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CARACTERÍSTICAS SOCIO SÓCIODEMOGRÁFICAS DOS
BOLIVIANOS E PARAGUAIOS NO BRASIL – 2000/2010
Ralfo Matos*
Carlos Lobo**
RESUMO: Bolivianos e paraguaios no Brasil, a despeito de serem migrantes
geralmente pobres, podem ser social e demograficamente semelhantes? Os dados dos
censos de 2000 e 2010 permitem investigar essa questão com base em determinadas
características desses imigrantes, identificadas por variáveis específicas, bem como suas
referências em termos de distribuição geográfica. Esse trabalho se propõe a responder, a
partir das evidências dos dois últimos censos, as seguintes questões: I) bolivianos e
paraguaios procuram principalmente os grandes centros urbanos ou há um número
significativo deles em municípios de pequeno e médio porte dos principais estados
receptores?; ii) esses imigrante são de baixa escolaridade e renda, condição que tipifica
os municípios receptores de menor tamanho?; iii) os imigrantes são principalmente
jovens ou adultos acompanhados de familiares e parentes? Esse tipo de investigação é
necessária para conhecer melhor as trajetórias de imigrantes sul-americanos muito
numerosos que têm procurado continuamente melhores condições de vida no Brasil. O
objetivo desse trabalho é, portanto, verificar se aspectos da seletividade socioespacial da
migração vêm se mostrando decisivos para o menor ou maior êxito desses trabalhadores
em sua inserção ocupacional no país. Além de padrões espaciais distintos, os resultados
indicam diferenças importantes entre essas duas nacionalidades de imigrantes. Diferente
dos paraguaios, os bolivianos englobam populações, em sua imensa maioria, em plena
idade ativa e de renda muito baixa.
PALAVRAS-CHAVE: Imigração estrangeira; Paraguaios; Bolivianos.
* Doutor em Demografia. Professor do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-Graduação em
Geografia do Instituto de Geociências da UFMG. **
Doutor em Geografia. Professor do Departamento de Geografia e dos Programas de Pós-Graduação em
Geografia e em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Instituto de Geociências da UFMG.
Subcoordenador do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IGC/UFMG.
INTRODUÇÃO
Brasil e vários países da bacia do Prata têm uma história comum que data do
início do período colonial, quando as frentes de exploração e ocupação desbravaram a
região, algumas delas orientadas pelas fabulosas riquezas encontradas nas minas de
prata de Potosi, na atual Bolívia. Trata-se de uma vasta região em que o quadro natural
sempre foi reconhecido como de valor estratégico, tanto em termos econômico, como
geopolítico, e pivô de disputas entre as coroas espanhola e portuguesa pelo domínio das
rotas comerciais nos séculos XVI e XVII (MATOS et al., 2004). Heranças históricas,
níveis de desigualdades sociais e econômicas, estrutura fundiária concentrada, caráter
oligárquico dos Estados, tamanho e características da população, níveis de dependência
da economia internacional, são elementos discutidos e considerados chaves para o
entendimento dessas economias regionais o que inclui a mobilidade espacial da
população. A discussão e a reflexão teórica sobre essas questões nunca deixaram de ter
importância, talvez porque os fluxos migratórios e seus significados econômicos e
espaciais não perderam intensidade nos últimos 50 anos. Uma das causas desse
fenômeno associa-se à dinâmica e mecanismos estruturais das economias de mercado,
que, frequentemente, acabam acirrando as desigualdades socioespaciais em regiões não
desenvolvidas que se integram subalternamente ao capitalismo internacional.
Esses migrantes têm sido objeto de vários ensaios e pesquisas que procuram
retratar suas características demográficas no Brasil, a exemplo de Azevedo (2005);
Baeninger, (2004); Pereira (2007); Roca (2008); Marques (2008); Matos e Lobo (2010);
Souchaud (2011). Contudo, nas últimas décadas, bolivianos e paraguaios têm
aumentado sua presença em várias grandes cidades brasileiras. São, em geral,
procedentes de regiões geográficas muitos distintas, sendo a cordilheira dos Andes um
dos fatores locacionais de grande diferenciação entre eles.
A despeito de serem migrantes geralmente pobres, podem ser semelhantes social
e demograficamente? Os dados dos censos de 2000 e 2010 permitem, responder
parcialmente essas questões com base na verificação de determinadas características
desses imigrantes e de suas preferências em termos de distribuição geográfica. Esse
trabalho se propõe a responder, com evidências resultantes dos dois últimos censos, as
seguintes questões: i) bolivianos e paraguaios procuram principalmente os grandes
centros urbanos ou há um número significativo deles em municípios de pequeno e
médio porte dos principais estados receptores? ii) esses imigrantes são jovens, de baixa
escolaridade e muito mal remunerados?
Esse tipo de investigação parece necessária, não apenas para conhecer melhor as
trajetórias de imigrantes sul-americanos muito numerosos e que têm procurado
continuamente melhores condições de vida no Brasil. Afinal, outros trabalhos podem se
alimentar de parte das evidências aqui reunidas. Assim, um dos objetivo desse estudo é
verificar se aspectos da seletividade da migração vêm se mostrando decisivos para o
menor ou maior êxito desses trabalhadores em sua inserção ocupacional no país ou não.
Afinal, a superexploração de paraguaios e bolivianos continua sendo uma constante? Ou
há exceções nesse quadro laboral dependendo das localidades receptoras dos
imigrantes?
A mobilidade espacial recorrente de trabalhadores migrantes, ao ser examinada
na perspectiva supranacional, carrega elementos relativos à (re)estruturação do território
derivadas, por exemplo, de mudanças na dinâmica demográfica e econômica na
América do Sul. Dessa forma, é relevante trazer evidencias recentes sobre as
características sóciodemográficas dos bolivianos e paraguaios recenseados no Brasil
(país de nascimento declarado), tendo como base os dados amostrais dos censos
demográficos brasileiros de 2000 e 2010. Nesse trabalho, foram utilizados os dados de
migração intercensitária que discriminavam os estrangeiros, naturais da Bolívia e
Paraguai, que fixaram residência no Brasil nos últimos 10 anos, contados de acordo com
o ano de referência de cada censo.
I – A PRESENÇA ESTRANGEIRA NO BRASIL: A PARTICIPAÇÃO DA
MIGRAÇÃO SULAMERICANA
Na América Latina, os fluxos de imigrantes procedentes da Europa, África e
Ásia foram intensos e recorrentes há séculos. Nos atuais espaços metropolitanos, os
imigrantes internacionais desenvolveram uma série de atividades e introduziram
hábitos, muitos dos quais permanecem vivos até hoje. Todavia, nas últimas décadas do
século XX, novas tendências migratórias parecem emergir, sobretudo em virtude de
acordos supranacionais que deram outros significados à integração econômica e política
sul-americana. Esse cenário geopolítico, demográfico e migratório mais recente deu
margem a múltiplas análises que aprofundaram o entendimento das conexões entre os
mecanismos e processos econômicos vis-à-vis a mobilidade espacial entre países latino-
americanos, como fizeram Singer (1973), Gaudemar (1977), Massey (1993), Patarra
(1997), Bauman (1999), Sayad (2000), Woodward (2000), Baeninger (2004), Matos et
al., (2004); Sala et al., (2004).
Por força da ação de agentes que estabelecem redes de fluxos variados, como os
de capitais, mercadorias e pessoas, que redinamizam territórios e alteram fisionomias
regionais, os nexos entre população e espaço reordenam espaços geográficos em
diferentes escalas. Na esfera desses nexos, a migração pode assumir um caráter mais ou
menos permanente, a depender do perfil e das características dos migrantes, da
conjuntura econômica, do grau de cooperação entre os países, dos níveis de
diferenciação étnico-culturais, das políticas de governo e da participação dos Estados
nas economias nacionais.
Em tempos de internacionalização e mundialização, a discussão teórica e
empírica sobre fluxos migratórios ganha mais importância entre os países da América
Latina e tem ensejado novos significados. O Brasil, nos últimos 15 anos, alcançou
notoriedade e relativo protagonismo em fóruns econômicos e geopolíticos, nos quais a
questão dos direitos humanos e dos migrantes internacionais alcançou alguma
visibilidade; o que interfere em prováveis alternativas de destino para migrantes
estrangeiros potenciais, em razão das oportunidades de trabalho e de investimentos que
ensejam os momentos de retomada do crescimento da economia brasileira, a despeito de
o Brasil ter experimentados nas décadas de 1980 e 1990 expressivas perdas migratórias
internacionais1.
O país de fato conheceu uma acentuada redução das trocas migratórias
internacionais durante boa parte do século XX, particularmente no período 1940-1950.
Em meados dos anos 1980, diante de alteração nos sistemas migratórios internacionais e
de dificuldades econômicas ganhou visibilidade a emigração internacional de
brasileiros. Se, em 1940, as estimativas davam conta de que mais de 1,4 milhão de
estrangeiros viviam no país, as últimas décadas do século XX deixam evidente a
redução desses números: de 912 mil, em 1980, a 767.781 em 1991 e 651.226 em 2000.
(PATARRA, 2005). Ao se examinar os dados referentes ao Censo de 2010, verifica-se
que a proporção de estrangeiros residentes no território brasileiro reduziu-se para cerca
1 Carvalho e Campos (2006), a despeito das dificuldades técnicas derivadas da variação de cobertura entre
os Censos de 1991 e de 2000, mostram que o Brasil, entre 1980 e 1990, teve um saldo migratório
negativo de aproximadamente 1.800.000 pessoas. Esse saldo, ainda negativo, reduziu-se para cerca de
550 mil pessoas, no decênio 1990/2000. Tal declínio deve se explicar pela diminuição da emigração
brasileira. De outra parte, a imigração internacional apresentou pequeno incremento nos dados censitários
de 1991 e 2000.
de 10% (592.570 pessoas), embora os números relativos a estrangeiros e naturalizados
da década de 2000 tenham aumentado (LOBO et al. 2014). O fato é que, a despeito da
queda no estoque acumulado de imigrantes internacionais no período 1991-2010, a
migração do último intervalo intercensitário, obtida com base no ano de fixação de
residência no país, registrou um incremento significativo: o número de estrangeiros
passou de 68.550, em 1982, para 164.420, em 1991 - uma elevação de quase duas vezes
e meia. A participação dos imigrantes do período 2000-2010 quase alcançou os 28% do
total de estrangeiros que residiam no Brasil em 2010 (LOBO et al., 2014).
Uma primeira observação relevante, como já demonstrado por Patarra (2005),
refere-se a expressiva redução da população estrangeira residente no Brasil, ainda que
no início do século passado, de 1900 para 1920, ela tivesse crescido fortemente. Em
1900 a população estrangeira era estimada em mais de um milhão de pessoas, o que
correspondia a mais de 6% da população residente no país (ver Figura 1). No último
Censo Demográfico, um total de 431.319 estrangeiros residia no Brasil. Esse volume
representava apenas 0,23% de toda a população brasileira em 2010. Essa queda na
participação estrangeira se deve, de um lado, à significativa redução dos fluxos de
trabalhadores imigrantes sobretudo após 1930; e, de outro, ao retorno e reemigração de
muitos dos imigrantes que viviam no Brasil nas primeiras décadas do século XX.
Figura 1: População estrangeira residente no Brasil: número e participação na população
total, 1900 a 2010
Fonte: Censos Demográficos brasileiros. Extraído e adaptado de Patarra (2005).
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
7,0
0
200
400
600
800
1.000
1.200
1.400
1.600
1900 1920 1940 1950 1970 1980 1991 2000 2010
%
Nº
(Mil
ha
res)
População Estrangeira Estrangeiros (%)
Considerando a tendência de queda da presença de estrangeiros no país, a
intensificação na entrada de migrantes no Brasil nas últimas décadas do século passado,
sobretudo a partir de 1980, sugere ter sido expressiva e crescente participação de
brasileiros retornados. A própria distinção da origem internacional desses fluxos
migratórios confirma essa assertiva, tendo em vista o elevado crescimento da imigração
com origem na Europa e América do Norte (destinos preferenciais da emigração de
brasileiros). A América Latina e o Caribe também são áreas de origem de onde partem
a maior parte dos imigrantes internacionais que residem no território nacional. Esses
números cresceram em 2010, embora fossem mais representativos no ano 2000
(43,6%), já que em 2010 perderam a primazia diante do expressivo aumento dos
imigrantes procedentes da Europa (140.638 pessoas). De toda a forma, a contribuição
dos imigrantes da América Latina no Brasil é crescentemente importante, como
mostram frequentes notícias da mídia sobre a presença de trabalhadores provenientes do
Haiti, Bolívia e Paraguai em busca da sobrevivência.
Tabela 1: Imigrantes estrangeiros de última etapa recenseados no Brasil em 2000 e 2010
segundo os continentes de origem
Fonte: Censos Demográficos de 2000 e 2010.
Brasil, Bolívia e Paraguai são países vizinhos e isso explica parte do incremento
dos fluxos de bolivianos e paraguaios para o Brasil em números relativamente
significativos. A presença considerável dos naturais desses países entre os dois últimos
censos foi notável, sobretudo no caso dos bolivianos que mais que triplicaram seus
Continentes 2000 2010
Imigrantes % Imigrantes %
América Latina e Caribe 121.242 43,63 130.310 28,89
América do Norte 39.805 14,32 84.294 18,69
Europa 58.564 21,07 140.638 31,18
Ásia 50.076 18,02 79.085 17,53
África e Oceania 8.219 2,96 16.723 3,71
Total 277.906 100,00 451.050 100,00
efetivos no Brasil, enquanto o número de paraguaios aumentou em quase 80%2. São
geralmente trabalhadores pobres de países vizinhos da América do Sul e talvez por isso
pode-se pensar que possuam características semelhantes. Isso é verdade, a julgar pelos
dados dos dois últimos censos brasileiros?
II – A IMIGRAÇÃO DE BOLIVIANOS E PARAGUAIOS NO BRASIL:
PADRÕES ESPACIAIS E DIFERENÇAS SÓCIODEMOGRÁFICAS
Os dados apresentados na Tabela 2 indicam que há uma clara distinção entre as
áreas preferenciais de destino de bolivianos e paraguaios no Brasil. Enquanto mais de
85% dos bolivianos estavam residindo em municípios metropolitanos em 2010, os
paraguaios se distribuíam por um conjunto muito maior de municípios e preferiam
tentar fixar-se nos municípios com população inferior a 50 mil habitantes (42,7% em
2010 e 44,7% no ano 2000).3 As figuras 2 e 3 demostram a distribuição espacial dos
imigrantes naturais da Bolívia e do Paraguai. Enquanto os bolivianos concentram-se nos
principais núcleos metropolitanos brasileiros, especialmente São Paulo e Rio de Janeiro,
os paraguaios são consideravelmente mais numerosos nos municípios próximos à região
de fronteira com o Paraguai, especialmente aqueles que pertencem aos estados de Rio
Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Mato Groso (embora em
2010 também haja uma presença significativa deles nas áreas metropolitanas de São
Paulo e Rio de Janeiro).
Contudo, um fato novo entre as áreas de destino dos dois últimos censos é a
maior difusão desses imigrantes por um número maior de municípios dos estados
vizinhos supramencionados. A distribuição alterou-se particularmente no caso dos
bolivianos que passaram a residir em várias das capitais desses estados. E o que dizer
das características sociais e demográficas desses imigrantes no que tange a idade e
escolaridade? Os dados da Tabela 3 permitem observar que os bolivianos são mais
2 Sales (1996) já observava, que os movimentos migratórios de fronteira entre Brasil, Uruguai, Paraguai e
Argentina pareciam se expandir associados às questões de luta pela terra. Recentes migrações de fronteira
causadas por questões agrárias envolveriam tanto a migração de proprietários rurais em busca de terras
mais baratas quanto a trabalhadores rurais ou pequenos produtores em busca de condições de
sobrevivência, após terem sofrido as consequências de processos de expulsão derivados da modernização
conservadora (SALES, 1996). 3 Os bolivianos são particularmente numerosos nas cidades de São Paulo onde se submetem a condições
de trabalho mal pago em fabriquetas da área de confecção e têxteis. Mais detalhes em Azevedo (2005);
Matos e Lobo (2010) e Pereira (2007).
velhos que os paraguaios, com idades variando entre 22 e 25 anos, embora no ano 2010
os dados mostrem os paraguaios menos jovens do que no ano 2000. É plausível supor
que a menor idade dos naturais do Paraguai seja decorrente da elevada participação da
migração familiar. Em termos de escolaridade, considerando apenas a população com
15 ou mais anos de idade, verifica-se que os paraguaios são mais alfabetizados que os
bolivianos em 2000 e 2010, a despeito de os bolivianos terem melhorado sua
escolaridade entre os 10 anos dos dois últimos censos.
Tabela 2: Número e percentual de imigrantes de data fixa, naturais da Bolívia e do
Paraguai, residentes nos Municípios Metropolitanos, de Pequeno Porte e Demais
Municípios, Brasil em 2000 e 2010.
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).
Tabela 3: Idade Mediana e Taxa de Alfabetização dos imigrantes da década, naturais da
Bolívia e do Paraguai, residentes nos municípios metropolitanos, de pequeno porte e
demais localidades – Brasil 2000 e 2010
Nota: Para cálculo da Taxa de Alfabetização foi excluída a população com idade inferior a 15 anos.
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).
Nº % Nº % Nº % Nº %
Municípios Metropolitanos 4.497 64,54 18.915 85,46 2.027 18,17 5.472 27,43
Demais Municípios 1.319 18,93 1.597 7,22 4.142 37,13 5.963 29,88
Pequenos Municípios 1.151 16,52 1.620 7,32 4.986 44,70 8.518 42,69
Total 6.967 100,00 22.132 100,00 11.156 100,00 19.953 100,00
Localidades
Selecionadas2000 20002010 2010
Bolivianos Paraguaios
2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010
Municípios Metropolitanos 25 25 15 23 98,53 98,88 97,20 97,77
Demais Municípios 25 25 18 22 95,05 94,72 91,49 94,24
Pequenos Municípios 22 23 11 18 91,85 97,15 82,81 92,23
Total 25 25 14 21 96,99 98,50 89,46 94,59
Localidades
Selecionadas
Idade Mediana (em anos) Taxa de alfabetização (%)
Bolivianos Paraguaios Bolivianos Paraguaios
Figura 2: Imigrantes da década, naturais da Bolívia, residentes nos municípios
brasileiros 2000 e 2010
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).
Figura 3: Imigrantes da década, naturais do Paraguai, residentes nos municípios
brasileiros 2000 e 2010
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).
No que tange aos quesitos relativos à ocupação e renda os dados revelam que os
bolivianos residentes em municípios metropolitanos apresentam maiores taxas de
ocupação que os paraguaios nos anos de 2000 e 2010. Em ambos os censos a razão de
ocupação dos bolivianos foi superior a 64%, embora nas demais classes de tamanho de
município os percentuais de população ocupada se situem próximos dos 45% (à exceção
dos 54,59% de paraguaios ocupados no ano 2010 entre os residentes nos Demais
Municípios, os quais reúnem muitas das cidades médias do Sudeste). Novamente, há
indícios de uma migração específica no caso de bolivianos: de populações em idade
laboral, com perfil não familiar (baixo volume de populações com idade inferior a 15
anos e superior a 65 anos).
Quanto a renda auferida no trabalho, os dados da Tabela 4 e da Figura 4,
indicam relações distintas entre esses dois grupos, embora ratifiquem antigas evidências
no que tange a condição de trabalhadores pobres de baixa renda. As diferenças se
explicam principalmente porque no ano 2000 a renda mediana dos bolivianos era
sensivelmente mais alta que a de 2010 em todas as classes de tamanho de municípios, e
talvez por isso mesmo também ostentassem rendas superiores aos seus vizinhos naturais
do Paraguai. Em 2010, entretanto, há uma alteração nesses números: os paraguaios das
áreas metropolitanas e de municípios intermediários possuíam rendas medianas
superiores às dos bolivianos (1,5 s.m. contra 1,3 s.m. e 1,2 s.m. contra 1,1 s.m.). Já entre
os pequenos municípios, onde os paraguaios são mais numerosos inverte-se essa relação
(1,3 s.m. contra 1,0 s.m.). Chama atenção, no caso dos bolivianos, a elevada frequência
de ocupados com rendimento de um salário mínimo, muito superiores aqueles sem
rendimento e/ou com ganhos mais elevados.
Tabela 4: Percentual da População Ocupada e Renda Mediana, em Salários Mínimos
(SM) dos imigrantes da década, naturais da Bolívia e do Paraguai, residentes nos
municípios metropolitanos, de pequeno porte e demais localidades – Brasil 2000 e 2010
Nota: A população ocupada foi aferida tendo como base a existência de trabalho remunerado nas semanas
de referência dos Censos Demográficos, que foram de 23 a 29 de julho de 2000 e de 25 a 31 de julho de
2010. Também foi excluída a população com idade inferior a 10 anos. Os valores do Salário Mínimo
utilizados como referências nos Censos de 2000 e 2010 foram, respectivamente, R$151,00 e R$510,00.
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).
2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010
Municípios Metropolitanos 64,19 74,23 38,77 65,49 2,65 1,27 2,32 1,53
Demais Municípios 45,68 42,11 45,20 54,59 3,31 1,10 1,52 1,18
Pequenos Municípios 47,54 43,48 28,15 46,33 1,99 1,37 1,00 1,00
Total 58,45 69,98 37,30 54,34 2,65 1,27 1,52 1,18
População Ocupada (%)Localidades
SelecionadasBolivianos ParaguaiosBolivianos Paraguaios
Renda Mediana (SM)
Figura 4: Diagrama de Caixa (Bloxplot) e histograma de frequência da renda dos
imigrantes da Bolívia e Paraguai residentes no Brasil, 2010
Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2010 (dados da amostra).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Antigas e novas territorialidades parecem se afirmar no Brasil meridional.
Expressivos fluxos populacionais na região – que não corroboram hipóteses de uma
suposta desterritorialização – parecem contribuir para uma nova etapa de estruturação
de novas territorialidades locais, intensificando, inclusive, as relações entre o Brasil e os
países vizinhos. O balanço das perdas e ganhos populacionais do Brasil com outros
países revela-se, de acordo com os dados do Censo de 2010, expressivo. O território
brasileiro assistiu ao incremento na entrada de imigrantes internacionais no intervalo
intercensitário 2000/2010. Parcela importante desses imigrantes realizou pelo menos
outro movimento migratório dentro das fronteiras nacionais, certamente reflexo direto
da ampliação das relações do Brasil com os países vizinhos. É provável que a dinâmica
migratória em vastas frações territoriais do Brasil seja reflexo de novos arranjos
políticos e econômicos no Cone Sul que, a trancos e barrancos ganharam expressão no
período 2000/2010, onde novas alternativas são impostas por forças econômicas de
escala ampla. Ações governamentais interferem nas transações comerciais e nas
variações tarifárias e cambiais. Políticas agrícolas são praticadas em países dessa região
e desencadeiam movimentos populacionais, notadamente nas zonas de fronteira, e
aglutinam movimentos sazonais ou circulares associados a movimentos
macroeconômicos, às atividades agrícolas, à construção de grandes obras de
infraestrutura que mobilizaram grandes empresas brasileiras.
Muitos dos imigrantes sulamericanos que chegaram ao Brasil nas últimas
décadas localizavam se em municípios próximos da fronteira (da porção brasileira da
bacia hidrográfica Paraguai/Paraná), embora fossem numerosos nas áreas
metropolitanas. A cartografia desses movimentos migratórios pôs em evidência a maior
dispersão regional dos deslocamentos realizados pelos paraguaios quando confrontados,
em especial, com os deslocamentos dos bolivianos. Centralidades de cidades-polo do
Brasil nas áreas próximas das fronteiras explicam parte dos movimentos migratórios
recentes, ainda que o poder de atração das regiões metropolitanas continue proeminente,
especialmente no caso dos bolivianos. Além de padrões espaciais distintos, os
resultados indicam diferenças importantes entre essas duas nacionalidades de
imigrantes. Diferente dos paraguaios, os bolivianos englobam populações, em sua
imensa maioria, em plena idade ativa e de renda muito baixa.
AGRADECIMENTOS: Ao CNPq e FAPEMIG ao financiamento de projetos de
pesquisa. Em especial a FAPEMIG pelo apoio financeiro destinado pelo Programa
Pesquisador Mineiro (PPM).
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