advocatus, 51

48
30 JOÃO VIEIRA DE ALMEIDA, MANAGING PARTNER DA VdA SOCIEDADES NÃO SÃO CENTRO DE LOBBY 10 MANUEL BARROCAS ARBITRAGEM 12 FILIPA SIMÕES ADVOGADA DA AMI Diretor: João Teives | Diretor Editorial: Hermínio Santos | Mensal | Ano V | N.º 51 | junho de 2014 | 15 euros 5 601073 210256 00051 Resolução de litígios com empresas chinesas www.advocatus.pt O agregador da advocacia Advogada de uma causa

Upload: news-engage

Post on 01-Apr-2016

233 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

advocatus, 51

TRANSCRIPT

Page 1: advocatus, 51

30JOÃO VIEIRA DE ALMEIDA, MANAGING PARTNER DA VdA

SOCIEDADES NÃO SÃO CENTRO DE LOBBY

10MANUEL BARROCASARBITRAGEM

12FILIPA SIMÕESADVOGADA DA AMI

Dire

tor:

Joã

o Te

ives

|

Dire

tor

Edit

oria

l: He

rmín

io S

anto

s |

Men

sal

| A

no V

|

N.º 5

1 |

jun

ho d

e 20

14 |

15

eur

os

ADVOCATUS  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00046

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00047

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00048

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00049

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00050

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00051

5 6 0 1 0 7 3 2 1 0 2 5 6

00052

Resolução de litígios com empresas chinesas

www.advocatus.pt O agregador da advocacia

Advogada de uma causa

Page 2: advocatus, 51

C

M

Y

CM

MY

CY

CMY

K

Page 3: advocatus, 51

3 advocatus junho 2014

PUBLISHER

Edifício Lisboa OrienteAv. Infante D. Henrique, 333 H | 37

1800-282 LisboaT. 218 504 060 | F. 210 435 935

DiretorA-geralMaria Luís

T. 961 571 [email protected]

DIRETORJoão Teives

[email protected]

DIRETOR EDITORIALHermínio [email protected]

EDITORA ExECUTIVAFátima de Sousa [email protected]

GESTOR COMERCIALJoão Pereira

T. 960 427 [email protected]

EDITOR FOTOGRÁFICORamon de Melo

www. ramondemelo.com

DISTRIBUIçÃO POR ASSINATURAPreço: 85€ (12 edições)[email protected]

TirAgEM MéDiA MENSAl: 2.500 ex.DEpóSiTO lEgAl: 21725

N.º rEgiSTO ErC: 113427

IMPRESSÃOTYPIA - Grupo MonterreinaÁrea Empresarial Andalucia

28320 Pinto Madrid - España

João de Macedo Vitorino, sócio fundador da Macedo Vitorino & Associados, é um crítico do modelo de organização da profissão de advogado em Portugal. Diz que a Ordem é do Estado Novo e afirma que já há várias eleições que “não temos bastonários com algum mérito que se lhes possa reconhecer”. Fala ainda sobre os desafios da socieda-de da qual é sócio, afirmando que existe “um enviesamento do mercado na contratação pública”.

www.advocatus.pt O agregador da advocacia

18DOSSIÊ

REFORMA DO IRS 27TELEVISÃO

DIREITO DA AVIAÇÃO22

VISTOS GOLD

INVESTIMENTO pOSITIVO 36

OPINIÃO

pROTEÇÃO DE DADOS

38JET ADVOCATUS

O ENCONTRO DA ASAp

Três artigos de opinião sobre o tema.

António Moura Portugal, da ABBC, no Direito a Falar.

João Caiado Guerreiro fala sobre o papel dos vistos gold na dina-mização do investimento chinês em Portugal.

Artigo de Marco Alexandre Saias, advogado associado da PRA & Associados.

Imagens de um encontro que debateu produtividade e capital intelectual.

06R. IPSUM LOREIUM

ENTREVISTA

“A ORDEM DOS ADVOGADOS É UMA INSTITUIÇÃO DEMAGÓGICA”

Page 4: advocatus, 51

advocatus.pt

4 advocatus junho 2014

Cortar a Direito

HAl 9000

The impossible ExileLIVRO

toma as decisões ou que pratica atos de forma automatizada.E julgo que é para este tipo de sistemas que estão pensadas as várias normas do projeto do novo Código de Procedi-mento Administrativo (cfr. entre outros artigos 14º, 61º, 62º). As preocupações que norteiam tais normas são a pro-moção da eficiência e a transparência administrativas e a proximidade com os interessados, devendo os meios eletrónicos utilizados devem garantir a disponibilidade, o acesso, a integri-dade, a autenticidade, a confidencia-lidade, a conservação e a segurança da informação. Mas esta realidade está a uma grande distância do que tem vindo a ser imple-mentado pela Administração Tributária. Uma Administração com procedimen-tos crescentemente automatizados e com intervenção humana decrescen-te. Uma máquina poderosa e temível. Pode dizer-se, e concordo em absoluto, que a computação é imprescindível no combate à fraude fiscal e na crescen-te eficiência da Administração Fiscal. Mas há um reverso da medalha que é ausência de uma regulamentação cla-ra dos procedimentos automatizados previamente programados pela AT sem

De acordo com o Jornal Expresso, em notícia publicada a 20 de junho, “desde Janeiro de 2013 a Maio pas-sado, a administração tributária gas-tou 29.730.747, 26 euros em software, serviços e derivados”. Tudo por ajuste direto, num total de 267 contratos pes-quisáveis no portal base.Pondo de lado a questão, mais do que discutível, da forma da contratação – ainda que não de um ponto de vista legal, visto existir autorização orçamen-tal nesse sentido - sempre se dirá que os números impressionam. E impres-sionam por corresponderem a uma alteração radical, ao longo da última década, da forma de funcionamento da Administração Tributária. Podemos dizer que a utilização de pla-taformas eletrónicas tornou-se trans-versal a quase toda a Administração. Se pensarmos na Justiça, e assim de cor, temos o CITIUS, SITAV, predial on line, portal da empresa, portal do cidadão etc.Todos estes sistemas têm em comum o facto de o utilizador, seja o Julgador, o Advogado, o Ministério Público, o funcionário, o notário, conservador ou o próprio particular, poder interagir com o sistema mas não é o sistema que

O novo projeto do CPA é claramente anacrónico ao ser totalmente omisso quanto à prática de atos no procedimento administrativo de forma automatizada, previamente programada informaticamente pela Administração.

JOãO TEiVESDirETOr

que haja intervenção humana. Veja-se, a título exemplo, a SIPA no auxílio à penhora. A regulamentação refere que teria de existir confirmação humana na prolação de uma notificação eletróni-ca de penhora mas percebe-se bem que, na prática, não é isso que sucede. Quanto a este aspeto é absolutamente esclarecedor o Acórdão do TCA de 13-03-2014, quando refere que são atos administrativos em matéria tri-butária “não só os atos diretamente introduzidos no Sistema Informático de Penhoras Automáticas por von-tade humana proveniente de alguém dotado das necessárias competên-cias funcionais como também aqueles que são produzidos automaticamente pelo sistema com base em programa-ção informática, na medida em que a sua automaticidade resulta de um programa informático com objetivos precisos e delineados previamente pelo programador, o mesmo é dizer, pela Administração Fiscal. Daí que devem ser considerados também atos ad-ministrativos em matéria tributária”. Até aqui nada a apontar, o problema é quando, como no caso aí relatado, existem atos com eficácia externa pra-ticados pelo sistema informático que

A memória por vezes atraiçoa e já não me recordo se o meu primeiro contacto com Stefan Zweig foi direto, com a sua novela “Vinte e quatro horas na vida de uma mulher”, ou foi intermediado por Max Ophüls e o seu “Letter from na unknown women” (1948), com a inolvidável Joan Fontaine, a mesma de “Rebbeca” e “Suspi-

cion”, de Hitchcock ou “Beyond a reasonable doubt”, de Lang. Recen-temente a ele voltei com a leitura do seu último livro, escrito no seu exilio em Petrópolis, perto do Rio de Ja-neiro, “Novela de xadrez”. Tal como Ophüls, ou Lang, também Zweig, não pactuando com o nacional-so-cialismo, exilou-se. Em 1934 vai para Londres e, depois, com receio de ser

considerado um “enemy alien”, no Brasil onde acaba, profundamente deprimido, por se suicidar. É preci-samente esta perspetiva, de exílio e de fim de mundo, a base da biografia que George Prochnik acaba de edi-tar sobre o autor: ”The impossible exile: Stefan Zweig at the the end of the world”, uma edição de other press (2014).

o julgador desvaloriza como erro. Esta automatização do sistema, com prática de actos previamente programados informaticamente pela Administra-ção, é uma realidade inelutável e certamente terá uma crescente im-portância no futuro. Se assim é, tal realidade tem de ser fortemente regulamentada, para não cairmos num vazio, em que a Admi-nistração decide se um ato praticado pelo sistema tem relevância ou não, consoante o efeito prático do mesmo. Neste aspeto, podemos dizer que o novo projeto do CPA é claramen-te anacrónico ao ser totalmente omisso quanto à prática de atos no procedimento administrativo de forma automatizada, previamente programada informaticamente pela Administração. Urge fixar os limites quanto à utilização desses meios, o acesso dos administrados à infor-mação quanto à forma como estão programados os procedimentos, pos-sibilitando, assim, uma real e eficaz responsabilização da Administração pelos atos assim praticados sob pena de, termos um HAL 9000, descontrola-do, a controlar e destruir impunemente as nossas vidas.

Page 5: advocatus, 51

VEJA COM OS SEUS PRÓPRIOS OLHOSNós deslocamo-nos ao seu escritório.

Para agendar uma demonstração sem qualquer compromisso contacte-nos:

www.jusnet.pt • [email protected] • Tel: 308 804 615

EXTRATODINÂMICO

Como saber se é revelante sem ter queler todos os documentos?

JusNet permite-lhe visualizar rapidamen-te os fragmentos de resultados encontra-dos, podendo ler os parágrafos mais rele-vantes, valorar os documentos sem necessi-dade de aceder ao texto e navegar até àparte do documento do seu interesse.

SUGESTÃO DECONSULTAS

Que termo pesquisar para conseguir osresultados pretendidos?

JusNet sugere-lhe opções para formulara sua consulta, precisas e de elevada qua-lidade.

ÁREAPESSOAL

Como personalizar a base de dados à me-dida das suas próprias necessidades?

JusNet é personalizável a cada utilizador:pode guardar as pesquisas e documentosmais utilizados, registar e guardar notas pes-soais e receber notificações sempre que sur-gem alterações ou novidades sobre os temasmarcados como favoritos.

E ALÉMDISSO…

• JusNet orienta a sugestão da pesquisa quandoexiste um lapso ortográfico (quis dizer…?).

• JusNet ordena os resultados por relevância oudata.

• JusNet permite guardar os documentos no seucomputador e imprimir em formato PDF, Word,HTML, com ou sem notas.

Surpreenda-se com a sua eficáciae fiabilidade JusNet

EXPANSÃOSEMÂNTICA

Como encontrar o que precisa sem terque fazer várias pesquisas?

AA expansão semântica de JusNet localiza,para além dos documentos que incluam aspalavras escritas na pesquisa, documentoscom sinónimos, expressões compostas, ex-pressões latinas, conceitos jurídicos, palavrasestrangeiras ou acrónimos.

Page 6: advocatus, 51

6 advocatus junho 2014

Entrevista

Há interesses e entropias na contratação pública e das grandes empresas. João de Macedo Vitorino não tem dúvidas disso. E a prova encontra-a nas escassas vezes em que a sociedade que fundou há 18 anos com o irmão António é consultada, nomeadamente em matérias em que tem track record, como as energias. Em entrevista, acusa a Ordem de ter trocado a democracia pela demagogia e desmonta os argumentos dos que rejeitam a entrada de sócios de capital nas sociedades de advogados.

João de Macedo Vitorino, Sócio fundador da Macedo Vitorino & Associados

Há um enviesamento do mercado na contratação pública

Page 7: advocatus, 51

7 advocatus junho 2014

Fátima de Sousa, jornalista,[email protected]

Advocatus | Numa sociedade de ad-vogados, 18 anos é a maioridade?João de Macedo Vitorino |O tem-po, numa sociedade de advogados, é muito importante. Ensina e permite a acumulação de experiência. Permite--nos ir fazendo mais coisas. O nosso projeto começou por ser fazer uma coisa de cada vez, por não fugirmos muito daquilo que sabemos fazer, por não arriscarmos em campos sem ter-mos uma base de saber. E, ao fim de 18 anos, já há várias coisas que sabemos fazer, não sabemos fazer todas, mas já sabemos o suficiente para podermos falar em maioridade.

Advocatus | Qual era a vossa ambi-ção quando fundaram a sociedade?JMV | É a mesma de hoje. É a de con-seguirmos fazer uma advocacia essen-cialmente de negócios, com uma com-ponente internacional que se meça por um padrão internacional e que tenha como resultado uma boa satisfação de cliente e uma boa remuneração para nós. A remuneração não é só o inte-resse financeiro, é uma valorização do tempo. O tempo é o nosso bem mais precioso e, quando estamos a exercer advocacia, devemos usar o tempo da forma mais rentável possível.

Advocatus | Mas há 18 anos o con-texto da advocacia era certamente outro…JMV | O que é diferente é a forma de atingir esse objetivo. Há muitas dife-renças e a primeira tem a ver com a profissionalização das sociedades de advogados. Quando começámos, as sociedades viviam num enquadramen-to muito mais pacífico e muito menos exigente do ponto de vista da organi-zação empresarial. O que foi uma das coisas que nos permitiu aceder a este mercado. Hoje, seria mais difícil… Só para lhe dar um exemplo: naquela altura, termos um router era uma coisa extraordinária, mas nós já tínhamos uma visão muito tecnológica. Somos um bocadinho geeks no que se refere ao lado tecnológico da advocacia, mas na altura ter um site ou ter endereços de email pessoais era ser rei em terra de cegos… Hoje em dia, a profissionalização levou a uma necessidade de investimento de capital, não basta o recurso humano.

Advocatus | É por isso que diz que hoje seria mais difícil?JMV | O que eu digo é que, com a nos-sa visão, certamente seria mais difícil. Logo no início, reparámos que o nos-so mercado era muito fechado e que seria mais difícil penetrar na clientela nacional, pelo que partimos para fora. Fizemos isto em 96 e continuamos a

fazer. E porque fizemos? Porque era relativamente fácil criar uma presença virtual noutros mercados, através de um bom site, de uma boa prepara-ção de conteúdos. Conseguimos ter uma visibilidade que em Portugal era medida de forma diferente. Hoje em dia, esse trunfo já não existe. Tem de haver outros fatores para se conseguir impor uma sociedade de advogados, é preciso investimento e, desse ponto de vista, considero que será mais difícil constituir uma sociedade. As que se formaram nos últimos cinco anos são basicamente cisões e a questão não se coloca, porque não estão a começar do zero. Mas estou a pensar em dois recém-licenciados sem clientes que se juntam para criar uma sociedade – foi praticamente assim que começámos. Éramos dois jovens advogados e co-meçámos logo com grandes bancos, como o Credit Suisse. Hoje em dia, uma estrutura de jovens advogados não conseguiria clientes dessa dimensão. É verdade que já tínhamos alguma ex-

“Conseguimos reagir, mas também tivemos de lugar pelas tarifas, que desceram no mercado em geral, embora tenham descido mais no mercado português do que nos clientes que contratamos, onde não houve uma erosão tão grande”

“Do ponto de vista da internacionalização, caracterizamo-nos por sermos exportadores de serviço mas no sentido em que atraímos investimento. Para a balança de pagamentos somos sempre muito favoráveis”

periência, nomeadamente em Direito bancário, o que nos permitiu procurar mercado. Como em Portugal o núme-ro de bancos era, e é, limitado, o que fizemos foi vender lá fora. Tínhamos capacidade linguística, conhecimento técnico, e andámos de mala na mão a fazer a ronda dos grandes bancos, o que na altura poucos faziam.

Advocatus | Essa vocação inter-nacional é um pouco inversa face ao que hoje leva as sociedades a internacionalizarem-se…JMV | Quando começámos a traba-lhar, Portugal era um país de atração de investimento, a procura de ativos portugueses era grande. Havia muitos projetos. Quando começámos, toda a gente estava ocupada com a Expo, o que, para nós, foi bom, pois ficámos com um mercado de telecomunica-ções ótimo. Do ponto de vista da internacionaliza-ção, caracterizamo-nos por sermos exportadores de serviço mas no sen-

“A Ordem e os advogados em Portugal, pelas votações que tenho visto, têm uma visão corporativa da profissão. O que corresponde à Constituição de Salazar, não ao que eles dizem ser – que é democratas”

Page 8: advocatus, 51

8 advocatus junho 2014

Entrevista

tido em que atraímos investimento. Para a balança de pagamentos somos sempre muito favoráveis. Porque é que não fomos, no início, exportadores no sentido de prestarmos serviços fora de Portugal? A forma tradicional de as so-ciedades se expandirem internacional-mente é acompanhando clientes, ora nós não tínhamos clientes portugueses de topo que estivessem a fazer os seus projetos de internacionalização.Por outro lado, de todas as que o fize-ram nenhuma o conseguiu, com uma exceção. É uma falsa questão falar-se em sociedades de advocacia portu-guesas que são internacionais. Onde é que obtêm a maioria dos rendimentos? Continua a ser em Portugal. Nós gostamos de Portugal, queremos exercer em Portugal, mas temos uma advocacia internacional e não há ne-nhum contrassenso nisso. Prestamos assessoria para projetos internacionais em Portugal e para projetos portugue-

“Dentro das próprias regras, a Ordem funciona, mas as regras violam a Constituição e, como se viu recentemente, foram manifestamente utilizadas para promoção pessoal. Não só do anterior bastonário”

ses no estrangeiro através de associa-ção. Não descartamos outros como é evidente e temos clientes puramente locais, mas andam na ordem dos 20 a 25%, no máximo.

Advocatus | Qual é a relação de for-ças entre os vossos clientes estran-geiros e os portugueses?JMV | Numa operação, normalmente estamos do lado estrangeiro. Se há um project finance, estamos do lado do banco, se há um projeto de constru-ção de uma parceria público-privada, estamos do lado de uma construtora estrangeira. Agora não há nada, mas quando houve era mais fácil para nós estar do lado estrangeiro. Porque, quando aparecemos, há 18 anos, as outras sociedades já cá estavam e continuam. O que nós conseguimos foi essa estabilidade e também cá es-tamos. Mas temos outra dimensão.

Advocatus | Especializaram-se em áreas que sofreram grandes cortes com a crise. Como amortizaram o impacto?JMV | Tínhamos uma base razoável, porque não vivíamos do banco por-tuguês A ou B. Tirando alguns casos, como o Lehman Brothers, não tivemos problemas de cobrança com os clien-tes estrangeiros. Houve financiamentos que ainda cá estão, nomeadamente da dívida pública, de que representamos uma boa parte. Mas toda a parte de project finance que existia ficou limi-tada. Ainda assim, tivemos algumas matérias, sobretudo em corporate fi-nance, que nos permitiram manter uma rentabilidade simpática. No bancário, que continua a representar um quarto do nosso negócio global, resistimos bem. E o próprio bancário trouxe outras coisas, passámos a ter em cima da mesa Códigos que dantes não usá-vamos muito. Conseguimos reagir, mas também ti-vemos de lugar pelas tarifas, que des-ceram no mercado em geral, embora tenham descido mais no mercado por-tuguês do que nos clientes que contra-tamos, onde não houve uma erosão tão grande. Como os clientes portugueses não têm a mesma representatividade no nosso negócio, o impacto foi mais suave.Aliás, o ano passado foi um ano exce-lente. Excelente neste contexto, porque se, há cinco anos, me dissesse que o ano passado ia ser como foi se calhar seríamos mais ambiciosos. Mas na rentabilidade individual foi um ano bom. Sempre naquele nosso critério: os ad-vogados que aqui estamos a trabalhar fazemos um trabalho bem feito e bem pago, mas somos competitivos e saber

ser competitivo mantendo estes parâ-metros é que é o desafio. Para manter a rentabilidade com tarifas mais baixas é preciso olear muito bem a engrenagem.

Advocatus | As privatizações foram um falso alarme?JMV | Esse é um daqueles mercados em que sentimos algumas dificuldades. As regras de contratação deviam ser diferentes, podia haver uma forma de auscultar o mercado. Em Portugal, te-mos um problema na contratação, em geral, e em particular na contratação pública: por muitas regras que tentem para criar critérios claros e simples, na prática isso não acontece. Contam-se pelos dedos de uma mão as vezes em que somos consultados para projetos do Estado. Ora, modéstia à parte, não pode ser. E não pode ser em áreas como as energias – ainda no outro dia o Estado se queixava de que não tinha advogados para empreender a guerra do gás contra a Galp, mas nem per-guntarem. Nós andamos nessa guerra. O que tem o Estado feito para saber quais os escritórios disponíveis para fazer a assessoria? Qual o critério para fazer a pergunta ao A, B e C e não fazer ao D, E e F? Não quero com isto fazer insinuações, não há só interesses, é também uma questão de comodismo. Há um enviesamento do mercado.Também há um lado de mérito da-queles que têm os mercados e que os sabem agarrar. Há escritórios, que são bem conhecidos, que têm boas relações com a administração pública, que estabelecem canais e os sabem segurar. E quem quiser chegar lá tem de se esforçar. O que achamos é que esse tipo de esforço não devia ser neces-sário. O Estado devia ter interesse em contratar pelos mesmos critérios com que nós queremos ser contratados: o trabalho é bom, é eficiente, é rentável para quem contrata e para quem faz. Estes deviam ser os critérios e não estar a fazer um esforço para entrar no radar. Esse esforço não é do mercado.Mas não acontece só no Estado, acon-tece também nas grandes empresas, que não fazem com os fornecedores de serviços jurídicos o mesmo benchmark que fazem com os outros fornecedores. E como é que eu sei que não fazem? Porque não nos fazem nenhuma per-gunta. Não é só interesses, mas tam-bém entropias.É apenas uma parte de um mal geral, de baixa competitividade da econo-mia. Mas todas as matérias de baixa competitividade nós pagamo-las. Sa-bemos o que pagamos de eletricidade, de gás… Foram processos em que houve liberalizações teóricas e que passaram de monopólio estatal para

“Para quem quer mudar o panorama da advocacia em Portugal com capital seria, teoricamente, possível. Ora quem neste momento domina o panorama não o quer. E quem não tem capital também não quer”

Page 9: advocatus, 51

9 advocatus junho 2014

Modelo da Ordem é do Estado Novo

Advocatus | Foi professor de Direito durante vários anos. Que olhar formou sobre a qua-lidade do ensino e dos futuros advogados? João de Macedo Vitorino | Há falta de bons advogados. Andamos a formar mas não com qualidade. O que é pena, porque andamos a dizer aos que investem cinco anos, agora quatro, da sua vida – não investem muito, pelas notas que tiram… – que há ali um futuro.Não quero dizer que as pessoas não devam ir atrás dos seus sonhos. Se querem ser licencia-das em Direito que sejam. Mas gostava que as universidades se esforçassem por melhorar os níveis de ensino e que a universidade do Estado, em vez de estar preocupada em ser sempre a que abre mais vagas, estivesse preocupada em criar um padrão de qualidade.

Advocatus | Não é, pois, a favor de uma maior restrição no acesso à profissão?JMV | O problema da Ordem e do acesso é um problema de visão. A Ordem e os advogados em Portugal, pelas votações que tenho visto, têm uma visão corporativa da profissão. O que corresponde à Constituição de Salazar, não ao que eles dizem ser – que é democratas. Todos nós, da mesma forma que devemos ser livres de tirar um curso – e aqueles que não têm possibilidades mas têm mérito devem ser apoiados pelo Estado – também devemos ser livres de exercer a profissão. Se a licenciatura é dada – e uma licenciatura é uma licença para exercer uma profissão – se há mil ou 100 mil advogados deve ser um problema dos próprios advogados.

Advocatus | Está a defender que o exame à Ordem devia acabar?JMV | O exame não é democrático. Você tira um curso, tem média e quer ser advogada. Não é um exame feito por pessoas normalmente menos qualificadas do que os professores da

universidade que já a examinaram que vai fazer diferença. A Ordem não deve ter essa função. Eu sou contra o exclusivo da Ordem, acho que deve haver liberdade de associação. Mas ver a Ordem como uma barreira ao exercício da profissão para que os que já saltaram essa barreira se sintam mais confortáveis não é nada justo e na prática é isso que acontece. São eleitos bastonários sistematicamente aqueles que têm uma visão mais restritiva do acesso à profissão.

Advocatus | Precisamente, os bastonários são eleitos. Não é um processo democrático? JMV | São eleitos, mas o voto é obrigatório e a Ordem é uma associação de inscrição obri-gatória. Se eu defender uma advocacia com parâmetros diferentes e se quiser uma asso-ciação com os mesmos poderes – os mesmos não, porque tem poderes a mais – não o poderia fazer. Os mesmos que defendem a liberdade sindical proíbem-na ao nível do exercício das profissões liberais. É um perfeito absurdo. Por isso é que eu digo que o modelo é do Estado Novo, não da Constituição de 76, que tem es-crito preto no branco a liberdade de associação.Dentro das próprias regras, a Ordem funciona, mas as regras violam a Constituição e, como se viu recentemente, foram manifestamente utilizadas para promoção pessoal. Não só do anterior bastonário. Já há várias eleições que não temos bastonários com algum mérito que se lhes possa reconhecer. Convenhamos: é um representante dos advogados, o mínimo que se espera é que seja advogado, que tenha exercido com o mínimo de competência e de mérito. Há uma subversão das regras – esse modelo tem acontecido nos clubes de futebol e nos partidos políticos. É o resultado das diretas. O critério da elegibilidade para dirigir uma organização passa a ser o da popularidade. E quando o critério é esse não funcionamos

em democracia, funcionamos em demagogia. A Ordem dos Advogados é uma instituição demagógica.

Advocatus | Essa sua visão é partilhada? JMV | Se tivesse aqui uma sala com 30 ad-vogados ninguém aceitava o que lhe estou a dizer. Ninguém quer. Como ninguém quer que haja acesso dos fundos de capital às so-ciedades de advogados. E a razão não é de princípio, embora seja esse o escudo usado. A razão é que há um status quo que separa os que conseguem ter organização e os que não conseguem e que é o capital. Para quem quer mudar o panorama da advocacia em Portugal com capital seria, teoricamente, possível. Ora quem neste momento domina o panorama não o quer. E quem não tem capital também não quer. Eu não tenho capital, mas sei reconhecer que haveria mérito em ter capital nas socieda-des de advogados, porque percebo que há um lado empresarial que é muito importante. Dava mais liquidez ao mercado. Mas não haverá sociedades de capital nos tempos próximos, porque entre uns e outros, têm a maioria…

“O exame não é democrático. Você tira um curso, tem média e quer ser advogada. Não é um exame feito por pessoas normalmente menos qualificadas do que os professores da universidade que já a examinaram que vai fazer diferença.”

um pequeno oligopólio. Foi um mal menor, assim como uma PPP é um mal menor face a uma empresa do Estado, mas não deixam de ser ambas males.

Advocatus | Se não lhe falta experi-ência, o que falta à Macedo Vitorino? Visibilidade?JMV | Há certas coisas que não temos de provar porque o mercado já sabe. É nesse sentido que a experiência valori-za. Mas, para que isso seja percebido, é necessário que sejamos mais visíveis, o que até há relativamente pouco tem-po não tínhamos interiorizado como

necessário. Hoje temos consciência de que é preciso um labor de comu-nicação, de boa gestão de imagem. O substrato já o temos, temos um tra-ck record de coisas que já fizemos e que estamos a fazer que nos permite dizer “Estado porque é que não fa-laste connosco por causa da Galp?”. Quando se estava a construir a ponte Vasco da Gama não tínhamos nenhu-ma ambição em ficar com o project finance, mas quando se fizeram as PPP das auto-estradas concorremos a todas e ficamos com três. Temos a sensação de que o mercado não tem essa perceção de nós. É um esforço que temos de fazer.

“O Estado devia ter interesse em contratar pelos mesmos critérios com que nós queremos ser contratados: o trabalho é bom, é eficiente, é rentável para quem contrata e para quem faz”

advocatus.pt

Page 10: advocatus, 51

10 advocatus junho 2014

Arbitragem

resolução de litígios com empresas chinesasA China é atualmente a segunda maior economia do mundo. É o segundo maior exportador e o terceiro maior importador. Em suma, como resolver litígios que toda esta enorme massa de relações comerciais pode gerar?

MANuEl p. bArrOCAS

Advogado e árbitro, é sócio fundador da Barrocas Advogados

“Na resolução de litígios comerciais internacionais é de toda a conveniência procurar a arbitragem institucionalizada e nela uma câmara arbitral experiente (a CCI, a LCIA, o Instituto de Arbitragem da Câmara de Comércio de Estocolmo, o Tribunal Permanente de Arbitragem)”

“O Supremo Tribunal do Povo tem gradualmente uniformizado o entendimento e praticamente nos últimos dez anos tem sido muito rara a recusa pelo Supremo do reconhecimento e execução, o que é sem dúvida um notável progresso e uma clara demonstração do pragmatismo chinês”

Este artigo incide particularmente sobre as relações comerciais entre a China e a África, mas pode ser entendido, igualmente, no contexto das relações entre a China e qual-quer país.Não trata de questões litigiosas no âmbito da OMC (Organização Mun-dial do Comércio), mas apenas entre empresas ou entidades privadas.As relações comerciais China/África aumentaram de USD 10 milhões nos anos 1980 para USD 100 biliões em 2009 e não tem parado de aumentar.A China, presentemente, tem rela-ções comerciais com praticamente todos os estados africanos. O co-mércio tem crescido, desde 2000, a um ritmo médio anual de 40%.Segundo a OMC, a China é atual-mente a segunda maior economia do mundo. É o segundo maior expor-tador e o terceiro maior importador. Em suma, como resolver litígios que toda esta enorme massa de relações comerciais pode gerar? Em primeiro lugar, vejamos a resolução de litígios no domínio do investimento.Centenas de empresas privadas chi-nesas estão envolvidas em vários sectores, hoje em dia um pouco por todo o mundo.

A CONVENçãO ICSIDComo se sabe, o instrumentos mais importante nesta área é a Convenção ICSID, que instituiu um centro de arbitragem para resolução de litígios resultantes de:• expropriaçãoounacionalização

pelo estado recetor, sem indem-nização

• alteraçãounilateralpeloestadorecetor das condições económi-cas e jurídicas em que o investi-mento foi efetuado

• discriminaçãounilateralfiscalououtra que afete, por agravamen-to, as condições do investimen-to relativamente a concorrentes internos ou outros investimentos internacionais posteriores

Os litígios comerciais, por seu turno, são todos os que não respeitem a investimento direto e em que este-jam em jogo interesses do comércio internacional.Nem a China, nem a maioria dos es-tados africanos têm particular expe-riência na arbitragem internacional.Na resolução de litígios comerciais internacionais é de toda a conve-niência procurar a arbitragem ins-titucionalizada e nela uma câmara arbitral experiente (a CCI, a LCIA, o Instituto de Arbitragem da Câmara de Comércio de Estocolmo, o Tribunal Permanente de Arbitragem, etc.).A arbitragem ad hoc não a é mais conveniente, a não ser que as partes se entendam sobre a nomeação dos árbitros e eles tenham verdadeira experiência e sejam competentes na arbitragem internacional.A escolha de um bom local para a realização da arbitragem é também um aspeto importante. Tem a ver com a qualidade do apoio que os tribunais estaduais podem conceder à arbitragem.No campo da anulação da senten-ça arbitral é conveniente que a lei da localização siga pelo menos o processo previsto na Lei-Modelo da UNCITRAL.No campo da execução internacional da sentença arbitral é essencial que o estado da localização seja mem-bro da Convenção de Nova Iorque para poder ser facilmente executada noutro estado membro.É também conveniente que os tri-

bunais locais e as leis locais tenham uma atitude pro-arbitragem e não, como ainda sucede em alguns es-tados, uma atitude negativa.Entre os principais meios de obstru-ção da arbitragem no domínio inter-nacional contam-se, por um lado, as normas de aplicação imediata (lois de police), com particular incidência na liberdade de escolha da lei apli-cável ao mérito do litígio, e por outro lado, a interpretação e aplicação lata ou liberal das condições que autori-

Page 11: advocatus, 51

11 advocatus junho 2014

advocatus.pt

zam a recusa do reconhecimento e da execução de sentenças arbitrais estrangeiras previstas na Convenção de Nova Iorque ou em leis nacionais. A anteposição ou sobreposição dos interesses nacionais ou mesmo re-gionais ao livre e previsível reconhe-cimento e execução de sentenças arbitrais noutro estado não corres-ponde ao cumprimento dos compro-missos internacionais assumidos por um estado membro da Convenção.Assim, o conceito de não arbitrabi-lidade de certos litígios, mas princi-palmente o conceito e o conteúdo de ordem pública têm sido por alguns estados entendidos latamente.O conceito de ordem pública na lei chinesa é um bom exemplo, pois assenta no conceito muito vago de interesse social e público da comu-nidade chinesa.Porém, o país, consciente da sua im-portância no conserto internacional, tem feito um esforço considerável no sentido de uniformizar o mais possível, na prática, o entendimento do que é e do que não é a ordem pública da China. Na realidade, foram muito frequentes num passado não distante os casos de recusa de reconhecimento e de execução de algumas sentenças arbitrais estrangeiras na China por força de um entendimento lato, por certos tribunais locais, do conceito da ordem pública relevante.Desde há cerca de 10 anos, porém, tem sido seguida a prática, impos-ta pelo Supremo Tribunal do Povo, de este tribunal dever ser sempre notificado de todas as recusas que ocorram no País de reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras decididas pelos tribu-nais intermédios regionais para que ele possa proferir uma decisão final sobre a matéria. Neste contexto, o Supremo Tribunal do Povo tem gradualmente uniformizado o enten-dimento e praticamente nos últimos dez anos tem sido muito rara a recu-

sa pelo Supremo do reconhecimento e execução, o que é sem dúvida um notável progresso e uma clara de-monstração do pragmatismo chinês, embora ao arrepio dos métodos que conhecemos nos países ocidentais. Sem qualquer dúvida que a arbitra-gem é o meio mais seguro e eficaz de resolução de litígios à escala in-ternacional, inclusive, obviamente, com empresas chinesas. A arbitragem doméstica neste país, se alguma empresa concordar em se submeter à resolução de litígios mediante arbitragem localizada na China, apresenta as seguintes ca-racterísticas principais segundo a lei arbitral chinesa:a) os tribunais estaduais locais po-

dem conceder medidas caute-lares a pedido de qualquer das partes de um litígio se alegar e provar que a sua não concessão pode causar dano irreparável.

O requerente deve prestar caução e instaurar a ação principal dentro de 30 dias. O pedido das medidas cautelares deve ser submetido ao próprio tribunal arbitral. Este remete então para o tribunal es-tadual competente o pedido que, a ser decretado, pode implicar o arresto de bens ou outras medi-das de conservação.

b) O princípio do efeito negativo da convenção de arbitragem é respeitado (princípio da compe-tência-competência).

c) A lei regula a execução por tribu-nais estaduais de sentenças ar-bitrais domésticas e o reconheci-mento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras, podendo recusar o reconhecimento basica-mente com idênticos fundamen-tos dos que estão previstos no artigo V da Convenção de Nova Iorque.

A instituição de arbitragem chi-nesa que importa referir aqui é o CIETAC (China International Economic and Trade Arbitration

“O conceito de não arbitrabilidade de certos litígios, mas principalmente o conceito e o conteúdo de ordem pública têm sido por alguns estados entendidos latamente. O conceito de ordem pública na lei chinesa é um bom exemplo, pois assenta no conceito muito vago de interesse social e público da comunidade chinesa”

Commission), frequentemente referido, o que é verdade, como uma instituição não independente do governo chinês, mas que sem dúvida tem feito, apesar disso, um bom trabalho na realização de arbitragens na China, seguindo uma cultura própria do sistema do direito civil.

“Segundo a OMC, a China é atualmente a segunda maior economia do mundo. É o segundo maior exportador e o terceiro maior importador. Em suma, como resolver litígios que toda esta enorme massa de relações comerciais pode gerar? Em primeiro lugar, vejamos a resolução de litígios no domínio do investimento”

Page 12: advocatus, 51

12 advocatus junho 2014

Testemunho

Depois de experiências de prática indi-vidual, no Estado e em sociedades de advogados, Filipa chegou há dois anos à AMI. E o percurso anterior revelou-se essencial para aceitar a proposta de trabalho da fundação e tê-la encarado como um desafio. Sem a experiência já adquirida, admite que teria ficado em pânico com a dimensão do trabalho. Pensaria que seria “impossível trabalhar sozinha na parte legal de uma funda-ção”, com as dimensões que a AMI tem e com todas as áreas que implica. É que, como a fundação não tem um ga-binete jurídico, é a advogada que trata de todos os assuntos jurídicos, nomea-damente prestando apoio ao conselho de administração. “As minhas funções são transversais a todos os problemas que existem”, explica. Assim, emite pareceres jurídicos e acompanha os

Tornou-se advogada um pouco por acaso, mas não se arrepende e hoje está feliz com a decisão. “Gosto muito do que faço”, garante. E não é caso para menos: aos 28 anos, Filipa Simões vive uma experiência “muito aliciante” enquanto única advogada na Assistência Médica Internacional (AMI).

Advogada de uma causa

JOR

GE

SO

AR

ES

Créditos das Fotos –

“Não é uma advocacia de negócio” – embora, tenha “obviamente” que “defender os interesses da fundação quando estão em causa contratos”

processos negociais, nomeadamente a nível de parcerias e campanhas. Além de elaborar contratos e efetuar o registo de marcas e de patentes. Uma das suas tarefas mais trabalho-sas foi promover a adequação à lei--quadro das fundações, que entrou em vigor em 2012. Um trabalho que caracteriza como difícil: “As exigên-cias eram muito elevadas e os timings eram muito apertados”, afiança. Acre-dita, por isso, que muitas fundações e instituições de solidariedade social terão tido dificuldades em fazer essa adaptação sem acompanhamento jurídico interno. Complicados são também os processos que envolvem testamentos. Por um lado, implicam procedimentos morosos, até porque, por vezes, existem famílias que não veem com bons olhos a transferência

de algum património para a instituição. Mas, ao mesmo tempo, são proces-sos “muito gratificantes”, garante. Em virtude da lei do mecenato, “tem que ficar garantido em que moldes é que as doações são feitas, para não surgir nenhum problema legal”, escla-rece. Filipa encara os bens que algu-mas pessoas deixam em testamento à fundação como o “reconhecimento que alguém faz em vida” do trabalho da AMI. É um “ato de amor”, diz, à semelhança da criação de uma funda-ção. “A AMI nasceu de um ato de amor do Dr. Fernando Nobre, que dedicou toda a vida a esta causa”, concretiza. É nesse afeto – que se materializa na prática do voluntariado – que Filipa crê que consiste a grande diferença entre exercer advocacia na AMI ou noutro local. “Aqui, além de traba-

Page 13: advocatus, 51

13 advocatus junho 2014

advocatus.pt

“O trabalho numa fundação é mais humano”, diz. “Faz-nos crescer como pessoas, porque lidamos com realidades que desconhecemos”

Ser advogada estava longe dos seus planos, mas teve “a sorte de ter um brilhante bisavô” com esta profissão. Não influenciou a sua decisão, garante, mas foi um conselho seu que lhe abriu as portas da advocacia, numa altura em que estava hesitante quanto ao futuro académico e profissional.

lhadores, somos todos voluntários”, nota. “Despendemos algum do nosso tempo para fazer os peditórios nacio-nais. Ajudamos à própria sobrevivên-cia da fundação, independentemente da função que desempenhemos”. A vocação deste trabalho é, assim, dis-tinta: “Não é uma advocacia de negó-cio” – embora, tenha “obviamente” que “defender os interesses da fundação quando estão em causa contratos”. São estas nuances que tornam este trabalho mais “gratificante que a prática de advocacia agressiva”, constata.Se tivesse que escolher entre prática individual, no Estado, em sociedades de advogados e na fundação, Filipa não conseguiria. Embora reconheça que o trabalho na fundação é “mais aliciante em termos pessoais”, não teve nenhu-ma experiência profissional negativa. “Todas as experiências de trabalho são positivas, independentemente das circunstâncias serem diferentes”, garante. A advogada iniciou o seu per-curso profissional no departamento de assuntos jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde ingressou depois de concluído o curso de Direito na Universidade Lusíada de Lisboa. Passou depois por dois escritórios de advogados e pela prática individual. Olhando para trás, assume que não desgostou do outro lado, até porque foi essa experiência que lhe permitiu “chegar aqui com 28 anos e ser a úni-ca”. Consubstancia: os dois anos que esteve no ministério deram-lhe as ba-ses de Direito administrativo, ao passo que a experiência nos dois escritórios lhe deu “muita bagagem” em termos de gestão do cliente e de contencioso. Mas “a missão da fundação faz com que o trabalho jurídico na AMI seja di-ferente”. Fazendo o paralelismo com o exercício numa empresa, explica que não tem um cliente, mas antes varia-díssimos clientes que não conhece – todos os beneficiários da instituição. A repercussão na sociedade é, assim, distinta. A existência de uma causa é, para Filipa, uma importante característica diferenciadora entre as várias práticas profissionais por que passou. “O traba-lho numa fundação é mais humano”, diz. “Faz-nos crescer como pessoas, porque lidamos com realidades que desconhecemos”. Por isso denomina o trabalho na AMI como mais do que um percurso profissional – é uma “ex-periência de aprendizagem”, assegura.Para a jovem advogada, além de “muito gratificante em termos pessoais”, o trabalho na AMI é também “muito de-safiante”, porque “obriga a estar a par de muitas áreas de prática” e a fazer uma “atualização diária, em virtude das

constantes mudanças de códigos”. A par do objeto da fundação, foi o “de-safio constante” implícito que a levou a aceitar o convite para trabalhar nesta organização.Filipa continua a ter as suas áreas de especialização (Direito público) – es-tava “muito vocacionada para Direito administrativo, societário e fiscal” – mas alargou o âmbito, de modo a dar resposta a outras áreas. É o caso das matérias relacionadas com propriedade industrial e intelectual, de que tinha um conhecimento genérico quando chegou à fundação. “Quando come-cei a lidar com o registo de marcas e patentes, tive que dedicar muito tempo a verificar como eram os procedimen-tos”, adianta.

Há 15 anos, Filipa não imaginava que hoje passaria os seus dias a lidar com estas questões. Ser advogada estava longe dos seus planos, mas teve “a sor-te de ter um brilhante bisavô” com esta profissão. Não influenciou a sua deci-são, garante, mas foi um conselho seu que lhe abriu as portas da advocacia, numa altura em que estava hesitante quanto ao futuro académico e profis-sional. Filipa explicou-lhe que “estava reticente em seguir Direito”, em virtude do estigma associado à profissão de “ter que defender criminosos” e conta que o familiar lhe respondeu “com toda a calma do mundo”: “Na sua vida futura lembre-se sempre de uma coisa - olhe para o caso concreto e veja qual é a so-lução mais justa. O código vai sempre

dar-lhe uma resposta para aquela que considere que é a solução mais justa. Só tem que depois conseguir suportar juridicamente a sua solução. Portanto, nunca vai contra os seus princípios, contra aquilo que considera correto”. Foi a chave para que as dúvidas da hoje advogada se atenuassem. “Pensei que era uma boa vertente do Direito. Nunca tinha pensado dessa forma, muito mais positiva”, assegura. A decisão estava tomada. Entrou na Faculdade de Direito e nunca mais hesitou. “Adorei toda a licenciatura. Nunca tive dúvidas”, diz. Hoje, gosta do que faz, até porque, independentemente do local de prática jurídica, nunca atenta contra os seus princípios. Tomou a decisão acertada, acredita.

Page 14: advocatus, 51

14 advocatus junho 2014

Direito Penal

Advocatus | Que objetivos perse-gue a União Internacional dos Ad-vogados Penalistas Europeus?Paulo de Sá e Cunha | Os objetivos são múltiplos. Os principais serão os de promover e difundir os valores fundamentais do Direito Penal e da garantia a um processo justo e equi-tativo no quadro de uma sociedade democrática; pugnar pela adequa-ção do Direito Penal e Processual Penal aos princípios estruturantes do Estado de Direito, aos direitos fundamentais internacionalmen-te reconhecidos e consagrados e ao respeito pela garantia e pelos princípios enformadores de um processo penal justo e equitativo; velar pela observância estrita dos

Promover os valores fundamentais do Direito Penal e da garantia a um processo justo e equitativo no quadro de uma sociedade democrática. Este é o objetivo basilar da União Internacional dos Advogados Penalistas Europeus. Entre os fundadores está o Fórum Penal, cujo presidente, o sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira Paulo de Sá e Cunha, considera que, no atual contexto de recrudescimento dos extremismos, a justiça penal é um património que importa, mais do que nunca defender.

pelos valores da justiça penal

direitos de defesa e pela sua con-formidade às normas e aos prin-cípios constitucionais e de direito internacional, salvaguardando a intervenção essencial do advoga-do no domínio do foro penal; pro-teger o prestígio e as prerrogativas da função do defensor, propondo, se necessário, as adequadas refor-mas legislativas; promover estudos e iniciativas culturais e políticas destinadas ao aperfeiçoamento da Justiça penal, seja no plano legisla-tivo seja no da organização judici-ária; colaborar com os organismos representativos dos advogados e cooperar com as entidades na-cionais e internacionais visando o aperfeiçoamento da Justiça penal.

Advocatus | Em que áreas irá atuar e de que modo?PSC | De momento, a União está ainda numa fase de consolidação, sendo transitoriamente dirigida por uma junta executiva composta pelos presidentes das associações nacio-nais fundadoras, que se manterá em funções até à eleição dos órgãos es-tatutários, a realizar no 1.º Congres-so Internacional da União, que será convocado no prazo máximo de três anos. A tarefa fundamental, nesta fase, é a de assegurar a consolida-ção da União, criando as condições necessárias para a realização do congresso e para a eleição e entrada em funções dos seus órgãos esta-tutários. Isto não significa, eviden-

temente, que a União não comece desde já a desenvolver as iniciativas necessárias ao seu reconhecimento como interlocutor representativo dos advogados penalistas europeus, seja nos planos nacionais, seja junto das instâncias europeias e internacio-nais, visando criar uma rede institu-cional de contactos que lhe permita vir a prosseguir eficazmente as suas finalidades. E certamente que não deixará de tomar posição pública e enérgica sempre que tal se justifique, sobretudo quando estejam em causa os valores fundamentais da Justiça penal ou dos direitos de defesa dos cidadãos e dos defensores, cuja pre-servação constitui a razão primordial da sua existência.

Page 15: advocatus, 51

15 advocatus junho 2014

advocatus.pt

Advocatus | Qual a importância, para a justiça no contexto euro-peu, de uma associação desta na-tureza?PSC | Pese embora as várias diferen-ças que resultam da diversidade das jurisdições nacionais e das respetivas práticas forenses, as associações fundadoras da União Internacional e os advogados que as integram par-tilham um conjunto de valores funda-mentais, tributários dos ideais liberais e humanistas, que são os estruturan-tes do Direito Penal hodierno. Entre estes contam-se princípios como o da presunção de inocência, por exemplo, ou, no domínio processu-al, o do direito a um processo justo e equitativo. Este património constitui um mínimo denominador comum, cuja observância deve, nos quadros do Estado de Direito democrático, ser absolutamente preservada. Alguns desenvolvimentos recentes demons-tram que aquilo que há poucos anos se tinha por definitivamente consoli-dado e universalmente aceite é hoje novamente ameaçado. É sabido, a História cruamente o demonstra, que o Direito Penal pode ser instrumenta-lizado para servir as finalidades de to-talitarismos de todos os quadrantes. Na Europa assiste-se ao recrudesci-mento de extremismos políticos, de tensões xenófobas, de nacionalis-mos, o que, entre vários outros fato-res, constitui fundado motivo de pre-ocupação e apela a um sentido cívico e militante de combate pela preserva-ção dos Direitos Fundamentais. Tra-dicionalmente os advogados sempre o têm feito e, entre estes, certamente que os penalistas estarão sempre na vanguarda. A par destas razões de fundo, a União Europeia tem vindo sucessivamente a desenvolver es-forços no sentido da harmonização legislativa ao nível do Direito Penal e do Direito Processual Penal. São disso exemplos, para me cingir aos mais recentes, a Diretiva 2013/40/UE, do PE e do Conselho, de 22/10/2013 (sobre o acesso a advogado em pro-cesso penal); a Diretiva 2014/41/UE, do PE e do Conselho, de 03/04/2014 (relativa à decisão europeia de inves-tigação em matéria penal) e a Pro-posta de Regulamento do Conselho [COM(2013) 534final, de 17/07/2013], sobre a instituição da Procuradoria Europeia (que configura a criação de um Ministério Público Europeu, inde-pendente dos Ministérios Públicos nacionais, dotado de extensas com-petências em matéria de “infrações lesivas dos interesses financeiros da União Europeia e de infrações indissociavelmente ligadas a estas”). A emergência desta nova realidade

reclama, do lado da advocacia penal, que se ergam instituições represen-tativas, dotadas de autoridade e de independência, que venham a consti-tuir-se como indispensáveis interlocu-tores dos diversos poderes públicos.

Advocatus | Intitula-se europeia mas reúne apenas seis associa-ções nacionais. Este facto não afeta a representatividade? Está previsto o alargamento?PSC | As associações nacionais de advogados penalistas fundadoras da União têm origens e tradições muito heterogéneas. A iniciativa da consti-tuição partiu da associação italiana – a Unione delle Camere Penali Ita-liane (UCPI) – de longe a mais antiga e representativa de todas. A associa-ção espanhola, por seu turno, é mais recente e tem menos associados do que a portuguesa. A associação francesa está ainda numa fase em-brionária. Esta realidade revela que o associativismo não é uma prática

“É sabido, a História cruamente o demonstra, que o Direito Penal pode ser instrumentalizado para servir as finalidades de totalitarismos de todos os quadrantes”

generalizada entre os advogados penalistas. E pode, é certo, suscitar questões de representatividade. Está previsto o alargamento no domínio das associações nacionais, bem as-sim como no da União. No caso das associações nacionais haverá que respeitar os respetivos códigos gené-ticos, uns de pendor mais restritivo na admissão dos associados, outros de natureza mais aberta. No domínio da União estão já projetados contactos com advogados penalistas de outras nacionalidades, visando-se atingir a máxima representatividade, não ten-do por limite os Estados que integram a União Europeia mas sim o âmbito mais vasto dos países que compõem o Conselho da Europa. De salientar que um dos princípios da União In-ternacional é o da representação pa-ritária por associação nacional, o que assegura o necessário equilíbrio entre todas as associações, independente-mente do número de advogados que representem.

“Se atentarmos nas múltiplas alterações legislativas no domínio do processo penal, o que se evidencia é a sistemática erosão das garantias de defesa (pense-se, por exemplo, nas sucessivas restrições do direito ao recurso”

Page 16: advocatus, 51

16 advocatus junho 2014

Direito Penal

Uma das associações nacionais que está na origem da recém-criada união europeia é o Fórum Penal. O que não admira. Afinal, as suas finalidades são em larga medida coin-cidentes: a defesa e promoção dos valores fundamentais do Direito Penal, com especial incidência no direito de defesa. Foi em maio de 2012 que o fórum presidido por Paulo de Sá e Cunha foi criado, propondo-se fomentar a discussão em torno das questões do Direito Penal (no sentido de Direito Penal total, que abrange não só o Direito Penal substantivo mas também o Direito Processual Penal e o Direito Penitenciário) em diálogo com as ciên-cias afins – criminologia, medicina legal, psi-quiatria forense, ciências policiais - e aberto a todos os intervenientes na área do foro penal – magistrados, académicos, agentes das for-ças e serviços de segurança, criminologistas, médicos, psicólogos.O sócio da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira rejeita que o fórum tenha um pendor acen-tuadamente corporativo, sem prejuízo de lhe interessarem também questões respeitantes ao exercício da profissão na área de prática penal. Ainda que relativamente jovem, tem desenvol-vido algumas tomadas de posição públicas, a propósito, por exemplo, das alterações às leis penais de 2013, à situação dos reclusos

um prestígio que urge reabilitarReabilitar a imagem e o prestígio que deve caber à advocacia criminal e ao advogado penalista, sobretudo quando intervém no processo na qualidade de defensor (“por-que não se pode esquecer que aos penalis-tas também cabe intervir em representação das vítimas que se constituam assisten-tes”). Esta é uma tarefa que urge e que o Fórum Penal se propõe desempenhar, “com orgulho e tenacidade”.Paulo de Sá e Cunha explica porquê. Na sua opinião, o papel do advogado penalista é frequentemente incompreendido pela opi-nião pública, mormente devido à crescente mediatização dos processos. Leva – diz – “a que muitas vezes se tome a parte pelo todo, conduzindo a perceções distorcidas da realidade”. Dá como exemplo os crimes que maior repulsa social suscitam (pense--se, por exemplo, nos abusos sexuais de crianças): não é raro acontecer que o odio-so que recai sobre o alegado criminoso se “contamine” ao seu defensor. Para esta distorção contribui também “a ideia ge-neralizada e muitas vezes alimentada por pessoas investidas em cargos de relevo de que os penalistas são hábeis profissionais do expediente dilatório, que entorpecem a marcha da justiça e que são os principais responsáveis pelas prescrições dos pro-cessos”. Uma ideia que – argumenta - sur-ge quase sempre associada a alguns mitos, como o do excesso de “garantismo” e o da “justiça para ricos e para pobres”. “Ora, se atentarmos nas múltiplas alterações legisla-tivas no domínio do processo penal, o que se evidencia é a sistemática erosão das ga-rantias de defesa (pense-se, por exemplo, nas sucessivas restrições do direito ao re-curso). Além do mais, é errado fazer recair sobre os advogados a responsabilidade pela prescrição dos processos. Os advo-gados estão adstritos ao cumprimento de prazos processuais rigorosos, que efetiva-mente cumprem”, contrapõe. Deixa, a propósito, algumas interrogações: “Quantos inquéritos criminais são concluí-dos pelo Ministério Público com observân-cia dos prazos legais? E qual a razão que leva os tribunais a entender que os prazos que a lei estabelece para o proferimento das suas decisões são prazos meramente ordenadores? E se um julgamento é man-dado repetir em consequência de uma irre-gularidade cometida no seu decurso, com o consequente retardamento da decisão final, de quem é a responsabilidade afinal? Do advogado que recorreu ou do tribunal que, violando a lei, cometeu a irregularidade?”.

nos períodos de greve dos guardas prisio-nais e, mais recentemente, sobre o problema das prescrições, estas últimas em iniciativas conjuntas com o Conselho Distrital de Lisboa (CDL) da Ordem dos Advogados. Com o CDL tem, aliás, aquilo que Paulo de Sá e Cunha define como uma ligação de natureza genética. Pela simples razão de que a cons-tituição de uma associação de advogados penalistas correspondia a um dos pontos do programa de ação do anterior conselho dis-trital, presidido por Vasco Marques Correia. As boas relações mantêm-se e foi, aliás, nessa qualidade que o fórum participou, em maio último, nas comemorações da Semana do Advogado, uma das muitas iniciativas de ordem institucional. Mas não as únicas: Pau-lo de Sá e Cunha destaca ainda a atividade que os associados desenvolvem a título in-dividual, nomeadamente junto dos media. “Embora a título individual e expressando, naturalmente, as posições pessoais de cada um, estas intervenções públicas não deixam de refletir uma perspetiva largamente parti-lhada entre nós e constituem, indiretamente, uma outra forma de prosseguir as finalidades do Fórum Penal. É bom ter presente que os advogados penalistas – e não o afirmo em jeito de crítica – são eminentemente individu-alistas!”, afirma.

A tomar posição desde 2012

“Quantos inquéritos criminais são concluídos pelo Ministério Público com observância dos prazos legais? E qual a razão que leva os tribunais a entender que os prazos que a lei estabelece para o proferimento das suas decisões são prazos meramente ordenadores?”

“O papel do advogado penalista é frequentemente incompreendido pela opinião pública, mormente devido à crescente mediatização dos processos”

ARBI

TRAG

EM TR

IBUT

ÁRIA

ArbitragemTributária n.º 1

2014Coordenação

Nuno Villa-Lobos

Tânia Carvalhais Pereira

10 E

uros

A Revista Arbitragem Tributária reúne artigos de fiscalistas mais experientes e de profissionais de uma nova geração, de académicos, advogados, magistrados e funcionários da Administração Tributária, apresentando-se como um ponto de encontro de diversas sensibilidades e um estímulo ao debate, de olhos postos nos mais recentes desenvolvi-mentos em matéria de arbitragem tributária.

À venda no site do CAAD(www.caad.org.pt)e no site do Advocatus(www.advocatus.pt)

Page 17: advocatus, 51

17 advocatus junho 2014

advocatus.pt

ARBI

TRAG

EM TR

IBUT

ÁRIA

ArbitragemTributária n.º 1

2014Coordenação

Nuno Villa-Lobos

Tânia Carvalhais Pereira

10 E

uros

A Revista Arbitragem Tributária reúne artigos de fiscalistas mais experientes e de profissionais de uma nova geração, de académicos, advogados, magistrados e funcionários da Administração Tributária, apresentando-se como um ponto de encontro de diversas sensibilidades e um estímulo ao debate, de olhos postos nos mais recentes desenvolvi-mentos em matéria de arbitragem tributária.

À venda no site do CAAD(www.caad.org.pt)e no site do Advocatus(www.advocatus.pt)

Page 18: advocatus, 51

18 advocatus junho 2014

Irs

A reforma do Código do Imposto sobre o Rendimento Singular (IRS) está no horizonte legislativo. O pretexto para ouvir três advogados fiscalistas sobre a pertinência desta reforma e sobre os contornos que poderá vir a assumir.

Uma reforma (in)oportuna?

O IRS é um imposto fulcral para as Finanças públicas nacionais: basta dizer que, em 2013, representou mais de um terço da receita fiscal global. Com repercussões para os contribuintes aos quais é feita uma exigência cada vez maior. Não admira que seja vox populi que, em Portugal, se paga muito para trabalhar. Entre impostos e contribuições para a Segurança Social. É neste contexto que se anuncia

uma revisão do Código do IRS. Em que moldes ainda não se sabe – o projeto deverá ser apresentado em outubro. Mas haveria necessida-de de uma reforma? O associado coordenador da área de Fiscal da Vieira de Almeida e Associados, João Pedro Lampreia, tem dúvidas. Considera que o atual código se mantém, de longe, como a me-lhor legislação fiscal em vigor, isto apesar das diversas alterações que lhe têm sido infligidas desde 1989.

Pergunta, pois, que reforma dig-na desse nome pode, então, ser encetada.Por sua vez, o sócio fundador da RFF Advogados, Rogério M. Fer-nandes Ferreira, considera que esta reforma se agita num tempo “por-ventura inapropriado”, mas entende que pode ser o momento de pon-derar alternativas, nomeadamente a da tributação pessoal (individual) dos rendimentos (de cada um) dos membros do agregado familiar.

Já Tiago Caiado Guerreiro, sócio da Caiado Guerreiro & Associados, opta por chamar a atenção para a necessidade de as alterações a consagrar pela reforma do IRS serem estratégicas e darem uma resposta satisfatória a problemas antigos que têm contribuído para a falta de competitividade fiscal de Portugal, no panorama inter-nacional.São três opiniões para conhecer melhor nas páginas seguintes.

Page 19: advocatus, 51

19 advocatus junho 2014

advocatus.pt

“E esta solução, mais simples - da tributação individual e da declaração autónoma dos rendimentos de cada um e, portanto, de cada pessoa singular (no caso dos filhos, representados pelos pais) - que sempre implicará, é certo, regras fiscais próprias para a imputação dos rendimentos comuns cada um dos cônjuges, mas é, ainda assim, bem tentadora”

Sócio fundador da RFF Advogados

uma tributação pessoal?

Sabe o leitor com certeza que os rendimentos dos cônjuges são, obri-gatoriamente, tributados no IRS em conjunto. Sabe o leitor também, provavelmente, que este regime da tributação conjunta foi estendido – mas nestes casos por opção - a quem viva em união de facto, inde-pendentemente do sexo. E estendido ainda, entretanto, a agregados constituídos por duas ou mais pessoas que vivam em economia comum há mais de dois anos, desde que uma seja maior de idade, não obstante a Administração tributária continuar sem aplicar, na prática, este regime, em virtude de não existir um campo específico, na declaração Modelo 3 de IRS, para assinalar as situações de econo-mia comum, contrariamente ao que sucede com as uniões de facto, já

O momento em que se agita a reforma do IRS - porventura em tempo inapropriado - pode ser o de

ponderar alternativas e, assim também, o da tributação pessoal (individual) dos rendimentos (de cada um) dos

membros do agregado familiar.

contempladas. Já não sabe, talvez, o leitor que a regra da tributação conjunta dos rendimentos do agre-gado familiar se aplica seja qual for o regime de bens. Nem que, afinal, os cônjuges podem apresentar as suas próprias declarações de rendimen-tos, mas só (só se) se declararem como separados de facto, sendo assim, quase, tributados como se fossem duas pessoas não casadas. E saberá o leitor, porventura, sendo casado, que é responsabilizado pelo pagamento do IRS sobre os rendi-mentos do seu cônjuge? Que esta responsabilidade fiscal se aplica mesmo em caso de separação de bens? E aos bens do cônjuge não titular de quaisquer rendimentos? Saberá ainda o leitor que são, à partida, havidos como residentes, e aqui também (duplamente) tribu-tados, o cônjuge e os filhos não residentes, por ser residente em Portugal o outro cônjuge, exigindo--se, para afastar a “presunção” ao cônjuge não residente, a prova da inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas activida-des económicas e o território por-tuguês?Estes e muitos outros problemas, cada vez mais complexos e diver-sos, têm origem no facto de a nossa Constituição ter sido interpretada inicialmente, por autores muito auto-rizados, no sentido de dela decorrer a injunção da tributação unitária dos rendimentos do agregado familiar. Mas decorre, também, de a solução da tributação separada onerar, mais, casais em que os rendimentos são, exclusiva ou predominantemente, apenas de um dos cônjuges (os “casados/único titular”), que não é, hoje, a situação mais comum.Esta solução alternativa - a da tributação separada e não unitá-ria dos rendimentos do agregado

“Esta solução alternativa - a da tributação separada e não unitária dos rendimentos do agregado familiar -, afinal, não parece mais conforme à Constituição, quando esta impõe (tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar) a tributação do rendimento pessoal?”

familiar -, afinal, não parece mais conforme à Constituição, quando esta impõe (tendo em conta as ne-cessidades e os rendimentos do agregado familiar) a tributação do rendimento pessoal? E esta solu-ção, mais simples - da tributação individual e da declaração autóno-ma dos rendimentos de cada um e, portanto, de cada pessoa singular (no caso dos filhos, representados pelos pais) - que sempre implicará, é certo, regras fiscais próprias para a imputação dos rendimentos comuns cada um dos cônjuges, mas é, ainda assim, bem tentadora. É, aliás, adoptada maioritariamente noutros países e aquela que permite mais respeito pela individualidade e responsabilidade dos membros do agregado familiar titulares dos rendimentos auferidos. E também ultrapassar as actuais di-ferenças de tratamento na panóplia fiscal de “situações familiares” hoje previstas pelo legislador e simplifi-car o regime da determinação do rendimento colectável e do imposto a pagar. Obstando, ainda, aos pro-blemas decorrentes da presunção de residência e da dupla tributação internacional do cônjuge residen-te no estrangeiro, aproximando as retenções na fonte do imposto devido a final e dispensando um número importante de contribuintes da apresentação das suas declara-ções fiscais, sem perda de controlo dos rendimentos auferidos. Além, principalmente, de facilitar a infor-matização dos procedimentos de recolha do imposto.O momento em que se agita a refor-ma do IRS - porventura em tempo inapropriado - pode ser o de pon-derar alternativas e, assim também, o da tributação pessoal (individual) dos rendimentos (de cada um) dos membros do agregado familiar.

rOgériO M. FErNANDES

FErrEirA

Page 20: advocatus, 51

20 advocatus junho 2014

Irs

A reforma do irSAs alterações a consagrar pela Reforma do IRS devem ser estratégicas e devem dar uma resposta satisfatória a problemas antigos que têm contribuído para a falta de competitividade fiscal de Portugal, no panorama internacional.

TiAgO CAiADO guErrEirO

Sócio da Caiado Guerreiro & Associados

“Os agravamentos, e os desagravamentos, da tributação devem ser cuidadosamente ponderados, de forma a promover a competitividade fiscal em Portugal sem comprometer o princípio da justiça que deve caracterizar este imposto”

Em 2013, a receita arrecadada com o IRS atingiu o seu valor máximo e representou mais de um terço da receita fiscal total, tornando-o um imposto fulcral para as Finanças Pu-blicas portuguesas. Note-se que, embora isso tenha contribuído para o cumprimento das metas impostas pelos parceiros internacionais, pro-vocou uma asfixia para as famílias portuguesas, muitas vezes insus-tentável.O aumento da carga tributária, a que acresce em regra a contribuição para a Segurança Social, tornou excessi-va a exigência feita aos contribuintes. Neste momento, assistimos a um efeito dissuasor na produção de ri-queza, já que o contribuinte comum deixou de procurar aumentar o seu rendimento bruto para manter o ren-dimento líquido. Isto é, o aumento da carga fiscal tornou os portugueses mais pobres, sem que procurem alternativas para fazer face a uma tributação que ultrapassa muitas vezes os 50%.Em Portugal, paga-se muito para trabalhar: IRS, Segurança Social, e permeia-se muito quem não traba-lha: subsídios de desemprego com demasiada duração, rendimentos mínimos garantidos. Naturalmente que esta afirmação se aplica àque-les que não querem trabalhar e se aproveitam do sistema e não àqueles que infelizmente querem trabalhar mas não conseguem e acabam por depender do sistema.Tudo isto é agravado pela neces-sidade de encontrar um equilíbrio de justiça entre as várias catego-rias de rendimentos. Se por um lado devemos ter especial atenção aos rendimentos provenientes do trabalho dependente e pensões, já que representam uma percenta-gem significativa da população que tem uma dificuldade acrescida na sua deslocalização, por outro lado,

agravar a tributação de rendimen-tos de capitais, pode causar uma diminuição da receita arrecadada, com a fuga destes rendimentos para o estrangeiro, que como sabemos não é difícil.Portanto, os agravamentos, e os de-sagravamentos, da tributação devem ser cuidadosamente ponderados, de forma a promover a competitividade fiscal em Portugal sem comprome-ter o princípio da justiça que deve caracterizar este imposto.Quanto às possíveis propostas da reforma, salientamos desde logo a diminuição da burocracia e a simpli-ficação das obrigações declarativas dos contribuintes. Consideramos que um sistema fiscal não é justo nem equitativo se os sujeitos passi-vos não conseguirem compreender a extensão das suas obrigações. É comum assistirmos ao incumprimen-to de obrigações tributárias por mero desconhecimento do contribuinte, ou porque houve uma mudança recente à qual ele ficou alheio. O princípio da cooperação, consagrado no artigo 59.º da Lei Geral Tributária, tem uma extensão bilateral e por isso a Autori-dade Tributária também deve, dentro das suas capacidades, fomentar a colaboração com os contribuintes e auxiliá-los no cumprimento das suas obrigações.Em relação às taxas de tributação, consideramos que o facto de o esca-lão máximo se fixar para rendimentos acima dos € 80.000 atribui ao impos-to características mais proporcionais que progressivas. Desta forma, será aconselhável uma revisão das taxas gerais que não ultrapasse os 40% e que estabelecesse níveis remunera-tórios mais elevados para os últimos escalões, por exemplo.Por último, resta-nos apenas ape-lar à estabilidade do sistema fiscal, embora esteja mais dependente de uma concertação entre os partidos,

“Será aconselhável uma revisão das taxas gerais que não ultrapasse os 40% e que estabelecesse níveis remuneratórios mais elevados para os últimos escalões”

do que de uma reforma isolada. Este factor é essencial para promover a competitividade fiscal, já que, quer os contribuintes, quer os investidores são avessos a ordenamentos instá-veis. Portanto, reformas e regimes de sucesso como o “Regime dos Re-sidentes Não-Habituais” e o Golden Visa, que tanto investimento estão a trazer para Portugal, devem ter um carácter permanente e duradouro. É com esta esperança que aguar-damos a apresentação do projecto, em Outubro.

Page 21: advocatus, 51

21 advocatus junho 2014

advocatus.pt

“O IRS deveria incidir sobre os subsídios pagos pela Segurança Social, como o do desemprego, da maternidade, etc.. (…) O pagamento de IRS devolveria ao beneficiário do subsídio um sentimento de dignidade acrescida, permitindo-lhe afirmar que também ele “contribui pagando os seus impostos”

Associado coordenador da área de Fiscal da Vieira de Almeida e Associados

Que reforma?

Todas as reformas legislativas de sucesso florescem de um difícil equi-líbrio entre a fuga à mera alteração técnica e o cuidado de não cair em radicalismos injustificados. E aqui começam as dificuldades da reforma em curso. É que o Código do IRS mantém-se, de longe, como a melhor legislação fiscal em vigor, isto apesar das diversas alterações que lhe têm sido infligidas desde

O Código do IRS mantém-se, de longe, como a melhor legislação fiscal em vigor, isto apesar das diversas alterações

que lhe têm sido infligidas desde 1989. Que reforma digna desse nome pode, então, ser encetada?

JOAQuiM pEDrO lAMprEiA

1989. Que reforma digna desse nome pode, então, ser encetada?Afastada que está uma alteração de paradigma, pois nem os tempos es-tão favoráveis a experimentalismos, nem se vislumbra um novo modelo de imposto exequível (para além do iníquo flat tax rate, cujos próprios proponentes estão em debandada), e atendendo aos constrangimentos financeiros do Estado, a reforma do IRS parece fadada a modestas al-terações pontuais de cariz técnico.Dir-se-á que daí não vem mal ao mundo. E no entanto, é difícil afas-tar a sensação de que uma reforma deve almejar algo mais. Uma ideia interessante – logo, polémica – seria a de colocar todos, ou quase todos, os contribuintes com rendimentos a pagar IRS. Tal implicaria que uma substancial faixa de famílias que atualmente nada paga, por não ter rendimentos suficientes, fosse cha-mada a efetuar uma contribuição, necessariamente simbólica (come-çando, por exemplo, nos 5 euros). Reconhece-se que esta medida seria politicamente melindrosa e um alvo fácil de ataque. No entanto, te-ria o benefício de permitir estreitar os laços comunitários entre todos, investindo também os que menos auferem na “propriedade” do bem comum (uma vez que quem paga por algo sente-o como seu).Da mesma forma, o IRS deveria incidir sobre os subsídios pagos pela Segurança Social, como o do desemprego, da maternidade, etc.. Note-se que o desempregado não só perde o emprego, como é tam-bém excluído de contribuir para o bem comum. O pagamento de IRS devolveria ao beneficiário do sub-sídio um sentimento de dignidade acrescida, permitindo-lhe afirmar que também ele “contribui pagando os seus impostos”. E para que esta não seja uma mera forma de arreca-

“Uma ideia interessante – logo, polémica – seria a de colocar todos, ou quase todos, os contribuintes com rendimentos a pagar IRS. Tal implicaria que uma substancial faixa de famílias que atualmente nada paga, por não ter rendimentos suficientes, fosse chamada a efetuar uma contribuição, necessariamente simbólica”

dar receita, os beneficiários pode-riam ser compensados economica-mente, aumentando-se o montante dos subsídios na proporção do IRS que se estima arrecadar sobre os mesmos (embora tal extravase o mandato da comissão, cremos ser possível lograr esta conjugação).No que respeita às taxas de IRS, o escalão mais elevado deveria ser repensado. Com efeito, não se justifica que o IRS deixe de ser progressivo para rendimentos superiores a € 80.000. Existindo atualmente uma taxa adicional de solidariedade agravada para rendimentos acima de € 250.000, parece-nos sensata a criação de um escalão superior ao atual, dis-tinguindo verdadeiramente entre a classe média-alta e a classe alta.Ainda sobre este aspeto, consi-deramos que a comissão deverá repensar o verdadeiro impacto das deduções e isenções nos objeti-vos extrafiscais. Se fosse possível reduzir as taxas, compensando o efeito financeiro com a eliminação de deduções e isenções várias de duvidosa utilidade, simplificando--se o imposto pelo caminho, al-cançar-se-ia a difícil quadratura do círculo. Várias outras alterações podem ser pensadas para adequar o IRS ao século xxI. Uma delas passa por conferir aos contribuintes casados a opção pela tributação em sepa-rado (sob pena de se beneficiar os unidos de facto). Outra passa pela introdução de regras claras para os emigrantes e imigrantes, especialmente nos anos de tran-sição (admitindo-se, por exemplo, a tributação como residente em apenas uma parte ano). Deverá ain-da ser revisto o regime das stock--options, dos golden parachutes e do reinvestimento das mais-valias imobiliárias.

Page 22: advocatus, 51

22 advocatus junho 2014

Vistos Gold

O investimento chinês em Portugal no âmbito dos Golden Visa tem sido “muito positivo” e cria postos de trabalho na saúde, no sector dos serviços domésticos, na restauração, no comércio. Esta é a convicção de João Caiado Guerreiro, sócio da Caiado Guerreiro & Associados, sociedade que conta com clientes chineses que já procuram oportunidades noutros sectores, como o dos vinhos, por exemplo.

Investimento positivo

Advocatus | Porque é que Portu-gal se tornou atrativo para o in-vestimento chinês? João Caiado Guerreiro | Durante o período mais difícil da crise, os investidores tradicionais, europeus e americanos, afastaram-se de Portugal. Pelo contrário, os inves-tidores chineses souberam avaliar Portugal de forma mais objetiva

e com uma perspetiva de longo prazo. O facto de os investidores chineses pensarem a longo prazo foi o que fez a diferença. E, assim, investiram significativamente na EDP e na REN, em duas grandes empresas portuguesas. Isso deu um sinal positivo a outros investi-dores Chineses, porventura mais pequenos que a china Three Gor-

ges e a China State Grid, mas que seguiram o exemplo destas duas grandes empresas.

Advocatus | Em que sectores é que ele tem sido mais “intenso”? JCG | Começou por ser no sec-tor da energia (EDP e REN) mas estendeu-se depois ao imobiliário, graças a essa excelente ideia que

“Creio que o papel dos vistos Gold foi decisivo. Tornou Portugal conhecido ou mais conhecido na China”

Page 23: advocatus, 51

23 advocatus junho 2014

advocatus.ptadvocatus.pt

é o Golden Visa. Creio que atual-mente o investimento chinês mais regular é na compra de imóveis para arrendamento, no âmbito do programa Golden Visa. Tem sido um investimento muito positivo para Portugal: o investimento es-trangeiro na compra de casa, e particularmente, o investimento chinês é altamente reprodutivo. Não atinge positivamente apenas as empresas de construção, que sentem alguma retoma e voltam a criar postos de trabalho. O inves-timento no âmbito do Golden Visa cria postos de trabalho na saúde, no sector dos serviços domésticos, na restauração, no comércio. Além disso, existem clientes da Caiado Guerreiro que fizeram o Golden Visa e procuram oportunidades de in-vestimento na indústria, agricultura (particularmente no sector vinícola, por exemplo). Outros já investiram mesmo na compra ou construção de fábricas.

Advocatus | Qual o seu “peso” no investimento estrangeiro to-tal em Portugal? JCG | Julgo que a China é neste momento, individualmente, como país, o maior investidor em Por-tugal, mas, naturalmente, não tem o “stock” de investimento que têm outros países, até porque só agora começou a investir. Mas a China é a segunda maior econo-mia do mundo, vale cerca de 10 biliões de dólares, cresce sete e meio por cento ao ano, e vai, nos próximos anos, ser a maior eco-nomia do mundo. Deste modo, é provável que venha a afirmar-se como o maior ou pelo menos um dos maiores investidores em Por-tugal e no resto do mundo. É uma onda de investimento que Portu-gal deve aproveitar.

Advocatus | Que papel é que os vistos “gold” tiveram neste au-mento? JCG | Creio que o papel dos vis-tos Gold foi decisivo. Tornou Por-tugal conhecido ou mais conheci-do na China. Note que todos os países ricos têm programas deste tipo: a Inglaterra dá residência a quem invista um milhão, no Ca-nadá bastam 250 mil dólares, nos EUA recebe-se um Green Card para residência se se investir 300 mil USD. Uma das coisas que os países mais desenvolvidos fazem é tentar atrair residentes ricos de outros países, isso aumenta a ri-queza do país de destino do in-vestimento. O Golden Visa tem

permitido a Portugal captar muito investimento que de outra forma iria para outros países.

Advocatus | A atribuição de vis-tos “gold” deveria continuar no modelo que existe atualmente ou deveria ser reformulada? JCG | O modelo é bom, mas pode ser melhorado. Devíamos dar o visto por cinco anos, renováveis, enquanto se mantivesse o inves-timento. E o custo do visto devia ser menor. Repare que quem faz um Golden Visa através de investi-mento imobiliário paga logo cerca de 40 mil euros em impostos entre o IMI e o Imposto de Selo na aqui-sição de casa. Ou seja, o processo do Golden Visa é altamente favo-rável a Portugal. Agora que outros países, como a Espanha, têm pro-gramas deste tipo, devíamos tor-nar o nosso mais competitivo.

Advocatus | Que outras medidas é que defenderia para aumentar o investimento estrangeiro em Portugal e, em particular, o in-vestimento chinês? JCG | Seria muito importante re-duzir a burocracia, agilizar pro-cessos, ter uma justiça mais rá-pida, e baixar, decisivamente, a fiscalidade e parafiscalidade (se-gurança social) sobre as empre-sas e o trabalho.

“Devíamos dar o visto por cinco anos, renováveis, enquanto se mantivesse o investimento. E o custo do visto devia ser menor. Repare que quem faz um Golden Visa através de investimento imobiliário paga logo cerca de 40 mil euros em impostos entre o IMI e o Imposto de Selo na aquisição de casa”

UPT_Avocatus_Junho_ 11,74x32,8_2014_1

Para mais informações contacte: Gabinete de Ingresso Número verde 800 27 02 01 Email [email protected]

www.upt.pt

Mestrado em DireitoEspecializações em:Ciências Jurídico-EmpresariaisCiências Jurídico-PolíticasCiências Jurídico-Processuais

Pós-graduaçãoLL.M Transnational Business Law

Estão abertas as candidaturas.Ano Letivo 2014/15

Page 24: advocatus, 51

advocatus.pt

24 advocatus junho 2014

Mediação

O novo regulamento da iCCNum mundo cada vez mais global, onde as fronteiras dos países pouco ou nada têm a ver com as fronteiras dos negócios, a mediação comercial tem vindo a demonstrar ser uma forma de resolução de litígios adaptada aos objetivos empresarias atuais.

ANA MAriA MAiA gONçAlVES

riTA SANTiNHO MArTiNS

Fundadora da Convirgente e presidente do Instituto de Certificação e Formação dos Mediadores Lusófonos (ICFML)

Advogada sénior da Gómez-Acebo & Pombo, é mediadora privada.

“A ICC com este novo regulamento de mediação proporciona às empresas uma ferramenta apropriada para alcançarem os seus objetivos, que procura compatibilizar a mediação com a arbitragem, permitindo assim que as partes possam extrair o beneficio máximo da mediação mesmo quando tenham em curso uma arbitragem”

A Câmara de Comércio Internacional (ICC - International Chamber of Com-merce) lançou o novo Regulamento de Mediação que entrou em vigor no dia 1 de janeiro de 2014, e veio substituir o Regulamento ADR, que estava em vigor desde 1 de julho de 2001.As novas regras de mediação foram descritas por Andrea Carlevaris, Diretor do Serviço de Resolução de Litígios da ICC e Secretário-Geral do Tribunal Internacional de Arbitragem da ICC, como “um bom equilíbrio entre dois ele-mentos essenciais de uma ferramenta moderna e eficiente de resolução de conflitos: clareza das regras e flexibi-lidade do processo.”

AltErAçõES FOrMAISAs alterações introduzidas no regula-mento denotam a predominância da mediação, a nível internacional, en-quanto meio de ADR, o que é visível, desde logo, pela alteração da designa-ção do Regulamento ADR para Regu-lamento de Mediação. De facto, cerca de 90 por cento dos procedimentos ADR na ICC, efectuados no âmbito do Regulamento ADR eram mediações. As conciliações e avaliações neutras representavam apenas 10 por cento do total dos procedimentos submetidos. Outra questão de ordem formal igual-mente demonstrativa da crescente im-portância da mediação foi a decisão da ICC de publicar conjuntamente o Regulamento de Arbitragem e o Regu-lamento de Mediação “em resposta à crescente procura de uma abordagem holística dos métodos de resolução de litígios.”

A MEDIAçãO COMO MECANISMO “PADrãO”O novo regulamento estabelece a me-

diação como o mecanismo “padrão” a utilizar, não excluindo a possibilidade de as partes, antes da nomeação ou aceitação do mediador, acordarem na utilização de outros mecanismos ou combinações de procedimentos simi-lares que visem a resolução amigável da disputa. Esta medida vem reforçar a predominância da mediação entre os outros meios de ADR.

O PAPEl DA ICCO papel da ICC para os procedimentos de mediação foi redefinido no regu-lamento. A ICC goza agora de uma intervenção mais alargada, podendo, nomeadamente, ajudar as partes a con-siderar o uso de mediação mesmo não havendo acordo prévio quanto a sub-meterem a sua disputa ao regulamento ICC, ou determinar o local, ou o idioma a ser adotado na condução da media-ção, ou ainda nomear um mediador ou propor uma lista de mediadores.

NOtAS DE OrIENtAçãO PArA A MEDIAçãOOutra novidade são as “Notas de Orien-tação para a Mediação”. Oferecem orientação sobre questões que devem ser ponderadas ao escolher e organi-zar uma mediação, revelando-se de grande utilidade para as partes menos familiarizadas com este mecanismo. Consistem em 41 pontos separados em secções: “O que é a mediação”, “Porquê a mediação “, “As sessões de mediação”, “Preparação para as sessões de mediação”, “Autoridade”, “Resumos de caso e documentos”, “Relação entre a mediação e arbitra-gem “ e “Diversos”.

CONFIDENCIAlIDADEO novo regulamento mantém a regra

da confidencialidade da mediação, contudo, exclui expressamente da aplicação desta regra o fato de o processo de mediação estar a de-correr, ter ocorrido ou vir a ocorrer, pelo que tais fatos não estão sujeitos a confidencialidade.

MEDIAçãO E ArbItrAGEMO novo regulamento traduz uma pre-ocupação de compatibilização entre a mediação e a arbitragem como resposta à crescente tendência das partes para recorrerem em paralelo a estes dois meios de resolução de litígios. Com efeito, prevê-se que as partes podem iniciar ou começar um processo judicial ou arbitral não obs-tante a mediação estar a ser utilizada. Outra materialização desta compa-tibilização é revelada nas Notas de Orientação no seu capítulo “Relações entre Mediação e Arbitragem”, suge-rindo-se aí que durante a “conferência sobre a condução do procedimento e cronograma do procedimento” seja considerada a existência de uma “ja-nela para mediação” no decorrer do processo arbitral. Num mundo cada vez mais global, onde as fronteiras dos países pouco ou nada têm a ver com as fronteiras dos negócios, a mediação comercial tem vindo a demonstrar ser uma for-ma de resolução de litígios adaptada aos objetivos empresarias atuais. A ICC com este novo regulamento de mediação proporciona às empresas uma ferramenta apropriada para al-cançarem os seus objetivos, que pro-cura compatibilizar a mediação com a arbitragem, permitindo assim que as partes possam extrair o beneficio máximo da mediação mesmo quando tenham em curso uma arbitragem.

Page 25: advocatus, 51

arte gráfica

IMPRESSÃO

INTERNACIONALENTREGA DOS TRABALHOS CONCLUÍDOS EM LISBOA EM 24 HORAS

IMPRESSÃO EM OFFSET ROTATIVA, OFFSET PLANA E DIGITAL

CATÁLOGOS, REVISTAS, FOLHETOS, TESES, LIVROS, FLYERS

Para mais informações, consulte-nos através dos contactos:

Monterreina Comunicación s.l.Telefone 0034 91 621 30 60Email [email protected]

Direcção:Cabo de Gata, 1-3, Sector 2Área empresarial Andaluzia.28320 Pinto Madrid. Espanha.

C

M

Y

CM

MY

CY

CMY

K

Page 26: advocatus, 51

26 advocatus junho 2014

Estante

FEIRA DO LIVRO jURíDICO

26 advocatus junho 2014

A Wolters Kluwer associa-se a esta edição oferecendo aos nossos leitores 20% de desconto na aquisição de qualquer uma das obras integradas nesta feira do livro jurídico.*

Do Contrato de Compra e Venda e do Documento particular AutenticadoA obra, de Rui Januário e António Gameiro, respon-de à prevenção de confli-tos, propondo uma refle-xão sobre as condições contratuais em todas as modalidades, como deci-dem os tribunais sobre a validade das cláusulas e do seu incumprimento.

jusprático Sociedades por Quotas e Sociedades Anónimas 2013Esta obra, com a chan-cela da CCA Advogados, consolida uma visão global das alterações ao regime das sociedades comerciais por quotas e anónimas, bem como das modificações avulsas que nele se anunciaram.

jusFormulários penal 2ª EdiçãoAntónio Gameiro e Maria Isilda Ribeiro escrevem sobre o exercício prático relacionado com direito penal, nomeadamente a acusação, o arquivamen-to, a contestação, a ins-trução e outros temas.

jusFormulário BancárioCom autoria de João Botelho, inclui formulá-rios e minutas de direito bancário, nomeadamente requerimentos, petições, contestações, providên-cias cautelares e oposi-ções a execução.

jusFormulários Insolvência e Recuperação de EmpresasCom autoria de Ana-bela Brízido, Andreia de Melo e Castro e Juliana Valente, inci-de sobre o exercício prático da atividade profissional do direito relacionada com a insolvência e a recu-peração de empresas.

Curso de Direito da Comunicação SocialJónatas E.M. Machado e Iolanda Rodrigues de Brito são os autores deste estudo que pro-põe respostas a ques-tões relacionadas com a rapidez na produção de mensagens conju-gada com a revolução tecnológica atual.

jusFormulários ConsumoDa autoria de Elionora Cardoso, inclui for-mulários e minutas do direito do consumo, entre eles petições iniciais, requeri-mentos, denúncias, impugnações e recla-mações.

jusFormulários Atos NotariaisAssinada por Rui Januário e Margarida Lima, visa o exercício prático da atividade profissional do direito relacionada com os atos notariais. Inclui notas de legislação, de jurisprudência e de doutrina, bem como comentários de autor.

jusFormulários Contratos Civis 2ª EdiçãoJoana Roque Lino as-sina esta edição des-tinada ao exercício prático da atividade profissional do direito em matéria civil e prática contratual.

Constituição da República portuguesa e Legislação ComplementarEsta obra, de Jorge Ba-celar Gouveia, propõe-se colmatar a lacåuna no mercado de conseguir obter numa só edição a variedade de diplomas relativos ao Direito Cons-titucional.

* Para beneficiar do desconto, basta aceder atra-vés dos seguintes links:http://loja.wkp.pt/epages/Wkp.sf/?ObjectPath=/Shops/Wkp/Categories/Estante-Advocatus ou http://bit.ly/estante-advocatus

Ou ainda, através de um dispositivo móvel, usando este QR Code:

Page 27: advocatus, 51

27 advocatus junho 2014

advocatus.ptTelevisão

EtV/Advocatus | Do quê que tra-ta o Direito da Aviação? Quais são as suas características par-ticulares?António Moura Portugal | Talvez três. Primeiro, um certo ecletismo, porque o Direito à Aviação é uma espécie de amálgama composta de vários ramos de Direito e que acaba por convocar questões de variadíssimos ramos do Direito. Uma segunda característica, que é quase óbvia, que é a sua natu-reza internacional: é por definição um ramo de Direito que nos obriga a ter essa componente internacio-nal. E uma terceira: acaba por ser um ramo do Direito envolto numa natureza técnica muito forte – todo ele anda à volta dos aviões, das aeronaves, da utilização do espaço aéreo, do acesso a infraestruturas aeroportuárias. Estas três caracte-rísticas acabam por ser uma boa

receita para lhe dar alguma com-plexidade e o desafio que alguns juristas gostam, como é o meu caso.

EtV/Advocatus | Como é que de-senvolveu esse gosto? É um sec-tor muito regulado?AMP | Sim, é muitíssimo regulado. É uma pergunta engraçada. Quan-do algumas pessoas perguntam o quê que eu faço e eu respondo, costumam pensar que quando era pequeno devia ser daquelas pes-soas que andam sempre a olhar para o céu. Mas não, não sabia sequer distinguir um Boeing de um Airbus. Mas são acasos da vida. Surgiu com um cliente que tínha-mos no escritório, em 1996, quan-do comecei a advogar, e a partir daí foi um nicho que se foi desen-volvendo. Investiguei, com aquela curiosidade própria de quem sai

“As questões relacionadas com as taxas têm fomentado muito trabalho. Também há trabalho a nível de reclamações de passageiros, a nível concorrencial – tem havido um processo de consolidação no setor - e algum contencioso”

dos bancos da faculdade, e sedu-ziu-me. A partir de um veio o outro. Ainda sou hoje diretor executivo da associação das companhias aéreas. Portanto, foi um amor que se foi desenvolvendo através das companhias aéreas e depois foi alargando para outros stakeholders importantes.

EtV/Advocatus | O quê que a erupção do vulcão na Islândia provocou de novo em termos de discussão na área do Direito da Aviação?AMP | Muitas dores de cabeça, para começar.

EtV/Advocatus | Foi uma ques-tão nova.AMP | Sim, como outras, nome-adamente os acidentes aéreos. A aviação tem uma componente muito mediática, nem sempre pe-

O Direito à Aviação foi o tema da entrevista do sócio da ABBC responsável pela área da aviação, António Moura Portugal, ao Direito a Falar. As taxas aeroportuárias, a regulamentação do setor e o desaparecimento do avião da Malaysia Airlines foram alguns dos assuntos abordados na edição do programa semanal, que é uma parceria entre a ETV e a revista Advocatus.

Aviação em discussão

Page 28: advocatus, 51

28 advocatus junho 2014

Televisão

las melhores razões. Neste caso, eu diria que pelas piores razões para os passageiros, porque cau-sou uma disrupção em termos de acesso ao aeroporto e na vida dos passageiros. Em primeiro lugar, o vulcão trouxe um desafio em perceber como é que um fenómeno natural pode, de um momento para o outro, parali-sar o tráfego aéreo na Europa. Aí foi notável a capacidade de reação das companhias aéreas e da indús-tria. Via-se funcionários a fazerem voluntariamente horas extraordiná-rias, no sentido de conseguir asse-gurar soluções. Criou um segundo nível e pôs à prova a coordenação entre as várias agências locais res-ponsáveis pela regulação da avia-ção, que também funcionou bem. E, em terceiro lugar, uma coisa que funcionou menos bem, que foi o apurar da responsabilidade, por-que toda esta operação envolveu custos e envolveu por parte das companhias aéreas uma assun-ção de todos os encargos relacio-nados com o redireccionamento de passageiros ou pelo menos com a busca de alternativas. Há a questão de saber se este é um caso

de força maior, e que objetivamente não deveria ser imputado às companhias. Essa foi a nota mais dissonante. Têm havido diversas posições por toda a Europa.

EtV/Advocatus | Esses proces-sos ainda correm em tribunal?AMP | Alguns sim. Outros, ainda a nível contraordenacional, porque as companhias aéreas têm um conjunto de deveres a nível de as-sistência ao passageiro, em que há um regulamento comunitário. E nos casos em que se entendeu que não houve cumprimento, os próprios reguladores iniciaram pro-cessos de contraordenação. Em Portugal, a experiência que tenho é que tem havido alguma compre-ensão e aceitação, tanto mais nos casos em que a companhia prova que deu essa assistência. Houve várias companhias, pelo que não posso fazer um retrato do setor. O que posso dizer é que o passageiro tem que ser protegido, mas criou esse enorme problema de saber quem é que fica com o encargo. O balanço que faço é que acabou por recair mais nas companhias aéreas do que em entidades europeias.

EtV/Advocatus | Este é um setor muito dominado por regulamen-tação internacional específica. Qual é a margem de manobra do Direito nacional?AMP | É, desde logo a nível inter-nacional, a nível das convenções e dos vários acordos que vão sendo feitos em diversas matérias. O cha-péu-de-chuva de tudo isto é a Con-venção de Chicago, assinada em 1944, onde foram estabelecidas as liberdades e onde os Estados con-trataram entre si a possibilidade de acesso, numa base de reciprocida-de, ao espaço aéreo de cada país e a exploração do tráfego e das rotas do ponto de vista comercial. E também a nível da ICAO [Interna-tional Civil Aviation Organization], que é a instituição da Organização das Nações Unidas que tem um papel a nível de segurança, não só nos procedimentos das próprias companhias, mas também perante terceiros e atos terroristas, ao nível dos direitos dos passageiros, com a Convenção de Montreal. Acaba por ser um setor que está muitís-simo regulado, numa base de con-venções e de acordos multinacio-nais plurilaterais. Num segundo nível – europeu – também tem havido uma enorme produção legislativa. Falo do céu único europeu, onde houve um pro-cesso de transferência das compe-tências dos países para a Comuni-dade. É a Comunidade que está a negociar os acordos de open skies com os Estados Unidos. Ao nível da regulamentação e dos direitos de passageiros, onde há regula-mentos comunitários a fixar obje-tivamente um conjunto de direitos para os passageiros e de deveres para as companhias aéreas. O quê que sobra, no fundo? Ao nível nacional, eu diria que, para além de margens ou de campos de atuação de desenvolvimento des-tas matérias, sobrará aquilo que diz respeito ao nosso território, à nossa infraestrutura e ao acesso à nossa infraestrutura em termos práticos. Falo, desse logo, ao nível dos ae-roportos e do modelo de relação económica para o acesso aos ae-roportos nacionais. Falo também ao nível contraordenacional, de-pois de definidos em que medida é que se aperta mais ou menos a malha às companhias incumpri-doras. Falo também de pequenas questões, ou mais relacionadas com aspetos como a transparência de preços. Mas tudo isto sempre sob um molde europeu, ou sob um chapéu internacional.

“Acaba por ser um ramo do Direito envolto numa natureza técnica muito forte – todo ele anda à volta dos aviões, das aeronaves, da utilização do espaço aéreo, do acesso a infraestruturas aeroportuárias”

Page 29: advocatus, 51

29 advocatus junho 2014

advocatus.pt

EtV/Advocatus | Mesmo na questão das taxas aeroportuá-rias?AMP | Aí existe uma diretiva comu-nitária, que fixa princípios. É uma das áreas onde tem havido alguns avanços e recuos. Tem havido uma tentação para ir mais além, mas tem sido uma área em que os Estados se têm mantido mais renitentes. Essa diretiva diz alguma coisa, mas não diz muito. Por cá, há liberdade, sobretudo, para definir o modelo. E foi isso que fez este governo, com a privatização recente da ANA, e, no fundo, grosso modo, com a pri-vatização dos aeroportos. Houve liberdade para definir, por exem-plo, se se considerava o aeroporto como um todo – e quando falo no aeroporto falo não só no lado ar, mas também toda a parte comer-cial – e aí a opção política foi de separar as coisas. Houve também liberdade na escolha do modelo de concessão e na escolha da privati-zação´. E aí a opção foi pela venda da ANA. E houve liberdade ao nível dos princípios da regulação – e aí a opção política também foi de dei-xar nas mãos do concessionário poderes e direitos para fixar o valor das taxas aeroportuárias, reservan-do um papel mais decorativo ao re-gulador, e deixando as companhias abandonadas à sua sorte e numa posição de alguma fragilidade. Onde houve possibilidade de o Estado português ter alguma li-berdade decisória terá prevale-cido, talvez, um interesse mais imediatista no encaixe de receita, aquando da privatização da ANA e, na minha opinião – e faço aqui a minha declaração de interesses, que estou, sobretudo, do lado das companhias aéreas – terá havido um negligenciar e deu-se a possi-bilidade de sobrecarregar dema-siado as companhias com essas taxas aeroportuárias.

EtV/Advocatus | O caso do avião da Malaysia Airlines também co-loca algumas questões difíceis de gerir no Direito à Aviação ou é um caso que está tipificado?AMP | Antes do Direito, eu diria que é um caso humano, que nos coloca algumas interrogações. Num mun-do em que nos sentimos quase monitorizados e vigiados, custa a crer que um avião possa desapare-cer assim, sem rasto. Reconduzindo-me à questão legal: coloca questões, desde logo, a nível de segurança. Há um anexo à Convenção de Chicago próprio

para este tipo de eventos e aciden-tes. E há protocolos estabelecidos em matéria de investigação. Numa base territorial, esses protocolos levam a que as várias entidades de aviação entrem em ação e lancem investigações. Depois há aqui um cruzar de investigação. Sem en-contrar a aeronave torna-se difícil avançar muito mais.No meio desta coordenação, e o responsável (o Ministério malaio) assumiu a condução, criou até um comité interministerial. No fundo, terá avocado a competência ao instituto de aviação local, pediu a colaboração de alguns. Sei que, nos termos do protocolo, a U.F.A. foi umas das primeiras entidades a entrar no terreno. A questão do desaparecimento do avião coloca, primeiro, a nível de investigação, um desafio: chegar a uma conclusão. Num segundo nível, vai colocar questões em ter-mos de responsabilidade civil. A Convenção de Montreal regula esta

matéria de dano por morte ou por lesão, e onde há limitações, o que também suscita questões jurídicas interessantes, nomeadamente rela-tivas à jurisdição onde os potenciais e as famílias lesadas poderão propor essa ação. Felizmente não tenho muita experiência em acompanhar processos deste tipo, mas creio que marcam uma carreira e uma vida, pelo que representam.

EtV/Advocatus | Esta área de ne-gócio da AbbC tem tido um au-mento nos últimos tempos? O quê que representa hoje na atividade da AbbC?AMP | Tem. É um dos pilares da ABBC. Tem sido, desde sempre, uma aposta da sociedade, que foi crescendo. De alguma forma, em Portugal e, no nosso caso, tem ha-vido bastantes questões ao nível re-gulatório. As questões relacionadas com as taxas têm fomentado muito trabalho. Também há trabalho a nível de reclamações de passageiros, a

nível concorrencial – tem havido um processo de consolidação no setor - e algum contencioso. Portugal tem conseguido, fruto de alguma flexibilidade legislativa, ser uma jurisdição com pergaminhos no setor da aviação. Acaba por ser também uma espécie de cluster da aviação executiva, o que é impor-tante porque há muitas companhias, apesar de sermos um país periféri-co em termos geográficos, que tem uma operação relevante em Portu-gal. Também a esse nível, de finan-ciamento e de registo de aeronaves, tem havido bastante trabalho. Este ecletismo do Direito da Aviação acaba por refletir-se também no tipo de trabalho. A nossa política tem sido a de criar uma equipa com alguma polivalência, mas temos três pesso-as dedicadas em full time apenas à aviação, coordenadas por mim. De-pois temos um conjunto de outros colegas no escritório que acabam por dar um input importante a nível laboral, de contencioso e fiscal.

Page 30: advocatus, 51

30 advocatus junho 2014

Entrevista

Durante muitos anos o problema da profissão de advogado foi “estar muito virada para dentro” e não se ter lembrado que “quem de facto conta é o cliente”. Quem pensa assim é João Vieira de Almeida, managing partner da VdA, uma das mais emblemáticas firmas de advogados de Portugal, já sondada para se unir a uma sociedade estrangeira e que se distingue da concorrência pela “permanente inquietação”.

João Vieira de Almeida, managing partner da VdA

O cliente é que conta

Advocatus | Quais as operações emblemáticas que destaca nos últimos anos?JVA | Temos quatro sectores fun-damentais: Bancário e Financeiro, Saúde, Infraestruturas e Telecomu-nicações. No primeiro temos feito muita coisa e pioneira, na Saúde temos uma intervenção muito for-te quer na área das farmacêuticas, quer noutras áreas. Nas Infraestru-turas sempre tivemos uma posição muito forte, quer na PPP, antes de

ser uma palavra “maldita”, quer na área da energia. Nas Telecomuni-cações temos um trabalho fortís-simo, sobretudo a nível regulatório e também muita coisa no plano da internacionalização.

Advocatus | referiu o pioneiris-mo de algumas operações no sector bancário e Financeiro. Quer especificar?JVA | A primeira securitização de créditos fiscais na Europa, por

exemplo. Há quatro anos que ga-nhamos o prémio de firma mais ati-va no mercado de capitais. Na área de dívida somos, de longe, a firma com mais prospetos emitidos. Re-centemente também trabalhámos nas privatizações e outros projetos muito relevantes de M&A.

Advocatus | A crise financeira implicou alguma redução de tra-balho?JVA | Temos 15 áreas de prática e

dentro delas o impacto da crise foi diferente. Umas melhoraram, ou-tras tiveram performances piores. Globalmente, nos últimos anos, as coisas têm corrido bem.

Advocatus | A crise obrigou a al-gumas mudanças na gestão da sociedade ou a alguns ajusta-mentos?JVA | A firma tem uma gestão pro-fissionalizada e o planeamento é uma preocupação séria. Mal a cri-

Page 31: advocatus, 51

31 advocatus junho 2014

Hermínio Santos, jornalista, [email protected]

se se anunciou tomámos uma série de medidas e a sociedade hoje, quer do ponto de vista da gestão, quer do próprio modelo de sociedade, tem algumas diferenças importantes.

Advocatus | Pode dar alguns exemplos?JVA | Por exemplo, todos os sócios são sócios de capital e têm um voto. Todos participam no modelo “lock- step”, que é completamente trans-parente.

Advocatus | O que é que distingue a VdA da concorrência?JVA | Uma inquietação permanen-te. Estamos permanentemente a questionar-nos, a procurar descobrir o que podemos fazer melhor. Isso tem razões históricas: quando o es-critório começou tínhamos um ca-beça de cartaz, que era o meu pai, e competíamos com escritórios que são hoje nossos concorrentes e que já tinham mais do que um cabeça de cartaz. Isso gerou sempre na VdA a necessidade de correr muito e de procurar formas de nos mantermos competitivos e atrativos no mercado. Esse espírito permaneceu e hoje é uma marca que leva a coisas como a nossa preocupação com a inovação e a gestão – e apontaria isso também como elemento diferenciador. Temos uma gestão muito profissionalizada e gente muito capaz.

Advocatus | O que é que quer dizer quando se refere a gestão muito profissionalizada? Há uma estru-tura permanentemente a olhar para a gestão, para os indicado-res?JVA | Sim. Temos um conselho de administração composto essencial-mente por sócios e que faz o acom-panhamento da sociedade e um comité executivo, onde estou eu e o resto são profissionais de gestão que fazem a gestão corrente. Tem gente muito capaz, muito treinada. Por exemplo, temos a trabalhar con-nosco uma pessoa que é o primeiro europeu formado em Georgetown em gestão de sociedades de advo-gados. O business development e o business intelligence são áreas às quais damos atenção há anos. Te-mos ferramentas informáticas pio-neiras, desenvolvidas por nós com consultores externos, em alguns ca-sos portugueses.

Advocatus | Como é que chega-ram ao primeiro europeu formado em Georgetown? Pesquisaram? recrutaram diretamente?JVA | Já cá estava quando foi fa-

Advocatus | Isso aplica-se a todas as pessoas da VdA? De quantas pessoas é que falamos?JVA | Temos 245 pessoas e aplica--se a todas. Esse foi um projeto interessante pois transformámos a inovação num dos nossos valores. Tínhamos quatro valores – equipa, qualidade, foco no cliente e inde-pendência – e acrescentámos a inovação porque a identificámos como fundamental. Quando fize-mos uma reunião com toda a equi-pa para comunicar esta ferramenta da inovação já tínhamos o perfil de cada um definido. Imediatamente a seguir a essa reunião todos os colaboradores tinham nos seus telemóveis o seu próprio perfil de inovação.

Advocatus | Esses valores tam-bém chegam a atividades como o pro bono, por exemplo?JVA | Estes valores chegam a to-

“Temos 15 áreas de prática e dentro delas o impacto da crise foi diferente. Umas melhoraram, outras tiveram performances piores. Globalmente, nos últimos anos, as coisas têm corrido bem”

“O business development e o business intelligence são áreas às quais damos atenção há anos. Temos ferramentas informáticas pioneiras, desenvolvidas por nós com consultores externos, em alguns casos portugueses.”

zer essa formação. Temos outra pessoa connosco, nos Recursos Humanos, que está a fazer um doutoramento com foco nas firmas de serviços profissionais. Uma das soluções que desenvolveu con-tribuiu para que ganhássemos o prémio do Financial Times de ino-vação. Trata-se de uma ferramenta que define o perfil de inovação de todas as pessoas que aqui traba-lham. Todos os colaboradores da VdA têm o seu perfil de inovação analisado – podem ser mais vira-dos para soluções conceptuais, de produto, de processo. Com esse perfil individual compôs-se o perfil da firma para perceber para onde é que temos mais ou menos foco e com isso pode-se, por exemplo, misturar os perfis de inovação de pessoas que fazem parte de de-terminados projetos. Esse perfil de inovação é também uma ferramen-ta única.

Page 32: advocatus, 51

32 advocatus junho 2014

Entrevista

A independência está no nosso ADN

Advocatus | A VdA já alguma vez foi sondada para se unir a uma sociedade estrangeira?JVA | Sim mas, como já afirmei anteriormente, independência é um dos nossos valores. Não é tabu, claro, e tudo é discutível mas essa independência é um valor que está impregnado no ADN da sociedade e por isso não parece que vá acontecer, pelo menos enquanto eu estiver aqui.

Advocatus | O Ministério da Justiça está sensível a alte-rações no sistema fiscal que regula as sociedades de ad-vogados? É uma questão im-portante para as sociedades?JVA | Não estou convencido que seja uma questão absolu-tamente vital. Percebo que há alguns temas importantes – de facto as outras profissões li-berais podem ter modelos de

organização diferentes – e bons argumentos para que os advoga-dos se possam organizar como entendam nas formas admitidas pela lei. É mais nesta perspetiva e não tanto pela razão fiscal em si. O incentivo que hoje existe nas sociedades de advogados é o de levantar o lucro todo. Não temos incentivo ao reinvestimento. Che-ga-se ao fim do ano e os sócios pagam pessoalmente imposto so-bre a totalidade do lucro apurado, independentemente do destino que lhe derem e de o conseguirem cobrar ou não.

Advocatus | Se fosse convidado para ministro da Justiça qual se-ria a sua principal prioridade?JVA | Mudar de cargo!

Advocatus | Enquanto cidadão, como é que olha para o rumo de Portugal?JVA | Com um misto de esperança

e de preocupação séria. Com esperança porque, tendo ob-servado aquilo porque passá-mos – e estamos ainda a pas-sar – nos últimos cinco anos, vejo, apesar de tudo, que há uma capacidade de regenera-ção, de reinvenção, das empre-sas e dos gestores portugueses que considero absolutamente notável e com uma capacidade de resposta que me surpreen-deu. Com preocupação porque penso que temos problemas muito sérios ainda por resolver, quer ao nível do equilíbrio das contas públicas, quer no de-semprego, que é dramático, e sobretudo porque não vejo na Europa capacidade efetiva de resposta às questões que têm a ver com o modelo de funcio-namento da União Europeia. E isso tem um impacto direto em Portugal, que tem uma econo-mia muito aberta e frágil.

“Temos um plano de pro bono que tem métricas anuais que são analisadas, comunicadas e vistas pelo conselho de administração. O modelo de atuação é completamente profissional”

das as áreas. O profissionalismo da gestão está no pro bono tam-bém. Para ter uma ideia de como trabalhamos nesta área enviámos para Londres duas advogadas antes de iniciarmos o programa. Temos um plano de pro bono que tem métricas anuais que são analisadas, comuni-cadas e vistas pelo conselho de ad-ministração. O modelo de atuação é completamente profissional. Ou seja, o nosso objetivo nesta área é que as horas pro bono tenham a mesma qualidade que as horas dos advoga-dos. Depois temos métricas – 3% das nossas horas têm que ser pro bono – e alinhámos os incentivos dos advogados (na sua avaliação são motivados a dar horas para o pro bono e elas contam como se fossem horas de cliente). Olhamos para esta área de uma forma completamente profissional.

Advocatus | A Academia VdA está a fazer cinco anos. O que é que os motivou a criar esta Aca-demia?JVA | Quando começou a crise tí-

Page 33: advocatus, 51

33 advocatus junho 2014

“Tínhamos quatro valores – equipa, qualidade, foco no cliente e independência – e acrescentámos a inovação porque a identificámos como fundamental.”

nhamos um leque de opções sobre a mesa e uma delas era aproveitá--la para fazermos um investimento para o futuro, na esperança e na convicção de que sairíamos de cri-se e que o faríamos a uma boa ve-locidade. Para que isso aconteces-se tínhamos que fazer determinado tipo de investimentos. No princípio da crise definimos alguns desses investimentos chave que tiveram a ver com plataformas tecnológicas e a formação dos advogados, que foi colocado no topo das priorida-des. Criámos então a Academia que também identificámos como uma forma de nos levar mais per-to do mundo académico e das fa-culdades. Temos protocolos quer em Portugal quer em outros paí-ses do espaço lusófono. Em cinco anos demos mais de 10 mil horas de formação, mais de 200 bolsas e certificámos a Academia – é a única entidade certificada fora das faculdades para dar formação em matéria jurídica ligada a uma socie-dade de advogados. Tenho imenso orgulho no projeto.

Advocatus | Qual é a abordagem que a sociedade faz à internacio-nalização?JVA | É um dos eixos fundamen-tais da nossa estratégia. Temos presença própria em Timor-Leste e duas parcerias bastante fortes em Moçambique e em Angola – o regime regulatório não permite a presença direta.

Advocatus | Uma das suas áreas é o M&A e o Corporate Finance. Que tendências especiais é que observa nessa área em Portugal?JVA | O atual responsável por essa área é o Jorge Bleck, uma contra-tação recente que foi muito feliz e com grande sucesso quer no plano da integração, que foi muito fácil, quer noutros planos – já nos per-mitiu crescer e aprender em termos de M&A. Foi uma situação win-win pois penso que ele também está satisfeito. Em termos de tendên-cias aquilo que há destacar neste momento em que falamos é o facto de as perspetivas serem mais ani-madoras. No M&A temos um pipe-

line que é muitíssimo positivo e não são só as privatizações - e penso que elas têm um lado muito im-portante, principalmente de motor desta área pois permitem captar o investimento estrangeiro, promo-vendo a sua credibilização.

Advocatus | As empresas por-tuguesas estão mais atentas ao private equity como alternativa ao financiamento bancário, que tem os constrangimentos que conhecemos?JVA | É principalmente por cau-sa disso que estão mais atentas. Já havia bastante investimento de private equity em Portugal, que tem uma natureza especial, com as suas próprias condicionantes. A maior parte das vezes implica uma adaptação, do ponto de vis-ta cultural, de quem está e fica nas empresas, um trabalho muito in-tensivo no alinhamento de interes-ses entre quem entra e quem fica e a gestão da empresa. Penso que é uma alternativa interessante que temos visto crescer.

“Estamos permanentemente a questionar-nos, a procurar descobrir o que podemos fazer melhor”

advocatus.pt

Page 34: advocatus, 51

34 advocatus junho 2014

Entrevista

Advocatus | É mais difícil ser ad-vogado hoje ou quando entrou na profissão?JVA | É diferente. Quando entrei era o quarto advogado, o escritório era bastante mais pequeno, um para-digma completamente diferente. Havia muito para fazer, muito mais terreno para desbravar e o país es-tava a crescer a dois dígitos. Nessa perspetiva, a de ter uma oportuni-dade para crescer, julgo que talvez fosse mais fácil. Naquilo que é a essência do papel do advogado - a responsabilidade e proximidade com o cliente, a experiência, o co-nhecimento técnico e os aspetos éticos e deontológicos - as coisas mudaram muitas vezes no proces-so e no modo mas não naquilo que é essencial. Os recém-licenciados vêm hoje mais bem preparados do

que nós no plano técnico mas in-felizmente continuam “imprepara-dos” no que diz respeito à capaci-dade de integração no mercado de trabalho e numa máquina como é a de uma sociedade de advogados desta dimensão. Esse investimento tem que se feito pelas sociedades.

Advocatus | O sistema de justiça em Portugal acompanhou a evo-lução das sociedades e da for-mação em Direito? também se modernizou?JVA | Não acompanhou mas, nos últimos anos, alguma coisa mudou. Se reparar, desde há 15 anos que o foco na justiça começou a ser cres-cente. Os problemas não se resol-veram mas penso que se plantou a semente da preocupação e de que era preciso fazer qualquer coi-sa. Mas estes processos demoram muito tempo e os interesses corpo-rativos são enormes em todos os agentes da justiça. Começou por se mexer no processo e se reparar bem houve uma onda de desbu-rocratização muito importante. Do ponto de vista do funcionamento dos tribunais as coisas andaram muito mais devagar e com as so-ciedades de advogados muito à frente do resto dos agentes da jus-tiça.

Advogados | As sociedades de advogados têm sido um motor de mudança no sector da justiça?JVA | Penso que têm contribuído para a mudança.

Advocatus | Quer dar exemplos?JVA | A própria perceção do que era a sociedade de advogados e o seu modelo de funcionamento. Há quem, infelizmente, ainda hoje não perceba o que é uma sociedade de advogados e isso tem custos pois há clivagens dentro da clas-se que têm a ver, essencialmente, com a falta de comunicação e de conhecimento. Hoje o paradigma é completamente diferente. Quando me juntei ao escritório o mundo era o da oferta, os advogados é que definiam quem estavam dispostos a receber. Agora, o mundo é da procura, do consumidor – e não tenho medo nenhum dessa palavra - e ainda bem. Ainda assim há um enorme caminho a fazer mas estou seguro de que o vamos fazer. Esse caminho é em dois sentidos: por um lado, tentar vencer as ideias feitas e os preconceitos acerca do que são as grandes sociedades de advogados, que muita gente pensa que são um centro de lobby e de

exploração de “trabalho infantil”, quando não são uma coisa nem outra; e por outro, uma transparên-cia ainda maior face aos clientes. O problema da profissão durante mais de uma centena de anos foi estar muito virada para dentro e poucas vezes nos lembrarmos que quem de facto conta é o cliente. Quanto maior transparência melhor e penso que isso se aplica a todos os advogados. Por isso a autorre-gulação não deve ser um tabú e os clientes também devem ter direito à palavra. A multidisciplinaridade, não interessando à VdA enquanto opção, também não nos assusta e aí o que interessa é que haja uma boa regulação. Saber quanto é que as sociedades faturam, por exem-plo, também não deveria ser um mistério.

“Os recém-licenciados vêm hoje mais bem preparados do que nós no plano técnico mas infelizmente continuam “impreparados” no que diz respeito à capacidade de integração no mercado de trabalho e numa máquina como é a de uma sociedade de advogados desta dimensão. Esse investimento tem que se feito pelas sociedades.”

“O profissionalismo da gestão está no pro bono também. Para ter uma ideia de como trabalhamos nesta área enviámos para Londres duas advogadas antes de iniciarmos o programa”

“No M&A temos um pipeline que é muitíssimo positivo e não são só as privatizações - e penso que elas têm um lado muito importante, principalmente de motor desta área pois permitem captar o investimento estrangeiro, promovendo a sua credibilização”

advocatus.pt

Page 35: advocatus, 51

35 advocatus junho 2014

advocatus.pt

Page 36: advocatus, 51

36 advocatus junho 2014

Proteção de dados

Esquecimento?É provável que a Google irá (i) recusar a grande maioria dos pedidos; (ii) provavelmente os resultados continuarão a aparecer fora do espaço da UE; e, (iii) à semelhança do que acontece com a remoção de conteúdos que violem direitos de autor, poderá aparecer um aviso idêntico.

MArCO AlExANDrE SAiAS

Advogado associado da Pedro Raposo & Associados

“O ‘direito ao esquecimento’ significa que o titular dos dados tem a possibilidade de exigir que o tratamento da sua informação cesse e que a mesma seja apagada, caso não existam razões justificadas para que o tratamento continue, não correspondendo assim a um direito novo”

Na sequência do Acórdão de 13 de Maio de 2014 do Tribunal de Justiça (TJUE) no âmbito do processo em que foram partes a “Google Spain, S.L.” e a “Google Inc.”, contra, a “Agencia Española de Protección de Datos (AEPD)” e “Mario Costeja González”, tem sido explorada a ideia de que se impôs o chamado “direito ao esquecimento”. ANtECEDENtESA 5 de Março de 2010, Mario Coste-ja González apresentou uma queixa junto à AEPD, na qual referia que, quando se pesquisava o seu nome no motor de busca da Google, a lista de resultados exibia ligações para duas páginas no diário La Vanguar-dia relativas a um anúncio de uma venda de imóveis em hasta pública destinado a cobrar as dívidas à Se-gurança Social.Mario Costeja González pedia que o La Vanguardia suprimisse ou al-terasse as páginas em causa de modo a que os seus dados pessoais deixassem de aparecer, ou, que se utilizassem ferramentas para pro-teger esses mesmos dados, mas também, que se ordenasse à Goo-gle que suprimisse ou ocultasse os seus dados pessoais para que estes deixassem de ser exibidos nos resultados, uma vez que o proces-so estava resolvido há vários anos e não havia nem atualidade nem

relevância na referência, tendo os dados sido conservados para além do razoável.

ESQUECIMENtO?A ideia de proteção dos dados pes-soais reside na proteção das liber-dades e dos direitos fundamentais dos indivíduos, concretamente, o seu direito à vida privada e ao tra-tamento dos seus dados pessoais.Os dados pessoais são simples-mente informação sobre um indiví-duo que vai permitir “identificá-lo”, e que, por sua vez, podem ser objeto de várias operações de tratamento: recolha, registo, organização, con-servação, adaptação ou alteração, recuperação, consulta, utilização, comunicação por transmissão, difusão ou qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição, genericamente desig-nadas como tratamento.As operações realizadas pelos mo-tores de busca exploram as infor-mações publicadas na internet, «de forma automatizada, constante e sistemática”1, sendo os resultados da pesquisa “recolhidos a par-tir de conteúdos que o motor de pesquisa tratou previamente. Isto significa que um motor de pesquisa recupera conteúdos de sítios web existentes e copia, analisa e indexa esses conteúdos nos seus próprios

dispositivos”2, o que representa um tratamento de dados na segundo a alínea b) do artigo 2º da Diretiva 95/46/CE3.As informações são recolhidas, pro-cessadas, organizadas através de programas de indexação, conserva-das nos servidores, pesquisáveis, e, comunicadas através de uma página web, o que na sequência do acórdão Lindqvist (C101/01) é um tratamento de dados realizado pelos operado-res dos motores de busca, uma vez que estes determinam as finalidades e os meios dessa atividade com vista a facilitar o acesso às mesmas pelos utilizadores através da pesqui-sa e podem conduzir à obtenção de uma visão global e estruturada de uma pessoa, obtendo-se um perfil, que pode afetar os direitos funda-mentais à vida privada e à proteção dos dados pessoais4.Este tratamento está sujeito à legis-lação de proteção de dados, não sendo prejudicado pelo facto de es-ses dados já terem sido publicados5, nem pelo motor de busca efetuar as mesmas operações com outras informações, não as distinguindo dos dados pessoais6.O “direito ao esquecimento” signi-fica que o titular dos dados tem a possibilidade de exigir que o trata-mento da sua informação cesse e que a mesma seja apagada, caso não existam razões justificadas para que o tratamento continue, não

1 Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (regulamento geral sobre a proteção de dados), conforme o texto adotado pelo Parlamento Europeu em Primeira Leitura a 12 de Março de 2014 (T7-0212/2014)

2 Acórdão de 13 de Maio de 2014, número 28.3 Conclusões do Advogado-Geral Niilo Jääskinen, 25 de junho de 2013. Ainda, p. 14 e ss. do «Parecer 1/2008 sobre questões de proteção dos dados ligadas aos motores

de pesquisa” do Grupo de Trabalho do Artigo 29.º Para a Proteção Dos Dados.4 Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995.5 Acórdão de 13 de Maio de 2014, números 80 e ss.6 De referir que a diferença entre informação “pública” e “publicada”, é importante.

Page 37: advocatus, 51

37 advocatus junho 2014

advocatus.pt

“A Proposta de Regulamento1 concretiza o direito do titular dos dados de se opor e de exigir o ’apagamento’ dos seus dados (artigo 17º), tendo sido inicialmente apresentado como ‘direito a ser esquecido’, e emendado para ‘direito ao apagamento de dados’”

“O TJUE tem presente que, se por razões especiais, nomeadamente, um interesse preponderante do público em ter acesso às informações em causa devido ao papel desempenhado por essa pessoa na vida pública, deve excecionar-se a mencionada prevalência”

7 V. “Parecer 1/2008”.8 Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação

desses dados (regulamento geral sobre a proteção de dados), conforme o texto adotado pelo Parlamento Europeu em Primeira Leitura a 12 de Março de 2014 (T7-0212/2014)

9 Acórdão de 13 de Maio de 2014, números 97 e ss.

correspondendo assim a um direi-to novo, pois a Diretiva, no artigo 14°, dispõe que os Estados devem reconhecer ao titular dos dados o direito de «se opor em qualquer al-tura, por razões preponderantes e legítimas relacionadas com a sua situação particular, a que os dados que lhe digam respeito sejam obje-to de tratamento”, continuando no artigo 28°, que as Autoridades Na-cionais devem dispor “de poderes efetivos de intervenção, tais como, por exemplo, o (…) de ordenar o bloqueio, o apagamento ou a des-truição dos dados (…)”.A Proposta de Regulamento7 con-cretiza o direito do titular dos dados de se opor e de exigir o “apaga-mento” dos seus dados (artigo 17º), tendo sido inicialmente apresentado como “direito a ser esquecido”, e emendado para “direito ao apaga-mento de dados”, não diferindo na sua substância do objetivo a que já se propunha a Diretiva, garantindo contudo uma maior autonomia e concretização prática ao titular dos dados.

ACórDãONa resposta à terceira questão pre-judicial apresentada pela Audiência Nacional, considera o TJUE8 que o titular dos dados pode, tendo em conta os seus direitos fundamen-tais, “requerer que a informação em questão deixe de estar à disposição do grande público através da sua inclusão numa lista de resultados

deste tipo” e que, “esses direitos prevalecem, em princípio, não só sobre o interesse económico do operador do motor de busca mas também sobre o interesse desse público em encontrar a referida in-formação durante uma pesquisa sobre o nome dessa pessoa.”O TJUE tem presente que, se por razões especiais, nomeadamente, um interesse preponderante do pú-blico em ter acesso às informações em causa devido ao papel desem-penhado por essa pessoa na vida pública, deve excecionar-se a men-cionada prevalência.Pelo que, no caso em apreço, o TJUE considera que não parece existirem razões especiais que justi-fiquem um interesse preponderante do público em ter acesso às infor-mações em causa, sendo legítimo ao titular, ao abrigo dos artigos 12°, alínea b), e 14°, primeiro parágra-fo, alínea a), da Diretiva, exigir a supressão das referidas ligações dessa lista de resultados.

PóS-ACórDãONa sequência desta decisão, a Goo-gle apresentou a sua solução para cumprimento das solicitações de apagamento/remoção de dados: um formulário, o que, apesar de não ser exatamente inovador, segue a linha de procedimentos da empresa no que respeita à retirada de conteú-dos, como acontece com aqueles que violam direitos de autor e direi-tos conexos, sendo muito provável

que a Google irá (i) recusar a grande maioria dos pedidos; (ii) provavel-mente os resultados continuarão a aparecer fora do espaço da UE; e, (iii) à semelhança do que acontece com a remoção de conteúdos que violem direitos de autor, poderá aparecer um aviso idêntico.

Page 38: advocatus, 51

38 advocatus junho 2014

Jet Advocatus

Produtividade e qualidade e o capital intelectual foram os temas principais do 7.º Encontro Nacional das Sociedades de Advogados de Portugal organizado pela ASAP. João Afonso Fialho, o presidente da Associação, fez as honras da casa e abriu a sessão de uma iniciativa que juntou a Bastonária da Ordem dos Advogados, Elina Fraga, e a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, que anunciou em primeira mão algumas novidades sobre o projeto do novo estatuto da Ordem dos Advogados.

Sociedades debatem futuro

Manuel Santos Vítor, managing partner da PLMJ

Gonçalo Anastácio, da SRS (à direita) e João Nuno Azevedo Neves, da ABBC

João Espanha, da Espanha e Associados

António Jaime Martins (à esquerda), presidente do CDL e Carlos Florentino, Presidente do CDE

Page 39: advocatus, 51

39 advocatus junho 2014

advocatus.pt

Da esquerda para a direita: Herminío Santos, Rogério Fernandes Ferreira, Filipa Mendes Pinto, Carlos Lucena e Nuno Abreu

A ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz

João Afonso Fialho, presidente da ASAP

Da esquerda para a direita: Pedro Pinto, Pedro Siza Vieira, Gonçalo Gama Lobo, Moray Mclaren e Raquel Valente

Da esquerda para a direita: Pedro Siza Vieira, Raquel Valente e Moray Mclaren

Elina Fraga, Bastonária da Ordem dos Advogados

Page 40: advocatus, 51

40 advocatus junho 2014

Marca

A história oficial começa no sé-culo xIx mas as raízes estão em 1559 e a marca foi formalmente criada em 1937. Confusos? Va-mos por partes. No site oficial da marca pode ler-se que o primeiro representante da família LeCoultre chegou ao vale do Joux em 1559. Pierre LeCoultre deixou a sua vila perto de Paris para se refugiar na Suíça, evitando as perseguições religiosas em França. Dedicou-se à agricultura e à exploração de madeiras. Em 1833, Antonie Le-Coultre criou, na vila de Sentier, a sua oficina relojoeira e começou a desenvolver os seus projetos e invenções.A primeira delas foi um instrumen-to para medir o mícron, o Milio-nomètre, criado em 1844. Com esta invenção LeCoultre es-tabeleceu o sistema métrico deci-mal como padrão para a indústria relojoeira. Três anos mais tarde desenvolveu o primeiro sistema de corda através de uma coroa, tornando-se desnecessária a utili-zação de uma chave para a corda. Em 1866, “quando cada compo-nente é fabricado, separadamen-te, em oficinas afastadas entre si”, como recorda uma publicação ofi-

Mais do que um relógioHá mais de 80 anos os oficiais ingleses que prestavam serviço na Índia andavam à procura de um relógio capaz de “sobreviver” ao ímpeto dos torneios de pólo. Para responder a esta necessidade nasceu o Reverso, um dos modelos mais famosos da Jaeger-LeCoultre, uma marca de relógios que já entrou para a eternidade com as suas invenções. Desde 1833, a partir do vale do Joux, na Suíça, que combina inovação com luxo, estilo e origininalidade.

cial da marca, nasceu a LeCoultre & Cie, a primeira manufatura do vale do Joux, criada por Antoine LeCoultre e pelo seu filho Elie.Foi já no século xx que a marca o LeCoultre “ganhou” o Jaeger, quando Jacques-David LeCoul-tre conheceu Edmond Jaeger. Os dois viriam a formar uma dupla de sucesso que continuou a surpre-ender o mundo na arte de medir o tempo – em 1928, por exemplo, apresentaram o “movimento per-pétuo virtual”, que foi aplicado no relógio de mesa Atmos – e levou à criação formal da marca Jaeger--LeCoultre, em 1937. No entanto, para o mercado norte-americano, e até 1970, continuou a ser usada apenas a assinatura LeCoultre.Segundo a marca, a criação do Milionomètre “marca uma etapa decisiva na procura da excelência e estará na origem de verdadeira cultura de precisão. Atualmente, “não são menos de 1242 calibres mecânicos diferentes os que fo-ram criados pela manufatura, ou seja mas de 190 cronógrafos e mais de 200 repetições de minu-tos”. Esta “criatividade ilimitada é protegida por 398 patentes”. Re-verso, Master Ultra Thin, Master

Control, Duométre, Rendez-Vous, Deep Sea, Amvox e Atmos são algumas dos nomes da atual cole-ção Jaeger-LeCoultre.A marca tem também uma ligação especial a Portugal através do seu representante no país, a Torres Distribuição. No ano 2000 foi lançado o projeto “Arte Portuguesa” que consiste na representação plástica do tempo por parte de vários artistas nacio-nais. O primeiro foi Júlio Pomar, seguindo-se Manuel Cargaleiro, Paula Rego, José de Guimarães e Julião Sarmento. Todos trabalha-ram com um modelo Reverso em edição limitada.

No ano 2000 foi lançado o projeto Arte Portuguesaque consiste na representação plástica do tempo por parte de vários artistas nacionais. O primeiro foi Júlio Pomar

40 advocatus junho 2014

Page 41: advocatus, 51

41 advocatus junho 2014

Em 1959, a marca desenvolveu um relógio integralmente pen-sado para responder às expec-tativas dos mergulhadores. Esta realização relojoeira era “tão ex-cecional para a época quanto a indicação acústica que assinala-

Com esta coleção, “nunca a mais alta tecnologia pareceu tão simples, tão óbvia e tão pura”. Para além de serem “notavelmente finos”, os re-lógios Master Ultra Thin distinguem--se por um vasto leque de funções complementares. À indicação da hora pode ainda acrescentar-se uma

reversoO Reverso foi criado em 1931, quando oficiais ingleses radicados na Índia tentavam encontrar, em vão, um relógio capaz de sobreviver ao ím-peto dos torneios de pólo. Na vanguarda há dé-cadas, a sua celebérrima caixa reversível é uma verdadeira proeza técnica, complexa, com mais de 50 peças componentes. O revirar da caixa a 180 graus permite-lhe proteger o mostrador do relógio. Um símbolo para os amantes da alta re-lojoaria e os estetas da Art Déco.

Jaeger-LeCoultre, Edição 2013-2014

Jaeger-leCoultre Deep Sea

41 advocatus junho 2014

advocatus.pt

reserva de corda, um cronógrafo, um calendário perpétuo ou ainda um tur-bilhão. Uma curiosidade: em 1907, a marca lançou um relógio de bolso equipado com o Calibre LeCoultre 145, o mais fino para a época. Foi fabricado durante cerca de meio sé-culo numa série de 400 exemplares.

va o momento em que o mergu-lhador tinha de regressar progres-sivamente à superfície”. Esta é a descrição para o Memovox Deep Sea, o primeiro relógio automá-tico de mergulho equipado com alarme mecânico.

Master ultra Thin

Page 42: advocatus, 51

42 advocatus junho 2014

Autor japonês, com romances de grande sucesso em todo o mundo, com um retrato profundo do Japão moderno, de que destaco a trilogia 1Q84, partilha o que pensa quando corre. Algo que é familiar a quem também corre grandes distâncias. Enquanto corre, discorre…o corpo não pára, a mente não pára. Relata a transformação na sua vida que resulta da corrida. Murakami come-çou a correr “tarde”, com 33 anos, decide viver da escrita, deixa o bar de jazz de que era proprietário, pas-sa a correr 10km por dia, corre a verdadeira maratona (ainda que “ao contrário”, de Atenas para Maratona)

e passa a participar numa maratona por ano. Entusiasma-se com o triatlo e (re)aprende a nadar e andar de bicicleta, para a competição. O seu corpo transforma-se, a sua mente transforma-se. A determinação do corredor de fundo coincide com a determinação do escritor, que de-cide viver da escrita, escrevendo também todos os dias sistematica-mente. “Vendo bem, em que penso eu, exactamente, enquanto corro? Para dizer a verdade, não tenho a mínima ideia…Corro, só isso. Corro no vazio. Dito de outro modo: corro para atingir o vazio. No entanto, há sempre um pensamento ou outro que

acaba por se introduzir nesse vazio. O espírito humano não pode ser um vazio completo. As emoções dos homens não se revelam suficien-temente fortes ou consistentes, ao ponto de albergarem o vazio. Quero com isto dizer que os pensamentos e ideias que invadem o meu espí-rito enquanto corro permanecem subordinados a esse espaço oco. Na medida em que lhes falta con-teúdo, mais não são do que pen-samentos ao correr da pena que têm como eixo a natureza do pró-prio vazio. As coisas que me vêm à cabeça enquanto corro são como nuvens no céu. Nuvens das mais

diferentes formas e de diferentes tamanhos, que vão e vêm enquan-to o céu permanece o mesmo de sempre. As nuvens não passam de convidados. Aproximam-se a passo, para depois se afastarem e desaparecerem no horizonte. Fica apenas o céu. Existe, ao mesmo tempo que não existe, o céu. Tem substância e ao mesmo tempo não tem. E nós limitamo-nos a acei-tar a existência desse recipiente incomensurável tal como ele é e deixamo-nos envolver por ele. E isso é qualquer coisa de profun-damente maravilhoso. Digam o que disserem.”

Miguel Castro pereira

Miguel Castro Pereira, managing partner da Abreu Advogados

O livro de advocatus.pt

Page 43: advocatus, 51

43 advocatus junho 2014

Www

A PLMJ foi eleita a melhor sociedade de advogados do ano, em Portugal, na área fiscal, pela International Tax Review. O prémio “Portugal Tax Firm of the Year 2014 é atribuído em função do número, complexidade e inovação das operações em que a sociedade es-teve envolvida ao longo do ano. Assim,

plMJ eleita melhor firma fiscal na international Tax review

China no caminho da internacionalização da Sérvulo

Who’s Who legal escolhe MlgTS e MC&AA Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (MLGTS) e a MC&A, em associação com a Mota Veiga Advogados, foram distinguidas pela Who’s Who Legal em análise de mercado legal na área de seguros e resseguros. A lista, que destaca 282 sociedades e 570 advogados a nível internacional, recomenda dois advogados destas sociedades, entre os melhores cau-sídicos de seguros e resseguros do mundo: a sócia da MLGTS Luísa So-ares da Silva e o responsável pela filial sueca da MC&A, Peter Morawetz.

NOTÍCiAS

advocatus.ptadvocatus.pt

no ano passado, a equipa assessorou algumas das operações de reestru-turação, privatização e contencioso tributário “mais emblemáticas” em Portugal, tendo ainda reforçado o seu posicionamento internacional, através da articulação com os escritórios em Angola, Moçambique e Suíça.

A Sérvulo celebrou com a Yin-gke, uma sociedade de advo-gados chinesa, um acordo de parceria para intensificar a prestação de serviços jurídi-cos a clientes na China, em Portugal e nos países de língua oficial portuguesa.Além de poder contribuir para o reforço da segurança jurídica na expansão das exportações portuguesas, o protocolo visa “acomodar a receção do in-vestimento direto estrangeiro, agora que Portugal está de volta aos mercados depois de ter anunciado a saída formal do programa da Troika”.Presente nos quatro conti-nentes, com 43 escritórios e 2500 advogados, a sociedade de advogados asiática tem-se dedicado sobretudo aos sec-tores da energia, alta tecnolo-gia, ciências da vida e saúde, imobiliário, construção, banca e financeiro.

A VdAcademia, entidade de incentivo ao conhecimento e à investigação jurídica criada no âmbito da Vieira de Almeida e Associados, está a celebrar cinco anos de atividade. Presidida por Rodrigo Este-ves de Oliveira, a VdAcademia apresenta-se como uma “ver-dadeira plataforma para a ino-vação e preparação do futuro da VdA e do mercado em que se insere”. Há muito – afirma o presidente, a propósito da efeméride – que extravasou o patamar da atualização do

VdAcademia assinala cinco anos

saber da sociedade de advogados que a constituiu para avançar para o meio académico e profissional enquanto associação certificada

de formação”.

Page 44: advocatus, 51

44 advocatus junho 2014

Www

>> SOFIA GALVÃO LANçA PROJETO PRóPRIO

>> SOFIA GALVÃO EM ENTREVISTA: “SOU UMA ADVOGADA HANDS ON”

>>VASCONCELOS ARRUDA & ASSOCIADOS AUMENTA EQUIPA

>> CDL CRIA VINHETA PARA COMBATER A PROCURADORIA ILÍCITA

>> CGP ASSESSORA COMISSÃO LIQUIDATÁRIA DO BPP

páginas vistas As mais pArTilHADAS>> ROCK’N’LAW JÁ MExE E APOIA RE-FOOD

>> SOFIA GALVÃO LANçA PROJETO PRóPRIO

>> RFF TEM DOIS NOVOS ÁRBITROS FISCAIS NO CAAD

>> MAPA JUDICIÁRIO: OA APROVA QUEIxA-CRIME CONTRA GOVERNO

>> SOFIA GALVÃO EM ENTREVISTA: “SOU UMA ADVOGADA HANDS ON”

o site do advocatus em maio

Ordem aprova queixa-crime contra governo

A Ordem dos Advogados (OA) apro-vou, na assembleia-geral extraordiná-ria de dia 30 de junho, a apresentação de uma queixa-crime contra todos os membros do governo por atentado contra o Estado de Direito. Na ori-gem da deliberação, aprovada pela maioria dos quase 700 advogados representados na reunião, está o novo mapa judiciário. Foi também decidida a organização, em conjunto com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), de um protesto contra a reorganização judiciária em frente ao Parlamento, previsto para dia 11 de julho.

Cgp assessora bancos VdA assessora governo de Cabo Verde A equipa da Vieira de Almeida & Asso-ciados (VdA) liderada pelo sócio Rodri-go Esteves de Oliveira e pela associada coordenadora Catarina Pinto Correia está a prestar assessoria ao governo de Cabo Verde na elaboração de diplomas legais na área do direito administrativo.Depois de ter elaborado os antepro-jetos do novo Código da Contratação Pública e do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas de Cabo Verde, a VdA irá agora auxiliar na elaboração de diplomas como o regime das privatizações e o regime das parcerias público-privadas. O re-gime dos contratos de concessão e o regime do domínio público também estão contemplados nesta assessoria.

A equipa de mercado de capitais da Cuatrecasas, Gonçalves Pe-reira (CGP) assessorou o Banif na operação de aumento do capital social, no montante de 138,5 mi-lhões de euros. A oferta pública de subscrição “não implicou o des-taque e negociação de direitos de preferência”, assegura a CGP em comunicado, acrescentando que a oferta pública foi “dirigida ao pú-blico em geral mas com alocação prioritária aos acionistas”.Entretanto, a equipa da CGP lide-

rada pela sócia Mafalda Ferreira Santos foi escolhida para repre-sentar a comissão liquidatária do Banco Privado Português (BPP) no processo de qualificação da in-solvência como culposa. Recorde--se que o fundador do BPP, João Rendeiro, e outros cinco ex-admi-nistradores foram considerados responsáveis pela insolvência do banco pelo Tribunal do Comércio de Lisboa, ficando inibidos de exercer atividade comercial du-rante oito anos.

A PLMJ acaba de lançar o “Lis-bon Investments & Avenida Lu-xury Retail Projects”. Coordena-do pelo sócio Tiago Mendonça de Castro, este é um serviço es-pecializado de aconselhamento jurídico ao desenvolvimento de projetos imobiliários e de ins-talação de lojas de retalho de artigos de luxo em Lisboa.Destina-se a investidores imo-

biliários e operadores de retalho que pretendam promover proje-tos de reabilitação urbana, cons-trução, promoção imobiliária, instalação e licenciamento de lojas de marcas internacionais, artigos de luxo, hotéis e esta-belecimentos de restauração na cidade de Lisboa, sobretudo na zona classificada da Avenida da Liberdade/ Baixa/ Chiado.

plMJ com equipa para imobiliário de luxo

Page 45: advocatus, 51

45 advocatus junho 2014

SIM, desejo assinar o jornal Advocatus com o custo total de 180 euros (12 edições).

Toda a Informação por apenas 180 eUros

FOrMAS DE PAGAMENtO:

Transferência bancária para o NIB 0007 0000 16658500253 23. Envio do comprovativo para o fax 210 435 935 ou através do email [email protected]

Cheque à ordem de Newsengage – Media, Conteúdos e Comunidades, SA, Av. Infante D. Henrique, nº 333 H, 37, 1800-282 Lisboa

AssinaturaA oferta será entregue após boa cobrança.

www.advocatus.pt O agregador da advocacia

NuNO gAlVãO TElES

ANA FilipA JANiNE

pAulO NETO

MiguEl C. rEiS

pessoasJuntou-se a Pedro Amaral e Almeida e a Hugo Nunes para criar a Sofia Galvão Advogados. O novo es-critório vai dedicar-se em exclusivo a questões rela-cionadas com o território, nomeadamente imobili-ário, urbanismo, turismo, transportes, infraestru-turas, mar, agricultura e florestas. A nova boutique aposta, assim, na diferen-ciação.

É o mais recente refor-ço do departamento de direito fiscal da Cua-trecasas, Gonçalves Pereira em Portugal. A advogada é licen-ciada em direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e tem uma pós-graduação em fiscalidade na Universi-dade Católica.

É o novo sócio da PLMJ, que irá reforçar o escritório do Porto. Transita da Gar-rigues e é o quarto sócio a integrar a equipa de Direito Fiscal, liderada por João Magalhães Ramalho. O fis-calista conta com mais de 25 anos de experiência na assessoria jurídica a clientes em assuntos de tributação nacional e internacional.

Foi nomeado Regional Vice Chair of the Mana-ging Partners Committee da Lex Mundi, uma asso-ciação de sociedades de advogados independen-tes. O managing partner da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados junta-se, assim, aos managing partners das sociedades membros da associação, que está em mais de 100 países.

Foi eleito vice-presidente da AEA - International Lawyers Network. O senior partner da Diogo, Neto, Marques e As-sociados cumpriu três mandatos consecutivos como coordenador para a Europa desta asso-ciação internacional de advogados sedeada em Alicante, Espanha.

SOFiA gAlVãO

advocatus.pt

Os dados recolhidos são processados automaticamente pela Newsengage – Media, Conteúdos e Comunidades, SA e destinam-se à gestão do seu pedido e à apresentação de futuras propostas. O seu fornecimento é facultativo, sendo-lhe garantido o acesso à respetiva retificação. Caso não pretenda receber propostas comerciais de outras entidades, assinale aqui

Page 46: advocatus, 51

46 advocatus junho 2014

Montra

óculos de estrelaA Roberto Cavalli Eyewear lança “Red Carpet Collection. Trata-se de uma coleção cápsula exclusiva de óculos de sol inspirados no encantamento pelo mundo das estrelas. Elaborados com cristais Swarovski e designs em animal print, os modelos são criados com perícia artesanal. A coleção está disponível para a estação primavera/verão 2014, sendo os modelos apresentados num estojo dourado.

Criar novos clássicosBecomes Me é a nova poltrona de edição limitada da Munna, que faz parte da coleção Dress Me. A peça é inspirada no Jardim do Éden, como um santuário, mantendo a filosofia de design com apelo intemporal da marca, com uma assinatura de elogio e elevação da produção artesanal. Desenvolvida com a exclusividade em mente, a coleção inclui peças concebidas para projetos especializados, coleções privadas e galeristas, todas numeradas e assinadas pelos seus criadores.

Sedução num frascoTrussardi My Name é a nova fragância da marca italiana. Este perfume pretende explorar as áreas mais femininas e sensoriais do mundo comunicativo da marca que representa. A fragância é uma composição delicada de violeta branca e flor de heliotrópio, conjugada com lilás, arum, baunilha, almíscar e ambroxan. O frasco é inspirado na essência da feminilidade.

Ouro coberto de diamantes

Tradição no pulsoSão três os novos cronógrafos masculinos da Lorus. De design clássico e intemporal, os modelos têm caixa em aço de 43 mm e indicador do dia do mês. Estão disponíveis em três versões: dourada ou rose gold, ambas com bracelete em pele castanha, e o modelo em aço com bracelete em pele preta.

Um anel de proporções extravagantes, dois colares e uma pulseira que reinterpreta o

freio fazem parte da nova linha da coleção Galop Hermès. O cavalo, enquanto emble-ma da marca, empresta o seu perfil a estas

joias em ouro rosa e ouro branco inteira-mente cobertas por diamantes. Na linha, o freio - um objeto funcional por excelência

- é transformado em cintas de ouro, ao passo que as correntes, que são montadas e ajustadas à mão, formam um tecido dou-rado. Já os aros e o fecho são inteiramente

cobertos por diamantes.

Page 47: advocatus, 51

47 advocatus junho 2014

advocatus.pt20142015

DIREITO EMPRESARIAL3ª edição

DIREITO ADMINISTRATIVO8ª edição

DIREITO E GESTÃO8ª edição PARCEIROS CMS Rui Pena & Arnaut | Garrigues | Uría Menéndez - Proença de Carvalho

| Galp Energia

FORENSE8ª edição PARCEIROS CMS Rui Pena & Arnaut | Garrigues | Linklaters | Miranda | PLMJ

| Sérvulo & Associados | Uría Menéndez - Proença de Carvalho

DIREITO FISCAL3ª edição PARCEIRO PLMJ

PARCEIRO Sérvulo & Associados

CANDIDATURAS1ª fase: 16 de junho a 31 de julho2ª fase: 1 de agosto a 5 de setembro(para o mestrado em Direito e Gestão termina a 2 de setembro)

Tel. 217 217 [email protected]/posgrad

Advocatus_Jun14:Layout 1 6/19/14 5:27 PM Page 1

Page 48: advocatus, 51

advocatus.pt

48 advocatus junho 2014

C

M

Y

CM

MY

CY

CMY

K

AF_Catolica LLM_International_Business_Law_235x328Advocatus.pdf 1 2/11/14 12:44 PM