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CARACTERIZAÇÃO DE COMPOSIÇÕES A BASE DE CIMENTO DE
ALUMINATO DE CÁLCIO EM CONTATO COM SOLUÇÃO SIMULADORA DE
FLUIDO CORPORAL
I. R. Oliveira*, T. L. Andrade*, V. C. Pandolfelli**
*Universidade do Vale do Paraíba – Univap
**Universidade Federal de São Carlos - UFSCar
Av. Shishima Hifumi 2911, São José dos Campos – SP, 12244-000
RESUMO
O aluminato de cálcio como biomaterial tem sido avaliado por mais de duas
décadas com relação as suas propriedades físicas, mecânicas e de
biocompatibilidade. Os materiais a base de aluminato de cálcio (CAC) exibem,
devido suas características únicas de cura/endurecimento e microestrutura, um
grande potencial como biomaterial. O objetivo desse trabalho foi avaliar a
bioatividade de composições a base de CAC em contato com solução simuladora de
fluido corporal (SBF) quando comparado com material comercial usado na ortopedia
(PMMA). As composições foram preparadas pela adição ao CAC dos seguintes
materiais (i) dispersante, (ii) plastificante e (iii) um dos compostos (alumina, zircônia,
óxido de zinco, hidroxiapatita, fosfato tricálcico, quitosana e colágeno). Amostras
preparadas a partir dessas composições foram mantidas em contato com água e
SBF a 37oC. Medidas de pH e concentração de íons Ca2+ foram realizadas para as
amostras em função do tempo (até 21 dias). Amostras também foram mantidas em
contato com SBF durante 21 dias em um shaker e suas superfícies após secagem
ao ambiente foi avaliada por MEV e espectroscopia Raman Confocal. As amostras
avaliadas apresentaram superior bioatividade comparada ao PMMA.
Palavras-chave: cimento aluminoso, bioatividade, SBF, íons cálcio.
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INTRODUÇÃO
Cimentos usados na ortopedia devem preencher vários requerimentos médicos
tais como baixo valor de temperatura de cura (para evitar necrose térmica do tecido
ósseo durante o endurecimento do cimento), tempo de endurecimento moderado (tal
que o cimento não cure tão rápido ou tão devagar) e altos valores de resistência à
compressão (permitindo ao cimento curado suportar as cargas de compressão
envolvidas nas atividades diárias).
O cimento ósseo de maior aplicação na ortopedia é composto principalmente
de polimetilmetacrilato (PMMA) o qual apresenta excelentes propriedades
mecânicas comparadas a outros polímeros(1). Entretanto, PMMA apresenta algumas
deficiências com relação a propriedades de manuseio e biocompatibilidade. Além
disso, suas reações são exotérmicas gerando excesso de calor no tecido
circundante o que pode causar danos e não é injetado diretamente após a mistura
devido a sua consistência muito líquida e cheiro forte. Em decorrência destes
aspectos faz-se necessário o desenvolvimento de novos produtos visando superar
essas deficiências(1).
Outra classe de materiais que vem sendo estudada na área de ortopedia diz
respeito às cerâmicas ligadas quimicamente (CLQ), as quais formam um corpo
sólido por meio de reações químicas com a vantagem destas ocorrerem à
temperatura ambiente(2). Dentro desta classe, fosfatos e sulfatos de cálcio têm sido
extensivamente explorados para preenchimento de defeitos ósseos e para
estabilizar vértebras fraturadas(1,2).
Cimento de silicato de cálcio (CSC) e de aluminato de cálcio (CAC) também
são classificados como CLQ(1,3). Quando aplicado como biomaterial, o CAC tem
apresentado: 1) fluidez e melhores condições de trabalhabilidade(4,5), 2) preparação
a temperatura ambiente com possibilidade de ajuste da reologia e tempo de
endurecimento, alta resistência mecânica inicial e boa resistência a corrosão(2), 3)
biocompatibilidade quando testado em tecidos subcutâneos de ratos sem a
identificação de reações inflamatórias(6,7) e 4) capacidade de atuar como barreira
contra a microinfiltraçao bacteriana(8).
Além das características citadas acima, o uso deste cimento como biomaterial
também pode ser indicado para a ortopedia devido a suas características inerentes
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como alta viscosidade, permitindo injeção direta após a mistura, baixa reação
exotérmica e alta biocompatibilidade(1,9).
Alguns estudos tem reportado a aplicação do CAC na reparação de defeitos
ósseos, já que sua composição e seu coeficiente de expansão são bastante
semelhantes ao do osso humano(3,10). Composição de CAC contendo zircônia
também foi desenvolvida especialmente para aplicação em estabilização de fraturas
de compressão vertebral, resultando em valores de resistência à compressão similar
ao PMMA, estabilidade após seis meses em solução tampão de fosfato e porosidade
de 10-15%. Investigações em vértebras de ovelhas indicaram menor inflamação e
melhor adaptação do osso em materiais à base de CAC quando comparados com o
PMMA(1).
A exemplo da composição CAC-zircônia, neste trabalho foram preparadas
diferentes composições a partir da mistura de CAC com diferentes teores dos
compostos (alumina, zircônia, óxido de zinco, hidroxiapatita, fosfato tricálcico,
quitosana e colágeno), visando comparar a sua bioatividade com o cimento ósseo
comumente usado na ortopedia (PMMA).
MATERIAIS E MÉTODOS
Os materiais utilizados nesta etapa do trabalho foram: CAC (cimento de
aluminato de cálcio, Kerneos Aluminates – France), CACH produzido pela mistura a
seco de CAC com dispersante poliglicol (Bayer, 0,6%-p) e plastificante CaCl2.2H2O
(Labsynth, 2,8%-p) em moinho de bolas durante 1 hora; e os compostos: (1) alumina
calcinada (CT3000SG, Almatis), (2) zircônia (CC-10, Saint-Gobain), (3) óxido de
zinco (Synth), (4) hidroxiapatita (Sigma-Aldrich 21223), (5) fosfato tricálcico (Cadisa),
(6) quitosana (Polymar) e (7) colágeno bovino (tipo I, JBS).
Os compostos foram adicionados ao CACH em teores 4%-p, seguido de
homogeneização durante 1 hora com auxílio de moinho de bolas. Após a
homogeneização, as misturas foram usadas na preparação de suspensões aquosas
(80%-p de sólidos), com auxílio de agitador mecânico e usadas na preparação de
amostras (11 mm de diâmetro x 4 mm de altura) e (10 mm de diâmetro x 1 mm de
altura). Apenas para colágeno e quitosana foi adicionado 1%-p e utilizado
suspensões com 73 e 80%-p de sólidos, respectivamente.
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Após a preparação, as amostras foram mantidas em estufa a 37 oC durante 24
horas em ambiente saturado. Após este tempo, as amostras foram desmoldadas e
mantidas a 37oC em ambiente saturado durante 3 dias.
Amostras (11 mm x 4 mm) foram adicionadas a potes plásticos contendo 33 ml
de água ou solução simuladora de fluido corporal (SBF) e armazenadas em estufa a
37 oC. Medidas de pH e concentração de íons Ca2+ foram realizadas para as
amostras em função do tempo (até 21 dias). Foram utilizados um equipamento
medidor de pH (MA 522/E, Marconi) e um medidor multiparâmetros com eletrodo
seletivo para íons Ca2+ (série 930, Aprolab).
A solução SBF foi preparada utilizando-se uma quantidade dos reagentes em
uma proporção 1,5 vezes superior (SBF 1,5) a concentração de íons (mM)
inorgânicos presentes no plasma humano a fim de acelerar a formação de apatita(11).
Amostras (10 mm x 1 mm) foram adicionadas a potes plásticos contendo 19 ml
de solução simuladora de fluido corporal (SBF) mantendo-se uma razão área
superficial/volume de 0,1 cm-1, durante 21 dias sob agitação a 37oC usando um
shaker MA420. Após esse período, as amostras foram levemente lavadas com água
para remover a solução e posteriormente secas à temperatura ambiente.
A superfície das amostras foi caracterizada usando as técnicas de microscopia
eletrônica de varredura (MEV) a fim de avaliar a interação do material com as
soluções de fluido corporal simulado.
A fim de caracterizar as fases formadas na superfície das amostras após
contato com SBF todas as amostras usadas foram avaliadas usando a técnica de
espectroscopia Raman. As análises foram realizadas utilizando um sistema de
diagnóstico Rivers (modelo 3510) acoplado a um laser com fonte de excitação de
785 nm. A luz do laser é focada na superfície da amostra que esta sob uma janela
de quartzo. A potência do laser na amostra foi medida em 25 ou 28 mW. Os dados
raman foram coletados por um detector CCD. Analisou-se a impressão digital
espectral (400-1200 cm-1) com tempo de exposição de 5 segundos e 3 acumulações.
Os espectros foram obtidos com o foco apenas na superfície das amostras.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os resultados das medidas de pH e concentração de íons cálcio em água e em
SBF são apresentados nas Figuras 1 e 2.
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Figura 1: pH em função do tempo para água e solução SBF em contato com as
amostras.
Figura 2: Concentração de íons cálcio para água e solução SBF em contato com as
amostras.
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De acordo com a literatura, quando em contato com soluções contendo fosfato
como o SBF, materiais bioativos apresentam a habilidade em formar apatita (fosfato
de cálcio) na sua superfície(11-13). Materiais com essa camada de apatita
desenvolvem ligação química e integração biológica com o osso(14).
O aumento do pH da solução de SBF após contato com um material bioativo
promove a precipitação de apatita na superfície do material. As reações superficiais
que ocorrem durante o teste in vitro (contato do material com a solução SBF)
também podem ser acompanhadas por meio das alterações da concentração do íon
Ca2+ presente na solução SBF. A análise química quantitativa do íon cálcio, em
função do tempo de ensaio, permite estabelecer uma relação com os estágios de
formação da camada de fosfato de cálcio(15).
Quando um material bioativo é colocado em contato com SBF, inicialmente
ocorre um aumento da concentração de íons cálcio em SBF com a migração desses
íons da amostra para a solução. Posteriormente ocorre uma queda da concentração
de íons cálcio com a migração desses e do PO4-3 a partir da solução para a
superfície do material formando a camada de fosfato de cálcio(15,16).
Nas Figuras 1 e 2 observa-se o aumento do pH e da concentração de íons
cálcio quando mantidas as amostras em contato com água. Por outro lado, quando
em contato com SBF observa-se menor aumento do pH do meio devido a solução
SBF apresentar entre seus constituintes o tampão tris, (CH2OH)3CNH2. Maiores
aumentos de pH foram verificados na presença de óxido de zinco e principalmente
hidroxiapatita.
Também se observa que ocorre o decréscimo na concentração de íons cálcio
em SBF quando em contato com as amostras, indicando a formação de apatita na
superfície das amostras.
Os resultados obtidos por microscopia eletrônica de varredura (MEV), a fim de
avaliar a interação do material com as soluções de fluido corporal simulado, são
apresentados na Figura 3.
Observa-se que as amostras avaliadas apresentaram bioatividade verificada
por meio da precipitação de fases (apatitas) na superfície das amostras. Isso esta de
acordo com o comportamento verificado da concentração de cálcio em SBF em
função do tempo. Com a precipitação de apatitas, a concentração de íons cálcio no
meio SBF diminuiu.
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Figura 3: Microscopia eletrônica de varredura para amostras após contato com SBF
durante 21 dias, comparado com a amostra de PMMA.
Nos espectros Raman são obtidas as intensidades da radiação espalhada em
função de sua energia (número de onda, cm-1). Cada espécie química fornece um
espectro que é como sua impressão digital permitindo sua identificação inequívoca.
A forma das bandas obtidas por intermédio das medidas de Raman pode indicar se
o material é amorfo ou cristalino; quanto mais larga a banda do material, mais
amorfo ele se apresenta.
Os espectros Raman obtidos para as amostras de CACH contendo diferentes
compostos após tratamento com SBF são apresentados na Figura 4. Após
tratamento com SBF, é verificado pico característico do fosfato (~ 960 cm-1) mais
intenso para as amostras óxido de zinco e hidroxiapatita.
Na região entre 900 e 1.100 cm-1 é esperado a contribuição dos grupos
funcionais PO43- e CO3
2- da hidroxiapatita(17-19). A presença da assinatura Raman em
960 cm-1 correspondente ao grupo fosfato confirma que sobre as superfícies das
amostras nucleou hidroxiapatita após a imersão em SBF. Na amostra de PMMA não
foi verificado o pico característico, concordando com os resultados do MEV.
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A assinatura Raman típica da HA cristalina é um pico estreito em 960 cm-1(17,18).
O que não ocorre nos espectros das amostras que passaram pelos ensaios de
bioatividade. Estes dados permitem inferir que o grau de cristalinidade da HA obtida
nos ensaios de SBF é baixo, pois os modos vibração tem ampla dispersão nos seus
valores.
Figura 4: Espectros Raman para amostras após contato com SBF durante 21 dias,
comparado ao PMMA.
CONCLUSÕES
As composições avaliadas apresentam maior bioatividade quando comparado
ao PMMA, verificada por meio da precipitação de fases (apatitas) na superfície das
amostras. Isso esta de acordo com os resultados Raman, não sendo verificado pico
característico do fosfato (~ 960 cm-1) na superfície da amostra PMMA.
A presença da assinatura Raman em 960 cm-1 correspondente ao grupo fosfato
confirma que sobre as superfícies das amostras das composições de CACH nucleou
hidroxiapatita após a imersão em SBF.
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AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a Fapesp (2013/22502-8 e 2014/08988-8) e CNPq pelo
suporte financeiro.
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EVALUATION OF COMPOSITIONS TREATMENT BASED ON CALCIUM
ALUMINATE CEMENT IN BODY FLUID SOLUTION
ABSTRACT
Calcium aluminate cement (CAC) has been evaluated for more than two
decades with respect to its physical, mechanical, and biocompatibility properties.
This material exhibits great potential as a biomaterial, due to its unique
curing/hardening and microstructure characteristics. The objective of this study was
to evaluate the bioactivity of compositions based on CAC in contact with a solution
simulating body fluid (SBF) compared to commercial material used in orthopedics
(PMMA). The compositions were prepared by adding the following materials to CAC
(i) dispersing agent, (ii) a plasticizer, and (iii) one of the compounds (alumina,
zirconia, zinc oxide, hydroxyapatite, tricalcium phosphate, collagen, and chitosan).
Samples prepared from these compositions were kept in contact with water and SBF
at 37 °C. Measurements of pH and Ca2+ ions were performed for the samples in
function of time (21 days). Samples were also kept in contact with SBF for 21 days in
a shaker, and their surfaces after drying were evaluated by SEM and Raman
Confocal. The evaluated samples showed superior bioactivity compared to PMMA.
Key-words: calcium aluminate cement, bioactivity, SBF, calcium ions.
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