o des-ordenamento cultural que atravessamos.

Umas das questões levantadas pelo autor e Rey (2004, p. 33) diz respeito à forma

como a experiência audiovisual iniciada com o cinema e, popularizada com a televisão, vem

afetar “o tipo de representação e de saber, no qual esteve baseado a autoridade”.

Primeiramente, levando às telas do cinema o universo multiculturais das grandes urbes e

depois, com a televisão, levando para dentro dos lares “suas cortantes separações entre

realidade e ficção, entre vanguarda e kitsch, entre espaço de ócio e de trabalho” (REY, 2004,

p. 33). Do ponto de vista da criança, os limites entre o mundo infantil e adulto ficam mais

tênues, ou melhor, vai se dissolvendo a separação desses universos, que foi se delineando ao

longo dos séculos XVII até meados do século XX, com o surgimento da escola primária, a

transição da aprendizagem prática para o aprender com os livros, a segmentação entre o

público e privado e entre o universo infantil e adulto.

A televisão age no sentido de fazer penetrar no cotidiano familiar o mundo adulto das

guerras, dos crimes, dos jogos de sedução, da hipocrisia, mentira, etc, colocando a criança e o

jovem em contato com temas e comportamentos que os adultos se esforçaram por ocultar

durante séculos (MEYROWITZ, 1992 apud MARTÍN-BARBERO, 2002). Rompe-se o filtro

da autoridade parental e modificam-se os modos de circulação do saber, processo que

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acentua-se partir da metade do século XX46, catalisando e refletindo uma dinâmica social que

já vinha minando a estrutura familiar com as novas condições de vida e de trabalho, a inserção

acelerada da mulher no mundo laboral, o aumento do número de divórcios, a diminuição do

número de filhos, a liberação sexual etc.

Emergem sensibilidades que se desvinculam das figuras de autoridade (pais,

professores, sacerdotes, elites intelectuais) que, tradicionalmente, detinham os saberes e

práticas e definiam os cânones culturais para um deslocamento onde a cultura audiovisual

passa a instruir a maioria. Cultura que quebra com os códigos da cultura impressa permitindo

o acesso e disseminação da informação a um público não letrado, rompendo com as ordens

sequenciais que, em etapas e idades, organizam o processo de aprendizado formal baseado na

leitura e as hierarquias no intenso e fragmentário movimento do zapping47 (BARROS FILHO,

2008). Ainda que possamos atribuir ao meio televisivo o fenômeno da banalização da cultura e

sua massificação e compreendê-la como um sistema de controle político-social, também

pode-se abordá-la por um outro viés, “como um dispositivo audiovisual através do qual uma

civilização pode exprimir a seus contemporâneos os seus próprios anseios e dúvidas, suas

crenças e descrenças, as suas inquietações, as suas descobertas e os voos de sua imaginação”

(MACHADO, 2005, p. 11).

Martín-Barbero (2002) associa o zapping ao modo nômade de habitar a cidade,

experiência que o flâneur de Baudelaire retrata passeando sem destino pelas galerias e ruas da

cidade misturando-se com a multidão e presenciando a velocidade das mudanças na sociedade

moderna, “a modernidade é o transitório, o efêmero, o contingente” (BAUDELAIRE, 1996).

Modernidade que inaugura o leitor movente (SANTAELLA, 2004) filho da Revolução

Industrial, da multidão, das vitrines e dos anúncios que passam a se espalhar pela cidade e

configuram novos ritmos de atenção. É o leitor que nasce com advento do jornal, “leitor

fugaz, novidadeiro, de memória curta, mas ágil” (SANTAELLA, 2004, p. 29), o leitor que

transita pela cidade e seus signos, “leitor de formas, volumes, massas, interações de forças,

                                                                                                                         46 Hobsbawn (1995) aborda a revolução cultural a partir da dissolução de instituições como a família e a igreja, a juventude vai adquirindo cada vez mais um protagonismo cultural definindo normas e valores, rompendo com hábitos intelectuais e educativos seculares, onde a rapidez das mudanças tecnológicas e dos meios de comunicação conferem aos jovens vantagens sobre as demais faixas etárias. 47 O conceito de zapping surgiu nos Estados Unidos para designar a prerrogativa que tinha um espectador de televisão para trocar de canal (ajudado pelo controle remoto) durante as inserções publicitárias. Depois o conceito foi estendido para qualquer mudança de canal (BARROS FILHO, 2008).

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movimentos, leitor de direções, traços, cores, leitor de luzes que se acendem e se apagam”

(SANTAELLA, 2004, p. 30). Nesses deslocamentos, a relação do sujeito com seu entorno,

mediado cada vez mais por uma tecnicidade, - que, alterando os regimes de visualidade,

redimensionam as noções de espaço e tempo -, transformam as representações, significados e

sentidos atribuídos a noções de próximo e distante, de território, de ambiência, de

temporalidade.

Di Felice (2009) propõe pensarmos a relação entre sujeito e ambiente como uma

relação comunicativa que vem transformando o sentido do habitar em uma prática de

interação comunicativa. Para tal, distingue três formas comunicativas do habitar:

(a) A empática, ligada à experiência tecnológica da leitura, que fará coincidir o habitar

com o ler, o espaço adquire um caráter textual e antropocêntrico em que o homem é:

[...] habitante da própria razão e somente morador temporário e ativo do ambiente ao seu redor. […] Nasce, assim, uma forma comunicativa unidirecional entre o sujeito e o espaço onde, de um lado do processo comunicativo, tem-se o emissor ativo e, do outro lado, a paisagem receptora e passiva (DI FELICE, 2009, p. 76).

É nesta forma comunicativa que habita o leitor contemplativo e meditativo do livro e

da imagem expositiva, leitor silencioso que, concentrado em sua atividade, separa-se

do ambiente circundante (SANTAELLA, 2004, p. 23);

(b) A exotópica, criada pela eletricidade e pelas experiências midiáticas de massas, que

exprime um habitar no qual o território continua a se manifestar como externo, porém

autônomo, cinético e independente do sujeito, a paisagem volta a adquirir cor,

tonalidades, texturas, sons reproduzidos tecnologicamente pela fotografia e cinema

(DI FELICE, 2009);

(c) E a atópica, difundida com os personal media digital que. transformando o território e

o espaço em informação pelos quais nos deslocamos, passam a configurar um habitar

informativo (DI FELICE, 2009). Partindo da concepção de que o ver, perceber e o

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habitar constituem uma relação cuja forma é simbiótica e que imprime um caráter

técnico e histórico à experiência sensível e às formas de habitar, desenvolve

argumentos relacionando as transformações técnicas da experiência sensorial com as

transformações das noções de território e os sentidos do habitar:

Se a escrita cria as representações de um espaço e território imateriais, reduzidos a palavras e textos, a eletricidade e as mídias audiovisuais, além de devolverem ao ambiente o movimento e as cores, contribuem para a formação de uma territorialidade externa, mecanicamente móvel, que se apresenta autônoma em relação ao sujeito. A digitalização do território, a partir do advento da comunicação digital reduzindo o ambiente a código informativo, produz pela primeira vez, uma superação da distância entre sujeito e território, permitindo a alteração da natureza do mesmo e a interpretação e interdependência entre ambiente e indivíduo. (DI FELICE, 2009, p. 21)

O ser-aí (Dasein) heideggeriano, um ser-no-mundo, é convocado por Di Felice (2009)

para pensarmos o modo de existir humano, um modo de habitar o mundo que difere

simplesmente de residir, mas encontra-se na sua própria ex-sistência, “aquilo em que a

essência do homem conserva a origem da sua determinação” (HEIDEGGER, 2005, p. 10), o

que permite ao homem atribuir significado e interagir fundado no seu pertencimento à

linguagem por meio da qual o homem e as coisas ganham e manifestam o sentido do seu ser,

“linguagem é advento iluminador-revelador do próprio ser” (HEIDEGGER, 2005, p. 12).

Di Felice (2009) utiliza o conceito de meio ambiente para descrever e sintetizar as

relações comunicativas entre sujeito, mídia (percepção) e ambiente, descrevendo uma

passagem onde a interação comunicativa, até então pensada e realizada a partir de fluxos

comunicativos direcionados a uma exterioridade, isto é, direcionados para um território

ambiente concebido como algo separado, adquire com a evolução tecnológica a configuração

da comunicação em rede, onde interior e exterior encontram-se integrados na interação e

imersão em um ambiente que articula sujeito-mídia-circuitos-natureza. “Nasce, assim, a

possibilidade de se pensar uma nova forma ecológica que, superando a visão ocidental

antropocêntrica, pense a natureza e o mundo como o conjunto de relações comunicativas

articuladas através dos dinamismos criadores de rede de redes” (DI FELICE, 2009, p. 29), o

que significa incluir construções intersubjetivas que estão prioritariamente baseadas em

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princípios participativos, de reciprocidade, confiança, compartilhamento, solidariedade

(SANTAELLA, 2012).

Tais princípios vão em direção ao que Capra no livro a Teia da Vida (1995) sugere

como eco-alfabetização, aprendizagem baseada na compreensão dos princípios de

organização das comunidades ecológicas (ecossistemas), tais como: interdependência

(compreender e nutrir as relações); padrões da rede, processos cíclicos e não lineares que

constituem laços de retroalimentação; sustentabilidade energética; conhecimento dos fluxos

energético e materiais; parcerias expressas no intercâmbio de energias e recursos por uma

cooperação generalizada; co-evolução, processo que ocorre na medida em que as parcerias,

fundadas na confiança e solidariedade, propiciam que ambos os parceiros aprendam e mudem,

co-evoluam; flexibilidade e diversidade, características que possibilitam ao sistema

permanecer sobrevivendo às perturbações e adaptando-se às condições mutáveis.

Para uma juventude designada como “nativo digital”48, tais configurações tecno-

ambientais traduzem formas de percepção e interação com o território, espaço, ambiente cujas

características vão estar associadas ao que caracterizamos como cibercultura. Ambientes,

culturas e linguagens que atravessam a elaboração de suas subjetividades. Estes se apresentam

como o leitor imersivo, virtual, “leitor que navega numa tela, programando leituras, em um

universo de signos evanescentes e eternamente disponíveis'' (SANTAELLA, 2004, p. 33).

Leitor mutante que passa a carregar a tela consigo pelas ruas da cidade, flâneur não mais

solitário na multidão, mas permanentemente enredado em mentes conectadas. Multidão que

passa a ser compreendida como rede redefinindo um modo de ver o mundo e agir sobre ele

(HARD; NEGRI apud LOVINK, 2005, p. 9):

                                                                                                                         48A origem do debate sobre os nativos digitais surge junto com a explosão da internet em meados dos anos 90. O ensaísta Barlow em sua Declaração da Independência do Ciberespaço, faz a seguinte advertência aos pais: “Vocês estão apavorados com suas próprias crianças, já que elas nasceram num mundo onde vocês sempre serão imigrantes" (BARLOW, 1995 apud CORRIN, 2010, p.1). Negroponte (1995) coloca a questão em termos de divisão cultural que apartaria gerações, onde o universo da cultura digital já se configurava para as crianças como um ambiente natural. O termo nativos e imigrantes digitais foi popularizado por Prensky (2001ab), educador norte-americano, ao propor a distinção entre os estudantes que frequentavam a escola no início do século XXI e seus professores. Prensky (2001ab) atribui à imersão em um ambiente cercado por computadores, videogames, celulares e todo tipo de brinquedo e ferramenta digital, o surgimento de habilidades e interesses que diferenciam estes estudantes de forma significativa daqueles que os antecederam.  

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Não se trata de que as redes não estavam entre nós anteriormente ou que as estruturas do cérebro tenham mudado. A questão é que a noção de rede vem se tornando uma forma comum, que tende a definir nossa maneira de compreender o mundo e agir sobre ele. O mais importante segundo nossa perspectiva, é que as redes são formas de organização de relações cooperativas e comunicativas ditadas pelo paradigma imaterial de produção. A tendência dessa forma de commons, que emerge e exerce sua hegemonia, é o que define este período.49

Uma outra modalidade de leitor emerge do desdobramento dos leitores moventes e

imersivo, o leitor ubíquo. Aquele que transita e tece as redes cooperativas e comunicacionais

munido de conexões velozes e wireless, celulares multifuncionais, tablets, laptops, aplicativos

de múltiplas funcionalidades (apps), plataformas interativas na forma de redes sociais e de

aprendizagem. Habita um ambiente que, articulando sujeito-mídia-circuitos-natureza, é

comunicacional e relacional, onde a conectividade torna-se um princípio de interconexão

entre todos e tudo e o corpo adquire uma mobilidade conectada, pois trafega num mundo onde

a informação habita o espaço físico mediada pelas redes de comunicação e computação física.

É também o leitor enredado num conhecimento em rede, apontando para uma direção em que

as teorias e conceitos estão interconectados. Articula o saber e o fazer, as dimensões

sensoriais, intuitivas, emocionais e racionais, desdobrando-se entre um ambiente em constante

fluxo informacional e situações que envolvem interação com diferentes tecnologias e

equipamentos relacionados a múltiplas e não correlacionadas ações. É o leitor que caminha

em direção à singularidade da convergência tecnológica e habita uma multiplicidade de

ambientes de aprendizagem. O leitor caiu na rede.

                                                                                                                         49It is not that networks were not around before or that the structure of the brain has changed. It is that network has become a common form that tends to define our ways of understanding the world and acting in it. Most important from our perspective, networks are the form of organization of the cooperative and communicative relationships dictated by the immaterial paradigm of production. The tendency of this common form to emerge and exert its hegemony is what defines the period.

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1.3 MUTAÇÕES EM EDUCAÇÃO

O conhecimento em rede está intimamente ligado ao conceito de singularidade.

Lembramos o debate que vem sendo realizado nos colóquios que discutem a Convergência

Tecnológica referindo-se à combinação sinergética de quatro campos de conhecimento a

Nanotecnologia, a Biotecnologia, as Tecnologias de Comunicação e Informação e Ciências

Cognitivas (neurociências). Se cada uma dessas áreas, individualmente, já é capaz de

introduzir modificações significativas na sociedade e no ambiente, a combinação das quatro

áreas poderá trazer modificações muito mais expressivas. Cavalheiro (2007, p. 6) esquematiza

no fluxograma abaixo algumas das possíveis aplicações práticas da convergência desses

campos:

Figura 3: Possíveis campos de aplicação da convergência tecnológica

Fonte: Cavalheiro (2007)

Destacamos aqui dois dos desdobramentos assinalados pelo autor (CAVALHEIRO,

2007, p. 5):

(a) Unificação da ciência e da educação: os desafios apresentados pelas novas tecnologias demandam transformações radicais nos ambientes educacionais, desde o nível elementar até a formação de pós-graduados. A convergência de disciplinas previamente isoladas não pode ocorrer sem a emergência de novos tipos de indivíduos capazes de compreender, em profundidade, esses múltiplos campos, e que possam, de forma inteligente,

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trabalhar para a sua integração. Novos currículos e novas formas de instituições educacionais são necessários.

(b) Expansão da cognição e da comunicação humana: deve-se atribuir alta prioridade aos esforços multidisciplinares que levam à compreensão da estrutura, das funções e do aprimoramento potencial da mente humana. Além disso, deve-se priorizar o desenvolvimento de dispositivos para a interface sensorial pessoal, o enriquecimento das comunidades através de tecnologias humanizadas, do aprender a aprender, e aperfeiçoar instrumentos que facilitem a criatividade.

Na introdução de Mutações em Educação segundo McLuhan, Lima (1980) comenta

sobre o futuro da educação colocada no contexto dos meios (referindo-se aos meios de

comunicação de massa) que serão utilizados pelos alunos para desenvolver uma

autoeducação, independente da presença de professores ou de escolas. Nesse sentido, educar-

se a partir do ponto de vista do educando, é um processo de informar-se, um processo de re-

agir, referindo-se à noção de feedback em cibernética e de acomodação em Piaget. Em uma

sociedade de excesso de informação, o equilíbrio dinâmico é solicitado para uma adaptação a

um fluxo informacional intenso e ubíquo que desequilibra constantemente o sistema, o que

pressupõe uma maior flexibilidade para adaptação a situações novas. A retroalimentação

constante exige, consequentemente, um processo de acomodação que corresponda (em termos

gerais, processo pelo qual os esquemas mentais existentes modificam-se em função das

experiências e relações com o meio) em grau e intensidade ao feedback, isto é, a propriedade

de estar habilitado a ajustar as futuras condutas às performances passadas.

Esta última função… é chamada de feedback, a propriedade de estar habilitado a ajustar as futuras condutas as performances passadas. O feedback pode ser tão simples quanto a de um simples reflexo, ou pode ser um feedback de ordem mais complexa, no qual a experiência passada é usada não apenas para regular movimentos específicos, mas também políticas de comportamento inteiras. Tal política de feedback pode aparentar ser, por um lado, como frequentemente o faz, o que nós conhecemos como reflexo condicionado e, de outro, como aprendizado. (WIENER apud TOMAS, 1995, html)

Lima (1980) alerta para o fato de que em uma atmosfera cultural saturada de

informações, não se tornará necessário um processo sistemático (escola) de provocação das

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reorganizações que constituem o fenômeno educativo. Essa proposição é realizada a partir das

previsões levantadas por McLuhan (1990 apud Lima, 1980) em um pequeno artigo, incluído

no livreto Mutation, do qual faz uma síntese e comenta. O autor parte da assertiva de que os

educadores somente estariam tomando consciência de que a educação é um processo de

comunicação a partir daquele momento (1970), - parece que, de fato, somente no século XXI,

podemos corroborar esta afirmativa -, e que as melhores possibilidades da didática

prospectiva estariam na “teoria de informação” (LIMA, 1990, p. 6). Segue uma síntese, em

tópicos, de suas proposições:

(a) A ideia de que a escola como recinto confinado é incompatível com os meios de

comunicação modernos. As crianças aprenderão muito mais - e muita mais rapidamente - em

contato com o mundo exterior (McLuhan), a consequência seria uma retribalização com a

difusão do processo educativo na comunidade;

(b) Todos educarão a todos pelo fato de que a informação não estará mais centralizada no

professor, mas disseminada publicamente pelos meios de comunicação, haveria uma filtragem

e atualização realizada por todos os profissionais da pesquisa;

(c) A exigência no século XXI é de maior flexibilidade operatória, o que exigirá menos

hábitos intelectuais fixos e mais poder de adaptação a situações novas;

(d) Mudança na arquitetura das salas de aula para incluir os visuais eletrônicos e a dinâmica

de grupos de trabalho e de reflexões;

(e) A transição da competição para a colaboração pela natureza própria da necessidade de

articulação de cérebros cada vez mais globalizados que funcionam a partir de grupos de

trabalho, “a especialidade é do indivíduo; a cultura é do grupo” (LIMA, 1990, p. 48);

(f) Intenso engajamento, condição necessária para que haja cooperação;

(g) O aluno-ouvinte será substituído pelo aluno-pesquisador e o professor-informador pelo

professor-animador (no sentido de mobilizar, engajar, motivar) ou mesmo que a função do

professor desapareça, o ensino será substituído pela auto-aprendizagem;

(h) Desaparecimento da dicotomia tradicional trabalho-lazer;

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(i) A revalorização da motricidade, “o que equivale a uma reinterpretação da inteligência

prática, diretamente ligado à atividade corporal” (LIMA, 1990, p. 52) e, da afetividade,

reintegrando os fenômenos motores, intelectuais e afetivos;

(j) A reestruturação do papel das escolas e universidades, “é na vida exterior que se irá buscar

a matéria-prima da educação e o exterior será a própria Galáxia” (MCLUHAN apud LIMA,

1990, p. 59).

Constatamos que grande parte ou quase a totalidade das previsões de McLuhan

tornaram-se realidade, permeando o universo do que vem sendo caracterizado como

aprendizagem ubíqua, e-learning, mobile-learning e outras formas derivadas das

características interativas, ubíquas, pervasivas e de mobilidade das tecnologias digitais em seu

presente estágio de desenvolvimento. Destacamos a modalidade denominada, por Santaella

(2010b), de aprendizagem ubíqua: aprendizagem espontânea, contingente, fragmentada e

caótica, que pode ocorrer em qualquer lugar e a qualquer hora, cujo processo não sistemático

e organizado é direcionado pelo desejo e interesse e, necessariamente, não segue uma ordem e

sequência de conteúdos e/ou estágios de aprendizagem. Tais características diferem do que

conhecemos como estruturantes nos sistemas de aprendizagem formais. Em certo grau,

aproximam-se do que Montaigne, em 1580, apresentava como fundamentos que devem

nortear o processo de aprendizagem das crianças, - uma individuação do aprendizado, a

valorização da vontade e da afeição e um aprender alicerçado na vida:

Tudo se submeterá ao exame da criança e nada se lhe enfiará na cabeça por simples autoridade e crédito. Que nenhum princípio, de Aristóteles, dos estoicos ou dos epicuristas seja seu princípio. Apresentem-se-lhe todos em sua diversidade e que ele escolha se puder. E se não puder fique na dúvida, pois só os loucos tem certeza absoluta de sua opinião.

'Não menos quer saber, duvidar me apraz' […] O proveito de nosso estudo está em nos tornamos melhores e mais avisados. É a inteligência, dizia Epicarmo, que vê e ouve; é a inteligência que tudo aproveita, tudo dispõe, domina e reina. Tudo o mais é cego, surdo e sem alma. […] Saber de cor não é saber: é conservar o que se entregou à memória para guardar. Do que sabemos efetivamente, dispomos sem olhar para o modelo, sem voltar os olhos para o livro. Triste ciência a ciência puramente livresca! (MONTAIGNE, 1993, p. 82)

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Alguns séculos transcorreram, as palavras de Montaigne reverberam nas críticas ao

sistema educativo em seu distanciamento do cotidiano, no seu caráter 'livresco' e de

memorização, no enfoque conteudista e massificado, mas a realidade de uma sociedade sem

escolas ainda nos parece ficção. O que se configura hoje na rede está longe de ser

compreendido e apreendido como uma possibilidade que venha a substituir a educação

formal. Santaella (2010b) argumenta que surge uma nova modalidade de aprendizagem, que

não substituirá a educação formal e, sim, haverá de complementar as modalidades de

educação formal, informal e não-formal, que já se encontram estabelecidas, cabendo-nos o

desafio de desenvolver estratégias integradoras:

Ou seja, inaugura-se uma modalidade de aprendizagem que é tão contingencial, inadvertida e não deliberada que prescinde da equação ensino- aprendizagem caracterizadora dos modelos educacionais e das formas de educar. O que emerge, portanto, é um novo processo de aprendizagem sem ensino. Isto posto, cumpre indagar sobre as possíveis consequências que essas condições trazem para a educação. (SANTAELLA, 2010b, p. 6)

Tal qual uma sociedade sem escolas, quais as consequências de um processo de

aprendizagem sem ensino? O que está em jogo ultrapassa compreender os processos

interativos entre os atores de dado processo educativo, como, por exemplo, a relação de

interação que se dá no contexto formal de educação entre professores e alunos mediado pelas

tecnologias, em especial, a computacional.

Princípios teóricos baseados na matriz sociocultural e histórica, que tem nos estudos

de Vigostky, no campo da psicologia, e de Bakthtin, na linguística, a inclusão do caráter

social e dialógico na formação do pensamento e da linguagem, têm fundamentado grande

parte das pesquisas que analisam as questões relacionadas às transformações na educação na

sua relação com as atuais tecnologias, buscando compreender a modalidade interativa de

comunicação da era digital. O pensamento complexo de Morin (1995; 1996), o conceito de

inteligência coletiva de Lévy (1994) e as teorias cognitivas de Varella e Maturana (1995;

1997), também estão presentes em grande parte dos estudos que abordam, principalmente, e-

learning ou educação on-line. Uma breve incursão no banco de dados da Capes, relacionando

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termos como educação, cibercutura, cultura digital, TICs, e a leitura dos resumos permite

confirmar tais enfoques teóricos. Em geral, as dinâmicas cognitivas discutidas ainda

apresentam o par ensino-aprendizagem, aluno-professor, indivíduo-sociedade. Sem

desconsiderar a importância de refletir sobre as mutações que afetam essas relações e as

transformações no papel tanto do aluno, quanto do professor, do significado do ato de ensinar

e aprender levando em conta estas dualidades, como pensar as transformações nas

transmissões educativas na ausência desses pares?

No próximo capítulo, propomos pensar a aprendizagem em rede como uma dinâmica

cognitiva própria de mentes conectadas e interdependentes, manifestas em novos ambientes

de aprendizagem onde a noção de coletivo e rede despontam como alternativas para se pensar

o social. Partimos de um enfoque sistêmico e da teoria ator-rede (TAR) para compreender as

transformações que estão no cerne das comunicações multimídia em rede (www) e da

comunicação multimodal (de qualquer lugar para qualquer lugar), onde as propriedades

sistêmicas, como organização e conectividade, aliam-se ao de inscrição e tradução oriundos

da teoria ator-rede (TAR) proposta por Latour (1998).

Por um lado, “os parâmetros dos sistemas complexos adaptativos podem lançar luzes

sobre o funcionamento e comportamento das RSIs” - Redes Sociais da Internet,

(SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 18) e, consequentemente, das redes de aprendizagem,

afinal as redes sociais são ambientes de educação desde que o mundo é mundo (SIEMENS,

2008; RECUERO, 2011) e, por outro lado, a TAR “confere maior elasticidade na

compreensão das interações e interdependência dos atores/actantes de uma rede”

(SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 54), propondo um outro modo de se pensar o que

compreendemos por sociedade e por social. A teoria do conectivismo proposto por Siemens

(2005) em Connectivism: learning as a network creation e Dowens (2005) em Introduction to

Connective Knowledge serão analisadas em sua proposta como uma teoria de aprendizagem

para a era digital, considerando os limites e análises críticas que advertem que esta teoria mais

se aproxima de uma pedagogia e não apresenta fundamentos epistemológicos que possam

configurá-la como uma teoria de aprendizagem (KON; HILL, 2008).

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2.0

Figura 4: Oneness

Fonte: Moriko Mori (2003)

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2.0 REDES, CONECTIVIDADE E APRENDIZAGEM

Um dia, os teóricos e historiadores da comunicação vão se dar conta de que pensar em rede não é apenas pensar na rede, que ainda remete à ideia de social ou à ideia de sistema, mas é sobretudo pensar a comunicação como lugar da inovação e do acontecimento, daquilo que escapa ao pensamento da representação. (PARENTE, 2010, p. 92)

As redes ganharam visibilidade com a digitalização e transparência ao se tornarem

pervasivas e ubíquas como fruto das tecnologias digitais da mobilidade e da conexão

contínua50. A digitalização possibilitou a materialização de seus nós e conexões, das relações

e associações e, simultaneamente, pulverizou e diluiu o termo em tantas facetas e múltiplas

noções e usos, que se faz necessário o trabalho cuidadoso sobre a trama e tessitura que dá

corpo às redes em cada contexto em que elas emergem. As tecnologias de mobilidade e

conexão contínua vêm tecendo, com um fio invisível e dispositivos cada vez mais diminutos,

os nós e conexões, desenhando tramas, grafos, diagramas e redes que, ultrapassando a ligação

entre pontos e elementos de um espaço topológico, entrelaçam coisas, corpos, afetos, mentes e

pensamentos.

No contexto da educação, essa relação é visível na perspectiva de inclusão das

tecnologias de informação e comunicação nas práticas pedagógicas. As noções de

aprendizagem e de conhecimento em rede e a constituição e caracterização de comunidades e

redes de aprendizagem ganham força como um novo paradigma a ser explorado e

compreendido. Por outro lado, também ganham em ambiguidade e pluralidade, na medida em

que a noção de rede adquire uma multiplicidade de significações que se entrelaçam e se

sobrepõem. A rede é, simultaneamente, um sistema de infraestrutura de comunicação mediada

por computadores (computadores conectados, redes de telecomunicação e energia), o espaço

                                                                                                                         50 As tecnologias de mobilidade e conexão contínua integradas aos GPS e serviços de localização física, são também mídias locativas. Segundo Santaella (2007, p. 227), “as mídias locativas estão voltadas para a interação social que se dá em um lugar por meio da tecnologia. São experiências inseridas no circuito de uma cultura da mobilidade que abarca informação dependente do local e consciência do contexto.” A mobilidade e a conexão contínua “inclui tanto interações sociais quanto conexões com a internet, enquanto as pessoas se movem, muitas vezes no burburinho fervilhante da cidade, insere contextos remotos dentro de contextos presentes” (SANTAELLA, p. 237), o uno e o múltiplo contidos nas dobras e redobras de um corpo sem órgãos.

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partilhado (o ciberespaço), a “rede de redes” (Internet), as RSIs (Redes Sociais da Internet).

Por ser um modo de organização não linear e não hierárquico, a rede é o agregado de pessoas

e conexões, é um sistema de relações definido por nós, conexões, laços sociais e capital

social, a rede é mediação...

Nesse contexto, a aprendizagem em rede é sinônimo de processos colaborativos e

conectividade e as redes de aprendizagem são a teia que entrelaça essas ações. Será que é

possível a existência de redes de aprendizagem sem que ocorra aprendizagem em rede ou o

oposto? A afirmativa de André Parente pode ser atualizada para a aprendizagem?

Aprendizagem em rede não é apenas aprendizagem na rede, que ainda remete à ideia do social

e de sistema, mas é sobretudo pensar a aprendizagem como lugar de inovação e

acontecimento, daquilo que escapa ao pensamento da representação.

2.1 CONECTIVISMO

George Siemens inicia, em 2004, um debate polêmico a partir do texto Conectivismo:

uma teoria de aprendizagem para a era digital, onde propõe que as teorias clássicas de

aprendizagem (Behaviorismo, Construtivismo e Construcionismo) seriam pouco eficazes para

descrever e explicar os processos de produção de conhecimento e aprendizagem mediados

pelas tecnologias contemporâneas, sendo necessária a proposição de uma nova teoria

contextualizada à realidade da era digital. Uma das razões seria o fato das teorias clássicas

terem sido elaboradas em outro contexto histórico-social e refletirem o ambiente social a

partir do qual foram desenvolvidas, no qual a aprendizagem ainda não havia sido impactada

pelas tecnologias. Outro fator é relativo aos princípios epistemológicos que fundamentam tais

teorias, focados nos processos de aprendizagem que ocorrem no interior de um indivíduo, sem

levar em conta a aprendizagem que ocorre externamente e no seio das organizações,

incluindo, nesta crítica, as teorias que levam em conta o contexto social e as relações sociais.

Um contexto de renovação continuada e intensa das produções requisita novas

competências, como a habilidade de conectar fontes de informação, de reconhecer padrões de

informações úteis, bem como, de ajuste às constantes mudanças desses padrões (SIEMENS,

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2004). Aprendemos com o auxílio de tecnologias que afetam nossos cérebros e pensamento e,

necessitamos, por exemplo, saber como encontrar o conhecimento, armazená-lo, processá-lo,

organizá-lo. Necessitamos também de flexibilidade e agilidade para aprender coisas novas,

diversificar as modalidades de aprendizagem, locais e temporalidade (horários e fases). A

aprendizagem na era digital exige uma capacidade de auto-organização em um ambiente

descentralizado, difuso, complexo e caótico, onde o conhecimento não é adquirido de forma

linear e a tecnologia realiza muitas das operações cognitivas. A inclusão da tecnologia e a

identificação das conexões são compreendidas como atividades de aprendizagem. Derivamos

nossa competência da formação de conexões, da formação de redes. Um movimento cíclico,

cujo ponto de partida é o indivíduo, mas que se estende para além dele:

O ponto de partida do conectivismo é o indivíduo. O conhecimento pessoal se constrói a partir de uma rede, que alimenta organizações e instituições, que por sua vez retroalimentam a rede, provendo nova aprendizagem para os indivíduos. Este ciclo de desenvolvimento e produção do conhecimento (pessoal para a rede, rede para a instituição) é que permite os aprendizes estarem atualizados em sua área mediante as conexões que tenham formado. (SIEMENS, 2004, p. 9)

Uma dos pontos centrais do conectivismo é a possibilidade da aprendizagem e do

conhecimento serem expandidos através de uma rede pessoal conectada a uma rede mais

ampla, que possibilita “equilibrar pequenos esforços de muitos com grandes esforços de

poucos” (SIEMENS, 2002, p. 9). O conectivismo parte do princípio de que a aprendizagem

ganha outras características na era digital: passa a ocorrer tanto internamente, quanto

externamente ao indivíduo; constitui um processo de conectar nós e fontes de informações

especializados; pode residir em dispositivos não humanos, por exemplo filtros e motores de

busca que auxiliam na seleção de informação relevante; a tomada de decisão em um ambiente

em constante mudança passa a ser uma competência central e é, em si mesma, considerada um

processo de aprendizagem; a constante atualização do conhecimento é uma das premissas e

intenções das atividades de aprendizagem e não a acumulação do conhecimento em si.

O conectivismo valoriza a capacidade de aprender, as meta-habilidades que antecedem

a aprendizagem em si, justificando que, numa sociedade interconectada em que o

conhecimento cresce de forma exponencial e é abundante, a adaptabilidade, a capacidade de

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sintetizar e reconhecer conexões e padrões, a habilidade de tomar decisões e agir em um

ambiente que se modifica rapidamente, de formar conexões entre comunidades

especializadas, de criar padrões de informação úteis a partir de uma variedade de fontes de

informação, são aspectos essências da aprendizagem (SIEMENS, 2004).

As questões levantadas por Siemens (2004) provocaram debates em fóruns, blogs,

eventos e seminários recebendo posteriores contribuições e reformulações do próprio autor e

de outros pesquisadores. Uma das contribuições mais significativas é de Dowens (2006;

2007), especialista nas áreas de aprendizagem on-line, novas mídias, pedagogia e filosofia,

que defende a noção de conhecimento distribuído como uma categoria descrita como

conectiva: a propriedade de uma entidade poder ser conduzida ou vir a tornar-se propriedade

de uma outra entidade de forma a poder considerá-las conectas. Não basta estar em relação

para estar conecto é preciso que haja interação, o conhecimento conectivo é resultante da

conexão estabelecida por meio da interação entre as diversas entidades, não podendo ser

atribuído a nenhuma parte específica, mas é uma propriedade emergente do agregado como

um todo. É um conhecimento distribuído, um conhecimento social.

O conhecimento conectivo é um fenômeno da rede, para conhecer algo é preciso estar

organizado de certa maneira e conhecer os padrões de conectividade. O conhecimento não

está localizado em um dado local, mas antes consiste na rede de conexões formadas a partir da

experiência e interações com uma comunidade de conhecimento, tanto quanto sua

aprendizagem. As comunidades de aprendizagem são nós e parte de uma rede maior e podem

ter diferentes tamanhos e força, dependendo da concentração de informação e do número de

indivíduos que estão navegando através de um determinado nó. A rede será constituída por

dois ou mais nós ligados de modo a partilhar recursos.

Críticas foram levantadas às proposições de Siemens (VERHAGEN, 2006; KERR,

2007; KOP; HILL, 2008), principalmente, na recusa de que o conectivismo seria de fato uma

teoria de aprendizagem que traria algo de novo e substancial, reiterando a importância de

teorias estabelecidas como o construtivismo e o construcionismo. A ausência de fundamentos

epistemológicos é tomado como o principal argumento para não considerá-la como uma teoria

de aprendizagem. Segundo Verhagen (2006), o conectivismo estaria mais próximo de uma

abordagem pedagógica e curricular do que de uma teoria de aprendizagem, propriamente: os

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argumentos de Siemens estariam centrados nas mudanças acerca de como o conhecimento é

distribuído e produzido e não teriam como foco questões de aprendizagem em si. Kerr (apud

MOTA, 2009) considera que as questões levantadas pelo conectivismo já foram abordadas no

passado: Vygotsky abordou a relação entre ambientes de conhecimento internos e externos;

Papert incluía o pensar com os objetos, explicados também pela cognição ativa e incorporada

de Clark; e as comunidades práticas já incluem a aprendizagem como inerentemente social e

situada. Kop e Hill (2008) consideram as questões levantadas por Siemens relevantes para

uma discussão de novos paradigmas na educação e de pedagogias que transfiram para os

alunos o controle do processo, contudo não atribuem ao conectivismo o status de uma teoria

de aprendizagem.

O fato é que estamos diante de um campo de teorias educacionais ainda em construção

ou em (re)construção, em que a necessidade de novas abordagens epistemológicas e novas

paradigmas se faz premente para que possamos transitar por um mundo interconectado e por

novas sensibilidades. Siemens (2006) rebate as críticas e reafirma a necessidade de uma nova

teoria de aprendizagem:

Uma alternativa é necessária. Se o conectivismo desempenha esse papel é irrelevante. De maior importância é que os educadores estejam refletindo acerca das mudanças na aprendizagem e as implicações que acompanham o design de ambientes e estruturas de aprendizagem hoje. (SIEMENS, 2006, p. 39)

Refletir sobre os conceitos de aprendizagem em rede e conectividade é um dos

movimentos que aponta para a possibilidade de descobrirmos novos caminhos para a

educação, caminhos que vêm sendo instituídos coletivamente, nos quais depositamos a

esperança de que estejam voltados para o exercício de uma atividade prático-poiética. Prático

enquanto desenvolvimento da atividade própria do sujeito, isto é, sua autonomia, utilizando

esta própria atividade para atingir esse fim, e poiética por ser criadora, por conduzir ao

aparecimento de um outro ser, instaurando possibilidades de singularização.

A busca de sentido é antes de tudo a busca da própria subjetividade humana, do sujeito em questão. Sujeito caracterizado pela reflexividade e pela

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vontade (capacidade de ação deliberada), como define Castoriadis. Reflexividade que tem como fundamento a imaginação. Imaginação produtiva e criadora – o imaginário último ou radical, que pressupõe, segundo as palavras do autor, “... a capacidade de ver em uma coisa o que ela não é, de vê-la diferente do que é”, ou seja, a capacidade de criação, que nos exclui de pensar o gênero humano como simples determinação social-histórica. (GOUDART, 1998, p. 20)

Guatarri (1992, p. 19) se refere à subjetividade como um conjunto de condições que

torna possível que instâncias individualistas e/ou coletivas estejam em posição de emergir

como território existencial auto-referencial em adjacência ou em relação com uma alteridade

ela mesma subjetiva. O que nos remete à pergunta: Que redes estamos tecendo na educação?

George Siemens (2008, p. 2) chama a atenção para o fato de que “a discussão das

redes de aprendizagem é por vezes imprecisa, sem distinção no modo como o termo tem se

desenvolvido ao longo das últimas décadas”. Propõe que os educadores se debrucem sobre as

nuances desse conceito para comunicar, mais precisamente, conceitos de conectividade e

aprendizagem em rede (SIEMENS, 2008, p. 8). A partir de uma revisão de literatura, o autor

propõe cinco estágios significativos e interdependentes da evolução na forma como a noção

de rede é percebida nos espaços educativos:

(a) como infraestrutura física;

(b) como uma mescla de infraestrutura e teorias de rede oriundas da sociologia, física e matemática;

(c) a partir de visões teóricas e transformadoras sobre aprendizagem, conhecimento e cognição;

(d) a partir da difusão da noção pelo uso e popularização dos serviços de rede sociais na internet;

(e) como um modelo de detalhamento do processo ensino e aprendizagem.

Tomamos como ponto de partida as análises do autor para realizar o levantamento de

algumas concepções e conceitos que emergem mesclados ao conceito de rede, conectividade e

aprendizagem, como o de comunicação mediada por computador, comunidades e redes de

aprendizagem, ciberespaço, interatividade, conectividade, aprendizagem colaborativa, entre

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outros. Pretendemos aqui apenas destacá-las, propiciando uma visão geral, sem a intenção de

explorar as diversas nuances de suas ocorrências e abordagens por educadores e

pesquisadores. A intenção é seguir a diretriz proposta pelo autor de refletir sobre os conceitos

de conectividade e aprendizagem em rede que vêm sendo adotados na educação.

Em um segundo momento, apresentamos o conceito de rede como mediação, a noção

de coletivo e actantes na perspectiva adotada por Bruno Latour (1993; 1996; 2005), segundo a

abordagem da Teoria Ator-Rede (TAR). Eixo teórico e metodológico a partir do qual

buscamos rastrear as dinâmicas de aprendizagem em rede que emergem na narrativa do

estudo de caso proposto nesta pesquisa.

Por fim, concluímos este capítulo abordando o conceito de conectividade e

aprendizagem em rede a partir de uma leitura propiciada pela Teoria de Sistemas e pela

filosofia Peirceana, buscando os possíveis pontos de convergência com a Teoria Ator-Rede.

2.2 REDES E CONECTIVIDADE NA EDUCAÇÃO

O primeiro estágio do digital emergiu junto com a possibilidade de conectar

computadores em rede, ligados a centros de supercomputação. Siemens (2008, p. 2)

exemplifica este estágio com a criação da National Science Fundation Network (NSFNET),

um programa coordenado para promover pesquisa avança e educação em rede, iniciado em

1985. Foi criado com a finalidade de conectar pesquisadores e acadêmicos nos Estados

Unidos, criando uma rede de pesquisa acadêmica e facilitando o acesso aos centros de

supercomputação. O NSFNET também é o nome para designar várias redes nacionais de

backbone51que foram construídas para apoiar as iniciativas da NSF de formação de redes de

pesquisa interconectadas, no período de 1985-1995. Inicialmente criada para vincular

pesquisadores de diversos centros de pesquisa do país, estas redes se transformaram em

grande parte do backbone da Internet, através de financiamento público adicional e parcerias

entre as empresas privadas.

                                                                                                                         51 Backbone é o termo que designa as principais rotas de dados entre as redes mais potentes e estratégicas e os core routers, roteadores que suportam múltiplas interfaces de telecomunicação em altas velocidades.

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Figura 5. Estudo da NSFNET de visualização do tráfego de entrada, medido em bilhões de bytes, do backbone T1 para o mês de setembro de 1991. A faixa de volume de tráfego é retratado de roxo (zero bytes) ao branco (100 bilhões de bytes). Ele representa os dados coletados por Mérito Network, Inc. Os nós de backbone NSFNET são mostrados no topo, redes regionais abaixo.

Fonte: Rede de Mérito, Inc., NCSA, e da National Science Foundation.

Ainda que o grande salto para interconectar redes de pesquisas em alta velocidade

tenha ocorrido na década de 80, redes de computadores têm sido utilizadas para integrar

pesquisadores desde 1960 (HARASIN et al, 1995). Seu uso amplo por estudantes só foi

possível a partir dos investimentos significativos em computadores e tecnologia de rede nas

escolas, faculdades e universidades, durante o período de 1980 a 2000, representando a fase

inicial de implantação de rede em termos de infraestrutura física e a consequente associação

da noção de rede articulada às tecnologias de informação e comunicação no seu aspecto

material em termos de hardware, software e redes de telecomunicação.

No Brasil, a partir de 1980, ocorrem os primeiros seminários envolvendo o Ministério

da Educação e Cultura (MEC) e a Secretaria Especial de Informática (SEI) e a formação da

Comissão Especial de Educação 1 (CEE-1) com a finalidade de “colher subsídios das duas

secretarias e gerar normas e diretrizes no novo e amplo campo que se abriria na educação”

(MEC/FUNTEVE, 1985, p. 3 apud MORAES, 2000b, p. 8). Em 1983, é aprovado o Projeto

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Brasileiro de Informática na Educação - EDUCOM, com o objetivo de realizar estudos e

experiências nesse setor visando formar recursos humanos para ensino e pesquisa e criar

softwares educacionais através de equipes multidisciplinares. O programa ocorre em centros

pilotos formados por cinco universidades: UFRGS, UFRJ, UFPel, UFMG e UNICAMP. A

Rede Nacional de Pesquisa (RPN) é criada em 1989, pelo Ministério de Ciência e Tecnologia

(MCT) com o objetivo de construir uma infraestrutura de rede para a comunidade acadêmica,

constituindo a primeira rede de acesso à Internet no Brasil. Somente em 2000, é criada a

UniREDE, um consórcio, inicialmente, de 33 universidades que nasceu com a finalidade de

oferecer, por meio de implantação de infovias e mídias integradas, um conjunto de aplicações

estratégicas especialmente voltadas para um Programa de Recuperação do Ensino Superior

Público pelas instituições signatárias, disseminando educação assistida por meios interativos

através da internet, videoconferência e outras mídias educacionais (MORAES, 2000, p.14).

O PROINFO, Programa Nacional de Informática na Educação, é implementado a

partir de 1997 com o objetivo de introduzir na escola pública (nos níveis fundamental e

médio) as Tecnologias de Informação e Comunicação, como ferramenta de apoio ao processo

de ensino-aprendizagem (MARCELINO, 2003, p. 1). Em 2007, o PROUCA (Programa Um

Computador por Aluno) é implantado, em fase experimental, com a distribuição de laptops

para alunos de 5 escolas, em regiões distintas do território brasileiro, tendo como objetivo ser

um projeto educacional utilizando tecnologia, inclusão digital e adensamento da cadeia

produtiva comercial do Brasil52. Para os próximos dez anos, o projeto de lei do novo Plano

Nacional de Educação (PNE 2011-2020) prevê como estratégias de universalização do ensino

fundamental e médio e aumento do IDEB53: a universalização do acesso à rede mundial de

computadores em banda larga de alta velocidade e o aumento da relação

computadores/estudante nas escolas da rede pública de educação básica, promovendo a

utilização pedagógica das tecnologias da informação e da comunicação; e o provimento de

equipamentos e recursos tecnológicos digitais para a utilização pedagógica no ambiente

escolar a todas as escolas de ensino fundamental e médio.

                                                                                                                         52 Conf.: http://www.uca.gov.br/institucional/projeto.jsp 53 Índice de desenvolvimento da Educação Básica, criado em 2007 pelo Ministério da Educação para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino. Calculado com base no desempenho do estudante em avaliações do Inep e em taxas de aprovação.

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A questão de desenvolvimento de infraestrutura das redes vai permear todas as fases,

atualizando-se de acordo com o desenvolvimento das tecnologias, como é o caso da

tecnologia de mobilidade e ubíquas de redes wi-fi e a discussão atual, no Brasil, sobre a

implantação do Programa Nacional de Banda Larga54 (PNBL, 2010) e o projeto Cidades

Digitais55, articulando para tal fim políticas públicas e interesses privados no campo da

comunicação, economia, justiça, cultura, educação etc. Sobrepõem-se outras linhas de forças

e rotas de fuga. A rede como infraestrutura é, simultaneamente, natureza, discurso e sociedade

(LATOUR, 1994, 2005), ainda que estas nuances permaneçam aos olhares menos atentos

invisíveis ou ocultas. Paralelamente, na medida em que as inovações tecnológicas vão sendo

incorporadas no dia-a-dia, novos modelos teóricos e práticas culturais vão emergindo e

sobrepondo-se alterando e hibridizando as concepções que norteiam os conceitos de rede, de

conectividade e aprendizagem em rede, sem que tenhamos tempo suficiente para realizar

mudanças significativas na educação formal, que acompanhem o ritmo das mudanças.

                                                                                                                         54 O Programa Nacional de Banda Larga – Brasil Conectado – foi criado pelo Governo Federal com o objetivo de ampliar o acesso à internet em banda larga no país, criar oportunidades, acelerar o desenvolvimento econômico e social, promover a inclusão digital, reduzir as desigualdades social e regional, promover a geração de emprego e renda, ampliar os serviços de governo eletrônico e facilitar aos cidadãos o uso dos serviços do Estado, promover a capacitação da população para o uso das tecnologias de informação e aumentar a autonomia tecnológica e a competitividade brasileiras. O plano tem três eixos: expandir a cobertura do serviço, elevar a velocidade do serviço e reduzir custos. 55 O projeto possibilita a modernização da gestão das cidades com a implantação da infraestrutura de conexão de rede entre os órgãos públicos, além da implantação de aplicativos, com o objetivo de melhorar a gestão e o acesso da comunidade aos serviços do governo. As cidades recebem softwares para os setores financeiros, tributário, de saúde e educação, e os servidores públicos serão capacitados no uso específico dos aplicativos e da rede, assim como das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Também está prevista a instalação de pontos de acesso à internet para uso livre e gratuito em espaços de grande circulação em locais definidos a critério das prefeituras. Para mais informações acessar: http://www.mc.gov.br/acoes-e-programas/cidades-digitais

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2.2.1 Ciberespaço como um ambiente virtual de aprendizagem

Os conceitos de comunicação mediada por computador (CMC) e comunidades e redes

de aprendizagem encontram-se associados à noção de rede como um sistema de conexão que

possibilita o surgimento de espaços e/ou ambientes partilhados:

Imagine-se aprendendo com seus pares, especialistas e recursos, disponíveis sempre que você deseja ou necessita deles. [...] Vocês estão todos aprendendo juntos não em um lugar no senso ordinário, mas em um espaço partilhado, o “ciberespaço”, utilizando sistemas de rede que conecta pessoas ao longo de todo o globo. Sua sala de aula em rede está em qualquer lugar onde você tenha um computador pessoal, um modem e linha de telefone, antena parabólica ou conexão por rádio. Discar para a rede transforma a tela do computador em uma janela para o mundo da aprendizagem. A rede é um nome para descrever esses espaços partilhados. Sinais de satélite e telefone formam uma vasta teia ou rede que conecta cada computador a outro computador no mundo. Suportados por estas redes, os educadores podem criar ambientes de aprendizagem eficientes através dos quais professores e estudantes em diferentes localidades trabalham juntos para construir sua compreensão e habilidade relativa a um conteúdo específico. (HARASIN et al, 1995, p. 3)

A rede compreendida como sistema de infraestrutura comunicacional e informacional

é o que possibilita a conexão entre máquinas-máquinas, máquinas-pessoas e pessoas-pessoas

e origina o ciberespaço. Na acepção de Rheingold (1996, p. 18), o ciberespaço é um “espaço

conceitual onde se manifestam palavras, relações humanas, dados, riquezas e poder da

tecnologia de CMC”. Lévy (1999, p. 92), por sua vez, compreende este espaço como:

[...] o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial de computadores e das memórias dos computadores. Essa definição inclui o conjunto de sistemas de comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de redes hertzianas e telefônicas clássicas), na medida em que transmitem informações provenientes de fontes digitais ou destinadas à digitalização. Insisto na codificação do digital, pois ela condiciona o caráter plástico, fluido, calculável com precisão e tratável em tempo real, hipertextual, interativo e, resumindo, virtual de informação que é, parece-me, a marca distintiva do ciberespaço.

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A noção de rede funde-se à noção de ciberespaço. Como um espaço sem limites

físicos, sem contornos, a ideia de localização transita para a de ambiência. Passamos a nos

(des)localizar nesse espaço conceitual virtual e espaço de comunicação como um estar na

rede, estar conectado, estar online e passamos a transitar ou navegar em diversos ambientes

mediados por interfaces culturais (softwares). Se deixamos de estar online, deixamos de estar

na rede, o que implica que deixamos de participar de um espaço de comunicação globalizado.

Na medida em que as tecnologias de conexão contínua e as mídias locativas vão se

disseminando, o estar online transforma-se no estar always-on56 (PELLANDA, 2005). A

distinção entre o ciberespaço e o espaço físico vai adquirindo contornos cada vez menos

nítidos e outras noções57emergem como a de territórios informacionais (LEMOS, 2008),

espaços intersticiais (SANTAELLA, 2007b; 2010), espaços híbridos (SOUZA e SILVA,

2006).

Redes aqui está sendo entendida como todo fluxo e feixe de relações entre seres humanos e as interfaces digitais. Nessa híbrida relação, toda e qualquer signo pode ser produzido e socializado no e pelo ciberespaço, compondo assim, o processo de comunicação em rede próprio do conceito de ambiente virtual de aprendizagem. [...] Nesse sentido o ciberespaço além de se estruturar como um ambiente virtual de aprendizagem universal que conecta redes sócio-técnicas do mundo inteiro, permite que grupos/sujeitos possam formar comunidades virtuais fundadas para fins bem específicos, a exemplo das comunidades de e-learning. (SANTOS, Edméa, 2003, p. 3)

Surgem ambientes específicos voltados para a aprendizagem online, baseados em

design instrucional e facilitações que propiciem a interatividade entre grupos e aprendizagem

                                                                                                                         56Always on é o termo utilizado por Pellanda (2010) para designar a conexão contínua propiciado pelas mídias móveis, permitindo um fluxo de dados de informação constante, a essa característica o autor acrescenta o fato do usuário tornar-se um ponto de compartilhamento de fatos ao seu redor. O usuário inserido em um ambiente físico geo-localizado transfere informação para outros sistemas ambientes agora virtuais, alimentando uma complexa rede sígnica ou semiótica. 57 Os três conceitos abordam a relação entre o que até então chamamos de ciberespaço e o espaço físico. Destacamos a noção de Lemos (2008, p.14): “Por territórios informacionais compreendemos áreas de controle do fluxo informacional digital em uma zona de intersecção entre o ciberespaço e o espaço urbano. O acesso e o controle informacional realizam-se a partir de dispositivos móveis e redes sem fio. O território informacional não é o ciberespaço, mas o espaço movente, híbrido, formado pela relação entre o espaço eletrônico e o espaço físico. Por exemplo, o lugar de acesso sem fio em um parque por redes Wi-Fi é um território informacional, distinto do espaço físico parque e do espaço eletrônico internet. Ao acessar a internet por essa rede wi-fi, o usuário está em um território informacional imbricado no território físico (e político, cultura, imaginário, etc.) do parque, e no espaço das redes telemáticas”.

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colaborativa, facilitando e estimulando a partilha de conhecimento e promovendo a

constituição de comunidades e redes de aprendizagem (HASARIM et al, 1995). Ambientes,

como o Blackboard e Moodle, são desenvolvidos e passam a ser utilizados como interfaces

para a implementação de cursos à distância ou semipresenciais, direcionados para a educação

formal. Reúnem diversos recursos de comunicação assíncrona e síncrona, de publicação e

produção de conteúdos, tendo como objetivo potencializar a autoria, autonomia, interatividade

e a remixagem de informação (SANTOS et al, 2012), características presentes na produção de

conhecimento nos ambientes digitais. Por outro lado, também reproduzem os ambientes

tradicionais de produção de conhecimento, representações implícitas em suas logomarcas, um

quadro negro (Blackboard) e o capelo (chapéu), utilizado em formaturas de cursos

tradicionais como o Direito (Moodle), fazem referência a esses universos. A aprendizagem

nesses ambientes tem sido criticada como reprodutora dos padrões tradicionais de

aprendizagem (MENDONÇA FRÓES, 2010; SANTOS, 2003), onde pouca ou nenhuma

interatividade é propiciada em função das metodologias adotadas.

Mota (2009) propõe uma distinção entre EAD, e-learning, e-learning 2.0, onde cada

uma dessas terminologias designariam processos diferenciados de aprendizagem,

respectivamente: (a) uma mera reprodução da transmissão de conteúdo utilizando os recursos

de interação disponíveis na rede; (b) processos que propiciam uma aprendizagem ativa e

interativa, mas ainda limitada na produção de conteúdos autorais; (c) uma evolução para as

dinâmicas de produção de conteúdo, partilha e colaboração das redes 2.0, onde a questão de

promover a aprendizagem colaborativa, suportada pela CMC, torna-se central e o papel do

professor é reformulado, passando a atuar mais como um facilitador e/ou tutor. A

aprendizagem colaborativa é definida, de modo geral, como uma modalidade de

aprendizagem resultante de processos interativos que ocorrem nas redes e comunidades de

aprendizagem. Conceitos que vão sendo redimensionados e ampliados na medida em que a

natureza da interação na web vai evoluindo e sofrendo transformações.

Uma primeira distinção entre comunidades e redes de aprendizagem58 surge ligada à

noção de identidade de grupo a partir de interesses comuns e da formação de laços afetivos,

                                                                                                                         58 Recuero (2002) apresenta em sua dissertação de mestrado uma análise da evolução do conceito de comunidades virtuais, cunhado por Reinghold no livro BBS, The Well (1996). Comparando as diferenças apontadas entre os conceitos de comunidade clássica e virtual, procura realizar uma desconstrução e uma

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no caso das comunidades e, no caso das redes, ao estabelecimento de um modo de

organização não hierárquica, deslocalizado e interconectado.

Harasin et al (1995, p. 4) analisando as potencialidades das redes 1.0 define as redes

de aprendizagem como grupos de pessoas que utilizam a comunicação mediada por

computador para aprenderem juntas no momento, lugar e ritmo, que melhor lhes convier e for

apropriado para a tarefa. Para a autora, as redes de aprendizagem são formas sem precedentes

de colaboração baseadas na partilha de interesses, que podem gerar comunidades de

aprendizagem on-line a partir do momento em que os laços sócio-afetivos se estreitam.

Segundo a autora, as redes são ambientes comunicacionais que aumentam a conectividade

social e propiciam uma comunicação sócio-emocional.

Rheingold (1998 apud CARVALHO, 2009, p. 37) reforça a concepção de

comunidades definidas a partir de laços pessoais ao referir-se às comunidades virtuais como

“agregados sociais surgidos na Rede, quando os intervenientes de um debate o levam por

diante em número e sentimento suficientes para formarem teias de relações pessoais no

ciberespaço”. Já para Lévy (1999, p.27 apud CARVALHO, 2009, p. 37), uma comunidade

virtual “é um grupo de pessoas se correspondendo mutuamente por meio de computadores

interconectados” que se constrói sobre “afinidades de interesses, de conhecimento, sobre

projetos mútuos, por meio de cooperação ou de troca, independentemente de proximidades

geográficas e das filiações institucionais”.

A concepção de rede ganha o cunho de social com as Redes Sociais da Internet (RSIs)

que emergem na era da web 2.0 e 3.0, como Facebook e Twitter, fruto das “modalidades

diferenciadas de interação que evoluem em compasso com a penetração e apropriação social

dessas redes” (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 55). Os termos grupos e coletivos

(ROITEBERG; RAMOS, 2010; DRON; ANDERSON, 2007) vão gradualmente sendo

utilizados em lugar de comunidades, mas não há um consenso em relação a essas atribuições.

Relativo aos conceitos de conectividade e aprendizagem em rede, podemos distinguir

nesta primeira fase as seguintes concepções: a conectividade estaria associada à mediação

tecnológica de computadores ligados entre si, formando uma rede de infraestrutura que

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           reinvenção do conceito à luz das novas formas de sociabilidade contemporânea. Posteriormente, em seu doutorado vai discutir o conceito de redes sociais da internet a partir das Teorias de Redes.

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comuta hardware (fisicalidade), software (ambiente) e telecomunicação (transporte de

informação) e de uma consequente comunicação mediada por computador que possibilita a

criação de ambientes de aprendizagem virtuais e instaura uma aprendizagem deslocalizada,

atemporal, de acesso universal à informação e pessoas, baseada na formação de comunidades

virtuais, na colaboração e partilha, segundo uma modalidade unidirecional de interação

característica da década de 90:

A modalidade de interação predominante na década de 1990, vale enfatizar, é a da navegação unidirecional, caracterizada pelo aumento exponencial dos nódulos de rede e pela estruturação de canais de comunicação entre esses nódulos através da evolução acelerada dos mecanismos de busca e das comunidades virtuais. A intensa velocidade de extensão e interconexão entre os nódulos informacionais da rede fez com que comunidades se formassem ao redor de nódulos estratégicos de interesses compartilhados. A partir desse movimento de “tribalização” digital é que as primeiras plataformas de redes sociais foram surgindo. (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 57).

A coordenação em tempo real e assíncrona entre usuários das redes 1.0 e a formação

das comunidades virtuais de compartilhamento de interesses, prenunciaram o que seriam

características potenciais da aprendizagem em rede (HARASIN et al, 1995) nas era das redes

2.0 e 3.0:

(a) alteração da relação aluno-professor face aos recursos educacionais e processos mediados

pelas tecnologias em rede;

(b) maior controle do aluno sobre a natureza da interação;

(c) acesso ampliado em termos temporais, espaciais e temáticos;

(d) acesso à educação formal e informal da escolha do aluno, de qualquer lugar e em qualquer

horário;

(e) aprendizagem ativa com maior grau de participação por parte do aluno;

(f) currículo interdisciplinar e integrado, com as ligações entre teoria e prática tornando-se

mais comum;

(g) oportunidade de envolvimento com outros, a partilha e a construção de conhecimento

conjunto;

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(h) maior fluidez entre os conceitos de quem é aluno e professor;

(i) ligação entre casa, escola e trabalho, integrando a aprendizagem entre os diversos planos

da vida;

(j) acesso aos melhores recursos.

A noção de aprendizagem, neste primeiro momento, está muito mais para uma

aprendizagem na rede, segundo características e dinâmicas ligadas às transformações do

espaço e do tempo associadas às tecnologias digitais e à emergência do conceito de

ciberespaço. Num segundo momento, a incorporação de teorias da sociologia e outros

campos, que tinham como base de pesquisa estabelecida o conceito de rede, vem ampliar e/ou

problematizar estas noções e trazer para a discussão elementos que caracterizam a cultura

emergente da apropriação social do ciberespaço e das tecnologias digitais, a cibercultura.

Destacamos que as etapas não apresentam fases temporais definidas, são concepções que vão

se sobrepondo e evoluindo, bem como, a evolução/construção dos conceitos relacionados.

2.2.2 Interatividade, fluxos informacionais e os nós da rede

Em 1978, Hiltz e Turoff publicam Network Nation, explorando o papel da

comunicação mediada por computador como um agente transformador da sociedade. A

popularização dos computadores permitiria que as barreiras de tempo e distância entre as

pessoas fossem rompidas, bem como a distância entre as pessoas e informações, que

tenderiam a zero. A Network Nation (Nação rede) seria um lugar onde os pensamentos seriam

facilmente trocados e de forma democrática, diminuindo diferenças entre minorias e

proporcionando um maior poder cognitivo pessoal. O texto é uma referência no campo da

comunicação mediada por computador, termo que passa a designar genericamente sistemas de

comunicação que permitem que pessoas se comuniquem com outras, utilizando computadores

interconectados em rede. A Internet seria um desses sistemas. Com sua popularização em

meados da década de 90, esta passa a ser sinônimo de rede global de computadores, a rede de

redes. Neste estudo, compreendemos a Internet como um sistema midiático, na concepção

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atribuída por Santaella (2007, p. 22): “sistemas midiáticos consistem em tecnologias

comunicacionais e nas mas variadas práticas econômicas, políticas, institucionais e culturais

que crescem com eles”.

A Internet por sua configuração informacional em rede potencializa as formas de

comunicação baseadas em transmissões digitais59, aglutinando, hibridizando e transformando

as diversas modalidades comunicacionais em uma única modalidade de transmissão, a

baseada em 0 e 1. O que possibilita a comunicação entre diversos computadores é uma

linguagem comum, denominada protocolo. O TCP/IP é o principal protocolo utilizado pela

Internet, é um protocolo livre (não patenteado) baseado na quebra da informação em

pequenos pacotes de dados que são transmitidos por linhas telefônicas, cabos ópticos, ondas

de rádio, satélite ou outras formas de transmissão. As vias de transmissão percorridas são

chamadas redes, variam de redes centrais (os backbones) de alta velocidade e capacidade de

transmissão de grande volume de dados, às redes de tamanho médio para as quais os dados

são distribuídos, que por sua vez, vão redistribuir para rotas secundárias. O que

compreendemos por www (world wide web) é um sistema de ambientes da Internet, cuja

arquitetura possibilita “o processamento da informação e da comunicação como hipertexto60,

isto é, como teia de conexões de um texto com inúmeros outros textos (SILVA, 2006, p. 14).

A noção de hipertexto e hipermídia é determinante para a formulação do conceito de

interatividade e para uma ruptura com a concepção de modalidade comunicacional unívoca e

massiva predominante no século XX. De acordo com Fernback e Thompson (1998 apud

RECUERO, 2002, p.14), a CMC é “ao mesmo tempo um meio de comunicação interpessoal,

‘um para um’ e ‘um para muitos’ ou até mesmo um forma de comunicação de massa de

‘muitos para muitos’”. Para Silva (2006, p. 15), “o hipertexto é o grande divisor de águas

entre a comunicação massiva e a comunicação interativa”.

                                                                                                                         59 Segundo Santaella (2003b, p. 21) transmissão digital significa conversão de sons, imagens, textos, vídeos e formas gráficas em formatos legíveis ao computador. 60Para Nelson (2007), que cunhou o termo hipertexto, a www representa um campo conformado por meio da estabilidade dada pelos browsers, que agem como formas de controle cognitivo. Nelson compara a Internet ao oceano, um sistema de comunicação onde a www é apenas como um ferryboat (NELSON, 2007) que se tornou mais popular. Um tipo de comunicação entre as milhares de formas, onde os navegadores (browsers) determinam um padrão, que, na sua opinião, é incapaz de fazer o que considera importante, entre outros: criar um documento feito de pedaços de diferentes partes; comprar conteúdo de um provedor em pequenas quantidades; seguir links bidirecionalmente. Tornando, assim, o navegar um modo de pensar fixo em relação `a comunicação (NELSON, 2007), organizado a partir de diretórios hierárquicos e arquivos convencionais a partir dos quais pensamos ser livres usuários.

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O conceito de interação e/ou interatividade ganha centralidade na educação como

quebra de paradigma comunicacional, operando no sentido de tanto personalizar os processos

sociais e de aprendizagem dos atores, quanto de dar a estes um lugar ativo.

No entanto, aqui estou enfocando a interatividade como perspectiva de modificação da comunicação em sala de aula e acreditando poder enfrentar o descompasso evidente entre o modelo de comunicação emergente e o modelo hegemônico que subjaz à instituição escolar que é a transmissão. Cultivo esta inquietação, mas não tenho a ingenuidade de querer solucionar a “crise da educação” modificando apenas a comunicação em sala de aula. Acredito que tal “crise’ não se resume às mazelas do modelo comunicacional “arborescente” que prevalece na educação. Entretanto, já que me sinto como aqueles que dizem “estamos cansados da árvore”, creio que modificar este modelo, promove efetivamente as bases da comunicação livre e plural - a participação, a bidirecionalidade e multiplicidade de conexões – significa buscar a condição propícia para que a expressão própria da “crise da educação” se evidencie em sua complexidade, na voz e na ação dos atores diretamente envolvidos com a sala de aula – professores e alunos -, e aí encontre formas de reação e de reinvenção da educação e da própria sociedade. (SILVA, 2006, p. 158)

O autor conceitua a interatividade como um tipo singular de interação, cujos

fundamentos estão balizados em três binômios: participação-intervenção, bidirecionalidade-

hibridação e potencialidade-permutabilidade. Estes termos e suas relações encontram-se

sintetizados nas seguintes proposições (SILVA, 2006):

- O emissor pressupõe a participação-intervenção do receptor: participar é muito mais

que responder “sim” ou “não”, é muito mais que escolher uma opção dada: participar é

modificar, é interferir na mensagem;

- Comunicar pressupõe recursão da emissão e recepção: a comunicação é produção

conjunta da emissão e recepção; o emissor é receptor em potencial e o receptor e

emissor em potencial; os dois pólos codificam e decodificam.

- O emissor disponibiliza a possibilidade de múltiplas redes articulatórias: não propõe

uma mensagem fechada, ao contrário oferece informações em rede de conexões

permitindo ao receptor ampla liberdade de associações e de significações.

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O potencial da comunicação em rede e de feedback imediato vão alterar os “esquemas

clássicos de comunicação, pois muda o estatuto do receptor através da participação-

intervenção, muda a natureza da mensagem e muda o papel do emissor” (SANTAELLA,

2003b, p. 35), originando o que viria a ser chamado de cultura participativa e aberta, onde a

“mensagem passa a ser um programa interativo que se define pela maneira como é

consultado, de modo que a mensagem se modifica na medida que atende às solicitações

daquele que manipula o programa” (SANTAELLA, 2003b, p.36).

Sociólogos como Castells (1996) e Watts (2003) trazem uma contribuição

fundamental na popularização das visões de rede de interação, comunicação e organização

social, através da publicação de textos que se tornaram populares: respectivamente, The rise

of the Network Society (O crescimento da sociedade em rede) e de Six Degrees (Seis Graus)”

(SIEMENS, 2008, p. 4).

Uma das principais contribuições de Castells é a noção de rede enquanto fluxo

informacional, o que caracteriza uma sociedade em rede como uma sociedade dos “espaços de

fluxo”, onde a lógica organizacional independe de localização e está centrada na dinâmica dos

fluxos. As sociedades são fundamentalmente constituídas de fluxos de trocas através de

organizações e instituições em rede. Por fluxos, Castells (1999, p. 57) quer dizer “sequências

programáveis, intencionais e repetitivas de trocas e interações entre posições fisicamente

desarticuladas realizadas pelos atores sociais em organizações e instituições da sociedade”. As

práticas sociais em uma sociedade em rede passam a funcionar segundo esta lógica

transformando as condições materiais da vida, do tempo e do espaço.

A descentralização, o caráter distributivo, a expansão ilimitada e a

multidirecionalidade são características desse espaço de fluxos. Por sua vez, conhecimento e

informação passam a ser a matéria prima que move a economia, onde a cultura e os processos

de simbolização tornam-se forças produtivas diretas nessa nova sociedade. O novo paradigma

tecnológico “acaba com a distinção secular entre produtores e consumidores levando os

teóricos a analisarem as sociedades em termos das relações sociais que atravessam as esferas

institucionais da ação social” (CASTELLS, 1999, p. 46). Uma outra consequência reside na

vinculação dos processos de produção, distribuição e gestão das organizações e de todos os

tipos de atividade, que não podem mais ser pensadas de forma independente. A habilidade

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para gerar novo conhecimento e reunir informação estratégica depende do acesso ao fluxo

desses conhecimentos e/ou informações. O que confere poder a uma organização ou pessoa

está agora na sua relação com as fontes de informação e conhecimento e na sua capacidade de

compreendê-las e processá-las, tendo em mente, que não há mais uma fonte privilegiada e

centralizada, o próprio conhecimento tornou-se fluxo, vivemos em uma sociedade baseada no

conhecimento, uma sociedade informacional (CASTELLS, 1999).

A concepção de uma sociedade organizada em rede, na qual o conhecimento passa a

ser a moeda vigente, bem como, a vinculação da inserção social como uma relação direta de

participar desse fluxo, isto é, estar na rede e dominar seus códigos de navegação (busca,

armazenamento, processamento, recuperação de dados), tem reflexos no campo da educação

em várias iniciativas. Podemos citar a criação das “universidades abertas oferecendo

oportunidades a grupos ou populações anteriormente impossibilitados de acesso à

universidade” (ABREU, 2006, p. 164), a expansão dos cursos de EAD, a inovação na

formação profissional, no treinamento e desenvolvimento de recursos humanos por meio de

recursos online e os impactos na educação convencional (instituições escolares), onde a

questão da inclusão digital e da formação para o letramento digital emerge como questões

fundamentais para a educação no século XXI.

Existe uma pressão advinda da economia de mercado para que as escolas absorvam a Internet como tecnologia educacional. Afinal, a principal premissa de que o aluno deve estar preparado para viver e ser produtivo na sociedade do seu tempo continua vigorando como uma das funções da educação escolar. (ABREU, 2006, p. 164)

O termo rede é utilizado para designar a internet ou vice-versa e esta passa a ser

abordada no campo da educação como um dispositivo didático, originando pesquisas que,

segundo Abreu (2006, p. 165), sugerem novas práticas e metodologias utilizando os recursos

da Internet; outros divulgam ferramentas e sistemas tecnológicos desenvolvidos para fins

educacionais; há também aqueles que propõem ações para a qualificação de professores com a

finalidade de que estes façam uso, em sua ação cotidiana dos recursos da Internet.

Em face do potencial da internet para a interatividade e a penetração da mediação

tecnológica em todos os segmentos da vida, “no tocante à aprendizagem e o conhecimento,

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chegamos a uma transformação sem precedentes das ecologias cognitivas, tanto internas da

escola, como das que lhe são externas, mas que interferem profundamente nela” (ASSMANN,

2000, p.1).

A emergência das redes 2.0 é acompanhada de processos que demandam a

participação, partilha, reciprocidade e colaboração entre usuários, características que definem

novas dinâmicas de aprendizagem, ampliando a distribuição do conhecimento para além dos

cânones tradicionais de transmissão do saber. A transição de uma sociedade de sistemas de

ensino para uma sociedade de aprendizagem ou redes de aprendizagem caminha junto com a

potencialização da conectividade e de um maior poder comunicacional. O modo de interação

monomodal múltiplo das redes 2.0, reunindo “em um uma mesma interface todas as

possibilidades de comunicação disponíveis até então: comentários, fóruns, chats, mensagens

de membro para membro, quadro coletivo de recados, repositório coletivo de documentos,

mensagens coletivas, indexações personalizadas etc” (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 58),

possibilitou o aumento da conectividade entre os nós da rede e potencializou a sociabilidade

em rede, gerando maior capital social e, consequentemente, dinamizando a aprendizagem

individual e coletiva.

No campo da Física, Barabási publica em 2002, Linked. A contribuição de Barabási

faz parte de um escopo de teorias advindas das ciências exatas sobre teorias de redes

complexas que vão ser incorporadas pela sociologia, na perspectiva da análise estrutural das

redes sociais. Autores como Buchanan (2002), Barabási (2002), Watts (1999; 2003) buscaram

compreender e teorizar sobre as propriedades dos vários tipos de grafos61e como ocorre o

processo de sua construção (RECUERO, 2004; 2009). Nós, conexões, clusters (grupos de nós

mais conectados), hubs (nós altamente conectados), grau de distribuição (conectividade),

laços fracos e fortes (GRANOVETTER, 1973) passam a incorporar um vocabulário aplicado

na análise de redes sociais na internet como elementos estruturais dinâmicos, cujas

características e propriedades evoluem no tempo e no espaço, atribuindo à rede um caráter

                                                                                                                         61O conceito de grafos tem sua origem no trabalho do matemático Ëuler que criou o primeiro teorema da teoria dos grafos. Um grafo é uma representação de um conjunto de nós conectados por arestas, formando uma rede. Ëuler trabalha na solução de seu enigma das pontes para acesso da cidade prussiana de Königsberg por volta do século XVIII. O problema consistia em atravessar todas as sete pontes que conectavam a cidade sem passar duas vezes pela mesma ponte. Ele demonstrou que isso não poderia ser feito através de um teorema em que tratava as pontes como arestas e os lugares que deveriam ser conectados como nós.

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mutante62. Tais metáforas possibilitam compreender os elementos dinâmicos da composição

dos grupos sociais e estudar os padrões de conexão expressos no ciberespaço. Segundo

Recuero (2004, p. 3):

Garton et al. (1997, online) explica que a análise de redes sociais está centrada, principalmente, nos padrões de relações entre as pessoas. O estudo de redes sociais "reflects a shift from the individualism commum in the social sciences towards a structural analysis". Para ir além dos atributos individuais e considerar as relações entre os atores sociais, a análise das redes sociais busca focar-se em novas "unidades de análise" tais como: relações (caracterizadas por conteúdo, direção e força), laços sociais (que conectam pares de atores através de uma ou mais relações), multiplexidade (quanto mais relações um laço social possui, maior a sua multiplexidade) e composição do laço social (derivada dos atributos individuais dos atores envolvidos). O estudo de redes sociais procura também levar para a sociedade os elementos principais estudados em uma rede, tais como densidade da rede, clusterização,etc.

Tendo como base os conceitos de redes oriundos da sociologia, matemática e física, os

educadores “começaram a adotar a terminologia de redes e, em particular, adotaram o foco

relacional e baseado em comunidades na aplicação de redes de computadores” (DE LATT,

2006, p. 75 apud SIEMENS, 2008, p. 5). Gradualmente a noção de comunidade virtual vai

sendo ampliada passando a ser incorporada na noção de rede social.

A rede social é composta de nós (indivíduos) conectados por laços sociais (WATT,

2003, p.75 apud RECUERO, 2004, p. 3) e capital social, construídos a partir de modalidades

de interação63 mediadas pelos diversos softwares sociais. O capital social pode ser

compreendido como um conjunto de recursos de um determinado grupo que pode ser

usufruído por todos os membros do grupo, ainda que individualmente, e que está baseado na

reciprocidade (FRAGOSO et al, 2011, p. 123). Recuero (2004, p. 124) distingue cinco

categorias de capital social a que se tem acesso através da rede:

                                                                                                                         62Para um maior aprofundamento da teoria de redes aplicada à análise de redes sociais na internet consultar Raquel Recuero (2004; 2009; 2009a) e Fragoso et al (2011). 63Recuero utiliza em seus estudos a tipologia de interação mediada por computador proposta por Primo (2003) como mútua e reativa. A interação mútua é de natureza dialógica e o que define propriamente a constituição de um laço social mais complexo de natureza relacional, dialógica e a reativa seria mais limitante, definindo um laço social associativo, onde a conexão entre atores é estabelecida sem constituir propriamente uma troca dialógica.

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a) relacional – que compreenderia a soma das relações, laços e trocas que conectam o indivíduo em uma determinada rede; b) normativo – que compreenderia as normas de comportamento de um determinado grupo e os valores desse grupo; c) cognitivo – que compreenderia a soma do conhecimento e das informações colocadas em comum por um determinado grupo; d) confiança no ambiente social – que compreenderia a confiança no comportamento de indivíduos de um determinado ambiente; e) institucional – que incluiria as instituições formas e informais, que se constituem na estruturação geral dos grupos, onde é possível conhecer as “regras de interação social, e onde o nível de cooperação e coordenação é bastante alto.

O capital social pode ser sintetizado como a capacidade dos indivíduos de produzirem

suas próprias redes sociais, redes pessoais que atuam como agentes inteligentes na troca de

informação e conhecimento, representando uma importante riqueza em termos de

conhecimento distribuído, de capacidade de ação e de potência cooperativa (COSTA, 2005, p.

12). A conectividade vai expressar essa condição, já que esta é definida pelo grau de conexão

entre os nós, o grau de conexão pela quantidade de conexões que um nó possui e as conexões

são compreendidas como os laços e o capital social (RECUERO, 2005).

As comunidades virtuais das redes 1.0, baseadas em interações monomodais e,

portanto, de acesso mais restrito aos ambientes virtuais onde emergiam (redes de interesses

específicos), com a evolução para os modos monomodais múltiplos das redes 2.0 e uma

consequente ampliação dos graus de conectividade propiciados pelos softwares sociais,

passam a integrar uma rede colaborativa sem contornos definidos e mais distribuída, um

social em rede.

2.2.3 Os objetos técnicos começam a ganhar vida...

Na fase três, reforçando a importância das interações sociais como meio de

aprendizagem, os conceitos de cognição e de conhecimento distribuído são enfocados. As

teorias sócio-construcionistas de aprendizagem são retomadas por seu enfoque nas interações

sociais dos grupos no processo de aprendizagem e na construção dialógica do conhecimento.

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O interesse pelas teorias de matriz sociocultural de Vygotsky ressurge por sua ênfase na

importância do contexto ou ambiente social no desenvolvimento cognitivo, associado as

teorias de Bakhtin centradas na linguagem como fenômeno social, bem como no interesse de

discutir “as ideias principais sobre a formação do pensamento e da linguagem, que podem ser

articuladas para observar como os alunos e professores interagem diante do computador em

situações de ensino” (GIORDAN, 2005, p. 29). Tanto em Vygotsky quanto em Bakhtin, a

mediação semiótica, apreendida nas dinâmicas de processo de criação e apropriação dos

signos e de sua relação de dependência em relação à situação na qual se desenvolve, é o

elemento que estabelece a ligação entre o plano social e o plano interno (GIORDAN, 2005).

O escopo desses autores é ampliado na integração com teorias que possibilitam incorporar à

mediação semiótica, o papel da mediação tecnológica, como é o caso da teoria de ação

mediada de James Wertsch (GIORDAN, 2005; STAROBINAS, 2008), entre outras:

Uma decorrência imediata em refutar a separação entre sujeito e ambiente está, portanto, em reconhecer o caráter mediado de qualquer ação. Mesmo isoladamente, sem o contato com o outro, o indivíduo age por meio de ferramentas, sejam eles computadores, linguagens, sistemas numéricos ou formas enunciativas. Nesse sentido, um objeto de estudo específico é a análise comparativa entre formas de ação mediada por diferentes ferramentas externas com o intuito de verificar quais fatores funcionais da ferramenta gozam de prioridade para o sujeito empregá-la em determinada situação. Uma vez que estamos ampliando o rol de ferramentas para incluir aquelas relacionadas à elaboração de significados, torna-se analiticamente fértil alçar as formas enunciativas relativamente estabilizadas à categoria de ferramentas ou meios mediacionais das ações, de modo a distinguir os fatores funcionais e também estruturais determinantes da realização da ação. (GIORDAN, 2005, pp. 85-86)

As ferramentas técnicas ganham uma dimensão cultural, histórico e institucional, na

medida em que, na interação com seu grupo social, o sujeito recorre às ferramentas que ele

empresta de seu grupo para dar significação a sua ação (GIORDAN, 2005). O contexto

histórico-cultural e sua relação com o uso e apropriação das tecnologias emergentes adquirem

uma importância nas análises que relacionam as mudanças cognitivas com o contexto cultural

e as linguagens que emergem a partir da mediação tecnológica As características associadas à

cibercultura, ao hipertexto e à hipermídia vão refletir uma nova condição perceptiva e

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cognitiva associada, principalmente, `aqueles que nasceram e cresceram na era digital, os

nativos digitais ou a geração NET (PRESNKY, 2001; TAPSCOTT, 1999).

A não linearidade e a fragmentação do conhecimento, a memória distribuída e atenção

parcial, a estrutura rizomática da linguagem das redes, a cultura de aprendizagem

participativa, colaborativa, do remix, a emergência da inteligência coletiva, vão contrapor-se à

linearidade do texto escrito, à internalização e individualização da mente e a uma cultura de

transmissão passiva do conhecimento pelos sistemas de ensino, ainda que a reflexividade seja

a premissa fundante que ilumina a tecnologia da escrita64.

A noção de uma distribuição social e técnica da cognição é enfatizada para explicar

como a “capacidade de formar redes com ideias e outras pessoas aumenta, quando as pessoas

se projetam para fora. Através da Internet, estas redes de projeção externa podem ser

formadas em nível global” (SIEMENS, 2008, p. 6). , explicita essa relação ao comentar que a

tecnologia digital auxilia na distribuição de conhecimento à medida que nos permite

“projetar-nos para fora digitalmente” (KERCKOVE, 1997, p. 38), a mente do hipertexto é

uma mente externalizada na tela e conectiva:

Pensamento ou deliberação em condições hipertextuais significa acessar as memórias de todos e compartilha-las diretamente em tempo real com o capital do conhecimento. É desnecessário dizer que uma afirmação como essa precisa ser matizada pelo reconhecimento de que as condições políticas e econômicas alteram esse estado ideal.

Entretanto, a cognição hipertextual não é limitada ao único indivíduo acessando a memória coletiva em uma forma conectada. É também uma cognição partilhada. Os conteúdos de nossas telas estão simultaneamente disponíveis a muitas pessoas ao mesmo tempo, sincronicamente, ou além do tempo, diacronicamente. (KERCKHOVE, 2003, p. 4)

Nesta linha temática, Lévy (1994) tem uma influente penetração nas pesquisas que

abordam a educação e cibercultura com o conceito de inteligência coletiva. A inteligência

coletiva compreendida como “uma inteligência repartida por todos as partes, coordenada em

                                                                                                                         64 A crítica é realizada à arquitetura e práticas do sistema de ensino centrado na cultura impressa, o que não significa que a cultura escrita resulte em passividade na aprendizagem. Apesar da natureza participativa da cultura digital e que supõe um aprendiz ativo, várias críticas são levantadas quanto à superficialidade e ausência de reflexividade ensejada, por exemplo, pela fragmentação e dispersão da atenção.

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tempo real, que conduz a uma mobilização efetiva das competências” (LÉVY, 1994, p. 19),

relacionada com a capacidade dos coletivos humanos de se engajarem em cooperação

intelectual com o objetivo de criar, inovar e inventar, é considerada pelo autor um fator

determinante no desenvolvimento criativo e competitivo humano, em uma sociedade do

conhecimento. O autor considera que se tornou essencial compreender como o processo de

inteligência coletiva pode ser multiplicado nas redes digitais, na medida em que as

tecnologias digitais têm proporcionado mais e um número cada vez maior de poderosas

ferramentas que ampliam os processos cognitivos pessoais e coletivos (LÉVY, 2009). O

diagrama a seguir é uma síntese proposta pelo autor do modelo de inteligência coletiva a

serviço do desenvolvimento humano e sua relação com as redes que as tecnologias digitais

integram (LÉVY, 2009, p. 17):

Figura 6: Um modelo de inteligência coletiva a serviço do desenvolvimento humano

Fonte: Lévy (2009)

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Segundo Costa (2005, p. 2), citando os conceitos de inteligência emergente

(JOHNSON, 2001), coletivos inteligentes (RHEINGOLD, 2002), cérebro global

(HEYLIGHEN et al, 1999), sociedade da mente (MINSK, 1997), redes inteligentes

(BARABÁSI, 2002), “todos apontam para uma mesma situação: estamos em rede,

interconectados com um número cada vez maior de pontos e com uma frequência que só faz

crescer. A partir disso, torna-se claro o desejo de compreender melhor a atividade desses

coletivos...”.

A aprendizagem e o conhecimento passam a residir em “redes heterogêneas de

relacionamentos entre o mundo social e material” (ARAÚJO, 1998, p. 317 apud SIEMENS,

2008, p. 6) e o acesso dos indivíduos a estas redes dependerá da conectividade mediada por

artefatos cognitivos, como as atuais tecnologias e da capacidade dos indivíduos de

estabelecerem conexões.

2.2.4 Redes sociais da internet

A popularização e disseminação das redes sociais como Myspace, em 2003, seguidas

pelo Orkut, Youtube, Twitter e Facebook, entre outras, elevou a importância da noção de

rede, que saí dos círculos acadêmicos para atingir o interesse de grandes públicos. A

utilização de softwares sociais65cresce e com ela a habilidade e competências de articulação

em rede, principalmente, dos jovens que constituem o grande público das redes sociais

(SALAWAY et al, 2008). Aliás, foram os jovens que, segundo Lévy (1999), impulsionados

por um movimento de experimentar coletivamente formas de comunicação diferentes das

mídias clássicas, promoveram o crescimento e a abertura de um novo espaço de comunicação,

o ciberespaço, estendendo essas novas redes de comunicação para a vida social e cultural. Da

interação monomodal das redes 1.0, transitando pelas interações múltiplas monomodais das

                                                                                                                         65Segundo Owen et al (2006), o termo teria sido cunhado por Clay Shirky, em 2002, para designar softwares que suportam a interação de grupos. Os autores ampliam essa definição para incluir o reconhecimento que os softwares sociais incrementam a sociabilidade entre indivíduos e grupos e a formação de comunidades, face as características de suportarem interação entre indivíduos e grupos em tempo real e assíncrono, suportarem feedback social permitindo o compartilhamento de ideias, opiniões, informação, conhecimento, etc, suportarem redes sociais que possibilitam a criação e o gerenciamento de uma expressão digital dos relacionamentos pessoais e contribuem para a construção de novos relacionamentos.

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redes 2.0 e pelas atuais redes 3.0, caracterizadas pela “integração de múltiplas redes,

plataformas e funcionalidades através do uso de aplicativos e de mídias móveis”

(SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 59), vamos adquirindo um benefício potencial secundário,

segundo Siemens (2008, p.6), a habilidade de pensamento em rede. Descobrimos maneiras de

encontrar informações e pessoas, resolver problemas coletivamente, circular e multiplicar

ideias, ampliar os laços e contatos sociais e, consequentemente, agregar o valor potencial

dessa rede social: o seu capital social e o poder da comunicação em rede. A questão central

passa a ser, como fazer rede? Fazer rede vai além das escolhas de quais tecnologias de

comunicação utilizar, coloca-nos diante do que Costa (2008, p. 1) aponta como uma

correlação entre inteligência coletiva e redes sociais:

É fato que a noção de rede social vem sendo empregada em larga escala para designar os fenômenos de cooperação ativa ou de simples colaboração via Internet. [...] Eis o que parece introduzir uma diferença que deve repercutir nos diversos estudos sobre a dinâmica de formação dos laços sociais. Como fazer rede? Como construir uma comunidade virtual ou uma comunidade de prática? Como ampliar a sinergia entre indivíduos em graus e escalas diferenciadas (Kim, 2000; Fidalgo, 1998; Preece, 2000)? Tais questões tornam pertinente a correlação entre inteligência coletiva e redes sociais do ponto de vista da comunicação e dos meios de comunicação. Isso porque, como o próprio conceito indica de forma intuitiva, inteligência coletiva se refere à circulação e multiplicação de ideias e de coletivos. Portanto, se desejamos por as ideias em movimento, devemos buscar os meios de colocar os indivíduos em relação, meios que possam facilitar a sinergia entre as pessoas.

Esta questão remete, no campo da educação, à pesquisa de recursos conceituais e

metodológicos voltados para a promoção de uma efetiva comunicação que facilite a sinergia

entre as pessoas, em consonância com as práticas culturais, cognitivas e de construção de

subjetividade da era digital. Pesquisas que envolvem o uso potencial das redes sociais na

educação, sua integração com e-learning e o desenvolvimento de habilidades de pensamento

em rede, surgem nessa fase.

As fases anteriores constituem a base para a quinta fase onde os educadores começam

a “explorar a forma como o modelos de redes podem ajudar não só a compreender a

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aprendizagem colaborativa em ambientes online e combinados, mas em redes de

aprendizagem móvel e universal” (SIEMENS, 2008, p.7).

2.2.5 Colaboração em foco

O trabalho colaborativo e a construção compartilhada de conhecimento tem sido

objeto de reflexões desde as redes 1.0, principalmente, nos estudos de EAD, ensino online, e-

learning (HARISIN, 1989; 2000; HILTZ, 1998). A diferença introduzida pelas redes sociais

2.0 e 3.0 encontra-se no fato da aprendizagem colaborativa ser compreendida como um

processo espontâneo e uma dinâmica própria dessas redes. As redes sociais são também redes

de aprendizagem ou ambientes que propiciam experiências de aprendizagem personalizadas e

colaborativas. Owen at al (2006) sugerem uma transição da concepção de e-learning para c-

learning, que designaria a aprendizagem colaborativa, aprendizagem comunitária ou

aprendizagem comunicativa, cujo processo extrapola os espaços formais de aprendizagem

(presenciais, semi-presenciais ou não-presenciais). Busca-se compreender como os alunos

interagem uns com os outros em fóruns on-line, e-mails, redes de blogs, redes sociais,

associados ao uso de análise de redes e/ou ferramentas de visualização, para avaliar a

qualidade e a natureza das interações e melhor compreender as características dos processos

de aprendizagem emergentes. Siemens (2008) considera que, a partir desse estágio, os

educadores começam a adotar o conceito de aprendizagem em rede e de conectividade. O

conectivismo, ambientes de aprendizagem abertos, recursos educacionais abertos (rea),

comunidades de práticas são temas que passam a ser abordados nas pesquisas em educação

mais recentes (OKADA, 2010; SANTANA; ROSSINI; PRETTO, 2012; SANTOS et al,

2012), refletindo uma abertura para um conceito de rede que extrapola a ideia de estar

simplesmente conectado, mas tudo indica que ainda estamos engatinhando na compreensão

dessa nova dinâmica, tanto quanto, nos adverte Lévy (1999), em relação ao conceito de

inteligência coletiva.

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2.3 APRENDIZAGEM EM REDE: UM CONCEITO QUE ESCAPA AO PENSAMENTO

DA REPRESENTAÇÃO

O enredamento das práticas comunicacionais e cognitivas em rede aproximam-se das

características de sistemas complexos dinâmicos fora do equilíbrio por sua natureza aleatória,

flexível e distribuída, regidas por parâmetros como a auto-organização e emergência. A auto-

organização “pode ser definida como a criação espontânea de padrões globalmente coerentes

a partir de interações globais” (HEYLIGHEN, 1997 apud SANTAELLA; LEMOS, 2010, p.

21). Moraes (1997; 2008) acredita ser este um dos conceitos mais importantes a ser trabalhado

na educação, levando-nos a conceber a aprendizagem não mais em razão de uma causa-efeito

do ensino ministrado, mas como resultante da construção realizada pelo indivíduo em razão

de sua capacidade de auto-organização individual e coletiva na necessidade de busca do

reequilíbrio.

Santaella e Lemos (2010, p. 21), atribuem aos coletivos inteligentes que surgiram com

a rede planetária de comunicação, características de sistemas complexos adaptativos, onde

propriedades emergentes66, como a mente coletiva, surgem como parte de um processo

evolutivo que vem amplificar as capacidades cognitivas dos seres humanos:

As tecnologias de comunicação digital, especialmente aquelas do tipo P2P (peer to peer, de igual para igual), as comunidades móveis, a blogosfera, a explosão das RSIs e as mensagens em tempo real produzem como propriedades emergentes a mente coletiva, um tipo de inteligência gerada pela interação entre os agentes em comunicação. Trata-se, evidentemente, de uma inteligência que vai ganhando em complexidade na medida em que passa das formigas, dos cardumes e dos pássaros para os seres humanos, sendo este a epítome da complexidade e cujas múltiplas interações resultam em capacidades cognitivas amplificadas pelo pensar, agir e sentir em rede.

A aprendizagem em rede pode ser compreendida como um sistema complexo

adaptativo, configurado numa intrincada rede de transformações que mobiliza um coletivo de

entidades heterogêneas, que vão tecendo o social a partir das associações que emergem.

                                                                                                                         66O fenômeno da emergência está relacionado com “a capacidade de produzir propriedades engendradas por interações, que os elementos tomados em sua individualidade e discrição não possuem” (BRAGA, 2009, p.2).

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Tomamos como princípio que, tratando-se de um sistema complexo adaptativo, a

aprendizagem em rede é prenhe de imprevisibilidade e irredutibilidade67, portanto, acatamos

as recomendações de Latour (2005) de seguir os rastros enquanto as redes se fazem com o

intuito de dar visibilidade na escala dos actantes às dinâmicas de aprendizagem em rede.

Apesar da distinção de ponto de vista operada pela TAR em relação à perspectiva sistêmica,

enfatizando as partes e não o todo na reconstituição das associações, o ator-rede é sempre uma

relação reversível entre a parte e o todo.

Recorremos nesse estudo às teorias sistêmicas, à semiótica peirceana e à teoria ator-

rede (LATOUR, 2005) para dar visibilidade às dinâmicas da aprendizagem em rede em um

estudo de caso. Recorremos também, à arte, com um modo de ir além do que apreendemos

por uma interpretação dos diversos conceitos de rede e conectividade.

A imagem que abre este capítulo é uma das obras da artista japonesa Mariko Mori de

título Oneness (2003), exposta no Brasil em 2011 no Centro Cultural Banco do Brasil (Rio de

Janeiro, São Paulo e Brasília) e que também foi título da exposição. Oneness significa

singularidade ou unicidade, em português. Segundo reportagem online da revista Época SP, o

título da exposição deriva do conceito de conexão entre todas as coisas. A obra é descrita no

site como uma peça que traz seis figuras de 1,35 m de altura, semelhantes ao estereótipo de

extraterrestres. Feitas de technogel, material entre o líquido e o sólido, acendem quando

tocadas. Dorf (2011) jornalista que escreve sobre cultura, diversão e arte, descreve Oneness

como uma alegoria da conectividade. Para quem teve oportunidade de ir à exposição e

interagir com Oneness, a experiência resultante se aproxima de uma mistura de

estranhamento, surpresa e alegria com a sensação de vida e afetividade que resulta da

interação com as estranhas figuras de technogel e com o público.

Frias e geladas em seu tom de azul translúcido, corpo misto de robô, gente e

extraterrestre, apresentando uma textura e consistência plástica entre o sólido e líquido, que

lhe conferem ao mesmo tempo uma artificialidade e uma maciez no contato. De mãos dadas,                                                                                                                          67 Santaella e Lemos (2010, p. 24), a partir da exposição de Braga (2009), destacam a imprevisibilidade e a irredutibilidade como as duas características mais fundamentais do fenômeno da emergência. “Imprevisibilidade: não há possibilidade de prever, de um ponto de vista pré-emergente, mesmo conhecendo suas partes as leis que governam as suas interações, quais serão as propriedades emergentes de sistemas complexos; de resto, uma imprevisibilidade ontológica, pois não depende do sujeito da observação; irredutibilidade: propriedades e leis emergentes são estruturadas por ciências da complexidade e são irredutíveis às categorias conceituais de ciências específicas.”

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as seis figuras formam um círculo, onde estão voltadas para fora. Uma roda de “crianças”

extraterrestres ou ciborgues.

O círculo visto de cima (Figura 7) é a imagem de um anel aromático, estrutura cíclica

formados por seis carbonos com duplas ligações intercaladas que representam elétrons em

ressonância, deslocalizados, formando uma espécie de nuvem de alta densidade eletrônica. A

estrutura é estável, contudo a riqueza eletrônica do anel possibilita realizar ligações com

outros elementos ou grupamentos de elementos sem que o anel se rompa. O desenvolvimento

da fórmula estrutural do Benzeno (anel aromático mais simples) é devida ao químico alemão

Kekulé (1865) que, a partir de um sonho, onde visualiza uma cobra mordendo o rabo e

girando, símbolo do Ouroboros (ou oroboro), propõe a estrutura de um anel hexagonal,

posteriormente (1930), foi desenvolvida a ideia de ressonância do anel benzênico. Segundo o

Dicionnaire des Symboles, o Ouroboros simboliza o ciclo da evolução voltando-se sobre si

mesmo. O símbolo contém ideias de movimento, continuidade, autofecundação e, em

consequência, eterno retorno.

Figura 7: Deitch Projects

Fonte: Marco Della Torres (2003)

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Figura 8: Estrutura ressonante do anel benzênico ou aromático

Fonte: http://www.brasilescola.com/quimica/descoberta-­‐estrutura-­‐benzeno.htm  

Figura 9: Estrutura proposta por Kékule baseada no sonho com o Ouroboro

Fonte: http://www.brasilescola.com/quimica/descoberta-­‐estrutura-­‐benzeno.htm

Sobre o sonho, em discurso realizado em 1890, em comemoração ao 25o aniversário

do anúncio da fórmula do benzeno, Kékule comenta: “Aprendamos, senhores a sonhar e então

talvez possamos encontrar a verdade... mas evitemos publicá-los antes de colocar à prova do

mundo real” (apud FONSECA, 2010b, p. 21).

Os “sonhos” de Mariko Mori não precisam ser colocados à prova da razão científica e

nem do mundo real, é um convite à interação direta de nossa sensibilidade com o potencial de

verdade contida na obra. Somos convidados para um abraço, um toque, uma saudação que

despertem as pequenas criaturas de um aparente sono, fazendo seus olhos brilharem e seus

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corações baterem. Tocando no torso, próximo do que parecia simular um coração, os olhos

acendiam e era possível perceber as batidas do coração, mas somente quando todas as seis

eram tocadas, simultaneamente, todo o platô se iluminava revelando a interdependência entre

todos os elementos, internos e externos à obra. Sensores infravermelhos de presença atuam no

sentido de conectar cada pessoa e cada pequena criatura, bem como o todo, sincronizando

batidas de coração em baixa frequência. Um ambiente sensível ao calor emanado na interação

com as estranhas figuras, conectavam o público entre si, revelando a potencialidade contida

na aceitação da diferença, na diminuição da distância que nos separa do outro (ou outros), na

diminuição das distâncias culturais, no ato solidário de dar as mãos e da aproximação do

toque e, principalmente, no fato de que ao fazê-lo de modo sincrônico, iluminamos e trazemos

vida não só a cada criatura, mas `a toda estrutura na qual elas assentam sua existência. Uma

relação de interdependência entre humanos, objetos que ganham vida e o ambiente que os

circunda.

2.4 REDES E MEDIAÇÃO: SOCIAL X COLETIVO

“A rede venceu o grupo como modelo do socius.” (VIVEIROS DE CASTRO, 2002, p.14)

A noção de sociedade vem sofrendo críticas e perdendo terreno, seja no seu sentido

universal como uma condição geral da vida humana, - a partir de uma interpretação biológica

(instintual) ou simbólico-moral (institucional) -, ou no seu sentido particular, ao designar um

grupo ou coletivo humano que partilha certas propriedades (como por exemplo territorialidade

e distinção cultural entre outras). Viveiros de Castro68 (2002) atribui essa condição a uma

crise histórica relacionada com o fim do colonialismo político formal, a transnacionalização

das identidades e a generalização da condição 'diaspórica' como experiência cultural, como

também, a uma crise cultural colocada pela falência da 'sociedade moderna'. Assim, “cresce a                                                                                                                          68 No artigo intitulado, O conceito de sociedade em antropologia: um sobrevôo, Viveiros de Castro (2002) apresenta um mapa esquemático e didático das incidências do conceito de sociedade em antropologia. Destacamos os conceitos que o autor apresenta como alternativa para a noção de sociedade e indivíduo, sem abordar a genealogia desses conceitos, para tal conferir o texto do autor, que oferece uma rica introdução aos principais norteadores teóricos desta discussão.

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convicção de que o Ocidente abandonou seu período 'moderno', fundado na separação que

permitia atribuir, por um lado, transcendência objetiva ao mundo natural e imanência

subjetiva ao mundo social, e, por outro lado, instrumentalidade passiva aos objetos e agência

coercitiva de valores” (VIVEIROS DE CASTRO, 2002, p. 16).

Concepções segundo as quais a sociedade era concebida como transcendendo o

indivíduo cedem lugar para noções como socialidade (WAGNER, 2010; STRATHERN,

1999), dispositivo e agenciamento (FOUCAULT; DELEUZE), coletivo e rede (LATOUR,

1994; 2005). Tais conceitos surgem como alternativas às noções clássicas de instituição e

ideologia, além de dissolver as dualidades entre humanos e não-humanos, natureza e cultura.

A ênfase não é mais na estrutura ou supra-estrutura da sociedade, definindo níveis micros e

macros, mas no aspecto relacional que “exprimiria melhor o processo semiótico fractal da

condição sócio-pessoal” (VIVEIROS DE CASTRO, 2002, p. 14).

A inclusão da perspectiva da reversibilidade, levantada por Wagner (2010), introduz

no trabalho do etnógrafo o experimentar a diferença no campo a partir da ênfase no aspecto

relacional que leva em conta as práticas de sentido conferidas pelos 'nativos'. Uma “troca de

perspectivas”, na concepção de Viveiros de Castro, citando Strathern (1999). Wagner (2010)

propõe compreender a antropologia, antes de tudo, como um modo de relacionamento com a

alteridade existente em qualquer coletivo humano. Ao propor que os melanésios também

praticam uma antropologia, à qual denomina de antropologia reversa, introduz a perspectiva

de que “o que está em jogo não é a assunção do ponto de vista do “nativo”, mas o

reconhecimento de que a descrição do antropólogo deriva do ponto de vista da sua relação

com o ponto de vista “nativo” (VIVEIROS DE CASTRO apud BENITES, 2007). A troca de

perspectiva é um deslocamento de um ponto de vista construído a partir de uma visão do

ocidente, alicerçada nos princípios da modernidade e nos grandes divisores que a

sustentavam, para incluir as singularidades, “entendidas como combinatórias locais (o que

não significa diferença absoluta e irredutível) de linhas de forças difusas (o que também não

significa universalidade absoluta)” (ABAÉTE, 2005). A experiência de Strathern (1991;

1996; 1999) com os Melanésios, igualmente enfoca a questão relacional ganhando contornos

na inversão do olhar do antropólogo, antes referenciado em sua própria cultura, para uma

outra construção que se dá na afecção dada e elaborada nos estados relacionais estabelecidos

pelo par antropólogo-nativo, introduzindo também o papel das coisas na construção

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identitária da cultura melanésia. O contexto e as relações, sejam elas entre humanos ou coisas,

adquirem um papel relevante para pensar a cultura e o que compreendemos por social:

Lembrando Wagner, devemos estar atentos às associações e seus respectivos contextos, que estão sendo carregados junto com o conceito de cultura em jogo. A invenção de novos sentidos sempre parte de convenções existentes, compartilhadas pelos indivíduos em questão. O problema é compreender como, por meio do modo de simbolização diferenciante, os sentidos da ideia de cultura vão sendo estendidos a partir de sucessivos processos metaforizantes. Em uma perspectiva complementar, suscitada pela reflexão de Latour (2005), uma tarefa interessante pode ser a de traçar uma rede de associações na qual sejam mostradas, em diferentes momentos, as mudanças que o conceito de cultura sofre a partir das traduções pragmáticas que cada mediador do conceito efetua. (BENITES, 2007, p. 9)

Na antropologia simétrica de Latour (1994), os objetos ganham vida e passam a

integrar um coletivo, um agregado de associações que elimina fronteiras entre a natureza e a

sociedade, sujeitos e objetos. O autor dá visibilidade aos híbridos de natureza e cultura

propondo a inclusão desses agentes na construção do social, fazendo-nos perceber os

procedimentos simultâneos de tradução e purificação que na modernidade foram mantidos

como práticas separadas. Reflexão que o autor atualiza no ensaio Jamais fomos modernos:

ensaio de Antropologia Simétrica:

A hipótese deste ensaio - trata-se de uma hipótese e também de um ensaio - é que a palavra "moderno" designa dois conjuntos de práticas totalmente diferentes que, para permanecerem eficazes, devem permanecer distintas, mas que recentemente deixaram de sê-lo. O primeiro conjunto de práticas cria, por "tradução", misturas entre gêneros de seres completamente novos, híbridos de natureza e cultura. O segundo cria, por "purificação", duas zonas ontológicas inteiramente distintas, a dos humanos, de um lado, e a dos não-humanos, de outro. Sem o primeiro conjunto as práticas de purificação seriam vazias ou supérfluas. Sem o segundo, o trabalho de tradução seria freado, limitado ou mesmo interditado. O primeiro corresponde ao que chamarei de redes, o segundo ao que chamarei de crítica. (LATOUR, 1994, p. 16)

A noção de rede como sinônimo de tradução é proposta como modelo alternativo de

socius e como modo crítico que pensa a “interdependência dos sistemas sociais concretos,

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concebidos como superposições de redes heterogêneas e abertas, mais do que grupos

totalizados e totalizantes” (VIVEIROS DE CASTRO, 2002, p. 14). Enquanto a crítica faz a

separação entre natureza e sociedade, entre o local e o global, distinguindo as leis da natureza

exterior e as convenções da sociedade (LATOUR, 1993, p. 129), a tradução é o que conecta

entidades heterogêneas por meio de agenciamentos intermediários. A proliferação dos

híbridos tornou difuso o que identificamos como relação social e nos fez perceber que os

humanos não agem sozinhos, no momento em que alguém age há sempre outros seres ativos,

os híbridos ou quase-objetos, termo que Latour toma emprestado de Michel Serres:

Como Michel Serres, chamo estes híbridos de quase-objetos, porque não ocupam nem a posição de objetos que a Constituição prevê para eles, nem a de sujeitos, e porque é impossível encurralar todos eles na posição mediana que os tornaria uma simples mistura de coisa natural e símbolo social. (LATOUR, 1993, p. 54)

A inclusão dos híbridos como parte integrante do coletivo, palavra que Latour (1993)

utiliza no lugar de sociedade, nos coloca diante do fato de que a ‘sociedade’ não se faz

somente no âmbito dos homens, - nem a sociedade é tão social e nem a natureza tão natural. O

sociólogo das ciências vai além, propondo uma reformulação do que é compreendido de

modo geral e na sociologia por social e sociedade e uma reformulação da própria sociologia.

Para o acolhimento dos objetos, sem que os tomemos como seres passivos e inertes sobre os

quais agimos ou que sofremos uma ação passiva, o autor sugere que acrescentemos à prática

de purificação, as práticas de mediação. Para explicar essa mistura de coisa natural e símbolo

social, dessa troca de perspectiva em que o sujeito se traduz em coisa e a coisa em sujeito,

acolhendo os aspectos relacionais em cada contexto, o autor recorre a Levi Strauss (1962, p.

294 apud LATOUR, 1993, p. 55):

Um observador exótico julgaria sem dúvida que a circulação automobilística no centro de uma grande cidade ou em uma rodovia ultrapassa as faculdades humanas; e de fato é assim, uma vez que esta circulação não coloca face a face nem homens nem leis naturais, mas sim sistemas de forças naturais humanizadas pela intenção dos motoristas, e homens transformados em forças naturais pela energia física da qual eles se tornam mediadores. Não se trata mais da operação de um agente sobre um objeto inerte, nem da reação

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de um objeto, promovido ao papel de agente, sobre um sujeito que se teria despossuído em favor do objeto sem nada pedir-lhe em retorno, ou seja, situações envolvendo, de um lado ou do outro, uma certa dose de passividade: os seres em presença se defrontam ao mesmo tempo enquanto sujeitos e objetos; e, no código usado por eles, uma simples variação na distância que os separa tem a força de um exorcismo mudo.

A riqueza das pequenas entidades, em sua diferença e complexidade, coloca em

questão a máxima: “o todo é sempre maior que a soma de suas partes” e está contida na

recusa em tomar a sociedade como uma ordem superior, mais complexa do que a manada

individual e o agenciamento humano como o único estofo do qual é feita a sociedade

(TARDE apud LATOUR, 2002). Latour (2002, p. 3) assume esta perspectiva na proposição

de que aquilo que consideramos como social e sociedade parece estar diluído em todo lugar e

em nenhum lugar especificamente. Na análise do autor, a abertura dada por Gabriel Tarde

permite compreender a sociedade como uma palavra que pode ser atribuída a qualquer

associação, “[...] isto quer dizer que cada coisa é uma sociedade e todas as coisas são

sociedades” (TARDE, 1999 apud LATOUR, 2002), a sociedade de mônadas é um fenômeno

generalizado do qual o próprio mundo é feito.

A monadologia de Gabriel Tarde é resgatada por Latour (2002, p. 2) que atribui ao

sociólogo a 'paternidade' da Teoria Ator-Rede (TAR) pela introdução nas teorias sociais de

dois argumentos, que estão no cerne da TAR: que a divisão entre natureza e sociedade é

irrelevante para a compreensão do mundo das interações humanas; e que a distinção entre

micro/macro sufoca qualquer tentativa de se compreender como a sociedade é gerada.

A TAR vai contribuir para reagrupar as conexões sociais, seguindo os rastros que

permitem descrever a formação dos coletivos sociotécnicos. Rastros que são inscrições de

ações e que tornam visível o agenciamento de entidades heterogêneas que compõem os

coletivos, entidades que são denominadas actantes. Definição que amplia a noção de ator,

vinculada a um agente humano, estendendo-a para entidades não-humanas e não-individuais.

Tudo que age no sentido de provocar diferença ou transformação vai ‘fazer’ a rede, enquanto

um movimento que costura as associações e confere um outro sentido ao social, distinto de

algo que já está constituído a priori e prescinde de uma explicação, para algo que está sempre

por se fazer e a ser explicado.

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Dissolvida a dicotomia entre natureza e sociedade, ao reunir o agrupamento de seres a

que chamamos natureza e o agrupamento a que chamamos sociedade em uma única

coletividade, Latour (2005) abre espaço para investigar suas associações, suas conexões e

suas políticas. É o que denomina de reassembling the social. Na TAR, a palavra social passa a

designar uma trilha de associações entre elementos heterogêneos e a sociologia, a ciência do

social, é redefinida como o rastrear de associações. A teoria ator-rede vai descrever o social

como algo que não está pronto, o social está sempre por se fazer ou se fazendo em vários

níveis por meio de cada nova associação. Por esta razão, é que “os sociólogos das associações

devem guardar como seu mais querido tesouro todos os rastros que manifestam as hesitações

percebidas pelos atores acerca de quem os ‘direciona’ a agir” (LATOUR, 2005, p. 47). Na

perspectiva da TAR, nunca está claro quem ou o que está agindo ou a origem da ação, a ação

é sempre coletiva, emprestada, distribuída, sugerida, traída, traduzida, o que redimensiona o

significado da palavra ator ao transportá-lo para o entremeios de uma rede de ações, este tipo

de ator é mais bem designado como ator-rede. “Um ator, na expressão hifenada, não é a fonte

de uma ação, mas o alvo em movimento de um vasto conjunto de entidades que pululam em

direção a ela” (LATOUR, 2005, p. 47). Nenhum critério substancialista vai definir o que é um

ator, o que importa é menos a natureza de quem ou o que age e mais o agir, no sentido de

provocar uma diferença, uma transformação (teoria da agência).

Quando se afirma que atores podem ser humanos e não humanos, que eles são infinitamente flexíveis, heterogêneos, que eles são associonistas livres, que desconhecem diferenças de escalas, que não há inércia nem ordem, que eles constroem sua própria temporalidade, isto não qualifica qualquer ator individual real, mas a condição necessária para que a observação e o registro dos atores sejam possíveis. Em vez de constantemente predizer como um ator deveria agir e quais associações são permitidas a priori, a TAR não parte de nenhuma pressuposição, e, para permanecer desengajada, ela precisa estabelecer seus instrumentos na insistência da infinita flexibilidade e absoluta liberdade (LATOUR, 1998 apud SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 37)

A ação é um acontecimento, um evento, que tem sempre múltiplos agentes, quando há

uma ação um antes e um depois se institui, ela deixa rastros, inscrições e coloca em relação

por tradução, isto é, pelo “transporte” da ação, os mediadores. A tradução induz dois

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mediadores a coexistirem, faz proliferar os actantes pela distribuição da ação. “Não há

sociedade, nem campo social e nem vínculos sociais, mas existem tradução entre os

mediadores que podem gerar associações rastreáveis” (LATOUR, 2005, p. 108). A rede é

aquilo que é rastreado no trabalho de tradução, ela é qualificada na habilidade de cada ator

para fazer com que outros atores ajam, de originar uma nova tradução.

Tradução, de fato é o que as redes de atores fazem. Atores traduzem, por exemplo, instrumentos, observações, inscrições, habilidades, interesses. “Nada é por si mesmo conhecível ou não conhecível, dizível ou indizível, nada esta perto ou longe. Tudo é traduzível” (Latour 1998a, p.167). Mais uma vez aqui faz falta a noção de semiose de C. S. Peirce que nos explicita, na sua lógica ternária, que a ação do signo é a ação de ser interpretado, isto é, a ação de dar origem a um outro signo, algo que só se processa por meio da tradução. O significado de um signo é ser traduzido em outro signo. (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 41)

A rede não designa nós interconectados, ela é tão menor ou maior conforme suas

associações, é sempre a superfície de suas conexões, de alguma maneira, é uma topologia

aberta, ela cessa quando a ação cessa, - é aquela que faz proliferar os actantes. Ela é menos a

coisa descrita, do que um método de descrição. A rede é um conceito que integra um método

de descrição de ações, de modo que se construa um mundo comum, ampliando a participação

de entidades heterogêneas e a distribuição dos mediadores. Nesta acepção, a noção de rede

vai além de sua mera descrição como um agregado de nós e conexões, no sentido de uma

estrutura e organização, para estender essa noção como processo. Pensando em termos da

filosofia perciana, seria compreendê-la ou descrevê-la como um processo de semiose, de

geração de signos e de ação dos signos, a rede como trabalho de tradução, é pura mediação.

Seguir os rastros das associações é retraçar, reconstituir a rede, ou melhor, percebê-la

enquanto ela se faz e, simultaneamente, tecê-la e ampliá-la. Procedimento que redistribui as

diferenças entre o macro e o micro, entre o individual e o coletivo, pois o ator é definido por

sua rede (LAW, 1999 apud LATOUR et al, 2012) e de modo reversível, a rede é totalmente

definida por seus atores. A distinção de níveis perde sua importância, quando os heterogêneos

são colocados no mesmo plano rizomático, o que não significa anular as diferenças, mas

considerar que cada actante é igualmente uma parte e um todo, uma mônada (ou um ator-

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rede). “A mônada não é a parte de um todo, mas um ponto de vista sobre todas as outras

entidades tomadas solidariamente e não como uma totalidade” (LAW, 1999 apud LATOUR et

al, 2012, p. 7). Latour et al (2012) atribui aos rastros digitais a possibilidade de dar

credibilidade a essa estranha noção de mônada extraída da sociologia de Tarde. A experiência

de seguir os individuais por meio de suas conexões, navegando pelos bancos de dados, é uma

passagem circular do ator para os atributos que o definem, de uma mônada para uma nova

mônada, individualizada pelas associações anteriores reunidos por essa mônada (LATOUR et

al, 2012, p. 15).

Mas o que confere às redes digitais essa característica peculiar de dissolver as

fronteiras dos grandes divisores?

A conexão ator-rede se faz em toda parte, mas quando se trata de descrevê-las e retraçá-las, os esforços são consideráveis. O que as redes digitais favorecem é precisamente esta rastreabilidade, de modo que se pode ao mesmo tempo seguir uma série de ações e associações locais e ver como cada uma delas participa da construção de coletivos. A passagem de uma escala a outra se torna facilitada: é possível manter simultaneamente o foco (local) e a amplitude da observação, como um movimento de zoom. (BRUNO, 2012, p. 14)

As redes digitais possuem essa característica peculiar de trânsito entre a matéria e a

forma, no sentido que Flusser (2007, p. 24) dá à relação entre estes dois termos no contexto

das atuais tecnologias: “Mas hoje em dia, sob o impacto da informática, começamos a

retornar ao conceito original de ‘matéria’ como um preenchimento transitório de formas

atemporais”. O que é compreendido por material é a manifestação do ato de in-formar (impor

formas a matéria) e o formal de produzir modelos. Emerge um mundo codificado por números

suportado por modelos teóricos e equipamentos técnicos, que compõem um agregado de

relações, uma multiplicidade de formas que deixam rastros em sua materialização. Nesse

sentido, não há razão para distinguir matéria e forma, a “‘imaterialidade’ ou no sentido estrito,

a forma, é precisamente aquilo que faz o material aparecer” (FLUSSER, 2007, p. 32).

Protocolos são modelos teóricos, inovação tecnológica e mistos de acordos

econômicos e políticos. São redes dentro de redes, que parecem ter vida própria, a vida

secreta dos objetos (tomando aqui emprestado o termo e o sentido proposto em uma disciplina

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e seminário em curso69). Por outro lado, temos a imaterialidade dos softwares, objetos que se

atualizam como interfaces transdutoras de linguagens de máquinas, algoritmos e dados que

ganham uma tessitura cultural em sua arquitetura ou design de informação e nas formas de

apropriação programadas (inteligência artificial) ou inventivas do público que acessa e utiliza.

Até aqui parece que a parte que nos cabe nessa rede nem é assim tão grande, mas somos

numerosos, uma multidão como Hard e Negri propõem. Somos também rede de corpos,

afetos, mentes, pensamentos, inscrições, objetos conectados, integrantes de uma inteligência

coletiva; coletivo inteligente, enxames emergentes, etc. Novamente a matéria e a forma se

apresentam não em dicotomia, mas como par de simetria. E ainda, não podemos esquecer que

essa malha é entremeada de outros mediadores como a política, economia, ciência, arte,

educação, cultura, religião, direito, ficção. Nas palavras de Latour (1994, p. 65):

Quem esqueceu o Ser? Ninguém, nunca, pois caso contrário a natureza seria realmente “vista como um estoque”. Olhem a volta: os objetos científicos circulam simultaneamente como sujeitos, objetos e discurso. As redes estão preenchidas pelo ser. E as máquinas estão carregadas de sujeitos e coletivos. Como é que o ente poderia perder sua continuidade, sua diferença, sua incompletude, sua marca?

Esse aspecto relacional, conectivo, heterogêneo, interdependente entre “as coisas” e os

humanos é o fundamento para a compreensão de um ecossistema comunicacional, cognitivo,

digital, cuja organização, por sua própria natureza, configura-se como redes dentro de redes,

tanto em seus aspectos materiais como formais e no seu entrelaçamento.

Falar em sistemas parece ir na direção oposta da TAR, no entanto, não temos como

propósito retomar uma distinção entre o todo e a parte, mas antes conciliar perspectivas a

partir de um sistemismo que se alimenta do atomismo e do holismo.                                                                                                                          69Disciplina proposta pelos professores Fernanda Bruno (UFRJ), Erick Felinto (UERJ) e Simone Pereira de Sá (UFF) para o primeiro semestre de 2012 e tema do seminário que será realizado em agosto de 2012, que levanta as seguintes questões: “O que os objetos têm a dizer (e fazer) ao pensamento? No recente campo da comunicação, a questão, que ecoa um imenso e antigo problema filosófico, só passou a ser enfrentada de modo mais sistemático a partir dos anos 1980, quando diferentes perspectivas retomam indagações que parte da tradição hermenêutica das humanidades obscureceu, tais como : o que é um meio e como se dão os processos de mediação? Em que aspectos as materialidades tecnológicas informam mundos culturais e condicionam formas de cognição? De que modos a dimensão material da experiência se conjuga com as dimensões imateriais da cultura? Em que sentidos as categorias do humano, do pensamento, do corpo e dos sentidos se reconfiguram em face das nossas relações com os objetos e as entidades inumanas?” (PROGRAMA DA DISCIPLINA, PPGECO/UFRJ, 1/2012)

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2.5 APRENDIZAGEM, CONECTIVIDADE E SEMIOSE

Admitiremos assim que a realidade é formada por sistemas abertos, tal que a conectividade entre seus subsistemas, com o consequente transporte de informação gera a condição em que cada subsistema é mediado ou vem a mediar outros, comportando-se como signo, de acordo com a proposta de Peirce. (VIEIRA, 2008, p. 29)

Seguindo as reflexões de Vieira, em sua proposta de que a Teoria Geral de Sistemas

possa desempenhar o papel de uma Ontologia Científica e lidar com sistemas de alta

complexidade (VIEIRA, 2008), buscamos relacionar propriedades sistêmicas como

permanência e conectividade na busca de uma melhor compreensão do conceito de

aprendizagem em rede. Para tal, abordaremos alguns parâmetros sistêmicos na perspectiva

dos autores adotados por Vieira (Bunge, Debigh, Uyemov, Prigoginne), relacionando-os com

a filosofia de Charles Sanders Peirce, admitindo a hipótese formulada na epígrafe acima.

2.5.1 Complexidade e aprendizagem em rede

Um agregado de elementos (qualquer que seja sua natureza) será um sistema S

quando, por definição, existir um conjunto de relações R entre os elementos do agregado de

tal forma que venham a partilhar propriedades comuns e coletivas (AVANIR UYEMOV apud

VIEIRA, 2008, p. 29). Considerando que os sistemas abertos realizam transporte de matéria,

energia e informação entre o interior do sistema e seu exterior, estes estarão sempre em

relação com outros sistemas, isto é, encontram-se envolvidos por um outro sistema, que é

denominado na Teoria de Sistemas de ambiente (VIEIRA, 2008, p. 30-33).

Admitimos a hipótese que a aprendizagem em rede pode ser compreendida como um

diagrama (um hipoícone diagramático70) de um sistema cognitivo de alta complexidade, que

                                                                                                                         70 O diagrama é um hipoícone diagramático, um primeiro de um segundo. Um ícone guarda uma similaridade com seu objeto, como não podemos apreender um ícone puro, podemos apreendê-lo em seu efeito em termos de secundidade. Dos três tipos de hipoícone: imagem, diagrama e metáfora, enquanto a imagem representa seu

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emerge a partir de condições complexas envolvendo aleatoriedade, estocasticidade e

caoticidade, na busca de uma “ordem a partir das flutuações” (PRIGOGINE apud VIEIRA,

2003. p. 291):

Aqui, o termo “ordem” é empregado como os físicos costumam fazer até hoje, englobando não só a ordem matematicamente definida, mas também a noção, mais complexa, de “organização”. É assim utilizado tanto para designar a ordem por simetria, sequenciamento, etc, como acontece na formação dos cristais, como para denotar as formas mais complexas de organização, com maior organicidade, como no caso dos sistemas vivos. Ou seja, Prigogine trabalhou principalmente com a rota que leva do que é entrópico ao que é organizado. [...] A expressão “flutuações” foi utilizada para falar de sinais complexos, sejam formas de ruído ou não... (PRIGOGINE apud VIEIRA, 2003, p. 291)

Estamos nos referindo, portanto, a um sistema adaptativo complexo, afastado do

equilíbrio, que lida com uma realidade que não é previsível, linear, ordenada e determinada.

Uma realidade que gera um ambiente em constante mudança que requer desse sistema

sensibilidade para reagir a tempo às constantes flutuações e buscar um novo estado de

metaestabilidade, se reestruturando e se reorganizando e, assim, sucessivamente. Um sistema

caracterizado pela diversidade e heterogeneidade de sua composição e de seus níveis de

funcionalidade e que, em sua relação com outros sistemas e subsistemas, constitui o sistema

ambiente onde “encontramos todo o necessário para trocas entre sistemas, desde energia até

cultura, conhecimento, afetividade, tolerância...” (VIEIRA, 2008, p. 34).

Se considerarmos que a mente coletiva é uma das propriedades emergentes desse

sistema, “um tipo de inteligência gerada pela interação entre os agentes em comunicação”

(SANTAELLA; LEMOS, 2010), e que esses agentes são heterogêneos, podemos equipará-lo

a um ecossistema, onde “elementos (ontologicamente, objetos) diversos em natureza podem

no entanto estar conectos por processos geradores de ação, no sentido de Bunge” (VIEIRA,

s/data, p. 15):

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           objeto por meio de suas qualidades e a metáfora representa por meio de uma similaridade encontrada em algo mais, o diagrama representa o objeto por um esqueleto, algo como um esboço de relações (STJERNFELT, 2007, p. 141).

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Vamos introduzir a seguir o conceito de ligação, conexão, ou junção entre os componentes de uma coisa. Nós precisamos distinguir entre uma simples relação, tal como aquela de ser mais velho, e a conexão tal como aquela de exercer pressão. Ao contrário da simples relação, a conexão faz alguma diferença ao seu relato, isto é, duas coisas são conectadas no caso em que pelo menos uma delas age sobre a outra – onde a ação necessária não consiste em terminar ‘alguma coisa’ mas pode consistir de eliminar ou abrir algumas possibilidades.

Por sua vez, nós dizemos que alguma coisa age sobre a outra se ela modifica a linha de comportamento da outra, a trajetória ou história. (BUNGE, 1979, p. 5)

A definição de ação de Bunge reitera a perspectiva de Latour (2005, p. 129 apud

SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 129) e sua definição de rede, a partir da TAR: “ redes não

designam algo lá fora que teria grosseiramente a forma de pontos conectados por linhas, algo

similar a redes de telefones, rodovias e esgotos, [...] Ela qualifica outro ator de fazer com que

outro ator faça coisas inesperadas”. Se um ator não faz diferença, não provoca desvios, ele

não é um ator. Estar conectado na internet, por exemplo, não significa formar uma rede, não

basta estar conectado, é preciso que a conexão resulte em uma ação, uma diferença, gere

transformação. Talvez aí resida o fato de que, nem sempre, o que designamos por redes de

aprendizagem, de fato, propicie ou potencialize um processo de aprendizagem em rede ou

vice-versa. Lembramos que a noção de actantes “corresponde a quaisquer espécies de figuras

dotadas da habilidade de agir, incluindo pessoas e objetos materiais: inscrições (quaisquer

coisas inscritas), artefatos técnicos, entidades sob estudo, conceitos, organizações, profissões,

dinheiro etc” (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 38).

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2.5.2 Conectividade e mediação

A capacidade que os elementos do agregado têm de estabelecer relações ou conexões,

isto é, a conectividade (VIEIRA, 2008, p. 34), é um parâmetro que surge ao longo da

evolução do sistema. É um parâmetro evolutivo que pode estar presente em um sistema e não

em outro ou pode surgir em algum tempo futuro. Nos termos de Bunge (considerando relação

e conexão como sinônimos), a conectividade exprime a capacidade de agir sobre algo, de

modificar sua linha de comportamento, a trajetória ou a história. Vieira (2008) nos lembra que

“a conectividade pode ter um caráter seletivo, ou seja, sistemas complexos podem agregar

certos elementos e negar ou excluir outros, na medida em que isso importe para a sua

permanência”.

A aprendizagem em rede pressupõe uma ecologia cognitiva, comunicacional e digital,

isto é, uma diversidade de subsistemas heterogêneos integrados que compartilham

propriedades, gerando um padrão ecossistêmico de organização, o padrão de rede (CAPRA,

1995). Conexão e transporte de informação são fundamentais para a compreensão desse

sistema, “a informação, sob a forma de diferenças sensíveis em algum nível (BATESON,

1980, p. 32) faz a mediação entre entidades de natureza diversa” (VIEIRA, s/data, p. 3). Nesse

ponto, incluímos a noção de semiose de Peirce para pensar a aprendizagem em rede como

uma rede semiótica, “as cognições são, consequentemente, nós na rede semiótica ilimitada”

(PEIRCE, CP 5.253). A rede é como uma extensão, uma extrasomatização de nosso sistema

nervoso central para o mundo, conectando um coletivo de homens e coisas. A ação que

mantém o sistema conecto pode ser compreendida com a mediação dos signos realizada na

geração de interpretantes em uma cadeia infinita, a semiose.

A permanência do sistema no tempo dependerá em manter seus elementos conectos,

essa capacidade é denominada de coesão. Segundo Vieira (s/data, p. 38), a coesão está

próxima em semiótica ao conceito de sintaxe, conjunto de regras que subjaz às relações.

Relações que precisam ter um “compromisso entre rigidez e flexibilidade de modo que o

sistema possa permanecer e possa suportar as crises” (VIEIRA, s/ data, p. 4). Essa auto-

organização é revelada em subconjuntos de elementos que sofrem alta conectividade,

permitindo a emergência de subsistemas, o que diminui o número de conexões e não permite

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que o sistema torne-se rígido demais. A configuração por meio de subsistemas é expressa pelo

parâmetro da integralidade. Para Denbigh (1975, p. 87 apud VIEIRA, 2008, p. 39), a

integralidade já é o grau de organização. A integralidade permitirá a emergência de

propriedades partilhadas entre os subsistemas, o que é denominado por funcionalidade.

No contexto da computação e informática, por exemplo, podemos compreender o

computador como:

Uma coleção de níveis funcionais, desde o nível mais baixo, do hardware e da linguagem da máquina, até os mais altos, como o do processo de interação homem-máquina, da interface ou interatividade – nos níveis intermediários, encontram-se entidades como o sistema operacional, os aplicativos, os arquivos. Todos funcionam de maneira coordenada, e cada nível tem uma relação paradoxal com o próximo (acima ou abaixo); em certa medida, ele é independente (podem-se utilizar diferentes sistemas operacionais sobre um mesmo hardware, por exemplo), mas também depende diretamente dele (se faltar energia para o hardware, o sistema operacional para de funcionar imediatamente). É como se cada camada, ou nível, tivesse uma relação dual, de dependência e independência, em relação ao seu contexto. Cada nível dá suporte para o próximo, mas também é influenciado por ele. (VASSÃO, 2010, p. 26-27)

Podemos supor que, na relação ou conexão homem-máquina, há também um

funcionamento coordenado relativo aos diversos níveis descritos acima, que se manifestam

em termos de modalidades diversas de interatividade e pela emergência de ações seja no

plano político, da sociabilidade, cognitivos, culturais, afetivos, apresentando diversos graus de

coesão que possibilitam a permanência do sistema no tempo. Temos uma integração das

ecologias cognitivas, comunicacionais e digitais, cujas propriedades partilhadas são

fundamentais para que permaneça a aprendizagem em rede, como um processo que atua como

um mapa isomórfico de um sistema cognitivo externalizado, distribuído e organizado como

rede.

Podemos citar a evolução para a conectividade always-on, onde a cultura da

mobilidade mistura o ciber e o físico (SANTAELLA, 2007), criando um fluxo de signos

textuais, imagéticos, sonoros que invadem a atmosfera com nuvens de dados acessíveis de

qualquer lugar e a qualquer hora. As conexões estabelecidas adquirem essa tessitura viva de

laços fortes, fracos, indiferentes que entrelaçados adquirem a rigidez e flexibilidade do

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bambu, que se inclina ao sabor dos ventos sem quebrar amparados pela estrutura rizomática71

de suas raízes, “o fio invisível que se multiplica entrelaçando consciências, espaços,

perguntas, desejos” (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 55). A mobilidade, pervasividade e

ubiquidade dos dispositivos digitais de última geração aumentaram os graus de conectividade

e de sociabilidade, no entanto, dependem da integralidade de subsistemas políticos (definição

de políticas e padrões de banda larga, por exemplo), econômicos (commons digitais x

propriedade intelectual) e culturais (cultura livre e aberta, compartilhamento, colaboração)

para sua permanência.

Se a conectividade exprime a capacidade de estabelecer relações, definindo graus de

coesão e uma consequente estrutura do sistema, ou seja, o número de relações estabelecidas

no tempo, o sistema como um todo (a rede) será apreendido por sua organização: “um sistema

será dito organizado quando for composto por subsistemas conectados por relações efetivas

(DENBIGH, 1975, p. 87) com graus variados de importância tanto nos subsistemas quanto

nas conexões, gerando uma totalidade dotada de propriedades irredutíveis aos subsistemas ou

elementos” (VIEIRA, 2008, p. 43). À organização está associada a característica de coerência,

que confere significação ao sistema, da sentido as partes. Vieira (s/data, p. 5) correlaciona as

características de coesão e coerência do sistema e os sinais que emite com a hipótese de uma

gramaticalidade, isto é, estas propriedades conferem ao sistema o caráter de texto e implicam

na produção de linguagem.

Dado o caráter de complexidade, que o sistema vai adquirindo, cresce a dificuldade de

definir com rigor lógico os parâmetros sistêmicos (VIEIRA, s/data), principalmente, em

sistemas culturais, comunicacionais, semióticos, que unem “o físico e o psíquico, o corpo e a

mente, o natural e o artificial, o biológico e o tecnológico, a carne e a alma” (SANTAELLA,

s/data, p. 4). Contudo, se admitirmos que a linguagem é sinônimo de pensamento, podemos

apreender de um sistema cognitivo organizado no padrão rizomático de rede “a constituição

de uma nova linguagem, uma espécie de ecologia dos signos, cujo DNA se encontra nas

hipersintaxes híbridas que nascem das misturas inconsúteis de uma diversidade de sistemas de

                                                                                                                         71 O conceito de rizoma (DELEUZE; GUATARRI, 2000) é aplicado na compreensão da estrutura da linguagem hipermídia e da forma de organização da rede. Este conceito será desenvolvido em capítulo próprio que aborda o conceito de rede e de linguagem hipermídia. Por hora, a coesão do sistema estará diretamente relacionado com o uso criativo da linguagem hipermídia e da forma como essa estrutura favorecerá a organização do sistema em rede.

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signos, ou seja a mais híbrida de todas as formas híbridas de linguagem” (SANTAELLA,

2010, p. 87), a linguagem hipermídia.

O que circula e mantém coeso esse sistema são os signos e suas mediações, resultante

de um intenso processo de tradução intersemiótica entre os diversos níveis funcionais desse

sistema. Para que a tradução ocorra são necessários canais e linguagens que permitam a

circulação e o intercâmbio de mensagens e a criação de sistemas de sinais que se articulem

com os órgãos emissores-receptores. As tecnologias em rede, acionadas pelos agenciamentos

dos sujeitos, possibilitaram o aumento do fluxo de informações, da interatividade, a

ampliação o rompimento das barreiras de tempo e espaço, e facilitaram a ocorrência de

interações multidirecionais, proporcionando tanto a emergência da aprendizagem em rede,

como originando um ambiente onde surgem as condições para sua permanência.

Segundo Vieira (2008a, p. 21), para um sistema aberto em determinado ambiente

permanecer no tempo este deve apresentar três capacidades:

(a) sensibilidade, no sentido de reagir adequadamente e `a tempo `as variações ou diferenças que ocorrem nele mesmo ou no ambiente, isto é, aos fluxos de informação;

(b) função memória, função desenvolvida ao longo do tempo, relacionada a capacidade de reter parte desse fluxo e gerar relações que possibilitem conectar passado, presente e um futuro possível com coerência com a realidade, o que na filosofia de Peirce podemos associar com o conceito de hábito;

(c) a capacidade de elaborar a informação retida, na medida de suas necessidades, isto é, a capacidade de uma mente de gerar interpretantes de todas as naturezas, sua capacidade de aprender.

Comparando estas condições com as condições necessárias para a permanência de um

sistema cognitivo, que tem na aprendizagem em rede e na emergência de mentes coletivas o

potencial para gerar a autonomia para interagir e evoluir junto com este sistema ambiente,

propomos as seguintes hipóteses:

(a) a sensibilidade para reagir adequadamente e a tempo a uma realidade onde predomina a

aleatoriedade, estoscacidade e caoticidade é dada a partir de uma Umwelt caracterizada pela

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110  

 

proliferação acelerada de signos (um reino de signos, a semiosfera), que origina a emergência

de um conectividade seletiva entre entidades heterogêneas (homens e objetos), possibilita a

emergência de uma mente coletiva, a integralidade por meio de subsistemas como o

ecossistema cognitivo, comunicacional e digital e origina um padrão de organização baseado

na interdependência, interconectividade e interatividade, o padrão de rede;

(b) a função memória está relacionada com o surgimento de uma memória complexa

externalizada, um tipo de memória temporária, fluida, dispersa e coletiva, adequada à

natureza de um sistema no qual informação e conhecimento encontram-se em um constante

fluxo reticular materializada em dispositivos técnicos e em uma rede de conexões. Podemos

destacar além das memórias físicas dos hardwares, arquivos e rastros digitais e softwares de

gerenciamento e busca de dados, os filtros explicitados no conceito de mindful attention de

Rheingold (2009; 2010): uma ferramenta psicossocial-técnica que necessitamos para

encontrar nosso caminho on-line, uma combinação de mente-máquina, da habilidade de poder

de atenção do cérebro e o poder computacional de filtrar (Anexo 1); a arquitetura dos

softwares e da linguagem hipermídia também configuram padrões cognitivos e culturais, onde

a predominância dos signos icônicos e a estrutura rizomática conduz para uma abertura ao

acaso, ao surgimento do leitor imersivo e do leitor ubíquo, bem como para uma

tendencialidade expressa em dinâmicas cognitivas que surgem como padrões culturais

interdependentes como a cultura da participação, da partilha e da colaboração, hábitos ou

modos de conduta vinculados `a cultura digital;

(c) por fim, a capacidade de elaboração da informação pode ser associada aos hábitos ou

modos de conduta que geram estratégias para uma elaboração eficiente do estoque de

informação em flexibilidade e em temporalidade necessárias para permitir a permanência

eficiente em um ambiente em constante e acelerada mudança, bem como, propiciar a própria

evolução do sistema, na medida em que esses padrões são coerentes com uma realidade regida

pela mutação acelerada. A cultura da participação, do compartilhamento, e colaboração, como

hábitos indissociáveis que emergem e integram a ecologia digital, a ecologia comunicacional

e a ecologia cognitiva originam ambientes onde predomina a cultura aberta, do remix, dos

commons digitais, do produtor/consumidor, da convergência de áreas, do uso de linguagens

híbridas, do incremento da capacidade de tradução intersemiótica, etc, e possibilitam a

aprendizagem em rede.

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111  

 

Essas ideias estão sintetizadas nas Figura 12 e 13 e serão melhor exploradas no

próximo capítulo e no estudo de caso. Adotamos como visualização a metáfora da estrutura

tetraédrica do carbono, Figuras 10 e 11:

Figura 10: Imagem obtida pelo captura da tela do software interativo disponibilizado no site www.uff.br/cdme/platonicos/platonicos-html/tetraedro-br.html, que possibilita a visualização tridimensional do tetraedro, incluir esferas circunscritas e inscritas, planificar e girar o polígono.

Fonte: Arquivo pessoal

Figura11: Molécula do Metano (CH4)

Fonte: Arquivo pessoal

O carbono é um elemento produzido pelas estrelas em uma de suas fases de evolução,

possui alto grau de conectividade (devido à natureza híbrida de suas ligações químicas),

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domina a constituição dos organismos e é promissor das formas de organização de

autopoiesis, de auto-organização. É, quimicamente e físico-quimicamente falando, ideal para

complexidade biológica (VIEIRA, 2008c). Possui uma proximidade com o elemento silício

(associado com a vida artificial e tecnologias computacionais) por possuir uma distribuição

eletrônica semelhante nos níveis mais energético (ns2 np2), o que implica na partilha de

comportamentos fisíco-químicos semelhantes.

Tomamos por analogia a capacidade de alta conectividade devido ao hibridismo de

suas ligações químicas, o que permite a formação de cadeias simples como o metano (CH4) à

complexidade do DNA. A diversidade que se origina a partir dessa propriedade é expressa

numa infinidade de compostos orgânicos e um número mais reduzido de compostos

inorgânicos, mas essenciais aos processos metabólicos como o CO2 e o H2CO3 (responsáveis

pelo equilíbrio do pH no sangue). Sua presença nas estrelas e nos organismos vivos, o fato de

ser fonte de energia como carvão ou o butano pode ser compreendido como uma metáfora da

aprendizagem em rede e dos diversos subsistemas que compõe uma ecologia digital,

comunicacional e cognitiva, bem como, a emergência da mente coletiva como uma

propriedade compartilhada e que provê coerência a um sistema baseado na interconexão entre

todas as coisas, em uma educação relacional. Por sua vez, o tetraedro é um poliedro convexo

regular, pois suas faces são polígonos regulares e congruentes entre si e o número de faces

concorrentes em cada vértice é sempre o mesmo. No caso do tetraedro, cada vértice é

congruente com três faces formadas por triângulos equiláteros. Essa multiplicidade de

relações triangulares, que se integram em uma outra forma, é utilizada como analogia para

representar as relações triádicas entre os diversos elementos que constituem a aprendizagem

em rede.

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Figura 12: As quatro faces do tetraedro

Fonte: Arquivo pessoal

Figura 13: Tetraedro planificado contendo uma esfera cirunscrita (semiosfera) e uma esfera inscrita (aprendizagem em rede)

Fonte: Arquivo pessoal

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2.5.3 Aprendizagem e semiose

Aprendizagem não é acumulação de informações, mas resultado de um processo de transformações, de mudanças estruturais a partir de ações e interações provocadas por perturbações a serem superadas. E a aprendizagem progride mediante fluxos dinâmicos de trocas, análises e sínteses auto-reguladoras cada vez mais complexas. (MORAES, 2008, p.255)

Aprender é uma atividade inerente e condição da permanência dos sistemas no tempo,

da vida. A condição de adaptabilidade e sobrevivência dos seres sensíveis, do planeta, do

universo depende dessa habilidade lógica, intimamente ligada à cognição e à ação inteligente,

capaz de gerar “a autonomia que um sistema necessita para elaborar, adequadamente, seu

meio ambiente, criar estoques de informação e função memória e assim, permanecer”

(VIEIRA, 2008a, p. 16). A permanência é a tendência que as coisas têm em durar, em ser. A

necessidade de permanência leva à mutação, o que conduz ao domínio ontológico da

evolução.

A evolução manifesta-se na histórica particular de cada espécie por meio do

desenvolvimento de uma interface entre o sistema vivo e a realidade, a Umwelt. Interface

responsável pela codificação das diferenças originadas na realidade, ou ontologicamente

falando, codificação de informação, e que permite ao sistema apresentar um comportamento

coerente com o real e, assim, permanecer na sua capacidade de interagir com o meio e evoluir

com e a partir dele:

O que chamamos aqui de diferença é a base ontológica do conceito de informação. Informação como diferença, que pode ser entendida como objetiva e/ou como aquela que é percebida e elaborada por um sistema cognitivo, logo com um certo teor de subjetividade. Diferenças podem estar associadas às distribuições espaciais na organização de um sistema ou podem surgir ao longo do tempo, na evolução de uma propriedade do mesmo. Este último caso constituem os sinais, sistemas também organizados de alta temporalidade, que acabam gerando os sistemas fenomênicos parcialmente percebidos por algum sistema receptor. (VIEIRA, 2008, p. 78)

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O meio ambiente, que cada espécie elabora, é seu “universo particular” ou Umwelt,

conceito criado pelo biólogo Jacob von Uexküell (1992) para definir “o segmento ambiental

de um organismo, que é definido por suas capacidades específicas da espécie tanto receptoras

quanto efetoras” (UEXKÜLL, 2004, p. 22). No que diz respeito à espécie humana, Vieira

(2007a; 2008) aponta para uma dilatação da Umwelt biológica. Buscamos permanecer para

além de uma evolução orgânica por meio da produção de signos psicossociais e culturais,

elaborando uma Umwelt expandida, que resulta na criação de representações que atuam como

“mapas isomórficos entre a organização da realidade e a organização cerebral, mental do

sistema cognitivo, permitindo aos sistemas uma eficiência para permanecer (VIEIRA, 2007b,

p. 100). O autor correlaciona esta Umwelt dilatada à noção de semiosfera, oriunda da

semiótica da cultura de Lotman (1992), conceituando-a como “a dimensão semiótica que

contém todos os processos de comunicação e de fluxos de informação, em uma dinâmica

típica dos sistemas abertos” (VIEIRA, 2007b, p. 100). Deixa clara a compatibilidade desta

noção com a ontologia sistêmica que adota, de Bunge (1979), e o fato de não limitar a

existência de uma semiosfera e da semiose a um universo abstrato, mas assumindo a hipótese

de objetivismo realista crítico72, considera que há uma continuidade entre os sistemas

culturais e os sistemas ditos materiais ou concretos.

A evolução da Umwelt humana, apreendida na extrassomatização da percepção e da

memória em dispositivos materiais ou meios de codificação das variações ambientais (ou

informação), de seleção e armazenamento (filtro e estoque relacionados com a função

memória) e internalização do fluxo de informações e sua elaboração (meios de processamento

e decodificação), produção e reprodução da linguagem, encontra-se relacionada diretamente

com a representação da realidade objetiva por um universo sígnico em contínuo crescimento e

expansão:

O aspecto fundamental desta semiose (a ação do signo) é que a tradução depende da natureza do sistema cognitivo e de sua história evolutiva. Ao longo dos bilhões de anos que caracterizam a evolução da vida em nosso planeta, as várias espécies desenvolveram maneiras por vezes bastante peculiares de perceber a realidade e a ela adaptar-se. Maneiras que variam de espécie a espécie, de história a história. É como se cada ser vivo estivesse

                                                                                                                         72 Hipótese gnosiológica que adota a crença em uma realidade externa que pode ser independente de sistemas cognitivos nela imersa. (VIEIRA, 2008, p. 48)

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envolvido em uma “bolha fictícia”, que constitui a interface desenvolvida pela evolução para gerenciar a adaptabilidade e sobrevivência do sistema. [...]

Do ponto de vista do realismo crítico, não podemos esquecer que a construção evolutiva de um determinado Umwelt nasce do embate direto com a realidade: esta interface possui, assim, um extremo diretamente ligado ao nível ontológico da física (na construção dos canais de percepção) e outro extremo, bem mais interno ao sistema do sujeito, que contém a dimensão da subjetividade. Os dois extremos são conectados pelo sistema nervoso central. (VIEIRA, no prelo apud VIEIRA, 2008, p. 100)

Santaella (2002), no texto A Semiosfera como síntese entre a fisio, bio, eco e

tecnosfera, discute o conceito de semiosfera à luz da noção de semiose e do sinequismo de

Peirce, a partir dos quais leva a cabo uma sustentação filosófica e metafísica para o modelo de

entendimento dos processos evolutivos como manifestações da mente. O conceito de mente

de Peirce é um conceito alargado, vai muito além de pensá-lo como um fenômeno interno da

caixa craniana humana. A mente encontra-se espalhada pelo universo:

De fato, para Peirce, as funções da mente não se restringem aos seres humanos (CP 1.269), nem se limitam ao reino biológico, pois não apenas qualquer organismo biológico tem mente, mas também máquinas, tais com computadores podem ter mentes. Como seu conceito de mente está subordinado aos princípios gerais da causação final, haverá mente onde houver triadicidade; onde houver tendência para aprender, para o crescimento, ou evolução, aí haverá mente, não importando quão rudimentar essa ação possa ser (SANTAELLA, s/ data, p. 7-8).

A mente é essencialmente um fenômeno externo (CP 7.364) governado por um modo

de ação universal, a causação final. A causação final é uma ação típica da terceiridade,

expressa na lógica da semiose. É a ação exercida por leis, de caráter processual e que

direciona uma sequência de eventos para um fim, sem, no entanto, determinar um modo

particular de vir a ser. Manifesta-se como uma tendencialidade para adquirir hábitos, diz

respeito a um modo geral de existência, a um coletivo, um todo. Esta contida na concepção de

Peirce de lei como um poder da vida fundado na peculiar concepção de hábito que abarca o

acaso, o crescimento e a evolução (SANTAELLA, 1999, p. 505).

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Peirce nomeia como continuidade o modo de ser de um todo, e não dos individuais,

que compõe uma pluralidade, manifesta em leis gerais que podem ser apreendidas nos

fenômenos do universo material, na forma de hábitos adquiridos que regem a conduta das

coisas existentes. O sinequismo é o termo adotado por Peirce para nomear a teoria da

continuidade (IBRI, 1992), uma propensão ou disposição para adquirir novos hábitos, ela

mesmo um hábito (CP 6.612). A tendência de adquirir hábitos é uma lei da mente,

característica que se encontra presente no universo físico, do cosmo ao protoplasma. Peirce

postula a existência de uma unidade no universo, onde a diferença entre o fenômeno mental e

o natural, seria apenas de grau (CP 7.463).

Em contraste, aquilo que chamamos de matéria é mente tão cerrada de hábitos, tão regular que ela cessa de exibir o mesmo comportamento espontâneo que é tão abundante na mente (CP 6.25, Reynolds 1996: 4-5-406). Enquanto mente é anárquica, a matéria é obediente à lei. Entretanto, a mente humana e a matéria física não são apenas os dois extremos de um espectro muito sutil e complexo de diferenciações na flecha do tempo contínua que constitui a natureza. (SANTAELLA, 2002, p. 8)

Para Peirce, existem duas ações operativas no universo: a ação diádica ou causação

eficiente e a ação triádica ou causação final. A ação diádica encontra-se embutida na triádica,

mas não é processual, diz respeito ao aqui e agora, ao instante singular. É ação bruta cega,

relativa ao que é factual, gerando eventos que configuram uma realidade individual, uma

singularidade, está relacionada com a categoria da secundidade. Há uma interdependência

entre causações finais e eficiente: “causação final sem causação eficiente é desesperança, mas

causação eficiente, sem causação final é pior do que desesperança; ‘pois ela é mero caos, e

caos, sem causação final, não é nem mesmo algo como caos, mas é um nada completo’ (CP

1.220)” (SANTAELLA, 2002, p. 6).

Vieira (2003, p. 2) relaciona a causação final no domínio humano com

intencionalidade e na física dos sistemas dinâmicos não lineares e afastados do equilíbrio, o

que envolve a classe das estruturas dissipativas (PRIGOGINE, 1980), com os atratores, uma

entidade topológica presente no espaço histórico que descreve o sistema e que parece atrair as

órbitas históricas deste, fazendo-as convergir para o seu domínio, criando condições para que

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ocorra uma ordem nas flutuações. Flutuações que estão relacionadas com o acaso, com as

características presentes na primeiridade, onde não há ação, apenas talidade e caráter

(SANTAELLA, 2002, p. 5). Elemento de espontaneidade responsável pela diversidade como

um princípio que atua na natureza, denominado como tiquismo:

A natureza não é regular. Nenhuma desordem seria menos ordenada que o arranjo do existente. É verdade que existe as leis especiais e as regularidades são inumeráveis; mas, ninguém reflete sobre as irregularidades que são infinitamente mais frequentes. (CP 5.342)

São essas irregularidades que afastam qualquer ideia de determinismo causal do

mundo. Na complementaridade entre tiquismo e sinequismo, Peirce encontra o caminho para

explicar “o caráter evolutivo de todas as leis, um caráter que deriva delas serem submetidas ao

crescimento e à mudança. Assim sendo, há três elementos operativos no mundo: primeiro, o

acaso; segundo, a lei; e terceiro, a tendência a adquirir novos hábitos” (SANTAELLA, 2002)

A tendência para aquisição de novos hábitos é a natureza própria da lei da mente, a tendência

a generalizar e formar associações, o que é próprio da terceiridade e também a essência da

aprendizagem.

De Tienne (2007) argumenta que, na ideia de aprendizagem, estão incluídas a ideia de

crescimento e de desenvolvimento e, portanto, a ideia de processo. O que significa pensar que

existe uma relação essencial entre aprendizagem e o fluxo do tempo, bem como, a

aprendizagem e continuidade, portanto, semiose: “Todo fluxo do tempo envolve

aprendizagem; e toda aprendizagem envolve o fluxo do tempo [...] toda apreensão de

continuidade envolve uma consciência de aprendizagem.” (CP 7536); e ainda, “A consciência

de um processo é o que eminentemente caracteriza a cognição.” (CP 1.381).

A aprendizagem como semiose é tanto uma questão de aumento da habilidade do

sujeito para compreensão de signos, como uma questão do aumento do campo de

interpretação através do teste da experiência (DE TIENNE, 2007, p.86):

Assim que um teste força sobre nós uma nova interpretação, esta interpretação, uma vez completada, se torna parte de nossa ‘experiência

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colateral’ e pode servir para aumentar o poder de um signo. Uma razão pela qual nós nunca cansamos de reler bons trabalhos é, que, a cada leitura, continuamos a experimentar a vida em toda a sua variedade e a cada experiência aumentamos nossa sensibilidade aos signo. Sensibilidade aumentada significa interpretabilidade aumentada, e vice-versa. Potencialmente, não há nenhum limite para esse processo.

Assim, nós podemos começar a ver o que chamamos de aprendizagem; vaga mas seguramente, ela deve estar conectada, com qualquer aparência que possa ter, a uma ‘semiótica’ crescente (de maneira geral), a uma crescente abertura para todo o tipo de signos, não só do ponto de vista de seu reconhecimento e interpretação, mas também do ponto de vista da própria criação e refinamento. Porque dentro da relação sígnica os interpretantes têm o poder para re-formar os signos que os determinam, tanto para preservar quanto para intensificar esta determinação por causa do objeto.

2.5.4 Aprendizagem em rede como um processo evolutivo

O conceito de rede como um trabalho de tradução (LATOUR, 1994; 2005) confere

uma natureza dinâmica e processual à rede de associações originadas a partir da ação de cada

actante sobre um outro actante, ocasionando desvios, operando diferenças, fazendo proliferar

os mediadores. A rede é circulação da diferença, na medida em que a ação (como mediação)

cessa, a rede se estabiliza e tal qual uma mente ressecada, adquire cada vez mais uma

materialidade, contornos definidos. As inscrições, esses rastros deixados pela ação, matter of

facts (LATOUR, 1994; 2005) ou em termos peirceanos, signos indiciais, é o que transporta a

ação, funcionam como veículos de transporte e, por essa razão, é que permitem retraçar as

associações. Relativo ao conceito de índice em Peirce, Santaella (1995, p. 161) exemplifica o

modo de ação dessas inscrições:

De fato, o índice funciona como um veículo de transporte, alertando e conduzindo o receptor diretamente para seu objeto. É assim que Sherlock Holmes, por exemplo, incomparável mestre na arte de se transportar dos índices para os objetos, consegue distinguir tipos de cinzas de diferentes charutos para chegar com precisão, por meio de uma cadeia de índices, ao exato fumante daquele exato charuto, no exato lugar em que o fumou, num exato tempo passado.

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Aqui temos a causação eficiente, a ação diádica, mas o que seria dela sem a causação

final? Sherlock Holmes ficaria perdido sem o trabalho de tradução que realiza a partir e com

as cinzas e que possibilita uma cadeia de associações na geração de outros interpretantes.

Quando multiplicamos os rastros pela digitalização e potencializamos o transporte da ação em

uma intrincada e complexa rede que envolve sujeitos humanos e objetos técnicos,

possibilitamos que o fenômeno mental distribuído no mundo adquira na rede a complexidade

e plasticidade do pensamento humano, este é o intricado resultado da associação entre

humanos e artefatos técnicos:

Como sugerem Serres (1992) e Latour (1994a), os termos quase-sujeitos e quase-objetos lhes seriam mais adequados e caberiam para designar tanto os homens quanto os artefatos técnicos, ora um ora outro, já que os primeiros não são inicialmente ou prioritariamente sujeitos, mas quase-sujeitos ou mesmo quase-objetos, pois que são constituídos também pelo artefatos técnicos. Estes por sua vez, não são completamente objetos, mas quase, pois não são inteiramente passivos e submetidos à ação e inteligência humana, mas sobre elas atuam, intervêm e engendram deslocamentos e transformações, podendo ser também concebidos como quase-sujeitos. [...] (BRUNO, 2012 p.11).

A aprendizagem em rede potencializa a geração de interpretantes, a ação inteligente,

pela emergência da mente coletiva, uma propriedade partilhada entre os diversos elementos

humanos e não-humanos, contribuindo para “a emergência de habilidades cognitivas que não

estavam antecipadas em parte alguma” (BRUNO, 2012, p.10). Esse complexo sistema age no

sentido de promover a auto-organização do sistema/rede em sua interação com um ambiente

caótico, heterogêneo e imprevisível da atualidade. A mente coletiva é expressão da lógica da

semiose, como um princípio contido na evolutiva e crescente “abertura para todo tipo de

signos”. Os conceitos de causação final e semiose nos auxiliam a pensar o conceito de mente

coletiva como uma manifestação de processo evolutivo amplo, vamos seguindo o fluxo do

pensamento de Santaella (2002, p. 13):

Como se pode ver, o conceito peirceano da mente como sinônimo de causação final e expresso na lógica da semiose, é um conceito muito amplo e liberal. Mas é justamente essa liberalização que coloca esse conceito em sintonia com algumas das mais recentes preocupações na física, biologia,

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inteligência artificial e o habilita para nos auxiliar a pensar as revoluções tecnológicas atuais que funcionam não apenas como amplificações de nossas funções corporais e de nossas capacidades perceptivas e sensórias, mas também de nossas forças cerebrais. O modelo lógico básico da semiose, que se expressa na definição de signo, não é apenas um modelo para a descrição da mente, pensamento, inteligência, continuidade e crescimento, ele é também consequentemente um modelo para o entendimento da evolução, visto que Peirce acreditou que processos evolutivos em geral são manifestações da mente, entendida no sentido alargada que ele deu a essa palavra. O que, na época de Peirce, soava como um aparente absurdo, é exatamente aquilo que está soando como mais atual no debate contemporâneo sobre a nova antropomorfia pós-humana.

Pierre Lévy (2000, p. 61) caracteriza essa etapa da evolução humana como uma meta-

evolução, uma evolução cultural que se inicia com os códigos do DNA e evolui até o

ciberespaço, unindo os reinos biológicos, da linguagem e da cultura e que deu suporte ao

aparecimento de um “aprendizado ou inteligência coletiva”. Inteligência que ocorre ao nível

da escala geológica das espécies, dos ecossistemas e do processo evolutivo global, fruto de

uma crescente intensificação e diversificação dos processos comunicacionais em tempo real e,

consequente, aumento da interconectividade. Por sua vez, a abordagem da semiosfera como

semiose, proposta por Santaella (2002, p. 11), vai um pouco além para “cobrir todos os

domínios que vão do físico, passam pelo ecobiológico, até o domínio do antropológico,

cultural e tecnológico”, concebendo uma “continuidade que existe entre a mente humana e

outros processos envolvidos por um propósito”, por uma ação inteligente:

Onde houver tendência para aprender, para processos de autocorreção, para mudanças de hábitos, onde houver ações direcionadas para um fim, haverá inteligência, onde quer que ela ocorra: no grão do pólen que fertiliza o óvulo de uma planta (W1: 333), no voo de um pássaro, no sistema imunológico, em um robô, na perversidade do inconsciente, ou na razão e ações humanas. (SANTAELLA, 2002, p. 12)

A mente como um fenômeno da terceiridade pode ser compreendida como uma mente

coletiva, afinal a causação final como uma forma geral de qualquer processo não está

relacionada a uma mente específica, “uma causa final deve ser concebida como operando sem

ter sido o propósito de qualquer mente” (CP 1.204), é um princípio presente na unidade do

universo. O processo de auto-geração de interpretantes é um processo contínuo, de início não

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determinado e que tende para um infinito, auto-corrigido pela ocorrência do acaso como um

princípio real responsável pelo afastamento do fato em relação a lei (IBRI, 1992, p. 52),

somado ao embate com a realidade, o que nos remete ao fabilismo: “ a doutrina de que nosso

conhecimento nunca é absoluto, mas é como se sempre flutuasse em um continuum de

incerteza e indeterminação” (CP 1.171). “Acaso, pura possibilidade, e ação dinâmica bruta,

mediadas por um princípio geral, um princípio guia, unindo infinito, acaso, com o segundo

infinito, ação cega, constituí a tríade dentro da qual a causação final se move”

(SANTAELLA, 2002, p. 10).

A trajetória desenvolvida até aqui permite retomar o que já havíamos anunciado no

primeiro capítulo sobre a relação da aprendizagem com os princípios da mutação (I Ching)

que, ao estabelecer que toda mutação supõe um ponto constante que lhe sirva de referencial,

alerta que “ o problema consiste agora em escolher o seu próprio ponto de referência de

modo a que coincida com o ponto de vista do vir a ser cósmico” (SANTAELLA, 2002) e com

o fato de que “a essência da aprendizagem consiste tanto na apreensão da tendência geral que

sugere uma direção para o futuro quanto na implementação criativa, ou atualização desta

sugestão percebida, [...] a aprendizagem é uma característica do universo e cresce dentro dos

limites de um plano geral e condicional” (SANTAELLA, 2002, p. 10)

Para complementar, retornamos à concepção de ação do signo ou semiose. Peirce

concebe o signo como corporificação do pensamento, o signo é mediação ou relação triádica.

Para melhor compreender esta definição de signo, é preciso ter em mira as categorias que

estão na base de todo o seu edifício filosófico, a fenomenologia ou faneroscopia73, onde todos

os fenômenos podem ser compreendidos a partir de três elementos gerais indecomponíveis:

qualidade, reação e mediação, respectivamente, relacionados com as categorias de

primeiridade, secundidade e terceiridade.

Realmente, uma representação necessariamente envolve uma tríade genuína. Pois envolve um signo, ou representante, de algum tipo, externo ou interno, mediando entre um objeto e um pensamento interpretador. Isto não é nem

                                                                                                                         73 Ciência que se propõe efetuar um inventário das características do faneron ou fenômeno (IBRI, 1992) : “...por faneron entendo o total do coletivo de tudo aquilo que está de qualquer modo presente na mente, sem qualquer consideração se isto corresponde a qualquer coisa real ou não.” (CP 1.284)

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uma questão de fato, uma vez que o pensamento é geral, nem é uma questão de lei, visto que o pensamento é vivo. (MP 1.480)

Retemos aqui o papel do signo em sua função mediadora entre o objeto e o

interpretante. O poder do signo está em gerar uma cadeia semiótica, onde signos-

interpretantes geram outros signos-interpretantes num processo infinito, sem que se perca a

relação originária com o objeto, relação, por sua vez, que é mantida pelo poder de

autogeração do signo de interpretantes:

Trocando em miúdos: a ação lógica do objeto é a ação do signo. E a ação do signo é funcionar como mediador entre o objeto e o efeito que se produz numa mente atual ou potencial, efeito este (interpretante) que é mediatamente devido ao objeto através do signo. A mediação do signo em relação ao objeto implica a produção de interpretante que será sempre, por mais que a cadeia dos interpretantes cresça, devido à ação lógica do objeto, a ação mediada pelo signo. (SANTAELLA, 1995, p. 39)

Os efeitos produzidos numa mente, isto é, os interpretantes, eles mesmo um outro

signo, estão diretamente relacionados com as três categorias e podem ser extraídos destas.

Recorremos a Santaella (1995, p. 101-102) para apresentar uma síntese da primeira

classificação dos interpretantes realizada por Peirce, a tríade interpretante imediato, dinâmico

e final relacionados, respectivamente, com as categorias de primeiridade, secundidade e

terceiridade:

Numa formulação das mais sintéticas, Peirce dizia que o signo tem três interpretantes: “seu interpretante como representado ou tido em vista (meant) para ser entendido; seu interpretante como ele é produzido e seu interpretante em si mesmo” (CP 8.333) A tríade corresponde ponto a ponto às três categorias. O imediato é primeiridade, uma possibilidade inscrita no signo para significar; o dinâmico (interpretante produzido), secundidade, é o fato empírico da interpretação ou resultados factuais do entendimento do signo; o final é terceiridade, uma regra um padrão para o entendimento do signo. O processo de interpretação de um signo genuíno incorpora necessariamente esses três momentos e, `a maneira das três categorias, o primeiro prescinde do segundo e terceiro, o segundo precisa do primeiro e o terceiro precisa do segundo e do primeiro. Os interpretantes imediato e final são interpretantes in abstracto e o dinâmico é interpretante in concreto.

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Nessa medida, todos os fatos empíricos de decifração de um signo são interpretantes dinâmicos. O interpretante final é aquilo para cuja direção o real tende. Sendo um limite ideal e abstrato, o interpretante final não depende estritamente de cada interpretante dinâmico efetivo. Ao mesmo tempo, no entanto, todo movimento e transformação do pensamento (signo) só pode se realizar devido e suportado por esses eventos reais de interpretação (interpretantes dinâmicos) O interpretante imediato, por seu lado, é uma mera possibilidade de sentido, ainda não revelada, mas que está de modo ainda vago e indeterminado contido no próprio signo.

Uma segunda classificação datada de 1907, desenvolvida no manuscrito 338 e também

extraída das três categorias (SANTAELLA, 1995, p. 104-108), propõe a tricotomia de

interpretantes emocional, energético e lógico, respectivamente relacionados por Peirce com

sentimentos (primeiridade), esforços (secundidade) e mudança de hábitos (terceiridade).

O interpretante emocional é o aspecto qualitativo do efeito produzido pelo signo

relacionado com a categoria da primeiridade, com a experiência imediata, talidade (ser tal

qual e nada mais), acaso, possiblidade, diversidade; o interpretante energético, correspondente

a um ato no qual alguma energia é despendida da ordem da secundidade, relacionada com a

experiência bruta, ação e reação, alteridade, realidade individual; e o interpretante lógico, o

pensamento ou entendimento geral produzido por um signo relacionado com a categoria da

terceiridade ou mediação, “um interpretante lógico é uma regra geral, que não se confunde

com um conjunto de palavras, mas é mais propriamente um hábito de ação que pode ser

expresso por palavras” (SANTAELLA, 1995, p. 106).

A referência às duas tricotomias de interpretantes sem abordar definições mais amplas

e suas correlações, bem como as definições de objeto e dos tipos de signos, tem a intenção de

situar, dentro do escopo desse trabalho, o fato que:

[...] os signos, mesmo os mais genuinamente triádicos, não produzem como interpretantes apenas pensamentos, mas também sentimentos, emoções, percepções, ações, condutas, comportamentos, de modo que, mesmo no signo de natureza pensamental e intelectual, todos esses elementos estão nele embutidos constituindo, assim, também sua substância.

Em segundo lugar, para da conta do fato de que, em determinadas situações, mesmo sendo triádico, o signo pode ter seu processo interpretativo interrompido, visto que este momento pode ser suficiente para a função que o signo cumpre naquela situação. Neste caso, embora a natureza do signo,

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125  

 

em si mesma, seja essencialmente triádrica, ela pode, no processo interpretativo, adquirir a forma de um signo degenerado, isto é, quando seu interpretante tem o caráter de uma ação ou até mesmo de uma mera qualidade de sentimento. (SANTAELLA, 1995, p. 116).

A amplitude do conceito de signo em Peirce reitera o papel dos sentimentos, emoções,

percepções, ações, condutas, comportamentos na aprendizagem, que não pode ser limitada a

uma mera apreensão de representações e conceitos intelectuais. Confere também uma

proximidade ao destaque que Moraes (2008, p. 181) confere ao “papel da emoção na

reconfiguração da aprendizagem como geradora de espaços operacionais de ação e de

reflexão, recordando também que a aprendizagem e conhecimento envolvem percepção e

intuição e tudo mais que constitui a estrutura do sistema vivo.

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no mundo nada

se perde tudo

se trans forma

Instruções : dada a matriz quadrada acima,

ache a determinante, alternando a ordem

dos elementos para encontrar esta matriz final:

se nada no

mundo trans forma

tudo se perde

(PHILADELFO MENEZES)

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127  

 

3.0 AS TRÊS ECOLOGIAS E A APRENDIZAGEM EM REDE

“O ser humano, tal como imaginamos, não existe” (Nelson Rodrigues)

Concepções como cognição distribuída e localização exomática da mente transformam

o modo como tradicionalmente se concebia a relação entre pensamento e tecnologia.

Deslocam a questão do que é pensar e como se pensa para uma concepção da mente não mais

internalizada, mas que evolui a partir de sua inscrição em um sistema material, ou seja, o

desenvolvimento do pensamento acaba assumindo a forma do desenvolvimento do meio

físico do pensamento.

Donald (1999) argumenta, em seu livro Origens do Pensamento Moderno, que a

aprendizagem tem o potencial de fornecer uma retroalimentação do processo de

desenvolvimento direcionando-o para a evolução, pois possibilita que certas espécies

modifiquem a evolução de seus ambientes. No caso da espécie humana, a cultura exerce o

papel de “ambiente” adaptativo, visto que nosso sistema cognitivo, além de possuir toda a

complexidade dos sistemas vivos, necessita da conexão com uma cultura em rede. Essa

relação tem implicações para as teorias de cognição, as quais deveriam levar em conta,

segundo o autor, mais do que a mente individual, mas deveriam considerar a emergência de

uma cognição coletiva, distribuída por várias mentes e suportada por uma variedade de

tecnologias de comunicação e memória em rede relacionadas com a evolução cultural e sem

uma forma fixa. O mecanismo da cognição humana abarca os dois processos, o orgânico e o

distributivo, em que a noção de uma evolução exomática da mente atribui aos seres humanos

uma cognição híbrida, que se desenvolve na relação entre os dois ambientes: o biológico e o

cultural. Somos a primeira espécie que desenvolveu, verdadeiramente, um sistema de

cognição distribuída, em que pensamento e memória são concretizados em uma comunidade

de mentes conectadas em rede.

O autor ainda defende que a evolução da mente humana vem sendo mediada por novas

tecnologias de memória externa, no lugar de mudanças geneticamente codificadas no cérebro

(memória biológica). A memória externa (ESS) é parte de um sistema de armazenamento

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coletivo e deve ser compreendida como parte integrante da arquitetura cognitiva do humano

moderno. A ESS se configura como uma rede, em que as capacidades do sistema são

distribuídas, e o sistema funciona como uma unidade maior do que qualquer um de seus

componentes individuais. Os indivíduos que detêm os códigos de acesso estão equipados para

se conectarem a qualquer rede que esteja disponível e, uma vez ligados, suas capacidades são

determinadas quer pelas redes, quer por sua herança biológica. “À medida que a base de

dados do sistema se expande para muito além do domínio de qualquer indivíduo, o sistema

torna-se, de longe, o fator mais determinante da cognição dos indivíduos” (DONALD, 1999,

p. 375).

A ampliação da interface que realiza a mediação entre o organismo e a realidade, a

Umwel expandida, foi comentada no capítulo 2.0, incluindo, além do sistema cultural,

sistemas psicossociais e tecnológicos, o que vem resultando no crescimento e na expansão do

reino de signos (a semiosfera). Os signos abrangem desde uma simples qualidade de

sentimento, uma inscrição, até a miríade dos conceitos e da diversidade de linguagens.

Vieira (2008), a partir de Bunge (1980), concebe o sistema psicossocial como

constituído de quatro subsistemas principais: o biológico, o cultural, o econômico e o político.

O autor destaca o sistema cultural como um dos mais fundamentais, pois estaria relacionado

com a permanência dos demais: “Parece-nos óbvio que é a cultura, incluindo todo o sistema

educacional, que pode produzir autonomia necessária para produzir material humano, que

possa efetivamente criar e gerenciar a complexidade dos outros subsistemas (VIEIRA, 2008,

p. 17, grifos nosso).

Processos culturais de comunicação e produção de signos caminham e evoluem lado a

lado. As tecnologias de comunicação evoluíram para configurar o que hoje identificamos

como uma cultura digital74, expressão da evolução de processos comunicacionais e cognitivos

mediados pelas tecnologias digitais. A expressão, segundo Deleuze (1968 apud CARVALHO,

2007), é como uma dobra, visto que envolve e explica, palavras que têm a raiz latina plicare

(dobrar): a primeira dobra para dentro e a segunda externamente. Isto implica a ideia de um

uno como dobra do múltiplo e um uno que se desdobra no múltiplo por meio de formas

                                                                                                                         74Optamos por usar a noção de cultura digital, como um modo mais abrangente do que cibercultura, para designar os processos culturais mediados pela digitalização que ocorrem tanto no ciberespaço como nos espaços intersticiais e físicos.

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dinâmicas e ativas, os seus atributos, manifestos como uma realidade física. São esses

atributos que Latour et al (2012) nos oferece como possibilidade de rastreamento das

associações e da reconstituição de um social, um coletivo heterogêneo em rede.

Dada a complexidade que esses processos adquiriram, apresentando atributos como a

“arquitetura” em rede, as propriedades comuns partilhadas, a heterogeneidade de composição

de seus sistemas, a interconectividade, o hibridismo e outras características que os

assemelham ao funcionamento de ecossistemas, optamos por abordar suas propriedades e suas

conexões a partir de um ponto de visto ecossistêmico, designando-os como ecologias:

ecologia comunicacional, cognitiva e digital (cultural). Esses processos, cujos atributos se

correlacionam, alimentam e são retroalimentados pelo modo de aprendizagem que tem sido

vinculado à cultura digital, a aprendizagem em rede. Isto justifica representá-la como esse

elemento conectivo no interior do tetraedro, essa esfera inscrita, que se dobra e desdobra na

expressão e a partir da expressão dessas três dimensões da ecologia e na emergência de uma

mente coletiva:

Figura 14: As quatro faces do tetraedro

Fonte: Arquivo pessoal

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Figura 15: Tetraedro planificado

Fonte: Arquivo pessoal

A Figura 15 foi apresentada no final do segundo capítulo com a finalidade de

representar as condições do sistema-ambiente que propiciam a emergência da mente coletiva

e a permanência da aprendizagem em rede. Tais condições surgem a partir da

interdependência das três ecologias e de seu desenvolvimento integrado e de sua evolução. Os

quatro lados do tetraedro são simétricos e, com isso, é possível rotacioná-lo no espaço,

observando uma equivalência entre cada face, pois não há hierarquia de níveis, apenas

diferenças de graus. Relações tríplices e diádicas são evidenciadas em cada plano e linha.

Falar de ecologias é integrar teorias que abordam a co-evolução de um organismo com

seu ambiente, o que também nos fornece importantes pontos de vista para se estudar a cultura

digital, pois permite que o pensamento supere dicotomias objeto-sujeito e veja essa situação

cultural das mídias como um feedback e uma auto recriação contínuos (PARIKKA, 2010, p.

145).

Ao discutir a “vida da cultura das redes”, ela não deve ser entendida como uma forma, mas sobretudo como movimento e junção, de maneira semelhante à leitura de Deleuze da afirmação de Spinoza:

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O importante é entender a vida, cada individualidade viva, não como uma forma ou um desenvolvimento da forma, mas como uma complexa relação entre velocidades diferenciais, entre desaceleração de partículas. (DELEUZE, 1988 apud PARRIKA, 2010, p. 145, grifos do autor)

3.1 ECOLOGIA COGNITIVA E COMUNICACIONAL: A LINGUAGEM HIPERMÍDIA

As mídias digitais propiciaram a multiplicação e a hibridização dos signos

disseminados em espaços de fluxos e por sintaxes fluidas, características da era

informacional. O computador, por exemplo, age como máquina semiótica, pois propicia a

produção, a multiplicação e a hibridização de signos e linguagens, configurando-se como um

artefato cognitivo que opera como parte integrante de uma cognição distribuída. Hutchins

(1996 apud BRUNO, 2003, p. 3) explora uma “arquitetura de cognição humana com base na

noção de cognição distribuída, definindo-a como algo que abarca tanto media internos quanto

externos, tanto processos mentais quanto dispositivos técnicos e relações sociais com outros

humanos”, em que o fundamental é o processo de tradução entre um meio e outro, que

transforma e redistribui os processos e as habilidades cognitivas envolvidas em nossas

atividades. Partindo dessa noção, Bruno (2003, p. 15) propõe uma redefinição da

espacialidade do pensamento: nossos sistemas cognitivos são constituídos por trocas

informacionais com o meio, onde os objetos técnicos que construímos e usamos integram

nossas “mentes”, nossos pensamentos. A autora argumenta que “a interioridade, aqui, não

coincide com o ‘que está dentro’ do sujeito, mas é constituída por processos, suportes

externos e internos, que configuram o seu modo de ser, pensar e agir sobre si e sobre o

mundo.”

Do papiro ao chip, os suportes ou meios (mídias) evoluíram para a configuração de

redes de computadores e dispositivos móveis interligados por satélites, de redes de memória

simbólica externa, incluindo os objetos técnicos que dão suporte a uma cognição coletiva,

distribuída por mentes conectadas. O ciberespaço, concebido como um novo meio de

comunicação (LÉVY, 2000), abriga um coletivo de elementos heterogêneos que partilham o

trabalho de mediação na construção da rede. Os mediadores são humanos, programas,

interfaces, protocolos de acesso, mecanismos e robôs de buscas, agentes que transportam

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informação, transduzem, armazenam, distribuem e operam na produção de um conjunto de

técnicas, práticas, de atitudes, de modos de pensamento e valores que denominamos como

cultura digital (BRUNO, 2003).

A digitalização opera o processo de virtualização de informações, cuja atualização

pode ocorrer em um número indefinido de manifestações e por processamentos automáticos

com alto grau de precisão e velocidade, mediada pela tecnologia digital de processamento e

pela transmissão de informações. Isto ocorre por meio de operações de transdução, isto é, a

passagem de um código estruturado para outro, a conversão de um sinal em imagem, a

combinação, a integração e a tradução − desenhos, textos, fotografias, sons e gráfico −

tornaram-se possíveis. Essa convergência de linguagens e signos permite formar um sistema

integrado, articulado, alinear e constituído por conexões em rede, gerando uma linguagem

calcada na visualidade e impregnada de fragmentação e de simultaneidade. A linguagem

hipermídia é a linguagem que expressa a cultura digital, a constrói e por ela é construída num

movimento reverso. Trata-se de uma linguagem que emerge no contexto de mediação

computacional e das mídias digitais como possibilidade de misturar e hibridizar linguagens

diversas. Segundo Santaella (2000), três características são definidoras da hipermídia:

(a) ser uma síntese da linguagem e pensamento sonoro, visual e verbal, com todos os seus

desdobramentos e misturas possíveis, germinando formas de pensamento heterogêneas, mas,

ao mesmo tempo e semioticamente, convergentes e não lineares;

(b) ter a capacidade de armazenar informação e, através da interação do receptor, transmutar

em incontáveis versões virtuais que vão brotando na medida mesma em que o receptor se

coloca em posição de co-autor;

(c) devido a sua multidimensionalidade, necessitar de um mapeamento, de um programa

cartográfico, por meio do qual pode ser avaliado o teor criativo de uma produção

hipermidiática.

A linguagem hipermídia, por ser uma síntese da linguagem e do pensamento sonoro,

visual e verbal, compreendidos como as matrizes básicas de todo e qualquer pensamento

(SANTAELLA, 2005), carrega consigo o movimento e o princípio da tradução intersemiótica

como transcriação de formas de linguagens. Plaza (1987) define três modos de aproximação

das formas sígnicas imprescindíveis para a operação tradutora: a captação da norma na forma,

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como regra ou lei estruturante; a captação da interação de sentidos ao nível do intracódigo; e a

captação da forma como se apresenta à percepção, como simultaneidade qualitativa (PLAZA,

1987 apud SANTAELLA, 2008).

Quando transitamos pelas interfaces dos softwares, interfaces que realizam a mediação

entre a lógica da máquina (traduzida por bits, 0 e 1) e a lógica humana, esses três modos

podem ser apreendidos nos agenciamentos descritos na noção de ritornelo. São agenciamentos

que, da caoticidade (infra-agenciamentos), expressam-se na diversidade sígnica, na

aleatoriedade do acesso, nos modos de atenção flutuantes (KASTRUP, 2007), na

predominância de signos icônicos que afetam nossa sensibilidade, e acionam um modo

abdutivo de navegar por sua estrutura diagramática (SANTAELLA, 2004). Essa captação da

forma como se apresenta à percepção nos conduz ao limiar de agenciamento territorial, em

que selecionamos, coletamos, organizamos, distribuímos e produzimos novas inscrições ou

novos índices, componentes dimensionais, intra-agenciamentos. Estes, por sua vez, nos levam

em direção a outros agenciamentos ou a outro lugar: o interagenciamento, germinando formas

de pensamento heterogêneas, componentes de passagem ou até de fuga, que criam condições

para a possibilidade de uma ressingularização da subjetividade (GUATTARI, 1992).

A subjetividade é compreendida como “um conjunto de condições que torna possível

que instâncias individuais e/ou coletivas estejam em posição de emergir como território

existencial auto referencial” (GUATARRI, 1992, p. 19). As condições propiciadas pelas

transformações tecnológicas da atualidade reverberam em mutações perceptivas e cognitivas

que tanto podem conduzir à homogeneização universalizante e reducionista da subjetividade,

quanto a uma tendência à heterogeneidade e à singularização, tudo depende das articulações

com os agenciamentos coletivos de enunciação.

O que importa aqui não é unicamente o confronto com uma nova matéria de expressão, é a constituição de complexos de subjetivação: indivíduo-grupo-máquina-trocas múltiplas, que ofereçam `a pessoa possibilidade de diversificadas de recompor uma corporeidade existencial, de sair de seus impasses repetitivos e, de alguma forma, de se re-singularizar. (GUATARRI, 1992, p. 17)

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134  

 

Procuramos abordar neste estudo os agenciamentos coletivos que estão emergindo

como possibilidade de ressingularização. Consideramos que a educação é, antes de tudo, o

lugar do sonho, da utopia como projeto, como possibilidade de vir a ser, tanto do ponto de

vista individual como coletivo.

Os sistemas de ensino formais se constituíram como espaços/ambientes que

reproduzem a discursividade construída a partir da linearidade do texto escrito e da cultura da

mídia livro. O saber baseado na tecnologia da escrita é marcado pelo viés teórico da

interpretação da realidade e, nessa atividade de interpretação, construímos um amplo

arcabouço teórico que foi sendo delimitado por campos e áreas dos conhecimentos

específicos, cada um deles constituindo-se numa disciplina específica e independente. A

metáfora arbórea representa a fragmentação cartesiana do saber, resultado das concepções

científicas modernas:

A ciência ocidental nasceu marcada pela concepção cartesiana do mundo exterior como matéria extensa e radicalmente distinta da mente. De um lado, está a interioridade do sujeito, senhor do pensamento e do conhecimento, do outro lado, está o mundo exterior sólido e extenso. Essa dissociação entre interior e exterior deu suporte à filosofia durante séculos e consequentemente também conduziu o modo como a ciência passou a conceber sua tarefa: esquadrinhar a natureza, seccioná-la em partes, dividir seus objetos entre distintos saberes para melhor domá-los por meio do conhecimento. (SANTAELLA, 2005, p. 37)

O tronco da “árvore do saber” seria a própria Filosofia, que, originalmente, reunia, em

seu seio, a totalidade do conhecimento. As ciências se relacionam com esse tronco comum,

ainda que nem sempre guardem ligações entre si, compondo os diversos ramos e galhos dessa

árvore. O paradigma arborescente implica uma hierarquização do saber, como modo de

mediatizar e regular o fluxo de informações pelos caminhos internos da árvore do

conhecimento (GALLO, 2008), paradigma que espelha também uma arborização do

pensamento. Ao supor ser esse paradigma fruto das tecnologias de conhecimento produzidas

no contexto da cultura da escrita, quando surgem novas tecnologias de conhecimento ou da

inteligência, tais quais as que se configuram na cultura digital, uma nova imagem do saber e

do pensamento é também introduzida.

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135  

 

Deleuze e Guattarri (2000) apresentam a noção do rizoma, que se assemelharia como

imagem ao tipo de caule radiciforme de alguns vegetais, como o bambu, formado por uma

miríade de pequenas raízes emaranhadas em meio a pequenos bulbos armazenáticos, para se

contrapor ao paradigma arborescente. O rizoma nos remete para a multiplicidade das formas e

dos caminhos; não há um único rizoma, mas rizomas. Por suas características de abertura,

descentramento, não hierarquia e multiplicidade, o conceito e a imagem do rizoma têm sido

utilizados para descrever a lógica da rede.

Como a linguagem própria da rede, a linguagem hipermídia também pode ser

compreendida segundo a lógica que a estrutura, os princípios de funcionamento do rizoma de

Deleuze e Guattari (2000). Segundo Kastrup (2010), o conceito de rede evolui da topologia,

em que o único elemento constitutivo é o nó, sendo definida por suas conexões, por seus

pontos de convergência e de bifurcações. A rede segue a lógica das conexões e não a da

superfície, onde a figura topológica é vazada, constituída de linhas e não de formas espaciais,

o que evoca o conceito de rizoma. Seis princípios de funcionamento regem o rizoma

(DELEUZE; GUATARRI, 2000): (a) Princípio da conexão: qualquer ponto de um rizoma

deve ser conectado a um outro e deve sê-lo. Conecta-se por contato, crescendo por todos os

lados e em todas as direções, provocando modificações nas linhas conectadas, imprimindo-

lhes novas direções e condicionando, sem determinar conexões futuras; (b) Princípio da

heterogeneidade: revela que o rizoma não é de natureza linguística. A linguagem aparece

como uma das linhas que o compõe, conectando-as com cadeias materiais, biológicas,

políticas e econômicas heterogêneas, irredutíveis a ela; (c) Princípio da multiplicidade:

explicita que o rizoma não é uma totalidade de formas unificadas, nem é composto de

totalidades ou formas puras – sujeito, objeto, natureza, etc; (d) Princípio da ruptura a-

significante: responde pela tensão permanente entre o movimento de criação de formas e

organizações e de fuga e desmanchamento dessas mesmas formas; (e) Princípio da

cartografia: primeiro princípio metodológico da filosofia de Deleuze e Guattari (1995). Ele

aponta para o fato de que o pensamento sobre o rizoma não é representacional, mas inventivo;

(f) Princípio da decalcomania: o decalque capta os pontos de estruturação, entendidos como

estabilizações temporárias do funcionamento de criação dos rizomas. Começa-se pelo mapa

que é aberto, desmontável, reversível, e projeta-se o decalque sobre ele.

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136  

 

O contexto rizomático rompe com as hierarquizações e com a disciplinarização do

saber, tanto no seu aspecto epistemológico como no político. Pensar uma educação que

incorpore essa dinâmica parece uma tarefa utópica, já que pressupõe a adoção de um

pensamento menos ordenado, no limite do caótico, bem como pressupõe outras arquiteturas

mais flexíveis, cujas estruturas possam se inclinar ao sabor dos ventos, sem quebras ou

rupturas, criando ambientes líquidos e oxigenados. Essa tarefa está colocada no diálogo entre

comunicação e educação, cuja manifestação, em maior grau de intensidade e liberdade, vem

se disseminando nas diversas experimentações criativas desenvolvidas fora do eixo formal

dos sistemas educacionais, em geral, vinculadas ao campo da cultura e das artes.

Não é fácil romper com a rigidez da arquitetura curricular da educação formal e com

todos os mecanismos de poder implícitos na disciplinarização, denunciados na obra de

Foucault. É fato também que a disciplina tem seu papel, bem como a disciplinarização do

saber, na organização de um cotidiano e na ordenação do conhecimento, que permitiu e tem

possibilitado o seu avanço, também tem papel importante. O problema é que não podemos

mais agir como agíamos anteriormente, a crise da razão já nos mostrou a falência de um

modelo e, agora, somos colocados diante da “fatalidade das transformações” (KRIEGEL 1979

apud FORQUIN, 2003), o que nos põe em movimento para repensar a questão das

transmissões educativas da atualidade e sua intrincada relação com a comunicação e com a

cultura.

3.2 O SOFTWARE: ATOMIZANDO A CULTURA

Motores de busca, sistemas de recomendação, aplicativos de mapeamento, ferramentas

de blog, clientes de mensagens instantâneas, plataformas que permitem escrever um novo

software – Windows, Unix, Android –, redes sociais, ambientes de aprendizagem, plataformas

de serviço, apps para tablets e celulares estão no centro da economia global e cultural, da vida

social e, cada vez mais, política (MANOVICH, 2010). O software carrega átomos de cultura

pelo uso individual e coletivo que fazemos deles, aspecto que não pode ser negligenciado. O

software modela a forma como os dados são estruturados e organizados uns em relação aos

outros, assim como a leitura que deles fazemos, isto é, o modo como nos ‘movimentamos’

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pelos bancos de dados. O uso particular que fazemos de cada software remodela o mesmo, da

mesma forma que o software age como uma interface comportamental que modela tipos ou

possibilidades de ações e interações pelo usuário. São camadas que permanecem, de certa

forma, encobertas em sua dimensão e extensão da formação cultural que engendram, o que

leva Manovich (2010) a propor um campo de estudos que denomina de estudos culturais do

software.

Segundo a perspectiva desse campo emergente e ainda em construção, “o papel do

software é moldar o processo de emissão e, ao mesmo tempo, construir a imagem a ser

comunicada” (SILVA, 2008), o que significa compreender o software como possuidor, ao

mesmo tempo, da forma e do conteúdo do processo comunicacional e como o lugar

simultâneo da linguagem e do processo de significação. Se compreendermos, como Umberto

Eco, que os processos culturais são processos de comunicação e que estes, por sua vez, só

funcionam comunicacionalmente porque são processos sígnicos (SANTAELLA, 2010),

podemos intuir como o software adquiriu um papel central na modelagem dos elementos

materiais e de estruturas imateriais que constituem conjuntamente a cultura (MANOVICH,

2008). É essa abordagem que delimita o campo dos estudos culturais do software:

O campo do Software Studies analisa a profusão da cultura do software e como o software vem cada vez mais alterando processos em vários níveis, interferindo na forma como ensinamos, pesquisamos, conhecemos e consumimos, isso sem falar nos mecanismos de controle social e político que hoje em dia fazem parte das práticas de utilização do software em todas as camadas das administrações públicas, em quase todos os países do mundo.

O papel do software, na ecologia comunicacional, cognitiva e digital das redes tem

uma centralidade na definição dos diferentes tipos e modelos de interação entre os actantes.

Cada software tem sua própria lógica, expressa em um tipo de arquitetura de dados que

possibilita, em maior ou menos grau, o fluxo aberto de informação, a tendência para

compartilhar e operar em redes, relacionadas com propriedades emergentes como

interatividade, interconectividade e interdependência. Tais propriedades estão relacionadas

com a disseminação, a descentralização e a semiodiversidade do conhecimento produzido,

consumido e distribuído em rede, bem como com o surgimento de padrões de

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comportamento, como a colaboração, a partilha e a participação. São padrões que contrastam

com os que vêm sendo identificados na cultura escolar e acadêmica: a competição, o

individualismo e a apatia ou recepção passiva. Cabe ressaltar que, se compreendemos a rede

como mediação (LATOUR, 2005), isto é, como trabalho de produzir ações que geram

desvios, transformações, diferença e proliferação de mediadores, podemos conceber a

aprendizagem em rede como o lugar da inovação e do acontecimento (PARENTE, 2010) e ter

a esperança de que esses antigos valores comunitários (colaboração, partilha e participação),

revisitados e redimensionados pela cultura digital, possam ressingularizar as práticas

educativas e as subjetividades.

A participação é um primeiro movimento mediado pela interatividade propiciada pela

interface gráfica, aqui compreendida como ter parte de e fazer parte de. Fazemos parte da

ecologia da mídia: “os humanos fazem parte da composição maquínica, que conecta e

organiza humanos e não-humanos” (PARIKKA, 2010, p. 166). A máquina abstrata de

Guattari (1992, p. 46-45) coloca em relação todos os níveis heterogêneos (máquinas materiais,

cognitivas, afetivas, sociais) que atravessam o conjunto funcional que associa os homens por

meio de múltiplos componentes. E temos parte em redes sociais diversas, em comunidades,

grupos, coletivos, organizações em rede, em listas de e-mails, rss feed, chats, espaços em que

uma ecologia comunicacional é o elemento conectivo que propicia a interconectividade entre

as partes.

Latour et al (2012) exemplificam como um simples acesso a um perfil na rede e o

movimento de seguir de link em link, encontrando pessoas e explorando comunidades, apesar

de parecer uma redução drástica das conexões sociais a um simples navegar de documento a

documento, revelam qualidades e atributos das partes e, consequentemente, do todo. Os graus

e a intensidade de participação estarão relacionados às diversas modalidades de interação. A

interatividade pluridirecional das redes 3.0, com o uso de múltiplos recursos comunicacionais

inseridos em redes distintas e interconectadas, aumentou o grau de sociabilidade, abertura

para as trocas, diversidade, solidariedade, ações fomentadas pela prática da partilha de

informação, conhecimento e afetos. A participação e a partilha favorecem o desenvolvimento

da confiança e da reciprocidade e o reconhecimento da interdependência como uma

propriedade que potencializa a construção colaborativa de redes de aprendizagem e

conhecimento. A colaboração emerge como um padrão de comportamento de rede que

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favorece a diversidade de pontos de vistas, de experiências, de saberes (práticos, científicos,

comuns), que, junto com a flexibilidade, possibilita que o sistema permaneça sobrevivendo às

perturbações e adaptando-se às condições mutantes. Por sua vez, as parcerias fundadas na

confiança e na solidariedade propiciam que ambos os parceiros aprendam e mudem, co-

evoluam (CAPRA, 1995). É esse filo maquínico que Parikka (2010) afirma que devemos

incorporar na compreensão das ecologias das mídias: “não estamos lidando com estruturas

rígidas ou ideias paradisíacas platônicas, mas tendências potenciais a ser cultivadas e

experimentadas para criar futuros alternativos para a cultura de redes digitais.”

Nas figuras 16 e 17, explicitamos algumas das relações e agenciamentos que os

atributos da linguagem hipermídia potencializam emergir. Na figura 17, tomamos o software

como ponto de partida para explicitar relações presentes na ecologia cognitiva e

comunicacional da aprendizagem em rede. Consideramos, em sua elaboração, a abordagem de

Manovich (2001; 2008) de software cultural e a lógica da linguagem hipermídia que está por

trás da interface gráfica.

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Figura 16

Relações e agenciamentos da linguagem hipermídia

Fonte: Arquivo pessoal

ECOLOGIACOGNITIVA

ECOLOGIADIGITAL

ECOLOGIACOMUNICACIONAL

MENTES COLETIVAS

INTERATIVIDADE INDIVÍDUOPARTILHA PARTICIPAÇ?OCOLETIVO

SIGNOS/LINGUAGEM INTERCONECTIVIDADEINTERDEPEND?NCIA

COLABORAÇ?O

COMUNICAÇ?O/MíDIAS CONFIANÇARECIPROCIDADE

SOLIDARIEDADE DIVERSIDADE

CULTURA/EDUCAÇ?O

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Figura 17: Ecologia cognitiva e comunicacional

Fonte: Arquivo pessoal

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3.3 ECOLOGIA DIGITAL

A noção de uma ecologia digital tem origem na comparação proposta por James

Boyle, professor de direito da Duke University, entre as políticas de propriedade e copyrights

e a política ambientalista: “enquanto os problemas ambientais podem, atualmente, destruir a

biosfera, a superproteção à propriedade intelectual pode fazer o mesmo com o ciberespaço”

(BOYLE apud HORVATH, 2001). A ecologia digital diz respeito a toda uma gama de ações e

proposições que preservem a livre circulação da informação na rede e o ambiente que permite

essa mobilidade. Essa história está vinculada diretamente a uma cultura e a uma ética Hacker,

que vão dar origem aos fundamentos e aos conceitos que estão por trás do movimento do

software livre e do código aberto.

O movimento do software livre surgiu na década de 1980, tendo como precursores

Richard Stalmann, que propôs os fundamentos filosóficos do movimento e fundou a Free

Software Foudation, e Linus Tovard, que iniciou o desenvolvimento do kernel Linux e

propulsionou uma virada na forma de produção de softwares, agregando toda uma

comunidade de hackers em torno do desenvolvimento colaborativo do sistema operacional

livre, Linux. Posteriormente, na década de 1990, por uma dissidência do movimento, foi

criado o movimento Open Source. A história desse processo foi documentada no vídeo

Revolution OS e nos sites das organizações Free Software Foudation e Open Source.

Destacamos um trecho da fala de Stalmann (2007) que sintetiza as motivações e a filosofia do

software livre:

Quando chamamos o software de ‘livre, queremos dizer que isso se refere as liberdades essenciais de uso do software: a liberdade para utilizá-lo, estudá-lo, modificá-lo e redistribuir as cópias como ou sem mudanças. Isto é uma questão de liberdade e não de preços, por isso pense em ‘linguagem livre’ e não ‘cerveja livre’. Essa liberdade é de uma importância vital. Ela é essencial, não apenas para o usuário, individualmente, mas para a sociedade como um todo porque promove a solidariedade— isto é, partilha e cooperação. Estas vêm se tornando cada vez mais importantes, à medida que nossa vida e atividades culturais estão cada vez mais digitalizadas. Num munda de sons, imagens e palavras digitais, o software livre tornou-se essencial para a liberdade em geral.

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A centralidade conferida por Stalmann e por toda uma comunidade de

desenvolvedores ao papel desempenhado pelo software, numa sociedade digitalizada e na sua

relação com um princípio de liberdade, configurou algumas premissas, entre elas: um

princípio de solidariedade intelectual e de partilha de conhecimento, uma mudança na

concepção de direitos autorais com o surgimento do Criative Commons e do Copyleft, a

proposição da autoria coletiva e a liberdade de acesso à linguagem, que está por trás do

software e, portanto, de expressividade no meio digital ao possibilitar sua execução,

reprodução, alteração e redistribuição, princípios contidos nas quatro liberdades que definem

o software livre (STALMANN, 2007):

(a) A liberdade de executar o programa, para qualquer propósito;

(b) O acesso livre ao código fonte, ou seja, ter a possibilidade de estudar como o programa

funciona e adaptá-lo às suas necessidades;

(c) A liberdade de redistribuir cópias de modo que ajude o próximo;

(d) A liberdade de aperfeiçoar o programa, e o comprometimento de liberar os seus

aperfeiçoamentos, de modo que toda a comunidade se beneficie.

A extensão da dinâmica cultural propulsionada por esses movimentos e que está por

trás da cultura do software tem sua expressão nos conceitos de produção colaborativa e

produção compartilhada, constituintes fundamentais do que denominamos de cultura digital.

Podemos tomar como exemplo a lógica de compartilhamento inerente à cultura hacker, cujo

processo de produção “tinha como metodologia resolver os problemas surgidos em cada um

dos projetos, e a cada solução, a imediata distribuição para ser objeto de crítica dos outros”

(PRETTO, 2010). Originalmente, e para certos programadores, hackers são indivíduos que

elaboram e modificam software e hardware de computadores, seja no desenvolvimento de

funcionalidades novas, seja na adaptação das antigas, possuindo um domínio e profundo

conhecimento em informática, engenharia de sistemas, linguagem de programação etc. Os

hackers são caracterizados por sua paixão pela computação e pela criação. Quando nos

referimos à cultura hacker, não estamos nos referindo aos gênios da programação, muito

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menos àqueles que utilizam seu conhecimento para atividades consideradas ilegais75.

Adotamos o termo para nos referir a essa procura por troca de experiências norteada pela ética

hacker, que predomina entre os usuários de softwares livres. São os hackers os responsáveis

por manter a cultura de desenvolvimento livre. Seis princípios éticos nortearam o trabalho

dessa juventude apaixonada que iniciou o desvelamento dos mistérios da computação (LÉVY,

2001, p. 40):

(a) o acesso ao computador deveria ser total e ilimitado. Mais do que computadores, deveria ser liberado o acesso a “qualquer coisa que pudesse ensinar a você alguma coisa sobre como o mundo funciona”;

(b) toda informação deve ser livre (free) porque “se você não tem acesso à mesma , não terá como consertar as coisas” ;

(c) se deve sempre desconfiar da autoridade, levando ao princípio da desburocratização e descentralização;

(d) a qualidade do que efetivamente fazem e realizam é o critério de reconhecimento e não escolaridade, raça, idade, posição social;

(e) apesar da aparente dureza das máquinas, “é possível criar arte e beleza num computador” ;

(f) acreditam que os computadores podem fazer um mundo melhor.

Himanen, no livro A Ética Hacker (2001), identifica sete características da chamada

ética dos hackers: paixão, liberdade, valor social (abertura), nética (ética da rede), atividade,

participação responsável e criatividade. Expandindo esses conceitos, o autor propõe que essa

postura possa ser expandida para todos os setores da atividade humana (HILMANEN apud

PRETTO, 2010, p. 8). Bustamonte (2010) argumenta a favor de uma cidadania digital, já que

as redes digitais constituem hoje o campo de batalha onde se travam as lutas mais

significativas pelos direitos humanos. O autor define o conceito de cidadania digital baseado

nos seguintes princípios:                                                                                                                          75 Importante fazer a distinção entre hacker e cracker. A verdadeira expressão para invasores de computadores é denominada craker e o termo designa programadores maliciosos e ciberpiratas que agem com o intuito de violar ilegal ou imoralmente sistemas cibernéticos. Essa questão tem bordas difusas e pode ser compreendida de maneira distinta de acordo com o contexto. Ver, por exemplo, o movimento do Wikileaks, que tem suas contas de doação bloqueadas com o argumento da ilegalidade sem, no entanto, ter sido submetido a qualquer processo judicial ou administrativo. Para saber mais sobre o movimento que resulta da prática do jornalismo investigativo associado à tecnologias de criptografia de dados, conferir http://wikileaks.org/About.html

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(a) a apropriação social da tecnologia, o que supõe empregá-la para fins não só de excelência técnica, mas também de relevância social;

(b) a utilização consciente do impacto da TIC sobre a democracia, avançada desde suas atuais formas representativas até novas formas de democracia participativa;

(c) a expansão de uma quarta geração de direitos humanos, na qual se incluiria o acesso universal à informática, à difusão das ideias e crenças sem censura nem fronteiras e por meio das redes, o direito de voz no desenho de tecnologias que afetam nossas vidas, assim como acesso permanente ao ciberespaço por redes abertas a um espectro aberto;

(d) a promoção política de inclusão digital, entendendo como inclusão não o simples acesso e compra de produtos e serviços de informática, mas o processo de criação de uma inteligência coletiva que seja um recurso estratégico para inserir uma comunidade ou um país em um ambiente ecologizado;

(e) o desenvolvimento criativo de serviços de governo eletrônico que aproximem a gestão dos assuntos públicos dos cidadãos;

(f) a defesa do conceito de procomun (commons, bens comuns), conservando espaços de desenvolvimento humano cuja gestão não está submetida às leis do mercado e ao arbítrio dos especuladores;

(g) a extensão da luta contra a exclusão digital e outras exclusões históricas de caráter cultural, econômico, territorial e étnico que ferem, na prática, o exercício de uma plena cidadania;

(h) a proteção frente às políticas de controle e às atividades das instituições de vigilância social. Em outras palavras, proteção frente ao exercício de um biopoder potencializado por um uso institucional das TIC;

(i) a aposta no software livre, no conhecimento livre e no desenvolvimento de múltiplas formas de cultura popular, com o objetivo de consolidar uma esfera pública interconectada. (BUSTAMONTE, 2010, p. 17-18, grifo nosso)

Um dos princípios universais da educação formal é a formação para o exercício pleno

da cidadania, o que significa adicionar mais uma camada às práticas educativas norteadas para

esse fim, a da cidadania digital. Benkler (apud BUSTAMONTE, 2010) defende que as redes

digitais devem ser mantidas como bens comuns, garantidas as liberdades dos usuários. Essa

garantia remete a uma ampla discussão sobre políticas públicas e marcos regulatórios

relacionados aos princípios especificados por Bustamonte. No Brasil, foram promovidos três

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fóruns de Cultura Digital realizados, respectivamente, nos anos de 2009, 2010 e 2011,

originando a formação da Rede de Cultura DigitalBr e a elaboração de propostas e ações

afirmativas no sentido de incitar, promover e contribuir para a discussão pública online e para

a construção de um projeto colaborativo de um Marco Civil da Internet no Brasil, iniciativa

do Ministério da Justiça em parceria com a Escola de Direito do Rio de Janeiro. O mapa da

figura 18 esquematiza esse fluxo, adicionando diversas camadas à rede digital − a política, a

economia, a cultura, a justiça, a sociedade civil, as leis e as controvérsias −, revelando

algumas das conexões que tecem essa intricada rede.

Conhecimento partilhado, tecnologias, padrões e protocolos abertos, cooperação

solidária e novos modelos de negócios são elementos que mobilizam as discussões. A defesa

de acesso a dados abertos do governo, das instituições públicas, e a garantia de um fluxo de

informação entre usuários, sem restrições nas liberdades propostas pela comunidade de

desenvolvedores do software livre e de protocolos e códigos fechados (como a identificação

nominal dos IPs), são exemplos de controvérsias que constituem a camada política das três

ecologias. A visualização de dados é um dos campos que tem priorizado a possibilidade de

desenvolvimento de softwares e de linguagens de programação, acessíveis ao público comum,

que possibilitem dar transparência e maior visibilidade aos bancos de dados disponíveis na

internet, os quais se perdem por sua abundância e seu volume. É também uma forma

expressiva e metodológica da linguagem hipermídia.

A linguagem, o software (como elemento cultural) e o sistema de infraestrutura material

constituem um ecossistema comunicativo, que é suporte e lugar de significação para um

ecossistema cognitivo e que, por sua vez, para sobreviver, depende de uma ecologia digital,

que envolve procedimentos relativos à garantia da livre circulação da informação,

propiciadores da permanência desse hipercomplexo sistema.

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Figura 18: Ecologia digital

Fonte: Arquivo Pessoal

Aprendemos uns com os outros em uma relação dialógica, que envolve também o

meio material. Diversos softwares têm sido desenvolvidos com o objetivo de permitir que

leigos em programação possam acessar esse universo de produção de objetos digitais

(Processing, Arduíno, etc) e, assim, tenham a possibilidade de se expressar a partir dessa

linguagem, além de softwares com funções específicas de distribuição de informação

(tecnologia p2p), comunicação (chats, skype, e-mails) e socialização e/ou uma mistura de

funcionalidades (Facebook). O código aberto e as quatro liberdades do software livre são os

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princípios que instauram outros valores e que permitem e/ou permitiram que se instaurassem a

prática do compartilhamento e a da colaboração, uma nova ótica na questão da autoria e da

propriedade intelectual, nos processos de produção de conhecimento e de sua distribuição,

caminhando junto com os paradigmas comunicacionais e culturais, concretizados na dinâmica

da aprendizagem em rede. Muito propriamente, Santaella (2010b), ao questionar se a

aprendizagem ubíqua76, propiciada pelo acesso livre e contínuo à informação, em qualquer

hora do dia e da noite e em de qualquer lugar, substitui a educação formal, levanta o fato de

que:

[…] inaugura-se uma modalidade de aprendizagem que é tão contingencial, inadvertida e não deliberada que prescinde da equação ensino-aprendizagem caracterizadora dos modelos educacionais e das formas de educar. O que emerge, portanto, é um novo processo de aprendizagem sem ensino. Isto posto, cumpre indagar sobre as possíveis consequências que essas condições trazem para a educação (SANTAELLA, 2010b, p. 5)

Na conclusão do texto, explicitando uma linha de pensamento que defende que

nenhuma forma cultural, até hoje, conseguiu levar as formações culturais anteriores ao

desaparecimento (SANTAELLA, 2010b), estende-se essa premissa para as formas de

aprendizagem e para os modelos educacionais. A autora propõe pensá-los em termos de

complementaridade e a partir do desenvolvimento de estratégias integradoras, tarefa que tem

se mostrado árdua. Deixemos a poesia falar (página inicial do capítulo) e traduzir a abertura e

a coragem necessárias para transitarmos pelo nosso tempo. Deixemos também falarem os

rastros das cartografias da aprendizagem em rede.

                                                                                                                         76 A aprendizagem ubíqua se caracteriza por processos de aprendizagem abertos, processos espontâneos, assistemáticos e, mesmo, caóticos (SANTAELLA, 2010)

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4.0 SEGUINDO OS RASTROS

4.1 METODOLOGIA

A escolha de realizar o estudo de caso do Visualizar’11 foi resultado de uma

confluência de associações, um fazer rede, desenvolvidas ao longo desta pesquisa, na busca

de formação teórico/prática que contribuísse para o desenvolvimento de hipermídias ou

interfaces interativas, como narrado na introdução. Não foi, propriamente, uma escolha, mas

um encontro. Fomos tecendo a rede, seguindo os rastros deixados por oficinas, ativistas,

softwares, instituições, textos, exposições, sites, artistas, vídeos, programadores, teóricos etc,

um coletivo de actantes, cujas ações estão voltadas para a construção, para o questionamento,

para a reflexão da cultura digital. Enquanto tecíamos a rede, fazendo parte deste trabalho,

deste movimento ou deste fluxo de ações, provocando transformações e produzindo rastros,

contribuímos para proliferar os mediadores. As cartografias apresentadas como resultado

desse processo são, também, uma outra inscrição, que objetiva tornar visível uma parcela da

trama e da topologia dessa rede, chamando atenção para os fluxos de aprendizagem e

produção de conhecimento alinhados com as emergentes dinâmicas da cultura digital.

Se, no início, intencionávamos construir evidências a partir da interação com outros

pares, ao aplicar o método clássico de observação participante (CHIZOTTI, 2003) no

desenvolvimento do Laboratório de Hipermídia (Labhiper), com o tempo, os acidentes de

percurso foram revelando que os fluxos e as dinâmicas da aprendizagem em rede são como as

corredeiras de um rio: ora tranquilas, ora bastante turbulentas, repletas de acidentes e de

mudanças velozes. Tudo isto nos conduziu a experienciar o Vizualizar’11. O uso do verbo e

não do substantivo “experiência” tem a intenção de pontuar que o estudo de caso do

Visualizar’11 não tem um recorte, mas é a observação e a descrição do experienciar, a

reconstituição das associações, as quais ultrapassam o período linear de tempo de realização

da oficina. Ao adotarmos a TAR como metodologia, deixamos de lado os métodos

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tradicionais de análise, seguindo as orientações de Latour (2005, p.143), reproduzidas em um

suposto diálogo entre orientando e orientador:

S (estudante): Você quer dizer que as outras teorias sociais não permitem isso?

P (professor): Em certo sentido, sim, e pelo fato delas possuírem muitos pontos fortes: elas são boas para falar de coisas substanciais acerca do que o mundo social é feito. Na maioria dos casos, isto é aplicável; os ingredientes são conhecidos; o repertório pode ser reduzido. Porém não funciona quando as coisas mudam rapidamente. Também não é bom para o estudo de organizações, estudos de informação, marketing, ciência e tecnologia e administração onde as ligações são tão, terrivelmente, difusas. Novos tópicos, é para isso que você precisa da TAR.

A Teoria Ator-Rede é uma teoria e um método que propõe que seja dada a palavra aos

actantes para que “eles próprios indiquem seus caminhos, seus quadros de referência, suas

teorias, seus próprios contextos, suas próprias metafísicas e até mesmo sua própria ontologia.

Logo, o caminho para segui-los será mais descritivo” (LATOUR, 2005, p. 147). Na sociologia

das associações, o “social” é construído a partir de muitos elementos conectados que circulam

dentro de finos conduítes (LATOUR, 2005), um tipo de conexão entre coisas que,

necessariamente, não são elas mesmas o que, até então, chamamos ou definimos por social.

Lembramos que, na TAR, o social não seria algo visível ou possível de ser postulado a priori,

já que sua visibilidade se daria a partir dos rastros produzidos pelos actantes quando uma nova

associação é realizada entre elementos que, não são eles mesmos “sociais”.

O desafio de utilizar a Teoria Ator-Rede como metodologia está em reconstituir e

reagrupar as associações em uma narrativa que revele as conexões, isto é, as ações, os

desvios, as transformações provocadas pelos actantes. Um bom texto é aquele que faz

proliferar os mediadores, o que significa que estamos, simultaneamente, descrevendo e

fazendo a rede, “a noção de rede é colocada em uso sempre que a ação é redistribuída”

(LATOUR, 2010, p. 2). Para tanto, uma das primeiras recomendações é a de não permanecer

preso a qualquer tentativa de categorizar a fala dos informantes e, com isso, permitir que os

atores tenham espaço para se expressar por si próprios (LATOUR, 2005, p. 143). Devemos

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tentar seguir as associações que estes constroem com os elementos. Segui-los link a link,

seguir os rastros deixados por suas ações, as inscrições.

Venturini (2009) oferece algumas pistas de como aplicar a TAR, a partir da cartografia

das controvérsias − um exercício de desenhar dispositivos para observar e descrever debates

sociais, especialmente, mas não exclusivamente, em torno de questões tecnocientíficas. A

cartografia das controvérsias seria uma espécie de versão mais ”pedagógica” de uma

cartografia baseada na TAR, cujo interesse não estaria em revelar estruturas gerais que estão

por trás de um fenômeno, pois seu único propósito é oferecer uma descrição, o mais detalhada

possível, do fenômeno como ele é visto por seus protagonistas. Nas palavras de Latour (apud

VENTURINI, 2009, p. 3), “apenas observe e descreva as controvérsias.”

Uma das primeiras consequências de “apenas” observar, destacada por Venturini

(2009), é que a cartografia do social não requer uma teoria específica ou uma metodologia. A

cartografia convida o pesquisador a utilizar todo tipo de ferramenta de observação disponível,

bem como misturá-las sem constrangimento. A segunda consequência está em uma

objetividade construída a partir da multiplicidade de pontos de vista, quando o pesquisador

também constrói a rede ao descrevê-la e, dessa forma, “não pode fingir ser imparcial”; e, por

fim, o pesquisador deve ouvir “as vozes dos actantes”, seus próprios pressupostos

(VENTURINI, 2009). Todas as concepções e todos os protocolos merecem ser considerados,

especialmente se eles são derivados dos próprios actantes.

As novas técnicas digitais oferecidas por ferramentas de análise de redes possibilitam

traçar e visualizar o fenômeno social nos termos discutidos pela TAR, sem que seja necessária

a distinção entre níveis macros e micros, a alternância entre o individual e o coletivo. Latour

et al (2012) exemplificam essa mudança de perspectiva a partir dos perfis disponibilizados em

muitas das plataformas digitais. Tomando como partida um nome, uma tag, um tema, é

possível definir uma entidade pela lista de atributos disponíveis nos bancos de dados. O ator-

rede vai sendo definido por seus rastros, distribuídos em uma rede de associações, assim

como, reversivelmente, a rede vai sendo definida pelo ator.

Aplicado ao estudo de caso do Visualizar’11, utilizaremos como inscrições os rastros

digitais disponíveis na internet, acessados por meio de mecanismos de busca e relacionados

ao Visualizar’11, ao Medialab-Prado e ao projeto I’m hungry, what to do next? (ou Refarm

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app: a new landscape to grow friends and food, versão final), um dos dez projetos

selecionados, do qual participei como colaboradora. Acrescentamos registros em fotografia e

vídeo, realizados durante as duas semanas de desenvolvimento do projeto, rastros digitais

produzidos ao longo do processo como actante. Coerente com o proposto pela TAR, não

foram elaborados instrumentos de coleta de dados, não nos preocupamos em definir a priori

os fatos e as circunstâncias a serem registrados. Realizamos registros textuais, sonoros,

imagéticos, que se inserem no próprio processo de desenvolvimento do projeto. O Medialab-

Prado prioriza o processo em si, e não o resultado, e propõe que os participantes registrem

todas as etapas, realizando também seu próprio registro no site da instituição, no wiki, no

flickr, etc. Essas pistas concretas deixadas pelos actantes permitem o rastreamento de suas

ações, acessíveis em uma busca na www, nas listas de grupos de discussão, nos sites e nos

blogs vinculados aos eventos, por exemplo, eles próprios possíveis actantes.

Seguimos, literalmente, os rastros digitais de página em página, link em link, indo e

voltando, conforme o movimento das inscrições, sem uma linearidade no tempo, sem definir o

número de actantes, anulando a distinção entre local e global, perto e distante, individual e

social, natureza e cultura, humanos e não humanos. Acrescentamos rastros digitais, como

notas, fotografias e vídeos do arquivo de registros realizados durante a oficina na sede do

Medialab Prado. Partimos da premissa, tal qual postulada pela TAR (LATOUR, 2005, p. 11),

de que, onde as inovações proliferam, os laços entre os grupos são incertos e o ranque de

entidades a serem consideradas é flutuante. A última coisa a estabelecer são limites, os quais

vão em sentido contrário à proliferação de formas, tamanhos, heterogeneidade e combinações

das associações. O limite, para interromper a descrição, é dado pelo tempo de finalização da

pesquisa. Quanto ao fato de seguir de link em link, Latour et al (2012, p. 3) comentam:

[...] a redução das conexões sociais para páginas html conectadas a outra página html parece soar muito drástica, mas é essa experiência própria de clicar através de plataformas como Flickr, Academia.edu ou MySpace, navegando de documento a documento, encontrando pessoas e explorando comunidades, sem mudar de níveis, que gostaríamos de utilizar para repensar a teoria social.

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Para registrar e visualizar esse movimento, utilizamos alguns recursos disponíveis na

web, entre eles a rede social Pearltrees (www.pearltrees.com). A Pearltrees é uma interface

visual que permite coletar, guardar e organizar os interesses pessoais de um modo particular.

Como uma rede social 3.0, é possível enriquecer a ‘coleção de interesses’ pessoais, a partir da

coleção de outros membros da rede, realizando comentários, convidando outras pessoas para

integrar uma pearltree específica e partilhando-as em outras redes, como o Facebook, o

Twitter e o Google+. Não se trata de uma ferramenta de análise de redes, como o Gephi77,

mas foi uma opção de mais fácil acesso e de uso adaptado de uma visualização de dados. Um

programa como o Gephi exige uma compreensão de algoritmos e de estrutura de banco de

dados, o que não seria possível realizar dentro do escopo deste trabalho.

A visualização das páginas acessadas no Pearltrees é feita por um agrupamento

arbóreo, em que cada link acessado é visualizado por um círculo de igual dimensão para todos

(exceto o que define a pearltree inicial). Cada pearl é identificada por uma imagem que o

programa captura da página correspondente; por exemplo, o Medialab-Prado é identificado

por seu logo MP e por um nome ou um título, como o termo Follow us, para a página do MP

que relaciona as diversas mídias que utilizam para registro e comunicação: wiki, blogs,

twitter, facebook, rss, etc. Quando passamos o mouse (sem clicar) sobre cada círculo, uma

pequena janela abre e permite a visualização e a identificação rápida de seu conteúdo. Caso

cliquemos na janela ou no círculo, uma outra janela, que ocupa toda a tela, abre, e é possível

acessar o conteúdo disponível na página. Um outro ícone, na página aberta, direciona para a

página original, mas é possível navegar na página nos dois modos. A visualização é distinta,

dependendo do dispositivo utilizado: o plug-in78 adicionado ao browser ou o app79 do iPad.

Para adicionar uma nova página ao Pearltree, basta clicar sobre o círculo azul com a estrela

branca, disponível na barra de ferramenta do browser. Uma nova pearl é originada à pearltree

principal, podendo ser deslocada para uma outra associação.

                                                                                                                         77O Gephi é plataforma de exploração e visualização interativa de todos os tipos de redes e sistemas complexos, dinâmicos e gráficos hierárquicos. É um software de código aberto e livre, disponível para os sistemas Windows, Linux e Mac OS X, utilizado para a grafia e a análise de redes. Utiliza um mecanismo 3D de renderização para exibir grandes volumes de dados em tempo real. Conferir https://gephi.org. 78O plug-in ou módulo de extensão é um programa de computador usado para adicionar funções a outros programas maiores, provendo alguma funcionalidade especial ou muito específica. 79App é uma extensão de nome de arquivo que indica uma aplicação desenvolvida para um sistema operacional.

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Figura 19: Captura de tela da interface da Pearltrees nomeada Cartografia da aprendizagem em Rede, em que foi aberta a pearl Visualizar’11. É possível agrupar diversas pearls em uma única, que pode ser fechada clicando no x, ao lado do círculo. A imagem capturada é do dia 19/08 e não corresponde à versão final.

Fonte: Arquivo pessoal

A estrutura arbórea limita a visualização de associações cruzadas. É possível, assim,

apenas agrupar em uma mesma pearl várias outras ou relacioná-las em sequência. Para

superar parte dessa limitação, duplicamos os links que têm conexão com outros pontos.

Outros artifícios foram utilizados, e como o Pearltrees solicita que seja realizado um login

para acesso, sendo necessária a criação de uma conta, foi criado o login “cartografias”, cuja

senha é “aprendizagem”. Trata-se de um login aberto que pode ser utilizado por aqueles que

não desejam criar uma conta no Pearltrees para acessar o conteúdo da cartografia. Contudo,

ainda é necessário instalar o plugin no browser utilizado pelo usuário.

As orientações de instalação se encontram no próprio site, pois a instalação é simples e

automatizada. Há, também, a opção de instalar um app para iPad, sendo a navegação bem

mais ágil no modo touch e de melhor e diferenciada visualização. A única limitação é a

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impossibilidade de visualizar conteúdos em flash, visto que o sistema operacional do iPad

bloqueia esse tipo de ação. Para contorná-la, realizamos o download dos vídeos em flash e

postamos no Vimeo ou Youtube, anexando-os como uma nova pearl. Para acesso aos pdfs e

apresentações em Power Point, postamos no Scribd, fotos no Flickr.

A rede vai sendo descrita pelo próprio movimento de navegação de link em link. É

preciso estar conectado para acessar os conteúdos das páginas e os comentários disponíveis

nas pequenas janelas abertas, quando passamos o mouse por cima das pearls, sem clicar (Fig.

1). Não é possível transpor tal experiência para o papel. No texto impresso da tese,

procuramos realizar uma descrição complementar à cartografia, uma espécie de tradução das

inscrições que foram rastreadas, mas que, em si mesma, constitui uma narrativa distinta da

que pode ser construída pelo acesso e pela navegação do pearl Cartografias da Aprendizagem

em Rede. Latour (2010, p. 11) comenta a mudança introduzida pela possibilidade de

recuperação de dados: podemos voltar e ir adiante, ir de um perfil individual a um agregado

de centenas e milhares de perfis e restaurar uma continuidade entre os níveis macro e micro:

Hoje, cada um de nós, devido à possibilidade de navegar através dos bancos de dados, é capaz de introduzir uma continuidade da contribuição individual para os agregados de uma forma muito mais suave do que antes. (A experiência só é possível na frente da tela, é muito mais difícil de manter esse foco em um pedaço de papel, e é por isso que não há muitas descrições desse tipo).

Outra diferença é que a leitura de uma hipermídia permite várias rotas, pois não há um

ponto de partida definitivo e nem de chegada. É inclusive possível acrescentar outras

inscrições, como no espaço para comentários, em que qualquer leitor pode deixar um. Certas

páginas adicionadas à cartografia, que já haviam sido adicionadas por outros usuários em suas

próprias pearls, podem apresentar comentários prévios. Por sua vez, utilizamos o espaço dos

comentários para realizar observações, as quais tecem uma descrição alinear do objeto de

estudo e são também tanto actantes da rede quanto novas inscrições. Nem todos os pearls são

comentados. Destacamos alguns trechos, identificando actantes ou intermediários −, os

agenciamentos − e “copiamos e colamos” outros trechos retirados de textos contidos na

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página: artigo (pdf), trechos de áudio de palestras etc. A melhor forma de compreender o

processo é navegando.

Figura 20: Detalhe capturado da Figura 19, janela aberta com a interação do mouse sobre a pearl correspondente. A janela permite uma visualização ágil do conteúdo da pearl, além de: disponibilizar recursos para comentários e partilha nas redes google+, twitter e facebook; obter o código que permite postá-la em outra página ou enviar um convite por e-mail; e obter a url completa ou reduzida para uma postagem no twitter, por exemplo, bastando clicar em cada ícone correspondente. Essa janela se difere das demais, pois corresponde à pearltree que nomeia o coletivo. Pode ser adicionado um editorial para descrevê-la. O número de pearls conectados é disponibilizado, bem como o número de visualizações (hits) e picks (uma variação do curtir do facebook). Convites para editar a pearltree podem ser feitos, compondo o team up.

Fonte: Arquivo pessoal

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Clicando em comments, o “verso” da janela é acionado e permite visualizar e adicionar

comentários. Como nas demais redes sociais, uma pergunta dinamiza as associações: O que

você pensa dessa pearltree?

Figura 21: Janela de comentários do pearl da página Processing.org. Quando foi adicionada, a página continha 7 comentários de usuários. Os comentários abordam o software Processing, disponibilizado para download na plataforma processing.org. O usuário Trackingnewtech descreve o software e Noncom acrescenta suas críticas e outras opções de programas para o mesmo fim. Essa página é um dos itens coletados na pearl Cartografias da aprendizagem em rede visualizada no iPad.

Fonte: Arquivo pessoal.

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4.2 CARTOGRAFIAS DA APRENDIZAGEM EM REDE

Em face da estrutura do software, que limita o número de pearls (nós) adicionados à

pearl que nomeia a coleção, no máximo 100, dividimos em três camadas a cartografia:

Linguagens líquidas, Medialab Prado e Visualizar’11, redes dentro de redes.

São três os modos como acionamos as inscrições para iniciar a cartografia:

(a) A partir do e-mail recebido pela própria pesquisadora, Izabel Goudart, cujo remetente é

Jarbas Jácome (artista e programador do LaboCA). E-mail encaminhado para o google groups

polo-de-cultura-digital, cujo conteúdo é a convocatória para apresentar projetos e artigos para

o Visualizar’11. Por sua vez, esse e-mail foi um encaminhamento do original, enviado pelo

Setor de Comunicação do Medialab-Prado, realizado pelo lista do puredata (plataforma e

software para criar interfaces interativas). O pdf do e-mail se encontra nos anexos da tese

(ANEXO 1), já que não pode ser acessado on-line diretamente, sendo necessário o login no

gmail. Além da convocatória, outros e-mails trocados com Jarbas Jácome, em resposta ao

recebido, revelam o desdobramento no envio de um projeto para o Visualizar’11, vinculado à

reformulação do Labhiper e a formação de uma parceria colaborativa com Jarbas e Jeraman

(LaboCA). Essa camada, denominada Linguagens líquidas, permite visualizar as associações

entre o Labhiper, o LaboCA e o Visualizar’11. A linguagem de programação é a actante que

multiplica os mediadores e os direciona para as camadas Medialab Prado e Visualizar’11;

(b) Busca no Google com as palavras Medialab Prado e Visualizar’11 e com o título do

projeto I’m Hungry, What to do next (ou Re: farm the app), com a finalidade de encontrar

inscrições realizadas por outros actantes, além das realizadas pela própria instituição e pela

pesquisadora (Izabel Goudart);

(c) Busca no flickr da tag Visualizar’11 com a finalidade de encontrar imagens vinculadas ao

programa e outras associações a partir delas. O registro fotográfico possibilita uma

reconstituição da arquitetura do ambiente, dos eventos e das atividades, uma percepção do

clima emotivo e uma visualização de outras inscrições que, nas páginas acessadas, nem

sempre estão presentes.

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A partir de uma inscrição, as demais vão se proliferando: do e-mail para uma página,

um vídeo, uma imagem, um texto, um software, uma lista de e-mails, perfis de pessoas,

coletivos e instituições, um assunto, uma tag, um resultado de busca, e assim por diante.

Procuramos, no movimento de um rastro digital para outro, estar atentos às seguintes

distinções (LATOUR, 2005, p. 62):

(a) Quais os agenciamentos invocados?

(b) Que configurações eles propiciam?

(c) Que modalidade de ação eles engajam?

(d) Estamos falando de causas e seus intermediários ou de um encadeamento de mediadores?

A resposta para essas questões é a própria narrativa produzida, ao percorrer a

cartografia on-line, e que vai dar visibilidade ao coletivo e às dinâmicas da aprendizagem em

rede. Uma outra descrição realizada textualmente, como já citado, procura dar uma visão

geral dos caminhos percorridos, procurando ater-se a uma descrição, a uma espécie de

relatório que narra o que foi observado.

Retornamos ao primeiro capítulo e à questão geracional, segundo a contribuição de

Karl Manheim. O sociólogo refina o conceito de geração até a noção de grupos concretos e

propõe que a base da formação desses grupos difere dos laços por proximidade ou de laços

vitais como os presentes na família, na tribo, nas comunidades territoriais. Trata-se da própria

conexão geracional, que se torna consciente e desejada, conduzindo das “formações

comunitárias” a um modo de “formação associativa”:

O conceito de gerações de Mannheim e sua acurada elaboração sobre a posição, a conexão e a unidade geracional rompem, por um lado, com a ideia de uma unidade de geração concreta e coesa. Nos instiga, por outro, a centrarmos nossas análises nas intenções primárias documentadas nas ações e expressões de determinados grupos, ao invés de buscarmos caracterizar suas especificidades enquanto grupo (WELLER, 2007, p. 11, grifo nosso).

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O estudo de caso do Visualizar’ 11 se situa nas ações e nas expressões de

determinados grupos, abordados na perspectiva da rede de laboratórios experimentais e nas

ações que estes mobilizam e distribuem. A presença nesses grupos de jovens entre 20-30 anos

é predominante, contudo não é exclusiva. Participam todos aqueles que partilham de

conteúdos comuns de consciência, representações, crenças e engajamento, independente da

idade. Deixamos de lado alguns conceitos, como o de geração digital ou o de nativos digitais,

para abordar as novas subjetividades elaboradas a partir do referencial da cultura digital, em

que as subjetividades juvenis são a expressão mais contundente. A cartografia aqui

apresentada objetiva mapear esses novos modos de produção de subjetividade −

conhecimento, cultura, sensibilidade e sociabilidade − em sua relação com a emergência da

aprendizagem em rede.

Permanece o desafio de traçar uma cartografia dessas ações, sabendo que, ao trilhar

um caminho ainda incerto, de métodos abertos e em construção, corremos o risco de não

alcançar os objetivos, de não fazer proliferar os mediadores. Descrever a rede é uma ação

política. A rede descreve a emergência de um mundo comum, onde entidades heterogêneas

coabitam. A política não é feita somente por homens, mas por aerossóis, pelo efeito estufa,

pela química do clorofluorcaboneto (LATOUR, 1994). É também uma “troca de perspectiva”

do “ponto de vista” para o “ponto da experiência”, em que “a percepção é a filosofia

silenciosa do cotidiano, a ordenação não dita através da qual vivemos e que sustenta, em sua

quietude, todos os nossos atos, palavras e pensamentos” (BASBAUM, 2010, p.1 ).

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5.0 CARTOGRAFIAS DA APRENDIZAGEM EM REDE

5.1 ESTUDO DE CASO DO VISUALIZAR’11

Visualizar é uma das linhas de trabalho do Medialab Prado (Madrid, Es), concebido

como um projeto de pesquisa aberto, participativo e colaborativo, que aborda as teorias, as

ferramentas e as estratégias de visualização de dados. O programa é também definido como

uma plataforma de pesquisa e educação voltada para a difusão, a investigação e a exploração

da cultura de grandes volumes de dados e de seu impacto nas artes, nas ciências e na

sociedade contemporânea. É o programa educativo e de investigação mais relevante da

Espanha sobre esse tema.

Até sua terceira edição, foram desenvolvidos cerca de trinta protótipos de visualização

de dados, envolvendo o trabalho colaborativo de mais de uma centena de desenvolvedores,

dentre os quais alguns dos melhores designers e artistas de dados do mundo. A edição do

Visualizar’11 foi dedicada à compreensão das infraestruturas (Understanding Infrastructures)

que dão suporte aos processos sociais vitais, tais como: infraestruturas energéticas, legais,

financeiras, de mobilidade, de emissões de rádio-frequências e de rede de dados. A

metodologia utilizada para a execução dos projetos prevê processos horizontais e

colaborativos, reunindo estudantes, artistas, especialistas e profissionais de todo o mundo e de

diversas áreas num seminário e numa oficina internacional, com duração aproximada de duas

semanas. O objetivo é o de coletar, analisar e disponibilizar publicamente visualizações que

possibilitem compreender como funciona a sociedade contemporânea.

A quarta edição do projeto, dirigido por José Luis Vicente, pesquisador, curador e

jornalista especializado em tecnologia, cultura e inovação, foi realizada em junho de 2011: o

Visualizar’11 (anteriores: ‘09, ‘08 e ‘07). Conta com o suporte da Bestiário, empresa e

coletivo sediada em Barcelona e Lisboa, dedicada à representação dinâmica de dados e ao

desenvolvimento de espaços digitais para criação colaborativa de projetos interativos. A

empresa é uma das principais referências em visualização de dados do mundo, representada

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na figura de Santiago Ortiz, artista, matemático e investigador de temas da arte, das ciências e

dos espaços de representação, um dos co-fundadores do Bestiário e parte da equipe de

investigação e desenvolvimento de projetos do Medialab.

A visualização de dados é uma metodologia e uma linguagem que desperta o interesse

de artistas, pesquisadores, designers e ativistas que desejam traduzir e compreender a cultura e

os processos contemporâneos contextualizados por um intenso fluxo e um grande volume de

dados. A linguagem de programação e o design interativo são dois campos de conhecimento

fundamentais para uma visualização criativa e personalizada. Atualmente, recursos de

visualização estão disponíveis on-line, como o ManyEyes80. Estes possibilitam elaborar

visualizações de dados, sem que seja necessário recorrer à programação e ao design, contudo

apresentam funcionalidades pré-definidas que limitam o desenvolvimento autoral ou o

direcionam a um determinado fim. Cursos ou formação nesse campo não são frequentes e, em

geral, são realizados pelos Laboratórios de Mídias no formato de oficinas, ministrados por

artistas e/ou programadores, artistas de softwares e designers, como os realizados no MP

(Madrid, Es) ou no LabMIS (SP, Br).

A plataforma do MP disponibiliza em seus bancos de dados, uma rica documentação

multimídia sobre visualização de dados e sobre o programa Visualizar, bem como

disponibiliza registros do processo. Camadas sobrepostas de informações oferecem aos que

acessam e exploram a página um mapa conceitual e metodológico do programa e os

conteúdos teórico-práticos sobre visualização de dados.

A cartografia on-line e a descrição textual, aqui apresentada, são frutos do trabalho de

observação e descrição dos rastros produzidos no desenvolvimento de um programa

investigativo e educativo, alinhado com a cultural digital e com suas linguagens. Portanto,

partimos da suposição de que, na reconstituição e no reagrupamento de suas associações,

daremos visibilidade aos seus actantes e aos agenciamentos e, assim, reconstituiremos um

sistema ambiente que sustenta e origina padrões e dinâmicas da aprendizagem em rede. O ato

de navegar de inscrição em inscrição ou, na terminologia da plataforma, de pearl em pearl,

constrói uma descrição do coletivo, dos atributos compartilhados entre seus elementos, das

ações transportadas e de suas transformações. Dependendo do ponto de vista a partir do qual                                                                                                                          80http://www-958.ibm.com/software/data/cognos/manyeyes/, plataforma desenvolvida pela designer brasileira Fernanda Viegas (MIT/USA).

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são abordadas, originam distintas descrições. Por essa razão, recomendamos que a cartografia

seja percorrida e a própria narrativa construída. A descrição impressa oferece um panorama

geral, um mapa que pode servir de guia para navegar pela cartografia on-line. É uma escolha

pessoal realizar o acesso à cartografia antes ou depois da leitura ou concomitantemente a ela.

Seguimos as orientações descritas na metodologia nos moldes da TAR; logo, o texto que

apresentamos não guarda semelhança ou aproximação aos métodos usualmente utilizados

para a análise de estudo de casos.

5.2 LINGUAGENS LÍQUIDAS

A convocatória para inscrição de projetos foi, para muitos que participaram como

proponentes ou colaboradores, um dos primeiros actantes que mobilizaram um coletivo

heterogêneo e acionaram tantos outros, como, por exemplo: aqueles que enviaram projetos

individuais ou coletivos, entre os quais me incluo; os futuros colaboradores; os softwares que

permitiram a redistribuição da mensagem, dos e-mails e do rss feed81; as listas e os grupos de

discussão; os grupos de pesquisa, as organizações, os coletivos de arte, os artistas,

programadores, os designers, os pesquisadores, o público comum, os quais participam dessas

listas e assinam os feeds de outros coletivos, instituições, organizações, blogs, etc.

O caminho percorrido para acessar a convocatória do Visualizar’11 ou o caminho

inverso, percorrido pela convocatória até minha caixa de e-mail é um estranho ponto de

partida para uma pesquisa (um deles). Inicia uma descrição que contém um duplo movimento

desta pesquisadora como actante: o primeiro pela própria reconstituição das associações,

resultando neste estudo, e o segundo, porque inclui a observação participante e os rastros

digitais produzidos e vivenciados no espaço e no ambiente físico, onde a oficina foi

desenvolvida, a sede do Medialab Prado. Um simples e-mail acionou uma rede de

associações, que originou transformações inesperadas no percurso de um estudo e de uma

formação. Por ele, também é possível rastrear ações anteriores que revelam que esse evento

específico é parte de um processo contínuo, enquanto essa rede não for interrompida ou se

estabilizar.                                                                                                                          81Web Feed (vindo do inglês alimentar) é um formato de dados usado em formas de comunicação com conteúdo atualizado frequentemente, como sites de notícias ou blogs.

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O fato é que, concluída a fase de construção desta tese em sua defesa, outro processo,

a aplicação prática das teorias aqui desenvolvidas, acontecerá: o projeto Aprender Brincando,

vencedor do prêmio 3o Instituto Claro Novas Formas de Aprender e Empreender . O projeto é

fruto das experiências e da aprendizagem vividas ao longo desta pesquisa e, em especial, no

período intenso e fervilhante do desenvolvimento colaborativo do protótipo REFARM APP: a

new landscape to grow friends and food. Alinhado com os princípios teóricos e

metodológicos do Medialab Prado e do LaboCA, o projeto Aprender Brincando objetiva

replicar essas experiências, remixando-as no ambiente escolar no desenvolvimento de projetos

colaborativos de visualizações de dados e interfaces interativas com alunos do ensino médio,

professores e alunos da graduação.

Informação, dados, conhecimento e afetos transitam e são transportados por pessoas,

softwares, redes pessoais e indiretas, grupos, coletivos, organizações, instituições etc

redistribuídos e transformados. Na observação e na descrição dos rastros digitais do e-mail, é

possível identificar:

Agenciamentos:

o Participação: fazer e ter parte em uma lista de discussão, assinatura de feed,

conta de e-mail, ter parte em grupos, organizações e instituições;

o Partilha: redistribuição da mensagem, dado, informação de nó para nó;

o Interconectividade: indivíduos, grupos, organizações, instituições, softwares e

hardwares, redes de infraestrutura agrupados e distribuindo ações;

o Curiosidade + escolha: selecionar o e-mail entre tantos recebidos, abrir, ler;

o Intenção + atenção: colocar a atenção e intenção na redação de um projeto e

envio;

o Interatividade + colaboração: reendereçar o e-mail para Jarbas com o projeto,

compartilhar ideias, sentimentos e ações (dúvidas, questionamentos) e receber

um retorno oferecendo ajuda e colaboração;

o Interdependência: ações sustentadas por uma rede.

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Mediadores e intermediários:

MP àNerea Garcia Gamendia (web content) à convocatória àfeedà conta de e-

mail àgoogle groupsà lista do puredataà Jarbas Jácome àgoogle groupsà e-mail

à lista do Polo de Cultura Digital/UFRJ à Izabel Goudart à e-mail à projeto pdfà

MP à projeto não selecionado + convite para colaboração à Izabel Goudart

+

Jarbas Jácome à retorno oferecendo colaboração

As tecnologias e as linguagens que permitem a transmissão de informação e sua

redistribuição, a formação de grupos e listas e os mecanismos automáticos de envio de

conteúdos de blogs ou de sites de interesse são actantes fundamentais para que a rede se faça.

Os softwares de diversas funcionalidades possibilitam a participação, a partilha de

conhecimento, informação e afetos, e a interconectividade de um coletivo. A grande maioria

dos humanos que participa dessa rede é intermediária e, até mesmo, desconhece que enviou

uma mensagem. Multiplicam-se os actantes e as ações distribuídas; a rede cresce, aprende,

media e, onde há crescimento e aprendizagem, encontramos mente (PEIRCE apud

SANTAELLA, 2002).

Recebemos e-mails diariamente, cujo significativo volume depende de um maior ou

menor grau de interatividade, interconectivade e interdependência nas redes que integramos.

Filtramos, excluímos sem ler, selecionamos e lemos, arquivamos, esquecemos, o que faz com

que uma informação, um dado, passe a ser relevante, principalmente quando a quantidade de

dados disponíveis adquire um volume cada vez maior e é renovado constantemente? O que

mobilizou os desenvolvedores a participarem da oficina? Qual foi a motivação desta

pesquisadora? Quais os agenciamentos invocados? Que configurações eles propiciam? Que

modalidade de ação eles engajam? Estamos falando de causas e de seus intermediários ou de

um encadeamento de mediadores?

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Registros82 com depoimentos de colaboradores, que são assíduos frequentadores das

diversas atividades no Medialab Prado e dos integrantes do projeto I’m hungry, what to do

next, revelam uma mistura do que estamos denominando de um mix de curiosidade+escolha e

de intenção+atenção. Nos depoimentos registrados em vídeo, os colaboradores revelam:

Ø o interesse em desenvolver conhecimentos no campo da visualização para ampliar

conhecimentos profissionais como designers ou artistas e o fato de ser o Medialab um

espaço único nesse sentido e de a oferta em instituições formais de ensino ser escassa

ou mesmo inexistente;

Ø a adesão ao tema de sustentabilidade e ao desenvolvimento de práticas que contribuam

para esse fim, no caso da colaboração específica no projeto I’m Hungry;

Ø a reputação do Medialab Prado, do programa e de profissionais que colaboram em face

da reconhecida competência no campo de desenvolvimento de interfaces interativas,

(o Medialab Prado reúne as melhores ‘cabeças’ que trabalham no desenvolvimento e

nas metodologias de visualização de dados, protótipos de computação física e afins);

Ø o interesse em participar, investigar e compreender as dinâmicas de um processo de

produção colaborativo envolvendo os distintos campos do conhecimento e as

circunstâncias que incluem seu desenvolvimento;

Ø o conhecimento e o desenvolvimento de habilidades no uso e no desenvolvimento de

tecnologias digitais;

Ø o fato de o foco do MP residir em processos fundamentados na investigação e no

desenvolvimento da cultura digital;

Ø as experiências prévias com outros projetos do MP;

Ø as questões éticas e estéticas relacionadas ao uso de tecnologias digitais;

Ø as questões relacionadas a ativismo político e democracia digital.

                                                                                                                         82Chamamos a atenção para o fato de que traduzir toda a cartografia numa narrativa em papel é uma tarefa impossível e vai em direção oposta ao método da TAR. Procuramos descrever certos padrões observados em termos de agenciamentos e identificar os actantes nomeando as pearls na cartografia on-line. Trechos foram transcritos ou copiados no espaço para os comentários de algumas pearls de forma que possam identificar onde nossa atenção foi detida, essa ação cria outra inscrição, direciona para uma leitura entre tantas outras possíveis.

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Shirky (2011, p. 171), ao discorrer sobre a cultura participativa das redes digitais,

associa diferentes lógicas de participação para cada indivíduo ou grupo, em face das

diferentes motivações que conduzem cada um a fazer coisas ou não.

Daniella Brill (Colombia, 21 anos): Vim com a intenção de trabalhar muito, isso nem aconteceu, mas fiz muitos amigos e estou indo embora muito feliz. A experiência foi muito bacana e aprendi muito. Escolhi o projeto porque amo agricultura e quero trabalhar com Hernani no projeto Re:farm the City. (vídeo do pearl Daniela, Visualizar’11).

Daniela estuda Artes na Colômbia e desenvolve projetos na interface com a Biologia.

Saiu da América do Sul para realizar um tratamento de saúde em Viena e para participar do

Visualizar. Precisou ausentar-se antes do término do projeto. Alguns meses depois do

workshop, Daniella e Hernani registraram, no blog do Re:farm the City, a realização do

projeto na cidade de Viena. A participação no Visualizar’11 originou a seleção para o

CODED CULTURES: City as an Interface, programa de iniciativa internacional do grupo

5uper.net, que discute e reflete a intersecção entre mídia, arte, sociedade e tecnologia

aplicada, por meio de exibições, oficinas, simpósios e apresentações e intervenções artísticas.

O projeto I’m hungry (Re:Farm the City) foi selecionado e apresentou uma proposta de

intervenção.

Re:Farm the City é um projeto coordenado por Hernani Dias, direcionado ao

desenvolvimento de interfaces que sustentem, incentivem e promovam a sustentabilidade da

produção e do consumo de alimentos, por intermédio da criação de dispositivos de

computação física de gerenciamento de plantações urbanas e hortas. I’m hungry what to do

next? foi um dos desdobramentos do projeto Re:farm edição China, em colaboração com o

jovem chinês Tian Li (designer interativo). Hernani conheceu Tian Li, na China, em ocasião

de convite para apresentar um workshop, na universidade que Tian Li estuda. O projeto

selecionado para o Visualizar foi uma iniciativa conjunta de Hernani Dias (coordenador do

projeto) e Tian Li (líder do projeto), resultando na proposta de desenvolvimento de um

aplicativo que possibilitasse conectar pessoas e dados vinculados ao plantio e à troca de

alimentos. Percorrendo a cartografia Visualizar’11, é possível acessar o pdf do projeto e os

vídeos de seu desenvolvimento. Tian Li já desenvolvia um projeto semelhante na sua

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graduação e, após participar da oficina (na China), com Hernani, formou a parceria que

resultou no projeto inscrito e em sua vinda da China para Madrid. São muitas inscrições, nas

quais os actantes revelam esse agenciamento que denominamos de:

Figura 22: curiosidade + escolha

Fonte: Popoya (2011)

Figura 23: intenção + atenção

Fonte: Popoya (2011)

São palavras e conceitos que encontramos distribuídos nos vídeos, nos textos, nos

registros, nos depoimentos e nas imagens das atividades desenvolvidas no MP. Popoya

(2011), designer e redatora do blog BrainPicks, destaca essas relações como motores da

criatividade, da polinização de ideias e da geração de novas ideias. Nas palavras de Coudal

(apud POPOYA, 2011): “Nosso valor mais essencial não é qualquer uma de nossas

habilidades específicas, mas o fato que somos essencialmente curiosos.” Curiosidade, escolha,

intenção-atenção é o que permeia o ambiente com inscrições sutis. Popoya (2011) acrescenta

que curiosidade, sem direção, pode gerar um esforço custoso e, em última análise,

improdutivo: “A escolha é a forma como domamos, canalizamos e direcionamos nossa

curiosidade, onde escolhemos como dispenderemos nosso tempo e energia e, finalmente, onde

escolhemos colocar nossa atenção”. Relembramos a citação de Peirce (CP 1.220), “causação

final sem causação eficiente é desesperança, mas causação eficiente, sem causação final, é

pior do que desesperança; ‘pois ela é mero caos, e caos, sem causação final, não é nem

mesmo algo como caos, mas é um nada completo’ (CP 1.220)”.

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Os resultados alcançados ao final de 15 dias de trabalho dedicado e intenso podem ser

acessados nos vídeos da apresentação final de cada grupo, na reverberação em novas parcerias

e nos projetos que sucederam a realização do Visualizar’11. Curiosidade+escolha e

intenção+atenção são potentes agenciamentos dos processos e das dinâmicas da aprendizagem

em rede, pois, na era digital, reafirmam algumas reflexões sobre questões83, tais como: a

aprendizagem da atenção na cognição inventiva (KASTRUP, 2004); o conceito de

infoatenção, como uma das competências centrais da aprendizagem na era digital

(RHEINGOLD, 2009); a relevância de uma economia da atenção (LEVY, 1993;

SANTAELLA, 2010). A citação de Sontag (apud POPOYA, 2011, p.1) é uma bela tradução

desse processo:

Faça coisas. Seja curioso e concentre-se. Não espere por um empurrão da inspiração ou um beijo da sociedade em sua testa. Preste atenção. Tudo está relacionado com prestar atenção. Atenção é vitalidade. Ela te conecta com os outros. Isso faz você ser ardente. Seja ardente.

Popoya (2011) associa a fala de Sontag ao princípio central da filosofia budista, o

equilíbrio entre intenção+atenção − curiosidade intencionada ao conhecimento e ao

crescimento, nossa escolha onde concentrar nossa consciência, onde colocar nossa atenção. A

visualização de dados, como uma modalidade da linguagem hipermídia, tem, em seus

princípios, esse exercício, já que exige o aprendizado de traduzir, por meio de recursos visuais

interativos, uma ação consciente (por parte de quem elabora) sobre a qual colocamos nossa

atenção e, portanto, nossa consciência.

A primeira camada dessa cartografia foi descrita a partir da pearl Linguagens

Líquidas. O termo foi inserido como uma outra inscrição. Remete às linguagens digitais, cuja

natureza fluida, híbrida e dinâmica pode ser observada na visualização interativa de dados e

nos agenciamentos a ela vinculados, como a cultura aberta e livre. É também o título do livro                                                                                                                          83As mudanças nas modalidades e nas formas de atenção na era digital são objetos de controvérsias. A atenção seletiva e focada da leitura silenciosa do livro ou da escuta atenta às aulas expositivas contrastam com uma dispersão e uma distração, identificadas como resultante do intenso uso e da interação, principalmente das crianças e dos jovens, com as tecnologias digitais. Outras modalidades, como a atenção flutuante ou fora de foco, seleção e escolha a partir de modos mais abdutivos, emergem como padrões mais sensíveis à velocidade e ao volume com que dados são produzidos e redistribuídos e à necessidade de estar atento ao que de fato é importante, essencial ou útil e que nos mantém conectados.

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de Santaella (2007), ponto de partida para que esta tese fosse redigida, um outro actante e

inscrição dessa rede.

A lógica e a expressividade da linguagem hipermídia estão presentes na própria

temática do programa: a visualização de dados. A programação e o designer interativo são

elementos que encontramos ao percorrer as cartografias e os atributos presentes no perfil de

actantes humanos, objetos técnicos e organizações, verificando uma relação direta com esses

campos de conhecimento. Retornando ao e-mail da convocação, identificamos rastros digitais

do puredata.inf, Jarbas Jácome, Polo de Cultura Digital, MP, Izabel Goudart. Puredata (Pd) é

um ambiente de programação gráfica interativa e de processamento em tempo real para áudio

e vídeo. É um projeto de código aberto que conta com uma comunidade de desenvolvedores e

uma plataforma com tutorias, exemplos, download gratuito do programa, download de patchs

(fluxograma de código) e outras informações. Jarbas Jácome é um programador e artista que

utiliza o Pd em diversos trabalhos e ministra oficinas dessa linguagem junto com o coletivo

LaboCA, faz parte da comunidade de Pd e de sua lista. Outros programas, como o Processing

e o Arduíno, vão apresentar atributos semelhantes, são softwares e plataformas livres e de

código aberto usadas para programação interativa gráfica ou computação física. Sua

linguagem é de mais fácil acesso para leigos e possui plataformas, extensamente

documentadas, que dão suporte e propiciam uma aprendizagem autônoma e em rede,

suportada por códigos abertos e licenças de copyleft. O LaboCA, coletivo e laboratório

nômade integrado por artistas de software (além de Jarbas, Jeraman, Ricardo Brasileiro e

Filipe Caligário), realiza oficinas promovendo o uso criativo e lúdico da linguagem de

programação. Os rastros nos levam para trás e para frente. Em 2010, realizei uma oficina com

o LaboCA oferecida pelo FILE (Festival de Linguagens Eletrônicas), quando fui fisgada pelo

modo como o processo se desenvolvia, um modo muito semelhante ao experimentado no

Medilab. Tratava-se de um tipo de ambiente que se desenrola a partir dos códigos abertos, do

copiar e colar livre e do remixar de ideias. Os dois laboratórios apresentam como princípios

basilares e comuns a ambos a cultura do software livre e dos códigos abertos. O Polo de

Cultura Digital, por sua vez, propõe, em uma das suas linhas de pesquisa, a investigação de

novas formas de ‘escrita’, o que originou seu interesse pelo trabalho de Jarbas e do LaboCA.

Os softwares para produzir interfaces interativas e suas linguagens são actantes

frequentes em projetos de visualização de dados, instalações artísticas, projetos de

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computação física, desenvolvidos tanto pelo LaboCA, quanto pelo MP. Acessando a wiki do

Visualizar’11 de cada projeto e os softwares e as linguagens listados, podemos verificar como

é frequente a citação de tais recursos. Artistas, designers, programadores, pesquisadores,

curiosos e Laboratórios de Mídias estão associados em torno da aprendizagem dessas

linguagens e da investigação em torno de seu uso criativo, bem como das interfaces que as

sustentam e/ou possibilitam desenvolver (softwares), em prol de projetos aplicados de

produção de conhecimento na arte e na ciência e nas convergências desses campos.

A primeira oficina que realizei no MIS-SP (2009) foi de Puredata, depois de

Processing com o LaboCA, no FILE 2010 e de Arduíno (2011), no Parque Lage, todos

vinculados a programas de arte, ciência e tecnologia. Durante o Visualizar’11, foi realizada

uma oficina para apresentar a interface Impure (que permite a programação por objetos), uma

introdução à linguagem Processing e do software R, além de sua aplicação prática e de outras

linguagens no desenvolvimento dos projetos. Os princípios de liberdade do software livre e do

código aberto, que estão no fundamento da criação de linguagens interativas livres e de suas

plataformas e comunidades, são agenciamentos que tecem essa rede, que reúne linguagem,

artistas, programadores, designers, plataformas, comunidades, grupos, coletivos, laboratórios

de mídias, instalações artísticas, robótica, oficinas e projetos educativos, como o Aprender

Brincando. Regem a escolha de que linguagem usar e que software priorizar.

Marcos Garcia (2011), um dos gestores do Medialab Prado, ao apresentar o programa

Visualizar no seminário sobre dados abertos realizado em fevereiro de 2011, destaca como

um outro atrativo o fato de a visualização de dados agregar campos diversificados de

conhecimento: “este seria um novo entorno relacionado com características da cultura digital,

foco de investigação e atuação do MP”, comenta o gestor. Essa característica solicita o

desenvolvimento de metodologias colaborativas que abordem uma estética de banco de dados.

Vesna (2007, p. X) levanta a questão da invisibilidade da estrutura que está por trás dos dados

e da navegação pelos fluxos de informação, como um dos princípios mais profundos de um

projeto estético com tecnologia digital. Os arquivos de bancos de dados agem como uma

cartografia da subjetividade, pois esses registros permitem mapear um perfil de hábitos,

universos de conhecimento, de formas de socialização e comunicação, daí a importância de

participarmos ativamente em como os dados são moldados, organizados e disseminados. Os

artistas nos socorrem nesse novo caminho de trabalhar, pensar e visualizar novas estruturas. É

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o que a cartografia Linguagens Líquidas aciona. Uma rede de artistas, programadores,

ativistas, laboratórios e mídias, linguagens e softwares de programação, listas de discussão,

conteúdo livre (código aberto) para ser partilhado, modificado, redistribuído, softwares livres

para download, uso e modificação segundo as características particulares do usuário,

plataformas que reúnem colaboradores para desenvolvimento conjunto, redistribuição de

conhecimento e aprendizagem em rede e convergência de áreas.

A visualização de dados (como linguagem) levanta uma questão relacionada com a

arquitetura de dados. Ela define uma topologia onde um ambiente é criado (característica da

linguagem hipermídia). Qual a importância do ambiente? Na comunicação, o meio é o suporte

para a linguagem. O papel para a escrita, a interface gráfica para a linguagem hipermídia. Por

sua vez, os atributos da linguagem definem um ambiente por onde transitamos e criamos

condições para realizar uma determinada atividade e atingir um fim, um tipo de habitar (DI

FELICE, 2009) e um tipo de leitor (SANTAELLA, 2004). O ambiente de sala de aula é fixo,

estável, organizado, definido temporalmente (hora-aula), tal qual o meio que suporta a

linguagem escrita. O ambiente digital pressupõe uma arquitetura líquida, de sobreposições,

uma topologia cujo tempo é um continuum e um espaço aberto, onde as trocas ocorrem de

forma simultânea e em uma multiplicidade de linguagens, tempos e sujeitos. O MP articula

um ambiente físico e virtual e os espaços intersticiais, que mobilizam atividades práticas e de

reflexão sobre a cultura digital. A vivacidade do ambiente é uma das motivações e diferenças

observadas por quem tem oportunidade de interagir diretamente ou por aqueles que se

detiverem atentamente às pistas deixadas por fotografias e vídeos espalhados na web, em

sítios específicos como o Flickr e Youtube e/ou na plataforma da instituição.

5.3 MEDIALAB PRADO (MP): PLATAFORMA ABERTA DE PROTOTIPADO COLABORATIVO

O Visualizar constitui uma das seis linhas de trabalho propostas e desenvolvidas pelo

Medialab Prado, entre elas: Interactivos, focado no uso criativo da eletrônica e da

programação; Inclusiva-net, focado na pesquisa e nas reflexões sobre a cultura da rede;

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Commons Lab, promotor de discussões transdisciplinares sobre Commons84; AVLAB, voltado

para a criação audiovisual e sonora; e o Digital Façade, programa recente (2011) focado no

desenvolvimento e na mostra de projetos interativos em uma fachada digital. Diversas outras

atividades são desenvolvidas em prol de reflexão, pesquisa, prática e experimentação da

cultura digital, de suas linguagens e da convergência entre a arte, a ciência, a tecnologia e a

sociedade.

Tais programas e atividades permitem traçar um perfil de atuação do Medialab- Prado,

definido como um programa de artes promovido pelo Madrid City Council85 e, como uma

plataforma aberta de prototipado (Marcos Garcia86) colaborativo. É um programa voltado para

a produção, a pesquisa e a disseminação da cultura digital e de áreas, dentre as quais a arte, a

ciência, a tecnologia e a sociedade se interceptam. Destacamos as temáticas presentes no

programa:

• Visualização de dados à investigação teórico-prática sobre a cultura de dados

e sobre seu impacto na sociedade; desenvolvimento metodológico e teórico

dessa linguagem como uma atitude política;

• Commonsà objetiva estruturar discussões e ações em torno da concepção de

Procomun, novo termo que procura expressar uma velha ideia: que certos

recursos pertencem a todos e juntos constituem uma comunidade de recursos

que devem ser ativamente protegidos e gerenciados (medialab-prado-

es/laboratório_del_procumun);

• Interativos à apropriação tecnológica por meio de práticas de

desenvolvimento de ferramentas baseadas em eletrônica e programação –

computação física;

• Inclusiva-net à plataforma dedicada à pesquisa, à documentação e à

circulação das teorias da cultura de redes;

                                                                                                                         84 São recursos partilhados ou divididos entre ou no seio de uma comunidade populacional. Esses recursos são considerados bens comuns e podem incluir tudo, desde recursos naturais, terra partilhada, ao software, incluindo propriedades públicas ou privadas, sobre as quais as pessoas possuem direitos tradicionais. Tradicionalmente, se referia ao meio ambiente, atualmente os commons compreendem também os bens da esfera cultural, bens e serviços públicos. Ref.: http://en.wikipedia.org/wiki/The_commons 85O Conselho da Cidade de Madrid é formado por 57 membros, entre eles o prefeito da cidade. É o órgão de representação política dos cidadãos no governo municipal. 86 Medialab-prado.es/article/visualizar11

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• AVLAB à plataforma que propicia encontros para criar e distribuir arte

sonora e visual através de uma aproximação colaborativa;

• Digital Facede à projeto de desenvolvimento de interfaces interativas que

interagem com o espaço urbano.

É visível a mobilização em torno das questões que permeiam a ecologia

comunicacional, cognitiva e digital das práticas culturais contemporâneas. Transitar pelo

espaço chama atenção para uma diferença sutil entre os espaços acadêmicos tradicionais e um

ambiente de aprendizagem e investigação como o MP. É um certo ambiente que, “chamando

a atenção pela sua novidade, deixa uma marca de impressão”, como relatado por Tiscar Lara

no vídeo/registro de uma mesa redonda ocorrida em 01/03/2012, com o título “Aprender

haciendo: conociemento e aprendizaje en comunidad” e como relatado na introdução deste

estudo.

Nascido em setembro de 2007, foi concebido como um segundo estágio do Medialab

Madrid, localizado no Conde Duque Cultural Center, desde 2002. A partir de 2007, é

transferido para o Paço do Prado, estando localizado ao lado do Caixa Fórum, próximo ao

Museu Reina Sofia e ao Museu do Prado, uma região rica em instituições, espaços e galerias

vinculadas à cultura e à arte. Ocupa um subsolo de um galpão industrial, cuja entrada fica

localizada numa pequena praça, a Plaza de Las Letras, a partir de onde se avista um paredão

frontal contendo uma fachada digital e, lateralmente, vidraças que permitem um contato

visual com seu interior. Isso estabelece uma comunicação visual com o entorno. Na descrição

de Felipe Fonseca (ciberativista brasileiro), realizada na ocasião de sua participação no

Labtolab e registrada em seu diário no blog Desvio, em 12/07/2010:

Descendo a rampa, já vi a programação do mês estampada na janela em letras adesivas, um detalhe sutil que mostra a preocupação do Medialab em ter uma interface pública, em vez de fechar-se no próprio umbigo.

A fachada digital é um outro elemento que explicita a filosofia e o funcionamento do

MP: ser um espaço aberto para todos, onde os visitantes não são apenas convidados, mas

encorajados a participar (GARCIA, 2011). A fachada é um projeto para propor experimentos

interativos baseados numa estética da programação. Um de seus desdobramentos é o grupo de

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estudos e oficina 26,000 pixels, realizado com o objetivo de refletir e investigar o

desenvolvimento criativo de código e princípios de design computacional.

Figura 24: Vista a partir da Plaza de las Letras

Fonte: http://desvio.cc/blog/labtolab-dia-dia

Figura 25: Detalhes do projeto da fachada digital, vista lateral

Fonte: Medialab-prado.es

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Figura 26: Plaza das Letras, vista frontal da fachada digital

Fonte: foto @ Miguel de Guzman (on-line)

No momento em que esta tese é escrita, o MP se encontra em fase de reforma para

ampliação, em função da qual vem a ocupar instalações provisórias no Intermedia Matadero,

no período de 7 de maio até dezembro de 2012. A mudança provoca uma reflexão sobre o

impacto da ampliação do espaço nos processos desenvolvidos por meio dos diversos

programas e atividades, levando ao debate da temática mediação e do papel do Medialab. A

ampliação modificará os modos de interação e interconexão até então praticados, pois

modifica a arquitetura do ambiente.

O Intermedia Matadero, local que, no momento, sedia as atividades do Medialab, foi

concebido como um laboratório voltado para a produção de projetos e para a inovação social,

especializado em cultura visual dirigida para a participação do público: investiga novas

formas de envolver diferentes audiências nos círculos da arte e da cultura. Destaca a condição

de existir como laboratório e não como um espaço museológico, segundo um movimento de

criação de modelos institucionais de caráter coletivo e de disseminação de projetos

emergentes e de produção de inovação87. Os dois laboratórios foram fundados por iniciativa

do Conselho de Artes da Cidade de Madrid, vinculados por uma perspectiva política local de

                                                                                                                         87http://intermediae.es/project/intermediae_en/page/a_laboratory_not_a_museum_2

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criar espaços de participação aberta e promover a cidadania e as cidades digitais, bem como

pelo fato de se organizarem como laboratórios de cultura digital.

O MP, baseado em processos abertos e experimentais de aprendizagem e construção

de conhecimento colaborativo, constitui-se como uma instituição de difusão cultural

caracterizado como um laboratório de mídias no formato de espaço aberto (openspace). Vem

agregar e incluir a participação, a intervenção e a interação direta do público na elaboração e

no desenvolvimento dos experimentos e das práticas, dos objetos culturais, artísticos e

científicos, do conhecimento teórico e experimental, difundidos em sua sede física e em seu

website, articulando e costurando ações entre o público comum, as instituições culturais e

artísticas, a academia, os coletivos independentes, o governo e as empresas. Para tanto,

oferece oficinas, exibições, leituras, seminários, sessões experimentais de áudio/vídeo, grupos

de debate, apresentações etc. Todas as atividades são gratuitas e abertas para a participação do

público, cuja predominância do perfil, embora sem limitação de idade, é adulta e jovem.

Segundo material de divulgação88, seu principal objetivo é criar uma estrutura em que

tanto a pesquisa quanto a produção sejam processos permeáveis à participação do usuário.

Para tal fim, oferece:

• um espaço permanente para informação, recepção e encontro, articulado por

mediadores culturais;

• as chamadas abertas para apresentação de propostas e participação no

desenvolvimento colaborativo de projetos.

As linhas de trabalho são organizadas para promover tal objetivo: híbridos de oficina,

exibição e seminário propiciam a criação de um espaço de reflexão, pesquisa e trabalho

colaborativo. Os dois vídeos institucionais disponibilizados no link http://medialab-

prado.es/article/que_es e a sequência de imagens de registro dos eventos ocorridos em sua

sede, acessados pelo Flickr http://www.flickr.com/photos/medialab-prado/, oferecem a

                                                                                                                         88Esse material se encontra disponível no site no link informações: http://medialab-prado.es/article/que_es. São apresentados dois vídeos: o primeiro de 1 minuto, acrescido de uma transcrição do texto em inglês, e um segundo de 15 minutos com mais detalhes.

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visualização de uma parcela de sua arquitetura funcional e cognitiva, bem como de seus

modos de funcionamento e processos até aqui descritos.

O vídeo Medialab en 1 minuto sintetiza o alinhamento do Medialab com a dinâmica

da cultura digital. A opção de apresentar um vídeo com tempo de um minuto estabelece uma

relação com os modos de atenção e agilidade requeridos para a velocidade e para o excesso de

informação em disponibilidade na web e sinaliza uma conexão com as linguagens digitais. O

vídeo se assemelha a uma apresentação do PREZI89 e parece comunicar apenas com 140

caracteres. Bem resolvido e de design minimalista, semelhante ao site, é de fácil comunicação

e interlocução com quem assiste. As legendas em espanhol e o texto em inglês, logo abaixo

do vídeo, permitem acompanhar o conteúdo do vídeo apresentado a partir de animações de

ícones que atuam de forma direta para comunicar a estética, a ética e a lógica para a qual

direcionam suas ações e suas metas. Destacamos as palavras que aparecem animadas e em

caixa alta, ao longo do vídeo: ABERTO, COLABORATIVO, EXPERIMENTAL.

Um segundo vídeo de 15 minutos de duração apresenta, com mais detalhes e de forma

mais pausada, uma descrição da instituição. Inicia apresentando vários frames dos vídeos em

tons esverdeados e com os movimentos acelerados. Telas são adicionadas, criando uma

multiplicidade de camadas; as imagens são do interior de suas instalações e criam, por sua

edição visual e sonora, a ideia de um ambiente ficcional/virtual/futurista e mutante que remete

às imagens de câmeras de vigilância. As imagens subsequentes contextualizam o espaço físico

e o tipo de ambiente dinamizado durante os eventos. Os programas realizados permitem

qualificar o tipo de atividade que desenvolvem, as variadas metodologias que utilizam, o

perfil predominante de um público jovem alinhado com o uso das tecnologias, o dinamismo

das relações, a presença e a relação com a cultura do “faça você mesmo” e da programação, a

descontração e informalidade e, ao mesmo tempo, a versatilidade e a seriedade conduzida nas

atividades e na relação com o espaço externo.

A centralidade do tratamento estético dado à informação e aos dados disponibilizados

é uma característica que norteia todo o material produzido e divulgado, cuidado que traduz

                                                                                                                         89Serviço on-line de construção de apresentações no estilo do Power Point, mas que inclui a possibilidade de utilizar animações, que geram formatos (como zoom) e movimentos não lineares, saindo do formato de janelas interligadas, para o de relações entre os tópicos.

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uma relação com a estética do banco de dados, presente também nas temáticas abordadas nos

programas, nos seminários, nos grupos de estudo e nas oficinas.

O ambiente físico e a plataforma virtual do MP são elementos importantes, criam um

ambiente dinâmico e flexível, que propicia a utilização de uma variedade de metodologias e o

acesso aberto aos processos, às práticas, aos dados e ao conhecimento produzido. Um

equilíbrio metaestável é favorecido pela mediação de um conjunto de elementos heterogêneos

materiais e formais: seja pela mediação humana, de objetos ou do design, seja pela arquitetura

dos ambientes, facilitando e propiciando trocas e fluxos de afetos, informação e

conhecimento, visíveis por meio de:

• Um ambiente físico flexível e aconchegante, contendo uma pequena biblioteca

e sofá, uma pequena cozinha, mesas para grupos, que podem ser desmontadas,

bancadas laterais com computadores para uso público, rede wi-fi, réguas com

saídas (tomadas) de energia elétrica, painéis magnéticos nas paredes para fixar

cartazes, fluxogramas, informações diversas, bancadas expondo em andamento

ou mostra dos projetos realizados;

• Um conjunto de canais de comunicação e memória que podem ser acessados

pelo link da plataforma http://medialab-prado.es/article/siguenos ou que são

indicados para uso durante a oficina, como: wiki, rss feed, flickr, fóruns,

streaming de atividades;

• Um banco de dados de vídeos, textos e podcasts que possibilita recuperar a

memória e acessar o conteúdo de oficinas, eventos, debates, seminários

realizados em sua sede;

• Transmissão por streaming da grande maioria de atividades vinculadas aos

programas. Um calendário e uma assinatura no rssfeed permitem acompanhar

datas, horário e conteúdo que será abordado;

• Design da plataforma simples, bem resolvido, chamando a atenção para a

atividade principal que ocorre em um dado período por meio de imagens e

texto explicativo na página principal e remetendo a outras atividades correlatas

ao tema, as quais aconteceram ou irão acontecer;

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• A presença de mediadores culturais: pessoas responsáveis por receber, acolher,

informar e ambientar visitantes, colaboradores, responsáveis pelos projetos,

organizar as atividades e o desenvolvimento do processo;

• Um rss feed atrativo e objetivo que comunica com imagens e sínteses as

atividades presentes, passadas e futuras.

Figura 27: Apresentação do AVLAB

Fonte: Flickr Medialab Prado

O fundo de sala na Figura 27 corresponde ao mesmo ambiente da Figura 28. Há um

certo ar de informalidade. A flexibilidade para adequar o ambiente ao tipo de evento e à

metodologia (expositiva, apresentação, grupo, oficina, etc) é uma das características que se

destaca. A interação com o entorno também (Figura 26) é priorizada, concretizada em

projetos como o Facede Digital. Recordamos que o subsolo tem uma comunicação com a

praça por vidros que permitem que o transeunte visualize o que ocorre no interior da sede,

convidando-o a participar pela mera observação ou por um convite a que adentremos o

espaço.

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Figura 28: Segundo dia de trabalho da oficina internacional Visualizar’ 11: compreender as infraestruturas; dedicado a visualização de infraestruturas compreendidas como grandes sistemas que suportam processos globais, desde os que produzem energia e água aos que possibilitam a comunicação global e mobilidade. Fonte: Flickr Medialab-Prado, Visualizar11

O registro, realizado pelo próprio Medialab e pelos participantes, forma um vasto

banco de imagens que configura uma narrativa imagética disponibilizada on-line. Digitando a

palavra Visualizar’11 e escolhendo a opção de busca “fulltext”, são registradas 407 fotos e

três fotógrafos principais: Medialab-prado, EOI (Escola de Organization Industrial) e Juan

Freire (Corunã –Spain). A maioria das fotos integra o registro diário do Visualizar’11 pelo

Medialab-prado, ocorrida no período de 14/06/2011 a 01/07/2011, três fotos postadas pela

EOI são relativas ao evento que ocorreu em 05/05/2011 no formato de mesa redonda com a

Temática: Experiências de “Dados Abertos e Inovação Aberta”. A foto da figura 30 permite

retraçar as associações entre os “três fotógrafos” identificados na busca do Flickr. O

Visualizar’11 ocorre com a parceria do EOI, em que Juan Freire é gestor e consultor de

projetos de Inovação.

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Figura 29: Imagem capturada da tela de computador da janela do Flickr, busca Visualizar’11, na lateral direita motores de busca relacionam outros participantes, redirecionando para imagens correlatas ao tema.

Fonte: Flickr, Medialab Prado

Figura 30: Mesa realizada em 05/05/2011 sobre o tema dados abertos

Fonte: Flickr, EOI

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Aplicando um zoom na imagem (a interface do Flickr permite a visualização das

imagens em vários tamanhos e aplicar a ferramenta do zoom), é possível distinguir os

integrantes da mesa, entre eles Juan Freire (o segundo da direita para esquerda) representando

a EOI. O texto explicativo contém um link90 para o vídeo do evento. Na página indicada, os

integrantes são identificados em suas competências e em suas relações com instituições e

projetos. Juan Freire é o moderador da mesa, professor e colaborador da EOI, os demais

participantes, seguindo a ordem da foto da esquerda para direita, são: Daniel Latorre,

desenvolvedor web do projeto DNDzgz91; Rubén Martín, técnico de projetos de dados abertos

da Fundación CTIC92; Alberto Ortiz de Zárate Tercero, responsável pelos dados abertos

Eukadi93 do Departamento da Justiça e Administração Pública do Governo Vasco. Essa

pequena inserção no banco de dados do Flickr, relativo ao Visualizar’11, vem traçar uma rede

de associações em torno de uma ação transversal entre os actantes aqui relacionados: o debate

sobre dados abertos, as cidades digitais, a gestão e a visualização de dados, o

desenvolvimento de tecnologias e aplicativos para acesso a dados e gestão de recursos. São

agenciamentos expressos no desenvolvimento de ações voltadas para a reflexão, pesquisa,

aprendizagem, desenvolvimento tecnológico, focados na política dos dados abertos, no

desenvolvimento de interfaces e na apropriação e na multiplicação dos meios e mediações.

Política, economia, inovação tecnológica, desenvolvimento de tecnologia em termos

de software e hardware, reflexões e práticas em torno da cultura digital, cultura de dados,

cultura livre, instituições acadêmicas, culturais e artísticas, organizações, grupos e coletivos,

comunidades de práticas e virtuais, colaboradores, artistas, designers, programadores,

pesquisadores, público leigo, jovens, adultos de todas as idades, crianças, mediadores

culturais, ambiente físico, plataformas, softwares que suportam partilha e desenvolvimento de

                                                                                                                         90http://www.eoi.es/portal/guest/evento/1580/innovacion-abierta-y-open-data 91Aplicativo para smartphones que permite identificar a parada de ônibus mais próxima e as redes wifi das cercanias, a partir de dados públicos disponibilizados na internet. Nasce como um projeto desenvolvido para Abredatos2010, concurso que propõe o desenvovilmento, em 48h, de um serviço tecnológico para os cidadãos baseado no uso de dados públicos. Entre as regras esta o uso de ao menos uma fonte de dados abertos, o trabalho em equipe (presencial ou não), a entrega do aplicativo funcionando e voltado para um serviço oferecido ao cidadão e fornecer o código aberto. O objetivo é gerar um debate em torno da necessidade dos órgãos públicos disponibilizarem os dados de forma acessível para uso e reuso por parte dos cidadãos. 92 CITIC é uma equipe interdisciplinar que desenvolve estratégias para melhorar os níveis de transparência do setor público através da publicação de dados em formato padronizado, aberto e acessível. O que permite o acesso de informações e dados de instituições públicas de um modo estruturado e e reutilizável por qualquer pessoa física ou jurídica. Conf.: datos.fundacionctic.org 93Open Data Euskadi é o portal de acesso dos dados públicos do Governo Vasco em formato reutilizável.

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projetos colaborativos e interativos, master’s livres e formais em cultura digital, metodologias

diversas (seminários, mesas redondas, encontros, oficinas, debates, eventos lúdicos,

apresentações e mostras artísticas), laboratórios de mídias, toda essa gama de actantes forma

um coletivo que aciona toda uma rede colaborativa mediada pelo MP.

5.4 VISUALIZAR’11: PLATAFORMA DE INVESTIGAÇÃO E APRENDIZAGEM

Uma das primeiras experiências, relacionadas com a investigação e com a

aprendizagem em torno do tema de visualização de dados, é oferecida na plataforma virtual

do MP. Acessando o link da convocatória, somos conduzidos de link em link, arquivo em

arquivo, a um banco de dados bem articulado e relacionado. Um fundo branco destaca

palavras e frases em vermelho que conduzem a outros links. A estrutura é a mesma para todas

as páginas da plataforma.

No topo, uma linha divide suavemente as informações sobre o MP, acessadas pelos

tópicos Infomation, Get involved, Follow us, Live e Archive, do lado direito das linhas de

trabalho e atividades oferecidas (workshops, AVLAB Meetings, Seminars, Work Groups,

Open Calls, Presentation and Debates). O vídeo exibido na página da convocatória explicita

os princípios teóricos e metodológicos do programa e da visualização de dados. Um outro

link, disponibilizado no final do texto introdutório, remete para outro vídeo, uma aula sobre a

história da visualização de dados de aproximadamente 1h com José Luis Vicente, o diretor do

programa.

Os vídeos apresentados na plataforma são bem elaborados, visualmente atrativos, e

apresentam um ritmo que associamos ao dinamismo presente nas atividades e, assim, tudo

convida à participação. Os conteúdos são apresentados de forma objetiva, são bem ilustrados

e editados, são narrados em espanhol com legenda em inglês ou vice-versa. O tempo em geral

é de até 15 min, exceto para os vídeos de registro das atividades oferecidas pelo MP. Possuem

um canal de streaming ativo, que transmite as apresentações, os debates, as mesas redondas,

as atividades dos workshops, os encontros e os seminários. Um banco de dados multimídia

pode ser acessado e permite realizar o download de cerca de 500 vídeos, arquivos sonoros e

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textuais, produção dos últimos 3 anos, cujo acesso e cuja utilização é livre, respeitado o tipo

de licença creative commons designada para os arquivos. O canal de comunicação follow us

apresenta as opções de acesso, a partilha, a redistribuição, o registro e as mídias sociais que

articulam a interconectividade entre os diversos elementos do coletivo.

Figura 31: Recorte da página da convocatória, vídeo apresentando o programa

Fonte: Medialab-prado.es

A documentação do processo é estimulada e priorizada. O wiki é uma dos principais

recursos de registro do processo, o fórum, o primeiro contato reunindo em cada projeto

possíveis colaboradores. A preocupação com a documentação é visível também no LaboCA.

O blog de Jeraman apresenta relato, vídeos, links para acesso aos códigos desenvolvidos,

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prática que tem origem na programação livre de softwares com o objetivo de melhor

compreensão da estrutura lógica de cada programador ao desenvolver um determinado

código. Ainda que a linguagem utilizada seja a mesma, cada programador tem seu estilo e

precisa documentar os passos para que possa ser compreendido, reproduzido e

‘reprogramado’.

A mediação não é só tecnológica. Há um equilíbrio entre a mediação tecnológica e

humana, na função dos mediadores e dinamizadores culturais. Os mediadores culturais têm a

função de receber os visitantes, apresentar o espaço e integrá-los ao ambiente e às atividades.

O MP oferece uma formação para quem desejar desenvolver atividades como mediadores e

dinamizadores culturais. No Flickr Mediación Cultural, uma das coleções do Flickr do

Medialab Prado, encontramos a seguinte descrição;

No funcionamento do Medialab é fundamental o trabalho dos mediadores e dinamizadores culturais, presentes sempre no espaço de atividades para que estes não sejam um lugar somente de emissão de informação, mas também de recepção, encontro, e conexão entre agentes diversos; os mediadores são ao mesmo tempo investigadores e agentes socioculturais que favorecem que as atividades programadas resultem em uma experiência produtiva e significante para todo o público.

Estes são, de fato, os primeiros que encontramos e conhecemos, mediando a

integração dos participantes entre si, com o ambiente, com os projetos de interesse, com os

recursos e com as tecnologias, disponibilizados para documentação e comunicação com o

entorno cultural, social e político de Madrid e do bairro. Apresentações lúdicas, como a

técnica do Pecha Kucha (uso de fotografia para construir uma narrativa com 20 imagens e

tempo de exposição de 20s, total 400s ou 6 min), são organizadas para melhor conhecer o

perfil dos participantes; busca-se uma integração com o contexto social e político, por

exemplo, na reconstituição do trajeto das manifestações que, naquele momento, aconteciam

por Madrid, como a ocupação da Plaza del Sol; um painel de fotos de todos os participantes é

produzido para melhor identificação nominal dos integrantes e como registro; um quadro

disponibilizado para que possamos escrever nossos contatos e interesses pessoais, por

exemplo, e-mail, fotografia, arte; os colaboradores são recebidos sem restrição, não há critério

de seleção, distinção de nível de conhecimento e capacitação. O acolhimento, a identificação

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e a gratificação são, na concepção de Vieira (2008), três atitudes relacionadas com as

propriedades que um sistema psicossocial precisa para permanecer, respectivamente: a

sensibilidade, a função memória e a elaboração. São agenciamentos mediados nas ações

promovidas pelos mediadores e pelos dinamizadores culturais e por uma agenda organizada e

metodologicamente planejada.

Três especialistas da área de visualização de dados orientam e fazem a crítica aos

projetos durante todo o processo. Assistentes, em geral programadores experientes, dão

suporte tecnológico e em programação no desenvolvimento dos projetos. Apresentações são

organizadas com a finalidade de avaliar criticamente e coletivamente o processo e dinamizar

sua organização e sua execução de objetivo. Na primeira apresentação, os idealizadores dos

projetos apresentam suas ideias para o público, logo no primeiro dia, com um tempo definido

de 15 min; nessa etapa, os colaboradores escolhem ou trocam de projetos de acordo com seus

interesses e com sua identificação (o que também pode ocorrer durante o processo ou algum

elemento novo pode vir a ser integrado). A segunda apresentação, com o tempo de 6 minutos,

é realizada pelo grupo, após uma semana de trabalho. A terceira possui um tempo de 3

minutos. A apresentação final, no último dia, é uma mostra dos protótipos que fica exposta

por mais dois meses no espaço. As apresentações, todas disponibilizadas na plataforma,

solicitam que os grupos objetivem suas ações e suas ideias, organizem o processo e realizem

sua documentação, possibilitando a evolução e a concretização dos objetivos.

Processos tradicionais como seminários, oficinas, debates, mesas redondas, reflexão

crítica, metodologias e técnicas de trabalho em grupo são utilizados; tecnologias de

comunicação em rede integram e conectam os participantes e os conteúdos; softwares de

registro compartilhado permitem a elaboração de um banco de dados e memória; softwares de

edição (imagem, som, texto) e programação possibilitam a autoria e a construção de

conhecimento com o uso de linguagens híbridas. A comunicação, uma ecologia

comunicacional, é um fator priorizado e percebido no modo como a informação é organizada,

tratada esteticamente e comunicada, e no uso de um conjunto de mídias para uma melhor

interconectividade. Solicita-se que haja um compartilhamento dos recursos utilizados, que

podiam ser registrados em um cartaz afixado no espaço, nos wikis e nas ferramentas de

registro e comunicação síncronas, como o Piratepad.

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Cada participante contribui com seu conhecimento específico, suas habilidades e suas

competências e as condições do ambiente estimulam a participação, a partilha e a

colaboração. No caso do projeto I’m hungry, Tian Li e Hernani Dias apresentaram, logo de

início, um fluxograma estruturado das ideias que gostariam de implementar na forma de um

app. Os tutores avaliavam as propostas, as intervenções dos colaboradores e as contribuições

que traziam e realizavam uma crítica do processo e das propostas, em reuniões com o grupo

ou durante as apresentações. Em alguns momentos, era percebida pelos participantes pouca

flexibilidade dos líderes do projeto em aceitar as opiniões e as sugestões, o que resultou num

sentimento de pouca aceitação e valorização dos atributos de cada um e, um consequente,

desestímulo e questionamento da adesão ao projeto. Um processo colaborativo não é isento de

crises, algumas delas relacionadas, principalmente, aos momentos em que há pouca abertura

para o acolhimento, a identificação e a gratificação dos participantes. O sentimento de fazer

parte e ter parte, de estar contribuindo para o desenvolvimento do processo, de ser valorizado

naquilo que tem para oferecer, é de fundamental importância em um processo dessa natureza.

A ausência desses fatores leva à dispersão e à fragmentação, contudo, para além desses

momentos, o que possibilitou a permanência do grupo e a concretização do protótipo

(REFARM APP) foi a afetividade e a ludicidade, que restauraram a confiança e a

credibilidade de que um projeto colaborativo pode, de fato, ser realizado e gerar resultados

gratificantes. O vídeo da apresentação final do projeto fornece uma leitura visual desse

processo. Ao final, quando o tempo urge e é preciso objetivar resultados, toda e qualquer

ajuda é valiosa. Enquanto uns programavam e finalizavam a interface visual, outros editavam

o vídeo da apresentação, produziam o material gráfico, cuidavam da alimentação do grupo. É

nesses momentos de “necessidade” de agir que a colaboração emerge com mais força.

REFARM APP reuniu em torno do desenvolvimento de um aplicativo de celular um

grupo heterogêneo: Adolfo Estalella, antropólogo espanhol; Ana Ceruti (43 anos), designer de

ambientes espanhola; Daniela Brill (21 anos), estudante de artes da Colômbia; Diego

Paonessa (42 anos), artista e designer de interface argentino; Enrique César (30 anos),

mexicano graduado em comunicação e design; Erica Takenouchi (35 anos), designer gráfica;

Miguel Alonso (33 anos), agricultor, videoartista e hacker espanhol; Hernani Dias

(coordenador), português graduado em designer e artes gráficas, ecodesigner; Izabel Goudart

(46 anos), química, educadora e fotógrafa brasileira; Tian Li (líder do projeto, 25 anos),

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mestrando em ciências da computação e tecnologia chinês; Rémy Greinhofer (30 anos),

graduado em ciências da computação, especializado em segurança de TI e ativista de software

aberto e livre francês; Max Kazemzadeh, artista e professor assistente de Arte e Mídia da

Universidade Gallaudet; USA, Medialabforun; I’m hungry Flickr álbum; re:farm blog; I’m

hungry Piratepad; Open spreadsheet; Table Pads; Processing; Open Street Map; Open gap

phone; sistema Android; celulares, notebooks; redes wi-fi; alegria; entusiasmo; generosidade

intelectual; e muitos momentos compartilhados em torno da mesa, um excelente ambiente

para fazer amigos e compartilhar o pão.

Essa narrativa pode ser reconstruída acessando a cartografia on-line. A quantidade de

informações textuais, sonoras e imagéticas solicita uma atenção flutuante que “revela uma

nova faceta da consciência, não como intencionalidade, mas como o domínio de mutações,

inclusive da própria intencionalidade” (KASTRUP, 2007, p. 17), atenção necessária para que

possamos apreender as dinâmicas de uma aprendizagem em rede, como se estivéssemos

capturando um pássaro em pleno voo.

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6.0 IVY-MARÃEN: A TERRA SEM MALES, ANO 2297

O povo iroquês de América do Norte exigia que os mais velhos somente tomassem suas decisões depois de considerar o impacto que teriam até sua sétima geração. Tenho para mim, que este é exatamente, o enfoque que necessitamos adotar em caráter urgente. Do contrário, pensar no futuro que herdaram nossos netos, parece insuportável. (GOLDSMITH, 2009, p. 8)

Darcy Ribeiro, em 1997, ocasião em que era senador da República, escreveu um texto

por encomenda do Senado, em que Ping e Olav, um chino e um escandinavo, viajavam pela

terra de Ivy-Marãen, palavra antiga da língua tupi-guarani que significa terra sem males. Ivy-

Marãen, além de designar a macro-nação que ocupava toda a América do Sul, corresponde à

morada de um povo só, os ivynos, unificados pela fusão das raças e integrados por uma

mesma língua e cultura. Ping e Olav, munidos de capacetes que possibilitavam uma

comunicação de seus pensamentos, em tempo real e direto, a múltiplas pessoas, por meio dos

sistemas mundiais de comunicação, mostravam, detalhadamente, tudo o que viam. Foram de

ponta a ponta, num estalar de dedos, transmitindo para o Lexomundo, a grande Universidade

do Mundo, por avançados sistemas de comunicação, tudo o que aprendiam e viam.

Espantaram-se com tudo o que presenciaram, assim como aconteceu com os cibernéticos que

os acompanhavam: a abundância reconstituída da natureza e os modos particulares e

integrados de viver e comunicar de seus habitantes, contextualizados aos ambientes que

habitavam e cheios de alegria de viver.

O Lexomundo emite o saber humano para toda a Terra e funciona como um enlace de

qualquer pessoa. Se esta desenvolveu bem seus talentos para conectar-se e pedir orientação, é

bem atendida e posta em contato com as pessoas mais capazes de ajudá-la no seu campo de

formação. Ao fim do período, terminada a formação, seus mestres a orientam a se inscrever

na universidade como um novo mestre, aberto a seus próprios discípulos. Dentre outras

características, chamou-lhes a atenção a modernidade dessa civilização (de Ivy Marãen),

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assentada na ciência mais avançada e na tecnologia de ponta, mas capaz de valorizar

profundamente toda a nossa herança humanística de forma generalizada.

A modernidade de Ivy-Marãen se expressa e se vê por toda parte e de muitos modos, principalmente na sua capacidade e gozo de comunicação com o mundo. Diante deles qualquer ser humano merece respeito como ser único, que vale à pena conhecer e ouvir. (RIBEIRO, 2008, p. 56)

A utopia de um mundo onde a diversidade é preservada em sua multiplicidade de

manifestações, ações e formas, onde o respeito por todas as nossas relações é generalizado e a

unidade de um povo, como os ivynos, é manifestada em sua capacidade ampliada de

comunicação com o mundo, parecia algo, até pouco tempo, impossível de ser imaginado e

sonhado. Hoje, ainda que nos pareça ser esta condição algo impossível de ser atingido,

presenciamos mutações mediadas pela comunicação em rede planetária de nossa

sensibilidade, sociabilidade, cultura e subjetividades. Uma perspectiva ecológica é retomada,

seja porque urge que coloquemos nossa atenção em nossas relações, seja pelo fato de que as

mutações que presenciamos implicam um consciência da mudança, cuja manifestação pode

ser percebida no “fosso entre gerações” ou na sensibilidade juvenil (MEAD, 1970; MARTÍN-

BARBERO, 2000).

RE:FARM APP: a new landscape to grow friends and food é fruto de uma experiência

de produção colaborativa, mediada pelas tecnologias e linguagens digitais, que, ampliando a

capacidade de comunicação e expressividade de um coletivo, possibilitou o enlace entre

homens e mulheres de nacionalidade, idade, formação, temperamento e personalidade

distintos, em torno do desenvolvimento de uma interface para celular, objetos que também

habita esse coletivo.

O slogan carrega átomos de mediações agenciadas por coletivos espalhados pelo

mundo: a criação de new landscap, novos ambientes, voltados para o crescimento.

Crescimento da amizade e do alimento, por meio de uma linguagem interativa e de

dispositivos físicos conectados por ondas eletromagnéticas, que geram condições para que um

ambiente participativo, de partilha e colaboração, emerja. Isto não é utopia, já que foi, de fato,

concretizado um protótipo, que não permaneceu apenas no papel. O mais importante não é o

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protótipo em si, mas o processo que resultou em sua concretização e as transformações que

originou. Voltamos a nossos países, porém ainda nos comunicamos e, dentro dos limites e

possibilidades de cada um e de seus contextos particulares, outras ações têm reverberado.

Figura 32: Storyboard elaborado para apresentação final e exposição dos projetos do Visualizar’11

Fonte: Arquivo pessoal

Um dos principais actantes que mobilizaram o direcionamento para o crescimento e

para a aprendizagem do coletivo foi o ambiente promovido por uma plataforma de

prototipado colaborativo, o MP. Um sistema ambiente voltado para a evolução, crescimento e

aprendizagem deve propiciar condições para que determinadas propriedades surjam e possam

garantir a autonomia do sistema, isto é, a capacidade de gerar sensibilidade, função de

memória e elaboração de informação de modo adequado para que o sistema permaneça e

evolua. O MP está em fase de pleno crescimento (de estrutura física e programas); suas ações

têm sido replicadas em vários outros ambientes, como: o Interctivos’12 em Mauá, que

acontecerá em novembro de 2012, e o Aprender Brincando, que inicia suas atividades na

segunda semana de setembro de 2012, logo após o depósito dos volumes deste texto, também

uma outra reverberação das trocas efetuadas com este ambiente, ambos projetos de caráter

aberto, participativo e experimental, baseados no desenvolvimento de projetos colaborativos,

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na cultura livre e de dados abertos. Trata-se de pistas de que a aprendizagem em rede tem um

grande potencial de germinar novas formas.

Comparemos com as palavras de Jacques Monod: Todos os homens de ciência devem ter, penso eu, tomado consciência de que sua reflexão, em nível profundo, não é verbal: é uma experiência imaginária, simulada com a ajuda de formas, de forças, de interações que só muito mal compõem uma “imagem” no sentido visual do termo. E aqui completamos por nossa conta e risco: artistas e cientistas são aqueles que encontram vias para flagrar, dar corpo, coisificar essas instâncias – instantes naquilo que chamamos suas grandes descobertas: ícones da sensibilidade que aspira a ser inteligida (arte) e ícones da intelecção que aspira a ser sensível (ciência). (SANTAELLA, 1980, p. 16)

A aprendizagem em rede foi, neste trabalho, descrita como um processo evolutivo que

emerge do crescimento e da evolução de três ecossistemas integrados e indissociáveis: o

ecossistema comunicacional (percepção); o ecossistema cognitivo (mente-espaço); o

ecossistema digital (mente-tempo) e a emergência da mente coletiva (plano da vida). Certos

padrões percebidos e vivenciados no experenciar do programa Visualizar’11 e na trajetória

espiralada que nos conduziu até o ambiente do Medialab Prado também fazem parte desta

descrição. Padrões que podem ser compreendidos como hábitos, na acepção peirceana desta

palavra, leis gerais que operam em direção à razoabilidade criativa, movimento tríplice da

ação sígnica, expressam-se nas categorias da primeiridade, secundidade e terceiridade.

Reproduzo aqui um outro trecho, entre muitos espalhados por esta tese, do pensamento

de Santaella (1980). Este não será o último, mas certamente é um reflexo da sensibilidade da

autora, sempre à espreita para captar o que está à frente de seu tempo e de sua lucidez, para

expressá-la de forma objetiva e, ao mesmo tempo, poética. O trecho é longo, mas vale à pena

ser lido:

O mais importante, porém, é que isso pode nos levar a crer que talvez não tenhamos de esperar até o ano de 2828 como preconizou Poe no Eureka, para que o dito pensamento científico humano possa se livrar da hegemonia e amarras da indução e dedução.

Mas, podemos ousar um pouco mais e levar nosso pensamento mais avante. O que vem a ser a sociedade sem classes, de contradições não antagônicas

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sonhada por Marx, senão uma estruturação social hiper-complexa cujas bases de organização repousam na coordenação, na parataxe, isto é, na analógica e não na subordinação e hierarquias rígidas? Não estaria Peirce no caminho certo ao dizer que a ética ou ciência da ação deveria repousar sobre a estética ou quase-ciência da analógica? É por acaso que Marx diz que a objetivação da existência humana, tanto no modo teórico como prático, representa tornar os sentidos humanos, assim como criar sentidos humanos correspondentes à vasta riqueza da vida humana e natural? É por acaso também que ele diz que uma sociedade sem classes não há pintores; quando muito, há pessoas que, entre outras coisas, pintam? É a partir disso que arriscamos afirmar que o homem não tenha encontrado vias de concretizar o sonho de uma sociedade frouxamente hierarquizada ou de contradições não antagônicas justo porque seu pensamento se mantém ainda agrilhoado à rigidez de hierarquias lógico-discursivas. É justamente o veneno da profunda irracionalidade da exploração do homem pelo homem e na qual as clausuras do saber se falam e o poder se instala, o que tem bloqueado os caminhos de uma estruturação social hierarquizada icônica ou analogicamente. Hierarquias analógicas não seriam aqui outra coisa senão a tradução da produtividade em relações de partilha, a da autoridade em relações de paridade, a da criatividade em relações de sabedoria (visto que a única sabedoria possível é a da criação – só sabemos bem aquilo que descobrimos) e a tradução da mutualidade em relações de reciprocidade. Não seria isso na correspondência com aquilo que Marx entendia por homem genérico? (SANTAELLA, 1980, p. 28-29, grifo nosso)

Apesar da falência das grandes narrativas, entre as quais o Marxismo se inclui, não

podemos deixar de lado o valor do pensamento de Marx. Essa analógica parece ter brotado na

multiplicidade contida na linguagem hipermídia, predominantemente icônica, cuja lógica

instaura um modo mais abdutivo de pensar e exige uma atenção fora de foco e uma atitude

colaborativa para reagrupar as associações por meio da produção de uma profusão de signos,

de um processo de semiose crescente, que vem ampliando as camadas da semiosfera, na

potencialização de mentes coletivas e de um processo de aprendizagem em rede.

Mas, que condições foram observadas e descritas ao seguirmos os rastros digitais?

Essas inscrições que, espalhadas nos bancos de dados em rede, carregam a materialidade dos

processos e as dinâmicas de aprendizagem que ali ocorreram?

A plataforma, que inclui espaço físico, interface digital e espaços intersticiais, tem sua

arquitetura baseada em três princípios: ser um ambiente aberto, participativo e experimental,

voltado para a produção colaborativa e para a investigação, a reflexão, a experimentação e as

práticas da cultura digital.

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A cultura aberta de dados, do software livre e do creative commons são princípios que

norteiam a elaboração da plataforma, bem como o aprendizado e a experimentação no uso das

linguagens e das tecnologias digitais como uma forma consciente da importância de

participarmos ativamente de como os dados são moldados, organizados e disseminados. Os

recursos tecnológicos de comunicação, registro e produção são priorizados em seu aspecto de

mediação tecnológica, que, afetando os planos da sensibilidade, da ação e da lógica, criam

condições para que a aprendizagem em rede ocorra e para que a mente coletiva emerja como

uma propriedade do sistema.

São três ecologias: a digital, que mobiliza o plano político; a cognitiva, que mobiliza a

produção de conhecimento e a transformação do ambiente; e a comunicacional, que propicia o

aumento de nossa sensibilidade por meio da interatividade, da interconectividade e da

interdependência (nutrir e cuidar das relações) do sistema. A colaboração é uma ação

coordenada pela participação e pela partilha, as quais só podem ocorrer em sistemas mais

flexíveis, horizontais e que valorizem todas as relações. As quatro ‘liberdades’ implícitas na

cultura do software livre, da ética hacker e do creative commons são princípios que emergem

com a cultura digital e com a expressão da estética, da ética e da lógica, que direcionam a

percepção, a ação e a conduta para uma analógica. Para que a aprendizagem em rede ocorra e

permaneça, é fundamental que estejamos atentos aos desdobramentos que estes originam e

aos novos ambientes que fazem brotar.

Lara (2011), educadora e pesquisadora espanhola que estuda os processos de

aprendizagem da cultura digital, durante uma sessão de debate do MP voltada para a temática

de discussão do papel dos laboratórios como o Medialab Prado, expõe as seguintes ideias,

síntese da novidade que parece estar por trás desses novos ambientes:

Existe sim, no entanto, uma profunda brecha manifesta entre os procedimentos, canais e objetivos da educação tradicional, aquela que nos rodeia no mundo físico mais próximo e o universo que temos aprendido a compreender na internet. Como construir pontes e como incorporar as lições aprendidas nos dois ambientes é o desafio. Precisamos, portanto, de satélites da cultura digital por bairros, espaços públicos onde as pessoas podem aprender a lógica de rede, onde é possível colocar em prática essas novas formas de pensar e de fazer juntos, onde a colaboração e o compartilhamento são as regras básicas de qualquer edifício do conhecimento.

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Estes espaços são os ramos naturais da rede, trazendo cultura digital para as ruas, traduzir os bytes em átomos e espalhar os seus valores em prática todos os dias. Esses espaços cidadãos bem projetados para educar-se a produzir, pensamento e ação, idéias e protótipos. A aprendizagem não tem que ser o alvo, mas é o resultado extraído de todo o processo. (LARA, 2011, p. 2).

Será esta uma das respostas possíveis para a indagação que Santaella (2010b, p. 6)

deixa em aberto ao falar sobre a aprendizagem ubíqua?

Ou seja, inaugura-se uma modalidade de aprendizagem que é tão contingencial, inadvertida e não deliberada que prescinde da equação ensino-aprendizagem caracterizadora dos modelos educacionais e da forma de educar. O que emerge, portanto, é um novo processo de aprendizagem sem ensino. Isto posto, cumpre indagar sobre as possíveis consequências que essas condições trazem para a educação.

Trata-se de ambientes flexíveis, mais oxigenados, que estimulem a diversidade e uma

atitude para a abertura e para a fluidez, que nos permita expandir nossos horizontes em

direção a um vir a ser cósmico. Quando há fechamento, imposição, limitação no universo das

escolhas, a cooperação é impossível:

A cooperação emerge quando você expande a percepção, abre o coração e está disposto a criar um resultado Maior que beneficie a todos. A cooperação é impossível quando você é rígido ou deseja controlar o resultado. Isso também acontece quando cooperando como o Universo. Coopere com todas as situações da vida, sendo aberto e fluido. Torne-se um Eu mais expandido. Integre as experiências da vida e os novos horizontes com fluidez. (Sincronário da Paz, 2012, p. 191)

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ANEXO 1