apostila curso de inverno 2005

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2º curso de inverno tópicos em fisiologia comparativa 11 a 29 jul 2005 departamento de fisiologia instituto de biociências - usp http://www.ib.usp.br/cursodeinverno

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2º curso de inverno tópicos em

fisiologia comparativa

11 a 29 jul 2005

departamento de fisiologia instituto de biociências - usp http://www.ib.usp.br/cursodeinverno

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

comissão organizadora

Ana Paula Canel Bluhm Andreas Betz Daniel Carneiro Carrettiero Denise Loli Eduardo Koji Tamura Gláucia Jansen Da Re Lopes James Fernando Malta da Silva Renata Brandt Nunes Rodrigo Pavão Roseli Barbosa alunos de pós-graduação do departamento de fisiologia – ib/usp

Orientador:

Profa. Dra. Maria Aparecida Visconti

Apoio south american society for comparative physiology and biochemistry pró-reitoria de cultura e extensão comissão de pós-graduação instituto de biociências

i

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

CRONOGRAMA

Data 8 às 12 h 14 às 18 h

11/07/05

Aula inaugural

Profa. Dra. Maria Aparecida Visconti

Módulo I

Fisiologia celular Daniel Carneiro Carrettiero

Eduardo Koji Tamura Lidiana Duarte de Almeida Paula

12/07/05

Módulo I

Fundamentos básicos de técnicas em cultura celular

Daniel Carneiro Carrettiero Eduardo Tamura

Lidiana Duarte de Almeida Paula

Módulo I

Célula pigmentar: teórica e prática Ana Paula Canel Bluhm

Gláucia Jansen Da Re Lopes Fernanda Pizão Farhat

Leonardo Henrique Ribeiro Graciani de LimaRoseli Barbosa

13/07/05

Módulo I

Metabolismo em parasitas tripanossomatídeos: descrição de alvos

quimioterápicos Profa. Dra. Lucile Maria Floeter-Winter

Marcos Gonzaga dos Santos Ariel Mariano Silber

Maria Fernanda Laranjeira da Silva

Módulo I

Mecanismos de osmorregulação em animais - parte I

James Fernando Malta da Silva

14/07/05

Módulo I

Relógio biológico em mamíferos: mecanismos moleculares e controle da

ritmicidade interna do organismo Cíntia Etsuko Yamashita

Pedro Augusto Carlos Magno Fernandes

Módulo II

Neuroanatomia básica Emerson Ferraz Coelho

Prática de neuroanatomia

Andreas Betz Daniel Carneiro Carrettiero

Emerson Ferraz Coelho Jéssica Ruivo Maximino

Regiane Xavier de Moraes

15/07/05

Módulo II Variabilidade cardíaca e modelamento

matemático de sistemas biológicos Breno Teixeira Santos

Módulo II As toxinas de anêmonas do mar como

ferramentas para entender a fisiologia de tecidos, órgãos e sistemas.

André Junqueira Zaharenko

ii

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

18/07/05

Módulo II Evolução do sistema nervoso

Adriano Alonso Pereira da Cunha Rodrigo Pavão

Memória em Aves

Silvia Maria Matsuda

Módulo II Mecanismos centrais do controle

cardiovascular Jéssica Ruivo Maximino Video: Reação de alerta

19/07/05

Módulo III Comportamento e fisiologia de formigas

Pedro Leite Ribeiro

Módulo III Ecofisiologia de lagartos

Renata Brandt Nunes

Metabolismo energético da vocalização em anfíbios anuros do gênero Scinax: “O canto da

perereca” Adne Abbud Righi

20/07/05

Módulo III Substâncias de organismos marinhos que podem causar acidentes e intoxicações

Cynthia Grazielle Martins Delboni Jeanete Lopes Naves

Módulo III Consciência como expressão do

funcionamento do sistema nervoso Adriano Alonso Pereira da Cunha

Exercício físico, hipertensão arterial e comportamentos: interações, efeitos e

benefícios Regiane Xavier de Moraes

21/07/05

Módulo III Ritmicidade biológica: conceitos e

aplicações em metabolismo energético Denise Loli

Módulo III Mecanismo de osmoregulação em animais -

parte II James Fernando Malta da Silva

22/07/05

Módulo III Ritmos circadianos e funções de

aprendizagem e memória Luiz Fernando Lopes do Espírito Santo

Fisiologia do sistema respiratório em

ambientes aquáticos Renato Massaaki Honji

Módulo III

Definição dos laboratórios para estágio

25/07/05 Estágio em laboratório Estágio em laboratório 26/07/05 Estágio em laboratório Estágio em laboratório 27/07/05 Estágio em laboratório Estágio em laboratório 28/07/05 Estágio em laboratório Estágio em laboratório

29/07/05 Apresentação dos resultados obtidos durante o estágio

Apresentação dos resultados obtidos durante o estágio

iii

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

INDICE

FISIOLOGIA CELULAR.................................................................................................................1

FUNDAMENTOS BÁSICOS DE TÉCNICAS EM CULTURA CELULAR...............................5

CÉLULA PIGMENTAR ...................................................................................................................8

METABOLISMO EM PARASITAS TRIPANOSOMATÍDEOS: DESCRIÇÃO DE ALVOS

QUIMIOTERÁPICOS ....................................................................................................................11

MECANISMOS DE OSMORREGULAÇÃO EM ANIMAIS.....................................................15

RELÓGIO BIOLÓGICO DE MAMÍFEROS: MECANISMOS MOLECULARES E

CONTROLE DA RITMICIDADE INTERNA DO ORGANISMO............................................26

NEUROANATOMIA BÁSICA ......................................................................................................28

VARIABILIDADE CARDÍACA E MODELAMENTO MATEMÁTICO DE SISTEMAS

BIOLÓGICOS..................................................................................................................................33

AS TOXINAS DE ANÊMONAS DO MAR COMO FERRAMENTAS PARA ENTENDER A

FISIOLOGIA DE TECIDOS, ÓRGÃOS E SISTEMAS..............................................................38

EVOLUÇÃO DO SISTEMA NERVOSO......................................................................................43

MEMÓRIA EM AVES....................................................................................................................45

MECANISMOS CENTRAIS DO CONTROLE CARDIOVASCULAR....................................49

COMPORTAMENTO E FISIOLOGIA DE FORMIGAS ..........................................................53

ECOFISIOLOGIA DE LAGARTOS.............................................................................................57

METABOLISMO ENERGÉTICO DA VOCALIZAÇÃO EM ANFÍBIOS ANUROS DO

GÊNERO SCINAX: “O CANTO DA PERERECA” ...................................................................60

CONSCIÊNCIA COMO EXPRESSÃO DO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

............................................................................................................................................................62

EXERCÍCIO FÍSICO, HIPERTENSÃO ARTERIAL E COMPORTAMENTOS:

INTERAÇÕES, EFEITOS E BENEFÍCIOS ................................................................................64

SUBSTÂNCIAS DE ORGANISMOS MARINHOS QUE PODEM CAUSAR ACIDENTES E

INTOXICAÇÕES ............................................................................................................................68

RITMICIDADE BIOLÓGICA: CONCEITOS E APLICAÇÕES EM METABOLISMO

ENERGÉTICO ................................................................................................................................71

RITMOS CIRCADIANOS E FUNÇÕES DE APRENDIZAGEM E MEMÓRIA....................75

FISIOLOGIA DO SISTEMA RESPIRATÓRIO EM AMBIENTES AQUÁTICOS................78

ANEXO............................................................................................................................................. 81

iv

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

FISIOLOGIA CELULAR

Daniel Carneiro Carrettiero

Eduardo Koji Tamura

Lidiana Duarte de Almeida Paula

EVOLUÇÃO E COMPARTIMENTALIZAÇÃO CELULAR

Todos os organismos, e todas as células que os constituem, acredita-se, descendem de um

ancestral celular comum e surgiram através do processo de evolução por seleção natural. Mas como

um aglomerado de matéria poderia ter originado a primeira célula?

Uma pequena parte da grande energia liberada no ambiente primitivo através das radiações e

descargas elétricas de altíssimas voltagens teria se acumulado nas substâncias através de ligações

químicas originando, assim, as primeiras moléculas precursoras da vida: os polipeptídeos e os

polinucleotídeos. Entre estas moléculas estava uma, muito parecida com o RNA que conhecemos

hoje, a qual acredita-se que desencadeou todos os processos que levariam a formação da vida. Um

dos passos importantíssimos que possibilitaria esta transformação foi o desenvolvimento dos

catalisadores que ajudariam no processo de replicação. Um segundo passo importante foi o

confinamento destas moléculas que se auto-replicavam em um compartimento individualizado.

Desta forma surgiu a primeira célula. Esta célula primitiva seria parecida com o que conhecemos

hoje por célula procariota.Tipos distintos de células se desenvolveram e a associação de alguns

daria origem às então conhecidas células eucariontes animais.

A complexidade de reações internas envolvidas na comunicação com o ambiente se tornou tão

grande que foi possível o aparecimento de estruturas especializadas como o Reticulo

Endoplasmático, o Complexo de Golgi, as vesículas, os centríolos e o citoesqueleto.

No processo de divisão celular algumas células se mantiveram unidas possibilitando o

aprimoramento da comunicação celular e o surgimento da divisão de trabalho originando, assim, os

primeiros organismos multicelulares. Hoje em dia, em um organismo vertebrado, existem mais de

200 tipos celulares diferentes.

1

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

SINALIZAÇÃO CELULAR

Para o desenvolvimento e funcionamento normal do organismo, tanto em reposta ao ambiente

externo, como exemplo uma lesão tecidual causada por alguma injúria, ou para o próprio controle

fisiológico como crescimento e diferenciação celular, o organismo necessita se adaptar e provocar

efeitos diversos que variam de acordo com a necessidade. As células executam funções e

características que são coordenadas por uma maquinaria interna do organismo, que envia sinais para

outras células que respondem de modo especifico, ou seja, as próprias células se encarregam de

gerar e/ou propagar o sinal.

Um dos constituintes necessários para a sinalização e comunicação celular é a presença de

moléculas sinalizadoras, que podem ser as mais variadas moléculas possíveis, como hormônios,

aminoácidos, proteínas e gases. A comunicação entre a célula sinalizadora e a célula alvo pode ser

através de diferentes modos: sinalização endócrina, parácrina, autócrina, sináptica e dependente de

contato.

Para o reconhecimento dessas moléculas sinalizadoras e para a propagação e ampliação do

sinal dentro da célula são necessárias proteínas, conhecidas como receptores que são classificadas

em cinco tipos: receptores acoplados a proteína G, canais iônicos, associados a enzimas, nucleares e

órfãos. Esses receptores atuam de forma distinta, mas têm como função propagar o sinal e

principalmente direcionar o efeito, visto que células diferentes podem responder de maneira similar

e a mesma célula também pode responder de diferentes maneiras dependendo do estímulo, ou seja,

depende da molécula sinalizadora e dos receptores específicos a essas moléculas, que direcionam o

sinal para resultar no efeito apropriado.

Após a ativação dos receptores, o sinal é propagado para uma cascata de reações que incluem

outras moléculas, principalmente enzimas, que controlam o sinal adequadamente dentro da célula,

essas enzimas podem ser ativadas ou inibidas por moléculas conhecidas como segundos

mensageiros que são produzidos após a ativação de receptores de membrana, podemos citar como

exemplo o AMPc, GMPc, DAG, IP3. Outro mecanismo importante, para controle do

comportamento celular é o processo que consiste na adição ou remoção em proteínas celulares de

grupamentos fosfato (PO43-).

O conjunto de reações que compõem todo o processo de sinalização, resulta finalmente no

efeito final da célula que pode ser na transcrição de genes específicos e/ou em reações morfológicas

e fisiológicas da célula.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

CICLO CELULAR

Basicamente, o ciclo celular é o programa para o crescimento e divisão (proliferação) celular.

Existem 4 fases no ciclo celular: G1 (e G0), S, G2 e M. A fase G1 é caracterizada por expressão de

genes e síntese de proteínas. Isto permite a célula crescer e produzir todas as proteínas necessárias

para a síntese de DNA. Durante a fase S, a célula replica seu DNA, permitindo que a célula divida-

se em duas células filhas, cada uma delas com uma cópia completa de DNA. Mas, antes que a

célula possa fazer isto, ela necessita entrar na terceira fase do ciclo celular: a fase G2. Na fase G2, a

célula novamente cresce e sintetiza proteínas permitindo a ela o processo de divisão. Completada

esta fase a célula finalmente entra na quarta fase do ciclo celular: a fase final M. Nesta fase a célula

passa por um processo denominada citocinese, originando 2 células filhas. O ciclo celular está

completo. As células agora, têm duas opções: podem começar outro ciclo entrando na fase G1 ou

podem tornar-se quiescentes entrando em G0.

Na maioria das células há vários pontos de checagem, nos quais as células podem ficar retidas

se eventos prévios não forem inteiramente completados.

APOPTOSE

Por definição Apoptose ou Morte Celular Programada é um tipo de "autodestruição celular"

que requer energia e síntese protéica para a sua execução. Está relacionado com a homeostase na

regulação fisiológica do tamanho dos tecidos, exercendo um papel oposto ao da mitose.

Fisiologicamente, esse suicídio celular ocorre no desenvolvimento embrionário, na organogênese,

na renovação de células epiteliais e hematopoiéticas, na involução cíclica dos órgãos reprodutivos

da mulher, na atrofia induzida pela remoção de fatores de crescimento ou hormônios, na involução

de alguns órgãos e ainda na regressão de tumores. Portanto consiste em um tipo de morte

programada, desejável e necessária que participa na formação dos órgãos e que persiste em alguns

sistemas adultos como a pele e o sistema imunológico.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Bibliografia:

Molecular Biology of the cell. 4.ed. Alberts, B., Johnson, A., Lewis, J., Raff, M., Roberts.K. &

Walter. P. Garland Science, 2002

Lenhinger Principles od Biochemistry, 3.ed. Nelson. D.L. & Cox. M. M. Worth Publishers, 2000.

http://fai.unne.edu.ar/biologia/cel_euca/celula3.htm

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

FUNDAMENTOS BÁSICOS DE TÉCNICAS EM CULTURA CELULAR

Daniel Carneiro Carrettiero

Eduardo Koji Tamura

Lidiana Duarte de Almeida Paula

Dadas as condições apropriadas, a maior parte das células vegetais e animais poderão viver,

multiplicar-se e até mesmo expressar propriedades diferenciadas em uma placa de cultura de

tecidos. As células podem ser observadas sob o microscópio ou analisadas bioquimicamente, e os

efeitos da adição ou remoção de moléculas específicas, tais como hormônios ou fatores de

crescimento podem ser explorados. Experimentos com células oriundas de cultura são, às vezes,

ditos como tendo sido conduzidos in vitro para contrastá-los daqueles experimentos com

organismos intactos, os quais são referidos como conduzidos in vivo.

O cultivo de células in vitro possibilita uma vasta aplicação nas áreas de: pesquisa, industria e

médica, todas com fins comerciais. O avanço na área de pesquisa com células tronco promete

avanços significativos no tratamento de diversas doenças.

O uso de células in vitro possibilita o estudo direto de respostas celulares específicas, ou seja,

sem grandes interferências dos inúmeros sinais provenientes do organismo. Atualmente é uma

grande ferramenta para o conhecimento dos mais diversos sistemas desde organismos procariotos

até os grandes grupos de vertebrados.

O estudo com células em cultura vem sendo desenvolvida e aprimorada desde o século XIX,

alguns dos principais estudos foram:

1885 – Wilheum Roux demonstrou que existia a possibilidade de manter células de

embriões de galinha in vitro em uma solução fisiológica.

1907 – Ross Harrison manteve por semanas fragmentos da crista neural de embriões de sapo

utilizando linfa coagulada como meio de cultura.

1910 – Rous utilizando extratos de células tumorais de galinha filtrado induziu a formação

de tumor, posteriormente foi demonstrada a presença de um oncovírus nestes extratos (vírus

do sarcoma de Rous).

1911 – Lewis & Lewis desenvolveram o primeiro meio de cultura líquido

1912 – Alexis Carrel manteve uma cultura de fibroblastos derivados do coração de galinha

por tempo indeterminado em cultura.

1948 – Earle e colaboradores desenvolveram células clonais a partir de células isoladas.

5

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

1952 - George Gey e colaboradores estabeleceram a primeira linhagem contínua de células

conhecida como HeLa,

1954 – Levi-Montalcini e colaboradores descobriram a existência de fatores de crescimento.

1954 – Abercrombie e colaboradores descrevera o fenômeno de inibição por contato.

1961 – Hatflick & Moorhead demonstraram que os fibroblastos humanos possuem um

número finito de divisões celulares.

1965 – Ham desenvolveu o primeiro meio de cultura sem soro.

1975 – Köhler & Milstein desenvolveram uma linhagem de células híbrida (hibridoma) para

a produção de anticorpos monoclonais.

1977 – Wigler & Axel descreveram um método eficiente para a introdução de genes de

mamíferos em células cultivadas.

1986 – Martin & Evans e colaboradores isolaram células embrionárias pluripotentes de

camundongos.

1998 – Thompson & Gearhart isolaram células tronco humanas.

Existem três tipos básicos de cultura celular:

Células normais (cultura primária): retiradas diretamente de um organismo para utilização em

experimentos.

Células estabelecidas: retiradas de um determinado tecido e cultivadas em laboratório,

possuem inibição por contato e apresentam características próximas do tecido de origem.

Células transformadas (linhagens celulares): retiradas de tumores ou imortalizadas através de

tratamentos físicos, químicos ou modificações genéticas, são muito utilizadas por poderem ser

mantidas indefinidamente em cultura, porém podem apresentar perda das características do

tecido de origem.

As características de células cultivadas in vitro são diretamente relacionadas com o ambiente

em que estão inseridas e um dos fatores que influenciam é o substrato, ou seja, o local em que as

células aderem, os substratos mais conhecidos são: polímeros sintéticos, como poliestireno e teflon;

polímeros biodegradáveis, formados por géis de colágeno ou outras biomoléculas, e polímeros

híbridos, contendo proteínas da matriz extracelular e peptídeos bioativos. Outros fatores que

influenciam a fisiologia das células cultivadas são os gases presentes no ambiente, principalmente o

oxigênio (O2) e o dióxido de carbono (CO2), a maioria das células necessitam somente da pressão

atmosférica de O2, a concentração de CO2 varia de acordo com o tipo celular, as células

normalmente são enriquecidas com até 10% CO2, mas como o CO2 é convertido em gás carbônico

quando dissolvido, deve se adicionar agentes tamponantes na solução, como bicarbonato de sódio

ou HEPES.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Inicialmente os meios de culturas utilizados continham misturas complexas, como extratos de

embriões ou linfas, mas para eliminação de fatores desconhecidos que poderiam influenciar na

preparação, diversos meios de culturas foram criados contendo quantidades especificas dos

ingredientes, com alguns componentes básicos como água, íons, fontes de energia (ex:

carboidratos), fontes de nitrogênio (aminoácidos), vitaminas, antibióticos e indicadores de pH.

Os meios de cultura são separados em complexos e quimicamente definidos, os meios

complexos são suplementados com soros (ex: soro fetal bovino), e os quimicamente definidos não

são suplementados com soro, mas por um conjunto de fatores de proteínas, fatores de crescimento e

hormônios. A temperatura que as culturas de células devem ser mantidas, depende da temperatura

corpórea do animal de onde foram extraídas, portanto nas culturas de células de animais de sangue

quente a temperatura deve ser de 37oC.

Bibliografia Básica:

Culture of Animal Cells: A Manual of Basic Techiques, 2. ed. Freshney. R.I. Jonh Wiley &

Sons, 1994.

Cd interativo do livro Molecular Biology of the cell. 4.ed. Alberts, B., Johnson, A., Lewis, J.,

Raff, M., Roberts.K. & Walter. P. Garland Science, 2002

http://www.cnice.mecd.es/eos/MaterialesEducativos/mem2001/biologia/ayuda/thesaurus.htm

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

CÉLULA PIGMENTAR

Ana Paula Canel Bluhm

Fernanda Pizão Farhat

Gláucia Jansen Da Re Lopes

Leonardo Henrique Ribeiro Graciani de Lima

Roseli Barbosa

A maioria dos animais apresenta cores variadas com as mais incríveis combinações e nuances.

Cor é uma propriedade física de certas substâncias cujas moléculas absorvem luz em certos

comprimentos de onda e, portanto, transmitem o comprimento de onda complementar ao absorvido.

Estas substâncias são denominadas pigmentos e há uma grande variedade deles presente na

natureza.

Os grânulos de pigmento são produzidos e armazenados nas células pigmentares ou

cromatóforos, que são células especializadas, com muitas projeções citoplasmáticas, que lhe

conferem aspecto estrelado. Nos vertebrados, são originárias da crista neural e migram para

diversas regiões, apresentando cores variadas, sendo classificadas conforme a natureza química dos

pigmentos que armazenam:

Melanóforos: pretos ou pardos, contêm grânulos de melanina (melanossomos);

Eritróforos: vermelhos, contêm diferentes proporções de pigmentos carotenóides e

pteridínicos (eritrossomos);

Xantóforos: amarelos, contêm pigmentos pteridínicos e carotenóides em proporções

variadas (xantossomos);

Leucóforos: brancos, contêm grânulos de purinas (leucossomos);

Iridóforos: iridescentes cores metálicas contêm purinas depositadas em finas placas

cristalinas.

Em aves e mamíferos a diversidade de cromatóforos foi perdida e o único tipo de célula

pigmentar presente é o melanócito, célula que sintetiza e armazena melanina.

8

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

O padrão de cor e a presença de listras e/ou manchas são determinados geneticamente, mas

alguns animais podem mudar de cor em resposta a estímulos ambientais, como temperatura

(termorregulação), cor do ambiente (favorecendo caça ou escape), iluminação, presença de outros

animais (atração de presas ou parceiro sexual), estações do ano e ciclos de dia/noite, permitindo sua

adaptação a uma nova situação. Alguns animais podem sofrer mudanças de cor de forma rápida

(mudança de cor fisiológica) ou de forma lenta (mudança de cor morfológica). A mudança na

coloração dos animais é, na maioria das vezes, regulada pela ação de hormônios ou

neurotransmissores.

A mudança de cor fisiológica é uma propriedade de alguns invertebrados, como cefalópodes e

crustáceos e dos vertebrados pecilotérmicos. São adaptações rápidas, que se completam em minutos

ou segundos, não estão presentes em aves e mamíferos, que apresentam apenas uma lenta migração

de grânulos de melanina para os queratinócitos vizinhos, penas e pêlos, alem da mudança de cor

morfológica.

Já a mudança de cor morfológica, que pode ocorrer em todos os animais, é decorrente de

alterações na quantidade ou no tipo de pigmento dentro das células pigmentares. Pode ocorrer como

uma resposta direta da célula pigmentar à luz ou à temperatura, como é o caso da resposta de

melanócitos humanos à luz UV (bronzeamento). São mudanças extremamente lentas, que podem

levar dias ou semanas, mas são mudanças duradouras.

Os seres humanos também possuem melanócitos na pele. A cor de nossa pele não depende do

número de melanócitos presente em uma determinada área, já que esta proporção é semelhante em

todas as raças. O que varia é a taxa de produção ou o tipo de melanina presente, determinados

geneticamente. Quando somos expostos à luz solar, a irradiação UV estimula a síntese de melanina

nos melanócitos, processo conhecido popularmente como bronzeamento. Este processo tem a

importante função de proteger o DNA de nossas células contra danos causados pela radiação

ultravioleta. Como este processo é muito lento, recomenda-se a exposição gradual ao sol, para

permitir a síntese de melanina em quantidade adequada. O câncer de pele é uma doença comum,

causada por uma exposição excessiva à luz solar.

Existem diversas patologias associadas à pigmentação, que podem ser causadas por

mecanismos fisiológicos deficientes: albinismo, vitiligo, hiperpigmentação, hipopigmentação,

melanose, lentigo, manchas diversas.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Bibliografia

Visconti, M.A. Regulação hormonal da célula pigmentar de vertebrados – Tese (Livre-Docência) –

Departamento de Fisiologia/Instituto de Biociências-USP, 1999.

Benabou, M.H.P. Modulação hormonal de células de eritroforoma da linhagem GEM 81 por α-

MSH e MCH – Tese (Mestrado em Fisiologia) – Departamento de Fisiologia/Instituto de

Biociências-USP, 1999.

Molecular Biology of the cell. 4.ed. Alberts, B., Johnson, A., Lewis, J., Raff, M., Roberts.K. &

Walter. P. Garland Science, 2002.

http://fisio.ib.usp.br/labpig/

www.pubmed.com

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

METABOLISMO EM PARASITAS TRIPANOSOMATÍDEOS: DESCRIÇÃO DE ALVOS

QUIMIOTERÁPICOS

Ariel Mariano Silber

Maria Fernanda Laranjeira da Silva

Marcos Gonzaga dos Santos

Lucile Maria Floeter-Winter

Os protozoários da família Trypanosomatidae apresentam dois gêneros, Trypanosoma e

Leishmania, com relevância na saúde pública, uma vez que são agentes de graves enfermidades

parasitárias.

Os protozoários do gênero Leishmania, formam um grupo de organismos que apresentam dois

hospedeiros obrigatórios em seu ciclo de desenvolvimento: um flebotomíneo e um mamífero Neste

ciclo o homem aparece acidentalmente, e essa infeção pode resultar um complexo quadro de

desdobramentos clínicos, denominados genericamente como leishmaniose. As leishmanioses são

consideradas pelo Tropical Diseases Research Programme Organização Mundial de

Saúde(TDR/OMS), uma das seis doenças de maior importância em Saúde Pública eleitas para o

desenvolvimento desse programa. Entre as protozooses, ocupam o segundo lugar, sendo superadas

apenas pela malária.

Do ponto de vista biológico, organismos do gênero Leishmania apresentam características

interessantes. São parasitas intracelulares obrigatórios de células do sistema fagocítico mononuclear

de um grande número de hospedeiros vertebrados, os quais adquirem a infecção, na quase totalidade

das ocasiões, através do contato com o vetor flebotomíneo (Zuckerman & Lainson, 1977). Nos

mamíferos, a principal célula parasitada é o macrófago. O interessante é que essa célula apresenta

diversos mecanismos microbicidas: enzimas lisossômicas, intermediários reativos de oxigênio e

nitrogênio e mediadores derivados de lipídeos. Contudo o parasita é capaz, por diversas estratégias,

algumas conhecidas, de escapar desses mecanismos microbicidas e sobreviver no ambiente hostil.

A arginase é uma enzima integrante do ciclo da uréia (Krebs-Henseleit) nos animais

uricotélicos, e é expressa em alguns tripanosomatídeos, entre eles Leishmania. A arginase utiliza

como substrato L-arginina, produzindo L-ornitina e uréia. Inicialmente seu papel funcional foi

associado apenas aos processos metabólicos envolvidos nessa interconversão arginina-ornitina-

11

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

citrulina. Além disso, a expressão específica é uma das características utilizadas na identificação de

organismos da família (Camargo, 1999).

Nos últimos anos, uma série de trabalhos vem sendo publicada relatando as propriedades de

uma outra enzima, a óxido nítrico sintase induzida (iNOS) que, como a arginase, utiliza a L-

arginina como substrato, produzindo citrulina e óxido nítrico (Nathan e Xie, 1994, Mori & Gotoh,

2000), e como a arginase é expressa em macrófagos. A produção de NO é uma importante resposta

microbicida dos macrófagos. Nessas células, a enzima iNOS é dependente de L-arginina, assim a

arginase pode atuar negativamente na regulação dos níveis de NO produzidos, consumindo o

substrato da iNOS (Boucher e cols., 1999). Recentemente, foi demonstrado que a presença de um

inibidor de arginase, a Nω-hydroxyl-L-arginina, diminui a capacidade de L. major em estabelecer a

infecção em macrófagos (Iniesta et al.., 2001).

Com base nestes resultados, postulamos que um dos papéis funcionais da arginase de

Leishmania estaria relacionado com a sobrevivência do parasita no interior dos macrófagos,

competindo com a iNOS pelo mesmo substrato.

Nosso laboratório tem-se dedicado à caracterização do segmento gênico que codifica a

arginase de Leishmania, assim como seu produto de transcrição (da Silva et al., 2002). As

informações geradas por essa caracterização permitiram a construção de um transfectante com

apenas uma cópia do gene nocauteado e esse organismo mutante foi utilizado em ensaios de

infecção in vitro, com macrófagos da linhagem J774. Os resultados dos experimentos apontam para

uma baixa taxa na infectividade de macrófagos por L. (L.) amazonensis com uma cópia do gene de

arginase nocauteado. Isso parece indicar que a arginase possa ser importante para a virulência e

viabilidade do parasita na célula hospedeira. Estudos complementares mostraram que a diminuição

da síntese de ornitina, também é responsável por uma diminuição na taxa de proliferação dos

parasitas, uma vez que esse composto é precursor na síntese de poliaminas e portanto essencial para

a replicação do DNA.

A doença de Chagas é um importante problema de saúde pública na América Latina, onde se

estima que existem aproximadamente 16 - 18 milhões de pessoas infectadas na América Latina e

sul dos Estados Unidos (http://www.who.int/ctd/chagas/disease.htm).

O T. cruzi apresenta um ciclo de vida complexo alternando entre hospedeiros mamíferos e

inseto vetor, um hematófago da família Triatominae. Durante esse ciclo, o T. cruzi passa por

distintos estádios evolutivos. Dois deles estão presentes no inseto vetor: tripomastigota metacíclico

e epimastigota. Outros dois estão presentes no hospedeiro mamífero: tripomastigota e amastigota.

No interior do hospedeiro mamífero, o T. cruzi deve obrigatoriamente invadir as células para poder

se diferenciar para formas replicativas e estabelecer a infecção (Brener, 1973).

12

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Pouco se sabe sobre os eventos que acontecem a partir da diferenciação das formas invasivas

no interior das células hospedeiras. Uma incógnita a respeito das características dessas formas

intracelulares é como sustentam o seu crescimento dentro da célula e quais são os fatores que

disparam a diferenciação entre os estágios. Nosso grupo abordou esse problema analisando o

transporte de prolina e glicose ao longo do ciclo intracelular de T. cruzi (Silber et al. 2002). Entre os

resultados obtidos observou-se que esses parasitas não são capazes de consumir glicose durante a

fase intracelular do ciclo de vida, já que não expressam o transportador correspondente. Porém, eles

têm altos níveis de prolina intracelular, que é consumida ao longo desse processo. É interessante

ressaltar que quando a prolina intracelular é consumida o parasita deve importá-la do ambiente, no

caso, o citoplasma da célula hospedeira. Nesse sentido, se observou também que a diferenciação

entre as formas intracelulares é um processo dependente do funcionamento do metabolismo e

transporte de prolina (Tonelli et al. 2004). Esses dados e outros nos levaram a propor que as

enzimas do metabolismo de aminoácidos, são alvos relevantes para a identificação de compostos

líderes para o desenho de novas drogas com perspectivas terapêuticas para a doença de Chagas

(Silber et al. 2005).

Bibliografia

Boucher JL, Moali C & Tenu JP (1999) - Nitric oxide biosynthesis, nitric oxide synthase inhibitors

and arginase competition for L-arginine utilization; Cellular and Molecular Life Sciences 55:

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14

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

MECANISMOS DE OSMORREGULAÇÃO EM ANIMAIS.

James Fernando Malta da Silva

COMENTÁRIOS GERAIS

Adaptado de R. Gilles (1979) por

Luis Alberto Valotta

James Fernando Malta da Silva

A vida na Terra é dependente de água. Os seres vivos são sistemas bioquímicos altamente

sofisticados organizados em torno das propriedades desta molécula. A água constitui-se no principal

meio onde as interações moleculares indispensáveis à vida ocorrem. Também se constitui no

veículo que transporta as moléculas para diferentes locais onde essas interações podem ocorrer.

Além dos muitos compostos orgânicos encontrados como solutos nos seres vivos, os íons

inorgânicos também são de fundamental importância: participam como cofatores em muitas reações

enzimáticas; formam os gradientes químicos os quais podem atuar como estoques de energia

potencial; e influenciam na permeabilidade das membranas biológicas a outros solutos. Os diversos

solutos encontrados nas células vão, por outro lado, influenciar a mobilidade osmótica da água e,

portanto, irão desempenhar um papel proeminente na manutenção da arquitetura celular. Além

disso, muitos dos sistemas enzimáticos que controlam as interações químicas características da vida

estão localizadas em estruturas altamente organizadas. Isto aponta a importância da manutenção da

estrutura celular e volume nas reações as quais envolvem estas enzimas como catalisadores.

Basicamente, as células podem ser vistas como máquinas químicas extremamente complexas

nas quais a localização e a concentração de várias espécies moleculares interatuantes devem ser

precisamente controladas no sentidos de manter atividade ótima. Em tal contexto, o controle e a

manutenção do volume celular podem ser considerados requisitos essenciais à vida. Além disso, o

problema da regulação de volume celular é um dos elementos cruciais na conquista de diferentes

biótopos e no estabelecimento de organismos em ambientes aquáticos com flutuações de

salinidade. De acordo, a vida foi originada em algum tipo de oceano e a capacidade de controlar o

volume celular é um dos principais pré-requisitos para a invasão de outros tipos de habitats como

os ambientes de água doce e terrestre. Os organismos que habitam este meio desenvolveram

adaptações osmóticas específicas habilitando a sua manutenção em suas comunidades. Há várias

maneiras através das quais o problema da manutenção do volume celular pode ser resolvido. O

15

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

organismo pode isolar-se completamente do meio externo, evitando dessa forma o ganho ou a

perda de água. Esta solução não foi mantida por um grande número de espécies ao longo da

evolução. Trocas com o meio externo são necessárias para satisfazer as necessidades celulares.

Alguns esporos bacterianos podem sobreviver por longos períodos com um conteúdo baixo de água

e sem trocas com o seu meio ambiente; nesta situação, entretanto, seus processos vitais são

essencialmente suspensos. Na maioria dos organismos, a água atravessa a membrana celular por

difusão em resposta a gradientes osmóticos. Há duas maneiras de evitar mudanças no volume

celular enquanto mantém-se a possibilidade de trocas entre o fluído intracelular e o meio ambiente.

O primeiro método consiste no controle da Concentração Osmótica (CO) do fluído intracelular em

relação a eventuais modificações do meio externo. O segundo método implica no controle da CO

do fluído que circunda as células em quaisquer condições externas. A última solução foi adotada

por diversos eucariotos e foi denominada por Florkin (1962), de a “regulação anisosmótica

extracelular”. Embora a existência de um fluído extracelular diferente do meio externo foi

observada precocemente na evolução, a efetiva regulação deste meio (os fluídos corpóreos) é um

atributo de apenas alguns grupos zoológicos altamente evoluídos. Pode ser encontrado em alguns

vermes e moluscos, mas, essencialmente, ocorre em artrópodes e em vertebrados. Além disso,

muitos dessas espécies são incapazes de manter o estado osmótico de seu sangue quando a CO do

ambiente varia.

Os mais eficientes reguladores anisosmóticos formam a categoria denominada dos assim

chamados animais homeostáticos; essas espécies podem manter a CO do seu sangue estacionária

independente das condições externas. Além de alguns crustáceos e peixes, representantes deste

grupo são encontrados entre répteis, aves, e mamíferos. Os íons inorgânicos Na+ e Cl- são

predominantes como efetor osmótico sanguíneo na maioria dos reguladores anisosmóticos. Uréia é

usada por alguns vertebrados inferiores. Este composto orgânico é encontrado essencialmente em

ciclostomados e em elasmobrânquios, mas também tem um papel em vários anfíbios e répteis.

Há apenas alguns animais homeostáticos. Em todos as outras espécies, as células têm que,

algumas vezes, se defrontar com importantes mudanças na CO de seu meio ambiente. Além disso,

os eficientes mecanismos de controle da CO sangüínea que atuam em espécies homeostáticas

podem estar encobertos sob certas condições ou podem apresentar uma certa demora em

responder a uma nova situação. Isto aponta para a importância dos mecanismos de controle

osmótico do fluído intracelular na manutenção do volume celular.

Na maioria das espécies de animais eucarióticas, os fluídos intra e extracelulares são mantidos

próximos da condição isosmóticas. Os mecanismos implicados neste processo foram denominados

por Florkin (1962) como mecanismos de “regulação isosmótica intracelular”. Trabalham para

manter o equilíbrio osmótico apesar da presença de solutos aniônicos não-difusíveis no interior das

16

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

células; estas partículas geram uma pressão osmótica a qual, de outra forma, iria induzir o

inchamento e a lise das células de animais por possuírem membranas facilmente distensíveis. Além

disso, estes mecanismos são de fundamental importância na resposta regulatória de volume que

estas células são capazes de desenvolver após mudanças na CO de seu meio ambiente. Em todos os

tecidos e células estudados até o momento, eles implicam no controle ativo do montante de vários

efetores osmóticos intracelulares entre os quais os íons inorgânicos Na+, K+ e Cl- e os aminoácidos

livres possuem um papel proeminente.

Os mecanismos de regulação isosmótica intracelular foram encontrados em tecidos e células

de muitas espécies de vários grupos zoológicos incluindo protozoários, invertebrados, e

vertebrados. É importante notar que muitos desses organismos ou não possuem, ou possuem de

forma muito frágil, a capacidade de regulação anisosmótica extracelular. Pode-se, portanto, concluir

que a regulação isosmótica em nível celular um processo mais primitivo o qual apareceu

precocemente e persistiu ao longo da evolução. Processos de regulação anisosmóticos devem ter

sido adquiridos posteriormente, adicionando às espécies que o possuíam um novo leque de

possibilidades.

Bibliografia Geral

Alberts, B., Bray, D., Lewis, J., Raff, M., Roberts, K. & Watson, J.D. (1994) Molecular Biology of

The Cell (3rd edition). Garland Publishing Inc.

Florkin, M. (1962) La regulation isosmotique intracellulaire chez les inevertebrés marins

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Gilles, R. (Editor) (1979) Mechanisms of osmoregulation in animals: maintenance of cell volume

(1st edition) John Wiley & Sons.

Gupta, B. L., Moreton, R. B., Oschman, J. L. & Wall, B. J. (1977) Transport of ions and water in

animals (1st edition). Academic Press.

Schmidt-Nielsen, K. (1997) Animal Physiology : Adaptation and Environment (1st edition)

Cambridge University Press.

Stone, G., Johnston, I. A.& Willmer, P. J. (2000) Environmental Physiology of Animals (2nd

edition). Blackwell Science Inc.

Strange, K. (Editor) (1994) Cellular and Molecular Physiology of Cell Volume Regulation (1st

edition). CRC Press.

Withers, P. C. (1992) Comparative Animal Physiology (1st edition). Harcourt Brace.

17

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

EXERCÍCIO TEÓRICO-PRÁTICO

BALANÇO OSMÓTICO EM AMBIENTES MARINHO, DE ÁGUA DOCE E XÉRICO

Elaborado por

Prof. Dr. Luiz Carlos Salomão

Introdução

Nos animais aquáticos, especialmente nos animais marinhos e estuarinos, as variações da

salinidade do meio podem resultar em variações nas concentrações iônica e osmótica do sangue e

fluídos extracelulares. Animais marinos hiposmóticos estão sujeitos ao efluxo de água e influxo de

íons, contrariamente aos animais de água doce, que por serem hiperosmóticos, estão sujeitos ao

influxo de água e efluxo de íons, alterando a Concentração Osmótica (CO) do sangue e líquidos

tissulares.

Há dois padrões básicos de resposta dos animais a tais variações na salinidade, isto é,

osmoconformação e osmorregulação. No primeiro caso, a CO do sangue, hemolinfa ou líquidos

extracelulares varia linearmente com a variação da CO do meio. No segundo caso, a CO se mantém

constante apesar das variações na salinidade do meio. Entre estes dois casos extremos,

osmorregulação e osmoconformação, ocorrem respostas intermediárias. Para se saber o padrão de

resposta osmótica, em laboratório, geralmente submetem-se os animais a meios de diferentes

salinidades, ou seja, de composições iônicas diferentes e determinam-se as concentrações iônicas e

a CO do sangue destes animais nestas diferentes condições experimentais.

Já no ambiente terrestre, em que a grande vantagem é a maior disponibilidade de oxigênio, o

balanço hídrico é de outra natureza e, muitas vezes, é obtido tanto por ajustes fisiológicos como

comportamentais. Tal é que se observa, por exemplo, no banco hidromineral do rato canguru

Dipodomys merriami. Entre os mamíferos, 40% das espécies pertence a Ordem dos roedores, a mais

numerosa. Distribue-se por todo planeta, mas principalmente na América do Sul. Adaptaram-se aos

diferentes ambientes, das regiões polares ao equador, das montanhas as praias e do deserto aos

pântanos. A maioria dos roedores é terrestre, mas alguns são arborícolas ou semi-aquáticos. A

maior parte dos roedores é de pequeno porte, isto é, de 10 a 20 cm de comprimento e de 50 a 500 g

de massa corporal. Alguns, no entanto, como uma espécie de porco espinho (Hystrix cristata) do

norte da África chega a atingir massas corpóreas de 20-50 kg. A presença dos roedores tem

relevante papel ecológico por serem a principal fonte de alimento para aves e mamíferos carnívoros,

havendo uma relação bem estabelecida entre o tamanho da população de roedores e suas presas. A

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

relação com os homens não se limita à destruição da agricultura ou à transmissão de doenças. São

úteis como animais de laboratório, por consumirem certos insetos e por propiciarem o arejamento

do solo cavando galerias subterrâneas.

Entre os mamíferos, são os roedores que ocuparam os mais diferentes ambientes com relação

à disponibilidade à água. Estão presentes nos desertos mais áridos onde a água não está disponível,

mas que também se tornou dispensável para eles. Nesse sentido, deve-se ressaltar as pesquisas de

Schmidt-Nielsen (1964) sobre os hábitos e a fisiologia renal do rato canguru que vive numa região

tão inóspita, quanto à disponibilidade de água, que poucas outras espécies lhe fazem companhia.

Respostas osmóticas em Perna perna

A Tab. 1 apresenta resultados em experimentos realizados com o molusco bivalve Perna

perna. Os mexilhões Perna perna foram coletados em costões nas proximidades de São Sebastião e

foram transferidos para tanques de cimento amianto e mantidos em água de mesma salinidade do

local de coleta, isto é, 1000 mOsm/kg H2O por cerca de 24 h. A seguir foram distribuídos em

tanques de cimento amianto contendo água do mar diluída com água destilada, obtendo-se, assim,

as diferentes salinidades experimentais. Em cada salinidade experimental foram colocados

mexilhões com cunha entre as valvas e sem cunha. A hemolinfa dos animais com cunha foi coletada

após 6 h de exposição aos diferentes meios, tempo previamente determinado considerando ser este

período o suficiente para as trocas osmo-iônicas. Nos animais sem cunha, as amostras foram obtidas

após 24 h. O objetivo das cunhas era o de manter a livre exposição das partes moles do animal aos

meios experimentais. Manteve-se arejamento contínuo durante todo o experimento.

Tabela 1. Concentração osmótica da hemolinfa de Perna perna, com cunha e sem cunha mantidos

em diferentes salinidades. Valores em mOsm/kg H2O. As concentrações osmóticas foram

determinadas pelo abaixamento do ponto de congelamento conforme descrito por Salomão (Bolm

Fisiol. Animal, Univ. S. Paulo, 4: 143-152, 1980).

Meio 250 410 560 700 850 1000 1150 1300

c/ cunha 417 598 685 864 1016 1150 1320

s/ cunha 910 650 620 730 860 1020 1160 1315

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Estes resultados podem ser visualizados na figura abaixo:

Respostas osmóticas em Macrobachium olfersii

Exemplares de Macrobrachium olfersii foram coletados no Rio Guaecá, cuja salinidade é

próxima de zero, transportados para o laboratório em condições que garantiam a sua higidez, onde

foram mantidos em tanques de cimento amianto, com água do mesmo local de coleta,

continuamente arejada. Após um período de permanência em meios iguais aos dos locais de coleta,

os animais foram transferidos para tanques com água do mar diluída a fim de se obter as diferentes

salinidades desejadas (concentrações osmóticas). A Tab. 2 indica os valores da concentração

osmótica dos oito diferentes meios experimentais e da hemolinfa dos camarões Macrobrachium sp.

E a figura 2 mostra estes dados plotados e ajustados por uma função polinomial de 3° grau.

Tabela 2. Concentração osmótica (mOsm/kg H2O) da hemolinfa de M. olfersii e dos diferentes

meios em que foram mantidos. As concentrações osmóticas foram determinadas pelo abaixamento

do ponto de congelamento em um osmômetro Fiske.

Meio 0 150 300 450 600 750 900 1000

Hemolinfa 430 480 500 510 550 580 650 800

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Discussão

1. Como você definiria o comportamento osmótico de M. olfersii e de P. perna?

2. No caso de P. perna, em que sentido a introdução da cunha altera a resposta osmótica? Qual

o significado fisiológico desta alteração?

3. Que tecidos ou órgãos seriam mais sensíveis ao estresse osmótico? Por que?

4. Em que níveis compartimentais estes fenômenos podem ser abordados?

5. O que se pode dizer acerca da eurialinidade destes dois animais, a partir dos resultados

obtidos?

6. A resposta osmótica de P. perna à variação de salinidade pode ser expressa por uma função

do tipo y = ax + b, enquanto que a do M. olfersii seria por uma função do tipo y = ax3 + bx2

+ cx + d. Qual o significado fisiológico destas representações?

7. No caso de P. perna com cunha e sem cunha, o que seria uma abordagem reducionista e

uma abordagem holística, sistêmica ou integrativa?

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Osmorregulação no rato canguru

O balanço hidromineral no rato canguru se torna crítico em razão do ambiente inóspito em que

vive fazendo-o depender apenas da pouca água contida nos alimentos e da água metabólica.

A Tab. 3 resume o balanço hídrico do rato canguru.

Ganho Perdas

Água metabólica 90% Evaporação 16%

Água livre nos alim. 10% Respiração 54%

Bebida 0% Urina 25%

fezes 5%

A perda de água através da pele, por evaporação, é reduzida mas chega a 16% enquanto que

mais da metade da perda total ocorre através do trato respiratório. As glândulas sudoríparas estão

ausentes da superfície do corpo dos roedores, sendo encontradas apenas em determinadas áreas,

como nas partes sem pêlo das patas. O estudo da perda de água através da respiração levou

Schimidt-Nielsen a descrever um fenômeno interessante que ocorre em outros animais.

A Tab. 4 mostra as diferentes formas de indicar a quantidade de água, na forma de vapor,

presente no ar em diferentes temperaturas.

Vapor de água

Temperatura

(°C) mmHg kPa % de 1 atm mg H2O/L ar

0 4,6 0,61 0,6 4,8

10 9,2 1,23 1,2 9,4

20 17,5 2,34 2,3 17,3

30 31,7 4,24 4,2 30,3

40 55,1 7,38 7,3 51,1

50 92,3 12,33 12,2 83,2

100 760 101,33 100 598

37 46,9 6,28 6,2 43,9

Como se vê nesta Tabela o ar saturado na temperatura do corpo (37 °C) contém cerca de 2,5

vezes mais água na forma de vapor do que o ar saturado na temperatura ambiente (20 °C), isto é,

43,9 e 17,3 mg/L, respectivamente. Assim, se o ar exalado for resfriado a perda de água por esta via

seria menor. De fato a temperatura do epitélio nasal é mais baixa do que de outras regiões do corpo

e, portanto, há economia de água. Este mecanismo, encontrado em outros mamíferos e em aves, é

22

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

denominado de mecanismo de contra-corrente nasal. No homem a temperatura do ar exalado está

próxima daquela do corpo. Logo, não há economia de água.

A Fig. 3 mostra a quantidade de água recuperada de água em duas condições: a 15 °C e 25 %

de umidade relativa do ar (u.r.) e a 30 °C e 25 %.

A perda de água pelas fezes é minimizada graças à reabsorção retal de água e a eliminação de

fezes desidratadas.

Desde que a regulação de água está intimamente associada à tempertura, certos hábitos

encontrados em animais que vivem em regiões desérticas, como o rato canguru, estão associados a

este fenômeno. Os seguintes hábitos são encontrados neste animal: hábitos noturnos – durante o dia

permanecem em galerias onde a temperatura é relativamente mais baixa; redução das atividades –

uma vez que a produção de calor é inevitável sempre que há contração muscular, o animal mantém-

se em atividades reduzidas durante o dia.

23

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

A Fig. 4 resume as estratégias utilizadas pelo rato canguru para sobreviver num ambiente de

grande restrição hídrica.

Produção de urina concentrada

Esta talvez seja a mais importante adaptação fisiológica do rato canguru. A concentração

osmótica da urina deste animal é superior a 6000 mOsm/kg H2O. É um valor elevado, embora

valores superiores a 9000 mOsm/kg H2O possam ser considerados em outros roedores de regiões

desérticas. (Lembre-se que a concentração osmótica da urina humana varia de cerca de 60 a 1200

mOsm/kg H2O) Rim capaz de produzir urina mais concentrada que o plasma só é encontrada em

ammíferos e aves.

O “truque simples”, como diz Schimidt-Nielsen, para a produção de urina concentrada reside

num fenômeno conhecido com “efeito multiplicador de contra-corrente”. Esquemas deste fenômeno

são encontrados em praticamente todos os livros de fisiologia. No entanto, valeria a pena ressaltar

que os elementos essenciais deste mecanismos são: (1) alça de Henle longa; (2) fluxo em sentido

contrário nos dois ramos da alça; (3) transporte ativo; (4) um ramo que reabsorve ativamente soluto

deve ser impermeável à água.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Discussão

1. Que relação há entre umidade relativa do ar e o balanço hídrico do rato canguru?

2. Que relação há entre a temperatura ambiente, balanço hídrico e temperatura corporal?

3. Em que o mecanismo de contra-corrente nasal difere do mecanismo multiplicador de contra-

corrente encontrado no rim?

4. Em que se assemelha a coriza observada no ser humano nos dias frios com aquele observado

nos animais com focinho frio?

5. Aves e mamíferos são capazes de produzir urina concentrada. Por que?

Bibliografia

Fyhn, H. J. Rodents. (1979) In: Maloiy, G. M. O. (Editor). Comparative Physiology of

Osmorregulation in Animal. London, Academic Press, v. 2

Salomão, L.C. & Luneta, J.E. (1989) The effects of salinity changes on the osmotic and ionic

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Schmidit-Nielsen, K. How animals work (1st edition). Cambridge University Press. 1988

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action potential of the cerebro-visceral connective of Perna perna (Mollusca: Bivalvia).

Comp. Biochem. Physiol., 101(A): 109-112.

25

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

RELÓGIO BIOLÓGICO DE MAMÍFEROS: MECANISMOS MOLECULARES E

CONTROLE DA RITMICIDADE INTERNA DO ORGANISMO

Cíntia Etsuko Yamashita

Pedro Augusto Carlos Magno Fernandes

Aspectos Abordados:

O intuito desta aula será passar um pouco da evolução dos relógios biológicos ao longo das

espécies até chegarmos aos mamíferos onde o estudo será aprofundado. Discutiremos os

mecanismos moleculares que controlam a ritmicidade interna do relógio central e como ele é

sincronizado por fatores externos como, por exemplo, o ciclo claro/escuro ambiental.

O relógio biológico central transmite as informações rítmicas ambientais para diversos

osciladores internos que, por sua vez, promovem respostas fisiológicas que se refletem em padrões

comportamentais específicos. Para ilustrar este processo tomarei por base o controle do relógio

sobre a produção rítmica dos glicocorticóides e da melatonina. Aproveitando para fazer um gancho

com a minha área de pesquisa que consiste na investigação da inter-relação entre as glândulas

pineal e adrenal durante um processo inflamatório crônico.

Introdução:

Os seres vivos, na sua forma mais simples, como os seres unicelulares, até sua forma mais

complexa, como os vertebrados, são estruturados no tempo e no espaço. A maioria dos parâmetros

bioquímicos, fisiológicos e comportamentais dos organismos apresenta flutuações diárias que

persistem sob condições constantes, indicando que osciladores endógenos foram incorporados aos

sistemas em resposta às variações do ciclo claro-escuro ambiental (Menaker et al., 1997).

No centro dos sistemas que controlam e regulam os ritmos circadianos dos vertebrados estão

três estruturas que se interconectam num “eixo circadiano central”, que são: os núcleos

supraquiasmáticos (NSQ), a retina e as glândulas pineal e adrenal (Menaker et al., 1997). Estes

otimizam as atividades básicas diárias, a vida reprodutiva e algumas respostas sazonais.

O sistema mínimo requerido para adaptação às variações ambientais seria um relógio

endógeno, independente do meio ambiente, um sistema sensor que pudesse detectar as alterações

rítmicas do meio ambiente e um ou mais elementos sincronizadores, que teriam como função o

26

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

ajuste do meio interno e das funções vitais às variações ambientais. Recentemente, foram descritos

os mecanismos moleculares do relógio central (NSQ) e de relógios biológicos locais, chamados de

servo relógios (Reppert e Weaver, 2002). Também é conhecida a forma como a retina é capaz de

detectar luz e enviar a informação fótica para os NSQ (Provencio et al., 2000) e o papel de diversos

marcadores internos como, por exemplo, o da melatonina – hormônio produzido e liberado pela

glândula pineal- como marcador do escuro e o dos glicocorticóides -produzidos ritmicamente pela

glândula adrenal- como antecipadores do período de atividade, agindo portanto sobre o ciclo

vigília/sono dos indivíduos.

Bibliografia:

Cronobiologia:Princípios e Aplicações; Organizadores: Nelson Marques e Luiz Menna-Barreto;

editora Fiocruz, 2003.

Menaker, M., Moreira, L.F., Tosini, G. Evolution of circadian organization in vertebrates. Braz. J.

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Sites Recomendados:

www.nature.com

www.pubmed.com

27

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

NEUROANATOMIA BÁSICA

Emerson Ferraz Coelho

Divisões do Sistema Nervoso:

Divisão do Sistema Nervoso com base em critérios anatômicos:

Sistema Nervoso Central:

Neuro eixo: Encéfalo (cérebro, cerebelo e tronco encefálico) e medula

Sistema Nervoso Periférico:

Nervos cranianos e espinais, gânglios, terminações nervosas sensitivas e motoras.

Divisão do Sistema Nervoso com base em critérios embriológicos

Prosencéfalo, mesencéfalo e rombencéfalo.

Divisão do Sistema Nervoso com base em critérios funcionais:

Sistema Nervoso da Vida de Relação (Somático).

Sistema Nervoso da Vida Vegetativa (Visceral).

Bibliografia: Neuroanatomia Funcional, Angelo Machado.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

ROTEIRO DE AULA PRÁTICA

NEUROANATOMIA

Andreas Betz

Daniel Carneiro Carrettiero

Emerson Ferraz Coelho

Jéssica Ruivo Maximino

Regiane Xavier de Moraes

OBJETIVO: Apresentar o Sistema Nervoso (SN) e suas possíveis divisões didáticas.

O SN é um todo. Sua divisão em partes tem um significado exclusivamente didático, pois várias

delas estão intimamente relacionadas do ponto de vista morfológico e funcional. O SN pode ser

divido levando-se em conta critérios anatômicos, funcionais e embriológicos.

DIVISÃO DO SISTEMA NERVOSO COM BASE EM CRITÉRIOS ANATÔMICOS

Sistema Nervoso

Sistema NervosoCentral

Sistema NervosoPeriférico

Encéfalo

Medula espinhal

CérebroCerebeloTronco Encefálico

MesencéfaloPonteBulbo

NervosGângliosTerminações Nervosas

EspinhaisCranianos

Sistema Nervoso

Sistema NervosoCentral

Sistema NervosoPeriférico

Encéfalo

Medula espinhal

CérebroCerebeloTronco Encefálico

MesencéfaloPonteBulbo

NervosGângliosTerminações Nervosas

EspinhaisCranianos

DIVISÃO DO SISTEMA NERVOSO COM BASE EM CRITÉRIOS FUNCIONAIS

Sistema NervosoSomático

Sistema NervosoVisceral

AferenteEferente

AferenteEferente

SimpáticoParassimpático

Sistema NervosoSomático

Sistema NervosoVisceral

AferenteEferente

AferenteEferente

SimpáticoParassimpático

DIVISÃO DO SISTEMA NERVOSO COM BASE EM CRITÉRIOS

Prosencéfalo

Mesencéfalo

Rombencéfalo

TelencéfaloDiencéfalo

MetencéfaloMielencéfalo

Cérebro

Mesencéfalo

Rombencéfalo

Prosencéfalo

Mesencéfalo

Rombencéfalo

TelencéfaloDiencéfalo

MetencéfaloMielencéfalo

Cérebro

Mesencéfalo

Rombencéfalo

29

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

EMBRIOLÓGICOS 1) Crânio: sustentação e proteção para o Sistema Nervoso Central.

- observar os ossos que constituem a caixa craniana e as suturas.

2) Encéfalo (cérebro, cerebelo e tronco encefálico).

a) Para o tecido ósseo não entrar em contato com o tecido

nervoso existem membranas fibrosas chamadas

meninges, que são: dura-máter, pia-máter e aracnóide.

30

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

b) Cérebro (Telencéfalo + Diencéfalo): giros e

sulcos (as artérias e veias ficam localizadas

preferencialmente nos sulcos).

Lobos (frontal, parietal, temporal e occipital)

c) Cerebelo

d) Tronco Encefálico: mesencéfalo, ponte e bulbo

e) Tálamos: Comunicação

3) Pares de Nervos Cranianos

I - bulbo olfatório / trato olfatório II - nervo óptico / trato óptico III - nervo óculomotor

31

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

IV - nervo troclear V - nervo trigêmeo

VI - nervo abducente VII - nervo facial VIII - nervo vestíbulo coclear IX - nervo glossofaríngeo X - nervo vago XI - nervo acessório XII - nervo hipoglosso

4) Cauda eqüína

5) Vértebra: Músculo e medula

6) Observar a reconstituição do

encéfalo

Referência:

Machado, A.B.M. Neuroanatomia Funcional. 2a edição. São Paulo. Ed. Atheneu, 2000.

32

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

VARIABILIDADE CARDÍACA E MODELAMENTO MATEMÁTICO DE SISTEMAS

BIOLÓGICOS

Breno Teixeira Santos

Variabilidade Cardíaca

Cada vez mais acumulam-se fatos na literatura indicando que diversos sinais biológicos

possuem altos níveis de variabilidade associada. Essa, por sua vez, parece indicar condições

saudáveis de funcionamento nos diversos órgãos como o cérebro e o coração.

O sistema cardiovascular está intimamente associado à demanda metabólica dos organismos.

Esse sistema se encontra sob controle nervoso e hormonal visando à adequação de fluxo aos órgãos

nas mais diversas situações de vida. Em mamíferos, o resultado desse controle aparece na forma de

uma intensa variabilidade na freqüência cardíaca, variabilidade essa que é independente da escala

temporal de análise. Quando o organismo se encontra exposto a situações adversas, como doenças

ou exercício extenuante, há, aparentemente, perda dessa variabilidade.

Visão geral do sistema cardiovascular

O sistema cardiovascular é o responsável pela manutenção de fluxo convectivo de matéria e

calor em praticamente todos os metazoários. Particularmente em mamíferos e outros vertebrados,

existe um órgão, o coração, responsável por gerar entalpia no sistema vascular, mantendo fluxo aos

órgãos. O funcionamento do coração como fonte de entalpia, é, portanto, controlado de acordo com

as necessidades do organismo de uma forma geral e de tecidos específicos em situações

particulares, como, por exemplo, o aumento do aporte sangüíneo ao trato digestivo quando da

alimentação (e.g., Secor, 2003). A manutenção da entalpia no sistema é, basicamente, em função da

manutenção da pressão intravascular, que, na sua porção das grandes artérias é a pressão arterial

(P.A.). Como o sangue será distribuído aos órgãos a partir das artérias e como é nessa porção do

sistema que o coração coloca pressão, o controle adequado da perfusão tecidual, no nível do

organismo, se dá através da manutenção da P.A. em níveis compatíveis com a demanda.

A pressão arterial é mantida através da combinação de duas variáveis principais: (1) débito

cardíaco (Q ), e (2) resistência periférica (Rp) (Milnor, 1997). Entretanto, além desses dois

componentes principais, podemos colocar a viscosidade sangüínea, turbulência nos ductos e outras

variáveis menos importantes como concorrentes no valor de P.A. a cada instante de tempo. O débito

cardíaco é resultado do quanto o coração ejeta a cada contração, i.e., o volume sistólico (VS), e do

&

33

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

número de contrações por unidade de tempo, i.e., a freqüência cardíaca (f). Já a resistência

periférica é resultado, basicamente, do raio, comprimento e complacência dos ductos. Assim, a

diferença de energia entre os pontos do sistema é o que causa o fluxo, e o “formato” geral abaixo se

aplica ao sistema cardiovascular, numa visão global do processo de circulação (Hoppensteadt &

Peskin, 2002):

P.A. = Rp (1a) Q&

e

= VS . f (1b) Q&

O controle da pressão arterial em mamíferos foi objeto de numerosos e extensos estudos. De

uma maneira geral, os estímulos oriundos do sistema nervoso autônomo simpático tendem a elevar

a pressão arterial, porém isso depende do local de ação (e.g., vasodilatação no território muscular

por receptores α-adrenérgicos). Mais diretamente, no miocárdio, agem os dois sistemas autônomos.

A inervação simpática aumenta a força de contração e a freqüência cardíaca, basicamente devido à

liberação de epinefrina. A epinefrina aumenta, ainda, a velocidade de condução do impulso elétrico

nos tecidos especializados (Milnor, 1997). Por outro lado, a acetilcolina, liberada nos terminais

vagais da inervação parassimpática, diminui a freqüência de disparos do marca-passo cardíaco e

velocidade de condução, além de levar a um decréscimo na força de contração.

A força de contração é dependente de características intrínsecas da musculatura cardíaca, mas,

também, do grau de estiramento prévio dessa musculatura. Exatamente como nos demais músculos

estriados, o cardíaco tem sua força de contração ligada ao deslizamento dos filamentos de miosina

sobre a actina devido à formação de pontes cruzadas (Guyton & Hall, 2000). No miocárdio, o grau

de estiramento prévio à contração é decorrente do grau de enchimento ventricular, ou seja, do

volume ao final da diástole. O aumento do volume diastólico final, até um certo limite, aumenta,

assim, o grau de estiramento das fibras miocárdicas, e leva, com isso, a um aumento na força de

contração (Lei de Frank-Starling, e.g., Milnor, 1997).

O volume sistólico, ou seja, o volume ejetado a cada contração, encontra-se diretamente

relacionado à força de contração. Quando há elevação da freqüência cardíaca, como na estimulação

simpática, ocorre uma diminuição do tempo para enchimento ventricular devido ao encurtamento

do tempo de diástole e o inverso ocorre com o estímulo parassimpático. Logo, segundo a equação

(1b) e o discutido acima para o efeito da pré-carga, paradoxalmente, um aumento de freqüência

pode ser acompanhado por uma diminuição de débito cardíaco e vice-versa.

34

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Como apresentado anteriormente, o controle da pressão arterial é de suma importância para a

manutenção de fluxo adequado aos órgãos; e agem, diretamente sobre o miocárdio, os sistemas

nervosos autônomos responsáveis por grande parte desse controle. A análise da freqüência cardíaca

revela uma grande variabilidade dessa ao longo do tempo. Independentemente da escala (e.g.,

segundo, minutos, horas, etc.), detecta-se uma constante modificação do número de batimentos

cardíacos por unidade de tempo (Goldberger et al., 1990). Apesar de que essa variação poderia estar

refletindo somente fenômenos locais decorrentes da relação pré-carga e volume sistólico (como

explicado acima, Lei de Frank-Starling), acumulam-se evidências ao longo das últimas décadas a

respeito do papel do controle nervoso gerando esse fenômeno. Assim, aceita-se, hoje em dia, que a

variabilidade de freqüência indica o funcionamento normal e adequado do órgão, como fonte de

entalpia, e do sistema cardiovascular, como fonte de fluxo sangüíneo (Goldberger, 1996).

Tem-se, como contra-exemplo, a perda da variação de freqüência quando o organismo

encontra-se fora de sua condição fisiológica. A insuficiência cardíaca congestiva de grau avançado

(Poon & Merrill, 1997), a isquemia miocárdica (Goldberger, 1996), a displasia broncopulmonar em

infantes pré-termo (Patzak et al., 1997), o período que antecede a fibrilação ventricular (Goldberger

et al, 1988), a apnéia obstrutiva do sono (Trzebski & Smietanowski, 2001), são todas situações nas

quais se evidenciou a perda de variabilidade. Mesmo em experimentos mais simples, pode-se

detectar uma maior estabilidade da freqüência cardíaca em decorrência de situações não-fisiológicas

(ver Figura 1). Assim, a avaliação em tempo real da variância da freqüência cardíaca é um valioso

elemento de diagnóstico com antecedência de condições não normais do sistema cardiovascular.

Mais ainda, condições de estresse para o sistema vêm sendo abordadas através da observação dos

componentes de variância presentes no espectro do sinal (e.g., Yeragania et al., 2003).

Figura 1: Intervalo <RR> (freqüência cardíaca) sob diferentes condições: ventilação normal

(traçado verde, porções oscilatórias) e em apnéia com glote aberta (traçado verde, porções sem

oscilação). Note que nos trechos 1, 3, 5 e 7, correspondendo a períodos de ventilação normal, que o

<RR> varia bastante e de forma aleatória. Nos demais trechos, onde foi imposta a condição

estressante, o sinal varia consideravelmente menos (Andrade e Santos, 2003).

35

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Modelamento Matemático

O modelamento matemático de sistemas biológicos é algo já bastante difundido em algumas

áreas da biologia como ecologia e fisiologia. Essa aula tem por objetivo demonstrar a utilidade,

importância e aplicabilidade dessa ferramenta dentro do estudo da biologia e, mais especificamente,

na fisiologia.

Mas afinal o que é um modelo? Uma boa definição é a apresentada no preâmbulo do capítulo

4 – Modelling, do livro Biomechanics of the Musculo-Skeletal System de Niggs e Herzog:

“Modelagem, uma tentativa de representar a realidade, é freqüentemente utilizada quando o

entendimento de um certo fenômeno se torna difícil. Um modelo é uma ferramenta poderosa para

aumentar o entendimento sobre um mecanismo e tem, portanto, sido muito aplicada em situações do

dia-a-dia e/ou em situações de pesquisa... Modelagem, freqüentemente combinada com dados

experimentais, torna-se uma poderosa ferramenta científica. ”

Normalmente, embora nem sempre, um modelo é uma representação simplificada da

realidade, específica para um determinado fim. Um modelo pode ser criado a partir de dois

paradigmas distintos: dedução ou indução. No primeiro, a partir de conhecimento sobre o sistema,

opera-se sobre princípios gerais (normalmente físicos e químicos) e deduz-se analiticamente uma

solução única. A segunda forma baseia-se em uma coleção de dados experimentais e, por indução,

tenta-se explicar os dados observados, o não leva a uma solução única.

Qual a melhor solução a adotar? Resposta: não há uma melhor. Sua escolha depende do nível

de conhecimento que se tem sobre o sistema, se é possível com os métodos conhecidos deduzir algo

ou ainda, se é factível obter dados experimentais.

Independente da escolha deve-se sempre ter em mente que um modelo possui basicamente

dois objetivos:

1- Aumentar o conhecimento e o “insight” sobre a realidade e

2- Estimar ou predizer variáveis de interesse.

Modelos podem ser: analíticos, semi-analíticos, modelos de caixa preta, ou conceituais.

Modelos analíticos são deduzidos matematicamente com base em conhecimento real ou especulado

e possui provas determinísticas. Os semi-analíticos diferem dos puramente analíticos pelo fato de

serem tão complicados que impossibilitam a dedução total – nesses casos pode ser possível chegar a

níveis de dedução intermediários. Modelos de caixa preta, ou de regressão, buscam funções de

36

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

transferência que mapeiem um conjunto de entradas em saídas respectivas. Por fim os conceituais

são hipóteses baseadas em conhecimento real ou dados experimentais.

Finalizaremos a aula com alguns exemplos de modelagem e análise matemática aplicadas ao

estudo de variabilidade cardíaca.

Biliografia

Andrade, F. R. & Santos, B. T. (2003)Comparação dos efeitos de três diferentes tipos de apnéia

voluntária na freqüência cardíaca. 6º Semana Temática da Biologia.

Goldberger, A. L. (1996) Non-linear dynamics for clinicians: chaos theory, fractals, and complexity

at the bedside. The Lancet 347: 1312-1314.

Goldberger, A. L., Rigney, D. R., Mietus, J., Antman, E. M. & Greenwald, S. (1998) Non-linear

dynamics in sudden cardiac death syndrome: heart-rate oscillations and bifurcations.

Experientia 44: 983-987.

Goldberger, A., Rigney, D. & West, B. J. (1990) Chaos and Fractals in Human Physiology. Sci.

Amer. Fevereiro: 35-41.

Guyton, A.C. & Hall, J. E. (2000) Textbook of Medical Physiology, 10a edição W B Saunders.

Hoppensteadt, F. C. & Peskin, C. S. (2002) Modeling and Simulation in Medicine and the Life

Sciences 2a edição. Springer, Nova York.

Milnor, W. R. (1997)Cardiovascular Physiology. Oxford University Press.

Secor, S. M. (2003)Gastric function and its contribution to the postprandial metabolic response of

the Burmese python Python molurus. J. Exp. Biol. 206:1621-1630.

Patzak, A., Schluter, B., Orlow, W., Mrowka, R., Gerhardt, D., Schubert, E., Presson, P. B.,

Barschdorff, D. & Trowitzsch, E. (1997) Linear and nonlinear properties of heart rate control

in infants at risk. Am. J. Physiol. Regulatory 273, R540-R547.

Poon, C. & Merrill, C. (1997) Decreased of cardiac chaos in congestive heart failure. Nature 389:

492-495.

Trzebski, A. & Smietanowski, M. (2001) Non-linear dynamics of cardiovascular system in humans

exposed to repetitive apneas modeling obstrutive sleep apnea: aggregates time series data

analysis. Anatomic Neuroscience: Basic and Clinical, 90, pg. 106-115.

37

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

AS TOXINAS DE ANÊMONAS DO MAR COMO FERRAMENTAS PARA ENTENDER A

FISIOLOGIA DE TECIDOS, ÓRGÃOS E SISTEMAS

André Junqueira Zaharenko.

As anêmonas do mar são animais que pertencem ao filo Cnidaria e a classe Anthozoa. Todas

as anêmonas, assim como os celenterados em geral, possuem estruturas celulares microscópicas,

similares a arpões, denominadas de nematocistos, responsáveis pelo papel de paralisar presas e

também atuam na defesa dos animais. Estas estruturas contêm potentes neurotoxinas paralisantes

que agem sobre crustáceos e peixes pelo simples contato com esses animais. Essa estratégia é de

vital importância para os mais distintos animais, desde esses cnidários, passando por moluscos

predadores, escorpiões, aranhas e até serpentes.

Todos esses tipos de animais produzem toxinas protéicas e peptídicas em glândulas

especializadas e as injetam, a partir de estruturas também especializadas na inoculação, como

ferrões, presas e, no caso dos cnidários, nematocistos. Durante muitos anos os cientistas em geral

se debruçaram em tentativas de purificar e elucidar os mecanismos de ação das toxinas, ainda que

por décadas as limitações tecnológicas e operacionais dificultassem essa tarefa.

Um dos aspectos mais importantes que devemos nos focar, quando vamos tentar investigar

quais são os possíveis mecanismos de ação e alvos das toxinas, é exatamente qual o tipo de animal

predado pelo nosso objeto de estudo. As anêmonas, por exemplo, predam em geral peixes e

crustáceos planctônicos. Essas presas, por sua vez, são de rápida locomoção e poderiam facilmente

escapar de um predador que também não fosse rápido na captura.

Quando pensamos nos ambientes ocupados pelas anêmonas, logo devemos nos ater ao fato de

que esses animais são sésseis, ou seja, vivem fixos em um substrato rochoso e basicamente não se

movem. Se as presas das anêmonas são animais de rápida locomoção, as toxinas direcionadas a sua

captura devem ter um efeito o mais efetivo e letal possível. Seguindo nessa linha de raciocínio, os

alvos mais conhecidos onde as toxinas anêmonas atuam são: na condução nervosa e na contração

muscular das presas. Toxinas que bloqueiam a neurotransmissão, levando a paralisia seguida de

morte, são as moléculas mais investigadas nesse grupo de animais até hoje.

Remetendo aos conhecimentos básicos de fisiologia e biologia celular, sabemos que um

potencial de ação (PA) é evocado basicamente pela mudança de voltagem do interior de uma célula

nervosa através da entrada de íons sódio (despolarização) e a saída de íons potássio na mesma. Este

38

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

último processo é um pouco mais tardio e permite o restabelecimento da voltagem inicial no interior

da célula (repolarização), o chamado potencial de membrana. A seqüência desses eventos,

controlados refinadamente pelos canais para Na+ e K+ dependentes de voltagem, leva a transmissão

do impulso elétrico, com consequências fisiológicas importantes para a comunicação neuronal e a

contração muscular. Para uma revisão completa, a leitura do capítulo 11 (páginas 523-547) do livro

MOLECULAR BIOLOGY OF THE CELL (Alberts et al., 3a e 4a edições; 1994, 2002) é bastante

recomendada.

Durante a passagem de um PA de um neurônio a outro, temos no neurônio pré-sináptico,

durante a despolarização, a abertura de canais para Ca2+ dependentes de voltagem próximos ao

botão sináptico. Quando se abrem, esses canais permitem o influxo de Ca2+ que provoca,

subsequentemente, a alteração da concentração intracelular desse íon e a ativação de maquinarias

secretórias de neurotransmissores. Vesículas contendo neurotransmissores são liberadas na fenda

sináptica e estes ligam-se aos respectivos receptores pós-sinápticos, propagando o PA ou

desencadeando eventos secundários importantes para a fisiologia celular. A contração muscular

desencadeia-se da mesma maneira, apenas diferindo na sequência de eventos pós-sinápticos

desencadeadas pela ligação da acetilcolina (no caso de mamíferos, por exemplo) ou do glutamato

(no caso de crustáceos e invertebrados) nos respectivos receptores das fendas sinápticas. É

importante ressaltarmos que nesse caso não há um neurônio pós-sináptico e sim uma musculatura

inervada por um neurônio pré-sináptico.

Essa revisão de conceitos básicos é importante quando nos deparamos com os mecanismos de

ação de neurotoxinas de anêmonas e de outros animais peçonhentos. A maioria dos peptídeos de

anêmonas descritos e estudados age em canais para Na+ ou para K+ dependentes de voltagem.

Retardam o processo de inativação dos canais de Na+ e bloqueiam os canais de K+, produzindo um

influxo enorme de íons Na+ e uma diminuição drástica da saída de íons K+ nas células. Isso faz com

que o PA tenha sua amplitude e duração aumentadas dramaticamente.

Para a fisiologia celular, a liberação de neurotransmissores passa a ser tremenda, levando a

contrações musculares que não cessam, paralisando um animal que tenha sofrido injeções diretas

dessas toxinas em seus tecidos.

Existem, atualmente, cerca de 10 subtipos de canais de Na+ dependentes de voltagem (os

chamados, Nav) distribuídos nos sistemas nervosos central e periférico, tecido cardíaco, medula

espinhal e músculo esquelético. São proteínas transmembranares que diferem levemente em termos

de sequências primárias e parâmetros cinéticos.

Como nosso grupo de pesquisa vem trabalhando há longos anos com neurotoxinas de

anêmonas do mar, recentemente publicamos um trabalho no qual a comparação dos efeitos de 3

39

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

toxinas praticamente idênticas difere pouco dependendo dos subtipos de Nav ensaiados (Oliveira et

al., 2004). Ou seja, isso mostra que a atuação das moléculas em seus sítios de ligação é sutilmente

modulada por alguns aminoácidos em suas estruturas. Dependendo do subtipo de Nav ensaiado,

havia efeitos preferenciais ou não de cada uma das toxinas. Durante a aula expositiva os resultados

serão apresentados e discutidos com os alunos. A leitura do trabalho de Oliveira et al.(2004) também

é requerida.

Conforme os diferentes tipos de toxinas são purificados e caracterizados, cada vez mais essas

moléculas são empregadas como ferramentas farmacológicas, para em laboratório induzirem seus

efeitos e ajudarem os cientistas a investigar diferentes aspectos da fisiologia.

Muitas companhias farmacêuticas revendem toxinas com esse propósito, a preços

elevadíssimos. Acessando o site www.alomone.com e clicando em Ion Channel Modulators e

Neurotoxins, podemos ver a lista de diferentes toxinas com seus respectivos preços.

Embora companhias farmacêuticas forneçam toxinas como substâncias para pesquisa básica,

muitas delas vêm investindo milhões de dólares no desenvolvimento de fármacos a partir dessas

moléculas. Como exemplo, existem peptídeos que bloqueiam especificamente canais de K+

dependentes de voltagem expressos em linfócitos-T. Esse tipo de bloqueio leva a uma supressão do

sistema imune e, consequentemente, esse tipo de toxina torna-se altamente atrativo como um

remédio para tratar artrite reumatóide e rejeição a órgãos transplantados. Na revisão apresentada

por Chandy et al., 2001, os alunos podem acompanhar os avanços recentes nesse sentido.

Finalizando, queremos mostrar que a partir de protótipos naturais pode-se obter substâncias

altamente eficazes para o estudo da fisiologia e que sirvam também como modelos para o

desenvolvimento de medicamentos.

REFERÊNCIAS:

ALBERTS, B. et al. 1994. Molecular Biology of the Cell. Garland Publishing. New York. 3rd

edition. 1294p.

CHANDY, K.G., CAHALAN, M., PENNINGTON, M., NORTON, R. ., WULFF, H., GUTMAN,

G.A. 2001. Potassium channels in T lymphocytes: toxins to therapeutic immunosupressants.

Toxicon. 39: 1269-1276.

OLIVEIRA, J. S., REDAELLI, E., ZAHARENKO, A. J., CASSULINI, R. R., KONNO, K., CURIA,

G., PIMENTA, D.C., FREITAS, J. C., CLARE, J. J., WANKE, E. 2004. Binding of sea

anemone toxins to Nav 1.1-1.6 Sodium Channels: Unexpected Contributions from Differences

in the IV/ S3-S4 Outer Loop. Journal of Biological Chemistry. 279 (32): 33323-33335.

40

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

ROTEIRO DE AULA PRÁTICA

Durante a aula prática, os alunos acompanharão procedimentos de fracionamento de peçonhas

totais pela técnica cromatográfica de gel-filtração. Basicamente, a metodologia consistirá conforme

descrito abaixo:

Purificação da peçonha por gel-filtração em gel de Sephadex G-50 e estimativa do conteúdo

protéico:

O fracionamento da peçonha liofilizada de anêmona será realizado através de uma coluna

(1,9cm X 131cm) empacotada com gel Sephadex G-50 (Pharmacia LKB- Biotechnology, Uppsala,

Sweden), para se obter as frações neurotóxicas e hemolíticas já detectadas neste tipo de

fracionamento. A peçonha previamente centrifugada e liofilizada (cerca de 1-2g de material seco;

200mg de proteína) será dissolvida em 10-20mL de tampão acetato de amônio 0,1M, pH 7,0 e

aplicada ao topo da coluna, equilibrada e eluída por gravidade com o mesmo tampão. Cerca de 60

frações de 10mL cada uma foram coletadas, agrupadas e liofilizadas.

A absorbância de cada fração, uma medida relativa da quantidade de proteína contida em

cada uma, será registrada diretamente na saída da coluna, através da passagem do efluente por um

detector de UV (Spectra/ ChromTM Flow Thru UV Monitor com unidade óptica de 280nm e UV

Monitor Controller, Spectrum, Austria) antes de entrar no coletor de frações. A informação, captada

pelo detector, é integrada e registrada permanentemente em papel (Spectra/ Chrom TM 1 Channel

Recorder, Spectrum, Áustria). O registro direto na saída da coluna permite o acompanhamento

constante do processo de filtração em gel, desta maneira, otimizando o processo de coleta.

Para estimar-se a quantidade de proteína presente na peçonha e nas frações obtidas, durante

esta etapa e nas subseqüentes, será empregado um “kit” que se baseia no método de dosagem do

ácido bicinconínico (BCA) seguindo-se o protocolo do manual do fabricante (Pierce, Rockford,

USA). Utiliza-se albumina sérica bovina como padrão.

Purificação por cromatografia de fase reversa (RP-HPLC) da fração neurotóxica (FR III):

Esta etapa será realizada no Laboratório Especial de Espectrometria de Massa (LEEM) do

Centro de Toxinologia Aplicada (CAT/CEPID- FAPESP) do Instituto Butantan.

O conjunto da fração neurotóxica (FR III) obtida de cromatografias por filtração em gel vai ser

ressuspendido em água Milli-Q (Millipore Inc.) e injetado em um sistema de purificação Shimadzu

de HPLC constituído por um detector UV-VIS SPD-10A VP, bombas LC-10AD VP e um sistema

controlador SCL-10A VP (Shimadzu Corp., Japan). As amostras são então cromatografadas em uma

coluna C-18 de fase reversa ODS (4.6 x 150 mm, 5µm; Hi-Q™) com um gradiente linear de 10 a

41

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

60% do solvente “B” composto de acetonitrila + 0,1% de ácido trifluoroacético (CH3CN / 0,1%TFA)

com fluxo de 1,0 mL/min durante 40min, através de monitoramento em UV 214 nm. O solvente “A”

é composto de 0,1% de TFA em água Milli-Q.

Todos os picos obtidos são coletados manualmente e individualmente ou agrupados em frações

para serem posteriormente submetidos a espectrometria de massa e ensaios biológicos.

Monitoramento de atividade neurotóxica das amostras em nervo sensorial de crustáceo.

Técnica de “sucrose-gap”:

A preparação será realizada utilizando-se nervos sensoriais de crustáceos decápodos braquiúros

da espécie Callinectes danae (siri azul), coletados no canal de São Sebastião. Testaremos o efeito de

neurotoxinas isoladas de peçonhas de anêmonas sobre o potencial de ação axonal de nervo de siri.

O procedimento consiste na separação do 2o ou 3o par de patas provocando-se autotomia por

compressão do artículo proximal (base-ísquio). Como o nervo ocupa uma posição aproximadamente

central no pereiópodo, o mesmo é exposto até o dáctilo, removendo-se um a um os artículos por

secção das membranas artrodiais, apódemas musculares e separação dos côndilos articulares.

Técnica de “sucrose-gap” - Essa técnica consiste no isolamento elétrico de uma área

superficial do nervo, na região entre os eletrodos de registro, através de lavagens sucessivas com

uma solução de sacarose 1M. São feitas 10 lavagens com sacarose a fim de remover íons da

superfície do nervo, deixando a área eletricamente isolada, impedindo a passagem de corrente na

superfície do nervo. O potencial de membrana pode ser medido de uma câmara contendo KCl para

outra com salina. Assim, eletrodos antes e após a barreira de sacarose registram tanto a voltagem

produzida pela corrente iônica que passa através da membrana e no interior das fibras nervosas

durante o potencial de ação, como o potencial de repouso. A câmara de acrílico que é utilizada no

experimento para estimulação e registro dos potenciais de ação contém 8 sulcos escavados, unidos

centralmente por um sulco onde se encontra apoiado o nervo e, para isolar um sulco do outro

adiciona-se vaselina. Os eletrodos de estimulação se encontram nos sulcos 1 (positivo) e 2

(negativo), enquanto que os de registro nos sulcos 5 e 8, separados por dois sulcos contendo sacarose

1M para isolamento. Os cinco primeiros sulcos são preenchidos com solução fisiológica de C. danae

e o último com solução de KCl isosmótica (0,46M). Para amplificação dos sinais obtidos utilizamos

um pré-amplificador modelo CP511AC (Grass Instruments Co., Warwick, USA). Os dados serão

adquiridos através de um microcomputador tipo PC e processados através do programa WinWCP

(Strathclyde Electrophysiology Software, University of Strathclyde, Glasgow, UK

http://www.strath.ac.uk/Departments/PhysPharm/ses.htm).

42

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

EVOLUÇÃO DO SISTEMA NERVOSO

Adriano Alonso

Rodrigo Pavão

Dado que todos os organismos compartilham um ancestral comum, porque eles diferem tanto

em relação a suas capacidades de sentir, lembrar e responder ao mundo que o cerca? Como

surgiram as habilidades para pensar e sentir? De que maneira diferimos de outros animais em

relação a essas capacidades? As resposta para essas perguntas dependem crucialmente do

entendimento de como o sistema nervoso evoluiu.

A evolução estaria ocorrendo de forma natural e não determinada, pois não sabemos qual será

a característica que acrescentará valor adaptativo aos indivíduos, ou seja, quais características serão

filogeneticamente conservadas. Podemos comparar a evolução a gotas sucessivas de água que

percorrem caminhos diferentes ao serem jogadas em uma rocha – não se pode prever qual caminho

será percorrido nem onde irão cair, devido à mudanças na umidade, vento etc. Cada caminho

diferente, nessa analogia, seria uma linhagem que pode ter originado os animais atuais, mostrando

toda a diversidade de serem que existem hoje.

Cada organismo tem feições neuroanatômicas distintas que, em última instância, refletem sua

relação com o meio. O estudo evolutivo do sistema nervoso é feito essencialmente através de

evidências indiretas. Isso porque o sistema nervoso não é fossilizável e o comportamento de seres

extintos pode apenas ser inferido. As características do sistema nervoso desses seres, como a

conformação e complexidade dos circuitos e conexões sinápticas são inacessíveis; o que é

observável é o volume da caixa craniana e as impressões nela gravadas. Assim, o estudo do sitema

nervoso e do comportamento baseiam-se na premissa de que capacidades funcionais de sistemas

filogeneticamente mais antigos são refletidas em animais originários dessas linhagens primitivas.

Vale a pena lembrar que essa concepção sobre animais primitivos e derivados, que parece

estar intimamente relacionada com a capacidade de processar informação e de agir favoravelmente

para benefício individual, não pode ser diretamente interpretada como superioridade. Um pequeno

sistema nervoso pode ser mais vantajoso do que uma grande, dependendo das circunstâncias

envolvidas. Um encéfalo grande e capaz de lidar com muita informação tem gasto energético maior,

ampla necessidade de oxigênio. Limitações a esses fatores podem beneficiar animais com encéfalos

pequenos e mais econômicos.

Dois princípios nortearam a configuração dos sistemas nervosos dos grandes grupos de

animais: (1) a capacidade de integrar mais informação sensorial e motora e (2) o sistema ter

43

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

dimensões reduzidas, com menor número de neurônios envolvidos. O resultado da atuação conjunta

desses fatores resultou em sistemas eficientes, capazes de processar informações diversas e de gerar

comportamentos complexos.

Neste módulo discutiremos a evolução do sistema nervoso através de uma abordagem

multidisciplinar envolvendo dinâmica dos genes reguladores do desenvolvimento, história

geológica da Terra, neuroanatomia e ecologia comportamental. As capacidades sensoriais, motoras

e cognitivas de animais de diferentes níveis da escala filogenética e as estruturas neuroanatômicas

relacionadas serão apresentadas conjuntamente. Uma vez descritos e comparados os sistemas

nervosos desses diferentes grupos, serão apresentadas as teorias mais consistentes sobre seus

padrões evolutivos.

Bibliografia

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Sites

http://www.ib.usp.br/~rpavao

44

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

MEMÓRIA EM AVES

Sylvia Maria Matsuda

O que é memória? Segundo Tulving (1995, p. 751) memória no sistema biológico sempre

requer aprendizagem (aquisição da informação) e aprendizagem implica em retenção (memória)

desta informação. Memória seria então a retenção de informações adquiridas. Mas como verificar se

um organismo realmente reteve dada informação?

Segundo Xavier (1993, p. 62) memória pode ser definida como a capacidade do organismo de

alterar o seu comportamento em função de experiências anteriores, uma vez que, dada uma

informação, é possível averiguar através de testes se esta informação fora retida ou não dependendo

do comportamento-resposta do indivíduo. Em geral, testes de memória apresentam, num primeiro

momento, certos estímulos a um indivíduo e depois de passado algum tempo é perguntado

(verbalmente ou não) ao indivíduo sobre tais estímulos.

Em seres humanos, é relativamente fácil verificar se uma dada informação foi guardada ou

não, podemos simplesmente perguntar ou, em habilidades não verbais, podemos realizar testes de

desempenho, se o desempenho melhora a partir de informações anteriores, podemos dizer que

houve aprendizagem e conseqüentemente retenção na memória.

Mas, e em animais não-humanos, como fazer testes que verifiquem sua memória? Seguindo o

mesmo princípio que nos seres humanos, mas como não podemos perguntar, realizamos testes que

analisem seu desempenho. Em geral testes de memória em animais envolvem a manipulação de

alimento (recompensa) e do local de oferecimento deste alimento Em aves, por exemplo, são

comuns testes de memória espacial, que seria a memória sobre a disposição de objetos, alimentos,

outros indivíduos, e da sua própria localização num determinado espaço.

Um teste simples de memória espacial seria oferecer, num primeiro momento, em dois locais

distintos, um recipiente com alimento e outro sem alimento e deixar o animal investigar o local até

achar o alimento e consumí-lo. Num segundo momento, oferecer os dois recipientes novamente,

agora sem alimento em ambos (a fim de evitar pistas olfativas) e verificar para qual se dirigem

primeiramente. Podemos tanto treiná-los a procurar no mesmo recipiente ou no oposto, dependendo

do tipo de pergunta que estamos fazendo.

Testes de memória em animais são importantes na construção de modelos que podem, dentro

de certos limites, ser extrapolados para humanos. Ao contrário dos humanos, testes com animais

permitem a manipulação invasiva, possibilitando, por exemplo, que o experimentador, através de

45

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

uma lesão em determinada região encefálica, verifique possíveis perdas de habilidade mnemônica e

consiga estabelecer uma relação entre esse dado substrato neural com alguma função de memória.

Ou ainda, testes de memória são muito utilizados para comparar o comportamento de diferentes

espécies ou grupos animais frente a um mesmo problema e, a partir dos resultados, extrapolar qual o

seu papel na ecologia do animal.

Por exemplo, estudos com diferentes espécies de pássaros das famílias Corvidae, Sittidae e

Paridae, mostraram que espécies estocadoras de alimento, ou seja, que coletam e estocam seus

alimentos em diferentes locais para depois serem consumidos, apresentam, no geral, melhor

desempenho e maior taxa de aprendizagem em testes de memória espacial do que espécies não-

estocadoras (ver revisão em Krebs, et al., 1996). Além disso, observou-se que o hipocampo* de aves

estocadoras de alimento é relativamente maior, proporcionalmente a todo o encéfalo e tamanho

corpóreo, em relação às espécies não estocadoras (Clayton, 1998; Healy, 1996; Krebs et al., 1996).

Sugere-se que esse aumento hipocampal em pássaros estocadores evoluiu em resposta a um

aumento na demanda cognitiva que deve acompanhar o comportamento de estocagem (Clayton,

1998) uma vez que, para estocar e reaver seus alimentos esses pássaros contariam com uma

memória e um mapa espacial apurados do ambiente.

Os pombos, por serem aves de fácil reprodução e manuseio e serem biologicamente bem

conhecidos, em geral são utilizados em estudos que envolvem o mapeamento de substratos neurais

e suas funções. Por exemplo, através de experimentos com pombos, hoje é consenso que o

hipocampo das aves é homólogo ao hipocampo dos mamíferos, apesar de diferirem

neuroanatomicamente e fisiologicamente, parecem possuir a mesma origem e função. (Striedter,

2002)

Uma outra família de aves bastante estudada é a dos beija-flores. Por serem aves

extremamente especializadas e possuírem uma das maiores taxas metabólicas dentre os endotermos,

são altamente dependentes da disponibilidade alimentar do meio. Acredita-se, portanto, que uma

memória espacial apurada seja um importante componente para seu sucesso alimentar, uma vez que

estes se beneficiariam se guardassem informações sobre os diferentes locais de plantas com flores e

fossem capazes de retornar no dia seguinte ou na estação seguinte quando voltarão a florescer, ou

até no mesmo dia, quando da reposição do nectar.

*substrato neural consensualmente considerado importante na aquisição e consolidação de

memória de longa duração (Clayton, 1998); o hipocampo seria responsável pela combinação de

estímulos elementares na construção de uma única representação do ambiente (Carlson, 1994) e,

dentre outras funções, a formação hipocampal forneceria para o restante do sistema nervoso um

mapa espacial do ambiente (O’Keefe & Nadel, 1978; Santos, 1999).

46

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

De fato, observou-se que, beija-flores das espécies Archilocus colubris e Selasphorus rufus,

aprendem locais de bebedouros idênticos, reforçados e não reforçados, em diferentes padrões de

distribuição (Miller & Miller, 1971; Brown & Gass, 1993; Hurly, 1995; Sutherland & Gass, 1995).

Ainda que, S. rufus é capaz de lembrar e evitar locais de bebedouros recentemente visitados e

utilizar sua altura para lembrar de sua localização (Henderson et al., 2001). E estudos envolvendo

diferentes espécies de beija-flores - Calypte anna, A. colubris e S. rufus - demonstraram que eles:

(1) respondem preferencialmente à disposição espacial em detrimento às pistas intrínsecas dos

bebedouros, como cor ou padrão de cores (Collias & Collias, 1968; Hurly & Healy, 1996; Miller &

Miller, 1971; Miller et al., 1985); (2) aprendem a utilizar a cor dos bebedouros para encontrar o

reforço (Brown & Gass, 1993; Collias & Collias, 1968; Miller & Miller, 1971; Miller et al., 1985)

e; (3) aprendem mais rapidamente tarefas espaciais do que tarefas que envolvem pistas visuais

(Brown & Gass, 1993; Miller et al., 1985, Healy & Hurly, 1998). Sugere-se que, na natureza, os

beija-flores se utilizariam tanto de pistas intrínsecas quanto de pistas espaciais durante seu

forrageamento. Pistas intrínsecas, como cor ou padrões de cores das flores, para a procura e

generalização de novas fontes de alimentares e, se utilizariam de pistas espaciais na discriminação

entre flores recentemente visitadas e para visitas subseqüentes depois de passado seu tempo de

renovação de néctar (Brown & Gass, 1993; Hurly and Healy, 1996; Miller et al.,1985).

Pudemos verificar que experimentos de memória em animais e, mais especificamente em

aves, são importantes tanto para a comparação comportamental entre as diferentes espécies e táxons

quanto para a criação e consolidação de modelos de memória que ajudam no entendimento dos

nossos próprios mecanismos de formação e evolução da memória.

Bibliografia

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

MECANISMOS CENTRAIS DO CONTROLE CARDIOVASCULAR

Jessica Ruivo Maximino

1. INTRODUÇÃO

A perfusão tecidual é garantida pela manutenção da força motriz da circulação em níveis

adequados e razoavelmente constantes ao longo de toda a vida dos indivíduos, estejam eles em

repouso ou desenvolvendo diferentes atividades comportamentais. Os níveis de pressão arterial

(PA), gerados pela atividade cardíaca e vascular são controlados por diversos sistemas inter-

relacionados que realizam funções específicas.

Assim, conhece-se alguns mecanismos de ajuste da PA:

- Mecanismo de controle a curto-prazo da PA (Mecanismos neuro-humorais)

- Mecanismos de controle a longo-prazo da PA (Mecanismos de fluidos

corporais)

2. CONTROLE DA PRESSÃO ARTERIAL PELO SISTEMA NERVOSO CENTRAL

O Sistema Nervoso Central (SNC) tem um papel importante na regulação do sistema

cardiovascular, por controlar tanto a atividade do sistema nervoso autonômico quanto a liberação

de fatores hormonais circulantes. O SNC modifica agudamente a PA e os batimentos cardíacos,

facilitando a homeostase e as respostas apropriadas ao meio ambiente (WYSS et al., 1990).

Assim, tem um papel fundamental na regulação a curto-prazo da PA.

O controle a curto-prazo da PA é realizado particularmente pelo reflexo barorreceptor, o

qual é iniciado em terminações nervosas localizadas no seio carotídeo e no arco aórtico, as quais

captam alterações no estiramento da parede arterial (KUMADA et al., 1990).

Sabemos que o SNC contribui diretamente em algumas formas de hipertensão (WYSS et al.,

1990) e algumas áreas encefálicas parecem ter uma grande importância na regulação

cardiovascular.

O núcleo do trato solitário (NTS) está localizado na porção dorsal da medula oblonga está

envolvido na recepção e integração de múltiplos processos viscerosensoriais, incluindo o

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

controle cardiovascular, respiratório, gustatório, hepático e renal (LAWRENCE & JARROT, 1996).

Ele é o principal núcleo de integração dos impulsos provenientes dos barorreceptores localizados

no seio carotídeo e no arco aórtico, dos quimiorreceptores dos corpos carotídeos e das aferências

provenientes do coração, pulmão e de outras vísceras (MIURA & REIS, 1971; LIPSKI et al., 1975 ;

CIRIELLO & CALARESU, 1981).

O NTS influencia o controle cardiovascular através de suas projeções para núcleos

medulares (OTAKE, 1993), área postrema (SAPER et al.,1983), locus coeruleus (LC) e núcleos

hipotalâmicos, como o núcleo paraventricular do hipotálamo (PVN) (SAWCHENKO & SWANSON,

1982).

Assim, além do NTS outros centros bulbares estão envolvidos no controle cardiovascular,

como neurônios da porção caudal (CVL) e da porção rostral (RVL) da medula ventrolateral

(VLM), áreas da formação reticular nesta região do SNC. A CVL recebe projeções diretas do

NTS que, por sua vez, envia projeções inibitórias à RVL. A RVL envia projeções para os

neurônios pré-ganglionares simpáticos na coluna intermédio lateral da medula espinhal

exercendo dessa forma, efeito modulatório sobre o tono do sistema nervoso simpático (revisado

por DAMPNEY, 1994). Essas projeções constituem o barorreflexo, assim, a circuitaria do

barorreflexo é ativada em decorrência da variação da PA.

O NTS é rico em variedade e quantidade de neurotransmissores, sendo que a participação

destes no controle neural da PA vem sendo muito discutida (VAN GIERSBERGEN et al., 1992;

LAWRENCE & JARROT, 1996). Mais de trinta neurotransmissores bem como seus respectivos

receptores são descritos no NTS, sendo que o papel funcional de cada um deles ainda não foi

adequadamente demonstrado. Além disso, é possível que interações entre sistemas de

neurotransmissão neste núcleo ampliem a capacidade de modulação das respostas que acontecem

após determinado estímulo pressórico.

O LC, localizado na ponte também tem participação relevante nas respostas reflexas

autonômicas e neuroendócrinas em decorrência de alterações da PA. O LC envia projeções para

diversas áreas do encéfalo e medula espinhal (FOOTE et al., 1983), recebendo aferências

principalmente da medula oblonga (ASTON-JONES et al., 1986).

Outro núcleo importante no controle da PA é o PVN, localizado bilateralmente ao terceiro

ventrículo, o PVN recebe e envia projeções diretas para o NTS podendo modular o processamento

bulbar do controle cardiovascular (SAWCHENKO & SWANSON, 1982). A estimulação deste núcleo

pode causar tanto efeito pressor quanto depressor. O efeito difere para cada órgão alvo. O fato de

existir projeções diretas do PVN para a coluna intermédio lateral e do NTS para o PVN, pode-se

relacionar esse circuito com o barorreflexo (SAWCHENKO & SWANSON, 1982).

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

No SNC diversos mediadores químicos participam do controle/modulação da PA, tais

como as catecolaminas, o neuropeptídeo Y (NPY), a angiotensina II (Ang II), o gaba, o

glutamato, a vasopressina entre outros.

Referências Bibliográficas:

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Site interessante:

www.pubmed.com

52

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

COMPORTAMENTO E FISIOLOGIA DE FORMIGAS

Pedro Leite Ribeiro

As sociedades dos insetos são conhecidas por se constituírem de indivíduos especializados em

diferentes tarefas. Em certas espécies de formigas, esta especialização está relacionada com o

aparecimento de diferenças surpreendentes no tamanho entre indivíduos de uma mesma colônia,

geralmente associadas a tarefas diferentes (Bonabeu, 1997). Temos, por exemplo, em colônias do

gênero Atta formigas cuja largura da cápsula cefálica pode variar de 0,8mm até 3,0mm.

Simplificando, podemos subdividir estes diferentes tamanhos em quatro grupos, de acordo com suas

funções. Assim, temos as jardineiras e “babás” que são as menores operárias da colônia e têm a

função de cuidar das hifas e das formas imaturas. Já as generalistas, de cápsula cefálica com

aproximadamente 1,4mm são responsáveis por vários tipos de atividades dentro do ninho, como a

preparação de vegetais, que deve ser feita antes da incorporação dos mesmos à esponja, descarte de

lixo e reconstrução das esponjas de fungo. Temos ainda a não menos importante casta das

forrageadoras com 2,2mm de cápsula cefálica, essas formigas exploram o meio externo ao ninho e

são responsáveis pela coleta de vegetação. Por último, temos as defensoras ou soldados, com

cápsula cefálica de 3,0mm, como o próprio nome sugere são elas as responsáveis pela defesa do

ninho contra invasores, principalmente de outras formigas. (Adam e Ratnieks, 2001; Roces e

Holldobler, 1994; Andrade et al., 2002; Carvalho, 1972; Wilson, 1980; Wilson, 1971). A divisão de

tarefas não é completamente rígida, sendo que a colaboração entre os indivíduos de diferentes

castas propicia o surgimento de padrões de comportamentos característicos de um

“superorganismo”, favorecendo a colônia de uma forma global (Hölldobler e Wilson 1984). A

manutenção do equilíbrio homeostático de uma colônia requer uma rápida percepção de fatores

desestabilizadores externos ou internos e uma comunicação que possibilite a reorganizaçao na

direção do equilíbrio.

Além da flexibilidade na troca de tarefas entre as diferentes castas de formigas operárias

variações do meio ambiente promovem comportamentos que conduzem ao reequilíbrio do

microambiente da colônia. Kleineidam e Roces em 2000, observaram em ninhos de formigas

cortadeiras Atta vollenveideri diferentes comportamentos em função da idade da colônia. Os ninhos

de colônias grandes, maduras, asseguram um bom micro-clima para o crescimento do fungo. Essas

colônias constroem montes de terra ao redor das entradas do ninho cuja arquitetura promove a

ventilação preservando a concentração de CO2 em baixos níveis. Além disso, esses montes de terra

53

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

impedem a entrada da enxurrada nos olheiros. As colônias jovens, pequenas e que ainda não

construíram montículos protetores se vêem obrigadas a fecharem todas as saídas do ninho para

protegê-lo do excesso de chuva. Quando fecham as entradas a concentração de CO2 aumenta

rapidamente, a taxa de respiração da colônia reduz-se, a respiração do fungo simbiótico também é

reduzida e o crescimento da colônia fica comprometido. Contudo, através do fechamento, as

operárias impedem a inundação e garantem a continuidade da colônia.

Freqüentemente a homeostase de uma colônia envolve processos complexos de

comportamentos onde aspectos individuais e sociais interagem para suprir, com maiores benefícios,

as necessidades energéticas da colônia (Roces, 2002). Em colônias de Atta cephalotes, a primeira

formiga forrageadora que encontra uma nova fonte de alimento, corta um fragmento de folha bem

menor do que cortaria numa situação de forrageamento bem estabelecida. Dessa forma, essa

primeira formiga diminui o tempo de corte e chega mais rapidamente ao ninho onde passará as

informações da fonte para suas irmãs. Assim, a coleta total para a colônia aumenta através do

recrutamento embora a primeira forrageadora tenha prejudicado sua performance. Num primeiro

momento, o recrutamento torna-se mais importante que a atividade individual de corte. Essa

capacidade individual de distinguir as diferentes situações de forrageamento possibilita maior

rapidez no reequilibrio energético da colônia (Roces, 1993). A velocidade com que as operárias

modificam seu comportamento em resposta aos estímulos externos varia de acordo com o tipo de

comportamento e o contexto. O grau de flexibilidade pode variar com o tamanho e a idade da

colônia, as operárias de colônias jovens parecem mais versáteis, mais flexíveis em suas tarefas, mas

a colônia como um todo é menos homeostática. Uma vez que a proporção entre as castas é muito

mais frágil em colônias jovens, e os mecanismos de suporte, como a mudança de tarefas não é

100% eficiente (Lenoir, 1979a; Gordon,1987).

Todo processo de homeostase de uma colônia que envolve novas organizações e mudanças de

comportamentos, individuais ou sociais, depende de um sofisticado mecanismo de comunicação

química. As intercomunicações ocorrem através de emanações de substâncias químicas

(feromônios) exaladas de diferentes partes do corpo das formigas e percebíveis por suas irmãns,

através das antenas que são órgãos de percepção química. Esses avisos químicos têm, de acordo

com as substâncias desprendidas e circunstâncias do momento, funções diferentes como: alarme de

invasão, chamados para os cuidados com a prole, recrutamento para a busca de alimentos e muitas

outras ainda não bem conhecidas (Hölldobler e Wilson, 1990). Além de se comunicar através de

feromônios as formigas são capazes de perceber diversas variações ambientais entre elas as de

temperatura e umidade. Uma vez identificadas essas variações as operárias podem modificar o seu

comportamento. Desta maneira, a colônia, aparentemente, reconhece a existência de um problema e

passa a se comportar de forma a tentar corrigi-lo. (Roces e Kleineidam, 2000).

54

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Nesta aula nos basearemos na descrição e discussão de experimentos realizados em nosso

laboratório. Estes experimentos mostram a plasticidade comportamental que formigas Atta sexdens

rubropilosa podem apresentar em diversas situações.

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56

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

ECOFISIOLOGIA DE LAGARTOS

Renata Brandt Nunes

A ecofisiologia pode ser interpretada como o estudo de como os organismos funcionam

e respondem a mudanças em seus ambientes naturais. Neste contexto, a aula tratará principalmente

das implicações fisiológicas das mudanças de temperatura nos Squamata, com ênfase nos lagartos,

pois é bastante profunda a influência deste fator na vida destes animais. Será importante recordar a

terminologia relacionada à regulação da temperatura, como os conceitos de endotermo e ectotermo

assim como pecilotermo e homeotermo; e ainda heliotermos, tigmotermos; a diferença entre ser

termorregulador e termoconformador; o que é a temperatura preferencial e conceitos relacionados

aos limites de temperatura de atividade.

A aula em si será baseada na discussão sobre os mecanismos morfológicos e fisiológicos

da termorregulação e a relação com aspectos da história natural dos lagartos no contexto metabólico

e dependente de temperatura, como distribuição e seleção de microhabitat; atividade diária e

sazonal; comportamento; alimentação, digestão e dieta; reprodução; infecção e balanço hídrico.

Sugestões de Leitura

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Jersey: Prentice – Hall, Inc.

Links Interessantes

Páginas de pesquisadores, com informações sobre as linhas de pesquisa e links para outras páginas

de herpetologia.

http://www.ib.usp.br/~rbrandt - Minha página pessoal

http://fisio.ib.usp.br/ecofis - Carlos A. Navas

http://rydberg.biology.colostate.edu/faculty/profile.php?name=Packard

http://lamar.colostate.edu/~packard/ – Gary Packard

http://faculty.washington.edu/hueyrb/index.html - Laboratory of Evolutionary Physiology, dirigido

por Raymond B. Huey. Dispõe ainda de conselhos para estudantes de pós-graduação ou

interessados em fazer pós-graduação

http://uts.cc.utexas.edu/~varanus/ - Pianka´s Lab Page. Página do Laboratório do Eric Pianka.

http://www.omnh.ou.edu/personnel/herpetology/vitt/ - Laurie J. Vitt

http://compphys.bio.uci.edu/bennett/bennett.htm – Albert F. Bennet

http://oeb.indstate.edu/faculty/Angilletta.htm – Michael J. Angilletta Jr.

Cursos de Ecofisiologia na Internet

http://wildlife.wisc.edu/courses/401/ - University of Wisconsin – Madison

http://www.eeb.uconn.edu/courses/eeb296/ - University of Connecticut

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

http://bioweb.wku.edu/faculty/Crawford/526.html – Western Kentucky University

Informações gerais sobre lagartos

http://tolweb.org/tree?group=Diapsida&contgroup=Amniota – Tree of Life, com cladogramas e

discussões sobre filogenia de todos os grupos de seres vivos. Este link direciona para o grupo dos

diapsida.

http://www.ucmp.berkeley.edu/diapsids/diapsids.html – UCPM Berkeley, cladogramas e todo tipo

de informação biológica (incluindo fósseis) sobre a diversidade da vida, este link direciona para o

grupo dos diapsida

59

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

METABOLISMO ENERGÉTICO DA VOCALIZAÇÃO EM ANFÍBIOS ANUROS DO

GÊNERO SCINAX: “O CANTO DA PERERECA”

Adne Abbud Righi

A comunicação vocal em anfíbios anuros é de grande importância dado que torna possível o

reconhecimento entre indivíduos da mesma espécie, além de ter papel central na atração de fêmeas,

na competição entre machos e na defesa de territórios. A atividade vocal é um exercício realizado

através de contrações dos músculos do tronco, cujas características principais são retículo

sarcoplasmático bem desenvolvido, grande número de mitocôndrias por unidade de volume e alta

densidade de capilares sangüíneos nas espécies mais ativas, assim indicando a existência de uma

ampla demanda de oxigênio durante o exercício. De acordo com tais características, muitos

pesquisadores acreditam que a intensa atividade vocal em anfíbios anuros seja mantida

essencialmente pelo metabolismo aeróbio. Porém, outros autores sugerem que o uso localizado da

glicólise independente de oxigênio pode ter um papel importante na vocalização em espécies cuja

massa muscular envolvida é relativamente pequena. Dessa forma, tal estratégia levaria à rápida

síntese de ATP e lactato nas células destes tecidos, como resultado de um aumento repentino do

fluxo glicolítico.

Com base no exposto anteriormente, o intuito desta aula será fazer uma análise integrada a

respeito das modificações bioquímicas e fisiológicas associadas à manutenção da atividade vocal.

Para tal estudo será utilizado como modelo a espécie Scinax gr. perpusillus, que exibe diferentes

padrões e níveis de atividades.

Sugestões de Leitura:

Bennett, A.F. & Licht, P. (1973) Relative contributions of anaerobic and aerobic energy production

during activity in Amphibia. J. Comp. Physiol. 87:351-360.

Carvalho, J.E. (2004) Correlações entre as capacidades metabólicas energéticas, o ambiente térmico

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Instituto de Biociências da USP, São Paulo.

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61

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

CONSCIÊNCIA COMO EXPRESSÃO DO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Adriano Alonso

Pessoas de várias formações diferentes já abordaram o tema consciência, tais como psicólogos

e filósofos. O livro de Marcel e Bisiach (1992) é uma coletânea de artigos que têm algumas dessas

maneiras de se analisar o tema, assim como o volume 8 da revista Psicologia USP (1997).

Uma forma de se abordar seria aquela que trata da consciência como uma entidade mística, a

consciência seria parte da essência de ser humano, temos um corpo que é ligado a uma consciência.

Essa forma seria uma derivação do conceito de alma. Essa abordagem impossibilita um estudo

científico sobre a consciência, já que traz consigo explicações místicas, metafísicas ou teológicas.

Uma segunda abordagem costuma se perguntar sobre a experiência que temos no mundo,

tentam explicar o motivo que essa experiência é dessa forma e, portanto, está ligada aos sentidos.

Traz uma subjetividade que também não é bem-vinda, pois embora os seres humanos percebam o

mundo através dos mesmos sentidos, cada um possui uma experiência única do mundo em que

vivemos. O que eu sinto ao tomar um copo de vinho é influenciado por muitos fatores, pela minha

experiência com vinhos e pelas condições atmosféricas, só para citar 2 exemplos. Essa experiência,

quando vivida por outra pessoa, será diferente da experiência que tive, já que estou em outro corpo e

vivencio outras experiências.

Já uma terceira abordagem, mais recente, assume que consciência seria um fenômeno

biológico como qualquer outro e por isso possa ser estudada, podemos investigar sua função e seu

funcionamento, como fazemos com qualquer outro fenômeno biológico complexo (Gazzaniga,

2002). Para esses autores, a consciência seria fruto da evolução do sistema nervoso. Uma explicação

satisfatória sobre consciência deve conter explicações sobre a continuidade evolutiva. Assim como

deve refletir a organização do sistema nervoso, que é funcionalmente modular, ou seja, cada módulo

é responsável por uma função, como por exemplo, o córtex visual primário . Podemos observar

vários comportamentos que indicam que os vários módulos do sistema nervoso contribuem para uma

experiência única do mundo em que vivemos, como o fenômeno da “visão-às-cegas”, em que

pacientes com lesões no córtex estriado reagem a estímulos visuais embora, quando questionados,

dizem que não estão “vendo nada”. Ao mesmo tempo em que um objeto tem características de

diversas modalidades sensoriais como visuais e tácteis, por exemplo, e temos uma única sensação

desse objeto, os vários módulos do sistema nervoso também proporcionariam uma única experiência

consciente.

62

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

A consciência seria formada pelo funcionamento desses diversos módulos que processam

informações específicas e, portanto não está localizada em nenhum local específico do sistema

nervoso. Essa última forma de olhar para a consciência possibilita que ela seja estudada de forma

científica, explica vários comportamentos e não tem a necessidade ser de complementada por

nenhum outro tipo de explicação mística ou metafísica.

Bibliografia

Campos, A.; Santos, A.M.G. & Xavier, G.F. (1997). A consciência como fruto da evolução e do

funcionamento do sistema nervoso. Psicologia USP, São Paulo, v.8, n.2, p.181-226. Instituto

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Psicologia USP, São Paulo, v.8, n.2, p.181-226. Instituto de Psicologia - USP.

63

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

EXERCÍCIO FÍSICO, HIPERTENSÃO ARTERIAL E COMPORTAMENTOS:

INTERAÇÕES, EFEITOS E BENEFÍCIOS

Regiane Xavier de Moraes

Neste tópico será sucintamente abordado a relação do exercício físico com a hipertensão

arterial, além de atualidades e tendências em pesquisa na área da Fisiologia do Exercício e doenças

cardiovasculares. Além disso, será também elucidada a importância do treinamento físico na

alteração de características e hábitos comportamentais.

O sedentarismo pode contribuir para o aparecimento e/ou agravamento de doenças

cardiovasculares como a hipertensão arterial. De acordo com 3° Consenso Brasileiro de

Hipertensão (1998), 15 a 20% da população brasileira está acometida. Atualmente 90 a 95% dos

idosos são hipertensos.

Durante os últimos tempos, o exercício físico, bem como as suas implicações e conseqüências,

tem sido extensamente estudado por cientistas de todo o mundo. Usualmente, os exercícios,

aeróbicos e/ou de resistência, mais recomendados e utilizados são a caminhada e a corrida, a

natação, a musculação e o ciclismo. Em animais, as metodologias normalmente utilizadas são a

roda de corrida espontânea, além da corrida induzida em esteiras rolantes adaptadas e a natação

forçada. No entanto, rodas de corrida espontânea são os métodos de treinamento animal mais

indicados para o estudo de parâmetros fisiológicos por não causar estresse e injúria aos animais. As

pesquisas buscam compreender as ações do exercício no organismo, quais os mecanismos centrais e

periféricos que as norteiam e, principalmente, quais os benefícios que poucas horas de mudança na

rotina diária podem causar tanto para uma pessoa ou animal saudável como para os acometidos por

patologias.

A realização do exercício físico provoca uma série de respostas fisiológicas nos diversos

sistemas corporais, em particular no cardiovascular e nervoso. Objetivando manter a homeostasia

celular, diante do aumento das necessidades metabólicas, há incremento do débito cardíaco,

redistribuição do fluxo e aumento da perfusão sanguínea para a musculatura em atividade.

Sabe-se que exercícios físicos regulares, quando são adequadamente prescritos, e de baixa

intensidade podem provocar alterações autonômicas importantes que influenciam o sistema

cardiovascular. Dentre estas, a atenuação da hipertensão arterial tanto em humanos quanto em ratos

espontaneamente hipertensos (SHR). A atividade física contribui para a melhora do controle

64

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

barorreflexo e para a redução de 8 a 11 mmHg da pressão arterial sistólica e diastólica,

respectivamente, em indivíduos hipertensos (Hagberg et al., 2000). Estudos mostram que a

diminuição da pressão arterial deve-se à diminuição do débito cardíaco que está associado à

diminuição da frequência cardíaca pós exercício (bradicardia de repouso) (Véras-Silva et. al., 1997).

Entretanto, alguns autores propõem que exercícios crônicos provocam queda na resistência vascular

sistêmica e, consequentemente na redução da pressão arterial (Nelson et al.,1986). O treinamento

físico normaliza o tônus simpático, que controla a frequência cardíaca em SHRs (Gava et al.,1995)

e diminui a atividade nervosa simpática em humanos, ou seja, estes resultados sugerem que a

atividade física pode modular a atividade nervosa simpática para o coração e vasos periféricos,

explicando, em partes, a queda pressórica.

Modulações específicas da frequência cardíaca durante o exercício constituem um mecanismo

muito preciso de manutenção do suprimento do fluxo sanguíneo para o cérebro, coração, pele e

músculos em atividade.

Alguns neurotransmissores possuem importantes funções que garantem condições necessárias

para a realização da atividade física. Dentre estes estão a vasopressina (AVP) e a ocitocina (OT). A

AVP e a OT são produzidas em neurônios magnocelulares do Núcleo Paraventricular do

Hipotálamo (PVN) que envia e recebe projeções do Núcleo do Trato Solitário (NTS). O PVN e o

NTS são importantes centros de controle cardiovascular (Michelini e Morris, 1999).

A AVP facilita a resposta taquicárdica durante a atividade física. Contraditoriamente, a OT

diminui a taquicardia e contribui para a bradicardia. Desta forma, estes neurotransmissores possuem

efeitos específicos e opostos no controle da frequência cardíaca. Este balanço entre o estímulo

excitatório (AVP) e inibitório (OT) provê a eficiência do ajuste fisiológico requerido

momentaneamente, já que a taquicardia é necessária para suprir a maior demanda de fluxo

sanguíneo e a maior taxa metabólica da musculatura em atividade durante o exercício. Assim, no

NTS de indivíduos treinados, a AVP e OT atuam como moduladores da frequência cardíaca durante

a atividade física por potencializar ou moderar, respectivamente, a taquicardia (Michelini, 2001).

É importante enfatizar que as vias vasopressinérgicas e ocitocinérgicas do tronco encefálico

não são os únicos mecanismos centrais envolvidos na gênese da taquicardia. Assim, projeções

descendentes vasopressinérgicas e ocitocinérgicas do PVN para o NTS são parte do mecanismo

central de modulação do reflexo barorreceptor no controle da frequência cardíaca durante o

exercício e outras condições ambientais (Michelini, 2001).

Podem ser observadas ainda outras alterações cardiovasculares decorrentes do treinamento

físico tais como a hipertrofia cardíaca. Exercícios aeróbicos, por meio do aumento de volume

sanguíneo, podem estimular adaptações na morfologia cardíaca, metabolismo energético e funções.

65

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Estes podem produzir hipertrofia cardíaca excêntrica, na qual o aumento da massa ventricular é

proporcional ao aumento da câmara cardíaca (Frohlic et al., 1992). Trata-se de uma resposta

fisiológica e compensatória fundamental para suportar o aumento da carga de trabalho. Estas

alterações estruturais, morfo-funcionais e metabólicas do coração induzidas pelo exercício resultam

em maior volume de ejeção sistólica, que torna-se mais vigorosa, e maior esvaziamento ventricular.

Entretanto, a hipertrofia cardíaca pode se instalar em resposta a certos estados patológicos

crônicos como e hipertensão arterial. Na hipertrofia concêntrica o aumento da massa ventricular não

é proporcional ao aumento da câmara cardíaca. Desta forma o trabalho cardíaco é feito contra uma

excessiva resistência ao fluxo sanguíneo. O coração hipertrofiado pode falhar e tornar-se incapaz,

em casos mais graves, de prover o fluxo sanguíneo normal para o indivíduo hipertenso.

Vários são os fatores desencadeantes da hipertensão arterial. Dentre eles, o excesso de peso, a

alimentação rica em gordura e sal e pobre em frutas, verduras e legumes, o tabagismo, o alcoolismo

e os fatores genéticos. Outros fatores importantes são os relacionados aos comportamentos e à

capacidade de reação em diversas situações cotidianas. Assim, os comportamentos que atualmente

acometem quase a totalidade das pessoas entre crianças e adultos, como o estresse e a ansiedade,

podem desencadear ou acentuar o estado hipertensivo. A ansiedade, o estresse e a hiperatividade

são acentuadas características comportamentais de SHRs. Interessantemente, foi observado que

SHRs efetivamente treinados em rodas de corrida espontânea apresentam diminuição do

medo/ansiedade, estresse e hiperatividade (Moraes, R.X. in dissertação de mestrado, 2005).

Em suma, o exercício físico crônico de intensidade baixa a moderada possui implicações

clínicas importantes já que pode reduzir ou mesmo abolir a necessidade de uso de medicamentos

anti-hipertensivos, diminuindo, desta forma, o custo do tratamento, extinguindo efeitos colaterais e

principalmente promovendo melhora do quadro clínico de indivíduos hipertensos. Assim, pode ser

tido como uma importante conduta não farmacológica no tratamento e controle da hipertensão

arterial. Somam-se à estas descobertas o fato de que o treinamento físico colabora não só para a

manutenção e conquista da saúde cardiovascular, mas, também para a saúde mental, já que atua

beneficamente na redução de comportamentos maléficos e deletérios que prejudicam os sistemas

corporais e podem levar a graves patologias psicossomáticas. Finalmente, uma mudança na rotina

diária para o desenvolvimento da prática de esportes, além de ser prazeroso e desestressante,

colabora para a melhora na qualidade de vida bem como para a manutenção e ganho da saúde física

e mental de indivíduos hipertensos e saudáveis.

66

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

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67

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

SUBSTÂNCIAS DE ORGANISMOS MARINHOS QUE PODEM CAUSAR ACIDENTES E

INTOXICAÇÕES

Cynthia Grazielle Martins Delboni

Jeanete Lopes Naves

Em todos os níveis da escala filogenética animal, existem vários exemplos de ataque, defesa

e outros comportamentos que dependem de substâncias repelentes, paralisantes ou de outras ações

farmacológicas. Durante os milhões de anos de evolução os organismos desenvolveram um

refinamento dessas substâncias para diversas funções, a captura de presas e as defesas químicas em

geral. A produção e a alta diversidade de toxinas têm estimulado outros animais a desenvolver

técnicas de sobrevivência a estes compostos. Rápida excreção ou acúmulo destas substâncias em

compartimentos do corpo, tais como tecido de gordura ou cutícula estão entre os mecanismos

desenvolvidos para combater o efeito letal dos compostos.

Para o homem se envolver em acidentes ou intoxicações por qualquer substância produzida

por organismos vivos, é necessário que esta exerça alguma influência química em um ou mais

constituintes das suas células a fim de produzir uma resposta farmacológica. Em outras palavras, é

necessário que as moléculas dessas substâncias fiquem muito próximas das moléculas celulares para

que o funcionamento destas seja alterado.

Popularmente chamamos de veneno toda substância química, ou mistura de substâncias

químicas, que provoca intoxicação ou a morte com baixas doses, como também reservado, segundo

alguns autores, especificamente para designar substâncias provenientes de animais, nos quais teriam

importantes funções de autodefesa ou de predação, como é o caso de veneno de cobra, de abelha,

etc. Entretanto existe diferentes terminologia para as diferentes substâncias que podem causar

algum dano a um sistema biológico – veneno, peçonha, toxina.

Venenos (em inglês ‘poisons’) são produtos metabólicos produzidos ou estocados em órgãos

que, em condições naturais, afetam o organismo que os ingere e podem também atuar, de modo

artificial, por via parenteral. Animais venenosos produzem substâncias tóxicas em glândulas ou

tecidos, mas eles podem também adquirir compostos do ambiente, de outros animais, plantas ou

microrganismos. Eles os estocam ou acumulam em seu corpo ou em algum órgão particular e fazem

uso passivo destes compostos. Envenenamento geralmente é o resultado da ingestão do animal pelo

seu predador, tais como os humanos. Ex: dinoflagelado marinho Garbierdiscus toxicus e aqueles

que adquirem suas toxinas através da cadeia trófica.

68

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Peçonhas (em inglês ‘venoms’) são originadas em glândulas especializadas associadas a

dutos excretores e possuindo ou não, estruturas inoculadoras; a maioria dessas substâncias contém

proteínas que são facilmente inativadas pela digestão. Animais peçonhentos utilizam à peçonha para

aquisição de presas, que pode incluir uma pré-digestão, e como defesa contra predadores,

obviamente a mais importante função de interação com os humanos. Ex: Peixe escorpião e

cnidários.

Peçonhas e venenos são compostos que são deletérios para outro organismo em certa

dosagem, interferindo em importantes atividades fisiológicas de plantas, animais ou humanos,

causando envenenamento. Peçonhas e venenos raramente são substâncias puras, na maioria dos

casos representam misturas de numerosos compostos, que podem ser tóxicos ou ter outra atividade.

Peçonhas consistem principalmente de peptídeos ou proteínas. Venenos são geralmente produtos ou

metabólicos secundários produzidos por microrganismos, plantas ou animais.

Toxinas são sempre de origem natural, são substâncias quimicamente bem definidas, puras e

homogêneas.

Uso terapêutico

Para que uma droga seja de algum modo útil tanto como instrumento terapêutico quanto

cientifico, ela deve agir seletivamente em determinadas células e tecidos, ou seja, deve mostrar alto

grau de especificidade de ligação ao sítio.

Para isso são necessários muitos estudos, principalmente de químicos e biólogos. Muitas

vezes, no final, a pesquisa não leva a nenhum produto de interesse farmacológico. Diferente do que

ocorreu com o ácido okadaico que se tornou uma importante ferramenta de estudo de mecanismos

moleculares. Ele foi primeiro isolado de esponjas marinhas e depois reconhecido como um

constituinte da microalga Prorocentrum lima.

Toxicologia x toxinologia

A disciplina científica ligada à peçonhas, venenos e toxinas de plantas e animais é

denominada de toxinologia, e pode ser considerado um ramo da toxicologia. Entretanto, toxinologia

inclui mais do que química e modo de ação das toxinas. Explica também, a biologia da peçonha ou

veneno produzido pelo organismo, a estrutura e função do aparato de peçonha, o uso da peçonha ou

veneno, e papel ecológico deles.

Toxinas no ambiente marinho

69

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

A vida no mar tem sua complexidade e diversidade bem observada em recifes de corais

tropicais. Neste ambiente, organismos de todas as classes e ordens vivem juntos expostos a uma

enorme pressão de competição intra e inter-específica. Essa luta por espaço em ambientes

consolidados, defesa contra competidores de espaço e predadores, proteção contra infecção por

bactéria e fungos são através do uso de produtos tóxicos.

“Todas as substâncias são venenos; não há nenhuma que não seja veneno. A dose correta

diferencia o veneno do remédio.”

Referências bibliográficas

Freitas, J.C. (1991). Nomenclatural em toxinologia. Relações com a comunicação química entre

organismos e propriedades biológicas das toxinas. Mem Inst Butantan 53 (2), 191-195.

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Halstead, B.W., Auerbach, P.S., Campbell, D. (1990). A colour atlas of dangerous marine animals.

Wolf Medical Publications Ltd. 192 p.

Mebs, D. (2002). Venomous and Poisonous Animals: A Handbook for Biologists, Toxicologists

and Toxinologists, Physicians and Pharmacists. CRC Press. 360 p.

Scheuer, P.J. (1991). Drugs from the sea. Chemistry and Industry 8, 276-279.

Rang, H.P., Dale, M.M., Ritter, J.M.(1997). Farmacologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara

Koogan, 692 p.

Oga, S. (2003). Fundamentos de Toxicologia. 2ª ed. São Paulo: Atheneu Editora, 474 p.

70

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

RITMICIDADE BIOLÓGICA: CONCEITOS E APLICAÇÕES EM METABOLISMO

ENERGÉTICO

Denise Loli

INTRODUÇÃO

Os ritmos biológicos, que estão presentes em todos seres vivos, parecem ter-se originado

desde os primórdios da vida. A ritmicidade encontrada em animais e plantas não é apenas expressão

reflexa dos eventos temporais do meio externo, mas possui um caráter endógeno, sendo

determinado geneticamente (Cipolla-Neto et al 1988). Halberg apud Withrow (1959), introduziu o

termo circadiano (latim circa: em torno de; dies: dia), para caracterizar os ritmos com períodos em

torno de 24 horas, quando o organismo é mantido em condições constantes.

Os ritmos circadianos são gerados endogenamente por um oscilador ou relógio biológico e sua

expressão independe do ambiente. Um ritmo biológico pode persistir em condições constantes por

muitos dias ou mesmo anos. Endogenamente, estes osciladores permitem a um organismo

antecipar-se a eventos no ambiente, antes mesmo que eles aconteçam. (Dunlap et al., 2004). O ritmo

obtido em condições naturais (exemplo, fotoperíodo natural) é denominado diário.

CONCEITOS IMPORTANTES EM ESTUDOS DE RITMOS BIOLÓGICOS

As condições ambientais constantes constituem-se de um ambiente completamente livre de

oscilações de iluminação, temperatura, ruídos, umidade relativa, chegada de alimento e de outras

variáveis que possam ser percebidas pela espécie em estudo. Estas condições constantes são

denominadas "de livre-curso". A característica endógena de um ritmo só se expressa em condições

de livre-curso e o período assim medido é chamado de "período do ritmo em livre-curso",

representado pela letra grega T (tau) (Marques et al, 1997).

O tau é específico de cada espécie e varia, no entanto, dependendo das características das

condições constantes (exemplo: iluminação) (Aschoff, 1960). Diversas condições podem abolir a

expressão rítmica e são chamadas "não permissivas" (Pittendrigh, 1960). O mecanismo pelo qual a

expressão do ritmo é afetada é conhecido como "mascaramento" (Aschoff, 1960). Quando exposto

ao ciclo ambiental, o tau (T) do ritmo endógeno torna-se igual ao do ciclo e tem suas fases acertadas

por ele. A este processo deu-se o nome "arrastamento" (Pittendrigh, 1960) e ao ciclo ambiental

arrastador, Zeitgeber, neologismo alemão criado por Jurgen Aschoff, que significa "doador de

tempo" (Aschoff, 1960).

71

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Três propriedades importantes caracterizam um ritmo biológico: 1) a endogenicidade 2) a

possibilidade do ritmo endógeno ser arrastado por um Zeitgeber e 3) a compensação de T a

variações da temperatura ambiente (Almeida, 2004).

APLICAÇÕES EM METABOLISMO ENERGÉTICO

Os estudos relativos a variações diárias na taxa metabólica tem sido estudados em diversos

animais. Em seres humanos, por exemplo, Ravussin et al (1986) estudaram as variações diárias da

taxa metabólica em 177 indivíduos, considerando a massa de gordura do corpo, determinada por

densitometria, e a atividade física espontânea.

Diversos insetos foram estudados sob o ponto de vista do ritmo circadiano da taxa respiratória,

como por exemplo por Banks et al. (1975) que pesquisaram o ritmo circadiano da taxa respiratória

de duas espécies de baratas Blaberus, observando um ritmo circadiano endógeno. Estudos da

ritmicidade metabólica de insetos Tribolium confusum (Coleoptera) e Camponotus rufipes

(Hymenoptera, Formicidae) indicaram uma flutuação rítmica da taxa respiratória sob condições de

ciclo normal claro/escuro 12:12 para as duas espécies.

Proni et al (2004) investigaram a taxa respiratória de abelhas operárias isoladas de

Nannotrigona (Scaptotrigona) postica, em fotoperíodo invertido (dia=escuro / noite=claro) por um

período de 24 horas, mostrando um ritmo circadiano metabólico invertido que provavelmente indica

a existência de um ritmo exógeno que aparece como uma resposta imediata às mudanças no

ambiente. Em operárias isoladas de Tetragonisca e Trigona um padrão definido de ritmo

circadiano metabólico foi observado, apresentando um maior consumo de oxigênio durante o dia,

com um pico entre 10h e 15h. À noite o consumo diminuiu, alcançando os níveis mínimos entre 2h

e 3h (Proni & Macieira, 2004).

AULA PRÁTICA

OBJETIVOS:

Demonstração de metodologias para coleta e análise de dados, em abelhas sem ferrão

Melipona quadrifasciata (mandaçaia), de variações diárias de taxa metabólica e termorregulação

individual e colonial. Discutir sobre as possibilidades de análises de dados de séries temporais

MATERIAIS E MÉTODOS

72

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Para cálculo de taxa metabólica, é utilizado sistema de respirometria, podendo-se utilizar a

colônia inteira e/ou operárias isoladas.

Para estudos de termorregulação individual, utiliza-se termômetro infravermelho (medição

de temperatura torácica), em temperatura ambiente constante. Para a termorregulação colonial,

utilizam-se sensores ligados a carregadores de dados de temperatura (Hobo e Stoway), em

diferentes regiões da colônia de abelhas. Pode-se utilizar a colônia aberta (forrageiras saem da

colônia) ou colônia fechada em condições constantes de iluminação e temperatura.

BIBLIOGRAFIA

Cipolla-Neto, J.; N. Marques &, L.S. Menna-Barreto. 1988. Introdução ao estudo da

cronobiologia. São Paulo, Icone Edusp.

Withrow, R.B. 1959. Photoperiodism and Related Phenomena in Plants and Animals.

Washington, American Association for the Advancement of Science.

Dunlap, J. C.; Loros, J. J.; DeCoursey, P.J. (2004) Chronobiology: biological timekeeping.

Massachusetts: Sinauer.

Marques, M. D.; Golombek, D.; Moreno, C. Adaptação Temporal. In: Marques, N. &

Menna-Barreto, L. (1997) Cronobiologia: princípios e aplicações. EDUSP, São Paulo.

Aschoff, J. (1960) Exogenous and endogenous components in circadian rhythms. Cold Sping

Harbor Symp. Quant. Biol. 25: 11-28.

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Spring Harbor Symposium on Quantitative Biology 25: 159-84.

Almeida, G.F. (2004) Estudo de componentes rítmicos detectados na colônia de

Frieseomelitta varia (Hymenoptera: Apidae: Meliponinae). Dissert de Mestrado, FFCLRP-USP.

Ravussin, E.; Lillioja, S.; Anderson, T et al. (1986) Determinants of 24-hour energy

expenditure in man. J Clin Invest 78: 1568-78.

Banks, W.M.; A.S. Bruce. & H.T. Peart. 1975. The effects of temperature, sex and circadian

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Physiology, Great Britain, 52 (A): 223-227.

Proni, E.A.; Macieira, O.J.D.; Morias, A.A.; Tristão, F.S.M. (2004) Circadian rhythm of the

respiratory rate of workers of Nannotrigona (Scaptotrigona) postica (Hymenoptera: Apidae:

Meliponinae) in inverted photoperiodic conditions during springtime. Proceedings of VI Encontro

sobre abelhas, Ribeirão Preto.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Proni, E. & Macieira, OJ.D. (2004) Ritmo circadiano da taxa respiratória de Tetragonisca

angustula fiebrigi (Schwarz), T. a. angustula (Latreille) e Trigona spinipes (Fabricius)

(Hymenoptera, Apidae, Meliponinae). Rev. Bras. Zool.21(4).

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

RITMOS CIRCADIANOS E FUNÇÕES DE APRENDIZAGEM E MEMÓRIA

Luiz Fernando Lopes do Espírito Santo

Os sistemas biológicos que evoluíram na Terra estiveram, desde a sua origem, expostos a

variações cíclicas do ambiente. Após o aparecimento de sistemas capazes de lidar com essas

oscilações ambientais, a seleção natural levou à manutenção desses sistemas.

São evidentes as vantagens adaptativas proporcionadas por sistemas que controlam ritmos

biológicos.. Num ambiente cujo funcionamento é cíclico, é possível prever a natureza das alterações

ambientais que ocorrerão. Organismos equipados com sistemas de temporização podem antecipar

essa ocorrência e iniciar os ajustes fisiológicos necessários para lidar com essa alteração ambiental

antes mesmo que ela ocorra. Vantagens adaptativas desse tipo levaram à seleção dos sistemas

controladores de ritmos biológicos e sua importância é ressaltada pelo fato de eles estarem presentes

em praticamente todos os grupos de animais.

Nos últimos anos se intensificou o interesse por identificar o papel de ritmos circadianos em

processos de aprendizagem e memória. Em mamíferos uma das estruturas responsáveis pelo

controle da ritmicidade circadiana é o conjunto formado pelos núcleos supraquiasmáticos (NSQ),

considerados os principais relógios (ou osciladores) circadianos. Nesse circuitaria neural os tratos

retino-hipotalâmicos transmitem informação temporal do ambiente externo, especificamente

informações sobre os ciclos claro-escuro (CE), de tal forma a permitir a sincronização da

ritmicidade endógena dos NSQ à ciclicidade ambiental. O sistema circadiano possui ainda diversas

vias eferentes, tanto neurais como humorais, que transmitem a informação sobre o tempo, gerada

nos NSQ e sincronizada ao meio externo, para o restante do organismo.

Aprendizagem e memória, envolvem diferentes estruturas do sistema nervoso. Definimos

aprendizagem como os processos subjacentes que levam à mudança de comportamento em

função de uma experiência prévia. Uma forma interessante de ilustrar a complexidade da

interação entre aprendizagem, memória e processos temporais é lembrar que o própio sistema

circadiano é capaz de "aprender" uma resposta. Em outras palavras, o funcionamento do sistema

circadiano pode ser modulado através de processos de aprendizagem e memória.

Do ponto de vista da circuitaria neural, as estruturas relacionadas com a temporização

circadiana e as estruturas envolvidas em processos de aprendizagem e memória mantém intimas

conexões, sugerindo que processos de aprendizagem e memória também são modulados pelo

funcionamento do sistema circadiano.

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

A maioria dos trabalhos que tentam investigar este assunto procura avaliar a eficiência da

aquisição e arquivamento de informação em função da hora do dia. Os resultados são ainda

escassos e inconsistentes. A aprendizagem do tipo espaço-temporal é particularmente sensível à

influência do sistema circadiano. Neste tipo de aprendizagem o organismo não raro estabelece uma

associação entre um evento biologicamente significante (e.g., disponibilidade de alimento) e uma

localização espacial em determinada hora do dia. Estes estudos podem resultar numa melhor

compreensão sobre a interação entre os sistemas de memória e o sistema circadiano na produção do

comportamento adaptativo.

APRENDIZAGEM ESPAÇO-TEMPORAL

Nos últimos anos diversos estudos têm utilizado animais em tarefas de aprendizagem

espaço-temporal para determinar sua capacidade de estabelecer associações entre a

disponibilidade de alimento num local determinado e numa determinada hora do dia. Vários

experimentos demonstraram que animais manifestam um bom desempenho numa tarefa de

aprendizagem com desafios espaço-temporais. O que é preciso ser demonstrado é que esta

estratégia se baseia em mecanismos de temporização circadianos, e conseqüentemente a

participação dos núcleos supraquiasmáticos nestes processos.

Eventos biologicamente significantes acontecem nas dimensões espacial e temporal.

Também o sistema cognitivo de vertebrados muito provavelmente evoluiu de tal forma a permitir a

percepção das regularidades espaço-temporais significantes, e usar essa informação para organizar

suas atividades eficientemente. De fato, diversos vertebrados aproveitam fontes de alimentos que

manifestam padrões de disponibilidade espaço-temporais. Estudos de campo têm mostrado que

alguns predadores ajustam seu horário de caça ao pico de atividade de sua pressa predileta

(Rijnsdorp et al., 1981). Por exemplo, caçadores de ostras antecipam os ritmos da maré associados à

disponibilidade de moluscos (Daan & Koene, 1981). Porém, nesses estudos não se demonstrou

inequivocamente que os animais estabelecem uma associação espaço-temporal, ou se simplesmente

respondem aos estímulos ambientais.

É provável que mamíferos possam fazer uso de múltiplas estratégias (além da mensuração

circadiana) para desempenhar tarefas de tipo espaço-temporal e que o uso de uma ou outra

estratégia pode variar em função das condições experimentais. Possivelmente, em determinadas

situações, mamíferos utilizam uma combinação de duas ou mais estratégias simultaneamente para

lidar com as demandas ambientais (Carr et al., 1999b).

76

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Carr J.A.R., Wilkie D.M. (1999) Rats are reluctant to use circadian timing in a daily time-place

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77

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

FISIOLOGIA DO SISTEMA RESPIRATÓRIO EM AMBIENTES AQUÁTICOS

Renato Massaaki Honji

Quando nos referimos aos habitantes encontrados no ambiente aquático, lembramos

rapidamente dos teleósteos (peixes ósseos), que são o mais numeroso e diverso grupo de

vertebrados. Os peixes representam aproximadamente 50% dos vertebrados, englobando cerca de

28.000 espécies viventes que ocupam ambientes aquáticos mais diversos, ocorrendo desde as altas

latitudes até as fossas submarinas dos oceanos. Essa diversidade de espécies viventes também

apresenta uma grande variedade morfológica, fisiológica e adaptações comportamentais dentre

outras características. Levando-se em consideração apenas à fisiologia da respiração em peixes,

podemos encontrar os seguintes tipos de respiração: branquial, aérea (facultativa e obrigatória) e

pulmonar.

A maioria das espécies de peixes apresenta respiração branquial. As brânquias são geralmente

ventiladas com um fluxo unidirecional de água, no qual a simples abertura da boca e do opérculo,

adicionado ao deslocamento do animal na água, faz com que haja um fluxo em uma única direção

(peixes migradores como os atuns, albacora entre outros). A grande maioria dos peixes apresenta

musculatura esquelética na cavidade bucal e opercular, que mantém o bombeamento ativo da água

nas brânquias, mantendo assim um suplemento regular de O2. As brânquias dos peixes consistem

geralmente de quatro arcos branquiais e desses arcos estendem-se duas fileiras de filamento

branquiais, dos quais, cada filamento possui várias lamelas que são estruturas achatadas e

densamente enfileiradas onde ocorrem as trocas gasosas. Conforme a água flui entre essas lamelas

em uma direção, o fluxo sanguíneo flui em direção oposta, esse tipo de fluxo é denominado

contracorrente. Desta forma, quando o sangue está saindo das lamelas, o mesmo encontra a água

cujo oxigênio ainda não foi removido e conforme a água passa entre as lamelas, ela encontra o

sangue com uma pressão de oxigênio sempre abaixo e, portanto continua liberando mais oxigênio.

Desta forma depois de passar pelas brânquias, a água pode ter perdido mais ou menos 80 a 90% de

seu conteúdo de oxigênio.

Além das brânquias, muitas espécies de peixes apresentam estruturas capazes de realizar

trocas gasosas como, por exemplo: vesícula gasosa, intestino, estômago, esôfago entre outras

estruturas. Esses animais são chamados de peixes com respiração aérea.

A maioria das espécies de peixes com respiração aérea habita ambientes aquáticos no qual, em

algum período do dia ou estação, a concentração de oxigênio é muito baixa ou em ambientes

hipóxicos, ou seja, são locais no qual o nível de oxigênio é reduzido. Esses peixes responderão à

diminuição da concentração de oxigênio na água, nadando até a superfície para sorver uma bolha de

78

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

ar pela boca, o que resulta num melhoramento no suprimento de oxigênio. A respiração aérea pode

ser facultativa ou obrigatória, ou seja, se o ambiente não estiver hipóxico, o animal consegue retirar

da água toda quantidade de oxigênio necessária para a sua manutenção, apenas bombeando a água

através das brânquias. Quando o ambiente estiver hipóxico, essas espécies retiram uma parte do

oxigênio necessário para a sua manutenção da atmosfera (respiração aérea facultativa). Os rios da

Amazônia são um bom exemplo de ambiente aquático, no qual se observa uma variação de

concentração de oxigênio durante a estação de seca, sendo que muitos Siluriformes apresentam esse

tipo de respiração aérea facultativa. Os peixes com respiração aérea obrigatória são aquelas espécies

que necessitam subir até a superfície para respirar ar atmosférico, no qual sorvem uma bolha de ar e

o oxigênio é absorvido através das estruturas relacionadas acima. Quem disse que peixe não morre

afogado!!! Neste caso se o peixe com respiração aérea obrigatória for impedido de subir até a

superfície, ele morre afogado sim.

Existem apenas três espécies de peixes com respiração pulmonar, uma espécie australiana

(Neoceratodus), outra espécie africana (Protopterus) e uma sul-americana (Lepidosiren).

Protopterus e Lepidosiren vivem em águas paradas e em lagos, quando a falta de chuvas pode

ocasionar o ressecamento total do seu habitat. Essas espécies estivam até a próxima estação

chuvosa, quando elas saem dos seus casulos que estavam enterrados na lama. A espécie australiana

habita rios e corpos de água lênticos, no qual, também estivam em períodos de seca.

Os animais endotérmicos como, por exemplo, as aves e mamíferos que possuem uma elevada

taxa metabólica, necessitam de um maior suprimento de oxigênio se comparados com os animais

ectotérmicos (peixes, anfíbios e répteis). Conforme avançamos na escala filogenética em direção a

esses animais endotérmicos, observa-se que os pulmões tornam-se cada vez mais complexos. Os

pulmões de mamíferos são amplamente subdivididos em sacos denominados alvéolos que

aumentam enormemente a área de superfície disponível para as trocas gasosas. Essa enorme área de

troca é essencial para a alta taxa de transferência de oxigênio necessária para manter essa elevada

taxa metabólica que esses animais endotérmicos apresentam. Em geral os pulmões servem

principalmente para a respiração aérea e as brânquias para a respiração aquática, é claro que existem

exceções. Apesar do ar atmosférico conter mais oxigênio, as brânquias são em geral inadequadas

para a respiração aérea, pois na água o peso das brânquias é facilmente sustentado e no ar, as

mesmas não conseguem sustentar o seu próprio peso. Por isso que os peixes morrem se

permanecerem por muito tempo fora da água (asfixia).

A renovação de ar nos pulmões dos mamíferos deve ser constante, devido a grande taxa

metabólica. A ventilação nos pulmões é do tipo bidirecional, no qual o ar entra e sai do sistema

respiratório por bombeamento ativo. É importante salientar que o sistema respiratório nas aves é

mais complexo se comparado com os mamíferos.

79

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Neste contexto, como os organismos com respiração pulmonar conseguem permanecer

submersos sem o acesso ao oxigênio atmosférico durante o mergulho? Algumas espécies de aves,

mamíferos e répteis marinhos e outras dulciaquícolas, permanecem grande parte de seu ciclo diário

submersos, sem acesso ao oxigênio atmosférico. Esses animais apresentam ajustes fisiológicos

cardiovasculares e respiratórios associados durante o período de mergulho. Normalmente essas

espécies permanecem durante o mergulho voluntário, em torno de 10 a 20 minutos, no entanto

existem alguns casos extremos como a foca Weddell que é capaz de permanecer submersa por

períodos de até 70 minutos. Os ajustes fisiológicos ao mergulho apresentado por esses animais,

evidenciando a integração dos sistemas cardiovasculares e respiratórios será discutido durante a

apresentação.

Referências Bibliográficas Recomendadas:

Butler, P. J. 2001. Diving beyond the limits. NewPhysiol. Sci. 16: 222-227.

Graham, J. B. 1997. Air-Breathing Fishes. Evolution, Diversity and Adaptation. Academic

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Withers, P. C. 1992. Comparative Animal Physiology. Fort Worth. Saunders Publ. 949p.

80

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

ANEXO

Relação de ministrantes e laboratórios

Renata Brandt Nunes: [email protected]

Adne Abbud Righi: [email protected]

Pedro Leite Ribeiro: [email protected]

•Laboratório de Ecofisiologia Teórica e Fisiologia Evolutiva - Prof. Dr. Carlos Arturo Navas

Iannini Tel: (11)3091-7609

Jessica Ruivo Maximino: [email protected]

Regiane Xavier de Moraes: [email protected]

Emerson Ferraz Coelho: [email protected]

Daniel Carneiro Carrettiero: [email protected]

Andreas Betz: [email protected]

•Laboratório de Neurotransmissão e Modulação Neural da Pressão Arterial - Profa. Dra. Débora

Rejane Fior Chadi

Tel: (11)3091-7608

Profa. Dra. Lucile Maria Floeter-Winter: [email protected]

Marcos Gonzaga dos Santos: [email protected]

Maria Fernanda Laranjeira da Silva: [email protected]

Ariel Mariano Silber: [email protected]

•Laboratório de Fisiologia de Tripanosomatídeos - Profa. Dra. Lucile Maria Floeter-Winter

Tel: (11)3091-7503

Adriano Alonso Pereira da Cunha: [email protected]

Rodrigo Pavão: [email protected]

Luiz Fernando Lopes do Espírito Santo: [email protected]

Sylvia Maria Matsuda: [email protected]

•Laboratório de Neurociências e Comportamento – Prof. Dr. Gilberto Fernando Xavier

Tel: (11)3091-7504

81

2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Eduardo Koji Tamura: [email protected]

Pedro Augusto Carlos Magno Fernandes: [email protected]

Cíntia Etsuko Yamashita: [email protected]

Lidiana Duarte de Almeida Paula: [email protected]

•Laboratório de Cronofarmacologia - Profa. Dra. Regina Pekelmann Markus

Tel: (11)3091-7612

James Fernando Malta da Silva: [email protected]

•Laboratório de Osmo-regulação e Transporte Transmembrânico - Prof. Dr. Luis Carlos Salomão

Tel: (11)3091-7518

Profa. Dra. Maria Aparecida Visconti: [email protected]

Roseli Barbosa: [email protected]

Ana Paula Canel Bluhm: [email protected]

Gláucia Jansen Da Re Lopes: [email protected]

Leonardo Henrique Ribeiro Graciani de Lima: [email protected]

Fernanda Pizão Farhat: [email protected]

•Laboratório de Fisiologia Comparativa da Pigmentação – Profa. Dra. Maria Aparecida Visconti e

Prof. Dra. Ana Maria de Lauro Castrucci

Tel: (11)3091-7610

Denise Loli: [email protected] / [email protected]

•Laboratório de Fisiologia Respiratória Comparativa e Metabolismo Energético – Prof. Dr. José

Eduardo Pereira Wilken Bicudo

Tel: (11)3091-7607

Breno Teixeira Santos: [email protected]

•Laboratório de Fisiologia Teórica – Prof. Dr. José Guilherme Chaui Berlinck

Tel: (11)3091-7479

Cynthia Grazielle Martins Delboni: [email protected]

•Laboratório de Biologia Celular de Invertebrados Marinhos – Prof. Dr. Márcio Reis

Custódio

Tel: (11)3091-7611

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2o curso de inverno – tópicos em fisiologia comparativa

Jeanete Lopes Naves: [email protected]

André Junqueira Zaharenko: [email protected]

•Laboratório de Toxicologia e Produtos Naturais - Prof. Dr. José Carlos de Freitas

Tel: (11)3091-7522

Renato Massaaki Honji: [email protected] / [email protected]

•Laboratório de Fisiologia Respiratória e Metabolismo Energético – Profa. Dra. Silvia Cristina

Ribeiro de Souza

Tel: (11)3091-7479

Laboratório de Metabolismo e Reprodução de Peixes do Núcleo de Ciências Ambientais da

Universidade de Mogi das Cruzes – Profa. Dra. Renata Guimarães Moreira

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