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CARACTERÍSTICAS SOCIO SÓCIODEMOGRÁFICAS DISTINTIVAS DE BOLIVIANOS E PARAGUAIOS NO BRASIL EM 2000 E 2010 Ralfo Matos * Carlos Lobo ** RESUMO: Bolivianos e paraguaios no Brasil, a despeito de serem migrantes geralmente pobres, podem ser social e demograficamente semelhantes? Os dados dos censos de 2000 e 2010 permitem investigar essa assertiva com base em determinadas características desses imigrantes e de suas referências em termos de distribuição geográfica. Esse trabalho se propõe a responder, a partir das evidências dos dois últimos censos, as seguintes questões: I) bolivianos e paraguaios procuram principalmente os grandes centros urbanos ou há um número significativo deles em municípios de pequeno e médio porte dos principais estados receptores?; ii) esses imigrante são de baixa escolaridade e renda, condição que tipifica os municípios receptores de menor tamanho?; iii) os imigrantes são principalmente jovens ou adultos acompanhados de familiares e parentes?. Esse tipo de investigação é necessária para conhecer melhor as trajetórias de imigrantes sul-americanos muito numerosos que têm procurado continuamente melhores condições de vida no Brasil. Assim, o objetivo desse trabalho é, portanto, verificar se aspectos da seletividade socioespacial da migração vêm se mostrando decisivos para o menor ou maior êxito desses trabalhadores em sua inserção ocupacional no país. Além de padrões espaciais distintos, os resultados indicam diferenças importantes entre essas duas nacionalidades de imigrantes. Diferente dos paraguaios, os bolivianos englobam populações, em sua imensa maioria, em plena idade ativa e de renda muito baixa. PALAVRAS-CHAVE: Imigração estrangeira; Paraguaios; Bolivianos. * Doutor em Demografia. Professor do Departamento de Geografia e dos Programas de Pós-Graduação em Geografia e em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Instituto de Geociências da UFMG. ** Doutor em Geografia. Professor do Departamento de Geografia e dos Programas de Pós-Graduação em Geografia e em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Instituto de Geociências da UFMG. Subcoordenador do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IGC/UFMG.

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CARACTERÍSTICAS SOCIO SÓCIODEMOGRÁFICAS

DISTINTIVAS DE BOLIVIANOS E PARAGUAIOS NO BRASIL EM

2000 E 2010

Ralfo Matos*

Carlos Lobo**

RESUMO: Bolivianos e paraguaios no Brasil, a despeito de serem migrantes geralmente

pobres, podem ser social e demograficamente semelhantes? Os dados dos censos de 2000

e 2010 permitem investigar essa assertiva com base em determinadas características

desses imigrantes e de suas referências em termos de distribuição geográfica. Esse

trabalho se propõe a responder, a partir das evidências dos dois últimos censos, as

seguintes questões: I) bolivianos e paraguaios procuram principalmente os grandes

centros urbanos ou há um número significativo deles em municípios de pequeno e médio

porte dos principais estados receptores?; ii) esses imigrante são de baixa escolaridade e

renda, condição que tipifica os municípios receptores de menor tamanho?; iii) os

imigrantes são principalmente jovens ou adultos acompanhados de familiares e parentes?.

Esse tipo de investigação é necessária para conhecer melhor as trajetórias de imigrantes

sul-americanos muito numerosos que têm procurado continuamente melhores condições

de vida no Brasil. Assim, o objetivo desse trabalho é, portanto, verificar se aspectos da

seletividade socioespacial da migração vêm se mostrando decisivos para o menor ou

maior êxito desses trabalhadores em sua inserção ocupacional no país. Além de padrões

espaciais distintos, os resultados indicam diferenças importantes entre essas duas

nacionalidades de imigrantes. Diferente dos paraguaios, os bolivianos englobam

populações, em sua imensa maioria, em plena idade ativa e de renda muito baixa.

PALAVRAS-CHAVE: Imigração estrangeira; Paraguaios; Bolivianos.

* Doutor em Demografia. Professor do Departamento de Geografia e dos Programas de Pós-Graduação em

Geografia e em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Instituto de Geociências da UFMG. ** Doutor em Geografia. Professor do Departamento de Geografia e dos Programas de Pós-Graduação em

Geografia e em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Instituto de Geociências da UFMG.

Subcoordenador do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IGC/UFMG.

INTRODUÇÃO

Brasil e vários países da bacia do Prata têm uma história comum que data do início

do período colonial, quando as frentes de exploração e ocupação desbravaram a região,

algumas delas orientadas pelas fabulosas riquezas encontradas nas minas de prata de

Potosi, na atual Bolívia.

Trata-se de uma vasta região em que o quadro natural sempre foi reconhecido

como de valor estratégico, tanto em termos econômico, como geopolítico, e pivô de

disputas entre as coroas espanhola e portuguesa pelo domínio das rotas comerciais nos

séculos XVI e XVII (MATOS et al., 2004). Heranças históricas, níveis de desigualdades

sociais e econômicas, estrutura fundiária concentrada, caráter oligárquico dos Estados,

tamanho e características da população, níveis de dependência da economia internacional,

são elementos discutidos e considerados chaves para o entendimento dessas economias

regionais o que inclui a mobilidade espacial da população. A discussão e a reflexão teórica

sobre essas questões nunca perderam importância, talvez porque os fluxos migratórios e

seus significados econômicos e espaciais não perderam intensidade nos últimos 50 anos.

Uma das causas desse fenômeno associa-se à dinâmica e mecanismos estruturais das

economias de mercado, que, frequentemente, acabam acirrando as desigualdades

socioespaciais em regiões não desenvolvidas que se integram subalternamente ao

capitalismo internacional.

Esses migrantes têm sido objeto de vários ensaios e pesquisas que procuram

retratar suas características demográficas no Brasil, a exemplo de Azevedo (2005);

Baeninger, (2004); Pereira (2007); Roca (2008); Marques (2008); Matos e Lobo (2010);

Souchaud (2011).

Nas últimas décadas, bolivianos e paraguaios têm aumentado sua presença em

várias grandes cidades brasileiras. São procedentes de países vizinhos, mas com

características geográficas muitos distintas, sendo a cordilheira dos Andes um dos fatores

locacionais de grande diferenciação entre eles.

A despeito de serem migrantes geralmente pobres, podem ser semelhantes social

e demograficamente? Os dados dos censos de 2000 e 2010 permitem, responder

parcialmente essas questões com base na verificação de determinadas características

desses imigrantes e de suas preferências em termos de distribuição geográfica. Esse

trabalho se propõe a responder, com evidências resultantes dos dois últimos censos, as

seguintes questões: i) bolivianos e paraguaios procuram principalmente os grandes

centros urbanos ou há um número significativo deles em municípios de pequeno e médio

porte dos principais estados receptores? ii) esses imigrantes são jovens, de baixa

escolaridade e muito mal remunerados?

Esse tipo de investigação parece necessária, não apenas para conhecer melhor as

trajetórias de imigrantes sul-americanos muito numerosos e que têm procurado

continuamente melhores condições de vida no Brasil. Afinal, outros trabalhos podem se

alimentar de parte das evidências aqui reunidas. Assim, um dos objetivo desse estudo é

verificar se aspectos da seletividade da migração vêm se mostrando decisivos para o

menor ou maior êxito desses trabalhadores em sua inserção ocupacional no país ou não.

Afinal, a superexploração de paraguaios e bolivianos continua sendo uma constante? Ou

há exceções nesse quadro laboral dependendo das localidades receptoras dos imigrantes?

A mobilidade espacial recorrente de trabalhadores migrantes, ao ser examinada na

perspectiva supranacional, carrega elementos relativos à (re)estruturação do território

derivadas, por exemplo, de mudanças na dinâmica demográfica e econômica na América

do Sul. Dessa forma, é relevante trazer evidencias recentes sobre as características

sóciodemográficas dos bolivianos e paraguaios recenseados no Brasil (país de nascimento

declarado), tendo como base os dados amostrais dos censos demográficos brasileiros de

2000 e 2010. Nesse trabalho, foram utilizados os dados de migração intercensitária que

discriminavam os estrangeiros, naturais da Bolívia e Paraguai, que fixaram residência no

Brasil nos últimos 10 anos, contados de acordo com o ano de referência de cada censo.

I – A PRESENÇA ESTRANGEIRA NO BRASIL: A PARTICIPAÇÃO DA

MIGRAÇÃO SULAMERICANA

Na América Latina, os fluxos de imigrantes procedentes da Europa, África e Ásia

foram intensos e recorrentes há séculos. Nos atuais espaços metropolitanos, os imigrantes

internacionais desenvolveram uma série de atividades e introduziram hábitos, muitos dos

quais permanecem vivos até hoje. Todavia, nas últimas décadas do século XX, novas

tendências migratórias parecem emergir, sobretudo em virtude de acordos supranacionais

que deram outros significados à integração econômica e política sul-americana. Esse

cenário geopolítico, demográfico e migratório mais recente deu margem a múltiplas

análises que aprofundaram o entendimento das conexões entre os mecanismos e

processos econômicos vis-à-vis a mobilidade espacial entre países latino-americanos,

como fizeram Singer (1973), Gaudemar (1977), Massey (1993), Patarra (1997), Bauman

(1999), Sayad (2000), Woodward (2000), Baeninger (2004), Matos et al., (2004); Sala et

al., (2004).

Por força da ação de agentes que estabelecem redes de fluxos variados, como os

de capitais, mercadorias e pessoas, que redinamizam territórios e alteram fisionomias

regionais, os nexos entre população e espaço reordenam espaços geográficos em

diferentes escalas. Na esfera desses nexos, a migração pode assumir um caráter mais ou

menos permanente, a depender do perfil e das características dos migrantes, da conjuntura

econômica, do grau de cooperação entre os países, dos níveis de diferenciação étnico-

culturais, das políticas de governo e da participação dos Estados nas economias nacionais.

Em tempos de internacionalização e mundialização, a discussão teórica e empírica

sobre fluxos migratórios ganha mais importância entre os países da América Latina e tem

ensejado novos significados. O Brasil, nos últimos 15 anos, alcançou notoriedade e

relativo protagonismo em fóruns econômicos e geopolíticos, nos quais a questão dos

direitos humanos e dos migrantes internacionais alcançou alguma visibilidade; o que

interfere em prováveis alternativas de destino para migrantes estrangeiros potenciais, em

razão das oportunidades de trabalho e de investimentos que ensejam os momentos de

retomada do crescimento da economia brasileira, a despeito de o Brasil ter

experimentados nas décadas de 1980 e 1990 expressivas perdas migratórias

internacionais1.

O país de fato conheceu uma acentuada redução das trocas migratórias

internacionais durante boa parte do século XX, particularmente no período 1940-1950.

Em meados dos anos 1980, diante de alteração nos sistemas migratórios internacionais e

de dificuldades econômicas ganhou visibilidade a emigração internacional de brasileiros.

Se, em 1940, as estimativas davam conta de que mais de 1,4 milhão de estrangeiros

viviam no país, as últimas décadas do século XX deixam evidente a redução desses

números: de 912 mil, em 1980, a 767.781 em 1991 e 651.226 em 2000. (PATARRA,

2005). Ao se examinar os dados referentes ao Censo de 2010, verifica-se que a proporção

de estrangeiros residentes no território brasileiro reduziu-se para cerca de 10% (592.570

pessoas), embora os números relativos a estrangeiros e naturalizados da década de 2000

tenham aumentado (LOBO et al. 2014). O fato é que, a despeito da queda no estoque

1 Carvalho e Campos (2006), a despeito das dificuldades técnicas derivadas da variação de cobertura entre

os Censos de 1991 e de 2000, mostram que o Brasil, entre 1980 e 1990, teve um saldo migratório negativo

de aproximadamente 1.800.000 pessoas. Esse saldo, ainda negativo, reduziu-se para cerca de 550 mil

pessoas, no decênio 1990/2000. Tal declínio deve se explicar pela diminuição da emigração brasileira. De

outra parte, a imigração internacional apresentou pequeno incremento nos dados censitários de 1991 e 2000.

acumulado de imigrantes internacionais no período 1991-2010, a migração do último

intervalo intercensitário, obtida com base no ano de fixação de residência no país,

registrou um incremento significativo: o número de estrangeiros passou de 68.550, em

1982, para 164.420, em 1991 - uma elevação de quase duas vezes e meia. A participação

dos imigrantes do período 2000-2010 quase alcançou os 28% do total de estrangeiros que

residiam no Brasil em 2010 (LOBO et al., 2014).

Uma primeira observação relevante, como já demonstrado por Patarra (2005),

refere-se a expressiva redução da população estrangeira residente no Brasil, ainda que no

início do século passado, de 1900 para 1920, ela tivesse crescido fortemente. Em 1900 a

população estrangeira era estimada em mais de um milhão de pessoas, o que correspondia

a mais de 6% da população residente no país (ver Figura 1). No último Censo

Demográfico, um total de 431.319 estrangeiros residia no Brasil. Esse volume

representava apenas 0,23% de toda a população brasileira em 2010. Essa queda na

participação estrangeira se deve, de um lado, à significativa redução dos fluxos de

trabalhadores imigrantes sobretudo após 1930; e, de outro, ao retorno e reemigração de

muitos dos imigrantes que viviam no Brasil nas primeiras décadas do século XX.

Figura 1: População estrangeira residente no Brasil: número e participação na população

total, 1900 a 2010

Fonte: Censos Demográficos brasileiros. Extraído e adaptado de Patarra (2005).

Considerando a tendência de queda da presença de estrangeiros no país, a

intensificação na entrada de migrantes no Brasil nas últimas décadas do século passado,

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1900 1920 1940 1950 1970 1980 1991 2000 2010

%

(Mil

ha

res)

População Estrangeira Estrangeiros (%)

sobretudo a partir de 1980, sugere ter sido expressiva e crescente participação de

brasileiros retornados. A própria distinção da origem internacional desses fluxos

migratórios confirma essa assertiva, tendo em vista o elevado crescimento da imigração

com origem na Europa e América do Norte (destinos preferenciais da emigração de

brasileiros). A América Latina e o Caribe também são áreas de origem de onde partem a

maior parte dos imigrantes internacionais que residem no território nacional. Esses

números cresceram em 2010, embora fossem mais representativos no ano 2000 (43,6%),

já que em 2010 perderam a primazia diante do expressivo aumento dos imigrantes

procedentes da Europa (140.638 pessoas). De toda a forma, a contribuição dos imigrantes

da América Latina no Brasil é crescentemente importante, como mostram frequentes

notícias da mídia sobre a presença de trabalhadores provenientes do Haiti, Bolívia e

Paraguai em busca da sobrevivência.

Tabela 1: Imigrantes estrangeiros de última etapa recenseados no Brasil em 2000 e 2010

segundo os continentes de origem

Fonte: Censos Demográficos de 2000 e 2010.

Brasil, Bolívia e Paraguai são países vizinhos e isso explica parte do incremento

dos fluxos de bolivianos e paraguaios para o Brasil em números relativamente

significativos. A presença considerável dos naturais desses países entre os dois últimos

censos foi notável, sobretudo no caso dos bolivianos que mais que triplicaram seus

efetivos no Brasil, enquanto o número de paraguaios aumentou em quase 80%2. São

2 Sales (1996) já observava, que os movimentos migratórios de fronteira entre Brasil, Uruguai, Paraguai e

Argentina pareciam se expandir associados às questões de luta pela terra. Recentes migrações de fronteira

causadas por questões agrárias envolveriam tanto a migração de proprietários rurais em busca de terras

mais baratas quanto a trabalhadores rurais ou pequenos produtores em busca de condições de sobrevivência,

Continentes 2000 2010

Imigrantes % Imigrantes %

América Latina e Caribe 121.242 43,63 130.310 28,89

América do Norte 39.805 14,32 84.294 18,69

Europa 58.564 21,07 140.638 31,18

Ásia 50.076 18,02 79.085 17,53

África e Oceania 8.219 2,96 16.723 3,71

Total 277.906 100,00 451.050 100,00

geralmente trabalhadores pobres de países vizinhos da América do Sul e talvez por isso

pode-se pensar que possuam características semelhantes. Isso é verdade, a julgar pelos

dados dos dois últimos censos brasileiros?

II – A IMIGRAÇÃO DE BOLIVIANOS E PARAGUAIOS NO BRASIL:

PADRÕES ESPACIAL E DIFERENÇAS SÓCIO DEMOGRÁFICAS

Os dados apresentados na Tabela 2 indicam que há uma clara distinção entre as

áreas preferenciais de destino de bolivianos e paraguaios no Brasil. Enquanto mais de

85% dos bolivianos estavam residindo em municípios metropolitanos em 2010, os

paraguaios se distribuíam por um conjunto muito maior de municípios e preferiam tentar

fixar-se nos municípios com população inferior a 50 mil habitantes (42,7% em 2010 e

44,7% no ano 2000).3 Os mapas apresentados em sequência confirmam essa distinção na

distribuição espacial dos imigrantes naturais da Bolívia e do Paraguai. Enquanto os

bolivianos concentram-se nos principais núcleos metropolitanos brasileiros,

especialmente São Paulo e Rio de Janeiro, os paraguaios são mais numerosos nos

municípios próximos da região de fronteira com o Paraguai, especialmente aqueles que

pertencem aos estados de Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul

e Mato Groso (embora em 2010 também haja uma presença significativa deles nas áreas

metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro).

Tabela 2: Número e percentual de imigrantes de data fixa, naturais da Bolívia e do

Paraguai, residentes nos Municípios Metropolitanos, de Pequeno Porte e Demais

Municípios, Brasil em 2000 e 2010.

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).

após terem sofrido as consequências de processos de expulsão derivados da modernização conservadora

(SALES, 1996). 3 Os bolivianos são particularmente numerosos nas cidades de São Paulo onde se submetem a condições de

trabalho mal pago em fabriquetas da área de confecção e têxteis. Mais detalhes em Azevedo (2005); Matos

e Lobo (2010) e Pereira (2007).

Nº % Nº % Nº % Nº %

Municípios Metropolitanos 4.497 64,54 18.915 85,46 2.027 18,17 5.472 27,43

Demais Municípios 1.319 18,93 1.597 7,22 4.142 37,13 5.963 29,88

Pequenos Municípios 1.151 16,52 1.620 7,32 4.986 44,70 8.518 42,69

Total 6.967 100,00 22.132 100,00 11.156 100,00 19.953 100,00

Localidades

Selecionadas2000 20002010 2010

Bolivianos Paraguaios

Figura 2: Imigrantes da década, naturais da Bolívia, residentes nos municípios brasileiros

2000 e 2010

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).

Figura 3: Imigrantes da década, naturais do Paraguai, residentes nos municípios

brasileiros 2000 e 2010

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).

Contudo, um fato novo entre as áreas de destino dos dois últimos censos é a maior

difusão desses imigrantes por um número maior de municípios dos estados vizinhos

supramencionados. A distribuição alterou-se particularmente no caso dos bolivianos que

passaram a residir em várias das capitais desses estados.

E o que dizer das características sociais e demográficas desses imigrantes no que

tange a idade e escolaridade? Os dados da Tabela 3 permitem observar que os bolivianos

são mais velhos que os paraguaios, com idades variando entre 22 e 25 anos, embora no

ano 2010 os dados mostrem os paraguaios menos jovens do que no ano 2000. É plausível

supor que a menor idade dos naturais do Paraguai seja decorrente da elevada participação

da migração familiar. Em termos de escolaridade, considerando apenas a população com

15 ou mais anos de idade, verifica-se que os paraguaios são mais alfabetizados que os

bolivianos em 2000 e 2010, a despeito de os bolivianos terem melhorado sua escolaridade

entre os 10 anos dos dois últimos censos.

Tabela 3: Idade Mediana e Taxa de Alfabetização dos imigrantes da década, naturais da

Bolívia e do Paraguai, residentes nos municípios metropolitanos, de pequeno porte e

demais localidades – Brasil 2000 e 2010

Nota: Para cálculo da Taxa de Alfabetização foi excluída a população com idade inferior a 15 anos.

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).

No que tange aos quesitos relativos a ocupação e renda os dados revelam que os

bolivianos residentes em municípios metropolitanos são bem mais ocupados que os

paraguaios em 2000 e 2010. Em ambos os censos a razão de ocupação dos bolivianos foi

superior a 64%, embora nas demais classes de tamanho de município os percentuais de

população ocupada se situem próximos dos 45% (à exceção dos 54,59% de paraguaios

ocupados no ano 2010 entre os residentes nos Demais Municípios, os quais reúnem

muitas das cidades médias do Sudeste). Novamente, há indícios de uma migração

específica no caso de bolivianos: de populações em idade laboral, com perfil não familiar

(baixo volume de populações com idade inferior a 15 anos e superior a 65 anos).

2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010

Municípios Metropolitanos 25 25 15 23 98,53 98,88 97,20 97,77

Demais Municípios 25 25 18 22 95,05 94,72 91,49 94,24

Pequenos Municípios 22 23 11 18 91,85 97,15 82,81 92,23

Total 25 25 14 21 96,99 98,50 89,46 94,59

Localidades

Selecionadas

Idade Mediana (em anos) Taxa de alfabetização (%)

Bolivianos Paraguaios Bolivianos Paraguaios

Quanto a renda auferida no trabalho, os dados da Tabela 4 e da Figura 4, indicam

relações distintas entre esses dois grupos, embora ratifiquem antigas evidências no que

tange a condição de trabalhadores pobres de baixa renda. As diferenças se explicam

principalmente porque no ano 2000 a renda mediana dos bolivianos era sensivelmente

mais alta que a de 2010 em todas as classes de tamanho de municípios, e talvez por isso

mesmo também ostentassem rendas superiores aos seus vizinhos naturais do Paraguai.

Em 2010, entretanto, há uma alteração nesses números: os paraguaios das áreas

metropolitanas e de municípios intermediários possuíam rendas medianas superiores às

dos bolivianos (1,5 s.m. contra 1,3 s.m. e 1,2 s.m. contra 1,1 s.m.). Já entre os pequenos

municípios, onde os paraguaios são mais numerosos inverte-se essa relação (1,3 s.m.

contra 1,0 s.m.). Chama atenção, no caso dos bolivianos, a elevada frequência de

ocupados com rendimento de um salário mínimo, muito superiores aqueles sem

rendimento e/ou com ganhos mais elevados.

Tabela 4: Percentual da População Ocupada e Renda Mediana, em Salários Mínimos

(SM) dos imigrantes da década, naturais da Bolívia e do Paraguai, residentes nos

municípios metropolitanos, de pequeno porte e demais localidades – Brasil 2000 e 2010

Nota: A população ocupada foi aferida tendo como base a existência de trabalho remunerado nas semanas de referência dos Censos Demográficos, que foram de 23 a 29 de julho de 2000 e de 25 a 31 de julho de

2010. Também foi excluída a população com idade inferior a 10 anos. Os valores do Salário Mínimo

utilizados como referências nos Censos de 2000 e 2010 foram, respectivamente, R$151,00 e R$510,00.

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010 (dados da amostra).

2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010

Municípios Metropolitanos 64,19 74,23 38,77 65,49 2,65 1,27 2,32 1,53

Demais Municípios 45,68 42,11 45,20 54,59 3,31 1,10 1,52 1,18

Pequenos Municípios 47,54 43,48 28,15 46,33 1,99 1,37 1,00 1,00

Total 58,45 69,98 37,30 54,34 2,65 1,27 1,52 1,18

População Ocupada (%)Localidades

SelecionadasBolivianos ParaguaiosBolivianos Paraguaios

Renda Mediana (SM)

Figura 4: Diagrama de Caixa (Bloxplot) e histograma de frequência da renda dos

imigrantes da Bolívia e Paraguai residentes no Brasil, 2010

Fonte: IBGE, Censo Demográfico de 2010 (dados da amostra).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Antigas e novas territorialidades parecem se afirmar no Brasil meridional.

Expressivos fluxos populacionais na região – que não corroboram hipóteses de uma

suposta desterritorialização – parecem contribuir para uma nova etapa de estruturação de

novas territorialidades locais, intensificando, inclusive, as relações entre o Brasil e os

países vizinhos. O balanço das perdas e ganhos populacionais do Brasil com outros países

revela-se, de acordo com os dados do Censo de 2010, expressivo. O território brasileiro

assistiu ao incremento na entrada de imigrantes internacionais no intervalo intercensitário

2000/2010. Parcela importante desses imigrantes realizou pelo menos outro movimento

migratório dentro das fronteiras nacionais, certamente reflexo direto da ampliação das

relações do Brasil com os países vizinhos. É provável que a dinâmica migratória em

vastas frações territoriais do Brasil seja reflexo de novos arranjos políticos e econômicos

no Cone Sul que, a trancos e barrancos ganharam expressão no período 2000/2010, onde

novas alternativas são impostas por forças econômicas de escala ampla. Ações

governamentais interferem nas transações comerciais e nas variações tarifárias e

cambiais. Políticas agrícolas são praticadas em países dessa região e desencadeiam

movimentos populacionais, notadamente nas zonas de fronteira, e aglutinam movimentos

sazonais ou circulares associados a movimentos macroeconômicos, às atividades

agrícolas, à construção de grandes obras de infraestrutura que mobilizaram grandes

empresas brasileiras.

Muitos dos imigrantes sulamericanos que chegaram ao Brasil nas últimas décadas

localizavam se em municípios próximos da fronteira (da porção brasileira da bacia

hidrográfica Paraguai/Paraná), embora fossem numerosos nas áreas metropolitanas. A

cartografia desses movimentos migratórios pôs em evidência a maior dispersão regional

dos deslocamentos realizados pelos paraguaios quando confrontados, em especial, com

os deslocamentos dos bolivianos. Centralidades de cidades-polo do Brasil nas áreas

próximas das fronteiras explicam parte dos movimentos migratórios recentes, ainda que

o poder de atração das regiões metropolitanas continue proeminente, especialmente no

caso dos bolivianos. Além de padrões espaciais distintos, os resultados indicam

diferenças importantes entre essas duas nacionalidades de imigrantes. Diferente dos

paraguaios, os bolivianos englobam populações, em sua imensa maioria, em plena idade

ativa e de renda muito baixa.

BIBLIOGRAFIA

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AGRADECIMENTOS: Ao CNPq e FAPEMIG ao financiamento de projetos de

pesquisa. Em especial a FAPEMIG pelo apoio financeiro destinado pelo Programa

Pesquisador Mineiro (PPM).