aula 06 - semi - poesia na virada de século

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015 1 AULA 06 POESIA BRASILEIRA NA VIRADA DE SÉCULO APRESENTAÇÃO Na virada do século 19 para o século 20, a melhor produção poética brasileira se dividia em duas estéticas: Parnasianismo e Simbolismo, que estudaremos nesta aula. PARNASIANISMO Os parnasianos renderam um tributo à cultura clássica. Apresentação Temos visto que o Realismo-Naturalismo caracterizou-se, basicamente, pela objetividade, pela reação aos excessos sentimentais dos românticos e por um descritivismo de ordem mais racional. Na poesia, o Parnasianismo apresenta, também, tais traços e, por isso, às vez é chamado de poesia do Realismo. Sim, o Parnasianismo é a poesia do período realista; do Realismo traz a objetividade, mas não o critério social a denúncia dos problemas vistos na realidade que os romances do período apresentam. Surgiu na França, em antologias poéticas chamadas Le Parnasse Contemporain, publicadas a partir da década de 1860, e no Brasil foi lançado com o livro Fanfarras, de Teófilo Dias, em 1882. Este tipo de poesia é produto da chamada Belle Époque, aquela euforia geral, provocada pelas riquezas surgidas com a industrialização, que dominou o final do século 19 e o início do século 20. Os artistas da época deixaram-se levar pelo exibicionismo cultural, que atravessou mares e se instalou num Rio de Janeiro afrancesado, onde nossos poetas fizeram uma poesia esnobe e bastante distante da realidade nacional. É interessante notar que nossos poetas parnasianos tornaram-se ídolos populares, soberanos até as primeiras décadas do século 20, quando daí passaram a alvo de críticas demolidoras por parte dos modernistas. Características fundamentais Objetividade, impessoalidade A poesia parnasiana representa uma espécie de reação ao sentimentalismo excessivo da poesia romântica. O eu lírico procura conter suas emoções, tentando mostrar-se impassível ante a realidade, embora nem sempre consiga. OBSERVAÇÃO: no Brasil, os parnasianos oscilaram constantemente entre a objetividade parnasiana e a subjetividade romântica. A poesia parnasiana brasileira é objetiva, mas não impassível, pois às vezes se abre para uma subjetividade moderada, por mais que tal postura contrarie os princípios teóricos parnasianos. Apego à tradição clássica Alusão constante a elementos da cultura greco-romana, considerada pelos artistas parnasianos exemplo supremo do belo e do universal, o que ajuda a conferir ao Parnasianismo ares de sofisticação e erudição e que, também, os afasta das tendências românticas. Arte pela arte, o esteticismo A elaboração de uma poesia distanciada dos temas cotidianos e que recusa os temas vulgares. Como efeito dessa postura, percebe-se um traço de alienação social no Parnasianismo, pois a poesia, via de regra, não retratará temas sociais mais profundos ou delicados. Busca da perfeição formal O poeta parnasiano promove um intenso artesanato poético, buscando rimas raras, a correção gramatical e estilística, a métrica perfeita, o vocabulário acadêmico e a predileção pelo soneto. A perfeição formal passa a ser uma espécie de obsessão do artista parnasiano.

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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AULA 06

POESIA BRASILEIRA NA VIRADA DE SÉCULO

APRESENTAÇÃO

Na virada do século 19 para o século 20, a

melhor produção poética brasileira se dividia em duas

estéticas: Parnasianismo e Simbolismo, que

estudaremos nesta aula.

PARNASIANISMO

Os parnasianos renderam um tributo à cultura clássica.

Apresentação

Temos visto que o Realismo-Naturalismo

caracterizou-se, basicamente, pela objetividade, pela

reação aos excessos sentimentais dos românticos

e por um descritivismo de ordem mais racional. Na

poesia, o Parnasianismo apresenta, também, tais

traços e, por isso, às vez é chamado de poesia do

Realismo.

Sim, o Parnasianismo é a poesia do período

realista; do Realismo traz a objetividade, mas não o

critério social – a denúncia dos problemas vistos na

realidade – que os romances do período apresentam.

Surgiu na França, em antologias poéticas chamadas

Le Parnasse Contemporain, publicadas a partir da

década de 1860, e no Brasil foi lançado com o livro

Fanfarras, de Teófilo Dias, em 1882.

Este tipo de poesia é produto da chamada Belle

Époque, aquela euforia geral, provocada pelas

riquezas surgidas com a industrialização, que dominou

o final do século 19 e o início do século 20. Os artistas

da época deixaram-se levar pelo exibicionismo cultural,

que atravessou mares e se instalou num Rio de

Janeiro afrancesado, onde nossos poetas fizeram uma

poesia esnobe e bastante distante da realidade

nacional.

É interessante notar que nossos poetas

parnasianos tornaram-se ídolos populares, soberanos

até as primeiras décadas do século 20, quando daí

passaram a alvo de críticas demolidoras por parte dos

modernistas.

Características fundamentais

Objetividade, impessoalidade – A poesia

parnasiana representa uma espécie de reação ao

sentimentalismo excessivo da poesia romântica. O

eu lírico procura conter suas emoções, tentando

mostrar-se impassível ante a realidade, embora nem

sempre consiga.

OBSERVAÇÃO: no Brasil, os parnasianos oscilaram

constantemente entre a objetividade parnasiana e a

subjetividade romântica. A poesia parnasiana brasileira

é objetiva, mas não impassível, pois às vezes se abre

para uma subjetividade moderada, por mais que tal

postura contrarie os princípios teóricos parnasianos.

Apego à tradição clássica – Alusão constante a

elementos da cultura greco-romana, considerada

pelos artistas parnasianos exemplo supremo do belo

e do universal, o que ajuda a conferir ao

Parnasianismo ares de sofisticação e erudição e

que, também, os afasta das tendências românticas.

Arte pela arte, o esteticismo – A elaboração de

uma poesia distanciada dos temas cotidianos e que

recusa os temas vulgares. Como efeito dessa

postura, percebe-se um traço de alienação social no

Parnasianismo, pois a poesia, via de regra, não

retratará temas sociais mais profundos ou delicados.

Busca da perfeição formal – O poeta parnasiano

promove um intenso artesanato poético, buscando

rimas raras, a correção gramatical e estilística, a

métrica perfeita, o vocabulário acadêmico e a

predileção pelo soneto. A perfeição formal passa a

ser uma espécie de obsessão do artista parnasiano.

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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Leiamos o fragmento de texto a seguir, que ilustra tal

aspecto do Parnasianismo:

PROFISSÃO DE FÉ

Quero que a estrofe cristalina,

Dobrada ao jeito

Do ourives, saia da oficina

Sem um defeito.

Olavo Bilac

Intenso descritivismo – Vasos, objetos clássicos,

paisagens, enfim, a pintura com palavras de

fenômenos naturais e fatos da história. A poesia

parnasiana é notadamente descritiva, o que

demonstra a tendência à objetividade.

Aproximação entre a arte literária e as artes

plásticas – Ao encarar a poesia como um

verdadeiro ofício, o poeta parnasiano torna-se um

artesão da palavra, um ourives de versos. Observe:

PROFISSÃO DE FÉ

Invejo o ourives quando escrevo:

Imito o amor

Com que ele, em ouro, o alto relevo

Faz de uma flor.

........................................................

Torce, aprimora, alteia, lima

A frase; e , enfim,

No verso de ouro engasta a rima

Como um rubim.

Olavo Bilac

Os principais poetas

Quando se fala de Parnasianismo no Brasil, é

muito comum citar-se a “tríade parnasiana”, a

“santíssima trindade parnasiana brasileira”, formada

pelos seguintes poetas:

Olavo Bilac

Aspectos centrais da obra

Quanto ao estilo, Bilac demonstra a

impassibilidade formal parnasiana em vários poemas,

como “Profissão de fé”, conforme lemos anteriormente.

Quanto ao conteúdo, entretanto, nota-se ainda

uma aproximação com o Romantismo, não por um

sentimentalismo excessivo, mas por um lirismo ora

mais intimista, ora de tendência mais reflexiva, até um

pouco filosofante. O soneto a seguir evidencia tais

traços:

OUVIR ESTRELAS

―Ora (direis) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso !‖ Eu vos direi, no entanto,

Que, para ouvi-las, muita vez desperto

E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto

A via Láctea, como um pálio aberto,

Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto,

Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: ―Tresloucado amigo !

Que conversas com elas? Que sentido

Tem o que dizem, quando estão contigo?‖

E eu vos direi: ―Amai para entendê-las !

Pois só quem ama pode ter ouvido

Capaz de ouvir e de entender estrelas.‖

A sensualidade e o erotismo estão presentes

na poesia de Olavo Bilac, principalmente nas obras de

sua juventude. O patriotismo de Olavo Bilac se

manifesta no poema épico O caçador de esmeraldas,

no Hino à Bandeira e em vários poemas que versam

sobre a língua portuguesa, o Brasil, a música

brasileira, etc.

Alberto de Oliveira

O mais parnasiano dos poetas brasileiros. Sua

poesia, essencialmente descritiva e cultuadora dos

modelos clássicos, dava de ombros aos problemas

brasileiros de sua época pois, para o autor, mais valia

ficar descrevendo em seus poemas taças, vasos ou

paisagens do que falar em desigualdade ou injustiça

social.

VASO GREGO

Esta, de áureos relevos, trabalhada

De divas mãos, brilhante copa, um dia,

Já de aos deuses servir como cansada,

Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.

Era o poeta de Teos que a suspendia

Então e, ora repleta ora esvazada,

A taça amiga aos dedos seus tinia

Toda de roxas pétalas colmada.

Depois... Mas o lavor da taça admira,

Toca-a, e do ouvido aproximando-a, às bordas

Finas hás de lhe ouvir, canora e doce,

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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Ignota voz, qual se da antiga lira

Fosse a encantada música das cordas,

Qual se essa voz de Anacreonte fosse.

Raimundo Correia

Autor considerado parnasiano muito mais pela

forma do que pelos temas abordados em sua poesia.

Reflexões filosóficas e lições de vida acompanham as

cenas apresentadas em seus versos, além de

heranças românticas, traços descritivistas e grande

profundidade filosófica que evidencia certo

pessimismo.

AS POMBAS

Vai-se a primeira pomba despertada...

Vai-se outra mais...mais outra...enfim dezenas

De pombas vão-se dos pombais, apenas

Raia sanguínea e fresca a madrugada.

E, à tarde, quando a rígida nortada

Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,

Ruflando as asas, sacudindo as penas,

Voltam todas em bando e em revoada.

Também dos corações onde abotoam,

Os sonhos, um por um, céleres voam,

Como voam as pombas dos pombais:

No azul da adolescências as asas soltam,

Fogem...Mas aos pombais as pombas voltam,

E eles, aos corações, não voltam mais...

SIMBOLISMO

Imagens vagas, diluídas: esta é a poesia simbolista, que guarda

grande afinidade com a pintura impressionista.

Contextualização

As últimas décadas do século 19 foram

marcadas por uma visão materialista, racional e

cientificista da realidade. Esse foi o pensamento

predominante, mas não único.

Nas artes – e, em especial, na literatura –

surgiram alguns artistas insatisfeitos com a

mentalidade de que tudo no mundo poderia ser

explicado de modo lógico e comprovado pela ciência.

Esses artistas perceberam que o discurso racional não

dava conta de explicar totalmente todas as questões

atinentes à existência humana. A ciência não era

capaz de traduzir a complexidade do intelecto humano,

muito menos a linguagem podia expressar todos os

dilemas vivenciados pelo homem mas, no máximo,

sugeri-los.

Lançado no Brasil oficialmente em 1893, com a

publicação dos livros Missal e Broquéis, de Cruz e

Sousa, o Simbolismo foi uma escola literária

contemporânea do Realismo-Naturalismo e significou

uma dupla reação:

reação ideológica contra o materialismo positivista

e cientificista do século XIX, colocando-se,

consequentemente, a favor da filosofia, da

metafísica e da espiritualidade;

reação estética contra a objetividade e

impessoalidade descritiva da poesia parnasiana, e a

consequente proposta de um retorno às raízes

subjetivistas da poesia.

Como o Parnasianismo brasileiro, também o

Simbolismo cultua a forma, embora com menos rigor, e

pratica Arte pela Arte. Este tipo de poesia permanece

distante, alienado da realidade nacional.

Características

Estas são as características fundamentais da

estética simbolista:

1. A sugestão predomina sobre a descrição: as

imagens que tão fartamente aparecem nos poemas

simbolistas são vagas, diluídas, suaves. Não

importa como a realidade é, mas os efeitos que ela

causa na sensibilidade do artista.

2. Misticismo: o simbolista mantém uma atitude

mística perante a vida; tenta atingir o inatingível, o

oculto e o misterioso.

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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3. Inovação no emprego das maiúsculas: o autor

simbolista usa maiúsculas em substantivos comuns

para ampliar o sentido desses vocábulos, além de

dar maior força emocional a eles.

4. Musicalidade: para os simbolistas, há uma relação

fundamental entre música e poesia. Os efeitos

sonoros são amplamente explorados, como o uso

das aliterações (repetição de sons consonantais).

5. Emprego de símbolos cósmicos e religiosos:

altares, incensos, estrelas, constelações, sinos,

nuvens, ... são símbolos frequentemente utilizados

pelos simbolistas para sugerir os estados da alma

humana.

6. Emprego de sinestesias: a sinestesia consiste

numa figura de linguagem que procura promover a

fusão de sensações (audição, tato, gustação,

olfato, visão), para tentar dizer o indizível, para

tentar sugerir, esboçar aquilo que não pode ser

descrito objetivamente.

7. Desejo de transcendência e integração

cósmica: em oposição aos limites do mundo físico

e material, os simbolistas apreciam situações de

viagem interior ou cósmica, o extravasamento e a

transcendência do mundo real. Em virtude desta

postura um tanto escapista, foram chamados

pejorativamente de nefelibatas (viviam nas nuvens).

Principais autores

Cruz e Sousa

Principais obras

Missal (1893) – prosa poética bastante refinada

Broquéis (1893), Faróis (1900), Últimos sonetos

(1905) – poesia

Aspectos centrais

Poesia de sublimação – anulação da matéria para

a liberação de uma profunda espiritualidade.

Comprove isso versos a seguir:

SIDERAÇÕES

Para as Estrelas de cristais gelados

Na ânsias e os desejos vão subindo,

Galgando azuis e siderais noivados

De nuvens brancas a amplidão vestindo...

Da Eternidade que nos Astros canta...

Erotismo sensual / espiritual, que demonstra certa

angústia sexual. Observe:

SEIOS (IV)

Oásis brancos e miraculosos

Das frementes volúpias pecadoras

Nas paragens fatais, aterradoras

Do Tédio, nos desertos tenebrosos...

(...)

Ó seios virginais, tálamos vivos,

Onde o amor nos êxtases lascivos

Velhos faunos febris dormem sonhando...

Misticismo indefinido – Em vários versos,

observamos um Cruz de Sousa cravejando sua

poesia de símbolos religiosos do culto católico e a

figura de anjos. Já em outros, há constante

referência ao reino das trevas, menção a demônios e

ao inferno. Leia os versos a seguir:

A FLOR DO DIABO

Branca e floral como um jasmim do Cabo

Maravilhosa ressurgiu um dia

A fatal Criação do fulvo Diabo,

Eleita do pecado e da Harmonia.

SINFONIAS DO OCASO

Sacrários virgens, sacrossantas urnas,

Os céus resplendem de sidéreas rosas,

Da Lua e das Estrelas majestosas

Iluminando a escuridão das furnas.

Obsessão pela cor branca e tudo que sugere

brancura – É interessante ressaltar que tal

característica também é muito comum em toda a

poesia simbolista francesa. Além disso, o branco

também significa a síntese de todas as cores, uma

vez que todas elas se diluem no branco. Observe:

BRAÇOS

Braços nervosos, brancas opulências,

Brumais brancuras, fúlgidas brancuras,

Alvuras castas, virginais alvuras,

Lactescências das raras lactescências.

Alphonsus de Guimaraens

Principais obras

Septenário das Dores de Nossa Senhora (1899);

Dona Mística (1899);

Kyriale (1902).

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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Aspectos centrais

Alphonsus de Guimaraens demonstra em seus

versos todas as principais características simbolistas: a

sugestão, a musicalidade e o desejo de

transcendência. Quanto à temática, o amor, a

religiosidade e o escapismo são bastante frequentes

em sua obra.

O traço marcante de Alphonsus vem ser a

descrição idealizada da mulher, normalmente uma

virgem inacessível tragada pela morte – talvez a

herança do desgosto pela perda da noiva Constança.

Já quanto à religiosidade, percebemos em seus versos

um eu lírico completamente rendido à fé católica.

ISMÁLIA

Quando Ismália enlouqueceu,

Pôs-se na torre a sonhar...

Viu uma lua no céu,

Viu outra lua no mar...

No sonho em que se perdeu,

Banhou-se toda em luar...

Queria subir ao céu,

Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,

Na torre pôs-se a cantar...

Estava perto do céu,

Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu

As asas para voar...

Queria a lua do céu,

Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu

Ruflaram de par em par...

Sua alma subiu ao céu,

Seu corpo desceu ao mar...

Augusto dos Anjos

Aspectos centrais

Um caso à parte na literatura brasileira: esta é a

melhor forma de classificarmos a produção poética de

Augusto dos Anjos, autor que não pode ser encaixado

plenamente em qualquer dos “-ismos” do final do

século XIX e início do século XX, tendo lançado

apenas um livro, intitulado Eu (1912). Na realidade, o

autor se valeu de todas as estéticas existentes para

escrever seus versos. Vejamos:

Seus poemas apresentam o rigor formal e o apuro

técnico típicos do Parnasianismo.

Sua poesia constantemente tematiza os aspectos

decadentes da condição humana, o viver doloroso,

numa linguagem bastante simbólica, melódica e

sugestiva, características que se configuram como

próprias ao Simbolismo.

A visão pessimista a respeito da sociedade e da

condição humana demonstra alguns pontos de

contato com o Realismo propriamente dito.

A utilização de um vocabulário cientificista, repleto

de termos considerados não poéticos – tais como:

amoníaco, escarro, vermes, mamífero,

malacopterígios, flamívomos, Zooplasma, ... – faz-

nos lembrar o Naturalismo. A propósito: esse

vocabulário tão inusitado torna inconfundíveis os

poemas de Augusto dos Anjos.

Sua visão multifacetada de realidade, misturando

filosofia, religião oriental, ciências naturais, o faz um

antecipador de tendências modernistas, que viriam

desabrochar no Brasil apenas a partir de 1922, com

a realização da Semana de Arte Moderna.

A morte é um dos temas mais frequentes em

suas obras; a morte seguida pela decomposição do

indivíduo até este voltar a ser apenas elemento

químico. É o niilismo existencial, o vazio da existência

humana.

VERSOS ÍNTIMOS

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável

Enterro de tua última quimera.

Somente a Ingratidão — esta pantera —

Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!

O Homem, que, nesta terra miserável,

Mora, entre feras, sente inevitável

Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!

O beijo, amigo, é a véspera do escarro,

A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,

Apedreja essa mão vil que te afaga,

Escarra nessa boca que te beija!

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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TESTES

01. (FGV – SP) – Assinale a alternativa correta a

respeito do Parnasianismo:

a) A inspiração é mais importante que a técnica.

b) Culto da forma: rigor quanto às regras de

versificação, ao ritmo, às rimas ricas ou raras.

c) O nome do movimento vem de um poema de

Raimundo Correia.

d) Sua poesia é marcada pelo sentimentalismo.

e) No Brasil, o Parnasianismo conviveu com o

Barroco.

02. (UPF – RS) – Segundo o crítico Luís Augusto

Fischer, uma escola literária que apresentou

significativa produção no Brasil, na segunda metade do

século XIX, tinha como propósito central a “descrição

profissional de mundos mortos”. O crítico refere-se,

certamente, à escola do

a) Romantismo d) Parnasianismo

b) Simbolismo e) Realismo

c) Naturalismo

03. (UPF – RS) – Dos traços abaixo mencionados,

aquele que não caracteriza a poética parnasiana é

a) o caráter confessional;

b) a objetividade na abordagem dos temas;

c) os ideais antirromânticos;

d) o culto da forma;

e) o desejo de impessoalidade.

04. (UCS – RS) – O Simbolismo foi um movimento

literário de grande repercussão na produção dos

escritores brasileiros. Nesse período, eles buscaram

evocar e sugerir imagens, explorando as experiências

sensoriais. Leia o fragmento do poema Cárcere das

Almas, de Cruz e Sousa, um dos representantes do

Simbolismo:

Tudo se veste de uma igual grandeza

Quando a alma entre grilhões as liberdades

Sonha e sonhando, as imortalidades

Rasga no etéreo Espaço da Pureza.

TUFANO, Douglas. Estudos de literatura brasileira

Analise a veracidade (V) ou a falsidade (F) das

proposições abaixo, sobre o fragmento do poema:

( ) Nesse fragmento, é possível perceber o estado

onírico, uma das características típicas do período

literário em questão.

( ) O sujeito lírico deseja a liberdade, buscando

encontrá-la no mundo das aparências.

( ) Ao grafar as palavras Espaço e Pureza em

maiúsculo, o poeta sugere uma personificação

das ideias contidas nesses vocábulos.

Assinale a alternativa que preenche corretamente os

parênteses de cima para baixo:

a) V – F – F d) V – F – V

b) V – V – V e) F – V – V

c) F – V – F

Texto para a questão 05:

Referir-se a um objeto pelo seu nome é

suprimir a três quartas partes da fruição do poema, que

consiste na felicidade de adivinhar pouco a pouco:

sugeri-lo, eis o sonho. É o uso perfeito desse mistério que

constitui o símbolo; evocar pouco a pouco um objeto e

desprender-se dele um estado de alma, uma série de

decifrações. Mallarmé

05. (UEPG – PR) – O autor faz referência à construção

da poesia simbolista e destaca-lhe características.

Com base no fragmento, assinale o que for correto:

01) A sugestão predomina sobre a descrição: as

imagens produzidas são vagas, diluídas, suaves.

02) Misticismo: o simbolista busca o inatingível, o

oculto e o misterioso.

04) O jogo dos sentimentos exacerbados, com

alargamento da subjetividade pela

espontaneidade coloquial.

08) Liberdade formal, com incorporação e valorização

do prosaico, do vulgar, do cotidiano, e pela livre

associação de ideias.

16) Emprego de inusitadas combinações entre sons,

cores e perfumes para expressar imagens e

sensações pertencentes a diferentes domínios

dos sentidos.

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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06. (UNIPAR – PR) – Com relação a Augusto dos

Anjos, podemos afirmar corretamente que ele foi o

poeta do

a) cientificismo triunfante que, aliado à ideia de

progresso, marcou boa parte da lírica

contemporânea aos primeiros anos da República.

b) pessimismo aliado à ciência que acusava a

degradação humana mediante associações e

comparações com processos químicos e

biológicos.

c) cientificismo militante disposto a abranger temas

como o cálculo algébrico, a crítica literária e

arquitetura para retirar o caráter subjetivo da

poesia.

d) esteticismo que depurava a forma de seus

sonetos à perfeição, sem jamais fazer concessões

a temas considerados prosaicos ou de mau gosto.

e) pessimismo acusatório que denunciou o latifúndio

e a política oligárquica, reproduzindo na poesia as

preocupações e temas de Lima Barreto.

07. (UEPG – PR) – Sobre as estéticas literárias

brasileiras, assinale o que for correto:

01) O principal representante do Realismo-

Naturalismo brasileiro foi José de Alencar, com

suas obras regionalistas e indianistas.

02) Os versos "Minha terra tem palmeiras,/ onde

canta o Sabiá;/As aves que aqui gorjeiam,/ Não

gorjeiam como lá." fazem parte do poema

"Canção do exílio", poema de Gonçalves Dias,

representante da primeira geração da poesia

romântica.

04) A preferência pelo soneto, a contenção da

emoção e o princípio da arte pela arte são

características do Parnasianismo.

08. (UP – PR) – Textos:

TEXTO 1

Invejo o ourives quando escrevo:

Imito o amor

Com que ele, em ouro, o alto relevo

Faz de uma flor.

Quero que a estrofe cristalina,

Dobrada ao jeito

Do ourives, saia da oficina

Sem um defeito:

Assim procedo. Minha pena

Segue esta norma,

Por te servir, Deusa serena,

Serena Forma

Olavo Bilac – excerto

TEXTO 2

Frouxo o verso talvez, pálida a rima

Por estes meus delírios cambeteia

Porém odeio o pó que deixa a lima

E o tedioso emendar que gela a veia!

Quanto a mim é o fogo que me anima

De uma instância o calor: quando formei-a,

Se a estátua não saiu como pretendo,

Quebro-a – mas nunca seu metal emendo.

Álvares de Azevedo – excerto

Qual(is) a(s) opção(ões) que se pode(m) deduzir dos

poemas, de seus autores e da literatura?

I. O primeiro texto e seu autor fazem parte do

movimento parnasiano brasileiro. O poema a que

os versos pertencem (Profissão de fé) é um do

símbolos dessa escola que defendeu o

comedimento emocional e a precisão formal como

meios para atingir o poema perfeito.

II. O segundo texto e seu autor pertencem ao

período romântico e o escritor se destaca como

um dos ícones do Ultrarromantismo, em que as

emoções tinham espaço privilegiado nas

composições poéticas.

III. Álvares de Azevedo defende, no texto II, a

liberdade de criação artística, não destaca a

elegância da composição, mas sim o quanto de

intensidade emotiva e paixão ela contém.

IV. Olavo Bilac entende que a poesia é uma rara joia

que precisa ser bem lapidada para alcançar a

perfeição, pois o poeta é um servidor da Deusa da

Forma.

V. Ambos os poetas estão errados, já que é

necessário seguir os princípios do Modernismo,

que defende ao mesmo tempo a liberdade criativa

do poeta, a ruptura com a tradição temática e a

precisão do que escreve.

Assinale a única alternativa que contém todas as

afirmativas corretas:

a) Apenas II e IV; d) I, II, III e IV;

b) Apenas I, III e IV; e) Apenas II, III e IV.

c) Apenas a V;

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LITERATURA BRASILEIRA – SEMIEXTENSIVO 2015

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09. (ENEM) – Texto:

CÁRCERE DAS ALMAS

Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,

Soluçando nas trevas, entre as grades

Do calabouço olhando imensidades,

Mares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza

Quando a alma entre grilhões as liberdades

Sonha e, sonhando, as imortalidades

Rasga no etéreo o Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas e fechadas

Nas prisões colossais e abandonadas,

Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silêncios solitários, graves,

que chaveiro do Céu possui as chaves

para abrir-vos as portas do Mistério?!

CRUZ E SOUSA, J. Poesia completa

Os elementos formais e temáticos relacionados ao

contexto cultural do Simbolismo encontrados no

poema Cárcere das almas, de Cruz e Sousa, são

a) a opção pela abordagem, em linguagem simples e

direta, de temas filosóficos.

b) a prevalência do lirismo amoroso e intimista em

relação à temática nacionalista.

c) o refinamento estético da forma poética e o

tratamento metafísico de temas universais.

d) a evidente preocupação do eu lírico com a

realidade social expressa em imagens poéticas

inovadoras.

e) a liberdade formal da estrutura poética que

dispensa a rima e a métrica tradicionais em favor

de temas do cotidiano.

10. (ENEM) – Textos:

Texto 1

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.

Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:

Na bruta ardência orgânica da sede,

Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

"Vou mandar levantar outra parede..."

– Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho

E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,

Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego

A tocá-lo. Minh’alma se concentra.

Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!

Por mais que a gente faça, à noite, ele entra

Imperceptivelmente em nosso quarto!

ANJOS, A. Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1994

Texto 2

O lugar-comum em que se converteu a

imagem de um poeta doentio, com o gosto do macabro

e do horroroso, dificulta que se veja, na obra de Augusto

dos Anjos, o olhar clínico, o comportamento analítico, até

mesmo certa frieza, certa impessoalidade científica.

CUNHA, F. Romantismo e modernidade na poesia

Em consonância com os comentários do texto 2 acerca

da poética de Augusto dos Anjos, o poema O

morcego apresenta-se, enquanto percepção de

mundo, como forma estética capaz de

a) reencantar a vida pelo mistério com que os fatos

banais são revestidos na poesia.

b) expressar o caráter doentio da sociedade

moderna por meio do gosto pelo macabro.

c) representar realisticamente as dificuldades do

cotidiano sem associá-lo a questões de cunho

existencial.

d) abordar dilemas humanos universais a partir de

um ponto de vista distanciado e analítico acerca

do cotidiano.

e) conseguir a atenção do leitor pela inclusão de

elementos das histórias de horror e suspense na

estrutura lírica da poesia.

GABARITO

01. b 06. b

02. d 07. 06 (02,04)

03. a 08. d

04. d 09. c

05. 19 (01, 02, 16) 10. d