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A A A S S P P E E C C T T O O S S F F U U N N D D A A M M E E N N T T A A I I S S D D D E E P P L L A A N N E E J J A A M M E E N N T T O O E E E N N E E R R G G É É T T I I C C O O DEZEMBRO DE 2005

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DDEEZZEEMMBBRROO DDEE 22000055

Ministério de Minas e Energia Ministério da Integração Nacional

Ministro Ministro Silas Rondeau Cavalcante Silva Ciro Ferreira Gomes

Presidente Diretor-Geral Mauricio Tiomno Tolmasquim José Zenóbio Teixeira de Vasconselos

Diretor de Estudos Econômicos e Energéticos Diretor

Amílcar Guerreiro Manoel Brandão de Farias

Superintendente de Economia da Energia Gerente de Infra-estrutura James Bolívar Luna de Azevedo Eduardo Cavalcanti Coordenadora de Inovação Tecnológica Maria Helena Lima

Contrato

ADENE Nº 13/2005

Título do Documento

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO Responsáveis Técnicos Amaro Pereira Juliana Marreco Mauro Almeida Vicente Correa Neto

URL: http://www.epe.gov.br

Sede SAN – Quadra 1 – Bloco “B” – 1º andar 70051-903 Brasília DF

Escritório Central Av. Rio Branco, n° 1 - 11° andar 20090-003 Rio de Janeiro RJ

Rio de Janeiro, Dezembro de 2005

Copyright © 2005, EPE – Empresa de Pesquisa Energética Autorizada a reprodução parcial desde que citada a fonte.

Apresentação pág. 1/2 ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

APRESENTAÇÃO

O Ministério de Minas e Energia - MME, através dos seus órgãos e empresas, promove diversos

estudos e análises com o objetivo de subsidiar a formulação de políticas energéticas, bem como

orientar a definição dos planejamentos setoriais

A Empresa de Pesquisa Energética – EPE, empresa pública vinculada ao Ministério de Minas e

Energia, instituída pela a Lei nº 10.847, de 15 de março de 2004, e regulamentada pelo Decreto nº

5.184, de 16 de agosto de 2004, tem por finalidade prestar serviços na área de estudos e

pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor energético, tais como energia elétrica,

petróleo e gás natural e seus derivados, carvão mineral, fontes energéticas renováveis e eficiência

energética, dentre outras.

Os estudos e pesquisas desenvolvidos pela EPE subsidiarão a formulação, o planejamento e a

implementação de ações do MME, no âmbito da política energética nacional. A lei que criou e

definiu as atribuições da EPE estabeleceu suas competências, entre as quais:

• A realização de estudos e projeções da matriz energética brasileira;

• A elaboração e publicação do balanço energético nacional;

• A identificação e quantificação dos potenciais de recursos energéticos;

• Desenvolvimento de estudos de impacto social, viabilidade técnico-econômica e sócio-ambiental para os empreendimentos de energia elétrica e de fontes renováveis;

• Desenvolvimento de estudos para avaliar e incrementar a utilização de energia proveniente de fontes renováveis;

• Promoção de estudos e produzir informações para subsidiar planos e programas de desenvolvimento energético ambientalmente sustentável, inclusive de eficiência energética;

• Promoção de planos de metas voltadas para a utilização racional e conservação de energia, podendo estabelecer parcerias de cooperação para este fim, entre outras.

A Agência de Desenvolvimento do Nordeste – ADENE, órgão vinculado ao Ministério da Integração

Nacional – MI, tem como missão a promoção do crescimento e a integração inter e intra-regional

do Nordeste Brasileiro, bem como a inserção e o progresso social desta região geográfica, com

base na disseminação do desenvolvimento sustentável.

No âmbito de suas competências, a ADENE objetiva promover o desenvolvimento de uma política

energética para a Região Nordeste que valorize o aproveitamento integrado dos recursos

energéticos, considerando sua diversidade e disponibilidade, os aspectos tecnológicos associados e

as potencialidades econômicas locais, bem como a inserção social e ambiental para o

desenvolvimento sustentável da região.

A ADENE identificou na maioria dos Estados da Região Nordeste a ausência dos recursos

fundamentais necessários à consecução deste objetivo, em particular as bases de dados

energéticos, apesar de ações anteriormente desenvolvidas com o objetivo de construí-las, que

Apresentação pág. 2/2 ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

resultaram na formação de conhecimento sobre as dificuldades, bem como sobre as alternativas

para sua consecução.

Objetivando identificar e desenvolver as condições necessárias para que sejam viabilizados os

elementos fundamentais e as ferramentas necessárias para a implementação, no futuro, do

pretendido Planejamento Energético Regional, a ADENE contratou a EPE para a realização de

estudo de identificação preliminar das condições atuais e diretrizes para aparelhar os Estados e a

Região Nordeste com os recursos necessários para a consecução do Planejamento Energético

Regional, e os respectivos Balanços Energéticos, desenvolvido através de oficina de trabalho e

seminário de capacitação de equipes regionais.

Considerando a importância e a amplitude dos objetivos de longo prazo, a complexidade das

atividades necessárias à execução de um planejamento energético regional, bem como dos

recursos necessários, em particular a formação de pessoal qualificado e capacitado e a

disponibilidade, confiabilidade, qualidade e abrangência de informações e estatísticas energéticas

adequadamente estruturadas, que constituem um balanço energético, a estratégia adotada para

proporcionar o melhor aproveitamento dos recursos alocados, diante do orçamento e do prazo de

execução disponíveis, será a elaboração de um estudo preliminar que visa identificar as barreiras e

as oportunidades para a realização do Planejamento Energético Regional na Região Nordeste, bem

como de seu Balanço Energético Regional, através da consolidação das experiências já realizadas

neste sentido, bem como seus resultados e aprendizados.

A metodologia adotada que permitirá obter as informações da experiência existente e a

identificação dos pontos críticos terá como base a realização de oficinas de trabalho, onde as

equipes regionais serão apresentadas a material didático teórico sobre planejamento energético e

balanço energético, constantes das apostilas preparadas, e em seguida participarão de grupos de

discussão sobre os temas, focando-se a elucidação das experiências passadas, barreiras e

oportunidades identificadas à luz da teoria apresentada.

Desta forma se objetiva materializar os conhecimentos dos participantes, auferidos em sua

vivência e na participação na oficina, consolidando-se os resultados fundamentais possíveis nesta

etapa de trabalho, quais sejam:

• Evidenciar as experiências passadas, maximizando os resultados das ações futuras;

• Capacitar as equipes através do nivelamento do conhecimento individual sobre as experiências já realizadas e potencializando os resultados através da sinergia entre os representantes dos diferentes Estados;

• Capacitar as equipes em um primeiro nível teórico através da apresentação e fornecimento de material didático de referência;

• Extrair o conhecimento tácito já existente, de forma organizada e sistematizada, explicitando os elementos que evidenciam o patamar atual da Região Nordeste em termos dos recursos necessários para alcançar o objetivo do Planejamento Energético, permitindo que se estabeleçam referenciais mínimos, diretrizes e recomendações para as ações a serem desenvolvidas.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 1

2 CONCEITUAÇÃO DE ENERGIA 2 2.1 ENERGIAS PRIMÁRIA, SECUNDÁRIA, FINAL E ÚTIL 3 2.2 FONTES RENOVÁVEIS E NÃO RENOVÁVEIS 4 2.3 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA TERMODINÂMICA 5 2.4 RENDIMENTO DAS CONVERSÕES ENERGÉTICAS 6

3 ENERGIA E DESENVOLVIMENTO 7 3.1 ECODESENVOLVIMENTO E DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 7

4 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO NO BRASIL 11 4.1 BREVE HISTÓRICO DO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO NO BRASIL 13

5 PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS - PIR 15 5.1 TIPOS DE MODELOS DE PROJEÇÃO 18 5.2 ANÁLISE PROSPECTIVA DE CENÁRIOS 19 5.3 IDENTIFICAÇÃO DAS OPÇÕES 20 5.4 GERENCIAMENTO PELO LADO DA DEMANDA (GLD) 21 5.5 HISTÓRICO DA CONSERVAÇÃO DE ENERGIA NO BRASIL 23 5.6 OPÇÕES DE OFERTA 25 5.7 DETERMINAÇÃO DO PLANO DE AÇÃO 26 5.8 O PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS NA ESFERA REGIONAL 27 5.9 IMPLEMENTAÇÃO DO PLANO DE AÇÃO 29 5.10 BARREIRAS AO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO INTEGRADO 29

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 31

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

1

1 INTRODUÇÃO

É indiscutível a importância da energia no processo de desenvolvimento de uma nação. A forma

como a energia será gerada e seus usos serão determinantes para garantir às gerações futuras

possibilidades de aproveitamento dos recursos energéticos tal como é possível para as gerações

atuais.

Para tanto, o planejamento energético torna-se imprescindível. E nessa linha, não se pode mais

pensar apenas no planejamento da expansão da oferta. Muitas outras preocupações de ordem

sócio-ambiental fizeram o planejamento tradicional evoluir para um planejamento energético

integrado.

Integrar ações de planejamento da expansão da oferta a medidas de gerenciamento pelo lado da

demanda em um processo participativo, contemplando riscos e incertezas com objetivos sócio-

econômicos e ambientais tornou-se fundamental na busca de boa parte dos problemas do setor

energético que acometem os países em desenvolvimento.

No Brasil, o evento do racionamento de energia elétrica em 2001 teve um importante papel em

promover ainda que de maneira forçada, uma maior racionalidade no uso da eletricidade e

estimular a eficiência energética. Mostrou que o potencial de conservação é enorme e que é

possível atender às necessidades de energia a partir de medidas relativamente simples de

substituição de equipamentos e racionalização do uso sem comprometer o conforto.

Considerando que a construção de alternativas consistentes para conciliar as necessidades de

energia e desenvolvimento com a melhoria das condições de vida da população e a preservação do

meio ambiente é objetivo do planejamento energético, apresentamos na primeira parte desta

apostila uma conceituação de energia em suas formas primária, secundária, final e útil , a noção de

fontes renováveis e não renováveis, uma descrição dos princípios básicos da termodinâmica e do

rendimento das conversões energéticas, construindo assim um entendimento da dimensão

energética e suas conseqüências.

Na seqüência, apresentamos uma introdução aos aspectos que relacionam energia e

desenvolvimento, assim como os conceitos de ecodesenvolvimento e de desenvolvimento

sustentável.

Estas descrições abrem caminho para a narrativa subseqüente, que aborda a importância do

planejamento energético e um breve histórico do processo no Brasil, os tipos de modelos de

projeção de oferta e consumo de energia e sua aplicação, as metodologias de análise prospectiva

de cenários, com a identificação das opções e oportunidades, a determinação do plano de ação

para uma planejamento integrado de recursos na esfera regional, sua implementação e as

barreiras ao planejamento energético integrado.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

2

2 CONCEITUAÇÃO DE ENERGIA

A energia é um insumo básico, praticamente utilizado em todas as atividades das sociedades

modernas, produzindo bens e serviços, substituindo o trabalho humano ou fornecendo conforto.

Existem diversas definições para a energia, podendo ser citadas: “capacidade de produzir

trabalho”, “capacidade de um sistema produzir ações externas” ou “propriedade da matéria que se

move”. Uma definição bastante completa, segundo RADOVIC (2005), considera a energia uma

propriedade da matéria que pode ser convertida em trabalho, calor ou radiação.

A energia se manifesta de diversas fontes e sob diferentes formas: energia química, energia

mecânica, energia térmica, energia eletromagnética, energia nuclear, energia elétrica.

A energia química pode ser definida como a energia de coesão dos átomos nas moléculas de

material combustível, ou seja, é a energia existente nas ligações químicas. As ligações químicas

formam-se ou se desfazem durante as reações químicas. Apesar de a realização de algumas

reações químicas exigir a absorção de energia do exterior, via de regra acontece o contrário: cada

vez que se verifica uma reação química ocorre liberação de energia. No caso das reações de

combustão, como a queima de carvão, libera-se esta energia sob a forma de calor. No caso de

uma reação eletroquímica, como a que ocorre em uma pilha comum, esta energia é liberada sob a

forma de corrente elétrica.

A energia mecânica pode ser subdivida em energia cinética e energia potencial. Energia cinética é

a forma da energia mecânica associada ao movimento. Um corpo em movimento, ou seja, dotado

de velocidade, como o êmbolo de um motor de combustão, por exemplo, possui energia cinética. A

energia potencial é a forma da energia mecânica associada à posição em que um corpo se

encontra. A energia existente em um peso preso a uma mola deformada é um exemplo de um

corpo com energia potencial (potencial elástica), assim como um corpo à determinada altura do

solo (potencial gravitacional).

A energia térmica surge devido ao movimento caótico dos átomos e moléculas de um gás ou corpo

aquecido. Normalmente surge como resultado de transformações de outras formas de energia

como, por exemplo, a partir de uma reação química.

A energia eletromagnética é a forma de energia associada às ondas eletromagnéticas. O principal

exemplo de energia eletromagnética é a forma em que parte da energia proveniente do Sol atinge

a Terra, sendo que a partir desta derivam diversas outras formas de energia, entre as quais a

energia química dos combustíveis.

A energia nuclear surge devido à coesão dos prótons e nêutrons dentro dos núcleos atômicos. As

reações nucleares como a fusão, que ocorre na superfície do Sol, e a fissão, usada nos reatores

nucleares, podem liberar uma quantidade de energia, por unidade de massa, incomparavelmente

superior à liberada em reações químicas.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

3

A energia elétrica é a forma de energia associada ao movimento dos elétrons. A energia elétrica

talvez seja, dentre todas as formas de energia, a mais preciosa devido à facilidade com que pode

ser transformada em trabalho útil e, principalmente, devido aos altos rendimentos associados à

conversão. As diversas facilidades que esta forma de energia apresenta e o fato de poder ser

eficientemente convertida em outras formas de energia, tornaram seu uso bastante difundido em

muitas das nossas atividades diárias. Hoje, a eletricidade é utilizada em um grande número de

aplicações, sendo esperado que sua participação no total da energia final consumida seja

crescente. É cada vez maior a variedade de equipamentos elétricos a disposição dos consumidores

e mesmo os aparelhos já existentes, em alguns casos apresentam potências cada vez maiores. No

setor residencial, por exemplo, são lançados modelos de televisores e de refrigeradores com

dimensões cada vez mais elevadas, assim como o número de eletrodomésticos a disposição dos

consumidores é crescente.

Apesar da multiplicidade de formas com que a energia se apresenta, acredita-se que todas elas se

originam de apenas três tipos de interações fundamentais da natureza, são elas: a gravitacional, a

eletromagnética e a nuclear.

A interação gravitacional apresenta uma magnitude proporcional às massas envolvidas, não sendo

significativa no mundo subatômico, mas em uma escala proporcional ao domínio do sistema solar,

sem dúvida, é a força dominante. A força gravitacional é uma importante fonte de energia

diretamente utilizável como, por exemplo, a energia hidráulica e a energia das marés.

As interações eletromagnéticas e nucleares ocorrem em nível subatômico e subnuclear. São

interações entre elétrons, entre elétrons e núcleos, e entre os próprios constituintes dos núcleos

atômicos. Estas interações geram, direta ou indiretamente, a maior parte das formas em que a

energia se manifesta.

2.1 ENERGIAS PRIMÁRIA, SECUNDÁRIA, FINAL E ÚTIL

As fontes de energia se caracterizam por apresentar uma disponibilidade natural de energia, mas

que em raras situações se apresenta diretamente na forma como pode ser utilizada. Em geral, no

uso da energia, são necessárias transformações ou conversões de uma forma de energia em outra.

A energia, na forma direta como é provida pela natureza, é definida como energia primária. As

principais fontes de energia primária são hidrelétricas, o petróleo, o gás natural, o carvão mineral,

o minério de urânio, os resíduos (vegetais e animais), a energia eólica e a energia solar. A maioria

das fontes de energia primária não é consumida diretamente, sendo transformada em outra forma

de energia.

Define-se energia secundária como a resultante dos diferentes centros de transformação, tendo

como destino os diversos setores de consumo ou, eventualmente, outro centro de transformação.

A energia final, por sua vez, é definida como a energia na forma como é recebida pelo usuário nos

diferentes setores, seja na forma primária, seja na forma secundária.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

4

A energia final apenas representa a forma em que a energia é comercializada. Nos setores de

consumo ainda é necessário converter a energia final para o atendimento das necessidades de

iluminação, força motriz, calor de processo etc. A energia na forma em que é demandada pelos

consumidores recebe o nome de energia útil.

A Figura 1 exemplifica os conceitos apresentados para um processo de geração de energia elétrica

a partir da queima de carvão mineral e posterior utilização final sob a forma de iluminação.

FIGURA 1 EXEMPLO DE CADEIA ENERGÉTICA PARA O CARVÃO MINERAL

Fonte: SAIDEL e FADIGAS, 2005.

2.2 FONTES RENOVÁVEIS E NÃO RENOVÁVEIS

Algumas formas de energia podem ser repostas em períodos relativamente curtos ou seu uso pelo

homem não implica necessariamente na sua exaustão. O álcool proveniente da cana-de-açúcar,

por exemplo, pode ser obtido continuamente em sucessivas safras, desde que haja uma utilização

racional do solo, não provocando uma degradação do mesmo. A energia elétrica obtida por

Modo de extração

Energia Primária

Energia Final

Tecnologia de Distribuição

Energia Secundária

Tecnologia de Transformação

Serviço de Energia

Tecnologia de Uso Final

Mina de Carvão

Carvão

Usina Elétrica

Eletricidade

Rede de Eletricidade

Eletricidade

Lâmpada

Iluminação

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

5

geração hídrica também pode ser considerada uma forma renovável de energia, pois seu uso não

implica na exaustão da água ou qualquer outro recurso. Outros exemplos de formas de energia

que podem ser consideradas renováveis são a energia obtida a partir de células fotovoltaicas, a

energia eólica, a energia das marés ou mesmo a energia obtida por óleos vegetais. Estes últimos

tanto podem ser utilizados como combustíveis em motores especiais ou adicionados ao óleo diesel

e utilizados em veículos movidos a biodiesel.

No caso de algumas formas de energia, no entanto, suas reposições naturais podem levar períodos

de tempo muito elevados e suas reposições artificiais são impraticáveis (JANUZZI, 1997).

Combustíveis fósseis tais como o petróleo, o gás natural e o carvão mineral, por exemplo, são

produzidos na natureza sob condições bastante específicas, em processos naturais que levam

milhares de anos. A utilização destes energéticos, dados os ritmos atuais de consumo, em algum

momento implicará na exaustão dos mesmos ou na impossibilidade econômica de seu uso, dado o

aumento de preço resultante de sua raridade.

2.3 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA TERMODINÂMICA

Nas conversões da energia entre as diversas formas possíveis, em geral de seu estado inicial

encontrado na natureza para formas mais apropriadas ao atendimento das necessidades dos

consumidores, normalmente perde-se parte de seu possível aproveitamento.

As conversões de energia são regidas pelos princípios básicos da termodinâmica. O primeiro

princípio, conhecido como Princípio da Conservação da Energia ou Primeira Lei da Termodinâmica,

estabelece que a quantidade de energia de um sistema isolado, isto é, um sistema que não troca

nem matéria nem energia com o ambiente, permanece constante. Assim, em um sistema isolado a

quantidade de energia total permanece inalterada, embora as formas em que a energia se

apresenta possam mudar. Logo, a energia não pode ser criada ou destruída, apenas convertida de

uma forma pra outra.

É interessante observar que uma importante conseqüência do Princípio da Conservação da

Energia, segundo RADOVIC (2005), é que o fornecimento de calor ou a realização de trabalho

modificam de forma equivalente, em termos quantitativos, a energia de um sistema. Assim, o

Primeiro Princípio não fornece uma distinção qualitativa entre calor e trabalho, ou entre outras

formas de energia.

Já o Segundo Princípio da Termodinâmica estabelece que a energia vai perdendo a sua “qualidade”

ao longo da cadeia energética, sendo esta “qualidade” explicitada através da capacidade de

realizar trabalho. Desta forma, a quantidade total da energia em um sistema isolado permanece

sempre constante, de acordo com o Primeiro Princípio, entretanto a quantidade de energia

disponível pode diminuir.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

6

2.4 RENDIMENTO DAS CONVERSÕES ENERGÉTICAS

A partir da Segunda Lei da Termodinâmica é possível compreender que ao longo das possíveis

conversões da energia, objetivando tanto o transporte quanto a utilização pelos usuários finais,

parte da energia inicialmente disponível pode não ser mais aproveitada. A Figura 2 ilustra o

processo.

O conceito de rendimento energético busca mensurar o quanto da energia ainda pode ser

aproveitada após um processo de conversão e qual a parcela que se transforma em outra forma

com menor possibilidade de utilização como, por exemplo, calor. Quanto maior o rendimento da

conversão, menores as perdas existentes, sendo estas entendidas como refletindo a

impossibilidade de utilização de uma parcela da energia inicial na entrada do processo de

conversão.

FIGURA 2 PROCESSO ESQUEMÁTICO DE CONVERSÃO DA ENERGIA

Fonte: elaboração própria.

O rendimento de um processo de conversão de energia sempre será inferior ou, no máximo, igual

a um. Quanto menos eficiente for o processo de conversão, menor será o rendimento e,

conseqüentemente, menor será a parcela da energia que poderá ser aproveitada.

original forma na energiadatransporta ou usda facilmente maisser pode como forma na enegia=Rendimento

O conceito de “uso eficiente da energia” engloba uma série de práticas e conhecimentos que visam

minimizar as perdas na conversão e no uso da energia. Implica na busca dos mesmos padrões de

conforto, da mesma quantidade de bens produzidos e da mesma qualidade nos serviços prestados,

mas com um menor consumo de energia, via redução das perdas e dos desperdícios.

Energia na forma original

Energia na forma como

pode ser mais facilmente utilizada ou

transportada

Energia não aproveitada

Conversão da

energia

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

7

3 ENERGIA E DESENVOLVIMENTO

Há uma visão tradicional que associa o consumo energético de um país com o nível de

desenvolvimento deste. Países com maior intensidade energética, definida como a razão entre o

consumo energético e o PIB, seriam mais desenvolvidos que outros com menor intensidade. Esta

visão, no entanto, é simplista e incompleta, pois omite uma série de questões importantes,

principalmente relacionadas ao próprio conceito de desenvolvimento e sua sustentabilidade.

As discussões buscando qualificar a questão do desenvolvimento evoluíram bastante ao longo do

tempo. Segundo LA ROVERE (1984), após a Segunda Guerra Mundial os neoclássicos associavam o

desenvolvimento de um país ao seu crescimento econômico. Esta escola de pensamento

econômico pregava que as vantagens comparativas que certos países possuiriam em relação a

outros, justificando a especialização da produção, tenderiam a reduzir as desigualdades entre os

povos.

Tanto os chamados Estruturalistas quanto os adeptos da Teoria da Dependência, nas décadas de

50 e 60, respectivamente, contestavam os conceitos principais apresentados pelos neoclássicos.

Estas escolas buscaram mostrar a deterioração das bases de trocas, a especialização na

exportação de matérias-primas e as próprias desigualdades internas nos países como

impedimentos para a redução das diferenças existentes. No entanto, não questionavam as

premissas básicas relacionadas ao crescimento econômico e ao desenvolvimento.

3.1 ECODESENVOLVIMENTO E DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

As primeiras discussões efetivas, analisando de forma qualitativa o desenvolvimento e mostrando

as restrições ambientais e energéticas resultantes dos estilos de crescimento então vigentes,

surgiram apenas na década de 70.

O conceito de ecodesenvolvimento surgiu com a constatação de que crescimento econômico,

desenvolvimento e meio ambiente são variáveis intrinsecamente relacionadas e que devem ser

avaliadas sob a perspectiva da melhora das condições de vida dos povos.

O conceito de Desenvolvimento Sustentável, por sua vez, surgiu com as mesmas bases do

ecodesenvolvimento, mas agregando a noção da responsabilidade que as gerações atuais devem

ter para com as gerações futuras, observando a preocupação com a própria sobrevivência da

humanidade.

A relevância desta interpretação para o conceito de desenvolvimento surge na medida em que não

há uma forma de transformação ou uso da energia que não provoque algum tipo de agressão ao

meio ambiente. Os padrões de crescimento historicamente adotados pelos países de economia

madura foram marcados pela utilização intensiva de fontes energéticas não renováveis e por

diversos problemas ambientais, em maior ou menor escala. A possibilidade de utilização de

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

8

tecnologias mais limpas e eficientes nas transformações e no uso da energia é um caminho que

deve ser sempre observado.

Uma outra questão relevante diz respeito ao próprio entendimento do que é desenvolvimento e de

qual a função da energia ao longo do caminho para que este seja atingido. O desenvolvimento

deve ser entendido não como o aumento da riqueza, medida cartesianamente pelo crescimento do

PIB, mas pela evolução favorável de um conjunto de parâmetros que procurem mensurar

efetivamente o bem estar do povo. Para tal, certamente o Índice de Desenvolvimento

Humano 1 (IDH) e o Índice de Gini 2 são muito mais apropriados que a simples medida do PIB.

Com relação à importância da energia neste processo, BRITO (1985, p.562) faz uma interessante

observação sobre o consumo energético dos países em desenvolvimento:

[...] ligadas a uma dissolução real entre consumo de energia e desenvolvimento. A

energia não mais estaria sendo utilizada prioritariamente, nestes países, em função da construção de uma infra-estrutura de suporte para o desenvolvimento, mas em função de necessidades externas – o que caracteriza o desenvolvimento do tipo

colonial, por oposição ao desenvolvimento autônomo realizado pelas grandes potências européias nos séculos XVIII e XIX.

FIGURA 3 PERCENTUAL DA POPULAÇÃO COM ACESSO A ENERGIA ELÉTRICA NO MUNDO

Fonte: ONU

1 O IDH avalia o desenvolvimento de uma nação não apenas pela renda, mas principalmente pela incorporação na análise de variáveis como educação e longevidade. O índice varia de zero (nenhum desenvolvimento humano) a um (desenvolvimento humano total). 2 O Índice de Gini busca medir o grau de concentração da renda disponível, variando de zero (perfeita igualdade) a um (a desigualdade máxima)

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

9

A importância do assunto emerge da análise do cenário energético mundial, onde observa-se

tendência de aumento do consumo de energia, dado que ainda há boa parte da população mundial

sem acesso aos serviços de energia conforme ilustrado na Figura 3.

No entanto, é sabido que o aumento do consumo de energia, mimetizando o padrão norte

americano, implicará em uma série de investimentos e atividades que resultarão em um processo

de degradação ambiental irreversível (poluição, chuva ácida, aquecimento global).

Alternativamente poderia se buscar um padrão de desenvolvimento menos intensivo em energia. A

cópia de estilos de desenvolvimento baseados na imitação de trajetórias seguidas pelos países de

economias maduras, não garante a melhoria das condições de vida da população ou a preservação

do meio ambiente. Embora esses países tenham consumido mais energia ao longo do seu processo

de industrialização, a existência, hoje, de tecnologias mais limpas e eficientes mostra a

possibilidade de conciliar energia e desenvolvimento.

FIGURA 4 RELAÇÃO INTENSIDADE ENERGÉTICA X DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Fonte: BERRAH (apud TOLMASQUIM (1990) e MATSUDO (2001)).

Nesse sentido é válido destacar as considerações de BERRAH (apud TOLMASQUIM (1990) e

MATSUDO (2001)), segundo as quais os países em vias de desenvolvimento deveriam buscar uma

trajetória em forma de túnel, conforme mostrado na Figura 4, atingindo o estágio Pós-Industrial

sem mudanças significativas nos consumos energéticos nas fases intermediárias. O crescimento

econômico não necessariamente implica na utilização dos mesmos energéticos, das mesmas

tecnologias, do mesmo padrão de industrialização e, principalmente, na existência dos mesmos

problemas ambientais enfrentados pelos países de economia madura. O efeito túnel pode ser

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

10

viável através de inovações tecnológicas e de padrões de consumo que não mimetizem os padrões

dos países desenvolvidos.

A busca do desenvolvimento sustentável consiste em um enorme desafio para as nações. Para

tanto, as atividades de planejamento tornam-se imperativas. O fornecimento de serviços de

energia sustentáveis requer que a energia seja produzida e utilizada de maneira a promover o

desenvolvimento humano em todas as suas dimensões, sejam elas social, econômica e ambiental.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

11

4 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO NO BRASIL 3

O planejamento do setor energético é fundamental para assegurar a continuidade do

abastecimento e/ou suprimento de energia ao menor custo, com o menor risco e com os menores

impactos sócio-econômicos e ambientais para a sociedade brasileira.

Dito de outra forma, a falta do planejamento energético pode trazer conseqüências negativas, com

reflexos em termos de elevação de custos e/ou degradação na qualidade da prestação do serviço,

tais como racionamentos ou excessos de capacidade instalada, produção ineficiente, etc.

Enfim, tanto as características técnicas e econômicas como o escopo e a complexidade dos

aspectos envolvidos no funcionamento da indústria de energia explicam a importância do

planejamento do setor energético.

Com relação aos aspectos técnicos e econômicos, deve-se destacar que o setor de energia possui

segmentos com características de monopólio natural 4 e de indústria de rede 5, como, por exemplo,

o segmento de transmissão e distribuição do setor elétrico, o segmento de transporte e

distribuição de gás natural. Alguns segmentos da cadeia da indústria do petróleo também

apresentam características de oligopólio.

A estrutura em rede gera economias de escopo, de escala e de coordenação e requer a operação

centralizada dos serviços. No caso do setor elétrico existem outras especificidades adicionais, como

as dificuldades técnicas e altos custos da estocagem de energia elétrica, que determinam a

estruturação de produção e logística para o atendimento instantâneo da demanda.

No setor elétrico além das características descritas acima o planejamento é essencial em função

dos seguintes aspectos:

• Base hidrelétrica, com usinas em cascata de propriedades distintas; 3 Extraído do documento de Cenários para o Planejamento Energético elaborado pela EPE em abril de 2005. 4 Um monopólio é dito natural quando o nível de produção suficiente (ou quase suficiente) para abastecer todo o mercado demandante ocorre ao mínimo custo médio de produção (FERGUNSON, 1989). As características típicas de um monopólio natural são: i) capital intensivo e economia de escala, ii) incapacidade de estocagem e demanda flutuante, iii) presença de rendas de localização, iv) serviço ou produto essencial para os consumidores, v) presença de conexão direta com os consumidores (NEWBERY, 1994, p.7). 5 Já as Indústrias de rede são aquelas dependentes de malhas para transportar mercadorias para o consumidor. Geralmente este tipo de indústria apresenta características como: (1) a necessidade de equilíbrio em curto prazo entre oferta e demanda, dada a dificuldade técnica de estocagem; considerável imprevisibilidade da demanda no curtíssimo prazo, levando à necessidade de manter uma capacidade instalada ociosa; investimento inicial alto e custos irrecuperáveis; redes com interconexões fixas, reduzindo a flexibilidade do consumidor na escolha de fornecedores (economias de coordenação); (2) as externalidades diretas e indiretas resultando em economias de escala; (3) a presença de mono e multi funcionalidade da rede resultando em economias de escopo; (4) as características de bem-público associadas aos serviços em rede, que resultam na dificuldade de diferenciação e cobrança dos serviços, principalmente daqueles relacionados às propriedades emergentes (anciliares); (5) a presença ou tendência de concentração de mercado (integração vertical para frente e para trás) devido aos incentivos para redução de custos de transação e para otimizar comportamentos estratégicos (KUNNEKE, 1999).

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

12

• Elevada intensidade de capital;

• Longa maturação dos investimentos;

• Grandes interligações e;

• Grandes incertezas (hidrológicas, no crescimento da demanda etc.).

Como a eletricidade é um fluxo, o tempo e o espaço são dimensões importantes na caracterização

da escala e do escopo dos processos de produção e transporte. A operação com níveis mais

elevados de potência permite a exploração de economias de escala e a exploração de economias

de escopo 6.

Embora os processos de geração e de utilização de energia elétrica sejam simultâneos, eles não

ocorrem no mesmo espaço físico. Desta forma, a integração temporal entre esses processos deve

corresponder a uma integração espacial para que haja continuidade do fluxo no tempo e no

espaço. Sendo assim, a capacidade de transporte tem impactos significativos na introdução de

concorrência na cadeia de valor da indústria de eletricidade. Um atributo técnico-econômico

fundamental do setor é o equilíbrio físico, que requer a coordenação do sistema, já que as suas

partes operam com forte interdependência.

A geração de energia elétrica pode ser obtida por meio de várias tecnologias com diferentes custos

e impactos sócio-ambientais, como por exemplo, a hidráulica, a térmica a gás, etc. No caso da

hidroeletricidade, o seu insumo é um fluxo aleatório baseado no regime de chuvas, o que implica

em uma complexidade no planejamento do parque gerador. A utilização do gás natural, um dos

insumos das usinas termelétricas, pode ser contratualmente adquirida como um fluxo não

aleatório.

A necessidade de planejamento também deriva do escopo e da complexidade do sistema

energético, incluindo os diferentes atores responsáveis pela evolução do setor, tanto do lado da

oferta quanto do lado da demanda. Em especial os formuladores de política e as agências

reguladoras são atores com grande poder institucional sobre as variáveis do sistema. Suas

decisões trazem impactos para todos os agentes e influenciam sobremaneira o futuro dos

sistemas. Essas decisões, na maioria das vezes, são tomadas perante um ambiente de incertezas e

necessitam de processos sistemáticos de apoio à decisão, em especial sobre as perspectivas de

futuro.

De fato, o futuro é incerto e não pode ser previsto com exatidão e segurança, sendo na verdade o

resultado de descontinuidades, rupturas e inflexões do padrão passado, altamente influenciado por

novos fatos portadores de futuro e fruto de uma construção social, resultado dos interesses e

estratégias dos atores sociais.

6 A economia de escala do setor elétrico advém da possibilidade de diluição de custos fixos de empresas com alta capacidade instalada. As economias de escopo, por sua vez, ocorrem devido à possibilidade de venda de serviços diferentes utilizando a mesma base de ativos.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

13

4.1 BREVE HISTÓRICO DO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO NO BRASIL

No setor energético, a importância do planejamento foi evidenciada a partir do primeiro choque do

petróleo na década de 70.

Nessa época ficou evidente que a energia seria um setor crítico da economia, indispensável para

alavancar o crescimento econômico e capaz de refreá-lo. A consciência desse fato levou os países

a examinarem as atividades do planejamento no setor energético.

Na maioria dos casos, concluiu-se que o planejamento era feito basicamente no setor de

eletricidade, carvão e petróleo enquanto o planejamento de fontes renováveis era praticamente

inexistente.

Com a eletricidade dominando a cena, as atenções dos governantes eram centradas na garantia de

suprimento a mínimo custo para atender à crescente demanda. De acordo com CODONI et al. (1985), isso resultou em uma coleção de planos desagregados de investimentos no setor elétrico

com desvantagens que merecem destaque tais como conflitos de objetivos inter setoriais, sub

otimização inter setorial (predominância de geração de eletricidade por combustíveis fósseis onde

poderiam ser usados recursos renováveis) e ausência de mecanismos capazes de tratar as

interfaces entre as questões ambientais e energéticas por exemplo.

O Brasil representa claramente essa situação. De acordo com JANNUZZI (1997), o preço do

petróleo durante os anos 70 determinou maiores esforços do Brasil em termos de redução da

dependência externa desse combustível, com a canalização de investimentos para exploração,

produção nacional e maior uso de hidroeletricidade. Programas de substituição de combustíveis

como o Programa Nacional do Álcool (Proalcool) foram iniciados com o objetivo de aumentar a

produção doméstica de combustível como uma mercadoria estratégica. Por anos o planejamento

energético no Brasil era restrito aos Planos para o setor elétrico desenvolvidos pela Eletrobrás, e

pelo planejamento do setor petrolífero realizado pela Petrobrás.

O objetivo dos Planos da Eletrobrás era atender à demanda de energia elétrica a mínimo custo.

Partiam de modelos do tipo ‘top-down’ para estimar a demanda futura, e com isso planejavam a

expansão da oferta e dos sistemas de transmissão.

O modelo tradicional de planejamento consistia portanto nos seguintes passos:

a) projeção do crescimento da demanda;

b) planejamento da expansão;

c) análise do custo de produção;

d) satisfação da demanda pelo menor custo.

Nos anos 70 as projeções da demanda eram baseadas em modelos econométricos que

essencialmente extrapolavam relações econômico-energéticas para o futuro. Essas projeções

indicavam invariavelmente um crescimento muito alto da demanda de energia.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

14

Estudos posteriores levaram ao desenvolvimento da metodologia bottom-up, envolvendo modelos

mais desagregados com intuito de melhorar a qualidade das projeções da demanda. O objetivo das

análises do tipo bottom-up era criar uma descrição quantitativa da estrutura tecnológica da

conversão e do uso da energia

Essas análises concluíram que muitos bens e serviços energo-intensivos estavam atingindo pontos

de saturação nos países industrializados e que técnicas mais avançadas tornaram-se disponíveis.

Nos anos 90 já havia ampla utilização de sistemas inteligentes no planejamento da expansão tais

como algoritmos genéticos, lógica fuzzy, redes neurais e técnicas de simulated annealing.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

15

5 PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS - PIR

O fortalecimento da dimensão ambiental com o agravamento do problema das mudanças

climáticas e o aumento das preocupações sociais refletiu sobre o planejamento energético dando

origem ao conceito de Planejamento Integrado de Recursos – PIR. O PIR passou a ser aplicado

nos setores elétrico e de gás canalizado a partir de meados de 80 em alguns países como EUA,

Canadá e Dinamarca. A associação do PIR com o desenvolvimento ambiental é bastante conhecida

conforme apontado por D´SA (2005). Uma de suas propostas originais é a de incluir os custos de

proteção ambiental bem como os riscos à saúde associados à produção e uso de energia no

processo de planejamento. A inclusão dos custos atuais (custos de controle de poluição) ou valores

aproximados (como sobretaxas sobre impactos negativos) na comparação dos custos resulta em

opções mais claras, relativamente mais baratas e portanto mais atrativas no escalonamento de

mínimo custo.

GALVÃO et al. (1996) define o PIR como um processo contínuo, de tal modo que o

desenvolvimento seja harmonioso, tanto na preservação do ambiente como na melhoria da

qualidade de vida da população usando tanto quanto possível os recursos da própria região.

Em se tratando de um conceito relativamente novo, vale destacar também a definição de PIR do

AWWA (American Water Works Association):

PIR é uma forma compreensiva de planejamento que envolve análises de custo mínimo do lado da oferta e opções de gerenciamento da demanda bem como um

processo de tomada de decisão aberto e participativo, desenvolvendo alternativas que incorporem a qualidade de vida das comunidades e os aspectos ambientais. O PIR leva em consideração todos os custos diretos e indiretos, benefícios do

gerenciamento pelo lado da demanda, gerenciamento e expansão da oferta através de cenários alternativos, análises multi-critério, envolvimento da comunidade no planejamento, na decisão e na implementação do processo, considerando benefícios

sócio-ambientais.

Através da análise de custo total mínimo para os serviços de energia, o PIR tende a facilitar a

extensão dos serviços àqueles que atualmente não tem acesso aos mesmos. Com isso, contribui

diretamente na promoção do desenvolvimento social.

BAJAY e LEITE (2004) ressaltam que uma característica marcante do PIR é a preocupação em se

realizar análises de riscos e incertezas mais abrangentes em função dos dados e informações

disponíveis. Além disso, o PIR permite incorporar na seleção dos investimentos a serem feitos

pelos agentes setoriais, preocupações e prioridades dos próprios agentes, do governo, do órgão

regulador, dos consumidores, de grupos ambientalistas e de outras organizações não

governamentais interessadas na evolução do setor. A Figura 5 representa os passos a serem

seguidos na lógica do PIR.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

16

FIGURA 5 PROCESSO ESQUEMÁTICO DO PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS

Fonte: elaboração própria.

Antes do PIR, a abordagem tradicional do planejamento considerava basicamente apenas opções

de oferta e mesmo assim essas eram limitadas por algumas tecnologias dominantes numa

perspectiva de análise de custo-benefício.

A abordagem do PIR difere do Planejamento Tradicional porque inclui os custos das externalidades

que afetam a sociedade como por exemplo o custo da mitigação dos impactos ambientais. Além

disso, o PIR é uma abordagem tecnologicamente neutra, tratando as opções tanto do lado da

demanda como da oferta com a mesma importância. O enfoque integrado entre oferta e demanda

para ampliação dos serviços de energia, concentra-se na minimização dos custos totais gerando

um planejamento flexível que contempla incertezas de origens variadas e se adapta mais

facilmente às mudanças do ambiente.

Levantamento dos Recursos

Existentes

Previsão da Demanda

Identificação das Opções

Avaliação Sócio-

Econômica-Ambiental

Curvas de Custo das

Alternativas + Conservação

Ranking dos Recursos por Custo e por

Risco

Considerações Políticas

(efeitos no ambiente e na

economia regional)

Determinação do Portfolio Final pelo

Custo Mínimo Total

Plano de Ação

Programas de Eficiência Energética

Oferta Integrada

Delimitação dos Objetivos

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

17

No PIR todas as alternativas de oferta passam a ser consideradas, além de ações de

gerenciamento do lado da demanda, através de um planejamento de objetivos e critérios, o que

torna o processo transparente e participativo em contraste com a abordagem do planejamento

tradicional.

Particularmente em um país com um parque gerador predominantemente hidroelétrico, o PIR se

aplica também para permitir a otimização dos usos múltiplos dos recursos hídricos sejam eles,

geração de energia elétrica, irrigação, navegação, abastecimento industrial e lazer.

Oferece portanto uma oportunidade para os planejadores de tratar questões complexas de forma

estruturada e transparente, promovendo maior compreensão das partes interessadas e melhores

condições para um planejamento regional efetivo.

O primeiro passo do PIR consiste na identificação dos objetivos, que devem ser explicitados de

maneira clara e formulada em termos quantitativos. Os critérios que irão determinar o atendimento

a cada objetivo devem ser definidos. A política e o planejamento nacional irão afetar os objetivos

no planejamento regional. Entre os objetivos mais comuns para um PIR destacam-se:

• confiabilidade dos serviços de energia;

• expansão do acesso aos serviços de energia; (eletrificação, por exemplo)

• minimização dos impactos ambientais;

• melhoria na qualidade dos serviços energéticos (redução de interrupções, por exemplo)

• melhor aproveitamento dos recursos existentes na região;

• diversificação da oferta;

• aumento da eficiência energética;

• minimização dos custos, de externalidades inclusive;

• desenvolvimento social;

• geração de empregos;

• desenvolvimento tecnológico;

• aquisição de flexibilidade.

O passo seguinte consiste no levantamento dos recursos disponíveis. Deverão ser consideradas

todas as alternativas de suprimento de necessidades energéticas na região. A organização dos

dados, como em qualquer processo de planejamento é crucial para o PIR, e a coleta e refinamento

dos dados são parte do exercício do planejamento mais do que uma pré-condição para o mesmo.

Do lado da demanda, deverão ser analisadas as alternativas mais adequadas para o suprimento

das necessidades energéticas.

A seguir, projeções de longo prazo da demanda deverão ser conduzidas, analisando a necessidade

de aumento da capacidade instalada, que fontes de geração se aplicam, bem como sua localização

geográfica.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

18

Diversos tipos de dados podem ser levantados para auxiliar nessas projeções como por exemplo

dados de consumo por classe e por região, dados e projeções econômicas e demográficas e dados

de uso final da energia.

O PIR auxilia no processo de tomada de decisões e, mais do que isso, é uma ferramenta que pode

ser usada para gerenciamento de crises energéticas nos países desenvolvidos, tais como

dificuldades de acesso aos serviços de energia, recursos financeiros insuficientes para

investimentos em setores não lucrativos, sistemas de transmissão e distribuição precários e

proteção ambiental inadequada. (D´SA, 2005)

5.1 TIPOS DE MODELOS DE PROJEÇÃO

A projeção do consumo e da oferta de energia é uma tarefa que engloba uma série de áreas de

conhecimento e uma grande quantidade de variáveis envolvidas. Dada a abrangência necessária,

são utilizados modelos matemáticos que descrevem as cadeias energéticas, desde a extração das

fontes até o seu uso final, passando pela produção, conversão, distribuição e armazenamento.

Existem basicamente duas abordagens distintas em que se baseiam as ferramentas construídas

para a análise do sistema energético, são elas as abordagens ‘bottom-up’ e ‘top-down’. Estas duas

abordagens diferem-se basicamente no nível de agregação dos modelos.

5.1.1 Modelos ‘Bottom-Up’

Nos modelos ‘bottom-up’ busca-se fazer uma descrição detalhada da estrutura tecnológica da

conversão e do uso da energia, considerando uma representação bastante desagregada da

economia. Com esses modelos é possível identificar potenciais tecnológicos, taxas de reposição de

equipamentos e requisitos de capital. Os modelos ‘bottom-up’ podem ainda ser classificados em

modelos de otimização, modelos de simulação e modelos paramétricos, dependendo da forma

como os dados são tratados.

Os modelos de otimização identificam soluções de mínimo custo para sistemas energéticos,

considerando um determinado conjunto de restrições, tais como de disponibilidade tecnológica, de

igualdade entre a oferta e a demanda, restrições ambientais, de investimento, entre outras. Tais

modelos permitem definir trajetórias de crescimento, porém são limitados para analisar escolhas

políticas, pois assumem que a energia é o único fator de escolha. MARKAL, MESSAGE e NEWAVE

são alguns exemplos de modelos energéticos de otimização.

Por sua vez, os modelos de simulação determinam o comportamento dos consumidores e dos

produtores em relação à energia, a partir da variação de preços, renda e progresso tecnológico.

Normalmente determinam o equilíbrio do mercado a partir de uma abordagem iterativa, por isso

esses modelos não são limitados pelo comportamento ótimo dos agentes. Entretanto, as relações

entre os agentes econômicos podem ser controversas e difíceis de parametrizar. As projeções

também são bastante sensíveis às condições e aos parâmetros iniciais. NEXUS e Stella são

exemplos de modelos que utilizam essa abordagem.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

19

Finalmente, os modelos paramétricos, também conhecidos como modelos contábeis, são aqueles

nos quais as projeções energéticas são fortemente baseadas em especificações determinadas pelo

próprio usuário. A principal função destes modelos é gerenciar dados e resultados, por isso são

bastante úteis para identificar possíveis resultados de políticas energéticas. Normalmente esses

modelos são mais simples e flexíveis, porém podem gerar soluções inconsistentes. Leap, MIPE e

MAED são exemplos de modelos contábeis.

5.1.2 Modelos ‘Top-Down’

Nos Modelos ‘top-down’, também chamados de modelos econômicos, a economia é representada

de forma bastante agregada. Estes modelos não consideram explicitamente a estrutura tecnológica

do país, representando de forma muito simplificada o consumo energético por meio de poucas

equações. Tais modelos são válidos apenas para a análise de grupos homogêneos de

consumidores, pois utilizam análise estatística para encontrar as relações entre os indicadores

usados. Como ponto positivo, no entanto, deve-se considerar que esse grupo de modelos

apresenta uma boa consistência entre oferta e demanda de energia. SGM e IMACLIM são

exemplos de modelos ‘top-down’.

5.1.3 Aplicação dos Modelos de Projeção

Em função das limitações existentes nas duas metodologias, ‘bottom-up’ e ‘top-down’, nos últimos

anos foram desenvolvidos modelos que buscavam incorporar alguns aspectos dos dois grupos. No

entanto, os chamados “modelos híbridos”, no fundo, são modelos ‘bottom-up’ que consideram de

forma mais consistente alguns parâmetros econômicos ou são modelos ‘top-down’ que apresentam

algum detalhamento das tecnologias na oferta e/ou na demanda de energia.

É importante frisar que os modelos nada mais são que ferramentas matemáticas que buscam

representar as relações econômicas e energéticas de um dado sistema, região ou país. Dado o

elevado número de variáveis envolvidas, há a necessidade de simplificar tanto quanto possível toda

uma rede de parâmetros dinâmicos, considerando todas as limitações decorrentes de tais

simplificações. Além disso, a qualidade e a abrangência das informações utilizadas limita bastante

a qualidade dos resultados. Assim, os modelos são bons apenas se os dados nele inseridos

representam de fato o contexto analisado e se as simplificações adotadas não foram excessivas.

5.2 ANÁLISE PROSPECTIVA DE CENÁRIOS

Normalmente recomenda-se uma análise de cenários das projeções capaz de nortear políticas

energéticas diante de premissas e hipóteses variadas. GODET (1993) define cenário como “o

conjunto formado pela descrição coerente de uma situação futura e pelo encaminhamento dos

acontecimentos que permitem passar da situação de origem à situação futura”. Cenários

prospectivos, portanto, têm a finalidade de nortear as decisões. É um método de decisão sob

incerteza que auxilia as ações estratégicas, inclusive na identificação de oportunidades e ameaças,

forças e fraquezas e, neste sentido, permite o diagnóstico das competências a serem fomentadas.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

20

Na análise de cenários, a incerteza é criativa e faz parte do processo, enquanto na previsão a

incerteza é continuamente não desejada. A metodologia de cenários, por ser mais flexível (admite

mudanças estruturais) permite uma análise qualitativa mais adequada em relação aos horizontes

futuros.

JANNUZZI e SWISHER (1997) sugerem pelo menos dois cenários de uso-final: um cenário de

referência e outro que considere melhorias na eficiência de uso-final. O cenário de referência

apresenta uma eficiência congelada e não é realista porque ainda que não sejam feitos esforços

concentrados para aumentar a penetração de novas tecnologias e medidas de eficientização, a

própria renovação dos equipamentos ao final do seu ciclo de vida levaria a ganhos de eficiência.

Ainda assim, esse cenário poderia ser usado para representar o crescimento futuro dos serviços de

energia. Esse cenário pressupõe a manutenção da evolução atual com relação ao uso de energia e

da penetração de novos equipamentos.

Alternativamente poderiam ser desenhados cenários de “Potencial Técnico”, “Potencial Econômico”

e “Potencial de Mercado”. No cenário de “Potencial Técnico” considera-se que todas as possíveis

melhorias técnicas nos equipamentos, construções e processos serão introduzidos no horizonte de

projeção. Define-se o potencial técnico de eficiência energética como uma melhoria na eficiência

de energia do uso-final que poderia resultar se as tecnologias eficientes disponíveis pudessem

atingir 100% da saturação do mercado durante a vida útil das tecnologias. Assume, portanto,

100% de penetração das tecnologias mais eficientes.

O cenário de “Potencial Econômico” considera apenas as alternativas que possuem uma avaliação

positiva do benefício econômico para os agentes. Representa uma fração de todo o potencial

tecnicamente viável.

O cenário do “Potencial de Mercado” reflete uma fração do potencial econômico que é percebida

como economicamente atrativa. Esse cenário captará as melhorias de eficiência disponíveis

através de programas reais e os limites de penetração de mercado existente ao longo do período

de planejamento.

5.3 IDENTIFICAÇÃO DAS OPÇÕES

Um levantamento das opções de suprimento de energia começa com a identificação de todas as

opções disponíveis e da infra-estrutura correspondente.

Nesse processo deverão ser levantadas características relacionadas à capacidade instalada, fatores

de capacidade, tipos de combustíveis, eficiências, custos operacionais e de capital, confiabilidade

do suprimento, riscos envolvidos, vida útil, dependência externa e impactos sócio-ambientais.

Devem ser consideradas tanto as tecnologias convencionais tais como termelétricas de

combustíveis fósseis, nucleares, hidrelétricas, PCHs, bem como opções re-potencialização,

armazenamento de energia, co-geração, produtores independentes e geração distribuída.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

21

Vale ressaltar que em todo mundo tem crescido a importância de planejar o futuro aumentando a

participação das fontes renováveis na matriz energética a fim de buscar a sustentabilidade no setor

energético. Diante disso, as fontes renováveis tais como biomassa, solar e eólica devem tratadas

com grande atenção nesse processo.

5.4 GERENCIAMENTO PELO LADO DA DEMANDA (GLD)

O termo “Gerenciamento pelo Lado da Demanda” é usado para referenciar programas que visam

reduzir a necessidade de energia através de ações sobre a demanda, sem comprometimento aos

usos finais. Com isso as opções de GLD podem reduzir o uso da energia adiando investimentos em

nova capacidade instalada.

As opções de GLD podem ser divididas em quatro categorias. A primeira refere-se à informação

e/ou incentivos para estimular a racionalização do uso da energia. A segunda categoria seria

referente à adoção de tecnologias mais eficientes, que contemplaria também medidas que

aumentem a eficiência nos processos. A terceira baseia-se na troca de combustíveis, como por

exemplo a utilização do gás e da energia solar para aquecimento de água de ambientes ou em

processos industriais. A quarta e última categoria é o gerenciamento da carga, através de medidas

que visam reduzir a demanda nos horários da ponta do sistema. Um exemplo dessa categoria seria

a adoção do horário de verão.

De acordo com o USAID (United States Agency for International Development), as seguintes

medidas poderiam ser destacadas por setor:

1. Setor Residencial

∗ Aparelhos eletrodomésticos mais eficientes;

∗ Dispositivos para economia de água quente;

∗ Lâmpadas fluorescentes compactas;

∗ Controles de iluminação automáticos;

∗ Melhorias nos padrões de construção voltadas para eficiência energética, permitindo redução do uso de refrigeração e aquecimento, e necessidade de iluminação artificial;

2. Setor Comercial

∗ Equipamentos de refrigeração e condicionamento de ar mais eficientes;

∗ Uso de lâmpadas fluorescentes;

∗ Controle de iluminação, aquecimento e refrigeração automáticos;

∗ Equipamentos de escritório mais eficientes;

∗ Motores elétricos de alta eficiência

3. Setor Industrial

∗ Melhorias nos processos;

∗ Motores e controles de alta eficiência.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

22

A avaliação da efetividade das ações de GLD é normalmente feita através das seguintes medidas:

• Custo do ciclo de vida da medida para eficiência energética em relação ao custo da alternativa de referência (padrão);

• Análise do Custo Benefício. Quando o valor do quociente entre o benefício e o custo for maior do que 1, a medida será considerada efetiva;

• Custo por unidade de energia conservada, calculada através da seguinte fórmula CSE = (CRF)x(Cc)x(A)/D. Nessa equação, CSE é o custo pela energia conservada, CRF é o fator de recuperação do capital, Cc é o custo de capital em unidades monetárias, A é o custo anual e D a energia conservada no ano;

• Custo por unidade de carvão evitada;

• Avaliação qualitativa da aceitação dos consumidores.

JANNUZZI e SWISHER (1997) definem GLD como qualquer esforço sistemático para promover

mudanças no uso de eletricidade. Nesse contexto, as estratégias de GLD têm como objetivo alterar

a forma da curva de carga ou sua área total (a integral da curva de carga dá a energia total

consumida), ou ainda ambas iniciativas combinadas. As diversas estratégias de GLD estão

ilustradas na Figura 6.

A estratégia de redução de pico poderia ser atingida com aumento das tarifas no horário de pico

ou mesmo com o horário de verão. Não necessariamente implica em redução do consumo total,

visto que o consumo pode apenas ser deslocado do horário de pico, conforme representado nas

estratégias de preenchimento de vales e deslocamento de picos. A criação de uma curva de carga

flexível permite acomodar a demanda dos consumidores e suas características operacionais. Por

exemplo em um sistema hidroelétrico durante a estação seca, o objetivo pode ser reduzir a

demanda de eletricidade, mas durante o período úmido, o objetivo pode ser justamente o oposto,

aumentando o consumo.

Com isso, observa-se que é possível atender diversos objetivos através de ações de GLD, que se

tornam uma ferramenta de suma importância na implementação de um Planejamento Integrado

de Recursos.

A necessidade de otimização dos serviços de energia e a valorização de ações de GLD levaram ao

surgimento das chamadas ESCOS – Energy Services Companies. Essas empresas foram criadas

com o intuito de facilitar a introdução de medidas de conservação de energia. Para tanto, atuam

na comercialização ou arrendamento de equipamentos de eficiência energética, realizam auditorias

energéticas para levantamento dos potenciais de conservação, auxiliam nos processos de

negociação tarifária e nos serviços de modernização das instalações.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

23

FIGURA 6 ESTRATÉGIAS DE GERENCIAMENTO DA CURVA DE CARGA

Fonte: JANNUZZI e SWISHER (1997).

5.5 HISTÓRICO DA CONSERVAÇÃO DE ENERGIA NO BRASIL

No Brasil a otimização dos recursos energéticos, através de medidas de conservação de energia

apresenta-se como uma alternativa com potencial de alavancar crescimento econômico através do

aumento da produtivade reduzindo os elevados investimentos na infraestrutura, e ainda reduzindo

os impactos ambientais associados ao crescimento. É portanto parte essencial no processo de

desenvolvimento sustentável.

Crescimento da Curva de Carga (aumento nas vendas)

Redução do Pico Conservação Estratégica (redução do Consumo)

Preenchimento de Vales

Deslocamento do Pico Curva de Carga Flexível

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

24

A referência cronológica do uso racional da energia no Brasil dá-se em meados de 1975, quando o

Grupo de Estudos sobre Fontes Alternativas de energia (GEFAE) organizou, em colaboração com o

MME, um Seminário sobre Conservação de Energia, tratando-se, portanto de uma iniciativa

pioneira no país. A seguir, ainda em 1975, a FINEP obteve autorização da Presidência da República

para alocar recursos financeiros à realização do Programa de Estudos da Conservação de Energia,

passando a desenvolver e apoiar estudos visando a busca de maior eficiência na cadeia de

captação, transformação e consumo de energia (LA ROVERE, 1994).

Apenas em 1985, dez anos mais tarde foi criado o Programa Nacional de Conservação de Energia

Elétrica (Procel) pela Eletrobrás. Sua atuação inicialmente caracterizou-se pela publicação e

distribuição de manuais destinados à conservação de energia elétrica entre vários setores sociais.

A seguir, foi implementado um programa pedagógico junto às escolas de ensino fundamental,

envolvendo uso de material didático e treinamento de professores. A partir de 1990, o Procel

iniciou projetos e cursos técnicos para formar profissionais com competência específica na área.

Em seus primeiros anos (1986-1993) o PROCEL investiu US$ 24 milhões em mais de 100 projetos.

De acordo com Geller et al (1998) a economia de 790 GWh por ano pode ser creditada a ações do

PROCEL no ano de 1996 além de 2.360 GWh conservados cumulativamente, o que seria

equivalente a 0,9% do total de eletricidade consumido no país nesse ano. Esse valor é comparável

ao que seria suprido por uma hidrelétrica típica de 565 MW.

Em 1991, foi instituído, por decreto presidencial, o Programa Nacional da Racionalização do Uso de

Derivados do Petróleo e Gás Natural (Conpet), para trabalhar sob a coordenação de um grupo

composto por representantes de órgãos estatais e privados. Embora, atualmente, o consumo de

petróleo e derivadas tenha um potencial de conservação em torno de 30%, o Conpet trabalha com

o objetivo de um ganho de eficiência em torno de 25%. A área de atuação do Conpet abrange as

instituições de ensino e os setores de transportes, industrial (melhoria ambiental e competitividade

produtiva), residencial e comercial (uso de selos de eficiência para produtos), agropecuário (uso de

óleo diesel) e geração de energia (termoelétricas).

Apesar da existência desses programas, ainda há um desperdício considerável de energia em

grande parte devido a processos industriais, equipamentos, veículos e prédios ineficientes.

Algumas barreiras ainda inibem a redução desses despedícios como por exemplo:

• A existência de tarifas relativamente baixas (quando comparadas aos padrões intenacionais) e representando pequena parte dos custos operacionais de boa parte dos consumidores industriais;

• A falta de incentivos financeiros para programas GLD;

• A baixa atratividade dos investimentos de melhoria da eficiência energética;

• Altas taxas de juros inibindo a substituição de bens de consumo (tais como eletrodomésticos) por modelos mais novos e, portanto mais eficientes, e;

• Falta de informação para grande parte da população sobre medidas e o potencial de conservação de energia.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

25

O racionamento de energia elétrica ocorrido em 2001 contribuiu para a redução desse desperdício

quando os consumidores forçados a diminuir o seu consumo começaram a racionalizar o uso e a

buscar alternativas de equipamentos e processos mais eficientes a fim de garantir a manutenção

da sua qualidade de vida (padrões de conforto, no caso dos consumidores residenciais) ou

continuidade da produção (no caso de consumidores comerciais, serviços e industriais) consumindo

menos energia elétrica. Os impactos do racionamento no consumo foram tão marcantes que

permaneceram mesmo depois do final do racionamento.

O Brasil apresenta um enorme potencial para redução no seu consumo de energia elétrica através

de políticas e ações relativamente simples e muitas vezes economicamente atrativas. Novas

tecnologias mais eficientes como refrigeradores de alta eficiência, aparelhos de condicionamento

de ar, motores e lâmpadas já são produzidas e/ou comercializadas no país. A conservação de

eletricidade reduz a necessidade por investimentos em expansão da capacidade instalada, sem

comprometer a qualidade dos serviços prestados aos usuários finais. É, sem dúvida, a maneira

mais efetiva de ao mesmo tempo reduzir os custos o os impactos ambientais tanto na esfera

nacional quanto global, diminuindo a necessidade de subsídios governamentais para promoção de

tecnologias limpas.

Entretanto, as dificuldades de financiamento ainda hoje persistem restringindo a implementação

dos programas do PROCEL, conforme analisado por PACCA e SAUER (1996). Além disso, a falta de

informação e de coordenação entre os diversos atores envolvidos acaba por reprimir ainda mais o

aumento das iniciativas de financiamento essenciais para o sucesso dos projetos de conervação no

Brasil.

5.6 OPÇÕES DE OFERTA

Depois de identificadas todas as opções de GLD e selecionadas as mais adequadas aos objetivos

propostos deverão ser listadas e analisadas as opções de suprimento das necessidades de energia

para atender à demanda projetada.

Nesse processo deverão ser consideradas as seguintes variáveis:

a) Localização. Deverão ser analisadas a proximidade dos centros consumidores e a infra-estrutura para logística quando for o caso (existência de linhas de transmissão, gasodutos, vias de acesso, densidade populacional etc.);

b) Tempos de construção;

c) Custos e financiamentos disponíveis;

d) Integridade e confiabilidade no fornecimento;

e) Impactos sócio-ambientais.

Para a avaliação de cada uma das opções disponíveis deverá ser feita uma análise de

investimentos, onde são considerados os custos de capital, os custos totais, a taxa de retorno, a

confiabilidade técnica e externalidades advindas de impactos sócio-ambientais.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

26

Esses custos deverão ser comparados aos custos de implementação das medidas de GLD. Quando

esses últimos são inferiores aos custos de suprimento, conclui-se que as medidas de GLD são

vantajosas; isto é, oferecem uma relação entre custos e benefícios positiva.

Dessa forma, o objetivo do planejamento poderia ser modelado através de um problema de

minimização dos custos totais, como o exemplo sugerido por JANNUZZI e SWISHER (1997):

Min C

C= CGLD + CCEP + CRE

Sujeito a:

E + D = ES

Em que C = Custo total

CGLD = custos dos programas de gerenciamento pelo lado da demanda

CCEP = custos de controle de emissões de poluentes

CRE = custo das emissões evitadas de CO2 equivalente

E = Energia consumida

D = Energia conservada através de medidas de GLD e outras medidas

ES = nível desejado de serviços de energia.

5.7 DETERMINAÇÃO DO PLANO DE AÇÃO

A combinação das análises de oferta e demanda resultarão no PIR para os anos subseqüentes.

Entre as várias maneiras de atendimento aos serviços de energia, deverá ser escolhida a que

represente o menor custo e o menor risco em todas as dimensões da análise. A escolha do

portfólio ótimo poderá ser feita manualmente ou através de softwares como, por exemplo, o

PROVIEW II, desenvolvido pela Resource Management Associates.

A escolha deverá ser realizada com base em uma metodologia de análise multi-critério. Para o

USAID (United States Agency for International Development) esses critérios poderiam ser listados

da seguinte forma:

1. Critérios Financeiros:

∗ Custos totais (incluindo custos de capital, de combustíveis e outros);

∗ Taxa de cobertura de juros;

∗ Taxa de Rentabilidade do capital próprio (ROE);

∗ Lucro Líquido;

∗ Geração interna de recursos;

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

27

2. Critérios de Performance:

∗ Consumidores atendidos;

∗ Probabilidade de perda de carga;

∗ Margem de reserva;

∗ Eficiência de uso final;

3. Critérios de Segurança

∗ Diversificação da oferta;

∗ Uso de recursos regionais;

∗ Uso de recursos renováveis;

4. Critérios Ambientais

∗ Total das emissões de gases de efeito estufa ao longo da vida útil do projeto;

∗ Total de emissões de outros poluentes (tais como gases ácidos, material particulado e hidrocarbonetos);

∗ Extensão de terras utilizadas para fins energéticos (para cultivo de biomassa, ou alagadas nos caso de hidrelétricas);

∗ Produção de resíduos líquidos;

∗ Produção de resíduos sólidos (considerando diferentes níveis de toxidades);

∗ Impactos sobre a biodiversidade;

5. Outros Critérios:

∗ Estéticos (impactos sobre a recreação e o turismo);

∗ Geração de empregos;

∗ Impactos da geração de energia sobre outros setores econômicos;

∗ Aceitação política e viabilidade do projeto;

∗ Implicações sociais (tais como impactos sobre populações indígenas);

∗ Impactos culturais.

Naturalmente que de acordo com os objetivos e prioridades do PIR, outros critérios podem ser

elencados e, mais do que isso, é possível atribuir diferentes pesos, tornando uma dimensão mais

importante que outras, caso isso seja de interesse dos planejadores. Ressalta-se a importância

crucial de que o PIR seja efetivamente um processo participativo, para que os interesses de todos

os grupos da população estejam bem representados na definição desses critérios, que em um

segundo momento serão decisivos na seleção do portfólio de ações e de oferta do PIR.

5.8 O PLANEJAMENTO INTEGRADO DE RECURSOS NA ESFERA REGIONAL

Várias são as vantagens do desenvolvimento de um PIR regional. Essas vantagens são ainda

maiores em países de dimensões continentais, como o Brasil, que apresentam enorme diversidade

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

28

de recursos e de desenvolvimento econômico entre as regiões, o que acarreta diferentes

necessidades de serviços de energia.

No caso particular da região nordeste brasileira, MAGRINI et al. (1984) já apontavam a

necessidade de um novo processo de desenvolvimento que deveria redirecionar três dinâmicas

eixo: a propriedade do capital, a dinâmica tecnológica e a distribuição dos frutos do

desenvolvimento.

Para esses autores tal reversão deveria ocorrer na linha de auto-sustentação, ganho de autonomia

e descentralização regional de forma articulada com as demais regiões do país. Somente nesse

contexto, a energia passaria por reformulações que seriam capazes de reduzir o caráter

centralizador das decisões de política energética fazendo com que os fluxos de energia final sejam

garantidos às camadas da população historicamente excluídas. Para tanto, sugerem uma

reavaliação das políticas que privilegiaram a implantação de unidades de produção energética

concentradas e capital intensivas de modo a abrir espaço às pequenas unidades que incorporem

uma menor intensidade de capital.

Nessa ótica, fontes alternativas passam a exercer um papel significativo, dado que constituem uma

vantagem comparativa da região.

O atendimento dos serviços de energia em uma dada região pode ser mais apropriado a partir de

fontes locais, evitando custos de transmissão e distribuição por exemplo.

A valorização de vantagens comparativas regionais é possível através do PIR. Além disso, a

abordagem regional do processo de planejamento apresenta as seguintes vantagens potenciais:

• Trocas de experiências profissionais;

• Melhor gerenciamento dos horários de ponta da carga;

• Superação de racionamentos e restrições energéticos;

• Adiar investimentos na expansão do setor, com a racionalização do uso, permitindo re-direcionamento dos recursos existentes;

• Maior utilização da capacidade instalada e aumento do potencial para ganhos de eficiência;

• Promover desenvolvimento e troca de tecnologias, bem como treinamentos relacionados;

• Aproveitar as vantagens do clima regional e das flutuações meteorológicas

• Estabelecer padrões técnicos, operacionais e ambientais para a região;

• Otimização dos recursos locais;

• Redução dos riscos de suprimento de energia;

• Promover os objetivos do desenvolvimento sustentável em um contexto amplo, contemplando impactos sócio-ambientais e econômicos;

• Promoção da cooperação regional, oferecendo a oportunidade de diversificação do mix energético, reduzindo a dependência em um recurso apenas;

• Contribuir para o crescimento econômico regional;

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

29

• Redução dos custos de transporte com geração, transmissão e distribuição e com isso aumento do retorno sobre o capital investido no desenvolvimento energético.

5.9 IMPLEMENTAÇÃO DO PLANO DE AÇÃO

Da mesma forma que existe uma racionalidade na regulação/ intervenção governamental tanto

para suprir falhas de mercado como para reduzir custos de transação existe também a necessidade

de ferramentas para atender à essas questões. Nesse sentido o exercício do PIR indica opções que

podem influenciar políticas energéticas se os resultados do PIR forem traduzidos em medidas

fiscais e financeiras. O exercício de um PIR pode portando auxiliar na priorização de políticas e

programas governamentais.

A adoção de um PIR constitui um passo importante no processo de planejamento, mas não o

esgota. A implementação do PIR deverá ser acompanhada e avaliada durante todo o processo,

para permitir revisões periódicas com a revelação de incertezas e o surgimento de novas

informações.

O monitoramento do processo constitui uma ferramenta essencial para o aprendizado no processo

do planejamento, através de respostas críticas tanto de aspectos táticos como estratégicos do PIR.

Para tanto são aplicados diversos métodos tais como programas de gerenciamento, visitas de

campo, aplicação de questionários, revisão de documentos, auditorias etc.

Sendo o Planejamento um processo contínuo por natureza, o desenvolvimento de PIR deve ser

repetido periodicamente. Normalmente os ciclos de planejamento variam entre 2 e 5 anos. Tudo

isso torna essencial que o processo seja apoiado com alta prioridade pelo governo e que seja

acompanhado por profissionais qualificados tanto na pesquisa como no gerenciamento das

atividades.

Flexibilidade é uma característica desejável visto que mudanças e correções ao longo do tempo

com as revisões sucessivas são inevitáveis. É fundamental, entretanto que tais mudanças sejam

feitas de maneira transparente e bem documentadas.

Ainda assim, mesmo diante de um forte comprometimento de órgãos do governo não há garantia

de sucesso. Por outro lado, o PIR é uma poderosa ferramenta quando se trata dos principais

problemas do setor energético dos países em desenvolvimento pela sua ênfase na seleção de

mínimo custo das opções, na redução do investimento requerido, na consideração da

descentralização da geração, em medidas para promover a eficiência energética e na inclusão de

custos sócio-ambientais no processo de planejamento.

5.10 BARREIRAS AO PLANEJAMENTO ENERGÉTICO INTEGRADO

A análise da experiência com o PIR em diversos países mostra que apesar do seu potencial para

auxiliar na solução de vários problemas do setor energético, a implantação do PIR enfrenta

algumas barreiras.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

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A primeira, e talvez a de maior visibilidade, consiste em um viés de planejamento voltado

exclusivamente para a expansão da oferta. Isto é, na crença de que o aumento da capacidade

instalada é a maneira mais eficiente de atender à demanda crescente de energia. Contribui para

essa cultura a falta de informações e de indicadores disponíveis que representem o potencial para

conservação de energia, e a extensão do dano ambiental causado por algumas tecnologias de

geração de energia.

Para as concessionárias, mecanismos de preço são desencorajados como investimentos de GLD,

sendo vistos como medidas que levariam a uma redução das vendas e conseqüentemente da

receita.

A introdução de medidas que favorecem tecnologias renováveis ou mais eficientes também não

ocorre como resultado natural do PIR ou porque sejam viáveis economicamente. Prescindem de

mudanças no comportamento do consumidor, no modo como estes e as companhias de energia

tomam decisões de investimentos e como a sociedade gerencia seus recursos energéticos. Muitas

vezes será necessária uma política energética de incentivos para o desenvolvimento de tecnologias

renováveis.

A falta de informação também representa uma barreira uma vez que o pequeno conhecimento das

possibilidades de melhoria no uso de energia por parte dos consumidores, vendedores, produtores

e administradores públicos pode distorcer a introdução de medidas de eficiência ou o uso de fontes

renováveis em situações que essas já são técnica e economicamente viáveis.

Existem ainda barreiras legais e institucionais inibindo o planejamento integrado. Existe pouca

coordenação entre programas de demanda e oferta de energia, o que é essencial para o sucesso

do PIR. Procedimentos legais de contabilidade muitas vezes impedem as companhias de considerar

investimentos junto a seus consumidores como investimentos próprios da empresa, e com isso

impedem a recuperação dos custos dos programas de conservação através das tarifas.

As decisões de investimento em programas de eficiência energética também enfrentam barreiras

financeiras, como por exemplo dificuldade de financiamentos uma vez que grande parte dos

consumidores de países em desenvolvimento não possui condições para investir em eficiência

energética ainda que seja vantajoso.

Muitas vezes as tarifas de energia são fixadas administrativamente e não refletem os custos

marginais da produção de energia, acabam representando mais uma barreira para o PIR, visto que

nesse caso, pode não haver o estímulo adequado para a racionalização do uso da energia.

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DE PLANEJAMENTO ENERGÉTICO

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6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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